Gestão ambiental de terras indígenas, um pouco do acre e os retrocessos das políticas indígena e...
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1 Gestão ambiental de terras indígenas, um pouco do Acre e os retrocessos das políticas indígena e ambiental brasileiras Roberta Graf Texto-base da fala na Mesa-Redonda da 66ª. SBPC, em Rio Branco, na UFAC, dia 24/07/2014: “Políticas públicas, comunidades tradicionais e a questão da sustentabilidade (ABA)” (Revisto e finalizado em 22 de agosto de 2014) Prefácio Este é apenas um breve artigo nada científico, sem revisão bibliográfica e, por vezes, coloquial, relatando um pouco da minha experiência em gestão ambiental de terras indígenas no Acre, suas potencialidades, mas em confronto com os desmontes atuais, em curso e propostos, às políticas indígena e ambiental, que tenho acompanhado de perto, com muita preocupação. Deixo claro, de início, uma vez que citarei partidos ao longo do texto, que eu não possuo filiação partidária e nem tenho nada contra partido algum, especificamente. Apenas aponto, como outros analistas, que o curso das políticas (ou a falta delas) ambiental e indígena vai mal, como não víamos desde a ditadura militar – em alguns pontos vemos retrocessos até em relação a esta época! E o retrocesso é suprapartidário, ou seja, composto de vários partidos, especialmente composto pelo setor ruralista (aliado ao de agrotóxicos e transgênicos) e das empreiteiras, entre outros. Mas esta não é uma dura realidade só brasileira. O mundo todo em seu capitalismo selvagem expansionista tem sido, em sua maioria de governos e nos órgãos mundiais, cego-surdo-mudo pra estas questões. Há países melhores e piores, e o Brasil infelizmente encontra-se no segundo grupo, há muito o que melhorar e que cuidar para não desabar ainda mais. Agradeço imensamente o convite da Profa. Dra. Andreia Martini e o endosso da ABA por esta fala na reunião da SBPC, que por sinal foi de ótima qualidade em todos os aspectos, contando inclusive com uma sessão especial intitulada “SBPC Indígena”, por esforço do Prof. Jacó Cesar Piccoli da UFAC, e outra “SBPC Extrativista”, por esforço do PZ / UFAC (e colaboradores). A SBPC indígena particularmente foi extremamente exitosa, com indígenas de todo o Brasil e América Latina, grandes personalidades, palestras, feiras de artesanato indígena, apresentações culturais e sessões espirituais (xamânicas, ou de pajelança, como eles preferem chamar). Os indígenas puderam, na ocasião, fazer intercâmbios e assembleias do seu movimento social, bem como apresentaram uns aos outros os 2 candidatos indígenas do Acre, um a deputado estadual e um a federal, 1 o que é de grande importância já que o Acre não teve, até hoje, um deputado indígena, e possui pouquíssimos vereadores indígenas. Embora meu nome, na programação, tenha vindo como “Ibama”, instituição em que trabalhei até o mês passado, 2 eu não estou apresentei em nome do Instituto, mas sim como pesquisadora independente, embora descreva, brevemente, um programa do Ibama deveras exitoso junto aos indígenas que liderei no Acre, com muito prazer, até que ele foi extinto, um dos muitos, no contexto de “enxugamento” do Ibama. Minha formação é de gestão e política ambiental, tendo doutorado pela Unicamp. Em minha trajetória passei por temas como epistemologia científica e tecnológica, um pouco de antropologia, gestão ambiental de resíduos sólidos, educação ambiental e ética ambiental. No Ibama tive a oportunidade de coordenar o Programa de Agentes Ambientais Voluntários (PAAV), com sucesso de 2006 a 2010 (e desacelerando em 2011 e 2012, por corte de recursos a zero), no qual formava e apoiava populações tradicionais e afins 3 na gestão ambiental de seus territórios, incluindo os indígenas. Com estes o Programa foi mais exitoso, pois eles tiveram bastante seriedade e apreço por ele, sem dúvida por já praticarem, historicamente, a defesa e gestão de seus territórios com afinco. E então iniciou-se uma fortuita cooperação profissional. Mesmo findo o Programa, eu segui me interessando pela temática de gestão ambiental de terras indígenas (GATI) e política indígena, um tanto por gosto particular (ensaio até um pós-doutorado no tema), e outro tanto para prestar apoio às associações indígenas em seu movimento social. Assim, esse artigo é uma panorâmica do cenário atual preocupante das questões indígenas e ambientais no Brasil. Eu, como servidora pública de um órgão (Ibama) e setor que, hoje, não pratica quase nenhuma educação ambiental ou agenda positiva junto à sociedade (mas sim comando e controle), me vejo totalmente sem tempo para atuar nesses campos, “escravizada pela burocracia”, como já dizia Max Weber. Mas assim mesmo, creio que vale a pena publicá-lo, podendo ser útil aos indígenas e seus parceiros, até porque consta um apanhado de importantes citações, ao longo do texto e no item 6, que recomendo. 1 Manoel Gomes, da TI Colônia 27, etnia Huni Kuin (Kaxinawá), e Sabá Manchineri, da TI Mamoadate, etnia Manchineri, respectivamente. 2 Obtive a redistribuição ao ICMBio, o órgão irmão gêmeo do Ibama (de quando este foi divido ao meio na gestão Lula), onde estou desde 30 de julho último. 3 Trabalhamos com indígenas, extrativistas, pescadores, ribeirinhos, pequenos colonos e até, em menor quantidade, comunidades urbanas voltadas a gestão ambiental de algum território, em geral uma unidade de conservação.
Gestão ambiental de terras indígenas, um pouco do acre e os retrocessos das políticas indígena e ambiental brasileiras
Texto-base da fala na Mesa-Redonda da 66ª. SBPC, em Rio Branco, na UFAC, dia 24/07/2014: “Políticas públicas, comunidades tradicionais e a questão da sustentabilidade (ABA)” (Revisto e finalizado em 22 de agosto de 2014)
Text of Gestão ambiental de terras indígenas, um pouco do acre e os retrocessos das políticas indígena e...
1. 1 Gesto ambiental de terras indgenas, um pouco do Acre e os
retrocessos das polticas indgena e ambiental brasileiras Roberta
Graf Texto-base da fala na Mesa-Redonda da 66. SBPC, em Rio Branco,
na UFAC, dia 24/07/2014: Polticas pblicas, comunidades tradicionais
e a questo da sustentabilidade (ABA) (Revisto e finalizado em 22 de
agosto de 2014) Prefcio Este apenas um breve artigo nada cientfico,
sem reviso bibliogrfica e, por vezes, coloquial, relatando um pouco
da minha experincia em gesto ambiental de terras indgenas no Acre,
suas potencialidades, mas em confronto com os desmontes atuais, em
curso e propostos, s polticas indgena e ambiental, que tenho
acompanhado de perto, com muita preocupao. Deixo claro, de incio,
uma vez que citarei partidos ao longo do texto, que eu no possuo
filiao partidria e nem tenho nada contra partido algum,
especificamente. Apenas aponto, como outros analistas, que o curso
das polticas (ou a falta delas) ambiental e indgena vai mal, como
no vamos desde a ditadura militar em alguns pontos vemos
retrocessos at em relao a esta poca! E o retrocesso suprapartidrio,
ou seja, composto de vrios partidos, especialmente composto pelo
setor ruralista (aliado ao de agrotxicos e transgnicos) e das
empreiteiras, entre outros. Mas esta no uma dura realidade s
brasileira. O mundo todo em seu capitalismo selvagem expansionista
tem sido, em sua maioria de governos e nos rgos mundiais,
cego-surdo-mudo pra estas questes. H pases melhores e piores, e o
Brasil infelizmente encontra-se no segundo grupo, h muito o que
melhorar e que cuidar para no desabar ainda mais. Agradeo
imensamente o convite da Profa. Dra. Andreia Martini e o endosso da
ABA por esta fala na reunio da SBPC, que por sinal foi de tima
qualidade em todos os aspectos, contando inclusive com uma sesso
especial intitulada SBPC Indgena, por esforo do Prof. Jac Cesar
Piccoli da UFAC, e outra SBPC Extrativista, por esforo do PZ / UFAC
(e colaboradores). A SBPC indgena particularmente foi extremamente
exitosa, com indgenas de todo o Brasil e Amrica Latina, grandes
personalidades, palestras, feiras de artesanato indgena,
apresentaes culturais e sesses espirituais (xamnicas, ou de
pajelana, como eles preferem chamar). Os indgenas puderam, na
ocasio, fazer intercmbios e assembleias do seu movimento social,
bem como apresentaram uns aos outros os 2 candidatos indgenas do
Acre, um a deputado estadual e um a federal,1 o que de grande
importncia j que o Acre no teve, at hoje, um deputado indgena, e
possui pouqussimos vereadores indgenas. Embora meu nome, na
programao, tenha vindo como Ibama, instituio em que trabalhei at o
ms passado,2 eu no estou apresentei em nome do Instituto, mas sim
como pesquisadora independente, embora descreva, brevemente, um
programa do Ibama deveras exitoso junto aos indgenas que liderei no
Acre, com muito prazer, at que ele foi extinto, um dos muitos, no
contexto de enxugamento do Ibama. Minha formao de gesto e poltica
ambiental, tendo doutorado pela Unicamp. Em minha trajetria passei
por temas como epistemologia cientfica e tecnolgica, um pouco de
antropologia, gesto ambiental de resduos slidos, educao ambiental e
tica ambiental. No Ibama tive a oportunidade de coordenar o
Programa de Agentes Ambientais Voluntrios (PAAV), com sucesso de
2006 a 2010 (e desacelerando em 2011 e 2012, por corte de recursos
a zero), no qual formava e apoiava populaes tradicionais e afins3
na gesto ambiental de seus territrios, incluindo os indgenas. Com
estes o Programa foi mais exitoso, pois eles tiveram bastante
seriedade e apreo por ele, sem dvida por j praticarem,
historicamente, a defesa e gesto de seus territrios com afinco. E
ento iniciou-se uma fortuita cooperao profissional. Mesmo findo o
Programa, eu segui me interessando pela temtica de gesto ambiental
de terras indgenas (GATI) e poltica indgena, um tanto por gosto
particular (ensaio at um ps-doutorado no tema), e outro tanto para
prestar apoio s associaes indgenas em seu movimento social. Assim,
esse artigo uma panormica do cenrio atual preocupante das questes
indgenas e ambientais no Brasil. Eu, como servidora pblica de um
rgo (Ibama) e setor que, hoje, no pratica quase nenhuma educao
ambiental ou agenda positiva junto sociedade (mas sim comando e
controle), me vejo totalmente sem tempo para atuar nesses campos,
escravizada pela burocracia, como j dizia Max Weber. Mas assim
mesmo, creio que vale a pena public-lo, podendo ser til aos
indgenas e seus parceiros, at porque consta um apanhado de
importantes citaes, ao longo do texto e no item 6, que recomendo. 1
Manoel Gomes, da TI Colnia 27, etnia Huni Kuin (Kaxinaw), e Sab
Manchineri, da TI Mamoadate, etnia Manchineri, respectivamente. 2
Obtive a redistribuio ao ICMBio, o rgo irmo gmeo do Ibama (de
quando este foi divido ao meio na gesto Lula), onde estou desde 30
de julho ltimo. 3 Trabalhamos com indgenas, extrativistas,
pescadores, ribeirinhos, pequenos colonos e at, em menor
quantidade, comunidades urbanas voltadas a gesto ambiental de algum
territrio, em geral uma unidade de conservao.
2. 2 1. Gesto ambiental de terras indgenas, e um pouco dela no
Acre Desde junho de 2012 temos promulgado o Dec. n. 7.747, que
regulamenta a Poltica Nacional de Gesto Territorial e Ambiental de
Terras Indgenas (Pngati), fruto de um amplo processo de consulta
pblica anterior, aos indgenas e aos envolvidos com o tema. At hoje,
porm, pouco dela foi implementado de fato enquanto poltica
nacional, ou seja, com recursos, planejamentos e envolvimento das
instituies. No ano de 2013 foi lanado um edital do PDPI para
execut-la, com poucos recursos e apenas 16 terras (projetos)
contemplados no pas. Ou seja, ainda falta muito, sendo uma poltica
ainda quase que s terica. Diz Mrcio Santilli que a Pngati da mais
alta importncia, afinal 13% do territrio do Brasil j est demarcado
em TIs oficiais, mas no h recursos ou vontade poltica nessa direo.4
Haveria muito o que se dizer sobre a GATI, e h diversos autores e
instituies se debruando na teoria e prtica do tema, mas,
rapidamente, eu gostaria de destacar dois aspectos. Um que os
indgenas, historicamente acostumados abundncia territorial sem
limites, e vidas nmades ou seminmades, hoje so obrigados a mudar o
foco e se acostumar a terras limitadas e demarcadas, para sempre
confinados (sendo algumas terras, inclusive bem pequenas, sobretudo
fora da Amaznia). Portanto, eles precisam se preocupar cada vez
mais com o bom manejo de recursos naturais e gesto do territrio,
pois precisam deles preservados para as futuras geraes, que
inclusive esto crescendo em nmero. Outro aspecto o de que,
sabidamente, em diversos levantamentos produzidos por instituies
ambientais, as TIs so reconhecidas como reas altamente preservadas,
at mais do que as unidades de conservao de proteo integral. Bem
como, numa viso mais ousada, o modo de vida indgena aponta
elementos que podem servir de modelo de escape ao prprio colapso
ecolgico da humanidade, com o agravar dos problemas (segundo o
antroplogo Eduardo Viveiros de Castro, citado por Moyss P. Neto,5 e
autores do campo da tica Ambiental). Sem dvida pode em muito nos
ensinar, sobre o convvio sustentvel com a floresta (e outros
ecossistemas) e o etnoconhecimento vegetal e animal, por exemplo. A
despeito da falta de vontade poltica do governo na PNGATI, j h
algum avano concreto no tema, em boa parte por iniciativa dos
prprio indgenas que procuram o MMA e instituies ambientalistas, em
outra parte por iniciativa deste Ministrio, da Funai, dos OEMAs e
do terceiro setor, como o caso da CPI (Comisso Pr-ndio), no Acre,
que h anos vem implementando projetos continuados de formao de
agentes agroflorestais indgenas (AAFIs) e apoio GATI, na prtica.6 A
experincia do PAAV / Ibama tambm foi relevante, Brasil afora. Me
recordo agora de pelo menos 6 estados em que houve trabalho assduo
junto a indgenas: Acre, Amazonas, Par, Mato Grosso, Mato Grosso do
Sul e Maranho. No Acre ele foi ativo de 2003 a 2012, mas foi mais
produtivo, com recursos financeiros prprios (embora parcos -
fazamos milagre com eles) por 5 anos (de 2006 a 2010). Formamos no
Acre e sudoeste do Amazonas um total de 506 agentes, representantes
de outros tantos agentes informais de suas comunidades, pois eles
eram multiplicadores de toda uma prxis de gesto. Destes, na ativa
(sem contar com as desistncias), permanecemos ao final com 172
indgenas, de 19 etnias (as 15 do Acre e mais 4 do Amazonas), de
todas as terras povoadas no estado e algumas no Amazonas
(perfazendo 44 terras / reas indgenas). O Programa no Acre
funcionava a partir de cursos densos de 45 horas, envolvendo o
principal da legislao ambiental pertinente em cada caso, noes de
ecologia e da questo ambiental, prticas de gesto e educao
ambiental, bem como de vigilncia e fiscalizao dos territrios. Os 15
cursos que ministramos geralmente possuam pblicos mistos, entre
indgenas, extrativistas e pequenos colonos, por exemplo, embora
alguns foram somente com indgenas. A integrao e troca de
experincias destes membros de populaes tradicionais de diversas
origens, reas e municpios diferentes era riqussima para eles. Tambm
procurvamos usar linguagem didtica a partir de fotos, figuras e
vdeos, pois parte do pblico era analfabeto ou semianalfabeto, e
tcnicas participativas durante todo o curso, com dinmicas e artes.
O Programa caiu como uma luva aos indgenas, que em muito se
satisfaziam com o andamento, nos procuravam bastante, e sempre
tentvamos apoi-los como podamos. O motivo central da cooperao
exitosa entre os indgenas e o Ibama, ao meu ver, o fato da
identificao profunda do indgena com sua terra, com a defesa
constante de seu territrio e recursos naturais. Por exemplo, quanto
vigilncia e fiscalizao ambiental contra invasores (que roubam caa,
pesca e madeira e podem cometer outras infraes como desmate,
queima, biopirataria e captura de animais silvestres para trfico),
os indgenas sempre praticam, independente de apoio externo ou no, e
j esto acostumados a encaminhar os invasores polcia e/ou ao
Ministrio Pblico mais prximo. Isso possvel devido forte coeso e
organizao comunitria7 dos indgenas em cada aldeia e TI, bem como
sua forte identificao com a prpria terra, a natureza. Estas so
questes centrais indgenas, e por isso que antroplogos tanto
insistem no fato de 4 Disponvel em http://racismoambiental.net.br,
de 19/07/2013. 5 Disponvel em http://racismoambiental.net.br, de
07/07/2014. 6 H diversas iniciativas exitosas resultantes, como
implementao de agrofloresta, produo de frutas, criao de peixes e
pequenos animais domsticos, educao ambiental, gesto de resduos,
saneamento, e vigilncia e fiscalizao de territrios. 7 A comunidade
para os indgenas bem coesa. As prprias relaes de parentesco entre
eles so ampliadas para alm das relaes sanguneas, tecendo redes
sociais fortes, intra e intercomunitrias, de trocas e ajuda mtua
contnuas.
3. 3 que se pode at mesmo exterminar uma etnia indgena se uma
hidreltrica os expulsa de seu territrio natal, por exemplo.8
Voltando ao assunto, portanto, por meio do PAAV / Ibama,
procurvamos apoi-los com algum recurso prprio para gasolina e
alimentao (para os mutires de vigilncia, da Resoluo Conama n. 03 de
1988), redigindo projetos para editais ambientais, indo s
comunidades e dando palestras ao conjunto delas, observando e
orientando atividades prticas de gesto ambiental dos agentes e seus
colegas. Bem como, prestvamos apoio ajudando-os a se integrar a
redes de governana ambiental local e global (fazendo a ponte entre
eles e rgos pblicos, ONGs e outras instituies). Algumas TIs foram
bastante beneficiadas com o Programa, o caso, por exemplo, da TI
Colnia 27, a qual, com dezenas de famlias, possui somente 300
hectares, encostada cidade de Tarauac, e quando receberam a terra
estava quase toda degradada com pastagem. A partir do primeiro
curso do PAAV / Ibama em 2002 (na poca, ministrado por servidores
de Braslia), os indgenas de l vestiram a camisa ambiental e
agroecolgica, tiraram todo o gado e foram recuperando pouco a pouco
toda a rea de pasto em lindos pomares e SAFs, e hoje so professores
e referncias para indgenas de vrias TIs, sediando cursos e
encontros. Concluindo, no caso do Acre, nosso Programa veio
enriquecer o trabalho j efetuado h mais de duas dcadas pela CPI,
por meio dos AAFIs, aprimorando a formao deles e envolvendo outros
colegas seus como agentes ambientais voluntrios. Fomos at aonde a
instituio e os recursos financeiros permitiram, com alta
produtividade, at que o Programa foi oficialmente extinto pelo
Ibama em maio de 2013. No Acre as etnias indgenas costumam ser
vistas como preservadoras, ecolgicas, bem como, felizmente, aqui h
uma situao de relativa ausncia de conflitos de terra (exceto
algumas pendncias pequenas em comparao com o restante do Brasil,
como as demarcaes das TIs Seringal Curralinho, Nawa e Kuntanawa).
No geral, tambm, pode-se dizer que as grandes degradaes e conflitos
socioambientais que vm ocorrendo amide no Brasil ainda no chegaram,
com fora, no Acre, ou, o capital ainda no solapou a maior parte dos
modos de vida das nossas populaes tradicionais. claro que existem
problemas, como a aprovao do milho transgnico pelo governo atual de
Sebastio Viana (PT) que desrespeitou a prpria lei estadual,9 algum
desmate e queima ilegal, retirada de madeira ilegal e planos de
manejo madeireiro permissivos e no fiscalizados,10 etc. O problema
de venda de carne de caa aqui no Acre serssimo, com fortes
quadrilhas, entranhado na m prtica cultural de cidados urbanos,
entre eles servidores pblicos, polticos e membros do poder
judicirio, at de alto escalo (!!!). Bem como ser muito problemtica
a explorao de petrleo e/ou gs natural que se vislumbra na regio do
Juru (de alta relevncia ecolgica e permeada de UCs e TIs), e a
passagem de rodovia e/ou ferrovia de Cruzeiro do Sul (AC) a
Pucallpa (Peru), que sangrar o Parque Nacional Serra do Divisor. As
experincias exitosas de indgenas no Acre so diversas e presentes em
praticamente todas as TIs e reas. H iniciativas de SAFs, pomares,
enriquecimento de capoeiras com madeireiras e frutferas, criao de
peixes e pequenos animais, manejo de recursos naturais, artesanato
com beneficiamento de produtos no-madeireiros (de sementes, palha,
algodo tecelagem, seringa com destaque aos produtos encauchados da
TI Nova Olinda, frutas como o batom de urucum da TI Rio Gregrio),
etc. Os indgenas costumam ser muito produtivos em produo de mudas
plantio, por exemplo, o caso dos Kuntanawa, que, no interior da
Resex Alto Juru, doam milhares de mudas, anualmente, aos
extrativistas vizinhos.11 Os indgenas acrianos tambm tm se
destacado por seus festivais culturais, alguns bastante abertos a
visitantes de fora, como o da Aldeia Nova Esperana, na TI Rio
Gregrio, que anualmente recebe centenas de visitantes no-ndios
(naws, como eles chamam) do Brasil e do mundo, agenciados por
empresas de turismo. H o festival das TIs Jordo e Independncia, j
crescendo anualmente, e h festivais menores em cada terra, cada vez
mais organizados e produtivos. Os festivais para eles so pea chave
na afirmao e valorizao cultural, no traado de alianas intertnicas,
interterras e deles com naws brasileiros e estrangeiros em geral,
que possam apoi-los em projetos 8 Dizem os autores da Plataforma
Dhesca vida digna a estes povos, visto que a produo e reproduo de
seu modo de ser est intimamente ligada ao espao da ancestralidade,
da terra (DHESCA, 2014, p. 17). 9 Lei Estadual n. 1.534, de
22/01/2004, que "veda o cultivo, a manipulao, a importao, a
industrializao e a comercializao de organismos geneticamente
modificados (OGMs) no Estado do Acre". 10 Alis os indgenas tm se
preocupado amide com macios manejos madeireiros na regio do Rio
Gregrio, por exemplo, em que o governo vem construindo diversas
serrarias de transbordo. Muitas destas reas fazem divisa com a TI
Rio Gregrio, e milhares de hectares pertencem ao milionrio
televisivo Ratinho, cuja fama no nada boa nestas paragens. O manejo
madeireiro muito criticado por cientistas e ambientalistas por, de
fato, no ser ecologicamente sustentvel, no ser bem monitorado pelos
rgos ambientais e abrir brecha futura ao desmate para instalao de
pecuria, alm de outros impactos socioculturais normalmente
desprezados pela cadeia econmica envolvida (com boas excees, no
entanto). 11 preciso fazer pelo menos outras duas menes honrosas
aos Kuntanawa. Eles foram os protagonistas, na pessoa do patriarca
Seu Milton e toda a famlia, junto a colegas extrativistas, na criao
da primeira reserva extrativista do mundo, a Resex Alto Juru. Na
poca, ainda no tinham retomado sua etnicidade Kuntanawa (cf FRANCO,
2008), mas h alguns anos sim, e esto demandando, ento, uma TI
especfica. Outra a do liderana jovem Haru Kuntanawa (AAV formado
pelo Ibama, inclusive) que tem se destacado na defesa ambiental
local internacional, sendo membro de uma comisso da ONU pela paz
mundial, e fazendo alianas com lideranas indgenas e ambientalistas
do exterior. Alis, h diversos indgenas acrianos famosos
internacionalmente por seus trabalhos e presenas em convenes
mundiais, como o caso tambm dos AAVs Benki Pianko (da etnia
Ashaninka), e Nilson Saboia (Tuwe, da etnia Huni Kuin,
cineasta).
4. 4 futuros, bem como, este um fator que amplia a conscincia
indgena da populao no-indgena em geral, o que de fato positivo e
uma necessidade, diante dos novos levantes racistas anti-indgenas
que vem surgindo com crescente fora no Brasil (falaremos desse tema
mais adiante). Se os festivais so, sem dvida, positivos, at pelo
aporte direto de recursos financeiros pelo etnoturismo da ocasio e
pela venda de artesanato, so tambm carregados de riscos, como
sempre alertamos aos indgenas, porque com os visitantes vm
numerosos impactos culturais, possveis doenas, possveis crimes
ambientais na surdina, possveis crimes culturais de uso indevido de
imagens e de apropriao de patrimnio imaterial (kens, cantos,
conhecimentos de pajelana), portanto preciso se ter um alto nvel de
cuidado, triagem e orientao aos visitantes, para minimizar os
impactos. A simples presena do naw urbano em sua terra, repleto de
botas chiques, roupas, mochilas, equipamentos audiovisuais
sofisticados, etc, j cria um enorme desafio aos indgenas para
reverter a tendncia de sada de indgenas para as cidades. Outro
aspecto relevante das TIs do Acre (e que certamente devem se
verificar em TIs brasileiras), que salta aos olhos dos
observadores, a democracia, transparncia, harmonia de gesto e
convivncia internas. Tudo resolvido em longas e harmnicas reunies,
e os lideranas so legtimos representantes do seu povo. Quando no
esto desempenhando bem seu papel, so trocados por outros. Os
indgenas em sua coeso de laos coletivos internos so muito avanados
nesses aspectos de organizao social. Sabem resolver bem problemas
internos, tendo eles prprios, s vezes, seguranas em ronda e cadeias
(para situaes-limite), j que tudo resolvido no consenso, e na mxima
incluso das demandas. Esse aspecto democrtico facilitado, sem
dvida, pelo relativamente baixo contingente populacional, mas o
fator determinante o cultural. E por falar em cultura, o que
central, realmente, em todos os casos, e tambm para o xito da gesto
ambiental e territorial, a valorizao cultural. Muitos indgenas tm
lutado com afinco para pesquisar com seus ancios a prpria cultura,
reavivar a lngua materna e todos os elementos, da arte cosmologia,
dos conhecimentos agrcolas e ecolgicos. Se os indgenas em seu
processo de contato crescente com a cultura ocidental urbana
perderem sua cultura, futuramente podero correr o risco de perder
os territrios, pois o capitalismo globalizante se estende a tudo, a
batalha pelo territrio inevitavelmente chegar a todos os rinces12
e, sem a cultura, a tendncia que o poder reinante destine apenas
algumas dezenas de hectares por famlia, como no modelo da reforma
agrria. Com a cultura preservada, justifica-se, alm da ligao
visceral dos indgenas com seu territrio materno por questes
sagradas e dos seus cemitrios, por exemplo, a necessidade de
sobrevivncia em funo da disponibilidade de recursos naturais
vastos, incluindo gua, vegetais e animais de caa e pesca, entre
outros elementos. Uma outra boa caracterstica que comum s 15 etnias
indgenas do Acre o uso da bebida ayahuaska (chamada por eles de
cip, nishi pe, huni, kamarpi e outros nomes, a depender da etnia e
contexto). Sabe-se que o xamanismo com uso de plantas de poder,13
ritualizadas em contextos sagrados, usado por praticamente todas as
etnias brasileiras, mas a ayahuaska possui de fato um dom especial
de coeso, unio e harmonizao do ser humano com a natureza, e talvez
ela tenha ajudado os indgenas acrianos a manterem um bom desempenho
na gesto ambiental o que se torna ntido para ns, que tambm
conhecemos esta bebida e sua ritualstica. Finalizando, do que pude
observar em campo, as TIs acrianas esto num timo caminho de gesto
ambiental, mas h 4 alertas importantes que eu gostaria de
salientar, para os indgenas e os gestores que forem trabalhar em
cooperao com eles: a) Como j foi analisado, a sempre central e
presente necessidade da valorizao cultural. b) A segurana alimentar
com base agroecolgica local. Por conta da proximidade e/ou
facilidade de acesso s cidades, bem como do aporte de mais recursos
financeiros regulares s famlias (tais como bolsas-famlia, auxlios-
natalidade e aposentadorias), muitos indgenas tm alterado seus
hbitos alimentares quase completamente, trocando a plantao, caa,
pesca e coleta pelos produtos industrializados mais baratos
(macarro, frango de granja, arroz refinado do sul do pas, suco de
saquinho - em p, e muitos outros itens), a maioria de baixo valor
nutritivo, e de alto teor contaminante (agrotxicos, transgnicos,
corantes, conservantes, hormnios). patente o crescimento de casos
de diabetes (por conta do excesso de acar), gastrite e cncer nos
indgenas por conta dessa m alimentao. Ora, a segurana alimentar
prpria, alm de ser pilar cultural, vital a longo prazo para manter
as sementes e mudas, os conhecimentos e tcnicos da rica
agrobiodiversidade que eles possuem, por exemplo, os indgenas
cultivam diversas espcies de mandioca, car, inhame e milho, para
muito alm do uso comum na cultura ocidental. Ou seja, muito
importante que sigam plantando, e sempre mais, inclusive frutas
nativas e exticas, espcies madeireiras e palmeiras (para suas
construes), etc, sem cair na tentao de usar o dinheiro para a (m)
alimentao da cidade. Em termos de protena animal, tambm, importante
o foco na criao de peixes e animais de pequeno porte (galinha,
pato, ovelha, porco com os devidos cuidados do manejo de cada um),
e at mesmo silvestres, para alimentao, ao invs da criao de gado, de
alto impacto e no recomendvel ao bioma amaznico. Felizmente j so
pouqussimos indgenas acrianos que ainda mantm gado em suas terras,
e a tendncia diminuir os rebanhos, pelo que temos visto dos Planos
12 Principalmente no Brasil, em que os grandes latifundirios, os
ruralistas, possuem muito poder poltico e esto avidamente se
estendendo por vastos territrios, inclusive com expulso de populaes
tradicionais (falaremos mais sobre isso adiante). 13 Os indgenas
acrianos utilizam de muitas outras plantas de poder, componentes do
rap (incluindo o tabaco) e o muk, ou irar, considerado ainda mais
sagrada, de uso restrito a iniciados com autorizao de um paj, e que
exige severas dietas para se utilizar.
5. 5 de Gesto Ambiental aprovados e revisados. Enfim, estes
assuntos so do cotidiano dos AAFIs, mas importante que obtenham
mais apoio ao seu trabalho de multiplicadores, para garantir a
manuteno e enriquecimento da agrobiodiversidade pelas famlias das
TIs. c) preciso mais cuidado com a gesto de resduos slidos e
saneamento. Infelizmente, em muitas terras, apesar dos agentes
indgenas de sade (AISs) e de saneamento (Aisans), estes itens tm
sido negligenciados, ocorrendo diversos casos de poluio j
evidentes, que contribuem em curto prazo em doenas como verminoses
e infeces, e, no longo prazo, cncer e outras doenas graves. Afinal,
cada vez mais, os indgenas trazem produtos industrializados e
embalagens para as aldeias, bem como a populao est aumentando e s
vezes no se tem o devido cuidado com as guas servidas (esgoto), que
fica espalhado em pequenos igaraps, audes e em torno das casas.
Destacam-se os seguintes subitens, para os quais necessrio uma
contnua e dedicada educao ambiental: c.1) Cada famlia ou conjunto
de famlias deve fazer banheiro ainda que simples, com fossas
spticas longe de corpos dgua, e orientem efetivamente a todos para
no espalhar fezes pelos arredores. c.2) Para as guas de lavagem de
louas e roupas, necessrio fazer sistemas de drenagem adequados, se
possvel at tratar estas guas (h sistemas caseiros relativamente
simples de se adotar). c.3) No lavar roupa ou loua com sabo em
igaraps pequenos, e, em hiptese nenhuma, em audes, pois estes
rapidamente eutrofizam (apodrecem), com o uso de sabo. c.4) Evitar
usar sabo, e usar mais sabo em barra tipo neutro do que os azuis, e
os em p. Evitar detergente e cosmticos (shampoos, cremes),
altamente poluentes. c.5) Evitar o consumo de produtos
industrializados, informar-se acerca dos mais txicos, usar somente
o que se precisa realmente. Fazer educao ambiental anti-consumismo,
explicando populao tudo o que est envolvido no produto, da fabricao
ao descarte na forma de lixo. Evitar a todo custo trazer embalagens
para as aldeias (deix-las nas cidades), usar paneiros e sacolas
permanentes. c.6) Efetuar a coleta seletiva de lixo casa a casa
efetivamente, pelo menos para separar entre orgnicos, reciclveis,
txicos e rejeitos. Os orgnicos devem ser destinados compostagem
para adubo (e no espalhados em volta das casas ou nos barrancos dos
rios, pois assim poluem). Os reciclveis podem ser reaproveitados na
aldeia mesmo, para alguma utilidade de armazenagem ou at para
artesanato, e o excedente pode ser comercializado ou doado nas
cidades (h prefeituras se preparando para a coleta nas aldeias,
seno os prprios indgenas devem se organizar para levar). Os
rejeitos e txicos tambm devem ser levados s cidades, sendo que os
txicos devem ser cuidadosamente separados e jamais deixados ou
enterrados nas aldeias, so eles os mais comuns: pilhas e baterias,
lmpadas fluorescentes, remdios e tintas. No caso de no se
conseguir, esgotando-se diversas tentativas, levar o lixo para a
cidade, necessrio enterrar na aldeia mesmo, num lugar organizado,
seguro, sinalizado e distante de corpos dgua, porm, repito, jamais
enterrem os resduos txicos estes devem retornar cidade, custe o que
custar. d) Manter as iniciativas sustentveis como produo de
artesanato, cadeias produtivas de no-madeireiros em geral,
etnoturismo (incluindo os festivais e olimpadas porm com os devidos
cuidados exigidos no controle da entrada e permanncia de naws nas
aldeias, por exemplo, recomendvel que as arenas, kupixaus14 e
hospedarias sejam distantes das aldeias em si, cujo acesso deve ser
bem mais restrito). Os indgenas so os nossos exemplos de vida
ecolgica, portanto, vamos manter as aldeias ecologicamente, como as
ecovilas que tantos naws lutam para manter em meio ao capitalismo
degradador, pois isto que vai nos sustentar, cada vez mais, no
futuro! 2. O contexto indgena e ambiental, no Brasil e no mundo
impossvel falar em gesto ambiental de terras indgenas sem olhar
para o contexto geral de como anda a questo ambiental e a questo
indgena no Brasil e no mundo. preciso que se esteja atento aos
retrocessos que esto ocorrendo e propostos nas polticas indgena e
ambiental em nosso pas, e na tendncia se o cenrio poltico no
melhorar, para que possamos, crescentemente, atuar em movimentos
sociais. No caso dos indgenas, populaes tradicionais e afins, pela
garantia de seus direitos humanos e territoriais, to suadamente
conquistados aps anos de dominao colonial. A questo ambiental, ou
ecolgica, a mais importante que existe, ao meu ver, e conforme
muitos 14 Kupixau ou kupixawa o nome dado aos chapus de palha ou
arenas cobertas, destinadas a reunies, festas e rituais
sagrados.
6. 6 cientistas e atuantes na rea. a questo da prpria vida, da
sobrevivncia humana e de todas as espcies, da manuteno da gua
potvel disponvel, do solo saudvel agricultvel e do prprio clima,
pois, como se sabe, somos fragilmente dependentes da estabilidade
climtica. Hoje j de mais amplo conhecimento que estamos num caminho
rpido ecocida, que ruma extino da prpria espcie humana, e no s de
tantas vegetais e animais que ocorre em ritmo alarmante. As mudanas
climticas com eventos extremos (enchentes e secas, muito calor ou
muito frio), a poluio e contaminao de vastas reas (terras, rios,
oceanos e atmosfera), a extino de espcies, a perda de
agrobiodiversidade e conhecimento tradicional associado, a escassez
de recursos naturais, as guerras pela gua e por petrleo, a
escravido e contaminao de trabalhadores com agrotxicos e minerao, a
expulso de moradores (indgenas, ribeirinhos e populaes
tradicionais) e degradao de vastos territrios pelas hidreltricas,
etc, so sinais de colapso socioambiental e ecolgico de toda uma
cultura, de todo um modelo de civilizao. Apesar disso, os grandes
blocos poltico-econmicos mundiais, capitalistas, fecham os olhos e
os ouvidos, e as convenes ambientais mundiais pelo clima, pela
biodiversidade e outras, seguem apenas no papel. A governabilidade
global de tais questes ser inevitvel, pois os impactos j so
globais, por exemplo, o mundo est sofrendo a radioatividade da
usina nuclear japonesa de Fukushima que explodiu sob uma tsunami em
mar/2011 (embora se escamoteie essa informao na grande mdia). A
falada desmaterializao da economia ou a economia ps-industrial, que
seria ambientalmente mais adequada, ainda nfima. A economia verde e
o desenvolvimento sustentvel, termos quando usados pelo mercado, so
um conjunto de paliativos, muitos deles questionveis, ou que no
passam de um marketing verde com propaganda enganosa. Os desastres
socioambientais na China e frica, por exemplo, que sustentam boa
parte da industrializao e fornecimento de matrias-primas ao
consumismo mundial, so catastrficos, mas de pouca ateno, j que suas
populaes so mais pobres e dominadas num colonialismo que nunca
deixou de existir. Vivemos mesmo numa situao de genocdio planetrio,
denunciado por exemplo num manifesto de mais de 250 cientistas
(IHU, 2014), ou numa sociedade suicida, ou ecocida, como apontam
eclogos e analistas h pelo menos duas dcadas. Fatalmente
precisaremos de fortes contingncias e planificaes no futuro para se
limitar o consumo e a poluio. Por exemplo, no possvel seguir
incentivando ao extremo a indstria automobilstica, porque as
cidades viram um caos de carros, totalmente inviveis. E fato de que
muito difcil construir esta governabilidade de forma democrtica,
pois a ONU e seus organismos, sabe-se, ou so inefetivos ou no
democrticos, e a tendncia , novamente, a repetio da supremacia dos
grandes blocos poltico-econmicos dos EUA (principalmente), Europa e
Japo sobre os demais, cujo desenvolvimento se d a custa dos outros.
As iniciativas sustentveis ainda so muito tmidas. Apesar disso h
bons sinais, como programas da FAO, do Pnuma e do PNUD, mas que em
muito precisam crescer. Na verdade precisaramos de outro modelo de
desenvolvimento, pautado pela igualdade e justia social ampla,
democracia, tica Ambiental, pela Economia Ecolgica, e a surgem
ideias muito pertinentes como a teoria do Crescimento Zero,
postulando que o crescimento econmico no vivel por definio, num
planeta limitado.15 Mas quando, e se chegaremos, a essa virada
positiva na humanidade, uma incgnita difcil de responder, e no se
vislumbra nada parecido no mdio prazo, antes o contrrio, a no ser
louvveis iniciativas pontuais de pequena escala. Algumas
constituies como a da Bolvia e do Equador j incluem temas da tica
Ambiental, na linha do bem viver e do direito intrnseco das demais
espcies e dos elementos naturais existirem (viso ecocntrica, ao
contrrio da antropocntrica), mas a prtica de seus governos tem sido
opostas ao que est escrito! O prprio capitalismo , intrinsecamente,
socialmente injusto e ecologicamente predatrio. Alm disso,
intensamente globalizante, como j diziam Karl Marx e Friedrich
Engels em seu famoso Manifesto Comunista de 1848, expandido seus
domnios a todo o espao global e territrios, aos poucos solapando os
povos primitivos ou no- capitalistas existentes (neles se incluem
as populaes indgenas). Ou seja, a no ser que tenhamos um firme
propsito de proteger as culturas originrias indgenas e de populaes
tradicionais em geral, que possuem relaes no-monetrias com a
natureza, vasto conhecimento e o direito intrnseco a manterem sua
existncia dessa forma, com amparo jurdico e de polticas pblicas
fortes, a tendncia do capitalismo de homogeneizao de todos os povos
na cultura ocidental dominante, com todo o seu arcabouo anti-
ecolgico e socialmente excludente. No Brasil no diferente, e mais,
um dos piores exemplos. Nosso governo, em particular na gesto
federal em vigor chefiada por Dilma Roussef (do PT, em forte aliana
com o PMDB), segue o mais anti-ambiental jamais visto, como
observam diversos analistas. Com o seu PAC, o governo pauta-se no
crescimentismo econmico de curto prazo a todo custo (e no
desenvolvimento), e pior, enriquecendo as oligarquias das mais
degradadoras possveis para manter nosso modelo primrio exportador.
Produzimos soja, gado e outros produtos agropecurios (empanturrados
de agrotxicos e transgnicos, sendo o Brasil campeo mundial de
consumo de agrotxicos desde 2008), alumnio, ferro e outros minerais
de baixo valor agregado (e de alto impacto ambiental). A nfase
econmica esta, em que o governo apoia sobremaneira os conglomerados
econmicos envolvidos, como os ruralistas do agronegcio,
negligenciando outros setores, e com quase nenhum investimento em
CT&I para que pudssemos alavancar setores econmicos de 15 Na
economia ecolgica, consultar autores como Robert Constanza e Clvis
Cavalcanti, e sobre o Crescimento Zero ou Decrescimento, consultar
N. Georgescu-Roegen, Meadows et al. (Limites do crescimento, de
1972), Herman Daly e Serge Latouche.
7. 7 ponta. Na ampliao da infraestrutura, o Brasil tem
priorizado as desastrosas mega-hidreltricas na Amaznia,16 tambm
refm do grande poder das gigantes empreiteiras, entre outros
problemas como rodovias sem os devidos cuidados ambientais. Temos o
caso da insana UHE Belo Monte, cujos empreendedores j sofreram
dezenas de processos judiciais e aes civis pblicas, cujas
condicionantes do licenciamento ambiental no tm sido obedecidas, e
cujos impactos socioambientais e ecolgicos so gigantes. Pelo mesmo
caminho seguem as UHEs dos Rios Tapajs e Teles Pires. Recentemente,
tivemos o desastre da enchente histrica do Rio Madeira, agravado
pelas UHEs Jirau e Santo Antnio, prximas a Porto Velho, que causou
calamidades pblicas em Rondnia, Acre e Bolvia. Como se no bastasse,
o Brasil vem estendendo suas obras, em parcerias do governo federal
com as empreiteiras, para construir algumas UHEs no Peru e na
Bolvia, cujos impactos previstos tambm so enormes, inclusive s
bacias hidrogrficas do Acre e Rondnia. Em todos os casos destas
hidreltricas em curso, o licenciamento ambiental tem sido frgil17
e, na questo indgena e de populaes tradicionais ou residentes
afetadas ou expulsas, tem sido trgico, sem nenhum cumprimento da
Conveno 169 de 1989 da OIT (consulta prvia, livre e informada). s
vezes h at assassinatos de lideranas, como foi o caso dos Munduruku
por conta de sua resistncia s hidreltricas dos Rios Tapajs e Teles
Pires. Tal fato motivou, inclusive, a edio de um decreto federal
para a entrada da Fora Nacional nas reas a serem afetadas por estes
mega-empreendimentos, algo tipicamente ditador (Dec. n. 7.957 de
2013). O governo tambm desafetou cerca de 150 mil hectares de sete
UCs na Bacia do Rio Tapajs (por medida provisria, transformada na
Lei n. 12.678 de 2012) para as futuras hidreltricas. E as mazelas
oriundas da construo das UHEs, como aumento da desordem e crimes
urbanos e no entorno de Altamira, so alarmantes.18 H outras linhas
de ao ambientalmente terrveis deste governo, como o apoio aos
agrotxicos e transgnicos (com instncias de aprovao e legislao
flexibilizadas), a explorao de petrleo na Amaznia e no pr- sal, a
abertura de leiles para a explorao de xisto (gs de folhelho, ou
fracking intensamente impactante) e a proposta de novas usinas
nucleares. Tudo isso faz do atual governo o pior que j se viu na
rea ambiental e, mais a frente, veremos que tambm o mais
anti-indgena. Some-se a isso o fato de que nosso governo
oligrquico, patrimonialista, coronelista, que no largou sua herana
de ditadura e exploracionismo colonial.19 Um governo de interesses
prprios, e um dos mais corruptos do mundo. Cargos do executivo e
legislativo so conquistados na base de doaes e alianas com grupos
econmicos de grande histrico anti-ambiental e de injustias sociais.
E o pior, neste governo de elites, temos uma elite burra, que
aposta nos modelos da mais alta explorao social e ecolgica, sem uma
boa viso da realidade. No judicirio os cargos superiores so
nomeados, e no fogem regra e, infelizmente, nos juzes concursados,
tambm h bastante corrupo, e quase nenhuma conscincia ambiental ou
indgena.20 Some-se a isso a ineficincia e gigantismo burocrtico da
prpria estrutura estatal. Precisamos, sobremaneira, de uma boa
reforma poltica, democrtica e popular. Os rgos pblicos que
trabalham com meio ambiente, populaes tradicionais, indgenas, da
agricultura familiar e afins, esto extremamente sucateados, at
mesmo com golpes intervencionistas em alguns momentos, como o
Ibama, o ICMBio, a Anvisa, a Funai e o Incra. Os oramentos e
polticas pblicas nestes assuntos tambm so nfimos. Da mesma forma,
sofremos de falta de um bom sistema educacional e cultural, de
forma at proposital, das elites capitalistas. Para manter o
consumismo e as elites no poder, preciso manter a populao alienada
e desinformada. Da a pssima programao da mdia dominante, e o
sucateamento da educao. Nesse contexto, vemos que ainda muito pobre
a conscincia ambiental e indgena da sociedade, e em alguns casos
mais graves de municpios conflituosos de domnio ruralista ou dos
mega-empreendimentos, as elites dominantes tm feito verdadeiras
campanhas 16 H dcadas se sabe que a Amaznia inadequada a
hidreltricas, pois o impacto socioambiental e ecolgico enorme. Hoje
se sabe mais, por exemplo, que elas so verdadeiras fbricas de
metano, um poderoso gs estufa (palestra do brilhante pesquisador do
INPA, Philip Fearnside nesta SBPC, em 25/07/2014). No que se refere
s PCHs (pequenas centrais hidreltricas), tambm, o impacto tem sido
considervel, pois seria necessrio uma avaliao ambiental estratgica
(AAE) de toda uma regio, pois vrias PCHs somadas so tambm de alto
impacto, mas isso nunca feito, outrossim, temos licenciamentos
ambientais pontuais cada vez mais simplificados. H dezenas de
hidreltricas previstas ou em construo na Amaznia, Pantanal (um
bioma que tambm muito sensvel) e outras regies brasileiras, em
detrimento de um parco investimento em energias alternativas,
eficincia energtica e repotenciao das UHEs existentes. Alm disso,
sabe-se que a grossa parte da energia eltrica prevista destina-se s
indstrias energointensivas como a do alumnio, e que a demanda desta
energia no assim to grande como o governo anuncia (falcia do perigo
de apages). 17 Tanto pela crescente flexibilizao da legislao a
respeito quanto pelo sucateamento dos rgos licenciadores (Ibama e
OEMAs). Neste ms o governo anunciou que breve sairo novas medidas
de flexibilizao, algo j perigosamente apelidado de licenciamento
express, para agilizar e facilitar os empreendimentos. 18 A este
respeito, consultar diversas matrias nos sites de Telma Monteiro,
Combate ao Racismo Ambiental e Ecodebate, e textos do Prof. Rodolfo
Salm, da UFPA em Altamira, de Claret Fernandes, de Clio Bermann e
de A. Oswaldo Sev Filho. 19 E s vezes, at hoje, os ativistas sofrem
perseguio e espionagem. A ditadura parece ter amansado e trocado de
mos, porm no ter sido extinta. 20 Na questo dos agrotxicos e
transgnicos observamos muito as empresas multinacionais ganhando
aes na justia, vergonhosas, contra a Anvisa, que embora sucateada,
um rgo que procura de toda a forma proteger a sade pblica da
populao, no controle destes venenos.
8. 8 anti-ambientais e anti-indgenas, com pronunciamentos,
panfletos e organizaes incitando dio na populao, como se os
indgenas e outros atores destas causas fossem anti-progresso, ou
anti-tudo o que bom.21 Estamos vivendo uma nova onda de racismo
indgena, presente tambm na grande mdia. 3. Detalhando o cenrio
indgena no Brasil: A ofensiva (ou barbrie) ruralista22 Na nsia pela
mxima expanso do latifndio do agronegcio23 esta a verdade as
organizaes ruralistas como a CNA e a FPA tem agido com fora pela
tomada de territrios indgenas, bem como pelo enfraquecimento de
leis ambientais (como ocorreu com o novo Cdigo (Des)Florestal, Lei
n. 12.651 de 2012, que vergonhosamente anistia 10 anos das multas
ambientais, por exemplo) e indgenas, e lanado PLs nocivos, indgena
e ambientalmente. Em algumas regies, estamos vivendo uma verdadeira
barbrie, com destaque sem dvida ao Mato Grosso do Sul, em que
Guaranis, Kaiows e outras etnias, confinados e expulsos, tm sofrido
um verdadeiro genocdio. Situaes terrveis tambm, atualmente, tm sido
vividas pelos Munduruku24 , Tenharim (aviltados por madeireiros
ilegais),25 e tambm ataques aos Terena (MS), Tupinamb (BA),
Kaingang (PR) e Aw-Guaj (MA, tambm invadidos por madeireiros), para
citar apenas os mais graves e recentes. Em todos os casos tm havido
assassinatos de lideranas indgenas, prises violentas e injustas,
perseguies e incitaes de racismo indgena nos municpios.26 Na ltima
dcada, 360 indgenas foram assassinados nos conflitos de terra
(APIB, mai/2014). Tambm est crescendo sobremaneira o ndice de
suicdios entre indgenas, maior no Mato Grosso do Sul, presente at
mesmo em adolescentes jovens. Nesse estado, foram 928 suicdios em
28 anos (mais de 33 por ano), e os ndices triplicaram na recente
dcada.27 Nesse estado tambm foram 273 assassinados nas ltimas trs
dcadas. L comum os jagunos dos fazendeiros entrarem nas reas ou
acampamentos indgenas atirando. Recentemente a sede da Funai na TI
Guarani foi invadida e os computadores da sede roubados, com
importantes documentos.28 Vrios indgenas foram envenenados com
cachaa adulterada. E ocorrem muitas mortes por doenas, desnutrio e
atropelamentos (estando vrios acampamentos deles em beira de
estrada). Afora as doenas e outros problemas sociais comuns do xodo
s cidades (como mendicncia, alcoolismo e prostituio, o que vem
acontecendo recentemente nas comunidades expulsas pelos canteiros
da UHE Belo Monte, e ocorre em todos os casos dos atingidos por
barragens, j que nunca h polticas pblicas suficientes de
atendimento a estas comunidades). No Mato Grosso do Sul vive a
segunda maior populao indgena do pas, so 80 mil indgenas, que
ocupam apenas 0,2% do estado.29 Na TI Dourados, encostada na cidade
homnima, vivem 13 mil indgenas encurralados em 3,6 hectares. No
Mato Grosso do Sul a barbrie da ofensiva ruralista caso para
interveno da ONU h muito tempo, praticamente uma guerra civil em
incio, uma crise humanitria (DHESCA, 2014). Os ruralistas de l
chegaram a organizar o Leilo da Resistncia, conclamando e
ludibriando at pequenos produtores a seu favor, vendendo bois e
angariando mais de R$ 1 milho para contratao de milcias
particulares para expulsar indgenas das terras em conflito.
Felizmente, at o momento, o Ministrio Pblico bloqueou este
dinheiro. Nesse estado o racismo indgena foi agravado por situaes
locais, pois as etnias Guarani e Kaiow so abundantes no Paraguai, e
parte delas lutou do lado de l, na guerra entre o Brasil e este
pas. So chamados de bugres e outros xingamentos com a maior
normalidade, no cotidiano das cidades. H mais de uma dcada, pelo
menos, o CIMI e as organizaes indgenas do Mato Grosso do Sul vm
publicando livros, relatrios e cartas s autoridades e sociedade
denunciando as graves violaes de direitos humanos indgenas locais.
Recentemente, houve o relatrio da Plataforma Dhesca, igualmente
contundente (DHESCA, 2014). O 21 o caso de vrios municpios no Mato
Grosso do Sul, Humait e Manicor, no Amazonas, e Altamira, no Par.
22 Ver o site www.republicadosruralistas.com.br, lanado pelas
organizaes ISA, CTI, CIMI, APIB e Greenpeace. 23 Em agronegcio l-se
a produo de vastas monoculturas de exportao com baixo valor
agregado, com destaque soja, sempre aliadas ao alto consumo de
agrotxicos e transgnicos, em que o setor ruralista tambm aliado das
multinacionais do ramo, como Monsanto, Syngenta e Bayer. 24 Houve
um violento ataque da PF em suas terras em 2013, supostamente para
conter garimpeiros, mas quem sofreu violncia foram os indgenas, um
deles assassinado. Logo aps os Munduruku terem contundentemente
feito uma srie de manifestos locais e em Braslia, diretamente com
os maiores chefes de estado, contra as 7 hidreltricas previstas que
lhes afetam. Recentemente, em Jacareacanga, 70 professores
Munduruku foram demitidos sem justa causa, sua casa de apoio foi
incendiada e houve violncia fsica em confrontos. O Ministrio Pblico
obrigou a prefeitura a recontratar os professores. O Dec. n. 7.957
que permite Fora Nacional conduzir estudos de licenciamento
ambiental de hidreltricas surgiu logo aps esse contexto de
resistncia s hidreltricas dos Rios Tapajs e Teles Pires. 25 O
cacique Tenharim foi assassinado em dezembro de 2013 aps ter
denunciado os madeireiros invasores ao Ibama. Recentemente houve
uma grande armao em que assassinaram trs no-ndios dentro da sua
terra, e acusaram injustamente 5 indgenas por isto, os quais esto
presos. Paralelamente, a sede e veculos da Funai em Humait (AM)
foram invadidos e incendiados. As elites incitam dio e racismo
indgena na populao deste municpio. 26 O Brasil no s tem sido
liderana em assassinatos de indgenas como tambm de ambientalistas e
ativistas sociais. 27 Disponvel em http://racismoambiental.net.br,
de 23/05/2014. 28 Alis comum servidores da Funai, Incra, Ibama e
ICMBio serem perseguidos em suas aes pr indgenas e meio ambiente,
quando poderosos fazendeiros, grileiros, madeireiros e outros
criminosos so confrontados. 29 Enquanto isso, nesse estado h pelo
menos 5 milhes de hectares degradados, improdutivos (dados da
Embrapa citados por Mrcio Santilli, apud CHIARETTI, 2014).
9. 9 Ministrio Pblico sempre ajuda, mas no final os juzes tm
sido morosos, brandos ou tendenciosos aos ruralistas. De qualquer
forma, o caso de barbrie no Mato Grosso do Sul merecia solues
urgentes e srias. Felizmente, lideranas indgenas foram ONU
denunciar as situaes que vivemos, e tambm a um encontro na
Universidade de Coimbra, Portugal, promovido pelo socilogo
Boaventura de Sousa Santos para apoiar o movimento social indgena,
de populaes tradicionais e camponesas.30 Os parlamentares federais
ruralistas diretos so ao menos um quarto do total, alm dos
apoiadores. Eles tm lanado diversos PLs anti-indgenas e
anti-ambientais. E o que pior, h conivncia tcita e ativa do governo
executivo federal, pois lanou a terrvel Portaria n. 303 de 2012 da
AGU. Est em vigor desde fevereiro de 2014, apesar de ter sido
suspensa por um tempo devido presso social. Essa Portaria dos
piores golpes anti-indgenas, pois abre as terras a empreendimentos
em geral, viola a Conveno 169 da OIT, paralisa demarcaes e ampliaes
e obriga reviso as demarcaes existentes. E como diz Mrcio Santilli,
do ISA, boa parte dos conflitos fundirios ocorrem porque o governo
no cumpre sua obrigao de indenizar os fazendeiros que possuam
titulao idnea nas terras indgenas originrias, ou seja, h tremenda m
vontade poltica. A pretexto de culpar o procedimento de demarcao de
TIs e a Funai, tm sido propostos outros mtodos, tais como submisso
prvia dos processos aos Ministrios de Agricultura e de Minas e
Energia (claramente para priorizar beneficiar ruralistas e
hidreltricas)31 e paralisao de todos os processos de demarcao em
curso, inclusive os conclusos em que no h nenhum conflito!32 Ora,
os procedimentos de demarcao j so densos e participativos com todos
os atores envolvidos, este no o problema. Pior ainda a PEC n. 215
de 2000, relanada com fora total, que transfere ao Congresso
Nacional a tarefa de demarcar TIs. Isto no s absurdo e infactvel
como mais um golpe anti-indgena, que vai gerar mais conflitos e
judicializao (segundo Mrcio Santilli e outros analistas). Inmeras
organizaes e todo o movimento social indgena tm se manifestado
frontalmente contra esta PEC. At o governo executivo j se declarou
contra, mas s vezes silencia e/ou contraditrio, pois j houve
manifestaes favorveis de um procurador geral da Repblica (Eugnio
Arago). estarrecedor ver como os indgenas, j afrontados desde o
descobrimento h mais de 500 anos, tendo lutado e conquistado uma
srie de direitos e territrios, principalmente aps o importante
marco da Constituio Federal de 1988 (CF-88), hoje enfrentam uma
nova onda de ataques, to forte quanto os genocdios iniciais, em
pleno sculo XXI. Lembrando que houve um alvar do Brasil-colnia de
1680 que j garantia terra aos indgenas que ali habitassem antes do
descobrimento, e que a CF-88 deu um prazo de cinco anos para
demarcar todas as TIs existentes, ou seja, estamos com pelo menos
21 anos de atraso oficial na demarcao de terras. Alm do passivo das
demarcaes, h importantes PLs positivos engavetados. O PL n. 2.057
de 1991, do novo Estatuto dos Povos Indgenas, est parado no
Congresso Nacional h 23 anos. Ainda vale o Estatuto do ndio da Lei
n. 6.001 de 1973, ruim e desatualizado, com o propsito de preservar
a sua cultura e integr-los, progressiva e harmoniosamente, comunho
nacional, que no respeita o direito sua particularidade cultural. A
CNPI, Comisso Nacional de Poltica Indigenista, continua dominada
por interesses anti-indgenas e apenas consultiva. Deveria ser
renomeada para Conselho, ser democraticamente representativa dos
indgenas e deliberativa, uma luta tambm antiga do movimento (PL n.
3.571 de 2008). Outro projeto perigoso o PLP n. 227 de 2012, um dos
piores. um projeto de vale tudo, dentro das TIs, entre minerao,
obras, projetos de assentamento, arrendamento ao agronegcio e at
vilas urbanas. Na pretenso de regulamentar o 6 do Art. 231 da
CF-88, tudo entra como relevante interesse pblico da Unio. Na
verdade, levantamentos apontam que existem ... mais de 100 PLs
contra TIs, quilombos, UCs e reforma agrria. So aes ruralistas de
disputa pelo territrio (latifndio). A novidade que hoje existe um
governo permevel presso ruralista, mais do que foi o governo
militar. Dilma tem o pior desempenho em relao titulao de quilombos,
criao de unidades de conservao, de reservas extrativistas, de
assentamentos da reforma agrria. O governo Dilma avesso destinao de
terras para fins socioambientais (Mrcio Santilli apud CHIARETTI,
2014). Paulo Quartiero, (DEM / RR), parlamentar ruralista dos mais
anti-indgenas, que perdeu na justia as reas que invadia com
arrozais na TI Raposa Serra do Sol, que possui multas ambientais e
seis processos penais contra ele, chegou ao cmulo de propor, em
junho, a revogao da assinatura brasileira da Conveno n. 169 da OIT
(revogar o Dec. n. 5.051 de 2004). Sendo que, at hoje no Brasil,
esta importante Conveno, 25 anos depois, no obedecida. Este
ruralista tambm coautor do PLP n. 227 e da PEC n. 215.33 30
Disponvel em http://racismoambiental.net.br, de 02/07/2014. 31 No
ano de 2013, houve uma iniciativa da Casa Civil de deslegitimar a
entidade [Funai] ao criticar estudos de demarcao com base em laudos
da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuria (Embrapa), cessando a
demarcao de terras indgenas em diversos Estados. Acerca disso,
ressalta-se que a Casa Civil no possui qualquer capacitao tcnica
para, por meio da Embrapa, propor a reformulao da Portaria do
Ministrio da Justia sobre os procedimentos demarcatrios (DHESCA,
2014, p. 20). 32 Lembrando que h um passivo de demarcao de dois
teros dos territrios ocupados ancestralmente por indgenas, pois, se
na Amaznia a situao mais ou menos encaminhada, h milhares de
indgenas sem terra em outras regies. 33 Paulo Quartiero do DEM,
ruralista dos principais, arrozeiro invasor TI Raposa Serra do Sol
em RR, grileiro, possui ao menos 12 mil ha de terra. ru em seis aes
penais por sequestro e crcere privado; por crime contra a liberdade
pessoal e formao de quadrilha; crimes contra o patrimnio; crimes
contra a segurana nacional, a ordem poltica e social; e crimes
contra a administrao
10. 10 Esperamos que nas eleies que se aproximam a sociedade
possa retirar parte destes ruralistas, mas o cenrio no bom, j que o
domnio coronelista destas famlias em seus feudos grande. Trata-se
de uma aliana suprapartidria, com nfase em partidos como o PMDB e o
PSD. A seguir um breve resumo dos piores PLs anti- indgenas em
curso, com alguns dos autores mais famosos, por partido (adaptado
de CAPIBERIBE & BONILLA, 2013), sabendo que eles so quase todos
da base aliada do governo, ou do prprio governo: PMDB = 9 PLs =
Valdir Colatto, do SC, ruralista, autor de seis deles. PSD = 5 =
quatro de Homero Pereira (ex-PR), do MT, ruralista, inclui o PLP n.
227, tendo como coautor Moreira Mendes (PSD-RO). Ktia Abreu,
senadora, do TO, a rainha ruralista, de alto poder e influncia na
FPA e CNA, autora do PLS n. 349 de 2013, que grave, versando que em
reas de conflito no podem ser demarcadas TIs. Ora, se as reas
indgenas so quase todas invadidas, h conflitos, portanto este
projeto inviabilizaria praticamente qualquer nova demarcao. PTB = 3
= dois deles de Mozarildo Cavalcanti, do RR, ruralista, inclui a
PEC n. 38 de 1999 (parecida com a PEC n. 215). PP = 3 = todos de
Luiz Carlos Heinze, do RS, ruralista. PT (Governo Dilma) = 2 =
Portaria da AGU n. 303 e PL s/n do Ministrio da Justia (para
alterar procedimentos de demarcao). DEM = 2 = todos de Romero Juc,
do RR, representante do setor da minerao, inclui o PL n. 1.610 de
1996 que abre completamente as TIs minerao. PPB = 2 = um deles a
PEC n. 215, de Almir S, do RR. PSDB = 2 (de menor impacto). PSC =
01 = de Nelson Padovani, do Paran, ruralista, PEC n. 237 de 2013
(que tambm abre as TIs concesso de agronegcio). A seguir, algumas
citaes da ofensiva ruralista parlamentar, racista e criminosa,
algumas proferidas inclusive em plenrio. Como podem os
parlamentares agir assim, com baixo nvel, e continuar recebendo
votos? Tomara que nestas eleies o cenrio melhore! Depois que ns
finalizarmos a questo indgena, eu quero saber qual o outro tema que
eles vo inventar para poder atrapalhar a agropecuria brasileira
(Ktia Abreu, senadora [PSD-TO], em pronunciamento na audincia
pblica da Comisso de Agricultura da Cmara dos Deputados, em
11/dez/2013 [MOLINA, 2013]). Da anlise de Lusa Molina, com
referncia ao momento poltico do Leilo da Resistncia no MS: Os
ruralistas esto se preparando para uma guerra, determinados a
passar por cima de qualquer obstculo. E no momento esse obstculo
chama-se terras indgenas. (...) Os deputados da Frente Parlamentar
da Agropecuria (FPA) e da Comisso de Agricultura investiam em seus
discursos a estratgia clssica de tentar uma aproximao com os
trabalhadores na luta contra o inimigo comum os povos indgenas e
seus apoiadores. E no faltaram falas, tanto de parlamentares como
de trabalhadores, onde apareceram ndios importados do Paraguai, a
rentvel profisso de ndio, a mo esmagadora da Funai e muito mais.
Falam em enfrentamento direto aos indgenas vrias vezes. (...) Ns
vamos fazer esse enfrentamento. Um enfrentamento duro. Em Mato
Grosso do Sul e em todo o pas, afirmou o senador Waldemir Moka
(PMDB- MS). Aplausos e expresses de satisfao rondaram o auditrio
[do Congresso Nacional] quando o deputado Giovanni Queiroz (PDT-PA)
falou de como lidaram com o problema indgena no seu estado, com
violncia. Ningum mais contrata advogado. Entrou hoje [indgena na
terra], sai na madrugada do dia seguinte. Sai debaixo de cacete.
Ele prossegue, aconselhando outros a contratarem empresas de
segurana [leia-se milcias privadas]: 4 horas da manh voc aborda o
pessoal [que entrou na terra], chega o cravo no primeiro que
reclamar, d-lhe um cacete, bota em cima de um caminho e manda
devolver. Queiroz, sem disfarar um racismo quase caricato, disse
ainda: [os ndios] querem ser civilizados. Ns todos um dia fomos
ndios. Ns, alis, fomos macacos (MOLINA, 2013). 4. Aprofundando
alguns elementos anti-ambientais do governo federal e aliados Para
o PAC da dinastia Lula Dilma, qualquer mega-obra relevante
interesse pblico da Unio, para isso vieram o novo Cdigo
(Des)Florestal, a Lei n. 12.678 que desafetou sete UCs na Bacia do
Tocantins e o Dec. n. 7.957 da Fora Nacional para acompanhar
licenciamentos ambientais. No PAC crescimentista e oligrquico,
altamente em geral, desobedincia e desacato. investigado por
homicdio qualificado, crimes contra o patrimnio, crimes de
responsabilidade, sonegao de contribuio previdenciria, crimes
contra o meio ambiente e o patrimnio gentico. alvo de ao de execuo
fiscal movida pelo Ibama e foi responsabilizado pelo TCU por
irregularidades em prestao de contas de convnio e condenado a pagar
a dvida e multa. Entrou com recursos, mas a deciso foi mantida
(http://www.republicadosruralistas.com.br/, jul/2014).
11. 11 questionado sob todos os vieses tcnicos e
poltico-econmicos, dezenas de UHEs esto previstas na Amaznia,
Pantanal e outros biomas, de grande impacto, sem contar com a
necessria Avaliao Ambiental Estratgica (AAE) que deveria prescindir
os isolados licenciamentos ambientais de cada hidreltrica, que no
tm como abarcar os impactos sinrgicos, regionais e nacionais.
Sabe-se que o PAC regido por poderosos interesses como as quatro
gigantes empreiteiras,34 e que boa parte da energia para fins
industriais, como a exportao barata de alumnio. O licenciamento
ambiental tem sido mais frouxo do que era para ser, pois a presso
pela celeridade grande, e seguidamente surgem novas normas de cada
vez mais simplificao dos processos. Com o Ibama sucateado e OEMAs
politicamente calados ou sucateados, as condicionantes no so
obedecidas nem monitoradas, e h numerosas aes civis pblicas do
Ministrio Pblico sobre todas as UHEs em construo e em
licenciamento. Mas o governo e os consrcios empreiteiros,
habilmente, tm conseguido seguir com as obras, uma a uma, apesar
das aes judiciais, dos protestos sociais variados e das seguidas
greves de trabalhadores nos canteiros. Ora, h dcadas cientistas e
ambientalistas provam que mega-hidreltricas no combinam com o bioma
amaznico, de plancie, densa vegetao e rios sedimentosos. Philip
Fearnside, renomado pesquisador do INPA, vem denominando estas
hidreltricas de fbricas de metano, devido aos ciclos de cheia e
vazante em reas de densa vegetao, alm da prpria vegetao alagada
pelas barragens, sendo o metano um gs estufa bem pior que o gs
carbnico. Ou seja, a alardeada energia limpa hidreltrica uma farsa,
quando se trata de Amaznia. Temos o exemplo dos problemas at hoje
vivenciados pelas malfadadas UHEs de Tucuru (PA), Balbina (AM) e
Samuel (RO). Hoje se repetem os equvocos, com ainda maior
desenvoltura agressiva. Este ano, sofremos a calamidade pblica em
Rondnia, Acre e Bolvia aps a enchente histrica do Rio Madeira, em
muito agravada pelas UHEs de Jirau e Santo Antnio, e o problema
tende a se repetir nos anos seguintes. Mas governo e empresas
concessionrias se fazem de sego-surdas-mudas, no h como provar
nada, a culpa da chuva, e tudo fica por isso mesmo, apesar do
esforo, novamente, do Ministrio Pblico de responsabiliz-los pelos
danos e cobrar preveno a novas calamidades. O setor da minerao
tambm se articulando com PLs de alto impacto ambiental e indgena,
como o PL n. 3.682 de 2012 que abre a minerao dentro de UCs e o PL
n. 1.610 que abre a minerao nas TIs. Boa parte dos interesses
envolvidos so poderosos e estrangeiros, e sempre tm gerado exportao
de metais de baixo valor agregado, ou seja, enriquecem as empresas
e governos estrangeiros, e aqui sobram os impactos socioambientais.
A velha explorao colonial. O governo promoveu o sucateamento da
gesto ambiental federal ao dividir o Ibama ao meio (dividir para
melhor dominar), em 2007, com a criao do ICMBio, que funciona em
extrema precariedade at hoje. O Ibama tambm foi enfraquecido, quase
todos os escritrios do Brasil foram (ilegalmente) fechados, e o
golpe cabal sobre o rgo foi a LC n. 140 de dezembro de 2011, a
partir da qual o Ibama se tornou bem mais minguado em atribuies,
teoricamente repassadas aos OEMAs (que por sua vez no as tm
abrigado). Esta lei tambm foi fruto da ofensiva anti- ambiental
ruralista, como o novo Cdigo (Des)Florestal. Quanto aos agrotxicos
e transgnicos a questo est gravssima, sendo o Brasil o maior
consumidor mundial de agrotxicos, havendo cidades e populaes
inteiras contaminadas, com destaque talvez ao Mato Grosso, Minas
Gerais e Cear. A Anvisa e o CTNBio, respectivamente, esto
sucateados e dominados, e tudo se aprova (os piores agrotxicos e
transgnicos). Os setores envolvidos esto propondo uma cmara
especial para a aprovao de agrotxicos, que retire a Anvisa
(Ministrio da Sade) e o Ibama (Ministrio do Meio Ambiente) do preo,
restando apenas o Ministrio da Agricultura e os setores
empresariais. Se mais este golpe passar, imaginem a piora que est
por vir. At temas de alto impactos e muito controversos como usinas
nucleares e extrao de xisto tm sido alavancadas pelo governo
federal atual. No Acre e sua divisa com Amazonas na poro mais
oeste, h a problemtica explorao de petrleo que ir iniciar, ningum
sabe quando nem como, em reas amaznicas de alta relevncia ecolgica
e recheadas de TIs e UCs. Ningum est informado, nem a prpria Funai,
e h muita revolta, mas j h indgenas visivelmente iludidos com a
promessa de compensao ambiental futura, o que deveras preocupante.
O xisto tambm foi includo no leilo de concesso de petrleo do Acre.
Nos itens 4.1 e 6.19 seguem alguns detalhamentos sobre a questo. No
Acre tambm h a enorme problemtica da vinda de centenas de indgenas
isolados, que fogem dos impactos das petroleiras e madeireiras de
toda a poro fronteiria do Peru, pas com ainda pior desempenho em
poltica indgena e ambiental. Os isolados fizeram recente contato
mais forte na Aldeia Simpatia, dos Ashaninka do Rio Envira,
sinalizando que a problemtica ir se agravar na atualidade, pois h
diversos conflitos com os indgenas acrianos, bem como, sabidamente,
os impactos socioculturais de sada do isolamento, principalmente as
novas doenas para as quais os isolados no possuem defesa. H tambm
os impactos futuros da estrada e ferrovia de Cruzeiro do Sul a
Pucallpa (Peru), que iro atravessar o Parque Nacional Serra do
Divisor, de alto impacto ambiental. Bem como, j vivemos e viveremos
cada vez mais os impactos das recentes pavimentaes completas das
BRs 364 e 317 (esta chamada de Transocenica ou 34 Odebrecht,
Camargo Correia, Andrade Gutierrez e OAS, que tambm tm faturado
imensamente com as mega-obras da Copa do Mundo de 2014 e das
Olimpadas de 2016 (As quatro irms: Odebrecht, OAS, Camargo Corra e
Andrade Gutierrez, em http://racismoambiental.net.br, em
01/07/2014), bem como faturaro nas hidreltricas a serem construdas
por iniciativa do governo brasileiro no Peru e na Bolvia, com
dinheiro do BNDES envolvido.
12. 12 Estrada do Pacfico, pois por ela se chega Lima, no
Peru). Os processos de licenciamento e de compensao ambiental
destas BRs so polmicos, obscuros e cheios de falhas at hoje. Outros
problemas no estado j foram comentados acima. 4.1. A explorao
vindoura de petrleo e/ou gs no Alto Juru (AC e sua divisa oeste com
o AM) Da 12. rodada de leiles de concesso de lotes para explorao de
petrleo e gs da ANP, de 28/11/2013, apenas o lote AC-T-8 foi
arrematado pela Petrobras. No se sabe mais nada, se e quando a
Petrobras pretende iniciar a prospeco propriamente dita, ela tem 8
anos de prazo (a prospeco 3D, para alm da ssmica, 2D, que j foi
feita).35 Praticamente nenhum ator social envolvido, desde
servidores pblicos aos indgenas, sabem informar detalhes. A nica
ocorrncia recente foi o patrocnio de um show de msica pela
Petrobras, do cantor Lenine, em julho, e ele esteve passeando
dentro da TI Puyanawa com este povo, um dos diretamente afetados
(vizinho a 10m) ao lote arrematado. O outro povo afetado
diretamente o Nukini, cuja TI fica a 39m do lote. Ambas possuem um
permetro de vrios quilmetros circundando o lote (ver o mapa no item
7). Ambos os povos esto desinformados, e diz-se que j esto de olho
na possibilidade de compensao monetria, como se esta compensasse,
de fato, algum impacto no curto e longo prazos. A TI Vale do Javari
ficou a 25km do bloco, mas antes ficava a 18m. Aps a recomendao da
Funai, a ANP recuou na medida do lote. Este povo tem sido bastante
avesso a qualquer explorao (ver itens 6.16 e 6.17), e diz que vai
ao enfrentamento com a Petrobras e a ANP. Ela possui diversos
povos, indgenas isolados, rica e preservada biodiversidade e tambm
muitos problemas sociais, sempre alvo de reivindicao,
principalmente a falta de atendimento sade indgena. Se o projeto se
ampliar, pelo mapa, as outras TIs que sero diretamente afetadas
futuramente (blocos da ssmica que no foram adquiridos no leilo) so:
TI Jaminawa-Arara do Igarap Preto (8m, totalmente circundada pelo
lote), TI Arara do Igarap Humait (10m, em boa parte circundada) e
TI Katukina do Campinas (26m, em boa parte circundada). Os indgenas
em geral esto desinformados e preocupados, e tm demandado Funai que
intermedie a problemtica e traga respostas e solues, mas ainda, ao
que parece, essa demanda tem sido pontual e desorganizada. Em todos
os casos, toda a regio de prioridade extremamente alta para a
preservao ecolgica, segundo os levantamentos mais recentes do MMA e
instituies ambientais renomadas. Bem como a regio amaznica
altamente sensvel e inadequada explorao de petrleo, tanto pela rica
floresta e biodiversidade, quanto pela abundncia de gua na
superfcie e no subsolo raso, quanto pela dificuldade de acesso e
escoamento (o que preocupa ainda mais em caso de acidentes e
vazamentos, algo muito comum), presena de populaes indgenas e
tradicionais (inclusive indgenas isolados), proximidade com
diversas TIs e UCs (no caso desta regio), e tambm de uma rea de UC
em criao para proteger um importante ecossistema local de
campinaranas.36 Por conta disso, recomenda-se que o licenciamento
ambiental das fases exploratrias seja absolutamente rigoroso na
exigncia das melhores prticas internacionais para atuao em reas
ambientalmente sensveis (GTPEG, 2013). H ainda pelo menos 19
espcies ameaadas de extino nos blocos que foram a leilo nesta
regio, e solo arenoso, mais vulnervel aos impactos. H tambm
sobreposio de blocos com projetos de assentamento do Incra.
Preveem-se, ainda, impactos futuros de adensamento populacional
(GTPEG, 2013) por conta do desenvolvimento do petrleo, em reas que
hoje so pouco adensadas e com bom nvel de conservao. H grande
preocupao, tambm, com a integridade futura do Parque Nacional Serra
do Divisor, se a explorao vier. E j h muitas presses para desafetar
esta UC. O governo brasileiro aventava explorar petrleo dentro
desta rea desde 1936, e chegou a prospectar com perfuraes, na dcada
de 80. A explorao de petrleo em reas semelhantes no Equador e no
Peru tem demonstrado verdadeiras catstrofes ecolgicas e
socioambientais, no s nos acidentes frequentes como no cotidiano da
explorao, o que subsidia ainda mais as posies contrrias explorao no
Acre. Porm, no parece ainda haver uma articulao forte do movimento
social a este respeito - h muito o que avanar. Atores sociais
locais como o CIMI, a CPT e algumas lideranas se posicionam
contrrios a qualquer explorao local de petrleo (ver item 6.15).
Acusam a ANP e os governos federal e estadual de no respeitarem o
meio ambiente e as populaes tradicionais, e as audincias pblicas
que houve de pura propaganda do empreendedor. Tambm diz-se que os
governos estaduais esto fazendo lobby para que o licenciamento
ambiental seja feito em mbito local (pelos OEMAs do Acre e do
Amazonas) e no pelo Ibama, como seria o mais adequado (por ser
petrleo, por ser 35 Desde a prospeco ssmica o processo tem sido
bastante criticado, localmente, por no ser participativo, nem mesmo
com os rgos pblicos. 36 Est para ser criada a UC de proteo integral
Campinaranas do Rio Ipixuna, com parte no Acre e outra bem maior no
Amazonas, rea de relevncia ecolgica extremamente alta, forte
endemismo, de nascentes de vrios rios do AM, e que far corredor
ecolgico com a TI Vale do Javari. Alm disso, h insuficincia de
proteo desse tipo de ecossistema no Brasil (GTPEG, 2013).
13. 13 rea de fronteira internacional e interestadual e por ser
rea extremamente vulnervel ecolgica e socioculturalmente). E o
pior, no leilo foi includa a possibilidade de explorao de xisto, de
gigante impacto ambiental, cuja explorao tem sido criticada por
vrias organizaes e impedida pelo MPF em alguns estados (prope-se,
na verdade, a moratria, ou seja, abortar a ideia de se explorar
xisto no Brasil).37 5. Rumos de melhoria do cenrio: Afirmao dos
direitos indgenas e de uma tica ambiental 5.1. O papel dos
cientistas, pesquisadores e professores J dizia Robert Dahl, que em
tudo h poltica permeada, at mesmo na ausncia da ao. Alm disso, a
cincia no neutra. J dizia Karl Marx tambm que a cincia poderia ser
uma prxis revolucionria, por desvendar o oculto ao senso comum. A
Sociologia e a Antropologia, se nasceram num contexto positivista
de consolidao do capitalismo, hoje se encontram num patamar bem
mais amadurecido de apontar as igualdades de direitos, lutando pela
justia social, e o respeito diferena cultural, entre etnias e
grupos sociais que advogam seu legtimo direito de subsistir
resistentes ao capitalismo e consumismo globalizantes. Dessa forma,
sociedades cientficas como a ABA e a SBPC so fruns legtimos de
manifestao de posio diante de projetos de lei, consultas pblicas,
audincias, conselhos, etc, e creio que tm exercido este papel, pois
tenho visto se manifestarem publicamente, por exemplo quando da
polmica mudana do Cdigo Florestal, no lanamento da Portaria n. 303
da AGU, nos PLs anti-indgenas em geral, e nas campanhas
agroecolgicas e contra os agrotxicos. E aes polticas dos
cientistas, pesquisadores e professores neste sentido so vitais, em
suas organizaes.38 Em junho, mais de 800 cientistas do mundo
inteiro divulgaram um manifesto contra os transgnicos.39 Bem como,
em julho, mais de 250 cientistas espanhis divulgaram um manifesto
contundente pela mudana radical no modelo de civilizao atual,
devido aos limites socioambientais j atingidos, o que denominaram
de ltima Chamada, contra o genocdio planetrio. Dizem que j
atingimos a capacidade de suporte limite, e, se no virarmos
radicalmente nosso leme agora para um modelo de vida no consumista
e baseado e critrios ambientais, a espcie humana de fato est
rumando extino (IHU, 2014). Voltando ao Brasil h pesquisadores
renomados como Philip Fearnside, do INPA, A. Oswaldo Sev Filho, da
Unicamp, Clio Bermann, da USP, Rodolfo Salm, da UFPA, Marcelo Firpo
e Tnia Pacheco, da Fiocruz, Manuela C. da Cunha, entre outros, que
tm se manifestado diante das mega-hidreltricas na Amaznia,
agrotxicos, transgnicos, retrocessos nas polticas ambiental e
indgena, perda de agrobiodiversidade nativa, perda de direitos
humanos, lanando mapas e dados de conflitos socioambientais, etc.
Mas para alm da necessria e importante manifestao poltica destes
atores sociais, mais fundamental ainda a nossa insero, nas escolas,
universidades, centros de pesquisa e etc, no sentido de direcionar
pesquisas, extenso e ensino para os temas ambientais e indgenas,
pois h muita carncia. Em especial, devemos direcionar esforos numa
educao mais ampla nesses temas, porque infelizmente a sociedade
tem-se mostrado aptica, ou mesmo contrria aos direitos indgenas e
aos critrios e tica ambiental. Fruto de uma desconstruo orquestrada
pela globalizao reinante, os meios de comunicao de massa e a educao
em franca decadncia rumam exatamente no sentido da alienao, ou para
no dizer, emburrecimento da populao, para que aceite de bom grado a
destruio ambiental e indgena em curso. E para no dizer que no falei
das flores, extremamente necessria sempre, em tudo por tudo, a
educao poltica e cidad tambm, da mesma forma carente no Brasil,
pois sem atuao de pouco valem a conscincia e o conhecimento. 5.2. O
papel dos movimentos sociais e do 3. Setor Sem dvida o mais
importante hoje, neste cenrio, o aprimoramento e toda a ao dos
movimentos sociais, os ambientalistas, indigenistas, e
principalmente, dos prprios atores atingidos pelos desmontes
(organizaes dos prprios indgenas, dos atingidos por barragens, dos
agricultores familiares, etc). Neste sentido tm 37 O xisto obtido
com um faturamento (fracking) de rochas profundas que contm bolhas
deste gs. O faturamento feito com jatos fortes de gua. A tcnica de
alto impacto e contamina fortemente guas superficiais e
subterrneas, e vem causando cnceres e malformaes fetais em reas dos
EUA em explorao. Na Amaznia a explorao de xisto simplesmente
inconcebvel, tamanho o impacto esperado numa rea to rica em gua e
frgil geologicamente (solo rico em areia e argila). 38 Me lembro
tambm de sempre ver manifestadas associaes de docentes e
pesquisadores de universidades como UFPA, UEPA e UFRR, entre
outras, por exemplo no caso das hidreltricas na Amaznia. Tambm
vemos associaes de servidores pblicos, como da Funai e Incra, e
como do Ibama e ICMBio (Asibama, como quando pronunciou-se e exigiu
posio do MMA em moratria contra a explorao de xisto). Idem para
manifestaes contra PLs anti-indgenas por parte da OAB e da associao
de advogados pblicos. Todas estas manifestaes so de suma importncia
na arena poltica brasileira. 39 Carta aberta do site Ecocosas,
disponibilizada por IHU em http://www.ecodebate.com.br, de
13/06/2014.
14. 14 despontado importantes organizaes como o CIMI, o ISA, o
CTI, o CPT, o IIEB, a Plataforma Dhesca, o Greenpeace, etc, e as de
base, como as diversas associaes de cada povo indgena ou territrio,
a APIB, a Coiab, o MAB, o MST, a Vila Campesina, etc. A arena
poltica, ou o espao pblico no Brasil, apesar da truculncia ditadora
das oligarquias no poder, tem sido farta e movimentada, e graas a
estes movimentos que retrocessos ainda maiores no se efetivaram,
bem como a existncia de alguns PLs e programas positivos. Tambm de
suma importncia a aliana de movimentos sociais, como se v na
Campanha Permanente contra os Agrotxicos, na campanha pelo
plebiscito constituinte (reforma poltica), etc.40 Os golpes
sofridos pelos indgenas tm sido iguais aos das populaes
tradicionais, ribeirinhos, quilombolas e agricultores familiares.
Estes atores precisam se unir cada vez mais. Nos faz recordar,
saudosos, da Aliana dos Povos da Floresta, nos idos dos anos 70 e
80 no Acre, em que o expoente Chico Mendes conquistou a modalidade
das reservas extrativistas entre uma visibilidade e mudana de
paradigma sobre a Amaznia e populaes tradicionais. Notemos que ele
foi o expoente, mas havia muito mais gente unida, entre indgenas,
seringueiros e apoiadores urbanos (movimentos organizados e
servidores pblicos), neste movimento, estando alguns deles na luta
at hoje. Foi muito bom ver nossas lideranas indgenas, recentemente,
indo ONU (20/05) e a Portugal (24/06) denunciar os desmontes e se
aliar a movimentos sociais internacionais. H tambm boas inciativas
de integrao de movimentos indgenas latino-americanos, como a Coica,
porque, inclusive, pases como o Peru, o Equador e a Argentina tm
sido vtimas s vezes mais sofridas de explorao petrolfera,
madeireira, transgnicos e, no futuro prximo, mais hidreltricas. A
fora do movimento indgena sempre impressionante. Se at hoje a PEC
n. 215 to incutida pelo poder ruralista no passou, foi por causa
desta fora. Eles fazem movimentos realmente poderosos, como foram
as ocupaes do Congresso Nacional em abril de 2013. (Alis, como diz
o colega Juan Negret da Funai / Acre, foi este movimento o estopim
de todo o rol de manifestaes de rua que estouraram em junho de
2013.) Recentemente, de 26 a 29 de maio, uma nova mobilizao indgena
nacional tomou a marquise do Congresso. Bem como sempre h marchas e
ocupaes (de ministrios, auditrios, praas pblicas e fazendas [que so
reas indgenas invadidas]) de povos como os Munduruku, Guarani /
Kaiow, etc. Mesmo no Acre, em que os conflitos no so to acirrados,
houve ocupaes por meses da Funai em 2013 e por mais de um ano da
Funasa entre 2012 e 2013, por exemplo, e eles nunca saem de mos
vazias destes movimentos ficam at alguma vitria satisfatria. E
nesta fora que se deposita a nossa maior esperana para frear os
retrocessos em curso, apesar das perdas, pois sabemos que h muitos
feridos e assassinados nestes movimentos, sendo o Brasil atual
campeo de assassinato de lideranas indgenas e ambientalistas, mas
isso j no seu dia a dia, e nem tanto nas grandes mobilizaes para se
ver a truculncia dos governos e setores econmicos oligrquicos
atuais, no pas. Alm de denunciar e combater o que h de negativo,
que tanto temos falado, h que se esforar pela luta em direo s
positividades: demarcao e gesto de TIs, UCs e territrios
quilombolas, reforma agrria, incentivos ao extrativismo sustentvel
e agroecologia, incentivos a programas ambientais, de direitos
humanos e sociais e pela reforma poltica, etc. Citando mais
especificamente, h a luta pela aprovao do novo Estatuto das
Sociedades Indgenas, parado no Congresso Nacional desde 1991, a
luta pela transformao da CNPI em conselho paritrio e deliberativo,
a efetivao de polticas no papel ou, no mnimo, muito tmidas, como a
Pngati, a Poltica de Populaes Tradicionais, a Poltica de reas
Protegidas, a Poltica de Mudanas Climticas, a Poltica de
Agricultura Orgnica, o PAA, o PNAE, a Poltica de Resduos Slidos, a
Poltica da Participao Social, o recentssimo Pronara (Programa
Nacional de Reduo de Agrotxicos), etc. H muito o que pressionar
pela melhoria do Estado / poltica / governos, penso eu, em 6 itens:
presena (seriedade, ou eficincia), desburocratizao, democracia,
transparncia, honestidade (fim da corrupo) e reforma poltica. Por
fim, no h como escapar da participao direta no sistema poltico
vigente, ou seja, o ingresso e participao cada vez mais qualificada
nos partidos polticos, e a ocupao de posies nos governos executivo
e legislativo. H muito o que melhorar nesta seara, certo, e por
isso h um desnimo e ceticismo geral quanto atuao por dentro da
poltica partidria, mas isso um fenmeno mundial, no s privilgio do
Brasil, e com muita educao e informao que precisamos mudar este
quadro, e tornar a nossa sociedade mais politizada (aumentar o
estrato poltico de Robert Dahl). Por exemplo, at hoje, no h
partidos com programas e linhas ideolgicas claras no Brasil, e
menos ainda os que seguem bandeiras ambientais e indgenas de fato,
e no de discurso, pois hoje todo mundo se diz a favor do
desenvolvimento sustentvel, sem nem mesmo saber o que isso. Alm dos
movimentos sociais quero enfatizar a ao do 3. Setor, de ONGs e/ou
microempresas que em muito tm enriquecido os prprios movimentos e
os territrios indgenas e de populaes tradicionais com projetos
afirmativos de sustentabilidade ambiental e afirmao de direitos
humanos e sociais. Muitos deles alcanam longo prazo, financiamentos
constantes e timos resultados. Como exemplos h inmeros, que embora
pontuais e aparentemente de pequena escala, quando somados fazem
toda a diferena, pois nem o Estado nem o mercado tm respondido a
estas demandas. o caso da CPI-Acre e SOS Amaznia, no Acre, do CIR
em Roraima, do Iep no Amap, 40 Um bom exemplo de aliana de
movimentos sociais foi o I Seminrio Estadual dos Defensores e
Defensoras de Direitos Humanos no Rio Grande do Sul, de 09 a
11/jun/2014, que uniu indgenas, quilombolas, populaes tradicionais
e agricultores familiares. Posicionaram-se contra a aliana
ruralista do agronegcio e as corporaes transnacionais de agrotxicos
e transgnicos.
15. 15 do IIEB, do ISA, do Ip, etc. Vida longa a estas
inciativas, e que elas possam ser internalizadas pelas polticas
pblicas. 5.3. O papel do Ministrio Pblico Este apenas um pargrafo
em elogio atuao frequente e vigilante do Ministrio Pblico, nas
esferas estaduais, mas, principalmente, federal. Seus promotores tm
sido atuantes em todos os casos de retrocessos indgenas e
ambientais, por exemplo, quando declararam a PEC n. 215
inconstitucional. Recentemente fizeram a prefeitura de
Jacareacanga, PA, recontratar os 70 professores indgenas que havia
demitido sem justa causa. Tambm sempre efetuam aes civis pblicas
com relao ao vergonhoso no cumprimento das condicionantes dos
licenciamentos das hidreltricas, bem como tentam evitar o
licenciamento de algumas, baseado nos impactos socioambientais.
Idem para outros mega-empreendimentos Brasil afora. Temos
necessidade do Ministrio Pblico cada vez mais fortalecido, neste
pas em que o governo imediatista tem sido to relapso na observncia
dos direitos sociais e da qualidade de vida. 5.4. O papel do
jornalismo e da internet O jornalismo consciente, contra a corrente
hegemnica dos meios de comunicao de massa, de suma importncia, e so
eles aliados importantssimos do movimento social. No a toa, os
jornalistas tm sido tambm perseguidos no Brasil, alguns at
assassinados. Ser que vivemos mesmo numa democracia, que exigiria
liberdade de expresso? Mas aos poucos, com a insistncia, algumas
questes mais srias vo ganhando espao, na democratizao da informao,
e na qualificao desta. O aquecimento global e as mudanas climticas
at que enfim so hoje populares nos meios de comunicao, de 2010 para
c, o que j era sabido e tratado por cientistas e ambientalistas,
assiduamente, desde a dcada de 70. E assim ser com os temas mais
detalhados. Por exemplo, h documentrios de alta qualidade na TV
Brasil (um canal de TV aberta, e, portanto, acessvel). Recente eu
pude assistir nela a um antigo (e atual) importante documentrio
sobre os desastres das UHEs de Balbina e Tucuru, bem como a outro
da expulso dos agricultores familiares com a chegada dos
latifundirios da soja, subindo no eixo da BR-163 (Cuiab-Santarm).
Desse modo, fazemos votos de que os cursos de jornalismo sejam cada
vez mais inclusivos com as questes polticas, indgenas e ambientais.
A internet sem dvida a inveno mais genial das ltimas dcadas, deve
ser usada e incentivada ao mximo em todos os nveis. Mas at hoje na
Amaznia nossos sinais de internet so pssimos, seja l qual for o
provedor, at mesmo nas capitais. A incluso digital imperiosa, bem
como a democratizao efetiva do acesso totalmente aberto, em todas
as instituies e nveis, e medidas contra a espionagem e bloqueios.41
As peties eletrnicas tambm do resultado, se bem que menor do que o
concreto do povo nas ruas. Bem como as redes sociais podem
rapidamente organizar movimentos-relmpago, e alterar expectativas
de eleies na ltima hora (como aconteceu na Primavera rabe). Porm,
sabemos que a internet uma faca de dois gumes. Por exemplo, no uso
das redes sociais, parece que 90% do tempo so ocupados com assuntos
vos, sem contedo. Alm de banalizante, pode ser alienante e
individualista, por exemplo, hoje se v grupos de pessoas reunidas
(de todos os tipos e classes sociais), ou pessoas sozinhas em todo
lugar, absolutamente absortas nos seus celulares smartphones, mas
sem nenhum contato humano efetivo! O que reflete, alis,
infelizmente, o baixo nvel educacional e de conscincia da sociedade
brasileira. Mas nada que no possa ser revertido, e a voltamos
necessidade de melhoria da educao em todos os nveis. E a prpria
internet pode ser um apoio a essa melhoria, pois mesmo em redes
sociais, usurios que se ocupem de assuntos mais srios (no nosso
caso: polticos, ambientais e indgenas), podem aos poucos conquistar
o interesse dos que no se atentam. No posso deixar de indicar
alguns sites de suma importncia, para as reas indgena e ambiental,
como o Combate ao Racismo Ambiental, o
conflitoambiental.icict.fiocruz.br, o Ecodebate, o do ISA, o
republicadosruralistas.com.br, o Oeco, o do CIMI, o do CIR, o de
Telma Monteiro, o de Philip Fearnside, o de Arsnio Oswaldo Sev
Filho, o brasildefato.com.br, o agroecologia.org.br, o
contraosagrotoxicos.org, o do Imazon, o do INESC e o
plebiscitoconstituinte.org.br. 5.5. Breve concluso Bem, caro
leitor, creio que j falei demais, agradeo a ateno. S peo mais um
pouco de pacincia leitura do item 6 abaixo, em que pesquei
importantes citaes atuais sobre as problemticas tratadas. Em
especial, 41 Infelizmente h notcia de que o governo brasileiro, no
se sabe por quais meios, e mesmo por dentro de alguma instituies
pblicas, esteja praticando a espionagem da internet dos usurios,
inclusive servidores pblicos, o que ilegal e lamentvel. Bem como,
nas instituies, apelida-se o sinal de internet de net-ditadura,
pois inmeros sites so bloqueados, no somente as redes sociais e o
youtube, bem como sites importantes, como os ambientais e de
organizaes cientficas. O que atrapalha sobremaneira o nosso
trabalho.
16. 16 recomendo a leitura dos itens 6.6, 6.8 e 6.14, sobre o
racismo indgena, e dos itens 6.12 e 6.18, sobre as questes indgenas
gerais e do Mato Grosso do Sul. Minha concluso? simples, e
resume-se em dois itens: 1) Precisamos atuar, atuar e atuar, em
qualquer forma de movimento social, de preferncia em aliana de
movimentos sociais, em todos os nveis, explorando todos os canais
de atuao, ocupao de espaos e comunicao, pela melhoria poltica e
democrtica do nosso pas, e das polticas indgenas e ambientais. 2)
Precisamos educar e constantemente nos auto-educar, educar e
educar, praticar ensino, pesquisa e extenso, e ampliar ao mximo as
informaes, sobre as trs temticas acima. 6. Apndice: Importantes
citaes Observao: os pargrafos separados so descontinuidades nas
citaes dos textos originais, ou seja, (...). 6.1. CIMI e outros, I
Seminrio Estadual dos Defensores e Defensoras de Direitos Humanos
no Rio Grande do Sul, 09 a 11/jun/201442 A omisso, negligncia e
conivncia das trs esferas de Estado (Judicirio, Legislativo e
Executivo) promoveram ao longo dos ltimos anos: a paralisao das
demarcaes das terras indgenas e quilombolas; a invaso aos
territrios ancestrais; o assassinato de milhares de jovens negros;
o desalojamento de milhares de famlias de suas casas e terras; a
implementao de megaprojetos criminosos realizados numa lgica de
desenvolvimento predatria para a maioria dos seres humanos e para o
meio ambiente; a criminalizao e priso de lideranas indgenas,
quilombolas e dos movimentos sociais. As violaes aos direitos
humanos aumentam, mas a resistncia tambm aumenta. Ns, entidades e
movimentos, que lutamos pela defesa dos direitos humanos nos
juntamos a todos aqueles que esto em luta pela garantia de direitos
sociais, polticos e nas lutas pela terra e contra o racismo
institucionalizado. Resistiremos e lutaremos contra o agronegcio,
contra os projetos do capitalismo para o campo e as alianas entre
os ruralistas, as corporaes transnacionais, o capital financeiro
com os governos. Colocamo-nos contra o governo federal e estadual
que estimulam o desenvolvimentismo e que pactuam com os crimes
impostos pelo latifndio e que geram inclusive conflitos entre os
pequenos. 6.2. Snia Guajajara, importante liderana indgena
nacional, em entrevista para a BBC, jun/2014 (FELLET, 2014) Nas
grandes obras, s vezes oferecem s comunidades algum dinheiro,
achando que vo resolver os problemas. Mas para o indgena o dinheiro
acaba sendo um ponto de conflito, porque no temos o costume de
lidar com ele. No temos essa coisa de acumular riquezas. Nossa
lgica e nosso modo de vida so outros. O que a maioria dos indgenas
nas aldeias quer tranquilidade. Qualidade de vida para ns
liberdade, e liberdade ter nossos territrios livres de ameaas e
invases para pro