2
IVAN SGARABOTTO [email protected] 2 Reprodução O casamento em 1906 de Charles Miller, pai da bola no país, com Antonieta Rud- ge, pianista brasileira, foi o ponta- pé inicial do matrimônio futebol e música. A participação do Brasil no primeiro mundial em 1930 no Uruguai e o começo da “era do rádio” consolidaram as duas maio- res paixões da população bra- sileira até hoje, o som e a bola. Conforme o jornalista da rádio Bandeirantes AM e Ipanema FM, Carlos Guimarães, 31 anos, Charles Miller e Antonieta Rudge podem ter sido um símbolo de duas culturas nacionais. “Não há cultura, civili- zação ou período da humanidade que não tenha relação com a me- lodia. Com o futebol, foi como um encontro à primeira vista. E como paixão combina com paixão, os dois acabaram se confundindo”. Guimarães começou a trabalhar com o futebol há 11 anos quando esteve na rádio Gaúcha AM, e des- de 2008 apresenta o programa de música Sub Pop na Ipanema. Ele acredita que o interesse pelo fute- bol chegou da mesma maneira que para todo o brasileiro. “A força que o esporte tem praticamente impossi- bilita a gente de não acompanhar. É parte da cultura do menino mesmo”. O gosto pela música iniciou cedo com o radialista quando olhava os LPs (discos) de samba do seu avô, como Originais do Samba, Beth Carvalho e Moreira da Silva. A des- coberta pelo rock, ocorreu como um estalo ao ver que era aquilo que so- nhava, com um disco do Iron Mai- den de um colega. “Acho que existe uma magia na arte de um disco”. A sonoridade do futebol A afinidade e a sintonia perfeita da bola com a música De acordo com o radialista Carlos Guimarães, para a maio- ria das pessoas o futebol e a música funcionam como lazer, mas para ele é um ganha-pão. “Eu ganho dinheiro fazendo isso, é uma maravilha. Não sei o que seria da minha vida sem o fute- bol e a música. Provavelmente estaria muito frustado”, afirma. As emissoras FM que atual- mente vivem na mesmice de “mú- sica + música” apesar de ser uma paixão nacional, têm a necessida- de de investir em outras formas de entretenimento, afirma o comu- nicador Guima- rães. “O futebol é uma delas, o for- mato AM/FM do rádio vai terminar. Ninguém cria uma rádio de notícias, até porque notícia e jogo de futebol não se inventa. Quem quer ouvir música, pode escolher as suas e colocar no ipod, no celular, em casa...” Para o radialista é uma ten- dência o futebol e o noticiário estarem no rádio FM. “O AM tem os dias contados. É uma forma absolutamente ultrapassada de veiculação, o som é ruim, a qua- lidade é péssima. Extinguiram com o vinil e o AM continua vivo. Só vai servir de recordação”. Hoje a urgência pede um som digital, com opções de interativi- dade, de dinâmica e de limpeza na audição. “O futebol precisa invadir o FM, tem que acabar a cultura de ouvir futebol com chia- do”, conclui Carlos Guimarães. O jornalista Ramiro Ruschel, 33 anos, coordenador da jornada esportiva e narrador da Máquina do Cafezinho, da rádio Pop Rock FM, explica que, por ter um som mais “limpo” e atingir um núme- ro maior de pessoas (ouvintes), e em razão das novas tecnolo- gias, as emissoras FMs vão tomar conta do mercado. “Aqueles que não modernizarem suas trans- missões, tornando a linguagem mais popular, vão perder espaço”. O criador da Máquina do Cafe- zinho, Thadeu Malta, sempre dizia que o projeto era um “boing” deco- lando. “Não se sabia o real destino, mas sabia que ia subir cada vez mais”, relembra Ramiro Ruschel. Segundo o jornalista, o pro- jeto da Máquina está fechando o terceiro ano de transmissões. “A intenção é desenvolver novas ‘ideias’ para atrair mais ouvintes. O público já é variado, crianças, jovens, adolescentes, adultos e idosos. Queremos é fidelizar a audiência como nossa maneira descontraída de ver o futebol”. A Máquina do Cafezinho se di- ferencia em duas situações que a fazem um produto único no rá- dio. “O bom humor e a formação da equipe nas transmissões, jo- gos do Grêmio, com os gremistas e partidas do Inter, com os colorados. Puxamos para o lado da paixão, e mesmo assim, os gremistas ouvem as transmissões do Internacional e vice-versa”. As barreiras foram quebra- das e acabaram com os ranços que envolvem o meio do futebol, afirma Ruschel. “Sem as críticas destrutivas, sem o revanchismo com as emissoras concorrentes e uma jornada honesta, enxuta. Não massacramos a audiência com matérias repetitivas”, explica. Conforme o narrador, depois da inovação da rádio Pop Rock, as emissoras AMs estão usando mais trilhas de rock em seus programas de pré-jogo. “O samba também é muito utilizado por ser eterna- mente relacionado ao futebol”. A implementação do rock se deve à chegada de profissionais mais jovens, que estão aos pou- cos substituindo figuras consagra- das nos meios das transmissões esportivas. “É uma fase de transi- ção, daqui a uns 10 anos, a nossa geração dos 30 aos 45 anos es- tará perto da aposentadoria e aí as coisas devem mudar”, avisa. O jornalista Ramiro Ruschel foi repórter esportivo da rádio Guaí- ba AM, antes de trabalhar na Pop Rock FM. Ele trocou de emissora e por consequencia de estilo, do jornalismo para o musical, por precisar de um espaço para crescer profis- sionalmente. “Chegou um ponto em que eu não conseguia mais evoluir na profissão por questões hierárquicas”, lembra. A contratação do Ramiro Rus- chel na rádio musical ocorreu através de uma indicação do comunicador Paulo Inchauspe, ao ex-coordenador da emisso- ra Alexandre Fetter. “A Pop Rock caiu como uma ‘luva’, o Fetter como visionário que é, comprou a ideia de implantar o esporte diariamente em uma emissora FM, estávamos ali inovando em rádio jovem no estado. Deu tão certo que o projeto continua vivo na Pop Rock e o Fetter levou a ideia para a rádio Atlântida”. A paixão pelo esporte ultrapassa as barreiras da música “É parte da cultura do menino.” Tita Sachet O futebol precisa invadir o FM.

A sonoridade do futebol

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: A sonoridade do futebol

IVAN [email protected]

2R

epro

duçã

o

O casamento em 1906 de Charles Miller, pai da bola no país, com Antonieta Rud-

ge, pianista brasileira, foi o ponta-pé inicial do matrimônio futebol e música. A participação do Brasil no primeiro mundial em 1930 no Uruguai e o começo da “era do rádio” consolidaram as duas maio-res paixões da população bra-sileira até hoje, o som e a bola. Conforme o jornalista da rádio Bandeirantes AM e Ipanema FM, Carlos Guimarães, 31 anos, Charles Miller e Antonieta Rudge podem ter sido um símbolo de duas culturas nacionais. “Não há cultura, civili-zação ou período da humanidade que não tenha relação com a me-lodia. Com o futebol, foi como um encontro à primeira vista. E como paixão combina com paixão, os dois acabaram se confundindo”. Guimarães começou a trabalhar com o futebol há 11 anos quando esteve na rádio Gaúcha AM, e des-de 2008 apresenta o programa de música Sub Pop na Ipanema. Ele acredita que o interesse pelo fute-bol chegou da mesma maneira que para todo o brasileiro. “A força que o esporte tem praticamente impossi-bilita a gente de não acompanhar. É parte da cultura do menino mesmo”. O gosto pela música iniciou cedo com o radialista quando olhava os LPs (discos) de samba do seu avô, como Originais do Samba, Beth Carvalho e Moreira da Silva. A des-coberta pelo rock, ocorreu como um estalo ao ver que era aquilo que so-nhava, com um disco do Iron Mai-den de um colega. “Acho que existe uma magia na arte de um disco”.

A sonoridade do futebolA afinidade e a sintonia perfeita da bola com a música

De acordo com o radialista Carlos Guimarães, para a maio-ria das pessoas o futebol e a música funcionam como lazer, mas para ele é um ganha-pão. “Eu ganho dinheiro fazendo isso, é uma maravilha. Não sei o que seria da minha vida sem o fute-bol e a música. Provavelmente estaria muito frustado”, afirma. As emissoras FM que atual-mente vivem na mesmice de “mú-sica + música” apesar de ser uma

paixão nacional, têm a necessida-de de investir em outras formas de entretenimento, afirma o comu-nicador Guima-rães. “O futebol é uma delas, o for-mato AM/FM do

rádio vai terminar. Ninguém cria uma rádio de notícias, até porque notícia e jogo de futebol não se inventa. Quem quer ouvir música, pode escolher as suas e colocar no ipod, no celular, em casa...” Para o radialista é uma ten-dência o futebol e o noticiário estarem no rádio FM. “O AM tem os dias contados. É uma forma absolutamente ultrapassada de veiculação, o som é ruim, a qua-lidade é péssima. Extinguiram com o vinil e o AM continua vivo. Só vai servir de recordação”. Hoje a urgência pede um som digital, com opções de interativi-dade, de dinâmica e de limpeza na audição. “O futebol precisa invadir o FM, tem que acabar a cultura de ouvir futebol com chia-do”, conclui Carlos Guimarães. O jornalista Ramiro Ruschel, 33 anos, coordenador da jornada esportiva e narrador da Máquina do Cafezinho, da rádio Pop Rock FM, explica que, por ter um som mais “limpo” e atingir um núme-ro maior de pessoas (ouvintes), e em razão das novas tecnolo-gias, as emissoras FMs vão tomar conta do mercado. “Aqueles que não modernizarem suas trans-missões, tornando a linguagem mais popular, vão perder espaço”. O criador da Máquina do Cafe-zinho, Thadeu Malta, sempre dizia que o projeto era um “boing” deco-lando. “Não se sabia o real destino, mas sabia que ia subir cada vez mais”, relembra Ramiro Ruschel.

Segundo o jornalista, o pro-jeto da Máquina está fechando o terceiro ano de transmissões. “A intenção é desenvolver novas ‘ideias’ para atrair mais ouvintes. O público já é variado, crianças, jovens, adolescentes, adultos e idosos. Queremos é fidelizar a audiência como nossa maneira descontraída de ver o futebol”. A Máquina do Cafezinho se di-ferencia em duas situações que a fazem um produto único no rá-dio. “O bom humor e a formação da equipe nas transmissões, jo-gos do Grêmio, com os gremistas e partidas do Inter, com os colorados. Puxamos para o lado da paixão, e mesmo assim, os gremistas ouvem as transmissões do Internacional e vice-versa”. As barreiras foram quebra-das e acabaram com os ranços que envolvem o meio do futebol, afirma Ruschel. “Sem as críticas destrutivas, sem o revanchismo com as emissoras concorrentes e uma jornada honesta, enxuta. Não massacramos a audiência com matérias repetitivas”, explica. Conforme o narrador, depois da inovação da rádio Pop Rock, as emissoras AMs estão usando mais trilhas de rock em seus programas de pré-jogo. “O samba também é muito utilizado por ser eterna-mente relacionado ao futebol”.

A implementação do rock se deve à chegada de profissionais mais jovens, que estão aos pou-cos substituindo figuras consagra-das nos meios das transmissões esportivas. “É uma fase de transi-ção, daqui a uns 10 anos, a nossa geração dos 30 aos 45 anos es-tará perto da aposentadoria e aí as coisas devem mudar”, avisa. O jornalista Ramiro Ruschel foi repórter esportivo da rádio Guaí-ba AM, antes de trabalhar na Pop Rock FM. Ele trocou de emissora e por consequencia de estilo, do

jornalismo para o musical, por precisar de um espaço para crescer profis-s iona lmente . “Chegou um

ponto em que eu não conseguia mais evoluir na profissão por questões hierárquicas”, lembra. A contratação do Ramiro Rus-chel na rádio musical ocorreu através de uma indicação do comunicador Paulo Inchauspe, ao ex-coordenador da emisso-ra Alexandre Fetter. “A Pop Rock caiu como uma ‘luva’, o Fetter como visionário que é, comprou a ideia de implantar o esporte diariamente em uma emissora FM, estávamos ali inovando em rádio jovem no estado. Deu tão certo que o projeto continua vivo na Pop Rock e o Fetter levou a ideia para a rádio Atlântida”.

A paixão pelo esporte ultrapassa as barreiras da música

“É parte da cultura do menino.”

Tita Sachet

“O futebol precisa invadir o FM.”

Page 2: A sonoridade do futebol

LINHA DO TEMPOFUTEBOL NA MÚSICA

1912 - Flamengo - Bonfiglio de Oliveira

1919 - 1 x 0 - Pixinguinha, Be-nedito Lacerda e Nelson Ângelo

1954 - Um a um - Jackson do Pandeiro

1956 - Na cadência do samba/Que bonito é - Luis Bandeira

1969 - Aqui é o país do futebol - Milton Nascimento e Fernando Brant

1972 - Fio Maravilha - Jorge Ben

1976 - Gol anulado - João Bosco e Aldir Blanc

1982 - Povo feliz/Voa canarinho voa - Memeco e Nono

1989 - O futebol - Chico Buarque

1996 - É uma partida de futebol - Samuel Rosa e Nando Reis

IVAN [email protected]

3

Brasil está vazio na tarde de domingo, né? Olha o sambão, aqui é o país do futebol

Milton Nascimento

O futebol e a música são as maiores paixões do radialista Ra-miro Ruschel, depois da família. “Ao natural os brasileiros são fes-

tivos, e a bola e a canção repre-sentam a alegria. O futebol chegou a ser chamado de o ‘ópio do povo’ e a música já está na veia de cada pessoa que nasce no país; junta os dois e dá samba”, brinca Ruschel.

O músico, torcedor identificado e apaixonado pelo Juventude, Rafael Gubert, 35 anos, define o futebol e a música em uma pala-vra, ‘arte’. “Um jogador de futebol é um artista. O Brasil é o país do futebol, já a música é uma paixão universal”.

Para Gubert, o povo brasileiro é muito peculiar, tanto no som, quanto na bola. “Ele tem uma ginga única, em todos os cantos do mundo, a nossa música é respeitada e admirada, o mesmo acontece com o futebol, o melhor mundo”.

O cantor já compôs músicas para a reinauguração do Alfredo Jaconi, estádio do Juventude. “Foi um prazer imenso, um prêmio ao meu amor pelo clube do meu co-ração, ‘Juventude pra sempre’.” Rafa Gubert também criou uma composição para tentar mobilizar a torcida alviverde na ideia de re-erguer o time, ‘Vamos subir papo’ e regravou neste ano o hino do Juventude em uma versão pop.

Rafael Gubert trabalha exclu-sivamente com a música, os ho-rários das apresentações quando coincidem com os das partidas, ele

perde alguns jogos do time, mas não deixa de acompanhar o clu-be. “O rádio está sempre comigo!”

Semanalmente o torcedor e músico Rafa Gubert participa do programa Na Torcida, da rádio São Francisco AM. Ele salienta que o formato da atração é mui-to parecido com o da Máquina do Cafezinho. “Muito legal essa abordagem mais descontraída no futebol, acho que Caxias do Sul ganharia muito com esse tipo de transmissão de jogos”.

O publicitário, comunicador e integrante da banda Os Tortos, Luiz Gustavo de Paris Ferreira, conhecido como Bivis, 31 anos, é torcedor declarado do Grêmio, e trabalha na Máquina do Cafezinho como repórter de campo. “É fan-tástico trabalhar com as duas pai-xões. Mudamos o perfil das outras transmissões de rádio por associar as duas coisas... música e futebol.”

Conforme o comunicador Bivis, é preciso casar mais os espetácu-los da bola e do som. “Estilo Su-perbowl, jogos com shows antes e ou depois do intervalo. Além de produtos como CDs promocionais e clips. Os torcedores argentinos misturam essa ideia com a cumbia.”

Bivis destaca os envolvimento do grupo de rock gaúcho Maria do

Relento no futebol, com músicas homenageando o Internacional. “Irado! Eles estão se dando tri bem com a banda Ataque Colorado.”

O casamento da bola com o som é perfeito para o público e pra quem fatura com ele, salien-ta o publicitário. “O mercado da bola é muito forte e rico, e o da música é um mercado mais for-te no que tange a arte.”

A “paixão” é o sentimento que define o matrimônio do futebol com a da música, que deu certo no Brasil, o país da bola e da canção.

Tita Sachet

Cabine de transmissão: Máquina do Cafezinho - rádio Pop Rock FM

Divulgação

Rafa Gubert, músico e torcedor incondicional do Juventude

Reprodução