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Sida - médicos e namorados adolescentes

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Page 1: Sida - médicos e namorados adolescentes

Médicos devem avisar companheiros de seropositivos do risco de contágio, se os doentes não o fizerem ALEXANDRA CAMPOS

Público, 24/07/2013 - 15:34

Direito à proteção da saúde e da vida sobrepõe-se ao dever de sigilo

médico, volta a afirmar a Ordem dos Médicos num parecer sobre um caso

que envolve um casal de namorados adolescentes.

Se uma pessoa infetada com VIH/sida, apesar de instada pelo médico, decidir

não avisar o companheiro do risco de contágio que este corre ao manter

relações sexuais desprotegidas, o profissional de saúde tem o direito de o

alertar para o perigo de transmissão do vírus. O problema já é antigo, deu até

origem a um parecer do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida

(CNECV) há 13 anos, mas ainda há médicos que continuam com dúvidas

sobre esta matéria.

Page 2: Sida - médicos e namorados adolescentes

Foi o que aconteceu com uma médica de família que pediu recentemente um

esclarecimento à Ordem dos Médicos (OM) quando uma sua doente – uma

adolescente de 17 anos, grávida e seropositiva – se recusou a informar o

namorado do risco de transmissão de VIH/sida. A médica tentou persuadi-la a

avisar o namorado, com quem a adolescente admitiu que continuava a manter

relações sexuais não-protegidas, mas a jovem persistiu na sua posição e disse

que não tencionava informá-lo da situação.

A adolescente foi infetada por transmissão vertical (através da mãe, quando

esta estava grávida) e está a ser seguida em consulta hospitalar e a ser tratada

com medicamentos anti-retrovirais.

O caso é relatado na última edição da revista da OM, que inclui o parecer do

consultor jurídico Paulo Sancho. Sublinhando que se trata de uma situação

“excepcional”, o jurista defende que a médica pode avisar o namorado da

situação clínica da doente, mas só depois de comunicar à paciente que o vai

fazer. A médica não necessita sequer de autorização expressa do bastonário

da OM, frisa.

“Situação excepcional”

Ao abrigo do artigo 89.º do Código Deontológico da Ordem, “a obrigação de

segredo médico não impede que o médico tome as precauções necessárias,

promova ou participe em medidas de defesa da saúde, indispensáveis à

salvaguarda da vida e saúde de pessoas que possam contactar com o doente,

nomeadamente membros da família e outros conviventes”, justifica.

Sendo a preservação da saúde e da vida “o valor fundamental”, acrescenta, o

médico deve, mesmo assim, tentar primeiro persuadir o doente a modificar o

seu comportamento. “Só depois poderá revelar a situação às pessoas

interessadas”, avisando o paciente que o vai fazer. Na prática, explicou Paulo

Sancho ao PÚBLICO, trata-se de uma “situação excepcional” que justifica “a

exclusão do dever de sigilo e que não implica uma escusa formal” por parte do

bastonário da OM.

“Esta é uma das situações em que é consensual aceitar-se que o sigilo médico

pode ser quebrado”, sintetizou o presidente do CNECV, Miguel Oliveira e Silva,

sublinhando que estes casos são discutidos “em aulas de ética médica” desde

há muitos anos. Esta doutrina é, de facto, defendida desde 2000 por Paulo

Sancho – que fez então um parecer sobre a matéria, depois enviado para

apreciação no Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida.

Page 3: Sida - médicos e namorados adolescentes

Relatando o caso específico de um doente em tratamento num centro de

atendimento a toxicodependentes – um paciente seropositivo e que, apesar de

instado, nunca informou a mulher da sua situação e continuava a manter

relações sexuais não-protegidas –, o CNECV defendeu que este tipo de

situação não pressupõe a quebra de sigilo médico.

Neste “conflito entre dois deveres”, o da defesa da privacidade e o da

protecção da saúde e vida da mulher do doente e eventuais filhos do casal,

refere o parecer, o médico deve “continuar a envidar todos os esforços para

rapidamente persuadir o doente da obrigação grave de comunicar à mulher a

seropositividade e risco de transmissão”. Se não o fizer, porém, o médico deve

informá-lo de que irá cumprir a sua obrigação de comunicação da

seropositividade e riscos de transmissão, o que “não pressupõe, neste caso,

quebra de sigilo médico”. Esta comunicação conclui o parecer, “é indispensável

para que a mulher possa fazer testes de diagnóstico e iniciar tratamento, caso

já tenha sido infectada”.

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Campos, Alexandra (2013). Médicos devem avisar companheiros de seropositivos do

risco de contágio, se os doentes não o fizerem. Público:

http://www.publico.pt/sociedade/noticia/medicos-devem-avisar-companheiros-de-

seropositivos-do-risco-de-contagio-se-os-doentes-nao-o-fizerem-1601188 , Acedido

em 25/07/14, às 00h.28min