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INOVAÇÃO E I&D NA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA
PORTUGUESA
CASO BIAL
por
Lídia Manuel Magalhães Teixeira de Carvalho
Tese de Mestrado em Ciências Empresariais
Orientada por
Prof. Doutor Hélder Valente da Silva
Faculdade de Economia
Universidade do Porto
2007
i
NOTA BIOGRÁFICA
Lídia Manuel Magalhães Teixeira de Carvalho nasceu a 28 de Novembro de 1977, em
Amarante, vive em Matosinhos e trabalha na Empresa BIAL – Portela & Companhia SA,
na Trofa.
Na sua Formação Académica, concluiu a Licenciatura em Relações Internacionais
Económicas e Políticas, que terminou em 1999, e depois, a Licenciatura em Economia,
concluída em 2001, pela Escola de Economia e Gestão da Universidade do Minho.
Realizou entre 2001 e 2002 o Estágio Internacional do Programa Contacto, promovido
pelo ICEP: estágio de 1 ano em BIAL – Portela & Companhia, SA no Departamento de
Marketing Internacional e na filial moçambicana do Grupo BIAL – Medimport – funções
de adjunto de direcção.
Exerceu a Função de Controlo de Gestão na ETIS – Gestão de Crédito SA, nos anos de
2004 a 2005.
Actualmente, é Gestora de Mercado para América Latina, no Departamento de Marketing
Internacional de BIAL – Portela & Companhia, SA, cargo que desempenha desde 2005.
ii
AGRADECIMENTOS
É sem dúvida valioso e positivo o contributo e a influência que o Mestrado tem na nossa
formação pessoal, académica e profissional. Apesar de não ser uma tarefa fácil conciliar as
exigências profissionais com a realização do Mestrado, é realmente precioso o apoio
daquelas pessoas que nos ajudam a alcançar o nosso objectivo. Os reconhecimentos e
agradecimentos desta dissertação são dirigidos:
Ao meu Orientador, Prof. Doutor Helder Valente da Silva, pela fundamental e
imprescindível orientação, compreensão e colaboração ao longo de toda a elaboração da
dissertação de mestrado.
Ao Conselho de Administração do Grupo BIAL e vários colaboradores pela ajuda na
recolha de informação e revisão de conceitos na área.
À Dra. Irina Saur pelo importante contributo nas várias fases desta dissertação.
À Dra. Júlia Serra pela sua pronta disponibilidade na revisão do texto.
Ao Conselho de Administração da ETIS por toda a comprensão e apoio durante a fase
curricular do Mestrado.
Aos meus amigos, em particular à D. Felicidade, à Helena e à Susana, pela coragem e
ânimo que deram nos momentos mais difíceis.
Ao Pedro, pela força que sempre transmitiu, pelo seu apoio na elaboração deste trabalho e
por toda a paciência durante as minhas ausências.
Aos meus pais e familiares mais próximos, agradecendo em particular o apoio e contributo
da minha prima Raquel.
E de uma forma muito especial, à minha Mãe, pelo grande interesse e entusiasmo
transmitido desde o início do Mestrado e pelo apoio e compreesão em todos os momentos.
A ela dedico este trabalho.
iii
SÍNTESE
A Indústria Farmacêutica destaca-se dos outros sectores de actividade pelo seu elevado
nível de investimento em I&D. As estatísticas mais recentes apontam-na como o sector
com maior investimento em I&D a nível mundial, tanto em termos absolutos como
relativos, colocando estas empresas na liderança do ranking mundial das empresas com
maior investimento em I&D.
A presente dissertação tem o propósito de estudar a Inovação e a I&D na Indústria
Farmacêutica, pretendendo contribuir com o caso de estudo específico português, dada a
falta de estudos académicos recentes sobre a I&D na Indústria Farmacêutica no país. É
apresentado o caso do Grupo BIAL, a empresa da Indústria Farmacêutica Portuguesa com
o maior investimento em I&D.
A teoria económica aponta a actividade inovadora como uma forma de crescimento e
desenvolvimento de uma empresa, de um sector ou de uma indústria. Como principais
conclusões, este estudo sugere uma forte relação entre a dimensão das empresas líderes na
Indústria Farmacêutica e a sua actividade de I&D. As maiores e mais fortes empresas deste
sector são multinacionais que mantêm uma forte actividade de I&D, considerando-se que o
seu crescimento está fortemente dependente do sucesso das suas inovações.
A actividade de I&D é morosa, dada a especificidade e forte regulamentação do processo
de I&D, dispendiosa, devido aos elevados custos na descoberta e desenvolvimento de um
medicamento, e de elevado risco, dadas as elevadas taxas de insucesso no desenvolvimento
de um medicamento. Como forma de protecção deste risco, esta indústria utiliza o sistema
de patentes, que é fundamental na sua actividade.
A Indústria Farmacêutica Portuguesa caracteriza-se por uma reduzida actividade de I&D.
No entanto, destaca-se o caso da BIAL pela forte intensidade do seu investimento em I&D,
prevendo lançar em 2009 o primeiro medicamento de investigação com origem em
Portugal. No que diz respeito às decisões de Inovação e I&D, poderemos considerar que a
BIAL se distingue da generalidade das empresas portuguesas e se assemelha às empresas
líderes a nível mundial.
iv
ÍNDICE
1. INTRODUÇÃO..............................................................................................................1
2. A ACTIVIDADE DE INVESTIGAÇÃO E DESENVOLVIMENTO (I&D) –
REVISÃO DE LITERATURA ..............................................................................................3
2.1. O INTERESSE PELA I&D ............................................................................................... 3
2.2. TAXONOMIA DAS INOVAÇÕES.................................................................................. 7
2.3. ESTRUTURA DE MERCADO E INCENTIVO À INOVAÇÃO .................................... 9
2.4. I&D COMO COMPETIÇÃO DIRECTA ENTRE EMPRESAS .................................... 11
2.5. PATENTES E POLÍTICA DE PATENTES.................................................................... 13
2.5.1. Duração Óptima da Patente..................................................................................... 13
2.5.2. Âmbito Óptimo da Patente...................................................................................... 14
2.5.3. Corrida às Patentes e a Actividade Inovadora como determinante na estrutura de
mercado................................................................................................................... 15
2.5.4. O Poder de Monopólio e as Patentes Adormecidas ................................................ 16
2.6. LICENCIAMENTO TECNOLÓGICO ........................................................................... 17
2.6.1. Incentivo de um oligopolista licenciar uma inovação não drástica......................... 18
2.6.2. Licenças, Bem-Estar Público e Política Pública ..................................................... 19
2.7. COOPERAÇÃO ENTRE EMPRESAS EM I&D............................................................ 21
3. A INDÚSTRIA FARMACÊUTICA E O MERCADO FARMACÊUTICO ...............24
3.1. CARACTERÍSTICAS DA INDÚSTRIA A NÍVEL MUNDIAL ................................... 24
3.2. O MERCADO FARMACÊUTICO MUNDIAL ............................................................. 26
3.2.1. Valor do Mercado Farmacêutico............................................................................. 26
3.2.2. Classes Terapêuticas líderes e os principais produtos............................................. 30
3.2.3. Performance Regional............................................................................................. 31
3.3. EMPRESAS LÍDERES ................................................................................................... 34
3.4. TENDÊNCIAS DO MERCADO..................................................................................... 36
3.5. A INDÚSTRIA FARMACÊUTICA EM PORTUGAL .................................................. 39
v
3.5.1. O Mercado Farmacêutico Português....................................................................... 39
3.5.2. Principais Classes Terapêuticas e Produtos ............................................................ 41
3.5.3. Empresas Líderes .................................................................................................... 43
3.5.4. A Indústria Farmacêutica Portuguesa ..................................................................... 44
4. O PROCESSO DE I&D NA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA .................................47
4.1. O PROCESSO DE INVESTIGAÇÃO DE UM MEDICAMENTO................................ 49
4.1.1. A fase da Pré-descoberta......................................................................................... 49
4.1.2. Descoberta da nova molécula.................................................................................. 50
4.2. O PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO DE UM MEDICAMENTO...................... 52
4.2.1. Ensaios Pré-clínicos ................................................................................................ 52
4.2.2. Ensaios Clínicos...................................................................................................... 53
4.2.3. Aprovação ............................................................................................................... 55
4.2.4. Produção.................................................................................................................. 56
4.2.5. Continuação de estudos e Ensaios Clínicos Fase IV............................................... 56
4.3. A INCERTEZA NO DESENVOLVIMENTO DE UM MEDICAMENTO E O PAPEL
DAS PATENTES ......................................................................................................................... 57
5. INOVAÇÃO E I&D NA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA .......................................60
5.1. O PESO DA I&D FARMACÊUTICA NA I&D GLOBAL............................................ 60
5.2. A DINÂMICA DA INOVAÇÃO TECNOLÓGICA NA INDÚSTRIA
FARMACÊUTICA....................................................................................................................... 63
5.3. FORÇAS CONDUTORAS DA INOVAÇÃO TECNOLÓGICA (IT) NA INDÚSTRIA
FARMACÊUTICA....................................................................................................................... 64
5.3.1. Inovações Radicais Versus Inovações Incrementais............................................... 66
5.3.2. O efeito dinâmico da IR .......................................................................................... 66
5.3.3. A difusão da tecnologia: IR, PT e TT ..................................................................... 68
5.4. A EMPRESA FARMACÊUTICA COMO INSTITUIÇÃO INOVADORA DE
CORPORATE TECHOLOGY TRADITIONS (CTT)..................................................................... 70
5.4.1. CTTs, TTs e a condução das grandes ondas ........................................................... 70
vi
5.4.2. As grandes ondas, a Inovação e as despesas de I&D das maiores empresas
farmacêuticas americanas........................................................................................ 72
5.5. A VANTAGEM COMPETITIVA DA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA NACIONAL 74
6. TENDÊNCIAS DA INOVAÇÃO E I&D NA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA
MUNDIAL ……………………………………………………………………………..76
6.1. ALTERAÇÕES AOS MODELOS DE I&D.................................................................... 79
6.2. O INVESTIMENTO EM I&D E A SUA REPARTIÇÃO REGIONAL......................... 84
6.3. NOVOS MEDICAMENTOS - NOVAS SUBSTÂNCIAS ACTIVAS –
DISTRIBUIÇÃO A NÍVEL MUNDIAL...................................................................................... 87
6.3.1. Áreas Terapêuticas .................................................................................................. 89
6.3.2. Empresas Líderes em I&D ...................................................................................... 89
7. A I&D NA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA PORTUGUESA..................................92
8. O CASO BIAL .............................................................................................................98
8.1. PERFIL DA EMPRESA.................................................................................................. 98
8.1.1. Historial................................................................................................................... 98
8.1.2. Investigação ............................................................................................................ 99
8.1.3. Internacionalização ............................................................................................... 100
8.1.4. Produção e Produtos.............................................................................................. 101
8.1.5. Fundação Bial ....................................................................................................... 101
8.1.6. Recursos Humanos................................................................................................ 102
8.2. A DECISÃO DE INVESTIMENTO EM I&D.............................................................. 103
8.3. PATENTES E MARCAS .............................................................................................. 106
8.4. AS NOVAS ENTIDADES QUÍMICAS ....................................................................... 109
8.5. PERSPECTIVAS........................................................................................................... 111
9. CONCLUSÕES..........................................................................................................112
10. LISTA DE REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................117
vii
ÍNDICE DE FIGURAS
Figura 1 – Processos de Inovação Drásticos e Não Drásticos................................................8
Figura 2 – A Estrutura de Mercado e o Desejo de Inovar ......................................................9
Figura 3 – Evolução do Valor do Mercado Farmacêutico Mundial .....................................27
Figura 4 – Taxas de Crescimento por Áreas do mercado farmacêutico...............................27
Figura 5 – Evolução Mercado Farmacêutico da Biotecnologia ...........................................28
Figura 6 – Evolução do Mercado Farmacêutico nos Mercados Emergentes .......................29
Figura 7 – Evolução do Mercado Farmacêutico dos Genéricos...........................................30
Figura 8 – Repartição do Mercado Farmacêutico Mundial – Vendas de 2006 ....................32
Figura 9 – Evolução do Mercado Farmacêutico Português..................................................39
Figura 10 – Evolução das Classes Terapêuticas no Mercado Farmacêutico Português.......41
Figura 11 – Processo de I&D de um Novo Medicamento....................................................48
Figura 12 – Evolução do Investimento em I&D e Novos Medicamentos............................77
Figura 13 – Evolução do Investimento em I&D na Europa, EUA e Japão ..........................84
Figura 14 – Localização dos Laboratórios de I&D ..............................................................85
Figura 15 – Evolução do Número de Lançamentos de NEQs..............................................89
Figura 16 – Ranking das Empresas Farmacêuticas com maior Investimento em I&D
(2005)………………… .......................................................................................................90
viii
ÍNDICE DE TABELAS
Tabela 1 – Ranking dos Principais Produtos do Mercado Farmacêutico Mundial ..............31
Tabela 2 – Ranking das 20 Maiores Empresas do Mercado Farmacêutico Mundial ...........34
Tabela 3 – Evolução do Mercado Farmacêutico dos Genéricos no Mercado Português .....40
Tabela 4 – Evolução das Taxas de Crescimento dos Genéricos no Mercado Português .....40
Tabela 5 – Ranking dos Principais Produtos do Mercado Farmacêutico Mundial ..............42
Tabela 6 – Ranking das 20 Maiores Empresas do Mercado Farmacêutico Mundial ...........43
Tabela 7 – Ranking das Empresas Farmacêuticas em Portugal com maior Investimento em
I&D entre o total das 50 maiores investidoras em I&D .......................................................93
ix
ÍNDICE DE ANEXOS
ANEXO A - The 2007 EU Industrial R&D Investment SCOREBOARD, Comissão Europeia, 2007……………………………………………………………………………126 ANEXO B - MCTES – Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Inquérito ao Potencial Científico e Tecnológico Nacional 2005………………………………………132
1
1. INTRODUÇÃO
A Indústria Farmacêutica é um dos sectores de actividade que mais investe em I&D e o
mais intensivo em I&D entre os diversos sectores (European Commission, 2007).
Este trabalho pretende estudar a Indústria Farmacêutica, analisando o seu funcionamento, a
tendência do seu mercado, a dinâmica da Inovação e da I&D neste sector, e sobretudo
contribuir com o caso específico da I&D na Indústria Farmacêutica Portuguesa, dada a
falta de estudos académicos recentes no país.
Pretende-se analisar a I&D realizada em Portugal, quais as principais empresas e as suas
áreas de investigação, e estudar o caso particular do Grupo BIAL que é a empresa da
Indústria Farmacêutica Portuguesa com o maior investimento em I&D e a quarta a nível
nacional entre os vários sectores (MTCES, 2007).
O objectivo é poder concluir sobre as semelhanças ou maiores diferenças entre a I&D
realizada na Indústria Portuguesa e a I&D mundial e de que forma Portugal está
representado no panorama da I&D Farmacêutica.
Iniciamos o presente estudo com uma revisão de literatura à teoria económica sobre a
Inovação e a I&D, explicando como se caracterizam as inovações, qual a estrutura de
mercado que mais favorece a I&D, a importância e problemática das patentes e do
licenciamento tecnológico e a possibilidade e vantagens da cooperação entre as empresas
em I&D.
Com o objectivo de melhor compreender a Inovação e I&D aplicadas à Indústria
Farmacêutica, faremos no terceiro capítulo uma caracterização da indústria a nível
mundial, do mercado farmacêutico, de seguida, das empresas líderes e por fim,
apresentamos o caso de Portugal (mercado farmacêutico português e indústria farmacêutica
portuguesa) na tentativa de enquadrar a realidade de Portugal.
2
O Processo de I&D de um medicamento é muito específico devido a toda a
regulamentação a que está sujeito. Trata-se de um produto da I&D que é utilizado na saúde
humana, daí toda a sua especificidade e regulamentação. Por isso faremos uma breve
descrição deste processo, para melhor se compreender o nível de investimento da I&D e o
resultado deste processo.
A Indústria Farmacêutica conseguiu ao longo de 200 anos de história inovar
constantemente. Depois da apresentação do processo de I&D na Indústria Farmacêutica, no
capítulo 5, faremos uma breve apresentação da história da Inovação na Indústria
Farmacêutica, focando a atenção em quais as forças condutoras da Inovação e as suas
consequências, o papel das tradições tecnológicas das empresas e a vantagem competitiva
das empresas nacionais.
Depois de se ter abordado a história das inovações na Indústria Farmacêutica, passamos às
tendências da inovação e I&D na Indústria Farmacêutica mundial, iremos analisar
nomeadamente as alterações aos modelos de I&D, o investimento realizado e a sua
repartição a nível mundial, os novos medicamentos e as empresas líderes em I&D.
Após a apresentação de todo o enquadramento da Indústria Farmacêutica Mundial, da
história das inovações, das tendências de I&D, das análises ao mercado farmacêutico
mundial e português, analisamos no Capítulo 7 de forma resumida a actividade das
empresas da Indústria Farmacêutica em Portugal que mais investem em I&D.
Procederemos à análise da sua actividade e das áreas em que actuam.
E terminamos com o caso BIAL, onde será analisado o projecto de I&D levado a cabo pela
empresa, vendo no que se distingue ou assemelha da realidade portuguesa e mundial.
Desta forma temos por objectivo mostrar que Portugal actua ao nível da I&D na Indústria
Farmacêutica, fazendo I&D e contribuindo com novas soluções para o mercado mundial.
3
2. A ACTIVIDADE DE INVESTIGAÇÃO E DESENVOLVIMENTO
(I&D) – REVISÃO DE LITERATURA
Este capítulo tem por objectivo a apresentação resumida do estado da arte da teoria
económica sobre a Inovação e a I&D em geral. Deste modo será apresentada a posição de
vários autores desde Schumpeter passando por Arrow até outros autores mais recentes
como Brandenburger, Nalebuff e Denicolò. Os temas a abordar irão desde a importância da
I&D, à taxonomia das inovações, passando à estrutura de mercado e à sua influência na
Inovação, a I&D como competição ou coopetição entre as empresas, até às patentes e ao
licenciamento tecnológico.
Esta será uma introdução ao tema da Inovação e I&D na Indústria Farmacêutica, para que
mais adiante melhor se possa reflectir sobre o enquadramento da realidade deste sector na
teoria económica.
2.1. O INTERESSE PELA I&D
“As empresas de maior sucesso são aquelas que descobrem novas formas de fazer as
coisas, ou que descobrem novos produtos e novos mercados”. Esta é a ideia virtual base do
livro de maior sucesso de Peters e Waterman, In Search of Excellence: Lessons from
America´s Best-Run Companies (1982). O ponto de vista prevalecente é de que as
empresas se tornam líderes do seu sector à medida que fazem I&D, que as leva a ter
inovações na sua tecnologia de produção ou nos produtos que fornecem.
Segundo Porter (The Competitive Advantage of Nations, 1990), a concorrência é a
mudança constante de novos produtos, novas formas de marketing, novos processos de
produção, fazendo assim emergir segmentos de mercado completamente novos. Esta ideia
de Porter pode ser quase literalmente revista na obra de Schumpeter de há cinquenta anos
atrás (Capitalism, Socialism, and Democracy, 1942).
Na perspectiva de Schumpeter (Capitalism, Socialism, and Democracy, 1942) não é a
4
competição pelo preço que importa, mas sim a competição por um novo produto, uma nova
tecnologia, uma nova fonte de oferta, uma nova forma de organização. O interesse na fonte
da actividade inovadora é ainda superior hoje do que no tempo de Schumpeter1. A origem
da vantagem competitiva está em explorar oportunidades não exploradas por outros.
Uma importante questão levantada por Schumpeter refere-se ao tipo de mercado mais
propício à actividade de I&D. Em primeiro lugar, Schumpeter conjecturou que os esforços
de I&D são mais fáceis de ser concebidos pelas grandes empresas do que pelas pequenas.
Em segundo lugar, especulou que as empresas monopolistas ou oligopolistas podem
prosseguir mais agressivamente a actividade inovadora do que as empresas que têm pouco
ou nenhum poder de mercado. Argumentou que mercados dominados por pequenas
empresas têm pequenos ganhos na eficiente alocação de recursos, enquanto mercados
dominados por grandes empresas, cada uma com considerável poder de mercado, têm
ganhos provenientes da eficiente dinâmica do desenvolvimento de novos produtos e novas
tecnologias.
Estas são consideradas as hipóteses Schumpeterianas. Ainda hoje permanece em aberto a
questão: São as maiores empresas as que fazem I&D? É uma estrutura de mercado
concentrado o melhor ambiente para o desenvolvimento de novas tecnologias? De acordo
com dados da U.S. Patent and Trademark Office (Junho 2000), as hipóteses de Schumpeter
são confirmadas. As 10 empresas que mais inovaram são efectivamente enormes. No
entanto, é necessário algum cuidado na interpretação dos dados: ou as maiores empresas
são as que mais inovam, ou então, as que mais inovam tornam-se as maiores.
Uma segunda questão, diz respeito à política pública que melhor pode encorajar a
descoberta de novas ideias e a sua disseminação. Por um lado, quando uma empresa
descobre um novo produto, ou uma nova forma de produção, é globalmente menos custoso
partilhar essa informação; no entanto, iria reduzir o retorno da actividade inovadora. Iria
corroer qualquer iniciativa para alcançar esse conhecimento em primeiro lugar. Então,
1 C. J. Whalen, “Today’s Hottest Economist Died 50 Years Ago” in Business Week, December 11, 2000, p.70., referencia que os macroeconomistas que estudam o crescimento, focam-se intensivamente no progresso tecnológico e inovação, como sendo a principal fonte do melhoramento dos padrões de vida ao longo do tempo.
5
conferindo direitos de propriedade às inovações, através de copyright ou patentes, e
permitindo aos inventores cobrar uma elevada taxa pela informação sobre a sua descoberta,
pode assim ser assegurada a provisão adequada do bem público chamado I&D. Ao mesmo
tempo, contudo, temos de reconhecer que garantindo os direitos do inovador também lhe é
dado temporariamente o poder do monopólio com todas as dificuldades que este poder
detém. Tem sido debatido nas políticas públicas o melhor ponto de equilíbrio entre
promoção da actividade inovadora (protegendo a propriedade intelectual) e promoção da
concorrência.2
Uma terceira questão advém do facto que o conhecimento tende a ser dispersado entre
vários indivíduos diferentes. Ainda poucas empresas possuem a especialização suficiente
dentro de portas. Assim, a I&D pode ser conduzida mais efectivamente por equipas de
investigadores de diferentes empresas. É possível encorajar a colaboração entre empresas
nos seus esforços de I&D, enquanto simultaneamente as empresas têm de competir no
mercado do produto?
No seu livro “Coopetition”, Adam Brandenburger e Nalebuff identificaram uma fraqueza
na Teoria das 5 Forças de Porter. A partir do ponto de vista de qualquer empresa, Porter
tende a olhar todas as outras empresas, os seus fornecedores, compradores, concorrentes
como ameaças ao lucro. Segundo Brandenburger e Nalebuff, as interacções entre empresas
podem ser positivas e negativas e enfatizam as muitas interacções positivas que Porter
geralmente ignora. Como exemplos dessas interacções positivas, incluem: esforços dos
concorrentes em fixar padrões tecnológicos que facilitam o crescimento do sector (como
por exemplo quando a Sony e a Toshiba formaram uma aliança para estabelecer padrões
compatíveis para os DVDs); esforços dos concorrentes em promover regras ou legislação
favoráveis; cooperação entre as empresas e os seus fornecedores para melhorar a qualidade
do produto para aumentar a procura, (como quando a Nintendo fixou o preço dos jogos
para que as empresas que desenvolvem o software tivessem incentivos a investir
fortemente em produzir jogos de elevada qualidade, o que levou a um aumento da
2 Nos Estados Unidos, patentes, “copyrights”, e “trademarks” são detidas pela U.S. Patent and Trademark Office. As patentes aplicam-se no caso de descobertas de novos “designs” ou no desenvolvimento de novas espécies. “Copyrights” são normalmente aplicadas a “itens” como programas de “software” e música. A distinção é um pouco dúbia. A diferença é que as patentes têm a duração de vinte anos e “copyrights” duram cinquenta.
6
procura); cooperação entre as empresas e os seus fornecedores para melhorar a eficiência
produtiva (por exemplo o Edward Hospital em Naperville trabalhou de perto com os
cirurgiões cardiovasculares para desenvolver um sistema informático que lhes permitisse a
ambos trocar rapidamente informações clínicas). (Brandenburger e Nalebuff, 1996)
Uma forma comum de colaboração é a investigação em joint venture (RJV). Devem as
RJV ser permitidas apesar do risco de colaboração que pode surgir no mercado do
produto? E se não forem permitidas, será de incentivar a cooperação sob licenciamento? É
possível que um inovador considere rentável e prefira licenciar a sua inovação a empresas
rivais? Deverá este licenciamento ser encorajado, por exemplo, tornando mais simples a
redacção de contratos que limitem o poder das licenças a explorar e talvez desenvolvam o
conhecimento pelo qual é obtida a licença?
Uma outra questão implícita a todas as anteriores é porque é que as empresas fazem I&D.
Schumpeter foi um dos primeiros a entender que a introdução de um novo produto debilita
as vendas das empresas no mercado. Do mesmo modo, a introdução de um novo processo
de produção que requer novo equipamento de produção reduz o valor da capacidade
produtiva das empresas existentes. Isto porque o processo de introdução de novos produtos
ou processos, inevitavelmente, corresponde à destruição dos anteriores, o que Schumpeter
chamou de processo de “destruição criativa”. Porque é que as empresas devem debilitar as
actividades existentes? Que incentivos encontram as empresas para I&D?
Em suma, muitas questões surgem quando se entende a concorrência como um processo
dinâmico que inclui o desenvolvimento de novos produtos e novos métodos de produção.
Estas questões envolvem os incentivos que as empresas têm em inovar, a relação entre
esforços de I&D e estrutura de mercado, o papel da política pública em garantir o poder de
monopólio (temporário) aos detentores de uma nova patente, e o desejo de permitir RJV.
7
2.2. TAXONOMIA DAS INOVAÇÕES
Os esforços de I&D são classificados como uma das três actividades relacionadas. A
primeira é a Investigação Básica: inclui estudos que não levam necessariamente a
aplicações específicas, mas levam ao conhecimento fundamental de modo que
subsequentemente possa ser útil a uma série de actividades. (A derivação da tecnologia
laser é um exemplo). A segunda categoria é a Investigação Aplicada: envolve a aplicação
da investigação básica a uma utilização específica e prática. Por fim existe a componente
de Desenvolvimento da I&D: o objectivo é passar do protótipo ao produto a ser utilizado
pelo consumidor e que seja capaz de uma produção massiva.
Relativamente ao resultado da I&D, distingue-se entre: Inovação de Processo que é a
descoberta de um novo e normalmente mais barato método de produção de bens existentes;
e Inovação de Produto que é a inovação que leva a um novo produto.
Relativamente à Inovação do Processo, as inovações distinguem-se de drásticas e não
drásticas ou inovações menores. As drásticas são aquelas que permitem a redução dos
custos a um ponto de dar ao inovador a posição de monopólio no sector sem recear
concorrência por entrada ou pelo preço durante algum tempo. No exemplo da figura 1, a
inovação drástica faz baixar o custo marginal de $80 para $20. O inovador, sendo
monopolista, fixa o preço igual ao custo marginal, ou seja, igual a $20. Dada a procura,
RM = 120 – 2Q, equacionando CM de 20, temos um output de 50 unidades e um preço de
monopólio de 70. Pelo contrário, uma empresa com uma inovação não drástica pode ter
alguma vantagem de custos em relação às concorrentes, mas nunca como uma empresa que
se comporta como monopolista sem recear a concorrência. Neste caso, de acordo com a
figura 1, em que a empresa inovadora apenas baixa os custos marginais de $80 para $60, se
esta tivesse um comportamento monopolista desejaria produzir 30 unidades a um preço de
$90. Mas as outras empresas do mercado não o permitiriam porque podiam praticar um
preço inferior. E assim, o melhor que a empresa inovadora conseguia fazer era fixar um
preço de $79,99 e um output de 40 unidades. Em conclusão, podemos afirmar que apenas
as inovações drásticas permitem às empresas um comportamento de monopolista. (Ver
Figura 1).
8
INOVAÇÃO NÃO DRÁSTICA
40 50 120
MC1
MC2
MR
PROCURA
QUANTIDADE
INOVAÇÃO DRÁSTICA
30
$/UNIDADE
120
80
70
20
PROCURA
MR
QUANTIDADE
MC2
MC1
120
$/UNIDADE
90
80
60
12040
Figura 1 – Processos de Inovação Drásticos e Não Drásticos
Fonte: Pepall, L. D. Richards e G. Norman, (2002), 2ª Ed., Industrial Organization: Contemporary Theory &
Practice. South-western College Publishing: Cincinnati.
9
2.3. ESTRUTURA DE MERCADO E INCENTIVO À INOVAÇÃO
Arrow (Economic Welfare and the Allocation of Resources for Inventions, 1962) levantou
a questão de quem teria mais incentivo a inovar (sendo o objectivo da inovação produzir a
custos variáveis médios inferiores): se uma empresa monopolista, ou se uma outra
empresa? Tratando-se de uma inovação drástica, o inovador, ficaria sem concorrentes no
mercado. Se o inovador for o monopolista, continuaria a ser monopolista. Caso o inovador
fosse uma nova empresa, então esta passaria a monopolista Em cada um dos cenários,
monopólio ou ambiente concorrencial (representados na Figura 2), Arrow conclui que o
valor de uma inovação é menor para o monopolista do que para uma empresa em ambiente
de concorrencial; isto porque, a empresa em ambiente concorrencial valoriza a inovação
pela totalidade das receitas adicionais geradas pela inovação. Pelo contrário, o monopolista
já tinha o lucro de monopólio.
MERCADO CONCORRENCIAL$/UNIDADE
MONOPOLIO $/UNIDADE
120
90
80
60
100
30 1204020 QUANTIDADE QUANTIDADE
PROCURA PROCURAMR
MC2
MC1
MC2
MC1
120
80
60
12040
Figura 2 – A Estrutura de Mercado e o Desejo de Inovar
Fonte: Pepall, L. D. Richards e G. Norman, (2002), 2ª Ed., Industrial Organization: Contemporary Theory &
Practice. South-western College Publishing: Cincinnati.
Dito de outro modo, uma inovação bem sucedida para uma empresa entrante, leva-a ao
monopólio. Mas uma inovação bem sucedida para uma empresa monopolista também a
leva a monopolista, mas dado que já era monopolista, os ganhos, a partir desta inovação,
são inferiores aos de uma empresa entrante. Através da inovação, a empresa entrante
´
10
substitui o monopolista, mas o monopolista não se substitui a si mesmo. Daí o chamado
efeito de substituição.
Os resultados são os mesmos no caso de um oligopólio com concorrência à Bertrand3 ou à
Cournot4 - isto porque enquanto a empresa à Cournot ou Bertrand tem lucros anteriores à
inovação, estes são muito inferiores aos lucros do monopolista. Daí que ambas têm muito
menos a perder do que o monopolista ao incorrer numa inovação.
Esta conclusão pode retirar-se tanto no caso de uma inovação drástica como não drástica,
assim como no caso de uma procura linear e não linear.
A análise de Arrow aplica-se ao caso da oportunidade de inovar não estar disponível aos
concorrentes ou a potenciais entrantes. Vejamos, no entanto, outros cenários a partir do
ponto 2.4.
3 Num oligopólio de concorrência à Bertrand, várias empresas competem pelos preços. 4 Num oligopólio de concorrência à Cournot, as empresas competem pelas quantidades.
11
2.4. I&D COMO COMPETIÇÃO DIRECTA ENTRE EMPRESAS
Se os ganhos da inovação são inferiores em monopólio do que num ambiente concorrencial
(Arrow, 1962), então seria de esperar que o nível da actividade inovadora fosse inferior
num sector de monopólio do que num sector de concorrência perfeita. Arrow tentou
responder ao argumento de Schumpeter de que o poder de monopólio promove a
actividade inovadora. Mas tanto Schumpeter, como a mais recente literatura, estudam
cenários em que o monopolista não está livre de entradas novas no mercado – na qual a
entrada não está efectivamente bloqueada.
Consideremos um cenário em que o detentor do monopólio reconhece que a alternativa a
não adoptar uma inovação é que o faça uma outra empresa. Neste cenário, as opções do
monopolista são comprar a inovação para manter o monopólio, ou não. E em qualquer dos
casos, passa a uma empresa high-cost num duopólio. Se ele não inovar, incorre num custo
superior a não adoptar a inovação uma vez que uma concorrente o fará. Quanto maior for o
custo da não adopção, maior vontade o monopolista terá de adoptar a inovação.
De acordo com Schumpeter, num cenário em que a estratégia da empresa é incorrer em
gastos de I&D de forma explícita, existe um modelo mais simples que é de Dasgupta e
Stiglitz (1980). Estes demonstram que o montante agregado gasto em I&D pode aumentar
e diminuir de acordo com o número de empresas possa diminuir e aumentar. Mas para que
o montante gasto em I&D aumente, é necessária uma elasticidade da procura do mercado
muito grande. Deste modo, o modelo de Dasgupta e Stiglitz (1980) é uma parte da
sustentação das hipóteses de Schumpeter de que a concentração alimenta a inovação. Este
modelo dá um suporte intelectual à ideia de que a concorrência imperfeita é boa para o
progresso tecnológico.
Existem modelos favoráveis às hipóteses de Schumpeter e outros que as contrariam. Têm
sido elaborados vários estudos estatísticos sobre a dimensão da empresa e estrutura do
mercado. Apesar destes estudos estarem longe de ser consensuais, nos seus resultados, têm
pelo menos algo em comum: a intensidade da I&D cresce com o aumento da concentração
do mercado, mas só até um determinado ponto, a partir do qual estagna ou começa a
diminuir, em função das receitas da empresa. Um dos primeiros estudos foi de Scherer
12
(1965), seguindo-se Levin e Reiss (1984), Levin et al. (1985), Lunn (1986), Scott (1990),
Geroski (1990), e Blundell, Griffith e Van Reem (1995) que vieram a confirmar a ideia
base de Scherer (1965).
13
2.5. PATENTES E POLÍTICA DE PATENTES
O estabelecimento de direitos de propriedade permitem ao detentor da patente actuar como
monopolista em relação àquela descoberta. O lucro resultante de monopólio é o que
incentiva as empresas a incorrerem em gastos de I&D.
Claro que a imitação continua a ser uma ameaça real que os inovadores têm de levar em
consideração, mesmo com a presença de patentes e copyrights e os casos de tribunal de
infracção de patentes.
2.5.1. Duração Óptima da Patente
A actual lei de patentes estabelece uma duração que varia de país para país. No Reino
Unido, a patente é normalmente concedida por 14 anos, mas pode ser estendida por mais
sete anos, para um total de 21 anos. Nos Estados Unidos, as patentes eram concedidas por
17 anos (número intermédio do Reino Unido), no entanto, recentemente, a lei foi alterada
para os 21 anos.
A teoria económica preocupa-se em estudar a duração óptima da patente. A chave é
encontrar o equilíbrio apropriado entre a capacidade do inovador ter um retorno do
investimento na I&D e o benefício proporcionado aos consumidores quando a patente
expira e a concorrência emerge. De acordo com o modelo base de Nordhaus (1969), a
duração óptima da patente é aquela que maximiza o ganho social líquido para os
consumidores e produtores.
Se a duração da patente é zero, os ganhos para o produtor são zero, porque o resultado da
inovação será imitado de imediato. Consequentemente não haverá I&D e não haverá
benefício social. Se a duração da patente for superior a zero, será induzida a inovação e
algum aumento do bem estar social. No entanto, para além de um determinado ponto,
haverá algum incentivo à inovação e, consequentemente, algum aumento no bem estar
total. Mas além de um determinado ponto, o aumento da duração da patente vai reduzir o
benefício social, mesmo que conduza a mais I&D e, consequentemente, a uma maior
14
redução no custo de produção; ou seja, há duas forças que trabalham para delimitar o
tempo óptimo da duração da patente.
2.5.2. Âmbito Óptimo da Patente
Fixar o âmbito de uma patente é uma tarefa bem mais complexa do que fixar a duração
óptima da patente; isto porque, a medida de duração da patente é o tempo, enquanto que a
medida do âmbito da patente não é uma medida aceite universalmente. Conceptualmente, a
ideia é fixar um montante mínimo pelo qual uma nova inovação possa diferir de outra já
existente (bem ou processo de produção), de modo a que ou a nova evite infringir uma
patente existente ou possa ela ser patenteada. Quanto maior for o requisito mínimo de
diferença, mais difícil se torna para as empresas inovar além da patente e entrar no lucro do
inovador. A determinação do âmbito óptimo da patente é muito difícil dada a imprecisão
da medida e reflecte-se na linguagem da concessão de Patentes. Esta questão está
particularmente associada à duração óptima da patente. Há sistemas de “short and fat”
(curta duração e de âmbito amplo) e de “long and thin” (longa duração e âmbito estreito).
Gilbert e Saphiro (1990) sugerem que apesar do âmbito da patente não ser mensurável, este
está relacionado com o lucro que a patente gera durante a vida; por isso, deduzem que o
bem-estar social é uma função decrescente do lucro gerado pela patente e que o aumento
do âmbito da patente é uma função crescente em termos de custos para o bem estar social.
Klemperer (1990), pelo contrário, considera que o âmbito da patente está relacionado com
a diferenciação do produto. No entanto, a patente só deve durar o suficiente até cobrir os
custos afundados5 de I&D pelo valor actual líquido gerado pelo lucro da patente.
Denicolò (1996) generaliza estas abordagens. Quanto menos eficiente é o tipo de
concorrência existente, maior a probabilidade de existirem patentes amplas e curtas.
Mercados em que as empresas tenham grande poder de monopólio, funcionam melhor com
políticas de “short and fat”, enquanto mercados concorrenciais com políticas “long and
thin”. De acordo com a evidência empírica, os mercados nos quais a I&D e o
5 Custos Afundados são todos os custos incorridos pela empresa e que não podem ser recuperados.
15
desenvolvimento de novos produtos são aspectos importantes na concorrência entre
empresas, são normalmente mercados com um estrutura concentrada (p.e., a indústria
farmacêutica). Como veremos no capítulo 3, a Indústria Farmacêutica está bastante
concentrada. Segundo a teoria de Denicolò aplicar-se-ia uma estratégia de patentes amplas
e de duração limitada.
2.5.3. Corrida às Patentes e a Actividade Inovadora como determinante
na estrutura de mercado
De acordo com Schumpeter, a inovação é uma espécie de competição diferente da
competição pelo preço. As empresas competem entre si “correndo” para desenvolver novas
tecnologias ou novos produtos e esta competição é mortal para as que chegam depois.
Chegar em primeiro lugar é tudo o que importa, mesmo que se ganhe por muito ou por
pouco. Por outras palavras, “winner-take-all”, de modo que chegar em segundo lugar ou
em décimo é igual.
A competição pela inovação pode ser vista como uma corrida na qual o sucesso de um
jogador é o fracasso do outro. O que perde a patente pode ver anos de investimento e
trabalho árduo deitado fora enquanto o rival anuncia uma grande viragem. Estas
consequências dramáticas são, sem dúvida, parte da ideia de Schumpeter quando descreveu
a concorrência baseada em novos produtos ou novas tecnologias.
A estrutura de mercado é também o resultado da interacção estratégica entre as empresas.
A competição através da inovação, por um lado, e o sistema de patentes, por outro lado,
podem alterar a configuração da Indústria. (Gilbert e Newberry, 1982)
De acordo com Schumpeter, o monopolista tem um maior incentivo à inovação do que a
empresa em concorrência, porque aquele tem que preservar o poder de monopólio. Quando
existe a ameaça real de uma nova entrada, a alternativa para o monopolista é tornar-se uma
empresa em duopólio de elevados custos – uma posição muito menos atractiva.
16
O sistema de patentes em interacção com a competição entre um detentor do monopólio e
um potencial rival pode levar o monopolista a aumentar o seu poder. Monopólios
regulados – protegidos da ameaça de entrada por agências governamentais – podem não
ser muito inovadores em comparação com empresas não protegidas. Isto porque sabem que
têm o lucro de monopólio assegurado.
2.5.4. O Poder de Monopólio e as Patentes Adormecidas
A realidade mostra que um grande número de patentes está relacionado com o mesmo
produto ou processo produtivo. Porque é que as empresas têm patentes de produtos que
nunca usam? Trata-se de proteger as receitas de monopólio geradas pela verdadeira
patente. A protecção garantida por uma única patente é muito limitada. Edwin Mansfield
(1981) encontrou 48 novas patentes de produtos, dos quais 60% eram imitados 4 anos após
a sua introdução. As empresas podem e fazem invenções em torno de uma inovação, como
acontece frequentemente na indústria farmacêutica. Normalmente existem várias soluções
técnicas para um mesmo problema. Cada alternativa é uma ameaça para a empresa
detentora da patente. Assim, patenteando as várias alternativas, uma empresa aumenta a
protecção.
Se uma empresa monopolista descobre uma nova tecnologia mais custosa tem sempre que
a patentear, mesmo que não a utilize. Caso contrário, uma outra empresa poderia usá-la
mesmo a um custo superior para entrar no mercado. Assim o monopolista incumbente
aumenta o seu poder de mercado, com esta patente adormecida.
17
2.6. LICENCIAMENTO TECNOLÓGICO
Uma empresa inovadora pode estar disposta a partilhar o seu avanço tecnológico com outra
empresa por um dado preço. Normalmente resulta num acordo de licenciamento entre a
empresa que detém a patente e a empresa que a vai usar. As actuais licenças afastam-se de
taxas altas e seguem na direcção de um preço pela informação, valor eficiente próximo de
zero.
Existem três tipos de acordos de concessão ou contratos que podem ser feitos: taxas fixas
(“flat fees”), “royalties” ou uma combinação de taxas fixas e “royalties”. O detentor da
patente poderá cobrar uma taxa fixa que autoriza o titular da licença a usar a nova
tecnologia na produção da quantidade de unidades que desejar. A outra hipótese será
cobrar uma “royalty” que requer ao titular da licença um pagamento que depende da
quantidade de unidades produzidas. Por fim, como terceira opção, o inovador pode ainda
decidir-se por uma combinação de taxas fixas e “royalties”.
A questão é saber se a empresa que inovou tem incentivos de lucro para licenciar a
descoberta.
O caso mais óbvio em que a empresa prefere licenciar a inovação é no caso da empresa
licenciada operar num mercado completamente distinto. Há, no entanto, alguns motivos do
licenciador para não querer licenciar mesmo em mercados estrangeiros. Em primeiro lugar,
é o facto de o licenciador não ver garantido um seguro pagamento para a licença. Em
segundo lugar, a empresa licenciada pode vir a produzir num mercado em que a
licenciadora concorra directamente. Por último, a licenciadora receia que a licenciada ao
conhecer a nova tecnologia possa desenvolver futuros desenvolvimentos tecnológicos e
consequentemente a faça perder a capacidade de competição. No caso de estudo da BIAL
que será estudado no capítulo 8, a primeira opção da BIAL, como empresa inovadora, é o
licenciamento a uma empresa que opera num mercado distinto.
Sendo estes receios efectivamente reais, há consideráveis benefícios nos acordos de
licenciamento. A licença traz, desde logo, receitas ao licenciador: uma vez que o custo de
partilhar a informação é reduzido, qualquer receita é lucro.
18
Caso o licenciador e a licenciada sejam concorrentes do mesmo mercado, podem existir
incentivos ao licenciamento, dependendo do tipo de concorrência no mercado. Vejamos
em detalhe esta análise no ponto 2.6.1.
2.6.1. Incentivo de um oligopolista licenciar uma inovação não drástica
Se estivermos num mercado de concorrência em preços – à la Bertrand - o incentivo a
licenciar é muito pequeno, o inovador não ganha nada com isso. Pode vender, como
monopolista, as unidades ao preço da concorrência, mas, agora, com um custo mais baixo.
Num mercado de concorrência à Cournot, o detentor da patente tem um incentivo enorme
para licenciar.
No caso de se tratar de uma inovação drástica, uma empresa em competição à Cournot não
vai querer licenciar a sua descoberta. Por exemplo num duopólio, se a empresa inovadora
não licenciar torna-se monopólio. A inovação oferece-lhe uma redução do custo tão grande
que mesmo um preço de monopólio associado a esse custo será inferior à empresa com
quem partilhava o duopólio, enquanto ganha um considerável lucro de monopólio. Neste
caso, nada se ganha com a licença, pois caso licenciasse a outra empresa, passavam a estar
num duopólio de custo baixo; por isso, um monopolista, com uma inovação drástica à
Cournot, não vai licenciar, nem mesmo em troca de uma taxa. O mesmo também se aplica
para empresas de concorrência à Bertrand.
No caso de um monopólio, se é o próprio monopolista o detentor da patente, não existe
qualquer outra empresa que ele possa licenciar. Se a empresa inovadora não for o
monopolista, a inovadora vai licenciar o monopolista. Desde que o detentor da patente não
esteja a operar no mercado, o único modo de ele obter receitas é vender a patente ou
licenciá-la ao monopolista.
Neste último caso, como deve ser o contrato de licenciamento? (Royalty de x por unidade,
ou uma taxa fixa independente do output, ou uma combinação?) Um royalty por unidade
leva ao problema da dupla marginalização (vai elevar o custo marginal da empresa
19
licenciada, o preço para o consumidor é duplamente distorcido, assim como o volume de
vendas é restringido). Para o laboratório que inovou, o melhor é ter uma dupla tarifa. A
maior parte será uma taxa fixa, por mês, ou por ano; a outra parte será um royalty, por
unidade, que reflicta qualquer custo por unidade que o detentor da patente incorre em
licenciar a tecnologia. Apenas pela passagem de informação, esta tarifa por unidade devia
ser zero. Mas se o detentor da patente necessita prestar serviços ou aconselhamento
técnico, que aumentam à medida que a tecnologia é utilizada, esta tarifa deve ser positiva.
Resumindo: o contrato de licenciamento é idêntico a um contrato de franchising. Em
princípio, a empresa que inovou pode apropriar-se de todo o lucro adicional trazido pela
inovação; isto, se o contrato for redigido correctamente, ou seja, recebendo uma taxa fixa,
exactamente igual ao lucro adicional gerado.
2.6.2. Licenças, Bem-Estar Público e Política Pública
As licenças são importantes para o bem estar social. De acordo com Katz e Shapiro (1985),
o bem-estar social é quase sempre aumentado com as licenças. A licença é socialmente
desejável, se aumentar o output total em resultado da licença. A licença não tem lugar, se
ambos não tiverem lucro e aumentar o lucro agregado. Se a licença aumentar o output
total, o preço é inferior, o bem-estar do consumidor aumenta. No caso de aumentar o
output total, tanto os produtores como os consumidores ganham com o acordo, e o acordo
é socialmente desejável. Mesmo se output total da indústria não aumentar, pelo menos,
aumentam as receitas do produtor, por isso, vale sempre a pena licenciar.
Existem outros efeitos benéficos das licenças. Se a empresa que investiga sabe que vai
licenciar a sua descoberta, tem maior incentivo para levar a cabo a investigação. A empresa
que sabe que pode ter a licença, por seu lado, vai reduzir a I&D desnecessária, diminuindo
o actual esforço de investigação.
Há, no entanto, riscos associados ao licenciamento. O risco associado ao pagamento de um
royalty relativo ao output. Por exemplo, para além da duração da patente licenciada, a
informação torna-se disponível publicamente. Se os royalty extraem a quase totalidade das
20
receitas que a empresa licenciada espera fazer, há o risco desta aceitar a licença, de modo a
ganhar a experiência na tecnologia, mas depois, produzir muito pouco, durante o período
do contrato, o que significa que vai pagar muito pouco pela licença. Ou caso o output seja
difícil de monitorar, a licenciada tem incentivos a não dizer a verdade sobre a quantidade
que efectivamente está a produzir. O que terá de ser feito pelo licenciador é referir no
contrato um montante mínimo de output por parte da licenciada, mas o que não é fácil de
negociar e conseguir.
Outro risco, é que pode ser difícil conseguir contratos que limitam os destinos em que a
licença será utilizada. O licenciador quer limitar os mercados onde o licenciado pretende
vender, por exemplo, para evitar a competição directa com o licenciador ou com outros
licenciados. Mas é quase impossível redigir contratos que referenciam onde os licenciados
podem operar. O acesso a um processo ou produto tecnológico pode potenciar a
capacidade do licenciado desenvolver tecnologias relacionadas que não estão cobertas pela
patente licenciada. E aqui também é quase impossível redigir contratos que protejam o
licenciador de tais imitações, ou pelo menos, dar ao licenciado algum retorno das novas
tecnologias que o licenciado desenvolva.
As políticas públicas devem encorajar activamente o licenciamento das inovações, com
vista a aumentar o bem estar social, mas, por outro lado, deverão ter alguma precaução em
favorecer e promover estes contratos de licenciamento. Alguns dos problemas resultantes
dos contratos de licenciamento são, por exemplo, restrições nos preços e em territórios, que
poderão levar a monopólios territoriais, e por outro lado, a serem ilegais de acordo com as
leis antitrust.
21
2.7. COOPERAÇÃO ENTRE EMPRESAS EM I&D
Dois motivos tornam muito atractiva a cooperação entre empresas para fazerem I&D do
ponto de vista da eficiência económica. Em primeiro lugar, a tecnologia moderna é muito
complexa e leva à necessidade de reunir uma grande variedade de especialização e de
experiência. E como é difícil encontrar todo este know-how possuído pelos engenheiros e
cientistas numa só empresa, é preferível que as empresas partilhem as suas experiências
individuais, resultados experimentais, e soluções elaboradas entre ambas de modo a
realizar totalmente os benefícios do estudo científico. Em segundo lugar, em muitos casos,
há um grande desperdício de despesas em I&D, pois as empresas duplicam esforços entre
elas numa corrida de I&D. A cooperação na investigação entre empresas oferece a possível
solução para estes problemas e o ganho de um ambiente industrial mais inovador.
Existem deseconomias de escala na I&D. Quanto mais I&D faz uma empresa mais custosa
se torna.
Quando os spillovers da investigação (informação e conhecimentos técnicos específicos e
resultantes da experiência) são baixos estamos perante empresas que são substitutos
estratégicos – maior investigação por parte de uma empresa reduz a actividade de
investigação da outra. Isto porque o aumento do esforço de investigação de uma empresa,
permite reduzir os seus custos e logo dá-lhe uma vantagem competitiva em relação à outra
empresa. A outra empresa terá menores lucros e por isso irá reduzir os seus esforços de
investigação (Pepall et al., 2002).
Quando os spillovers são elevados, estamos perante complementares estratégicos – o
aumento dos esforços de investigação por parte de uma de duas empresas levam ao
aumento dos esforços de investigação da outra empresa. Neste caso, os benefícios da
actividade de I&D passam para a outra empresa, levando os seus lucros também a
aumentar, fazendo com que esta obtenha mais fundos e desejos de aumentar os seus gastos
de I&D (Pepall et al., 2002).
Numa Research Joint Venture (RJV) as empresas actuam não só para coordenar as suas
despesas de I&D, mas também para se assegurarem que o spillover do sucesso de
22
investigação de uma empresa para os ganhos da outra empresa, seja efectivo.
Maximizando a extensão dos spillovers, uma RJV, também maximiza os benefícios da
I&D. Por um lado, qualquer descoberta é “espalhada” por todas as empresas do sector. Por
outro lado, apesar deste “spillover intensivo”, o problema de free-riding é agora evitado.
Isto porque como as duas empresas decidiram coordenar a investigação, elas internalizam
totalmente os efeitos externos da investigação. Daí, as empresas levarem a cabo uma
investigação extensiva, que em parte, devido ao efeito de “spillover extensivo” relacionado
com a partilha de resultados, vai trazer uma grande redução de custos para todas as
empresas. Por outro lado, esta redução de custos leva a uma redução considerável do preço
aos consumidores (Kamien, 1992).
As RJV devem ser encorajadas porque elas beneficiam tanto os consumidores como os
produtores, desde que as autoridades antitrust possam assegurar que essa cooperação seja
feita apenas no esforço de investigação e que não se estenda à cooperação na produção e
nos preço, ou seja, evitando que se forme um price-fixing cartel.
O grande benefício potencial da cooperação é sem dúvida a razão das RJV que não são
tratadas como violações pelas autoridades antitrust. Pelo contrário, eles são avaliados com
base na racionalidade6.
A partir deste capítulo podemos concluir que apesar da teoria económica estar longe de ser
consensual sobre qual dos ambientes é mais favorável à Inovação (se concorrencial,
monopólio, oligopólio ou duopólio, se são as empresas grandes que fazem I&D ou são as
pequenas), ou como as políticas públicas melhor podem encorajar a inovação (através de
direitos de propriedade – política de patentes), ou sobre a possibilidade de cooperação
entre empresas, a teoria conclui que a actividade de I&D e a Inovação são condutoras do
sucesso empresarial. De acordo com estudos estatísticos actuais, há uma tendência para o
aumento da I&D à medida que aumenta a concentração de mercado, assim como quanto
6 O Congresso dos Estados Unidos da América legislou em 1984 requerendo a aplicação explícita da responsabilidade no caso específico das RJV.
23
maior são as empresas maior a despesa em I&D. O caso da Indústria Farmacêutica, como
veremos no capítulo seguinte, é de uma estrutura bastante concentrada em que as maiores
empresas são as que mais investem em I&D e as que mais inovam.
De acordo com a teoria económica as patentes e políticas de patentes servem para
encorajar a actividade inovadora, dado que protegem o lucro de monopólio, que irá
compensar a empresa da sua despesa em I&D. Como será analisado mais adiante no
capítulo 4, o recurso às patentes na Indústria Farmacêutica é fundamental.
O licenciamento tecnológico é uma prática importante tanto para a empresa inovadora
como para a empresa licenciada assim como para o bem estar social. Pois permite maiores
lucros ás empresas e permite que a nova tecnologia esteja disponível de uma forma mais
vasta para a sociedade. No caso do produto da inovação farmacêutica (capítulo 5), as
consequências para o bem estar social são claramente positivas, assim como a
possibilidade de obtenção de lucros para licenciadoras e licenciadas é também muito
interessante.
A cooperação entre empresas para a Investigação é muito favorável, não só porque leva a
um aumento da eficiência económica mas também pela partilha de conhecimento. A partir
do capítulo 6 veremos a importância cada vez maior que as RJV têm na I&D da Indústria
Farmacêutica.
24
3. A INDÚSTRIA FARMACÊUTICA E O MERCADO
FARMACÊUTICO
Para melhor ter uma noção da dimensão e do processo de I&D na indústria farmacêutica,
importa entender e medir o mercado farmacêutico e a indústria farmacêutica.
Este capítulo tem por objectivo caracterizar a indústria farmacêutica a nível mundial e
fazer o respectivo enquadramento do mercado e da indústria portugueses. Nesse sentido,
começamos por caracterizar a nível mundial a indústria e o mercado farmacêutico, de
seguida as empresas líderes e por fim, o caso de Portugal (mercado farmacêutico português
e indústria farmacêutica portuguesa).
3.1. CARACTERÍSTICAS DA INDÚSTRIA A NÍVEL MUNDIAL
O objectivo do negócio da indústria farmacêutica é disponibilizar medicamentos que
possam prolongar e salvar vidas, tratar doenças e diminuir o aparecimento de doenças e a
velhice.
A indústria farmacêutica a nível mundial é dominada por empresas de larga escala,
multinacionais, localizadas em sociedades industriais avançadas e vendem os seus
produtos por todo mundo. As dez maiores empresas a nível mundial detêm quase metade
do valor do mercado da indústria farmacêutica (medido em receitas) (Busfield 2003; IMS,
2007).
Na indústria farmacêutica existem as empresas que investem em I&D e inovam trazendo
novos medicamentos para o mercado. E existem outras empresas que fabricam produtos
genéricos (que são produtos já sem patente e sem marca). Estas últimas são normalmente
mais pequenas e estão mais dispersas. São muito significativas em países como a Índia,
China e Brasil (Busfield, 2003).
As vinte maiores empresas a nível mundial que formam mais de metade do valor do
mercado, fazem I&D activamente e são extremamente dependentes do sucesso das
25
inovações decorrentes do processo de I&D. Estas empresas utilizam as marcas e patentes
para proteger os novos medicamentos descobertos e maximizarem o seu lucro potencial.
Os lucros obtidos estão dependentes do número de medicamentos que ainda têm patente.
São estes lucros que geram a receita necessária para conduzir o dispendioso processo de
um novo medicamento. Por sua vez, o desenvolvimento de um medicamento é intensivo
em investigação, e por isso as companhias farmacêuticas reinvestem na I&D mais dos seus
lucros do que qualquer outra indústria (Bhattacharya, 2005).
Estas empresas líderes são também as que mais investem em marcas e fazem uso extensivo
do marketing (Bhattacharya, 2005).
26
3.2. O MERCADO FARMACÊUTICO MUNDIAL
A informação de mercado apresentada ao longo desta tese é proveniente do IMS
(International Medical Statistics). O IMS é o fornecedor líder mundial de market
intelligence para as indústrias farmacêuticas e de cuidados de saúde. Tem uma experiência
da indústria de mais de 50 anos, oferecendo diariamente produtos e serviços de informação
aos seus clientes, que vão desde produtos, capacidade de optimização de carteiras de
produtos, soluções de lançamentos e marcas, inovações para a eficiência da força de
vendas das empresas, ofertas sobre a saúde do consumidor, até serviços de consultadoria e
soluções para aumentar os resultados das empresas.
As vendas globais totais incluem informação auditada e não auditada. A informação
auditada provem de auditorias do IMS que cobrem 94% do mercado, enquanto os restantes
6% são estimativas dos prognósticos de mercado TM. O crescimento das vendas é medido
em dólares a taxas de câmbio constantes e incluem produtos de prescrição e OTC (over-
the-counter). As vendas reflectem preços ex-manufacter em dólares a taxas de câmbio
correntes incluindo também os produtos de prescrição e os OTC.
3.2.1. Valor do Mercado Farmacêutico
O valor do mercado farmacêutico segundo dados IMS de Março 2007 era
aproximadamente 643 biliões de dólares (valor anual em 2006). A indústria farmacêutica
tem sido uma indústria em crescimento. Assistimos ao aumento do valor de mercado,
apesar das taxas de crescimento serem menores a cada ano (Ver Figura 3) (IMS, 2007).
27
Evolução Mercado Farmacêutico Mundial
0
100
200
300
400
500
600
700
1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
Bili
ões
de d
ólar
es
0
2
4
6
8
10
12
14
16
% C
resc
imen
to v
s. a
no a
nter
iorValor Global
% Crescimento
Figura 3 – Evolução do Valor do Mercado Farmacêutico Mundial Fonte: IMS Health, IMS Market Prognosis International, Feb 2007
A indústria farmacêutica no último ano apresentou um crescimento de 6,5%, a taxas de
câmbio constantes. Este crescimento está neste momento relacionado com 8,3% de
crescimento no mercado dos Estados Unidos da América e com as inovações oncológicas
que conduziram fortemente a 20,5% de crescimento na sua classe terapêutica. Na Figura 4
estão identificadas as origens deste crescimento (IMS, 2007).
Origens do Crescimento do Mercado Farmacêutico Global
(2006)
6,5%
11,4%
17,9%
12,2%
20,5%
10,8%
0% 5% 10% 15% 20% 25%
Mercado Global
Mercados Emergentes
Biotecnologia
Genéricos
Oncológicos
Produtos de Especialidade
% Crescimento (dólares a taxas constantes)
Figura 4 – Taxas de Crescimento por Áreas do mercado farmacêutico
Fonte: IMS Health, MIDAS, MAT Dez 2006
28
“Os produtos de oncologia e de imunologia estão incrivelmente a demonstrar o seu valor
na resposta às necessidades dos pacientes, oferecendo significantes oportunidades de
crescimento”, segundo Aitken (Director na IMS).
É também de referir o crescimento dos produtos com origem na biotecnologia, que
apresenta taxas de crescimento superiores (17,9%) às do mercado global. A evolução do
mercado dos produtos com origem na biotecnologia é representado na Figura 5. É um
mercado em crescimento mas também a taxas de crescimento cada vez menores.
Evolução do Mercado da Biotecnologia
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1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
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es)
Vendas globais da Biotecnologia
Crescimento da Biotecnologia
Crescimento Farmacêutico
Figura 5 – Evolução Mercado Farmacêutico da Biotecnologia
Fonte: IMS Health, MIDAS, MAT Dez 2006
A tendência de crescimento está relacionada com dois factores. Por um lado, está
relacionado com a passagem de mercados maduros (como o mercado europeu, que está a
diminuir o seu peso a nível do mercado mundial) para mercados emergentes (como por
exemplo a Índia e a China, que têm vindo a aumentar fortemente o seu peso no mercado
farmacêutico mundial). Enquanto o mercado global cresceu em 2006 cerca de 7%, os
mercados emergentes cresceram quase 12% (ver a Figura 6). Por outro lado, este
crescimento deve-se também à passagem de classes terapêuticas de cuidados primários
(como por exemplo a antibioterapia) para a biotecnologia e de especialidade (por exemplo
29
classes como a dos anti-hipertensivos ou produtos oncológicos) (IMS, 2007).
Evolução dos Mercados Emergentes
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es)
Vendas dos Mercados Emergentes
Crescimento Mercados Emergentes
Crescimento do Mercado Global
Figura 6 – Evolução do Mercado Farmacêutico nos Mercados Emergentes
Fonte: IMS Health, MIDAS, MAT Dez 2006
No ano de 2006 os produtos de especialidade contribuíram em 62% para o crescimento
global do mercado, relativamente a 35% em 2000. Muitas das classes terapêuticas de
cuidados primários abrandam o seu crescimento ou crescem a taxas inferiores à média do
mercado, o que se relaciona com a entrada de genéricos de baixo custo e elevada qualidade
e permutas para produtos over-the-counter. Estas classes são a dos inibidores da bomba de
protões, os antihistamínicos, inibidores de agregação plaquetária e antidepressivos. No ano
de 2006 representaram mais de metade do volume dos produtos farmacêuticos vendidos
em sete mercados chave – Estados Unidos, Canadá, França, Alemanha, Itália, Espanha e
Reino Unido. Esta tendência reflecte o balanço de mudança entre novos e velhos produtos
e a crescente “genericalização” de muitas das classes de cuidados primários. Na Figura 7
podemos observar a evolução dos genéricos desde 2001 a 1006.
30
Crescimento dos Genéricos
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2001 2002 2003 2004 2005 2006
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tes)
Venda global de Genéricos
Crescimento de Genéricos
Crescimento Farmacêutico (7 mercados)
Figura 7 – Evolução do Mercado Farmacêutico dos Genéricos
Fonte: IMS Health, MIDAS, MAT Dez 2006
3.2.2. Classes Terapêuticas líderes e os principais produtos
No top do ranking das classes terapêuticas estão os reguladores de lípidos que cresceram
7,5% para 35,2 biliões de dólares apesar da perda de patente da sinvastatina e da
pravastatina nos principais mercados (IMS, 2007).
Os produtos oncológicos atingiram os 34,6 biliões em vendas em 2006, aumentando
20,5%. Este significativo crescimento, o maior entre as dez classes terapêuticas líderes, foi
alimentado pela forte aceitação da terapia efectiva e inovadora que está a reformar a
abordagem aos tratamentos do cancro e os seus resultados. O ano de 2006 foi
particularmente expressivo com 360 compostos em desenvolvimento. Metade dos produtos
oncológicos na sua última fase de desenvolvimento são terapias alvo – tratamentos
direccionados especificamente para moléculas específicas envolvidas no carciogenénese e
no crescimento do tumor. Estas terapias vieram revolucionar o tratamento do cancro pois
abrem a possibilidade de fazer um tratamento de manutenção a longo prazo. Esta terapia vê
o cancro como uma doença crónica e não como uma doença de fim de vida. Com o
31
decorrer dos avanços científicos e a inovação na indústria espera-se que o crescimento em
terapias dirigidas continue a ser muito forte e com resultados cada vez mais
impressionantes (IMS, 2007).
A classe terapêutica dos agentes respiratórios foi a terceira no ano de 2006, com 10% de
crescimento em vendas para quase 25 biliões de dólares em vendas. Outra das classes
terapêuticas com elevado crescimento foi a dos agentes de auto imunoterapia, que cresceu
20% em 2006 passando para quase 11 biliões de dólares em vendas. Este crescimento foi
alimentado pelo crescente uso dos anti-TNF tais como o Remicade e o Humira e a
expansão das indicações aprovadas para estes produtos. A Tabela 1 apresenta a lista dos
principais produtos do mercado farmacêutico mundial. Os principais produtos no ano de
2006 foram o Lipitor, o Nexim, o Seretide, o Plavix e o Aranesp.7
Tabela 1 – Ranking dos Principais Produtos do Mercado Farmacêutico Mundial
Biliões dólares (PVA)
Produtos MAT Dez 2006
Quota Mercado %
LIPITOR 13,6 2,2% NEXIUM 6,7 1,1% SERETIDE 6,3 1,0% PLAVIX 5,8 1,0% ARANESP 5,0 0,8% NORVASC 5,0 0,8% ZYPREXA 4,7 0,8% RISPERDAL 4,6 0,8% ENBREL 4,5 0,7% EFFEXOR 4,0 0,7% TOTAL GLOBAL 603,9 100%
Fonte: IMS Health, MIDAS, MAT Dez 2006
3.2.3. Performance Regional
O mercado farmacêutico mundial está dividido em 3 grandes blocos: América do Norte
(Estados Unidos e Canadá), Europa e Japão.
7 Vendas dos 13 mercados farmacêuticos globais que representam cerca de dois terços do total a preços de produção.
32
Repartição do Mercado Farmacêutico Mundial -
Vendas de 2006
47,7%
29,9%
9,3%
8,6%4,5% América Norte (EUA,
Canadá)Europa
Japão
África, Ásia (exceptoJapão) e AustráliaAmérica Latina
Figura 8 – Repartição do Mercado Farmacêutico Mundial – Vendas de 2006
Fonte: IMS Health, MIDAS, MAT Dez 2006
A América do Norte, com quase 50% da quota global do mercado, cresceu 8,3% em 2006
para 290 biliões, acima dos 5,4% de crescimento no ano anterior. Este forte crescimento
estava relacionado com o primeiro ano de benefício do Medicare Part D e o consequente
aumento no volume de prescrição, assim como o sólido crescimento de 7,6% no Canadá.
No bloco europeu, os cinco maiores mercados são a França, Alemanha, Itália, Espanha e o
Reino Unido. Estes mercados apresentaram 4,4% de crescimento para 123 biliões de
dólares em 2006, 4,8% abaixo do crescimento de 2005, o terceiro ano a baixar de
performance.
As vendas na América Latina cresceram 12,7% para cerca de 34 biliões de dólares.
A Ásia-Pacífico (sem o Japão) e África cresceu 1,5% para 66 biliões.
O mercado do Japão diminuiu cerca de 0,4% em 2006, relativamente ao ano anterior,
resultado dos cortes dos preços bienais do governo.
33
As vendas de produtos farmacêuticos na China cresceram 12,3% para 13,4 biliões em
2006, comparados com 20,5% do ano anterior. Este abrandamento do crescimento esteve
relacionado com a introdução de uma campanha para limitar a promoção física dos
fármacos.
A Índia foi um dos mercados de mais rápido crescimento em 2006, com produtos
farmacêuticos a crescer a 17,5% para 7,3 biliões de dólares. “No mesmo ano a Índia passa
de um mercado em desenvolvimento para um mercado emergente, com muitas
multinacionais farmacêuticas a aproveitar o enorme potencial que este mercado oferece”,
segundo Ray Hill, director geral da IMS Global Consulting. Vários factores como o aceitar
dos direitos de propriedade intelectual, uma economia robusta e o forte crescimento das
necessidades de cuidados de saúde contribuíram para acelerar o crescimento do país.
No total, 27% do total do crescimento é agora proveniente de países de Rendimento
Nacional per capita de menos de vinte mil dólares. Em 2001 estes países de menor
rendimento contribuíram em 13% para o crescimento.
34
3.3. EMPRESAS LÍDERES
As empresas líderes, na Indústria Farmacêutica, são das maiores empresas a nível mundial.
São empresas internacionais em termos de vendas, de actividades de produção, com
subsidiárias e filiais. A dominação desta indústria por empresas de larga escala tem vindo a
aumentar principalmente nos últimos anos. A partir de 1990 houve um período de maior
consolidação na indústria, como resultado tanto de fusões entre empresas já em posições
elevadas no ranking das empresas líderes, como também em resultado de importantes
aquisições pelas empresas líderes. Como resultado, o ranking das companhias líderes a
nível mundial tem vindo a mudar consideravelmente. No ano de 2006 estas eram as
empresas líderes estão apresentadas na Tabela 2.
Tabela 2 – Ranking das 20 Maiores Empresas do Mercado Farmacêutico Mundial
Ordem Laboratórios Valor Mercado 2006 (Biliões de Dólares)
Quota de Mercado
TOTAL MUNDIAL 607,9 100,00% 1 PFIZER 46,1 7,58% 2 GLAXOSMITHKLINE 37,0 6,09% 3 NOVARTIS 31,6 5,20% 4 SANOFI-AVENTIS 31,1 5,12% 5 JOHNSON & JOHNSON 27,3 4,49% 6 ASTRAZENECA 26,7 4,39% 7 MERCK & CO. 25,0 4,11% 8 ROCHE 23,5 3,87% 9 ABBOTT 17,6 2,90% 10 AMGEN 16,1 2,65% 11 WYETH 14,9 2,45% 12 LILLY 14,7 2,42% 13 BAYER 12,4 2,04% 14 BMS 12,3 2,02% 15 BOEHRINGER ING. 11,2 1,84% 16 TAKEDA 10,0 1,65% 17 TEVA 9,3 1,53% 18 SCHERING-PLOUGH 8,6 1,41% 19 DAIICHI SANKYO 5,6 0,92% 20 NOVO NORDISK 5,6 0,92% OUTROS 221,3 36,40%
Fonte: IMS Health, MIDAS, MAT Dez 2006
35
Mais de metade destas empresas em 2000 tinham sede nos Estados Unidos da América e as
restantes na Europa. No ano de 2006 já aparecem no ranking das maiores empresas,
empresas de outras regiões como a Ásia.
De acordo com dados do IMS de Junho 2007 (últimos 12 meses) temos agora a Pfizer em
primeiro lugar, seguindo-se a Glaxosmithklein, a Novartis, a AstraZeneca e a Sanofi-
Aventis.
36
3.4. TENDÊNCIAS DO MERCADO
Apesar da contínua expansão do mercado farmacêutico, a dinâmica subjacente continua-se
a alterar. Segundo o IMS, em 2006, produtos em que as vendas excediam os 18 biliões
perderam a patente em sete mercados chave – incluindo os Estados Unidos, que representa
14 biliões das suas vendas. Os genéricos irão assumir cada vez mais um papel central na
restrição das despesas de saúde, com a elevada adesão a terapias de baixo custo,
substituindo os produtos de marca em classes como os reguladores de lípidos,
antidepressivos, inibidores de agregação plaquetária, antieméticos e agentes respiratórios.
De acordo com o IMS, um outro factor a influenciar o mercado é o forte aumento do papel
dos pacientes ao cuidarem da sua saúde e procurarem bastante o acesso a terapias que vão
melhorar ou prolongar a sua vida. Os pacientes surgem como agentes que pretendem gerir
a sua saúde, entre outras formas através da poupança. Dado que eles são consumidores
finais, ganham poder para aprovações regulatórias para influenciar o acesso às decisões do
mercado e influenciar a prescrição. Assim sendo, de acordo com o IMS, as empresas de
maior sucesso serão aquelas que têm o focus nos consumidores finais e pacientes, sem
perderem a perspectiva de crucial do papel dos médicos.
Segundo Aitken (IMS), para manter o crescimento, as empresas farmacêuticas terão de
estar conscientes da dinâmica do mercado mundial. Isto requer um focus superior em
realizar ganhos de produtividade a partir das suas vendas, marketing e investimento em
lançamentos, na avaliação do seu I&D, nas estratégias de carteira de produtos, para apoiar
as oportunidades de mercados maduros e emergentes e um compromisso para melhor
demonstrar o valor dos seus medicamentos entre os stakeholders chave (consumidores
/pacientes).
De acordo com as previsões do IMS Market Prognosis Mar 2007 Preview, espera-se que
em 2010 surjam 50 novos medicamentos, continuando a existir a pressão pelos preços
baixos, e maior exposição aos genéricos. Entre os 20 maiores mercados farmacêuticos
mundiais, prevê-se que a China ocupe o sétimo lugar, o Brasil o décimo, e que o México, a
Índia, a Turquia, a Rússia, a Venezuela e a Polónia estejam presentes entre os primeiros
vinte. Os mercados emergentes serão a oportunidade e o desafio de crescimento. Prevê-se
37
ainda que o número de Novas Entidades Químicas (NEQs) tenha um ténue crescimento,
com mais inovação nas áreas da oncologia e da biotecnologia do que nas áreas de cuidados
primários. Entretanto existe uma perda em grande escala de patentes, na ordem dos 100
biliões de dólares, o que torna a pressão em novos lançamentos cada vez mais forte.
Segundo o relatório sobre o futuro da indústria farmacêutica, publicado pela
Pricewaterhouse Coopers, intitulado Pharma 2020: The Vision - Which Path Will You
Take?, haverá uma expansão do mercado farmacêutico global, podendo atingir 1,3 trilhão
de dólares em 2020. Este crescimento é baseado sobretudo no maior recurso a tratamentos
preventivos, à medida que a população mundial cresce e que aumenta a proporção de
idosos e de obesos, em virtude da maior esperança de vida e do maior poder de compra.
Estas últimas previsões apontam para a tendência de crescimento do mercado farmacêutico
mundial, de acordo com o que se tem verificado nos últimos anos. Desse modo, países
emergentes como a Índia, a China, a Indonésia, o México, a Rússia e a Turquia, deverão
ser responsáveis por 1/5 das vendas globais de produtos farmacêuticos. O estudo prevê
ainda que o quadro de doenças crónicas nos países em desenvolvimento será cada vez mais
similar ao do mundo desenvolvido. No entanto, o actual modelo de negócios da indústria
farmacêutica é economicamente insustentável e operacionalmente incapaz de produzir, ao
ritmo necessário, os tratamentos inovadores exigidos pelo mercado global. Para aproveitar
essa futura oportunidade de crescimento, a indústria precisa, fundamentalmente, mudar seu
modus operandi.
O relatório da Pricewaterhouse Coopers, afirma ainda que apesar da procura sem
precedentes, a indústria farmacêutica encontra-se num momento decisivo em que precisa
aperfeiçoar a sua capacidade para poder aproveitar essas oportunidades. As empresas
enfrentam a escassez no desenvolvimento de novas fórmulas, o fraco desempenho
financeiro (o índice FTSE Global Pharmaceuticals registou crescimento de 1,3% nos seis
anos encerrados em 30 de Março de 2007 enquanto o índice Dow Jones World cresceu
34,9%), o aumento crescente das despesas com vendas e marketing, maiores restrições
legais e regulatórias e reputações “beliscadas”. Ao mesmo tempo, os fornecedores e
clientes de sistemas de saúde em todo o mundo estão a perceber que a despesa está a
tornar-se insustentável, a menos que disponham de benefícios tangíveis e de equilíbrio na
38
relação custo benefício em longo prazo.
“O desafio para a indústria farmacêutica é aumentar sua produtividade em I&D para poder
capitalizar as oportunidades. Embora o investimento nessa área tenha duplicado nos
últimos 10 anos, a produção de novos medicamentos caiu 60%, isso indica que o actual
modelo de negócios é insustentável”, afirma o Dr. Steve Arlington, líder global em
consultoria de I&D da indústria farmacêutica global da Pricewaterhouse Coopers e
coordenador do estudo.
39
3.5. A INDÚSTRIA FARMACÊUTICA EM PORTUGAL
3.5.1. O Mercado Farmacêutico Português
Evolução do Valor do Mercado Farmacêutico Português
1.221.328
1.293.131
1.342.768
1.522.682
1.647.325
1.788.524
1.934.251
2.002.457
2.185.683
2.306.097
2.415.504
0 500000 1000000 1500000 2000000 2500000 3000000
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
Milhares de Euros
Figura 9 – Evolução do Mercado Farmacêutico Português
Fonte: IMS, 2007
O valor do Mercado Farmacêutico Português duplicou nos últimos dez anos, passando de
1.221 milhões de Euros, em 1996, para 2.415 milhões de Euros, em 2006. Sendo o valor do
mercado farmacêutico mundial, de aproximadamente 643 biliões de dólares, o mercado
farmacêutico português tem o peso de 0,27% no valor do mercado farmacêutico mundial
(considerando o câmbio de 1EUR=1,38USD, no ano de 2006).
Analisando a quota de mercado dos genéricos no mercado farmacêutico português,
conclui-se que passamos de um valor de quase 3 milhões de euros, no ano 2000, que
representava 0,1% do mercado total, para quase 500 milhões em 2006, representando
15,2% da quota de mercado em 2006. Há um claro aumento do peso dos genéricos não só a
nível mundial, mas também em Portugal.
40
Tabela 3 – Evolução do Mercado Farmacêutico dos Genéricos no Mercado Português
Ano Mercado Total
PVP* Mercado Não
Genéricos PVP* Mercado
Genéricos PVP* Quota Mercado
Genéricos
2000 2.336.936 2.334.012 2.924 0,1% 2001 2.551.830 2.543.068 8.762 0,3% 2002 2.735.263 2.686.999 48.264 1,8% 2003 2.876.313 2.715.576 160.737 5,6% 2004 2.979.040 2.743.821 235.219 7,9% 2005 3.104.612 2.711.958 392.654 12,6% 2006 3.161.767 2.682.669 479.098 15,2%
* Milhares Euros
Fonte: INFARMED, 2003, 2007
Em termos de crescimento, observou-se um forte crescimento no valor do mercado
farmacêutico dos genéricos entre 2000 e 2006, sendo 164 vezes superior o valor do
mercado dos genéricos em 2006, relativamente a 2000. Quanto ao valor do mercado dos
Não Genéricos observou-se que, para além da sua quota de mercado estar a diminuir,
também o valor cresceu a ritmos cada vez mais lentos até 2004, sendo que já no ano de
2005 e de 2006 estes crescimentos foram negativos. Ou seja a tendência dos últimos anos é
para um decréscimo do mercado dos Não Genéricos.
Tabela 4 – Evolução das Taxas de Crescimento dos Genéricos no Mercado Português
Ano Crescimento Anual do Mercado Total
Crescimento do Mercado dos Não Genéricos
Crescimento do Mercado dos Genéricos
2001 9% 9% 200% 2002 7% 6% 451% 2003 5% 1% 233% 2004 4% 1% 46% 2005 4% -1% 67% 2006 2% -1% 22%
Fonte: INFARMED, 2003, 2007
Quanto à repartição entre o mercado farmacêutico de ambulatório e o mercado
farmacêutico institucional, o peso do mercado farmacêutico português está concentrado no
mercado de ambulatório. Em 2005, este representava 19% do mercado total. No entanto
41
há uma tendência de crescimento do mercado institucional pois no ano de 2001,
representava apenas cerca de 16% do mercado total e até 2006, tem vindo a aumentar o seu
peso.
Além dos cerca de 19% do mercado institucional, os restantes 81% correspondentes ao
mercado de ambulatório repartem-se em cerca de 75% para os medicamentos sujeitos a
prescrição e apenas 6% para os medicamentos de venda livre (APIFARMA, 2006).
3.5.2. Principais Classes Terapêuticas e Produtos
As principais classes terapêuticas responsáveis pelo crescimento do mercado farmacêutico
português nos últimos 10 anos são a classe do sistema cardiovascular que passou de 274
milhões de euros em 1996 para 689 milhões de euros em 2006 e a classe do Sistema
Nervoso Central que passou de 171 milhões de euros em 1996 para 421 milhões de euros
em 2006 (Figura 10).
Evolução das Classes Terapêuticas no
Mercado Farmacêutico Português
0
100.000
200.000
300.000
400.000
500.000
600.000
700.000
800.000
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
Milh
ares
Eur
os
C SISTEMA CARDIOVASCULAR
N SISTEMA NERVOSO
A AP DIGEST E METABOLISMO
M SIST MUSCULO/ESQUELETICO
J ANTINFECCIOSOS SIST
R APARELHO RESPIRATORIO
G SIST GENITUR/HORM/SEX
B SANGUE/ORG HEMATOPOET
D DERMATOLOGICOS
S ORGAOS DOS SENTIDOS
T PROD.UTIL.MEIOS DIAGNOST
H HORM SIST EXC HORM SEX
L A.A./NEO-PLAS./IMUNOMOD.
V DIVERSOS
P PARASITOLOGIA
Figura 10 – Evolução das Classes Terapêuticas no Mercado Farmacêutico Português
Fonte: IMS, 2007
42
Em valores relativos, os crescimentos mais elevados foram dos Produtos de Utilização e
Meios Diagnósticos, a classe dos Órgãos dos Sentidos e do Sistema Genitourinário e
Hormonal / Sexual.
Tabela 5 – Ranking dos Principais Produtos do Mercado Farmacêutico Português
Produtos Data de
Introdução no Mercado
Milhares Euros (PVF)
MAT 8/2007
Quota Mercado (%)
PLAVIX 6/2001 52.739 2% ZARATOR 12/1998 31.178 1% CO-DIOVAN 7/1999 23.643 1% COAPROVEL 11/1999 22.816 1% FOSAVANCE 2/2006 21.805 1% ZYPREXA 5/1997 21.291 1% DAFLON 9/1974 20.155 1% INEGY 4/2005 19.014 1% VASTAREL 12/1983 18.831 1% COVERSYL 4/1993 18.303 1% CRESTOR 3/2004 17.084 1% SINGULAIR 3/1999 16.548 1% CIPRALEX 7/2003 16.217 1% OMEPRAZOL MG MCK 7/2001 15.480 1% PANTOC 4/1997 15.226 1% NEXIUM 6/2001 14.947 1% BEN U RON 12/1967 13.995 1% EFEXOR 12/1996 13.589 1% ACTONEL 5/2001 13.566 1% ADALAT 12/1975 13.458 1% TOTAL PORTUGAL 2.511.749 100%
Fonte: IMS, 2007
Os principais produtos no mercado farmacêutico português estão relacionados com o
sistema cardiovascular. Entre os principais produtos que se encontram nos primeiros 10
mais importantes, encontram-se 2 em comum com o mercado farmacêutico mundial. Estes
são o Plavix que ocupa o 4º lugar a nível mundial com 1% de quota de mercado a nível
mundial, e 1º em Portugal, com uma quota de mercado de 2% e o Zarator, que é também
comercializado como Lipitor, que ocupa o 1º lugar no mercado farmacêutico mundial com
uma quota de 2,2% e ocupa o 2º lugar em Portugal, com uma quota de mercado de 1%.
(Ver Tabela 5).
43
3.5.3. Empresas Líderes
Tabela 6 – Ranking das 20 Maiores Empresas do Mercado Farmacêutico Português
Ordem Laboratórios Valor Mercado
2006 (Milhares Euros)
Quota de Mercado
TOTAL PORTUGAL 2.415.774 100,00% 1 MERCK SHARP DOHME 154.756 6,41% 2 PFIZER 148.872 6,16% 3 SANOFI-AVENTIS 107.153 4,44% 4 SERVIER 94.957 3,93% 5 NOVARTIS FARMA 92.248 3,82% 6 BAYER PORTUGAL 85.335 3,53% 7 SANOFI-BMS 80.005 3,31% 8 ASTRAZENECA 77.970 3,23% 9 GLAXOSMITHKLINE 74.427 3,08%
10 BIAL 72.131 2,99% 11 JANSSEN/CILAG FAR. 66.253 2,74% 12 MEDINFAR 49.632 2,05% 13 WYETH LEDERLE PORT 44.792 1,85% 14 MERCK GENERICOS 44.007 1,82% 15 BOEHRINGER INGELH 41.806 1,73% 16 RATIOPHARM 40.757 1,69% 17 MERCK 40.525 1,68% 18 LILLY PORTUGAL 37.888 1,57% 19 VITORIA 36.843 1,53% 20 ROCHE FARM.QUIMICA 35.249 1,46%
OUTROS 990.168 40,99%
Fonte: IMS, 2007
À semelhança do que acontece no mercado farmacêutico mundial, em Portugal as 20
maiores empresas concentram cerca de 60% da quota de mercado. As principais empresas
líderes de mercado em Portugal são quase as mesmas do mercado farmacêutico mundial.
Destaca-se o caso da BIAL, que é uma empresa portuguesa e é a única no ranking das 10
maiores empresas. No top do ranking das maiores empresas de um país é frequente
encontrar uma ou mais empresas nacionais como das principais.
As restantes são empresas multinacionais presentes em todos os continentes, fazem I&D e
muitas delas como veremos no Capítulo 7, também investem em I&D em Portugal.
44
3.5.4. A Indústria Farmacêutica Portuguesa
Em Portugal existem 141 empresas farmacêuticas (importadoras ou produtoras de
medicamentos), 267 Armazenistas (independentemente de operarem ou não no mercado),
2759 farmácias e 247 postos de medicamentos, segundo dados de 2004 (INFARMED,
APIFARMA, 2006).
Portugal emprega mais de 10 mil pessoas na indústria farmacêutica, segundo dados de
2004 (EFPIA, 2006).
A produção em Portugal de matérias primas e de produtos farmacêuticos passou de 1.045
milhões de euros, em 1996, para 1.745 milhões de euros em 2005 (EFPIA, APIFARMA,
2006), o que significa um crescimento de 67%, na produção da indústria farmacêutica
entre 1996 e 2005.
Quanto à diferença entre a importação e exportação de matérias primas e produtos
farmacêuticos, entre o ano de 2001 e 2005, tem-se vindo a assistir ao aumento das
Importações (passou de 1207 milhões de euros em 2001 para 1645 milhões de euros em
2006) e à diminuição das exportações (passou de 344 milhões de euros em 2001 para 285
milhões em 2005) (INE; 2001-2004, EFPIA; 2005).
Em 2004, no mercado farmacêutico português, apenas 15% da quota de mercado pertencia
a empresas portuguesas (APIFARMA, 2006).
Relativamente a empresas portuguesas o volume de negócios destas aumentou de 317
milhões de euros em 2001 para 471 milhões de euros em 2005 (APIFARMA, 2005).
Trata-se do volume de negócios das empresas: Azevedos, Basi, Bial, Bluepharma, Edol,
Farma APS, Iberfar, Jaba, Lasbesfal, Medinfar, OM Portuguesa, Lusomedicamenta,
Tecnimede, Vida (Atral Cipan), Vitória. Treze destas empresas pertencem ao Projecto
PharmaPortugal que é um projecto laboratórios farmacêuticos portugueses – todos eles
com capital 100 por cento nacional. Estabeleceram uma parceria com o ICEP, a Apifarma
e o Infarmed para promover a exportação de medicamentos. São eles a Basi, Bial,
Bluepharma, Edol, Iberfar, Jaba, Labesfal, Laboratórios Azevedos, Lusomedicamenta,
45
Medinfar, Tecnifar, Tecnimed e Vida. Embora no seu conjunto tenham apenas subsidiárias
em Angola, Argentina, Brasil, Cabo Verde, Espanha, Marrocos, Moçambique e Peru, estes
laboratórios estão presentes nos mercados farmacêuticos de cerca de oitenta países
(APIFARMA, 2005).
Esta união de esforços em torno do sector farmacêutico nacional, com a finalidade de o
promover no exterior, assume as potencialidades do sector e configura um projecto de
internacionalização, designado PharmaPortugal, cujas previsões apontam para uma subida
das exportações destes laboratórios em 6 por cento em 2005, 8 por cento em 2006 e 10 por
cento em 2007. As exportações de medicamentos portugueses incidirão em quatro grandes
mercados: Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP), países do Magreb,
Brasil e três estados da União Europeia: Espanha, Polónia e República Checa. A presença
dos medicamentos portugueses nestes países demonstra que é possível penetrar nos
mercados, de forma expressiva, colocando os produtos nacionais em competição com os
seus congéneres internacionais (APIFARMA, 2005).
Em 2004 as mesmas empresas portuguesas empregavam 3.224 trabalhadores.
Os montantes de investimento das empresas farmacêuticas portuguesas foi de 49 milhões
de euros, em 2004. Este montante de investimento tem vindo a aumentar (INFARMED,
APIFARMA, 2005).
Como principais conclusões deste capítulo, podemos afirmar que a indústria farmacêutica
a nível mundial é dominada por empresas de larga escala, multinacionais, localizadas em
sociedades industriais avançadas e vendem os seus produtos por todo mundo. As maiores
empresas a nível mundial detêm quase metade do valor do mercado da indústria
farmacêutica (medido em receitas). Estas empresas fazem I&D activamente e são
extremamente dependentes do sucesso das inovações decorrentes do processo de I&D. O
valor do mercado farmacêutico mundial é de 643 biliões de dólares, com tendência de
crescimento (valores de 2006). A maior parte do valor deste mercado está concentrada na
América do Norte (EUA e Canadá) com quase 50% da quota de mercado, a Europa com
46
quase 30%, o Japão com quase 10% e a restante fatia reparte-se entre África , Ásia e
América Latina.
O valor do Mercado Farmacêutico Português duplicou nos últimos dez anos, sendo de
2.415 milhões de Euros em 2006 e representa cerca de 0,27% do valor do mercado
farmacêutico mundial. À semelhança do que acontece no mercado farmacêutico mundial,
em Portugal as 20 maiores empresas concentram cerca de 60% da quota de mercado. As
principais empresas líderes de mercado em Portugal são quase as mesmas do mercado
farmacêutico mundial. As empresas portuguesas em 2004 representavam apenas 5% da
quota do mercado português. Destaca-se o caso da BIAL, que é uma empresa portuguesa e
é a única no ranking das 10 maiores empresas.
47
4. O PROCESSO DE I&D NA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA8
Depois da explicação do funcionamento e da análise à Indústria Farmacêutica e ao
Mercado Farmacêutico, a nível Mundial e Português (no capítulo 3), antes de apresentar a
actividade de Inovação e I&D realizada na Indústria Farmacêutica, a nível mundial e em
Portugal, apresentamos, neste capítulo, a descrição do processo de I&D na Indústria
Farmacêutica, dada toda a sua especificidade.
No capítulo 2 (e mais especificamente no ponto 2.2. Taxnomia das Inovações) vimos os
conceitos de Inovação e I&D em geral. Vejamos como se aplicam à Indústria Farmacêutica
em particular.
Uma vez que o produto da Indústria Farmacêutica é constituído pelos medicamentos
utilizados na saúde humana, trata-se de uma área extremamente regulamentada a nível
governamental e também ao nível de instituições internacionais.
O Processo de I&D na Indústria Farmacêutica divide-se em duas partes: a investigação -
que dá origem aos novos compostos; e o desenvolvimento – que corresponde à passagem
de um composto para um medicamento aprovado, ou seja, o desenvolvimento do
medicamento. Após esta fase de I&D, segue-se a fase de comercialização que exige o
registo do medicamento novo em cada um dos países onde a empresa pretende
comercializar. A empresa terá de proceder à Autorização de Introdução no Mercado (AIM)
de cada país visado.
O processo de desenvolvimento de um medicamento segue uma série de procedimentos
repartidos em etapas a partir da descoberta de um novo composto ou nova entidade
química (NEQ).
A tarefa de descobrir e desenvolver um medicamento eficaz e seguro é mais esperançosa à
medida que o conhecimento da doença aumenta (Innovation.org, 2007).
8 A descrição do Processo de I&D na Indústria Farmacêutica foi baseada no Relatório: Drug Discovery and Development: Understanding the R&D Process, Innovation.org, 2007. A Innovation.org é um projecto da Pharmaceutical Research and Manufacturers of America (PhRMA). A PhRMA representa os empresas farmacêuticas e de biotecnologia líderes nos EUA. A Indústria investiu no seu total cerca de 55,2 biliões de dólares, e os membros da PhRMA investiram 43 biliões.
48
Tarda cerca de 10 a 15 anos, em média, a desenvolver um novo medicamento. O custo
médio para investigar e desenvolver cada medicamento com sucesso, estima-se entre 800
milhões a 1 bilião de dólares. Estes números incluem também o custo de milhares de
insucessos: em média para cada 5.000 a 10.000 compostos iniciais, apenas 1 chega a ser
aprovado - última fase (Innovation.org, 2007; EFPIA 2007; Bhattacharya et al., 2005;
Tokens, 2005).
O processo de I&D na Indústria Farmacêutica pode ser dividido nas seguintes fases: a
primeira fase é a fase pré-descoberta; a seguinte é a descoberta; depois a fase dos ensaios
pré-clínicos; os ensaios clínicos; e, por fim, a fase de aprovação e fabrico. Até à fase da
descoberta, trata-se do Processo de Investigação e depois entra-se no Processo de
Desenvolvimento do medicamento. (Figura 11)
Pré
Des
cobe
rta
Componentes
3 - 6 Anos
Descoberta do Medicamento
5.000 -10.000 250
5
Fase I Fase II Fase III
6 - 7 Anos
Nº de Voluntários
Ensaios Clínicos
0.5 - 2
1 novo
Revisão FDAProdução Larga Escala
Ensaios Pré - Clinicos
Submissão às Autoridades Aprovação das Autoridades
20 - 100 100 - 500 1000 - 5000
Anos
Fas
e IV
-V
igilâ
ncia
do
Pro
duto
medicamentoaprovado
Figura 11 – Processo de I&D de um Novo Medicamento
Fonte: PhRMA, 2007, Innovation.org, 2007
49
4.1. O PROCESSO DE INVESTIGAÇÃO DE UM MEDICAMENTO
Todos os medicamentos introduzidos no mercado são resultado de uma investigação lenta,
custosa e de elevado risco. Pela primeira vez na história, os cientistas começam a entender
a nível molecular, o que está por trás de uma doença. Recentes avanços na genómica,
proteómica e o poder computacional, apresentam novas formas de entender as doenças
(Innovation.org, 2007).
4.1.1. A fase da Pré-descoberta
Antes da descoberta de um novo medicamento, os cientistas trabalham para entender o
melhor possível a doença que se pretende tratar e para saberem a causa da sua condição
(Innovation.org, 2007; EFPIA 2007; Bhattacharya et al., 2005; Tokens, 2005).
A investigação académica e a indústria privada contribuem para este conhecimento de
base. No entanto, apesar dos novos instrumentos e conhecimentos, esta investigação leva
muitos anos de trabalho e por vezes leva a conclusões frustrantes. Sendo a investigação
bem sucedida, ainda levará muitos mais anos de trabalho para fazer deste conhecimento de
base da causa da doença, um tratamento.
Esta fase inclui ainda a identificação do alvo que consiste na escolha de uma molécula alvo
do medicamento. E ainda inclui a validação do alvo, que é testar o alvo e validar o seu
papel na doença (Innovation.org, 2007; EFPIA 2007; Bhattacharya et al., 2005; Tokens,
2005).
Na fase da identificação do alvo terapêutico, os cientistas escolhem um alvo, que é uma
molécula única, um gene ou uma proteína, que possa ser afectado pela molécula de
investigação, ou seja, vão escolher um alvo que seja susceptível para que o novo
medicamento consiga combater a doença em causa (Innovation.org, 2007).
Depois também é feita a validação do alvo, confirmando o seu papel na doença e
confirmando que pode ser afectado por um novo medicamento. Estes testes podem ser
50
levados a cabo por modelos em células vivas ou em animais com a doença em estudo
(Innovation.org, 2007).
4.1.2. Descoberta da nova molécula
Esta etapa é a descoberta de uma molécula promissora que se possa tornar um
medicamento. Poder-se-ão encontrar vários compostos.
Os cientistas depois de compreenderem bem a doença, começam a procurar o drug
candidate, ou seja, tentam encontrar a molécula ou o composto, que possa actuar no seu
alvo para modificar o percurso da doença. Ao fim de vários anos de testes, se um dos
compostos tiver sucesso, pode tornar-se um novo medicamento (Innovation.org, 2007).
Há várias formas de encontrar um medicamento:
- Através da natureza: os cientistas procuram na natureza compostos interessantes para
o combate às doenças. Por exemplo, bactérias encontradas no solo ou nas plantas
podem levar a novos tratamentos. A natureza ainda oferece muitas substâncias úteis,
mas agora existem outras abordagens para a descoberta de medicamentos.
- High-throughput Screening: Os avanços na automação e no poder computacional
permitem aos investigadores testar centenas de milhares de compostos no seu alvo
para identificar algum que seja promissor. Baseado nos resultados, os cientistas
seleccionam alguns compostos para continuarem o estudo.
- Química medicinal: através da química medicinal, os cientistas vão sintetizando
compostos químicos na natureza de forma iterativa e essa informação é usada para
desenhar novas moléculas. Nesta fase as técnicas sofisticadas de informática
molecular podem ajudar e tornar mais racionais os processos de decisão.
- Biotecnologia: os cientistas podem também desenhar moléculas biológicas de
combate a doenças produzidas a partir de sistemas vivos (Innovation.org, 2007).
Nesta fase também são feitos os primeiros testes de segurança farmacocinética aos
compostos promissores. Os cientistas testam a Absorção, a Distribuição, Metabolismo,
51
Excreção e Toxicidade (ADME/Tox), ou a cinética de cada composto. Os compostos de
sucesso têm de ser os bem absorvidos no sangue, distribuídos para a zona própria do corpo,
metabolizados de forma eficiente e efectiva, correctamente excretados do corpo e que
demonstrem não ser tóxicos. Estes estudos servem para os investigadores priorizarem os
compostos no processo de descoberta. Os estudos ADME/Tox são elaborados em células
vivas, em animais e através de modelos computacionais (Innovation.org, 2007; EFPIA
2007; Bhattacharya et al., 2005).
Os compostos que sobrevivem à primeira despistagem são depois optimizados, ou
alterados, para se tornarem mais eficazes e seguros. Através da alteração da estrutura do
composto, os cientistas conseguem dar-lhes outras propriedades. Por exemplo, podem
torná-los menos propensos a interagir com outros percursos químicos no corpo, assim
podendo diminuir os efeitos secundários. São elaboradas e testadas centenas de variações
ao composto inicial. Nestas equipas, trabalham a par bioquímicos (testam os efeitos dos
compostos em estudo no sistema biológico) e químicos (tomam a informação dos biólogos
para fazerem alterações adicionais, que voltam a ser testadas pelos biólogos). O composto
resultante é o medicamento candidato. Mesmo nesta fase inicial, os investigadores
começam a pensar na formulação do medicamento (as substâncias inactivas - que são as
substâncias usadas para ligar o composto e que o permite dissolver no momento certo),
mecanismo de entrega (que é a forma como será tomado – toma oral, injectável ou inalado)
e na produção em larga escala (como se vai fabricar o medicamento em grandes
quantidades) (Innovation.org, 2007).
Ao fim de vários anos de trabalho intensivo (em média são entre 3 a 6 anos), a fase da
descoberta termina, em média, com 5.000 a 10.000 compostos.
Após a descoberta das moléculas promissoras, as companhias farmacêuticas procedem ao
pedido de patentes a nível nacional e internacional, para se protegerem no futuro do risco
de cópia. (O tema das patentes aplicado à Indústria Farmacêutica está desenvolvido no
ponto 4.3).
52
4.2. O PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO DE UM
MEDICAMENTO
4.2.1. Ensaios Pré-clínicos
A fase de ensaios pré-clínicos, tem por objectivo determinar se o medicamento é seguro o
suficiente para ser testado em seres humanos. Nesse sentido são elaborados testes em
laboratório ou em animais.
A partir de um ou mais compostos optimizados em mãos, os investigadores testam
extensivamente para determinar se devem seguir para testes em seres humanos. Os testes
podem ser testes in vitro (são experiências conduzidas em laboratório, feitas em tubos de
ensaio e em copos) e testes in vivo (que são os testes em células de cultura e em modelos
de animais). Os cientistas tentam entender como funciona o medicamento e como o seu
perfil de segurança parece. A U.S. Food and Drug Administration (FDA) requer testes
extremamente meticulosos antes do candidato a medicamento ser estudado em humanos
(Innovation.org, 2007; EMEA, 2007; EFPIA 2007; Bhattacharya et al., 2005).
A empresa tem de submeter um Investigational New Drug (IND) Application and Safety à
FDA. Este pedido a submeter à FDA inclui os resultados dos testes pré-clínicos, a estrutura
química deste candidato a medicamento, como é suposto actuar no corpo humano, uma
lista de efeitos secundários e informação sobre a sua produção. Inclui também um plano
detalhado dos ensaios a realizar com informação de como, onde e com quem será feito o
ensaio. A FDA revê este pedido para assegurar os participantes do ensaio que não estarão
expostos a riscos não razoáveis (Innovation.org, 2007; EMEA, 2007; EFPIA, 2007).
Nesta fase os investigadores também se preocupam em saber como farão para ter a
produção deste novo composto em quantidade suficiente para os testes clínicos.
Esta fase termina em média com cerca de 5 moléculas candidatas a medicamentos, que
serão testadas em nos ensaios clínicos (Innovation.org, 2007; EMEA, 2007; EFPIA 2007;
Bhattacharya et al., 2005).
53
4.2.2. Ensaios Clínicos
Estes ensaios servem para determinar a eficácia e segurança em seres humanos.
É frequente a realização de partes ou totalidade dos ensaios do desenvolvimento clínico
fora da empresa, recorrendo a outras entidades especializadas ex. CRO (Contract Research
Organizations), centros especializados de I&D, universidades, hospitais. Nessa altura o
composto em desenvolvimento está protegido pela patente e procura-se reduzir o tempo até
à introdução no mercado. Os custos nessa fase são particularmente elevados (Bhattacharya
et al., 2005; IFPMA & FIIM, 2004; Saur-Amaral & Borges Gouveia, 2006; Tokens, 2005).
Um candidato a novo medicamento tem de seguir estudos intensivos em seres humanos e
têm de provar a segurança e eficácia antes das autoridades reguladoras (ex. FDA, EMEA)
o aprovarem. Este processo envolve uma série de ensaios clínicos, cada um com os seus
objectivos e requisitos específicos. Alguns são realizados em voluntários saudáveis, em
unidades especializadas em farmacologia clínica, e outros são realizados em doentes,
internados em hospitais ou em regime ambulatório. O processo de ensaios clínicos é ao
mesmo tempo caro e demorado, e na maioria das vezes termina mais em fracassos do que
em sucessos. Desde o seu início até terminar, demora em média entre 6 a 7 anos. Os
ensaios clínicos estão divididos em 3 fases:
- Ensaios clínicos Fase I: são ensaios normalmente realizados em voluntários
saudáveis, normalmente algumas dezenas por ensaio. O principal objectivo desta
fase é a caracterizar a farmacologia humana, nomeadamente a farmacocinética
(modo como o fármaco é absorvido, metabolizado e eliminado), a farmacodinamia
(mecanismos de acção e efeitos farmacológicos) e tolerabilidade/segurança (efeitos
indesejáveis previsíveis, margem de segurança entre a dose que causa os efeitos
farmacológicos desejados e a dose que causa efeitos indesejáveis significativos, etc.).
Estas experiências ajudam a determinar os parâmetros de doses de segurança e se
devem continuar o desenvolvimento.
54
- Ensaios clínicos Fase II: são ensaios terapêuticos exploratórios em doentes com a
doença sob estudo. O número de doentes em ensaio pode variar significativamente.
Por vezes fazem-se ensaios preliminares em pequenos grupos de doentes (menos de
100 doentes, normalmente), que visam provar o conceito farmacológico ou replicar
estudos realizados na fase I em doentes, que se podem designar por ensaios de Fase
IIa. Os ensaios típicos de fase II propriamente dita fazem-se testando várias doses do
fármaco em estudo em comparação com um placebo e/ou um medicamento de
referência comercializado. O objectivo é identificar duas ou três doses (entre as quais
se presume estar a dose mais útil, isto é, a com melhor relação
eficácia/tolerabilidade) e a posologia (número de tomas diárias) a testar nos ensaios
de fase III, a realizar posteriormente. Cada ensaio de Fase II envolve um número de
doentes variável, mas mais comummente de poucas centenas (150-300 doentes). Se
tudo corre bem, faz-se a preparação de Ensaios da Fase III.
- Ensaios clínicos Fase III: são ensaios ditos “terapêuticos” confirmatórios e visam
caracterizar a eficácia, tolerabilidade e segurança das doses identificadas na fase II
como potencialmente úteis, em comparação com um placebo e/ou um comparador
activo (medicamento comercializado de referência). São essenciais para a
determinação da relação risco-benefício. O número de doentes em cada ensaio é
determinado em função de considerandos estatísticos, variando entre algumas
centenas (quando o efeito esperado é muito diferente em relação ao comparador,
como é o caso de um analgésico em relação ao placebo) e vários milhares (quando o
efeito esperado é difícil de descriminar, como é o caso por exemplo de um fármaco
que visa reduzir a morbilidade e mortalidade causada por colesterol elevado).
Actualmente, as autoridades reguladoras exigem pelo menos dois ensaios de fase III
em cada indicação. A fase III é uma fase dispendiosa e longa, envolvendo centenas
de centros espalhados por todo mundo. Coordenar todos os centros e a informação
que chega de todos eles é uma tarefa extremamente complexa e onerosa. Durante a
fase III (ou mesmo na I e II), os investigadores estão também a conduzir outros
estudos críticos, incluindo planos para a produção em grande escala e a preparação
dos complexos requisitos requeridos para a aprovação pelas autoridades reguladoras
55
(FDA, EMEA, etc.) (Innovation.org, 2007; EMEA, 2007; EFPIA 2007; Bhattacharya
et al., 2005).
4.2.3. Aprovação
A partir do ano 2000 começou o constante aumento da exigência das entidades reguladoras
com vista a assegurar a segurança e a eficácia dos novos produtos. A indústria
farmacêutica adaptou-se e desenvolveu estratégias para gerir o processo de I&D de forma
mais eficiente, por exemplo, através do desenvolvimento de novas competências de
trabalho em equipas multidisciplinares, ou de novas competências especializadas para gerir
o processo de inovação que envolvia uma gama alargada de parceiros internacionais
(Achilladelis & Antonakis, 2001; Attridge, 2007; Busfield, 2003; EMEA, 2007;
INFARMED, 2007; Quere, 2003).
Depois de concluídos os ensaios clínicos, as companhias farmacêuticas submetem à
European Medicines Agency (EMEA) um pedido de autorização de comercialização para
os países da União Europeia. Estes pedidos podem ser feitos de forma centralizada para
obter uma autorização para todos os países da União Europeia ou para um país em
específico (EMEA, 2007).
Depois de completadas as 3 fases de ensaios clínicos, a empresa patrocinadora analisa a
informação. Se os dados mostrarem que o medicamento em análise é ao mesmo tempo
seguro e eficaz, a empresa vai preencher e submeter a aprovação à FDA um New Drug
Application (NDA), que pode ser um documento com mais de 100.000 páginas, com os
requisitos de aprovação da FDA para comercializar o medicamento. O NDA inclui
informação desde os primeiros anos de trabalho até à proposta de produção e labeling do
novo medicamento. Os especialistas da FDA vão rever toda a informação incluída no NDA
para determinar se esta demonstra que é segura e eficaz o suficiente para aprovação. A
FDA pode aprovar, rejeitar ou considerar aprovável que significa a necessidade de mais
informação ou estudos (Innovation.org, 2007).
Uma revisão de uma NDA pode incluir uma avaliação por um comité de aconselhamento,
56
um grupo de especialistas independentes dos quadros da FDA indicados pela FDA, por
representantes da empresa e por revisores da FDA. Os comités então votam se a FDA deve
ou não aprovar o pedido, e sob que condições. A FDA não tem de atender às
recomendações dos comités, mas muitas vezes fá-lo (Innovation.org, 2007).
A aprovação pode tardar entre 6 meses e 2 anos (Innovation.org, 2007; EFPIA 2007;
Bhattacharya et al., 2005).
4.2.4. Produção
A passagem de uma produção de pequena para larga escala implica por vezes uma
construção de uma nova fábrica ou a reconstrução da antiga porque o processo de produção
é diferente de um medicamento para outro. Cada passo deve seguir estritamente as guias da
FDA das Good Manufacturing Practices (GMP) - Boas Práticas de Fabrico. Para a
produção em larga escala é necessário um cuidado muito grande (Innovation.org, 2007;
EMEA, 2007; EFPIA 2007; Bhattacharya et al., 2005).
4.2.5. Continuação de estudos e Ensaios Clínicos Fase IV
Mesmo depois da aprovação, a investigação continua. Quanto maior o número de pacientes
a utilizar o medicamento, as companhias são obrigadas a monitorar cuidadosamente e
submeter relatórios periódicos às autoridades reguladoras, nomeadamente os casos de
efeitos adversos.
Adicionalmente, as autoridades reguladoras por vezes requerem à empresa que conduza
estudos adicionais num medicamento aprovado – Ensaios Fase IV. Estes ensaios podem
ser levados a cabo para avaliar a segurança a longo prazo ou como o novo medicamento
afecta um subgrupo específico de pacientes.
57
4.3. A INCERTEZA NO DESENVOLVIMENTO DE UM
MEDICAMENTO E O PAPEL DAS PATENTES
O Processo de I&D na Indústria Farmacêutica é tipicamente caracterizado por elevados
níveis de incerteza.
O tempo de desenvolvimento e os custos associados à descoberta de um novo
medicamento são extremamente elevados. A indústria farmacêutica leva em média dez
anos por cada medicamento e um custo médio de um bilião de dólares por cada
medicamento (DiMasi, Grabowski, & Vernon, 2004).
A taxa de sucesso é extremamente baixa. Apenas um em cada cinco mil medicamentos
potenciais atingem a fase final do processo de I&D. Apenas um em quatro medicamentos
de investigação alcança o mercado e apenas um em cada 5 medicamentos lançados no
mercado pagam o investimento de I&D (DiMasi, Grabowski, & Vernon, 2004).
As restrições regulamentares estão a aumentar. As autoridades são cada vez mais avessas
ao risco. O tempo necessário para obter as autorizações do mercado tem aumentado
consideravelmente e os requerimentos regulamentares são cada vez mais apertados, o que
aumenta a pressão para aumentar a velocidade do processo de desenvolvimento do
medicamento para compensar atrasos associados, e para aumentar a sua eficiência
(Achilladelis & Antonakis, 2001; Archibugi & Iammarino, 2002; IFPMA & FIIM, 2004;
Quere, 2003).
Os novos medicamentos necessitam de entrar no mercado o mais rápido possível para
maximizar as receitas associadas durante a validade da patente (DiMasi, Grabowski, &
Vernon, 2004).
O dilema do tempo correcto para patentear aumenta a incerteza. As empresas têm de
registar a patente no preciso instante, não muito cedo para evitar desperdiçar o tempo no
mercado antes da entrada de genéricos e não muito tarde para que a concorrência não o
faça primeiro (Saur-Amaral & Borges Gouveia, 2006).
58
A indústria farmacêutica tem enfrentado uma redução nas patentes e nos novos
medicamentos que entram no mercado cada ano; os verdadeiros blockbusters são cada vez
mais raros (Achilladelis & Antonakis, 2001; Quere, 2003). Identificar e actuar para reduzir
o risco e a incerteza associada ao desenvolvimento do novo medicamento, são medidas que
podem ajudar a aumentar a sua eficiência e eficácia.
A indústria farmacêutica é um sector extremamente dependente do sistema de patentes.
Este facto deve-se essencialmente a três ordens de razões: em primeiro lugar devido ao
elevado nível de investimento, pois sendo o caso do desenvolvimento de uma nova
molécula, o investimento pode ir até 1 bilião de dólares; em segundo lugar, devido ao
elevado risco de insucesso, pois apenas 1 em cada 5.000 a 10.000 compostos chega à fase
de comercialização; e em terceiro lugar, devido à longa duração dos projectos, que podem
durar entre 10 a 15 anos desde o pedido de submissão da patente à comercialização.
De acordo com a informação apresentada no capítulo 2, por exemplo, a patente tem uma
duração de 14 anos no Reino Unido, podendo ser estendida até aos 21 anos e de 17 anos
nos Estados Unidos (antes era de 14 anos, tendo passado a 17 anos, número de anos
intermédio entre os anteriores 14 anos e os 21 anos possíveis no Reino Unido) (Peppal,
2002).
No caso da Indústria Farmacêutica, é possível obter um Certificado Complementar de
Protecção, que permite o prolongamento da exclusividade conferida pela patente durante
mais 5 anos, a partir da data da Autorização de Introdução no Mercado.
Em geral o primeiro pedido de patente de cada projecto, é aquele que reivindica e protege
o composto per se, a que se seguem outros pedidos de patente destinados a proteger os
resultados da actividade de I&D à medida que esses resultados vão surgindo e se traduzem
em dados novos, inventivos e susceptíveis de aplicabilidade industrial, como por exemplo,
novos processos de fabrico, novas formulações ou novos usos ou indicações terapêuticas.
Após a submissão de um pedido de patente nacional, que estabelece a data relevante para
efeitos de prioridade e proporciona o prazo de um ano após essa mesma data, pode-se
então avançar com pedidos de extensão da patente a outros países.
59
A partir da informação apresentada neste capítulo podemos concluir que o processo de
I&D é efectivamente moroso, bastante regulamentado e de elevada especificidade. O risco
financeiro inerente a este processo é extremamente elevado. Daí a importância do sistema
de patentes. No próximo capítulo veremos a importância da I&D na Indústria
Farmacêutica, a história das Inovações e as suas consequências na Indústria.
60
5. INOVAÇÃO E I&D NA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA
No presente capítulo veremos a importância da I&D na Indústria Farmacêutica em relação
a outros sectores. Depois da apresentação do processo de I&D na Indústria Farmacêutica
no capítulo anterior, faremos uma breve apresentação da história da Inovação na Indústria
Farmacêutica, das forças condutoras da Inovação e das suas consequências, das tradições
tecnológicas de uma empresa e da vantagem competitiva das empresas nacionais.
5.1. O PESO DA I&D FARMACÊUTICA NA I&D GLOBAL
De acordo com o relatório da Comissão Europeia sobre o investimento em I&D a nível
mundial (Edição de 2007)9, o investimento global em I&D cresceu 10%, sendo que as
empresas presentes na Europa aumentaram o investimento em I&D em 7,4%. Em 2006 o
crescimento do investimento em I&D tinha sido apenas 5,3%. O ranking destas empresas
mostra também uma tendência de subida na rentabilidade das mesmas em todo o mundo.
De acordo com o mesmo relatório, as empresas que pertencem à União Europeia estão a
aumentar o investimento em I&D mas a taxas de crescimento inferiores ao resto dos países
do mundo (European Commission, 2007).
É de destacar que, pela primeira vez, o sector que mais investiu em I&D foi o sector
farmacêutico, com 19,3% de quota de I&D no global dos sectores. Da mesma forma, a
intensidade de I&D é muito superior na Indústria Farmacêutica do que em qualquer outro
sector (15,9%) (European Commission, 2007).
A mesma análise indica que as empresas farmacêuticas e biotecnológicas gastaram 15,7 %
mais face à avaliação anterior, num total de 70,5 mil milhões de euros investidos da I&D
em 2006, superando o sector das tecnologias, hardware e equipamento, com um
investimento de 64,5 mil milhões de euros (European Commission, 2007).
9 A lista destas empresas compreende as primeiras 1000 empresas que investem em I&D da União Europeia e as primeiras 1000 empresas do resto do mundo. Juntas estas 2000 empresas investem 372 biliões de euros em I&D, estimando-se que estas representam 85% do total de investimento empresarial em todo mundo. Esta lista está disponível no ANEXO A.
61
A Pfizer destaca-se como o maior investidor individual, com 5,76 mil milhões de euros
gastos, ultrapassando a Ford Motors, que registou um investimento de 5,5 mil milhões de
euros. Para além do laboratório norte-americano há mais duas farmacêuticas no top 10 dos
maiores investidores mundiais, é o caso da Johnson & Johnson em terceiro lugar e da
GlaxoSmithKline a ocupar o sétimo lugar e a destacar-se enquanto o maior investidor
europeu. Logo a seguir à Pfizer, J&J e GSK, surgem como maiores investidoras no sector
farmacêutico, a Sanofi-Aventis, a Roche, a Novartis, a Merck, a AstraZeneca, a Amgen e a
Eli Lilly (European Commission, 2007).
O relatório da Comissão Europeia compara ainda os gastos em I&D e as vendas anuais das
empresas. Entre as grandes empresas farmacêuticas, a Amgen e a Merck são as que gastam
uma maior proporção das suas vendas em I&D (mais de 20 % cada). Houve uma melhoria
em geral, na performance das empresas. As vendas das empresas da União Europeia
cresceram 10% e as empresas dos Estados Unidos e Japão cresceram 8%. Os lucros das
empresas da União Europeia (11,6%) situaram-se entre os lucros dos Estados Unidos
(12,9%) e o Japão (7,4%) (European Commission, 2007).
As empresas de sucesso da indústria farmacêutica inovam e fazem Investigação e
Desenvolvimento em tempo útil e de forma eficaz. Para esta indústria, a maior parte dos
lucros e do valor da organização depende da actividade de I&D (Achilladelis & Antonakis,
2001; European Commission, 2004; Quere, 2003; Schmid & Smith, 2005).
De notar, também, que esta actividade é mais próxima da investigação fundamental.
Comparativamente com outros sectores de actividade, a indústria farmacêutica tem um
número elevado de invenções e patentes que foram desenvolvidas em ambiente
empresarial, e uma experiência de investigação e desenvolvimento de mais de 200 anos
(Quere, 2003).
O volume da informação gerada no processo de I&D da indústria farmacêutica tem
aumentado exponencialmente, devido à utilização das novas técnicas de desenvolvimento
de medicamentos. Em muitos casos, a cooperação com as empresas de biotecnologia é
62
necessária10 para facilitar a descoberta de novos compostos e a investigação faz-se
recorrendo à cooperação entre os químicos e os especialistas em biologia molecular. Esta
aprendizagem interdisciplinar leva à descoberta de novos métodos de trabalho, novas
técnicas, novos equipamentos etc. (Orsenigo, Pammolli, & Riccaboni, 2001).
10 Necessária, apesar de não ser muito fácil, porque as empresas farmacêuticas, com as suas estruturas pesadas e competências especializadas, tem dificuldades em absorver e utilizar o conhecimento associado com as técnicas da biotecnologia (Achilladelis & Antonakis, 2001; Quere, 2003).
63
5.2. A DINÂMICA DA INOVAÇÃO TECNOLÓGICA NA INDÚSTRIA
FARMACÊUTICA
A indústria farmacêutica apresentou um recorde de fortes inovações ao longo de 200 anos
de história, considerando os 1736 novos medicamentos entre 1800 e 1990 (Achilladelis &
Antonakis, 2001)11. Desde o seu estabelecimento até hoje, tem mantido uma próxima e
frutuosa relação com instituições de investigação académica, em química, farmacologia,
ciências da vida e medicina.
A sucessão das tecnologias não criou ondas de destruição criativa, mas muita agitação, isto
porque as empresas líderes foram flexíveis o suficiente para se adaptar às exigências dos
novos regimes e ainda para prosperar através deles. Foi criado um negócio florescente e
extremamente lucrativo, a partir de algumas das suas inovações que se tornaram nomes
familiares por quase um século e outras que afectaram profundamente a natureza, a
estrutura e as morais da sociedade (Achilladelis & Antonakis, 2001).
Apenas 30 empresas introduziram 70% do total de inovações. A maior parte delas estão na
área há cerca de um século, apesar das revolucionárias mudanças do ambiente competitivo
da indústria farmacêutica, causado pela introdução de sucessivas gerações tecnológicas.
Apesar da necessidade universal de medicamentos, há uma grande concentração do
segmento de inovação da indústria farmacêutica em 5 países, nomeadamente nos EUA,
Alemanha, Suiça, Reino Unido e França (Achilladelis & Antonakis, 2001).
11 O estudo é, em primeiro lugar, baseado na identificação e avaliação das inovações de produtos da indústria farmacêutica, que foram comercializados entre 1800 a 1990. Os Novos medicamentos incluem novas entidades químicas (NECs), i.e. diferem na composição e estrutura química. As misturas ou outras formulações de NECs não foram incluídas. Os autores deste estudo concluíram a partir de outros estudos prévios (Achilladelis et al., 1987; Achilladelis, 1993), que todas as inovações de um sector industrial ou subsector são essenciais se queremos chegar a conclusões sobre a dinâmica da IT. Com esse propósito foram identificadas todas as inovações (1736) de 16 subsectores da indústria farmacêutica descritos na Martindale´s Pharmacopeia (Reynolds, 1989), que contou com cerca de 80% de todos os subsectores. A estrutura química e composição de cada medicamento foram obtidas através da USAN e USP Dictionary of Drug Names (Fleeger, 1994); as marcas, as empresas inovadoras e os anos de comercialização foram obtidos através do cruzamento de dados das referencias anteriores com o World Pharmaceutical Directory (Anon, 1991). Para assegurar contra a omissão de importantes medicamentos, foram cruzadas as listas de dados com a USA Food and Drugs Administration´s (FDA); Center for Drug Evaluation and Research (U.S. Department of Health and Human Services, 1989) “AMA Drug Evaluations”; e com o livro de Sneader (1996) “Drug
Prototypes and their exploitation”, que descreve cerca de 1300 medicamentos. Por isso, apesar de ter obrigatoriamente de existir omissões, os dados foraam considerados apropriados para a investigação e análise.
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5.3. FORÇAS CONDUTORAS DA INOVAÇÃO TECNOLÓGICA (IT)
NA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA
As inovações são difíceis de identificar e avaliar com certeza. Algumas foram usadas para
a produção de um ou poucos produtos de modo que o produto da inovação cobre
indirectamente o processo também. Além disso as inovações de processo também são
comercializadas porque as empresas licenciam o seu processo, a não ser que licenciem o
produto correspondente.
A IT envolve incerteza tecnológica / científica e comercial, e por consequência, a aceitação
de riscos financeiros por parte de instituições públicas e privadas. Por isso é essencial
identificar as forças científica, tecnológica, social e económica que levaram a indústria
farmacêutica ao longo da sua longa história a descobrir, desenvolver e comercializar novos
medicamentos. Apesar da incerteza inerente aos processos da IT, muitas empresas no virar
do século XX, aceitaram incorrer no risco financeiro porque concluíram que podiam a
partir daí obter lucros, movidas por forças sociais e económicas que as levaram a inovar.
No entanto, as ITs também foram introduzidas em países socialistas, ou quando o sistema
capitalista era muito recente, e as empresas intensivas em investigação não existiam, assim
como o caso da indústria farmacêutica, na maior parte do século XIX. Nesta altura as
forças que operaram foram de carácter não financeiro. Cientistas individuais, engenheiros,
físicos, instituições, tais como as universidades, hospitais públicos e privados,
organizações de cuidados de saúde sem fins lucrativos, descobriram e desenvolveram
novos medicamentos e tornaram-nos disponíveis ao público. Estas forças foram efectivas
pelas suas características da relação não comercial com a IT, nomeadamente a sua
dependência no avanço científico, indivíduos criativos e o reconhecimento de necessidades
sociais, em vez da procura de mercado, da concorrência comercial e do lucro.
A ciência e a tecnologia por um lado, o mercado por outro, são consideradas as principais
forças condutoras da IT e muitos académicos argumentaram a favor de umas e de outras
(Schmookler, 1976; Mowery and Rosenberg, 1979; Walsh, 1984). Para os economistas, em
particular, este conceito acomodou o tratamento de todos os parâmetros sob a procura de
mercado, deixando a ciência e a tecnologia como uma externalidade.
65
Dada a complexidade do processo de IT, este conceito tem um fraco poder explicativo,
olhando a explicação de factos históricos e é inadequado para o suporte da teoria da
dinâmica da IT. Por isso, outros autores optam por uma explicação multifacetada de mais
factores explicativos (Dosi et al., 1988; Mokryr, 1990; Porter, 1990).
Para estudar as forças condutoras que levam as empresas à IT, Achilladelis & Antonakis
(2001) estudaram vários casos práticos. No projecto SAPHO examinaram os factores que
estavam associados ao sucesso e ao fracasso na inovação industrial (Freeman et al., 1971,
1972) e no projecto “Inovação e a empresa na indústria química” estudaram as dinâmicas
da IT incluindo as forças que conduziram à Inovação (Achilladelis et al., 1982, 1990).
Foram identificadas 7 forças:
- avanços científicos e tecnológicos (externos à instituição inovadora);
- matérias-primas (disponibilidade e escassez);
- procura de mercado (avaliada por empresas antes da decisão de prosseguir com o
desenvolvimento de uma inovação);
- concorrência (resposta aos avanços científicos / técnicos / comerciais levados a cabo
pelas empresas concorrentes);
- necessidades sociais (que não podem ser avaliadas em termos de procura de mercado
anterior à decisão de prosseguir com o desenvolvimento de uma inovação);
- legislação governamental (legislação que afecta a I&D e o panorama concorrencial
de um sector industrial);
- especialização científica, tecnológica e de mercado da empresa (uma empresa ter
introduzido no passado inovações baseadas na ciência relacionada, tecnologia e
mercados) (Achilladelis & Antonakis, 2001).
As primeiras 6 forças são ambientais e afectam todas as empresas intensivas em I&D.
Segundo Landes (1970) são estes os factores responsáveis pela mudança técnica desde a
Revolução Industrial. A última é específica da empresa, exerce uma influência enorme no
recorde de inovações da empresa ao longo dos períodos de tempo.
66
5.3.1. Inovações Radicais Versus Inovações Incrementais
O critério para determinar a Originalidade de uma inovação na Indústria Farmacêutica,
deve ser baseado na composição química, acção terapêutica e eficácia, tempo de
comercialização e a extensão pela qual foi imitada (Achilladelis & Antonakis, 2001).
As origens dos novos produtos e novos processos são frequentemente descobertas
(revelações de novos conhecimentos) ou invenções (dispositivos, aparelhos ou processos
originários depois do estudo e experimentação). O termo Inovação Radical (IR) é às vezes
aplicado só para inovações que fizeram nascer novos sectores da indústria, por exemplo a
morfina (o primeiro alcalóide), o ácido ascórbico (o primeiro anticéptico), etc. Outros
autores (Freeman et al., 1982) usaram o termo IR em sentido mais amplo, incluindo
também inovações que alargaram a gama e mercados de sectores actuais, através da
aplicação ou introdução de novos princípios científicos, tecnologia ou materiais e, tendo
deslocado ou competido com sucesso contra produtos ou processos já no mercado, que
serviram de modelos para outras inovações. Por exemplo o VERONAL tem 32 imitações.
No estudo de Achilladelis & Antonakis (2001) é utilizado o termo IR neste sentido mais
vasto.
O termo Inovação Incremental é aplicado a inovações no modelo de produtos ou processos
existentes com diferenças triviais na ciência, tecnologia, materiais, composição e
propriedades e que, por causa disso não permitem gama para mais inovação por imitação.
Estas inovações são importantes na difusão de tecnologias entre empresas e países.
5.3.2. O efeito dinâmico da IR
As inovações altamente originais provocam o estabelecimento de novos sectores ou
subsectores industriais e contribuem para a difusão da tecnologia. A indústria farmacêutica
não é uma excepção a esta regra.
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5.3.2.1. As IR e o avanço da ciência e da tecnologia
Até meados do séc. XVIII, os cientistas dedicavam-se à classificação das espécies em
animais, vegetais e minerais. Quando os inventores passaram a transformar química e
fisicamente as propriedades dos materiais e a introduzir novas formas de energia, os
cientistas passaram a interessar-se também por fenómenos de mão-de-obra humana. A
partir daí a ciência e tecnologia ficaram ligadas, de modo que além dos seus mecanismos
tradicionais, o avanço científico é também influenciado por forças económicas e sociais.
Na maior parte do século XIX e até mesmo hoje, os investigadores académicos
responsáveis pelas IR deixaram o seu desenvolvimento a outros e seguiram as suas
carreiras académicas, como foram por exemplo, os físicos e académicos que descobriram
os primeiros anestésicos, hipnóticos e anticépticos. No entanto, outros viram as
oportunidades comerciais e criaram empresas para desenvolver as suas aplicações
comerciais. Algumas foram as primeiras intensivas em I&D, como por exemplo a Merck
(alcalóides).
Com o crescimento das economias capitalistas na segunda metade do séc. XIX, as
empresas desenvolveram e comercializaram as descobertas académicas. As empresas
passaram a contratar os cientistas académicos líderes, e depois passaram a financiar
projectos de investigação nas universidades e politécnicos, e terminaram por organizar
laboratórios de I&D internamente. Estas actividades criaram sinergias entre os interesses
académicos e os industriais, que orientaram e aceleraram os efeitos na direcção e avanço
tanto da ciência e da tecnologia.
As II têm um papel muito importante na difusão de tecnologias. É uma tarefa não dos
cientistas líderes mas de equipas de laboratórios industrias que já aderiram à IR e
pretendem aumentar a sua posição. Muitas delas são até superiores à IR.
Pode também acontecer de uma descoberta não ter lugar no mercado, apesar de ter
interesse científico ou terapêutico, acaba por não ter suporte financeiro da indústria. O
progresso destes casos segue o ritmo do avanço científico. É o exemplo da penicilina que
foi descoberta em 1928 e a sua realização como um antibacteriano efectivo foi em 1941.
68
5.3.2.2. As IR e a performance de mercado
A Performance do mercado farmacêutico é medida pelo sucesso comercial das inovações
farmacêuticas. Esta é mais fácil de medir do que em outros sectores, devido à existência de
relatórios governamentais. Sobretudo a partir de 1970 os relatórios IMS começaram a dar o
valor anual de vendas dos produtos farmacêuticos que se mantinham no mercado. Para os
produtos mais antigos foram usados os relatórios anuais das empresas e as
pharmacopoeias, que forneceram a informação sobre o período de tempo que os produtos
permaneceram no mercado. Também foi levado em conta o tempo da sua introdução,
assim como o valor das vendas de muitos produtos de sucesso entre 1950-1960.
Apenas uma forte relação positiva entre originalidade e lucro pode manter a cooperação
entre os centros académicos de excelência e os laboratórios industriais e o emprego de
cientistas de fora e engenheiros da indústria (Achilladelis & Antonakis, 2001).
Esta relação entre originalidade e sucesso no mercado é a maior preocupação do gestor da
I&D de uma empresa. Ele tem de ponderar entre seguir com o desenvolvimento de uma
especialização internamente, construir redes de cooperação com os líderes académicos,
enfrentar as incertezas tecnológicas e financeiras de um projecto para tentar obter uma IR,
ou então, pelo seguir um concorrente líder, esperando através de um modesto investimento
em pessoas e meios, um melhoramento de um produto ou processo existente mais lucrativo
(Achilladelis & Antonakis, 2001).
Existe uma relação estatística significante e positiva entre a originalidade e o sucesso
comercial, e a trivialidade com a modesta performance de mercado ou fracasso. As IRs que
representam cerca de 20%, têm maior probabilidade de terem sucesso de mercado. Apenas
10% tiveram fraca performance de mercado ou falharam (Achilladelis & Antonakis, 2001).
5.3.3. A difusão da tecnologia: IR, PT e TT
A história de 200 anos de inovação da indústria farmacêutica é única em produção. Para
identificar a dinâmica e os mecanismos pelos quais manteve um quase contínuo percurso
69
para inovar por um período tão longo, Achilladelis & Antonakis (2001) examinaram as
características da distribuição ao longo do tempo das IRs e IIs por sector terapêutico e
identificaram as características das inovações que serviram os paradigmas tecnológicos
(PTs) e as trajectórias tecnológicas (TTs) que geraram. O conjunto dos PTs e das TTs
deram origem a 5 gerações sucessivas de medicamentos que mantiveram vivo o percurso
da indústria pela inovação.
Ordenando cronologicamente os PTs pela ordem das 5 gerações consecutivas de
medicamentos, é possível obter as TTs divididas em 4 estágios diferentes (Achilladelis &
Antonakis, 2001):
- A juventude caracterizada pelas poucas, na maioria, IR. Entre 1820 e 1880:
alcalóides (morfina e quinino) e químicos orgânicos (éter).
- O crescimento caracterizado por um maior número de empresas inovadoras e de
inovações, muitas das quais foram sucessos comerciais porque os mercados se
expandiram. As empresas concorrentes tratavam de melhorar a eficácia terapêutica
do medicamento, retirar efeitos secundários, desenvolver melhores processos de
produção e vencer as barreiras das patentes. Ocorreu entre 1880 e 1930.
- A maturidade é o estágio em que o número de inovações introduzidas anualmente
atinge e ultrapassa o seu pico. A maioria das inovações eram incrementais e por isso
o potencial da tecnologia foi explorado. Dependendo do potencial do mercado,
algumas tornaram-se sucessos comerciais. Em muitos casos as patentes expiraram
neste estágio facilitando a entrada de empresas menos especializadas. A modesta
performance comercial pode ser atribuída ao seu lançamento num período em que os
medicamentos líderes estavam bem estabelecidos no mercado e era difícil deslocar a
procura por novos produtos, muitos dos quais não ofereciam vantagens terapêuticas
substanciais. Decorreu entre 1930 e 1960.
- O estágio declínio caracteriza-se por uma redução drástica do número de inovações,
pela ausência de IRs e de sucessos de mercado. A sua duração depende do tamanho
do mercado, da força das Corporate Technology Traditions das empresas inovadoras
originárias e do número de empresas pouco intensivas em I&D. Decorreu entre 1960
e 1980.
70
5.4. A EMPRESA FARMACÊUTICA COMO INSTITUIÇÃO
INOVADORA DE CORPORATE TECHOLOGY TRADITIONS (CTT)
Normalmente as empresas não investigam indiferentemente, mas sim, em áreas dos seus
conhecimentos e aptidões (Pavitt, 1984). As empresas intensivas em investigação
respondem a estímulos externos através do investimento em capitais para o
desenvolvimento de novos produtos e processos, em antecipação a retornos consideráveis
da sua comercialização.
As IRs são mais frequentemente sucessos comerciais do que as IIs, e mais lucrativas. Por
isso, as empresas inovadoras podem despender mais em I&D para perpetuar a sua
vantagem perante a concorrência que introduz IIs (Achilladelis & Antonakis, 2001). A
introdução de IRs com sucesso comercial provoca um efeito de orientação no avanço
científico e tecnológico, reforça a procura de mercado e incentiva a concorrência. Esta é
uma importante razão para que cada vez mais empresas se especializem em ciência,
tecnologia e mercados.
O sucesso comercial de uma IR é uma poderosa força condutora interna, que influencia
fortemente a subsequente I&D, a inovação e os mercados. Foi apelidada de CTT
(Achilladelis, 1973; Achilladelis et al., 1987, 1990) e define-se como a especialização de
uma empresa na tecnologia, a sua sub ciência e os mercados dos produtos que daí derivam,
accionado por um sucesso comercial de uma IR e seguida pela concentração de recursos, a
especialização das suas equipas e a introdução de inovações relacionadas durante um longo
período de tempo entre 20 a 40 anos.
5.4.1. CTTs, TTs e a condução das grandes ondas
Apesar de muitos laboratórios de produção e empresas farmacêuticas se terem unido ao
longo de 200 anos de história da indústria farmacêutica, quase todas as grandes empresas
dos dias de hoje, estão no mercado há um século, o que significa que ultrapassaram as
crises associadas às tecnologias. O facto de conseguirem conduzir as grandes ondas,
71
relaciona-se com o facto de serem empresas multi-produto, tanto dentro como fora da
indústria farmacêutica, não dependentes de apenas uma TT (Achilladelis & Antonakis,
2001).
A diversificação horizontal feita pela maioria das empresas intensivas em investigação foi
levada a cabo pela sua própria investigação, mas também pela onda de fusões e aquisições
(F&A) de companhias com CTT em mercados terapêuticos complementares. Esta política
foi adoptada nos anos de 1940 a 1950 e particularmente entre 1980 a 1990 como
demonstrado pelas super fusões, que criaram companhias globais com uma ampla margem
de mercados terapêuticos.
Muitas empresas da indústria farmacêutica foram estabelecidas como ramos da química e
tintas e foram desde o início membros de empresas multi-produto beneficiando em
períodos de turbulência, causados pela sucessão das grandes ondas, dos cash flows gerados
pelo negócio da química das empresas originárias. Mas só foi possível até aos anos 70,
pois, de seguida, a indústria química começa a declinar. Outras empresas que começaram
como boticários de produção (a maioria das americanas), mantiveram-se entre as guerras e
no início do período pós guerra, com medicamentos over-the-counter (OTC), cosméticos e
de higiene pessoal. Mas este negócio era modesto quando comparado com o da química e
farmacêutica. Por isso as empresas americanas iniciam o processo de F&A no início dos
anos 60 numa série de sectores. Este negócio apesar de menos intensivo em I&D, e menos
lucrativo do que a indústria farmacêutica, levou as empresas americanas a elevadas taxas
de crescimento. Esse retorno elevado permitiu às empresas farmacêuticas crescer e
aumentar a sua despesa em I&D e inovação, num momento em que tiveram de enfrentar
importantes barreiras tecnológicas. Esta diversificação permitiu às empresas americanas
ultrapassar o período de 1960-1980 e chegar ao período de 1980 a 1990 em que a indústria
farmacêutica garantia já tanto crescimento como lucros (Achilladelis & Antonakis, 2001).
Existem também inovações independentes da TT. Cerca de 70% ou menos estão
relacionadas com o mercado terapêutico que deu origem a essa TT.
Apesar da queda das patentes, e de muitas empresas produzirem e venderem genéricos, a
empresa da inovação original mantém uma fatia considerável do mercado. Isto porque
72
existe a familiaridade do consumo associado ao nome de marca e a experiência do médico
com o produto (Achilladelis & Antonakis, 2001).
5.4.2. As grandes ondas, a Inovação e as despesas de I&D das maiores
empresas farmacêuticas americanas
A indústria farmacêutica é um dos sectores mais lucrativos da produção. Ter I&D própria e
a inovação é o trajecto de excelência para as empresas farmacêuticas terem lucro e
crescerem em tamanho (Achilladelis & Antonakis, 2001; Busfield, 2003).
As maiores empresas hoje, foram as que mais inovaram desde 1930, e entre elas, algumas
eram as mais inovadoras desde o virar do século XX. A Merck e a Lilly destacam-se entre
as empresas americanas como as de recorde de inovações. Os takeovers por parte de outras
relacionam-se com: as incertezas dos projectos, melhorias associadas às sucessivas
gerações dos medicamentos, a inércia relacionada com a CTTs e o sucesso dos
concorrentes, combinados com esforços frustrados de empresas em manter taxas de
crescimento através da inovação (Achilladelis & Antonakis, 2001).
As empresas com grande despesa em I&D mostraram crescimento e as outras estagnaram
ou desapareceram, muitas destas últimas foram tomadas em takeovers.
A percentagem de I&D em relação às vendas vai de 7,3 a 10,7 para as empresas de vendas
de produtos éticos, e de 2,9 a 6,9 para as empresas que mais diversificam (considerando o
período de análise de 1800 a 1930). As grandes empresas farmacêuticas conseguiram
sobreviver às melhoras associadas às sucessivas gerações de tecnologias de medicamentos:
pelo seu forte compromisso com a I&D e a inovação, pelo lucro dos novos produtos, pelo
desenvolvimento de CTTs, e pela sua adaptabilidade ao ambiente concorrencial em
mudança. Esta adaptabilidade ao mercado foi accionada por mudanças estruturais
drásticas, incluindo as F&A. A relação forte relação entre cash flows e gastos em I&D,
combinadas com o facto do custo médio em I&D de um novo produto ser da mesma
proporção entre as empresas grandes, conta para o forte recorde de inovações destas
73
grandes empresas, ao contrário do que acontece com os pequenos concorrentes (mesmo
que estes sejam mais intensivos em investigação, isto é, mesmo que gastem maior
percentagem do seu retorno em I&D.
74
5.5. A VANTAGEM COMPETITIVA DA INDÚSTRIA
FARMACÊUTICA NACIONAL
As tecnologias desde o século XVIII são na sua maioria dos países da Europa Ocidental,
dos EUA e do Japão e o avanço tecnológico foi liderado com sucesso pelo Reino Unido,
Alemanha, EUA e Japão. No caso da indústria farmacêutica, os EUA, a Suiça, Alemanha,
o Reino Unido e a França contribuíram com mais de 80% de todas as inovações. As suas
exportações excederam 60% o comércio mundial e eram os países originários de quase
todas as empresas de inovação.
A vantagem competitiva das indústrias nacionais tem sido estudada em várias áreas
(Bernal, 1954; Servan-Schreiber, 1968; Landes, 1970; Mokyr, 1990; Porter, 1990), e foi
atribuída a vários factores incluindo: um sistema de ensino superior mais forte, força de
trabalho abundante e bem preparada, presença de empresas intensivas em investigação e
indústrias de suporte, uma forte procura de mercado interna e o preço relativo dos factores
de produção.
A geografia do avanço tecnológico e a vantagem competitiva das indústrias nacionais
foram determinadas em considerável extensão pelas intensidades e sinergias das forças
condutoras da IT, que à parte das suas flutuações ao longo do tempo, são fortemente
influenciadas pelas envolventes nacionais.
As forças condutoras poderão ser agrupadas da seguinte forma:
- Avanço científico: a indústria farmacêutica depende do avanço das disciplinas de
medicina, fisiologia, química orgânica, farmacologia, bacterologia, biologia,
enzimologia, biologia molecular, e por esta dependência as empresas inovadoras
estão estabelecidas em países com sistemas académicos robustos, escolas de
investigação (Geison, 1981) e outras instituições que detiveram a sua atenção nestas
disciplinas.
- Legislação governamental – a indústria farmacêutica é a mais regulada de entre a
produção devido à importância do medicamento para a saúde pública, sistemas de
seguro de saúde públicos. As regulamentações de práticas de gestão da empresa,
75
preços estabelecidos pelo Estado, medidas de protecção internas, legislação de
patentes, regulamentos de provação e testes de novos produtos, e o Welfare State,
positiva ou negativamente contribuem para o crescimento e competitividade da
Indústria Farmacêutica nacional.
- Necessidades sociais.
- Procura de mercado – um forte mercado interno pode criar vantagens competitivas
para a indústria nacional (Porter, 1990), mas no caso da indústria farmacêutica, isto
apenas aconteceu nos EUA.
- Matérias primas – o acesso a plantas medicinais (no séc. XIX) e químicos orgânicos
derivados do alcatrão criaram vantagens competitivas à indústria francesa, britânica,
e alemã.
- Concorrência, empresas intensivas em I&D e CTTs – as inovações passam as
fronteiras nacionais antes de terminar a patente através do licenciamento ou da
intervenção governamental (que aconteceu com a penicilina). Quando muitas das
empresas pelas suas CTTs cobrem a quase totalidade das classes terapêuticas de um
país geram-se fortes sinergias (caso da Alemanha e dos EUA).
A partir deste capítulo pudemos concluir que a I&D tem um peso particularmente
importante na Indústria Farmacêutica, que foi de todos os sectores o que mais investiu em
I&D (com 19,3% de quota de I&D no global dos sectores). Da mesma forma, a intensidade
de I&D foi muito superior na Indústria Farmacêutica do que em qualquer outro sector
(15,9%). A Indústria Farmacêutica é única em inovações, em 200 anos de história
conseguiu 1736 novos medicamentos, que originaram trajectórias tecnológicas. As
empresas que fazem I&D seguem as suas tradições tecnológicas nas decisões de
Investimento em I&D.
No próximo capítulo veremos a tendência da I&D e da Inovação, onde se localiza, quem
lidera este investimento e as principais alterações.
76
6. TENDÊNCIAS DA INOVAÇÃO E I&D NA INDÚSTRIA
FARMACÊUTICA MUNDIAL
Neste capítulo estudaremos as tendências da inovação e I&D na Indústria Farmacêutica
mundial, nomeadamente as alterações aos modelos de I&D, o investimento realizado e a
sua repartição a nível mundial, os novos mediamentos e as empresas líderes em I&D.
A indústria farmacêutica é uma das maiores contribuintes privadas para fundos de I&D a
nível mundial. O investimento farmacêutico das empresas alcançou os 56 biliões de
dólares em 2005. Este valor tem crescido cerca de 6% anualmente desde 1995 e prevê-se
que continue a crescer nos próximos anos (The Economist, 2005)12.
A I&D na Indústria Farmacêutica está focada no desenvolvimento de novas formas de
tratar a doença, através do desenvolvimento de medicamentos, que podem ser da categoria
das entidades químicas ou biológicas. Ao falarmos de entidades biológicas estamos a falar
de entidades que surgem da investigação através da biotecnologia, enquanto as Novas
Entidades Químicas (NEQs) surgem da Investigação farmacêutica tradicional.
No entanto, apesar do aumento dos investimentos em I&D, o número de NEQs tem
diminuído (European Commission, 2007; EFPIA, 2007).
Durante os anos 90, entraram no mercado um grande número de moléculas blockbuster13,
que foram responsáveis pelo crescimento de cerca de 80% das receitas das vendas nas
décadas seguintes. No entanto, à medida que as patentes destes blockbusters expiraram, ou
se aproximam da data de expirar, estes passam a ser concorrentes dos genéricos e das
variantes me-too14
. Por isso, as vendas começam a diminuir levando as empresas a
procurar novos medicamentos para reforçar a pipeline. As mudanças a nível tecnológico e
de outros níveis levaram a que os medicamentos em desenvolvimento apontem cada vez
mais para um segmento muito pequeno da população. Com cada vez menos blockbusters a
12 The Economist, 2005, 'Pharmaceutical Industry Survey', The Economist, 16 June 2005. 13 Produtos que conseguem obter em vendas anuais mais de mil milhões de dólares. Normalmente são produtos inovadores e protegidos por patentes. 14 Produtos que seguem as inovações radicais e ajudam a melhorar certos componentes, como a forma de administração ou a posologia. São muitas vezes associados à inovação incremental e a trajectórias de inovação existentes.
77
surgir na pipeline farmacêutica nos próximos anos, apesar do investimento em I&D estar a
aumentar, prevê-se que as receitas e lucros na Indústria Farmacêutica venham a diminuir.15
Descoberta de Medicamentos Versus Investimento em I&D
Farmacêutico Actual e Previsto
0
10
20
30
40
50
60
70
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
Novas Moléculas no 1º ano delançamentoDespesa Global de I&D da IndústricaFarmacêutica ( Biliões de Dólares)
Figura 12 – Evolução do Investimento em I&D e Novos Medicamentos
Fonte: CMR International and the Economist, 2005, Pharmaceutical Industry Survey, The Economist, 16 June 2005
Enquanto o investimento em I&D quase duplicou entre 1996 e 2003, o número de novos
medicamentos aprovados caiu de 62 em 1996 para 35 por ano em 2003. (Rasmussen,
200416)
Por um lado, a descoberta do mapa do genoma humano não provocou a rapidez na
inovação que se esperava, dada a complexidade do genoma. Por outro lado, o tamanho da
população para os candidatos a medicamentos está a diminuir à medida que a tecnologia
melhora, e há cada vez mais fast followers a entrar no mercado. Tudo isto levou à queda
gradual do modelo de blockbusters. O abrandamento no desenvolvimento dos produtos,
atenuando os seus ciclos de vida e esmagando o tamanho do mercado, tem mantido todas
15 The Boston Consulting Group, (2004), “Rising to the Productivity Challenge: A Strategic Framework for Biopharma”, May. 16 Rasmussen, B., (2004), “Aspects of the Pharmaceutical Business Model: Implications for Australia”, Draft Working Paper No 15, Centre for Strategic Economic Studies
78
as companhias farmacêuticas sob intensa pressão para optimizar a eficiência e a
produtividade do total do investimento em I&D. O resultado disto tem sido o estreitamento
da linha de produtos em desenvolvimento, assim como um crescente grau de acordos in-
licensing e de alianças de I&D. Neste sentido as empresas farmacêuticas têm vindo cada
vez mais a subcontratar serviços de I&D.
79
6.1. ALTERAÇÕES AOS MODELOS DE I&D
Ao contrário do modelo tradicional de investigação farmacêutica, as empresas
farmacêuticas têm procurado cada vez mais parcerias externas para a I&D, tais como, com
empresas de biotecnologia intensivas em investigação, universidades e institutos médicos
de investigação.
O crescimento da tecnologia baseado na genómica tem sido um condutor desta tendência e
prevê-se que estas tecnologias e estes pequenos players sejam uma importante fonte das
novas moléculas farmacêuticas (Biotecnologia). Dependendo da estratégia da empresa, as
empresas grandes fazem alianças com outras empresas (tais como acordos in-licensing) ou
adquirem-nas.
As empresas farmacêuticas disponibilizam os fundos e o conhecimento técnico, sem os
quais as pequenas empresas não seriam capazes de preparar um novo medicamento. Por
um lado, as empresas farmacêuticas estão a aumentar as parcerias de inovação externas,
mas por outro lado, irão continuar a manter a sua investigação dentro de portas. Estima-se
que o rácio de investigação interna / externa passará de 90/10 como se observava nos anos
90 para um rácio de 70/30 em 201017.
Na fase de desenvolvimento do medicamento, há uma tendência crescente para a
subcontratação da fase clínica (Ensaios clínicos). Dado que o número de centros de
investigação necessário é elevado e se espera que os pacientes sejam difíceis de identificar,
as empresas farmacêuticas tendem a contratar este trabalho a uma organização que possa
completar este trabalho de uma forma mais eficiente.
Um outro factor que pode afectar o desenvolvimento da Indústria Farmacêutica é o facto
de existir uma certa concorrência entre governos de vários países para atrair o
investimento. Países como os Estados Unidos, a Irlanda e Singapura, têm oferecido um
conjunto de incentivos para atrair as empresas capital-intensivas em investigação. Estes
incentivos têm tido impacto em algumas decisões de investimento, nomeadamente em
investimento de produção ou decisões de reinvestimento.
17 The Allen Consulting Group, Drivers of Pharmaceutical Industry Investment, September 206
80
As mudanças na indústria resultantes do declínio do modelo de negócio de blockbusters
têm-se reflectido em alterações dos padrões de investimento: os investimentos em
produção e em ensaios clínicos passam a ser aplicados em várias localizações a nível
global; há uma contínua consolidação dos investimentos em I&D maioritariamente nos
Estados Unidos, em paralelo com crescentes oportunidades de colaboração das grandes
empresas com terceiras organizações, numa parte da Investigação.
Desde 1990 até 1996, todas as alianças entre as grandes empresas farmacêuticas e as
empresas de biotecnologia e universidades cresceu a uma taxa de 22,7% ao ano. No
entanto, esta tendência abrandou para 3,1% ao ano entre 1996 e 2001. Apesar do in-
licensing continuar a ser uma tendência actual na I&D das empresas farmacêuticas, as
empresas farmacêuticas irão continuar a colocar o seu focus na sua própria investigação
interna. Este facto explica-se por várias razões: assim têm um maior controlo sobre a
investigação; as empresas grandes conseguem mais facilmente recrutar os melhores
talentos; e o conhecimento intrínseco dos seus registos e experiências em áreas de
especialização tornam a competição dos parceiros externos contra o pipeline interno muito
difícil.
De acordo com um estudo feito em 2001 às 10 maiores empresas farmacêuticas com filial
na Austrália18, sobre as escolhas nas decisões de investimento em I&D, conclui-se que os
factores mais importantes nesta decisão são os recursos humanos e as infraestruturas e o
factor menos importante é a localização geográfica.
Estas conclusões vêm confirmar a noção de que as decisões de I&D se baseiam na procura
de ideias (quando se considera que 72% do investimento é dispendido em fracassos).
Torna-se claro que o primeiro critério é a capacidade dos investigadores em identificar
eficientemente medicamentos alvo ou candidatos, de elevado valor. Isto leva a que as
regiões de elevada performance sejam as mais propensas a continuar a atrair a maioria do
capital investido no curto e médio prazo. Neste sentido, o resultado deste estudo explica os
actuais padrões de investimento, dado que a maioria do investimento continua a seguir para
18 The Lewin Group, 2001, Analysis of Investment Decisions by the International Pharmaceutical Industry
and the Competitive Position of Australia, presented to the Pharmaceuticals Industry Action Agenda Working Group 2 ‘Strategic Factors and Decision Making for Investment’, December.
81
a investigação interna dos grandes laboratórios situados nos Estados Unidos e na Europa
Ocidental.
Esta tendência dos maiores investimentos em I&D estarem nos Estados Unidos e na
Europa Ocidental perto da sede destas companhias, resultado do tradicional modelo de
negócio, deve-se ao facto de que estes centros desenvolveram recordes em termos de
produtividade da I&D, relacionados com a capacidade de reciclar continuamente os seus
departamentos com investigadores talentosos e estarem construídos sobre infraestruturas
eficientes que suportam o processo de inovação.
No entanto, existe um aumento do trabalho partilhado com fontes externas, relacionado
com o elevado número de candidatos a medicamentos no pipeline, originários de pequenas
empresas de biotecnologia (67%)19. Também aqui o que importa às empresas é a procura
de inovações com qualidade. O investimento externo também depende da capacidade e
competências disponíveis. E a concorrência vai ocorrer entre I&D interna ou externa às
empresas. Devido aos tempos necessários no desenvolvimento de um medicamento, os
cientistas externos vão querer colaborar com os investigadores das grandes empresas, e por
isso os fundos serão repartidos pelas várias partes envolvidas.
O ambiente regulamentar é outro dos factores apontados como influente na decisão de
investimento em I&D. A incerteza nas leis e na sua aplicação ao processo de inovação é
um factor de afastamento da I&D.
Países como a Índia e a China, introduziram legislação sobre o processo de inovação para
atrair o investimento em I&D. No entanto, a Índia depois da introdução desta legislação em
Janeiro de 2005, é uma localização potencial de I&D, enquanto a China é vista como uma
localização a não seguir.
O sistema de impostos relativo aos investimentos em I&D e o apoio governamental para a
I&D também influenciam o fluxo de capitais e tornam-se significativos no investimento a
longo prazo.
19 The Boston Consulting Group, (2004), “Rising to the Productivity Challenge: A Strategic Framework for Biopharma”, May.
82
Concluindo, a disponibilidade de competências e infraestruturas para a investigação, com
uma base de investigação de elevada qualidade, são os factores de influência mais
importantes para este tipo de decisões de investimento. No entanto outras questões tais
como os incentivos financeiros ou um ambiente de impostos baixos e a atractividade do
mercado local será decisivo na escolha entre duas localizações com a mesma base
científica. 20
Os contratos de Outsourcing para a contratação de empresas de investigação têm
aumentado. Constitui cerca de 20% da investigação de medicamentos no mercado e
aumentou 18% entre 1990 e 2003.21 A expectativa de crescimento continua, tendo sido
previsto 29% do investimento em ensaios clínicos no ano de 2005 (Aoris Nova, 2003).
As empresas farmacêuticas procuram formas mais eficientes de gestão de informação e de
melhorar a colaboração entre grupos de investigação.
Actualmente, algumas das grandes empresas da indústria farmacêutica procuram resolver o
problema da baixa produtividade da Investigação e Desenvolvimento através de aquisições
de empresas concorrentes com medicamentos em fase final de desenvolvimento. Esta é,
contudo, uma solução temporária, pois o que interessa é aumentar a eficiência do processo
de Investigação e Desenvolvimento, reduzir o tempo até ao lançamento do produto no
mercado e aumentar o número de lançamentos de novos medicamentos no mercado por
ano (de um para três) (Achilladelis & Antonakis, 2001; Quere, 2003).
As empresas da indústria farmacêutica devem encontrar o justo equilíbrio entre a I&D feita
internamente, em cooperação22 ou externamente (sendo que neste último caso podem optar
por escolher parceiros internacionais, caso em que se diz que a I&D foi
internacionalizada). Devem identificar as actividades de I&D interna que trazem valor
acrescentado ou que tem importância estratégica e sub-contratar as restantes actividades e
20 The British Pharma Group, 2005, The British Pharma Group (BPG) on Competitiveness and Investment Criteria, prepared by GSK and AstraZeneca. 21 Aoris Nova, 2003, Advance Consulting and Evaluation and BioAccent, 2003, Australia’s Preclinical and
Scale-up Manufacturing Capabilities — A Comparative Analysis, prepared for the Department of Industry, Tourism and Resources, Canberra. 22 Quere (2003) realça que a cooperação pode estimular a inovação, por causa das oportunidades que podem surgir na combinação de conhecimento organizacional distinto. Quanto maior for a diferença entre as bases de conhecimento organizacional, maior o potencial da descoberta (Saur, 2005).
83
processos relacionados com Investigação e Desenvolvimento, inclusive I&D em curso23
(Cooke, 2006; O. Gassmann, Reepmeyer, & Zedwitz, 2004).
23 Por Investigação e Desenvolvimento em curso entende-se qualquer processo de Investigação e Desenvolvimento que tem sido iniciado internamente.
84
6.2. O INVESTIMENTO EM I&D E A SUA REPARTIÇÃO REGIONAL
O investimento do processo de I&D está concentrado sobretudo na fase de Ensaios
Clínicos (43,1%) sendo a Fase 3 destes ensaios a de maior investimento, totalizando 25,3%
do investimento do total do processo de I&D. De seguida a etapa do processo de I&D de
maior investimento é a dos Ensaios Pré Clínicos (25,7%) e por fim a fase IV de
Farmacovigilância (13,3%). Os restantes 11% de investimento são considerados como não
categorizados (PhRMA, 200724).
Há uma forte concentração do investimento em I&D nos EUA em relação à Europa, onde
até aos anos 90 se concentravam os maiores investimentos de I&D. Em 1992, o
investimento nas empresas europeias totalizava 10 biliões de dólares, enquanto nos EUA
era de 9 biliões de dólares. No entanto, no decorrer da década seguinte, o I&D nos EUA
aumentou 11% anualmente para 26 biliões em 2002, comparado com apenas 8% do
crescimento na Europa para 21 biliões de dólares.
Evolução do Investimento em I&D Farmacêutico
0
5.000
10.000
15.000
20.000
25.000
30.000
1990 1995 2000 2005 2006
Milh
ões
de E
uros
Europa
USA
Japão
Figura 13 – Evolução do Investimento em I&D na Europa, EUA e Japão
Fonte: EFPIA, PhRMA, JPMA
Desde os anos 90, a indústria farmacêutica baseada na Europa, tem vindo a perder
competitividade em relação aos seus principais concorrentes, em particular, os Estados
Unidos. Dados de 2004 e preliminares de 2005 confirmam a falta de atractividade como
24 Percentagens calculadas com dados de 2005.
85
local de investimento em I&D. Desde 1990 a 2005, a I&D nos Estados Unidos cresceu 4,6
vezes enquanto a Europa apenas cresceu 2,8 vezes. Hoje em dia há um rápido crescimento
no ambiente de investigação nas economias como a Índia e a China (EFPIA, 2006).
Figura 14 – Localização dos Laboratórios de I&D
Fonte: The Allen Consulting Group, Drivers of Pharmaceutical Industry Investment, September 2006
Alguns estudos sugerem que esta tendência é também em parte uma função dos cenários de
reembolso e preço na Europa. Estes estudos argumentam que enquanto o registo de
recordes das empresas europeias são excelentes, as empresas farmacêuticas procuram
investir em nações onde exista uma coerência entre a protecção dos preços dos produtos de
inovação e os apoios às actividades de I&D. Seria demasiado simplista atribuir a relativa
falta de atractividade da I&D farmacêutica a um único factor. Contribuindo para este
problema estão também a base científica, e as atitudes da sociedade relativamente às novas
tecnologias (EFPIA, 2006).
Os preços praticados nos EUA são cerca de 4 vezes superiores aos preços na Europa, e por
outro lado, as políticas de incentivos aos investimentos em I&D praticadas nos EUA, são
de fortes incentivos fiscais e de subsídios a fundo perdido para as empresas que praticam
I&D. Em 1990 os incentivos a fundo perdido concedidos pelos EUA às empresas que
praticavam I&D eram de 26%, cerca do dobro do que acontecia na Europa. Estes
incentivos foram diminuindo à medida que os resultados inovadores foram permitindo às
86
empresas liderarem a introdução de novos produtos e, com eles, o mercado global. Mas,
apesar disso, mantendo sempre incentivos superiores aos praticados pela generalidade dos
governos europeus (OCDE, 2003).
Os Estados Unidos ainda dominam o campo da biofarmacêutica, contando para os 3
quartos das receitas mundiais em biotecnologia e despesa em I&D. Em 2005 a América do
Norte contou para 47% das vendas mundiais farmacêuticas contra 30% na Europa. De
acordo com dados do IMS Health, 66% das vendas de novos medicamentos
comercializados desde 2001 são gerados no mercado americano, comparado com 24% do
mercado europeu (EFPIA, 2006; IMS, 2007).
Entre 1994 e 2004, o mercado americano cresceu a 12,5% ao ano, bem melhor que o
Europeu, média não ponderada de 7%. Estas evoluções do mercado têm benefícios
particulares para as empresas baseadas nos Estados Unidos, que aumentaram
significativamente a sua quota no desenvolvimento e vendas de novos medicamentos. No
entanto, em 2005, o mercado europeu ultrapassou o mercado americano em termos de
crescimento, pela primeira vez em mais de uma década (EFPIA, 2006).
Quanto à percentagem de investimento médio que uma empresa investe em I&D em
relação às suas vendas, a média passou de 15,6% em 1985 para 20,6% em 2000 e os
valores estimados para 2005, são de 17%25 (EFPIA, 2006).
25 Médias para os membros associados da EFPIA.
87
6.3. NOVOS MEDICAMENTOS - NOVAS SUBSTÂNCIAS ACTIVAS –
DISTRIBUIÇÃO A NÍVEL MUNDIAL
O principal objectivo da Indústria Farmacêutica é colocar à disposição da população novos
medicamentos que permitam aumentar a esperança de vida, tratar doenças e reduzir os
sinais da idade. São gerados lucros elevados durante o período de protecção de patente.
Esta indústria depende fortemente dos novos medicamentos para gerar a receita necessária
à prossecução do caro processo de desenvolvimento de um medicamento.
O custo de trazer para o mercado um novo medicamento aumentou de 54 milhões de
dólares em 1976 para uma estimativa de 802 milhões em 2001 (Bhattacharya, 2005).
O sucesso da I&D de novos medicamentos ajudou na luta contra anteriores doenças fatais
(Varíola, a tuberculose, sífilis, difteria e poliomielite) e impulsionou o progresso médico
no tratamento de infecções como o HIV-SIDA, Cancro, distúrbios do sistema nervoso,
úlceras gástricas, asma, e hipertensão, para citar apenas alguns exemplos. Desde que a
aspirina foi inventada há 1 século atrás, descobertas científicas e tecnológicas da indústria
farmacêutica, permitiram aos investigadores identificar doenças cada vez mais complexas
mais de perto, primeiro, explorando a bioquímica de tecidos, e, em seguida, por meio de
análise de células individuais. Através do mapeamento do genoma humano, a investigação
de hoje permitirá aos cientistas identificar as causas das doenças do homem enraizadas na
estrutura molecular.
Os investigadores esforçam-se por produzir NEQs de elevada qualidade que possam
potencialmente ser transformadas em medicamentos efectivos. No entanto, apesar do
aumento a cada ano dos investimentos em I&D, o número de NEQs tem diminuído
significativamente nos últimos anos. Para enfrentar este desafio, as empresas de
investigação procuram novas formas de gerir os processos e a informação e de promover a
colaboração entre equipas. Esta passagem de uma abordagem tradicional para um
processo de descoberta organizado e em linha é também chamado de “industrialização” da
descoberta do medicamento (Bhattacharya, 2005).
No ano de 2006 foram lançadas 31 NEQs nos principais mercados. A sua contribuição para
88
o crescimento do mercado farmacêutico pelos produtos lançados entre 2001 e 2005
atingiram os 13,5 biliões de dólares em 2006. Os produtos de mais elevado potencial
lançado em 2006 foi o Gardasil, a primeira vacina na prevenção do cancro cervical; o
Januvia, o primeiro oral da classe do tratamento dos diabetes tipo II (IMS, 2007).
O crescimento da pipeline de I&D continua forte, especialmente pelos produtos em Fase I
e II de Ensaios Clínicos. No final de 2006, havia cerca de 2075 moléculas em
desenvolvimento, mais 7% do que em 2005, e mais do que 35% em relação ao final de
2003. Além disso, um prometedor conjunto de medicamentos estão em Fase III de ensaios
clínicos ou no estado de pré-aprovação, incluindo 95 produtos de oncologia, 40 de
infecções do vírus HIV e 27 para a artrite e dor. Deste total 27% são resultantes da
biotecnologia (IMS, 2007).
Os EUA dominam o lançamento das Novas Moléculas. Mais de 50% das moléculas novas
são lançadas no mercado dos EUA (dados de 2005). Antes de 2005 eram lançadas apenas
35% das novas moléculas (IMS, 2007).
Quanto à origem de 30 novas moléculas, de acordo com os dados de 2005, 13 eram da
Europa, 9 dos EUA, 4 do Japão e 4 de outras origens (SCRIPT; EFPIA, 2006).
Desde 2002, são cada vez menos os lançamentos resultantes da biotecnologia, ao contrário
das projecções, de que estes iriam representar cerca de 50% (dados apresentados na Figura
15) (IMS, 2007).
89
Número de Novas Moléculas (NEQS) e Produtos Biotecnológicos
1 7 6 2 5 7 6 5 10 9 4 11 2 4 6 6
36
51
43
4040
4136
46 37
3228 26 24
28
4131
0
10
20
30
40
50
60
70
1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005
NEQs (Total : incluindo ProdutosBiotecnológicos
Produtos Biotecnológicos
Figura 15 – Evolução do Número de Lançamentos de NEQs
Fonte: EFPIA, 2007
6.3.1. Áreas Terapêuticas
Nos lançamentos de 2005, 17% das NEQs eram anti-infecciosos e medicamentos da área
do sistema nervoso central, enquanto os produtos para o cancro contaram 13% do total. Em
2004 o número de produtos para o cancro foi de 32% do total. Estima-se que o número de
anti -cancerígenos prevaleça elevado ou aumente, baseado no actual pipeline. (IMS, 2007)
6.3.2. Empresas Líderes em I&D
No ANEXO A podemos ver a lista das empresas que mais investiram a nível mundial em
I&D de acordo com a Publicação da Comissão Europeia em 2007. Na Figura 16 estão
representadas de acordo com o Script a lista de empresas apenas da Indústria Farmacêutica.
90
Despesa Total em I&D - Top Ten Mundial de Companhias
Farmacêuticas
2,7
3
3,4
3,8
3,8
4,8
4,8
5,4
6,3
7,4
0 1 2 3 4 5 6 7 8
W yeth
Lilly
AstraZeneca
F Hoffman-La Roche
Merck & Co.
Sanofi-Aventis
Novartis
GlaxoSmithKline
Johnson & Johnson
Pfizer
Biliões de Dólares
Figura 16 – Ranking das Empresas Farmacêuticas com maior Investimento em I&D (2005)
Fonte: Script Pharmaceutical Company League Tables 2006
A Novartis foi a empresa mais bem sucedida no que respeita aos lançamentos de 2005
(responsável por 3), e de seguida a Bayer com 2 lançamentos. A Novartis lançou o
Enablex (darifenacina) nos E.U. e na Alemanha, em Janeiro de 2005 e o Prexige (o
lumiracoxib) no Brasil em Agosto para o tratamento da osteoartrose aguda. A terceira NEQ
lançada pela Novartis foi o Exjade (deferasirox), lançado em Novembro para os E.U. em
tratamento crónico devido à sobrecarga de ferro nas transfusões sanguíneas. A Novartis
tem sido a mais consistente produtora de NEQs ao longo da última década.
Os lançamentos da Bayer foram licenciados para outras empresas. O Nexavar (sorafenib
tosylate), a co-desenvolvido com o Onyx, foi lançado nos EUA em Dezembro para o
carcinoma das células renais avançado, enquanto o GW Pharmaceuticals' Sativex
(tetrahidrocanabinol + cannabidiol) foi lançado pela Bayer, no Canadá, em Julho para
aliviar dor neuropática associada com Múltiplo Esclerose; cannabidiol é a componente
activa da associação fixa.
Embora o número de NEQs lançadas tenha voltado a diminuir em 2005, há indícios de que
o pipeline da saúde seja cada vez mais global, com um maior número de produtos em
desenvolvimento durante o ano, em comparação com 2004. Agora, os fabricantes têm de
91
centrar-se na segmentação de necessidades médicas insatisfeitas, executando ensaios
clínicos substanciais que ajudem a demonstrar tanto a segurança e a relação custo - eficácia
dos seus produtos para garantir que a tão discutida pipeline escassa comece a diminuir
(IMS, 2007).
Em conlusão, podemos afirmar que estão a verificar-se algumas alterações a nível da
Inovação e I&D Farmacêutico. O modelo de blockbusters está em decadência porque cada
vez mais os novos medicamentos são dirigidos a grupos cada vez menores e o número de
patentes a expirar leva estes blockbusters competirem com produtos me-too e surgem cada
vez mais fast folowers no mercado. Este facto acarreta ainda mais risco ao processo de
I&D porque coloca em causa os lucros necessários ao retorno do investimento. Uma outra
mudança a salientar corresponde ao aumento de parcerias de investigação, nomeadamente
na fase de ensaios clínicos e na fase de investigação de novos compostos, apesar que as
grandes companhias irão continuar a colocar o seu focus na investigação e manter a maior
parte da sua actividade de I&D interna.
Relativamente à localização da I&D, há uma tendência de fuga dos investimentos da
Europa para os EUA, ao contrário do que se passava até 1992, onde a maior parte do
Investimento se concentrava na Europa. Outros estudos sugerem que a escolha da
localização do Investimento em I&D está em primeiro lugar relacionada com a base
científica instalada (recursos humanos e infraestruturas) e em caso de igualdade deste
factor, poderá depender de incentivos fiscais. Os preços de venda muito superiores nos
EUA do que na Europa também influencia esta decisão.
Apesar do aumento do investimento em I&D verifica-se que o número de NEQs está a
diminuir. No entanto existem muitas moléculas em pipeline, e de acordo com dados de
2005 a maioria tiveram origem na Europa, ao contrário dos últimos anos, em que a maioria
era original dos EUA.
No capítulo 7 vamos estudar o caso de Portugal ao nível da actividade de I&D
farmacêutica.
92
7. A I&D NA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA PORTUGUESA
Depois do enquadramento a nível mundial sobre as tendências e os investimentos a nível
da I&D farmacêutica, neste capítulo vamos estudar a actividade de I&D realizada em
Portugal.
De acordo com a lista das 50 empresas de maior investimento em I&D em Portugal26,
encontramos 9 empresas do sector farmacêutico (ANEXO B – Lista das 50 empresas de
maior investimento em I&D). No ranking das 50 empresas de maior investimento em
I&D, o Grupo BIAL surge em quarto lugar no global dos sectores, que é o nosso caso de
estudo (Capítulo 8) e de seguida a Hovione FarmaCiencia (já em nono lugar), que é uma
empresa dedicada à Inovação do Processo, depois os Laboratórios Pfizer Lda. (em
décimo), a Tecnimede, a Biocant, o Grupo Atral-Cipan, a Astrazeneca, o LEF, e o grupo
Sanofi Aventis. Poder-se-á considerar que são estas as empresas de maior investimento em
I&D do sector farmacêutico em Portugal (MCTES, 2007). Na Tabela 7 encontram-se
resumidas apenas as empresas do sector farmacêutico retiradas desta lista.
Dentro do sector farmacêutico, BIAL ocupa o primeiro lugar no ranking das farmacêuticas
com maior investimento em I&D (dados de 2005). Como será desenvolvido no capítulo
seguinte, veremos que BIAL faz investigação e desenvolvimento de novos medicamentos,
como NEQs, enquanto as outras empresas se dedicam a outro tipo de investigação.
A Hovione que se encontra em segundo lugar no sector farmacêutico dedica-se à Inovação
de processos de fabrico. A Investigação e Desenvolvimento na Hovione ocupa 110
26 O Gabinete de Planeamento, Estratégia, Avaliação e Relações Internacionais (GPEARI) apresenta uma publicação das 50 empresas que mais investiram em actividades de Investigação e desenvolvimento (I&D) em 2005. Esta lista tem por base os resultados do Inquérito ao Potencial Científico e Tecnológico Nacional (IPCTN) de 2005, o qual foi enviado a um total de 7.018 empresas potencialmente executoras de actividades de I&D. Foram obtidas 5.180 respostas válidas, que representam cerca de 74% do total inquirido. A posição das empresas na lista das 50 maiores investidoras em I&D em 2005 é definida tendo em conta o total da despesa em I&D (intramuros) que as empresas declararam no referido inquérito. A lista indica a designação social dessas empresas e as respectivas posições, estando organizada por ordem decrescente da despesa em I&D em 2005. A posição das empresas na lista pode também ser ocupada por grupos económicos, equivalendo a despesa em I&D, para efeitos de ordenação, à soma da despesa em I&D das várias empresas do grupo que declararam este tipo de investimento em 2005. Nestes casos, e para além da referência ao grupo são indicadas as empresas com despesas de I&D que o constituem, sendo estas apresentadas imediatamente abaixo do nome do mesmo por ordem decrescente da sua despesa em I&D em 2005. A lista total das 50 empresas encontra-se no ANEXO B.
93
cientistas, técnicos e auxiliares em Loures e New Jersey, que trabalham em
desenvolvimento químico e farmacêutico de processos de fabrico de novos produtos, ainda
em fase de investigação clínica. Uma vez esses produtos aprovados, a Hovione torna-se o
fabricante à escala mundial. A Hovione tem uma longa tradição em inovação e patentes,
tendo depositado dezenas de patentes originais e gerindo um portfólio à escala mundial de
cerca de 300 patentes. Tem em curso 40 projectos de I&D, na sua grande maioria
relacionados com novas entidades químicas. (MCTES, 2007; www.hovione.com)
Tabela 7 – Ranking das Empresas Farmacêuticas em Portugal com maior Investimento em I&D entre o total das 50 maiores investidoras em I&D
Posição entre as
50
Posição entre as
Farmacêuticas
Empresa
4 1 BIAL – Portela & Cia, S.A. 9 2 HOVIONE FarmaCiencia, S.A. 10 3 LABORATÓRIOS PFIZER, Lda. 14 4 TECNIMEDE - Sociedade Técnico-Medicinal, S.A. 17 5 BIOCANT - Associação de Transferência de Tecnologia em
Biotecnologia 18 6 Grupo ATRAL-CIPAN 35 7 ASTRAZENECA – Produtos Farmacêuticos, Lda. 38 8 LEF – Instituto Farmacêutico de Ciência e Tecnologia,
Unipessoal, Lda. 50 9 Grupo SANOFI AVENTIS
Fonte: DSIECT - Direcção de Serviços de Informação Estatística em Ciência e Tecnologia / GPEARI – Gabinete de Planeamento, Estratégia, Avaliação e Relações Internacionais / MCTES – Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Inquérito ao Potencial Científico e Tecnológico Nacional 2005.
Os Laboratórios Pfizer ocupam o terceiro lugar entre as farmacêuticas, em Portugal, com
maior investimento em I&D. No entanto, sendo a Pfizer a empresa de maior I&D a nível
global de todos os sectores e a nível mundial, (de acordo com o último relatório da
Comissão Europeia), com um investimento de 5,8 biliões de euros anual, e sendo a Pfizer
um dos maiores contribuintes de NEQs na Indústria Farmacêutica, a actividade de I&D
realizada em Portugal acaba por ser residual no total de I&D a nível mundial e ao nível dos
seus principais centros de investigação (Europpean Comission, 2007; MCTES, 2007;
www.pfizer.com).
94
A Tecnimed, em quarto lugar entre as farmacêuticas em Portugal com maior investimento
em I&D, é uma empresa portuguesa, que faz I&D dedicada sobretudo ao desenvolvimento
de formulações farmacêuticas, desenvolvimento e validação de processo de fabrico e de
métodos analíticos. Tem ainda capacidade para promover e coordenar estudos Pré-clínicos
e Ensaios Clínicos, através de parcerias internacionais (MCTES, 2007;
www.grupotecnimede.com).
A Biocant é a quinta empresa desta lista, dedicando-se à Investigação sobretudo na área da
Biotecnologia e fazendo investigação própria e também investigação contratada por outras
empresas (MCTES, 2007 ; www.biocant.pt).
O grupo Atral – Cipan ocupa o sexto lugar na lista das empresas farmacêuticas que mais
investem em I&D em Portugal. A sua actividade principal é o fornecimento de matérias
primas, apesar dos seus principais interesses ao nível da I&D passarem por: novas
moléculas com ênfase nas novas tetraciclinas e derivados, novos anti-infecciosos
produzidos pela fermentação e/ou síntese química, NEQs para a terapia fotodinâmica de
aplicação na oncologia, desenvolvimento de medicamentos relacionados com as estatinas,
novas formulações galénicas e novos sistemas de “entrega”, combinação destes produtos
com os produtos comercializados pelo grupo, conhecimento do Process analytical
technology e transferência de tecnologia da produção de matérias primas e projectos chave
(MCTES, 2007; www.cipan.pt).
Os Laboratórios Astrazeneca, ocupam a sétima posição no ranking português das
farmacêuticas que mais investem em I&D em Portugal. À semelhança dos Laboratórios
Pfizer, este grupo de origem no Reino Unido é também um dos maiores investidores em
I&D a nível mundial, pois ocupam a vigésima sétima posição no ranking global de
empresas com maior investimento em I&D, apesar de em Portugal investirem apenas uma
pequena parcela do seu investimento global. Este Laboratório tem também contribuído
com NEQs a nível mundial (Europpean Comission, 2007; MCTES, 2007;
www.astrazeneca.com).
O LEF – Instituto Farmacêutico de Ciência e Tecnologia, Unipessoal, ocupa o oitavo lugar
entre as farmacêuticas que mais investem em I&D em Portugal. De origem português, este
95
Instituto fornece soluções na área da biotecnologia a Farmácias, Hospitais, à Indústria
Farmacêutica nacional e estrangeira e a outros centros de estudo farmacêuticos (MCTES,
2007; www.anf.pt).
O nono lugar neste ranking português das empresas farmacêuticas que mais investem em
I&D pertence ao Grupo Sanofi Aventis, que é um grupo francês que faz investigação ao
nível de NEQs. Tal como a Pfizer e a Astrazeneca, o grupo Sanofi Aventis é um dos
maiores investidores de I&D global, a nível mundial, ocupando a 12ª posição no ranking
mundial de empresas que mais investem em I&D. Em Portugal têm apenas uma pequena
parte do seu Investimento em I&D (Europpean Comission, 2007; MCTES, 2007;
www.sanofi-aventis.com).
Concluindo, na generalidade, entre as várias empresas enumeradas, umas são
multinacionais que realizam a maior parte do seu I&D fora de Portugal, outras são
empresas cujo objectivo não está focado na descoberta de NEQs, mas sim Inovações de
Processo (no caso da Hovione) ou no caso do Grupo ATRAL-CIPAN que tem vários
objectivos de investigação e outras estão dedicadas à Biotecnologia.
Importa analisar estes resultados. Ou seja, estando presentes em Portugal empresas
multinacionais que são das maiores investidoras de I&D a nível mundial como a Pfizer, a
Astrazeneca e a Sanofi, porque é Portugal um destino de um investimento tão reduzido?
Ou porque não assistimos a um maior investimento por parte de outras empresas
portuguesas aqui em Portugal para além da BIAL?
De acordo com os estudos apresentados no capítulo 5, as empresas de sucesso da indústria
farmacêutica inovam e fazem I&D em tempo útil e de forma eficaz. Para esta indústria, a
maior parte dos lucros e do valor da organização depende da actividade de I&D. Ter I&D
própria e a inovação é o trajecto de excelência para as empresas farmacêuticas terem lucro
e crescerem em tamanho. (Achilladelis & Antonakis, 2001; European Commission, 2004;
Quere, 2003; Schmid & Smith, 2005; Busfield, 2003).
Sendo a actividade de I&D um trajecto de excelência destas empresas, então os estudos
apresentados no ponto 5.5 sobre a vantagem competitiva da indústria nacional, sugerem
96
como consequência, que Portugal não é competitivo em termos de: um sistema de ensino
superior mais forte, força de trabalho abundante e bem preparada, presença de empresas
intensivas em investigação e indústrias de suporte, uma forte procura de mercado interna e
o preço relativo dos factores de produção (Bernal, 1954; Servan-Schreiber, 1968; Landes,
1970; Mokyr, 1990; Porter, 1990).
Outra eventual explicação complementar para a reduzida I&D em Portugal é o risco
associado a esta actividade. Cada vez menos surgem NEQs no mercado em relação a um
aumento do Investimento a nível mundial, o que não se torna nada convidativo para
empresas de reduzida dimensão (European Commission, 2007; EFPIA, 2007).
De acordo com a análise apresentada no capítulo 6, um outro factor que pode afectar o
desenvolvimento da Indústria Farmacêutica é o facto de existir uma certa concorrência
entre governos de vários países para atrair o investimento. As mudanças na indústria
resultantes do declínio do modelo de negócio de blockbusters têm-se reflectido em
alterações dos padrões de investimento: os investimentos em produção e em ensaios
clínicos passam a ser aplicados em várias localizações a nível global; há uma contínua
consolidação dos investimentos em I&D maioritariamente nos Estados Unidos, em
paralelo com crescentes oportunidades de colaboração das grandes empresas com terceiras
organizações, numa parte da Investigação.
Esta tendência dos maiores investimentos em I&D estarem nos Estados Unidos e na
Europa Ocidental perto da sede destas companhias, resultado do tradicional modelo de
negócio, deve-se ao facto de que estes centros desenvolveram recordes em termos de
produtividade da I&D, relacionados com a capacidade de reciclar continuamente os seus
departamentos com investigadores talentosos e estarem construídos sobre infraestruturas
eficientes que suportam o processo de inovação.
O ambiente regulamentar é outro dos factores apontados como influente na decisão de
investimento em I&D. A incerteza nas leis e na sua aplicação ao processo de inovação é
um factor de afastamento da I&D. O sistema de impostos relativo aos investimentos em
I&D e o apoio governamental para a I&D também influenciam o fluxo de capitais e
tornam-se significativos no investimento a longo prazo.
97
A BIAL é a única empresa que apresenta como sua decisão estratégia, a descoberta de
novas moléculas, daí ser a maior investidora (ano de 2005). Por esta característica e por
outras que estudaremos no próximo capítulo relativas ao perfil da empresa, parece que
BIAL se assemelha à realidade das maiores empresas farmacêuticas que fazem I&D
activamente.
De seguida vamos analisar o caso da BIAL mais em detalhe, por ser esta a maior
investidora de I&D em Portugal, entre as farmacêuticas.
98
8. O CASO BIAL
A BIAL foi a empresa farmacêutica que mais investiu em I&D no ano de 2005, segundo o
relatório publicado em 2007 pelo Ministério da Tecnologia, Ciência e Ensino Superior,
sobre as 50 empresas que mais investem em I&D em Portugal. No mesmo ranking
encontrava-se em quarto lugar entre todos os sectores.
8.1. PERFIL DA EMPRESA
Constituído em 1924, BIAL é o maior grupo farmacêutico português e tem como missão
desenvolver, encontrar e fornecer novas soluções terapêuticas na área da Saúde.
“Ao serviço da sua Saúde” é o lema que assume, tendo como áreas estratégicas a Inovação
e a Qualidade.
O crescimento sustentado do grupo faz da BIAL a única empresa portuguesa a figurar no
Top Ten da indústria farmacêutica em Portugal, apresentando um volume de facturação na
ordem dos 100 milhões de euros em 2005 e 2006.
8.1.1. Historial
Os Laboratórios BIAL foram fundados em 1924, data em que Álvaro Portela – avô do
actual presidente do grupo – decidiu criar um pequeno laboratório farmacêutico.
Nos anos 60, com a morte de Álvaro Portela, é o filho, António Emílio Portela, que assume
o controlo da empresa. BIAL consegue empreender um notável trabalho de renovação de
equipamentos e mecanização de fabrico, transformando-se num dos principais laboratórios
farmacêuticos do país.
No final da década de 70, Luís Portela assume a direcção da empresa, fazendo rejuvenescer
os quadros humanos e trazendo para a companhia profissionais dinâmicos e especializados
99
em várias áreas, do marketing à gestão, passando pela actividade industrial.
Em 1996, BIAL inaugura uma das mais modernas unidades industriais do país na área
farmacêutica, com um Centro de Investigação & Desenvolvimento único em Portugal.
Num sector caracterizado pelo elevado grau de especialização e exigência, como é o caso
da Indústria Farmacêutica, os recursos humanos da BIAL considerados essenciais para o
seu desenvolvimento. O Grupo conta com uma experiente equipa de mais de 650
colaboradores altamente qualificados, dos quais mais de metade são licenciados ou
doutorados.
8.1.2. Investigação
A BIAL está na vanguarda da investigação científica na área da Saúde. A procura de novas
soluções terapêuticas constitui a grande aposta do grupo que desenvolve os seus projectos
nos seus dois Centros de Investigação e Desenvolvimento (na Trofa e em Bilbau), onde
trabalham 87 pessoas, das quais 19 são doutoradas.
Em 1993, a BIAL começou a desenvolver no Centro de Investigação e Desenvolvimento,
novas moléculas na área do sistema nervoso central e do sistema cardiovascular. Em
Bilbau, têm sido realizados diversos estudos e investigações no campo da imunoterapia.
BIAL é o grupo farmacêutico português que mais investe em Investigação e
Desenvolvimento (20% da sua facturação anual). Nos últimos anos o grupo patenteou
vários novos medicamentos a nível mundial, entre os quais um antiepiléptico (acaba de
terminar a fase III de ensaio clínico) e um anti-parkinsoniano (em fase II). Num futuro
próximo, estes produtos poderão constituir os primeiros medicamentos de raiz portuguesa a
serem comercializados a nível mundial. BIAL espera desta forma contribuir para a
evolução terapêutica, disponibilizando no mercado produtos que proporcionam uma maior
qualidade de vida.
Em reconhecimento do compromisso da BIAL com a Investigação e Desenvolvimento, o
100
grupo foi admitido na European Federation of Pharmaceutical Industries and Associations
(EFPIA), reputada Federação que reúne as companhias de investigação líderes do sector
farmacêutico europeu.
8.1.3. Internacionalização
A aposta na internacionalização constitui um dos principais vectores de actuação do grupo
BIAL, que distribui os seus produtos em mais de 30 países da Europa, América, África e
Ásia. O principal objectivo é permitir o desenvolvimento autónomo e sustentado de
projectos que incluam não só a componente industrial, mas também a área de investigação
de novos produtos – vertentes apenas possíveis através da presença directa em mercados
com dimensão.
Os mercados de África de expressão portuguesa e francófona constituíram as primeiras
apostas internacionais. Seguiram-se os países da América Latina e, mais recentemente, os
mercados Europeus.
Em 1998 o grupo adquiriu uma empresa farmacêutica espanhola, passando a operar como
BIAL Espanha - o mercado espanhol é o sétimo maior mercado da indústria farmacêutica e
um dos mais dinâmicos a nível mundial. O investimento realizado nos dois primeiros anos,
que ascendeu a 22 milhões de euros, faz daquele país o principal mercado externo do
grupo.
Em Espanha, o grupo BIAL conta com cerca de 170 colaboradores e está presente em
Madrid, que acolhe a Direcção Geral e os Departamentos de Assuntos Regulamentares e
Comercial, e em Bilbau, onde está situada a unidade industrial e o Centro de Investigação e
Desenvolvimento.
O grupo centraliza em Espanha a produção de vacinas anti-alérgicas e meios de
diagnóstico para alergias. A BIAL Espanha também comercializa uma gama de
especialidades farmacêuticas de variadas áreas, nomeadamente respiratória e
101
cardiovascular.
As vendas de Bial nos mercados internacionais representam já em 2006, 28% do volume
de negócios do grupo.
8.1.4. Produção e Produtos
O grupo BIAL produz uma gama alargada de medicamentos de diversas áreas terapêuticas:
antibióticos, anti-inflamatórios, analgésicos, antiasmáticos, anti-histamínicos,
cardiovasculares, antidepressivos, ansiolíticos, antianémicos, antiulcerosos, entre muitos
outros.
A produção de medicamentos e de vacinas é realizada de acordo com os mais elevados
níveis de exigência e padrões de qualidade. A Bial foi a primeira empresa farmacêutica em
Portugal, e uma das primeiras na Europa, a obter a certificação do Sistema de Gestão da
Qualidade, de acordo com as normas ISO 9001 e a obter certificação do Sistema de Gestão
Ambiental, segundo a norma ISO 14001.
8.1.5. Fundação Bial
O grupo BIAL tem-se distinguido pelo apoio a inúmeras actividades de âmbito médico e
científico, nomeadamente através das acções da Fundação BIAL.
Criada em 1994, a Fundação BIAL tem como objectivo primordial o incentivo do estudo
científico do Homem, tanto do ponto de vista físico como espiritual, distinguindo,
apoiando e promovendo o trabalho de todos aqueles que procuram trilhar novos passos no
caminho da Investigação, da Ciência e do Conhecimento.
Considerada uma instituição de utilidade pública pelo governo português, a Fundação
BIAL conta com os altos patrocínios do Presidente da República, do Conselho de Reitores
102
das Universidades Portuguesas e da Ordem dos Médicos.
A Fundação canaliza a sua atitude incentivadora da investigação científica na área da
Saúde através de duas acções distintas: o Prémio Bial, um dos prémios de maior
significado na área da Saúde em toda a Europa, e as Bolsas de Investigação Científica que
têm como objectivo incentivar o estudo neurofisiológico e mental do Homem, despertando
o interesse dos investigadores das áreas da Psicofisiologia e da Parapsicologia. Como
forma de fomentar o diálogo e o debate de ideias entre os seus bolseiros e toda a
comunidade científica a Fundação BIAL organiza bianualmente, desde 1996, o Simpósio
Aquém e Além do Cérebro.
8.1.6. Recursos Humanos
A Bial tem em 2007 cerca de 660 colaboradores: 51% tem formação universitária e 3% são
doutorados. Durante 2005 o número de horas de formação profissional foi de 59 por
pessoa, a que acresce o facto de a empresa subsidiar actualmente a frequência de pós-
graduações ou licenciaturas de mais de uma dezena dos seus profissionais. O investimento
em formação ascendeu a 0,9 milhões de euros em 2005.
103
8.2. A DECISÃO DE INVESTIMENTO EM I&D
O grupo BIAL é um grupo farmacêutico de origem portuguesa, que optou pela I&D em
1993 com o objectivo da síntese de novas entidades químicas e o seu subsequente
desenvolvimento farmacológico e clínico.
Em média, a indústria farmacêutica investe em I&D 15 a 20% do seu volume de negócios,
sendo uma das áreas de actividade com maior investimento em inovação.
BIAL reconhece a actividade de I&D na Indústria Farmacêutica, como: morosa,
dispendiosa e arriscada.27
O tempo compreendido desde o início do processo de investigação até à disponibilização
do novo produto no mercado é de cerca de 13 anos.
Durante todo este longo período, os custos, directamente relacionados com o
desenvolvimento de medicamentos cada vez mais eficazes e seguros, são incontornáveis.
Estima-se que o custo associado à Investigação e Desenvolvimento de um novo fármaco
ronde, em média, 800 milhões de euros (valor que tem aumentando nos últimos anos). Este
investimento pode não ter qualquer retorno ou pode ter um retorno que não é
compensatório. Para cada novo produto, muitos milhares de moléculas ficam pelo
caminho. Actualmente, as estimativas referem que apenas cerca de um terço dos
medicamentos desenvolvidos e comercializados consegue recuperar totalmente o avultado
investimento que lhe foi alocado.
Foi a esta arriscada tarefa que Bial se entregou quando definiu a Inovação como área
estratégica para o desenvolvimento do grupo. Acreditando que estar ao serviço da saúde de
todas as pessoas significa proporcionar-lhes medicamentos inovadores e eficazes. Foi com
este intuito que, em 1993, num pequeno laboratório com apenas três pessoas, deram início
ao “sonho” de encontrar e desenvolver novas soluções terapêuticas.
27 Revista Sociedade Portuguesa de Bioquímica, Julho 2006
104
Para além do risco incorrido, a perspectiva dos retornos em consequência do êxito da
descoberta e comercialização de uma nova molécula são muito atractivos.
Actualmente há dois centros de I&D, um na Trofa e outro em Bilbau, onde trabalham 87
pessoas de sete nacionalidades, das quais 19 são doutoradas. Bial concentra os passos
cruciais da investigação, contratando com instituições universitárias e centros de
investigação a realização das restantes fases do processo de desenvolvimento. Tem
actualmente contratos de investigação ou de desenvolvimento com mais de quarenta
instituições diferentes, de mais de uma dezena de países.
Atendendo a todas as especificidades que caracterizam este sector, descritas anteriormente,
a actividade de I&D da BIAL está centrada em três áreas: sistema nervoso central, sistema
cardiovascular e alergologia.
Para a prossecução deste propósito de apresentar novas soluções terapêuticas no mercado,
a BIAL tem vindo a investir anualmente cerca de 20% da sua facturação em I&D, o que
representa cerca de vinte milhões de euros, por ano. Sendo estes os primeiros
medicamentos de investigação própria, o esforço de financiamento é enorme. Tem sido,
essencialmente, um esforço de auto-financiamento, um esforço que tem subjacente um
grande controlo e rigor orçamental. Em 2005, no âmbito do programa SIME-Inovação, a
União Europeia aprovou um financiamento de 45 milhões de euros para o projecto de I&D
do grupo BIAL. Este apoio, embora importante, cobre apenas uma pequena parte do
montante previsto investir no período compreendido entre 2000 e 2009 e que ascende a
230 milhões de euros.
Quanto ao ambiente favorável à inovação em Portugal, e também na Europa, a empresa
reconhece que “o cenário apresentado não deixa dúvidas face à necessidade urgente de
fomentar novas formas de financiamento para as empresas que apostam em I&D.
Financiamento que poderia passar pela criação de incentivos fiscais, pelo aumento dos
fundos comunitários destinados à Investigação, apoios para a internacionalização das
empresas, alargamento dos prazos de patente dos medicamentos, maior liberalização na
fixação de preços dos fármacos, revisão dos sistemas de comparticipação e maior rapidez
nos processos de aprovação de entrada no mercado de novos produtos. Estas medidas
105
assumem grande relevância para as empresas que, tal como BIAL, querem gerar valor,
querem contribuir para a evolução terapêutica. Estas medidas poderiam também constituir
um bom incentivo para o início de uma nova forma de encarar a Inovação na área da
Saúde.”28
28 Revista Sociedade Portuguesa de Bioquímica, Julho 2006
106
8.3. PATENTES E MARCAS
Quando BIAL decidiu fazer I&D há alguns anos atrás, BIAL estava consciente de que os
resultados, bem como a sua exploração comercial seriam e serão protegidos de forma a
permitirem uma adequada retribuição dos investimentos efectuados e dos riscos assumidos.
É essa protecção conferida pelo sistema de patentes, que funciona como alavanca da
inovação e estimula e fomenta aquilo que BIAL desde há muito tempo atrás definiu como
uma das suas missões: a busca de novas soluções terapêuticas. Caso contrário e na
ausência de uma adequada protecção, jamais seria possível assumir os riscos e realizar os
investimentos que um novo medicamento pressupõe.
É neste sentido que BIAL tem vindo a incrementar sucessivamente a parcela do seu
orçamento anual que reserva às patentes e que tem vindo a reflectir-se num sistemático
aumento do número de pedidos de patente submetidos e de patentes concedidas.
Ascendem a mais de três dezenas o número de patentes submetidos por BIAL – cada um
deles em mais de 20 países, tendo já sido concedidas 26 patentes nos países da UE, nos
EUA, Canadá, Austrália, Japão e China entre outros.
No que respeita à estratégia de BIAL em matéria de patentes, podemos afirmar que não
existe uma estratégia única mas várias estratégias, dependentes essencialmente de cada
projecto de I&D, e dentro de cada um desses projectos, do tipo de invenção a proteger. O
primeiro pedido de patente de cada projecto, é para reivindicar e proteger o composto per
se, de seguida seguem-se outros pedidos de patente destinados a proteger os resultados da
actividade de I&D à medida que esses resultados vão surgindo e se traduzem em dados
novos, inventivos e susceptíveis de aplicabilidade industrial: como por exemplo, novos
processos de fabrico, novas formulações ou novos usos ou indicações terapêuticas.
Após a submissão de um pedido de patente nacional, que estabelece a data relevante para
efeitos de prioridade e proporciona após essa mesma data, para avançar com pedidos de
extensão a outros países, BIAL procede à selecção desses países, tendo em vista
fundamentalmente dois critérios: por um lado a dimensão e a importância estratégica do
respectivo mercado – que poderá variar consoante a área terapêutica em que o produto se
107
insere – e por outro, o âmbito e a efectividade da protecção dos direitos de propriedade
industrial nesse país.
Depois no que respeita às vias seguidas para submissão dos pedidos de patentes nos
diversos países, BIAL tem maioritariamente optado pela submissão do pedido PCT, que
apresenta, entre outras, a vantagem de permitir designar um vasto número de países através
de um único pedido de patente, numa única língua, e diferir, por um prazo adicional não
inferior a 18 meses, a decisão sobre quais os países em que efectivamente depositarão os
pedidos de patente nacional em cada uma das línguas desses países, ou por exemplo, no
caso da Europa, o pedido de patente europeia numa das línguas convencionadas.
Esta decisão estratégica reflecte-se também, em certa medida, na escolha dos diferentes
agentes de propriedade industrial de que BIAL se socorre. Tradicionalmente, BIAL tem
vindo a trabalhar directamente com patent attorneys estabelecidos, para além de Portugal,
na Alemanha, Espanha, Reino Unido e Estados Unidos, funcionando esses mesmos
agentes, por seu turno, como interlocutores de BIAL junto dos agentes nacionais de um
grupo restrito de países e nessa medida, como sub-coordenadores do projecto de patentes
para esses países.
A crescente importância da estratégia das patentes na actividade de I&D de BIAL reflecte-
se ainda no próprio orçamento que lhe está anualmente reservado e que actualmente é mais
do dobro do que lhe estava destinado há cinco ou seis anos atrás. Este acréscimo resulta do
incremento do número de pedido de patentes efectuados por BIAL e da posterior extensão
de cada um desses pedidos a cerca de 30 países com os correspondentes custos de
submissão, prossecução e concessão; mas advém também dos encargos com as anuidades
(taxas de manutenção) de cada patente, que são tanto maiores quanto mais perto do final da
respectiva vigência a patente estiver; resulta finalmente dos custos com consultadoria nos
diversos países, por força da necessidade de adaptação às especificidades legais e da
propriedade industrial de cada país.
Em sequência da actividade de I&D mencionada a propósito da matéria de patentes, e face
aos mercados–alvo desses projectos de I&D, BIAL desencadeou já também o processo de
registo de marcas em cerca de trinta novos países, os mesmos onde detém protecção por
108
patente, entre os quais os maiores mercados, ou seja, Europa, EUA e Japão.
Para além dos habituais pedidos nacionais de marcas efectuados directamente em cada um
dos países, BIAL tem também alguma experiência do recurso a pedidos de marca
internacional (a marca BIAL, solicitada por esta via, está registada em mais de trinta
países) e pedidos de marca comunitária, embora quanto a estes últimos, não obstante as
inegáveis vantagens na abrangência à totalidade dos países da União Europeia, haja que
referir que se têm revelado bastante mais morosos do que seria desejável.
A estratégia de marcas de BIAL tem passado pela tentativa de manter, em todos os
mercados em que opera, as mesmas marcas, embora, em alguns casos, felizmente poucos,
BIAL se tenha deparado com a necessidade de se socorrer de uma segunda marca – nesses
casos, a estratégia tem sido a de procurar que cada marca seja aceitável num número
razoável de países e, preferencialmente, que esses países possam ter em comum, pelo
menos, a respectiva língua uma vez que isso influenciará não apenas a própria embalagem
do produto, mas também quaisquer outros materiais de informação e promoção.
À semelhança do que acontece com a gestão de patentes, também em matéria de marcas,
BIAL combina o recurso directo a agentes locais em vários países com o recurso a agentes
portugueses e espanhóis que, para além de terem a seu cargo as marcas em Portugal e
Espanha, desempenham as funções de pivot entre BIAL e os agentes locais noutros países.
109
8.4. AS NOVAS ENTIDADES QUÍMICAS
Nos últimos anos, o grupo BIAL investigou mais de 10 mil novas moléculas, das quais seis
foram patenteadas a nível mundial, estando actualmente a licenciar tecnologia sua para
empresas de diversos países.
Bial é o grupo farmacêutico português que mais investe em Investigação e
Desenvolvimento, um esforço que representa mais de 20% da sua facturação global, que
em 2007 deverá ultrapassar os 100 milhões de euros.
O trabalho que o departamento de I&D do Grupo Bial tem vindo a desenvolver abrange as
áreas do sistema nervoso central e do sistema cardiovascular. Resultado deste trabalho –
iniciado em 1993 – o grupo Bial tem neste momento seis moléculas patenteadas a nível
mundial entre as quais um antiepiléptico que num futuro próximo poderá constituir o
primeiro medicamento de raiz e patente portuguesa e que terá como destino o mercado
mundial. Este produto já está registado na OMS como eslicarbazepina.
Cronologia Antiepiléptico:
- 1994 – Investigação laboratorial, selecção e síntese da nova entidade química
- 1996 – Optimização da nova entidade química; registo da patente
- 1997 – Realização de testes pré-clínicos e ensaios de toxicologia
- 2000 – Ensaios de fase I. Estes ensaios são realizados em voluntários saudáveis e
visam, essencialmente, obter informação sobre a tolerabilidade da substância e
respectiva farmacocinética.
- 2002 – Ensaios de fase II. São ensaios exploratórios de eficácia e são realizados num
número limitado de doentes. No caso do antiepiléptico de Bial estes ensaios
envolveram 143 doentes e 17 centros de investigação de nove países da Europa
Central.
- 2003 – Ensaios de fase III. Têm como objectivo provar a eficácia do novo produto e
são decisivos para a aprovação do medicamento pelas autoridades sob o ponto de
vista regulamentar. Estes ensaios devem cobrir a maior parte dos países do globo.
Para que um novo medicamento possa ser usado à escala mundial a sua eficácia terá
110
de ser comprovada nas diferentes raças e populações. O antiepiléptico de Bial foi
testado em diversos países (África do Sul, Alemanha, Argentina, Áustria, Austrália,
Bélgica, Brasil, Croácia, Dinamarca, Espanha, França, Holanda, Hungria, Lituânia,
Polónia, Portugal, Reino Unido, República Checa, Roménia, Rússia, Suécia, Suiça e
Ucrânia), envolvendo mais de mil doentes.
- 2007 – Registo junto das autoridades
- 2009 – Data prevista para introdução deste novo fármaco no mercado
Os ensaios já realizados têm comprovado a eficácia e boa tolerabilidade da molécula
desenvolvida no Departamento de Investigação e Desenvolvimento de Bial.
BIAL pretende licenciar esta nova molécula no mercado mundial, começando pelo maior
mercado farmacêutico mundial, que é dos Estados Unidos da América.
111
8.5. PERSPECTIVAS
Nos últimos anos foram patenteados vários novos medicamentos a nível mundial, entre os
quais, além do antiepiléptico, já está também registado na Organização Mundial de Saúde
um anti-parkinsoniano (em fase II).
Num futuro próximo, estes produtos poderão constituir os primeiros medicamentos de raiz
portuguesa a serem comercializados a nível mundial.
O projecto de BIAL passa pela continuidade da actividade de I&D. Após o lançamento
destes dois novos medicamentos, perspectiva-se o desenvolvimento de novos compostos e
o sucessivo lançamento nos mercados mundiais.
A aposta na internacionalização constitui também um dos pilares da estratégia de
desenvolvimento da Bial, que tem como objectivo assegurar, num prazo de cinco anos, que
o valor das vendas nos mercados internacionais ultrapasse o da facturação no mercado
nacional. Neste sentido os novos medicamentos terão um papel fundamental na
internacionalização do grupo.
Em conclusão, podemos afirmar que BIAL, em relação à intensidade de investimento em
I&D e à decisão estratégica de I&D na procura de novas moléculas, se assemelha às outras
empresas multinacionais de maior investimento em I&D a nível mundial e menos às
empresas de origem portuguesa.
A procura de novas soluções terapêuticas, realizada de forma constante, irá permitir a
BIAL deter e renovar uma carteira de produtos inovadores. Como consequência, a empresa
ficará numa posição de forte competitividade.
112
9. CONCLUSÕES
A Indústria Farmacêutica destaca-se dos outros sectores de actividade pelo seu elevado
nível de Investimento em I&D. O último relatório elaborado pela Comissão Europeia
apresenta a Indústria Farmacêutica como o sector com maior investimento em I&D a nível
mundial, tanto em valor absoluto como em intensidade de I&D (European Commission,
2007).
Apesar da teoria económica estar longe de ser consensual sobre qual dos ambientes é mais
favorável à Inovação (se concorrencial, monopólio, oligopólio ou duopólio, se são as
empresas grandes que fazem I&D ou são as pequenas), ou como as políticas públicas
melhor podem encorajar a inovação (através de direitos de propriedade – política de
patentes), ou sobre a possibilidade de cooperação entre empresas, a teoria conclui que a
actividade de I&D e a Inovação são condutoras do sucesso empresarial. O caso da
Indústria Farmacêutica é de uma estrutura bastante concentrada em que as maiores
empresas são as que mais investem em I&D e as que mais inovam, o que vai inteiramente
de acordo com a teoria de que são as estruturas de mercado concentrado e das maiores
empresas, as que mais investem em I&D. O licenciamento tecnológico é uma prática
importante tanto para a empresa inovadora como para a empresa licenciada assim como
para o bem estar social. Pois permite maiores lucros ás empresas e permite que a nova
tecnologia esteja disponível de uma forma mais vasta para a sociedade. No caso do produto
da inovação farmacêutica (capítulo 5), as consequências para o bem estar social são
claramente positivas, assim como a possibilidade de obtenção de lucros para licenciadoras
e licenciadas é também muito interessante (Peppal, 2005; Besanko, 2003; IMS, 2007).
A indústria farmacêutica a nível mundial é dominada por empresas de larga escala,
multinacionais, localizadas em sociedades industriais avançadas e vendem os seus
produtos por todo o mundo. As dez maiores empresas a nível mundial detêm quase metade
do valor do mercado da indústria farmacêutica (medido em receitas) (Busfield 2003; IMS,
2007). Encontramos empresas que investem em I&D e inovam trazendo novos
medicamentos para o mercado, fazem I&D activamente e são extremamente dependentes
do sucesso das inovações decorrentes do processo de I&D. Estas empresas utilizam as
marcas e patentes para proteger os novos medicamentos descobertos e maximizarem o seu
113
lucro potencial. Os lucros obtidos estão dependentes do número de medicamentos que
ainda têm patente. São estes lucros que geram a receita necessária para conduzir o
dispendioso processo de um novo medicamento. Por sua vez, o desenvolvimento de um
medicamento é intensivo em investigação, e por isso as companhias farmacêuticas
reinvestem na I&D mais dos seus lucros do que qualquer outra indústria. Estas empresas
líderes são também as que mais investem em marcas e fazem uso extensivo do marketing
(Bhattacharya, 2005).
Existem outras empresas que fabricam produtos genéricos (que são produtos já sem patente
e sem marca). Estas últimas são normalmente mais pequenas e estão mais dispersas. São
muito significativas em países como a Índia, China e Brasil (Busfield, 2003).
O mercado farmacêutico mundial é de 643 biliões de dólares (valores de 2006) e está
dividido em 3 grandes blocos: América do Norte (Estados Unidos e Canadá), Europa e
Japão. O valor do Mercado Farmacêutico Português duplicou nos últimos dez anos, sendo
de 2.415 milhões de Euros em 2006 e representa cerca de 0,27% do valor do mercado
farmacêutico mundial. A importância de Portugal pode-se considerar reduzida, mas não
deixa de ser um dos países com um mercado de valor. À semelhança do que acontece no
mercado farmacêutico mundial, em Portugal, as 20 maiores empresas concentram cerca de
60% da quota de mercado. As principais empresas líderes de mercado em Portugal são
quase as mesmas do mercado farmacêutico mundial. As empresas portuguesas em 2004
representavam apenas 15% da quota do mercado português. Destaca-se o caso da BIAL,
que é uma empresa portuguesa e é a única no ranking das 10 maiores empresas. Assim
como no mercado farmacêutico mundial assiste-se a um forte crescimento das classes de
produtos genéricos e de oncológicos.
Uma vez que o produto da Indústria Farmacêutica é constituído pelos medicamentos
utilizados na saúde humana, trata-se de uma área extremamente regulamentada a nível
governamental e também ao nível de instituições internacionais. A indústria farmacêutica é
um sector extremamente dependente do sistema de patentes. Este facto deve-se
essencialmente a três ordens de razões: em primeiro lugar devido ao elevado nível de
Investimento, pois sendo o caso do desenvolvimento de uma nova molécula, o
investimento pode ir até 1 bilião de dólares; em segundo lugar, devido ao elevado risco de
114
insucesso, pois apenas 1 em cada 5.000 a 10.000 compostos chega à fase de
comercialização; e em terceiro lugar, devido à longa duração dos projectos, que podem
durar entre 10 a 15 anos desde o pedido de submissão da patente à comercialização.
É fortemente sustentado o peso que a I&D tem na Indústria Farmacêutica, que foi de todos
os sectores o que mais investiu em I&D (com 19,3% de quota de I&D no global dos
sectores). Da mesma forma, a intensidade de I&D foi muito superior na Indústria
Farmacêutica do que em qualquer outro sector (15,9%) (European Commission, 2007).
A Indústria Farmacêutica é única em inovações, em 200 anos de história conseguiu 1736
novos medicamentos, que originaram trajectórias tecnológicas. No entanto estão a
verificar-se algumas alterações a nível da Inovação e I&D Farmacêutico. O modelo de
blockbusters está em decadência porque cada vez mais os novos medicamentos são
dirigidos a grupos cada vez menores e o número de patentes a expirar leva estes
blockbusters a competirem com produtos me too e surgem cada vez mais fast followers no
mercado. Este facto acarreta ainda mais risco ao processo de I&D porque coloca em causa
os lucros necessários ao retorno do investimento. Uma outra mudança a salientar
corresponde ao aumento de parcerias de investigação, nomeadamente na fase de ensaios
clínicos e na fase de investigação de novos compostos. apesar que as grandes companhias
irão continuar a colocar o seu focus na investigação e manter a maior parte da sua
actividade de I&D interna.
Relativamente à localização da I&D, há uma tendência de fuga dos investimentos da
Europa para os EUA, ao contrário do que se passava até 1992, onde a maior parte do
Investimento se concentrava na Europa. Outros estudos sugerem que a escolha da
localização do Investimento em I&D está em primeiro lugar relacionada com a base
científica instalada (recursos humanos e infraestruturas) e em caso de igualdade deste
factor, poderá depender de incentivos fiscais. Os preços de venda muito superiores nos
EUA do que na Europa também influenciam esta decisão.
Apesar do aumento do investimento em I&D verifica-se que o número de NEQs está a
diminuir. No entanto, existem muitas moléculas em pipeline, e de acordo com dados de
2005 a maioria tiveram origem na Europa, ao contrário dos últimos anos, em que a maioria
115
era originária dos EUA.
A Indústria Farmacêutica Portuguesa caracteriza-se por uma reduzida actividade de I&D.
Quanto ao caso específico de Portugal, conclui-se que existe actividade de I&D
farmacêutica em Portugal e as várias empresas farmacêuticas que praticam I&D podem ser
distinguidas de três formas: umas são das maiores empresas no ranking mundial e realizam
a maior parte do seu I&D fora de Portugal; outras são empresas cujo objectivo não está
focado na descoberta de NEQs, mas sim Inovações de Processo (no caso da Hovione) ou
no caso do Grupo ATRAL que tem vários objectivos de investigação; ainda outro grupo
das que estão dedicadas à Biotecnologia (MTCES, 2007).
No entanto, destaca-se em Portugal o caso da BIAL pela forte intensidade do seu
investimento em I&D, prevendo lançar o primeiro medicamento de investigação com
origem em Portugal em 2009. No que diz respeito às decisões de Inovação e I&D,
poderemos considerar que a BIAL se distingue das empresas nacionais e se assemelha às
empresas líderes a nível mundial.
BIAL pretende seguir esta estratégia de inovação e I&D para com o objectivo de criar e
renovar uma carteira de produtos inovadores. Deste modo aumentará a sua competitividade
e poder de mercado.
Conseguimos mostrar que Portugal faz I&D na Indústria Farmacêutica e tudo indica que já
a partir de 2009 teremos lançado no mercado a primeira molécula de origem de
investigação em Portugal.
As principais limitações encontradas foram relacionadas com a falta de dados de
investimento em I&D em Portugal. Para além do relatório do MTCES, não existem bases
de dados com este tipo de informação e as empresas são muito fechadas, à excepção de
BIAL, que à semelhança das maiores empresas da indústria farmacêutica, divulga os seus
produtos em pipeline e a sua estratégia.
Como tema de investigação futura, o presente trabalho sugere um estudo sobre os retornos
dos novos medicamentos, com o objectivo de verificar se as margens de lucro são
116
atraentes, uma vez que estamos num ambiente de mudança no mercado farmacêutico: as
populações alvo dos medicamentos são cada vez menores; as patentes expiram em pouco
tempo, dado o cada vez mais regulamentado processo de I&D que se torna demasiado
moroso; os blockbusters dão lugar a produtos me-too e há cada vez mais fast followers a
surgir no mercado.
117
10. LISTA DE REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Worldwide corporate investment in R&D grew by 10% last year, according to a new European Commission study The 2007 edition of the European Commission's annual scoreboard of companies' pending on research and development (R&D) shows that corporate R&D has increased by 10%, with EU-based companies increasing their R&D investment by 7.4%. This compares to 5.3% growth reported in the 2006 edition. The scoreboard also shows an upward trend in companies' profitability all over the world. The world's biggest investor in R&D in the 2007 Scoreboard is Pfizer of the US, with €5.8 billion. The top EU company is DaimlerChrysler of Germany with €5.2 billion "We are only ever going to improve our R&D performance if more companies see the benefit of investing in research," said European Science and Research Commissioner Janez Potoènik. "The positive upward trend in R&D investment seen in the last two years is encouraging, and leads me to believe that our innovation strategy is on the right track. But we must not allow ourselves to be complacent – quite the opposite: we should reinforce the positive measures already taken to consolidate and improve private investment in R&D." The EU Industrial R&D Investment Scoreboard is published annually by the European Commission as part of its Industrial Research Investment Monitoring activity. The figures are derived from company accounts for the previous financial year and indicate the investment made by a company from its own funds. The Scoreboard does not reflect where the expenditure was made, just the origin of the company making the investment. The Scoreboard comprises the top1000 R&D companies from the EU and the top1000 R&D companies from the rest of the world. Together, the 2000 Scoreboard companies invested €372 billion in R&D, estimated to represent more than 85% of corporate expenditure on R&D worldwide. On the downside, the report shows that R&D investment by EU companies is still growing at a lower rate than their non-EU counterparts, a trend identified in every edition of the Industrial R&D Scoreboard published to date. This difference is primarily explained by a growth rate in high R&D-intensive sectors outside the EU of almost twice that within the EU. These sectors also account for a much larger proportion of R&D outside the EU. Nevertheless, the EU did record the highest growth in fixed capital investment. This represents an important part of total corporate investment that also underpins investment in innovation. In the coming months the European Commission will publish the 2006 EU Survey on R&D Investment Business Trends with information about 110 R&D EU companies' investment expectations for the period 2007-2009. This survey provides new insights into company expectations about future R&D investments and their motivations to invest in research. The preliminary results confirm the positive trends of the 2007 Scoreboard. Sector trends Pharmaceuticals & biotechnology becomes the top R&D investing sector, overtaking the technology hardware & equipment sector. This sector is represented by many EU companies. Many pharmaceutical companies show a strong increase of R&D investment, e.g. Merck (+24.3%), AztraZeneca (+15.5%), Roche (+15.5%), Johnson & Johnson (+12.9%), GlaxoSmithKline (+10%). Chemicals shows a strong recovery in R&D investment (+9.8%), compared to the negative growth of the previous year. This is especially pronounced in the EU group of companies (+17%) where the large chemical companies show impressive R&D growth
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rates, e.g. Bayer (+30.3%), Solvay (+20.3%) and BASF (+19.8%). This is partly due to processes of acquisitions and concentration in the sector. Aerospace and defence raised its R&D investment by 12.5% continuing the trend of strong growth of the past years. The sector's most representative companies, EADS and Boeing increased their R&D investment by 21.2% and 47.7% respectively. Company trends Three EU companies keep a position within the top 10 R&D ranking: DaimlerChrysler, the top EU company with 5.2 bn EUR (5th), GlaxoSmithKline (7th) and Siemens (8th). Four US companies are in the top positions: Pfizer (5.8 bn EUR), Ford Motor, Johnson & Johnson and Microsoft. The performance of Scoreboard companies further improved in the past year. Sales of EU companies grew by 10% and sales of US and Japanese companies grew by about 8%. The profitability of EU companies increased further to 11.6% (between 12.9% for the US and 7.4% for Japan). The 2007 EU Industrial R&D Investment Scoreboard can be downloaded from: http://iri.jrc.ec.europa.eu
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Figure 1. Ranking of the world top 50 companies by their total R&D investment (millionEUR). Note: The numbers in parentheses, after the names of the companies, refer to their ranking in the 2006 Scoreboard. Source: The 2007 EU Industrial R&D Investment Scoreboard European Commission, JRC / DG RTD
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ANEXO B - MCTES – Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior,
Inquérito ao Potencial Científico e Tecnológico Nacional 2005
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