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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL 2.ª Vara Federal Criminal Seção Judiciária do Rio de Janeiro 1 N.º DE ORDEM: 38/2017 SENTENÇA TIPO: D1 PROCESSO Nº: 0182771-15.2016.4.02.5101 AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL RÉU: ANDREA EUNICE HAAS IMPUTAÇÃO: art. 1.º, V, da Lei 9.613/98 (redação original) n/f do art. 69 do Código Penal JUIZ PROLATOR: ALEXANDRE LIBONATI DE ABREU DATA: 29/06/17 I - RELATÓRIO O Ministério Público Federal ofereceu denúncia contra: ANDREA EUNICE HAAS, brasileira, casada, filha de Laís Haas e de João Francisco Haas, nascida em 30- 04-1961 e inscrita no CPF sob o n.º 375.576.880- 15, dando-a como incursa nas sanções do art. 1.º, V, da Lei 9.613/98, por 5 (cinco) vezes, na forma do art. 69 do Código Penal. De acordo com a exordial: I. Dos crimes antecedentes à lavagem de capitais: Henrique Pizzolato (HENRIQUE), esposo de ANDREA, foi condenado criminalmente na Ação Penal nº 470 do STF (conhecida vulgarmente como “mensalão”), pela prática dos crimes de peculato (art. 312 do CP) e corrupção passiva (art. 317 do CP), ambos crimes contra a administração pública, antecedentes à lavagem de capitais, na redação original do art. 1º, V, da Lei nº 9.613/1998. JFRJ Fls 2253 Assinado eletronicamente. Certificação digital pertencente a ALEXANDRE LIBONATI DE ABREU. Documento No: 76313150-224-0-2253-20-984918 - consulta à autenticidade do documento através do site http://www.jfrj.jus.br/autenticidade .

Henrique Pizzolato Sentenca da esposa Andrea Eunice Hass - BARROSO INDULTO PARTICULAR

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N.º DE ORDEM: 38/2017 SENTENÇA TIPO: D1 PROCESSO Nº: 0182771-15.2016.4.02.5101 AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL RÉU: ANDREA EUNICE HAAS IMPUTAÇÃO: art. 1.º, V, da Lei 9.613/98 (redação original) n/f do art. 69 do Código Penal JUIZ PROLATOR: ALEXANDRE LIBONATI DE ABREU DATA: 29/06/17

I - RELATÓRIO O Ministério Público Federal ofereceu denúncia

contra: ANDREA EUNICE HAAS, brasileira, casada, filha de Laís Haas e de João Francisco Haas, nascida em 30-04-1961 e inscrita no CPF sob o n.º 375.576.880-15, dando-a como incursa nas sanções do art. 1.º, V, da Lei 9.613/98, por 5 (cinco) vezes, na forma do art. 69 do Código Penal.

De acordo com a exordial:

“I. Dos crimes antecedentes à lavagem de capitais: Henrique Pizzolato (HENRIQUE), esposo de ANDREA, foi condenado criminalmente na Ação Penal nº 470 do STF (conhecida vulgarmente como “mensalão”), pela prática dos crimes de peculato (art. 312 do CP) e corrupção passiva (art. 317 do CP), ambos crimes contra a administração pública, antecedentes à lavagem de capitais, na redação original do art. 1º, V, da Lei nº 9.613/1998.

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II. Da união de HENRIQUE com ANDREA HENRIQUE e ANDREA vivem maritalmente há mais de 30 anos, conforme declaração em testamento do próprio HENRIQUE, feita em 24/04/2009. No ano de 2005, veio à tona o notório “escândalo do mensalão”, tendo o congresso instaurado CPI para sua apuração. Em 01/03/2006, ainda antes da abertura do inquérito que culminaria na condenação de HENRIQUE (Ação Penal 470/STF), ele e ANDREA requerem consensualmente a dissolução da sociedade de fato que mantinham. Entretanto, a dissolução da união estável foi fictícia, tendo o casal inclusive celebrado casamento em 23/07/2009. Além da própria declaração de HENRIQUE em seu testamento, que afirma a vida comum contínua, durante o período entre a “dissolução da sociedade de fato” e o matrimônio o casal fez diversas viagens conjuntas ao exterior, de longos períodos. Dos registros de saída e entrada do país (disponíveis apenas a partir de 2008), constam as seguintes viagens conjuntas: a) saída do país no vôo JJ8054, no dia 12/03/2008 e regresso no

voo TAM 8055, no dia 27/04/2008. b) saída do país no vôo AF 447, no dia 10/06/2008 e regresso no

voo AF442, no dia 11/7/2008; c) saída do país no vôo RG8616, no dia 19/08/2008 e regresso no

voo RG 8617, no dia 23/08/2008; d) saída do país no vôo AF443, no dia 04/09/2008 e regresso no

vôoAF 442, no dia 03/10/2008; e) saída do país no vôo AF 447, no dia 11/11/2008 e regresso no

vôo AF442, no dia 31/12/2008; f) saída do país no vôo AF 447, no dia 10/02/2009 e regresso no

vôo AF 442, no dia 11/03/2009; g) saída do país no vôo AF 443, no dia 26/04/2009 e regresso no

vôo AF 442, no dia 2/06/2009. Ademais, foi apreendido com o administrador de bens do casal um computador, onde constavam tabelas denominadas “PIZZOL”,

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em suas diversas versões, evidenciando contas de créditos e débitos com o casal. Note-se a existência de uma única conta de encontro de créditos e débitos de HENRIQUE e ANDREA, desde 2006, sendo explícitos os pagamentos e recebimentos feitos nos anos de 2006 a 2010, onde constavam recebimentos de alugueres, pagamento de despesas de condomínio, taxas de incêndio, IPTU, entre outras. Tanto do apartamento “1205” (referência clara ao imóvel da Rua República do Peru, 72, APTO. 1205, Copacabana, Rio de Janeiro, que, pela “partilha”, seria de ANDREA) quanto do apartamento “1001” (referência clara ao apartamento da Rua Domingos Ferreira, 46, apto. 1001, Leblon, Rio de Janeiro, que seria de HENRIQUE) Nessas planilhas também são narrados diversos depósitos feitos à ANDREA, nos anos de 2006 e 2007, evidenciando a transferência constante de recursos entre HENRIQUE a ANDREA. Em janeiro de 2006, o casal abriu conta conjunta no banco Unicaja, agência 0258-Malaga-82, na Espanha, declarando terem o endereço no imóvel Calle Sierra Del Co, 16, bloq 29016, Málaga. Verifica-se a movimentação nesta conta conjunta e nas demais contas abertas na Espanha, com transferências entre o casal durante a alegada dissolução da união. Assim, resta claro que a separação foi artifício utilizado pelo casal para a prática de parte dos atos de lavagem de capitais aqui descritos. III. Dos atos de lavagem de dinheiro. 1) DA CONTA BANCÁRIA EM NOME DE CELSO PIZZOLATO

Entre outubro de 2008 e março de 2011, ANDREA ocultou (juntamente com Henrique) a origem, localização, disposição, movimentação e propriedade de valores provenientes, direta ou indiretamente, de crime contra a administração pública.

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A conta poupança nº 67628-7, na agência 0308 do Banco Itaú foi aberta em 2008 em nome CELSO PIZOLLATO, falecido desde 1978, com uso de carteira de identidade emitida em 30/11/2007. Foi também declarado o endereço à Rua Domingos Ferreira, 46, apto. 1001, Rio de Janeiro e utilizado como comprovante de residência a conta de gás do referido imóvel, imóvel este residência de HENRIQUE e ANDREA. Tal conta recebeu no curto espaço de tempo, entre os dias 03/10/2008 e 11/11/2008, mais de 35 depósitos em dinheiro, sempre em valores inferiores a R$3.000,00, totalizando o saldo de R$ 53.271,41. Com o pagamento de juros, o saldo chegou ao valor de R$55.167,77. Entre janeiro de 2009 a 15 de março de 2011, diversos saques foram feitos por meio de cartão magnético em nome de CELSO PIZZOLATO, quando o saldo passou a ser menos de R$1,00. Entre o período de 12/2008 a 07/2010, foram feitos diversos débitos para pagamento de conta de gás do imóvel onde HENRIQUE e ANDREA residiam, comprovando-se assim os reais proprietários/beneficiários dos valores depositados em nome do irmão falecido de Henrique. É notório que o próprio HENRIQUE solicitou a produção dos documentos de CELSO PIZZOLATO após sua morte e, a partir deles, produziu passaporte com o qual fugiu para a Itália, em setembro de 2013. A falsidade do documento de identidade (que foi utilizado para a abertura da conta) é objeto de outro processo criminal, em relação à HENRIQUE, do qual se requer solicitação de prova emprestada. O fato de a conta ter sido aberta com uso de documento falso do falecido irmão de HENRIQUE, bem como os diversos depósitos em espécie, seguidos, de baixo valor, evidenciam o dolo de ocultar a origem e propriedade dos recursos, utilizados em benefício da acusada e de seu esposo.

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2) DAS AQUISIÇÕES DE BENS NO EXTERIOR EM NOME DE ANDREA

ANDREA ocultou (juntamente com HENRIQUE) a origem, localização e propriedade dos seguintes bens, provenientes direta ou indiretamente de crime:

a) Apartamento da Rua Ronda del Golf Este, finca Doña María Sur, Conjunto residencial “Las Azucencas, bloco 5, 3º andar, porta B, na cidade de Benalmádena/Málaga, Espanha – Imóvel adquirido em 08/04/2008, em nome exclusivo de ANDREA (durante o período de separação fictícia do casal), por 270.000,00 euros (equivalente a R$ 722.636,10, na data da aquisição); b e c) Apartamento na zona residencial na zona residencial TORREQUEBRADA 2, bloco A, Escada 1, sótão, Porta E do residencial “COSTAQUEBRADA”, em Benalmádena, Málaga, Espanha e Garagem na Zona Residencial TORREQUEBRADA 2, subsolo, bloco A, portais 1, 2 e 3, do residencial “COSTAQUEBRADA”, em Benalmádena, Málaga, Espanha. Imóveis adquiridos em 14/12/2009 no nome exclusivo de ANDREA, pelo valor de 350.000,00 euros (equivalente a R$ 896.182,00, na data da aquisição). d) Automóvel FIAT modelo Punto, placa 7597GNF, registrado em 30/06/2009, em nome exclusivo de ANDREA. A compra dos bens acima em nome exclusivo de ANDREA, parte deles durante a dissolução fictícia da união estável, a localização dos bens no exterior, a falta de remessa lícita dos recursos para a aquisição dos bens no exterior e sobretudo a ausência de declarações de tais bens às autoridades brasileiras evidenciam o dolo de ocultar a origem, a localização e a propriedade dos bens provenientes dos recursos obtidos ilicitamente por Henrique.

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Nenhum destes bens foram declarados por ANDREA ou seu esposo para a Receita Federal, na relação de bens e direitos das diversas declaração de Imposto de Renda de Pessoa Física. Tampouco foram os imóveis declarados ao BACEN, já que ANDREA nunca prestou declaração CBE (capitais brasileiros no exterior)”.

A denúncia foi recebida em 16/01/2016 (fls.

1.594/1.596). A acusada foi citada por hora certa, conforme

certidão de fl. 1.848, e apresentou a resposta escrita à acusação adunada às fls. 1.849/1.861, sob o conduto de defesa técnica constituída (fl. 1.862). Nessa peça, alegou, preliminarmente, a inépcia da denúncia e indicou três testemunhas.

Em decisão de fl. 1.864/1.865, o Juízo afastou a

questão preliminar suscitada e deflagrou a instrução. Audiência de instrução e julgamento realizada

conforme fls. 2.195/2.198, ocasião em que foram inquiridas as testemunhas IVETE TANZAWA e ARLINDO ZUCHELLO. Ao final, interrogou-se a ré.

Diligências decorrentes da instrução requeridas e

deferidas em audiência, conforme fl. 2.195. As respostas aos requerimentos diligenciais estão adunadas às fls. 2.201 e 2.217/2.218.

Em memoriais de fls. 2.206/2.215, o Ministério

Público Federal requereu a condenação nos termos da denúncia, fundamentando que as provas colhidas são aptas a caracterizar a materialidade e autoria dos atos de lavagem imputados. Acrescentou que a testemunha Ivete declarou em juízo que não ouvira falar de qualquer separação do casal e que a própria ré declarou no

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interrogatório judicial que manteve relação com Henrique Pizzolato após a eclosão do “escândalo do mensalão”. Asseverou que as declarações da ré em juízo no sentido de que desconhecia o número e agência da conta aberta em nome de Celso Pizzolato não se presta a afastar o seu dolo, pois é público e notório que, à época, o seu marido vinha sendo processado perante o STF e foi condenado pela prática de crimes, motivo pelo qual ambos fugiram para a Europa. Enfatizou que a ré tinha conhecimento de que o dinheiro que o casal usava para se sustentar no exterior provinha de ilícitos penais, pois ambos não trabalhavam nem possuíam modo de auferir renda fora do País. Adscreveu, ainda, que a afirmação de que não declarara às autoridades brasileiras os bens adquiridos no exterior por medo de que fossem considerados fruto de dinheiro espúrio reforça a tese de que tinha consciência do caráter ilícito dessas aquisições.

A defesa técnica, a seu turno, postulou em seus

memoriais (fls. 2.220/2.251) a improcedência do pedido condenatório. Preliminarmente, aduziu que a resposta de fls. 2.216/2.217 apresentada pelo Município de Toledo (PR), em atendimento ao seu requerimento diligencial, encontra-se desconectada dos termos do pleito formulado, pelo que requereu a reiteração do ofício e a subsequente abertura de novo prazo para memoriais finais. No mérito, argumentou que a aquisição dos bens dados como lavados pela ré deu-se com os recursos auferidos pelo seu próprio trabalho, não tendo qualquer conexão com as condutas imputadas ao seu marido HENRIQUE PIZZOLATO no caso conhecido como “escândalo do mensalão”. Indicou que o seu marido, em decorrência do “escândalo do mensalão”, já foi condenado pela lavagem de R$ 326.660,67, montante muito inferior à lavagem de dinheiro que lhe é imputada nestes autos. Alegou que não há nos autos qualquer narrativa que aponte para atos objetivos e dolosos de Andrea quanto à abertura de conta em nome de Celso Pizzolato e movimentação financeira da mesma. Explicou que a separação e partilha de bens do casal não foi fictícia. Por fim, discorreu

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sobre a impossibilidade de imputação de lavagem de dinheiro em concurso material, conforme pretende a acusação.

Informações sobre antecedentes criminais

juntadas às fls. 1.601/1.602 e 1.901/1.904. Vieram conclusos. Foi o relatório. Passo a fundamentar. II - FUNDAMENTAÇÃO A decisão de fls. 1.864/1.865, adiante reproduzida,

já afastara a alegação de inépcia suscitada em resposta à acusação. Transcrevo:

“Tenho que a peça incoativa foi suficientemente clara, implementou todos os pressupostos legais e propicia o mais amplo exercício do direito de defesa. Bem se extrai da exordial que a conduta imputada à ré é de lavagem de dinheiro, através da abertura de conta bancária em nome de Celso Pizzolato, irmão falecido do esposo da acusada, Henrique Pizzolato, e aquisição de bens no exterior, advindos de recursos de origem supostamente ilícita, auferidos por meio dos crimes antecedentes de peculato e corrupção passiva praticados pelo esposo da acusada no processo conhecido como ‘mensalão’. Extrai-se da peça inicial a justa causa consubstanciada pelos elementos de convicção constantes nos autos e por estarem presentes os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, contendo a exposição do fato criminoso com todas as suas circunstâncias, a qualificação da

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acusadas e a classificação do crime. Dessa forma, a denúncia permite precisar com acuidade os limites da imputação, a fim de viabilizar o exercício da ampla defesa e do contraditório”.

Também não há azo para reiteração de ofício à

municipalidade de Toledo/PR, conforme requerido pela defesa em seus memoriais, porquanto não foram encontrados quaisquer registros sobre a ré nos sistemas informatizados daquela prefeitura (fl. 2.218). Frise-se que a diligência poderia ter sido providenciada pela própria defesa, e foi deferida pelo juízo em caráter excepcional, com o intuito de acelerar a resposta. Ademais, no atual estágio processual, pode-se afirmar que eventual resposta diversa do Município de Toledo acerca dos ARTs não modificará o resultado deste processo. Isto porque não se questiona, nestes autos, o desempenho de atividade profissional da ré; e nem os ARTs poderão comprovar que os recursos eventualmente pagos pelas obras acompanhadas pela ré serviram de fonte para os depósitos e contas no exterior.

Portanto, nenhuma nulidade há que ser

reconhecida pelo indeferimento da diligência. Na questão de fundo, atribuem-se atos de lavagem

de dinheiro à acusada, consistentes em:

1. Ocultação, juntamente com seu esposo Henrique Pizzolato, entre outubro de 2008 e março de 2011, da origem, localização, disposição, movimentação e propriedade de valores provenientes, direta ou indiretamente, de crime contra a Administração Pública, através da movimentação da conta-poupança 67628-7, mantida na agência 0308 do Banco Itaú, aberta em nome de Celso Pizzolato, falecido em 02/04/1978 (certidão de óbito à fl. 320);

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2. Ocultação, juntamente com Henrique Pizzolato, da origem, localização e propriedade do Apartamento na Rua Ronda del Golf Este, finca Doña María Sur, Conjunto residencial “Las Azucencas, bloco 5, 3.º andar, porta B, na cidade de Benalmádena/Málaga, Espanha, adquirido em 08/04/2008, em nome da ré ANDREA, com recursos provenientes direta ou indiretamente de crime; 3. Ocultação, juntamente com Henrique Pizzolato, da origem, localização e propriedade do Apartamento na zona residencial TORREQUEBRADA 2, bloco A, Escada 1, sótão, Porta E do residencial “COSTAQUEBRADA”, em Benalmádena, Málaga, Espanha, adquirido em 14/12/2009, em nome da ré ANDREA, com recursos provenientes direta ou indiretamente de crime; 4. Ocultação, juntamente com Henrique Pizzolato, da origem, localização e propriedade da Garagem na Zona Residencial TORREQUEBRADA 2, subsolo, bloco A, portais 1, 2 e 3, do residencial “COSTAQUEBRADA”, em Benalmádena, Málaga, Espanha, adquirida em 14/12/2009, em nome da ré ANDREA, com recursos provenientes direta ou indiretamente de crime; e 5. Ocultação, juntamente com Henrique Pizzolato, da origem, localização e propriedade do Automóvel FIAT, modelo Punto, placa GNF-7597, registrado em 30/06/2009 em nome da ré ANDREA, adquirido com recursos provenientes direta ou indiretamente de crime.

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Esses são os limites da acusação, cuja peça incoativa inaugura os presentes autos às fls. 01/05.

É mister observar que os crimes antecedentes são

os de peculato e corrupção passiva (artigos 312 e 317 do Código Penal, respectivamente), pelos quais o esposo da ré, Henrique Pizzolato, foi condenado nos autos da Ação Penal 470, que tramitou no Supremo Tribunal Federal, amplamente conhecida e divulgada como “processo do mensalão”, cujo julgamento encerrou-se em 04/09/2013 naquela Corte.

Pois bem. Indicados os crimes antecedentes ao

delito de lavagem de ativos, confira-se a redação do tipo penal no qual a ré estaria incursa, conforme redação original da Lei 9.613/98:

Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de crime: ... V – contra a Administração Pública, inclusive a exigência, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, de qualquer vantagem, como condição ou preço para a prática ou omissão de atos administrativos;

Nessa toada, há que se atentar para a circunstância

de todas as condutas acima relatadas evidentemente constituírem fatos praticados após os crimes antecedentes. Do contrário, não haveria como se admitir o branqueamento de ativos, que deve ser, no mínimo, concomitante à prática do crime antecedente. É este o entendimento pretoriano:

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PENAL. LAVAGEM DE DINHEIRO. ART. 1°, DA LEI 9.613/98. NULIDADES PROCESSUAIS. INOCORRÊNCIA. CRIME ANTECEDENTE. DINHEIRO ILÍCITO. OCULTAÇÃO OU DISSIMULAÇÃO. AUSÊNCIA DE PROVAS. ABSOLVIÇÃO. (...) 5. Para caracterização do delito de lavagem de dinheiro é necessária a prévia ocorrência de crime do qual o numerário seja proveniente. Restando evidenciada nos autos a prática de tráfico de entorpecentes apenas a partir de setembro de 2004, as imputações de lavagem de dinheiro anteriores desta data devem ser excluídas, por serem atípicas. (...) (TRF4, 8.ª Turma, ACR 2005.72.00.000260-8, Rel. DF Élcio Pinheiro de Castro, j. 09-08-2007, D.E. 13-08-2007)

Os referidos crimes antecedentes foram cometidos

em meados da década de 2000, tendo sido instaurado o respectivo inquérito policial, inaugurando as investigações, perante o STF em julho de 2005, sendo que os fatos ora imputados foram praticados entre os anos de 2008 e 2011.

Registro que, embora o MPF tenha requerido vista

dos autos após a AIJ para instruir os autos acerca dos documentos de abertura e extratos de movimentação da conta poupança n.º 67628-7, mantida na agência 0308 do Banco Itaú em nome de Celso Pizzolato (fl. 2195), o procurador atuante nada fez (fl. 2.201), limitando-se a dar “ciente”. Se assim é, forçoso constatar que inexiste prova desse possível ato de lavagem, objeto do item III.1 da denúncia.

De todo modo, a despeito da inexistência de prova

da manutenção e movimentação da conta-poupança

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supramencionada, a materialidade delitiva do crime de lavagem de dinheiro encontra-se devidamente positivada pelos diversos documentos que instruem o caderno processual eletrônico.

Consta certidão de inteiro teor de casamento de Henrique Pizzolato e Andrea Eunice Haas, datada de 24 de julho de 2009 (fl. 1.035), sob o regime de comunhão parcial de bens. Todavia, em testamento público de Henrique Pizzolato (fls. 1.009 e seguintes), está registrado que o mesmo vivia em união estável com a ré desde cerca de trinta anos antes do casamento civil de ambos.

Outrossim, há resposta das autoridades

espanholas (fls. 753/758) ao pedido de cooperação jurídica internacional, informando acerca das aquisições de bens no exterior por ANDREA EUNICE HAAS, conforme indicados na denúncia, a saber:

1. apartamento na Rua Ronda del Golf Este

2008, adquirido em 08/04/2008 por 270 mil euros;

2. apartamento na zona residencial TORREQUEBRADA 2 e respectiva vaga de garagem pelo valor total de 350 mil euros em 14/12/2009; e

3. veículo automotor Fiat Punto, registrado no órgão competente em 30/06/2009.

Por fim, aponto a existência de diversas

declarações de imposto de renda pessoa física de Henrique Pizzolato e Andrea Eunice Haas, referentes a anos calendários da década de 2000 e início da década de 2010 (fls. 1.208/1.380), apreendidas na residência de ambos através medida cautelar de busca e apreensão deferida por este juízo, nas quais não constam quaisquer referências aos bens supramencionados.

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No que se refere à autoria, esta também é evidenciada pelos elementos informativos supramencionados, que dão conta da efetiva atuação da ré no branqueamento de ativos provenientes da prática delituosa levada a efeito pelo seu cônjuge.

A testemunha IVETE TANZAWA disse que foi

colega de HENRIQUE PIZZOLATO no Banco do Brasil. Aduziu que o projeto de sua casa, e da casa de vários conhecidos, foi elaborado por ANDREA HAAS, que era considerada arquiteta de renome na cidade de Toledo.

A testemunha ARLINDO ZUCHELLO, arrolada pela

defesa, nada sabia sobre os fatos. Disse, contudo, que conhecia o casal ANDREA EUNICE e HENRIQUE PIZZOLATO desde 1981 e que ANDREA sempre trabalhou como arquiteta. Disse que soube de uma separação do casal por volta de 2007, mas quando soube do fato, o casal já havia reatado. Que sabia que o casal possuía um apartamento alugado na Espanha. Que nada sabia sobre conta em nome de CELSO PIZZOLATO.

Interrogada em juízo, a ré ANDREA EUNICE HAAS

negou a acusação. Disse que sempre trabalhou e os recursos para aquisição dos bens na Espanha eram seus. Disse que desconhecia a conta aberta por HENRIQUE em nome do irmão. Aduziu que a separação consensual ocorreu realmente, e foi feita a partilha. Acrescentou que a separação foi decidida quando seu marido decidiu mudar-se para Brasília, para assumir a Diretoria de Marketing do Banco do Brasil. Afirmou que após a CPI seu marido “ficou muito mal”. Disse que não pôde abandoná-lo. Acrescentou, ainda, que se mudou para a Espanha em 2006 e que não declarou os bens por medo.

De fato, conforme bem assinalado pelo Ministério

Público Federal, a dissolução de sociedade de fato e partilha de bens

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(fls. 1.105 e seguintes) realizada pelo casal foi fictícia, o que se denota não só pela realização do casamento civil pouco tempo depois, em 2009, mas também pelo fato de a mesma ter sido claramente utilizada para a prática dos atos de lavagem imputados. A testemunha ARLINDO ZUCHELLO, arrolada pela defesa, inclusive, ao ser indagado sobre eventual separação do casal, disse que ocorrida antes de 2007, e que, quando soube, o casal já tinha reatado.

A referida dissolução começou a ser processada

em 2006, logo após vir à tona o “escândalo do mensalão”. Contudo, pelo que consta da documentação carreada ao caderno processual, a ré nunca deixou de conviver maritalmente com Henrique Pizzolato. Ora, se o casal estivesse em processo de separação, com partilha de bens, não haveria explicação plausível para que procedessem, no mesmo ano de 2006, à abertura de conta conjunta no banco espanhol UNICAJA (fls. 1.527 e seguintes), da qual, inclusive, não consta menção nas declarações de renda da ré ou do seu esposo (fls. 1.208/1.380).

Extrai-se daí que as transferências de patrimônio

realizadas por Henrique Pizzolato para a ré a partir daquele ano de 2006, sob o pálio de dissolução de sociedade de fato, objetivavam a ocultação do lucro auferido ilicitamente por Henrique, então investigado e processado perante o STF, pela prática de crimes contra a Administração Pública. Também desmentem a versão defendida pela acusada, no sentido de que todo o seu patrimônio foi constituído mediante recursos próprios, adquiridos por meio de seu trabalho como arquiteta.

Aliás, inexiste dúvida acerca do desempenho

profissional lícito da acusada. A acusada fez prova de que trabalhava como arquiteta. Contudo, não há demonstração de que os honorários recebidos sejam a fonte lícita para aquisição dos bens ocultados no exterior. Tratar-se-ia, aliás, de prova simples para a defesa, que

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sequer indicou as transferências e as operações de câmbio que teriam permitido à ré fazer a aquisição dos bens na Espanha.

Consoante a dicção do tipo penal imputado, o bem

ou direito objeto da ocultação deve provir, direta ou indiretamente, do lucro auferido com a prática do delito antecedente, sob pena de violação ao princípio da tipicidade, o que fica claramente demonstrado no caso sob análise.

Frise-se que é despicienda a descrição

pormenorizada dos crimes antecedentes na denúncia: a uma, pois as imputações objeto do presente feito restringem-se à lavagem; a outra, pois a condenação de Henrique Pizzolato na Ação Penal 470 do STF é fato notório, o qual independeria de prova (art. 374, I, do CPC c/c art. 3.º do CPP) e não pode ser ignorado pelo juízo.

As três fases do crime de branqueamento de

capitais estão devidamente demonstradas nos autos, senão vejamos: A conversão, também chamada de ocultação ou

colocação (placement), quando o dinheiro é aplicado no sistema financeiro ou transferido para outro local, é caracterizada pela abertura de conta-corrente no banco espanhol UNICAJA, conjuntamente pela ré e seu marido Henrique, sem declará-la às autoridades nacionais. Não se identifica procedimento lícito nessa transferência, pelo que se conclui que resultado de operação espúria.

A fase de dissimulação, também chamada de

controle ou estratificação (empilage), que objetiva dissociar o dinheiro de sua origem, é denotada pela fictícia separação do casal com a respectiva dissolução de sociedade de fato e partilha de bens, logo após vir à tona o “escândalo do mensalão”.

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Por fim, denota-se a fase final de integração (integration) com a aquisição de bem móvel e bens imóveis no exterior pela ré, em seu próprio nome, em período próximo à data do seu casamento civil com Henrique Pizzolato, com o fim de escamotear a origem desse patrimônio.

Dessa forma, perfeitamente colmatado está o tipo

penal atribuído na denúncia, que deve ser tido como crime único, observadas as fases do delito conforme acima exposto.

Portanto, não há azo para o reconhecimento do

concurso material – art. 69 do Código Penal, conforme pretende o MPF. De acordo com melhor doutrina, o delito de lavagem de dinheiro pode consumar-se instantaneamente ou de forma permanente. O Desembargador ABEL GOMES, ao tratar sobre o tema, afirmou:

“É interessante observar que dentro dos núcleos ‘ocultar’ e ‘dissimular’ cabem diversas modalidades de atos que venham a se revelar aptos a atingir esses desideratos. O delito em tela é daqueles que, com certeza, estarão em constante e aprimorada evolução no que toca à sua prática. Ao próprio legislador quando da elaboração do tipo penal, não seria possível imaginar as várias maneiras pelas quais um sujeito pudesse vir a ‘lavar dinheiro’, sobretudo diante das inúmeras hipóteses que lhe fornecem os sistemas econômico e financeiro e a tecnologia moderna. Em função disso, não encontramos formas vinculadas de conduta nesse tipo penal, que é, pois, um crime de forma livre, de característica algo aberta. É por essa razão que, de acordo com a forma delineada pela conduta praticada e seu transcurso no tempo, o crime poderá não se

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configurar sempre instantâneo, tornando-se eventualmente, permanente (...)” (in Lavagem de Dinheiro, José Paulo Baltazar Jr e Sérgio Moro, Livraria do Advogado, 2007, Porto Alegre, p. 78). Ao se constatar configuradas as fases clássicas do

iter criminis da lavagem, por consequência lógica estará rejeitado o concurso de crimes. Impossível atribuir a cada ato de ocultação um delito de lavagem de ativos, até porque eles fazem parte das três fases supraindicadas, expostas pela doutrina como o “passo-a-passo” do branqueamento de capitais. Trata-se, in casu, de hipótese de permanência delitiva.

Pois bem, em decorrência do exposto, presentes

estão os elementos objetivos (descritivos e normativos) e o subjetivo dolo do crime previsto no art. 1.º, V, da Lei 9.613/98 (redação original). A par disso, não agiu a acusada amparada por qualquer excludente de ilicitude. A agente é culpável, eis maior de 18 (dezoito) anos, com maturidade mental, que, com consciência da ilicitude dos fatos, sendo livre e moralmente responsável, reunia aptidão e capacidade de autodeterminação para decidir-se pelo direito e contra o crime.

III – DISPOSITIVO

Diante do exposto, julgo PARCIALMENTE

PROCEDENTE a denúncia para CONDENAR ANDREA EUNICE HAAS às sanções do art. 1.º, inciso V, da Lei 9.613/98 (redação original).

Passo à dosimetria das penas. Em relação às circunstâncias judiciais (art. 59 do

Código Penal), tenho que a ré atuou com culpabilidade acentuada para delitos da espécie, isso dentro da respectiva moldura de

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imputação subjetiva, em razão do intrincado esquema utilizado, ultrapassando as fronteiras nacionais. Os antecedentes criminais, até então não maculados, não constituem fator negativo de valoração (fls. 1.601/1.602 e 1.901/1.904). A conduta social é desconhecida do Juízo e, portanto, em nada prejudica. Quanto à personalidade, não aparenta transtornos antissociais. Circunstâncias agravadas pelas vultosas quantias de valores branqueados e pela adrede preparação e engendração do crime. O motivo foi a intenção de auferir lucro fácil. As consequências do crime são ínsitas ao próprio tipo penal. O comportamento da vítima não contribuiu.

Sendo assim, e sopesando essas várias

operacionais, fixo a pena-base em 4 (quatro) anos de reclusão e pagamento de 14 (quatorze) dias-multa, a qual torno definitiva na ausência de circunstâncias atenuantes ou agravantes genéricas na segunda fase, bem como por inexistirem causas especiais de diminuição ou aumento de pena na terceira fase da dosimetria da pena.

Fixo o valor do dia-multa em 5 (cinco) salários-

mínimos vigente ao tempo do fato, cada, devidamente corrigidos até o efetivo pagamento, considerando a boa condição econômica da ré.

O regime carcerário é o semi-aberto, que fixo

consoante determina o art. 33, § 2.º, “c”, do Código Penal, observando os critérios previstos no art. 59 e de acordo com o que determina o § 3.º do art. 33 do mesmo Código.

Faculto à ré condenada o apelo em liberdade, nos

termos do art. 387, parágrafo único, do CPP, eis ausentes, ao menos por ora, os pressupostos que justifiquem a necessidade da constrição cautelar.

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Considerando que a condenada preenche os requisitos estabelecidos pelo artigo 44 do Código Penal, substituo a pena privativa de liberdade imposta por 2 (duas) penas restritivas de direitos, consistentes em:

- prestação de serviços à comunidade, mediante

atribuição de tarefas gratuitas à sentenciada, conforme suas aptidões, e que serão cumpridas à razão de uma hora de tarefa por dia de condenação, fixados, o local e horário, em sede de execução, e observada a ressalva contida no § 4.º do art. 46 do CP; e

- repatriação e conversão em renda da União dos

valores lavados. Condeno a ré ao pagamento das custas judiciais. Decreto a perda em favor da União do veículo

automotor e imóveis sequestrados na Espanha (fls. 1.457 e seguintes).

Em caso de interposição de recurso e confirmação

da condenação pelo Egrégio TRF – 2.ª Região, expeça-se carta para execução provisória da pena.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Rio de Janeiro/RJ, 29 de junho de 2017.

ALEXANDRE LIBONATI DE ABREU Juiz Federal

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