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Formação de Docentes em nível Médio no Estado do Paraná: entre interesses e
intermediações políticas
Maria Aparecida de Oliveira Jesus*
Angela Galizzi Vieira Gomide**
RESUMO O artigo sintetiza resultados de estudos realizados no PDE – Programa de Desenvolvimento Educacional, da Secretaria de Estado da Educação do Estado do Paraná. Caracteriza-se como Trabalho Final de participação no Programa. O texto trata das políticas públicas de formação de professores a partir do contexto das reformas empreendidas na educação brasileira na década de 1990. Aborda a formação docente em nível médio, no Paraná, tendo como referência a retomada do Curso de Formação de Docentes, modalidade Normal, na rede pública estadual de ensino a partir do ano de 2003. Considera particularmente a realidade do Curso no município de Primeiro de Maio. Pontua algumas das propostas da UNESCO para a área da educação com o intuito de estabelecer possíveis relações entre estas propostas e as políticas educacionais de formação de professores da Educação Básica no Brasil. Objetiva-se desvendar as reais intenções que sustentam as políticas de formação de professores para a docência na Educação Infantil e anos iniciais do Ensino Fundamental, bem como provocar um repensar crítico sobre a prática pedagógica e as teorias que sustentam o trabalho do professor que atua na formação de docentes em nível médio. Para realizar o trabalho recorreu-se à perspectiva teórico-metodológica do materialismo histórico, pois se fez necessário lançar olhar crítico sobre o contexto histórico, político, econômico e social em que se dá a formação docente na atualidade brasileira.
Palavras-chave: Educação. Políticas Educacionais. Formação de Professores.
ABSTRACT This article sums up results of studys fulfilled in the PDE – Programa de Desenvolvimento Educacional, from Secretary of State of Education from Paraná State. It characterize like the Final Work of participation in this Educational Program. The text is about the publics politics of training of teachears from the context of the Reforms enterprised in the Brasilian education in the nineties. It approachs the teaching formation in medium level, in the Parana State, had like reference the resume from teaching training course, in the Normal level, in the public state web of
*Professora Pedagoga do Colégio Estadual Marechal Castelo Branco – Ens. Fund., Médio e Normal do
município de Primeiro de Maio, Estado do Paraná e Professora PDE turma 2007.
**Professora da Universidade Estadual de Londrina, orientadora PDE, doutoranda em Educação pela PUC/PR.
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teach from of 2003. It weight up, particulary, the reality of this course in Primeiro de Maio city. Apoint some of the proposals from UNESCO for the area of the education, with the purpuse of set up some possibles connections between this porpuses and the educationals politics of training of teachers from the Basic Education from Brazil. It purpuses to show the true intentions Wich Support politics of training of teacher to teaching at the children´s Education and the first ones series from Fundamental Teaching, as well as to provoke a critic thinking about the pedagogic pratic and theories who support the word of the teacher, who perform in the training of teachers in medium level. For realize the work, it´s need to return for the theoric and methodologic perspectives of the historic materialism, since it be necessary get a critic look about the historic, politic, economic and social contexts wich realize the training of teacher in Brasilian actually.
Keywords: Education. Educationals Politics. Traing of Teachers.
Introdução
A gestão das políticas sociais no Brasil, assim como em outros países da
América Latina, tem sofrido nas últimas décadas processo intenso de
desmantelamento. Tal fato pode ser melhor compreendido a partir da análise crítica
da política ideológica e econômica neoliberal que determina, segundo seus
desígnios, a direção dessas políticas sociais. Assim, ao seguirem as determinações
dos dominantes, os países de periferia acabam criando as condições favoráveis ao
crescimento da desigualdade social e contribuindo com a exclusão extrema de suas
populações. Direitos essenciais como trabalho, saúde e educação são negados à
maioria dos cidadãos dos países pobres. Por sua vez, as ações implementadas na
área da educação, nos países que se encontram hierarquicamente em posição
periférica com relação aos dominantes, não escapam desse processo. Some-se a
isso, a fragilidade que envolve as políticas educacionais voltadas para a formação
de professores nesses países.
É importante destacar que as estratégias utilizadas pela política neoliberal
têm como objetivo único a manutenção da divisão de classe e da dominação. Desse
modo, a expressão ideológica neoliberal reforça a idéia da “naturalização” da
desigualdade social, da pobreza e da exclusão, impedindo o desvelamento por parte
da população, que é levada a pensar como se tais fenômenos fizessem parte do
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“destino” das pessoas. No tocante às políticas educacionais, o discurso neoliberal
reproduz o argumento que defende direitos, sem no entanto defender a ampliação e
melhoria das condições de vida da classe trabalhadora.
Sob tal compreensão e com o objetivo de enriquecer a reflexão aqui
proposta, importa trazer à luz os fundamentos, objetivos e princípios que dão
sustentação à Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e que
correspondem ao Estado Democrático de Direito. Em linhas gerais são eles:
cidadania; dignidade da pessoa humana; emancipação do poder que provém do
povo, que o exerce através de representantes eleitos ou diretamente nos termos da
referida Constituição; construção de uma sociedade livre, justa e solidária;
erradicação da pobreza e da marginalização e diminuição das desigualdades sociais
e regionais; promoção do bem de todos, sem nenhum tipo de preconceito;
predominância dos direitos humanos; defesa da paz; solução pacífica dos conflitos e
cooperação entre os povos para o progresso da humanidade (Constituição Federal,
1988, p. 3-4).
A implementação da política neoliberal, ao exigir nova reestruturação do
campo político, econômico e social no capitalismo, acaba impedindo a concretização
de tais princípios tão almejados pela sociedade brasileira. Como resultado desse
processo tem-se uma realidade extremamente excludente que promove, de forma
intensa, a desigualdade entre os Homens. Igualdade e justiça social continuam
sendo uma utopia.
Com relação à educação, a Carta Constitucional de 1988 traz a idéia de que
a educação é um “direito de todos e dever do Estado e da família” (Art.205). Da
mesma forma, estabelece que o ensino se dará com base nos princípios: da
igualdade de condições para o acesso à escola e a permanência nela; da liberdade
de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber; da
pluralidade de idéias e de concepções pedagógicas, e existência simultânea de
instituições públicas e privadas de ensino; da gratuidade do ensino público em
instituições oficiais; da valorização dos profissionais do ensino, assegurado, na
forma da lei, planos de carreira para o magistério público, com piso salarial
profissional e ingresso por concurso público de provas e títulos, garantido regime
jurídico único para todas as instituições mantidas pela União; da gestão democrática
do ensino público; da garantia de padrão de qualidade (pp. 137-138).
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Nessa direção, este trabalho tem por finalidade discutir sobre as políticas de
formação de professores para a educação básica, de modo especial a formação em
nível médio, no Estado do Paraná, a partir da reimplantação do Curso de Formação
de Docentes na modalidade Normal na rede pública estadual de ensino a partir do
ano de 2003. Organiza-se o texto em três partes para tratar do assunto.
Primeiramente, aborda algumas das propostas da UNESCO – Organização das
Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura – para a área da educação,
com o intuito de estabelecer possíveis relações entre essas propostas e as políticas
educacionais pensadas para a formação de professores nas últimas décadas no
Brasil. Em segundo, discorre sinteticamente, sobre as reformas educacionais
ocorridas no Brasil na década de 1990, considerando o contexto do capitalismo que
busca se reestruturar. Ressalta as políticas de formação de professores a partir
deste contexto. Na terceira parte trata do retorno do curso de Formação de
Docentes, em nível médio, na modalidade Normal, à rede pública estadual de ensino
do Estado do Paraná e pontua as principais dificuldades enfrentadas atualmente
pelo Curso, bem como por aqueles que buscam nele iniciar sua formação docente.
Considera particularmente a realidade do Curso no município de Primeiro de Maio,
Estado do Paraná, dando ênfase às suas reais condições de funcionamento, às
diretrizes curriculares pedagógica e ao perfil da comunidade local, dos professores e
dos alunos do Curso.
O Objetivo é desvendar, através da pesquisa e da análise de documentos
básicos como: “Declaração Mundial sobre Educação para Todos” (UNESCO, 1990),
“Relatório Jacques Delors” (UNESCO, 1996), “Educação para Todos: o
compromisso de Dakar” (UNESCO, 2000) e documentos nacionais que tratam da
formação docente, quais são as reais intenções que sustentam as políticas de
formação de professores para o exercício docente na Educação Infantil e nos anos
iniciais do Ensino Fundamental e, ainda, provocar um repensar crítico sobre a
prática pedagógica e as teorias que dão sustentação ao trabalho do professor que
atua na formação de docentes em nível médio.
Recorre-se assim, à perspectiva teórico-metodológica do materialismo
histórico para realizar os estudos, uma vez que, se faz preciso lançar um olhar crítico
sobre o contexto histórico, político, econômico e social em que se dá a formação
docente na atualidade brasileira.
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Por tratar da formação de professores para o exercício docente na educação
básica das crianças brasileiras, espera-se que o presente trabalho traga
contribuições no sentido de suscitar questionamentos e reflexões a respeito da
formação docente, que deve estar comprometida de fato com a educação pública de
qualidade, amparada por princípios democráticos e desejosa de conduzir o Homem
à sua emancipação humana.
UNESCO e Educação: algumas considerações
Propaga-se há séculos, no Brasil, de forma intensa e convincente, os ecos
de um discurso que enaltece a educação pública colocando-a, teoricamente, em
posição de destaque nas propostas de ações dos governantes. Nesse sentido,
procura-se justificar as reformas educacionais realizadas a partir da década de 1990,
no Estado brasileiro, como sendo necessárias para a promoção de uma educação
de qualidade para todos. Assim, é interessante verificar que, sob o manto da
ideologia dominante, o Estado eximi-se cada vez mais de seu papel diante das
políticas públicas e sociais, imputando aos cidadãos a responsabilidade por seus
sucessos ou fracassos no âmbito da sociedade capitalista.
Dado o alcance desse fato, faz-se necessário observar que as mudanças
empreendidas no campo da educação nacional na década de 1990, foram
direcionadas por organismos internacionais que exerceram, e ainda exercem
influências nos rumos das políticas públicas voltadas à educação. Um deles é a
UNESCO, agência multilateral que apoiou a Conferência Mundial sobre Educação
para Todos, realizada em Jomtien, na Tailândia, de 5 a 9 de março de 1990 e que
contou com a participação de governos, organismos internacionais, ONGs,
associações profissionais e personalidades da área educacional de todo o mundo.
Financiaram o evento, além da UNESCO, o UNICEF – Fundo das Nações Unidas
para a Infância, o PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento e
o Banco Mundial.
Tendo como referência a Declaração Universal dos Direitos Humanos
(1948), que defende a educação como direito fundamental do Homem, a
Conferência Mundial sobre Educação para Todos definiu objetivos, traçou
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estratégias, propagou a idéia de que as necessidades básicas de aprendizagem
deveriam ser asseguradas a crianças, jovens e adultos e deu destaque à Educação
Básica como sendo prioridade mundial. Na ocasião, governos de 155 países
subscreveram o documento: Declaração Mundial de Educação para Todos, também
conhecido como Declaração de Jomtien e se comprometeram a assegurar uma
Educação Básica de qualidade para todos.
Para uma melhor compreensão do conceito: necessidades básicas de
aprendizagem e dos resultados obtidos com a satisfação destas necessidades, é
importante destacar o artigo 1º da Declaração:
Satisfazer as necessidades básicas de aprendizagem 1. Cada pessoa – criança, jovem ou adulto – deve estar em condições de aproveitar as oportunidades educativas voltadas para satisfazer suas necessidades básicas de aprendizagem. Essas necessidades compreendem tanto os instrumentos essenciais para a aprendizagem (como a leitura e a escrita, a expressão oral, o cálculo, a solução de problemas), quanto os conteúdos básicos da aprendizagem (como conhecimentos, habilidades, valores e atitudes), necessários para que os seres humanos possam sobreviver, desenvolver plenamente suas potencialidades, viver e trabalhar com dignidade, participar plenamente do desenvolvimento, melhorar a qualidade de vida, tomar decisões fundamentadas e continuar aprendendo. A amplitude das necessidades básicas de aprendizagem e a maneira de satisfazê-las variam segundo cada país e cada cultura, e, inevitavelmente, mudam com o decorrer do tempo. 2. A satisfação dessas necessidades confere aos membros de uma sociedade a possibilidade e, ao mesmo tempo, a responsabilidade de respeitar e desenvolver a sua herança cultural, lingüística e espiritual, de promover a educação de outros, de defender a causa da justiça social, de proteger o meio-ambiente e de ser tolerante com os sistemas sociais, políticos e religiosos que difiram dos seus, assegurando respeito aos valores humanistas e aos direitos humanos comumente aceitos, bem como de trabalhar pela paz e pela solidariedade internacionais em um mundo interdependente. 3. Outro objetivo, não menos fundamental, do desenvolvimento da educação, é o enriquecimento dos valores culturais e morais comuns. É nesses valores que os indivíduos e a sociedade encontram sua identidade e sua dignidade. 4. A educação básica é mais do que uma finalidade em si mesma. Ela é a base para a aprendizagem e o desenvolvimento humano permanentes, sobre a qual os países podem construir, sistematicamente, níveis e tipos mais adiantados de educação e capacitação (UNESCO, 1998).
Diante de uma realidade que mostrava-se com grande número de crianças
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sem acesso ao ensino primário, com elevadas taxas de analfabetismo e com as
meninas e as mulheres sendo as maiores vítimas desse processo de exclusão, a
Conferência Mundial sobre Educação para Todos alicerçou-se nas idéias da
universalização do acesso à educação e promoção da eqüidade, da concentração
da atenção na aprendizagem, da ampliação dos meios e raio de ação da educação
básica, da criação de ambiente adequado à aprendizagem e do fortalecimento de
alianças (UNESCO, 1998).
Pode-se afirmar, de forma categórica, que a Conferência Mundial sobre
Educação para Todos impulsionou mudanças significativas na educação brasileira,
como destacam Shiroma et al (2002, p.57):
[o] evento foi o marco a partir do qual os nove países com maior taxa de analfabetismo do mundo (Bangladesh, Brasil, China, Egito, Índia, Indonésia, México, Nigéria e Paquistão), conhecidos como “E 9”, foram levados a desencadear ações para a consolidação dos princípios acordados na Declaração de Jomtien.
Segundo as autoras (2002), os governos dessas nações assumiram o
compromisso de dar impulso a políticas educativas acordadas a partir do Fórum
Internacional Consultivo para a “Educação para Todos”, coordenado pela UNESCO,
que avaliou a implementação dessas políticas durante toda a década de 1990 (p.57).
Foram três reuniões globais (Paris/1991, Delhi/1993 e Amã/1996), precedidas por
reuniões regionais de avaliação.
O estudo realizado pelas pesquisadoras (2002, p. 61) evidenciou alguns
problemas, de cunho político e ideológico, que serviram para conduzir interpretações
e definir posições após a Conferência:
Um primeiro problema [...] enfrentado refere-se à expressão “para todos” que sugeria uma universalização da educação básica, que no Brasil compreendia desde a educação infantil até o ensino médio, que a Conferência não pretendia. Em segundo lugar, alguns autores compreenderam o conceito NEBA [Necessidades Básicas de Aprendizagem] em sua função ideológica de indicar a natureza do ensino a ser ministrado. Isto é, para estratos sociais diferentes, ensinos diferentes, uma vez que as necessidades básicas de um e outro não poderiam ser as mesmas.
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Nas palavras de Shiroma et al (2002, pp. 61-62) reeditava-se o dualismo na
educação brasileira, tendo como ponto de partida a suposição de que se as
necessidades básicas de aprendizagem das amplas camadas empobrecidas eram
peculiares, deveriam continuar recebendo atendimento diferente do exigido por
clientela mais seleta.
A Conferência Mundial de Educação para Todos passou a ser um marco
importante para as políticas educacionais desenvolvidas no Brasil a partir dos anos
finais do século XX, fato que começa a se materializar com a publicação do Plano
Decenal de Educação para Todos, em 1993, no governo Itamar Franco. O
comportamento político brasileiro assumido a partir da década de 1990 deixa claro
que, “com esse plano, o Brasil traçava as metas locais a partir do acordo firmado em
Jomtien e acenava aos organismos multilaterais que o projeto educacional por eles
prescrito seria aqui implantado” (SHIROMA et al, 2002, p.62).
Outro evento de grande importância promovido pela UNESCO convocou
especialistas do mundo todo para formar a Comissão Internacional sobre Educação
para o século XXI. Coordenada pelo francês Jacques Delors, a Comissão
constituída elaborou um relatório para a UNESCO com o título: Educação: um
tesouro a descobrir, conhecido como Relatório Jacques Delors. O documento,
iniciado em março de 1993 e concluído em setembro de 1996, expressa as
convicções e considerações da Comissão com relação ao papel da educação e das
políticas educacionais no novo século que se aproxima, ressalta questões
importantes presentes no mundo globalizado e faz o delineamento de algumas
orientações, tanto para o nível nacional quanto para o nível mundial.
Sinalizando para a importância da democracia e do viver juntos no mundo,
os membros da Comissão consideram que as políticas educativas podem contribuir
“para um mundo melhor, para um desenvolvimento humano sustentável, para a
compreensão mútua entre os povos, para a renovação de uma vivência concreta da
democracia” (UNESCO, 2001, p.14). Reelaboram os conceitos de educação ao
longo de toda a vida, educação permanente e a partir destes, descrevem os 4
pilares sobre os quais a educação do século XXI deve se organizar: aprender a
conhecer, aprender a fazer, aprender a viver juntos, aprender a ser (UNESCO, 2001,
pp. 89-101).
Trata-se do novo discurso que sustentará e dará direção às políticas
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educacionais que deverão ser implementadas no âmbito da comunidade mundial. A
Comissão constituída atribui à educação papel relevante e ambicioso para o
desenvolvimento da pessoa humana e das sociedades, e considera enormes as
responsabilidades dos professores na concretização do “projeto educativo” por ela
almejado (UNESCO, 2001, p. 153):
Para melhorar a qualidade da educação é preciso, antes de mais nada, melhorar o recrutamento, a formação, o estatuto social e as condições de trabalho dos professores, pois estes só poderão responder ao que deles se espera se possuírem os conhecimentos e as competências, as qualidades pessoais, as possibilidades profissionais e a motivação requeridas.
Como assinalado no relatório, os participantes da Comissão julgam que é
necessário repensar a formação docente de modo a desenvolver nos futuros
professores qualidades humanas e intelectuais que satisfaçam novas perspectivas
de ensino. Além disso afirmam que, com o crescimento da população escolar, a
entrada no magistério passa a fazer-se em massa, desconsiderando, muitas vezes,
os recursos financeiros escassos, a falta de professores qualificados para o
exercício docente e o despreparo para o cumprimento das novas tarefas que se
impõem a estes profissionais, uma vez que, muitas vezes chegam à escola, alunos
com grandes dificuldades de relacionamento e socialização tanto no ambiente
familiar como na sociedade. O saldo que resulta da ausência de financiamentos, de
meios pedagógicos e a superlotação das turmas é, segundo a Comissão, o
aviltamento das condições de trabalho dos professores (pp. 157-158).
O novo argumento, defendido pela Comissão, ao enaltecer a educação
básica, a qualidade do ensino e dos professores, e ainda, ao alertar para o fato de
que, sendo maiores as dificuldades que o aluno tiver de ultrapassar, mais exigências
serão postas aos professores, parece ignorar as reais condições de vida da classe
trabalhadora no contexto do capitalismo.
Assim, a Comissão indica no relatório algumas medidas que visam melhorar
a qualidade e a motivação dos professores. Quanto ao recrutamento, recomenda
melhorar a seleção, sobre a formação inicial e contínua, sugere o estabelecimento
de laços mais estreitos entre as universidades e os institutos de formação de futuros
professores do primário e do secundário, além de desenvolver programas de
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formação contínua. Ao referir-se aos professores de formação pedagógica, alerta
para a importância do recrutamento e do aperfeiçoamento destes, uma vez que,
podem contribuir para a renovação das práticas educativas (UNESCO, 2001,
pp.159-160).
Retomando parte do pensamento de Shiroma et al (2002, p. 68) percebe-se
que as autoras, ao identificarem as principais características do professor
(competência, profissionalismo e devotamento), defendidas no Relatório Jacques
Delors, chegam à conclusão de que, na verdade, almeja-se um professor edificante,
ao sugerir que para ser eficiente o professor precisa recorrer a competências
pedagógicas e a qualidades humanas tais como autoridade, empatia, paciência e
humildade.
No que diz respeito à educação das mulheres e das jovens, o Relatório
Jacques Delors defende a idéia de uma educação para a igualdade de gêneros.
Para isso, apóia-se em argumentos exaltados por outras declarações como por
exemplo, a Declaração da Quarta Conferência Mundial sobre as mulheres, realizada
em Beijing em setembro de 1995 e que estabeleceu alguns objetivos fundamentais a
serem alcançados: igualdade de acesso das mulheres à educação, eliminação do
analfabetismo feminino, melhoria do acesso das mulheres à formação profissional,
ao ensino científico e tecnológico e à educação permanente.
Ao mostrar-se convencida do dever da comunidade internacional de tudo fazer para
acabar com estas desigualdades, a Comissão afirma que:
Garantir às jovens e às mulheres uma educação que lhes permita eliminar, o mais rapidamente possível, a diferença que as separa dos homens, a fim de lhes abrir, no trabalho, na sociedade, no domínio político, as vias de ação e de acesso ao poder que até hoje lhes estão vedadas, não é apenas uma exigência ética. É que, efetivamente, vários estudos põem em evidência um fato social importante: as mulheres tornaram-se, em todo o mundo, agentes econômicos de primeira grandeza, ainda que os indicadores analisados tendam, muitas vezes, a minimizar ou a ocultar a sua verdadeira contribuição para o desenvolvimento. A educação das mulheres e das jovens é deste ponto de vista um dos melhores investimentos para o futuro. Quer o objetivo seja melhorar a saúde pública das famílias, a escolarização das crianças ou a vida comunitária, é educando as mães e provendo, de um modo geral, a condição feminina, que as sociedades terão mais possibilidades de ver coroadas de êxito os seus esforços. O mundo em que vivemos, dominado quase exclusivamente pelos homens, tem muito a aprender e a esperar da emancipação feminina (pp.197-198, grifo nosso).
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As colocações feitas pela Comissão a respeito da educação feminina trazem
implícita uma ideologia que reforça a idéia de que, às mulheres, cabe o papel de
amar, cuidar, educar e, assim, contribuir para a promoção da paz mundial e do
progresso da humanidade. Pode-se em síntese dizer que, espera-se das mulheres o
cumprimento da tarefa de educadoras da infância, da moral e dos bons costumes.
Dez anos após a Conferência Mundial sobre Educação para Todos, governos de
164 países membros da UNESCO e participantes da Cúpula Mundial de Educação,
foram convocados para participarem do Fórum Mundial de Educação de Dakar, no
Senegal, no período de 26 a 28 de abril, com o propósito de avaliar a última década
da educação e assumir o compromisso coletivo de alcançar os objetivos e metas de
Educação para Todos – EPT até o ano de 2015. Na ocasião, reafirmaram a visão
instituída na Declaração Mundial de Educação para Todos “de que toda criança,
jovem e adulto têm o direito humano de se beneficiar de uma educação que
satisfaça suas necessidades básicas de aprendizagem, no melhor e mais pleno
sentido do termo [...]” (Dakar, 2000, p. 1). Reafirmaram também o compromisso pela
educação básica feito pela comunidade internacional ao longo dos anos 90 e
definiram rumos a serem seguidos nos próximos 15 anos.
Dentre as estratégias estabelecidas a partir da assinatura do Marco de Ação de
Dakar estão aquelas cuja lógica do discurso, ao dar lugar central à educação,
elegem os professores como atores essenciais na promoção de uma educação de
qualidade e ressaltam a valorização e qualificação destes profissionais como forma
de favorecer o processo de mudança que se deseja para as sociedades
contemporâneas.
A Reforma educacional no Brasil – década de 1990
As décadas finais do século XX testemunharam processo intenso e profundo
de reorganização do sistema capitalista, com conseqüências de grandes
proporções, que acabaram afetando as relações humanas e os direitos humanos em
todo o mundo. A crise econômica e política, já antes vivida pelos países periféricos,
ressurge nas décadas de 70 e 80 de maneira avassaladora. Para Tavares (1985,
apud NAGEL, 2001, p. 103-104), no Brasil:
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Os resultados do Censo demográfico de 1970 e das subseqüentes Pesquisas Nacionais por Amostra de Domicílios (PNAD) do IBGE, mostraram resultados aterradores. A paisagem social desoladora, no campo e nas grandes cidades, era a contraface da expansão do mercado interno e externo, do endividamento acelerado e da exacerbação de consumo e de sucesso que embriagavam as mentes das novas classes médias. [...] Na base da pirâmide social, a mobilidade horizontal e espacial significou novas oportunidades de miséria. Milhões de trabalhadores rurais em peregrinação na busca de sobrevivência percorriam o Brasil. Milhões desaguaram, nas grandes cidades, fazendo estágio temporário na construção civil, inchando as periferias e desembocando finalmente na marginalidade.
Esse quadro desolador faz lembrar o processo de enfraquecimento das
políticas sociais, com a ausência cada vez maior do Estado de Bem-estar social que
significava uma conquista do século XX. Sob a acusação de ser o responsável por
muitos dos males presentes na sociedade contemporânea, o Estado de Bem-estar é
retirado de cena e substituído pela mercantilização dos serviços sociais. A
intervenção do Estado passa a se dar de forma focalizada, com medidas
compensatórias aos considerados pobres. Sobre isto, Soares (2003, p.12) diz:
A filantropia substitui o direito social. Os pobres substituem os cidadãos. A ajuda individual substitui a solidariedade coletiva. O emergencial e o provisório substituem o permanente. As microssoluções ad hoc substituem as políticas públicas. O local substitui o regional e o nacional. É o reinado do minimalismo no social para enfrentar a globalização no econômico.
A autora (2003), ao abordar a questão das políticas de ajuste ao novo
modelo político e econômico, observa que estas políticas são recomendadas aos
países periféricos, que devem adotá-las “com abertura indiscriminada [de seus
mercados], “rigor” fiscal e “reformas” ”(p.13). Chama atenção para o fato de que
estas políticas de ajuste não são postas em prática pelos países dominantes, que
comandam as agências multilaterais proponentes e supostamente financiadoras
dessas políticas e que, são estes mesmos organismos internacionais que propõem
“ajuda” aos países pobres.
Essas exigências impostas aos países de periferia e controladas pelos
organismos internacionais, provocaram mudanças significativas nesses Estados,
13
que foram incitados a aceitarem soluções preconcebidas além-fronteira para tratar
de suas realidades locais. Assim, a política neoliberal, determinada para os países
da América Latina, expressa o despotismo das agências internacionais que
representam os interesses dos donos do capital.
Nessa perspectiva, fica evidente que a reforma educacional, implementada
nos países latino-americanos, na década de 1990, não pode ser analisada de forma
desvinculada do processo de regulação da acumulação capitalista que tenta superar
a crise política e econômica que agrava-se a partir da década de 1970, passando a
exigir novos paradigmas para a produção e para o mercado mundializado. É preciso
considerar ainda, a reforma institucional e política do Estado brasileiro nas décadas
de 80 e 90, já que seus efeitos se refletiram nas políticas educacionais
implementadas no país nos últimos anos.
Desse modo, é oportuno lembrar que, a Reforma do Aparelho do Estado
Brasileiro, cuja finalidade era promover mudanças em todo o sistema burocrático do
Estado, teve início com a Presidência de Fernando Henrique Cardoso que assumiu
o poder em 1995. Como medida inicial de seu governo, o Presidente da República
transformou a Secretaria da Administração Federal em Ministério da Administração
Federal e Reforma do Estado – MARE, colocando-o sob a responsabilidade do
Ministro Luiz Carlos Bresser Pereira. Assim que foi instituído, em 1995, o MARE
elaborou seu primeiro documento – o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do
Estado – e definiu ações consideradas inadiáveis: o ajuste fiscal, que deveria ser
duradouro; as reformas econômicas voltadas para o mercado; a reforma da
previdência social; a inovação dos instrumentos de política social e a reforma do
aparelho do Estado (BRASIL, 1995, p.16).
É nesse contexto de mudanças políticas e econômicas que Fernando
Henrique Cardoso constrói a base de seu discurso, que servirá para justificar a
reforma da educação profissional e da formação de professores da educação básica
nos anos iniciais de seu governo. O novo argumento apóia-se em palavras chaves
como: qualidade, produtividade, competitividade e empregabilidade, para disseminar
as ideologias necessárias à implantação de seu projeto neoliberal.
A década de 1990 foi, assim, palco de novas demandas de educação,
notadamente marcadas pela ampliação do acesso à escola em todo o sistema
educacional. Porém, isso não significou a garantia do direito à educação, como
14
preconizam os documentos oficiais, entre eles, a Constituição Federal e a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB 9394/96. Além disso, a expansão do
sistema, nos últimos anos, ocorreu em um contexto marcado por extremas
desigualdades sociais e com elevados índices de pobreza e de exclusão.
No que é específico às políticas de formação de professores da educação
básica no Brasil, nos anos 90, importa dizer “que a reforma da formação de
professores teve o objetivo deliberado de reduzir custos e ao mesmo tempo
aumentar o controle sobre esta categoria profissional; em outros termos, visa a
proletarização dos docentes” (SHIROMA, 2003, p.65). Em sua análise, Shiroma
assinala o verdadeiro sentido de profissionalização, afirma que o termo constituiu-se
conceito-chave da reforma na América Latina nos anos de 1990, porém, sendo
pouco discutido no debate sobre a formação de professores. A autora faz uma
observação:
O conceito “profissional”, por seu turno, alude a status profissional, código de ética, treinamento especial por meio do qual se adquire a ampla base de conhecimento específico que permite controlar o trabalho desenvolvido. A redução deste controle indica tendência à desprofissionalização e à desqualificação. O mesmo ocorre quando se reduz o âmbito de exigências de qualificações para ingresso na profissão ou se aligeira a formação (p. 65, grifo da autora).
Shiroma (2003, p. 67) alerta para o fato de que, a retirada da formação de
professores da universidade no período, tinha como intenção não apenas diminuir
gastos, mas também conduzir ao processo gradativo de desintelectualização do
professor.
A estas contribuições, agrega-se a da educadora Acácia Z. Kuenzer (1998,
p.7) que ao analisar as políticas de formação conclui que as mesmas
descaracterizam o professor como cientista e pesquisador da educação, função que
será exercida por uma minoria que atuará no ensino superior. “À grande maioria
compete a função de divulgação do conhecimento produzido em níveis
diferenciados, para o que se propõe uma qualificação também diferenciada e tão
mais aligeirada e menos especializada quanto mais se destine às classes
subalternas [...]”.
É rica também a contribuição de Oliveira (2004) ao ressaltar a precarização
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do trabalho docente sofrida, nos últimos anos, no que diz respeito aos aspectos
relacionados ao emprego. Considerando todo o processo de desqualificação,
desprofissionalização e desvalorização dos professores, a autora afirma:
O aumento dos contratos temporários nas redes públicas de ensino, chegando, em alguns estados, a número correspondente ao de trabalhadores efetivos, o arrocho salarial, o respeito a um piso salarial nacional, a inadequação ou mesmo ausência, em alguns casos, de planos de cargos e salários, a perda de garantias trabalhistas e previdenciárias oriunda dos processos de reforma do Aparelho de Estado têm tornado cada vez mais agudo o quadro de instabilidade e precariedade do emprego no magistério público (p. 1140).
É sob estas condições inóspitas que as políticas atuais de formação de
professores estão sendo postas no cenário brasileiro. Repensar essas políticas de
formação se faz urgente e necessário já que, à educação, deve ser dada a
prioridade merecida.
O Estado do Paraná e as políticas de formação de professores, em nível médio, a
partir da década de 1990
A reestruturação produtiva da economia, sobre a qual se assenta o sistema
capitalista é um dos fatores, talvez o mais significativo, que tem provocado situações
de contrastes entre os estados brasileiros colocando-os em posição diferenciada
dentro do próprio território nacional.
O Estado do Paraná situa-se na região sul do Brasil sendo considerado por
muitos como área privilegiada da nação brasileira. Segundo Gomide e Miguel (2008,
p. 2) o Estado é tido como pólo produtor e exportador de grãos, principalmente de
soja e trigo, além de se destacar na pesquisa agrícola desenvolvendo estudos sobre
organismos geneticamente modificados. No entanto, as autoras afirmam que as
transformações ocorridas no contexto paranaense, nas últimas décadas, vêm
acompanhadas de um processo contraditório onde se evidenciam “[...] contrastes
sociais e um movimento de revisão e transformação dos valores tradicionais,
impulsionado pelo choque de modernidade e de globalização”(p.2). Com relação às
questões comerciais, ressaltam que o Paraná traz, hoje, uma nova identidade que
16
lhe permite ser reconhecido em nível nacional, fato que favorece as transações
comerciais que estabelece, por exemplo, com o MERCOSUL.
Por outro lado, os problemas sociais da população paranaense também se
agravam nas últimas décadas, como salientam Gomide e Miguel (2008, p. 3). Nesse
sentido, a exemplo de toda comunidade brasileira, tais problemas são provocados
pela reorganização do sistema produtivo, pela desregulamentação das relações de
produção, pela flexibilização dos contratos de trabalho e pela privatização das
políticas sociais.
As novas exigências postas pelo mercado regulador atingem em cheio o
campo educacional e passam a definir os rumos das políticas públicas do Estado,
principalmente a partir da década de 1990.
Nessa direção, importa resgatar da história recente da educação
paranaense, alguns aspectos relacionados às mudanças implementadas pela
reforma na Educação Profissional e na política de formação de professores em nível
médio, no Estado, a partir da década de 1990.
De início faz-se necessário acrescentar que, de acordo com Gomide e
Miguel (2008, pp. 3-4), no âmbito político-administrativo o Estado do Paraná passou,
no período aqui considerado, pela gestão de dois governos: Jaime Lerner, que
governou de 1995 a 2002, já que foi reeleito para o segundo mandato, e Roberto
Requião, que cumpriu sua primeira gestão de 1991 a 1994, reassumindo o governo
do Estado a partir de 2003. Sendo reeleito nas últimas eleições estaduais, governará
até o ano de 2010.
Um outro fato importante a ser considerado é a relação entre a Reforma do
Estado brasileiro, intensificada a partir de 1995, com Fernando Henrique Cardoso na
presidência da República, e as políticas implementadas pelo governador Jaime
Lerner no Estado do Paraná. Assim, é interessante destacar que a Secretaria de
Estado da Educação – SEED/PR, ordenou, em outubro de 1996, a cessação
gradativa das matrículas para os cursos profissionalizantes e cursos de Habilitação
Magistério que se encontravam em funcionamento na rede de ensino do Estado.
Com esta atitude, Lerner antecipou-se à promulgação da nova LDBN 9394/96, que
ocorreu somente em 20 de dezembro daquele ano. Isso sugere ausência de
legislação, em nível nacional, regulamentando o Ensino de Segundo Grau e a
Educação Profissional no país naquele momento histórico (SEED, 2006, p. 26).
17
Os cursos profissionalizantes, no Brasil, passaram a ter legislação específica
com a homologação do Decreto Presidencial nº 2.208, de 17 de abril de 1997, o que
significou o fortalecimento da política de formação profissional nos moldes da
educação almejada pelo Estado neoliberal. Vale dizer que, o Decreto nº 2.208/97 foi
revogado pelo Decreto Presidencial nº 5.154, de 23 de julho de 2004, que trata da
integração da educação profissional técnica de nível médio e formação do ensino
médio.
Respaldado pelo discurso da gestão compartilhada, da excelência da escola
e da empregabilidade, em 1996, Lerner impõe o PROEM – Programa de Melhoria e
Expansão do Ensino Médio que propunha a estruturação do Ensino
Profissionalizante em cursos Pós-Médio, para alunos concluintes do Ensino Médio.
A rede pública estadual de ensino do Paraná sofreu fortes abalos causados
pelas reformas implementadas pelo governo a partir do ano de 1997. Os professores
que atuavam nos cursos profissionalizantes e no curso de Habilitação Magistério,
em processo de desativação no Estado sentiram-se, de certa forma, inseguros e
sem perspectivas de futuro com relação à profissão e a juventude paranaense, para
continuar a sua formação se viu forçada a buscar, na iniciativa privada, a realização
desse “direito social”.
No entanto, não foi sem resistências que tal processo se deu. Citando
particularmente o caso do curso de Magistério, quatorze instituições de ensino,
desconsiderando as determinações da SEED, não aderiram ao PROEM e
continuaram a ofertar o Curso. Por conta desta decisão, enfrentaram sérias
ameaças de restrições quanto a financiamento e modernização da escola com os
recursos que viriam do BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento, que
financiou o PROEM (SEED, 2006, p. 27). Fator fundamental neste processo de luta
e de enfrentamento foi a conquista, por estas instituições de ensino, do respeito, da
credibilidade e do reconhecimento. Dada a importância deste fato, cabe o
questionamento: Afinal, quais foram as mudanças e benefícios trazidos pelo PROEM
às escolas que aderiram ao Programa?
A retomada do debate sobre formação de professores em nível médio, no
Estado do Paraná, teve início no ano de 2003 quando o governador Roberto
Requião reassumiu a gestão do Estado. Assim, por intermédio do Departamento de
Educação Profissional, que contou com representantes dos professores da rede e
18
técnicos dos demais Departamentos de Ensino da SEED/PR, abriu-se a discussão
“sobre a reconfiguração das propostas de formação de professores em nível médio
no Estado [...]” (SEED, 2006, p. 24).
Nesse sentido, é interessante perceber que o retorno do Curso de Formação
de Docentes em nível médio, no Paraná, está em consonância com as diretrizes
emanadas dos organismos internacionais e se justifica pelo argumento legal
prescrito no artigo 62 da Lei 9394/96:
Art. 62. A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade Normal (grifo nosso).
Com a implantação gradativa na rede de ensino pública a partir do ano de
2003, o número de escolas que ofertavam o Curso até o ano de 2006 já somava 113
instituições no Estado. A ampliação da oferta, no entanto, vem acompanhada de
uma série de dificuldades, dentre as quais pode-se citar: a rotatividade dos
professores provocada pelas contratações temporárias; a precariedade da estrutura
física de grande parte dos prédios onde funciona o Curso; a falta de integração entre
as disciplinas da Base Nacional Comum com as da Parte Específica da Formação; a
escassez de recursos materiais e pedagógicos para atendimento da demanda e a
carência de bibliografia especializada nas bibliotecas escolares. Além disso, importa
acrescentar que os argumentos legais que amparam a formação docente em nível
médio, na modalidade Normal, às vezes apresentam-se de forma destoante.
Exemplo disso, é a questão da exigência da formação em nível superior para
atuação na Educação Básica, apontada no próprio artigo 62 que admite a formação
em nível médio e também no artigo 87, § 4º ao estabelecer que “até o fim da Década
da Educação [1997 a 2007] somente serão admitidos professores habilitados em
nível superior ou formados por treinamento em serviço” (Lei nº 9394/96).
Dessa forma, o Curso de Formação de Docentes em nível médio precisa ser
pensado, pelos estudantes que buscam nele sua formação, como um espaço de
formação inicial que necessita ser ampliado permanentemente.
19
O Curso de Formação de Professores, em nível médio, no município de Primeiro de
Maio
O município de Primeiro de Maio localiza-se ao norte do Estado do Paraná e
faz divisas: ao Norte com Iepê (SP), ao Sul com Sertanópolis, a Leste com Sertaneja
e a Oeste com Alvorada do Sul e Bela Vista do Paraíso. Possui cerca de 10.753 mil
habitantes (IBGE/2007) e sua população é formada por imigrantes de várias
nacionalidades entre eles: portugueses, espanhóis, italianos, japoneses, paulistas,
mineiros, nordestinos e por descendentes destes imigrantes.
A principal característica econômica do município é a agricultura,
destacando-se na produção de soja e milho. Desenvolve outras atividades
econômicas, entre as quais, a piscicultura, a avicultura, o comércio e o serviço
público. Considerando que a atividade econômica predominante no município é a
agropecuária, faz-se necessário observar que a mesma desenvolve-se em
pequenas e médias propriedades que estão concentradas nas mãos de um número
significativo de famílias, o que fortalece a economia familiar que incorpora a
produção mecanizada, fato que contribui para a falta de trabalho no campo. Por sua
vez, o comércio local apresenta-se com pouca dinamicidade, poucas indústrias, o
que restringe ainda mais as opções de trabalho. Dessa forma, o perfil das profissões
desenvolvidas no município é diversificado, apresentando índice maior de
trabalhadores temporários como: “bóias-frias”, empregadas domésticas diaristas
e/ou mensalistas e, mais recentemente, chacareiros.
Com a construção da Usina Hidrelétrica Capivara, iniciada em 1970 no rio
Paranapanema, na divisa do Estado do Paraná com o Estado de São Paulo (região
de Porto Capim), o município de Primeiro de Maio sofreu vários prejuízos sociais e
ambientais, assim como ocorreu com outros municípios da região. Sua paisagem
natural foi modificada, tendo parte de suas terras férteis invadidas pelas águas
represadas pela Usina. Hoje, o município utiliza-se da Represa Capivara para
explorar a atividade pesqueira que se constitui como fonte sustentável de emprego e
renda, além de aproveitar as condições ambientais que favorecem o
desenvolvimento do turismo local.
Nesse sentido, é importante ressaltar que Primeiro de Maio participa do
CIBACAP – Consórcio Intermunicipal da Bacia Capivara, do qual fazem parte outros
20
10 municípios: Alvorada do Sul, Florestópolis, Ibiporã, Jataizinho, Leópolis,
Porecatu, Rancho Alegre, Santa Mariana, Sertaneja e Sertanópolis. Constituindo-se
como uma política ambiental, o Consórcio tem como objetivo implantar diretrizes de
proteção, uso e conservação do Reservatório de Capivara nos municípios
consorciados, visando à adequada exploração econômica através de práticas
recreativas, desportivas e de lazer, de modo a conciliar desenvolvimento econômico
social com preservação do meio ambiente e equilíbrio ecológico.
Na verdade, essas medidas políticas “reparadoras” servem para disfarçar os
impactos causados ao meio ambiente quando da construção da Usina Hidrelétrica
Capivara, que atendeu a grandes interesses políticos e econômicos. No momento,
não cabe neste trabalho aprofundar estas questões.
Com relação à vida cultural da comunidade primaense pode-se dizer que
apresenta algumas limitações, já que se reduz às práticas religiosas, como por
exemplo, a festa da padroeira e as procissões; as festas juninas; a roda de viola,
que envolve principalmente o público da terceira idade; a televisão; o rádio e a
internet. Fontes culturais como cinema, teatro e museus, não existem no local.
Como espaço turístico o município apresenta: o Parque Turístico de Primeiro
de Maio, também conhecido como Terminal Paranatur, que localiza-se às margens
da Represa e as várias chácaras particulares que possuem infra-estrutura adequada
para acolher seus proprietários, já que muitos residem em outros locais do município
ou fora dele e os visitantes. Sob estas condições desenvolvem-se atividades
relacionadas ao lazer como a pesca e a tradicional Festa do Rodeio.
No que se refere ao campo educacional do município é importante trazer
informações sobre o seu sistema de ensino. Os quadros apresentam resultados de
pesquisa realizada pelo IBGE no ano de 2007:
Nível de Ensino Nº de Escolas Nº de Docentes Matrículas/2007 Pré-escolar 07 32 293 Ens. Fundamental 08 102 1613
Ens. Médio 01 31 505
21
Ensino Rede Nº de Escolas
Nº de Docentes Matrículas/2007
Pública municipal 04 20 200
Pré-escolar Escola Privada 03 12 93
Pública estadual 02 44 827
Pública municipal 04 41 676
Ens. Fundamental
Escola privada 02 17 110
Ens. Médio Pública estadual 01 31 505
Fonte: IBGE, 2007
É nesse contexto histórico, político e social que se insere o curso de
Formação de Docentes em nível médio, modalidade Normal, voltando a compor o
cenário educacional da rede pública de ensino do município a partir do ano 2006,
anos depois da extinção da sua oferta. Dessa feita, é fundamental perceber como se
deu os processos de implantação e extinção do Curso após a Lei 5692/71 e de
reinício da oferta em 2006.
Nessa direção, é preciso assinalar que o Curso Normal é ofertado
atualmente no Colégio Estadual Marechal Castelo Branco – Ensino Fundamental,
Médio e Normal, o qual pertence ao Núcleo Regional de Educação de Londrina,
ficando distante deste cerca de 80 quilômetros. De dependência administrativa
estadual, a Instituição tem como entidade mantenedora o Governo do Estado
através da SEED. Localiza-se na área urbana, e sua comunidade escolar apresenta
algumas características que definem o seu perfil: os pais são, na maioria das vezes,
os responsáveis pela vida escolar dos alunos menores que estudam no Colégio;
cada família possui em média, dois filhos nele matriculados; a maioria dos pais têm
formação em nível médio; são também em sua maioria, adeptos da religião católica;
trabalham em atividades diversas dos três setores da economia e a renda mensal
varia, em percentual maior, entre um e dois salários mínimos (Projeto Político
Pedagógico, 2007, p.16).
No que diz respeito ao perfil dos alunos, constata-se que são pré-
adolescentes, adolescentes e jovens, alguns cursando as séries finais do Ensino
22
fundamental, outros, as séries do Ensino Médio ou do Curso Normal. Muitos,
precisam conciliar estudo e trabalho, principalmente os que estudam no período
noturno. Dentre o público estudantil existem ainda alguns adultos que retornaram à
escola para retomar estudos anteriormente interrompidos (p.16-17).
Antes de prosseguir, e numa tentativa de recuperar parte da história da
formação de docentes no município de Primeiro de Maio, importa ressaltar que
através de conversas informais com professores que se formaram pela antiga Escola
Normal do município, bem como por meio de consultas a documentos, chegou-se às
seguintes informações: Em 1957 foi implantado no município o Curso Normal
Regional de Primeiro de Maio, de nível ginasial, mas que, ao mesmo tempo,
propunha em seu currículo disciplinas voltadas para a formação docente,
principalmente na última série do Curso, o que sugere, segundo as professoras
consultadas, a tentativa de resolver a situação de muitos professores que atuavam
na escola primária e que não tinham sequer a formação ginasial. O Curso
funcionava no período noturno e formou apenas uma turma (1957 a 1960) já que,
praticamente neste mesmo período, foi implantado no município o curso ginasial;
estruturava-se em 4 anos letivos e certificava os concluintes dando-lhes o direito de
participarem de concurso público para ministrar aulas no ensino primário. O Curso
Normal Regional de Primeiro de Maio funcionou no prédio da atual Escola Municipal
Cecília Meireles que já recebeu várias denominações: Grupo Escolar Moysés Lupion
(1956 a 1959); Grupo Escolar Miguel Dewes de Primeiro de Maio (1960 a 1965);
Escola de Aplicação Miguel Dewes (1966 a 1977) e, Escola Miguel Dewes – Ensino
de 1º Grau (1978 a 1982). Merece destaque no Curso as disciplinas que
compunham o seu currículo nos anos de 1957 a 1960: na 1ª e na 2ª séries –
Português, Matemática, Geografia, Ciências, Desenho, Trabalhos Manuais, Canto
Orfeônico e Educação Física; na 3ª série – Português, Matemática, História Geral,
Ciências Naturais, Desenho e Caligrafia, Canto Orfeônico, Trabalhos Manuais e
Educação física e, na 4ª série – Português, Matemática, Didática, Psicologia
Pedagógica, História do Brasil, Desenho, Ciências, Educação Física e Canto
Orfeônico (Atas de exames finais, 1957-1960).
A partir do ano de 1961, o município de Primeiro de Maio passou a ofertar
também a educação de nível secundário, sendo que o curso autorizado a funcionar
foi o de formação de professores. No seu primeiro ano de funcionamento a Escola
23
Normal Colégio Estadual “Gustavo Barroso” ocupou a sala da antiga Biblioteca
Pública Municipal José Correa Porto de Abreu, transferindo-se no ano seguinte para
o prédio do Grupo Escolar Primeiro de Maio (já demolido) e, finalmente, instalando-
se no prédio onde hoje funciona a já citada Escola Municipal Cecília Meireles –
Educação Infantil e Ensino Fundamental. Permaneceu neste local até o
encerramento das suas atividades no ano de 1979.
O Curso Normal tinha duração de 3 anos e funcionava no período noturno
até o ano de 1968. Nos anos de 1969 e 1970 foi ofertado em 2 turnos: diurno e
noturno; de 1971 a 1979 funcionou exclusivamente no período diurno (Atas de
exames finais, 1961 a 1979). As aulas de estágios ocorriam no contra turno e a
regência de classe se realizava em uma semana, incluindo os dias de sábados. A
falta de professores formados para atuar na Escola Normal exigiu que os
profissionais viessem de outras localidades, às vezes, distantes, fato que levou
algumas famílias a fixarem residência no município.
Considerando que muitos dos professores que atuaram ou que ainda atuam
na rede de ensino do município formaram-se pela Escola Normal, é interessante
afirmar que o gênero feminino sempre se destacou no Curso e as turmas eram
formadas principalmente por moças que aspiravam a uma carreira no magistério
público. A título de ilustração acrescente-se que, segundo as professoras
consultadas, as normalistas vestiam-se de maneira uniforme, trajando saias
pregueadas de cor azul marinho e camisa de cambraia branca, calçavam meias três
quartos brancas e sapatos pretos. Assim, eram facilmente percebidas e identificadas
na comunidade, fato que acabou criando uma imagem que se cristalizou no
imaginário de muitas pessoas.
Com a aprovação da Lei 5.692/71 estabeleceu-se novas regras para o
ensino de 1º e 2º graus. A Lei introduziu, entre outras inovações, a obrigatoriedade
da profissionalização em todos os cursos do 2º grau. Para a formação de
professores, em nível médio, propôs a Habilitação para o Magistério. Do ponto de
vista de Almeida (2006, p. 93):
A transformação da Escola Normal em mais uma habilitação profissional fez com que o curso perdesse sua identidade e especificidade. Essa descaracterização [da Escola Normal] apareceria também na ausência de bibliografia especializada e de qualidade para disciplinas pedagógicas que
24
são introduzidas no currículo por força da lei, no empobrecimento dos programas de formação geral e sua desarticulação com a parte específica do curso, na inadequação de métodos e conteúdos às necessidades de uma formação plena.
Implantado de forma gradativa no município a partir do ano de 1981, o curso
de Habilitação para o Magistério recebeu autorização de funcionamento e
reconhecimento de curso através da Resolução nº 65/82, de 15 de janeiro de 1982.
De acordo com levantamentos feitos em relatórios finais apresentados à SEED/PR
nos períodos de 1981 a 1999, constatou-se que dezoito turmas foram formadas pelo
Curso, totalizando 394 alunos dos quais a maioria eram mulheres. A cessação
definitiva do Curso se deu por meio da Resolução nº 2.327/97 de 04 de julho de
1997.
É oportuno dizer que a função do magistério público, na Educação Infantil e
nas quatro primeiras séries do Ensino Fundamental, da rede municipal de ensino, é
desempenhada atualmente por profissionais que apresentam algumas
características específicas, entre elas: são em percentual maior do sexo feminino;
ingressaram na carreira por meio de concurso público municipal, com exceção de
alguns casos de contratações temporárias ou atuação em escolas da rede particular
de ensino; alguns destes profissionais não cursaram o ensino superior,
interrompendo sua formação na escola de nível médio.
Nessa direção, pode-se afirmar que as condições de vida de muitas famílias
que vivem na comunidade local dependem do trabalho feminino. Assim, é
interessante destacar que a extinção do Curso de formação de professores, em nível
médio, no ano de 1999, na cidade de Primeiro de Maio, provocou um certo
desconforto para as pessoas que viam, no Curso, uma possibilidade de
profissionalização. A procura por matrículas, no período da extinção da oferta do
Curso, foi grande e sua cessação demorou algum tempo para ser aceita por
moradores do local. Para Almeida ( 2006, p. 96), “atualmente, não só a maioria dos
lares de baixa renda como também os da classe média são sustentados com o
trabalho feminino, e o magistério representa uma importante fonte de renda.”
Com esse pensamento, é preciso dizer que foram poucos os profissionais da
educação que assumiram postura crítica diante das políticas educacionais impostas
pelo governo do Paraná, naquela ocasião, fato que demonstra pouca ou nenhuma
reflexão sobre as mudanças que estavam sendo colocadas para a Educação
25
Profissional, entre elas, o fechamento do curso de Habilitação Magistério no Estado
e a adesão ao PROEM. Um exame mais cuidadoso de documentos oficiais
produzidos no período pela SEED/PR pode revelar sutileza, por parte do governo,
ao tomar essas medidas, como demonstra os processos em que as direções das
escolas “solicitavam” a cessação das atividades do Curso de Magistério e,
juntamente com os presidentes das APMF – Associação de Pais, Mestres e
Funcionários, assinavam o Termo de Adesão ao PROEM.
Como já foi dito, o curso de Formação de Docentes em nível médio,
modalidade Normal, retorna à rede pública estadual de ensino do Paraná a partir do
ano de 2003 e sua implantação no município de Primeiro de Maio ocorreu em 2006.
De acordo com a proposta pedagógica (SEED, 2006), o Curso tem como objetivo a
formação profissional para o exercício docente na Educação Infantil e nos anos
iniciais do Ensino Fundamental. A referida proposta norteia-se pelos seguintes
princípios: o trabalho como princípio educativo, a práxis como princípio curricular e,
o direito da criança ao atendimento escolar. Trabalho, ciência e cultura, são as
bases que dão sustentação a esses princípios.
Acrescente-se, ainda, que o Curso destina-se aos alunos egressos da última
série do Ensino Fundamental e, de acordo com o Decreto Presidencial nº 5.154/04,
está estruturado no formato “integrado”, o que significa a integração da formação
profissional técnica de nível médio e da formação do ensino médio. A duração do
Curso Normal, em nível médio, é de 4 anos letivos, com uma carga horária mínima
de 3.200 horas e a Prática de Formação deverá ter o mínimo de 800 horas
(Deliberação nº 010/99, Sistema Estadual de Ensino do Estado do Paraná).
O regime de funcionamento do Curso é o presencial e o processo de
implantação no município está ocorrendo de forma gradativa: em 2006 iniciou com
uma turma de 1ª série, composta por 33 alunos; em 2007, contou com uma turma de
1ª e uma de 2ª séries, formadas respectivamente por 22 e 29 alunos; em 2008, está
atendendo a uma turma de1ª série com 32 alunos, uma de 2ª com 21 alunos e uma
de 3ª série com 26 alunos. No ano letivo de 2009 será formada a primeira turma
concluindo-se assim, a 4ª série do Curso.
Analisando o quadro dos profissionais que atuam no Curso ofertado no
município constata-se que, nove são professores do QPM – Quadro Próprio do
Magistério Estadual e nove contratados pelo PSS – Processo Seletivo Simplificado.
26
Um dado interessante a ser considerado refere-se à distribuição destes profissionais
no trabalho com as disciplinas. Observa-se que os professores efetivos atuam na
Base Nacional Comum e os contratados temporariamente, atendem às disciplinas
de Fundamentos da Educação, da Gestão Escolar, das Metodologias e da Prática
de Formação. Sob tal situação alguns agravantes se colocam para o Curso: o
programa de formação continuada, implementado pela SEED, nem sempre
consegue atingir a todos os profissionais; a contratação tem ocorrido quando o ano
letivo já começou, fato que impede a participação dos professores na semana
pedagógica que abre o ano letivo; a cada início de período escolar os alunos ficam
sem aulas de algumas disciplinas até a abertura de contrato para professores.
Em 2008 o curso de Formação de Docentes, em nível médio, conta com o
apoio de uma coordenadora, formada em Letras e, membros da equipe pedagógica,
num número de 4 pessoas, se dividem no atendimento do Curso e de outros níveis
de escolaridade ofertados pela Escola. Quanto aos alunos que freqüentam o Curso
são, em sua maioria, do sexo feminino e apresentam idade variável entre 15 a 18
anos.
Considerações Finais
Tendo em vista que a educação é um direito social que deve ser assegurado
com qualidade, igualdade e justiça a todos os cidadãos, faz-se necessário lembrar
que, quanto mais o Estado se eximir desse papel, maiores serão as conseqüências
para toda a população. Nesse sentido, refletir sobre as políticas de formação de
professores que estão sendo disseminadas nas últimas décadas no Brasil, significa,
além de assumir postura ética, social e política, distanciar-se das aparências, a fim
de enxergar, nas entrelinhas da história, suas reais intenções e perceber, assim, o
jogo político que as sustentam.
Nessa direção, é fundamental estar atento ao que preconizam os
documentos oficiais, nacionais e internacionais, a favor de uma “educação para
todos”, já que os argumentos propugnados não podem ser considerados porto
seguro que garantam, por si só, a conquista de direitos humanos essenciais,
relacionados tanto ao ato de ensinar quanto ao de aprender. Do mesmo modo, é
27
preciso observar atentamente o quadro em que se insere a educação brasileira
neste início do século XXI, percebendo a distância entre o que é proclamado e as
ações que de fato estão sendo implementadas na área educacional.
No que se refere à formação docente em nível médio, particularmente no
Estado do Paraná, as posições políticas assumidas ora estão contra, ora a favor da
permanência da oferta na rede pública de ensino. Independentemente dessas
posturas é importante considerar algumas contradições que acompanham o Curso
de Formação de Docentes, em nível médio, na modalidade Normal e que precisam
ser aprofundadas e discutidas no âmbito da educação paranaense: priorizar a
educação básica de qualidade para todos exige, além de outras iniciativas
governamentais, o investimento em educação pública de nível superior para que a
formação de professores possa se dar de forma digna, enriquecedora e bem
fundamentada teórica e metodologicamente, com cursos presenciais, de licenciatura
plena, não se fazendo de modo aligeirado; o argumento legal que admite a formação
docente em nível médio para atuar na Educação Infantil e nos anos iniciais do
Ensino Fundamental nem sempre é garantido, já que para participar de concurso
para atuação na rede pública de ensino normalmente se exige, como critério, que o
candidato tenha formação de nível superior, o que aliás deveria ser o
posicionamento assumido por todos os governos que defendem a educação pública
de qualidade para todos. Assim, é interessante acrescentar que a própria LDB
9394/96 reforça essas contradições ao trazer implícito seus reais interesses: atender
às demandas do mercado. Nesse contexto, fica evidente que a formação de
docentes em nível médio no Estado do Paraná, situa-se entre interesses e
intermediações políticas.
Dessa forma, a concentração de esforços políticos e pedagógicos na
formação do professor em nível médio, deve vir acompanhada de atitudes que
demonstrem responsabilidade e comprometimento com uma formação docente de
qualidade, guiada pelos princípios democráticos já estabelecidos no artigo 206 da
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Por outro lado, o exercício
docente no curso de formação de professores, em nível médio, deve embasar-se em
teorias que possam dar sustentação à prática pedagógica desenvolvida no Curso.
Acrescente-se ainda, que é fundamental que os professores entendam suas próprias
condições de trabalho para que possam atuar conscientemente sobre elas.
28
Quanto às propostas da UNESCO para o campo educacional, importa
reafirmar que o projeto de educação nacional, desenvolvido nas últimas décadas,
atende aos interesses deste organismo internacional, na medida em que implementa
políticas de formação de professores para atuação na Educação Básica que
admitem o aligeiramento e a desintelectualização da formação docente, processos
que conduzem aos fenômenos da desprofissionalização docente; da precarização
do trabalho do professor e da desvalorização destes profissionais.
Enfim, por tudo isso, acreditar que a educação carrega o sonho de uma
sociedade mais justa, consciente e fraterna é fundamental para se recriar a
esperança e continuar a luta por um mundo melhor.
Referências Bibliográficas
ALMEIDA, Jane Soares de. Mulheres na Educação: Missão, Vocação e Destino? In:
SAVIANI, Dermeval et al. O Legado Educacional do Século XX no Brasil. 2ª Ed.
Campinas, SP: Autores Associados, 2006. 203 p. p. 93-96.
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Federal.
_____Plano Decenal de Educação para Todos. Brasília: MEC, 1993.
_____Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado. Brasília, DF: Presidência
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_____Resolução nº 2.327, de 04 de julho de 1997. Trata da cessação definitiva das
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