View
214
Download
0
Category
Preview:
Citation preview
DIMAS SOARES JÚNIOR
A ORGANIZAÇÃO DE REDES DE UNIDADES PRODUTIVAS COMO INSTRUMENTO DE APOIO AO DESENVOLVIMENTO
TERRITORIAL RURAL
Londrina
2006
DIMAS SOARES JÚNIOR
A ORGANIZAÇÃO DE REDES DE UNIDADES PRODUTIVAS COMO INSTRUMENTO DE APOIO AO DESENVOLVIMENTO
TERRITORIAL RURAL
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Administração, da Universidade Estadual de Maringá, em parceria com a Universidade Estadual de Londrina, como requisito à obtenção do título de Mestre.
Orientador: Profo. Dro. Rodne de Oliveira Lima
Londrina
2006
DIMAS SOARES JÚNIOR
A ORGANIZAÇÃO DE REDES DE UNIDADES PRODUTIVAS COMO INSTRUMENTO DE APOIO AO DESENVOLVIMENTO
TERRITORIAL RURAL Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Administração, da Universidade Estadual de Maringá, em parceria com a Universidade Estadual de Londrina, como requisito à obtenção do título de Mestre, sob avaliação da seguinte Banca Avaliadora:
18 de janeiro de 2006.
___________________________________________ Profo. Dro. Rodne de Oliveira Lima (PPA-UEL)
(Presidente)
__________________________________________ Dro. Antonio Carlos Laurenti (IAPAR)
(membro)
_________________________________________ Profa. Dra. Márcia Regina Gabardo Câmara (PPA-UEL)
(membro)
AGRADECIMENTOS
A Deus, por tudo.
Ao Instituto Agronômico do Paraná (IAPAR), nas pessoas daqueles que me ofereceram esta
oportunidade de treinamento, reiterando a confiança que nunca me foi negada.
Ao Márcio, João, Rafael e Simony, pela amizade, pelos ideais compartilhados, pela
disposição no trabalho conjunto.
Ao Sérgio, Rafael Figueiredo, Adenir e todos os(as) demais companheiros(as)
Extensionistas Rurais das Redes, pela amizade e aprendizado oferecidos, pelas experiências
transmitidas.
Ao Profo Rodne, que com sua orientação segura e serena, ofereceu-me a tranqüilidade
necessária para a realização desse trabalho.
Aos profissionais que gentilmente dedicaram parte de seu tempo nas entrevistas realizadas.
Aos membros da banca examinadora pela cuidadosa leitura e relevantes contribuições.
Ao Doretto, Laurenti, Tiago, Flávio, Mauro, Gil e Aníbal, pela amizade e confiança
oferecidos.
Ao Profo Paulo Lopes e ao Francisco, pela cordialidade e atenção que me foram dedicados
durante minha permanência no PPA.
Ao Frei Ildo Perondi a ao Armênio pela boa vontade em atender-me no complemento final
desse texto.
A Profa Cláudia Souza Passador pelo acompanhamento dos primeiros passos desse trabalho.
A Anaís e Paula, pelo entusiasmo motivador.
A Ewelyn e Cássia, pelo apoio sempre solícito.
As minhas irmãs, meus familiares e meus/minhas amigos/as, pelo carinho e respeito que
sempre me dedicaram, fundamentais para tudo que fiz e farei.
Nessuna carovana ha mai raggiunto l'utopia, però è l'utopia che fa andare le carovane
Nenhuma caravana jamais atingiu a utopia, mas é a utopia que faz as caravanas andarem
Provérbio magrebino
RESUMO
SOARES JÚNIOR, Dimas. A ORGANIZAÇÃO DE REDES DE UNIDADES PRODUTIVAS COMO INSTRUMENTO DE APOIO AO DESENVOLVIM ENTO TERRITORIAL RURAL . 2006. 142f. Dissertação (Mestrado em Administração) -Programa de Pós-Graduação em Administração, Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2006.
A busca de novas estratégias para o desenvolvimento rural, as quais superem as limitações de abrangência e o viés tecnicista hoje predominantes, é uma forte preocupação das instituições públicas e privadas de pesquisa e desenvolvimento que atuam nesta área. Com o objetivo de contribuir nessa discussão, o presente estudo discute as possibilidades da organização de redes de unidades produtivas como instrumento de apoio ao desenvolvimento territorial rural, tomando como objeto de análise empírica o projeto Redes de Referências para a Agricultura Familiar, conduzido no Estado do Paraná, sob responsabilidade do Instituto Agronômico do Paraná (IAPAR) e Empresa Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER/PR). Para tanto, apresenta primeiramente em seus aspectos teóricos e conceituais, os enfoques de redes interorganizacionais e de desenvolvimento rural sob a ótica territorial. Partindo do referencial teórico analisado e de informações coletadas junto a sete especialistas envolvidos com o tema, cujas contribuições foram discutidas com o uso da técnica da análise de conteúdo, o trabalho caracteriza, teórica e conceitualmente, as Redes de Referências para a Agricultura Familiar e discute a sua pertinência às ações de desenvolvimento territorial rural, bem como os ajustes necessários para a sua adoção nessa perspectiva. Considerando aspectos relativos à formação de capital social, à valorização de atributos para a construção de territórios e ao incentivo do desenvolvimento endógeno, a pesquisa aponta a adoção da estratégia de redes de unidades produtivas como instrumento adequado às ações de desenvolvimento territorial rural. Constata também que as perspectivas da inovação tecnológica e gerencial; de aumento da competitividade territorial; de aprimoramento institucional associado à transformação dos sistemas produtivos; e a possibilidade de validação e transferência de inovações surgidas no meio rural, todos elementos presentes no projeto Redes de Referências para a Agricultura Familiar, qualificam-no como potencialmente útil às ações desenvolvidas sob o enfoque do desenvolvimento territorial rural. O texto aborda ainda as perspectivas futuras para o projeto Redes de Referências, considerando sobretudo os aspectos necessários para a sua adequação ao enfoque do desenvolvimento sob a ótica territorial. Tais aspectos são discutidos considerando o escopo atual do projeto, as mudanças de ordem metodológica e/ou operacional pertinentes e, ainda, os ajustes necessários no plano institucional para a sua implementação, oferecendo, assim, elementos que devem permitir uma melhor adequação da proposta às ações de desenvolvimento territorial rural. Palavras-Chave: redes interorganizacionais. redes de unidades produtivas rurais. desenvolvimento territorial rural.
ABSTRACT
A major concern of public and private development oriented organizations is the development of broad scope rural development strategies. Such strategies need the economic and social aspects of development, in additions to its technical aspects. In this dissertation I discuss the potential of reference farm networks as a conceptual tool to support the terroir development approach. The empirical basis was the project Reference Family Farms Network, conducted by Instituto Agronômico do Paraná (IAPAR) and Empresa Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER/PR) in the State of Paraná, southern Brazil. I present the theoretical and conceptual bodies of the farm network approach and terroir development approach. On the basis of these approaches and on information from seven experts on rural development, I used the content analysis technique in order to assess the potential of the two theoretical bodies. As a result of this exercise, I propose adjustments in the methodologies so as to increase the adoption and the efficiency of the development strategy. The adjustments concerned mainly the increase in social capital, the construction of terroirs and incentives to endogenous development. In addition, I observe that some perspectives of the Family Farms Reference Network are highly valuable for the terroir development approach, namely the perspectives of technologic and management innovations, of the increase in the terroir competitiveness, and of the institutional improvement associated with the transformations of production systems. I also explore the prospect of the Family Farms Reference Network Project considering the requisites to convey it to the terroir development approach. Such requisites comprise methodological, operational, and even its very scope, which bring altogether and instutional/implemention consequences. They are, however, key elements for the improvement of terroir development in the context of rural development iniatives. Key-Words: interorganizational networks. rural firms networks. terroir development.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Modelo geral de rede para o desenvolvimento de um sistema econômico local .51
Figura 2 – Territórios do Estado do Paraná, 2005.................................................................55
Figura 3 – Hierarquia, mercado e redes.................................................................................67
Figura 4 – A evolução dos conceitos de redes em uma perspectiva organizacional.............76
Figura 5 – Rede ciência, tecnologia e mercado de Callon ....................................................79
Figura 6 – Complementaridade de conhecimento na rede ....................................................82
Figura 7 – Visão geral da estrutura Redes de Propriedades de Referências do Institut de l’Élevage com o número de propriedades e de técnicos participantes ...............87
Figura 8 - Estrutura organizacional das Redes de Referências. ............................................94
Figura 9 – Etapas do trabalho das Redes de Referências ......................................................96
Figura 10 – Estrutura e distribuição regional das Redes de Referências para a Agricultura Familiar no Paraná..............................................................................................97
Figura 11 – Municípios onde existem estabelecimentos das Redes e principais atividades econômicas que compõem sistemas de produção em estudo .............................98
Figura 12 – Modelo de pesquisa adotado............................................................................107
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 – Principais características dos modelos de desenvolvimento rural exógeno e das abordagens endógenas .......................................................................................44
Quadro 2 – Territórios selecionados para trabalho no Estado do Paraná..............................55
Quadro 3 – Síntese dos aspectos epistemológicos considerados na análise de Vizeu ..........66
Quadro 4 – Tipologia geral de redes organizacionais ...........................................................71
Quadro 5 – Tipologias específicas de redes organizacionais elaborada a partir da contribuição de diferentes autores .........................................................................................73
Quadro 6 – Identificação das questões de pesquisa e dos objetivos contemplados nas diferentes questões do roteiro utilizados nas entrevistas com técnicos...........103
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Rede urbano-rural brasileira .................................................................................35
Tabela 2 - Evolução da população do Brasil, 1981– 99 ........................................................36
LISTA DE ANEXOS
Anexo A - Tipologia das regiões da OCDE segundo seu grau de ruralidade: participação relativa da população .........................................................................................140
Anexo B – Relação nominal dos técnicos entrevistados, com a indicação da instituição a qual vinculam-se, bem como da função e/ou das atividades desenvolvidas que os credenciam para a colaboração na pesquisa ......................................................141
Anexo C – Modelo do roteiro de entrevista utilizado com os técnicos ...............................142
SIGLAS E ABREVIATURAS UTILIZADAS
BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento
CEDRAF - Conselho Estadual de Desenvolvimento Rural e Agricultura Familiar
CEPAL – Comissão Econômica para América Latina e Caribe
CNDRS - Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável
DTR – Desenvolvimento Territorial Rural
EMATER/PR – Empresa Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural
FAO – Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação
FIDA - Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola
GTZ – Sociedade Alemã de Cooperação Técnica
IAPAR – Instituto Agronômico do Paraná
IICA - Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura
IPEA – Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas
MDA - Ministério do Desenvolvimento Agrário OCDE - Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico
PRONAF – Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar
PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
SEAB – Secretaria da Agricultura e do Abastecimento do Estado do Paraná
SDT – Secretaria de Desenvolvimento Territorial / Ministério do Desenvolvimento Agrário
UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 15
1.1 O PROBLEMA DE PESQUISA E SUA DELIMITAÇÃO............................................... 15
1.2 OBJETO DE PESQUISA................................................................................................... 18
1.3 OBJETIVOS DO TRABALHO ......................................................................................... 21
1.4 JUSTIFICATIVA DA PESQUISA ................................................................................... 22
1.5 ESTRUTURA DO TRABALHO....................................................................................... 25
2 DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL RURAL................ ......................................... 26
2.1 OS ANTECEDENTES DO DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL RURAL.............. 27
2.2 ASPECTOS TEÓRICOS E CONCEITUAIS .................................................................... 32
2.2.1 Novos Enfoques para o Rural....................................................................................... 32
2.2.2 Territórios ...................................................................................................................... 39
2.2.2 Desenvolvimento ............................................................................................................ 41
2.3 PREMISSAS E POSSIBILIDADES PARA A OPERACIONALIZAÇÃO...................... 45
2.4 AÇÕES PARA O DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL RURAL NO BRASIL E NO PARANÁ.................................................................................................................................. 52
3 REDES INTERORGANIZACIONAIS ............................................................................. 57
3.1 POR QUE REDES E PARA QUE ESTUDÁ-LAS ?......................................................... 57
3.2 ABORDAGENS PARADIGMÁTICAS PRESENTES NOS ESTUDOS SOBRE REDES ..................................................................................................................................... 62
3.3 ASPECTOS TEÓRICOS E CONCEITUAIS .................................................................... 67
3.4 TIPOLOGIAS DE REDES................................................................................................. 71
3.5 REDES E INOVAÇÃO TECNOLÓGICA ........................................................................ 76
3.6 REDES E GESTÃO DO CONHECIMENTO....................................................................80
4 AS REDES DE REFERÊNCIAS PARA A AGRICULTURA FAMILI AR................... 84
4.1 ANTECEDENTES DO PROJETO E A EXPERIÊNCIA DO INSTITUT
DE L’ÉLEVAGE....................................................................................................................... 84
4.2 OBJETIVOS E OPERACIONALIZAÇÃO DAS REDES................................................. 88
4.3 METODOLOGIA DE TRABALHO UTILIZADA E ESTRUTURA ATUAL ................ 94
5 METODOLOGIA................................................................................................................ 99
5.1 CARACTERIZAÇÃO DA PESQUISA............................................................................. 99
5.2 UNIVERSO DE PESQUISA, FONTES E INSTRUMENTOS DE COLETA DE DADOS............................................................................................................................ 100
5.3 ANÁLISE DAS INFORMAÇÕES .................................................................................. 104
5.4 MODELO DE PESQUISA............................................................................................... 106
6 RESULTADOS E DISCUSSÃO....................................................................................... 108
6.1 REDES: CLASSIFICAÇÃO TEÓRICA E CONCEITUAL ............................................ 108
6.2 A ESTRATÉGIA DE REDES E O DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL RURAL 113
6.2.1 Adequação .................................................................................................................... 113
6.2.2 Potencialidades e Limitações ...................................................................................... 115
6.3 O PROJETO REDES E O DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL RURAL ..............118
6.3.1 Potencialidades ............................................................................................................ 118
6.3.2 Limitações .................................................................................................................... 121
6.4 PERSPECTIVAS PARA AS REDES.............................................................................. 123
6.4.1 Mudanças de escopo .................................................................................................... 123
6.4.2 Mudanças de ordem metodológica e/ou operacional................................................ 125
6.4.3 Mudanças de ordem organizacional .......................................................................... 128
CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................... 131
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................... 133
ANEXOS ............................................................................................................................... 140
15
1. INTRODUÇÃO
1.1 O problema de pesquisa e sua delimitação
Não obstante caracterizar-se sob inúmeros aspectos como segmento econômico fundamental
para a economia do país, os agronegócios brasileiros vivenciam um período de contínuas
mudanças, diante das quais torna-se crucial a capacidade de adaptação e transformação de
seus diferentes agentes.
Se os últimos anos têm evidenciado sobretudo a transformação tecnológica do campo, com
contínuos incrementos na produtividade física da agropecuária, o momento atual aponta para
mudanças nos padrões de relacionamento entre os agentes econômicos presentes em distintos
segmentos das cadeias produtivas agroindustriais, entre as quais podem-se citar o aumento na
adoção de contratos na relação entre os agricultores e os demais segmentos das cadeias
(Zylbersztajn, 2005), e a expressiva utilização da terceirização como estratégia para execução
dos trabalhos agrários (Laurenti, 2000), fatos que fazem com que os estudos e análises
voltados à compreensão dos fenômenos do setor tenham de levar em conta novas abordagens
que não somente aquelas de viés tecnológico.
Neste contexto, evidencia-se a necessidade de enfoques que tomem em conta também
aspectos relativos à gestão das unidades produtivas rurais. Trata-se de investigar, por
exemplo, a natureza da organização e operacionalização de redes interorganizacionais, bem
como a própria visão de desenvolvimento, que passa a ser tomado dentro de uma abordagem
mais ampla privilegiando a construção territorial.
Diante destes fatos, os desafios inerentes ao desenvolvimento de sistemas de produção
agropecuários competitivos e sustentáveis ganham maior complexidade, exigindo respostas
efetivas nas agendas de trabalho de inúmeras organizações públicas e não-governamentais de
pesquisa e desenvolvimento que realizam ações neste campo.
16
No estado do Paraná, uma das iniciativas conduzidas na perspectiva de oferecer tais respostas
é a implantação das “Redes de Referências para a Agricultura Familiar1” , trabalho iniciado
em junho de 1998 pela Empresa Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural
(EMATER/PR) e pelo Instituto Agronômico do Paraná (IAPAR), sob os auspícios do projeto
de Estado “Paraná 12 Meses” (MANUAL, 1999).
O projeto propõe uma metodologia de pesquisa adaptativa, que tem por objeto a validação e a
difusão de tecnologias, apoiada em redes de estabelecimentos agropecuários – grupos de
estabelecimentos representativos dos sistemas de produção2 encontrados em uma dada região
agrícola, analisados e acompanhados com o enfoque sistêmico que, após experimentarem
intervenções para a sua melhoria, servem para o fornecimento de referências técnicas e
econômicas (PASSINI, 1997).
A partir do acompanhamento desses estabelecimentos, procura-se elaborar sistemas de
produção adaptados à região e passíveis de serem adotados por um maior número de
produtores. Os sistemas de produção são analisados no seu conjunto - produção animal,
vegetal, florestal; e recursos naturais, financeiros e humanos, avaliando-se sua viabilidade a
partir dos resultados econômicos alcançados pelos mesmos.
A integração entre agricultores, extensionistas e pesquisadores proporcionada pelas Redes
torna possível compreender o funcionamento e a evolução dos sistemas de produção no curto
e médio prazo e também fazer os ajustes e análises de sistemas inovadores, podendo-se ainda
1 Com o intuito de oferecer maior fluidez de leitura, tal projeto passa a ser designado simplesmente por Redes na continuidade deste documento. 2 Entende-se como sistema de produção a associação entre a categoria social do agricultor, a qual toma como critérios de definição o seu montante de capital fixo, a área explorada e a proporção entre a mão-de-obra familiar e contratada utilizadas; e as atividades predominantes em sua unidade produtiva, considerando como tal aquelas que participam com pelos menos 30% da receita bruta alcançada (p.ex. Empresário Familiar Café + Leite, Empresário Capitalista Soja + Milho + Trigo, etc.).
17
utilizar os estabelecimentos participantes do projeto como local de teste e validação de
tecnologias desenvolvidas em estações experimentais.
Em suma, as Redes propõem uma complementação; em algumas situações uma total
reformulação dos métodos, técnicas e procedimentos de pesquisa e extensão rural para que
seja possível, ao obterem-se referências e parâmetros técnicos e econômicos, subsidiar a
agricultura familiar em tecnologias apropriadas e novos arranjos de seus sistemas de
produção, os quais devem possibilitar a melhoria da renda e da qualidade de vida.
Entretanto, muito embora as Redes tenham oferecido alternativas no sentido de propiciar o
intercâmbio técnico entre os agricultores colaboradores3, e inúmeras ações de difusão de seus
resultados tenham sido desenvolvidas, utilizando-se para tanto publicações técnicas,
instrumentos clássicos da extensão rural como dias de campo e excursões, além de alguns
instrumentos inovadores, como os dias de porteiras abertas e outros (MIRANDA e
DOLIVEIRA, 2005), constata-se que o seu potencial de uso como estratégia de apoio às ações
de desenvolvimento rural ainda não foi plenamente explorado4.
Associado a isso, se tem o fato de que a concepção inicial do projeto, focada no setor
agropecuário, não previa o seu uso em estratégias de desenvolvimento rural mais amplas, tais
quais as ações de caráter multisetorial previstas nos projetos sob o enfoque do
desenvolvimento territorial rural, aspectos que tornam necessária a reflexão acerca do futuro
das Redes como estratégia de P&D, tomando em conta a possível disseminação do enfoque do
desenvolvimento rural sob a ótica territorial.
3 Os encontros regionais e estaduais dos agricultores colaboradores e as reuniões de restituições de dados para análise do desempenho individual e coletivo nas diferentes atividades ao longo das últimas safras são alguns dos exemplos dessas alternativas (MIRANDA e DOLIVEIRA, 2005). 4 Fatores de ordem administrativa que serão apresentados no capítulo 4 como, por exemplo, as dificuldades na alocação de técnicos para a constituição plena das equipes, certamente contribuíram para tanto. Contudo, a presente discussão estará naturalmente focada nos aspectos de ordem teórica, conceitual e operacional, os quais, acredita-se, também tenham sido relevantes, e o serão a cada dia mais, para esta situação.
18
É justamente tal reflexão que se busca no presente trabalho, no qual discute-se a possibilidade
de implantação de redes de unidades produtivas como instrumento de propostas de
desenvolvimento territorial rural.
Sendo assim, a questão de pesquisa que orientou essa pesquisa pode ser apresentada na forma
de duas interrogações complementares :
• As redes de unidades produtivas rurais podem se constituir em um instrumento útil
ao processo de desenvolvimento territorial rural ?
• Em que medida as Redes hoje implantadas podem ser ajustadas para que sua
utilização seja potencializada em um contexto mais amplo de desenvolvimento ?
Respondendo essas questões, o projeto tem a pretensão de servir a todos os diferentes agentes
atuantes em ações para o meio rural.
A seguir, apresenta-se o objeto da presente pesquisa, bem como seus objetivos, discutindo-se
alguns aspectos que justificam a sua realização.
1.2 Objeto de pesquisa
O objeto da presente pesquisa pode ser compreendido em dois diferentes níveis. No nível
teórico, trata-se de analisar a potencialidade de organização de redes interorganizacionais
como instrumento de desenvolvimento territorial rural. Já no nível empírico, trata-se de
analisar as Redes organizadas pela EMATER/PR e IAPAR em conformidade com a questão
de pesquisa acima enunciada.
19
Preliminarmente à discussão teórica conceitual, que será apresentada no espaço
apropriado, deve-se antecipar que no contexto desta pesquisa concebe-se redes
interorganizacionais segundo o conceito proposto por Migueletto (2001, p.48):
A rede é um arranjo organizacional formado por um grupo de atores, que se articulam – ou são articulados por uma autoridade - com a finalidade de realizar objetivos complexos, e inalcançáveis de forma isolada. A rede é caracterizada pela condição de autonomia das organizações e pelas relações de interdependência que estabelecem entre si. É um espaço no qual se produz uma visão compartilhada da realidade, se articulam diferentes tipos de recursos e se conduzem ações de forma cooperada. O poder é fragmentado e o conflito é inexorável, por isso se necessita de uma coordenação orientada ao fortalecimento dos vínculos de confiança e ao impedimento da dominação.
Também antecedendo a discussão no que diz respeito a territórios, cabe primeiramente
destacar as considerações de Villa Verde (2003), que afirma que, muito embora o verbete
território possa ser encontrado hoje em inúmeros textos sobre desenvolvimento, urbanismo,
agricultura familiar, regiões, etc., a noção de território encontra-se vulgarizada e o termo
perde gradualmente sua capacidade explicativa.
Para aquela autora, território aparece ora como sinônimo de um espaço definido política e
juridicamente, ora como a base física que abriga determinada sociedade ou grupo, ora como o
espaço em que se inserem atividades econômicas especializadas. No senso comum, território
liga-se a um determinado espaço, podendo abrigar uma nação, um grupo étnico, determinadas
espécies animais, formação geológica, etc. Diante de tal abrangência é fundamental que seja
definida a visão de território considerada no presente trabalho.
Seguindo o conceito proposto em Ministério (2005a, p.28), define-se território para fins do
presente estudo como:
...um espaço físico, geograficamente definido, geralmente contínuo, compreendendo cidades e campos, caracterizado por critérios multidimensionais, tais como o ambiente, a economia, a sociedade, a cultura, a política e as instituições, e uma população, com grupos sociais relativamente distintos, que se relacionam interna e externamente por meio de processos específicos, onde se pode distinguir um ou mais elementos que indicam identidade e coesão social, cultural e territorial.
20
Complementarmente, assume-se também a definição de território rural proposta por
aquele trabalho, qual seja:
São os territórios, conforme definidos anteriormente, onde os critérios multidimensionais que o caracterizam, bem como os elementos mais marcantes que facilitam a coesão social, cultural e territorial, apresentam explicita ou implicitamente a predominância de elementos “rurais”*. Nestes territórios incluem-se os espaços urbanizados que compreendem pequenas e médias cidades, vilas e povoados. *Ambiente natural pouco modificado e/ou parcialmente convertido a atividades agro-silvo-pastoris; baixa densidade demográfica população pequena; base na economia primária e seus encadeamentos secundários e terciários; hábitos culturais e tradições típicas do universo rural. (MINISTÉRIO, 2005a, p.28)
Deste modo, o termo território deve ser entendido como uma definição técnica a priori de
um tipo de região com certa homogeneidade em suas características socioeconômicas e
fisiográficas, que se constitui numa base a partir da qual possa se desenvolver o
consenso institucional necessário à formulação de políticas de desenvolvimento.
Considera-se, portanto, que as “fronteiras” dos territórios rurais estão continuamente sujeitas a
modificações em função da evolução dos arranjos locais, tanto de natureza produtiva quanto
política.
Finalmente, cabe apresentar o objeto empírico do presente estudo, as Redes de Referências
para a Agricultura Familiar, definidas como um conjunto de estabelecimentos agropecuários
representativos de determinado sistema de produção familiar, que após processo de
otimização, visando a ampliação de sua eficiência e sustentabilidade, conduzido por
agricultores e técnicos, servem como referência técnica e econômica para as outras unidades
por elas representadas.
Implantadas em onze regiões administrativas da EMATER/PR, as Redes contam em cada
região com um Extensionista Rural daquela empresa que é o responsável pelo
acompanhamento por vinte estabelecimentos, em média, técnico que se convencionou chamar
de Extensionista de Redes.
21
As regiões são agrupadas em três mesorregiões: Norte, Noroeste e Oeste/Sudoeste. Em cada
uma delas há uma equipe de três técnicos das áreas de sócio-economia, fitotecnia e zootecnia,
chamados de Articuladores Mesorregionais. Sua função primordial é dar apoio metodológico
e técnico aos Extensionistas de Redes, fazer a consolidação e análise das informações dos
sistemas de produção em estudo na mesorregião e promover a articulação com outros agentes,
em especial, com os órgãos de pesquisa. Pesquisadores do IAPAR, especialistas da
EMATER/PR e consultores estão cumprindo esta função.
A coordenação estadual, composta por técnicos do IAPAR, da EMATER/PR e da Unidade de
Gerenciamento do Paraná 12 Meses, é responsável pela unidade do trabalho e pela articulação
do projeto no âmbito da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado, instituições
parceiras e de outras organizações e atividades ligadas ao desenvolvimento rural. Atualmente
participam do trabalho por volta de 200 agricultores.
1.3 Objetivos do trabalho
As Redes hoje instaladas concentram seus esforços no campo das tecnologias de produção e
gestão, pouco operando no contexto do desenvolvimento territorial rural, uma das premissas
que se coloca hoje para o crescimento sustentável no campo. Deste modo torna-se oportuno
discutir a forma de apropriação desta estratégia no sentido de uma proposta mais ampla de
desenvolvimento.
Assim, a pesquisa que originou esse trabalho teve os seguintes objetivos:
22
• Objetivo Geral:
Discutir e analisar as potencialidades e as limitações de utilização das redes de unidades
produtivas rurais como instrumento de desenvolvimento territorial rural.
• Objetivos Específicos
Caracterizar a adoção de redes de unidades produtivas no contexto rural, tal qual proposta no
projeto Redes de Referências, à luz das diferentes tipologias e abordagens paradigmáticas
existentes.
Discutir o método de implantação e condução hoje utilizado nas Redes de Referências,
avaliando a necessidade e possibilidades de ajustes em face de um contexto mais amplo de
desenvolvimento territorial rural.
Propor, a partir da análise dos resultados da pesquisa, um novo modelo de implantação de
redes de unidades produtivas rurais.
1.4 Justificativa da pesquisa
A importância dos agronegócios anteriormente indicada justifica o desenvolvimento de
esforços no sentido de buscar avanços nos processos de gestão organizacional das unidades
produtivas rurais. Novos programas de Estado para o campo devem tomar em conta a questão
da organização dos territórios, de forma que se torna importante estabelecer as reflexões
propostas neste estudo.
A implantação de redes interorganizacionais tem-se apresentado como uma estratégia
adequada para as empresas que buscam respostas frente às freqüentes e intensas
23
transformações verificadas no ambiente de negócios. (PECI, 2000; LOIOLA e MOURA,
1996).
Conforme afirmam Balestrin e Fayard (2003), citando levantamento internacional, o tema
redes interorganizacionais tem sido crescentemente estudado desde 1980, de modo que mais
de uma centena de artigos que o abordam explicitamente foram publicados em revistas
científicas da área de administraçao e sociologia das organizações, entre aquele ano e o ano de
1998. No Brasil, entre 1999 e 2003, 71 trabalhos foram apresentados em eventos e/ou
publicados em períodicos das áreas de administraçao, economia e sociologia rural; a
contribuição sobre o tema é crescente, avançando de quatro trabalhos no primeiro ano, para
23 contribuições no último ano da série. (SOARES JÚNIOR, 2004)
No que diz respeito às unidades produtivas rurais, paralelamente ao progresso no campo das
tecnologias de produção, faz-se necessário também o desenvolvimento de novas alternativas
de gestão, entre as quais, pode ser considerada a formação de redes com diferentes
finalidades.
No Estado do Paraná, o projeto Redes foi implantado segundo os preceitos metodológicos da
abordagem sistêmica de pesquisa e desenvolvimento rurais. Nela rejeita-se a idéia de que cada
componente de um dado sistema de produção agropecuário funcione isoladamente do meio
ambiente e independentemente dos outros componentes. A abordagem sistêmica é uma
abordagem holística, na qual os sistemas devem ser tratados no seu conjunto, com ênfase
principalmente na interação deste com o meio ambiente e na interação das partes que o
constituem.
Esta abordagem mostra-se adequada para a organização de redes, uma vez que o princípio de
interação é comum tanto quanto nas redes como nos sistemas. Constata-se, entretanto, que
24
esta estratégia não tem impedido que recaía sobre esta ação o risco presente em iniciativas
similares, qual seja, o de que
Freqüentemente as políticas públicas são formuladas e implementadas a partir de leituras parciais da realidade, procurando atender a setores sociais específicos, com pouca atenção às interdependências e às complementaridades. As iniciativas em regionalização de políticas tomaram rumos diversos, mas a maioria delas terminou por reforçar distorções econômicas e sociais. (MINISTÉRIO, 2005a, p.23).
Naquele mesmo texto afirma-se também que:
... o desenvolvimento sustentável dos territórios rurais depende também de diversos outros fatores, propiciados pelas políticas públicas e pela reação organizada da sociedade. Essas políticas deverão apoiar a formação de infraestruturas sociais e econômicas, favorecer o acesso aos serviços públicos essenciais e à assistência técnica qualificada, implementar mecanismos de desenvolvimento e de proteção social, promover o ordenamento territorial, incentivar a prática de inovações tecnológicas, sociais e institucionais e promover a diversificação econômica. As políticas de incentivo ao desenvolvimento territorial deverão conjugar, harmonicamente, as quatro dimensões fundamentais do desenvolvimento sustentável. (MINISTÉRIO, 2005a, p.25).
Vê-se, portanto, que a necessidade de incentivar a prática de inovações tecnológicas, sociais
e institucionais enquadra-se como um dos objetivos precípuos das Redes, razão pela qual
buscar-se-á nesta pesquisa estudar a viabilidade de ampliar tal abordagem para a consecução
de objetivos que a potencializem e levem-na para além da obtenção de sistemas de produção
agropecuários melhorados.
Ademais, a revisão bibliográfica elaborada confirma a pertinência da discussão de aspectos
teóricos e conceituais da implantação de redes interorganizacionais de unidades produtivas
rurais, uma vez que são raros os estudos sobre o assunto, os quais, em sua maioria,
privilegiam componentes empíricos, ou tratam da interação com segmentos a montante nas
cadeias agroindustriais.
25
1.5 Estrutura do trabalho
O estudo está organizado em seis capítulos, além desta Introdução. No capítulo 2 é
apresentada a revisão da literatura acerca do enfoque do desenvolvimento territorial rural,
organizado em quatro principais tópicos: discussão dos antecedentes que cercam o tema, seus
aspectos teóricos e conceituais, contemplando os conceitos acerca do rural do território e do
desenvolvimento, além das premissas e perspectivas para sua operacionalização e as ações em
curso para implantação de projetos sob tal enfoque no Brasil e no Paraná.
O capítulo 3 apresenta o referencial teórico referente às redes interorganizacionais. A
discussão está organizada de modo que primeiramente apresente-se o tema e justifique-se a
sua relevância para estudo, destacando-se a seguir as abordagens paradigmáticas utilizadas em
sua análise, os aspectos teóricos e conceituais envolvidos nos trabalhos que o contemplam e
as tipologias de redes. Dado o foco desta pesquisa, discute-se em maior detalhe na seqüência
duas situações particulares na utilização de redes, quais sejam, suas aplicações na inovação
tecnológica e na gestão do conhecimento.
O capítulo 4 apresenta em detalhe o objeto empírico do trabalho, o projeto Redes de
Referências para a Agricultura Familiar, oferecendo ao leitor elementos para melhor
compreensão dos resultados e discussão que serão trazidos no capítulo 6, posteriormente à
apresentação da metodologia empregada para a execução do trabalho, a qual está apresentada
no capítulo 5.
Finalmente, o capítulo 7 contempla as conclusões finais do estudo, trazendo ainda as
recomendações julgadas pertinentes.
26
2. DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL RURAL
Como lembra Veiga (1999), em texto no qual busca discutir a face territorial do
desenvolvimento, a associação do adjetivo territorial ao substantivo desenvolvimento deve ser
investigada inicialmente sob duas principais hipóteses. A primeira, de que tal associação
envolve uma revalorização efetiva da dimensão espacial da economia; a segunda, de que se
trata na verdade de mais uma das infindáveis iniciativas de se adjetivar desenvolvimento, sob
as mais diferentes argumentações.
O fato é, ainda segundo aquele autor, que se vivencia hoje uma mudança semântica no debate
público sobre desenvolvimento rural, marcada pela constatação coletiva de que as noções até
então utilizadas não mais correspondem à interpretação que se faz dos problemas enfrentados,
nem tampouco exprimem o caráter das soluções propostas, fazendo com que, em tais
situações, tal debate seja marcado pela imprecisão, fluidez e ambigüidade (VEIGA, 1999,
p.1318).
Assim, o desafio deste capítulo mostra-se redobrado, uma vez que além da noção de
desenvolvimento e território, também a noção de rural encontra-se em debate semelhante,
precisando ser claramente apresentada no que concerne a sua utilização no presente trabalho.
O capítulo é organizado de modo a oferecer primeiramente os antecedentes que trouxeram à
tona o debate acerca do desenvolvimento territorial rural5, procurando permitir que a leitura
seguinte, dos aspectos teóricos e conceituais que o fundamentam, dê-se em um contexto já
delimitado. Na seqüência, apresentam-se as premissas e possibilidades de operacionalização
que o enfoque oferece, descrevendo-se então algumas ações para a sua implementação no
Brasil e no Estado do Paraná.
5 Para maior fluidez no texto e maior comodidade do leitor, o enfoque do “Desenvolvimento Territorial Rural” será designado doravante pela abreviatura “DTR” no corpo deste documento.
27
2.1 Os antecedentes do Desenvolvimento Territorial Rural
A busca de novas abordagens para as políticas e ações visando o desenvolvimento rural no
contexto latino-americano parte, na visão de Schejtman e Berdegué (2004), de uma
lamentável constatação: não obstante os esforços empreendidos, a pobreza rural tem se
mantido constante nas últimas três décadas, afetando entre 20 e 86% da população rural,
dependendo do país considerado6, denotando a limitação e pouca eficiência das políticas até
então adotadas.
A persistência das desigualdades regionais e setoriais de natureza sociais e econômicas
também se evidencia no Brasil (MINISTÉRIO, 2005a), e no que diz respeito ao Estado do
Paraná, observa-se que o número de pessoas abaixo da linha da pobreza alcança 20,5% da
população rural, índice muito superior aos 8,6% verificados entre a população urbana
(DORETTO et al., 2003).
Diante dessas constatações, “... são cada vez mais numerosos aqueles que pensam que, se
queremos que os resultados sejam diferentes no futuro, devemos evitar seguir fazendo mais
do mesmo” (SCHEJTMAN e BERDEGUÉ, 2004, p. 8, tradução nossa). Com efeito, a
literatura sobre o tema aponta que a identificação de mudanças nos condicionantes externos
do desenvolvimento rural e de limitações na capacidade de respostas das políticas tradicionais
transcende em muito o âmbito da América Latina, onde tem sido disseminada por organismos
internacionais como o Banco Mundial, BID, FAO, CEPAL e IICA, bem como por agências
de cooperação como o GTZ e o FIDA, encontrando-se em marcha, obviamente com fatores
motivadores distintos, na União Européia, Estados Unidos e Canadá, locais nos quais pode-se
identificar uma convergência na busca de novos enfoques para tratar a questão
6 Há de se considerar que os diferentes parâmetros de delimitação dos espaços rurais adotados nesses paises também devem estar contribuindo para tal variação.
28
(ABRAMOVAY, 2003; BEDUSCHI FILHO e ABRAMOVAY, 2003; SCHEJTMAN e
BERDEGUÉ, 2004; VEIGA, 1999).
Entretanto, quais seriam efetivamente as mudanças de condicionantes externos e os pontos de
convergência possíveis de serem identificados nas novas políticas que se pretendem
implementar para o desenvolvimento rural ?
No que tange às novas características e condicionantes externos do desenvolvimento rural
latino-americano, Schejtman e Berdegué (2004) apontam e discutem nove principais fatores,
seis dos quais são agrupados aqui, destacando-os nos quatro tópicos seguintes:
i) Os efeitos da globalização, com a abertura das economias e os processos de
concentração e internacionalização das indústrias agroalimentares, notadamente no
segmento varejista;
ii) As mudanças na dinâmica do emprego rural com o crescimento do emprego rural
não agrícola;
iii) As demandas por participação e cidadania, bem como os processos de
descentralização administrativa decorrentes do avanço nos sistemas democráticos;
e
iv) As mudanças nos padrões culturais das populações rurais, especialmente entre os
mais jovens, em virtude do maior contato com o urbano e do avanço dos meios de
comunicação.
Já no tocante aos pontos de convergência, é possível identificar na literatura sobre o tema
dois aspectos principais. O primeiro diz respeito à importância assumida pelo debate sobre
desenvolvimento econômico e espaço, ao qual conjuga-se, como segundo aspecto, a
29
identificação dos aportes do chamado capital social, abordagens que naturalmente extrapolam
os limites do rural mas são úteis para a sua análise.
Segundo Veiga (1999), o debate sobre desenvolvimento econômico e espaço se apresenta
quando da identificação, em meados dos anos 80, de regiões européias nas quais a
combinação entre eficiência e altos níveis de emprego permitiam que se superasse a recessão
econômica então predominante no continente, trazendo a inevitável pergunta acerca da
possibilidade de que os modelos de desenvolvimento ali presentes pudessem ser replicados
para outros países e regiões.
Neste cenário, a experiência vivenciada na região da Emilia-Romagna, no nordeste da Itália,
tornou-se paradigmática7, despertando grande interesse e entusiasmo entre os estudiosos do
desenvolvimento rural latino-americano, porque na maioria dos casos incorporou os pequenos
e médios produtores, aproveitando a razoável distribuição de renda existente e as vantagens
de custos e flexibilidade de trabalho que esta condição permitia, ampliando desse modo o
número de agricultores pluriativos. Deste modo, fez com que estes produtores passassem a
desempenhar uma importante função tanto na etapa inicial como nas etapas intermediárias e
posteriores do desenvolvimento local, ao oferecer, entre outros fatores, a produção de
subsistência, a moradia e os recursos humanos para iniciativas empresariais endógenas,
adaptadas às condições locais (SCHEJTMAN e BERDEGUÉ, 2004)8
Conforme descrevem aqueles autores, para a análise destes casos exitosos de
desenvolvimento são resgatados pelos estudiosos italianos os aportes teóricos oferecidos pelo
7 Regiões como o “Vale do Silício” na Califórnia, a “Rota 128” nas cercanias de Boston, o Oeste de Flanders na Bélgica além de outras regiões italianas têm merecido atenção similares (SCHEJTMAN e BERDEGUÉ, 2004; VEIGA, 1999). As considerações no presente estudo estarão focadas na região mencionada, não somente pelo escopo do trabalho, mas sobretudo pelos fortes vínculos daquela experiência com a questão do DTR. 8 Veiga (1999) ressalta que os estudos sobre tal experiência, muito embora apontem o legado da agricultura familiar como condição necessária, colocam-no longe de ser condição suficiente. Entre outros fatores necessários são destacados aspectos de infra-estrutura e condições que estimulem o empreendedorismo dos agentes econômicos.
30
economista inglês Alfred Marshall, o qual, em seu clássico livro “Princípios de Economia”,
descreve as vantagens decorrentes do adensamento na localização das atividades produtivas
em “distritos industriais”, com a redução dos custos de produção pela presença de: i) um
conjunto de trabalhadores qualificados; ii) um acesso fácil a insumos e serviços
especializados; e iii) facilidade para a disseminação de novos conhecimentos, técnicas e
tecnologia, dada a existência de um fator intangível, uma ‘atmosfera industrial’ entremeada de
costumes e sensibilidades úteis.
Na discussão sobre desenvolvimento econômico e espaço soma-se à abordagem destes então
chamados novos distritos industriais o conceito de clusters também derivado dos princípios
marshallianos, definidos como sendo “...concentrações geográficas de companhias e
instituições em um campo particular” (PORTER, 1986. p.78). Tais concentrações oferecem a
possibilidade de, ao reunir componentes da cadeia de valor em um mesmo âmbito territorial,
gerar oportunidades de ganhos de eficiência coletiva decorrentes não somente das economias
externas descritas por Marshall, mas também de redução nos custos de transação e da ação
concertada.
Entretanto, para além dos aspectos de ordem meramente econômica capazes de influenciar a
localização e o desempenho de empresas e dos trabalhadores, o que os estudos sobre estas
experiências denotam é o papel desempenhado pela confiança, interconhecimento e interação
social entre os indivíduos, indicando que os motivos do êxito de tais iniciativas devem levar
em conta também aspectos relacionados à história, antropologia cultural e sociologia
(ABRAMOVAY, 2003; IPIRANGA, 2001). Dito de outro modo, destaca-se o fato de que
O importante é que um ambiente de cooperação entre empresas – no sentido da troca de informações, da preocupação comum com a formação dos trabalhadores, com a implantação dos serviços indispensáveis ao seu funcionamento e com a qualidade de vida numa certa região – é uma das bases essenciais para o processo de desenvolvimento. (ABRAMOVAY, 2003, p. 91)
31
É aqui que a discussão acerca do desenvolvimento econômico e espaço deve ser
complementada, sendo utilizado para tanto o conceito de capital social presente no trabalho
de Robert Putman, que o descreve como sendo “....características da organização social
como confiança, normas e sistemas, que contribuam para aumentar a eficiência da
sociedade, facilitando as ações coordenadas.” (PUTMAN, 1996, p.177) - o que, no caso
italiano estudado por aquele autor, resultaria na noção da comunidade cívica, na qual a
presença de espírito público e de participação dos cidadãos em um ambiente de relações
políticas igualitárias resulta em uma estrutura social firmada na confiança e na colaboração.
Como constata Abramovay (2003, p.86), a noção de capital social nos permite observar que
“... os indivíduos não agem independentemente, que seus objetivos não são estabelecidos de
maneira isolada e seu comportamento nem sempre é estritamente egoísta” 9.
O mesmo autor identifica na literatura recente sobre o tema a distinção de dois tipos de
vínculos entre os indivíduos. De um lado, os chamados laços de tipo cola, caracterizados
como sendo a confiança que se forma com base na identidade social dos atores. De outro, os
vínculos em formato de ponte, identificados na capacidade de determinado grupo ampliar o
círculo de relações em que se movem seus indivíduos para além daqueles que participam
imediatamente de sua vida social, vínculos estes que, quando conjugados ao comportamento
pró-ativo da burocracia do estado, potencializam as iniciativas em busca do desenvolvimento.
Temos assim apresentados os antecedentes que permeiam o enfoque do DTR, bem como os
elementos presentes nas discussões sobre desenvolvimento econômico e espaço e capital
social utilizados na sua elaboração. É chegado o momento pois de tentar-se melhor
caracterizar tal enfoque, o que será feito neste trabalho pela discussão dos aspectos teóricos e
9 O autor oferece como exemplo da manifestação do capital social no contexto rural as relações de confiança estabelecidas entre agricultores e agentes financeiros quando da formação de fundos de aval, os quais permitem que aqueles acessem recursos bancários que individualmente lhes seriam negados (ABRAMOVAY, 2003, p.86)
32
conceituais subjacentes a cada um de seus componentes, quais sejam a discussão acerca do
rural, dos territórios e do desenvolvimento.
2.2 Aspectos teóricos e conceituais
2.2.1 Novos enfoques para o rural
O conceito acerca do que é o rural encontra-se em franco processo de reconstrução no
ambiente acadêmico brasileiro. Tal reconstrução parte de um lado das limitações decorrentes
daquilo que Abramovay (2003) chama de “vício de raciocínio” na maneira como se definem
hoje no Brasil as áreas rurais, ao qual soma-se o estigma que identifica ruralidade como
sinônimo de atraso, deficiência e declínio, que devem ser superados com o avanço do
progresso e da urbanização, fenômenos estes comumente associados à noção do
desenvolvimento (ABRAMOVAY, 2003; GRAZIANO DA SILVA, 1999; VEIGA, 2002b).
Assim, é possível identificar, como também o fazem Mendonça e Ortega (2005), duas
vertentes complementares e convergentes pelas quais se dá esta necessária reconstrução do
conceito do rural no país, as quais podem ser assim sintetizadas: uma, capitaneada nos
trabalhos de Abramovay, Veiga e colaboradores, enfatiza o acima mencionado “vício de
raciocínio” e procura, com base nos aspectos normativos da definição do rural brasileiro e em
análises comparativas internacionais, mostrar os vieses presentes em tal definição e as
conseqüências por eles acarretados, bem como identificar, também na literatura internacional,
quais seriam as características comuns possíveis de serem encontradas na ruralidade.
33
A outra, caracterizada nos estudos desenvolvidos por Graziano da Silva e equipe no âmbito do
projeto Rurbano, coordenado pelo Instituto de Economia da UNICAMP, busca, com base
sobretudo nos dados das Pesquisas Nacionais por Amostras de Domicílios (PNADs) do
IBGE, demonstrar a evolução e a importância das chamadas “ocupações não agrícolas” na
geração de trabalho e renda para a população rural brasileira10.
Abordando o primeiro grupo de estudos, cabe identificar o “vicio de raciocínio” já apontado
como tendo origem na natureza residual como são definidas as áreas rurais no Brasil: aquelas
que se encontram fora dos limites das cidades. Como o estabelecimento dos limites urbanos é
prerrogativa das prefeituras municipais torna-se comum encontrar áreas com um mínimo de
adensamento populacional, nas quais a associação à oferta, também mínima, de infra-estrutura
e serviços básicos, é suficiente para a caracterização do território, e de sua população, como
urbanas (ABRAMOVAY, 2003).
Legados de legislação datada de 1938, que “...transformou em cidades, todas as sedes
municipais existentes, independentemente de suas características estruturais e funcionais.”
(VEIGA et al., 2001, p.8), tais critérios levam à categoria de urbanas áreas de sedes
municipais que exercem mínima pressão antrópica sobre os ecossistemas, fazendo com que
em 70% dos municípios brasileiros a densidade demográfica seja inferior a 40 habitantes/km2,
enquanto, a titulo de comparação, a OCDE define como urbanas as áreas com densidade
populacional superiores a 150 habitantes/km2 11. Tais fatos fazem com que a metodologia
oficial de cálculo da taxa de urbanização no Brasil possa ser considerada, como o faz Veiga,
como anacrônica e obsoleta, exigindo a realização de novas tipologias capazes de melhor
10 boa parte dos trabalhos gerados no projeto pode ser acessada em http://www.eco.unicamp.br/nea/rurbano/rurbapre.html 11 Analisando os critérios existentes internacionalmente para delimitação do rural, Abramoway (2003) identifica além do patamar populacional, vigente principalmente na Europa, o peso da mão-de-obra na agricultura, adotado, por exemplo, em Israel. A delimitação administrativa presente no Brasil encontra similar na América Latina somente no Equador, Guatemala, El Salvador e República Dominicana. Considerando a discrepância observada na classificação brasileira optou-se para melhor ilustrar a questão, por apresentar no Anexo 1 a tipologia completa das regiões da OCDE segundo seu grau de ruralidade.
34
captar a diversidade dos municípios brasileiros, como aquela que propõe este mesmo autor a
partir do estudo “Caracterização e Tendências da Rede Urbana no Brasil” , desenvolvido
pelo IBGE em associação com o IPEA e a UNICAMP.
Adicionando parâmetros relativos à caracterização dos municípios rurais, aos critérios
propostos naquele estudo, Veiga conclui que pode ser definida como urbana 56,8% da
população brasileira, contingente bastante inferior aos 81,2% da taxa de urbanização no ano
de 2000, calculada pelo IBGE sob os vieses contidos nos critérios acima discutidos. No
tocante ao número de municípios, somente 8,3% destes são classificados como urbanos,
cabendo a 81,4% a classificação de essencialmente rurais, como pode ser visto na Tabela 1, a
seguir.
35
Tabela 1. Rede urbano-rural brasileira.
Absoluto Relativo (%) Absoluta (milhões) Relativa (%)
URBANOS 455 8,3 96,3 56,8
12 Aglomerações Metropolitanas 200 3,6 57,4 33,8
37 Aglomerações Não-metropolitanas 178 3,2 22,7 13,4
77 Centros urbanos 77 1,4 16,1 9,5
RELATIVAMENTE RURAIS a 567 10,3 21,7 12,8
ESSENCIALMENTE RURAIS b 4485 81,4 51,6 30,4
BRASIL 5507 100 169,6 100
TiposPopulação (2000)No de municípios
a Relativamente rurais: possuem população entre 50.000 e 100.000 habitantes, ou inferior a 50.000 habitantes mas com densidade populacional superior a 80 habitantes/km2. b Essencialmente rurais: possuem, simultaneamente, população inferior a 50.000 habitantes e densidade populacional menor de que 80 habitantes/km2. Fonte: adaptado de Veiga et al. (2001) e Veiga (2002).
Já com os trabalhos do projeto Rurbano é possível identificar, a partir da evolução das
ocupações e renda das famílias, a dissociação do perfil rural como sinônimo de agrícola. Os
dados apresentados na Tabela 2, abaixo, indicam que o estancamento, entre 1992 e 1996, da
queda da população rural brasileira, a qual cresce entre 1996 e 1999 em taxa anual
ligeiramente inferior àquela verificada na população total, é acompanhado de uma forte
elevação na taxa de crescimento da população rural ocupada em atividades não-agrícolas, taxa
esta que cresce 6,1% ao ano no período 1996 – 1999, contra 1,3% de crescimento anual da
população total.
36
Tabela 2. Evolução da população do Brasil a, 1981– 99.
Absoluta % Absoluta % Absoluta % Absoluta %
URBANO 85,2 71,2 113,4 78,0 122,4 79,4 127,8 79,7 2,6c 1,7c 1,4c
Ocupados b31,7 - 46,6 - 50,4 - 52,7 - 3,6c 1,8c 1,5c
Agrícola 2,6 8,2 3,7 7,9 3,4 6,7 3,4 6,5 3,3c -1,6c-0,2
Não-agrícola 29,1 91,8 42,9 92,1 47,0 93,3 49,3 93,5 3,6c 2,0c 1,6c
RURAL 34,5 28,8 32,0 22,0 31,7 20,6 32,6 20,3 -0,7c 0,2c 1,1c
Ocupados b13,8 - 14,7 - 13,9 - 14,8 - 0,6c -0,2c 2,1d
Agrícola 10,7 77,5 11,2 76,2 9,9 71,2 10,2 68,9 0,4c -1,7c0,4
Não-agrícola 3,1 22,5 3,5 23,8 4,0 28,8 4,6 31,1 1,2c 3,7c 6,1d
TOTAL 119,7 - 145,4 - 154,1 - 160,4 - 1,8c 1,4c 1,3c
a não inclui a população das áreas rurais da região Norte, exceto Estado de Tocantins.b PEA restrita, que exclui os não-remunerados que trabalham menos de 15 horas na semana e os que se dedicam
exclusivamente ao auto-consumo.c,d,e indicam nível de significância estatística de 95%, 90% e 80%, respectivamente.
Fonte: adaptado de GRAZIANO DA SILVA, 2001, p.39.
População (milhão de pessoas e %) Taxa de crescimento (% ao ano)
1981 1992 1996 19991981/92 1992/99 1996/99
Entre 1981 e 1999 sobe de 22 para 31 o percentual de pessoas ocupadas residentes no campo,
dedicadas às atividades não-agrícolas, de forma que é possível afirmar que em 1999, três em
cada dez brasileiros ocupados residentes na zona rural dedicavam-se a atividades não-
agrícolas, as quais perdem a capacidade de explicarem sozinhas a dinâmica da produção e das
ocupações nos espaços rurais. O emprego doméstico, a construção civil, o trabalho nos
estabelecimentos públicos de ensino e no comércio de alimentos, eram, em 1997, os quatro
principais setores de atividades não-agrícolas nos quais encontravam-se engajadas as pessoas
residentes na zona rural (LAURENTI e DEL GROSSI, 2000, p.38)12.
Considerando a dinâmica própria destes e outros setores não-agrícolas empregadores da
população rural, é possível identificar as zonas rurais também como espaços de moradia ou
segunda moradia, respectivamente para a população de baixa e alta renda, localização de
pequenas e médias unidades fabris ou de serviços, atendendo também à clientela urbana,
como é o caso do lazer e do turismo rural.
12 Estes autores analisam a dinâmica do crescimento de tais atividades nas diferentes regiões do país identificando pontos de distinção e similaridade na intensidade e características desta transformação.
37
A importância das ocupações não-agrícolas nas áreas rurais pode ser constatada com
evidência ainda maior no cenário internacional, com a agricultura representando uma parcela
cada vez menor na geração de emprego e renda dos paises capitalistas centrais.
Abramovay (2003) aponta que, nos Estados Unidos, somente 10% do pessoal ocupado no
meio rural vive da agricultura, e mesmo nas localidades fundamentalmente agrícolas, menos
de 35% dos empregos estão na agricultura e agroindústrias, havendo, em 1991, 1,6 milhão de
domicílios agrícolas e 23 milhões de domicílios rurais não-agrícolas, ou seja, não
caracterizados como unidades de produção agropecuária. Situação similar é observada na
França, onde 90% dos domicílios em espaço predominantemente rural não contam com
nenhum trabalhador agrícola.13
A convergência destas duas vertentes de estudos aqui rapidamente apresentadas encontra-se,
portanto, na constatação taxativa de que o rural não pode mais ser visto como um setor
econômico associado exclusivamente à produção agropecuária, assim como as indústrias e
serviços são comumente associados ao setor urbano. A ruralidade deve ser tratada como um
conceito de natureza territorial, e não setorial, o que faz com que a unidade de análise para a
sua abordagem deva migrar dos sistemas agrários ou alimentares para as economias regionais,
fazendo do desenvolvimento das regiões rurais uma perspectiva de ordem espacial e
multissetorial, da qual a produção agropecuária é parte integrante, mas não exclusiva. Deste
modo, a ruralidade deve ser tomada como um espaço com características próprias, e não
como uma etapa a ser superada com o avanço do progresso e da modernização.
13 Na OCDE, a taxa de emprego agrícola varia de 2,4% do total na Grã-Bretanha, a um máximo de 11,6% na República Tcheca, com nítido declínio do emprego agrícola durante a década de 80, fazendo com que o emprego industrial apresente-se superior ao agrícola mesmo nas regiões essencialmente rurais (ABRAMOVAY, 2003).
38
Finalmente, cabe apresentar as três características presentes na ruralidade, as quais, conforme
afirma Abramovay (2003), têm sido evidenciadas de forma convergente na literatura
internacional. São elas:
i) A relação com a natureza, produto óbvio de um contato muito mais intenso que os
habitantes locais possuem com o meio natural vis a vis àquele possível nos centros
urbanos, condição esta que emerge não somente como um valor ético e afetivo,
mas também como promissora fonte de renda, como por exemplo nas iniciativas
voltadas ao chamado turismo rural14;
ii) Uma relativa dispersão populacional, salientada por exemplo na definição da
Divisão de Desenvolvimento Rural da FAO, que concebe como áreas rurais “...as
pessoas, a terra e outros recursos localizados em campo aberto e pequenas
cidades, fora da influência direta das grandes cidades” (ABRAMOVAY, 2003,
p.30), definição que, ressalta aquele autor, encontra resguardo etimológico na
palavra latina rus, que significa “espaço aberto”. É a característica que os critérios
de patamar populacional vêm buscando identificar para a definição de áreas rurais.
iii) A relação com as cidades, às quais o bem-estar econômico das áreas de
povoamento mais disperso está ligado, permitindo que se identifique nas áreas
rurais mais prósperas a ocorrência de estreitos laços econômicos com grandes
centros urbanos.
14 É nesta característica que se fundamenta a noção da multifuncionalidade da agricultura, atividade à qual caberia não somente a tarefa de produção de alimentos em quantidade e qualidade suficientes, como também a preservação do meio-ambiente e das paisagens rurais. Citando Jollivet, Abramovay (2003, p.27), lembra que o espaço rural constitui-se em argumento na negociação da reforma da Política Agrícola Comum da União Européia (UE), “... tendo os agricultores franceses descoberto que podiam se prevalecer da condição de seus gestores [...] para justificar que o Estado e a UE preservassem seus interesses nas negociações com o Estados Unidos”.
39
Conhecidos os novos enfoques associados à definição do rural, apresenta-se na seqüência a
discussão teórica associada à construção dos territórios.
2.2.2 Territórios
Como relatam Blume e Schneider (2003), o termo território tornou-se corriqueiro nas
produções acadêmicas, extrapolando os limites da Geografia, disciplina que reivindica a
primazia em sua utilização, para alcançar a Biologia, e mais recentemente, a Sociologia, a
Antropologia e a Economia, na busca que tais ciências realizam de proceder a uma leitura
diferencial do espaço.
A discussão emergente com a utilização do termo pode ser iniciada, como o fazem Rocha,
Schefler e Couto (2003), apresentando sua etimologia: originário do adjetivo latino
territorium, que deriva de territorialis – pedaço de terra apropriada. É este o sentido no qual é
empregado na etologia, ciência que o associa às idéias de dominação de lugar, de extensão e
limites, enquanto define territorialidade como a conduta de um organismo para tomar posse
de seu território e defender-se contra os membros de sua própria espécie, noções estas que
encontram-se próximas daquelas que o termo possui no senso comum.
De volta à geografia, constata-se no trabalho de Blume e Schneider (2003), que o uso da
noção de território ganha legitimidade e consolida-se no campo da geografia política ainda no
final do século XIX, cedendo espaço, especialmente depois da 2ª Guerra Mundial, ao conceito
de região. No Brasil, o conceito de região torna-se hegemônico a partir do momento em que o
Estado dele faz uso para qualificar os espaços brasileiros, compondo uma divisão regional
para fins de planejamento, procedendo a
40
...recortes funcionais em escala nacional, sendo que nestes foram estabelecidas unidades territoriais contendo espaços com uma hierarquia escalonada. Esta divisão ficou compreendida como a das grandes regiões ou das macrorregiões, onde as diferenciações do quadro natural do País tiveram grande relevância para o estabelecimento deste primeiro recorte. Sobre estas novas divisões foram estabelecidas as subregiões. Nas sub-regiões recortaram-se as zonas denominadas de fisiográficas que tiveram como prioridade considerações de ordem econômica e social. (BLUME e SCHNEIDER, 2003, p.6).
Segundo aqueles autores, diante da constatação de que os contornos regionais estabelecidos
vinham perdendo sua densidade explicativa no que diz respeito à dinâmica econômica
nacional, o uso do conceito de região passou a ser severamente questionado, tornando-se
obsoleto segundo seus críticos, os quais advogavam a necessidade de uma nova alternativa
analítica para os diferenciados modos de gestão e entendimento da formação do espaço.
Resgata-se então o conceito de território, incorporando ao mesmo novos elementos e novos
fundamentos. Para Santos (2000, p.96) o território pode ser entendido como sendo "...o chão
da população, isto é sua identidade, o fato e o sentimento de pertencer àquilo que nos
pertence. O território é a base do trabalho, da residência, das trocas materiais e espirituais e
da vida, sobre os quais ele influi." Como destacam Rocha, Schefler e Couto (2003), também
Haesbaert (1997), contribui no entendimento deste conceito, descolando-o, tal qual Santos, da
questão de soberania do Estado sob o qual foi gerado no passado, para as dimensões política e
simbólico-cultural que hoje integram a sua definição e ampliam a sua capacidade analítica:
O território envolve, sempre, ao mesmo tempo, mas em diferentes graus de correspondência e intensidade, uma dimensão simbólica, cultural, através de uma identidade territorial atribuída pelos grupos sociais, como forma de controle simbólico sobre o espaço onde vivem (sendo também, portanto, uma forma de apropriação), e uma dimensão mais concreta, de caráter político-disciplinar: a apropriação e ordenação do espaço como forma de domínio e disciplinarização dos indivíduos. (HAESBAERT, 1997, apud ROCHA, SCHEFLER e COUTO, 2003, p.3).
A presença dos elementos de apropriação, domínio e disciplinarização, ressaltam a existência
das relações de poder na constituição e definição dos territórios, os quais não devem ser vistos
meramente como suporte das atividades econômicas ou como um espaço dado, mas sim como
espaços histórica e socialmente construídos que expressam o resultado das interações ali
41
presentes, definidos por e a partir de relações de poder (BLUME e SCHNEIDER, 2003;
VILELA, 2000).
Retomando o contexto do DTR, é oportuno ressaltar a proposição de Abramovay (2002) que
afirma que:
um território não consiste simplesmente em atributos naturais. Ele é construído segundo a capacidade dos atores de estabelecer relações organizadas – mercantis e não mercantis – que favoreçam não só a troca de informações e a conquista conjunta de certos mercados, mas também a pressão coletiva pela existência de bens públicos e de administrações capazes de dinamizar a vida regional (ABRAMOVAY, 2002, p.122).
Temos assim, que na perspectiva do DTR, o território deve ser encarado como espaço onde se
constata a identidade de uma população, o sentido de pertencer a, associado à interação dos
aspectos ambientais, econômicos, sociais e histórico-culturais, entre os quais destaca-se um
tecido social de bases históricas que transcende a análise econômica (ROCHA, SCHEFLER E
COUTO, 2003).
Finalizando o presente tópico é necessário destacar as evidentes dificuldades analíticas e
operacionais decorrentes da adoção da abordagem territorial como discutida aqui,
dificuldades estas que serão abordadas posteriormente, apresentando-se na seqüência deste
texto as implicações da noção de desenvolvimento presente no DTR.
2.2.3 Desenvolvimento
Como o pretendem novo e capaz para superar as limitações existentes em abordagens
anteriores, os formuladores do enfoque de DTR não poderiam prescindir da tarefa de
oferecer-lhe também uma nova perspectiva para o conceito de desenvolvimento ao qual
pretendem associá-lo.
42
Isto porque, a noção de desenvolvimento confundido com crescimento econômico, traduzido
em geral na dimensão do Produto Interno Bruto (PIB), mesmo que seja ainda hoje utilizada, já
se mostrou por demais limitada para captar em plenitude o significado tão abrangente deste
conceito, bastando para isso lembrar, como sugerem Blume e Schneider (2003), da condição
de países do Oriente Médio, de elevado PIB per capita, em função da exploração petrolífera, e
precários indicadores sociais em decorrência da desigualdade na distribuição da renda. Sem
desmerecer a importância da base material para o desenvolvimento, fazia-se necessário
encará-la como um meio e não como um fim, a partir da constatação de que o crescimento
econômico não se associa diretamente ao processo de desenvolvimento (ABRAMOVAY,
2003).
Com efeito, a proposição, pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
(PNUD), de indicadores como o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), com todos os
riscos reducionistas que possa implicar, em muito supera esta limitação, ao associar à noção
de desenvolvimento aspectos relacionados à qualidade de vida dos indivíduos, tais como
longevidade, acesso à saúde e à educação.
Neste sentido, faz-se oportuno resgatar as idéias de um dos mentores do IDH, o Prêmio Nobel
de Economia de 1993, Amartya Sen, para quem, como destaca Abramovay (2002),
desenvolvimento
...é o aumento da capacidade de os indivíduos fazerem escolhas. É esta visão do desenvolvimento que o faz exigir uma definição positiva de liberdade: liberdade não é apenas a ausência de restrições, o direito abstrato de ir, vir, comprar, vender, amar e ser amado. A liberdade – e portanto o desenvolvimento – não podem ser pensados fora das condições concretas de seu exercício. Não basta que a lei garanta certos direitos: o essencial é que os indivíduos tenham as capacidades, as qualificações, as prerrogativas de se deslocar, de participar dos mercados e de participar de relações humanas que enriqueçam sua existência. (ABRAMOVAY, 2002, p.114 – grifos no original)
43
Constata-se portanto que os desafios para o desenvolvimento, dentro da acepção sugerida,
entre as quais destaca-se o aumento na capacidade dos indivíduos fazerem escolhas, são por
demais ambiciosos, e tal ambição fica reforçada quando se agrega ao enfoque do DTR o
atributo de sustentabilidade, fazendo com que suas políticas devam, conforme Ministério
(2005a, p.25):
...conjugar harmonicamente as quatro dimensões fundamentais do desenvolvimento sustentável: a dimensão econômica, em que se destaca a competitividade territorial; a dimensão sociocultural, na qual sobressai a equidade e o respeito pela diversidade; a dimensão ambiental, onde se enfatiza o conceito de administração e gestão da base de recursos naturais e a dimensão político-institucional, em que ressalta o conceito de governabilidade democrática e a promoção da conquista e do exercício da cidadania. (MINISTÉRIO, 2005a, p.25 – grifos nossos).
Por fim, além de tomar em consideração o desenvolvimento humano e os princípios da
sustentabilidade, pretende-se que o enfoque do DTR assuma ainda uma perspectiva endógena
de desenvolvimento, ao contrário dos enfoques tradicionais caracterizados pelo caráter
exógeno de suas iniciativas. O Quadro 1 abaixo coteja as duas perspectivas de modo a
explicitar a distinção entre ambas15:
15 A concepção do modelo endógeno de desenvolvimento rural, suscita questões como, por exemplo, a amplitude das transformações possíveis nas áreas distantes da atração das regiões metropolitanas, ou ainda, sobre a construção dos vínculos em formato de ponte, presentes na concepção do capital social (p.31), bem como os mecanismos de mediação de interesses entre os indivíduos e diferentes atores sociais presentes. Respondê-las, contudo, foge ao escopo do presente trabalho.
44
Quadro 1. Principais características dos modelos de desenvolvimento rural exógeno e das abordagens endógenas 1.
Características Modelo exógeno Abordagens endógenas de desenvolvimento
Princípio chave Economia de escala e concentração.
Os recursos específicos de uma área (naturais, humanos e culturais) contêm a chave do desenvolvimento sustentável.
Força dinâmica
Pólos de crescimento urbano. As principais forças do desenvolvimento são concebidas como emanando de áreas externas às áreas rurais.
Empresas e iniciativas locais.
Função das áreas rurais
Produção de alimentos e outros produtos primários para a expansão da economia urbana.
Economias e serviços diversos.
Maiores problemas de desenvolvimento
Baixa produtividade e marginalização.
Limitada capacidade de áreas e grupos sociais participarem da atividade econômica e do desenvolvimento.
Foco do desenvolvimento rural
Industrialização e especialização agrícola. Estímulo à mobilidade de capital e trabalho.
Construção de capacidades (habilidades, instituições e infra-estrutura). Superação da exclusão social.
1 A utilização de modelo (singular) e abordagens (plural) tem um significado fundamental para o entendimento das diferenças entre ambos. A noção de desenvolvimento endógeno parte da premissa de que não existe um modelo único a seguir e, sim, princípios, e que as abordagens variam de lugar para lugar. Fonte: extraído de Mior (2005, p.38).
Destaca-se assim a necessidade de que o enfoque do DTR assuma a valorização dos recursos
naturais, dos recursos humanos e culturais, das empresas e das iniciativas locais, trabalhando
na construção de capacidades e na superação da exclusão social, assumindo os valores da
sustentabilidade e da visão ampliada do rural.
Agora que estão colocados e discutidos os aspectos teóricos e conceituais associados à
perspectiva do DTR, cabe apresentar as premissas e possibilidades para a sua
operacionalização.
45
2.3 Premissas e possibilidades para a operacionalização
Considerando os aspectos de ordem teórico-conceituais já discutidos, é oportuno destacar, não
na tentativa de estabelecer parâmetros, mas sim de estimular a reflexão, alguns elementos
relacionados à operacionalização de propostas sob o enfoque do DTR trazidos na literatura
consultada, ora como premissas, ora como possibilidades baseadas muitas vezes em
experiências internacionais.
Na perspectiva do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MINISTÉRIO, 2005a), aceita
como orientadora das reflexões realizadas nessa dissertação, pretende-se afirmar a
abordagem ampla dentro da qual fundamenta-se o enfoque do DTR, sustentada em diversos
aspectos complementares, partindo-se do pressuposto de que:
A perspectiva territorial do desenvolvimento rural sustentável permite a formulação de uma proposta centrada nas pessoas, que leva em conta os aspectos de interação entre os sistemas socioculturais e ambientais, e que considera a integração competitiva dos recursos produtivos [...] promove a superação da visão da participação como condições para a obtenção de compensações, pondo em destaque a cooperação, a co-responsabilidade e a inclusão econômica e social [...] encara a questão ambiental mais além da visão convencional de manejo de recursos naturais, a partir de uma perspectiva de proteção ambiental e de produção limpa [...] supera a visão de que a economia rural se reduz a uma economia agrícola e favorece uma economia territorial e [...] trata a questão da tecnologia não apenas como fator incremental da produtividade, mas promove conceitos de inovação tecnológica e competitividade territorial... (MINISTÉRIO, 2005a, p. 25).
Como sugere Vecchiatti (2003), quando se busca visualizar o desenvolvimento rural a partir
de uma abordagem territorial, deve-se ter em mente quais os tipos de articulações e interações
presentes no território trabalhado, que envolvem vínculos urbano-rural, a geração de
inovações, o desenvolvimento institucional e o dinamismo econômico.
Esta é a visão presente também no trabalho de Schejtman e Berdegué (2004, p.31), quando
propõem um conjunto de oito critérios orientadores para o desenho de estratégias e políticas
no âmbito de programas de DTR:
46
i) A transformação produtiva e o desenvolvimento institucional devem ser abordados
de forma simultânea;
ii) O rural deve ser considerado dentro de um contexto ampliado;
iii) O território deve ser considerado como um espaço com identidade e um projeto de
desenvolvimento concertado socialmente;
iv) A heterogeneidade entre territórios deve ser explicitamente considerada;
v) A diversidade de agentes do território deve ser convocada para a ação;
vi) Diferentes rotas de saída da pobreza devem ser consideradas;
vii) Deve-se levar em conta a complexa arquitetura institucional demandada para os
programas de DTR, e
viii) Os projetos devem ser formulados e administrados com horizonte de médio e
longo prazo.
Aspectos relacionados ao desenvolvimento das instituições16, perspectiva de longo prazo,
sustentabilidade, diversidade dos agentes que devem ser considerados nas ações para o DTR e
visão ampliada do desenvolvimento rural, são também reforçados nas diretrizes que devem ter
as políticas públicas articuladas sob este enfoque, as quais devem, segundo o Ministério do
Desenvolvimento Agrário (MINISTÉRIO, 2005a, p.24):
i) Levar em consideração as quatro dimensões elementares do desenvolvimento:
economia, sociedade e cultura, ambiente, política e instituições;
ii) Atuar sobre situações presentes mediante mecanismos articulados a um projeto de
longo prazo;
16 No que tangem às limitações, problemas e potencialidades vinculadas ao funcionamento nesta perspectiva dos atuais Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural, o debate tem sido amplo, estando presente em trabalhos como os de Abramovay (2003), Marinozzi e Moraes (2003) e Rocha, Schefler e Couto (2003) entre outros.
47
iii) Adotar um modelo de desenvolvimento que não comprometa as metas de bem-
estar e progresso das gerações futuras;
iv) Considerar as relações entre os diversos setores da sociedade, o que significa
romper com esquemas setoriais e favorecer um enfoque integral, e
v) Priorizar a articulação de uma economia territorial, na qual se reconheça a
multiplicidade, a complementaridade , a importância de outros setores produtivos
não vinculados à produção primária, os serviços ambientais e as externalidades
econômicas do território rural.
Como observa Ipiranga (2001, p.6), a dimensão política-institucional, a visão sistêmica,
holística e evolutiva, construída a partir das interconexões dos resultados entre as dimensões
econômica, sócio-cultural e ambiental, quando presentes nas propostas de desenvolvimento
devem almejar:
i) Resultados econômicos, com adequados níveis de eficiência através da capacidade
de usar e articular fatores produtivos endógenos para gerar oportunidades de
trabalho e renda, fortalecendo as cadeias produtivas locais e integrando redes de
pequenos negócios;
ii) Maior eqüidade social, que se contrapõe ao acelerado processo de “apartheid
social”, através da maior participação do cidadão e cidadã nas estruturas do poder,
tendo como referência a história, os valores e a cultura do território;
iii) Novas institucionalidades que, através da expressão política e maior representação
dos segmentos sociais, permitam a construção de políticas territoriais negociadas
entre os agentes governamentais, do mercado e da sociedade, gerando um entorno
inovador favorável às transformações da economia local e o resgate da cidadania;
e
48
iv) Compreensão do meio ambiente como ativo de desenvolvimento, considerando o
princípio da sustentabilidade em qualquer opção transformadora.
Na mesma perspectiva, porém sob a ótica de desafios, Abramovay (2003, p.93) indica sete
pontos que devem ser considerados na implantação de projetos de desenvolvimento rural,
quatro dos quais são aqui destacados:
i) Os projetos terão mais chance de sucesso quanto mais forem capazes de extrapolar
um único setor profissional, oferecendo a perspectiva de formação de uma rede de
atores, entre os quais os agricultores, trabalhando para a valorização dos atributos
de uma certa região17;
ii) O município é na maior parte das vezes uma unidade administrativa pouco
adequada para gerir a rede de relações necessárias ao desenvolvimento;
iii) O pressuposto fundamental para a formação de redes territoriais é a construção de
uma nova visão, inclusive sob o ponto de vista estatístico, do que significa o meio
rural; e
iv) As instituições de ensino superior no interior do país e as Universidades podem
exercer um papel decisivo na formação de redes territoriais de desenvolvimento,
propiciando, por exemplo, ações de estímulo ao empreendedorismo e estudos das
dinâmicas organizativas locais.
Sob um enfoque mais específico, é oportuno destacar ainda a proposição do MDA para a
dinamização econômica dos territórios rurais, no sentido de que sejam consideradas
17 Os trabalhos de Alcoforado (2003a e 2003b) aprofundam o debate e oferecem interessantes perspectivas neste sentido.
49
“...estratégias que enfatizem a melhoria da qualidade e a agregação de valor aos produtos
locais, a diversificação de atividades produtivas e a inovação tecnológica e gerencial como
caminhos para se alcançar melhorias significativas na eficiência e na competitividade
sistêmica ou territorial”. (MINISTÉRIO, 2005b, p.21 – grifo nosso)
Discutindo a condição brasileira à luz das experiências locais e aquelas acumuladas desde o
início da década de 90 pela União Européia no âmbito do Programa LEADER18 (Ligações
Entre Ações de Desenvolvimento da Economia Rural), e pelos Estados Unidos, na execução
do Programa EZ/EC (Empowerment Zones and Entreprise Communities - Zonas de
Empoderamento e Comunidades Empresariais), Beduschi Filho e Abramovay (2003)
ressaltam a necessidade de que sejam estabelecidos Contratos de Desenvolvimento
Territoriais entre os atores locais e as diferentes articulações intermunicipais, como meio de
pôr fim à ótica de balcão, materializada em projetos com formatos de listas de compras, e não
de desenvolvimento, que hoje emanam dos planos municipais de desenvolvimento rural.
Na mesma linha de raciocínio, Veiga (2002b) discute possíveis ações no âmbito de tais
contratos, sugerindo então a
...formação de uma rede de solidariedade ativa entre as microrregiões rurais, que promova um efetivo intercâmbio de experiências, conquistas e conhecimentos. Essa rede deverá servir para a validação e transferência de inovações surgidas no meio rural . E a participação ativa na rede deverá ser exigida de todos os consórcios intermunicipais...”. (VEIGA, 2002b, p. 391 - grifo nosso).
18 Como observam aqueles autores o programa LEADER, “...trouxe à tona a necessidade de se utilizar uma abordagem territorial em face das crises experimentadas por inúmeras áreas rurais européias. A abordagem desta iniciativa, que privilegia o enfoque no planejamento com base na competitividade dos territórios, incorpora de forma inovadora os aspectos econômicos, ambientais, sociais e culturais nas suas ações. Além disso, com a experiência de mais de uma década e mais de mil projetos apoiados, a Iniciativa LEADER acumulou grande quantidade de lições aprendidas, que podem ser compartilhadas com outros países que estão se lançando na inovação de seus processos de planejamento”. (BEDUSCHI FILHO e ABRAMOVAY, 2003, p.8)
50
Assim, é oportuno resgatar o modelo geral de rede para o desenvolvimento de um sistema
econômico local proposto por Casarotto Filho e Pires (1999, p. 21), o qual, muito embora não
tenha ênfase rural, foi concebido a partir da experiência da Terceira Itália, que, pelos fatores
já apontados, mostra-se pertinente para o debate em tela. (Figura 1)
Ali é possível identificar-se a presença de diferentes agentes, cada um dos quais é apresentado
e tem suas funções discutidas na obra daqueles autores, estando entre esses os governos, as
instituições de pesquisa, as associações de pequenas empresas, bancos, etc. É possível
constatar ainda a ocorrência de instituições criadas com o propósito-fim de apoiar as ações de
desenvolvimento, como o fórum local, o observatório econômico, a cooperativa de garantia de
crédito e o centro catalisador de tecnologia, fato que vem ao encontro das necessidades acerca
dos aspectos institucionais apontadas ao longo deste tópico.
51
Figura 1. Modelo geral de rede para o desenvolvimento de um sistema econômico local.
Instituições de pesquisa
Governos Bancos
Redes de Grandes Empresas
Consórcios Legenda: Atores diversos: Grandes empresas, bancos, institutos de pesquisas, governos Instrumentos de integração Pequenas e médias empresas
Fórum Local de Desenvolvimento
Observatório Econômico
Associação de pequenas Empresas
Centro Catalisador de
Tecnologia
Cooperativa de Garantia de Crédito
Fonte: extraído de Cassaroto Filho e Pires (1998, p.21).
52
2.4 Ações para o desenvolvimento territorial rural no Brasil e no Paraná
A discussão sobre a perspectiva territorial de um projeto de desenvolvimento rural para o
Brasil surge de forma elaborada em um documento produzido por Veiga e colaboradores
(VEIGA et al., 2001) sob os auspícios do Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento
Rural do MDA e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável (CNDRS). Ali
se encontram fundamentados todos os elementos componentes da abordagem territorial, sendo
propostas, entre outras estratégias para a operacionalização de um Plano Nacional de
Desenvolvimento Rural Sustentável, a adoção dos Contratos Territoriais de Desenvolvimento
acima discutidos.
Já em 2003, com o inicio do governo do Presidente Luís Inácio Lula da Silva, é criada no
âmbito do MDA, a Secretaria de Desenvolvimento Territorial (SDT) que segue, como
afirmam Mendonça e Ortega (2005, p. 15) “...a reorientação estratégica das políticas de
desenvolvimento rural que em linhas gerais converge no sentido da implementação de ações
definidas no 1º Plano Nacional de Desenvolvimento Sustentável (1º PNDRS), idealizado em
2002 pelo [CNDRS]. A abordagem territorial é o eixo central e o foco de atuação da SDT”.
Ainda segundo aqueles autores, com a criação da SDT identificam-se mudanças na linha de
financiamento de ações de infra-estrutura do Programa Nacional de Fortalecimento da
Agricultura Familiar (PRONAF), que adota como estratégia de atendimento o suporte ao
desenvolvimento de “territórios rurais”, com o apoio a iniciativas de caráter intermunicipal,
buscando unir os municípios em torno de um projeto de desenvolvimento territorial, através
da formação de novos arranjos intermunicipais.
53
Ao desafio de identificar e constituir os territórios a partir da composição de identidades
regionais como elemento aglutinador e promotor do desenvolvimento sustentável, a SDT
adota como critério a realização de consultas à Sociedade Civil e ao Governo, com aprovação
do respectivo Conselho Estadual de Desenvolvimento Rural Sustentável19 e do CNDRS,
assumindo, como pode ser visto em Ministério (2005a, p. 29), o fato de que “a revelação
definitiva de cada território somente ocorrerá quando a sua população, através dos atores
sociais, reconheça os seus elementos caracterizadores da coesão social e territorial, durante,
ou logo após o processo de construção de sua identidade e proposição de sua visão de
futuro” . Neste sentido, foram priorizados20 para apoio até outubro de 2005, 104 Territórios
Rurais, englobando 1.669 municípios, os quais devem articular-se visando a elaboração de
seus Planos Territoriais de Desenvolvimento Rural Sustentável (PTDRS), a serem
construídos com a participação das organizações sociais e dos governos locais.
(MINISTÉRIO, 2005b e 2005d)
Para Mendonça e Ortega (2005) a estratégia da SDT/MDA é de que os PTDRS, partindo das
premissas já aqui apresentadas de priorização de ações descentralizadas que valorizem os
potenciais endógenos locais no processo de desenvolvimento desses territórios, possam
integrar ações de associativismo, comercialização e capacitação, além de outras políticas
públicas correlatas, na perspectiva de que seus limites sejam extrapolados, com a geração de
processos contínuos e sustentados de desenvolvimento.
No Paraná, o Decreto de no 1.791 de 05 de setembro de 2003 instituiu o Conselho Estadual
de Desenvolvimento Rural e Agricultura Familiar (CEDRAF), constituído por representantes
19 No caso do estado do Paraná, Conselho Estadual de Desenvolvimento Rural e Agricultura Familiar, como será visto a seguir. 20 Adotando-se critérios como concentração de agricultores familiares, de famílias assentadas por programas de reforma agrária e de famílias de trabalhadores rurais sem terra, mobilizados ou não. (MINISTÉRIO, 2005b, p.16)
54
do Estado e de entidades profissionais e de classe, atribuindo-lhe, entre outras, as seguintes
competências (PARANÁ, 2003):
I. Contribuir para a formulação de políticas públicas voltadas para o desenvolvimento territorial, considerando as suas diversas dimensões e setores, buscando: [...] b) o ordenamento territorial como instrumento de gestão; [...] k) ampla participação e controle social das políticas públicas; [...] m) geração e apropriação de conhecimento científico, tecnológico, gerencial e organizativo; n) preservação ambiental e manejo sustentável dos ecossistemas regionais; o) elaboração e implantação do zoneamento ecológico e sócio-econômico dos territórios; e p) divulgação de experiências relativas ao desenvolvimento sustentável, através de redes de informação; II. Coordenar a implementação do PRONAF, em todo o Estado do Paraná, articulando com a Coordenação Nacional e com os Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural – CMDR; III. Acompanhar o desenvolvimento dos programas governamentais voltados à agricultura familiar e ao desenvolvimento sustentável do Estado; IV. Estimular o aperfeiçoamento dos mecanismos de participação e controle social, visando otimizar os esforços e fortalecer o desenvolvimento sustentável;...(PARANÁ, 2003, p.1 – grifo nosso).
Assim, já em sua primeira reunião, realizada em 09 de setembro daquele ano, o CEDRAF
aprovou a indicação dos quatro primeiros Territórios a serem trabalhados no Estado e de
cinco “pré-Territórios” a serem avaliados para seleções futuras. Hoje, são cinco os Territórios
constituídos, os quais abrangem 73, ou 18,3%, dos municípios do Estado, cuja distribuição é
indicada no Quadro 2, podendo ser visualizada na Figura 2, ambos a seguir.
55
Quadro 2. Territórios selecionados para trabalho no Estado do Paraná.
Território / Municípios No de Municípios
Data de definição no CEDRAF
CANTUQUIRIGUAÇU Campo Bonito, Candói, Cantagalo, Catanduvas, Diamante do Sul, Espigão Alto do Iguaçu, Foz do Jordão, Goioxim, Guaraniaçu, Ibema, Laranjeiras do Sul, Marquinho, Nova Laranjeiras, Pinhão, Porto Barreiro, Quedas do Iguaçu, Reserva do Iguaçu, Rio Bonito do Iguaçu, Três Barras do Paraná, Virmond.
20 09/09/2003
CENTRO – SUL Fernandes Pinheiro, Guamiranga, Imbituva, Inácio Martins, Ipiranga, Irati, Ivaí, Mallet, Prudentópolis, Rebouças, Rio Azul, Teixeira Soares
12 11/05/2005
PARANÁ CENTRO Altamira do Paraná, Boa Ventura de São Roque, Campina do Simão, Cândido de Abreu, Iretama, Laranjal, Manoel Ribas, Mato Rico, Nova Cantu, Nova Tebas, Palmital, Pitanga, Rio Branco do Ivaí, Roncador, Rosário, do Ivaí, Santa Maria do Oeste, Turvo.
17 09/09/2003
SUDOESTE Ampére, Barracão, Bela Vista da Caroba, Bom Jesus do Sul, Capanema, Flor da Serra do Sul, Manfrinópolis, Marmeleiro, Pérola Doeste, Pinhal de São Bento, Planalto, Pranchita, Realeza, Renascença, Salgado Filho, Santa Izabel do Oeste, Santo Antônio do Sudoeste.
17 09/09/2003
VALE DO RIBEIRA Adrianópolis, Bocaiúva do Sul, Cerro Azul, Doutor Ulysses, Itaperuçu, Rio Branco do Sul, Tunas do Paraná.
7 09/09/2003
Fonte: adaptado de Ministério (2005d).
Figura 2. Territórios do Estado do Paraná, 2005.
Fonte: cedida pela Área de Geoprocessamento da EMATER/PR.
Pinhão
Irati
Pitanga
Candói
Prudentópolis
Ivaí
Turvo
Cêrro Azul
Mal let
Ipi ranga
Adrianópolis
Guaraniaçu
Palmital
Imbituva
Goioxim
Cândido de AbreuRoncador
Iretama
Rio Azul
Nova Laranjeir as
Lar anjal
Inácio Martins
Verê
Teixeira Soar esCantagalo
Doutor Ulysses
Bocaiúva do Sul
Catanduvas
Rebouças
Mar quinho
Nova Cantu
Rio Branc o do Sul
Quedas do Iguaçu
Nova Tebas
Reserva do Iguaçu
Realeza
Planalto
Francisco Bel trão
Manoel Ribas
Mato Rico
Tunas do Paraná
Santa Maria do Oeste
Capanema
Ampére
Lar anjeiras do Sul
Mar meleiro
Itaper uçu
Renascença
Rio Bonito do Iguaçu
Dois Vizinhos
Campo Bonito
Virmond
Pranchita
Porto Bar reir o
Rosário do Ivaí
Ibema
Boa Ventura de São R oque
Três Barras do Par aná
Fernandes P inheiro
Salto do Lontr a
Altamir a do Paraná
São Jorge D'Oeste
Barracão
Foz do Jordão
Nova Prata do Iguaçu
Manfr inópol is
Pérola D'Oeste
Salgado F ilho
Enéas Mar ques
Tibagi
Ortigueira
Reserva
Ipor ã
Guaratuba
Guaraqueçaba
Umuarama
Cianorte
Antonina
Ventania
Vi la A lta
Ivaté
Chopinzinho
Mor retes
Icaraíma
Telêmaco Bor ba
Altônia
Curiúva
Rondon
Tapir a
Tapejar a
Mar iluz
Perobal
Imbaú
Coronel Vivida
Xambrê Cruzeiro do Oeste
Alto Piquiri
São João
Douradina
Tuneir as do Oes te
Pérola
Mar ia Helena
Paranaguá
Sul ina
Juss ara
Cidade Gaúcha Japurá
Cafezal do Sul
São Tomé
Francisco Alves
Guaporema
Brasilândia do Sul
Figueira
Matinhos
Pontal do Paraná
Esperança Nova
TERRITÓRIOS PARA DESENVOLVIMENTO - 2005
Escala: 1:3315554Data: 09/05/05
Divisão municipais
PRE-TERRITÓRIOSCaminhos do TibagiCONSAD Entre RiosLitoralSudoeste Ampliação
TERRITÓRIOSCantuquiriguaçuCentro-SulParaná CentroSudoesteVale do Ribeira
56
O processo de elaboração dos Planos de Desenvolvimento Territorial obedece a dinâmicas
diferenciadas em cada um destes Territórios, e o trabalho do CEDRAF no momento de
avaliação das propostas para recebimento de apoio financeiro por parte do PRONAF é
justamente na tentativa de melhor harmonizá-las aos princípios dos PTDRS aqui discutidos,
sendo empreendidos esforços também no sentido de aprimorar o funcionamento institucional
das instâncias de organização territorial 21.
A apresentação do enfoque do DTR realizada neste capítulo possivelmente tenha deixado
transparecer algo que, por via das dúvidas, deve-se aqui explicitar. Trata-se do risco de que
nos encontremos diante de um modismo, risco anunciado já no primeiro parágrafo do capitulo,
quando se ressaltava a necessidade de uma abordagem teórica que o sustente. Isto porque, em
sua operacionalização o DTR torna-se passível de transfigurar-se em uma mera carta de
intenções legada por seus formuladores, abandonando os seus aspectos inovadores aqui
discutidos.
Associado a isso, se tem o fato, salientado por Veiga (1999), de que ainda que a retórica do
desenvolvimento territorial seja indiscutivelmente melhor do que as anteriores, ainda
encontra-se longe de oferecer a combinação de teoria e prática que permita atestar a sua
efetiva funcionalidade.
É neste cenário de risco que o presente trabalho se coloca, pretendendo contribuir para a
viabilização das perspectivas positivas que o enfoque do DTR carrega consigo. O capítulo
seguinte apresenta os fundamentos do outro elemento teórico do trabalho, quais sejam as
redes interorganizacionais.
21 Informação pessoal do Secretario Executivo do CEDRAF. Esforços no sentido do fortalecimento da organização institucional nos Territórios são discutidos também em Assis e Ribeiro (2005) e Ministério (2005c).
57
3. REDES INTERORGANIZACIONAIS
Como ressaltam Cândido e Abreu (2000), as idéias e conceitos utilizados no estudo de redes
não são novos, estando desde a década de 30 presentes em diversas áreas de conhecimento,
como as Ciências Sociais (Antropologia e Psicologia), Biologia e Medicina.
Este capítulo tem por objetivo oferecer uma revisão crítica da literatura acerca dos temas
concernentes ao estudo das redes no campo das organizações. Em seu início tenta responder
duas questões fundamentais para o desenvolvimento deste estudo: por que as organizações
estruturam-se em forma de redes ? E, sendo assim, por que merecem ser estudadas como tal ?
Respondidas tais questões, discutem-se as diferentes abordagens paradigmáticas comumente
utilizadas nos trabalhos sobre redes, para, somente então, apresentar primeiramente os
aspectos conceituais relativos ao tema, trazendo-se em seguida diferentes tipologias utilizadas
para o estudo do mesmo, o que, espera-se, contribua para uma leitura melhor circunstanciada
destes dois importantes conteúdos.
O capítulo é concluído com a discussão da organização de redes sob a ótica da inovação
tecnológica e da gestão de competências, vertentes que se mostram importantes para a análise
da implantação de redes no contexto de unidades produtivas rurais, conforme o objeto de
estudo proposto no presente trabalho.
3.1 Por que Redes e para que estudá-las ?
Segundo vários autores, nos últimos anos tem sido ampliada sistematicamente a literatura
sobre análise dos relacionamentos interorganizacionais. Miles e Snow (1986) indicam que os
estudos sobre cooperação entre organizações tornaram-se um campo estruturado a partir da
58
década de 80, quando a competição internacional e o rápido desenvolvimento tecnológico
forçaram a reestruturação das empresas americanas.
Segundo Nohria e Eccles (apud BALESTRIN e FAYARD, 2003), existem três razões
principais para o aumento do interesse sobre redes nos estudos organizacionais:
a) a emergência da nova competição, como a que está ocorrendo nos distritos industriais italianos e do Vale do Silício. Se o velho modelo de organização era a grande firma hierárquica, o modelo da organização considerada característica da nova competição é a rede de relações laterais intra e interfirmas; b) o surgimento das TICs (Tecnologias de Informação e Comunicação), como por exemplo as bases de dados compartilhadas, o correio eletrônico, as intranets organizacionais, a internet, o groupware, tem tornado possível uma maior capacidade de interação entre firmas dispersas e c) a consolidação da análise de redes como uma disciplina acadêmica, não somente restrita a alguns grupos de sociólogos, mas expandida para uma ampla interdisciplinaridade dos estudos organizacionais. (NOHRIA e ECCLES, 1992 apud BALESTRIN e FAYARD, 2003. p.05).
Este crescente interesse no mundo acadêmico suscita um primeiro questionamento para o
mundo real: o que tem levado as organizações a buscarem as redes interorganizacionais como
forma de articulação e operação ? Novamente na academia, encontram-se algumas respostas.
Cândido e Abreu, por exemplo, enunciam que:
o homem é um ser eminentemente social e necessita durante toda a sua existência manter diversos tipos de relacionamentos e interações com outras pessoas. Este tipo de comportamento social pode ser estendido para os grupos sociais, dentro do princípio de que estes grupos são formados por pessoas. (CÂNDIDO e ABREU, 2000, p.01).
Contudo, é fácil observar que, conforme os próprios autores ressaltam, o princípio enunciado
acima justifica somente parcialmente os motivos que levam as organizações a procurarem
formas de atuação em rede junto a outras organizações, muitas vezes concorrentes, em
situações nas quais o isolamento as afastaria das condições ideais de sobrevivência e
desenvolvimento, uma vez que, sob a ordem capitalista, a busca pela maximização de lucros
pode muitas vezes identificar somente competição onde pode haver também colaboração.
Já quando se reflete acerca da máxima de que vivemos em um mundo em transformação...,
hoje com assento reservado nos lugares-comuns, constata-se que esta é inequivocamente
verdadeira, quando analisados, por exemplo, fenômenos como os impactos das modernas
59
tecnologias de informação e comunicação e da globalização financeira e dos mercados na
economia mundial. Talvez seja correto encontrar na soma destes fatores, necessidade social e
mudanças no ambiente empresarial a justa explicação para a emergência das redes
organizacionais.
Assim o faz Peci (2000), que reforça o seu ponto de vista discorrendo sobre o pensamento de
Lipnack e Stamps:
Na opinião [daqueles autores], três ondas dividem a humanidade em quatro grandes épocas, denominadas: era nômade, agrícola, industrial e de informação. Cada nova época de civilização traz em si a sua forma principal de organização. O pequeno grupo caracterizava a era nômade, a hierarquia cresceu com a agricultura, a burocracia nasceu na era industrial e a era de informação está trazendo a rede, “(...) uma forma de organização, como a hierarquia e a burocracia, um dos desenhos básicos que nós usamos para construir o nosso mundo social” (LIPNACK e STAMPS,1994:38) (Tradução nossa). No entanto, cada forma organizacional constitui-se sobre as outras, incluindo o passado. Particularmente, as redes são inclusivas pela própria natureza. Na era das redes, continuarão a existir hierarquias e burocracias, assim como continuam a existir fazendas e fazendeiros nos dias de hoje. (PECI, 2000. p.01).
A chamada era da informação traz consigo a emergência das redes enquanto forma
organizacional, e no tocante as mudanças ambientais, pode-se justificar as redes como
resposta a um ambiente cada vez mais concorrencial, sendo utilizada como “...estratégia para
enfrentar as turbulências e incertezas que caracterizam o ambiente contemporâneo,
decorrente do crescimento da competitividade, de crises e de movimentos de reestruturação,
tanto na esfera pública como na dos negócios” (LOIOLA e MOURA, 1996, p.57).
Neste novo ambiente, a necessidade de respostas cada vez mais rápidas para as mudanças
cada vez mais intensas, aumenta a interdependência entre as organizações, pois cresce a
necessidade de recursos especializados, processamento de informações, contato com clientes,
surgindo por outro lado as novas tecnologias de informação e comunicação para apoiar o
relacionamento interfirmas. (PECI, 1999).
Analisando tal fenômeno sob o ponto de vista dos modelos organizacionais, pode-se avaliar,
como já o fizeram Nohria e Eccles citados acima, e também o faz Peci (1999), que este novo
60
ambiente de negócios implica na inflexão no predomínio do modo fordista de produção e
gestão, caracterizado pela empresa hierarquizada e integrada verticalmente, em detrimento de
outras formas organizacionais, sendo a rede uma delas.
Da mesma forma Pereira e Pedrozo (2003), afirmam que o paradigma fordista de produção
vem dando lugar ao paradigma da especialização flexível, o qual enfatiza a busca da
agregação de valor, o emprego da ciência e da tecnologia, a diversidade da linha de produtos,
a capacidade de adequação da produção às oscilações de mercado, a produção em pequenos
lotes de produção de alta tecnologia, a flexibilização de plantas industriais e a poliqualificação
de trabalhadores.
Neste novo paradigma, conhecimento e tecnologia adquirem papéis centrais e as redes, ao
incorporarem princípios de gestão que estimulam a cooperação, facilitam o processo de
inovação e fortalecem as empresas participantes, permitindo com que estas possam continuar
competindo em um ambiente mutável, resguardadas por inovações em produtos, serviços e
processos.
Objetivamente, Lipnack e Stamps (apud CÂNDIDO e ABREU, 2000), identificam as
seguintes iniciativas, descritas abaixo segundo diferentes áreas de ação empresarial, que
justificam a atuação das empresas em redes:
1. Marketing : marketing conjunto, pesquisas de mercado, avaliação de necessidades
comuns, marcas comuns, serviços de exportação, etc;
2. Treinamento: conhecimentos especializados e habilidades gerais e específicas;
3. Recursos: aquisições conjuntas, armazenagem/estocagem conjunta, coordenação de
fornecedores, equipamentos especializados, serviços profissionais, etc;
61
4. Pesquisa e Desenvolvimento: desenvolvimento conjunto de produtos e/ou serviços,
desenvolvimento conjunto de processos, compartilhamento de pesquisa e inovações,
transferência e difusão de tecnologias etc;
5. Pesquisa: programa conjunto de qualidade, benchmarking, compartilhamento de padrões
internos, certidão de padrões internacionais, etc;
Ou seja , trata-se de buscar a colaboração para a aquisição de recursos e competências que
individualmente a organização não possui.
Este contexto é particularmente verdadeiro para as pequenas e médias empresas (PMEs), uma
vez que se torna impossível para estas possuírem a mesma capacidade que as grandes
empresas, no sentido de dominar todas as atividades, cada vez mais complexas, de um ciclo
de agregação de valor. Balestrin e Fayard (2003, p.05) afirmam que
a organização em redes representa uma opção estratégica para a competitividade frente as grandes empresas. Pois inseridas em um ambiente hipercompetitivo, as PMEs, na maioria das vezes, apresentam certas dificuldades, como baixo volume de compras, o que as impede de obter melhores preços e vantagens na compra de matérias-primas, custos de participação em feiras, custos de campanhas publicitárias, custos de reciclagem e treinamento da mão-de-obra, atualização tecnológica, acesso a linhas de crédito e financiamento, custos de aluguel, custos envolvidos na exportação de produtos, etc. Esses problemas dificilmente desaparecerão, contudo, podem ter seus efeitos neutralizados ou amenizados pela ação coletiva das PMEs. (BALESTRIN e FAYARD, 2003. p.05).
A organização em redes permite então que as PMEs ganhem maior escala, mais habilidades e
maior capacidade inovativa para fazer frente à competição.
Especificamente no contexto das PMEs, as redes possuem características que favorecem a
formação de um ambiente profícuo com geração de confiança entre as firmas (BALESTRIN e
FAYARD, 2003):
a) compartilhamento e discussão de informações sobre mercados, tecnologias e lucratividade;
b) suficiente similaridade entre processo e técnicas utilizadas, permitindo com que cada
participante possa entender e julgar o comportamento do(s) outro(s);
62
c) relações estabelecidas em longo prazo;
d) pouca diferença entre tamanho, poder ou posição estratégica dos participantes;
e) periódica rotação de lideranças para representar o conjunto de firmas;
f) recompensa financeira para as firmas e empregados dentro delas e
g) alcance de vantagem econômica pela experiência coletiva das firmas, pelo aumento das
vendas e pelos ganhos marginais.
Uma vez que já se conhecem as motivações que levam a estruturação de redes, é importante
para a compreensão do fenômeno saber quais as ferramentas que o mundo acadêmico tem
utilizado para melhor compreendê-lo, o que será feito a seguir com a discussão dos diferentes
paradigmas presentes nos estudos realizados sobre o tema.
3.2 Abordagens paradigmáticas presentes nos estudos sobre Redes
Os estudos sobre redes interorganizacionais tem sido conduzidos a partir de abordagens
distintas dentro da teoria organizacional, as quais, quando identificadas e descritas oferecem
maior clareza para a análise deste fenômeno. Identificá-las e descrevê-las foi o que buscou
Vizeu (2003), autor que oferece os principais fundamentos para este tópico.
Neste sentido, aquele autor caracteriza o que chama de distinção paradigmática em duas
principais vertentes, quais sejam: a orientação técnico-econômica de tradição norte-
americana e a abordagem fenomenológica de europeus não saxônicos, especialmente
franceses e italianos. (VIZEU, 2003)
63
Os trabalhos identificados sob a égide da orientação técnico-econômica norte-americana,
enfocam a organização de redes interorganizacionais sobretudo sob a ótica da estratégia
competitiva, tomando este tipo de organização como mais facilmente adaptável às pressões do
ambiente externo.
Tais trabalhos se distinguem entre si em decorrência de três diferentes referenciais teóricos
utilizados para a interpretação e análise das redes, como a economia dos custos de transação, a
teoria de dependência de recursos e o conceito de cluster.
Considerada um dos eixos teóricos da nova economia institucional22 a economia dos custos
de transação (ECT) possui caráter essencialmente micro-analítico, centrando-se nas
transações como unidade básica de análise, as quais podem ser definidas como sendo a "...
transferência de bens ou serviços por uma interface tecnologicamente distinta" (FARINA,
AZEVEDO e SAES, 1997, p.284). Desta forma, assume-se não só a existência de custos de
produção, como também aqueles vinculados às transações, os quais são definidos como "os
custos ex-ante de preparar, negociar e salvaguardar um acordo bem como os custos ex-post
dos ajustamentos e adaptações que resultam, quando a execução de um contrato é afetada
por falhas, erros, omissões e alterações inesperadas” (FARINA, AZEVEDO E SAES, 1997).
Sob este ponto de vista, como discorre Vizeu (2003, p.07), as redes são consideradas
como instrumentos eficazes de controle dos custos de transação, pois permitem uma melhor regulação de operações interfirmas comumente regidas pela lógica de mercado, e, ao mesmo tempo, não comprometem a capacidade de rápida adaptação às mudanças na ‘regras do jogo econômico’ (como por exemplo, mudanças no sistema de preços), dado que não se perde o caráter de firma autônoma. (VIZEU, 2003, p.07)
São deste modo caracterizadas como uma forma híbrida de realização das transações
econômicas, as quais combinariam virtudes do controle peculiares à forma organizacional
22 Embora Vizeu (2003) tenha identificado a ECT como vertente teórica presente nos estudos de redes, mais apropriado seria identificar nesta abordagem a presença da Nova Economia Institucional (NEI) , uma vez que os aspectos de ordem institucional, os quais encontram-se fortemente presentes nestes estudos, não são contemplados pela ECT e sim pelos trabalhos de outras vertentes teóricas que se fundem com a ECT no escopo da NEI .
64
hierárquica com os estímulos e a capacidade de adaptação às mudanças presentes nas
transações que são realizadas via mercado. (FARINA, AZEVEDO E SAES, 1997)
Já sob o ponto de vista da teoria da dependência dos recursos, “...as redes tem sido
consideradas como um importante mecanismo de obtenção de recursos produtivos, em
especial, os financeiros e tecnológicos, [atribuindo-se] ao incremento de recursos produtivos
a grande vantagem oferecida pela adoção do arranjo de redes por parte das pequenas e
medias empresas” (VIZEU, 2003, p.07).
A presença de tal abordagem nos estudos de redes pode ser vista como natural, uma vez que,
como ressaltam Sacomano Neto e Truzzi (2002), a dependência de recursos considera que as
organizações são dependentes dos recursos de que necessitam como novas tecnologias,
matéria-prima, recursos financeiros, e outros, sendo deste modo, dependentes também do
ambiente no qual atuam. O ambiente exerce uma influência crítica nas organizações,
sobretudo sob o fluxo de recursos críticos e escassos. A organização de redes seria então um
mecanismo para minimizar a vulnerabilidade e dependência ambiental, oferecendo melhores
condições de acesso aos recursos produtivos, especialmente os financeiros e tecnológicos.
Os estudos sob a orientação técnico-econômica fundamentam-se por fim no enfoque dos
clusters produtivos. Para melhor entendê-los, é oportuno reportar-se novamente a Vizeu
(2003), que analisando tais trabalhos indica que estes se organizam
em torno da idéia de cadeia de valor, idéia esta mais especificamente expressa pelo conceito de cluster. Para Porter (1998, p. 78) – um dos grandes difusores das idéias de cluster e de vantagem e estratégia competitiva – “clusters são concentrações geográficas de empresas e instituições interconectadas em um campo particular” nos quais “abarcam uma disposição específica de setores industriais e outras entidades importantes para a competição”. Nestes termos, os clusters representam uma espécie de amplo arranjo em rede onde participam importantes atores do processo produtivo. A concentração destes atores representa o pressuposto central do conceito de cluster, e, segundo seus difusores, também está ai o seu potencial competitivo, tendo em vista que a concentração de empresas e instituições de um mesmo setor produtivo permite o desenvolvimento de competências estruturais locais, especialmente quanto ao desenvolvimento de tecnologia e de uma adequada infra-estrutura de distribuição, fornecimento, mão de obra especializada e tantos outros recursos produtivos. (VIZEU, 2003.p.08).
65
Em síntese, por caminhos distintos, a abordagem técnico-econômica acaba por destacar as
redes como tecnologia organizacional, a qual oferece maior capacidade de adaptação às
mudanças e exigências impostas pelo processo de competitividade, dada a complementaridade
entre as competências das firmas participantes constituindo-se assim em um diferencial
estratégico que permite melhor responder a crescente complexidade nos mercados
competitivos. (VIZEU, 2003)
Por outro lado, abordagem fenomenológica de europeus não saxônicos, surge como
contraponto a interpretação que a corrente técnico-econômica faz do fenômeno das redes,
notadamente a partir dos estudos que buscavam interpretar e analisar o fenômeno na região da
chamada Terceira Itália. (VIZEU, 2003, p.09)
Para os autores identificados com esta vertente, a abordagem técnico-econômica para a
interpretação da ocorrência das redes terceiro-italianas mostra-se restrita seja pela não
valorização do contexto histórico – cultural, particularmente marcante na implantação das
redes naquela região, como também pela interpretação incorreta que faz do processo
colaborativo existente entre os participantes das redes.
Assim, quando inserida como elemento de análise, a questão da cultura adquire grande
capacidade explicativa para a ocorrência das redes, sobressaindo-se aos postulados
administrativos e organizacionais, permitindo com que o princípio de cooperação entre os
integrantes das redes seja interpretada não sob o interesse estritamente econômico, mas pelos
vínculos de afetividade e confiança característicos da cultura regional.
Sendo assim, tais estudos, destacam, ainda conforme Vizeu (2003) que a economia dos
distritos italianos na citada região tem maior relação com aspectos da cultura local do que
com prerrogativas administrativas e organizacionais. Isto faz com que ganhe importância o
interesse pelo enfoque, já discutido, da territorialidade, na análise do fenômeno de redes
66
interorganizacionais, uma vez que o tecido social derivado da identidade cultural dos
territórios onde se estabelecem as redes, seria mais explicativo de sua ocorrência de que o
imperativo tecnológico para o seu estabelecimento23.
O Quadro 3 trazido abaixo ilustra as diferentes perspectivas de estudo segundo a abordagem
aqui discutida:
Quadro 3. Síntese dos aspectos epistemológicos considerados na análise de Vizeu.
Abordagem técnico-econômica Abordagem histórico-cultural
Comportamento oportunístico (apropriado da Nova Economia Institucional)
Ênfase no âmbito histórico-cultural
Racionalidade cognitivo-instrumental Uso de perspectivas sociológicas subjetivistas
Determinismo ambiental Conceito de territorialidade (enquanto categoria culturalmente constituída)
Reificação de categorias organizacionais (estrutura; estratégia)
Consideração da esfera econômica como um enclave emerso de uma dimensão social mais ampla
Ênfase em fatores tecnológicos Consideração da confiança enquanto pressuposto intersubjetivo (reconhecimento mútuo e identidade)
Nenhuma ou pouca consideração do imperativo sócio-cultural
Consideração das relações interfirmas enquanto interações sociais efetivadas no mundo vivido (categoria fenomenológica)
FONTE: extraído de Vizeu (2003, p.12).
Corroborando a presente discussão, Cardoso et. al. (2002, p.09) identificam a partir dos
trabalhos de Powell e Smith-Doerr e de Smelser e Swedberg, duas linhas básicas de pesquisa:
23 Embora presente nos estudos de clusters, a questão da territorialidade é utilizada ali somente sob o enfoque das categorias tecnológicas, estruturais e econômicas, não abarcando questões de ordem cultural como o fazem os trabalhos desenvolvidos dentro da abordagem fenomenológica de redes. (VIZEU, 2003)
67
a primeira está relacionada mais claramente aos campos da Economia, da Estratégia Empresarial e da Teoria das Organizações, concentrando uma série de perspectivas que entendem as ‘redes’ como formas de governança – ou de ‘organização e coordenação’. A segunda vertente surge a partir da Sociologia, tendo no centro das preocupações o entendimento das redes enquanto fenômenos sociais. (CARDOSO et. al., 2002, p.09)
A Figura 3 apresentada por aqueles autores ilustra claramente a distinção apontada ao longo
deste tópico:
Figura 3. Hierarquia, mercado e redes.
Fonte: extraído de Cardoso et. al. (2002, p. 10)
3.3 Aspectos teóricos e conceituais
Etimologicamente, o substantivo feminino “rede” deriva do latim, tendo como um de seus
dezesseis diferentes significados o “entrelaçamento de fios, cordas, cordéis, arames, com
aberturas regulares fixadas por malhas, formando uma espécie de tecido" (FERREIRA,
1986).
68
Ainda segundo Cândido e Abreu (2000, p.2), “...Loiola e Moura ao analisarem os conceitos
de redes [...] apontam que os fios e as malhas dão a forma básica da rede e, que os fios
podem corresponder às linhas ou às relações entre atores e organizações, os quais
representariam as malhas ou os "nós"”.
Trazendo tal definição paro o plano técnico-operacional, é possível observar, como fazem
aqueles autores que
o termo "rede" denota comumente a idéia de fluxo, de circulação como por exemplo as redes de comunicação, de transportes, de água e esgoto e de telecomunicações. Neste sentido Loiola e Moura (op. cit.) apontam que existem dois tipos de rede: o primeiro caracterizado pelo fluxo unidirecional, com pontos de origem e de destino bem definidos e, o segundo as multidirecionais, onde os fluxos acontecem sem que haja necessariamente um centro propulsor, percorrendo as unidades que se complementam para formar a rede, o exemplo mais ilustrativo deste tipo de rede são as redes de computadores, como a Internet. (CANDIDO e ABREU, op.cit., p.02).
Verifica-se contudo que, conforme ressalta Olivares (2003), inexiste uma nomenclatura
uniforme para a definição de redes enquanto fenômeno presente no campo das organizações.
Expressões como organização-rede, redes-interorganizacionais, redes interempresas, network,
networking, redes estratégicas e redes integradas, surgem indistintamente em diferentes
estudos para identificar fenômenos muitas vezes similares.
Ainda que o mesmo autor afirme que “...em sentido amplo, as configurações de redes
consistem de interações ou relações entre colaboradores interdependentes que cooperam
para alcançar um objetivo.” (COHEN, apud OLIVARES,2003, p.02), a indefinição
conceitual é evidenciada em outros trabalhos como o de Peci (1999, p.01), quando esta
afirma que “...os termos “organização rede”, “formas rede de organização”, “rede
interempresas”, “redes organizacionais”, “especialização flexível” ou “quase-empresas”
têm sido freqüentemente utilizados para se referir à coordenação que se estabelece entre as
empresas”.
69
Parte desta indefinição conceitual pode ser atribuída à presença de diferentes abordagens
paradigmáticas no estudo das redes, como já discutido. Como lembra Peci (1999), quando
analisadas sob a ótica das relações sociais; da qual assume-se o pressuposto de que
internamente uma organização constitui-se de uma rede de pessoas, departamentos e setores
específicos mantendo uma constante rede de relações; qualquer organização pode ser
considerada uma rede, na medida em que estabelece relações com outros atores sociais,
fazendo com que deste modo as redes possam ser vistas também sob o aspecto
intraorganizacional.
De toda sorte, a exemplo de Peci (1999), destaca-se como constructo de análise no presente
trabalho as formas específicas de organizações baseadas em redes, como aquelas que buscam
maior capacidade de adaptação às mudanças por intermédio de redes estabelecidas com
outras organizações. Neste sentido, as redes podem ser divididas em intra e
interorganizacioanais, as quais englobam as alianças, como por exemplo joint-ventures,
consórcios, franchising, as fusões e aquisições, as organizações virtuais, os clusters
(aglomerados), etc. (CÂNDIDO e ABREU, 2000).
Já quando analisadas sob a ponto de vista da economia dos custos de transação, e da
dependência de recursos, associadas ao enfoque de redes enquanto formulação estratégica,
pode-se definir uma Rede Organizacional como uma estrutura, na qual podem participar empresas, que devido a limitações de ordem dimensional, estrutural e financeira, não podem assegurar as devidas condições de sobrevivência e desenvolvimento. São formadas por uma estrutura celular não rigorosa e compostas de atividades de valor agregado que, constantemente, introduzem novos materiais e elementos. (CÂNDIDO e ABREU, p.06, 2000)
Sob esta mesma ótica, Cardoso et al (2002) afirmam que as redes são definidas como formas
híbridas de organização entre o mercado (onde a coordenação do trabalho se dá a partir da
racionalidade estrita de transações independentes ao longo do tempo) e a hierarquia (onde a
coordenação se dá pelo poder formal).
70
Uma rede, ainda para aqueles autores, “...é uma coleção de atores que estabelecem relações
de troca de longo prazo, e que ao mesmo tempo não possuem legitimidade e autoridade para
arbitrar e resolver disputas que podem ocorrer durante a troca” (PADOLNY e PAGE apud
CARDOSO et al, p.09).
Em termos gerais, afirmam os autores supra citados, a organização em rede pressupõe a
existência de objetivos / interesses comuns ou complementares entre os participantes,
caracterizando-se por:
a) Ser compostas por diferentes atores/organizações que interagem entre si e detém, cada um,
um conjunto de recursos;
b) Manter as organizações participantes da rede com um razoável grau de independência
formal / contratual entre si;
c) Propiciar relações “não formais” de dependência significativa entre os participantes da
rede, as quais se aprofundam na medida em que dinamicamente se desenvolvem os laços entre
os participantes;
d) Manter as interações entre os nós da rede não em momentos únicos, mas repetidos ao longo
do tempo, configurando padrões e evoluindo.
Em suma, princípios como o de interação, relacionamento, ajuda mútua, compartilhamento,
integração e complementaridade, estarão sempre presentes na análise de redes, ainda que sob
diferentes enfoques conceituais.
71
3.4 Tipologias de Redes
Como lembram Farias Filho et al. (1999), alguns fatores são comumente utilizados para
classificar e diferenciar os tipos de redes. Entre estes estão a dependência estratégica criada
entre as partes envolvidas, a forma relacional, a flexibilidade e integração da produção, o grau
de compartilhamento das funções, os objetivos e a amplitude dos mesmos, o tempo de
duração da relação, os setores industriais envolvidos, o grau e tipo de ligação e os vínculos
entre as partes, as liderança de organizações centrais, etc.
Diferentes estudos oferecem tipologias para a análise de redes organizacionais. Olivares
(2003), apresenta os tipos gerais de redes, ressaltando que uma rede enquadra-se, ou possui
características, simultaneamente em mais de um dos tipos descritos:
Quadro 4. Tipologia geral de redes organizacionais.
Critérios Tipos de Redes Características
(redes constituídas por)
Local Organizações da mesma nacionalidade
Nacionalidade Internacional
Organizações de nacionalidades diferentes
Bi-rede Somente duas organizações participantes
Número de participantes Poli-Rede
Mais de duas organizações participantes
Privada Organizações de direito privado
Propriedade Pública
Organizações de direito público
Integrada
Organizações com processos de negócios conjuntos em várias áreas simultaneamente (p.ex. finanças, marketing, logística, etc.) Processos conjuntos
Específica
Organizações com processos de negócios em áreas ou assuntos específicos. (p.ex. somente vendas)
continua
72
Critérios Tipos de Redes Características
(redes constituídas por)
Física
Organizações que se preocupam principalmente com o aspecto físico da relação, tendo em conta fatores de localização, tamanho, infra-estrutura, etc.
Abstrato-concreto
Virtual Organizações preocupadas principalmente com a relação cibernética, informática
Interna Organizações que fazem parte do mesmo grupo empresarial
Âmbito da relação Externa
Organizações que pertencem a diversos grupos empresariais
Permanente Organizações que participam da rede por período pré-determinado
Tempo de duração Variável
Organizações que tem liberdade para entrar ou sair da rede a qualquer momento, logicamente com aviso prévio
Industrial Organizações que atuam no setor industrial
Comercial Organizações que atuam no setor comercial
Setor de atuação
Serviços Organizações que atuam no setor de serviços
Similar
Organizações que possuem características similares de dimensão, sejam grandes, médias ou pequenas Tamanho
Não similares Organizações que possuem diferentes tamanhos
Sede conjunta Organizações que atum operacionalmente no mesmo local ou sede
Integração de layouts
Sede independente Organizações que atum operacionalmente em sedes diferentes
Fonte: elaboração do autor a partir de Olivares (2003).
Enquanto tipologias específicas, ancorados em estudos desenvolvidos por diferentes
pesquisadores do tema, trabalhos como os de Olivares (2003), Farias Filho et al. (1999) e
Cândido e Abreu (2000), descrevem aquelas que são apresentadas no Quadro 5 a seguir:
Quadro 4. Tipologia geral de redes organizacionais. continuação
73
Quadro 5. Tipologias específicas de redes organizacionais elaborada a partir da contribuição de diferentes autores.
Autores Tipos de Redes Características
Interna Constituídas por uma organização vinculada internamente à outra com o propósito de obter benefícios de mercado oriundos da divisão interna
Estável Constituídas por organizações independentes, de diferentes proprietários, obedece em sua construção a ótica da cadeia de valor do segmento no qual atua
Dinâmica, modular ou virtual
Também obedecem a ótica da cadeia de valor em sua constituição, distinguindo-se pela ausência de relação permanente, com ampla flexibilidade de entrada e saída da rede
Miles e Snow
Poli-Rede Possuem mais de duas organizações participantes
Top-down Definidas quando uma organização constitui-se em provedora de uma organização maior, ou de outro modo, uma empresa de menor porte fornece direta ou indiretamente sua produção a uma empresa-mãe, por meio de subcontratações, terceirizações, estabelecimento de parcerias e demais outras formas de repasse da produção Casarotto
Filho e Pires Flexível
Presentes quando várias organizações se reúnem para criação de uma aliança, ou de um consórcio, com objetivos amplos ou mais restritos, simulando a administração de uma grande empresa, mas com muito mais flexibilidade de atendimento a produtos diferenciados
de Fornecedores Envolvem a subcontratação e/ou os acordos entre um cliente e seus fornecedores de insumos intermediários para a produção
de Produtores Abrangem os acordos de co-produção firmados entre várias organizações, os quais permitem que produtores concorrentes reúnam seus meios de produção com o propósito de ampliar sua carteira de produtos, bem como sua cobertura geográfica
de Clientes Correspondem aos contratos e acordos firmados entre as indústrias (produção) e seus distribuidores, canais de comercialização, revendedores com valor agregado e usuários finais (comércio e serviços), visando mercados específicos
de Coalizões-padrão
Envolvem de um lado empresas capazes de constituírem-se em definidoras de padrões globais em seus ramos de negócios, com o objetivo de vincular outras empresas a seu produto ou padrões de interface, estendendo as suas relações comerciais
Ernst
de Cooperação tecnológica
Criadas com o propósito de facilitar a aquisição de tecnologia para projetos e produção, capacitar o desenvolvimento conjunto dos processos e da produção e permitir o acesso compartilhado aos conhecimentos científicos genéricos oriundos da P&D
de Relações organizacionais de forma par
Envolvem duas organizações
de Relações conjuntas inter-organziacionais
Quando uma organização se relaciona independentemente com cada uma das organizações participantes da rede Van de Ven e Walter
Network interorga-nizacional Quando todas as organizações participantes se relacionam mutuamente entre si.
Veereck e Van Dierdonck
Global Multinacional Transnacional
Definidas de acordo com sua amplitude geográfica
Fonte: elaborado pelo autor.
74
Cabe considerar ainda a proposta de Zaleski Neto (2000) que apresenta duas modalidades
básicas de redes, modo competitivo e modo cooperativo, afirmando que redes formadas pelo
modo competitivo implicam na existência de mercado econômico competitivo, estando
sujeitas a normas que regulam seu comportamento. Sendo assim, por apresentarem
relacionamento antagônico, suas ligações tendem a serem vistas com suspeição pelos
diferentes lados envolvidos. Por outro lado, se tais redes permitem o desenvolvimento de
relações interorganizacionais de caráter mais permanente, as empresas envolvidas podem ser
acusadas de subverterem o mecanismo do mercado na tentativa de alcançarem vantagens
injustas. Tem-se então em redes organizadas no modo competitivo, empresas identificadas
como entidades que buscam suas metas particulares, procurando manter sua autonomia e
efetividade para além das redes que participam.
As redes formadas no modo cooperativo pressupõem, segundo aquele mesmo autor, que as
organizações envolvidas muito embora possuam suas metas particulares, entendem que o
benefício será maior quando perseveram na procura de um objetivo maior, com o qual a rede
tem compromisso. Buscando alcançar este objetivo, as organizações estruturam suas
atividades considerando as outras participantes, pois acreditam que esta atitude é mais efetiva
que a atuação dos mecanismos de mercado. As redes podem ser classificadas ainda segundo
Zaleski Neto (2000) segundo seu objetivo (produtora ou criadora de fatores); sua estrutura
(república ou reino; vertical ou horizontal) ou sua dinâmica (estática ou dinâmica).
As redes criadoras de fatores, classificação mais oportuna no contexto da presente proposta,
são aquelas que têm por objetivo catalisar os esforços coletivos na criação de infra-estrutura
adequada para uma determinada indústria, envolvendo associações comerciais fortes ou
centros de serviços (em redes mais desenvolvidas), com o apoio do governo local e de
universidades (ou de outras instituições educacionais e de pesquisa). As redes produtoras são
75
formadas por firmas que se engajam na produção conjunta e/ou desenvolvimento de
atividades de marketing partilhadas.
É possível ainda efetuar outras classificações, como o fazem Cândido e Abreu (2000, p.07),
baseando-se nas finalidades da rede, tais quais redes de inovação24, redes de relacionamento,
redes de informação, redes de comunicação e redes de pesquisa.
A Figura 4 a seguir ilustra a evolução dos conceitos de redes em uma perspectiva
organizacional, partindo da utilização da teoria de redes sob o enfoque das redes sociais. Nela
é possível identificar alguns dos tipos aqui descritos:
24 As redes de inovação podem ser enquadradas também no conceito de Redes Técnico-Econômicas descritas por Callon (VIEIRA e OHAYON, 2002). Contudo, dadas as especificidades e importância deste tipo de redes para o presente estudo, estas serão abordadas separadamente, no tópico a seguir.
76
Figura 4. A evolução dos conceitos de redes em uma perspectiva organizacional.
Fonte: extraído de Cândido e Abreu (2000, p.03)
3.5 Redes e inovação tecnológica
Como já mencionado, o acesso à tecnologia é um dos fatores que tem levado as empresas a
procurarem as redes como estrutura organizacional, movidas seja pela importância que este
Teoria de Redes
Redes Sociais
Redes Intrapessoais Redes Interorganizacionais
(Bilateral / Multilateral) Homogênea / Heterogênea
Formal / Informal )
Redes Alianças
• Redes Flexíveis de PME's (Redes de Subcontratação) • Redes de Inovação • Redes de Relacionamento • Redes de Informação • Redes de Comunicação • Redes de Pesquisa
• De Fornecimento • De Posicionamento • De Aprendizado
• Estratégica • Vertical • Horizontal • Transacional
• Joint Ventures • Consórcios • Acordos Cooperativos • Fusões e Aquisições • Franchising • Organização Virtual • Clusters (etc.)
Sociologia Antropologia Psicologia Biologia Molecular Teoria de Sistemas
Interação / Integração Relacionamento Ajuda Mútua Compartilhamento Complementaridade
Redes Intraorganizacionais (Características da sua cadeia de valor e do processo produtivo)
77
fator adquire no tocante à competitividade, seja pela maior dificuldade relativa de acesso ao
mesmo.
Deste modo, é natural que o estudo sobre redes tenha evoluído no sentido de abordar a
questão tecnológica, focando-se na inovação. Um dos autores que tem se dedicado a isto é o
francês Michel Callon, no qual fundamentam-se textos como os de Vieira e Ohayon (2002) e
Hasegawa e Furtado (2001), utilizados como referenciais para este tópico.
Segundo Vieira e Ohayon
As redes de inovação (networks) se inscrevem dentro do conceito de redes técnico-econômicas definidas por CALLON e seus colaboradores (1992) que coordenam atores heterogêneos e contemplam níveis institucionais tais como governo, institutos públicos, universidades e firmas industriais, que participam coletivamente do desenvolvimento e da difusão de inovações, via numerosas interações, organizando as relações entre o meio científico e tecnológico, o governo e os mercados, em prol das inovações tecnológicas. (VIEIRA e OHAYON, 2002, p.07).
Deste modo, as redes técnico-econômicas distinguem-se dos tipos apresentados até aqui, não
se enquadrando nos modelos
descritos por economistas (sistemas produtivos), de sociólogos (interações humanas) e de administradores (relações inteorganizacionais e gerenciais)[...]. [Trata-se de] um conjunto coordenado de atores heterogêneos, como por exemplo, laboratórios públicos (IPPs), centros de pesquisa técnica, empresas, organizações financeiras, usuários e governos que participam coletivamente na concepção e desenvolvimento, produção e distribuição, ou da difusão de procedimentos para a produção de bens ou serviços, alguns dos quais dão origem a transações de mercado (CALLON, 1992, p. 73, apud VIEIRA e OHAYON, 2002, p.08).
Como detalham Hasegawa e Furtado (2001), na concepção de Callon o ator possui um papel
ativo na rede, definindo-se como qualquer entidade capaz de transformar e de criar um
conjunto de intermediários. Estes, que desempenham um papel passivo na rede, são
caracterizados como sendo qualquer elemento que passa de um ator para outro, oferecendo
consistência para a relação entre ambos, podendo ser classificados em quatro tipos: textos;
artefatos técnicos (instrumentos científicos, máquinas, robôs, bens de consumo, etc.);
habilidades ou capacidades incorporadas em seres humanos e dinheiro.
78
Conforme descrevem Vieira e Ohayon (2002) e Hasegawa e Furtado (2001), a rede técnico-
econômica engloba três pólos principais, e dois pólos intermediários identificados pelo tipo de
ator e de intermediários envolvidos:
• Pólos principais:
1. Pólo Científico: constituído de universidades e centros de pesquisa independentes,
públicos ou privados. É caracterizado pela produção e validação do conhecimento científico
que disponibiliza à rede como intermediários.
2. Pólo Tecnológico: constituído por laboratórios de empresas, centros de pesquisa
cooperativos e plantas piloto. Caracteriza-se pela concepção e desenvolvimento de objetos
materiais destinados a servir propósitos específicos. Seus intermediários incluem patentes,
protótipos, softwares, normas, padrões, modelos, projetos piloto, etc.
3. Pólo de Mercado: constituído de usuários.
• Pólos intermediários:
1. Pólo Transferência: atuando entre os pólos científico e tecnológico, envolve os recursos
envolvidos na transferência de tecnologia, como as competências incorporadas e os
mecanismos de contratos.
2. Pólo Desenvolvimento/Comercialização: presente entre o setor tecnológico e o mercado,
abrange as atividades de produção, distribuição e manutenção.
A Figura 5 abaixo permite que se visualize a organização da rede técnica-econômica proposta
por Callon:
79
Pesquisadores Científicos
Tecnólogos Engenheiros
Usuários Compradores
Processos e Produtos
CIÊ
NC
IA
(C)
TE
CN
OLO
GIA
(T
)
ME
RC
AD
O
(M)
Produção de conhecimentos
certificados
Patentes, Protótipos, Normas, Softwares, etc.
Competências Incorporadas Contratos
Difusão de produtos
Transferência (CT)
Desenvolvimento Comercialização
(TM )
Operadores de Transferência
Empresas - Distribuição
LEGENDA
Pólos principais Pólos intermediários Intermediários Atores
Figura 5. Rede ciência, tecnologia e mercado de Callon.
Fonte: adaptado de Vieira e Ohayon (2002, p.09).
Importante também é distinguir os conceitos apresentados por Callon de redes de adoção,
aquelas em que atores e técnicas já estão estabilizados; e redes de concepção, aquelas em que
os atores e técnicas estão em co-evolução (VIEIRA e OHAYON, 2002), as quais podem ser
analisadas utilizando-se os mesmos conceitos já apresentados.
Por fim, outra abordagem presente no trabalho de Callon, importante para a análise do objeto
de estudo da presente dissertação, é aquela relativa ao papel atribuído ao poder público na
implantação das redes técnico-econômicas.
80
No caso das redes implantadas sob os auspícios do poder público, estas devem, segundo
aquele autor,
facilitar as alianças, as aproximações, a circulação de homens e equipamentos, a difusão de informações e outros, estimulando a diversidade, encorajando opções originais e sua experimentação progressiva no âmbito de operações conjugadas e cooperações amplas. Quando estabilizadas as redes, os poderes públicos devem se retirar para evitar favorece qualquer que seja o ator. Devem organizar a competição e lutar contra as irreversibilidades que surgem, especialmente atuando em áreas como direitos de propriedade, dosando proteção e divulgação. Uma ação típica dessa fase é a de compatibilizar padrões e tecnologias, de maneira a evitar o desaparecimento prematuro de participantes. (VIEIRA e OHAYON, 2002, p.11).
Já no caso de programas tecnológicos, o poder público deve tomar em conta o estágio no qual
a rede se encontra; incompleta, dispersa ou polarizada; para então pautar a sua intervenção, a
qual justifica-se não só em função do potencial da aproximação de parceiros, os quais a
princípio não estabeleceriam nenhuma ação coletiva, como também pela possibilidade de
criação de um instrumento para a avaliação dos impactos dos programas tecnológicos por
intermédio de seu monitoramento. Do mesmo modo, tal monitoramento oferece as evoluções
temporais que permitem uma leitura estratégica do funcionamento da rede, tornando possível
a definição de trajetórias tecnológicas possíveis e outras ações necessárias, ainda que as
mesmas sejam pontuais (VIEIRA e OHAYON, 2002).
Para a conclusão deste capítulo é oportuno, como já ressaltado, apresentar a perspectiva de
redes na gestão do conhecimento, outro componente importante para melhor avaliar a
implantação de redes junto a unidades produtivas rurais, o que será feito em seqüência.
3.6 Redes e gestão do conhecimento
Quaisquer que sejam os enfoques teóricos ou conceituais utilizados para o estudo de redes,
um aspecto não pode, inegavelmente, deixar de ser lembrado: o papel desempenhado pelo ser
humano no funcionamento deste tipo de organização.
81
Destaca-se então o pensamento de Peci (1999, p.12), quando esta advoga a centralidade do
papel desempenhado pelo homem no funcionamento de redes organizacionais, recordando
que se tratam de homens comuns, expostos a fluxos de informações e comunicações, em
diferentes processos econômicos e sociais, de modo que, para a autora, tais homens devem ter
sua ação potencializada.
Esta afirmativa traz consigo a perspectiva da rede operando também como espaço de geração
e troca do conhecimento indispensável para potencializar a ação de seus operadores, fato este
reconhecido como de suma importância para também sob o aspecto estratégico, pois como
lembra Peci (1999):
Segundo Castells (1996), o [...] conhecimento, seja este “explicito” ou “tácito” 25 é de suma importância para a sobrevivência da “empresa criadora de conhecimento”. Uma grande parte do conhecimento acumulado na empresa provêm do conhecimento tácito e da experiência, o que o torna difícil de ser codificado Os trabalhadores devem estar em contato um com o outro, a fim de comunicar entre si, para poder aproveitar essa fonte importante de conhecimento. Assim, o estabelecimento de redes interorganizacionais, ou intraorganizacionais, faz possível uma maior interação entre os trabalhadores, cientistas, funcionários etc. dentro ou fora da organização, levando numa maior troca de conhecimentos”. (PECI, 1999, p. 12).
Diante de tais afirmações, justifica-se o fato que organizações ingressem em redes em busca
de aprender e adquirir cada qual outros produtos, conhecimentos e competências, fazendo
como que autores como Pereira e Pedrozo (2003) sugiram inclusive a distinção entre redes de
conhecimento, formadas para tais objetivos e redes de negócios, quando a intenção é
maximizar a utilização de recursos complementares, tais quais os principais modelos de rede
já descritos aqui.
25 Cabe lembrar o enfoque de conhecimento oferecido pelo pensador japonês Ikujiro Nonaka. Nesta abordagem “... para entender a verdadeira natureza do conhecimento e da criação do conhecimento é necessário reconhecer que o conhecimento tácito (geralmente complexo, sistêmico, pessoal, difícil de formalizar e fortemente relacionado à ação, procedimentos, rotinas, idéias, valores e emoções) e o conhecimento explícito (expresso de maneira formal e sistemática e compartilhado em forma de dados, fórmulas científicas e especificações) são complementares e ambos tipos são essenciais para o processo de criação de conhecimento organizacional”. (BALESTRIN e FAYARD, 2003).
82
Mas quais seriam os aspectos da operação de redes favoráveis ao processo geração e fluxo do
conhecimento? Pereira e Pedrozo (2003) lembram que no contexto da rede, favorece-se o
sucesso do processo de aprendizagem por intermédio da interação sinérgica criada entre seus
membros. Ou de outro modo, ao entrar em redes, as organizações buscam alcançar recursos
complementares, fazendo da rede o mecanismo para a transferência de conhecimento e
relacionamento de capacidades. A figura de Nielsen apresentada por aqueles autores facilita a
compreensão deste processo:
Figura 6. Complementaridade de conhecimento na rede
Fonte: extraído de Pereira e Pedrozo (2003, p.10).
De maneira distinta mas não totalmente antagônica, Balestrin e Fayard (2003), ainda
reportando à teoria de Nonaka, observam que o conhecimento só é criado por indivíduos, não
sendo possível a sua criação em uma organização ou uma rede interorganizacional, cabendo a
estas
proporcionar um espaço de relações positivas e construtivas entre os atores e entre os atores e seu ambiente. Assim, as trocas de dados, de informação, de opinião, de colaboração e de mobilização sobre um projeto confrontado às necessidades e ao desconhecido convergem a um ambiente para a ampliação do conhecimento dentro das organizações. (BALESTRIN e FAYARD, 2003, p.07)
Empresa A
Base de Conhecimento
Conhecimento Específico da
empresa
Capacidadescomplementares
Conhecimento derede
Transferência deconhecimento
Conhecimento específico da
empresa
Capacidadescomplementares
Base de Conhecimento
Empresa B
-Single ou Double-loopAprendizado
83
A pesquisa de campo realizada por aqueles autores no âmbito de PMEs, confirmou a
configuração de redes como elemento que proporciona as condições favoráveis aos processos
de criação e ampliação do conhecimento organizacional reforçando deste modo a afirmação
de que
uma rede interorganizacional poderá proporcionar um ambiente favorável à existência de uma efetiva interação entre pessoas, grupos e organizações, ampliando interorganizacionalmente o conhecimento criado inicialmente pelos indivíduos. Essa dinâmica forma uma verdadeira comunidade estratégica de conhecimento (Fayard, 2003) em que o conhecimento, as práticas, os valores, os processos, a cultura e as diferenças dos indivíduos são compartilhados coletivamente em favor de um projeto comum. Para Corno et al. (1999) as redes representam o lugar onde os processos de aprendizado e de sedimentação do conhecimento tomam forma. (BALESTRIN e FAYARD, 2003, p.07).
Por fim, cabe reforçar a observação de Cardoso et al. (2002) de que as competências não
devem ser analisadas isoladamente, já que se encontram presentes não somente junto aos
diferentes integrantes da rede, como podem estar presentes também em entidades tais como
centros de pesquisa e universidades, as quais, quando inseridas na organização da rede podem
significar também a construção de vínculos de longo prazo, modelo de rede caracterizado na
descrição da rede tecnico-econômica de Callon.
Conhecidos os aspectos teóricos e conceituais associados às redes organizacionais, apresenta-
se no próximo capítulo o objeto empírico da pesquisa, qual seja, o projeto Redes de
Referências para a Agricultura Familiar.
84
4. AS REDES DE REFERÊNCIAS PARA A AGRICULTURA FAMIL IAR
Considerando que as Redes de Referências para a Agricultura Familiar constituem o objeto
empírico deste trabalho, é preciso oferecer elementos que permitam ao leitor conhecer em
maior profundidade este projeto desenvolvido pelo IAPAR e EMATER/PR, melhor
habilitando-o à leitura deste texto, especialmente em seus capítulos finais, quando serão
discutidos os resultados obtidos e apresentadas as conclusões e recomendações da pesquisa.
O capítulo organiza-se de modo a apresentar primeiramente um breve histórico da adoção
desta metodologia, ressaltando sobretudo a experiência francesa na qual foi baseada, trazendo
na seqüência os objetivos e os elementos fundamentais para sua operacionalização, a
metodologia empregada e sua estrutura atual. Para tanto, fundamentou-se na leitura e
adequação do Manual Operativo do Projeto (MANUAL, 1999), bem como dos trabalhos de
Passini (1997), Miranda et al. (2001), Miranda e Doliveira (2005), e também, no tocante à
experiência francesa, em Soares Júnior et al. (2000).
4.1 Antecedentes do projeto e a experiência do Institut de l’Élevage
O projeto Redes inicia-se no programa de pesquisa em Sistemas de Produção do IAPAR,
quando do desenvolvimento de metodologias para as etapas básicas da pesquisa em sistemas
de produção agropecuários, quais sejam, a tipologia de produtores, o diagnóstico dos sistemas
e a validação de tecnologias e de sistemas modificados. Neste sentido, oportunizado por uma
parceria existente desde 1988 com o Institut de l’Élevage, instituição francesa de pesquisa e
desenvolvimento na área de produção animal, foi identificada uma alternativa metodológica
para a fase de validação de sistemas, traduzida na proposta das Redes de Propriedades de
Referências, desenvolvidas por aquela instituição desde 1981. Inicia-se então o processo de
85
intercâmbio de técnicos do IAPAR e do Institut de l’Élevage, treinamento de pessoal,
instalação de duas redes de propriedades em regime experimental em 1994, e finalmente a
implantação da proposta integral em 1998, pelo IAPAR e EMATER/PR, no âmbito do projeto
Paraná 12 Meses (MIRANDA e DOLIVEIRA, 2005; SOARES JÚNIOR et al., 2000).
Criado e gerido pelos produtores desde a década de 60, o Institut de l’Élevage é o resultado da
fusão de três diferentes institutos técnicos voltados à produção animal, constituindo-se em um
dos quinze institutos e centros técnicos organizados por produtos sob a responsabilidade das
organizações profissionais dos produtores franceses (SOARES JÚNIOR et al., 2000). Tais
instituições cumprem três tarefas básicas: definir, juntamente com todos os parceiros que
atuam na especialidade, as orientações técnicas a serem difundidas, realizar experimentações
e investigações aplicadas e apoiar o desenvolvimento de seus setores por intermédio da
formação e informação.
As Redes de Propriedades de Referências surgem no então Institut Techinique Élevage Bovin
(ITEB), antecessor do Institut de l’Élevage, como proposta de um método de pesquisa
aplicada. O principal objetivo desse método é a descrição do funcionamento das propriedades
agropecuárias, a partir dos dados técnicos e econômicos observados e registrados. Esses
registros e observações são realizados em todas as atividades desenvolvidas nas propriedades
acompanhadas, visando a avaliação global dos sistemas de produção.
A forte parceria com as Chambres d’Agriculture26 garante, além do acompanhamento das
propriedades a campo para a coleta de informações, a participação dos profissionais daquelas
26Criadas em 1924, constituem-se em organismos consultivos e representativos dos agricultores presentes nos âmbitos departamental, regional e nacional, com representantes eleitos por seus pares, aspectos que as credenciam como instância consultiva, de intervenção e coordenação da execução das políticas propostas para o segmento, às quais vinculam-se, entre outros, os serviços de assistência técnica (SOARES JÚNIOR et al., 2000).
86
organizações nas análises dos dados, nas intervenções técnicas necessárias para aprimorar os
sistemas de produção e na difusão dos resultados. Um Comitê de Pilotagem, constituído por
representantes de entidades que atuam na área rural, define os temas a serem trabalhados e os
tipos de propriedades, cabendo a coordenação geral do trabalho ao Institut de l’Élevage.
As Redes de Referências são formadas a partir das realidades regionais, selecionando as
atividades pecuárias mais representativas, tais como bovino de corte, bovino de leite, ovinos
de carne, caprinos, entre outras. Em cada sede regional de programação o Comitê de
Pilotagem se reúne uma ou duas vezes ao ano para avaliar e legitimar as diretrizes de
trabalho, permitindo a participação da comunidade no processo decisório das grandes linhas
de ação das Redes. O técnico do Institut de l’Élevage (“animador”) participa e assume a
secretaria executiva do referido comitê.
Os “animadores” regionais têm dedicação exclusiva e um papel fundamental na condução do
processo, pois coordenam as ações previstas nos planos de ação e executam a organização dos
dados coletados no campo. É preciso habilidade e tempo para agregar os profissionais das
Chambres d’Agriculture visando as análises das informações obtidas, processá-las e, a partir
daí, definir a melhor forma de difundi-las. Frente a essa complexidade, cada animador é
responsável por apenas um ou no máximo dois tipos de Redes (exemplo: Redes de Bovino de
Leite e de Caprinos), o que permite elevar o grau de especialidade técnica dos profissionais e
ter maior agilidade nas respostas às demandas dos agricultores acompanhados. As Redes
contam com de cerca de 214 Eqüivalentes-Técnicos e 3.000 propriedades acompanhadas. A
Figura 7 oferece uma visão geral da organização do trabalho.
87
Figura 7. Visão geral da estrutura Redes de Propriedades de Referências do Institut de l’Élevage com o número de propriedades e de técnicos participantes.
Fonte: extraído de Soares Júnior et al. (2000, p.18).
88
4.2 Objetivos e operacionalização das Redes
Conforme Passini (1997) e Miranda et al. (2001), as Redes buscam como objetivo geral
propor e difundir sistemas de produção equilibrados nas suas atividades e fatores de produção
para aumentar sua rentabilidade, viabilidade, estabilidade e adaptabilidade pelos agricultores
de mesmo tipo sócio-econômico.
Já como objetivos específicos encontram-se:
i) O levantamento de demandas de pesquisa a partir de diagnósticos nos
estabelecimentos participantes;
ii) A realização de testes, ajustes e validação de tecnologias;
iii) A oferta de tecnologias e/ou atividades que ampliem a eficiência dos sistemas
de produção;
iv) A disponibilização de informações e a proposição de métodos para orientar
os agricultores na gestão da propriedade rural;
v) A utilização das propriedades participantes como pólos de difusão e
capacitação de técnicos e agricultores; e ainda
vi) A oferta de subsídios para a formulação de políticas de promoção da
agricultura familiar.
Para garantir o cumprimento de tais objetivos, o Manual Operativo do projeto (MANUAL,
1999) previa a sua implantação com a estrutura descrita a seguir. Deveriam ser constituídos
dois tipos de comitês, para definir as orientações e garantir o funcionamento do método, a
saber:
89
a) Comitês de Coordenação
Constituídos para este fim nas três instâncias de trabalho (regional, mesorregional e estadual)
representam a autoridade deliberativa que possui a atribuição de impulsionar o trabalho e
coordenar a reflexão dos comitês técnicos. São ainda os responsáveis por levantar as
preocupações das diferentes regiões de trabalho no que diz respeito ao: funcionamento dos
sistemas predominantes, futuro de certos sistemas existentes; interesse de sistemas
inovadores, definindo o conjunto de sistemas a serem prioritariamente estudados.
Devem ser compostos pela Comissão Regional do Projeto Paraná 12 Meses, com a
participação de parceiros do desenvolvimento (EMATER/PR, IAPAR, ONG's, prefeituras,
sindicatos, conselho municipal de desenvolvimento, cooperativas, associações de produtores,
etc.).
b) Comitês Técnicos
Responsáveis pela realização dos trabalhos de estudo prévio, proposição e priorização dos
sistemas de produção a serem estudados e escolha das propriedades. Em número reduzido, são
formados por técnicos e alguns agricultores da região (cooperativa, sindicatos, prefeituras,
EMATER/PR). Na realização de seus trabalhos, seus membros deverão respeitar a decisão do
comitê de coordenação na definição dos objetivos para as Redes.
No plano executivo, o trabalho é realizado nas três instâncias já descritas (regional,
mesorregional e estadual), com a seguinte proposta de atuação de cada agente prevista no
Manual Operativo (MANUAL, 1999):
a) Estadual
Em nível estadual um articulador do IAPAR e um da EMATER, diretamente ligados à
coordenação do Projeto Paraná 12 Meses, devem garantir o bom funcionamento das Redes.
90
São responsáveis pela animação das equipes mesorregionais e também por promover a
integração das Redes com outras instâncias do governo e fora dele. Suas principais atribuições
são :
i) Coordenar e planejar o funcionamento das Redes;
ii) Garantir a execução de métodos comuns aos diferentes estágios de elaboração
das referências. Isto supõe organização/formalização, melhoramento
permanente dos métodos utilizados na busca de referências e sua valorização
e o treinamento para seu uso;
iii) Garantir que haja trocas de informação e de experiências dos resultados entre
os técnicos das Redes;
iv) Harmonizar no plano estadual as formas de apresentação de resultados e de
documentos de difusão, colocando à disposição dos diferentes intervenientes
nas propriedades as referências obtidas, levando em consideração a prática
profissional de cada um;
v) Assegurar a formação de novos extensionistas de sistemas e a formação
contínua dos que estão em atuação, e
vi) Avaliar as ações em diferentes níveis.
b) Mesorregional
Em cada mesorregião deve ser constituído um centro de difusão. Este centro deve ser
composto por uma equipe formada por dois pesquisadores do IAPAR e um extensionista da
EMATER abrangendo as áreas de recursos naturais, difusão de tecnologias, sócioeconomia e
91
produção vegetal/animal, que terão a função de animação e coordenação dos trabalhos das
equipe de técnicos regionais referentes ao seu núcleo.
Este centro deve possuir como principal missão a aglutinação e o tratamento das informações
obtidas nas Redes. Para isso são organizados diversos suportes de difusão adequados à
utilização por parte de técnicos e agricultores. É nesta instância que são definidas e
organizadas as operações de comunicação necessárias.
O trabalho de acompanhamento técnico e econômico realizado por extensionistas locais junto
às Redes deve gerar informações que, recolhidas e trabalhadas nos centros de difusão,
constituirão um banco de dados. Os tratamentos específicos após o reagrupamento dos dados
das propriedades similares no plano de suas dificuldades, de suas orientações, de seu
funcionamento (propriedades do mesmo caso tipológico), adicionam indicadores úteis sobre o
funcionamento e/ou seus resultados, ano após ano para diferentes categorias de propriedades.
As principais atribuições das equipes dos centros de difusão são:
i) Ajustar e atualizar o zoneamento agroecológico e a tipologia das
propriedades do núcleo que coordenam;
ii) Propor os sistemas de produção a ajustar e os temas de estudo a aprofundar;
iii) Apoiar técnica e metodologicamente os extensionistas de sistemas e garantir
o uso correto e uniforme da metodologia;
iv) Realizar, juntamente com os extensionistas de sistemas, o diagnóstico das
propriedades;
v) Orientar o estudo/projeto das propriedades das Redes;
92
vi) Aglutinar e analisar os dados obtidos nas Redes pertencentes à mesorregião;
vii) Realizar os ajustes dos dados para definição das referências técnicas e
econômicas dos sistemas de produção;
viii) Sistematizar os resultados obtidos e escrever os casos típicos;
ix) Implementar e coordenar as pesquisas adaptativas através de unidades de
teste e validação (UTV’s);
x) Orientar e propiciar a elaboração de instrumentos para difusão dos resultados
das propriedades de referências.
c) Regional com Extensionistas de Ssistemas
No plano prático o trabalho deve ser conduzido à escala das regiões administrativas da
EMATER/PR, com um técnico por região, bem preparado no uso da metodologia e sobretudo
nos conceitos do enfoque sistêmico. Este técnico deve ter facilidade para transformar os
conhecimentos adquiridos em publicações e documentos de difusão.
Este extensionista, dedicado integralmente ao projeto, é encarregado do acompanhamento de
uma rede composta por 20 estabelecimentos agropecuários, dedicando metade do seu tempo a
ele, e outra metade à difusão das referências
São atribuições destes extensionistas:
i) Diagnosticar os estabelecimentos da rede;
ii) Elaborar, em conjunto com o agricultor, o planejamento dos estabelecimentos;
iii) Acompanhar a execução do projeto (fase de intervenção);
93
iv) Registrar os resultados obtidos durante a implantação e execução do projeto (estes
registros comporão a base de dados para a elaboração das referências técnicas e
econômicas desejadas, pois são compostas de indicadores agronômicos e de
administração);
v) Sistematizar resultados e elaborar os casos típicos;
vi) Organizar a instalação e acompanhamento de UTV’s ;
vii) Ajudar na elaboração de suportes de difusão;
viii) Participar na formação e apoio técnico aos extensionistas locais, e
ix) Promover a difusão das informações obtidas nas Redes.
A estrutura de trabalho descrita pode ser visualizada na Figura 8, a seguir, extraída de Passini
(1997), presente também em Manual (1999). Alguns aspectos fundamentais da metodologia
de trabalho utilizada, bem como de sua estrutura atual são apresentados na seqüência.
94
Figura 8. Estrutura organizacional das Redes de Referências.
Fonte: extraído de Passini (1997, p.121).
4.3 Metodologia de trabalho utilizada e estrutura atual
A metodologia de implantação do projeto Redes prevê inicialmente a elaboração de um estudo
prévio sobre a região onde se instalará o trabalho, procurando-se a caracterização dos recursos
naturais e condições sócio-econômicas. Faz-se também a tipificação dos agricultores
familiares, levando em conta as atividades econômicas mais importantes na geração de renda
em suas propriedades e sua categoria social, o que permite a identificação dos principais
Estadual M esorregional Regional
Equipe Sistemas
Extensionista de Sistemas Coordenar e planejar o funcionamento Atualizar tipologia Escolher propriedades das redes Apoio metodológico e técnico Diagnosticar propriedades Garantir a execução do método de aos Extens ionistas de s istemas Elaborar projetos forma homogênea Ajuste de dados para obtenção de Orientar a execução dos pro jetos Promover a evolução do método referê n cias R egistrar os resultados obtidos Promover a troca de informações e Elaborar suportes de difusão Formação de E xtensionistas e xperiências Implementar e conduzir as Difusão local Gerenciar o a cordo de Cooperação pesquisas adaptativas Or ganizar UTV s Avaliar as ações
Comitês de Coordenação e
Té cnico
Comitês de Coordenação e
T é cnico
Comitês de Coordenação e
Té cnico
Rede de Propriedades
Centro de Difusão
Coordenação
95
sistemas de produção, seja pela freqüência com que ocorrem, seja pelo potencial como opção
para o desenvolvimento regional.
De posse dessas informações, previa-se inicialmente que a Comissão Regional criada para
acompanhar a implantação do projeto de Estado Paraná 12 Meses, composta por
representantes do governo e de beneficiários do projeto, selecionasse os sistemas a integrarem
as Redes, mas este método de seleção nem sempre pôde ser obedecido. Com o auxílio de
Extensionistas Rurais da região são escolhidos os agricultores que representarão estes
sistemas de produção, em número mínimo de quatro por sistema.
Os estabelecimentos escolhidos passam por um diagnóstico expedito, com base em
informações dadas pelos agricultores e por observações feitas pelo Extensionista das Redes
em visita de campo. Este diagnóstico servirá de base para a formulação de um plano de
melhorias de curto prazo, que visa principalmente a redução de perdas e a correção de
possíveis incoerências entre os objetivos dos agricultores e suas famílias e o sistema de
produção adotado no estabelecimento.
No processo de implantação deste plano, dados e informações são registrados de forma a
permitir a confirmação dos resultados positivos em relação ao estado inicial. Também este
período de observações permite a ratificação e/ou retificação do diagnóstico inicial. Ao final
de um ano já há condições para a formulação de um projeto de longo prazo buscando a
otimização no uso dos recursos da propriedade para obtenção dos melhores resultados, de
acordo com os objetivos dos agricultores e suas famílias. As propostas elaboradas em
conjunto entre técnico e agricultor, são implantadas num processo que pode levar de três a
cinco anos, dependendo da complexidade do sistema atual e daquele que se pretende
construir. Durante todo este período registros técnicos e econômicos são efetuados.
Validadas as propostas implantadas, estes dados constituirão as referências técnicas e
96
econômicas que servirão para a orientação dos agricultores com características semelhantes
representados nas Redes. O encadeamento das etapas metodológicas descritas acima pode ser
visualizado na Figura 9.
Figura 9. Etapas do trabalho das Redes de Referências.
Fonte: extraído de Miranda e Doliveira (2005, p.13).
A execução de cada etapa do trabalho propicia a geração de diferentes produtos. A
caracterização regional oferece informações sobre os recursos naturais, o quadro sócio-
econômico, agrícola e agrário das regiões trabalhadas. O diagnóstico identifica problemas e
oportunidades relevantes para o desenvolvimento da agropecuária regional. Já as referências,
de sistemas e modulares, são em essência o produto mais característico do projeto. As
Caracterização Regional
Tipificação Seleção das Propriedades
DD II FF UU SS ÃÃ OO
Escolha dos Sistemas
Diagnóstico
Planejamento
SS U B S Í D I O S
•Políticas públicas
•Pesquisa •Extensão
Referências (Sistemas e Modulares)
97
primeiras, relativas aos sistemas de produção analisados como um todo, as segundas, tomando
em conta a análise individual das diferentes atividades agrícolas e pecuárias componentes de
tais sistemas.
São obtidos assim, não apenas materiais de difusão, tanto de tecnologias quanto de
informações econômicas e métodos de gestão para instrumentalizar agricultores e agentes da
assistência técnica na condução de suas atividades, como também subsídios para a formulação
de políticas públicas e organização das ações da pesquisa e da extensão rural.
A Figura 10, abaixo, mostra a atual estrutura e distribuição regional das Redes:
Figura 10. Estrutura e distribuição regional das Redes de Referências para a Agricultura Familiar no Paraná.
Fonte: extraído de Miranda e Doliveira (2005, p.11).
Cornélio Procópio Londrina
Paranava
í
Umuarama
Campo Mourão
Toledo
Cascavel
Francisco Beltrão
Pato Branco Coordenação estadual
Equipe mesorregional
Extensionistas das Redes
Curitiba
Paranavaí
Cornélio Procópio Londrina Apucarana
Maringá
Toledo
Cascavel
Francisco Beltrão
Pato Branco
Umuarama
98
Já na Figura 11, são apresentados os municípios nos quais o projeto vem sendo executado,
destacando-se as atividades econômicas mais importantes na composição dos sistemas em
estudo em cada região:
Figura 11. Municípios onde existem estabelecimentos das Redes e principais atividades econômicas que compõem sistemas de produção em estudo.
Fonte: extraído de Miranda e Doliveira (2005, p.12).
Apresentado o objeto empírico da pesquisa, cabe, no próximo capitulo, descrever a
metodologia utilizada para a sua realização.
Noroeste: Leite, Grãos,
Fruticultura,
Sericicultura,
Café, Mandioca.
Oeste: Leite, Grãos,
Peixe, Pequenas
Criações.
Sudoeste: Leite, Grãos,
Fruticultura,
Agroindústria.
Norte: Grãos, Café,
Fruticultura,
ORNA* (oficina
de costura).
* Ocupação Rural Não-Agrícola
99
5. METODOLOGIA
5.1 Caracterização da pesquisa
A presente pesquisa caracteriza-se, conforme Mattar (1996), como qualitativa, descritiva e
exploratória. Qualitativa no que diz respeito à natureza das variáveis pesquisadas. Descritiva
no tocante ao relacionamento entre estas variáveis, já que não se buscou estabelecer quaisquer
relações de causa e efeito. E, finalmente, exploratória quanto ao seu objetivo e grau em que o
problema de pesquisa foi enfocado, pois não se trata de uma investigação conclusiva acerca
da questão, e sim de um aprofundamento sobre o tema, suscitando possíveis investigações
posteriores com a formulação de novas questões.
Quanto à sua amplitude, o método de pesquisa proposto alcança uma das dimensões
apresentadas por Abramo (1979, p.39), qual seja, aquela que abrange pesquisas monográficas
e de profundidade com o exame do maior número possível de variáveis que interfiram no
problema pesquisado.
Assim, a opção pela pesquisa qualitativa deveu-se à natureza do problema de pesquisa
identificado, o qual, por sua amplitude e inter-relações presentes, demandava uma abordagem
ampla que permitisse o entendimento do fenômeno com toda a sua complexidade, condição
para a qual, conforme sugere Godoy (1995a, p.63), a análise qualitativa está entre as mais
indicadas.
Entre o que Godoy (2005, p.86) classifica de “frondosa árvore” das metodologias qualitativas,
o presente estudo caracteriza-se como “básico ou genérico”, uma vez que contém
características essenciais da metodologia qualitativa, mas não possui os requisitos que
possibilitariam o seu enquadramento em um tipo específico, como por exemplo um estudo de
caso, um estudo etnográfico, ou outro qualquer.
100
Citando Merriam, Godoy (2005, p.86) afirma que “...o estudo qualitativo básico tem como
objetivo descobrir e compreender um fenômeno, um processo, ou as perspectivas e visão de
mundo das pessoas nele envolvidas”, características que reforçam a escolha da abordagem
aqui utilizada.
Ainda segundo aquela autora, quatro características-chave devem estar presentes nos estudos
qualitativos básicos, três das quais ao menos são encontradas no presente trabalho:
i) O pesquisador está interessado em compreender quais os significados que os participantes atribuem ao fenômeno ou situação que está sendo estudada. ii) Busca-se compreender os significados que as pessoas constroem sobre [ ] as experiências [...] vividas, tendo o pesquisador como principal instrumento de coleta e análise de dados. Para coletar os dados são feitas entrevistas, realizadas observações ou analisados documentos. iii) O processo de condução da pesquisa é essencialmente indutivo , isto é, o pesquisador coleta e organiza os dados com o objetivo de construir conceitos, pressuposições ou teorias, ao invés de, dedutivamente, derivar hipóteses a serem testadas. A análise indutiva dos dados leva a identificação de padrões recorrentes, temas comuns e categorias. iv) O resultado da pesquisa é expresso por meio de um relato descritivo – detalhado e rico – a respeito do que o pesquisador aprendeu sobre o fenômeno. Tais resultados são apresentados e discutidos usando-se as referências da literatura especializada a partir das quais o estudo se estruturou. (MERRIAM apud GODOY, 2005, p.86-86 – grifos no original)
Caracterizada a pesquisa desenvolvida, descreve-se na seqüência o seu universo de trabalho,
bem como as fontes e os instrumentos de coleta de dados utilizados.
5.2 Universo de pesquisa, fontes e instrumentos de coleta de dados
Em seu componente empírico, o estudo está circunscrito ao Estado do Paraná, contemplando
o exame da iniciativa em curso no tocante à organização de redes de unidades produtivas
rurais, qual seja, o projeto Redes apresentado no capítulo anterior.
Já no que diz respeito ao seu componente teórico, muito embora a pesquisa bibliográfica para
a análise da potencialidade de utilização de redes interorganizacionais como instrumento para
o DTR tenha propiciado exame de material bibliográfico referente a situações nacionais e
101
internacionais, a discussão dos resultados obtidos focou-se também nas condições
paranaenses, ainda que sua transposição para outras realidades seja perfeitamente possível,
desde que sempre considerada a necessária observância às especificidades locais.
Além do levantamento e análise bibliográfica que permitiu o alcance do objetivo específico de
caracterizar a adoção de redes de unidades produtivas no contexto rural à luz das diferentes
tipologias e abordagens paradigmáticas existentes, a pesquisa contou também com um
levantamento de experiências, realizado conforme descrito a seguir, o qual possibilitou a
discussão do método de implantação e condução hoje utilizado no projeto Redes e a avaliação
da necessidade e das possibilidades de ajustes face um contexto mais amplo de DTR.
Para Mattar (1996, p.82-83), o levantamento de experiências coloca-se como método efetivo
de pesquisa exploratória dado o fato de que “...grande parte das experiências e dos
conhecimentos adquiridos não está escrita. Muitas pessoas, em função da posição
privilegiada que ocupam cotidianamente, acumulam experiências e conhecimentos sobre um
dado tema ou problema em estudo”.
Cooper e Schindler (2003) lembram que as entrevistas com especialistas encontram-se entre
as técnicas recomendadas nesta perspectiva, devendo ser conduzidas de modo a permitir que
se busque não só as idéias do entrevistado em relação a aspectos importantes do assunto
tratado, mas também a descoberta acerca daquilo que é importante dentro do campo de
conhecimento da pessoa, utilizando-se para tanto de um formato investigativo flexível, que
permita a livre manifestação do entrevistado, de modo que se explore em profundidade as
informações e os detalhes que surgem durante a entrevista.
Neste sentido, o levantamento de experiências foi conduzido pelo autor da pesquisa por meio
da realização de sete entrevistas semi-estruturadas, pessoais (face a face) e individuais, junto a
102
técnicos do Sistema Estadual de Agricultura e do Ministério de Desenvolvimento Agrário,
identificados no Anexo 2.
Como critério para a seleção dos entrevistados, considerou-se o grau de contato profissional
que os mesmos possuem com os temas em questão, avaliado por meio não somente de suas
atuais funções, mas também pelas atividades desenvolvidas que os credenciam para a
colaboração na pesquisa.
A condução das entrevistas foi norteada pelas orientações de Quivy e Campenhoudt (1992).
Partindo da necessidade de um ambiente e contexto adequados, foram realizadas nos
escritórios de trabalho dos entrevistados em dia e hora previamente agendados por meio de
contato telefônico ou por correio eletrônico, momento no qual foram expostos os objetivos do
trabalho e solicitada a colaboração.
As entrevistas foram iniciadas com uma exposição introdutória na qual reiteravam-se os seus
objetivos e as expectativas presentes com a colaboração do entrevistado. As intervenções
realizadas ativeram-se exclusivamente à condução do roteiro, o qual não foi necessariamente
obedecido no que diz respeito à seqüência de questionamentos. Realizadas em outubro de
2005, as entrevistas, que tiveram entre 19 e 36 minutos de duração, foram todas gravadas,
totalizando-se 199 minutos de gravação, posteriormente transcritos na íntegra.
No roteiro de entrevista utilizado (Anexo 3), procurou-se formular as perguntas da forma mais
aberta possível, tendo em mente o objetivo geral do trabalho, bem como um de seus objetivos
específicos. O Quadro 6 apresenta as questões presentes no roteiro, de modo a vinculá-las aos
objetivos propostos e às questões de pesquisa que lhe deram origem:
103
Quadro 6. Identificação das questões de pesquisa e dos objetivos contemplados nas diferentes questões do roteiro utilizado nas entrevistas com Técnicos.
Questões de Pesquisa Objetivos Questões no roteiro de entrevistas
1. Considerando a implantação dos projetos de desenvolvimento territorial rural atualmente em curso no estado, a organização de Redes de Unidades Produtivas Rurais poderia se constituir, no seu entendimento, em uma estratégia de ação pertinente para a consecução dos objetivos gerais destes projetos? Por quê?
As redes de unidades produtivas rurais podem se constituir em um instrumento útil ao processo de desenvolvimento territorial rural ?
Geral - Identificar as potencialidades e as limitações de utilização das redes de unidades produtivas rurais como instrumento de desenvolvimento territorial rural
2 e 3. Quais seriam ao seu ver as principais (2) potencialidades / (3) limitações contidas na implantação de Redes de Unidades Produtivas Rurais, sobre a ótica destes projetos?
4 e 5. Quais seriam ao seu ver as principais (4) potencialidades / (5) limitações contidas na implantação de Redes, tal qual hoje concebidas na proposta da EMATER/PR e IAPAR, sobre a ótica destes projetos? 6. Face as suas considerações anteriores e a atual experiência de implantação de Redes desenvolvida pela EMATER/PR e IAPAR, existiriam alterações a fazer no escopo da atual proposta? Quais seriam estas? 7. Além das eventuais alterações no escopo do projeto, seriam necessárias também, no seu entendimento, alterações de ordem metodológica / operacional? Em caso positivo, discuta estas alterações considerando as diferentes etapas de implantação das Redes.
Em que medida as Redes hoje implantadas podem ser ajustadas para que sua utilização seja potencializada em um contexto mais amplo de desenvolvimento ?
Específico II - Discutir o método de implantação e condução hoje utilizado no projeto Redes, avaliando a necessidade e possibilidades de ajustes face um contexto mais amplo de desenvolvimento territorial rural.
8. Além das eventuais alterações já mencionadas, seriam necessárias também, no seu entendimento, alterações de aspecto institucional no tocante a articulação das instituições responsáveis pela proposta.
104
5.3 Análise das informações
A técnica da entrevista pressupõe que na comunicação entre entrevistado (emissor) e
entrevistador (receptor), seja gerado um conjunto de significados que deve ser decifrado para
que seja procedida a sua análise. Conforme afirma Bardin (1977, p.32), “...qualquer
comunicação, isto é, transporte de significações de um emissor para um receptor, controlado
ou não por este, deveria poder ser escrito e decifrado pelas técnicas de análise de conteúdo”,
as quais partem, como ressalta Godoy (1995b, p.23) “...do pressuposto de que, por trás do
discurso aparente, simbólico e polissêmico, esconde-se um sentido que convém desvendar”.
Diante disto, para a análise das informações obtidas nas entrevistas realizadas, optou-se pela
análise de conteúdo, definida por Bardin (1977) como sendo
um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção / recepção (variáveis inferidas) destas mensagens. (BARDIN, 1977, p.42).
Uma das funções apresentadas por aquele autor para este conjunto de técnicas mostrou-se
fundamental quando de sua escolha, qual seja, aquela que permite verificar por meio da
análise sistemática a confirmação, ou não, de questões ou afirmações provisórias, o que
reforça a possibilidade de utilização da análise de conteúdo também em documentos gerados
para fins específicos de pesquisa, como é o caso das entrevistas realizadas para o presente
trabalho (BARDIN, 1977, p. 39).
Como ressalta aquele autor, não existe um modelo único de análise de conteúdo, mas sim
algumas regras básicas que devem ser obedecidas para que seja alcançado o duplo propósito
de: i) compreender, tal qual um receptor da mensagem em condições normais, o sentido da
comunicação, mas também, ii) captar, no desvio de olhar do investigador, as mensagens
presentes ao lado da mensagem primeira, ou seja, não somente uma leitura literal, mas sim
105
uma leitura que ressalte questões subjacentes que permanecem em um segundo plano.
Metaforicamente, sugere Bardin (1977, p.41) tem-se o plano horizontal, com a análise
descritiva do texto e o plano vertical, no qual são feitas as inferências possíveis, atingindo
assim o objetivo para o qual a técnica se vale27.
Ainda segundo Bardin (1977), para a utilização da análise de conteúdo, prevê-se a execução
de três etapas fundamentais, com procedimentos de trabalho bem definidos, embora flexíveis.
Tais etapas são descritas abaixo considerando o contexto de sua adoção neste trabalho:
i) Pré-análise: é a fase de organização do trabalho com a preparação do material e
definição dos parâmetros que conduzirão a análise. Compreende a chamada leitura flutuante,
momento no qual procedeu-se um primeiro contato com a transcrição das entrevistas
degravadas, recordando-se detalhes na condução destas, estabelecendo-se ainda as primeiras
impressões e orientações sobre a análise que se seguiria. Neste momento também foram
recuperados os objetivos que suscitaram as entrevistas, definindo-se três categorias de análise
a partir das nove questões inicialmente formuladas.
Tais categorias foram assim denominadas: i) A estratégia de redes e o DTR: envolve a
discussão das limitações e potencialidades de adoção desta estratégia organizacional nos
projetos de DTR, correspondendo às questões 1, 2 e 3 do roteiro de entrevistas; ii) o projeto
Redes e o DTR: abarca as questões associadas à condução atual do projeto e sua associação ao
DTR, correspondentes aos itens 4 e 5 do roteiro; e, por fim, iii) Perspectivas para as Redes:
pautada nas três últimas questões do roteiro, abrange as perspectivas de futuro apresentadas
para o projeto, associadas ou não diretamente ao DTR.
27 A distinção que o autor apresenta entre a lingüística e a análise de conteúdo ajuda a melhor compreender esta última. Bardin (1977, p.44) ressalta que a lingüística, o estudo da língua, busca descrevê-la para interpretar o seu funcionamento, enquanto a análise de conteúdo procura conhecer aquilo que está por trás das palavras sobre as quais se debruça, buscando outras realidades através das mensagens.
106
ii) Exploração do material: trata-se da execução dos procedimentos definidos na pré-análise.
Aqui, as entrevistas foram analisadas novamente, retendo-se agora na separação e
classificação nas categorias acima descritas, as quais foram sendo permanentemente cotejadas
com o referencial teórico utilizado. Operacionalmente, foram identificados e grifados no
material transcrito das entrevistas os trechos correspondentes a cada uma das categorias, os
quais foram depois agrupados com o auxilio do editor eletrônico de texto, constituindo-se
assim no documento base utilizado na etapa seguinte.
iii) Tratamento dos resultados obtidos e interpretação: é a etapa na qual trabalha-se na busca
de padrões, tendências ou relações implícitas, significativas e válidas, que permitam a
realização de inferências que venham ao encontro dos objetivos do estudo. Procurou-se,
tomando como unidade de análise parágrafos e sentenças, ressaltar a estrutura lógica do texto
produzido com o entrevistado. Os resultados obtidos nesta etapa constituem a base do
próximo capítulo.
5.4 Modelo de Pesquisa
A Figura 12, a seguir, ilustra o modelo de pesquisa adotado, apresentando a combinação
utilizada de enfoques teóricos e diferentes fontes de dados para fazer frente aos objetos de
pesquisa descritos:
107
Figura 12. Modelo de pesquisa adotado.
Projeto Redes e sua associação às experiências com
DTR em implantação no
Paraná
Experiências com DTR e redes
interorganizacionais externas a
delimitação do estudo
Enfoque Teórico Objeto de Pesquisa Fonte de Dados
Red
es in
tero
rgan
izac
iona
is
Des
envo
lvim
ento
Ter
ritor
ial R
ural
Revisão bibliográfica
Questionários com Técnicos
108
6. RESULTADOS E DISCUSSÃO
A estrutura deste capítulo obedece à seqüência dos objetivos específicos definidos para a
pesquisa. Assim, discute-se primeiramente, com base na literatura pesquisada, a
caracterização da adoção de redes de unidades produtivas no contexto rural, tal qual proposta
no projeto Redes, à luz das diferentes tipologias e abordagens paradigmáticas existentes.
Passo seguinte, com base nos aportes teóricos e nas entrevistas realizadas, é discutida a
adequação, as potencialidades e as limitações da adoção da estratégia de redes
interorganizacionais em projetos de DTR, bem como o método de implantação e condução
hoje utilizado no projeto Redes, avaliando na seqüência a necessidade e as possibilidades de
ajustes em face do contexto mais amplo do DTR.
Tal discussão apresenta-se pautada naquelas que foram as categorias de análise definidas para
o tratamento das informações obtidas nas entrevistas, seguindo a denominação já apresentada:
a estratégia de redes e o DTR, o projeto Redes e o DTR e perspectivas para o projeto.
Para cada um destes tópicos, a discussão organiza-se considerando elementos no plano
teórico, a partir da literatura pesquisada e no plano empírico, destacando as informações
obtidas nas entrevistas realizadas, complementando-se com a formulação do autor a partir
destas duas fontes de dados.
6.1 Redes: Classificação teórica e conceitual
Como pôde ser visto, movida por fatores como o novo ambiente competitivo e alavancadas
pelas modernas tecnologias de informação e comunicação, a implantação e operacionalização
de redes interorganizacionais obedece as mais diferentes finalidades específicas, que passam
109
pela realização de ações compartilhadas nas áreas de marketing, treinamento, pesquisa e
desenvolvimento, entre outras.
Distinguidas na teoria organizacional sob o prisma dos paradigmas teóricos utilizados para a
sua análise, a organização de redes vem sendo estudada sob duas diferentes abordagens
designadas como técnico-econômica e histórico-cultural. Entre estas, propõe-se que a
abordagem histórico-cultural seja a mais apropriada para a análise da atual
conformação das Redes de Referências para a Agricultura Familiar.
Com efeito, criadas por ação de um interveniente externo, no caso instituições públicas como
o IAPAR e a EMATER/PR, as Redes não necessitam para a consecução de seus objetivos -
com destaque para geração das referências técnicas e econômicas, de que os aspectos
associados à gestão operacional, à gestão estratégica ou de custos das unidades participantes
sejam definidos no âmbito da rede da qual participam.
Dito de outro modo, o agricultor participante continua a levar em conta na gestão de sua
unidade produtiva e em seu processo de tomada de decisão, fatores de ordem exclusivamente
individual, utilizando os produtos decorrentes de sua contribuição e participação no
dispositivo como insumos para o aprimoramento de seu sistema produtivo.
Assim, torna-se menos relevante analisar o funcionamento das Redes sob a ótica da estratégia
competitiva dos agentes participantes – os agricultores, perspectiva dominante na orientação
técnica-econômica, do que sob os aspectos da territorialidade, no qual a esfera econômica é
considerada em uma dimensão social mais ampla, e do reconhecimento mútuo e identidade
social dos atores, fatores relevantes para motivar e garantir a continuidade da participação no
projeto, aspectos esses subjacentes à abordagem histórico-cultural.
110
Já no tocante à sua tipologia, as Redes podem, seguindo dez os critérios gerais propostos por
Olivares (2003), serem classificadas como:
i) Nacionalidade - Local: reúnem organizações da mesma nacionalidade;
ii) Número de participantes - Poli-redes: participam mais de duas organizações;
iii) Propriedade - Público-privada: envolvem organizações de direito privado, sob a
coordenação de instituições públicas;
iv) Processos Conjuntos - Específica: a ação coletiva está voltada ao objetivo específico
de compartilhar dados e informações;
v) Abstrato/Concreto - Virtual : o compartilhamento de ativos e fatores físicos é
inexistente. Ainda que atualmente não esteja previsto este tipo de participação, em
última análise, o agricultor poderia participar do dispositivo de modo exclusivamente
virtual;
vi) Âmbito da relação - Externa: ou interorganizacional, envolve unidades produtivas
distintas;
vii) Tempo de duração - Variável: participantes tem liberdade de entrar e sair da rede a
qualquer momento;
viii) Setor de atuação – Agropecuária: participantes vinculados a este setor da
economia;
ix) Tamanho – Similares: no âmbito de uma rede, os agricultores participantes
possuem estrutura produtiva similar; e
111
x) Integração de layouts – Sede independente: participantes atuam operacionalmente
em diferentes locais.
Complementarmente, quando consideradas as tipologias específicas formuladas por diferentes
autores, as Redes podem ser classificadas como:
i) Miles e Snow - Rede dinâmica, modular ou virtual: distinguem-se pela ausência
de relação permanente, com ampla flexibilidade de entrada e saída da rede.
ii) Casarotto Filho e Pires - Rede flexível: voltada a um objetivo restrito, embora sem
o propósito de atendimento a produtos diferenciados.
iii) Ernst - Rede de cooperação tecnológica: criadas com o propósito de facilitar o
acesso à tecnologia de produtos e processos e permitir o acesso compartilhado aos
conhecimentos científicos genéricos oriundos da Pesquisa e Desenvolvimento.
iv) Van de Vem e Walker - Network interorganizacional: quando todas as
organizações participantes se relacionam mutuamente entre si.
v) Zaleski Neto – Rede do modo cooperativo: os agricultores envolvidos embora
possuam metas particulares, entendem que o benefício será maior quando
perseveram na procura de um objetivo maior, no caso a melhoria dos processos
produtivos.
vi) Pereira e Pedrozo – Rede de conhecimento: o aprendizado e a aquisição de
conhecimentos e competências sãos os fatores motivadores para o ingresso na
rede.
112
Deve-se destacar, contudo, que muito embora as Redes possam ser tomadas como
representantes de quaisquer dos tipos específicos acima descritos, nenhum desses capta, na
dimensão apropriada, a participação dos organismos públicos na implementação e
funcionamento do dispositivo, sendo mais adequados à leitura sob a ótica de um participante
individual.
Esta é a razão pela qual acredita-se que, a melhor maneira de definirem-se as Redes seja
como um tipo de rede de inovação, com uma lógica operacional próxima àquela presente
no modelo de redes técnico-econômicas proposto por Michel Callon.
Ali, estão contemplados níveis institucionais tais quais os institutos públicos, as universidades
e outros que “...participam coletivamente do desenvolvimento e da difusão de inovações, via
numerosas interações, organizando as relações entre o meio científico e tecnológico, o
governo e os mercados, em prol das inovações tecnológicas” (CALLON, 1992, p.73, apud
VIEIRA e OHAYON, 2002, p.07).
Como já discutido, Callon sugere que as redes técnico-econômicas distinguem-se dos tipos
descritos por economistas e administradores, já que envolve de forma coordenada agentes
heterogêneos, públicos e privados, voltados à “...concepção e desenvolvimento, produção e
distribuição, ou difusão, de procedimentos para a produção de bens ou serviços” (CALLON,
1992, p. 73, apud VIEIRA e OHAYON, 2002, p.08).
Aquele autor aponta explicitamente o papel do poder público no funcionamento da rede, na
qual deve atuar como animador e catalisador de ações coletivas, a exemplo do papel
desempenhado nas Redes pelo IAPAR e EMATER/PR.
Assim, ainda que tal classificação não possa ser realizada de modo pleno; existem distinções
entre os pólos propostos por Callon e aqueles efetivamente trabalhados nas Redes, acredita-se
113
que uma rede de inovação técnica-econômica, implantada no modelo proposto por aquele
autor é o tipo que mais se aproxima das estratégias de operacionalização hoje presentes nas
Redes.
6.2 A estratégia de redes e o desenvolvimento territorial rural
6.2.1 Adequação
Os estudos realizados para a presente pesquisa permitiram observar que, a adoção de redes
enquanto forma organizacional e o enfoque do DTR possuem como fatores motivadores, entre
outros, a necessidade de reação aos processos de globalização, abertura, concentração e
internacionalização das economias.
Se por um lado tais processos resultaram em um ambiente cada vez mais concorrencial, tido
como estimulante para a emergência das redes (LOIOLA e MOURA, 1996), por outro lado
são identificados como alguns dos condicionantes externos que levaram ao esgotamento dos
enfoques tradicionais de desenvolvimento rural, aos quais o DTR surge como proposta
alternativa (SCHEJTMAN e BERDEGUÉ, 2004).
No aspecto teórico, tais estudos não deixam margem de dúvida para afirmar-se que, a
estratégia de implantação e operacionalização de redes interorganizacionais, em seu
sentido amplo, constitui-se em instrumento adequado ao enfoque do DTR. Tal assertiva
sustenta-se em três principais aspectos, aqui apresentados e discutidos:
i) A formação do capital social, elemento marcante para o DTR, também pode ser
encontrada e intensificada com a operacionalização de redes, já que estas
favorecem o estabelecimento dos chamados laços de tipo cola, ao reforçar espaços
114
criados com base na confiança gerada pela identidade social dos atores. Favorecem
também os vínculos em formato de ponte, uma vez que propiciam aos
participantes a possibilidade de interações para além daquelas presentes em sua
vida social imediata, fato este que, sustenta Abramovay (2003), pode potencializar
as iniciativas em busca do desenvolvimento.
ii) A própria definição de território, reforça a idéia do estabelecimento de redes, no
caso sociais e interorganizacionais, uma vez que concebe território para além dos
aspectos naturais, definindo-os como espaços construídos a partir da capacidade de
estabelecimento de relações organizadas, mercantis ou não, por parte dos atores,
relações essas que favoreçam, entre outros aspectos, a troca de informações
(ABRAMOVAY, 2003).
iii) A perspectiva do desenvolvimento endógeno presente no DTR, qual seja a
valorização dos recursos naturais, dos recursos humanos e culturais, das empresas
e das iniciativas locais (IPIRANGA, 2001 e MIOR, 2005), também encontra
resguardo na estratégia de organização de redes, as quais podem constituir espaços
que estimulem, entre os seus participantes, a construção de capacidades úteis aos
processos de desenvolvimento.
No plano empírico, as análises obtidas nas entrevistas realizadas, foram unânimes no sentido
de confirmarem a pertinência da organização de redes para as ações de DTR. As
mudanças nos ambientes produtivos surgiram, entre os entrevistados, como fatores
motivadores para a adoção de tal estratégia:
115
...eu acho que, prá qualquer tipo de objetivo em comum, o trabalho em rede é interessante. Porque, ainda mais vendo que hoje as instituições, as organizações, as unidades, não tem condições de sozinhas competir com a tal da globalização. Porque você tem uma competição que vai além dos limites daquela região e tudo mais. Não tem como sozinho, individualmente, se viabilizar. Então eu acho que para qualquer atividade que tenha um objetivo comum, logicamente né! Trabalho em rede é fundamental no sentido de buscar complementaridade né! Um poder colaborar naquilo que é forte pro outro, os dois juntos, a rede, os dois chegarem lá. (6)28
Contudo, o que não deixa de ser surpreendente, uma vez que os entrevistados são em sua
totalidade técnicos da área de ciências agrárias, sobressaiu-se, como justificativa da
pertinência de tal estratégia organizacional nas ações de DTR, o capital social dela resultante,
fato que, como já mencionado, pode ser justificado também na literatura sobre o tema:
...além do objetivo que ela [rede] tem de construir referência para o desenvolvimento de tecnologias e validação, ela tem um componente que é a participação efetiva dos atores né! O processo de desenvolvimento territorial também pressupõe não só o resultado, mas que o processo seja participativo, portanto gerando formação de capital social né! Acho que neste aspecto, pelo que entendo, a rede também tem esta característica, a participação no processo, no crescimento do processo. (4) Considerando redes um processo assim de articulação, uma ferramenta de articulação para o desenvolvimento seja pro lado tecnológico, seja, de vida né! De desenvolvimento local territorial.[...] é técnica de gestão, na verdade, né! É técnica de gestão! De grupo de pessoas, é network, trabalho de grupo. Isso não é novidade e tem tecnologia. [...] soluções que a gente vê prá resolver problemas estruturais em áreas produtivas, em ambiente ou em territórios foram com o mesmo tipo de metodologia, de juntar esforços. Precisa ter um pacto com as pessoas, precisa fazer as pessoas almoçarem junto, é comer do mesmo prato, tem que ter um certo pacto aí, estar cooperando. Tem que melhorar o relacionamento interpessoal. (5)
6.2.2 Potencialidades e Limitações
Na literatura consultada, as potencialidades teóricas associadas à criação de redes destacam
a pertinência desta estratégia quando presente no universo das pequenas e médias empresas
(PMEs), estrutura produtiva equivalente àquela predominante nos territórios rurais
paranaenses.
Assim, a proposição de organização em redes para a aquisição de recursos e competências
que individualmente a organização não possui, ressalta-se como potencial para este público
28 Os números que surgem entre parênteses foram aleatoriamente escolhidos para designação do entrevistado.
116
já que as unidades produtivas deste segmento em geral encontram-se impossibilitadas de
dominar todas as atividades, cada vez mais complexas, de um ciclo de agregação de valor.
Deste modo, a organização de redes para unidades produtivas no contexto do DTR, representa
uma opção estratégica para a competitividade dessas frente as grandes empresas, permitindo
com que busquem superar certas dificuldades, como o baixo volume de compras, o que as
impede de obter melhores preços e vantagens na compra de matérias-primas, custos de
participação em feiras, atualização tecnológica, acesso a linhas de crédito e financiamento,
entre outros (BALESTRIN e FAYARD, 2003).
Outros aspectos apontados na literatura, dizem respeito à formação de um ambiente profícuo,
com geração de confiança entre as firmas, o qual favorece, entre outras ações, o
compartilhamento e a discussão de informações sobre mercados, tecnologias e lucratividade
(BALESTRIN e FAYARD, 2003); elementos que vem ao encontro dos aspectos
participativos do DTR.
Entre os entrevistados, em geral, a discussão acerca das potencialidades referentes à
implantação de redes de unidades produtivas como instrumento de apoio ao DTR, foram
contaminadas por observações referentes ao projeto em curso. A potencialidade identificada
efetivamente referente à implantação de redes com objetivos distintos das atuais, refere-se ao
fortalecimento do mercado local, o que vai ao encontro da premissa de desenvolvimento
endógeno acima discutido:
Eu acho que fortaleceria, [...] e eu acho que um reflexo mais diretamente vinculado à agricultura familiar e ao pequeno empreendedor vamos chamar assim o microempreendedor lá, local. Acho que abrirá a perspectiva de renda num modo geral no território, ampliará a perspectiva de renda e ocupação no sentido em que você poderia construir mecanismos de comercialização solidária, você poderia construir mecanismos de comercialização desses grupos com o setor público, dessas compras públicas, então você daria uma injeção na economia local que permitiria você criar espaços de renda maior e de trabalho.(7)
117
Finalmente, de modo paradoxal mas justificável, os entrevistados afirmam que as limitações
contidas na adoção de redes sob o enfoque do DTR residem no mesmo elemento apontado
como principal justificativa para a implementação de tal estratégia - o capital social:
Habilitação das pessoas. Trabalhar em redes exige consciência elevada, [...]. Exige algo maior, algo de espírito assim, no sentido de conseguir dividir, repartir, perdoar amar! [...] Isso a gente vai aprendendo na vida, não aprende na escola ou mesmo no berço em casa. Quando você divide você ganha né? E isso é lei, é interessante, tá na natureza! Então, as pessoas educadas e treinadas, sejam nas empresas, na escola, na família, são instituições básicas, tem que aprender isso em algum lugar. Então pra falar em desenvolvimento territorial, tem que falar de educação de base de princípio moral, ético nesse sentido, espiritual também.(5) Ah ! eu acho que tem uma limitação que sempre aparece. Bom, a gente tem uma cultura própria né! Uma propriedade, uma pessoa, uma instituição, tem uma tendência achar que tudo que faz, faz bem né! Lógico que faz melhor, que tá com a razão nas coisas. Então se tem uma dificuldade de se colocar na condição do outro, na posição do outro. [...] você tem essa dificuldade de se entender a lógica do outro. Um trabalho que se faz em conjunto o ideal é que... Bom o ideal é que todo mundo tenha a mesma disposição né? Mas como chegar nesse ideal, nesse equilíbrio, seu ponto de vista pode ser diferente do outro. Então... sempre vai ter um conflito aí né? O risco de conflito na competição e na dificuldade de enxergar da forma que o outro enxerga, acho que esses dois pontos são os mais limitantes. Mais chances de atrito e dificuldade.(6)
Configura-se portanto um dilema, pois se pode entender que a organização de redes de
unidades produtivas em projetos de DTR é desejável pelo capital social resultante, mas a
ausência deste, limita a adoção de tal estratégia. Tal fato justifica a presença de instituições
publicas como elementos articuladores de redes, características presentes no modelo de redes
técnico-econômicas acima apresentados.
Discutem-se na seqüência as questões afetas ao projeto Redes analisadas sob o enfoque do
DTR.
118
6.3 O projeto Redes e o Desenvolvimento Territorial Rural
6.3.1 Potencialidades
Do ponto de vista teórico, a maior facilidade de acesso ao conhecimento e à tecnologia, é
identificada como um dos fatores determinantes para a formação de redes interorganizacionais
(Loiola e Moura, 1996), constituindo-se também em um dos elementos centrais para a
organização e funcionamento das Redes.
Por si só, tal constatação já seria forte o bastante para associar o projeto Redes e DTR, mas a
leitura do segundo capítulo da presente dissertação acentua ainda mais a série de indícios que
apontam para o fato de que iniciativas com enfoque do DTR prescindem de instrumentos com
as características das Redes, as quais reúnem diversas potencialidades que podem vir a
transformá-las, de fato, em estratégias úteis às ações de desenvolvimento. Entre tais indícios
destacam-se:
i) A perspectiva territorial trata a questão da tecnologia não apenas sob a ótica dos
avanços incrementais de produtividade, mas busca promover a perspectiva da
inovação tecnológica e gerencial e da competitividade territorial
(MINISTÉRIO, 2005a), possibilidades já presentes – inovação, ou perfeitamente
ajustáveis – competitividade territorial, nas Redes já no atual desenho operacional.
ii) Como se configuram em iniciativas de aprimoramento institucional associadas
à transformação dos sistemas produtivos, as Redes já se encontram enquadradas
nos critérios orientadores para o desenho de estratégias e políticas no âmbito de
programas de DTR propostos por Schejtman e Berdegué (2004).
iii) Ao propor a adoção dos Contratos Territoriais de Desenvolvimento como
estratégia de implantação de ações para o DTR, Veiga (2002b) sugere a adoção de
119
redes, as quais caracteriza como “de solidariedade”, para a validação e
transferência de inovações surgidas no meio rural, objetivos específicos do
projeto hoje em marcha.
Ao discutir com os entrevistados as principais potencialidades contidas na implantação do
projeto Redes, sob a ótica dos projetos de DTR, discutiu-se, antes de tudo, os processos de
implantação e operacionalização das Redes como hoje se encontram estabelecidas, bem como
as expectativas decorrentes dos resultados alcançados, uma vez que a condição atual operou
como a base orientadora da reflexão suscitada pelas questões.
Deste modo, é oportuno recuperar o objetivo geral do projeto – proposição e difusão de
sistemas de produção melhorados, bem como alguns de seus objetivos específicos, como por
exemplo: o levantamento de demandas de pesquisa; a realização de testes, ajustes e validação
de tecnologias; a oferta de tecnologias e/ou atividades que ampliem a eficiência dos sistemas
de produção; a disponibilização de informações e a proposição de métodos para orientar os
agricultores na gestão da propriedade rural; a utilização das propriedades participantes como
pólos de difusão e capacitação de técnicos e agricultores e a oferta de subsídios para a
formulação de políticas de promoção para a agricultura familiar.
Assim, uma potencialidade identificada tem origem no próprio método de implantação das
Redes, o qual toma por base o acompanhamento e a melhoria dos sistemas produtivos em sua
condição técnica e econômica real, ou seja, trabalhando na condição concreta dos
agricultores, ou, como identificado por um entrevistado:
...baseado em uma realidade, baseado em uma coisa que já existe na comunidade. Não é uma coisa artificial que se coloca lá.(2)
Deste modo, outro aspecto valorizado como potencial colaboração das Redes aos projetos de
DTR, refere-se ao próprio elenco de informações técnicas e econômicas que são avaliadas,
geradas e difundidas no processo de condução do projeto – as referências:
120
Eu vejo o seguinte [...] o trabalho que nós possamos implementar, criando para o território referências, com essas propriedades tendo toda essa gestão [...] nos vamos contribuir, e muito, com as propostas que já tem vindo. Você pega o Território do Sudoeste, você vê o seguinte: já tem uma evolução de dez, quinze anos de discussões, tem avanços e retrocessos, mas na efetivação de atividades que criam modelos, que criam as referências, são muito poucas ainda. Nós já contribuímos com alguns produtos, mas eu acho que ainda tem muito mais. Tanto que nós estamos aí para elaborar mais propostas, mais sistemas sendo trabalhados para apresentar para aquele território...(1) Quando você vai falar em desenvolvimento territorial, as possibilidades são inúmeras, inclusive amplia o leque do técnico né, no aspecto tecnológico. Aí como o técnico faz, [...] como é que o cara vai conhecer o universo? Não conhece... Eu acho que se a Rede conseguir produzir, as referências facilitam [...] É esse o negócio hoje! O técnico perde menos tempo pra reproduzir aquilo depois. Então esse é o papel enorme de Rede, seja [na] tecnologia específica - simples, pequena e pontual, seja na técnica de safra ou que envolva uma safra, ou uma tecnologia de sistema.(5) Hoje, os projetos [de caráter territorial] carecem inclusive de informação técnica que poderiam ser geradas pelos indicadores né! Referências que poderiam ser geradas por ele [projeto Redes] tranqüilo.(4)
A identificação da geração de referências como potencial contribuição, surge também
associada a uma eventual ampliação no escopo do projeto, aspecto que será posteriormente
discutido:
Acho que na questão tecnológica, da geração da tecnologia, eu acho [o projeto] bem avançado. Às vezes está faltando se aproximar com a Rede, pra conhecer a própria tecnologia e se apropriar melhor da referência. E eu não sei se também, [...] a gente tem referências mais em áreas de propriedades individuais, e talvez a gente devesse analisar alguns projetos, projetos grupais, projetos cooperativos, não sei se caberia aí ou não? (4)
Foram valorizadas também contribuições indiretas que a implantação das Redes oferece,
como por exemplo, a caracterização física, edafo-climática e socioeconômica da região de
trabalho, um dos primeiros passos da metodologia de implantação:
Dentro do próprio território, acho que [poderiam implantar-se] as Redes de Referências [...]. Então já pode ser um ponto, uma demarcação de área, assim da Rede. Ao mesmo tempo, ela também pode trabalhar com microrregiões. Hoje, a constituição de territórios leva em conta a questão de microclima e tal. Mas é muito mais de relação de instituições. Então, não necessariamente o território é demarcado a partir do zoneamento agrícola [...] do zoneamento ambiental...(4)
Destaca-se, por fim, como potencial contribuição das Redes aos projetos de DTR, algo que
tal estratégia de trabalho deve oferecer às instituições que hoje lhe coordenam, IAPAR e
121
EMATER/PR, ambas com inegável papel a cumprir nos projetos estaduais a serem
implantados sob a ótica do DTR:
Eu acho que a proposta das Redes deveria ser ah...Uma proposta, não sei... básica. [...] Tanto pro Iapar, tanto pra Emater, pra eles desenvolverem toda a programação de trabalho, acho que em termos ideais era isso que tinha que ocorrer. Deviam ter Redes instaladas em todo o estado, levantando demanda de pesquisa pro Iapar e indicando caminhos prioritários pra Emater nesse trabalho de extensão, de difusão e de desenvolvimento. Eu penso que é um instrumento muito valioso pra se fazer isso aí, fazer uma leitura da realidade e fazer uma posição de caminho pra se seguir. Então eu acho que tem um papel enorme, um potencial enorme pra se fazer isso.(6)
6.3.2 Limitações
Naturalmente, a implantação das Redes também possui limitações no tocante à sua associação
aos projetos de DTR. Aqui, estas são indicadas com uma premissa que as avalizam: surgem a
partir de condições concretas, vivenciadas nos mais de sete anos de operacionalização
daqueles dispositivos de P&D.
Desse modo, uma limitação, abaixo descrita, decorre do tempo demandado para completa
execução da proposta:
O que nós temos aí é uma questão comportamental muito séria. Nós estamos num mundo cada vez mais exigente de rapidez de informação, da velocidade, da disponibilidade dessa informação pra ontem, não é pra amanhã, é pra ontem sempre, e isso leva a atropelar, pelo que nós temos da experiência nossa vivenciada até agora. Uma das limitações é esse tempo de fazer as coisas acontecerem. Tanto a proposta de trabalho, quanto ao seu momento certo de fazer a implantação, fazer a maturação e depois ter o resultado. O que demora dois, três anos no mínimo, até quatro, cinco anos em algumas situações. Algumas coisas eu vejo que são assim limitantes.(1)
Fatores vinculados à atual estratégia das Redes no tocante à comunicação foram também
lembrados como limitantes, surgindo posteriormente também entre os aspectos operacionais a
serem alterados:
...acho que a Rede tem um problema: nós erramos, nós colocamos muitos fios de comunicação, tinha que ter comunicação direta, [...]. Eu acho que não precisa ser nenhum doutor pra fazer isso [...]. Isso a gente errou um pouco né. A gente tentava trazer isso pro acadêmico pra depois voltar pro produtor [...] nós não temos competência pra fazer isso com agilidade, não estávamos estruturados ao processo de fluxo de informação.(5)
122
A estratégia de condução das Redes envolve o acompanhamento de propriedades, e tal
acompanhamento, se não for conduzido com rigor, pode acarretar no fato relatado abaixo,
mais no sentido de um risco de que como uma limitação efetiva:
...eu temo que o risco que se tem quando se trabalha com propriedade de referência [é] que essas propriedades acabem recebendo benefícios, estímulos, subsídios grandes e que isso não possa ser conseguido pros demais, ou seja, as propriedades de referências acabam construindo uma elite daí se quer os outros acompanhem ou aproveitem o exemplo dados por esta elite, sem dar aos outros as mesmas condições que foram dadas pra que esta elite se constituísse como elite né! no caso tecnológico ou de sistemas e tal. Então estes são riscos sempre presentes né ! Porque o que se começa a estar presente nesta propriedade de referência a toda hora apontando facilidades, acaba que daqui a pouco estas propriedades não são mais representativas daquela condição, daquela meta, daquela região, então isso são riscos que precisam sempre estar sendo levados em conta né.(3)
Contribuir para a formulação de políticas públicas para a promoção da agricultura
familiar é, entre os objetivos específicos das Redes, aquele que foi mais timidamente
alcançado. Em decorrência, tal fato é lembrado como limitante para a utilização da estratégia
em projetos conduzidos sob a ótica do DTR:
Não temos esse vinculo, essa capacidade de fazer com que as pessoas comprem a idéia e levem adiante [...]. Por isso que eu digo, que é um objetivo que a gente tem e que ainda não conseguiu atingir bem ainda, é esse da difusão das políticas públicas.(6)
Finalmente, surgem questões associadas à estrutura de funcionamento do projeto, as quais,
ainda que não possam ser encaradas como fatores limitantes em ações de DTR, devem ser
lembradas, no sentido de que sejam garantidos todos os recursos necessários em uma eventual
implantação de propostas de redes no âmbito de tais ações, fato não observado plenamente na
condução do projeto Redes sob os auspícios do programa de Estado Paraná 12 Meses:
Hoje nós temos uma limitação interna: é a questão dos recursos humanos, nós estamos pobres de recursos humanos.(2) Para mim, o fundamental é ter no mínimo senão uns três, ao menos dois [coordenadores mesorregionais], para poder trocar informações, mas ter essa condição da equipe, ao menos regional, efetivada para poder realmente dar consistência.(1) A gente poderia ter feito muito mais. Tem muita coisa pra se aproveitar [...] em termos de informações. Então, uma limitação acho que é a estrutura.(6)
123
Agora, como último tópico dessa discussão dos resultados obtidos, abordam-se as
perspectivas futuras para o projeto Redes sob a ótica de sua expansão para ações de DTR.
6.4 Perspectivas para as Redes
A discussão acerca das perspectivas futuras para as Redes é realizada a partir das opiniões dos
entrevistados, agregando-se, quando pertinente, aspectos de ordem teórica colhidos na
literatura pesquisada.
Tal discussão, abrange três considerações complementares, as quais envolvem as eventuais
necessidades de mudanças no escopo do projeto, ou alterações de ordem metodológica e/ou
operacional, e, por fim, mudanças no arranjo institucional para implementação da proposta,
hoje sob responsabilidade do IAPAR e da EMATER/PR, com a participação de representante
de seu financiador, o projeto de Estado Paraná 12 Meses.
6.4.1 Mudanças de escopo
Neste aspecto, as opiniões dos entrevistados não foram convergentes, identificando-se
distinções claras entre aqueles que vivenciam, ou vivenciaram, o “dia-a-dia” de condução do
projeto, daqueles que o conhecem, mas não acompanham cotidianamente os seus
procedimentos de trabalho.
Entre os primeiros, talvez por conhecerem com maior profundidade a amplitude da proposta e
as dificuldades observadas em sua implementação, prevalece a opinião de que o escopo do
projeto deve ser mantido:
124
...eu não teria grandes coisas a mudar em termos de grandes idéias nos objetivos do trabalho, da estratégia e tal. Só que o que tá faltando conseguir é implantar tudo o que se está construindo, porque é bem pretensiosa a proposta, vai além da questão do desenvolvimento tecnológico, vai além do processo de geração de referências, é definir políticas públicas, orientar por aí, e a gente não conseguiu fazer isso ainda, na forma que precisava. Talvez aí a gente tinha que pensar de uma forma, amarrar melhor o nosso papel, usar da melhor forma o nosso trabalho [...]. Fazer e fazer mais rápido. Acho que essas coisas [...] são questões assim que a gente pode melhorar, tem que ampliar mas [...] em termos gerais o que está aí, está proposto até hoje, não é uma mudança, mas sim uma questão de acrescentar às coisas que estão colocadas ali como proposta.(6) ...eu não vejo necessidade de mudar o escopo, acho que ele dá para ser mantido na parte de estratégias e metodologias do trabalho. Eu também não vejo assim grandes modificações, eu vejo pequenos aperfeiçoamentos que devem ser mantidos, [que não] são de estratégia, [são] de metodologia de trabalho.(2)
Já entre os demais entrevistados, os quais, por sua vez, encontram-se mais expostos à
discussão sobre a temática do DTR, a posição acerca da necessidade de ampliação do escopo
do projeto é clara. Para estes, conforme já antecipado, as Redes devem abranger não somente
unidades de produção agropecuária individuais, como também empreendimentos rurais
grupais, comunitários ou associativos. Devem também ampliar o foco de análise para além da
etapa de produção agropecuária em si:
Acho que o primeiro passo é avançar de sistemas agrícolas para sistemas não- agrícolas no meio rural ainda. Um outro avanço que eu acho que seria possível, e tranqüilo, é olhar, alargar a leitura da cadeia daqueles produtos que estão inseridos nesse sistema de produção, enxergar um pouco mais a cadeia desses produtos [...] e olhar um pouco mais também, olhar eles na perspectiva da comercialização, da cadeia, de estruturação da rede de distribuição e tal. Eu acho então [...] que como primeiro avanço, e dentro ainda da SEAB, dentro do que está hoje, na estrutura do Iapar, da Emater, talvez ela dê essa “alargada” então. Do agrícola dá um passo, um pouco mais rural, [...] do sistema para o produto na cadeia, enxergar um pouco mais isso.(7)
No plano teórico, é evidente a necessidade de que a estratégia de organização de redes deve
extrapolar os limites da produção agropecuária, buscando alcançar a perspectiva ampliada do
enfoque do DTR. O que ainda não é possível discutir, é a possibilidade de que isso seja feito
na condição atual do projeto Redes, no qual duas instituições, associadas eminentemente ao
desenvolvimento agropecuário, têm a responsabilidade de condução da proposta. Tal questão
será debatida quando apresentados os aspectos de ordem institucional vinculados ao futuro da
condução das Redes.
125
6.4.2 Mudanças de ordem metodológica e/ou operacional
As proposições para este tópico foram recolhidas nas entrevistas realizadas e serão
apresentadas considerando as diferentes etapas, já descritas, de implantação do projeto Redes.
Preliminarmente, cabe ressaltar uma questão que antecede o próprio processo de implantação
de Redes, a qual diz respeito ao perfil da equipe exigido para a sua condução:
E agora também tem o seguinte: tem que escolher as pessoas certas pra se fazer isso aí né ! Não é todo mundo, tem gente que nunca vai conseguir fazer. Isso também é uma questão até interessante de se colocar, eu penso né! Que numa rede de instituições tem que se escolher as pessoas certas pra se fazer essa costura. Não adianta, é uma coisa tem que fazer, então vamos botar um lá e pronto. Não... tem gente que não tem perfil pra isso, nunca vai conseguir fazer! É uma pessoa que dentro da instituição vai contribuir na rede, mas sempre trabalhando dentro dela, nunca vai ser um contato, não é um cara que vai iniciar um processo.(6)
Isto posto, a etapa de caracterização da região de trabalho, também mereceu sugestões,
associadas à amplitude das questões de natureza socioeconômicas hoje trabalhadas e à
temporalidade para a sua realização:
...eu acho que aquele diagnóstico inicial [deveria ser um] diagnóstico mais macro, talvez devesse incorporar algumas outras variáveis [...] tentar responder a pergunta: quais fatores são cruciais, ou foram cruciais no histórico do território, para levar a essa situação que está hoje ? ou seja, que conjugação de forças e de interesses econômicos principalmente estão presentes ali ? E tentar entender um pouco isso, então acho que um estudo um pouco mais nessa direção, e acho que [...] que tem que ser permanentemente monitorado; o diagnóstico é uma coisa permanente não é um corte só.(7)
A seleção dos sistemas de produção a serem acompanhados recebeu sugestões no sentido
de melhor vincular tal etapa aos processos de desenvolvimento territorial que estejam em
curso na região trabalhada, de modo que os resultados alcançados sejam não só mais
facilmente apropriados, no caso de sistemas vigentes, como possam também apontar sistemas
alternativos para o desenvolvimento territorial:
...veja bem, você pode focar aquele território ali e verificar quais são as prioridades daquele território, quais são as vocações daquele território e a partir desse referencial, você selecionar sistemas que venham contribuir mais efetivamente com esse desenvolvimento. Então, à medida que você tem um trabalho territorial, eu acho que essa é uma coisa que se dá para trabalhar melhor, quer dizer, eu tenho uma visão mais abrangente, mais ampla, mais regional ou micro regional, se eu tenho uma visão de prioridade [...] isso vai me ajudar a selecionar sistemas de uma forma mais adequada para poder trabalhar.(2)
126
Trabalhar com sistemas predominantes é correto né! Porque que a resposta em princípio acaba sendo maior, já que tem mais gente trabalhando neste sistema [...]. Então diria assim, que essas propriedades de referência deveriam também contemplar sistemas que não são ainda muito disseminados, mas que possam ter assim, [algo] concreto, potencial, pra se fazer, aquilo de transição, de sistema de transição [...] pra outro sistema de produção mais integrado, mais diversificado...(3)
Foi ressaltada ainda, a necessidade de que o cumprimento de tal etapa ocorra no contexto de
um processo de articulação maior, representado nos objetivos dos planos de desenvolvimento
concebidos para o território:
Então diria assim: as propriedades de referências [...] tem que guardar sintonia com as prioridades estabelecidas pelos planos de desenvolvimento territorial. Porque essas, as Redes de Referências, são as bases do assunto né! Vários sistemas de produção, digamos assim né! Então eu acho que precisa ter esta sintonia né! E além disso, essas Redes de Referências, essas propriedades que compõem as Redes, possam estar a serviço do conjunto dos atores que trabalham na capacitação e assistência técnica, porque o plano de assistência técnica vai compatibilizar a ação de vários atores...(3)
Para a seleção de agricultores colaboradores, foram destacadas sugestões as quais, se não
representam mudanças significativas na metodologia em curso, ressaltam a importância da
etapa e da obediência aos procedimentos de escolha, os quais associam, aos aspectos de
natureza técnica, também questões vinculadas ao perfil dos colaboradores e, explicitamente, à
perspectiva de sucessão na propriedade:
Um cuidado que eu acho que nós temos que ter também é nessa seleção [de agricultores]. Nós já temos todo um critério de todas as situações para saber como fazer uma boa seleção, mas infelizmente, às vezes nós erramos por mais que a gente escolha há percalços, há acidentes de trabalho que ocorrem [...]. Esse cuidado, com a experiência já acumulada, nós podemos aprimorar melhor essa seleção, rever alguma coisa nessa seleção, onde nós erramos. O que a gente imagina que seja o melhor, de repente não é o melhor, tem gente com muito mais possibilidades, potencialidades e características que serão favoráveis.(1) ...nós discutimos [...] alguns critérios na seleção do produtor [...] as características de personalidade dele, que nós na Rede colocamos alguns critérios que fossem considerados na seleção da pessoa em si, além de selecionar a propriedade, selecionar a pessoa. Eu sinto que não foram [os critérios de seleção da pessoa] talvez muito considerados, é um ponto a melhorar, porque além de selecionar o sistema ou a propriedade, você tem que considerar a personalidade do produtor. Como é que ele é, as suas relações ou o grau de extensão dele na comunidade, se ele se relaciona melhor, se comunica melhor, se ele abre mais a sua propriedade para visitas, se ele conta, digamos, suas experiências. Então, acho que esse é um ponto crucial para você maximizar os resultados desse trabalho.(2) Então, as próprias propriedades nas quais existem os jovens, eu acho que deveriam ser privilegiadas pelas redes de referências.(3)
127
As etapas de planejamento, ajustes e acompanhamento dos sistemas produtivos
mereceram ressalvas quando comparadas ao método hoje vigente. Os ajustes sugeridos
passam, em síntese, pela necessidade de que sejam incorporados, de modo mais enfático, os
aspectos de ordem ambiental e social, quebrando aquilo que pode ser considerado como um
viés tecnicista presente no projeto, melhor alinhando-o à perspectiva de sustentabilidade
destacada no enfoque do DTR:
Quando se falava em gestão da propriedade, só via a questão econômica e técnica, de ajuste de produção. E hoje, a gente está percebendo isso, nós estamos exercitando alguma coisa dentro do nosso modelo [...] é também a questão da gestão ambiental, e também da questão social da propriedade.(1) Eu acho que nós desenvolvemos muito mais nas questões técnicas, agronômicas, do que nas sociais e ambientais [...]. Acho que é uma coisa que a gente pode melhorar, avançar mais. As nossas análises neste aspecto.(6)
Por fim, as estratégias de restituição de dados e de comunicação adotadas foram aquelas
que mereceram mais sugestões, as quais apontam os limites atualmente presentes, sobretudo
na agilidade de execução, e indicam novos possíveis caminhos:
O público das instituições têm expectativa, porque isso cria essa expectativa com os parceiros que nós temos envolvido nas propostas, inclusive o produtor, que é o ator principal da história, ele também quer esse retorno o mais rápido possível, e aí a gente [deve] disponibilizar os meios de informação ou até criar meios digitais que possam divulgar uma resposta mais rápida.(1) ...nós temos que procurar uma velocidade maior na restituição de resultados. Nós temos que as coisas mudam muito velozmente, talvez até pela dificuldade inicial que nós começamos, [...] a gente era inexperiente, [...] eu acho que tem que ter uma velocidade maior em analisar e produzir os resultados, e, principalmente restituir resultados para essas unidades com mais agilidade.(2) ...eu acho que ainda tem um espaço imenso para se avançar ainda na questão de comunicação. [...] a Rede produz muita informação importante, mas elas, não sei eu tenho impressão, que elas [restingem-se] aos extensionistas, aos técnicos, e em última instância, os agricultores com sistemas similares àqueles. [...] daria para avançar bastante nessa questão de sistematização das informações e comunicação, acho que precisaria criar [...] uma câmara, uma rede virtual, então você tem uma rede material do campo, [e uma] rede virtual na Internet, que além do grupo técnico que participa da Rede de referência, pudesse ter uma rede de técnicos e Ong’s muito maior com uma participação aí de especialistas. Acho que essa Rede que é hoje uma rede física, ela podia vir a ser uma rede virtual, com debates, com seminários periódicos [em uma] TV Educativa, pela Internet...(7)
128
Chega então o momento de discutir o arranjo institucional que não só melhor habilita o
projeto Redes à realização das mudanças sugeridas, como também o coloca em condições de
fazer frente aos desafios mais amplos presentes nas ações sob o enfoque do DTR.
6.4.3 Mudanças de ordem organizacional
Neste aspecto, também com base nas entrevistas realizadas, devem ser lembradas
primeiramente as articulações de caráter macroinstitucional, as quais, embora obviamente
extrapolem os limites das Redes e o campo de ação de seus implementadores, seriam capazes
de garantir um funcionamento mais harmonioso de um dispositivo de P&D com tal
perspectiva e melhor combinam com o caráter das ações de DTR já discutidas:
...nós não temos nenhuma estrutura de governo que pensa essa escala mesorregional. Então, do ponto de vista de estrutura de governo, talvez devêssemos pensar como outros Estados que já tem uma estrutura nessa dimensão, [...] tem várias ações de políticas públicas, seja no governo federal, seja através do MDA, seja através do Banco do Estado, atuando em mesorregião, nessa estrutura meso. [...] se nós estivermos pensando esse desenvolvimento, a rede atuando nas dimensões além da agrícola, da rural, uma dimensão de território, é de pensar que tenha que ter uma articulação com saúde, com educação, com uma política dessa de inclusão social. Enfim, todas as ações do governo estadual pudessem ter um fórum para seu debate, a sua formulação e a otimização de estruturas e de recursos.[...] talvez pensar em alguma coisa desse tipo, então uma estrutura nova do governo do Estado e um fórum colegiado que abrigasse as forças da sociedade, as forças produtivas e o debate nesse fórum regional e estadual, onde pudéssemos formular um pouco melhor essas políticas. Eu acho que dá uma racionalidade melhor por aí.(7) Na medida que isso fosse possível, eu acho que uma questão seguinte que esse trabalho permitiria é você alinhar as políticas públicas. Eu acho que você conseguiria dar um certo alinhamento, seja nas políticas locais, você poderia imaginar daí o conjunto de municípios atuando em conjunto pra determinadas coisas, otimizando estruturas e recursos. Você poderia imaginar uma atuação conjunta do ponto de vista político, de representação nesse território, você poderia imaginar esse pacto no território permitindo um canal de diálogo com as políticas públicas do governo estadual e federal. Você poderia então alinhar essas políticas dentro do território, você poderia imaginar então que, exagerando num extremo, as políticas estaduais e federais fossem ajustadas às necessidades e à realidade regional.(7)
Outro tipo de articulação macroinstitucional também lembrada, esta ao alcance das Redes e de
seus implementadores, seria a aproximação, ou até vinculação do projeto, ao âmbito dos
129
consórcios e, especialmente, porque já consolidados em diversas situações, fóruns de
desenvolvimento territorial:
Outra coisa que está acontecendo na área institucional é o tal do consorcio. [...] é uma forma de organização [...] pra gerenciar projetos. Mais forte nisso é a [área da] saúde, que tem mais de vinte [consórcios] no Paraná. [...] é uma organização, no caso, de prefeituras. Hoje temos uma linha que está ampliando, você permitir o consorcio ainda do setor público, mais a prefeitura, governo federal, estadual. Não deixa de ser uma certa rede.(4) ...eu acho que nos territórios, seria importante que nesse fórum, nesses conselhos, nesses comitês, pudessem estar presentes os técnicos da Emater e do Iapar que trabalham na Rede de Referência.[...] fundamentalmente, acho que é isso que deve ser buscado pra poder compatibilizar e aprimorar o uso deste instrumento, e até que se possa constituir ou incluir dentro dessas redes, propriedades que sejam referência pra aquelas prioridades que o plano desenvolvido pro território aponta né.(3)
Por fim, cabe destacar uma proposição praticamente unânime entre os entrevistados, quando
considerada a necessidade de um novo desenho institucional para o projeto Redes, a qual,
ressalte-se, foi lembrada em situações de ampliação, ou não, do escopo das atividades
atualmente desenvolvidas.
Tal sugestão, diz respeito à ampliação no número de instituições participantes do projeto, e
não surgiu sem que fosse lembrada, também, a dificuldade operacional de tal prática:
...fazer parcerias entre instituições exige pré-disposição ao diálogo, pré-disposição aí em ouvir, ceder né! Fazer concessões, seja de ordem pessoal, seja de ordem institucional, em cima do objetivo maior né! Exige que você tenha esta visão mais ampla né! Que a gente é dificultado [para fazê-las] até na formação [universitária] que é segmentada [...]. Que a gente vai trabalhar em uma instituição dentro de uma linha muito segmentada né. Exige que você tenha esta visão de conjunto né! [...]. Então eu diria que é um exercício grande...(2)
Para justificar essa ampliação no número atores, foram apresentadas justificativas de
diferentes ordens, que passam pela atual condição interna de funcionamento do projeto, mas,
sobretudo, pela necessidade de sua ampliação.
Algumas das proposições neste sentido encontram-se transcritas abaixo para ressaltar a
diversidade das alternativas, e, conseqüentemente, dos ajustes possíveis de serem realizados
nesta perspectiva:
130
Bom, primeiro acho que devia ter mais parceiros sabe. Mais parceiros. [...] mais gente participando, porque acaba tudo virando Emater e Iapar, com algumas exceções [...] Mas seria mais interessante a gente ter mais instituições, parceiros [...]. Fora isso, ainda a liderança, a coordenação, a gerência do processo, nesse momento não vejo outra forma de fazer a não ser com essas duas instituições. Talvez, na medida que outros agentes forem se incorporando possa dividir também. Seria interessante.(6) Então, eu vejo que naquelas regiões tradicionais, aonde a Rede [...] já está aí há bastante tempo, [...] talvez pudéssemos pensar em passar o que está hoje, eu não sei precisaria avaliar bem, para cooperativas, prefeituras, com uma outra estrutura no campo, ou manter o que tem mas ampliar essa rede de uma forma exponencial, incorporando esses outros atores no sentido [...] da Rede ser apropriada por Ong’s etc. Então, mesmo daí os técnicos do Iapar e da Emater, que hoje dominam a ferramenta, seriam consultores, aí entre aspas, para o sistema poder se dedicar para esses territórios novos aí, no sentido de formar lá então uma nova capacidade.(7) ...a gente sabe das nossas limitações e das nossas necessidades, então eu acho que a gente tem que buscar mais ainda, eu vejo assim, a parceria das instituições oficiais. Eu acho que até é fácil de acontecer, por uma razão óbvia, por força até de questões operacionais, [...] se nós precisarmos falar em meio-ambiente e tivermos que chamar o IAP nós já temos a condição [...] não tem dificuldade se formos trabalhar com a Secretaria da Educação e a Secretaria de Saúde, também não vejo dificuldade. O que nós temos que tentar buscar mais é a iniciativa privada, para ela também fazer o seu papel. Nós temos muito aquele viés do setor produtivo, que é o nosso chão, que é a cooperativa, que a gente vê como primeiro momento, que também é um parceiro de primeira hora enfim, com a sua condição, a FETAEP, a FAEP, representação sindical que também é importante. Mas eu acho que nós temos mais serviços que podem vir a nos ajudar, seja lá o serviço do SENAR que tem contribuições que nós não aproveitamos ainda dentro deste modelo, eu acho que ainda esta disponível, o SEBRAE [...], associações comerciais e industriais que também estão disponíveis, todo esse serviço estão disponíveis e podem ajudar em campanhas por exemplo.(1) Acho que precisa se incluir nisso as prefeituras municipais [...] e outras entidades que possam existir em alguns desses territórios, vou citar alguns exemplos: as casas familiares rurais que tem em praticamente todos os territórios que trabalhamos no Paraná.(3)
O aprofundamento das discussões referentes ao detalhamento das adequações sugeridas nos
aspectos metodológicos e operacionais do projeto Redes transcende aos objetivos deste
estudo, contudo é possível afirmar que um novo modelo deve, em seu aspecto institucional,
considerar necessariamente a articulação direta deste dispositivo com as instâncias territoriais
existentes, como os fóruns, conselhos ou similares.
131
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considera-se que o trabalho atingiu o seu objetivo geral de discutir as potencialidades e as
limitações da utilização das redes de unidades produtivas rurais como instrumento útil ao
enfoque do DTR, apresentando tanto no que diz respeito à estratégia de redes, como no que
tange aos projetos sob a ótica do DTR, justificativas que confirmam a pertinência de
associação destas abordagens.
No que diz respeito aos seus objetivos específicos, o estudo ofereceu a caracterização da
estratégia de redes, tal qual hoje presente nas Redes de Referências para a Agricultura
Familiar, indicando a abordagem histórico-cultural como aquela mais apropriada para a sua
análise, e o modelo de redes técnico-econômicas como sendo o que mais se aproxima de sua
conformação.
A discussão dos métodos de implantação e condução hoje utilizados no projeto Redes, avaliou
a necessidade e possibilidades de ajustes nos elementos metodológicos e operacionais, e
destacou as mudanças de ordem institucional passiveis de serem implementadas, oferecendo
elementos úteis para proposição de um novo modelo.
A revisão da literatura sobre os temas pesquisados confirmou a expectativa de que esses não
se encontram plenamente consolidados do ponto de vista teórico-conceitual, co-existindo
perspectivas de diferentes vertentes para o estudo de ambos.
A metodologia de trabalho mostrou-se apropriada. A realização das entrevistas de campo,
ofereceu ao estudo uma boa base de aplicação concreta, ainda que não tenha sido possível
encontrar, entre os entrevistados, o mesmo grau de conhecimento e domínio acercas das
temáticas, redes e DTR, em questão. Já a análise de conteúdo realizada, evidenciou de forma
circunstanciada as principais contribuições oferecidas em cada uma das entrevistas.
132
A limitações da pesquisa derivam-se principalmente de seu caráter exploratório, uma vez
que o aprofundamento naquele que é o tipo de rede identificado como mais pertinente à
situação, as redes técnico-econômicas, e na proposição de um novo modelo para as Redes de
Referências, devem ser objetos de pesquisas futuras sobre o tema.
133
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ABRAMO, Perseu. Pesquisa em ciências sociais. In: HIRANO, Sedi (org.) Pesquisa social: projeto e planejamento. São Paulo: T. A. Queiroz, 1979. 232p.
ABRAMOVAY, Ricardo. Desenvolvimento territorial rural e capital social. In: SABOURIN, Eric e TEIXEIRA, Olívio (orgs.). Planejamento do desenvolvimento dos territórios rurais – Conceitos, controvérsias e experiências. Brasília: UFPB/CIRAD/EMBRAPA, 2002. p.113-128.
______. O futuro das regiões rurais. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2003. Coleção Estudos Rurais. 149p. ISBN: 85-7025-695-7.
ALCOFARADO, Ihering Guedes. Desenvolvimento local territorial um approach da economia cultural. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE ECONOMIA E SOCIOLOGIA RURAL, 41., 2003, Juiz de Fora. Anais... Juiz de Fora: SOBER, 2003a. 1 CD-ROM.
______. Patrimônio e desenvolvimento local territorial um approach da economia dos direitos de propriedade. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE ECONOMIA E SOCIOLOGIA RURAL, 41., 2003a, Juiz de Fora. Anais... Juiz de Fora: SOBER, 2003b. 1 CD-ROM.
ASSIS, Thiago Rodrigo de Paula; RIBEIRO, Eduardo Magalhães. Agricultura familiar, organizações territoriais de desenvolvimento (OTDs) e políticas públicas: estudos de caso em Minas Gerais. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE ECONOMIA E SOCIOLOGIA RURAL, 43., 2005, Ribeirão Preto. Anais... Ribeirão Preto: SOBER, 2005. 1 CD-ROM.
BALESTRIN, Alsones; FAYARD, Pierre. Redes interorganizacionais como espaço de criação de conhecimento. In: ENCONTRO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO, 27., 2003, Atibaia. Anais... Atibaia: ANPAD, 2003. 1 CD-ROM.
BARDIN, Laurence. Análise de Conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1977. 226p. ISBN: 972-44-0898-1.
BEDUSCHI FILHO, Luiz Carlos; ABRAMOVAY, Ricardo. Desafios para a gestão territorial do desenvolvimento sustentável no Brasil. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE ECONOMIA E SOCIOLOGIA RURAL, 41., 2003, Juiz de Fora. Anais... Juiz de Fora: SOBER, 2003. 1 CD-ROM.
BLUME, Roni; SCHNEIDER, Sérgio. Do território ao desenvolvimento territorial: uma reflexão sobre o crescente uso do conceito território frente às dinâmicas socioeconômicas contemporâneas. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE ECONOMIA E SOCIOLOGIA RURAL, 41., 2003, Juiz de Fora. Anais... Juiz de Fora: SOBER, 2003. 1 CD-ROM.
134
CÂNDIDO, Gesinaldo Ataíde; ABREU, Aline França de. Os conceitos de Redes e as Relações Interorganizacionais: um estudo exploratório. In: ENCONTRO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO, 24., 2000, Florianópolis. Anais... Florianópolis: ANPAD, 2000. 1 CD-ROM.
CARDOSO, Vinícius Carvalho; ALVAREZ, Roberto dos Reis; CAULLIRAUX, Heitor Mansur. Gestão de competências em redes de organizações: discussões teóricas e metodológicas acerca da problemática envolvida em projetos de implantação. In: ENCONTRO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO, 26., 2002, Salvador. Anais... Salvador: ANPAD, 2002. 1 CD-ROM.
CASAROTTO FILHO, Nelson; PIRES, Luis Henrique. Redes de pequenas e médias empresas e desenvolvimento local. São Paulo: Atlas, 1999. 148p.
COOPER, Donald R.; SCHINDLER, Pamela S. Métodos de pesquisa em administração. 7. ed. Porto Alegre: Bookman, 2003.
DORETTO, Moacyr et al. Pobreza urbana e rural nos municípios paranaenses - situação segundo municípios e associações de municípios do Paraná, Ano 2000. Mimeo. Londrina, set. 2003. 37p.
FARIAS FILHO, José Rodrigues de; CASTANHA, Anderson Lopes Belli; PORTO, Clarice Breviglieri. Arquiteturas em redes: um paradigma competitivo para as micro, pequenas e médias empresas. In: ENCONTRO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO, 23., 1999, Foz do Iguaçu. Anais... Foz do Iguaçu: ANPAD, 1999. 1 CD-ROM.
FARINA, Elizabeth Maria Mercier Querido; AZEVEDO, Paulo Furquim de Azevedo; SAES, Maria Sylvia Macchione. Competitividade: mercado, Estado e organizações. São Paulo: Singular, 1997. 285p.
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986. 1838p.
GRAZIANO DA SILVA, José. Velhos e novos mitos do rural brasileiro. Estudos Avançados. São Paulo. v.15, n.43, p.37-50, set./dez. 2001. ISSN 0103-4014.
______. O novo rural brasileiro. Campinas: Universidade de Campinas – Instituto de Economia. 1999. (Coleção Pesquisa no 1)
135
GODOY, ARILDA SCHMITD. Refletindo sobre critérios de qualidade da pesquisa qualitativa. Gestão.org – Revista Eletrônica de Gestão Organizacional, Recife. v.3, n.2, p. 86-94, mai./ago.2005. Disponível em < http://www.gestaoorg.dca.ufpe.br/ >. Acesso em 05.out.2005.
______. Introdução à pesquisa qualitativa e suas possibilidades. Revista de Administração de Empresas, São Paulo. v.35, n.2, p.57-63, mar./abr. 1995a.
______. Pesquisa qualitativa: tipos fundamentais. Revista de Administração de Empresas. São Paulo. v.35, n.3, p.20-29, mai./jun. 1995b.
HASEGAWA, Mirian; FURTADO, André Tosi. Em direção a um modelo de criação e circulação do conhecimento em redes de inovação. In: ENCONTRO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO, 25., 2001, Campinas. Anais... Campinas: ANPAD, 2001. 1 CD-ROM.
IPIRANGA, Ana Sílvia Rocha. Discutindo Idéias Inovadoras em Prol do Desenvolvimento Local: a organização das Micros, Pequenas e Médias Empresas com Foco no Território. In: ENCONTRO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO, 25., 2001, Campinas. Anais... Campinas: ANPAD, 2001. 1 CD-ROM.
LAURENTI, Antonio Carlos. Terceirização dos trabalhos agrários e o “novo rural”. In: OFICINA DE ATUALIZAÇÃO TEMÁTICA / ORNAS – OCUPAÇÕES RURAIS NÃO-AGRÍCOLAS. IAPAR – Instituto Agronômico do Paraná. 2000, Londrina, Anais... Londrina, 2000. p.1-34.
LAURENTI, Antonio Carlos e DEL GROSSI, Mauro Eduardo. A evolução das pessoas ocupadas nas atividades agrícolas e não-agrícolas nas áreas rurais do Brasil. In: CAMPANHOLA, Clayton e GRAZIANO DA SILVA, José (Ed.): O novo rural brasileiro: uma análise nacional e regional. Jaguariúna: EMBRAPA, 2000. Cap.1, p. 15-66. 190p. ISBN 85-85771-04-6.
LOIOLA, Elisabeth; MOURA, Suzana. Análise de redes: uma contribuição aos estudos organizacionais. In: FISCHER, Tania. (Org.) Gestão contemporânea: cidades estratégicas e organizações locais. Rio de Janeiro: Fundação Getulio Vargas, 1996. Cap. 3, p. 53-68
MANUAL OPERATIVO DO PROJETO PARANÁ 12 MESES. Governo do Estado do Paraná. Secretaria de Estado do Planejamento e Coordenação Geral / Secretaria de Estado da Agricultura e do Abastecimento. Curitiba, 1999. 232p.
136
MARINOZZI, Gabrio; MORAES, Júlio César de. Caracterização dos conselhos municipais de desenvolvimento rural sustentável do estado de Goiás e de seu papel na gestão participativa do desenvolvimento territorial. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE ECONOMIA E SOCIOLOGIA RURAL, 41., 2003, Juiz de Fora. Anais... Juiz de Fora: SOBER, 2003. 1 CD-ROM.
MATTAR, Fauze Najib. Pesquisa de marketing. São Paulo: Atlas, 1996. V.1: Metodologia, planejamento, execução e análise. 336p.
MENDONÇA, Nilton César; ORTEGA, Antônio César. Estratégias de desenvolvimento territorial rural: Governo FHC x Governo Lula. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE ECONOMIA E SOCIOLOGIA RURAL, 43., 2005, Ribeirão Preto. Anais... Ribeirão Preto: SOBER, 2005. 1 CD-ROM.
MIGUELETTO, Danielle Costa Reis. Organizações em Rede. Rio de Janeiro, 2001. Dissertação (Mestrado), Escola Brasileira de Administração Pública, Fundação Getúlio Vargas. 96p.
MILES, Raymond E.; SNOW, Charles C. Network organizations: new concepts for new forms. California Management Review. California, Vol. XXVIII, N°. 3, p. 62-73, spring 1986.
MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO. Referências para uma estratégia de desenvolvimento rural sustentável no Brasil. Brasília, mar. 2005a. 29p. (Documentos Institucionais - Secretaria de Desenvolvimento Territorial, no 01)
______. Marco referencial para apoio ao desenvolvimento de territórios rurais . Brasília, jun. 2005b. 28p. (Documentos Institucionais - Secretaria de Desenvolvimento Territorial, no 02)
______. Institucionalidades para a gestão social do desenvolvimento rural sustentável. Brasília, set. 2005c. 78p. (Documentos do CONDRAF, no 01)
______. Territórios rurais apoiados pela SDT. Brasília, 2005d. Disponível em <http://www.mda.gov.br/sdt/index.php?sccid=478>. Acesso em 11.nov.2005.
MIOR, Luiz Carlos. Agricultores Familiares, Agroindústrias e Redes de Desenvolvimento. Chapecó: Argos, 2005. Coleção Debates. 338p. ISBN: 8598981184.
137
MIRANDA, Márcio et al. A busca de referências técnicas e econômicas para o desenvolvimento da agricultura familiar no estado do Paraná através de uma rede de propriedades. In: ENCONTRO DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE SISTEMAS DE PRODUÇÃO, 4. 2001, Belém. Anais... Belém: Sociedade Brasileira de Sistemas de Produção, 2001. 1 CD ROM.
MIRANDA, Márcio; DOLIVEIRA, Diniz Dias. Redes de Referências: Um dispositivo de pesquisa & desenvolvimento para apoiar a promoção da agricultura familiar paranaense. In: Conselho Nacional dos Sistemas Estaduais de Pesquisa Agropecuária (ed.). Redes de Referências: Um dispositivo de pesquisa & desenvolvimento para apoiar a promoção da agricultura familiar . Campinas, 2005. p.9-19.
OLIVARES, Jose Enrique Louffat. Estrutura organizacional em red (EOR): explorando sus bases teóricas. In: ENCONTRO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO, 27., 2003, Atibaia. Anais... Atibaia: ANPAD, 2003. 1 CD-ROM.
PARANÁ (Estado). Decreto no 1.791, de 05 de setembro de 2003. Diário Oficial do Estado do Paraná no 6.597, Poder Executivo, Curitiba, 05 set. 2003
PASSINI, João José. Redes de propriedades de referência. In: IAPAR. Enfoque Sistêmico em P&D: a experiência metodológica do IAPAR. Londrina, 1997. 152p. Ilust. (IAPAR. Circular, 97).
PECI, Alketa. Emergência e proliferação de redes organizacionais marcando mudanças no mundo dos negócios. In: ENCONTRO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO, 23., 1999, Foz do Iguaçu. Anais... Foz do Iguaçu: ANPAD, 1999. 1 CD-ROM.
______. Pensar e agir em rede: implicações na gestão das políticas públicas. In: ENCONTRO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO, 24., 2000, Florianópolis. Anais... Florianópolis: ANPAD, 2000. 1 CD-ROM.
PEREIRA, Breno Augusto Diniz; PEDROZO, Eugênio Ávila. Modelo de análise do comportamento das redes interorganizacionais sob o prisma organizacional. In: ENCONTRO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO, 27., 2003, Atibaia. Anais... Atibaia: ANPAD, 2003. 1 CD-ROM.
PORTER, Michael E. Clusters and the new economics of competition. Harvard Business Review. Boston, v.76, no 6, p. 77-90, nov./dez. 1998.
PUTNAM, R.D. Comunidade e democracia: a experiência da Itália moderna. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1996. 260p.
138
QUIVY, Raymond; CAMPENHOUDT, Luc Van. Manual de Investigação em Ciências Sociais. Lisboa: Gradiva, 1992. 275p.
ROCHA, Alynson dos Santos; SCHEFLER, Maria de Lourdes Novaes; COUTO, Vitor de Athayde. Organização social e desenvolvimento territorial: reflexões sobre a experiência dos Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural Sustentável (CMDRS) na região de Irecê – Bahia. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE ECONOMIA E SOCIOLOGIA RURAL, 41., 2003, Juiz de Fora. Anais... Juiz de Fora: SOBER, 2003. 1 CD-ROM.
SACOMANO NETO, Mário; TRUZZI, Oswaldo Mário Serra. Perspectivas contemporâneas em análise organizacional. Gestão e Produção, São Carlos. v. 9, n.1, p. 32-44, abr. 2002.
SANTOS, Milton. Território e sociedade: Entrevista com Milton Santos. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo. 2000.
SCHEJTMAN, Alexander; BERDEGUÉ, Julio A. Desarrollo territorial rural. Santiago: Rimisp – Centro Latinoamericano para el Desarrollo Rural, 2004. 53p. (Debates y temas rurales, no 1). Disponível em <http://www.rimisp.org/seccion.php?seccion=9>. Acesso em 09.jun.2005.
SOARES JÚNIOR, Dimas. Levantamento da produção acadêmica brasileira nos últimos cinco anos sobre os temas redes e territórios. Mimeo. Londrina, 2004. 30p.
SOARES JÚNIOR, Dimas et al. Relatório analítico dos trabalhos desenvolvidos na viagem técnica à França. Mimeo. Curitiba, 2000. 36p.
VAN DE VEN, Andrew H.; WALKER, Gordon “The Dynamics of Interorganizational Coordination”. Administrative Science Quartely, v. 29, p. 598-621, dec. 1984.
VECCHIATTI, Karin. Desenvolvimento territorial rural o diálogo entre economia, sociedade e natureza segundo Jane Jacobs. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE ECONOMIA E SOCIOLOGIA RURAL, 41., 2003, Juiz de Fora. Anais... Juiz de Fora: SOBER, 2003. 1 CD-ROM.
VEIGA, José Eli da. A face territorial do desenvolvimento. In: ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA, 27., 1999, Belém. Anais... Belém: ANPEC, 1999. p.1301-1318.
______. Cidades imaginárias: o Brasil é menos urbano do que se calcula. Campinas: Autores Associados, 2002a.
______. Do crescimento agrícola ao desenvolvimento rural. In: CASTRO, Ana Célia (org.). Desenvolvimento em debate. Rio de Janeiro: Mauad/BNDES, 2002b. vol. II. p.338-409.
139
VEIGA, José Eli da et al. O Brasil rural precisa de uma estratégia de desenvolvimento. Brasília: Convênio FIPE - IICA (MDA/CNDRS/NEAD), ago. 2001. 2ª reimpressão. 108p. (Texto para Discussão no 1)
VIEIRA, Vera Maria da Motta; OHAYON, Pierre. Novas tendências organizativas das atividades de P&D: as redes de inovação tecnológica. In: ENCONTRO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO, 26., 2002, Salvador. Anais... Salvador: ANPAD, 2002. 1 CD-ROM.
VILELA, Sérgio L. de O. A territorialidade das novas atividades agrícolas no Nordeste do Brasil: O caso do estado do Piauí. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE ECONOMIA E SOCIOLOGIA RURAL, 38., 2000, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: SOBER, 2000. 1 CD-ROM.
VILLA VERDE, Valéria. Critérios para a definição de territórios rurais (Notas para uma discussão conceitual). Mimeo. Curitiba, 2003.
VIZEU, Fábio. Pesquisas sobre redes interorganizacionais: uma proposta de distinção paradigmática. In: ENCONTRO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO, 27., 2003, Atibaia. Anais... Atibaia: ANPAD, 2003. 1 CD-ROM.
ZALESKI NETO, João. Formação e Desenvolvimento de Redes Flexíveis no Contexto do Progresso Regional. Florianópolis, 2000. Tese (Doutorado), Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção, Universidade Federal de Santa Catarina. 242p.
ZYLBERSZTAJN, Decio. Agricultura de Contratos. In: FAVA NEVES, Marcos, ZYLBERSZTAJN, Decio e NEVES, Evaristo Marzabal. Agronegócio do Brasil. São Paulo: Saraiva, 2005. p.69-71.
140
ANEXOS
ANEXO A - Tipologia das regiões da OCDE segundo seu grau de ruralidade: participação relativa da população.
Essencialmente Relativamente EssencialmenteRural (ER) Rural (RR) Urbana (EU)
Irlanda 62 - 38Turquia 58 30 12Noruega 51 38 11Suécia 49 32 19Finlândia 47 32 21Grécia 47 18 35Áustria 40 39 22Dinamarca 39 38 23Estados Unidos 36 34 30Portugal 35 24 41Islândia 35 8 57Canadá 33 23 44França 30 41 29Japão 23 34 43Austrália 23 22 55Espanha 19 46 35Reino Unido 15 17 68Suiça 14 25 61Itália 9 44 47Alemanha 8 26 66Bélgica 2 17 81Luxemburgo - 100 -Nova Zelândia - 61 39Holanda - 15 85
PaísPopulação (em %)1
1 Comunidades rurais: unidades locais com densidade populacional inferior a 150 habitantes/km2 (500 habitantes/km2 no caso do Japão): Essencialmente rurais: regiões onde mais de 50% da população vivem em unidades rurais. Relativamente rurais: regiões onde entre 15% e 50% da população vivem em unidades rurais. Essencialmente urbanas: regiões onde menos de 15% da população vivem em unidades rurais
Fonte: adaptado de Abramoway (2003, p.49).
141
ANEXO B - Relação nominal dos técnicos entrevistados, com a indicação da instituição a qual vinculam-se, bem como da função e/ou das atividades desenvolvidas que os credenciam para a colaboração na pesquisa.
NOME INSTITUIÇÃO FUNÇÃO e/ou ATIVIDADES
Adelar Antonio Motter IAPAR
Coordenador do Projeto Capacitação de Gestores de Processos de Desenvolvimento Local no Território da Cantuquiriguaçu
Antonio Celso Córdova de Souza EMATER/PR
Gerente de Desenvolvimento e Tecnologia, ex-Coordenador Estadual do Projeto Redes de Referências para a Agricultura Familiar.
Celso Daniel Seratto EMATER/PR
Diretor Técnico, ex- Extensionista do Projeto Redes de Referências para a Agricultura Familiar.
Diniz Dias Doliveira EMATER/PR Coordenador Estadual do Projeto Redes de Referências para a Agricultura Familiar.
Luiz Carlos Teixeira Lopes SEAB/PR Secretário Executivo do Conselho Estadual de Desenvolvimento Rural e Agricultura Familiar (CEDRAF).
Márcio Miranda IAPAR
Coordenador Estadual do Projeto Redes de Referências para a Agricultura Familiar, Líder do Programa de Pesquisa em Sistemas de Produção.
Reni Antonio Denardi Ministério do Desenvolvimento Agrário
Delegado Federal do MDA no Estado do Paraná.
142
ANEXO C - Modelo do roteiro de entrevista utilizado com os técnicos.
Roteiro de entrevista
Nome do Entrevistado : Cargo/Função : Telefone : 1. Considerando a implantação dos projetos de desenvolvimento territorial rural atualmente em curso no estado, a organização de Redes de Unidades Produtivas Rurais poderia se constituir, no seu entendimento, em uma estratégia de ação pertinente para a consecução dos objetivos gerais destes projetos ? Porquê ? 2. Quais seriam ao seu ver as principais potencialidades contidas na implantação de Redes de Unidades Produtivas Rurais, sob a ótica destes projetos ? 3. Quais seriam ao seu ver as principais limitações contidas na implantação de Redes de Unidades Produtivas Rurais, sob a ótica destes projetos ? 4. Quais seriam ao seu ver as principais potencialidades contidas na implantação de Redes, tal qual hoje concebidas na proposta da EMATER/PR e IAPAR, sob a ótica destes projetos ? 5. Quais seriam ao seu ver as principais limitações contidas na implantação de Redes, tal qual hoje concebidas na proposta da EMATER/PR e IAPAR, sob a ótica destes projetos ? 6. Face as suas considerações anteriores e a atual experiência de implantação de Redes desenvolvida pela EMATER/PR e IAPAR, existiriam alterações a fazer no escopo da atual proposta ? Quais seriam estas ? 7. Além das eventuais alterações no escopo do projeto, seriam necessárias também, no seu entendimento, alterações de ordem metodológica / operacional ? Em caso positivo, discuta estas alterações considerando as diferentes etapas de implantação das Redes. 8. Além das eventuais alterações já mencionadas, seriam necessárias também, no seu entendimento, alterações de aspecto institucional no tocante a articulação das instituições responsáveis pela proposta. 9. Considerações complementares.
Universidade Estadual de Maringá Universidade Estadual de Londrina Programa de Pós-Graduação em Administração Projeto de Dissertação: A organização de redes de unidades produtivas como instrumento de apoio ao desenvolvimento territorial rural.
Recommended