View
0
Download
0
Category
Preview:
Citation preview
0
CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ
FACULDADE CEARENSE
CURSO DE TURISMO
ANA PAULA FERNANDES DE ARAÚJO
A POTENCIALIDADE TURISTICA DO BAIRRO SERVILUZ
FORTALEZA
2012
1
ANA PAULA FERNANDES DE ARAÚJO
A POTENCIALIDADE TURÍSTICA DO BAIRRO SERVILUZ
Trabalho apresentado à banca examinadora do Curso de Turismo da Faculdade Cearense - FaC, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Turismo, sob orientação do prof. Mansueto da Silva Brilhante.
FORTALEZA
2012
2
ANA PAULA FERNANDES DE ARAÚJO
A POTENCIALIDADE TURISTICA DO BAIRRO SERVILUZ
Monografia como pré-requisito para obtenção do título de Bacharelado em Turismo, outorgado pela Faculdade Cearense – FaC, tendo sido aprovada pela banca examinadora composta pelos professores abaixo. Data de aprovação:___/___/___
BANCA EXAMINADORA
Esp. Mansueto da Silva Brilhante
___________________________________________________________________
Ms. Ariane de Queiroz Sousa
___________________________________________________________________
Esp Paula Roberta de Oliveira Leite
3
A Deus, aos meus pais e a minha família.
4
AGRADECIMENTOS
Primeiramente a Deus, que me ajudou a realizar esse SONHO.
A minha mãe Margarida, pelas inúmeras horas de orações, amor e zelo dedicados a
mim, ao meu pai Ribamar, que soube me educar, repreendendo-me quando
necessário, mostrando-me o caminho certo a seguir, formando meu caráter, a minha
irmã Patrícia, por ser minha melhor amiga e companheira, e aos meus irmãos Júlio e
Zezinho pelas brincadeiras e experiências compartilhadas.
Ao meu esposo Elias, que esteve comigo durante toda minha vida acadêmica,
apoiando-me, incentivando e sendo compreensivo nos momentos em que mais
precisei.
À Compassion, que teve grande influência em minha vida, motivando-me a sonhar
alto e que contribuiu diretamente para a realização deste sonho.
A todos do Projeto Vila Mar, em especial àSra Joyce, Tia Tafnes, Tia Marlene, Sr.
José das Graças, Tia Gildete, Tia Josenir, ao Pastor Francisco e sua esposa
Aldeniza, que acreditaram em mim e me incentivaram ir em busca dos meus sonhos
e objetivos, ensinando-me valores que levarei por toda minha vida.
Às minhas amigas do grupo de aliança Yaline, Damares, Sheile, Grasi e Carol,com
quem compartilhei as alegrias e ansiedades da vida no LDP (Programa de
Desenvolvimento em Liderança).
As minhas amigas de sala de aula Viviane Teixeira, Tatiana, Valéria, Fabiane, Ana
Luiza, Germana, Viviane, Tatiane e Adriana que fizeram desta fase da minha vida
um momento muito especial cheio de alegria e travessuras.
Aos professores da Faculdade Cearense que foram facilitadores no processo da
minha formação, em especial à professora Ariane Queiroz que, com empenho,
dedicação e profissionalismo me auxiliou na construção do presente trabalho.
5
Aos meus Gran Amigos que me apoiaram e incentivaram a concluir essa etapa
importante da minha vida.
E a todos que direto e indiretamente contribuíram para realização deste trabalho.
6
“O coração do homem faz planos, mas a
resposta certa dos lábios vem do Senhor”
(Provérbios, 16:9).
7
RESUMO
O turismo é uma atividade de grande proporção no mundo inteiro. Sua característica
principal é a utilização de recursos naturais e culturais, com o intuito de torná-los
atrativos capazes de motivar deslocamento. A utilização desses recursos pelo
turismo potencializa a valorização da localidade na qual eles estão
inseridos,contribui,assim, para seu desenvolvimento. Nesse sentido, o Turismo
funciona como agente transformador de espaços, que contribui para melhores
condições de vida da comunidade receptora. Por isso, o presente trabalho tem como
objetivo fazer o levantamento da potencialidade do bairro Serviluz, comunidade
pobre e carente localizada próximo a um dos portões de entrada da cidade, o Porto
do Mucuripe, e entre os dois principais polos turísticos da capital, a Avenida Beira
Mar e Praia do Futuro, a fim de conhecer seu contexto histórico, dando foco ao Farol
do Mucuripe como um equipamento turístico, e analisar uma possível estruturação
da atividade turística no local. Para alcançar o objetivo proposto optou-se pela
pesquisa exploratória utilizando-se defontes bibliográficas e documentais, além da
entrevista. Os resultados revelaram que apenas a manutenção do equipamento
existente não adiantaria para incluir o Serviluz no roteiro turístico da cidade, é
necessário primeiramente politicas publicas que atendam as necessidades básicas
desta comunidade.
Palavras-chaves: Turismo. Potencialidade. Serviluz.
8
ABSTRACT
Tourism is an activity of great proportions worldwide. Its main feature is the use of
natural and cultural resources, in order to make them attractive and able to motivate
displacement. The use of these resources by tourism enhances the appreciation of
the locality in which they are embedded, thus contributes to its development. In this
sense, tourism acts as a transforming agent of spaces, which contributes to better
living conditions of the receiving community. Therefore, this paper aims to survey the
potential of the neighborhood Serviluz, a poor and needy community located near
one of the entrance gates of the city, the Port of Mucuripe, and between the two main
tourism centers of the capital, Avenida Beira Mar and Praia do Futuro, in order to
know its historical context, giving focus to Mucuripe Lighthouse as a tourist
equipment, and analyze a possible structuration of tourism locally. To achieve our
objective we opted for an exploratory research using literature sources and
documentary, in addition to an interview. The results revealed that only the
maintenance of the existing equipment would not help to include Serviluz in the
sightseeing tour of the city. First, public policies that meet the basic needs of this
community are needed.
Keywords: Tourism, Potentiality, Serviluz.
9
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1: Mapa da Regional II da cidade de Fortaleza......................................
Figura 2: Ponta do Mucuripe por volta da década de 30...................................
Figura 3: Ponta do Mucuripe atualmente...........................................................
Figura 4: Surf na Praia do Titanzinho................................................................
Figura 5: Praia do Titanzinho.............................................................................
Figura 6: Farol do Mucuripe...............................................................................
Figura 7: Farol do Mucuripe, desde sua inaguração até a década de 50..........
Figura 8: Placa Turística em frente ao Farol Velho............................................
23
27
28
31
32
35
36
38
10
LISTA DE ABREVITURAS E SIGLAS
CAGECE - Companhia de Água e Esgoto do Ceará.
COELCE - Companhia de Eletrificação do Ceará.
COPAHC - Coordenadoria do Patrimônio Histórico do Ceará.
EMBRATUR – Empresa Brasileira de Turismo.
FUNESCE - Fundação do Serviço Social do Ceará.
IDH - Desenvolvimento Humano Municipal.
OMT - Organização Mundial do Turismo.
SER - Secretaria Executiva Regional.
SERVILUZ - Companhia de Serviço de Força e Luz.
SOEC - Secretaria de Obras do Ceará.
ZEIS - Zona Especial de Interesse Social.
11
SUMARIO
1 INTRODUÇÃO................................................................................................
2 TURISMO: ASPECTOS HISTÓRICOS E CONCEITUAIS............................
2.1 Mercado, Produto e Atrativos Turísticos................................................
3 O BAIRRO SERVILUZ: ASPECTOS HISTÓRICOS, CULTURAIS E
NATURAIS.........................................................................................................
4 ANÁLISE DOS DADOS..................................................................................
4.1 Descrição do Equipamento..................................................................
4.2 Comentários das Entrevistas...............................................................
CONSIDERAÇÕES FINAIS...............................................................................
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................................
12
14
18
23
34
35
38
42
44
12
1 INTRODUÇÃO
Caracterizado como atividade motivadora de deslocamento, o turismo se
utiliza dos recursos naturais e culturais das localidades, transformando-os para
torná-los atrativos interessantes capazes de atrair visitantes. Esses recursos depois
de transformados passam a ser comercializadosdando vida ao mercado turístico e
gerando uma dinâmica imposta pela atividade que acaba caracterizando a
localidade.
Fortaleza foi transformada por essa dinâmica e hoje é uma cidade
genuinamente turística. Diversão, sol e praia são os principais atrativos da cidade,
na qual o turismo nos últimos anos vem crescendo de forma significativa. Com o
segundo maior réveillon do Brasil, Fortaleza tornou-se uma das capitais mais
visitadas do nordeste do país. Sua beleza e sua cultura encantam a todos que
passam por aqui e levam na mala as lembranças e o desejo de voltar.
Os dois pólos turísticos mais importantes da cidade são a Avenida Beira
Mar e a Praia do Futuro, os quais, geradores de emprego e renda, representam
muito bem o produto turístico da cidade. Cultura, passeios, encontros, show de
humor, restaurantes são os atrativos da Avenida Beira Mar enquanto barraca,
caranguejos, sol e praia são os atrativos da Praia do Futuro.
Entre esses dois pólos está o bairro Serviluz, objeto de estudo do
presente trabalho. Com localização bastante privilegiada entre os dois mais
importantes pólos turísticos da cidade, o bairro também fica bem próximo a um dos
portões de entrada da capital, o porto de Fortaleza, o qual tem passado por reformas
para receber um moderno terminal de passageiros.
Devido a seu alto índice de violência, o Serviluz é considerado um dos
bairros mais perigosos da cidade, além de ser uma das comunidades mais pobres,
com um dos menores Índices de Desenvolvimento Humano, com tudo o bairro
também tem seus aspectos positivos. Santuário dos Surfistas, o Serviluz é revelador
de grandes nomes do surf, atividade predominante da localidade, e possuidor de
uma das mais belas paisagens da cidade, vista da Praia do Titanzinho.
O bairro também é rico em história. Há controvérsias de que foi na Ponta
do Mucuripe que desembarcou o primeiro europeu em terras brasileiras, o espanhol
Vicente Pinzon. Além desse fato relacionado ao descobrimento do Brasil, no Serviluz
13
está inserido um dos monumentos histórico mais importante do Ceará, o Farol do
Mucuripe, primeiro orientador da costa Fortalezense, foco do presente trabalho.
Pretende-se, com essa pesquisa, responder a seguinte pergunta: se
existem potencialidade e atrativo turístico para o bairro se tornar parte integrante de
uma rota turística em Fortaleza.
Com isso, o objetivo geral do trabalho corresponde a identificar o
potencial turístico do bairro, sendo os objetivos específicos: conhecer o espaço, sua
historia, seu contexto; analisar o território para uma possível estruturação da
atividade turística.
Para atingir esses objetivos, o trabalho se realizará através da pesquisa
exploratória utilizando-se de fontes bibliográficas e documentais, além da entrevista
realizada com Sr. Otavio Menezes, responsável pela Coordenadoria do Patrimônio
Histórico do Ceará (COPAHC).
Assim, esse trabalho divide-se em quatro capítulos. O primeiro
corresponde a essa Introdução. No segundo, os conceitos de Turismo serão
apresentados assim como os aspectos históricos e econômicos da atividade.
No terceiro, será descrito o objeto de estudo, o bairro Serviluz, sua
história e suas características culturais e naturais. No quarto, será descrito o Farol
do Mucuripe e apresentada a análise da entrevista. Por fim, seguem as
considerações finais e as referências bibliográficas.
14
2 TURISMO: ASPECTOS HISTÓRICOS E CONCEITUAIS
O turismo é uma atividade muito complexa, por isso ainda há, nos dias
atuais, muitas dificuldades em defini-la. Uma dessas dificuldades é a sua
interpretação e os vários motivos que a impulsionam, fazendo essa assumir várias
facetas: ora vista como deslocamento sem fins lucrativos, ora usa-se o termo turismo
de negócios, e tantas outras nomenclaturas que adjetiva a atividade de acordo com
a motivação.
O termo turismo, de acordo com Barreto (2003), surgiu na Inglaterra por
volta do século XVII, referindo-se a um tipo viagem específica, e, segundo
pesquisador suíço Arthur Haulot, a origem da palavra está na língua hebraica em
que tur na Bíblia significa viagem do conhecimento.
Conforme Barreto (2003, p. 9), a primeira definição foi elaborada pelo
economista austríaco Hermann Von SchullernzuSchattenhofen e dizia que “turismo é
o conceito que compreende todos os processos, especialmente os econômicos, que
se manifestam na chegada, na permanência e na saída do turista de um
determinado município, país ou estado”.
Desde então foram muitas as definições de diversas linhas e escolas, as
quais Barreto (2003) elenca algumas. Muitas delas foram da escola berlinesa, como
por exemplo, a criada por Morgentoth, em 1929:
Tráfego de pessoas que se afastam temporariamente do seu lugar fixo de
residência para deter-se em um local com o objetivo de satisfazer suas
necessidades vitais e de cultura ou para realizar desejos de diversas
índoles, unicamente como consumidores de bens econômicos e culturais
(BARRETO, 2003, p.10).
Outra definição foi elaborada por Walter Hunziker e Kurt Krapf, em 1942:
Turismo é o conjunto das relações e dos fenômenos produzidos pelo
deslocamento e permanência de pessoas fora do seu local de domicilio,
sempre que ditos deslocamento e permanência não estejam motivados por
uma atividade lucrativa (BARRETO, 2003, p.11).
Além destas, há também outra da escola berlinesa, vez criada por J.I
Arrillaga:
15
O turismo é o conjunto de deslocamentos voluntários e temporais
determinados por causas alheias ao lucro; conjunto de bens, serviços e
organização que determinam e tornam possíveis estes deslocamentos e as
relações e fatos que entre aqueles e os viajantes têm lugar (BARRETO,
2003, p. 12).
Conforme De La Torre (apud BARRETO, 2003, p. 12), a definição aceita
pela Organização Mundial do Turismo (OMT) conceitua a atividade como a “soma de
relações e de serviços resultantes de um câmbio de residência temporário e
voluntário motivado por razões alheia a negócios ou profissionais”. O mesmo autor
fornece uma definição ainda mais abrangente:
O turismo é um fenômeno social que consiste no deslocamento voluntário e
temporário de indivíduos ou de grupos de pessoas que, fundamentalmente,
por motivos de recreação, descanso, cultura ou saúde, saem do seu local
de residência habitual para outro, no qual não exercem nenhuma atividade
lucrativa nem remunerada, gerando múltiplas interrelações de importância
social, econômica e cultural (DE LA TORRE apud BARRETO, 2003, p.13).
Vale ressaltar que o turismo como fenômeno social envolve todas as
esferas humanas, sendo transformador de espaços e sociedades, e, de acordo com
Beni (2007, p.39), “não pode ficar limitada a uma simples definição, pois este
fenômeno ocorre em distintos campos de estudo, em que é explicado conforme
diferentes correntes de pensamento e verificado em vários contextos da realidade
social”.
Antes de vermos como o turismo se transformou em uma atividade
econômica consumidora de espaços e culturas, realizamos uma viagem no tempo
para compreendermos como surgiu o Turismo.
De acordo com a história convencional do turismo na cultura ocidental, os
gregos foram um dos primeiros a realizar essa atividade. Um dos principais motivos
de suas viagens era em busca da saúde, assim aponta-se “os banhos como
motivadores das viagens dos gregos antigos” (LATY apud REJOWSKI, 2002, p.20)
quando esses encontram fontes de água com poder curativo.
Outro motivo eram os jogos que ocorriam na Grécia, “que, além de caráter
esportivo, tinham um caráter religioso e eram realizados periodicamente, como as
Olimpíadas que atraiam até 200.000 pessoas, que esgotavam a água potável e as
acomodações, e consumia muita comida, vinho e suvenires nos cincos dias de
jogos” ( WOLF apud DIAS, 2005, p. 33).
16
Toda a Grécia se organizava para receber os viajantes e os gregos, em
sua grande maioria, praticavam o exercício da hospitalidade, “constituía-se num ato
honroso e numa instituição que obrigava o cidadão grego a receber com
benevolência os estrangeiros que chegassem á cidade” (CUNHA apud REJOWSKI,
2002, p.20)
Os romanos, por sua vez, tinham a viagem como objeto de prazer e
cultura. Segundo Barreto, eles teriam sido os primeiros a viajar por prazer.
“Informações obtidas através de pinturas pré-históricas, azulejos, placas, vasos,
mapas, demonstram que os romanos iam à praia e aos spas, buscando, nas
primeiras, divertimento, e nos segundos, cura” (BARRETO, 2000, p. 45).
Frequentemente, os romanos visitavam locais e monumentos com valor
histórico, como, por exemplo, a Grécia e Egito. Essas viagens, entretanto, não se
tornaram uma atividade de massa devido às condições precárias de transporte da
época (DIAS, 2005), embora o Império Romano tivesse construído muitas estradas
que facilitava o deslocamento dos romanos (BARRETO, 2000).
Entre os séculos XVII e XVIII, surge uma nova motivação para viajar: a
educação. Praticada na maioria das vezes por rapazes que viriam a exercer cargos
elevados, o objetivo era que eles “adquirissem experiência de vida, firmeza de
caráter e preparação para a guerra” (BARRETO, 2000, p. 48). Essas viagens ficaram
conhecidas como grand tour, na qual
a nobreza europeia, especialmente a inglesa, enviava seus filhos para
viagens educativas... de modo geral era acompanhados por um instrutor,
um intelectual, que orientava seus pupilos de forma mais ou menos
organizada durante a viagem. Esses deslocamentos ocorriam
prioritariamente na Europa, além de Grécia e Oriente Médio, regiões
consideradas berços da civilização e onde existia um grande numero de
monumentos expressivos que contribuíam para o aumento do status social
de quem os visse (DIAS, 2005, p. 34).
Com o advento da Revolução Industrial, novas tecnologias influenciaram
a forma de se locomover. A descoberta do vapor bem como a invenção do trem e da
ferrovia possibilitou uma locomoção mais rápida, segura e confortável, aumentando,
consequentemente, o número de pessoas viajando (DIAS, 2005).
Utilizando o trem como meio de transporte, Thomas Cook, missionário
vendedor de bíblias, na Inglaterra, deu início a época moderna da atividade turística.
Ainda de acordo com Dias (2005), a maior contribuição de Cook foi elaborar um
17
pacote de viagem com alguns serviços incluídos, como transporte, hospedagem e
atividades no local de destino, o que deixou a viagem mais atrativa.
Esta prática passou a ser difundida por todo o mundo e as “viagens
tornaram-se atrativas; o entretenimento e o lazer tinham lugar garantido, e assim foi
introduzido um novo conceito, o de gozar as férias em lugares distantes de seu local
habitual de residência” (LICKORISH e JENKINS apud DIAS, 2005, p. 35).
Somado a esses fatores, o direito a férias remuneradas foi um elemento
que contribuiu para a expansão e a socialização da atividade:
Um fato importante ocorrido em 1936 que foi fundamental para o
crescimento do turismo nos próximos anos foi a realização da primeira
convenção internacional de trabalho, criada com o objetivo de conseguir
férias remuneradas para os trabalhadores. Ainda durante a Segunda Guerra
Mundial, principalmente logo após a conflagração, as férias deixaram de ser
concebidas de maneira generalizada como uma “concessão” do empresário
para o trabalhador. As legislações nacionais estabeleceram de forma
explicita o período obrigatório de férias, desenvolvendo-se o que
convencionamos chamar hoje de turismo social (DIAS, 2005, p. 38).
Outros elementos também influenciaram a atividade turística: o
surgimento do automóvel e a construção de rodovias para atender a demanda; a
melhoria da infraestrutura; a melhoria e evolução dos meios de transporte; o
surgimento do avião como meio de transporte mais rápido; as melhorias nas
condições de trabalho; as novas técnicas de comercialização como o marketing; a
informática auxiliando nos processos gerenciais e operacionais; a consolidação das
empresas multinacionais relacionadas ao turismo; o crescimento das operadoras de
turismo e, de modo geral, a globalização (LOHAMNN; NETTO, 2008).
Assim, a atividade turística foi aos poucos se transformando, deixando de
ser objeto, para se tornar agente de transformação da sociedade, construindo sua
própria história (BARRETO, 2007).Acerca desta transformação, Dias afirma que o
turismo
passou de uma atividade lúdica, sem intenções maiores, para um fenômeno
mundial que se caracteriza hoje como o maior movimento de massa já
ocorrido em toda a historia da humanidade e uma atividade econômica,
considerada a maior da atualidade, que se projeta para os próximos anos
um crescimento sem precedentes em relação a qualquer outra já criada
pelo homem (DIAS, 2005, p. 32).
18
Lohamnn e Netto (2008) afirmam que, com todas as transformações
ocorridas, o homem passou a interessar-se mais por experiências sensoriais, de
lazer e entretenimento, e consequentemente, foi nesse período que o turismo mais
se transformou.
Desta forma, o turismo evoluiu e foi influenciado pelo capitalismo, o que
pode ser verificado ao analisarmos alguns dados da atividade na
contemporaneidade:
O turismo é o setor da economia que mais cresce na atualidade, já tendo
atingido o status de principal atividade econômica no mundo. Superou
setores tradicionais, como a indústria automobilística, a eletrônica e a
petrolífera. É um setor que tende a crescer 7,5% ao ano nos próximos 10
anos, movimenta cerca de US$ 3,4 trilhões de (10,9% do PIB mundial) e
emprega 204 milhões de pessoas (10% da força de trabalho global) e um
número incalculável de atividades correlatadas (DIAS, 2008, p. 10).
O resultado desse crescimento consiste em uma enorme movimentação
de divisas, que pode representar desenvolvimento local, ocasionada pelo Mercado
Turístico, cujos conceitos serão abordados no tópico seguinte juntamente com os
aspectos relacionados ao produto e atrativo turísticos.
2.1 Mercado, Produto e Atrativos Turísticos
Mercado Turístico “pode ser definido como a relação entre a demanda e a
oferta de turismo, ou seja, os consumidores (turistas) e os bens e serviços”
(LOHMANN; NETTO, 2008, p. 176).
Segundo Ruiz e Armand, a demanda “é constituída pelos turistas que
estão motivados por adquirir determinados produtos e serviços turísticos que
atenderão suas necessidades de descanso, recreação, entretenimento e cultura
durante seu período de férias” (RUIZ; ARMAND apud DIAS, 2005, p.51) enquanto a
oferta pode ser definida como “todos os bens e serviços que estão à disposição dos
consumidores-turistas, por um dado preço em determinado período de tempo”
(LOHMANN; NETTO, 2008, p. 369).
Segundo a EMBRATUR, a oferta pode ser classificada em três
categorias, a saber:
19
Atrativos turísticos – todo lugar, objeto ou acontecimento de interesse
turístico que motiva o deslocamento de grupos humanos para conhecê-los.
Podem ser atrativos naturais ou histórico-culturais; manifestações e usos
tradicionais e populares; realizações técnicas e científicas contemporâneas,
acontecimentos programados.
Serviços e equipamentos turísticos – representam o conjunto de
edificações, de instalações e serviços indispensáveis ao desenvolvimento
da atividade turística. Compreendem os meios de hospedagem, serviços de
alimentação, de entretenimento, de agenciamento, de informação e outros
serviços turísticos.
Infra-estrutura de apoio turístico – é o conjunto de obras e instalações da
estrutura física da base, que cria condições para o desenvolvimento de uma
unidade turística: sistema de transportes, energia elétrica, rede de esgotos,
serviço de abastecimento de água, sistema de água, sistema de
comunicações etc.” ( EMBRATUR apud LOHMANN E NETTO, 2008, p.
369).
Para Ignarra (2003), a somatória dos itens relacionados acima (Atrativos
turísticos, Serviços e equipamentos turísticos, Infra estrutura de apoio turístico), os
quais a EMBRATUR classifica como categorias, é o que constitui o produto final ou
produto turístico. Segundo Dominguez e Tovar (apud DIAS, 2005), há algumas
características próprias que o diferenciam dos demais produtos, tais como:
subjetividade, apresentando-se de forma diferente para cada pessoa;
simultaneidade, produzido no momento do consumo; caducidade, não pode ser
armazenado; heterogeneidade, composto por outros subprodutos diferentes, entre
outros.
O produto turístico pode ainda ser caracterizado como uma experiência
de percepções intangíveis que são vivenciadas pelo consumidor desde o momento
que parte de sua casa até o retorno do local da viagem (RUSCHMANN apud DIAS,
2008).
O turismo tem uma característica bastante interessante de ser observada:
a capacidade de transformar em atrativos turísticos, para uso da atividade, os
elementos culturais e naturais de determinada localidade, tornando-os motivadores
de deslocamento. Esses elementos, naturais e culturais, são chamados de recursos
turísticos, os quais são considerados a matéria-prima do turismo. Com eles é
possível planejar a atividade através da elaboração de projetos, definir o produto
turístico, estabelecer estratégias de mercado e, assim, desenvolver a localidade com
o potencial (DIAS, 2005).
Dias nos fornece quatro classificações de recursos turísticos:
20
Recursos atuais: aqueles que já estão sendo explorados em termos
turísticos;
Recursos potenciais: aqueles que poderão ser explorados futuramente;
Recursos básicos: aqueles que constituem o suporte das atividades que
sustentam os programas de um plano. Seu papel é atrair e fixar demanda
em uma região. Por exemplo: um monumento, uma praia, um parque ou
uma vila histórica;
Recursos complementares: são aqueles que não têm poder de atração
suficiente para fixar uma demanda e que justifiquem por si só a criação de
infraestrutura e equipamentos, pois as atividades que geram produzem
estadias de curta duração. Desempenham um papel complementar,
contribuindo para diversificar as atividades dos turistas que se encontram na
região (RUIZ; ARMAND DIAS apud DIAS, 2005, p. 61).
Sendo assim a matéria-prima do turismo compõe-se dos recursos
culturais e naturais, dos quais nos interessa saber suas definições e a importância
da sua utilização pela atividade turística:
Os recursos naturais “são compostos pelo ar, clima, pelos acidentes
geográficos, o terreno, a flora, a fauna, as massas de água, as praias, as belezas
naturais, o abastecimento de água potável, usos sanitários e outros” (IGNARRA,
2003, p. 52). Outra definição proposta por Barreto para recursos naturais é a
seguinte: “são aqueles nos quais não houve intervenções do homem, tais como
florestas, acidentes geográficos, formações rochosas” (BARRETO, 2003, p. 37).
Andrade (2002) aponta o potencial natural como um elemento primário
para que uma localidade, uma região ou um país seja avaliado como um lugar com
vocação turística.
O turismo é altamente dependente dos recursos naturais, pois estes são
os maiores motivadores de viagens. O aproveitamento de climas, a exuberância de
paisagens, a busca por novos ares, o sol e a praia, fazem da natureza um elemento
de grande valor para a atividade turística, que pode contribuir positivamente para o
desenvolvimento local e preservação do meio natural (DIAS, 2005).
A utilização dos recursos naturais pode apresentar-se como um meio
indutor de crescimento econômico, preservação da autenticidade natural,
manutenção da paisagem, aumento da consciência ambiental, criação ou
melhoramento da infraestrutura local, captação de recursos para preservação,
aumento da qualidade de vida, dentre outros (DIAS, 2005).
21
Por sua vez, o recurso cultural é definido como o conjunto composto “pelo
patrimônio arquitetônico, pelos acervos dos museus, pela cultura da população local,
sua gastronomia típica, seu artesanato, folclore, seus eventos, hábitos e costumes,
sua música, literatura, língua e etc.” (IGNARRA, 2003, p. 52).
Além desta, há muitas outras definições expressas por diversos autores
tal como a exposta por Dias (2005, p.64) que caracteriza o recurso cultural como
sendo “a herança cultural material e não material, que são entre outros: o patrimônio
artístico, arqueológico, histórico, paleontológico, as festas, festivais, eventos,
folclore, a música, a dança, etc., que constituem e caracterizam a comunidade local”.
Assim como os recursos naturais, os recursos culturais têm um enorme
valor para o turismo, pois a atividade turística acontece impulsionada por pessoas
que viajam em busca de conhecer e vivenciar culturas diferentes da qual estão
habituadas. O patrimônio cultural de uma localidade representa sua identidade, e
essa quanto mais autêntica for, maior valor terá para o turismo (BARRETO,2007).
A utilização desses recursos pode significar desenvolvimento para
comunidade local uma vez que são muitos os efeitos positivos gerados por essa
apropriação, tais como: recuperação e revitalização de espaços, revitalização de
atividades tradicionais, preservação de bens tombados, aumento pelo interesse da
cultural local, aumento do conjunto de informações da localidade etc.
(BARRETO,2007).
Dias (2006, p. 46), aponta mais um aspecto importante da utilização dos
recursos culturais: “o fortalecimento dos laços dos moradores com o território local
compreendido como um espaço de realização de interações sociais bastantes
específicas e singulares”, além dos benefícios econômicos, pois são recursos que se
forem bem administrados poderão durar por muito tempo.
Portanto, um recurso só é considerado um atrativo quando for capaz de
motivar o deslocamento de pessoas interessadas em conhecer tal recurso. Para isso
é necessário que haja uma infraestrutura básica que torne possível essa relação,
como facilidades de acesso, instalações e equipamentos (DIAS, 2008).
Sendo assim, atrativo turístico é, segundo Barreto (2003, p. 33), “aquilo
que atrai”, ou seja, aquilo que desperta interesse. Outra definição dada para esse
elemento da oferta turística é proposta por Pearce, o qual define atrativo como “um
dado local com uma característica específica natural ou construída, que é foco de
atenção do turista” (PEARCE apud LOHMANN, 2008, p. 390).
22
Contudo, a definição de atrativo turístico está intimamente ligada à
subjetividade de quem o visita, pois determinados atrativos podem ser interessantes
para alguns turistas como pode não ser para outros, ou seja, no que se refere
delimitar o que é ou não atrativo turístico, deve-se levar em conta o conjunto da
singularidade das pessoas que expressam a vontade de conhecer e ter contato com
determinado lugar (CRUZ, 2003).
Como exemplo disto tem-se a Rocinha1, a maior favela do Rio de Janeiro,
considerada hoje um atrativo turístico principalmente por estrangeiros que se
aventuram em conhecer a localidade. Para muitos, esse território jamais seria
frequentado, enquanto para outros é roteiro turístico consolidado (CRUZ, 2003).
Apresentados os conceitos teóricos norteadores do presente trabalho, no
próximo capítulo, conheceremos os aspectos históricos, culturais e naturais do bairro
Serviluz, objeto do nosso estudo.
1Informações retiradas do The New York Times disponível em
http://www.rocinha.org/rocinhanarede/view.asp, acesso em 14.11.12.
23
3 O BAIRRO SERVILUZ: ASPECTOS HISTÓRICOS, CULTURAIS E NATURAIS
De acordo com as informações da Secretaria Executiva Regional (SER)
II2, o nome oficial do bairro é Cais do Porto, o qual mede 2,56 km, tem uma
população de 22.382 habitantes e limita-se a Norte e Leste com o Oceano Atlântico,
ao sul com o Mucuripe e a Oeste com o Vicente Pinzón, como mostra o mapa
abaixo.
Figura 1: Mapa da Regional II da cidade de Fortaleza Fonte: Disponível em http://www.fortaleza.ce.gov.br/
Porém, popularmente e pela mídia, o bairro é conhecido como Serviluz,
tendo surgido esse nome, “por força da existência da Companhia de Serviço de
Força e Luz de Fortaleza (Serviluz), na década de 1950, utilizada pelos moradores
como referência para situar a localidade” (MOSCOSO, 2010).
Seu surgimento se deu por conta de diversos fatores, sendo o principal a
construção do Porto do Mucuripe, o qual foi pensado como solução para atender as
necessidades que o antigo Porto de Fortaleza, localizado na atual Praia de Iracema,
já não conseguia atender por contado crescente número de embarcações (AGUIAR,
2007).
Como o Antigo Porto de Fortaleza já não apresentava condições de
segurança, para realizar as atividades portuárias bem como embarques e
2Informações extraídas do site da Prefeitura de Fortaleza: http://www.fortaleza.ce.gov.br/ acessado
em 21.03.12
24
desembarques, por conta das condições difíceis e perigosas, as pesquisas e os
estudos oceanográficos e sedimentológicos realizados apontaram a ponta do
Mucuripe como sendo o lugar ideal para a construção desse novo equipamento
(MORAIS apudLIMA, 2005).
Por volta de 1939, as obras foram iniciadas e demoraram quase duas
décadas para ser finalizada a construção, em torno de 1964, gerando alterações no
cenário natural e social ocasionadas pelos avanços da tecnologia necessária (LIMA,
2005).
Lima (2005) aponta as décadas de 50 e 60 como o período em que as
indústrias se instalam ao redor do porto do Mucuripe, ocupando grande parte dessa
região,
[...] para ali foram as indústrias que estão na maior dependência do
transporte marítimo com relação às matérias-primas, como os moinhos de
trigo e a Fabrica de Asfalto de Fortaleza, subsidiária da PETROBRAS, além
dos estabelecimentos de frigorificação da pesca. Os incentivos concedidos
pela SUDENE à indústria do beneficiamento da pesca contribuíram para o
surgimento de indústrias do ramo, favorecendo assim uma maior ocupação
do Mucuripe pelo setor secundário (SOUZA apud LIMA, 2005, p.109).
Essa iniciativa atraiu moradores, tais como pescadores, migrantes do
Sertão e de diversas áreas, assim “os equipamentos relacionados ao Complexo
Portuário do Mucuripe foram, de certa forma, um atrativo adicional ao aumento
populacional no Serviluz” (LIMA, 2005, p.110).
Antes do porto os primeiros ocupantes dessa parte da cidade foram em boa
parte pescadores, migrantes de outras regiões praianas da longa costa
cearense, que em distintas épocas de calamidade, fugiram para a capital.
Na cidade, optaram pela vida numa tradicional região de pesca, dirigindo-se
para as areias do Mucuripe (AGUIAR, 2007, p. 32).
As oportunidades de empregos surgiam à medida que novas indústrias se
estabeleciam. Com elas, começa a ocorrer uma mudança na população do lugar,
uma vez que era necessária uma escolaridade mais elevada, como menciona
Aguiar:
Com os investimentos realizados na construção e ampliação do porto, a
região do Mucuripe se configurou como locus privilegiado de oportunidades
e como possibilidades concretas de inserção no mundo urbano do trabalho.
Esse processo de atração se acentuou a partir de 1965, como o
25
encerramento das obras do porto e a chegada da energia elétrica
proveniente da Hidrelétrica de Paulo Afonso. Nesse instante intensificava-se
ainda mais a montagem das indústrias que constituiriam o pólo industrial do
Mucuripe (AGUIAR, 2007, p.34).
Porém, o processo de crescimento industrial não foi o único fator
impulsionador para fazer crescer a população em torno do Porto. Pode-se dizer que
o turismo foi também um agente impulsionador.
A relação entre homem e natureza fez com que esse enxergasse o mar
como uma opção de lazer, fins terapêuticos e um lugar onde se podia estabelecer
relações sociais. Segundo o historiador Alain Corbin (apud AGUIAR, 2007), o
homem tinha um olhar repulsivo sobre as águas oceânicas devido ao contexto
histórico da gênese bíblica. A partir do século XVII, houve uma mudança nessa
visão que fez com que se criasse um novo olhar a respeito do mar, desenvolvendo
por este uma admiração que motivou dentre outras coisas, a prática da viagem
turística. Ainda segundo Alain Corbin, “desde o século XVIII se operou uma espécie
de invenção da praia, que despertou o interesse pelo mar como um verdadeiro
fenômeno social”(apud AGUIAR, 2007, p.44).
Em Fortaleza, a elite começa a frequentar a Praia de Iracema por volta da
década de 20. A partir dos anos 70, com advento do turismo e a especulação
imobiliária no litoral de Fortaleza, muda-se completamente a paisagem da enseada
do Mucuripe, como descreve Aguiar:
Aquela primitiva aldeia de pescadores da enseada do Mucuripe logo se
transformou numa espécie de selva de “selva de pedra” luxuosa onde
jangadeiro pobre já não podia mais morar
A segregação espacial e a maquiagem no espaço urbano tornaram
Fortaleza uma cidade para inglês ver. A medida que foi chegando o turista,
o pescador foi sendo obrigado a sair. O resultado desse processo é
concretização de uma cidade que construiu espaços de lazer e
equipamentos de luxo para os turistas e as elites locais, mediante a
destruição de valores e tradições culturais há tempos sedimentados,
aumentando ainda mais a desigualdade, a exclusão social e o avanço da
degradação do meio ambiente já iniciado pela indústria.
(...)
Nesse novo contexto de Fortaleza, não é preciso muito esforço para
perceber que as praias passaram a ter novas funções e novos
frequentadores. Na ponta do Serviluz, por exemplo, muitos dos
personagens que não interessavam no novo cenário, criados para as elites,
logo foram confinados aos casebres mais afastados da luxuosa Avenida
Beira Mar. Interessa aqui registrar as conexões entre turismo e prostituição
no bairro(AGUIAR, 2007, p.45).
26
Nesse processo de construção do bairro, no início de 1960, ocorre a
retirada de mulheres que ganhavam a vida na antiga Rua da Frente, atual Avenida
Beira Mar, para o entorno do Farol Velho. Segundo Aguiar (2007, p. 47), este foi “o
primeiro registro de ocupação em grande escala para o entorno do velho farol”. Essa
ocupação, de certa forma, melhorou a localidade, com a instalação de água, luz e
telefone,“devido às necessidades dos meretrícios que ali foram se instalando, além
da renda deixada pelos estrangeiros que desembarcavam no porto e frequentavam
os cabarés contribuindo para o comércio local”.
Segundo Aguiar (2007), em 1977, ocorre mais um episódio de ocupação
no Serviluz: os pescadores que ocupavam a Praia Mansa, terras próximas ao porto,
foram retirados para o entorno do Farol Velho devido à necessidade de aumentar as
instalações portuárias. Para isso, foi preciso um árduo trabalho dos próprios
moradores em construir suas casas em um terreno que apresentava fenômenos
típicos da natureza local, como ventos, areias esvoaçantes e as marés, que
ameaçavam as casas até então feitas de taipa.
Nesse momento foi preciso união e mobilização das pessoas para junto
ao poder público conseguir ajuda para se estabilizarem naquele espaço onde se
desenvolveu o sentimento de comunidade,como descreve moradora do bairro,
senhora Maria Dias: “Aos poucos, fomos conseguindo montar o bairro com a
construção das casas, por meio de mutirões, a vinda de escolas e do posto de
saúde. As conquistas aconteceram com muita luta” (MOSCOSO, 2010).
Segundo Braga (apud LIMA, 2005), entre os anos de 1987 e 1989, foram
construídas no Serviluz em torno de 2.224 casas, no entanto a meta era 4.121. No
governo de Tasso Jereissati foram construídas 104 habitações, no entanto eram
previstas 400.
Aguiar (2007, p. 101) relata que “as pequenas casas do Serviluz só foram
erguidas após a construção de um grande espigão de pedras, capaz de fazer recuar
o mar”. Nesse lugar, as casas foram tomando todo o terreno de forma desordenada:
becos e vielas formavam um grande labirinto, chuvas ameaçavam as casas, a falta
de saneamento e as pestes ocasionavam doenças. Esses problemas foram
amenizados com a intervenção do Governo do Estado através do projeto Sanear na
década de 90.
27
Somente nesse período as pedras, há tempos transportadas pelos
retirantes, e o asfalto, há anos produzido na fábrica ao lado, começavam
enfim a solidificar as ruas. Com vielas pavimentadas, muitos becos foram
fechados, as residências receberam ligação domiciliar de esgoto,
iluminação foi reforçada e um calçadão que ligava a orla do Serviluz à Praia
do Futuro foi construído (AGUIAR, 2007, p. 109).
Foram precisos anos para que os moradores do bairro naturalmente
desenvolvessem suas relações sociais, culturais e econômicas. A pesca continuou
sendo o sustento principal das famílias, porém houve um declínio na atividade
devido aos avanços da pesca industrial, obrigando os pescadores e seus familiares
procurar outras formas para obterem seu sustento. Uma das alternativas foi
aproveitar as oportunidades de emprego nos bares, restaurantes e hotéis da cidade,
como camareira, garçom e recepcionista (AGUIAR, 2007).
Assim, no bairro se estabeleceram novas relações sociais provocadas
pelo seu desenvolvimento e pelas mudanças urbanas que ocorriam por toda a
capital. Tais mudanças podem ser percebidas nas duas imagens a seguir:
Figura 2: Ponta do Mucuripe por volta da década de 30
Fonte: Arquivo Nirez, disponível em http://fortalezaemfotos.blogspot.com.br
28
Figura 3: Ponta do Mucuripe atualmente.
Fonte: Foto de Gentil Barreira, disponível em http://blog.opovo.com.br:/pliniobortolotti
O que era, antes, basicamente terra e mar foi, aos poucos, sendo
transformado por conta da construção do Porto, a instalação das indústrias e a
ocupação das pessoas que ali se instalaram.
Antes de nos prosseguirmos no presente trabalho, há aspectos históricos
e culturais que merecem ser mencionados para que possamos compor um quadro
completo para nosso estudo.
Um desses aspectos relaciona-se com as discussões acerca do
descobrimento do país. “A Ponta do Mucuripe coincide com o Descobrimento do
Brasil, uma vez que comprovado está (pelo menos oficiosamente) ter sido por ela
onde desembarcou o primeiro europeu em terras brasileiras3”
De acordo com entrevista ao Diário do Nordeste, o jornalista e
pesquisador cearense Rodolfo Espínola, que há tempos estuda sobre as
navegações do final do século XV, argumenta que o primeiro europeu a pisar no
Brasil foi o navegador espanhol Vicente Yañez Pinzón antes, mesmo que Pedro
Alvares Cabral, em 22 de abril de 1500 no Sul da Bahia. Pinzón teria desembarcado
em um lugar “que ele batizou de Santa Maria de La Consolación, local este que a
3Informações extraídas do site http://www.diariodonordeste.globo.com/materia, acessado em 29.03.12
29
moderna cartografia indica como sendo a Ponta do Mucuripe, a 3º 42 S, a cerca de
10 km do centro de Fortaleza4”
Espínola lamenta a falta de sensibilidade dos políticos e especialistas
para esse fato de importância histórica e imagina, que se fosse diferente, vários
setores seriam impactados por esta questão inclusive o turismo que utiliza a “história
como elemento fundamental para suas estratégias de vendas5”.
Outro aspecto relaciona-se com a atividade da pesca, prática milenar
exercida por homens simples e meio de sustento para a comunidade do Serviluz,
onde “a maior parte da população vive na informalidade, exercendo atividades como
a pesca” (MOSCOSO, 2010).
Segundo Aguiar (2007), o tipo de pesca empreendida no bairro é
tradicionalmente o de três malhas, na qual são utilizadas cordas, varas de madeira,
uma rede e um bote (tipo de barco), e se dá da seguinte forma:
O barco, ancorado na praia, é arrastado pelos pescadores para a beira d
água, sendo carregado sobre um eixo de ferro e sustentado por duas rodas
de um velho automóvel.
(...)
Quando toda a embarcação e equipamento já estão na superfície da água,
a equipe impulsiona, “faz força”, e o casco do barco desliza contra as
ondas.
(...) À medida que o barco se inclina, os homens tentam controlá-lo. Na
“vara”, o pescador, em pé, impulsiona a longa tira de madeira no chão,
arremessando a embarcação para dentro d água. Os “cordeiros” vão aos
poucos soltando a corda. Vale ressaltar que todas as tarefas são realizadas
em conjunto e calorosos gritos de orientação são pronunciados a todo
instante. A fala é um componente importante.
Vencida a arrebentação, o barco faz uma espécie de circulo, distribuindo a
rede cuidadosamente, realizando um tipo de cerco. (...)
Quando o bote retorna á areia trazendo a outra ponta da corda, recomeça o
trabalho em terra. (...) É chegada a hora de puxar as duas pontas da corda
de maneira coordenada e essa é quase sempre a etapa mais demorada do
trabalho.(...)
Os primeiros metros da corda são arrastados para a terra e um pescador
desata o nó destacando-a do resto da rede.(...)
Os homens aceleram, empregam mais força intensificam-se os gritos. Em
meio a gritaria, o esforço consiste em aproximar a rede o máximo possível
das pedras do espigão, onde a fertilidade natural e as pedras despejadas
por tratores fazem concentrar o
4Informações extraídas do site http://www.diariodonordeste.globo.com/materia, acessado em
29.03.12. 5Informações extraídas do site http://www.diariodonordeste.globo.com/materia, acessado em
29.03.12.
30
À medida que a rede se estreita , dois pescadores, certamente os mais
habilidosos, encarregam-se do desembaraço e da aproximação das cordas.
A atenção e a falação são redobradas (AGUIAR, 2007, p. 13).
Ao passo que a rede vai chegando em terra, é comum a presença de
curiosos e pessoas intencionadas em se aproveitar das sobras de peixes que caem
da rede. Após a captura total dos peixes, esses são distribuídos e levados
imediatamente para serem comercializados nas vendas locais (AGUIAR, 2007).
Além da pesca de três malhos, a captura de peixes é também realizada
com rede de náilon, lançada manualmente ao mar em uma profundidade rasa o
pescador estando de pé dentro d’água, com vara e anzol, e com lanças quando são
capturados na prática do mergulho.
Desta forma, se dá o grande espetáculo de força e resistência dos
homens do mar, que contam com a sorte e a proteção de Deus para retornarem à
terra firme. As condições do clima, do vento e da maré são determinantes na
decisão de adentrar no mar. Mesmo com essas condições imposta por ela, “A
NATUREZA é a maior vantagem do bairro Serviluz. Para os moradores, é o que
garante o sustento de 20% da população local, especialmente no que diz respeito à
pesca” (MOSCOSO, 2010).
A atividade pesqueira pode ser entendida em um contexto maior em que
a praia corresponde a um lugar de lazer, diversão e sociabilidade. A definição dada
por Lefebvre para espaço se enquadra dentro da perspectiva que temos desse
lugar:
é o meio, a mediação, ao mesmo tempo, instrumento e intermediário das
relações que nele se reproduzem (...) não é somente regra, forma superior,
norma, aquele que proporciona as formas, os sentidos e as finalidades; ele
é também o lócus em que se faz a reprodução social (LEFEBVRE apud
LIMA, 2005, p. 29).
No Serviluz, o conjunto de elementos deste espaço é que forma a
paisagem do local, a qual retrata a essência de uma localidade praiana, com suas
expressões próprias e originais. Por se tratar de um bairro litorâneo, os moradores
desenvolvam uma intima relação com a natureza, símbolo do modo de viver a vida.
No bairro, tem-se a praia como espaço de lazer e recreação para a
comunidade e os visitantes, motivados, na maioria das vezes pelo surf, atividade
esportiva predominante na comunidade, como ilustra a imagem a seguir.
31
Figura 4: Surf na Praia do Titanzinho
Fonte: Foto de Natinho Rodrigues disponível em http://blogs.diariodonordeste.com.br
Há duas praias no bairro: a Praia do Vizinho e a Praia do Titanzinho,
separadas por um molhe, popularmente chamado de Paredão.
Medindo 700 metros de extensão, com 5 metros de largura e outros 5
metros de altura em relação ao mar, o Paredão6serve como atracadouro para barcos
e botes que ficam ali ancorados seguros por cordas e bóias, em uma espécie de
porto improvisado pelos pescadores que aguardam a hora de se aventurar nos
verdes mares em busca do seu sustento e de sua família.
A Praia do Vizinho7 é mais frequentada por moradores que na maioria das
vezes escolhem o domingo como dia da semana para se refrescar e aproveitar as
ondas na companhia dos amigos, apesar de não contar com uma infraestrutura de
barracas como acontece na Praia do Futuro. Além dos banhistas, este espaço é
frequentado pelos que preferem jogar uma partida de futebol, prática comum nos
finais de tarde quando a maré está seca, ou pelos que escolhem o lugar como
espaço para treinar a capoeira. Há também os que optam utilizar a praia para fazer
exercícios físicos, ou, apenas dar um passeio observando a paisagem à beira-mar.
Lima (2005) aponta as características geográficas da praia do Vizinho: “a
faixa praial desta área, geologicamente, é composta de sedimentos que são
6Informações retiradas do Jornal O Povo, no site: http://sitedanoticia.com/canais/ceara; acessado em
21/04/2012. 7Informações retiradas do Jornal O Povo, no site: http://sitedanoticia.com/canais/ceara; acessado em
21/04/2012.
32
arenosos e marinhos. Ela está gradativamente sujeita tanto à ação da hidrodinâmica
litorânea quanto da dinâmica eólica” (Lima, 2005, p.62).
A Praia do Titanzinho está localizada nas imediações do Titanzinho, uma
localidade do bairro, que recebeu este nome por conta da “marca dos tratores que
foram usados para a remoção das antigas casas da Praia Mansa” (SILVA, 2011, p.
40).
Figura 5: Praia do Titanzinho.
Fonte: disponível em http://blogspot.com.br
A Praia do Titanzinho8 é uma bacia artificial formada entre os dois molhes
que existe na área, um de 1,9 km que a separa do Porto do Mucuripe e o outro que
mede aproximadamente 800 que a divide da Praia do Vizinho, faixa litorânea que
mais a leste é a Praia do Futuro. Nela há uma massa rochosa, na qual é possível
visualizar, a olho nu, algumas espécies de vida marinha que ali se desenvolve tal
como peixes e siris. Morais, diz que essas rochas “são sedimentos terciários
consolidados e cimentados por oxido de ferro e/ou carbonato de cálcio e magnésio,
com diagênese média e alta, oriundos do fundo do mar” (MORAIS apud LIMA, 2005,
p. 60).
Conhecida internacionalmente por conta do surf, a Praia do Titanzinho9, é
considerada um dos melhores point para a prática do esporte. De lá já saíram
8 Informações retiradas do site do jornal O Povo http://www.opovo.com.br, acessado em 01.05.12.
9Informações retiradas do site do jornal O Povo http://www.opovo.com.br, acessado em 01.05.12.
33
grandes nomescampeões do surf como o de Tita Tavares, Pablo Paulino, André
Silva e Fábio Silva.
Além do seu valor para a prática do esporte, a praia tem uma grande
função social: a de distrair e dar esperança para crianças e jovens que fogem da
marginalidade no bairro e sonham com dias melhores em conseqüência do surf,
sendo, ainda, um lugar onde se estabelece relações sociais inerentes do bairro.
Exposto o bairro Serviluz, objeto de estudo do presente trabalho, com
seus aspectos históricos, culturais e naturais, caminharemos agora para a análise
dos dados, dando foco a um dos equipamentos histórico mais importante do Ceará,
o Farol do Mucuripe, o qual está inserido dentro do bairro.
34
4 ANÁLISE DOS DADOS
O Serviluz trata-se de um bairro periférico que, mesmo com suas
características e peculiaridades, assemelha-se aos demais bairros pobres, típicos da
cidade de Fortaleza.
O bairro é um dos que possui menor Índice de Desenvolvimento Humano
Municipal (IDH), que é de 0,386. A comunidade é carente de serviços, com 90%
beneficiada com o Bolsa Família, sobrevivendo da pesca 20% dos seus 21 mil
habitantes. O bairro é conhecido pelo seu alto índice de violência e marginalização.
As brigas entre gangues são constantes, sendo a droga, na maioria das vezes, a
causa dos conflitos (MOSCOSO 2010).
O bairro é composto por apenas duas avenidas, a Avenida Zezé Diogo e
a Avenida Vicente de Castro, pelas quais os moradores têm acesso ao transporte
público, através das linhas de ônibus Caça e Pesca Centro Via Serviluz, Serviluz
Papicu, Parangaba Mucuripe da empresa viação urbana e o micro ônibus 52.
Grande parte do bairro é asfaltada, porém, em algumas ruas próximas à
praia, o calçamento é coberto por areia fina, além daquelas estreitas vielas e becos
por onde não é possível trafegar carros particulares, ambulância ou mesmo o carro
da polícia acionados em uma ocorrência.
Por se tratar de um bairro na região litorânea, é afetado pelas condições
impostas pela geografia local, somada à ação humana que também contribuiu para
o quadro de desequilíbrio atual. É comum, principalmente nos meses de julho a
dezembro, os moradores do Serviluz que residem próximo a Praia do Vizinho
sofrerem com os problemas causados pela movimentação das areias, que é
transportada pelos ventos, ondas, marés dentre outros fatores geográficos, que
invadem as casas e as ruas dificultando e muitas vezes impossibilitando o tráfego de
pessoas e transporte (LIMA, 2005)
A CAGECE é presente no bairro, no entanto, em algumas ruas, o esgoto
corre a céu aberto sendo foco de contaminação para doenças. Ao andarmos pela
praia, também é possível percebermos o descaso com o meio ambiente por falta de
uma infraestrutura adequada, uma vez que a água do esgoto de algumas casas é
direcionada para o mar sem o devido tratamento. A COELCE também atua na
comunidade, mas, em algumas localidades, geralmente nas ruas mais próximas à
praia, as instalações e as fiações elétricas são danificadas devido à maresia.
35
É considerando este múltiplo contexto social que será analisado um dos
potenciais turísticos da cidade de Fortaleza, o Farol do bairro Serviluz, sendo a sua
descrição o primeiro momento, acrescido dos aspectos históricos.
4.1 Descrição do Equipamento
O Farol Velho10 estálocalizado na Avenida Vicente de Castro, s/n, e faz
parte do patrimônio histórico do Estado (FIGURA 6). Do seu topo, é possível
apreciar uma das mais belas paisagens panorâmica da cidade: sua orla marítima,
além do Porto do Mucuripe, junto à Praia Mansa e aos aerogeradores da usina
eólica, das casas configuradas com as indústrias locais, e da Praia do Titanzinho.
Figura 6: Farol do Mucuripe
Fonte: Disponível em http://ceturdigital.blogspot.com.br, acessado em 10.04.12.
O Farol11 é uma das construções mais antiga do Ceará (FIGURA 7). Sua
planta foi apresentada pelo presidente do Ceará, Manoel Joaquim Pereira da Silva,
10
As informações foram retiradas do site http://www.secult.ce.gov.br/patrimonio-cultural/patrimonio-material/bens-tombados/fortaleza, e do site da empresa de transporte urbano Dragão do Mar, http://www.avdragaodomar.com.br/site/ponto_turistico.php, ambos acessados em 10.04.12. 11
As informaçõesforam obtidas do arquivo de matérias do Jornal O Povo de 10.12.80 e 01.12.91, pertencente à Coordenadoria de Patrimônio Histórico do Ceará - COPAHC.
36
ao D. Pedro II, o qual a aprovou em 17 de agosto de 1826. Porém a construção só
foi iniciada em 1840, e foi concluída em 1846. Os engenheiros responsáveis pela
obra, considerada de quarta classe, foram Luis Albuquerque e Júlio Álvaro Teixeira
de Azevedo. Sua inauguração coincidiu com o aniversário da Princesa Isabel; sua
luz branca tinha um alcance de 12 milhas, o mesmo que 22 quilômetros, e brilhava a
cada 30 segundos.
Figura 7: Farol do Mucuripe, desde sua inaguração até a década de 50
Fonte: Disponível em http://fortalezanobre.blogspot.com.br/2009/05/mucuripe.html, acesso 10.04.12
O Farol do Mucuripe12 servia de referência para guiar as embarcações
que se aproximavam da costa de Fortaleza, porém foi desativado em 1957, sendo
construído um novo farol mais moderno e mais potente no bairro Vicente Pinzon, no
grande Mucuripe.
No ano de 198113, foram encontradas atrás do farol ruínas de um antigo
forte. “Acredita-se que pertençam ao Forte São Luiz, construído em 1801, no
governo de Bernardo Manuel de Vasconcelos, primeiro governador do Ceará, depois
que a província tornou-se independente de Pernambuco”. Essa descoberta
apresenta significativo valor histórico, pois “o Forte São Luiz é considerado, pelos
12
As informaçõesforam obtidas do arquivo de matérias do Jornal O Povo de 14.07.81, pertencente à
Coordenadoria de Patrimônio Histórico do Ceará - COPAHC. 13
As informações foram retiradasdo site da empresa de transporte urbano Dragão do Mar, http://www.avdragaodomar.com.br/site/ponto_turistico.php, ambos acessados em 10.04.12.
37
historiadores, como a segunda mais antiga edificação do Ceará”. (informações
extraídas da aviação Dragão do mar 10.04.12)
Após anos de abandono14 depois de sua desativação, o Farol do
Mucuripe foi cedido pelo Ministério da Marinha, através da Capitania dos Portos, à
Funesce (Fundação do Serviço Social do Ceará), a qual pretendia instalar, nas
dependências da edificação, um centro de artesanato com cunho social,
aproveitando a mão-de-obra local.
Em 1981/8215, o Farol do Mucuripe passa por um processo de
restauração, a Secretaria de Obras do Ceará (SOEC) foi a responsável pela
execução das obras do projeto da Divisão do Patrimônio Histórico e Artístico da
Secretaria de Cultura e Desporto do Estado. Em 1983, o edifício foi tombado pelo
Estado de acordo com o decreto número 16.237, de 30 de novembro de 1983.
O interesse principal era revitalizar16 e dar uso ao equipamento. Para isso
foram pensadas diversas alternativas de aproveitamento e conservação do Farol
desde a criação de um restaurante típico, até a instalação do primeiro planetário de
Fortaleza. Porém, a ideia que foi posta em prática foi a do historiador Raimundo
Girão, de transformar o Farol no Museu do Jangadeiro como uma forma de valorizar
esse personagem do Ceará.
Oficialmente17, o Museu do Jangadeiro foi inaugurado em 25 de março
de 1982. Em julho de 1983, o atrativo chegou a receber cerca de 1.30018 visitantes,
porém as peças e o material exposto, como jangada, mansuás, tarrafas, fotos e
pôsteres de pescadores, eram tão resumidos que não demonstravam a real vida do
homem do mar, suas dificuldades e enfrentamentos ocasionados pela profissão.
Somado a isto, o descuido e a falta de segurança foram os motivos que afastaram
os turistas que iam ao Museu, mais para conhecer aquele ponto histórico da cidade
e apreciar a bela paisagem vista do topo do Farol do que para visitar o Museu.
14
As informaçõesforam obtidas do arquivo de matérias do Jornal O Povo de 11.11.81, pertencente à Coordenadoria de Patrimônio Histórico do Ceará - COPAHC. 15
As informações foram retiradas do site http://www.secult.ce.gov.br/patrimonio-cultural/patrimonio-material/bens-tombados/fortaleza, 16
As informaçõesforam obtidas do arquivo de matérias do Jornal O Povo de 11.11.81, pertencente à Coordenadoria de Patrimônio Histórico do Ceará - COPAHC 17
As informaçõesforam obtidas do arquivo de matérias do Jornal O Povo de 11.04.83, pertencente à
Coordenadoria de Patrimônio Histórico do Ceará - COPAHC 18
As informaçõesforam obtidas do arquivo de matérias do Jornal O Povo de 14.11.83, pertencente à Coordenadoria de Patrimônio Histórico do Ceará – COPAHC.
38
No inicio da década de 90, o Farol foi novamente reformado19 (FIGURA
8) desta vez para abrigar o Museu de Fortaleza, com fotos que ilustravam a
evolução urbana de Fortaleza, trechos de romance, documentos, desenhos, dentre
outros, chegando a ser um dos pontos turísticos mais visitados, porém novamente
o descaso dos órgãos responsáveis pelo equipamento e a violência local fizeram
com que este entrasse em declínio.
Figura 8: Placa Turística em frente ao Farol Velho Fonte: Disponível em http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp, acessado em 10.04.12.
Atualmente, o Farol do Mucuripe está fechado20 para visitações, pois o
equipamento não se encontra em condições de receber turistas. Em torno desse
problema há uma falta de entendimento dos órgãos federal, estadual e municipal
que discutem entre si de quem é a responsabilidade de manter o equipamento.
4.2 Comentário da Entrevista
19
As informaçõesforam obtidas do arquivo de matérias do Jornal O Povo de 18.07.96, pertencente à Coordenadoria de Patrimônio Histórico do Ceará – COPAHC. 20
As informações foram retiradas do site http://www.diariodonordeste.globo.com/materia.asp, acessado em 10.04.12
39
A entrevista foi realizada com Sr. Otávio Menezes, responsável pela
Coordenadoria de Patrimônio Histórico do Ceará – COPAHC, no dia 26 de
novembro de 2012, na Secretaria de Cultura do Estado do Ceará, a qual se localiza
na Rua Major Facundo, 500 - Centro - Edifício Cine São Luiz, Fortaleza/Ce.
Em relação à importância do Farol do Mucuripe para a cidade de
Fortaleza, o entrevistado disse que o Farol é um equipamento histórico, de grande
importância por ter sido um dos primeiros sinalizadores que orientou as
embarcações na costa cearense, e que esse seria um dos motivos pelo qual se
tornou símbolo emblemático na bandeira do Estado. Ele aponta também a
característica arquitetônica do equipamento como algo que chama atenção por ter
uma estrutura diferenciada, pois se trata de uma construção antiga do século IXX de
aspecto arquitetônico próprio e singular que o difere dos demais faróis. Sua escada
no interior em forma helicoidal a qual dá acesso ao seu topo que parece uma coroa,
e sua largura são aspectos interessantes de serem observados. Outro fato relevante
é seu tombamento, que o protege e o reconhece oficialmente como monumento de
valor histórico para a sociedade Cearense.
O tombamento é uma ferramenta de grande importância para a
valorização de equipamentos históricos, pois assegura que eles sejam mantidos em
seu estado original contribuindo, para a prolongação e perpetuação da história e da
cultura de um povo, o que atrai visitantes de outros lugares. Com relação ao Farol
do Mucuripe,de acordo com Sr. Menezes ele passou ter características de um
monumento histórico, com valor turístico, quando foi restaurado e tombado. A partir
daí ele, por intermédio das instituições turísticas, passa ter mais visibilidade
incluindo-se nos roteiros da cidade. O entrevistado narrou como se deu esse
processo: “a partir do tombamento é que a orientação começa acontecer com mais
frequência”. “Antes do tombamento ele realmente estava no abandono, quebrado,
então foi completamente restaurado (...) ganhando assim essa característica de
monumento, e passa então, fazer parte do trade turístico da cidade”.
O Sr. Menezes afirma que após a restauração, o equipamento foi
primeiramente Museu do Jangadeiro, com peças expostas que foram doadas pelos
pescadorespróximos da localidade. Posteriormente, a prefeitura em parceria com a
secretaria do turismo o transformou em Museu de Fortaleza com exposição de
fotografias da cidade. Atualmente ele se encontra fechado.
40
Ainda de acordo com o entrevistado todas as peças do Museu do
Jangadeiro foram devolvidas aos pescadores, já as fotos do Museu de Fortaleza, de
acordo com a última visita técnica, “ainda se encontram lá, porém estão
completamente inutilizadas, mofadas”, pois os quadros foram afetados pela à
umidade do prédio por conta da maresia. O pouco caso com os registros históricos
da cidade de Fortaleza mostra o quanto precisamos avançar na valorização da
nossa história
A falta de manutenção no equipamento por parte dos órgãos
responsáveis e a ausência de uma consciência de preservação da comunidade do
entorno fez com que o equipamento chegasse ao estado em que se encontra
hoje.Questionado a respeito de quem é a responsabilidade do Farol do Mucuripe e
ao que se deve seu atual estado de abandono, o Sr. Otávio Menezes respondeu que
ele pertence à Marinha do Brasil e que “a legislação do tombamento diz que o
responsável pela manutenção do equipamento tombado é aquele que está com a
propriedade do imóvel, porém a mesma o cedeu para a Emcetur, que está com a
posse do bem e deveria mantê-lo, no entanto o órgão não tem ações voltadas para a
manutenção do mesmo”.
Esta é uma questão que não está bem resolvida e esclarecida. Pelo que
pode ser percebido é responsabilidade da Coordenadoria do Patrimônio Histórico do
Cearáfazer apenas a fiscalização do projeto de manutenção com objetivo de
assegurar que o bem tombado não sofra alterações em suas características
originais: “nós faríamos, como sempre fazemos o acompanhamento técnico da
manutenção do bem para que ele não seja alterado fisicamente”. No entanto, é
necessária uma fiscalização mais eficaz, que responda os anseios da sociedade
Fortalezense que vê um dos seus marcos históricos se acabar por falta de
manutenção.
Sobre o atual estado físico do Farol do Mucuripe, Sr. Menezes falou que a
estrutura interna de ferro da construção está completamente comprometida, a
umidade tomou conta das paredes, o reboco está precisando de reparo e que, por
medida de precaução, o prédio não tem condições de funcionamento.
Indagado sobre se ainda há possibilidade do Farol do Mucuripe ser
revitalizado, o Coordenador respondeu confiante: “Sim, sem dúvidas”. (...) “A
prefeitura de Fortaleza tem um projeto de revitalização daquela área, de
requalificação de toda aquela área, e pelo que me consta segundo conversa que
41
tivemos com a diretora do Patrimônio Histórico da Prefeitura, o Farol entraria nesse
circuito de restauração, nesse circuito de reparo”.Resta à comunidade do Serviluz
aguardaresperançosamente para saber como se dará esse projeto, o qual
certamente elevará a estima dos moradores que terão um espaço para lazer e
socialização.
Ao finalizar a entrevista, Sr. Menezes falou a respeito da contribuição da
Coordenadoria do Patrimônio Histórico do Ceará em favor do Farol do Mucuripe.O
mesmo informou que o departamento juntamente com a prefeitura de Fortaleza
esteve verificando a possibilidade de revitalização do equipamento. Aproveitando a
oportunidade esclareceu mais uma vez que a obrigação da Coordenadoria é
acompanhar tecnicamente todos os projetos de revitalização do bem histórico “para
que seja mantido o aspecto original do prédio e ele possa cumprir sua missão visual
de edificação histórica”.
O entrevistado falou ainda, a respeito de uma vistoria técnica feita na
edificação, a qual resultou em um relatório contendo aspectos históricos do prédio,
seu estado de conservação e suas necessidades, o qual foi enviado para a Marinha
do Brasil para que tomasse ciência que o bem a pertence, além de ter sido enviado
também, para a Secretaria de Turismo do Estado e para Secretaria de Cultura do
Município. Ao analisar esse relatório foi observada uma tentativa, por parte da
Coordenadoria do Patrimônio Histórico do Ceará, de resolver os problemas
existentes em torno do equipamento.
Dentre as ações recomendas estava a solicitação de um estudo para
redefinir o uso do equipamento. Por tanto, é preciso que os órgãos responsáveis
pelo uso e manutenção do Farol do Mucuripe tomem para si de fato a
responsabilidade que lhes foi atribuída: a de zela e preservar o patrimônio histórico
que é bem de todos, e contribui para a propagação da nossa cultura através da
atividade turística.
42
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Turismo é uma atividade que vem ganhando grandes proporções no
mundo inteiro. Por ser uma atividade multidisciplinar, envolve vários setores da
localidade na qual se desenvolve, por isso pode ser uma mola propulsora para o
desenvolvimento local. A comunidade receptora pode se beneficiar com os
impactos positivos do turismo, tais como valorização da localidade, melhoria da
infraestrutura e serviços básicos, geração de emprego e renda, bem como melhoria
da autoestima dos moradores da localidade.
O turismo consiste em uma atividade que tem um aspecto próprio e
singular, o de transformar determinado espaço em atrativo turístico e lhe atribuir
valor por uma razão já existente ou criada, e então comercializá-lo. A atribuição de
valor a esse espaço garante a ele uma nova configuração diante da sociedade que
passa vê-lo com outros olhos.
Através do presente trabalho, foi possível perceber que a localidade
pesquisada, o bairro Serviluz, mesmo sendo um bairro periférico tem potencial para
a atividade turística. No entanto, o contexto social no qual o bairro está inserido
impede que a atividade ali se desenvolva.
A violência é, sem dúvida, um dos principais empecilhos para que a
atividade não aconteça no local e a razão principal pela qual os visitantes se
afastaram, impedindo do bairro se consolidar como roteiro turístico da cidade. A falta
de melhores condições de vida, o analfabetismo, a ausência de infraestrutura e a
pobreza são também barreiras para o turismo local.
Além da falta de manutenção no equipamento turístico já existente, o
Farol do Mucuripe, e da ausência de incentivo para criação de novos atrativos,
aproveitando os aspectos naturais existentes no bairro, que contribuem, também,
para que o Serviluz não se configure como uma localidade turística.
Apenas a manutenção do equipamento turístico já existente não
adiantaria para transformar esse bairro em uma parte integrante do roteiro turístico
da cidade de Fortaleza, é necessário, antes de tudo, políticas públicas a fim de
atender as necessidades básicas dos moradores dessa comunidade, pois uma
localidade para ser interessante para o turismo tem que primeiramente ser para a
comunidade autóctone. É preciso projetos exequíveis, que respondam aos anseios
primários dessa comunidade que há tempos espera por transformações.
43
Assim, em consequência do novo cenário turístico que se configuraem
Fortaleza, se faz necessários investimentos em localidades com potencialidade
turística para que se possa ter um numero maior de atrativos turísticos capaz de
atrair e impulsionar cada vez mais o turismo na capital Fortalezense.
44
REFERÊNCIAS
AGUIAR, Nogueira André. Fogo, Vento, Terra e Mar. A arte de falar dos
trabalhadores do Mar. Secretaria de Cultura Esporte e Lazer do Municipio de
Capaçava. São Paulo. 2007
BARRETO, Margarita. Manual de iniciação ao estudo do turismo. 13 Ed. Ver. E
atual. São Paulo, Paripus, 2003.
________, Margarita. Cultura e turismo: Discussões contemporâneas. São
Paulo: Papirus, 2007.
BENI, Mario Carlos. Análise estrutural do turismo. 9 ed. São Paulo: Senac, 2003.
CRUZ, Rita de Cássia Ariza da. Geografias do turismo: de lugares a pseudo-
lugares. São Paulo: Roca, 2007.
DIAS, Reinaldo. Introdução ao turismo. São Paulo: Atlas, 2005.
________, Reinaldo. Turismo e patrimônio cultural – recursos que acompanham
o crescimento das cidades. São Paulo: Saraiva: 2006.
________, Reinaldo. Planejamento do turismo: política e desenvolvimento do
turismo no Brasil. 1. Ed. – 3.reimpr. São Paulo: Atlas, 2008.
LIMA, Ernandy Luis Vasconcelos de. Das areias da praia às areias de moradia:
um embate social em Fortaleza, 2005.
IGNARRA, Luiz Renato. Fundamentos do turismo. 2 Ed. ver. e ampl. São Paulo:
Pioneira Thomson Learning, 2003.
LOHANN, Guilerme. Teoria do turismo: conceitos, modelos e sistemas. São
Paulo: Aleph, 2008.
REJOWSKI, Mirian. Turismo no percurso do tempo. São Paulo: Aleph, 2002.
SILVA, Hélida Lopes da: A Busca do “Ser Gente”- Fortaleza, 2011.
45
APÊNDICE
Entrevista
1. Qual a importância do Farol do Mucuripe para Fortaleza/Ceará?
2. A quem pertence o Farol do Mucuripe? E a que se deve o atual estado de
abandono do equipamento?
3. A partir de quando o Farol do Mucuripe começou ser visitado como atrativo
turístico?
4. Como ocorreu o processo de utilização do Farol do Mucuripe?
5. E as peças de exposição dos Museus para onde foram?
6. Atualmente como se encontra a estrutura física do Farol do Velho do
Mucuripe?
7. Ainda há possibilidade do Farol do Mucuripe ser revitalizado?
8. Qual tem sido a contribuição da Coordenadoria do Patrimônio Histórico do
Ceará?
Recommended