SELEÇÃO E AVALIAÇÃO DO DOCENTE DE ENFERMAGEM · 2015-03-03 · de seleção de docentes...

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SELEÇÃO E AVALIAÇÃO DO DOCEN TE DE ENFERMAGEM

Esterlina Watanabe' Leila Conceição Rosa dos Santos" Edina Brasileiro Lima' "

RESUMO. Estudo sobre a seleção do docente de enfermagem em dezenove Escolas de En ­fermagem do Estado de São Paulo. Salienta a problemática do ingresso do docente na ins­tituição de ensino e as maneiras pelas quais ele é selecionado, assim como a aval iação periódica do seu desempenho. Dentre os resultados obtidos, constata-se que 85% dos do­centes são admitidos através de indicações e em 7 2 % das Escolas são feitas aval iações periódicas dos mesmos.

ABSTRACT. This is a study of the nursing school teacher appraisal and selection made in 19 Nursing School in São Paulo State. It emphasies the problem of the ad mission of the teacher i n the Teatching Institution and the way they are selected, as well as the periodical evaluation of their performance. Among the results obtained it was observed that 85% of the teachers are admitted by indications and period ical appraisals are made in 7 2 % of the schools.

1. INTRODUÇÃO

No Brasil, são poucos os registros sobre critérios de seleção de docentes existentes nas escolas de gra­duação em Enfermagem e, de igual modo, há escassez de dados registrados sobre a avaliação dos docentes em atuação.

Para · CARVALHO (1962) é utópica a pretensão das escola de enfermagem exigirem, de um dia pa­ra o outro, curso superior de suas professoras, ten­do em vista que somente a partir de 1961, a enferma­gem firmou-se defInitivamente em sua condição de pro­fissão de nível universitário. Isso porque a Lei 775/49, no seu artigo 5?, estabelecia como exigência para o cur­so de Enfermagem, o certificado de conclusão do cur­so secundário. Concedia porém, um prazo de sete anos a partir de sua publicação, para a matrícula de candi­datos portadores de certifIcado de curso ginasial ou equivalente; expirado o prazo, surgiu uma nova Lei, a de n? 2995/56, prorrogando por mais cinco anos o prazo de exigência do curso secundário.

CARVALHO (1962) sugere os seguintes critérios pa-

ra a seleção: " preparo geral correspondente ao secun­dário completo, diploma de enfermeiro e especializa­ção na matéria que vai lecionar". Thrmina o artigo, que consideramos ousado para aquela época, prevendo es­tar próximo o dia em que as escolas recrutariam suas docentes dentre as diplomadas pelos cursos superio­res.

Seleção, em seu sentido genérico, significa ação ou efeito de escolher ou selecionar; escolha feita sob ação do raciocínio e fundamentada nos motivos do fIm a que se mira (CALDAS, 1964).

A seleção de pessoal é um processo de escolha de elementos adequados para participarem de um deter­minado grupo operacional. Nem sempre significa es­colher pessoas com aptidões ou capacidades nos seus índices mais elevados, mas, principalmente aqueles que dentro de um determinado plano de ação, se encaixam melhor a uma situação pré-determinada (SANTOS, 1977).

Segundo MENDONÇA (1956), o método empírico baseado em provas externas de aptidões, referências de capacidade profIssional ou antecedentes de condu-

• Enfermeira da CCIH do Instituto Central do Hospital das Clínicas - FMUSP. Docente de Enfermagem dos Centros Integrados de Ensino Superior "Farias Brito", Garulhos, São Paulo .

•• Enfermeira. Auxiliar de Ensino do Departamento de Enfermagem Médico-Cirúrgica da Escola de Enfermagem da USP - disciplina Fundamentos de Enfermagem .

••• Enfermeira responsável pela Unidade de Internação - Clínica Médica e Nefrológica do Hospital Brigadeiro - INAMPS _. São Paulo.

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ta, era considerado suficiente para solucionar o pro­blema da seleção ou recrutamento, sem contar com o predomínio de influências externas do candidato. En­tendemos que, para esse autor, seleção é sinônimo de recrutamento. Já outros autores, como por exemplo CA­MACHO (1981) entendem por recrutamento a triagem que antecede à seleção, e esta, a análise de conheci­mentos, habilidades e atitudes do candidato no pleito de um cargo ou função.

Quando se trata de seleção para o cargo de profes­sor, conhecimentos mais profundos são exigidos. Co­nhecimentos esses que geralmente são avaliados atra­vés de concursos que podem constar ou não de provas dissertativas e didáticas. O que se deve levar em con­ta são as funções a serem exercidas com eficiência e não simplesmenté vagas a serem preenchidas.

Sabe-se que nos concursos para seleção de profes­sores de primeiro e segundo graus, os pontos referen­tes à freqüência nas escolas em que anteriormente le­cionaram, são somados às notas obtidas e, certos crité­rios de desempate utilizados, como idade, estado civil e número de filhos, dará preferência aquele candida­to que for mais velho, casado e com maior número de filhos.

Com relação ao docente universitário, os critérios variam muito e a ocorrência de concursos ou exames de seleção, nem sempre é uma constãncia, fato que ge­rou interesse para as autoras, em elaborar o presente trabalho.

CARVALHO (1973) <1Iscorrendo sobre o papel do do­cente de enfermagem como "modelo a ser imitado", atribui às escolas a responsabilidade da escolha corre­ta de seu corpo docente. Considera que tão importan­te quanto a competência e eficiência, são as atitudes e as qualidades desse docente que deve ser assíduo e pontual, líder, simples e elegante no vestir e no falar, subordinado, paciente, interessado pelos problemas da­queles com os quais mantém contato permanente ou esporádico, que tenha gosto e entusiasmo pelas pro­gramações das entidades de classe, participando ati­vamente em movimentos profissionais, culturais e as­sistenciais.

A seleção, por melhor que tenha sido realizada, não se completa por si só. Ela relaCiona-se estreitamente com a avaliação. É claro que na seleção é feita uma es­timativa ou inferência do futuro desempenho do sele­cionado. Esse desempenho deve ser medido através de avaliação, que, por sua vez , quando feita adequada­mente vai mostrar a eficiência ou não da seleção. (BER­GAMINI, 1981)

Avaliar significa determinar o valor real ou o pre­ço; o valor moral ou o merecimento; reconhecer a gran­deza; a intensidade, a força (CALDAS, 1964).

O conceito de avaliação pode variar conforme o tempo e o enfoque dado, assim, como os próprios pro­cedimentos utilizados para a avaliação. BRADFIEL & MOREDOCK citados por TURRA et alii (1982), descre-

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vem que a " avaliação significa atribuir um valor a uma dimensão mensurável do comportamento em relação a um padrão de natureza social e científica". Para SA­RUBI, citado pela mesma autora, avaliação é definida como " um processo complexo, que começa com for­mulação de objetivos e requer a elaboração de meios para obter evidências de resultado, interpretações de resultados para saber em que medida foram os objeti­vos alcançados e formulação de um juízo de valores".

Quando se fala em avaliação está implícito a ne­cessidade da utilização de um instrumento para me­di-la. A dificuldade está justamente na sua confecção e numa análise de resultados que traga benefícios à prá­tica. TUCKMAN e OLIVER, citados por TEIXEIRA (1982) descobriram que os docentes que recebiam "feed-back" dos seus estudantes, melhoravam poste­riormente suas avaliações de desempenho mais do que aqueles que não o recebiam.

Para o presente trabalho, procuramos saber das es­colas de enfermagem do Estado de São Paulo, de que maneira o docente era admitido e posteriormente apreciado no seu desempenho. Seja como for a sua se­leção e avaliação, isso refletirá na eficiência do ensi­no, na melhoria da assistência e no avanço da pesqui­sa. Não se pode abrir margens à inércia, ao descaso quanto ao seu desempenho. A busca de uma adequa­da resposta a esta preocupação, poderá contribuir pa­ra que instituições de ensino tenham um corpo docente altamente qualificado.

2. METODOLOGIA

O estudo foi realizado com diretoras e/ou coorde­nadoras de dezenove Escolas de Enfermagem, sendo 8 (oito) na capital e 11 (onze) no interior do Estado de São Paulo. Utilizou-se um instrumento de pesquisa ela­borado em forma de questionário com 11 (onze) ques­tões, das quais 2 (duas) eram abertas e 9 (nove) fecha­das, o qual foi submetido a um estudo preliminar para confirmação da confiabilidade em relação aos objeti­vos, efetuando-se posteriormente as modificações e adaptações que se fizeram necessárias.

Para a coleta dos dados alguns questionários foram aplicados pessoalmente pelas autoras, quando a esco­la era de fácil acesso e, outros, enviados pelo correio, quando a entrega pessoal não era possível. Na remes­sa do questionário, juntamente com uma carta de apre­sentação, foi enviado também, um envelope selado e endereçado para resposta.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Se considerarmos o interesse que o trabalho des­pertou nas escolas pesquisadas, na razão direta das res­postas recebidas, podemo-nos sentir satisfeitos pela es­colha do tema em questão, pois das 19 (dezenove) es-

colas consultadas, 18 (dezoito) responderam, perfazen­do assim um índice de 95,0% . A escassez de publica­ções sobre o assunto, não pode ser considerada como indicador de que as escolas não estejam voltadas para esse tipo de problema, que julgamos estar intimamen­te relacionado com o nível de ensino e a qualidade do profissional de enfermagem formado por essas escolas.

Quanto à pergunta sobre a existência de normas pré-estabelecidas ou critérios para a seleção de docen­tes, 67,0% responderam afirmativamente. Percebemos que para uma análise mais profunda dessa questão, será necessário a continuidade desse trabalho, quando pre­tendemos saber se esses critérios são registrados, di­vulgados e dados a conhecer previamente pelo candi­dato.

Em 56,0% das escolas pesquisadas, são os docen­tes de cada departamento que elaboram os critérios de seleção e em 28,0% são elementos da direção que se responsabilizam por esta tarefa. Em 56,0% das es­colas, as disciplinas possuem autonomia para a modi­ficação desses critérios. Nesse ponto, convém ressal­tar que as escolas nas quais foram colhidos os dados, não possuem a mesma estrutura organizacional.

O exame de seleção ou concurso público para, ad­missão do docente é feito em 15,0% das escolas e em 85,0% delas o docente é admitido através da indica­ção de outro docente. Essa questão gerou nas pesqui­sadoras algumas dúvidas como:

- que cr\térios são utilizados por esses docentes para indicar outros docentes para a escola?

- o fato do aluno de graduação ter conhecimento de que essa é a porta para o ingresso na carreira do ensino universitário, não poderia desenvolver atitudes de "bajulação" ou mascarar suas verdadeiras caracte­rísticas para tornar-se meramente um papel carbono do seu professor, subjugando seu espírito crítico e ques­tionador, objetivando ser futuramente mais um " indi­cado" ?

- não estariam essas indicações colaborando pa­ra o reforço de uma imagem já existente de que só in­gressam aqueles que já " são da casa" ou fazem um tra­balho de bastidores a contento, transformando assim cada escola em uma "grande familia"?

Mesmo que 85,0% das escolas não admitam docen­tes através de exame de seleção, o curriculum vitae é considerado o requisito de maior peso, sendo que nele são considerados em ordem decrescente, os títulos aca­dêmicos, especialização, habilitação, tempo de exercí­cio profissional, trabalhos publicados, projeto de pes­quisa, participação em jornadas ou congressos, moni­toria e tempo de formado.

A falta de uniformidade na interpretação dos itens do "curriculum vitae" foi comum nas escolas pesqui­sadas. Para as autoras, "títulos acadêmicos" incluem a Especialização (Pós-graduação sensu latu), Mestra­do e Doutorado (Pós-graduação sensu strictu) sendo que a habilitação é incluída no curso de graduação. Em

relação a escala de prioridades, estes " títulos acadê­micos" variaram tanto na seqüência, apresentada quanto na importãncia. A explicação encontrada pa­ra tal variação é a de que, em escolas onde é difícil a liberação posterior do docente para que este adquira seu grau de Mestre ou Doutor, há interesse em já se contratar alguém possuidor do título, mas, em institui­ções onde existem cursos de pós-graduação (sensu stric­to), pelo fato do docente lecionar no local e freqüen­tar o curso sem a necessidade de um afastamento, o título não tem um peso maior na seleção.

Em relação ao tempo de exercício profissional, per­cebemos pelas respostas obtidas ter havido pelo me­nos 2 (duas) interpretações diferentes: experiência ini­cial com o enfermeiro assistencial ou de campo e ex­periência em ensino superior. Ouvimos, freqüentemen­te que o ensino está divorciado da realidade, talvez por existirem docentes excessivamente acadêmicos, sem mesmo nunca terem vivido experiência em campo. Acreditamos que o aluno ao se formar, por mais bri­lhante que tenha sido durante o curso, não está apto totalmente a transmitir o que realmente é a enferma­gem sem antes passar algum tempo em uma institui­ção de saúde, colocando em prática o que aprendeu, embora não seja objetivo deste trabalho determinar qual seria esse período.

Nas respostas relacionadas à avaliação do docen­te, 72 ,0% das escolas afirmaram fazê-la . A periodici­dade da avaliação em 38,0% é semestral, 17,0% é anual, 22,5% é "quando necessário" e 22,5% das es­colas não responderam a este item. Infelizmente, não foi esclarecido, no presente trabalho, o que as escolas entendem por "quando necessário".

Em relação ao levantamento de quem avalia o pro­fessor, as respostas foram diversas por se tratar de uma pergunta aberta. Destacamos aqui algumas dessas res­postas: o diretor da instituição; colegiados; o departa­mento; o próprio corpo docente e boletins de avalia­ção feitos pelo corpo discente.

Dos critérios de avaliação, as instituições utilizam: nível de relacionamento, cumprimento das atividades programadas e o rendimento escolar do aluno.

Quando detectada atitudes deficientes de um do­cente, poucas escolas efetuam demissão desse profes­sor, assim mesmo, só após terem esgotado todos os re­cursos de orientação. As demais escolas resolvem o pro­blema transferindo o' docente para uma outra discipli­na ou então não adotam nenhum método para a solu­ção do problema.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na elaboração deste trabalho, verificou-se quanto ainda há para ser feito quanto à seleção e avaliação dos docentes das Escolas de Enfermagem. Sem dúvi­da, o tema provocou grande entusiasmo, a tal ponto de se pretender a continuação do estudo.

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Do mesmo modo que se tem atribuído à formação inadequada do profissional de enfermagem, motivos como deficiência na qualidade do ensino brasileiro, se­leção inadequada de alunos através do sistema de ves­tibular, falta de bons campos de estágio, falta de inte­gração docente-assistencial, falta de preparo de docen­tes, ensinamentos dicotomizados dos fatos ou ausên­cia de uma filosofia de compromisso com a profissão, há de atribuir, também, como causa o que procuramos expor neste trabalho que a seleção, muitas vezes ine­ficaz de docentes ou mesmo a inexistência de seleção, no verdadeiro sentido da palavra e a falta de uma ava­liação periódica do desempenho de atuação.

Em face da evidência da problemática, demonstra­da neste trabalho, consideramos que: a. tanto os diretores como os coordenadores e os pró­

prios docentes se conscientizem da importância e influência que a seleção e avaliação exercem sobre a qualidade do ensino de enfermagem;

b . os membros do corpo docente procurem aprimorar seus estudos de seleção e avaliação a partir daí es­tabeleçam critérios Dem definidos a respeito e que estes sejam os mais homogêneos possíveis nas es­colas de enfermagem;

c. as vagas para docentes sejam divulgadas em órgãos de grande circulação e entre os enfermeiros e em todos os sistemas que os absorvem como profissio­nal ;

d. haja o cumprimento de um programa de auto-ava-

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liação e avaliação periódica para todos os docen­tes, independentes do cargo ou do título que pos­suem;

e. a ABEE seja reativada e através de sua assessoria pedagógica, promova encontros, seminários e jor­nadas proporcionando assim melhor integração en­tre os docentes.

REFERêNCIAS BIBlIOGRAFICAS

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