MORTE E VIDA SEVERINA...Obra •Pedra do Sono (1942) •Os Três Mal-Amados (1943) •O Engenheiro...

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MORTE E VIDA SEVERINA

De João Cabral de Melo Neto

Biografia

• João Cabral de Melo Neto (Recife, 9 de janeiro de 1920 — Rio de Janeiro, 9 de outubro de 1999) foi um poeta e diplomata brasileiro.

• Sua obra poética, que vai de uma tendência surrealista até a poesia popular, porém caracterizada pelo rigor estético, com poemas avessos a confessionalismos e marcados pelo uso de rimas toantes, inaugurou uma nova forma de fazer poesia no Brasil.

• Irmão do historiador Evaldo Cabral de Melo e primo do poeta Manuel Bandeira e do sociólogo Gilberto Freyre, João Cabral foi amigo do pintor Joan Miró e do poeta Joan Brossa. Membro da Academia Pernambucana de Letras e da Academia Brasileira de Letras, foi agraciado com vários prêmios literários. Quando morreu, em 1999, especulava-se que era um forte candidato ao Prêmio Nobel de Literatura.

Obra

• Pedra do Sono (1942)

• Os Três Mal-Amados (1943)

• O Engenheiro (1945)

• Psicologia da Composição com a Fábula de Anfion e Antiode (1947)

• O Cão sem Plumas (1950)

• O Rio ou Relação da Viagem que Faz o Capibaribe de Sua Nascente à Cidade do Recife (1954)

• Dois Parlamentos (1960)

• Quaderna (1960)

• A Educação pela Pedra (1966)

Obra

• Morte e Vida Severina (1966)

• Museu de Tudo (1975)

• A Escola das Facas (1980)

• Auto do Frade (1984)

• Agrestes (1985)

• Crime na Calle Relator (1987)

• Primeiros Poemas (1990)

• Sevilha Andando (1990)

MORTE E VIDA SEVERINA

Os retirantes, de

Portinari

Análise

• Mistura de gêneros: Lírico, narrativo e dramático•Auto de natal pernambucano•Morte e Vida Severina foi publicado em 1966•Poema escrito em primeira pessoa

•Composição realizada em Redondilhas maiores

•18 quadros que narram a viagem de Severino pelo sertão em direção a Recife.

Presença constante da morte

Influência barroca

Apesar do tom pessimista em quase

toda a obra, no final, João Cabral

transmite solidariedade e

esperança ao retirante na imagem

da vida “severina”

Análise

• O livro apresenta um poema dramático, escrito entre 1954 e 1955 e relata a dura trajetória de um migrante nordestino em busca de uma vida mais fácil e favorável no litoral.• Consiste basicamente em duas partes: antes de chegar em Recife e depois. Antes de chegar chamamos de caminho ou fuga da morte; e depois em o presépio ou encontro da vida.

Enredo

• A obra possui 18 trechos ao longo dos quais Severino, o retirante, primeiro apresenta-se ao leitor para em seguida ir relatando, com o auxílio de outras vozes, outros personagens encontrados na travessia, as etapas de que ela se compõe até chegar no Recife, onde o rio se encontra com o mar...

• ... Ora dialogando individualmente com ele, ora funcionando como um coro, tais vozes dão mobilidade aos trechos e ressoam de modo a contagiar os que seguem as pegadas do protagonista, explicitadas por títulos que resumem os seus movimentos principais, de forma semelhante às titulações dos capítulos dos romances medievais.

Enredo

Retirantes

Recife, década de 50

Crítica

“ João Cabral de Melo Neto foi o principal representante da geração 45. Como outros poetas dessa época, apresentava uma grande preocupação com a construção do poema e com sua forma visual, insistindo na composição de métrica regular. No entanto, ele se destacou pela qualidade de sua poesia. Utilizando-se de uma expressão sintética, fugindo a qualquer tipo de derramamento ou sentimentalidade (...)

Crítica

(...) João Cabral conseguiu à palavra poética a contundência da pedra. No poema dramático Morte e vida severina, a dureza da expressão corresponde formalmente às dificuldades e desalentos da história do retirante que aperte em direção ao litoral em busca de vida, e só encontra morte pelo caminho. O subtítulo do poema, auto de natal pernambucano, confirma a esperança do título no advento de uma nova vida, que represente a redenção do povo nordestino.” (Emília Amaral)

“O RETIRANTE EXPLICA AO LEITOR QUEM É E A QUE VAI”

“— O meu nome é Severino,como não tenho outro de pia.Como há muitos Severinos,que é santo de romaria,deram então de me chamarSeverino de Mariacomo há muitos Severinoscom mães chamadas Maria,fiquei sendo o da Mariado finado Zacarias(...)”

“(...)Somos muitos Severinosiguais em tudo na vida:na mesma cabeça grandeque a custo é que se equilibra,no mesmo ventre crescidosobre as mesmas pernas finase iguais também porque o sangue,que usamos tem pouca tinta. (...)”

“(...) E se somos Severinosiguais em tudo na vida,morremos de morte igual,mesma morte severina:que é a morte de que se morrede velhice antes dos trinta,de emboscada antes dos vintede fome um pouco por dia(de fraqueza e de doençaé que a morte severinaataca em qualquer idade,e até gente não nascida). (...)”

“ (...)Mas, para que me conheçammelhor Vossas Senhoriase melhor possam seguira história de minha vida,passo a ser o Severinoque em vossa presença emigra.”

“ENCONTRA DOIS HOMENS CARREGANDO UM DEFUNTO NUMA REDE, AOS GRITOS DE "Ó IRMÃOS DAS ALMAS! IRMÃOS DAS ALMAS! NÃO FUI EU QUEM MATEI NÃO!”

— E quem foi que o emboscou,irmãos das almas,quem contra ele soltouessa ave-bala?— Ali é difícil dizer,irmão das almas,sempre há uma bala voandodesocupada.

— E o que havia ele feitoirmãos das almas,e o que havia ele feitocontra a tal pássara?— Ter um hectares de terra,irmão das almas,de pedra e areia lavadaque cultivava.

— Mas que roças que ele tinha,irmãos das almasque podia ele plantarna pedra avara?— Nos magros lábios de areia,irmão das almas,os intervalos das pedras,plantava palha. ”

“(...) Pensei que seguindo o rioeu jamais me perderia:ele é o caminho mais certo,de todos o melhor guia.Mas como segui-lo agoraque interrompeu a descida?Vejo que o Capibaribe,como os rios lá de cima,é tão pobre que nem semprepode cumprir sua sina (...)”

“—— Desde que estou retirandosó a morte vejo ativa,só a morte depareie às vezes até festivasó a morte tem encontradoquem pensava encontrar vida,e o pouco que não foi mortefoi de vida severina(aquela vida que é menosvivida que defendida,e é ainda mais severinapara o homem que retira).

Penso agora: mas por queparar aqui eu não podiae como Capibaribeinterromper minha linha? ”

O RETIRANTE CHEGA À ZONA DA MATA, QUE O FAZ PENSAR, OUTRA VEZ, EM INTERROMPER A VIAGEM.

“—— Bem me diziam que a terrase faz mais branda e maciaquando mais do litorala viagem se aproxima.Agora afinal chegueinesta terra que diziam.Como ela é uma terra docepara os pés e para a vista.Os rios que correm aquitêm água vitalícia. ”

ASSISTE AO ENTERRO DE UM TRABALHADOR DE EITO E OUVE O QUE DIZEM DO MORTO OS AMIGOS QUE O LEVARAM AO CEMITÉRIO

“—— Essa cova em que estás,com palmos medida,é a cota menorque tiraste em vida.—— é de bom tamanho,nem largo nem fundo,é a parte que te cabeneste latifúndio. ”

O RETIRANTE RESOLVE APRESSAR OS PASSOS PARA CHEGAR LOGO AO RECIFE

“E chegando, aprendo que,nessa viagem que eu fazia,sem saber desde o Sertão,meu próprio enterro eu seguia.Só que devo ter chegadoadiantado de uns diaso enterro espera na porta:o morto ainda está com vida.A solução é apressara morte a que se decidae pedir a este rio,que vem também lá de cima, (...)”

“(...) —— Seu José, mestre carpina,e quando ponte não há?quando os vazios da fomenão se tem com que cruzar?quando esses rios sem águasão grandes braços de mar?—— Severino, retirante,o meu amigo é bem moçosei que a miséria é mar largo,não é como qualquer poço:mas sei que para cruzá-lavale bem qualquer esforço. (...)

“(...) —— Seu José, mestre carpina,e quando é fundo o perau?quando a força que morreunem tem onde se enterrar,por que ao puxão das águasnão é melhor se entregar?

(…)—— Seu José, mestre carpina,que diferença fariase em vez de continuartomasse a melhor saída:a de saltar, numa noite,fora da ponte e da vida?”

UMA MULHER, DA PORTA DE ONDE SAIU O HOMEM, ANUNCIA-LHE O QUE SE VERÁ

—— Compadre José, compadre,que na relva estais deitado:conversais e não sabeisque vosso filho é chegado?

“—— Severino, retirante,deixe agora que lhe diga:eu não sei bem a respostada pergunta que fazia,se não vale mais saltarfora da ponte e da vidanem conheço essa resposta,

se quer mesmo que lhe digaé difícil defender,só com palavras, a vida,ainda mais quando ela éesta que vê, severinamas se responder não pudeà pergunta que fazia,ela, a vida, a respondeucom sua presença viva.”