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HOLLYWOOD NAS TELAS DO INTERIOR GAÚCHO: UMA BREVE HISTÓRIA DA PROGRAMAÇÃO CINEMATOGRÁFICA EM SANTA MARIA (RS) NOS ANOS
1920
ALEXANDRE MACCARI FERREIRA1
Este trabalho é integrante do projeto do Curso de História do Centro Universitário
Franciscano A Era de Ouro do Cinema em Santa Maria: Uma Retomada Histórico-Cultural
(1920-1950). Julgamos necessário o desenvolvimento de estudos deste porte no universo
acadêmico, para que possamos aperfeiçoar e despertar o senso crítico-científico tanto entre o
público discente quanto na comunidade em geral que recebe o cinema e a crítica
cinematográfica sem problematizar e sem estabelecer o diálogo necessário do fazer histórico-
cultural na sociedade do município de Santa Maria.
O desenvolvimento de uma responsabilidade acadêmica, social e cultural, transita
tanto pelo meio da produção de conhecimento universitário quanto pela inserção de discussão
de temas que estão ligados a questões de fruição popular.
Nesse sentido, os estudos de Pierre Bourdieu (2008) sobre o julgamento de valores
estéticos de arte e cultura como um aspecto de distinção social, são relevantes, pois, o papel
da crítica desempenha uma relevante relação entre filme e público, possibilitando a formação
de um juízo informativo, muitas vezes acompanhado de um juízo de valor temático, social e
estético.
Bourdieu afirma que a experiência das pessoas com o cinema contribui para
desenvolver o que se pode chamar de competência para ver, isto é, uma certa disposição,
valorizada socialmente, para analisar, compreender e apreciar qualquer história contada em
linguagem cinematográfica. (in: DUARTE, 2002:13)
Para explorar os meandros do cinema, são fundamentais para colocar em pauta
questões que perpassam o exercício do olhar crítico ao assistir a um filme: sua historicidade e
seu sentido histórico; os aspectos culturais envolvidos em sua produção, assim como suas
1 Professor do Curso de História do Centro Universitário Franciscano (UNIFRA). Mestre em Integração Latino-Americana pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Pesquisador de História do Cinema.
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visões políticas; a dicotomia entre arte e ciência; seus olhares sobre a vida humana
(TURNER, 1997: 49).
A preocupação com a diversidade cinematográfica e o cinema enquanto meio de
comunicação industrial, independente e de expressão cultural e ideológica de determinados
países, possibilita a análise continental das peculiaridades criativas, políticas e temáticas de
cinemas pelo mundo, considerando o filme como objeto de fruição e como documento
científico.
Nesse sentido, este trabalho se justifica pela necessidade de estudos mais sistemáticos
e científicos acerca do universo da crítica cinematográfica enquanto um espaço de
problemática do filme, ao mesmo tempo em que um reflexo cultural das obras
cinematográficas em Santa Maria, Rio Grande do Sul.
Assim o objetivo de analise deste texto será verificar os tipos de obras
cinematográficas na inserção cultural do município e na vida dos espectadores, considerando
a relevância histórica e cultural de um levantamento da trajetória dos cinemas de calçada em
Santa Maria, que foram marcas de uma época de ouro da projeção do cinema no município.
No que se refere à metodologia deste estudo serão levantadas fontes em acervos
particulares como da Casa de Memória de Edmundo Cardoso e públicos como o Arquivo
Histórico de Santa Maria, bem como uma pesquisa em fontes bibliográficas de historiadores e
cronistas da cidade como José Belém, Romeu Beltrão, Cirilo Costa Beber, Roselâine
Casanova Corrêa,. Hermito Sobrinho, João Daudt Filho, Roque Callage, entre outros.
Procurar-se-á realizar uma digitalização das fontes bem como uma organização de fotografias
e gravuras sobre as imagens dos cinemas, bem como realizar um fichamento das obras
pesquisadas.
A preocupação com a diversidade cinematográfica e o cinema enquanto meio de
comunicação industrial, independente e de expressão cultural e ideológica de determinados
países, possibilita a análise continental das peculiaridades criativas, políticas e temáticas de
cinemas pelo mundo, considerando o filme como objeto de fruição e como documento
científico.
1. Uma cidade e o cinema
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O período entre as décadas de 1920 e 1950 foi de efervescência cinematográfica no
município de Santa Maria, Rio Grande do Sul. Um indício importante disso é o número de
cinemas de calçada que foi inaugurado nesse período, bem como as obras cinematográficas
que foram exibidas nesse contexto cultural marcado por uma cidade que atravessava um
momento de transição no sentido econômico e político.
A história das exibições cinematográficas em Santa Maria, segundo acervo da Casa de
Memória Edmundo Cardoso, remete ao ano de 1897 quando um diretor de uma companhia
teatral que voltara de Buenos Aires trouxe para a região a novidade do aparelho de projeção
denominado cinematógrafo.
Segundo Romeu Beltrão o primeiro registro de sala de exibição data de 1902 - 19082 o
Salão Seyffarth, localizado no centro da cidade. No Salão não havia exibições diariamente,
ele funcionava somente quando exibidores ambulantes chegavam à cidade. Após esse
momento foi instalado o cinema Recreio Ideal no Teatro Treze de Maio, que funcionou até
1911, ano que marca uma nova fase do cinema em Santa Maria.
Entretanto, apenas a partir de 1920 podemos estabelecer a inserção do universo
cultural cinematográfico em Santa Maria. A sala de cinema nesse período que mais se
destacou foi a do Cine Independência (1922 – 1995), mas é importante construir uma história
mais minuciosa e detalhada desse espaço assim como de outros cinemas como o Cine-Teatro
Coliseu Santamariense (1911 – 1945), o Cinema Ar-Livre (1923 – 1929), o Cinema Imperial
(1935 - (1960), o Cinema Odeon (1937 – 1939) e o Cinema Glória (1956 – 1997), ainda em
fase inicial que marcaria a partir de meados da década de 1950 outro sentido histórico de
avanço da tecnologia de projeção.
O desenvolvimento de uma cultura audiovisual é implícita no tipo de documentação
pesquisada, jornais e revistas da década de 1920, pois revelam a necessidade de um
acompanhamento do público na vivência e criação de um cotidiano que os conduz a sala de
cinema.
Se pensarmos a crítica de cinema da época, ainda que produzida essencialmente por
autores do centro do país, verificamos a delimitação e inserção cultural e social de um espaço
2 Há um relato de Edmundo Cardoso que afirma que o Cinematografo Seyffarth foi inaugurado em 1908, mas Schilling (2005) precisava que o salão fosse inaugurado em 22 de outubro de 1902, sendo considerado o primeiro cinema permanente da cidade.
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importante de observação dos filmes, pois evidencia o avanço de Hollywood sobre as salas de
cinema no Brasil. Os textos relacionam-se ao universo do fazer histórico-cultural da arte.
Pensar o cinema enquanto meio de análise e contra-análise da sociedade (FERRO, 2010: 15) é
um dos elementos que norteiam estudiosos, leitores e mesmo cinéfilos interessados em
compreender o mote ou as temáticas de obras artísticas ligadas ao áudio visual.
Neste estudo, motivado pelo interesse profissional e pessoal sobre a s relações entre
cinema e história, e o desenvolvimento de pesquisas no âmbito acadêmico, esboçaremos de
forma inicial considerações sobre sociedade, cinema e produção crítica da década de 1920, a
era de ouro do cinema em Santa Maria, RS.
2. A exibição e o universo do espectador
Nesse sentido, a compreensão da crítica passa necessariamente pelo entendimento do
papel interpretativo e social do cinema. Essa arte é um importante espaço de reflexão social
que permite discussões históricas e analogias a outros universos científicos.
A necessidade da abordagem das relações entre cinema e História vislumbra-se a partir
de uma abertura de um pensamento reflexivo calcado tanto sobre a análise das representações
quanto das inter-relações viáveis do projeto de lançamento de um filme, como utilização de
um bojo alegórico voltado para causas políticas, sociais, documentais e propagandísticas que
as obras visam retratar e expô-las ao grande público espectador. A crítica cinematográfica
colaborou para que essa análise reflexiva sobre o cinema se desenvolve, principalmente a
partir da década de 1950 com a criação na França do Cahiers du Cinéma por André Bazin e
Jacques Doniol-Valcrose (COSTA, 1989, p.35-36).
A partir dos estudos de Marc Ferro (2010, p.13) podemos vislumbrar e compreender
mais sistematicamente as interferências múltiplas entre cinema e história, por exemplo: na
confluência entre a História que se faz e a História compreendida como relação de nosso
tempo, como explicação do devir das sociedades. Em todos esses pontos o cinema intervém.
Se pensarmos a relevância das atividades exercidas pelas salas de cinema na história
da cidade, Giulio Carlo Argan afirma que:
É urbano o espaço onde vive uma sociedade organizada, onde as técnicas do trabalho humano têm a dignidade da ciência, onde se tomam decisões políticas e se executam ações
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destinadas a ter efeitos longínquos e duradouros; em suma, o espaço da cidade é o espaço da história. (ARGAN, 1993: 111).
Para Peter Burke (2004), o sentido da utilização das imagens não está apenas no que
está sobre o véu do objeto analisado, mas também os elementos e os detalhes que se acionam
como um modo de trazer o que deve ser sutilmente visto. O cinema enquanto imagem, e
outros meios, e representação possibilita a vinculação do movimento como um viés de
capacitação da ação artística e do sentido histórico e temático da obra.
É interessante observar que boa parte dos filmes exibidos em Santa Maria não faz
parte de um cânone cinematográfico, o que inviabiliza tanto acesso aos filmes quanto às
críticas de época. Se a época do cinema silencioso em Hollywood foi marcada por uma
transformação constante do ponto de vista técnico, no que se refere as abordagens temáticas
muito era repetido e baseado em estratégias narrativas de gênero como aponta Philippe
Paraire (1994).
Assim, quando refletimos os usos da imagem na sociedade contemporânea
percebemos que artes como a cinematográfica ganharam especial enfoque e destaque no
universo acadêmico, seja pela necessidade de reflexão ideológica, estética, cultural e
científica, capazes de avaliar as propostas que os produtores e criadores dessas imagens
propõem em relação ao público receptor, seja pelo destaque da comunhão
criação/produto/recepção a partir da formação do sentido de espetáculo, com as formas de
expressão simbólica, comunicativa, criativa e propagandística que o cinema desenvolveu no
século XX, e reinventa-se cada vez mais neste século XXI, também podemos pensar a questão
da crítica cinematográfica produzida em determinado espaço social, como pretenderemos
estudar neste projeto.
2. Hollywood em Santa Maria: as telas de cinema e a modernização do cotidiano
interiorano
Se pensarmos o universo cinematográfico atualmente, veremos que as produções
cinematográficas hollywoodianas dominam o espaço das salas de cinema em shopping
centers. Santa Maria possui hoje três shoppings, sendo que dois possuem cinema (Santa Maria
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Shopping, 2 salas gerenciadas pelo Cinemas Movie Arte; e o Royal Plaza Shopping, 4 salas
sendo uma em 3D, da rede de cinemas Arco íris.
De forma hegemônica é notável o domínio das produções vindas de Hollywood, ainda
que não seja surpreendente em se considerando marketing, investimento das grandes redes e
público que está culturalmente habituado às produções vindas dos Estados Unidos.
A evidência da “invasão” norte-americana neste aspecto remete ao surgimento dos
cinemas no município. O desenvolvimento dos cinemas de calçada em Santa Maria é um
aspecto marcante no processo de modernização dos locais de convivência.
No começo da década de 1920, o cinema era um entretenimento relativamente recente
e, portanto, ainda um tanto cru; nada de efeitos especiais ou enredos muito mirabolantes. As
premissas simples e até inocentes eram mais recorrentes, e um dos maiores nomes do ramo
era Chaplin, com seu personagem icônico, Carlitos (ou Vagabundo). Em uma época de
sofrimento e privações causados pela Primeira Guerra Mundial, o Vagabundo servia não
apenas como um “palhaço”, mas também como uma válvula de escape para toda a agonia que
ainda prevalecia. Chaplin o usava como um tipo de consolo que tantos precisavam, assim
como também o usava como um manifesto contra a condição deplorável do mundo pós-
guerra. Mas foi apenas com O Garoto que o diretor incluiu nesse universo de Carlitos um
núcleo familiar, a única coisa que faltava para enriquecer por completo a gama de temas
pertinentes que sempre marcaram presença nas aventuras do personagem.
Durante os anos 1920, a produção cinematográfica que maior tempo ficou em cartaz
foi O Garoto, de Charles Chaplin. O filme estreou dia 10 de Janeiro de 1923 e ficou em
cartaz por um mês, sendo que segundo a programação divulgada pelo jornal Diário do
Interior, o filme entrou em cartaz outras vezes ao longo do ano e também em 1924 e 1925.
A trama remete a trajetória de um garoto, de uma mãe e de um vagabundo. A comédia
pastelão aparece de forma predominante durante boa parte da narrativa, que acentua o afeto
entre o garoto criado pelo vagabundo, após ser deixado pela mãe, com dificuldades
financeiras. Após a transformação da mãe em uma bem sucedida artista ela mantém a
esperança de encontrar o filho que teve que abandonar para possibilitar uma vida digna.
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Publicado em Diário do Interior - 10 Janeiro de 1923
Esse tipo de história atinge o publico espectador pelo tom emotivo, por uma
ingenuidade característica dos filmes de Charles Chaplin e principalmente por trazer uma
mensagem positiva, dignificante, alegre e de esperança por um mundo melhor. Isso em 1921,
ano de produção do filme. Considerando o estrondoso sucesso, inferimos que a identificação
do público santa-mariense acompanhou de certa forma o próprio sucesso histórico do filme,
considerado uma das principais realizações de Chaplin.
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O Garoto (The Kid) 1921, Direção: Charles Chaplin
Em O Garoto, Chaplin realiza uma representação da condição da sociedade da época,
algo entre a decadência e o orgulho. Além disso, há um destaque na trama no momento em
que Carlitos sonha com uma sociedade utópica sendo maculada por sentimentos como inveja
e mentira é retratada. Durante essa breve sucessão de cenas, Chaplin monta rapidamente um
mundo ideal, onde pessoas convivem sem nenhum tipo de atrito (inclusive uma insinuação de
sexo livre entre todos é mostrada), e depois desmorona tudo apenas inserindo os elementos
egoístas e mesquinhos que fazem do mundo um verdadeiro caos. Tudo acontece rápido
demais e não é grande o suficiente para tirar o foco principal do enredo, que é o valor da
família, mote que traduz a essência do tipo de filme que fez sucesso não apenas entre os
santamarienses, mas em boa parte das salas cinematográficas.
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Diário do Interior – 18 de agosto de 1927
Outro filme exibido na década de 1920 foi Rosita, que também é um filme de família.
Ao trazer o universo de Sevilha, a obra evidencia um período em que a cidade se afundou nas
profundezas da depravação e do pecado. Chocado com as profundezas de seu povo ter
afundado, o rei de Espanha decide dar à cidade uma visita quando um carnaval é organizado,
a fim de resgatá-lo. Um de seus habitantes é Rosita, uma cantora de rua amada e elogiada
pelas pessoas da cidade.
Rosita (Rosita) 1923 – Direção: Ernst Lubitsch
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A jovem Rosita é a única fonte de renda para sua família pobre, que estão sempre
lutando entre si. Ela está farto de viver na pobreza extrema, enquanto o rei está vivendo em
riqueza. Depois de ser obrigado a pagar impostos, Rosita está enfurecido e vem com uma
música em que ela insulta o rei. Logo, o rei é informado com a balada ofensiva e visita sua
anonimamente. Em vez de ser bravo, ele fica encantado pela mulher. No entanto, os soldados
vieram prendê-la por insultar publicamente o rei.
Logo depois, Rosita é informado de que Diego foi executado. Arrasada, ela tenta
matar o rei, até que ela eo rei descobrir Diego ainda está vivo, e os amantes se reencontram. O
rei deixa seu castelo para ser confrontado por sua esposa sobre seu caso. Ela revela que ela
ordenou aos guardas para poupar Diego.
Em O hábito faz o monge, de Joseph de Grasse são retratados elementos da vida
cotidiana. Estabelece na obra uma importante relação entre parecer e ser, que constrói uma
característica ligada a personalidade do homem ao mesmo tempo em que remete a ideia da
família.
Diário do Interior - 14 de setembro de 1927
No enredo John Paul Bart é um sujeito simples que considera a questão do vestuário
um elemento importante no modo de vida, já que a partir das roupas se “faz um homem”. Ele
compra um terno na alfaiataria onde trabalha para ir a uma recepção luxuosa. Bart chama a
atenção de Abraão Nathan, o presidente de uma empresa de navio a vapor que o convida a
participar de um cruzeiro e em seguida a trabalhar como gerente em sua empresa. A partir
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deste momento a trajetória do protagonista fica imersa entre o status provocado pela roupa e
sua personalidade humilde e lutadora, que é evidenciada pela relação de amor com sua
namorada e pela defesa das questões trabalhistas.
O Hábito faz o monge (A Tailor Made Man) 1922 - Direção: Joseph De Grasse
A questão familiar percorre a trama no sentido de estabelecer uma ponte entre o modo
de vida de Bart com núcleos simples de qualquer comunidade. Em evidenciar as questões
ligadas ao trabalho, o espectador santamariense também se identifica já que durante a década
de 1910 houve várias manifestações trabalhistas (inclusive greves) ligadas principalmente a
Companhia Ferroviária.
Revista Cinearte, 23 de Novembro de 1927.
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O sentido de aventura, comédia e drama moral aproximam o espectador de seu
cotidiano imaginado, ainda que na ‘jovem’ cidade interiorana do Rio Grande do Sul. O final
feliz caracteriza e marca o desenlace da trama, o que proporciona a sensação de bem estar
familiar aos espectadores do filme.
O fundo temático das obras ainda que bastante distintos são tratados como um ótimo
programa para o público já que evidenciam núcleos e temas de família. As qualidades
estéticas e temáticas dos diretores capacitam tanto em nível social quanto cultural, pois
exigem um grau de compreensão e erudição mais desenvolvidos no sentido de leituras (já que
as obras também são produtos que vão além das relacionadas a adaptações literárias).
Entre as características das três obras analisadas compõe elementos em comum que
nos ajudam a compreender os tipos de filme que em geral eram exibidos em Santa Maria,
visando o interesse do público consumidor.
Importante destacar que durante a década de 1920 verifica-se a exibição de filmes
soviéticos, franceses, italianos, alemães e brasileiros. Contudo, tanto o período que tais obras
ficaram em cartaz quanto as difusão histórica do filme em pesquisas contemporâneas sobre os
filmes, evidenciam que estes tipos de produção possuíam restrição, desinteresse e não
atingiram o âmago dos espectadores interioranos. Inclusive, algumas obras, como eram
exibidas de forma seriada, não chegavam a concluir o período de exibição.
Considerações Finais
Este texto considera relevante relacionar cinema e história, pois proporciona um
estudo social do cinema, em seu contexto de produção, lançamento e crítica. Os estudos sobre
crítica cinematográfica como documentos para uma escrita cultural da história.
As reflexões sobre os tipos de filmes que eram lançados no cinema estão diretamente
relacionados a questões de fruição e sociedade, na medida em que filmes com artistas e
diretores renomados atingiram um grau de recepção favorável pelos espectadores, como se
evidencia a partir da duração de exibição do filme na cidade.
Por outro lado, produções consideradas de baixo orçamento, que apelavam para o
erótico, sexual e pela chanchada, são na grande maioria das vezes rechaçados pelos autores,
que consideram subproduto artístico, e não correspondem a ideia de qualidade do público
leitor da crítica. Ainda assim, estes filmes ficavam mais tempo em cartaz por serem sucessos
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de bilheteria, já que atingiam uma parcela da população afeita com o perfil de filme em
questão.
Os filmes da era silenciosa atingiram um interessante sucesso em Santa Maria, em
especial as obras norte-americanas. O distanciamento entre o lançamento do filme e a
exibição no município também ajudaram a criar uma expectativa das produções, que eram
exibidas antes nos grandes centros do Brasil, em especial no Rio de Janeiro. A crítica da
Revista Cinearte colabora para uma apreciação dos filmes, ainda que não haja indícios de que
tais críticas chegavam antes da exibição no interior do estado do Rio Grande do Sul.
A documentação verificada nos jornais Diário do Interior aponta para uma perspectiva
de uma vida cultural efervescente em que a divulgação das estrelas de Hollywood,
predomínio de comédias, melodramas e dramas históricos, em geral exibidos de forma seriada
como uma construção de dependência e cotidiano de participação da programação de cinema.
O aspecto que marca de forma determinante os cinemas de calçada é a criação de
espaços sociais e culturais articulados a vida pública santa-mariense, elemento esse que o
cinema de Hollywood ajudou a formar, ainda que, tornando reféns o perfil dos consumidores
de cinema em Santa Maria, como se verifica pela programação cinematográfica dos dias
atuais.
A pesquisa, nesse sentido, ainda que possa oferecer uma diversidade bastante grande
de análises, serve como ponto de partida para pesquisas futuras e uma reflexão mais ampla
sobre a programação e exibição cinematográfica hollywoodiana e seu enquanto documento
cultural e social na cidade de Santa Maria.
Referências
ARGAN, Giulio Carlo. História da Arte Como História da Cidade. São Paulo: Martins Fontes, 1993.
BELTRÃO, Romeu. A evolução do cinema em Santa Maria. [S.I], 1956.
BOURDIEU, Pierre. A distinção: crítica social do julgamento. São Paulo: EDUSP, 2008.
BURKE, Peter. Testemunha ocular: História e imagem. Tradução de Vera Maria Xavier dos Santos. Bauru, SP: EDUSC, 2004.
COSTA, Antonio. Compreender o cinema. Tradução de Nilson Moulin Louzada. 2ª ed. São Paulo: Globo, 1989.
DUARTE, R. Cinema & Educação. Belo Horizonte: Autêntica, 2002.
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EBERT, Roger. A magia do cinema. Tradução de Miguel Cohn. Rio de Janeiro: Ediouro, 2004.
FERRO, Marc. Cinema e História. Tradução de Flávia Nascimento. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2010.
LEITE, Sidney Ferreira. Cinema Brasileiro: das origens à retomada. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2005.
PARAIRE, Philippe. O cinema de Hollywood. Tradução de Marina Appenzeller. São Paulo: Martins Fontes, 1994.
TURNER, Graeme. Cinema como prática social. Tradução de Mauro Silva. São Paulo: Summus, 1997.
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