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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC SP
PEDRINA ROSA ARAÚJO
Concepções do designer educacional sobre a aprendizagem para o
desenvolvimento de recursos multimídia
Mestrado em Tecnologias da Inteligência e Design Di gital
São Paulo
2011
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC SP
PEDRINA ROSA ARAÚJO
Concepções do designer educacional sobre a aprendizagem para o
desenvolvimento de recursos multimídia
Mestrado em Tecnologias da Inteligência e Design Di gital
Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Tecnologias da Inteligência e Design Digital - Aprendizagem e Semiótica Cognitiva, sob a orientação da Professora Doutora Ana Maria Di Grado Hessel.
São Paulo
2011
Banca Examinadora:
________________________________________
________________________________________
________________________________________
À luz eterna que carregarei sempre no coração:
STELLA.
AGRADECIMENTOS
À energia superior que com toda sua grandeza, mesmo nos momentos mais difíceis
da vida, nos possibilita a superação, o crescimento e a transformação.
À minha família - José, Maria, Mateus, Selma, Isabel, Marcia, Tamiris, Emerson e
Breno - que me fez entender e valorizar o que realmente importa. Especialmente os
meus pais, que com toda sua simplicidade e dedicação são exemplos de luta, de
sacrifícios, de perseverança e de conquistas sem nunca perderem de vista os
ensinamentos mais valiosos: o respeito e amor ao próximo.
Ao meu colega nos estudos, amigo, irmão, companheiro e alma-gêmea, Edinho, que
há 11 anos torna minha vida muito mais completa e feliz.
À inseparável, incansável e doce Frida. Sinônimo de que a linguagem do respeito e
do amor ao próximo não tem raça, etnia, idioma, tamanho e nem lugar.
A todos os amigos e colegas que mesmo inconscientemente doaram um pouco de si
e levaram um pouco de mim em seus caminhos.
A todos os professores que passaram por minha formação escolar e acadêmica,
que, ao ultrapassarem os limites educacionais, contribuíram grandemente em minha
formação pessoal. E na verdade vocês não passaram, pois estão comigo em cada
ensinamento que compartilharam.
Ao SENAC-SP pelo incentivo e apoio nesta pesquisa e por proporcionar uma
educação de qualidade e inovadora para seus alunos e funcionários.
Às professoras Adriana Bruno e Graça Moreira pelos sábios apontamentos no
momento da qualificação que me possibilitaram ampliar os olhares sobre esta
pesquisa.
Aos designers educacionais entrevistados que muito solicitamente contribuíram para
que esta pesquisa fosse realizada.
À querida Ana Di Grado, orientadora, amiga e grande mensageira de que o
“eternamente” existe. É preciso mais que palavras para expressar minha gratidão.
Muito obrigada!
RESUMO
ARAÚJO, Pedrina Rosa. Concepções do designer educacional sobre a aprendizagem para o desenvolvimento de recursos mul timídia . Programa de Pós-Graduação em Tecnologias da Inteligência e Design Digital. 2011. 89 p. Dissertação de mestrado. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
A presente dissertação apresenta um estudo sobre a aprendizagem humana, em especial sobre sua nova cultura, que se utiliza cada dia mais de estratégias tecnológicas como facilitadoras em ambientes online. O objetivo desta pesquisa foi delimitado em qual o papel do designer educacional para a aprendizagem dos alunos de cursos a distância online, na qual foi investigado que conhecimentos esses profissionais possuem sobre aprendizagem para elaborar recursos educacionais multimídia que contribuam com a aprendizagem nesses ambientes. A pesquisa qualitativa se desenvolveu por meio de estudo de campo se utilizando de entrevistas como estratégia para coleta de dados com os designers educacionais selecionados. Isso possibilitou que emergisse dos discursos seus conceitos, práticas e percepções sobre seus afazeres profissionais. Os estudos desenvolvidos sob as concepções biológicas e culturais da aprendizagem, as concepções da aprendizagem multimídia e da carga cognitiva revelaram que esses profissionais possuem conhecimentos diversos sobre a aprendizagem, principalmente no campo da multimídia. Entretanto, foi possível constatar que esses conhecimentos são, em sua maioria, de natureza empírica, resultantes de suas observações e experiências adquiridas no dia a dia da profissão, o que confirmou a premissa proposta nesta pesquisa. Como um processo complexo e que envolve aspectos de naturezas diversas, a aprendizagem é inerente à própria história da humanidade e, por isso, independentemente do meio a que se propõe, ela deverá sempre estar no foco de todos os profissionais envolvidos no desenho das estratégias educacionais, entre eles, o designer educacional.
Palavras-chave: Aprendizagem, designer educacional e recursos educacionais
multimídia.
ABSTRACT
This dissertation presents a study about human learning, especially about its new culture, which is used increasingly as a facilitator of technological strategies in online spaces. The aim of this research was limited in the role of educational designer for the learning of students from distance education online courses which was investigated that knowledge these professionals have about learning to develop multimedia educational resources whose intentionality is to help to learning in these spaces. The qualitative research was developed through field study where some interviews were made with selected educational designers as strategy to collect datas. These interviews allowed to emerge from their speeches their conceptions, practices and perceptions about their professional tasks. The studies developed based on the biological and cultural conceptions of learning, conceptions of multimedia learning and cognitive load revealed that these professionals have diverse knowledge about learning, especially in the field of multimedia. However, it was possible to notice that these knowledge are mostly empirical, resulting from their observations and experiences in daily life of their profession which confirmed the premise proposed in this research. As a complex process which involves aspects of diverse natures, the learning is inherent from owner history of mankind, and therefore, it independent on the way that the learning happens, it should always be in focus from all the professionals who involved in the design of educational strategies, among them, the educational designer.
Keywords: Learning, educational designer and multimedia educational resources.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1- Neurônio .................................................................................................... 18
Figura 2- Condições da aprendizagem ..................................................................... 26
Figura 3- Processos controlados e automáticos........................................................ 28
SUMÁRIO
RESUMO..................................................................................................................... 7
ABSTRACT ................................................................................................................. 8
LISTA DE FIGURAS ................................................................................................... 9
INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 12
Capítulo 1: Aspectos biológicos da aprendizagem ... ........................................... 17
1.1 – Como o cérebro funciona? ............................................................................... 17
1.2- Aprendizagem e Memória .................................................................................. 21
1.2.1- Aprendizagem Associativa .............................................................................. 24
1.2.2- Aprendizagem Construtiva .............................................................................. 26
1.3 - A mente, a consciência e a aprendizagem ........................................................ 28
Capítulo 2: Aspectos culturais da aprendizagem .... ............................................. 32
2.1- Breve contextualização da cultura ocidental ...................................................... 32
2.2- Breve contextualização cultural da aprendizagem ............................................. 34
2.3 – Nova cultura da aprendizagem ......................................................................... 41
Capítulo 3: Aprendizagem online ........................................................................... 44
3.1- Aprendizagem multimídia ................................................................................... 46
3.2- Aprendizagem e a carga cognitiva ..................................................................... 52
3.3- O design (er) educacional .................................................................................. 53
3.3.1- Os processos do design educacional .............................................................. 55
3.3.2- A criação dos recursos educacionais multimídia e os princípios da aprendizagem multimídia e da carga cognitiva ......................................................... 57
Capítulo 4: A pesquisa ............................ ................................................................ 61
4.1- Contexto institucional ......................................................................................... 61
4.2- Sujeitos da pesquisa ....................................................................................... 62
4.3- Contexto da entrevista ..................................................................................... 64
4.4- Descrição, análise e interpretação dos dados ................................................. 65
4.4.1- Concepções biológicas e culturais da aprendizagem ..................................... 65
4.4.2- Concepções da aprendizagem multimídia ...................................................... 67
4.4.3- Concepções da carga cognitiva ...................................................................... 75
Capítulo 5: Considerações finais .................. ......................................................... 79
Referências bibliográficas ......................................................................................... 83
APÊNDICES .............................................................................................................. 87
12
INTRODUÇÃO
Tudo começou com meu ingresso na graduação.
Iniciei meus estudos no curso de Tecnologias e Mídias Digitais como um livro
praticamente em branco, que ao longo de quatro anos foi se preenchendo com
diversos saberes resultantes de uma formação interdisciplinar e, entre eles, a
educação a distância - EAD.
Ao tomar contato com a EAD, um novo mundo de possibilidades e
curiosidades surgiu, trazendo consigo diversas questões sobre essa modalidade de
ensino e que obviamente não foram sanadas durante a graduação. Mais tarde,
descobriria que só encontraria mais respostas e questionamentos no mercado de
trabalho.
Dentre as diversas questões que surgiram durante a graduação, a mais
pertinente ocorreu no momento da escolha do problema de pesquisa para o
Trabalho de Conclusão de Curso. Como ele foi realizado em grupo, optamos por
pesquisar a não-linearidade em cursos a distância. Alinhado a esse problema,
criamos um curso-piloto com conteúdos não-lineares para testar nossa hipótese de
que essa característica contribuiria para o aprendizado dos alunos.
Por meio de uma pesquisa qualitativa com os alunos participantes do curso
piloto, concluímos que não só a não-linearidade contribuiu, mas também as
estratégias de ensino que inserimos no curso, como HQ, vídeos e ilustrações foram
apontadas como facilitadoras da aprendizagem. Na ocasião, 61% dos participantes
sinalizaram que esse conjunto contribuiu para uma melhor assimilação do conteúdo
proposto. Porém, não foi possível descobrir o motivo pelo qual as estratégias não
contribuíram para o aprendizado dos outros 39% dos participantes, ficando esse
questionamento em aberto.
Alguns anos mais tarde, já atuando como designer educacional em cursos
online no Senac SP, e vendo de perto como tudo ocorre na prática, ressurgiu a
antiga curiosidade em estudar o motivo pelo qual uma estratégia é eficiente para um
grupo de alunos e para outros, não.
Essa é uma incógnita de grande relevância para meu trabalho, pois sou
responsável pelo desenho educacional do conteúdo nos cursos que desenvolvo e,
13
por essa razão, preciso dar conta de algumas demandas que vão desde a
elaboração1 do material didático dos cursos até a análise do curso já produzido.
Com esse cenário surgiu, em um primeiro momento, o interesse em pesquisar
a aprendizagem humana por meio do papel que os recursos multimídia têm nesse
processo. Porém, esses recursos são concebidos por designers educacionais e, por
isso, o foco da pesquisa direcionou-se para a questão do que esses profissionais
sabem acerca da aprendizagem para conceber tais recursos, delimitando-a para a
aprendizagem multimídia em cursos online.
Dessa maneira, entendo que os estudos acerca da aprendizagem multimídia
são de grande relevância, já que cursos a distância online, geralmente, se utilizam
de recursos multimídia como estratégia de ensino a fim de auxiliar os alunos na
compreensão de seus conteúdos. E mesmo havendo mediação docente e interação
com outros participantes do curso, a interface de comunicação nesses casos se faz
por meio de uma máquina, comumente, um computador. Por isso, é importante que,
além de interfaces amigáveis, os ambientes virtuais de aprendizagem tenham
conteúdos que sejam trabalhados de maneira que motivem os alunos a acessá-los,
chamando sua atenção para os principais conceitos abordados, a fim de auxiliá-los
na construção de sua aprendizagem.
A comunicação homem-máquina requer do primeiro um trabalho linguístico-cognitivo, visando a tarefa a que se propõe. É necessário interpretar os recursos da interface, (re)conhecer suas funções e aprender como acioná-las. Isso não se faz sem a participação da língua, que, remetendo a sistemas de referências historicamente construídos, oferece ao usuário condições de interpretar e utilizar significativamente o programa computacional: sua terminologia, ícones, janelas, funções etc. (FREIRE, 1999, p. 72 apud SILVA, 2003).
Ao trazer a perspectiva de Freire para o contexto da educação a distância, a
utilização de recursos educacionais em cursos online se torna pertinente, pois é
possível perceber a importância de se utilizar estratégias que não só ajudem os
alunos a navegarem pelos ambientes virtuais, mas que os auxiliem a entender as
funcionalidades de suas ferramentas. Além disso, o emprego de recursos que se
utilizem das possibilidades que a multimídia oferece também pode ajudá-los na
compreensão e significação dos conteúdos desses cursos, pois estratégias com
1 Em parceria com o especialista da área.
14
essa característica trabalham com diferentes sentidos dos alunos, dividindo a carga
informacional entre seus canais de processamento.
A concepção desses recursos, por sua vez, faz parte das atribuições do
designer educacional que, de acordo com Filatro (2008), é quem concebe um
produto com propósitos bem definidos e que se utiliza de conversões inteligentes
para facilitar a compreensão de um determinado assunto e, ainda, é ele que tem:
a ação intencional e sistemática de ensino, que envolve o planejamento, desenvolvimento e a utilização de métodos e técnicas entre diversos outros recursos a fim de facilitar a aprendizagem humana a partir dos princípios de aprendizagem e instrução conhecidos (Ibid., p. 3).
Conforme aponta a autora, é a esse profissional que cabe a intencionalidade
pedagógica de escolher e conceber os recursos educacionais que deverão facilitar a
aprendizagem dos alunos nos cursos por ele desenhados e, por isso, o objetivo
geral desta pesquisa está pautado em compreender qual o papel do designer
educacional na aprendizagem dos alunos de cursos a distância online, já que é ele o
responsável por conceber recursos educacionais multimídia com a finalidade de
auxiliar esses alunos a construírem seus conhecimentos. Dessa maneira, o
problema desta pesquisa se propõe a investigar “que conhecimentos o designer
educacional possui sobre aprendizagem para elaborar recursos educacionais
multimídia? ”.
A partir do delineamento do problema, os objetivos específicos buscam
identificar no fazer diário desses profissionais:
� O que sabem sobre os processos biológicos e culturais envolvidos na
aprendizagem;
� Quais concepções da aprendizagem multimídia estão presentes no
desenvolvimento de estratégias e recursos educacionais;
� Quais os critérios que, de maneira geral, mais impactam em suas escolhas
com relação às estratégias e recursos utilizados.
A premissa para essa questão é de que “seus conhecimentos sobre a
aprendizagem são, principalmente, de natureza empír ica, resultantes de suas
práticas diárias na elaboração de roteiros para rec ursos e estratégias
educacionais para cursos online”, pois a formação acadêmica para essa área é
15
variada, ora pendendo à Comunicação e Pedagogia ou à Tecnologia, fazendo com
que questões específicas acerca da aprendizagem multimídia não sejam
contempladas em suas formações. E, dessa maneira, seus conhecimentos vão se
consolidando conforme sua observação e prática.
Para contemplar todos os conhecimentos envolvidos nos objetivos traçados,
foi elaborado referencial teórico inspirado nas ideias de Maturana & Varela (2002, p.
40-1), por afirmarem que o ser humano “não é independente do meio”, e se
queremos “entender o ser vivo, o que temos que encarar é o que o faz, o que o
constrói”. Em outras palavras, é necessário levar em conta toda história do indivíduo,
pois o ambiente à sua volta influencia sua maneira de ser e pensar. Além desses
autores, os estudos de Basbaum (2009) também se mostraram pertinentes, ao
esclarecer a relação biológico-cultural existente no ser humano:
Onde se busque no homem um mero bicho, se queira reduzi-lo ao biológico - como hoje em dia muito se faz - se encontrará um ser de cultura que instala sobre o naturalmente dado um mundo que lhe é próprio; e onde quer que se busque isolar esse mundo de cultura, de pulsões e desejos sublimados pelas convenções, ali se encontrará os traços de uma vida biológica, um animal vestido nos trajes da cultura (p. 14).
Esta é uma pesquisa qualitativa, cujo método de trabalho objetivou o
desenvolvimento de um estudo de campo. A técnica escolhida para coleta dos
dados foi a entrevista, visto que a intencionalidade era deixar emergir do discurso
dos entrevistados suas concepções, suas práticas e suas percepções sobre os
afazeres diários de um designer educacional. E, de acordo com Bervian, Cervo &
Silva (2007), essa técnica é uma das possibilidades indicadas para contextos
similares.
O teor das entrevistas permitiu a definição das categorias nas quais os dados
foram agrupados, analisados e interpretados. São elas: concepções biológicas e
culturais da aprendizagem, concepções da aprendizagem multimídia e as
concepções da carga cognitiva.
Com base nessas percepções entendi que para estudar a aprendizagem seria
necessário compreender os aspectos biológicos e culturais envolvidos nesse
processo, além das concepções da aprendizagem multimídia, por tomar os cursos
online como foco da pesquisa. Dessa maneira, além da introdução, a pesquisa foi
estruturada em cinco capítulos:
16
No capítulo 1 , o propósito é abordar algumas características cognitivas
envolvidas no processo de aprendizagem humana. Embasado, principalmente, nos
estudos de McCrone (2002), Pozo (2002) e Izquierdo (2004), esse capítulo explana
um pouco sobre a anatomia e funcionamento do cérebro, função dos neurônios e de
suas sinapses, e o papel da memória para a aprendizagem, o que foi fundamental
para a compreensão de toda a complexidade envolvida no processo de assimilação
de conhecimentos.
Embasado em Cambi (1999), o capítulo 2 apresenta, brevemente, as
principais transformações culturais humanas ao longo da história e como elas
impactaram na maneira de aprender. Com isso ficou claro, no campo da
aprendizagem, o quanto ainda somos semelhantes com nossos ancestrais em pleno
século XXI. E com Matui (1995), os caminhos que a educação - e com ela
aprendizagem - foi seguindo no Brasil até as abordagens atuais se fizeram mais
claros.
No capítulo 3 , baseado nos estudos de Filatro (2008), Mayer (2009) e
Oliveira (2009) são apresentadas as principais características do designer
educacional, bem como as concepções da aprendizagem multimídia e da carga
cognitiva. É nesse momento que se delineiam de maneira mais completa os
conhecimentos que o público investigado nesta pesquisa precisa possuir.
O capítulo 4 vem para contextualizar, analisar e interpretar os dados
coletados nas entrevistas, a fim de verificar a premissa proposta. Aqui é possível
identificar quais são seus conhecimentos, bem como a natureza deles.
O capítulo 5 sintetiza os dados coletados e apresenta as considerações
finais, elaboradas a partir da interpretação dos dados, em que são propostos alguns
conhecimentos considerados pertinentes para os designers educacionais.
Como também atuo na área de design educacional, considero fundamental o
desenvolvimento de um estudo que investigue junto a outros profissionais quais são
os seus conhecimentos sobre esse tema, que há tempos me causa grandes
indagações e curiosidades, que certamente não se esgotarão com esta pesquisa: a
aprendizagem.
17
Capítulo 1: Aspectos biológicos da aprendizagem
Apesar de ser um processo complexo e que envolve questões de diversas
naturezas, incluindo as particularidades de cada indivíduo, neste capítulo, a
aprendizagem será abordada sob o ponto de vista biológico objetivando um melhor
entendimento de alguns aspectos físicos envolvidos nesse processo.
Para tanto é importante compreender o que é o cérebro e como se dá seu
funcionamento já que, segundo McCrone (2002), ele é responsável por transformar
entradas de informações em saídas de informações com o máximo de eficiência,
graças a sua anatomia.
Na sequência, será explanado um pouco qual é o papel da memória na
aprendizagem, pois, segundo Pozo (2002), ela afeta seriamente nossa maneira de
aprender porque a aprendizagem consiste em incorporar novas representações à
memória permanente ou mudar as representações que já possuímos.
Por fim, será abordado o problema mente e cérebro a fim de explicar,
segundo Teixeira (2008), suas duas diferentes visões para tentar entender o que
vem a ser a consciência para, a partir daí, tentar estabelecer suas relações com o
processo de aprendizagem.
1.1 – Como o cérebro funciona?
“A função do cérebro é transformar entradas de informações em saídas de
informações com o máximo de eficiência, pois ele foi feito para agir e isso fica
evidente quando se examina a sua anatomia” (MCCRONE, 2002, p.17).
A observação da anatomia do cérebro humano, segundo os estudos atuais,
indica que ele tem aproximadamente 100 bilhões de neurônios (células nervosas
cerebrais) e que cada um desses neurônios pode fazer entre mil e várias centenas
de milhares de sinapses2. Ou seja, o cérebro é capaz de produzir cerca de 100
2 De acordo com Dicionário Eletrônico Houaiss, sinapse é o local de contato entre neurônios, onde ocorre a transmissão de impulsos nervosos de uma célula para outra. Em outras palavras podemos dizer que sinapse é a junção entre dois neurônios.
18
trilhões de conexões e todas elas são significativas e têm a sua própria história e o
seu próprio objetivo (MCCRONE, 2002).
Mas o que são os neurônios? Um neurônio é uma versão incrementada de
uma célula comum, pois:
Todas as células têm a capacidade de secretar e responder a mensagens químicas. Todas também possuem uma diferença natural de carga elétrica entre seu interior e exterior [...] O que era necessário para criar um neurônio era dar formato às células – esticá-las para fora a fim de criar uma via de entrada e saída (Ibid., p.23).
Figura 1- Neurônio Fonte: http://www.sogab.com.br/anatomia/sistemanervosojonas.htm
Em uma das extremidades do neurônio há um tufo de ramificações
conhecidas como dendritos, já na outra extremidade há uma longa ramificação,
como se fosse um braço, conhecida como axônio, então, quando o neurônio atinge
seu limite de cargas elétricas recebidas pelos dendritos, ele dispara um impulso
nervoso que parte do axônio até seu destino.
Fisicamente, a diferença entre um neurônio e uma célula comum é muito
pequena, mas quando se observa a capacidade de um neurônio em armazenar
informação e a precisão na entrega de mensagens, a diferença se torna enorme,
pois em todas as células trafegam mensagens químicas, porém, a entrega dessas
mensagens é meio a esmo, porque os sinais precisam se difundir por tecidos ou ser
conduzidos ao longo de vasos sanguíneos para atingir seus alvos. Já com os
neurônios não, eles podem entregar uma mensagem em qualquer lugar do corpo
quase instantaneamente, pois:
19
Nervos motores com grosso isolamento conduzem seus sinais a várias centenas de quilômetros por hora. As próprias mensagens são codificadas em padrões flexíveis de impulsos nervosos. Um neurônio pode estar transmitindo sinais sobre visões ou sons, paladares ou movimentos, anseios e frustrações. Os impulsos nervosos parecem exatamente iguais; o significado está nos padrões de conexão que estão sendo formados (MCCRONE, 2002, p.23-5).
No cérebro, cada neurônio está conectado a milhares de outros e a força de
cada uma dessas conexões3 é ajustada por experiência. Isso pode explicar por que
grande parte dos neurônios morre ou se atrofia4 em determinado período da vida já
que inicialmente o sistema nervoso produz um grande excesso de fibras neuronais e
que mais tarde morrem ou atrofiam envolvendo entre 15% a 85% da população
neuronal inicial (GARDNER, 1994).
Mas qual o motivo de haver um grande excesso de conexões iniciais para
depois grande parte delas se atrofiar? O autor diz que um “brotamento” precoce
excessivo constitui a flexibilidade do período de crescimento, pois é uma
característica normal do desenvolvimento e apresenta vantagens adaptativas. Ele
exemplifica dizendo que, caso ocorra algum dano enquanto houver uma quantidade
excessiva de conexões, haverá maiores chances de que o organismo sobreviva
apesar deste dano. Além disso, em uma competição entre as células, as mais
eficazes em formar conexões de força e especificidade terão mais chances de
sobreviver (Ibid.).
Bruno (2010) traz uma visão complementar acerca desse assunto ao dizer
que os sistemas cerebrais são multicomponentes e plásticos, além de indicarem a
possibilidade de novas conexões celulares ao longo da existência humana. Além
disso, a aprendizagem também pode promover a plasticidade5, pois seu processo
3 Os receptores numa sinapse podem mudar seu formato depois de uma explosão de atividade. Por cerca de um segundo, uma conexão se tornará mais sensível e a longo prazo, a ponta de um dendrito pode inchar para expor novas sinapses, fortalecendo fisicamente a conexão, ou um neurônio poderia fazer brotar dendritos inteiramente novos (MCCRONE, 2002). 4 Pesquisas publicadas nos últimos anos estão reforçando a ideia de que a neurogênese em humanos não se limita à infância, ao contrário do que se acreditou por muito tempo. Fonte: Instituto Ciência Hoje. Disponível em: http://cienciahoje.uol.com.br/noticias/neurociencia/bulbo-olfatorio-tem-novos-neuronios/?searchterm=neuronios. Acesso em 23/11/10. 5 “A ideia de plasticidade humana transcende o próprio organismo enquanto máquina biológica. Para a educação, a plasticidade que é social e cultural, além de biológica, sinaliza que quanto mais rico for o ambiente, de modo a estimar atividades mentais e sociais, maior o impacto sobre as capacidades cognitivas e da memória” (BRUNO, 2010, p. 46).
20
faz com que ocorram alterações estruturais e funcionais nas células neurais e suas
conexões.
Sendo assim, desde muito cedo, são as vivências e aprendizagens
ocasionadas pelo meio em que se vive que influenciam a maneira de perceber o
mundo, pois dependendo desse meio, algumas conexões sinápticas podem ser
reforçadas ao invés de outras e vice-versa resultando em um “panorama neural
esculpido pelas próprias experiências”.
Assim que nasce, o indivíduo começa a aprender. O legado genético vai se ajustando pela história pessoal de experiências. A pessoa se adapta ao seu próprio mundo, e suas respostas refletem a trajetória particular, que inclui ameaças e oportunidades com as quais aprendeu a lidar (MCCRONE, 2002, p.18).
O autor explica que cada momento representa “um conjunto singular de
desafios” e que o sistema nervoso deve montar uma resposta mental tão precisa
quanto esse desafio, pois são as compreensões, reações e experiências adquiridas
anteriormente que irão determinar um padrão de conexões para melhor comandar o
momento atual. “É como se o cérebro estivesse concentrando a atenção no
significado de cada instante, focando aquela atividade específica” (Ibid., p.18-9).
Nesse processo de conexões, houve uma mudança significativa:
Nos cérebros grandes tanto processamento como as mudanças de memória ficaram quase instantâneas. Assim, aquilo que era originalmente um panorama neural e estava sendo esculpido pela experiência genética evoluiu para um processo ativo de reestrutura neural, que causa a experiência. A resposta do cérebro não é apenas reflexiva, uma série de padrões emitidos por vias fixas. O cérebro sabe porque está agindo da maneira que está agindo. Ele está fazendo escolhas. Está ciente (Ibid., p.26).
O autor ainda diz que qualquer cérebro nada mais é do que uma elaboração
do sistema nervoso, mecanismo que junta sensações e ações e, ao mesmo tempo,
é o produto final de um longo processo evolutivo remanescente de uma seleção
natural. Nesse sentido, Bruno (2010) ainda acrescenta alguns estudos, já
confirmados por neurocientistas atuais, sugerindo que as funções mentais humanas
não se localizam em zonas isoladas do cérebro, mas habitam locais diferentes e
distantes uns dos outros não se limitando a um único sistema neural ou processo.
21
Em outras palavras, além de juntar ações e sensações, o cérebro também
permite adquirir os mais diversos conhecimentos ao longo da vida, já que é capaz de
estabelecer novas conexões neurais a todo o momento e até produzir novos
neurônios. Além disso, a memória é um dos principais processos envolvidos na
aprendizagem, pois armazena e “gerencia” todas as sensações e ações de maneira
tão eficiente que, por um segundo, uma pessoa é capaz de relembrar a mais remota
informação que há muito se fazia esquecida.
É por todos esses motivos que conhecer o funcionamento do cérebro torna-se
importante, uma vez que é por seu intermédio que se dá a percepção e assimilação
do mundo necessitando para isso, de seus neurônios e sinapses, pois são os
responsáveis por transmitir todos esses estímulos através do sistema nervoso
possibilitando que sejam selecionados, armazenados e recuperados quando
necessário pela memória.
1.2- Aprendizagem e Memória
“Memória é a aquisição, conservação e evocação de informações”
(IZQUIERDO, 2004).
Além da percepção, cognição e linguagem, a memória também é um
processo cerebral importante para a aprendizagem, já que é a responsável pela
seleção, armazenamento e recuperação de informações e/ou conhecimentos
adquiridos pelo sistema cognitivo. Caso não houvesse um armazenamento mental
das representações do passado, não haveria uma solução para tirar proveito das
atuais experiências. Em outras palavras, a memória está intimamente associada
com a aprendizagem, já que esta última é, entre outras definições, a habilidade de
mudarmos o nosso comportamento por meio das experiências que foram
armazenadas na memória, logo, a memória é a retenção dos conhecimentos
aprendidos6.
Pozo (2002), ao falar sobre o sistema da aprendizagem, diz que existem dois
sistemas de memória interconectados com características e funções diferentes: uma
6 Definição completa na Revista Eletrônica Cérebro & Mente. Disponível em: http://www.cerebromente.org.br/n01/memo/memoria.htm. Acesso em 28/10/10.
22
memória de trabalho - curto prazo - e memória permanente - longo prazo. Já
Izquierdo (2004) diz que a memória pode ser dividida em dois tipos:
� De acordo com sua duração: memória imediata que dura alguns segundos;
memória de curta duração que dura de uma a seis horas; e memória de longa
duração que dura muitas horas, dias ou anos.
� De acordo com sua função: memória de trabalho que não armazena arquivos
permanentemente; memórias declarativas que são aquelas que podemos
dizer que existem e como são; e memórias procedurais, também conhecidas
como hábitos, que estão relacionadas com nossas habilidades sensoriais
e/ou motoras.
Pozo (2002) ainda faz a comparação do sistema cognitivo com alguns
aspectos dos computadores7, pois de maneira similar, a memória de trabalho é
bastante reduzida restringindo as possibilidades do nosso funcionamento cognitivo.
Izquierdo (2004) traz o termo seleção ao invés de restrição para a memória de
trabalho, pois além de ser extremamente seletiva, escolhe com bastante precisão o
que guardar e o que descartar, porém, “uma vez guardadas as informações
pertinentes a cada memória, o cérebro pode decidir que elementos de cada uma
convêm guardar, quais é melhor extinguir e quais é melhor esquecer” (Ibid., p. 55).
Ou seja:
A memória humana é um sistema construtivo e interativo, não um arquivo ou um museu (como nos computadores) em que o conhecimento é armazenado e repousa a espera que alguém um dia o recupere ou venha vê-lo. Ela assemelha-se mais a um jardim, em que um dia plantamos certas sementes, mas isso não basta, é preciso regá-las e alimentá-las para que cresçam, é preciso mantê-las com cuidados ativos, já que são expostas a muitas influências externas. Seu crescimento afetará outras plantas e organismos (POZO, 2002, p. 87).
O autor afirma ainda que essa propriedade orgânica da memória afeta
seriamente a maneira de aprender, pois a aprendizagem consiste em incorporar
7 Izquierdo (2004) explica que as analogias entre memória e formas de funcionamento dos computadores ou outros sistemas não significam que uma coisa seja explicável pela outra, pois “[...] Um computador tem que ser ligado na tomada ou a uma bateria para funcionar; nós, não. Um computador grava suas memórias em circuitos integrados; nós não. Nós formamos, guardamos e evocamos memórias com fortes componentes emocionais e sob intensa modulação hormonal; os computadores, não. Nós seres vivos utilizamos processos bioquímicos localizados em diferentes células de nosso sistema nervoso para fazer ou evocar memórias; os computadores não têm bioquímica” (p. 16).
23
novas representações à memória permanente ou mudar as que já temos, mas que
para se adquirir novos conhecimentos são necessários diferentes processos mentais
que vão desde a repetição ou assimilação de uma nova informação por aquelas que
já estão presentes na memória, até os processos radicais de reestruturação. Esses
processos serão mais eficazes quanto maior e mais significativa for a relação que se
estabelece entre a nova informação e os conhecimentos que já estavam
representados na memória. Além desses processos mentais, o autor diz que são
necessários, ainda, certos processos externos que otimizam ou minimizam a
eficiência da aprendizagem:
1- Motivação: o aluno deve ter algum motivo para aprender, do contrário, a
aprendizagem será bastante improvável;
2- Atenção: com a característica seletiva da memória de trabalho é necessário
destacar a informação que o indivíduo deverá considerar, pois, assim, terá um
melhor aproveitamento de seus recursos cognitivos;
3- Recuperação e transferência das representações presentes na memória:
as aprendizagens que não são incorporadas tendem a ser esquecidas mais
facilmente. Quanto mais forem mobilizados os resultados de uma aprendizagem,
mais fácil será sua transferência, mas também, quanto mais o indivíduo
compreender o que faz, quanto mais consciência houver sobre os próprios
conhecimentos, maior será a probabilidade de se recorrer a eles em novas
situações, já que será possível relacioná-los com muitas outras situações;
4- Consciência e o controle dos próprios mecanismos de aprendizagem: o
ideal é fazer com que seja o próprio indivíduo quem exerça o controle de seus
processos, utilizando-os de maneira estratégica, mediante uma tomada de
consciência dos resultados que espera de sua aprendizagem.
Além desses processos Pozo (2002) ainda ressalta a importância de outro
mecanismo para aprendizagem que é o esquecimento:
O esquecimento é um mecanismo adaptativo de nosso sistema cognitivo, que está vinculado ao próprio funcionamento da memória e não com possíveis limites em sua capacidade. [...] A memória humana não só serve para representar e recordar o aprendido como também para esquecê-lo quando deixa de ser útil ou eficaz. [...] A lembrança – e com ela o
24
esquecimento – é função da organização de nossas representações de memória (POZO, 2002, p. 106-7).
Essa ideia converge com Izquierdo (2004, p. 13) ao afirmar que “eu sou eu, e
você é você, porque cada um tem sua própria história para lhe dizer isso. O conjunto
de memórias que cada um de nós tem é o que nos caracteriza como indivíduos. Mas
também nos caracteriza como indivíduos aquilo que resolvemos ou desejamos
esquecer”.
Mas como é que incorporar novas aprendizagens na memória? Pozo (2002)
responde apresentando dois métodos de aprendizagem: o associativo e o
construtivo. Basicamente, o método associativo é adquirido pela repetição e
automatização de ações, já o construtivo é adquirido pela compreensão das ações.
1.2.1- Aprendizagem Associativa
A aprendizagem associativa é considerada a maneira ancestral de aprender o
que assemelha os humanos a todos os mamíferos, vertebrados e invertebrados.
Porém, na espécie humana, há novas possibilidades, pois a capacidade
computacional é consideravelmente superior às outras espécies permitindo
estabelecer mais relações ou associações entre informações, comportamentos ou
fatos (Ibid.).
Um primeiro processo associativo está formado para extrair regularidades do
ambiente, estabelecendo sequências de previsões de fatos e comportamentos que
permitam viver em um mundo mais previsível e controlado, como, por exemplo, ao
perceber nuvens carregadas, logo podem ser associadas com chuva. Essa é a base
da aprendizagem associativa: não apenas detectar co-variações simples, pois há
uma relação de contingência entre dois fatos quando a probabilidade de que
ocorram juntos é maior do que a de que ocorram de modo separado. Esse processo
é muito importante, pois:
Detectar contingências e não só co-variações requer um sofisticado sistema de cômputo, com um alto valor adaptativo, já que nos permite antecipar os fatos mais prováveis a partir de um antecedente e obter certas consequências prováveis mediante nosso comportamento. É um mecanismo associativo, implícito, do qual não temos consciência e que não usamos de modo deliberado (Ibid., p. 116).
25
Um segundo processo associativo, ocasionado devido à característica
seletiva da memória de trabalho, é a condensação ou fundição de elementos
informativos como, por exemplo, agrupamentos de números em forma de chunks
(pedaços, fragmentos) ou peças de informações que se recuperam como uma única
representação, pois ainda que o número de cifras seja o mesmo, a quantidade de
informação se reduz, o que facilita a recordação (POZO, 2002). Além desses
processos, o autor ainda cita um terceiro, conhecido como automatização, que
ocorre com a prática repetida de certas aprendizagens que se consolidam na
memória de trabalho até o ponto de passarem de atividades controladas para rotinas
automatizadas, sem controle consciente.
Uma das vantagens dos comportamentos automatizados é sua rapidez de
execução, pois “as pessoas que automatizaram habilidades consomem menos
tempo ao executá-las que os aprendizes que realizam essas mesmas tarefas de
modo controlado” (Ibid., p. 121), por exemplo: resolução de equações, diagnósticos
médicos etc. Entretanto, o automatismo pode levar um indivíduo a cometer erros
fatais, pois a resposta é disparada ante os indícios habituais sem que se dê conta de
uma leve diferença na situação, como ao excluir um documento importante do
computador, por exemplo.
Apesar disso, ainda há a vantagem de sua eficácia em tarefas múltiplas8: a
realização de dois comportamentos que requerem comportamento controlado
produz uma interferência mútua que reduz grandemente a qualidade de cada uma
delas devido a característica seletiva da memória de trabalho. À medida que se
automatiza um conhecimento o indivíduo torna-se capaz de usá-lo paralelamente
com outras tarefas e essa capacidade é um requisito imprescindível para um
funcionamento cognitivo eficiente.
A principal limitação da aprendizagem associativa é que, somente repetindo e
juntando peças, não há grandes possibilidades de compreender o que se está
fazendo conforme acontece na aprendizagem construtiva.
8 A ideia de automatização do conhecimento que proporciona a realização de algumas tarefas ao mesmo tempo pode ser percebida no comportamento da geração dos nativos digitais ou geração Y, nascida após os anos de 1980, que é conhecida pela capacidade de fazer diversas tarefas ao mesmo tempo: ver TV, ouvir música, teclar no celular etc. Fonte: Jornal online O Globo. Disponível em: http://oglobo.globo.com/tecnologia/mat/2009/05/18/nativos-digitais-ja-estao-dominando-mundo-transformando-forma-como-ser-humano-se-comunica-755911408.asp. Acesso em 01/02/2011.
26
1.2.2- Aprendizagem Construtiva
Enquanto que a aprendizagem associativa ocorre por meio da repetição,
junção e automatização de informações e/ou ações, a aprendizagem construtiva
ocorre por meio da compreensão desses mesmos processos.
Uma das maneiras de se produzir aprendizagem construtiva é fazendo uma
organização conceitual interna nos materiais de aprendizagem para serem
compreendidos, ou seja, que estejam internamente organizados de forma que cada
elemento de informação tenha uma conexão lógica ou conceitual com outros
elementos, como pode ser observado na figura 2.
Figura 2- Condições da aprendizagem Fonte: Adaptado Pozo, 2002, p. 127
Como observado na figura, além da conexão lógica ou conceitual com outros
elementos é necessário que o material tenha um vocabulário adaptado ao contexto
do aluno e que seus conhecimentos prévios9 sobre o tema sejam levados em
9 FENKER & SCHUTZE (2008 apud BRUNO, 2010) dizem que pesquisas recentes apontam para importância de oferecer novos conteúdos aos alunos nos momentos iniciais da aula ao invés do
27
consideração fazendo com que haja uma predisposição à compreensão desse
conteúdo criando significado10 e sentido em relação ao que está sendo aprendido.
Para que um aprendiz compreenda um material ele precisa ter a atitude ou
disposição favorável a esta aprendizagem, pois compreender exige mais esforço e
supõe mais consumo de recursos cognitivos do que simplesmente decorar (POZO,
2002).
Compreender implica, em maior ou menor medida, uma construção pessoal do significado da tarefa. [...] É sempre traduzir um material às próprias palavras, reconstruí-lo a partir dos próprios contos armazenados na memória permanente (Ibid., p.128).
Ao observar a figura 3 torna-se perceptível que as características dos
processos controlados diferem dos processos automáticos.
Processos
Controlados Automáticos
Consomem atenção Mal consomem atenção
Não são rotinas aprendidas São adquiridos por aprendizado
São flexíveis e se adaptam a novas situações
Uma vez adquiridos modificam-se com dificuldade
Requerem esforços conscientes Não exigem esforços conscientes
Perdem eficiência em condições adversas
Podem ser executados com eficácia em condições adversas
Produzem interferências em situações de dupla tarefa
Não interferem na execução de uma segunda tarefa
tão explorado levantamento de conhecimentos prévios, pois esse movimento pode favorecer a dispersão diante de temas já conhecidos pelos alunos, enquanto que novas informações ativam áreas cerebrais que melhoram significativamente a memória. “Estudos indicaram que as “novidades” potencializam as atividades no hipocampo, bem como a substância negra e a área tegmentar ventral, podendo favorecer o aprendizado e a memória, assim como sua duração” (p. 48). 10 A teoria da aprendizagem significativa, elaborada por Ausubel, é entendida por relacionar uma nova informação de maneira significativa (não-arbitrária) com os conhecimentos que o aluno já possui. Isso produz uma transformação tanto no novo conteúdo assimilado quanto naquele que o aluno já sabia (MARTÍN & SOLÉ, 2004).
28
Figura 3- Processos controlados e automáticos Fonte: Adaptado Pozo, 2002, p. 120
Comparando cada um dos processos, em síntese, verifica-se que os
processos controlados – aqueles que levam a compreender determinado assunto –
exigem atenção ou consciência enquanto que os automáticos – aqueles que já se
conhece ou “decora” – não, pois já estão incorporados no indivíduo.
Ambos os processos são de grande importância ao sistema cognitivo, pois se
não houvesse a capacidade de automatizar algumas aprendizagens, não seria
possível, a cada instante, a incorporação de novos conhecimentos por uma possível
sobrecarga cognitiva, tema que será abordado no terceiro capítulo desta
dissertação.
Mas além da memória e todos os seus processos, teriam a mente e a
consciência algum papel na aprendizagem? É isso que será discutido a seguir.
1.3 - A mente, a consciência e a aprendizagem
“O cérebro existe para que possamos perceber o mundo e saber como reagir, já a
mente existe para otimizar nosso comportamento” (MCCRONE, 2002, p.17).
[...] “o termo consciência tem hoje tantos significados distintos, que, às vezes, mais
que um conceito ou um processo cognitivo, parece um curinga, uma palavra que
serve para denominar tudo o que nos escapa ou escorre por entre os dedos quando
estudamos o sistema cognitivo humano” (POZO, 2002, p.157).
Teixeira (2008) trata de maneira muito clara alguns questionamentos
filosóficos acerca do problema mente e cérebro que há muito tempo divide a
comunidade científica sobre o que é a mente humana e se ela é algo imaterial que
independe do cérebro (visão dualista) ou se mente e cérebro são a mesma coisa
sendo a existência do cérebro necessária para que a mente possa existir (visão
materialista).
Para os dualistas “o mental se sobrepõe ao físico e determina algo para além
das propriedades físicas” (Ibid., p. 33), ou seja, não é possível mapear o que
acontece na mente. Já para os materialistas, “toda nossa vida mental nada mais
29
seria do que uma grande variação dos estados químicos e físicos do cérebro”
(TEIXEIRA, 2008, p. 21), ou seja, estados mentais são iguais aos estados cerebrais.
Para ajudar a entender esse paradoxo, o autor cita como exemplo o problema
da vaca amarela que ilustra um filósofo pensando em estrelas coloridas seguidas
por uma vaca amarela e que por fim é tomado pela sensação de calor. A partir
desses três movimentos, ele argumenta que, se alguém pudesse abrir o cérebro do
filósofo e examiná-lo, “não veria estrelas coloridas nem uma vaca amarela. Veria
apenas neurônios e tempestade elétrica ocorrendo” (Ibid., p. 9). Baseado nisso, ele
afirma que os estados mentais (pensamento) não podem ser considerados iguais
aos estados cerebrais (neurônios e tempestade elétrica) conforme a visão
materialista. Porém, ao falar sobre o que é a mente, ele diz que caso o cérebro de
uma pessoa seja danificado, sua mente também será afetada e que por isso deve
haver uma relação entre os estados mentais e cerebrais.
Sobre a consciência, McCrone (2002) diz que sua natureza não é passiva,
pois ela está relacionada com a percepção dos aspectos do mundo que exigem uma
resposta ou ação. Ele ainda diz que apesar de se sentir consciente para dirigir a
própria mente, os indivíduos não possuem controle absoluto sobre seu núcleo
psíquico. É o cérebro que faz, conscientemente, suas próprias escolhas.
Uma possível relação entre a mente, a consciência e a aprendizagem é
apresentada por Pozo (2002) ao dizer que:
não é casual que a mente humana, o único sistema capaz de se autoprogramar, de refletir sobre si mesmo, seja a máquina de aprender mais potente que se conhece, não só pelo ótimo uso que faz de seus recursos limitados, como também porque pode aprender de uma forma mais controlada e reflexiva que o resto dos sistemas que conhecemos (p. 159). A característica que melhor identifica a mente humana quando a comparamos com outros sistemas de conhecimento é que pode refletir sobre si mesma, pode tomar consciência de seus estados e inclusive, as vezes, de seus processos (Ibid., p. 161).
Ainda para o mesmo autor, enquanto alguns processos - como atenção ou
recuperação - desempenham uma função concreta, específica e localizada em
momentos determinados das tarefas de aprendizagem, a consciência tem uma
função distinta, menos sólida ou concreta.
30
Ao analisar os diversos níveis de análise cognitiva, a consciência está acima, ou abaixo, do resto dos processos, é transversal a eles, já que trata de regulá-los ou controlá-los. Em vez de ter uma função específica em dados momentos da aprendizagem, é algo onipresente. Está sempre aí, ou talvez nunca esteja, como uma névoa que flutua sobre todo o funcionamento cognitivo. Sua onipresença, unida a algumas de suas propriedades mais conhecidas (caráter difuso e inapreensível, vagos contornos, contínua mobilidade) faz da consciência uma entidade, digamos, mais gasosa. Como os gases, está em todos os lugares e em nenhum (POZO, 2002, p. 156-7).
Segundo McCrone (2002), nos últimos anos, está se assumindo que o
sistema cognitivo humano não é apenas um complexo e sutil mecanismo para
adquirir e armazenar representações, pois também é capaz de adquirir consciência
de si mesmo, regular sua própria atividade e refletir sobre suas próprias produções.
Ele ainda fala sobre como a reflexão consciente dos processos cognitivos
(metaconhecimento) é uma característica que diferencia a mente humana de outros
sistemas de conhecimento, sejam orgânicos ou artificiais, junto com outras
características diferenciadoras, que são apontadas por Pozo (2002):
a representação simbólica da realidade através de uma linguagem compartilhada e tingida não só de cultura, como também de desejos, intenções, humor, ironia, ou, a capacidade de aprender de modo construtivo e atribuir significados, gerada no marco de uma cultura da aprendizagem com o fim de construir novas formas culturais que modifiquem, simbólica e realmente, o mundo em que vivemos (p.161-2).
O surgimento do Homo sapiens, aproximadamente 100 mil anos atrás, trouxe
consigo uma impressionante diferença em relação aos demais hominídeos: os
símbolos11 e, com isso, a capacidade de pensar de maneira inovadora, além de ter
imaginação suficiente para se influenciar por superstições e temores (MCCRONE,
2002). Mas o que poderia ter produzido essa transformação intelectual? O autor diz
que “essa revolução intelectual deve ter sido resultado da linguagem, provocada
pelo desenvolvimento da fala articulada e da gramática” e que “a fala foi a
ferramenta mental que permitiu nossa grande evolução” (Ibid., p. 55-6).
A linguagem permitiu que a mente do Homo sapiens fosse libertada. [...] um cérebro que domine não só o tempo presente mas também tenha a capacidade de analisar o passado e refletir e ponderar sobre o futuro iria se tornar fundamental para sua franca evolução (p. 57). [...] A fala foi o
11 Eles esculpiam figurinos, decoravam cavernas com cenas de caça e enterravam seus mortos com rituais. Essa evidência arqueológica não deixa dúvida de que se tornaram modernos e conscientes de nosso passado e futuro (MCCRONE, 2002, p. 54).
31
mecanismo. A fala, especialmente quando usada como voz interior, deu-nos novo tipo de software, que conseguiu levar o nosso cérebro já consciente a lugares em que jamais havia estado antes. As palavras puderam nos transportar a situações do nosso imaginário, podemos até imaginar como seríamos vistos pelos outros. As palavras favoreceram o exercício não só da consciência como da autoconsciência – capaz de compreender que o nosso grande atributo é ter individualidade com história e futuro, com desejos e responsabilidades (MCCRONE, 2002, p. 58).
Se essa condição única dos seres humanos - de ter uma mente consciente
que regula e controla nossos processos de aprendizagem e possuir um sistema de
linguagem tingido de cultura e percepções – transformou-os em grandes aprendizes,
como é que a cultura influenciou esse processo? É o que o próximo capítulo busca
esclarecer.
32
Capítulo 2: Aspectos culturais da aprendizagem
Para entender a aprendizagem sob seus aspectos culturais, devido às
diversas dimensões que a cultura possibilita, serão, brevemente, consideradas as
principais transformações humanas ao longo da história e como estas impactaram
nossa maneira de aprender, já que para Pozo (2002) a aprendizagem é tão antiga
quanto a própria história da espécie humana, entretanto, como atividade socialmente
organizada, ela é muito mais recente, pois nem sempre os humanos tiveram a
cultura de viver em sociedade.
Para McCrone (2002), uma pessoa é uma coleção de memórias e hábitos que
moldam seu fluxo mental, fazendo da individualidade apenas um acúmulo de
histórias. Assim, pode-se partir do princípio que todas as transformações pelas quais
a humanidade passou, e ainda passará, remontam a cultura humana e, como
consequência, sua maneira de aprender.
Para haver um melhor entendimento da relação entre os conceitos de cultura
e aprendizagem é necessário, primeiramente, entender brevemente como a cultura
ocidental se consolidou para, então, observar como os processos de aprendizagem
foram se transformando desde os primórdios, por meio da imitação até a utilização
dos recursos tecnológicos na atualidade.
2.1- Breve contextualização da cultura ocidental
Nossa continuidade cultural histórica ocidental foi definida através da helenização após Alexandria, da unificação do Império Romano somada à manutenção da cultura antiga por parte da Igreja Cristã. [...] a cultura seria o resultado de uma longa construção da manutenção e das diferenciações entre várias outras culturas (BAIRON, 2002, p. 26).
Antes de abordar, resumidamente, alguns movimentos que contribuíram para
a constituição da cultura ocidental, há um longo caminho a ser percorrido que, de
acordo com as ideias de Cambi (1999), se iniciou com a pré-história humana quando
os primeiros hominídeos adquiriram a posição ereta tornando-os capazes de
controlar o território com o olhar e, sobretudo, liberando as mãos que se tornaram
independentes do caminhar e se transformaram no instrumento fundamental de
33
múltiplo uso modificando radicalmente a sua relação com a natureza e preparando o
processo da cultura, mesmo que ainda grosseiramente e elementar.
A partir dessa conquista, os hominídeos ainda passaram por diversas
evoluções que vão desde o Australopithecus, passando pelo Pitecanthropus e o
homem de Neanderthal até surgir o Homo sapiens que já possuía as características
atuais: domínio da linguagem, elaboração de múltiplas técnicas, educação de seus
“filhotes”, domínio da caça, nômade, “artista” impregnado de cultura, cultos e
crenças. Durante essas evoluções, os hominídeos deixaram de ser simples
caçadores que lascavam pedras e construíam abrigos, passando a viver da colheita
e caça para, mais tarde, aperfeiçoar suas armas, além de desenvolver culto aos
mortos e pinturas que transmitiam o seu ainda simples saber técnico: a posse do
fogo, o uso das armas, a caça, os rituais etc. (CAMBI, 1999).
Há cerca de oito ou dez mil anos iniciou-se o período Neolítico no qual,
segundo o autor, houve uma verdadeira e própria revolução cultural, pois nasceram
as primeiras civilizações agrícolas permitindo um aperfeiçoamento das técnicas, tais
quais: fabricação de vasos, tecelagem, aragem da terra, além da divisão do trabalho
entre homem e mulher e o nascimento de uma arte cada vez mais rica e sofisticada,
estilizada e simbólica, com função mágica e educativa ao mesmo tempo.
O milagre grego, que se iniciou no século VII a.C. e se estendeu até o século
VI d.C., embora mesclado de elementos provenientes do mundo oriental - mítico-
religiosos - e de outros ligados ao mundo mediterrâneo - técnico-pragmáticos -
tendeu a tornar esses elementos em instrumentos nas mãos dos homens para
compreender e dominar o mundo natural e humano em que viviam. Além disso,
esses homens tenderam a laicizar-se, fugindo das práticas mágicas e esotéricas
tornando o conhecimento como próprio da mente humana.
“Assim, no centro da cultura grega, coloca-se a racionalidade, ou seja, aquele
uso rigoroso da mente que se desenvolve na direção lógica e crítica e que organiza
cada âmbito da experiência humana, submetendo-o a uma reconstrução à luz da
teoria.” (Ibid., p.72). Ainda de acordo com ele foi essa virada que a civilização grega
proporcionou no mundo antigo que tornou a cultura mais autônoma e enciclopédica,
mais humana e abertamente teorética, colocando esse modelo no centro da história
ocidental alimentando o mundo moderno.
34
Com o advento do cristianismo, iniciado com o nascimento de Jesus Cristo,
operou-se uma profunda revolução cultural no mundo antigo, que talvez tenha sido a
mais profunda que o mundo ocidental conheceu em sua história, pois se tratava de
“uma revolução da mentalidade, antes mesmo que da cultura e das instituições
sociais e, depois, políticas também” (CAMBI, 1999, p. 121), ou seja, surgia um novo
“tipo” de homem com características de igualdade, solidariedade, com a virtude da
humildade, do amor universal, da dedicação pessoal e ainda da castidade e
pobreza.
Nasce um novo modelo de sociedade inspirada e sustentada pelos valores do evangelho e que encontra na igreja o seu ideal-guia e o seu instrumento de atuação, já que se afirma como uma sociedade baseada em relações de fraternidade e civilidade, além de igualdade, e como o motor de todo o processo de renovação da vida social (Ibid., p. 122).
Toda essa revolução estabeleceu uma grande ruptura na organização social,
política e cultural em relação ao mundo antigo, pois foram difundidos novos valores,
que, em sua maioria, foram inversos aos valores clássicos, como a humildade diante
do poder e a paz diante da força, entre outros.
Essas transformações sociais e políticas, desde a pré-história humana até o
advento do cristianismo, acabaram por ajudar a moldar não só a cultura ocidental,
mas também, como consequência, revolucionaram o campo educativo
transformando todo processo de ensino e aprendizagem que se iniciou com a
imitação, passou pela repetição e memorização e que hoje, além de se utilizar de
todos esses processos, também utiliza recursos e meios tecnológicos
complementares para alcançar os mesmos propósitos.
2.2- Breve contextualização cultural da aprendizage m
Partindo do princípio de que a aprendizagem, como uma atividade biológica,
remonta à própria história da humanidade (POZO, 2002) é possível supor que os
indivíduos já nasçam aprendendo. Mas será que desde os primórdios a humanidade
aprende da mesma maneira? Pelo que é possível perceber, ao observar a história
da sua evolução, fica claro que, com o passar do tempo, eles acumularam diferentes
maneiras de aprender possibilitando sua evolução.
35
De acordo com o autor, a imitação foi a primeira estratégia de aprendizagem
utilizada pelo homem primitivo, já que foi dessa maneira que ele aprendeu ou
ensinou a utilizar armas, a caçar e colher, se utilizar da linguagem etc. Já no período
do Homo sapiens, a educação dos jovens tornou-se o instrumento central para a
sobrevivência do grupo e a atividade fundamental para realizar a transmissão e o
desenvolvimento da cultura, porém, eles continuavam se utilizando da mesma
estratégia para isso, qual seja: o jogo-imitação.
Com o advento do período neolítico, a humanidade e, consequentemente, a
aprendizagem sofreu algumas mudanças importantes que, apesar de ainda estar
baseada na transmissão da tradição e imitação, tornou-se mais independente desse
modelo, redefinindo-se como processo de aprendizagem e transformação ao mesmo
tempo. Além disso, ligou-se cada vez mais à linguagem, primeiro oral, depois escrita,
tornando-se cada vez mais transmissão de saberes discursivos e não somente de
práticas e, por fim, reivindicando a institucionalização dessa aprendizagem em um
local apropriado para transmissão da tradição e saberes diversos: a escola12.
Na civilização assírio-babilônica, aproximadamente entre os anos de 1300
a.C. a 539 a.C., Cambi (1999) diz que sacerdotes eram os responsáveis pela
formação escolar que acontecia em três etapas: primeiro aprendia-se a língua
oralmente, depois de maneira codificada e por fim na dimensão de escrita comum.
Era essa experiência escolar que formava os escribas e já ocorria em ambientes
aparelhados para escrever sobre tabuletas de argila, com o controle de um mestre
sob uma rígida disciplina.
Já na civilização egípcia, surgida há aproximadamente 4000 a.C., o autor diz
que o primeiro instrumento do sacerdote-intelectual era a escrita, cuja aprendizagem
se fazia por transcrição de hinos e livros sagrados, acompanhada de “exortações
morais” e de “coerções físicas”. Nessa civilização, além da escrita, já se ensinava
também aritmética.
12 Segundo Pozo (2002), os vestígios mais antigos já encontrados que sugere a aprendizagem como atividade humana, ou seja, institucionalizada, pertenciam à civilização suméria e datam de aproximadamente 3000 a.C. Ele ainda diz que após este período, com os assentamentos neolíticos próximos ao atual Iraque, surgiu o primeiro sistema de escrita que se tem conhecimento e, consequentemente, com o tempo, foi surgindo a necessidade de formar escribas e depois as primeiras escolas formais que trabalhavam uma “aprendizagem memorística ou repetitiva” (p. 27), ou seja, os aprendizes decoravam para, então, reproduzir o que aprendiam.
36
Na Grécia, com a leitura educativa dos poemas homéricos, aproximadamente
entre os séculos IX e VIII a.C.13, que foram utilizados como texto de formação pelas
classes dominantes, desenvolveu-se o modelo ideal de formação ligado à excelência
e ao valor. Além disso, existiram três aspectos da educação grega que pesaram de
modo particular sobre a tradição educativa ocidental: 1- a noção de Paideia, que
universalizou e tornou mais independente o processo de formação, entendido como
um formar-se se universalizando e desenvolvendo a própria humanitas; 2- a
Pedagogia como teoria, destinada a universalizar e tornar rigoroso (no sentido
racional) o tratado dos problemas educativos; 3- a problematização da relação
educativa, que supera o nexo pedagogo-pai e docente-discente, relação autoritária e
formalista, abstrata e geralmente impessoal, para, ao contrário, delinear essa
relação como eminentemente espiritual, quase um segundo nascimento, que faz do
“mestre” o interlocutor fundamental de um processo de formação e, portanto, um
educador dotado de excepcional carisma e de uma exemplaridade que induz à
imitação (CAMBI, 1999).
Foram todos esses aspectos, segundo o autor, que colocaram a experiência
grega no ápice da cultura pedagógica antiga e que evidenciaram bem o papel de
inspiradora que, por tão longo tempo, ela assumiu dentro do Ocidente romano,
depois cristão e medieval e, por fim, também moderno.
Anos mais tarde, com a difusão do cristianismo e sua legitimação político-
religiosa sob Constantino, no século III d.C., criou-se uma ruptura no terreno
educativo, pois os cristãos depreciavam a retórica greco-romana14 e a cultura dos
pagãos em geral e atacavam as escolas que transmitiam uma literatura contrária ao
espírito cristão e orientada para valores diferentes dos evangélicos. Ou seja, “a
revolução do cristianismo é também uma revolução pedagógica e educativa, que
durante muito tempo irá marcar o Ocidente, constituindo uma das suas complexas,
mas fundamentais, matrizes” (Ibid., p. 123).
13 De acordo com Murari e Pereira Melo (2009). Disponível em: http://www.ppe.uem.br/publicacoes/seminario_ppe_2009_2010/pdf/2009/36.pdf. Acesso em 05/02/11. 14 Pozo (2002) ainda acrescenta que na Grécia e Roma clássicas, nas escolas de ensino superior, os modelos de aprendizagem diferiam da simples revisão e repetição citando o exemplo da academia de Platão, cujo modelo era baseado em diálogos e persuasão ou “comunidades de aprendizagem” reduzidas e fechadas em si mesmas.
37
Na Idade Média, a educação se desenvolveu em estreita convivência com a
Igreja, com a fé cristã e com as instituições eclesiásticas que eram as únicas
delegadas a educar, a formar, a conformar. A escola, tal como se conhece hoje, é
produto desse período: estrutura ligada à presença de um professor que ensina
muitos alunos de diversas procedências e que deve responder pela sua atividade à
Igreja ou a outro poder. Porém, segundo Pozo (2002), durante os quase dez
séculos, desde a queda do Império Romano até o Renascimento, mal existiram
alterações no modelo de aprendizagem, pois as mudanças mais notáveis na cultura
da aprendizagem se devem a uma revolução na tecnologia da escrita: a invenção da
imprensa que, juntamente com a cultura do Renascimento, permitiu maior
divulgação, acesso e conservação do conhecimento. A escrita passou a ser a
memória da humanidade e, com isso, ocorreu um declive social da memória
repetitiva.
Com a Modernidade, iniciada aproximadamente no século XVI, ocorreram
algumas mudanças na educação, pois agora ela se destinava a um indivíduo ativo
na sociedade, liberado de vínculos e de ordens, nutrido pela fé laica e aberto para o
cálculo racional da ação e suas consequências. Além disso, os meios educativos
também passaram por mudanças, fazendo da escola um lugar cada vez mais central
e funcional para o desenvolvimento da sociedade moderna. E, finalmente, as teorias
pedagógicas também mudaram, se emancipando de um modelo unitário, definido a
priori e considerado invariante tomando uma conotação histórica e empírica,
encarregando-se das novas exigências sociais de formação e instrução, modelando
fins e meios da educação em relação ao tempo histórico e às condições naturais do
homem, que, portanto, deveria ser estudado cientificamente. Com a Modernidade,
nasceu a Pedagogia como ciência: como saber da formação humana que tende a
controlar racionalmente as complexas (e inúmeras) variáveis que ativam esse
processo (CAMBI, 1999).
No início da Pedagogia moderna, no século XVI, o método utilizado para
aprendizagem era o praelectio: leitura de uma passagem sem interrupção, na
explicação do sentido das partes mais obscuras, na conexão de uma com a outra e
nas observações adequadas a cada classe e a concertatio: disputa suscitada pela
pergunta do docente e pelas correções dos concorrentes ou pela interrogação
recíproca dos próprios concorrentes e tida em alta consideração e, usada as vezes,
38
com grande incentivo aos estudos. Esses métodos ainda eram acompanhados da
atribuição de tarefas escritas e repetições orais a fim de reforçar a memória (CAMBI,
1999).
Mas foi nos anos de 1600 que a escola se racionalizou e se laicizou,
tornando-se um instrumento cada vez mais central na vida do Estado e também da
sociedade civil e, portanto, cada vez mais submetida ao controle e à planificação do
poder público. Já entre o fim dos anos de 1600 e os primeiros decênios dos 1700
foram tomando corpo dois modelos pedagógicos, culturais e educativo-escolares
que se opunham frontalmente ao racionalismo e ofereciam uma imagem
radicalmente nova dos processos formativos, ligando-a aos processos empírico-
naturais e às suas conotações histórica e geograficamente variáveis; ou recorrendo
à história, à linguagem, à cultura em todas as suas formas, vistos como terrenos em
que o homem se realiza a si próprio e nos quais vem operar sua formação mais
específica (Ibid.).
O empirismo e o historicismo elaboraram dois modelos pedagógicos15 que,
embora se contrapondo, alimentaram o debate e o desenvolvimento da Pedagogia,
sobretudo contemporânea, chegando até aos anos de 1900.
Se o empirismo valoriza a ciência como meio e fim educativo, reportando a educação à instrução e esta para a formação da mente interpretada no sentido cognitivo e epistemológico, o historicismo fixa o valor da história como habitat da formação, como centro da cultura, mas também como modelo de formação, que implica a construção da personalidade enquanto entremeada de cultura e caracterizada pelo pensamento como atividade crítica (Ibid., p. 315-6).
O século XVIII acabou por completar o processo de laicização, que foi típico
do mundo moderno, que o animou e que o caracterizou profundamente, impondo
uma emancipação das condições de vida e de produção de âmbito social,
emancipação de uma concepção do mundo dominado pelo modelo religioso e de
uma explicação mágica dos eventos. O efeito de todos esses processos,
acompanhado também pelo papel cada vez mais incisivo e mais amplo assumido
15 Esses dois modelos, embora se excluíssem reciprocamente, se evocaram e se integraram historicamente. “A pedagogia ou se liga à natureza, à biofisiologia, ao corpo, e desenvolve uma formação que se atenha às conotações do processo natural (crescimento e desenvolvimento), ou se vincula à história e à cultura e as indica como os terrenos mais próprios da formação, que é sempre
um processo espiritual” (CAMBI, 1999, p. 315).
39
pelo nascimento e difusão do livro, pela expansão da alfabetização - inicialmente por
razões religiosas, depois civis e econômicas -, pelo amadurecimento do novo perfil
de intelectual - o intelectual moderno não mais emissário do poder religioso e
político, mas caracterizado por uma autonomia e um papel social mais incisivo e
dinâmico - foi um grande processo de laicização, de uma maior liberdade por parte
de classes sociais e de indivíduos que se tornaram independentes de modelos
unívocos e vinculantes, agora valorizados justamente pela sua independência.
Foi nesse cenário que nasceu a escola contemporânea16: com suas
características públicas, estatais e civis, sua estrutura sistemática, seu diálogo com
as ciências e os saberes em transformação, dando lugar, no nível da didática, a
processos de ensino e aprendizagem bastante inovadores: mais científicos ou mais
empíricos ou mais práticos. Esta é, sobretudo, a Pedagogia do iluminismo (CAMBI,
1999).
Já o século XIX, para o autor, pode ser definido como o “século da
Pedagogia”, pois com o advento da sociedade de massa e com a afirmação do
industrialismo, viu-se diante do problema da conformação a novos modelos de
comportamento das novas classes sociais, de povos, de grupos, realizáveis apenas
por meio da educação, mas uma educação nova e regulada por teorias novas, por
uma pedagogia consciente do desafio a que ela deve responder.
A partir dessa consciência, diversos pensamentos/movimentos pedagógicos
emergiram e pouco a pouco foram formando uma nova cultura da aprendizagem.
Foi com a Escola Nova17 - movimento iniciado na Inglaterra no final do século
XIX e que chegou ao Brasil na década de 1920 - que uma nova visão de mundo
passou a ser considerada na educação: não há uma essência humana determinada
desde o nascimento, mas sim construída durante toda sua existência, assim, a
educação deveria seguir o ritmo da vida variando de pessoa a pessoa. Esse
16 A época contemporânea nasce – convencionalmente – em 1789, com a Revolução Francesa, já que é com aquele evento crucial que caem por terra seculares equilíbrios sociais, econômicos e políticos, enquanto toda a sociedade europeia entra numa fase de convulsão e de transformação que se prolongará por muito tempo e que mudará as características e profundas da história (CAMBI, 1999, p. 377). 17 As características da escola nova foram definidas em oposição às da escola tradicional que deriva da visão fixista do mundo que, nascida do idealismo grego, considerava que as coisas foram criadas acabadas, de uma vez por todas. Assim, na escola tradicional, o objetivo era ensinar a ler, escrever e contar por meio de uma metodologia autoritária e rígida, “pois se existe uma essência humana, o ensino deve ser igual para todos, numa ordem lógica e preestabelecida” (MATUI, 1995, p.5).
40
movimento deu uma contribuição inquestionável à história da Pedagogia inventando
vários métodos e técnicas de ensino (MATUI, 1995).
Ainda na metade dos anos de 1950 se constituiu a psicologia cognitiva, que
operou uma revolução da qual, segundo o autor, ainda não foi possível explorar os
limites. Porém, as sementes plantadas nessa época germinaram rapidamente no
decênio seguinte, difundindo os resultados da ciência cognitiva também em outros
âmbitos, mas tendo em primeiro lugar a Pedagogia (Ibid.). Assim, segundo Cambi
(1999), tomou corpo uma nova concepção da Pedagogia, pouco atenta aos
problemas sociais da educação e muito atenta aos problemas da aprendizagem e da
instrução, sobretudo científica.
Entre os anos de 1960 e 1970 foi introduzido no Brasil o modelo educacional
americano conhecido como Escola Tecnicista, cujo objetivo era produzir indivíduos
competentes para o mercado de trabalho por meio da transmissão de informação de
maneira rápida, eficiente, objetiva e precisa. Esse modelo via o aluno como
depositário passivo de conhecimentos que deveriam ser acumulados na mente por
meio de associações (MATUI, 1995).
Segundo o autor, hoje o cognitivismo é considerado como parte de uma nova
ciência da mente da qual o construtivismo18 e o sócio-interacionismo19 fazem parte;
ele junta os dois conceitos tratando-os como “construtivismo sócio-histórico”, pois
considera que a aprendizagem não procede só do sujeito, nem só do objeto, mas da
interação de ambos.
Essa visão permite ao construtivismo focalizar a interação sujeito-objeto como uma estrutura bifásica ou bipolar, cujos elementos são inseparáveis. Não há sujeito sem objeto e não há objeto sem sujeito que o construa. O sujeito não está simplesmente situado no mundo, mas o meio (o objeto) entra como parte integrante do próprio sujeito, como matéria e conteúdo cognitivo e histórico (Ibid., p. 45).
18 Para Piaget, um dos principais estudiosos dessa linha teórica, o desenvolvimento cognitivo é “um processo de construção de estruturas lógicas, explicada por mecanismos endógenos, e para a qual a intervenção social externa pode ser uma facilitadora ou obstaculizadora”, ou seja, “uma teoria universalista e individualista do desenvolvimento, capaz de oferecer um sujeito ativo porém abstrato (“epistêmico”), e que faz da aprendizagem um derivado do próprio desenvolvimento” (CASTORINA, 2003, p. 12). 19 A teoria de Vygotsky, um dos principais estudiosos dessa linha, “aparece como uma teoria histórico-social do desenvolvimento que, pela primeira vez, propõe uma visão da formação das funções psíquicas superiores como “internalização” mediada da cultura e, portanto, postula um sujeito social que não é apenas ativo mas sobretudo interativo” (CASTORINA, 2003, p. 12).
41
Ou seja, nesse momento, além da repetição e memorização, que já
pressupunha a interação entre indivíduos, percebeu-se que o ser humano está,
constantemente, construindo seus conhecimentos por meio da interação com o
próprio ambiente em que se situa, além é claro, da interação com outros indivíduos
já que também não deixou de aprender com a repetição e memorização.
O final do século XX trouxe consigo diversas mudanças. Já na década de
1980 a sociedade vivenciou o tempo das mídias, especialmente do computador,
deixando a certeza de que na década de 1990, parte da população mundial teria um
computador em suas casas. No Brasil essa década representou o sonho de ter um
computador conectado à internet e, assim, esse período foi marcado pela
comunicação e por toda a tecnologia que a envolve (BRUNO, 2007).
Com a chegada do século XXI, a população teve mais acesso aos
computadores e à internet e, com eles, a informação. Por esse motivo, segundo a
autora, ouve-se com frequência termos como Era da informação, Sociedade da
informação e Sociedade do conhecimento, termos estes que estão intimamente
ligados a uma nova maneira de aprender, pois os alunos têm fácil acesso à
informação não recorrendo apenas ao mestre em seus processos de ensino e
aprendizagem.
Com esse cenário está sendo construída uma nova cultura da aprendizagem
que, a cada dia, acrescenta meios tecnológicos que objetivam contribuir com a
promoção da aprendizagem.
2.3 – Nova cultura da aprendizagem
De acordo com Pozo (2002), a nova cultura da aprendizagem pode ser
definida como a construção do conhecimento que ocorre por meio de uma educação
generalizada e uma formação permanente e massiva, além de também ocorrer por
saturação informativa e por um conhecimento descentralizado e diversificado.
Diante dessa nova cultura, proporcionada pelo fácil acesso à informação, uma
das propostas inovadoras encontra-se na Educação a Distância20 online que se
20 Segundo Bruno (2007) foi a partir do século XlX, com a evolução dos meios tecnológicos, que passaram a ser oferecidos cursos por correspondência (material impresso), rádio, fitas cassete, vídeo, TV, computador, internet, vídeo e teleconferência etc. Com a incorporação desse segmento para cursos destinados a profissionais de diversas áreas do conhecimento, mudanças paradigmáticas
42
diferencia de outros ambientes digitais pelo propósito de auxiliar a aprendizagem
entre seus alunos.
Bruno (2007) diz que nessa modalidade de ensino é necessário que o aluno
seja mais responsável pelo seu próprio processo de aprendizagem, porém, esse
processo de transformação envolve mudanças que atingem os sujeitos da
aprendizagem em seus mais diversos aspectos, como a reflexão em seu conviver e
interferência direta sobre as propostas educacionais e no formato dos cursos a
distância.
Peters (2003 apud BRUNO, 2007) diz que apesar de os indivíduos já terem
incorporado alguns tipos aprendizagens - leitura de textos impressos, por imagens,
pela audição, pelas relações interpessoais ou pelo estudo autodirigido entre outros -
o desenvolvimento tecnológico fez com que fossem desenvolvidas outras
habilidades para aprendizagem, “permitindo-nos sair da linearidade, que nos
aprisionou durante tanto tempo, para vislumbrar o ‘caos’ da não-linearidade, que
vem ao encontro da forma como pensamos, criamos, aprendemos” (p.192), porém,
os mecanismos para aprendizagem em ambientes online, apesar de contarem com
elementos familiares, não ocorrem da mesma maneira que os presenciais, pois
suscitam a apropriação de ferramentas cuja estrutura envolve autonomia para auto-
aprendizagem, ainda que exista a presença de um mediador.
Além disso, a autora destaca também que o fato de a educação online
integrar recursos tecnológicos educacionais, tais como: imagens, textos, sons,
animação ou mesmo interligar informações em sequências não-lineares, não é
garantia de boa qualidade pedagógica e de uma nova abordagem educacional, pois
apesar de refletir preocupações com a escolha da abordagem e com estratégias
didáticas que favoreçam a aprendizagem do aluno, esses recursos não asseguram a
aprendizagem (BRUNO, 2007).
Dessa maneira é interessante investigar como se dá a concepção desses
recursos tecnológicos educacionais, pois é importante que sejam levados em
consideração alguns princípios da aprendizagem multimídia para facilitar a
estão ocorrendo em todos os envolvidos no processo e essas mudanças estão favorecendo o surgimento de comunidades de aprendizagem, nas quais os indivíduos, por meio da formação de ambientes interativos de aprendizagem online, se encontram e constroem seu próprio conhecimento.
43
assimilação do conteúdo apresentado. São esses princípios que o próximo capítulo
busca explanar.
44
Capítulo 3: Aprendizagem online
Por milênios, ensinar e estudar foram atos que sempre ocorreram em proximidade física. Isto se fixou firmemente na consciência das pessoas. Por isso o ensinar e estudar a distância é considerado de antemão como excepcional, não comparável ao face-to-face e, muitas vezes, também como especialmente difícil (PETERS, 2001, p. 47).
Foi a partir do século XIX, com a evolução dos meios tecnológicos, que
cursos a distância passaram a ser oferecidos.
Kearsley & Moore (2007) relacionam essa evolução com as cinco gerações
da educação a distância: a primeira realizada por meio de correspondência; a
segunda por transmissão em rádio e televisão; a terceira surgiu de experiências
norte-americanas que integravam áudio/vídeo e correspondência com orientação
face a face; já a quarta utilizou a teleconferência por áudio, vídeo e computador,
proporcionando a primeira interação em tempo real entre alunos e instrutores a
distância; e, por fim, a quinta geração, que, com base na internet, utiliza-se de
classes virtuais online permitindo a convergência entre texto, áudio e vídeo em uma
única plataforma de comunicação conhecida como ambiente virtual de
aprendizagem (AVA)21.
Soares & Valentini (2005) afirmam que com a evolução desse contexto
educacional, as tecnologias diminuíram algumas barreiras de tempo e espaço
tornando a interação entre indivíduos e instituições educacionais mais rápida. O
resultado disso foi o surgimento de novas necessidades educacionais, por parte dos
alunos, e a criação de novas estratégias pedagógicas que respondessem a essas
necessidades, por parte das instituições de ensino. Essas estratégias estão
relacionadas com as novas possibilidades que cursos a distância online podem
oferecer a fim de auxiliar a aprendizagem por meio de recursos multimídia.
Mayer (2009), ao apresentar o estudo sobre aprendizagem multimídia,
considera como hipótese fundamental que mensagens educacionais multimídia22,
concebidas a partir da forma como a mente humana funciona, têm mais
21 Essa expressão tem sido utilizada, segundo Soares & Valentini (2005), para se referir ao uso de recursos digitais de comunicação utilizados para mediar a aprendizagem, ao desenvolvimento de condições, estratégias e intervenções de aprendizagem num espaço virtual na web, organizado de tal forma que propicie a construção de conceitos, por meio da interação entre alunos, professores e objeto de conhecimento.
45
probabilidades de levar a uma aprendizagem significativa do que as que não o são,
pois as pessoas aprendem melhor por meio de palavras e imagens do que apenas
por palavras.
Mayer diz ainda que durante milhares de anos, as palavras foram o principal
formato do ensino: primeiramente as palavras ditas e, nos últimos séculos, as
palavras impressas. Com os avanços tecnológicos nos dias de hoje, as formas
pictóricas de ensino estão mais acessíveis, principalmente através das
extraordinárias capacidades gráficas dos computadores. Porém, o autor diz que o
simples fato de adicionar imagens às palavras não garante uma melhoria da
aprendizagem, pois nem todas as apresentações multimídia são igualmente
eficazes.
Nesse sentido, Kearsley & Moore (2007) dizem que o preparo de um curso de
educação a distância requer não apenas o especialista em conteúdo, mas também
profissionais da área de instrução, que possam organizá-lo de acordo com aquilo
que é conhecido a respeito da teoria e da prática do gerenciamento da informação e
da teoria do aprendizado, pois em virtude de os cursos e o ensino serem veiculados
utilizando a tecnologia, seus materiais precisam ser elaborados por especialistas
que saibam como fazer o melhor uso de cada uma das tecnologias disponíveis. E
por mais que alguns especialistas em conteúdo também possuam aptidão para
elaboração de instruções ou tenham conhecimento de tecnologia, muito poucos são
igualmente especialistas nessas três áreas, fazendo com que o ideal seja que essas
responsabilidades possam ser assumidas por especialistas diferentes.
Isso reforça a ideia de que, na elaboração de cursos a distância online, é
necessária a constituição de uma equipe com profissionais especializados em
diversas áreas e, para mediar todos eles, é necessário também que haja um
profissional com conhecimentos multidisciplinares responsável pela concepção de
mensagens e recursos educacionais do curso a fim de facilitar a aprendizagem dos
alunos. Esse profissional é conhecido como designer educacional23 que ainda será
melhor caracterizado neste capítulo.
22 Uma mensagem educacional multimídia é uma comunicação que contém palavras e imagens destinadas a promover a aprendizagem. A comunicação pode ser veiculada por qualquer meio, incluindo o papel (livros) ou o computador (MAYER, 2009). 23 Filatro (2008) denomina os profissionais que criam as instruções como designers instrucionais, porém, de acordo com a CBO - Classificação Brasileira de Ocupações, o Designer instrucional também pode ser chamado de: Desenhista instrucional, Designer educacional e Projetista
46
Logo, para entender como se dá a aprendizagem em cursos a distância online
que, geralmente, se utilizam de recursos multimídia para auxiliar a aprendizagem
dos alunos, é necessário conhecer quais são os princípios da aprendizagem
multimídia que precisam ser levados em consideração na concepção desses
recursos educacionais por parte do designer educacional.
3.1- Aprendizagem multimídia
Conforme já pontuado nesta pesquisa, a aprendizagem é um processo que
envolve aspectos de diversas naturezas e que vem evoluindo junto com a história da
humanidade. Com isso é possível supor que o advento das tecnologias na
educação, o que inclui a educação a distância e seus recursos multimídia, seja
consequência dessa evolução resultando em outras possibilidades de adquirir
conhecimento, já que os alunos são expostos a novas dinâmicas e recursos digitais
de ensino.
Alves & Nova (2003) dizem que a apreensão de elementos por via audiovisual
traz algumas vantagens diferentes em relação à realizada por meio de textos
escritos ou pela fala, pois, em geral, as imagens são percebidas com mais rapidez
do que os textos e a sua memorização, geralmente, é melhor do que a memorização
de representações verbais. Além disso, as autoras afirmam que a maior parte dos
raciocínios espontâneos utiliza muito mais a simulação de modelos mentais
imagéticos do que cálculos (lógicos) sobre cadeias de caracteres e que as
representações icônicas são independentes de idiomas e, por isso, eliminam parte
das dificuldades de tradução. Por fim, as imagens possuem um poder, muito maior
que a escrita e a fala, de evocar a multiplicidade de visões e de leituras de seus
significantes e significados.
Logo, é possível considerar que o contato com o universo audioimagético é
uma das maneiras privilegiadas à concretização do processo de construção do
conhecimento. Por esse motivo, é interessante entender como os conteúdos
multimídia são processados no sistema cognitivo.
Mayer (2009) apresenta a teoria cognitiva da aprendizagem multimídia, que
se baseia em três princípios da ciência cognitiva para aprendizagem: (1) o instrucional. Nesta pesquisa, optou-se por designer educacional por ser essa a nomenclatura oficial da CBO.
47
pressuposto do canal duplo de processamento, (2) a capacidade limitada de
processamento e (3) processamento ativo de informações.
O pressuposto do canal duplo prevê que os seres humanos possuem canais
distintos na memória de trabalho para processamento de informações visuais e
auditivas, ou seja, possuem um canal auditivo/verbal e um canal visual/pictórico.
Então, quando a informação é apresentada aos olhos (ilustrações, animações,
vídeos ou textos), o processamento dessa informação inicia-se no canal visual;
quando a informação é apresentada aos ouvidos (uma narração ou sons não
verbais) o processamento dessa informação inicia-se no canal auditivo. Por isso, ao
conceber uma estratégia para um curso online, é importante levar em consideração
esse pressuposto, pois caso se apresente ao aluno um recurso que exija muito de
apenas um de seus canais, este poderá ser sobrecarregado, prejudicando a
aprendizagem, conforme será observado na teoria da carga cognitiva mais adiante.
O segundo pressuposto fala sobre a limitação humana em relação ao
processamento de informações, ou seja, quando se apresenta ao aluno uma
ilustração ou animação, ele só consegue reter na memória de trabalho algumas
imagens a cada momento e não uma cópia exata. O mesmo ocorre quando se
apresenta uma narração, ele só consegue reter simultaneamente algumas palavras
na memória de trabalho e não a reprodução exata. Isso ocorre porque a memória de
trabalho24 é utilizada para reter, temporariamente e de maneira consciente, os
conhecimentos adquiridos para conseguir manipulá-los - armazenando-os e
recuperando-os quando necessário - tornando possível a integração dos novos
conhecimentos com os que já estão armazenados na memória de longo prazo.
O pressuposto da aprendizagem ativa ocorre quando o aluno aplica
processos cognitivos ativos - prestar atenção, organizar as informações recebidas e
integrá-las com outros conhecimentos - às informações que recebe. O objetivo
desses processos é ajudá-lo a conseguir que essas informações façam sentido
resultando na construção de uma representação mental coerente, o que permite ver
a aprendizagem como um processo de construção de modelos de aprendizagem
que é único para cada um.
24 Conforme já exposto no primeiro capítulo, enquanto que Mayer (2009) e Pozo (2002) falam em limitação da memória de trabalho, Izquierdo (2004) diz que sua função é de selecionar as informações que serão processadas no sistema cognitivo, o que não quer dizer que ela seja limitada.
48
Em outras palavras, as pessoas processam as informações ativamente
buscando sentido nas apresentações multimídia. Porém, para que essa
aprendizagem, em ambientes online, seja significativa, o aluno ainda precisará
proceder a cinco processos cognitivos durante a aprendizagem:
1- Escolha das palavras relevantes no texto ou narrativa
Na seleção das palavras relevantes, o aprendiz deve prestar atenção a
algumas das palavras apresentadas na mensagem multimídia: se as palavras forem
apresentadas de maneira falada, este processo começa no canal auditivo, mas se
forem apresentadas como texto digital ou impresso, o processo iniciará no canal
visual, podendo passar para o canal auditivo, caso o aluno articule mentalmente as
palavras impressas.
A necessidade de selecionar uma parte da mensagem apresentada decorre da capacidade limitada de cada canal do sistema cognitivo. Se essa capacidade fosse ilimitada, não seria necessário centrarmo-nos apenas numa parte da mensagem verbal (MAYER, 2009, p.221).
O autor ainda reforça que a seleção das palavras não deve ser aleatória. O
aluno é quem deverá determinar quais são as palavras mais relevantes do texto,
pois, dessa maneira, ele estará agindo de maneira ativa no seu aprendizado.
2- Escolha de imagens relevantes das ilustrações apresentadas
Na seleção das imagens relevantes, o aluno deve prestar atenção a uma
parte da animação ou das ilustrações apresentadas na mensagem multimídia. Esse
processo começa no canal visual, mas é possível convertê-lo em parte para o canal
auditivo caso o aprendiz narre mentalmente a animação em curso.
Assim como na seleção de palavras relevantes, a necessidade de selecionar
apenas uma parte do material pictórico apresentado resulta, segundo o autor, do
fato de a capacidade de processamento do sistema cognitivo ser limitada. Também
nesse caso, o processo de seleção de imagens não deve ser aleatório porque o
aluno precisa avaliar quais são as imagens mais relevantes para perceber o sentido
da apresentação multimídia.
3- Organização das palavras selecionadas numa representação verbal coerente
49
Na organização das palavras selecionadas, além de organizá-las, o aluno
deve também estabelecer ligações entre diferentes fragmentos de conhecimentos
verbais, por isso, há mais probabilidades de este processo ser realizado no canal
auditivo estando sujeito às mesmas limitações de capacidade que afetam o
processo de seleção.
4- Organização das imagens selecionadas numa representação pictórica coerente O processo de organização de imagens é paralelo ao da seleção de palavras
e nele o aluno estabelece ligações entre diferentes partes de conhecimentos
pictóricos. Tal processo ocorre no canal visual, que possui as mesmas limitações de
capacidade para estabelecer todas as ligações possíveis na sua memória de
trabalho devendo, por isso, concentrar-se na construção de um conjunto simples de
ligações. Tal como acontece no processo de organização das palavras, o processo
de organização das imagens também não é aleatório, pelo contrário, reflete o
esforço de construir uma estrutura simples que faça sentido ao aluno em uma cadeia
de causa e efeito.
5- Integração das representações pictóricas e verbais com os conhecimentos
anteriores
Talvez seja essa a fase mais importante da aprendizagem multimídia. Nela há
uma mudança de duas representações distintas – um modelo pictórico e um modelo
verbal – para uma representação integrada na qual os elementos e relações
correspondentes de cada modelo são inscritos no outro. A entrada de informação
dessa fase é formada pelos modelos pictórico e verbal que o aluno construiu até o
momento e a saída é um modelo integrado, baseado na ligação das duas
representações.
Esse modelo integrado inclui ainda as ligações com os conhecimentos já
existentes que envolvem a construção de relações entre as partes correspondentes
aos modelos pictórico e verbal e também conhecimentos da memória de longo
prazo. Desenrola-se na memória de trabalho visual e verbal e implica uma
coordenação entre ambas. É um processo extremamente exigente que obriga a
utilização eficiente da capacidade cognitiva e, em certa medida, é um resumo da
busca de sentido, uma vez que o aluno precisa se concentrar na estrutura
50
subjacente às representações visuais e verbais. Esse processo pode ser facilitado
com a utilização dos conhecimentos já existentes na memória de longo prazo do
aluno.
Além desses pressupostos que auxiliam na significação das informações
recebidas pelos alunos possibilitando a aprendizagem, Mayer (2009) também
explica como ocorre o processamento dos elementos comunicacionais25 presentes
nos recursos educacionais multimídia pelos canais visual/pictórico e auditivo/verbal:
imagens, palavras ditas (narração) e palavras impressas (textos digitais ou
impressos).
No caso do processamento de imagens , por um breve período de tempo, o
olho do aluno fixa a fotografia ou os frames da animação, o que ocorre sem grande
esforço. Porém, em seguida, há o início do processamento cognitivo ativo, no qual o
aluno já possui algum controle consciente sobre esse processo.
Caso o aluno preste atenção nessas imagens, parte delas ficarão
representadas na memória de trabalho, o que corresponde à fase de seleção de
imagens. Quando a memória de trabalho fica cheia de pedaços de imagens, o passo
seguinte consiste na organização desses pedaços numa estrutura coerente,
correspondendo à organização de imagens.
O resultado desse processo de conhecimento é a criação, segundo o autor,
de um modelo pictórico ou, em outras palavras, o aluno constrói uma representação
visual organizada dos principais componentes do cenário ilustrado ou um conjunto
organizado de imagens representativas da sequência de causa e efeito.
Por fim, o processamento cognitivo ativo integra a nova representação a
outros conhecimentos. Além disso, se os alunos tiverem produzido também um
modelo verbal podem tentar ligá-lo ao modelo pictórico, por exemplo, fazendo a
correspondência entre uma frase do texto e uma parte da imagem, dando origem a
uma aprendizagem integrada.
No processamento de palavras ditas , quando o computador emite uma
narração, os sons são captados pelos ouvidos do aluno e ficam temporariamente
25 Filatro (2008) define imagens como gráficos que podem ser estáticos (ilustrações, fotografias, modelagem) ou dinâmicos (animações, vídeos, realidade virtual). Define animação e vídeo como uma sequência de imagens que, uma vez exibida, demonstra alterações de uma imagem para outra, porém, o vídeo se diferencia da animação no sentido de trabalhar com imagens reais.
51
retidos na memória sensorial auditiva. Se ele prestar atenção aos sons que lhe
chegam aos ouvidos, alguns desses sons serão selecionados para serem incluídos
na base de sons de palavras, iniciando o processamento cognitivo ativo.
Essa base de palavras são fragmentos desorganizados, sendo o passo
seguinte sua transformação numa estrutura mental coerente. Nesse processo, as
palavras deixam de estar representadas com base no seu som, passando a estar
representadas com base no seu significado. O resultado pode ser uma corrente de
causa e efeito nas diferentes fases do cenário ilustrado. Por fim, o aluno pode utilizar
os seus conhecimentos prévios para ajudar a explicar a transição de um passo para
outro e pode também ligar as palavras a imagens.
No processamento de palavras impressas , a apresentação de texto
impresso em mensagens multimídia constitui um desafio para o sistema de canal
duplo em termos de processamento de informação, pois caso um aluno tenha que
ler um texto e ver uma ilustração ao mesmo tempo, a informação precisará passar
por diversas etapas até receber um significado e ser assimilado.
Primeiramente as palavras serão apresentadas visualmente e começarão a
ser processadas através dos olhos. Depois o aluno poderá prestar atenção em
algumas palavras recebidas e levá-las à memória de trabalho como parte integrante
das imagens. Por fim, quando os recursos verbais são obrigados a entrar pelo canal
visual, as palavras têm de fazer um percurso complexo através do sistema e
também disputar a atenção com a ilustração que o aluno também está processando
pelo canal visual. Caso o aluno pronuncie mentalmente as imagens das palavras
impressas, ele pode transportar as palavras para o canal auditivo/verbal que, na
sequência, serão processadas como palavras ditas pelo método correspondente,
descrito anteriormente.
Essa disputa de atenção que acontece quando um recurso se utiliza do
mesmo canal para comunicar duas ou mais informações pode sobrecarregá-lo a
ponto de prejudicar o processamento das informações que estão sendo transmitidas
ao aluno, comprometendo sua aprendizagem. Outro ponto que precisa ser levado
em consideração no desenho dos recursos é o fato de uma mensagem visual poder
ser direcionada para o canal auditivo e vice-versa, pois isso pode se tornar mais um
tipo de disputa de atenção, agravando ainda mais o processo de aprendizagem.
52
A teoria cognitiva da aprendizagem multimídia pode ser resumida com a ideia
de que ela está fundamentada numa arquitetura cognitiva que consiste numa
memória de trabalho limitada, com unidades de processamento parcialmente
independentes associadas à informação visual/espacial e auditivo/verbal, que
interage com uma memória de longo prazo comparativamente ilimitada (PAAS,
TUOVINEN ET AL., 2003 apud OLIVEIRA, 2009). Oliveira diz ainda que, para
aprender a resolver problemas usando as tecnologias, é necessária uma utilização
criteriosa e fundamentada dessas ferramentas e uma cuidadosa preparação dos
materiais de instrução que devem, entre outros, respeitar a arquitetura e
funcionamento cognitivos para não sobrecarregar a memória de trabalho (carga
cognitiva).
3.2- Aprendizagem e a carga cognitiva
A carga cognitiva refere-se à atividade mental na qual a memória de trabalho
está sujeita em cada instante, por exemplo, ao ler um texto, ao observar uma
imagem ou animação etc. Ela é formada pela carga cognitiva intrínseca, relativa à
natureza da informação - dificuldade - e pela carga cognitiva estranha, dependente
do modo como a informação é apresentada - materiais instrucionais (OLIVEIRA,
2009).
A carga cognitiva da memória de trabalho pode ser sobrecarregada quando,
por exemplo, o aluno é exposto a uma animação com legendas textuais, pois ele
precisará, através do canal visual, observar as imagens em movimento e ainda ler
as legendas. Essa carga pode ser minimizada se, ao invés de legendas textuais, as
cenas forem narradas, pois, dessa maneira, as informações serão processadas por
dois canais - auditivo e visual - ao invés de apenas um - visual.
O autor ainda apresenta algumas estratégias que podem ser utilizadas em
cursos online para reduzir a carga cognitiva do aluno melhorando sua
aprendizagem, por exemplo:
Quando o canal visual está sobrecarregado pode-se deslocar algum
processamento para o canal auditivo, pois há uma melhor transferência dos
conhecimentos armazenados na memória de longo prazo quando as palavras são
apresentadas na forma narrativa do que em texto.
53
Quando os canais visual e auditivo estão sobrecarregados pode-se
acrescentar tempo entre pequenos segmentos sucessivos do recurso, pois há
melhor transferência dos conhecimentos armazenados na memória de longo prazo
quando uma lição é apresentada em segmentos controlados do que em uma
unidade contínua. Também é interessante eliminar materiais desnecessários e
destacar o que for mais relevante de modo a reduzir o processamento de material
estranho melhorando a transferência de conhecimentos entre as memórias de
trabalho e de longo prazo. Quando um ou dois canais estão em sobrecarga pode-se colocar as
palavras impressas perto das imagens ou gráficos correspondentes de modo a
reduzir a captação visual e evitar a apresentação de torrentes de palavras impressas
e faladas, pois há melhor transferência dos conhecimentos armazenados na
memória de longo prazo quando palavras impressas estão junto das partes gráficas
correspondentes e quando as palavras são apresentadas em forma narrativa do que
nas formas narrativa e texto escrito. Também é possível apresentar a narração e a
correspondente animação simultaneamente para minimizar a necessidade de reter
representações na memória, pois há melhor transferência dos conhecimentos
armazenados na memória de longo prazo quando a animação e narração
correspondentes são apresentadas simultaneamente, porém isso é válido para
alunos com elevada perícia espacial, caso não sejam, a apresentação deverá ser
desenhada para acontecer sequencialmente. O desenho e/ou design de recursos para auxiliar a aprendizagem que não
utilize toda a capacidade da memória de trabalho, isto é, com baixa carga cognitiva e
que utilize materiais com procedimentos de instrução adequados, encoraja os alunos
a envolverem-se no processo cognitivo que é diretamente relevante na construção
de seus esquemas, fundamental na aprendizagem (OLIVEIRA, 2009).
A concepção dessas instruções, bem como o tipo de materiais multimídia que
podem ser utilizados em um curso online, geralmente, cabe ao designer
educacional.
3.3- O design (er) educacional
54
Em um curso a distância online é possível se utilizar de diferentes recursos
multimídia como apoio à aprendizagem, porém, caso esses recursos não sejam
concebidos de maneira didática e respeitando a arquitetura do sistema cognitivo, ao
invés de ajudar, poderão dificultar a aprendizagem devido à sobrecarga nos canais
de processamento.
Para otimizar as possibilidades que esses recursos podem oferecer para os
alunos de um curso online há um profissional responsável por concebê-los e
adequá-los de maneira didática a fim de contribuir com sua aprendizagem em cursos
dessa modalidade. Esse profissional é o designer educacional cuja função é
desenvolver o design educacional de cursos a distância.
A prática do design educacional é definida como:
a ação intencional e sistemática de ensino que envolve o planejamento, o desenvolvimento e a aplicação de métodos, técnicas, atividades, materiais, eventos e produtos educacionais em situações didáticas específicas, a fim de promover, a partir dos princípios de aprendizagem e instrução conhecidos, a aprendizagem humana (FILATRO, 2008, p. 3).
Cabe ao designer educacional, em conjunto com outros profissionais de
diferentes áreas, o direcionamento e a execução de todas essas atribuições.
Kearsley & Moore (2007) dizem que os profissionais que criam as instruções
devem trabalhar com os especialistas em conteúdo para ajudá-los a decidir sobre
assuntos que vão desde os objetivos do curso, passando pelo layout do texto e
ilustrações até as questões para sessões interativas online, por áudio ou
videoconferência. Designers gráficos, programadores de internet e outros
especialistas em mídia devem ser agrupados para transformar as ideias dos
especialistas em conteúdo e dos designers educacionais em materiais e programas
do curso de boa qualidade. Por fim, os especialistas em avaliação e pesquisa devem
planejar o modo de avaliar o aprendizado individual do aluno, bem como a eficácia
de todos os aspectos do curso, a fim de assegurar que ele dê certo.
Filatro (2008) diz que, ao trabalhar com profissionais de diferentes áreas, uma
das principais atribuições desse profissional “é assegurar a boa comunicação entre
os diferentes membros da equipe, de modo que as ideias iniciais se concretizem em
soluções de qualidade” e, além disso, “também é responsável por apresentar e
validar com o cliente e demais interessados os produtos resultantes de cada fase,
apresentando relatórios de análise e acompanhamento, documentos de
55
especificação, pilotos e avaliações” (p. 26). Além dessas, de acordo com a
Classificação Brasileira de Ocupações - CBO26, suas atribuições também podem
englobar desde a implementação, avaliação, coordenação e planejamento de
projetos pedagógicos, passando pela aplicação de técnicas para facilitar o processo
de ensino e aprendizagem até a viabilização do trabalho coletivo.
Além de tudo isso, esse profissional ainda precisa produzir conhecimento
sobre os princípios e os métodos de instrução mais adequados a diferentes tipos de
aprendizagem e, para isso, fundamenta-se em diferentes campos do conhecimento,
como as ciências humanas, ciências da informação e ciências da administração
(FILATRO, 2008). Logo, para que consiga fazer a ponte entre todos os profissionais
envolvidos no projeto educacional e desenhar adequadamente os recursos
educacionais multimídia de um curso online, ele precisa ter conhecimento em
diferentes áreas, pois também lhe cabe “especificar que tipo de informações verbais
e não verbais devem fazer parte dos conteúdos do aprendizado eletrônico” (Ibid., p.
84).
Mas qual é o processo de trabalho do designer educacional? O que ele
precisa saber antes de conceber os recursos multimídia?
A autora responde essas questões trazendo alguns processos envolvidos no
desenvolvimento do desenho educacional de um curso e uma síntese dos
pressupostos da aprendizagem multimídia e da carga cognitiva que devem ser
levados em consideração no desenvolvimento de recursos educacionais multimídia.
3.3.1- Os processos do design educacional
Filatro diz que o formato mais utilizado no processo do design educacional é o
ADDIE - do inglês: Analysis, Design, Development, Implementation e Evaluation. Em
português essas cinco etapas equivalem a: análise, desenho, desenvolvimento,
implementação e avaliação.
É na etapa de análise que o problema educacional é entendido para que seja
elaborada uma solução adequada. “Isso é feito por meio da análise contextual, que
26 Atribuições também utilizadas para as funções de coordenador pedagógico, orientador educacional, pedagogo, professor de técnicas e recursos audiovisuais, psicopedagogo e supervisor de ensino. Disponível na CBO: http://www.mtecbo.gov.br/cbosite/pages/pesquisas/BuscaPorTituloResultado.jsf;jsessionid=FA20E83E479E8031E6A6A502772BC5D9.lbroute813. Acesso em 15/02/11.
56
abrange o levantamento das necessidades educacionais propriamente ditas, a
caracterização dos alunos e a verificação de restrições” (FILATRO, 2008, p. 28).
Na etapa do design é feito o planejamento e o desenho didático do curso por
meio de um mapeamento e sequenciamento dos conteúdos que serão trabalhados.
Além disso, é feita também “a definição das estratégias e atividades de
aprendizagem para alcançar os objetivos traçados, a seleção de mídias e
ferramentas mais apropriadas e a descrição dos materiais que deverão ser
produzidos para utilização por alunos e educadores” (Ibid., p. 28-9).
É no desenvolvimento que se realiza a produção de tudo que foi elaborado
na fase de design. Além disso, é feita também “a adaptação de recursos e materiais
didáticos impressos e/ou digitais, a parametrização de ambientes virtuais e a
preparação dos suportes pedagógico, tecnológico e administrativo” (Ibid., p. 30).
A etapa de implementação é quando tudo que foi desenhado e produzido é
publicado e finalmente executado pelos alunos no ambiente virtual no caso de
cursos online.
Por fim, na etapa de avaliação é verificada a efetividade da solução proposta
e é quando também pode ser feita a revisão das estratégias implementadas
“avaliando tanto a solução educacional quanto os resultados de aprendizagem dos
alunos” (Ibid., p. 31) que poderá refletir na adequação do design educacional do
curso. A autora ainda enfatiza que o início dessa etapa pode ser realizado antes
mesmo da execução do curso, pois deve permear todo o processo de desenho
desde a primeira etapa verificando os produtos resultantes de cada fase do
desenvolvimento e as características dos alunos matriculados percebendo se
possuem determinados conhecimentos e habilidades.
Ao desenvolver todas essas etapas e atribuições é muito importante que o
designer educacional tenha conhecimento acerca dos princípios da aprendizagem
multimídia e da carga cognitiva para que a compreensão dos materiais
desenvolvidos, por parte dos alunos, seja favorecida, pois caso contrário, esses
materiais poderão sobrecarregar os canais de processamento do aluno tornando
todo o processo envolvido na aprendizagem ainda mais complexo.
Mayer (2009) ainda afirma que o desenho de um recurso carrega em si a
influência de quem o concebeu, logo, é possível supor que essa influência pode
57
incluir seus saberes, sua maneira de ver o mundo e, principalmente, a sua maneira
de aprender e a visão de como os outros aprendem.
O autor também enfatiza que o design de recursos multimídia requer que:
1- Os materiais apresentados tenham uma estrutura coerente;
2- A mensagem deve dar uma orientação ao aluno sobre a forma de construir
sua própria estrutura ou modelo de aprendizagem.
Caso a informação não tenha uma estrutura coerente - se for um conjunto de
fatos isolados, por exemplo - os esforços do aluno para construir um modelo de
aprendizagem serão infrutíferos. Se a mensagem não contiver uma indicação sobre
a forma de estruturar os materiais apresentados, seus esforços podem não dar
qualquer resultado.
Assim, o conceito de design de recursos multimídia poderia resumir-se à
tentativa de ajudar os alunos a construírem seus próprios modelos de aprendizagem
(MAYER, 2009) ou, em outras palavras, ajudá-los a criar significados selecionando,
ordenando e integrando os novos conhecimentos aos que já estão armazenados na
memória de longo prazo.
É a memória de trabalho que une informações visuais e auditivas e,
posteriormente, as integra ao conhecimento já armazenado na memória de longo
prazo. É por essa razão que oferecer palavras, imagens e sons em uma
apresentação unificada torna a integração entre os canais de processamento
sensorial mais fácil. Da mesma maneira, atividades práticas ativam o processo de
integração dos novos conhecimentos aos conhecimentos já existentes (FILATRO,
2008).
Para contribuir com a recuperação e a transferência dos conhecimentos
armazenados na memória de longo prazo, de acordo com a autora, o designer
educacional deve oferecer exemplos e atividades práticas que incorporem
elementos e situações autênticas dos contextos de uso pós-aprendizagem. Isso
ajudará os alunos a criar âncoras de recuperação e transferência do aprendizado.
3.3.2- A criação dos recursos educacionais multimíd ia e os princípios da
aprendizagem multimídia e da carga cognitiva
58
Conforme já apontado nesta pesquisa, os princípios da aprendizagem
multimídia e da carga cognitiva devem ser levados em consideração na concepção
dos recursos multimídia para que esses, de fato, auxiliem na aprendizagem dos
alunos de cursos online.
Filatro (2008), de maneira bem resumida, elenca sete princípios que orientam
a concepção de um design educacional multimídia com baixa carga cognitiva. São
eles:
O princípio da multimídia
Enfatiza que o aprendizado eletrônico deve incluir textos e imagens e não
apenas um desses dois tipos de informação e, além disso, eles devem ser
apresentados ao aluno de maneira conjunta ao invés de separadamente.
Em outras palavras, ao apresentar um texto escrito ao aluno é interessante
que o designer apresente também algum recurso imagético – desde uma simples
ilustração até um vídeo mais elaborado – que, de acordo com a autora, torne esse
conteúdo mais interessante ou ofereça uma visão geral dele, que direcione a
atenção do aluno para a informação mais importante, que ajude a reduzir sua carga
cognitiva, que o ajude a construir novas memórias ou que o auxilie no entendimento
mais aprofundado do conteúdo.
O princípio da proximidade espacial
Ao trabalhar com textos e imagens, esses devem ser apresentados de modo
integrado, ou seja, textos posicionados próximo às imagens a que se referem,
poupando o aluno da tarefa de reuni-los. Hiperlinks devem ser abertos em janelas
que não cubram a tela original do texto, as orientações ou atividades devem ser
posicionadas na mesma tela de realização das atividades e o feedback deve ser
exibido na mesma tela em que o aluno realizou ou respondeu uma atividade, pois
informações apresentadas de maneira simultânea são mais facilmente integradas do
que as que são apresentadas de maneira sequencial.
O princípio da coerência
59
Textos, imagens ou sons não relevantes ao assunto abordado devem ser
excluídos, evitando distrações que disputarão a atenção do aluno com os recursos
que realmente contribuem para o significado do conteúdo do curso.
Ou seja, imagens meramente decorativas, música de fundo, recursos
educacionais sem necessidade pedagógica só aumentarão a carga cognitiva do
aluno sobrecarregando sua memória de trabalho.
O princípio da modalidade
Para melhorar o processamento das informações, os recursos imagéticos
devem ser acompanhados por áudio ao invés de texto escrito, pois isso reduzirá a
demanda por processamento visual simultâneo diminuindo a carga cognitiva nesse
canal.
Por exemplo, ao desenhar um vídeo ou animação, o designer deve optar por
locução para descrição das imagens ao invés de legendas, pois, com isso, o aluno
poderá prestar atenção nas imagens enquanto ouve a locução ao invés de precisar
dar conta das imagens e legendas ao mesmo tempo.
O princípio da redundância
Quando um elemento informacional pode ser entendido por si só - por
exemplo, um determinado texto - não há necessidade de se utilizar um recurso -
como uma ilustração - para auxiliar seu entendimento, pois isso pode causar
sobrecarga cognitiva no aluno. Nesses casos, de acordo com Filatro (2008), é
recomendado que toda informação já apresentada anteriormente ou elaborada em
outra mídia, considerada irrelevante ou já conhecida pelo aluno, seja removida.
O princípio da personalização
As orientações educacionais estabelecidas com o aluno devem ser próximas
dele e em estilo conversacional, mas sem ferir o princípio da coerência
apresentando informações que não estejam relacionadas ao conteúdo apresentado.
Por exemplo, pode-se falar diretamente com o aluno utilizando frases na
primeira e terceira pessoa - eu, nós, você e vocês.
60
O princípio da prática
O aprendizado online deve propor atividades e exercícios práticos em
contextos autênticos, em vez de simplesmente reconhecer ou recuperar informações
previamente fornecidas, pois assim, os alunos serão desafiados a integrar esses
novos conhecimentos aprendidos.
É importante lembrar que, mesmo levando em consideração todos esses
princípios, não há garantia de aprendizado por parte do aluno, pois a aprendizagem
é um processo que depende unicamente do indivíduo para se concretizar. E, de
acordo com Filatro (2008), isso ainda depende da capacidade que esse indivíduo
possui para captar as informações através dos sentidos, armazená-las
temporariamente na memória de trabalho para que sejam manipuladas e,
posteriormente, possam interagir com os conhecimentos armazenados na memória
de longo prazo e, por fim, sejam integradas e armazenadas na memória de longo
prazo.
Todo esse processo pode ser mais eficiente caso o aluno se envolva
ativamente aumentando sua consciência e o controle sobre seus processos mentais.
E esse envolvimento, muito provavelmente, está diretamente ligado com sua
motivação para aprender, pois, caso ele não esteja motivado, a aprendizagem
poderá se tornar improvável, independente da qualidade do material elaborado pelo
conteudista, das estratégias desenvolvidas pelo designer educacional, da mediação
docente e de todos os esforços dos outros integrantes da equipe de
desenvolvimento do curso.
61
Capítulo 4: A pesquisa
Para responder a questão deste estudo, foi realizada uma pesquisa de campo
por meio de entrevista. A opção por esse método se deu pelas suas características,
como: observar, registrar, analisar e correlacionar fatos ou fenômenos sem
manipulá-los; por tratar-se de uma conversa orientada para um objetivo definido, a
fim de recolher, por meio do interrogatório do informante, dados à pesquisa. A
entrevista ainda é indicada nos casos em que não houver fontes mais seguras para
as informações desejadas ou até mesmo quando for necessário completar dados
extraídos de outras fontes (BERVIAN, CERVO e SILVA, 2007).
A seguir será apresentado o contexto institucional no qual as entrevistas
foram realizadas, bem como os sujeitos da pesquisa, o contexto da entrevista e a
descrição, análise e interpretação das categorias abordadas.
4.1- Contexto institucional
O Senac SP é uma instituição educacional criada em meados dos anos 1940,
com o intuito de promover a profissionalização dos empregados do comércio e
serviços. Com o passar dos anos sua atuação foi aumentado e, nos dias de hoje,
além dos cursos livres e técnicos profissionalizantes, há também a oferta de cursos
de graduação, extensão universitária e pós-graduação, atendendo aos mais diversos
públicos.
É importante destacar que, exceto a graduação, as demais modalidades de
formação também são ofertadas a distância, demandando novas estratégias e
possibilidades de aprendizagem.
O Núcleo de Tecnologias Aplicadas à Educação (TAE) foi criado justamente
para dar conta dessas novas demandas que a educação a distância apresenta27 e
também para estimular a inserção de tecnologias em sala de aula.
27 Importante destacar que a proposta educacional do Senac SP é embasada no desenvolvimento de competências profissionais que procura fortalecer a autonomia dos alunos na aprendizagem, desenvolvendo sua capacidade crítica, a criatividade e a iniciativa. Dessa maneira, além dos conteúdos e recursos educacionais desenvolvidos pelo TAE, os cursos online ainda contam com mediação docente, atividades reflexivas e interativas, entre outras estratégias que visam o
62
Para desenvolver todas as soluções e recursos multimídia é preciso haver
uma equipe multidisciplinar e qualificada para atender aos diferentes saberes
envolvidos nesse desenvolvimento. No Senac SP essa equipe multidisciplinar é
dividida, resumidamente, da seguinte maneira:
� Coordenação do núcleo
Responsável pela gestão de todas as equipes que integram o núcleo;
� Equipe pedagógica
Composta pela coordenação de projetos, coordenação pedagógica e designers
educacionais, que são responsáveis pelo desenho e estratégia dos cursos e
recursos multimídia;
� Equipe de produção
Composta pela coordenação de produção, designers de interface, programadores e
ilustradores, que são responsáveis pela criação multimídia de todo curso;
� Equipe de tecnologia
Composta pela coordenação de tecnologia e programadores responsáveis pela
manutenção e customização do ambiente virtual;
� Equipe administrativa
Composta por assistentes administrativos responsáveis por todos os assuntos
funcionais e administrativos do núcleo.
É nesse contexto institucional, junto à equipe pedagógica, que os sujeitos
selecionados para a entrevista atuam28.
4.2- Sujeitos da pesquisa
Os sujeitos selecionados para participar da entrevista são designers
educacionais que possuem experiência de um e três anos nessa função; são
graduados nos cursos de Comunicação e Multimeios, Jornalismo, Pedagogia e
Tecnologia e Mídias Digitais; e têm entre 22 e 30 anos de idade.
desenvolvimento das competências-alvo propostas para os cursos. Fonte: Proposta pedagógica do Senac SP. Disponível em: http://www.sp.senac.br/pdf/29550.pdf. Acesso em 12/05/2001. 28 É no mesmo contexto institucional que a pesquisadora também atua como designer educacional há três anos, desenvolvendo cursos de extensão universitária, técnicos e livres.
63
Nessa equipe são desenvolvidos cursos online com diferentes propósitos:
cursos corporativos, que são customizados de acordo com as necessidades dos
clientes para o treinamento de suas equipes de trabalho, podendo ter o formato
auto-instrucional ou mediado por um docente; cursos livres, que introduzem
conceitos profissionais básicos voltados ao público de ensino médio; cursos de
extensão universitária, que aprofundam alguns conceitos profissionais ao público do
ensino superior e, mais recentemente, cursos técnicos, que oferecem formação
profissional ao público de ensino médio.
Nesse sentido, os designers educacionais, além de mediar os envolvidos nos
projetos em que atuam, ainda são responsáveis, durante a etapa de design, por
desenvolver tarefas como:
� Orientar e acompanhar o desenvolvimento do material educacional pelo
conteudista, para que seja didático e de acordo com a mídia na qual o curso
será veiculado, nesse caso, web;
� Transformar o material desenvolvido pelo conteudista em roteiro e/ou
storyboard – roteiro desenhado - para que a equipe de produção transforme-o
no material educacional multimídia que será oferecido aos alunos;
� Desenhar recursos educacionais, multimídia ou não, no material educacional,
de preferência com auxílio do conteudista, possibilitando aos alunos outras
possibilidades de interação e compreensão com esse material;
� Elaborar, preferencialmente em conjunto com o conteudista, estratégias e
atividades que fomentem a recordação de informações importantes – por
meio de quiz e outras estratégias de memorização; que ajudem os alunos a
organizar as novas aprendizagens e estabelecer significados com os
conhecimentos anteriores – por meio de mapas conceituais, resumos,
agrupamento das informações; que levem os alunos a exercer a criatividade e
o pensamento crítico – por meio de brainstorm, elaboração de metáforas,
estudo de casos e, principalmente, que incentive à cooperação entre os
alunos no ambiente virtual – por meio de fóruns, trabalhos em grupo, análise
e avaliação do trabalho dos colegas etc.
Já na fase de implementação dos cursos, outras demandas são necessárias
para o andamento do projeto:
64
� Análise e conferência do material produzido junto à equipe de produção
multimídia, a fim de corrigir eventuais problemas técnicos no material e
recursos;
� Montagem do ambiente virtual com todos os conteúdos, recursos e atividades
desenvolvidos para o curso em sequência lógica e com as devidas instruções
para execução de cada etapa por parte dos alunos.
É importante reforçar que, dependendo do contexto institucional, essas
demandas podem sofrer alterações significativas, aumentando ou atenuando as
responsabilidades desse profissional.
4.3- Contexto da entrevista
Para a coleta dos dados foi utilizada a estratégia de entrevista que teve o
propósito de investigar quais os conhecimentos que os designers educacionais têm
sobre aprendizagem para elaborar recursos educacionais multimídia em cursos
online. Para tanto, foram utilizadas doze questões norteadoras embasadas nos
aspectos biológicos e culturais da aprendizagem e as concepções da aprendizagem
multimídia e da carga cognitiva já abordados nesta pesquisa.
A entrevista foi gravada individualmente, na própria instituição em que o
público selecionado atua, e teve duração média de vinte minutos cada uma. O
público era composto por quatro designers educacionais do Senac SP. Eles
discorreram, sem maiores problemas, sobre as questões abordadas, mas em alguns
momentos houve a necessidade de elaborar perguntas complementares para que
fossem melhor compreendidas e respondidas dentro do foco esperado.
Os participantes, apesar de pensativos com algumas questões, estavam bem
à vontade e motivados a contribuir com a pesquisa. A escolha desse público se deu
pelo fato de compartilharem do mesmo contexto institucional e da mesma equipe de
trabalho que a pesquisadora, com demandas e métodos de trabalho afins.
65
4.4- Descrição, análise e interpretação dos dados
Ao iniciar a entrevista, com o propósito de assegurar a privacidade dos
designers educacionais (DEs), foi solicitado que cada um escolhesse um nome pelo
qual gostaria de ser tratado e, a partir de suas escolhas, eles passaram a ser
identificados como: Carol, Jean, Marília e Peres.
A descrição, análise e interpretação dos dados coletados foram separadas
por categorias de acordo com o referencial teórico desta dissertação, quais sejam:
concepções biológicas e culturais da aprendizagem, concepções da aprendizagem
multimídia e concepções da carga cognitiva.
4.4.1- Concepções biológicas e culturais da aprendi zagem
Nessa categoria a análise e interpretação dos dados coletados buscou
investigar os conhecimentos dos DEs sobre os processos biológicos envolvidos na
aprendizagem e quais os fatores culturais que fazem parte de suas práticas diárias
de trabalho.
Ao serem questionados sobre a clareza do processo de aprendizagem do
aluno, cujo objetivo era investigar seus conhecimentos acerca dos processos
biológicos e culturais, os apontamentos mais recorrentes foram sobre a importância
da motivação e atenção desse aluno, bem como sua pré-disposição e faixa etária,
conforme relatos:
A aprendizagem acontece muito de acordo com a pré-disposição do aluno [...] Eu posso até não interagir o suficiente no próprio recurso digital, mas o que eu vou ler, o que eu vou conversar com o tutor. Eu acho que a aprendizagem acontece mais ou menos aí. (Marília) Varia do público-alvo: adolescente tem que prender muito a atenção, tem que ser uma coisa muito mais dinâmica, tem que ter muito mais interações. Agora, se for um público atual, mas com uma maturidade maior, então, ele tem que ter um dinamismo um pouco menor, tem que ser um pouco mais controlado, ter um pouco mais de conteúdo... (Peres)
Ainda foram apontadas as particularidades com que cada aluno aprende, a
importância do professor em ambientes online, a utilização de diferentes tipos de
66
recursos educacionais e a recuperação e transferência de conhecimentos já
presentes na memória:
Acho que a grande maioria dos alunos assimila pela exposição mais do que só com a leitura, sozinho. Esse papel do professor é bastante importante nessa assimilação. No ambiente online força um pouco mais ele (aluno) a aprender sozinho. (Carol)
Cada um aprende de um jeito. Na hora da criação da animação, quanto mais recursos você utilizar, eu diria assim, mais você vai causar (recuperar) as lembranças deles em situações anteriores [...] mais aquilo pode ser efetivo para ele. Às vezes você coloca um sonzinho dentro da animação, que nossa, aquilo fez ele lembrar de alguma coisa. Ele associa o que ele está aprendendo naquele momento com uma coisa que ele já tinha antes. (Jean)
Esses apontamentos dão conta de alguns dos processos biológicos e
culturais envolvidos na aprendizagem, pois a motivação, atenção, recuperação e
transferência de conhecimentos já presentes na memória de um indivíduo são
apontados por Pozo (2002) como processos externos, complementares aos
processos mentais, que podem otimizar ou minimizar a aprendizagem. No entanto, o
quarto processo, consciência e controle da própria aprendizagem, não foi
mencionado em nenhum momento pelos participantes.
Com o propósito de investigar alguma particularidade na prática dos DEs, foi
investigado quais os conhecimentos sobre aprendizagem que eles consideram
indispensáveis a um designer educacional no momento de elaborar um roteiro.
As respostas foram diversificadas e apontaram à importância de saber como
é que a aprendizagem vai ocorrer para o aluno, além da necessidade de se
considerar e tentar aproveitar alguns pontos dos ambientes web. Além disso, o tipo
de conteúdo e a noção de qual impacto o recurso poderá causar também surgiram,
conforme os primeiros relatos:
[...] como que (o aluno) vai realizar essa aprendizagem, como que vai acontecer? [...] O aluno online, ele vai com uma visão do que ele vê em sites, do que ele vê, enfim. [...] você trazer uma... Alguns pontos disso para aprendizagem, acho que é super válido. (Marília) Qual o tipo de conteúdo que ele (DE) está lidando, do que ele vai apresentar. Essa noção de leitura, de disposição, essa noção sobre os recursos, sobre qual impacto que cada recurso causa, sendo utilizado com tal conteúdo e ter essa noção de aluno
67
mesmo, de docente e aluno, ler a respeito, ter um pouco de conhecimento sobre isso. (Carol)
A questão da experiência, seja por observação em situações anteriores, por
parte do DE, ou mesmo no sentido de propor experiências diversas ao aluno
também foi observada por dois participantes em seus relatos:
Experiência, ter certo conhecimento sobre algumas experiências anteriores para poder fazer esse curso e criar em cima disso, e também ter a cabeça muito aberta. (Peres) Você acaba fazendo experiências, puxa isso deu certo, aquilo não deu. [...] Um grande trabalho de experimentação, por isso, quando a gente fala roteiro, você acaba sempre falando: vou desenvolver imagens. Só que você não desenvolve imagens, você desenvolve experiências, porque você tem interatividade, você tem áudio, você tem recursos imagéticos, e tudo isso, de alguma maneira, está refletido na cabeça do aluno. Você tem que ter ciência de que você está mexendo com a cabeça dele e não com uma imagem, não é com um som. (Jean)
Com esses apontamentos é possível perceber que há ciência sobre os
diversos fatores envolvidos no processo de aprendizagem, incluindo os aspectos
biológicos e culturais, porém, torna-se claro que todos esses conhecimentos que
esses designers educacionais consideram indispensáveis em suas práticas
profissionais resultam de suas observações diárias, como: conhecer o público-alvo,
o propósito, o formato, o tamanho e o tipo de conteúdo do curso. Entretanto, isso
não quer dizer que eles não tenham conhecimentos de natureza teórico-científica,
porém, esses aspectos não foram observados em suas respostas.
4.4.2- Concepções da aprendizagem multimídia
Nessa categoria a análise e interpretação dos dados coletados objetivou
investigar quais os conhecimentos que os designers educacionais selecionados
possuem sobre as concepções da aprendizagem multimídia.
Para verificar, de maneira geral, o que os participantes entendem sobre
aprendizagem online, eles foram questionados sobre quais são as principais
características dessa aprendizagem.
As respostas emergiram, naturalmente, para o cuidado com a elaboração do
material educacional, já que essa é a principal atribuição do designer educacional no
68
contexto institucional estudado. Os apontamentos ainda sugerem que o conteúdo
online deve ser mais leve e acessível, e sintetizar o que precisa ser dito; se utilizar
de mais recursos que facilitem a aprendizagem, já que o ambiente online possui um
dinamismo e uma grande variedade em seus recursos, possibilitando buscas
diversas ao mesmo tempo. O tipo de conteúdo, perfil do público-alvo, formato do
curso e a integração de diferentes mídias foram também considerados como
características relevantes da aprendizagem online, conforme os relatos:
[...] um conteúdo um pouco mais acessível, uma coisa bem... Síntese. [...] Acho que depende, na verdade, do conteúdo, do público-alvo desse conteúdo online. (Carol) [...] nos recursos online você tem uma variedade muito maior e você consegue buscar muito mais coisa ao mesmo tempo... (Peres) Eu acho que tem essa questão de o material que vai ser desenvolvido [...] acho que o ponto principal é esse: na mudança que esse conteúdo vai ser apresentado. (Marília) As melhores formas (de aprender online) são aquelas que integram mais mídias, sejam elas linguagem de vídeo, linguagem de TV, linguagem radiofônica, linguagens visuais, como as HQs, imagens estáticas ou um mix de todos esses tipos de linguagem, que podem potencializar a aprendizagem. (Jean)
No apontamento da Carol observa-se a importância dos fatores culturais ao
dizer que depende do perfil do público-alvo. Os discursos de Peres e Jean mostram-
se de acordo com as concepções da aprendizagem multimídia apresentadas por
Mayer (2009), que defende a utilização de diversas mídias no conteúdo dos cursos
online, por contribuírem para uma aprendizagem mais significativa.
Ao serem questionados sobre qual o objetivo dos recursos e estratégias
educacionais que elaboram, as respostas indicaram, de maneira geral, a
preocupação em facilitar a aprendizagem do aluno, promovendo sua atenção e
motivação. Surgiu também a preocupação com o objetivo, linguagem e público-alvo
do curso no momento da criação desses recursos ou estratégias, conforme apontam
os relatos:
Eu acho que não consigo ver um princípio. Por exemplo, vou fazer um jogo, primeiro eu penso no objetivo... Porque se é só passar uma informação, às vezes é melhor o texto só, sem recurso nenhum... O que exatamente, de que forma o aluno tem que absorver aquilo e aí, pensando nisso, qual conteúdo, que recurso que eu posso trabalhar com aquele conteúdo [...] é mais ou menos pegando no lado de objetivo, linguagem e público-alvo. [...] Se no conteúdo que eu tenho cabe um jogo, mas o
69
objetivo daquele curso, o objetivo daquele conteúdo não vai ser passado com um jogo, não cabe um jogo ali, apesar de o conteúdo ser bacana e encaixar. (Marília) Atingir o aluno e passar o conteúdo de uma maneira que fixe de verdade [...] O maior objetivo que eu tenho quando desenvolvo um recurso ou alguma coisa do gênero é simplesmente fazer com que ele fixe sem essa obrigação (sem se sentir obrigado
a aprender). (Peres) Além de facilitar a aprendizagem do aluno, prender essa atenção dele [...] São para facilitar, para assimilar, para chamar a atenção [...] Quando trabalha com uma metáfora, quando ele usa outro tipo de estratégia para mostrar o mesmo conteúdo [...] o aluno consegue extrapolar e consegue compreender melhor até o que ele já tinha visto. (Carol) Se ele estiver motivado para aprender, se ele quiser, se ele estiver disposto a aprender e aberto, é bem possível que ele, utilizando o recurso que a gente cria, ele pode conseguir a aprendizagem. (Jean)
A preocupação em motivar o aluno a construir sua própria aprendizagem de
maneira consciente não foi observada no discurso de nenhum dos designers
educacionais, o que entra em desacordo com o conceito de design de recursos
multimídia, segundo o qual deve-se tentar ajudar os alunos a construírem seus
próprios modelos de aprendizagem (MAYER, 2009), o que acabaria por contribuir
para a consciência e controle dos processos de aprendizagem dos alunos. Segundo
Pozo (2002), na medida em que há consciência do processo de aprendizagem, esta
se torna mais significativa para o aluno.
Entretanto, foi observado na fala da Marília o princípio da redundância, Filatro
(2008), em que caso um elemento possa ser entendido por si só, não há
necessidade de se utilizar um segundo elemento, o que poupará recursos cognitivos
do aluno.
Ainda complementando a questão, foram colocadas duas situações para que
os DEs avaliassem se haveria alguma diferença para a aprendizagem: a) material
didático apresentado somente de maneira textual, e b) material didático apresentado
de maneira multimídia.
As respostas de dois participantes penderam mais para o estilo de
aprendizagem do aluno como fator determinante nessas situações, mas também
houve duas visões diferentes, que enfatizaram a importância entre forma e conteúdo
para mostrar que ambos são indissociáveis, além do fato de se aprender a todo o
momento, independentemente do meio em que a informação está disponibilizada, e
70
também a vantagem do conteúdo multimídia em relação ao textual, por trabalhar a
interação e os sentidos do aluno, conforme os relatos:
Você tem determinado tipo de pessoa que vai buscar só o texto, para ela aquilo é suficiente [...] Eu acho que texto e imagem, áudio ou vídeo, o que tiver é interessante e ajuda bastante. (Peres)
Depende do aluno, porque tem gente que é mais visual, tem uma memória visual melhor, uma memória auditiva melhor, tem gente que só assimila mesmo quando ela escreve, faz um mapa mental, um esquema. Tem gente que só com leitura para ela é melhor, só texto corrido mesmo. (Carol)
É uma situação muito antiga que vem lá de Platão, o que é mais importante a forma ou o conteúdo? Sendo que, por exemplo, você não consegue dissociar uma coisa da outra. [...] Qual é o objetivo que você quer com aquilo? [...] A gente aprende a todo o momento, não é só com o computador. (Jean)
Tem bastante (diferença) [...] Você pega um conteúdo em texto e pega esse mesmo conteúdo com uma parte em texto e outra em áudio, eu tenho certeza de que ela vai absorver mais daquilo. [...] você vai trabalhar diversos fatores com a pessoa que vai interagir, ela vai ler, ela vai ouvir, enfim, e aí, isso vai fazer que ela absorva mais o conteúdo, com certeza. (Marília)
De maneira geral, eles percebem que a convergência dos elementos textual,
imagético e auditivo é importante para a aprendizagem, até pelo fato de cada aluno
aprender de uma maneira diferente, fazendo com que essa convergência atenda um
maior número de pessoas. Entretanto, não justificaram essa percepção com base
nos princípios da aprendizagem multimídia e nem em outras teorias. Algumas
respostas sugerem que tal conhecimento provém de experiência adquirida com a
própria prática de trabalho, e outras, além de experiência, também estavam
baseadas em leitura de livros e artigos que abordavam o assunto:
[...] Algumas coisas (eu sei) são por experiência própria, por conhecer pessoas que trabalham com isso, elas realmente buscam uma coisa mais interativa, uma coisa mais chamativa. (Peres) É instintivo mesmo. (Carol) [...] Eu pesquisei essa questão. (Marília)
71
Com o propósito de verificar se há clareza sobre os princípios da
aprendizagem multimídia entre os DEs, foram questionados os papéis da imagem,
texto e áudio na aprendizagem, e como eles pensam que esses recursos e
estratégias auxiliam no processo de aprendizagem dos alunos.
No caso das imagens, as respostas indicam que seu papel está vinculado a
auxiliar o aprendizado, pois, além de chamar a atenção do aluno, elas ainda
complementam o conteúdo, possibilitando uma visualização mais ampla,
melhorando a fixação dos conceitos abordados, conforme os trechos selecionados:
[...] aquela velha história de que uma imagem vale mais do que mil palavras, muitas vezes ela é verdade [...] a imagem consegue traduzir muito mais um conteúdo, ela fixa muito melhor no aluno do que textos [...] (Peres) [...] a imagem vai dar um complemento que vai fazer a pessoa, eu acho, entender melhor, eu acho que vai dar uma visualização mais concreta do conteúdo [...] (Marília)
Com relação ao texto, também ficou perceptível que existe consciência sobre
sua importância, pois reconheceram que cabe a ele o papel explicativo dos cursos e,
por isso, precisa ser apresentado de maneira equilibrada com as imagens, o que
contribui para uma compreensão mais completa do conteúdo. Além disso, estão
conscientes também de que texto em excesso nos ambientes online fica cansativo e
sobrecarrega o aluno, conforme os relatos:
O texto é sempre necessário, na verdade é o que te traz a informação [...] (Carol) Eu vejo mais como um papel explicativo [...] ele serve muito mais como uma legenda ou uma explicação daquilo que está acontecendo [...] o texto junto com a imagem eles se completam para poder fazer com que o aluno compreenda o conteúdo por inteiro. (Peres) [...] é fundamental também, mas tem que ser uma coisa meio casada [...] texto demais no online sobrecarrega e fica cansativo [...] Texto é tão importante quanto imagem, só que tem que ter [...] uma sincronia entre os dois para não ficar nem só imagem, mas também não só texto. (Marília)
Já o papel do áudio é visto como um recurso que deve ser usado sempre que
possível, pois ele aproxima o aluno de alguém, como um intermediário entre ele e o
curso, ou até mesmo o professor. Além disso, ele também é importante para chamar
e prender a atenção do aluno, conforme é possível verificar nos relatos:
72
O áudio é uma estratégia muito interessante, porque é como se trouxesse um interlocutor, outra pessoa para aquele momento aluno-computador, então, aproxima ele de alguém, como se fosse um intermediário, mas que chama atenção por causa disso, por ser um recurso diferente. (Carol) Basicamente ele (o áudio) é para chamar a atenção e para diversificar, por exemplo, uma aula narrada, [...] ao mesmo tempo em que ele (aluno) tem os recursos multimidiáticos, ele tem lá o professor, ele se sente mais próximo do professor falando também [...] (Peres)
A convergência da imagem, texto e áudio é uma medida estratégica, pois
mobiliza os sentidos, auxilia no aprofundamento de situações e possibilita uma maior
compreensão do conteúdo. O relato do participante Jean resumiu claramente a
importância da convergência entre esses três elementos:
Eles são compostos, são coisas que se complementam a todo o momento, não dá para escrever um curso só com imagem, não dá para escrever um curso só com texto nem só com falas [...] Você pode se limitar bastante (caso desenhe um curso com apenas um dos elementos), você pode perder momentos importantes em que, por exemplo: você coloca uma imagem que suscita algo e aquilo toca o aluno de alguma maneira. Ele vai se sentir aberto e em seguida, se você coloca um texto que resume tudo que você quer dizer com aquilo, você está quase conseguindo atingir seu objetivo, que é fazer com que ele aprenda, coisa que se você coloca texto corrido durante muito tempo, você não consegue achar um momento em que, bom, quando é que ele vai parar para respirar e tomar água e continuar o curso [...] Quando você faz essa divisão, esse mix, você consegue determinar momentos em que, bom, aqui e agora entra o texto, aqui entra um áudio, você consegue perceber mais.
De maneira geral, as respostas apresentam alguns saberes oriundos da
aprendizagem multimídia e outras teorias, como: a utilização de imagens para
melhorar a fixação do conteúdo, o equilíbrio entre texto, imagem e áudio, bem como
a convergência entre esses elementos.
Em complemento à questão anterior, ainda procurou-se investigar na
entrevista quais os critérios que motivam os designers educacionais a utilizar uma
determinada imagem, áudio, vídeo e animações no material didático. As respostas,
em sua maioria, estavam sempre vinculadas, de alguma maneira, com o tipo de
conteúdo trabalhado.
No caso da imagem, os critérios apontados penderam para o tipo de conteúdo
em questão, no sentido de utilizá-la como reforço do texto. Critérios como coerência,
73
redundância e a cultura do público-alvo em relação à compreensão das imagens
também surgiram nos relatos:
Eu acho que depende do conteúdo [...] na maioria das vezes, são imagens ligadas ao conteúdo, para reforçar [...] (Marília)
[...] o que me motiva mais a buscar uma imagem nesse aspecto é isso: é fazer uma leitura daquela parte do texto, só que visualmente. (Peres)
Inicialmente coerência, se ela vai ajudar em alguma coisa ou se ela vai só fazer mais do mesmo, mostrar alguma coisa, mas quando ela consegue extrapolar um pouquinho do que já foi dito no texto, acho que vale a pena a imagem estar lá. (Carol)
Passa por um filtro muito particular que o designer educacional (tem) [...] quantas imagens, quantas pessoas vão reconhecer essa imagem que eu estou colocando? Será que, por exemplo, minha mãe, meus irmãos vão entender essa imagem? Ah, mas eu posso falar: meus irmãos (entenderão) e minha mãe não. (Jean) No relato de Marília e Peres, fica evidente a redundância como critério para
escolha de imagens, pois elas são utilizadas para reforçar o que já está sendo
informado no conteúdo. Nesse sentido, Filatro (2008) aponta que ao elaborar um
recurso, não há necessidade de utilizar um segundo para repetir ou reforçar o que
pode ser entendido por si só, para não haver sobrecarga cognitiva.
Na fala da Carol foi possível observar o oposto, ao dizer que vale a pena se
utilizar de uma imagem, caso ela extrapole o que o texto traz. Em outras palavras,
percebe-se o critério da coerência em seu relato, pois conforme a mesma autora
aponta, imagens meramente decorativas ou não relevantes devem ser excluídas
para não disputarem a atenção do aluno com o que realmente é importante.
Já a fala do Jean reforça a afirmação de Mayer (2009) de que o desenho do
recurso carrega em si a influência de quem o concebeu, ao dizer que o critério de
escolha de uma imagem passa por um filtro muito particular do DE. Logo, é possível
supor também que é de grande importância atentar às características culturais do
designer educacional.
Os critérios utilizados para utilização do áudio em materiais didáticos
multimídia vão desde a análise do tipo de conteúdo trabalhado até a utilização como
um recurso complementar e como uma possibilidade de diversificação em relação
ao texto, conforme foi relatado:
74
[...] para usar o áudio, tem que ser uma coisa bem diferente, porque senão fica como se realmente a pessoa estivesse realmente falando a mesma coisa que você acabou de ler, então, acho que o áudio, mais que a imagem, tem que ser algo bem complementar. (Carol)
Principalmente em conteúdos densos, que precisam ser contados de maneira mais fluida, você consegue ter um poder muito maior (de associação) do que uma leitura. (Jean)
No caso do áudio também é possível perceber no relato da participante Carol
sua preocupação com a coerência desse elemento com o conteúdo textual, o que
diminuirá a carga cognitiva do aluno favorecendo sua atenção para outros pontos
relevantes do curso (FILATRO, 2008). Já o relato do Jean acorda com as
concepções da aprendizagem multimídia (MAYER, 2009), ao propor uma maneira
alternativa para abordar um conteúdo mais denso, o que aliviará o canal visual ao
desviar parte do material para o canal auditivo.
Os vídeos e animações também são utilizados de acordo com os conteúdos
trabalhados e são percebidos como mais eficazes que o áudio e as imagens,
justamente por contê-los em um único recurso, conforme apontam os relatos:
[...] o vídeo também te dá mais liberdade [...] Você pode colocar um vídeo que não fale exatamente sobre aquele conteúdo, mas que vai fazer... (o aluno extrapolar o assunto abordado). (Marília)
[...] você já não precisa mais do texto para poder passar o conteúdo que precisa, então, talvez o vídeo seja uma coisa bem mais ilustrativa do que uma imagem. (Peres)
[...] o vídeo te transporta mais que o áudio, te transporta acho que para outro lugar, para um outro espaço, que tem cenário, personagem, [...] pessoas. (Carol)
Os apontamentos supracitados acordam, de maneira geral, com a concepção
da aprendizagem multimídia. Mayer (2009) diz que vídeos e animações com locução
são considerados ótimos recursos, por explorarem os dois canais de processamento
dos alunos - visual e auditivo - ao mesclarem em um único recurso áudio e imagens.
Caso esses mesmos recursos sejam acompanhados de legendas, o canal visual do
aluno será sobrecarregado por ter que dar conta do texto e imagem ao mesmo
tempo.
75
Essa sobrecarga informacional também é abordada por Oliveira (2009) em
seus estudos acerca da carga cognitiva. Ele diz que a concepção de recursos para a
aprendizagem não deve utilizar toda a capacidade da memória de trabalho do aluno,
pois isso o encoraja a envolver-se no processo cognitivo, o que é de grande
relevância na construção de seus esquemas mentais, fundamental na
aprendizagem.
4.4.3- Concepções da carga cognitiva
Nessa categoria a análise e interpretação dos dados coletados buscou
investigar o que os designers educacionais selecionados sabem sobre as
concepções da carga cognitiva, bem como o seu impacto na aprendizagem do
aluno.
Com o objetivo de identificar quais os princípios para a concepção de um
design multimídia, os DEs foram questionados se estavam preocupados com a
convergência de tempo e espaço entre elementos textuais, imagéticos e sonoros na
elaboração de uma estratégia ou recurso educacional.
As respostas indicaram certa unanimidade, pois todos se preocupam em
equilibrar os recursos, porém, os motivos para tal são diversos e apontam para como
o aluno irá interagir com o recurso, o que deve ser destacado, a ordem de leitura da
tela, o tipo de conteúdo e da mídia que será utilizada para publicação do curso,
conforme os relatos:
Eu acho que eu tenho (preocupação com a convergência) [...] No começo a tendência é você colocar o que você acha [...] mas aí você começa a entender que... Não tem uma lógica por trás da pessoa [...]. Já é comprovado que a pessoa vai entrar para ver XYZ na ordem N (relativo ao conteúdo que os usuários da internet procuram e como seus olhos navegam pelas telas), então eu já penso nessa questão de como o aluno vai interagir. Não adianta colocar uma informação super importante, por exemplo, numa tela bem pequenininha porque eu acho que ficou bonito aqui se o interessante é deixar ela no centro, sei lá em que parte, porque é ali que o aluno vai ver primeiro. (Marília)
(Me preocupo) Bastante, porque você não pode deixar nunca nenhum deles (elementos) de lado [...] você tem que ter a parte textual e a parte imagética, a parte do áudio você tem que ter elas sempre trabalhando em conjunto [...]. Eu busco a quantidade de texto. Se o destaque está na imagem, então a imagem (fica) um pouco mais
76
centralizada, um pouco maior, depende muito do layout do curso, do layout do próprio conteúdo. [...] É bastante instintivo (o motivo para tal preocupação). (Peres)
Sim, acho que toda estratégia que você cria para mostrar um conteúdo, ela tem que ser muito bem dividida, não dá para colocar um vídeo gigante, um conteúdo que foi minimamente apresentado e o vídeo falando só sobre aquilo, mais do mesmo por uma hora [...] o aluno pode ficar disperso. [...] (Convergência) É sempre de acordo com o conteúdo e quanto tempo é o curso, o tamanho do conteúdo... Depende. [...] Eu penso na forma com que a gente lê (ordem de
leitura da tela). (Carol) É o primordial de tudo, independente da mídia que você vai usar. Se colocar texto seguido de texto e no último, uma imagem, o aluno não vai chegar nem na metade do texto que você quer que ele leia, e a sua imagem provavelmente não vai ser vista. (Jean)
Com base nas concepções da carga cognitiva (OLIVEIRA, 2009), a
importância em equilibrar os recursos educacionais, exposta pelos participantes
Peres, Carol e Jean, é muito importante para não sobrecarregar o aluno expondo-o
a recursos educacionais que contenham apenas um tipo de elemento em seu
desenho, o que exigirá esforços de apenas um de seus canais de processamento.
Entretanto, esse ponto de vista não foi apontado em nenhum depoimento.
Ainda complementando essa questão, os DEs foram questionados se essa
convergência pode causar sobrecarga informacional no aluno.
As respostas também foram similares, reforçando o argumento de que se não
houver um equilíbrio e cautela entre os elementos, pode, sim, haver uma sobrecarga
informacional prejudicando a intencionalidade do recurso e o processo de
aprendizagem do aluno o que acorda com as concepções de Oliveira (2009). Ainda
foi mencionada a importância de entender o que é melhor para o público-alvo
trabalhado, conforme os relatos a seguir:
[...] Tem que ter um equilíbrio, não adianta você querer, ah porque vídeo é legal e jogo é bacana e tem fundamento, então vamos colocar tudo. Não adianta também porque até perde a funcionalidade da coisa, então, eu acho que pode ficar uma overdose péssima, tem que ter uma mescla. (Marília)
Se utilizado sem cautela nenhuma, sem uma estratégia bem elaborada, eles podem atrapalhar, pode ficar muita informação, e você não tem aquele respiro para conseguir assimilar, e tudo mais. Fica muita coisa e acaba atrapalhando mesmo. (Carol)
77
Você não tem que achar que o aluno é obrigado a receber tudo aquilo que você acha que é bom para ele, o pensamento é o contrário, não é o que eu acho que é bom e sim o que eu realmente pesquisei e tive certeza que dentre todos os recursos que eu tenho disponíveis o X e o Y são os mais propícios para aquele determinado público. (Jean) [...] se você não disponibiliza de uma maneira equilibrada cada um deles, ele pode às vezes ser muita coisa na tela e ficar muito poluída... Aí sim, você perde a informação que você precisa passar. (Peres)
É perceptível que os DEs estão cientes de como se deve utilizar recursos
multimídia e que os alunos não conseguem dar conta de muitas informações ao
mesmo tempo. Porém, essas concepções foram construídas, provavelmente, de
maneira empírica, com base em suas práticas diárias, já que nenhuma
argumentação explicitou conhecimentos teóricos a respeito da carga cognitiva ou
outras teorias.
Os designers educacionais ainda foram questionados sobre o que deve ser
observado no desenvolvimento de uma estratégia ou recurso educacional para um
curso online. Em outras palavras, quais os critérios que estão envolvidos nesse
desenvolvimento.
Nas repostas evidenciou-se que há uma preocupação com o equilíbrio entre o
público-alvo, o objetivo e a estrutura do curso, a aplicabilidade e coerência do
recurso educacional, bem como as características culturais do público que utilizará
esse recurso. Os relatos exemplificam:
(Devemos observar no recurso) Se ele é pedagogicamente aplicável e se ele é bom para aquele momento, para aquele conteúdo, se é coerente com o que você quer, com o que você está desenvolvendo... (Carol)
[...] de acordo com o público-alvo você vai adaptar a linguagem, o curso, quais os recursos e tudo mais. (Marília)
Além do público-alvo, me baseio na estrutura do curso [...] você tem sempre que equilibrar o conteúdo e o público-alvo para trabalhar e fazer um recurso de acordo. (Peres) Saber para quem você está fazendo o curso, o que ele precisa aprender, o que ele lê, o que ele assiste, quanto tempo ele já estudou na vida dele, saber a fluência dele com os diferentes tipos de linguagem, seja ela escrita, falada ou mesmo visual. (Jean)
Nas falas dos participantes Carol, Marília e Peres, mais uma vez fica claro
que Mayer (2009) foi muito assertivo ao dizer que o desenho de um recurso carrega
78
em si a influência de quem o concebeu, pois mesmo levando em consideração todo
o perfil do público e curso que será desenvolvido, é a maneira como o designer
educacional percebe esse contexto que determinará o tipo de recurso que será
inserido naquele material educacional.
Já na fala do Jean percebe-se a preocupação com o contexto do usuário.
Logo, é possível supor que, quanto mais o designer entender o universo do seu
público-alvo, maiores serão as chances de atingi-lo, pois assim ele assimilará
algumas dessas características e conseguirá elaborar recursos mais próximos da
realidade desse aluno.
Observando, de maneira geral, todos os relatos dos participantes
selecionados para entrevista, fica perceptível sua diversificação quando analisados
sob o ponto de vista teórico das categorias abordadas. Dessa maneira, faz-se
importante a indicação de alguns saberes teórico-científicos para complementar os
conhecimentos já assimilados pelos designers educacionais. São essas indicações
que as considerações finais desta dissertação pontuam.
79
Capítulo 5: Considerações finais
A aprendizagem humana é um processo complexo que envolve diversos
aspectos de natureza biológica e cultural e que evolui juntamente com a história da
humanidade.
Por meio do percurso teórico desenvolvido nesta pesquisa foi possível
identificar parte desses processos, permitindo compreender como essa nova cultura
da aprendizagem é, por nós, construída a cada dia, independentemente do meio
selecionado: seja em uma sala de aula tradicional, em que o professor tanto se
utiliza de giz e lousa quanto de novas tecnologias educacionais; seja também por
meio de todo o acervo informacional disponível na internet ou até mesmo por meio
de ambientes virtuais de aprendizagem que integram a boa e velha experiência do
professor com as novas tecnologias educacionais que surgem a todo o momento.
A educação a distância online, além de outras possibilidades, integra essa
nova cultura e com ela traz diferentes possibilidades à aprendizagem de seus
alunos. Os recursos educacionais multimídia concebidos, geralmente, por designers
educacionais, a fim de contribuir com a compreensão dos conceitos estudados pelos
alunos, são parte dessas novas possibilidades que, se forem bem planejadas,
trabalham os sentidos dos alunos auxiliando-os em seus processos de seleção,
armazenamento, recuperação e transferência de conhecimentos nas memórias de
trabalho e de longo prazo, ou seja, na assimilação de novos conhecimentos. Logo, é
possível perceber o tamanho das responsabilidades que permeiam as demandas
desse profissional, daí a relevância em investigar quais eram seus conhecimentos
acerca da aprendizagem ao propor esses recursos.
Por meio de entrevistas foi possível perceber que a premissa proposta de que
os conhecimentos dos designers educacionais sobre a aprendizagem são,
principalmente, de natureza empírica, resultantes de suas práticas diárias na
elaboração de roteiros educacionais para recursos e estratégias multimídia em
cursos online foi confirmada, apesar de os relatos concedidos pelos participantes
evidenciarem que, além dos conhecimentos empíricos29, conhecimentos adquiridos
por meio de pesquisas rotineiras e estudos acadêmicos também se fazem presentes
29 O que é “baseado na experiência e na observação, metódicas ou não”. Fonte: Dicionário Eletrônico Houaiss 3.0.
80
no momento de conceber um recurso ou estratégia educacional. O cruzamento das
informações sobre o tipo de curso, o perfil do público-alvo e conteúdo também
aparecem em praticamente todos os relatos como primordiais à concepção do
recurso, o que acorda com a fase de análise - dentro do processo ADDIE do design
educacional - de um curso a distância, conforme aponta Filatro (2008).
A abordagem da entrevista, nesta pesquisa, possibilitou obter algumas
impressões sobre a ação desses designers educacionais que, de maneira geral,
levou à conclusão de que:
� O modo como posicionam cada elemento na tela é pautada na maneira
como lhes faz sentido, levando em consideração a ordem de leitura de
telas web;
� Os recursos elaborados objetivam, principalmente, chamar a atenção do
aluno para o contexto abordado, motivá-lo a continuar no curso e também
para facilitar sua aprendizagem;
� Eles têm consciência de que se não houver equilíbrio nos recursos
utilizados o aluno pode ser sobrecarregado;
� Percebem que as características culturais do aluno impactam em seu
aprendizado;
� Os recursos, muitas vezes, são utilizados de maneira redundante;
� A convergência entre os elementos textuais, imagéticos e auditivos se faz
importante, bem como a ineficiência em se utilizar apenas um deles no
desenho de um curso;
� Os conteúdos multimídia proporcionam maiores vantagens em relação aos
que não o são por diversificarem as opções de aprendizagem aos alunos;
� Há grande preocupação em adequar o conteúdo do curso à linguagem
web ou para a linguagem apropriada com a mídia do curso, pois entendem
a dinâmica e facilidades que esses ambientes oferecem;
� Suas estratégias remontam à própria maneira como aprendem.
Dentre todas essas constatações, o que mais intrigou foi a observação de
que, sob o ponto de vista teórico acerca da aprendizagem, os designers
educacionais se mostraram com opiniões diversificadas e com pouca clareza sobre
os processos envolvidos. Isso pode ser decorrente das diferentes áreas do
81
conhecimento envolvidas em suas formações acadêmicas, que abordam as
questões da aprendizagem sob diversos pontos de vista e profundidades. Também
foi possível perceber que quanto maior o tempo de atuação do profissional nessa
área, melhor é a sua articulação entre os afazeres diários com uma teoria que tenha
algum relacionamento com o assunto.
Em outras palavras, esses apontamentos reforçam a impressão do caráter
empírico existente no fazer desses profissionais, o que não quer dizer que eles
estejam mais ou menos qualificados ou que não sejam assertivos em suas
estratégias, pois também de nada adiantaria possuírem amplos conhecimentos
teóricos se não possuíssem as competências necessárias para articular esses
saberes com as atividades práticas que essa profissão demanda. Porém, era
esperado que mesmo sem um grande aprofundamento houvesse certa clareza
sobre os processos da aprendizagem, pois, com esse conhecimento, a concepção
de suas estratégias poderia ser potencializada e, além disso, proporcionaria um
melhor aproveitamento sobre suas novas experiências que são adquiridas no dia a
dia.
Sendo assim, é interessante apontar que designers educacionais de cursos
online tenham maior consciência sobre os processos envolvidos na aprendizagem
multimídia, pois além de entender como as informações se transformam em
conhecimento, isso contribuiria também para a concepção de recursos que
privilegiem o modo como o sistema cognitivo humano funciona, evitando estratégias
com grande carga cognitiva.
Logo, é importante sugerir que esses profissionais tenham um mínimo
entendimento acerca:
� Do funcionamento da memória, pois é ela que seleciona e recupera as
informações recebidas pelos sentidos na memória temporária e as
transfere e integra aos conhecimentos já armazenados na memória
permanente;
� Da importância do contexto cultural do aluno, pois ao reconhecer em um
recurso algo que o remeta a seu contexto, sua atenção provavelmente se
voltará para o propósito a que se destina tal recurso, possibilitando que
sua aprendizagem seja mais significativa;
82
� Dos pressupostos da aprendizagem multimídia e, entre eles, os da carga
cognitiva, pois apresentam princípios que muito podem contribuir para
uma aprendizagem mais efetiva que não sobrecarregue o sistema
cognitivo do aluno e, também, por orientar o designer educacional no que
deve ser considerado no momento da concepção de seus recursos;
� E, principalmente, da relevância em propor recursos que, ao invés de
apenas facilitarem a aprendizagem, auxiliem o aluno na construção de
uma aprendizagem mais ativa e significativa.
É importante destacar que, além desses conhecimentos, tudo que foi relatado
pelos profissionais entrevistados também é essencial em sua atividade. Além disso,
outros diversos conhecimentos ainda podem ser incorporados a esses tópicos, pois
é sabido que não existem categorias suficientes que deem conta das
particularidades humanas envolvidas no desenvolvimento de um curso. Sempre
haverá diferentes fatores que precisarão ser levados em consideração.
Como não há docência sem discência (FREIRE, 1996) ou, em outras
palavras, não há ensino sem aprendizagem, também “não há ensino sem pesquisa
nem pesquisa sem ensino” (Ibid., p.29), assim, fica evidente a importância da
continuidade desta pesquisa nas mais variadas linhas de pensamento, pois sendo o
ato de ensinar “uma especificidade humana” (Ibid., p. 91), e a aprendizagem
inerente e determinante na própria história da humanidade (POZO, 2002), quanto
maiores os conhecimentos nessa área, tanto maior serão os ganhos para todos os
indivíduos.
Assim, fica a indicação de que outros contextos institucionais e perfis de
designers educacionais merecem ser investigados a fim de se obter maior
entendimento sobre seus conhecimentos teóricos e empíricos acerca da
aprendizagem humana. Também merece investigação o papel que os recursos
multimídia exercem para os próprios alunos que se utilizam de cursos online, para
melhor direcionar seu desenvolvimento.
“[...] é pensando criticamente na prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar
a próxima prática. [...]” (FREIRE, 1996, p. 39).
83
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TEIXEIRA, João de Fernandes. Como ler a filosofia da mente . São Paulo: Paulus,
2008.
87
APÊNDICES
APÊNDICE A - Termo de Consentimento Livre e Esclare cido
Você está convidado a participar de uma pesquisa de mestrado que investiga quais
são os conhecimentos que o designer educacional possui em relação a
aprendizagem em cursos online.
Essa pesquisa será realizada por meio de entrevista que terá duração de
aproximadamente 15 minutos e abordará entre dez e quinze questões. A entrevista
será gravada e seus dados serão mantidos em sigilo, pois cada participante definirá
um nome fictício pelo qual será identificado em todos os momentos da pesquisa.
Você terá total liberdade e direito de não responder as questões apresentadas e de
se retirar do estudo se assim desejar.
Solicitamos sua autorização para o uso de suas declarações para publicação nessa
pesquisa de mestrado e para produção de artigos técnico-científicos futuros sempre
mantendo seus dados em sigilo absoluto.
Obrigada pela participação e colaboração.
Pedrina Rosa Araújo
Mestranda em Tecnologias da Inteligência e Design Digital – PUC/SP
Consentimento
Declaro que fui informado (a) sobre os procedimentos da pesquisa, que recebi de
maneira clara e objetiva todas as explicações pertinentes ao projeto e que todos os
meus dados serão mantidos em sigilo.
Declaro ainda que minha participação é voluntária e sigilosa.
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Nome: ______________________________________________
RG: _______________________
São Paulo, ______/______/_______ Assinatura: __________________________
APÊNDICE B - Roteiro para entrevistas
1- Pensando em assegurar sua privacidade, como você prefere ser chamado
durante a entrevista?
2- Em sua opinião, quais as características da aprendizagem online?
3- Você tem clareza sobre o processo de aprendizagem do aluno? Explique.
4- Qual o objetivo dos recursos e estratégias educacionais que você elabora?
5- O que é importante observar no desenvolvimento uma estratégia ou recurso
educacional para um curso online?
6- Ao desenvolver uma estratégia ou recurso educacional, como você percebe o
papel da imagem, do texto e do áudio no processo de aprendizagem?
7- Como você pensa que os recursos e estratégias educacionais auxiliam o
processo de aprendizagem dos alunos?
8- Em sua opinião há diferença para aprendizagem do aluno quando o material
didático é apresentado: a) de maneira textual ou b) sob a forma de texto com
imagem ou áudio? Explique.
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9- Quais são os critérios que te motiva a utilizar uma determinada imagem
no material didático? E para utilizar áudio? E víde os e animações?
10- Você se preocupa com a convergência (temporal e de espaçamento) entre os
elementos textuais, imagéticos e sonoros na elaboração de uma estratégia ou
recurso educacional? Como é isso?
11- Você acha que a convergência desses elementos pode causar sobrecarga
informacional ao aluno?
12- Para elaborar um roteiro quais são os conhecimentos sobre aprendizagem
que você considera indispensáveis a um designer educacional?
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