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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
PRÓ-REITORIA DE CULTURA E EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA
PREFEITURA DO CÂMPUS ADMINISTRATIVO DE RIBEIRÃO PRETO
SEÇÃO DE ATIVIDADES CULTURAIS
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
ReitorProf. Dr. ADOLPHO JOSÉ MELFI
Pró-Reitor de Cultura e Extensão UniversitáriaProf. Dr. ADILSON AVANSI DE ABREU
Prefeito do CampusProfa. Dra. EMÍLIA CAMPOS DE CARVALHO
Divisão de Apoio à Cultura e ExtensãoJOÃO BRAZ MARTINS JÚNIOR
Seção de Atividades CulturaisAURÉLIO MANOEL CORRÊA GUAZZELLI
Equipe:
AURÉLIO M. C. GUAZZELLI (LELO)CARLOS DE ARAÚJO ARANTES
JOSÉ GUSTAVO JULIÃO DE CAMARGOREGINA CÉLIA REIS DA SILVA
ISSN 1516-0513
poesia & prosa
VOLUME 12
Seção de Atividades Culturaisda Prefeitura do Campus Administrativo
de Ribeirão Preto - USP
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULOPRÓ-REITORIA DE CULTURA E EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA
PREFEITURA DO CAMPUS ADMNISTRATIVO DE RIBEIRÃO PRETODivisão de Apoio à Cultura e ExtensãoSEÇÃO DE ATIVIDADES CULTURAIS
Produção: Seção de Atividades CulturaisCoordenação do Projeto: Lelo Guazzelli
Seleção de Originais: Claudio Bazzoni e Rosie MehoudarPreparação e Edição Gráfica: Sheila Guimarães
Revisão: André BordiniDesenhos: Marina Simões Florio Ferreira,
pós-graduanda em psicologia - FFCLRP/USP
SEÇÃO DE ATIVIDADES CULTURAIS •DVACEX •PCARPPrefeitura do Campus Administrativo de Ribeirão Preto • USPRua Pedreira de Freitas, casa 04 – tel.: (16) 3602.353014040-900- Ribeirão Preto / SP
www.pcarp.usp.br/cultura cultura@pcarp.usp.br
TTTTTeeeeexto do júrixto do júrixto do júrixto do júrixto do júri
O texto literário é fonte inesgotável de conhecimento, de des-coberta, de reflexão e de divertimento. É uma das formas mais en-cantadoras de fruir o viver. O autor de um texto literário faz umaleitura pessoal do mundo e o “traduz” por meio de uma seleção ecombinação de palavras. É o uso especial das palavras que torna otexto literário artístico. Assim, quando estamos diante de criaçõesficcionais de “toque poético” que produzem emoção estética, é es-sencial observar o que o texto diz (o conteúdo) e como diz (comoestá escrito).
Foi pensando assim, que nós, do júri, selecionamos os textosque compõem o volume 12 do Poeta de Gaveta - 2005. Não foi tare-fa fácil! Vimos qualidades em todos os textos inscritos. Todos, emversos ou em prosa, apresentavam o(s) tema(s) que abordavam demaneira inteligente e instigante. Lendo-os, vislumbramos inúmerasformas de amor, refletimos sobre a estranheza e familiaridade docotidiano, passeamos por paisagens, por pensamentos, por sonhos,pelos sentidos. Mas, como se sabe, para realizar as escolhas, é inevi-tável restringir, comparar, analisar, julgar, excluir...
Queremos dar parabéns a todos que se inscreveram para oPoeta de Gaveta - 2005. É importante lembrar que a viagem literáriadeve continuar sempre. Para que continue e nos revele quem somos,como somos, como nossa vida é, precisamos de textos escritos porquem ama o ato de escrever e o encara como um instrumento demaravilhamento e de compreensão. Como disse Guimarães Rosa:um livro também deve valer pelo que nele não deveu caber.
Claudio Bazzoni e Rosie Mehoudar
Claudio Bazzoni é doutor em Literatura Espanhola pelaFaculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, daUniversidade de São Paulo. Estuda o teatro alegórico deCalderón de la Barca e de outros escritores do Século de Ouroespanhol, numa perspectiva retórica. É professor de literaturabrasileira e escreveu, entre outros, “A beleza está nos olhosde quem a vê”, “Ler e viver o texto literário”. É um doselaboradores da Proposta Curricular, 2º Segmento do EnsinoFundamental de EJA, na área de Língua Portuguesa, do MEC/INEP. É consultor na área de Linguagens, Códigos e suasTecnologias, e atua na formação de educadores.
Rosie Mehoudar é doutora em Literatura Francesa pelaFaculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, daUniversidade de São Paulo. Estuda a obra de StéphaneMallarmé. É professora universitária de Língua Portuguesa,pesquisadora do Laboratório do Manuscrito Literário naUniversidade de São Paulo e coordenadora de oficinas deescrita. Escreveu ensaios como: “Linguagem e subjetividadenos Contos Indianos de Mallarmé”, “O Nome-do-Pai e ocircuito da significação em aberto.”
Sumário
11 À PRIMEIRA VISTA > EDBERTO FERNEDA
13 VISÕES (ENXERGÂNCIAS) > WERNER ROBERT SCHMIDEK
15 PUPILAS-ESPELHOS > DAYANA NATALIA TRIFONI
17 JARDINS QUADRADOS > MILTON AUGUSTO V. DE ÁVILA
19 SERVIDÃO DA LIBERDADE > RONIE CHARLES FERREIRA DE ANDRADE
21 HISTÓRIA SEM CORDA > VITOR HUGO DE OLIVEIRA
25 SAUDADEANDO > JULIANA MILITÃO BERBERT
27 GARI > RONALDO NOVAES
29 SOBRE OS HUMORES DE MEUS PÉS > MILTON AUGUSTO V. DE ÁVILA
31 FORTUITA DUALIDADE > AGDA RITA LORENCINI ROSA CAMPOS
33 AEROPLANO > MANOEL ANTONIO DOS SANTOS
35 ARMADILHA PARA DEMÔNIOS > MANOEL ANTONIO DOS SANTOS
39 TRÍADE PERFEITA > RONALDO NOVAES
41 FLOCOS E NEVE > GABRIEL WAN-DICK CORBI
43 DICOTOMIA > MÁRCIA B.R.AGUILAR
45 VELA > FELLIPE MIRANDA LEAL
47 RELENDO CAZUZA > MANOEL ANTONIO DOS SANTOS
49 FILHO MEU... > MARIA LUIZA DE MORAES SOUZA
53 CICLO > EDBERTO FERNEDA
55 MORTE MORRIDA > ANA MARIA DE ARAÚJO MELLO
57 USO LIMITADO > MÁRCIA B.R. AGUILAR
59 CINZA > MILTON AUGUSTO V. DE ÁVILA
61 DESVALOR > ANA RAZABONI
63 AMIZADE > AGDA RITA LORENCINI ROSA CAMPOS
65 PESCARIA > FABIO SCORSOLINI COMIN
67 DOMINGOS > MARIA LUIZA DE MORAES SOUZA
69 DA BOCA, DOS PRAZERES > ALEX WAGNER DIAS
71 TEMPESTADE > LARISSA DE ANDRADE DEFENDI
73 SEMPRE DA NOSSA FORMA DE AMAR > ALEX WAGNER DIAS
75 SER TERAPEUTA OCUPACIONAL > DAYANA NATALIA TRIFONI
77 SÓ O ÓDIO CORRE AGORA EM MINHAS VEIAS > NATÁLIA GALLO MENDES
79 MEUS OLHOS DE A(DEUS)! > ALEX WAGNER DIAS
81 BORBOLETAS NO TERREIRO > DANIELE CRISTINE DE LIMA BONONI
83 MENINO SONHADOR > CLÁUDIO SILVA CARDOSO
85 ASAS... > PÂMELA SOARES DE BALDINI ROCHA
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À primeira vistaEDBERTO FERNEDA
Seu de nuvens
choveu
alegria
e dis-sol-veu
meu
D - FFCLRP
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Visões (Enxergâncias)WERNER ROBERT SCHMIDEK
Ver e enxergar,enxergar e ver.Coisas tão próximas.Aparentemente...
Agora estou sozinhomas te enxergo(sem te ver),evidentemente.
Logo estaremos juntos.Espero te enxergarsem te perder de vista,viu...
Nos vemos já há muito tempo.(Nos enxergamos já há muitas vezes).E cada vez parece a primeira.E cada vez nos (re)descobrimos.
D – FMRP. Adv. Literária Científica.Poesia para “consumo interno”.
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Quanto mais te vejo,mais aprendo a te enxergar.E passo a enxergar detalhesque antes não eram enxergáveis.
E conhecendo estes detalhesaprendo a te ver.Aprendo a buscar peculiaridadesantes invisíveis.
Ver é ato rápido.Não fosse o nosso lento cérebro,poderia ocorrer à velocidade da luz.(Poderia ocorrer junto com a luz).
Mas enxergar é ainda mais rápido,pois vemos à velocidade do pensamento.E enxergamos no tempo;para diante e para trás.
Vemos cores.Sete são as do arco-íris;e os esquimós vêem dez tonssó de branco.Mas enxergar é ainda mais pleno,pois além das coisasenxergamos emoções.(Coisas tristes são mais lentas).
E enxergamos o amorque além da emoção,tem corese temperaturas.
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Pupilas-espelhosDAYANA NATALIA TRIFONI
A força das palavras que não dizemosfeitas por olhares que não se calam.Nossos silêncios cúmplicesque captam nós dois separados......e mesmo assim, juntos,unidos por pupilas-espelhorefletem o que dentro de nós já habita.
A - Terapia Ocupacional. Gosto de falar da vida,da alma, do que sinto e do que vejo.
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Jardins quadradosMILTON AUGUSTO V. DE ÁVILA
Felizes as flores feias e que têm em seus[espinhos as gotas dos insetos.
Pobres que nunca saberão por que se iludem,nem mesmo que feios podem ser.
Aquela flor grosseiraque não aprende a balançar no vento,e que nem tento ver por ter bela cor.
A flor que espalha seu perfume no nariz do[insano inseto que não sou.
Flor de boa sorte que não conhecerá um vasoe achará o seu um belo caso entre os amores
[não-vividos.É a flor que vejo ter sua importância ao primeiro
[que a viue cativou seu corpo para, enfim, cortá-lo
[e nada mais...
A – Biologia. Nunca publiquei. Escrevo.
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Servidão da liberdadeRONIE CHARLES FERREIRA DE ANDRADE
A liberdade é uma escravidãoque me leva a qualquer parte do que existe,do que posso ver, do que sei sentir, do que sei dizer,das ilusões, do que sou capaz, do que posso sonhar...do que vai além de mim,do que dentro de mim está...,do que aquém de mim ficou...revirando em minha mente,a liberdade de pensar.Porque sou livre!Livre?
Para seguir a servidão de todos os caminhosque abrem as grades do impossível.
F – Psicologia.
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História sem cordaVITOR HUGO DE OLIVEIRA
Sinto que o tempo passa e eu persisto. Manter-se não é algo dese orgulhar. É sobreviver, mesmo se não há a opção para seguir.Caminhar com o Tempo, isso é digno. Assumir que ao virar umaesquina, após tomar um refrigerante e comer dois salgados, acompa-nhados daquela paz que oculta o cansaço do cotidiano, um metalovalado atravessa seu caminho. Aí ele segue, e é você quem fica.Vira passado. Ser passado é inexistência presente. Ter passado énostalgia.
Quando era criança, me orgulhava de resistir ao calor do asfal-to. A grossa palma dos pés mantinham-se sobre o solo quente deRibeirão Preto em janeiro. As vezes era preciso correr, mas quandoficava ali, parado, percebia que aquilo subia-me pelos pés mas nãome incomodava – eu era um herói, sobre-humano.
Tenho passado, mas agora persisto. Algo rompe a linha históri-ca, vê-se um campo nebuloso onde nada que possui grande sanidadepenetra. Depois disso, eu. Ali, a contar.
Um, dois, três. Lembro-me de meu reino. Centenas de miniatu-ras formavam famílias, possuíam casa e função. Todos sob um go-verno forte, centralizado pelo meu alter-ego. Acho que na verdadeeu não era o governo. Sempre tive vocação para ser Deus. Animavao plástico, e dizia: “Do polímero vieste, ao polímero voltarás”. Enesse meio termo viviam. Os velhos vidros de esmalte de minhamãe; feiticeiras e magos representavam aquela pressa de resolver-setudo rápido – o mundo salvo a cada tarde. Assim me sacrifiquei, e nadivina posição persisto.
A – Psicologia. Já é o terceiro ano que me inscrevo no PG. Sempre escrevi, mas sóhá pouco tempo foi que comecei a expor meus trabalhos.
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Só há dois problemas na perfeição. Sua solidão e suainexistência. Há também sua finitude, pois o clímax é o início dofim. Fim, que fim? Só persisto.
Se houvesse um relógio de pêndulo em casa, teria jogado talcriatura aos ventos pela janela até o quintal. Seu ir e vir, tic-tac, 1, 2,3, 4, 5... contar, contar para quê? Se ainda soubesse o que me movea contemplar, parado, a observar todos passando, com seus carros,em seus dramas de chegar do trabalho prontos para falarem de seusdias, ou não. Olhando e contando, 4, 5, 6,... tic-tac, tempo passa e eupersisto. Todos passam por mim, cumprimentam, vão, vêm outros,que também passam, dão bom dia e eu respondo “hum-hum”.
Nas aulas de biologia, via quem eu era. A luz atingia meusfotorreceptores, abriam-se canais de sódio, e lá ia um impulso pelonervo óptico para minha nuca, saía pela esquerda, passava pela mi-nha orelha e unia-se a um pulso elétrico dizendo “Bom dia, comovai?”. Daí era só seguir mais um pouco, parar e dizer “hum-hum!”.
Era dono de mim, de minha vida, meu corpo, contemplava –sabia o porquê. Cogito ergo sun! Fotorreceptores, 5, 6, 7, 8, cócleatic-tac, faringe hum-hum! Tudo em seu lugar, ritmado e ordenado,exaltados por serem donos de si!
Mantinha os pés no asfalto. Ali, brincando sem me preocuparde ir em casa, para um fútil chinelo de dedo. No máximo, as caridosasárvores cediam-me suas sombras para que eu esperasse um pouco erespirasse. Inspira, expira, 6, 7, 8,...
Já tenho vários pôr-do-sol. Todos os têm. Mas poucos os vêem.Já vi alguns. Laranjas, vermelhos, rosas, o céu numa variação deazul-claro ao marinho. Vi também seus extremos, o nascimento deesferas amarelas gigantes. Podia vê-las sem ter que desviar os olhos.Acho que sempre desafiei o Sol. Um Deus de derivados petrolíferosnão deve teme-lo, a não ser que derreta sua criação.
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Fazia questão de montar uma cidade inteira, pôr todos os per-sonagens. O protagonista era pequeno, laranja, com orelhas de ursocarcomidas e pequenas, olhos alegres. Fiz-lhe uma voz infantil, frá-gil porém destemida. Ele não estava só, uma pequena gata, cor-de-rosa, de voz meiga, era sua namorada. Ela rapidamente se foi. Todosse foram. Persisto.
O interessante de persistir é que o tempo não passa para nós.Ele nos abandona, e acompanha aqueles que estão ocupados demaispara percebê-lo.
O devir temporal encontra-se quando seu primo aparece emsua casa, usando uma roupa de abrigo que você reconhece comosua. E ele é 10 anos mais novo... De repente achamos uma foto ondesua pele lisa, cabelos desarrumados e roupa suja de barro se mos-tram, e você nem se lembra de quando foi; 8, 9, tic-tac...
Minha vó possuía três relógios no quarto (tic-tac)3. Dois foramparar na cozinha, do outro lado da sala, numa noite em que dormialá. O tempo me irrita. Tira toda novidade do mundo, pois olho, vejo,é só tic-tac, ele lá, me olhando, distante, com suas longas barbasbrancas pelo chão. A sua córnea esbranquiçada não me permite dis-tinguir o quanto seus olhos eram azuis. A raiz amarelada do cabelo,o que sobrou dele misturado às longas barbas, eram consoantes coma cor das unhas desgastadas. Já não sorria mais. Só me olhava abalançar o cajado, pastoreando o mundo a contar. 10, 9, 8, 7... E eudaqui também enumerava 8, 9, 10. Persisto.
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SaudadeandoJULIANA MILITÃO BERBERT
É bom ficar quietinha com vocêAqui sozinha no meu cantoO trazendo bem pertinho (lembrando)Assim tão fácil:Te saudadeando.
A – Física Médica. Na atividade literária comecei após entrar na faculdade. Gosto deler e estou tentando escrever sempre e melhor a cada vez.
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GariRONALDO NOVAES
A vassoura baila no silêncio da noiteA lua brilhaMas não há tempo para poesiaO pensamento vagaPelas contasPelos contosPelos cantosO pensamento divaga...
Uma folha caída ao chãoLetras miúdas escritas à mãoUma lágrima se funde ao suorUma lata, um loteO carrinhoO caminhoO meio-fioA meia vida
A vassoura baila no silêncio da noiteUm canto sem encantoFaz o tempo passarLuvas, botas, boné, macacãoA noite se esconde nos braços da auroraA pálpebra pesa: descortina as trevas!A cidade acorda, a vassoura descansa,A mão... Não!
A – Música. Sou aprendiz da música, da vida e da poesia.
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Sobre os humores de meus pésMILTON AUGUSTO V. DE ÁVILA
Maldita alma viva que se diz defuntaNão sabe que meus pés são sensíveis ao chão quente?E ah... se eles falassem... Não diriam nada!Suariam como o fazem normalmente.
Descobriram, pois, que amam, e suportam muito breveSão piegas, calejados e doentes,Febris, ansiados e freqüentesEm desmaios pelas pegadas serem poucas.
O encontro agora é um caminho longo e percorridoSe pudesse haveria de ter outro,Mas é tão florido e belo e vivoQue se meus pés falassem, eu seria canhoto.
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Fortuita dualidadeAGDA RITA LORENCINI ROSA CAMPOS
Era uma vez... A bem da verdade, era só o final de tarde deuma quarta-feira qualquer.
O sol ainda esparramava variantes em tons alaranjados no céusem nuvens e foi justamente essa nuance forte que reavivou-me alembrança de fatos passados ainda agorinha no Fórum da cidade.
Segundo discorrido, tratava-se de acontecimento passional...como pode um homem aceitar a traição da mulher amada?
O crime: assassinato cometido com requintes de crueldade. Sómais um crime...
O réu: homenzinho simplório, magro, a aparência frágil acen-tuada pela vestimenta (um horrível macacão alaranjado), pelo cortede cabelos tão rente à cabeça, pelo olhar fixo no nada. Claudionor.Só mais um réu...
A juíza, autoridade novata no Fórum, com o olhar quase au-sente, em estática e alheia observação a um homem escancarado àignomínia popular.
Saltaram-me à mente as rebuscadas palavras da eloqüente nar-rativa do ilustre doutor advogado de defesa... aqui, seria o réu ino-cente!
Ato seguinte, desfilou o também ilustre doutor promotor, comprovas e processos à mão. Impiedosamente trabalhando para a con-denação de tão brutal desfecho para simples briga de casal. Conjec-turas? Testemunhas. Seria aqui, o réu culpado!
Tudo por lá transcorrera de forma comedida, permitindo quecada um dos sete jurados do tribunal se insinuasse pelos caminhosda investigação, de maneira fria e pessoal.
Minhas opiniões e conclusões se fundiram entrelaçadas e teri-am me absorvido completamente não fosse, logo aqui, na saída do
F – PCARP. Só abro minhas gavetas para o Poeta!
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Câmpus da USP, um bilhete grudado num poste de iluminação: “Clécio,eu te amo. Tha”. E em outro poste e em mais outro... e em todos ospostes daquela rua.
Os postes, geometricamente enfileirados, se rendiam pacíficos àque-la dose de alienação juvenil, aos caprichosos bilhetes ali colados. Osten-tavam-nos, até. Pareciam embasbacados por tal fantasia.
Afastando o fantasma do pudor, ela, provável jovem mulher, fazianua divulgação de seu sentimento.
Talvez, permeando estrelas em noite romântica e quente, ela tenhase inspirado na lua decidindo-se, assim, por essa declaração de amor.
Num desejo quase insaciável resolveu mostrar o quanto estavaamando ao mundo todo, ou apenas aos que transitam por esta rua... noscarros... nos ônibus... a pé!
Não se sustentava em irresponsabilidade. Amava excitantemente.Amava a ponto de deixar exposto o nome do eleito nos postes de umavia pública.
Os postes não são frios; frios são os olhos de sonhos mortos do réu.Os postes não são inertes; inertes são os planos do réu.Os postes não são vazios; vazio é o espelho de vida do réu.De novo a jovem e o réu.As dores se desenvolvem em fases distintas e intermitentes.As paixões, idem.Amara a vítima, o Claudionor?Corresponderia à jovem, o Clécio?Ainda a jovem dos bilhetes e o réu.A independência e o privado de espírito. A audácia e a falta de
liberdade. A sonhadora e o desacreditado. A generosa e o egoísta.
O Fórum e o Câmpus.Lá, um cadáver ocultado... cá, um romance escancarado.Clécio... declarado, divulgado, invejado.Claudionor... acuado, julgado, condenado.
_ Ah! Lelo, meu querido amigo! Não há poesia onde não hásonhos... porque não há sonhos ali onde não existe vida!!!
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AeroplanoMANOEL ANTONIO DOS SANTOS
Para Beth
áureo plano:a céu aberto se renovaa minúscula felicidade
D – Psicologia
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Armadilha para demôniosMANOEL ANTONIO DOS SANTOS
a) Armadilha para demônios
1. os presságiosno relógio da sala
hora após horao tempo avisa:
não há descanso
2. os cenárioso que falta em fala
transborda nos gestoso que fala em falta
tece a teia de palavras
3. as biografiasa linfa da vida
se aferra ao corpoque a doença desalinha
em sua caligrafia
4. os combatesa morte nas entrelinhasrondando nossas falas
pronuncia sua sentençaem paletós de cambraia
5. os inquilinosdentro do álbum de retratos
o convescote de suicidas ilustresa conspiração de solteironas aflitas
o estandarte dos herdeiros falidos
6. os ardisnas fotografias amarelecidaso irresistível relicário de engodosas cinco chagas vivas de Cristoestelionato da carne:reino do malogro
7. os exercíciosparentes tramamassassinatos íntimossobrinhas cometempecados ímpiosimpostores elucidamcrimes perfeitostudo se desgastana moldura carcomida– a morte não é misericordiosa
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b) Armadilha para mim(A mãe):envolvida pelos vapores da cozinhanão esquece de entoar a ladainha(A avó):toda a vida despendidaem bandeiras e procissões(A bisavó):matriarca entre elixires e urinóiscamuflada no xale preto de famalicão(O pai):ranger de botas estalando o assoalhono epicentro da sala um alçapão(A tia):engomando suas anáguas castasincapaz de transmitir sua semente(A prima):excomungada depois que deuo passo torto(Os rebentos):na linha de sucessão da dinastiaantes do conhecimento das trevas
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Na galeria de retratos desfila o cortejo dos antepassados(mando senhorial ou caráter duvidoso?)
Arcaicas arcas onde almas & armas recendemà alfazemaUm boi de punhos engomadosrumina os segredos de família
O que foi feito, patriarca de teu reino desesmarias?Que fim levaram as dominicais iguarias os cataplasmas e o frasco de cafespirinao pijama que arrastava suas sandálias– dálias de uma extinta estirpeque permanecem como barbatanas no bolso?O mais restou do que uma vez se disse:– um amplexoe um espinho na bocatudo são melindres– ausência às avessas
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Tríade perfeitaRONALDO NOVAES
Àquele que É!
Meu ponto de tensão encontra, em ti, resoluçãoFlutuam sobre mim harmônicos seriais de tua voz fundamentalOnde meu barco dissonante encontra o cais e a paz constante
Em terças sobrepostas em azuis e tons floraisEncontro a harmonia e regozijo em recitaisEm contrapontos, cantus firmus, leio contos, ouço hinosE meus olhos de menino brincam feito torvelinos com as folhasdos quintais
Na harmonia das esferas ouço a tríade perfeitaNo encadeamento dos meus dias sinto tua mão direitaAfinando o pensamento e trazendo à tona o somDe onde flui a melodia em que a vida faz canção
No descompassar da história busco aflito o ritornelloNa ânsia de viver e reviver o Bom e o BeloNo refrão inconfundível onde cantam rios e valesEu me encontro pronto e findo, junto a ti no Gran Finale!
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Flocos e neveGABRIEL WAN-DICK CORBI
Olha pela janela:“_ É ela!”A neve se desfaz em flocose os flocos se desfazem nela.Não se sabe se é o floco ou a neveque se forma primeiro.Mas é a sensação de quesão a expressão do mesmogelo...
Formas poéticas de se contara nostalgia, a melancolia.Ainda bem que há poesia.É nela que a gente se desfaze ela se desfaz na gente.Traz o algo que se senteigual o gelo...em água corrente.
A - Terapia Ocupacional. Participei do PG em 2003 compublicação e em 2004.
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DicotomiaMÁRCIA B.R.AGUILAR
O veio da vida viajaTurbulento, por vezes sereno,
Com cachoeiras, que se conformam a planícies;Com manancial cristalino e aquelas
Pequenas flores brancas,Perfumadas,
Que em suas várzeas crescem!
Água!Sangue incolor que pulsa a vida.
Esteve em MartePara que vida lá houvesse?
Vai, caudaloso!Dança em curvas suntuosas
De sua floresta virgem.Pulsa, coração da mata!
Derrama teu sangue.Balança a torrente
Enquanto a mão do homem não te feriu,Enquanto teu sangue é incolor.
Lágrimas... Oh, não! O que fizeram contigo?A majestosa natureza que te circundava
Cedeu espaço para o asfalto.Corpo d’água mutilado.
Arrancaram teus braços e tuas pernas.Transformaram tuas margens em marginais.
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Indefeso, tiraram tua inocência!Alteraram teu curso, teu relevo, tuas quedas.
Sim, foste violentado,Espremido em tubos de concreto.
Lavado com vômitos urbanos.No céu da pátria raia o sol da liberdadeNo seio de tuas entranhas escravizadas.
Abusaram de tua passividade!Não há mais flores nem peixes.
Apenas o odor fétido que de ti emana.
Sobre ti, correntes aéreas úmidas poluídas.Recebes a chuva ácida que em ti se precipita
Tua existência foi resumidaAo ser transformado em um lixão.És apenas um caldo mal-cheiroso
Que insiste em correr, insiste em viver.
Tua força é grandeMas não podes lutar sozinho nesta guerra
Nossa água, nosso rio,Onde iremos te levar?O ciclo desequilibrou.
Não gira mais adequadamente.Vida que nasce da morte?
Ou morte que nasce da vida?Onde cairá a vil roleta?
DesenvolvimentoX
Preservação
Ao pairar os olhos sobre teu leito,Uma tristeza miúda contorna os pneus
E os restos mortais de tua biodiversidade.Na foz, em estuário, jaz a vida....
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VelaFELLIPE MIRANDA LEAL
V E L A E L E ,ELE É UMA VELA;
E E L A V E L A . . .V E L A É E L A !
V Ê - L A ?A P A
GOU-SE
A
VELA.
A – MEDICINA. PARTICIPEI DE ALGUNS PRÊMIOS, INCLUSIVE O PG.
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Relendo CazuzaMANOEL ANTONIO DOS SANTOS
Para o Marquinho
o tempo não párao tempo disparao tempo diz: pára!
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MARIA LUIZA DE MORAES SOUZA
Filho meuNaco de carne em meu seio futuro.Acalanto de sonhos no berço de meus braços.Não temasas trevas, as dores, a vidaa morteNão temas.Tudo está sempre morrendo.Tu estarás sempre morrendonas trevas, nas dores, na vidana morte.O belo é amanheceres.Ressuscitares semprepara a morteaté que um dia chegue sem aurora.O mundo passará sobre tioutros pés e passossobre teu corpo de mimque nunca será meusobre teus pés diversose teus rumos outros.Vontade de abarcar-tena concha de minhas mãos!(luz cálida sem lágrimas)mas nada que possa mataráa morte, as dores, as trevasa vida.
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Tens de viver, filho meue o mundo não é beloe o homem não é beloe muitas coisas não são belas.Mas podes sermesmo nesse mundomesmo com eleou por eleLembra-te de que és livrepara os erros sempre novose não insistas em errarpor passados repisados.Agora ao meu lado, vidazinha,de que me adianta sonhar-te um futuro?O futuro, tu mesmo tens de sonharsabendo que nunca sairá a teu contento.Serão os homens muito rudes sempreo mundo áspero e feioe tudo parecerá burro e subvertidoo amor de pouco fôlegoas belezas frágeiso poder medonhoserão os olhos e o pânicoos dedos em riste, o escrutínioo mistério e o medo.E eu, nem teu sangue todoeu, nem toda a tua metadeo que fazer enquanto espero?Espero e amopor seres meu filhoe não há mérito na escravidãonem no amor.
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Serás meu filho para semprepara tua penatua desgraçateu desesperoteu massacretua revolta.Vais odiar-me, filho meucomo odeiam todos os que amamsó fé sem razão algumano inefável.E por baixo da tua sobrecasacano bolso de ter ódiovais amar-me, minha criacomo o reduto de tudo que degenera em ticomo arcabouço do que não ésrestolho da tua novidade.Perdão, filho meuque agora que és sonho pequeno e frágileu tremo na borda de teu berçoe desespero triste por trazer-tenesse leito pequeno de desconfortoao mundo mortal dos que não te amam.Perdão pela lágrima, o tapa, a falta,o afago, o beijo, o carinho, a casa,a vida, a morte, o tempoperdão porque nunca serás meufilho meu.Até sempre.Tua mãe.
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CicloEDBERTO FERNEDA
A semente brotaa flor
da terra
E só se notaa cor
tão bela
Mas nela tocaa dor
da fera
E o vento cortasem dó
a quimera
E já rotao odoré mera
Lembrança remotado amorque dera
Mas mesmo mortaoutra florbrota dela
E outra vez se notaa flor
da terra
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Morte morridaANA MARIA DE ARAÚJO MELLO
Eu quero morrerDesse tipo de vidaDesse tipo de vida eu não quero viver
Eu quero morrerDesse tipo de vidaPara poder viverA morte morrida.
F – COSEAS. Sou educadora brasileira e como talnão ando atrás de belas coisas boas, ando atrás de bons desafios.
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Uso limitadoMÁRCIA B.R. AGUILAR
Racionem a águaRacionem a energia
Racionem seus pensamentos
Os pregos saltam das paredesFicam apenas os buracos
O silêncio prega marcasMuito profundas, que doem
A dignidade vai escorrendoNas veias abertas da injustiça
Como um sistema carcerárioDos mais aviltantes e degradados
Quem quebra o silêncio?Não, não há permissão para largar a omissão!
ViverSobreviver
É a teimosa insistência na vida.
Vida racionada
A – Química. Participei em anos anteriores do PG e do Projeto Nascente.
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CinzaMILTON AUGUSTO V. DE ÁVILA
Um intento de gotas que seduz a terra nuaDesfila por folhas com destino ao chão
Entre passeios e sombras pela majestade sensívelSons de um violão
Como indica e manda a perfeição naturalComo sonha o insano um lugar ideal para não estar
E expiro, então, o ar que respiroEspero, em vão, que não seja o primeiro
A ter o céu que, só, admiroCinza como os olhos que se dizem azuis
Cinza que o intento ainda seduz,Céu bastardo que jamais seria luzAo lugar ideal para ser e não estar.
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Desvalor,Desamor,Mau humor,É pensar que já valemos,O empenho,O suor,O labor,Nessa vida margarida,Com dois pesos e várias medidas,Com ensinar sem saber,Com aprender sem querer,E com o dane-se,Sem ao menos poder,E ninguém a merecer,Esse descaso,Com pouco caso,E sem valorÉ desvalor.
Desvalor,Desamor,E só resta a dor,Por quê?
Desvalor
Desvalor,Desamor,Essa dor,Que se vê,Que se ouve,Se sente,Essa dor que pressente,Essa alma perdida,Esse corpo doente,Essa mente,Nem sempre presente,Esse grito,Que não é ouvido,Essa guerra,A que somos submetidos,Esse frio só por dentro,Que já foi bem sentido,Esse medo,Do assalto embutido,Essa violência sem esperança,Que muito me cansa,Pensar que agora,Há alguém bem lá fora,Sem tênis...
ANA RAZABONI
D - FORP
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AmizadeAGDA RITA LORENCINI ROSA CAMPOS
Amizade...é uma mistura de emoções.São sensações rápidas.São momentos meio-mágicos.Exemplos que marcam a alma,turbulência cadenciando a calma.Feito bailarina maduraensaiando passo de dança.Feito poeta desconhecidoe seus cordéis de esperança. Parece colcha de retalhosonde se costuram, caprichosamente,problemas, ansiedades, angústias, premonições...dúvidas, medos, conquistas, bons resultados...riso solto, meio-bobo, luta diária e explicações.É um ensinar com o exemplo,um bem-querer fraternal.É um respeito firmadonum sucesso compartilhado.Um não julgar, nem condenar.Aceitar a mão estendida,um afastar de desavenças.É doação de ensinamentose força sincera na lida.Tomar um livro emprestado,comprar briga lado a lado.Abrir a janela do mundoe enxergar o que não se via.
É!...meu caro João,amigo não se ganha todo dia!
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PescariaFABIO SCORSOLINI COMIN
“Disse-lhes Simão Pedro: Vou pescar. (...) E,tendo ouvido dizer que era o Senhor, cingiu-se com a túnica, e lançou-se ao mar. (...) Subiuà barca, e tirou a rede para terra, cheia decento e cinqüenta e três grandes peixes. E,sendo tantos, não se rompeu a rede. Disse-lhesJesus: Vinde, jantai”.
[João, 21: 3-13]
Peço a Pedro:joga em mim a redeque à boca me sobem peixesde toda sorte de vertebradosem espinhos e espinhasque espicaçammeu apetitede palavra.
Fala nos meandros de tuas mãosque puxam as reentrecidas cordasafogadas de sale batizadasnos teus ombrosde lobo do mar.
Fala sentindo o fogochamuscar a línguaque pentecostizaa vinda-ainda do amor que pregao meu nada-santo-evangelho:segura meu coraçãoque vem à tona.
A – Psicologia. Participei do PG vol. 10 e 11, antologias “Escritos para um novo milênio”(2001), “Poetas Brasileiros Contemporâneos” (2004). “Escrever sempre que possível, para
que a alma não pereça”.
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DomingosMARIA LUIZA DE MORAES SOUZA
Em minha cidadeque é todas as cidadesnos domingos de todos os diasas coisas andam entre pés de alfaceem passos de lagarta-borboletapassos lentos de fomeque serão vôosbelosem outro tempoem outra eterna idade.
Nada corre.Até a igualdadede todos os domingos,domingos como todos,é sem desespero e pressa,as crianças brincam de criançar,o almoço se cozinha para mais um,o café ferve no bule de arame amarrado,idéia do avô não-prático,eternamente requentado.
A mesa sempre à postospara uma refeição qualquerquer se tenha fomeou não.
A – Medicina. Publiquei alguns poemas em um jornal da minha cidade,e já ganhei alguns concursos, também em Rancharia.
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Come-se aos domingosnos dias da lagarta fome-sono.A saudade canta no rádiomúsicas de mãe-mocinha.Mãe menos moça cantaem língua que não conheçoem vozes de comício além do esmerilou dos furos de furadeiraou das marteladas de paique sempre tem algo pra arretar.Consertos sinfônicos tocam aos domingos.Acordam com fogo, pó e cheiro de caféfervem à tardeescurecem à noiteos domingose são intragáveis na segundagosto de amargo no corpode coisa velha e fria.Na segunda sempre se pensaque domingo é coisa tristeparada e mortasono e café frio.Mas segunda não éo dia domingonão é dia de se pensar.E os domingoscomo todos os domingosem todas as cidadesem todas as idadesem todas as famíliasserão coisa de lagartafome-sonopassos lentospés de alfacecorpo do casulopara o vôo após.
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Da boca, dos prazeresALEX WAGNER DIAS
As tuas faces manhãs são pêrasAzuis de cristal, num jarro arroio de salDois potes de mel nas pestanas e uma sandáliaRomanaDas flores do campo de Tróia.
Tuas manias de estares tão ventoComo as divinas maçãs do momento você passa e sorri.Teus moranguinhos na pele e os açudes que percorrem teu corpoSão de um perfume dos dias mais puros que nunca eu os vi.Vens tuas acerolas de espáduas sobrepostasComo borboletas dançantesDar, da aritmética progressiva a minha inimigaregressiva e nefasta solidão.Cachoeiras dos teus poros são mais quentessauna que a gelatina faço gostoDestes aconchegos vagarosos que só a noite tem para se safar felizDas obrigações que tem no lenho fardo dos homens de qualquer cor.
A – Ciência da Informação. Participei do PG vol. 10 e 11, entre outros.
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E as tuas mãos.Menina das sensações mais táticas, só queria saber dos desejos dohorizonte!Que meu olhar é qualquer coisa que te atravessa de tanto te sentir noolhar dos horizontes.As novelas sentimentais dos teus castelos de areia e tuas bonecas deporcelana e de nanquim,Tuas estrelas de teto e as auroras que colorem as preta e brancasensações de uma noite de lua enamorada. De lua constrangida deesfera e espuma e sândalo desmedida das fontesde uma cachoeira cais,sede-me teus seios para meu porto que em nada mais eu penso, emnada mais eu cresço, em nada mais sou tão liberto dessa alforria-amordo teu corpo de calor e luz.
Deixo-te pintá-la as asas das tuas palavras feito música orquestrada emque se quer dormir.Deixo-te fugir ensimesmada das fronteiras em que minhas garras tepoderão ferir.Aparo os anjos que te atravesseiram para que possas me dizer que anoite nem piscou nos teus olhos.
E cada dia o meu cardápio de você será um eu mais profundamenteamoroso-evoluído.
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TempestadeLARISSA DE ANDRADE DEFENDI
Quando o tempo começa a fechar e o clima fica assim, mais friozinho,mais ameno, lembro-me de um ocorrido singular da minha infância -como todos o são, nessa época tão onírica.
Era um sábado, eu e minha mãe preguiçosamente esparramadas nosofá, terminando de assistir um daqueles típicos filminhos românticosda sessão da noite. Toda semana, o ritual se repetia: após o filme, euescovava os dentes calmamente (para remover os restinhos da pipoca),vestia o pijaminha e aguardava impaciente que mamãe viesse ao quarto,quando delicadamente estendia as cobertas sobre mim.
Naquele dia, porém, não vimos o final do filme: um estrondo varou océu, indicando a tempestade que se aproximava. As luzes da casaapagaram-se, minha mão procurou a de minha mãe. Tentamos chegar atémeu quarto, tateando em uma meia-escuridão – lá fora, os raios no céuatravessavam teimosamente as frestas da janela e iluminavam a casa emflashes muito velozes. Quando, enfim, conseguimos nos sentar à beirada cama, a chuva já caía torrencialmente: o tilintar dolorido das pedrinhasde gelo na janela formava um uníssono com os uivos do vento naspalmeiras do quintal.
Mas a janela era, sem dúvida, o mais assustador: ela balançavaarduamente em seu leito, ao mesmo tempo em que era maltratada, sem amínima compaixão, pela chuva de granizo. Quase que se podia ouvirseus gritos desesperados de lamento. Aquilo me aterrorizava... Naincompreensão de meus quatro anos, virei-me para minha mãe – o rostopouco visível na luz dos raios – e lhe perguntei por que existiam chuvasdaquele jeito, tão más, tão avassaladoras: afinal de contas, o mau me eraum conceito desconhecido. Ela hesitou por um instante – hoje imaginoque fardo pesado lhe era ter respostas para todas as minhas dúvidas – e,enfática, respondeu-me que era o desejo do Papai do Céu. Somando-se àresposta, veio um abraço apertado e uma outra frase: "Ah, filhinha!Imagina só quem não tem uma casinha para se proteger, como nós.Imagina quem precisa dormir na rua... O que eles estariam sentindo agora?Será que estariam sofrendo muito?"
E eu imaginei pessoas com expressões tristes e assustadas, tentandose cobrir com papelões, escondendo com dificuldade o rosto da chuvade pedras. Confesso que meu coração partiu. Foi bem pior do que imaginar
A – Medicina. Escrevo para esquivar-me da náusea,da angústia e das tristezas do mundo.
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o meu dia seguinte trancada em casa, brincando na sala, como era de seesperar em dias chuvosos. Nesse momento, pareceu-me que um raio maisintenso cruzou o céu, iluminando sem pudor os móveis tímidos naescuridão. E ali, diante de mamãe e da claridade súbita, com a tempestadeimpiedosa ao fundo, presenciei minha primeira tentativa de abandonodo pensamento egocêntrico. Epifania. O mau não era um mau só paramim. E ele podia ser bem pior para os outros.
A partir daquele dia, sempre que houvesse uma tempestade qualquermaltratando a janela, eu me deitava com os olhos cerrados e imaginavaas razões que Papai do Céu teria em ordená-las para nós, os seres queviviam sob seu reino. Mas eu já sabia que Papai do Céu se tratava dealguém muito bom e que nunca desejaria o mau a nenhum de nós. Diantedisso, meu raciocínio foi imediato: se era ele quem controlava astempestades, passei a rezar para ele, e em todas as preces, eu o lembravadas pessoas que não tinham casa e lhe pedia que desse trégua aoshabitantes da Terra. E eu orava principalmente pelas crianças, porqueelas eram como eu: pequenas, frágeis, indefesas, vulneráveis. Enquantoo granizo fustigava a janela, eu cerrava os olhos com mais força, em ummisto de medo e súplica. Adormecia encolhidinha, mas despertava comos pássaros cantando alegremente na janela. A certeza de que um belodia azul me esperava era imediata, bem como a de que Papai do Céununca me abandonava.
Hoje em dia, tempestades castigam a minha janela com freqüência,como sempre o fizeram. Mas acabo poupando Papai do Céu, mesmoporque talvez ele já não me ouça com tanto afinco. Dizem que as vozesdas crianças chegam mais rápido até Deus, porque a inocência comoveaos anjos e esses decidem, eles mesmos, por levá-las até o chefe.Temperada pelas malícias do mundo, a minha súplica já não é tão doce eimaculada. Diante das preces de crianças tais como eu, a minha assumeo fim da fila, o lugar adequado à sua eloqüência.
Tempestades – de qualquer tipo – ferem o nosso orgulho. Fazem-nossentir tal qual a criança de muitos anos atrás, pequena e indefesa no meioda chuva de granizo. Mas será que é apenas Papai do Céu quem controlatodas as tempestades? Talvez eu ainda continue sendo essa criança, porqueem momento algum, desde aquele abraço confortador de minha mãe,voltei-me para mim mesma e me perguntei quem era o dono supremodos ventos e das chuvas, do sol e da brisa, da paz e da guerra. Talvez osconhecimentos (vastos) acumulados ao longo da vida não respondam.Talvez a resposta fuja completamente à nossa compreensão. Talvez elanão possa ser lida, nem ouvida, nem falada: apenas sentida. Talvez elasequer exista.
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Sempre da nossa forma de amarALEX WAGNER DIAS
Sempre da nossa forma de amarComo amo...Meus dedos percorremLongas datas de sua pele.
Este seu cheiro aindaVaga bucólico de aroma.Adormece lisa, estirada,Sua seda de fios perfumadosSobre o peito meu.
Não canto-lhe senão o silêncio,Nesta tez adormecida e róseaÉ que repousam meus pensamentos.
É primavera, dizem seus lábios.Seu pólen, porém, adormece.Reclinado a ti ouso...
Mas não uso o corpoPara sentir-lhe.Somente basta o sentimento.
Sempre da nossa forma de amarComo ama...Sei que tem profundos desejos
– e se são profundos –
Não são simples beijos;Seus dedos percorremLongas datas de minha alma.
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Ser terapeuta ocupacionalDAYANA NATALIA TRIFONI
Se um dia minhas mãos cessarem e se calarem. Se um dia eu não sentir o mundo com a ponta dos meus dedos. Se meus olhos se fecharem, se ficarem presos no escuro. Se minhas pernas não puderem caminhar para onde a liberdade me leva. Se o interno obscuro se transcender e se mostrar nu, e o externo parecer tão doente quanto aqui dentro está. Pensarei que seguir em frente é ilusão. O que me debilita é regresso. Minhas dores e sufocos, meus gritos calados, meus gemidos sufocados, todos tão à vista que, essa minha diferença, antes tão só minha e agora tão compartilhada, viraria indiferença em sociedade alienada.
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Mas aos poucos lembraria de tudo que sou, de tudo que acredito. Lembraria da paixão, que me move a vida inteira. E lembraria que tudo é vida, seja ela de qualquer maneira. Pensaria na transformação que minha profissão possibilita. E tentaria eu ser T.O. de minha vida.
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(Malditos! Malditos sejam todos vocês, seus cães miseráveis!)
NATÁLIA GALLO MENDES
Serei má!A bondade não leva a nada...Serei perversa!O amor é uma barca furada...
Só o Ódio constróiA paixão apenas destróiSer ruim será meu objetivoE a razão pela qual eu vivo
Irei destruir a quem me fizer tropeçarEsmigalhar a quem me enganarDestroçar a quem me atraiçoarAmaldiçoar a quem comigo falhar
Sinto-me agora rancorosa, vingativaE tenho vontade de ficar sempre na ativaCravando as unhas em quemSobre mim depositar a cabeça altiva
Eu quero ver sangue escorrendoCarnes dilaceradasGargantas gemendoE muitas vidas para sempre desgraçadas!
(Beatrice Goodfire, alter-ego de Natália Gallo)
Só o ódio corre agora em minhas veias
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Meus olhos de a(Deus)!ALEX WAGNER DIAS
Por que se fossem tão negros os passos da noitee as vozes do vento tocassem as coresmanhãs despertadas nos cachos-sabores do beijo da amadanum passo sem plumas, nem estranhezas agudas das luas do céue se fosse a torrente tão alta pra genteas vistas ardessem do inconscientenão fossem as frestas de luz tão clarinha de verdes pedidosdos cílios perdidos tombados no chão.Não fossem despertos os mastros ignóbeisdas formas sem formas do seu sorriso açoitee as malucas palavras que brotam das fontes mais desesperadasdas dores.O cacho das ruas e os arquivos tão vivostão mortos suscintosque a lembrança deixouseus dedos passando nas minhas entrelinhase as estrelas sozinhas me chamando de mãe.O suspiro das sestasdas horas incertastão cedo austeras para o interior.Tão tarde despidasverdades perdidas nos breus conformistasdos olhos de adeus!Meus pés, onde vagam?Areia sortidaqual fibra do peito estirada de mimdá tristes pesaresdas correntes pungentesdos filhos dormentes da luz da manhã.E simples a vidapasseia perdidaqual flor amanhecida sem cor nem perfume
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qual rio sem ternuradas águas escurassem sereia ou luar.Inda assim, maravilhas...não menos premissasdas menores divas,divindades do céu.Soberbas famintasas moringas e as tintaspintando infinitas paisagens ao léu.Se sentes, não temas!Se temes, não sintas!as obscuras descidas das tocas de mim:não penses tristezanão queiras certezaque tenho onde páraum andar mais longínquo;onde pairo sozinhosou mais pequeninoe valente o sei.Anedotas curtinhas,as cortinas da falados olhos, da facemeu Deus! como é graveviver sem ter Euviver de pertinhocom a estampa querendomais que o véu suspensoromper este breu.Romper a desfechadas frouxas conversasdo que se escreveu.Ora penso mais seco.Ora sinto mais puroe caminho tão certoque o enlevo das ferasacompanham-me, deveras, o coração a roer.
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Borboletas no terreiroDANIELE CRISTINE DE LIMA BONONI
E foi só tristeza quando meu tio buscou aquele lençol alvo,alvo... da nona.
No momento em que eles — o lençol e o tio — passaram pelasala, foram lágrimas acompanhadas pelo choro agudo da sanfona.
Tocava uma polca... e lá no terreiro, de grama baixinha,estavam estirados o passado e o presente do vô Juca.
Terno branco de linho, cheiro de loção barata e cravo vermelhono bolso. Parecia que se vestira para esperar por Ela.
Era um sábado de vento manso e leve o qual trazia o cheirodo campo— de mistura de muitas flores— e de terra molhada pelachuva da noite.
A vó olhava, de olhos azuis estalados, o movimento do lençol.Não derrubava uma lágrima e nem piscava. Acho que a experiênciae o cansaço de arrastar os chinelos roubaram-nas; amava sim o Jucae como.
Eram um casal exemplar, carinhosos e pacientes com asmudanças dos tempos e com os netos mais novos, que nem ligarampara a solene passagem do tecido.
A tia Zira foi quem os tirou das pernas do tio; achavam queera o pano de fazer a cabana para passar o fim de semana.
O vento soprou forte e quando o lençol foi cobrir o véio Juca,dono de um sorriso largo e olhar terno-eterno, o tio Neco não precisoude ajuda na outra ponta— parecia que o tempo não queria cobrir ovô...— era só solavanco.
A – ESALQ. Tenho participado de várias atividades que difundem a poesia...Visando sempre o aprendizado e engrandecimento pessoal.
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A sanfona parou e o vento também, e a fazenda brancapousou— naquela vida ali interrompida— como galho que caide repente.
A tia Zira berrava, o tio Neco parou de respirar, as crian-ças foram correr atrás das borboletas que apareceram ali— tal-vez à alma do vô tivesse cheiro de flor— e a vó Nesca entrouarrastando os chinelos, ainda mais pesados, e dizendo: — Vamosmeninos, hoje não tem comentário do sermão do padre Onofre,não tem bengala para o café da tarde e nem cheiro de cachimbo ànoite. Hoje não é sábado e o Juca não vem.
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Menino sonhadorCLÁUDIO SILVA CARDOSO
O menino vive sonhando,E diante de um universo de imaginação,Resolveu ser e se sentir lua,Distribuindo beleza,Iluminando caminhos,Matando saudades,Encantando namorados.Cultivando crenças, mitosControlando marés,Suavizando noites escuras,Inspirando escritores.Transformando montanhas em mistérios,Hipnotizando oceanos,Trazendo peixes aos pescadores,Esperança aos sonhadores.Cumplicidade ao assassino,Curiosidade no menino.Que diante de tanta imaginação,Que diante de tanta beleza,Descobriu um paraíso de luzes,E uma solidão imensa,Do tamanho da lua,E desistiu de ser lua,Quis apenas ser menino,Menino sonhador.
F – PCPS
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Asas...PÂMELA SOARES DE BALDINI ROCHA
Pássaro,algo isento de tributos, livre, só livre.Mas ainda assim distante.... ante mim.Era apenas um admirar o quãopodia se mexer no mundo.Sozinho,talvez com seus limites, mas muito menos que os meus.As asas davam isso.Também quero.Liberdade, porque escolhe os pássaros?
Aquela euforia, alegria de pessoas.Muitas pessoas.Mas sozinha também diante delas.Pensei ver um pássaro dentre tanta gente.Crente nisso, era fácil de ver,um ser sozinho,um ser livre,livre.
A – Medicina. Essa é a minha primeira participação em uma atividade literária, emborasempre tive o costume de escrever.
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Fazia-se sozinho,até perceber que não o era, não mesmo.Via-se com tantos pés, tantos quanto tinha eu.
Agora, asas deixou de ter.Por semelhança?Assim não deveria ser,mas assim é.Que pena.Se antes mais próximo sentissemenos tarja teria.Não queria vê-lo assimcom asas desgarradas.Cadê?Vamos voar primeiro livremente.Depois, sem asas.
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PROJETO POETA DE GAVETA
Inscrições realizadas no período de 02 a 27 de maio de 2005.Total de 34 participantes com 88 trabalhos:
Ribeirão Preto – 30 p – 78 t/inscritosPiracicaba – 3 p – 07 t/inscritosPirassununga – 1 p – 03 t/inscritos
Volume 12 – 2005 – ISSN 1516-0513
POETA DE GAVETA é uma publicação de poemas, contos e crônicasde alunos, funcionários e docentes dos campi da USP, editada pelaSeção de Atividades Culturais da Prefeitura do Campus Administrati-vo de Ribeirão Preto – USP. Os textos publicados são de inteira res-ponsabilidade de seus autores.
POETA DE GAVETA – VOLUME 12 - 2005
ISSN 1516-0513
Impresso em novembro de 2005. Tiragem de 800 exemplares.Distribuição gratuita. Proibida a Reprodução.
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