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Anais da
Semana de Pedagogia da UEM ISSN Online: 2316-9435
XXII Semana de Pedagogia
X Encontro de Pesquisa em Educação
05 a 08 de Julho de 2016
¹ Acadêmica bolsista do Programa de Educação Tutorial PET- Pedagogia/UEM
² Professora Doutora Docente Temporária do Departamento de Lingua Portuguesa/UEM
O LIVRO DIDÁTICO DE LÍNGUA PORTUGUESA: reflexões iniciais a partir das
concepções de linguagem
RODRIGUES, Ana Paula Aires¹
paulinhaaires13@outlook.com
SILVA, Darkila Camila Xavier da
irmacamila23@gmail.com
BAZZA, Adélli Bortolon²
adellibazza@hotmail.com
Universidade estadual de Maringá (UEM)
História e Historiografia da Educação
INTRODUÇÃO
É inquestionável o papel que a linguagem exerce no desenvolvimento da sociedade
humana, a grande maioria das produções científicas que versam sobre a constituição e
organização da nossa sociedade atribuem à linguagem um papel de destaque. Partindo dessa
afirmação, consideramos que a linguagem no ambiente escolar deve ser tratada como um
aspecto relevante no processo de ensino e de aprendizagem. Portanto, ressaltamos a
necessidade de que os/as profissionais envolvidos na educação formal compreendam a
importância de conhecer de maneira analítica os materiais didáticos a serem utilizados nesse
processo. Especialmente os livros didáticos, que em última instância não são frutos de
escolhas autônomas dos/as docentes.
Contudo, para que possamos realizar qualquer análise dos livros didáticos e suas
propostas, devemos considerar o percurso do ensino de Língua Portuguesa no Brasil. Segundo
Doretto e Beloti (s/d), “o ensino de língua portuguesa iniciou-se com os jesuítas, com o intuito
de alfabetizar e catequizar os nativos”. Porém segundo as autoras,
Durante o período colonial, a língua mais utilizada no Brasil era o
Tupi. Depois, dada a interação dos colonizados e colonizadores,
passou-se a ter a Língua Geral. Somente com a expulsão dos jesuítas
em 1759, pelo Marquês de Pombal, é que a Língua Portuguesa se
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tornou o idioma oficial do Brasil e, então, obrigatório o seu ensino (
DORETO e BELOTI s/d).
Portanto, percebemos que houve um grande trajeto até que a Língua Portuguesa se
constituísse como língua oficial, e mais ainda até ser inserida no currículo educacional. De
acordo com Soares apud Pietri,
[...] durante as primeiras quatro décadas do século XX, com a progressiva
perda do valor do ensino de latim, assumiu autonomia o ensino da gramática
do português. A retórica também sofre modificações no período, quando se
substituiu, como objetivo da disciplina, o falar bem, algo já não tão valorizado
socialmente, pelo escrever bem, então exigência social (SOARES apud
PIETRI, 2010, p.70).
Assim, a língua portuguesa como disciplina escolar pode ser compreendida como fruto de um
processo histórico longo e complexo, permeado por discussões educacionais e alternância de
concepções e objetivos.
Contudo, o que pretendemos com este trabalho é expor de maneira sintética as principais
concepções de linguagem que estiverampresentes no processo de constituição da língua portuguesa no
Brasil. Considerando que o livro didático faz parte do material distribuído para as escolas e constituem
parte fundamental dos planejamentos de aulas da maioria dos/das professores/as, objetivamos
apresentar uma análise, em caráter inicial, de uma unidade de um livro didático, afim deperceber como
se fazem presentes essas concepções nos materiais utilizados pelos/as professores em sua prática
pedagógica no ensino de LP.
Para tanto o livro escolhido foi: “Novo Tempo: Português/ 4 ano” de Maria Helena Correa e
Bernadette Simas Nascimento, editora Scipione publicado em 2010, do qual selecionamos
apenas uma unidade devido às limitações desse trabalho e por se tratar de uma pesquisa de
pequeno porte, em fase inicial.
AS CONCEPÇÕES DE LINGUAGEM E O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA
De acordo com Alba Maria Perfeito (2010), as concepções de linguagem relacionadas
ao ensino da língua portuguesa são abordadas e discutidas por diversos autores. Entre estes
destacam-se Geraldi e Castilho.
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Geraldi (1994) propõe três modos de conceber a linguagem: como Expressão do
Pensamento; como Instrumento de Comunicação e como uma Forma de Interação. Em
contrapartida Castilho (1998) denomina a concepção de linguagem com três modelos teóricos:
como Atividade Mental, como Estrutura e como uma Atividade Social.
Em síntese, Geraldi e Castilho (apud Perfeito, 2010) fazem as mesmas reflexões em
relação as formas de conceber a linguagem, porém com denominações diferentes. Utilizando
os termos de Geraldi (1994), Perfeito (2010) esclarece cada concepção, tendo em vista as
abordagens de ensino apresentadas em cada modelo, ou seja, apresenta o ensino da língua
portuguesa na gramática, na leitura e na produção textual.
A linguagem como expressão de pensamento é compreendida como um recurso que
torna possível a expressão do pensamento de cada sujeito, em outras palavras, significa que a
linguagem é a tradução do pensamento. Este modo de compreender a língua deriva da
tradição gramatical grega, depois foi aderida pelos latinos, na Idade Média e também na
Modernidade.
A linguagem como expressão do pensamento fundamenta os estudos tradicionais, em
que a linguagem é vista como sendo de natureza da racional e por isso o ser humano pensa
conforme regras universais: classificando, ordenando, e entre outros meios próprios da
racionalidade.
No que tange ao ensino da gramática, a concepção de linguagem como expressão do
pensamento, enfatiza o ensino da gramática teórico-normativa, isto é, conceituar, classificar,
dar atenção à concordância, à regras de pontuação e demais regras gramaticais. Em suma, no
ensino da língua prevalece a aprendizagem e o exercício das normas.
No ensino da leitura, a prioridade está no contato com modelos de textos que
apresentam a norma clássica da escrita, ou seja, a aplicação das normas gramaticais com
perfeição. Podemos compreender que a arte do escrever bem pressupõe o falar bem, e para
isso os textos clássicos são apresentados de forma enfática com pressuposto de que o aluno,
ao ver a forma correta de falar e escrever, possa fazer com a mesma qualidade. Contudo, é
importante esclarecer que a interpretação, isto é, a extração do sentido fica a cargo do
professor. Dessa forma, a alfabetização ocorre por meio da aprendizagem da combinação dos
fonemas, e a leitura prioriza a fixação de sentidos já disseminada.
O exercício da produção textual integra a concepção da arte de falar e escrever bem,
com isso há um cuidado excessivo a reprodução e imitação das normas. Uma das estratégias
de ensino é o professor apresentar a estrutura do texto, definir tema e por vezes se limitar na
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construção de frases, pois possibilita a execução da gramática. Sendo assim, as produções são
na maioria das vezes descontextualizadas. De modo geral, no ensino pela concepção da
linguagem como expressão do pensamento, o professor apresenta exemplos do que é esperado
na aprendizagem do aluno e ele deve se espelhar nos bons exemplos.
De acordo com Zanini (1999), essa concepção foi muito marcante na década de 1960,
quando o ideal era dominar informações e acumular conhecimento. O aluno/a nesse contexto
era compreendido como um receptor do conhecimento do professor/a. Além disso, os
conteúdos não estavam necessariamente relacionados com o contexto social do aluno/a.
Desse modo, o ensino priorizava a aprendizagem das normas e dos conceitos, com isso
esperava-se que o/a estudante deveria alcançar o domínio de conhecimentos científicos.
Somente o conhecimento científico era considerado relevante, e por isso o/ aluno/a tinha
contato com livros clássicos que apresentavam a norma culta de escrever e falar corretamente.
Na sala de aula, não havia inclusão dos conteúdos apreendidos no cotidiano dos/as alunos/as,
nem a consideração do contexto social dos/as mesmo/as.
Ao tratar da segunda concepção de linguagem, isto é, a linguagem como instrumento
de comunicação, Perfeito (2010) deixa claro que a língua é compreendida como sistema de
signos expressos em códigos para transmitir uma mensagem. Sobre isso, a autora apresenta
Saussure, o criador da linguística, que afirma que aos poucos a língua passou da comunicação
linguística para função informativa.
O ensino, sob esta perspectiva, foi tratado com destaque para os materiais didáticos,
no período histórico que corresponde à ditadura militar no Brasil, no qual houve o predomínio
da concepção tecnicista. Os livros apresentavam modelos que o aluno deveria repetir. Em
síntese, a aprendizagem da língua era reduzida ao treino e não como expressão de
pensamento, mas aplicação de técnicas para apresentar informações e comunicar-se.
A partir dessa segunda concepção de linguagem, o ensino da gramática direciona para
o estudo dos fatos linguísticos com objetivo de conduzir à internalização inconsciente de
hábitos linguísticos, ou seja, por meio da repetição a aplicação das regras gramaticais se
tornaria automatizada.
Nessa concepção estruturalista, de acordo com Perfeito (2010), especificamente no
que concerne a leitura, o texto é compreendido como portador de sentidos. Sobre isso a autora
cita Goodman (1987), o qual afirma que, partindo da visão do falante universal, pode-se
inferir que também há um leitor universal. Com isso, as estratégias para a leitura, isto é, para
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compreensão, estão direcionadas para o exercício da seleção, antecipação, inferência e
verificação. Esse conjunto de estratégias permite ao leitor abstrair sentidos do texto.
Levando em consideração esse aspecto tecnicista da aprendizagem da língua, de
acordo com Perfeito (2010), podemos afirmar que a produção textual está voltada para ensino
de habilidades que proporcionem fluidez, ou seja, no ensino apresenta-se a estrutura de
determinados textos e o aluno aplica a técnica apresentada para produzir seu texto. Com isso,
a narração, a descrição e a dissertação são gêneros textuais mais exercitados e aplicados na
vida escolar do aluno.
Sobre esta concepção, Zanini (1999) afirma que era predominante na década de 70,
quando se vivia um contexto social de ditadura na qual era essencial que o ensino não
abordasse reflexão, mas aplicação de técnicas para facilitar a aprendizagem. Em outras
palavras, isso significava aprender rápido na lógica de produção.
A terceira concepção de linguagem é denominada como uma forma de interação.
Nesse sentido, percebe-se que o termo interação está relacionado com visões e concepções
advindas da psicologia interacionista. Isso significa que o ensino e aprendizagem da língua
são tratados de uma forma flexível, correspondendo às necessidades e interesses educacionais,
que envolvem a relação dos sujeitos no processo de ensino e aprendizagem.
Com isso, indica-se que a contextualização se torna um elemento educacional
marcante, pois no ensino abordam-se vários gêneros textuais levando em consideração as
relações sociais. Neste caso, uso da técnica e das normas gramáticas, a arte do bem falar e
bem escrever, apresentadas nas concepções anteriores não são predominantes nesta concepção
de linguagem.
Perfeito (2010) cita alguns teóricos que discutem sobre esta terceira concepção de
linguagem, destacando Bakhtin, que compreende a linguagem como uma interação entre a
língua e o sujeito de modo que dependendo do contexto assume diversidade de sentidos.
Sobre isso a autora escreve
Bakhtin considera o homem um ser histórico e social, carregado de valores,
e a língua na qual e pela qual se constitui, como reflexo das relações estáveis
entre os falantes. De acordo com a época e com os grupos sociais, em
determinada situação concreta, há o domínio de uma variante sobre outra,
existindo, pois, diferentes e inúmeros modos de dizer ( BAKHTIN apud
PERFEITO,2010,p.23).
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Dessa maneira, explicita que há uma diversidade de textos e gêneros, que conversam
entre si e que por vezes se integram, como o jornalismo, pois além de envolver a reportagem
pode haver crônicas, tirinhas e etc. Neste sentido, no ensino da língua portuguesa, a proposta é
combinar, ampliar, transformar determinados gêneros textuais de acordo com o contexto dos
interlocutores.
Em suma, isto significa que para além do ensino da língua é preciso levar em
consideração a eficácia comunicativa em determinado contexto. O autor esclarece que “[...]
em termos pedagógicos a linguagem na percepção enunciativa, os gêneros discursivos,
segundo os PCN (BRASIL,1998) tornam-se objeto de ensino” (PERFEITO,2010, p.25). Com
isso, a autora explica que os documentos oficiais, assim como as Diretrizes Curriculares do
Paraná, tendem a exercer a transposição didática de acordo com as esferas sociais que a escola
possui.
O que se nota sobre a leitura na concepção interativa, é que o leitor assume a função
de atribuir sentido aos textos para além do autor, sendo que, dessa forma, agregam-se novas
formas de ver e avaliar o mundo em todas as relações interpessoais de locutor e interlocutor.
Sobre estes aspectos, Giraldi que afirma que “o texto não tem sentido fixo eúnico, contudo o
leitor não pode ser visto como categoria única no processo dialogal”. (GIRALDI,1991 apud
PERFEITO, 2010, p.27). No que tange a análise linguística é compreendida segundo Perfeito
(2010) como,
Processo reflexivo dos sujeitos-aprendizes em relação à
movimentação de recursos textuais, lexicais e gramaticais no tocante
ao contexto de produção e aos gêneros veiculados no processo de
leitura, de construção e de reescrita textuais (PREFEITO, 2010, p.29)
A partir destes apontamentos, podemos inferir que a análise linguística envolve vários
elementos que possibilitam a reescrita de um texto, sendo que o contexto estará vinculado
com os fatores normativos da língua, isto é, a gramática. Sendo assim, o texto assume novos
sentidos juntamente com a construção de vários gêneros textuais sem perder aspectos formais
da língua.
Ao trabalhar sobre a produção e refacção textuais, o/a professor/a torna-se mediador
entre o sujeito e o objeto de ensino de modo que este deve seguir uma sequência que
favorecem a rapidez na aprendizagem, ou melhor, reduzir a complexidade da tarefa. Contudo,
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nesse processo de reescrita do texto é importante proporcionar ao/a aluno/a uma observação
de seus problemas linguísticos discursivos e não uma forma de apontar erros e/ou substituir
elementos do texto produzido.
Para finalizar, essa terceira concepção de linguagem como forma de interação, nos
encaminhamentos metodológicos, os matérias didáticos bem como a postura do/a professor/a,
partem da exploração do que o/a aluno/a conhece sobre determinado assunto em questão. A
partir das respostas, o/a docente realiza a mediação acrescentando saberes. Além disso,
propõe exercícios que possibilitam a reflexão dos conteúdos aprendidos assim como a
aplicação dos mesmos por meio de atividades.
Zanini (1999) aponta que esta concepção como interação, faz parte do período
histórico de 1980, caracterizada como a época do discurso. Com isso, a participação dos/as
estudantes na aprendizagem a qual também é compreendida como descoberta, o/a professor/a
interage com a turma e estes interagem entre si e com o objeto de conhecimento.
Nota-se, que na década de 80, havia discussões sobre democracia, emancipação, bem
como a efervescência da elaboraçãoe divulgação de teorias psicológicas sobre o
desenvolvimento e aprendizagem, destacam-se nesse contexto a Epistemologia Genética de
Piaget e a abordagem Histórico-Cultural de Vigostsky, além de Saviani e Paulo Freire. Com
isso, pode-se dizer que para além do pensamento sobre educação, o contexto social influencia
de forma significativa as concepções de criança, de desenvolvimento, bem como de
encaminhamentos e organização do espaço escolar, desde a estrutura, papel do/a professor/a e
até os métodos e materiais didáticos.
Apresentação do livro escolhido para análise: “ Novo tempo: português: 4ª série”. São
Paulo: Scipione,2001.
O livro “Novo Tempo: português” é dividido em unidades de modo que, em cada
unidade, há três capítulos. Os capítulos são estruturados da seguinte forma: apresenta um
texto que introduz o tema, depois apresenta exercícios de interpretação oral e escrita, traz
textos complementares, propõe uma atividade lúdica envolvendo o tema abordado. A
produção de textos e a gramática são as últimas propostas de cada capítulo, e a produção de
texto engloba estudo de, ao menos, um elemento da gramática.
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Além desses itens, é possível verificar que o livro traz atividades para serem realizadas
evidenciando opinião e reflexão sobre o conteúdo, e no ensino da gramática, o livro prioriza a
ortografia, denominada como “ortografia aplicada”.
As autoras que escreveram e organizaram o livro foram Maria Helena Corrêa e
Bernadette Simas Nascimento. Maria Helena é licenciada em Língua Portuguesa pela
Universidade de São Paulo (USP). Ex-professora efetiva do Ensino Fundamental e do Ensino
Médio do estado de São Paulo. Autora, com Celso Pedro Luft, da coleção “A palavra é sua-
Língua Portuguesa (de 5ª a 8ª séries) pela Editora Scipione, obra vencedora do Prêmio Jabuti
de Melhor Livro Didático- 1996”.
Bernadette Simas é licenciada em Língua e Literatura Portuguesa pela Faculdade de
Filosofia, Ciências e Letras de Joinville (SC). Formada no curso de Magistério (de 1ª a 4ª
série) no Colégio Normal Novo Ateneu, Curitiba, especializou-se em Alfabetização no
Instituto de Educação do Paraná.O livro em estudo traz na apresentação, escrita pelo professor
Luiz Carlos Cagliari (Unicamp), aspectos evidentes da terceira concepção de linguagem.
Ao mencionar as considerações acerca da importância e validade do livro, o autor
escreve: “trata-se de um material que proporciona interação, integração entre o conhecimento
do aluno com novos conhecimentos, as atividades propostas possibilitam respostas pessoais
bem como abordam conhecimentos interdisciplinares”.
O/a professor/a é visto essencialmente como mediador/a entre o sujeito e
conhecimento, levando em consideração aspectos da ludicidade que englobam a criatividade e
a opinião e não apenas a repetição de modelos.
A unidade 3 foi escolhida para análise de forma aleatória. Nota-se que prevalece o
ensino dos gêneros textuais. Porém, em cada capítulo, aborda mais de três tipos de textos e
com questões de nível de compreensão do tema e do conteúdo em questão.
O primeiro capítulo da unidade 3 introduz o conteúdo com a variação linguística. Para
isso, apresenta um texto que mostra a origem da língua portuguesa bem como outros códigos
utilizados para representar a fala ou denominam coisas, situações e pessoas.
Após meia página de explicação sobre isso, um texto reflexivo sobre o assunto e
algumas atividades de descrição e identificação, o livro traz o gênero trovas e aponta para
uma interpretação oral subjetiva do conteúdo do texto. Além disso, sugere que os alunos
façam uma trova a partir da leitura que acabaram de fazer. Para tornar agradável e facilitar a
declamação da trova, a proposta é de incorporar melodias de rap na trova elaborada.
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Tendo abordado a trova, a identificação do sentido de algumas palavras, aponta, de
forma deslocada, para o gênero carta. Depois retoma as palavras diferentes, mas com
significados semelhantes entre Brasil e Portugal. Em seguida traz o gênero tirinha. Propõe
uma breve interpretação da história e inclui ensino da gramática. Podemos verificar que,
desde o primeiro gênero apresentado,as atividades são de seguir o modelo e ou interpretação
subjetiva. Seguem as imagens das propostas mencionadas,
Figuras 1 e 2
Com essas considerações, podemos destacar que apesar de ser introduzido o ensino de
um elemento da gramática, este não traz explicações consistentes, ao contrário, aponta
modelos e explica a diferença. Os gêneros apresentados não permitem que o aluno veja outros
modelos, nem tampouco aplique em forma de produção textual o que hipoteticamente
aprendeu com a gramática trabalhada a partir da tirinha.
O capítulo posterior retoma o gênero carta, mas sem apresentar a estrutura de uma
carta. Apenas apresenta uma carta enigmática, fazendo algumas atividades interdisciplinares
entre história e língua portuguesa. Pode-se perceber, até aqui, que não há uma linearidade nos
conteúdos e também não há conexões entre os mesmos.
As atividade referentes à interpretação possuem característica da terceira concepção de
linguagem, os exercícios referentes à gramática são predominantemente da concepção de
linguagem como instrumento de comunicação. Isso significa que os exercícios evidenciam a
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agilidade na execução da atividade, ou seja, características próprias do modelo tecnicista de
ensino da língua materna.
Apesar de o capítulo em estudo trazer várias representações linguísticas, gêneros
textuais e conteúdos interdisciplinares, o ensino se reduz ao exercício de aplicação de
modelos e isso influi de forma significativa na complexidade, pois estabelece um nível
mínimo de aperfeiçoamento e ampliação do conhecimento.
Figura3
Podemos avaliar que, apesar de o livro ter sido editado no ano de 2001, com
abordagens da linguagem como interação - conforme o professor Cagliari apresentou no
início do livro- as atividades propostas correspondem de forma predominante à concepção de
linguagem presente na década de 1970. Isso significa que o livro tem algumas características
do interacionismo, mas aborda de forma predominante concepções tecnicistas.
Com base em Zanini (1999), pode-se afirmar que o livro deixa evidente a repetição e a
cópia do modelo, mas, não faz a relação dos conteúdos com a realidade social dos educandos
como preconiza a concepção de linguagem como interação.
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Além disso, em análise das atividades propostas e da estrutura dos capítulos, pode-se
inferir que a mediação do professor supracitada na apresentação do livro, não corresponde ao
que se apresenta no decorrer do livro, de forma especifica na unidade em análise, pois as
explicações se reduzem a seguir modelos e não impulsiona complexidade para o raciocínio do
aluno. Sendo assim a intervenção do professor é mínima.
Em suma, podemos concluir que o livro tenta aplicar a concepção de linguagem como
interação, mas prevalece a linguagem como instrumento de comunicação. A interação está
presente no diálogo e na execução de algumas atividades lúdicas. A complexidade do livro é
regularmente baixa tendo em vista que se trata de um livro destinado ao 4º ano.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considerando o processo histórico consolidação da língua Portuguesa como língua
materna e a sua inserção na educação formal como componente obrigatório, nota-se que
muitas formulações e reformulações foram postas em prática, e para tanto o livro didático
serviu como instrumento auxilador do/a professor/a nesse processo.
O estudo referente às concepções de linguagem presentes nos diferentes contextos
históricos no Brasil, bem como o exercício de percepção da qualidade do livro didático de
acordo com as intenções pedagógicas de ensino, é tema de extrema relevância para as
discussões no âmbito educacional. Além disso, a análise de um livro da língua portuguesa a
partir das concepções de linguagem, permite identificar as divergências que há entre essas
concepções materializadas em atividades e encaminhamentos metodológicos. Outro fator a ser
considerado é a contribuição para busca de seleção de materiais que possam complementar o
que falta nas atividades e conteúdos do livro, o que poderá instigar o/a professor/a a pesquisar
mais materiais e diponíveis para tratar de determinado conteúdo.
A análise do livro possibilitou a percepção de que, embora haja variações de
concepções de linguagem, estas foram desenvolvidas no decorrer da história da educação com
teorias e métodos de ensino e de aprendizagem diversos, e que em cada contexto social tal
concepção foi proposta como essencial e útil para ensinar a língua materna naquele momento.
Contudo, podemos inferir que, no contexto social atual, é possível indicar que
nenhuma da concepções apresentadas são suficientemente completas se aplicada sozinha.Uma
vez que, a partir da necessidade real da sala de aula o/a professor/a poderá identificar quais
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métodos fundamentados nessas concepções podem contribuir de forma significativa para
aprendizagem dos/as alunos/as e/ou ampliação das mesmas.
REFERÊNCIAS
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DORETTO,Shirlei Aparecida. BELOTI, Adriana. Concepções de linguagem e conceitos
correlatos: a influência no trato da língua e da linguagem. Revista Encontros de Vista -
oitava edição Página 89-104.ISSN 1983-828X.
HINTZE, Ana; ANTONIO, Juliano. Variação linguística e o ensino de língua portuguesa
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Ed. Eduem.
PERFEITO, Alba Maria. Concepções de linguagem, teorias subjacentes e ensino de língua
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PIETRI, Émerson de. Sobre a constituição da disciplina curricular de língua portuguesa
Faculdade de Educação Revista Brasileira de Educação v. 15 n. 43 jan./abr. 2010.
ZANINI, Marilurdes. Uma visão panorâmica da teoria e da prática do ensino da língua
materna. Acta Scientiarum 21 (1): 79-88, 1999.
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