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EM A ç ã O Religião e Desenvolvimento A felicidade e o orgulho de uma nação consistem em brilhar como o sol no elevado céu do conhecimento. 'Abdu'1-Bahá

Fé em ação religião e desenvolvimento

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FÉ EM A ç ã O

Religião e Desenvolvimento

A felicidade e o orgulho de uma nação consistem em brilhar como o sol no elevado céu do conhecimento.

'Abdu'1-Bahá

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Fé em Ação Religião e Desenvolvimento

Assembléia Espiritual Nacional dos Bahá ís do Brasil

Escritório Bahá'í de Meio Ambiente e Desenvolvimento Brasília, Abril/96

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Publicação da

Assembléia Espiritual Nacional dos Bahá'ís do Brasil

2a edição - Abril de 1996

Escritório Bahá'í de Meio Ambiente e Desenvolvimento Caixa Postal 7035 71619-970 Brasília, DF

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SUMARIO

Apresentação 4

Desenvolvimento Sócio-Econômico Bahá' í 5

O Discurso Bahá' í de Desenvolvimento 14

Aprendizagem como Base para o Desenvolvimento 17

Os Objetivos do Desenvolvimento 20

Conhecimento e Prosperidade 23

Religião e Desenvolvimento - Visão da História 25

O Convênio e o Processo de Desenvolvimento 30

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APRESENTAÇÃO

A meta de capacitação de recursos humanos do Plano de Três Anos da Assembléia Espiritual Nacional dos Bahá'ís do Brasil, tem como objetivo final tornar os bahá'ís cada vez mais conscientes da elevada posição e sublimes virtudes a eles conferidas pelo seu Criador.

Para apoiar as iniciativas em prol desta capacitação em tor­no do desenvolvimento sócio-econômico, que é tão somente uma extensão dos esforços de expansão e consolidação da Fé e visando aumentar a literatura em português a cerca visão bahá'í na questão do Desenvolvimento Sócio-Econômico, a sua Assembléia Espiritual Nacional decidiu publicar, em caráter especial, a série "Fé em Ação". Religião e Desenvolvimento, é o segundo número da sé­rie. A forma como foram arranjados os textos, inclusive os desta­ques dados, permitirão que os amigos individualmente ou em grupo sistematizem e aprofundem os diversos subtemas apresentados neste estudo.

O propósito é subsidiar e orientar, a nível individual e coleti­vo, as iniciativas da comunidade bahá'í para o desenvolvimento sócio-econômico.

O Departamento de Desenvolvimento Sócio Econômico Bahá 7

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Desenvolvimento Sócio-Econômico Baháí tradução de Roll von Czékus

PERSPECTIVAS PARA O FUTURO 16 de setembro de 1993

Excertos de uma declaração aprovada pela Casa Universal de Justiça

a ser usada para orientar e guiar o trabalho de desenvolvimento sócio-econômico através do mundo

Em sua mensagem de 20 de outubro de 1983, dirigida ao mundo bahá'í, a Casa Universal de Justiça solicitou a incorporação dos processos de desenvolvimento sócio-econômico nas atividades regulares da comunidade do Maior Nome. Durante os últimos dez anos muitas comunidades responderam a este chamado e um nú­mero considerável de projetos — principalmente de educação, mais diversos também em saúde, agricultura e desenvolvimento comuni­tário — estão agora sendo ativamente implementados. Alguns des­tes projetos alcançaram a envergadura de organizações de desen­volvimento, com estruturas prográmaticas razoalvelmente comple­xas e significativas esferas de influência. No entanto, além dos su­cessos desta coleção de projetos e organizações, o resultado mais precioso dos esforços devotados dos fiéis neste campo, tem sido o conhecimento acumulado de como operacionaüzar uma abordagem distintivamente bahá'í no desenvolvimento sócio-econômico. A mensagem de outubro de 1983 especificava alguns dos elementos mais dignos de nota desta abordagem, entre os quais encontram-se os seguintes: • A unicidade da humanidade, que é ao mesmo tempo o princípio

operacional e a meta final da Revelação de Bahá'u'lláh, implica

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na realização de uma coesão dinâmica entre as necessidades es­pirituais e práticas da vida na terra.

• O desafio de ocupar-se em desenvolvimento sócio-econômico evoca a engenhosidade, flexibilidade e coesão das muitas co­munidades que compõem o mundo bahá'í.

• Os primeiros passos a serem dados devem, necessariamente, ter seu início na própria comunidade bahá'í, com o esforço dos amigos em se soerguerem — através de sua aplicação dos prin­cípios espirituais, sua retidão de conduta e a prática da arte da consulta — e assim se tornarem auto-sufucientes e auto-confiantes.

• O progresso no campo do desenvolvimento dependerá, em grande parte, das manifestações naturais originárias do povo e deveria receber sua força impulsora daquelas mesmas origens em lugar de ser através de uma imposição de planos e programas vindos de cima.

• Todos, independentemente de suas circunstâncias ou íecursos, estão dotados com a capacidade de responder, de alguma for­ma, a este desafio, pois todos podem participar no empreendi­mento conjunto de aplicar mais sistematicamente os princípios da Fé na elevação da qualidade da vida humana.

• As atividades no campo do desenvolvimento deveriam ser vistas como um reforço do trabalho de ensino, como uma maior mani­festação de fé em ação.

• O envolvimento sincero dos amigos nestas atividades assegurará uma consolidação mais profunda da comunidade em todos os níveis.

• A chave para o sucesso é a unidade em espirito e em ação. A experiência alcançada durante os últimos dez anos é agora

suficientemente ampla para permitir que a comunidade bahá'í ex-

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panda sistematicamente, durante os anos por vir, o número e o campo de suas atividades de desenvolvimento sócio-econômico.

Neste contexto, diversas idéias merecem cuidadosa conside­ração:

Graus de Complexidade

Em geral, é melhor que os projetos sócio-econômicos, com origem no povo, se iniciem com uma série de ações relativamente simples.

Deve-se permitir que os amigos adquiram experiência e ampliem o campo de suas atividades de forma natural, sem pres­sões indevidas de opiniões que muitas vezes são somente baseadas em considerações teóricas.Teoricamente, por exemplo, uma escola tutelar pode tornar-se um centro de atividades tais como educação em saúde, aconselhamento familiar e reflorestamento; na maioria dos casos, no entanto, é aconselhável que comece simplesmente com uma escola que concentra todos os seus recursos nas crianças às quais se propõe servir.

Insistência na simplicidade inicial de ação a nível local não contradiz, naturalmente, a inerente complexidade do próprio pro­cesso de desenvolvimento. De fato para elevar a ação local a um nível razoável de eficácia, é necessário desenvolver gradualmente estruturas correspondentes na micro região e na própria nação, ca­pazes de lidar com graus crescentes de complexidade teórica e ad­ministrativa. Do contrário, o desenvolvimento sócio-econômico cor­re o risco de ser reduzido a uma série de atividades de ações louvá­veis, desprovidas de coerência e integração, que são indispensáveis para um progresso consistente.

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Desenvolvendo capacidades

Tem sido dito muitas vezes que desenvolvimento não é um produto a ser entregue pelos desenvolvidos aos sub-desenvolvidos. Pelo contrário, é um processo cujos principais protagonistas têm que ser o povo.

A maior preocupação dos projetos bahá'ís tem que ser o de­senvolvimento da capacidade dos amigos para tomarem decisões a respeito de seu progresso espiritual e material e, em seguida, im­plementá-las.

Num projeto ideal, enquanto a ação concreta está envolvida em direção à melhoria visível de certos aspectos da vida, o sucesso é medido pelo impacto que estas ações têm sobre a capacidade da comunidade e de suas instituições em tratar de questões de desen­volvimento a níveis cada vez maiores de complexidade e eficácia.

Neste contexto, o relacionamento entre desenvolvimento e prestação de serviços necessita ser examinado.

Para os bahá'ís, serviço é, naturalmente, um princípio básico da existência humana; todo ato, todo projeto pessoal ou comunitá­rio, deve ser realizado em espírito de serviço. Ainda assim, a presta­ção de serviço não deveria ser vista como o principal propósito dos empreendimentos bahá'ís de desenvolvimento.

Métodos de desenvolvimento centrados em doação de bens e serviços, tão característicos da tradicional caridade religiosa e dos programas governamentais para o bem-estar, são conhecidos como tendo efeitos debiütadores e muitas vezes levam à paralisia.

Nas aldeias do mundo, a comunidade bahá'í deve tornar-se a ponta de lança da transformação espiritual, social e econômica. Uma aldeia não desenvolve meramente porque recebe serviços simples de saúde e saneamento básico, de educação primária ou de extensão agrícola estruturada ao redor de pacotes de crédito e tec­nologia.

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Aprendizado

É fundamental para a capacidade da comunidade bahá'í de levar avante um processo de transformação, a habilidade de seus membros e instituições de aplicar a Revelação de Bahá'u'lláh aos diversos aspectos da vida e, assim, estabelecer padrões consistentes de mudança.

De fato, aprender a aplicar os ensinamentos para alcançar progresso, poderia ser considerado como a real definição de desen­volvimento sócio-econômico bahá'í.

Tal aprendizado tem que ocorrer localmente, nacionalmente e internacionalmente e vir a se tornar o eixo ao redor do qual nos­sos esforços de desenvolvimento, em todos os níveis, são organiza­dos.

Aprender, neste sentido, não se limita ao estudo e avaliação, ocorre em combinação com a ação.

Os crentes devem regularmente se empenhar na consulta, ação e reflexão — todas estas à luz da orientação inerente aos ensi­namentos da Fé.

Um tal processo de aprendizado pode ocorrer de um modo muito simples a nível local e de aldeia, mas com maior sofisticação a nível de entidades nacionais e instituições. No nível internacional, demanda um grau-mais elevado de conceituação, um grau que leva em conta os processos mais amplos de transformação global, como descrito nas Escrituras, e que serve para ajustar, conseqüentemente, a direção global das atividades de desenvolvimento em cada país.

Desenvolvimento de recursos humanos

O aprendizado e o desenvolvimento de capacidade são inti­mamente associados ao desenvolvimento de recursos humanos.

Que idéias e projetos de desenvolvimento não são impostos de cima e que as instituições devem responder às aspirações e ini­ciativas do povo, são características já estabelecidas do desenvolvi­mento bahá'í.

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A vigilante aplicação destes princípios, no entanto, não im­plica que não se possa tomar qualquer iniciativa vinda de cima.

Programas e abordagens de desenvolvimento, comprovados e bem concebidos, podem ser promovidos nacionalmente e inter­nacionalmente, principalmente através de treinamento.

Os métodos de treinamento teriam que promover, natural­mente, a participação e ser realizados com uma atitude de humil­dade com relação ao aprendizado. Do contrário, o treinamento tende a produzir um quadro de indivíduos que são escravos de uma determinada forma de fazer as coisas.

Além disso, a necessidade de desenvolvimento de recursos humanos não está limitada aos participantes diretos dos projetos propriamente ditos.

Milhares de jovens bahá'ís em colégios e universidades atra­vés do mundo, assim como um crescente número de profissionais trabalhando em campos relacionados ao desenvolvimento sócio-econômico, deveriam ser encorajados a participar em processos de aprendizado de âmbito mundial elaborados para crescer em tama­nho e alcance.

Na verdade os projetos bahá'ís de desenvolvimento podem ser visualizados como locais onde se prove treinamento para um crescente número de indivíduos, tanto de nações materialmente pobres como ricas, e de diversos setores da sociedade.

Influenciando a sociedade

Sem levar em consideração se um indivíduo que usufruiu de um período de colaboração, em um projeto de desenvolvimento se torna diretamente envolvido em tais projetos ou não, a habilidade de aplicar os ensinamentos de Bahá'u'lláh aos assuntos da socieda­de aprendida em ação — constitui uma vantagem preciosa nos seus futuros esforços para servir e influenciar a sociedade

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Os próprios projetos de desenvolvimento oferecem grandes oportunidades aos amigos para que se envolvam na vida da socie­dade de uma forma que transcende em muito os esforços para me­lhorar a situação de umas poucas pessoas.

A abertura para colaboração com pessoas de capacidade e líderes de pensamento preocupados com questões de progresso, e a disposição e habilidades de convidá-los a participar na aplicação dos ensinamentos a problemas específicos, têm que ser criados em todos os níveis, se é que desejamos explorar plenamente esta di­mensão de nossos esforços de desenvolvimento.

Integração

Certas lições que foram aprendidas na grande sociedade precisam ser incorporadas no pensamento bahá'í a respeito de des­envolvimento sócio-econômico. Preeminente entre estes está a ne­cessidade de integração.

A experiência demonstrou que atividades fragmentadas em diversos campos tais como saúde, educação, agricultura ou desen-volviemento industrial, não levam a um desenvolvimento sistemáti­co.

O conhecimento que deve ser aplicado aos problemas de desenvolvimento das comunidades do mundo não corresponde a uma única disciplina.

Desenvolvimento efetivo exige, inequivocamente, uma ação coordenada inter-disciplinar e multi-setorial.

Pode parecer que a idéia de desenvolvimento integral con­tradiz o princípio enunciado em cima, ou seja, que a ação se orgina no povo e deve começar simples e de uma forma que possa ser manejada pela própria comunidade. No entanto esta aparente contradição deixa de existir se a ação local é vista como um meio para desenvolver capacidade. Neste caso não tem importância com qual atividade o desenvolvimento da comunidade se inicia de fato; a complexidade surgirá naturalmente de uma forma orgânica.

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O que se deve evitar é a fragmentação artificial criada por programas separados postos em andamento em determinada popu­lação por profissionais em disciplinas específicas, cada um ignoran­do o conhecimento e a experiência dos outros grupos, cada um competindo por recursos e pela constante atenção a quem deve servir.

Os programas bahá'ís de integração apresentam um desafio adicional. Dentro do contexto bahá'í o progresso material não pode ser separado do desenvolvimento espiritual.

"Os esforços de desenvolvimento sócio-econômico têm de ser executados dentro do contexto mais amplo de expansão e con­solidação da Fé".

Quando isso não ocorre, quando as diversas instituições que servem a comunidade local não estão bem conscientes dos esforços umas das outras e não consultam a respeito da natureza e do âmbi­to de suas atividades, os projetos de desenvolvimento tornam-se di­fíceis de serem manejados. Divorciado dos processos básicos de ex­pansão e consolidação da Fé, o desenvolvimento sócio-econômico não pode prosperar, está destinado ao fracasso.

Em nosso zelo por levar avante o desenvolvimento sócio-econômico no contexto de expansão e consolidação, devemos evi­tar um perigo latente que leva à dissipação de energia e à confusão: impressionados com a interligação de todos os fatores que levam ao desenvolvimento comunitário, podemos ser tentados a definir o desenvolvimento sócio-econômico como um sinônimo do desen­volvimento da comunidade bahá'í.

De acordo com tal definição, todos os esforços para desen­volver a comunidade, incluindo o estabelecimento da Festa de 19 Dias, a realização de aulas para educação espiritual das crianças, e o fortalecimento das Assembléias Locais e Nacional e seus órgãos subsdiários, teriam que ser considerados projetos de desenvolvi-

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mento sócio-econômico. Uma tão ampla definição deixa de levar em consideração o fato de que o crescimento da comunidade baháí é o resultado de diversos processos interligados, cada um di­rigido por várias instituições da Ordem Administrativa e seus órgãos subsidiários em colaboração mútua.

O desenvolvimento sócio-econômico é tão somente um componente e deve desempenhar um papel específico no processo de crescimento.

n

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O Discurso Bahá'í de Desenvolvimento

Um discurso de desenvolvimento centrado em temas de aprendizagem sobre a ciência e a tecnologia, e profundamente en­volvido em deliberações acerca do seu propósito e as capacidades morais que impulsionariam um processo de modernização, sem dúvida, contribuirá fortemente ao florescimento de movimentos so­ciais nos quais os setores populares possam trabalhar na construção de uma nova sociedade. Porém, ainda assim, resta-nos saber se este aspecto é suficiente para gerar as forças de que necessitam os povos para idealizar seu próprio destino, como também, pôr em marcha processos que contribuam ao desenvolvimento de uma civi­lização mundial.1

Segundo o Dr. Farzam Arbab, a resposta a esta pergunta é negativa e é essencial situar o discurso dentro de um conceito espiri­tual. "Somente quando se articulam os discursos sobre a ciência e a religião como forças necessárias à tranformação social, sem que um invada o domínio do outro, a força do conhecimento orienta a di­reção da mudança que se faz necessária."

"A religião sem a ciência leva tão somente à superstição, e a ciência sem a religião torna-se um instrumento de brutal materialis-mo."

O paradigma bahá'í de desenvolvimento afirma que a espiritualidade tem um papel central no desenvolvi­mento: a visão de como criar o bem-estar da huma­nidade mediante a palavra revelada por Deus. Assim os seres humanos, através da sua relação com o Cri­ador, desenvolvem capacidades para levar avante ações eficazes. Bahá'u'lláh afirma que "o propósito

1 [a Senda dei Aprendizaje em Latinoamérica Opción Moral, por Farzam Arbab

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pelo qual os homens têm chegado do nada absoluto é para que trabalhem pela melhora do mundo e vivam juntos e em harmonia."2

Os bahá'ís vêem o seu compromisso com as atividades de desenvolvimento como o cumprimento desta obrigação espiritual de servir à humanidade.

Mais importante que os resultados imediatos de qualquer esforço concreto de desenvolvimento é aumentar a unidade entre as pessoas, desenvolver a habilidade de ouvir as vozes da comuni­dade e iniciar um processo de ação participativa.

Atividades de desenvolvimento bahá'í devem expressar a prática dos princípios centrais da Fé Bahá'í, cujo discurso focaliza principalmente aspectos tais como: a aspiração de que estas ativi­dades contribuam à reabilitação da sociedade humana e elimine os extremos de pobreza e riqueza; a crença de que o desejo de servir aos outros é a motivação mais sustentável para a participação em atividades de desenvolvimento; e a convicção de que altos estan­dartes de moralidade podem e devem ser cultivados individualmen­te por cada pessoa.3

Há uma ciência nova!

Definições "mais acertadas da ciência" já admitem a influên­cia das crenças, da cultura e da ideologia na construção do corpo do conhecimento científico. Cientes disso, deveríamos então re­examinar que crenças são essas e procurar melhor compreender seus aspectos transcedentais

2 La Honradez: una Virtude Cardinal Baháí. p 13 3 Una vista General Del Desarrolo Social Y Econômico Baháí. por Holly E Hanson, p 2

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Existe uma luz que ilumina a inteligência

Se a natureza somente é capaz de dar respostas às perguntas formuladas dentro de paradigmas elaborados em processos com­plexos do pensamento individual e coletivo, então, que luz poderia iluminar a inteligência do homem para que ele faça as perguntas apropriadas, para que não se percam de vista as conexões que existem entre as diversas realidades, e para que não descubram somente os elementos isolados da ciência que, em sua forma mais fragmentada, somente conduz à destruição do mundo físico e soci­al, e enche o interior do ser humano de confusão e finalmente de­sesperança?

Reflexão

1. Sendo tão óbvio que o homem pode utilizar a ciência para o bem ou para o mal, para criar ou para destruir, como se pode esperar que a guia para o uso do conhecimento provenha dessa mesma ciência?

2. Não será necessário deixar de lado esse positivismo absurdo que ao mesmo tempo em que nos abriu as portas de uma ciência po­derosa, nos cobriu de horrores que nos levou as piores crises da história da raça humana?

3. Como o Convênio de Bahá'u'lláh influencia o processo de de­senvolvimento?

4 Pode o homem contentar-se com pouco para deixar uma porção para os pobres e desamparados?

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Aprendizagem como base

para o desenvolvimento

Inteligência e sabedoria

Louvores e ação de graças sejam dadas a Suma Pro­vidência, que de todas as realidades da existência, es­colheu a realidade do homem e a honrou com inte­lecto e sabedoria, as duas lâmpadas mais luminosas de ambos mundos.1

Com estas palavras 'Abdu'1-Bahá revela à humanidade a graça de Deus ao homem na época atual.

Se observarmos objetivamente o mundo do Ser, fica­rá evidente que de idade em idade, o templo da existência é embelezado continuamente com uma nova graça caracterizada por um esplendor sempre variado, conseqüência da sabedoria e do poder do pensamento.2

Estes dons têm precedência sobre todas as coisas criadas é o emblema de Deus. "Antes que tudo mais, Deus criou a mente."

O vós que tendes mente para entender! Erguei vossas mãos suplicantes para o céu do Deus único, e sedes humildes e submissos ante Ele e agradece-lhe por este supremo dom e importante, e implorá-lhe que nos

1 Abdu'1 Baha. El Secreto de La Civilización Divina 2 Idem

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socorra dentro da presente época, que os impulsos divinos possam ser irradiados da consciência da hu­manidade e este fogo divinamente aceso que foi con­fiado ao coração humano, jamais seja extinguido.3

Por este motivo, 'O Exemplo mais Perfeito' sentencia nestas palavras: "Reflexionai cuidadosamente: todos estes fenômenos tão diferentes, estes conceitos, este conhecimento, estes procedimentos técnicos e sistemas filosóficos, estas ciências, artes, industrias e in­venções, são todas emanações da mente humana".4

O dom do intelecto como afirma 'Abdu'1-Bahá, "deverá ser causa de paz e da evolução da civilização. Qualquer povo que se haja aventurado mais profundamente neste mar sem limites, terá superado aos demais. A felicidade e o orgulho de uma nação con­sistem em brilhar como o sol no céu do conhecimento. (...) E a dis­tinção e a honra do indivíduo, consiste em que entre todas as pes­soas do mundo, chegue a ser uma fonte de bem social."5

No Kitáb-i Iqán Bahá'u'lláh nos diz que "não há opressão maior que a de uma alma que busca a verdade e deseja alcançar o conhecimento de Deus e não saiba a quem dirigir-se e de quem obtê-lo". Na atualidade muitos povos do mundo vivem em condi­ções de opressão porque grande parte deles estão alijados do ver­dadeiro conhecimento.

Este significado de opressão muda não somente nossa defi­nição com respeito a quem são os oprimidos deste mundo, como também nos dá muita luz sobre o significado do bem-estar, o estado mais desejado de todos os povos.

Visto dessa maneira a opressão pode ser definida como a in­capacidade de alcançar o conhecimento de Deus, pois o conheci­mento de Deus permite o conhecimento de todas as outras coisas criadas, portanto a busca do conhecimento, a participação na sua

:i Idem ao de número 1 pág-19 4 Idem ao de número 1 pág 19 5 Idem ao de número 1 pág 19

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produção e por conseqüência a sua apropriação devida, resultariam em liberação e emancipação.

"Equiparar a opressão com o alijamento do conhecimento, um estado que em seu extremo não é mas que o distanciamento da essência e da causa de todo conhecimento, Deus, e entender a emancipação e a liberação em termos da aquisição do verdadeiro saber, nos ajudará a fixar melhor os objetivos do que hoje em dia se conhece como desenvolvimento. "

Reflexão

1. De que poderia se orgulhar uma nação?

2. Em que consiste a distinção e a honra para um indivíduo?

3. Como seria possível o estabelecimento de uma Nova Ordem Mundial sem o conhecimento de Deus?

4. A luz dos ensinamentos de Bahá'u'lláh, de que maneira deve-se utilizar o dom do intelecto?

i')

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Os objetivos do desenvolvimento1

Por Haleh Arbab

"Os objetivos do desenvolvimento são levar bem-estar e feli­cidade aos povos do mundo. Enquanto estes objetivos são contrá­rios à opressão por outro lado se harmonizam com a liberação. Este conhecimento opõe-se ao entendimento convencional do desen­volvimento como crescimento econômico unicamente, ou como progresso tecnológico."

Qualquer processo de desenvolvimento cujo propósito seja a emancipação e liberação dos povos, obviamente tem que começar com o desenvolvimento da nossa capacidade de alcançar todo tipo de conhecimento, tanto o espiriual como o material.

Sem dúvida, é este contato com conhecimento divino e hu­mano que finalmente contribui ao bem estar, a liberação, o desen­volvimento e progresso dos povos.

Busca de conhecimento

Esta busca de conhecimento, este processo de geração e aplicação de conhecimento no qual devem participar particulamen-te aquelas populações à margem da ciência e tecnologia modernas, pode expressar-se melhor como um processo de investigação, ação e aprendizagem.

Investigação — seu propósito é explorar e gerar conheci­mento;

Ação - - porque o conhecimento é gerado da própria reali­dade dos indivíduos onde é possível ver as tranformações na vida diária dos sujeitos do desenvolvimento;

1 1 Seminário Hei Desorrolb Econômico Social Bahá'í Latinoamericano. Santa Cruz Bolivia, 1993

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Aprendizagem - porque seu valor como ciência e sua utilida­de dependem da sistematização de seus resultados em um corpo de conhecimento ao qual podemos nos referir como "o aprendido"

Uma vez sistematizado, este saber estará pronto para ser comprovado outra vez por meio da ação...

Ação e reflexão

No caso de projetos concretos de desenvolvimento, este pro­cesso se relaciona com uma metodologia que consiste em um con­junto de atividades sucessivas e simultâneas descritas em termos de ação e reflexão, um processo que contém atividades conduzidas sob diversas situações de aprendizagem, seguidas de reflexão e análise.

Junto a isto tem todo um intercâmbio de experiência entre grupos e uma análise conjunta dos resultados à luz de outras expe­riências e teorias.

Por último, a sistematização dos resultados das experiências acumuladas para contribuir com a formação de um marco de refe­rencia dos distintos grupos de participantes.

Desde o início, estas atividades são iluminadas pelos ensi­namentos de Bahá'u'lláh, sobretudo os relacionados com a natureza do homem e a sociedade, o significado do progresso espiritual e material, os atributos da alma humana, o significado das forças da história e as leis espirituais que governam tanto o crescimento pes­soal como as relações entre os indivíduos e as intituições.

Evolução espiritual

Desde o começo da vida coletiva, povos de diferentes raças, tribos e nações ocuparam-se da aprendizagem, acumulando assim uma quantidade impressionante de conhecimentos sobre a maneira de interagir com o meio ambiente, de alcançar determinados graus de estabilidade e a abordar gradualmente a transformação. Alguns

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grupos aprenderam ainda a manejar os mais turbulentos transtor­nos do seu próprio ambiente físico e social e de como sair vitorioso nas situações mais críticas.

No entanto em assuntos como a harmonia, a unidade, a co­operação e a paz, a aprendizagem coletiva tem sido penosamente lenta podendo-se afirmar até que certos padrões de violência foram fortalecidos como resultado do progresso da civilização material.

O desafio, então, é superar as limitações impostas pela exis­tência material definidas pelas exigências da sobrevivência, desen­volver as qualidades de uma realidade superior e aprender a con­trolar os impulsos provenientes da condição animal.

Esta meta é ao mesmo tempo individual e intransferível, po­rém, é também uma ta.efa a ser realizada coletivamente por toda a raça humana, no seu processo evolutivo que depois de suas etapas físicas culminará em evolução espiritual.

Reflexão

1 Se estamos conscientes que o Conhecimento é a força que im­pulsiona o processo evolutivo, não será então necessário criar e recriar o saber das coisas que conduzem a degradação e das que levam à dignidade e à honra?

2. Dentro do atual sistema educativo teria o homem a possibilidade de descobrir em si mesmo além das suas necessidades e atributos materiais, qualidades como a nobreza, a liberdade e a unidade?

3. Sem crer na nobreza inerente à natureza humana poderá o ho­mem evoluir?

4. E possível levar avante a evolução da civilização quando reside no coração humano a crença que o homem é tremendamente egoísta e somente capaz de lutar por seus próprios interesses e trabalhar em prol de lutas que não sabe com certeza o quê final­mente alcançará?

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Conhecimento e prosperidade1

por Farzam Arbab

A prosperidade não tem um fim em si mesmo. A prosperida­de é um meio para alcançar aspirações mais elevadas.

A aspiração mais elevada, por sua vez, seria contribuir para que a civilização sempre avance, porém não por exigências exter­nas e sim pelo desejo de cumprir com os ideais da própria existên­cia.

Sobre a base deste saber tem-se que descobrir e acumular então os conhecimentos que conduzem a prosperidade.

A prosperidade será somente aceitável se cumprir com três condições paralelas. Terá que ser obtida como resultado de esforços honestos, ser gasta generosamente em prol de ideais que propiciem avanços intelectuais e espiriutais e não dar lugar a extremos de ri­queza e pobreza e sim, contribuir para o bem-estar da comunidade.

"Porém, falar de conhecimentos que conduzem à prosperi­dade não implica necessariamente um apego irracional a produtivi­dade material. De fato. não há nenhuma razão para que de todos os processos materiais, intelectuais e espirituais da vida humana se ressalte a produtividade como o básico, o que determina tudo o mais. O materialismo histórico faz isto explicitamente porém tam­bém o fazem as escolas de economia ocidentais ainda que não ne­guem a importância de outros processos, os relegam a planos se­cundários para seguir a discussão de suas fórmulas econômicas que oferecem como salvação da sociedade.

Esta crença em que só depois de 'encher o estômago' o ho­mem é capaz de pensar em aspirações mais elevadas é simplesmen­te errônea.

Talvez se possa defender no contexto de uma visão da his­tória que é a dos elementos mais agressivos da raça humana que

1 La Senda dei Aprendizaje em Latinoamérica Opción Moral, por Farzam Arbab.

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sempre a tem dominado, porém , não na visão de um estudo da história das massas sofridas da humanidade. Não se trata aqui de justificar a pobreza; os meios materiais são necessários e uma civili­zação que sempre avança implica no crescimento contínuo desses meios.

Simplesmente não se aceita que por ser necessário o produ­zir e reproduzir, a natureza humana esteja determinada pelas inte­rações com o meio meterial. Que seu comportamento esteja influ­enciado por estes processos é algo óbvio, porém, não são eles os determinantes finais da vida humana.

Reflexão

1. É a pobreza neste mundo a condição necessária para ganhar o mundo vindouro?

2. É a riqueza pessoal o reflexo da superioridade inata do homem e ainda um sinal da recompensa que se seguirá recebendo por toda a eternidade?

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Religião e Desenvolvimento1

Visão da História

Os seguidores das religiões sempre enfrentaram um dilema, ou um paradoxo. Por um lado, são orientados para serem des­prendidos das coisas materiais. Por outro lado, teriam algum tipo de dever de trabalhar pelo progresso, tanto material quanto espiritual, da civilização. Obviamente, a maioria não seria capaz de trabalhar, de livre e espontânea vontade, apenas para o enriquecimento alheio. Sendo teologicamente reprovado o enriquecimento próprio, a tendência seria de indiferença ou rejeição do enriquecimento em si, ou então de hipocrisia e exploração dos outros.

O asceticismo, que pende exageradamente para o lado anti-materialista da religião, tende a retardar o progresso material. Exemplos são o hinduismo tradicional na índia, o sufismo no Orien­te Médio e o monasticismo na Europa (ver Mirza Abu-Fadl, Bahá'í Proofs).

O vigor da civilização islâmica constituiu um desafio para a Europa da Idade Média. O pretenso desprezo cristão pelas coisas materiais começou a ceder lugar à inveja e cobiça direcionadas ao poderoso vizinho ao sul e ao leste. No entanto, o islã era sempre considerado inimigo do cristianismo, não podendo suas teses sob hipótese alguma serem incorporados oficialmente ao ideário cristão (embora tenham exercido uma influência considerável subrepticia-mente).

Da mesma forma, os judeus na Europa eram invejados e odiados, pelo seu suposto enriquecimento individual e sectário às custas da sociedade cristã.

Foi dentro do próprio cristianismo que surgiria uma ideolo­gia capaz de reconciliar a ambição materialista com a religiosidade.

1 Religião e Desenvolvimento, Robert K. Walker. maio de 1994.

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A Reforma Protestante, especialmente na versão calvinista que nas­ceu e predominou em Genebra, ofereceria uma "ética" capaz de justificar o enriquecimento pessoal através da exploração "racional" de recursos materiais e humanos para poder melhor competir em mercados "livres". Tal justificativa era implícita, não explícita, sendo desvendada séculos depois pelo grande sociólogo alemão, Max Weber (A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo).

Para João Calvino, a salvação era predestinada por Deus. Os "eleitos", predestinados para a salvação, recebiam as bênçãos divinas — inclusive bênçãos materiais. Portanto, a riqueza exterior era sinal de salvação. O cristão que desejava estar contado entre os eleitos teria que trabalhar para seu próprio enriquecimento, sob pena de desqualificação para a salvação aos olhos de seus pares, de si mesmo, e, supostamente, de Deus. Por outro lado, não pode­ria lançar mão abertamente de práticas prejudiciais à comunidade dos fiéis, sob pena de desqualificação por ser considerado um mal cristão. A solução seria o empreendimento capitalista.

Na virada do século quinze, o protestantismo batalhava para dominar países importantes do norte da Europa, tais como os esta­dos alemães, a Holanda e a Inglaterra. O capitalismo, nascente ideologia de grande vigor, seria a chave do seu sucesso naquelas regiões e posteriormente em remotas colônias na América do Norte, na África do Sul, na Austrália e na Nova Zelândia.

A Igreja Católica, acuada pela nova heresia, tinha dois im­portantes aliados: Espanha e Portugal, onde o protestantismo não havia lançado raízes. Em 1494, suas poderosas marinhas já domi­navam os sete mares. Nada mais lógico que dividir o mundo entre eles! O Tratado de Tordesilhas, patrocinado pelo Vaticano naquele ano, procurou fazer exatamente isso.

Nos países efetivamente sob domínio ibérico, a ordem era fechar as fronteiras a quaisquer influências estranhas, sejam estas na forma de invasores, idéias heréticas, novas tecnologias ou mes­mo mercadorias. Até a iniciativa individual era praticamente proibi­da no Brasil, sendo a atividade econômica efetivamente restrita à

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exploração de ouro e determinados recursos naturais, para envio à metrópole em troca de mercadorias acabadas.

Tamanha era a riqueza sob domínio das duas coroas (fundidas, durante um certo período, numa só) que as velhas práti­cas de conquista, saque, escravização e tirania eram adequadas para manter seu poder e preservar o monopólio da Santa Igreja so­bre vastas regiões da terra por algum tempo. No entanto, a ten­dência seria de progresso nos países sob domínio protestante e capitalista e estagnação ou retrocesso nos países sob domínio cató­lico e ibérico. A derrota da poderosa Armada Espanhola pelos in­gleses foi um golpe irreparável para aquela potência. Dentro de pouco tempo, seriam invertidas as posições. Primeiro os ingleses, e depois os norteamericanos, seriam os novos "opressores" dos po­bres países ibéricos.

O capitalismo, já liberado da estreita associação com o pro-testantismo e em boa parte cartelizado, traria grandes avanços eco­nômicos para uma minoria da população da terra. Vastas áreas "subdesenvolvidas" seriam convocadas para fornecer matéria prima e mão de obra baratas. Dentro dos próprios países capitalistas, ha­veria crescentes disparidades entre ricos e pobres.

Rebelando contra essa tendência histórica, novas ideologias rejeitariam a própria religião como "o ópio do povo". No entanto, as tentativas de criar em bases materialistas uma sociedade em que cada cidadão estaria disposto a sacrificar seus próprios interesses para o bem da coletividade estariam fadadas a fracassar. Pois não seria o sacrifício em prol do bem-estar dos outros a própria essência da espiritualidade?

Sem rumo na busca do desenvolvimento harmonioso e eqüitativo, o mundo volta às idéias "neo-liberais" de progresso para os vencedores. Embora estas correntes possam estar corretas na sua pregação do livre comércio dentro de um mundo economicamente unificado, a ausência de uma visão de um mundo política e espiri­tualmente unida impede uma solução que satisfizesse as mais altas aspirações da humanidade. Enquanto isso, os povos do mundo re-

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cebem doses maciças e intermináveis de propaganda pregando o mais crasso comercialismo.

Não estaria na hora de voltar a questionar as bases ideológi­cas e espirituais do desenvolvimento?

A Fé Bahá'í inverte a lógica da motivação pelo desenvolvi­mento. "Todos os homens foram criados para levarem avante uma civilização destinada a evoluir sempre" (Bahá'u'lláh), não para bus­car a própria salvação.

Adora tu a Deus de tal modo que, se tua adoração te levasse ao fogo, isso não te faria alterar tua adoração, e tão puco a alterarias se paraíso fosse a recompensa" (O Báb). O trabalho em serviço à humanidade é con­siderado adoração, e "Quando é oferecida a adora­ção verdadeira, quem adora é salvo do fogo e entra no paraíso do beneplácito de Deus, mas não deve ser este, entetanto, o motivo de seu ato

(OBab).

O desprendimento na Fé Bahá'í não é sinônimo de asceti-cismo.

"Havendo atingido a etapa do cumprimento e alcan­çado sua maturidade, o homem necessita de riqueza, e a riqueza que ele adquire mediante ofícios ou pro­fissões é recomendável e digna de louvor aos olhos dos homens sábios e, especialmente, dos servos que se dedicam à educação do mundo, à edificação de seus povos."

Desprendido é aquele que, perdendo tudo que tem no ca­minho de Deus, não se entristece. "Sede generosos em vossos dias de abundância, e pacientes na hora do prejuízo" (Bahá'u'lláh).

A Fé Bahá'í prega a eliminação dos extremos de riqueza e pobreza. Um dos mecanismos para alcançar esta meta é o Hu-

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quqVlláh (Direito de Deus), onde cada bahá'í cujo lucro pessoal atinge um certo nível voluntariamente dá 19% deste a um fundo a ser usado para a promoção do bem-estar da humanidade.

Finalmente, o conceito de desenvolvimento assume dimen­são planetária, confundindo-se com o próprio estabelecimento do Reino de Deus na Terra. Este é considerado por todos os bahá'ís como uma realidade histórica pela qual trabalhamos todos os dias, e não um evento apocalíptico removido do fluxo da história e das nossas próprias preocupações pessoais.

Cuidai zelosamente das necessidades da era em que viveis e concentrai vossas deliberações em suas exi­gências e seus requisitos"

(Bahá'u'lláh).

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O Convênio e o Processo de Desenvolvimento1

Segundo 'Abdu'1-Bahá, o Convênio é a base da unidade do gênero humano e à medida que a causa avança, nos daremos conta também de que o Convênio deverá ser o eixo ao redor do qual se estrutura o discurso bahá'í em qualquer grupo de temas que se formulem. A formulação de um discurso bahá'í de desenvolvi­mento social e econômico levará algum tempo até ser alcançada.

Obediência a Bahá u Uáh

Nós bahá'ís somos os seguidores de Bahá'u'lláh, a quem te­mos aceito como a manifestação de Deus para o dia de hoje. Nossa lealdade para com Bahá'u'lláh vai mais além da aceitação de uma série de princípios e regras de conduta individual. Implica entrar em um Convênio com Ele, um Convênio que se situa na própria base de nossas vidas. E daí que brotam nossas mais altas aspirações, nossos pensamentos mais criativos e nossas ações mais louváveis. Este Convênio requer nada menos que total obediência a Bahá'u'lláh. Porém a obdiência neste contexto pouco tem a ver com a forma de que se trata este conceito atualmente. Obedecer a Bahá'u'lláh significa ordenar nossas vidas de acordo com as leis da existência e cumprir com o propósito para o qual fomos criados. As leis e ensinamentos de Bahá'u'lláh não são uma série de limitações externas impostas arbitrariamente. Expressam aquilo que tem sido depositado pela mão de Deus no mais íntimo de nossas vidas.

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As partes deste convênio

Ao entrar em um Convênio com Bahá'u'lláh temos aceito pelo menos dois tipos de obrigações.

O primeiro tipo de obrigação é de ordem pessoal e envolve a aplicação dos ensinamentos ao crescimento individual, à aquisi­ção de qualidades e modelação das faculdades que cada um ne­cessita no caminho infinito que conduz a fonte de nosso ser.

O segundo tipo de obrigação se refere a nossa vida coletiva como espécie humana, e ao nosso propósito comum de levar avante uma civilização em constante evolução. Ao aceitar entrar no Tabernáculo do Convênio nos comprometemos a nos tornar traba­lhadores incansáveis da Causa de Bahá'u'lláh e em participantes ativos do seu projeto: a construção de uma nova Ordem Mundial.

Desenvolvimento e caridade

Há várias décadas os povos do mundo vêm se ocupando com o desenvolvimento social e econômico daquelas nações que por uma razão ou outra, são consideradas à margem do acelerado processo de mudança tecnológica que começou na Europa Ociden­tal há dois séculos atrás. Enquanto que alguns dos que trabalham no mundo do "desenvolvimento" são motivados pelo interesse pes­soal, a maioria é impulsionada pelo altruísmo e o desejo sincero de aliviar o sofrimento dos seus semelhantes. Desafortunadamente, as posturas ideológicas acerca da natureza do desenvolvimento e do curso que se deve seguir são extrememente diferentes e contraditó­rias. A maioria dos que se preocupam pelo destino do pobre, con­funde o desenvolvimento com a caridade. Alguns vão um passo mais adiante e terminam igualando o desenvolvimento com a prestação de serviços tais como saúde, educação, crédito e assis­tência técnica.

Outros consideram que o desenvolvimento consiste em pro­ver emprego para as pessoas. Outros ainda encontram na pobreza

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o material com o qual se pode fazer a revolução política. Como é de se esperar, esta confusão ideológica dá lugar a inúmeras teorias, enfoques e métodos, parcialmente válidos, porém carentes da visão e consistência necessárias para produzir a almejada mudança.

Permitam-me sugerir que uma das principais razões para de­liberar sobre o tema do Convênio no contexto dos programas so­ciais e econômicos bahá'ís é assegurar que não seremos vítimas das confusões de uma ordem cambaleante.

O que devemos ter em mente é que estamos comprometidos com o desenvolvimento da Ordem Mundial de Bahá'u'lláh. Qual­quer coisa que façamos deve ser vista nesta luz.

O primeiro objetivo dos nossos projetos

Todos os nossos projetos devem ser considerados como elementos de um plano mais amplo: o da construção da civilização humana. Nossa participação individual e coletiva nestes projetos representa nada mais nada menos que o cumprimento das respon­sabilidades que assumimos ao entrar no Convênio com Bahá'u'lláh

O desenvolvimento social e econômico bahá'í não pode ser outro senão o esforço sistemático por aplicar à vida da humanidade a Revelação de Bahá'u'lláh.

Um projeto pequeno pode fazer isso em um cenário muito limitado; porém, um projeto maior pode abarcar uma série de obje­tivos bastante ambiciosos. Entretanto a natureza do projeto é sem­pre a mesma — o emprego da Revelação de Bahá'u lláh na criação dos elementos de uma nova civilização e no empreendimento do caminho para a Nova Ordem Mundial de Bahá'u'lláh.

Características distintivas de nossos enfoques

Se concordarmos em situar nossos projetos sociais e eco­nômicos dentro desta perspectiva, devemos tratar então de especifi­car características distintivas de nossos enfoques. Estou seguro de

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que vocês identificarão muitas destas características durante suas deliberações; porém, eu gostaria de mencionar uma que eu consi­dero de vital importância em qualquer enfoque que adotemos.

Perguntemo-nos, o que acreditamos que será o papel das massas da humanidade no processo de transformação sem prece­dentes concebido por Bahá'u'lláh? Todos nós sabemos que a Or­dem Mundial de Bahá'u'lláh representará o reino da Justiça Divina e que portanto todos nos participaremos do benefício da grande civilização a qual levará. Ninguém será marginalizado, ninguém passará necessidades. Porém, em relação à participação no proces­so de desenvolvimento, o que haverá de conduzir esta civilização? A nova civilização será construída para o pobre por aquela porção da humanidade que tem acesso aos benefícios da presente ordem — acesso à educação, certas posições de influência e a meios eco­nômicos?

Se esse é o caso, nossos projetos devem ser unicamente a administração de vários tipos de serviços para que os pobres bene­ficiem-se dos avanços modernos e assim pouco a pouco sejam as­similados pela civilização do mundo no processo de sua configura­ção.

A participação de todos

Estou seguro de que nenhum de nós aceitará tal definição de desenvolvimento social e econômico bahá'í e que todos estarão de acordo em que o desafio de edificar uma nova civilização deve ser encarado pela humanidade inteira, tanto pelos ricos como pelos pobres, pelos líderes e as massas. É privilégio de cada ser humano contribuir para o surgimento de uma nova Ordem Mundial; é esta tarefa que cada homem e cada mulher deve assumir de maneira responsável. Um dos traços sobressaltantes de nossos projetos de desenvolvimento é então, a ênfase que dão a participação das pes-

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soas na busca de seus própios caminhos de progresso. Não existe tal coisa como "nós" e "eles" em nossos projetos, nós os planejado­res, os expertes, os administradores dos projetos e eles os benefici­ários das nossas ações. Um projeto bahá'í em uma comunidade pertence às pessoas dessa comunidade. Os bahá'ís que tomam parte em um projeto, porém, vivendo em outra cidade não partici­pam como estranhos. Eles fazem parte da mesma comunidade mundial bahá'í à qual pertencem os bahá'ís da aldeia. São guiados pelo mesmo conjunto de instituições.

Agora, o que tem tudo isso a ver com o Convênio? Eu penso que, embora, estejamos todos de acordo com as considerações so­bre a participação, também sabemos que é sumamente difícil incor­porar o princípio de participação em seu sentido real em um pro­grama de desenvolvimento.

O desafio é: levantar as massas da humanidade

De alguma maneira, os povos do mundo não estão dispostos ou não sabem como participar totalmente em projetos que lhes aju­dem a planejar o futuro. As massas do mundo necessitam liberar sua capacidade para levantar-se e enfrentar os desafios de construir uma Nova Ordem. Desta forma, desenvolver a capacidade das pes­soas para contribuir ao estabelecimento de Nova Ordem converte-se no tema central de um discurso sobre desenvolvimento sócio-econômico bahá'í. Surge então a pergunta sobre qual será o poder que realmente terá efeito em tal transformação? A resposta é, por conseguinte, que uma tarefa de magnitude tão imensa somente po­derá ser levada avante mediante o poder do Convênio. Os projetos sócio-econômicos bahá'ís terão que aprender a servir-se deste po­der. As pessoas têm que ser galvanizadas pela força do Convênio e ajudada pelo poder da Assistência Divina, um poder que estará sempre disponível cada vez que alcançarmos níveis mais elevados

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de firmeza no Convênio. Em última análise, os principais sujeitos do desenvolvimento poderão ser somente homens e mulheres que te­nham respondido ao chamado de Bahá'u'lláh e que estejam se es­forçando para serem fiéis ao seu Convênio.

Permitam-me terminar esta breve apresentação com uma citação de 'Abdu'1-Bahá:

O poder do Convênio protegerá a Causa de Bahá'u'lláh das dúvidas do povo do erro. É a cidadela fortificada da Causa de Deus, e o firme pilar da reli­gião de Deus. Hoje nenhum poder é capaz de con­servar a unidade do mundo bahá'í, exceto o Convê­nio de Deus: de outra maneira as diferenças, como uma grande tempestade, circundarão o mundo bahá'í. E evidente que o eixo da unidade do gênero humano é o poder do Convênio e nada mais. ...Por isso, cada um deve primeiramente fazer firmes seus próprios passos no Convênio, para que as confirma­ções de Bahá'u'lláh possam acercá-lo por todos os la­dos, e as hostes do Concurso Supremo se tornem as defensoras e as ajudantes; e as exortações e conse­lhos de Abdu'1-Bahá, como que gravados em pedra, permaneçam indeléveis na tábua dos corações. ( Ta-blas do Plan Divino, Revelado por 'Abdu'1-Bahá, Buenos Aires: EBILA,1975, pgs.21-22)

Tablas de Plan Divino, 'Abdu I Bahá. Buenos...

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