View
214
Download
0
Category
Preview:
DESCRIPTION
Ramiro Marques 2015
Citation preview
2
Envolvimento das famílias no jardim-de-infância e nas escolas do 1º CEB: tendências e
diferenças
Há precisamente dez anos que tenho vindo a realizar estudos sobre a colaboração escola-
família, utilizando uma metodologia de investigação-acção. De comum a todos os estudos, a
coordenação de Don Davies, os apoios institucionais do Institute for Responsive Education
(Boston) e o trabalho de uma equipa de investigadores portugueses constituída, entre outros,
por Pedro Silva e Ricardo Vieira (ESE de Leiria), Luís Souta (ESE de Setúbal) e Adelina Villas-Boas
(Universidade de Lisboa). A maior parte dos estudos realizou-se em escolas públicas do 1º ciclo,
mas houve oportunidade de realizar um estudo que incluiu educadores de infância e mães com
crianças a frequentar o jardim de infância. Foi possível, ainda, comparar os resultados dos
estudos conduzidos em Portugal, com estudos realizados nos EUA e na Grã-Bretanha, utilizando
metodologias e instrumentos de recolha de dados idênticos ou iguais.
A primeira surpresa consistiu na semelhança dos resultados nos três países, os quais poderão
ser resumidos da seguinte forma: 1) há obstáculos à colaboração escola-família que ultrapassam
as fronteiras e que estão para além da geografia e das culturas; 2) a escassa preparação dos
professores para lidarem com projectos deste tipo é um padrão comum aos três países; 3) a
ausência de mecanismos escolares, de carácter informal, facilitadores da comunicação
continuada e a ausência de estratégias escolares intencionalmente orientadas para o
envolvimento das famílias constitui outro traço comum; 4) a incapacidade dos professores para
lidarem com as diferenças culturais, sociais e étnicas constitui outra semelhança evidente; 5) o
uso de formas de comunicação negativas, que deitam as culpas aos pais pelo fracasso dos filhos
constitui um outro padrão comum.
A segunda surpresa foi a existência de diferenças marcantes entre o que se passa nos jardins de
infância e o que sucede nas escolas do ensino básico. Com efeito, a frequência e a diversidade
das formas de colaboração escola-pais, num e noutro nível de ensino, mostraram constituir uma
característica comum aos três países, com destaque particular para Portugal. Nos jardins de
infância a colaboração entre as educadoras e os pais é mais frequente, assume características
mais positivas, mais informais e mais continuadas e percorre os seis tipos de colaboração
identificados na tipologia de Joyce Epstein. Nas escolas do ensino básico, a colaboração é menos
frequente, menos variada e assume, demasiadas vezes, um carácter negativo e culpabilizante
do trabalho desenvolvido pelos pais, havendo uma tendência maior para desvalorizar as culturas
familiares e, em particular, as culturas das minorias étnicas. Tendo em consideração a tipologia
de Joyce Epstein, as escolas do ensino básico limitam-se, regra geral, ao desenvolvimento de
práticas de tipo 2 (comunicação escola-família), sendo raras as práticas de tipo 3 (ajuda da
família à escola), de tipo 4 (envolvimento da família no processo educativo em casa) e de tipo 5
(participação da família na tomada de decisões). Se isolarmos as práticas de tipo 2 (comunicação
escola-família) conseguimos detectar diferenças marcantes entre os jardins de infância e as
escolas do ensino básico: a) nas primeiras, a comunicação com as mães faz-se quase todos os
dias e assume um carácter informal, atendendo a que é muito frequente a educadora conversar
com o adulto que traz ou vem buscar a criança ao estabelecimento educativo; b) as educadoras
solicitam com muita frequência a participação das famílias em actividades de apoio ao programa
educativo, nomeadamente na realização de festas, comemorações e visitas; c) as educadoras
3
utilizam uma linguagem mais directa e menos técnica - e portanto mais facilmente
compreensível pelas famílias de todos os grupos sociais - quando realizam reuniões com os
encarregados de educação; d) o tema das reuniões com os encarregados de educação centra-
se, quase sempre, na concretização de projectos que visam melhorar o programa educativo e o
bem estar das crianças; e) as educadoras estão mais habituadas a integrar as culturas familiares
e comunitárias no programa educativo do jardim de infância e suscitam, com frequência, a
colaboração das famílias, com essa finalidade.
Se isolarmos as características notadas nas escolas do ensino básico, é possível concluir o
seguinte: 1) os professores do 1º ciclo sentem um pressão maior em cumprirem os programas,
sendo forçados a sobrevalorizarem a componente lectiva do currículo, os conteúdos e a área
cognitiva, dispensando, por isso mesmo, a colaboração das famílias no processo de construção
do currículo; 2) o peso da avaliação e da classificação obriga os professores do 1º ciclo a
desvalorizarem as actividades de complemento curricular e a ocupação educativa dos tempos
livres, os quais constituem as componentes do programa educativo escolar onde a participação
das famílias poderia ser mais útil; 3) os professores do 1º ciclo fazem uso de uma linguagem
mais técnica - de difícil entendimento para as famílias desfavorecidas - quando realizam as
reuniões com os encarregados de educação; 4) o tema mais frequente das reuniões com os
encarregados de educação é a procura da melhoria da componente lectiva (isto é
marcadamente conteudal e cognitiva!) e não a participação das famílias na concretização de
projectos que enriqueçam o currículo em sentido amplo; 5) os professores do 1º ciclo caem mais
facilmente na tentação de culpar a vítima, sempre que a criança não tem aproveitamento na
escola; 6) a tentação de culpar a vítima é evidente sobretudo quando a escola serve crianças
oriundas de minorias étnicas ou pertencentes a famílias culturalmente desfavorecidas; 7) alguns
professores do 1º ciclo receiam que a participação das famílias no processo de tomada de
decisões escolares constitua uma interferência abusiva de não profissionais nos assuntos
pedagógicos e técnicos, os quais no entender de muitos devem estar reservados aos
profissionais.
A identificação destas diferenças entre os jardins de infância e as escolas do 1º ciclo começou a
fazer sentido para mim e para a equipa com quem trabalho desde 1985, quando foi possível
conhecer os resultados de um estudo, realizado em 1988, em jardins de infância e escolas do 1º
ciclo de 8 distritos de Portugal. Nesse estudo (Davies et alii, 1989) a equipa utilizou um
instrumento de recolha de dados comum, constituído por uma entrevista semi-estruturada,
realizada a quase duas centenas de educadores de infância, professores do 1º ciclo e mães. Os
dados foram sistematizados e categorizados através de um processo de análise de conteúdo,
tendo sido possível mostrar que as professoras do 1º ciclo olham para as famílias como difíceis
de envolver no processo educativo, enquanto as educadoras de infância consideram que o
problema principal da falta de colaboração consiste na tradição organizacional da escola
portuguesa, a qual faz da escola uma organização difícil de alcançar pelas famílias, graças à
permanência das rotinas burocráticas, falta de espaços e de tempo e abuso de linguagens
formalistas que mantêm o isolamento da instituição.
Não foi possível, ainda, investigar se a explicação para estas diferenças reside no tipo de
formação inicial das educadoras de infância e das professoras do 1º ciclo ou se reside apenas no
peso da tradição, atendendo a que a criação de uma rede pública de jardins de infância, data,
em Portugal, de 1977. Seria interessante a realização de um estudo que visasse encontrar
explicações para estas disparidades tão elevadas. Contudo, parece-me possível avançar com
algumas pistas explicativas: 1) a quase totalidade das educadoras de infância recebeu formação
4
após 1974, tendo encontrado, por isso mesmo, um clima nas Escolas de Formação propício ao
envolvimento comunitário; 2) por outro lado, beneficiaram de um plano de estudos onde
passaram a constar disciplinas de Sociologia da Educação, Administração Educacional,
Antropologia Educacional e, em alguns casos, Escola e Comunidade ou Escola e Família,
proporcionando-lhes o acesso a informação actualizada sobre os benefícios do envolvimento
das famílias e das comunidades no processo educativo e na vida das escolas; 3) as educadoras
de infância formadas nos últimos 20 anos tiveram acesso a informações sobre a metodologia do
trabalho de projecto, sobre a construção de projectos educativos e sobre a investigação-acção
que as despertaram para as actividades de colaboração; 4) a ausência nos jardins de infância da
rede pública de um currículo demasiado estruturado e sujeito a programas definidos
nacionalmente constitui uma vantagem para a existência de uma maior abertura à colaboração
dos não profissionais - nomeadamente dos pais - na construção curricular, já que as educadoras
não têm estado sujeitas à pressão do cumprimento de programas concebidos a partir do exterior
nem de processos rígidos de avaliação.
Estas considerações levam-me a concluir que é de incentivar tudo o que estimule uma maior
aproximação do jardim de infância e das escolas do ensino básico, tanto ao nível da partilha dos
espaços como dos recursos humanos. Quanto maior for a articulação entre ambos mais fácil
será a integração escolar da criança. Quanto maior for a aproximação entre a formação das
educadoras de infância e dos professores do 1º ciclo mais fácil será a comunicação e a partilha
de recursos entre todos. Essa aproximação deve passar, desde já, pela transformação dos
bacharelatos em educação de infância e professores do 1º ciclo em licenciaturas em Educação
Básica, com um plano de estudos de 4 anos, com um tronco comum nos primeiros 3 anos e um
4º ano diferenciado, consoante o aluno opte por trabalhar com crianças dos 3 aos 6 anos de
idade ou com crianças dos 6 aos 10 anos de idade. Ao nível dos estabelecimentos escolares,
deve caminhar-se para a partilha dos espaços e recursos, de forma a englobar progressivamente
no mesmo centro de educação básica as crianças dos 3 aos 10 anos de idade.
Referências
Davies, D. et alii (1989) A escola e as famílias: Realidade e perspectivas. Lisboa. Livros Horizonte
5
Envolvimento das famílias no processo educativo: resultados de um estudo em cinco países
Com este artigo pretendo 1) apresentar os resultados de um estudo de investigação- acção
sobre colaboração escola-famílias em cinco países; 2) analisar as diferenças e semelhanças no
que diz respeito aos obstáculos à colaboração; 3) comparar os efeitos das diferenças culturais e
tradições históricas na criação de projectos de colaboração; 4) apontar recomendações, tendo
como objectivo uma maior descentralização, autonomia e participação comunitária.
A investigação-acção sobre colaboração escola-famílias em cinco países foi um estudo
internacional que decorreu de 1992 a 1995, em escolas de Portugal, Chile, República Checa,
Espanha e Austrália, envolvendo oito investigadores principais, entre os quais quatro
portugueses, e um conjunto de 75 investigadores com responsabilidades educativas nas escolas
básicas onde decorreram os projectos. Os investigadores principais foram: Don Davies e Vivian
Johnson (Boston University), Ramiro Marques (ESE do IPS), Pedro Silva e Ricardo Vieira (ESE do
IPL), Adelina Villas-Boas (FPCE da Universidade de Lisboa), Bernardita Icaza (CIDE do Chile),
Raquel-Amaya M. Gonzalez (Universidade de Oviedo), Derek Tomey (Universidade LaTrobe na
Austrália) e Eliska Walterová (Charles University na República Checa). O estudo foi coordenado
por Don Davies e Vivian Johnson e teve a direcção institucional do Center on Families,
Communities, Schools and Children`s Learning.
Como começou o Estudo?
Três dos quatro investigadores portugueses fizeram um mestrado em Educação, na Boston
University, em 1984, com a supervisão de Don Davies. Em 1987, participaram, juntamente com
Don Davies, num estudo que visou a) a identificação dos obstáculos à colaboração escola-
famílias em Portugal e b) a caracterização das escolas difíceis de alcançar e das famílias difíceis
de envolver. Don Davies comparou os resultados do estudo realizado em Portugal com os
resultados de um estudo realizado em escolas de Liverpool e de Boston e concluiu que, apesar
das diferenças políticas e culturais, os obstáculos que impedem o envolvimento das famílias no
processo educativo são os mesmos nos três países: a existência de uma cultura escolar que
acentua a separação; uma cultura pedagógica que acentua uma linguagem técnica; rituais e
formalismos que afastam as famílias dos assuntos escolares; escassez de espaços e de tempos
para o diálogo e o intercâmbio com as famílias; falta de preparação dos professores para lidarem
com os problemas de comunicação, envolvimento, participação e criação de projectos de
colaboração. Desse estudo resultou a publicação do livro "A escola e a família em Portugal:
Realidades e perspectivas", Lisboa, Livros Horizonte, 1989). Em 1991, Don Davies criou a League
of Schools Reaching Out, uma associação de escolas interessadas na criação de projectos de
colaboração com as famílias, dispostas a porem em práticas alguns resultados dos estudos
anteriores, numa perspectiva de investigação-acção. As escolas que aderiram à LSRO passaram
a receber documentação, boletins informativos, revistas e relatórios e aplicaram, pelo menos,
uma das seguintes estratégias: sala para as famílias, boletim para as famílias, equipas de
investigação com pais, professores e um facilitador externo e visitas domiciliárias. Em 1994, a
LSRO agrupava 85 escolas, entre as quais quatro de Portugal. A par do intercâmbio de
documentos escritos, realizaram-se inúmeros encontros e seminários que juntaram os
investigadores para troca de experiências e comparação de instrumentos, estratégias e
6
resultados. Em Portugal, realizaram-se três Seminários Internacionais, com a presença dos
investigadores portugueses e uma dezena de investigadores estrangeiros associados ao Estudo
Internacional, entre eles Don Davies e Vivian Johnson. Ao longo destes encontros internacionais
foi possível concluir que os projectos de investigação-acção, nos cinco países, estavam a atingir
resultados semelhantes: melhor aproveitamento escolar, maior envolvimento das famílias no
processo educativo em casa, maior participação das famílias nas actividades da escola e maior
colaboração das escolas com as agências comunitárias.
Porquê a investigação-acção?
O grupo de investigadores envolvidos neste estudo há muitos anos que acredita nos benefícios
do trabalho multidisciplinar, das equipas multivariadas e na inovação educativa. O grupo
considera que a mudança nas escolas se faz melhor recorrendo a projectos demonstrativos, cujo
exemplo de trabalho se vai alargando a cenários com problemas semelhantes. A investigação-
acção oferece demonstrações em pequena escala sobre formas alternativas de governar as
escolas e de concretizar o curriculum. Uma avaliação cuidadosa desses projectos permite a
construção de teorias e de exemplos orientadores da mudança noutros cenários. Este grupo de
investigadores acredita que a generalização da inovação nas escolas se faz sobretudo através do
exemplo. Estes projectos dão visibilidade às escolas, estimulam a inovação e proporcionam
exemplos que podem ser seguidos, com ligeiras adaptações noutras escolas. Quanto maior for
a variedade de contextos a beneficiar de projectos de investigação-acção, mais fácil será a
generalização da experimentação e da inovação na área da colaboração escola-famílias. Os
exemplos bem sucedidos de projectos de inovação nesta área constituem um estímulo para as
restantes escolas e professores interessados em aproximar as escolas das famílias e das
comunidades. Numa época em que se esgotaram as soluções reformistas impostas de cima para
baixo, através de um figurino tipo pronto a vestir e com o recurso a metodologias normativo-
dedutivas, torna-se particularmente importante a divulgação de projectos de inovação
educativa, nascidos nas escolas básicas e envolvendo parcerias constituídas por professor do
ensino superior e professores do ensino básico.
O estudo internacional que a seguir se apresenta inclui as seguintes características inovadoras:
1) envolve escolas básicas de cinco países; 2) quatro dos cinco países suportaram durante
décadas regimes ditatoriais (Portugal, Espanha, Chile e República Checa); 3) os projectos
envolvem parcerias constituídas por escolas básicas e escolas superiores; 4) a coordenação
internacional foi assegurada por um Centro de Investigação privado; 5) em algumas escolas,
assistiu-se à criação de equipas de investigação constituídas por professores e pais; 6) os
instrumentos de recolha de dados incluíram não só questionários semelhantes para todos os
casos, mas também entrevistas semi-estruturadas, registos de observação, diários, análise de
documentos escolares e análise de relatórios. De forma a explicitar melhor a metodologia, os
procedimentos e os instrumentos de recolha de dados, abro, de seguida, um capítulo sobre essa
matéria.
As escolas
O estudo decorreu em três escolas portuguesas, duas escolas chilenas, uma escola espanhola,
uma escola da República Checa e uma escola australiana. Sete são públicas e uma é privada. São
todas escolas do ensino básico.
7
A escola do Entroncamento tem 120 alunos distribuídos por quatro anos de escolaridade. Cerca
de 50% dos alunos são provenientes de famílias com rendimento anual inferior a 2000 contos.
O edifício escolar é moderno e amplo. A escola recebe os alunos a partir das 9 horas. Em caso
de necessidade dos pais, as crianças podem permanecer na escola até às 19 horas. Para além do
programa curricular comum a todas as escolas públicas do 1º ciclo, as crianças beneficiam de
actividades de complemento curricular e de ocupação de tempos livres.
A escola de Leiria tem 74 alunos distribuídos pelos quatro anos de escolaridade e possui quatro
professoras. O horário escolar funciona de manhã e de tarde, mas a escola não possui refeitório.
A maioria dos alunos são oriundos de famílias desfavorecidas, mas há um número considerável
de alunos da classe média.
A escola de Lisboa possui cerca de 400 alunos, 40% dos quais imigrantes recém-chegados de
África e da China. O edifício é antigo mas encontra-se em bom estado de conservação.
A escola de Laviada fica situada em Gijón, na região das Astúrias, em Espanha. A escola possui
813 alunos distribuídos por 8 anos de escolaridade. A maior parte dos alunos pertence a famílias
com rendimentos médios. A escola possui 38 professores, alguns dos quais há vários anos que
colaboram com a Universidade de Oviedo.
A escola básica "Red Hill" fica situada a 12 quilómetros do centro de Praga e serve uma
população heterogénea, composta sobretudo por crianças oriundas de famílias de rendimentos
médios. A escola possui uma piscina , pista de atletismo e amplos espaços exteriores. Trinta por
cento das crianças vivem com apenas um dos progenitores e 90% dos pais possuem pelos menos
o ensino secundário. A escola possui 650 alunos distribuídos por 9 anos de escolaridade. Há
vários anos que os professores da escola colaboram com a Charles University.
A escola básica da Austrália fica situada no Estado de Vitória e serve uma maioria de alunos
provenientes de famílias de baixos rendimentos, composta, em grande parte, por imigrantes
europeus e asiáticos.
As escolas do Chile ficam localizadas em La Florida, a sudeste de Santiago, junto às montanhas
dos Andes e servem uma maioria de alunos considerados pobres. A equipa de investigação foi
constituída por investigadores do CIDE (Centro para a Investigação e Desenvolvimento da
Educação), uma instituição privada que há longos anos promove a inovação educativa em
escolas chilenas.
Metodologia, procedimentos e instrumentos
0 estudo internacional visou quatro objectivos: 1) identificar semelhanças e diferenças
encontradas nos cinco países no que diz respeito ao envolvimento das famílias no processo
educativo; 2) aprender o que resulta e o que não resulta e em que condições; 3) explorar o uso
de diferentes abordagens no âmbito da investigação-acção; 4) estimular o surgimento de outros
estudos internacionais sobre o mesmo tema. Cada projecto desenvolveu os seus próprios
objectivos específicos.
Embora todos os projectos tenham feito uso da investigação-acção, em apenas dois ( os
projectos em Espanha e na República Checa) foi possível associar grupos de mães às equipas de
investigação-acção constituídas por professores do ensino superior e do ensino básico. Nos
restantes estudos, só foi possível incluir os directores das escolas, os professores do ensino
8
básico e os professores do ensino superior nas equipas de investigação. No projecto da escola
do Entroncamento, a equipa foi constituída apenas pelo director da escola, pelo director-
adjunto e pelo professor da Escola Superior. Na escola de Leiria, a equipa foi constituída por dois
professores do ensino superior e a directora da escola. Na escola de Lisboa, pela professora do
ensino superior, pela directora e por alunas finalistas da Faculdade de Psicologia e de Ciências
da Educação de Lisboa. Na escola do Chile, a equipa foi apenas constituída por investigadores
do CIDE. Na escola da Austrália, a equipa incluiu um professor do ensino superior e um professor
do ensino básico.
Foram seis as características comuns: 1) os projectos foram concretizados em escolas básicas;
2) todas as escolas tinham, pelo menos, 50% de alunos provenientes de famílias com fracos
rendimentos; 3) as escolas básicas associaram-se a uma Escola Superior; 4) foi concretizada pelo
menos uma intervenção de promoção do envolvimento das famílias, dentro dos limites da
tipologia de Joyce Epstein; 5) foram usados três questionários para a recolha de dados, um
dirigido aos pais, outro dirigido aos professores e um terceiro dirigido aos alunos; 6) para além
dos questionários, foram usadas entrevistas, diários, registos de observações e análise de
documentos escolares.
As escolas básicas foram escolhidas pelo professor do ensino superior com base em três
critérios: possuir um director interessado na promoção do envolvimento das famílias, estar
geograficamente próxima da escola do ensino superior e servir alunos de baixos rendimentos.
Após aprovação pelo conselho pedagógico da proposta de adesão à League of Schools Reaching
Out, a escola básica começou a receber a documentação produzida pelo Center on Families,
Communities, Schools and Children`s Learning. O professor do ensino superior, de agora em
diante facilitador, reuniu com o director e os professores da escola básica uma vez por mês, com
os seguintes objectivos: recolha de dados, análise dos dados e reformulação de estratégias. A
equipa nacional de investigação, constituída pelos grupos de todas as escolas envolvidas, reuniu
uma vez por ano para balanço das actividades desenvolvidas. As equipas mantiveram um
contacto constante com os coordenadores internacionais, Don Davies e Vivian Johnson, através
do E-Mail, Fax e encontros no âmbito dos três Seminários Internacionais realizados em Portugal
e nas três Mesas-Redondas sobre Colaboração Escola-Família, realizadas nos Congressos da
AERA (American Education Research Association). Como resultado desses encontros, foram
publicados dezenas de artigos e relatórios pelo Center on Families, Communities, Schools and
Children`s Learning e pelo Institute for Responsive Education.
Os três questionários comuns foram aplicados todos os anos, no princípio e no final do ano
lectivo. Os dados foram enviados para Boston e objecto de tratamento por uma equipa da
League of Schools Reaching Out. Os questionários incluíam três dezenas de itens de escolha
múltipla, agrupados em torno das seguintes questões: oportunidades para a comunicação;
oportunidades para falar sobre os objectivos educativos; oportunidades para a participação na
tomada de decisões; contactos para resolver problemas; contactos para analisar aspectos
positivos; oportunidades para conceber planos tendo em vista a melhoria da escola. Nos
projectos da escola do Entroncamento, da escola de Laviada (Espanha) e da escola de Praga
(República Checa), os dados dos questionários permitiram concluir que 1) tanto os pais como os
professores tinham oportunidades frequentes para comunicarem entre si, mas a percentagem
de professores que o afirmam claramente é muito superior à dos pais; 2) tanto os professores
como os pais consideram que há oportunidades frequentes para discutir objectivos, tomar
decisões e fazer planos em conjunto, mas a percentagem de professores que o afirmam
claramente é muito superior à dos pais; 3) enquanto os professores se queixam que os pais vêm
9
pouco à escola, uma grande parte dos pais afirma que a escola não lhes dá oportunidade para
estabelecer mais encontros. Nos projectos da escola de Leiria e de Lisboa, a comunicação
continuou a ser pouco frequente, mas foi melhorando à medida que os projectos avançavam. O
mesmo se pode afirmar para a participação na tomada de decisões, discussão de objectivos e
elaboração de planos conjuntos. No caso da escola de Leiria, um dos resultados do projecto foi
precisamente a criação de uma Associação de Pais, com grande poder reivindicativo junto dos
professores.
Em todas as escolas, houve uma enorme concordância entre pais e professores no que diz
respeito 1) ao acentuar de atitudes positivas favoráveis à aprendizagem; 2) ao encorajar da
criança face ao estudo; 3) à percepção positiva face à escola e ao trabalho dos professores.
O questionário aplicado aos alunos permitiu concluir que 1) os alunos pensam que tanto os
professores como os pais se interessam pelo seu sucesso académico; 2) os alunos recebem ajuda
dos pais e dos professores quando surgem problemas; 3) os professores não se preocupam o
suficiente com os problemas pessoais dos alunos. Foi interessante verificar a ausência de
diferenças significativas entre as percepções dos alunos, professores e pais nos cinco países face
às questões identificadas atrás. Apesar das grandes diferenças culturais entre os países, verifica-
se que as preocupações e os problemas são semelhantes. Note-se que, quatro dos cinco países
(Chile, Portugal, Espanha e República Checa) sofreram um longo período de governo ditatorial
com imposição de sistemas educativos centralizados. Os quatro países têm vindo a passar por
profundas reformas educativas com objectivos semelhantes: maior descentralização, mais
autonomia para a escola, maior aproximação às famílias, governos das escolas mais participados
e democráticos e maior envolvimento das famílias no processo educativo. Note-se que os
problemas identificados são muito semelhantes: falta de formação dos professores e, em
particular, dos directores das escolas, falta de espaços nas escolas para receber os pais,
desconhecimento dos pais face aos seus direitos e deveres de participação e rituais escolares
demasiado formalistas.
Os facilitadores fizeram reuniões mensais com as equipas escolares para troca de impressões
sobre o andamento do projecto e análise dos dados recolhidos. Os facilitadores registaram as
observações efectuadas durante as visitas às escolas e esse material foi objecto de análise de
conteúdo. Foram igualmente objecto de análise de conteúdo os registos escolares, em
particular, actas de reuniões pedagógicas, fichas biográficas dos alunos e registos de
aproveitamento.
Em algumas escolas, como a escola do Entroncamento e a escola Laviada, os directores
escreveram relatórios anuais e apresentaram comunicações sobre o projecto em vários
seminários e colóquios. Em todos os casos, os facilitadores dos projectos elaboraram relatórios
anuais que foram enviados a Don Davies e Vivian Johnson, tendo havido oportunidade para
apresentarem comunicações nos Congressos da AERA e noutras reuniões científicas. No final
dos projectos, isto é, em 1995, os facilitadores dos projectos (Bernardita Icaza, Raquel Martinez,
Ramiro Marques, Pedro Silva, Ricardo Vieira, Derek Tomey, Adelina Villas-Boas e Eliska
Walterová) apresentaram os relatórios finais que foram publicados no livro "Crossing
Boundaries-Multi-National Action Research on Family-School Collaboration", Report nº 33,
Center on Families, Communities, Schools and Children`s Learning, 1996.
10
Enquadramento teórico
Os projectos optaram pela adesão a uma tipologia comum de actividades de colaboração escola-
família: a tipologia de Joyce Epstein. Esta tipologia agrupa as actividades em 6 tipos: tipo 1 -
ajuda da escola às famílias - as escolas proporcionam assistência às famílias para que estas
consigam cumprir as suas obrigações básicas com o vestuário, alimentação e saúde; tipo 2 -
comunicação escola-famílias - as escolas comunicam regularmente com as famílias acerca do
progresso dos alunos e sobre o programa educativo; tipo 3 - ajuda da família à escola -
envolvimento da família em actividades de voluntariado na escola; tipo 4 - envolvimento da
família no processo educativo em casa - apoio na realização dos trabalhos de casa e apoio ao
estudo; tipo 5 - participação na tomada de decisões e na direcção da escola - desempenho de
tarefas nos órgãos da escola; tipo 6 - intercâmbio com a comunidade - partilha de
responsabilidades e recursos entre a escola e as instituições comunitárias que trabalham com
as crianças e os jovens.
Para além da tipologia de Joyce Epstein, os projectos comungaram de um conjunto de ideias
concebidas e lavas à prática por Urie Bronfenbrenner, James Comer e Henry Levine. De Urie
Bronfenbrenner, foram buscar a defesa de uma escola que partilhe recursos com todas as
instituições comunitárias com vocação para servirem as crianças, em particular a família, o
bairro e as associações locais. O desenvolvimento e a educação da criança dependem sobretudo
do esforço comum das esferas sobrepostas que constituem o mundo da criança. Quando estas
esferas comunicam e se relacionam de forma positiva, cria-se um ambiente ecológico favorável
ao desenvolvimento. Quando estão de costas voltadas, perseguem objectivos opostos ou
comungam de valores conflituantes, estamos perante um ambiente que dificulta o
desenvolvimento da criança. Esta ideia encontra-se presente, de uma forma feliz, no célebre
ditado africano "para educar uma criança é preciso a aldeia toda". O modelo de James Comer
desenvolveu-se nos EUA, desde meados da década de 70, tendo conhecido uma ampla difusão
sobretudo em escolas situadas em áreas desfavorecidas. Os projectos analisados neste artigo
fizeram suas duas das três ideias básicas do modelo de James Comer: intervenção precoce, apoio
às famílias e partilha do poder escolar. Intervenção precoce significa agir ainda antes da criança
chegar à escola, com o recurso a equipas multidisciplinares, constituídas por psicólogo e médico
escolar. O apoio às famílias concretiza-se não apenas durante as visitas domiciliárias, mas
também nas escolas, com a criação de centros de pais e a difusão de boletins informativos para
os pais. A partilha do poder é feita através da participação dos pais nos órgãos da escola. Neste
estudo conduzido em escolas de cinco países, apostou-se sobretudo na segunda e na terceira
ideia, embora a resistência cultural dos professores à partilha do poder tenha tornado difícil a
participação dos pais na tomada de decisões escolares.
O estudo conduzido em cinco países foi buscar algumas ideias importantes ao modelo das
"accelerated schools"de Henry Levin, nomeadamente as componentes: participação dos pais,
comunicação eficaz entre todos os membros da comunidade educativa, reflexão sobre a prática,
construção de equipas de investigação e inovação, avaliação frequente dos alunos e ênfase nas
actividades de aprendizagem realizadas em casa.
Resultados
Uma análise comparativa dos projectos permite a identificação de padrões comuns sobre os
obstáculos à colaboração escola-família, nomeadamente a força das tradições, rituais escolares
11
formalistas, relutância dos professores, deficiências na formação de professores e falta de
confiança dos pais.
A tradição de separação entre a escola e as famílias é comum a todos os projectos, com
particular ênfase para os projectos dos quatro países que suportaram regimes ditatoriais:
Portugal, Espanha, Chile e República Checa. Nestes casos, por força da tradição centralista dos
sistemas educativos, a cultura de separação é bem maior do que na Austrália, país onde a
descentralização e a autonomia das escolas gozam de um forte apoio político. Por tradição, os
professores encaram os pais como parceiros silenciosos do processo educativo. Espera-se deles
que apoiem os esforços dos professores, proporcionem, em casa, as condições básicas ao
desenvolvimento da criança, confiem no saber e na dedicação dos professores, reforcem, em
casa, hábitos de trabalho e de estudo, compareçam nas reuniões escolares sempre que
solicitados para o efeito, tomem conhecimento dos testes e das fichas de avaliação e
compareçam nas festas escolares. Os professores esperam que haja continuidade de valores e
atitudes entre a escola e o lar e quando isso não acontece tendem a culpar as famílias, acusando-
as de falta de interesse na educação dos filhos e falta de cultura. O medo da interferência nos
assuntos pedagógicos foi particularmente evidente no projecto da escola de Leiria, onde a
direcção e as professoras sentiram a intervenção da recém-formada Associação de Pais como
uma ameaça ao profissionalismo docente, ou seja, uma intrusão dos não profissionais em
matérias que, no entender das professoras, devem ser reservadas aos profissionais. Neste caso,
a colaboração da família com a escola é apenas bem vinda quando não ultrapassa os tipos 2, 3
e 4 da tipologia de Joyce Epstein: a ajuda da família à escola, a comunicação entre os professores
e as famílias e o envolvimento das famílias no processo educativo em casa. Quando a Associação
de Pais começou a interessar-se pela participação na tomada de decisões, começaram a surgir
os primeiros desentendimentos com a direcção da escola.
A ideia de que a escola é um domínio dos professores e que os pais não devem atravessar essa
fronteira está presente nos projectos dos cinco países, incluindo no projecto da escola da
Austrália. Essa intrusão é vista pelos professores não só como uma potencial perda da sua
autonomia profissional, mas também como uma forma de aumentar as suas obrigações e
reduzir o espaço dos seus direitos. A inclusão no programa educativo escolar de actividades
referenciadas como dos tipos 5 e 6 da tipologia de Joyce Epstein (isto é, participação dos pais na
tomada de decisões e actividades de colaboração com a comunidade) é vista como
potencialmente ameaçadora pelos professores dos cinco países. Uma tal inclusão significa: mais
reuniões fora do horário normal de trabalho, mais vigilância sobre o trabalho dos professores,
maior partilha do poder e mais dependência política das escolas face às famílias e a outros
grupos comunitários. Os próprios pais revelam uma percepção negativa face às actividades de
colaboração que impliquem a participação na tomada de decisões. Essa percepção é sobretudo
evidente nas escolas portuguesas, com excepção da escola do Entroncamento, pelo facto de ser
uma escola privada, beneficiando de uma liderança educativa que coloca o acento tónico na
criação de um programa educativo que corresponda às necessidades das famílias. A escola do
Entroncamento é, na verdade, uma escola de livre escolha, já que se situa num concelho bem
servido de escolas públicas, procurando captar os seus alunos de entre as famílias que precisam
de um programa educativo a tempo inteiro, pluridimensional e com a componente da ocupação
dos tempos livres. A necessidade de responder às necessidades e anseios das famílias obriga a
reuniões mensais com os pais e a uma comunicação constante entre os professores e os
encarregados de educação, com o recurso a meios alternativos e informais: telefone para casa
dos professores, envio de notas aos pais e distribuição de um boletim com periodicidades
trimestral. Na escola de Leiria, pelo contrário, a ênfase é colocada na defesa do profissionalismo
12
docente, mantendo-se os pais afastados das decisões escolares, sob o pretexto de que na escola
mandam os professores e em casa mandam os pais. Se cada um cumprir adequadamente os
seus papeis, não haverá confrontos e todos beneficiarão. Na escola de Lisboa, as fronteiras da
escola também não são fáceis de ultrapassar, levando-se à prática o ditado popular "cada
macaco no seu galho". As razões que justificam essa separação são as mesmas em todos os
projectos: falta de tempo dos professores, pouca disponibilidade dos pais, divisão de tarefas
entre professores e pais, com cada um a fazer apenas aquilo que lhe compete sem interferências
na esfera dos outros. Na escola de Praga, os professores continuaram a fazer valer os seus
valores tradicionais, reveladores da estima que têm pelo profissionalismo, autonomia
pedagógica e pela recusa na assunção de obrigações que aumentem o tempo de permanência
na escola.
Apesar da relutância em aceitarem a participação das famílias na tomada de decisões, notou-se,
em todos os projectos, uma crescente adesão às actividades promotoras da comunicação
professores-pais, do apoio dos pais às actividades escolares e do envolvimento dos pais no
processo educativo em casa (Actividades das categorias 2, 3 e 4 da tipologia de Joyce Epstein).
Em todos os projectos, mas sobretudo nas escolas da República Checa, Chile e Espanha, notou-
se uma enorme adesão dos pais e professores à criação de "Dias da Escola Aberta", contactos
telefónicos com os professores, festas escolares e edição de boletins para os pais, ou seja,
actividades de tipo 2 e 3, facilitadoras da comunicação entre a escola e a família. Em todos os
projectos, houve resistência dos professores às actividades que obrigavam a fazer mais do que
aquilo que geralmente lhes é exigido. A questão do tempo assume preponderância em todos os
projectos. Com excepção da escola do Entroncamento, notou-se uma grande resistência à
marcação de reuniões com os pais em horário nocturno ou à generalização dos telefonemas
para casa dos professores. Contudo, nos casos em que foi possível ultrapassar a resistência
inicial, notou-se uma grande adesão dos pais. Essa adesão registou-se sobretudo sempre que os
professores aceitaram marcar as reuniões à noite e sempre que se disponibilizaram para receber
chamadas telefónicas em casa. No projecto da escola de Laviada, houve grande resistência dos
professores à marcação de reuniões com os pais, para além daquelas que a legislação obriga. O
mesmo aconteceu no projecto das escolas do Chile. E na escola de Lisboa foi necessário recorrer
a estudantes finalistas do Curso de Psicologia para a realização das visitas domiciliárias, já que
os professores se recusavam a assumir obrigações que ultrapassam o que a legislação obriga.
Na escola do Entroncamento, apenas o director e o director-adjunto participaram na equipa de
investigação-acção. Os restantes professores declinaram o convite a pretexto de falta de tempo.
Na verdade, a resistência dos professores às actividades de colaboração com as famílias que
exijam partilha de poder foi uma constante nos projectos dos cinco países, embora com maior
ênfase em Portugal, Espanha, Chile e República Checa, ou seja os países com uma tradição mais
centralista e que suportaram regimes ditatoriais. Notou-se, igualmente, em todos os projectos
que o factor que mais influencia a adesão dos professores às actividades de colaboração com as
famílias consiste na orientação dada pela direcção da escola. Se o director defender essa
orientação, os professores ultrapassam com mais facilidade as suas resistências. Se o director
da escola não se assumir claramente a favor da colaboração, os professores aumentam as suas
resistências.
Um outro padrão comum às escolas de Portugal, Espanha, Chile e República Checa - mas não na
escola da Austrália - é a relutância dos pais em atravessar a fronteira que separa o lar dos
domínios da escola. Essa relutância revela uma falta de confiança devido às más lembranças que
muitos pais têm da escola e à dificuldade em entenderem a linguagem técnica dos professores.
13
As famílias de baixos rendimentos não estão habituadas a expressar as suas opiniões em público
e os professores raramente encaram a discordância dos pais de uma forma positiva. Em muitos
casos, olham para a discordância como um atrevimento dos pais e uma intrusão nos domínios
profissionais. A falta de confiança dos pais não significa, em caso algum, ausência de
preocupação com a educação dos filhos. Significa, antes, um sentimento de impotência e uma
enorme dificuldade em compreender como poderão ajudar os filhos no processo educativo. A
escola continua a ser, para muitos pais, um local ameaçador. Alguns pais receiam o
envolvimento no processo educativo porque estão habituados a serem responsabilizados pelo
fracasso dos filhos. A maior parte dos pais sabe, por experiência própria, que os professores só
pedem aos pais para irem à escola quando têm más notícias para dar. Por outro lado, os pais
estão habituados a receber mensagens contraditórias dos professores: alguns professores
esperam que os pais ajudem os filhos nos trabalhos de casa, enquanto outros recusam essa
ideia.
Um outro padrão comum às escolas dos cinco países é a percepção que professores e pais têm
acerca dos seus papéis: enquanto os professores centram os seus papéis no colectivo formado
pela turma, os pais estão preocupados apenas com o seu filho. Essa é a razão pela qual os
professores consideram que há muitas oportunidades para tomarem decisões com os pais,
definirem objectivos em conjunto e fazerem planos, enquanto os pais consideram que as
oportunidades são poucas. Em todos os projectos, foi possível verificar que os pais não dão
muito valor e importância às reuniões colectivas com os professores pela seguinte razão: nessas
ocasiões não é possível tratar de assuntos concretos que afectem a vida e a aprendizagem dos
seus filhos. Por outro lado, essa desconfiança dos pais face às reuniões colectivas leva os
professores a concluírem que os pais não estão interessados na melhoria da escola, mas apenas
nos interesses dos seus filhos. Alguns professores encaram essa atitude como uma intromissão
indevida no trabalho pedagógico do professor. Essa é a razão pela qual os professores
desconfiam da participação dos pais nos conselhos pedagógicos.
Um outro padrão comum aos cinco países é a percepção positiva que os pais têm face ao
trabalho dos professores e da escola. A grande maioria tem os professores em boa conta e
considera que a escola está a desenvolver um trabalho razoável. São sobretudo os pais
pertencentes a grupos sociais desfavorecidos que têm uma percepção mais positiva face ao
trabalho dos professores e da escola. Estes pais encaram o fracasso escolar dos filhos como uma
fatalidade biológica ou social e mostram-se impotentes para ultrapassar essa situação.
Nas escolas dos cinco países, notou-se igualmente uma maior proximidade cultural entre os
professores e os pais da classe média, os quais se mostram mais activos nas Associações de Pais,
comparecem mais vezes às reuniões e participam com mais à-vontade nos processos de tomada
de decisões. Essa proximidade cultural foi particularmente evidente na escola de Leiria e na
escola do Entroncamento. Em Leiria, a constituição da Associação de Pais foi uma iniciativa de
mães professoras e no Entroncamento os grupos de mães que fizeram a gestão da sala de pais
e que intervieram com mais frequência nas reuniões foram mães da classe média, em geral
professoras do ensino básico e do ensino secundário. Na verdade, os projectos desenvolvidos
nos cinco países mostraram esta característica comum: as mães professoras tomaram a
iniciativa de constituir grupos de apoio às actividades escolares e foram as mais activas na
direcção das Associações de Pais.
Por último, uma nota sobre a dependência dos professores face ao investigador que
desempenhou as funções de facilitador. Uma característica comum aos projectos dos cinco
países foi a presença de uma facilitador externo - professor de uma Escola Superior próxima -
14
que coordenou os trabalhos, preparou a análise dos dados e procedeu à elaboração dos
relatórios finais. Com efeito, nenhum dos projectos teria hipóteses de concretização sem o
envolvimento activo do facilitador externo. Sem a presença do facilitador, os projectos deixaram
de ter continuidade, embora algumas das actividades tenham sido interiorizadas pelos
professores e integradas nas práticas educativas quotidianas. O facilitador assegurou o apoio
científico e institucional de uma Escola Superior, permitiu o acesso a pequenas bolsas de
investigação e deu visibilidade à escola. Apoio científico, apoio financeiro, apoio político e
visibilidade são os ingredientes necessários à manutenção de projectos deste tipo. A garantia
destes apoios permitiu a longevidade dos projectos. Quando o facilitador deixou de colaborar
com a escola, assistiu-se ao decréscimo das actividades de colaboração.
Conclusões
Os projectos desenvolvidos nos cinco países mostram que há obstáculos à colaboração escola-
família que ultrapassam as fronteiras e que estão para além da geografia e das culturas. São uma
constante em todos os países, embora com mais intensidade em Portugal, Espanha, Chile e
República Checa, provavelmente por causa da tradição centralista comum e do carácter
ditatorial dos regimes políticos durante décadas, a provar que a força da tradição de separação
é provavelmente o maior obstáculo à colaboração. Para além deste traço comum, foi possível
identificar outros padrões: escassa preparação dos professores para lidarem com projectos de
colaboração escola-família; falta de preparação das famílias; ausência de mecanismos escolares,
de carácter informal, facilitadores da comunicação continuada; ausência de estratégias
escolares intencionalmente orientadas para o envolvimento das famílias difíceis de alcançar;
falta de tempo dos professores; ausência de incentivos à criação de projectos de inovação
educativa; incapacidade dos professores para lidarem com as diferenças culturais e as diferenças
sociais e étnicas. Para além disso, notou-se um uso persistente e continuado, em todas as
escolas, de formas de comunicação negativas, que deitam as culpas aos pais pelo fracasso dos
filhos e que acentuam os problemas escolares. No que diz respeito à participação na tomada de
decisões escolares, notou-se, em todas as escolas, um monopólio da participação por parte das
mães da classe média, sobretudo as mães professoras.
A força e a persistência das atitudes tradicionais, a par do afastamento cultural da escola em
relação às famílias mais desfavorecidas, impede as escolas de continuarem a dar vida aos
projectos, após o término do apoio institucional e financeiro por parte da Escola Superior e do
facilitador externo. Embora, algumas actividades permaneçam e comecem a fazer parte do
"ethos" da escola, verifica-se o abandono progressivo de todas as actividades que envolvem
mais obrigações para os professores e a partilha do poder com os pais. Uma forma de evitar o
abandono das actividades de colaboração é a manutenção de uma estrutura de apoio à escola
interessada em dar continuidade ao projecto. Essa estrutura de apoio pode incluir a colaboração
de uma Escola Superior ou um serviço ou organismo do Ministério da Educação vocacionado
para a inovação educativa.
Nos cinco países, tem havido grandes esforços por parte dos Ministérios da Educação com a
finalidade de promoverem um maior envolvimento das famílias no processo educativo e na vida
das escolas. Esses esforços têm passado, sobretudo, pela aprovação de diplomas legais e de
orientações precisas que aumentam os direitos de participação dos pais nos órgãos escolares.
Esses diplomas legais e orientações têm constituído estímulos poderosos às actividades de
colaboração, embora - por si só - sejam incapazes de mudar atitudes há muito enraizadas pela
15
tradição. Os resultados dos projectos indicam que, a par das políticas e das orientações sobre
colaboração, torna-se necessário aumentar os conhecimentos dos professores sobre os
benefícios da colaboração, colocando ao seu dispor informações sobre projectos que resultam.
Um esforço semelhante poderá também ser feito com as Associações de Pais, de forma a
aumentar o poder informativo das famílias sobre estas matérias.
Um outro resultado comum a todos os projectos é a preponderância do factor "apoio da
direcção da escola aos projectos de colaboração". Com efeito, os projectos foram levados por
diante graças ao apoio incondicional dos directores das escolas. Sem esse apoio, os professores
não sentem motivação para se empenharem na criação de novas rotinas e na concretização de
novas actividades que, em muitos casos, exigem uma mudança de atitudes. A participação dos
directores nas equipas de investigação-acção revelou-se um factor decisivo para a continuidade
do projecto.
A criação de equipas de investigação-acção compostas pelo facilitador externo, director da
escola, professores e pais só foi realmente conseguida na escola de Laviada, em Gijon. Nas
restantes, não foi possível associar grupos de mães às equipas, embora tenha havido uma
grande preocupação com o dar a conhecer à Associação de Pais o trabalho desenvolvido no
âmbito do projecto. O facto de, em todas as escolas, se ter registado um maior envolvimento
das mães da classe média e um certo alheamento das mães oriundas de meios mais
desfavorecidos leva-nos a questionar a eficácia de algumas estratégias de envolvimento mais
tradicionais. Na verdade, as famílias difíceis de envolver continuaram afastadas da escola,
notando-se um predomínio das famílias da classe média nas actividades de coordenação e de
tomada de decisões, tanto nos órgãos da escola como na Associação de Pais.
Referências
Bronfenbrenner, U (1979). The ecology of human development. Cambridge. Harvard University
Press
Davies, D, e Johnson, V. (1996). Crossing boundaries: Multi-National acttion research on family-
school collaboration. Boston. Center on Families, Communities, Schools and Children`s Learning
Davies, D., Marques, R. e Silva, P. (1993). Os professores e as famílias: Colaboração possível.
Lisboa. Livros Horizonte
Formosinho, J. (1988). "Organizar a escola para o sucesso educativo", in CRSE, Medidas que
promovam o sucesso educativo. Lisboa. ME, 105-136
Marques, R. (1996). "Reinventar a escola". Noesis, nº 37, Março, 48-51
Marques, R. (1996). "A investigação-acção na criação de projectos de colaboração escola-
família". Revista ESES, nº 7, Janeiro
16
Nem tudo o que luz é outro nas relações família-escola
As escolas portuguesas e as vidas dos professores, alunos e famílias dos alunos estão a ser
sacudidas por uma produção legislativa cujos efeitos estão ainda por apurar e avaliar, mas que
estão a mudar as percepções que as famílias dos alunos têm dos professores e as percepções
que os professores têm da sua profissão.
A profissão docente está a mudar e a percepção que os professores têm da sua profissão e do
seu estatuto está a atravessar uma profunda crise manifesta em descrença e vitimização.
A retórica dos benefícios do envolvimento parental nas escolas e no processo educativo dos
alunos chegou tarde a Portugal (princípios da década de 80 do século passado), mas tem vindo
a ganhar um peso crescente na configuração das novas políticas educativas. O novo estatuto da
carreira docente dos educadores e dos professores dos ensinos básico e secundário (ECD) revela
o peso dessa retórica, nomeadamente ao permitir que as famílias dos alunos participam no
processo de avaliação do desempenho dos professores, ainda que essa participação seja
meramente simbólica. As novas funções que o novo ECD acrescenta às funções tradicionais dos
professores (nomeadamente, assegurar as aulas de substituição, os complementos educativos
e a ocupação dos tempos livres dos alunos) são uma resposta do poder político à crescente
pressão do movimento associativo dos pais que, como é sabido, tem procurado que algumas
funções tradicionalmente exercidas pelas famílias passem a ser exercidas pelas escolas. A
retórica política oficial acentua mesmo o conceito de “escola a tempo inteiro”! Como se fosse
possível e aconselhável manter as crianças nos espaços escolares todo o dia, em actividades
estruturadas e formais, sob a dependência directa e a orientação de professores! Sendo um
conceito absurdo e perigoso, a “escola a tempo inteiro” mereceria longos parágrafos, mas a
economia deste texto impede-me de o aprofundar. Registo apenas a sua perigosidade!
Há até quem diga, em tom jocoso e certamente exagerado, que o novo ECD está a transformar
os professores em empregados domésticos dos pais. Sendo um exagero, essa afirmação reflecte,
em parte, a realidade dramática da crescente assunção de responsabilidades e funções por parte
dos professores, que há muito viram acrescentar às funções tradicionais de planificação, ensino
e avaliação, novas e crescentes funções de carácter social e de apoio à família.
Essa pressão e esse movimento resultam, sem dúvida, das alterações ocorridas na estrutura das
famílias e no mercado de trabalho. Com efeito, Portugal é um dos países da União Europeia com
uma maior taxa de emprego feminino e onde as mulheres, sobretudo as jovens mães, trabalham
mais horas por dia. Na ausência de sistemas mais flexíveis no mercado de trabalho e de apoios
estatais à natalidade e à maternidade, têm sido as escolas e os professores a assumirem e a
responsabilizarem-se pelas deficiências e problemas da sociedade e das famílias e pela ausência
de políticas públicas amigas das famílias e das crianças. Falta saber se a assunção das novas
funções de apoio às famílias, por serem tão exigentes e aumentarem, em demasia, a carga de
trabalho e de responsabilidade dos professores, não estão a provocar efeitos nefastos na
qualidade do exercício das funções de planificação, ensino e avaliação. Os fenómenos de
exaustão, burn out, stresse e ansiedade estão a afectar os professores mais do que quaisquer
17
outros profissionais (Pereira, Silva, Castelo-Branco e Latino, 2003) e estão aí para demonstrar os
efeitos nefastos dessas políticas.
A primeira vaga de estudos sobre as relações escola-família, ocorrida na década de 80 do século
passado, fortemente influenciada por Don Davies (1989) e a sua equipa de investigadores,
acentuou a retórica dos benefícios do envolvimento parental nas escolas (Davies, Marques e
Silva, 1993). De acordo com esses estudos, todos beneficiavam: os alunos tinha melhor
desempenho, os professores mais apoio e reconhecimento social e as famílias um conhecimento
melhor do processo educativo. Esses estudos acentuaram um conjunto de benefícios que, mais
tarde, na década de 90, viriam a ser problematizados em estudos de tipo sociológico, que
tiveram como objectivo identificar alguns efeitos perversos do envolvimento parental e em que
medida esses benefícios podem, em alguns casos, ser apropriados pelas famílias da classe média
e alta, em desfavor das famílias afastadas da cultura escolar (Silva 1993, 1996, 1999 e
2003).
A partir da década de 90, alguns estudos vieram mostrar que nem todas as famílias e nem todos
os alunos eram igualmente beneficiados pelo envolvimento parental nas escolas (Silva, 1993).
Alguns estudos mostraram mesmo que as classes média e alta controlavam uma parte
significativa das associações de pais e usavam, em alguns casos, o poder de participação na
tomada de decisões a favor dos seus próprios filhos, ajudando a moldar a estrutura e as práticas
escolas, no sentido de manter as desigualdades escolares (Silva, 2003). Outros estudos
mostraram que nem todas as práticas de envolvimento parental nas escolas produziam efeitos
positivos no desempenho escolar dos alunos (Marques, 1998). Por exemplo, as práticas de
envolvimento parental do tipo “participação na tomada de decisões” têm um impacto reduzido
na melhoria do desempenho dos alunos, até porque asfamílias dos alunos oriundos de famílias
afastadas da cultura escolar participam pouco nos processos deliberativos (Marques, 1998). Por
outro lado, as práticas de envolvimento das famílias no apoio ao estudo em casa produzem
efeitos positivos no desempenho dos alunos, mas essas práticas suscitam um problema: as
famílias mais afastadas da cultura escolar nem sempre possuem as competências para o fazer
(Henriques, 2006). Daí que certas práticas de envolvimento, nomeadamente quando não há o
cuidado de criar respostas para os pais de mais baixos rendimentos, possam acentuar as
desigualdades, em vez de promoverem o sucesso educativo de todos.
Resulta desta problematização que o envolvimento parental nas escolas não é uma panaceia,
nem tão pouco é sempre um instrumento de promoção do sucesso educativo para todos. Pode
até ter efeitos perversos se não for bem implementado e se não tiver a preocupação de atender
às necessidades educativas dos alunos de mais baixos rendimentos. E esses efeitos podem
traduzir-se no acentuar das desigualdades escolares.
O estudo de Diogo (2006), inserido neste livro, mostra como a condição de classe e a localização
geográfica contribuem para influenciar a oferta e a procura educativa. E o estudo de Faria
(2006), igualmente inserido neste volume, mostra também, como as famíliasdos alunos
negoceiam a sua intervenção nos processos de decisão. Diferentes famílias utilizam diferentes
processos de negociação e as famílias mais próximas da cultura escolar revelam possuir técnicas
de negociação mais favoráveis do que as famílias que estão afastadas da cultura escolar. E o
estudo de Henriques (2006) evidencia a forma como se potenciam e se reforçam as
desigualdades escolares em torno dos trabalhos de casa e a forma como as famílias da classe
média se envolvem activamente nesse processo. Veja-se a esse propósito o volume de negócios
que gira em torno do mercado de “apoio ao processo educativo dos alunos realizado fora da
18
escola” e como as famílias das classes média e alta usam esse mercado em seu favor. De notar,
ainda, a problemática dos pais-professores, levantada pelo estudo de Silva (2006), que sugere
que os pais-professores constituem um grupo privilegiado para desempenhar o papel de pais-
parceiros, sendo aqueles que melhor interpretam a atitude pró-activa dos encarregados de
educação no processo de reconfiguração da relação escola-família.
Importa, ainda, levantar outra questão importante resultante do envolvimento parental nas
escolas. Será legítimo que as famílias dos alunos exerçam pressão no sentido de moldarem as
práticas pedagógicas e os processos de avaliação dos professores? Ou será que a área
pedagógica e didáctica, por ser uma área técnica, deve estar vedada à influência parental? Onde
começa e acaba a autonomia técnica do professor? Esta questão prende-se com a definição
exacta do conceito de pais-parceiros e com a noção de parceria educativa. Até onde é que a
parceria pode ir? A este propósito podemos estar perante um amplo leque de práticas de
parceria: práticas de comunicação, práticas de participação nos órgãos escolares, práticas de
colaboração em actividades educativas fora da sala de aula, práticas de colaboração em
actividades educativas na sala de aula, práticas de apoio ao estudo em casa e outras. Sendo
certo que os benefícios das práticas de comunicação, de colaboração em actividades educativas
fora da sala de aula e de apoio ao estudo não oferecem quaisquer dúvidas, já as práticas de
participação das famílias nos órgãos escolares não são aceites, de forma pacífica, por todos. Em
que órgãos escolares devem as famílias participar? Em todos? Só em alguns? Quais? Será
legítimo que as famílias participem no conselho pedagógico, sendo este um órgão
eminentemente técnico? Será legítimo que participem nos conselhos de turma onde se tratam
de questões de avaliação?
Como se vê, a área das relações escola-família suscita muitos problemas e está aberta a uma
grande discussão. Contudo, esses problemas não impedem que se reconheçam os benefícios
que os bons programas de envolvimento parental podem gerar.
Será que os efeitos perversos do envolvimento parental, nomeadamente das práticas de
participação nos processos deliberativos, são de tal ordem que invalidam os benefícios que os
estudos realizados na década de 80 do século passado registaram?
Sendo uma questão complexa, a exigir novos estudos, importa referir que é possível criar
programas de envolvimento parental dirigidos a famílias de alunos afastadas da cultura escolar
capazes de gerar benefícios ao nível do desempenho e da integração dos alunos.
Importa, igualmente, recentrar o olhar dos investigadores e dos decisores políticos nas formas
como as escolas se tornam difíceis de alcançar por certas famílias. E essas formas são variadas:
ausência de espaços condignos para receber os pais dos alunos, linguagem dos professores
inadequada, atitudes dos professores pouco amigas dos pais, horários de atendimento e de
reuniões que impedem os pais de participar, etc.). Se isso for feito, isto é, se as escolas se
reorganizarem no sentido de serem mais respondentes às necessidades das famílias afastadas
da cultura escolar, será possível potenciar os benefícios do envolvimento parental. No caso de
se persistir em programas de envolvimento vocacionados para a promoção da participação das
famílias das classes média e alta nos processos decisórios, será difícil impedir que os efeitos
perversos se façam manifestar.
Referências
Davies, D. e tal. (1989). As escolas e as famílias em Portugal. Lisboa: Livros Horizonte
19
Davies, D., Marques, R. e Silva, P. (1990). Escolas e Famílias: A colaboração possível. Lisboa:
Livros Horizonte
Diogo, A. (2006). “Dinâmicas familiares e investimento na escola à saída do ensino obrigatório”.
In Interações, 2, Escola Superior de Educação de Santarém
Faria, S. (2006). “O envolvimento familiar no processo de decisão dos jovens à saída do 9º ano”.
In Interações, 2, Escola Superior de Educação de Santarém
Henriques, M. (2006). “Trabalhos de casa na escola do 1º ciclo da Luz: Estudo de caso”. In
Interações, 2, Escola Superior de Educação de Santarém
Marques, R. (1998). Professores, famílias e projecto educativo. Porto: Edições Asa
Pereira, A., Silva, C., Castelo-Branco, M. e Latino, M. (2003). Stress and teaching ability. In 24 th
International Conference Stress and Anxiety. Lisboa: Universidade Lusófona
Silva, P. (1993). “Escola-Família: Uma relação armadilhada?” In Ensaios de Educação Participada,
nº 11, ESE, Instituto Politécnico de Santarém
Silva, P. (1996). “Escola-família, uma relação entre culturas”. In L. Barbeiro e R. Vieira (Orgs.). A
criança, a família e a escola: Vamos brincar? Vamos aprender?. Leiria: Escola Superior de
Educação, 21- 30
Silva, P. (1999). Escola-família: o 25 de Abril e os paradoxos de uma relação” Educação,
Sociedade e Culturas, 11, 83-108
Silva, P. (2002). “Escola-família: Tensões e potencialidades de uma relação”. In Lima, J. (Org.).
Pais e professores: Um desafio à cooperação. Porto: Edições Asa
Silva, P. (2003). Escola-família: Uma relação armadilhada. Porto: Edições Afrontamento
Silva, P. (2006). “Pais-professores: Reflexões em torno de um estranho objecto de estudo”. In
Interacções, 2, Escola Superior de Educação de Santarém
Recommended