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FERNANDO HALINSKI DA SILVA
EDUCAÇÃO SETORIAL PARA FORMAÇÃO DE COMPETÊNCIAS BÁSICAS INDIVIDUAIS: O CASO DA PARCERIA DO
GOVERNO DO ESTADO DE PERNAMBUCO COM O SESI/SENAI PARA ATENDER ÀS DEMANDAS DAS
INDÚSTRIAS NO COMPLEXO DE SUAPE
RECIFE 2008
Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Administração da Faculdade Boa Viagem, área de concentração Gestão de Pessoas e Organizações, como requisito complementar para obtenção do grau de Mestre em Administração. Orientadora: Profª Lúcia Maria Barbosa de Oliveira, Ph.D.
1
Silva, Fernando Halinski da
Educação Setorial para Formação de Competências Básicas Individuais: o caso da parceria do Governo do Estado de Pernambuco com o SESI/SENAI para atender às demandas das indústrias no complexo de Suape / Fernando Halinski da Silva . –Recife: O Autor, 2008.
106 folhas ; quadros ; abreviaturas
Dissertação (mestrado) – Faculdade Boa Viagem. Administração, 2008.
Inclui bibliografia, apêndices e anexos .
1. RECURSOS HUMANOS – Capacitação profissional.
Competência profissional 2. Educação Setorial 3. Andragogia (Educação) I. Título
CDU
658.3
S586e FBV
2
Faculdade Boa Viagem Centro de Pesquisa e Pós-Graduação em Administração – CPPA
Mestrado Em Administração
Educação Setorial para formação de competências básicas individuais: o caso da parceria do Governo do Estado de
Pernambuco com o SESI/SENAI para atender às demandas das indústrias no complexo de Suape
Fernando Halinski da Silva
Dissertação submetida ao corpo docente do Mestrado em Administração do Centro de Pesquisa e Pós-Graduação em Administração (CPPA) da
Faculdade Boa Viagem e aprovada em 29 de julho de 2008.
Banca Examinadora: Lúcia Maria Barbosa de Oliveira, Ph.D., Faculdade Boa Viagem (Orientadora) Mônica Maria Barbosa Gueiros, Doutora, Universidade Federal de Pernambuco (Examinadora Externa) Hélder Pontes Régis, Doutor, Faculdade Boa Viagem (Examinador Interno)
3
Dedico este trabalho a minha esposa, que
durante minha pesquisa assumiu carga
muitas vezes maior que a minha.
Sei que cada momento de carinho, apoio,
silêncio, preocupação, oração e vibração que
recebi foram vividos por ti intensamente,
enquanto eu retribuía apenas estudando.
Obrigado, meu amor.
4
AGRADECIMENTOS
Agradeço aos meus colegas de mestrado que, com suas palavras de incentivo e
críticas bem fundamentadas, me apoiaram nesta realização.
Em especial agradeço a Paulo Lyra, Gerente do SESI, que foi um apoiador de
primeira hora, abrindo as portas de sua Unidade para a execução desta pesquisa.
Agradeço à Mônica Menezes, Professora de Língua Portuguesa do SESI, que
superou todas as expectativas (minhas e de seus alunos).
Agradeço às colegas Mônica Carvalho e Lucy Barbosa, também do SESI, pela
participação ativa nos pré-testes, além das horas de lazer que foram
transformadas em revisões ortográficas e sintáticas.
Meus agradecimentos especiais aos Professores Mônica Gueiros (UFPE), Hélder
Régis e André Leão (FBV), pelas suas significativas contribuições e permanente
postura construtiva.
E agradeço, principalmente, à Professora Lúcia Barbosa, da FBV, pela sua luz e
confiança ao longo do processo de orientação.
5
RESUMO
Esta pesquisa teve como objetivo compreender a percepção dos stakeholders envolvidos no
trabalho de educação setorial ‘reforço de escolaridade’ quanto ao resultado desta ação de
suporte às demandas das indústrias do complexo de Suape-PE. A pesquisa foi conduzida em
quatro etapas: entrevistas com quatro stakeholders demandantes, entrevistas com oito
stakeholders executores, entrevistas com seis stakeholders participantes e grupo focal com
oito stakeholders participantes. A metodologia utilizada foi a análise de conteúdo, conforme
procedimentos de Bardin (2006) . Os resultados do estudo sugerem que, embora não houvesse
expectativa inicial dos demandantes do trabalho quanto ao desenvolvimento de competências
básicas individuais, sua capacidade interna de articulação e o conhecimento técnico dos
executores realinharam o caso em questão e foram percebidos pelo público-alvo como
transformador. Ao atuar na base pessoal das competências profissionais, estima-se que foi
instaurado um processo de crescimento, que tende a refletir-se futuramente na economia do
Estado de Pernambuco.
Palavras-chave: Competência. Educação Setorial. Andragogia.
6
ABSTRACT
This research aimed to understand the perception of stakeholders involved in the job of
sectorial education ‘lifting of schooling’ as the result of this action to support the demands of
the industries of the complex of Suape-PE. The research was conducted in four stages:
interviews with four applicants stakeholders, interviews with eight stakeholders executors,
interviews with six stakeholders participants and focus group with eight stakeholders
participants. The methodology used was the content analysis, as procedures for Bardin (2006).
The results suggest that although there was initial expectation of applicants on the
development of basic individual skills, their internal capacity of articulation and the technical
knowledge of the executors was realigned the case and were perceived by the target as
provocateur of change. By acting on the basis of personal professional skills, it is estimated
that was initiated a process of growth, which tends to reflect itself in the future economy of
the state of Pernambuco.
Keywords: Skill. Sectorial Education. Andragogy.
7
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 - organização dos objetivos de estudo ............................................................ 16
Quadro 2 - árvore de análise de conteúdo .................................................................... 43
Quadro 3 - dimensões e categorias – demandantes ......................................................... 46
Quadro 4 - categorias e subcategorias – demandantes ...................................................... 47
Quadro 5 - categorias e subcategorias – demandantes – primeira dimensão .............................. 48
Quadro 6 - categorias e subcategorias – demandantes – segunda dimensão .............................. 50
Quadro 7 - categorias e subcategorias – demandantes – terceira dimensão ............................... 52
Quadro 8 - dimensões e categorias – executores ............................................................ 54
Quadro 9 - categorias e subcategorias – executores – terceira dimensão .................................. 55
Quadro 10 - dimensões e categorias – trabalhadores ....................................................... 60
Quadro 11 - categorias e subcategorias - trabalhadores – primeira dimensão ............................ 60
Quadro 12 - categorias e subcategorias – trabalhadores – segunda dimensão ............................ 60
Quadro 13 - categorias e subcategorias – trabalhadores – terceira dimensão ............................. 68
Quadro 14 – quadro-resumo da análise – expectativas de competências a desenvolver ................. 71
Quadro 15 – quadro-resumo da análise – planejamento do trabalho ...................................... 72
Quadro 16 – quadro-resumo da análise – visão de futuro .................................................. 73
8
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
CHA – Conhecimento, Habilidade, Atitude
CIET – Centro Integrado de Emprego, Trabalho e Renda
DN – Departamento Nacional
FIEPE – Federação das Indústrias do Estado de Pernambuco
NBR – Normas Brasileiras
ONG – Organização Não-Governamental
PAC – Programa de Aceleração do Crescimento
PAE – Programa de Aceleração da Escolaridade
pg – Página
PNQP – Programa Nacional de Qualidade e Produtividade
PROMINP – Programa de Mobilização da Indústria Nacional de Petróleo e Gás
Natural
RH – Recursos Humanos
SEBRAE – Serviço Brasileiro de Apoio à Micro e Pequena Empresa
SENAC – Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial
SENAI – Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial
SESI – Serviço Social da Indústria
T&D – Treinamento e Desenvolvimento
UNISESI – Universidade Corporativa do SESI
9
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................. 10
1.1 Contextualização ....................................................................................................... 10
1.2 Objetivos geral e específicos ..................................................................................... 15
1.3 Justificativas teóricas ................................................................................................. 17
1.4 Justificativas práticas ................................................................................................. 17
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ................................................................................ 19
2.1 Aprendizagem e educação nas organizações ............................................................. 19
2.1.1 Andragogia: a educação de adultos ............................................................................. 21
2.1.2 Educação corporativa ................................................................................................. 23
2.1.3 Educação setorial: educação corporativa com responsabilidade social ..................... 25
2.2 A gestão mediada pelas competências ........................................................................ 30
2.2.1 A formação de competências básicas e individuais ................................................... 33
3 METODOLOGIA DE PESQUISA ................................................................................ 36
3.1 O tipo de pesquisa ...................................................................................................... 36
3.2 A coleta de dados ....................................................................................................... 38
3.2.1 Entrevistas semi-estruturadas com stakeholders ........................................................ 38
3.2.2 Grupo focal com alunos-trabalhadores ....................................................................... 41
3.3 A análise dos dados .................................................................................................... 42
3.3.1 A percepção do entrevistado: mediadora na análise dos resultados da pesquisa ....... 44
3.4 Limites e limitação ..................................................................................................... 45
4 ANÁLISE DE RESULTADOS ..................................................................................... 47
4.1 Análise do primeiro objetivo específico ...................................................................... 47
4.2 Análise do segundo objetivo específico ....................................................................... 55
4.3 Análise do terceiro objetivo específico ........................................................................ 60
5 CONCLUSÕES E SUGESTÕES ................................................................................... 74
5.1 Conclusões ................................................................................................................... 74
5.3 Sugestões ...................................................................................................................... 79
REFERÊNCIAS ................................................................................................................. 82
APÊNDICES ..................................................................................................................... 88
ANEXOS ............................................................................................................................ 93
10
1 INTRODUÇÃO
1.1 Contextualização
A evolução das ciências sociais aplicadas permite às organizações um aumento geométrico de
seu potencial de geração e concentração de riqueza; contudo, graças ao principal fundamento
deste mesmo grupo de ciências – as pessoas em um contexto social, aumenta na mesma
proporção o impacto de suas interferências no ambiente externo. A atenção aos interesses
econômicos dos stakeholders continua sendo um objetivo primordial das empresas;
entretanto, Ulrich e Brockbanck (2005) sustentam que uma visão mais ampla antecipa a
tendência de explicar a sustentabilidade das organizações através da gestão de pessoas.
O reflexo externo da operação das empresas, bem como sua responsabilidade com tais
conseqüências, é citado por Fischer (2002) como tema polêmico desde o início da revolução
industrial. A interatividade do atual modelo competitivo de mercado, por sua vez, torna
irreversível o aprofundamento da discussão: encontra-se já incorporada às práticas gerenciais
a função social da administração. Segundo a autora, o que regula suas ações tem mais a ver
com a compreensão do que seja efetivamente responsabilidade social, e cada vez menos tem
relação com o simples aceite da importância da relação empresa-ambiente social.
Sobre sustentabilidade há uma quantidade razoável de estudos e crescente interesse dos
executivos; em contrapartida, as inúmeras visões possíveis permitem diversos entendimentos
e confundem a aplicação prática das ações que visam à sustentação econômica, social e
ambiental das organizações. Karkotli (2006) remonta que o início mais tradicional de grande
parte das ‘fundações’, por exemplo, está ligado aos valores e crenças da empresa;
normalmente, nestes casos, as ações sociais estão de tal forma desvinculadas da missão e das
estratégias da empresa que necessitam de um gerenciamento paralelo.
Para Porter e Kramer (2006) “a única sustentabilidade real é a duradoura”. Demonstrando
outro tipo de visão sobre o assunto, o autor considera que deve existir, nas empresas com
preocupações e atividades de enfoque social, uma integração de tais anseios com a filosofia
organizacional. Vincular a estratégia às ações equilibra a relação entre a sobrevivência da
empresa (lucro através da venda de seus produtos) e sua sustentabilidade futura (estratégias
11
que contemplem o mercado, stakeholders e mudanças no triple botton line), sinalizando uma
gestão que se complementa através da responsabilidade social, evitando que o contrário
aconteça e, por conseqüência, seja maléfico à empresa, à economia e à sociedade.
Em contraponto a essa linha, Friedman (1989) presume que a geração de emprego e renda é a
contrapartida justa do capitalismo à sociedade. O autor argumenta que a empresa, ao adotar
práticas diferentes de sua missão, pode comunicar ao mercado falta de foco estratégico e
fragilidade da competência empresarial. Retornando a Porter e Kramer (2006), estes lembram
que enquanto nas economias de primeiro mundo encontra-se maior eficiência do Estado do
bem-estar (pleno emprego, economia forte, altos índices de inclusão social) contrapõem-se a
esta realidade as economias em desenvolvimento.
Já para Ashley (2001) as organizações decididas a assumir suas responsabilidades sociais
defrontam-se, principalmente, com o problema de como determinar e avaliar o seu
desempenho social, seja para efeitos de diagnóstico, seja para acompanhamento das atividades
ou para avaliação de resultados. De tal forma, a autora considera como visão limitada a
restrição da ‘responsabilidade social’ a uma ação de uma empresa na comunidade do seu
entorno ou em um grupo carente de atenção do governo. Por outro lado, Karkotli (2006)
lembra que a educação é uma das preferências das ações privadas na esfera social. Ele
considera que a importância social da educação do entorno pode ser razoável, considerando a
proporcionalidade do impacto nesta comunidade (desenvolvimento, emprego e renda),
mediada pela sua importância estratégica na organização.
A educação corporativa reforça esta função pública assumida pela empresa com fins de
complementar o aprendizado, de acordo com os interesses organizacionais. Eboli (2004)
considera que, muito mais do que um mero complemento de escolaridade, a educação
assumida pela empresa permite diagnosticar, tratar e direcionar a gestão do conhecimento,
que servirá de matéria-prima nos processos internos da empresa.
A educação corporativa começou a ganhar espaço a partir da década de 80, com a
internacionalização da economia e, por conseqüência, a ampliação da competitividade das
empresas. Aumentou a necessidade das empresas contarem com colaboradores que reúnam
competências mais desenvolvidas do que as do cenário daquele momento. A “sociedade do
12
conhecimento” passou a exigir, segundo Meister (1999), competências pessoais que
atendessem às necessidades da empresa quanto ao aprendizado, solução de problemas,
trabalho em equipe, liderança, domínio da tecnologia e visão de negócios em um mercado
globalizado.
No caso do desenvolvimento de competências dos colaboradores nas empresas brasileiras,
Marcondes (2007) percebe uma migração de ações da tradicional área de ‘Treinamento e
Desenvolvimento’ para a elaboração interna e aplicada de aprendizado que explore questões e
demandas reais da empresa, com menor ênfase para objetivos específicos. Segundo o autor,
tal aprendizagem continuada passou a ser considerada assunto estratégico na empresa, à
medida em se considera como vantagem competitiva o desenvolvimento de competências.
Um dos motivos desta migração da função de recursos humanos é tratado por Marcondes
(2007) como de origem estrutural: a relação de poder hierárquico à qual a área de
‘treinamento e desenvolvimento’ está sujeita (como apêndice do departamento de recursos
humanos) reduz sua visão estratégica e sistêmica.
Tal limitação é combatida por Ulrich e Brockbanck (2005), que sugerem uma nova
proposição de valor para o departamento de recursos humanos, mais alinhado às estratégias da
empresa e com uma postura proativa quanto ao desenvolvimento de pessoas. Nesta
perspectiva, a área de ‘treinamento e desenvolvimento’ deveria ser menos reativa
(contribuindo apenas quando convocada) e mais sistêmica, entendendo as potencialidades da
empresa e adaptando sua oferta de trabalho à concretização da visão, atuando local e
operacionalmente para a execução dos planos gerais e estratégicos. Neste sentido, a mudança
de ótica quanto ao departamento de recursos humanos, e treinamento e desenvolvimento em
especial, deixaria de encará-los como custo para vislumbrar fontes de negócios e vantagens
competitivas. Entretanto, segundo Marcondes (2007), apesar de aparentemente a discussão
tratar de treinamento e desenvolvimento, é a educação corporativa que avança neste terreno,
por ter um posicionamento mais definido e sem um ranço histórico que deturpe sua proposta.
Além da educação corporativa tradicional, que trata de competências de níveis tático e
estratégico, Bonamino (2005) alerta que os ensinos fundamental e médio merecem tratamento
específico. Segundo a autora, as formas mais flexíveis do modelo de trabalho pós-taylorista
tornam a empresa cada vez mais dependente da participação do trabalhador e do
13
desenvolvimento de habilidades cognitivas e comunicativas, em grande medida propiciado
por uma educação básica completa.
Perrenoud (1999) sustenta que o desenvolvimento de competências individuais do homem
moderno passa por suas ações, vontade e por alguns conhecimentos profundos, tais como:
analisar um texto e constituir as intenções do autor, argumentar com a finalidade de convencer
alguém cético ou um oponente, construir uma hipótese e verificá-la, detectar uma falha no
raciocínio de um interlocutor, negociar e conduzir um projeto coletivo. Por mais óbvias que
pareçam tais competências, elas são a base dos sofisticados modelos de aprendizado
estratégico e formação de redes de competências organizacionais. Ao decorrer da atual
pesquisa a citada lista de competências individuais básicas será considerada como a
norteadora da profundidade deste estudo.
No caso do Brasil, vincular educação e trabalho significa assumir papel ativo em um histórico
social repleto de sinais desencontrados. Romanelli (1982) descreve que, desde os primeiros
tempos da República, existe a distinção entre raciocínio e mão-de-obra. Com as restrições às
importações durante o período da grande guerra, na década de 40, o sistema de ensino vigente
demonstrou ser incapaz de prover a formação profissional necessária ao novo modelo
produtivo; montou-se, então, um sistema de ensino paralelo, organizado em convênio com a
indústria e o comércio, e constituído pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial
(SENAI) e pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC). Surgiram também,
naquela época, as primeiras experiências de preparação de mão-de-obra no próprio ambiente
fabril.
Bonamino (2005) conta que, no início dos anos 60, houve uma grande onda de falências de
pequenas empresas, derivadas do referido momento sócio-econômico-político. O fechamento
deste tradicional canal de ascensão social da classe média elevou a busca pelo ensino superior,
movimento que foi contido com a reforma do ensino superior em 1968. Com isto, a educação
profissional e a educação técnica mantiveram-se restritas a poucas iniciativas, reforçando as
escolas técnicas federais e o sistema SENAI-SENAC.
Segundo Bonamino (2005), o desemprego retroalimenta-se da ignorância. A autora apresenta
a consideração do Banco Mundial que, como não há recursos nem postos de trabalho para
14
todos, a obrigação do governo com a educação restringe-se à conclusão do ensino
fundamental, no qual a rentabilidade do investimento na redução da pobreza é mais alta. Tais
medidas procuram evitar o desperdício de recursos escassos nas modalidades educacionais
mais caras, como a formação profissional e o ensino superior, que devem ser deixadas nas
mãos da iniciativa individual do consumidor que possa pagar por elas e do fornecedor privado
interessado nesse tipo de investimento (BANCO MUNDIAL, 1995).
Eboli (2004) entende que, atentas a tal descompasso, as organizações que descobriram
vantagem competitiva através de suas pessoas optaram por realizar um trabalho social
vinculado com suas estratégias de educação corporativa. Mesmo quando qualificam
profissionais que brevemente farão parte das estatísticas de rotatividade em diversas
empresas, determinados setores da economia acabam sendo beneficiados ao envolverem seus
stakeholders em ações similares, com o mesmo foco sistêmico. Esta variação da educação
corporativa recebeu de tal autora o nome de ‘educação setorial’, a qual permite resgatar
competências básicas que foram mal exploradas quando do momento da escola formal, além
de completar as habilidades necessárias para o perfil do profissional de determinados
segmentos de mercado. Por tratar-se de assunto razoavelmente novo, a própria Eboli (2004)
comenta que não existe extensa literatura a respeito desta nova modalidade de educação
corporativa.
É neste contexto que se pretende estudar um trabalho específico de educação setorial em
competências básicas, envolvendo planejamento, recrutamento e qualificação de cerca de
5.400 pessoas, possibilitando-as receber treinamento técnico e concorrer a emprego na região
do distrito industrial de Suape, região situada no litoral sul de Pernambuco. De acordo com o
‘Fórum Regional 2007’ do Programa de Mobilização da Indústria Nacional de Petróleo e Gás
Natural (PROMINP), os potenciais investimentos de organizações expressivas como
Petrobrás, Estaleiro Atlântico Sul, Tintas Iquine e Raymundo da Fonte (Brilux), bem como
das Construtoras Queiroz Galvão, Norberto Odebrecht e Andrade Gutierrez (consórcio para
duplicação da BR101-Sul), além de incrementar a economia do Estado, servirão de canteiro
de obras para o desenvolvimento profissional de uma grande massa de trabalhadores pouco
qualificados e atualmente subempregados.
15
O arranjo produtivo metal-mecânico que está sendo formado em Suape, fortalecido pela
futura instalação de uma usina siderúrgica, assim como outras redes de negócio que se
constituirão ao redor das principais indústrias da região, também precisarão de mão-de-obra
qualificada. Tal exercício de montar uma verdadeira ‘universidade setorial’ (nomeada pela
expressão ‘reforço de escolaridade’) foi terceirizado pelo governo do Estado ao Serviço
Social da Indústria (SESI) e SENAI, entidades com experiência em atividades correlatas de
educação básica e profissional.
Será a partir desta situação específica em Suape que a atual pesquisa irá buscar fundamentos
nas teorias de educação setorial e desenvolvimento de competências individuais básicas.
Dutra (2008) considera que além das competências individuais outras variáveis intervenientes
podem ter influência no atendimento às demandas do mercado, tais como a experiência
anterior, a formação e as habilidades pessoais. Contudo, será feito o aprofundamento de
apenas uma destas variáveis, considerando a relevância da questão que resume o problema de
pesquisa: qual a percepção dos stakeholders diretamente envolvidos no trabalho de educação
setorial ‘reforço de escolaridade’ quanto ao resultado desta ação de suporte às demandas das
indústrias do complexo de Suape?
Na próxima seção tal problema de pesquisa será tratado como o objetivo geral deste trabalho,
sendo este subdividido em três objetivos específicos.
1.2 Objetivos Geral e Específicos
Objetivo Geral:
Compreender a percepção dos stakeholders diretamente envolvidos no trabalho de educação
setorial ‘reforço de escolaridade’ quanto ao resultado desta ação de suporte às demandas das
indústrias do complexo de Suape.
Objetivos Específicos:
Compreender a percepção dos demandantes do trabalho de educação setorial ‘reforço de
escolaridade’ quanto à necessidade de desenvolvimento de competências básicas individuais
dos trabalhadores para as indústrias do complexo de Suape.
16
Compreender a percepção dos executores do trabalho de educação setorial ‘reforço de
escolaridade’ quanto à necessidade de desenvolvimento de competências básicas individuais
dos trabalhadores para as indústrias do complexo de Suape.
Compreender a percepção dos alunos participantes do trabalho de educação setorial ‘reforço
de escolaridade’ quanto ao desenvolvimento de suas competências básicas individuais
(conforme teoria de Perrenoud).
O seguinte Quadro 1 demonstra a organização dos objetivos do estudo, salientando algumas
variáveis que, apesar de sua influência, não serão consideradas:
Quadro 1: organização dos objetivos de estudo (autoria própria).
Nas duas próximas seções serão apresentadas justificativas que demonstrarão a relevância
desta pesquisa, seja como referência e estímulo para novos trabalhos, bem como para
aumentar o conhecimento a respeito das teorias tratadas na fundamentação.
demandas das indústrias Suape
SESI
SENAI
Reforço de Escolaridade:
Percepção executores Percepção
demandantes
Percepção alunos
ALUNOS
Variáveis intervenientes (experiência, habilidades, ambiência, formação, etc. )
17
1.3 Justificativas Teóricas
O termo ‘educação setorial’ foi publicado pela primeira vez em 2002, através de pesquisas da
professora Marisa Eboli, que comenta serem poucos os estudos teóricos a respeito. Esta
pesquisa se propõe a contribuir no aumento do entendimento da teoria, suscitando futuras
pesquisas e aprofundamento teórico sobre a educação corporativa setorial.
Eboli (2004) salienta, ao longo das citações no referencial teórico, que “pedagogia é teoria;
educação é prática”. O vínculo do tema educação setorial com a experimentação prática
pressupõe que se aproveitem oportunidades singulares - como o caso recente de aporte de
investimentos industriais na região de Suape - para que possam ser evidenciadas similaridades
e diferenças teóricas com o conhecimento corrente de educação corporativa.
Outra razão que torna relevante este trabalho para a academia é o fato de ainda ser pequena a
quantidade de trabalhos científicos em administração que tenham como foco o complexo de
Suape. Nome indígena que representa a região litorânea da mata sul de Pernambuco, Suape é
a principal rota de investimentos privados no nordeste, neste início de século. Com potencial
para tornar-se o principal pólo industrial do Estado, Suape necessita, também em grande
medida, de aportes de conhecimento científico sobre seus domínios, com vistas a garantir
vantagem competitiva.
1.4 Justificativas Práticas
A região de Suape, através de sua infra-estrutura portuária e do distrito industrial, está
atraindo relevantes investimentos privados. Para concretizar a instalação de diversas
indústrias está sendo dada atenção a um participante na cadeia de desenvolvimento da região
que tem importância fundamental: o futuro trabalhador de tais empresas.
Considerando que o movimento de formação de mão-de-obra que se instala em Suape tenderá
a fortalecer economicamente a mata sul do Estado de Pernambuco, é possível também antever
que tal aumento de capacidade profissional representará um significativo desenvolvimento
social local. De tal forma, a atual pesquisa propõe-se a contribuir na seara de gestão de
18
pessoas, de evidente carência atual, mas de potencial relevância estratégica para o Estado de
Pernambuco.
Nesta pesquisa serão mapeadas e contrapostas expectativas e percepções de resultados quanto
ao trabalho desenvolvido pela parceria do governo estadual com a dupla SESI-SENAI,
chamado de ‘reforço de escolaridade’. Esta dissertação pretende contribuir com reflexões e
sugestões que permitam representar um potencial redirecionamento das práticas usuais de
educação setorial, bem como propor novas percepções que possam estimular soluções às
demandas empresariais da região de Suape.
Na próxima seção será apresentada a fundamentação teórica que embasa esta pesquisa.
19
2 FUNDAMENTAÇÃO TÉORICA
A busca em atingir os objetivos desta pesquisa exige, inicialmente, que sejam aprofundados
os temas ‘aprendizagem’ e ‘educação corporativa’. O entendimento teórico destes dois
assuntos servirá como fundamento para a compreensão dos conceitos de ‘competência’ sob o
enfoque organizacional.
O desenvolvimento do estudo sobre aprendizagem e educação na empresa conduz,
naturalmente, à prática da andragogia, que significa ‘educação para adultos’: este é o tema da
primeira seção deste item.
Em seguida será apresentada a ‘educação corporativa setorial’, termo relativamente novo que
retrata o trabalho de aprendizagem e educação corporativa ofertado em comum por um grupo
de empresas que visam, além do ganho de escala, a homogeneização do tratamento social
dado à determinada classe de trabalhadores.
As últimas três seções abordarão o tema ‘competências’, tratando primeiro de sua influência
junto à ‘gestão’, para logo após considerar a ‘competência na educação corporativa’ e, por
fim, chegar ao ‘processo de desenvolvimento individual’.
2.1 Aprendizagem e Educação nas Organizações
Para Fleury e Fleury (2006) a aprendizagem é um processo de mudança, oriundo de
experiência anterior, que não necessariamente pode ser observado pela alteração do
comportamento. De tal forma, apesar de respeitar a linha behaviorista, onde a aprendizagem
organizacional é comprovada a partir de novos comportamentos, os autores citados reforçam
que a solução de problemas é uma manifestação cognitiva da aprendizagem. Esta é uma das
formas encontradas para classificar aprendizagem: comportamental ou cognitiva. Elkjaer
(2001) identifica aprendizagem como cognição individual que encara as organizações como
sistemas; por outro lado, a autora sugere uma perspectiva social da aprendizagem, envolvendo
tanto a qualidade de ser membro de uma equipe ou comunidade, quanto o aperfeiçoamento
das habilidades de seus membros. Esta perspectiva interacionista das organizações amplia
ainda mais o espectro onde possa se situar o aprendizado.
20
A visão da autora serve de exemplo para demonstrar como aparentemente tais tipos de
aprendizagem podem ser eminentemente individuais, contudo explicam também a
aprendizagem organizacional. Considerando que uma empresa funciona como um organismo
baseado em pessoas, Senge (2006) explica que as empresas que aprendem estabelecem redes
de aprendizagens individuais que se expandem e formam redes de aprendizado coletivo. Para
tanto, em termos de aprendizagem organizacional, é fundamental partir do individual para
obter respostas do grupo. Para este autor, as organizações devem desenvolver cinco
disciplinas fundamentais para garantir o processo de aprendizagem: domínio pessoal
(autodimensionamento em busca de objetivos pessoais), modelos mentais (imagens
profundas que representam uma visão de mundo), pensamento sistêmico (visão intuitiva do
mundo subjacente), visões compartilhadas (reflexo dos valores num futuro comum) e
aprendizagem em equipe (diálogo que permita pensar em conjunto).
Fleury e Fleury (2006), por sua vez, comentam a proposta de Garvin (1993) quanto aos cinco
caminhos de ocorrência da aprendizagem organizacional: resolução sistemática de
problemas (ferramentas da qualidade), experimentação (focar novos horizontes, e não
dificuldades), experiências passadas (aprender com sucessos e fracassos), circulação de
conhecimento (compartilhamento de novas idéias) e experiências realizadas por outros
(benchmarking).
No caso da capacitação tecnológica para países de industrialização tardia, Brasil incluído,
Fleury e Fleury (2006) apresentam alguns mecanismos que sustentam o processo de
aprendizagem e capacitação: aprender ao operar (passivamente, se espera mais consciência
com a prática), aprender ao mudar (experimentação e melhoria contínua), aprender pela
análise do desempenho (indicadores criam memória de experiências passadas), aprender ao
treinar (compartilhamento de novas idéias), aprender por contratação (benchmarking),
aprender por busca (transferência de tecnologia).
Como pode ser visto acima, há várias maneiras de dizer coisas parecidas, adaptadas a
situações específicas. Esta pesquisa optou por posicionar-se, perante tais teorias, pelo viés
cognitivo, preocupando-se em compreender se, no caso em questão, as pessoas envolvidas
estão efetivamente aprendendo ao confrontarem suas experiências com novos conhecimentos,
21
e se estão sendo estimuladas a mudarem do patamar atual para uma nova condição pessoal e
profissional.
Este interesse pelo duplo resultado da ação de desenvolvimento de competências é
comungado por Kirkpatrick (2006), que em seu artigo deixa uma incômoda dúvida ao leitor: a
seu ver, o trabalho de qualificação profissional tem dois objetivos: melhorar o desempenho
tanto do comportamento quanto dos resultados. Pela sua experiência, muitas poucas
organizações conseguem integrar os dois conceitos.
A seguir o tema educação nas organizações será tratado de forma prática, considerando que as
organizações são ocupadas por adultos e para estes existe um tratamento pedagógico
específico. Além disso, a educação a distância e a educação corporativa são assuntos díspares,
mas que se complementam dentro do contexto de aprendizagem e educação nas organizações.
2.1.1 Andragogia: a educação de adultos
Quando Perrenoud (2001) cita a pedagogia da aprendizagem, está se referindo a uma vertente
da educação que prioriza a formação e o desenvolvimento de competências individuais tanto
para o aluno quanto para o professor.
Segundo Eboli (2004), pedagogia é a reflexão sistemática sobre modelos, métodos e técnicas
de ensino – é a ciência da educação; andragogia, por sua vez, é a ciência de educar adultos,
diferenciando-se da primeira, em essência, somente na estratégia metodológica. Ou seja,
enquanto pedagogia e andragogia são teorias: pensamento e ideal a ser vivido, educação é
prática: experiência e realidade vivida.
Educação, ainda segundo Eboli (2004), é o processo de desenvolvimento e realização do
potencial intelectual, físico, espiritual, estético e afetivo existente em cada ser humano. A
autora complementa que educação é o processo de transmissão da herança cultural às novas
gerações, de modo intencional e sistemático, exercendo influência na formação e
desenvolvimento a fim de conservar e transmitir a existência coletiva.
22
Para Luckesi (1999) existem três entendimentos filosóficos sobre a educação na sociedade:
educação redentora: busca integrar os elementos à margem da sociedade que apresentem
baixo grau de alinhamento cultural; educação reprodutora: reforça os condicionantes
econômicos, sociais e políticos; educação transformadora: entende os condicionantes e age
estrategicamente para transformar a sociedade, mediante um projeto social.
No âmbito da educação profissional, durante a década de 1980, questionava-se a pertinência
do modelo taylorista e tecnicista vigente em face das transformações científico-tecnológicas,
políticas, econômicas, sociais e culturais em curso no Brasil e em nível mundial
(BONAMINO e PINHEIRO, 1998).
Para Bonamino (2005), embora persistam discussões quanto ao grau e à intensidade de
difusão de inovações tecnológicas e organizacionais no Brasil, emerge um novo modelo
produtivo, onde formas mais flexíveis de trabalho substituem a organização taylorista-
fordista. As empresas contemporâneas cada vez mais estão dependentes de trabalhadores com
competências e estruturas cognitivas que garantam a capacidade de aprender, de criar, de
resolver problemas e de se relacionar.
Fleury e Fleury (2006), ao fazerem um contraponto com o modelo taylorista-fordista de
gestão do conhecimento, lembram que hoje as empresas precisam implementar uma certa
reversão ao modelo clássico: o que era fragmentado e isolado precisa ser integrado, não
apenas em nível de indivíduos, como também organizacional. Para os autores, o que antes
tinha um caráter estático hoje precisa ter uma natureza dinâmica: não basta integrar o
conhecimento, e sim estabelecer um sistema contínuo de aprendizagem. A educação na
empresa precisa encontrar nova postura, que é a de aprender a aprender, para mudar sempre.
No caso de uma aprendizagem que envolva tanto conhecimento técnico quanto conduta
pessoal, e se tais conceitos forem novos e “revolucionários” (porque permitem a mudança de
postura e de relacionamento profissional, social e econômico), vale a indicação de Berger e
Luckmann (2004) quanto à importância futura de tal aprendizado. Na medida em que o adulto
consegue unir sua experiência com novos conhecimentos, aplicando tal aprendizado na sua
rotina e obtendo novos resultados/aprendizados, este conjunto de novos significados de
23
realidade terá reflexos, quando da formação da nova geração: seus filhos partirão em suas
jornadas carregando esta formação institucional, para agregarem aprendizados futuros.
Como o aprendizado organizacional demanda técnicas que permitem a ocorrência de tal
processo, na próxima seção serão tratados conceitos e princípios da ‘educação corporativa’, os
quais pretendem demonstrar ser possível a tomada de medidas objetivas que estimulem a
postura de aprendizagem organizacional dentro de um sistema contínuo de aperfeiçoamento
dirigido aos interesses das organizações.
2.1.2 Educação corporativa
Educação corporativa começou a ganhar espaço a partir da década de 80, com a
internacionalização da economia e, por conseqüência, a ampliação da competitividade das
empresas. Aumentou a necessidade das empresas contarem com colaboradores com
competências mais desenvolvidas do que as do cenário daquele momento. A “sociedade do
conhecimento” passou a exigir, segundo Meister (1999), competências pessoais que
atendessem às necessidades da empresa quanto ao aprendizado, solução de problemas,
trabalho em equipe, liderança, domínio da tecnologia, comunicação e colaboração,
autogerenciamento da carreira e visão de negócios em um mercado globalizado.
A partir do comprometimento da empresa com a educação e o desenvolvimento dos
funcionários, Meister (1999) apresenta cinco forças-tendências que sustentam o aparecimento
do fenômeno das universidades corporativas: organizações flexíveis - com capacidade de dar
respostas rápidas ao ambiente empresarial; era do conhecimento - nova base para o ciclo de
formação de riqueza (individual, empresarial e nacional); rápida obsolescência do
conhecimento - urgência na renovação das informações que constituam vantagem
competitiva; empregabilidade – carreira através de várias organizações; educação para a
estratégia global - mercados constituídos de pessoas com visão global.
Para Eboli (2002) a universidade corporativa é um sistema de desenvolvimento de pessoas
pautado pela gestão por competências. As universidades corporativas estão para o conceito de
competência assim como os tradicionais centros de treinamento e desenvolvimento estiveram
24
para o conceito de cargo. A mesma autora comenta que, apesar de conceitualmente terem
sutis diferenças, comumente é aceito equivaler os termos educação corporativa e universidade
corporativa. O primeiro, contudo, serve também para os centros de treinamento e
desenvolvimento que têm um enfoque continuado, mais voltado para o desenvolvimento das
competências, enquanto o segundo trata de um formato rompedor que historicamente
estabeleceu a diferença entre a educação por cargo e por competência. Gomes e Starec (2006)
complementam esta definição, ao afirmarem que a educação corporativa tem o objetivo
promover a cultura e os valores da empresa. Os autores entendem que, não tendo este foco, a
educação corporativa tende a reduzir o prazo de validade do conhecimento, pois este tende a
tornar-se desatualizado se desprovido de valores mais perenes, quando voltado à aplicação em
uma empresa específica.
Para Eboli (2002) um projeto bem sucedido de universidade corporativa corresponde à
implantação de aspectos como: a definição dos conhecimentos críticos para o sucesso da
empresa; o diagnóstico das competências críticas (individuais e organizacionais); o foco no
aprendizado organizacional, inovação e mudança constante; a educação inclusiva,
contemplando todos os elementos da cadeia de valor; a orientação para as necessidades dos
negócios e a venda de serviços, tornando-se gerador de receita para a organização. Um
exemplo deste resultado é apresentado por Mundim (2002). A autora relata que um programa
de educação corporativa pode englobar, além das técnicas de gestão do conhecimento e novas
formas de capacitação, um mapeamento de competências necessárias para a eficiente
execução do planejamento e desenvolvimento de produtos, identificando os conhecimentos
que serão englobados em um currículo voltado para desempenhar tal função na organização.
Outro exemplo de aplicação ampliada da educação corporativa é apresentado por Harrison,
Leitch e Chia (2007), que tratam da quebra de paradigmas durante o trabalho de
desenvolvimento de competências através da universidade corporativa. Os autores sugerem
que programas de desenvolvimentos de executivos devam tratar, além de metas e
problemáticas, de questionamentos quanto às suas aspirações pessoais e à estrutura da
organização, por exemplo. Eles entendem que devem ser explorados os insights sobre
assuntos básicos das pessoas, e, considerando a influência do ambiente corporativo em suas
vidas, chegam a afirmar que há casos em que apenas a universidade corporativa tem
condições de ir tão fundo na realidade e nos valores dos participantes. Pela visão dos autores,
25
um novo patamar de universidade corporativa emerge, muito mais amplo e profundo do que
originalmente concebido.
Considerando as diferentes escolhas possíveis para aplicação da educação corporativa, Eboli
(2004) definiu sete princípios de um sistema de sucesso. O primeiro princípio é o da
Competitividade, voltado para transformar o capital humano da empresa em diferencial
competitivo; o segundo princípio é o da Perpetuidade, onde a cultura da organização é
reforçada em cada processo de desenvolvimento; Conectividade: privilegia a interação, o
relacionamento e a construção social; Disponibilidade: fácil acesso, disponibilizando
aprendizagem a qualquer hora e em qualquer lugar; Cidadania: forma sujeitos capazes de
refletir, construir e modificar a realidade organizacional; Parceria: a complexidade da
formação de competências envolve tanto parceiros internos quanto externos;
Sustentabilidade: ser um centro que agregue valor e gere resultados para a empresa.
Na próxima seção será apresentado um modelo de educação corporativa que atenda aos
aspectos acima e que seja factível com a realidade brasileira, onde as micro e pequenas
empresas são a maioria e não dispõem de condições de montar sua própria universidade
corporativa. Além desta modalidade de empresa, as grandes também se beneficiam da
educação setorial, já que podem se unir e reduzir custos formando uma universidade focada
para sua realidade local.
2.1.3 Educação Setorial: educação corporativa com responsabilidade social
Segundo a Teoria dos Stakeholders, descrita por Freeman (1984), o conceito de relação fiduciária
da empresa com o conjunto de partes interessadas substitui a antiga idéia de que as empresas não
possuem responsabilidades senão em relação aos acionistas. De tal forma, o resultado final da
atividade de cada organização empresarial deve levar em consideração os retornos que
aperfeiçoam os resultados de todos os stakeholders envolvidos, e não apenas os resultados dos
acionistas. A complexidade da gestão organizacional demonstra que existem visões paralelas
da mesma empresa por muitos stakeholders. Entender e atender suas expectativas é um
desafio complexo.
26
Na visão de Mariotti (2007) sobre as investigações de Bertalanffy, a teoria sistêmica consiste
no estudo transdisciplinar da organização abstrata dos fenômenos, analisando os princípios
comuns a todas as entidades complexas e os modelos que podem ser usados para descrevê-las,
com o objetivo de chegar a uma visão da totalidade por meio de um viés abrangente, oposto
ao mecanicismo cartesiano. Para o autor, os seres vivos são sistemas abertos e, portanto,
autônomos e auto-sustentáveis, mas dependem das trocas que fazem com o ambiente para
manter esta autonomia. Mariotti (2007), ao estudar Morin (2000), diz que esta condição de
sermos ao mesmo tempo autônomos e dependentes foi tratada como um paradoxo de
autonomia dependente, que constitui por excelência a característica dos sistemas complexos.
A expressão “realismo ingênuo”, criada por Galbraith (2004), representa um modo de pensar
produzido pela lógica linear predominante de nossa cultura, que dificulta a compreensão da
complexidade do mundo e as relações causais de suas transformações. Em contraponto a esta
maneira de pensar, Mariotti (2007) sugere a busca da essência da expressão ‘competitividade’
para a compreensão da possibilidade de desenvolvimento de sistemas econômicos
sustentáveis. Para este autor, o sentido original da expressão remete à competição ligada a
uma economia que não exclui sua dimensão social, podendo ser expressa pela seguinte
fórmula:
Competitividade = Competição ↔ Cooperação
Para Mariotti (2007) tal equação demonstra que a competição se beneficia do trabalho
conjunto, cooperativo, o qual por sua vez retroage sobre ela, moderando-a e impedindo-a de
ignorar o fato de que entre os objetivos do processo econômico está o de promover o bem-
estar social. Caso seja eliminado um dos componentes desta equação, a idéia de
competitividade ficará distorcida e o processo se tornará insustentável.
Considerando que toda fórmula é redutora, deve ser levado em conta o que se pode ampliar da
equação acima demonstrada, no tocante às responsabilidades dos stakeholders enquanto
membros da sociedade. Por exemplo: no século XVIII, Adam Smith (2000) utilizou a
metáfora da “mão invisível” da auto-regulação como moderadora da competição original do
capitalismo puro. Tal visão sugere que, já na origem da codificação do capitalismo a
competição desenfreada era vista como perigosa, considerando a possibilidade de extinguir a
27
concorrência, ferindo o princípio básico da própria competitividade. O egoísmo, na sua
essência, era defendido pelo autor como uma característica humana propulsora da busca da
melhoria contínua, tão forte quanto o altruísmo e com o mesmo potencial mobilizador social.
Garantir o equilíbrio entre estas duas forças naturais das pessoas seria a base do capitalismo,
na visão deste teórico. A “mão invisível” do Estado deveria moderar os excessos tanto da
dimensão egoísta quanto da altruísta: sem monopólio nem assistencialismo, por exemplo.
Mariotti (2007) considera que, nos dias atuais, as Organizações Não-Governamentais (ONGs)
cumprem, de certa forma, esta missão de ser a “mão invisível” no aspecto executivo,
implementando projetos, definindo critérios de gestão, certificando ou, em alguns casos
especiais, propriamente exercendo o “poder de polícia” que outrora era particularidade
exclusiva do poder formal.
Ao tratar da complexidade desta realidade, especificamente no Brasil, Eboli (2004) aponta um
problema. Ela comenta que as micro e pequenas empresas, assim como certas categorias
profissionais, não têm condições de montar uma estrutura de educação corporativa,
principalmente onde a escolaridade formal não atendeu às demandas de educação necessária.
Apesar desta dificuldade, o Serviço Brasileiro de Apoio à Micro e Pequena Empresa -
SEBRAE (2002) avalia que as cadeias produtivas precisam se aprimorar para continuarem
competitivas, em muitos casos através da própria união entre concorrentes, com o objetivo de
formar profissionais com o perfil demandado pelo setor. No entendimento do Programa de
Mobilização da Indústria Nacional de Petróleo e Gás Natural (PROMINP, 2007), para reduzir
a dimensão de tais problemas existe a possibilidade da orientação de esforços específicos de
educação setorial. Através de associações, sindicatos e organizações não-governamentais são
realizadas parcerias com o objetivo de formar profissionais com o perfil de competências
necessário ao setor e promover a gestão do conhecimento setorial, possibilitando a geração de
emprego e renda e reduzindo os problemas sociais no entorno das organizações.
A educação continuada, considerada por Eboli (2004) como o quarto grau de evolução da
universidade corporativa, tem como pressuposto a consciência da empresa de que educação
gera competência, que reflete em qualidade, promove competitividade e retorna como lucro.
Para tal visão sistêmica é necessária uma percepção mais apurada da posição da empresa na
cadeia produtiva, nos arranjos locais e suas responsabilidades no ambiente sócio-econômico.
Formar profissionais que no futuro possam estar servindo outras empresas pode ter um
28
reflexo importante no próprio desempenho da empresa, caso esta participe de um cluster ou
região geográfica privilegiada.
Nesta situação, Eboli (2004) aponta que o ganho de escala da união de empresas, permite a
formação e atualização contínua dos empregados de setores de atividades específicas, bem
como a superação de carências regionais de determinadas categorias profissionais. Este novo
tipo de organização virtual é nomeado pela autora como ‘Universidade Setorial’. Eboli (2004)
diz que, na maior parte das vezes, tal trabalho de educação é terceirizado para entidades
especialistas que se agrupam na formação de profissionais com o perfil de competências
exigido pelo setor, criando em conjunto programas de educação que desenvolvam as
competências necessárias para uma determinada indústria ou setor produtivo.
As experiências realizadas no Brasil com este tipo de educação setorial têm demonstrado
objetivos comuns, conforme preconizado por Eboli (2004), tais como o desenvolvimento de
competências críticas para aumentar o padrão de desempenho do setor de atividade, montar
um pólo de irradiação de conhecimentos e formação de profissionais para o setor, propagar
crenças e valores (cultura setorial) do setor de atividade, aumentar o valor de mercado das
categorias profissionais envolvidas e, o que será objeto deste estudo, formar categorias de
profissionais competentes para gerar o sucesso do setor e das empresas componentes de toda a
sua cadeia produtiva.
Para Souza (2006) com a universidade setorial o que é feito pela empresa em termos de
educação deixa de ser apenas reprodução para tornar-se criação. Incluir o trabalhador no
processo de construção do conhecimento tem menos amarras quando a educação corporativa
não está vinculada a apenas uma empresa. Por mais positivo que seja o fato da propagação da
cultura de uma organização, ao mesmo tempo existe uma relação limitante. Quando se trata
de setor a educação ganha mais amplitude, pois apesar das missões das empresas envolvidas
estarem fragmentadas, costumeiramente a visão tem pontos em comum.
Costa Filho (2007), por sua vez, lembra que as ações de educação setorial constituem espaços
de diálogo entre seus atores (comunidade acadêmica, governo e setor produtivo), voltados
para a análise, discussão e consenso quanto a gargalos, oportunidades e desafios de cada uma
das cadeias produtivas em questão. Para o autor, os Fóruns de Competitividade são o
29
ambiente propício para a articulação de parcerias setoriais, já que é proposta básica deles a
discussão em torno de problemas comuns, o compartilhamento de soluções e ações em
benefício da cadeia produtiva.
Por outro lado, Bonamino (2005) lembra que mesmo na educação corporativa existe uma
distância enorme entre o que se ensina e a vivência dos alunos: a grande maioria dos
professores e tutores pauta seu trabalho em realidades distanciadas dos alunos e apresenta
materiais produzidos em e para outros contextos. Considerando a importância, na formação
das competências, da realidade sócio-econômica vivida, Vygostky (1987) evidencia a
interdependência entre o pensamento humano e seus sistemas de representações simbólicas,
mediados pelas tecnologias da comunicação.
Hoje, são necessários poucos segundos para a disseminação de fatos ocorridos em qualquer
lugar do mundo. Apesar de consciente de que esse acesso não está disponível para todas as
pessoas, Bonamino (2005) entende que tal universalização da educação depende quase
exclusivamente de fatores econômicos e políticos, e não tecnológicos. Há algumas décadas
McLuhan (1964), ao dizer que “o meio é a mensagem”, provocou discussões entre os teóricos
a respeito da primazia entre as ideologias e os meios. Bonamino (2005) entende que essa
discussão histórica, entretanto, não considerou a relação dialética entre forma e conteúdo,
entre meio e mensagem, que são partes de um todo, não existem isoladamente e, em
conseqüência, não se separam.
Como os suportes de comunicação presentes nos processos de ensino-aprendizagem das
escolas tradicionais não acompanham o ritmo dessas transformações, em muitos casos a
empresa se vê na obrigação de assumir esta tarefa, tendo em vista estar mais bem aparelhada
tecnologicamente e suas necessidades exigirem atitudes com maior celeridade. No caso da
educação setorial, a discussão dialética do parágrafo acima se repete: a empresa está inserida
num cluster e na comunidade; da mesma maneira e ao mesmo tempo, as pessoas estão dentro
e fora da empresa, o que confirma Fleury e Fleury (2001): assumir o gerenciamento do
conhecimento, de modo estratégico, é vantagem competitiva e fator de sobrevivência das
organizações.
30
A partir da próxima seção será tratado o segundo grupo de assuntos relevantes desta pesquisa.
Complementando a fundamentação teórica sobre aprendizagem, andragogia, educação
corporativa e educação setorial, será necessário o entendimento sobre competências e sua
influência na gestão dos assuntos há pouco citados.
2.2 A gestão mediada pelas competências
Para Fleury (2002) o tradicional modelo americano de competências, ‘taylorista-fordista’,
sustenta que o conceito de qualificação técnica é suficiente para definir os requisitos
necessários para o trabalhador exercer suas funções; já o modelo francês privilegia o “saber
agir”, estabelecendo uma relação entre saberes e competências, ou seja, diploma e emprego.
Assim sendo, pode ser dito que o conceito de competência vai além da simples qualificação
técnica (conhecimento formal). Mesmo para o desempenho de atividades relativamente
simples, que exigem alguma qualificação técnica, é necessário o aprimoramento do raciocínio
espacial e aritmético, por exemplo. Considerando o modelo formal de ensino-aprendizagem
aplicado no Brasil, Bonamino (2005) percebe falhas no tocante a tais fundamentos de
desenvolvimento de raciocínio, podendo comprometer as competências futuras do
profissional que será qualificado tecnicamente.
Eboli (2004) explica que, de modo simplificado, o entendimento de competência é resultante
de três fatores básicos, que formam a sigla ‘CHA’: Conhecimentos: relacionam-se aos
conceitos e técnicas (o saber fazer); Habilidades: representam aptidão e capacidade de
realizar, relacionadas à experiência e ao aprimoramento progressivo (o poder fazer);
Atitudes: apresentam a postura e o modo pelo qual as pessoas agem e procedem (o querer
fazer). Já Dutra (2008) aperfeiçoa tal explicação, ampliando a visão de competências para
além de um “estoque” de conhecimentos, habilidades e atitudes, chegando à entrega de valor
mediante o uso consciente das competências. Para o autor, de pouco adiantar “ter” as
competências; para a organização, o que realmente importa é o resultado oriundo da aplicação
prática destas competências, agregando valor e contribuindo efetivamente para as vantagens
competitivas da empresa. Uma maneira encontrada por Dutra (2008) para explicar a diferença
entre “ter” o CHA e agregar valor “através” do CHA é diferenciar dificuldade e
complexidade, em relação à execução de atividades. Uma tarefa difícil exige ter
31
conhecimento, habilidades e tomar atitudes para resolvê-la. Já uma atividade complexa
necessita uma grande capacidade de lidar com diversas variáveis, integrando seus
“componentes” de CHA e tendo que articular novas soluções para as quais ele talvez não
tivesse se programado. Essa maior aplicação cognitiva e foco na entrega de valor extrapolam
o simples conceito de se “acumular” competências. Para cumprir tal papel, o desenvolvimento
pessoal é de fundamental importância dentro das atividades de gestão de pessoas.
Eboli (2004) entende que, com a gestão do conhecimento é possível construir as competências
críticas (aquelas que irão diferenciar a empresa estrategicamente). Para a autora, implantar um
sistema de educação corporativa significa aumentar a inteligência da empresa através da
implementação de um modelo de gestão de pessoas e da gestão do conhecimento. Ela sustenta
que, para tanto, é essencial a criação de um ambiente e uma cultura empresarial cujos
princípios e valores disseminados sejam propícios ao processo de aprendizagem ativa e
contínua, que desperte nas pessoas a postura do autodesenvolvimento e favoreça a formação e
a atuação de lideranças educadoras.
Enquanto a gestão do conhecimento corresponde a um modelo gerencial adotado pela
empresa, a aprendizagem organizacional pode ser considerada como uma das metodologias a
ser aplicada. Seguindo este neologismo de Fleury (2001), as competências podem ser
consideradas como a matéria-prima a ser beneficiada. A competência pode ser baseada em
diferentes estâncias de compreensão: pessoal (competências do indivíduo), organizacional
ou essencial (core competences) e nacional (sistemas educacionais e formação de redes de
competências).
Considerando que as competências individuais serão tratadas com maior detalhe a seguir, e
que as ditas competências nacionais fogem do escopo desta pesquisa, permanece necessário
um maior aprofundamento quanto ao entendimento sobre as competências essenciais. De
acordo com Cerqueira (2006) tais competências tratam da abordagem estratégica da empresa,
e não de recursos humanos. São as competências da organização, também chamadas de
competências de gestão ou core competences, termo este cunhado por Prahalad e Hamel
(2005). Para estes autores, a competência essencial resulta da combinação de três fatores:
recursos, capacidades e competências. Como recursos entende-se tanto os tangíveis
(patrimoniais) quanto os intangíveis (processos e conhecimentos técnicos e gerenciais). Como
32
capacidade entende-se a habilidade da organização de ocupar, utilizar e explorar tais recursos.
Cerqueira (2006) afirma que as competências essenciais devem atender a três requisitos:
ofertar benefícios efetivos aos clientes, serem difíceis de imitar e prover acesso a diferentes
mercados.
Dutra (2008) recorda que até poucas décadas atrás o termo competência era discutido
principalmente por psicólogos e educadores; atualmente, faz parte também de discussões
acadêmicas e empresariais.
A linha seguida por psicólogos e educadores, segundo Charlier (2001), sustenta que as
competências profissionais na educação constituem um conjunto com três elementos
indissociáveis: o tríptico “projetos-atos-competências”. Como ‘projetos’ entende-se os
objetivos estabelecidos para a ação; ‘atos’ são as condutas apresentadas, enquanto
‘competências’ são os saberes, as representações, as teorias pessoais e os esquemas de ação
mobilizados para resolver problemas em situação de trabalho. Para a autora, as competências
são significativas apenas quando se traduzem em atos e quando tais atos orientam-se de
acordo com os projetos assumidos.
O texto de Dutra (2008) vem em complemento ao comentário de Charlier (2001), supra
citado: competências ao mesmo tempo podem ser pessoais e organizacionais, que por sua vez
ratifica o texto anterior de Fleury. Dutra (2008) dedicou-se a levantar dados sobre a evolução
do conceito de competência, identificando que David McClelland, em 1973, foi o primeiro a
propor de forma estruturada que competência era um conjunto de conhecimentos e
habilidades acumulados em uma pessoa, fator importante no processo de seleção em uma
organização. Boyatzis, em 1982, expandiu o entendimento sobre o conceito de competências,
a partir da caracterização da demanda de cargos, procurou fixar ações ou comportamentos
efetivos esperados. Foi a partir de Le Boterf (1994) e Zarifian (1996) que o conceito de
competência foi explorado associado à idéia de agregação de valor a partir da pessoa,
independente do cargo, articulando estratégia empresarial com competências individuais.
A junção dos assuntos já abordados na atual fundamentação teórica terá espaço nas próximas
duas seções. Será visto o que a aprendizagem, a educação corporativa e as competências têm
33
em comum: todos estes processos se iniciam e têm por fim a própria individualidade do
trabalhador.
Conforme Lei et al. (2001) as características setoriais influenciam diretamente as estratégias
empresariais, resultando na modelagem desta última, quando bem alinhada às suas forças e às
oportunidades do ambiente competitivo. Contudo, estes autores chamam a atenção para uma
importante fonte interna de influência estratégica: a aprendizagem e a acumulação de ativos
intangíveis. A explicação desta nova força causal concentra-se na potencial habilidade das
pessoas de desenvolver novos produtos e processos.
A maneira com que a empresa gerencia tal potencial pode tornar-se importante vantagem
competitiva; segundo tais autores, caracteriza-se como competência essencial de uma empresa
o seu conjunto central de insights de definição e solução de problemas, desenvolvido através
de um peculiar processo idiossincrático de aprendizagem. Segundo Lei et al. (2001), enquanto
Argyris e Schön (1978) lideram uma corrente teórica que prega a aprendizagem como
estrutural e não diretamente associada com a estratégia consciente da empresa, outros
teóricos, tais como Prahalad e Hamel (2005) sustentam o contrário: a estratégia deve estar
orientada para a aprendizagem. Seguindo tal linha de pensamento, Lei et al. (2001) sugerem
que o desenvolvimento consciente e orientado de competências individuais constrói as
competências essenciais da organização.
A próxima seção vai tratar de um necessário aprofundamento sobre o tema competências, que
são as competências básicas e individuais, assunto que compõe este objeto de estudo.
2.2.1 A formação de competências básicas e individuais
Perrenoud (1999, pg 7) ensina que, dos múltiplos significados dados para ‘competência’, sua
preferência é defini-la como sendo “uma capacidade de agir eficazmente em um determinado
tipo de situação, apoiada em conhecimento, mas sem limitar-se a eles”. Contrapondo esta
definição às linhas teóricas descritas no item anterior, pode ser observado que, aqui, as
competências tratadas são estritamente as individuais, e não as da organização. Para este autor
os conhecimentos fazem parte dos vários recursos cognitivos utilizados pelas pessoas para
34
que possam enfrentar as situações. Eles são representações da realidade, construídas e
armazenadas conforme a formação e experiência individual.
Perrenoud (1999, pg 8) ainda defende que “uma competência nunca é a implementação
‘racional’, pura e simples de conhecimentos, de modelos de ação, de procedimentos”. A
apropriação de conhecimentos somente se completa como competência quando permite sua
mobilização em situações de ação. O pensamento de Paulo Freire (2005) complementa esta
visão, ao considerar que, apesar do conhecimento formal ser básico, até o mais simples dos
homens tem condições de reconhecer-se como condicionado e não como determinado: ao
aplicar sua experiência e problematizar a própria vida (e não torná-la inexorável), a
competência individual se desenvolve.
Voltando a Perrenoud (1999), este entende que outrora as empresas se apropriaram da noção
de “competência” e a equivaleram à “qualificação”. As transformações de trabalho, lembra o
autor, flexibilizando procedimentos e delegando aos funcionários a solução de problemas da
empresa tornaram insuficiente a simples alocação de indivíduos com as qualificações-padrão
para determinado cargo. O teórico considera que é preciso gerenciar competências, no sentido
mais amplo, original e profundo da expressão, para que as ações de preparação deste
desenvolvimento sejam estruturadas da base para o alto, partindo da experiência pessoal e da
apreensão da realidade individual. Como descrito na seção Introdução, para Perrenoud (1999)
é fundamental que o indivíduo moderno, independente de sua qualificação, domine suas
competências básicas, que são analisar um texto e constituir as intenções do autor, argumentar
com a finalidade de convencer alguém cético ou um oponente, construir uma hipótese e
verificá-la, detectar uma falha no raciocínio de um interlocutor, negociar e conduzir um
projeto coletivo.
Dutra (2008) ressalta que, para se compreender a realidade da gestão de pessoas na empresa
moderna é necessário considerar a complexidade da entrega como um conceito importante, já
que requer alguns desdobramentos a serem ponderados: a análise das pessoas a partir da sua
individualidade, a análise das deficiências individuais, a análise da efetividade das ações de
desenvolvimento e a adequação destas ações.
35
O autor exemplifica cada um destes desdobramentos: a não-entrega por parte de uma pessoa
teoricamente competente para tal pode ter sido motivada tanto por deficiências da organização
quanto por deficiências individuais – o modo de sanar as deficiências, portanto, requer uma
análise anterior de suas causas; quando individuais, estas podem se apresentar como de falha
de formação básica, inabilidade inata ou falta de experiência, por exemplo. A elaboração em
conjunto de um plano de desenvolvimento pode criar uma cumplicidade entre pessoas e
organização, aumentando o mútuo comprometimento e as chances do trabalho ser bem
planejado e devidamente cumprido; uma orientação que Dutra (2008) dá quanto à elaboração
de um plano de desenvolvimento é a análise da individualidade com o foco em explorar os
pontos fortes da pessoa: o autor sugere que o crescimento, nestes casos, se dá de forma mais
elaborada e sofisticada.
Para Zarifian (2001) no desenvolvimento de pessoas o conjunto de conhecimentos e
habilidades acumuladas não é o mais importante; a riqueza está na evolução do nível de
complexidade que ela consegue articular. Dutra (2008) salienta que decorre daí a prática de
promoções laterais, onde um profissional pode transferir-se para outra atividade, às vezes até
tecnicamente desconhecida, mas com o mesmo nível de complexidade a que ele está apto a
entregar valor à empresa.
A ampliação da compreensão de competências proposta por Dutra (2008) - como o conjunto
‘CHA’ que entrega valor; a sugestão de Zarifian (2001) sobre a articulação na complexidade
como fator de desenvolvimento, além da ponderação de Perrenoud (1999), reforçada por
Freire (2005), de que as competências são representações da realidade, construídas,
armazenadas e libertadoras, são algumas das perspectivas sobre competências propostas nesta
fundamentação teórica.
Na próxima seção será apresentada a verificação científica do caso em estudo, descrita em
pormenores nos itens da metodologia de pesquisa que trataram da estratégia adotada e da
técnica utilizada para a análise dos dados levantados, bem como dos limites e limitações deste
estudo.
36
3 METODOLOGIA DE PESQUISA
A metodologia adotada para este estudo teve como referência a busca da resposta à questão de
pesquisa: qual a percepção dos stakeholders diretamente envolvidos no trabalho de educação
setorial ‘reforço de escolaridade’ quanto ao resultado desta ação de suporte às demandas das
indústrias do complexo de Suape?
Para direcionar os rumos da pesquisa foram consideradas as seguintes questões norteadoras:
a) Qual a percepção dos demandantes do trabalho de educação setorial ‘reforço de
escolaridade’ quanto à necessidade de desenvolvimento de competências básicas individuais
dos trabalhadores para as indústrias do complexo de Suape?
b) Qual a percepção dos executores do trabalho de educação setorial ‘reforço de escolaridade’
quanto à necessidade de desenvolvimento de competências básicas individuais dos
trabalhadores para as indústrias do complexo de Suape?
c) Qual a percepção dos alunos participantes do trabalho de educação setorial ‘reforço de
escolaridade’ quanto ao desenvolvimento de suas competências básicas individuais (conforme
teoria de Perrenoud)?
É importante ressaltar que tanto a pergunta de pesquisa quanto as perguntas norteadoras
guardam relação direta com os objetivos geral e específicos apresentados em seção anterior.
Na próxima seção segue a apresentação relativa ao tipo de pesquisa que será aplicada.
3.1 O tipo de pesquisa
Para responder às questões norteadoras, o tipo de pesquisa utilizado foi o estudo de caso, com
caráter exploratório e qualitativo. Entendeu-se que a teoria de educação setorial poderia gerar
melhor entendimento sendo explorada em um caso específico, já que existem poucos estudos
neste campo. Como os objetivos pretendem compreender a percepção dos stakeholders
envolvidos, mediante entrevistas, o enfoque qualitativo é o que melhor se presta para
37
subsidiar uma análise de seus conteúdos, já que, segundo Mattos (2006), muitos problemas
que permeiam as organizações escapam ao pesquisador quando expressos em números. Para
este autor, a entrevista qualitativa torna-se rica ao incrementar a reflexão sobre o conteúdo
pela análise pragmática da conversação.
Para Yin (2005) a escolha do estudo de caso como estratégia de pesquisa está condicionada ao
tipo de questão de pesquisa proposta, à extensão de controle que o pesquisador tem sobre
eventos comportamentais atuais e ao grau de controle em acontecimentos contemporâneos,
em oposição a acontecimentos históricos. Partindo do pressuposto que o objeto de estudo
desta pesquisa focaliza acontecimentos contemporâneos, não exige controle sobre eventos
comportamentais e a questão de pesquisa não utiliza a série “quem, o que, onde, como e por
que”, a definição de Yin (2005) sugere ser o estudo de caso a estratégia adequada.
Quanto ao conceito de estudo de caso, tanto Yin (2005) quanto Stake (1994) têm a mesma
abordagem, retratando que não é apenas uma escolha metodológica, e sim uma escolha do
objeto específico a ser estudado, sem a intenção de generalização. O que pode ser replicado a
partir de um estudo de caso é a teoria, e não a inferência obtida dos dados.
Contudo, Yin (2005) chama a atenção da importância de não confundir ‘estudo de caso’ com
‘pesquisa qualitativa’, pois esta última pode fazer parte de uma pesquisa etnográfica, cujo
interesse está na descrição da cultura de um grupo social, por exemplo, o que difere do
interesse do estudo de caso. Ainda existem outros entendimentos sobre o assunto: André
(2005), seguidora de Stake, tem uma visão diferente de Yin quanto a estudo de caso, tanto que
na sua concepção trabalha com “estudo de caso de tipo etnográfico”.
A atual pesquisa, contudo, será qualitativa e utilizará a estratégia do estudo de caso de caráter
exploratório, seguindo os preceitos da teoria de Yin (2005).
Para Gil (2007) o delineamento da pesquisa através de estudo de caso é a análise exploratória
contextual profunda de um ou poucos fatos, e é utilizado principalmente quando os limites
não estão claramente definidos. Este estudo empírico enfatiza os detalhes e fornece
importantes informações para a solução de problemas. Para o autor, as pesquisas exploratórias
têm como principal finalidade esclarecer ou modificar idéias. São desenvolvidas com o
38
objetivo de proporcionar visão geral sobre determinado fato, que normalmente envolve tema
pouco explorado e difícil de formular hipóteses precisas e operacionalizáveis.
Para Cooper e Schindler (2003) o estudo exploratório é útil quando não se tem uma idéia clara
dos problemas que serão enfrentados durante o estudo, principalmente quando a área
explorada é nova ou vaga, pois variáveis importantes podem não estar claramente definidas.
Por fim, os mesmos autores consideram que a pesquisa qualitativa – que será o caráter desta
pesquisa, é o tipo que melhor se adapta ao estudo exploratório.
Sendo assim, considerando os autores supra citados, para um estudo de caso de educação
setorial na região de Suape, o estudo exploratório está adequado.
Na seção a seguir serão apresentadas as ações utilizadas nesta pesquisa para a coleta de dados.
3.2 A coleta de dados
Seguem abaixo os três momentos distintos e não-sequenciais em que a pesquisa foi realizada:
3.2.1 Entrevistas semi-estruturadas com representantes dos stakeholders sobre suas
percepções quanto às expectativas de desenvolvimento de competências básicas dos
potenciais trabalhadores das empresas do complexo de Suape. Todas as entrevistas sofreram
uma rodada de pré-teste, foram gravadas digitalmente e posteriormente transcritas.
Quanto ao formato, os roteiros das entrevistas encontram fundamentação teórica em Gil
(2007): foi traçado um planejamento minucioso quanto à duração, ao ambiente, a disposição
física do entrevistador e do entrevistado, a clareza nas perguntas, respostas não implícitas,
perguntas elaboradas para evitar recusa em responder, questões feitas diretamente ao
entrevistado, ordenamento das perguntas visando o interesse do respondente. Os roteiros das
entrevistas com os stakeholders demandantes, executores e participantes encontram-se
respectivamente nos Apêndices A, B e C, no final deste estudo.
39
Em relação ao conteúdo dos roteiros de entrevista, a base teórica utilizada foi Dutra (2008),
no tocante aos entendimentos sobre ‘competência’ e Perrenoud (1999) em relação às
competências básicas e individuais.
No total foram dezoito entrevistados, assim distribuídos:
Quatro representantes dos stakeholders demandantes:
a) Presidente da Federação das Indústrias do Estado de Pernambuco – FIEPE;
b) Ex-Diretor de RH do Estaleiro Atlântico Sul;
c) Secretário de Educação do município de Ipojuca;
d) Secretário Executivo do Programa de Mobilização da Indústria Nacional de Petróleo e
Gás Natural (PROMINP-PE).
Tais entrevistados foram escolhidos por serem os únicos demandantes que se envolveram
diretamente com o trabalho de ‘reforço de escolaridade’, sendo, portanto, as pessoas com
mais condições de expressar a percepção dos demandantes. O Presidente da FIEPE representa
os empresários industriais; o Diretor de RH de uma indústria (na época da demanda do
trabalho) envolveu-se pessoalmente nas discussões e formulações da demanda. O Secretário
de Educação de Ipojuca representa a classe política, demandante direta deste trabalho que foi
gerado e colhido em Ipojuca. Por fim, o Secretário Executivo do PROMINP-PE foi o
articulador entre governo, empresas e executantes quando das negociações de demanda.
Oito representantes dos stakeholders executores, escolhidos pelo seu envolvimento com o
programa ‘reforço de escolaridade’ nos seus diversos níveis, seja articulando a operação,
gerenciando os executores ou executando propriamente dito o trabalho.
• Coordenadora Nacional da Universidade Corporativa do SESI – UNISESI;
• Superintendente do SESI-PE;
• Diretora de Operações do SESI-PE;
• Gerente da Unidade de Negócios do SESI - Cabo de Santo Agostinho;
• Diretor Técnico do SENAI-PE;
• Professores de matemática que lecionaram pelo programa (duas pessoas);
• Professora de português que lecionou pelo programa.
40
Tanto no grupo de executivos quanto no grupo de professores, o limite para as entrevistas foi
um misto de conveniência (a lista de stakeholders demandantes ficou satisfatória) com
saturação de conteúdo. A Diretora de Operações, por motivos de agenda, foi a última a ser
entrevistada, mas antes dela as percepções já estavam se repetindo, o que tornou a ocorrer
com suas respostas. O mesmo ocorreu quanto aos professores: a professora de português foi a
última a ser entrevistada e, mesmo com toda sua riqueza de percepções, o principal do
conteúdo já havia sido discorrido anteriormente por seus colegas, professores de matemática.
Seis representantes dos stakeholders participantes:
• três alunos-trabalhadores que tiveram notas altas no curso,
• três alunos-trabalhadores que tiveram notas baixas no curso.
Tais participantes foram escolhidos aleatoriamente dentre os alunos-trabalhadores com
melhores e piores notas do primeiro grupo de 300 pessoas que receberam o ‘reforço de
escolaridade’. Foi considerado importante ouvir trabalhadores com desempenhos diferentes
para reduzir o risco de o desempenho viciar as percepções para apenas um tipo de visão. A
quantidade de seis alunos-trabalhadores deu-se por conveniência, considerando que os
mesmos fizeram parte do grupo focal.
Para Gil (2007) a entrevista pode ser considerada a técnica por excelência na investigação
social. Ele avalia a entrevista focalizada como de tipo livre, mas razoavelmente estruturada,
considerando que deve abranger um foco bem específico. O entrevistador faz algumas
perguntas diretas e deixa o entrevistado falar livremente, desde que seguindo a uma restrita
pauta (o pesquisador deve cortar se o assunto sair do foco). A partir da memória, anotações e
gravações, o pesquisador após a entrevista terá condições de reconstruí-la de forma mais
estruturada, possibilitando uma análise mais objetiva da mesma.
Godoi e Mattos (2006) notam que a condução da entrevista através de sutis “trilhas” não torna
previsível a conversação, já que a mesma deve continuar seguindo o sentido do raciocínio do
entrevistado, mesmo que redundante. Cabe ao entrevistador procurar interagir para não deixar
lacunas vazias, sem, contudo, induzir as respostas. Os autores consideram que o centramento
41
da entrevista sobre um tema específico é fundamental para o aprofundamento da investigação,
neste tipo de entrevista.
Um outro tipo de coleta de dados foi feito, além das entrevistas supra citadas, através da
realização de um grupo focal, como melhor descrito na próxima seção.
3.2.2 Grupo focal com alunos-trabalhadores.
Foi realizado um grupo focal com a participação de oito pessoas, escolhidas aleatoriamente
dentre os alunos-trabalhadores que já concluíram o curso de reforço de escolaridade. A
duração da reunião do grupo focal foi de uma hora e trinta minutos, tendo sido utilizado um
gravador digital para posterior transcrição dos dados. O pesquisador foi o moderador.
Cooper e Schindler (2003) sugerem que o moderador utilize dinâmicas de grupo na troca de
idéias, sentimentos e experiências em um tópico específico. Foi entregue individualmente aos
participantes uma cópia de notícia de jornal veiculada naquele dia, tratando de um tema do
contexto dos participantes: a greve dos motoristas de ônibus (ver Anexo A). Foi pedido que
todos lessem individualmente o texto, e logo após o moderador conduziu um debate,
questionando individualmente a compreensão do texto lido e as intenções do autor do texto.
Posteriormente, foi realizada uma discussão sobre o ponto de vista de cada um a respeito do
tema, técnica esta complementada por simulações de negociação entre patrões e empregados.
O moderador conduziu as discussões para que todos os aspectos importantes a serem
observados fossem tratados, o que efetivamente aconteceu.
No decorrer da dinâmica foi observado o desempenho de cada participante do grupo, com o
intuito de investigar o estágio de desenvolvimento das cinco competências básicas individuais
apresentadas por Perrenoud (1999), ou seja, analisar um texto e constituir as intenções do
autor, argumentar com a finalidade de convencer alguém cético ou um oponente, construir
uma hipótese e verificá-la, detectar uma falha no raciocínio de um interlocutor, negociar e
conduzir um projeto coletivo.
42
Oliveira e Freitas (2006) recomendam o grupo focal quando é necessário, dentre outras
situações, o fornecimento de interpretações dos resultados dos participantes em decorrência
de estudos iniciais. Os autores consideram que, atualmente, as duas principais técnicas de
coleta de dados qualitativos são as entrevistas individuais e a observação participante em
grupos. O grupo focal combina estas duas técnicas, tendo em vista que algumas das
competências que se procura desvelar são decorrentes de ações (argumentação e negociação).
A homogeneidade do grupo relacionada ao assunto em questão é fator importante para o
sucesso do grupo focal, lembram Cooper e Schindler (2003): o fato dos escolhidos terem feito
parte do mesmo grupo inicial dos 300 alunos-trabalhadores mais bem classificados na região
de Suape demonstra que este requisito foi devidamente atendido.
Ao todo, compondo um montante de 7 horas e 5 minutos de entrevistas, foram entrevistadas
vinte diferentes pessoas, considerando que seis das oito pessoas do grupo focal também foram
entrevistadas individualmente.
A próxima seção tratará da metodologia escolhida para análise dos dados.
3.3 A análise dos dados Na etapa da análise dos dados foram utilizados os procedimentos de Bardin (2006) quanto à
técnica de ‘análise de conteúdo’ como método de interpretação dos dados pesquisados. Todas
as entrevistas foram gravadas digitalmente, transcritas e classificadas, visando facilitar a
hermenêutica.
Para Bardin (2006, pg 33) a análise de conteúdo é “um conjunto de técnicas de análise das
comunicações, que utiliza procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo
das mensagens”. É um instrumento marcado por grande quantidade de formas de aplicação,
tendo em vista a amplitude de seu objeto principal: a comunicação. A autora considera este
método empírico e dependente do tipo de fala a que se dedica, bem como do tipo de
interpretação que se pretende como objetivo.
Para Bardin (2006) a primeira etapa é a descrição analítica. O processo começa com o
tratamento descritivo, depois a fragmentação em categorias, a definição de unidades de
contexto e a classificação em registros. A autora orienta que a segunda etapa deve ser a
43
inferência, onde se utiliza a dedução lógica para entender as causas e as conseqüências dos
enunciados classificados por categorias. Esta etapa intermediária deve considerar o contexto
em que foi gerado o dado, bem como as características do emissor e do destinatário da
informação. A terceira etapa é a interpretação, que procura o significado das características
encontradas anteriormente.
O desenvolvimento da análise de dados da pesquisa seguiu minuciosamente as
recomendações acima, construindo a seguinte arquitetura de etapas:
Escolha de um dos objetivos secundários >> Leitura de todas as entrevistas >> Registro dos
primeiros critérios >> Releitura das entrevistas >> Seleção e recorte de mensagens
significativas >> Classificação das mensagens por subcategorias >> Classificação das
subcategorias em categorias >> Classificação das categorias em dimensões >> Organização
das dimensões mediante cada um dos objetivos secundários.
Cabe salientar que em algumas destas etapas foi necessário retornar mais de uma vez às
transcrições das entrevistas para confirmar o entendimento da fala e garantir a coerência da
classificação dos dados, como demonstrado abaixo no Quadro 2.
Quadro 2: árvore de análise de conteúdo (autoria própria).
X
X
Dimensões Categorias
X
X
X
X
X
X
X
X
X
Objet ivo Especí f ico
X X
X X
X X
X X
X X
X X
Subcategorias
X X
X X
X X
X X
X X
X X
Descrição Analítica
Codifi cação
Árvore de Análise de Conteúdo
44
Bardin (2006) afirma que o processo de análise de conteúdo é simples, porém trabalhoso, caso
seja feito manualmente. Ela expressa, porém, que a recente multiplicação de softwares pode
ser uma armadilha, já que conduz a uma redução da quantidade de leitura pelo pesquisador, e
conseqüentemente restringe as chances de insights a respeito do conjunto palavra-imagem-
som-gestual, somente capturáveis na íntegra pela mente humana. Atento a captar todas as
informações necessárias, o pesquisador optou por ser artesanal: foi também o moderador do
grupo focal e o realizador de todas as entrevistas. Além disso, o registro e a organização dos
dados foram realizados manualmente, utilizando como apoio o software Microsoft Office
Excel 2003. A única ajuda externa solicitada foi a terceirização da transcrição das gravações.
3.3.1 A percepção do entrevistado: mediadora na análise dos resultados da pesquisa
Todas as entrevistas foram conduzidas pretendendo capturar a declaração de percepção dos
entrevistados. Para tanto, o condutor deste trabalho de pesquisa precisou identificar a
importância e o tipo de percepção de cada público.
No caso dos alunos-trabalhadores, tratados como stakeholders participantes, foi considerado
como referência teórica o entendimento de Skinner sobre percepção. Sobre esta linha de
pensamento Lopes e Abib (2002) destacam que tradicionalmente toda a percepção da
realidade tem como resultado uma “representação mental” do mundo percebido, baseada na
teoria de reforço de condicionamento de Skinner. Para esta linha teórica, quando uma pessoa
tem um problema significa que ela está diante de uma situação onde uma resposta apresenta
uma certa probabilidade de ser emitida, dependendo da existência de uma estimulação
externa. No caso específico da pesquisa em questão, uma possível nova percepção da
realidade por parte dos alunos-trabalhadores pode ser considerada mediante o reforço externo
do trabalho de educação setorial a que foram submetidos. Segundo os autores, ao serem
expostos a novos paradigmas de mundo, os alunos-trabalhadores podem formar novas
“cópias” de realidade, mediadas pelo estímulo em questão. Esta consideração foi levada em
conta pelo entrevistador no momento da pesquisa e, posteriormente, da avaliação dos
resultados.
45
Condicionados pela retórica construtivista dos professores, os alunos-trabalhadores puderam
abrir novas janelas cognitivas e vislumbrar outras opções de mundo. Contudo, como
decorrência do trabalho comportamental mediador de ‘reforço de escolaridade’, é possível
identificar insights nas falas que demonstram auto-descobertas reveladoras, tanto de formação
de novos horizontes de vida quanto de consciência social.
Por outro lado, os entrevistados que foram agrupados como stakeholders demandantes e
executores, em decorrência de sua evidente diferenciação social, tiveram suas percepções
consideradas mediante uma linha de pensamento fenomenológica. Merleau-Ponty (1994)
considera incompleto o esquema comportamentalista de estímulo-resposta proposto por Lopes
e Abib (2002), já que um novo conceito de sentido e de ação é necessário. O autor propõe que
a consciência perceptiva dos agentes, pois além do condicionamento do comportamento
mediante visões de “representações da realidade” a vivência aperfeiçoa e orienta a percepção
de mundo. Segundo o autor, o reducionismo é permitido sob condução da experimentação da
consciência. Desta forma, quando os stakeholders mais experientes em relação a formatos de
entendimento da realidade avaliam de forma reduzida o comportamento resultante dos alunos-
trabalhadores após o ‘reforço de escolaridade’. A redução desta avaliação deve-se, segundo o
autor, à necessidade do entrevistado a delimitar a “cópia da realidade” dos alunos como algo
menor e incluso em sua visão mais ampla do que é real.
A sutileza da linguagem dos stakeholders demandantes e executores contrapõe-se à
espontaneidade dos stakeholders participantes, de modo mais do que proporcional à
escolaridade de cada grupo de entrevistados. Quem vislumbra pela primeira vez uma nova
realidade expressa tal fenômeno de modo mais contundente do que as pessoas que já tiveram
esta e outras novas visões do que considera real. Apreende-se, por fim, que a experiência de
optar por diversas alternativas de vida interfere no comportamento de modo a causar tanto
impacto quanto os condicionamentos reforçados por essa mesma realidade.
3.4 Limites e Limitação
Dos 5400 alunos-trabalhadores que receberam o ‘reforço de escolaridade’, os 300 mais bem
classificados fazem parte da primeira turma. Focar apenas nos primeiros 300 é uma
46
delimitação assumida como escopo da pesquisa, por questões de conveniência e
acessibilidade, já que as outras turmas serão formadas após a conclusão deste estudo.
Outro limite da pesquisa foi a opção de ser feito um recorte da percepção dos entrevistados; se
a mesma tivesse um enfoque longitudinal é possível que as respostas tivessem um amplitude
temporal que apresentasse diferentes contribuições ao estudo.
Como limitação é possível apontar a influência da subjetividade nas percepções dos
entrevistados, permitindo que aspectos estranhos ao assunto pesquisado, tais como os estados
emocional e físico dos entrevistados, além de sua própria escolaridade, possivelmente estejam
refletidos no resultado das entrevistas.
No projeto original estava prevista a realização de três grupos focais, porém a dificuldade de
agendar com os alunos-trabalhadores, já que estudam e trabalham no Cabo e moram na zona
rural de Ipojuca, possibilitou somente a montagem de um grupo focal, limitando o resultado
da pesquisa.
Apesar das limitações este estudo contribuiu para o aumento do entendimento acerca da
interferência de um trabalho técnico, o “reforço de escolaridade”, na ampliação de visão de
mundo dos participantes e nas implicações desta evolução no desempenho de suas funções
profissionais.
A próxima seção tratará da análise dos resultados encontrados nas entrevistas realizadas com
os representantes dos stakeholders envolvidos com o ‘reforço de escolaridade’.
47
4 ANÁLISE DOS RESULTADOS
Para a análise de dados primários, decorrentes de entrevistas e grupo focal, foram necessário
organizar os dados em 9 dimensões, 23 categorias, 49 subcategorias, 71 descrições analíticas
e 184 codificações (recortes de trechos de falas). A partir da próxima seção serão apresentadas
em pormenores tais análises, inferências e interpretações, distribuídas por objetivos
específicos.
4.1 Análise do primeiro objetivo específico
O primeiro objetivo específico trata da percepção dos demandantes. Com a análise das
entrevistas foram identificadas três dimensões de percepção dos demandantes, assim
denominadas: ‘tipo de qualificação esperada’, ‘resultado esperado da qualificação’ e
‘amplitude da visão quanto às pessoas’. Cada uma destas dimensões está baseada em uma
série de categorias, como consta no Quadro 3:
Quadro 3: dimensões e categorias - demandantes (autoria própria).
Entendimento de competência
Modelo Americano
Planejamento
Expectativa
Tempo
Projeto querido
Tipo de Qualificação Esperada
Resultado Esperado da Qualificação
Amplitude da Visão Quanto às
Pessoas
Modelo Francês
Projeto renegado
Dimensões Categorias
48
Tais categorias, por sua vez, são agrupamentos de subcategorias que representam os
elementos de mensagem obtidos na análise de conteúdo das entrevistas. Antes de aprofundar
o entendimento sobre cada uma destas mensagens, o Quadro 4 apresenta esta síntese:
Quadro 4: categorias e subcategorias - demandantes (autoria própria).
A primeira dimensão foi chamada de ‘tipo de qualificação esperada’ pela razão de ser
necessário um nivelamento inicial quanto ao entendimento dos entrevistados sobre os tipos
eficazes de qualificação para atender às demandas de contratação. Neste sentido, foram
identificadas três categorias que representam o pensamento deste grupo de pessoas. A
primeira categoria trata dos diversos entendimentos da expressão ‘competência’, largamente
utilizada nas entrevistas (tanto perguntas quanto respostas). Tais entendimentos estão
organizados em três subcategorias, nomeadas por ‘conceito competência’, ‘competências
básicas’, ‘competência visão ampla’. A segunda e a terceira categorias agrupam expectativas
que demonstram a linha seguida pelos entrevistados, no tocante ao seu entendimento sobre
desenvolvimento de competências. Enquanto a segunda categoria reúne subcategorias de
mensagens com aspectos similares à escola americana, a terceira categoria contém elementos
que remetem à escola francesa. O Quadro 5 é uma representação gráfica desta hierarquia de
dados:
Entendimento de competência
Modelo Americano
Planejamento
Expectativa
Tempo
Projeto querido
Modelo Francês
Projeto renegado
Conceito de Competência Competências Básicas
Domínio da Tecnologia Absorção
Contextualização Empreendedorismo
Atendimento às demandas Educação Corporativa
Inclusão Horizontes
Emergência Carga horária
Melhoria da educação Eficiência Infraestrutura
Papel do Estado
Categorias Subcategorias
49
Quadro 5: categorias e subcategorias – demandantes – primeira dimensão (autoria própria).
A primeira inferência que se faz desta análise é que os stakeholders demandantes não têm
claramente definido o conceito de ‘competência’ conforme apresentado na fundamentação
teórica por Eboli (2004), quando tal termo é usado num contexto de desenvolvimento humano
na organização. Desta forma, o ‘fazer bem feito’ é evocado como ‘competência’ por todos os
entrevistados representantes de empresários ou governo. Tal limitação no entendimento é
esperada, tendo em vista o termo em questão ser mais socializado no meio acadêmico ou nas
áreas de recursos humanos das empresas, mas contém em si uma demonstração da qualidade
da demanda apresentada aos stakeholders executores. A fala do ex-diretor de recursos
humanos de uma das empresas demandantes confirma esta interpretação:
“se você falar em recursos humanos hoje, falar em habilidade e competência, muita
gente vai saber de fato o que é, tá legal? Mas, é... Esse meio é um pouco mais
complicado. Vão entender pelo lado de ser competente ou não” (Demandante B)
Questionados a elaborar uma reflexão mais profunda quanto às competências básicas
individuais necessárias para o atendimento das demandas das empresas do complexo de
Suape, os entrevistados foram unânimes em apontar a ‘capacidade de analisar um texto e
constituir as intenções do autor’ (Perrenoud, 1999) como a mais importante, como se
confirma através da fala de um representante das indústrias:
“é você pegar o manual do equipamento de uma máquina, ler ali e começar a
trabalhar com ela” (Demandante A)
Entendimento de competência
Modelo Americano
Modelo Francês
Conceito de Competência Competências Básicas
Domínio da Tecnologia Absorção
Contextualização Empreendedorismo
Tipo de Qualificação Esperada
Dimensão Categorias Subcategorias
50
Com menos ênfase do que esta competência foi citada, também, a ‘capacidade de negociar e
conduzir um projeto coletivo’ (Perrenoud, 1999). Vale salientar que tal resposta surgiu
somente após o estímulo dirigido da conceituação de competência e da apresentação da lista
de competências básicas individuais de Perrenoud. Mesmo assim, pode ser inferido que existe
a perspectiva de trabalho em equipe, apesar da solidão no desempenho das funções de
montagem e solda (que será o destino das primeiras centenas de alunos-trabalhadores que
receberam a qualificação em estudo).
Em contraponto ao fato dos demandantes não esperarem que haja discussão ou argumentação
quanto aos manuais de equipamentos, aproveitando o exemplo citado na última fala, ficou
transparente no conteúdo dos entrevistados que serão considerados naturais encontros
informais de trabalhadores, antes ou depois da execução das tarefas de montagem e solda,
onde deverão ser freqüentes conversas sobre melhores práticas e aperfeiçoamento de
processo. Neste contexto, passa a ser mais bem delineada a rotina da ação dos trabalhadores,
ampliando-se a visão dos stakeholders demandantes quanto ao trabalho que possa extrapolar
os limites da tarefa esperada.
Considerando na fundamentação teórica que, para Dutra (2008), o estudo de competências
diferencia as escolas francesa e americana, foram mantidas as mesmas expressões na
categorização dos diferentes entendimentos dos stakeholders entrevistados, que demonstraram
mais afinidade com a visão americana. Uma inferência que pode ser deduzida das diversas
falas é que a competência mais desejada por este grupo de entrevistados é a correta aplicação
do conhecimento técnico: a eficiência no cumprimento da tarefa foi ratificada como o
esperado. Com reduzida expectativa pela busca pessoal de inovação, revisão de processos ou
solução de problemas sistêmicos, a seguinte mensagem de um representante dos demandantes
sintetiza a idéia de que o desenvolvimento básico do indivíduo deve estar restrito a uma visão
“taylorista digital”:
“antigamente, uma moto niveladora ela... Você funcionava com oito a dez
alavancas. Hoje, é joystick, você trabalha com GPS, tem que entender de
trigonometria" (Demandante D)
51
Diferente da uniformidade do conteúdo das entrevistas destes primeiros stakeholders, uma
visão mais ampla sobre o assunto foi apresentada pelo representante do PROMINP. Este, por
sinal, em todos os momentos das entrevistas, demonstrou que sua função no projeto de
reforço de escolaridade foi de ligação técnica entre os demandantes e os executores. Como
evidência pôde ser observado que, ao longo da entrevista o conteúdo de sua fala transita entre
estas duas linhas de diferente raciocínio. Tal articulação voltará a ser citada no decorrer da
apresentação de resultados da pesquisa.
A segunda dimensão foi chamada de ‘resultado esperado da qualificação’, representando tal
expectativa. Neste sentido foram identificadas duas categorias que representam o pensamento
deste grupo de pessoas. A primeira categoria trata da expectativa formada em decorrência do
‘planejamento’ do próprio trabalho de qualificação; quem se envolveu nesta etapa acabou
influindo e delineando sua expectativa mediante a própria experiência de participar do
processo - mesmo que tal participação tenha sido apenas de definir as demandas iniciais. A
segunda categoria é a ‘expectativa’ declarada, que pode ou não ter similaridade com as
demonstrações anteriores de resultado esperado. Tal demonstração de expectativa, por vezes,
representa apenas intenções aparentes, razão esta que torna importante evidenciar a categoria.
Abaixo o Quadro 6, que representa graficamente tal agrupamento de critérios vinculados à
segunda dimensão:
Quadro 6: categorias e subcategorias – demandantes – segunda dimensão (autoria própria).
A visão pragmática esperada dos profissionais entrevistados que representam os stakeholders
demandantes (empresários e políticos) é confirmada de modo curioso: todos demonstram
interesse restrito no cumprimento do projeto acertado com os executores, não havendo espaço
para nenhum questionamento sobre a possibilidade de serem atingidos outros resultados além
da demanda contratada. A descrição analítica feita a partir das falas (visão técnica: além da
demanda original) resumiu uma série de “nãos”. A assumida visão de curto prazo restringiu a
Planejamento
Expectativa
Atender às demandas Educação Corporativa
Inclusão Horizontes
Resultado Esperado da Qualificação
Dimensão Categorias Subcategorias
52
expectativa de ganhos percebidos posteriormente. Contudo, ao serem questionados quanto à
expectativa de demanda futura, há uma contagiante empolgação com seu potencial, conforme
fala secretário executivo do Programa de Mobilização da Indústria Nacional de Petróleo e Gás
Natural (PROMINP):
"porque veja é um efeito desencadeador e multiplicador imenso, o efeito
multiplicador de uma refinaria efeito direto e indireto, efeito... São duzentos e trinta
mil empregos em diversas fases" (Demandante D)
"quer dizer, precisa ter uma atualização sistemática, porque o nível de
diversificação do desenvolvimento de Pernambuco é grande e passa da área de
petróleo e gás, farmoquímico, alimentício, e... siderúrgico" (Demandante D)
"ampliando pra mais nove (sic) municípios que nós já nominamos municípios de
área de abrangência dos empreendimentos. Considerando Recife, Olinda, Paulista,
Igarassu, São Lourenço da Mata, Camaragibe e Sirinhaém e Barreiros"
(Demandante D)
Ratificando a visão objetiva deste grupo de entrevistados, sua percepção unânime de enormes
oportunidades permite antever um delineamento de solução futura para a constância do
desenvolvimento da mão-de-obra local; similar a um esforço consciente para a construção de
uma universidade corporativa setorial, os entrevistados demonstram que estão negociando
futuras ações que reforçam a idéia de um movimento novo e concentrado para subsidiar
determinados focos de crescimento. As próximas citações encontram eco em cada um dos
entrevistados deste grupo de stakeholders demandantes:
"a academia, nós tamos fazendo uma ação junto com a PROMINP (...) nós temos o
núcleo de informática da Universidade Federal de Pernambuco (...) nosso desafio é
discutir a parte de estruturação de simuladores para máquina pesadas internacional"
(Demandante D)
"Centro Brasileiro de Energia Eólica, da Universidade Federal e que nós estamos
fazendo um pólo de desenvolvimento na área de componentes de energia eólica em
Pernambuco" (Demandante D)
53
"os docentes, porque eles estão defasados, também, tecnologicamente na fase desse
novo empreendimento (...) , já tem um projeto lá pro nivelamento básico, para o
ensino a distância... Tem que reciclar os docentes, tem que colocar eles, também, na
rota do desenvolvimento, porque se não..." (Demandante D)
"eles vão ter uma condição muito grande de estar preparado para as demais
empresas da região, tem muita empresa chegando. Nós temos hoje oitenta e uma
empresas na região e têm outras chegando, a própria refinaria (...) Tem a prestação
de serviço..." (Demandante B)
"teve, acredito, 60% dos pernambucanos e 40% dos outros Estados, nós
conseguimos sensibilizar a Petrobrás de que isso não precisaria ser feito na
universidade corporativa, inclusive, já que a refinaria está aqui prestigiando as
instituições locais " (Demandante D)
A terceira dimensão procura tratar da ‘amplitude da visão quanto às pessoas’. Ao contrário
das duas dimensões anteriores, que buscam identificar os limites da percepção dos
entrevistados, esta nova dimensão pretende entender como são previstas conseqüências
externas do trabalho, bem como esclarecer as dificuldades internas que porventura possam vir
a ser obstáculos futuros a novos trabalhos como o que está em estudo. A categorização desta
dimensão trata do ‘tempo’, assunto recorrente durante boa parte de todas as entrevistas, além
de fazer referências ao próprio caso em estudo, que divide opiniões quanto a ser um ‘projeto
querido’ e ao mesmo tempo um ‘projeto renegado’. O Quadro 7 demonstra tal organização:
Quadro 7: categorias e subcategorias – demandantes – terceira dimensão (autoria própria).
Tempo
Projeto querido
Projeto renegado
Emergência Carga horária
Melhoria da educação Eficiência Infraestrutura
Papel do Estado
Amplitude da Visão Quanto às Pessoas
Dimensão Categorias Subcategorias
54
Uma aparente contradição pode ser entendida quando se faz a análise de conteúdo desta
dimensão. A percepção de sucesso na execução do projeto e seus ganhos para a sociedade e
economia são acompanhados pelo sentimento de tempo perdido, no que se refere ao
retrabalho que se configura uma ação de reforço de escolaridade. Como foi citado na
introdução desta pesquisa, ações de responsabilidade social empresarial podem resultar em
uma eventual substituição de atividades públicas pela emergência dos interesses
organizacionais. Apesar de Porter e Kramer (2006) considerarem usualmente fora do foco
estratégico de uma organização, um projeto de desenvolvimento de competências básicas
individuais no entorno das indústrias pode vir a evitar um futuro desperdício de demandas
lucrativas, a ponto do representante das indústrias de Pernambuco considerar a capacitação da
mão-de-obra como um sinalizador de infra-estrutura, perante investidores externos:
"essas empresas que aqui se instalarão são de altíssima tecnologia (...) Então, nós
temos que efetivamente ter uma mão-de-obra preparada, até porque... é ... Um
elemento que você pode captar investimento para o Estado em função disso" (...)
"Exatamente, é uma infra-estrutura, o conhecimento hoje é infra-estrutura"
(Demandante A)
A relação da ação privada em comparação com a política pública é novamente evidenciada
quando se compara o potencial de novas ações de educação setorial com o PAC (Programa de
Aceleração do Crescimento) do governo federal, conforme fala do secretário executivo
PROMINP:
"eu acho que vou lançar isso até pro secretário e vou dizer: Pernambuco é o nosso
PAE, Plano de Aceleração Educacional focado no investimento" (Demandante D)
A próxima seção trata da análise do segundo objetivo específico desta pesquisa, que é
compreender a percepção dos executores do trabalho de educação setorial ‘reforço de
escolaridade’ quanto à necessidade de desenvolvimento de competências básicas individuais
dos trabalhadores para as indústrias do complexo de Suape.
55
4.2 Análise do segundo objetivo específico
O Quadro 8, a seguir, demonstra as dimensões e categorias relacionadas ao segundo objetivo
específico desta pesquisa. A percepção dos executores foi estudada utilizando os mesmos
instrumentos de coleta de dados, método e agrupamentos de análise dos demandantes.
Portanto, como pode ser observado, a demonstração gráfica inicial desta organização analítica
é idêntica à demonstrada no Quadro 3:
Quadro 8: dimensões e categorias - executores (autoria própria).
Já a demonstração gráfica da rede de análise de conteúdo do segundo grupo de stakeholders
tem uma particularidade que difere do quadro de categorias e subcategorias dos demandantes:
não foram identificados elementos que justificassem a subcategoria ‘melhoria da educação’,
vinculada à categoria ‘projeto querido’ e à dimensão ‘amplitude da visão quanto às pessoas’.
Em contrapartida, foi acrescentada uma nova subcategoria (‘competência – visão ampla’)
dentro da categoria ‘entendimento de competência’. Segue na próxima página o Quadro 9,
que representa esta organização, similar ao Quadro 4 do primeiro grupo de stakeholders,
contendo apenas estas duas alterações:
Entendimento de competência
Modelo Americano
Planejamento
Expectativa
Tempo
Projeto querido
Tipo de Qualificação Esperada
Resultado Esperado da Qualificação
Amplitude da Visão Quanto às
Pessoas
Modelo Francês
Projeto renegado
Dimensões Categorias
56
Quadro 9: categorias e subcategorias – executores – terceira dimensão (autoria própria).
O grupo de stakeholders executores contou, dentre os entrevistados, com uma autora citada na
seção de fundamentação teórica: Joana D´Arc Machado Cerqueira, coordenadora nacional da
Universidade Corporativa do SESI - UNISESI. Apesar de não ter atuado diretamente na
formatação ou execução do projeto em estudo nesta pesquisa, seu modelo conceitual teve
importância na formulação teórica deste trabalho de educação corporativa setorial.
Diferente do grupo de demandantes, os executores trataram o termo ‘competência’
envolvendo conceitos mais profundos de educação e gestão. Tanto que a subcategoria
‘competências básicas’, uma das dezesseis relativas a este objetivo específico, responde por
35% de todas as mensagens recortadas para codificação. Das seis descrições analíticas que
procuraram explicar esta subcategoria, o ‘pensamento estruturado pelo raciocínio lógico’
consiste na mais relevante. Diretamente compatível com as expectativas demonstradas pelos
stakeholders demandantes, ‘saber pensar’ é uma competência básica aparentemente óbvia,
mas pouco presente no público em questão, caso seja feita uma rigorosa análise orientada
pelas demandas das organizações competitivas. Como o desenvolvimento primário do
pensamento analítico e lógico pode ser estimulado com uma constância de ações de
condicionamento cerebral (Pinker, 1999), esta demanda das empresas encontra respaldo direto
pelo estudo de disciplinas como matemática e lógica. De acordo com Freire (2005), a opção
pelo modelo pedagógico de contextualização permite extrair da ambiência e da experiência o
Entendimento de competência
Modelo Americano
Planejamento
Expectativa
Tempo
Projeto querido
Modelo Francês
Projeto renegado
Conceito Competência Competências Básicas Competência Visão Ampla
Domínio da Tecnologia Absorção
Contextualização Empreendedorismo
Atendimento às demandas Educação Corporativa
Inclusão Horizontes
Emergência Carga horária
Eficiência Infraestrutura
Papel do Estado
Categorias Subcategorias
57
desenvolvimento de uma pessoa mais completa. Abaixo algumas frases cortadas das
entrevistas, tomado o cuidado de não citar nenhum dos três professores que também foram
entrevistados neste grupo de stakeholders:
"o que eu quero é alguém que solde com perfeição, com perfeição... Corte a chapa
com perfeição e não me interessa a escolaridade formal. A formal interessa pouco,
mas interessa que ele domina amplamente os manuais, a leitura e a lógica e a
matemática” (Executor D)
"eu acho que essa questão do raciocínio lógico e relações interpessoais são
competências pra esse público que a gente tá querendo... Fundamentais, porque tem
que fazer com que o pessoal pense, não só fique robotizado" (Executor E)
"você precisa exercer competências básicas no respeito a competências de
linguagem, competências de raciocínio lógico, é... competências relacionadas a sua
possibilidade de lidar com as ações do mundo, de raciocínio" (Executor C)
Ainda na categoria ‘competências básicas’, um segundo grupo de descrições analíticas trata
de assunto não abordado nas demandas contratadas: ‘desenvolvimento cognitivo’. Após as
respostas às entrevistas, quando foi apresentado aos stakeholders demandantes o assunto
‘amadurecimento baseado em experiência e raciocínio’, foi unânime a importância dada ao
fato desta visão não constar do contrato inicial. Apesar de não demandado, para os executores
o desenvolvimento deste tipo de competência individual era tão básico que sua ausência não
foi questionada. Foi o secretário executivo do PROMINP o articulador de uma revisão da
demanda, garantindo a formalização da expectativa de competências básicas. Ainda nas
entrevistas realizadas com os stakeholders demandantes permanece evidente uma
compreensão superficial sobre o assunto. A seguinte fala, relativa à entrevista de uma
professora do reforço de escolaridade, é um bom exemplo da amplitude do tratamento dado,
notadamente além da simples qualificação técnica profissional:
"um suporte de exercício de cidadania, a visão ética, a responsabilidade, o respeito,
o compromisso e também as relações interpessoais que seriam: a postura
profissional, a elevação de auto-estima e também a valorização da cultura
pernambucana" (Executor H)
58
Abaixo segue outro extrato das falas de dois professores que, apesar de entrevistados
separadamente, demonstram a clareza do entendimento quanto às competências que deveriam
ser trabalhadas:
"hoje, trabalhando com matemática, você pode usar o erro, você pode errar e
trabalhar com o erro e acertar com o erro e aprender com o erro" (Executor F)
“aprender com o erro? É importante errar. É lógico que a gente recomenda que
sempre acerte, mas só não erra quem não tenta, quem não faz, não é?" (Executor B)
A frase abaixo corresponde à entrevista concedida pela gestora nacional de educação
corporativa do SESI; demonstrando alinhamento quanto ao entendimento da expectativa e do
modo de realizá-la:
"o indivíduo pode sair com conhecimento técnico sobre uma determinada área de
conhecimento, pode sair com a parte técnica formada, mas não necessariamente
com competências" (Executor C)
Abaixo, a mesma entrevistada fala sobre a abrangência que pode ter o trabalho de
desenvolvimento de competências básicas individuais:
"se você capacitou uma pessoa em competências básicas, aquela pessoa foi
trabalhar numa indústria prestadora de serviços na região, numa borracharia (...) No
comercio local, numa prestação de serviços, aquele elemento ajuda a dinamizar o
processo produtivo local, porque você coloca pessoas mais capacitadas em outros
segmentos (...) Outra empresa pequena, de um ramo diferente daquele do porto de
Suape que se instale nas imediações, pode utilizar essa competência que você
formou" (Executor C)
Além da contextualização, a transversalidade interdisciplinar é outra opção pedagógica
adotada que não constava da demanda original. Como o tempo era restrito, além de grande a
quantidade de pessoas a serem educadas, tornou-se importante o encaixe de todos os temas
tratados em sala de aula, mesmo que em diferentes disciplinas. Seguindo as orientações
pedagógicas de Freire (2005), a idéia foi utilizar a experiência como matéria-prima dos novos
conhecimentos, mas não apenas a carga de vivências, como também o que foi trabalhado em
59
dentro da sala de aula. Como exemplos práticos de como a contextualização e a
transversalidade foram tratados no ‘reforço de escolaridade’, foram selecionadas algumas
páginas das apostilas de língua portuguesa e matemática, disponíveis no Anexo B deste
estudo.
Conscientes de que estavam construindo uma das etapas mais importantes da história de boa
parte dos alunos-trabalhadores, os professores demonstraram nas entrevistas que se
comunicavam entre si e com os professores do SENAI, onde futuramente aqueles alunos-
trabalhadores iriam continuar seu aprendizado. Mesmo tratando, nesta etapa futura, apenas de
conhecimentos técnicos, a carga experimentada no reforço de escolaridade continuará
surtindo efeito por um bom tempo, em decorrência desta transversalidade dos ensinamentos.
Abaixo o relato da professora de português que assumiu, também, a tarefa de estimular os
alunos-trabalhadores a se desenvolver no relacionamento interpessoal:
"é o teu momento de estudo, mas sabendo que a partir dali vai ser um pulo, um
passo para o mercado de trabalho (...) Aí tão dizendo que eu já não estou levando
mais a área de educação, tô levando mais pro lado de empresa, isso até me
incomoda. Mas, é... Tem que ser o real. É a realidade, né? É a realidade vivenciada
no dia-a-dia, é isso que eu tenho que passar pra eles (..) Que não tinha
conhecimento e, a partir do momento que ele se dedica, lê e aprende coisas novas, é
um conhecimento que ele vai levar para o resto da vida" (Executor H)
A segunda dimensão que foi pesquisada junto aos executores foi o ‘resultado esperado da
qualificação’. Retorna um assunto tratado pelo grupo de demandantes: a educação
corporativa, agora no depoimento de um executor. É importante complementar as falas
anteriormente citadas da entrevista do diretor técnico do SENAI sobre sua impressão quanto
ao potencial de novas ações de educação corporativa:
"as top de linha, elas são capazes de fazer sua própria formação profissional, mas
não é papel dela fazer ensino médio, não é papel delas manter uma faculdade. Ouvi
do estaleiro (..): nós precisamos de engenheiro naval, engenheiro de planejamento
naval, engenheiro de estrutura naval, engenheiro de segurança com especialidade
em naval e engenheiros de instrumentação. Cinco engenheiros nós precisamos, me
entregue isso de qualquer forma, engenheiro me entregue de qualquer forma que
aqui a gente complementa" (Executor D)
60
A terceira dimensão ‘amplitude da visão quanto às pessoas’ utiliza a mesma estrutura
categórica do primeiro objetivo específico. É consenso entre todos os executores que a
urgência com que foi executado o projeto interferiu de modo negativo no aproveitamento de
seu potencial. O preparo dos professores, a entrega do material didático e a própria execução
das aulas poderia ter garantido um melhor resultado, caso os prazos fossem maiores. O
interessante é que o assunto “tempo” também foi relevante para os demandantes, no sentido
da emergência com que surgiu a demanda e a pressa para preparar os trabalhadores e dispô-
los ao mercado.
A próxima seção trata da análise do terceiro objetivo específico desta pesquisa, que é
compreender a percepção dos trabalhadores do trabalho de educação setorial ‘reforço de
escolaridade’ quanto à necessidade de desenvolvimento de competências básicas individuais
para as indústrias do complexo de Suape.
4.3 Análise do terceiro objetivo específico
O trabalho de coleta de dados para atender ao terceiro objetivo específico desta pesquisa
utilizou dois instrumentos diferentes, cujo resultado será apresentado a seguir. Se comparado
com os quadros anteriores, é possível observar que o Quadro 10, apresentado na próxima
página, demonstra novas dimensões e categorias de dados. A primeira e a segunda dimensões
foram obtidas através da análise do conteúdo das entrevistas feitas com os trabalhadores,
tendo como objetivo identificar sua percepção quanto ao desenvolvimento de competências
básicas individuais, em decorrência do caso em estudo. Já a terceira dimensão é fruto do
grupo focal realizado com alguns alunos-trabalhadores, com categorias e subcategorias
específicas.
61
Quadro 10: dimensões e categorias - trabalhadores (autoria própria).
A seguir serão apresentados os Quadros 11 e 12, que representam as duas primeiras
dimensões observadas na busca de atingir o terceiro objetivo específico desta pesquisa. Os
quadros serão apresentados em seqüência para que possa ser percebida a pequena diferença de
agrupamentos entre tais dimensões:
Quadro 11: categorias e subcategorias - trabalhadores – primeira dimensão (autoria própria).
Quadro 12: categorias e subcategorias – trabalhadores – segunda dimensão (autoria própria).
Pessoal
Mundo Exterior
Pessoal
Mundo Exterior
Conhecimento Fundamentado
Criatividade Fundamentada
Expectativa
Percepção de Auto-
desenvolvimento
Observação
Interpretação Inadequada
Dimensões Categorias
Pessoal
Mundo Exterior
Auto-estima Frustração
Horizontes Abertura Organização
Expectativa
Dimensão Categorias Subcategorias
Pessoal
Mundo Exterior
Auto-estima Frustração
Horizontes Volta ao estudo Abertura Relacionamento
Expectativa
Dimensão Categorias Subcategorias
62
A primeira dimensão representa as expectativas dos trabalhadores e sua percepção quanto às
intenções do projeto do qual eles participaram. A primeira categoria que surgiu de suas falas
foi a ‘pessoal’, organizando as subcategorias ‘auto-estima’ e ‘frustração’. Pelos conteúdos das
entrevistas é possível deduzir que o reforço de escolaridade causou severo impacto pessoal em
todos os participantes. Aparentemente uma nova dimensão de mundo se abriu para eles,
abertura esta conduzida de modo a permitir que a grande maioria dos participantes pudesse
assumir o controle das conseqüências deste insight que, em alguns casos, será a maior
oportunidade de suas vidas.
No início da entrevista foi recorrente o uso de palavras como valor, interesse, abertura,
despertar, recomeçar, futuro, esperança, oportunidade e crescimento. A descrição analítica é
representada pela expressão ‘valorização da pessoa’, cuja mensagem diz que é possível se
desenvolver, ser útil e progredir na vida.
Tal necessidade de acreditar que se tem valor suficiente para melhorar de situação contrapõe-
se com sua própria ‘história de fracassos’, expressão utilizada para representar a descrição
analítica da subcategoria frustração. Acostumado a ter mais dissabores do que alegrias, o
público entrevistado demonstra algum receio de que algo fora de seu controle saia errado e
desmanche este momento especial de esperança no próprio potencial. A auto-estima e o medo
do fracasso andam juntos no imaginário destas pessoas, provavelmente reforçado pelo choque
cultural a que foram expostos, e pela insegurança de ainda não terem completado o ciclo de
qualificação profissional pelo SENAI. Mesmo que vários dos entrevistados já sejam
funcionários “de carteira assinada” de alguma empresa de Suape, a inexperiência com a
sensação de segurança profissional é expressa no conteúdo de suas entrevistas.
Os horizontes, contudo, são tão prósperos que mesmo os mais receosos se rendem às fórmulas
que acabaram de aprender, como se fosse um caminho infalível para progredir na vida. A
maioria dos entrevistados assegura que pretende continuar estudando, estimulados pelo
recente reforço de escolaridade. Entusiasmados e com a auto-estima reforçada, eles afirmam
que sua concepção de futuro mudou à medida que tomaram consciência do retorno de seus
esforços. Via de regra, tais pessoas encontram-se em situação financeira muito delicada, e o
esforço de continuar estudando permite-lhes antever um diferencial considerável na renda em
63
médio prazo. A influência positiva desta nova visão de “mundo possível” normalmente
contagia ao menos mais uma pessoa na família, seja companheiro, irmão, filho ou amigo
próximo; foi afirmado que muitas pessoas que não participaram do reforço de escolaridade
passaram a acreditar mais em si mesmo e confiar na melhoria do futuro, caso haja um esforço
adicional e o retorno aos estudos.
A esperança declarada nas entrevistas foi classificada na categoria ‘horizontes’, e contém três
descrições analíticas distintas dispostas com freqüência similar. Alguns tratam esta visão de
futuro com uma ‘esperança emocional’, acreditando nas promessas, no governo e nos que
“comandam”. Tal comportamento passivo pode ser observado nas seguintes falas:
"estaria acreditando porque o governo não investiu o dinheiro dele à toa e o custo
disso é muito alto. E o rapaz foi bem claro: vai chamar todo mundo"
(Participante E)
"fui criado em engenho, meus pais trabalhadores rurais, mas foram as pessoas que
sempre me deram uma boa educação (...) fico até emocionado (...) mas tem
esperança, né? Porque tanto faz velho, como novo, não faz diferença"
(Participante F)
"não, isso aí, ele vai ter que esperar porque vão ser chamados (...) nessa palestra, o
rapaz que é bem claro, ele disse que todos vão ser chamados (...) Os que tiraram
melhores notas, iam ser chamados primeiros, porque ele explicou...(...) Embora que
eu seja a última, mas eu vou tá esperando. Torcendo pra ser chamada"
(Participante A)
O segundo grupo de percepções foi representado pela descrição analítica ‘esperança racional’,
que mantém suas expectativas mediante as notícias de investimentos na região. Esta postura,
ainda que representada por um comportamento um tanto passivo, ao menos fundamenta sua
crença em fatos e dados, embora não tenha controle algum sobre eles nem procure validá-los.
Algumas falas exprimem bem as percepções classificadas por este critério:
"então, se ele deu a palavra que iria chamar, então a gente tem que aguardar,
esperar que vai ser chamado. Se não for aproveitado para o Estaleiro, mas tem a
Refinaria aí" (Participante E)
64
"porque eles nos explicaram muito bem que não era só pro estaleiro, era pra
refinaria, pra empresas que tá chegando" (Participante B)
O terceiro grupo que representa a subcategoria ‘horizontes’ é representado pela descrição
analítica nomeada de ‘esperança ativa’. É mantida viva a expectativa de que as promessas de
emprego se solidifiquem, mas o próprio reforço na escolaridade permite procurar outros
empregos, visando aumentar segurança. A confiança continua, mas de maneira ativa. Duas
frases representam esta postura:
"então, acho que não deve se desesperar e também não deve parar, deve procurar
outro meio, também não vai ficar só esperando, vamos procurar outro meio, né?"
(Participante A)
“bom, eu esperaria ser chamado e tentaria procurar algum emprego enquanto o
chamado não chegava" (Participante D)
Continuando a explorar a categoria ‘mundo exterior’, iniciada pelo estudo acima da
subcategoria ‘horizontes’, é apresentada agora a subcategoria ‘abertura’. De contexto mais
social do que o anterior, de cunho econômico, a abertura aqui tratada representa três
descrições analíticas, elaboradas na tentativa de explicar diversas falas agrupadas pela
similaridade de sentido do seu conteúdo. A primeira destas descrições traduz a ‘descoberta
pessoal’ que muitos dos trabalhadores sofreram nos últimos meses. A fala de uma das
entrevistadas foi de uma sinceridade e tão direta que tem condições de representar esta
mensagem, repetida por outras pessoas:
"foi pra abrir a mente de muitas pessoas, como a minha mesma já estava totalmente
fechada" (Participante A)
Esta classificação naturalmente remete para duas novas descrições analíticas, talvez as mais
fortes e veementes de todas as 71 descrições levantadas nesta pesquisa: a ‘inclusão cultural’ e
a ‘inclusão social’. A primeira trata de algo aparentemente singelo, mas inovador para aquelas
pessoas: ver televisão, entender o que está sendo falado e ter interesse em saber mais sobre
65
tais assuntos. Abaixo será transcrita a frase de um professor, que foi entrevistado no grupo de
stakeholders executores, mas cujo depoimento representa bem a sutileza do avanço:
"notação científica, falam lá no diário, que é o jornal, 2,3 milhões de brasileiros...
Eles não sabem o que significa isso" (Executor B)
Ao demonstrar a amplitude que tomou sua vida, sem nenhuma revolução aparente, uma aluna
fez comentário que reforça as palavras supra citadas do professor:
"alertar as pessoas pra estudar mais, melhorar o conhecimento, passar a conviver,
ah... Ler mais jornal, revista, assistir mais” (Participante D)
Por fim, o terceiro agrupamento de percepções sobre o tema ‘abertura’ não trata de sua
experiência pessoal, nem de seu interesse pelas coisas do mundo, mas sim de sua descoberta
da importância das outras pessoas. O trabalho específico de relacionamento interpessoal
ajudou as pessoas a expandirem sua consciência sobre a dependência de outras pessoas, bem
como da conseqüência de suas atitudes para outros. Os entrevistados destacaram uma sensível
melhoria no relacionamento, alcançado simplesmente pela descoberta da importância “do
outro”. Novamente será apresentada a frase de uma professora, mesmo que esta tenha sido
entrevistada para atender a outro objetivo específico. Contudo, o depoimento da professora de
português permite compreender a direção que foi dada no momento da orientação da
disciplina. Imediatamente após esta frase será destacada a fala de um aluno-trabalhador que
salienta sua percepção prática desta mesma descoberta:
"a preocupação de como fazer uma entrevista em determinada empresa, seja em
Suape, seja em uma farmácia, em um supermercado... Como ter o comportamento...
(...) de como ele fazer uma entrevista, como ele se expressar, usar a oralidade, o
tom de voz, usar as três (sic) palavras mágicas, que é um boa noite, um bom dia e
um boa tarde, um por favor, um obrigada, um com licença... " (Executor H)
"como é que você vai se comportar dentro de uma empresa" (Participante E)
Completando a análise do conteúdo apreendido nas entrevistas com os trabalhadores, dentro
da categoria ‘mundo exterior’, foram organizadas algumas falas mediante a subcategoria
‘organização’, representada pela expressão analítica ‘exigir seus direitos’. Instigados a criticar
66
o projeto de reforço de escolaridade, os trabalhadores citaram uma série de melhorias
passíveis de serem colocadas em prática em uma próxima versão deste trabalho.
A segunda dimensão da pesquisa que visa atender o terceiro objetivo específico, assim como a
primeira dimensão, está agrupada pelas categorias ‘mundo exterior’ e ‘pessoal’. Contudo,
enquanto a primeira dimensão procurou organizar as expectativas, a segunda tentou dispor as
percepções do auto-desenvolvimento propriamente dito.
Sendo assim, o primeiro subgrupo de percepções trata da ‘empregabilidade’. Diferente do
cenário de Pernambuco de alguns anos atrás, no entendimento deste grupo de trabalhadores,
agora há empregos e pessoas qualificadas para disputá-los. As duas frases selecionadas a
seguir representam esta “nova fase”. Merece destaque o fato de uma delas tratar não apenas
do seu emprego, mas também do interesse em saber do emprego dos colegas:
"ser uma pessoa capacitada, que nunca tive essa oportunidade que agora eu tô
tendo" (Participante F)
"até o ponto de que, hoje, os meus companheiros que acompanharam as aulas
comigo, tiveram as aulas, eles foram... Estão, hoje, no Estaleiro, né?"
(Participante F)
A segunda descrição analítica tem relação com esta primeira citada. Para além da
empregabilidade, os trabalhadores estão pela primeira vez pensando em uma ‘carreira
profissional’, fato que confirma o conjunto da análise demonstrada até então. As falas da
entrevista de um mesmo trabalhador espelham esta preocupação também demonstrada por
outros entrevistados:
"sou soldador, me fez sonhar em ser... Dar mais um pulo que é ser inspetor de
solda" (Participante E)
"quem sabe no futuro, fazer uma faculdade e se Deus quiser, eu vou chegar lá"
(Participante E)
67
É provável não ser por acaso que justamente esta dimensão e categoria tenham o maior
número de subcategorias. O mundo exterior na percepção do auto-desenvolvimento une
pragmaticamente a mudança interna com as oportunidades externas. Sendo assim é possível
entender o contexto que confere importância para a subcategoria ‘volta ao estudo’, que é
analisada em dois pontos de vista antagônicos mas que convivem nas mesmas pessoas: voltar
a estudar é, ao mesmo tempo, ‘investimento no futuro’ e ‘resgate do passado’. A educação
será o fundamento de novas conquistas, mediante a superação dos obstáculos que
anteriormente afastaram o sujeito do estudo. As três frases citadas abaixo, ditas
separadamente por diferentes entrevistados, contêm, na sua simplicidade, um encadeamento
lógico que permite deduzir como as duas subcategorias acima podem conviver na mente de
uma mesma pessoa:
"mudou muito meu modo de pensar de estudo" (Participante B)
"a perspectiva, agora, é de não deixar de estudar" (Participante E)
"me interessar melhor pelos meus filhos" (Participante A)
O auto-desenvolvimento foi sistematicamente comentado pelos entrevistados, mesmo que não
inquiridos a este respeito. Quando se tratou de averiguar diretamente a percepção dos
trabalhadores, formaram-se três descrições analíticas sobre a subcategoria ‘abertura’. As
mesmas expressões que foram tratadas na dimensão expectativa voltaram a ser necessárias
para agrupar as percepções demonstradas como respostas às entrevistas: ‘descoberta pessoal’,
inclusão social’ e ‘inclusão cultural’. Para evitar repetir os significados já tratados
anteriormente, serão dispostas a seguir algumas frases, carregadas de significados sobre as
percepções quanto à relação do auto-desenvolvimento com a abertura ao mundo:
"eu aprendi ser uma pessoa mais interesseira (sic), antigamente, eu não tinha esse
interesse e agora eu tô tendo" (Participante F)
"melhorou meu aprendizado do dia-a-dia com as pessoas" (Participante D)
"agora tô mais aberta. Passei a falar mais um pouco" (Participante D)
68
"eu passei a ler jornal, eu não gostava, né? Revista... De vez em quando, eu assisto
televisão... Jornal... É uma coisa que eu não fazia antes. Eu passei a desenvolver
mais..." (Participante D)
"não foram só professores, como amigos e pais (...) eu acredito que quando nós
estivermos lá no Estaleiro, nós vamos lembrar deles, porque através deles, segundo
eles, foi quem nos ensinou como é que deve-se andar" (Participante F)
No âmbito ‘pessoal’ - nome da categoria que pretende averiguar a percepção de auto-
desenvolvimento dos trabalhadores entrevistados, muita coisa se repete, em relação ao que já
foi posto. Contudo, a confiança na própria capacidade e o fato das pessoas se considerarem
importantes, orgulhosas, são indícios de mudanças na estrutura psicológica e emocional. A
valorização do investimento feito em cada um deles, para usufruto dos próprios, sem a
desconfiança de que estão sendo explorados, teve um impacto acima das expectativas
originais dos demandantes. Neste sentido, três frases recortadas de dois entrevistados
diferentes são emblemáticas no seu significado (o sublinhado em uma delas representa a
entonação mais forte e emocionada no momento da fala):
"fiz na tora, naquela época não tinha curso, nem nada. Então, foi na bruta sorte, tora
mesmo, porque não tinha curso e hoje... (...) Hoje eu me sinto um cara preparado"
(Participante E)
"foi uma coisa que resgatou muita, pelo menos minha, resgatou muita coisa que eu
não conhecia da minha da nossa cultura, principalmente, da minha cultura
pernambucana, que eu sou Pernambucano ! " (Participante E)
"assim, eu sou uma pessoa muito inexperiente com essas coisas de entrevista (...)
Da próxima eu me expresso melhor porque eu nunca fui entrevistada, é a primeira
vez que eu tô começando. É, sinal que eu estou podendo, né?" (Participante A)
Chama-se ‘observação’ a última dimensão que pretende compreender a percepção dos
stakeholders alunos-trabalhadores quanto ao desenvolvimento de suas competências básicas
individuais. O nome desta dimensão decorre do fato das mensagens que foram estudadas
serem decorrentes da observação de um grupo focal. Seguindo a mesma metodologia de
análise de conteúdo, as declarações foram gravadas e transcritas, suas mensagens registradas e
agrupadas em descrições analíticas, subcategorias e categorias, demonstradas no Quadro 13:
69
Quadro 13: categorias e subcategorias – trabalhadores – terceira dimensão (autoria própria).
O grupo focal foi observado ao tratar de um tema comum: uma notícia do jornal do dia sobre
a greve dos motoristas de ônibus. Inquiridos a assumirem posturas extremas acerca do assunto
(alguns representaram os donos das empresas de ônibus, enquanto outros simularam ser os
grevistas), notou-se que para todas as pessoas a negociação fluiu mediante argumentações
baseadas nos fatos e dados do texto fornecido. A busca de soluções, inclusive, permitiu a
formulação e discussão de hipóteses. Apesar de o tema ter sido escolhido propositalmente
para despertar emoções, as discussões foram conduzidas racionalmente. As emoções
esperadas afloraram, mas foram bem administradas pelos debatedores. A empatia foi utilizada
de maneira adequada, favorecendo a clareza de idéias dos participantes. Esta investigação
sobre a ação teve como objetivo específico deduzir o quanto o reforço de escolaridade
interferiu positivamente para a segurança, desinibição e raciocínio analítico, confirmando a
contribuição de algumas das competências básicas listadas por Perrenoud (1999): argumentar
visando convencer alguém, construir uma hipótese e negociar um projeto coletivo. Algumas
falas foram pinçadas do material codificado para ilustrar a análise; o linguajar peculiar, ao
contrário de atrapalhar o entendimento, de certa forma enriquece ainda mais o que foi dito.
"Se o empresário vai a justiça, que a justiça já é feita. Por que eles fizeram a greve?
Porque eles tem direito. Então, todo ser humano tem direito e que o direito já é
feito, tá entendendo?" (Participante A – Grupo Focal)
"Porque o salário que a gente tá ganhando não tá sendo adequado aquilo que a
gente tá trabalhado (...) Segundo, nós estamos ganhando um salário de miséria (...)
terceiro que nós temos que fazer uma advertência" (Participante F – Grupo Focal)
"É por isso que eu falei ceder, né? A metade, em ambas as partes, porque ele
também tá sendo prejudicado, não é só o motorista" (Participante C – Grupo Focal)
Notação científica Experiência Citação articulada
Argumentação Hipótese
Observação
Dimensão Categorias Subcategorias
Interferência externa
Conhecimento Fundamentado
Criatividade Fundamentada
Interpretação Inadequada
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A ‘criatividade fundamentada’, nome da categoria que expressa o processo acima
demonstrado de argumentação e negociação relaciona-se diretamente com a próxima
categoria que vai ser analisada: ‘conhecimento fundamentado’. A atitude do trabalhador ao ler
o texto, fazer suas conclusões, além de procurar entender as entrelinhas, permite-lhe supor
algo como “eu sei do que estou falando”. Isto é confirmado com a utilização de fatos e dados
do texto no momento da apresentação de suas idéias e da defesa de seu ponto de vista. Outra
forma de demonstrar fundamentação no conhecimento, principalmente no caso de adultos, é
através do aprendizado pela experiência, quando o próprio sujeito valida a nova informação
dentro de uma contextualização pessoal, repleta de associações e significados relacionados
entre si. As duas frases abaixo, utilizadas no processo de discussão, tiveram o efeito de selar
aspectos que estavam sendo debatidos, tornando quase impossível a continuidade da
argumentação adversária.
"ano passado, vamos supor, a gente fez uma greve que a gente pedia vinte e quatro
vírgula oito por cento... Oitenta e sete por cento, aí vocês propôs cinco vírgula vinte
e três por cento" (Participante D – Grupo Focal)
"meu marido, agora, só vai trabalha oito horas. Quer dizer, ele passou a ganhar
menos e a gente tá vivendo, eu acostumada a ganhar mais...(...) Continua
empregado e tamos vivendo aquele menos. Aquele menos, tá dando pra viver. Vai
fazer o quê?" (Participante C – Grupo Focal)
O grupo focal foi formado por três alunos-trabalhadores com notas altas, outros três alunos de
notas baixas e dois com notas intermediárias. O interessante é que não foi unânime o
entendimento dos assuntos tratados: dois dos três alunos-trabalhadores de notas baixas
demonstraram dificuldades na interpretação do texto, fato observado pelas suas falas ao
utilizarem dados influenciados por expressões e exemplos complementares de outras pessoas,
mas sem fundamentação nos dados dispostos no texto. A amostra não tem representatividade
suficiente para confirmar a justiça das notas baixas para estes alunos, mas também não
desconfirmou o veredicto das notas. As duas frases apresentadas na próxima página servem
de exemplo, pois não têm sustentação no material utilizado (disponível no anexo A desta
pesquisa):
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"Acho que ele escreveu com a intenção de alertar os motoristas (...) estavam
correndo muito perigo, isso não só com assalto, mas buraco na pista"
(Participante H – Grupo Focal)
"A população foram pra rua brigar pelos direitos dos motoristas, dos cobradores"
(Participante G – Grupo Focal)
Com o objetivo de organizar as diversas informações e análises desta seção, serão
apresentados a seguir três quadros-resumo que expressam os resultados dos achados junto aos
stakeholders entrevistados.
O Quadro 14 apresenta o resumo da análise dos três grupos em relação às expectativas de
competências a desenvolver. Poderá ser observado que o único ponto convergente entre os
stakeholders demandantes e os executores trata-se da importância da função da articulação
realizada pelo representante do PROMINP. As percepções dos participantes, por sua vez,
ratificam, com maior ênfase, a ótica dos executores.
Expectativas de competências a desenvolver
Percepção dos demandantes Percepção dos executores Percepção dos participantes
Os stakeholders demandantes não têm claramente definido o conceito de ‘competência’
Os executores trataram o termo ‘competência’ envolvendo conceitos mais profundos de educação
e gestão
Unânimes em apontar a ‘capacidade de analisar um texto e constituir as intenções do autor’ como
a mais importante
O ‘pensamento estruturado pelo raciocínio lógico’ consiste na descrição analítica mais relevante
A necessidade de acreditar que se tem valor suficiente para melhorar de situação contrapõe-
se com sua própria ‘história de fracassos’
Existe a perspectiva de trabalho em equipe, apesar da solidão no desempenho das funções de
montagem e solda
‘Saber pensar’ é uma competência básica aparentemente óbvia, mas pouco presente no
público em questão, caso seja feita uma rigorosa análise orientada pelas demandas das organizações
competitivas
O trabalho específico de relacionamento interpessoal ajudou as pessoas a expandirem sua
consciência sobre a dependência de outras pessoas, bem como da conseqüência de suas
atitudes para outros
Não esperam que haja discussão ou argumentação quanto aos manuais de
equipamentos
Quando foi apresentado aos stakeholders demandantes o assunto ‘amadurecimento baseado
em experiência e raciocínio’, foi unânime a importância dada ao fato desta visão não constar
do contrato inicial
A confiança na própria capacidade e o fato das pessoas se considerarem importantes,
orgulhosas, são indícios de mudanças na estrutura psicológica e emocional
A função do representante do PROMINP no projeto de reforço de escolaridade foi de ligação técnica entre os demandantes e os executores
Foi o secretário executivo do PROMINP o articulador de uma revisão da demanda, garantindo
a formalização da expectativa de competências básicas
Quadro 14: quadro-resumo da análise – expectativas de competências a desenvolver (autoria própria).
72
O Quadro 15 é uma representação do resumo das análises dos conteúdos dos três grupos de
stakeholders que tratou de assuntos pertinentes ao planejamento e execução do trabalho. A
primeira linha permite observar uma divergência de percepções entre os demandantes e os
executores, sendo esta ratificada com ênfase pelos participantes. Os demais itens citados
como percepções demonstram, por sua vez, uma convergência de entendimentos de como foi
e como deveria ter sido planejado e executado o trabalho.
Planejamento do trabalho
Percepção dos demandantes Percepção dos executores Percepção dos participantes
Todos demonstram interesse restrito no cumprimento do projeto acertado com os
executores, não havendo espaço para nenhum questionamento sobre a possibilidade de serem atingidos outros resultados além da demanda
contratada
Além da contextualização, a transversalidade interdisciplinar é outra opção pedagógica adotada
que não constava da demanda original
A valorização do investimento feito em cada um deles, para usufruto dos próprios teve um impacto acima das expectativas originais dos demandantes
É consenso entre todos os executores que a urgência com que foi executado o projeto interferiu
de modo negativo no aproveitamento de seu potencial
A percepção de sucesso na execução do projeto e seus ganhos para a sociedade e economia são
acompanhados pelo sentimento de tempo perdido O assunto “tempo” também foi relevante para os demandantes, no sentido da emergência com que
surgiu a demanda e a pressa para preparar os trabalhadores e dispô-los ao mercado
Quadro 15: quadro-resumo da análise – planejamento do trabalho (autoria própria).
O Quadro 16, apresentado a seguir, completa a série de resumos das análises, demonstrando
uma convergência de percepções quanto à visão de futuro de Pernambuco, no que tange à
capacitação de profissionais para o atendimento às potenciais demandas. Apesar da
expectativa e do planejamento da execução conter divergências entre as percepções dos
diversos stakeholders, parece que finalmente há consenso quando se fala das oportunidades e
desafios do futuro.
73
Visão de futuro
Percepção dos demandantes Percepção dos executores Percepção dos participantes
A assumida visão de curto prazo restringiu a expectativa de ganhos percebidos posteriormente
Para além da empregabilidade, os trabalhadores estão pela primeira vez pensando em uma
‘carreira profissional’ A carga experimentada no reforço de escolaridade continuará surtindo efeito por um bom tempo, em
decorrência desta transversalidade dos ensinamentos
A maioria dos entrevistados assegura que pretende continuar estudando, estimulados pelo
recente reforço de escolaridade Contudo, ao serem questionados quanto à expectativa de demanda futura, há uma
contagiante empolgação com seu potencial Diferente do cenário de Pernambuco de alguns
anos atrás, no entendimento deste grupo de trabalhadores, agora há empregos e pessoas
qualificadas para disputá-los
O representante das indústrias de Pernambuco considera a capacitação da mão-de-obra como um
sinalizador de infra-estrutura
Retorna um assunto tratado pelo grupo de demandantes: a educação corporativa, agora no
depoimento de um executor Entusiasmados e com a auto-estima reforçada, eles afirmam que sua concepção de futuro
mudou à medida que tomaram consciência do retorno de seus esforços
Quadro 16: quadro-resumo da análise – visão de futuro (autoria própria).
Na próxima seção serão apresentadas as conclusões e sugestões oriundas da análise dos
resultados da pesquisa, confrontados com a fundamentação teórica.
74
5 CONCLUSÕES E SUGESTÕES
5.1 Conclusões
Porter e Kramer (2006) foram citados na primeira página da Introdução desta dissertação;
nada mais justo que sejam evocados em seu final, para que voltem a afirmar que “a única
sustentabilidade real é a duradoura”. Para que a sustentabilidade de Pernambuco e de suas
empresas possa se tornar duradoura, faz-se necessário tomar uma série de providências. E
uma delas é investir na preparação das pessoas, potencialmente a principal vantagem
competitiva pernambucana dos próximos tempos.
A presente dissertação procurou tratar deste assunto com o cuidado de quem tem nas mãos
algo de muito valor. Afinal, o ‘reforço de escolaridade’ foi a primeira ação de grande porte
envolvendo os trabalhadores da região de Suape, e ocorreu justamente no momento em que
começaram as obras de infra-estrutura que vão dar condições à instalação de grandes
empresas que deverão incrementar a renda de todo o Estado.
Como problematizado, o objetivo geral deste estudo foi compreender a percepção dos
stakeholders diretamente envolvidos no trabalho de educação setorial ‘reforço de
escolaridade’ quanto ao resultado desta ação de suporte às demandas das indústrias do
complexo de Suape. Não que haja dúvidas quanto à relevância conferida ao trabalho, contudo
mediante a compreensão da percepção de diversos pontos de vista talvez seja possível
desvendar ainda mais riquezas além das que usualmente são divulgadas.
Para tanto, na primeira etapa desta pesquisa acadêmica foi necessário entender a base teórica
relativa aos conhecimentos colocados em prática no caso de ‘reforço de escolaridade’. Neste
sentido foram estudados alguns fundamentos de responsabilidade social, desenvolvimento de
competências, aprendizagem e educação corporativa. Partindo para a coleta de dados, foram
inquiridos vinte representantes dos stakeholders que tiveram envolvimento direto com o caso
em estudo. O conteúdo de suas entrevistas foi trabalhado mediante metodologia científica, e o
resultado permite compreender um pouco mais as percepções dos envolvidos neste trabalho. É
evidente que tais percepções não podem ser generalizadas como se fossem idênticas para
todos os pares dos entrevistados: o objetivo, quando utilizada esta metodologia, é outro. A
75
profundidade do que foi exposto permite capturar parte das percepções de alguns dos
principais stakeholders deste e de outros trabalhos similares que eventualmente serão
desenvolvidos no futuro. O importante, no fundo, é a possibilidade de ampliar a visão em
relação à facetas das teorias, mediante o exemplo de um caso em estudo, fato que dificilmente
ocorreria em um exercício apenas teórico.
A pesquisa foi norteada pela busca de percepções de três diferentes grupos de pessoas, em
relação ao mesmo assunto. Por observarem ou atuarem a partir de diversas posições, era
esperado que sutilezas ganhassem forma e, juntas, formassem um novo corpo.
Na pesquisa referente ao primeiro objetivo específico, que tentou compreender a percepção
dos stakeholders demandantes do trabalho de reforço de escolaridade em relação ao
desenvolvimento de competências básicas individuais dos participantes, a discussão dos
dados resultou na compreensão de que este grupo de pessoas demonstra uma dificuldade
inicial em encarar a mão-de-obra como ‘sujeitos’. Orientados pela formação técnica (comum
a todos), e acostumados a tomar decisões sem emoções, tais stakeholders demonstram
‘objetivar’ as pessoas. Pelas suas falas, as pessoas são recursos econômicos (fazem parte da
infra-estrutura).
Além disso, foi identificado um caráter de emergência para realização do ‘reforço de
escolaridade’ que sugere servir de desculpa para a superficialidade das ações; por trás de tal
pressa encontra-se a idéia de que devem ser tratados com celeridade os assuntos de aparente
menor importância.
Contudo, tais stakeholders acreditam que capacitar é um processo simples e totalmente
mecânico, algo como: “é só empurrar conhecimento por um lado da máquina para produzir
profissionais, saindo pelo outro lado”. Esta metáfora demonstra que a partir daí a “frieza
racional” dá lugar a certo tipo de ignorância. É certo que não se espera que tais executivos
sejam especialistas em comportamento humano, contudo por falta de conhecimento aspectos
importantes deixam de ser considerados, o que pode influenciar negativamente no resultado
dos negócios. A visão linear em sua expectativa de resultados mediante a capacitação permite
reduzir sua capacidade de perceber a rede de influências e conseqüências que pode ser nutrida
por decisões lógicas - e ao mesmo tempo superficiais, quando o assunto é gestão de pessoas.
76
A situação na qual a grande quantidade dos participantes hoje se encontra favorece tal visão
linear. Em considerável parcela dos trabalhadores participantes do ‘reforço de escolaridade’, a
situação é de exclusão social. Contudo, diferente do que se costuma imaginar, a imaturidade
cognitiva demonstra ser mais severa e excludente do que a carência econômica. Decorre
naturalmente destes dois aspectos uma terceira causa excludente: a falta de horizontes. Sem
dinheiro, sem futuro e sem entender o que se passa: o relato dos trabalhadores entrevistados
demonstra uma exclusão fora das previsões dos executivos demandantes do ‘reforço de
escolaridade’, com exceção do Secretário Executivo do PROMINP, cuja missão foi de
transformar esta realidade em códigos que tenham significado na mente dos demandantes, e
retroagir aumentando a objetividade dos stakeholders executores.
Outro grupo de pessoas foi entrevistado com a intenção de atender o segundo objetivo
específico desta pesquisa, que é compreender a percepção dos stakeholders executores, no
que se refere ao desenvolvimento de competências básicas individuais para atender às
demandas das indústrias de Suape.
Comparando este grupo com o primeiro é possível inferir que os executores têm visão
diferente dos demandantes em relação à expectativa de capacitação. Apesar de não ter sido
explicitado, tão logo os executores foram chamados a planejar o trabalho elegeram a
contextualização como método de ensino. Também diferente dos demandantes, de pronto foi
identificada a oportunidade de inclusão social de parte dos participantes do curso. Tal
disparidade deve-se, em boa parte, também à formação acadêmica dos executores (todos da
área de humanas e sociais). Um detalhe sutil, mas significativo, foi a baixa ênfase no
desenvolvimento econômico e tecnológico na visão dos stakeholders executantes desta ação
setorial. Por sinal, tais profissionais somente conseguiram compreender a ênfase setorial
quando a explicação envolvia região geográfica; os interesses do setor econômico que se
tornou o distrito industrial de Suape foram pouco absorvidos por eles.
Como elemento aglutinador do “sonho” deste grupo com o pragmatismo do primeiro existe a
expectativa de perfeição do trabalho de solda naval – é um trabalho onde o erro deve ser zero.
O processo longo de qualificação e certificação deste tipo de atividade exigirá do profissional
anterior trabalho comportamental. Além da inevitável habilidade manual detalhista, o
profissional apto a desempenhar tal função, com a qualidade exigida, deve ter traços
77
comportamentais específicos, como comprometimento, paciência e exigência, por exemplo.
Como nesta função os dois grupos de stakeholders concordaram desde o início, o
representante do PROMINP conseguiu engenhosamente articular os contrapontos necessários
para as reais necessidades dos participantes serem atendidas, dentro do limite máximo de
eficiência possível. É por tal motivo que o trabalho acabou sendo executado além das
expectativas dos demandantes, mas dentro de sua expectativa urgente de tempo. Não foi nada
surpreendente, portanto, que a principal reclamação dos executores tenha sido a escassez de
tempo: a velocidade de realização do ‘reforço de escolaridade’ foi impetrada pelos
demandantes, especialistas em pressionar para que o mínimo de recurso seja consumido.
O terceiro objetivo específico que norteou a pesquisa foi compreender a percepção dos
stakeholders participantes do ‘reforço de escolaridade’ em relação às competências básicas
individuais desenvolvidas.
O resultado obtido pelas entrevistas foi de profunda percepção de desenvolvimento de suas
próprias competências básicas. Nem todos, contudo, entendem como tal “despertar” poderá
ser útil no ambiente profissional, já que aparentemente os ganhos foram mais pessoais do que
de conhecimento técnico. Como a intenção era exatamente esta, o resultado sugere que o
trabalho teve o resultado esperado. O fato do entrevistado não ter consciência das
competências que lhe serão exigidas impede-lhe de vincular os ganhos aparentemente só
pessoais com a melhoria de relacionamento interpessoal, entendimento de informações
secundárias, consciência ambiental e desenvolvimento de raciocínio lógico e espacial. É
possível que apenas a melhora do raciocínio numérico possa ser percebida pelo trabalhador
como algo que possa ser útil no seu trabalho.
Como o projeto ‘reforço de escolaridade’ tem como fundamento a educação setorial, a
expectativa de aproveitamento do empregado vai além das primeiras empresas contratantes,
neste início de obras estruturadoras em Suape. Despertado o interesse em continuar
estudando, a tendência de melhoria da escolaridade já é fato, o que sugere desenvolvimento
intelectual e econômico da massa trabalhadora da região nos próximos anos, já que todos os
entrevistados alegaram que desdobraram sua visão de futuro junto a seus familiares: o aluno-
trabalhador passou a ser agente multiplicador do desenvolvimento individual.
78
Um aspecto tão importante quanto a melhoria de condições de empregabilidade é a descoberta
das próprias potencialidades, o aumento de auto-estima e de consciência social. Tais
características foram demonstradas como percebidas nas respostas às entrevistas e,
principalmente, observadas nas dinâmicas do grupo focal.
Os resultados com o ‘reforço de escolaridade’ sugerem que, além da expectativa dos
demandantes de garantir o entendimento mínimo da população carente da região para os
cursos de qualificação profissional ministrados pelo SENAI, foram também atingidos as
expectativas dos executores, em relação à inclusão social. Quanto aos stakeholders
participantes, na verdade suas expectativas eram modestas; as carências, contudo, enormes.
Sua percepção é de superação das expectativas, alguma consciência das carências e uma
melhoria razoável nas suas condições de redução de problemas sociais e econômicos em um
futuro de médio prazo.
Os stakeholders que demonstraram maior satisfação, contudo, foram os vinculados com os
poderes públicos. Nem tanto pelo resultado imediato deste trabalho, mas principalmente pela
confirmação do instrumental necessário para alavancar grandes quantidades de pessoas
carentes em direção a uma melhor qualidade de vida: a educação. Como este é um trabalho de
longo prazo, o alento complementar é a influência positiva dos pais participantes do ‘reforço
de escolaridade’ em relação ao aumento do interesse nos estudos de seus filhos.
Atendidos os objetivos específicos, e por conseqüência o objetivo geral, é possível agrupar e
resumir as principais conclusões:
A primeira delas é que as discussões dos dados sugerem que a visão estratégica linear dos
demandantes foi retificada pela correta escolha dos agentes terceirizados – SESI e SENAI,
representantes patronais com experiência em educação.
Outra conclusão é que efetivamente o governo do Estado agiu com visão de educação setorial.
Também se conclui que é viável ser trabalhado o desenvolvimento de competências básicas
individuais dentro de um contexto profissionalizante.
79
Nova conclusão é que as organizações não aparentaram perceber seus recursos humanos
como estratégicos, o que sugere uma oportunidade de melhoria.
E, por fim, sugere-se uma especulação baseada nas respostas obtidas: é possível que a cultura
secular de exploração da região tenha sido a causa da não consideração dos recursos humanos
como potencial vantagem competitiva (e, por conseqüência, o Estado ter uma “infra-estrutura
humana” pouco atraente).
A próxima seção vai tratar das sugestões de melhoria para novas versões do ‘reforço de
escolaridade’, bem como de proposições para novas pesquisas.
5.3 Sugestões
Algumas sugestões podem ser feitas, como decorrência do que foi estudado nas teorias e na
pesquisa de campo:
Sugere-se que a comunidade acadêmica se aproxime mais do complexo de Suape, pois o
momento estruturado requer o desenvolvimento de novas pesquisas complementares sobre os
assuntos tratados nesta dissertação, em especial educação setorial.
Além disso, a região demonstra que será grande demandante de gestores qualificados; sugere-
se que os alunos-trabalhadores sejam estimulados desde os cursos médio, de graduação e pós-
graduação a realizarem pesquisas regulares sobre inovação tecnológica, desenvolvimento de
produtos, soluções de logística, arranjos produtivos locais, estudos de viabilidade de
investimentos e gestão de projetos focados na região de Suape.
Quanto às novas turmas de reforço de escolaridade, sugere-se um cuidado especial quanto ao
planejamento logístico, além de incluir no conteúdo temas que estimulem e fundamentem o
empreendedorismo, já que nem todos precisam ser empregados em Suape.
80
Aos alunos-trabalhadores que concluíram o curso de ‘reforço de escolaridade’ poderiam ser
desenvolvidos novos trabalhos em seqüência a este, enfocando a educação continuada em
cursos de menor duração para aplicação profissional.
Aproveitando o universo dos atuais alunos sugere-se uma pesquisa que aprofunde um
importante aspecto que chamou a atenção: o desenvolvimento da auto-estima dos
participantes mediante sua inclusão social.
Considerando a grande quantidade de pessoas que ainda necessitam de elevação de
escolaridade, sugere-se avaliar a possibilidade deste trabalho ser realizado utilizando a
tecnologia de educação a distância.
Como proposta de pesquisa futura sugere-se investigar os mesmos alunos-trabalhadores em
um outro momento profissional, acerca do desenvolvimento de suas competências básicas
individuais, permitindo uma futura visão longitudinal, considerando o presente estudo.
Um outro tema importante para estudo futuro seria analisar o efeito multiplicador das ações
do ‘reforço de escolaridade’ em aspectos de ordem social.
Pernambuco vive um momento especial; contudo, em um dado momento, o ‘futuro’ vai
transformar-se em ‘hoje’. Importa acertar nas ações agora para que, neste futuro, todos os
investimentos feitos não tenham sido em vão.
Para além da visão econômica do desenvolvimento do Estado, é interessante ajustar o foco na
necessidade do desenvolvimento das pessoas. Seja considerando a ótica de profissionais
representando a infra-estrutura pernambucana, ou a partir da preocupação com o nivelamento
por cima do padrão de vida do povo mais humilde, é importante um acréscimo nos estudos
aplicados do desenvolvimento desta parcela da sociedade. Sublimar a cultura de exploração,
elemento integrante das raízes históricas desta região do Brasil, urge que ocorra de forma
planejada e sustentável. A eminente migração dos cortadores de cana para o ambiente fabril
em Suape é um exemplo arrebatador da gritante necessidade de se repensar a relação
empresa-empregado; mais do que isso, a inclusão destas pessoas na rede cultural e econômica
81
representa a ampliação da intensidade desta espiral de desenvolvimento que os investimentos
privados representarão no PIB do Estado.
Crescer sustentavelmente representa mais do que uma política de governo, ou o
aproveitamento das potenciais oportunidades que se apresentam; crescer sustentavelmente
significa atuar conscientemente da base para o topo da pirâmide social, considerando o
entorno do desenvolvimento e as relações encadeadas deste arranjo produtivo. Fortalecidos
pelos ideais da responsabilidade social, mas acima destes pela necessidade estratégica de
agregar valor, a consciência empresarial no desenvolvimento de sua mão-de-obra potencial
preenche as lacunas sociais que as próprias desigualdades de poder econômico provocaram,
ao longo das últimas décadas.
Assim sendo, desenvolver as competências básicas significa garantir o necessário salto
coletivo de pessoas esquecidas para um novo patamar de consciência e participação social. Os
ganhos desta ação continuarão sendo percebidos após um melhor aprendizado
profissionalizante: uma sociedade mais equânime, justa e participativa.
82
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88
APÊNDICES
Apêndice A - Roteiro de entrevista - demandantes
Objetivos Específicos: Compreender a percepção dos demandantes do trabalho de educação
setorial em Suape quanto à necessidade de desenvolvimento de competências básicas
individuais dos trabalhadores para as indústrias do complexo de Suape.
a) Caso alguém comentasse sobre o trabalho de reforço de escolaridade que está sendo feito
junto ao público da região de Suape e utilizasse a expressão “competência”, qual seria o seu
entendimento sobre este termo?
b) Em sua opinião o trabalho de reforço de escolaridade deveria ter o objetivo de desenvolver
competências individuais? Se sim, cite algumas.
c) No seu entendimento o governo do Estado (e potencialmente alguma empresa de Suape)
expressou alguma expectativa quanto ao desenvolvimento de competências individuais
relativas aos alunos classificados para receber o reforço de escolaridade? Se sim, cite algumas
destas competências desejadas por estes patrocinadores.
d) No seu entendimento houve algum tipo de preparação especial para que tais competências
individuais pudessem ser desenvolvidas através do trabalho de reforço de escolaridade? Se
sim, qual?
e) Caso nem todos os alunos sejam empregados pelas empresas do complexo de Suape, que
competências individuais continuariam sendo importantes para sua participação na cadeia
produtiva da região?
f) Na lista de competências básicas individuais abaixo, cite qual (ou quais) seria a mais
importante para ser desenvolvida junto ao público que hoje estuda no reforço de escolaridade:
• analisar um texto e constituir as intenções do autor,
• argumentar com a finalidade de convencer alguém cético ou um oponente,
• construir uma hipótese e verificá-la,
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• detectar uma falha no raciocínio de um interlocutor,
• negociar e conduzir um projeto coletivo.
g) Qual a sua percepção quanto ao trabalho de reforço de escolaridade realizado pelo
SESI/SENAI?
h) Se uma nova versão pudesse ser colocada em prática, o que poderia ser melhorado?
As intenções destas duas perguntas são evidentes a partir da análise de seu próprio enunciado.
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Apêndice B - Roteiro de entrevista - executores
Objetivos Específicos: Compreender a percepção dos executores do trabalho de educação
setorial em Suape quanto à necessidade de desenvolvimento de competências básicas
individuais dos trabalhadores para as indústrias do complexo de Suape.
a) Caso alguém comentasse sobre o trabalho de reforço de escolaridade que está sendo feito
junto ao público da região de Suape e utilizasse a expressão “competência”, qual seria o seu
entendimento sobre este termo?
b) Em sua opinião o trabalho de reforço de escolaridade deveria ter o objetivo de desenvolver
competências individuais? Se sim, cite algumas.
c) No seu entendimento o governo do Estado (e potencialmente alguma empresa de Suape)
expressou alguma expectativa quanto ao desenvolvimento de competências individuais
relativas aos alunos classificados para receber o reforço de escolaridade? Se sim, cite algumas
destas competências desejadas por estes patrocinadores.
d) No seu entendimento houve algum tipo de preparação especial para que tais competências
individuais pudessem ser desenvolvidas através do trabalho de reforço de escolaridade? Se
sim, qual?
e) Caso nem todos os alunos sejam empregados pelas empresas do complexo de Suape, que
competências individuais continuariam sendo importantes para sua participação na cadeia
produtiva da região?
f) Na lista de competências básicas individuais abaixo, cite qual (ou quais) seria a mais
importante para ser desenvolvida junto ao público que hoje estuda no reforço de escolaridade:
• analisar um texto e constituir as intenções do autor,
• argumentar com a finalidade de convencer alguém cético ou um oponente,
• construir uma hipótese e verificá-la,
• detectar uma falha no raciocínio de um interlocutor,
• negociar e conduzir um projeto coletivo.
91
g) Qual a sua percepção quanto ao trabalho de reforço de escolaridade realizado pelo
SESI/SENAI?
h) Se uma nova versão pudesse ser colocada em prática, o que poderia ser melhorado?
As intenções destas duas perguntas são evidentes a partir da análise de seu próprio enunciado.
92
Apêndice – C - Roteiro de entrevista – alunos-trabalhadores
Objetivo: Compreender a percepção dos alunos participantes do trabalho de educação setorial
em Suape quanto ao desenvolvimento de suas competências básicas individuais (conforme
teoria de Perrenoud).
a) Depois de sua participação neste trabalho de reforço de escolaridade, qual a sua percepção
quanto ao seu desenvolvimento pessoal e profissional? Algo mudou? O quê?
b) Em sua opinião quem planejou este reforço de escolaridade tinha que tipo de expectativas?
c) Até que ponto você considera que atingiu estas expectativas?
d) Pense nos seus colegas de curso que continuam desempregados. Se você estivesse no lugar
deles, o que estaria pensando sobre sua participação no reforço de escolaridade?
e) Qual a sua percepção quanto ao trabalho de reforço de escolaridade realizado pelo
SESI/SENAI?
f) Se uma nova versão pudesse ser colocada em prática, o que poderia ser melhorado?
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ANEXOS
Anexo A – Texto para Grupo Focal
Fonte: Jornal do Commercio, 26/06/2008.
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Material Didático de Matemática
Recife, 2007
Anexo B – Páginas das Apostilas
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Sumário
1. NÚMEROS, PARA QUE TE QUERO? .................................................................... 3 2. QUAL É O PROBLEMA? ........................................................................................ 7 3. ONDE ESTOU? PARA ONDE VOU? ...................................................................... 8 4. 100 PROBLEMAS! .................................................................................................. 12 5. EM SEQÜÊNCIA ..................................................................................................... 15 6. CRESCER PARA EMPREGAR .............................................................................. 19 7. COMPOSTO OU DECOMPOSTO? ........................................................................ 21 8. 100 PROBLEMAS! ................................................................................................... 24 9. PONTO DE VISTA ................................................................................................... 27 10. QUAL É O PROBLEMA? ......................................................................................... 31 11. CABE OU NÃO CABE? ............................................................................................ 32 12. INCLUSÃO DIGITAL................................................................................................ 36 13. QUEM SOU EU? ...................................................................................................... 38 14. 100 PROBLEMAS! .................................................................................................. 40 15. PEQUENAS GRANDEZAS, GRANDES MEDIDAS ............................................. 43 16. QUAL É O PROBLEMA? ........................................................................................ 46 17. POR QUEM? POR CEM! ......................................................................................... 46 18. AGRONEGÓCIO....................................................................................................... 48 19. ARTE COM SIMETRIA............................................................................................ 49 20. 100 PROBLEMAS! ................................................................................................... 53 21. QUEM PARTE E REPARTE..................................................................................... 56 22. QUAL É O PROBLEMA? ......................................................................................... 58 23. POSSÍVEL POSSIBILIDADE .................................................................................. 59 24. ÁGUA: ESCASSEZ E DESIGUALDADE ............................................................. 62 25. DESCE BEM? DECIMAIS! ..................................................................................... 64 26. 100 PROBLEMAS! ................................................................................................... 66
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1) Observe o cupom fiscal abaixo.
a) O que significam os números indicados pela letra A?
b) E os indicados pela letra B?
c) Qual o 2º produto registrado no caixa? E o 3º?
d) O que significam os números indicados pela letra C? e) Em que dia e hora foi emitido esse cupom?
1. NÚMEROS, PARA QUE TE QUERO?
A
B
C
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f) Quanto o cliente poderia ter dado ao caixa, para facilitar o troco e receber 10
reais? 2) Xurupita das Couves fez uma compra no valor de 134 reais nas Casas Mania e
vai realizar o pagamento em cheque. Preencha o cheque de Xurupita. 3) O quadro abaixo mostra o comprimento total de alguns rios. Represente esse comprimento em algarismos.
Rio Comprimento em quilômetros Em algarismos Rone oitocentos e doze Danúbio dois mil oitocentos e cinqüenta Amazonas sete mil e vinte e cinco Sena setecentos e setenta e seis Mississipi três mil setecentos e oitenta Nilo seis mil e setecentos Yang Tse Kiang cinco mil e quinhentos a) Qual o rio mais comprido? b) Quantos quilômetros o rio Amazonas tem a mais do que o rio Nilo? 4) Um sistema bastante prático para representar números é o utilizado pelas calculadoras. A partir de uma forma básica, é possível representar qualquer algarismo. Por exemplo, ao lado representamos o número 13.
Banco
999 Agência
1234 Conta
3456789-0 Cheque No
011222 R$
ou à sua ordem
e centavos acima
Pague por este cheque a quantia de
H BANCO HORTA
AG RECIFE RUA CENOURAS, 55RECIFE – PE
de de 20
XURUPITA DAS COUVES CPF 123.456.789-00 Cliente desde 03/1997
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Usando esse sistema, represente os números indicados abaixo.
a) quarenta e sete
b) três mil e sessenta e oito c) duzentos e cinco
5) A Refinaria Abreu e Lima, que está sendo construída em Suape, vai aumentar a capacidade de refino no país em 0,8 milhões de barris de petróleo por dia, gerando 1,5 mil empregos diretos, e permitindo a arrecadação de 2,05 bilhões de reais por ano, em impostos. No quadro abaixo, represente esses números em algarismos e por extenso.
Número Em algarismos Por extenso 0,8 milhões 1,5 mil 2,05 bilhões 6) Associe cada um dos números abaixo à sua representação em algarismos.
23,4 milhões 2 340
2,34 mil 23 400
2,34 milhões 2 340 000
23,4 mil 23 400 000 7) Uma outra maneira de representar grandes números é usando a notação científica. Por exemplo, um milhão e oitocentos mil pode ser representado por 1,8 x 106. O quadro abaixo mostra as distâncias aproximadas que separam o sol dos planetas de nosso sistema. Represente cada um desses números em notação científica.
Planeta Distância em quilômetros Em notação científica Terra Cento e cinqüenta milhões Júpiter Setecentos e setenta e oito milhões Vênus Cento e oito milhões Saturno Um bilhão quatrocentos e vinte e sete milhões Netuno Quatro bilhões quinhentos e cinco milhões Mercúrio Cinqüenta e oito milhões Plutão Cinco bilhões novecentos e treze milhões Urano Dois bilhões oitocentos e sessenta e nove milhões Marte Duzentos e vinte e oito milhões
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2. QUAL É O PROBLEMA? Qual é o problema que José Ricardo precisa resolver?
Crie problemas para a situação acima. NA CABEÇA
Calcule mentalmente:
19 – 12 = 9 – 2 = 29 – 22 = 139 – 132 = 21 – 7 = 22 – 8 = 23 – 9 = 24 – 10 = 40 + 60 + 3 = 50 + 7 + 30 = 10 + 4 + 9 = 8 + 20 + 6 =
100
LÍNGUA PORTUGUESA COLETÂNEA DE TEXTOS
101
ÍNDICE
MÓDULO UNIDADE TEXTOS
Textos 1 e 2 - Calunga e Reisado (Dicionário do Folclore Brasileiro, de Luís da Câmara Cascudo) – verbetes Texto 3 – Mapa de praias de Pernambuco - mapa
UNIDADE 1 Pernambuco é o lugar!
Texto 4 - O Litoral Pernambucano – texto expositivo Texto 1 - A chegada dos europeus (Antônio Paulo Rezende) - texto expositivo
Texto 2 - A cobiça flamenga (Antônio Paulo Rezende) - texto expositivo
UNIDADE 2 Recife: um lugar de muitas histórias...
Texto 3 - O boi não bateu asas, mas voou – matéria da revista Ciência Hoje
Texto 1 – Leão do Norte (Lenine e Paulo César Pinheiro) – letra de música UNIDADE 3
Caldeirão de cultura pernambucana Texto 2 – Meu signo de artista (Antônio Nóbrega)
Texto 1 – Economia de Pernambuco (Wikipédia) - verbete de enciclopédia virtual
MÓD. 1 P E R N A M B U C O
UNIDADE 4 Economia em Pernambuco:
mudanças à vista Texto 2 – PIB de Pernambuco entre 1994 e 2004 (Wikipédia) - gráfico
Texto 1 - Revolução Industrial UNIDADE 1 O que é trabalho? O que é emprego?
Texto 2 – O trabalho e o emprego
Texto 1 - Rosalba exalta trabalho voluntário da Liga Norte Riograndense Contra o Câncer - notícia Texto 2 - Voluntariado em alta – notícia Texto 3 - IAP cadastra voluntários para trabalhar em parques estaduais durante o feriado - notícia Texto 4 - Asilo São Vicente de Paulo parabeniza voluntários no Dia Nacional do Voluntariado - notícia
UNIDADE 2 Diversas formas de
trabalho
Texto 5 - Companhia Agrícola Harmonia: um caso de autogestão de empresa pelos trabalhadores - notícia
Texto 1 - A crise no mundo do trabalho (Glória Kok) – texto didático UNIDADE 3
Trabalho e (des)emprego
Texto 2 - Falta pessoal qualificado para refinaria Abreu e Lima – notícia
Texto 1 – 10 minutos para você - folheto informativo
MÓD. 2 T R A B A L H O
UNIDADE 4 Saúde e Trabalho Textos 2 e 3 - Torne seu ambiente de trabalho
confortável a você (Quadra Virtual) - dicas
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Textos 1 e 2 – Manguezal (Roger Mello) – texto expositivo e Os manguezais, de norte a sul – texto expositivo.
UNIDADE 1 Manguezais e meio
ambiente Texto 3 – Manguetown (Nação Zumbi) – letra de música Texto 1 – Como acontece o efeito estufa (revista Nova Escola) - infográfico Textos 2 – O que o aquecimento global pode causar ao Brasil? (Luiz Iria Sattu e Vilmar Oliveira) - infográfico
UNIDADE 2 Aquecimento global
Texto 3 – Na terra onde as crianças não andam (Silva Bessa) - reportagem Texto 1 – Responsabilidade social e meio ambiente (Flavio Valsani) – artigo de opinião Texto 2 - Sustentabilidade da Economia Florestal (Instituto Ethos) – texto expositivo Texto 3 - Responsabilidade Frente às Gerações Futuras (Instituto Ethos) – texto expositivo
MÓD. 3 M E I O A M B I E N T E
UNIDADE 3 Preservar o meio ambiente: quem é responsável?
Texto 4 - Dicas para um consumo responsável (WWF-Brasil) – dicas
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5) O mapa ao lado mostra um pedaço do litoral sul de Pernambuco.
Escala
1 : 5000 000 a) Quantos quilômetros
percorre uma pessoa que sai do Porto de Suape e chega em Nossa Senhora do Ó, passando pelas rodovias PE-060 e PE-038?
b) Rui e Rogério combinaram
de se encontrar no Cabo de Santo Agostinho. Rui saiu do centro de Recife e pegou a BR-101, que está duplicada, até chegar no centro do Cabo. Rogério saiu de Candeias, mas preferiu ir por Ponte dos Carvalhos, apesar dos buracos na pista, até o centro do Cabo. Qual dos dois percorreu a maior quilometragem? Quantos quilômetros a mais?
c) Um Ultraleve decolou de
Candeias e, voando sempre em linha reta, sobrevoou Gaibu e depois Porto de Galinhas, até pousar em Serrambi. Supondo que ele tenha feito essa viagem a uma velocidade de 50 km/h, e sabendo que ele decolou de Candeias às 9 horas, a que horas ele pousou em Serrambi?
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O boi não bateu asas, mas voou
Conheça a incrível história do animal que passeou pelos céus de Recife no século 17!
E então: você acreditaria se alguém lhe contasse que boi voa? Brincadeira ou não, no tempo em que os holandeses invadiram o Recife, um boi voou nos céus da cidade. Essa história, que pode parecer sem pé nem cabeça, começa assim...
Você já deve ter ouvido falar que, para explorar as riquezas naturais do Brasil, veio gente de toda parte. Entre 1580 e 1640, os reinos de Portugal e Espanha dividiam o domínio de nosso território. Nessa história, havia também os holandeses, antigos parceiros dos portugueses na produção de açúcar e responsáveis por sua distribuição no mundo, mas inimigos dos espanhóis. E aí, tudo começa.
Proibidos pelos espanhóis de continuar no Brasil, os holandeses, a partir de 1630, invadiram e dominaram boa parte do Nordeste. Até 1654, fizeram a sede do governo Brasil Holandês em Pernambuco. Entre seus principais feitos está a fundação da cidade de Maurícia, na Ilha chamada Antonio Vaz, atual Recife. O nome da cidade foi uma homenagem ao governante mais famoso nas conquistas holandesas no nordeste brasileiro: o Conde Maurício de Nassau. Ele governou o chamado Brasil holandês entre os anos de 1636 e 1644, e foi o responsável pelo inesperado vôo do tal boi.
Um dia, um boi, uma ponte
No dia 28 de fevereiro de 1644, um domingo, seria inaugurada uma ponte de madeira que o Conde de Nassau havia construído em Recife. Para a ocasião, o nobre holandês organizou um grande espetáculo de comemoração que marcaria também o dia de sua partida do Brasil em retorno à Holanda. Ele queria muita gente e, para isso, conclamou toda a população para assistir a um fato inusitado: ele faria “um boi voar” sobre sua ponte. A ponte sobre o rio Capibaribe separava Recife, sede do governo, da ilha de Antonio Vaz, onde o Conde morava. Era uma obra grandiosa. A ponte possuía uma parte levadiça, permitindo a passagem de grandes embarcações. E o boi, como havia prometido o governante, iria voar sobre ela.
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Ninguém conseguia imaginar de que forma um animal pesado e terrestre como um boi poderia voar. Nassau, por sua vez, aproveitaria a curiosidade geral para ganhar dinheiro e recuperar os gastos com as obras de construção. Todos que quisessem assistir ao espetáculo teriam de pagar uma quantia em dinheiro.
No finzinho da tarde do domingo, o Conde colocou um boi empalhado pendurado numa corda que estava amarrada entre as duas torres do Palácio Friburgo, sede de seu governo, pagando sua dívida com a sociedade. Como assim? Embora parecesse mágica ou algo inexplicável, Maurício de Nassau nada mais fez do que usar sua engenhosidade e seus conhecimentos básicos de ciência. Primeiro, escolheu o animal que participaria do espetáculo. Deveria ser um boi manso, que se mantivesse parado durante todo dia, para ser observado por todos. Escolheu então o "boi do Melchior", um animal de pêlo amarelado, famoso na cidade por entrar nas casas e subir escadas. Enquanto o povo observava de dia, no chão, o boi que iria voar à noite, o Conde ordenou que se arranjasse um bom pedaço de couro, do tamanho mesmo de um boi de verdade. Empalhado, o pedaço de couro foi inflado como um balão. Aí, foi amarrado em cordas bem finas, que não pudessem ser vistas pelo público, que lotava as praias e os barcos. Preso por roldanas, o falso boi foi controlado por alguns marinheiros que o faziam dar muitas cambalhotas em pleno ar para o delírio de todos que pagaram para assistir ao grandioso espetáculo! A apresentação aconteceu com a presença de muitas pessoas, certamente de queixo caído ao ver algo tão inesperado e maravilhoso. O conde foi muito aplaudido pela sua peripécia. Maurício de Nassau cumpriu a promessa de fazer um boi voar, ficando muito conhecido e admirado por todas aquelas pessoas pela sua criatividade e astúcia.
A inauguração da ponte com boi voador fez tanto sucesso que entrou para a história dos holandeses em Pernambuco. E mais, os cofres da Coroa holandesa faturaram uma boa cifra com a cobrança de ingressos, recuperando quase todos os gastos com a construção da ponte. Por causa desta peripécia, de outras tantas e de suas grandes obras, o conde se tornou um personagem lembrado ainda hoje pelos pernambucanos. A história do boi voador atravessa os tempos. Já virou letra de música e até tema de Escola de Samba!
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TEXTO 1 Leão do Norte (Lenine e Paulo César Pinheiro)
Sou o coração do folclore nordestino Eu sou Mateus e Bastião do Boi Bumbá Sou o boneco do Mestre Vitalino Dançando uma ciranda em Itamaracá Eu sou um verso de Carlos Pena Filho Num frevo de Capiba Ao som da Orquestra Armorial Sou Capibaribe Num livro de João Cabral Sou mamulengo de São Bento do Una Vindo no baque solto de maracatu Eu sou um auto de Ariano Suassuna No meio da feira de Caruaru Sou Frei Caneca do Pastoril do Faceta Levando a Flor da Lira Pra nova Jerusalém Sou Luis Gonzaga E eu sou mangue também Eu sou mameluco Sou de Casa Forte Sou de Pernambuco Sou o Leão do Norte Sou Macambira de Joaquim Cardoso Banda de Pifo no meio do Carnaval Na noite dos tambores silenciosos Sou a calunga revelando o Carnaval Sou a folia que desce lá de Olinda O Homem da Meia-Noite Puxando esse cordão Sou jangadeiro Na festa de Jaboatão Eu sou mameluco... (Gravadora Trama)
Para saber mais sobre Lenine, acesse os sites http://www.sobrecarga.com.br/node/view/6004. http://www.lenine.com.br/
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