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Nas viagens aéreas a serviço, diferenciar a classe de vôo em função do nível hierárquico do funcionário é uma política discriminatória.
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Ética na gestão de pessoas: discriminação em viagens a
serviço Flavio Farah*
Tempos atrás, uma matéria publicada na imprensa especializada dava conta de pesquisa reali-
zada por uma empresa de consultoria com 31 grandes empresas brasileiras. A pesquisa infor-
mava em que classe os profissionais eram colocados nas viagens aéreas de mais de 7 horas de
duração, de acordo com o cargo. Em um extremo estavam os Presidentes: 35% voavam de
1ª classe, 62% de classe executiva e 3% de classe econômica. Na outra extremidade, estavam
os gerentes de linha: 55% voavam de classe executiva e 45% de classe econômica.
Certa vez, fiz uma viagem aérea internacional noturna de 9 horas de duração na classe econô-
mica. O avião estava lotado e eu fui colocado na primeira fileira, aquela que dá de frente para
a divisória. Não havia espaço para esticar as pernas. Como eu não consigo dormir em viagens
de avião, aquela viagem foi uma tortura. Eu passei 9 horas sentado com os joelhos dobrados,
sem dormir e sem ter o que fazer.
O espírito que preside a política das empresas nas viagens aéreas a serviço é o mesmo que
orientava uma construtora em que trabalhei. A empresa dava aos operários que dormiam nas
obras um colchão de espuma de apenas 5 cm de espessura e não instalava água quente nos
alojamentos, obrigando os trabalhadores a tomar banho frio mesmo no inverno. Esse mesmo
espírito também dá origem às políticas que estabelecem diárias de viagem de valores diferen-
tes conforme o nível hierárquico do funcionário.
Essas políticas têm a mesma origem: a discriminação decorrente do autoritarismo. O pensa-
mento autoritário consiste, basicamente, na crença de que as pessoas são desiguais, ou seja,
na crença de que existem seres humanos “superiores” e “inferiores”. E mais, que essa desi-
gualdade é natural, biológica, genética, não podendo ser alterada.
Para o indivíduo autoritário, não existe o conceito de igualdade: os homens não são, de modo
algum, iguais em dignidade e direitos. O autoritário vê o mundo em termos de uma rígida hie-
rarquia. A sociedade compõe-se de pessoas “superiores” e “inferiores” que estão inseridas em
classes hierarquicamente ordenadas. Os membros das classes “superiores” possuem “maior
dignidade” que os membros das classes inferiores. Por esse motivo, os “superiores” devem ter
mais direitos e privilégios do que os “inferiores”, sendo que os membros das classes “inferio-
res” merecem menos respeito do que os membros das classes “superiores”, e tanto menos res-
peito quanto mais “inferior” for o indivíduo. Para as pessoas autoritárias, pessoas “inferiores”
têm menos dignidade do que as “superiores” e, portanto, têm direito a menos benefícios.
Em minha vida, fiz várias viagens de trem, na época em que era comum o transporte ferroviá-
rio de passageiros. Certa vez fiz uma viagem noturna de trem para o Rio de Janeiro. De trem-
leito. Naquela época, não passava pela cabeça de ninguém fazer uma viagem ferroviária
noturna que não fosse de trem-leito. Hoje, continua sendo comum as pessoas fazerem uma
viagem rodoviária noturna em ônibus-leito. Ora, se isto é comum e natural, também deveria
ser comum e natural fazer viagens aéreas noturnas de longa duração em avião-leito.
Nenhum funcionário, mesmo aquele situado na base da pirâmide hierárquica, deveria ser obri-
gado a viajar a serviço sofrendo a tortura de um vôo noturno de longa duração em classe eco-
nômica. Ainda mais tendo que trabalhar no dia seguinte no local de destino.
Os critérios de decisão sobre a classe em que um funcionário será colocado nas viagens aéreas
a serviço deveriam ser a duração do vôo e o período em que este será realizado: diurno ou no-
turno, sem levar em conta o nível hierárquico do viajante.
* Flavio Farah é Mestre em Administração de Empresas, Professor Universitário e autor do livro “Ética na gestão de pessoas”. Contato: farah@flaviofarah.com
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