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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
INTERVALO INTRAJORNADA
Por: Sidney Baptista Ribeiro
Orientador
Prof. Dr. William Rocha
Rio de Janeiro
2008
2
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
INTERVALO INTRAJORNADA
Apresentação de monografia à Universidade
Candido Mendes como condição prévia para a
conclusão do Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu”
em Direito e Processo do Trabalho.
Por: Sidney Baptista Ribeiro
3
AGRADECIMENTOS
Aos professores do Instituto A vez do Mestre: Dr.
Ayrton Vargas, Dra. Deisy Alves, Dra. Denise
Guimarães, Dr. Alexandre Couce, Dra. Patrícia
Gomes, Dra. Sorean Thomé, Dr. Sérgio Coelho e Dr.
William Rocha, e aos queridos colegas de profissão
e alunos Arthur de Castro Neves Filho e Jorge
Maurício Cyriaco de Castro, pela gentil e primorosa
companhia.
4
DEDICATÓRIA
Dedicado a minha família e aos meus colegas de
profissão Maurício Miranda Sampaio Corrêa e
Raimundo da Cunha Castro, pelo apoio recebido.
5
RESUMO
O estudo aborda a falta de descanso do trabalhador na jornada de
trabalho. As questões jurídicas quanto à sua afetação física, mental e psíquica,
inclusive no que tange ao relacionamento familiar, social e profissional, e as
implicações na atividade produtiva. Cuida especialmente do intervalo para
descanso e alimentação durante o labor, denominado INTERVALO
INTRAJORNADA, e o enfrentamento legal da redução e da sua supressão por
normas de Convenção e Acordos Coletivos de Trabalho. Constata as perdas e
danos causados devido a não observância das leis de proteção da saúde e
segurança no trabalho. Elenca as regras que principiam o interesse público e
o tratamento dado à relação contratual de trabalho.
6
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................................................ 8
CAPÍTULO I - A PAUSA DO TRABALHADOR NA JORNADA DE
TRABALHO........................................................................ 11
1.1. Os intervalos do trabalhador............................................................. 14
1.2. Objetivos específicos........................................................................ 16
1.3. O intervalo intrajornada..................................................................... 18
1.4. A resistência à obrigação biológica de descanso e
alimentação....................................................................................... 19
CAPÍTULO II - LEGISLAÇÃO E PRINCÍPIOS DE DIREITO DO
TRABALHO SOBRE INTERVALO INTRAJORNADA......... 21
2.1. Tipos de intervalo intrajornada.......................................................... 21
2.2. Artigo 71, da CLT (intervalo durante o trabalho)............................... 21
2.3. Súmula 118, do TST (intervalos não previstos em lei)..................... 22
2.4. O princípio da adequação setorial negociada................................... 23
2.5. O princípio da norma mais favorável ao trabalhador........................ 23
2.6. Artigos 1º, III, e 170, caput, da Constituição Federal (CRFB)........... 23
2.7. Artigo 72, da CLT, e Súmula nº 346, do TST (digitadores)............... 24
2.8. Artigo 7º (VI, XIII, XIV), da Constituição Federal (CRFB).................. 24
2.9. Artigo 298, da CLT (trabalhadores em minas de subsolo)............... 26
2.10. Artigo 5º, da lei 5.889/73 (sobre os rurícolas)................................... 26
2.11. Artigo 229, da CLT (telefonia)........................................................... 27
2.12. Lei 8.923, de 27-7-1994.................................................................... 27
2.13. Quanto aos empregados domésticos................................................ 27
2.14. Artigo 253, da CLT (câmaras frias)................................................... 28
2.15. Artigo 224, § 1, da CLT; Orientação jurisprudencial nº 178, da
SBDI-1, do TST (bancários).............................................................. 28
2.16. Orientação Jurisprudencial nº 342 da SDI-I, do TST........................ 28
7
2.17. Convenção nº 171, da OIT, de 1990; Decreto 5.005, de 8 de
março de 2004 (trabalhador noturno)................................................ 29
2.18. Portaria nº 42, de 28 de março de 2007, do Ministério do Trabalho
e Emprego......................................................................................... 29
2.19. Orientação jurisprudencial 354 da SBDI-1, do TST.......................... 29
2.20. O princípio da razoabilidade.............................................................. 30
2.21. O princípio da irrenunciabilidade....................................................... 31
2.22. Novação............................................................................................ 31
2.23. Artigo nº 384, da CLT (intervalo da mulher)...................................... 31
CAPÍTULO III- INTERVALO INTRAJORNADA E OPOSIÇÃO
PATRONAL........................................................................ 32
3.1. Exemplos práticos............................................................................. 32
3.2 A doutrina.......................................................................................... 33
3.3. jurisprudência do TST........................................................................ 35
CAPÍTULO IV- CONSEQUÊNCIAS DA AUSÊNCIA DE INTERVALO
INTRAJORNADA................................................................ 41
4.1. O fenômeno da flexibilização das normas trabalhistas.................... 41
4.2. Os efeitos legais................................................................................ 42
CONCLUSÃO................................................................................................ 45
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................... 49
ANEXO 1....... ............................................................................................ 50
FOLHA DE AVALIAÇÃO................................................................................ 51
8
INTRODUÇÃO
Os vários tipos do intervalo intrajornada buscam a reposição das forças
físicas, mentais e emocionais do trabalhador, com vistas à segurança e higidez
no trabalho. A lei assegura a sua regulação, que tem no artigo 71 da
Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), e em seus 4 parágrafos, a sua
estruturação jurídica básica.
Entretanto, os períodos temporais sofrem alteração, inclusive a
supressão pelas partes, principalmente pelas entidades de classe. São
utilizados como moeda de troca, onde sobreleva o interesse privado
quebrantando o da ordem pública de proteção do hipossuficiente. A
inobservância do descanso na jornada de trabalho, especialmente o
intrajornada, objeto deste estudo, é um fenômeno trabalhista que ocorre nas
diversas formas da atividade econômica. É uma das vertentes de que cuida a
Constituição Federal quando preconiza no seu artigo 7º, inciso XXII:
“REDUÇÃO DOS RISCOS INERENTES AO TRABALHO, por meio de normas
de saúde, higiene e segurança.” (grifado)
Portanto, a questão tratada é: podem as normas de convenção ou
acordo coletivo de trabalho, reduzir ou mesmo suprimir o intervalo intrajornada,
previsto em lei? Também, é verificar a possibilidade de flexibilização da norma
geral tutelar da segurança e saúde do trabalhador, nas diversas formas da
atividade laboral, ser mais vantajosa aos anseios das categorias econômicas e
profissionais.
Com vista a assegurar outros interesses, mormente econômicos, o
intervalo, que tem objetivo esperado e previsto pela ciência médica, e com
lastro em lei, não é respeitado. A pausa não concedida coloca em risco o
trabalhador, a atividade produtiva e a sociedade.
9
Os danos provocados com os acidentes que nos são noticiados, dentre
os quais os mais relevantes são os acidentes envolvendo caminhoneiros,
usineiros e motoristas de coletivos, nos dão conta que toda norma de
segurança, saúde e higiene no trabalho não pode ser desprezada.
Conseqüentemente impõe-se a necessidade de preservar o caráter cogente e
obrigatório das normas de proteção ao trabalho, a qual é o cerne do enfoque
proposto.
Exemplifica-se como é tratado o intervalo intrajornada em algumas
categorias profissionais de trabalho.
Demonstra-se que somente a fiscalização austera do respeito pelas
partes do horário de trabalho, só sendo extrapolado por necessidade ou
previsão legal, é a forma certa de controle.
As questões secundárias vistas são o intervalo interjornada, o repouso
semanal remunerado, domingo e feriados. O intervalo anual remunerado
(férias) não é abordado no tema.
Traça observações sobre a não concessão da pausa pelo empregador.
A ilegalidade da sua inexistência estabelecida em convenção coletiva. A
previsão legal do artigo 71 da CLT, obrigando a todos os trabalhadores. E
quantos aos autônomos? A CRFB quando alude à redução dos riscos
inerentes ao trabalho não prescinde nenhuma forma laboral na cadeia
produtiva, não importando se individual ou industrial (taylorista). Seu valor e
sua valorização (artigo 170 da CRFB). A observância dos descansos para o
trabalho: a visão pelo empregador, com a supervisão do estado – a maior ou
menor intervenção dos órgãos de fiscalização diante das atividades
intimamente ligadas ao meio social. Mais do que um direito do trabalhador, um
dever de trabalhar com segurança, sem colocar em risco a atividade produtiva
e as comunidades a ela ligadas.
10
Os aspectos perfunctórios da remuneração do descanso como causa da
suspensão ou interrupção do contrato de trabalho é mesclado na exposição do
tema.
Se a cadeia produtiva não pode descurar de toda a jornada, opera-se
com o turno ininterrupto de revezamento, porque o homem não pode trabalhar
excedendo sua carga de trabalho biologicamente aceitável. Não é máquina.
Está na CRFB o princípio da dignidade da pessoa humana, insculpido no seu
artigo 1º, inciso III. Lamentavelmente lembrado somente nas demandas
judiciais, tratado filosoficamente, servindo de embasamento dos pleitos e dos
julgamentos.
Aduz as consequências fáticas pelo descumprimento do preceito legal
impositivo.
Cuida dos artigos 1º e 7º, e seus incisos, da Constituição Federal
(CRFB). A relação sistemática das normas. O caráter hermenêutico de
interesse das partes e que fundamentam a jurisprudência. A jurisprudência dos
tribunais trabalhistas. Os princípios de direito do trabalho. O trato da questão
em convenções e acordos coletivos de trabalho. O regime de 12 x 36 horas de
trabalho. O trabalho noturno, rural, da mulher, e outros. A pausa no trabalho
em atividades perigosas e insalubres. Convenção internacional. A postura do
empregador.
O estudo está baseado em livros de doutrinadores do direito material do
trabalho, afins e julgados, enfocando restritamente a questão do descanso
dentro da jornada de trabalho.
11
CAPÍTULO I
A PAUSA DO TRABALHADOR NA JORNADA DE
TRABALHO
O homem sobrevive por conta do seu trabalho. E como ser social a
medida do seu esforço gera interdependência com a atividade produtiva.
Contudo, quanto ao aspecto da pausa para descanso, sua biologia não permite
que labore ininterruptamente, em oposição resistente aos interesses dos meios
e modos de produção, que hodiernamente acontecem de forma mecanizada.
Invariavelmente, a busca desenfreada da supremacia comercial, através de
maior dinamismo no empreendimento, requer muito a força humana para o
desenvolvimento econômico. Essa situação dificilmente condiz com a
individualidade humana, seja no campo físico, no intelectual ou emocional
(psíquico). Necessita ter pausa durante a jornada e entre os turnos de trabalho.
Ter o seu repouso semanal, ter o seu domingo, aproveitar os feriados,
desfrutar anualmente de férias. Não há como enfatizar qual deles se sobressai,
pois cada intervalo atende a um tipo especial de interesse.
Quando faz pausa durante o trabalho é denominado intervalo para
descanso e/ou alimentação, inclusive por imposição típica do labor em
algumas atividades. Nessas, são as situações próprias dos digitadores, dos
trabalhadores em câmaras frigoríficas, dos cortadores de cana, dos motoristas
de ônibus e caminhões, dos mergulhadores enquanto profissionais, daqueles
que trabalham em minas de carvão e em outras atividades insalubres ou
perigosas.
Intervalo é a liberação do homem do seu trabalho. È a obrigação de
fazer pausas nas suas atividades, não importando quais sejam, em prol de um
equilíbrio orgânico necessário.
12
Robert Castel, em seu trabalho sobre a relação salarial francesa,
referência nas ciências sociais, mostra a evolução e a constituição da
“sociedade salarial” moderna, registrando quanto à pausa, in verbis:
[...] Parece que as primeiras “cabalas” ilícitas de
companheiros tenham sido desencadeadas muito mais
para controlar o tempo de trabalho do que para obter um
aumento dos salários. [...] O sindicalismo do início do
século faz do repouso semanal (conquistado em 1906) e
da jornada de 8 horas uma de suas principais
reivindicações, a única talvez, para os sindicalistas de
ação direta, que não seja “reformista”. [...]. Porém, mais
simbolicamente significativa do que a redução do tempo
de trabalho (a semana de 40 horas é conquistada em
junho de 1936), mais profundamente libertadora do que o
acesso ao consumo permitido pelo aumento dos salários,
a remuneração de um tempo livre equivale a um
reconhecimento oficial da humanidade do trabalhador e
da dignidade humana do trabalho. 1
Contudo, em determinados momentos da vida do trabalhador, este tem
sua preocupação muito mais voltada para o dinheiro e entes familiares. Isso é
mais forte do que pensar no seu descanso. Por esses faz qualquer sacrifício,
até impensados. Não descansa e não se alimenta com qualidade, sob o
auspício de melhores dias. Esquece que está se sacrificando e, não raro, a
segurança dos seus colegas e pondo em risco a atividade produtiva, alijando,
inclusive, a segurança das comunidades próximas do empreendimento.
1 ROBERT CASTEL, As metamorfoses da questão social: uma crônica do salário, Editora
Vozes, Petrópolis, 1998, p. 438/439.
13
O homem precisa de trabalho, consumo, habitação e instrução, e ainda
de lazer, de sua integração social e de sua religião. A alimentação é
necessidade inerente a todos. O descanso está ligado à atividade laboral.
A CRFB manda em seu artigo 7º, inciso XXII:
“redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de
normas de saúde, higiene e segurança”.2
A previsão insculpida no artigo 71 e parágrafos, da CLT, é fazer do
tempo de intervalo intrajornada como de descanso e refeição obrigatórios. É
imposição que o trabalhador, não raramente, em muitos setores econômicos,
não sabe aquilatar. Remunerado ou não, com ou sem efeito suspensivo ou
interruptivo do contrato de trabalho, a norma retira do patrão o seu poder de
dispor da força do trabalho do empregado. O jus variandi 3 aqui é limitado. Por
sua vez, o obreiro tem a obrigação legal de se abster do labor. É uma
interferência contundente da ordem pública no contrato de trabalho. Qualquer
alteração entra na esfera do risco. E risco pode levar a dano. E dano leva a
responsabilidade, em todas as esferas de todos que o perpetraram. A lei tutela
mais que os direitos subjetivos do empregado.
De uma análise sistêmica da norma do artigo 71, da CLT, conclui-se que
a lei não há margem para supressão do descanso intrajornada. Ela tem em
seu centro o comando para evitar situações como dos trabalhadores em
empresas que adotam o turno interrupto de revezamento, dos caminhoneiros e
dos motoristas de ônibus.
2 CLT-LTR, 35ª Edição, Editora LTR, São Paulo, 2008, p.6. 3 Jus variandi é o direito do empregador de alterar as condições de trabalho contratadas, dentro
do seu poder diretivo da empresa, considerando que é seu o risco da realização do
empreendimento, mas sem levar prejuízos ao trabalhador.
14
O intervalo para repouso e alimentação é forma de proteção do direito à
vida. Ilação hermenêutica sobre possibilidades de ampliação redução ou
supressão fora das suas bases é ilegal. A esse respeito o Tribunal Superior do
Trabalho editou a sua orientação jurisprudencial pela SBDI-I4, número 342,
publicada em 22/6/2004, vista adiante.
1.1. Os intervalos do trabalhador
No dizer de Mauricio Godinho Delgado:
Os períodos de descanso conceituam-se como lapsos
temporais regulares, remunerados ou não, situados intra
ou intermódulos diários, semanais ou anuais do período
de labor, em que o empregado pode sustar a prestação
de serviços e sua disponibilidade perante o empregador,
com o objetivo de recuperação e implementação de suas
energias ou de sua inserção familiar, comunitária e
política.5
4 SBDI-1 - Seção de Dissídios Individuais – I, do Tribunal Superior do Trabalho. 5 MAURICIO GODINHO DELGADO, Curso de Direito do Trabalho, 6ª edição, 2007, p 919.
15
Continua o jurisconsulto:
Intervalos e jornada, hoje, não se enquadram, porém,
como problemas estritamente econômicos, relativos ao
montante de força de trabalho que o obreiro transfere ao
empregador em face do contrato pactuado. É que os
avanços das pesquisas acerca da saúde e segurança no
cenário empregatício têm ensinado que a extensão do
contato do empregado com certas atividades ou
ambientes laborativos é elemento decisivo à configuração
do potencial efeito insalubre ou perigoso desses
ambientes ou atividades. Tais reflexões têm levado à
noção de que a redução da jornada em certas atividades
ou ambientes, ou a fixação de adequados intervalos no
seu interior, constituem medidas profiláticas importantes
no contexto da moderna medicina laboral. Noutras
palavras, as normas jurídicas concernentes à jornada e
intervalos não são, hoje, tendencialmente, dispositivos
estritamente econômicos, já que podem alcançar, em
certos casos, o caráter determinante de regras de
medicina e segurança do trabalho, portanto, normas de
saúde pública. (grifos originais) 6
6 MAURICIO GODINHO DELGADO, op. cit., p 921.
16
1.2. Objetivos específicos
A medida do intervalo é que atenderá às aspirações de vida do obreiro e
de sua atividade produtiva. O dia a dia é toda a vida do trabalhador. Entre um
dia trabalho e outro, e no curso deste, tem ele intervalos previsto em leis. O fim
de semana é o ápice do descanso, sobretudo mental e espiritual. Tem os dias
de domingo, ainda que seja um só domingo para os trabalhadores em
atividades especiais. Aqueles intervalos no curso laboral da semana é a pausa
mais experimentada. As férias anuais significam o total afastamento do
trabalho, voltando-se inteiramente o trabalhador para o seu lado pessoal. As
pausas ficam à mercê do devido cumprimento das normas contratuais. Tem,
também, o descanso nos dias de feriados civis e religiosos em que é vedado o
labor, para que, como cidadão, participe das festas e solenidades coletivas
(políticas, cívicas e religiosas). Toda parada é salutar numa visão estritamente
biológica.
Trabalhos em condições insalubres e perigosas reclamam mais atuação
fiscalizadora estatal. A salvaguarda do interesse público se sobrepõe. Há o
espaço aberto a possibilidade de negociação sindical, contudo nos limites da
norma e princípios de proteção à vida humana. São as normas imperativas e
intransponíveis quanto à segurança e higidez no trabalho.
O intervalo quando ocorre entre um turno e outro de trabalho é
denominado “intervalo interjornada”. O artigo 66, da CLT, manda que ele deva
ser de no mínimo 11 horas, contados a partir da última hora trabalhada,
inclusive hora extra. Nos casos de Repouso Semanal Remunerado (RSR), às
11 horas serão acrescidas às 24 horas do repouso, devendo o trabalhador
retornar ao trabalho nessa ocasião somente após 35 horas de labor. Sobre ele,
foi editada recentemente a orientação jurisprudencial de nº 355, do SDI-1, do
TST:
17
Nº 355 INTERVALO INTERJORNADAS.
INOBSERVÂNCIA. HORAS EX-TRAS. PERÍODO PAGO
COMO SOBREJORNADA. ART. 66 DA CLT.
APLICAÇÃO ANALÓGICA DO § 4º DO ART. 71 DA CLT.
DJ 14.03.2008. O desrespeito ao intervalo mínimo
interjornadas previsto no art. 66 da CLT acarreta, por
analogia, os mesmos efeitos previstos no § 4º do art. 71
da CLT e na Súmula nº 110 do TST, devendo-se pagar a
integralidade das horas que foram subtraídas do intervalo,
acrescidas do respectivo adicional.7
Veja-se, a propósito, a Súmula nº 110, do TST:
Nº 110 JORNADA DE TRABALHO. INTERVALO
(mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003
No regime de revezamento, as horas trabalhadas em
seguida ao repouso semanal de 24 horas, com prejuízo
do intervalo mínimo de 11 horas consecutivas para
descanso entre jornadas, devem ser remuneradas como
extraordinárias, inclusive com o respectivo adicional.
Histórico: Redação original-RA 101/1980, DJ 25.09.1980.8
7OJ nº 355, do SBDI-1, do TST, extraída do site da internet do Colendo Tribunal Superior do
Trabalho. 8 Súmula nº 110, do TST, extraída do site da internet do Colendo Tribunal Superior do Trabalho.
18
1.3. O intervalo intrajornada
O intervalo intrajornada é aquele que é feito dentro da própria duração
diária de trabalho. Normalmente suspende a execução do contrato de trabalho,
pois paralisa a atividade do trabalhador, não decorrendo a obrigação legal do
patrão de pagar o salário correspondente ao lapso temporal. O seu período
temporal varia de acordo com a duração da jornada de trabalho. Os intervalos
não podem ser concedidos no início ou término do trabalho, pois não
representam pausa para repouso. Também não podem ser divididos, devendo
corresponder a um período mínimo de 15 minutos ou uma hora,
ininterruptamente. Não há intervalo em jornada igual ou inferior a quatro horas.
A legislação prevê que em certas atividades haverá outros períodos de
intervalo intrajornada devido à natureza do serviço. São os casos de
interrupção do contrato de trabalho, para os quais são mantidas as cláusulas
remuneratórias. Nos serviços de mecanografia, datilografia e digitação, por
exemplo, a cada período de 90 minutos de trabalho consecutivo haverá um
intervalo de 10 minutos. Nos serviços em frigorífico, em que os empregados
trabalham em câmara fria, havendo movimentação de mercadorias do
ambiente quente ou normal para o frio, e vice-versa, será concedido um
intervalo de 20 minutos após 1 hora e 40 minutos de trabalho contínuo. Os
trabalhadores em minas de subsolo terão um intervalo de 15 minutos para
cada 3 horas consecutivas de trabalho. A mulher que está em fase de
amamentação possuindo filho de até seis meses de idade, terá dois intervalos
especiais de 30 minutos cada. Esses intervalos, com exceção do referente à
mulher em amamentação, não são deduzidos da duração normal de trabalho.
Os demais intervalos não previstos em lei são considerados como tempo de
serviço à disposição do empregador, devendo ser remunerados como horas
extras, se acrescidos ao final da jornada.
19
1.4. A resistência à obrigação biológica de descanso e
alimentação
Pelo disposto no § 4º, do artigo 71, da CLT, a par de qualquer multa
imposta ao empregador, o empregado fará jus ao pagamento do intervalo para
repouso e alimentação não concedido com, no mínimo, 50% de acréscimo
sobre o valor da hora normal de trabalho. Sobre isso, Alice Monteiro de Barros
assim se manifestou:
A inserção do referido § 4º no art. 71 da CLT estimula
o empregado a trabalhar nos intervalos para refeição,
em detrimento de sua própria saúde. O mais correto
teria sido manter-se a redação anterior, mas
elevando-se as multas administrativas na hipótese de
violação aos preceitos que dispõem sobre pausas e
descansos. (grifos originais) 9
O TST tem a seguinte posição a esse respeito, conforme a orientação
jurisprudencial nº 307, da SBDI-1:
9 ALICE MONTEIRO DE BARROS, Curso de Direito do Trabalho, Editora LTR, São Paulo, 3ª
edição, 2007, p. 669.
20
Nº 307 INTERVALO INTRAJORNADA (PARA REPOUSO
E ALIMENTAÇÃO). NÃO CONCESSÃO OU
CONCESSÃO PARCIAL. LEI Nº 8.923/1994. DJ
11.08.03. Após a edição da Lei nº 8.923/1994, a não-
concessão total ou parcial do intervalo intrajornada
mínimo, para repouso e alimentação, implica o
pagamento total do período correspondente, com
acréscimo de, no mínimo, 50% sobre o valor da
remuneração da hora normal de trabalho (art. 71 da
CLT).10
10 OJ nº 307, do SDI-I, do TST, extraída do site da internet do Colendo Tribunal Superior do
Trabalho.
21
CAPÍTULO II
LEGISLAÇÃO E PRINCÍPIOS DE DIREITO DO
TRABALHO SOBRE O INTERVALO INTRAJORNADA
2.1. Tipos de intervalo intrajornada
Os intervalos intrajornadas podem ser do tipo comum, quando atendem
às diversas formas da atividade laborativa. Especiais, quando atendem às
necessidades de determinadas categorias profissionais. Remunerados, por
atender exigências que o trabalho impõe, integrando no cômputo do tempo
diário à disposição do empregador. E aqueles não remunerados, que
constituem o padrão básico de intervalo – tempo livre do trabalhador, para
descanso e alimentação precipuamente.
2.2. Artigo 71, da CLT (intervalo durante o trabalho)
Art. 71. Em qualquer trabalho contínuo, cuja duração
exceda de seis horas, é obrigatória a concessão de um
intervalo para repouso ou alimentação, o qual será, no
mínimo, de uma hora e, salvo acordo escrito ou contrato
coletivo em contrário, não poderá exceder de duas horas.
§ 1º Não excedendo de seis horas o trabalho, será,
entretanto, obrigatório um intervalo de quinze minutos
quando a duração ultrapassar quatro horas.
§ 2º Os intervalos de descanso não serão computados na
duração do trabalho.
22
§ 3º O limite mínimo de uma hora para repouso ou
refeição poderá ser reduzido por ato do Ministro do
Trabalho, quando, ouvido o Departamento Nacional de
Higiene e Segurança do Trabalho (DNHST) (atualmente
Secretaria de Segurança do Trabalho – SSMT), se
verificar que o estabelecimento atende integralmente às
exigências concernentes à organização dos refeitórios e
quando os respectivos empregados não estiverem sob
regime de trabalho prorrogado a horas suplementares.
§ 4º Quando o intervalo para repouso e alimentação,
previsto neste artigo, não for concedido pelo empregador,
este ficará obrigado a remunerar o período
correspondente com um acréscimo de no mínimo
cinqüenta por cento sobre o valor da remuneração da
hora normal de trabalho.11
2.3. Súmula 118, do TST (intervalos não previstos em lei)
A concessão de intervalos não previstos em lei, por parte do
empregador, na jornada de trabalho, representa tempo à disposição da
empresa, remunerado como serviço extraordinário, se acrescido ao final da
jornada. A interpretação jurisprudencial da Súmula 118 decorre da aplicação
do art. 4º, caput, da CLT, onde se tem que a jornada de trabalho compreende
o lapso temporal em que o empregado está à disposição do empregador,
executando ou aguardando ordens.
11 CLT-LTR, op. cit., p. 45/46.
23
2.4. O princípio da adequação setorial negociada
O trabalhador é impossibilitado de renunciar os seus direitos firmados
em lei, atraindo a invalidade absoluta de qualquer ajuste com o patrão nesse
sentido. Da mesma forma, não pode transacioná-los, sem previsão em norma
coletiva de trabalho, e sem que lhe traga prejuízos. Nesse patamar de idéias
poderá uma norma autônoma coletiva levar alterações ao caráter heterônomo
contido no artigo 71, da CLT? Pelo princípio de direito da adequação setorial
negociada não.12 Isso porque, à luz desse princípio, só haveria possibilidade
nos casos em que a norma coletiva contemplasse direitos superiores ao
padrão permitido em lei, e a transação versasse tão-somente sobre direitos de
indisponibilidade relativa. Posto assim é inviável, já que as normas
concernentes à integralidade da saúde do obreiro e sua segurança são de
indisponibilidade absoluta.
2.5. O princípio da norma mais favorável ao trabalhador
A legislação heterônoma consolidada, e outras esparsas que tratam da
questão do descanso de determinadas categorias profissionais, são
balizadoras dos direitos mínimos do trabalhador. Diante disso, normas
autônomas coletivas mais vantajosas são aceitas pelo Direito do Trabalho
pátrio. Situação em contrário, consideradas as normas prejudiciais ao obreiro,
são passíveis de nulidade, conforme previsão do artigo 468, da CLT.
2.6. Artigos 1º, III, e 170, caput, da Constituição Federal (CRFB)
Cuidam do princípio da dignidade da pessoa humana e da valorização
do seu trabalho.
12 Mauricio Godinho Delgado, op. cit., p. 923/925
24
2.7. Artigo 72, da CLT, e Súmula nº 346, do TST (digitadores)
Determina a concessão de intervalo de 10 (dez) minutos a cada período
de 90 (noventa) minutos nos serviços permanentes de mecanografia –
datilografia, escrituração ou cálculo, remunerado e computado na jornada de
trabalho. O Colendo órgão do TST aplicou-o aos digitadores, por analogia. Eis
o entendimento:
Nº 346 DIGITADOR. INTERVALOS INTRAJORNADA.
APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 72 DA CLT.
Histórico: Redação original - Res. 56/1996, DJ 28.06, 03,
04 e 05.07.1996. Os digitadores, por aplicação analógica
do art. 72 da CLT, equiparam-se aos trabalhadores nos
serviços de mecanografia (datilografia, escrituração ou
cálculo), razão pela qual têm direito a intervalos de
descanso de dez (10) minutos a cada noventa (90) de
trabalho consecutivo.13
2.8. Artigo 7º (VI, XIII, XIV), da Constituição Federal (CRFB)
Da norma do artigo 7º, da CRFB, 3 (três) incisos prevêem a negociação
coletiva de trabalho para regulação de matéria que especifica. Trata-se dos
incisos VI XIII e XIV a seguir:
13 Súmula do TST, extraída do site da internet do Colendo Tribunal Superior do Trabalho.
25
Artigo 7º - São direitos dos trabalhadores urbanos e
rurais, além de outros que visem à melhoria de sua
condição social:
VI - irredutibilidade do salário, salvo o disposto em
convenção ou acordo coletivo;
XIII - duração do trabalho normal não superior a oito
horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a
compensação de horários e a redução da jornada,
mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho;
XIV - jornada de seis horas para o trabalho realizado em
turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação
coletiva.14
Sobre turnos interruptos de revezamento, veja-se a súmula 360:
Nº 360 TURNOS ININTERRUPTOS DE
REVEZAMENTO. INTERVALOS INTRAJORNADA E
SEMANAL. Histórico: Redação original - Res. 79/1997, DJ
13, 14 e 15.01.1998. A interrupção do trabalho destinada
a repouso e alimentação, dentro de cada turno, ou o
intervalo para repouso semanal, não descaracteriza o
turno de revezamento com jornada de 6 horas previsto no
art. 7º, inciso XIV, da Constituição da República de
1988.15
14 CLT-LTR, op cit., p. 6. 15 Súmula do TST, extraída do site da internet do Colendo Tribunal Superior do Trabalho.
26
Também editou recentemente a OJ de nº 36, da SBDI-1, a seguir:
Nº 360 TURNO ININTERRUPTO DE REVEZAMENTO.
DOIS TURNOS. HORÁRIO DIURNO E NOTURNO.
CARACTERIZAÇÃO. DJ 14.03.2008. Faz jus à jornada
especial prevista no art. 7º, XIV, da CF/1988 o trabalhador
que exerce suas atividades em sistema de alternância de
turnos, ainda que em dois turnos de trabalho, que
compreendam, no todo ou em parte, o horário diurno e o
noturno, pois submetido à alternância de horário
prejudicial à saúde, sendo irrelevante que a atividade da
empresa se desenvolva de forma ininterrupta.16
2.9. Artigo 298, da CLT (trabalhadores em minas de subsolo)
O labor em minas de subsolo terá uma pausa especial de 15 minutos
em cada período de 3 horas consecutivas de trabalho. Trata-se de intervalo
especial, computando-se na duração normal de trabalho, portanto remunerado.
2.10. Artigo 5º, da lei 5.889/73 (sobre os rurícolas)
Ao contrário do trabalhador urbano, no trabalho contínuo, de duração
superior a seis horas, o empregado rural terá um intervalo para repouso e
alimentação, observado os usos e costumes da região, não sendo computado
na duração do trabalho.
16 Súmula do TST, extraída do site da internet do Colendo Tribunal Superior do Trabalho.
27
2.11. Artigo 229, da CLT (telefonia)
Cuida do intervalo dos empregados nos serviços de telefonia, de
telegrafia submarina e subfluvial, de radiotelegrafia e radiotelefonia. Determina
20 minutos de descanso em cada 3 horas de esforço contínuo, para
empregados sujeitos a horários variáveis (jornada de 7 horas). Remunerado.
2.12. Lei 8.923, de 27-7-1994
Acrescentou o § 4º ao artigo 71, da CLT, decorrendo o cancelamento da
súmula nº 88, do E. TST, que até então entendia que o obreiro não teria direito
a ressarcimento pelo desrespeito ao intervalo legal, salvo se importasse em
acréscimo na jornada efetivamente trabalhada. O entendimento era que seria
apenas caso de multa, por infração ao texto de lei
2.13. Quanto aos empregados domésticos
Sua base legal é a Constituição Federal de 1988, Lei n.° 5.859/72,
regulamentada pelo Decreto n.° 71.885/73 e alterada pela Lei n.° 10.208/01 e
pelo seu regulamento, o Decreto n.° 3.361/00, e pela Lei n. 11.324/2006. Tem
o direito de não trabalhar em feriados civis e religiosos, ou a receber em dobro
esses dias trabalhados, ou os dias de repouso remunerado, caso não sejam
compensados com folgas compensatórias, uma vez que revogado o teor do
art. 5º da Lei n.° 605/49 (trata do repouso remunerado), que excluía o
empregado doméstico de sua incidência. Não tem intervalo intrajornada
previsto em lei.
28
2.14. Artigo 253, da CLT (câmaras frias)
Impõe a concessão de um intervalo de 20 minutos para cada 1 (uma)
hora e 40 (quarenta) minutos para os trabalhadores em câmaras frias.
2.15. Artigo 224, § 1, da CLT; Orientação jurisprudencial nº 178,
da SBDI-1, do TST (bancários)
O bancário sujeito a seis horas de trabalho, não terá computado em sua
jornada o período de 15 minutos destinados para lanche ou descanso.
2.16. Orientação Jurisprudencial nº 342 da SDI-I, do TST
O Colendo TST nega ser possível a negociação coletiva sobre o
intervalo destinado a repouso e alimentação dentro da jornada:
Nº 342 INTERVALO INTRAJORNADA PARA REPOUSO
E ALIMENTAÇÃO. NÃO CONCESSÃO OU REDUÇÃO.
PREVISÃO EM NORMA COLETIVA. VALIDADE. DJ
22.06.04. É inválida cláusula de acordo ou convenção
coletiva de trabalho contemplando a supressão ou
redução do intervalo intrajornada porque este constitui
medida de higiene, saúde e segurança do trabalho,
garantido por norma de ordem pública (art. 71 da CLT e
art. 7º, XXII, da CF/1988), infenso à negociação
coletiva.17
17 OJ nº 342, da SBDI-1, do TST, extraída do site da internet do Colendo Tribunal Superior do
Trabalho.
29
2.17. Convenção nº 171, da OIT, de 1990; Decreto 5.005, de 8 de
março de 2004 (trabalhador noturno)
Dentre as medidas de proteção do trabalho noturno, exige a
manifestação dos representantes sindicais acerca dos detalhes dos horários
de trabalho, bem como sobre as medidas de saúde e serviços sociais. È um
trabalho, do ponto de vista médico, que deveria ser proibido, pois atenta contra
o equilíbrio biológico do homem.
2.18. Portaria nº 42, de 28 de março de 2007, do Ministério do
Trabalho e Emprego
Reconhece a validade de norma coletiva que reduz o intervalo para
repouso ou alimentação, impondo a condição do preceituado no § 3º, do artigo
71, da CLT (o empregador terá de ter refeitório próprio, na forma da lei, e os
trabalhadores não realizarem horas extras).
Observa Cláudia José Abud: “Nessa toada, várias convenções coletivas
de trabalho têm fixado cláusulas que prevêem a redução e a exclusão de
intervalos para descanso e refeição, sem autorização do órgão oficial, [...]. 18
2.19. Orientação jurisprudencial 354 da SBDI-1, do TST
Entende o Egrégio órgão do TST que a natureza da parcela paga a título
de não concessão do intervalo intrajornada é salarial. Por corolário,
repercutindo nas demais verbas. Eis a redação:
18 CLÁUDIA JOSÉ ABUD, Jornada de Trabalho e a Compensação de Horários, Editora Atlas
S.A., São Paulo, 2008, p 154.
30
Nº 354 INTERVALO INTRAJORNADA. ART. 71, § 4º, DA
CLT. NÃO CON-CESSÃO OU REDUÇÃO. NATUREZA
JURÍDICA SALARIAL. DJ14. 03.2008. Possui natureza
salarial a parcela prevista no art. 71, § 4º, da CLT, com
redação introduzida pela Lei nº 8.923, de 27 de julho de
1994, quando não concedido ou reduzido pelo
empregador o intervalo mínimo intrajornada para repouso
e alimentação, repercutindo, assim, no cálculo de outras
parcelas salariais. 19
2.20. O princípio da razoabilidade
Neste contexto, liga-se ao exercício do jus variandi do empregador.
Dentro de seu poder de organização das atividades da empresa (artigo 2º, da
CLT), poderá ele alterar os horários de intervalo. Contudo, deve exercê-lo
razoavelmente, com razões justas e legais, que lhe darão azo na realização
dos seus objetivos. Deverá, assim, pautar sua conduta diante também das
razões que possam ser invocadas pelo seu empregado, aquilatando se a
medida a ser implementada causará prejuízos à saúde do obreiro,
desproporcionais ao fim colimado. O gerenciamento do negócio, assim,
ocorrerá em bases razoáveis e não arbitrárias, que possam desaguar no poder
judiciário.
19 OJ nº 354, da SBDI-1, do TST, extraída do site da internet do Colendo Tribunal Superior do
Trabalho.
31
2.21. O princípio da irrenunciabilidade
É uma decorrência do caráter de ordem pública que têm as disposições
do direito do trabalho. As regras de intervalo não podem ser descartadas pelo
operário por contratos individuais ou coletivos. Reflete a necessidade de se
proteger um mínimo indispensável ao hipossuficiente. É a salvaguarda máxima
de proteção das normas trabalhistas contra fraudes à lei, também no que se
refere à proteção das políticas sociais.
2.22. Novação
É a modificação das condições de trabalho. É a substituição de alguns
direitos por outros que pode ser, para o trabalhador, melhor, pior ou igual ao
que se abandona. No dizer de Américo Plá Rodrigues “Deve-se evitar que se
pretenda elidir normas inderrogáveis ou que sejam afetados benefícios que
são totalmente indisponíveis.” 20
2.23. Artigo nº 384, da CLT (intervalo da mulher)
Trata da obrigatoriedade de um descanso de 15 (quinze) minutos antes
do início do horário extraordinário de trabalho.
20 AMÉRICO PLÁ RODRIGUEZ, Princípios de Direito do Trabalho, Editora LTR, São Paulo, 3ª
tiragem, 1994, p. 113.
32
CAPÍTULO III
INTERVALO INTRAJORNADA E OPOSIÇÃO PATRONAL
3.1. Exemplos práticos
Cerca de 90% da demandas trabalhistas ocorrem por irregularidades do
horário de trabalho. Mais precisamente sobre horas extras ditas trabalhadas e
não remuneradas.21
Reportagem de jornal intitulada “UMA TRAGÉDIA BRASILEIRA – Um
terço dos acidentes envolve caminhões”:
[...] do total de acidentes nas estradas, mais de um terço
(36%) envolve veículos de carga. A falha humana é causa
de 66% dos desastres. E mais: nos acidentes com
vítimas, 41% dos motoristas disseram estar alcoolizados.
O resultado está na pesquisa “Custos e causas dos
acidentes rodoviários: O Brasil e o mundo”, organizada
pela Coppead da Universidade Federal do Rio de Janeiro,
com dados de 2005. Tombamento é o tipo de acidente
mais freqüente – O tipo de acidente mais comum,
segundo a pesquisa, é o tombamento (47%), em seguida
aparece o abalroamento (27%). [...] A imprudência (43%)
é a principal causa dos erros humanos ao volante.
21 ABADI, reportagem de 9/8/2008, Jornal “O Globo”, fls. 18.
33
Entre os motoristas envolvidos em acidentes, 57%
disseram estar em velocidade incompatível. [...] da frota
de 923 mil caminhões, 722 mil pertencem a autônomos,
segundo a Federação Interestadual dos Transportadores
Rodoviários Autônomos de Bens (Fenacam). [...] A
velocidade também agrava as consequências dos
desastres. Entre os que resultaram em mortes, 21%
foram causados por velocidade incompatível. Já nos sem
vítimas, 10% estavam em alta velocidade. Contribuem
ainda para a equação [...] a falta de treinamento e a
excessiva carga de trabalho a que são submetidos os
motoristas. [...] A carga horária de um caminhoneiro varia
entre 16 e 18 horas diárias. [...] Normalmente os que
chegam mais cedo ao destino recebem uma bonificação
das empresas para quem prestam serviços. [...] os
entorpecentes acabam se tornando um recurso para o
motorista se manter acordado. (grifado)
(Em ANEXO 1, encontra-se uma cópia da publicação de
uma entrevista com caminhoneiro de carga sobre jornada
de trabalho e relação com o empregador).22
3.2. A doutrina
Podem os acordos e convenções coletivas de trabalho reduzir ou
mesmo suprimir o intervalo intrajornada?
22 Reportagem publicada por “O GLOBO”, edição de 12/10/2007, p 13, com o tema “UMA
TRAGÉDIA BRASILEIRA – Um terço dos acidentes envolve caminhões”.
34
A essa indagação, Alice Monteiro de Barros responde que não,
observando que a Constituição Federal admite a flexibilização da jornada, no
artigo 7º, inciso XIV. Mas assevera que as normas que regulam a medicina e
segurança no trabalho não estão afetas à negociação sindical, sendo elas de
ordem pública. Lembra que a finalidade do intervalo intrajornada, bem como o
interjornada, é permitir que o trabalhador tenha a oportunidade de alimentar-
se, descansar e repor suas energias. Não admite a flexibilização da jornada
sob o prisma da teoria do conglobamento, por tratar-se de preceito imperativo
indisponível pela vontade das partes.23
Corrobora esse entendimento a doutrina de Carlos Maximiliano, para
quem estaremos diante de prescrições de ordem pública quando se constata
que a tutela do interesse é o da sociedade, acima de tudo, sendo esse o fim
principal do preceito obrigatório. Ressalta que, em caso de dúvida de
interpretação, a disposição de ordem pública deve ceder às regras de natureza
privada, considerando a tutela geral como limitadora de direito. Nesse passo,
teríamos a adoção das normas coletivas de trabalho. Salienta, porém, que as
normas que cercam de garantias o trabalho, com providências sobre horários,
higiene e acidentes de trabalho, são de ordem pública e estão dentro do
domínio do direito público. Observa o jurista que:
Em todo caso, o fim da lei e o modo pelo qual está
formulada a prescrição obrigatória indicam, melhor do que
qualquer preceito, se a mesma pode, ou não, ser pelos
particulares postergada, se é lícito ao indivíduo dispor ou
convencionar em desacordo com a norma (4). (grifos
originais) 24
23 ALICE MONTEIRO DE BARROS, op cit, p. 666 e 667. 24 CARLOS MAXIMILIANO, Hermenêutica e Aplicação do Direito, 9ª edição, 1981, p 220.
35
3.3. jurisprudência do TST
Processo nº TST-RR-1393/2005-003-24-00, publicação
de 27/10/2006, da 4ª Turma: [...] INTERVALO
INTRAJORNADA. REDUÇÃO VIA CONVENÇÃO
COLETIVA DE TRABALHO. EMPREGADOS EM
EMPRESAS DE TRANSPORTE URBANO COLETIVO.
VALIDADE. I - O Colegiado de origem excluiu da
condenação o pagamento de uma hora diária acrescida
de 50%, fundamentado na validade da cláusula
convencional que reduzira o intervalo intrajornada dos
empregados de empresas de transporte urbano coletivo.
II - A Orientação Jurisprudencial nº 342/SBDI-1 do TST foi
baixada tendo em conta o padrão da empresa que opera
mediante unidade técnica fixa, em relação à qual se torna
inteligível a norma do § 3º, do art. 71, da CLT, em que se
previu a possibilidade de redução do intervalo mínimo de
uma hora se constatado que o estabelecimento atende
integralmente as exigências relativas à organização de
refeitórios. III - Não sendo materialmente possível a
existência de refeitório no caso de empresas de
transporte de passageiros, decorrente da própria natureza
da sua atividade, é de se admitir excepcionalmente a
validade de cláusula convencional em que tenha sido
ajustada a redução do intervalo intrajornada, mesmo sem
a intervenção do Ministério do Trabalho. IV - Isso não só
em razão da prevalência da vontade coletiva privada,
consagrada no art. 7º, XXVI da Constituição Federal,
como também porque restou evidente no acórdão
regional que a redução do intervalo, além de não implicar,
objetivamente, prejuízo à saúde e segurança dos
36
motoristas e cobradores, veio ao encontro dos seus
interesses, na medida em que, liberados de um recesso
forçado de uma hora, são beneficiados com um menor
tempo a disposição do empregador com o conseqüente
elastecimento do tempo para proveito próprio e convívio
familiar. V - Diante do exposto, é de se concluir que, em
se tratando de empresa de transporte público local, deve
ser respeitada a norma instituída por Convenção Coletiva
de Trabalho que estipula a redução do intervalo
intrajornada, não se divisando contrariedade à Orientação
Jurisprudencial nº 342/SBDI-1 do TST, tampouco violação
aos arts. 71, § 4º, da CLT e 7º, XXII, da Carta Magna. VI
Recurso integralmente não conhecido. Vistos, relatados e
discutidos estes autos de Recurso de Revista, nº TST-
RR-1393/2005-003-24-00.0, em que é Recorrente
CLAUDIVAL ZANDONA e Recorrida JAGUAR
TRANSPORTES URBANOS LTDA. O TRT da 24ª
Região, emprestando validade à cláusula convencional
que reduziu o intervalo intrajornada dos motoristas, deu
provimento ao recurso ordinário da reclamada, para
excluir da condenação o pagamento de uma hora diária
com adicional de 50%. O reclamante interpõe recurso de
revista às fls. 769/774, com fulcro nas alíneas a e c do art.
896 da CLT. Admitido pelo despacho de fls. 776/778, o
apelo recebeu razão de contrariedade às fls. 780/809
Dispensada a remessa dos autos ao Ministério Público do
Trabalho, na forma do art. 82 do Regimento Interno do
TST. É o relatório. [...] 1.2 INTERVALO INTRAJORNADA.
REDUÇÃO VIA CONVENÇÃO COLETIVA DE
TRABALHO. EMPREGADOS EM EMPRESAS DE
TRANSPORTE URBANO COLETIVO. VALIDADE. O
37
Colegiado de origem excluiu da condenação o pagamento
de uma hora diária acrescida de 50%, fundamentado na
validade da cláusula convencional que reduzira o intervalo
intrajornada dos empregados de empresas de transporte
urbano coletivo, conforme fls. 760/761: Analisando-se
perfunctoriamente essa cláusula convencional, nota-se,
em tese, a inobservância ao art. 71 da CLT, que exige a
concessão de um intervalo para repouso ou alimentação
de, no mínimo, uma hora para a jornada de trabalho que
exceda seis horas. Contudo, essa cláusula contempla
situação específica do serviço dos trabalhadores em
transporte coletivo urbano, peculiaridade que exige
tratamento diferenciado conforme estipularam as partes.
A Constituição Federal atribuiu amplos poderes aos
sindicatos, incumbindo-os de proceder à defesa dos
interesses da categoria que representam (art. 8º, III) e,
inclusive, dispor sobre a redutibilidade salarial (art. 7º, VI).
Impõe-se, portanto, o reconhecimento das deliberações
pactuadas nesses instrumentos normativos (art. 7º,
XXVI), por representarem a vontade das partes. Por outro
lado, não há notícia de que a prática da jornada contínua
de sete horas e vinte minutos diários tenha prejudicado a
saúde dos trabalhadores no transporte coletivo urbano,
mormente porque é adotada desde meados de 1989
(cópia do acordo em dissídio coletivo às f. 98-99),
demonstrando que foram atendidas as necessidades dos
trabalhadores, devendo ser prestigiado o princípio da
boa-fé, que rege toda a espécie de contrato. Além disso,
é fato público e notório a ocorrência de paradas nos
pontos finais de cada linha de ônibus, o que propicia o
descanso dos trabalhadores durante a jornada de
38
trabalho. O reclamante pugna pela reforma do julgado,
asseverando que a Constituição Federal/88 não autoriza
a celebração de negociação coletiva que atente contra
normas referentes à segurança e saúde no trabalho,
direitos indisponíveis ligados à higidez física e mental do
trabalhador. Aponta aresto à divergência, contrariedade à
Orientação Jurisprudencial nº 342/SBDI-1 do TST e
violação aos arts. 71, § 4º, da CLT e 7º, XXII, da
Constituição da República. O recurso não se viabiliza pela
via da alínea a do art. 896 da CLT, pois o único
paradigma colacionado é oriundo de Turma do TST.
Resta analisar, assim, a procedência da indicação de
mácula aos arts. 71, § 4º, da CLT e 7º, XXII, da
Constituição da República e de contrariedade à OJ nº
342/SBDI-1 do TST. Efetivamente a referida OJ firma a
tese de ser inválida cláusula de acordo ou convenção
coletiva de trabalho contemplando a supressão ou
redução do intervalo intrajornada, por envolver medida de
higiene, saúde e segurança do trabalho, garantida por
norma de ordem pública. O precedente, no entanto, foi
baixado tendo em conta o padrão da empresa que opera
mediante unidade técnica fixa, em relação à qual se torna
inteligível a norma do § 3º, do art. 71, da CLT, em que se
previu a possibilidade de redução do intervalo mínimo de
uma hora se constatado que o estabelecimento atende
integralmente as exigências relativas à organização de
refeitórios. Não sendo materialmente possível a
existência de refeitório no caso de empresas de
transporte de passageiros, decorrente da própria natureza
da sua atividade, é de se admitir excepcionalmente a
validade de cláusula convencional em que tenha sido
39
ajustada a redução do intervalo intrajornada, mesmo sem
a intervenção do Ministério do Trabalho. Isso não só em
razão da prevalência da vontade coletiva privada,
consagrada no art. 7º, XXVI da Constituição Federal,
como também porque restou evidente no acórdão
regional que a redução do intervalo, além de não implicar,
objetivamente, prejuízo à saúde e segurança dos
motoristas e cobradores, veio ao encontro dos seus
interesses, na medida em que, liberados de um recesso
forçado de uma hora, são beneficiados com um menor
tempo a disposição do empregador com o conseqüente
elastecimento do tempo para proveito próprio e convívio
familiar. Nesse sentido, em recente decisão do Processo
TST-ROAA-141.515/2004-900-01-00.5, em 9/3/2006, a
Seção Especializada em Dissídios Coletivos do TST
declarou que, para o pessoal do tráfego do transporte
coletivo urbano do Município do Rio de Janeiro, é válida a
cláusula de convenção coletiva de trabalho que suprimiu
o intervalo intrajornada de 1 hora, substituindo-o por uma
indenização pecuniária e mantendo o descanso de cinco
minutos ao final de cada viagem, ao mesmo tempo em
que reduziu a jornada de trabalho para quarenta e duas
horas semanais. Diante do exposto, é de se concluir que,
em se tratando de empresa de transporte público local,
deve ser respeitada a norma instituída por Convenção
Coletiva de Trabalho que estipula que fica mantida a
jornada de trabalho contínua de 07:20 h (sete horas e
vinte minutos) para motoristas, cobradores, fiscais e
tráfego abrangidos pelos sindicatos signatários,
permitidas jornadas de reforço e intervalos variados (fls.
760), não se divisando, assim, contrariedade à
40
Orientação Jurisprudencial nº 342/SBDI-1 do TST,
tampouco violação aos arts. 71, § 4º, da CLT e 7º, XXII,
da Carta Magna. Não conheço do recurso. ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros da 4ª Turma do Tribunal Superior
do Trabalho, por unanimidade, não conhecer
integralmente do recurso de revista. Brasília, 09 de
outubro de 2006. MINISTRO BARROS LEVENHAGEN
Relator.25
25 Acórdão TST-RR-1393/2005-003-24-00, extraído do site da internet do Colendo Tribunal
Superior do Trabalho.
41
CAPÍTULO IV
CONSEQUÊNCIAS DA AUSÊNCIA DE INTERVALO
INTRAJORNADA
4.1. O fenômeno da flexibilização das normas trabalhistas
É verificar a possibilidade ou não da flexibilização da norma geral tutelar
da segurança e saúde do trabalhador, nas diversas formas da atividade
laboral, vir a ser mais vantajosa aos anseios das categorias econômicas e
profissionais.
Existe a flexibilização das normas de trabalho, por meio de acordos
coletivos. Interpretações à parte, não podemos não escudar a norma
constitucional de redução dos riscos inerentes ao trabalho.
Distorcem e quebram as regras. Essas situações são perpetradas pelos
próprios interessados, que não prevêem adequadamente o resultado, quando
celebram os acordos e as convenções coletivas de trabalho.
É bem verdade que o fenômeno da flexibilização retrata a valorização da
autonomia sindical, quebrantando a rigidez das normas trabalhistas, conforme
normas constitucionais atinentes à espécie (incisos VI, XIII e XIV, do artigo 7º,
registrados anteriormente). Mas a CRFB estabeleceu áreas inatingíveis,
através de normas que devem ser indubitavelmente vistas como
assecuratórias de garantias mínimas a serem implementadas na relação
trabalhista. O legislador constituinte originário assim previu na Magna Carta de
1988, e o fez ao insculpir o inciso XXII, do artigo 7º. E normas mínimas, são
mínimas, não comportando alteração de espécie alguma.
42
Como regramento mínimo, ressalta-se, somente vantagens a mais é
permitido legislar particularmente, visando à melhoria das condições de vida do
trabalhador, categoricamente chamado de hipossuficiente. Assim, podem ser
objeto de flexibilização os salários e a duração da jornada nos turnos
ininterruptos de revezamento. Obviamente, até a legislação infraconstitucional
é passível de verificação de validade, ante a imperatividade e inderrogabilidade
das normas relativas à segurança e higiene do trabalho. Do seu
enquadramento nos ditames superiores da Constituição Federal, diz-se que a
norma vigente foi recepcionada pela lei maior.
Alguns entendem que artigo 8º, da Constituição Federal (CRFB),
conferiu plena liberdade aos sindicatos na celebração das negociações
coletivas, levando o poder judiciário a autorizar a flexibilização dos intervalos.
4.2. Os efeitos legais
O artigo 75 da CLT prevê multas a serem impostas pela fiscalização
trabalhista em caso de não observância do capítulo II do diploma consolidado,
que cuida da duração do trabalho. Mesmo sob o auspício do artigo 468 da
CLT, que cerca de nulidade qualquer alteração contratual que lhe seja
prejudicial, pode o obreiro, valendo-se do seu jus resistentiae, pleitear a
rescisão indireta do seu contrato de trabalho, a teor do disposto no artigo 483,
da CLT. Também poderá exigir perdas e danos em caso de responsabilidade
civil, objetiva para o empregador quanto à ilicitude do seu ato. E fará jus ao
valor da hora de descanso, nos moldes do artigo 71, § 4º, instituído pelo
legislador ordinário em 1994 (Lei nº. 8.993, de 27 de julho de 1994).
43
O Egrégio TRT da 3ª Região (Minas Gerais) tem a seguinte
jurisprudência:
Súmula 27 do TRT: concessão parcial de intervalo gera
direito a uma hora extra diária - 12.08.2008 - A 5ª Turma
do TRT-MG, aplicando a Súmula 27 deste Tribunal,
negou provimento ao recurso de uma empresa,
condenada ao pagamento integral do intervalo para
refeição e descanso ao reclamante, que exercia a função
de motorista e tinha direito a pausa mínima uma hora, já
que a sua jornada diária era superior a seis horas. Ao
contestar a ação, a reclamada alegou que o empregado,
na função de motorista, realizava serviço externo, não
sujeito à fiscalização. Afirmou, ainda, que as horas extras
prestadas pelo reclamante foram devidamente pagas ou
compensadas. A desembargadora relatora do recurso,
Lucilde D'Ajuda Lyra de Almeida, explica que o fato de o
reclamante prestar serviço externo não torna impossível a
fiscalização do horário, cabendo à reclamada produzir a
prova de que o intervalo era efetivamente gozado, o que
não foi feito. A relatora citou a Súmula 27 do TRT-MG,
pela qual a concessão parcial do intervalo intrajornada
mínimo gera para o empregado o direito ao pagamento,
como extra, da integralidade do período destinado ao
repouso e alimentação, nos termos do parágrafo 4º do
artigo 71 da CLT e da Orientação Jurisprudencial nº 307
da SBDI-I/TST. Nesse contexto, está descartado o
argumento de que o reclamante faz jus apenas ao tempo
não usufruído, uma vez que o §4º do artigo 71 da CLT
determina que a não concessão do intervalo intrajornada
44
implica na remuneração de todo o período com um
acréscimo de 50% sobre o valor da hora normal de
trabalho. Com base nesses fundamentos, a Turma negou
provimento ao recurso da reclamada, que deverá pagar,
como extra, uma hora diária a título de intervalo
intrajornada, acrescido do adicional de 50%, previsto nas
normas coletivas. Fonte: TRT3ª.26
26 Notícia publicada pela ANAJUSTRA, Associação Nacional dos Servidores da Justiça do
Trabalho, no site WWW.anajustra.org.br/mostra_notícia, de 12/8/2008.
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CONCLUSÃO
De uma leitura perfunctória do art. 71 da CLT, vemos que a todo
instante a lei fala em intervalo para descanso e refeição.
A princípio, a jornada de trabalho pode ser convencionada ao arbítrio
das partes, que entabularão o que bem convierem. Contudo, sob o enfoque
colocado, entendo deva ser observado o estatuído no art. 71, da CLT, que não
descurou, em nenhum momento, do intervalo para repouso e alimentação.
O art. 71, da CLT regula aspectos concernentes ao intervalo
intrajornada. É lei, dispositivo ordinário, de ordem pública, recepcionado que
está pela CRFB em seu art. 7º, inciso XXII. A Convenção Coletiva encontra
arrimo constitucional no inciso XXVI do art. 7º (reconhecimento das
convenções e acordos coletivos de trabalho), e tem regulação nos artigos 611
a 625, da CLT. O legislador flexibilizou, mas não previu a supressão desse
direito do obreiro. É disposição imperativa de ordem pública. Portanto não
pode deixar de haver o intervalo, na forma prescrita em lei.
Como nenhuma lei é, em princípio, inconstitucional, posto que da Lei
Maior seja uma decorrência, se uma delas – lei ou convenção coletiva de
trabalho desvincular-se das injunções sociais e jurídicas e ferir a Constituição
Federal, estará fadado a ser invalidada quando submetida ao princípio da
legalidade. Em face do ordenamento jurídico pátrio, ambas ingressaram no
universo típico da relação contratual do trabalho de modo subordinadas à Lei
Maior, sem que uma ignore a outra como estranha ao sistema, pois, tem
existência, tem seu papel como norma prevista constitucionalmente. Ainda que
não digam respeito à sua forma, o seu conteúdo tem validade jurídica ditada
pela nossa Lei Soberana.
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Verificado a coexistência das duas normas (função normativa
concorrente) 27, logicamente a questão enseja aparente conflito - a inexistência
de intervalo de descanso e/ou refeição, ajustada pelas partes convenentes. Porém, o direito funciona em um complexo sistema onde o funcionamento de
uma norma é o fundamento de outra. E, no Estado de Direito, não podemos
descuidar de pensar que uma norma impõe-se isoladamente. As leis ordinárias
e as convenções coletivas estão no mesmo patamar da hierarquia das normas
dentro da pirâmide jurídica, amparadas na juridicidade da norma maior, a
Constituição Federal. Ambas são legais, a princípio válidas, e devem coexistir
fulcradas uma nas outras.
O estabelecido numa convenção não torna inoperante a regra definida
em lei. O art. 71, da CLT, além de norma de ordem pública, não é permissivo
quanto à supressão do intervalo intrajornada. Não há margem para
convencionar-se de modo diverso, ainda que favoravelmente ao trabalhador.
Não é dispositivo legal derrogável pelas partes convenentes, a se ver
suprimido o espaço intrajornada no labor, e conseqüente prejuízo às
necessidades biológicas do empregado. A ratio legis da CLT, nesse tópico, é a
observância do intervalo na jornada de trabalho. O horário poderá ser tratado
conjuntamente, reduzido e mesmo elastecido. Conseqüentemente, a exegese
terá de ser estrita.
As partes convenentes têm livre arbítrio para estabelecer as regras de
intervalo que melhor atendam às suas categorias, econômicas e profissionais,
desde que não afrontem o estatuído pelo legislador.
27 Mauricio Godinho Delgado, op. cit., p. 190.
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A CLT tem por princípio, em seu artigo 9º, que “Serão nulos de pleno
direito os atos praticados como objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a
aplicação dos preceitos contido na presente Consolidação”. O Código Civil
Brasileiro, diz no seu artigo nº 166 (inciso VI), que é nulo o negócio jurídico
quando tiver por objetivo fraudar lei imperativa.
Por intervalo para descanso e refeição, entendo que pretendeu o
legislador dá relevância à proteção do labor no empreendimento. Não é
norma inteiramente protecionista ao obreiro. O que se buscou foi
preservar toda a atividade produtiva. Sem descanso e sem refeição os
riscos de acidentes são maiores, podendo ter desdobramentos de
relevância social. (grifei)
O inciso XXII da Constituição Federal prevê a “redução dos riscos
inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança”. A
inteligência do artigo 71, da CLT, é dirigida ao aspecto biológico do trabalhador
(sua higidez corporal, mental e emocional). Verifica-se, por tudo isso, que a
responsabilidade social do trabalho se impõe. Sobreleva a tutela individual do
trabalhador o bom funcionamento dos meios de produção e a sociedade que
dele é afetada. A norma contratual de trabalho de direito coletivo, contrária à
Lei Maior, não merece ser interpretada, ainda que de boa-fé, porque não pode
imperar. É norma não escrita. Não existe para o mundo jurídico.
O nosso legislador estipulou que os períodos de intervalo não devem ser
em regra computados no fluir do trabalho, limitando o mínimo e máximo do
intervalo intrajornada porque a cadeia produtiva não pode se descuidar disso.
Suprimindo tal horário, viola-se a CRFB no inciso XXII. E o inciso XIII não é
conflitante. A lei é tão rigorosa que estipula indenização ao trabalhador
correspondente ao valor da remuneração (não do salário) e com o acréscimo
de, no mínimo, 50% da remuneração da hora normal, não afastando a sujeição
do empregador às penalidades das normas de fiscalização do trabalho.
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Assim, creio que a recusa do trabalhador, que venha a laborar forçado
pelas contingências patronais, fará jus à indenização pelos danos que venha a
sofrer, sendo a forma de indenizar, preconizada em lei, fixada como parâmetro
mínimo.
Também é relevante notar que a lei não consagra que os turnos de
revezamento sejam trabalhados de forma ininterrupta (art. 7º, inciso XIV, da
CRFB). A atividade contínua do processo produtivo não induz a não haver
intervalo para o empregado. Nesse caso, a jornada normal diária não pode
passar das 6 horas. Ou turno fixo ou turno variável, o intervalo é obrigatório. É
o entendimento do colendo TST, quando editou recentemente a OJ nº 360, do
SBDI-1.
Pelo exposto, constata-se que a maioridade sindical das representações
classistas não será atingida enquanto ocorrerem os casos em que haja a
redução, supressão ou o elastecimento da jornada de trabalho atentatórios à
atividade do trabalhador, exemplificados com a jornada dos motoristas de
ônibus e de caminhões, que envolvem basicamente a vida e a economia da
sociedade brasileira. Como verificado, há convenções coletivas de trabalho
que tornam letra morta o art. 71 da CLT, integralmente. Decerto por imposição
da categoria empregadora, sabidamente mais forte e representativa. Imagino
quando se faz negociação coletiva o cerne é a salvaguarda dos interesses do
trabalhador, sobretudo por sua representação sindical. Portanto, numa
sociedade dita de Direito se estabelece o que é ou não de ordem pública ou
privada. Conseqüentemente, ao se fazer a interpretação de norma de ordem
pública, ainda que cingida de boa-fé, colimando interesse privado, é errado. A
lei estabeleceu o intervalo intrajornada do trabalhador e em nenhum momento
abdicou desse interesse, cunhado que fora no princípio da dignidade no
trabalho.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALICE MONTEIRO DE BARROS, Curso de Direito do Trabalho, Editora LTR,
São Paulo, 3ª edição, 2007;
AMÉRICO PLÁ RODRIGUEZ, Princípios de Direito do Trabalho, Editora LTR,
São Paulo, 3ª tiragem, 1994;
CARLOS MAXIMILIANO, Hermenêutica e Aplicação do Direito, 9ª edição,
1981;
CLÁUDIA JOSÉ ABUD, Jornada de Trabalho e a Compensação de Horários,
Editora Atlas S.A., São Paulo, 2008;
CLT-LTR, 35ª Edição, Editora LTR, São Paulo, 2008;
CÓDIGO CIVIL – NOVO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO, Editora Revista dos
Tribunais, 2003;
HENRIQUE SAVONITTI MIRANDA, Curso de Direito Constitucional, Editor:
Senado Federal, Brasília, 2004;
MAURICIO GODINHO DELGADO, Curso de Direito do Trabalho, Editora LTR,
São Paulo, 6ª edição, 2007;
ROBERT CASTEL, As metamorfoses da questão social: uma crônica do
salário, Editora Vozes, Petrópolis, 1998, p. 438/439.
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ANEXO 1
Reportagem citada na página 33, de 12/10/2007
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FOLHA DE AVALIAÇÃO
Nome da Instituição: INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
Título da Monografia: INTERVALO INTRAJORNADA
Autor: SIDNEY BAPTISTA RIBEIRO
Data da entrega:
Avaliado por: Conceito:
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