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BRANCA MARIA DE MENESES
JUVENTUDE, TRABALHO E FORMAÇÃO: UM ESTUDO COM JOVENS DAS CAMADAS POPULARES
DOUTORADO: PSICOLOGIA SOCIAL
PUC-SP 2007
BRANCA MARIA DE MENESES
JUVENTUDE, TRABALHO E FORMAÇÃO: UM ESTUDO COM JOVENS DAS CAMADAS POPULARES
Tese apresentada à Banca Examinadora daPontifícia Universidade Católica de SãoPaulo, como exigência parcial para obtençãodo título de Doutor em Psicologia Social,sob orientação do Prof. Doutor José LeonCrochík.
PUC-SP2007
BANCA EXAMINADORA
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MENESES, Branca Maria. Juventude, formação e trabalho: um estudo com jovens dascamadas populares. Tese (Doutorado). Programa de Psicologia Social, PontifíciaUniversidade Católica de São Paulo. São Paulo. 2007.
RESUMO
A apreensão de valores concernentes à relação entre formação e trabalho, sob a ótica de
jovens estudantes e trabalhadores das camadas populares, é o tema de investigação desta
tese. Com o interesse em compreender o significado atribuído a essa relação, objetivou-
se verificar as possíveis formas de expressão de autonomia desses jovens ou o quão
estão adaptados às normas estabelecidas pela sociedade. A população da pesquisa é
composta por jovens de 15 a 17 anos de idade, participantes, durante o ano de 2006, do
Programa de Formação Profissional, no Instituto Mirim de Campo Grande-MS. Dessa
população, foi extraída uma amostra de duzentos jovens, com base na Escala Formação
e Trabalho, elaborada de acordo com o método de Likert e validada pela autora. Os
temas que fazem parte desse instrumento estão subdivididos em quatro subescalas:
concepção de trabalho; atitudes valorizadas no trabalho; valor dado à educação escolar e
ao trabalho; adaptação à ideologia do mundo administrado. Os conteúdos que orientam
as questões das subescalas propostas foram estabelecidos e fundamentados em estudos
de autores da teoria crítica da sociedade, bem como em pesquisas que abordaram os
conceitos de juventude, trabalho e formação. Os resultados obtidos confirmaram a
hipótese de que os sujeitos da pesquisa, ao responderem os itens acerca da relação entre
formação e trabalho manifestaram, em suas escolhas, a prevalência de valores que
indicam concordância à lógica administrada pelo capital. Contudo, não se comprovou a
hipótese de que os jovens creditam mais valor à formação decorrente das experiências
vividas no trabalho, do que àquela obtida na formação escolar. De um modo geral, é
possível afirmar, ainda que haja, inequivocamente, o peso das contradições no pensar do
jovem, que há atitudes indicativas de reservadas resistências, no sentido de haver
contraposições e, ao mesmo tempo, concordância com os valores do sistema social
dominante.
Palavras-chave: juventude, formação, trabalho, sociedade e adaptação.
MENESES, Branca Maria. 2007. Youth, formation and work: one study with
youngsters of the popular layers. Thesis (PhD). Program of Social Psychology.
Pontifical University Catholic of São Paulo.
SUMMARY
The apprehension of values concerned to the relation between formation and work,
under the point of view of workers and students of the popular layers, is the research
subject of this thesis. The interest in understanding the meaning attributed to this
relation aimed at verifying the possible ways of autonomy expression of those
youngsters or how they are adapted to the rules established by the society. The universe
of this research, are youngsters aged between 15 and 17 years old that in 2006
participated in the Program of Professional Formation at Instituto Mirim de Campo
Grande/MS, from which was extracted a sample of two hundred youngsters, based on
the Formation and Work Scale, prepared according to the Likert method, and validated
by the author. The subjects that comprise this instrument are subdivided in four sub-
scales: work conception; attitudes valued at work; value given to the school education
and work; adaptation to the ideology of the managed world. The contents that guide the
questions of sub-scales proposed were established based on studies of authors of the
critical theory of the society, as well as on researches that approached the concept of
youth, work and formation. The results obtained confirmed the assumption that the
individuals of the research, while answering the items about the relation between
formation and work, they expressed in their choices the prevalence of values that
appoint agreement to the logics managed by the capital. However, it was no possible to
prove the assumption that those youngsters value more the formation resulting from
experiences lived at work, instead of that one obtained in the school formation. In
general, it is possible to state that, despite there is unequivocally the weight of the
contradiction in the thoughts of those youngster, there are indicative attitudes of
reserved resistances, in the sense of having contrapositions and, at the same time,
harmony with the values of the social dominating system.
Keywords: youngsters, formation, work, society and adaptation.
Aos meus amores, Mário, Andrei e Bruno.
Aos jovens trabalhadores do InstitutoMirim de Campo Grande, participantes dapesquisa.
AGRADECIMENTOS
Ao Professor Doutor José Leon Crochík, pela orientação segura, determinada,instigante e, especialmente, pelo esclarecimento sobre a Teoria Crítica da Sociedade.
Ao Professor Doutor Odair Sass, por compartilhar a orientação com o Prof. Leon, porsua sagacidade inquietante e, também, por iluminar meus caminhos no desafio dapsicometria.
Ao Mário, meu querido esposo, pelo irrestrito apoio, sem o qual seria muito difícil arealização desta tese.
A cada um dos Professores do doutorado, pelos bons momentos vividos de descobertas,de orientação e, até mesmo, por aumentarem as angústias sobre a necessidade do saber.
Ao Professor Doutor Sérgio Ozella, pelo respeito e compreensão de minhas dúvidasconceituais.
Aos meus colegas de doutorado pelas agradáveis horas de convivência e fervorososdebates no percurso desta formação.
Aos jovens do Instituto Mirim de Campo Grande (IMCG) que, atenciosamente,participaram da pesquisa.
À Presidente do Conselho Deliberativo do IMCG, Srª. Elizabeth M. Puccinelli, poracreditar no meu trabalho junto aos jovens.
À direção e aos técnicos do IMCG, pela colaboração na realização da pesquisa, emespecial, à Prof. Rosa M.de Oliveira Freitas, pelo apoio constante.
À Secretaria Estadual de Educação de MS, pela concessão da minha licença para fins deestudos.
Ao Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social, da Pontifícia UniversidadeCatólica de São Paulo.
Ao CNPq, pela concessão de dois anos de bolsa de estudo.
Que vai ser quando crescer? Vivem perguntandoem redor. Que é ser? É um corpo, um jeito, um
um nome? Tenho os três. Eu sou? Tenho demudar quando crescer? Usar outro nome, corpo
e jeito? Ou a gente só principia a ser quandocresce? É terrível, ser? Dói? É bom? É triste?Ser: pronunciado tão depressa, e cabe tantas
coisas? Repito: ser, ser. Er. R. Que vou serquando crescer? Sou obrigado a? Posso
escolher? Não dá para entender. Não vouser. Não quero ser. Vou crescer assim
mesmo. Sem ser. Esquecer.
(Carlos Drummond de Andrade, 2005, p. 37)
LISTA DE TABELAS
TABELA 4.1. - Cargas fatoriais das subescalas da escalaformação e trabalho .............................87
TABELA 4.2. - Resultado da subescala T: conceito detrabalho ............................90
TABELA 4.3. - Resultado da subescala AT: atitudesvalorizadas no trabalho ............................92
TABELA 4.4. - Resultado da subescala ET: valor dado àeducação e ao trabalho ............................95
TABELA 4.5. - Resultado da subescala A: adaptação àideologia do administrado ............................97
.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO........................................................................................................... 3
Definição do tema, dos objetivos e da hipótese central da pesquisa .......................... 3
Organização dos capítulos ......................................................................................... 11
CAPÍTULO 1 – JUVENTUDE E REBELDIA ......................................................... 14
1.1 – O conceito de adolescência............................................................................... 14
CAPÍTULO 2 – A FORMAÇÃO DO HOMEM E O TRABALHO: MARCAS DE
SOFRIMENTO E ADAPTAÇÃO............................................................................. 26
2.1- Trabalho e pseudoformação................................................................................ 27
2.2- Adaptação da flexibilidade de corpos juvenis ao trabalho ................................. 38
2.3 – Trabalho e alienação ......................................................................................... 47
CAPÍTULO 3 – A PSEUDOFORMAÇÃO INSTITUCIONALIZADA:
SIGNIFICADO DA ESCOLA E DA FORMAÇÃO PROFISSIONAL.................... 55
3.1- O valor dado ao trabalho e à educação por jovens brasileiros............................ 55
3.2 – Exigências do mercado de trabalho à formação profissional............................ 66
CAPÍTULO 4 – O PONTO DE VISTA DOS JOVENS ACERCA DA RELAÇÃO
FORMAÇÃO E TRABALHO...................................................................................76
4.1 – A investigação................................................................................................... 76
4.2 – Objetivo geral.................................................................................................... 78
4.3 – Hipóteses........................................................................................................... 80
4.4 – Características da população e da amostra da pesquisa.................................... 80
4.5 - Local da pesquisa............................................................................................... 83
4.6 - Instrumento de medida: escala formação e trabalho ......................................... 84
4.6.1. Objetivos e resultados psicométricos das subescalas da escala formação e
trabalho ...................................................................................................................... 86
4.6.1.1. Subescala T (concepção de trabalho)............................................................ 87
4.6.1.2. Subescala AT (atitudes valorizadas no trabalho).......................................... 87
4.6.1.3. Subescala ET (valor dado à educação escolar e ao trabalho) ....................... 88
4.6.1.4. Subescala A (adaptação à ideologia do mundo administrado) ..................... 89
4.7 – Etapas da pesquisa ............................................................................................ 89
4.8 – Apresentação e discussão dos resultados da escala formação e trabalho ......... 92
4.8.1- Resultados estatísticos por subescala .............................................................. 97
2
CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................... 107
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................... 113
ANEXOS ................................................................................................................. 118
3
INTRODUÇÃO
Definição do tema, dos objetivos e da hipótese central da pesquisa.
A apreensão de valores concernentes à relação formação e trabalho, sob a ótica
de jovens estudantes e trabalhadores das camadas populares, é o tema de investigação
desta tese.
O interesse em compreender o significado atribuído por esses jovens a essa
relação tem como objetivo verificar as possíveis formas de expressão de autonomia
desses jovens ou o quão eles estão adaptados às normas estabelecidas pela sociedade.
Para compor o universo de análise desta pesquisa, foram escolhidos jovens com
idade entre 15 e 17 anos, de ambos os sexos, participantes, durante o ano de 2006, do
Programa de Formação Profissional, no Instituto Mirim de Campo Grande/MS.
O fato de esta pesquisadora ter administrado, durante oito anos (de janeiro de
1997 até dezembro de 2004), o Instituto Mirim de Campo Grande - IMCG suscitou
questionamentos que impulsionaram a realização deste estudo. A experiência de
trabalho na Instituição constituiu um desafio constante e, ao mesmo tempo, tornava
claro a necessidade de aprender mais sobre o processo de formação do jovem que dela
participava. Embora essa experiência tenha sido desenvolvida com relativa autonomia
técnica e tendo sido possível realizar atividades entendidas como adequadas aos jovens
da Instituição, constantes conflitos e dúvidas sempre se fizeram presentes acerca do que
representava o trabalho desenvolvido. Ficava evidente o quão difícil é resistir ao poder
instituído (se é que realmente se resiste), mesmo quando há a deliberada intenção de
modificar a dura realidade existente. Por conta dessas inquietações, foi essa a Instituição
escolhida para realizar a pesquisa.
Fundada no ano de 1966, a Instituição, então chamada Corporação dos
Patrulheiros Mirins de Campo Grande (no período de 1980 a 1982 esteve desativada),
tinha uma proposta de trabalho estruturada por cursos profissionalizantes (auxiliar de
4
escritório, padaria, pintura em tecido, horticultura, marcenaria, sapataria, dentre outros),
que requeriam habilidades operacionais. Os princípios dessa formação eram centrados
em uma educação militar. A partir do ano de 1995, houve alteração na proposta de
trabalho e, conseqüentemente, nos conteúdos dos cursos. Os adolescentes passaram a
contar com cursos de Office boy, recepcionista, auxiliar de escritório, datilografia e
foram acrescentados estudos de português básico, matemática básica e uma disciplina
sobre noções básicas para o trabalho.
Conforme o que pôde ser levantado em entrevista com funcionários que
trabalhavam na Instituição desde o período mencionado, foi constatado que mesmo
estando a maioria dos jovens já cursando o segundo grau ou as últimas séries do ensino
fundamental, os conteúdos das disciplinas de Português e Matemática eram condizentes
aos conteúdos ministrados nas séries iniciais. Por outro lado, quando a pesquisadora
iniciou sua gestão administrativa, foi observado, ao discutir com alguns professores
sobre seus planos de aula, que alguns deles sequer sabiam o que significava o que estava
escrito em seus planos.
Entre 1997 a 2004, período da experiência administrativa desta pesquisadora,
novas reformulações foram feitas na proposta de trabalho: criação de salas de leitura,
estudos de filosofia, curso de informática, curso de preparação básica para prestação de
serviços (cursos de tele marketing, telefonista, recepcionista, legislação trabalhista,
empacotador, auxiliar de escritório, secretária, Office boy e outros), dinâmicas de grupo
orientadas por psicólogos, além de aulas de português, matemática e inglês básico,
práticas desportivas, incentivo à participação em eventos culturais e reorganização da
fanfarra. Foram reestruturadas, também, atividades com o conjunto de funcionários e
feitas ampliações e reformas do espaço físico, para adequá-lo ao bom andamento dos
trabalhos.
Dentre o conjunto das reformulações propostas ao funcionamento do IMCG
(Instituto Mirim de Campo Grande), considerava-se que era preciso ajustá-las às
exigências do mercado de trabalho. Assim, desde o início da gestão administrativa,
foram sendo tomadas providências no sentido de esclarecer a equipe técnica sobre as
mudanças consideradas necessárias. Para a realização do trabalho, foi organizada uma
equipe, designada como Grupo Operativo, representada por técnicos dos diferentes
setores da Instituição, responsáveis por atividades rotineiras.
5
O trabalho desse grupo consistia em avaliar e discutir o que acontecia na
Instituição, independente de dizer respeito à própria área de trabalho, para avaliar
resultados e discutir possíveis mudanças. Cabia a cada representante do Grupo
Operativo discutir, com seus colegas de setor, os assuntos de cada reunião e colher
sugestões. Desse modo, os funcionários tinham informações das atividades de todos os
setores e podiam participar com suas idéias. Quando necessário, ocorriam reuniões
separadas com cada setor, mas o resultado nunca deixava de ser avaliado pelo Grupo
Operativo. Essa prática não fazia parte do gerenciamento anterior e foi vista como
estranha no início, pois as pessoas estavam acostumadas a fazer apenas atividades de
rotina, sem pensar em seu significado para a formação dos jovens participantes da
Instituição. Para agilizar essa forma de trabalhar, houve o apoio de Leila Tannous
Guimarães, psicanalista didata do GESP (Grupo de Estudos Psicanalíticos de MS), que
organizava seminários de discussões com os professores e com a equipe do Serviço de
Assistência Social.
Mas, para realizar reflexões sobre a prática realizada na Instituição, bem como
implementar alterações, foi preciso, para esta pesquisadora, aprender a assumir a figura
de autoridade administrativa visando garantir o trabalho articulado entre os diferentes
setores do IMCG. Ao mesmo tempo, tinha-se ciência que as propostas de mudanças não
podiam acontecer por decretos.
No início daqueles trabalhos, romper com as marcas fortemente entranhadas de
uma administração militarista, que compunha as atividades da Instituição, estruturada
no modelo dos anos da ditadura, implicou em travar uma cuidadosa luta para não serem
assumidas atitudes paternalistas ou assistencialistas. Por outro lado, havia o empenho
constante no sentido de garantir o respeito aos jovens como sujeitos de direitos, zelando
pelo cumprimento da lei. Ao mesmo tempo, houve a preocupação em fundamentar as
atividades, realizadas com os púberes, em estudos técnicos. Para desenvolver essa
proposta de trabalho buscou-se parceria com diferentes instituições universitárias. O
objetivo era garantir a capacitação do corpo técnico da Instituição e ir modificando os
valores cristalizados pela experiência de trabalho desenvolvida até então. Tarefa difícil,
pois foi preciso ir rompendo as barreiras fortemente construídas que compunham o
ideário discriminatório em relação ao processo de formação profissional proporcionado
àqueles jovens do IMCG/MS.
6
Chamava a atenção, de modo marcante, o fato de serem desprovidas de qualquer
tipo de avaliação as atividades oferecidas aos jovens e por haver, por parte da equipe,
pouco interesse pelos conhecimentos técnicos relacionados ao trabalho com os jovens.
A preocupação maior – exigência de eficiência – materializava-se na rígida disciplina,
ainda espelhada em atitudes do comportamento de militares. Contudo, essas atitudes
destoavam do fato de não ser incentivada a prática desportiva, mesmo havendo
condições estruturais para que ela ocorresse.
Foi possível observar, a partir das reuniões realizadas, ainda outras deficiências:
os conteúdos dos cursos profissionalizantes não correspondiam às exigências do
mercado de trabalho e muitos professores não compreendiam o significado e a
importância do que ensinavam aos alunos, pois sequer sabiam explicar o que escreviam
em seus planos pedagógicos.
Os jovens do IMCG, depois de participarem dos cursos profissionalizantes, eram
encaminhados ao mercado de trabalho, em vagas decorrentes de contratos estabelecidos
pela Instituição. Para esse procedimento havia o acompanhamento da equipe técnica.
Caso o jovem não conseguisse permanecer no emprego, por não atender às exigências
do empregador, prevaleciam atitudes disciplinatórias, pelos problemas que surgiam.
Quase sempre, era a eles direcionada a responsabilidade por não se esforçarem, sem
levar em conta que, muitas vezes, apesar do esforço individual, o jovem precisava de
apoio para superar as dificuldades, frente às normas institucionais e ao ajuste exigido e
imposto pelo mercado de trabalho.
Mas os jovens não sofriam penalizações apenas ao deixar o emprego, ao
contrário, havia também cobranças por qualquer tipo de conduta que fugisse às normas
estatutárias existentes no IMCG, embora nem sempre as justificativas educativo-
disciplinadoras se fizessem explícitas, como, por exemplo, a proibição de namorar na
Instituição.
O interesse em modificar a proposta de trabalho oferecida àqueles jovens conduziu
a muitas reestruturações no trabalho institucional. Apesar das dificuldades e resistências
iniciais, acabou por culminar no reconhecimento da sociedade civil pelo trabalho que
passou a ser realizado, sendo até mesmo premiado e indicado como modelo de gestão
7
eficiente, devido ao resultado da administração empresarial e, também, pelas atividades
pedagógicas desenvolvidas junto aos jovens.1
Contudo, é importante esclarecer que não há o interesse em desmerecer o
trabalho anteriormente realizado e nem mesmo glorificar as mudanças ocorridas, uma
vez que há ciência de que os processos formativos institucionalizados, nas diferentes
áreas de conhecimento, não deixam de representar os valores predominantes na
sociedade. Todavia, não é possível modificar e, até mesmo, superar tais valores sem
identificá-los.
Mas o reconhecimento pelas mudanças realizadas pôde ainda ser constatado
pelo aumento significativo da concorrência por uma vaga no IMCG. Entre 1991 e 1997,
eram oferecidas cerca de 500 vagas por ano, e a concorrência era de uma média de 2,4
vagas por candidato. No decorrer dos últimos oito anos a oferta cresceu, variando entre
570 a 700 vagas, e o número de concorrentes passou a oito candidatos por vaga. 2
O grande aumento dessa demanda, na busca pelo primeiro emprego, pode ser
explicado de várias maneiras: a forte crise de empregabilidade, a falta de perspectiva de
futuro para os jovens, a crescente preocupação das famílias pobres em tirar seus filhos
da rua. Enfim, as dificuldades gerais que fazem parte da estrutura desta sociedade
voltada aos interesses do mercado, em detrimento das pessoas. Outra explicação, para o
aumento significativo na procura anual de jovens por uma vaga no IMCG, pode ter sido
o impacto provocado pela mudança no conceito interno da Instituição, principalmente,
ao romper os resquícios da educação voltada aos valores da formação militar.
Embora seja a finalidade precípua da Instituição garantir cursos
profissionalizantes, com o intuito de facilitar o ingresso do jovem estudante das
camadas populares no competitivo mercado de trabalho, a reforma proposta, na gestão
em questão, procurou não se restringir à formação profissional stricto sensu, pois, houve
a preocupação de que a formação profissional pudesse ir além da mera exigência em
organizar cursos de habilidades técnicas. Tendo em vista essa finalidade, foram
desenvolvidas atividades com o objetivo de tentar despertar o interesse dos jovens pela
1 O IMCG recebeu o IX Prêmio Bem Eficiente, gestão 2004.2 De acordo com dados publicados na revista Instituto Mirim em Revista, gestão 1997/2004, de 1991 a1996, por ano, cerca de 1200 adolescentes, em média, buscaram ocupar uma vaga na instituição. Entre
8
busca do conhecimento e, também, possibilitar ao corpo técnico repensar a prática de
trabalho e, ao mesmo tempo, conhecer mais sobre adolescência, com o propósito de
modificar valores cristalizados.
Mas, para a implementação de mudanças na Instituição não foram poucas as
dificuldades, dentre as quais pode ser citada a escassez de material de estudo sobre
adolescência que dessem suporte ou analisassem práticas que optassem por dar voz ao
jovem, sobretudo, quando eles pertencem às camadas mais pobres da sociedade, a fim
de ajudar a refletir sobre a formação desses jovens e a relação dessa formação com o
mercado de trabalho. A predominância de pesquisas nessa área atém-se mais a temas
que estão vinculados aos interesses das escolhas profissionais, índices estatísticos sobre
empregos e desempregos, exigências do mercado para formação profissional e estudos
de políticas públicas sobre o primeiro emprego.
O fato de predominar esse tipo de literatura, compõe o imaginário de que o
trabalho com adolescentes e, sobretudo, com os mais pobres, é sempre indicativo de um
enorme desafio, tendo por referência a maneira como é compreendida essa fase da vida:
época de conflitos, de conturbações, de perdas e de comportamentos rebeldes.
De fato, o trabalho não deixa de ser desafiante, principalmente como ocorreu na
experiência mencionada, na tentativa de realizar ações que pudessem fazer resistência,
ou mesmo romper com os valores instituídos pela sociedade. Contudo, em um contexto
em que havia uma média de mil e quinhentos jovens, pôde-se constatar que a
dificuldade maior estava nos estereótipos conceituais consagrados pelas pessoas e nos
procedimentos institucionais estabelecidos, em especial, os que dependiam de
exigências burocráticas. Estas, muitas vezes, eram impeditivas de realizar as mais
simples ações, e, nem sempre, garantia as benesses anunciadas e pretendidas pelo poder
institucionalizado.
Ao considerar a experiência de trabalho desenvolvida no IMCG, ousa-se afirmar
que são os adultos que complicam o mundo dos jovens, por já terem idéias pré-
concebidas de como estes se comportam. Tal afirmação é feita pautada na observação
do comportamento da grande maioria dos jovens participantes do trabalho realizado ao
1997 e 2004, as matrículas cresceram 350%. A procura anual passou, em média, para mais de 4300/ano, oque soma um total de 30 mil jovens.
9
longo dos oito anos mencionados, pois ficou evidente que as atitudes deles nem sempre
se encaixavam nos perfis recorrentes sobre a adolescência. A tão anunciada rebeldia não
compunha, necessariamente, o quadro de seus comportamentos. De um modo geral, o
percentual de jovens com os denominados distúrbios de conduta, de desequilíbrios, era
muito pequeno em relação à maioria (uma média de 4,8%, de acordo com pesquisa feita
na Instituição) 3.
Ao constatar que os estereótipos não se confirmavam, surgiam questionamentos:
seria a falta da esperada rebeldia decorrente da história da Instituição, calcada em
atitudes de repressão, que amedrontava aqueles jovens? Seria o fato de os jovens
precisarem do emprego, por serem pobres, o motivo de adaptarem seus comportamentos
às normas estabelecidas pela Instituição?
Acreditava-se que a vida difícil que tinham de assumir precocemente, sem que
lhes desse condições de fazerem escolhas, já os colocava na situação de submissos e
impossibilitados de expressarem seus anseios. Havia, ainda, a constante dúvida e
inquietação acerca da possibilidade de existir espaços subjetivos a serem ocupados, no
processo de formação daqueles jovens, espaços que pudessem conduzir à constituição
de atitudes de autonomia do pensamento. Pois, ao mesmo tempo em que se buscava
trabalhar nesse sentido, existia o fato concreto de ser preciso encaminhá-los ao mercado
de trabalho. Tal necessidade implicava em adaptá-los às exigências impostas por esse
mercado, o que demandava estabelecer o padrão da “racionalidade instrumental”, como
linha de conduta às ações pedagógicas. Então, havia sempre o conflito do que pudesse
significar o trabalho realizado, pela Instituição, na formação dos jovens.
Todas essas questões, durante o período que a pesquisadora esteve à frente da
Instituição, eram por demais inquietantes. Por isso, decidiu-se investigar, mais
sistematicamente, a relação entre juventude, formação e trabalho. Para tanto, o jovem do
próprio IMCG tornou-se o sujeito da pesquisa. Para alcançar esse propósito e caminhar
para o esclarecimento dos conceitos básicos da pesquisa, o referencial teórico escolhido
ateve-se à teoria crítica da sociedade, vinculada à Escola de Frankfurt e representada,
entre outros, pelos estudiosos: Adorno (1903-1969), Horkheimer (1895-1973) e
Marcuse (1898-1979).
3 O dado apresentado foi levantado pela pesquisadora no Setor do Serviço Social do IMCG/MS.
10
Os estudos desenvolvidos por esses autores referem-se à crítica à sociedade
burguesa, esclarecendo o movimento real dessa sociedade e o quanto há de irracional na
racionalidade que tem administrado a vida dos homens, sem pretender constituir um
modelo direcionador, um sistema ordenador e redutor do pensamento ao formalismo
lógico, que subordina a razão ao que está dado.
Esclarecida a orientação teórica escolhida para dar suporte à pesquisa, é
importante afirmar que, na realização desta proposta de investigação, o caminho a ser
percorrido tem por princípio considerar a necessidade de desenvolver o conhecimento
ancorado nos significados e valores éticos, no qual o objeto está inserido. Isso significa
que, ao analisar as categorias indicadas, é fundamental abalizar o momento histórico
que as engendram, o que implica saber que a lógica imposta pela sociedade tem tornado
os homens instrumentos de seus arranjos que não descompassam do ritmo administrado.
Assim, essa lógica, os têm mantido no seu (des) harmonioso conjunto, que ainda se
apresenta tocando sempre a sofrível melodia da dominação, impeditiva de levar os
homens a constituírem uma formação que os esclareça, ilumine-os para romperem com
a ordem instituída na sociedade. E, ainda no sentido metafórico: considera-se que a
educação/formação deve possibilitar ao indivíduo sair do ritmo regido pela lógica do
mundo administrado4. E a melodia a ser regida tocaria para enlevar o homem aos
acordes da liberdade e o faria perceber que existem outras formas para organizar a vida.
Uma vida em que todos tenham direitos iguais na participação dos ensaios e possam
criar o novo, diferenciando suas composições, suas melodias, na orquestra da vida.
Por isso, não deixa de ser um compromisso ético pensar o que representa a
organização da sociedade atual na vida de jovens trabalhadores estudantes das camadas
populares e como a sociedade os tem formado, ao estudar a relação entre formação e
trabalho, com o propósito de ouvir o que dizem esses jovens. Espera-se, com isso,
contribuir para desnudar os valores formalizados pela ideologia burguesa, ao explicar o
significado dessa relação, bem como o ideário existente em relação ao comportamento
da juventude, até mesmo denominada como rebelde, buscando refletir sobre os aspectos
conflitantes que definem esse tempo da vida, ao se falar de jovens trabalhadores
estudantes das camadas populares.
4 O conceito de mundo administrado é inerente ao de indústria cultural, apresentado por Horkheimer eAdorno (1985). Resumidamente: indica a consciência manipulada das massas, impeditiva do
11
Pelo perfil social, econômico e cultural da grande maioria desses sujeitos, pode-
se aventar a idéia de que estes terão poucas oportunidades de alcançarem diferentes
postos de trabalho, dadas as limitadas opções de escolhas existentes em suas vidas.
Manterem-se em um posto de trabalho (frente à dificuldade de empregabilidade nos dias
atuais) já configura grandes expectativas para eles. A oportunidade de realizar
conquistas idealizadas, sonhos da formação profissional desejada – conforme compõe o
ideário da ideologia existente – fica como responsabilidade centrada apenas no sujeito,
no seu esforço e desempenho pessoal. Com isso, deixa-se de levar em conta que a
estrutura hierárquica existente na sociedade é marcada por relações de dominação e
acaba por impedir a autodeterminação dos indivíduos. Assim como afirma Crochík
(1999, p. v) “à necessidade de dominação social sobre os indivíduos corresponde a
necessidade de dominação do indivíduo sobre si mesmo e sobre os outros”.
A dominação existente sobre os indivíduos nesta sociedade acaba por
possibilitar poucos espaços para expressões de atitudes de autonomia para o jovem em
questão, considerando o quanto é subjugado em suas experiências formativas, em
particular, nas decorrentes das relações de trabalho.
Com base nessas questões, a hipótese central que orienta esta tese é que nas
análises elaboradas pelos sujeitos da pesquisa, ao refletirem sobre questões referentes à
relação entre formação e trabalho, predominam valores que indicam concordância à
lógica administrada pelo capital.
Organização dos capítulos
A estrutura do presente trabalho, introdutoriamente, contém reflexões que visam
delinear o interesse suscitado na realização desta investigação, seguidas das discussões
dos principais temas da pesquisa e das reflexões conclusivas resultantes da empiria.
No primeiro capítulo, faz-se a discussão sobre o conceito de adolescência e
juventude, aqui adotados como sinônimos, com o objetivo de questionar concepções
formuladas por estudos na área da Psicologia, destacando os pontos conflitantes. O
desenvolvimento do pensamento crítico e que penetra no processo de formação do indivíduo, ou seja, em
12
objetivo proposto é apresentar os estereótipos que universalizam esses conceitos e que,
muitas vezes, impedem olhar para o jovem (de qualquer camada social), considerando
experiências concretas de vida.
Hoje, essa fase da vida é indicada, de acordo com a legislação vigente, como o
momento de inserção no mercado de trabalho, e os sujeitos desta pesquisa fazem parte
desse período geracional. Outro aspecto entendido como relevante atém-se ao fato de o
comportamento do jovem, em geral, ser carregado de estereótipos e atitudes que nem
sempre são condizentes à realidade de sua vida. Em especial, os argumentos referentes à
autonomia de comportamento, costumeiramente identificados por atitudes de rebeldia,
que desconsideram a compreensão da adolescência como categoria histórica.
No segundo capítulo, são apresentados os conceitos entendidos como
imprescindíveis à orientação desta pesquisa: a relação entre formação e trabalho. O
objetivo é analisar o que essa relação tem representado, sob o domínio do capital, para a
vida do jovem trabalhador e de sua família.
No terceiro capítulo, sob perspectivas diversas, é apresentado um levantamento
da produção acadêmica referente a estudos realizados com jovens brasileiros, tratando
dos interesses e dos valores deles em relação à escola e ao trabalho. Também são
discutidas as exigências do mercado de trabalho para a formação profissional na
sociedade atual, procurando esclarecer que mesmo o poder público, apesar de expressar
interesse pela formação dos trabalhadores, não deixa de atender, principalmente, às
necessidades do mundo administrado pelo capital.
No quarto capítulo, trata-se da pesquisa empírica e se esclarece acerca do
processo de construção da Escala Formação e Trabalho, com a discussão dos
principais temas e a apresentação do estudo realizado para a validação dessa escala.
Esse instrumento tem o formato de escalas do método Likert, com um total de 31
itens. Para cada item, estão associados escores de 1 a 4 pontos. Os temas dessa escala
estão divididos em quatro subescalas: concepção de trabalho (subescala T); atitudes
valorizadas no trabalho (subescala AT); valor dado à educação escolar e ao trabalho
(subescala ET); adaptação à ideologia do mundo administrado (subescala A). Para
todos os níveis da cultura.
13
verificar o número de variáveis subjacentes (fatores) ao conjunto dos 31 itens, das
diferentes subescalas, recorreu-se à análise fatorial.
Para a análise dos itens da escala proposta e avaliação conclusiva desta pesquisa,
pautou-se em estudos de autores frankfurtianos, referência teórica desta tese. Vale
ressaltar que o entendimento desses estudiosos é indispensável para a compreensão da
crise de formação existente na sociedade moderna e para esclarecer o quanto de
sofrimento, alienação e massificação tem feito parte das atitudes necessárias à adaptação
do indivíduo aos interesses determinados pelo mundo administrado.
14
CAPÍTULO 1 – JUVENTUDE E REBELDIA
A luta contra os conceitos universais nãotem sentido. Mas isso não nos diz o que
pensar da dignidade do universal. O queé comum a muitos indivíduos, ou o que
reaparece sempre no indivíduo, nãoprecisa absolutamente de ser mais
estável, mais eterno, mais profundo doque o particular
(Horkheimer & Adorno, 1985, p. 205).
Neste capítulo, o objetivo é discutir o conceito de adolescência, com o interesse
de apresentar reflexões que permitam pensar nesse tempo da vida fora de configurações
conceituais abstratas e generalizantes. Isso implica tratar desse tema, fundamentando-o
como categoria histórica. Para tal intento, foram propostas discussões concernentes aos
estereótipos existentes em estudos psicanalíticos, ao definir o adolescente como rebelde,
indicando pontos conflitantes dessa abordagem. Para discutir esses estereótipos, a
referência teórica pauta-se nos autores da teoria crítica da sociedade.
1.1 – O conceito de adolescência
Ao considerar a impossibilidade de universalizar o conceito de adolescência,
mas sem deixar de subsidiá-lo por concepções gerais que têm predominado ao explicar
essa fase da vida, como período de transição, tempo de indefinições, posterior à infância
e anterior à vida adulta, ousa-se aqui pensá-lo em figuras retóricas, recorrendo a
conceitos da dialética hegeliana, da seguinte forma: a infância é identificada ao botão de
uma flor; o botão (infância) desaparece ao desabrochar a flor (adolescência); o botão é
15
refutado pela flor, que o contém e o nega; a adolescência nega e contém a infância; a
flor transforma-se em fruto (a vida adulta); o fruto nega e contém a flor e torna-se a
essência da planta; o ser adulto nega e contém a juventude; o fruto (o adulto) traz a
semente e torna-se o vir a ser de um novo processo de reprodução de vida5.
Recorrer à dialética de Hegel visa expressar a dinâmica da vida e, em especial, a
vida juvenil. Assim, ao pensar no conceito de juventude, na sociedade atual, implica
definir aquilo que o jovem deixa de ser e o seu tornar-se. Tais formulações traduzem a
substancialidade abstrata do conceito pela sua negatividade, o que significa explicitar
diferenças e articular características que possam identificá-lo, referendadas pelos seus
opostos. Como aponta Marcuse (1967, p.199), “o conceito expressa de algum modo à
diferença e a tensão entre potencialidade e realidade – identidade nessa diferença”. Ora,
entende-se que há uma gama significativa de conceitos designativos da adolescência,
porém, na ordem das sintaxes, esse tempo acaba por configurar mais predicados e
adjetivos ao ser denominado de primavera da vida, florescer da idade, tempo dourado,
tempo de liberdade, de beleza, de vigor físico, de descobertas, de escolhas (inclusive as
profissionais).
Mas, como são reunidas as qualidades que caracterizam esse tempo da vida
humana situado entre a infância e a maturidade? Seria possível substantivá-las?
Aludir apenas às palavras, formuladas pelo caminhar das idéias, facilita e, até
mesmo, encanta, ao pensar esse tempo da existência e pode conduzir à lógica do
pensador alemão sobre a Idéia Absoluta e assim culminar em um exemplo supremo da
unidade em que todas as diferenças desaparecem. Contudo, a produção do pensamento
transcende o só pensar, pois, como afirma Marcuse (1967, p. 201): “O material do
pensamento é material histórico independente do quão abstrato, geral ou puro ele se
possa tornar na teoria filosófica ou científica”. De acordo com essa lógica, faz-se
necessário partir das condições históricas, dos elementos da experiência de vida de
jovens trabalhadores estudantes das camadas populares, das particularidades de suas
vidas e dos valores apreendidos, no que tange ao conjunto das normas impostas pela
sociedade, para conceituar o ser adolescente. Mas, de qualquer forma, a racionalidade e
5 A discussão, que contém a analogia do filósofo alemão, faz parte do prefácio por ele escrito na obraFenomenologia do Espírito (Hegel, 2002, p. 26).
16
a lógica invocadas no movimento do pensamento e ação são as das condições dadas a
serem transcendidas, como esclarece o autor acima mencionado.
Ao invocar o movimento do pensamento para categorizar a adolescência, é
preciso analisar o movimento histórico de seus conceitos ao explicar seus tributos,
códigos, taxonomias e sistemas que os representam e os configuram em categorias
universais6, bem apresentadas em vasta literatura, de diferentes áreas de estudo e, em
especial, da Psicologia e da Sociologia.
Assim, não se pode deixar de pensar que as mudanças não são fenômenos em si,
descolados do que ocorre no conjunto da sociedade e desconsiderar o valor histórico de
verdades conceituais. Basta olhar para uma tela da Idade Média para verificar que o
padrão conceitual de beleza de uma jovem valorizava a protuberância abdominal. Nos
dias atuais, há até mesmo muitos jovens que deterioram a saúde no intuito de manter o
padrão estético longilíneo.
Acorrer aos estudos que advertem em relação às variações do significado de ser
jovem, considerando os diferentes contextos sociais, culturais e econômicos, visa
desvendar as diversidades da criação de cada juventude, em cada tempo histórico e,
assim, poder pensar sobre o que determina as atitudes que prevalecem em seus
comportamentos nos dias atuais.
Para este estudo, dentre a multiplicidade de categorias que discutem esse tempo da
vida, a escolha recai sobre o conceito de rebeldia, por ser comumente utilizado. É mister
afirmar que esse conceito está relacionado a atitudes condizentes com autonomia
cognitiva e de comportamento, corroborando a explicação de que o jovem é capaz de
pensar criticamente sobre o mundo que o cerca7.
6 De acordo com Adorno e Horkheimer (1985, p. 204-205): “Os conceitos universais, formados pelasdiversas ciências com base na abstração ou na axiomatização, constituem o material da representação,assim como os nomes que servem para designar coisas individuais. A luta contra os conceitos universaisnão tem sentido. Mas isso não nos diz o que pensar da dignidade do universal. O que é comum a muitosindivíduos, ou o que reaparece sempre no indivíduo, não precisa ser absolutamente de ser mais estável,mais eterno, mais profundo do que o particular” . 7 Jean Piaget, ao explicar o sistema de operações formais do pensamento do adolescente, afirma: “ Sódepois que este pensamento formal começa, por volta dos 11 a 12 anos, é que se torna possível aconstrução dos sistemas que caracterizam a adolescência. As operações formais fornecem ao pensamentoum novo poder, que consiste em destacá-lo e libertá-lo do real, permitindo-lhe, assim, construir a seumodo as reflexões e teorias. A inteligência formal marca, então, a libertação do pensamento e não é deadmirar que este use e abuse, no começo, do poder imprevisto que lhe é conferido. Esta é uma das
17
Ao considerar as reflexões, formalizadas na introdução desta tese, vale a pena
imaginar se é possível “encaixar” o ser rebelde às exigências impostas pelo mercado de
trabalho nos dias atuais e, principalmente, quando se trata do jovem que trabalha e
estuda vivendo sob a pressão de ter que garantir a própria subsistência e, muitas vezes, a
da família, como ocorria com muitos jovens do IMCG.
A presença marcante dessa categoria – rebelde8 – não deixa de abarcar uma série
de equívocos que merecem ser pensados: o quão rebelde realmente são os jovens? O
conjunto de suas atitudes corresponde às diversas explicações indicativas de autonomia?
O poder da indústria cultural, na sociedade atual, tem deixado espaços para atitudes
rebeldes? O conceito de rebelde não colabora para compor o quadro de uma pretensa
democracia que até permite manifestos de revolta juvenil? Não configuraria um
significado idealizado para camuflar as vicissitudes da sociedade, as falácias de seus
programas - das políticas públicas - para a juventude, principalmente, no que tange ao
processo de formação profissional? Frente a tais questões, pode-se considerar,
adiantando o que será assunto no capítulo três, que a existência de substancialidade dada
à categorização do conceito de adolescência tem ocorrido sem abalizar o que tem
representado o avanço tecnológico no processo das exigências requeridas à formação
profissional.
Segundo estudos de Psicologia e de Sociologia, o ser rebelde faz parte do quadro
de comportamento do jovem. O psicanalista Erikson (1968, p.129), um estudioso dos
diferentes ciclos da vida, ao explicar a “epigênese da identidade”, diz que, na
novidades essenciais que opõe a adolescência à infância: a livre atividade da reflexão espontânea”(Piaget, 1995, p. 60).Vygotsky, ao abordar a idade de transição (adolescência), afirma: “ En esa época madura la personalidady su concepción del mundo, es el período de las síntesis superiores producidas por la crisis del devenir yde la maduración de aquellas formaciones superiores que son el fundamento de toda la existenciasconsciente del ser humano”. (Vygotsky, 1996, p. 200).Anna Freud, ao explicar a intelectualização na puberdade, chama atenção para o desabrochar daintelectualidade e a incoerência de seu comportamento: “Argumentarão a favor e contra o amor livre, ocasamento e a vida familiar, a existência autônoma ou adoção de uma profissão, a vida errante ou afixação, e discutirão problemas filosóficos como religião ou livre-pensamento, diferentes teorias políticas,tais como revolução versus submissão à autoridade, ou a própria amizade sob todas as formas. (...)ficaremos não só surpreendidos pelo conferir e desimpedido âmbito de seus pensamentos maisimpressionantes, também, pelo grau de empatia e compreensão manifestado, pela aparente superioridadeem relação a pensadores mais maduros e até, por vezes, pela sabedoria que revelam no tratamento dosmais difíceis problemas” (Freud, A. 1974, p. 135-136).8 O conceito de rebelde, de acordo com o Dicionário Houaiss, significa: “que ou quem se rebela ourebelou; amotinado, revoltoso; que ou quem não se submete, não acata ordem ou disciplina;insubordinado (juventude r.) (r sem causa)...” (2001, p. 2394). A definição “juventude r” indicacaracterística do comportamento juvenil como rebelde e “r sem causa”.
18
adolescência, ocorre um processo por ele designado de moratória: um tempo para
integração dos elementos de identidade no comportamento do adolescente. Ou seja, um
tempo de crise, necessário para que ele adquira confiança em si e procure
fervorosamente homens e idéias nos quais possam ter fé, mas sem deixar de expressar
suas desconfianças. E, em outro momento, há o desejo de fazer escolhas livremente,
tomar decisões e assumir os medos que possam ocorrer desse seu querer, esclarece
Erikson (1968).
Para Erikson (1968), estudioso da Identidade, juventude e crise, em qualquer
período dado da história, o tempo mais afirmativamente excitante será desfrutado por
aquela parte da juventude que se encontrar na onda de um progresso tecnológico,
econômico ou ideológico aparentemente promissor de tudo que a vitalidade juvenil
pode desejar. Mas a adolescência seria menos “tempestuosa” no segmento da juventude
talentosa e bem treinada na exploração das tendências tecnológicas em expansão e apta,
por conseguinte, a identificar-se com os novos papéis de competência e invenção e a
aceitar uma perspectiva ideológica mais implícita.
São visíveis as contradições expressas no processo de identidade explicado por
Erikson (1968), pois para ele a melhor parte da juventude, ao deixar de ser
“tempestuosa”, é quando o jovem encaixa-se, ou seja, fica apto para ingressar no
sistema e aceitar uma perspectiva ideológica mais explícita. Ao abordar o tema da
inserção no campo profissional, diz que os significados assumidos excedem as questões
de remuneração e status, pois, de seu ponto de vista, o progresso tecnológico é um fator
gerador de estabilidade.
Nos dias atuais, com a acirrada competição existente, até mesmo porque a
tecnologia tem suprimido postos de trabalho, o sentimento que tem prevalecido, para
uma grande maioria de jovens, é a sensação de impotência. O jovem tem tido
dificuldade de ver-se como parte integrante da sociedade. Há uma sociedade que lhe faz
exigências mas não está estruturada para corresponder às exigências que faz, deixando
cada um responsável por si mesmo. E, como se sabe, a ideologia predominante prioriza
o resultado do aumento da produção e o mercado dos bens, e não os indivíduos. Assim o
jovem, por sua vez, acaba por ter importância maior no papel de consumidor, como um
filão diferenciado do mercado.
19
O comportamento do jovem, explicado por Erikson (1968), mesmo apresentando
contradições, não deixa de ser importante. Contudo, os conceitos a que recorre não
devem ser olhados como categorias delimitadas e marcadas, afirmativas sobre o que é o
comportamento do jovem. É preciso deixar aberto o espaço para o que pode vir-a-ser e
as possíveis contradições do movimento de constituir-se adolescente, já que o pensador
psicanalista deixa de abrir espaços em sua categorização. A constituição da identidade
adolescente, para Erikson (1968), reafirma-se, tem um significativo caráter adaptativo,
pois ele pondera que, quando o meio priva o adolescente, de forma radical, de todas as
formas de expressão que lhe possibilita o desenvolvimento e a integração conseqüente,
a sua resistência pode adquirir “o vigor selvático que se encontra nos animais que são
forçados, subitamente, a defender a própria vida. Pois, de fato, na selva social da
existência humana, não existe sentimento vivencial sem um sentimento de identidade.”
(Erikson, 1968, p.130).
O espaço – moratória – para rebelar-se, é identificado em um caráter
heteronômico para esse autor. Tal tempo – estabelecido pela sociedade atual – é
importante para a vida do jovem, porém não em quadros previamente determinados,
como Erikson (1968) e outros psicanalistas estabelecem. Sem desconsiderar a
importância desses estudos, a teoria crítica da sociedade chama a atenção para os
aspectos regressivos existentes quando os conceitos fecham as possibilidades de
experiências. Assim, o que poderia ser o novo, ao se pensar sobre o que concerne à
adolescência, continua sendo o velho: conflitos, crises. Por isso, é preciso direcionar o
olhar para verificar se há espaços que possam operar o pensamento no sentido da
liberdade.
As argumentações de Erikson (1968) não diferenciam, substancialmente, das
afirmações de Anna Freud (1974), quanto a aspectos presentes no comportamento de
adolescentes. Para essa autora, o jovem idealiza o mundo adulto e isso incrementa seus
conflitos, fazendo aparecer as contradições do seu processo de desenvolvimento. Para
ela, a intelectualização do jovem é explicada como um mecanismo de defesa típico da
adolescência.
Adorno (1991), em estudos feitos sobre as argumentações dessa psicanalista, faz
crítica à posição que ela assume sobre adolescência. Identifica-a como revisionista em
relação à psicanálise freudiana e considera que ela utiliza suas categorizações com fins
20
“sociologizantes”, pelo fato de não valorizar adequadamente a complexa dinâmica entre
a estrutura orgânica da psique – questão essencial para Freud (apud Adorno, 1991). Ao
ater-se com obstinação à atomística existencial do indivíduo, Freud, como esclarece
Adorno (1991), alcançou a essência da socialização com mais profundidade e mostrou a
mutilação social, o sofrimento do homem burguês. Desse modo, de acordo com o
pensador frankfurtiano, aquela autora não contribuiu para aprofundar o conhecimento
da psicanálise, ao procurar adaptá-la às ciências sociais, pois regrediu com relação às
análises já empreendidas por Freud. Ao voltar-se à psicologia do eu, perdeu o indivíduo
e, assim, a capacidade de entender sua possibilidade de diferenciação. A força pulsional,
reconhecida por Freud (apud Adorno, 1991), capaz de gerar conflitos, mudanças de
comportamento, é vista, por sua filha, como impeditiva de equilíbrio e deve ser
canalizada às defesas do ego, ou seja, os mecanismos de defesa entram em ação.
Para Anna Freud (1974), no que diz respeito ao comportamento dos jovens, para
conter as forças pulsionais, deve-se possibilitar mecanismos que favoreçam um
processo de desenvolvimento que os adaptem aos padrões determinados pela ordem
instituída na sociedade atual. Assim, fica claro que a “confusão de identidade” do jovem
o torna rebelde apenas porque apresenta conflitos existenciais e de geração. Refletir
criticamente sobre tais questões implica saber o que a adolescência deve significar,
assim como observar as contradições existentes na sociedade e as armadilhas do sistema
de produção que prendem o jovem aos interesses da sociedade e fazem com que o
processo de identificação acabe por se enquadrar em prol da onipresente lógica do
capital, homogeneizadora das diferenças individuais, que impede o processo de
individuação.
Adorno (1991) refere-se aos estudos de Anna Freud para chamar a atenção ao
fato de que os comportamentos por ela identificados como pertinentes à adolescência
podem também ocorrer na vida dos adultos.
Observa-se que as discussões de Adorno (1991) são significativas, ao considerar
que a capacidade de pensar o novo, mesmo o cotidiano da vida, não é uma atitude
peculiar à adolescência. Assim, percebe-se a pertinência do pensamento desse autor, ao
apontar a incoerência das afirmações de Ana Freud, pois é possível se rebelar contra o
que está instituído em qualquer fase da vida e isso não é característica particular de
jovens. A sociedade precisou tornar os jovens rebeldes, idealizando seus feitos, ou
21
desmascarando-os, mas sem deixar de louvar os valores da juventude e consagrar esse
tempo a devaneios libertários. Assim acabou por plasmar o comportamento dos jovens a
modelos estereotipados.
Segundo Luzzatto (1996), é preciso olhar melhor a história9 porque,
A imagem de uma juventude no século XIX em perpétua revolução – alguém háde objetar – foi desmentida, ou pelo menos diluída por pesquisas de campo maisrigorosas: os historiadores da área social demonstraram, por exemplo, como nãoeram tão jovens assim os revolucionários que subiram nas barricadas de julho,na Paris de 1830; e enfatizaram que na Paris de junho de 1848, os jovensserviram à causa da ordem bem melhor que à causa revolucionária (Luzzatto,1996, p.196).
Percebe-se, então, que se o “espírito” de rebeldia fez os jovens e não jovens
serem iluminados para pensarem e agirem contra a ordem instituída pela força do
capital, essa força também esteve organizada para aplacar ânimos e ímpetos rebeldes
outrora voltados aos ideais revolucionários de indivíduos que ensejavam o sonho de
transformar a sociedade. Por isso, não se pode esquecer de que há fatos na história em
que a participação juvenil também foi obscurecida pela cor do gás que dizimou milhões
de judeus pelo ideal nazista de amor à pátria, aliado à crença ingênua emprestada pela
fachada de racionalidade científica, levada aos seus extremos tanto para formar os
jovens, como para dizimar pessoas.
Reafirma-se, então, ao se analisar o significado da atividade do jovem, por ser
uma faixa etária em que mais diretamente repercutem as mudanças orientadas pelo
interesse do mundo administrado, que é preciso avaliar o que representam as ações
desses jovens para entender como a sociedade os tem formado. Nesse sentido, o
significado do comportamento ativista da juventude, identificado como rebelde e
revolucionário, não deve ser explicado apenas nas vertentes psicológicas ou
sociológicas, que insistem em abordá-lo pelo viés da fenomenologia e esquecem que o
poder da razão, ao administrar as atitudes dos jovens e a pseudo-atividade, adapta-se à
situação existente. Nas palavras de Adorno (1995 b, p. 217),
9 No livro História dos Jovens – A época contemporânea (1966, v.2), em dois outros artigos: AExperiência Militar, de Sabina Loriga (p.17 a 47) e A Juventude Operária. Da Oficina a Fabrica, deMichelle Perrot (p.83 a 136) fornecem dados e análises que colaboram à compreensão dos estudos feitospor Luzzatto.
22
contra os que administram a bomba, são ridículas as barricadas; por isso, brinca-se de barricadas e os donos do poder toleram temporariamente os que estãobrincando (...). A pseudo-atividade é provocada pelo estado das forçasprodutivas técnicas, estado que, ao mesmo tempo, a condena à ilusão.
O poder da instrumentalização usurpa a possibilidade de se formar uma firme
subjetividade, diz Adorno (1995 b), tendo em vista que, na pseudo-atividade, assim
como na revolução fictícia, a tendência objetiva da sociedade liga-se, sem fissuras, à
involução subjetiva. “Parodisticamente, a história universal produz outra vez os tipos de
homens de que necessita” (Adorno, 1995 b, p. 218).
Mas Adorno (1995 b) observa que a Psicologia, mesmo com suas contradições,
ajuda a compreender a passividade e a irracionalidade, sempre destrutivas, do
comportamento do homem, por fazê-lo aceitar o que é contraditório aos seus interesses.
Disso decorre a necessidade de entender os determinantes psicológicos que conduzem
os estudantes ao ativismo. Para esse autor, o ativismo é irracional pelo fato de sequer
“fazer cócegas” em relação ao poder, sendo que os mais espertos têm consciência da
inutilidade do ativismo, outros enganam a si próprios. Observa-se que a crítica de
Adorno (1995 b) ao comportamento do ativista é conduzida com bastante sagacidade,
mas não deixa de alertar para os riscos de recorrer a explicações fundamentadas apenas
em motivos psicológicos Assim, ele adverte que “é verdade que a construção de uma
realidade ilusória é imposta, em definitivo, pelas barreiras objetivas; ela é
psicologicamente mediada, e a paralisia do pensamento está condicionada pela dinâmica
pulsional” (Adorno, 1995 b, p. 219).
A grande contradição dessa situação, segundo Adorno (1995 b), é conseqüente
do fato de
os ativistas mostrarem um interesse libidinoso por eles mesmos no que concerneà satisfação de suas necessidades anímicas e à obtenção adicional de prazer queproporciona ocupar-se da própria pessoa, o fato de que o momento subjetivo semanifeste nos seus contendores provoca neles um maldoso sentimento de ira(Adorno, 1995 b, p. 219).
23
Mas, outro aspecto observado faz referência ao comportamento das figuras
autoritárias contra as quais os jovens protestam e que acabam sendo por eles imantadas
quando chegam à maturidade. Constatar a afirmação de Adorno (1995 b) não é difícil,
basta acompanhar a carreira de políticos que, de fervorosos críticos na juventude,
empunhando bandeiras de diferentes segmentos organizados para fazerem
reivindicações, ao conquistarem uma vaga em qualquer das esferas do poder público,
passam a ter atitudes condizentes com o poder instituído (o cenário nacional deste
momento histórico ilustra, infelizmente, tal situação). Ao assumir o poder, não há
dificuldade alguma em deixar-se enredar por suas malhas e lembrar seus atos como
coisas da juventude, levando-os a perderem o significado de outrora.
No entanto, vale ressaltar que as questões trazidas por Adorno (1995 b)
esclarecem as contradições postas pelo mundo administrado, desvelando as máscaras
libertárias sob as quais a sociedade procura encobrir suas artimanhas, ainda atreladas
com vigor aos valores do fascismo, até no que diz respeito ao comportamento da
juventude pela supervalorização de sua ação, também denominada como a esperança do
futuro. Um futuro apresentado como promissor, bastando querer para poder, pois
depende da disposição do indivíduo tornar-se empreendedor, conforme orientam as
propostas de capacitação de recursos humanos, de um modo geral.
Essas considerações, acerca do comportamento dos adolescentes, fazem pensar
sobre a experiência de trabalho com os jovens do IMCG/MS, que mostrou o quanto os
valores atribuídos ao comportamento dos jovens podem impregnar-se em suas atitudes,
fazendo-lhes repetir os comportamentos desejados. Ao fazer um levantamento sobre a
história da Instituição, fazendo uso até mesmo de relatos orais, foi possível constatar o
quanto eram valorizadas as experiências passadas, em que a formação para o trabalho
era orientada pela disciplina militar: jovens felizes por poderem trabalhar e serem
soldados da pátria, mesmo quando os treinamentos eram acompanhados com atos de
tortura.
Ao se fazer a crítica ao passado e comparar ao que tem ocorrido com as atitudes
de muitos jovens das camadas populares da sociedade atual, fica evidente que, agora,
eles vêm se tornando soldados do trabalho. Nesse sentido, valorizam o esforço pessoal
no árduo embate que têm de enfrentar na guerra contra o desemprego ou para
conseguirem manter o emprego.
24
Por outro lado, é sem grande dificuldade que se pode constatar que muitos
jovens sequer participam de movimentos reivindicatórios, mas, com facilidade, muitas
vezes é possível verificar que eles se identificam com atitudes de violência ou aderem à
violência. Basta olhar o que tem acontecido nos dias atuais para saber o quanto de
jovens tem participado de ações de violência: queimam transportes coletivos, soltam
bombas, e, até mesmo se autoflagelam acreditando participar na luta por uma sociedade
justa, atendendo designações divinas.
Adorno (1986 a), mesmo ao contestar, de forma veemente, o ativismo
inconseqüente no comportamento dos jovens, não deixa de chamar a atenção ao que
pode representar o tempo da juventude, na irracionalidade da razão administrada, frente
ao poder do intervencionismo econômico no capitalismo tardio. Para ele:
No intervencionismo a força de resistência do sistema (mas indiretamentetambém a teoria do colapso do sistema) se confirmou; o seu télos (meta) é apassagem para a dominação independente do mecanismo do mercado.Inadvertidamente o chavão da “sociedade formada” deixou escapar isso. Talinvolução do capitalismo liberal tem o seu correlato na involução daconsciência, em uma regressão do homem, para aquém da possibilidade objetivaque lhe estaria aberta. Os homens perdem as qualidades que eles não maisprecisam e que só os atrapalham; o cerne da individuação começa a sedecompor. Só bem recentemente é que os rastros de uma tendência contrária setornam visíveis, especificamente em grupos dos mais diversos da juventude:resistência contra a cega acomodação, liberdade para metas racionalmenteescolhidas, nojo diante do mundo enquanto embuste e mentira, atenção para apossibilidade de mudança (Adorno, 1986 a, p. 73).
Essas advertências de Adorno (1995 b, 1986 a) levam a questionar se estariam
mais atentos os jovens trabalhadores estudantes das camadas populares, ao expressarem
o que pensam acerca da relação entre formação e trabalho. As condições precárias de
suas vidas tornam suas consciências mais adaptadas ao sistema instituído pela sociedade
ou fazem com que compreendam melhor suas contradições? Há espaço na experiência
da vida desses jovens para comportamentos rebeldes, numa vida em que seu tempo é
totalmente administrado: acordar muito cedo, pegar um ônibus lotado, trabalhar o dia
todo (muitas vezes sem almoçar) em um serviço que não foi escolhido, em que
predominam tarefas rotineiras, e ter de voltar para casa ao final do dia, nas mesmas
condições da ida?
25
As adversidades, no entanto, não cessam na volta para casa, porque, antes, ainda
precisam ir à escola, que, por sua vez, está organizada para não diferenciá-los do
contexto geral da sociedade e acaba por ser mais um local de encontros dos jovens do
que um espaço de constituição do saber (Cf. Alves, 2001). Dessa forma, dificulta-lhes
compreender a irracionalidade produzida pela organização da escola. Frente a tal
situação, fica mais difícil para o jovem trabalhador, estudante das camadas populares,
ocupar o tempo que a sociedade “lhe concede”- moratória - para pensar que o mundo
pode ser diferente.
Para esta pesquisadora, o fato de a organização da sociedade ser tão desigual e
injusta acaba por destituir a capacidade, para uma grande parcela da juventude, de
sonhar, de desejar e de pensar em mudanças – ter comportamentos rebeldes. O quadro
delineado para o futuro dos jovens, na sociedade atual, vem sendo marcado pela falta de
perspectiva, mascarado por pseudo-atividades que tentam encobrir a dura e cruel
realidade da vida na sociedade contemporânea. Assim, ao pensar conceitualmente sobre
a juventude, não é possível desconsiderar como a sociedade tratou e vem tratando os
jovens das diferentes classes sociais.
A investigação sobre esse tempo da vida não deve ser iluminada só pelas marcas
que traz consigo, pelas categorizações que universalizam as mudanças que ocorrem
durante a adolescência, mas ao que pode estar aberto, aos possíveis elementos de
liberdade, do novo, ou de formas de resistência às ordens impostas pela sociedade, sem
desconsiderar o que representam os mecanismos de determinação social e seus efeitos
na vida dos indivíduos, nos diferentes momentos históricos.
26
CAPÍTULO 2 – A FORMAÇÃO DO HOMEM E O TRABALHO: MARCAS
DE SOFRIMENTO E ADAPTAÇÃO
“O trabalho social de todo indivíduo estámediatizado pelo princípio do eu na
economia burguesa; a um ele deverestituir o capital aumentado, a outro a
força para um excedente de trabalho.Mas quanto mais o processo da
autoconservação é assegurado peladivisão burguesa do trabalho, tanto mais
ele força a auto-alienação dos indivíduos,que têm que se formar no corpo e na alma
segundo a aparelhagem técnica”.
(Horkheimer & Adorno, 1985, p. 41).
Neste capítulo, dividido em três partes, são enfocados os temas concernentes ao
processo da relação entre formação e trabalho. Na primeira parte, com o título
“Trabalho e Pseudoformação”, o objetivo é discutir conceitualmente esses temas, sem
deixar de considerar os significados em relação à vida do trabalhador, tendo por
referência estudos dos autores frankfurtianos.
Na segunda parte, intitulada “Adaptação de Corpos Juvenis ao Trabalho”, o
objetivo é mostrar a contradição entre o aumento da produção, decorrente do
desenvolvimento da tecnologia, e as conseqüências à vida do trabalhador. Assim, sem a
preocupação em, até mesmo, ser redundante, mas com interesse em analisar o
movimento histórico do capital para a formação de jovens (e crianças), recorre-se a
alguns relatórios e estudos apresentados por Karl Marx, em O Capital, com a finalidade
de melhor ilustrar essa questão.
Na terceira parte, denominada “Trabalho e Alienação”, o propósito é refletir,
tanto à luz dos estudiosos da Escola de Frankfurt quanto de Karl Marx, sobre as
contradições impostas pela lógica da racionalidade tecnológica que tem dominado a
formação para o trabalho.
27
2.1- Trabalho e Pseudoformação
Ao pensar a relação entre formação e trabalho, tema norteador desta pesquisa, os
interesses atêm-se em desvelar o que essa relação representa à vida do homem na
sociedade atual, com fins de apreender as conexões em relação à vida dos jovens
trabalhadores e estudantes do IMCG. Para tratar dessa questão, pauta-se na importância
em entendê-la no movimento das transformações que fazem parte da sociedade, com
todas as contradições que há nesse movimento. Refletir sobre essas contradições
significa compreender as experiências concretas vividas pelo homem em suas relações
de trabalho.
Vê-se que, na sociedade atual, tem prevalecido a lógica utilitária no que diz
respeito às questões pertinentes ao mundo do trabalho. Assim são focalizadas as
configurações ocupacionais, as novas práticas de emprego, as diferentes formas de
organização das relações industriais e os novos padrões de produção. Todos esses
interesses sempre são abalizados pelos agentes reguladores do poder público. Por sua
vez, os monopólios acadêmicos atêm-se, preferencialmente, às necessidades funcionais,
ao interesse do mercado e tratam, com desdém, o que isso significa à constituição do
trabalhador, um sujeito que pensa, sente, tem desejos, sonhos. Mas, para o mercado de
trabalho, não há interesse em saber aspectos concernentes à subjetividade do trabalhador
que não sejam direcionados às necessidades de produção e consumo, ou seja, em como
administrar a vida do trabalhador para atender aos ditames do capital.
Desse modo, a formação do indivíduo tem sido direcionada para atender ao
competitivo mercado de trabalho. Resta ao indivíduo, para ter sua subsistência
garantida, entrar no time do mercado e participar de seu jogo. Por outro lado, com
certeza, existem muitos estudos que anunciam a defesa do trabalhador, mas, muitas
vezes, acabam por consagrar seus valores numa linha de raciocínio atrelada a princípios
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que não deixam de afirmar a ordem existente na sociedade, mesmo ao anunciarem
discordância em relação a essa ordem.10
Por isso, a idéia de trabalho, do fazer do trabalhador, acaba por fundamentar-se,
particularmente, na necessidade de manutenção da sobrevivência. Isso significa que a
força de trabalho deve subsistir para garantir a vigência dos modos de produção. Pensar
o trabalho dessa forma significa estabelecer distância do que pode dar prazer ao homem
ao produzir sua vida. O trabalho fica categorizado como algo que deve exigir esforço,
sacrifício. Por conseguinte, o que precisa ser feito não carece de sentido para quem o
faz, mas deve ter sentido – valor de mercado – para quem administra esse fazer.
Num artigo da revista Psicologia Atual, Malvezzi (s/d) relata a experiência de
um estagiário de Psicologia, na área de Recursos Humanos, que ajuda a esclarecer a
afirmação feita:
Na primeira semana de meu estágio, meu chefe, o Gerente de RecursosHumanos, pediu-me que conhecesse a fábrica e preparasse os instrumentos paraa descrição e avaliação de cargos. Visitando vários setores, vi que ninguémparecia interessado em conversar. Tentei sorrir. Não fui correspondido. Até que,ao sorrir para um operário, percebi que ele queria me dizer alguma coisa. Ficouperturbado quando me aproximei; respondeu gaguejando ao meu “bom dia”.Disse que era psicólogo estagiário, um novo técnico para cuidar dos problemasdo pessoal da empresa, e que meu papel era auxiliar os empregados no trabalho.“O Sr. não leva a mal uma pergunta?” gaguejou. Respondi que não, estava alipara ele perguntar o que quisesse. “É que meu supervisor não gosta de conversa.O caso é que estou para casar daqui a quatro meses; minha noiva e os pais delame perguntam no que eu trabalho. “E eu não sei lhes dizer o que esta fábricafabrica”. Respondi, e ele me agradeceu como se lhe tivesse prestado um favorenorme.Esse homem trabalhava há dois meses numa fábrica do ramo metalúrgico, comcerca de 3 mil operários, na região de Santo André (Malvezzi, s/d, p. 28).
Esse caso é um exemplo de situações constrangedoras e degradantes sobre as
condições de trabalho, que cristalizam a alienação do trabalhador e a coisificação de sua
consciência e que fazem parte do modos operandi do capital. Assim, a negligência aos
elementos destrutivos à constituição da autonomia do indivíduo é organizada tendo
10 Em sua tese de doutorado, A formação do Indivíduo no Capitalismo Tardio: uma análise dos estudosque vinculam a esfera subjetiva ao mundo do trabalho, Imbrizi (2001), ao analisar as categorias deCodo e Dejours (autores identificados com a linha de uma psicologia crítica), mostra as distorções
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como referência os discursos altissonantes da liberdade administrada pelo capital. Na
formação do indivíduo, as relações valorizadas na experiência de trabalho atrelam-se a
princípios da necessidade e de obediência para cumprir determinações, mesmo que
absurdas, como o exemplo citado. O que fica evidente para o trabalhador, o que é
aprendido, sem resvalo para dúvidas, é a obrigação de continuar trabalhando.
Nos dias atuais, a obrigação de ter o trabalho administrado para a obediência
ganha proporções tão grandes que o trabalhador se sente privilegiado só por ter a
carteira de trabalho assinada, sendo formalizada, legalizada, a exploração com registro.
Burocracia que lhe garante os privilégios do que é considerado ser cidadão. E tal
situação acaba por virar motivo de status social.
Essa situação é evidente para os adolescentes vinculados ao IMCG, onde se
podia constatar, durante o período que se manteve contato com esses jovens, o orgulho
de muitos deles em viver a experiência do primeiro emprego, com a carteira de trabalho
assinada. Alimentava-se fortemente a ilusão de que o histórico de dois anos de trabalho
era como um passaporte para adentrar e permanecer no competitivo mercado de
trabalho. De certa forma, não deixava de ser um fator diferenciador para o preparo dos
jovens, até por contarem com o respaldo do IMCG em lhes garantir o emprego
temporário.
Mas, por outro lado, situações como essas mostravam que a subserviência
imperava nas atitudes daquele grande contingente de jovens trabalhadores. Os espaços
de constituição de possíveis atitudes de autonomia – moratória – ficavam subjugados ao
poder da Instituição em orientar suas vidas, embora essa orientação não pudesse deixar
de atender às exigências do mercado de trabalho, o que implicava em um processo
formativo com forte caráter de adaptação à ordem vigente, ainda que houvesse o
interesse, por uma parte da equipe técnica, em superar o processo de formação
institucionalizado.
Verificava-se ainda que muitos jovens sequer podiam pensar nas diferentes
situações de emprego oferecidas, que não eram muitas, pois precisavam escolher seus
empregos em decorrência das necessidades de sobrevivência. Mesmo quando
desses autores ao legado marxiano e freudiano e, principalmente, aponta as contradições que expressamreferentes ao mundo do trabalho.
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demonstravam habilidades ou interesse por diferentes áreas de conhecimento, eram
“obrigados” a ser empacotadores, almoxarifes, recepcionistas ou fazer outras atividades
de pura rotina, porque dependiam da vaga oferecida, no momento em que completavam
dezesseis anos de idade. Os sonhos e desejos de muitos desses jovens acabavam na
expectativa de conseguirem se manter no emprego, independente da atividade
desenvolvida. Assim sendo, o fato de conquistar a continuidade do contrato de trabalho
representava uma grande conquista, pois acabava por ser o fato diferenciador para a
experiência de trabalhador.
Ao ter interesse em apenas manter um posto de trabalho – com carteira assinada
– o objeto de desejo para muitos trabalhadores nos dias atuais, torna evidente o
sentimento de impotência frente à ordem existente. Obviamente, esse desejo, como já
observado, alia-se à submissão exigida e, dessa forma, torna inacessível a capacidade de
reflexão para desvelar que as novas técnicas exigidas para formar o indivíduo –
profissionalizar - vêm com a velha fórmula da dominação travestida de roupagem nova.
Por isso, verifica-se ser preciso desvelar o que têm impedido o indivíduo de iluminar-
lhe a razão, que outrora pôde sonhar com uma sociedade justa e fraterna. Essa sociedade
parecia ser conseqüência do desenvolvimento das relações de produção burguesas.
Porém, o que tem resultado, das relações de trabalho instituídas, tem sido a
impossibilidade de o indivíduo poder se diferenciar e consolidar o que seria a liberdade.
Uma liberdade em que todos os indivíduos da sociedade pudessem participar: liberdade
de escolher, de pensar, para além do já existente.
No entanto, constata-se que o avanço das forças produtivas não deixou de
oferecer aos homens possibilidades concretas de modificar, de transformar a
desigualdade social existente, mas, diferente disso, esse avanço ainda continua
aumentando a divisão entre os homens, a liberdade em apenas ter, em possuir o que é
administrado pela ordem vigente. O poder da ciência, da técnica, tem mantido a história
da dominação subjacente ao caminho traçado para a vida dos homens. Todavia, a
técnica não é o elemento funesto, conforme afirmou Adorno (1986 a), mas sim o seu
enredamento nas relações sociais, nas quais ela se encontra envolvida. “Basta lembrar
que os interesses do lucro e da dominação têm canalizado e norteado o desenvolvimento
técnico: este coincide, por enquanto, de modo fatal com necessidades de controle”.
(Adorno, 1986 a, p. 69). Tal controle pode-se acrescentar, fica instalado na formação do
indivíduo.
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Sem dúvida, ao pensar na amplitude que pode tomar o significado da formação
do homem, a partir do trabalho, necessariamente se pensaria em uma sociedade sem a
divisão social do trabalho e sem a necessidade da existência de comando entre os
homens. Dessa forma, o trabalho não estaria aliado ao mesquinho caráter da utilidade,
que não diferencia homens e coisas.
Para a reflexão dessas questões, como diz Matos (1993, p. 64), “é preciso uma
racionalidade capaz de nos inserir nas contingências das coisas”. Isso exige, segundo a
autora, a modalidade de ser memorioso, lembrando o sofrimento do passado para que a
barbárie, a degradação, deixe de ser uma constante na vida dos homens. Não é possível
se esquecer de que, quando o cientificismo permitiu ao homem dominar as forças da
natureza, deu-lhe também as mais terríveis armas de destruição, como está marcado em
nossa história. Uma história em que os dominantes monopolizam a formação do
trabalhador e apenas garantem-lhe a pseudoformação. Não é sem razão, que nos portões
de entrada do campo de concentração de Auschwitz, tinha, em destaque, o slogan Arbeit
macht frei (O trabalho liberta) (apud Koltai, s/d, p. 93).
O que se observa é que o trabalho tem se constituído sem sentido e sem
significado para o trabalhador e, ao mesmo tempo, o tem tornado conivente com os
ditames do poder, impedindo-o de tomar consciência de que a ordem social instituída
podia ter sido (e pode ser) uma história sem exploração.
Como se sabe, o homem, outrora, quando conseguiu conservar o fogo, por
exemplo, fê-lo para garantir sua autopreservação, planejou suas necessidades. Ao
construir os instrumentos de caça, de pesca, armazenar e produzir bens, criou os
instrumentos de trabalho e modificou-os. Ao mesmo tempo, planejou e organizou as
relações de trabalho com seus pares e foi rompendo a naturalidade de sua vida.
Todavia, tem-se ciência que o homem é natureza e mais que natureza, mas
precisou negar essa naturalidade. Negou-a porque, sendo apenas natureza, sua
existência seria voltada a produzir apenas sob o domínio da necessidade, tal como o
animal que produz unilateralmente. Diversamente dos animais, o homem trabalhou,
usou a razão e transformou a natureza em algo para si na luta para libertar-se da
repetição. Nesse embate, foi superando as necessidades apenas orgânicas de origem e
transformando sua existência. Ao defrontar-se com a natureza e apropriar de seus
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recursos, imprimindo-lhes forma útil, o homem não deixou de desenvolver, ao mesmo
tempo, potencialidades que o permitiu dominar as forças naturais, as formas instintivas
animais de trabalho. “Quando o trabalhador chega ao mercado para vender sua força de
trabalho, é imensa a distância histórica que medeia entre sua condição e a do homem
primitivo com sua forma ainda instintiva de trabalho. Pressupomos o trabalho sob forma
exclusivamente humana” (Marx, 1980, p. 202).
Ao prover seu espaço vital, o homem transformou os recursos disponíveis
existentes, modificou suas necessidades e suas relações de trabalho. Mas tais mudanças
não foram relacionadas apenas à produção e reprodução material de bens e à presença
das motivações e coações econômicas, pois, na objetivação de sua vida, pelo trabalho, o
homem se torna acto histórico, como esclarece Marcuse (1988, p. 32): “Na medida em
que o homem se insere pela via do trabalho no objeto de seu trabalho, no objeto
trabalhado, elaborado, ele se torna permanente, presente, ‘objetivamente’ real e efetivo
em meio ao campo histórico e também ao tempo de vida histórico”.
O trabalho, ao se unir ao seu objeto, diz Marx (apud Marcuse, 1981), objetiva-se,
ou seja, o objeto é transformado pelo trabalho e o trabalhador se reconhece no resultado
de seu fazer. O sentido social da objetivação é explicado por Marcuse ao afirmar que
o campo dos objetos do trabalho é um campo de atividade vital conjunta; nosobjetos de trabalho o Outro se torna visível para o homem em sua realidade. (...)Todo trabalho é trabalho com, para e contra outros, de tal forma que somente aíos homens se mostram uns aos outros e entre si o que realmente são. Assim,todo objeto em que o homem atua, em sua individualidade, é, “ao mesmotempo, sua própria existência para os outros homens, a existência desses outrosessa mesma existência para ele” (Marcuse, 1981, p. 30-31).
Entretanto, ao objetivar a vida, no acontecer da existência, o homem estruturou a
sociedade em diferentes camadas sociais e, no mesmo espaço de convivência,
organizando-a sob o peso da dominação. Hierarquizou, dessa forma, a relação de
trabalho em diferentes classes sociais, dividindo o trabalho entre material e espiritual.
Essa divisão estabeleceu, entre os homens, a relação entre dominador e dominado. O
resultado do trabalho humano tornou-se estranho ao próprio homem, pois a condição de
dominado bloqueou-lhe a possibilidade de formação que poderia tê-lo conduzido ao
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“reino da liberdade” e o tornado sujeito de sua própria efetivação, porque, conforme
Adorno e Horkheimer (1971), os mecanismos da formação têm se ajustado sobre a base
dos mecanismos do mercado. Assim, esses mecanismos têm modelado a vida, até as
últimas ramificações, pelo princípio da equivalência, esgotando-se em si mesma, na
reiteração do sistema. Dizem, ainda, os pensadores frankfurtianos, que as exigências
impostas, pelos elementos presentes na pseudoformação, incidem sobre os indivíduos
tão dura e despoticamente, que eles não podem manterem-se firme contra elas, como
condutores de si mesmos, de sua própria vida.
O processo dialético de formação do homem no mundo deveria levá-lo à
realização de suas potencialidades, reforçando sua autoconsciência e, por essa via,
também o seu eu. Atualmente a sociedade, diz Adorno (1995 a), premia em geral uma
não individuação; uma atitude colaboracionista. O ideal formativo corresponderia,
nesses termos, a um processo de trabalho social que levaria à emancipação do sujeito,
fá-lo-ia romper com as forças opressivas existentes. No entanto, a ordem burguesa
tornou o homem livre para vender sua força de trabalho, sem romper com o sacrifício
dos homens. Assim, esclarece Adorno (1996), as relações de poder instituídas na
divisão do trabalho expressam a opção feita pelos homens de manterem o comando da
sociedade estabelecendo diferenças sociais, normatizando a relação entre os que detêm
bens e poder, do qual usufruem, e os desapropriados do poder, que vivem de acordo
com o interesse daqueles. Os homens têm se conformado com essa relação e, ainda,
permanecem adaptados ao esquema do progresso atrelado ao da dominação.
A presença da dominação nas relações de trabalho, de acordo com a razão
esclarecida, foi necessária em seus primórdios, pois os homens temiam as forças da
natureza, sentiam-se ameaçados por elas. Depois, a natureza deixou de ameaçá-los e
passou a sofrer, devido à falta de preservação, as conseqüências de ações destruidoras,
dos efeitos da dominação. Para romper com o medo, com a opressão das esmagadoras
forças da natureza, os homens buscaram a autonomia de seu desenvolvimento. Nesse
processo, foram substituindo formas de produção ultrapassadas por outras diferenciadas,
mais condizentes às necessidades humanas.
Desse modo, desde os simples e essenciais instrumentos de caça à primeira
máquina a vapor, que levou à revolução industrial e às atuais máquinas robotizadas, a
história da vida humana tem sido marcada pela força imperativa da contradição: ao
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mesmo tempo em que se convive com o avanço das forças produtivas, há a convivência
com os danos causados aos trabalhadores11. Em contrapartida, o magnífico avanço
tecnológico decorrente do poder da ciência beneficiou o capitalista, porque aumentou
extraordinariamente a produção de bens e não deixou de beneficiar os homens. Porém,
os donos desses bens monopolizaram a formação cultural e o proletariado, classe que
deveria suplantar a burguesia, de acordo com os prognósticos marxianos, e transformar
a ordem vigente para instaurar uma sociedade igualitária, mas que nunca realizou sua
responsabilidade histórica12. Segundo Adorno (1996, p.392), “o proletariado não se
encontrava, de maneira alguma mais avançado subjetivamente que a burguesia”. Por
isso, os donos do poder monopolizaram a formação cultural numa sociedade
formalmente vazia, diz o pensador frankfurtiano. As conseqüências dessa formação para
a vida do trabalhador não legitimou o poder da classe operária. Os trabalhadores do
mundo não se uniram ao chamado da razão emancipadora - “Proletários de todos os
países, uni-vos!” (Marx & Engels, s/d, p. 47), rumo à libertação do modo de produção
vigente. Adorno (1996) afirma ainda que
a desumanização implantada pelo processo capitalista de produção negou aostrabalhadores todos os pressupostos para a formação e, acima de tudo, ócio. Astentativas pedagógicas de remediar a situação transformaram-se em caricaturas.Toda a chamada “educação popular” – escolha dessa expressão demandoumuito cuidado – nutriu-se da ilusão de que a formação, por si mesma e isolada,poderia revogar a exclusão do proletariado, que sabemos ser realidadesocialmente constituída (Adorno, 1996, p.393).
11 A respeito do que o advento da produção industrial faz com a vida do trabalho e de sua família, ver OCapital, de Karl Marx (1980).12 Adorno (1986, p. 65-66) observa “que, nos países capitalistas dominantes, não se possa falar de umaconsciência proletária de classe não refuta de per se, ao contrário da opinião comum, a existência declasses: a classe é definida pela posição quanto aos meios de produção, e não pela consciência de seusmembros. Não faltam, nesses países, razões bastante plausíveis para a inexistência de consciência declasse: não era de se prever que os trabalhadores não continuassem mais na miséria, que eles viessem aser cada vez mais integrados na sociedade burguesa e em sua visão de mundo, ao contrário do que ocorriadurante e logo após a revolução industrial, quando proletariado industrial era recrutado entre osmiseráveis e se situava, de certo modo, na periferia da sociedade. A existência social não gera de modoimediato, consciência social. Sem que essas massas – e isso exatamente por causa de sua integração social– tivessem agora em suas mãos o seu destino social mais do que há 120 anos, elas prescindiram não só dasolidariedade de classes, mas fugiram à plena consciência de que são objetos, e não sujeitos do processosocial, processo que, no entanto, elas mantêm em andamento como sujeito. A consciência de classe – daqual, segundo a teoria de Marx, deveria depender o salto qualitativo – era, de acordo com ele,simultaneamente um epifenômeno.”
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Na argumentação do pensador frankfurtiano, o a priori do conceito de formação
propriamente burguês, a autonomia, não teve tempo algum de constituir-se e a
consciência passou diretamente de uma heteronomia a outra. “No lugar da autoridade da
Bíblia, instaura-se a do domínio dos esportes, da televisão e das ‘histórias reais’, que se
apóiam na pretensão da literalidade e da facticidade aquém da imaginação produtiva”
(Adorno, 1996, p. 393).
As categorias dinâmicas do capitalismo geram uma teoria objetiva da sociedade,
fundamentada na valorização do progresso da técnica, e o trabalho passa a ser retratado
como fonte de riqueza, o redentor para a formação do homem, assente aos valores
morais da Reforma Protestante. O conceito burguês do trabalho “socialmente útil”,
segundo Adorno (1986 a), que se demonstrou no mercado, no lucro, jamais foi
demonstrado em utilidade transparente para os próprios homens e menos ainda para a
felicidade deles. Segundo Marcuse (1967, p.85),
o âmbito da satisfação social permissível e desejável é grandemente ampliado,mas o Princípio do Prazer é reduzido por meio dessa satisfação – privado dasexigências que são irreconciliáveis com a sociedade estabelecida. O prazer,assim ajustado, gera submissão.
Prevalece, assim, de acordo com esse autor, a crescente capacidade da sociedade
para manipular a “dessublimação institucionalizada” (Marcuse, 1967, p.88), um tipo de
conquista como uma falta de liberdade confortável, suave, razoável e democrática.
A falta de liberdade confortável foi se constituindo, impondo o aparato da
dominação e tem impedido o surgimento de uma oposição eficaz ao todo, diz Marcuse
(1967), pois a racionalidade tecnológica, que serviu aos donos dos bens de produção,
não serviu aos trabalhadores, tornou-se irracional. “O resultado é a atrofia de dos órgãos
mentais, impedindo-os de perceber as contradições e alternativas e, na dimensão
restante da racionalidade tecnológica, prevalece a Consciência Feliz” (Marcuse, 1967, p.
88).
Então, pela maneira como têm sido administradas as relações de trabalho, não
há condições para uma forma de sociedade humana. O aparato do poder político
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existente firma-se, por meio de seus poderes, sobre a organização técnica do aparato. O
governo de sociedades industriais desenvolvidas e em fase de desenvolvimento (Cf.
Marcuse,1967), só pode se manter e garantir-se quando mobiliza, organiza e explora
com êxito a produtividade técnica, científica e mecânica à disposição da civilização
industrial. A sociedade, em sua totalidade, é mobilizada por essa produtividade, uma
vez que a máquina superou o indivíduo.
O fato brutal de o poder físico (somente físico?) de a máquina superar o doindivíduo e o de quaisquer grupos particulares de indivíduos torna a máquina omais eficiente instrumento político de qualquer sociedade cuja organizaçãobásica seja a do processo mecânico. Mas a tendência política pode ser invertida;essencialmente, o poder da máquina é apenas o poder do homem, armazenado eprojetado. O mundo do trabalho se torna a base potencial de uma nova liberdadepara o homem no quanto seja concebido como uma máquina e, por conseguinte,mecanizado (Marcuse, 1967, p. 25).
A civilização industrial, pelo que já foi apontado, consagrou modificações que
modelaram a vida do trabalhador pelo princípio da equivalência, reiterando o sistema de
exploração pautado na produtividade e no lucro. Embora conquistas em relação à vida
do trabalhador pudessem tornar-lhe a vida menos penosa em seu conjunto, uma vez que
há o aumento do progresso na produção, as necessidades dos trabalhadores são
orientadas por forças independentes de suas vontades. Deixam-se conduzir, de acordo
com Marcuse (1967), pelos acordes do valor da venda. E esse pensador ainda acrescenta
que a música da alma é também a música da arte de vender. “O que importa é o valor de
troca, e não o da verdade. Em torno dele gira a racionalidade do status quo, e toda
racionalidade alienígena se submete a ele”. (Marcuse, 1967, p. 70).
Essas considerações são importantes, porque não é possível pensar em formação
para o trabalho, sem compreender como se constituiu o trabalhador assalariado, pois a
história aponta que os trabalhadores são direcionados, “formados”, para não perceberem
as contradições de suas vidas, das exigências descarregadas em suas relações de
trabalho, e são até mesmo impedidos de adquirirem a “consciência infeliz” de sua
condição de explorados.
Verifica-se, ainda, que o despotismo do processo de produção determina a vida
dos trabalhadores nos moldes da coisificação, ou seja, na constituição do pensamento
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reificado, que tem impedido o trabalhador de refletir sobre a exploração existente nas
relações de trabalho e de romper com os arranjos do sistema que administra a razão. O
conformismo, que tem afastado os homens das verdades e os embrutecem, não é mero
pretexto dos dominantes, mas a conseqüência lógica da sociedade industrial. Uma
lógica que permanece presa à dominação, com seu reflexo e seu instrumento ao mesmo
tempo. Por isso, segundo Horkheimer e Adorno (1985, p. 47- 48), “sua verdade é tão
questionável quanto sua evidência inevitável. É verdade que o pensamento sempre
bastou para designar concretamente seu próprio caráter questionável. Ele é o servo que
o senhor não pode deter a seu bel-prazer”. Isso se justifica porque, ao se reificar na lei e
na organização, quando os homens se tornaram sedentários e, depois, na economia
mercantil, a dominação teve que limitar-se. Mas, no percurso dessas mudanças, da
mitologia à logística, como afirmam os pensadores frankfurtianos, o pensamento perdeu
o elemento de reflexão sobre si mesmo, e hoje a maquinaria mutila os homens mesmo
quando os alimenta (Cf. Horkheimer & Adorno, 1985).
Assim, o poder de autoformação obtido pelo desempenho da máquina, o avanço
nas forças produtivas, equivale ao poder da ideologia que domina a relação capital-
trabalho. Seu conteúdo veicula-se pela necessidade de trabalho intenso para manter o
aumento da produção e do lucro, independente do que faz à vida do trabalhador. A
necessidade desmesurada de produção imposta pelo modelo industrial de trabalho
tomou conta da sociedade, expandindo-se, por exigência econômica, para diferentes
áreas, inclusive para aquela denominada cultura, de modo que o processo de formação
do trabalhador corresponde a essa imposição. Como explica Adorno, a partir da análise
de Marx, com o advento da revolução industrial, os homens seguiram sendo o que eles
eram por volta da metade do século XIX:
apêndices da maquinaria, e não mais apenas literalmente os trabalhadores, quetêm de se conformar às características das máquinas a que servem, mas, alémdeles, muito mais, metaforicamente: obrigados até mesmo em suas mais íntimasemoções a se submeterem ao mecanismo social como portadores de papéis,tendo de se modelar sem reservas de acordo com ele. Hoje como antes produz-se visando o lucro. (Adorno, 1986 a, p. 68).
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Para garantir tal modelação, explica Marx (1980), a produção operada pelas
máquinas foi acompanhada com rigor por leis científicas. Foi avaliado todo o processo
de conservação, durabilidade e desgaste para obter garantias e controle do campo de
produção. Tomar conta do sistema da maquinaria era mais fácil do que controlar os
homens e reparar “seus” desgastes e, ao mesmo tempo, ao aumentar a eficácia de sua
produção, os custos diminuíam.
Nessas condições, o trabalhador, junto com sua família, virou um acessório da
produção, sendo apenas apêndices a serem adaptados de acordo com o interesse do
capital. O trabalho tornou-se obrigatório para o capital, tomou lugar dos folguedos
infantis e do trabalho livre realizado, em casa, para a própria família, dentro dos limites
estabelecidos pelos costumes, diz Marx (1980).
O resultado disso levou à necessidade de subjugar a razão, a força do
trabalhador, sua vida, aos esquematismos petrificadores da consciência. O trabalhador
passou a trabalhar para viver, para ter assegurado os seus meios de subsistência. O
trabalho deixou de fazer parte de sua vida, passou a ser um sacrifício, uma mercadoria
arrogada a um terceiro. Assim, em detrimento da vida humana, passou a ser priorizado o
funcionamento da máquina, sendo exigido um processo, de adaptação, da rudimentar
máquina humana, diante de máquinas altamente aperfeiçoadas. Para tanto, fazia
necessário ajustar a máquina humana desde cedo, desde a mais tenra idade.
2.2- Adaptação da flexibilidade de corpos juvenis ao trabalho
A necessidade de sobrevivência, frente à avassaladora força da revolução
industrial, foi degradando a existência do trabalhador e de sua família. O uso das novas
máquinas permitiu a realização do trabalho sem a força muscular do trabalhador. Porém,
ainda não era possível prescindir da flexibilidade do movimento dos corpos juvenis.
Diante disso, a escolha desse subtítulo não considera a idéia dualística entre mente e
corpo, mas tem a intenção de explicar como a ação imposta à formação dos jovens
trabalhadores, sob o jugo do capital, no uso da mobilidade de corpos jovens, obliterou
as possibilidades do pensamento. O desgaste imposto aos corpos de jovens
trabalhadores domou-lhes a energia, sem deixar qualquer espaço para a constituição de
qualquer tipo de resistência, conforme esclarece Marx (1980).
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Ao ocorrer a diminuição da quantidade necessária de força-motriz dos
trabalhadores, substituída pela máquina-ferramenta, todos os membros da família do
trabalhador puderam ser lançados ao mercado de trabalho, sem distinção de sexo e
idade. Assim, a maneira de avaliar o valor da força de trabalho foi modificada. O
cálculo passou a incluir não apenas o tempo utilizado para manter o trabalhador adulto,
mas também o tempo necessário para manter toda sua família trabalhando. Tal situação
desvalorizou a força de trabalho do adulto, mas o capitalista não deixou de aumentar a
jornada de trabalho. Acerca disso diz Marx (1980, p. 450-451) que “a máquina, ao
aumentar o campo específico de exploração do capital, o material humano, amplia, ao
mesmo tempo, o grau de exploração. Ela aumenta radicalmente o contrato entre o
trabalhador e o capitalista ...” e, assim, aumenta a liberdade de conquista e o poder do
capitalista.
Tal liberdade, além de comercializar a força de trabalho, em que havia
“liberdade” de venda, não deixou de fora a comercialização da infância, da
adolescência, das mulheres, dos valores morais. Enfim, passou-se a comercializar a
vida. “Antes, vendia o trabalhador sua própria força de trabalho, da qual dispunha
formalmente como pessoa livre. Agora vende mulher e filhos. Torna-se traficante de
escravos”, esclarece Marx (1980, p.451).
Para facilitar o tráfico, o capitalista tinha apoio da propaganda de jornais:
“Precisa-se de 12 a 20 jovens com aparência de 13 anos pelo menos. Salário 4 xelins
por semana. Dirigir-se a etc.”, anunciava um jornal (Redgrave em “Reports of Insp. of
Fact for 31 st October 1858”, apud Marx, 1980, p. 452).
Marx (1980) relata a existência de leilões e aluguel de crianças e jovens, pois
eram tidos como objetos com boa disposição e vitalidade para uso:
Em Bethnal Green, distrito mal afamado de Londres, todas as manhãs desegunda e terça-feira, realiza-se publicamente leilão e, crianças de ambos ossexos, a partir de 9 anos, se alugam diretamente às fábricas de seda de Londres.As condições usuais são 1 xelim e 8 pence por semana (que pertencem aos pais)e mais 2 pence e chá, para mim´. Os contratos são válidos apenas por umasemana. As cenas e o linguajar são realmente revoltantes. Ocorre ainda naInglaterra que mulheres “tomam garotos aos asilos e os alugam a qualquercomprador por 2 xelins e 6 pence por semana”. Apesar da legislação, 200garotos pelo menos são vendidos pelos pais, na Grã-Bretanha, como máquinas
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vivas de limpar chaminés, embora existam máquinas para substituí-los (Marx,1980, p. 452-453).
Marx (1980), reproduzindo, de modo ímpar, os fenômenos da degradação moral
ocasionada pela exploração capitalista do trabalho, chama a atenção à obliteração
intelectual dos adolescentes que trabalhavam nas indústrias, uma vez que foram
transformados em simples máquinas de fabricar mais valia. Para Marx (1980), essa
anulação era bem diversa daquela ignorância natural em que o espírito, embora sem
cultura, não perde a capacidade de desenvolvimento, a fertilidade natural. “Essa
obliteração forçou finalmente o Parlamento inglês a fazer da instrução elementar
condição compulsória para o emprego ‘produtivo’ de menores de 14 anos em todas as
indústrias sujeitas às leis fabris” (Marx, 1980, p. 456).
Vê-se, portanto que, ao tornar necessário empregar os adolescentes e as crianças,
o espírito da produção capitalista resplandecia vitorioso na redação confusa das
chamadas cláusulas de educação das leis fabris. Essas leis indicavam a obrigatoriedade
do ensino e, para cumpri-la, o recurso utilizado pelos fabricantes eram as trapaças para
forjar diplomas. O relatório apresentado por Marx (1980), de Sir John Kincaid, inspetor
de fábrica na Escócia, narra experiências de atestados de freqüência escolar, oferecidos
às crianças sem nenhum ensino e até mesmo o caso de uma professora que não sabia
escrever o próprio nome.
De acordo com Marx (1980), os falsos diplomas e os horários de freqüentar a
escola eram determinados em consonância ao funcionamento e necessidades das
indústrias. O afluxo predominante de crianças e mulheres na formação do pessoal de
trabalho, ocasionado pela maquinaria, quebrou a resistência do trabalhador masculino,
existente no sistema manufatureiro, pelo automatismo do funcionamento da
maquinaria13. Mas os resultados da eficiência da máquina para a vida dos trabalhadores
foram desastrosos, porque tanto a vida dos trabalhadores, quanto de suas famílias,
passaram a ser consideradas em função do processo de produção e não o contrário. Com
isso, as conseqüências de miserabilidade impostas às crianças e adolescentes em
13 “A História não oferece nenhum espetáculo mais horrendo que a extinção progressiva dos tecelõesmanuais ingleses, arrastando-se durante decênios e consumando-se finalmente em 1838. Muitos delesmorreram de fome, muitos vegetaram por longos anos com suas famílias, com uma renda de 2 ½ pence
41
decorrência do trabalho fabril atingiram excessos tão absurdos (como ainda continua
atingindo), que o Estado começou, então, a estabelecer as políticas de assistência e
mudar suas leis.
O sistema de exploração adquiriu capacidade de expansão e tornou elástica sua
forma de dominação. Para tanto, os capitalistas travavam entre si embates furiosos na
luta pela conquista de mercados. Para o trabalhador, nessa luta, sobrava apenas o fato de
ser o objeto de uso a ser manipulado de acordo com o interesse do capital. Em sendo
objeto, a miséria, a fome, a mendicância, a doença do trabalhador viraram fontes de
estudos e passaram a ser controladas, administradas pelo capitalista e mantidas de
acordo com os interesses e conveniências deste, apoiados pela estrutura do poder
público.
Marx (1980) faz referências do quão desumano se tornaram as condições de
trabalho com o avanço da ciência. Crianças e adolescentes foram considerados apenas
objetos facilitadores do aumento da produção. O quanto eles sofriam, as precárias
formas de sobrevivência, os valores morais, anunciados pelo burguês, deixavam de ter
valor quando a questão era aumentar a produção. O único interesse envolvendo esses
sujeitos era o quanto valia, o quanto podiam render, sendo a forma degradante de suas
vidas indiferente ao capitalista 14 .
Não eram diferentes, diz Marx (1980), os acontecimentos dos trabalhos
realizados nos domicílios. Sob o jugo do capitalista, para ter garantida à sobrevivência,
os pais impunham às crianças situações de total desconforto e sofrimento. Essas
relações não se diferenciavam de animais adestrados, em confinamento, segundo o
pensador alemão:
por dia. Por outro lado, foram agudos os efeitos da maquinaria da indústria têxtil algodoeira na Índia”(Marx, 1980, p.493). 14 Conforme cita Marx (1980, p.531-532): “É impossível passar uma criança pelo purgatório de umaolaria sem degradar-se moralmente... A linguagem baixa que costumam ouvir desde a mais tenra idade, oshábitos obscenos, sólidos e imprudentes em meio dos quais crescem inconscientes e meio selvagens,tornam-nas, para o futuro, marginais, vis e dissolutas... Fonte terrível de desmoralização é a maneiracomo moram... Todos estão tão esgotados pelo trabalho do dia, que ninguém observa nem regras dehigiene, nem de limpeza, nem de decência... O mais grave mal do sistema de empregar meninas nessaespécie de trabalho decorre de elas em regra se integrarem, desde a infância para o resto da vida, na maisabjeta corja. Elas se tornam garotos grosseiros, desbocados, antes de a natureza lhes ensinar que sãomulheres... o pior de tudo é que os oleiros desesperam de si mesmos. Um dos melhores disse ao capelãode Southallfield que ele poderia mais facilmente reabilitar e emendar o diabo do que um oleiro”.
42
Em Nottingham, não é raro encontrarem-se 15 a 20 crianças amontoadas numpequeno quarto que talvez não tenha mais de 144 pés quadrados, ocupadosdurante 15 das 24 horas num trabalho, em si mesmo esgotante, entediante emonótono, executado nas piores condições de insalubridade... Mesmo ascrianças menores trabalham com uma atenção contínua e uma velocidadesurpreendente, quase nunca descansando os dedos nem retardando seusmovimentos. Quando lhes fazemos perguntas, não levantam os olhos dotrabalho, com medo de perder um simples instante (Marx, 1980, p. 535).
O objetivo de traçar essa longa discussão, buscando ressaltar as conseqüências
do sistema fabril na vida do trabalhador e, em especial, na vida de crianças e jovens
trabalhadores, além de objetivar esclarecer aquele momento histórico, evidencia o valor
dos estudos de Karl Marx, ao extrair e compreender o quadro da realidade de sua época.
Pode-se perceber que a análise feita por ele supera a mera facticidade imediata. Além
disso, o compromisso dele com as mudanças da sociedade e a luta dele pela liberdade
mostram o esforço de sua lucidez intelectual. Assim, não há aqui o interesse em
formalizar juízos acerca de seu trabalho, mas apenas iluminar o presente estudo com os
fortes refletores da realidade apresentada por esse autor, sem perder a clareza de que o
tempo histórico dele foi outro e que os lugares mencionados não deixam de ter suas
particularidades.
Nesse sentido, as contradições demonstradas por esse grande pensador não
podem ser simplesmente enquadradas em esquematismos e abalizadas numa ótica
evolucionista, todavia devem conduzir a se pensar o porquê de os “demônios das
máquinas”, garantidoras da autonomia do capitalista em decorrência do impecável e
implacável avanço tecnológico, não terem garantido, e continuarem não garantindo,
autonomia à vida do trabalhador.
Marx (1980), ao pensar em tais questões, deixa marcada a diferença de sua
posição política em relação aos interlocutores da economia política de seu tempo. Esses
se mantiveram atrelados aos valores da ideologia apologética do capital, anunciando o
avanço do progresso das relações de produção, desconsiderando o que tais avanços
representavam para a vida dos trabalhadores. Por isso, pondera-se que os estudos de
Karl Marx são essenciais à compreensão das contradições engendradas pelo conflito
entre o desenvolvimento das forças produtivas e o processo de formação sob o domínio
43
do capital, por ter levado o trabalhador a “interiorizar” a dominação e a aniquilar-se
como indivíduo.
Marcuse (1967), ao falar das novas formas de controle que prevalecem na
civilização industrial desenvolvida, sagazmente, questiona se, de fato, o que poderia ser
mais racional do que a supressão da individualidade na mecanização de desempenhos
socialmente necessários, mas penosos:
a concentração de empreendimentos individuais em organizações mais eficazese produtivas; a regulamentação da livre competição entre sujeitos econômicosdesigualmente equipados; a redução de prerrogativas e soberanias nacionais queimpedem a organização internacional dos recursos? (Marcuse, 1967, p.23).
O pensador frankfurtiano chama a atenção para o fato de que essa ordem
tecnológica compreende uma coordenação política e intelectual e pode ser um
acontecimento lamentável, mas promissor. Ele adverte que “Os direitos e liberdades que
foram fatores assaz vitais nas origens e fases iniciais da sociedade industrial renderam-
se a uma etapa mais avançada dessa sociedade: estão perdendo o seu sentido lógico e
conteúdo tradicional” (Marcuse, 1967, p.23). Ou seja, a liberdade de pensamento, que
ajudou a promover idéias essencialmente críticas, foram substituídas pelas idéias
produtivas e cheias de racionalidade.
Segundo Adorno (1996), os ideais impostos pelo capital fizeram crer aos
trabalhadores que eles eram livres e autodeterminados. Mas esses ideais possibilitaram
apenas estruturas pré-determinadas, heteronômicas, que os conduziram à semiformação.
Assim, cada vez mais, foi diminuindo o potencial libertário outrora desejado. A
totalitária figura da semiformação, observa esse pensador frankfurtiano (1996), não
pode se explicar simplesmente a partir do dado social e pelo psicológico, mas inclui
algo potencialmente positivo, a saber:
que o estado de consciência, postulado em outro tempo na sociedade burguesa,remeta, por antecipação, à possibilidade de uma autonomia real da própria vidade cada um – possibilidade que tal implantação rechaçou e que se leva aempurrões como mera ideologia (Adorno, 1996, p. 396).
44
No mundo administrado pela lógica do capital, tende a fracassar a identificação
daquele tempo, porque o ser singular nada recebe em relação a formas e estruturas de
uma sociedade virtualmente desqualificada pela onipotência do princípio da troca,
segundo Adorno (1996). Assim, não há nada com que o indivíduo possa identificar-se
de alguma forma. O poder da totalidade toma conta do indivíduo, o desenvolvimento da
tecnologia não tem por objetivo mudar as condições de vida dos homens, mas o quanto
pode aumentar o poder de controle do capital, esclarecem Horkheimer e Adorno (1985,
p. 49):
Agora que uma parte mínima do tempo de trabalho à disposição dos donos dasociedade é suficiente para assegurar a subsistência daqueles que ainda se fazemnecessários para o manejo das máquinas, o resto supérfluo, a massa imensa dapopulação, é adestrado como uma guarda suplementar do sistema, a serviço deseus planos grandiosos para o presente e o futuro. Eles são sustentados comoum exército dos desempregados. Rebaixados ao nível de simples objetos dosistema administrativo, que preforma todos os setores da vida moderna,inclusive a linguagem e a percepção, sua degradação reflete para eles anecessidade objetiva contra a qual se crêem impotentes. Na medida em quecresce a capacidade de eliminar duradouramente toda a miséria, cresce tambémdesmesuradamente a miséria enquanto antítese da potência e da impotência.
Esses autores destacam ainda que, apesar de todas as reiterações em contrário,
apesar de toda dinâmica e do crescimento da produção, a atual sociedade revela
aspectos estáticos.
Essa consideração é facilmente confirmada se comparado o modo como viviam
crianças e jovens submetidos às terríveis condições de trabalho, mesmo com o advento
da industrialização, do grande avanço tecnológico, ao que ainda acontece na sociedade
atual. A comparação, do período pós-revolução industrial com o que se observa hoje,
deixa claro os aspectos estáticos da sociedade. Sabe-se que hoje, por exemplo, o
trabalho infantil é proibido, há uma rigorosa legislação a condená-lo, e os adolescentes
45
têm proteção legal na realização de seus trabalhos. Contudo, mesmo com as mudanças
existentes, ainda há muito sofrimento na vida de crianças e jovens15.
Inúmeros relatos poderiam aqui ser elencados sobre as condições abomináveis
do que ocorre hoje com crianças e adolescentes em situações abusivas de trabalho: falta
de condições objetivas da educação; envolvimento com as drogas e com o tráfico; falta
de cuidados da família ou, muitas vezes, de abandono; falta de atendimento em saúde;
vítimas de violência (espancamento, morte, abuso sexual); prostituição, todos esses
problemas conjugados a uma inegável omissão e indiferença do poder público, da
sociedade em geral, frente a tal quadro. Essa indiferença está manifesta na precariedade
e falta de compromisso dos serviços públicos existentes. Tais serviços deveriam garantir
a proteção legalmente formalizada e anunciada, o que demandaria mudanças estruturais
na sociedade e não a existência avassaladora de programas meramente assistencialistas,
pois são apenas medidas paliativas e não resolvem as causas reais dos problemas.
Tal quadro, de modo ímpar, configura a convergência para o desenvolvimento
de uma sociedade que se tornou, como defende Marcuse (1967), totalitária16. Para esse
autor, mesmo com todas as mudanças ocorridas no desenvolvimento da sociedade
(avanço tecnológico, aumento da produção, entre outras inúmeras modificações), o
homem foi conduzido a resignar o seu pensar e a deixar a unanimidade empobrecer sua
capacidade de refletir sobre as contradições que foram constituindo sua vida, pois, como
diz Adorno (1986), o julgamento de necessidades corretas e falsas teria de ser feito de
acordo com uma visão da estrutura geral da sociedade, com todas as suas mediações.
Para ele, “o fictício que hoje deforma todo e qualquer atendimento das necessidades,
inconscientemente percebido sem questionamentos, provavelmente contribui para o
atual mal-estar na cultura” (Adorno, 1986, p.71). Contudo, esclarece ainda esse autor,
15 O levantamento de Galeano (1998), ao citar diferentes lugares, onde crianças e jovens vivem“indiferentes” à égide legal, revela as contradições da sociedade: “Mientras los niños ricos juegan a laguerra con balas de rayos láser, y a las balas de plomo amenazan a los niños de la calle; Cosechan café enColombia y en Tanzania, y se envenenan con los pesticidas;(…) En Malasia recogen la leche de losárboles del caucho, en jornadas de trabajo que se extienden de estrella a estrella; (…)En Port-au-Prince,Colombo, Yakarta o Recife sirven la mesa del amo, a cambio del derecho de comer lo que de la mesa cae;Venden fruta en los mercados de Bogotá y venden chicles en los autobuses de San Pablo; (…)Vendidos acien dólares por sus padres, se ofrecen en sudán para labores sexuales o todo trabajo.” (Galeano, 1998,p.15 -16).16 De acordo com Marcuse (1967), “totalitária” não é apenas uma coordenação política terroristada sociedade, mas também uma coordenação técnico-econômica não-terrorista que opera pormeio da manipulação das necessidades por interesses adquiridos. “Impede, assim, uma oposiçãoeficaz ao todo” (Marcuse, 1967, p.24-25).
46
que essa visão geral é muito mais importante, mais até do que o quase impenetrável
quid pro quo entre necessidade, satisfação e interesse de lucro ou poder.
O que se percebe, como adverte Adorno (1986 a), é que o peso da dominação
das relações de produção sobre os homens, revela que o valor dos bens de consumo e os
mecanismos financeiros, advindos dessas relações, tornaram-se mais importantes que os
homens. O estágio alcançado por essas relações e seu caráter de destruição, desde outros
tempos, pode ser acompanhado pelo tipo de formação consolidada nas experiências de
trabalho dos jovens não pertencentes às camadas detentoras dos bens de produção, de
que trata esta pesquisa.
Marcada por relações de exploração, a história mostrou com que indiferença
crianças e jovens foram subjugados ao interesse do mundo administrado, sendo tratados
apenas como peças – mais flexíveis – a serem utilizadas nas engrenagens do poder.
Pensar o significado de tais questões conduz à necessidade de compreender o
significado histórico da relação entre formação e trabalho, pois as experiências vividas
pelos trabalhadores, jovens ou não, ainda os têm mantido coagidos pelo interesse do
capital e adaptados à irracionalidade do mundo administrado. Segundo a análise de
Horkheimer e Adorno (1985, p. 143):
As massas desmoralizadas por uma vida submetida à coerção do sistema, e cujoúnico sinal de civilização são comportamentos inculcados à força e deixandotransparecer sempre sua fúria e rebeldias latentes, devem ser compelidas àordem pelo espetáculo de uma vida inexorável e da conduta exemplar daspessoas concernidas. A cultura sempre contribuiu para domar os instintosrevolucionários, e não apenas os bárbaros. A cultura industrializada faz algo amais. Ela exercita o indivíduo no preenchimento da condição sob a qual ele estáautorizado a levar essa vida inexorável.
Essas considerações fazem pensar, portanto, que nas relações capitalistas de
produção, o trabalho, inexoravelmente, tem como conseqüência a alienação. Essa
relação será abordada com mais detalhes no item a seguir.
47
2.3 – Trabalho e alienação
Ao designar este tópico como trabalho e alienação, a intenção é tentar esclarecer
no que resulta a vida do trabalhador despojado da autonomia e do controle de sua
produção, a partir dos autores da teoria crítica da sociedade. O foco da análise recai na
relação entre o trabalho e a repressão funcional, ou seja, a vida danificada do
trabalhador subsumida ao poder do capital. Poder esse que o despoja da condição de ser
sujeito de sua existência.
Marcuse (1978) explica o que significa a alienação do trabalhador frente ao seu
trabalho, quando as relações de produção foram adequadas às exigências do mercado da
livre concorrência. Para esse autor,
o trabalhador alienado do seu produto está, ao mesmo tempo, alienado de simesmo. Seu próprio trabalho não é mais seu, e o fato de que se tornepropriedade de outro anuncia uma expropriação que atinge a essência mesma dohomem. O trabalho, na sua forma verdadeira, é um meio para a auto-realizaçãoautêntica do homem, para o pleno desenvolvimento de suas potencialidades; autilização consciente das forças da natureza poderia ocorrer para sua satisfaçãoe prazer. Na forma corrente, entretanto, ele deforma todas as faculdadeshumanas e proscreve satisfação (Marcuse, 1978, p. 255-256).
Assim, conforme observa esse autor, na sociedade contemporânea, a alienação
faz parte das relações de trabalho, pois a ordem imposta pelo mundo administrado tem
mantido o eixo principal de seu interesse nos resultados alcançados pela produção e
não pelo sujeito que trabalha17. O trabalhador, muitas vezes, deixa-se enganar pelo
17 Marcuse (1981), ao examinar o valor dos estudos de Marx nos Manuscritos de 1844, chama a atençãoao fato de que essa obra fundamenta a teoria revolucionária. Portanto, a posição de crítica filosófica setorna imediatamente crítica prática-revolucionária. “(...) a alienação e alheamento do ente humano,expressando-se na alienação o alheamento do trabalho, assim a situação do ente humano na facticidadehistórica do capitalismo – este facto como a sua total inversão e ocultamento, o que a crítica determinaraenquanto o ente do homem e do trabalho humano! O trabalho não é ‘atividade livre’, auto-realizaçãouniversal e livre do homem, e sim a sua total escravização e desrealização (Entwirklichung), - o
48
pretenso interesse demonstrado a seu respeito e não consegue perceber que a expressa
preocupação com ele tem apenas o objetivo de saber o quanto ele pode render,
produzir.
A liberdade de escolha do homem que olhou a realidade com os olhos de
experimentador, utilizando a razão postulada no mundo burguês, sem deixar de ensejar
preceitos do humanismo, de forma contraditória, deixou a liberdade de escolha
aprisioná-lo, aliená-lo, impedindo-o assim de pensar que sua história podia (e pode) ser
direcionada de outra forma. No entanto, o que se vê é que os rumos que os homens
continuam tomando ainda os têm mantido fora dos caminhos da liberdade. Basta olhar o
que têm representado todas as mudanças ocorridas na sociedade, nas relações
estabelecidas entre os homens, para verificar que o controle sobre seus pares apenas
aparece com novos contornos e efetiva a eficácia da dominação. A respeito disso,
Marcuse (1967) explica que
sob o jugo de um todo repressivo, a liberdade pode ser transformada empoderoso instrumento de dominação. O alcance da escolha aberta ao indivíduonão é o fator decisivo para a determinação do grau de liberdade humana, mas oque pode ser escolhido e o que é escolhido pelo indivíduo. O critério para a livreescolha jamais pode ser absoluto, mas tampouco é inteiramente relativo. Aeleição livre dos senhores não abole os senhores ou escravos. A livre escolhaentre ampla variedade de mercadorias e serviços não significa liberdade se essesserviços e mercadorias sustêm os controles sociais sobre uma vida de labuta etemor – isto é, se sustêm alienação. E a reprodução espontânea, pelo indivíduo,de necessidades super impostas não estabelece autonomia, apenas testemunha aeficácia dos controles (Marcuse, 1967, p. 28).
A eficácia do poder de controle do capital pode ser verificada na diversidade de
estratégias utilizadas, de contínua reprodução e expansão, e pode ser acompanhada nas
profundas mudanças no mundo do trabalho. Tais transformações têm trazido alterações
qualitativas na forma de ser do trabalhador, nas experiências de sua vida. Contudo,
trabalhador não representa o homem na totalidade da sua manifestação vital, e sim um ‘sub-homem’, umpuro sujeito físico em atividade ‘abstrata’, - os objetos do trabalho não são exteriorizações ecomprovações da atividade humana do trabalho e sim estranhas ‘mercadorias’, coisas pertencentes aterceiros e não ao trabalhador. Com tudo isto, não se converte a existência do homem, no trabalhoalienado, não ‘meio’ da sua realização essencial, e sim, pelo contrário, torna-se o próprio ente humano ummeio da sua mera existência: a pura existência física do trabalhador constitui a meta, a cujo serviço sedispõe toda sua atividade vital” (Marcuse, 1981, p. 129).
49
sendo aliadas às estratégias de dominação do capital, essas mudanças têm
desconsiderado a necessidade de singularidade para a existência da vida dos homens.
A esse respeito Crochík (2003) afirma que uma sociedade que não tenha dado
conta da produção necessária, por meio do trabalho, de satisfazer as necessidades de
seus indivíduos, não é propícia à liberdade. Segundo ele,
a carência é sua inimiga. Claro, a liberdade é histórica, e quanto mais as forçasprodutivas avançam, mais ela se torna real, mas como a sociedade também temprogredido em sua forma de dominação, a liberdade só pode se constituir emoposição à forma social estabelecida (Crochík, 2003, p. 65).
Ao se observar o avanço das forças produtivas, as metamorfoses significativas
nas relações de trabalho, utilizando diferentes modelos: fordismo, taylorismo,
neofordismo, neotaylorismo, descentralização produtiva, acumulação flexível,
desenvolvimento do setor de serviços, combinação de processos produtivos, toyotismo
ou modelo japonês, gestão de qualidade total, sabe-se que essas modificações não têm
alterado, substancialmente, as relações de dominação. Não diminuíram o estranhamento
e a alienação do sujeito em relação ao trabalho. Ao contrário, os avanços tecnológicos
não deixam de ampliar o processo de reificação constitutivos da formação do
trabalhador.
A sociedade, ao anunciar a democracia e a neutralidade da técnica, cujo avanço
beneficia a todos, porém, mais a uns que a outros, sustenta os interesses das relações de
produção dominantes, ou seja, o interesse da ideologia dominante, que tem na
tecnologia sua aliada para exercer melhor a coerção. Metaforicamente, o uso da técnica
transforma os homens em peças a serem ajustadas, acompanhadas de manuais de
funcionamento, na grande máquina posta para funcionar pelo mundo administrado. O
filme Tempos modernos é exemplar para essas considerações, pois nele Charles Chaplin
mostra como as engrenagens das máquinas engolem os homens.
O homem do mundo tecnológico é despojado de sua espontaneidade, em
decorrência da forma como é exercido o controle sobre a produção por ele realizada,
seja ela intelectual ou não, pois, na administração do trabalho, é preciso ter o domínio
50
também sobre o pensamento do trabalhador, iludindo-o e fazendo-o acreditar que a
possibilidade de conquistar espaços e de se manter no mercado de trabalho depende
apenas de seu esforço, valorizando, assim, a supremacia do sujeito sobre o mundo
objetivo.
Observa-se que, com essa estratégia, quanto mais o sujeito se envolve e interage
com o trabalho mais aumenta sua alienação, ampliando o distanciamento da realidade.
O ego fragiliza-se e o impede de refletir e perceber que o que é dito pode não ser a
verdade. Assim, no comportamento desenvolvido no trabalho, o sujeito cada vez mais
se vale de atitudes irracionais. Fica feliz em desenvolver neuroses que o permitem ficar
empregado, o trabalho vira obsessão, o que importa é adaptar-se às exigências do
mercado. Para ele, passa então a ser mais importante ser empreendedor, ser flexível do
que ter habilidade e capacidade. O que importa é a disposição para deixar-se dominar,
vestir a camisa da empresa, de ser massa de manobra. O trabalhador precisa manter-se
na defensiva o tempo todo e não consegue romper com os medos e refletir sobre o que
lhe é feito sob o jugo do capital.
De acordo com Horkheimer e Adorno (1985), os modos de trabalho
racionalizados na sociedade burguesa englobam relações e emoções que fazem os
homens se reconverterem naquilo contra o que se voltara à lei evolutiva da sociedade, o
princípio do eu. Pois, os trabalhadores tornam-se meros seres genéricos, iguais uns aos
outros pelo isolamento na coletividade governada pela força.
Assim, o avanço técnico ocorrido na sociedade industrial, produzido pelo
desenvolvimento da ciência, tem feito a técnica referendar a coerção, uma vez que passa
a ser um valor em si.
O custo do aprimoramento da ciência, sem negar sua importância, ao exigir cada
vez mais realização de experiências, com dados comprobatórios, tem auferido
resultados voltados ao valor no mercado, ao valor venal, ao resultado do lucro a ser
obtido. Se, para a constatação desse custo, o valor implicar a dizimação da vida de
milhares de pessoas, isso pouco importa aos executores. Por conta disso, o homem
explode bombas e mata seus iguais, somente para aperfeiçoar a técnica e testar sua
eficácia, como têm sido os horrores produzidos pela sofisticação tecnológica das
guerras, defendidas astutamente como necessárias. Desse modo, ensejam uma lógica
51
que perde a noção de que a sociedade é constituída por seres que deveriam ser tratados
como humanos.
As transformações possibilitadas pela técnica já progrediram de tal forma que
não seria preciso mais trabalhar tanto quanto se trabalha. O trabalho poderia não ser
constituído de sacrifício, impositor de tantos medos e ilusor de falsas liberdades, falsos
prazeres. Tal situação representa o insucesso da humanização da sociedade administrada
pelo capital. Por outro lado, é evidência contumaz da crise do processo formativo
existente, como bem esclarece Maar (1995), referendado pelos estudos adornianos:
A realidade efetiva da história é a “formação pelo trabalho”: eis a revoluçãocopernicana de Marx. A partir desta formação pelo trabalho seria possíveldoravante pensar no capitalismo como uma síntese socialmente formada. Masmuito cedo ficaria claro que, embora o trabalho fosse formador, o que seobservava era a universalização da forma social do trabalho alienado,deformador; a formação se desenvolveu como um défict ético no capitalismo. Omodelo da formação, originalmente atrelado a uma concepção de solidariedadetotalizada nos moldes do antigo trabalho artesanal, tinha seu destino traçadopela própria prática produtiva dos homens no movimento histórico daindustrialização. A experiência formativa pelo trabalho social acompanha odesenvolvimento do processo de trabalho e tudo o que isto representa em termosde transformações culturais, científicas, tecnológicas etc. (Maar, 1995, p. 17).
Crochík (2003) explica ainda melhor o que ocorre na sociedade atual. Para ele,
“o avanço obtido pelo progresso, que permite uma vida mais digna, deve ser irmanado
com a felicidade e a liberdade que já seriam possíveis, como negação determinada, e
não com a felicidade e a liberdade existente” (Crochík, 2003, p. 65) , pois, o usufruir
dessas últimas, para ele, fortalece a resignação. Assim, a felicidade, na sociedade
existente, só é possível na negação de todo sofrimento que essa sociedade gera, explica
Crochík (2003).
Segundo esse autor, na sociedade atual, o que se observa é uma constante
necessidade de novas produções materiais, de mudanças para atender ao mercado de
trabalho. Com isso, o trabalhador intelectual tem cada vez mais suas capacidades
cognitivas envolvidas subjetivamente, não deixando também de produzir a regressão e
até acredita em ter liberdade e autonomia para estabelecer estratégias e tomar decisões
na realização de seu trabalho. Isso demonstra o quanto ele não percebe que toda sua
52
vida fica vinculada à lógica da ordem estabelecida. Dedica-se tanto ao trabalho que
perde o prazer ao realizá-lo, já que ele constitui uma obrigação de sobrevivência frente a
caoticidade das relações de trabalho existentes na sociedade. O trabalhador não tem
tempo para pensar sobre o que faz, entra na engrenagem, como já se mencionou.
Apenas sabe que precisa garantir o emprego, dando um enorme poder de domínio ao
empregador, à empresa. Como resposta, o trabalhador torna-se descartável e sem poder
de barganha sobre seu saber, sua criatividade e dedicação que estabelece com o
trabalho. O progresso, nessa sociedade, tem feito dos trabalhadores meros executores de
papéis, atuando de acordo com a necessidade do empregador, uma vez que podem ser
substituídos com facilidade por outros.
A realização do trabalhador fica impedida de ser constituída, pois a vida dele
tornou-se um mero instrumento de trabalho a ser manipulado, sem diferenciar dos
resultados que produz. Marcuse (1967) argumenta que a civilização industrial
desenvolvida, pelo caráter racional de sua irracionalidade, leva as criaturas a se
reconhecerem em suas mercadorias; encontram sua alma em seu automóvel, hi-fi, casa
em patamares, utensílios de cozinha. A prova disso está no fato de os indivíduos
valorizarem, cada vez mais, a necessidade de ter. O afeto fica vinculado à administração
de bens, à eficiência e à capacidade de controlar a vida, de acordo com o controle da
racionalidade tecnológica. É preciso ser frio, calculista e configurar uma personalidade
moldada para atender às exigências do mercado de trabalho. O trabalho, dessa forma,
transformou-se em um fim em si mesmo, não importando o quão destrutivo possa ser ao
trabalhador, à formação de suas emoções, de seus afetos. Não é de admirar, segundo
Marcuse (1967), que nos setores mais desenvolvidos da civilização industrial, os
controles sociais tenham sido introjetados a ponto de até o protesto individual ser
afetado em suas raízes18. Ele ainda acrescenta que
a negativa intelectual e emocional de “prosseguir” parece neurótica eimpotente. Esse é o aspecto sócio-patológico do acontecimento político quemarca o período contemporâneo: o desaparecimento das forças históricas que,na fase anterior da sociedade intelectual, pareceu representarem a possibilidadede novas formas de existência (Marcuse, 1967, p. 30).
18 Marcuse (1967) explica que o termo introjeção sugere uma variedade de processos relativamenteespontâneos pelos quais um Eu (Ego) transfere o “exterior” para o “interior”. Assim, introjeçãosubentende a existência de uma dimensão interior, distinta e até antagônica das exigências externas – umaconsciência individual separados da opinião e do comportamento públicos.
53
Atualmente, os espaços constitutivos do indivíduo foram invadidos pela
ideologia da racionalidade tecnológica, que tem reivindicado o “indivíduo por inteiro”,
fazendo-o identificar-se com o todo e tornando-o incapaz de refletir o que tem
significado sua existência, incapaz de pensar o poder repressivo do todo19.
De forma instigante, Adorno e Horkheimer (1985) falam das necessidades
psíquicas e da cultura de uma sociedade que tem negado a livre experiência ao
indivíduo, afirmando, inicialmente, que o símbolo da inteligência, nesse tipo de
sociedade, é a antena do caracol, devido a sua visão tateante. Diante de um obstáculo, o
caracol imediatamente retira a antena para proteger o corpo do perigo e manterá essa
atitude até se sentir livre da ameaça. Contudo, observam os frankfurtianos, que mesmo
os animais mais evoluídos não ultrapassam atitudes de repetição. Nessa lógica, fazem
analogia ao fato de ser negada, na sociedade administrada para o sacrifício, a
possibilidade da livre experiência do indivíduo, pois desde a infância, o homem fica
compelido a repetir. Segundo os autores,
com a inibição, teve início a inútil repetição de tentativas desorganizadas edesajeitadas. As perguntas sem fim da criança já são sinais de uma dor secreta,de uma primeira questão para a qual não encontrou resposta e que não sabeformular corretamente (...) se as repetições já se reduziram na criança, ou se ainibição foi excessivamente brutal, a atenção pode se voltar numa outra direção,a criança ficou mais rica de experiências, como se diz, mas freqüentemente, nolugar onde o desejo foi atingido, fica uma cicatriz imperceptível, um pequenoenrijecimento, onde a superfície ficou insensível. Essas cicatrizes constituemdeformações. Elas podem criar caracteres, duros e capazes, podem tornar aspessoas burras – no sentido de uma manifestação de deficiência, da cegueira eda impotência, quando ficam apenas estagnadas, no sentido da maldade, dateimosia e do fanatismo, quando desenvolvem um câncer em seu interior. Aviolência sofrida transforma a boa vontade em má. E não apenas a perguntaproibida, mas também a condenação da irritação, do choro, da brincadeiraarriscada, pode provocar essas cicatrizes. Como as espécies da série animal,assim também as etapas intelectuais no interior de um indivíduo designam asetapas em que a esperança se imobilizou e que são o testemunho petrificado dofato de que todo ser vivo se encontrar sob uma força que o domina (Horkheimere Adorno, 1985, p. 240).
19 Conforme Crochík (1999), a ideologia da racionalidade tecnológica é mais que um conjunto de idéias,crenças e valores, e se configura como uma tendência a analisar todos os fenômenos através da razãoinstrumental, não se atendo às suas especificidades; o predomínio é a lógica do sujeito e não a do objeto oque significa que a realidade não é entendida em seus próprios termos, mas nos do sujeito. Na suapretensa neutralidade não se dá conta da natureza não conquistada que a acompanha: a necessidade dedominação.
54
Disso se compreende, portanto, que são as condições de vida existentes na
sociedade que tem tornado enrijecido o pensamento do adulto, como resultado das
restrições aos desejos e fantasias já iniciados na infância. Interessa, aos detentores do
poder, manter o pensamento aprisionado pela racionalidade tecnológica, manter as
“antenas” dos homens aprisionadas, sem captar o novo, e ter o domínio sobre a vida dos
indivíduos, domínio esse desaparecido atrás das instituições, das normas e critérios que
implicam a formação profissional exigida, pois os indivíduos tornam-se, de acordo com
Crochík (2004), cada vez menos necessários para a reprodução da ordem social.
Nesse sentido, a possibilidade existente para os indivíduos é a resignação, a
adaptação, sem oferecer condições de uma vinculação racional. E Crochík (2004) é
taxativo ao afirmar que “o pouco empenho e compromisso que os atuais trabalhadores
têm em relação ao seu ofício revela a ampliação da alienação, que agora é quase que
consciente” (Crochík 2004, p. 43). Ele ainda aponta que basta verificar o que tem
acontecido nos sindicatos dos trabalhadores: tornam-se cada vez mais clubes de serviços
do que espaços para reivindicações de direitos trabalhistas. Conforme explica esse
autor, “os explorados pelo trabalho ficam contentes de terem uma remuneração, ainda
que insuficiente, e por serem explorados, os que não trabalham tentam a todo custo, de
maneira formal ou informal, também ser explorados” (Crochík, 2004, p. 43).
Frente a tais situações, é possível ponderar que as relações de trabalho e,
conseqüentemente, a formação profissional, têm levado os homens a cultuarem o que os
oprimem. Tais relações, da maneira como têm sido organizadas, continuam
desconstituindo a subjetividade do trabalhador. O apego demasiado à regularidade do
trabalho tem impedido os indivíduos de pensarem numa vida em que o trabalho não
esteja articulado à necessidade de sacrifício e emancipado do poder exercido pelo
capital. Ter um emprego qualquer tem sido considerado, nos dias atuais, até mesmo aval
de dignidade. Essa discussão será detalhada no capítulo seguinte.
55
CAPÍTULO 3 – A PSEUDOFORMAÇÃO INSTITUCIONALIZADA:
SIGNIFICADO DA ESCOLA E DA FORMAÇÃO
PROFISSIONAL
Características marcantes de nossaépoca é a preponderância das
relações de produção sobre as forçasprodutivas, que, porém há muito
desdenham as relações. Que o braçoestendido da humanidade alcance
planetas distantes e vazios, mas queela, em seu próprio planeta, não sejacapaz de fundar uma paz duradoura,
manifesta o absurdo na direção doqual se movimenta a dialética social
(Adorno, 1986, p. 70).
Para dar seqüência ao debate da relação entre formação e trabalho, neste
capítulo, dividido em duas partes, o objetivo é discutir o que tem representado para os
jovens o processo de formação existente na sociedade atual. Na primeira parte,
intitulada “Valor dado ao trabalho e à educação, por jovens brasileiros”, destaca-se a
vulnerabilidade tangente a essa relação ao ser expressa por jovens, de acordo com o
resultado de estudos de alguns pesquisadores. Na segunda parte, denominada “As
exigências do mercado de trabalho à formação profissional” , como sugere o título, são
apresentadas características pertinentes à formação profissional nos dias atuais e às
políticas públicas formuladas a fim de dar aos jovens a formação – pseudoformação –
profissional.
3.1- O valor dado ao trabalho e à educação por jovens brasileiros
56
Para iniciar a discussão, retomam-se questões pertinentes à experiência
profissional da pesquisadora. Dentre os motivos já apontados, significativos ao mote
desta investigação, uma situação, que chamava bastante atenção nas atitudes dos jovens
do IMCG, era o desinteresse que muitos deles apresentavam pela escola ao serem
encaminhados ao mercado de trabalho. Frente a tal problema, a Instituição precisou
organizar um controle mensal, em parceria com as escolas, para tentar impedir o
abandono. Além disso, parecia que, para muitos jovens e seus familiares, o trabalho
tinha maior importância que a escola, por atender às necessidades de subsistência não só
do jovem, mas também da família. Assim, no momento em que o jovem tinha acesso ao
mercado de trabalho, ficava-se com a impressão que a escola deixava de apresentar
resultados pragmáticos, conforme diziam os jovens e seus familiares. Ao ter o emprego
garantido, estudar parecia perder sentido.
Em reuniões de avaliação sobre os trabalhos desenvolvidos, os professores do
IMCG, costumeiramente, relatavam que os jovens afirmavam terem maior apreço pelas
atividades ali realizadas, pois conseguiam aprender com mais facilidade no Instituto que
nas escolas. Esses professores, com o objetivo de melhor se capacitarem, eram
incentivados a participarem de constantes programas de estudos, orientados para que
trabalhassem respeitando as possibilidades de cada jovem e, ao mesmo tempo, deviam
procurar instigá-lo a pensar de forma crítica sobre a sociedade atual20, mesmo com todas
as limitações e contradições que isso implicasse, pois o processo de formação proposto
não podia deixar de capacitá-los para atender ao mercado de trabalho.
Mas, seria essa forma de trabalho, que buscava ser instigadora, responsável por
despertar maior interesse nos jovens? Ou decorria da necessidade imperativa de
emprego, conforme mencionado? Provavelmente, é possível articular as duas situações.
Mas, sem dúvida, outro aspecto interessante a ser pensado é o significado do valor
erótico que passou a ser dado ao trabalho, na sociedade contemporânea.
20 Não há aqui o propósito em fazer apologia ao trabalho da Instituição, pois há a clareza das limitaçõesimpostas pela sociedade ao processo educativo de um modo geral. Os técnicos “formadores” dos jovensnão deixavam de se confrontarem, também, com as artimanhas de uma pseudoformação. Por outro lado,tem-se presente que a ideologia da filantropia não deixa de representar uma forma de barbárie, uma vezque o desenvolvimento da sociedade, no que tange à tecnologia, já prescindiria de ações filantrópicas.Nos valores dessas ações, os direitos do indivíduo viram favores, fazendo com que esses indivíduos sesintam privilegiados por ter acesso aos benefícios oferecidos.
57
O significado da relação entre trabalho, prazer e repressão, está relacionado à
tendência erótica para o trabalho, uma vez que, no trabalho, há possibilidade de
descarga dos impulsos libidinais. Marcuse (1999) observa que a síndrome instintiva
“infelicidade e trabalho”, relacionada à interpretação do mito de Prometeu, apresentada
por Freud, tem por fulcro a ligação entre a sujeição da paixão sexual e o trabalho
civilizado. O processo civilizatório e a relação entre trabalho e prazer, estão articulados
a um processo de sublimação, quando o trabalho oferece um elevado grau de satisfação
libidinal. Conforme Marcuse (1999) há um modo de trabalho que oferece um elevado
grau de satisfação libidinal, cuja execução é agradável: “E o trabalho artístico - sempre
que genuíno - parece brotar de uma constelação instintiva não-repressiva e visar
finalidades não-repressivas – tanto assim que o termo sublimação parece requerer
considerável modificação” (Marcuse, 1999, p.88). No entanto, as relações de trabalho
dadas na sociedade atual ocorrem de modo muito diferente, não acontecem pela livre
opção dos trabalhadores, principalmente os assalariados. As pequenas chances de
escolha existentes, propagandeadas como se existisse o poder de “livre opção”, não
deixam de representar limites preestabelecidos para melhor administrar um princípio
repressivo de realidade. E, da forma como as relações de trabalho têm sido organizadas,
sustentadas por acirradas formas de competição, fica cada vez mais difícil realizar
trabalho aliado a prazer, à situação de gratificação. Aliar trabalho e prazer acaba sendo,
portanto, uma situação de privilégio para poucas pessoas.
Abordar essa discussão é importante, pois ajuda a refletir sobre as condições de
vida dos jovens que participam do IMCG, os quais, na grande maioria das vezes, sequer
podiam pensar em escolhas, em algo a que pudesse ater os seus interesses ou desejos,
mesmo nas limitadas condições das escolhas possíveis que, às vezes, a Instituição
procurava lhes oferecer. A “libido” desses jovens – o impulsivo arroubo juvenil –
direcionava-se à garantia de subsistência. O trabalho, para eles, representava a força da
disciplina, mesmo não sendo mais fundamentada nos princípios de valores militares,
que outrora fizera parte da história dessa Instituição.
Todavia , além da questão da sobrevivência de jovens que precisam trabalhar, é
preciso pensar o quanto o desenvolvimento das forças produtivas tem valorizado o
trabalho e o faz ser visto como prioridade a uma significativa maioria de jovens dessa
sociedade. Consagra-se, assim, contraditoriamente, uma vez que, com o avanço da
58
tecnologia, têm diminuído os postos de trabalho, a ideologia do trabalho, como um fim
disciplinador, referenciando toda lógica do mundo administrado, conforme já destacado.
Freire (2003), em um estudo que discute como o jovem estudante paulista utiliza
o tempo livre e os espaços de convivência com seus pares, aborda temas como escola e
trabalho, política, dentre outros, analisados a partir da fala dos jovens. Nas
considerações referentes às análises dos dados obtidos, a autora mostra que a escola
representa para os jovens investigados um fator de exclusão social e de injustiça em
relação às diferentes classes sociais. Os jovens, que não podem pagar a escola e cursos
complementares, acreditam que serão prejudicados quanto à profissionalização e à
continuidade dos estudos.
A autora também afirma ser evidente o binômio exclusão-pertencimento, quando
os jovens falam de sua formação, ou seja, da intensidade do processo de
pseudoformação ao qual estão submetidos. Mas, mesmo quando eles tecem críticas à
sua realidade, não são despertos para ações transformadoras, desde aquelas pessoais,
como mudar o canal de televisão, quanto às grupais, como participar de processos
reivindicatórios estudantis. Com isso, Freire (2003) observa um presente nível de
adaptação e conformismo. Para ela,
os jovens ressaltam o sentimento de desrespeito com o qual são tratados pelosadultos e nas conversas sobre o tema trabalho, ao apontarem a dificuldade, emespecial das meninas, de ingressarem no primeiro emprego devido ao descréditoatribuído pelos adultos aos jovens (Freire, 2003, p. 107).
Pode-se afirmar que, de um modo geral, nos diferentes temas abordados pela
autora, fica claro o imobilismo provocado pela pseudoformação, decorrente das
experiências do processo de escolarização. Os jovens percebem que terão o futuro
comprometido ao fazerem projeções, mas não conseguem se ver fora dos contornos
sociais já definidos pela sociedade existente.
Os estudos de Giovinazzo Jr. (2003), sobre o significado que adolescentes
atribuem à experiência escolar, também colaboram para o esclarecimento das questões
59
que se referem à juventude e, principalmente, o que tem significado a experiência
formativa procedente da escolarização.
Nas análises realizadas, Giovinazzo Jr. (2003), observa ser difícil submeter à
crítica os dizeres dos jovens a respeito de si mesmos e da realidade, pela falta de
linearidade e pela ambigüidade de suas posições. O autor ainda explica que eles têm,
também, dificuldades em definir posicionamentos e relacioná-los aos esquemas que lhes
orientam as observações. Os alunos conhecem seus problemas, seus limites e suas
possibilidades e conseguem distinguir as dificuldades encontradas na escola. No
entanto, as opiniões deles “não passam da reprodução de clichês e estereótipos, o que
paralisa o movimento do sujeito e do objeto e dificulta a reflexão e a auto-reflexão”
(Giovinazzo Jr., 2003, p.204).
Segundo esse autor, as identificações com o coletivo e a naturalização dos
condicionamentos sociais ficaram claramente expressas nos dizeres dos jovens, ao
verificar que, mesmo reconhecendo a necessidade de maior envolvimento com a
política, não deixavam de serem absorvidos pela necessidade de adaptação aos valores
impostos pela sociedade. Por outro lado, o autor constata também que eles valorizavam
a importância da ação e percebiam limites nos seus fazeres. E, ao concordarem que
podiam fazer algo para melhorar, conseguiam encarar as ações apenas em termos
individuais.
Giovinazzo Jr. (2003) também observa que a escola ainda parece ser uma
instituição que exerce influência sobre os alunos e suas famílias, mesmo que seja
verdade o fato de os alunos não valorizarem a escola, pois, algum tipo de trabalho ainda
continua sendo realizado por meio da educação escolar, ainda que seja como
pseudoformação (nos termos de Adorno), continua sendo imposta.
Ainda para esse autor, o controle social representa uma das funções para o qual a
escola foi criada. Mas, para ele, a escola pode também ser um espaço de produção
cultural. Espaço criado, muitas vezes, pelos próprios alunos, que transformam a
passagem pela escola em uma experiência significativa. “Havendo certa tensão na
relação dos alunos com a escola algumas resistências acontecem, algumas práticas fora
dos padrões estabelecidos ganham espaço e podem conter alternativas à ordem social e
às próprias práticas pedagógicas.” (Giovinazzo, 2003, p. 208).
60
Assim, a escola pode tornar-se um espaço para contradições, capaz de fazer surgir
o novo, de favorecer o processo de individuação do sujeito. Porém, o que tem
predominado nas experiências produzidas nas escolas, observadas a partir de como ela é
organizada, é que ela tem atuado como uma extensão da indústria cultural, mesmo
quando, aparentemente, opõe-se a ela. O interesse expresso nas práticas pedagógicas
fica muito preso à adaptação dos alunos, a oferecer apenas uma cultura purgada dos
elementos que possibilitariam o desenvolvimento da autonomia, da crítica, já que ela
mesma busca adaptar-se às necessidades sociais, defende Giovinazzo Jr. (2003). Pois, a
escola passa a ser apenas uma instituição que trabalha a favor da perpetuação da
necessidade de “ganhar a vida”, impedindo, assim, o florescimento de outras
necessidades.
Souza (2003), ao investigar que tipo de sujeito está sendo formado na escola, por
ela identificada em crise e em um momento de mutação cultural, apresenta os resultados
de uma pesquisa realizada em 1997.
A investigação apresentada por essa pesquisadora contou com a participação de
172 sujeitos (faixa etária entre 17 e 20 anos), estudantes da última série do ensino
médio, do período noturno e inseridos no mercado de trabalho, em dois
estabelecimentos escolares, administrados pelo Estado de São Paulo, localizados na
Zona Norte. Dentre as conclusões a que se chegou, são interessantes as comparações
feitas sobre o comportamento do jovem das gerações anteriores (até os anos de 1970)
com os da investigação, em 1997. Segundo Souza (2003), o jovem (ou pelo menos o
“modelo ideal” do estudante radical) dos anos anteriores acreditava em seu caráter
rebelde e no seu poder de mobilização e intervenção social. Entretanto, nos sujeitos
pesquisados, foi identificado um sentimento de “insignificância” perante a realidade.
Para a amostra dos jovens, pesquisados em 1997, a realidade apresentava-se,
portanto, na forma de fatos dados, prontos e acabados, os quais não comportavam uma
reflexão sobre os processos que os produziram, tampouco um esforço de imaginação de
alternativas possíveis. Assim, verificou-se que o poder de realização dos jovens pareceu
débil, e sua ação – individual – condenada a não ter alcance algum, nem a seus olhos,
nem aos olhos do mundo. Para eles, não havia nada que podia ser feito diante do
imediatamente dado, conforme explica Souza (2003).
61
Vale ressaltar que as conclusões dessa autora não são diferentes das feitas por
Freire (2003), para quem os traços do sentimento de insignificância transpareceram nas
atitudes dos alunos, diante da própria relação de ensino e de aprendizagem, que
acontece na escola. O aluno se coloca como aquele que deve ser resgatado, convencido,
capturado pelo professor. Nas palavras de Souza (2003, p. 170),
ele não se vê como receptor passivo ou mero depositário de conteúdo, poisquestiona o valor do conhecimento escolar, mas também não se coloca comosujeito da ação educativa. O jovem aluno se auto-representa como aquele quedeve ser “guiado” pelo mestre, depois de ter sido suficientemente persuadido,não por meio de argumentação racional, mas pela relação – porque não dizer –afetiva que deve se estabelecer entre ambos. Ao professor, e apenas a ele,caberia a iniciativa e a condução do processo de aprendizagem escolar.
Há outras situações que indicam o comportamento de insignificância do jovem,
apresentadas pela autora: a questão das drogas (percebe-se como vítima indefesa); a
questão do desemprego (sente-se como um indivíduo a quem se negam oportunidades).
Mas, com relação ao desemprego, a autora constata que eles reconhecem o fato,
estatisticamente comprovado, de que se trata de um dos maiores problemas que tem
acometido a juventude. E, ao contrário do que prega a retórica neoliberal, eles
identificaram a origem do problema não na ausência de qualificações pessoais, mas nas
condições adversas do mercado de trabalho.
Já com relação à importância do conhecimento produzido na escola, a autora
constata que o interesse do jovem está intimamente relacionado às necessidades
práticas, inclusive às relativas a comportamentos que tenham utilidade imediata para a
vida social. Para eles,
enquanto a escola é considerada como o local em que se aprende apenas obásico, o trabalho é visto como o ambiente onde se pode aprender ampliar ocírculo inicial composto pelos familiares e pelo grupo de pares, além de seadquirir responsabilidade. Isto é, o trabalho – ao contrário da escola – é aoportunidade de crescimento e amadurecimento (Souza, 2003, p.172).
62
Observa-se, assim, que o valor dado ao trabalho, em relação à escola, sobressai
de maneira significativa, de acordo com as conclusões de Souza (2003). Essa autora
ainda assinala que, mesmo exercendo funções de trabalho menos qualificadas, os jovens
entrevistados, na grande maioria, declaram-se satisfeitos com seus empregos.
Essas posições evidenciam, portanto, que estão na contramão das teorias que
decretaram o fim do trabalho na sociedade pós-industrial, pois, ao contrário, valorizam
o trabalho como uma importante oportunidade de socialização e fator de inserção social.
Outro estudo que mostra o valor dado ao trabalho, ao discutir a relação entre
escolaridade e emprego, é o de Gomes (1997). Nesse estudo, a autora constata que há
discrepâncias entre os discursos e a vida de jovens filhos de pais analfabetos, para o
valor dado à escola e ao trabalho.
A parte inicial da pesquisa de Gomes (1997), foi feita acerca da ação familiar
socializadora com base na construção de histórias de vida, para o que foram colhidas
informações sobre as experiências escolares dos sujeitos e seus familiares. Depois, a
pesquisa foi complementada por um estudo longitudinal das trajetórias de adolescentes
em relação à escola e ao trabalho, no período de 1988 a 1992.
Essa investigação permitiu constatar que os jovens entravam e saíam da escola
sem que tivessem, de fato, premidos por qualquer necessidade material mais imediata e,
ao mesmo tempo, manifestavam acentuada intolerância à rotina escolar . Pareciam,
portanto, buscar no trabalho um substitutivo ao proposto pela escola, pois trabalhar
parecia ser mais atraente e mais convincente do que a escola.
O valor dado ao trabalho também está presente nos relatos resultantes dos
estudos desenvolvidos pelo Projeto Juventude, com o objetivo de investigar o perfil da
juventude brasileira, realizado por meio de um amplo levantamento quantitativo,
organizado pelo Instituto Cidadania e apresentado no livro Retratos da Juventude
Brasileira (2005). Dentre o conjunto das análises feitas, baseadas nos dados colhidos,
destacam-se dois artigos que reforçam as discussões em questão: o de Branco (2005) e o
de Guimarães (2005). Os temas desses autores atêm-se ao estudo dos dados que
pesquisaram a importância do trabalho para os jovens. Seus argumentos são
fundamentados em relatos colhidos de 3.501 entrevistados, com idade entre 15 e 24
anos, distribuídos em 198 municípios.
63
O trabalho apresentado por Guimarães (2005), Trabalho: uma categoria chave
no imaginário juvenil?, revela que a questão do trabalho foi uma preocupação central
no imaginário juvenil (valor, necessidade, direito). Para essa autora, a peculiaridade do
jovem brasileiro está implícita ao adjetivo que lhe qualifica a especificidade: “trata da
juventude trabalhadora brasileira” (Guimarães, 2005, p.167). Os dados mostrados
identificam a especificidade dessa juventude, “que em parcela não desprezível, ingressa
no trabalho ainda na infância; nada menos que 33% deles iniciam sua carreira como
trabalhadores entre 5 e 14 anos, e somente um quarto deles o faz depois da maioridade”.
(Guimarães, 2005, p. 167).
Branco (2005), ao fazer uma análise das condições estruturais do mercado de
trabalho e das demandas dos jovens ante o tema, apresenta dados que não são diferentes
dos apontados por Guimarães (2005). Com pesquisas distintas, os autores mostram que
os jovens destacam o trabalho como o assunto de interesse principal, tanto os que já têm
trabalho, quanto os que ainda o estão procurando.
Por outro lado, os pesquisadores também demonstram que o desemprego é
considerado o problema manifesto mais agudo, em especial, entre os jovens de 18 a 20
anos de idade. Os resultados quantitativos apresentados pelos pesquisadores revelaram o
sentido da centralidade do trabalho para o jovem brasileiro, pois mostram o interesse
sobre a questão da empregabilidade.
Por terem sido, os estudos aqui apresentados, feitos com o propósito de mostrar
o valor dado pelos jovens, na sociedade atual, ao trabalho e à escola, não serão feitas
análises do que representam as conclusões formalizadas pelos autores citados.
Ao avaliar o quão presente se demonstrou o valor dado ao trabalho e seu
significado para os jovens, de acordo com as pesquisas mencionadas, suscita pensar no
manifesto de Lafargue (2003), do direito à preguiça. Esse autor chama a atenção à
degradação imposta à vida do trabalhador, afirmando que as relações de trabalho
tornaram-se uma loucura. “Vergonha para os proletários!”, exclama Lafargue (2003, p.
29). E ainda questiona:
Onde estão aquelas velhas comadres de que falavam as nossas fábulas ehistórias antigas, atrevidas, sem papas na língua, amantes de um bom trago?
64
(...). Hoje as moças e as mulheres estão na fábrica, insignificantes flores decores pálidas, com o sangue sem força, estômago deteriorado, os membros semenergia! (...). E as crianças? Doze horas de trabalho para as crianças. Oh,miséria! (Lafargue, 2003, p. 29).
O tempo desse autor data do século XIX, mas os apelos ainda servem para o
momento atual, pois o peso do dogma sobre o trabalho ainda domina os homens e está
dominando os jovens, como mostraram as pesquisas acima citadas. Essa estranha
loucura tomou conta da sociedade e traz, como conseqüência, misérias individuais e
sociais. O valor dado ao trabalho, por ser considerado o responsável em garantir o bem-
estar do trabalhador, há séculos tortura a triste humanidade, argumenta Lafargue (2003).
Embora o valor benéfico atribuído ao trabalho seja anunciado por dogmas das igrejas,
abalizado por economistas, referendado por filósofos, na experiência da vida humana,
esse dogma vem sendo imposto ao trabalhador de forma a escravizá-lo e a fazê-lo
aceitar com paciência uma vida de adversidades e de exploração.
Para o jovem, não é diferente o valor atribuído ao trabalho e, mesmo quando ele
não pode entrar na esfera de satisfação dos desejos imediatos, como na situação dos
jovens do IMCG, por terem de cumprir obrigações institucionais, compõe esperança,
simboliza sonhos de conquistar os bens propagandeados pelo mundo administrado, de
galgar melhores postos de trabalho, de ser, um dia, o dono do próprio negócio.
Observa-se, assim, que o trabalho povoa o imaginário de muitos jovens,
cultivando a crença em que o caminho da educação junto ao esforço pessoal são
suficientes para garantir realizações idealizadas e, quiçá, transformações na sociedade.
Na maioria das vezes, eles não conseguem perceber o quanto a vida nessa sociedade
está modelada, reiterando o sistema voltado ao interesse do capital. E, desse modo, essa
vida padronizada tem impedido os indivíduos de serem sujeitos de suas existências,
condutores de suas vidas, de suas histórias. As possibilidades oferecidas pelo processo
educativo não têm iluminado, com saber suficiente, a capacidade de se “pensar em
pensamento”, e poder pensar diferente da coercitiva razão assumida pelas grandes
forças sociais e econômicas da sociedade atual. Ao contrário, o indivíduo, desde o início
de sua vida, é forçado ao conformismo, à submissão aos poderes instituídos. Assim, o
espaço para a pretensa rebeldia, anunciada para o comportamento do adolescente, faz
parte da necessidade de integração do indivíduo às contradições da sociedade.
65
Horkheimer (2002) observa que o adolescente fica cheio de aflição, acima de
tudo, pela obscura e confusa compreensão da ligação estreita ou identidade próxima
entre razão, eu, dominação e natureza. Para esse pensador, o adolescente sente a brecha
entre os ideais que lhe ensinaram e as esperanças que esses ideais lhe despertam por um
lado, e o princípio de realidade ao qual é forçado a submeter-se por outro. “A sua
rebelião subseqüente se dirige contra a circunstância de que a atmosfera de piedade, de
distanciamento da natureza, de superioridade infinita, oculta a regra do mais forte ou do
mais esperto” (Horkheimer, 2002, p. 115-116).
Descobrir essa regra pode acrescentar um dos mais importantes elementos ao
caráter do indivíduo que a faz: resistência ou submissão. O indivíduo resistente se oporá
a qualquer tentativa pragmática de conciliar as exigências da verdade e as
irracionalidades da existência. Em vez de sacrificar a verdade pela conformidade com
os padrões dominantes, ele insistirá em expressar em sua vida tanta verdade quanto
possa, tanto na teoria quanto na prática, afirma Horkheimer (2002).
Mesmo quando há o indivíduo que luta pela busca da verdade, que não desiste
de confrontar o existente, o elemento da submissão é o que a maioria acaba sendo
levada a adotar, pois o peso da razão administrada tem tomado conta de todos os
espaços da vida dos indivíduos, atrofiando-lhes a sensibilidade e a capacidade de
pensar.
Adorno (1996) chama a atenção ao fato de que o processo de formação tem se
ajustado ao interesse dos mecanismos do mercado e não à autonomia pretendida pelo
ideário que outrora iluminou a razão com os sonhos de liberdade, segundo observação já
feita. E, nesse sentido, perde significado querer identificar os jovens, por si, só como
rebeldes reivindicadores da liberdade, pois tem prevalecido na sociedade a totalitária
figura da semiformação, o poder da indústria cultural, reproduzindo a vida nas formas
previamente determinadas21.
A crítica feita por Adorno (1996) à formação cultural controlável, que
transformou a si mesma em norma e em qualificações, é que ela se equivale à cultura
geral que se degenera no palavrório de vendedores. Para ele, a formação perdeu os
21 Segundo Maar (2003), Adorno no ensaio Superstição de segunda mão, resume de modo exemplar: “aindústria cultural como um todo, duplica na consciência dos homens o que existe”. (Adorno, apud Maar,2003, p. 460).
66
momentos de espontaneidade, tal como glorificado nas teorias de Bergson e nos
romances de Proust. Assim ela é caracterizada como algo distinto dos mecanismos de
domínio social da natureza, decompondo-se na agressiva luz das avaliações. O autor
segue esclarecendo que
a formação esquiva-se do autodidatismo, é de árdua conquista pelos própriospunhos e, se adquirida, tende à má posse. Mas, justamente, porque escapa davontade, está envolvida no culpável contexto do privilégio. Apenas nãonecessitam adquiri-la, nem possuí-la, aqueles que, a todos os títulos, jápossuem. Dessa maneira, cai-se na dialética da liberdade e da falta de liberdade.Sucessora da antiga falta de liberdade não é possível que mais decaia, noentanto, não se realiza como liberdade meramente subjetiva, enquanto persistamas condições que objetivamente a negam (Adorno, 1996, p. 399).
Entretanto, esse pensador frankfurtiano, mesmo reconhecendo os abusos sociais
da semicultura, não deixa de considerar que o processo educativo/formativo pode
significar a busca da autonomia, da autodeterminação; a possibilidade de romper e
superar os limites dos modelos impostos, até então, pela pseudoformação e que tem
impedido o homem de olhar a sociedade com criticidade, sem o “véu tecnológico” que
embaça sua capacidade de discernimento e torna sua razão irracional.
Mas, pela bibliografia analisada, pode-se afirmar que, no que diz respeito ao
processo formativo, decorrente das experiências de trabalho – qualificação profissional
–, tem prevalecido o interesse em fazer com que o sujeito busque o ajuste, cada vez
maior, para atender as exigências do mercado, conforme será mostrado na discussão a
seguir.
3.2 – Exigências do mercado de trabalho à formação profissional
Dentre o conjunto de temas pertinentes ao mundo do trabalho, não deixa de ter
destaque a questão da formação profissional. O órgão regulador das políticas públicas
67
para essa formação é o Planfor – Plano Nacional de Qualificação Profissional22. Com
essa função, propõe-se a integração dos que atuam no campo da profissionalização para
estimular sua participação e fortalecer sua capacidade de execução, segundo explicam
Fidalgo e Machado (2000).
Esses autores revelam que os documentos do Planfor manifestam ser a educação
profissional, pretendida por esse órgão, um complemento e um estímulo para a
suplência da educação básica, explicitando não ser um substituto dessa educação. Nessa
lógica, a educação profissional deve ser organizada a partir de bases contínuas e
flexíveis, para contemplar alternativas de aprendizagem, qualificação, requalificação e
de especialização, sem deixar de propiciar o desenvolvimento das habilidades dos
educandos. O aperfeiçoamento das habilidades, tanto as básicas quanto as específicas e
as de gestão, constitui um objetivo fundamental dessa educação profissional. No
documento, segundo os autores, ela deve, ainda, resultar em um processo integrado de
formação, ao incluir a socialização dos conhecimentos e de experiências diversas como
aquelas relativas à área da Segurança, da Saúde e do Meio Ambiente.
Para esta pesquisa, a referência a esse órgão é importante por duas questões:
primeiro, por ser essa política a que compunha, de modo geral, as experiências de
trabalho na Instituição (Instituto Mirim de Campo Grande/local da pesquisa); em
segundo lugar, porque a política desse órgão não deixa de representar o interesse do
mundo administrado pelo capital, apesar de ser direcionado aos trabalhadores.
Segnini (2000), ao ter como objetivo de seus estudos chamar a atenção para a
relação educação, trabalho e desenvolvimento, ao percorrer caminhos que explicam as
contradições dessa relação, destaca uma questão (pautada em dados colhidos no
Ministério do Trabalho): a escolaridade não tem sido garantia de empregabilidade, pois
há um crescente desemprego de trabalhadores escolarizados com ensino médio e
superior completos.
A autora ressalta que há um crescimento concomitante dos índices de
escolaridade com desemprego de jovens, que participam de trabalhos precários e em
situações de subemprego (estágios). Dentre as demais análises feitas por Segnini (2000),
22 De acordo com Fidalgo e Machado (2000), o termo “formação” foi substituído por educaçãoprofissional com o propósito de inserir essa modalidade de prática educativa no que chama de agenda demodernização das relações de trabalho.
68
vale ressaltar o questionamento que fez sobre qual seria o significado da “nova
qualificação” exigida para o bancário, pela ótica dos bancos. Ela constata que, se por
um lado, as mudanças nos procedimentos dos serviços dessas instituições evidenciam a
simplificação de seus serviços, por outro, o aprendizado exigido mostra,
particularmente, ser preciso saber vender e competir, em todos os momentos, no
contexto da intensa concorrência bancária. A qualificação, na perspectiva dos bancos,
significa intensificar os trabalhos e reduzir os custos. Fica expresso ter presente a
capacidade de competir, mesmo com os colegas de trabalho, na execução de serviços
internos. Importa ser capaz de, cada vez mais, vender produtos e serviços bancários,
afirma Segnini (2000). Isso quer dizer que, na ótica dos bancos, é preciso ser capaz e ter
disposição para competir, ser capaz de ser “um vencedor”, marca e caracteriza
competências, compreendidas como sendo de qualificação.
Assim, de acordo com Segnini (2000), são qualificações apontadas para ocupar o
cargo de bancário: ser capaz de se adaptar à intensificação do ritmo de trabalho e às
demandas dos clientes, disposição para ser competitivo, ser amável, equilibrado, ser
capaz de se adaptar às novas situações, ter comportamento social adequado, entre outras
atitudes e habilidades.
As exigências apontadas por Segnini (2000), como padrões de comportamentos
adequados aos bancários, compõem o perfil requerido para uma variedade de profissões
nos dias atuais. E, por outro lado, pode-se identificar que não há diferenças substanciais
em relação às exigências estabelecidas pelo órgão que representa a ideologia do Estado,
o Planfor. As propostas políticas desse órgão confirmam que o Estado se organiza em
consonância com gestores do capital, como já dito. No presente, de modo geral, o
processo de formação profissional, ao prescrever a capacidade de ser flexível, dinâmico,
atento às mudanças, como padrão das exigências de formação estabelecidas para os
trabalhadores, não se diferencia, substancialmente, da formação necessária para os
donos dos bens de produção, pois, segundo Adorno e Horkheimer (1971), a
pseudoformação, com seus interesses práticos, contagia a toda sociedade.
A proposta do Programa Nacional de Inclusão de Jovens – ProJovem, decretado
e sancionado pela Presidência da República – Lei n. 11.129, de 30 de junho de 2005,
representa laços dessa relação: o capital com total apoio do Estado, mesmo quando as
propostas são feitas em prol dos trabalhadores.
69
O princípio fundamental do ProJovem é o da integração entre formação básica,qualificação profissional e ação comunitária, tendo em vista a promoção daeqüidade e, assim, considerando as especificidades de seu público: a condiçãojuvenil e a imperativa necessidade de superar a situação de exclusão em que seencontram os jovens no que se refere aos direitos à educação e ao trabalho. (...)o ProJovem propõe aliar a prática, formação e ação e explorando à dimensãoeducativa do trabalho e da participação cidadã. E para que a educação básica, aqualificação para o trabalho e a ação comunitária possam se fortalecermutuamente, cada uma delas deve desenvolver-se plenamente e em consonânciacom os requerimentos para uma inserção plena, criativa e produtiva nasociedade contemporânea (ProJovem, 2005, p. 16).
Assumir algumas categorias desse princípio induz pensar em uma sociedade sem
contradições – apesar de ter como objetivo “incluir excluídos”, a qual possibilita a
promoção da eqüidade por meio da integração entre sistema educacional vigente e
qualificação profissional, aliada à ação comunitária. Mas, há um desconhecimento do
significado do conceito eqüidade, igualdade de justiça, retidão. Será possível falar de
igualdade de justiça numa sociedade cruelmente desigual, que precisa criar programas
para excluídos, para torná-los iguais? Não são reconhecidas suas contradições? Falta
clareza em saber que faz parte das necessidades da sociedade capitalista a existência de
excluídos.
Sem dúvida, esse programa espelha o quão acirradas são as contradições para a
vida do jovem nesta sociedade, particularmente em relação às oportunidades de
trabalho. 23 Sinaliza, por si só, buscar resolver o sério problema de “jovens excluídos”.
Por outro lado, ao definir objetivos referentes às unidades formativas das propostas
23 Essas contradições podem ser percebidas claramente ao analisar os protestos na França, em 2006. Osjovens franceses foram às ruas, exigindo empregos estáveis e bem remunerados, como foi possível amuitos de seus pais. A revista Veja (29 de março de 2006) traz uma matéria, fazendo uma análisecomparativa do que representa a manifestação dos jovens franceses, nomeados como Os Mimados deMarço, em relação ao movimento de maio de 1968. Para a revista, o movimento de 68 foi libertário, poisexigia mudanças no sistema educacional e transformou-se em manifestações por amplas reformas nasociedade francesa, nos costumes e pelo fim do governo Charles de Gaulle. O movimento atual, como diza reportagem, é um movimento conservador. Os estudantes querem preservar o modo de vida de seuspais. O estopim do protesto é um projeto de lei que, para facilitar a contratação de jovens sem experiênciaprofissional, permite a demissão sem justa causa nos primeiros dois anos. Contando com apoio desindicatos e políticos de esquerda, o slogan dos protestos é: “Todos juntos contra o Contrato do PrimeiroEmprego”. Sem concordar com a análise expressa pela revista na comparação feita em relação àsmanifestações, até mesmo por suas contradições, considera-se que os acontecimentos atuais mostram oquão complexa é a questão da empregabilidade dos jovens, mesmo em países do considerado primeiromundo, para a sociedade atual. E, do ponto de vista da pesquisadora, reformas e programas paliativos
70
pedagógicas, e ao especificar o que é esperado da capacidade dos jovens excluídos,
aponta algumas contradições, como pode ser observado no objetivo geral:
Ao integrar ensino fundamental, qualificação profissional e ação comunitária, oprograma deve oferecer oportunidade para que os jovens experimentem novasformas de interação, se apropriem de novos conhecimentos, re-elaborem suaspróprias experiências e sua visão de mundo e, ao mesmo tempo, se re-posicionem quanto à sua inserção social e profissional (ProJovem, 2005, p.16).(Grifos meus).
Os conceitos grifados, em tese, partem do princípio de que os jovens não são
excluídos, pois eles devem se apropriar de novas formas de interação e de novos
conhecimentos para a qualificação profissional, o que significa que eram integrados e
tinham outros conhecimentos. Por outro lado, o prefixo re (utilizado em reelaborar /
reposicionar) é indicativo de contradição, pois a necessidade de reposicionar-se perante
os valores da sociedade, ou mesmo pensar em mudar as condições de vida existentes,
deveria implicar em considerar o papel da instrução em uma perspectiva crítica, que
possibilitasse o indivíduo refletir e, assim, “libertar-se dos tabus, sob cuja pressão a
barbárie se reproduz”, segundo Adorno (1995 b, p.103).
Mas, ao tratar, de forma específica, sobre a participação dos jovens em ações
comunitárias, com o propósito de se fazer um diagnóstico das necessidades locais e
regionais, de promover o engajamento do jovem como cidadão voluntário e para formar
valores solidários, fica evidente o desinteresse em qualquer atitude que visa transformar
a realidade “diagnosticada”. Pelos princípios do Programa, o jovem deve formar valores
de solidariedade, ser voluntário, mesmo vivendo experiências caóticas – ser excluído –
que o faz dependente das ações solidárias do poder público, tal como se configura a
intenção do ProJovem. O sentimento implícito nesse programa é o de conformar o
jovem, de adaptá-lo aos valores impostos pela sociedade. Apesar de todo avanço
tecnológico existente, da abundância produzida materialmente e que já poderia ser
suficiente para resolver inúmeros problemas da sociedade, senão todos, o foco do
programa atém-se a ações de solidariedade. A necessidade dessas ações implica na
estarão sempre sendo necessários, sem solução definitiva, enquanto houver o poder do capitaladministrando a vida dos trabalhadores, jovens ou não.
71
existência de pessoas que delas precisam. O que não deixa de representar a necessidade
de adequar-se à injustiça social.
Vale apontar que a proposta para ações de formação profissional desse programa
não se diferencia do que já foi anteriormente abordado acerca das exigências
determinadas pelo mercado de trabalho. Serve de exemplo algumas observações da
Unidade Formativa II: Juventude e Trabalho, ao orientar: “visitas guiadas a empresas
públicas e privadas e empreendimentos cooperativos; (...) vivências (de curta duração)
em diversos ambientes de trabalho (...)” (Projovem, 2005, p. 23). Na Unidade Formativa
IV: Juventude e Cidadania, diz:
Quanto às ações com ênfase na qualificação para o trabalho (...)dar continuidade à formação técnico-prática visando ao aperfeiçoamento dosaber-fazer específico do arco profissional. Embora a formação vise umaespecialização, o curso deverá tratar também esse momento numa perspectivaintegrada, ou seja, de caráter pluriocupacional, procurando contemplar diversosmomentos do processo de trabalho; (...) orientando o planejamento dospróximos passos que cada cursista deverá prever, visando sua re-inserção ereposicionamento no mundo do trabalho (Projovem, p. 23, 2005).
Ao afirmar que a formação do “jovem excluído” visa à especialização, o
programa esclarece que seu caráter é pluriocupacional e deve ser realizado junto a
vivências de curta duração. Percebe-se que a proposta do ProJovem é um exemplo
ímpar da ênfase formativa calcada nos preceitos de “mobilidade e polivalência”, típica
das formulações do “modelo de competência”, cujo interesse, em tese, é aumentar a
capacidade do indivíduo em manter-se no mercado de trabalho e, conseqüentemente, no
mercado de consumo. No entanto, não leva em conta que, cada vez mais, os postos de
trabalho diminuem e, principalmente, ignora o que isso significa à constituição da
subjetividade do trabalhador, pois há desconsideração sobre as contradições existentes
na sociedade, mesmo ao ser afirmado, textualmente, o interesse em romper com a
ordem por ela imposta.
Para pensar sobre essa questão, vale considerar o trabalho de Santos (2000) que
apresenta o resultado de uma enquête, realizada com o emprego da Técnica de Grupo
72
Nominal (T.G.N.)24, que relaciona representações de alunos e professores do ensino
técnico em relação às competências exigidas para garantir a empregabilidade na
“sociedade tecnológica”. Conceito que explora na perspectiva de suas inter-relações
com a formação profissional.
Em decorrência da aplicação da T.G.N., o autor obteve a composição de grupos
de competência, que um técnico de nível médio deveria deter para ter sua
empregabilidade assegurada, definidos em três grupos distintos: 1 – Conhecimentos
(gerais e específicos); 2 – Atitudes (gerais e específicas); 3 – Habilidades (gerais e
específicas) 25.
O autor explica que o conjunto das verbalizações indica, de imediato, que as
representações sobre perfis profissionais dos egressos do sistema de formação
profissional oscilam entre uma formação geral ampla, suscetível de instrumentar o
indivíduo para a mudança conjuntural e para a aprendizagem permanentes, e uma
formação específica igualmente flexível, centrada principalmente na adaptação a novas
situações profissionais.
Nas conclusões, Santos (2000) expõe pontos contraditórios no que tange à
questão da redefinição necessária à função social do professor para atender às
exigências que compõem as competências necessárias à formação profissional, pois se
atem a aspectos que visam a reformas e não a mudanças na ordem social existente.
Porém, o autor também constata que tanto os professores quanto os alunos
(participantes da pesquisa) reconhecem a necessidade e urgência em formar para a
polivalência, para a autonomia, para a multiplicidade, para a criatividade, para a
liderança e para a maleabilidade. Observa-se que a lógica predominante dos valores
impostos pelo sistema à formação profissional se faz presente frente ao reconhecimento
dessas necessidades. E, a grande contradição nas relações de trabalho, na sociedade
atual, é que não se pode abrir mão dessas necessidades para orientar a formação
profissional, para haver garantia de permanência no mercado de trabalho.
24 A Técnica de Grupo Nominal foi proposta por Delbecq e Van de Vem (1975), com o objetivo deotimizar o processo de coleta de dados para análise e avaliação de necessidades de formação (Cf. Santos,2000).25 A relação completa das competências exigidas para a formação profissional é apresentada por Santos(2000, p. 118).
73
Percebe-se que vários estudos que tratam da questão da educação profissional,
mesmo ao fazerem crítica ao sistema instituído, não deixam de se aportarem em
conceitos que expressem a necessidade de adaptação às novas formas operacionalizadas
de acordo com o interesse do capital. Indicam, principalmente, a necessidade de novas
atitudes no comportamento dos trabalhadores.
A esse respeito, Lúcio e Sochaczewski (1998) afirmam que as exigências da
educação profissional, requerida hoje pelas novas formas de trabalho, caracterizam-se
por ter como eixo central uma educação básica de qualificação, por ser flexível do ponto
de vista dos conteúdos específicos, por necessitar de constante reciclagem ou
substituição, inaugurando o conceito de formação contínua, e por incluir de forma
explícita elementos comportamentais como iniciativa, participação, discernimento,
envolvimento e compromisso.
Assim, percebe-se que as novas competências exigidas no processo de formação
profissional têm sido entendidas como a capacidade de um indivíduo ou de um grupo ao
conquistar resultados operacionais. Para tais conquistas, o comportamento do indivíduo
não exige diferenciação e sim adaptação à ideologia da produtividade. Isso ocorre,
segundo Pedrosa (2002), porque os estudos sobre qualificação profissional atribuem
uma autonomia ao progresso das forças produtivas, a despeito de toda estagnação das
relações de produção.
O controle que acaba sendo exercido sobre os indivíduos, “os métodos dirigistas,
com os quais, apesar de tudo, as massas são mantidas sobre controle” (Adorno, 1994, p.
71), tem impedido que as críticas ao poder do capital abarquem uma consistência
necessária, inclusive, a de autores identificados com Marx, que apregoam a defesa ao
trabalhador, mas sem deixarem de atribuir o valor-em-si ao trabalho. Nessa lógica,
esquecem de pensar na reciprocidade determinada entre capital e trabalho: revalorizam
o trabalho.
Pedrosa (2002) questiona qual seria o sentido dessa revalorização, expressa na
noção de qualificação profissional, numa perspectiva materialista. Para ele, pensar na
revalorização do trabalho é considerar o valor-em-si do trabalho. O que é diferente da
perspectiva marxiana, ao englobar os estudos dos Manuscritos e da Ideologia Alemã,
para a qual não há valor-em-si no trabalho. O conceito de trabalho, diz esse autor,
74
presente nos estudos de qualificação profissional, tem se mostrado contaminado pela
ideologia burguesa, ao revalorizar o trabalho, no sentido de torná-lo uma atividade
mobilizadora do espírito do trabalhador e de estreitar, cada vez mais, as relações dele
com a instituição escolar, pois, como afirma, isso “é o mesmo que hipostasiar o capital,
a dominação e o reino da necessidade” (Pedrosa, 2002, p.192), no sentido de
caracterizar a a-historicidade e, consequentemente, a positividade formativa do
trabalho.
Assim, pelo que aponta Pedrosa, as contradições que marcam os conceitos
presentes nos estudos sobre a qualificação profissional, ao valorizarem os interesses do
mundo administrado, têm impedido os indivíduos de se diferenciarem e terem
consciência entre falso e verdadeiro em relação ao que lhes é imposto, como proposta
de qualificação profissional. O interesse em ter a especialização que caracteriza a
habilidade para determinada função passa a ser mais importante que qualquer
conhecimento esclarecedor sobre o significado desse saber e suas conseqüências, para a
formação profissional do indivíduo.
Marcuse (1967), ao falar das novas características exigidas pela racionalidade
tecnológica, irresistível na empresa irracional, mostra que essa racionalidade tem
impedido os indivíduos de terem qualquer controle sobre o que ocorre em suas vidas,
tornando-os escravos dessa irracionalidade. E argumenta que: “Os escravos da
civilização industrial desenvolvida são escravos sublimados, mas são escravos,
porquanto a escravidão é determinada (...). Esta é a forma pura de servidão: existir como
um instrumento, como uma coisa” (Marcuse, 1967, p. 49).
Essa relação de escravidão, de que fala Marcuse (1967), mostra a presença da
dependência total do trabalhador ao sistema imposto pelo capital. A dominação total à
vida do trabalhador, seja jovem ou adulto, faz com que o trabalhador vá perdendo, cada
vez mais, sua capacidade de diferenciar-se. Nesse sentido, é importante buscar cada vez
mais ocupar espaços para a constituição de resistência, aos valores do mundo
administrado.“É preciso romper com a educação enquanto mera apropriação de
instrumental técnico e receituário par a eficiência, insistindo no aprendizado aberto à
elaboração da história e ao contato com o outro não-idêntico, o diferenciado” (Maar,
1995, p. 27).
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Assim, para avaliar o que pode significar para o jovem investigado a relação
entre formação e trabalho, nos dias atuais, pondera-se ser preciso pensar sobre o
conjunto das questões discutidas até aqui: a formação que foi imposta ao trabalhador,
levando-o a alienar-se do produto de seu trabalho; o quanto crianças e jovens não foram
poupados de serem tratados como meros instrumentos do capital; a necessidade de olhar
para o jovem (cada vez mais sem perspectiva nessa sociedade) sem esquecer o
significado histórico de sua existência; e, também, a supervalorização dada ao trabalho,
independente do que pode causar à vida do trabalhador, nas propostas dos programas de
formação profissional, mesmo em diferentes áreas de conhecimento.
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CAPÍTULO 4 – O PONTO DE VISTA DOS JOVENS ACERCA DA
RELAÇÃO FORMAÇÃO E TRABALHO
Felizes, vós olhosQue tudo o que vistes,
Não importa o quê,Foi um prazer ver
(Goethe, 1965)
Neste capítulo, serão descritos os caminhos da pesquisa empírica, realizada com
jovens do Instituto Mirim de Campo Grande (IMCG). Em primeiro lugar, trata-se da
proposta de investigação e, em seguida, são apresentados os estudos psicométricos da
escala formação e trabalho, acompanhados pela análise dos resultados expressos nas
respostas dos sujeitos da pesquisa.
4.1 – A investigação
O tema de estudo desta pesquisa é a relação entre formação e trabalho e tem por
referência o ponto de vista expresso por jovens trabalhadores e estudantes das camadas
populares ao pensarem questões implicadas nessa relação. Para melhor esclarecer esse
propósito, foram feitos alguns questionamentos tidos como pertinentes à investigação, a
saber: como o jovem trabalhador estudante das camadas populares concebe o trabalho?
Esse jovem prioriza seu valor utilitário? Pensa o trabalho aliado à necessidade de
garantia de subsistência? Considera o trabalho como meio de ascensão e de realização
profissional e pessoal? Como ele avalia o valor dado ao esforço pessoal no processo de
formação do indivíduo? Como ele valoriza a formação decorrente da experiência de
trabalho? Que importância é dada pelo jovem à formação escolar? Prevalecem, nas
escolhas desse jovem, valores que indicam sua adaptação aos padrões sociais
estabelecidos nesta sociedade? Pensa ser possível modificá-los?
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4.2 – Objetivo geral
Verificar como o jovem trabalhador e estudante das camadas populares analisa a
relação entre formação e trabalho, ao avaliar alguns aspectos de sua vida envolvidos
nessa relação, constitui o objetivo principal desta tese.
Assim as atenções voltam-se às expressões desse jovem, sem deixar de refletir
sobre os elementos do conjunto da organização da sociedade presentes em suas
manifestações. Isso significa observar a influência das determinações impostas pelo
mundo administrado no processo de formação profissional do jovem, com o propósito
de verificar se predominam valores que indicam adaptação à ideologia dominante ou se
prevalecem expressões que evidenciam espaços constitutivos de resistência, ou seja,
atitudes representativas de emancipação em relação a tais determinações.
4.2.1 – Objetivos específicos
Os objetivos específicos, a seguir apresentados, estão direcionados de acordo
com as quatro subescalas que compõem a escala formação e trabalho.
- Analisar o conceito de trabalho formulado pelos sujeitos da pesquisa;
- Verificar que atitudes, pertinentes ao cotidiano das relações de trabalho, são
valorizadas pelos sujeitos da pesquisa;
- Analisar o valor atribuído às experiências formativas vividas na escola e no
trabalho pelos sujeitos da pesquisa;
- Identificar se há atitudes que expressam autonomia de pensamento em relação aos
padrões sociais estabelecidos pela sociedade.
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4.3 – Hipóteses
A hipótese central que orienta esta pesquisa é que, nas análises elaboradas pelos
sujeitos, ao refletirem sobre questões referentes à relação entre formação e trabalho,
predominam valores que indicam concordância à lógica administrada pelo capital.
As hipóteses específicas, abaixo relacionadas, foram formuladas relacionadas aos temas
das diferentes subescalas.
1 – Para o jovem trabalhador estudante das camadas populares, o trabalho é concebido
de forma contraditória, pois, ao mesmo tempo em que critica as condições de
trabalho existentes, não deixa de defender a lógica da sociedade administrada.
2 – O jovem trabalhador estudante das camadas populares, ao refletir sobre atitudes
pertinentes ao cotidiano das relações de trabalho, faz escolhas de valores morais
identificados à lógica do capital.
3 – O jovem trabalhador estudante das camadas populares credita mais valor à
formação decorrente das experiências vividas no trabalho, do que aquela obtida na
formação escolar.
4 - O jovem trabalhador estudante das camadas populares, ao se posicionar sobre o
sistema social vigente, expressa valores indicativos de adaptação à ordem por ele
imposta.
4.4 – Características da população e da amostra da pesquisa
A coleta de dados desta pesquisa ocorreu em duas etapas e atingiu o total de 215
jovens trabalhadores e estudantes, participantes dos programas de formação para o
trabalho do Instituto Mirim de Campo Grande/MS (IMCG/MS), no ano de 2006.
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Na primeira etapa, na realização do pré-teste, para a validação do instrumento
desta pesquisa, a amostra foi de 15 jovens do sexo masculino, de uma população com o
total de 785 sujeitos (o critério de seleção dessa amostra está no anexo II). Com uma
população de 810 jovens26, na segunda etapa, com o instrumento já validado, a amostra
foi de 200 sujeitos, de ambos os sexos e, dessa quantidade, em decorrência do critério
de atenção ao instrumento de pesquisa, foram avaliados 102 sujeitos. A faixa etária
desses jovens variou de 15 a 17 anos de idade, todos eram estudantes de escolas da rede
pública de ensino (estadual e municipal), cursando entre a oitava série do Ensino
Fundamental e o Ensino Médio. Todos moravam com as famílias ou com representantes
legais, com renda familiar que não ultrapassava três salários mínimos.
Deve-se explicitar que o sistema de empregabilidade dos jovens do IMCG/MS é
a terceirização de serviços, com contratos firmados entre o IMCG e instituições públicas
ou privadas. As formas que regulamentam os empregos é o regime de CLT
(Consolidação das Leis Trabalhista). A renda é o salário mínimo, na condição de Menor
Aprendiz, conforme Portaria 702 do Ministério do Trabalho, de 18 de dezembro de
2001, em que o salário é calculado com base no salário mínimo hora (Lei 10.097). Vale
ressaltar que as atividades do instituto são pautadas no cumprimento do Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA).
O perfil socioeconômico da população, da qual foi extraída a amostra, foi
levantado com base nos documentos utilizados pelo setor do Serviço Social do IMCG/
MS. Os dados desses documentos trazem informações do histórico da vida do jovem e
da família, considerados de relevância para o trabalho institucional. A disponibilidade
desse material facilitou a coleta de informações necessárias à investigação.
O tamanho da amostra foi estabelecido de forma aleatória e atingiu 24% da
população de jovens do IMCG/MS. Não houve distinção de gênero para avaliar os
resultados obtidos, uma vez que tal distinção não foi considerada relevante para esta
investigação.
26 A diferença do total da população da primeira para a segunda etapa da investigação (785 e 810)correspondeu ao número de jovens do IMCG/MS que estavam trabalhando no momento da realização dapesquisa. Deve-se ressaltar que há uma constante mobilidade nessa quantidade devido ao fato de sereminterrompidos os contratos de trabalho quando os jovens completam 18 anos de idade.
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4.5 - Local da pesquisa
O local escolhido para ser realizada a pesquisa foi o Instituto Mirim de Campo
Grande/MS, por ser uma Instituição que desenvolve um programa de trabalho com
jovens das camadas populares e ter como objetivo principal prepará-los e encaminhá-los
ao mercado de trabalho. Além disso, trata-se do local onde a investigadora trabalhou
durante oito anos, como diretora executiva, de 1997 até 2004, quando se sentiu instigada
a refletir, mais sistematicamente, acerca da relação formação e trabalho.
O IMCG prepara o jovem para o mercado de trabalho, realizando as seguintes
atividades: cursos básicos de preparação para serviços administrativos, auxiliares de
escritório, recepcionista, telefonista e outras atividades de apoio a serviços gerais; curso
de informática; atividades de reforço escolar nas disciplinas de português e matemática;
atividade de incentivo à leitura; estudo de filosofia e práticas desportivas. E, após a
preparação básica para o trabalho (conforme é denominada pela Instituição), o jovem é
encaminhado ao emprego. Outro programa de trabalho é o do Menor Aprendiz, com os
cursos de telemarkting, empreendedorismo, qualidade e prestação de serviços,
complementados pelas atividades acima relacionadas.
De acordo com os estatutos da Instituição, é definida a renda familiar de até três
salários mínimos para que o jovem possa fazer parte dos programas de trabalho
oferecidos, além de ser estipulada a idade mínima de 15 anos para que os jovens possam
passar pelo processo seletivo de acesso à Instituição. Esse processo é realizado pelos
técnicos que lá trabalham, coordenado pela equipe do serviço social, orientado no
sentido de procurar atender jovens das diferentes regiões populares da cidade de Campo
Grande.
Identificada como uma Instituição filantrópica, a fonte de recursos do IMCG/MS
tem um significativo montante obtido por recursos próprios, oriundos da taxa
administrativa de 12,36%, que incide sobre o custo mensal a cada contrato firmado,
tanto de empresas privadas ou públicas, ao ser empregado um jovem da Instituição. Por
outro lado, um convênio firmado com a Prefeitura Municipal de Campo Grande
contribui para a administração do local, garantindo a manutenção e a cedência de grande
84
parte dos recursos humanos. Deve-se reconhecer que esse convênio tem sido essencial
para o funcionamento do IMCG.
A experiência de trabalho do IMCG/MS, desde o ano de 1982, desenvolvendo o
programa de formação profissional de jovens das camadas populares, tornou-o um local
de grande interesse e disputa por parte de famílias de baixa renda, quando acontece o
processo seletivo, pelo fato de garantir emprego a todos os jovens que são selecionados.
Isso pode ser comprovado pela média de disputa por vaga ocorrida nos últimos anos. De
1991 a 1996, cerca de 1200 adolescentes, em média, buscavam ocupar uma vaga na
Instituição. Entre 1997 e 2004, as matrículas cresceram 350%. A procura anual passou,
em média, para mais de 4300/ano, o que soma um total de 30 mil jovens (Cf. Instituto
Mirim, 2004, p. 6).
4.6 - Instrumento de medida: Escala Formação e Trabalho
Os itens que compõem a escala formação e trabalho foram baseados em questões
presentes nas relações de trabalho na sociedade atual e em estudos de autores
frankfurtianos. A experiência de trabalho da pesquisadora, voltada à formação
profissional de jovens das camadas populares, não deixou de ser importante na
elaboração dessa escala.
Na proposta inicial, a escala formação e trabalho continha 69 itens (Cf. modelo
no anexo I), após a experiência piloto – pré-teste –, realizada para certificar sua
validade, resultou num total de 31 itens27.
Os temas que compõem a escala dividem-se em quatro subescalas: concepção de
trabalho (subescala T); atitudes valorizadas no trabalho (subescala AT); valor dado à
educação escolar e ao trabalho (subescala ET); adaptação à ideologia do mundo
27 No momento da coleta de dados, o instrumento de pesquisa foi apresentado com 32 itens. No entanto,os itens 13 e 32 foram repetidos para testar a concentração dos sujeitos da pesquisa. Tal procedimento foitambém utilizado na experiência para validar o instrumento de pesquisa. Dentre o total apresentado de 70itens foram repetidos os itens 30 e 59.
85
administrado (subescala A). Dentre as questões abordadas nas quatro subescalas, vale
ressaltar que elas não são inteiramente independentes no que diz respeito aos conteúdos
dos itens. De fato, alguns itens até poderiam ser apresentados em uma subescala
diferente da que foi incluída. No entanto, cada subescala, no conjunto de suas questões,
buscou definir aspectos que pudessem esclarecer os objetivos desta pesquisa.
O formato da escala está estruturado de acordo com o método de Likert 28. Com
esse método se consegue medir a intensidade das opiniões e das atitudes, possibilitando
ao sujeito indicar o grau de acordo ou desacordo com cada item. Isso permite uma
determinação mais adequada de diferenças sutis entre grupos e indivíduos e facilita a
análise qualitativa dos distintos modelos de respostas, possibilitando abarcar um campo
mais amplo de opiniões e atitudes (Cf. Levinson, 1995).
A escala de Likert é ancorada em dois extremos: de favorável para desfavorável,
variando de um para cinco ou sete pontos. Os pontos entre as escalas são reservados
para indicar a posição média do sujeito avaliado. As respostas dessa escala são
analisadas por procedimentos estatísticos, aplicados para determinar a relativa
significância das atitudes dos sujeitos da amostra. Para esta pesquisa, optou-se em
utilizar quatro pontos. Essa quantidade foi entendida como suficiente para ser utilizada
na validação da escala e, também, para a coleta de dados, na realização da pesquisa.
Desse modo, para cada item da escala, foram associados escores de 1 a 4 pontos:
concordo totalmente (1 ponto); concordo parcialmente (2 pontos); discordo
parcialmente (3 pontos); discordo totalmente (4 pontos), cuja resposta consiste na
escolha de um desses escores.
Nas duas etapas da pesquisa (validação do instrumento e coleta de dados), a
ordem dos itens foi apresentada por sorteio, com vistas a impedir seqüências das
questões que pudessem facilitar identificações conceituais.
Para testar a validade da escala (primeira etapa da pesquisa), recorreu-se à
análise estatística, sendo utilizada a prova de significância do coeficiente de correlação
28 Para a utilização da escala Likert, foram elucidativos os estudos de Adorno et al (1965); Casas eSaporiti (2001); Crochík (1999). Para Levinson (1965, p. 78), “con el método de Likert se logra medir laintensidad de las opiniones y las actitudes haciendo que el sujeto indique su grado de acuerdo odesacuerdo con cada ítem”. Outro fator destacado por esse pesquisador refere-se ao fato de esse métodotambém facilitar a análise qualitativa dos resultados obtidos, pois, como ele explica: “los dados más
86
de postos de Spearman, (Cf. Levin, 1978, p. 229). O uso dessa correlação teve como
objetivo observar a relação de cada item com o total dos 69 itens da escala. O valor do
rs (coeficiente de correlação de Spearman), calculado para testar a significância de 0,05
a 0,10, foi crítico ao nível de 0,535. Os resultados desse procedimento encontram-se no
anexo II.
Após a validação da escala, com os resultados obtidos na aplicação da pesquisa
(segunda etapa), foi realizado o estudo da correlação entre os itens, pelo método de
análise fatorial, recorrendo ao programa SPSS 13.0 Windows (Statistical Package for
Social Sciences). Segundo Kerlinger (1980), a análise fatorial é um método analítico
para determinar o número e natureza de fatores subjacentes a um grande número de
variáveis ou medidas. As “variáveis subjacentes”, nessa definição, são chamadas
“fatores”. O fator é um construto que reflete uma determinada ordenação dos itens que
compõem o instrumento de pesquisa. Tal ordenação, conforme esclarece Kerlinger
(1980), mostra os índices de concordância dos sujeitos da amostra, em relação aos itens
da escala. Também pode ser analisado como um subconjunto de itens, respondido de
maneira semelhante por um número de sujeitos.
Segundo esse autor, uma pequena correlação entre os fatores apresenta carga
fatorial próxima de zero, o que significa que os fatores não são correlacionados, sendo
entendidos como entidades separadas e distintas. Quanto mais próxima de 1,0 melhor é
a correlação entre os fatores. Para analisar os resultados da escala proposta,
determinaram-se itens com cargas fatoriais cujo índice de significância foi estabelecido
a partir do coeficiente de correlação de 0,40 na carga fatorial. Esse critério pautou-se em
estudos apresentados por Kerlinger (1980), sobre atitudes sociais.
4.6.1. Objetivos e resultados psicométricos das subescalas da Escala Formação e
Trabalho
importantes sobre cada ítem son la média grupal y el P.D (Poder Discriminatorio)” (Levinson, 1965,p. 78).
87
A seguir, após discutir os objetivos de cada subescala da escala formação e
trabalho, estão apresentados os resultados psicométricos obtidos na avaliação dessa
escala, indicando: o total de itens no pré-teste; o total de itens após o pré-teste (escala
validada – estudo da correlação de cada item com o total); o resultado da correlação
entre itens, correspondendo ao número dos fatores.
4.6.1.1. Subescala T (concepção de trabalho)
O objetivo com essa subescala é identificar o conceito de trabalho expresso
pelos sujeitos da pesquisa. Os estudos dos autores da teoria crítica da sociedade foram
essenciais para fundamentar a elaboração dos conceitos que compõem os itens dessa
subescala, em especial os estudos de Marcuse (1998, 1981 e 1967) e Horkheimer e
Adorno (1985). Tais estudos esclarecem sobre o que tem representado o trabalho na
vida dos homens na sociedade atual.
A proposta inicial desta subescala era de 10 itens, dentre o total dos 69 da escala
formação e trabalho. A prova para testar a correlação de significância entre o item e a
escala (Coeficiente de correlação de Spearman) resultou em um total de 7, entre os 10
itens (ver tabela II.1, no anexo II). A correlação entre itens (cargas fatoriais) resultou
em 2 fatores, com 5 itens: fator 1, com 3 itens, e fator 2, com 2 itens. A ordem que
aparece entre os itens indica o agrupamento dos fatores, conforme mostra tabela 4.1,
mais adiante.
4.6.1.2. Subescala AT (atitudes valorizadas no trabalho)
O objetivo com essa subescala é avaliar quais atitudes são valorizadas no
trabalho pelo sujeito da pesquisa. Para a construção da subescala, não deixaram de ser
importantes os estudos da escala anterior. Por outro lado, pode-se afirmar que a
experiência da pesquisadora, em ter trabalhado num programa de qualificação
profissional para jovens das camadas populares, também contribuiu para a elaboração
das questões desta subescala. A proposta principal enfatiza atitudes expressas em
88
relações que fazem parte do cotidiano do trabalho, envolvendo, mais especificamente, a
afetividade do sujeito e valores morais atribuídos àquelas relações, sem deixar de
considerar o que tem representado o trabalho na vida dos indivíduos na sociedade atual.
A proposta inicial desta subescala era de 29 itens, dentre o total dos 69 da escala
formação e trabalho. A prova para testar a correlação de significância entre o item e a
escala (Coeficiente de correlação de Spearman) resultou em um total de 14, entre os 29
itens (ver tabela II.2, no anexo II). A correlação entre itens (cargas fatoriais) resultou
em 4 fatores, com 10 itens: fator 1, com 2 itens; fator 2, com 3 itens; fator 3, com 2
itens; fator 4, com 4 itens. A ordem que aparece entre os itens indica o agrupamento
dos fatores, conforme mostra tabela 4.1, mais adiante.
4.6.1.3. Subescala ET (valor dado à educação escolar e ao trabalho)
Com a subescala ET, tem-se como objetivo analisar a importância dada à
formação escolar ao ser comparada com a experiência profissional. Os estudos de Freire
(2003), Giovinazzo Jr. (2003), Gomes (1997), Guimarães (2005), Segnini (2000) e
Souza (2003), trouxeram contribuições significativas à elaboração desta subescala, pois
abordam questões pertinentes ao tema fundamentadas em pesquisas realizadas com
jovens brasileiros.
Na elaboração dos itens, foi destacada a importância dada ao conhecimento e ao
que representa a responsabilidade do indivíduo no seu processo de formação, com o
interesse de verificar a capacidade de análise, crítica ou não, do indivíduo referente à
experiência formativa.
A proposta inicial desta subescala era de 11 itens, dentre o total dos 69 da escala
formação e trabalho. A prova para testar a correlação de significância entre o item e a
escala (Coeficiente de correlação de Spearman) resultou em um total de 6, entre os 11
itens (ver tabela II.3, no anexo II). A correlação entre itens (cargas fatoriais) resultou
em 2 fatores, com 5 itens: fator 1, com 3 itens; fator 2, com 2 itens. A ordem que
aparece entre os itens indica o agrupamento dos fatores, conforme mostra tabela 4.1,
mais adiante.
89
4.6.1.4. Subescala A (adaptação à ideologia do mundo administrado)
O objetivo, com a subescala A, é analisar se os sujeitos da pesquisa são
adaptados ou não à ideologia do mundo administrado. Os itens presentes nessa
subescala foram escolhidos tendo por base os estudos de Adorno (1971, 1986),
Horkheimer e Adorno (1985), Marcuse (1967) e Crochík (1999). Tais autores discutem
sobre a eficácia do mundo administrado, que instrui os indivíduos para se adaptarem,
sem resistência, aos seus controles. Os autores esclarecem que a lógica que predomina
neste mundo, mesmo com todo avanço tecnológico, ainda mantém “as velhas” relações
de dominação nas experiências de trabalho e, assim sendo, continuam impedindo o
indivíduo de pensar nas contradições existentes na sociedade impostas às suas vidas,
impossibilitando também pensar que é possível lutar contra a ordem imposta pelo
mundo administrado para transformar a sociedade e torná-la justa.
A proposta inicial desta subescala era de 19 itens, dentre o total dos 69 da escala
formação e trabalho. A prova para testar a correlação de significância entre o item e a
escala (Coeficiente de correlação de Spearman) resultou em um total de 4, entre os 19
itens (ver tabela II.4, no anexo II). A correlação entre itens (cargas fatoriais) resultou em
1 fator, com 4 itens. A ordem que aparece entre os itens indica o agrupamento dos
fatores, conforme mostra tabela 4.1, mais adiante.
4.7 – Etapas da pesquisa
A seguir, relatam-se as etapas que envolveram a realização da pesquisa. Pelo
fato da proposta envolver os jovens do IMCG/MS a primeira atitude tomada foi o
contato com a da Diretora Executiva e a Coordenadora Pedagógica da Instituição. Ao
esclarecer o objetivo e a metodologia para a aplicação da pesquisa, a direção
desconsiderou a necessidade de formalizar por escrito a autorização para os trabalhos da
investigação, bem como disponibilizou todo apoio que fosse preciso, até mesmo a
colaboração dos técnicos. O contato com a Instituição ocorreu no mês de maio de 2006.
90
Na primeira etapa da pesquisa, como já informado, foi feita a validação da escala
formação e trabalho, cujos resultados estão dispostos no anexo II desta tese.
Para a segunda etapa, foram retomados os contatos anteriores para informar da
continuidade do trabalho e esclarecer as mudanças no processo de aplicação do
instrumento de pesquisa, inclusive por envolver um maior número de jovens. Com a
mesma solicitude recebida anteriormente, aconteceram os acertos necessários à
realização da pesquisa e foram avaliados os resultados do pré-teste, com o objetivo de
facilitar o encaminhamento dos trabalhos.
Do mesmo modo que na etapa anterior, ficou entendido que o melhor período
para contatar um maior número de jovens, ao mesmo tempo, era no final do mês,
quando os jovens, inseridos no mercado de trabalho, recebem o holerite e devem
apresentar a Declaração Escolar (documento que comprova a freqüência escolar), de
acordo com datas previamente estabelecidas, no calendário da Instituição. O contato
com o IMCG/MS e a realização dessa etapa da pesquisa ocorreu no mês de agosto de
2006.
Para atender aos jovens nas atividades acima mencionadas, a equipe do Serviço
Social, junto com a equipe do Setor Administrativo, organizam-se com o objetivo de
garantir a agilidade dos serviços. Aproveitou-se desse momento para solicitar aos
técnicos dos dois setores que formalizassem o convite para que os jovens colaborassem
com a pesquisa.29
Foi deixado claro o caráter não obrigatório de participação e os jovens
interessados eram encaminhados ao auditório da Instituição. Pela infra-estrutura do
local, esse espaço correspondeu à ambientação adequada à realização dos trabalhos: boa
iluminação e boa temperatura ambiente, mobiliário confortável e espaço amplo, que
permitia o contato com os jovens que iam se encaminhando ao auditório sem prejudicar
os que lá já estavam respondendo ao instrumento da pesquisa.
Os procedimentos utilizados para aplicação do instrumento de pesquisa
obedeceram aos Critérios da Ética na Pesquisa com Seres Humanos, conforme a
29 A pesquisadora contou com a colaboração da pedagoga da Instituição, Rosa Maria de Oliveira Freitas,que não só contribuiu como facilitou os trabalhos da pesquisa.
91
Resolução n. 196/96 do Conselho Nacional de Saúde. Assim sendo, foi apresentado aos
jovens o termo de consentimento individual para a participação na pesquisa, com a
garantia do sigilo das informações pessoais e também foi deixado claro que seria
disponibilizado o apoio necessário no decorrer dos trabalhos. Os técnicos da Instituição
que colaboraram foram devidamente esclarecidos acerca da metodologia e do
comportamento ético necessário à aplicação da pesquisa. Tais atitudes também foram
confirmadas na aplicação do pré-teste realizado para validar a escala em questão.
O critério para representar a amostra da pesquisa foi o método de amostragem
não causal, amostragem acidental, como diz Levin (1977), uma vez que foi organizado
da maneira mais conveniente ao pesquisador, mas sem comprometer o resultado da
coleta de dados.
Para evitar inibições nas respostas, a pesquisa foi indicada apenas como uma
tese de doutorado, em Psicologia Social, da PUC-SP, sobre o tema formação e trabalho.
Após tal explicação era reiterado ao jovem o caráter não obrigatório de participação na
investigação.
Com fins de evitar qualquer incidente que pudesse comprometer o andamento da
pesquisa e o desenrolar das atividades da Instituição, optou-se por realizá-la em dois
períodos: matutino e vespertino. Mesmo sendo o período do almoço um horário de
grande concentração dos jovens que fazem refeição no IMCG, em torno de duzentos,
eles não foram convidados para a pesquisa, por se considerar inadequado responder um
questionário logo após a uma refeição ou, no caso contrário, antes de fazê-la.
Do total de duzentos e sete jovens que se deslocaram ao auditório (local onde
estava sendo aplicada a pesquisa), apenas sete declinaram ao tomar conhecimento do
objetivo a que se destinava a investigação. Com isso, pode-se afirmar que a realização
ocorreu sem nenhum tipo de constrangimento. Houve, até mesmo, um grupo de jovens,
do Programa de Menor Aprendiz que fez questão de colaborar. A curiosidade maior
demonstrada pelos jovens atinha-se ao objetivo da pesquisa e, também, em quem era a
pesquisadora. Apenas um jovem questionou se a pesquisa objetivava investigar o
interesse dos mirins em fazer greve.
A coleta de dados, no período da manhã, contou com a participação de 87 jovens
e com 113 no período da tarde. Do total de 200 sujeitos que responderam ao
92
instrumento da pesquisa, foram eliminados 98, por não atenderem ao critério
estabelecido de verificação da atenção do sujeito. Esse critério pôde ser verificado a
partir das repostas diferentes para itens iguais, pois, conforme já esclarecido, o
instrumento de pesquisa contém 31 itens, mas foi acrescentado o item 32, igual ao 13,
para testar a concentração do sujeito. Assim, os questionários com respostas diferentes
nesses itens não foram computados, resultando numa amostra de 102 sujeitos30. A
média de tempo usada pelos jovens, para responder ao instrumento da pesquisa, ficou
em torno de vinte a vinte e cinco minutos.
4.8 – Apresentação e discussão dos resultados da escala formação e trabalho
Conforme já dito, a escala formação e trabalho, utilizada nesta tese, com 31
itens, divididos em quatro subescalas, em decorrência do processo de validação,
apresentou qualidade psicométrica satisfatória quanto ao resultado de seu conteúdo, o
que pode ser avaliado pelas correlações obtidas entre os itens, pelo método da análise
fatorial, cujos cálculos encontram-se no anexo IV. A operacionalização dos
componentes da análise fatorial foi organizada de acordo com cada subescala da escala
formação e trabalho.
Para determinar os valores indicativos do grau de consistência das correlações
entre os itens (Cf. Guiford, 1954), recorreu-se à extração de análise dos componentes
principais. O conceito de cada fator foi designado pelo item com maior carga fatorial ou
por uma definição que sintetizasse o conjunto das questões abordadas.
30 A variabilidade de respostas com diferença significativa na escolha dos escores, de mais de dois pontos,resultou numa perda de vinte e sete (27) instrumentos. Respostas com escores variando em um ponto dediferença resultaram numa perda de setenta e dois (72) instrumentos. Ao se verificar os índices deatenção, foi possível observar que não houve discrepância significativa entre os índices obtidos noperíodo da manhã e da tarde. Dos vinte e sete (27) instrumentos, com diferenças de mais de um ponto nasrespostas, quatorze (14) ocorreram no período da manhã e treze (13) no período da tarde.
93
Na tabela abaixo, estão estimados dados estatísticos dos itens da escala formação
e trabalho, determinados pelo resultado da análise fatorial, discriminando os fatores e os
temas dos itens (no instrumento de pesquisa, os itens são frases maiores).
94
TABELA 4.1.
Cargas fatoriais das subescalas da escala formação e trabalho(Continua)
SUBESCALAS FATORES ITENS CARGA FATORIAL
Item 27 – Trabalho valoriza e dignifica o trabalhador. ...........................0,793
Item 20 – Trabalho possibilita realização pessoal. ...........................0,774
FATOR 1 - Concepção alienada de trabalho
Item 23 – Trabalho entendido com expressão de liberdade,conhecimento e criatividade. ...........................0,480
Item 9 – A realização do trabalho, nesta sociedade, nãopermite autonomia. ..........................0,672
T: concepção de trabalho
FATOR 2 - Trabalho e autonomia
Item 29 – Não há, na sociedade atual, exploração dotrabalho.
..........................0,635
Item 21 – Trabalhador jovem ao participar de greveprejudica sua carreira ..........................0,655
FATOR 1 - Trabalho e participação
Item 2 – Trabalhador jovem deve ater-se à carreiraprofissional. ..........................0,443
Item 16 – Trabalhador deve ser competente sem preocupar-se com os outros. .........................0,658
AT : atitudes no trabalho
FATOR 2 - Atitudes no trabalho
Item 26 – Trabalho aliado a ganhar dinheiro. .........................0,589
(Continua)
95
Item 30 – O mercado de trabalho oferece chances iguais. ...........................0,811FATOR 3 - Trabalho e possibilidades
Item 25 – Trabalho: lugar para realizar sonhos. ...........................0,740
Item 3 – Horas livres devem ser voltadas ao trabalho. ....................... ...0,772
Item 6 – Trabalho deve ser independente de problemaspessoais.
Item 14 – Trabalhador intelectual deve ser mais
valorizado
...........................0,462
..........................0,434
FATOR 4 - Envolvimento com o trabalho
Item 22 – Diploma é considerado mais importante que oaprender. .........................0,735
Item 17 – Um bom emprego torna os estudosdesnecessários. .........................0,720
FATOR 1 - Relação estudo e trabalho
Item 8 – Realização profissional e formação escolar. .........................0,528
Item 19 – Formação escolar deve preparar o indivíduo paraser subserviente. ........................0,749
ET: valor dado àeducação e ao trabalho
FATOR 2 - Significado da formaçãoescolar
Item 4 – Trabalho amplia a capacidade do indivíduo emdetrimento da formação escolar. .......................0,615
96
(Conclusão)
Item 111 – No capitalismo, o sucesso na vida depende,principalmente, do indivíduo. ..........................0,758
Item 18 – Sociedade é justa, o que vale é o esforço pessoal. ..........................0,730
Item 12 – Nossa juventude necessita de uma rigorosadisciplina, firme determinação, vontade detrabalhar e lutar pela pátria e pela família. .........................0,679
A: adaptação àideologia do mundoadministrado
FATOR 1 - Sociedade capitalista e atitudesdo indivíduo
Item 13 – Nesta sociedade, as pessoas têm autonomia eliberdade. .........................0,498
Fonte: Tabela elaborada com base nos estudos de Kerlinger (1980) e calculada com o programa SPSS 13.0 for Windows.
Método de extração: Análise dos Componentes Principais
Método de rotação: Varimax com normalização Kaiser
Obs.: Os itens no instrumento de pesquisa eram frases mais completas.
Notas: 1 - Item da escala da ideologia da racionalidade tecnológica (Crochík, 1999).2 - Item da escala F (Adorno et al, 1965).
97
Na tabela 4.1., pode-se observar que vinte itens, dentre o conjunto das
subescalas, apresentam coeficiente de correlação acima de 0,40, de acordo com o valor
determinado, conforme já discutido anteriormente. Esse resultado, ao mostrar a
correlação positiva entre os itens, orienta o pesquisador sobre quais itens devem
analisados.
Nas tabelas abaixo, de acordo com cada subescala, estão discriminados os
cálculos da média e o índice de variabilidade do desvio padrão, para os itens que
obtiveram correlação significativa na análise fatorial. A partir desses dados são
analisados os resultados das respostas formuladas pelos sujeitos da pesquisa.
De acordo com a variabilidade dos pontos (de 1 a 4), a média estabelecida para
os escores corresponde ao valor de 2,5, sendo uma posição intermediária, que, mesmo
não encontrado na escala, pode ser interpretado como ponto médio, referente à
concordância ou discordância do sujeito sobre a questão proposta.
4.8.1 - Resultados estatísticos por subescala
Na tabela a seguir, da Subescala T, estão mostrados a média e o desvio padrão,
dos itens selecionados pela análise fatorial, sem especificar os fatores.
TABELA 4.2.
Resultado da Subescala T: conceito de trabalho1
Nº. do item Média Desvio Padrão
09 2,5 0,8
20 1,9 0,8
23 1,9 0,8
27 2,0 0,8
29 3,5 0,8
Fonte: Resultados obtidos a partir da escala formação e trabalho, com dados
calculados com o programa SPSS 13.0 for Windows.
98
Nota 1: Número de sujeitos participantes da amostra: 102.
O item 9, com média de 2,5 e desvio padrão de 0,8, mostra um índice de
equilíbrio entre os índices de concordância e discordância, em relação à afirmativa que
a maneira como o trabalho é realizado, nos dias atuais, impossibilita o trabalhador ter
atitudes de autonomia e de expressar seus desejos e interesses.
O item 20, com a média de 1,9 e desvio padrão de 0,8, mostra o predomínio do
índice de concordância ao se afirmar que, em geral, o trabalho, na sociedade atual,
possibilita a realização pessoal.
O item 27, com a média 2,0 e desvio padrão de 0,8, o que prevalece o índice de
concordância ao afirmar que nesta sociedade o trabalho valoriza e dignifica o
trabalhador.
O item 23, com a média de 1,9 e desvio padrão de 0,8, mostra o predomínio do
índice de concordância ao se afirmar que a organização do trabalho, na sociedade atual,
possibilita o indivíduo ser livre para expressar criatividade e conhecimento.
O item 29, com média 3,5 e desvio padrão de 0,8, mostra um alto índice de
discordância em relação à afirmativa de que não há, na sociedade atual, exploração no
trabalho.
Os dados dessa subescala confirmam a proposta da primeira hipótese, ao afirmar
que o jovem trabalhador estudante das camadas populares concebe o trabalho de forma
contraditória, pois, ao mesmo tempo em que ele critica as condições de trabalho
existentes, não deixa de defender os valores da sociedade administrada.
Ao avaliar que o trabalho impossibilita o trabalhador expressar atitudes de
autonomia, de expressar desejos e interesses, houve equilíbrio nos índices de
concordância e discordância, nas respostas obtidas. Houve concordância ao se afirmar
que o trabalho, nesta sociedade, possibilita a realização pessoal e que valoriza e
dignifica o trabalhador. Também se concordou que o trabalho possibilita liberdade ao
indivíduo para expressar criatividade e conhecimento Mas não deixou de haver uma
99
significativa discordância à afirmativa da não existência de exploração do trabalho,
nesta sociedade.
Ao avaliar tais resultados, fica claro o posicionamento dos sujeitos da pesquisa
em concordar com os valores predominantes na sociedade ao pensar sobre o trabalho.
“Se os indivíduos se encontram nas coisas que moldam a vida deles, não o fazem
ditando, mas aceitando a lei das coisas – não a lei da Física, mas a lei da sociedade”
(Marcuse, 1967, p.31). Nesse sentido, entende-se que os indivíduos se identificam com
o que lhes é imposto.
Frente à ambivalência apresentada nos índices obtidos pondera-se que mesmo o
indivíduo ao pensar sobre as conseqüências dos danos causados pelo trabalho em suas
vida, ele não deixa de se identificar aos valores predominantes da sociedade. Assim
sendo, deixa de avaliar que a situação factual laborativa tem tornado os homens apenas
meros instrumentos, usados para garantir os bons resultados na produção de bens
materiais, conforme discussões do capítulo dois, desta tese.
Na tabela a seguir, da Subescala AT, estão mostrados a média e o desvio
padrão, dos itens selecionados pela análise fatorial, sem especificar os fatores.
TABELA 4.3.
Resultado da Subescala AT: atitudes valorizadas no trabalho1
Nº. do item Média Desvio Padrão
02 3,0 1,0
03 3,0 0,9
05 3,4 0,8
06 1,4 0,7
14 2,3 0,9
16 2,8 1,0
21 2,5 1,0
25 2,5 1,0
26 2,4 0,9
30 2,5 1,1
100
Fonte: Resultados obtidos a partir da escala formação e trabalho, com dados
calculados com o programa SPSS 13.0 for Windows.
Nota 1: Número de sujeitos participantes da amostra: 102.
O item 2, com a média de 3,0 e desvio padrão de 1,0, mostra o predomínio do
índice de discordância em relação à afirmativa de que o jovem deve estar atento só à sua
carreira profissional e despreocupar-se com o que acontece na sociedade.
O item 3, com a média 3,0 e desvio padrão de 0,9, mostra o predomínio do
índice de discordância ao se afirmar que o trabalhador deve, nas horas livres, continuar
preocupado com o trabalho.
O item 5, com média de 3,4 e desvio padrão de 0,8, mostra que prevalece o
índice de discordância ao se afirmar que o trabalhador jovem deve centrar seu interesse
em fazer só o que lhe mandam, sem preocupar-se em demonstrar criatividade e
inteligência.
O item 6, com média de 1,4 e desvio padrão de 0, 7, mostra o predomínio do
índice de concordância à assertiva de que os problemas de ordem pessoal não devem
interferir no trabalho.
O item 14, com média de 2,3 e desvio padrão de 0,9, mostra que prevalece o
índice de concordância em assentir que o trabalhador intelectual deve ser mais
valorizado, por ser quem pensa e planeja a execução das atividades dos outros
trabalhadores.
O item 16, com média de 2,8 e desvio padrão de 1,0, mostra o predomínio do
índice de discordância para a afirmativa que o trabalhador deve ser competente,
conhecer o serviço, sem se incomodar com os colegas de trabalho.
O item 21, com média de 2,5 e desvio padrão de 1,0, mostra um índice eqüitativo
entre a discordância e a concordância à afirmativa de que o jovem trabalhador deve
evitar participar de movimentos grevistas para não prejudicar a carreira profissional.
O item 25, com média de 2,5 e desvio padrão de 1,0, mostra um índice
eqüitativo entre a concordância e a discordância para a afirmação que, nesta sociedade,
o local de trabalho é um lugar para sonhar e realizar desejos.
101
O item 26, com média de 2,4 e desvio padrão de 0,9, mostra um índice de
equilíbrio entre a concordância e a discordância ao se afirmar que independente de
gostar do que faz, as atitudes do trabalhador devem ser voltadas para ganhar mais
dinheiro e ter aumento de salário.
O item 30, com média de 2,5 e desvio padrão de 1,1, mostra um índice de
equilíbrio entre a concordância e a discordância em relação à afirmativa que o mercado
de trabalho oferece chances iguais para todos, assim o trabalhador jovem, antes de
escolher definitivamente o que quer fazer, tem condições de experimentar diferentes
tipos de trabalho.
Os resultados estatísticos apresentados nesta subescala não revelaram facilidade
de avaliação. Sem ter aqui a pretensão de testar uma teoria, a referência é válida no
sentido de avaliar quão complexo é lidar com conceitos que implicam valorar atitudes
do indivíduo. Os resultados discriminados mostram que os sujeitos da amostra
defendem atitudes de participação em movimentos pela defesa de direitos do
trabalhador, negam a indiferença aos colegas de trabalho, discordam de atitudes de
subserviência e da condição de não ser possível demonstrar criatividade e inteligência.
Contudo, foi quase eqüitativo o resultado em relação ao fato de que deve ser dado valor
ao dinheiro em detrimento a se fazer o que gosta tal qual a diferença em concordar que
o mercado de trabalho oferece chances iguais para todos. Houve equilíbrio ao se
concordar e discordar que, nesta sociedade, o trabalho é lugar para sonhos. Patto (2000),
ao discutir sobre o trabalho e o sonho, reconhece que a realização do trabalho pode
significar o direito de sonhar, no cativeiro a que está submetida à humanidade.
Ao abordar questões relativas ao envolvimento com o trabalho, fica evidente que
o trabalho aparece como um peso na vida do indivíduo, pois nas horas livres ele deve
ser esquecido e os problemas de ordem pessoal não devem interferir no desempenho do
trabalho. O trabalho também aparece como algo cindido do todo na existência do
trabalhador, mas, ao mesmo tempo toma conta da vida dos homens na sociedade atual,
como bem ironizou Lafargue (2003) ao defender o direito à preguiça.
Os dados demonstram também que, mesmo sendo os sujeitos da pesquisa, na
grande maioria, responsáveis por serviços de rotina, houve uma significativa
concordância que o trabalhador intelectual deve ser mais valorizado por ser quem
102
planeja o trabalho, expressando assim desvalorização do trabalho que fazem. Adorno
(1995) chama a atenção para o quanto a cultura dividiu os homens, sendo que a divisão
mais importante é aquela entre trabalho físico e intelectual. “Desse modo ela subtraiu
aos homens a confiança em si e na própria cultura” (Adorno, 1995 a, p.164).
No cômputo geral, pela ambigüidade presente nos resultados, mostram-se as
contradições de valores e falta de clareza acerca de princípios dos sujeitos da pesquisa,
ao pensarem atitudes pertinentes às relações de trabalho. Ainda que tenha o peso das
contradições, as expressões identificadas não deixam de revelar atitudes de resistência,
o que é essencial para saber que se pode imaginar, pensar o mundo diferente do que ele
tem sido: comandado por relações de poder entre os homens.
Mas, ao se avaliar o conjunto dos resultados apresentados nesta subescala, pode-
se auferir a comprovação da segunda hipótese: que o jovem trabalhador estudante das
camadas populares, ao refletir sobre atitudes pertinentes ao cotidiano das relações de
trabalho, faz escolhas de valores morais identificados à lógica defendida pelo capital,
conforme pode ser observado no capítulo dois deste trabalho. Reforça tal afirmação as
contradições identificadas em suas escolhas.
Na tabela a seguir, da Subescala ET, estão discriminados a média e o desvio
padrão, dos itens selecionados pela análise fatorial, sem especificar os fatores.
TABELA 4.4.
Resultado da Subescala ET: valor dado à educação e ao trabalho1
Nº. do item Média Desvio Padrão
04 3,0 1,0
08 2,7 1,0
17 3,7 0,6
19 2,5 0,9
22 3,3 0,9
Fonte: Resultados obtidos a partir da escala formação e trabalho, com dados
calculados com o programa SPSS 13.0 for Windows.
Nota 1: Número de sujeitos participantes da amostra: 102.
O item 4, com uma média de 3,0 e desvio padrão de 1,0, mostra o predomínio
do índice de discordância frente à assertiva de que é a experiência no trabalho que faz o
103
indivíduo ampliar a capacidade de análise, sendo desnecessário que a formação escolar
o torne crítico e capaz de refletir sobre o que acontece na sociedade.
O item 8, com uma média de 2,7 e desvio padrão 1,0, mostra que prevalece o
índice de discordância para a afirmação que a realização profissional independe do grau
de formação escolar.
O item 17, com média de 3,7 e desvio padrão de 0,6, mostra um alto índice
discordância em relação à afirmativa que um bom emprego torna os estudos
desnecessários.
O item 19, com média de 2,5 e desvio padrão de 0,9, mostra equilíbrio entre o
índice de discordância e concordância em relação à afirmativa que a formação escolar
deve preparar o indivíduo para obedecer às autoridades e cumprir a lei, sem que seja
necessário desenvolver-lhe a capacidade de emancipar o pensamento.
O item 22, com média de 3,3 e desvio padrão de 0,9, mostra o predomínio do
índice de discordância ao se afirmar que, ao estudar, o mais importante é conseguir
receber o diploma, independente do que é aprendido.
Os resultados apresentados pela subescala ET, mostram que os sujeitos da
pesquisa ressaltam a importância da formação escolar. Tais resultados são
significativamente relevantes, uma vez que foi avaliado o valor da formação escolar
comparado-o à experiência no trabalho, pelo fato desses sujeitos já estarem inseridos no
mercado de trabalho.
Spósito (2005), ao analisar a relação escola e trabalho sob o ponto de vista de
jovens, diz não ser possível configurar nem uma adesão linear à escola ou um abandono
ou exclusão total de aspirações de escolaridade no âmbito das orientações dos jovens
que trabalham. Assim, para os jovens brasileiros, explica Spósito (2005, p.106), “escola
e trabalho são projetos que se superpõem ou poderão sofrer ênfases diversas de acordo
com o momento do ciclo de vida e as condições sociais que lhes permitam viver a
condição juvenil”.
Nesta pesquisa, os jovens trabalhadores e estudantes das camadas populares
demonstraram ter maior interesse pela formação escolar se comparada à atividade
laboral. Essa constatação contrariou a hipótese levantada, ao afirmar que seria dado
104
mais valor à formação decorrente das experiências vividas no trabalho, em detrimento
da formação escolar. Pondera-se aqui, a importância desse resultado, pois, ao depender
de escolhas objetivas, o sujeito pode optar pelo que lhe é mais caro. Nesse sentido, é
possível problematizar que, de certo modo, talvez o desinteresse pelo processo
formativo esteja mais presente nos responsáveis pela educação, não nos jovens; nas
promessas não cumpridas da cultura, nos termos de Adorno (1995 a); na defesa do
processo civilizatório aliado à repressão.
Se há interesse dos jovens pela escola, existe um espaço a ser conquistado, para
o rompimento com o conjunto das idéias que tem predominado nas propostas
educacionais. No entanto, os equívocos impostos pela educação têm impedido os
indivíduos de pensarem na barbárie produzida por esta sociedade, pois, como diz
Adorno (1986 a, p.71), “o julgamento das necessidades corretas e falsas teria de ser
feito de acordo com uma visão da estrutura geral da sociedade, com todas as suas
mediações”.
Na tabela a seguir, da Subescala A, estão mostrados a média e o desvio padrão,
dos itens selecionados pela análise fatorial, sem especificar os fatores.
TABELA 4.5.
Resultado da Subescala A: adaptação à ideologia do administrado
Nº. do item Média Desvio Padrão
01 1,7 0,7
11 1,5 0,6
13 2,1 1,0
18 1,8 0,8
Fonte: Resultados obtidos a partir da escala formação e trabalho, com dados
calculados com o programa SPSS 13.0 for Windows.
Nota 1: Número de sujeitos participantes da amostra: 102.
O item 1, com média de 1,7 e desvio padrão de 0,7, mostra o predomínio do
índice de concordância, ao se afirmar que a maior necessidade de nossa juventude é de
105
uma rigorosa disciplina, firme determinação e vontade de trabalhar e lutar pela família e
pela pátria.
O item 11, com média de 1,5 e desvio padrão de 0,6, mostra um alto índice de
concordância, ao se afirmar que, no capitalismo, o sucesso da vida depende,
principalmente, do indivíduo.
O item 13, com média de 2,1 e desvio padrão de 1,0, mostra o índice de
concordância em relação à afirmativa de que, nesta sociedade, as pessoas têm
autonomia, têm liberdade para decidirem sobre suas vidas.
O item 18, com média de 1,8 e desvio de 0,8, mostra o predomínio do índice de
concordância em relação à afirmativa de que a sociedade oferece condições de trabalho
de maneira justa para todos e o que importa é o esforço do indivíduo para conquistar seu
espaço.
Os índices obtidos nas respostas dos sujeitos da pesquisa nesta subescala, ao
enfocar questões voltadas a atitudes políticas, foram marcados pela opção de
concordância.
Prevaleceu a concordância ao afirmar que o sucesso na vida, nesta sociedade,
depende do esforço pessoal. Concordar com essa questão significa que o indivíduo traz
para si a responsabilidade do que acontece em sua vida e deixa de perceber o quanto a
vida, nesta sociedade, é administrada e impede o indivíduo de se diferenciar.
Constatou-se que houve concordância em dizer que o indivíduo tem autonomia e
que a sociedade oferece condições de trabalho de maneira justa para todos.
O conjunto do resultado apontado nesta subescala confirma a hipótese: que o
jovem trabalhador estudante das camadas populares, ao se posicionar sobre o sistema
social vigente, expressa valores indicativos de adaptação a esse sistema. Reforça essa
afirmação a concordância de que a obediência e o respeito às autoridades são tidos
como essenciais à vida do jovem, na defesa de uma rigorosa disciplina. Verifica-se,
então, que o trabalho cumpre um papel disciplinador e regularizador de atitudes.
Essa forma de pensar alia-se à defesa de ações coercitivas e da cultura regida
pela lei e pela ordem. Talvez o componente mais definido do conservadorismo seja o
106
apego, aparente pelo menos, às “coisas como estão”, à organização social e ao modo de
vida estabelecidos, como diz Levinson (apud Adorno et al, 1965). A esse respeito,
esclarece Adorno (1995), que a sociedade do século XIX endeusou o falso princípio de
que a pessoa correta é aquela que se conforma à sociedade, organizando-se a si mesma
como a norma que a mantém unida em sua estrutura mais íntima. Mas o ser correto,
conservando valores da ordem imposta, adverte Adorno (1995), leva inúmeros sujeitos a
conformarem-se com o nazismo, com o fascismo, com a miséria existente e com as
bombas, que ainda continuam destruindo os homens. Assim, o frankfurtiano chama a
atenção ao perigo da adesão cega ao coletivo. Nesse sentido, é preciso fortalecer
resistências para romper a lógica conformista que assegura atitudes de adaptação e
indiferença frente à barbárie existente na sociedade.
107
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Discutir a relação entre formação e trabalho e, em especial, o interesse em
apreendê-la sob o ponto de vista dos jovens do Instituto Mirim de Campo Grande/MS,
além de tratar das questões pertinentes à pesquisa, conseqüentemente, levou a
pesquisadora a avaliar criticamente a experiência de trabalho que participou, por um
período de oito anos, como diretora executiva dessa Instituição. Essa experiência
orientou a formulação dos objetivos do projeto da pesquisa e a elaboração das hipóteses,
que foram avaliadas pela escala formação e trabalho, instrumento da investigação
empírica.
Dentre o conjunto das inquietações que suscitaram a vontade de elaborar este
estudo, uma das primeiras ateve-se à compreensão do comportamento do jovem,
identificado como rebelde, de acordo com estudos na área de Psicologia, pois, no
trabalho institucional, com jovens trabalhadores estudantes das camadas populares, não
era evidente a manifestação desse comportamento. O que se observava eram muito mais
atitudes de subserviência. Então, como pensar a rebeldia, o destemor e arroubos juvenis,
tão anunciados pela Psicologia? Como conciliar rebeldia com a disciplina exigida no
trabalho? O que pensavam os jovens do IMCG/MS sobre as questões do mundo do
trabalho? Estavam de acordo com o sistema social vigente? Articular tais questões levou
à construção da escala formação e trabalho, com fins de buscar possíveis respostas às
dúvidas, tendo como referência os estudos dos autores da teoria crítica da sociedade.
Nos capítulos apresentados foram abordadas discussões entendidas como
relevantes para o esclarecimento dos objetivos propostos. Na introdução, avaliou-se o
que representou a experiência de trabalho no IMCG/MS, pelo significado desse trabalho
para a elaboração desta tese, conforme já mencionado.
Assim, com a análise do conceito de adolescência, foram abertas as discussões
dos temas pertinentes a esta pesquisa. Os sujeitos investigados são jovens e esse tempo
da vida é o período em que o indivíduo é considerado apto para entrar no mercado de
trabalho, pelo menos em tese, pois é sabido o quão freqüente ainda tem sido a
participação de crianças no mercado de trabalho.
Por ter em vista a grande influência dos estudos psicanalíticos no que diz
respeito à definição do conceito de adolescência, optou-se por polemizá-lo,
considerando esses estudos, a fim de pensar essa fase da vida humana. Nesse sentido, os
108
estudos de Adorno, ao analisar o que pode significar o ativismo da juventude, bem
como, as reflexões críticas dos demais autores frankfurtianos atribuídas aos estudos
psicanalíticos, permitiram ampliar a compreensão do ser adolescente, sem ater-se em
categorias generalizantes e que se abstraem das categorizações históricas.
Nesta sociedade, a adolescência é entendida como um período de vida com um
tempo – moratória - que inclui a permissão para se representar o papel de ser rebelde e
fica demarcado como um tempo em que se permite libertar o pensamento. Como bem
mostra estudos na área da Psicologia do Desenvolvimento, o indivíduo, nessa fase da
vida, ao se enquadrar no modelo de desenvolvimento identificado como normal, estaria
em condições de ir percebendo os valores e normas existentes na sociedade e de
entender a lógica de sua organização. Ou seja, pode compreender o mundo de acordo
com os pressupostos do raciocínio científico.
Entretanto, mesmo que haja espaços, dentre os diferentes papéis que o jovem
pode representar nesta sociedade, inclusive pela multiplicidade que compõe a
personalidade humana, há que se identificar como tais espaços estão sendo constituídos.
Disso decorre a responsabilidade do pesquisador em não ser onipotente com os
conceitos, pois, ao realizar esta pesquisa, ao escutar o jovem, ficou claro que é essencial
tanto o conhecimento de resultados estatísticos quanto à reflexão crítica. O pensamento
crítico deve estar presente a todo o momento no processo investigativo. Particularmente,
em relação aos adolescentes que participaram da pesquisa, aprendeu-se o quanto ainda
se faz necessário aguçar a percepção sobre os papéis que eles precisam representar, nas
diferentes situações que têm que viver nesta sociedade.
Com o propósito de analisar se o papel de rebelde se concilia com o do jovem
trabalhador, no segundo capítulo, os estudos realizados enfocaram os temas da relação
entre formação e trabalho, tendo por objetivo discutir o que tem representado essa
relação à vida do jovem trabalhador, na sociedade administrada pelo capital. Do ponto
de vista desta pesquisadora, significou saber o quanto a eficiência do sistema embota a
compreensão do trabalhador e o faz identificar-se com o que lhe é imposto e assim
adaptar-se ao processo de dominação existente na sociedade.
Pode-se afirmar que a sociedade burguesa tem feito os homens conviverem com
a lógica da racionalidade tecnológica. Assim sendo, faz-se a defesa cega do progresso
da produção dos bens, objetivados pelo trabalho. Essa lógica tem impedido o homem de
ajuizar o quanto de sofrimento tem configurado a formação pelo trabalho e também
dificulta o surgimento da razão crítica; não permite ao trabalhador perceber as gritantes
109
contradições e os aspectos destrutivos presentes nas relações de trabalho, na sociedade
atual.
A sociedade administrada pela técnica avançou na reificaçao da razão do
trabalhador, alienou-o da produção de seu trabalho, tornando-o apenas mais uma
mercadoria para os donos dos bens de produção. Desse modo, o trabalhador entrega seu
corpo e sua alma, que se formam segundo o poder mistificador da aparelhagem técnica;
deixa-se entranhar pelos valores da formação do mundo administrado na defesa do
esforço individual e do trabalho realizado com sacrifício; não consegue avaliar o
processo de alienação que toma conta de sua existência e acaba por defender a lógica de
quem o oprime.
Ao desenvolver esta tese, o que se compreendeu, mesmo na condição de alguém
que se propôs a pensar criticamente sobre a irracionalidade dessa lógica, é o quanto tais
valores tomam conta da existência do indivíduo. Resistir ao mundo administrado é mais
difícil de consolidar do que se pode conceber. Por conta disso, faz-se necessário pensar
o quanto se assume os valores dos papéis institucionalizados e perceber o quanto as
engrenagens do sistema, da máquina que se tornou esta sociedade, bem representada
pelo filme de Chaplin, Tempos Modernos, toma conta da razão do indivíduo,
impedindo-o de pensar diferente do que está posto.
A irracionalidade presente nas relações de trabalho foi expressa pelos sujeitos
desta pesquisa, ao conceituarem e ao identificarem quais atitudes eram mais valorizadas
nessas relações. Ainda que tenham feito algumas escolhas que revelaram a percepção de
contradições presentes no mundo trabalho, mesmo assim, estiveram em concordância
com o seu valor utilitário e desconsideraram os danos que lhes são causados. Nesse
sentido, verificou-se que o espaço para a rebeldia esteve preenchido pelos valores do
sistema dominante.
O terceiro capítulo desta tese, com fins de ampliar as discussões sobre a
vulnerabilidade tangente a relação entre formação e trabalho, teve por interesse buscar
desmistificar o que tem representado para o indivíduo o processo de formação
profissional, na sociedade atual. Iniciado com as impressões da pesquisadora
decorrentes da experiência de trabalho, acima mencionada, sobre o que pensavam os
jovens do IMCG/MS em relação à formação escolar e à formação profissional,
postulou-se que os jovens daquela Instituição tinham maior interesse pela formação
profissional. Contudo, o que se observou, de acordo com o resultado da empiria, é que
110
os sujeitos da pesquisa defendem a prevalência da formação escolar em detrimento da
formação profissional e, assim, contradisseram a hipótese levantada. Mostraram ao
poder responder, sem justificativas, que pretendem ter mais do que lhes tem
proporcionado a aprendizagem decorrente do trabalho, uma vez que deram mais valor à
formação escolar. Se comparado o resultado deste estudo com outros que discorrem
sobre as críticas que os jovens fazem ao funcionamento da escola, pode-se dizer que os
jovens querem mais da escola, pois foi constatado que lhes é cara essa Instituição.
A importância desse resultado, vale a pena problematizar, ao não corresponder
às conclusões advindas de anos da experiência de trabalho, esclarece o quanto é preciso
ir além do que é dado, do fenômeno por si só, e mostra que o pesquisador deve estar
aberto para rever seus valores e convicções, pois, ao contrário do que se esperava, os
jovens do IMCG/MS, formados para se tornarem soldados do trabalho, expressaram
valores diferentes do que fora possível avaliar no cotidiano do trabalho institucional.
No capítulo quatro, ao apresentar os caminhos percorridos pela investigação,
apontando objetivos, hipóteses e os resultados psicométricos dos estudos relativos à
escala proposta, quebrou-se resistências a esse tipo de pesquisa, uma vez que os
resultados, já comentados, mostraram o valor que pode ter uma análise quantitativa
mediada pela reflexão crítica da sociedade.
No que diz respeito à elaboração de hipóteses, arriscou-se a categorizar o objeto,
ao ser externada a subjetividade da pesquisadora e questionado aspectos da experiência
de vida. Assim sendo, a hipótese central formulada considerou que predomina, na
concepção do jovem, ao conceber a relação entre formação e trabalho, valores que
indicam concordância com a lógica administrada pelo capital.
No entanto, no cômputo geral, distinguiram-se, nas escolhas dos sujeitos da
pesquisa, valores da ordem social vigente. Então, a hipótese acima referida se confirma.
Os resultados obtidos não indicam que os jovens se rebelariam para mudar as relações
de dominação existentes nesta sociedade. Isso demonstra que eles não deixam de ser
subjugados pelos valores da lógica da produção e do consumo e de conceber o trabalho
como disciplinador de atitudes. Desse modo, eles permanecem do lado daquilo que está
posto na sociedade, mesmo ao sentirem, no cotidiano de suas vidas, o peso das
111
contradições e das injustiças sociais. Constata-se, então, que a lógica da razão
administrada é suficientemente forte e eficiente e explica a adesão aos seus valores.
Contudo, ainda que os índices estatísticos apontem as atitudes acima
discriminadas, não se pode negar que houveram algumas delas que indicaram
resistência. Ainda que elas não prevaleçam, pode-se falar de pequenos desafios nas
concepções dos jovens, o que pode representar comportamento de subserviência
funcional. Sabe-se que a capacidade de pensar pode levar a idéia de liberdade e também
a idéias de adaptação. Isso vai depender do quanto o indivíduo se deixa levar pela lógica
dominante ou o quanto consegue resistir. Porém, a possibilidade de pensar em
liberdade, de romper com a experiência vivida, implica conhecer as causas que oprimem
o pensamento, de saber o que representa a constituição do indivíduo despojada de
autonomia.
Refletir sobre tais questões, ou seja, dentre o quadro de dissonâncias desta
sociedade, tem-se como essencial saber que os avanços dos meios de produção também
têm feito avançar os instrumentos de dominação. Em especial, chamam a atenção às
contradições do mundo do trabalho, pois a perpetuação da necessidade de trabalho em
tempo integral tem exigido crescente desperdício de recursos, a criação de empregos e
serviços cada vez mais desnecessários e também o crescimento do setor militar ou
destrutivo, que, mais do que qualquer outro, evidencia a produção sofisticada da
barbárie.
Pensar tais questões, dentre tantas outras, que expressam e conduzam refletir
sobre a dimensão das contradições que fazem parte da existência humana, reafirma-se,
deve fazer parte da responsabilidade da educação escolar. A escola também precisa
perceber os desejos dos alunos e procurar entender os papéis que, muitas vezes,
precisam representar. Observa-se, então, que tem faltado à escola, na forma como está
organizada, compreender o quão emancipatório pode ser seu trabalho.
A Psicologia, por sua vez, ao pensar a constituição do indivíduo, os aspectos de
sua subjetividade, precisa avaliar o que pode significar o “ajuste” ou a falta dele, aos
padrões repressivos existentes. É preciso saber o quanto de subserviência se exige à
formação do indivíduo, aliada às novas técnicas de qualificação profissional, bem como
nos comportamentos exigidos pela sociedade administrada.
112
Pondera-se, assim, que não há sentido para a educação na sociedade burguesa,
senão o resultante da crítica e da resistência à sociedade vigente, responsável pela
desumanização, pela produção da barbárie. Isso permite concluir que a educação deve
ser subversiva, se pretende a humanização do indivíduo, pois o mundo administrado não
permite a diferenciação. A totalidade, imposta pela indústria cultural, formaliza a
padronização do indivíduo, maltrata com sucesso a individualidade porque nela sempre
se reproduziu a fragilidade da sociedade.
Se a razão humana já pode conceber uma sociedade justa e o desenvolvimento
dos bens de produção já a garantiria, poder-se-ia ter uma vida que dispensaria ações
institucionais estabelecendo valores pautados em ações “bem intencionadas”, como as
realizadas pelas instituições filantrópicas. Uma sociedade em que o arroubo juvenil,
decantado em vasta literatura, comporia um importante papel em lutar por um mundo
onde seria possível viver em liberdade, que não a liberdade de poder adquirir bens e de
vender a força de trabalho, a liberdade que emanciparia o indivíduo da dominação
existente.
113
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118
ANEXOS
119
ANEXO I
INSTRUMENTO DO PRÉ-TESTE
PESQUISA SOBRE FORMAÇÃO E TRABALHO
INSTRUÇÕES:
A seguir, apresentaremos uma série de afirmações para avaliar o que você pensa e o
quanto concorda ou não com cada uma delas. Após a leitura, sua resposta deve ser de
acordo com sua primeira impressão.
É importante que todas as questões sejam respondidas. Todas as informações coletadas
serão tratadas de maneira CONFIDENCIAL. Por favor, não comente as respostas com
os colegas no decorrer da aplicação.
Atenção: em cada uma das afirmações numeradas, circule o número da resposta que
indique sua opinião.
1 2 3 4Concordototalmente
Concordoparcialmente
Discordoparcialmente
Discordototalmente
Exemplo:
Os programas de televisão são feitos apenas para o lazer das pessoas.
1 2 3 4
Ao circular a nº. 2 significa que você concorda parcialmente com a afirmativa.
DADOS PESSOAIS:
IDADE ______ anos.
SEXO: masc. fem.
FUNÇÃO QUE OCUPA: _______________________________
120
1) A obediência e o respeito pela autoridade são as primeiras virtudes a ser ensinadas àsnossas crianças.1 2 3 4
2) Nesta sociedade, o trabalho reduz o homem à condição de produtor e consumidor, nãopermitindo a auto-realização do trabalhador.
1 2 3 4
3) As ordens dadas por chefes no trabalho devem sempre ser obedecidas, estando certasou erradas.
1 2 3 4
4) O trabalhador não deve participar de movimentos grevistas, pois não adianta lutar pordireitos e melhores condições de trabalho.1 2 3 4
5) Nesta sociedade, o trabalho valoriza e dignifica o trabalhador.
1 2 3 4
6) O trabalhador intelectual deve ser mais valorizado por ser quem pensa e planeja otrabalho.1 2 3 4
7) Às vezes os jovens têm idéias rebeldes que, com os anos, deverão superar paraassentar os seus pensamentos.
1 2 3 4
8) Trabalhar não é apenas produzir e reproduzir bens materiais, mas constituir a vida,tendo consciência do que faz, por que o faz e o valor desses fazer para a sociedade.
1 2 3 4
9) No capitalismo, o sucesso na vida não depende, principalmente, do indivíduo.
1 2 3 4
10) No desempenho do trabalho, devo demonstrar meu esforço e boa vontade atodo o momento se quiser conseguir promoção.
1 2 3 4
121
11) Trabalhar é a realização de ações necessárias apenas para garantir a sobrevivência.
1 2 3 4
12) Nesta sociedade, em geral, o trabalho possibilita a realização pessoal.
1 2 3 4
13) Obediência e humildade são as melhores atitudes do trabalhador.
1 2 3 4
14) O trabalhador jovem não deve se preocupar com o que precisa ser modificado nasociedade, deve estar atento apenas à sua carreira profissional.
1 2 3 4
15) Trabalhar é participar da construção econômica do país, contribuindo para seudesenvolvimento.
1 2 3 4
16) É importante estar sempre atento e preparado para competir enquanto estivertrabalhando.
1 2 3 4
17) O trabalhador deve sempre estar disposto a fazer horas extras.
1 2 3 4
18) O que realmente importa é ser competente, conhecer o serviço, sem se importar como que acontece com os colegas de trabalho.
1 2 3 4
19) Entre fazer algo que não concordo (mesmo que seja considerado imoral), e ficarempregado, o melhor é ficar empregado.
1 2 3 4
20) O trabalhador deve sempre estar disposto a agradar os seus chefes, em qualquersituação, mesmo fora das relações de trabalho.
1 2 3 4
122
21) Problema pessoal não deve ser discutido no trabalho.
1 2 3 4
22) O que mais necessita a nossa juventude é uma disciplina estrita, firme determinaçãoe vontade de trabalhar e lutar pela família e pela pátria.
1 2 3 4
23) A atitude de submissão é a melhor forma de manter-se empregado, para o jovem naexperiência do primeiro emprego.
1 2 3 4
24) Fazer o que mandam é mais importante do que fazer o que gosta.
1 2 3 4
25) No trabalho, vale mais saber um pouco de tudo do que ser especialista (saberbem) algo.
1 2 3 4
26) O socialismo é um sistema que contém belos ideais teóricos, porém não aplicáveis naprática.1 2 3 4
27) Mesmo ao ter condições de ganhar um salário maior, não se deve correr risco demudar de um emprego em que há maior segurança.
1 2 3 4
28) O resultado do trabalho produzido é sempre pago com justiça.
1 2 3 4
29) Nesta sociedade, o trabalhador é apenas mais uma mercadoria valorizada pela suaforça de trabalho.
1 2 3 4
30) Nesta sociedade, as pessoas têm autonomia, têm liberdade para decidirem sobre suasvidas.
1 2 3 4
123
31) O trabalho é o resultado do potencial produtivo do indivíduo.
1 2 3 4
32) O processo existente na divisão do trabalho na sociedade atual – administrado pelointeresse do capital – conduz à auto-alienação do indivíduo, que tem que se adequar, seformar, acompanhando o desenvolvimento da aparelhagem tecnológica.1 2 3 4
33) O trabalhador manual deve ser mais valorizado por fazer mais esforço físico.
1 2 3 4
34) Para o trabalhador, a melhor situação é o emprego de concurso, pois pode acomodar-se profissionalmente1 2 3 4
35) O que é aprendido na escola garante a formação necessária para conseguir emprego.
1 2 3 4
36) A sociedade atual é justa e democrática, pois a lei garante e faz cumprir direitosiguais para todos.1 2 3 4
37) Trabalhar é apenas ter emprego e receber salário.1 2 3 4
38) O trabalhador jovem deve se preocupar em mostrar sua inteligência e criatividadeapenas quando for consultado.1 2 3 4
39) O trabalho realizado com sacrifício e esforço é mais gratificante.1 2 3 4
40) A formação oferecida pelas escolas tem tornado os alunos cultos e críticos.1 2 3 4
41) A formação escolar não deve preparar o indivíduo para desenvolver sua capacidadede reflexão, mas para obedecer às autoridades e aprender a cumprir a lei.1 2 3 4
124
42) O trabalho, na forma como está organizado na sociedade atual, é uma atividade queas pessoas têm possibilidades de serem livres para expressar a criatividade econhecimento.1 2 3 4
43) O trabalhador jovem tem condições de experimentar diferentes tipos de trabalho,antes de escolher definitivamente o que quer fazer, pois o mercado de trabalho oferecechances iguais para todos.1 2 3 4
44) Para que façamos bem nosso trabalho, é necessário que os patrões nos indiquemcuidadosa e exatamente o que devemos fazer e como.1 2 3 4
45) Trabalhar nesta sociedade é ser explorado.1 2 3 4
46) O mais importante que o estudo em si é conseguir um diploma.1 2 3 4
47) Estudar garante que as pessoas melhorem as condições de vida, sempre.1 2 3 4
48) O melhor trabalho é o que possibilita ser independente, ser “dono do próprionegócio”.1 2 3 4
49) A realização profissional depende de maior grau de formação escolar.
1 2 3 4
50) A experiência aprendida no trabalho (no fazer do dia-a-dia) é mais importante que osconteúdos aprendidos na escola.
1 2 3 4
51) O trabalho não é lugar para sonhos, realização de desejos, mas lugar de cumprirobrigações.
1 2 3 4
125
52) Com os recursos científicos e tecnológicos de hoje, não somos mais livres queantigamente.
1 2 3 4
53) O jovem trabalhador não deve participar de movimentos grevistas, pois só prejudicasua carreira.
1 2 3 4
54) Ao conseguir um bom emprego, os estudos não são mais necessários.
1 2 3 4
55) Da maneira como o trabalho é realizado nos dias atuais, tem impedido as pessoas deterem atitudes autônomas, de expressar seus desejos e interesses.
1 2 3 4
56) A formação escolar não precisa tornar o indivíduo crítico e capaz de refletir sobre oque acontece no mundo, pois é a experiência no trabalho que o faz ampliar suacapacidade de análise.1 2 3 4
57) As atitudes no trabalho devem ser voltadas apenas para se ganhar mais dinheiro, parase ter aumento de salário, não importando se você gosta ou não do que deve ser feito.1 2 3 4
58) Em minhas horas livres devo me manter preocupado com o trabalho.1 2 3 4
59) Nesta sociedade, as pessoas têm autonomia, têm liberdade para decidirem sobre suasvidas.1 2 3 4
60) Frente à crise do desemprego existente na sociedade, o que importa é o esforçopessoal do indivíduo para conquistar seu “espaço”, pois a sociedade oferece condiçõesde trabalho de maneira justa para todos.1 2 3 4
61) Considerando os altos índices de desemprego, nos dias atuais, mais importante que osalário é estar empregado.1 2 3 4
126
62) Conseguir cursar uma universidade só depende do esforço pessoal, de querer estudar.1 2 3 4
63) A sociedade pode ser organizada de forma diferente de como ela está e ser justa,igualitária e realmente democrática.1 2 3 4
64) A formação escolar deve orientar os alunos a ser competitivos, a desenvolver aambição e a valorizar, principalmente, o dinheiro.1 2 3 4
65) Todas as pessoas deveriam ter direito de escolher o trabalho que gostaria de fazer.1 2 3 4
66) Da forma como está organizada a sociedade, o filho de um trabalhador manual nãotem muita chance de cursar uma universidade.1 2 3 4
67) Na formação escolar, é mais importante o aluno ser esforçado e estudioso do que osensinamentos dos professores.1 2 3 4
68) O trabalhador manual deve ser mais obediente do que o trabalhador intelectual.1 2 3 4
69) Esta sociedade valoriza mais os bens produzidos para consumo do que as pessoas.
1 2 3 4
70) No trabalho é preciso relacionar-se bem com todos e procurar participar de tudo oque acontece, inclusive das festas.
1 2 3 4
127
ANEXO II
RESULTADO DO PRÉ-TESTE DA ESCALA FORMAÇÃO E TRABALHO
II. 1 - RESULTADO DA VALIDAÇÃO DA ESCALA
O instrumento desta pesquisa - escala formação e trabalho - foi elaborado com
69 itens, vinculados aos objetivos da investigação e divididos em quatro subescalas:
concepção de trabalho, com 10 itens (subescala T); atitudes valorizadas no trabalho,
com 29 itens (subescala AT); valor dado à educação e ao trabalho, com 11 itens
(subescala ET); adaptação à ideologia do mundo administrado, com 19 itens (subescala
A). Os escores da escala e, conseqüentemente, de cada subescala variaram de 1 a 4
pontos: 1 (concordância total); 2 (concordância parcial); 3 (discordância parcial); 4
(discordância total).
Os itens foram pré-testados em uma amostra de 15 indivíduos do sexo
masculino. A escolha da amostra ocorreu por meio de sorteio, até mesmo em relação ao
gênero. O levantamento dos nomes dos participantes foi feito a partir de uma lista,
fornecida pelo IMCG/MS, contendo a relação de 785 jovens, na faixa etária de 16 a 18
anos. Para garantir a homogeneidade da amostra, optou-se pelos jovens de 16 anos e 6
meses de idade, o que representava uma população de 108 jovens do sexo masculino.
Na realização do pré-teste, em primeiro lugar, foi considerada a atenção do sujeito
participante (o instrumento apresenta os itens de números 30 e 59 repetidos, assim é
apresentado com 70 itens). Esse procedimento resultou em uma amostra de onze
sujeitos, os quais mantiveram a atenção concentrada nas perguntas do instrumento da
pesquisa. Quatro foram eliminados por terem os itens acima referidos contendo
respostas diferentes. O tempo médio para responder ao questionário foi em torno de 25
a 30 minutos.
128
II. 2 - RESULTADO DA ANÁLISE ESTATÍSTICA
No estudo estatístico realizado para validar a escala formação e trabalho,
determinou-se o grau de associação entre cada item (variável) da escala em relação ao
conjunto dos itens (variáveis). Para tal procedimento foi utilizado o Coeficiente de
Correlação de Postos de Spearman, conforme estudos e tabela demonstrados por Levin
(1978). O índice de significância desse coeficiente é calculado pelo valor da correlação
(rs) entre as variáveis, a fim de testar o grau de confiabilidade da escala.
Ao ser calculado o coeficiente de correlação (rs) deve-se considerar que um
valor absoluto próximo de zero que indica fraca ou nenhuma associação linear.
Enquanto um valor absoluto próximo de um indica uma forte associação. O valor
calculado para a escala formação e trabalho correspondeu ao coeficiente 0,535. Isso
implica que o calculo do rs crítico (significante ao nível de 0,05) deve ser maior ou
igual ao valor desse coeficiente.
A seguir, após a apresentação dos conteúdos dos itens e avaliar seus significados
de acordo com os valores dos escores, estão discriminados os resultados obtidos no
cálculo do coeficiente de correlação, acima referido, de acordo com cada subescala da
escala formação e trabalho. A numeração que aparece nos itens corresponde à ordem no
instrumento de pesquisa.
II. 2.1 - ITENS DA SUBESCALA T: CONCEPÇÃO DE TRABALHO
1- Item 5. Nesta sociedade, o trabalho valoriza e dignifica o trabalhador.
2- Item 8. Trabalhar não é apenas produzir e reproduzir bens materiais, mas constituir a
vida, tendo consciência do que faz, por que o faz e o valor desse fazer para a
sociedade.
3- Item 11. Trabalhar é a realização de ações necessárias para garantir a sobrevivência.
4- Item 12. Nesta sociedade, em geral, o trabalho possibilita a realização pessoal.
5- Item 15. Trabalhar é participar da construção econômica do país, contribuindo para
seu desenvolvimento.
6- Item 31. O trabalho é o resultado do potencial produtivo do indivíduo.
129
7- Item 37. Trabalhar é ter emprego e receber salário.
8- Item 42. O trabalho, na forma como está organizado na sociedade, é uma atividade
em que as pessoas têm possibilidades de serem livres para expressar a
criatividade e conhecimento.
9- Item 45. Trabalhar, nesta sociedade, é ser explorado.
10- Item 55. A maneira como o trabalho é realizado, nos dias atuais, tem impedido as
pessoas de terem atitudes autônomas, de expressar seus desejos e interesses.
Dentre o conjunto dos 10 itens apresentados, os de número 5, 11, 12, 15, 31, 37
e 42, ao terem por opção o escore 1 (concordo totalmente) ou 2 (concordo
parcialmente), significa que o sujeito, ao conceituar o trabalho, pensa de acordo com os
valores atribuídos pela lógica do mundo administrado. Desse modo, significa o não-
reconhecimento das condições de exploração que fazem parte das relações de trabalho
nesta sociedade e a incapacidade de avaliar o processo de alienação, a dissolução da
experiência formativa, que tem constituído a vida do trabalhador. Assim, percebe-se que
o trabalho é valorizado pelo seu caráter utilitário, obrigatório, caracterizado como um
“peso” necessário à vida do indivíduo. Também são identificadas atitudes de
subserviência, assente a uma visão pragmatista, que alia trabalho, principalmente, à
necessidade de produção e reprodução de bens de consumo. A escolha do escore 3
(discordo parcialmente) ou 4 (discordo totalmente) inverte os valores e indica a
capacidade do sujeito em reconhecer as contradições que fazem parte da vida do
trabalhador.
Nos itens número 8, 45 e 55, a opção pelo escore 1 ou 2 indica que o sujeito
concebe o trabalho sem identificá-lo aos valores predominantes nesta sociedade. Ou
seja, o sujeito avalia criticamente as condições de exploração existentes nas relações de
trabalho, ponderando sobre a falta de autonomia existente nessas relações. A opção
entre o escore 3 ou 4 indica o inverso dessa maneira de pensar.
130
II. 2.1.1. Resultado do pré-teste disposto em tabela – SUBESCALA T
TABELA II. 1.
SUBESCALA T1: TESTE DO COEFICIENTE DE CORRELAÇÃO
ITEM CORRELAÇÃO
5 0,7*
8 0,3
11 0,3
12 0,5*
15 0,3
31 0,6*
37 0,4*
42 0,7*
45 0,7*
55 0,6*
Fonte: Tabela elabora a partir dos estudos de Levin (1977) e calculada
pela autora
Nota 1: Escala validada a partir da participação de 11 sujeitos.
* : rs (crítico) = 0,535 / significante ao nível de 0,05
Pela tabela II. 1 pode-se verificar que, na subescala T, os coeficientes de
correlação obtidos nos itens (variáveis) 5, 12, 31, 42, 45 e 55 apresentam valores
correspondentes ao calculado (0,535). O item 37* mesmo estando fora do coeficiente
obtido (baixa correlação: 0,4) foi mantido pelo interesse da pesquisadora em relação ao
tema abordado. Os itens 8, 11 e 15 foram eliminados por não apresentarem valores de
correlação positivas em relação aos demais itens (variáveis).
II. 2.2 - ITENS DA SUBESCALA AT: ATITUDES NO TRABALHO
1- Item 3. As ordens dadas por chefes no trabalho devem sempre ser obedecidas,
estando certas ou erradas.
131
2- Item 4. O trabalhador não deve participar de movimentos grevistas, pois não adianta
lutar por direitos e melhores condições de trabalho.
3- Item 6. O trabalhador intelectual deve ser mais valorizado por ser quem pensa e
planeja o trabalho.
4- Item 10. No desempenho do trabalho devo demonstrar meu esforço e boa vontade a
todo o momento, se quiser conseguir promoção.
5- Item 13. Obediência e humildade são as melhores atitudes do trabalhador.
6- Item 14. O trabalhador jovem não deve se preocupar com o que precisa ser
modificado na sociedade, deve estar atento apenas à sua carreira
profissional.
7- Item 16. É importante estar sempre atento e preparado para competir enquanto estiver
trabalhando.
8- Item 17. O trabalhador deve sempre estar disposto a fazer horas extras.
9- Item 18. O que realmente importa é ser competente, conhecer o serviço, sem se
importar com o que acontece com os colegas de trabalho.
10- Item 19. Entre fazer algo com que não concorda (mesmo que seja considerado
imoral), e ficar empregado, o melhor é ficar empregado.
11- Item 20. O trabalhador deve sempre estar disposto a agradar aos seus chefes, em
qualquer situação, mesmo fora das relações de trabalho.
12- Item 21. Problema pessoal não deve ser discutido no trabalho.
13- Item 23. A atitude de submissão é a melhor forma de manter-se empregado para o
jovem na experiência do primeiro emprego.
14- Item 24. Fazer o que mandam é mais importante do que fazer o de que gosta.
15- Item 25. No trabalho, vale mais saber um pouco de tudo do que ser especialista
(saber bem) em algo.
132
16- Item 27. Mesmo ao ter condições de ganhar um salário maior, não se deve correr
risco de mudar de um emprego em que há maior segurança.
17- Item 33. O trabalhador manual deve ser mais valorizado por fazer mais esforço
físico.
18- Item 34. Para o trabalhador, a melhor situação é o emprego de concurso, pois pode
acomodar-se profissionalmente.
19- Item 38. O trabalhador jovem deve se preocupar em mostrar sua inteligência e
criatividade apenas quando for consultado.
20- Item 39. O trabalho realizado com sacrifício e esforço é mais gratificante.
21- Item 43. O trabalhador jovem tem condições de experimentar diferentes tipos de
trabalho antes de escolher definitivamente o que quer fazer, pois o
mercado de trabalho oferece chances iguais para todos.
22- Item 44. Para que façamos bem nosso trabalho, é necessário que os patrões nos
indiquem exatamente o que devemos fazer e como.
23- Item 48. O melhor trabalho é o que possibilita ser independente, ser “dono do
próprio negócio”.
24- Item 51. No trabalho não é lugar para sonhos, realização de desejos, mas lugar de
cumprir obrigações.
25- Item 53. O jovem trabalhador não deve participar de movimentos grevistas, pois só
prejudica sua carreira.
26- Item 57. As atitudes no trabalho devem ser voltadas apenas para se ganhar mais
dinheiro, para se ter aumento de salário, não importando se você gosta ou
não do que deve ser feito.
27- Item 58. Em minhas horas livres, devo manter-me preocupado com o trabalho.
28- Item 68. O trabalhador manual deve ser mais obediente do que o trabalhador
intelectual.
133
29- Item 70. No trabalho, é preciso relacionar-se bem com todos e procurar participar de
tudo o que acontece, inclusive das festas.
Essa escala contém os mesmos valores dos escores da subescala anterior, variando
de 1 a 4 pontos. Em sua totalidade, os itens, ao serem respondidos de acordo com o
escore 1 ou 2, indicam atitudes de subserviência e aceitação aos valores determinados
pelas relações de dominação existentes no mundo do trabalho. Atitudes que demonstram
resistência e indignação a essas atitudes implicam a escolha do escore 3 ou 4.
134
II. 2.2.1 – Resultado do pré-teste disposto em tabela – SUBESCALA AT
TABELA II. 2.
SUBESCALA AT1: TESTE DO COEFICIENTE DE CORRELAÇÃO ITEM CORRELAÇÃO
3 0,4
4 0,8*
6 0,8*
10 0,5*
13 0,2
14 0,5*
16 0,2
17 0,4
18 0,5*
19 0,5*
20 0,2
21 0,5*
23 0,4
24 0,3
25 0,0
27 0,5*
33 0,0
34 0,4
38 0,5*
39 0,3
43 0,7*
44
48
0,3
0,3
51 0,7*
53 0,8*
57 0,5*
58 0,5*
68 0,4
70 0,2
Fonte: Tabela elabora a partir dos estudos de Levin (1977) e calculada pela autora. Nota 1: Escala validada a partir da participação de 11 sujeitos. * : rs (crítico) = 0,535 / significante ao nível de 0,05.
135
Pela tabela II. 2 pode-se observar que, na subescala AT, os coeficientes de
correlação obtidos nos itens (variáveis) 4, 6, 10, 14, 18, 19, 21, 27, 38, 43, 51, 53, 57 e
58 apresentam valores correspondentes ao calculado (0,535). O que significa eliminar
os itens 3, 13, 16, 17, 20, 23, 24, 25, 33, 34, 39, 44, 48, 68 e 70, por não apresentarem
valores com correlação positiva em relação aos demais itens (variáveis).
II. 3 - ITENS DA SUBESCALA ET: VALOR DADO À EDUCAÇÃO E AO
TRABALHO
1- Item 35. O que é aprendido na escola garante a formação necessária para conseguir
emprego.
2- Item 40. A formação oferecida pelas escolas tem tornado os alunos cultos e críticos.
3- Item 41. A formação escolar não deve preparar o indivíduo para desenvolver a
capacidade de reflexão, mas para obedecer às autoridades e aprender a lei.
4- Item 46. Mais importante que o estudo em si é conseguir um diploma.
5- Item 47. Estudar garante que as pessoas melhorem as condições de vida, sempre.
6- Item 49. A realização profissional depende de maior grau de formação escolar.
7- Item 50. A experiência aprendida no trabalho (no fazer do dia-a-dia) é mais
importante que os conteúdos aprendidos na escola.
8- Item 54. Ao conseguir um bom emprego os estudos não são mais necessários.
9 Item 56. A formação escolar não precisa tornar o indivíduo crítico e capaz de refletir
sobre o que acontece no mundo, uma vez que é a experiência no trabalho
que o faz ampliar sua capacidade de análise.
10- Item 64. A formação escolar deve orientar o aluno a ser competitivo, a desenvolver
a ambição e a valorizar, principalmente, o dinheiro.
136
11- Item 67. Na formação escolar, é mais importante o aluno ser esforçado e estudioso
do que os ensinamentos dos professores.
Com um total de 11 itens, nesta subescala também são mantidos os mesmos
valores dos escores das subescalas anteriores, de 1 a 4 pontos. Nesta subescala, sem
inversão de valores no conjunto das questões, ao predominar o escore 1 ou 2, significa
que o sujeito não pensa de modo crítico em relação ao seu processo formativo. Assim
sendo, não avalia que a formação escolar e a formação profissional, estão centradas nos
valores da razão administrada. Ou seja, estão de acordo com as normas vigentes na
sociedade. Ao prevalecer respostas de acordo com o escore 3 ou 4, indica a capacidade
do sujeito de avaliar criticamente as falácias do processo de formação existente nesta
sociedade.
II. 3.1 – Resultado do pré-teste disposto em tabela – SUBESCALA ET
TABELA II. 3.
SUBESCALA ET1: TESTE DO COEFICIENTE DE CORRELAÇÃO
ITEM CORRELAÇÃO35 0,2
40 0,4
41 05*
46 0,5*
47 0,7*
49 0,6*
50 0,3
54 0,5*
56 0,6*
64 0,3
67 0,1
Fonte: Tabela elabora a partir dos estudos de Levin (1977) e calculada
pela autora.
Nota 1: Escala validada a partir da participação de 11 sujeitos.* : rs (crítico) = 0,535 / significante ao nível de 0,05
137
Pela tabela II. 3 pode ser observado que, na subescala ET, os coeficientes
obtidos nos itens (variáveis) 41, 46, 47, 49, 54 e 56 apresentaram valores
correspondentes ao calculado (0,535). O que significa eliminar os itens 35, 40, 50, 64 e
67, pois os valores de suas correlações não são positivos em relação aos demais itens
(variáveis).
II. 4 - ITENS DA SUBESCALA A: ADAPTAÇÃO À IDEOLOGIA DO MUNDO
ADMINISTRADO
1- Item 1. Obediência e o respeito pela autoridade são as primeiras virtudes a serem
ensinadas às nossas crianças.
2- Item 2. Nesta sociedade, o trabalho reduz o homem à condição de produtor e
consumidor, não permitindo a auto-realização do trabalhador.
3- Item 7. Às vezes, os jovens têm idéias rebeldes que, com os anos, deverão se superar
para assentar os seus pensamentos.
4- Item 9. No capitalismo, o sucesso na vida não depende, principalmente, do indivíduo.
5- Item 22. O que mais necessita nossa juventude é uma disciplina estrita, firme
determinação e vontade de trabalhar e lutar pela família e pela pátria.
6- Item 26. O socialismo é um sistema que contém belos ideais teóricos, porém não
aplicáveis na prática.
7- Item 28. O resultado do trabalho é sempre pago com justiça.
8- Item 29. Nesta sociedade, o trabalhador é apenas mais uma mercadoria valorizada
pela sua força de trabalho.
9- Item 30/59. Nesta sociedade, as pessoas têm autonomia, têm liberdade para
decidirem sobre suas vidas (item repetido).
10- Item 32. O processo existente na divisão do trabalho na sociedade atual,
administrado pelo interesse do capital, conduz à alienação do indivíduo,
138
que tem de adequar-se, formar-se, acompanhando o desenvolvimento da
aparelhagem tecnológica.
11- Item 36 A sociedade atual é justa e democrática, pois a lei garante e faz cumprir
direitos iguais para todos.
12- Item 52. Com os recursos científicos e tecnológicos de hoje não somos mais livres
que antigamente.
13- Item 60. Frente à crise do desemprego existente na sociedade, o que importa é o
esforço pessoal do indivíduo para conquistar seu “espaço”, pois a
sociedade oferece condições de trabalho de maneira justa para todos.
14- Item 61. Considerando os altos índices de desemprego, na atualidade, mais
importante que o salário é estar empregado.
15- Item 62. Conseguir cursar uma universidade só depende do esforço pessoal, de
querer estudar.
16- Item 63. A sociedade pode ser organizada de forma diferente de como ela está e ser
justa, igualitária e realmente democrática.
17- Item 65. Todas as pessoas deveriam ter direito de escolherem o trabalho que
gostariam de fazer.
18- Item 66. Da forma como está organizada a sociedade, o filho de um trabalhador
manual não tem muita chance de cursar uma universidade.
19- Item 69. Esta sociedade valoriza mais os bens produzidos para consumo do que as
pessoas.
Dentre o total de 19 itens desta subescala, os itens 1,7, 22, 26 foram utilizados da
Escala F1, traduzidos de Adorno et al (1965). Os itens 9, 36 e 52 foram utilizados da
1 A escala F foi aplicada por Adorno et al (1965), nos Estados Unidos da América, com o objetivo demedir o potencial antidemocrático – expresso pela hostilidade franca contra grupos minoritários – e fazparte do conjunto da pesquisa empírica que fundamenta os estudos sobre a “Personalidade Autoritária”.
139
Escala da Racionalidade Tecnológica, de Crochík (1999). Porém os escores
estabelecidos para tais itens têm os mesmos valores dos outros 13 itens restantes.
Os itens 2, 9, 29, 32, 52, 63, 65, 66 e 69, ao ter por opção o escore 1 ou 2 indica
capacidade do sujeito em pensar criticamente sobre os valores predominantes nesta
sociedade. A opção pelo escore 3 ou 4 inverte essa lógica.
A opção pelo escore 3 ou 4, nos itens 1, 7, 22, 26, 28, 30 (59), 36, 60, 61 e 62,
indica que o sujeito analisa criticamente a ordem imposta pelo mundo administrado.
Significa a existência de resistência ao que está posto, a capacidade de pensar as
contradições existentes na sociedade, de pensar ser possível transformar a sociedade,
torná-la justa, livre, democrática. Nesses itens, o escore 1 ou 2 indica a adaptação aos
valores existentes na sociedade.
II.4.1 – Resultado do pré-teste disposto em tabela – SUBESCALA A
TABELA II. 4.
SUBESCALA A1: TESTE DO COEFICIENTE DE CORRELAÇÃO
ITEM CORRELAÇÃO1 0,3
2 0,2
7 0,4
9 0,6*
22 0,5*
26 0,2
28 0,4
29 -0,1
30 / 59 0,8*
32 0,0
36 0,3
52 0,1
60
61
0,8*
0,3
62 0,4
63 0,0
140
65
66
69
0,0
0,2
0,4
Fonte: Tabela elabora a partir dos estudos de Levin (1977) e calculada
pela autora
Nota 1: Escala validada a partir da participação de 11 sujeitos.* : rs (crítico) = 0,535 / significante ao nível de 0,05
Pela tabela II. 4 observa-se que, na subescala A, os coeficientes de correlação
obtidos nos itens (variáveis) 9, 22, 30, 592 e 60 apresentaram valores correspondentes ao
nível de significância calculado (0,535), em relação ao coeficiente de correlação de
Spearman. O que significa eliminar os itens 1, 2, 7, 26, 28, 29, 32, 36, 52, 61, 62, 63,
65, 66, 69, por não apresentarem valores com a correlação positiva aos demais itens
(variáveis).
2 Os itens 30 e 59 são itens repetidos, usados para testar a atenção do sujeito da pesquisa.
141
ANEXO III
MODELO DO INSTRUMENTO DE PESQUISA
PESQUISA SOBRE FORMAÇÃO E TRABALHO
INSTRUÇÕES:
A seguir, apresentamos-lhes uma série de afirmações para avaliar o que você
pensa e o quanto concorda ou não com cada uma delas. Após a leitura, sua resposta
deve ser de acordo com sua primeira impressão.
É importante que todas as questões sejam respondidas. Todas as informações
coletadas serão tratadas de maneira CONFIDENCIAL. Por favor, não comente as
respostas com os colegas no decorrer da aplicação.
Atenção: em cada uma das afirmações numeradas circule o número da resposta que
indique sua opinião.
1 2 3 4Concordototalmente
Concordoparcialmente
Discordoparcialmente
Discordototalmente
Exemplo:
Os programas de televisão são feitos apenas para o lazer das pessoas.
1 2 3 4
Ao circular a nº. 2, significa que você concorda parcialmente com a afirmativa.
DADOS PESSOAIS:
IDADE ______ anos.
SEXO: masc fem.
FUNÇÃO QUE OCUPA: _______________________________
142
1) O que mais necessita nossa juventude é de uma rigorosa disciplina, firmedeterminação e vontade de trabalhar e lutar pela família e pela pátria.1 2 3 4
2) O trabalhador jovem deve ficar atento à sua carreira profissional e despreocupar-secom o que acontece na sociedade.
1 2 3 4
3) O trabalhador deve, nas horas livres, continuar preocupado com o trabalho.
1 2 3 4
4) É a experiência no trabalho que faz o indivíduo ampliar sua capacidade de análise,sendo desnecessário que a formação escolar o torne crítico e capaz de refletir sobre oque acontece na sociedade.
1 2 3 4
5) O trabalhador jovem deve centrar seu interesse em aprender a fazer o que lhemandam, sem preocupar-se em demonstrar sua capacidade criativa e inteligência.
1 2 3 4
6) Problemas de ordem pessoal não devem interferir na realização do trabalho.1 2 3 4
7) Para conseguir promoção no trabalho, o indivíduo precisa demonstrar esforço e boavontade a todo o momento.
1 2 3 4
8) A realização profissional independe do grau de formação escolar.
1 2 3 4
9) Nos dias atuais, a maneira como o trabalho é realizado impossibilita o trabalhador deter atitudes de autonomia, de expressar seus desejos e interesses.
1 2 3 4
10) O trabalho deve ser avaliado, principalmente, pelo resultado produtivo do indivíduo.
1 2 3 4
11) No capitalismo, o sucesso na vida depende, principalmente, do indivíduo.
1 2 3 4
143
12) Mesmo tendo condições de mudar para um emprego com melhor salário, otrabalhador deve manter-se no emprego que lhe garante estabilidade.
1 2 3 4
13) Nesta sociedade, as pessoas têm autonomia, têm liberdade para decidir sobre suasvidas.
1 2 3 4
14) Por ser quem pensa e planeja a execução das atividades de outros trabalhadores, otrabalhador intelectual deve ser mais valorizado.
1 2 3 4
15) Estudar nem sempre garante que a pessoa possa melhorar as condições materiais desua vida.
1 2 3 4
16) Para o trabalhador, o que realmente importa é ser competente, conhecer o serviço,sem incomodar-se com o que acontece com os colegas de trabalho.
1 2 3 4
17) Ao conseguir um bom emprego, os estudos tornam-se desnecessários.
1 2 3 4
18) Como a sociedade oferece condições de trabalho de maneira justa para todos, o queimporta é o esforço pessoal do indivíduo para conseguir seu “espaço”.
1 2 3 4
19) A formação escolar deve preparar o indivíduo para obedecer às autoridades e acumprir a lei, sem que seja necessário desenvolver-lhe a capacidade de emancipar opensamento.
1 2 3 4
20) Em geral, o trabalho, na sociedade atual, possibilita a realização pessoal.
1 2 3 4
21) Por prejudicar a carreira profissional, o jovem trabalhador deve evitar participar demovimentos grevistas.
1 2 3 4
22) Ao estudar, o mais importante é conseguir receber o diploma, independente do que é
144
aprendido.
1 2 3 4
23) Da forma como está organizado na sociedade atual, o trabalho é uma atividade emque a pessoa tem possibilidade de ser livre para expressar criatividade e conhecimento.
1 2 3 4
24) Entre fazer algo com o qual discorda (mesmo que seja considerado imoral), e ficarempregado, o melhor é ficar empregado.
1 2 3 4
25) Nesta sociedade, o local de trabalho é um lugar para sonhar e realizar desejos.
1 2 3 4
26) Independente de gostar do que faz, as atitudes do trabalho devem ser voltadas paraganhar mais dinheiro e ter aumento de salário.
1 2 3 4
27) Nesta sociedade o trabalho valoriza e dignifica o trabalhador.
1 2 3 4
28) O trabalhador deve participar de movimentos grevistas, lutar por seus direitos emelhores condições de trabalho.
1 2 3 4
29) Não há, na sociedade atual, exploração no trabalho.
1 2 3 4
30) Como o mercado de trabalho oferece chances iguais para todos, o trabalhadorjovem, antes de escolher definitivamente o que quer fazer, tem condições deexperimentar diferentes tipos de trabalho.
1 2 3 4
31) Trabalhar é apenas ter emprego e receber salário.
1 2 3 4
32) Nesta sociedade, as pessoas têm autonomia, têm liberdade para decidirem sobresuas vidas.1 2 3 4
145
ANEXO IV
RESULTADOS DOS PROCEDIMENTOS ESTATÍSTICOS DA ESCALAFORMAÇÃO E TRABALHO
A seguir estão relacionados, de acordo com cada subescala, os itens que
mostraram adequação psicométrica após o pré-teste, acompanhados da tabelas com os
resultados da Análise Fatorial, cujo valor que foi determinado para o coeficiente de
correlação (rs) entre os itens ficou estabelecido em 0,40 (Cf. Kerlinger, 1980, p.231). A
numeração dos itens de cada subescala corresponde ao número do instrumento de
pesquisa (validado com 31 itens).
IV. 1 – Subescala T: Concepção de Trabalho
Dos 69 itens da proposta inicial, da escala formação e trabalho, 10 itens
abordaram as questões da subescala T, que após o pré-teste resultou em 7 itens, abaixo
relacionados:
1. Item 9: Nos dias atuais, a maneira como o trabalho é realizado impossibilita o
trabalhador ter atitudes de autonomia, de expressar seus desejos e
interesses.
2. Item 10: O trabalho deve ser avaliado, principalmente, pelo resultado
produtivo do indivíduo.
3. Item 20: Em geral, o trabalho, na sociedade atual, possibilita a realização
pessoal.
4. Item 23: Da forma como está organizado na sociedade atual, o trabalho é uma
atividade em que a pessoa tem possibilidade de ser livre para expressar
criatividade e conhecimento.
5. Item 27: Nesta sociedade, o trabalho valoriza e dignifica o trabalhador.
6. Item 29: Não há, na sociedade atual, exploração no trabalho.
146
7. Item 31: Trabalhar é apenas ter emprego e receber salário.
Dentre o conjunto dos itens que compõem a subescala T, ao ser escolhido o
escore 1 ou 2, indica que o sujeito da pesquisa concebe o trabalho pautado pela lógica
do mundo administrado. A escolha pelo escore 3 ou 4 indica discordância a essa lógica,
ou seja, revela a expressão de atitudes de resistência e capacidade de pensar
criticamente sobre as contradições que fazem parte das relações de trabalho na
sociedade atual. Assim sendo, o indivíduo é capaz de perceber que subserviência e
atitudes de conformismos configuram o mundo do trabalho sob o jugo do capital.
A tabela abaixo mostra os itens com carga fatorial significativa: 27, 20, 23, 9 e
29. Os itens 10 e 31 foram excluídos por não apresentarem correlações substanciais.
TABELA IV. 1
RESULTADO DA ANÁLISE FATORIAL – SUBESCALA T
FATORES ITENS CARGAFATORIAL
Item 27 – Trabalho valoriza e dignifica otrabalhador ...............0,793
Item 20 – Trabalho possibilita realizaçãopessoal ...............0,774
FATOR 1 – Concepçãoalienada de trabalho
Item 23 – Trabalho entendido com expressãode liberdade, conhecimento ecriatividade ...............0,480
Item 9 – A realização do trabalho, nestasociedade, não permite autonomia ...............0,672
FATOR 2 – Trabalho eautonomia
Item 29 – Não há, na sociedade atual,exploração do trabalho ...............0,635
Fonte: Tabela elaborada com base nos estudos de Kerlinger (1980) e calculada com o programa SPSS
for13.0 Windows .
Método de extração: Análise dos Componentes Principais
Método de rotação: Varimax com normalização Kaiser
Obs: Os itens no instrumento de pesquisa eram frases mais completas.
147
A medida de adequação da amostra (0,540) é considerada satisfatória para o
tratamento estatístico da subescala. A prova de esfericidade de Bartlett 3 (51,322), com
grau de liberdade (gl) 21 e significância 0,000, mostra a possibilidade de uso da
amostra.
IV.2 - Subescala A T: Atitudes Valorizadas no Trabalho
Na proposta inicial, esta subescala tinha 29 itens, dentre os 69 da escala
formação e trabalho. Após o pré-teste, resultou em 14 itens, relacionados a seguir:
1. Item 2: O trabalhador jovem deve ficar atento à sua carreira profissional e
despreocupar-se com o que acontece na sociedade.
2. Item 3: O trabalhador deve, nas horas livres, continuar preocupado com o
trabalho.
3. Item 5: O trabalhador jovem deve centrar seu interesse em aprender a fazer o
que lhe mandam, sem preocupar-se em demonstrar sua capacidade
criativa e inteligência.
4. Item 6: Problemas de ordem pessoal não devem interferir na realização do
trabalho.
5. Item 7: Para conseguir promoção no trabalho, o indivíduo precisa demonstrar
esforço e boa vontade a todo o momento.
6. Item 12: Mesmo tendo condições de mudar para um emprego com melhor
salário, o trabalhador deve manter-se no emprego que lhe garante
estabilidade.
7. Item 14: Por ser quem pensa e planeja a execução das atividades de outros
trabalhadores, o trabalhador intelectual deve ser mais valorizado.
3 A prova de esferecidade de Bartlett é um matriz que avalia a possibilidade de se prosseguir com aanálise fatorial, de acordo com a configuração espacial dos resultados.
148
8. Item 16: Para o trabalhador, o que realmente importa é ser competente, conhecer
o serviço, sem se incomodar com o que acontece com os colegas de
trabalho.
9. Item 21: Por prejudicar a carreira profissional, o jovem trabalhador deve evitar
participar de movimentos grevistas.
10. Item 24: Entre fazer algo com o qual discorda (mesmo que seja considerado
imoral), e ficar empregado, o melhor é ficar empregado.
11. Item 25: Nesta sociedade, o local de trabalho é um lugar para sonhar e realizar
desejos.
12. Item 26: Independente de gostar do que faz, as atitudes do trabalhador devem ser
voltadas para ganhar mais dinheiro e ter aumento de salário.
13. Item 28: O trabalhador deve participar de movimentos grevistas, lutar por seus
direitos e melhores condições de trabalho.
14. Item 30: Como o mercado de trabalho oferece chances iguais para todos, o
trabalhador jovem, antes de escolher definitivamente o que quer fazer,
tem condições de experimentar diferentes tipos de trabalho.
Dentre os 14 itens que passaram a compor esta subescala após o pré-teste, a
opção pelo escore 1 ou 2, nos 14 itens 2, 3, 5, 6, 7, 12, 14, 16, 21, 24, 25, 26 e 30,
mostra a concordância com atitudes de subserviência e aceitação dos valores
determinados pelas relações de dominação existentes no mundo do trabalho. Atitudes
demonstrativas de resistência e indignação, a essa dominação, devem ser apontadas na
opção pelo escore 3 ou 4. Somente o item 28 inverte a lógica dos valores dos escores.
A tabela abaixo mostra os itens com carga fatorial significativa: 21, 2, 16, 5, 26,
30, 25, 3, 6 e 14. Os itens 7, 12, 24, 28 foram excluídos por não apresentarem
correlações substanciais.
TABELA IV. 2
RESUTADO DA ANÁLISE FATORIAL – SUBESCALA AT(Continua)
FATORES ITENS CARGA
149
FATORIAL
Item 21 – Trabalhador jovem aoparticipar de greve prejudicasua carreira ...................0,655
FATOR 1 - Trabalho e participação
Item 2 – Trabalhador jovem deve ater-se à carreira profissional ...................0,443
Item 16 – Trabalhador deve sercompetente sem preocupar-secom os outros ...................0,658
FATOR 2 - Atitudes no trabalho
Item 5 – Trabalhador jovem deve sersubserviente sem demonstrarcriatividade ...................0,611
Item 26 – Trabalho aliado a ganhardinheiro ...................0,589
150
(Conclusão)
Item 30 – O mercado de trabalhooferece chances iguais ..................0,811
FATOR 3 – Trabalho e possibilidades
Item 25 – Trabalho: lugar para realizarsonhos. .................0,740
Item 3 – Horas livres devem servoltadas ao trabalho. ...................0,772
Item 6 – Trabalho deve serindependente de problemaspessoais. ...................0,462
FATOR 4 – Envolvimento com o trabalho
Item 14 – Trabalhador intelectual deveser mais valorizado. ...............0,434
Fonte: Tabela elaborada com base nos estudos de Kelinger (1980) e calculada com o programa SPSS 13.0
for Windows .
Método de extração: Análise dos Componentes Principais
Método de rotação: Varimax com normalização Kaiser
Obs: Os itens no instrumento de pesquisa eram frases mais completas.
A medida de adequação da amostra (0,625) é considerada satisfatória para o
tratamento estatístico da subescala. A prova de esfericidade de Bartlett (152,470), com
grau de liberdade (gl) 51 e significância 0,000, indica a possibilidade de uso dos
resultados da amostra.
O método de rotação para a subescala AT, conforme cálculo do SPSS 13.0 for
Windows, indicou 6 fatores. Todavia, o resultado da correlação de convergência nos
fatores 4 e 5 apresentou apenas um item com carga fatorial acima de 0,40, por isso,
optou-se pela exclusão desses fatores.
IV. 3- Subescala E.T: Valor dado à Educação Escolar e ao Trabalho
A proposta inicial desta subescala era de 11 itens, dentre o total dos 69 da escala
formação e trabalho. Após o pré-teste, passou a ter os 6 itens, abaixo relacionados:
1. Item 4: É a experiência no trabalho que faz o indivíduo ampliar sua capacidade de
análise, sendo desnecessário que a formação escolar o torne crítico e
capaz de refletir sobre o que acontece na sociedade.
151
2. Item 8: A realização profissional independe do grau de formação escolar.
3. Item 15: Estudar nem sempre garante que a pessoa possa melhorar as condições
de sua vida.
4. Item 17: Ao conseguir um bom emprego, os estudos não são mais necessários.
5. Item 19: A formação escolar deve preparar o indivíduo para obedecer às
autoridades e a cumprir a lei, sem que seja necessário desenvolver-lhe a
capacidade de emancipar o pensamento.
6. Item 22: Ao estudar, o mais importante é conseguir receber o diploma,
independente do que é aprendido.
Nesta subescala, o predomínio dos escores 1 ou 2 nos itens 4, 15, 17, 19, 22
evidencia falta de análise crítica do sujeito em relação ao seu processo formativo, tanto
no que diz respeito à escolaridade quanto à profissionalização. Ao prevalecer respostas
de acordo com o escore 3 ou 4, indica a capacidade do sujeito de pensar criticamente, de
compreender as falácias do processo de formação existente nesta sociedade. Nos itens 8
e 15, a opção pelo escore 1 ou 2 indica descrença em relação às possibilidades dadas
pela formação escolar e a opção pelo escore 3 ou 4 inverte essa lógica.
A tabela abaixo mostra os itens com carga fatorial significativa: 22, 17, 8, 19 e 4.
O item 15 foi excluído por não apresentar correlação substancial.
TABELA IV. 3
RESUTADO DA ANÁLISE FATORIAL – SUBESCALA ET
FATORES ITENS CARGAFATORIAL
Item 22 – Diploma é considerado maisimportante que o aprender. .............0,735
Item 17 – Um bom emprego torna os estudosdesnecessários. .............0,720
Fator 1 – Relação estudo etrabalho
Item 8 – Realização profissional e formaçãoescolar. .............0,528
Item 19 – Formação escolar deve preparar oindivíduo para ser subserviente. ...........0,749
Fator 2 – Significado daformação escolar
Item 4 – Trabalho amplia a capacidade doindivíduo em detrimento da formaçãoescolar. ...........0,615
152
Fonte: Tabela elaborada com base nos estudos de Kelinger (1980) e calculada com o programa SPSS 13.0for Windows .
Método de extração: Análise dos Componentes PrincipaisMétodo de rotação: Varimax com normalização KaiserObs: Os itens no instrumento de pesquisa eram frases mais completas.
A medida de adequação da amostra (0,571) é considerada satisfatória para o
tratamento estatístico da subescala. A prova de esfericidade de Bartlett (38,332) com
grau de liberdade (gl) 15 e significância 0,001 indica a possibilidade de uso dos
resultados da amostra.
IV.4 - Subescala A: Adaptação à Ideologia do Mundo Administrado
A proposta inicial desta subescala era de 19 itens, dentre os 69 da escala
formação e trabalho. Após o pré-teste, passou a ter os 4 itens, abaixo relacionados:
1. Item 1: O de que mais necessita a nossa juventude é uma disciplina estrita, firme
determinação e vontade de trabalhar e lutar pela família e pela pátria.
2. Item 11: No capitalismo, o sucesso na vida depende, principalmente, do
indivíduo.
3. Item 13: Nesta sociedade, as pessoas têm autonomia, têm liberdade para
decidirem sobre suas vidas.
4. Item 18: Como a sociedade oferece condições de trabalho de maneira justa para
todos, o que importa é o esforço pessoal do indivíduo para conquistar
seu “espaço”.
Nesta subescala, os itens 1, 11, 13, 18, ao ter por opção o escore 1 ou 2, mostra a
falta de capacidade do sujeito de pensar o novo, de pensar que é possível transformar a
sociedade, ou seja, indica a predominância de comportamentos adaptados aos valores do
mundo administrado. A opção pelo escore 3 ou 4 revela condições de se emancipar o
pensamento, de romper com a lógica da produção e do consumo de bens valorizadas por
esse mundo.
A tabela abaixo mostra os itens com carga fatorial significativa: 11, 18, 1, 13.
153
154
TABELA IV.4.
RESULTADO DA ANÁLISE FATORIAL – SUBESCALA A
FATORES ITENS CARGAFATORIAL
Item 111 – No capitalismo, o sucesso na vidadepende, principalmente, doindivíduo .............0,758
Item 18 – Sociedade é justa, o que vale é oesforço pessoal. .............0,730
Item 12 – Nossa juventude necessita de umarigorosa disciplina, firmedeterminação, vontade de trabalhare lutar pela pátria e pela família .............0,679
Fator 1 - Sociedade capitalista eatitudes do indivíduo
Item 13 – Nesta sociedade, as pessoas têmautonomia e liberdade .............0,498
Fonte: Tabela elaborada com base nos estudos de Kerlinger (1980) e calculada com o programa SPSS13.0 for Windows.Método de extração: Análise dos Componentes PrincipaisObs.: Os itens no instrumento de pesquisa eram frases mais completas.Notas: 1 - Item da escala da ideologia da racionalidade tecnológica (Crochík, 1999).
2 - Item da escala F (Adorno et al, 1965).
A medida de adequação da amostra (0,661) é considerada satisfatória para o
tratamento estatístico da subescala. A prova de esfericidade de Bartlett (40,379), com
grau de liberdade (gl) 6 e significância 0,001, indica a possibilidade de uso dos
resultados da amostra.
Nesta subescala, o resultado da análise dos componentes principais extraiu
apenas 1 fator, não sendo possível fazer a rotação da matriz (Varimax com Kaiser,
conforme programa do SPSS 13.0 for Windows). A rotação, como explica Kerlinger
(1980), significa colocar o máximo possível de cargas próximas aos eixos que
representam os fatores.
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