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Tiragem: 44837
País: Portugal
Period.: Diária
Âmbito: Informação Geral
Pág: 16
Cores: Cor
Área: 15,87 x 30,32 cm²
Corte: 1 de 2ID: 43749278 14-09-2012
Quantas palavras lêem por minuto?
A B C D E F G H I J L M N O P Q R S
Fonte: Maria Dulce Gonçalves
Velocidade de leitura observada nos mesmos alunos em dois anos distintos
0
20
4060
80
100
120
140 palavras
2010 2011
Meta no 4.º ano: Ler um texto com articulação e entoação correctas e uma velocidade de leitura de, no mínimo, 125 palavras por minuto
Meta no 5.º ano: Ler um texto com articulação e entoação correctas e uma velocidade de leitura de, no mínimo, 140 palavras por minuto
Num primeiro momento, a psicó-
loga educacional e professora da
Universidade de Lisboa Dulce Gon-
çalves, especialista em difi culdades
de aprendizagem, regozijou-se. Fi-
nalmente ia chegar, já este ano, às
escolas portuguesas o que descreve
como “uma técnica maravilhosa” —
medir a afl uência da leitura — para
ajudar as crianças com difi culdades
a acreditar que também elas são ca-
pazes. Mas a euforia esgotou-se mal
começou a ler o documento das no-
vas metas curriculares de Português
para o ensino básico, já em vigor, e
concluiu que afi nal aquela técnica
chegará às escolas portuguesas “da
pior das formas”.
Dulce Gonçalves sabe do que
fala. Nos últimos três anos tem co-
ordenado o projecto Investigação
das Difi culdades para a Evolução da
Aprendizagem (IDEA) da Universida-
de de Lisboa, no âmbito do qual tem
acompanhado várias escolas, tendo
na base a avaliação e o acompanha-
mento da evolução precisamente
em fl uência da leitura, embora não
só. Os resultados foram apresenta-
dos em Junho, em Avis.
Na terça-feira, o IDEA voltou a
promover novo seminário naque-
la vila alentejana, agora já na posse
das novas metas curriculares, cujo
aplicação este ano é já “fortemente
recomendada” pelo Ministério da
Educação e Ciência e que passarão
a ser obrigatórias no próximo.
No 1.º ano todos os alunos terão
de conseguir ler 55 palavras por
minutos; no 2.º ano 65; no 3.º 80;
no 4.º 125 e por aí fora. Dulce Gon-
çalves não tem dúvidas de que tal é
“impossível” e aponta como exem-
plo os resultados apresentados esta
semana em Avis. Aterradores. O mé-
todo de medição proposto pelo mi-
nistério é o mesmo que tem sido uti-
lizado pelos investigadores do IDEA.
Mas bastou sobrepor uma linha aos
gráfi cos que davam conta das ava-
liações feitas nas escolas parceiras
do projecto para ver o que poderá
acontecer: com os novos indicado-
res impostos aos alunos, pelo menos
mais de metade dos estudantes de
todas as turmas e escolas avaliadas
Novas metas curriculares para Português vão criar “novas dificuldades de aprendizagem”
não conseguiriam alcançar os des-
critores de desempenho em fl uên-
cia de leitura que o MEC dá como
obrigatórios em cada ano de esco-
laridade. Há mesmo casos, como o
descrito no gráfi co que acompanha
este texto, em que nenhum alcança-
ria o objectivo.
Dulce Gonçalves frisa que entre os
alunos avaliados não fi gura nenhum
com necessidades educativas espe-
ciais e que nenhuma das escolas par-
ceiras do IDEA se pode descrever
como sendo problemática. Em vez
de melhorar a qualidade do ensino
e as aprendizagens dos alunos con-
forme anunciado, este tipo de des-
critores de desempenho incluídos
nas metas curriculares vão levar a
que “surjam novas difi culdades de
aprendizagem”, alerta a psicóloga,
que desafi a os pais a experimenta-
rem fazer o que irá agora ser pedido
aos fi lhos.
Não obedecerO susto levou-a a abdicar do mês
de férias para escrever um livro
— Metas, Mitos e Desafi os — onde
aplica o que é proposto pelo MEC
aos resultados da sua longa inves-
tigação. Considera que esta “é uma
obrigação moral” para quem andou
“tantos anos a estudar” estas maté-
rias e alarga o desafi o. Fê-lo, aliás,
já em Avis, frente a uma plateia de
professores: um documento como
o das metas curriculares de Portu-
guês “devia suscitar uma resposta
de não-obediência por parte dos
professores”.
Segundo a psicóloga, o que irá
passar a ser obrigatório, ao impor
um critério único para todos, ignora
“que o que caracteriza a escolarida-
de obrigatória é a diversidade e não
o contrário”. “Em vez de apontar
uma faca, o ministério devia ter op-
tado por fi xar intervalos de valores”,
defende, lembrando que é isso que
se faz, por exemplo, nos EUA, de
onde vem precisamente esta técnica
e onde “a medida de fl uência de lei-
tura é utilizada para perceber como
os alunos estão a evoluir”.
Mas há mais perigos, adverte. Não
foram fi xados os momentos em que
a avaliação da fl uência da leitura é
feita, nem sobretudo quais os textos
que serão propostos para esta ava-
liação. O que signifi ca que “a com-
plexidade dos textos propostos po-
derá fi car totalmente dependente do
critério de cada professor”, alerta. E
fi nalmente, frisa, continua também
sem se saber o que irá acontecer aos
alunos que não atinjam as metas
curriculares. Chumbam?
A avaliar pelo que se indica repe-
tidamente no documento das metas
curriculares de Português, talvez se-
ja esse o destino. Ali se indica que os
objectivos e descritores de desem-
penho “indicados em cada ano de
escolaridade são obrigatórios”.
No seu livro refere, a propósito,
que “a sanha do redactor das me-
tas curriculares de Português foi tal
que, para cada ano de escolaridade,
se repete sempre a reafi rmação des-
ta obrigatoriedade”. Uma imposi-
ção que, nota Dulce Gonçalves, não
se encontra expressa, por exemplo,
nas metas curriculares de Matemá-
tica.
EducaçãoClara Viana
A maioria dos alunos não conseguirá alcançar o que vai ser obrigatório em fluência da leitura, adverte investigadora
55É o número de palavras por minuto que um aluno do 1.º ano terá obrigatoriamente de conseguir ler. No 4.º ano o número aumenta para 125.
Tiragem: 44837
País: Portugal
Period.: Diária
Âmbito: Informação Geral
Pág: 1
Cores: Preto e Branco
Área: 4,81 x 5,10 cm²
Corte: 2 de 2ID: 43749278 14-09-2012
A maioria dos alunos não conseguirá alcançar o que vai ser obrigatório em fl uência da leitura, adverte investigadora. E dá vários exemplos concretos p16
Metas no Português criam “problemas de aprendizagem”
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