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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
A RESPONSABILIDADE SOCIOAMBIENTAL CRISTÃ: IGREJA
CATÓLICA E IGREJA METODISTA
Por: Denise Nascimento Vieira
Orientador
Prof. Francisco Carrera
Rio de Janeiro
2011
2
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
A RESPONSABILIDADE SOCIOAMBIENTAL CRISTÃ: IGREJA
CATÓLICA E IGREJA METODISTA
Apresentação de monografia à AVM Faculdade
Integrada como requisito parcial para obtenção do
grau de especialista em Direito Ambiental.
Por: Denise Nascimento Vieira.
3
AGRADECIMENTOS
Ao meu companheiro amado, amigo
Gerson.
4
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho ao meu filho Pedro e
meu amado Gerson.
5
RESUMO
Esta pesquisa monográfica, sob o título “A Responsabilidade Sócio-
Ambiental Cristã: Igreja Católica e Igreja Metodista”; procura atentar para os
papéis desempenhados por essas duas denominações cristãs diante da
responsabilidade socioambiental cidadã.
Partindo da observação crítica, orientada pela ética e ecoespiritualidade
cristãs, duas iniciativas de cunho ecológico são apresentadas: a Campanha da
Fraternidade 2011 “Fraternidade e a Vida no Planeta”, promovida pela CNBB
no âmbito Católico; e a organização e projetos do Centro Ecológico Metodista
Ana Gonzaga (CEMAG), instituição ligada à Igreja Metodista localizada na
Zona Oeste da Cidade do Rio de Janeiro. Tais iniciativas evidenciam um nível
mínimo de comprometimento socioambiental dessas igrejas, apontando a
direção do caminho de um envolvimento potencialmente maior do que se
apresenta.
6
METODOLOGIA
O procedimento metodológico desta monografia constitui-se em
pesquisa bibliográfica, servindo-se de textos legislativos que versem a respeito
do lugar social das igrejas analisadas, de documentos que evidenciam o
compromisso social e ambiental dessas igrejas (Cânones da Igreja Metodista e
Manual da Campanha da Fraternidade 2011), periódicos institucionais e obras
teológicas que tratem do tema da espiritualidade e ética transformadoras
cristãs (inicialmente as obras do teólogo Leonardo Boff).
A pesquisa realiza um recorte institucional e geográfico. No campo
institucional católico será verificado o impacto da Campanha da Fraternidade
2011, elaborado pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), cujo
tema é “Fraternidade e a Vida no Planeta”, sobre realidade paroquial carioca.
No âmbito metodista é verificada a relevância dos projetos sócio-ambientais
realizados no Centro Ecológico Metodista Ana Gonzaga (CEMAG), localizado
na Zona Oeste da Cidade do Rio de Janeiro, nas igrejas locais.
Inicialmente, são situadas na pesquisa, histórica, jurídica e socialmente,
tanto a Igreja Católica como a Metodista. Em seguida é estabelecido o
referencial, ou critério para observação e análise das duas igrejas, a partir das
conceituações de espiritualidade, ética ambiental e ecoespiritualidade
compreendidas como elementos motivacionais para atitudes de preservação e
compromisso socioambientais dessas denominações.
O caminho desta pesquisa finda o seu percurso ao analisar os projetos
socioambientais do catolicismo e metodismo no Brasil sob as luzes da
ecoespiritualidade, sem prescindir de aspectos fundamentais do Direito
Ambiental relacionados às ações das duas igrejas verificadas. Nessa etapa, a
pesquisa apresenta sua crítica, avaliando a adequação das iniciativas dessas
igrejas a partir do referencial mencionado.
7
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I - O Catolicismo e
o Metodismo no Brasil 10
CAPÍTULO II - A Motivação Socioambiental
Cristã 21
CAPÍTULO III – A Responsabilidade
Socioambiental das Igrejas 33
CONCLUSÃO 53
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 56
ÍNDICE 60
8
INTRODUÇÃO
Há de se considerar que a constituição da sociedade civil brasileira é
delineada por múltiplos setores representativos e organizados. O próprio
adjetivo “representativo” de determinado setor traz consigo, de forma intrínseca
e extrínseca, a relevância para estudos a respeito da presença e impacto em
seu respectivo contexto.
Figurando dentre uma gama variada de setores estão as representações
cristãs, manifestadas institucionalmente pelas organizações eclesiásticas
(igrejas) na sociedade brasileira. Mesmo (constitucionalmente falando) em se
tratando de um país laico, não há como descartar no Brasil os influxos da ética
cristã, bem como dos posicionamentos eclesiásticos sobre a mentalidade e
comportamentos (elementos constitutivos de uma cultura) dos/as cidadãos/ãs
que ora são julgados como pertinentes, ora como ultrapassados, anacrônicos,
conservadores, não aplicáveis às expectativas e necessidades atuais.
As igrejas cristãs são segmentos importantes na sociedade brasileira,
com destaque nesta pesquisa à parcela católica e metodista por sua relevância
histórico-social no país. Nestes segmentos conta-se com considerável
diversidade sócio, econômica e cultural entre seus fiéis, cuja unidade segue
possibilitada por uma espiritualidade que poderia plasmar comportamentos
éticos transformadores na sociedade. Trata-se da espiritualidade e ética cristãs
tratadas em perspectiva libertadora e, portanto, viabilizadoras de ações sociais
de impacto positivo no contexto em que tais igrejas estejam presentes.
Através da ética e espiritualidade cristã libertadora se torna possível
identificar, tanto no catolicismo como no metodismo brasileiros, ações
concretas que não somente apontem, mas evidenciem a responsabilidade
sócio-ambiental assumida.
9
Em função de tais considerações, o presente trabalho monográfico
pretende fundamentalmente apresentar e analisar as ações concretas que
evidenciem a responsabilidade sócio-ambiental da Igreja Católica e da Igreja
Metodista. Afim de que tal objetivo seja alcançado a pesquisa buscará seguir
alguns caminhos.
Diante da seguinte suposição: Podem tanto a Igreja Católica como a
Igreja Metodista, uma vez motivadas pela espiritualidade e éticas libertadoras
cristãs, exercerem um papel de importância e relevância sócio-ambiental? A
seguinte hipótese procurará ser confirmada nesta pesquisa: tanto a Igreja
Católica, como a Igreja Metodista, exercem um papel minimamente de
importância e relevância no que diz respeito à responsabilidade
socioambiental.
Visando o alcance dos objetivos, bem como a confirmação da hipótese
aventada, esta monografia se estruturará da seguinte forma: o primeiro
capítulo se dedicará à apresentação da Igreja Católica e da Igreja Metodista,
buscando situá-las histórica e socialmente no Brasil. No segundo capítulo,
atendendo ao objetivo de estabelecer o referencial motivacional socioambiental
das duas igrejas, será desenvolvida a conceituação de ecoespiritualidade sem
prescindir à passagem pela espiritualidade cristã libertadora e da ética
socioambiental. No terceiro capítulo serão observadas, com os critérios
ecoespirituais, as iniciativas ecológicas da Igreja Católica e da Igreja Metodista
seguindo a direção da confirmação da hipótese do comprometimento mínimo
dessas igrejas com as causas socioambientais.
10
CAPÍTULO I
O CATOLICISMO E O METODISMO NO BRASIL
As igrejas Católica e Metodista são ramos importantes do cristianismo
com marcas históricas e sociais no Brasil. Como primeiro passo desta
pesquisa, serão brevemente apresentados neste capítulo um breve histórico da
inserção e presença dessas igrejas no País, assim como a organização
jurídico-administrativa de cada uma delas. Dessa maneira, este capítulo
começará a atender o principal objetivo lançado para do estudo, a saber: o de
apresentar e analisar as iniciativas sócio-ambientais do catolicismo e
metodismo brasileiros.
1.1 - A Igreja Católica no Brasil
Sabemos que o Cristianismo é a principal religião do Brasil, com
predominância da Igreja Católica Apostólica Romana. Ela chegou ao Brasil na
época do descobrimento trazida pelos missionários que acompanhavam os
exploradores e colonizadores portugueses. Sua chegada é de grande
importância para a sociedade, pois é uma instituição que influencia
diretamente a política e cultura do país (Cf. HOONAERT, 1983).
A Igreja Católica é quem assumiu a evangelização dos indígenas, bem
como a educação nos colégios e serviços nas paróquias e dioceses, sendo as
primeiras ordens a chegarem ao Brasil os jesuítas, carmelitas descalços e
beneditinos (Cf. HOONAERT, 1983).
Até o século XVIII o Estado controlava a atividade eclesiástica,
impedindo assim a entrada de outros cultos religiosos exigindo obediência e
reconhecimento.
11
Era o Estado quem nomeava e remunerava párocos e bispos, além de
conceder licenças para construção de igrejas. Também era função do Estado
confirmar e executar as sentenças dos Tribunais de Inquisição, além de
controlar todo o clero (Cf. HOONAERT, 1983).
A partir de 1707, a Igreja Católica adquire maior autonomia através das
primeiras constituições do Arcebispado da Bahia. Há uma uniformização do
culto, da educação, da formação do clero e da atividade missionária (Cf.
HOONAERT, 1983).
Só após a Proclamação da República que foi reconhecido o caráter laico
do Estado, acabando com o padroado e garantindo a liberdade religiosa (Cf.
HOONAERT, 1983).
Foi no Governo de Getúlio Vargas e com a aprovação da Constituição
de 1934 que Estado e Igreja passaram a colaborar um com outro. Nesta época
foi que algumas reivindicações da Igreja Católica foram atendidas como:
ensino religioso facultativo as escolas públicas e a presença do nome de Deus
na Constituição.
No ano de 1952 foi criada a Confederação Nacional dos Bispos no
Brasil (CNBB), que coordena a ação da Igreja Católica no Brasil, atualmente
presidida pelo Arcebispo de Aparecida (SP) D. Raymundo Damasceno de
Assis, no cargo desde 2004.
As questões da fome e do desemprego no país passaram a ser motivo
de preocupação da Igreja no final dos anos 50, e em 1960 a Juventude
Universitária Católica (JUC) sob influência da revolução Cubana, declara sua
opção pelo socialismo. A pressão dos conservadores da Igreja levou à criação
um movimento de esquerda denominado de Ação Popular (AP). Naquela
12
ocasião, a Igreja estava dividida com as reformas apresentadas pelo Governo
de João Goulart (Cf. HOONAERT, 1983)
Os conflitos entre Igreja e Estado crescem a partir do ano de 1964 com
a instalação do Regime Militar. A ruptura total entre Igreja e Estado se dá com
o Ato Institucional nº 5 (AI-5), pois ocorrem diversas repressões, torturas,
prisões e assassinatos a estudantes, padres, bispos e operários. Nesta época
a Igreja atuava em setores populares com as comunidades eclesiais de base
(CEBs). Tais comunidades eram inspiradas na Teologia da Libertação que
vincula o compromisso cristão com a justiça social. Nos anos 70 a Igreja se engaja na luta pela redemocratização ao lado de instituições da sociedade civil
em virtude dos abusos que ocorriam entre a ordem jurídica e os direitos
humanos (Cf. RÚBIO, 1983)
Entre as décadas de 1960 e 1970, atingindo maior notoriedade nos anos
que se seguiram à década de 1980, se desenvolve o movimento de
Renovação Carismática Católica (RCC). Em termos gerais, tal movimento veio
marcado pela moral conservadora, bem como pelos rituais semelhantes aos
das Igrejas pentecostal. Em certa media a RCC se contrapôs às organizações
eclesiais de base dinamizadas pela Teologia da Libertação (Cf. PORTAL DA
RCC).
Para gerir a Igreja Católica no mundo, o Vaticano divide cada país em
dioceses, que são regiões autônomas, comandadas por bispos indicados pelo
Papa. Existem também as Arquidioceses, que são regiões (dioceses) maiores,
comandadas por Arcebispos. As dioceses são formadas por paróquias
comandadas por vigários e padres que atuam diretamente junto aos fiéis,
orientados pelos bispos. Entre os bispos e arcebispos são escolhidos pelo
papa os cardeais, que na hierarquia da Igreja Católica só estão abaixo do Papa
(Cf. SITE OFICIAL DO VATICANO).
13
No Brasil, como em outros países, bispos e arcebispos se organizam em
Federação. A organização representativa dos bispos brasileiros é já
mencionada Conferência Nacional dos Bispos o Brasil (CNBB). Mesmo sem
uma função deliberativa em termos administrativos, a CNBB traz ao mesmo
tempo visibilidade no âmbito social ao governo da Igreja Católica, bem como a
posição pastoral e doutrinária no que concerne a temas e desafios atuais. A
CNBB declara como sua missão o que segue:
• “Fomentar uma sólida comunhão entre os Bispos que a
compõem, na riqueza de seu número e diversidade, e
promover sempre a maior participação deles na
Conferência;
• Concretizar e aprofundar o afeto colegial, facilitando o
relacionamento de seus membros, o conhecimento e a
confiança recíprocos, o intercâmbio de opiniões e
experiências, a superação das divergências, a
aceitação e a integração das diferenças, contribuindo
assim eficazmente para a unidade eclesial;
• Estudar assuntos de interesse comum, estimulando a
ação concorde e a solidariedade entre os Pastores e
entre suas Igrejas”. (Cf. SITE OFICIAL DA CNBB)
Importante ressaltar que a CNBB é também responsável pela
Campanha (anual) da Fraternidade. Esse projeto anual corresponde,
geralmente, ao posicionamento católico frente a algumas questões
desafiadoras na sociedade brasileira, dentre os quais figuram as questões
sócio-ambientais. Adiante, no último capítulo desta pesquisa, será apresentado
e analisado o conteúdo da Campanha realizada em 2011, cuja motivação foi
precisamente o desafio da responsabilidade sócio-ambiental da Igreja Católica
no Brasil
14
Vale atentar que a Igreja Católica no Brasil é uma sólida instituição
social. Juridicamente falando, o art. 53 e seguintes do Código Civil Brasileiro,
as igrejas são definidas como associação civil de pessoas, sem fins lucrativos,
estando sujeitas a mandamentos estatais. O próprio Código Civil determina
que as associações se constituam livremente, independentes de autorização,
devendo haver liberdade para associação de membros, com clareza dos
direitos e deveres dos mesmos, indicando quais são as fontes de recursos
para sua manutenção. Entretanto, o Código Civil respeita as peculiaridades de
cada Igreja, no tocante ao seu livre funcionamento.
Assim, há uma garantia legal para que seus pontos de vista sejam
livremente difundidos e divulgados. Obviamente nem sempre tais posições,
uma vez expressadas, são isentas de contradições e contestações visto que
alguns conflitam diretamente com convenções e reivindicações sociais. Mesmo
contraditórias, não se nega a relevância, ou melhor, o impacto de uma
declaração oficial católica aberta a toda sociedade.
Outra organização eclesiástica importante no Brasil é a Igreja Metodista.
Sendo contemplada juridicamente da mesma forma que a Igreja Católica
Romana no Brasil, a Igreja Metodista traz algumas peculiaridades que a
distingue como um ramo do Cristianismo Universal. Um pouco de sua história e
organização no Brasil é o que será apresentado em seguida.
1.2 - A Igreja Metodista no Brasil
A Igreja Metodista foi fundada no século XVIII, na Inglaterra, pelos
irmãos John e Charles Wesley. No Brasil integra o ramo do protestantismo
histórico de missão. O protestantismo histórico reúne as primeiras igrejas,
herdeiras das reformas protestantes do século XVI, que chegaram ao Brasil no
15
século XIX, e estão divididas em dois grupos: imigração e missão (Cf.
LÉONARD, 1981; MENDONÇA, 1984; MENDONÇA E VELASQUES, 1990).
As Igrejas pertencentes ao ramo da imigração se instalaram no Brasil
por ocasião da abertura dos portos às nações amigas, possibilitado pelo
“Tratado de Comércio e Navegação” no reinado de dom João VI, quando se
favoreceu e intensificou as relações comerciais com a Inglaterra e a
incorporação da mão-de-obra imigrante. São Igrejas autônomas, porém
preservam os traços europeus. São as igrejas: Anglicana (Inglaterra),
Confissão Luterana (Alemanha) e algumas Reformadas de orientação
calvinista provenientes da Holanda, Armênia, Suíça e Hungria.
As Igrejas pertencentes ao grupo do protestantismo de missão se
instalaram no Brasil pela mediação norte americana durante. A Inserção
dessas igrejas no País é resultado das empresas missionárias ocorridas
durante o século XIX dinamizadas pelo movimento denominado por “era das
missões”. Além da Igreja Metodista, inseriram-se no País nesse mesmo
período as igrejas Presbiteriana, Batista, Congregacional, Episcopal e
Evangélica Luterana.
Durante boa parte do período de implantação, tais igrejas foram
estimuladas pelo mesmo projeto e estratégia missionários. Proveniente
fundamentalmente do sul dos EUA, após o fim da Guerra de Secessão, esse
grupo foi impulsionado pelo “Destino Manifesto”, trazendo consigo traços
culturais anglo-saxões confundidos como determinantes religiosos. Esta
concepção está baseada na convicção do chamado divino dos Estados Unidos
da América para o comando mundial. Tal crença alimentou o expansionismo
norte americano, a partir do século XIX, através das empresas missionárias,
campanhas militares, propaganda ideológica, empréstimo de capital aos
países do Terceiro Mundo gerando a dependência econômica, extermínio de
povos nativos e nas intervenções em áreas de conflito mundial ao longo dos
dois séculos. (Cf. WEINBERG, 1935).
16
O tipo de protestantismo procedente, portanto, é etnicamente branco,
além de conservador, fundamentalista e ser movido pelo proselitismo. A
estratégia de expansão que adotou envolveu algumas ações: o
estabelecimento de escolas confessionais (Cf. RAMALHO, 1976; MESQUIDA,
1994); a educação paroquial conjugada às campanhas de alfabetização,
alinhadas com a ação social das igrejas geradoras de creches, orfanatos,
ambulatórios médicos e hospitais; e a organização de editoras para a produção
e distribuição de folhetos evangelísticos e jornais denominacionais, bem como
material de estudo de temas cristãos amplamente usados nas escolas
dominicais.
As denominações desse grupo possuem em comum uma concepção de
salvação chamada de arminiana1, que reforça a prática da evangelização. Elas
se caracterizam pelo comportamento puritano notado na exigência do
cumprimento de um código de disciplina moral baseado na negação de
determinados costumes, tais como beber, fumar, dançar. Outra característica
marcante é a oposição ao catolicismo, identificado como segmento religioso
(mesmo que cristão!) pagão e herético. Geralmente são extremamente
proselitistas, não sendo muito adeptas de projetos de transformação social,
distinguindo a ação política da tarefa da igreja, cujo propósito irrestrito é “salvar
almas” (MENDONÇA E VELASQUES, 1990, p.81-109).
Neste enquadramento doutrinário e ideológico é que se inseriu o
metodismo no Brasil. O pioneirismo da inserção metodista se deve a Justin
Spaulding e a Daniel Kidder, em 1836. Em 1841 a missão brasileira foi
abandonada por uma série de fatores:
• “Falecimento da esposa do Rev. Kidder, que ficou sozinho
com duas crianças.
1 Corrente herdeira das concepções sinergistas de Thiago Armínio (1560-1609), que compreende a salvação como operada pela cooperação humana e divina.
17
• Problemas pessoais dos missionários.
• Dificuldade muito grande de aceitação da mensagem do
Evangelho pelos brasileiros.
• Dificuldade financeira dos Estados Unidos em manter o
trabalho missionário. Neste tempo, o Brasil passa a produzir
menos cana-de-açúcar e tabaco (fumo) e começa a produzir
muito café. A mão-de-obra escrava já não era tão importante e
havia necessidade de mão-de-obra mais especializada. A
Inglaterra pressionava para que se acabasse com a
escravidão. Em 1850, saiu uma lei no Brasil que proibia a
importação de mão-de-obra escrava. Uma forma de resolver
esse problema era abrir o país para que os colonos de outros
países viessem para cá. Assim, chegaram aqui muitos
italianos que trabalharam em fazendas de café”. (OS
PRIMÓRDIOS DA OBRA MISSIONÁRIA).
Em um segundo momento, em 1867, Junius Estaham Newman se
estabelece no País. Ele acompanhou, como pastor, o primeiro grupo de
americanos que chegaram ao Brasil incentivado por D.Pedro II. O Imperador,
na época, motivou a chegada dos americanos vendendo-lhes terra a preços
baixos, financiando suas passagens, comprando ferramentas e sementes, bem
como uma série de outras facilidades.
Em 1875, Newman enviou uma correspondência para a Igreja Metodista
Episcopal do Sul dos EUA relatando a realidade e potencialidades missionárias
no Brasil. Assim, a igreja norte americana enviou o missionário J. J. Ranson
(Cf. OS PRIMÓRDIOS).
Foi em 1878 que o Rev. Ranson iniciou seu trabalho no Rio de Janeiro,
capital do Império, enviado pela Junta de Missões da Igreja Metodista
Episcopal. Fundamentalmente Ranson contou com o apoio de políticos liberais
18
com aspirações republicanas, intelectuais e pela Maçonaria no País. A
estratégia e ação missionárias metodistas, nos anos que se seguiram à
chegada de Ranson, não se restringiram à evangelização através da formação
de comunidades cristãs. O metodismo também cooperou com a formação da
mentalidade das elites brasileiras ao fundar seus colégios confessionais (Cf.
SALVADOR, 2004).
Como parte integrante do movimento missionário norte americano, a
Igreja Metodista foi um dos berços do liberalismo no Brasil, tendo sido o seu
principal traço mesmo após sua autonomia decretada em setembro de 1930,
quando se desvinculou da Igreja Metodista Episcopal dos EUA (Cf. REILY,
1981).
Nas décadas que se seguiram após a autonomia, a Igreja Metodista
procurou se configurar de maneira autóctone e afinado com as necessidades e
desafios da sociedade brasileira, posicionando-se diferenciadamente da
ideologia desenvolvimentista e liberal no Continente Latino-Americano.
Posteriormente a Igreja Metodista foi assumindo e declarando
comprometida com os desafios e causas sociais. Gerson Lourenço Pereira
(2009) pontua que:
“Nas décadas de 1970 e 1980, a Igreja Metodista no Brasil
buscou, em termos institucionais, mudar seus paradigmas
conservadores notadamente através dos “Planos
Quadrienais” (o primeiro 1974-1978; o segundo 1978-
1982), se utilizando dos referenciais teológicos mediados
pelas ciências sociais; e com a aprovação do “Plano para a
vida e Missão da Igreja” (Concílio Geral de 1982),
estabelecido como plataforma pastoral da Igreja Metodista,
influenciado pelos referenciais teóricos da Teologia da
19
Libertação e estruturado pelo método ver-julgar-agir”.
(PEREIRA, 2009, p.22-23).
Atualmente a Igreja Metodista se encontra organizada em Regiões
Eclesiásticas assim distribuídas: Primeira Região - Rio de Janeiro; Segunda
Região - Rio Grande do Sul; Terceira Região - São Paulo capital (e Região
Leste do Estado); Quarta Região - Minas Gerais e Espírito Santo; Quinta
Região - Interior de São Paulo, Goiás, Tocantins, Mato Grosso, Mato Grosso
do Sul, Triângulo Mineiro, Sul e Brasília; Sexta Região - Paraná e Santa
Catarina; Região Missionária do Nordeste - Alagoas, Bahia, Ceará, Paraíba,
Pernambuco,Piauí, Sergipe e Rio Grande do Norte; Campos Missionários do
Amazonas - Acre, Amazonas, Pará, Rondônia e Roraima.
Cada Região Eclesiástica é presidida por um bispo ou bispa. As
Regiões são subdivididas em Distritos que são supervisionados por
Superintendente Distritais. Tais distritos circunscrevem determinado número de
Igrejas locais que, por seu turno são presididas por pastores ou pastoras.
De acordo como os Cânones da Igreja Metodista, os fóruns de
deliberação administrativa são os Concílios, nas Instâncias Geral,
correspondendo ao âmbito Nacional; Regionais, jurisdicionadas pelas Regiões
Eclesiásticas; Distritais, aos distritos; e Locais, circunscritas às igrejas locais .
Tais concílios são, em termos gerais, assembléias para tomada de decisões
onde a participação é estendida tanto a clérigos como pra leigos. Cada
instância conciliar corresponde a uma forma administrativa: Concílio Geral –
Administração Geral; Concílio Regional – Administração Intermediária; e
Concílios Distrital e Local – Administração Básica. (CÂNONES, 2007, p.87).
Os mesmos Cânones estabelecem áreas de ação de uma Igreja Local,
dentre as quais figura a Área de Ação Social (CÂNONES, 2007, p.135). A partir
dessa área é que o metodismo manifesta seu compromisso, envolvimento e
20
adesão aos múltiplos desafios, dentre os quais o sócio-ambiental através de
iniciativas e projetos locais, bem como por meio de suas instituições de serviço
e assistência. Em particular se destaca o Centro Ecológico Metodista Ana
Gonzaga, na Cidade do Rio de Janeiro, que será mais bem refletido e
analisado no último capítulo.
Sendo o catolicismo e o metodismo ramos significativos do cristianismo,
presentes e relevantes na sociedade brasileira, podem ser compreendidos
como instituições juridicamente bem estabelecidas com formas de organização
sólidas. Portanto, a relevância social dessas denominações é evidente ainda
mais considerando a representatividade, pela Igreja Católica, da CNBB; e das
ações sociais da Igreja Metodista, por meio das suas instituições.
O passo seguinte, a ser dado no segundo capítulo, diz respeito ao
referencial teórico-teológico que será estabelecido com a finalidade de nortear
a análise dos projetos e iniciativas sócio-ambientais das Igrejas Católica e
Metodista.
21
CAPÍTULO II
A MOTIVAÇÃO SÓCIOAMBIENTAL CRISTÃ
Neste capítulo a pesquisa dará o segundo passo na direção do objetivo
proposto, estabelecendo como referencial teórico da reflexão a respeito da
responsabilidade sócio-ambiental das igrejas Católica e Metodista a motivação
que reside na espiritualidade cristã.
O sentido antropológico de espiritualidade, que por vezes se entrelaça
com o conceito proveniente do senso comum de mística, diz respeito à
motivação interior, ao estímulo nato para ações concretas que exprimem a
responsabilidade diante de determinados desafios (cf. BETTO; BOFF, 2005). O
ser humano é ser de transcendência, ou seja, que busca ultrapassar estágios e
estados de sua existência. É ser que busca desenvolver-se, amadurecer e
edificar. As religiões são então estabelecidas como expressões dessa
espiritualidade, dessa busca humana por transcendência.
Todavia, embora geralmente pertença ao universo do estudo das
religiões, por ser um dado antropológico, a espiritualidade não é monopólio de
uma única confissão de fé. Há formas de espiritualidade vinculadas ou não a
uma denominação religiosa, bem como abertas ou fechadas aos desafios
sociais que se nos apresentam na atualidade. Segundo Roberto Crema (2010),
a “espiritualidade é uma consciência não dual, uma consciência de uma
participação da parte no todo que na essência é o amor e na prática é a
solidariedade” (apud: TERESINHA, 2011, p. 139).
O que se pretende nesta etapa da reflexão é apresentar um tipo de
espiritualidade cristã que possibilita a motivação de grupos e instituições
eclesiásticas para atitudes responsáveis na sociedade. Trata-se de uma
22
espiritualidade libertadora que, por seu turno, se manifesta na ética (práxis)
diante de determinados desafios, aqui situados no âmbito ecológico.
Portanto, o caminho que será percorrido neste estágio perpassará por
uma sucinta explanação do conceito de espiritualidade cristã libertadora, pela
motivação que proporciona atitudes éticas e responsáveis no âmbito do
compromisso com a preservação e cuidado ambientais e, finalmente, através
da conceituação de uma ecoespiritualidade cristã.
2.1 - A Espiritualidade Cristã Libertadora
Convive-se hoje em dia com um fenômeno tipificado por alguns
estudiosos como “retorno ao sagrado” ou “volta para o Mistério”. Esse
fenômeno basicamente se caracteriza pela agudez com que a fome pelo
transcendente se manifesta. Há uma busca acentuada por experiências a partir
e extrapolando as tradições religiosas, confirmando que a espiritualidade e a fé
não são exclusivas a uma determinada instituição eclesiástica (NOLAN, 2008,
p.30-39). Contudo, também não significa que as instituições tradicionais
estejam alheias a tais acontecimentos.
Essa realidade vem, há muito, interpelando fortemente o cristianismo.
Diante de uma série de questões como a globalização, da chamada crise da
pós-modernidade, da secularização, do individualismo, das lutas por direitos
civis de grupos organizados, da pluralidade religiosa, pergunta-se pelo lugar e
relevância de uma espiritualidade cristã historicamente lida e tida como
essencialmente contemplativa e alienada (Cf. NOLAN, 2008, p.25-84).
Bem certo é que, de forma estereotipada, a espiritualidade e mística
cristãs tendem a ser considerada conforme assinalado. Entretanto, muito
embora por razões justificáveis do ponto de vista histórico a espiritualidade
cristã seja adjetivada como alienada e alienante, reflexões teológicas atuais
23
evidenciam outra face da moeda. Mesmo em formas de espiritualidade
tipicamente de oração, como a mística contemplativa cristã, não se dissocia da
atenção e dedicação os temas desafiadores da sociedade.
Thomas Merton, por exemplo, foi um monge trapista, contemplativo, e
profundamente engajado nas causas de seu tempo. Atuou de maneira
aguerrida contra a guerra do Vietnã, bem como contra a corrida armamentista
iniciada pelos idos da década de 1960 nos EUA (NOLAN, 2008, p.32). Sua
vida e atuação demonstraram como é inoportuna e anacrônica uma
espiritualidade que tão somente vislumbra, de maneira dualista, o “céu” com
desprezo e desdém pelo chão que se pisa e o outro ser humano como quem
respira junto (conspira).
A postura de Merton, e a de tantos outros místicos e místicas cristãos,
não deveriam provocar estranheza a não cristãos, visto se tratar de uma
expressão do que a doutrina cristã denomina como “imanência”. O que isto
significa? É simples. Na perspectiva cristã, Jesus foi a encarnação de Deus, ou
seja, Deus que se fez gente, se manifestou visivelmente assumindo a natureza
humana. Ora, ao assumir tal natureza, Deus assumiu os dramas e paixões da
humanidade, sabendo o que é ser humano com o fim de plenificar e dignificar
a humanidade.
Pois bem, a pessoa devota ao Deus concebido pelo cristianismo se
mostra incoerente com sua fé desvinculando a sua devoção do outro ser
humano, uma vez lembrando que o homem e a mulher são tanto seres
individualmente considerados como socialmente situados. Portanto, a forma de
espiritualidade cristã coerente é aquela que contempla e atua; que ora é
promove a dignidade humana e da integridade toda a criação (meio ambiente);
que intercede e ao mesmo tempo contesta as injustiças, os quadros de
opressão e de ameaças à vida. O contexto sócio, econômico e político
interpela a fé cristã, visto se expressar na encarnação: aspecto exclusivo do
seguimento de Cristo. Dessa maneira, a espiritualidade cristã assumirá o
24
compromisso de servir e atuar sempre que situada e contextualizada. É um
tipo de espiritualidade libertadora que consiste em “ter os olhos abertos e as
mãos operantes”.
Nessa direção e nesses termos é que se torna possível tratar da
responsabilidade sócio-ambiental das igrejas cristãs, uma vez que redunda em
um conjunto de princípios (ética) orientadores de ações concretas e
dignificadoras.
2.2 - A Ética Ambiental Cristã
Antes de tratar da ética ambiental em perspectiva cristã, qual é o sentido
filosófico de ética, bem como a distinção do conceito de moral?
Ética, como disciplina filosófica, geralmente significa “o que pertence ao
caráter”. Dedica-se aos assuntos de natureza moral. Começa, na antiguidade,
como resultado das especulações a respeito dos preceitos de conduta. Ética
era o estudo dos meios de se alcançar e investigar o significado da felicidade
(eudemonia). Para Aristóteles a felicidade consistia numa vida virtuosa (virtude
= areth). Para Espinoza, a felicidade consistia em compreender e criar as
circunstâncias que aumentem nossa potência de agir e de pensar.
Leonardo Boff (2011) faz uma interessante distinção entre os conceitos
de ética e moral. Utilizando-se da experiência humana de habitar, Boff ajuda
na compreensão de tal distinção. O ato de morar possui algumas
características. Uma morada não é tão somente um espaço físico onde se
habita (quatro paredes e telhado). Existencialmente, é o modo de o ser
humano habitar. É a forma com que o ser humano organiza harmonicamente
sua vida em família, em relação. Essa maneira de organizar a vida em relação
requer a observação de determinados princípios para se viver humanamente.
Tais princípios, essa maneira de conviver é denominado de ética. (BOFF,
2011, p.9-12).
25
Os princípios de convivência a que Leonardo Boff se refere são o amor
universal, o cuidado, a solidariedade e o perdão. Seguindo a metáfora, qual
seria o estilo ideal de uma casa? Há muitos estilos (jeitos) de se morar, ou
melhor, de se organizar uma casa. Esses “jeitos” podem ser denominados
como Moral. O que Importa é morar humanamente. (BOFF, 2011, p.12-13).
Assim, a Ética busca fundamentar o bom modo de viver pelo
pensamento humano. A Moral se fundamenta na obediência a normas, tabus e
costumes estabelecidos por uma cultura. Tanto a Ética como as Morais “...
Devem servir à vida, à convivência humana convívio e á preservação da Casa
Comum, a única que temos, que é o Planeta Terra”. (BOFF, 2011, p.13).
É importante salientar que na sociedade atual a ética dominante, ou
seja, os princípios que orientam o ato de morar são norteados pelo utilitarismo
e antropocentrismo. Leonardo Boff (1993), ao considerar o predomínio ético
utilitarista e antropocêntrico atuais sobre o meio ambiente, afirma que:
“O ser humano estima que tudo se ordena a ele.
Considera-se senhor e patrão da natureza, que está
aí para satisfazer suas necessidades e realizar seus
desejos... Tal postura de base leva à violência e à
dominação dos outros e da natureza. Nega a
subjetividade de outros povos, a justiça às classes e
o valor intrínseco dos demais seres da natureza.
Não percebe que os direitos não se aplicam apenas
ao ser humano e aos povos, mas também aos
demais seres da criação. Há um direito humano e
social como há um direito ecológico e cósmico. Não
temos o direito de destruir o que nós mesmos não
criamos”. (BOFF, 1993, p.35).
26
Sendo assim, a opção pelo caminho de uma ética ambiental requererá a
renúncia do ser humano de estar sobre os outros para estar junto com os
outros, respeitando a alteridade e acolhendo as diferenças, atentando para os
valores da solidariedade, cuidado, amor e perdão. Isto implica no abandono do
paradigma utilitário e no comprometimento com as causas da “Casa Comum”,
a terra. (BOFF, 1993, p.36).
Nessa perspectiva é que se celebra a ética cristã sobe o meio ambiente.
Diante da necessidade do abandono da visão utilitarista e antropocêntrica,
uma concepção solidária, cuidadosa e integradora é reivindicada. As ações
cristãs então são redimensionadas como expressão da espiritualidade
libertadora posta e vista como fomentadora do compromisso sócio-ambiental.
Se um paradigma da modernidade imposto sobre o mundo foi o
desencantamento religioso, se torna válida a proposta de um reencantamento
ambiental. Cabe hoje ao âmbito religioso lançar-se aos desafios ecológicos,
em termos gerais; e às igrejas cristãs, em particular, “dar a sua contribuição
para a construção e educação de uma nova aliança do ser humano como a
natureza”. (BOFF, 1993, p.77).
“Hoje verificamos um novo advento religioso. Ele
não se esconde. Nem tem vergonha de se anunciar
como religioso e místico. Tal afirmação não é uma
regressão ao mundo pré-moderno e das culturas
agrárias. É a afirmação que inaugura um novo
tempo, depois daquele da modernidade, tempo de
integração de todas as dimensões do humano e do
cósmico no interior de uma totalidade viva,
cambiante, orgânica, espiritual e mística: a criação e
a natureza num imenso processo de evolução. Deus
não aparece como competidor do ser humano; Deus
não precisa mais ocultar-se para dar visibilidade.
27
Agora convivem, Deus e ser humano, em mútua
aceitação.” (BOFF, 1993, p.79-80).
Visto neste quadro, a espiritualidade cristã é interpelada a corresponder.
Isso significa que, na perspectiva libertadora, deve-se refletir a respeito de uma
“ecoespiritualidade” que estimulem tais ações éticas ambientais cristãs.
2.3 - A Ecoespiritualidade Cristã
Segundo Leonardo Boff (2004), ao ser humano cabe uma missão
ecológica nos seguintes termos:
“A missão do ser humano reside em poder captar os
mil ecos que vêm dessa grande Voz que reboa de
ponta a ponta do universo e que vibra e cada ser.
Cabe-nos unir nossa voz a esse eco universal;
somos chamados a ser sinfônicos e a venerar o
Maestro dessa imensa orquestra cósmica... Deus
vivificador e atrator de todas as coisas para seu seio
paternal e maternal.” (BOFF, 2004, p.133).
A ecoespiritualidade começa pela tomada da consciência dessa missão
humana. Movidas pela orientação de uma espiritualidade libertadora, as
pessoas de fé se lançam pelo caminho da contemplação compromissada, ou
seja, da contemplação que permite ir ao encontro do Deus da Vida através da
vida. Trata-se da atitude oração ou mística dos olhos abertos como as mãos
operantes que foi dito anteriormente.
Em que termo se manifesta a eco-espiritualidade? O seu ponto de
partida é á ética supracitada. Uma ética do cuidado essencial que reside na
“raiz fontal da constituição do ser humano” (BOFF, 2011, p. 35). A vida humana
28
conspira a partir da necessidade do cuidado, sem o qual não se sobrevive,
tampouco convive. Cuidar implica em zelar compassivamente, (com) paixão,
com intenso e profundo amor entendido como valor ético universal sem o que
a casa comum se torna lugar inabitável.
Ser humano é ser que eticamente será continuamente interpelado a
preservar a vida do próximo. Ora, como o meio ambiente é contemplado nesse
sentido? Diante da realidade da necessidade inescapável do cuidado, o ser
humano é posto frente ao drama planetário/ambiental. A Terra além da Casa
Comum é um organismo vivo do qual todos os seres integra, em que todos são
parte. Em outras palavras, é “entender-se e sentir-se Terra”. Trata-se de uma
concepção que traz algumas importantes implicações e ajudam a definir a eco-
espiritualidade.
Como primeira implicação, se o desafio é sentir-se e entender-se Terra,
assim o é pensando, sentindo e amando. “Somos a própria Terra, que na sua
evolução chegou ao estágio de sentimento, de compreensão, de vontade, de
responsabilidade e de veneração. Nua palavra: somos a Terra no seu
momento de autorrealização e autoconsciência” (BOFF, 2011, p.73-74). O ser
humano e a terra formam uma mesma realidade complexa, unida e marcada
pela diversidade. Portanto, o drama da terra é o drama humano.
Outra implicação importante diz respeito à presença da Terra na
natureza humana. Em todos os aspectos constitutivos, a saber: no biológico,
existencial, espiritual o ser humano traz consigo o resultado do processo
evolucionário que principia com a explosão que culminou na origem do
Universo, prossegue na proliferação biológica, desemboca na origem da
espécie humana e culmina no estágio atual da consciência planetária.
Para a espiritualidade ecológica, correspondendo a tal implicação, o ser
humano pode pensar numa intervenção responsável na Terra, porém sempre
vinculada ao sentimento filial que se tem com ela, considerando o princípio
29
generativo, ou seja, de identificá-la como a Grande Mãe geradora da vida. Ela
existe e deve ser sentida como o chão que se pisa e onde se convive com
outros filhos e filhas que trazem os mesmos códigos genéticos da mesma
origem.
Nestes termos, a eco-espiritualidade é um caminho em que se opta pela
resignificação do sentido da morada comum, do lugar de convivência em que
se reconhece a mútua dependência uns dos outros pela teia da vida. É
também uma forma de redimensionar a espiritualidade cristã em si que tem em
vista os desafios que passam a Vida e a Terra. Por meio do cuidado e do
respeito à integridade da Vida atenta-se para a Fonte de tudo, de onde proveio
o ato originário que traz em sua essência os valores do viver comunitário. (Cf.
TERESINHA, 2011, p. 140).
A resignificação ecoespiritual redireciona a compreensão do que a
doutrina cristã denomina por Teologia da Criação. Tal concepção segue uma
interpretação extremamente utilitária, além de literal, do relato do mito da
criação do mundo, do homem e da mulher contido nos dois primeiros capítulos
do livro bíblico de Gêneses. Nesse sentido a relação humana com a criação é
de domínio e exploração. Cultivar a ecoespiritualidade significa reinterpretar o
relato bíblico, entendendo como mensagem primordial a geração da vida por
Deus e a tarefa do cuidado, integração e interrelação que comissiona ao ser
humano.
Há alguns desafios a serem considerados pela ecoespirtualidade nos
tempos atuais:
1. Um grande desafio é deslocar o ser humano do centro,
desconstruindo assim o paradigma antropocêntrico. “O humano é
elo ético e não centro; é parte e não dono; é eco-relação e não
único”. (TERESINHA, 2011, p. 141).
30
2. É também desafiadora a valorização do dom da cooperação em
contraposição à competitividade tão característica da sociedade
de consumo e mercado. A possibilidade disto acontecer reside na
observação da importância do cuidado. “Cuidar dos mais fracos,
integrar o que está desintegrado e o que está perdido”.
(TERESINHA, 2011, 141).
3. O cuidado, enquanto categoria ética/teológica, desponta como
outro desafio para a ecoespiritualidade. “Espiritualidade é o
profundo do humano, é elo que une e reúne” Por essa razão é
que se deve “buscar crescer a generosidade, acolher o diferente,
abrir espaços para o novo e para a vivência da mística do
cuidado”. (TERESINHA, 2011, p.141).
4. A integração com transcendente, consigo mesmo, com o próximo
e com o meio ambiente. “O ser humano é um microcosmo, parte
do todo”. (TERESINHA, 2011, p.141).
5. Finalmente, outro grande desafio da ecoespiritualidade está na
necessidade de se ressacralizar as moradas: “o planeta, a
natureza, a casa, o corpo como morada da Trindade, o coração
como morada da alma”. (TERESINHA, 2011, p.141).
Considerando esses desafios, bem como as resignificações
mencionadas, a ecoespiritualidade é inicialmente praticada por quem se sente,
ouve e se vê como filho ou filha da Terra. Não escapando a mais antiga
disciplina espiritual dos movimentos místicos, tanto cristãos como procedentes
de outras manifestações religiosas, a saber: a contemplação. “A contemplação
nos faz pessoas sensíveis às injustiças, à depredação da natureza...
Contemplar é olhar com o coração aquilo que os olhos não enxergam. É ver
além daquilo que se vê. É penetrar a realidade com o olhar de Deus e sua
ternura” (TERESINHA, 2011, p. 142).
31
Thomas Merton, já mencionado místico cristão extremamente engajado
nas lutas e desafios de seu tempo, se referia à finalidade da contemplação em
um mundo que requer o compromisso e atuações éticas das pessoas de fé
(MERTON, 1979). Em perspectiva ecológica, Helena Teresinha (2011) afirma
que:
“Contemplação é caminho do coração e sabedoria.
Sabedoria é seguir tentando, com respeito,
humildade, cuidado e paz. Onde há sabedoria
nascida da contemplação não há lixo nem exclusão,
há seres em relação. Quando vivemos nossa
essência de seres relacionais, fazemo-nos ouvintes
da Palavra que vem de todos os seres e das redes
de comunicação que se estabelecem com o todo e
mais nos tornamos seres de comunhão e integração,
seres ecológicos.” (TERESINHA, p.144).
Cultivar a eco-espiritualidade é, por meio da contemplação, ver, ouvir,
sentir e se integrar de forma responsável ao meio sócio-ambiental como parte
situada em um contexto. Essa forma de espiritualidade torna a presença cristã
na sociedade desvinculada do utilitarismo, bem como do antropocentrismo
herdados da modernidade e fonte dos prejuízos ecológicos, dentre os quais a
falta de consciência da responsabilidade sócio-ambiental.
A motivação sócio-ambiental cristã reside na forma de espiritualidade
libertadora que, posta diante da necessidade de se assumir a responsabilidade
ética frente aos desafios ambientais, se manifesta como eco-espiritualidade. A
manifestação dessa espiritualidade se estabelece como o referencial para a
práxis ecológica cristã.
32
Findada esta etapa, no próximo capítulo serão analisadas as iniciativas
da Igreja Católica e da Igreja Metodista de cunho ecológico como expressão do
seu comprometimento ético/espiritual sócio-ambiental. Tais ações, todavia, não
prescindem do que a legislação do País considera a respeito do tema e que
externa no Direito Ambiental.
33
CAPÍTULO III
A RESPONSABILIDADE SÓCIOAMBIENTAL DAS
IGREJAS
Esta pesquisa encerra neste capítulo o percurso da apresentação da
responsabilidade sócio-ambiental das igrejas Católica e Metodista. A etapa
final que será transposta aqui leva em consideração o caminho já trilhado.
Após a apreciação da situação sócio, jurídica e histórica do catolicismo e
metodismo no Brasil, bem como a motivação ecoespiritual que propulsiona as
igrejas cristãs a assumirem o compromisso socioambiental, serão avaliadas e
aquinhoadas as iniciativas do catolicismo e metodismo no que reflitam e
exprimam tal compromisso.
Há duas perguntas de fundo que são feitas neste capítulo. A primeira diz
respeito ao que será analisado: quais as iniciativas que serão apresentas
dessas igrejas cristãs? Considerando que o universo cristão além de plural é
vasto, optou-se nesta pesquisa por observar duas iniciativas pontuais e
declaradamente voltadas para a preocupação ecológica, a saber: a Campanha
da Fraternidade 2011, promovida pela CNBB sob o tema “Fraternidade e a
Vida no Planeta”; e a organização, atuação e objetivos do Centro Ecológico
Metodista Ana Gonzaga.
A outra pergunta de fundo corresponde à forma com que a observação
será feita: qual é o critério para analisar tais iniciativas? Ao tratar do tema da
motivação cristã para o compromisso sócio-ambiental no capítulo anterior, esta
pesquisa preparou todo um arcabouço para orientação da análise. Toda
observação científica necessita de rigor, método e referenciais. Portanto, o
método que será seguido é o do julgamento da situação posta, ou seja, das
iniciativas de cunho ecológico das duas igrejas, através do referencial teórico
proveniente do conceito de ecoespiritualidade e pelos desafios pontuados nas
últimas linhas do segundo capítulo.
34
Há, porém, algumas observações do ponto de vista jurídico que devem
ser levadas em consideração, pois situam no Direito as ações das igrejas
mencionadas. De acordo com a Constituição Federal de 1988, o direito
ambiental é definido como um direito de todos e de interesse público.
“Todos têm direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do
povo e essencial à sadia qualidade de vida,
impondo-se ao Poder Público e à coletividade o
dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes
e futuras gerações.” (Art. 225, CONSTITUIÇÃO
FEDERAL, 1988)
Para um entendimento melhor do referido artigo, deve-se atentar para
os princípios gerais do Direito Ambiental.
3.1 – Princípios Gerais do Direito Ambiental
Podem ser resumidamente elencados pelo menos nove princípios gerais
do Direito Ambiental: o direito ao meio ambiente equilibrado; o direito à sadia
qualidade de vida; o acesso equitativo aos recursos naturais; os princípios do
usuário-pagador e poluidor-pagador, da precaução, de prevenção, da
informação, da participação e da intervenção obrigatória do poder público.
35
3.1.1 - Princípio do direito ao meio ambiente equilibrado
Juridicamente, o conceito meio ambiente está definido na Lei 6.938/81,
que instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente em seu art. 3º,I, no
seguintes termos: “entende-se por meio ambiente, o conjunto de condições,
leis, influencias e interações de ordem física, química e biológica, que permite,
abriga e rege a vida em todas as suas formas”
De acordo com Paulo Affonso Leme Machado (2010) meio ambiente
equilibrado é aquele que do ponto de vista ecológico, está consubstanciado a
conservação das propriedades e das funções naturais do meio ambiente, de
modo a permitir a “existência¸ a evolução e o desenvolvimento dos seres vivos”
(p. 56). Portanto, quando afirmarmos que temos direito a um meio ambiente
ecologicamente equilibrado, nos conscientizamos que não podemos
igualmente desequilibrá-lo com ações abusivas de qualquer natureza.
É ilusório achar que o meio ambiente nunca será alterado. Entretanto, é
preciso ter a consciência de que a interferência do ser humano de forma
desordenada e irresponsável pode causar danos irreparáveis à natureza. Para
se ter um meio ambiente equilibrado, devem-se mudar os valores morais,
deixando de lado o egoísmo humano com seu consumo exagerado e sem
limites, o desperdício e a destruição da natureza. Deve-se tomara a
consciência de que a terra é a casa de todos, que seus recursos são findáveis,
tomando assim uma postura ecologicamente correta, evitando os
desequilíbrios provocados pelo ser humano, em razão do uso desordenado
dos recursos naturais da terra.
Paulo Afonso (2010) ainda salienta que a principal característica deste
princípio reside no fato de que o desequilíbrio ecológico não é indiferente ao
Direito, lembrando que o Direito Ambiental só se realiza em uma sociedade
36
equilibrada ecologicamente, e que conforme determina o art. 225 da
Constituição Federal cabe ao Poder Público a proteção da fauna e a flora,
impedindo as práticas que colocarem em risco a função ecológica ou
provocarem a extinção de espécies. (p. 60)
3.1.2 - Princípio do direito à sadia qualidade de vida
Todos os seres humanos têm o direito de buscar uma sadia qualidade
de vida. O que é ter qualidade de vida? É apenas não ficar doente? A ONU
mede a qualidade de vida, levando em conta três fatores: saúde, educação e
produto interno bruto.
Para se ter uma sadia qualidade de vida devemos levar em conta
também os elementos da natureza, ou seja, fauna, flora, água, solo, ar, pois se
estes devem estar saudáveis, pois são essenciais para que o ser humano
possa usufruir de uma boa qualidade de vida.
3.1.3 - Princípio do acesso equitativo aos recursos naturais
Tal princípio entende que os recursos naturais são um direito de todos
e que todos devem usufruí-los de forma igual. Em contrapartida, é dever de
todos preservar tais recursos para que possam ser usados por todos e não por
determinados grupos ou em apenas determinada época.
A exploração equilibrada dos recursos naturais, evitando o esgotamento
dos mesmos, garante que esses bens estarão disponíveis para as gerações
futuras.
37
3.1.4 - Princípios do usuário-pagador e poluidor-pagador
Os princípios do usuário-pagador e poluidor-pagador estão previstos no
art. 4 VII da Lei 6938/81 que ao reconhecer que os recursos naturais estão
escassos, e que o meio ambiente pertence a todos, a exploração gratuita por
alguns pode ser considerado um enriquecimento ilícito.
O princípio do usuário-pagador determina que aquele que se utiliza do
recurso natural deve pagar por sua utilização. Dessa forma se obtém a
compensação ambiental que está prevista no art. 36 parágrafo 3º da Lei
9.985/2000 e tem por objetivo contrabalançar os danos causados ao meio
ambiente.
Já o poluidor-pagador deve arcar com a responsabilidade corrigindo ou
recuperando o meio ambiente pelo dano causado. Tal pagamento tem como
objetivo evitar que outros pratiquem atos ou ações idênticas que possam
causar danos ao meio ambiente.
3.1.5 - Princípio da Precaução
O princípio da precaução tem como objetivo principal impedir
intervenções no meio ambiente, exceto, se tiver a certeza que tais intervenções
não causarão danos irreversíveis ao meio ambiente.
Busca-se através do princípio da precaução não só a preservação do
meio ambiente, mas também a integridade da vida humana. A intervenção do
homem no meio ambiente sem conhecer os riscos dessa intervenção,
compromete não só a sobrevivência da geração atual, mas principalmente as
gerações futuras. Diante da dúvida ou da incerteza dos impactos causados
por algum tipo de intervenção humana no meio ambiente, esta não deve ser
realizada. A preservação do meio ambiente e da espécie humana está em
primeiro lugar não podendo ser colocada em risco com intervenções duvidosas
38
e sem conhecimento das ameaças ao meio ambiente e na dúvida deve
prevalecer o interesse do meio ambiente, ou seja, o homem deve abster-se de
agir.
3.1.6 - Princípio de Prevenção
O princípio da prevenção não se confunde com o da precaução, já que se
conhecem os impactos da intervenção humana no meio ambiente.
Paulo Affonso Leme Machado (2010) divide o princípio da prevenção em
cinco itens: 1º.) identificação e inventário das espécies animais e vegetais de
um território, quanto à conservação da natureza e identificação das fontes
contaminantes das águas e do mar¸ quanto ao controle da poluição; um mapa
ecológico; 3º) planejamento ambiental e econômico integrados; 4º)
ordenamento territorial ambiental para a valorização das áreas de acordo com
a sua aptidão; 5º) estudo de impacto ambiental. (p.94)
O princípio da prevenção está previsto na Lei da Política Nacional do
Meio Ambiente (Lei 6.938/81) em seu segundo artigo. Corroborando, Édis
Milaré (2005) define o conceito de prevenção da seguinte forma: “Prevenção é
substantivo do verbo prevenir, e significa ato ou efeito de antecipar-se, chegar
antes; induz uma conotação de generalidade, simples antecipação no tempo, é
verdade, mas com intuito conhecido.” (p.265)
Conforme tal princípio, a conclusão que se chega é a da necessidade da
aplicação de medidas de prevenção para a proteção do meio ambiente.
3.1.7 - Princípio da Informação
Quando são mencionados os princípios do meio ambiente, é
fundamental que a sociedade civil tenha todo tipo de informação necessária,
seja ela visual, oral, eletrônica ou escrita sobre as condições do ar, água, solo,
39
terras, etc., pois a sonegação de tais informações por parte da Administração
Pública pode ocasionar danos irreparáveis ao meio ambiente.
Como salienta Paulo Affonso Leme Machado (2010), a informação serve
não apenas para o processo de educação da pessoa e da comunidade, mas
também para oportunizar a pessoa informada de se posicionar diante da
informação que lhe foi passada.(p.98)
A informação sobre o meio ambiente à população, está prevista no artigo
9º VII da Lei 6938/81. Através da informação que se forma uma consciência
ambiental da sociedade, possibilitando que o/a cidadão/ã cobre da
Administração Pública ações efetivas de preservação do meio ambiente, além
de, ao tomar conhecimento de qualquer dano ambiental, possa se utilizar dos
mecanismos existentes para cobrar das autoridades as medidas punitivas
contra o causador do dano.
3.1.8 - Princípio da Participação
O princípio da participação está previsto no art. 10 da Declaração do Rio
de Janeiro, da Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente, de
1992, onde declara que é dever de toda população e do Poder Público atuar
em favor da defesa e proteção do meio ambiente, com o intuito de garantir a
todos um ambiente sadio.
O direito ao meio ambiente possui natureza difusa e apesar de estar sob
custódia do Poder Público, tal fato não impede de forma alguma que o povo
atue em favor da conservação e preservação de tal direito, já que o povo é o
titular do mesmo.
A participação popular está cada vez mais atuante na defesa do meio
ambiente, seja ela através de associações , ONGs, segmentos religiosos, que
têm como objetivo atuarem conjuntamente com o Pode Público, em parcerias e
não em substituição ao Poder Público. A defesa do meio ambiente, com
40
contribuição da opinião popular deve ser o foco, e tal participação pode ser
verificada quando a população participa de audiências públicas, toma as
medidas judiciais cabíveis em favor do meio ambiente ao perceberem qualquer
ameaça que possa vir a causar danos a natureza, enfim se utiliza dos
mecanismos lícitos para defender o meio ambiente , ou seja sua própria
sobrevivência.
3.1.9 - Princípio da Obrigatoriedade da Intervenção do Poder
Público
Fianlmente, este princípio, previsto no art. 225 da Constituição Federal
definindo que todos têm direito a um meio ambiente ecologicamente
equilibrado, impõe ao Poder Público a promoção de medidas protetivas em
favor do meio ambiente, não podendo se omitir, sob pena de ser
responsabilizado civilmente e até mesmo criminalmente por prevaricação, pois
está gerindo bens ambientais (água, ar, fauna, flora, etc) que são bens de uso
comum de todos, devendo prestar conta a sociedade de como tais bens estão
sendo utilizados.
A partir desses princípios gerais elencados, atentado para a forma de
organização e representatividade social, jurídica e históricas do catolicismo e
metodismo no Brasil, nota-se que a responsabilidade socioambiental católica e
metodista correspondem diretamente aos princípios da informação e
participação.
Como segmentos religiosos, juridicamente compreendidos como
associações sem fins lucrativos, com intenções filantrópicas, tanto a Igreja
Católica como a Igreja Metodista possuem uma função social que conjuga a
conscientização e a ação. O papel conscientizador previsto pelo artigo 9º VII
da Lei 6938/81supracitado; e o papel ativo, correspondendo ao princípio da
participação contido na Declaração do Rio de Janeiro.
41
O que se seguirá serão as apresentações das iniciativas da Igreja
Católica e da Igreja Metodista neste sentido, consideradas e avaliadas pela
motivação ecoespiritual e situadas no contexto jurídico. Em primeiro lugar será
vista a iniciativa Católica contida na Campanha da Fraternidade de 2011,
seguida pela iniciativa metodista através do seu Centro Ecológico.
3.2 - Iniciativa da Igreja Católica: A Campanha da
Fraternidade 2011.
O que é a Campanha da Fraternidade? Trata-se de um projeto
motivacional promovido pela CNBB anualmente junto às instâncias
organizacionais da Igreja Católica no Brasil. Seu lançamento corresponde ao
início do período do calendário litúrgico cristão denominado de Quaresma. A
primeira campanha ocorreu em 1964, sob o tema “Lembre-se: Você Também é
Igreja”. (Campanha da Fraternidade, 1964).
Desde então seu leque temático gira em torno de inúmeras questões
tanto internas como externas ao ambiente eclesiástico. Ultimamente,
entendendo que a Igreja Católica é uma instituição de profunda relevância na
sociedade brasileira, seu enunciados correspondem diretamente a desafios e
angústias comuns partilhadas por todos os cidadãos e cidadãs independente
da pertença religiosa.
No ano de 2011 o tema girou em torno da ecologia: “ Fraternidade e Vida
no Planeta”. Conforme o Texto-base (2011) da Campanha apresenta:
“... A CNBB propõe que todas as pessoas de boa
vontade olhem para a natureza e percebam como as
mãos humanas estão contribuindo para o fenômeno
do aquecimento global, que provoca mudanças
climáticas consideráveis, com sérias ameaças para
42
a vida em geral, e a vida humana em especial,
sobretudo a dos mais pobres e vulneráveis. É nesse
contexto que a CNBB propõe para 2011, a
Campanha da Fraternidade com o tema
“Fraternidade e a vida no planeta”, e como lema “A
criação geme em dores de parto (Rm 8, 22)”. (Texto-
base, Apresentação, 2011)
A Campanha de 2011 não foi a primeira a tratar de ecologia. Em 2004,
sob o tema “Fraternidade e Água”, a CNBB procurou alcançar o seguinte
grande objetivo: “Conscientizar a sociedade que a água é fonte da vida, uma
necessidade de todos os seres vivos e um direito da pessoa humana, e
mobilizá-la para que este direito à água com qualidade seja efetivado para as
gerações presentes e futuras” (Texto-base, 2004).
Na Campanha de 2011, a preocupação externada girou em torno do
aquecimento global e suas ameaças à vida. Quais foram as propostas da
Campanha de 2011? Segundo o Texto-base (2011):
“... A Igreja no Brasil propõe, como Objetivo Geral:
contribuir para a conscientização das comunidades
cristãs e pessoas de boa vontade sobre a gravidade
do aquecimento global e das mudanças climáticas, e
motivá-las a participar dos debates e ações que
visam enfrentar o problema e preservar as
condições de vida no planeta”. (Texto-base da
Campanha da Fraternidade, 2011).
O que precisamente a CNBB procurou atingir como objetivos específicos
e metas, pela Campanha de 2011, são o que segue:
43
• A viabilização dos meios para a formação da consciência ambiental em
relação ao problema do aquecimento global e identificar
responsabilidades e implicações éticas;
• A promoção da discussão sobre os problemas ambientais com foco no
aquecimento global;
• A demonstração da gravidade e da urgência dos problemas ambientais
provocados pelo aquecimento global e articular a realidade local e
regional com o contexto nacional e planetário;
• A partilha de experiências, bem como da proposta de caminhos para a
superação dos problemas ambientais relacionados ao aquecimento
global.
Como estratégias foram propostas as seguintes ações: a mobilização de
pessoas, comunidades, Igrejas, religiões e sociedade “para assumirem o
protagonismo na construção de alternativas para a superação dos problemas
socioambientais decorrentes do aquecimento global” (Texto-base, 2011); a
proposta de atitudes, comportamentos e práticas fundamentados em valores
que tenham a vida como referência no relacionamento com o meio ambiente; e
a denúncia de “situações e apontar responsabilidades no que diz respeito aos
problemas ambientais decorrentes do aquecimento global”. (Texto-base, 2011).
Seguindo o método hermenêutico ver-julgar-agir, o Texto-base
apresenta com riqueza de informações alguns dados que evidenciam as
causas e a gravidade do aquecimento global, observa seguindo critérios
bíblicos e teológicos e, finalmente, propõe possibilidades de ações.
No último tópico, podem ser destacadas as seguintes propostas e
orientações:
44
Propostas para diminuir o consumo pessoal, como vinte itens:
“1º. Faça de conta que as sacolas plásticas não existem:
use bolsas e sacolas de algodão para carregar compras.
2º. Consuma produtos locais: o transporte de produtos que
vêm de longe consome petróleo e aumenta o efeito estufa.
3º. Diminua a temperatura de geladeiras, ar condicionados
e estufas no inverno e aumente no verão: assim, você vive
melhor e polui menos.
4º. Use melhor os eletrodomésticos: desligue o computador
e a televisão quando não são utilizados. O modo stand-by
consome energia e, portanto, polui.
5º. Pegue sol. Como? Com painéis solares – para aquecer
água ou produzir energia elétrica.
6º. Troque (se puder) de carro; prefira os movidos a gás ou
etanol. E, principalmente, use-os o menos possível.
7º. Fique com os pés no chão: os aviões provocam 10% do
efeito estufa mundial.
8º. Coma frutas e verduras (se orgânicas, melhor): carne
de ovinos e carne de bovinos são responsáveis por 18%
das emissões mundiais de gás carbônico, além de
favorecer o desmatamento devido à sua exploração
intensiva.
9º. Use fraldas ecocompatíveis: a biodegradação das
fraldas tradicionais leva 500 anos.
10º. Para conservar os alimentos, use vidro e não alumínio
ou plástico: esses poluem e, para a sua produção, o
desperdício energético é enorme.
11º. Informe-se com inteligência: existem centenas de
sítios, revistas e canais de TV que falam sobre meio
ambiente e a sustentabilidade.
45
12º. Não use papel: utilize a tecnologia digital para enviar e
receber documentos e para se informar. Assim, você salva
árvores e não polui com o transporte.
13º. Escove os dentes, mas com inteligência: se deixar a
torneira aberta, você joga fora 30 litros de água. Abra a
torneira só quando for preciso.
14º. Use lâmpadas econômicas: consomem cinco vezes
menos e duram 10 vezes mais.
15º. Coma de forma sadia, prefira o orgânico: é um método
de cultivo que respeita o meio ambiente.
16º. Coma com consciência: os hambúrgueres são bons,
mas, para serem produzidos, requerem uma grande
pegada ecológica. Pense nisso.
17º. Um banho é bom se dura pouco: em três minutos,
você consome 40 litros d'água. Em 10 minutos, mais de
130 litros em média.
18º. Pense sempre que todo objeto que você usa irá se
tornar lixo: faça com que ele dure o máximo possível.
19º. Usar e jogar fora? Não, obrigado. Por exemplo, use
pilhas recarregáveis: podem ser recarregadas até 500
vezes.
20º. Faça a coleta seletiva: é a contribuição mais
inteligente e mais importante que você pode dar ao meio
ambiente.” (Texto-base, 2011)
Além de uma série de outras propostas de ações apelando para o
envolvimento, não somente das dioceses e paróquias da Igreja Católica, mas
também de setores da sociedade civil, a Campanha da Fraternidade 2011
declarou que:
“A Campanha da Fraternidade apoia as iniciativas que
trabalham em favor do desenvolvimento de um grande
46
projeto de políticas públicas que atuam nas situações
emergenciais no Brasil. Essas situações devem, em
primeiro lugar, ser evitadas a todo custo, pois trazem
sofrimento e morte, geram fome, miséria e exclusão social.
Também é necessária a realização de um trabalho
preventivo no que diz respeito às situações de risco como,
por exemplo, construções em encostas ou em áreas
sujeitas a alagamentos ou correntes de vento. Este
trabalho deve promover a proibição de construções nessas
áreas e a remoção, com garantia de direitos, das que lá
existem, pois remover a casa depois da morte de alguns de
seus moradores não resolve. Este projeto deve também
desenvolver programas que não trabalhem simplesmente
as situações emergenciais, mas continuem conduzindo um
processo que leve efetivamente à superação das questões.
A Campanha da Fraternidade de 2009, Fraternidade e
Segurança Pública, mostrou que a defesa civil é de
responsabilidade dos Estados e Municípios102. É
necessário ir além e construir um projeto nacional de
defesa civil, com controle social a partir da criação de um
organismo social que exerça o controle sobre o projeto no
seu planejamento, realização e avaliação.” (Texto-base,
2011).
O passo seguinte nesta etapa da pesquisa é descrever a atuação do
metodismo, no campo da responsabilidade sócio-ambiental, por meio de uma
das instituições ligada à Igreja Metodista no Brasil.
47
3.3 - Iniciativa da Igreja Metodista: O Centro Ecológico
Metodista Ana Gonzaga
O Centro Ecológico Metodista recebe o nome da Dona Ana Gonzaga,
proprietária da antiga Fazenda de Inhoaíba, localizada no bairro de Campo
Grande na Zona Oeste da Cidade do Rio de Janeiro. São 400 hectares
inicialmente doados, em 1927, para que a Igreja Metodista estabelecesse um
orfanato. Além de um orfanato, organizado em 1932, as terras doadas por Ana
Gonzaga também abrigaram mais recentemente um lar para pessoas idosas.
Tais instituições ocupam hoje um pouco mais de 100 hectares da área total da
antiga propriedade. (CASTRO, 2003, p.169).
As terras de Ana Gonzaga estavam divididas em pequenos sítios na
ocasião da doação. Como o crescimento demográfico no Grande Rio nos anos
da década de 1960, a propriedade foi cercada por bairros populares,
contribuindo muito para a degradação de uma área verde que correspondia a
alguns resquícios de Mata Atlântica.
Por iniciativa da liderança eclesiástica da Igreja Metodista naquele
momento, foram realizadas algumas reuniões em 1989 que resultaram na
constituição do Centro Ecológico Ana Gonzaga (CEMAG), visando
fundamentalmente a preservação de uma área de 76 hectares, bem como o
desenvolvimento de projetos de conscientização ambiental. Em 1999 o
CEMAG recebeu do IBAMA o certificado de “Reserva Particular de Patrimônio
Ambiental”. (CASTRO, 2003, p.170)
A principal motivação dessa Instituição hoje é a preservação da Mata
Atlântica, combatendo assim o desmatamento a partir de projetos de
sensibilização e conscientização ambiental das igrejas da denominação
Metodista.
48
A iniciativa da constituição do CEMAG reflete o comprometimento social
da Igreja Metodista em que se firma e afirma nos seguintes termos, quando
conceitua a ação social da Igreja no documento basilar Plano para Vida e
Missão da Igreja:
“A ação social da Igreja, como parte da missão, é
nossa expressão humana do amor de Deus. É o
esforço da Igreja para que na terra seja feita a
vontade do Pai. Isto acontece quando, sob a ação
do Espírito Santo, nos envolvemos em alternativas
de amor e justiça que renovam a vida e vencem o
pecado e a morte, conforme a própria experiência e
vida de Jesus Cristo.” (Cânones, 2007, p.36)
Correspondendo à conceituação, bem como ao compromisso social, o
Conselho Diretor do CEMAG participou em 2002 da décima quinta Semana
Wesleyana, promovida pela Faculdade de Teologia da Igreja Metodista, em
São Bernardo do Campo, sob o tema “Meio Ambiente e Missão: a
responsabilidade ecológica das Igrejas”. Na ocasião, os representantes do
CEMAG apresentaram as iniciativas e projetos realizados até então, sugerindo
algumas ações ecológicas nas diversas instâncias da Igreja Metodista.
No âmbito das igrejas locais foram sugeridas ações como o
despertamento da consciência da preservação da natureza por meio dos
estudos de textos bíblicos; oferecimento de cursos de reciclagem,
aproveitamento de plantas medicinais, nutrição; desenvolvimento de atividades
que criem uma consciência crítica sobre o problema do desperdício de
recursos naturais; criação de ministérios de ecologia. (Cf. CASTRO, 2003,
p.177)
Às instâncias distritais o CEMAG sugere que organize seminários
reunindo pessoas interessadas no tema ambiental e divulgue o trabalho do
49
próprio CEMAG. (Cf. CASTRO, 2003, p.177). Na esfera das regiões
eclesiásticas, a promoção de cursos de conscientização e capacitação através
da Secretaria de Ação Social e CEMAG; a criação de um site com reportagens,
fotos, estudos, endereços relacionados com o tema ambiental; a criação de
uma pastoral sobre ecologia e meio ambiente; e a criação de um cadastro de
profissionais metodistas na área. (Cf. CASTRO, 2003, p.178)
Finalmente, o CEMAG sugere à Igreja Metodista no âmbito de sua
administração nacional: a publicação de estudos sobre o tema ambiental nas
revistas de Escola Dominical, desde a infantil até a de adultos; a criação de
uma pastoral do meio ambiente; e a promoção da educação ambiental nas
áreas de educação da Igreja, com especial atenção à educação teológica
formadora de pastores e pastoras. (Cf. CASTRO, 2003, p.178)
A Igreja Metodista entende, como parte de sua própria constituição, que
seu compromisso social é uma forma de cumprimento da vontade de Deus
para a humanidade. Por essa razão é que nas iniciativas como a do CEMAG,
da Faculdade de Teologia, e ainda do Seminário “Impacto das Mudanças
Climáticas e Exclusão Social”, sediado no Instituto Central do Povo (uma
instituição de serviço social da Igreja Metodista localizado atrás da Central do
Brasil, no Rio de Janeiro), sob a organização da ONG Visão Mundial
evidenciam o comprometimento e a responsabilidade sócio-ambiental. (Cf.
COSTA, 2011, p.4)
É importante salientar que a motivação reside na espiritualidade. Pois
bem, uma vez apresentada a atuação metodista, precedida pela católica na
questão ambiental, a pesquisa dará o último passo nesta etapa. Como,
criticamente, devem ser vistas as iniciativas católica e metodista no que
concerne à responsabilidade sócio-ambiental?
50
3.4 – As Iniciativas das Igrejas à Luz da Ecoespiritualidade e
do Direito Ambiental
Lembrando do que foi dito a respeito da ecoespiritualidade: trata-se de
uma forma de espiritualidade que desvincula a mentalidade sobre e a atuação
na natureza do utilitarismo e antropocentrismo; é possível avaliar em que
medida as iniciativas socioambientais católica e metodista são significativas
para o memento atual. Assim, algumas considerações podem ser feitas à luz
dos desafios pontuados nessa nova forma de espiritualidade.
A primeira consideração a ser feita a partir do referencial da
ecoespiritualidade diz respeito, precisamente, ao deslocamento da posição
antropológica. As duas iniciativas partem dessa premissa. O apelo feito pela
Campanha da Fraternidade, quando convoca tanto cristãos católicos, como de
outras confissões e a própria sociedade ao envolvimento no combate ao
aquecimento global evidencia uma nova concepção do ser humano diante da
natureza: elo ético, e não dono da criação. A mesma concepção, ao que
parece, orienta os projetos do CEMAG, ficando patente nas sugestões
encaminhadas às instâncias da Igreja Metodista por ocasião da Semana
Wesleyana em 2002.
A marca da cooperação em contraposição à lógica competitiva da
sociedade de consumo e mercado atual parece ter sido um desafio abraçado
tanto pela Campanha da Fraternidade, como pelo CEMAG. É fundamental nas
duas iniciativas a atuação voluntária, compassiva e, sobretudo, altruísta e
cooperativa do ser humano na reversão do quadro do aquecimento global
(através do consumo consciente), assim como na preservação da Mata
Atlântica nos projetos do CEMAG. Em substituição ao pensamento egoísta que
resulta na exploração dos recursos, as iniciativas católica e metodista
demonstra a responsabilidade socioambiental expressando a
ecoespiritualidade por meio da exortação ao cuidado com a Terra na qual e da
qual somos.
51
Ao abraçar a dinâmica do cuidado, ao mesmo tempo as duas iniciativas
abraçam o desafio de cultivar uma forma mística de lidar com o a ecologia de
maneira generosa, acolhedora, reunindo ao convívio humano toda
biodiversidade circundante. Há uma conjunção presente no Texto-base na
Campanha da Fraternidade e na declaração de propósitos do CEMAG entre o
transcendente, do humano consigo mesmo, com o próximo e com o meio
ambiente. Essa conjunção desfaz uma visão individualista e exploradora do ser
humano sobre suas relações, corroborando com uma visão integrada, não
mecanicista da antropologia.
Finalmente, o pano de fundo das duas iniciativas é a noção de que o
planeta, o outro, quem somos são ambientes da morada do Sagrado que,
portanto, são dignos de reverência e dedicação.
No que se refere ao Direito Ambiental, precisamente no tocante aos
princípios da informação e participação, algumas observações podem ser
feitas. Em primeiro lugar, pelo que evidencia no Texto-base, a Campanha da
Fraternidade de 2011 exerceu um papel conscientizador e, portanto,
basicamente informativo aos católicos é à sociedade como um todo. É o que
evidencia objetivamente os dados estatísticos que apresenta, somadas às
orientações práticas às diversas instâncias que caminham na direção de ações
concretas de compromisso sócioambiental.
Por seu turno, a iniciativa socioambiental da Igreja Metodista pareceu
exercer o duplo papel conscientizador e prático. Os projetos do CEMAG levam
tanto em consideração o princípio da informação, uma vez que contemplam a
condução de dados que se relacionam com a preservação do meio ambiente;
como o princípio da participação, realizando projetos de replantio e
concretamente de preservação da Mata Atlântica.
52
Através da análise da Campanha da Fraternidade 2011, no âmbito
Católico; assim como dos projetos e propostas do CEMAG, no âmbito
Metodista, pode ser constatada à luz da ecoespiritualidade, bem como do
Direito Ambiental, que se tratam de iniciativas que expressam a preocupação e
compromisso socioambiental desses dois ramos do Cristianismo brasileiro.
53
CONCLUSÃO
Seguindo o roteiro metodológico proposto, a pesquisa inicialmente
situou a Igreja Católica e a Igreja Metodista histórica e socialmente. Em
seguida estabeleceu o critério para observação e análise das duas igrejas, a
partir das conceituações de espiritualidade, ética ambiental e
ecoespiritualidade compreendendo-as como elementos motivacionais para
atitudes de preservação e compromisso socioambientais das duas
denominações, por de tratarem de aspectos da motivação cristã em termos
gerais. O percurso findou com a análise dos projetos socioambientais do
catolicismo e metodismo no Brasil à luz da ecoespiritualidade, apresentando
sua crítica, avaliando a adequação das iniciativas das duas igrejas a partir do
referencial mencionado.
O caminho percorrido possibilitou que algumas conclusões pudessem
ser formuladas, atingindo assim os objetivos lançados, bem como confirmando
a hipótese do compromisso assumido minimamente pelas Igrejas estudas
através das suas iniciativas ecológicas.
1. O catolicismo e o metodismo são ramos significativos do cristianismo,
presentes e relevantes na sociedade brasileira, sendo compreendidos
como instituições juridicamente bem estabelecidas com formas de
organização sólidas. Portanto, a relevância e solidez social dessas
denominações se mostram mais evidentes uma vez que se considere
representatividade, pela Igreja Católica, da CNBB; e das ações sociais
da Igreja Metodista, por meio das suas instituições.
2. A motivação socioambiental cristã reside na forma de espiritualidade
libertadora que, posta diante da necessidade de assumir a
responsabilidade ética frente aos desafios ambientais, se manifesta
como ecoespiritualidade. A manifestação dessa espiritualidade se
estabelece como o referencial para a práxis ecológica cristã.
54
3. Tanto a Campanha da Fraternidade 2011, no âmbito Católico; assim
como dos projetos e propostas do CEMAG, no âmbito Metodista,
observadas sob o prisma da ecoespiritualidade e do Direito Ambiental,
são iniciativas que expressam a preocupação e compromisso
socioambiental desses dois ramos do Cristianismo brasileiro.
Pode-se ainda inferir que as iniciativas, embora significativas e
relevantes, ainda não são suficientes para um nível maior de comprometimento
socioambiental dos fieis católicos e metodistas no Brasil. Em função de uma
limitação metodológica imposta pela exigüidade do tempo para elaboração
desta pesquisa, não se pôde mensurar a eficácia da Campanha da
Fraternidade 2011, tampouco a adesão dos metodistas aos projetos e
propostas do CEMAG. Essa lacuna poderá ulteriormente ser suprida com uma
pesquisa de campo junto a paróquias católicas e igrejas locais metodistas.
Todavia, a principal conclusão que se pôde chegar confirma a hipótese,
o coração desta pesquisa. A Igreja Católica e a Igreja Metodista assumem
minimamente o compromisso socioambiental através do que declaram
institucionalmente. A constatação que se faz é que tal compromisso é, pelo
menos, expressado no campo projetual na Igreja Católica uma vez
considerando que a Campanha da Fraternidade possui em si um propósito
motivacional para ações diocesanas e paroquiais. Tal propósito torna o
catolicismo brasileiro cumpridor do seu papel conscientizador, seguindo assim
o princípio jurídico ambiental da informação.
No âmbito metodista o compromisso abraçado parece ter ido um pouco
mais adiante. A estruturação de uma instituição, objetivamente voltada para a
preservação ambiental, denota uma ação concreta que ultrapassou à fase da
idealização e motivação (princípio da informação). Fica, contudo, uma lacuna
55
que reside na ausência de verificação das iniciativas recentes e impacto sobre
as igrejas locais metodistas conforme anteriormente sinalizado, podendo-se
inferir com certa coerência que, através dos projetos e da própria criação do
CEMAG, o metodismo segue e cumpre o princípio jurídico ambiental da
participação na sociedade.
56
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http://www.metodistavilaisabel.org.br/docs/MetodismonoBrasil.pdf (Acesso
em 25 de setembro de 2011).
60
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 2
AGRADECIMENTO 3
DEDICATÓRIA 4
RESUMO 5
METODOLOGIA 6
SUMÁRIO 7
INTRODUÇÃO 8
CAPÍTULO I
O CATOLICISMO
METODISMO NO BRASIL 10
1.1 – A Igreja Católica no Brasil 10
1.2 – A Igreja Metodista no Brasil 14
CAPÍTULO II
A MOTIVAÇÃO SÓCIOAMBIENTAL
CRISTÃ 21
2.1 – A Espiritualidade Cristã Libertadora 22
2.2 – A Ética Ambiental Cristã 24
2.3 – A Ecoespiritualidade Cristã 27
CAPÍTULO III
A RESPONSABILIDADE SÓCIOAMBIENTAL
DAS IGREJAS 33
3.1 – Princípios Gerais do Direito Ambiental 34
3.2 – A Iniciativa da Igreja Católica:
A Campanha da Fraternidade 2011 41
3.3 - A Iniciativa da Igreja Metodista:
O Centro Ecológico Metodista Ana
Gonzaga 47
3.4 – As Iniciativas das Igrejas à Luz da
Ecoespiritualidade e do Direito Ambiental 50
61
CONCLUSÃO 53
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 56
ÍNDICE 60
Recommended