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J ULGAR E C UIDAR (S AÚDE MENTAL DO P ERITO MÉDICO) J ULGAR E C UIDAR (S AÚDE MENTAL DO P ERITO MÉDICO)

Julgar E Cuidar

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JULGAR E CUIDAR

(SAÚDE MENTAL DO PERITO MÉDICO)JULGAR E CUIDAR

(SAÚDE MENTAL DO PERITO MÉDICO)

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WANDERLEY CODO

organizador

JULGAR E CUIDAR

(SAÚDE MENTAL DO PERITO MÉDICO)JULGAR E CUIDAR

(SAÚDE MENTAL DO PERITO MÉDICO)

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Índices para catálogo sistemático:

EDITORA LTDA.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

R

Rua Jaguaribe, 571CEP 01224-001São Paulo, SP — BrasilFone (11) 2167-1101www.ltr.com.brProdução Gráfica e Editoração Eletrônica: RLUXProjeto de capa: FÁBIO GIGLIOImpressão: PSI7 GRÁFICAAgosto, 2013

Todos os direitos reservados

Codo, WanderleyJulgar e cuidar (saúde mental do peritomédico) / Wanderley Codo. — São Paulo : LTr,2013.

Bibliografia

1. Medicina do trabalho 2. Perícia médica3. Perítos médicos — Profissão 4. Peritos médicos —Saúde mental I. Título.

13-02666 CDU-347.948:331

1. Perícia médica : Justiça do trabalho347.948:3312. Perito médico como profissão347.948:331

Versão impressa - LTr 4842.2 - ISBN 978-85-361-2629-6

Versão digital - LTr 7624.7 - ISBN 978-85-361-2688-3

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ORGANIZADORES E COLABORADORES

Wanderley CodoPesquisador e coordenador do Laboratório de Psicologia do Trabalho. Autor dos livros Educação: Carinhoe Trabalho; LER: Diagnóstico, Tratamento e Prevenção; Saúde Mental e Trabalho: Leituras; Indivíduo,Trabalho e Sofrimento; Sofrimento Psíquico nas Organizações; O trabalho Enlouquece? Um encontroentre a clínica e o trabalho; Salud Mental Y Trabajo; O novo Seguro de Acidente e o novo FAP (2009 —LTr); Saúde e Trabalho no Brasil uma revolução silenciosa (2010 Editora Vozes)

Paola da Silva AmendoeiraPsicóloga formada pela PUC — RJ, atualmente atuando como pesquisadora do Laboratório de Psicologiado Trabalho — LPT contribuindo com sua experiência em Psicanálise Clínica, Saúde Mental e FatoresHumanos no Trabalho.

Remígio TodeschiniEx-diretor de Políticas de Saúde e Segurança Ocupacional do Ministério da Previdência Social. Ex-secretáriode Políticas Públicas de Emprego do Ministério do Trabalho e Emprego (2003-2006). Ex-presidente daFundacentro, órgão de Pesquisa em Saúde e Segurança do Trabalho (2007). Advogado formado pelaUSP (1982). Mestre em Direitos Sociais pela PUC — SP (2000). Autor dos livros Gestão da PrevidênciaPública e Fundos de Pensão (2000 — LTr). O novo Seguro de Acidente e o novo FAP (2009 — LTr). Saúdee Trabalho no Brasil uma revolução silenciosa — O NTEP e a previdência social (2010 Editora Vozes).(Doutorando do Departamento de Psicologia Social e do Trabalho da UnB).

Jaqueline Gomes de JesusDoutora em Psicologia Social, do Trabalho e das Organizações pela Universidade de Brasília — UnB,pesquisadora do Laboratório de Trabalho, Diversidade e Identidade — LTDI/UnB e professora do CentroUniversitário Planalto do Distrito Federal — UNIPLAN. É integrante da Associação Brasileira de PsicologiaSocial — ABRAPSO e da Associação Brasileira de Pesquisadores Negros — ABPN, além de serinvestigadora da Rede de Antropologia Dos e Desde os Corpos. Currículo Lattes: <http://lattes.cnpq.br/0121194567584126>

Iône Vasques-MenezesAtua como professora efetiva no Programa de Mestrado em Psicologia da Universidade Salgado deOliveira (Universo — Niterói) e como professora colaboradora no Programa de Pós-Graduação em PsicologiaSocial, do Trabalho e das Organizações (PSTO) da Universidade de Brasília – UnB. Tem pesquisas epublicações nas áreas de Saúde Mental e Trabalho e de Intervenção Clínica em Sofrimento do Trabalhador.Seus trabalhos envolvem Burnout, Perfil de Trabalhadores, Diagnóstico Integrado do Trabalho, AspectosObjetivos e Subjetivos na Relação Trabalho, Trabalhador, Emprego-Desemprego e Saúde Mental.

Marcelo TavaresPsicólogo Clínico pelo Alliant University em 1993; especialista em psicodiagnóstico, psicopatologia eintervenção em crise; Coordenador do Núcleo de Intervenção em Crise do Programa de Pós-graduaçãoem Psicologia Clínica e Cultura do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília.

Maircon Batista RibeiroEstatístico formado pela Universidade de Brasília. Pós-graduado a nível de especialização em estatísticaaplicada pela Universidade do Distrito Federal — UDF. Pesquisador do Laboratório de Psicologia doTrabalho da Universidade de Brasília — UnB.

Renata Pereira de MatosGerente de projetos de pesquisas do Laboratório de Psicologia do Trabalho. Formada em Gestão deRecursos Humanos pela Universidade Paulista — UNIP. Gerenciou e executou a criação do banco e acoleta de dados da pesquisa.

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SUMÁRIO

Introdução ................................................................................................................ 13

PARTE 1 — O QUE SÃO A PERÍCIA E O PERITO

Capítulo 1 — O trabalho do perito ............................................................................... 19

Um médico e um antimédico .................................................................. 19

Um investigador por atacado de problemas no varejo ............................. 27

Fraude..................................................................................................... 32

Simulações .............................................................................................. 35

A anulação do trabalho do perito ............................................................ 36

Capítulo 2 — O perito médico e seus afazeres ............................................................. 41

Os peritos médicos: percepção e necessidades ........................................ 44

Relação entre peritos médicos e segurados ............................................. 50

Capítulo 3 — Uma breve história da saúde e do trabalho no Brasil .............................. 59

A escravatura .......................................................................................... 59

A Revolução Industrial ............................................................................ 61

Período Vargas ........................................................................................ 64

O campeão mundial de acidentes no trabalho......................................... 66

O surgimento da medicina do trabalho ................................................... 69

As transições no trabalho dos peritos junto à Previdência Social ............. 71

PARTE 2 — ORGANIZAÇÃO E CONDIÇÕES DO TRABALHO DOS PERITOS

Capítulo 4 — Relações sociais e o trabalho dos peritos ................................................ 75

Relacionamento com as chefias ............................................................... 82

Relacionamento com os colegas ............................................................. 84

Suporte Social ......................................................................................... 85

Conclusão ............................................................................................... 87

Capítulo 5 — Relação do trabalhador com o seu trabalho ............................................ 88

Sobre a satisfação entre os peritos .......................................................... 89

Insatisfação entre os peritos .................................................................... 91

Infraestrutura de trabalho e insatisfação .................................................. 92

Relacionamento social e insatisfação ....................................................... 94

Significado do trabalho e insatisfação ..................................................... 98

A outra face da moeda ............................................................................ 100

Comprometimento com a organização .................................................... 101

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Capítulo 6 — Condições de trabalho dos peritos .......................................................... 106

O sistema SABI ........................................................................................ 106

Condições para a realização do exame físico ........................................... 110

Condições ambientais/físicas para o trabalho da perícia .......................... 111

Capítulo 7 — Ameaças e agressões na perícia .............................................................. 117

O diagnóstico que é um antidiagnóstico ................................................. 123

Ameaças e agressões não são fenômenos que possam ser examinados de

um ponto de vista estatístico .............................................................. 126

Ameaças e agressões têm efeito vicariante .............................................. 127

Estado da segurança nas APS .................................................................. 128

Detector de metais .............................................................................. 128

O botão de pânico ............................................................................. 129

A rota de fuga .................................................................................... 129

A entrega do resultado da perícia ............................................................ 131

A arquitetura da agência ......................................................................... 132

Ameaças e agressões trazem consequências perversas ............................. 132

Capítulo 8 — Os conflitos no trabalho da perícia médica ............................................. 133

O que é conflito? .................................................................................... 133

Conflito do perito com o segurado ......................................................... 135

Duas situações em que o conflito é obvio ............................................... 135

Um conflito permanente com a própria consciência ................................ 136

Uma tentativa frustrada de evitar os conflitos ......................................... 141

Uma contradição insolúvel ...................................................................... 149

PARTE 3 — O SOFRIMENTO PSICOLÓGICO DO PERITO

Capítulo 9 — Burnout e os peritos médicos ................................................................. 153

Capítulo 10 — Depressão introjetiva e o sofrimento psíquico dos peritos ..................... 165

Primeiras concepções do processo depressivo ....................................... 165

Depressão anaclítica .............................................................................. 167

Depressão introjetiva ............................................................................. 168

Depressão introjetiva e a natureza do trabalho de perícia médica .......... 171

Conclusão ............................................................................................. 181

Metodologia ............................................................................................................. 182

Sobre os protocolos de investigação ..................................................... 183

1. Condições específicas da perícia ................................................... 183

2. Escalas de avaliação do trabalho ................................................... 185

3. Escalas de avaliação de sofrimento psicológico ............................. 186

Análise dos dados quantitativos ............................................................ 187

Análise dos dados qualitativos .............................................................. 187

Referências bibliográficas ........................................................................................ 188

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LISTA DE FIGURASFigura 1.1 — Símbolo da Associação Nacional dos Médicos e Peritos (ANMP) .............. 19

Figura 1.2 — Asclépio, deus da medicina ...................................................................... 20

Figura 1.3 — Símbolo da medicina ................................................................................ 21

Figura 1.4 — Símbolo da igualdade e equilíbrio processual ........................................... 22

LISTA DE GRÁFICOSGráfico 3.1 — Total de acidentes (1970 — 2008) .......................................................... 68

Gráfico 3.2 — Óbitos (1970 — 2008) ............................................................................ 68

Gráfico 3.3 — Doenças (1970 — 2008) ......................................................................... 68

Gráfico 3.4 — Acidentes de trajeto (1970 — 2008) ....................................................... 69

Gráfico 7.1 — Você já foi ameaçado por um segurado ou acompanhante? ................... 118

Gráfico 7.2 — Já foi agredido? ...................................................................................... 122

Gráfico 7.3 — Benefício concedido por medo do assegurado ....................................... 123

Gráfico 10.1 — Variância compartilhada de cada estressor do trabalho com a depressãointrojetiva .............................................................................................. 172

Gráfico 10.2 — Distribuição de incidência de estressores para médicos-peritos com esem depressão introjetiva ..................................................................... 173

LISTA DE TABELASTabela 1.1 — Segundo emprego ................................................................................... 24

Tabela 1.2 — Já tentaram fraudar o benefício em uma perícia que você fazia? .............. 33

Tabela 1.3 — Cada 10 perícias que eu faço, X (número) são tentativas de simulação .... 36

Tabela 3.1 — Acidente de trabalho e doenças profissionais de 1970 a 1988................ 67

Tabela 4.1 — Relações sociais e número de organizações em que os peritos trabalham ... 76

Tabela 4.2 — Problemas de relações sociais com chefias e sobrecarga de trabalho ........ 77

Tabela 4.3 — Relações sociais e tempo de trabalho como perito ................................... 78

Tabela 4.4 — Relações sociais no trabalho e suporte social ........................................... 78

Tabela 4.5 — Relações sociais no trabalho e relação pessoal com a chefia .................... 79

Tabela 4.6 — Relações sociais no trabalho e importância social do trabalho ................. 79

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Tabela 4.7 — Relações sociais no trabalho e rotina ....................................................... 80

Tabela 4.8 — Relações sociais no trabalho e segurança ................................................. 81

Tabela 4.9 — Relação entre satisfação e relações sociais no trabalho dos peritos .......... 81

Tabela 4.10 — Significado do trabalho e relações sociais com a chefia ......................... 82

Tabela 4.11 — Relação entre satisfação e relações com as chefias no trabalho dos peritos ..... 82

Tabela 4.12 — Relação entre satisfação e relações com os colegas no trabalho dos peritos ... 84

Tabela 4.13 — Relação entre satisfação e suporte social no trabalho dos peritos ........... 85

Tabela 4.14 — Suporte social e comprometimento no trabalho ..................................... 86

Tabela 4.15 — Suporte social e significado do trabalho ................................................. 86

Tabela 5.1 — Frequência da divisão das categorias por satisfação ................................. 91

Tabela 5.2 — Insatisfação .............................................................................................. 92

Tabela 5.3 — Condições de informática ........................................................................ 93

Tabela 5.4 — Funciona bem? ........................................................................................ 93

Tabela 5.5 — Funcionários de suporte (limpeza, administração etc.)? ............................ 93

Tabela 5.6 — Relacionamento social no trabalho........................................................... 95

Tabela 5.7 — Insatisfação x relacionamento com chefia ................................................ 95

Tabela 5.8 — Suporte social .......................................................................................... 96

Tabela 5.9 — Escala de relacionamento ......................................................................... 96

Tabela 5.10 — Escala de importância social do trabalho ................................................ 97

Tabela 5.11 — Escala de controle sobre o trabalho ....................................................... 99

Tabela 5.12 — Escala de rotina no trabalho .................................................................. 99

Tabela 5.13 — Escala de significado do trabalho ........................................................... 100

Tabela 5.14 — Escala de comprometimento com a organização .................................... 102

Tabela 5.15 — Escala de comprometimento com a organização (PROV) ........................ 102

Tabela 5.16 — Escala de comprometimento com a organização .................................... 102

Tabela 5.17 — Escala de comprometimento com a organização .................................... 103

Tabela 5.18 — Escala de comprometimento com a organização .................................... 103

Tabela 5.19 — Escala de comprometimento com a organização .................................... 103

Tabela 5.20 — Escala de comprometimento com a organização .................................... 104

Tabela 5.21 — Escala de comprometimento com a organização .................................... 104

Tabela 6.1 — Em Informática ......................................................................................... 106

Tabela 6.2 — Informática e Comprometimento .............................................................. 107

Tabela 6.3 — Informática e Significado do trabalho ....................................................... 107

Tabela 6.4 — Informática e Carga de Trabalho .............................................................. 107

Tabela 6.5 — O SABI funciona bem? ............................................................................. 108

Tabela 6.6 — O sistema sai do ar constantemente? ....................................................... 108

Tabela 6.7 — O sistema é lento? ................................................................................... 108

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Tabela 6.8 — Faltam opções para a resposta adequada da perícia? ............................... 109

Tabela 6.9 — O SABI tem informações em excesso que tenho de preencher? ................ 109

Tabela 6.10 — Faltam informações importantes para a perícia? ..................................... 109

Tabela 6.11 — Condições para a elaboração do exame físico ........................................ 110

Tabela 6.12 — Exame físico e satisfação ........................................................................ 110

Tabela 6.13 — Exame físico e comprometimento........................................................... 111

Tabela 6.14 — Exame físico e carga de trabalho ............................................................ 111

Tabela 6.15 — Qualidade das intalações físicas ............................................................. 112

Tabela 6.16 — Instalações físicas e relações sociais de trabalho .................................... 113

Tabela 6.17 — Instalações físicas e rotina ...................................................................... 113

Tabela 6.18 — Condições do mobiliário ........................................................................ 113

Tabela 6.19 — Suporte de atividades-meio .................................................................... 114

Tabela 6.20 — Funcionários de suporte e satisfação ...................................................... 115

Tabela 6.21 — Funcionários de suporte e comprometimento ........................................ 115

Tabela 6.22 — Funcionários de suporte e relações de trabalho ...................................... 115

Tabela 6.23 — Funcionários de suporte e carga de trabalho.......................................... 116

Tabela 7.1 — Ameaças como estas já aconteceram com 91% dos peritos ..................... 118

Tabela 7.2 — Quantos peritos trabalham na APS onde você trabalha? ........................... 121

Tabela 7.3 — Agressões vividas por peritos ................................................................... 122

Tabela 7.4 — Agressões conforme quantidade de peritos por agência ........................... 122

Tabela 7.5 — Benefício concedido por medo do assegurado ......................................... 123

Tabela 7.6 — Sua APS tem detector de metais? ............................................................. 128

Tabela 7.7 — Existe botão de pânico? ........................................................................... 129

Tabela 7.8 — Existe rota de fuga? ................................................................................. 130

Tabela 7.9 — O corpo de segurança é eficiente? ........................................................... 131

Tabela 7.10 — A entrega do resultado da perícia é feita por você mesmo? ................... 131

Tabela 7.11 — É feita por um funcionário administrativo? ............................................. 131

Tabela 7.12 — O segurado pode entrar a qualquer hora na sua sala? ............................ 132

Tabela 8.1 — A perícia vive em conflito permanente com o segurado ........................... 135

Tabela 8.2 — A perícia vive em conflito permanente com o segurado ........................... 135

Tabela 8.3 — Conflito com a própria consciência .......................................................... 136

Tabela 8.4 — A perícia vive em um conflito permanente entre conceder um benefício enegá-lo ..................................................................................................... 138

Tabela 8.5 — Conflito entre a necessidade do segurado e negar um benefício .............. 139

Tabela 8.6 — A perícia vive em conflito permanente sobre o que é justo ou não é .......... 140

Tabela 8.7 — A perícia vive em conflito permanente com o segurado ........................... 141

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Tabela 8.8 — A perícia vive em conflito permanente com a sua própria consciência .......... 141

Tabela 8.9 — A perícia vive em conflito permanente entre conceder um benefício enegá-lo ..................................................................................................... 142

Tabela 8.10 — A perícia vive em conflito permanente entre a vida de necessidades dosegurado e a necessidade de negar um benefício injusto ........................ 142

Tabela 8.11 — A perícia vive em conflito permanente sobre o que é justo ou não ........... 142

Tabela 8.12 — A perícia vive em conflito permanente com o assegurado ...................... 143

Tabela 8.13 — A perícia vive em conflito permanente com as leis da Previdência .......... 143

Tabela 8.14 — A perícia vive em conflito permanente com a sua própria consciência ......... 143

Tabela 8.15 — A perícia vive em conflito permanente entre conceder um benefício enegá-lo ................................................................................................... 144

Tabela 8.16 — A perícia vive em conflito permanente entre a vida de necessidades dosegurado e a necessidade de negar um benefício injusto? ...................... 144

Tabela 8.17 — A perícia vive em um conflito permanente sobre o que é justo ou não ..... 144

Tabela 8.18 — A perícia vive em um conflito permanente com o assegurado ................ 145

Tabela 8.19 — A perícia vive em um conflito permanente com a sua própria consciência ... 145

Tabela 8.20 — A perícia vive em conflito permanente entre conceder um benefício enegá-lo ................................................................................................... 145

Tabela 8.21 — A perícia vive em um conflito permanente entre a vida de necessidadesdo segurado e a necessidade de negar um benefício injusto? ................. 146

Tabela 8.22 — A perícia vive em um conflito permanente sobre o que é justo ou não ..... 146

Tabela 9.1 — Importância social do trabalho X exaustão emocional .............................. 158

Tabela 9.2 — Controle sobre o trabalho X exaustão emocional ..................................... 159

Tabela 9.3 — Relacionamento com colegas X exaustão emocional ................................ 160

Tabela 9.4 — Rotina X exaustão emocional ................................................................... 160

Tabela 9.5 — Importância social X baixa realização ....................................................... 161

Tabela 9.6 — Relacionamento com colegas X baixa realização ...................................... 161

Tabela 9.7 — Suporte social X realização ...................................................................... 161

Tabela 10.1 — Depressão introjetiva X categoria profissional ........................................ 171

Tabela 10.2 — Carga de trabalho X depressão introjetiva .............................................. 174

Tabela 10.3 — Risco de suporte social X depressão introjetiva ...................................... 175

Tabela 10.4 — Sentido de trabalho X depressão introjetiva ........................................... 176

Tabela 10.5 — Conflito permanente com o segurado X depressão introjetiva ................ 177

Tabela 10.6 — Conflito permanente entre a necessidade do segurado e conceder beneficioinjusto X depressão introjetiva ................................................................ 177

Tabela 10.7 — Conflito permanente com a própria consciência X depressão introjetiva ... 178

Tabela 10.8 — Depressão introjetiva X risco de comprometimento ................................ 179

Tabela 11 — Estados da federação e número de participantes ....................................... 182

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INTRODUÇÃO

Muitos jogos para ipad, iphone, noteboooks, desktops reproduzem no mágicouniverso eletrônico situações muito semelhantes ao trabalho do perito. As pessoascompram e passam horas se divertindo em fazer investigações simuladas. ArthurConan Doyle se tornou exatamente por ter criado um detetive que utilizava ométodo hipotético dedutivo, exatamente o mesmo que os peritos usam hoje, suashistórias até hoje são lidas e relidas em todo o mundo, 120 anos depois (!).

Sim, o trabalho do perito é fascinante, divertido até, e muitos peritos sedivertem com ele.

Não há como colocar em dúvida a importância social do trabalho do perito esabemos todos que esta é uma boa dimensão para julgar um trabalho. Trabalhonão rotineiro, trabalho com um nível de autonomia maior do que muitos, emboraos peritos reclamem da falta dela e sempre queiram mais, outra vez bons critériospara enxergar um bom trabalho, o salário também não é dos piores.

Sim, o trabalho do perito é um trabalho bom, e saudável.

Mas isto não nos importa aqui, o que nos importa é fazer um diagnóstico desaúde mental do perito, e, aqui, a analogia com o médico deve ser útil, ninguémconsulta um médico para saber o que está bom, a consulta é feita para ver osproblemas, para poder pensar uma solução, tal e qual nosso diagnóstico, o queprecisamos é ver os problemas do trabalho do perito.

O médico maldoso, o insensível às dores de todos nós, o carrasco do governocontra o pobre do trabalhador, o relapso que sem mais nem menos tira o direitoao benefício, esse lobo mal é que será objeto do estudo que agora entregamos aoleitor.

Um trabalho complicado, vítima de ameaças, agressões, tentativas de fraudee simulação, um trabalho cobrado por todos, contraditório, conflituoso.

O livro se divide em 3 seções:

Parte 1. O que são a perícia e o perito?

Capítulo 1. O que é um perito?

Em que se examinam as marcas mais importantes do trabalho dos peritos, ainserção que este trabalho tem na divisão nacional do trabalho e algumascontradições deste trabalho.

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Capítulo 2. O perito-médico e seus afazeres.

As tarefas dos peritos e os problemas que enfrenta no trabalho, o que ele faz,seus procedimentos e como os avalia, em que condições desempenha suas funções.

Capítulo 3. Uma breve história da saúde e do trabalho no Brasil.

Desde a escravidão até nossos dias, de forma sucinta se conta a história dasaúde e do trabalho no Brasil, até desembocar no INSS e suas perícias, nos dias atuais.

Parte 2. Organização e condições do trabalho dos peritos

Capítulo 4. Relações sociais eo trabalho dos peritos.

A importância do relacionamento social no trabalho, com os colegas, com achefia, e também as relações sociais extratrabalho capazes de darem suporte aosperitos.

Capítulo 5. A relação do trabalhador com o seu trabalho.

A satisfação do perito com seu trabalho e as inúmeras insatisfações, ocomprometimento deste trabalhador com seu trabalho e o descomprometimento,formas de defesa contra os problemas de trabalho.

Capítulo 6. Condições de trabalho dos peritos.

Os problemas nas condições de trabalho do perito, as dificuldades com ainformática, particularmente o sistema SABI, a deficiência do mobiliário necessáriopara a realização de um bom diagnóstico, inclusive o layout da agência.

Capítulo 7. Ameaças e agressões na perícia.

Ocorrem muitas ameaças e agressões ao trabalho do perito, aqui se examinamas incidências e as possíveis consequências destas violências cotidianas, assim comosuas possíveis causas.

Capítulo 8. Os conflitos no trabalho da perícia médica.

A profissão de perito é essencialmente conflitante, o julgamento pressupõesempre um conflito e um perito só faz julgar, este é um fator estressante no trabalhodeste profissional.

Parte 3. O sofrimento psicológico do perito

Capítulo 9. Burnout e os peritos médicos.

Burnout é uma síndrome que afeta em muito os profissionais da saúde e daeducação, também afeta os peritos; neste capítulo se examinam a incidência e adistribuição do burnout e suas consequências para a saúde mental do trabalhador.

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Capítulo 10. Depressão introjetiva e o sofrimento psíquico dos peritos.

Os peritos apresentaram uma alta incidência de depressão introjetiva: pode--se demonstrar que este é um problema oriundo do trabalho — aqui examinamosas relações entre esta síndrome e o trabalho e suas consequências para otrabalhador.

Quem é perito verá que em muitos lugares nada a acrescentar ao que eles jásabem, o livro funcionando para dar nome aos sentimentos e pensamentos eações que sempre estiveram lá, funcionando quase como um porta-voz, mas,mesmo assim, haverá novidades, coisa que se vive e não se entende.

Quem não é perito, prepare-se para uma viagem por dentro de um trabalhoque é mágico, único, contraditório.

Ver-se-á, estaremos mais próximos de entender o exercício do médico que éjuiz, do juiz que é médico, a sabedoria fala em estar entre a cruz e a caldeirinha,falaremos que o perito está entre o cajado e a cobra, da medicina, e a balança dajustiça. Fascinante, como se vê, como se lerá.

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PARTE 1

O QUE SÃO A PERÍCIA E O PERITO

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Capítulo 1

O TRABALHO DO PERITO

Wanderley Codo

Um médico e um antimédico

Uma boa definição de símbolo, o termo tem origem no grego σúµβολον(sýmbolon), é a de que ‘designa um elemento representativo que está (realidadevisível) em lugar de algo (realidade invisível)’. Ao se deparar com um símbolo, amelhor pergunta a fazer é: O que ele está representando, o que está tornandoconcreto?

Que seja o símbolo da Associação Nacional dos Médicos Peritos (ANMP).

Figura 1.1. Símbolo da Associação Nacional dos Médicos e Peritos (ANMP)

O que se vê é que o símbolo funde dois outros símbolos, o da medicina e odo direito.

Sobre o símbolo da medicina, na mitologia grega, Asclépio é filho de Apolo eda ninfa Coronis. Foi criado pelo centauro Quíron, que lhe ensinou o uso de plantasmedicinais. Tornou-se um médico famoso e, segundo a lenda, além de curar osdoentes que o procuravam, passou a ressuscitar os que ele já encontrava mortos,

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ultrapassando os limites da medicina. Foi por isso fulminado com um raio porZeus. Após a sua morte, foi cultuado como deus da medicina, tanto na Grécia,como no Império Romano.(1)

Figura 1.2. Asclépio, deus da Medicina

Em várias esculturas procedentes de templos de Asclépio greco-romanos, odeus da medicina é sempre representado segurando um bastão com uma serpenteem volta, o qual se tornou o símbolo da medicina. Não há unanimidade de opiniõesentre os historiadores da medicina sobre o simbolismo do bastão e da serpente.As seguintes interpretações têm sido admitidas:

• Em relação ao bastão:

* árvore da vida, com o seu ciclo de morte e renascimento;

* símbolo do poder, como o cetro dos reis e o báculo dos bispos;

* símbolo da magia, como a vara de Moisés;

* apoio para as caminhadas, como o cajado dos pastores;

ASCLÉPIO, DEUS DA MEDICINACOM O BASTÃO E A SERPENTE

(1) Disponível em: <http://bibliotecamedicinauff.blogspot.com.br>.

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• Em relação à serpente:

* símbolo do bem e do mal, portanto da saúde e da doença;

* símbolo da astúcia e da sagacidade;

* símbolo do poder de rejuvenescimento, pela troca periódica da pele;

* ser crônico, elo entre o mundo visível e invisível.

De qualquer maneira, Asclépio foi reverenciado e punido por ter poderessobre a vida e a morte. Eis o abstrato que o símbolo do cajado e da cobra tornamconcreto, os que têm poder de vida e morte sobre os mortais.

A tradução destas imagens se tornou símbolo da medicina na figura de umcajado e uma cobra.

Figura 1.3. Símbolo da Medicina

No símbolo da ANMP, o cajado cede lugar ao eixo central de uma balança,símbolo do direito.

O símbolo da balança, usado isoladamente, mas atrelado à Justiça, representaa igualdade e o equilíbrio processual conferido às partes envolvidas em um processo.

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Figura 1.4. Símbolo da igualdade e equilíbrio processual

A igualdade e o equilíbrio processual estão previstos em nossa Constituiçãoe são inerentes ao Estado de Direito. Mas também sabe-se que uma balança temfunção precípua de aferir peso e, no contexto legal, em seus pratos, serão colocadaspelas partes contendoras todas as suas provas e, sem qualquer interferência externa(imparcialmente), a balança apontará quem de fato detém a prova mais robustae, portanto, será o vencedor no litígio. Aí reside a importância da prova processual,pois apenas invocar direitos não é base para fazer mover o prato da balança emseu favor. Cabe a quem alega os fatos a sua comprovação.

Utensílio de origem caldeia, símbolo místico da justiça, quer dizer, daequivalência e equação entre o castigo e a culpa (CIRLOT, 1984. p.

112); não é apenas um signo zodiacal, mas em geral o símbolo dajustiça e do comportamento correto, da medida, do equilíbrio; em muitasculturas, representa a imagem da jurisdição, da justiça terrena, da“Iustitia” com os olhos vendados, que não se deixa influenciar durantea avaliação da culpa.

Também no além, segundo a doutrina ética de muitas religiões no quese refere à remissão dos pecados, ocorre um julgamento que decidesobre o peso das boas e das más ações realizadas na terra; assim como,

por exemplo, o julgamento dos mortos dos antigos egípcios, no qual odeus Osíris, na presença de Maat, a deusa da justiça, pesa o coração domorto e decide sobre seu destino ultraterreno. O ato de pesar as açõesterrenas encontra-se presente também nos julgamentos do além dos

antigos persas e dos tibetanos.

Na Grécia, com a balança, Zeus inflige ao homem seu destino. No cristianismo

a balança é símbolo e atributo eminente do juiz universal no fim dos tempos;

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ele decide, com a balança na mão, se aquele que se encontra defronte à

cadeira do juíz divino deve ser designado ao paraíso do céu ou aos

tormentos eternos do inferno (BIEDERMANN, 1994. p. 49).

Outro poder agora, o poder de julgar, de decidir sobre o destino alheio, deculpar ou absolver.

A perícia médica pode ser definida como um ramo da medicina legal:

“É a contribuição da medicina e da tecnologia e ciências afins às questões

do Direito, na elaboração das leis, na administração judiciária e na

consolidação da doutrina.” (Genival Veloso de França)

“É a aplicação dos conhecimentos médicos aos problemas judiciais.”(Ambroise Paré);

“Arte de pôr os conceitos médicos a serviço da administração da

Justiça.” (Lacassagne)

“A aplicação dos conhecimentos médico-biológicos na elaboração e

execução das leis que deles carecem.” (Flamínio Fávero).

“É o conjunto de conhecimentos médicos e para-médicos, destinados a

servir ao Direito e cooperando na elaboração, auxiliando na interpretação

e colaborando na execução dos dispositivos legais no seu campo de

ação de medicina aplicada.” (Hélio Gomes).

Eis a tradução do símbolo da ANMP, a fusão, a integração de dois poderes,o poder da cura e o poder do julgamento da culpa ou inocência, o poder dajustiça, da punição ou do perdão.

O símbolo da ANMP, portanto, é um bom símbolo, concretiza o que se podeabstrair do trabalho da perícia, o poder da lei, na balança, o poder da cura, nacobra entrelaçada.

Pena que são poderes incompatíveis.

A lógica do médico é a lógica da confiança, a lógica do juiz é a lógica dadesconfiança, o perito impede o médico de exercer seu poder, o médico impede operito de exercer o seu poder, os dois poderes se anulam. As duas forças se anulam.

• Trabalho e compaixão na medicina e nos peritos.

• O médico só pode exercer sua profissão se tiver compaixão.

• Se encontra em Aristóteles o estudo da compaixão.

“Seja, então, a compaixão [éléos] certo pesar por um mal que se mostradestrutivo ou penoso, e atinge quem não o merece, mal que poderiaesperar sofrer a própria pessoa ou um de seus parentes, e isso quandoesse mal parece iminente, [—] com efeito é necessário que aquele que

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vai sentir compaixão esteja em tal situação que creia poder sofrer algummal, ou ele próprio ou um de seus parentes, e um mal como tal comofoi dito na definição(...)” Retórica. (II, 8, 2)

“A palavra compaixão vem do latim compassione, compartilhar paixões.Compaixão é o sentimento piedoso exclusivamente humano de simpatiapara com a tragédia pessoal de outrem, acompanhado do desejo deminorá-la; participação espiritual na infelicidade alheia que suscita umimpulso altruísta de ternura para com o sofredor” (Houaiss)

O exercício da medicina impõe a compaixão, é preciso que o médico compreendaa dor do paciente, compartilhe com ele aquela dor, tome partido do paciente, sofracom o sofrimento dele e fique feliz quando o sofrimento do outro se vai.

O perito não pode se compadecer, tem que manter distância do sofrimentoalheio, não pode se envolver com ele, não pode tomar partido do segurado, devefazer seu julgamento ignorando a dor do outro.

O médico toma partido do paciente, o perito não pode e não deve tomarpartido do segurado nem contra ele, o perito deve ser imparcial, é o que querdizer a balança no símbolo da ANMP.

O médico cuida, o sofrimento alheio é para ele a razão de suas ações, eliminara dor do outro é o seu objetivo, o perito não cuida, coloca sub judice a dor do outro.

A relação Pto/Pdo (perito/periciado) tem uma lógica diversa da relação M/P;naquela, estão em jogo interesses da sociedade e da justiça, senão, interesses legaisdo periciado com vista à obtenção de benefícios legais. A relação M/P(médico-paciente)é sempre de confiança e simpatia mútuas, enquanto a relação Pto/Pdo prima peladesconfiança e antipatia. Aqui o médico é fiscal, ali é curador (J. C. M. Gomes, 2010).

O perito é um médico, faz diagnósticos, toma decisões utilizando o sabermédico, examina o segurado como um médico e com critérios médicos, mas é aomesmo temo um antimédico, no sentido que não se compadece, não cura, desconfiado seu paciente.

Acontece que apenas 8% dos médicos trabalham apenas como peritos, como sepode ver na tabela abaixo, embora 20% deles exerçam atividades equivalentes à perícia.

Tabela 1.1. Segundo emprego

Nenhum

Consultório

Hospital

Outras atividades equivalentes à perícia

Posto de saúde

Total

Frequência

83

167

287

211

235

983

Porcentagem

7,9

15,8

27,2

20,0

22,3

93,2