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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO FACULDADE DE MEDICINA
PROGRAMA DE PÓS - GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA SAÚDE
PARACOCCIDIOIDOMICOSE: perfil epidemiológico, clínico e terapêutico dos pacientes diagnosticados nos serviços de referência do Estado de Mato
Grosso (2006-2013)
Hugo Luciano de Almeida
Cuiabá - MT 2014
HUGO LUCIANO DE ALMEIDA
PARACOCCIDIOIDOMICOSE: perfil epidemiológico, clínico e terapêutico dos pacientes diagnosticados nos serviços de referência do Estado de Mato
Grosso (2006-2013) Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Ciências da Saúde da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Mato Grosso como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Ciências da Saúde – Área de concentração: Doenças infecciosas e tropicais. Orientadora: Prof. Dr.ª Rosane Christine Hahn
Cuiabá - MT 2014
UFMT UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
Reitoria Drª. Maria Lucia Cavalli Neder
Vice- Reitoria Prof. Dr. João Carlos de Souza Maia
Pró-Reitora de Ensino e Pós- Graduação Drª. Leny Caselli Anzai
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA SAÚDE
Coordenação Prof. Dr. Amilcar Sabino Damazo
Ficha Catalográfica Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
A447p Almeida, Hugo Luciano de.
Paracoccidioidomicose: perfil epidemiológico, clínico e terapêutico dos pacientes diagnosticados nos serviços de referência do Estado de Mato Grosso (2006-2013). / Hugo Luciano de Almeida. – Cuiabá, 2014.
75 f. : il. Dissertação (Mestrado em Ciências da Saúde) - Universidade Federal de Mato Grosso. Orientadora: Profa. Drª. Rosane Christine Hahn. 1. Odontologia. 2. Patologia Bucal. 3. Micoses. 4. Paracoccidioidomicose. I. Título.
CDU 616.31
Catalogação e Normalização
Bibliotecária Valéria Oliveira dos Anjos - CRB1/1713
A Deus, о qυе seria dе mіm sem а fé qυе еυ tenho nele;
Aos meus pais, Alberto, o “seu Polaco” e Cleoronice, a “dona Tita” meus exemplos de vida, equilíbrio e retidão;
Ao meu filho João Pedro pela compreensão nos momentos em que fui ausente;
Às pessoas acometidas por paracoccidioidomicose
AGRADECIMENTOS
À minha orientadora Professora Dra. Rosane Christine Hahn pela confiança em mim depositada, pelos ensinamentos, pela paciência e boa vontade em sempre estar à disposição;
A todos os professores do Mestrado, Prof. Cor Jesus, Prof. Francisco Souto, Prof. Amilcar e Profa. Denise;
Às secretárias da Coordenação de Pós-graduação em Ciências da Saúde, Keylla Okada e Hélida Leseux sempre simpáticas, atenciosas e prestativas;
Aos funcionários do MT Laboratório e do registro do Hospital Universitário Júlio Muller;
À Andréia Nery pelos conhecimentos, experiência e material compartilhados sem os quais as dificuldades na finalização desta pesquisa seriam muito maiores;
A Hugo Hoffmann pela fundamental ajuda na análise dos dados;
À Tomoko Tadano do Laboratório de Patologia Clínica do HUJM pela disponibilidade.
“Se você encontrar um caminho sem obstáculos, ele provavelmente não leva a lugar nenhum.”
Frank Clark
ALMEIDA, Hugo Luciano de. Paracoccidioidomicose: perfil epidemiológico, clínico e terapêutico dos pacientes diagnosticados nos serviços de referência do Estado de Mato Grosso (2006-2013). 2014. 75 f. Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde, Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá, 2014.
RESUMO A paracoccidioidomicose (PCM) é uma doença de caráter sistêmico cujas manifestações orais são bastante frequentes e muitas vezes o primeiro sinal da doença constituindo, portanto infecção fúngica de bastante interesse para a Odontologia. Foram coletados dados sobre gênero, idade, ocupação e procedência dos 230 pacientes atendidos no Hospital Universitário Júlio Muller (HUJM) e Laboratório Público do Estado de Mato Grosso (MT Laboratório), sobre a sintomatologia, localização anatômica das lesões, hábitos associados como tabagismo, etilismo e uso de drogas ilícitas, comorbidades, métodos diagnósticos, o tratamento instituído, tipo de entrada se caso novo, recidiva ou reentrada após abandono, sazonalidade e o encerramento de cada caso. Os resultados encontrados mostraram que a PCM é endêmica em Mato Grosso sendo mais frequente nas mesorregiões Norte e Centro-Sul do estado acometendo em sua maioria, indivíduos adultos do sexo masculino que tem ou tiveram sua atividade laboral relacionada ao meio rural ou que pela natureza do trabalho estão mais expostos à inalação de poeira. As lesões orais foram as mais frequentemente encontradas. Como conduta terapêutica a associação sulfametoxazol-trimetoprim continua sendo a droga mais empregada devido ao baixo custo e disponibilidade no Sistema Único de Saúde (SUS) no estado de Mato Grosso. Há alto índice de abandono e descontinuidade de tratamento dos pacientes atendidos no HUJM. O índice de tabagismo e etilismo associado a PCM foi bastante elevado. Observou-se que a maioria dos Cirurgiões Dentistas (CDs) não se sente apta para o diagnóstico da PCM e desconhecem os serviços de referência. Palavras-chave: Paracoccidioidomicose. Manifestações Orais. Mato Grosso. Epidemiologia.
ALMEIDA, Hugo Luciano de. Paracoccidioidomycosis: epidemiological, clinical and therapeutic profile of patients diagnosed in reference services in the State of Mato Grosso (2006-2013). 2014. 75 f. Dissertation (Master's) - Graduate Program in Health Sciences, Federal University of Mato Grosso, Cuiabá, 2014.
ABSTRACT The paracoccidioidomycosis (PCM) is a systemic disease whose oral manifestations are quite common and often the first sign of the disease and, thus constituting fungal infection of great interest in dentistry. Data such as gender, age, occupation and origin of 230 patients seen in Public Laboratory of Mato Grosso and Julio Muller University Hospital (JMUH), about symptoms, anatomical location of the lesions, associated habits like smoking, drinking and illicit drug use, comorbidities, laboratory diagnosis, treatment instituted, the type of entry if new case, relapse or re-entry after abandonment, seasonality and closure of each case were collected. The results showed that the PCM is endemic in Mato Grosso being more frequent in North and Central South mesoregions of state and affecting mostly adult males who have or have had their work activities related to rural areas or that the nature of work are more exposed to inhalation of dust. Oral lesions were most frequently found. As therapeutic conduct to trimethoprim-sulfamethoxazole remains the most used drug due to the low cost and availability in the Unified Health System – SUS (the public health system in Brazil) in the state of Mato Grosso. There is high rate of abandonment and discontinuance of treatment of patients seen at JMUH. The rate of smoking and alcohol consumption associated with PCM was quite high. It was observed that most dentists do not feel able to diagnose PCM and they ignore the reference services. Keywords: Paracoccidioidomycosis. Oral Manifestations. Mato Grosso. Epidemiology.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Distribuição por gênero dos pacientes acometidos por PCM ................. 35
Figura 2 - Distribuição por faixa etária de 229 casos de PCM ................................ 36
Figura 3 - Distribuição geográfica por mesorregião de 229 casos de PCM em Mato Grosso. .......................................................................................... 37
Figura 4 - Mapa de Mato Grosso por mesorregião de 229 casos de PCM. ............ 37
Figura 5 - Mapa de Mato Grosso por mesorregião – municípios com maior incidência de PCM (2006-2013 – HUJM e MT Laboratório) ................... 38
Figura 6 - Ocupação laboral principal de 165 pacientes acometidos por PCM em MT .......................................................................................................... 39
Figura 7 - Tipo de entrada em 230 casos de PCM ( HUJM e MT Laboratório - 2006-2013) ............................................................................................. 40
Figura 8 - Forma clínica em 229 casos de PCM. .................................................... 40
Figura 9 - Localização anatômica das manifestações clínicas em pacientes acometidos por PCM. ............................................................................. 41
Figura 10 - Hábitos e comorbidades associadas em pacientes acometidos por PCM. ...................................................................................................... 42
Figura 11 - Exames realizados para diagnóstico laboratorial da PCM (HUJM – MT Laboratório 2006-2013). ......................................................................... 43
Figura 12 - Casos de PCM em Mato Grosso (2006-2013) por períodos climáticos (secos x chuvosos). ................................................................................ 44
Figura 13 - Pacientes que receberam tratamento para PCM. .................................. 45
Figura 14 - Drogas utilizadas no tratamento de PCM. .............................................. 46
Figura 15 - Drogas utilizadas no reingresso ao tratamento por abandono ou recidiva ................................................................................................... 46
Figura 16 - Alteração da medicação prévia SMX-TMP para outra droga. ................ 47
Figura 17 - Alteração da medicação prévia Anfotericina B para outra droga ............ 47
Figura 18 - Encerramento dos casos de PCM .......................................................... 48
Figura 19 - Auto avaliação dos CDs em reconhecer lesões orais de PCM .............. 49
Figura 20 - CDs que prestaram atendimento a pacientes acometidos por PCM ...... 49
Figura 21 - CDs que acompanharam o desfecho do caso de PCM atendido ........... 50
Figura 22 - Direcionamento a ser dado pelos CDs aos casos de PCM. ................... 51
LISTA DE ABREVIATURAS
AIDS – Síndrome da Imunodeficiência Adquirida
CD – Cirurgião Dentista
CEOPE – Centro Estadual de Odontologia para Pacientes Especiais
CIE – Contraimunoeletroforese
CRO/MT – Conselho Regional de Odontologia do Estado de Mato Grosso
HIV – Vírus da Imunodeficiência Humana
HUJM – Hospital Universitário Júlio Muller
IB – Tipo immunoblot
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
ID – Imunodifusão dupla
IFI – Imunofluorescência indireta
MT – Mato Grosso
MT Laboratório – Laboratório Público do Estado de Mato Grosso
P. brasiliensis – Paracoccidioides brasiliensis
P. lutzii – Paracoccidioides lutzii
PCM – Paracoccidioidomicose
PSF – Programa Saúde da Família
PUC-RS – Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
SMX-TMP – Sulfametoxazol-trimetoprim
SNC – Sistema Nervoso Central
SUS - Sistema Único de Saúde
UFMS – Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
SUMÁRIO
1 REVISÃO DA LITERATURA .......................................................................... 12
1.1 PARACOCCIDIOIDOMICOSE – CONSIDERAÇÕES GERAIS ...................... 12
1.2 CLASSIFICAÇÃO CLÍNICA ............................................................................ 14
1.3 DIAGNÓSTICO LABORATORIAL .................................................................. 17
1.4 TRATAMENTO ............................................................................................... 21
1.5 ECO-EPIDEMIOLOGIA .................................................................................. 22
1.6 CASUÍSTICA .................................................................................................. 24
2 SOBRE O ESTADO DE MATO GROSSO ..................................................... 29
3 RELEVÂNCIA E JUSTIFICATIVA ................................................................. 31
4 OBJETIVOS ................................................................................................... 32
4.1 OBJETIVO GERAL ......................................................................................... 32
4.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ........................................................................... 32
5 MATERIAL E MÉTODOS ............................................................................... 33
5.1 DESENHO DO ESTUDO ................................................................................ 33
5.2 ASPECTOS ÉTICOS ...................................................................................... 34
5.3 CRITÉRIOS DE INCLUSÃO ........................................................................... 34
5.4 CRITÉRIOS DE EXCLUSÃO .......................................................................... 34
5.5 TABULAÇÃO DE DADOS .............................................................................. 34
6 RESULTADOS ............................................................................................... 35
6.1 GÊNERO ........................................................................................................ 35
6.2 IDADE ............................................................................................................. 36
6.3 DISTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA ..................................................................... 36
6.4 OCUPAÇÃO ................................................................................................... 38
6.5 TIPO DE ENTRADA ....................................................................................... 39
6.6 FORMA CLÍNICA E LOCALIZAÇÃO ANATÔMICA DAS LESÕES ................ 40
6.7 AGRAVOS ASSOCIADOS ............................................................................. 42
6.8 EXAMES REALIZADOS – DIAGNÓSTICO LABORATORIAL ........................ 42
6.9 SAZONALIDADE ............................................................................................ 43
6.10 DROGAS UTILIZADAS NO TRATAMENTO ................................................... 44
6.11 ENCERRAMENTO DOS CASOS ................................................................... 48
6.12 CONHECIMENTO E POSTURA DOS CDS FRENTE A PCM ........................ 48
7 DISCUSSÃO .................................................................................................. 52
8 CONCLUSÕES .............................................................................................. 59
REFERÊNCIAS .............................................................................................. 60
ANEXOS ......................................................................................................... 69
ANEXO A - PARECER CONSUBSTANCIAL DO CEP .................................. 70
APÊNDICES ................................................................................................... 73
APÊNDICE A - QUESTIONÁRIO ................................................................... 74
APÊNDICE B - FICHA EPIDEMIOLÓGICA ................................................... 75
12
1. REVISÃO DA LITERATURA
1.1 PARACOCCIDIOIDOMICOSE – CONSIDERAÇÕES GERAIS
Inicialmente denominada de Blastomicose Sul-Americana, a
paracoccidioidomicose (PCM) é uma micose sistêmica causada pelo fungo termo-
dimórfico Paracoccidioides spp, incluindo as espécies Paracoccidioides brasiliensis
(P. brasiliensis) (McEWEN et al., 1995; SHIKANAI-YASUDA et al., 2006) e
Paracoccidioides lutzii (P. lutzii) (TEIXEIRA et al., 2013).
Foi descrita pela primeira vez juntamente com seu agente etiológico pelo
pesquisador Adolpho Lutz em 1908, na cidade de São Paulo no Brasil, quando o
autor relatou a diferença entre o agente causador da PCM e o Coccidioides immitis
com o qual poderia ser facilmente confundido (TOLENTINO et al., 2010; MARQUES,
2008).
Em 1912, Alonso Splendore, classificou seu agente etiológico dentro de um
gênero já existente na micologia, o Zymonema, denominando-o então, Zymonema
brasiliensis (PALMEIRO; CHERUBINI; YURGEL, 2005). Posteriormente em 1930,
Floriano Paulo de Almeida criou o novo gênero, Paracoccidioides, e o nomeou
Paracoccidioides brasiliensis (MARTINEZ, 2009).
Em 2013 foi proposta nova espécie (P. lutzii) a partir de evidências
filogenéticas. Esta nova espécie foi descoberta graças ao aparecimento de
evidências genéticas e moleculares em isolados clínicos provenientes da região
Central do Brasil, especialmente o estado de Mato Grosso (TEIXEIRA et al., 2013) e
segundo Marques-da-Silva et al. (2012), a incidência de PCM causada por P. lutzii
pode estar subestimada na região Norte do Brasil. Os primeiros questionamentos
sobre a possível existência de diversidade genética dentro do gênero
Paracoccidioides foram aventados por Batista Jr. et al. (2010).
Como sua distribuição não é exclusiva do Brasil nem da América do Sul e
como “blastomicose” não era denominação apropriada, em 1971, durante importante
simpósio de micologistas das Américas em Medelín (Colômbia), o termo
paracoccidioidomicose foi adotado oficialmente (MARQUES, 1998; LACAZ; PORTO;
MARTINS, 1991). Nessa mesma reunião foi proposto ainda que a lesão primária no
pulmão ocorresse devido ao contágio por meio da inalação de propágulos
infectantes do fungo P. brasiliensis (DEL NEGRO; LACAZ; FIORILLO, 1982;
13
SHIKANAI-YASSUDA et al., 2006).
Os achados de McEwen et al. (1987), possibilitaram associar as atividades
agrícolas e de manejo do solo (agricultores, lavradores, operadores de máquinas
agrícolas, trabalhadores rurais) à aquisição dessa infecção.
A suspensão do fungo na atmosfera favorecida pelo desmatamento
acelerado e o revolvimento do solo para plantio facilitam a contaminação humana e
favorecem a formação de áreas hiperendêmicas com as mais altas percentagens de
adultos jovens infectados (GIMENEZ, 1998; FONSECA et al., 1999). O isolamento
de algumas cepas de Paracoccidioides brasiliensis em plantações de café em solo
mineiro reforçou a hipótese da aquisição da infecção durante atividades na
agricultura (SILVA-VERGARA et al., 1998).
Crê-se que a infecção por P. brasiliensis ocorra pela inalação de conídios
que ao parasitar os tecidos do hospedeiro se transformam em leveduras (FRANCO
et al., 1987) seguindo-se a disseminação fúngica por via linfática ou hematogênica,
quando o parasita adere e penetra o endotélio dos vasos sanguíneos invadindo
tecidos mais profundos (KULLBERG; ANAISSIE, 1998). A progressão de infecção
primária para doença depende do tamanho do inóculo, da patogenicidade e
virulência do fungo e da qualidade e integridade dos mecanismos de defesa do
hospedeiro e na dependência destes fatores a infecção primária pode regredir com a
destruição do fungo, permanecer na forma latente como organismos viáveis ou
progredir, comprometendo outros locais do organismo do hospedeiro, levando ao
aparecimento dos sintomas (BRUMMER; CASTANEDA; RESTREPO, 1993).
Alguns fatores de risco parecem estar associados à doença, como o
tabagismo e etilismo interferindo na relação agente-hospedeiro (LONDERO;
RAMOS, 1972; MARTINEZ; MOYA, 1992) então se deve considerar também que as
taxas mais altas de alcoolismo e tabagismo no sexo masculino favorecem a
instalação da doença (BENARD; DUARTE, 2000; MARQUES, 1998).
Níveis adequados do hormônio estradiol parecem inibir a transformação de
micélio para a forma infectante de levedura o que daria uma aparente resistência
das mulheres à doença (RESTREPO et al., 1984; SALAZAR; RESTREPO;
STEVENS, 1988; SEVERO et al., 1998).
Telles Filho et al. (1986), em estudo realizado em Curitiba, Paraná
observaram uma relação de 9,1 homens para 1 mulher, sendo que 78% dos
pacientes com PCM estavam relacionados à atividade agrícola, com uma maior
14
incidência na faixa etária compreendida entre 30 e 39 anos.
Londero e Ramos (1990) no interior do Rio Grande do Sul em estudo clínico
e micológico de pacientes com PCM encontraram uma relação de 16 homens para 1
mulher, a maioria (82,3%) agricultores na faixa etária entre 50 e 59 anos.
1.2 CLASSIFICAÇÃO CLÍNICA
Várias classificações foram propostas e em fevereiro de 1986 em Medellín,
Colômbia, no International Colloquium Paracoccidioidomycosis, foi apresentada uma
nova classificação, que à semelhança de outras micoses, presumia a existência de
infecção e doença e correlaciona dados clínicos à história natural da moléstia
(FERREIRA, 2005; SHIKANAI-YASUDA et al., 2006; BOCCA et al., 2013).
Reconheceram-se as seguintes formas clínicas:
1) Paracoccidioidomicose-infecção - Pacientes que residem em áreas
endêmicas e que apresentam teste cutâneo positivo com
paracoccidioidina. Não há depressão da resposta imune celular, sendo
possível o achado de cicatrizes radiológicas pulmonares.
2) Paracoccidioidomicose-doença - Pode apresentar-se nas formas aguda
ou subaguda e crônica.
2.1) Forma aguda ou subaguda (Tipo Juvenil) – Habitualmente grave, de
evolução mais rápida, afetando jovens de ambos os sexos e
comprometendo o sistema monocítico-fagocitário. Ocorrem dois
subtipos: grave e moderada.
2.2) Forma crônica (Tipo Adulto) – Caracteriza-se por evolução mais
prolongada, instalação lenta com alteração progressiva do estado geral
do paciente. Pode ser leve, moderada ou grave. São reconhecidos dois
subtipos: unifocal e multifocal.
3) Paracoccidioidomicose associada à imunossupressão – É a PCM
oportunística.
4) Paracoccidioidomicose sequelar – Resulta da combinação de processo
infeccioso, agravante (tabagismo) e reparação cicatricial.
A maioria dos indivíduos consegue conter a infecção e não desenvolve a
doença após o contato com o fungo, o que é evidenciado pela alta taxa de
moradores de áreas endêmicas que apresentam teste cutâneo de hipersensibilidade
15
tardia (HTT) positiva para antígenos do fungo, mas não apresentam qualquer
sintoma da doença (BETHLEM et al., 1999; WANKE; LONDERO, 1994). Tal
condição é denominada PCM-infecção e é muito mais comum do que a PCM-
doença, embora não estejam estabelecidos os índices precisos dessa relação
(SOUTO et al., 2000).
Em áreas de alta endemicidade, os inquéritos com paracoccidioidina
demonstram que até 52 a 60% da população tem ou teve contato com o fungo
(LONDERO; MELO, 1988). Em relação ao sexo não são observadas diferenças
significativas sendo que ambos estão igualmente expostos ao fungo (MOK; FAVA-
NETO, 1978).
A forma adulta ou crônica é geralmente mais localizada e menos agressiva
que a forma juvenil ou aguda, mais grave e disseminada. Em ambos os casos a
imunidade celular apresenta-se comprometida e a ausência de terapia específica
leva a altas taxas de mortalidade, principalmente em crianças (BENARD et al., 1996;
LACAZ, 2002).
Na forma juvenil que ocorre em crianças e adultos jovens de ambos os
sexos, a evolução da doença é rápida, com febre, emagrecimento e
comprometimento do sistema fagocítico-mononuclear (fígado, baço, linfonodos e
medula óssea) evidenciando-se nestes pacientes a presença de adenomegalia,
hepatoesplenomegalia e eventual disfunção de medula óssea, simulando doenças
linfoproliferativas. Estes casos representam menos de 10% da casuística geral da
doença (BENARD et al., 1994).
A forma aguda/subaguda (tipo juvenil) da doença é responsável por 3 a 5%
dos casos da doença, predominando em crianças e adolescentes e eventualmente,
acometendo indivíduos até os 35 anos de idade. A forma crônica (tipo adulto)
responde por mais de 90% dos pacientes e apresenta-se principalmente em adultos
entre os 30 e 60 anos, predominantemente, do sexo masculino (SHIKANAI-YASUDA
et al., 2006).
Gonçalves et al. (1998), analisando 36 casos de PCM aguda disseminada
em crianças, entre 3 e 12 anos, nativas do Estado do Rio de Janeiro e residentes em
área rural, observaram que 44,4% dos casos ocorreram em áreas onde existiam
condições climáticas e ambientais favoráveis à sobrevivência do P. brasiliensis tais
como a presença de abundantes cursos de água e preservação de alguma
vegetação nativa, distribuídas em áreas limitadas e bem definidas.
16
No período de janeiro de 1985 e julho de 1996 foram observados 102 casos
de PCM em hospital de Belém do Pará. Treze pacientes eram crianças entre 3 e 13
anos de idade, representando 12,7% dos casos, com predomínio do sexo feminino
(8:5). Todos apresentavam a forma disseminada subaguda da micose, observando-
se a alta prevalência em áreas endêmicas da região amazônica (FONSECA;
PARDAL; SEVERO, 1999).
A forma adulta ou crônica, que ocorre em aproximadamente 90% dos
pacientes, pode ser leve, moderada ou grave. As lesões variam desde uma
ulceração oral isolada até o envolvimento pulmonar difuso podendo apresentar-se
de forma localizada (unifocal), sendo o pulmão o órgão mais atingido ou como
múltiplas lesões que atingem mais de um órgão ou sistema, além dos pulmões,
apresentando sintomas variados com lesões na mucosa oral, nasal, pele, linfonodos
e em menor escala nas glândulas adrenais, intestinos e sistema nervoso central e
manifestações clínicas como tosse, expectoração e dispnéia a esforços. Sua
progressão é lenta e insidiosa, podendo levar meses ou anos para se estabelecer
como resultado da reativação de um foco latente da infecção fúngica (FRANCO et
al., 1987; BRUMMER; CASTANEDA; RESTREPO, 1993).
Por ser uma micose sistêmica, qualquer sítio orgânico pode ser acometido,
mas na forma crônica, os pulmões são frequentemente envolvidos (SHIKANAI-
YASUDA et al., 2006). As manifestações clínicas são produtos da complexa
interação entre o agente hospedeiro e das múltiplas variáveis capazes de influenciar
a história natural desta doença (FRANCO et al., 1987). Mesmo sendo o pulmão a
porta de entrada da infecção, são as lesões extra-pulmonares, em especial na
orofaringe, que habitualmente motivam a procura do tratamento. As lesões orais
costumam caracterizar a doença dando aos dentistas a responsabilidade de efetuar
o diagnóstico diferencial das lesões orofaríngeas e tornando este profissional uma
referência na assistência ao paciente de PCM (BISINELLI et al., 2001; VERLI et al.,
2005).
As lesões pulmonares são significativamente mais freqüentes nos casos
crônicos e muitos pacientes com lesões pulmonares evidenciadas radiologicamente,
não apresentam sintomas respiratórios (RIZZON, 1980; LEME, 1989; LONDERO;
RAMOS, 1990).
Os linfonodos são comumente envolvidos e, algumas vezes, há extensão
para outros órgãos, principalmente tecido cutâneo e adrenais (MENDES-GIANNINI;
17
MELHEM,1996; TENDRICH et al.,1994).
O sistema nervoso central (SNC) é comprometido em cerca de 6 a 25% dos
casos de PCM, sendo sua apresentação mais comum representada por lesões
expansivas, únicas ou múltiplas, em hemisférios do cérebro, cerebelo ou de ambos.
O potencial de sequelas das formas neurológicas desta micose é bastante
substancial. Os pacientes frequentemente evoluem com déficit motor, síndrome
convulsiva (epilepsia) e/ou hidrocefalia (SHIKANAI-YASUDA et al., 2006).
Pacientes com PCM, frequentemente apresentam comorbidades de
natureza infecciosa e/ou não infecciosa. Dos processos infecciosos, destacam-se
tuberculose, cuja associação é registrada em 5 a 10% dos casos e AIDS. Neste
contexto, indivíduos que, apesar do uso regular da medicação antifúngica,
apresentam resposta clínica insatisfatória devem ser investigados para a presença
de comorbidade ou sequela (SHIKANAI-YASUDA et al., 2006).
Pouco mais de uma centena de casos de PCM associada à AIDS foram
relatados, na maioria deles com características da forma aguda e disseminada de
PCM concomitantemente às características da forma crônica da doença (SHIKANAI-
YASUDA et al., 2006).
Para Marques (2012), a PCM tem diferentes manifestações clínicas que
exigem diferenciação com a tuberculose, doença de Hodgkin, várias micoses
sistêmicas e subcutâneas e carcinoma de células escamosas.
Rodrigues et al. (2010), com o objetivo de analisar a associação entre PCM
e câncer realizaram estudo retrospectivo de 25 casos diagnosticados da doença e
câncer, extraídos de uma série de 808 casos consecutivos de pacientes adultos
diagnosticados no Laboratório de Micologia da Santa Casa Complexo Hospitalar de
Porto Alegre (RS), entre 1972 e 2007. Em 16 pacientes (64%), o sítio de PCM era o
mesmo do tumor. Dos 25 pacientes, 12 foram curados para PCM e 4 faleceram. Em
9, o desfecho final foi desconhecido. Observaram uma prevalência de câncer de
pulmão na população geral na área significativamente maior em fumantes com PCM
que em fumantes sem PCM (p < 0,001) e concluiram que o diagnóstico de PCM
parece aumentar o risco de câncer de pulmão.
1.3 DIAGNÓSTICO LABORATORIAL
O padrão ouro para o diagnóstico de PCM é o encontro de elementos
18
fúngicos sugestivos de P. brasiliensis em exame a fresco de escarro ou outro
espécime clínico (raspado de lesão, aspirado de linfonodos) e/ou fragmento de
biopsia de órgãos supostamente acometidos (SHIKANAI-YASUDA et al., 2006).
O diagnóstico laboratorial definitivo da doença é obtido pelo isolamento do
fungo por meio de cultura, pela análise anatomopatológica de biópsias ou pelo
achado do fungo no exame micológico direto em materiais clínicos (LACAZ et al.,
2002).
A pesquisa de anticorpos anti-Paracoccidioides, através de exames
sorológicos, tem sido uma ferramenta importante no prognóstico dessa micose,
principalmente no que tange ao acompanhamento da resposta dos pacientes ao
tratamento (LACAZ et al., 2002; MARTINEZ, 2004; BOUSQUET et al., 2007).
O diagnóstico laboratorial das micoses se fundamenta no estudo de uma
amostra obtida da lesão onde o agente etiológico em sua forma parasitária ou
invasiva deve ser visualizado ao exame microscópico e demonstrado sua presença
por seu isolamento e identificação em substratos apropriados (WANKE et al., 2006).
O exame micológico direto é realizado através da visualização em
microscópio óptico, pelo método da potassa, de elementos esféricos de parede
birrefringentes medindo de 5 a 10 até 40 m ou mais de diâmetro, apresentando um
ou mais brotamentos, que se ligam à célula-mãe por fina ponte citoplasmática, a
partir do preparo de lâminas contendo material biológico (secreções, raspados de
lesões, escarro, lavado brônquico ou broncoalveolar, pus e tecido biopsiado)
(LACAZ et al., 2002; SHIKANAI-YASUDA et al., 2006; WANKE et al., 2006;
MOREIRA et al., 2006).
No exame histopatológico, os cortes histológicos corados com hematoxilina
e eosina e por técnica de impregnação de prata, é possível observar-se estruturas
fúngicas patognomônicas. O multibrotamento característico, nem sempre pode ser
observado, porém em cortes corados ao Grocott, elementos com dezenas de
brotamentos de 1 a 2 m de diâmetro, surgindo em toda a periferia do fungo é bem
evidente (MARTINEZ, 2004; WANKE et al., 2006).
O isolamento em cultura do fungo é conseguido através da inoculação do
material biológico em meios de culturas específicos (Mycosel, Fava-Netto e
Sabouraud Dextrose Ágar acrescido de cloranfenicol) e por sua incubação em
estufas reguladas a temperatura de 35°C - 37°C, por até 40 dias. A adição do
cloranfenicol ao meio Sabouraud Dextrose Ágar (100 mg/L) objetiva inibir o
19
crescimento bacteriano de materiais biológicos contaminados, como por exemplo, o
escarro (LACAZ et al., 2002).
O fungo se caracteriza pelo dimorfismo. As colônias filamentosas
(aveludadas ou algodoadas) são compostas de uma trama de hifas e por vezes
clamidoconídios e seu crescimento é muito lento sendo evidenciadas em 20 dias ou
mais após a semeadura em meio de Sabouraud-glicose 2%. A fase leveduriforme é
facilmente obtida, bastando incubar o cultivo a 35°C. As colônias de consistência
cremosa de cor creme clara são compostas de conglomerados de elementos
esféricos grandes e multibrotantes, com número variável de brotos em elementos
leveduriformes de tamanho muito variável (LACAZ et al., 2002; MARTINEZ, 2004;
WANKE et al., 2006).
A detecção de anticorpos específicos anti-P. brasiliensis nos soros dos
pacientes é um dos principais indicadores diagnósticos da PCM e tem sido muito
importante para o diagnóstico rápido da doença especialmente nos indivíduos com
lesões em órgãos internos ou que ainda não apresentam sinais clínicos aparentes
(LACAZ et al., 2002).
Os testes sorológicos mais empregados para confirmação da PCM são a
imunodifusão dupla em gel de agarose (ID), a imunofluorescência indireta (IFI),
contraimunoeletroforese (CIE), os ensaios imunoenzimáticos como ELISA, que são
mais rápidos e mais indicados para grandes quantidades de soros, porém com maior
exigência na padronização e interpretação dos resultados positivos e os ensaios tipo
immunoblot (IB) que permitem especificar os tipos de anticorpos séricos contra os
diversos determinantes antigênicos do fungo (CONTI DIAZ et al., 1973; CHAMMA et
al., 1983; MISTRETA et al., 1985; DEL NEGRO et al., 2000; DO VALLE et al., 2001;
CAMARGO et al., 2003; DA SILVA et al., 2004).
Utilizando-se técnicas padronizadas e antígenos adequados, estes testes
apresentam sensibilidade entre 85% e 100%. O título de anticorpos específicos anti-
P. brasiliensis apresenta correlação com a gravidade das formas clínicas, sendo
mais elevado na forma aguda-subaguda da doença. Casos de PCM com resultados
falso-negativos, observados com quaisquer dos testes citados acima, na maioria das
vezes se associam com lesões muito localizadas e com hospedeiros
imunodeprimidos. Reações falso-positivas podem ocorrer com soros de pacientes
acometidos por histoplasmose e aspergilose (SHIKANAI-YASUDA et al., 2006).
O primeiro teste amplamente utilizado no diagnóstico e acompanhamento de
20
pacientes com PCM foi a fixação de complemento, desenvolvido por Moses em
1916, empregando extrato de P. brasiliensis em salina como antígeno (LACAZ et al.,
2002).
Atualmente a ID é o principal método de diagnóstico sorológico da PCM,
tendo em vista a maior simplicidade do teste, ausência da utilização de
equipamentos de maior custo, valores de sensibilidade e especificidade superiores a
80% e a 90%, respectivamente e pela experiência acumulada nas últimas décadas
(SHIKANAI-YASUDA et al., 2006).
Esta técnica permite verificar a diminuição dos títulos de anticorpos
circulantes anti-P. brasiliensis e avaliar a eficácia do tratamento (DO VALLE et al.,
2001; ELIAS COSTA et al., 2000). Os resultados da ID podem variar segundo a
preparação antigênica utilizada, a forma da doença e o início do tratamento
(SIQUEIRA; LACAZ, 1991). Del Negro et al. (2000) avaliaram a eficácia de
diferentes provas sorológicas empregando como antígeno filtrado de cultura e
demonstraram que 95,3% dos soros de pacientes com PCM apresentaram sorologia
positiva pela prova de ID. Ao avaliarem o padrão de reatividade destes soros pela
prova de fixação do complemento, verificaram que 50% dos soros não apresentaram
reatividade ou apresentaram títulos de anticorpos circulantes anti-P. brasiliensis
próximos ao ponto de corte avaliados com o filtrado de cultura.
As técnicas imunoenzimáticas do tipo western blot ou IB possuem alta
sensibilidade e foram empregadas originalmente para caracterizar a resposta imune
humoral aos antígenos de P. brasiliensis (ELIAS COSTA et al., 2000; MENDES-
GIANNINI et al., 1994; CAMARGO et al., 1994). Atualmente têm sido empregadas
para comprovar a positividade da PCM quando os testes de ID e/ou de CIE
apresentarem-se falso-negativos (DEL NEGRO et al., 1995).
Segundo Mendes-Giannini et al. (1994) a determinação da resposta IgG anti-
gp 43 é utilizada para o diagnóstico confirmatório da PCM e como uma forma de
acompanhar a eficácia da terapêutica antifúngica prescrita. Empregando-se provas
mais sensíveis como os ensaios imunoenzimáticos, verifica-se que todos os
pacientes apresentam anticorpos circulantes anti-gp43 no momento do diagnóstico
clínico. Pacientes com a forma aguda da doença possuem índices elevados de IgG.
Anticorpos da classe IgM anti-gp43 estão presentes em 100 % dos pacientes
portadores da forma aguda e em apenas 46,6% dos pacientes com a forma crônica.
Tem-se observado que a detecção de anticorpos circulantes anti-gp43 diminui com a
21
melhora clínica promovida pelo uso de medicamentos específicos.
Os ensaios imunoenzimáticos da PCM são práticos e sensíveis, porém
apresentam reatividade cruzada com outras doenças, principalmente quando
testados com os soros de pacientes acometidos por histoplasmose, aspergilose,
candidíase e doença de Jorge Lobo. Recentemente, vem apresentando reatividade
com soros de pessoas aparentemente sadias, residentes em áreas endêmicas para
PCM (SIQUEIRA; LACAZ, 1991; MALUF et al., 2003; CAMARGO et al., 1984;
BOTTEON et al., 2002; MALUF et al., 2003). A procura por determinantes
antigênicos purificados, visando excluir o problema da reatividade cruzada, tem sido
objeto de pesquisa de diferentes grupos envolvidos no estudo da PCM. Estes
incluem a gp 43 e a fração de 70 kDa (ELIAS COSTA et al., 2000; CAMARGO et al.,
1984; DINIZ et al., 2002, CISALPINO et al., 1996; CARVALHO et al., 2008).
1.4 TRATAMENTO
Até 1940, quando Ribeiro introduziu o uso de sulfonamidas, não existia
tratamento para paracoccidioidomicose. Posteriormente, outros agentes se
mostraram eficazes contra o fungo: derivados sulfamídicos associados ou não ao
trimetoprim, derivados azólicos (cetoconazol, itraconazol, fluconazol) e anfotericina B
(RESTREPO et al., 1980; RESTREPO et al., 1987, NARANJO et al., 1990;
MENDES; NEGRONI; ARECHAVALA, 1994). O baixo custo e a boa tolerabilidade
têm feito do sulfametoxazol-trimetoprim a droga mais utilizada no tratamento da
PCM, entretanto a ausência de estudos randomizados comparando diferentes
drogas limita a definição de qual seja a droga de escolha. Em estudo comparativo
randomizado, Queiroz-Teles, Colombo e Nucci (1998), mostraram igual eficácia
entre o sulfametoxazol-trimetoprim e o itraconazol, com vantagens do último, por
necessitar de tempo mais curto de tratamento e consequentemente, diminuir a taxa
de abandono ao tratamento.
O tratamento de um modo geral é prolongado e os critérios de cura definitiva
são, ainda, de difícil estabelecimento e dependendo da resposta do paciente, o
tratamento pode ser feito com outras drogas sendo os medicamentos mais utilizados
a anfotericina B e derivados azólicos orais, como cetoconazol, itraconazol e
fluconazol, isoladamente ou combinados (MANNS et al., 1996; GONÇALVES et
al.,1984).
22
Como o tratamento é de longa duração, não são raros os episódios de
recidiva da doença devido ao uso irregular ou mesmo abandono da medicação
(RESTREPO, 1985; DILLON et al., 1986).
Alguns estudos indicam que o tratamento com itraconazol pode ser mais
eficiente em relação aos outros por necessitar de um período mais breve resultando
em menor número de recidivas (CALVI et al., 2003).
Devido à coexistência, sugeriu-se que o alcoolismo e desnutrição estariam
envolvidos na patogenia da PCM. Encontrado em mais de 50% dos pacientes de
uma casuística de São Paulo, o etilismo foi considerado possível fator predisponente
da micose e parece ter maior importância na patogenia da forma crônica, cujos
doentes consomem mais álcool e por tempo mais prolongado do que os pacientes
com a forma aguda. O tratamento desses doentes também poderia estar sendo
prejudicado pelo etilismo, a julgar pela tendência observada de reativação mais
frequente da moléstia entre os pacientes que consomem álcool de forma excessiva
(MARTINEZ; MOYA, 1992).
A PCM se constitui em importante problema em saúde pública uma vez que
é motivo comum de incapacitação para o trabalho em indivíduos na fase mais
produtiva da vida devido as frequentes sequelas secundárias trazendo elevados
custos sociais e econômicos (PARANÁ, 2002).
A PCM pode ser altamente agressiva em pacientes imunocomprometidos
(submetidos à quimioterapia, terapia imunossupressora, uso de corticosteroides por
tempo prolongado, portadores de linfoma e leucemia e os infectados pelo HIV). O
quadro em geral é grave e a mortalidade específica alta, chegando a 29,4% entre 19
casos conhecidos até 1994 (MARQUES; CAMARGO, 1998).
Embora constitua sério agravo social, como não é doença de notificação
compulsória, não é possível estabelecer a real prevalência da PCM. Ademais, a falta
de conhecimento mais consistente sobre a ecologia do agente e a epidemiologia da
micose priva-nos de medidas de prevenção adequadas (GONÇALVES et al.,1984).
O longo período de latência da doença impede a determinação precisa do
local onde foi adquirida (BORELLI, 1972).
1.5 ECO-EPIDEMIOLOGIA
Segundo Marques (1998), há evidências de que determinadas condições
23
ecológicas favoreçam a sobrevida do fungo na natureza que determinariam a
variação da incidência da micose nos países e também em distintas regiões no
mesmo país.
Para Barrozo et al. (2010), há uma associação entre fatores climáticos e o
diagnóstico clínico da PCM. Paracoccidioides spp ocorre preferencialmente em
locais de elevado índice pluviométrico e solo com ótima permeabilidade, o que está
associado a uma elevada umidade relativa do ar e da abundância de vegetação e
cursos de água. O volume de água durante a estação chuvosa satisfatória associada
à temperatura variável entre 18 e 28º C pode ser favorável para a esporulação e
dispersão aérea do fungo.
O conceito de “reservárea” _ os locais onde existem e atuam os fatores que
condicionam a infecção_ ou “áreas nas quais os indivíduos se infectam” foi criado
por Borelli (1964). Sua identificação é importante, nas tentativas de isolamento do
fungo do solo, na delimitação de nichos ecológicos e na busca de possíveis animais
reservatórios ou vetores. Segundo Marques et al. (1983), estas áreas estariam
delimitadas por fatores ligados ao ecossistema; tais como altitude, temperatura,
regime de chuvas e características do solo e da vegetação.
Segundo Ono (2000), a hipótese de que o fungo habite locais agrícolas
sugere que estas plantações poderiam proporcionar condições de solo mais estáveis
ao seu desenvolvimento e deste modo a infecção do hospedeiro seria facilitada pela
grande quantidade de partículas que ficam em suspensão no ar no período da
colheita.
Muitas regiões endêmicas estão localizadas em zonas de plantação de café,
que também compartilham um número significante de características ecológicas
favoráveis ao agente da PCM, tais como altitude, temperatura e umidade (CALLE et
al., 2001).
O fungo Paracoccidioides spp é encontrado predominantemente em regiões
de clima úmido, com temperaturas médias de 17 a 24°C, alto índice pluviométrico,
altitude média, solo ácido e vegetação densa, como florestas tropicais e subtropicais
(RESTREPO, 1985; BRUMMER; CASTANEDA; RESTREPO, 1993; BOCCA et al.,
2013).
A PCM é mais frequente no Brasil, na Colômbia, na Venezuela e na
Argentina, não sendo encontrada no Chile, Suriname, Guiana, Guiana Francesa,
Nicarágua e Belize (LONDERO, 1982; LONDERO; MELO, 1988; WANKE;
24
LONDERO, 1994; MARQUES; CAMARGO, 1998; BOCCA et al., 2013). Há relatos
de raros casos no México (América do Norte) e no Caribe (MARQUES, 1998).
No Brasil, a maioria dos casos procede das regiões Sul, Sudeste e Centro-
Oeste, sendo considerada rara na região Norte do país (VALLE et al., 1991;
WANKE; LONDERO, 1994). Entretanto, tem sido observado um aumento abrupto de
casos desta micose entre habitantes que se estabeleceram na última década na
região amazônica, principalmente nos estados do Maranhão, Pará, Mato Grosso,
Rondônia e Acre (WANKE; LONDERO, 1994).
Apesar de não haver uma época mais propícia no ano para a infecção pelo
P. brasiliensis a perturbação do microambiente em que o fungo vive devido às
escavações feitas em terraplanagens, a derrubada de árvores e a preparação dos
campos para o plantio pode ser um fator importante (BAUMGARDNER; PARETSKY;
YOPP,1995).
1.6 CASUÍSTICA
Na pesquisa bibliográfica na base de dados da Biblioteca Virtual em Saúde
utilizando as palavras-chave Paracoccidioidomicose e manifestações orais ou bucais
pesquisando em todos os índices e todas as fontes foram encontradas alguns
artigos sendo em sua maioria relatos de casos que tem pouca relevância científica.
Incluindo-se na pesquisa os termos epidemiológicos ou epidemiologia foram
encontrados vários artigos sendo a maioria do início da década passada ou
anteriores.
López-Martínez et al. (2014), realizaram um estudo clinico-epidemiológico
em 93 casos não notificados de PCM no México no período compreendido entre
1972 e 2012. As infecções foram encontradas predominantemente em homens
(97,5%), camponeses (88,5%), com idades variando entre 31 e 60 anos. A maioria
dos casos ocorreu em áreas tropicais. Foram encontradas lesões principalmente em
mucosa oral (39,4%) e pele (34%). O tratamento mais eficaz foi realizado com
itraconazol ou itraconazol associado a sulfametoxazol-trimetoprim.
Cavallo et al. (2002) realizou um estudo com o objetivo de investigar a
prevalência de PCM no município de Andrés Eloy Blanco em Guapa, Venezuela.
Foram estudadas 366 pessoas através de entrevista, exame clínico e teste da
paracoccidioidina. O autor relatou positividade em 47%, sendo que 71% destes eram
25
assintomáticos e foi identificado apenas 1 caso (0,27%) de paracoccidioidomicose
doença.
Em trabalho de revisão, Conti Díaz (2010) fez uma análise atualizada dos
avanços científicos dos principais aspectos etiológicos, clínico-epidemiológicos e
etiopatogênicos além da relação parasita/hospedeiro, diagnóstico e tratamento da
doença no Uruguai, considerada também uma área endêmica desta infecção com 77
casos clínicos registrados até 1997.
Marques (2003) apresentou dados de atualização epidemiológica, clínica,
diagnóstica e terapêutica relativos à paracoccidioidomicose. Discutiu a importância
epidemiológica resultante do isolamento do P. brasiliensis a partir de tatus (Dasypus
novemcinctus) em regiões do Brasil e Colômbia, assim como dos resultados de
inquéritos soro-epidemiológicos em cães e do surgimento do primeiro caso de
paracoccidioidomicose doença em cão. Neste artigo as dificuldades de isolamento
do fungo a partir do solo são correlacionadas com novos informes de investigação
epidemiológica. Foram apresentados aspectos clínicos das manifestações da forma
aguda da doença, assim como das manifestações da neuroparacoccidioidomicose e
da enfermidade associada à infecção pelo HIV. Discutiu-se ainda o papel da
sorologia e da técnica da PCR no diagnóstico e dos possíveis avanços no
tratamento da paracoccidioidomicose com os novos derivados triazólicos.
Estudos em áreas endêmicas mostraram a presença de P. brasiliensis no
fígado e/ou baço de tatu (Dasypus novemcinctus), onde bandos destes animais
apresentam-se frequentemente infectados e podem estar relacionados com o
aumento observado no grau de exposição em ameríndios que foram acometidos
pela micose em áreas desmatadas na Amazônia (RESTREPO; McEWEN;
CASTANEDA, 2001).
Estima-se que aproximadamente 10 milhões de pessoas estejam infectadas
com o fungo, das quais 2% podem desenvolver a doença (MC EWEN et al., 1995).
No Brasil, estima-se uma incidência anual de 1 a 3 casos por 100.000
habitantes para áreas de alta endemicidade, com um índice de mortalidade de 0,14
por 100.000 habitantes (RESTREPO; McEWEN; CASTANEDA, 2001).
Coutinho et al. (2002) publicou um artigo onde foram estudados 3.181 óbitos
por paracoccidioidomicose no Brasil, por um período de 16 anos (1980-1995). No
período, esta micose mostrou grande magnitude e baixa visibilidade, destacando-se
como oitava causa de mortalidade por doença predominantemente crônica ou
26
repetitiva, entre as doenças infecciosas e parasitárias e a mais elevada taxa de
mortalidade entre as micoses sistêmicas (BOCCA et al., 2013) A região Centro-
Oeste teve o segundo coeficiente mais alto do país, com tendência a ascensão. A
taxa de mortalidade predominou em indivíduos do sexo masculino, com 84,75% dos
óbitos e razão de masculinidade de 562 homens/100 mulheres. O grupo etário entre
30-59 anos foi o mais atingido, seguido dos indivíduos com 60 anos ou mais. O
estudo mostrou que a taxa de mortalidade pode ser considerada como indicador
para definir a doença como importante agravo de saúde no Brasil.
Girard et al. (2012) conduziram uma análise retrospectiva dos prontuários
dos casos de paracoccidioidomicose com manifestações em cabeça e pescoço no
Sul do Brasil ao longo de um período de 10 anos, de 1998 a 2008 num total de 36
casos confirmados por exame histopatológico, exame micológico direto ou cultura. A
maioria dos casos consistia de homens com hábito do tabagismo e/ou hábitos de
consumo crônico de álcool e com a falta de higiene e nutrição. Concluíram que a
doença é endêmica no Sul do Brasil e como os fatores de risco e as manifestações
clínicas são semelhantes aos carcinomas da cabeça e pescoço é premente a
realização do diagnóstico diferencial.
Zoppas (1995) identificou três casos de paracoccidioidomicose em 1084
exames micológicos realizados em pacientes com suspeita de micose superficial, em
um estudo retrospectivo de 1990 a 1994, em Caxias do Sul, Rio Grande do Sul.
Verli et al. (2005), descreveram as características clínicas e epidemiológicas
de 61 casos de paracoccidioidomicose, atendidos no Serviço de Estomatologia do
Hospital São Lucas da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
(PUCRS), no período de junho de 1976 a junho de 2004 no Rio Grande do Sul
sendo que todos os casos apresentavam manifestações estomatológicas e as
lesões orais ocorreram predominantemente com aspecto ulcerado e moriforme,
observadas em vários sítios anatômicos.
Seben et al. (2010), em Chapecó, Santa Catarina, no intuito de auxiliar os
cirurgiões-dentistas a procederem ao correto diagnóstico e encaminhamento para
tratamento dessa doença, apresentou um caso clínico de paracoccidioidomicose
com manifestação clínica bucal passível de ser confundida com doença periodontal.
Coutinho (1999), em estudo sobre mortalidade por PCM no Brasil, no
período de 1980 a 1995, demonstrou que a PCM é a oitava causa de mortalidade
entre as doenças infecciosas e parasitárias predominantemente crônicas, e que o
27
estado do Paraná apresenta a maior taxa entre as unidades federadas das regiões
Sul e Sudeste, com 14,52% dos óbitos ocorridos no Brasil, revelando um coeficiente
de mortalidade médio anual de 3,45 /milhão de habitantes.
Bisinelli et al. (2001) apresentou um estudo retrospectivo em 187 prontuários
médicos de pacientes provenientes do Serviço de Infectologia do Ambulatório de
Micoses Profundas do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná em
Curitiba-PR, no período de maio de 1985 a março de 1998. A avaliação dos
resultados evidenciou mudanças pouco significativas em relação à epidemiologia da
doença. A exuberância nas manifestações orais da doença, que são muito comuns e
com frequência levam à piora do estado geral do paciente ou mesmo à manutenção
da doença, pela dificuldade de alimentação que aumenta a imunossupressão, ficou
bem evidenciada. Pela riqueza de lesões orais encontradas na amostra, sugeriu a
criação de equipes médicas e odontológicas multidisciplinares, nas regiões de risco,
para contribuir mais efetivamente com o diagnóstico e tratamento desta infecção.
Gomes et al. (2008) descreveram as características clínico-laboratoriais e
epidemiológicas de 45 indivíduos com PCM, atendidos em um serviço de referência,
no Noroeste do Estado do Paraná, no período de março de 1996 a novembro de
2006. Observou-se que as manifestações clínicas que motivaram a procura por
assistência foram lesões na orofaringe em 28 (62,2%) casos, seguida do
comprometimento pulmonar em 9 (20,0%), sendo que 10 dos 45 pacientes (22,2%)
foram encaminhados ao serviço por cirurgiões-dentistas. A proporção homem/mulher
foi de 14:1, houve predomínio de maiores de 41 anos de idade; da forma crônica da
doença e profissão vinculada à agricultura. Os hábitos de tabagismo e consumo de
bebida alcoólica foram frequentes.
Fornazieri et al. (2008) realizaram um estudo retrospectivo dos prontuários
de 142 pacientes diagnosticados com as doenças granulomatosas comuns, sendo
93 com diagnóstico de leishmaniose, 39 de paracoccidioidomicose e 10 de
hanseníase do período de 1º de janeiro de 2005 a 31 de outubro de 2007, no
ambulatório de infectologia de um hospital terciário em Londrina, Paraná. Na
paracoccidioidomicose, a lesão mucosa mais frequente foi a ulceração orofaríngea
com 15 casos (38,4%).
Em 2010 na cidade de Bauru, São Paulo, Tolentino apresentou uma revisão
da literatura sobre essa doença, abordando aspectos clínicos, epidemiologia,
métodos diagnósticos e de tratamento, além de relatar um caso diagnosticado após
28
avaliação clínica, citologia esfoliativa e biópsia incisional.
Em artigo publicado por Hassessian et al. (2000), com a finalidade de
estudar a presença de lesões na cavidade bucal, realizaram levantamento
epidemiológico em 189 prontuários de pacientes com diagnóstico positivo para a
doença no Hospital Universitário da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
(UFMS) compreendendo o período de 10 anos (1989-1998). A análise dos dados
obtidos demonstrou maior incidência no gênero masculino (91 %). Noventa e oito
pacientes (51,9 %) eram trabalhadores rurais, com prevalência na faixa etária
superior a 50 anos. Houve significativa incidência de lesões bucais, 122 em 189
casos (64,5%), o que destaca a importância do cirurgião dentista no diagnóstico
dessa patologia.
Paniago et al. (2003) descreveram as características clínicas e
epidemiológicas de 422 casos de paracoccidioidomicose atendidos no Hospital
Universitário da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (Campo Grande, Mato
Grosso do Sul, Brasil) no período de Janeiro de 1980 a Agosto de 1999. Houve
sequelas em 30,3% e óbito em 7,6 % dos casos.
Vieira e Borsatto-Galera (2006) descreveram as manifestações clínicas
bucais provocadas pela paracoccidioidomicose em 20 pacientes atendidos no
Hospital Universitário Júlio Müller (HUJM), em Cuiabá (MT), no período de junho de
2002 a junho de 2003.
De forma geral, na literatura brasileira e da América do Sul são encontrados
poucos levantamentos clínico-epidemiológicos os quais apresentam provavelmente
falhas em relação ao real número de casos da PCM devido à ausência de
notificação compulsória desta grave micose sistêmica. Atualmente no Brasil a PCM
encontra-se inserida no grupo de doenças negligenciadas e com exceção do estado
do Paraná, no qual há obrigatoriedade de notificação dos casos de PCM, em todos
os outros, não é conhecido o número exato de casos.
29
2. SOBRE O ESTADO DE MATO GROSSO
O estado de Mato Grosso está localizado no centro geodésico da América
do Sul e na região Centro-Oeste do Brasil. Sua estrutura socioeconômica, pautada
no processo de colonização ligado à exploração de recursos naturais e nas políticas
governamentais com programas de ocupação e desenvolvimento regional, atrai
contingentes populacionais de todas as regiões brasileiras (CAMARGO, 2011). Esta
“colonização acelerada” ocasionou a multiplicação de diversos novos municípios que
sofrem até hoje com a ausência de infraestrutura e serviços. São cidades pequenas,
na maioria das vezes com população variando entre 20 e 50 mil habitantes (CUNHA,
2006).
O estado de Mato Grosso apesar de ainda pouco povoado (ocupa
aproximadamente 10% da área total do país e a população representa apenas
1,53% dos habitantes do Brasil) vive um intenso processo de migração ocorrido
principalmente nas últimas décadas e vem sendo gradativamente ocupado por
migrantes procedentes principalmente do Sul e do Sudeste do Brasil (PORTAL
MATO GROSSO, 2014c).
De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística,
IBGE, Mato Grosso conta com 3.182.113 habitantes estimados em 2013. Seus 141
municípios estão distribuídos numa área de 903.366,192 km². Vivem na zona urbana
83,28% da população e na zona rural 16,72%. A densidade demográfica é de 3,36
hab/km2.
Nas últimas décadas Mato Grosso vivencia significativa transformação
socioeconômica que o projeta em destaque no cenário econômico nacional e
internacional com sua economia baseada no agronegócio (CAMARGO, 2011).
A principal atividade econômica do estado de Mato Grosso é a agricultura,
embora a pecuária e o extrativismo tenham bastante destaque. Mato Grosso é o
maior produtor de algodão e de soja do Brasil e também se destaca na produção de
girassol. O rebanho bovino no estado está entre os maiores do Brasil, competindo
principalmente com seus vizinhos da mesma região. A criação de suínos também é
expressiva. O extrativismo, tanto vegetal (madeira, borracha, castanha-do-pará)
como mineral (ouro, calcário, estanho), foi de grande importância para a economia
do estado. Principalmente no extremo norte do estado, o extrativismo vegetal foi
bastante intenso na década de 1980 até o início do século assim como os garimpos
30
de ouro (INFOESCOLA, 2014).
Mato Grosso tem representado em seu território três biomas brasileiros. A
Amazônia é o mais abrangente, com 480.215 Km2 (53,6%), o Cerrado ocupa
354.823 Km2 (39,6%) e a menor área é do Pantanal, com 60.885 Km² (6,8%)
(SECRETARIA..., 2011).
O Pantanal localiza-se na região sudoeste e é constituído por uma planície
periodicamente inundável, cujo fenômeno é regulado pelas cheias e vazantes da
Bacia do Rio Paraguai. O clima é quente e úmido, no verão, e frio e seco, no inverno
(SECRETARIA..., 2011).
O Cerrado apresenta duas estações bem definidas: verão chuvoso e inverno
seco, característico de regiões tropicais. Em pelo menos 2/3 da região o inverno é
demarcado por um período de seca que prolonga-se por cinco a seis meses
(PORTAL MATO GROSSO, 2014b).
A Amazônia é considerada o maior bioma brasileiro com 3,3 milhões de km².
Devido a sua grande área de superfície, a Amazônia ainda possui vastas extensões
cobertas por floresta tropical úmida e na região situada próxima à linha do equador
encontramos o clima equatorial caracterizado também por elevadas temperaturas
(com temperatura média de 25 °C) e alto índice pluviométrico (PORTAL MATO
GROSSO, 2014a).
Localizado entre as latitudes de 8 à 18º LS, posição que propicia elevados
totais de radiação solar global, incidentes na superfície do solo, praticamente o ano
todo e pequenas variações entre os solstícios de inverno e verão, Mato Grosso
encontra-se dentro da faixa intertropical da porção central do Continente Sul-
Americano observando-se os climas equatorial e tropical quente com pequena
variação térmica sazonal e anual. A variação da temperatura média anual no estado
é de 21 a 26ºC (TARIFA, 2011).
Alta Floresta, Matupá, Cotriguaçu, Juína e Vilhena apresentam amplitude
térmica anual muito parecida, com valores entre 19 e 25ºC. Destaca-se outubro
como mês mais quente com temperaturas variando de 25,3ºC a 26,1ºC, enquanto o
mês mais frio é julho com 23,4º C a 23,8ºC (TARIFA, 2011).
31
3. RELEVÂNCIA E JUSTIFICATIVA
A paracoccidioidomicose (PCM) é uma doença de caráter sistêmico cujas
manifestações orais são bastante frequentes e muitas vezes o primeiro sinal da
doença, constituindo infecção fúngica de bastante interesse para a Odontologia.
A região Centro-Oeste do Brasil é tida como endêmica para a doença que é
considerada um grave problema de saúde pública.
Seu diagnóstico precoce e controle requer a participação de todos os
profissionais da saúde, dentre os quais o cirurgião dentista (CD) uma vez que as
manifestações estomatológicas são o principal motivo da consulta para tratamento.
O conhecimento dessa doença é de grande interesse odontológico, uma vez
que, entre suas manifestações, as lesões orais concorrem para sua caracterização
clínica e condicionam a necessidade de participação do cirurgião-dentista no
diagnóstico e na terapêutica desta micose.
O diagnóstico precoce da PCM é importante a fim de serem evitadas, pela
rápida instituição da terapêutica, as formas mais avançadas e mutilantes da doença.
A PCM é considerada a oitava causa de mortalidade por doenças infecciosas e
parasitárias e a mais elevada taxa de mortalidade entre as micoses sistêmicas
sendo comparada às grandes endemias como a doença de Chagas, tuberculose,
malária, esquistossomose, sífilis e hanseníase.
O foco principal deste trabalho foi a realização do levantamento do número
de casos de pacientes acometidos pela paracoccidioidomicose no período
compreendido entre 2006 a 2013, devido à escassez absoluta de dados numéricos
que possam refletir a demanda desta doença nos serviços de saúde em Cuiabá –
Mato Grosso. Devido à ausência da obrigatoriedade de notificação compulsória não
são conhecidos os números reais dos casos ocorridos em Mato Grosso, os quais
são encaminhados em sua maioria aos serviços de referência da capital do estado:
MT Laboratório e Hospital Universitário Júlio Muller. Informações referentes à
abordagem por cirurgiões-dentistas de pacientes acometidos pela doença foram
obtidas com o auxílio do Conselho Regional de Odontologia (CRO/MT), com o
objetivo de conhecer a dinâmica envolvendo diagnóstico precoce por estes
profissionais a partir das lesões estomatológicas e encaminhamento dos pacientes
pelos mesmos aos serviços de referência da capital.
32
4. OBJETIVOS
4.1 OBJETIVO GERAL
Verificar a incidência da doença através de levantamento realizado em
prontuários médicos dos casos de paracoccidioidomicose diagnosticados nos
serviços de referência em Cuiabá, Mato Grosso no período compreendido entre
2006-2013.
4.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS
A. Conhecer o perfil clínico, epidemiológico e terapêutico dos indivíduos
diagnosticados com paracoccidioidomicose em Mato Grosso no período avaliado.
B. Verificar o número de casos novos, recidivas e abandono de tratamento
ocorridos entre 2006-2013.
C. Verificar a relação de sazonalidade da PCM em Mato Grosso.
D. Verificar os tipos de exames diagnósticos utilizados e suas frequências.
E. Verificar os hábitos associados e comorbidades presentes nos pacientes
acometidos pela PCM em Mato Grosso no período avaliado.
F. Verificar o conhecimento dos CDs de Mato Grosso em relação ao
diagnóstico da paracoccidioidomicose através de questionário enviado via mailing do
Conselho Regional de Odontologia de Mato Grosso.
G. Apresentar uma sugestão de abordagem e manejo da doença pela
elaboração de uma cartilha a ser distribuída às secretarias regionais de saúde do
estado de Mato Grosso e entidade de classe (Conselho Regional de Odontologia de
Mato Grosso, Sindicato dos Odontologistas de Mato Grosso e Associação Brasileira
de Odontologia – Seccional MT).
33
5. MATERIAL E MÉTODOS
5.1 DESENHO DO ESTUDO
Trata-se de um estudo transversal, descritivo e retrospectivo realizado por
meio de pesquisa documental obtida através de levantamento de prontuários dos
pacientes atendidos no Hospital Universitário Júlio Muller (HUJM), referência no
tratamento de pacientes acometidos por PCM no estado de Mato Grosso e
levantamento de laudos emitidos no Laboratório Público do Estado de Mato Grosso
(MT Laboratório). Este último representa serviço de referência na realização de
exames citológicos e histopatológicos de boca para os 1.255 estabelecimentos de
saúde pertencentes ao Sistema Único de Saúde (SUS) sediado em Mato Grosso no
período compreendido entre 2006-2013.
Foram coletados os dados sobre gênero, idade, ocupação e procedência
dos pacientes, sobre a sintomatologia, localização anatômica das lesões, hábitos
associados como tabagismo, etilismo e uso de drogas ilícitas, comorbidades,
métodos diagnósticos, o tratamento instituído, o tipo de entrada se caso novo,
recidiva ou reentrada após abandono, sazonalidade e o encerramento de cada caso.
Paralelamente realizou-se pesquisa através de questionário via “mailing” do
Conselho Regional de Odontologia de Mato Grosso (CRO-MT) enviado a todos os
Cirurgiões Dentistas (CD) inscritos neste órgão de classe com o objetivo de
conhecer a dinâmica envolvendo diagnóstico precoce da doença por estes
profissionais a partir de suas lesões estomatológicas e o encaminhamento dos
pacientes atendidos pelos mesmos aos serviços de referência da capital.
Neste questionário, a ser respondido anonimamente, foi abordado se o CD
sentia-se capacitado para atender e diagnosticar pacientes acometidos por PCM,
qual o encaminhamento a ser dado a estes pacientes, se já havia atendido algum
paciente acometido por PCM. Em caso afirmativo se o CD acompanhou o
encerramento do caso (Apêndice A ).
O questionário ficou aberto para o recebimento das respostas pelo Google
Drive no período de 17/02/14 a 31/03/14 e foi respondido anonimamente por 200
profissionais.
34
5.2 ASPECTOS ÉTICOS
Este trabalho foi aprovado pelo CEP (Plataforma Brasil) em 10 de julho de
2013 sob número CAAE 16338413.8.0000.5541 (Anexo A).
5.3 CRITÉRIOS DE INCLUSÃO
Pacientes com suspeita de infecção por Paracoccidioides spp com
diagnóstico laboratorial confirmado de PCM no período de 2006 a 2013.
5.4 CRITÉRIOS DE EXCLUSÃO
Pacientes com diagnóstico laboratorial com resultado negativo para PCM.
5.5 TABULAÇÃO DE DADOS
Para a tabulação das variáveis abordadas tanto na ficha epidemiológica
utilizada nos dois serviços de referência (Hospital Universitário Júlio Muller e MT
Laboratório) bem como o questionário encaminhado a todos os CD via mailing foram
utilizados os programas EpiData 3.1 e EpiData Analysis e organizados em planilhas
do programa Microsoft Excel 2010.
35
6. RESULTADOS
Em relação às variáveis epidemiológicas foram selecionadas: gênero, idade,
distribuição geográfica e atividade ocupacional. Além destas foram avaliadas
principais manifestações clínicas, tipo de exame mais utilizado para o diagnóstico
laboratorial e ainda tipo de droga mais empregada no tratamento dos pacientes
acometidos por paracoccidioidomicose no período compreendido entre 2006 e 2013.
Foram observados 230 pacientes, sendo 116 diagnosticados no serviço de
referência MT Laboratório e 114 no Hospital Universitário Júlio Muller, ambos em
Cuiabá – Mato Grosso.
6.1 GÊNERO
Dos 230 pacientes, 225 (98%) foram pertencentes ao gênero masculino e
apenas 5 (2%) ao gênero feminino (Figura 1) resultando uma proporção homem:
mulher de 45:1.
Figura 1 - Distribuição por gênero dos pacientes acometidos por PCM
36
6.2 IDADE
Em 229 casos foi possível obter a idade do paciente. O grupo compreendido
entre 31 e 60 anos exibiu a maior frequência de diagnóstico da doença com 188
casos como mostra a figura 2. A média de idade foi de 49,34 anos.
Figura 2 - Distribuição por faixa etária de 229 casos de PCM
6.3 DISTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA
O estado de Mato Grosso pode ser dividido em cinco mesorregiões (Norte,
Nordeste, Sudoeste, Centro-Sul e Sudeste).
O maior número de casos de PCM ficou concentrado nas mesorregiões
Norte e Centro-Sul (79%) sendo que 125 casos (54,3%) foram diagnosticados na
mesorregião Norte. A mesorregião Centro-sul contribuiu com 57 casos (24,7%) como
pode ser visto nas figuras 3 e 4.
Os municípios que apresentaram o maior número de casos foram a capital
Cuiabá (25) e Várzea Grande (16) perfazendo 41 dos 57 casos diagnosticados na
mesorregião Centro-Sul (Figura 5). Os munícipios de Alta Floresta e Guarantã do
Norte pertencentes a mesorregião Norte, contribuíram com 16 e 12 casos
diagnosticados respectivamente (Figura 5).
Um paciente residia em Rolim de Moura no estado de Rondônia e foi
desconsiderado nesta análise.
n = 229
37
Figura 3 - Distribuição geográfica por mesorregião de 229 casos de PCM em Mato Grosso.
Figura 4 - Mapa de Mato Grosso por mesorregião de 229 casos de PCM.
n = 229
38
Figura 5 - Mapa de Mato Grosso por mesorregião – municípios com maior incidência de PCM (2006-2013 – HUJM e MT Laboratório)
6.4 OCUPAÇÃO
Foi possível identificar a profissão atual ou pregressa de 165 pacientes. A
maioria dos casos de PCM foi diagnosticada em indivíduos que tem ou tiveram sua
atividade laboral relacionada ao meio rural (agricultores, lavradores, operadores de
máquinas agrícolas) tendo sido identificados 103 casos (62,5%). Pacientes
acometidos por PCM que tinham profissões não relacionadas ao meio rural, mas
que pela natureza do trabalho estão mais expostos a inalação de poeira (construção
civil, pedreiros, carpinteiros, marceneiros, madeireiros, cortadores de madeira,
operadores de motosserra, mecânicos, jardineiros, garimpeiros) somaram 27 casos
(16,3%) e todas as outras profissões estritamente urbanas contribuíram com 35
casos (21,2%) diagnosticados (Figura 6).
39
Figura 6 - Ocupação laboral principal de 165 pacientes acometidos por PCM em MT
6.5 TIPO DE ENTRADA
Dos 230 casos diagnosticados, 178 (77,4%) procuraram tratamento pela
primeira vez e foram considerados casos novos. Em 20 pacientes (8,7%) houve
recidiva da doença após determinado período e procuraram atendimento novamente
e 21 pacientes (9,1%) voltaram a procurar tratamento após o terem abandonado
antes da cura clínica e laboratorial. Houveram 10 pacientes (4,3%) que vieram
transferidos de outro serviço ou de outro estado da Federação. Sobre um caso não
havia informação. Esta distribuição está evidenciada na figura 7.
40
Figura 7 - Tipo de entrada em 230 casos de PCM (HUJM e MT Laboratório - 2006-2013)
6.6 FORMA CLÍNICA E LOCALIZAÇÃO ANATÔMICA DAS LESÕES
Em 218 casos (95,2%) os pacientes apresentaram a forma crônica da
doença. A forma aguda esteve presente em menor proporção, comparecendo com
apenas 11 casos (4,8%). Para os casos agudos, os pacientes apresentaram idades
variando de11 aos 30 anos (Figura 8).
Figura 8 - Forma clínica em 229 casos de PCM.
41
As manifestações em mucosa oral foram as mais frequentes. Em 186
pacientes foram encontradas lesões orais. Foi comprovado envolvimento pulmonar
em 70 pacientes. Outras localizações anatômicas que apresentaram lesões foram:
linfonodos (33), lesões na pele (22), laringe (13) e mucosa nasal (11). Três pacientes
tiveram comprometimento do sistema nervoso central (SNC). Manifestações em
outros sítios anatômicos foram encontradas em 11 pacientes (Figura 9).
Figura 9 - Localização anatômica das manifestações clínicas em pacientes acometidos por PCM.
42
6.7 AGRAVOS ASSOCIADOS
Foram pesquisados hábitos associados e comorbidades que pudessem
facilitar o desenvolvimento da doença ou dificultar seu tratamento (Figura 10). Não
foi possível obter estes dados em 129 casos.
Em 101 casos o hábito de fumar esteve presente em 93 (92,1%). O etilismo
foi o segundo hábito mais frequente entre os acometidos pela doença sendo que 58
doentes (57,4%) relataram consumir bebidas alcoólicas diariamente. Pacientes que
tinham os dois hábitos associados somaram 56 pacientes (55,4%).
A tuberculose foi a comorbidade mais frequente estando presente em 10
casos (9,9%) sendo que um destes também era tabagista e outros sete pacientes
tuberculosos eram tabagistas e etilistas concomitantemente. Outros hábitos e
comorbidades (consumo de drogas ilícitas, hepatite, diabetes, hipertensão, doença
de Chagas) também foram relatados e somaram juntos 8 casos.
Houve um caso de Síndrome da Imunodeficiência Adquirida associada a
PCM.
Figura 10 - Hábitos e comorbidades associadas em pacientes acometidos por PCM.
6.8 EXAMES REALIZADOS – DIAGNÓSTICO LABORATORIAL
Os exames mais utilizados para a comprovação do diagnóstico de PCM
foram o exame histopatológico da lesão (120 – 52,2 %) e o exame micológico direto
43
(83 – 36,1%).
Outros tipos de exames foram empregados com menor frequência. O exame
citológico foi realizado em 20 casos, o exame sorológico em 5 casos e a cultura para
fungos em 2 casos (Figura 11).
Figura 11 - Exames realizados para diagnóstico laboratorial da PCM (HUJM – MT Laboratório 2006-2013).
6.9 SAZONALIDADE
Em Mato Grosso pode-se considerar dois períodos climáticos, a saber:
“inverno” ou período das chuvas que engloba os meses de novembro a março e o
“verão” ou período da seca que compreende os meses de abril a outubro.
Considerando os meses das solicitações dos exames nos dois centros de referência,
HUJM e MT Laboratório, em 230 casos diagnosticados foi observado que 132
exames foram solicitados no período da seca e 98 exames no período chuvoso. A
distribuição dos 230 casos diagnosticados no período levando-se em consideração
os períodos secos e chuvosos está representada na figura 12.
44
Figura 12 - Casos de PCM em Mato Grosso (2006-2013) por períodos climáticos (secos x chuvosos).
6.10 DROGAS UTILIZADAS NO TRATAMENTO
Devido à dificuldade de identificar o esquema terapêutico utilizado nos
pacientes oriundos do interior e que não foram tratados no HUJM tendo apenas sido
diagnosticados nos laudos emitidos pelo MT Laboratório, dos 230 pacientes
diagnosticados apenas 116 foram considerados para as análises referentes às
drogas mais utilizadas no tratamento da PCM em Mato Grosso. Dos outros 114
pacientes restantes, para 112 foi admitido que por residirem no interior recebessem
o tratamento em sua cidade de origem. Houve um paciente que apesar de residir em
Cuiabá não retornou para iniciar o tratamento. Um paciente veio a óbito antes de
iniciar o tratamento (Figura 13).
45
Figura 13 - Pacientes que receberam tratamento para PCM.
As drogas mais comumente utilizadas para o tratamento da PCM foram a
combinação de sulfametoxazol-trimetoprim (SMX-TMP) e os derivados azólicos
(itraconazol, cetoconazol e fluconazol).
Muitos pacientes receberam tratamento combinado com duas ou mais
destas drogas dependendo da disponibilidade no Sistema Único de Saúde – (SUS)
ou da gravidade dos sintomas apresentados. Como tratamento prévio foi
considerado a droga utilizada no primeiro tratamento nos casos de recidiva da
doença ou a droga utilizada anteriormente ao retorno ao tratamento após abandono.
O tratamento atual está representado pelo último esquema terapêutico prescrito.
Considerando o tratamento prévio e o tratamento atual de casos novos, na
terapêutica inicial, a droga mais utilizada foi o SMX-TMP em 97 casos (83,6%). O
itraconazol e o cetoconazol foram prescritos em 15 casos. A anfotericina B foi a
droga de escolha em 3 casos Para um paciente não foi possível identificar a
medicação prévia pois o mesmo havia sido tratado em outra instituição no estado de
Rondônia e não soube informar (Figura 14).
46
Figura 14 - Drogas utilizadas no tratamento de PCM.
Após o reingresso ao tratamento por abandono ou devido a recidiva as
drogas mais utilizadas foram SMX-TMP em 26 casos (49%) seguido do itraconazol
em 23 casos (43,4%). A anfotericina B foi prescrita a 3 pacientes (5,7%). Um
paciente recebeu fluconazol.
Figura 15 - Drogas utilizadas no reingresso ao tratamento por abandono ou recidiva
A figura 16 mostra a terapêutica adotada para os pacientes que no
tratamento prévio foram tratados com SMX-TMP (44 casos) e retornaram após um
3 6 9
97
1
Terapêutica Inicial
Anfotericina B
Cetoconazol
Itraconazol
SMX-TMP
Ignorado
3 1
23
26
Terapêutica de retorno
Anfotericina B
Fluconazol
Itraconazol
SMX-TMP
47
período de abandono do tratamento ou recidiva da doença. Para 20 pacientes o
tratamento com SMX-TMP foi mantido e 21 pacientes tiveram sua medicação
alterada para itraconazol. Três pacientes passaram a usar a anfotericina B e um
paciente fluconazol.
Figura 16 - Alteração da medicação prévia SMX-TMP para outra droga.
Os três pacientes que haviam iniciado o tratamento com anfotericina B
tiveram sua terapêutica modificada para itraconazol (2) e SMX-TMP (1) como é
mostrado na figura 17.
Figura 17 - Alteração da medicação prévia Anfotericina B para outra droga
3
1
21 20
0
5
10
15
20
25
Anfotericina B Fluconazol Itraconazol SMX-TMP
Alteração de medicação SMX-TMP
2
1
Alteração da medicação anfotericina B
Itraconazol
SMX-TMP
48
6.11 ENCERRAMENTO DOS CASOS
Dos 230 casos diagnosticados, em 117 não foi possível obter informações
sobre o encerramento uma vez que o MT Laboratório apenas realiza os exames
encaminhados pelos estabelecimentos de saúde pertencentes ao SUS sediados em
Mato Grosso. A maioria destes munícipios encontra-se localizadas no interior do
estado e provavelmente estes pacientes retornaram a sua cidade de origem onde
receberam o tratamento.
Dos 113 restantes, 60 (53,1%) abandonaram tratamento no HUJM por
razões desconhecidas. Há 13 pacientes em tratamento e 8 em controle de cura.
Receberam alta por cura clínica e laboratorial 27 pacientes e 5 foram a óbito.
A distribuição dos casos de PCM por motivo de encerramento pode ser vista
na figura 18.
Figura 18 - Encerramento dos casos de PCM
6.12 CONHECIMENTO E POSTURA DOS CDS FRENTE A PCM
A maioria dos CDs, 127 (63,5%), respondeu não se sentir capacitado para
identificar lesões orais da PCM, enquanto que 73 afirmaram apresentar aptidão para
diagnosticar clinicamente lesões suspeitas de PCM (Figura 19).
49
Figura 19 - Auto avaliação dos CDs em reconhecer lesões orais de PCM
Os CDs que responderam já ter atendido pacientes acometidos por PCM
totalizaram 43 profissionais (21,5%), porém somente 21 acompanharam o desfecho
do caso (Figuras 20 e 21).
Figura 20 - CDs que prestaram atendimento a pacientes acometidos por PCM
127
73
Auto-avaliação no diagnóstico clínico da PCM
Não Aptos
Aptos
157
43
Atendimento
Não
Sim
50
Figura 21 - CDs que acompanharam o desfecho do caso de PCM atendido
O direcionamento a ser dado aos pacientes é apresentado na figura 22.
A maioria dos CDs – 159 (79,5%) respondeu não saber para onde
encaminhar o paciente caso seja procurado por alguém com queixas e
manifestações orais de PCM.
Dez profissionais encaminhariam para o médico. Seis profissionais
encaminhariam para algum serviço de referência local (hospital municipal, regional,
Programa Saúde da Família - PSF) e três para alguma faculdade de odontologia ou
hospital universitário.
Treze dentistas (6,5%) encaminhariam ao HUJM. Outros profissionais
encaminhariam para o Hospital do Câncer de Cuiabá (3) e Centro Estadual de
Odontologia para Pacientes Especiais – CEOPE (1).
Três odontólogos encaminhariam para colega de outra especialidade e dois
fariam o tratamento no próprio consultório.
52
7. DISCUSSÃO
O estudo epidemiológico referente aos 230 pacientes diagnosticados com
paracoccidioidomicose, atendidos no Hospital Universitário Júlio Muller (HUJM)
sediado em Cuiabá – MT e pelos laudos emitidos no Laboratório Público do Estado
de Mato Grosso (MT Laboratório) no período compreendido entre 2006-2013,
mostrou uma relação homens: mulheres de 45:1, bem mais alta que a maioria dos
relatos epidemiológicos descritos na literatura.
Em áreas de alta prevalência a doença ocorre mais frequentemente em
homens adultos, numa proporção de 13 homens para uma mulher (BRUMMER;
CASTANEDA; RESTREPO, 1993; LACAZ et al., 2002), podendo variar dependendo
da região estudada (BORELLI,1970; LONDERO; RAMOS, 1972; GONÇALVES et
al., 1984).
López-Martínez et al. (2014), em estudo clínico e epidemiológico no México
encontraram um relação homem: mulher de 22:1.
Na cidade de Botucatu (SP), área endêmica para a doença, Marques et al.
(1983) encontraram uma relação de pacientes masculino:feminino de 10,7:1 com
maior frequência entre trabalhadores rurais e da construção civil.
Em estudo publicado por Telles Filho et al. (1986) em Curitiba no estado do
Paraná foi observado uma relação de 9,1:1 e 78% desses indivíduos tinham
atividades relacionadas à agricultura. Já Mota (1996), encontrou uma relação de 6,5
homens para 1 mulher no estado do Paraná atribuindo tal fato a constante presença
de mão de obra feminina nas plantações de café da região.
Girard et al. (2012), em análise retrospectiva de prontuários registraram 36
casos confirmados de paracoccidioidomicose em um período de 10 anos no Sul do
Brasil obtiveram uma taxa homem: mulher de 8:1.
Carvalhosa et al. (2012), realizaram um estudo epidemiológico com o
objetivo de avaliar a prevalência da PCM através dos dados de 3670 laudos de
exames citológicos e histopatológicos de lesões orais emitidos pelo Laboratório
Público de Mato Grosso ao longo de um período de 4 anos (2004-2008). No período
de avaliação, 96 (2,6%) casos de PCM foram diagnosticados sendo mais
prevalentes em homens (97,9%) oriundos de áreas rurais (94%) e na quinta década
de vida (35,4%).
Esta relação aumentada pode ser devida ao intenso movimento migratório
53
em Mato Grosso uma vez que homens migram mais e antes que mulheres por
constituírem o arrimo da família que deixa sua localidade natal somente após o
estabelecimento profissional do responsável por seu sustento.
Apesar de estudos mostrarem que a mulher, por razões hormonais que
inibem a transição do micélio ou conídio para a forma de levedura (SANTOS, 2007),
apresenta um acometimento menor da PCM, poder-se-ia também esperar uma
relação homem: mulher mais equilibrada devido à mudança comportamental das
mulheres no que tange ao consumo de tabaco, álcool e outras drogas e execução
de atividades laborais antes somente exercidas por homens, o que aumentaria sua
exposição ao fungo, como sugeriram Loth et al. (2011).
Não se averiguou se as pacientes eram imunocompetentes ou se
apresentavam algum distúrbio endócrino justificando a manifestação da doença.
A maior incidência da doença neste estudo foi na faixa etária de 31 a 60
anos para indivíduos do gênero masculino. Indivíduos situados nesta faixa etária
representam parcela da população que se encontra em idade produtiva, constituindo
força de trabalho rural. Nos 5 casos encontrados para o gênero feminino a idade
variou dos 22 aos 56 anos.
Segundo Borelli (1972) a PCM possui um longo período de latência que
impede a determinação precisa do local onde foi adquirida. Alguns autores
acreditam que o fungo pode contaminar o ser humano em idades precoces e ficar
incubado por anos, e somente após uma falha do sistema imunológico haver a
manifestação da doença (PANIAGO et al., 2003; SHIKANAI-YASUDA et al., 2006;
LOTH et al., 2011).
A principal atividade laboral dessas pessoas estava relacionada ao meio
rural (agricultores, lavradores, operadores de máquinas agrícolas) ou ofícios que por
sua natureza estão mais expostos a inalação de poeira (construção civil, pedreiros,
carpinteiros, marceneiros, madeireiros, cortadores de madeira, operadores de
motosserra, mecânicos, jardineiros, garimpeiros).
A discussão em relação às razões da elevada incidência em pedreiros pode
ser conduzida também pela premissa de que pedreiros constituem uma comunidade
formada principalmente por migrantes da zona rural, portanto ex-lavradores, que
teriam se infectado no exercício da antiga profissão. Tal análise evidencia a
necessidade de se conhecer o “histórico” da vida do doente, quando se estuda a
epidemiologia da PCM.
54
Foram diagnosticados casos de PCM em 76 (53,9%) dos 141 municípios
mato-grossenses, porém a maior concentração de casos foi nas mesorregiões Norte
e Centro-Sul, destacando-se na primeira os municípios de Alta Floresta e Guarantã
do Norte e na segunda, Cuiabá e Várzea Grande.
A mesorregião Norte vem apresentando um grande desenvolvimento
intimamente ligado ao agronegócio e à extração de madeira, ou seja, atividades
ligadas ao campo e assim estariam mais expostas à contaminação pelo
Paracoccidioides spp também favorecida pela ocupação desordenada da terra. Na
mesorregião Centro-Sul, os moradores encontrariam maior facilidade de acesso à
assistência à saúde por ser onde se localiza a capital e o serviço estadual de
referência no tratamento da doença.
No estado de Mato Grosso predominam os climas equatoriais e tropicais
quentes e seu território possui as características ambientais que favorecem o
estabelecimento do P. brasiliensis (ARAÚJO; SOUSA ; CORREIA, 2003; FORTES et
al., 2011).
Neste trabalho, levando-se em consideração os meses em que os exames
laboratoriais para diagnóstico da PCM foram solicitados e comparando-os com o
período de seca e chuva, apesar de haver pequena superioridade no número de
exames solicitados na estiagem, essa diferença não foi significativa estatisticamente,
o que demonstra não haver associação entre as variáveis.
O Laboratório Público do Estado de Mato Grosso (MT Laboratório) é o
centro de referência na realização de exames citológicos e histopatológicos de boca
para os estabelecimentos de saúde pertencentes ao Sistema Único de Saúde (SUS)
sediados em Mato Grosso.
Dos 116 laudos emitidos pelo MT Laboratório somente 5 eram de pacientes
residentes em Cuiabá e 2 do município de Várzea Grande. Os 109 laudos restantes
foram de pessoas residentes em municípios do interior que provavelmente após
receberem o diagnóstico positivo para PCM foram submetidos ao tratamento em seu
próprio município de residência
Em 1992 foi criado o ambulatório de referência em leishmaniose, hepatites
virais e PCM no HUJM.
O HUJM recebe, além de pacientes provenientes de Cuiabá, Várzea Grande
e municípios vizinhos, os doentes encaminhados de todo o estado e também de
municípios do estado de Rondônia. Estes pacientes do interior provavelmente são
55
acometidos pelas formas mais graves e de difícil tratamento, ficando a terapêutica
das formas leves da doença, restritas aos centros de saúde locais ou hospitais
menores da região.
Esta dinâmica de atendimento explica a alta porcentagem de encerramento
desconhecido dos casos de PCM encontrada neste trabalho uma vez que o
pacientes cujos laudos foram emitidos pelo MT laboratório são em sua maioria
provenientes de pacientes procedentes do interior do estado.
Para os casos diagnosticados nesta investigação o exame mais utilizado
para a comprovação do diagnóstico de PCM foi o exame histopatológico da lesão
(120) seguido do exame micológico direto (83) em detrimento de outros tipos de
exames (citológico, sorológico e cultura para fungos) que foram empregados com
menor frequência.
Tal fato pode estar associado em razão da biopsia constituir o exame de
eleição em casos câncer de boca, um dos diagnósticos diferenciais a ser realizado,
que não é diagnosticado pelo exame citológico.
A maioria dos casos diagnosticados (77,4%) foram considerados casos
novos uma vez que os pacientes estavam procurando atendimento médico com
sinais e sintomas de PCM pela primeira vez. A descontinuidade do tratamento pode
estar associada às dificuldades de deslocamento principalmente no período das
chuvas quando as condições das estradas se tornam mais precárias uma vez que
16 pacientes dos 21 que voltaram a procurar tratamento após o terem abandonado
eram provenientes de municípios do interior.
O alto índice de abandono do tratamento pode ser explicado pelo mesmo
motivo. Dos 60 pacientes que abandonaram o tratamento, 43 (70,4%) residiam no
interior e 18 ( 29,6%) em Cuiabá e Várzea Grande.
Com relação a forma clínica apresentada, os achados desta investigação
são bastante próximos da estatistica mostrada na literatura. Em 95,2% dos casos foi
observada a forma crônica da doença em pacientes na faixa etária de 31 a 60 anos
de idade. A forma aguda esteve presente em menor proporção (4,8%) e a idade dos
pacientes variou dos 11 aos 30 anos.
Como o MT Laboratório é a referência na realização de exames citológicos e
histopatológicos de boca nos resultados desta casuística as lesões em mucosa oral
foram as mais frequentemente encontradas estando presentes em 186 (80,8%) dos
230 pacientes diagnosticados.
56
O comprometimento pulmonar foi evidenciado em 70 pacientes. Esta
desigualdade porém deve ser analisada com cautela devido ao viés da amostra uma
vez que os exames realizados no MT Laboratório só contemplam lesões orais.
Considerando apenas os 114 pacientes que foram diagnosticados no HUJM, o
comprometimento pulmonar dos pacientes analisados foi igual a 61,4%.
Da mesma maneira, considerando apenas os pacientes do HUJM, 22
pacientes (19,3%) apresentaram evidências clínicas ou laboratoriais de
envolvimento ganglionar. As lesões de pele e mucosa nasal foram menos
frequentes.
O SNC foi atingido em 3 pacientes (2,6%) evidenciando uma casuistica
menor em relação aos registros encontrados na literatura.
Houve alto índice de tabagismo e etilismo no grupo estudado. Este resultado
assume relevância uma vez que estudos clínicos mostraram que o alcoolismo e o
tabagismo são fatores de risco para a doença, pois favorecem um desequilíbrio
imunológico que pode levar a reativação de focos quiescentes da PCM (ANDRADE,
1987; MARTINEZ; MOYA, 1992).
Nesta pesquisa o percentual de tuberculose associada a PCM foi de 9.9%
corroborando com os percentuais encontrados na literatura.
Apenas um caso de AIDS associado a PCM foi diagnosticado neste estudo.
O paciente apresentava a forma crônica da doença e já tinha diagnóstico de PCM
confirmado quando contraiu o HIV.
O tratamento da PCM iniciou-se com o uso da sulfadiazina (RIBEIRO, 1940).
Após o início de tratamento regular, a boa resposta clínica é evidente, porém
recidivas são frequentes quando ocorre a suspensão do medicamento
precocemente.
A terapêutica empregada para o tratamento da PCM em Mato Grosso não
difere da literatura. Na maioria dos tratamentos foi utilizado o SMX-TMP, mas muitos
pacientes receberam tratamento combinado com duas ou mais drogas. A segunda
droga de escolha foi o itraconazol. Em três casos mais graves da doença foi
prescrita a anfotericina B e após a melhora clínica dos sintomas a medicação foi
alterada para SMX-TMP em um caso, e para itraconazol em dois casos.
Houveram três casos cujo tratamento fora iniciado com SMX-TMP e após
um período sem melhora clínica e piora dos sintomas do paciente a medicação foi
alterada para anfotericina B.
57
Os oito pacientes que estão em acompanhamento de cura finalizaram seu
tratamento utilizando SMX-TMP (7) e itraconazol (1).
Os 27 pacientes que receberam alta finalizaram o tratamento utilizando
SMX-TMP (13), itraconazol (12) e anfotericina B (2).
Os critérios de cura em PCM são: clínico, micológico, radiológico e
imunológico mas a palavra “cura” dificilmente possa ser aplicada aos pacientes
portadores de PCM pela impossibilidade de erradicação do Paracoccidioides spp.
Os pacientes apresentam o risco potencial de uma reativação tardia, motivo pelo
qual se emprega o termo “cura aparente ou cura clínica”. As diferentes modalidades
terapêuticas diminuem a quantidade de fungos no organismo, permitindo a
recuperação da imunidade celular e restabelecendo o equilíbrio entre parasito e
hospedeiro. Por este motivo, após a interrupção do tratamento uma vez observados
os critérios de cura, os pacientes devem ser acompanhados ambulatorialmente, uma
vez ao ano, com exame clínico e sorológico, se necessário.
Dos 230 pacientes investigados em 117 o encerramento do caso foi
considerado desconhecido sendo que destes, 8 eram residentes em Cuiabá e
Várzea Grande e 109 provenientes de municípios do interior do estado. Estes
pacientes provavelmente receberam tratamento em sua cidade de origem.
No HUJM há atualmente 13 pacientes em tratamento e 8 em controle de
cura. Abandonaram o tratamento por razões desconhecidas, 60 pacientes.
Receberam alta por cura clínica e laboratorial 21 pacientes e 5 foram a óbito.
O cirurgião dentista exerce um importante papel no diagnóstico e
encaminhamento para tratamento do paciente acometido por PCM uma vez que a
procura por tratamento em grande parte ocorre em fase adiantada da doença,
quando esta já apresenta manifestações bucais, secundárias à infecção pulmonar
(VERLI et al., 2005) sendo muitas vezes o primeiro profissional a examinar o
paciente.
Ao analisarmos a pesquisa adicional realizada junto aos CDs para se avaliar
a dinâmica destes profissionais frente a pacientes acometidos por PCM e seu
direcionamento com os dados epidemiológicos obtidos neste trabalho foram
observados pontos interessantes.
O local anatômico das lesões mais evidenciado nos pacientes acometidos
por PCM foi a mucosa oral. Em contrapartida, a maioria dos CDs não se julga apto a
reconhecer ou diagnosticar tais lesões o que leva a suposição de que muitos dos
58
157 profissionais que responderam jamais ter atendido um paciente acometido pela
doença já estiveram à frente de tais pacientes e não souberam diagnosticá-los
corretamente.
Dos 43 dentistas que disseram ter atendido pacientes acometidos por PCM,
4 CD's disseram não se sentirem capacitados para identificar lesões características
de PCM. Indaga-se como estes profissionais identificaram um "caso de PCM" se
pela sua auto avaliação reconheceram não conhecer as lesões características da
doença. Provavelmente estes profissionais devem tê-lo atendido enquanto ingressos
na faculdade sob a supervisão de um professor ou numa policlínica onde outro
profissional tenha identificado as lesões.
Outra análise que se pode fazer é que apenas 21 CDs tiveram interesse em
acompanhar o desfecho do caso de seu paciente. As razões que podem ser
aventadas para tal são diversas. Este profissional apesar de inserido numa região
endêmica da doença, apontada como oitava causa de mortalidade por doença
infecciosa predominantemente crônica entre as doenças infecciosas e parasitárias,
segundo dados do Ministério da Saúde, não está ciente de sua importância no
diagnóstico da mesma. As instituições de ensino, quer de graduação ou pós-
graduação não estão dando a devida importância e formação adequada a seus
discentes no que se refere a PCM. Estes profissionais podem ser oriundos de outras
regiões do país onde a PCM não é endêmica e podem não ter tido a adequada
formação no tocante a mesma. Os pacientes acometidos por PCM são em sua
maioria pessoas de baixa renda e procuram atendimento na rede pública e portanto
não há retorno financeiro ao CD independente do acompanhamento do desfecho.
Como a resposta ao questionário foi feita anonimamente não sabemos o
local de residência dos profissionais que o responderam. Apenas 6,5 % dos
entrevistados conhecem o serviço de referência prestado no HUJM, mas 10%
dariam o direcionamento correto ao paciente (HUJM, médico ou serviço de
referência local). Cerca de 80% dos CDs não saberia para onde encaminhar o
paciente. Dos 73 dentistas que se consideram aptos ao diagnóstico, 34 (46,6%) não
sabem que direcionamento dar ao paciente.
59
8. CONCLUSÕES
1. Os 230 casos diagnosticados em um período de 8 anos refletem
endemicidade da PCM no estado de Mato Grosso com maior incidência nas
mesorregiões Norte e Centro-Sul.
2. Em relação à faixa etária que variou dos 31 aos 60 anos, atividade
ocupacional, forma clínica e localização anatômica das lesões os achados
mostraram perfeita correlação com os clássicos registros da literatura. Quanto ao
gênero dos pacientes a relação homens: mulheres de 45:1 foi bem mais alta que os
relatos epidemiológicos já descritos.
3. Considerando o tratamento dos pacientes acometidos foi possível
observar que a associação sulfametoxazol-trimetoprim continua sendo a droga mais
empregada devido ao baixo custo e disponibilidade no SUS no estado de Mato
Grosso.
4. Há alto índice de abandono e descontinuidade de tratamento dos
pacientes atendidos no HUJM.
5. Considerando os períodos de seca e chuva apesar de haver pequena
superioridade no número de exames solicitados na estiagem, essa diferença não foi
significativa estatisticamente demonstrando não haver associação de sazonalidade
para PCM.
6. No período de 2006 a 2013 os exames mais utilizados para a
comprovação do diagnóstico de PCM foram o exame histopatológico da lesão e o
exame micológico direto.
7. Há alto índice de tabagistas e etilistas entre os pacientes
diagnosticados no MT Laboratório e HUJM.
8. A maioria dos CDs (CRO-MT) não se considera apto a reconhecer
lesões patognomônicas da PCM ao se depararem com um paciente acometido pela
doença tampouco sabe para onde encaminhá-los e desconhecem os serviços de
referência no estado de Mato Grosso.
9. As manifestações orais da PCM são bastante frequentes sendo
importante inserir o CD no processo de diagnóstico precoce da doença.
60
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74
APÊNDICE A - QUESTIONÁRIO
Questionário encaminhado aos Cirurgiões Dentistas inscritos no CRO-MT
1. Sente-se capacitado em identificar lesões
características de PCM? SIM
NÃO
( )
( )
2. Já atendeu algum caso de PCM? SIM
NÃO
( )
( )
3. Em caso afirmativo após o encaminhamento
acompanhou o desfecho do caso? SIM
NÃO
( )
( )
4. Sabe qual direcionamento a ser dado ou para onde
encaminhar o paciente caso venha a se deparar com
algum paciente com manifestações de PCM? Qual? SIM
NÃO
( )
( )
75
APÊNDICE B - FICHA EPIDEMIOLÓGICA
DADOS GERAIS
nº prontuário
1 Nome do paciente :
2 D.N.:
/ /
3 Data notificação / /
Municipio:
4 Local de Nascimento:
5 Idade:
6 Sexo
M ( ) F ( )
7 Gestante N 1T 2T 3T Ig
( ) ( ) ( ) ( ) ( )
8 Ocupação:
9 Trabalho rural atual ou passado
SIM ( ) NÃO ( ) Ignorado ( )
10 Tipo de entrada
caso novo ( ) recidiva ( )
reing. após aband. ( ) não sabe ( ) transf. ( )
11 Forma Clínica
Aguda/sub ( ) Crônica ( )
12 Orgãos Comprometidos
SIM ( ) NÃO ( )
pulmões ( ) mucosa oral ( )
linfonodos ( ) laringe ( )
adrenal ( ) pele ( )
SNC ( ) outros ( )
13 Agravos associados
AIDS ( ) TB ( ) Diabetes ( )
Neoplasias ( ) Tabagismo ( )
Outros ( ) Ignorado ( )
14 Diagnóstico Laboratorial
Positivo ( ) Negativo ( )
Inconclus. ( )
Não Realiz. ( )
76
Cultura ( )
Micológ. direto ( )
Sorológico ( )
Histopatológico ( )
Citopatológico ( )
15 Encerramento do caso
Confirmado ( ) Provável ( )
16 Tratamento prévio
SIM ( ) NÃO ( )
17 Primeiro diagnostico
Data / /
Local
Droga e duração
18 Tratamento Atual
SIM ( ) NÃO ( )
19 Drogas utilizadas
SM-Trimetop. ( )
Itraconazol ( )
Anfotericina
Data início / /
Data término / /
20 Esquema Terapêutico:
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