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http://sdpbrasil.blogspot.com/ Breves Traços Da Vida Do Padre Giácomo Cusmano Fundador Do “BOCADO DO POBRE” Palermo Gráfica “Bocado do Pobre” 1914

Breves traços do beato giácomo cusmano

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Breves Traços

Da Vida

Do

Padre Giácomo Cusmano

Fundador

Do

“BOCADO DO POBRE”

Palermo

Gráfica “Bocado do Pobre”

1914

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Estes “Breves Traços da Vida do Pe. Giácomo”, que vieram à luz a mais ou

menos vinte e cinco anos após a morte do Beato padre, estão entre os escritos mais

preciosos que dão testemunho dele.

O anônimo livrinho que recolhera o que fora publicado no periódico “La

Caritá”, deve ser atribuído sem dúvida aos primeiros Missionários Servos dos Pobres

que redigiam o periódico, de modo particular ao Pe. Miguel Fici, que cuidou da

publicação em 1914.

Estes padres conviveram com o Pe. Giácomo e foram testemunhas oculares da

caridade heróica e sem limites, que o levou a consumir a vida no trabalho, contínuo e

sem pausas, a fim de levar de novo o pobre àquela dignidade humana e cristã,

desvirtuada pela necessidade e pelo vício.

Estas páginas possuem também outra preciosidade, a da língua. Embora já

passados tantos anos, conservam o frescor de uma obra recente.

O que nos leva a re-imprimir esta obra é, antes de mais nada, o motivo de não

deixar que se perca um documentos histórico tão importante, e de facilitar o primeiro

encontro com o Pe. Giácomo aos jovens de nossas casas de formação e aos devotos fiéis

que querem conhecê-lo em sua autêntica espiritualidade.

Em apêndice, para completar o que foi narrado na obra, publicamos, na tradução

portuguesa, o decreto promulgado pelo Santo Padre João Paulo II a cerca da heroicidade

das virtudes do Beato Padre, o discurso pronunciado por ele no dia da Beatificação e a

Carta Apostólica com a qual ele levou ao conhecimento de todo o mundo cristão a

realizada Beatificação.

Palermo, 25 de julho de 1991,

Pe. Giuseppe Giorgio, sdP.

Superior Geral

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AO LEITOR

A coleção ordenada e resumida do que fora publicado em várias partes,

especialmente em “La Caritá”, periódico da pia obra “O Bocado do Pobre” a cerca do

fundador desta mesma obra providencial, deu origem a estes: Breves traços da vida do

Pe. Giácomo Cusmano.

Na espera de uma história completa que ilustre as virtudes pessoais deste grande

Servo de Deus e da pia Obra por ele fundada, achamos por bem imprimir estes breves

traços de sua vida, por ocasião da transladação de seus restos mortais para o Orfanato

feminino de Terre Rosse. Estes servirão, esperamos, a relembrar em tempos de

exagerado egoísmo a luminosa figura deste grande herói da caridade, cuja memória é

abençoada.

Conforta-nos pois na publicação deste pequeno trabalho o lisonjeiro parecer que

deu o Revmo. Mons. Cônego Nicolau Crisafi, encarregado pela revisão eclesiástica.

Este, após o Nihil Obstat escrevia estas palavras, que nós com gratidão

publicamos para provar a verdade histórica dos fatos que narramos:

“Estou feliz de atestar minha complacência ao autor destes Breves traços da vida

do Pe. Giácomo Cusmano.

É um escrito em perfeita língua, historicamente verdadeiro até nos mínimos

detalhes, sem nenhum artifício retórico, ágil e simples em sua dicção, comove

permitindo-nos admirar cada vez mais a grande virtude daquele grande Servo de Deus e

dos Pobres que foi o Pe. Giácomo Cusmano”.

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CAPÍTULO I

Nascimento – Adolescência – Estudo do Pe. Cusmano

De Giácomo Cusmano e Madalena Patti casados no civil e no religioso e

ornados de excelentes virtudes cristãs, nasceu o Pe. Giácomo em Palermo aos 15 de

março de 1834; foi batizado na tarde do dia seguinte na Paróquia de São Nicolau na

Albergueria.

Ele foi o quarto de cinco filhos que o casal Cusmano tiveram, duas mulheres e

três homens. A primogênita Vincenzina foi a mais válida colaboradora nas obras de

caridade do Servo de Deus, e a que melhor copiou em si as santas e heróicas virtudes do

irmão. A outra irmã, Giuseppina, casada com o Senhor Salvador Marocco, deu ao Pe.

Giácomo três de suas filhas que vestiram o hábito de Servas dos Pobres, duas delas

ainda estão vivas. Também o irmão mais velho, Pedro, ofereceu três filhas, que, mortas

com o hábito de Servas dos Pobres, deixaram grande saudade na obra do Bocado do

Pobre. A mais velha destas, Irmã Madalena, foi entre as primeiras que recebeu o hábito

religioso pelas mãos do Pe. Giácomo e substituiu a tia, Irmã Vincenzina, no cargo de

Superiora Geral das Servas dos Pobres.

O irmão mais novo, Giuseppe, logo que foi criada a comunidade dos Servos dos

Pobres, vestiu o hábito de irmão, tomando o nome de seu Santo irmão.

Com a idade de três anos, o Pe. Giácomo perdeu sua mãe que morreu de cólera

em julho de 1837; parece que a providência quis provar o pequeno Giácomo com uma

tão grande desventura para formar desde o amanhecer de sua vida a sua alma com os

sentimentos de compaixão para com os infelizes.

O vazio deixado na família pela morte da boa Madalena foi logo preenchido pela

filha mais velha Vincenzina, a qual assumiu o governo interno da casa.

Foi ela que cuidou da primeira educação do pequeno Giácomo; este cresceu sob

seus joelhos e recebeu no coração os germes do amor divino, que mais tarde, deviam

produzir frutos abundantes de caridade.

Desde criança o nosso Giácomo começou a demonstrar como a graça antecedeu

em seu coração a santa educação que recebeu por parte da pia irmã Vincenzina; nele a

piedade era tão notável que parecia quase inata.

Mas o que pareceu verdadeiramente extraordinário e maravilhoso neste filho da

bênção, foi o seu engenhoso amor para com os pobres, amor com o qual devia se

identificar por toda a sua vida.

Alguns detalhes da sua infância, contados pela sua mesma irmã Vincenzina, nos

revelam que grande alma possuía este tenro mocinho, que ainda ignorava as infinitas

misérias que afligem a humanidade.

Suas primeiras ações foram as esmolas. Era ainda garotinho, e um dia viu que

um infeliz menino não tinha camisa para cobrir seu corpo inocente. O pequeno Giácomo

não agüenta, chama perto de si o pobrezinho, leva-o até a esquina, tira seu paletó, tira a

camisa e a dá ao menininho, veste rapidamente o paletó e volta para sua casa.

Outro dia se encontrava na sacada, e viu que um garotinho que passava não tinha

sapatos. Giácomo o chamou, tirou os seus e os jogou embaixo ao pobrezinho.

Ao ver um indigente despido ou faminto se afligia e então dava tudo, isto é, dava

o que naquela idade podia ter, seu pão, seu dinheiro. Freqüentemente, quando tomava

café ia à janela esperando que passasse algum pobre e todo feliz o dava ao primeiro que

se apresentasse.

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Algumas vezes, como se lê na vida de São Vicente de Paulo, baseando-se na

caridade dos seus parentes da qual freqüentemente era testemunha, tirava

escondidamente o que recebia para comer, para vestir, o dinheiro que ganhava, e os

distribuía aos necessitados, ao ponto que seus parentes tiveram que chavear tudo,

porque Giácomo à vista de um pobre não teria hesitado em dar até os talheres de prata

da mesa.

Giácomo recebeu as primeiras noções escolares à sombra do santuário

doméstico por um pio e inteligente sacerdote, Pe. Francisco Li Bassi, que lhe ensinou a

ler, a escrever e as primeiras lições de gramática.

O pai que o via tão inteligente e de boa vontade, logo o mandou estudar no

Colégio dos Padres Jesuítas, e com professores tão iluminados e preparados, quais são

os beneméritos padres da Companhia de Jesus, a juízo dos mesmos adversários, fez com

honra os estudos de letras italianas e latinas e as disciplinas filosóficas, dando prova de

inteligência pronta e perspicaz e de uma penetração de mente extraordinária.

Porém, mesmo com esta cultura intelectual que possuía e que cada dia

aumentava enriquecendo sua mente, não se distraía, como acontece normalmente com

os jovens, das suas práticas de piedade e de religião, nem sequer prejudicou os germes

de virtude que a graça tinha colocado abundantemente em seu coração, pelo contrário

serviu para elevar e embelezar seu espírito.

As leituras que o jovem Giácomo mais gostava era as cartas dos missionários,

especialmente os dos países infiéis.

Natureza ardente, capaz de teimosas e generosas resoluções e sacrifícios,

desejou sempre dedicar-se às Missões estrangeiras. Quem teve a sorte de conviver com

ele, muitas vezes o escutaram falar, até o final de sua vida, com ardentes palavras, dos

perigos, dos sofrimentos, das fadigas enfrentadas pelos missionários, do bem e das

conversões realizadas por eles no meio dos povos infiéis e bárbaros, em invejar sua

sorte, e aspirar também o martírio, ou como ele brincando dizia “camiseta vermelha”!

Contamos um fato de quando Giácomo era ainda estudante de humanidades na

escola do Colégio dos Padres Jesuítas, fato que saindo das vias ordinárias, encontra-se

somente na adolescência de alguns santos e grandes homens.

Giácomo naqueles dias estava lendo sobre as missões nas Montanhas Rochosas.

Terminando as tarefas escolares se ajoelhava e fazia aquelas leitura com o maior

espírito de recolhimento e piedade. Eis que se acende nele o mais vivo desejo de tornar-

se missionário. Começa logo a entrar em contato com os Padres da Companhia de Jesus,

os quais conhecendo a alma pia e fervorosa do jovenzinho, encorajaram-no neste

ardente desejo.

Naquele tempo viera a Palermo o Pe. Geral da Companhia, e o pequeno

Giácomo quis absolutamente fixar sua viagem no mesmo dia em que o Pe. Geral

viajaria para Roma. Chegando o dia por ele tanto suspirado, vai embarcar-se

escondidamente. Sabendo disso Pe. Mora, Jesuíta, amigo da casa Cusmano, corre a

informar a seu pai, o qual mandou o irmão mais velho Pedro, que o reconduziu para

casa xingando e batendo nele. Giácomo naquela época não tinha mais que quatorze

anos.

Terminado o curso de letras e filosofia com a idade de dezessete anos, do

Colégio passou para a Universidade e se matriculou na faculdade de medicina.

Ele teve para com a arte médica um culto apaixonado, e esta sua inclinação

natural, favorecida pelo engenho vivo e penetrante, ajudou-o a progredir nas disciplinas

médicas, sendo sempre o primeiro com a admiração dos mesmos professores que

previam as mais felizes realizações por parte do Cusmano. A sua índole doce e

camarada, o seu caráter franco, leal, generoso, a fisionomia aberta e atraente lhe

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cativaram o afeto de todos, e logo Giácomo se tornou o centro da escola. Era sempre

rodeado pelos melhores entre seus companheiros, os quais gostavam de estar-lhe perto,

conversar com ele, confiar a ele os segredos mais íntimos de seus corações, e

aconselhar-se com ele em seus negócios mais importantes: e dado que ele se mostrava

um grande gênio nas ciências que aprendia, os mais estudiosos se reuniam ao seu redor,

e a sua casa foi transformada em sala anatômica. Disso renderam testemunho os mesmo

seus companheiros, entre os quais alguns se tornaram ilustres e gloriosos na arte

médica; muitos destes fatos da sua juventude contavam o mesmo Pe. Giácomo nos

últimos dias de sua vida, quando conversava com o Dr. Giovanne Piazza, que vinha

visitá-lo quase todos os dias, e que gostava de entreter-se longamente com o amigo

íntimo dos seus primeiros anos.

O Cusmano, como afirmava todos os seus antigos colegas, se tivesse continuado

nos estudos se tornaria com certeza grande perito nas artes médicas e celebre naquelas

ciências.

Entre os companheiros de estudo do Pe. Giácomo durante o curso universitário,

recordamos Henrique Albanese, famoso cirurgião, merecidamente celebrado em

Palermoe fora pela sua valentia.

Por aquela afinidade de natureza que une freqüentemente as almas, entre

Albanese e o Cusmano se criou uma amizade tal que somente a morte pode quebrar.

Tinham recebido os dois uma alma elevada, fervorosa, capaz de amar até o sacrifício e

se amaram de verdade com afeto tenaz e sincero. Quando adulto, por vários motivos,

tiveram que separar; o Albanese não cessou de amar o seu antigo companheiro, e

mesmo tende se tornado adversário feroz de Giácomo quanto aos princípios, sempre o

estimou e venerou grandemente.

Logo que Giácomo começou a freqüentar a Universidade foi visitado por uma

grave desventura bem no mais profundo do coração.

Aos 27 de julho de 1852 o Senhor Cusmano morria por prolongada doença,

suportada com paciência cristã, deixando seus cinco filhos inteiramente órfãos.

O nosso Giácomo naquela época tinha 18 anos, idade na qual o amor filial põe

profundas raízes e por isso se torna mais doloroso o encontro com a morte. Se a morte

do pai amargurou a carreira dos seus diletos estudos, por isso nem sequer foi distraído,

porque os prosseguiu e cultivou com o mesmo ardor até completá-los na Universidade.

Terminado portanto o estágio teórico e prático começou a exercer a profissão de

médico em Palermo, mas dado que interesses familiares o obrigavam freqüentemente a

morar em San Giuseppe Jato, esta cidade ganhou as vantagens provenientes da rara

inteligência e bondade de alma do jovem médico. Verdadeiramente naquele breve

tempo em que exerceu a medicina foi o gênio benéfico daquele município. De sua

perícia médica se contam muitas coisas, como por exemplo cirurgias e curar realizadas

quase sempre com ótimos resultados: isso lhe adquiriu demasiadamente o afeto e a

estima daquele podo a tal ponto que a memória e a impressão perduram até hoje.

O nosso Giácomo entendeu o exercício da sua profissão como o alívio,

especialmente dos Pobres, em favor dos quais dirigiu a inteligência, a atividade e

freqüentemente os seus bens, nunca aceitando deles a mínima doação, mas recebendo

como compensação de suas fadigas, a alegria de beneficiá-los.

Os doentes o procuravam em multidão antes de amanhecer, pelo fato que eram

camponeses e deviam ir para a roça.

Ele mesmo contou várias vezes que os doentes de lá não lhe davam sossego; um

dia, voltando para Palermo estava a quase um quilômetro da cidade quando percebeu

que uma pobre mulher corria, esforçando-se para alcança-lo. Mandou então o cocheiro

parar, e conhecido o motivo pelo qual aquela pobrezinha o procurava, sem perder tempo

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pagou a viagem e a pé voltou à cidade para fazer os curativos no marido daquela mulher

que havia sido ferido no pé por um tiro. Estupendas manifestações de um coração que

vive de caridade!

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CAPÍTULO II

Abraça o estado Eclesiástico – Começa a pensar numa

instituição religiosa a serviço dos Pobres

Embora o Pe. Giácomo, terminados os seus estudos de medicina, começasse a

recolher os primeiros frutos na assistência dos enfermos pobres, coisa que satisfazia sua

irresistível tendência de ajudar os infelizes, sentia em si que não era aquela a meta

prefixada por Deus.

Desde quando era estudante, interrogado pela irmã Vincenzina se estudava com

gosto a medicina, respondia: Sim, estudo-a com prazer, mas tenho o pressentimento que

não serei sempre médico. Então, como aconteceu sua transformação de médico dos

corpos em médico das almas? De que modo o Senhor lhe manifestou sua vontade?

Um dia, enquanto ainda freqüentava a Universidade, um querido amigo seu,

Michele De Franchis, talvez por desejo manifestado por ele mesmo, apresentou-o ao

cônego Domênico Turano, que havia pregado os Exercícios Espirituais aos jovens

universitários. Aquele grande apóstolo de Palermo, quando o encontrou ficou admirado

da fisionomia aberta, inteligente e do olhar puríssimo do jovem Cusmano; amou-o, leu

em seu rosto os desígnios da Providência e se sentiu inspirado a cativá-lo para o

sacerdócio. Com a sua quente e influente palavra exerceu tamanha influência sobre o

jovem doutor, que nunca mais se apagou durante a sua vida. “Eu – contava o cônego -

senti algo no coração, e ainda não sei expressar o que provei naqueles momentos, e que

incêndio se despertava no meu coração”. Giácomo o escolheu por seu pai e mestre

espiritual e confiou inteiramente sua alma nas suas mãos. O Pe. Giácomo disse depois,

que o Turano começou exortando-o a comungar todos os dias, e que ele tirou grande

fruto daquela comunhão diária. De fato, logo que seu diálogo com o Senhor se tornou

mais freqüente, e o Deus escondido pode entreter-se com ele de coração a coração,

sentiu aquela palavra divina, que nem todos podem ouvir, aquela palavra que o chamava

a uma vida de completo sacrifício e abnegação e que o queria todo para si. O Cusmano

sentiu em seu coração aquela voz pela qual se decidiu a pedir ao seu guia a bênção para

entrar numa ordem mendicante como simples frade leigo. Mas o Senhor, se por um lado

se comprazia em ver os sentimentos de humildade e amor no coração de seu escolhido,

por outro, não deixava de inspirar seu Diretor Espiritual a conduzi-lo por um caminho

diferente.

Foi assim que por obediência ao seu Diretor Espiritual, aos 8 de dezembro de

1859 vestia o hábito talar na Paróquia de são Giácomo, à beira mar, agora destruída, e

ingressava na Associação Clerical de Santa Maria do Fervor.

Em um ano completou os estudos teológicos indispensáveis para a sagrada

ordenação, sob a guia do Monsenhor Pedro Boccone, atual Vigário Geral da

Arquidiocese de Palermo e então simples sacerdote.

Recebeu a Tonsura clerical e as ordens menores aos 18 de março de 1860; o

Subdiaconatoaos 24 do mesmo mês e o Diaconato aos 22 de setembro. E finalmente aos

22 de dezembro do mesmo ano era ungido sacerdote com o Crisma sagrado.

Todavia aceitou com relutância e grande senso de temor a sagrada ordenação, e

com freqüentemente ele mesmo dizia em sua profundo humildade: “eu sou o chamado

da última hora”.

Logo que se tornou sacerdote entendeu mais claramente aquilo ao qual o Senhor

o destinava; compreendeu sua missão. Numa carta dirigida em 1882 ao Pe. Daniel de

Bassano, confessor Papa Leão XIII e seu amigo, escrevia: “Chamado à última hora, e

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elevado por vontade de Deus ao sacerdócio em dezembro de 1860, senti em minha alma

o desejo de consagrar-me aos Pobrezinhos, assumir suas misérias, tirá-los de seus

terríveis sofrimentos e aproximá-los de Deus”.

Seria muito bonito poder registrar o programa da vida deste grande Servo de

Deus com suas mesmas palavras! Ele foi fiel a este seu programa, não houve um

instante em sua vida em que se afastasse dele. A partir deste momento começou a traçar

as primeiras linhas do grande ideal que queria realizar numa congregação religiosa;

deste vivíssimo sentimento ele sempre tirou imensa força com a qual resistiu a todos os

obstáculos e a todos superou.

O programa não podia ser com certeza mais vasto. Basta ler aquelas suas

palavras para ver claramente que ele não fixou o olhar em algum tipo particular de

santidade para imitá-lo em tudo ou parcialmente; não: ele fixou seu olhar no divino

mestre e procurou encarnar em si aquele exemplar divino. Quando ele diz: “senti em

minha alma o desejo de consagrar-me aos Pobrezinhos”, ele não faz distinção entre

judeu e grego, entre servo e patrão, entre homem e mulher, mas abraça a todos, pobres,

sofredores, miseráveis, infelizes, seja a sua miséria espiritual ou corporal, porque todos

são uma só coisa na caridade de Jesus Cristo.

Ele se fez tudo para todos, e nenhuma coisa no mundo poderá frear e limitar sua

caridade celeste.

Quando ele acrescenta: “assumi suas misérias”, está estendendo a mão para

convidar a Santa Pobreza a celebrar as núpcias com ele.

Ele compreende com o grande Francisco de Assis, que a miséria humilha e abate

o espírito do Pobre e entende que é necessário oferecer-lhe o conforto e descer para

encontra-lo em sua própria miséria; ele compreende que aliviará a angústia do faminto,

compartilhando com ele o pão da caridade; compreende que trará paz e consolação ao

miserável que não encontra vestuário para cobrir sua nudez, aproximando-se dele com

pobres e remendadas vestes; compreende que pode diminuir a vergonha do mendigo

mostrando-lhe que também ele é capaz de pedir o pão de porta em porta; compreende

que elevará o espírito abatido do Pobrezinho que vem procurá-lo em sua habitação,

acolhendo-o em sua pobre cela que, privada de qualquer objeto de luxo, aproxima-se

muito ao casebre do infeliz; compreende que lhe tornará menos amarga sua condição,

mostrando-lhe sua pobre caminha que na verdade é um simples saco, que sua comida é

uma sopa mal temperada junto a poucos pedacinhos de pão duríssimo, preto e até

embolorado. Por isso ele casou-se com a pobreza do seráfico Pai, amando-a sempre

como as pupilas dos seus olhos.

Quando depois ele diz: “para tirá-los de seus terríveis sofrimentos para

aproximá-los de Deus”, ele está se lançando atrás da bandeira hasteada por Vicente de

Paulo, e quer correr nos hospitais, entrar nas prisões, acolher os recém nascidos e

rejeitados, procurar os órfãos abandonados, abrir casas de repouso para os velhos

enfraquecidos e para as velhas inválidas, estender os braços amigáveis e paternos às

transviadas e às moças que estão em perigo, para que correndo ao seu encontro pudesse

reconduzir suas almas a Jesus, que a todos comprou com seu divino sangue. É verdade

que ele oferecerá um pão ao faminto, mas ao mesmo tempo o alimentará com o pão

celestial que é a palavra de vida eterna; lavará e tratará também as chagas do enfermo

ulceroso, mas ao mesmo tempo levantará a mão para curá-lo de suas horríveis úlceras

que sujaram sua alma; estenderá a mão ao órfão, para procurar-lhe uma adequada

educação, mas não deixará de formar à escola do amor de Deus aquela alma inocente,

aquele coração cheio das graças da juventude; acolherá o velho moribundo, enquanto

procurará manter em vida aquele corpo que está apagando, cuidará de preparar a alma

para a grande viagem; apertará ao coração o infeliz para consolá-lo, e no mesmo abraço

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abrir-lhe-á o coração sacerdotal, pronto a receber a confissão de seus pecados e dar-lhe

o perdão por parte de Deus,

O novo ungido do Senhor se sente então inspirado por estes nobres sentimentos.

É o Senhor que o vai formando à escola de sua divina caridade para depois servir-se

dele em benefício de seus filhos infelizes.

O Pe. Cusmano no entanto sente aquele fogo que lhe abrasa o peito, dilata seu

pensamento para ver as necessidades de todo o gênero humano; grandiosos ideais

agitam seu coração. É ele mesmo que diz: “O meu desejo era de ver surgir uma

comunidade religiosa, a qual inspirando-se à caridade de Jesus Cristo, que assumiu

todas as misérias da humanidade, se dedicasse totalmente ao serviço dos Pobres, para

conduzi-los das misérias desta vida às alegrias do céu. Os membros de tal comunidade,

despojando-se de tudo para dá-lo aos Pobres devem achar uma grandíssima sorte

servir o mesmo Jesus Cristo no Pobre, trabalhando, mendigando o necessário,

colocando-se em tudo depois dos Pobres, preferindo faltar a eles as coisas necessárias

à vida do que aos Pobres”. E com maior clareza escrevia em outra ocasião, que ele

sempre almejara “uma instituição de Irmãos e Irmãs, que vivessem em verdadeira

pobreza e no espírito de abnegação evangélica, para reerguer a todos das misérias e

dos sofrimentos; uma instituição também de Missionários, dedicados à direção dos dois

Institutos e à evangelização apostólica dos Pobres; e enfim duas Congregações, uma de

Damas, outra de Senhores, os quais deveriam atrair pessoas em favor dos Missionários

e assim ganhá-las para Jesus Cristo”.

A idéia, portanto de uma Instituição que estendesse sua obra a cada miséria

humana e tivesse os mesmos limites da terra, foi o pensamento sublime diante do qual

meditava a alma do Cusmano e que atormentou o seu espírito sete anos, dia e noite.

Sobre isto conversava freqüentemente com sua irmã Vincenzina, e às vezes, acordando

de manhã lhe dizia: Vincenzina, esta noite não pude dormir, e sabe por quê? Pensei no

que se poderia fazer para os Pobres.

Mas ainda não tinha chegado o tempo decidido pela divina Providência, cujas

obras requerem como virtude essencial a paciência, a longanimidade, a provação.

No momento ele se acontentava em correr à cabeceira dos moribundos passando

a noite inteira a reanimar aquelas almas angustiadas; acontentava-se em dirigir palavras

de conforto aos míseros que corriam a ele pedindo socorro; acontentava-se em dar a eles

tudo o que era seu, enquanto seu coração se partia à vista das miséria que afligiam os

seus irmãos.

Foi neste período que em São Giuseppe Jato, superando indizíveis dificuldades,

envolvendo o povo e as autoridades, conseguiu fundar um Instituto de Filhas da

Caridade, que se tornou tão útil para aquelas populações rurais.

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CAPÍTULO III

Como lhe nasce a idéia do “Bocado do Pobre” –

Provações às quais o Senhor o submeteu – consegue

fundar sua Obra.

Um caso imprevisto determina muitas vezes a vocação dos homens bons, ou

pode ser um meio que a Providência apresenta a eles para atuar seus grandes projetos.

Assim foi com a obra do Pe. Cusmano; teve início e também um nome por um

acontecimento praticamente acidental.

Um dia foi visitar seu íntimo amigo Dr. Miguel De Franchis. Estava na hora do

almoço e ficou impressionado por um nobre gesto de caridade que se costumava

praticar diariamente naquela família. Viu que todos tiraram um bocado do próprio prato

pondo-o em outro colocado no meio da mesa, e que eles chamavam “o bocado do

pobre”.

Terminando o almoço, entrava um pobre, sentava à mesa e os filhos se

apressavam em servi-lo.

Foi aquela faísca que acendeu uma grande chama no coração do Pe. Giácomo.

Ele lê naquele fato somente o projeto de uma obra benéfica que a Providência

lhe inspirava. “Entre as obras de são Francisco de Sales – escreve o Cantú1 – existe

também a do bocado do pobre; em cada almoço se tira um bocado e isto basta para

alimentar centenas de pobres”.

Sabia disso o Dr. De Franchis e o seu jovem amigo sacerdote? Não, poderíamos

afirmá-lo. Uma coisa, porém está certa, que para o Pe. Cusmano aquele gesto foi como

que uma revelação totalmente nova; ele soube admirar o bonito daquele ato e tirar as

oportunas conseqüências. Dizia ele: “se metade da população de Palermo se associasse

para cumprir esta obra benéfica, privando-se de um bocado, poderiam-se alimentar até

sete mil pobres em um só dia”. Com um tal pensamento seu coração exultou.

Ele descobriu o meio, um meio simples, para atuar seus grandes ideais; e já via

os pobrezinhos alimentados, salvas as órfãs desamparadas e educado para a família,

para a sociedade e para a Igreja o menor abandonado.

Lê-se numa carta pastoral publicada por Monsenhor Naselli, então Arcebispo de

Palermo, em favor da nascente Instituição, aos 6 de abril de 1869: “A idéia foi

amadurecendo aos pés do crucifixo, foi submetida ao conselho de seu Diretor

Espiritual”. Mas este – diz o mesmo Pe. Cusmano – pôs à prova por sete anos aquele

desejo.

Esta prova foi duríssima, e precisou da ajuda do Espírito Santo, do qual o santo

jovem era animado, para resistir e perseverar até o fim.

O Pe. Cusmano escrevia a tal propósito: “Eu sentia ardentíssimo, em meu

coração, o desejo desta obra, e lutei tanto comigo mesmo durante sete anos sem podê-

lo extinguir. Eu era contrariado por meu Diretor Espiritual, o qual queria que,

esquecido tudo e apagado o meu desejo, dedicasse-me somente aos estudos. Mas aquele

desejo era tão forte no meu coração, tão firme estava aquela idéia na minha mente, que

era impossível vencer-me, e aplicar a outras coisas as forças da minha alma.

Naturalmente eu me acusava disso, e o meu Diretor achando que eu queria resistir na

luta contra a obediência, várias vezes chegou a deixar-me sozinho de joelhos no

1 CATÚ, Buon senso e buon cuore, Conf. XII.

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confessionário. Imagine a amargura da minh’alma e as angústias que oprimiam meu

pobre coração”.

Finalmente, porém, a prova devia ter seu término, faltava somente a ocasião para

atuar a obra tão desejada. E esta se ofereceu propícia.

No ano de 1866 uma louca revolta popular e uma epidemia de cólera que a

acompanhou, a supressão das comunidades religiosas tinham acumulado imensas ruínas

sobre a cidade de Palermo. Muitas famílias definhavam e um triste dia apareceu nos

jornais a notícia de que numa casa uma jovem e um menino tinham morrido de fome.

A alma do Pe. Giácomo ficou dolorosamente despedaçada. Corre ao Cônego

Turano, conta-lhe o piedoso caso e pede-lhe que lhe dê a suspirada permissão de iniciar

a obra em favor dos pobres, há muito tempo desejada. Recebida a bênção de joelhos, vai

rapidamente visitar as duas aflitas famílias.

Bate à porta da primeira casa mas uma voz fraca de um pobre velho lhe faz

entender que não podia abrir porque os seus jaziam por terra, morrendo de fome, quase

nus. Voa para outra casa e encontra – é horrível dizer – algumas pessoas famintas, às

quais nada sobrou, a não ser um cachorro; tendo tirado a pele, devoravam-no cru.

Diante daquela cena repugnante não pode refrear o choro. Com ardente espírito de

caridade começa a visitar algumas pessoas amigas para recolher esmolas, roupas e

móveis para aquelas duas pobres famílias.

Precisava porém pensar diariamente à sua subsistência; e ei-lo pelas ruas da

cidade com duas grandes mochilas subindo e descendo as escadas de manhã até à noite,

batendo de porta em porta e persuadindo a todos a fazer aquilo que ele tinha visto fazer

em casa de De Franchis. Outras famílias pobres, no entanto, estimulavam sua

compaixão: e ei-lo a multiplicar-se, recolhendo durante o dia os bocados de pão, restos

de massa, roupas e outras coisas velhas, levando-as para sua casa dos Santos Quarenta

Mártires; e isso se repetia três ou quatros vezes por dia.

Antes de escurecer colocava tudo sobre uma mesa e separava por gênero, para

distribuir de noite escondidamente às famílias mais miseráveis.

O Pe. Giácomo fazendo a coleta se servia no início da ajuda de pessoas pagas.

Depois, porém, atraídos pelas palavras e mais ainda pelo exemplo do Servo de Deus,

um bom número de leigos devotos e de sacerdotes uniram-se a ele para ajudá-lo na

coleta e na distribuição dos socorros. Entre estes destacavam-se: o Pe. José Guarino,

Cônego da Igreja de Magione, elevado depois à Sé episcopal de Siracusa e depois à Sé

metropolitana de Messina e por fim feito Cardeal; o Pe. Ignácia Zucchero que depois se

tornou Cônego da Catedral de Palermo, secretário do Cardeal Celesia e por fim Bispo

de Caltanissetta; o Pe. Antônio Pennino, feito Cônego pelo Cardeal Celesia e depois

nomeado como seu Vigário Geral; o Pe. Pedro Boccone, ainda vivo e atual Vigário

Geral do Cardeal Lualdi; o Pe. Francisco Mammana, que, tirado pela obediência do lado

do Pe. Giácomo para ocupar a tarefa de diretor espiritual do Seminário Diocesano de

Palermo e nomeado Cônego da Catedral Metropolitana, voltava a reunir-se, após ter

renunciado ao canonicato, ao seu amado pai e mestre em 1887, quando se inaugurava a

Casa dos Missionários Servos dos Pobres, e sucedendo-lhe depois na direção da Obra.

Alma, porém, da nascente pia Obra era a irmã do Pe. Giácomo, a boa

Vincenzina. Ela se ocupava de separar tudo aquilo que era recolhido na coleta e depois

destiná-lo às várias famílias. A ela, após algum tempo, se uniu como colaboradora uma

jovem piedosa, repleta do Espírito de Jesus Cristo e da sua caridade; seu nome era

Maria Ana Delise. “Incansável, embora doente, escolheu para si quase todo o peso da

fadiga: ela classificava os alimentos e os repartia para os pobres, apontava os doentes

para serem socorridos; e recolhia os farrapos para fazer camisas, vestidos e outras coisas

úteis; preocupava-se até em manter ordenados os registros para que servissem de guia

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àqueles que depois tomariam seu lugar. A heróica jovem gastou dois anos neste

caridoso serviço; quando de repente uma grave doença a arrebatou do meio de suas

fadigas. Continuou até quando pode, com uma força que parecia prodigiosa. Na medida

que enfraquecia-se nela o vigor da natureza (era consumida pela tuberculose),

aumentava a sua caridade; sentia a dor e o peso da doença somente quando era distraída

dos seus trabalhos de verdadeira caridade cristã. nos seus últimos momentos relembrava

às outras colaboradoras, os recursos a serem distribuídos aos Pobres. Todos os Pobres

choraram sua morte porque quando não podia ajudá-los materialmente, sempre dava os

confortos da alma, infundindo o espírito de paciência, e exortando-os, como mãe

amorosa a confiar em Deus”2.

Com tantos e zelosos cooperadores, a Obra ia se desenvolvendo.

Uma associação, porém, de tamanha atividade à qual pertenciam um bom

número de eclesiásticos, numa época de muitas agitações políticas e de perseguição

contra a Igreja, não podia deixar de atrair a atenção suspeitosa da autoridade civil, de

modo que o Pe. Giácomo foi chamado pelo comandante da polícia de Palermo para dar

satisfações da Obra por ele fundada.

Bastou um simples encontro para que o comandante da polícia se convencesse

logo das sinceras intenções caridosas do Servo de Deus e ao invés de impedi-lo na Obra

que havia empreendido, obrigou-o a apresentar um projeto ao governo para obter uma

casa e auxílios para o melhor desenvolvimento da mesma Obra. Foi então que ele em

maio de 1868 escreveu privadamente ao Santo Padre Pio IX por meio do seu amigo

beneditino, o Pe. Ercoli Tedeschi, que naquela época morava em Roma, “para obter –

são suas palavras – do Santo Padre a aprovação e autorização de apresentar ao

governo um pedido para aceitar alguma casa religiosa aonde fosse oferecida. Pediu ao

mesmo tempo uma grande bênção que confirmasse a Obra e a preenchesse de todos os

privilégios e indulgências concedidas a todas as Obras de São Vicente de Paulo,

desejando ao mesmo tempo que a Obra do Bocado do Pobre fosse filiada a ela,

desejando que aparecessem na Sicília, por meio desta pequena semente, todas aquelas

grandes obras que mudaram e melhoraram as condições da França. Tudo isso por

meio de contribuições adaptadas às circunstâncias, aos tempos, aos lugares, afim de

que se tornasse mais fácil a difusão da caridade no coração de todos, e enrobustecesse

a fé que parecia adormecida”.

“O Senhor deveria relembrar – continua a falar, retornando sobre a sua idéia

fixa – quantas belas idéias se planejavam no início desta Obra. O pedido que Vossa

Reverência apresentará ao Santo Padre, deverá mostrar ao Santo Padre, deverá

mostrar as necessidades deste pobre e abandonado povo, e a paterna bênção Dele

imprimir nas almas destes afortunados e generosos (homens e mulheres) que querem se

tornar pobres por amor dos Pobrezinhos de Jesus Cristo e ter a sorte de se consagrar

ao seu serviço, aquela fé, aquele espírito, aquela caridade, que leve a termo, em nossos

tempos, uma Obra tão grande e tão difícil a ser realizada”.

Dado que não queria fazer nada sem primeiro ter certeza de agradar a Deus,

fecha esta carta com estes sentimento que manifestam o homem de Deus: “O Senhor

seria cortês dizer-nos a acolhida que fará o nosso Santo Padre a estes nossos desejos,

os quais somos prontos a abandonar, se forem por ele minimamente desaprovados; pois

é querida a nós do que qualquer outra coisa a adorável vontade de Deus, por causa da

qual foi escrita esta presente. Se for a vontade de Deus que por meio do senhor seja

aprovado pelo Santo Padre todo desejo que aqui se manifestou, deixando ao zelo

caridoso de Vossa Reverência formular o pedido como achar conveniente, então nos

2 Carta Pastoral de Mons. Naselli.

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será leve todo obstáculo e doce toda pena que encontrarmos, seguros de agradar a

Deus”.

Após esta carta Sua Santidade Pio IX, após ter tomado as devidas informações

com o Ordinário, aos 5 de agosto de 1868, mandava-lhe sob forma de Decreto a

Apostólica Bênção sobre a Obra, e sobre todos os membros a ela agregados. No mesmo

dia do mesmo ano com documento da Sagrada Congregação dos Bispos e dos

Religiosos, ele recebia a faculdade de pedir ao Governo Italiano, Casas de Religiosos

para acolher os Pobres.

Diante deste impulso dado pelo Sumo Pontífice, o Arcebispo Naselli, em

dezembro do mesmo ano instituía canonicamente a Obra sob o título de “Associação do

Bocado do Pobre”.

Assim ela teve o início difícil. Naquela ocasião se leu um discurso inaugural

entre os associados e os cooperadores para estimular-se reciprocamente. O mesmo

Arcebispo propôs a criação de carteirinhas capazes de apresentar a Obra e seu

significado à primeira vista e ao mesmo tempo estimular o amor aos Pobres. Na

carteirinha foi representado o bom Jesus acolhendo de um lado os Pobrezinhos e de

outro as esmolas dos ricos que Ele recebia como feitas a si mesmo. A inscrição que

circundava a figura era conforme a idéia expressa na mesma: são as palavras de Nosso

Senhor: esurivi et dedistis mihi manducare: Quod uni ex minimis meis fecistis, mihi

fecistis. (Tive fome e me destes de comer: o que fizestes a um destes pequeninos, a mim

o fizestes).

A forma, porém, que a Obra estava tomando não respondia de modo algum à

inspiração que o Pe. Giácomo tinha recebido de Deus. Ele não via surgir aquela

comunidade religiosa por ele desejada, “consumida na caridade para copiar em si a

vida de Jesus Cristo”. Isso se tornava para o seu coração motivo de grande sofrimento.

Escrevia ele: “Eu sofria muito em servir-me de pessoas mercenárias e de outras

que, mesmo tendo vontade de cooperar, não tinham o desejo de unir-se em comunidade

para praticar a vida por mim desejada. Mas todavia este era o desejo dos Superiores.

As necessidades falavam mais alto, faltavam as vocações, nem ele podia suscitá-las.

Tive que me confortar com esta situação. O Arcebispo Monsenhor Naselli criou um

conselho diretivo para organizar as coletas; foram criados também escritórios de

contabilidade, arquivo, secretaria, inspetoria, e a Associação começou a tomar

proporções interessantes.”3

A Carta Pastoral de Monsenhor Naselli nos informa sobre os felicíssimos

resultados daqueles primeiros tempos. Os auxílios dados em vinte e dois meses

chegaram a 48.428, isto é, se alimentaram mais de cem pobres cada dia, além das ajudas

em dinheiro para manter as órfãs nos orfanatos, as moças, as virgens dos Colégios de

Maria, sem contar os pobres enfermos curados em suas próprias casas e os remédios e

médicos oferecidos gratuitamente.

3 Carta ao Pe. Daniel de Bassano.

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CAPÍTULO IV

Novas provas às quais é submetido – Fica sozinho em

sustentar a Obra por ele fundada – Renuncia ser

pároco de Santo Hipólito – É nomeado membro do

Conselho de Administração do Depósito de

Mendicância – Renuncia ao Canonicato da Catedral de

Palermo – Monsenhor Turano o conduz consigo a

Agrigento – Passa as orfãzinhas para o Convento de

São Marcos.

Aonde Deus opera é preciso que o homem desapareça ou se esconda.

Foi por isso que enquanto a obra do Pe. Cusmano tomava um satisfatório

desenvolvimento, ele começava a sentir em si um grande desânimo que o mergulhava

numa angustiosa tristeza.

Mais deixemos que ele mesmo nos descreva aquilo que então se passou no seu

coração. Suas palavras deixam transparecer toda a santidade do Servo de Deus: “A

partir daquele momento uma profunda dor começou a entristecer a minha alma, porque

a consciência me advertia que Deus não deixava surgir, pela minha indignidade a

desejada Comunidade; sobretudo contristava-me o pensamento que eu tivesse

começado a Obra com desejos que não eram pura e simples caridade, (oh santa, imensa

humildade do Servo de Deus!).

De maneira que sentia um ardente desejo de voar aos pé do Santo Padre Pio IX,

confessar-lhe as graves iniquidades de toda a minha vida, manifestar-lhe os maus

desejos do meu coração, que pareciam estragar em mim o espírito de caridade, para

saber se aquele desejo que eu sentia era de Deus ou do demônio, e para decidir se

devia ou não continuar no caminho empreendido”.1

Sublimes sentimentos de filial confiança para com o Pai comum dos Crentes

aqui na terra, o Santo Vigário de Jesus Cristo, lembra aquela confiança mostrada por

outros santos em semelhantes situações! Aqui aparece claramente como o espírito

humano desapareceu totalmente, para permanecer somente o espírito de Deus que se

serve do seu ministro como de um dócil instrumento. E tal foi a prova à qual o Senhor

quis submetê-lo que ele mesmo chegou a dizer: “Muitas vezes resolvi abandonar tudo

para fugir na solidão e chorar, por toa a vida, o meu horroroso passado”. Em seguida

continua narrando assim as coisas de então: “Todavia a Obra progredia, mais de vinte

sacerdotes partilhavam comigo a fadiga da coleta e da distribuição dos alimentos para

os Pobres a domicílio; um número razoável de leigos de ambos os sexos trabalhavam

também: em casas alugadas separadamente estavam reunidos meninos e meninas que o

Conselho me autorizava a recolher para que mais proveitosa para suas almas se

tornasse aquela esmola que com tanto sacrifício se recolhia, oferecendo-a juntamente

com a palavra de Deus, com a instrução catequética, com o ensinamento das letras e

das artes.

1 Carta ao Pe. Daniel de Bassano.

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Passaram mais ou menos quatro anos nesta feliz situação e não havia pobre que

conhecêssemos que não recebesse os benéficos auxílios da Obra, antes, chegava até a

estragar-se o pão e o macarrão pela abundância das esmolas, e era muito bonito ver

como por meio destas ajudas materiais se aproximavam as almas a Deus”.

Mas quando o servo fiel do Senhor já começava a gozar um pouco em sua alma,

vendo que quase se realizavam os seus desejos, e as coisas se encaminhavam para um

êxito feliz, eis que o Senhor renova com mais dureza a provação, que qual fogo mais

vivo e ardente deve purificar nosso Pe. Giácomo de toda levíssima imperfeição. De fato

– é o Pe. Giácomo que escreve – “promovido ao bispado de Agrigento, o Cônego

Turano, Vice-presidente do Conselho Diretivo da Obra, e ao mesmo tempo elevado a

Arcebispo de Siracusa o Cônego Guarino, um dos mais zelosos conselheiros, e quase

todos promovidos a altos cargos eclesiásticos, aqueles sacerdotes que tanto se

afadigavam pelos pobres, encontrei-me de repente quase sozinho a sustentar com

minha miséria todo o peso e responsabilidade da Obra. A coleta começou a diminuir

em grande parte. Diminuíram as distribuições a domicílio, foi fechada a casa das

orfãzinhas, foram mantidas somente as órfãs internas pelo perigo de sua perdição.

Governo e Prefeitura, não obstante suas promessas, permaneceram na mais completa

indiferença, a coleta diminuía sempre, e parecia um milagre que por onze anos se pode

providenciar o sustento daquelas infelicíssimas criaturas”.

Nestes onze anos, o Pe. Giácomo ficou sozinho com um simples leigo que o

ajudava nas escassas coletas, e somente algum sacerdote dos mais afeiçoados, como o

Pe. Vincenzo Datino e o Pe. Francesco Mammana, que vinham ainda para ajudá-lo um

pouco na assistência às órfãs. Estas eram confiadas à sua irmã Vincenzina e a outras três

boas moças que deixando as famílias queriam dedicar-se a servir Jesus nos seus

pobrezinhos, até o Senhor permitir o surgimento da desejada Comunidade. O Servo de

Deus, porém, estava fiel no lugar onde a Providência o tinha colocado, pronto a

permanecer como vítima do que dar um passo atrás.

Na vida do Pe. Giácomo talvez é este o período no qual, melhor do que qualquer

outro, ele teve que mostrar aquela firme virtude que adornava seu nobre coração.

Entretanto, enquanto o Pe. Cusmano levava sozinho a Obra que, como vimos se

reduzia em manter vinte órfãos, vindo a faltar em 1871 o pároco de Santo Hipólito, a

Câmara Municipal de Palermo que tinha o privilégio de nomear os párocos da cidade,

unanimemente o chamava àquele cargo, e encarregava o Cônego Professor Vicente Di

Giovanni, da Universidade de Palermo, então vereador municipal, de comunicar-lhe a

escolha que dele se fizera. Eis como o ilustre Professor, que em seguida foi consagrado

Bispo, narra o encontro tido e a impressão que teve: “O Pe. Giácomo me olhava fixo

com os seus olhos bondosos, na atitude de grande surpresa, e com o rosto pálido queria

falar, mas lhe faltava a palavra.

Naquele momento com certeza passaram diante de seus olhos as suas orfãzinhas,

pensou na sua Obra; não sabia quais os planos da Providência com aquela nomeação.

Calando e sentindo grande confusão na alma, apareceram as lágrimas em seus olhos. A

única coisa que pode dizer-me foi: “Mas como, meu Padre? Eu não posso...” Entendi

tudo quanto se passava então naquela grande alma: ele era o Pai do Bocado do Pobre,

era a providência das orfãzinhas, e era aquele e não outro o lugar destinado-lhe por

Deus, querido pelo seu coração, exigido pelas condições dos tempos, necessitados de

novas formas de caridade, de nova operosidade evangélica, de nova ação do

cristianismo numa sociedade egoísta e materializada pelo lucro e pelos prazeres baixos

do sexo.

Pedi-lhe, portanto, com muita comoção, que ficasse sereno, e que teria pedido

dos colegas da Câmara e ao Prefeito de Palermo de dirigir-se aos outros sacerdotes para

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providenciar um pároco para a paróquia vacante; e que ele ficasse no seu lugar de pai

amoroso das orfãzinhas, como um sinal luminoso da caridade urbana. Teria sido mais

fácil encontrar um pároco para uma paróquia, do que um pai para os Pobres e as órfãs

pelos quais fora instituído o Bocado do Pobre. O bom padre Giácomo sorriu às minhas

palavras com aquela doçura inefável dos lábios e das serenas pupilas; deixando-o, levei

comigo uma admiração ainda maior por aquela grande alma, por um coração que

palpitava somente pela caridade aos pobres, aos velhos, às orfãzinhas, imagens todos de

Jesus Cristo sobre a terra.

De tais almas, (concluía o ilustre Monsenhor Di Giovanni), não se tem senão

raríssimo exemplo; e afortunados aqueles que puderam admirá-las de perto”.

Depois da renúncia a ser pároco, a Câmara de Palermo com deliberação de 3 de

abril de 1871, nomeava-o membro do Conselho de Administração do Depósito de

Mendicância.

Tratando-se de uma assistência a ser dada aos Pobres, ele aceitou e foi nesta

ocasião que pronunciou um discurso que em seguida foi publicado, no qual defendendo

a liberdade de consciência lesada por algumas deliberações daquele Conselho, deu

provas admiráveis de eloquência, mansidão e fortaleza sacerdotal.

Foi naquele mesmo período que o Ex.mo. Cardeal Celesia querendo-o honrar

pelos seus méritos preclaros, com insistência lhe oferecia a dignidade de Cônego da

Catedral de Palermo. Mas ele soube suplicar tanto a seu venerável Pastor, que

conseguiu não ser tirado dos Pobres aos quais tinha jurado consagrar-se inteiramente.

Eis como relata este fato o mesmo Cardeal Celesia em ocasião 5º aniversário da morte

do Servo de Deus: “Como prova de nossa pastoral complacência por tão grande bem, e

mais como prova de estima pessoal, não como recompensa aos méritos que Deus

somente podia conceder-lhe, nós, de bom gosto lhe oferecemos com insistência as

honras eclesiástica em nossa Catedral. Mas fomos profundamente edificados pela

modéstia, aliás, pelo desprezo com que a si mesmo tratava, que se tornou mais

acentuado naquele momento em que prostrado no chão aos nossos joelhos, suplicou

para ser exonerado de tal honra, afirmando que, além de ser indigno, os Pobres, seus

filhos em Jesus Cristo, não podiam ficar sem sua contínua assistência e dos serviços de

todo o gênero que tinha jurado prestar a eles. Acontentamo-lhe pela sua insistência: mas

o amamos mais ainda e nunca mais foi-lhe negada a entrada em nosso palácio nem tão

pouco lhe negamos a entrada em nosso coração, abençoando-o em cada passo seu por

causa de sua Obra tão querida para Deus e para os homens”.

Em 1872, consagrado como Bispo de Agrigento o seu Diretor Espiritual o

Cônego Turano, este quis conduzi-lo com ele naquela Sede para receber ajuda e

conselho no governo da Diocese.

Obedecendo, o Pe. Giácomo, embora com o coração despedaçado por afastar-se

de suas orfãzinhas, deixa estas aos cuidados da irmã Vincenzina e segue o seu Pai e

Mestre para o novo campo destinado por Deus às suas fadigas apostólicas.

O afastamento do Pe. Giácomo fez com que a Obra caminhasse para a ruína. O

Pe. Mammana, que por ele fora encarregado em substituí-lo durante sua ausência,

escrevia-lhe cartas de fogo, pressionando-o a voltar para Palermo se não quisesse que a

Obra se destruísse. O Pe. Giácomo, gemendo em seu coração, na oração e no silêncio,

esperava que se manifestasse a vontade de Deus por meio da obediência.

Uma destas cartas caída nas mãos de Monsenhor Turano o deixou muito

impressionado. Foi então que ele, mesmo de má vontade, consentiu que o diletíssimo

Giácomo voltasse a Palermo para sustentar a moribunda Obra do Bocado do Pobre.

Uma carta enviada pelo Monsenhor Turano ao Pe. Giácomo aos 17 de dezembro

de 1872, mostra todo o bem operado por ele em dois meses naquela Diocese. “Você foi,

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escreve-lhe, um rio de bênçãos que derramou a abundância na minha Diocese com a sua

benéfica estadia”. Numa outra carta, queixando-se de não poder tê-lo consigo diz:

“lembro-me que no ano de 1860, Monsenhor Cilluffo, apontando-te a mim, disse: eis o

teu Timóteo. Você será São Timóteo e até mais, mas não para mim...”

O retorno do Pe. Giácomo a Palermo serviu para aquele germe que ainda

permanecia da Obra por ele fundada, não morresse, germe que ele devia regar e

fecundar som seus suores, suas lágrimas, seus gemidos, suas orações.

Em 1873 conseguira transportar as orfãzinhas da incômoda casa dos Santos

Quarenta Mártires no mais amplo Conventinho de São Marcos, gratuitamente concedido

pela benemérita Confraria da Companhia de São Marcos Evangelista; mesmo assim, as

coisas não melhoraram muito,

Vendo-o lutar contra toda esperança por tão longo período de tempo, não faltava

quem o chamasse de louco, de fanático, ou quisesse desviá-lo de seu caminho, mas ele

que não baixava a cabeça como um vencido, mas confiava no Senhor, suportando com

heróica mansidão toda maledicência e maldade, não deixava de renovar os esforços para

continuar, aliás, para fazer ressurgir aquela Obra bendita.

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CAPÍTULO V

Quer confiar as orfãzinhas a vários Institutos religiosos

– Confortado por um sonho misterioso, dá o hábito às

primeiras Irmãs Servas dos Pobres.

Passaram-se onze anos, onze longos anos de luta e de sacrifícios, e vendo o Pe.

Cusmano faltar-lhe qualquer socorro, convicto que aquela Obra era querida por Deus,

começou a pensar em confiá-la a algum Pio Instituto entre os aprovados pela Igreja,

para impedir que a sua indignidade, como ele com profunda humildade dizia,

continuasse a ser um obstáculo.

Dirigiu-se então a várias Instituições religiosas para confiar suas pequenas

orfãzinhas a piedosas Irmãs, às quais, mendigando de casa em casa o piedoso bocado,

as poderiam socorrer.

Porém, nem as Filhas da Caridade, nem as Pequenas Irmãs dos Pobres quiseram

aceitar. Enquanto em seu coração pensava em recorrer às Estigmatinas, o Senhor que,

em seus planos quisera provar tão longamente sua constância veio consolá-lo de um

modo todo especial. Deixemos a ele a palavra da narração de um fato que teve uma

importância capital na vida do Servo de Deus e na existência da Obra por ele fundada:

“No dia em que recebi esta outra recusa (a das Pequenas Irmãs dos Pobres do

Abade Lepailleur) cheguei ao cúmulo da minha dor. Havia terminado o meu trabalho –

era hora do meu descanso – na amargura do meu coração, estava iniciando uma carta

ao meu Diretor Espiritual para informá-lo sobre a resposta das Pequenas Irmãs dos

Pobres, e pedir-lhe licença de convidar as Estigmatinas e confiar a elas as orfãzinhas,

abandonando totalmente a idéia de querer conservar ainda a Associação do Bocado do

Pobre que eu, por minha indignidade, via já destruída. Estava no término da carta

quando um sentimento de mal estar unido ao sono, sem perceber, fez-me deitar na

cama que estava ao meu lado, e na quietude daquele repouso, parecia-me estar num

campo e na fenda de uma montanha que erguia-se à minha esquerda... Voltando o

olhar, via um grande antro, onde estavam reunidas minhas pequenas órfãs com as boas

senhoras que as tem sempre assistido. Atrás destas, distinguia uma outra Senhora a

mim desconhecida, também ela em trajes pobres, no ato de amamentar um menino.

Estas coisas se manifestavam a um mesmo tempo e foi extrema minha surpresa, quando

naquela Senhora reconheci a Grande Mãe de Deus! (...) Um alto grito e um rápido

impulso que me fez cair de joelhos aos pés da Mãe Santíssima, alertaram a todos, mas

eu, prostrando-me profundamente, beijava seus pés, sentindo-me confortado, seguro,

livre de qualquer perigo, como um menino no aconchego do seio materno.

Teria permanecido ali toda a vida, se a meiga Senhora, soerguendo-me, não me

tivesse avizinhado ao seu seio materno, onde, pouco antes, havia visto um menino; e,

naquele instante, que não sei repensar sem comover-me, consolava-me da esperança de

que a Obra era aceita pelo Senhor e que, oportunamente seria levada ao grande fim

pelo qual a havia feito nascer.

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Depois com o sentimento que aludia aos meus desalentos e à minha

indignidade: “É ao meu tenro Filho, é a Ele, a Ele só que tu deves tudo!” dizia-me

dirigindo seu doce olhar atrás dos meus ombros, olhar que tirou-me da posição em que

me encontrava; porque naquele mesmo instante, por um sentimento espontâneo de

reverência, de gratidão, de temor, voltei a procurar Aquele ao qual tudo devia; vi então

o menino na idade de quatro anos, com os olhos vermelhos, como quem havia tido um

grande pranto, recolhido, sério, que obrigou-me a prostrar-me, pedir perdão das

minhas ingratidões, e implorar piedade para as pobres criaturas a mim confiadas,

pedindo também a ajuda de sua Providência para saciar-lhes materialmente.

Então me ergui e recolhi pedaços de pão, que constituía toda nossa provisão,

mas, ao retornar, vi somente a Mãe de Deus. Prostrando-me, supliquei-lhe de abençoar

aqueles restos de pães, para que fossem suficientes para a alimentação de todas as

órfãs, e a Mãe Santíssima, com benévolo aspecto acolheu minha prece e abençoou

aqueles sobejos. Contentíssimo, ergui-me para distribuir os pães às órfãs, quando,

voltando o olhar, vi duas grandes panelas de ferro em meio a grande fogo, e a água em

ebulição que cozinhava o macarrão, lancei-me sobre elas, sem proteger as mãos,

quando, a meiga Senhora me veio em auxílio. Quando acordei, surpreendi-me vestido

na cama sem saber como. Não pensava nada daquilo que havia sonhado, porém meu

coração não estava mais com aquelas angústias, que impeliam-me de escrever a carta,

que eu deixara começada sobre a escrivaninha.

Aprecei-me rapidamente para a celebração da Santa Missa, e no

agradecimento, com nova surpresa, o sonho me veio à memória. Sinto ainda tanta

consolação só ao pensar no sonho. Contei tudo ao meu amigo sacerdote, ao qual, na

ausência do meu diretor espiritual, costumo dirigir-me para algum conselho (este era o

Cônego Antônio Pennino) e ele me proibiu de completar e enviar a carta começada,

exortando-me, pelo contrário, a não deixar de buscar a instituição das Irmãs e dos

Frades que deveriam sustentar a Obra conforme eu a tinha desejado, e não recorrer às

Estigmatinas, a não ser, quando, depois de se ter tentado tudo, visse claramente que o

Senhor não queria esta nova Instituição.

Continuei a trabalhar pacificamente em meio às dificuldades nas quais vivia há

tantos anos, mas nenhum conforto humano via aparecer para iniciar a desejada

Instituição. Era um contínuo milagre da Providência a alimentação de tantos pobres

com a magra coleta que se ganhava durante o dia, a ponto de não ter coragem de

comer minha sopa, sem antes ter certeza de que todos da casa estivessem saciados;

após este período, a abundância começou a crescer a cada dia. Foi então que por

maior segurança de minha alma, e afim de conhecer melhor a vontade do Senhor, fui

consultar uma pia pessoa, que fora muito favorecida pelo Senhor e pela Virgem

Santíssima. (Esta era Melânia, que naquele tempo encontrava-se em Palermo). Após ter-

lhe contado os meus problemas, ela com grande humildade me encorajou a continuar

na Obra começada, servindo dos elementos que o Senhor tinha me dado sem procurar

outras Instituições para me ajudarem. Em seguida me animou a vestir as Irmãs e a

procurar reunir e iniciar a Comunidade daquele modo que o Senhor teria-me

inspirado, confiando muito na ajuda de Deus e de Maria Santíssima, afim de que as

coisas prosperassem para a sua glória e a salvação das almas.

Entretanto eu estava esperando a volta do nosso Monsenhor Arcebispo que

estava fazendo uma visita pastoral, para pedir-lhe licença de vestir as primeiras Irmãs.

Chegando lhe relatei tudo, consegui a licença de vestir as primeiras Irmãs e na festa da

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Santíssima Trindade do ano de 1880 tive a sorte de vê-las já trabalhando com a

aprovação do Ordinário”. 1

Assim finalmente o Senhor premiava a constância heróica do Pe. Giácomo, e a

partir daquele dia a Obra do Bocado do Pobre tomava sua verdadeira forma regular e

estável, como desde o princípio se apresentara mais no coração do que na mente do

Servo de Deus.

Muitos dias antes da vestição religiosa, sua sobrinha Madalena sonhara estar já

vestida de Irmã: parecia-lhe estar trajada com um hábito preto, uma capa também preta,

um capuz branco, um amplo avental azul, e um terço de Nossa Senhora ao lado. Foi

aquele o hábito que o Pe. Giácomo adotou para as primeiras Irmãs, hábito que vestem

ainda hoje. O manto preto completa este hábito quando as Irmãs saem de casa. Durante

a coleta saíam com dois alforjes brancos, pareciam anjos de misericórdia andando pelas

ruas de casa em casa, recolhendo as ofertas da caridosa cidade.

As primeiras Irmãs que receberam o hábito sacro e às quais o Pe. Giácomo deu o

título de Servas dos Pobres eram seis; primeira entre elas estava a Irmã Vincenzina.

Educada na escola das grandes virtudes por aquele grande mestre de vida interior,

Monsenhor Turano, foi o retrato perfeito de seu santo irmão e dividiu com ele a direção

da Obra por tantos anos, também ela vítima da caridade. Que doçura inefável ela

experimentou quando foi revestida do branco véu e do humilde hábito das Servas dos

Pobres! Levada por natureza à vida de clausura venceu heroicamente a si mesma e se

lançou na nova via que o Senhor lhe apontou, consagrando-se inteiramente ao serviço

dos Pobres. “Vê, dizia-lhe brincando o Pe. Giácomo, tu querias entrar num mosteiro

pequeno, ao invés o Senhor te quer num mosteiro grandíssimo. O mundo inteiro deve

ser para ti este mosteiro.” E ela permaneceu fiel no seu lugar até que em 1894 o Senhor

a chamou a receber o prêmio da sua caridade.

1 Carta ao Pe. Daniel de Bassano

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CAPÍTULO VI

Conseguida do Prefeito de Palermo a Quinta Casa a

beira mar, funda o primeiro Asilo de Pobres incapazes

de trabalhar – sofre uma cirurgia – Suas relações com

o Barão Turrisi.

Logo que o Pe. Giácomo deu o hábito às primeiras Irmãs, com a bênção do

Arcebispo de Palermo e do seu Diretor Espiritual Monsenhor Turano, confortado pela

certeza de que a Instituição por ele a tantos anos desejada era querida por Deus, com

todo o impulso deu-se totalmente a todo tipo de obra de caridade.

As Irmãs Servas dos Pobres, que com seu jeito humilde e modesto começaram a

andar por toda a cidade para recolher o “Bocado do Pobre”, tornavam sempre mais

popular o nome de seu Pai e mestre. A pequena Casa de São Marcos tornou-se em breve

um centro de bênção aonde acorriam todos os tipos de necessitados e infelizes porque

na inesgotável caridade do Servo de Deus encontravam ajuda e conforto. Foi assim que

se formou aquele ditado popular: “A caridade está em São Marcos”.

Existia naquela época em Palermo um lugar desprezível chamado Refúgio, onde

estavam reunidos, sem nenhuma distinção de sexo ou de idade, um grande número de

pobres abandonados por todos.

Era prefeito de Palermo o Barão Nicolau Turrisi, o qual informado da condição

desagradável daqueles infelizes e da situação indigna na qual se encontravam, pensou

resolver o caso assegurando a eles uma assistência mais humana. Movia-o a isso o fato

que, devendo chegar em breve em Palermo o Rei na ocasião das festas centenárias das

Vésperas Sicilianas, queria tirar das ruas o grande número de pobres mendigos, que

davam a impressão de um triste espetáculo.

Mas onde coloca-los e a quem confia-los? Portanto tivessem estudado para

encontrar uma solução, não conseguiam chegar a cabo de modo satisfatório em

providencial à necessidade.

Falaram-lhe do Pe. Cusmano e do seu espírito de caridade e de sacrifício; mas o

Barão Turrisi que, embebido de preconceitos contra a Igreja, não era muito tenro com os

padres, não quis ouvir. No entanto o tempo apertava e não se encontrava nenhuma

solução. Foi então que, apertado pela necessidade, decidiu-se finalmente dirigir-se ao

Pe. Cusmano, que nem conhecia. Apresentaram-lhe o Pe. Giácomo e bastou aquele

primeiro encontro para que o Prefeito Turrisi ficasse de tal modo impressionado que se

tornou um dos maiores admiradores e protetores dele.

O Pe. Giácomo com o coração exultante oferece a si mesmo e suas filhas, as

Servas dos Pobres para assistir todos aqueles pobres que quisessem confiar-lhe; o Barão

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Turrisi lhe promete por parte da prefeitura, toda ajuda material e moral. Começou

dando-lhe a Quinta Casa à beira mar.

Pertencia esta grande construção originariamente aos padres Jesuítas que a

utilizavam como Casa de retiro. Suprimida a Companhia de Jesus por Clemente XIV,

aquela Casa passou às mãos do governo Bourbônico, o qual a destinou primeiramente

como quartel e depois como cadeia dos endividados. Restaurada na Sicília a Companhia

de Jesus em 1804, a Quinta Casa ficou com o governo dos Bourbons, até que caído em

1860, esta passou a pertencer ao novo governo que acabou abandonando-a por causa do

mau estado no qual se encontrava. O Barão Turrisi a pediu e conseguiu por motivos

beneficentes.

Conseguida a Casa, o Pe. Giácomo fez as necessárias reparações conforme a

nova destinação. Em março de 1881 todos os Pobres que se encontravam no Refúgio

foram levados até lá. Eram dez pobres velhos inválidos, quinze velhinhas, sete

orfãzinhas e vinte órfãos; era uma situação deplorável! Foi assim que as antigas

aspirações do Servo de Deus foram finalmente concretizadas; ele via por caminhos

totalmente providenciais à sua disposição uma grandíssima construção onde poderia

acolher todo tipo de Pobres abandonados.

O pequeno grãozinho já começava a germinar; não passará muito tempo e

produzirá vigorosos rebentos.

O Pe. Giácomo, porém, com grande pena não pode assistir à passagem dos

Pobres à Quinta Casa. Naquele dia ele estava constrangido a ficar na cama.

As excessivas fadigas enfrentadas para preparar o local excitaram de tal modo

aquele mal que o atormentava desde os primeiros anos do seu sacerdócio e que de

verdade o tornara o homem das dores, a ponto de submeter-se a uma cirurgia. Tratava-

se de uma profunda fistula intestinal. E o Pe. Giácomo se submeteu àquele corte com tal

fortaleza e tranqüilidade de espírito, a tal ponto de maravilhar aqueles que o visitavam

após a dolorosíssima cirurgia.

Mal tinha se restabelecido voou à Quinta Casa para dedicar-se aos serviços mais

humildes para com os Pobres que ali estavam, e os mais repugnantes eram os que mais

atraíam seus cuidados.

Um dia foi admitido um pobre velho paralítico. A entrada de um novo Pobre era

uma festa para o Pe. Giácomo. Acolheu-o com gestos da mais viva alegria e, cingido

seu avental branco pôs-se a lavá-lo, penteá-lo e trocar-lhe a roupa. Arrumou a cama e

carregando-o no colo para deita-lo,olhou-o amorosamente e contemplando naquele rosto

emagrecido a bela imagem de Jesus Pobre e sofredor, tenramente o abraçou e o beijou.

O pobre velho paralítico, como o velho Simeão, não se continha da alegria, e

dizia: “Agora posso morrer, não desejo mais nada, o Pe. Giácomo me deu um beijo!”

O Barão Turrisi que naquele primeiro período da abertura do asilo da Quinta

Casa teve freqüentes ocasiões de aproximar-se do Servo de Deus, afeiçoou-se sempre

mais a ele,chamando-o de “o melhor dos meus amigos”. E o Pe. Giácomo que o

considerava como o maior benfeitor da sua Obra, olhou-o sempre com a mais viva e

afetuosa gratidão. E quando após alguns anos o Barão Turrisi sofreu uma paralisia que

lhe tirou também o uso da palavra, o Pe. Giácomo empenhou-se em reergue-lo daquela

terrível doença. Como um dos maiores sofrimentos do pobre Barão era o de não

conseguir deixar-se compreender em suas diversas necessidades, o Pe. Giácomo com

sua operosa caridade, mandou colocar ao lado de seu leito uma taboa onde estava

escrito em grandes caracteres tudo o que lhe pudesse ser útil, de maneira que o pobre

doente devia somente indicar com uma varinha o que precisava para logo ser servido.

A caridade do Pe. Giácomo não se preocupava somente com os sofrimentos do

corpo do Barão Turrisi; ele queria a todo custo salvar-lhe a alma. Com estrema

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delicadeza, servindo-se da estima que gozava do Barão, começou a induzi-lo a pensar

em sua própria consciência. Com certeza teria conseguido se, nos últimos dias de sua

doença, não tivessem com sua imensa dor, fechando-lhe a porta da Casa Turrisi,

certamente não por vontade do pobre Barão.

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CAPÍTULO VII

Funda uma Casa de Misericórdia em Agrigento.

Se grande consolação fora, para o Pe. Giácomo a fundação do Asilo da Quinta

Casa, não menor foi a alegria pelo insistente convite que lhe fazia seu venerado Padre

Monsenhor Turano de implantar a Obra em Agrigento. Existia naquela cidade um lugar

sujo, fedorento, infestado de insetos, com o teto e o piso em ruínas. Encontravam-se ali

internadas muitas mulheres e moças, sem governo nem disciplina; saiam e entravam por

conta própria e cada uma devia providenciar seu próprio sustento. Um leito de palha e

um fogão de barro eram os únicos móveis de cada quarto.

Monsenhor Turano gemia em seu paterno coração e, após alguns graves

problemas aí ocorridos, tendo combinado com o Prefeito de Agrigento, dirigiu-se ao Pe.

Giácomo para confiar às Servas dos Pobres a direção e a reforma daquela casa. O Pe.

Giácomo entendeu rápido a dificuldade daquela missão. Como disciplinar aquelas

jovens a tantos anos habituadas a uma completa liberdade? Como manter

convenientemente aquelas pobres desamparadas numa absoluta deficiência de meios

materiais? Seu grande coração zeloso pela salvação das almas e a completa confiança

que tinha em Deus, fizeram com que ele não recusasse nem colocasse condições.

Mas a quem entre as suas filhas confiar a árdua missão? Fazia-se mister a

presença de almas acostumadas ao espírito de sacrifício e prontas a imolar-se

inteiramente pela salvação do próximo. Primeira entre estas foi a própria irmã. E aos

cinco de janeiro de 1882 a boa Irmã Vincenzina com outras cinco companheiras,

acompanhadas pelo Pe. Giácomo chegam a Agrigento e tomam posse daquela Casa. A

boa madre andava entre aquela miséria, consolando aquelas jovens e animando-as a

rezar para que o bom Deus as ajudasse a melhorar sua condição.

O Pe. Giácomo por sua vez derrama naquelas infelizes criaturas toda plenitude

da sua misericordiosa caridade procurando amansar aquelas jovens enfurecidas pelo

novo gênero de vida à qual queriam submete-las.

No entanto faltam as camas para as Irmãs e de um ínfimo albergue alugaram-se

seis colchões de palha; mas onde coloca-los? Os quartos estão todos lotados; recorre-se

ao sótão, aí se encontra espaço. A Irmã Vincenzina é a primeira a caças os ratos, tirar a

teias de aranha e tampar as frestas com papel. Aquele ninho de ratos do qual através das

telhas podia-se ver as estrelas por muito tempo foi o dormitório das Irmãs. A boa Irmã

Vincenzina, como era alta, freqüentemente batia a cabeça no telhado, mas não se

importava com estes incômodos. O que mais angustiava seu coração eram as

dificuldades que encontrava na educação, moralização e formação religiosa daquelas

jovens ali reunidas. Um trabalho longo, paciente, doloroso, levado adiante com

abnegação e singular caridade foi o de derrubar os fogões, habituar as internas à mesa

comum, proibir as saídas, arrancar tantos hábitos péssimos, espantar os vícios e

incentiva-las à virtude. O que não teve de sofrer por vários anos a santa mulher

juntamente às heróicas Irmãs! Abertas revoltas, injúrias cotidianas, insultos, zombarias,

implicância, ameaças... e ela sempre doce, amorosa, caridosa, constante em promover

sua transformação. Era uma luta contínua entre pecado e graça, vício e virtude, brutal

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egoísmo e sublime caridade! Mas quem sustentava de fato aquelas heroínas era o Pe.

Giácomo que, tendo voltado a Palermo, com seu espírito permanecia sempre no meio

delas. Com sua palavra ardente ele não deixava de animar continuamente as Irmãs na

dificílima missão a elas confiadas de conforta-las em meio àquelas duríssimas

provações às quais tiveram que submeter-se. Assim de fato escrevia para a Irmã

Vincenzina em maio de 1882: “...Coragem e grande ânimo em todos os

acontecimentos. Não se deixem nunca abater, minha filhas e não entristeçam vossas

almas; procurem sempre novos recursos para responder às necessidades dos Pobres,

procurando sempre a salvação de todos. Quando pois suceder que as almas se

obstinam à ação da graça, e aos contínuos esforços da caridade, transformam em

veneno o leite das misericórdias de Deus, e tornam-se molestas não para vós, mas para

si mesmas e para as outras almas com suas desordens e escândalos, então convém

consentir à sua desaconselhada resolução de ir embora, esclarecendo para as outras

que são elas mesmas que querem se perder e não são vocês que as abandonaram...

Eu me consumo no desejo de apascentar-vos com a Palavra de Deus, de

sustentar-vos e confortar-vos com seus santos conselhos, e assim que chegam vossas

caríssimas cartas, gostaria de respondê-las prontamente uma vez que não posso correr

em vossa ajuda. Mas o Senhor dispõe diversamente e tornam-se inúteis os meus

esforços. Deus quer formar o nosso espírito com toda prova, quer que nossa confiança

nele multiplique-se com os mesmos obstáculos que se interpõem claramente para

atrapalhar as mesmas obras da sua glória; quer que a nossa espera em sua ajuda seja

sempre maior e verás, na medida em que desaparecem as esperanças humanas que

confortam os nossos corações. Este Deus de bondade não quer ser vencido por

gentilezas, e estando vós prontas a responder ao seu convite e dedicar-vos ao seu

serviço, quer ser somente Ele vossa ajuda e vosso conforto. Teriam a ousadia de dizer-

me que não vos basta?

Eu espero que não, antes faço votos que vossos corações exultem de ternura em

seu amor e em sua união. Não digo isso porque queira ser poupado ou porque esteja

longe de vós, mas porque sinto grandíssima pena em não ver vocês apreciarem, com

vossa inteligência os tesouros infinitos com os quais Deus vos estreita ao seu coração;

se pudesse tomar sobre mim vossos necessários sofrimentos e deixar em vossas almas

os tesouros de Deus que eles vos trazem, quereria a todo custo fazer o possível para

livrar-vos e ver-vos repletas do Espírito Santo, sem ter a dor de sentir-vos sofredoras...

Nós somos chamados a ser vítimas por amor a Jesus, servindo-o e ajudando-o

em seus Pobrezinhos. Foi o Bispo que nos chamou a Agrigento e por conseguinte

estamos seguros de aí estarmos por vontade de Deus...

Meus caminhos não são os vossos caminhos, diz o Senhor; e se a prudência

humana, minhas filhas, deve ajudar a formar a norma do nosso agir, mesmo assim

nunca devemos temer os homens quando nos encontramos empenhados nas obras de

Deus. Todos vos desprezam, ninguém se importa com vocês? No entanto vós, na

humildade e na paciência vos empenhais em amar o Bom Jesus desprezado e

abandonado na pessoa dos seus Pobrezinhos? Pois bem, a obra de Deus está completa,

o triunfo em todos os corações está seguro...

Surgirá uma outra Instituição? Esta,o conseguirá melhor que vocês em operar

em Jesus Cristo, e então terão o conforto de confiar aos seus cuidados o importante

serviço de Jesus sofredor em seus Pobrezinhos, ou viverá dividindo vossas privações e

as imitarão santamente no serviço do Senhor, ou não será aprovada e acabará o

obstáculo que a prudência humana faz temer.

De qualquer maneira,o que a nós convém é empenhar-nos com todo zelo e

caridade em cumprir santamente o ministério que Deus nos confiou, e até que Deus não

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nos tire desta situação, procuraremos fazer com toda fidelidade os nossos deveres, e o

Senhor se encarregará do resto...”.

Para compreender bem o último trecho desta carta é preciso saber que nos

primeiros tempos que as Servas dos Pobres começaram a dirigir a Casa de Agrigento,

elas não foram acolhidas benevolamente pela população.

Não eram conhecidas, não se entendia bem qual era sua missão, por isso, quando

saíam para a coleta, eram rejeitadas por todos.

Naquele tempo um sacerdote de Agrigento tentou fundar uma outra Instituição

semelhante que no princípio atraiu a simpatia dos cidadãos. Tudo isso, enquanto

desanimava as pobres Irmãs, animava a fé do Servo de Deus, o qual, por sua vez,

procurava reanimar o ânimo abatido de suas filhas com contínuas cartas. E estas cartas

não eram recebidas em vão pelas Irmãs. Entre estas encontra-se uma dirigida à Irmã

Vincenzina em setembro de 1883, na qual aparece o quanto tiveram que sofrer em

Agrigento as primeiras Servas dos Pobres, verdades heroínas de caridade . Nesta carta,

após ter exortado a Irmã a estar tranqüila no meio da tempestade que a circundava,

aludindo ao seu antigo desejo das missões estrangeiras e do martírio, prossegue

dizendo: “Agrigento é o Noviciado da China, e eu não acredito que a tua alma não

aspire em preparar-se para a missão bárbara, onde, juntamente à alegre esperança de

ganha as almas que são possuídas pelo demônio, encontraras também a grande

consolação de poder dar a vida por Jesus Cristo na infinita sorte do martírio.

Estar em Agrigento é um martírio seco, quer dizer, sem derramamento de

sangue, sem tortura material mas justamente por isso é um martírio mais elevado,

porque os instrumentos de tortura são morais, e o sacrifício se cumpre somente diante

de Deus que é a única testemunha dos enormes sacrifícios que se fazem por seu amor...

Coragem então, minha filha, e avante, com ânimo tranqüilo e cheio daquela calma que

o verdadeiro amor desinteressado é capaz de dar”.

Fortalecidas por estas santas exortações as filhas do Pe. Giácomo ficaram firmes

em meio as mais duras provações materiais e morais. No entanto a Providência

dispunha-se em premiar a fé de seu fiel servo.

Por ocasião de uma festa da cidade, houve uma caridosa pessoa que quis dae um

suntuoso almoço para todos os Pobres de Agrigento, incluindo as órfãs assistidas pelo

Pe. Giácomo.

Na ocasião foi feito um grande convite entre as mais distintas Senhoras da

aristocracia agrigentina para que assistissem àquele. Estas acorreram em grande número

na Casa das Órfãs e ficaram fortemente impressionadas em ver o lugar onde moravam

as Servas dos Pobres. Não paravam de chamar aquelas Irmãs de anjos terrestres que,

movidas somente pela caridade viviam naquele lugar tão miserável em meio a tantas

privações.

A nobre Senhora Margarida Montana conseguiu logo uma importância em

dinheiro para que a Irmã Vincenzina pudesse reformar aquele local sujo e em ruínas.

Muitas obras depois se empenharam para que as autoridades e toda a cidadania se

interessassem e viessem em ajuda daquela pobre Casa. O Pe. Giácomo , informado de

tudo, acorreu a Agrigento e para organizar este entusiasmo propôs a constituição do

Comitê das Damas de Caridade. Esta proposta foi acolhida com ímpeto. O Pe. Giácomo

convidou o Monsenhor Turano a dar uma palestra mensal àquelas nobres senhoras para

anima-as mais no espírito de caridade. Mas teve que sofrer muito em sua profunda

humildade quando o Monsenhor Turano lhe impôs por obediência dar ele mesmo a

palestra mensal. Dobrou a cabeça por obediência mas era uma tortura cada vez que

devia desenvolver algum tema diante daquelas pias senhoras. Pedia a este ou a outros

entre seu amigos para que lhe sugerissem uma idéia, dessem-lhe uma dica para

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desenvolver ou melhor, que lhe escrevessem toda inteira a palestra para decora-la e

recitá-la em Agrigento. Mas por quantos esforços fizesse para preparar-se ou

desenvolver algum tema sugerido por alguma amigo, nunca conseguia, no ardor do seu

falar acompanhar os conceitos preparados: suas palestras eram sempre espontâneas e

sempre eloqüentes, capazes de envolver e levar a qualquer sacrifício as pessoas que o

ouviam.

Foi assim que em breve toda a Agrigento se entusiasmou pelo Pe. Giácomo e

pela sua Obra; a coleta começou a receber abundantes esmolas; todas as classes sócias

competiam em ajudar as pobres orfãzinhas, de modo que após algum tempo aquela

pobre Casa tornada quase nova, pode oferecer comodamente a hospitalidade a oitenta

orfãzinhas que, com sua piedade, tornaram-se a consolação do Servo de Deus.

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CAPÍTULO VIII

Funda um Orfanato Feminino em Terre Rosse – Abre

uma Casa para as Órfãs, Pobres e Doentes em

Valguarnera Caropepe, uma outra par Órfãs em

Monreale e outra para Velhos e orfãzinhas em São

Cataldo.

Enquanto o Pe. Giácomo se ocupava da fundação da Casa de Agrigento, ia

aumentando o número das orfãzinhas na Quinta Casa. Compreendendo bem em sua

caridade iluminada que não era bom que as órfãs vivessem juntas com as velhinhas,

começou a procurar outro local para instalar as meninas.

Foi-lhe oferecida a casinha de Sommariva com um pequeno jardim ao lado na

localidade de Terre Rosse a noroeste de Palermo. Precisavam, porém de 26 mil liras:

onde consegui-las?

O novo Cottolengo encaminha o negócio confiando na Providência.

Até a véspera do dia em que devia assinar o contrato, ele não sabia onde

encontrar aquele dinheiro. Mas como – lhe diz o Pe. Gambino, o primeiro sacerdote que

se uniu a ele para ajuda-lo em sua nobre missão – o senhor precisa de 26 mil liras e

amanhã se deve assinar o contrato!

Respondeu ele: “O negócio é de grande importância, se Deus o quer, Ele o

providenciará”. E o Senhor providenciou. Naquele mesmo dia o nobre e piedoso Senhor

Barão Rafael Starrabba oferecia-lhe as 26 mil liras, a serem devolvidas quando pudesse.

Nesta Casa, a primeiro de maio de 1882 o Pe. Giácomo alojou trinta órfãs, e

separadamente os vinte órfãos que, como foi dito, tinham passado do Refúgio à Quinta

Casa junto aos velhinhos. Lá permaneceram por dois anos assistidos pelo próprio Pe.

Giácomo que por eles gastou as melhores horas do dia e com imensa alegria cuidava de

sua higiene, instrução e educação.

Aquele Casa em seguida foi ampliada e totalmente restaurada por outro generoso

benfeitor que gastou mais de cem mil liras: o senhor Salvador Celestre, fervido

admirador do Pe. Giácomo, de maneira que em poucos anos pode acolher mais de

trezentas órfãs, além das Irmãs que cuidavam das meninas.

O Monsenhor Domingos Lancia, da família dos Duques de Brolo, Arcebispo de

Monreale, no 5.º aniversário da morte do Pe. Giácomo, unindo a sua voz àquela dos

vários outros Bispos, que naquela circunstância quiseram honrar a venerada memória do

Servo de Deus, assim escrevia: “Recordo com prazer que convidado pelo Pe. Giácomo

fui a Terre Rosse para consagrar com as orações da Igreja e a Bênção episcopal, a

primeira pedra para a fundação de uma Casa beneficente. A esta feliz inspiração daquele

Servo de Deus, não parecia corresponder os recursos humanos.

Contudo, não transcorrera muito tempo que eu passei por lá juntamente a ele, e

vi com surpresa que daquela pedra surgira, como por encanto, um magnífico edifício

onde encontram pão, trabalho, educação religiosa e civil centenas de inocentes órfãs.

Era a fé do sacerdote Cusmano que sabia realizar tais milagres”.

Multiplicando-se, no entanto, o número de Órfãos e dos Pobres, aumentava

sempre mais no Pe. Giácomo o desejo de dar vida à Comunidade dos Irmãos Servos dos

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Pobres. Ele de fato teve que confiar os primeiros Pobres e Órfãos internados à Quinta

Casa a um piedoso capuchinho. Ele era Pe. Antonio de Petralia que, embebido do

espírito do seu Seráfico Pai São Francisco, mesmo após a supressão da Ordem

Franciscana, mantivera o hábito na espera de tempos melhores. Tendo conhecido o Pe.

Giácomo se apegou a ele, e após a inauguração do Asilo da Quinta Casa dedicou-se com

ardente zelo à assistência dos Pobres. Queria ligar-se à nova Instituição, mas como já

começavam reabrir-se vários conventos da sua Ordem, foi chamado pelos seus

superiores.

O Pe. Giácomo, entretanto, colocava em Deus sua confiança, seguro que quem

lhe dera a possibilidade de reunir a família das Irmãs Servas dos Pobres, tornar-lhe-ia

fácil também a fundação dos Irmãos Servos dos Pobres, segundo seu antigo desejo.

E o Senhor que queria servir-se dele para dar vida na Igreja a esta nova

Instituição, enviou-lhe um bom número de piedosos leigos que, atraídos pela fama de

santidade do Servo de Deus, acorreram a ele animados pelo nobre desejo de sacrificar-

se inteiramente sobre o altar da caridade.

Foi assim que no mesmo ano de 1884 pode dar, juntamente com o hábito, o

título de Servos dos Pobres a nove jovens corajosos que formaram o primeiro núcleo da

nova família.

A eles foram confiados no mesmo local da Quinta Casa, mas em

compartimentos separados, tanto os pobres inválidos como os orfãozinhos. Para estes

últimos, que trouxe de volta de Terre Rosse, alugou um local do lado da Quinta Casa e

deixou Terre Rosse somente para as Órfãs.

Este novo local servia exclusivamente como dormitório para os órfãos. Durante

o dia, sob a direção dos irmãos ficavam no Asilo para estudar e trabalhar, já que o Pe.

Giácomo foi solícito em criar algumas oficinas para educar nas artes e no trabalho, os

pobres órfãos, afim de que pudessem tirar desta profissão, um dia, o sustento de sua

vida e tornar-se então úteis para si mesmos e para a sociedade.

Por volta daquele período, outro sacerdote entre os admiradores do Pe. Cusmano

decidia-se a tudo deixar para seguira as pegadas do Servo de Deus. Este foi o Pe.

Salvador Boscarini, filho do Barão Antônio, de Valguarnera Caropepe. Jovem de bela

inteligência e entusiasta para as obras de caridade, tendo conhecido o Pe. Giácomo

aderiu a ele e acabou entrando em São Marcos, onde num pequeno quartinho, ao lado da

Igreja, morava o Servo de Deus. Não passou muito tempo e o Pe. Giácomo lhe confiava

a direção do Orfanato Feminino de Terre Rosse, assim como ao Pe. Salvatore Gambino

que o havia precedido, tinha confiado a direção do Asilo da Quinta Casa.

O Pe. Boscarini, desejoso de ajudar as pobres órfãs de sua cidade natal, apressou

em apresentar o Pe. Giácomo a alguns nobres senhores daquela cidade. Tendo

conhecido o Servo de Deus e visitadas as Casas por ele fundadas em Palermo, ficaram

de tal modo entusiasmados, que fizeram todo o possível para ter, a todo custo, as Servas

dos Pobres em Valguarnera.

Conseguiram da Prefeitura para o Pe. Giácomo um ex-Convento de

Franciscanos, distante meia hora da cidade, e com muita insistência pediram-lhe que ali

fundasse uma Casa de Misericórdia para as órfãs, os pobres velhos e os doentes da

cidade.

O Pe. Giácomo, que já dispunha de um bom número de Irmãs, acolheu o convite

de bom coração em abril de 1883 viajou para Valguarnera com um grupo de Servas dos

Pobres. Enquanto estas preparavam a vasta casa para a beneficência e a santa

hospitalidade, ele girava pela cidade, pelas estreitas ruas, lugares de miséria, procurando

os pobres para interna-los. Por acaso encontrou um amigo que comovido grita-lhe: “Oh

Pe. Giácomo, o céu mandou-vos aqui”, e apontando-lhe uma porta em pedaços de uma

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parede velha e suja, disse: “Aí dentro estão dois infelizes precisando de ajuda”. O Pe.

Giácomo, com o coração palpitante, como se pela primeira vez assistisse a um triste

espetáculo, entrou naquele casebre e oh!... Que horrível cena!

Num vão de escada incômodo, úmido, preto, onde o ar era abafado pelo mofo e

pelo mau cheiro igual ao que provém dos quartinhos sujos dos enfermos, sofria

terrivelmente uma mulher. Estava deitada numa esteira, que ocupava quase todo o

espaço, esteira formada por uma espécie de grelha de ramos cheios de nós, erguida

sobre quatro troncos fixos no chão; sem colchões nem cobertores. A pobre mulher

estava com a perna quebrada em três lugares. Diante da porta, numa grande sujeira,

estava sentada sua mãe. Tirada à força do lado da filha, sentada encolhida numa pedra

com a cabeça reclinada sobre o peito, chorava soluçando. O Pe. Giácomo dirigiu-lhe

afetuosamente a palavra. De repente a velha levantou o rosto; oh, que rosto horrendo!

Uma casca preta cobria-lhe a olheira; um câncer roia-lhe o olho direito. Não se via nada

de tão repugnante: um rosto tão deturpado e que no entanto levava a uma grande

compaixão. A pobre velha chorava com o outro olho e as lágrimas caíam sobre sua pele

ressequida e cheia de rugas, sobre seus lábios trêmulos e rachados, sobre suas mãos

amarelas e ásperas. Oh, infeliz criatura! O Pe. Giácomo estava inclinado amorosamente

sobre ela, com a mão sobre seu ombro. Não se pense que naquele momento o Pe.

Giácomo estivesse vencendo um sentimento de repugnância porque sua fé viva lhe fazia

ver nos Pobres o seu Jesus e os amava profundamente por causa disso; tinha em seu

coração o mesmo fogo que aquecia São Francisco quando curava os leprosos e beijava

suas chaga. No entanto uma carroça coberta de colchões estava esperando diante da

porta.

A caridade dos cidadãos, que renasce por causa dos santos exemplos, reacendeu-

se naquele momento como um milagre. Bastou uma só palavra do Pe. Giácomo para que

todos acorressem para ajudar as infelizes. Porém, somente as Irmãs, as pias criaturas

que o Pe. Giácomo comparava às santas mulheres do Calvário, quiseram cumprir o

piedoso ofício.

A triste caravana encaminhou-se lentamente ao Asilo entre as estreitas vias da

cidade, e pelas vias lamacentas do campo, em meio a uma comoção geral. E quando as

duas mulheres foram colocadas no leito, depois que as Irmãs lhes deram banho e as

vestiram com roupas limpas, o Pe. Giácomo assentou-se ao lado das camas e começou a

falar-lhes com aquele fogo e intensidade de afeto próprios dele, sobre a brevidade das

dores deste mundo e das delícias eternas do Paraíso.

No dia seguinte, após a celebração da santa missa, chorando de alegria, o Pe.

Giácomo começou a andar pelas ruas desejoso de caçar os Pobres, como ele dizia

brincando. Encontrou um guia, um amigo que o conduzia até a cidade para socorrer

outro caso desesperador.

Seguiram-no pelo caminho alguns senhores do laicato e do clero e muita gente

que soubera do gesto caridoso do dia anterior.

Perto da casinha daquelas duas pobres mulheres, as primeiras internadas, num

beco sem saída, numa estrada lamacenta, apresentou-se outra cena angustiante.

Sobre um leito de tábuas do mesmo comprimento do quartinho no qual se

encontrava, mas muito curta para a pessoa que estava deitada, jazia um jovem com a

metade do corpo paralisado. O infeliz devia ter sido forte antes, porque era bem robusto

e muito alto. Mas agora mexia somente um braço, sua única parte viva, que agitava de

cima para baixo como se estivesse tentando procurar alguma coisa ou expulsar suas

dores. Daquele casebre escuro saíam tristes gemidos. Eram de uma pobre velha, a mãe

que sentada aos pés do filho, lamentava-se pelos reumatismos que lhe atormentavam as

pernas.

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O quarto era pequeno e não dava para se mexerem, nem se podia transportar o

enfermo sobre um carro, porque os solavancos o torturariam. Por isso pediu-se uma

maca. No entanto o tempo fechou-se e começou uma garoa fina, mas que aos poucos se

tornava mais forte. O céu escureceu e as nuvens estavam baixas.

Chegou a maca trazida pelas Irmãs. Desta vez foi uma verdadeira e viva disputa:

“Não, elas não poderiam carregar este peso, pobres mulheres fracas e cansadas”.

Protestavam os senhores. Mas aquelas boas criaturas socorriam porque tinham a força

da alma. Lenta e delicadamente pegaram o enfermo, ajudadas pelo Pe. Giácomo e o

puseram sobre as almofadas da maca. No ato de erguer a maca com seus braços

delicados, quatro senhores fortes e robustos tiraram delas, quase à força bruta, a piedosa

carga. E assim, revezando-se, levavam pela via, felizes e orgulhosos sob a chuva que os

molhava e com os pés que atolavam na lama.

Chegando ao Asilo o Pe. Giácomo tomou entre seus braços o enfermo e

colocando-o sobre uma poltrona começou a limpa-lo e penteá-lo com piedoso cuidado,

antes amável. Enquanto os outros, enojados profundamente, olhavam a cabeça daquele

infeliz que fervilhava de insetos; o Servo de Deus, sorrindo, passava o pente entre seus

cabelos emaranhados.

Também ele, o Pe. Giácomo teve que trocar a roupa. Depois voltou sereno, feliz

e com o rosto transfigurado. Correu então até um senhor que tinha-se prestado com

maior entusiasmo em ajudar o transporte daquele paralítico, e com os olhos cheios de

lágrimas e voz trêmula, abraçou-o e beijou-o chamando-o com os doces nomes de

amigo, irmão e benfeitor... Todos então choravam ao seu redor.

Aconteceram muitas cenas semelhantes a esta até que o Asilo ficou repleto de

todos os Pobres que podia conter.

Foi então que o Pe. Giácomo voltou para Palermo deixando os habitantes de

Valguarnera cheios de admiração pela sua heróica caridade.

Em Palermo encontrou o Pároco José Soldano que o convidou a enviar a

Monreale, sua cidade, algumas Irmãs para abrir o internato para as pobres órfãs.

Oferecia-lhe uma grande casa desabitada na estrema periferia da cidade, usada um

tempo como casa de Exercícios Espirituais, por isso chamada de Casa Santa.

O Pe. Giácomo aceitou o convite e dispondo de tudo que precisava para o bom

êxito dessa nova fundação, no Natal do mesmo ano mandou a Irmã Vincenzina, que ele

chamara de Agrigento para a Casa Central de São Marcos, juntamente a outras Irmãs a

Monreale.

Contemporaneamente recebeu um outro convite por parte do Prefeito de São

Cataldo, o Cavalheiro Salvatore Baglio.

Tendo este conhecido as várias fundações feitas pelo Pe. Giácomo e querendo

providenciar uma melhor assistência aos Pobre de São Cataldo que se encontravam

internados num antigo Convento de Capuchinhos, assistidos por pessoas pagas, dirigiu-

se ao Pe. Cusmano para pedir-lhe as Irmãs. Também este convite ele aceitou de bom

grado, e em julho de 1884 inaugurou esta outra Casa de Misericórdia que, em seguida,

além dos Pobres, velhos e doentes, começou a hospedar também as meninas pobres.

E assim, num período de quatro anos, o Pe. Giácomo tinha a consolação de ver a

sua Obra começar a difundir-se em toda a Sicília para a consolação de tantos Pobres.

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CAPÍTULO IX

Assiste as orfãzinhas de Terre Rosse durante a

epidemia de cólera – Funda a Colônia Agrícola de São

José Jato.

Já chegamos, nestes breves traços da vida do Pe. Giácomo ao ano de 1885; isto

é, naquele ano de triste recordação no qual a bela cidade de Palermo vinha sendo

cruelmente provada pela epidemia asiática. Logo estourou a cólera os mortos pelo

contágio aumentavam cada dia vertiginosamente. O medo tomou conta de todos os

cidadãos; bem-aventurado se achava quem podia fugir da cidade. Fechadas a maioria

das lojas e parado o comércio, a cidade assumiu um aspecto desolador. A prefeitura,

para cuidar da saúde pública, elegeu uma comissão sanitária com plenos poderes,

chefiada pelo Dr. Henrique Albanese.

No início da epidemia foram abertas várias enfermarias onde eram conduzidos à

força todos aqueles que eram atingidos pelo mal; precaução necessária mas que não

deixava de se tornar desoladora a quem a ele sujeitava-se. Como poder expressar o que

sofreu o Pe. Giácomo nesta triste circunstância! Além da precariedade dos meios

materiais de subsistência das órfãs e dos pobres por causa do enfraquecimento da coleta

devido aos tempos anormais, era atormentado pela idéia do que poderia acontecer às

órfãs e às Irmãs se o mal penetrasse nas três Casas já existentes em Palermo.

O bom padre não sabia resignar-se à idéia de ver suas queridas filhas

transportadas a uma enfermaria pública em contato com todo tipo de pessoas. Como

fugir de tal perigo? Valendo-se de sua antiga amizade com o Dr. Albanese, conseguiu a

permissão para construir no jardim do Orfanato Feminino de Terre Rosse uma barraca

de madeira para ser usada como enfermaria, no caso de alguma Irmã ou Órfã se atingida

pelo mal.

A barraca bem grande e capaz de conter vinte leitos e vários quartinhos para

isolar os casos mais graves, provida de tudo o quanto a ciência exigia para enfrentar a

terrível doença, surgiu como que por encanto. Aos 30 de setembro daquele ano, tendo já

se verificado entre as órfãs alguns casos suspeitos, o Pe. Giácomo toma a heróica

resolução de fechar-se juntamente a duas Irmãs escolhidas como enfermeiras e a duas

órfãs entre as mais adultas como assistentes. Faltavam ainda as janelas a serem

terminadas, enquanto um jovem marceneiro trabalhava nelas, viu no interior da barraca

uma pobre orfãzinha que vomitava. Ficou de tal forma impressionado que começou a

perturbar-se e também ele sentiu-se atingido pelo mal. O Pe. Giácomo corre em sua

ajuda, dá-lhe os primeiros remédios, convence-o a confessar-se e com uma carroça

manda-o para casa. Naquela mesma noite o pobre jovem faleceu.

Todo o mês de outubro o Pe. Giácomo ficou trancado naquela barraca para

assistir às doentes que eram tratadas pelo Dr. Di Bella, o qual gratuitamente oferecia

seus serviços. Cerca de oitenta doentes foram transportadas àquela barraca, e entre elas

somente duas Irmãs e duas órfãs com imensa dor do bom padre, perderam sua vida. em

todo este tempo ele não tirou o seu hábito nem deitou-se. Todas as noites, após ter

respondido as cartas que recebia das outras Casas, preocupadas e com razão pela sua

preciosa saúde, dedicava o tempo que lhe sobrava para a oração. Permanecia de joelhos

aos pés do altar que erigira naquela barraca e onde todos os dias celebrava a santa

missa. Naquela mesma barraca, por meio de um porta-voz, ele dava suas disposições

para o governo da Congregação.

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As duas Irmãs, que consideraram uma sorte toda singular terem sido escolhidas a

prestar sua assistência às afetadas pelo mal juntamente ao Pe. Giácomo, lembram ainda,

com grande consolação aqueles dias por elas chamados de beatos, nos quais puderam

então de perto gozar das santas palavras e dos exemplos, das mais heróicas virtudes

praticadas pelo Servo de Deus.

No início de novembro, passando finalmente a epidemia, após ter feito tantas

vítimas, – e foram poucas as famílias que não tiveram que chorar a perda de alguma

pessoa querida – o Pe. Giácomo deixou aquele voluntário eremitério, testemunho de

tantos heróicos sacrifícios. Ele, no entanto, há muito tempo pensava destinar, para o

alívio dos órfãos e dos Pobres do interior, aquelas terras que, como dissemos no início, a

sua família possuía em São José Jato.

Pensou ter chegado a hora de começar a Obra por ele há tanto tempo desejada: a

fundação de uma Colônia Agrícola. E eis que ao invés de pensar em descansar pelas

imensas fadigas enfrentadas durante a cólera, com magnífico entusiasmo se dispões à

nova obra.

O inverno não o detém; o ardor de sua caridade deve vencer o frio da natureza. E

dado que naquele lugar onde ele tinha pensado edificar a Colônia não era fácil encontrar

pedras para a construção, decidiu construir a casa em madeira, reservando para outros

tempos a construção em pedra.

Tomadas as providências via-se logo uma longa fila de carros cheios de madeira

e ferramentas atravessar a via provincial que de Monreale levava a São José Jato.

Encabeçava-os o bom padre com seis Irmãos Servos dos Pobres e vários operários,

pedreiros e marceneiros. Às 14 h. do dia 24 de novembro chegaram à cidade, onde

esperava-o seu irmão Giuseppe para hospedá-lo numa casa de propriedade sua, mas o

Pe. Giácomo prosseguiu para as terras que ficavam a cerca de três quilômetros da

cidade.

Existia ainda no meio daquela sua propriedade uma construção rural em ruínas,

devido ao abandono no qual foi deixada há muito tempo, e aí, desde a primeira noite,

dormiu com os Irmãos e com os operários.

No dia seguinte começaram a trabalhar. No lugar da manjedoura, servindo-se

das faculdades recebidas do Arcebispo de Monreale, fez adaptar, com a devida

decência, o Altar para a celebração da santa missa. Posteriormente naquele lugar

mandou construir um forno para o pão, e onde se encontrava o antigo forno construiu

uma igrejinha, que ele carinhosamente chamava de Belém ou casa do pão. Ele mesmo

desenhou a planta da Colônia, planta muito simples, mas ao mesmo tempo prática e

eficiente. No ardor de sua caridade, não se contentou em acolher naquele Casa somente

os órfãos, mas quis estender este benefício aos pobres velhos inválidos, separando-os

porém uns dos outros.

Aos operários vindos de Palermo uniram-se outros das cidades vizinhas e em

breve seu número subiu a cem. Ele animava a todos com suas palavras gentis e cheias

de delicadeza, de modo que era grande o entusiasmo que reinava entre aquele grupo de

operários. Ele conseguira infundir em todos um grande empenho para poder inaugurar a

nova igrejinha, única construção em pedra, no dia da Imaculada Conceição, sob cuja

proteção queria colocar a Colônia. E o dia tão esperado chegou, e a igrejinha estava

pronta. Não se pode expressar com que fervor de espírito ele celebrou aquela festa,

juntamente com um povo numerosíssimo vindo das cidades vizinhas. Como sinal

visível da consagração feita a Deus, aos Pobres e aos órfãos daquelas terras, quis plantar

sobre uma colina que se ergue sobre a Colônia, uma grande cruz de madeira. Carregado

desta pesada cruz e ajudado por muitos sacerdotes que, cheios de comoção admiravam

seu ardente e humilde fervor, ele levou a cruz entre sacros hinos e cânticos entoados

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pelo povo até o cimo e a colocou no lugar estabelecido. Não podendo conter seus

sentimentos, dirigiu àquele povo palavras tão ardentes que arrancaram as lágrimas dos

olhos de todos. Assim, em meio ao frio e à neve que começou a cair abundantemente,

continuou a construção da Colônia em madeira, de modo que na festa do Santo Natal,

pode receber os primeiros dois orfãozinhos e os primeiros dois velhinhos que ele

mesmo quis limpar tirando todos os insetos dos quais eram repletos.

Em abril do ano seguinte a construção estava terminada e se receberam outros

Pobres e Órfãos que em breve chegaram a quarenta. O entusiasmo com o qual o povo de

São José acolhera a fundação da colônia, aos poucos começou a enfraquecer. A coleta

que os bons Irmãos faziam para manter os Pobres e os Órfãos era insuficiente para as

necessidades daquela Casa, e começaram as dívidas.

Às dívidas contraídas para a fundação se acrescentaram as outras diárias para o

sustento. Mesmo que o Arcebispo de Monreale tivesse apoiado de todo o coração a

existência daquela Casa de Misericórdia, ajudado com recursos próprios e procurando

mover à caridade os habitantes daquela cidade que mais diretamente gozava os

benefícios da Colônia, a situação não melhorou muito e assim as dívidas cresciam

desmedidamente. O bom padre acabou ficando completamente oprimido. Na véspera da

sua morte, cerca de dois anos após a fundação da Colônia, diante dos pedidos

urgentíssimos, que ele não podia atender por causa das necessidade dos Pobres das

Casas de Palermo, ouviram-no clamar penosamente: “A Colônia de São José me

mata!” No dia seguinte às quatro horas da madrugada, morria de aneurisma, vítima da

caridade!

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CAPÍTULO X

Funda um Asilo Canicatti – Abre em São Marcos a

Casa dos Missionários Servos dos Pobres.

Antes da cólera de 1885, a Confraria da Caridade de Canicatti querendo oferecer

àquela cidade uma Casa de Misericórdia que, como em outros lugares acolhesse os

Pobres doentes, velhos e órfãos, dirigiu-se ao Pe. Giácomo para pedir-lhe as Irmãs. Uma

comissão escolhida entre os membros da Confraria foi a Palermo para os oportunos

acordos. Trabalhosas foram as negociações porque o Pe. Giácomo, sempre cheio de

doçura e condescendência, quando tratava de assuntos que ele considerava

indispensáveis ao bom funcionamento de uma casa, tornava-se irremovível. De fato

aqueles senhores não concordavam com ele sobre algumas condições essenciais. Porém

o Pe. Giácomo, com sua persuasiva eloqüência conseguiu convence-los e o negócio foi

fechado.

Sobrevindo a epidemia de cólera a inauguração foi adiada, e somente em janeiro

de 1886 também Canicatti pode ver seus pobres assistidos pelas filhas do Pe. Cusmano.

As várias e sucessivas fundações que o Servo de Deus tinha realizado até agora

não conseguiam, porém satisfazer o desejo mais ardente do seu coração: a fundação da

Comunidade dos Padres Missionários Servos dos Pobres. Era este seu mais alto ideal e

meta suprema das suas aspirações. Se Jesus lhe concedesse recolher um grupo de

sacerdotes que, movidos pela mesma graça e impregnados pelo mesmo espírito de

caridade, unissem-se a ele para ajuda-lo a dirigir a nascente Instituição, ele veria

assegurada a sua existência também no futuro. E o que não fez o Pe. Giácomo para

conseguir este objetivo! Desde o início da Obra na Igreja dos Santos Quarenta Mártires,

quando por meio das coletas diárias alimentavam-se famílias pobres e envergonhadas, o

Pe. Giácomo não cessava de convidar sacerdotes, seus amigos, para ajuda-lo. E como

ficava feliz quando conseguia ganhar alguém para esta causa! Servia-se de todos os

meios para infundir nestes ministros do altar o espírito da Obra e, dado que ele

considerava-se incapaz de faze-lo, recorria a outros para auxilia-lo nesta santa missão

para com os sacerdotes.

Foi com esta finalidade de atrair sacerdotes, especialmente jovens, em dedicar-se

à Obra de caridade, que ele induziu o Cardeal Guarino, então Cônego da Igreja da

Magione em Palermo um dos seus maiores, afetuosos e ativos admiradores e ajudantes,

a iniciar uma série de conferências no local dos Santos Quarenta Mártires, e em seguida

na igreja anexa ao hospital dos sacerdotes. Durante estas conferências, baseadas mais

sobre o Direito Canônico, do qual o Monsenhor Guarino era cultíssimo, tentava colocar

no coração dos jovens padres o ardor de caridade do Servo de Deus em socorrer os

infelizes. Como era eloqüente, como acendia-se de santo zelo, como brilhavam de luz

cintilante suas vivíssimas pupilas, quando falava da pia Associação e das virtudes do

seu querido Pe. Giácomo.

Aquelas reuniões porém, mesmo que suscitassem zelo de caridade em muitos,

não conseguiram que, naquele momento alguém se unisse ao Pe. Giácomo em

comunhão de vida; ele conseguiu cooperadores, não Missionários, que unidos numa

única família vivessem exclusivamente para os Pobres. E este seu ardente desejo crescia

sempre mais depois da fundação das Irmãs e dos Irmãos Servos dos Pobres, dado que

compreendia muito bem que, para poder manter sempre vivo o espírito da pia

Instituição e dos Irmãos e das Irmãs, era indispensável a obra dos Missionários.

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E por esta finalidade ele rezava ardentemente e mandava outros rezarem.

“Rezem – escrevia à sua irmã Vincenzina e às outras Irmãs – rezem, para que o

Senhor envie operários à sua vinha, pois é sumamente necessário para consolidar a

Obra que um bom número de Missionários observantes a espalhem e a fortifiquem com

suas fadigas apostólicas”.

Os desejos do Servo de Deus se realizaram somente vinte anos depois, quando

faltavam poucos meses para terminar sua preciosa vida sobre esta terra. Foi em 1887,

aos 21 de novembro, dia consagrado à Apresentação da Santíssima Virgem, que ele viu

os Padres Missionários Servos dos Pobres reunidos em Comunidade na Casa de São

Marcos, desocupadas pelas Irmãs que foram morar em Terre Rosse, e receberam a

instituição canônica pelo Eminentíssimo Cardeal Arcebispo Celesia.

Alguns meses antes, quando por disposição da Providência divina, o desejo de

tantos corações estava sendo realizado, ele escrevia à sua irmã: “Dado que o Senhor

quer que se abra a Casa muito importante dos Missionários, deve mandar-nos as

ajudas necessárias. Assim, exceto no caso de assistir os moribundos, todos os

sacerdotes deverão reunir-se nesta casa, e terão o meio de pensar um pouquinho em

suas próprias almas, para serem mais capazes de ajudar os outros. Sairão segundo sua

tarefa para atender as Casas de Misericórdia e, com algumas exceções estarão sempre

em casa nas horas comuns e reavivado seu espírito, empreenderão novamente a missão

de evangelizar os Pobres do interior”. E aos 21 de novembro, já estando tudo pronto no

Conventinho anexo à Igreja de São Marcos, inaugurava-se a Casa dos Missionários

Servos dos Pobres. De manhã bem cedinho estavam reunidos na igreja os velhinhos e os

órfãos internados nas Casas de Misericórdia de Palermo e os Irmãos Servos dos Pobres.

O Pe. Giácomo tendo celebrado a Santa Missa e distribuído a eles o Pão dos Anjos,

exortou-os a rezar eficazmente ao Senhor para que abençoasse a nova e pequena família

dos Missionários, e os fizesse crescer em espírito e número, para o alívio de tantos

infelizes Pobrezinhos.

“A messe é grande – disse a eles repetindo as palavras do Nazareno – mas os

operários são poucos; rezem então, rezem vocês ao dono que envie operários à sua

messe”.

Aos órfãos lembrou ainda que os pequenos pedem pão, mas não há quem lhos

parta. Exortou-lhes também, os mais próximos do coração de Deus, para que pedissem

ao Deus de amor que lhes enviasse alguém para partir não somente o pão para o corpo,

mas o alimento da alma, isto é, o pão da educação e do conhecimento das virtudes. “E

os Pobres – concluiu – comerão assim, comerão à vontade, e seus corações que

procuram o Senhor o agradecerão para sempre e viverão eternamente pelos séculos

dos séculos”.

Em seguida o Revmo. Sacerdote Giuseppe Palazzotto, pároco do distrito ao qual

pertencia a igreja de São Marcos, celebrou a Santa Missa à presença de sua eminência, o

Cardeal Celesia e do seu Vigário o Monsenhor Cirino.

Os órfão cantavam as partes do coral. Após o santo evangelho o Cônego José

Soldano de Monreale, subindo ao púlpito fez um discurso magistral. Comparando a

cerimônia da instituição dos Missionários à Festa da Apresentação de Maria ao Templo,

que a Igreja celebrava naquele dia, explicou aos fiéis a missão importante que Deus

confiava àquele grupo de sacerdotes, e a estes lembrou as obrigações e os sacrifícios

que voluntariamente abraçavam tomando das mãos de seu Superior o Crucifixo dos

Missionários, que levariam sempre consigo em cada instante de suas vidas e para que

em nenhum momento esquecessem a Missão que empreendiam.

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Terminada a Missa, o Eminentíssimo Pastor, seu Vigário, sua corte, e os mais

afeiçoados amigos da Obra, juntamente aos novos Missionários foram todos à pequena

Casa da Missão situada sobre a igreja.

Sua Eminência e o seu Vigário sentaram-se no meio da sala à qual dava acesso

aos pequenos e pobres quartinhos e quis ao seu lado o pio Fundador e ao seu redor os

novos Missionários. Dirigiu-lhes calorosas e eficazes palavras. Disse-lhes que ele

sempre havia tido em seu coração uma santa inveja admirando os milagres da caridade

cristã operados em Turim pelo Cottolengo e por Dom Bosco, e em Nápoles pelo Pe.

Casória. Que sempre desejou que um homem suscitado por Deus cumprisse tais coisas

em sua Palermo. Revelou-lhes que tinha colocado suas esperanças no Pe. Giácomo e

por isso tinha olhado com interesse o crescimento e a expansão da pia Obra do Bocado

do Pobre.

Acrescentou que gozava muito em ver confirmada oficialmente aquela Obra de

caridade laboriosa com a Instituição da nova família dos Missionários, aos quais então

dirigiu-se recordando-lhes que a parte mais eleita do rebanho de Deus, os Pobrezinhos,

são os mais rejeitados e abandonados no embrutecimento da ignorância e do vício.

“Ide vós na minha vinha, disse-lhes, em nome do mesmo divino Redentor; ide

vós instruir os ignorantes, consolar os sofredores, reerguer os caídos, redimir da culpa

os pobre de espírito. Esta é a graça da vocação que receberam de Deus; de graça a

receberam, de graça a empreguem em favor dos míseros.

Avós são confiados o Pobres e vós seríeis ajuda para o Orfãozinhos.

Com vossos suores dêem de comer aos Pobres que estão com fome; com vossas

renúncias tornai menos pesada a pobreza dos míseros; com vosso exemplo santificai os

povos e esperai somente de Deus a recompensa de tantas fadigas”. No final declarou

canonicamente instituída a Congregação dos Missionários Servos dos Pobres.

Todos choravam; e mais do que todos o Pe. Cusmano, que, recolhido em si

mesmo, fazendo-se pequeno, com os braços cruzados e a cabeça baixa, com o rosto

radiante de luz e os olhos banhados de lágrimas, já via realizados os seus desejos.

Talvez naquele momento proferiu aquele “nunc dinitis” (deixai agora) que foi

ouvido somente por Deus; e fato, após poucos meses voou para o Céu.

Depois do discurso o Eminentíssimo Celesia quis abençoar aqueles locais com a

água benta como é prescrito no Ritual. Em seguida todos foram embora. O Pe.

Giácomo, ficando sozinho com os seus, louvou o Senhor no íntimo do coração e, a cada

um dos Missionários, entregou uma cela pobre, aliás paupérrima, e foi com eles para a

oração e à mesa.

Assim começou a vida dos Missionários Servos dos Pobres. Na mesma casa

alojou os mais pequenos entre os orfãozinhos, aos quais ele mesmo tantas vezes teve

que velar de noite para poupar o Irmão aos quais eram confiados.

Assim escreve: “Após tantos anos de desejo o Senhor quis na sua infinita

misericórdia, conceder-me também este grande bem de viver em comunidade com

tantos ótimos Sacerdotes que me inspiram veneração e respeito. desejara tua presença

naquele tenríssimo dia que, faço votos, permaneça indelével na minha vida, quer pela

ternura das circunstâncias que o acompanharam, quer ainda pela graça que o Senhor

conceder-me-á – espero – de saborear este fruto até o meu último respiro”. Passa então

a descrever os detalhes do que aconteceu naquele dia, e concluiu: “Não posso

transcrever todo aquele tenríssimo dia, que ficará gravado por toda a minha vida, mas

espero que o Senhor me regenere à verdadeira vida de fé na sua adorável vontade para

estar sempre no seu santo serviço”.

Infelizmente, porém, seus dias estavam contados. Somente por poucos meses ele

pode gozar daquela vida comunitária que fora a aspiração de toda a sua vida.

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CAPÍTULO XI

Reúne as nobres Damas de Palermo num Comitê

permanente de beneficência – Sua última doença – Sua

morte.

Embora o Pe. Giácomo tivesse um físico forte e robusto, seu corpo foi sempre

castigado por indizíveis sofrimento.

Uma tormentosa doença que, como vimos, obrigou-o a enfrentar dolorosíssimas

cirurgias tornou-o por vinte e sete anos verdadeiramente o homem das dores. Uma

doença agravada pelo excesso das suas fadigas, pela austeridade do seu regime, e talvez

ainda mais pela dor que lhe provocavam as misérias alheias. Aprouve à Divina Bondade

submeter sua virtude a uma longa e dolorosa prova e, podemos dizer que durante a sua

vida naquela cruel situação ele se apresentava a quantos o circundavam como uma

oferta a Deus.

Após a inauguração da Casa dos Missionários começou a mostrar-se mais

abatido do que antes, e de vez em quando deixava fugir alguma palavra que mostrava o

agravamento de sua saúde. Porém, mesmo abatido pelos males, não deixava descansar

seu corpo, mas obrigando-o à habitual fadiga, continuava a exercitar o ministério de

caridade que se impusera. Vítima voluntária, ele via com uma certa complacência

cumprir-se seu sacrifício e diminuir gradualmente a sua vida. faltavam-lhe somente

alguns dias aqui na terra e seriam a manifestação do esforço supremo do seu amor.

Aos 09 de fevereiro de 1888 inaugurava-se no Orfanato Feminino de Terre

Rosse uma exposição dos trabalhos executados pelas meninas. Aproveitou a ocasião

para reunir num Comitê permanente de beneficência as nobres Damas de Palermo,

assim como fizera em Agrigento.

Num breve e ardente discurso que dirigiu a elas disse: “Minha missão

terminou”.

Será que o Senhor naquele momento lhe fizera pressentir próxima a sua morte?

Ou crendo já terminada a sua carreira aqui na terra, pedia ele mesmo a Deus o eterno

repouso?

Quem poderá saber o que se passou naquele coração tão humilde e escondido

quase a si mesmo? O certo é que na noite do dia 17 de fevereiro ia para a cama com

uma febre violentíssima. No dia seguinte não conseguiu levantar-se ao tocar da

campainha.

Mesmo assim quis celebrar a Santa Missa, e logo que terminou, não podendo

ficar de pé, foi constrangido a voltar para a cama.

A notícia de sua doença espalho-se rapidamente por todas as Casas. Acorriam

então a são Marcos parentes, e pessoas amigas que perguntavam por ele; muitos

telegramas e cartas chegavam pedindo notícias sobre sua preciosíssima saúde.

Em cada Casa elevavam-se a Deus ardentes orações para que conservasse o

tenro Padre. Quantos corações palpitaram de temor e de esperança!

Alguns padres prestavam ao enfermo atenciosos cuidados. É neste momento que

aparece também o espírito de mortificação e de pobreza que morava naquela alma

eleita.

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Oh, como aparecia em seu rosto a expressão do sacrifício interno que fazia a

Deus por faltar o espírito de pobreza, ao qual queria permanecer fiel até à morte, quando

lhe preparavam algumas sopinhas substanciosas! Certa vez um dos padres percebendo

esta dor da alma em seu rosto, oferecendo-lhe a sopa disse: “Tome padre, ...factus

obediens usque ad mortem”. Ele ergueu os olhos para o céu e continuou o versículo

levando à boca a tigelinha.

No entanto a febre mantinha-se numa temperatura muito elevada. Mesmo assim,

em meio a seus sofrimento de corpo e alma, nunca foi visto perturbado, mas conservou

sempre aquela sua calma habitual. Somente dois pensamentos o perturbavam na cabeça:

um de não poder rezar o Ofício Divino, outro de não poder celebrar a Santa Missa.

Quanto à reza do Ofício, providenciou facilmente, pedindo o favor aos seus

Padres que dois ou um rezasse o Ofício Divino em voz alta no seu quarto; e ele que não

podia ler o breviário, rezava mentalmente e acompanhava com os lábios a divina prece.

Quanto à Santa Missa teve que se contentar em receber somente a Santa Comunhão,

pois, não obstante seus insistentes pedidos,o médico não lhe permitiu que se levantasse

da cama. Passaram-se vários dias e a febre começou a diminuir, até que aos 26 de

fevereiro, segundo domingo da quaresma, desapareceu completamente. A partir daquele

dia começou a deixar a cama por algumas horas, celebrando diariamente a Santa Missa

numa capelinha arrumada perto do seu quartinho. Mas devia ser segurado o tempo todo

do Santo Sacrifício, porque vacilava. A febre terminara mas uma falta absoluta de

forças o mantinha mais fraco do que antes. Interrogado sobre sua saúde respondia:

“Sinto-me desvanecer, sinto faltar-me aos poucos a vida”. não se podia compreender o

que tinha. No entanto não queria deixar de oferecer o divino sacrifício sem omitir

nenhuma das cerimônias, inclusive as genuflexões que tanto lhe custavam sacrifício. O

homem de Deus achava que o seu dia, aliás, tão belo e tão santamente cheio, não era

verdadeiramente consagrado ao Senhor sem oferecer o incruento sacrifício do altar.

Após alguns dias, porém, sobreveio-lhe uma pleurite. Se alguém tivesse

desconfiado que aquela seria a última doença do Servo de Deus, com certeza teria

anotado, para a perpétua memória, suas sutis palavras, aquelas conversas ardorosas e

bem humoradas das quais podia-se perceber o engenho, o espírito interior, o amor ao

sacrifício, a fé, a caridade, a prudência, todas as grandes virtudes daquela alma bendita.

Passada a fase aguda da pleurite, no dia 13 de março os médicos o declararam quase

completamente curado e teriam-lhe permitido levantar-se se suas forças muito abatidas

o tivessem consentido. Mas às quatro horas da madrugada do dia seguinte um dos

padres que o velavam naquela noite ouviu alguns gemidos. Acorreu ao quarto e o

encontrou sofrendo muito com a respiração. Acorreram os outros padres. Tinha

movimentos de espasmos tremendos, suava frio e o pulso não dava quase nenhum sinal.

Correram para administrar-lhe a Santa Comunhão, mas não chegaram a tempo. A morte,

como se fosse impaciente para juntá-lo novamente a Deus, apanhava-o dentre os braços

de seus amados filhos. Fez um último esforço para erguer-se um pouco da cama, mas

caiu sobre os travesseiros e, após poucos respiros, recompondo um semblante sereno e

com um doce sorriso nos lábios abandonou-se como em um sono profundo. O Pe.

Giácomo entregava a sua bela alma a Deus!

Eram quatro e meia, hora sagrada, na qual ele, quando era são, costumava

levantar para colocar-se à presença de Deus. Até o último dia ele foi fiel à sua regra e às

quatro e meia ressurgia na contemplação de Deus que se mostrou-lhe não mais como

sombra, mas como luz pura, incorruptível, eterna!

Espalhando-se por Palermo a notícia de que o Pe. Giácomo tinha morrido, foi

um luto geral e pela primeira vez, na frente de todas as lojas e mercearias leu-se “luto

municipal”. A notícia levada pelo telefone ou pelo telégrafo às várias Casas da Cidade e

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da Ilha, despertou por toda parte um eco dolorosíssimo. Dos olhos de todos

derramavam-se lágrimas como nunca, pela perda do Pai mais saudoso e mais amado. Da

boca de todos ouvia-se exclamar com voz de espanto e de pesar: Morreu um Santo!

Morreu um Santo!

Entretanto o corpo foi exposto na igreja aonde começaram a celebrar santas

missas pela alma bendita. Um povo numerosíssimo aglomerava-se ao redor do esquife,

desejoso de contemplar aquele semblante angélico. Misturados no meio do povo

estavam personagens ilustres do Clero e do Laicato da cidade, nobres Damas e pessoas

de todas as condições sociais; todas as autoridades municipais lá estavam lamentando a

perda do homem de Deus. Traziam velas, terços, paninhos e outros objetos e os davam

aos irmãos que estavam ao redor do esquife para que tocassem o seu corpo.

No dia seguinte, além das muitas missas que foram espontaneamente celebradas

por sacerdotes admiradores do Servo de Deus, o Pároco do distrito cantou a Missa à

qual assistiram o Cardeal Arcebispo Celesia, Monsenhor Cirino, vigário geral,

Monsenhor Daddi, auxiliar de Sua Eminência, Monsenhor Masi, bispo grego e Sua

Excelência Reverendíssima Monsenhor o Arcebispo de Monreale, além de um grande

número de dignitários, de Damas e de pessoas insignes. Na parte da tarde, com um

cortejo soleníssimo, como nunca visto antes, o humilde sacerdote de Cristo foi

acompanhado até o cemitério por todo o povo no meio do qual estavam misturadas

todas as classes da Cidade de Palermo.

O enterro do Servo de Deus parecia mais um triunfo do que uma cerimônia

fúnebre, e serviu para despertar a fé já adormecida de alguns corações, porque a autora

de tamanho espetáculo era a fé.

No entanto fora apresentado um pedido ao Cardeal Celesia assinado por

muitíssimas e conceituadas pessoas com o qual se pedia ao Eminentíssimo Cardeal que

declarasse, conforme os sagrados cânones, como depósito sagrado o túmulo do Pe.

Giácomo. O Arcebispo consentiu de todo o coração porque ele mesmo era a melhor

testemunha das heróicas virtudes do Pe. Giácomo. No terceiro dia após a morte depois

de se ter verificado o cadáver, foi sepultado.

O caixão que continha o Pe. Giácomo foi lacrado e redigida uma ata pelo

Reverendíssimo Chanceler da Cúria. Em meio a uma comoção geral foi colocado num

túmulo doado no cemitério dos “Rótoli” pelo Prefeitura de Palermo, que fez tudo o que

estava ao seu alcance para honrar os despojos do Servo de Deus.

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CAPÍTULO XII

Virtudes do Pe. Giácomo – Sua fama de santidade –

Solenes funerais – Exumação de seus restos mortais.

Logo que se espalhou em Palermo a triste notícia da morte de Pe. Giácomo,

como vimos, ouvia-se esta exclamação na boca de todos: Morreu um santo! Morreu um

santo! E como tal verdadeiramente, era considerado por todos pelas suas singulares

virtudes e especialmente pela sua heróica caridade. Esta santidade, pois, transparecia

luminosa no seu comportamento modesto e humilde, no seu rosto simples e atraente. É

uma grande pena não termos o verdadeiro retrato do Servo de Deus. Na humildade

sempre resistiu às insistentes pressões para que se deixasse fotografar.

Dele temos apenas uma fotografia tirada logo após à sua morte e alguns retratos

extraídos da máscara em gesso moldada sobre seu rosto após a morte.

O Pe. Giácomo era um homem de bela aparência: tinha uma fronte larga, um

semblante sereno, os olhos azuis cheios de doce esplendor. Ninguém ficava insensível

quando sua boca assumia a atitude de amigável sorriso e o seu olhar se enchia de amor;

todos ficavam atraídos por aqueles modos e se apegavam a ele com potentíssimo afeto.

Bastava simplesmente vê-lo para amá-lo; por isso todos que o conheceram o amaram.

Seu comportamento humilde, pois, era um cândido véu que se estendia modestamente

sobre ele a ponto de tornar manso e suave aos olhos de quem o admirava o fogo

ardentíssimo de caridade que o incendiava por dentro. Sua voz suave, branda e

penetrante era o eco dulcíssimo das fortes pulsações do seu coração. Seu olhar sereno e

cheio de vida revelava todo o interior daquela alma ardente. Humildade e fortaleza,

doçura e severidade, mansidão e firmeza, prudência e simplicidade, abandono em Deus

e solicitude em toda necessidade uniam-se admiravelmente nele; sinal este de

verdadeira santidade, antes efeito único de santidade consumida. Bem escreveu dele o

Pe. Núncio Russo, seu grande amigo e admirador: “Ele alcançou no exercício da

caridade para com os pobres aquele alto grau ao qual se elevaram, em tempos menos

cruéis que os nossos, as figuras majestosas de Vicente de Paulo, Camilo de Lellis,

Francisco de Sales. Como Dom Bosco refulgiu na Itália do Norte com sua operosidade

inocente e pura em favor da humanidade sofredora, também ele brilhou em nossa Ilha.

Ele foi a pessoa mais verdadeira, mais humildemente grande, mais santamente querida

que se possa imaginar; foi o Pai dos Pobres segundo o Espírito de Jesus Cristo”.

O Pobre foi o centro de toda a vida do Pe. Cusmano, dado que o Pobre aqui na

terra tem o lugar de Jesus e o Pe. Giácomo vivia somente para Jesus. Nas suas conversas

tinha como objetivo o bem do Pobre; quando caminhava, com certeza, dirigia-se para

tratar do interesse de algum Pobre; freqüentando pessoas da alta burguesia ou da

nobreza, era para defender a causa do Pobre. Não é de se maravilhar, então, se por amor

aos Pobres ele abraçava aquele gênero de vida que despertava a admiração de todos.

Passava os dias inteiros em jejum, e à noite tinha como consolo um prato de sopa

preparada há muitas horas e poucos pedacinhos de pão Preto e duro impossíveis de se

mastigar. Cansado, com dores, desfalecido, andava sempre a pé e recusava qualquer

comodidade, da qual estava privado seu amado Pobrezinho: no inverno, encolhido de

frio, não queria mudar seu pobre traje. Certa vez disse a um jovem sacerdote: “O

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Senhor queria que eu ficasse em jejum pelos Pobres só uma vez, e duas vezes concedeu-

me dormir no chão por ter dado minha cama a um Pobre. Oh! Se soubesse como é doce

e suave ir para a cama em jejum e morto de frio e passar a noite toda acocorado num

cantinho do quarto sobre o chão frio por amor a Jesus, com certeza não cansaria

nunca de pedir esta graça ao Senhor!”

Se o Pe. Giácomo dedicava-se totalmente a socorrer as misérias corporais do

próximo, fazia-o somente para reconduzir as almas a Jesus Cristo. Por isso ele amava a

todos indistintamente: e os homens mais iníquos e pervertidos nunca foram excluídos

do seu coração generoso e transbordante de caridade divina. Ele vencia até os mais

obstinados e rebeldes e os reconduzia à graça com sua doçura, com sua mansidão, com

seu amor! No seu linguajar, nunca encontrou-se uma só palavra que pudesse perturbar a

alguém; a sua correção era com um bálsamo salutar que, ao invés de ferir, enchia de

doçura a alma do delinqüente.

E o que dizer da sua mansidão inalterável com a qual tolerava até os mais

molestos e importunos? Muitas vezes, estando em jejum e sem forças, sofria por várias

horas com paz e alegria inexprimíveis só porque não queria cortar a palavra da boca de

alguém que queria desabafar com ele a tristeza do seu coração.

Um prepotente importuno tinha-o enchido de insultos e, se não bastasse, tinha-o

ameaçado de várias maneiras. O Pe. Giácomo não se perturbou, mas despedindo-o

amavelmente apertou sua mão com imensa doçura e lhe disse: “Volte, volte quando

quiser, sua companhia é-me imensamente agradável”. Sim, era agradável ao seu

espírito que amava vencer a si mesmo, ainda que atormentasse sua natureza.

Certa vez uma mulher despejava contra ele uma grande quantidade de insultos

da forma mais grossa e imprudente; o Pe. Giácomo escrevia e, só de vez em quando,

soltando a caneta, esfregava com a palma da mão sua larga fronte. A mulher continuou

de tal ponte\o que um sacerdote, que estava presente, tomando a palavra e com voz

indignada ordenou-lhe que se retirasse para não continuar a insultar o santo homem

daquela maneira. Mas quando a paciência daquele sacerdote esgotou-se, a do Pe.

Giácomo começava a manifestar-se. Largou a caneta, olhou para a mulher e com voz

suave disse-lhe: “Pois bem, minha senhora, quer algum socorro, não é verdade? Então,

padre, dê a ela duas liras”. Eu, - observou aquele bom sacerdote – apesar da raiva que

subira até os meus olhos, tive que também triunfar sobre mim, tirar do bolso a carteira,

pegar as duas liras e doá-las à mulher. Em seguida o Pe. Giácomo acrescentou: “Agora

ide, ide em paz, e não deixe de voltar freqüentemente para dar-me as notícias de vossa

filhinha”. A mulher foi-se embora e o sacerdote não pode conter-se sem fazer esta

pergunta ao Pe. Cusmano: “Padre, como fez para vencer-se e dominar-se de tal

maneira?” O Servo de Deus respondeu: “Caro Padre, é trabalho de muitos anos”.

Esta mesma caridade sugeria-lhes uma eloqüência fora do comum, uma palavra

capaz de ganhar o coração e a mente de todos, quando tratava-se de defender a verdade

e a justiça. Todos, após tê-lo ouvido falar ficavam maravilhados e aceitavam suas idéias.

Com esta palavra simples, plana, mas cheia de unção celeste, ele estimulava os

seus a cumprirem os maiores sacrifícios com alegria e generosidade.

Animado por esta imensa caridade ele não deixou aos seus como herança

somente as obras por ele realizadas, mas também o desejo de muitas outras fundações,

pois queria socorrer as necessidades de todos os Pobres e abrindo hospitais e orfanatos,

multiplicando as casas para os Pobres e abrindo internatos para os orfãozinhos,

ajudando as mulheres que se prostituíam e os meninos e as meninas em perigo. Não

havia necessidade que ele não abraçasse com nobre e magnânimo coração e à qual não

dirigisse sua mente. A sede ardentíssima que sentia pela salvação da sociedade

transviada, impulsionou-o a fundar a Casa da Missão. Ele queria fundar um Seminário

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onde pudessem crescera as plantinhas eleitas do Senhor, e fossem educadas para a vida

de abnegação e de zelo tão necessário aos missionários. Nunca deixava de falar aos seus

sobre a vida apostólica que ele queria que abraçassem quando tivessem ido nos

povoados e nas colônias evangelizando aquelas populações abandonadas, como os

primeiros apóstolos entregues à Providência.

E o que ele pensava em seu coração quando, na última doença, com grandíssima

ânsia perguntava sobre as coisas da África e quis até ver e estudar seu mapa?

Semelhantes pensamentos não eram nele efeitos de uma vã e inútil curiosidade! É certo

que quando os missionários de Dom Bosco, com algumas Irmãs, preparavam-se para

partir para evangelizar a Patagônia, o Pe. Giácomo sentiu o desejo vivíssimo de unir-se

àqueles heróis. Vai entre suas Irmãs e pergunta quem dentre elas queriam acompanha-

lo: todas se ofereceram com imensa alegria, a ponto de o sento homem deixar que a

sorte decidisse quem devia partir. Mas quando foi falar com o Cardeal Celesia para

implorar a bênção sobre aquela missão, escutou como dirigidas a si por parte de seu

venerado Pastor aquelas palavras que certa vez foram dirigidas a São Felipe Néri: “Meu

filho, a tua Patagônia é Palermo: fique aqui e continue tuas obras de caridade”.

Com tudo o que dissemos, bem se vê quanto era justificada a estima e a grande

veneração com que era tido o Servo de Deus.

Esta estima ele não gozava somente entre pessoas amigas, mas também alguns

que se gloriavam de ser incrédulos e ateus tiveram que celebrar publicamente suas

virtudes.

O Cardeal Guarino, numa carta que escreveu aos Missionários Servos dos

Pobres logo após a morte do Pe. Giácomo, comparava-o a Dom Bosco e chamava-os de

astros que espelharam tanta luz, um maior em Turim, outro menor em Palermo; não

menor por espírito e virtude, mas por tempo e progresso da Obra fundada.

E o Pe. Mammana em março de 1893 escrevia: “Deus pusera no peito do Pe.

Giácomo o coração de São Vicente de Paulo. O ardor de sua caridade para com os

Pobrezinhos era inatingível, a pureza de sua conduta era verdadeiramente Angélica, sua

mansidão e doçura revelavam ao vivo São Francisco de Sales. Eu que o segui com

grande atenção em todas as etapas de sua puríssima vida, confesso que nunca conheci

um sacerdote mais zeloso, mais amável, mais santo do que ele”.

Altíssimo era o conceito que o Cardeal Guarino tinha do Pe. Giácomo e

profunda a veneração que sentia por ele; com certeza, se tivesse vivido mais, no exame

das virtudes heróicas do Servo de Deus, o Cardeal Guarino teria sido uma das

testemunhas mais influentes e iluminadas. Deixou escritos, porém, alguns depoimentos

sobre a virtude dele e nos quais diz que “o coração do sacerdote Giácomo Cusmano era

transbordante de caridade; que São Vicente de Paulo transfundira nele todo o seu

espírito”; chama-o “sacerdote angélico, anjo de carne que a Providência e a Caridade de

Jesus Cristo tornou sensível”; lembra “o seu aspecto angélico e modesto, os seus modos

dulcíssimos, a sua profunda humildade”. E acrescenta: “Ouvi-lo falar era uma delícia,

queria dilatar seu coração ao infinito para abraçar e erguer as misérias do mundo inteiro:

suas palavras eram fogo capaz de incendiar de caridade todos os corações”.

Monsenhor Carini, querendo também ele consolar os filhos do Pe. Giácomo,

logo após sua morte, dirigia-lhes, aos 19 de março de 1888 uma longa carta na qual

chama o Servo de Deus de “A mais fúlgida estrela da Igreja de Palermo”; afirma que

“sem ele a Sicília não figuraria em quase nenhuma história que, entre todas as histórias

é certamente a mais bonita; que ao invés é por ele (sem ofender a ninguém, o melhor

padre que viveu na Sicília neste século) e principalmente por ele que a nossa Ilha

ocupará páginas dignas na história admirável da caridade”. E acrescenta: “Sua magra e

pálida figura, com o olhar ardente e suave refletia muito bem aquele espírito de caridade

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que difundia-se nele como o mar sem tréguas! Parecia-me quase que o fogo da sua

caridade me queimava e, não obstante a doçura inefável do sorriso, a pureza do Pe.

Giácomo dava um senso de temor à minha miséria. Querendo imaginar-me a santidade

vivente, sempre ma representei sobre a figura do Pe. Giácomo. Se um dia, como espero,

a Igreja levar em consideração as virtudes em grau heróico do Servo de Deus, valha esta

minha carta como documento que o Pe. Cusmano é proclamado sacerdote santo não

somente pelo entusiasmo de todo um povo, mas também por um que de longe escreve

perto do sepulcro dos santos apóstolos”. Há alguns anos, apresentado ao Eminentíssimo

Cardeal Parocchi o Pe. Giácomo, disse-lhe (sem que o humilíssimo padre ouvisse):

“Eminência, eis a mais bela pedra preciosa do clero da Sicília”. E como tal o acolheu o

Vigário de sua Santidade.

No “Jornal da Sicília” 1 (testemunha de certeza insuspeitável) assim lia-se logo

após a morte do Pe. Cusmano: “O homem que há pouco desceu no sepulcro,

acompanhado à triste morada da qual não se volta pelo unânime lamento de uma cidade

inteira que ele tanto amou e beneficiou, pertence à classe privilegiada daqueles seres

que dedicaram totalmente sua vida à realização de um altíssimo ideal. Sacerdote

daquele Cristo cujo nome é símbolo santo de caridade e de amor e que a maioria não

entende ou não compreende de jeito nenhum, Giácomo Cusmano teve da sua missão um

conceito exato, elevado. Ele, em meio à vulgaridade que prevalece, pareceu homem de

outros tempos, de uma época infelizmente tão distante da nossa e, repensando à obra por

ele realizada experimenta-se uma interna complacência, uma viva satisfação em

constatar que ainda existem homens verdadeiramente bons e não hipocritamente pios, os

quais entrevêem convictos seus apostolados santos em prol da humanidade com o

coração cheio de fé e como mais puro e religioso dos ideais”. E após ter traçado a vida

acrescenta: “Esta, sumariamente, é a vida do homem que desapareceu, ao redor do qual

vinha se formando uma piedosa e popular lenda. Diante de seu cadáver é piedoso

inclinar-se reverentes, porque a nós, nascidos neste período tão estéril, tão cético, tão

pequeno em cada manifestação sua, a nós que demolimos todos os ideais, que banimos

os entusiasmos, que renunciamos a fé, faz bem de vez em quando relembrar a doce

figura de um homem que muito amou e muito acreditou”.

O professor Ragusa Moleti, que não obstante seus princípios adversos à Igreja

tinha uma grande veneração pelo Pe. Giácomo, em um artigo publicado no jornal

“L’Ora” (ano 2.º, N.º 17), a propósito do Orfanato Masculino do Bocado do Pobre,

homenageia a virtude do Servo de Deus e o faz com palavras de sincera admiração:

“Orfanato dos Servos dos Pobres, se não souberem vo-lo direi, surge na esquina

daquela avenida que da Rua Calatafimi conduz até o Convento dos Capuchinhos. Mas

aquele prédio não foi sua primeira sede; seus primórdios foram humildes, muito

humildes. Quem primeiro teve a idéia de funda-lo foi o Pe. Giácomo Cusmano.

A este santo nome, as palavras que saem da caneta queriam reunir-se por si em

verso sobre a branca página que este diante de mim. E isto é natural: toda a vida daquele

santo homem foi tão boa e contínua poesia de amor para com os outros que um pouco

dela, é impossível, que não entre também em nós e não faça vibrar a nossa alma todas as

vezes que pronunciamos, mesmo que somente com os lábios, o nome daquele anjo. E é

uma fadiga para mim tentar desagregar à força estas palavras, que queriam unir-se em

gentis melodias de um hino, para constrange-las ao invés, nos desarmônicos períodos da

fria prosa de um jornal. Não se escandalizem então por todo este entusiasmo no qual eu

me inflamo ao relembrar um homem que vestia a batina preta. Tenham grandes almas,

1 Ano 1888, n. 79.

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amigos leitores; tão grandes que possam encontrar lugar também à cara imagem de um

santo sacerdote”.

Estes breves traços da vida do Pe. Giácomo são certamente mais que suficientes

para demonstrar também por meio destes testemunhos, a fama de santidade juntamente

à alta estima e veneração que de todos, indistintamente, gozava o Servo de Deus. Isto

explica o porque, após um mês da sua morte, por iniciativa popular, puderam-se

celebrar na majestosa igreja de Casa Professa soleníssimos funerais, aos quais, além de

um imenso povo que se comprimia e se calcava, mantendo mesmo assim um

comportamento pio, grava, verdadeiramente religioso, participavam todas as

personalidades mais importantes da aristocracia palermitana, e também o Prefeito da

cidade com o Conselho Comunal e todas as outras autoridades. Isso explica ainda hoje

porque esta veneração não tenha diminuído mas, pelo contrário, parece aumentar com o

passar dos anos.

A prova disto este no fato de que após ter passado 25 anos da sua morte, a

Prefeitura de Palermo, fazendo-se intérprete do comum desejo da cidadania de ver

honrados de modo especial os restos mortais do Servo de Deus, apresentava um pedido

à autoridade competente “para que o corpo do Pe. Cusmano fosse transportado para o

lugar que é testemunho contínuo da obra de caridade por ele criada, isto é, o Orfanato

Feminino de Terre Rosse”.

Este pedido foi acolhido pelo Ministro das Relações Interiores o qual por sua

parte, segundo a praxe, defenderia para o Conselho Provincial de Saúde a decisiva

deliberação. Este se reuniu aos 08 de abril de 1914 e pronunciava a seguinte

deliberação:

O CONSELHO

“considerando que nenhuma razão higiênica se opõe para o acolhimento do

pedido apresentado, dispõe que seja prontamente autorizada a solicitada transladação

dos restos do Pe. Giácomo Cusmano como testemunho da gratidão dos pósteros pela

admirável obra de caridade por ele realizada, e que o coloca fora e acima de qualquer

competição de partes e como estímulo para os cidadãos que na caridade devem

reconhecer a única força com a qual se vence o impenetrável egoísmo.

DELIBERA

acolher favoravelmente este pedido”.

Após esta deliberação do Conselho Provincial de Saúde, o Presidente da

Província de Palermo decretava a autorização para a desejada transladação.

Obtida esta, não estando ainda pronta no Orfanato Feminino a capela que devia

acolher os restos mortais do Servo de Deus, decidiu-se executar a exumação e deixa-los

no momento, nas catacumbas dos Capuchinhos para serem depois transportados

solenemente a Terre Rosse.

Esta exumação foi realizada aos 29 de abril daquele mesmo ano à presença do

Cardeal Lualdi que tanto amava a Obra do Pe. Giácomo e que crescia sempre mais na

veneração do Servo de Deus na medida em que ia conhecendo e apreciando seus

méritos singulares.

Aqueles amados despojos, em meio à comoção geral de um grande número de

Irmãs, Irmãos e Padres Servos dos Pobres e, de muitos admiradores do Servo de Deus,

foram colocados em novo caixão, lacrado pelo próprio Cardeal Lualdi e transportados

privadamente até os Capuchinhos. Os Padres e os Irmãos Servos dos Pobres

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carregando-o sobre suas costas colocaram-no nas catacumbas de onde, dentre em breve,

em meio ao entusiasmo e à veneração de todo um povo que nunca esqueceu e nem

poderá esquecer o doce Pai dos pobres e dos órfãos, irão descansar em meio às suas

amadas Filhas, na espera daquele dia tão desejado no qual, como esperamos, seja a eles

decretado pela autoridade da Santa Mãe Igreja, aquele glorioso culto que somente aos

Santos compete.

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ÍNDICE

Ao Leitor

Capítulo I: Nascimento – Adolescência – Estudo do Pe. Cusmano

Capítulo II: Abraça o estado Eclesiástico – Começa a pensar numa instituição religiosa

a serviço dos Pobres

Capítulo III: Como lhe nasce a idéia do “Bocado do Pobre” – Provações às quais o

Senhor o submeteu – consegue fundar sua Obra

Capítulo IV: Novas provas às quais é submetido – Fica sozinho em sustentar a Obra

por ele fundada – Renuncia ser pároco de Santo Hipólito – É nomeado

membro do Conselho de Administração do Depósito de Mendicância –

Renuncia ao Canonicato da Catedral de Palermo – Monsenhor Turano o

conduz consigo a Agrigento – Passa as orfãzinhas para o Convento de São

Marcos

Capítulo V: Quer confiar as orfãzinhas a vários Institutos religiosos – Confortado por

um sonho misterioso, dá o hábito às primeiras Irmãs Servas dos Pobres

Capítulo VI: Conseguida do Prefeito de Palermo a Quinta Casa a beira mar, funda o

primeiro Asilo de Pobres incapazes de trabalhar – sofre uma cirurgia – Suas

relações com o Barão Turrisi

Capítulo VII: Funda uma Casa de Misericórdia em Agrigento

Capítulo VIII: Funda um Orfanato Feminino em Terre Rosse – Abre uma Casa para as

Órfãs, Pobres e Doentes em Valguarnera Caropepe, uma outra par Órfãs em

Monreale e outra para Velhos e orfãzinhas em São Cataldo

Capítulo IX: Assiste as orfãzinhas de Terre Rosse durante a epidemia de cólera –

Funda a Colônia Agrícola de São José Jato

Capítulo X: Funda um Asilo Canicattí – Abre em São Marcos a Casa dos Missionários

Servos dos Pobres

Capítulo XI: Reúne as nobres Damas de Palermo num Comitê permanente de

beneficência – Sua última doença – Sua morte

Capítulo XII: Virtudes do Pe. Giácomo – Sua fama de santidade – Solenes funerais –

Exumação de seus restos mortais

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Nihil obstat

Can. Nicolaus Crisafi

Panormi, XXII Septembris 1914

Imprimatur

╋ Gaspar Episcopus Vic. Gen.

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DECRETO SOBRE A HEROICIDADE DAS VIRTUDES

Quesito

Resulta, ao fim da dita causa, que ele havia exercitado em grau heróico as virtudes

teologais da Fé, Esperança e Caridade para com Deus e para com o próximo, nonche

as virtudes cardeais Prudência, Justiça, temperança, Fortaleza e as outras a essas

conexas?

“Libertará o pobre que grita e o mísero que não encontra ajuda, terá pena do

débil e do pobre a salvará a vida dos seu míseros” (Salmo 71, 12-14).

Estas palavras do autor dos Salmos que se referem ao Messias que deve vir, se

adaptam muito bem ao Servo de Deus Giácomo Cusmano, sacerdote palermitano. Ele

de fato,