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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
INSTITUTO DE LINGUAGENS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DE LINGUAGEM
LENI DIAS DE SOUSA ERDEI
A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA
ANÁLISE ENUNCIATIVO-DISCURSIVA BAKHTINIANA
CUIABÁ – MT
2014
ii
LENI DIAS DE SOUSA ERDEI
A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA
ANÁLISE ENUNCIATIVO-DISCURSIVA BAKHTINIANA
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Estudos de Linguagem da Universidade Federal de Mato Grosso como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre em Estudos de Linguagem. Orientadora: Professora Dra. Simone de Jesus Padilha.
CUIABÁ – MT
2014
iii
iv
Com a ajuda de Deus.
Em nome de Jesus.
v
AGRADECIMENTOS
A Deus, porque Ele é bom; Seu amor dura para sempre.
À professora Dra. Simone de Jesus Padilha, meus sinceros agradecimentos por me
aceitar como orientanda. Agradeço pelo aprendizado por meio de seus
conhecimentos, empréstimos de livros, indicações de leituras, correção de trabalhos,
pelo simples convívio diário e pelas orientações claras ou mesmo as “implícitas” que
fizeram nós, os “Simonetes”, lermos tanto e construirmos nosso próprio caminho.
Preciso dizer que Simone Padilha, para mim, foi mais que orientadora, foi amiga,
presença forte, amorosa, protetora e equilibrada durante todo o curso. Em tempos
difíceis ou mais fáceis da pesquisa, ela sempre estava ali bem perto, aguardando para
que fosse chamada.
Ao professor Pós-Dr. Mário Cezar Silva Leite por aceitar ler meu trabalho e fazê-lo
com enorme atenção a ponto de perceber lacunas e, no exame de qualificação e na
defesa, sugerir melhorias, as quais seguramente contribuíram para um trabalho mais
claro, pois sua visão percebeu o que eu ainda não tinha visto.
À professora Dra. Marta Helena Cocco por aceitar ler este trabalho fazendo uma
leitura “bakhtiniana” detalhista, ainda que em pouco espaço de tempo. Obrigada pelas
valiosas sugestões, no exame de qualificação e, também na defesa, as quais me
levaram a refletir e a buscar pela essência desta pesquisa com maior intensidade.
À professora Pós-Dra. Célia Maria Domingues da Rocha Reis por sempre ter uma
solução e um sorriso para mim quando eu precisava e por permitir, também, que meu
Estágio de Docência ocorresse em suas aulas. Além de aprender muito nesse
período, também pude me divertir com os colegas dos Estudos Literários – a Mariana
Miranda Máximo, a Heloisa Helena Ribeiro de Miranda e o João Paulo de Azevedo.
À professora Mra. Alba Valéria Alves Ignácio por me aconselhar a entrar no mestrado
e, mais tarde dizer:
– Vai Leni, vai que Jesus, Maria e José vão te ajudar!
vi
Aos professores do Programa de Mestrado em Estudos de Linguagem e Estudos
Literários – MeEL, Célia Maria Domingues da Rocha Reis, Cláudia Graziano Paes de
Barros, Dánie Marcelo de Jesus, Franceli Aparecida da Silva Mello, Maria Rosa
Petroni, Sérgio Flores Pedroso, Simone de Jesus Padilha. Para cada um desses
professores guardo uma imagem carinhosa adquirida durante o convívio em suas
aulas, colóquios, palestras, cursos ou estágio. Ter tido a liberdade de interagir e a
oportunidade de aprender com cada um deles foi realmente um privilégio. Obrigada!
À coordenação do Programa de Pós-graduação em Estudos de Linguagem
representada pela professora Dra. Divanize Carbonieri e aos funcionários Nelson,
Winnie e Juliana pela colaboração e simpatia.
À Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior –
CAPES pela disponibilização da bolsa de estudos.
Ao meu marido Mauricio pelo companheirismo, por ouvir minhas explicações
bakhtinianas quando eu ficava eufórica, por conta da compreensão teórica e pelo
orgulho que demonstrava ao perceber meu crescimento intelectual.
A minha filha Suzane por me ouvir falar diariamente sobre minha pesquisa, com muita
paciência e tranquilidade, apesar de eu querer, às vezes, que ela acompanhasse o
raciocínio comigo.
Ao meu irmão Robson por me incentivar constantemente. Também por ajudar com
esclarecimentos históricos e sociológicos, os quais foram imprescindíveis para que eu
pudesse compreender teorias necessárias para este trabalho. A minha cunhada
Alessandra e ao meu sobrinho Daniel pelos momentos de convívio roubados.
Ao meu tio José Dias por emprestar sua coleção de livros de faroeste americano para
mim, ainda no primário. Um dos motivos por eu ter adquirido o gosto pela leitura.
Às orações dos amigos do Pequeno Grupo de Oração, liderado pela Genima, da 1ª
Igreja Batista de Cuiabá – MT.
vii
As minhas irmãs-amigas Eliana Aparecida Albergoni de Souza, Leila Figueiredo de
Barros, Shirlei Neves dos Santos e Viviane Letícia Silva Carrijo, agradeço por
compartilharem comigo as leituras, as lamúrias e as risadas.
À Lucimeire da Silva Furlaneto, pela ajuda em momentos muito difíceis. Muito
obrigada.
À Isabel Cristina Corgosinho, Josilene Auxiliadora Ribeiro e Neiva de Souza Boeno,
agradeço pelas leituras de Pablo Neruda, na mesa do bar, em São Carlos - SP.
Excelente lugar para aprendermos.
Aos colegas do Grupo de Pesquisa Relendo Bakhtin (REBAK) pelos encontros,
conversas, ouvidos, viagens e festas. Foram momentos inesquecíveis!
Ao Anderson Simão Duarte, porque o primeiro livro emprestado no MeEL, jamais
esquecerei.
Ao bibliotecário Douglas Rios do UNIVAG pelo empréstimo de livros.
viii
RESUMO
Durante nossa pesquisa refletimos sobre a escolarização e a didatização do gênero poema inserido no Caderno Poetas da Escola do Programa Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro (OLPEF), uma parceria público-privada entre o MEC e a Fundação Itaú Social, sob a coordenação técnica da ONG de São Paulo CENPEC. A proposta do material inclui tanto o ensino da leitura e produção textual do gênero poema, para os alunos de escolas públicas brasileiras do 5º e 6º anos do Ensino Fundamental, bem como a formação do professor fundamentada na visão formalista da língua. A OLPEF, continuamente, amplia seu campo de atuação nas práticas escolares diárias, entretanto sua qualidade não é avaliada institucionalmente e nas academias ainda ocupa pouco espaço nas análises. Nossa pesquisa teve origem a partir da consideração de uma das conclusões de Padilha (2005), em sua tese de doutoramento - Os gêneros poéticos em livros didáticos de língua portuguesa do Ensino Fundamental: uma abordagem enunciativo-discursiva. Nela, a autora afirma que as diferentes formas de abordagem dos gêneros dos discursos poéticos nos livros didáticos demonstram as incompreensões teóricas desses materiais, no que diz respeito ao que vem a ser a concepção dos gêneros literários e, mais especificamente, do gênero discursivo poema. Tais empenhos estão atrelados, ainda, a estudos fundamentados na teoria literária, permeados por concepções formalistas que privilegiam, sobretudo, os aspectos da forma composicional. Nosso objetivo foi descrever os modos como o gênero discursivo poema foi didatizado na 2ª edição do Caderno Poetas da Escola do Programa da Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro 2010 e sugerir uma leitura e produção do poema na perspectiva enunciativo-discursiva, considerando, além dos aspectos formais, os sócio-históricos, discursivos e ideológicos, imbricados no processo de criação verbal. Nossas reflexões e análises foram fundamentadas, principalmente, na teoria enunciativo-discursiva de abordagem sócio-histórica de Bakhtin e o Círculo e na teoria de ensino-aprendizagem de Vygotsky. A análise do modelo didático revelou que a concepção de língua como comunicação e a abordagem formal do poema leva o ensino para uma direção tradicional em que identificar, memorizar e localizar são prioridades no estudo do texto poético. Adicionada a isso, a sequência didática elaborada pelos estudiosos genebrinos tende a tratar o poema de forma rígida sem dar abertura ao professor para modificações no planejamento. Ao término de nossa investigação, desejamos que os alunos possam assumir, desde cedo, a palavra de modo democrático no país em que vivem, portanto o olhar do ensino de língua materna deve estar voltado para a leitura e produção de textos em diferentes gêneros discursivos e, ainda, para a busca e compreensão das relações dialógicas que há neles. Palavras-chave: Olimpíada de Língua Portuguesa; gênero discursivo poema; didatização.
ix
ABSTRACT
During our research, we reflected on schooling and didactization of the poem genre, inserted in the Poets of School Notebook of the Portuguese Language Olympics Program Escrevendo o Futuro (Writing the Future) (OLPEF), a public-private partnership between MEC and Fundação Itaú Social, under the technical coordination of São Paulo’s NGO CENPEC. The proposed material includes both the teaching of reading and textual production of the poem genre, for the Brazilian public school students in the 5th and 6th years of elementary school, as well as teacher training based on the formalist view of language. The OLPEF continuously expands its field in daily school practices, though its quality is not evaluated institutionally, and, in the academies, it still occupies little space in the analyses. Our research originated from the consideration of one the findings of Padilha (2005), in her doctoral thesis - Os gêneros poéticos em livros didáticos de língua portuguesa do Ensino Fundamental: uma abordagem enunciativo-discursiva. In it, the author states that the different ways to approach the genre of poetic discourse in textbooks demonstrate the theoretical misunderstandings of these materials, in regards to what is to be the conception of literary genres and, more specifically, of poems discursive genres. Such endeavors are linked, still, to studies grounded in literary theory, permeated by formalist conceptions which privilege, especially, the aspects of compositional form. Our objective was to describe the ways in which discursive genre poem was taught in the 2nd edition of the Poets of School Notebook of the Portuguese Language Olympics Program Escrevendo o Futuro (Writing the Future) 2010 and suggest a reading and production of poem in the enunciative-discursive perspective, considering formal, socio-historical, discursive and ideological aspects, embedded in the verbal creation process. Our reflections and analyses were based mainly on enunciative-discursive theory of socio-historical approach of Bakhtin and the Circle and in the theory of teaching and learning of Vygotsky. The analysis of the didactic model revealed that the conception of language as communication and formal approach of the poem takes the teaching to a traditional direction in which identifying, memorizing and locating are priorities in the study of the poetic text. Added to this, the didactic sequence, developed by Genevan scholars, tend to treat the poem rigidly, without giving opening to the teacher for changing the planning. At the end of our investigation, we wish that students can take, early on, the word, in a democratic way, in the country in which they live, so the gaze of the teaching of the first language should be facing the reading and production of texts in different discursive genres and, furthermore, to the search for and understanding of dialogical relations in them. Keywords: Portuguese Language Olympics; poem discursive genre; didactization.
x
SUMÁRIO
CAPÍTULO 1 ............................................................................................................. 12
Apresentando nosso objeto de pesquisa ............................................................. 12
1.1 Objeto de Pesquisa ......................................................................................... 14
1.2 Metodologia de pesquisa: a compreensão dos dados ..................................... 16
1.3 Apontamentos teórico-metodológicos para a investigação científica em
Ciências Humanas ................................................................................................. 17
1.4 A base metodológica para a coleta de dados .................................................. 20
CAPÍTULO 2 ............................................................................................................. 24
Ensino e didatização do poema: diversos caminhos para atingir o mesmo fim
.................................................................................................................................. 24
2.1 Vygotsky: educação de natureza social ........................................................... 24
2.1.1 Zona de Desenvolvimento Proximal: processo de autonomia do aluno e
mediação do professor ....................................................................................... 26
2.2 Escolarização da literatura ............................................................................... 29
2.2.1 Didatização: diferentes caminhos em busca da mesma essência ............ 32
2.2.2 PCN: texto literário em suas particularidades ........................................... 48
2.3 Considerações genebrinas: gêneros e desenvolvimento da linguagem .......... 54
2.3.1 Gêneros secundários: uma continuação dos primários ............................. 56
CAPÍTULO 3 ............................................................................................................. 63
Mapeamento descritivo da proposta pedagógica do Caderno do Professor da
Olimpíada de Língua Portuguesa: Escrevendo o Futuro 2010 ............................ 63
3.1 Refletindo sobre o que estaria dito na capa do Caderno: uma reflexão sobre a
imagem .................................................................................................................. 63
3.2 Breve comentário sobre o aspecto físico do material da OLPEF ..................... 68
3.3 Organização preliminar do Caderno ................................................................ 69
xi
3.3.1 Carta ao Professor .................................................................................... 69
3.3.2 Apresentação da Coleção ......................................................................... 70
3.3.3 A proposta do Caderno apresentada ao Professor ................................... 71
3.3.4 Organização interna do Caderno do Professor ......................................... 75
3.4 Distribuição interna das oficinas ...................................................................... 79
3.5 Por que não está considerada A Outra Face do Jano? Uma proposta de
exame analítico de alguns dados do Caderno Poetas da Escola .......................... 91
3.6 Levantamento das atividades recorrentes ....................................................... 93
3.6.1 Os dados sob um olhar bakhtiniano .......................................................... 96
3.6.2 Uma análise comparativa dos aspectos discursivos e dialógicos ............. 98
3.7 Exame do corpus: o oculto bem à vista no Caderno Poetas da Escola ......... 119
3.7.1 OFICINA 1 – Memória de versos e mural de poemas ............................. 120
3.7.2 OFICINA 2 – O que faz um poema ......................................................... 126
3.7.3 OFICINA 6 – Sentido próprio e figurado .................................................. 132
3.7.4 OFICINA 7 – Comparação, metáfora, personificação ............................. 139
3.7.5 OFICINA 8 – Sonoridade na poesia ........................................................ 148
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES .............................................................................. 153
REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 158
ANEXOS ................................................................................................................. 164
12
CAPÍTULO 1
Apresentando nosso objeto de pesquisa
Desde o início do século XX a educação brasileira esteve em pauta para
aqueles que se dedicam ao ensino oferecido pelo Estado e para a sociedade em geral.
Contudo, depois das revoluções sociais ocorridas na década de 60, a problemática da
educação direcionou-se a novos rumos e tornou-se mais evidente. Com o aumento
populacional nas cidades e a industrialização a todo vapor, surgiu o interesse por uma
educação universal no país, isto é, de acordo com os Parâmetros Curriculares
Nacionais (1998) “necessidade política para as nações do Terceiro Mundo a partir da
metade do século XX” (BRASIL, 1998, p. 17).
Como vivemos em sociedades conectadas umas com as outras, a educação
na contemporaneidade deveria contribuir para, por meio de uma reciprocidade entre
as culturas, com a autonomia do sujeito, preparar esse estudante, a partir de
conhecimentos adquiridos de modo sistematizado, para que ele participe ativa e
criticamente das questões sociais.
Conforme esclarecem os PCN (1998), as discussões se voltaram para o ensino
de Língua Portuguesa, porém a preocupação principal era modificar a metodologia
desse ensino e não o conteúdo. A estrutura da língua era o foco principal das
prioridades que se destacavam no campo educacional.
As crenças existentes eram as de que se os alunos dominassem as regras e
as exceções da norma-padrão, estariam preparados para participar das práticas
sociais, culturais, políticas e decisivas da sociedade letrada em que viviam. Contudo,
com o passar dos anos, o método de ensino que valorizava a estrutura da língua
perdeu o status que o tornava digno de “superioridade”.
A educação formal passou a se distanciar da normatividade e dos textos
descontextualizados e construídos para ensinar a norma-padrão. Assim, a escola
assumiu uma posição em direção ao respeito às variedades linguísticas próprias dos
alunos que, na maioria das vezes, eram estigmatizadas, e passou a trabalhar com
textos contextualizados e autênticos, ou seja, os variados gêneros do discurso que
circulam nas esferas da comunicação discursiva como objeto de ensino de língua
portuguesa.
13
De acordo com o filósofo russo Mikhail Bakhtin (2010[1952-53;1979]), todas as
esferas da comunicação humana estão entrelaçadas, por meio dos usos da linguagem
e devemos compreender que as especificidades e as formas desses usos sejam
proporcionais à infinidade de espaços sociais.
Se em todas as esferas de atividade são estabelecidas diferentes relações
sociais e linguísticas entre as pessoas, há, então, a necessidade do aluno ser
apresentado aos atos de fala que concretizam os enunciados e surgem no interior
dessas relações. Em todos os momentos necessitamos de habilidades específicas
para desenvolvermos as relações dialógicas de acordo com a demanda das práticas
sociais, por exemplo, no trabalho, nas compras, nos passeios turísticos, ao vermos
um filme ou uma peça de teatro, etc.
Dentre as diferentes esferas, temos a esfera artístico-literária que da mesma
forma, possui suas especificidades. Tal esfera vem de longa data fazendo parte do
ambiente escolar e das práticas escolares no ensino de línguas. A literatura, contudo,
ainda não conseguiu integrar de maneira satisfatória a cultura letrada do aluno
brasileiro. Apesar das proximidades entre as artes, por exemplo, entre a música e a
poesia, a formação do leitor literário, na escola, ainda deixa a desejar.
Conforme Padilha (2005), sobre o tema, “o professor encontra-se totalmente
despreparado para o ensino do texto poético” (PADILHA, 2005, p. 48). O professor
não consegue, por exemplo, reconhecer os efeitos de sentido produzidos pela
fonética, inferir o significado de palavras ou expressões que estão contidas no texto,
por meio do contexto, respeitar a importância e a utilização da pontuação adequada,
etc. Ou seja, os aspectos formais são estudados de forma separada, não se
retornando ao texto para se indagar a respeito de quais efeitos de sentido são
sugeridos quando se reflete sobre o todo do enunciado.
Nesse sentido, nossa pesquisa surge a partir da consideração de uma das
conclusões de Padilha (2005), em sua tese de doutoramento, Os gêneros poéticos
em livros didáticos de língua portuguesa do Ensino Fundamental: uma abordagem
enunciativo-discursiva. Nela, a autora afirma que as diferentes formas de abordagem
dos gêneros dos discursos poéticos nos livros didáticos demonstram as
incompreensões teóricas desses materiais, no que diz respeito ao que vem a ser a
concepção dos gêneros literários e, mais especificamente, dos gêneros discursivos
poemas.
14
Tais empenhos estão atrelados, ainda, a estudos fundamentados na teoria
literária, permeados por concepções formalistas1 que privilegiam, sobretudo, os
aspectos comunicativos e da forma composicional.
1.1 Objeto de Pesquisa
O objetivo principal deste trabalho é analisarmos a inter-relação entre modelo
teórico adotado e a abordagem didática decorrente e suas implicações para o
processo de ensino da língua materna, no caso específico, da linguagem literária, na
2ª edição do Caderno Poetas da Escola do Programa da Olimpíada de Língua
Portuguesa Escrevendo o Futuro 2010 (OLPEF). Vale dizer que o material proposto
nesse estudo, ou seja, o trabalho com o gênero poema é reservado ao 5º e 6º anos
do ensino fundamental. Por meio dele, pretende-se compreender efetivamente o
poema como gênero discursivo, a partir da perspectiva enunciativo-discursiva
bakhtiniana.
Além disso, pensamos que estamos em consonância com os Parâmetros
Curriculares Nacionais de 3º e 4º ciclos do Ensino Fundamental, que sugerem para
as práticas de ensino-aprendizagem de Língua Materna alguns gêneros literários,
entre eles o poema.
A união entre o Ministério da Educação, da Fundação Itaú Social e do Centro
de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (CENPEC)
resultou na realização de um trabalho colaborativo em busca de ensino de qualidade
para todos. Abrimos parêntesis para explicar que a Olimpíada de Língua Portuguesa
Escrevendo o Futuro nasceu com a implantação do Plano de Desenvolvimento da
Educação (PDE). O plano foi lançado oficialmente em 24 de abril de 2007, ao mesmo
1 Segundo Carlos Ceia (2010) “Corrente de crítica literária que se desenvolveu na Rússia a partir de 1914, sendo interrompida bruscamente em 1930, por decisão política. O nome do movimento foi objecto de discussão e, muitas vezes, se disse que era inadequado [...] Os formalistas russos são responsáveis por uma renovação da metalinguagem crítica, fornecendo novos termos de análise do texto literário, discutíveis individualmente, sem dúvida, mas que constituem ainda hoje objecto de reflexão e discussão, o que prova a sua importância. Muitos dos temas teóricos escolhidos para investigação nunca antes haviam sido discutidos: as funções da linguagem, em particular a relação entre a função emotiva e a função poética [...], a entoação como princípio constitutivo do verso [...], a influência do metro, da norma métrica, do ritmo quer na poesia quer na prosa [...] a metodologia dos estudos literários [...], etc.” Disponível em: <http://www.edtl.com.pt/index.php?option=com_mtree&task=viewlink&link _id=212&Itemid=2>. Acesso em: jan. 2014.
15
tempo em que foi promulgado o Decreto n° 6.094, dispondo sobre o “Plano de Metas
Compromisso Todos pela Educação” (SAVIANI, 2007, p. 1233).
De acordo com Saviani (2007), o PDE é a mola propulsora de todo o projeto.
No entanto, a composição global do PDE agregou outras 29 ações do Ministério da
Educação e Cultura (MEC). Os níveis escolares da educação básica foram
contemplados com 17 ações, nas quais 12 delas têm caráter global e 5 são
especificas.
Em meio a essas ações foi lançada “‘Gosto de Ler’, que pretende, por meio da
Olimpíada Brasileira da Língua Portuguesa, estimular o gosto pela leitura nos alunos
do ensino fundamental” (SAVIANI, 2007, p. 1235).
Em comparação entre o Plano Nacional da Educação (PNE) e o PDE, Saviani
(2007) afirma que, teoricamente, o PDE não se configura como plano, mas ações e
estratégias para a concretização dos objetivos e das metas – alvos do PNE. Conforme
o autor, além de diagnosticar, fornece diretrizes e mantém o foco em “mecanismos
que visam à realização progressiva de metas educacionais” (SAVIANI, 2007, p. 1239).
Nesse sentido, no Ensino Fundamental, por exemplo, o programa “Gosto de Ler”, ao
tornar efetiva a Olimpíada Brasileira da Língua Portuguesa, incentiva a leitura e a
escrita, mesmo não sendo diretamente cumpridora das metas do PNE. Assim,
contribui para a melhoria da qualidade da leitura e da escrita da língua materna.
A Fundação Itaú-Social considera a iniciativa de colaborar para a melhoria de
ensino e aprendizagem de língua materna como prioridade. Em 2002, a intervenção
foi denominada como Programa Escrevendo o Futuro. Nos cinco anos seguintes, o
Programa foi um sucesso, pois houve participação nas atividades de 3,5 milhões de
alunos. Em 2008, um novo avanço, isto é, o reconhecimento “como iniciativa
importante para alcançar a melhoria da qualidade de educação pública do governo
federal, o programa foi nomeado Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o
Futuro”. Em seguida tornou-se parte do PDE, do Ministério da Educação.
Sendo assim, a Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro consiste
em programa que mobiliza, a cada dois anos, os professores em ações de trabalho,
visando a formação desses. Em anos pares, proporciona aos alunos a oportunidade
de participarem de um concurso de produção de texto, com tema específico. Tal
concurso é destinado aos alunos desde o 5º ano do Ensino Fundamental até o 3º ano
do Ensino Médio. Nos anos ímpares, o trabalho é dirigido aos diferentes profissionais
da área educacional que trabalham com a formação, são eles: os técnicos de
16
secretarias de educação que desenvolvem o trabalho como formadores, os diretores
das escolas e os professores.
Conforme a OLPEF (2010), não há interesse em se buscar talentos entre os
alunos, mas sim em contribuir para o aprendizado deles no sentido de melhorar sua
produção de textos, pois a partir do estudo acerca das características do gênero
textual abordado, poderão assumir a palavra, na sociedade em que vivem, como
cidadãos preparados para defenderem seus direitos.
Compreendemos que a produção didática da Olimpíada, ou seja, os materiais
didáticos utilizados com os alunos pelo professor, nas oficinas reservadas a cada
gênero, são representantes de um filão do mercado atual da produção editorial
brasileira voltada para o ensino-aprendizado de língua materna: os paradidáticos e os
materiais didáticos alternativos, ou seja, materiais que estão presentes na escola, mas
não passam pelo crivo de avaliação do Ministério da Educação.
1.2 Metodologia de pesquisa: a compreensão dos dados
Não interrogamos a natureza e ela não nos responde. Interrogamos a nós mesmos,
e nós, de certa maneira, organizamos nossa observação ou nossas
experiências a fim de obtermos resposta.
Mikhail Bakhtin
A metodologia de pesquisa escolhida é de base qualitativa e documental. Os
estudos bibliográficos também buscam dar suporte à escolha dos critérios de análise
do Caderno Poetas da Escola.
A pesquisa relatada, neste texto, foi realizada no âmbito dos Estudos
Linguísticos voltados para a compreensão de língua materna, no caso pesquisado, o
português e seu ensino em contexto escolar. Na pesquisa de ensino-aprendizagem
de língua materna, selecionamos como objeto de investigação do material didático –
sequência didática na forma de caderno do professor – com vistas à análise das
características discursivas e pedagógicas do objeto.
Constitui, de certa maneira, um estudo de interface entre a produção teórica
sobre a língua e a transposição e modelização didática, questão fundamental para o
ensino de língua materna. Entendemos que a escolha teórica, no campo aplicado, é
relevante, pois configura, de certo modo, a abordagem prática. Dessa forma, as
17
categorias didáticas selecionadas acabam por definir o que os alunos precisam
aprender e isso está relacionado à eficácia social da proposta de ensino (ROJO,
2004).
Desse modo, o objetivo principal deste trabalho é analisar a inter-relação entre
modelo teórico adotado e abordagem didática decorrente do trabalho desenvolvido
pelo Material do OLPEF e suas implicações para o processo de ensino-aprendizagem
da língua materna. O trabalho pretende contribuir para a compreensão dos processos
de articulação entre modelo teórico e modelo didático na modelização dos objetos de
ensino a partir da abordagem enunciativo-discursiva.
O material para didatização selecionado compõe a coleção de material didático
da Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro, um programa oficial
nacional que desenvolve ações de práticas de ensino da leitura e da escrita e de
práticas de formação do professor, propondo-se a contribuir com melhorias nessas
práticas no contexto da escola pública brasileira. Em meio à coleção composta por
quatro cadernos, optamos por analisar o caderno do professor “Poetas da Escola” de
autoria de Anna Helena Altenfelder e Maria Alice Armelin (2010).
Na próxima seção, explicitaremos o paradigma no qual se insere a pesquisa, a
metodologia de análise e a estratégia de geração de dados.
1.3 Apontamentos teórico-metodológicos para a investigação científica em Ciências
Humanas
O que confere ao texto um caráter de obra é a palavra do autor dialogicizada nas vozes das
personagens, diálogo inacabável, infinito. Problemas de épocas
diferentes e pontos de vista diferentes desfazendo fronteiras.
Augusto Ponzio
A abordagem sócio-histórica, no campo das ciências humanas, orienta a
investigação desta pesquisa, que é de cunho qualitativo. Os princípios que
caracterizam, de certa forma, esse procedimento de pesquisa são os de atividade
situada e de abordagem interpretativa, que surgem em contraposição aos postulados
científicos ligados ao positivismo, cujo método investigativo prioriza procedimentos
que garantam uma visão objetiva e neutra em relação à pesquisa (DENZIN; LINCOLN,
2006).
18
A visão de uma ciência objetiva e neutra, hoje, capaz de formular leis gerais
cujo valor de verdade seria garantido pela aplicação criteriosa do método já não
encontra sustentação. A maioria dos cientistas admite que nenhum conhecimento é
inteiramente objetivo e que os valores e crenças do pesquisador podem interferir no
trabalho, por se tratar de um processo intersubjetivo. Por isso, esse processo permite
identificar as perspectivas do pesquisador, decorrentes de convicções e importância
atribuída e associadas conforme a inserção social e a história dele. Para a
compreensão, geração, coleta e tratamento dos dados, a metodologia adotada foi a
dos estudos bakhtinianos.
Bakhtin, no texto Metodologia das Ciências Humanas (2010 [1974-79]), já
observava que o conhecimento da coisa e o conhecimento dos sujeitos sociais
requerem procedimentos diferentes. Segundo o filósofo russo, a coisa morta
(geralmente objeto de conhecimento das ciências exatas como, por exemplo, uma
pedra) só existe para o outro, portanto, pode ser totalmente revelada por um ato
unilateral desse outro.
A coisa não tem interior próprio, coincide consigo mesma, por isso, a exatidão
é necessária para a assimilação prática. Já o conhecimento do indivíduo envolve um
ato bilateral, porque ele possui núcleo interior, impossível de ser absorvido e
consumido pelo outro. Ele conserva sempre uma distância que lhe permite
permanecer também para si, então, só pode ser objeto de desinteresse. O objeto das
ciências humanas concentra-se na voz do homem e em sua não concernência consigo
mesmo, portanto, isso o faz inesgotável em seu sentido e significado. O ser expressivo
não pode ser tolhido nem forçado a se revelar, porque é livre e não apresenta
nenhuma garantia. Para Bakhtin (2010[1974-79]), o pesquisador pode partilhar nessa
(re)liberdade, nunca tolhê-la com um ato de conhecimento (material).
Sendo assim, o pesquisador em ciências humanas não faz a pergunta a si
mesmo nem a um terceiro em presença da coisa, mas ao próprio pesquisado. Nesse
sentido, o ser da expressão é bilateral, isto é, sua realização ocorre na interação, no
encontro de duas consciências (a do eu e a do outro). Por isso, fazer pesquisa, em
ciências humanas, é uma relação dialógica, isto é, envolve uma relação entre sujeito-
sujeito(s), não uma interação sujeito-objeto.
Compreender o ser humano implica uma participação ativa dos interlocutores,
uma compreensão responsiva que, no ato de escuta do outro, traz em si as sementes
de uma resposta. Por isso, compreender o ser humano transcende a uma mera
19
empatia, porque, colocar-se no lugar do outro não permite o conhecimento do ser
único em seu acontecer. Conhecer o outro implica a penetração mútua com
manutenção da distância, de uma posição exotópica que pode levar o pesquisador a
compreender o ser cognoscível no acontecimento singular, uma vez que atividade de
criação “começa propriamente quanto retornamos a nós mesmos e ao nosso lugar
fora da pessoa que sofre, quando enformamos e damos acabamento ao material da
compenetração” (BAHKTIN, 2010[1920-1924], p. 25).
Dessa forma, se nas ciências exatas/naturais prevalece uma forma monológica
de construção de conhecimento em que o pesquisador, diante de seu objeto de
estudo, assume uma atitude contemplativa, de quem observa e se expressa sobre o
objeto, nas ciências humanas, a construção de conhecimento exige uma postura
dialógica em que o pesquisador está defronte de outro ser que também expressa
pensamentos, constrói sentidos e significados, realizados e dados ao pesquisador
apenas sob a forma de textos, considerado, por isso, o ponto de partida das disciplinas
em ciências humanas:
As ciências humanas são as ciências do homem em sua especificidade, e não de uma coisa muda ou um fenômeno natural. O homem em sua especificidade humana sempre exprime a si mesmo (fala), isto é, cria texto (ainda que potencial). Onde o homem é estudado fora do texto e independente deste, já não se trata de ciências humanas (anatomia e fisiologia do homem, etc.). (BAKHTIN, 2010[1959-1961], p. 312)
Não há possibilidades de acessar o homem, sua vida, seu trabalho, sua luta, a
não ser por meio dos textos sígnicos criados e por criar. A ação física do homem tem
de ser compreendida como um ato, mas esse ato não pode ser interpretado fora de
sua expressão sígnica que é criada:
Por toda parte há o texto real ou eventual e a sua compreensão. A investigação se torna interrogação e conversa, isto é, diálogo. Nós não perguntamos à natureza e ela não nos responde. Colocamos as perguntas para nós mesmos e de certo modo organizamos a observação ou a experiência para obtermos a resposta. Quando estudamos o homem, procuramos e encontramos signos em toda parte e nos empenhamos em interpretar o seu significado. (BAKHTIN, 2010[1959-1961], p. 319).
Assim, ainda que nosso objeto nos seja acessível por meio de base
documental, um material didático constituído na forma de um caderno do professor
20
Poetas de Escola, não anula a abordagem dialógica escolhida, uma vez que “todo
texto tem um sujeito um autor (o falante ou quem escreve)” (BAKHTIN, 2010[1959-
61], p. 308). Nesse sentido, a ação de conhecimento não recai sobre o material
didático em si, mas sobre os pensamentos, os sentidos, as escolhas, os valores
construídos pelos sujeitos do discurso, marcados na linguagem, sobre determinado
objeto, o poema, pensado para uma situação específica e que se configura como uma
esfera social de circulação de discursos – a escola.
Na seção seguinte, expomos o procedimento utilizado para a geração de
dados.
1.4 A base metodológica para a coleta de dados
A pesquisa qualitativa envolve estudar e/ou usar diversos materiais empíricos,
porém, em nosso caso, tentamos compreender o modo de tratamento dispensado ao
ensino-aprendizagem do poema nos discursos dos sujeitos autores do Caderno do
Professor da OLPEF, por meio da pesquisa documental. Nossa intenção
fundamentou-se em Bakhtin (1929) a partir da perspectiva de que ele: “critica também
as posições empíricas e idealistas do que denomina de objetivismo abstrato e
subjetivismo idealista e propõe, em sua perspectiva dialógica, o estudo da língua em
sua natureza viva e articulada com o social” (FREITAS, 2002, p. 22).
Dessa forma, o sentido de nossa pesquisa reside em compreender qual a
motivação para o discurso autoral. Em uma época como a que vivemos, de tão
complexas formas de linguagem, a dimensão formal da língua ainda é privilegiada e
concretiza-se em materiais didáticos de grande repercussão nas salas de aula
brasileiras. Esse fato é revelador, na medida em que representa tratamento
descontextualizado e desconectado dos aspectos discursivos que levariam o aprendiz
a construir seu perfil de cidadão contemporâneo, conforme é o almejado por alguns
segmentos da sociedade brasileira.
A especificidade do nosso objeto de pesquisa e que pretendemos desvelar, ao
realizar a análise dos dados gerados e coletados, consiste nas relações, nos sentidos,
nos processos contidos no Caderno, a partir dos textos contidos nele. Para isso, foi
necessário adotarmos conceitos bakhtinianos e identificarmos se havia tais
parâmetros e qual a incidência deles no Material. Esperávamos, com isso,
21
percebermos no discurso autoral e nos dados evidências que comprovassem a
metodologia escolhida pela OLPEF.
Assim, nossa finalidade fundamentou-se na descrição do processo de
didatização do gênero poema e na comparação entre o que está sendo abordado no
Caderno Poetas da Escola e as exigências do novo perfil de cidadão (leitor crítico),
idealizado pela educação contemporânea, e nos apontamentos de Rojo (2005) para
os diferentes letramentos.
Para nortear os procedimentos de nossa investigação, elaboramos os
seguintes objetivos:
1) Descrever os modos como o gênero discursivo poema foi didatizado no
Caderno do Professor da Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro 2010.
2) Explicar como seria a contemplação das capacidades de leitura e produção
do gênero poema numa perspectiva enunciativo-discursiva, levando em conta, para
além dos aspectos formais, os sócio-históricos, discursivos e ideológicos, imbricados
no processo de criação verbal.
Tais objetivos geraram as seguintes questões de pesquisa:
1) Como foi sistematicamente elaborada a proposta de trabalho com o gênero
do discurso poema no Caderno Poetas da Escola?
2) Quais e como as contribuições teóricas bakhtinianas podem fundamentar a
transposição didática, privilegiando uma abordagem discursiva dialógica no ensino-
aprendizagem do gênero poema?
O Caderno do Professor constitui um material de apoio em que há uma
proposta de sequência didática que auxilia o professor no ensino-aprendizagem de
língua materna por meio de gêneros textuais, como: artigo de opinião, crônica, poema
e memórias literárias.
Esta pesquisa se ocupa em investigar a base teórico-metodológica na qual
fundamenta a sugestão do Caderno Poetas da Escola, bem como as atividades
didáticas dispostas nesse Material para o ensino e a aprendizagem do gênero poema.
A partir desse corpus de análise, esperamos ter construído um sólido alicerce
para compreensão de nosso objeto, com o intuito de atingir os nossos objetivos.
22
Conforme Denzin & Lincoln (2006), os pesquisadores da área qualitativa
“utilizam uma ampla variedade de práticas interpretativas interligadas, na esperança
de sempre conseguirem compreender melhor o assunto que está ao seu alcance”
(DENZIN; LINCOLN, 2006, p. 17). Nesse sentido, contamos com as contribuições
cientificas bibliográficas de diversos autores a respeito de nosso tema. A pesquisa
documental focou o Caderno do Professor da OLPEF. Também lançamos mão de um
aspecto da pesquisa quantitativa, a contagem das atividades recorrentes e de acordo
com nossas categorias de análise: gêneros discursivos e relações dialógicas.
Com a finalidade de analisarmos o material didático, realizamos leitura prévia
de todo o material. A partir da leitura panorâmica, fizemos levantamento da
organização global do caderno, da sistematização geral da sequência didática
(descrevendo as oficinas com apontamento de título e objetivo) e, por fim,
levantamento da organização das atividades da sequência a fim de classificarmos as
atividades-tipo (recorrentes) do projeto de ensino do gênero poético poema.
A contagem, procedimento relacionado à técnica de análise quantitativa, foi
necessária para selecionarmos a parte qualitativa pertinente para os objetivos
propostos na pesquisa. Pois, dessa forma, pudemos constatar que o enfoque da
sequência didática privilegiou os elementos formais da teoria literária e comunicativa
para o ensino. Nisso, as evidências mostraram que a concepção de gênero assumida
pelo Material didático da OLPEF é textual, isto é, o gênero poema literário.
Esta pesquisa foi delineada da seguinte forma: no 1º capítulo, Apresentando
nosso objeto de pesquisa, descrevemos nosso objeto, a metodologia de pesquisa
utilizada para a compreensão dos dados, os apontamentos teórico- metodológicos
para a investigação científica em Ciências Humanas de Bakhtin (2010[1974-1979]) e
a base metodológica para a coleta de dados.
O capítulo 2, intitulado Ensino e didatização do poema: diversos caminhos para
atingir o mesmo fim, exploramos as contribuições do pensamento de Vygotsky para o
ensino-aprendizado da linguagem, e as questões que envolvem a didatização dos
gêneros poéticos.
Já no 3º capítulo, Mapeamento descritivo da proposta pedagógica do Caderno
do Professor da Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro 2010,
inicialmente, refletimos sobre a imagem na capa do Caderno e, também o aspecto
físico, a organização preliminar do Material, a distribuição interna das oficinas. Em um
segundo momento, sob o título Por que não está considerada A Outra Face do Jano?
23
Uma proposta de exame analítico de alguns dados do Caderno Poetas da Escola,
buscamos compreender nosso segundo questionamento de pesquisa, fizemos uma
breve contextualização do trabalho, refletimos sobre nossos dados e expomos em
linguagem gráfica, descrevemos, analisamos e avaliamos as oficinas 1, 2, 6, 7 e 8.
Dessa maneira, nosso desejo é que, a partir de nossas reflexões nesta
pesquisa, possamos contribuir para futuros estudos na área de Linguística Aplicada,
para o ensino-aprendizagem de Língua Materna e, também, para as políticas de
ensino, já que os materiais didáticos da OLPEF abarcam em sua amplitude de
produção de materiais específicos, além de concessões financeiras cedidas pelo
Governo Público Federal, a participação no funcionamento das escolas sem serem
avaliados pela instituição de ensino, e de forma ainda bastante incipiente pela
academia.
24
CAPÍTULO 2
Ensino e didatização do poema: diversos caminhos para atingir o mesmo fim
Não me contentando com as ciências que nos ensinavam,
percorrera todos os livros que pudera ter em mãos.
Descartes
A aprendizagem demanda pesquisas para compreendermos sua dinâmica. Por
isso, neste capitulo, apresentamos as contribuições de Lev Semenovich Vygotsky
para a educação. Referente à nossa pesquisa, os estudos vygotskyanos serão base
teórica para fundamentar a análise do Caderno poetas da escola e irão nos auxiliar
em relação às atividades que iremos propor ao final de nosso trabalho. Em seguida,
discorreremos brevemente sobre a escolarização da literatura, para depois tratarmos
de alguns procedimentos utilizados por alguns professores/autores que trabalham
com a didatização do poema e, finalmente, abordaremos o que dizem os PCN sobre
o ensino da literatura.
Enfocaremos, em primeiro lugar, a assertiva de Vygotsky ao defender que a
apreensão do processo educacional é originada categoricamente a partir de
referências históricas e relacionamentos sócio-históricos. Ainda, seguindo o
pensamento do psicólogo russo, comentamos a respeito do conceito Zona de
Desenvolvimento Proximal, imprescindível para o ensino-aprendizagem de forma
geral, e o importante papel do professor enquanto mediador do processo educacional.
Dialogamos com diversos professores/autores que desenvolvem atividades
significativas tanto em relação às suas teorias sobre escolarização da literatura quanto
às práticas pedagógicas para a didatização do poema e a posição dos PCN para com
esses modos de ensino-aprendizagem dos textos literários.
2.1 Vygotsky: educação de natureza social
A educação em todos os países e em todas as épocas sempre foi social.
Vygotsky
As pesquisas de Lev S. Vygotsky (1869-1934) demonstram em seu conteúdo
reflexões e formulações a respeito do relacionamento entre o desenvolvimento da
25
criança na idade escolar e seu desenvolvimento humano. Tais estudos estão
fundamentados em observações da psicologia do desenvolvimento e, também, sobre
os próprios estudos de Vygotsky. Dessa forma, o desenvolvimento do homem, bem
como a natureza social do indivíduo são ideias centralizadoras das pesquisas do
psicólogo russo. Assim, tais pressupostos se estendem e são imprescindíveis ao
campo da educação.
Nessa perspectiva, Vygotsky (2007[1935]) participando ativamente em torno
dessa temática, percebe que, para Koffka (1886-1941), há uma complexa relação
entre o ensino e o aprendizado, na qual o desenvolvimento se movimenta sempre à
frente do aprendizado. Já para Thomrdike (1874-1949), o desenvolver do sujeito dá-
se paralelamente à aprendizagem da criança, como se fosse quase estático. Vygotsky
(2007[1935]), então, acrescenta algo novo às teorias desses psicólogos.
Para Vygotsky (2007[1935]), os processos de aprendizagem iniciam-se logo
quando a criança nasce. Mas, a formação das funções psicológicas superiores
desenvolve-se nas interações sociais. Oliveira (2009) esclarece que a aprendizagem
significa “o processo pelo qual o indivíduo adquire informações, habilidades, atitudes,
valores, etc. a partir de seu contato com a realidade, com o meio ambiente e com as
pessoas” (OLIVEIRA, 2009, p. 59). Logo, é um processo no qual o ser humano, além
das qualidades biológicas inerentes à sua constituição, como por exemplo, a
capacidade de visão e o processo de maturação do organismo, em que as células
sexuais masculinas e femininas desenvolvem-se, sem nenhuma informação externa,
preparando o sujeito para a vida reprodutiva, desenvolve também outras habilidades
responsáveis pela formação das funções psicológicas superiores, as quais, conforme
Ignácio (2010):
Não são imaginadas, muito menos nascem subitamente, isto é, essas funções se constroem a partir das experiências vivenciadas. São funções mediadas da natureza histórica e origem sociocultural. Nesse sentido, o pensador defende que as interações sociais tem uma importância basilar na construção das funções psicológicas humanas. (IGNÁCIO, 2010, p. 08).
Segundo Padilha (2005), os postulados Vygotskyanos consideram “o processo
de desenvolvimento intelectual em termos de apropriação mediada pelo signo e pelo
outro” (PADILHA, 2008, p. 42). Significa dizer que os usos das diferentes formas de
linguagem, nas situações reais de comunicação, dependem da interação entre os
26
sujeitos e da internalização dos signos que surgem no processo interacional, ou seja,
via linguagem, das atitudes dos outros, observadas, ressignificadas e praticadas pela
criança.
Para Vygotsky (2001[1926]), toda a educação é essencialmente de natureza
social, apesar de ter sido constituída sobre nossa base biológica, cujas condições
naturais não podem ser modificadas por fatores externos. Mesmo assim, é na
sociedade que “se erige um sistema de reações adquiridas” (VYGOTSKY, 2001[1926],
p. 63) por nós, quer estejamos de acordo ou não2.
Conforme Vygotsky (2001[1926]), então, a possibilidade de um professor
qualquer educar o aluno, do ponto de vista científico, não existe. Somente o próprio
educando a partir de suas experiências pessoais pode modificar seu comportamento.
Não podemos esperar, portanto, que somente a ação pedagógica isolada do professor
seja capaz de educar e modificar as ações de um aluno seja na sala de aula ou na
vida diária. Por isso, Vygotsky (2001[1926]) adverte “nossos movimentos são nossos
mestres” (VYGOTSKY, 2001[1926], p. 64).
Nesse sentido, veremos na próxima etapa como Vygotsky (2007[1935])
denominou e descreveu a Zona de Desenvolvimento Proximal.
2.1.1 Zona de Desenvolvimento Proximal: processo de autonomia do aluno e
mediação do professor
No processo de educação o mestre deve ser os trilhos por onde se movimentam com
liberdade e independência os vagões, que recebem dele apenas
a orientação do próprio movimento.
Vygotsky
Já na ocorrência da elaboração, em que a criança passa do estágio do senso
comum à reflexão, elaborando sínteses, mas com a ajuda do professor. Retornamos,
pois, à questão em que Vygotsky concorda com o psicólogo Koffka (1886-1941), ao
reconhecer que há diferença entre o aprendizado na pré-escola e na escola, isto é, no
primeiro não existe sistematização, mas, no segundo, a aprendizagem é
2 Vale a pena comentar que Vygotsky na época da elaboração desta obra, direcionava a ênfase de seu pensamento sobre a educação adquirida pelo meio social, ao passo que na década de 30 seu foco estava na colaboração entre os participantes do processo educativo.
27
sistematizada. Vygotsky (2007[1935]), entretanto, visualiza outro item e argumenta
que entre o desenvolvimento humano e o aprendizado é necessário considerarmos a
existência de dois níveis: A Zona de Desenvolvimento Real (ZDR) e a Zona de
Desenvolvimento Proximal (ZPD).
Conforme Vygotsky (2007[1935]), as crianças aprendem mesmo antes de
iniciarem seus percursos na escola. No que se refere à linguagem, por exemplo, a
criança, no início de sua vida escolar, é apresentada à modalidade escrita da língua –
conhecimento científico –, entretanto a oralidade de sua língua materna, bem como
sua variante, já foi dominada em casa, por meio da interação com outras pessoas,
pois “o aprendizado e o desenvolvimento estão inter-relacionados desde o primeiro
dia de vida da criança” (VYGOTSKY, 2007[1935], p. 95). Assim, a criança, ao chegar
à escola, já domina bem a própria língua e não precisa da ajuda de outros sujeitos
para interagir.
Logo, temos as duas funções da linguagem, as quais contribuem para o
desenvolvimento humano: instrumento de inter-ação (a responsável pela
comunicação com o outro) e a função de organização do pensamento (a constituidora
de conhecimentos das funções psicológicas superiores), Vygotsky (2007[1935])
afirma ser esta observação um ponto extremamente relevante, o qual não deve ser
esquecido. O primeiro desses estágios foi denominado pelo psicólogo de “nível de
desenvolvimento real [...] das funções mentais da criança que se estabeleceram como
resultado de certos ciclos de desenvolvimento já completados” (VYGOTSKY,
2007[1935], p. 95-96). São tarefas executadas, portanto, pelas crianças sem auxílio
de outros ou mesmo pistas de algum procedimento a se tomar para finalizar
determinado trabalho manual ou intelectual.
Entretanto, para Vygotsky (2007[1935]), se a criança não consegue concluir
uma tarefa sozinha, não significa dizer que sua capacidade de desenvolvimento
mental já esteja definida e estagnada, pois existem ainda possibilidades de alterações
na execução das atividades por outras pessoas, tais interferências geram situações
definidas por Vygotsky (2007[1935]), como:
Zona de desenvolvimento proximal. Ela é a distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma determinar através da solução independente de problemas, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes. (VYGOTSKY, 2007[1935], p. 97).
28
Conforme Vygotsky (2007[1935]) a ZPD indica com mais clareza o
desenvolvimento mental do sujeito que a Zona de Desenvolvimento Real, já que na
Zona de Desenvolvimento Proximal devemos considerar, além do componente
intelectual, os fatores externos que influenciam na aprendizagem do aluno. Mas, de
acordo com Oliveira (2009), não é qualquer pessoa que pode se beneficiar da
interferência do outro, porque para a obtenção desses benefícios é necessário que o
sujeito esteja em um momento de desenvolvimento acessível às modificações em
suas ações individuais. Assim,
A zona de desenvolvimento proximal define aquelas funções que ainda não amadureceram, mas que estão em processo de maturação, funções que amadurecerão, mas que estão presentemente em estado embrionário. Essas funções poderiam ser chamadas de ‘brotos’ ou ‘flores’ do desenvolvimento, em vez de ‘frutos’ do desenvolvimento. (VYGOTSKY, 2007[1935], p. 98).
Se nas pesquisas de Vygotsky as interações sociais constituem fator essencial
para a formação mental do ser humano, na educação não é diferente e o professor
tem o papel de mediador da aprendizagem, significa dizer que o mestre atua, de forma
sistematizada, como facilitador no sentido de que o aluno alcance seu potencial de
conhecimento.
Nesse sentido, para Vygotsky (2007[1935]), o educador atua da mesma forma
em relação ao ensino-aprendizado, organizando e administrando o meio social
educativo, onde coloca à disposição do aluno os recursos que poderão ser utilizados,
no momento da aprendizagem e, ainda, a formação de duplas ou grupos, em que uns
serão os pares avançados dos outros, estabelecendo assim a colaboração entre eles.
Mas, ao mesmo tempo, o mestre, assim como o trabalhador, é inerente à ação
pedagógica atuando, também, como mediador-aprendiz. Aqui, está a segunda função
do professor explicitada por Vygotsky (2007[1935]) “Nas formas mais primitivas e nas
mais complexas de trabalho humano, o trabalhador exerce um duplo papel: por um
lado como organizador e administrador da produção, por outro, como peça de sua
própria máquina” (VYGOTSKY, 2007[1935], p. 66).
Nessa perspectiva, portanto, Vygotsky (2007[1935]) apresenta sua fórmula do
processo educacional, isto é, processo no qual o ato educacional, contando com as
experiências vivenciadas do aluno – determinadas pelo meio social ou específico – e
29
em conjunto com a atuação organizadora e administrativa do professor, cooperam
para a instauração de uma educação mais efetiva. Os pontos vygotskyanos
abordados, principalmente relativos à Zona de Desenvolvimento Proximal, serão úteis
como suporte teórico para a análise de atividades em nosso último capítulo. Na
próxima seção, compreenderemos a escolarização da literatura vista nos modos de
Magda Soares.
2.2 Escolarização da literatura
A questão fundamental das relações entre literatura infantil e escola
é que é necessário saber (ou descobrir?) como realizar, de
maneira adequada, a inevitável escolarização da leitura.
Magda Soares
Soares (2001) afirma existir relações entre a escola e a literatura infantil e
juvenil. No decorrer do texto, a autora reflete sobre essas conexões. A apropriação é
o primeiro olhar observado por Soares (2001), pois “nesta perspectiva, analisa-se o
processo pelo qual a escola toma para si a literatura infantil, escolariza-a, didatiza-a,
pedagogiza-a, para atender a seus próprios fins – faz dela uma literatura escolarizada”
(SOARES, 2001, p. 17), isto é, demonstra a noção de que existe uma literatura
utilizada nas práticas pedagógicas escolares e que seja de interesse das crianças.
O segundo olhar da autora se volta para a escolarização da literatura como
produção, ou seja, “analisa-se o processo pelo qual uma literatura é produzida para a
escola, para os objetivos da escola, pela clientela escolar busca literatizar a
escolarização infantil” (SOARES, 2001, p. 17). Uma literatura produzida para as
crianças e jovens tendo a escola como ‘utilizadora’ desse material, ou mesmo sendo
a escola intermediária em um processo de produção e consumo. Nesse sentido, para
Soares (2001), o enunciado “escolarização da literatura infantil toma um sentido de
literatização do escolar, isto é, de tornar literário o escolar” (SOARES, 2001, p. 18).
Na visão de Soares (2001), esse incorreto procedimento é necessário, visto
que tal pensamento deve-se à responsabilidade inerente à escola, que é a de formar
e de educar. Nesse sentido, a autora relembra, por exemplo, um fato ocorrido em
1921, quando Monteiro Lobato publicou a obra A menina do nariz arrebitado,
afirmando que o livro era dirigido às segundas séries e, em consequência, o Governo
30
de São Paulo o comprou e distribuiu. Soares (2001) acrescenta, ainda, que no Brasil
o desenvolvimento da literatura infantil e juvenil caminha paralelamente ao
crescimento da educação escolar. A autora conclui dizendo que tal afirmação pode
ser comprovada quando comparamos o aumento da multiplicação de vagas escolares
com o “boom da literatura infantil e juvenil” (SOARES, 2001, p. 19).
Entretanto, Soares (2001) diz que existem posições antagônicas a essa relação
entre produtores e consumidores de livros como, por exemplo, a de Marisa Lajolo,
denunciando o pacto entre a literatura infantil e a escola, bem como a posição de Nelly
Novaes Coelho, afirmando que depois da década de 70, os livros infantis saíram da
dimensão que eram lidos por prazer e tornaram-se ferramentas de trabalho para que
os professores transmitissem valores morais como a política, a ética, a estética, etc.
aos alunos, assim como transformar suas ideologias.
Em conclusão ao seu exposto, Soares (2001) coloca provas concretas da
existência de tal relação, ou seja, as fichas sobre a compreensão da leitura, para o
aluno responder; o grande número de escritores de literatura infanto-juvenil que visita
as escolas e, finalmente, os próprios professores que atuam, também, como
escritores. Porém, a relação em que a autora demonstra mais interesse em discutir
em A escolarização da literatura infantil e juvenil consiste na escolarização da
literatura que se destina à criança, bem como desperta o interesse nela. Portanto, o
foco maior é a literatura como apropriação pela escola.
O conceito de escolarização, para Soares (2001), pode ou não ter conotação
depreciativa. Porém,
Não há como ter escola sem ter escolarização de conhecimentos, saberes, artes: o surgimento da escola está indissociavelmente ligado à constituição de ‘saberes escolares’, que se corporificam e se formalizam em currículos, matérias e disciplinas, programas, metodologias, tudo isso exigido pela invenção, responsável pela criação da escola, de um espaço de ensino e de um tempo de aprendizagem. (SOARES, 2001, p. 20).
Antes do século XVI, conforme Soares (2001), o aprendizado era corporativo,
mas, a partir dessa época, houve modificações que revolucionaram o ensino como o
surgimento do espaço e do tempo para ensinar. A partir disso, consequentemente,
surgiu, também, a necessidade da sistematização: “os graus escolares, as séries, as
classes, os currículos, as matérias e disciplinas, os programas, as metodologias, os
31
manuais e os textos – enfim, aquilo que constitui até hoje a essência da escola”
(SOARES, 2001, p. 21).
Portanto, o ensino depende de uma uniformização, assim como a literatura
também necessita de um processo de escolarização para ser abordada. Nesse
sentido, conforme Soares (2001), não é possível esquivar-se desse processo
inevitável em teoria, já que ele é necessário para a própria existência da escola, mas
se não existe a possibilidade de evitá-lo, no mínimo devemos tentar da melhor maneira
tornar a escolarização em atitudes mais próximas do que deveria ser.
De acordo com Soares (2001), se não podemos evitar a escolarização da
literatura infantil ou outra qualquer, assim como é impossível recusarmos essa
escolarização, porque seria negarmos a própria escola, já que essa instituição tem
seu funcionamento e métodos sistematizados, por conta do próprio ensino
escolarizado é necessário, portanto, que as ações inerentes a tal processo sejam
feitas de forma adequada.
O que precisamos criticar é a escolarização
[...] inadequada, a errônea, a imprópria escolarização da literatura, que se traduz em sua deturpação, falsificação, distorção, como resultado de uma pedagogização ou uma didatização mal compreendidas que, ao transformar o literário em escolar, desfigura-o, desvirtua-o, falseia-o. (SOARES, 2001, p. 22).
Portanto, conforme Soares (2001), para discutir e tentar resolver a questão da
inadequada escolarização da literatura, existe uma vasta bibliografia descrevendo
regras para o tratamento dos textos literários, porém a pretensão da autora está em
discutir as circunstâncias em que a literatura infantil tem sido inadequadamente
escolarizada.
A escolarização da literatura é realizada, conforme Soares (2001), a partir de
três divisões: “a biblioteca escolar; a leitura e estudo de livros de literatura, em geral
determinada e orientada por professores de Português; a leitura e o estudo de textos,
em geral componente básico de aulas de Português” (SOARES, 2001, p. 22-23).
Desse modo, durante o decorrer do texto, a autora aponta diversas dificuldades a
respeito da inadequada escolarização da literatura na escola.
Magda Soares (2001) conclui dizendo que se a escolarização do gênero é
inevitável, então, que tal processo seja realizado adequadamente. Assim, em acordo
com Soares (2001), percebemos que existem tentativas de a escola trabalhar os
32
textos poéticos, porém a prática, em certa medida, torna-se inviável por conta de
vários motivos.
Mais adiante, veremos alguns métodos de trabalho direcionados ao gênero
poema.
2.2.1 Didatização: diferentes caminhos em busca da mesma essência
Que a criança goste de ler, de sorver devagarinho, sem pressa,
a poesia que encontrar...
Fanny Abramovich
Para a configuração de um novo ser que se quer menos fragmentado e
mais consciente de sua missão global do que o ser
dessubstancializado do nosso passado recente
Sylvia Helena Cyntrão
Considerar os aspectos para além dos tradicionais em análises de textos
poéticos, na contemporaneidade, com representações da linguagem em diversas
formas, torna-se imprescindível. Desse modo, as práticas sociais demandam do leitor
a articulação dos sentidos explícitos ou implícitos formadores da estrutura interna de
um texto em consonância com seus aspectos formais exteriores. Assim, atuar
participativamente como mediador do processo educativo, demonstrando interesse no
aprendizado do outro, requer uma postura diferenciada.
Em virtude de ilustrarmos o aspecto geral de como tem sido trabalhado o
gênero discursivo poema, nas salas de aula, apresentamos a visão de alguns
professores/autores a respeito dessa temática.
Abramovich (2005), em primeiro lugar, tece alguns comentários sobre o
pensamento de algumas pessoas, as quais não são citadas, no que diz respeito à
poesia. Logo após, a autora compartilha com José Paulo Paes o pensamento de que
a poesia consiste em uma brincadeira com palavras. Assim,
Há poetas que brincam com as palavras dum modo gostosíssimo de a criança ouvir e ler. Lidam com toda uma ludicidade verbal, sonora, às vezes engraçada, no jeito como vão juntando palavras, fazendo com que se movam pela página quase como uma cantiga, e ao mesmo
33
tempo jogando com os significados diferentes que uma mesma palavra possui. (ABRAMOVICH, 2005, p. 66).
Ao dar continuidade ao raciocínio de J. P. Paes, a autora relembra os recursos
utilizados, como os linguísticos: os fonológicos, morfológicos, sintáticos e semânticos.
Abramovich (2005) explica que, em alguns poemas, o jogo com as palavras
torna-se um meio em que os poetas podem representar os sonhos, os desejos. A
autora não aprova, por exemplo, o tratamento da poesia repetindo as odes patrióticas
decoradas, os temas3 moralizadores ou a pieguice gasta, mas defende a emoção
verdadeira.
Na seção Como trabalhar poesia com as crianças? Abramovich (2005), sugere
que, ao ler um poema para a classe, a professora deve conhecê-lo bem e, por isso é
importante
que o tenha lido várias vezes antes, que o tenha sentido, percebido, saboreado. Para que passe a emoção verdadeira, o ritmo e a cadência pedidos, que sublinhe o importante, que cada ouvinte possa cobrir – por si próprio – cada passagem, cada estrofe, cada mudança. (ABRAMOVICH, 2005, p. 95).
A respeito dessa citação, cabe ressaltar, em nosso ponto de vista, a leitura
antecipada feita pelo professor, porque é necessário que ele duvide e questione o que
está escrito (ou implícito), no poema. Dessa forma, a emoção a ser compartilhada,
nas aulas, será perceber que as infraestruturas (a educação, a ciência, a religião, a
família, etc.) são responsáveis pelas relações sociais e que, no ambiente dessas
relações, existem as interações verbais (da comunicação), nas quais nascem e são
desenvolvidas as questões ideológicas e as formas (os gêneros do discurso), pelas
quais podemos desvelar os pensamentos da sociedade. Sendo assim, “o ritmo e a
cadência [...] estrofe, mudanças” (ABRAMOVICH, 2005, p. 95) devem ser analisados
depois dessa compreensão, como disse Bakhtin/Volochinov (1929).
Posteriormente, a sugestão de Abramovich (2005) consiste em analisar textos
com temáticas semelhantes, neste caso, a finalidade é perceber que formas diferentes
3 Bakhtin/Volochinov (1929), esclarece que na concepção bakhtiniana o tema tem a ver com a realização de novos sentidos, nas interações reais de comunicação, ou seja, o “tema da enunciação é concreto, tão concreto como o instante histórico ao qual ela pertence” (BAKHTIN/VOLOCHINOV 1929 PG 134). Mas, o “tema” de uma obra refere-se à “unidade temática” do texto, portanto, conceitos diferentes.
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podem conter a mesma temática. Em seguida, abrir espaço aos alunos para que eles
discutam e exponham suas ideias.
Sugere Abramovich (2005), em seguida, que os alunos escrevam seus próprios
poemas, pois poderiam descobrir eles mesmos um “jogo de rimas – fáceis ou difíceis
–, de significados, de inversões, de brincadeiras, com o sentido das palavras, por meio
da cor, da textura, do movimento de cada palavra, cada frase ou estrofe”.
(ABRAMOVICH, 2005, p. 94). Vimos, então, a defesa da autora pela adoção das
formalidades da língua como primeira via de acesso ao significado do poema,
entretanto, conforme nossa assunção ao pensamento enunciativo-discursivo
bakhtiniano, a ordem de análise consiste em observarmos os seguimentos da
sociedade, depois os gêneros discursivos e, por último, as formas linguísticas.
No caso da seleção do texto, conforme a autora, com exceção dos alunos não
alfabetizados, a atitude mais sensata está em “recorrer àqueles autores que já
dominam o verbo, constroem o verso, controlam o ritmo, sabem eliminar o supérfluo,
para condensar-se – de modo exato e belo – as imagens, para provocar
encantamento, suspiros, concordância, gostosura [...]” (ABRAMOVICH, 2005, p. 95).
De acordo com o exposto na obra de Abramovich (2005), desde o início,
percebemos a ênfase de uma combinação das formas do sistema da língua com os
aspectos subjetivos sendo utilizada para a compreensão do gênero poema, por isso
precisamos esclarecer que em Bakhtin e o Círculo, nossa filiação teórica, a
subjetividade para Bakhtin “considera o ato de fala como individual e é por isso que
tenta explicá-lo a partir das condições da vida psíquica individual do sujeito falante”
(BAKHTIN/VOLOCHINOV, 1929, p. 113), mas para esses estudiosos o processo
enunciativo é proveniente de natureza social.
Cunha (1987) inicia seu texto posicionando-se contra a ideia difundida de que
não há interesse, por parte das crianças, em poesia. Em seguida, salienta que a
escolha dos poemas a serem tratados em sala de aula é feita de forma inadequada,
pois contém uma tendência de incutir nos alunos valores morais. Tal constatação da
autora faz com que a mesma afirme que esses textos são elaborados por professores
e não por poetas.
Nesse sentido, Cunha (1987) pontua que a decisão mais sensata seria
selecionar textos em antologias poéticas e que sejam aqueles que provoquem maior
repercussão entre as crianças, a partir de tal afirmação, a autora afirma que
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ressonâncias como a sensibilidade e a fantasia são inicialmente preferidas pelas
crianças por conta do sentimento sensorial.
Na visão de Cunha (1987), portanto, ocorre que a poesia é para ser sentida,
muito mais que compreendida e uma das principais características é exatamente a
ambiguidade, a conotação. Logo, para a autora, a sensibilidade deve ser incentivada
ainda quando a criança está na infância, desse modo na fase adulta o indivíduo estará
inclinado à apreciação da poesia que encontrará em diferentes gêneros poéticos.
De fato, necessariamente, concordamos com a sensibilidade criativa da
criança, desde os primeiros anos de vida. Mas, retornando à subjetividade derivada
do meio social, como já comentamos sobre o pensamento bakhtiniano, seria
adequado trabalharmos a sensibilidade já incentivando as crianças a perceberem que
a leitura de um poema envolve aspectos sócio-ideológicos da realidade. Pois se
observarmos nossos relacionamentos com as pessoas e com o universo que está ao
nosso redor, as ligações que o discurso do poema herda do passado, a
verossimilhança com nosso presente e as conexões com o futuro poderíamos assumir
posturas próprias refletindo, planejando e concretizando nossos projetos individuais
ou sociais. Portanto, incentivaríamos a sensibilidade usando os eventos ou materiais
da realidade para a reflexão.
O ritmo e a rima surgem como uma outra preocupação de Cunha (1987) e a
importância desses elementos consistem em fazer com que a criança logo entre em
contato com a atividade lúdica da poesia uma vez que “A linguagem [...], deve ser
simples: o rebuscamento e a retórica, mesmo na poesia mal suportados pelo adulto,
são inaceitáveis pela infância” (CUNHA, 1987, p. 94).
A autora refere-se ao excesso do caráter sutil, do poeta, resultantes de sua
subjetividade unida à sua intelectualidade, visto que esses provocam dificuldade de
compreensão na criança. Por isso, os tropos4 são aceitáveis, contudo os poemas e os
versos curtos são os mais indicados para o ensino-aprendizado das crianças.
Cunha (1987) acrescenta que o interesse das crianças por diversas cantigas
populares se estende aos poemas e aos versos curtos exatamente pela semelhança
4 Conforme Antonio Candido os tropos estão divididos em três famílias, com as funções de: ornar e significar, apenas significar e somente ornar. “1. Do primeiro tipo havia as seguintes: metáfora, alegoria, ironia, metonímia, metalepse, antonomásia, onomatopeia, hipérbole. 2. Do segundo tipo: sinédoque, epíteto. 3. Do terceiro tipo: perífrase, hipérbato.” (CANDIDO, 2006, p. 129).
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que há entre esses dois gêneros, por conseguinte, os poemas modernistas são os
mais apreciados pelos alunos ainda na infância.
Conforme Cunha (1987), o resultado de sua pesquisa sobre o tratamento
realizado com o poema em sala de aula tanto no Ensino Fundamental quanto no
Ensino Médio demonstrou que os professores deixam o gênero poema em segundo
plano, porque não conhecem a forma de abordá-lo, pois no momento da pesquisa os
poemas a serem trabalhados eram selecionados pela escola e priorizavam aspectos
moralizantes ou mesmo eram escolhidos como pretexto para ensinar em outras
disciplinas.
Cunha (1987) sugere, para o tratamento da poesia, a leitura expressiva (ler
várias vezes) tanto do aluno como do professor. Salienta que o educador deve evitar
a memorização ou o ditado, já que tais atividades impedem a compreensão textual,
pois,
Todas as estratégias capazes de aguçar a sensibilidade da criança e do adolescente para a poesia são válidas. Parece-nos importante ressaltar, entretanto, que para essa sensibilização é fundamental a frequência com que a poesia lhes é apresentada. (CUNHA, 1987, p. 96).
Em Cunha (1987), por conseguinte, além da articulação entre características
subjetivas e os elementos da formalidade para o tratamento do poema, o educador
deve expor à criança o contato com os poemas o maior número de vezes possível,
para um bom aprendizado.
No trabalho de Held (1980), são discutidas as dificuldades em relação aos
efeitos do imaginário existente nos produtos culturais que se destinam às crianças. A
autora faz um questionamento problemático: o fantástico na literatura infantil seria
realismo ou fantasia? Logo adiante, responde assumindo uma posição contra o
fantástico ter como característica primordial a angústia ou mesmo o imaginário dos
tradicionais contos de fada, nos quais os príncipes se casam com as plebeias.
Acrescentado a isso, neles são incentivadas, ainda, as decisões fatalistas, bem como
as revoltas de injustiçados. Assim, a autora salienta “o imaginário de que nos
ocuparemos não é [...] pseudo-imaginário com função de esquecimento, de exorcismo
e de diversão, que desvia a criança dos verdadeiros problemas do mundo de hoje e
da vida” (HELD, 1980, p. 12).
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Nesse sentido, Held (1980) compreende ser inconcebível pensar uma obra de
arte qualquer como sendo irreal - um imaginário do senso comum. Para a autora, a
arte, primeiramente, precisa ser imaginada na subjetividade do artista, conforme o seu
querer, o irreal torna-se real (verossimilhante), portanto. Para Held (1980), o produto
final já exposto na realidade existiu, antes, no espírito do autor. Dessa forma, o
fantástico (verossímil) expõe os desejos interiores do homem de projetar e construir
um universo particular estritamente como em seus pensamentos.
Logo, o imaginário fantástico e a realidade estão em constante relação
dialógica, isso nos remonta, novamente à subjetividade bakhtiniana e, por isso
lembramos a importância de constantemente buscarmos, na compreensão do poema
a ligação que há entre o passado e a contemporaneidade que há neles. Além disso,
vale a pena ressaltar, que no momento da escrita do trabalho de Held (1980), a
preocupação da autora estava na “necessidade vital de resgatar a categoria do
imaginário como fator de desenvolvimento e de renovação das potencialidades
humanas nas artes, na literatura, na ciência e na vida em geral” (HELD, 1980, p. 13).
A preocupação de Held (1980), bem como de outros representantes de
diversos segmentos da sociedade francesa era visível, por conta do pensamento
racionalista cartesiano, vigente na época, pois apesar de desenvolver extremamente
as capacidades intelectuais de forma mecânica, outras habilidades eram desprezadas
no desenvolvimento humano.
Nessa perspectiva, Held (1980), a princípio, ao tratar a abordagem do ensino
com o poema, critica o ensino de forma tradicional que incita a criança a repetir os
modelos criados pelo professor, porque o aluno ainda pequeno tem a capacidade de
inventar suas próprias criações poéticas e fantásticas e tal habilidade deveria ser
incentivada para se estender até a vida adulta, pois resultaria em jogo poético e
fantástico, manifestações lúdicas em sons e ritmos e também em nonsense5, isto é, a
ressignificação do mundo.
Held (1980), na mesma linha do pensamento freudiano, a respeito da palavra
espirituosa, diz que há interesse na criança, particularmente, pela pluralidade e
5 Se recorrermos à sua etimologia — non («não») + sense («sentido») —, de origem inglesa, depreende-se o significado do termo nonsense: “expressão, linguagem ou situação ilógica, absurda, desprovida de sentido ou de coerência”. Disponível em: <http://www.ciberduvidas.com/pergunta.php? id=19429>. Acesso em: jan. 2014.
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ambiguidade das palavras, ou o resultado de sua imaginação para o início de uma
produção de poema,
O envolvimento inicial da criança pela linguagem se assemelha, em muitos aspectos, do ponto de vista dos interesses psicológicos, ao gosto pelos brinquedos de montar, pelos quebra-cabeças. Procura inconsciente ou semi-consciente do infinito. Encantamento diante do fenômeno de encaixe, das inumeráveis combinações inconcebíveis. (HELD, 1980, p. 201).
Para Held (1980), o mais importante para a criança é que, ao aprender a utilizar
a língua, o professor encontre um equilíbrio entre a estrutura da linguística e a
capacidade psicológica de criar, entretanto, para a autora, mesmo quando o aspecto
gramatical é observado, não é permitido à criança o direito da liberdade criadora, pois
é necessário que ela compreenda a ordem direta das orações e não a inversa. Nesse
sentido, Held (1980) sugere a desconstrução de textos para que o equilíbrio entre a
liberdade criadora e os aspectos gramaticais sejam vivenciados na prática de
aprendizado das crianças.
Contudo, há um problema, para Held (1980), a criança, ainda interagindo no
meio com os adultos, logo aprenderá que existem palavras diferentes, e embora
precise de tudo que é dito ao seu redor, para enriquecer seu vocabulário, a língua
poderá se transformar em obstáculo se for vista como unívoca. Pois, conforme Held
(1980), existe diferença entre a linguagem – instrumento e linguagem criadora. Na
primeira, a palavra tem uma função específica, já na segunda é criadora. Adicionado
a isso está o fato de que tudo que é redundante na linguagem instrumental constitui
material significativo para o surgimento da redundância na poesia. A esse respeito diz
Held que
O próprio da linguagem poética e fantástica, o que a torna insubstituível na formação equilibrada de uma criança, é a sua essência multiunívoca. É convite à viagem ao país das palavras. Dá á criança, ou prolonga nela, o sentido de uso gratuito, não utilitário, da linguagem. (HELD, 1980, p. 215).
Sendo assim, Held (1980) assume a posição de ser contra o ensino tradicional
da língua, ou seja, o que segue modelos. Esclarece que a noção de fantástico na
literatura infantil tem conexões com a realidade, já que o imaginário é formado ainda
na psique do indivíduo. Portanto, para autora, o imaginário deve fazer parte do
aprendizado e, por meio da ludicidade com as palavras, sugere a desconstrução de
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textos para ensinar poesia, pois o jogo e a ambiguidade reprimidos na linguagem
funcional é imprescindível na linguagem criadora.
No livro A poesia na Escola de Ana Elvira Luciano Gebara, afirma-se que para
o aluno ler poesia na escola é preciso ser estimulado. Assim, a proposta de Gebara
(2002) é que haja estratégias preparadas e orientadas pelos professores nesse
sentido. O livro é dividido em duas partes, uma teórica e outra prática, essa divisão
proposital auxilia o professor no momento da aplicação dos conteúdos em sala de
aula. Na segunda parte, são utilizados pela professora poemas de José Paulo Paes
para a análise e interpretação desses textos poéticos.
Na opinião de Gebara (2002), para o aluno alcançar uma boa compreensão da
leitura de poemas é necessário um estímulo. A autora, então, sugere a “atividade
lúdica, como o jogo, resultando em fonte de prazer capaz de seduzir e conquistar
pequenos leitores” (GEBARA, 2002, p. 09), ou seja, a ludicidade se tornará
componente das aulas de língua portuguesa, quando o conteúdo envolver o trabalho
com poemas.
No texto Ora, direis escrever poemas... certo perdeste o senso? – Poema da
Olimpíada de Língua Portuguesa: Escrevendo o Futuro – edição 2010, a professora
Ana Gebara apresenta o resultado da análise de um grande número de textos
produzidos para a 2ª edição da Olimpíada 2010.
Gebara (2010) comenta que embora os poemas não tenham lugar privilegiado
na escola, são responsáveis pela “natureza da linguagem poética, assim como as
particularidades do fazer poético” (GEBARA, 2010, p. 08).
Segundo a autora (2010), entretanto, a Olimpíada se constitui como espaço em
que há liberdade para que os professores os tragam para as práticas diárias de
ensino-aprendizagem de língua materna, por meio dos textos contidos no Caderno
Poetas da Escola e também de suas orientações para a produção.
Gebara (2010) comemora o sucesso do desafio lançado pela OLPEF e
descreve o percurso metodológico percorrido pelos professores ao ensinar os
elementos da composição formal do poema. Desse modo, a forma composicional e
as figuras de linguagem foram privilegiadas fundamentando sua avaliação, pois:
Os poemas analisados apresentam distribuição gráfica adequada, mantendo, inclusive, certa regularidade no aspecto visual quanto a versos e a estrofes. Nesses versos as coincidências sonoras finais, a rima, e a procura de métrica regular surgiram como uma constante. [...] quanto ao metro, observa-se uma tendência à regularidade,
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muitas vezes baseada no cumprimento dos versos gráficos, numa clara percepção de simetria visual. [...] as estruturas paralelísticas [...] Importante mencionar também como os alunos-poetas distribuíram seus versos nas páginas. A estrutura mais frequente foi o quarteto. (GEBARA, 2010, p. 09-11, grifo da autora).
Para Gebara (2010), os resultados da Olimpíada em relação à produção dos
alunos foram satisfatórios. Mas, entre diversas observações, a professora afirma que,
em alguns momentos, “Os alunos-poetas ainda parecem muito preocupados com o
que têm a dizer, deixando em segundo plano a procura da forma mais adequada a
seus conteúdos” (GEBARA, 2010, p. 11). Percebemos, portanto, o foco da
preocupação de Gebara ao tratar o gênero discursivo poema centralizado nas
formalidades linguísticas. Acrescentado a isso, nos questionamos por que a
preocupação excessiva do trabalho com poemas no Poetas da Escola com a forma,
se o objetivo não é o talento artístico.
Jolibert (1994) fundamenta sua pesquisa nas teorias de C. Freinet, A. Vasques
e F. Oury. Adota uma pedagogia de projetos e o cooperativismo entre os sujeitos
envolvidos no processo de ensino-aprendizagem, para o tratamento tanto da leitura
como para a produção textual. Referente ao primeiro volume, em que o centro está
na leitura, coloca um questionamento pertinente: o que é ler? Em seguida, temos em
sua resposta esclarecimentos a respeito de que ler não é decifrar o sistema linguístico
e também não consiste em oralizar por meio de grupos respiratórios, mas a validade
efetiva do ato de ler significa “atribuir diretamente um sentido a algo escrito”
(JOLIBERT, 1994, v. 1, p. 15). Para isso, é preciso que sejam desenvolvidas, no aluno,
competências inerentes à compreensão da leitura, portanto, as competências
linguísticas. Não é só isso que garante a leitura, além do que os sentidos são múltiplos.
Em relação aos dois volumes, Jolibert (1994) adota procedimentos
metodológicos interessantes, para dinamizar as relações estabelecidas entre os
alunos e os meios em torno desses componentes, assim,
A vida cooperativa em sala de aula, e da escola, e a prioridade conferida à prática da elaboração e conduta de projetos explicitamente definidos juntos permitem, de uma maneira exemplar, que a criança viva seus processos autônomos de aprendizado e se insira num grupo e num meio considerados como estrutura que estimula, que exige, que valoriza, que provoca contradições e conflitos e que cria responsabilidades. (JOLIBERT, 1994, v. 1, p. 20).
41
Percebemos, aqui, uma criança envolvida em um organismo, cujos elementos
vivos (equipe escolar e os pais), materiais (recursos) ou circunstanciais
(oportunidades de vivenciarem a preparação e a ação pedagógica) as influenciam,
para interagirem como sujeitos ativos, em que consequentemente o aluno tem a
percepção de que faz sentido o frequentar a escola durante tantos anos. Há, também,
resultado para seus ensino-aprendizagem, porém não tanto eficaz, visto que
pensamos ainda estar ausente o componente da perspectiva enunciativo-discursiva
bakhtiniana para a compreensão efetiva do poema. Na visão de Jolibert (1994), a
forma sintética metodológica para o tratamento da leitura da representação poemática
deve ser:
– ao nível da superestrutura: a “silhueta” do poema é construída no quadro, e as crianças propõem utilizá-la para escrever poemas “à maneira de...” No final da sequência, ela serve para ajudar a implementar a memorização do poema; – ao nível das rimas: as crianças recapitulam as palavras que terminam com a rima [ã] [...] e as leem oralmente; procuram outras rimas; – ao nível dos sufixos: analisa-se e decompõe-se a palavra ‘rafraîchissant’ [refrescante]; – ao nível dos verbos: estabelece-se a seguinte classificação: comer comido tornar tornado, etc. (JOLIBERT, 1994, v. 1, p. 190).
Vimos, na síntese, Jolibert (1994) se referindo à análise feita pelo professor
juntamente com os alunos do poema Les quatre éléments6. É possível visualizarmos,
nesse recorte, o que havíamos dito, anteriormente, acerca da leitura em Jolibert
(1994), não apresentar os parâmetros enunciativo-discursivos para tal análise, pois as
orientações vão em direção da identificação da linguística textual.
Nas atividades empreendidas para a produção textual da poesia, Jolibert (1994)
comenta sobre sua insatisfação ao ver os colegas professores enfatizando “mais o
desbloqueio do imaginário, a expressão ou a liberação pela poesia do que os
aprendizados” (JOLIBERT, 1994, v. 2, p. 185). Para a autora, esses componentes
devem ser abordados em unidade, mas os aprendizados a que se refere a autora
abrangem três dimensões: a linguística, a afetiva e a imaginária. O aprendizado
consiste no processo de conhecimento e domínio das habilidades linguísticas.
6 Os quatro elementos
42
A especialista em didática defende, portanto, que a poesia seja
desescolarizada. No entanto, tal fenômeno é visto por ela como um paradoxo, pois ao
mesmo tempo em que uma das funções da escola é preparar o aluno para que ao
final de sua escolarização tenha adquirido a capacidade de ler, declamar e produzir
poemas independentemente, é no espaço escolar que se dão as experiências reais
da criança com o poema, isto é, com
– atividades, espaços e encontros poéticos que convidam para viver em poesia com o passar dos dias; – dois módulos sistematizados de aprendizado de produção de poemas, diferentes, porem convergentes, os ateliês de impulsão afetiva e imaginária e os canteiros com dominante linguística; – atividades de treinamento de dicção. (JOLIBERT, 1994, v. 2, p. 187).
O canteiro é definido como “módulo de aprendizagem [...] centrado em um tipo
de texto” (JOLIBERT, 1994, v. 2, p. 38). Nessa perspectiva, em que o poema é visto
sob esse aspecto, a inclusão de canteiros na ação pedagógica, para abordar o poema,
demonstra a intenção da professora em privilegiar as competências linguísticas a
serem aprendidas.
Diz Jolibert (1994), que tanto na leitura como na produção textual do poema,
as formalidades devem ser superadas abrindo passagem para a poesia
contemporânea. Mas, as diretrizes pertinentes a seu trabalho convergem, ao final,
primordialmente, para a valorização dos aspectos linguísticos ou da teoria literária
com as suas funções poéticas.
Dessa forma, diz Dolz & Schneuwly (2010) é chegado o momento de refletirmos
sobre uma nova abordagem para o ensino de língua materna e já que, conforme os
pesquisadores, o período das tipologias textuais é passado, percebe-se, então, a
necessidade de aderirmos a outra perspectiva como, por exemplo, a coesão entre a
concepção sócio-histórica de Vygotsky e a enunciativo-discursiva de Bakhtin. Nas
considerações de Dolz & Schneuwly (2010) são esclarecidos os conceitos
vygotskyanos de instrumentos ou ferramentas, bem como gêneros do discurso
primários e secundários de Bakhtin. Assim, o pesquisador sentencia que como em
toda pesquisa científica é preciso a classificação, por isso, os gêneros também devem
ser classificados.
Pinheiro (1995), outro autor sobre a didatização do poema, diz que devido à
própria experiência em trabalhar em alguns estados diferentes, percebeu que “a
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ausência da poesia na sala de aula é uma constante” (PINHEIRO, 1995, p. 10). Por
isso, lamenta o fato de que há uma carência de professores leitores de poesia,
principalmente, da tradição poética.
Nesse sentido, Pinheiro (1995) critica a abordagem privilegiando apenas o jogo
pelo jogo e desprezando os sentidos, pois o aluno mais experiente ao adquirir novos
conhecimentos, por meio de diversos tipos de leitura, torna-se desinteressado pelas
“assonâncias, aliterações, ecos, paranomásias, paralelismos [...] recursos
sonoros/semânticos que povoam muitos poemas infantis” (PINHEIRO, 1995, p. 16).
Além disso, existe, ainda, o problema da moralização por meio do texto poético.
Para o professor é necessário que o educador esteja atento, porque a utilização
de tais recursos não garante a literariedade, um aspecto constitutivo dos poemas e
que, em certa medida, enriquece os sentidos sem tornar-se demasiadamente comum.
A poesia expressa sentimentos e expressões individuais, os quais somente podem
ser reconhecidos por usuários da mesma língua.
Pinheiro (1995) defende que mesmo os alunos resistentes à leitura de poemas
podem estar receptivos ao aprendizado com esse gênero se refletirmos sobre a
‘função social da poesia’ (PINHEIRO, 1995, p. 16). O autor retoma as palavras de T.
L Elliot em A função social da poesia e diz que em primeiro lugar é essencial que o
leitor esteja atento à intenção do poeta ao escrever o texto:
As pessoas suspeitam à vezes de qualquer poesia com um propósito particular, isto é, poesia em que o poeta defende conceitos, morais, políticos ou religiosos, assim como outras pessoas julgam amiúde que determinada poesia seja autêntica só porque exprime um ponto de vista que lhe apraz. (T. S. ELLIOT, 1991, apud PINHEIRO, 1995, p. 17).
Pinheiro (1995) explica que a função essencial da poesia consiste em ser um
ato prazeroso para o leitor, vivenciar a cada nova leitura e relacioná-la com a
realidade, para a qual não temos explicação. Assim, nossa consciência será ampliada
e sempre exercerá uma ponte de comunicação para uma nova experiência, ou uma
compreensão do que já nos é familiar ou a expressão de algo que já experimentamos,
entretanto, não temos palavras para explicar, dessa maneira, segundo o autor a
ampliação de nossa consciência será aperfeiçoada para reprogramarmos nossas
atitudes.
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Pinheiro (1995) defende que o valor da poesia consiste em expressar
sentimentos e expressões individuais, mas ao mesmo tempo tem uma função social,
pois somente os conhecedores da mesma língua – idioma – podem compreender seus
possíveis sentidos. Já ao artista cabe o papel de conduzir aos homens para um mundo
de fantasia e da reflexão sobre o universo real, pois ‘em nossas origens, toda a poesia
é uma ato social, em que comungam o poeta e o povo’ (THOMSON, 1977, apud
PINHEIRO, 1995, p. 19).
Quanto à metodologia, diz Pinheiro (1995) que em seus diálogos com
professores de língua materna, esses constantemente lhe pedem técnicas para
auxiliá-los no momento da leitura oral do poema, principalmente no que diz respeito
aos poemas do Modernismo, pois existe a “falta de pontuação, as elipses, a ausência
de uma direção de leitura” (PINHEIRO, 1995, p. 29). Por isso, indica a leitura e a
releitura em voz alta, pois na oralização percebemos as pausas, identificamos o valor
de cada palavra e as formas apropriadas para o tom.
Nesse sentido, os professores não se interessam por uma educação que
sensibilize aos alunos para a poesia. Entretanto, Pinheiro (1995) afirma ser importante
trabalhar com a poesia em sala de aula, respeitando critérios estéticos na escolha das
obras ou na confecção de antologias.
Um pouco mais adiante, Pinheiro (1995) elenca três regras encontradas por ele
durante seus estudos. A primeira regra é ler o poema ‘todo sem parar, quer você ache
que entende quer não’ (ADLER, 1974, apud PINHEIRO, 1995, p. 31), para captar a
unidade de sentido do todo textual. Na segunda sugestão é aconselhado que o leitor
‘leia o poema todo novamente – mas leia-o em voz alta’ (ADLER, 1974, apud
PINHEIRO, 1995, p. 31). Segundo essa regra, na pronúncia das palavras em voz alta,
é possível corrigirmos um verso mal compreendido, na leitura anterior. A terceira
norma diz que devemos fazer alguns questionamentos ao próprio poema:
Por que certas palavras soltam do poema e atraem a atenção? Será por causa do ritmo? Ou da rima? Ou são palavras repetidas? Várias estrofes parecem referir-se às mesmas ideias: sendo assim, essas ideias seguem algum tipo de sequência? (ADLER, 1974, apud PINHEIRO, 1995, p. 32).
De acordo com Pinheiro, tais sugestões, se realizadas em conjunto, podem
contribuir para a compreensão do poema, entretanto, o autor ressalta que o aluno, ao
longo de seus estudos, “construirá” seu próprio modo de ler o gênero poema, pois a
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leitura de um poema lírico requer uma busca pelas descobertas de sentidos de um
grande poema, que pode se estender por toda uma vida.
Outro procedimento que pode ser adotado, pelo professor, para a abordagem
do gênero poema, segundo Pinheiro (1995), é a Organização de Antologias devido à
dificuldade de se encontrar obras com poemas adequadas na literatura juvenil. A partir
da leitura das antologias, o aluno buscará os estilos e as temáticas de seus poetas
preferidos.
A última possibilidade para o trabalho com a poesia em sala de aula, apontada
por Pinheiro (1995), constitui as Pequenas montagens teatrais. O autor explica que o
teatro está localizado em um campo de fronteira, pois enquanto texto poético podemos
abordar a inflexão da voz, a linguagem gestual, a dinâmica dos movimentos nos
cenários, portanto “o teatro é uma arte que, como a poesia, lida com a emoção, com
o sentimento, com a subjetividade. [...] a aproximação poesia-teatro muito pode ajudar
na criação do hábito de ler poesia” (PINHEIRO, 1995, p. 36).
Já Cyntrão (2004) reflete acerca das manifestações em diferentes gêneros e
investiga como se constituem os significados em cada texto a partir do ponto de vista
do “analista literário; manifestações autônomas em sua existência como
representação, mas antenas e prismas em suas possibilidades dialógicas”
(CYNTRÃO, 2004, p. 07).
Durante o percurso de seu texto, Cyntrão (2004), apresenta olhares de Roland
Barthes, Humberto Eco e Otávio Paz sobre a literatura, bem como inclui leituras do
antropólogo Canclini e do sociólogo Gilbert Durand necessárias para a análise
denominada pela autora de inter-trans-textual da poesia. Desse modo, Cyntrão (2004)
propõe “análises que partem da intertextualidade comparativa para chegar à trans-
textualidade de abertura semiótica” (CYNTRÃO, 2004, p. 08). Uma leitura, portanto,
que visa a re-problematizar a relação autor-leitor, via texto, e a possibilitar uma
amplitude de reflexões sobre o sujeito impresso nas representações simbólicas.
Cyntrão (2004) afirma que o ato de ler um poema significa buscar os sentidos
derivados do imaginário do poeta, mas não nas formas iniciais vivenciadas por esse
artista, no contexto sócio-histórico, e sim em outras diferentes formas estruturais, e é
nessa perspectiva que o artista, em primeiro lugar, age como um catalisador de
experiências comportamentais ou de linguagens e as transforma em outras diferentes
manifestações poéticas, porque
46
Buscar no texto poético sentidos significa identificar as estruturas psicológicas e sociológicas significadas em sua semântica, já que se a palavra é o fenômeno ideológico por excelência, os signos emergem do processo de interação entre uma consciência individual e outra e a construção do objeto poético subordina-se à verdade (real ou imaginária) do sujeito e do grupo. (CYNTRÃO, 2004, p. 12).
Para Cyntrão (2004), essencialmente, “ler um poema consiste em decifrar-lhe
o sentido tensionado, nascido do imaginário do poeta e transformado pela via da
representação estética na construção do objeto textual” (CYNTRÃO, 2004, p. 11). A
defesa da autora está em que o leitor, no momento da leitura, traga para seu contexto
conexões com diferentes áreas de conhecimento da cultura humana para, enfim,
desvendar os possíveis sentidos que parcialmente foram sugeridos no texto.
Cyntrão (2004) explica que o fazer poético é um movimento de escolhas
conscientes do poeta. O movimento que existe é por conta dos confrontos que existem
na subjetividade e seleção estilística. Essas escolhas pertencem ao sujeito eu-lírico,
mas existe a relação entre os dois autores (autor/poeta e autor/lírico), conforme
Bakhtin (2003), e o leitor.
A intenção de quem quer desvelar as formas simbólicas é a tensão criada entre
esses três interlocutores, para em seguida ressignificar os sentidos de acordo com o
histórico, pois interpretar é a vontade de se compreender e compreender o outro.
Para Koch (1970), a preocupação consiste em como atrair a atenção das
crianças e também em como melhorar o ensino da poesia. Apesar de esse
pesquisador ter realizado seu trabalho na década de 70, o tema ainda é atual. Em
nosso trabalho, comentaremos apenas o capítulo Teaching children to write poetry,
em que o autor expõe a técnica utilizada para estimular a criatividade dos alunos na
escrita da poesia. Indiretamente, Koch (1970) pretendia ensinar aos professores e
diretamente aos alunos.
A primeira direção tomada pelo autor foi não utilizar a mesma linguagem para
adultos e crianças, porque para estas, a linguagem daqueles poderia ser monótona.
Para motivar os alunos, inicialmente, o pesquisador solicita que eles produzam um
poema em conjunto oralmente, mas cada criança contribuiria apenas com uma frase.
Às crianças foi esclarecido que não havia a necessidade de competição, pois não
haveria julgamento de valores. Contudo, as frases não seriam aleatórias, ou seja,
seguiriam um fio condutor ou uma amarração que as unissem em uma unidade de
sentido ao serem finalizadas. Assim, os alunos seguiriam regras e instruções simples.
47
Em primeiro lugar, a frase deveria conter “I wish” – eu desejo – (KOCH, 1970, p. 10),
ao final do texto, torna-se perceptível que a união de frases resultou em um poema,
com a finalização do professor.
O sucesso do empreendimento deve-se ao fato de que as frases fazem parte
da realidade das crianças e foi sugerido, então, aos alunos, que produzissem um texto
escrito seguindo o mesmo critério. Todavia, foi-lhes apresentada a segunda
precaução de Koch (1970), concernente ao não uso de rimas. Para o professor,
apesar de as rimas serem “belas”, as crianças perderiam o fluxo da escrita ao tentarem
combinar as terminações das palavras.
Outra linha bastante abordada em poemas e desconsiderada por Koch (1970)
foi o uso da metáfora, pois se percebeu que, para elas, era significativamente mais
fácil e compreensível a adoção das comparações.
Uma particularidade a mais foi um fator de reflexão para Koch (1970), isto é,
ao ensinar poemas, professores se deparam com a sextina7. Existem, basicamente,
duas correntes teóricas, uma que preza pela forma estrutural e pouco enfatiza o
sentido do poema. E outra, na qual o sentido do texto é defendido e a forma assume
segundo plano. Koch (1970) propõe, portanto, uma técnica prazerosa e
simultaneamente enigmática, para a inclusão da sextina na produção textual: escreve
as palavras do poema no quadro e incentiva as crianças a completarem a produção
do texto.
Koch (1970), por conta das diferentes faixas etárias, considerou trabalhar com
a linguagem adequada para cada uma. Por isso, o pesquisador encontrou como
solução incluir trechos de autores renomados, que se aproximassem da perspectiva
poética das crianças, a fim de despertá-las para a leitura das poesias dos adultos.
Finalmente, durante o trabalho desenvolvido por Koch (1970), uma prática
interessante e eficaz foi percebida. O rendimento da escrita em sala de aula era
superior ao desempenho em casa. Nas palavras do autor:
A surprising discovery I made at P.S. 618 was that children enjoyed writing poems at school more than at home. I had assumed that like grownup writers they would prefer to be comfortable, quiet, and alone
7 Composição de origem provençal, formada por seis sextilhas e um terceto. Disponível em: <http://www.infopedia.pt/$sextina>. Acesso em:jan. 2014. 8 P.S. 61 é a nomenclatura usada no estado de Nova York para designar as escolas públicas. Mais precisamente Public School 61. Nota do tradutor.
48
when they wrote, but I was wrong. Once it had to be done away from school, poetry was part of the detestable category “homework”, which cuts one off from the true pleasures of life; whereas in school it was a welcome relief from math, spelling, and other required subjects. Closing their heavy books to hear about a new idea for a poem made the children happy and buoyant.9 (KOCH, 1970, p. 31-32).
Dessa forma, vimos o papel do professor como mediador, conduzindo muito
bem sua tarefa de auxiliar o aluno a encontrar meios mais claros que a exploração
das formas fixas da língua, para chegar ao objetivo final da produção do texto, já que
trabalhavam com a busca e a construção dos múltiplos sentidos do texto.
2.2.2 PCN: texto literário em suas particularidades
A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada
com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu
preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
Constituição Federal de 1988
O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais populares e acesso às
fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das
manifestações culturais.
Constituição Federal de 1988
Pela linguagem os homens e as mulheres se comunicam, tem acesso à informação,
expressam e defendem pontos de vista, partilham ou constroem
visões de mundo, produzem cultura.
Parâmetros Curriculares Nacionais
Para a educação brasileira tornar-se eficiente, o Ministério da Educação, por
meio dos PCN e estes subjacentes à Constituição Federal de 1988, baliza as
9 “Uma descoberta surpreendente que eu tive na escola pública 61 foi que as crianças gostam muito mais de escrever poemas na escola que em casa. Eu acreditava que como escritores adultos elas iriam preferir estar confortáveis, quietas e sozinhas quando elas escrevessem, mas eu estava errado. Uma vez que a poesia tivesse que ser feita fora da escola ela faria parte da detestável categoria de “dever de casa”, o qual tira as pessoas dos verdadeiros prazeres da vida; enquanto que na escola era um alívio bem-vindo e distante da matemática, de soletrar palavras e outras tarefas requisitadas. Ao fechar os livros pesados para ouvir sobre novas ideias para um poema deixava as crianças alegres e felizes” (Tradução livre de Robson Dias de Assis).
49
condições em que funcionam os currículos na escola e também os conteúdos
disciplinares a serem ministrados na sala de aula, com a finalidade de garantir uma
educação básica de qualidade, pois os alunos devem
Compreender a cidadania como participação social e política, assim como exercício de direitos e deveres políticos, civis e sociais, adotando, no dia-a-dia, atitudes de solidariedade, cooperação e repudio às injustiças, respeitando o outro e exigindo para si o mesmo respeito. (BRASIL, 1998, p. 07).
Dessa forma, se às crianças devem ser garantidos esses direitos e deveres e
também o aprendizado e prática dos valores necessários para a convivência
harmoniosa em sociedade, compreendemos a importância dos alunos manterem
contato constante com a literatura, pois
O texto literário constitui uma forma peculiar de representação e estilo em que predominam a força criativa da imaginação e a intenção estética. Não é mera fantasia que nada tem a ver com o que se entende por realidade, nem é puro exercício lúdico sobre as formas e sentidos da linguagem e da língua. (BRASIL, 1998, p. 26).
A literatura, portanto, possibilita ao indivíduo a formação intelectual e,
consequentemente, a prática do que foi internalizado, porque em seus textos existe,
constantemente, um movimento entre os acontecimentos da realidade e suas
representações. Assim, se as transformações sociais, políticas e históricas são bases
para a criação literária, podemos perceber uma relação entre os discursos reais e a
escolarização da literatura.
Em vista disso, ao se preocupar com o valor do ensino literário na escola - visto
que por meio de leituras literárias, os alunos podem refletir sobre o que leem,
estabelecer relações entre eles mesmos, o autor e o texto e a partir disso desenvolver
competências de leitura – os PCN (1998), então, indicam para o ensino de Língua
Materna a leitura de diversos textos, unidade fundamental do ensino-aprendizagem
de língua materna, os quais veremos adiante.
Conforme os PCN, o texto literário como representação significa “um modo
particular de dar forma às experiências humanas” (BRASIL, 1998, p. 26), ou seja, não
se submete aos critérios científicos, às diferentes maneiras de observação da
realidade nem às regras linguísticas. O texto literário transgride todos os padrões para
mediar relações “entre o sujeito e o mundo, entre a imagem e o objeto, mediação que
50
autoriza a ficção e a reinterpretação do mundo atual a dos mundos possíveis”
(BRASIL, 1998, p. 26).
De acordo com os PCN, por meio dessas relações, nascem diferentes diálogos
em um movimento de aproximação e afastamento, por isso surgem, para o aluno,
diferentes pontos de vista. Assim, a relativa autonomia da literatura constitui fonte de
conhecimento.
Considerando as condições de produção da contemporaneidade, conforme os
PCN (1998), o texto literário ainda deve ser analisado do ponto de vista linguístico e
acrescenta-se que, embora existam textos escritos dentro da norma padrão da língua,
“a composição verbal e os recursos linguísticos obedecem à sensibilidade e a
preocupações estéticas” (BRASIL, 1998, p. 27), por isso as criações literárias têm a
liberdade de se afastar das convenções do sistema linguístico. A língua, portanto,
torna-se matéria prima para a dimensão semiótica do objeto literário
[...] na exploração da sonoridade e do ritmo, na criação e recomposição das palavras, na reinvenção e descoberta de estruturas sintáticas singulares, na abertura intencional a múltiplas leituras pela ambiguidade, pela indeterminação e pelo jogo de imagens e figuras. Tudo pode tornar-se fonte virtual de sentidos, mesmo o espaço gráfico e signos não-verbais, como em algumas manifestações da poesia contemporânea. (BRASIL, 1998, p. 27).
Nesse sentido, os PCN (1998) nos alertam para estarmos atentos à forma
inadequada de abordagem dos textos do campo literário, pois não podemos tratá-los
como pretexto para o ensino da gramática nem como veículo de transmissão de
valores morais, os quais poderiam ser assimilados pelas crianças, mas sim que os
alunos sejam “capazes de reconhecer as sutilezas, as particularidades, os sentidos, a
extensão e a propriedade das construções literárias” (BRASIL, 1998, p. 27).
Os documentos oficiais delineiam os objetivos específicos para o 3° e o 4°
ciclos, isto é, habilidades que deveriam ser desenvolvidas nos alunos, para cada uma
das atividades globais de leitura e de produção de textos orais e escritos, bem como
análise linguística, além da preocupação com a ZPD de Vygotsky.
Salientam os PCN que os conteúdos a serem apresentados aos alunos no 3°
e 4° ciclos devem abranger os objetivos específicos para esses ciclos e também para
o Ensino Fundamental, mas primeiramente sugerem uma relação de gêneros a serem
abordados.
51
Quadro 1 – Prática de escuta de textos orais e leitura de textos escritos
GÊNEROS PRIVILEGIADOS PARA A PRÁTICA DE ESCUTA E LEITURA DE TEXTOS
LINGUAGEM ORAL LINGUAGEM ESCRITA
LITERÁRIOS
DE IMPRENSA
DE DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA
PUBLICIDADE
cordel, causos e similares
texto dramático
canção
comentário radiofônico
entrevista
debate
depoimento
exposição
seminário
debate
palestra
propaganda
LITERÁRIOS
DE IMPRENSA
DE DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA
PUBLICIDADE
conto
novela
romance
crônica
poema
texto dramático
notícia
editorial
artigo
reportagem
carta do leitor
entrevista
charge e tira
verbete enciclopédico (nota/artigo)
relatório de experiências
didático (textos, enunciados de questões)
artigo
propaganda
Fonte: Organizado pela autora/2013, de BRASIL (1998, p. 54).
Quadro 2 – Prática de produção de textos orais e escritos
GÊNEROS SUGERIDOS PARA A PRÁTICA DE PRODUÇÃO
DE TEXTOS ORAIS E ESCRITOS
LINGUAGEM ORAL LINGUAGEM ESCRITA
LITERÁRIOS
DE IMPRENSA
canção
textos dramáticos
notícia
entrevista
debate
LITERÁRIOS
DE IMPRENSA
crônica
conto
poema
notícia
artigo
carta do leitor
52
DE DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA
depoimento
exposição
seminário
debate
DE DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA
entrevista
relatório de experiências
esquema e resumo de artigos ou verbetes de enciclopédia
Fonte: Organizado pela autora/2013, de BRASIL (1998, p. 57).
A intenção dos PCN em sugerir os grupos de gêneros visa auxiliar o professor
a reunir a seleção de conteúdos para a prática de análise linguística.
Há grande número de gêneros que circulam na sociedade, por isso, é preciso
selecioná-los, e o critério é: dar prioridade ao gênero “cujo domínio é fundamental à
efetiva participação social, encontrando-se agrupados, em função de sua circulação
social, em gêneros literários, de imprensa, publicitários, de divulgação cientifica,
comumente presentes no universo escolar” (BRASIL, 1998, p. 53):
Os princípios organizadores dos conteúdos de Língua Portuguesa (USO –> REFLEXÃO –> USO), além de orientarem a seleção dos aspectos a serem abordados, definem, também, a linha geral de tratamento que tais conteúdos receberão, pois caracterizam um movimento metodológico de AÇÃO –> REFLEXÃO –> AÇÃO que incorpora a reflexão às atividades linguísticas do aluno, de tal forma que ele venha a ampliar sua competência discursiva para as práticas de escuta, leitura e produção de textos. (BRASIL, 1998, p. 65).
Lembram os PCN (1998), entretanto, que essa seleção é aberta, pois quanto
ao tratamento didático dos conteúdos, a informação a ser transmitida pelo professor
e o método de ensino com os gêneros devem ter em vista o desenvolvimento do aluno,
já que é esperado, ao final do Ensino Fundamental, que as habilidades, nos ciclos
anteriores, tenham se convertido em competências para escutar, ler e produzir textos.
Nesse sentido, faz-se necessária, ainda, a avaliação para saber se os conteúdos
foram apreendidos pelos alunos.
Conforme os PCN (1998), no caso do ensino de língua materna e, cremos que
especificamente com a literatura, os alunos podem ter no professor leitor um exemplo,
se este vivencia diariamente esse hábito em sala de aula, pois os alunos ao
observarem os atos de leitura do educador podem se familiarizar com isso e tomar
com prática cotidiana deles.
53
Finalmente, os PCN (1998) sugerem que além de novos conteúdos que
precisam ser apresentados à sala, o aluno deveria ter acesso a diversos gêneros, pois
os conceitos e os métodos referentes à análise de cada um dos textos, bem como os
recursos discursivos e linguísticos na formação de cada um deles, precisam ser
(re)visitados.
Os PCN (1998) nos advertem, ainda, sobre ser necessária uma reavaliação a
respeito da formação do professor:
Isso implica revisão e atualização dos currículos oferecidos na formação inicial do educador e a implementação de programas de formação continuada que cumpram não apenas a função de suprir as deficiências da formação inicial, mas que se constituam em espaços privilegiados de investigação didática, orientada para a produção de novos materiais, para a análise e reflexão sobre a prática docente, para a transposição didática dos resultados de pesquisas realizadas na linguística na educação em geral. (BRASIL, 1998, p. 67).
Nossa pesquisa está inserida, pois, nessa linha de pensamento. Buscamos
descrever o modo como foi abordado o poema no Caderno Poetas da Escola e, em
seguida, apresentar apenas algumas contribuições bakhtinianas no sentido de
acrescentar, para uma maneira diferente de lidar com tal gênero poético. Por
enquanto, de acordo com os PCN (1998), expomos as sugestões didáticas
responsáveis pela formação de um leitor, mas no caso de pretendermos formar
leitores capazes de compreensão crítica seria necessária a leitura colaborativa, em
que
[...] o professor pode selecionar situações didáticas adequadas que permitam ao aluno, ora exercitar-se na leitura de tipos de texto para os quais já tenha construído uma competência, ora empenhar-se no desenvolvimento de novas estratégias para poder ler textos menos familiares, o que demandará maior interferência do professor. (PCN, 1998, p. 72).
Dessa forma, vejamos os outros tipos de leitura, conforme os PCN (1998):
Leitura autônoma – leitura de textos, em que o aluno já seja proficiente no
gênero e de forma silenciosa.
54
Leitura em voz alta pelo professor – leitura compartilhada pelo professor em
voz alta, para auxiliar o aluno, ainda não capacitado para compreender a estética ou
permanecer lendo um longo capítulo.
Leitura de escolha pessoal – leitura na qual o aluno realiza em casa, escolhe
seu autor ou gênero, com a intenção de relatar aos colegas suas impressões.
Leitura colaborativa – leitura estratégica, feita em conjunto pelo professor e os
alunos para que eles adquiram autonomia em relação ao ato. São observados
recursos linguísticos que dão sustentação ao texto e produzem sentidos,
antecipações, inferências, diferenciação entre ficção e realidade, ideologias, imagens,
projeto discursivo do autor etc. Logo, tal procedimento torna-se essencial para a
formação do leitor crítico (PCN, 1998, p. 72-73).
2.3 Considerações genebrinas: gêneros e desenvolvimento da linguagem
O gênero pode ser considerado um instrumento psicológico,
no sentido vygotskyano do termo
Dolz & Schneuwly
Schneuwly (2004), em concordância com o pensamento de A ideologia alemã
afirma:
A apropriação não é senão o desenvolvimento das capacidades individuais correspondentes aos instrumentos materiais de produção. A apropriação de uma totalidade de instrumentos de produção é o desenvolvimento de uma totalidade de capacidades nos próprios indivíduos. (MARX; ENGELS, 1845-1846[1969], apud SCHNEUWLY, 2004[1994], p. 20-21).
O pensamento filosófico alemão, o qual seduziu grande parte da população
mundial defendia a ideia de que os instrumentos materiais estão disponíveis para
desenvolver pessoalmente tudo o que o homem constrói. Pois este, ao se apropriar
das capacidades em lidar com os instrumentos, se desenvolveria. Entretanto, a não
apropriação revelaria, para a sociedade, o estado em que esse sujeito se encontra:
homem sem cultura.
Dessa forma, Schneuwly (2004[1994]) coloca duas visões psicológicas
esclarecedoras para demonstrar que o instrumento constitui “fator de desenvolvimento
das capacidades individuais” (SCHNEUWLY, 2004[1994], p. 21).
55
A psicologia, inicialmente, considera a atividade humana dividida em duas
extremidades, em uma está posicionado o sujeito e na outra o objeto sobre o qual a
ação se desenvolve, por intermédio desse sujeito, tal como acredita Piaget, mas
Na perspectiva do interacionismo social, a atividade é necessariamente concebida como tripolar: a ação é mediada por objetos específicos, socialmente elaborados, frutos das experiências das gerações precedentes, através dos quais se transmitem e se alargam as experiências possíveis. Os instrumentos encontram-se entre o indivíduo que age e o objeto sobre o qual ou a situação na qual ele age: eles determinam seu comportamento, guiam-no, afinam e diferenciam sua percepção da situação na qual ele é levado a agir. (SCHNEUWLY, 2004[1994], p. 21).
Para Schneuwly (2004[1994]), o instrumento (texto), nessa perspectiva, não
mais apenas constitui uma ponte de ligação entre o aluno e a atividade executada,
mas sim determina a situação e molda o comportamento desse homem conforme a
especificidade desse instrumento.
Em nosso caso, em relação ao tratamento didático dispensado ao poema, em
sala de aula, por exemplo, apenas identificar o sistema linguístico selecionado para a
construção textual (no instrumento texto) já não mais se configura como ação
pedagógica eficiente a favor do aprendizado do aluno. Pois, ao educando não mais
interessa, na contemporaneidade, identificar as formalidades linguísticas em um
gênero qualquer. É necessário, portanto, que sejam ampliadas as suas possibilidades
de compreensão a partir dessa materialidade textual, já que o poema foi elaborado
como instrumento de comunicação anteriormente pela demanda social da esfera
artística. Entretanto, existe como lugar privilegiado das representações da sociedade
e dessa forma, então, as possibilidades semióticas e dialógicas implícitas ou
explícitas, nesse texto, devem receber atenção especial, pois os contextos onde
circulam esse instrumento poderão ser modificados.
Em seguida, Schneuwly (2004[1994]) analisa o gênero na proposição de duas
faces. Primeiramente, existe a dimensão (etapa) exterior do sujeito, cuja função
constitui materializar as finalidades para as quais se destinam o instrumento. E por
outro ângulo, existem os esquemas de utilização do objeto. Portanto, um instrumento
com que provoca mudanças nos objetos e controla os processos da natureza. Um
instrumento, por exemplo, um poema pode ser uma fonte de novas visões de mundo
ou de pensamento para o estudante. Assim, a essência passa a ser controlada no
sentido de que jamais as ideias serão as mesmas a partir do momento da leitura,
56
principalmente se o aprendiz domina sua forma de utilização, isto é, seus esquemas
de utilização.
Schneuwly (2004[1994]) explica que há três importantes particularidades na
definição bakhtiniana de gênero discursivo, em primeiro lugar, o gênero é elaborado
a partir do objetivo para o qual a situação real discursiva exige e por conta da
necessidade dos possíveis destinatários e do conteúdo temático. Em seguida, o
gênero é escolhido entre várias possibilidades de textos existentes nas esferas da
comunicação conforme o que mais se adapta à situação interativa. Em terceiro lugar,
apesar de os gêneros serem flexíveis e mutáveis em seus conteúdos, obedecem a
uma rigidez estrutural que não é absoluta de acordo com sua função, com a interação,
bem como o estilo individual e do gênero.
Schneuwly (2004[1994]) cita um outro problema, ou seja, devido ao “rico
repertório de gêneros” surge a dificuldade para o aluno adaptar-se ao grande número
de gêneros e mesmo assim, ainda, não aparece na teoria bakhtiniana a presença dos
esquemas de utilização dos gêneros.
Schneuwly (2004[1994]), entretanto, divide os esquemas de utilização da língua
em duas formas: o primeiro esquema de utilização do “gênero como instrumento –
unidade de conteúdo temático, composição e estilo – deve poder ser adaptado a um
destinatário preciso, a um conteúdo preciso, a uma finalidade dada numa determinada
situação” (SCHNEUWLY, 2004[1994], p. 24). Todavia, esse mesmo esquema
funciona de forma contrária, por exemplo, para que o homem possa ser bem sucedido
quanto à utilização do gênero instrumento é necessário que ele reconheça uma
situação em que somente um determinado tipo de gênero se adapta a ela, pois esse
indivíduo deve conhecer o gênero e também os mecanismos de controle sobre o
instrumento. Dessa forma, se existe a possibilidade de lançarmos mão dos
conhecimentos sobre o instrumento para realizar nossa intenção discursiva, significa
dizer, então, que temos o conhecimento. Logo, conforme Schneuwly (2004[1994]) “o
instrumento é um meio de conhecimento” (SCHNEUWLY, 2004[1994], p. 25).
2.3.1 Gêneros secundários: uma continuação dos primários
Schneuwly (2004[1994]) aponta os ângulos em que podemos perceber o modo
de existência do gênero primário: ideias são compartilhadas mutuamente e
57
controladas pelo contexto onde estão inseridas no ato da comunicação. Nessa
interação, portanto, quase não existe a preocupação com a metalinguística. “O gênero
simples, dessa maneira, basta-se a si mesmo; funciona como que por reflexo de
automatismo” (SCHNEUWLY, 2004[1994], p. 26-27).
Em relação à especificidade dos gêneros complexos, para Schneuwly
(2004[1994]) ocorre um processo de maneira diferente, pois embora não sejam
controlados pela ação imediata da situação real de comunicação, são
contextualizados. O controle de seu funcionamento e sua metalinguística é feito
obedecendo aos objetivos do campo comunicativo para o qual foram elaborados.
Para Schneuwly (2004[1994]), portanto, a criança se utiliza dos gêneros
primários, em primeiro lugar, para participar das diferentes situações de comunicação
que fazem parte de seu cotidiano. Entretanto, o diálogo – gênero primário – torna-se
instrumento capacitando as crianças a utilizá-lo sempre, mas abordando diferentes
temas. A partir disso, os diálogos simples sofrem uma modificação, pois os “gêneros
se complexificam e tornam-se instrumentos de construções novas, mas complexas”
(SCHNEUWLY, 2004[1994], p. 27).
Dolz & Schneuwly (2004[1996]) apresentam, então, um quadro, com cinco
agrupamentos, os quais balizam seus trabalhos com os textos. Os professores
ressaltam que os critérios para os agrupamentos tentam equilibrar coerentemente
seus estudos com os objetivos externos. Os estudiosos declaram, entretanto, que
suas ênfases não estão em colocar à disposição dos educadores mais um
agrupamento, visto que já existem tantos outros, mas sim em definirem, nos gêneros,
as capacidades de linguagem globais, comuns em relação às tipologias já existentes
e necessárias à aprendizagem do aluno durante o período de sua educação formal.
Quadro 3 – Proposta provisória de agrupamento de gêneros
Domínios sociais de comunicação
Aspectos tipológicos Capacidades de linguagem dominantes
Exemplos de gêneros orais e escritos
Cultura literária ficcional
Narrar Mimeses de ação por meio da criação da
íntegra no domínio do verossímil
conto maravilhoso conto de fadas fábula lenda narrativa de aventura narrativa de ficção científica
58
narrativa de enigma narrativa mítica sketch ou história engraçada biografia romanceada romance romance histórico novela fantástica conto crônica literária adivinha piada
Documentação e memorização das ações humanas Relatar
Representação pelo discurso de experiências vividas, situadas no tempo
relato de experiência vivida relato de viagem diário íntimo testemunho anedota ou caso autobiografia curriculum vitae ... notícia reportagem crônica social crônica esportiva ... histórico relato histórico ensaio ou perfil biográfico biografia ...
Discussão de problemas sociais controversos
Argumentar Sustentação, refutação e negociação
de tomadas de posição
textos de opinião diálogo argumentativo carta de leitor carta de reclamação carta de solicitação deliberação informal debate regrado assembleia discurso de defesa (advocacia) discurso de acusação (advocacia) resenha crítica artigos de opinião ou assinados editorial ensaio ...
Transmissão e construção de saberes
Expor Apresentação textual de diferentes
formas de saberes
texto expositivo (em livro didático) exposição oral seminário conferência comunicação oral
59
palestra entrevista de especialista verbete artigo enciclopédico texto explicativo tomada de notas resumo de textos expositivos e
explicativos resenha relatório científico relatório oral de experiência ...
Instruções e prescrições
Descrever Ações Regulação mútua de comportamentos
instruções de montagem receita regulamento regras de jogo instruções de uso comandos diversos textos prescritivos ...
Fonte: Organizado pela autora/2013, de Dolz & Schneuwly (2004[1996], p. 51-52).
Conforme Dolz & Schneuwly (2004[1996]), os agrupamentos, por serem
diferentes, possuem características particulares a cada um e por esse motivo
esclarecem o porquê da progressão ser elaborada retornando sempre ao ponto
anterior, isto é, os alunos aprendem, mas depois é necessário desenvolver o que foi
aprendido durante as práticas didáticas com eles, nos outros ciclos, assim se
consolidam as capacidades de linguagem necessárias para a apropriação dos
gêneros. Dolz & Schneuwly (2004[1996]), nesse ponto, estão pensando no
desenvolvimento do instrumento, pois, de forma análoga, há a transferência de
capacidades adquiridas em um gênero, tais capacidades podem, também, serem
transferidas para outros do mesmo grupo. Para além disso, os autores, em uma visão
mais ousada, dizem esperar que haja, também, os transagrupamentos.
Ao apresentar, todavia, a tabela com os agrupamentos, há uma nota
esclarecedora dos estudiosos “Ignoramos propositadamente a poesia, que não pode,
absolutamente, ser tratada como agrupamento de gêneros. Para um tratamento
interessante, ver Jolibert, Sraiki, e Herbeaux 1992” (DOLZ; SCHNEUWLY,
2004[1996], p. 50).
Recorremos à pesquisa de Padilha (2005), entretanto, em que coloca seus
pontos de discordância nas questões pontuadas a respeito dos cinco agrupamentos
60
de gêneros, porque conforme a pesquisadora, inicialmente, se o poema pertence às
representações sociais de uma determinada sociedade, como qualquer outra
produção literária ou cultural, mesmo que não haja versos em todo o texto existe
essência literária e, portanto, essas manifestações literárias constituem o quadro com
os cinco agrupamentos delimitados por Dolz & Schneuwly (2004[1996]).
Padilha (2005) acrescenta que relativamente os poemas respondem ‘às
necessidades da linguagem em expressão escrita e oral’ (DOLZ; SCHNEUWLY, 1996,
apud PADILHA, 2005, p. 245) o que nos remete, por exemplo, aos poemas da
literatura engajada, seguramente os anseios de uma sociedade qualquer, por meio da
linguagem descrevem seus acontecimentos históricos ou suas aspirações, já que nos
domínios da esfera artística está incluída a literatura, com seu modo diferente de
discursos em que transgride as possibilidades de uso da língua.
Para o segundo critério, ‘certas distinções tipológicas’, Padilha (2005) também
apresenta uma contrapalavra, pois a ciência literária sempre descreveu configurações
de poemas.
No que diz respeito ao terceiro critério, conforme a base teórica bakhtiniana de
Padilha (2005), em que o poema é visto e analisado como único e, ainda, que o poeta
sempre estará em busca de novos modos eficazes para a produção de textos ou
discursos, a pesquisadora apresenta, portanto, uma serie de vocábulos que são
sinônimos, para representar o aspecto tipológico da poesia: versejar, linguajar, poetar,
poetizar, poetificar ou, ainda, o termo sonetear. Finalmente, a autora defende que a
elaboração de agrupamentos não deve ser baseada nas capacidades de linguagem,
isto é, fundamentada em critérios formais, pois tais capacidades dependem do “devir
da corrente verbal, ao momento e ao processo de atualização das leituras, num
espaço discursivo dos interlocutores” (PADILHA, 2005, p. 247). Dessa forma, os
grupos poderiam ser pensados segundo seus espaços e tempos – cronotopos –
apropriações intergenéricas, visando sempre o conceito de memória do gênero
bakhtiniano.
Retornando, então, à nota de advertência contra a poesia ter seu lugar no
agrupamento de gêneros de Dolz e Schnewly (2004), buscamos tal sugestão e vimos
que Jolibert, em suas obras, Formes des enfants lecteurs (tome 1), bem como Former
des enfants lecteurs et producteurs de poèmes (tome 2), ambos (1994),
decididamente não tratam o poema como gênero discursivo, mas sim como tipo de
texto exatamente ao contrário do que diz Batista (2008), descrevendo o que seria
61
necessário incluir na análise desse texto, isto é, “uma filologia ao contrário ou [...] uma
ecdótica às avessas – um trabalho de reintegrar ao texto elementos que lhe foram
subtraídos na construção histórica, pela atividade filológica, da noção do texto”
(BATISTA, 2008, p. 138).
Após comparar o gênero com um instrumento que se desenvolve por
continuidade e ruptura do simples ao complexo, Schneuwly (2004[1994]) afirma que
tal conceito configura-se como um instrumento de grande valia no desempenho de
uma atividade discursiva sobre a realidade concreta, pois é considerado como
“‘megainstrumento’, como uma configuração estabilizada de vários subsistemas
semióticos (sobretudo linguísticos, mas também paralinguísticos), permitindo agir
eficazmente numa classe bem definida de situações de comunicação” (SCHNEUWLY,
2004[1994], p. 25).
O enunciador, no momento da interação verbal, busca utilizar diferentes
artifícios para se fazer entender como: metáforas, linguagem gestual, informal,
entonação ou qualidade da voz etc. Logo, os instrumentos semióticos de mediação
encontram um elo de compreensão entre o projeto discursivo inicial daquele que
enuncia e o sentido no imaginário do interlocutor.
Nessa perspectiva, se para cada novo período de tempo é essencial que os
discursos sejam adequados em relação a sua importância e seu valor,
consequentemente nos deparamos com a necessidade de haver uma “revisão
substantiva dos métodos de ensino e à constituição de práticas que possibilitem ao
aluno ampliar sua competência discursiva na interlocução” (BRASIL, 1998, p. 23).
Entretanto, o que pudemos perceber que, em alguns materiais didáticos
utilizados para trabalhar como gênero discursivo poema, apesar de ser preciso
observar diversos recursos para analisar um texto poético, ainda existe uma
significativa preocupação com somente um dos recursos sendo priorizados: as
formalidades do jogo com as palavras, as figuras de linguagem, o imaginário, a
subjetividade, etc. E mesmo que os materiais didáticos estejam bem intencionados e
planejados, seguem teorias que, do ponto de vista bakhtiniano, não oferecem
compreensão efetiva do gênero em questão.
Uma vez tendo entrado em contato com trabalhos de vários
pesquisadores/professores, percebemos ser necessário refletirmos sobre nossas
práticas diárias com relação ao método de abordagem para a leitura e escrita do
poema. Vale frisar que não esperamos uma mudança em curto prazo, porém
62
pensamos que, ao estimular as crianças na leitura, escrita e entendimento de poemas,
estaremos colaborando para que elas possam ler, refletir e, imediatamente, produzir
sobre o que leram.
Dessa forma, portanto, apesar de exemplos da postura de professores leitores
empenhados a incitar a motivação à descoberta dos múltiplos sentidos, ao despertar
da consciência dos alunos para a ideologia e dialogismo nos poemas, dentre outros
fatores, a preocupação com a forma deve ser considerada somente para um plano
secundário, visto que outras são as competências necessárias para que os aprendizes
dominem o gênero discursivo poema com maestria.
Na próxima seção, veremos o mapeamento descritivo do Caderno. A
distribuição interna das oficinas, o levantamento das atividades recorrentes e o exame
do corpus.
63
CAPÍTULO 3
Mapeamento descritivo da proposta pedagógica do Caderno do Professor da
Olimpíada de Língua Portuguesa: Escrevendo o Futuro 2010
Neste capítulo, pretendemos descrever a sistematização das atividades do
Caderno Poetas da Escola exatamente como estão dispostas na elaboração das
autoras. Para isso, na primeira parte, refletiremos sobre o que poderia estar implícito
na ilustração da capa. Depois, veremos o aspecto físico. Mais adiante, em outra
seção, nosso olhar estará voltado para a disposição estrutural generalizada do
Caderno, em que em que a decomporemos em três blocos: uma parte preliminar, outra
com todas as oficinas e na última os critérios de avaliação e as referências. Em
seguida, resumiremos a distribuição interna dos ateliês.
A finalidade de descrição do capítulo consiste em uma síntese para que o
possível destinatário que não esteja familiarizado com o Caderno em versão original
tenha ao menos uma visão sintética e panorâmica da totalidade de onde será
recortada nossa amostra para a análise.
3.1 Refletindo sobre o que estaria dito na capa do Caderno: uma reflexão sobre a
imagem
Então se a criança muda a função de um
verbo, ele delira.
E pois.
Em poesia que é voz de poeta, que é a voz
de fazer nascimentos –
O verbo tem que pegar delírio.
Manoel de Barros
Para entendermos o processo de elaboração do Caderno Poetas da Escola,
serão necessárias algumas análises em seu conteúdo temático, entretanto para a
realização de uma leitura mais significativa deste Manual, antes, é necessário
refletirmos brevemente sobre a capa, pois ela tem a função de proteger e aumentar a
durabilidade de um livro e para, além disso, funciona como um convite a visitarmos o
interior dele.
64
Nesse sentido, tentamos compreender o enunciado em seu todo, conforme
Brait (2008) nos orienta,
Um enunciado verbo-visual e, portanto, imagens (cores, figuras, lugar que ocupam no espaço enunciativo etc.) e sequências verbais estão inteiramente articuladas, interatuantes, a partir de um projeto ‘gráfico’, de um projeto discursivo. Por essa razão, para efeito de análise e produção de sentidos, não podem ser ‘separadas’. (BRAIT, 2008, p. 72-73).
Além disso, temos ainda que pensar em outros efeitos informativos, porque são
esses diálogos feitos com o texto que esclarecerão muitas de nossas dúvidas. Nossa
observação deve ser voltada para a esfera de circulação, ao contexto social, ao tema,
aos destinatários, às relações entre diversos discursos e entre textos, aos agentes
que praticam a ação, ao formato e às cores das fontes, ao conjunto estabelecido pela
disposição dos tons, da iluminação, a valoração a respeito dos objetos, porque sem
esses critérios de leitura não poderíamos compreender o enunciado. Sendo assim,
vejamos a imagem da capa.
Figura 1 – Capa do Caderno do Professor
Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor:
orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010.
65
Dentro dos parâmetros de nossa interpretação, a primeira imagem que nos
chama a atenção é a do título Poetas da escola. A locução adjetiva “da escola” está
associada ao substantivo “poetas”, mas, uma análise separada desse termo nos
remete à noção das pessoas, com habilidade para escrever, dedicadas à escrita de
versos poéticos (poemas), isto é, ao trabalho de um artista independente de
escolarização formal.
A associação do termo “poetas” à expressão “da escola” por meio da contração
da preposição “de” + artigo definido “a”, entretanto, ressignifica o sentido do primeiro
termo restringindo esse poeta ao ambiente escolar nos esclarecendo que os alunos
serão apenas produtores de textos sem a obrigação de serem novos talentos
literários. Portanto, no título, a afirmação do discurso autoral do Caderno em que não
objetiva a busca de jovens talentos está em consonância com o papel da escola que
é o ensino-aprendizagem formal da leitura e da escrita.
Em seguida, temos a ilustração de uma menina-moça, semblante alegre,
inocente, com olhar adocicado e longos cílios como se quisesse ter acesso à visão
dos segredos guardados no infinito. A imagem é composta por linhas suaves e
onduladas o que poderia ser o reflexo de um estado de espírito espontâneo. Como
uma linha descreve a história do movimento de um ponto, os círculos e os semicírculos
sugerem a continuidade, a velocidade, a agilidade, o mistério, e, novamente, a
infinitude.
Sendo assim, há indícios dessas características no cabelo, o que poderia
indicar a fluidez da imaginação humana, nas ondas coloridas de toda a extensão da
capa e nas folhas do livro que estão unidas ao alinhamento da saia conferindo uma
ambivalência, pois um mesmo elemento é visto com duas funções, isto é, a
representação de uma saia e de uma mesa.
De fato, a roupa da menina aguça nossa imaginação, pois na blusa temos mais
linhas arredondadas e a própria saia tem formato circular, mas com arabescos cujas
características pertencem à cultura islâmica. Para os mulçumanos, essas formas
geométricas têm uma importância para além da materialidade e do mundo perceptível,
porque elas representam a natureza infinita criada por Deus. Tais símbolos nos
lembram a evasão romântica, na qual eram empregados elementos exóticos para
compor a idealização da realidade.
Ainda sobre a linha, vale ressaltar, que não há o traçado da superfície do solo,
mas, se o homem na vida real tem a necessidade inerente de equilíbrio tanto físico
66
como psicológico e, por isso, os pés dele devem estar firmados na terra, por conta
dos efeitos da gravidade, a imagem da jovem saltitando com os pés no ar, induz-nos
ao pensamento de que ela está alheia ao que se passa ao seu redor, mais uma vez
tal suposição está em acordo, portanto, com a expressão reflexiva e tranquila do rosto.
Na capa, é possível vermos ainda a diferenciação dos tons sendo divididos por
linhas. Na vida real, por meio deles, podemos ver profundidade ou superficialidade,
escuridão ou claridade, por isso a tonalidade está relacionada à nossa sobrevivência.
Os tons justapostos uns sobre outros têm a finalidade de representar os espaços
escuros ou claros para que possamos visualizar a dimensão dos objetos e a totalidade
do ambiente. Nesse sentido, o Caderno apresenta mescla tonal demonstrando ilusão
de ótica com cores claras e escuras representando espaços profundos ou superficiais
revelando, além das dimensões ilustrativas por todo o Manual, também, a ênfase do
discurso autoral no interior do Caderno, quando destaca mais alguns aspectos que
outros.
As cores estão ligadas às nossas reações emocionais e dependem da
valoração individual de cada um, já que nossas lembranças são particulares, mas isso
se pensarmos de forma descompromissada. Contudo, substâncias coloridas são
utilizadas por comunicadores visuais impregnadas de informação.
No Caderno, as cores predominantes são o azul, cor primária significando
serenidade na representação do céu estrelado. A cor laranja classificada como
secundária e com carga semântica de entusiasmo ou alegria sugere, talvez, o amor.
Na logomarca da OLPEF temos o verde que está associado à esperança. Vale
frisar, que tais cores aparecem, desde a capa e ao longo do Caderno com variados
matizes. Nossa inferência nos leva ao seguinte pensamento: o azul transmite uma
conotação de céu estrelado, pois há nele pequenas marcas brancas. O laranja teria a
intenção de incentivar os alunos à produção de poemas. O verde, para a criança mais
observadora, poderia demonstrar a esperança de competir na Olimpíada com chance
de chegar à final do campeonato.
As cores, as tonalidades, as formas geométricas apresentadas na capa se
estendem por toda a extensão do Caderno. Logo, nossas observações nos induzem
ao pensamento de que há nas imagens características do Romantismo. Percebemos:
aspectos delicados de todo o corpo da menina indicando, talvez, que ela seja uma
sonhadora em busca de desvendar mistérios ainda não revelados e formas
geométricas exóticas simbolizando a fuga da realidade, pois em Bakhtin/Volochinov
67
(2010[1929]) “Todo fenômeno que funciona como signo ideológico tem uma
encarnação material, seja como som, como massa física, como cor, como movimento
do corpo ou como outra coisa qualquer [...] Um signo é um fenômeno do mundo
exterior” (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2010[1929], p. 31).
Diante disso, rememoramos as palavras de Padilha (2005) ao afirmar que os
meninos sentem aversão em relação ao poema, pois em suas visões este é “coisa de
mulher” (PADILHA, 2005, p. 10). Entretanto, eles comentam suas habilidades e o
prazer que sentem quando compõem letras de canção. De acordo com a
pesquisadora, o que os meninos ainda não perceberam é que as palavras em suas
letras tornam-se apenas elementos musicais, pois já estão carregados de poesia
antes mesmo de serem cantadas. Logo, embora o aspecto físico e as imagens –
diagramação – do Caderno sejam de excelente qualidade, os meninos poderiam ver
nesse material uma propriedade feminina para o trabalho com os poemas e não se
sentirem motivados à aprendizagem.
De acordo com Choppin (2004), o livro didático exerce quatro funções variáveis
conforme “o ambiente sociocultural, a época, as disciplinas, os níveis de ensino, os
métodos e as formas de utilização” (CHOPPIN, 2004, p. 553). Uma delas:
Função ideológica e cultural: é a função mais antiga. A partir do século XIX, com a constituição dos estados nacionais e com o desenvolvimento, nesse contexto, dos principais sistemas educativos, o livro didático se afirmou como um dos vetores essenciais da língua, da cultura e dos valores das classes dirigentes. Instrumento privilegiado de construção de identidade, geralmente ele é reconhecido, assim como a moeda e a bandeira, como um símbolo da soberania nacional e, nesse sentido, assume um importante papel político. Essa função, que tende a aculturar – e, em certos casos, a doutrinar – as jovens gerações, pode se exercer de maneira explícita, até mesmo sistemática e ostensiva, ou, ainda, de maneira dissimulada, sub-reptícia, implícita, mas não menos eficaz. (CHOPPIN, 2004, p. 553).
Se uma das funções do livro didático é transmitir culturas e ideologias, já que
as palavras e, como já vimos, as imagens, também são veículos condutores de ideias,
poderíamos pensar que a ilustração da capa não motivaria os meninos a aprenderem
a ler ou a escrever o poema. Talvez, se olhássemos com um olhar mais reflexivo
perceberíamos que a figura feminina estampada na capa transmite à percepção
masculina de que algo inerente ao gênero poema espelha um alerta, por exemplo, de
que esse gênero literário não é direcionado aos homens.
68
Por outro lado, portanto, se em uma obra de arte são instigadas as capacidades
cognitivas, imaginativas, afetivas e emocionais do aluno por meio da estética, temas
transversais poderiam ser tratados nela como a Pluralidade Cultural e a Orientação
Sexual, abordando as diferenças com a finalidade de ajudar a construir conceitos e
formar a opinião singular de cada aluno. As imagens constitutivas da capa do OLPEF,
também trazem inúmeras possibilidades de interpretações para quem as observa.
Portanto, de acordo com nossa leitura, pensamos que tais imagens, cores, formas etc.
deveriam estar aliadas aos temas contemporâneos que norteiam as experiências dos
alunos e como isso poderia influenciar a atuação deles em cenários reais.
Logo, se queremos formar leitores críticos e proficientes em muitos e diferentes
gêneros, temos de pensar primordialmente que as configurações humanas devem ser
representadas nos enunciados, contudo é imprescindível a interpretação e reflexão,
entre professor e aluno, em seu aspecto tanto verbal como visual.
3.2 Breve comentário sobre o aspecto físico do material da OLPEF
O kit disponibilizado para cada escola é um conjunto de materiais muito bem
elaborado no aspecto físico, bem como de excelente qualidade gráfica, portanto, um
material com preço elevado. A capa do Caderno do Professor e da Coletânea de
Poemas dos alunos é produzida com papel Triplex de 300 gramas, com um
acabamento especial chamado de Laminação BOPP Fosca – um modo de
plastificação – com a finalidade de agregar maior durabilidade, já que seria
manuseado por várias pessoas. Além disso, as folhas em contato com a superfície de
outros materiais não perderia a qualidade da imagem ou das cores.
A parte interna do caderno, chamada pelos gráficos de miolo, é produzida com
papel sulfite normal (o conhecemos como papel A4) usado na impressora de nossa
casa, mas a resma que compramos usualmente tem uma gramatura de 75 g/m²
(setenta e cinco gramas por metro quadrado), e o papel utilizado no caderno tem 90
g/m², ou seja, ele é um pouco mais espesso que o papel A4 convencional em que
imprimimos os nossos trabalhos no dia-a-dia. O Caderno do Professor tem o
acabamento final das folhas unidas por cola e na Coletânea dos alunos elas são
grampeadas.
A caixa que acomoda a Coleção também é feita com papel Triplex de 300
gramas, com acabamento Laminação BOPP Fosca. O corte arredondado das bordas
69
é feito com uma ferramenta especial, para um acabamento diferenciado. As dobras
do kit são coladas com uma cola quente especial, pois, como o material possui
laminação, uma cola normal não o fixaria.
As dimensões físicas e a arte final da coleção não dependem da gráfica, são
definidas por seus organizadores. Devemos elogiar, portanto, aos idealizadores de
todo esse trabalho, por todos os aspectos acima citados, pois são de excelente
qualidade. Mas um questionamento nos perturba: seria também o conteúdo desse
material didático tão relevante para a melhoria da qualidade do ensino de leitura e
escrita do gênero discursivo poema? No próximo capitulo trataremos dessa questão.
3.3 Organização preliminar do Caderno
A organização do Poetas da Escola está colocada da seguinte forma: uma carta
de boas-vindas, da equipe da OLPEF, direcionada ao professor, na qual se explica
que se trata de um concurso utilizado como ferramenta de trabalho para o ensino e a
aprendizagem de gêneros textuais via sequência didática, em seguida, há uma
apresentação da Coleção da Olimpíada.
3.3.1 Carta ao Professor
Esta define o que é a Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro e
traz diretrizes para as escolas e os professores trabalharem o material com seus
alunos. Enumera os componentes da parceria envolvidos no Programa, a saber, o
MEC, a Fundação Itaú Social e o CENPEC. Apresenta seu “objetivo em comum:
proporcionar ensino de qualidade para todos” (ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p.
03), por meio da metodologia do Programa Escrevendo o Futuro e utilizando o método
de sequência didática para ensinar o gênero textual poema. Informa o tema da
produção de texto “O lugar onde vivo” e conta com a participação dos professores,
dos diretores, dos pais e da comunidade onde está situada a escola. A 2ª edição foi
desenvolvida em torno de quatro gêneros:
70
Poema – 5º e 6º anos do Ensino Fundamental.
Memórias literárias – 7º e 8º anos do Ensino Fundamental.
Crônica – 9º ano do Ensino Fundamental e 1º ano do Ensino Médio.
Artigo de opinião – 2º e 3º anos do Ensino Médio.
Mas, apesar do público alvo ser grande, a equipe OLPEF deixa claro que não
está em busca de talentos e sim de “cidadãos mais bem preparados”
(ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 03), visto que ao final do Concurso os alunos
seriam mais competentes no gênero trabalhado.
3.3.2 Apresentação da Coleção
Após o processo de confecção, são distribuídas nas escolas públicas
brasileiras a Coleção da Olimpíada de Língua Portuguesa: Escrevendo o Futuro
contendo uma pasta, e nela há um Caderno do Professor, dez exemplares da
Coletânea de Textos e um CD-ROM, materiais auxiliares para o professor no ensino-
aprendizagem da leitura e da produção do gênero poema. A Coleção é composta de
quatro pastas, mas cada uma delas preparada para um gênero textual, e destinadas
aos alunos desde o 5° ano do Ensino Fundamental até o 3° ano do Ensino Médio.
Figura 2 – Capa dos cadernos do professor
Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010.
Memórias Literárias
9° - E.F. e 1° E.M.
Poemas
5° e 6° - E.F.
Memórias Literárias
7° e 8° - E.F.
Artigo de Opinião
2° e 3° - E.M.
71
O Caderno do Professor consiste em um material para auxiliar o professor no
plano e desenvolvimento das aulas. O Manual contém uma sequência didática,
dividida em oficinas dedicadas ao ensino de gêneros diferentes, como: o Poema, as
Memórias Literárias, a Crônica e o Artigo de Opinião.
Em cada pasta há os seguintes componentes: 01 Caderno do Professor, 10
exemplares da Coletânea de textos e 01 CD-ROM.
Figura 3 – Composição da pasta da Coleção Poetas da Escola
Coletânea de Textos Caderno do Professor CD-ROM
Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010.
Os textos explorados nas oficinas podem ser vistos pelos alunos na Coletânea
e/ou no CD-ROM. As orientações para a produção textual dos alunos estão dispostas
no Caderno do Professor, um material de apoio elaborado a partir de uma sequência
didática. Tais atividades devem ser utilizadas no planejamento e realização das aulas.
Entretanto, nosso material a ser investigado serão alguns aspectos, sobre
leitura e produção do poema, no Caderno Poetas da Escola, elaborado para o
tratamento desse gênero literário.
3.3.3 A proposta do Caderno apresentada ao Professor
A apresentação dos Cadernos é feita por Joaquim Dolz, um dos pesquisadores
que, ao lado de Jean Paul Bronckart, Bernard Schneuwly e outros estudiosos
pertencem à chamada Escola de Genebra. Seus trabalhos influenciam fortemente a
educação brasileira, incluindo a elaboração dos Parâmetros Curriculares Nacionais
72
(PCN). As explicações a respeito de Dolz resumem-se a alguns dados da vida e das
atividades profissionais do pesquisador.
No prefácio de Joaquim Dolz, há uma explicação inicial referente à idealização
referenciando os jogos olímpicos com a Olimpíada de Língua Portuguesa, isto é, a
“igualdade social e democratização da atividade desportiva” (DOLZ, 2010, p. 09). Por
conta das dificuldades do ensino e de leitura no Brasil, a equipe da Olimpíada
organizou um programa que tenciona ir de encontro ao problema da leitura e escrita
brasileira tendo três objetivos:
Primeiro, busca-se uma democratização dos usos da língua portuguesa, perseguindo reduzir o “iletrismo” e o fracasso escolar. Segundo, procura-se contribuir para melhorar o ensino da leitura e da escrita, fornecendo aos professores material e ferramentas, como a sequência didática – proposta nos Cadernos –, que tenho o prazer de apresentar. Terceiro, deseja-se contribuir direta e indiretamente para a formação docente. (ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 09).
Nesse sentido, conforme Dolz (2010) “Ler e escrever: prioridades da escola”
(DOLZ, 2010, p. 10), a educação formal deve estar preocupada com uma educação
cidadã que ultrapasse os limites das habilidades em decifrar os códigos linguísticos
para a leitura e escrita. Tem como função, portanto, levar o aluno à compreensão e
produção de textos, os quais fazem parte das atividades diárias dos indivíduos, porém
isso implica a mobilização das capacidades de linguagem, para um efetivo
entendimento e maior participação das instâncias sociais, culturais e psicológicas.
Assim, no âmbito social, é imprescindível o domínio de diversos gêneros para
a democratização das produções culturais. Em nível psicológico, é necessário que o
aluno desenvolva diferentes estratégias de leitura para que se torne um leitor
autônomo. Dessa forma, o aluno, no que diz respeito à cognição, estudando e
aprendendo sozinho, selecionando conforme sua afetividade os textos a serem lidos
e
Finalmente, permite desenvolver a capacidade verbal, melhorando o conhecimento da língua e do vocabulário e possibilitando observar como os textos se adaptam às situações de comunicação, como eles se organizam e quais as formas de expressão que os caracterizam. (DOLZ, 2010, p. 10).
73
Nessa perspectiva, portanto, o papel do professor é induzir o aluno à aquisição
de estratégias para a compreensão e apropriação da cultura. Além de decifrar os
códigos da língua, o aluno precisa:
Aprender a relacionar, hierarquizar e articular essas informações com a situação de comunicação e com o conhecimento que ele possui, a ler nas entrelinhas o que o texto pressupõe, sem o dizer explicitamente e a organizar todas as informações para dar-lhes um sentido geral. (DOLZ, 2010, p. 10-11).
Para que o aluno organize as informações no momento da leitura, precisa
receber instruções das ferramentas características do gênero, pois “precisa aprender
a tomar certos distanciamentos dos textos para interpretá-los criticamente e ser capaz
de identificar suas características e finalidades” (DOLZ, 2010, p. 11).
Conforme a equipe da OLPEF, se a pretensão primordial do programa é
incentivar a escrita, já que um indivíduo que não domina as habilidades dessa
modalidade em diferentes gêneros, seguramente, dependerá de pessoas que saibam
produzir textos. Além disso, há também a questão de que a vida profissional desse
sujeito poderá ser afetada.
Nesse sentido, precisamos lançar mão de armas estratégicas, para vencermos
o inimigo da incompetência para a escrita no ensino-aprendizagem da língua materna
abrangendo as dimensões constitutivas do homem.
A primeira instância a ser observada pela OLPEF são os campos da sociedade
e os textos que circulam nela. Significa dizer que a relevância está em “trabalharmos
os usos e as normas dela [da língua], bem como sua adaptação às situações de
comunicação” (DOLZ, 2010, p.11).
Percebemos na citação acima, a preocupação com o aprendizado da estrutura
do texto, a norma padrão linguística e a função à qual o texto está destinado.
Pensamos, sobre esse aspecto, que ainda faltam pontos a serem trabalhados ou, no
mínimo, a hierarquia de análise deveria ser invertida.
O Caderno apresenta outros mecanismos para o âmbito psicológico, ou seja, Preparar-se para escrever pressupõe ler, fazer registros pessoais, selecionar informações... atividades cognitivas, todas elas. Mas escrever é também um auxílio para a reflexão, um suporte externo para memorizar e uma forma de regular comportamentos humanos. (DOLZ, 2010, p.12).
74
Salientamos, nesse item, a importância da reflexão em torno de nosso objeto,
como prioridade, pois é evidente que primeiramente pensamos sobre acontecimentos
observados ao nosso redor, depois buscamos informações armazenadas em nosso
“mapa mental” e somente, em seguida, é que usamos a tecnologia da escrita para os
registros.
Finalmente, na dimensão da linguagem, diz o Caderno que precisamos
considerar:
[...] a situação de produção do texto, isto é, quem escreve, qual é o seu papel social (jornalista, professor, pai); para quem escreve, qual é o papel social de quem vai ler, em que instituição social o texto vai ser produzido e vai circular (na escola, em esferas jornalísticas, científicas, outras); qual é o efeito que o autor do texto quer produzir sobre seu destinatário (convencê-lo de alguma coisa, fazê-lo ter conhecimento de algum fato atual ou de algum acontecimento passado, diverti-lo, esclarecê-lo, sobre algum tema considerado difícil); planificar a organização do texto e utilizar os mecanismos linguísticos que asseguram a arquitetura textual: a conexão e a segmentação entre suas parte, a coesão das unidades linguísticas que contribuem para que haja uma unidade coerente em função da situação de comunicação. Esses aspectos de textualização dependem, em grande parte, do gênero do texto”. (DOLZ, 2010, p. 12).
Sobre essa última afirmação do Caderno acerca das estratégias para o
aprendizado da escrita, parece-nos que mais uma vez os aspectos formais ou
estruturais do sistema da língua são privilegiados. Entretanto, preferimos o conceito
de arquitetônica bakhtiniano ao de arquitetura colocado pela equipe OLPEF. Pois, no
primeiro, os objetos devidamente valorados pelo homem é que estruturam o gênero e
a forma e o conteúdo não se divide a partir desse ponto de partida, podemos
selecionar os meios linguísticos, os quais serão utilizados. Por fim, Dolz (2010)
ressalta que se considerarmos o ato de escrever como um processo e não como
produto é necessário observarmos “as atividades de revisão, de releitura e de
reescrita, que são necessárias para chegarmos ao resultado final” (DOLZ, 2010, p.
12).
Depois, como consideramos a análise discursiva dialógica da reflexão
bakhtiniana, pensamos que o termo “efeito” no singular estaria incompleto, pois os
efeitos produzidos por uma materialidade linguística, em contexto real de
comunicação, dependem do que poderia vir a ser. Além de observarmos a fonética,
inferirmos significados nas palavras ou nas expressões, pensamos que as relações
75
dialógicas nos levariam a outros e novos diferentes modos de vida, pois os sentidos
estão situados nas interações reais, posto que nesses relacionamentos interativos
mais imediatos, bem como nos desenvolvidos no contexto mais amplo, é que
modificamos a nós mesmos e aos outros.
Por fim, Dolz (2010) ressalta que se considerarmos o ato de escrever como um
processo e não como produto é necessário observarmos “as atividades de revisão, de
releitura e de reescrita, que são necessárias para chegarmos ao resultado final”
(DOLZ, 2010, p. 12).
Tudo isso se resume em um “real desafio do ensino da produção escrita”
(DOLZ, p. 13), conforme a Olimpíada, nessa perspectiva é lançada, portanto, a
proposta de ensino segundo os passos da sequência didática, pois os organizadores
afirmam ser esse o caminho mais viável para um processo de ensino mais abrangente.
3.3.4 Organização interna do Caderno do Professor
O Manual está organizado em 15 oficinas, sendo que cada uma delas
apresenta os objetivos e uma “nota” intitulada “Prepare-se!”, que dialogam e instruem
o professor tanto sobre o desenvolvimento das aulas como os conteúdos.
Abaixo, podemos observar o sumário enumerando as divisões das oficinas,
como estão colocadas no Caderno, com seus respectivos títulos.
Figura 4 – Sumário do Caderno do Professor
Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 06-07.
76
Após a capa, portanto, a estrutura do Caderno está delineada em uma carta de
boas-vindas ao professor, uma descrição da Coleção da Olimpíada, um convite para
que o professor se inscreva no Concurso, o sumário, a apresentação e o prefácio de
Joaquim Dolz informando que o Programa tem na sequência didática uma ferramenta
de ensino e de aprendizagem de textos para conter a falta de letramento.
Na introdução, a equipe do Caderno apresenta o poema “Convite” de José
Paulo Paes, esclarecendo que o poema é apenas um dos muitos gêneros poéticos e
podem ser apresentados de diversas formas e que, além disso, é uma brincadeira em
que são utilizadas as palavras. Salientamos que, desde o início, a formalidade é o
foco principal do ensino no Caderno. Vejamos:
Figura 5 – Poema “Convite”
Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 17.
77
O poema é criado como se fosse um jogo de palavras. Ele motiva o leitor a descobrir não apenas a leitura corrente, mas também a buscar outras leituras possíveis. E como o poeta faz isso? Ora... com as palavras e com tudo o que se pode fazer com elas. O poeta busca mostrar o mundo de um jeito novo, com a intenção de sensibilizar, convencer, fazer pensar ou divertir os leitores. Ele sugere associações entre palavras, seja pela posição que ocupam no poema, seja pela sonoridade, seja por meio de outros recursos. (ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 18).
A defesa do Caderno é que a originalidade e inovação da palavra poética está
relacionada a partir das formas linguísticas e de seus (re)arranjos, estes dizem
respeito aos movimentos internos no texto poético, mas em nossa perspectiva
enunciativo-discursiva consta como relações dialógicas internas, as quais foram
desprezadas neste Material. O Caderno afirma, ainda, que em contato com tais jogos
de palavras podem surgir, no aluno, o interesse por outros poemas.
O Material define o poeta como o “artista que usa as palavras para fazer uma
obra de arte – o poema” (ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 20). Compreendemos
que essa convicção nos incita a pensar que todo o processo criativo do gênero
discursivo poema é condensado ao elemento combinatório de palavras por parte do
artista, bem como dos fatores surpresa e/ou comoção gerados no leitor, visto que o
poema seria, apenas, uma atividade de “recriação mecânica de palavras”.
A seguir, diz o Caderno (2010), que por meio das atividades propostas, a
intenção é que o aluno atinja a proficiência na linguagem e nas palavras para se
comunicar e se expressar. Mas o caminho para se encontrar os sentidos no poema é
a técnica do poeta, esta adquirida somente em anos de experiência de trabalho do
artífice e na habilidade do aluno em repetir as combinações de palavras. Entretanto,
em nosso cotidiano, em nossa realidade, o que faríamos com a arte de declamações
precisas e vazias de reflexões acerca dos objetos implícitos do texto?
Em seguida, o Caderno cita o trabalho Palavras de encantamento de Marisa
Lajolo, para definir poeta como alguém que “brinca com as palavras” (ALTENFELDER;
ARMELIN, 2010, p. 21), diz também que “poema é um jogo com a linguagem.
Compõe-se de palavras [...]. Além de diferentes pela sonoridade e pela disposição na
página, os poemas representam uma maneira original de ver o mundo, de dizer coisas
[...]” (ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 21). E o trabalho do poeta é utilizar
palavras, descrevendo elementos emocionais, da natureza, da vida etc., inventando
poesia.
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Finalmente, com uma citação de Versos, sons, ritmos de Norma Goldstein, a
diferenciação entre poema e poesia consiste em que a ‘poesia está presente no
poema, assim como em outras obras de arte que, como o poema, convidam o
leitor/espectador/ouvinte a retornar à obra mais de uma vez, desvendando as pistas
que ela apresenta para a interpretação de seus sentidos’ (GOLDSTEIN, 2006, apud
ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 22).
Figura 6 – Poema ou poesia?
Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 22.
Há, de fato, uma distinção entre esses dois conceitos, porque a poesia é vista
como uma abstração, algo em que não podemos tocar, mas que representa estados
e sentimentos da essência humana, em grande medida, por meio de imagens. No
caso do poema consiste em um texto “‘marcado por recursos sonoros e rítmicos [...]
permite outras leituras, além da linear’, pois sua organização sugere ao leitor a
associação de palavras ou expressões ‘posicionadas estrategicamente no texto’”
(GOLDSTEIN, 2006, apud ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 22). Nessa
circunstância, a definição é concreta, corresponde simplesmente ao produto
elaborado, definitivamente à obra de arte.
Quanto ao período de tempo necessário para o desenvolvimento das oficinas
o Caderno, diz ser necessário de uma a quatro aulas para cada ateliê e que é preciso
planejamento para cumprir o “Cronograma de atividades” que deverá permanecer na
sala de aula.
79
3.4 Distribuição interna das oficinas
A quadra é um vaso de flores que o Povo põe à janela da sua alma
Fernando Pessoa
O manual do professor contém 15 oficinas cujas temáticas e cujos objetivos
apontam para a relação de aproximação correspondente entre a estruturação da
sequência didática para o ensino-aprendizagem do gênero poema e o procedimento
“sequência didática” previsto pelo modelo didático de gênero da Escola Didática de
Genebra. Ressaltamos, porém, que a proposta de ensino parte dos princípios do
procedimento didático, por isso, o aparecimento de um passo a mais, como é o caso
da oficina 15, preferimos denominar de divulgação por não se encaixar no passo a
passo previsto no modelo.
Apresentaremos, em seguida, no quadro 4, os objetivos das 15 oficinas no
Caderno Poetas da Escola, referentes à proposta pedagógica que visa proporcionar
o ensino de qualidade, formando o aluno em leitor e escritor literário, no que diz
respeito ao gênero literário poema.
Quadro 4 – Objetivos das Oficinas
Oficina Páginas
Título da Oficina Objetivos das Oficinas
01
24 a 29
Memória de versos e mural de poemas
Resgatar e valorizar a cultura da comunidade;
Avaliar e ampliar o repertório de poemas conhecidos pelos alunos;
Reconhecer os poemas em suas diversas formas.
02
30 a 37
O que faz um poema Conhecer e sistematizar informações sobre as características de um poema: versos, estrofes, ritmos, rima, repetição.
03
38 a 41
Primeiro ensaio
Apresentar a situação de produção;
Escrever um primeiro poema para avaliar o conhecimento dos alunos.
04
42 a 47
Dizer poemas Conhecer alguns poetas consagrados da literatura brasileira;
Descobrir a importância de ouvir e de dizer poemas.
05
48 a 63
Toda rima combina? Reconhecer rimas em poemas;
Conhecer as diferentes combinações de rimas;
Produzir poemas com rimas.
06
64 a 67
Sentido próprio e figurado
Apresentar os conceitos de denotação e conotação;
Delimitar o texto poético.
80
07
68 a 79
Comparação, metáfora, personificação
Identificar e usar as figuras de linguagem.
08
80 a 87
Sonoridade na poesia Investigar as relações entre som e sentido na poesia;
Observar a expressividade das repetições de palavras ou da mesma consoante;
Escrever textos com repetições.
09
88 a 99
Poetas do povo
Trabalhar com o poema popular;
Perceber a importância do ritmo no poema;
Escrever versos observando rima e ritmo.
10
100 a 109
O lugar onde vivo Estudar poemas de diferentes autores sobre a terra natal;
Resgatar observações, conhecimentos e sentimentos dos alunos sobre o lugar onde vivem.
11
110 a 117
Um novo olhar Possibilitar um olhar novo e original sobre o lugar onde os alunos vivem.
12
118 a 123
Nosso poema Produzir um texto coletivo sobre o local onde vivem os alunos.
13
124 a 129
Virando poeta Escrever um poema individualmente sobre o tema “O lugar onde vivo”.
14
130 a 135
Retoque final Aprimorar os poemas produzidos.
15
136 a 139
Exposição ao público
Organizar um sarau para a apresentação dos poemas;
Selecionar três poemas que serão enviados para a Comissão Julgadora da escola.
Fonte: Organizado e adaptado pela autora/2013, de ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. (2010).
Conforme o quadro acima e o próprio esclarecimento da equipe OLPEF,
pudemos observar que cada oficina foi organizada para cumprir os objetivos da
Olimpíada, de três formas distintas. Em primeiro lugar, busca atingir uma
democratização dos usos da língua portuguesa, com o propósito de reduzir o fracasso
escolar. O segundo objetivo busca cooperar para melhoria do ensino da leitura e
escrita, para que os professores tenham ferramentas adequadas em sala de aula para
isso. E o terceiro demonstra a intenção da OLPEF na contribuição direta e indireta
para a formação adequada do professor.
O quadro 5 apresenta a organização interna de cada uma das 15 oficinas, de
como elas foram organizadas, para que o professor possa planejar e conduzir suas
aulas, bem como os materiais necessários para cumprir os objetivos de cada tarefa.
81
Para isso, cada oficina foi dividida em seções, e cada uma delas contém: os
“Objetivos” específicos da oficina; um quadro denominado “Prepare-se!” com algumas
orientações de cada tarefa; um quadro “Material” com a lista de materiais e
ferramentas necessárias para o desempenho da oficina em sala de aula e as “Etapas”
da oficina, que variam de 1 até 4 etapas, dependendo da complexidade do tema
abordado. Além disso, algumas oficinas possuem boxes exclusivos, com poemas,
alertas e informações adicionais ao professor.
Quadro 5 – Organização Interna das Oficinas
Oficinas Organização interna das oficinas
Oficina 01 Memória de versos e mural de poemas
0bjetivos Prepare-se Material 1ª etapa: Memória de versos dos alunos Atividades 2ª etapa: Memória de versos da comunidade Atividades 3ª etapa: Um mural caprichado Atividades Boxe explicativo (sugestivo): Há palavras que o vento não leva.
Oficina 02 O que faz um poema
0bjetivo Prepare-se Material 1ª etapa: Leitura do mural Atividades 2ª etapa: Sistematização das observações Atividades Boxe (de advertência): Atenção Poema (texto): Tem tudo a ver Boxe: A importância de participar Boxe: Paralelismo sintático (seção de conteúdo?)
Oficina 03 Primeiro ensaio
0bjetivos Prepare-se Primeiro poema Atividades Boxe: Primeira escrita Boxe: Atenção
Oficina 04 Dizer poemas
0bjetivos Prepare-se Material Atividades Orientação para o trabalho com leitura de poemas Boxe: Buscando sentido
Oficina 05 Toda rima combina?
0bjetivos Prepare-se Material 1ª etapa: Rimas e quadras Atividades Boxe: Rimas e Versos Atividades
82
2ª etapa: Onde estão as rimas? Atividades Boxe: Fique rima com pique 3ª etapa: Mais quadras Atividades Quadras ao gosto popular 4ª etapa: Qual o papel das rimas? Atividades Boxe: Poema Boxe: Rimas externas e internas Atividades Boxe: Estratégia de leitura Boxe: Sobre “Duas dúzias de coisinhas à toa que deixam a gente feliz”
Oficina 06 Sentido próprio e figurado
0bjetivos Prepare-se Material 1ª etapa: Sentido próprio, ou denotação, e sentido figurado, ou conotação Atividades Boxe: Poema Boxe: Alguns sentidos 2ª etapa: Qual o sentido? Atividades 3ª etapa: Definições poéticas Atividades
Oficina 07 Comparação, metáfora, personificação
0bjetivo Prepare-se Material 1ª etapa: Recursos que aproximam dois termos Atividades 2ª etapa: Personificação Atividades 3ª etapa: Estabelecer comparações Atividades 4ª etapa: Transformar comparações em metáforas
Oficina 08 Sonoridade na poesia
0bjetivos Prepare-se Material 1ª etapa: Som e sentido Atividades Aliteração Ritmo irregular 2ª etapa: Trava-línguas Atividades
Oficina 09 Poetas do povo
0bjetivos Prepare-se Material 1ª etapa: O varal de cordel Atividades Boxe: Poema 2ª etapa: Quadrinhas divertidas Boxe: Poema Atividades
Oficina 10 O lugar onde vivo
0bjetivos Prepare-se Material
83
1ª etapa: O lugar onde o poeta vive Atividades Boxe: Poema Atividades Uma análise aprimorada Boxe: Poema Sobre “Cidadezinha” 2ª etapa: Temas semelhantes, recursos parecidos Atividades Recursos expressivos
Oficina 11 Um novo olhar
0bjetivo Prepare-se Material 1ª etapa: A observação dos pequenos detalhes Atividades A matéria-prima da poesia 2ª etapa: Uma viagem imaginária Atividades
Oficina 12 Nosso poema
0bjetivo Prepare-se Material 1ª etapa: Um passeio pelas oficinas Atividades 2ª etapa: O poema coletivo Atividades
Oficina 13 Virando poeta
0bjetivo Prepare-se Material 1ª etapa: A análise Atividades 2ª etapa: A produção Atividades Afinando um pouco mais o olhar
Oficina 14 Retoque final
0bjetivo Prepare-se Material 1ª etapa: A primeira produção Atividades 2ª etapa: Passando a limpo Atividades Boxe: Atenção
Oficina 15 Exposição ao público
0bjetivos Prepare-se Material 1ª etapa: Escolha de textos e ensaio de apresentação Atividades 2ª etapa: Arrume “a casa” para o sarau Atividades 3ª etapa: Seleção interna Critérios de avaliação para o gênero poema Boxe: Poema
Fonte: Organizado e adaptado pela autora/2013, de ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. (2010).
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A partir do quadro 5, podemos agora explicar, por meio de uma visão geral e
resumida, as etapas internas de cada uma das 15 oficinas e entender como se deu a
elaboração dessa sequência didática por parte de seus autores.
Na oficina de número 1, intitulada “Memórias de versos e mural de poemas”,
visa-se à consideração da cultura do aluno, ativação do conhecimento e, também, o
reconhecimento de formas de poemas. Essa oficina está dividida em três etapas de
atividades. Na primeira etapa, é levantado o conhecimento prévio sobre poemas, para
realizar um diagnóstico, no sentido em que talvez haja apreciação ou não do gênero
e o que motivou tal gosto e, também, uma identificação dos elementos formais: ritmo,
rima e forma com o intento de diagnosticar pontos a serem trabalhados.
Na 2ª etapa, “Memórias de versos da comunidade”, a entrevista consiste na
estratégia de ensino e o foco é alimentação temática. Os alunos precisam conversar
com os parentes e a comunidade para coletar dados a respeito de poetas clássicos
ou contemporâneos e usá-los na alimentação temática. Finalmente, fixá-los no mural.
Na 3ª fase, “Um mural caprichado”, há uma sugestão para que professor e alunos
construam um mural e registrem todas as produções feitas pelos alunos. Essa tarefa
objetiva leituras futuras.
“O que faz um poema” intitula a oficina 2. Nela, há uma leitura do mural e
discussão convergindo em torno do conteúdo temático e da forma composicional do
poema, bem como avaliação oral baseada na forma. Na 2ª etapa “Sistematização das
observações”, há um momento interativo, leitura ou audição de “Tem tudo a ver”,
exposição em Datashow, localização de palavras ou repetição de versos, informação
dos conteúdos a serem trabalhados, definição da poesia e cópia das conclusões dos
alunos no caderno.
A oficina 3, “Primeiro Ensaio”, não está dividida em etapas. Tem o intuito de
fazer com que os alunos produzam o primeiro texto tematizando “O lugar onde vivo”,
que servirá de diagnóstico ao professor, para as devidas intervenções. Além, disso
motiva a participação no concurso.
A Oficina 4, “Dizer Poemas”, também não está dividida em etapas. Assim, seus
objetivos são: leitura, audição e tomada de conhecimento de poetas e poemas, ambos
consagrados. A leitura e audição são centralizadas nas formalidades linguísticas
como: “recursos sonoros e ritmo dos textos” (ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 44).
Há, também, incentivo aos questionamentos do professor quanto aos conteúdos
temáticos e as impressões despertadas no aluno ou mesmo perguntas como “o que o
85
autor quis exprimir” (ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 47). Todavia, pensamos que
dentro do projeto discursivo do autor foi dito o que ele planejou, isto é, o acabamento
escolhido por ele. Cabe, ao leitor – o aluno – refazer esse acabamento, conforme o
meio social em que ele mesmo vive e da individualidade dele – já estabelecida,
também, na sociedade. Uma outra preocupação são os sentidos localizados nas
próprias palavras do texto.
O ponto principal da oficina 5 “Toda rima combina?” é reconhecimento de rimas
simples e populares, por exemplo, a quadrinha. A professora é orientada a escrever
uma quadra incompleta, na lousa, e solicitar dos alunos uma rima para completá-lo.
Para a construção do poema as rimas devem ser encontradas no dicionário.
Entretanto, para Bakhtin/Volochinov (1929), “as palavras são tecidas a partir de uma
multidão de fios ideológicos que servem de trama a todas as relações sociais em todos
os domínios” (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 1929, p. 40). Há, na palavra, diversos
julgamentos valorativos fundamentados em critérios cognitivos, científicos e éticos.
Depois de uma leitura em voz alta e análise em conjunto, com a professora de
a “Canção do exílio”, observam qual a maneira de seleção de alguns termos por
Gonçalves Dias.
Pois “Os versos e as estrofes não são construídos apenas com palavras que
rimam entre si, mas de modo que esses elementos se articulem com o conjunto para
produzir um sentido” (ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 51). No final da etapa,
definem: rima, versos regulares, versos brancos e verso solto. Privilégio do ritmo, som
e verso. Na etapa de número 2, “Onde estão as rimas?” os alunos reunidos em grupos,
observam duas quadras na lousa para reconhecer se há rimas e identificar em quais
versos elas aparecem.
Na 3ª fase, “Mais quadras”, o professor contextualiza o autor e explica a
diferença entre pseudônimo e heterônimo. Há também a compreensão da “redondilha
maior”. Depois, os alunos produzem coletivamente alguns versos, ouvem a Coletânea,
revisam e socializam suas produções, para fixar no mural. Na 4ª etapa “Qual o papel
das rimas?”, a professora solicita aos alunos que produzam uma quadra
coletivamente. Discutem em torno do título “Duas dúzias de coisinhas à toa que
deixam a gente feliz”, de Otávio Roth.
Ouvem esse poema em busca de possíveis temas, já que o título nos remete à
simplicidade cotidiana. A compreensão e busca do conhecimento de mundo é
realizada via assimilação e relacionamento entre grafema e poema. Conversam para
86
a percepção das rimas internas capaz de formar “uma lista” de coisas, Identificam e
transcrevem recursos linguísticos correspondentes aos temas do texto. Discutem no
sentido de levantar e comparar termos com temas sociais. Exploram o título,
compreendem que os aspectos metalinguísticos contribuem para a interpretação do
texto. Tomam conhecimento de técnicas que agrupam a lista de termos, bem como
sublinhar e circular que são estratégias de leitura e as formas linguísticas para uma
produção coletiva. Selecionam, individualmente, no dicionário, palavras, mas em trio
compõem versos. Depois, elaboram o texto em coletivo utilizando palavras e rimas
que combinam. Elegem a ordem em que os versos devem estar e escolhem o título.
A nosso ver, a palavra já tem sua própria carga valorativa.
A oficina 6 “Sentido próprio e figurado” tem a finalidade de apresentar os
conceitos de Denotação (sentido próprio) e Conotação (sentido figurado), além de
delimitar o texto poético. Na 1ª etapa são esclarecidas aos alunos as particularidades
do poema e a diferença com outros textos, porque os recursos expressivos sugerem
vários sentidos. Há uma atividade em grupo, audição do poema “Livros e flores” de
Machado de Assis, com vistas à preocupação da organização sintática.
A compreensão do texto é percebida por meio da verificação de termos no
dicionário. É nessa etapa que se define o sentido próprio e sentido figurado na
produção textual. São trabalhados ainda a ambivalência do termo, estranhamento
causado pela inversão sintática “recurso que favorece o ritmo” (ALTENFELDER;
ARMELIN, 2010, p. 69) e a observação da sequência lógica textual. A 2ª etapa “Qual
o sentido?” instrui o professor a colocar textos na lousa e solicitar dos alunos a
localizar sentidos denotativos e conotativos. A etapa 3 “Definições poéticas” visa a
apresentação das “definições poéticas”: Modéstia, Reticências e Recordação de Mário
Quintana. Os alunos fazem uma atividade em grupo, leem e discutem sobre as
“definições poéticas” para descobrir significado e expõem suas conclusões em
atividade lúdica de apresentação. Em seguida, é proposto que eles realizem uma
atividade para fixação, individualmente ou em grupos, produção escrita empregando
as definições poéticas.
A oficina 7, “Comparação, metáfora, personificação”, tem como meta a
identificação e, também, a utilização das figuras de linguagem. Essa oficina está
dividida em 4 etapas. Na 1ª “Recursos que aproximam dois termos” é apresentado o
conteúdo: a linguagem figurada, com ênfase na identificação, aprendizagem e
emprego das figuras comparação, metáfora e personificação. Há a solicitação para a
87
realização de uma atividade em grupo. Os alunos serão “avaliados”, a partir de uma
leitura da letra de canção “O leão” de Vinícius de Morais.
Novamente, comentam sobre o sublinhar, como estratégia de leitura e a
explicação seguinte: “a metáfora produz efeitos de sentido que ampliam a significação
do texto e as possibilidades de interpretação” (ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p.
76). Na 2ª etapa “Personificação” temos a definição dessa figura. O trabalho é
desenvolvido em leitura do poema “Meus oito anos” de Casimiro de Abreu e cópia na
lousa para observação das partes sublinhadas: metáfora e personificação. Na 3ª
etapa “Estabelecer comparações” é pedido aos alunos que façam atividade escrita:
produção de comparações e metáforas sobre “O lugar onde vivo”. Eles são
questionados para ativar o conhecimento, e a compreensão escrita se dá através por
meio de preenchimento de espaços vazios, individualmente ou em duplas. Depois,
são solicitados apresentação e debate sobre a tarefa e, também, cópia pela
professora dos exercícios de outros alunos. A 4ª etapa “Transformar comparações em
metáforas” consiste na criação de metáforas eliminando os termos de comparação e
leitura das melhores frases construídas pelos grupos.
A oficina 8, “Sonoridade na poesia”, foi dividida em duas etapas. Na 1ª “Som e
sentido” os alunos leem em grupo e em voz alta “Pássaro livre”, de Sidônio Muralha,
além de “Haicai” da autora “Ângela Leite”, com o objetivo de perceber as repetições
de palavras, de versos e de letras que produzem sons, bem como a definição de
Aliteração (repetição da mesma consoante), ritmo regular, ritmo irregular. Debatem
sobre os possíveis efeitos de sentido irregular que pode surgir em “Pátria minha”, de
Vinicius de Moraes. Na 2ª etapa “Trava-línguas”, conversam construindo o conceito
de trava-línguas, depois leem textos da lousa e os alunos são desafiados a decorá-
los e apresentá-los. A professora divide a turma em grupos para treinarem, mas
individualmente os meninos são responsabilizados por apenas um. Por meio de
sorteio, são convidados a apresentar, pois “Falar trava-línguas é uma verdadeira arte”
(ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 85). Em seguida, ouvem o trava-trovas “O
pedreiro Pedro Alfredo”, “Se um dia me der na telha”, “Chegou ‘seu’ Chico Sousa”, da
autoria de Ciça. Depois de uma competição, os melhores da 1ª etapa são convidados
a lerem em voz alta e individualmente ou em grupos a produzirem e registrarem, no
caderno, trava-línguas ou trava-trovas usando encontros consonantais ou sons
parecidos. Após, leitura em voz alta e socialização das produções, revisão e
exposição dos textos no mural.
88
A oficina de número 9 “Poetas do povo” está dividida em duas etapas: a 1ª “O
varal de cordel” retoma o trabalho com o poema popular, rapidamente abordado na
oficina 1 e também as formalidades da língua valorizadas no decorrer do todo o
Caderno. Na 1ª fase, há contextualização do poeta, ativação do conhecimento sobre
o cordel “Emigração e as consequências” de Patativa do Assaré, com audição e
leitura, de acordo com as orientações da oficina 4, para a interpretação desse poema.
Faz-se um comentário a respeito da definição de Estilo como "maneira de se
expressar de um escritor, de um grupo literário ou dos autores de determinado
período. O termo também pode ser usado por todas as pessoas que escrevem e criam
um modo pessoal” (ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 97). Então, Assaré tem um
estilo com vocabulário simples, mas com habilidade para a criação de metáforas e
comparações. Acrescentado a isso, exploram os “assuntos” presentes no texto, a
construção dos sentidos via figuras de linguagem e a escansão (divisão) do poema
em sílabas métricas. Depois, propõe-se a leitura de “A valsa” do poeta Casimiro de
Abreu, para a compreensão do ritmo cadenciado (marcado). Na 2.a etapa
“Quadrinhas divertidas”, há o trabalho com a noção de ritmo nas quadras do poema
“O buraco do tatu”, de Sergio Caparelli, para audição e leitura. Realiza-se, também,
uma retomada dos conhecimentos: regularidade das estrofes, tamanho dos versos,
rimas, repetição dos versos. Propõe-se observação da sequência de ideias para a
forma do poema, em atividade individual ou em dupla. Em seguida, incentiva-se a
produção de quadras, acrescentando a cidade dos alunos ao percurso do tatu, a partir
do primeiro verso original mantendo “o ritmo e as rimas nos versos pares”
(ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 99). Em seguida, é proposta uma leitura em voz
alta das quadras. Ao final, atividade lúdica: montagem de um painel ilustrado com o
novo percurso do tatu.
A Oficina 10 “O lugar onde vivo” está distribuída em duas etapas e visa resgatar
os conhecimento e os sentimentos dos alunos, através por meio de textos de autores
sobre a terra natal deles. Na 1ª etapa “O lugar onde o poeta vive”, o poema escolhido
é “Milagre no Corcovado” de Mário Quintana. Há, portanto, ativação do conhecimento.
Em seguida, leitura de “O Milagre do Corcovado” e retomada das orientações da
oficina 4. Propõe-se exploração do tema: “Comente com eles a diferença de dimensão
que os objetos assumem, vistos de longe e de perto” (ALTENFELDER; ARMELIN,
2010, p. 104). Leitura e releitura do poema “Cidadezinha” de Mário Quintana, para
imaginar a intenção do autor e como é a cidade dos alunos, focando-se a forma e a
89
idealização. Compreensão do tema e do tom via forma. Solicita-se busca do
significado dos termos “triste” e “melancólico” no dicionário. A seguir, comparação
entre as cidades dos dois poemas e uma descrição das diferenças e semelhanças.
Interpretação dos sentimentos do poeta com foco nas formas linguísticas. Na 2ª etapa
“Temas semelhantes, recursos parecidos”, faz-se retomada dos dois poemas,
observando os recursos expressivos. São Identificadas semelhanças na organização
composicional, rimas, ritmo marcado e repetições representando uma apreciação
valorativa positiva. Já para simbolizar as diferenças temos o tom alegre e triste dos
poetas. A Oficina 11, “Um novo olhar”, tem uma divisão em duas etapas e visa
direcionar a percepção do aluno para um olhar diferente e original. Na etapa de
número 1, “A observação dos pequenos detalhes”, são apresentadas a situação de
produção e a ativação do conhecimento, para a delimitação do tema que retrata a
cidade. É pedido aos alunos que conversem ou passeiem para a coleta de dados
sobre a cidade, focalizando as impressões e sensações. Em seguida, propõe-se
debaterem para descobrirem a intenção discursiva de Alberto Caieiro. Leem
“Confidência do Itabirano” de Carlos Drummond de Andrade e “Alma Cabocla” de
Paulo Setúbal, para a percepção do tema. Há um privilégio das características
literárias. Na 2ª etapa “Uma viagem imaginária”, a professora propõe uma viagem
imaginária objetivando a busca de “impressões, sensações e sentimentos” com vistas
à produção, bem como registro de palavras e impressões dos alunos. É proposta uma
atividade lúdica com desenhos das impressões dos alunos em um painel.
Planejamento e confecção do painel, em grupo, que retratará a cidade. Finalmente,
pede-se uma colagem dos elementos transcritos no painel.
A Oficina 12 “Nosso poema” está decomposta em 2 etapas e tem como objetivo
a produção coletiva a respeito do local onde vivem os alunos. Na etapa de número 1,
“Um passeio pelas oficinas”, é observado o painel, para refletir sobre o que já foi
aprendido e realizado, é solicitada a produção de um quadro-resumo, os alunos
deverão ouvir e ler alguns poemas, retomando o aprendizado do significado de:
poema, poesia, poeta, verso, estrofe, estilo, tema, figuras, denotação, conotação,
aliteração. Na 2ª etapa “O poema coletivo”, a professora deverá copiar na lousa e
conversar sobre os aspectos selecionados no mural para fundamentar a produção do
poema coletivo, também precisará escrever os versos criados em conjunto na lousa,
recompondo as rimas, o sentido, as figuras de linguagem, a forma composicional e os
versos e estrofes. Em seguida, os alunos deverão ler em voz alta para adequação do
90
tamanho dos versos, ritmo e exclusão de clichês, por fim, reler o poema e a pensar a
escolha do título.
A Oficina 13 “Virando poeta” tem como objetivo a escrita do poema individual
sobre “O lugar onde vivo” e está dividida em duas fases. Na 1ª denominada “A análise”
é realizada uma leitura e análise do poema vencedor do último concurso para
motivação e, também para a percepção dos recursos no poema de Carla M. Xavier.
Na 2ª etapa “A produção”, são retomadas a situação de produção de “O lugar onde
vivo”, a delimitação do tema, interlocutor, seleção de recursos, com foco na Teoria
Literária. É solicitada a 1ª produção individual, com escrita e (re)escrita do poema. O
Caderno privilegia recursos literários, linguísticos enfatizando a aproximação dos
aspectos da cidade.
A Oficina 14 “Retoque final” propõe um aprimoramento dos poemas produzidos
e está separada em duas etapas. Na etapa de número 1, “A primeira produção”, a
professora copia o poema na lousa e, em seguida, os alunos devem ler e debater
sobre alguns versos para aperfeiçoamento do texto, e adaptação do título ao tema.
Recomenda-se que eliminem as repetições de termos na construção do som e
aperfeiçoem o estilo e reescrevam o poema. Na 2ª etapa, “Passando a limpo”, é
proposta a revisão do poema: título, tema, “O lugar onde vivo”, delimitação temática;
harmonia do ritmo; organização em versos e estrofes; ocupação da página; margens;
efeitos sonoros; ritmo marcado e rimas; repetição da mesma construção (paralelismo
sintático); figuras de linguagem.
A Oficina 15 “Exposição ao público” está decomposta em 3 etapas e tem como
proposta a organização de um sarau para divulgar os poemas e a seleção dos três
melhores que serão enviados para a Comissão Julgadora da escola. Na 1ª etapa
“Exposição ao público”, é sugerida a realização de um sarau para os pais e a
comunidade, bem como uma atividade lúdica. É feita a sugestão da leitura de um
poema de poeta e outro de um aluno, para ensaio da apresentação. O foco deve ser
no ritmo, pausas e entonação da voz. A 2ª etapa “Arrume ‘a casa’ para o sarau”, o
professor é orientado a decorar o local e, se quiser, complementar com música e
teatro. A finalização poderá ter um lanche comunitário. Na 3ª etapa, “Seleção interna”,
após o sarau, devem ser escolhidos três poemas pelos alunos e pela Comissão
Julgadora da Escola, com a finalidade de escolher o melhor poema por essa
Comissão.
91
Ao finalizarmos nosso propósito, portanto, esperamos que nosso leitor tenha
verificado a implicação de uma leitura em que considera a linguagem verbo-visual do
texto. Além da preocupação da parceria entre o Ministério da Educação – MEC, a
Fundação Itaú Social e o Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e
Ação Comunitária CENPEC em confeccionar um material de boa qualidade, e que
também possa ter percebido os passos da sequência didática conforme os
pressupostos de Dolz & Schnewly (2010[1996]).
Na próxima seção, iremos analisar algumas oficinas do Caderno do Professor,
na tentativa de perceber quais as semelhanças ou diferenças que podem ser vistas
no ensino-aprendizagem do gênero poema subjacente ao pensamento da Teoria
Literária Escola de Genebra, e qual poderia ser a contribuição da filosofia da
linguagem de Bakhtin e seu Círculo10.
3.5 Por que não está considerada A Outra Face do Jano? Uma proposta de exame
analítico de alguns dados do Caderno Poetas da Escola
Não basta abrir a janela
Para ver os campos e rios.
Não é bastante não ser cego
Para ver as árvores e flores.
Alberto Caeiro
Nossa pesquisa, não objetiva principalmente expor possibilidades de
inadequações na proposta pedagógica do Caderno, mas seguir os resultados dos
dados levantados, e a reflexão sobre o tratamento didático dispensado ao gênero
poema no Manual, conforme os estudos bakhtinianos, comprovado em três gráficos,
para finalmente tentarmos contribuir para o conhecimento científico acerca da teoria
10 Durante entrevistas com Viktor Duvakin (2008), Mikhail Bakhtin menciona e explica particularidades de alguns Círculos de estudos, os quais reuniam pessoas com interesses em comum sobre conhecimentos literários ou filosóficos. Tais Círculos eram denominados como “salões”. Conforme Bakhtin declara em Duvakin (2008) que sua preferência era ouvir. Sendo que no Círculo de Pavel Nikolaevich Medvedev a ocupação dos participantes era a recitação de poesias e leitura de narrativas, e, em seguida, discussões sobre os textos. Alguns participantes do Círculo foram: Mikhail Bakhtin (1895-1975), Matvei Isaevich Kagan (1889-1937); Pavel Nikolaevich Medvedev (1891-1938); Lev Vasilievich Pumpianskii (1891-1940); Ivan Ivanovich Sollertinskii (1902-1944); Valentin Nikolaevich Voloshinov (1895-1936).
92
enunciativo-discursiva de Mikhail Bakhtin e seu Círculo, pois cremos ser necessário
nos adaptar às condições da contemporaneidade no que diz respeito a “Um dos
objetivos principais da escola é justamente possibilitar que seus alunos possam
participar de várias práticas sociais que se utilizam da leitura e da escrita
(letramentos) na vida da cidade, de maneira ética, crítica e democrática”. (ROJO,
2009, p. 107, grifo da autora).
Logo, a educação linguística deve interessar-se em viabilizar caminhos que
conduzam o aluno à aceitação dos multiletramentos ou letramentos múltiplos tanto
das culturas locais quanto das culturas valorizadas, também ao contato com os
letramentos multissemióticos, ou seja, não mais apenas à interpretação de textos em
materiais impressos e sim às leituras que podem fluir provenientes do progresso
tecnológico os quais nos fazem perceber outros sentidos nos sons, nas imagens, nos
desenhos, nas cores etc., com a finalidade de esse aluno agir como protagonista
frente aos próprios julgamentos éticos, já que qualquer texto nasce das concepções
de cada um, situados sócio e historicamente.
De outro ângulo, contudo, tentaremos colaborar para uma análise do gênero
discursivo poema diferenciada e considerando todo o seu processo, visto que os
dados por nós investigados estão alicerçados em outras perspectivas de ensino-
aprendizagem do gênero literário poema – a teoria literária e a teoria comunicativa –,
nas quais pensamos, tratam as características constitutivas do gênero em questão
de forma inversa e, às vezes, insuficiente quando comparamos tais teorias ao método
sociológico de análise dialógica do discurso bakhtiniano.
Durante nossa revisão bibliográfica, entramos em contato com diversos textos
e tentaremos mobilizar compreensões adquiridas e concretizá-las em nossos
apontamentos a seguir. Cremos, portanto, que, a partir dos novos conhecimentos
adquiridos pelo professor, o aluno será beneficiado e buscará situar os discursos em
seus devidos cronotopos e, desse modo, desvelará as vozes e os discursos, por meio
das relações dialógicas e assumirá a condição de leitor e/ou produtor literário
competente.
A partir da orientação teórica de Bakhtin e seu Círculo, então, buscaremos
compreender e explicitar nosso segundo questionamento de pesquisa, isto é: quais
as contribuições teóricas bakhtinianas e como elas podem fundamentar a
transposição didática, privilegiando uma abordagem discursiva dialógica do ensino-
aprendizagem do gênero discursivo poema no Caderno da OLPEF.
93
Este capítulo foi delineado da seguinte forma: breve contextualização de nosso
trabalho; observação do recorte de nossos dados em linguagem gráfica; descrição,
análise e avaliação das oficinas 1, 2, 6, 7 e 8 e, por fim, faremos algumas constatações
sobre o que percebemos no Caderno em geral e nas atividades citadas. Assim,
realizamos cuidadosamente mais uma leitura do projeto e atribuímos valor qualitativo
às oficinas e às atividades sob a ótica da análise dialógica discursiva de Bakhtin e seu
Círculo.
3.6 Levantamento das atividades recorrentes
Quanto a mim, em tudo eu ouço vozes e relações dialógicas entre elas.
Mikhail Bakhtin
Primeiramente, levantamos o conjunto de tematizações enfocadas nas
atividades do Caderno, com base no encaminhamento dos moldes da sequência
didática, e que poderá ser observado nos tipos de atividades desenvolvidas em cada
uma das suas 15 oficinas, e que são classificadas conforme Dolz; Noverraz e
Schneuwly (2004[2001]) em: situação de produção, alimentação temática, produção
oral, produção escrita, reescrita e, no caso do Poetas da Escola, há seção para
divulgação dos textos dos alunos.
Dessa maneira, elaboramos o gráfico 1, que traz a representação percentual
de um total de 188 atividades, encontradas nas 15 oficinas, e distribuídas conforme a
classificação da sequência didática acima descrita. Essas atividades foram
catalogadas na “TABELA 1 – Tipos de atividades nos moldes da Sequência Didática”,
e se encontra no anexo deste trabalho.
94
Gráfico 1 – Tipos de atividades na configuração da Sequência Didática
Fonte: Organizado pela autora/2013, com informações compiladas da TABELA 1 no anexo.
Observamos então, por meio do gráfico 1, a distribuição das respectivas
atividades e concluímos que a produção oral foi a atividade que mais contribuiu para
o desenvolvimento das oficinas, com uma representatividade de 35%, seguida dos
elementos fundamentais do poema com 23% do total e situação de produção com
19%. A produção escrita soma 12%, a alimentação temática 7% e, por fim, a que tem
a menor representatividade é a reescrita, com apenas 3% de atividades em todas as
15 oficinas do Caderno.
Através dessa visualização, em que o Caderno apresenta uma sequência
didática focada com maior incidência na produção oral, tendo em vista que das 188
atividades analisadas em suas oficinas, os 35% observados acima representam 66
tarefas que se preocuparam com a oralidade entre professor e aluno, em que 1/3 do
Manual está destinado às tarefas de produção oral.
A partir desse resultado, verificamos que, de fato, há grande preocupação com
tal modalidade da língua, entretanto são voltadas para a situação de produção,
diagnóstico do que representa poema na visão dos alunos, apreciação do texto
poético pelo alunado, orientações de como devem ser desenvolvidas as atividades,
identificação das unidades da língua como: ritmo, rima, forma, figuras de linguagem.
Parece-nos que, referentemente ao pensamento de Bakhtin/Volochinov
(2010[1929]), em que a língua corresponde à interação verbal, o discurso autoral
0%
10%
20%
30%
40%
50%
19%
7%
23%
35%
12%
3%
95
ainda não está conscientizado dessa dimensão da linguagem, já que não
encontramos nas conversas entre professor e alunos a contextualização ampla do
gênero ou as vozes sociais (na subjetividade dos alunos), demonstrando que
compreenderam as outras vozes de cada um dos atores existentes nos textos.
Também, não há sugestão do Caderno, para que o professor ajude aos alunos a
perceberem, que tais ecos sempre são de natureza social e que a
[...] orientação da palavra em função do interlocutor tem uma importância muito grande. Na realidade, toda palavra comporta duas faces. Ela é determinada tanto pelo fato de que procede de alguém, como pelo fato de que se dirige para alguém. Ela constitui justamente o produto da interação do locutor e do ouvinte. Toda palavra serve de expressão a um em relação ao outro, isto é, em última análise, em relação à coletividade [...] A palavra é o território comum do locutor e do interlocutor. (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2010[1929], p. 117).
Nesse sentido, se a palavra está orientada para os interlocutores e consiste
exatamente a “realidade fundamental da língua” (IBDEM, p. 127). Percebemos que o
Caderno segue o que Bakhtin/Volochinov (2010[1929]) nos orienta a não fazer, isto é,
considerar o diálogo face a face como único, apesar de ser o principal, lembrando que
nos textos também há diálogos. Vimos, nas interações entre professor e alunos,
digamos, uma forma menos aprofundada de diálogo com/sobre os textos.
Como não vimos a preocupação com as ideologias, os confrontos entre os
valores sociais – físicos, intelectuais, morais, religiosos, etc. – com a finalidade de
relativizar ou de se posicionar exotopicamente e, também, de respeitar os valores do
outro, sugerimos a reflexão sobre esses pontos. Nesse sentido, nos lembramos de
uma passagem de Notas do Subterrâneo de Dostoiévski:
‘Anda, Vânia, desce por aqui! É o destino dela: até aqui ela vai de cabeça para baixo [...] Segura a corda, animal!’ – ‘Está bem assim’. – Mas não vês que ela está deitada de lado? Afinal, foi uma criatura humana, mas não tem importância, joga a terra! [...] Taparão a cova o mais depressa possível, com uma camada de terra lamacenta, e irão para a taberna. É o fim e ninguém mais pensará em ti. (DOSTOIÉVSKI, 2010, p. 116).
No trecho prosaico, há uma multiplicidade de vozes, a do protagonista se
dirigindo a interlocutora Vânia - uma prostituta a quem tentava convencer de que tal
profissão traria muitos sofrimentos para ela, seu enterro não teria importância e depois
disso ninguém mais se lembraria que ela existiu -, bem como os diálogos dos
96
personagens que são duas pessoas representando os coveiros. Então, se para
Bakhtin (2010[1920-1924]) viver significa assumir posições diante dos atos, nesse
trecho, é possível ouvir as vozes de cada personagem posicionado e agindo de acordo
com seu lugar social.
Logo, não vimos essa preocupação do discurso autoral quanto a esse ponto
nas atividades, pois quando o momento é de leitura elas são para identificação,
localização e análise de aspectos formais da língua. Mas se no poema está
sobressalente a voz do poeta sem os discursos diretos da prosa, o Caderno poderia
ampliar a preocupação referente às vozes dos papeis sociais, as quais estão implícitas
e constituem o texto, bem como as marcas que elas estão imprimindo no pensamento
das crianças. Se fosse para abordarmos algo no fragmento de Dostoiévski poderia
ser, por exemplo, a questão do preconceito e, também discutirmos sobre o Princípio
da dignidade da pessoa humana tão em alta, nos últimos tempos. Assim, a falta de
compreensão pode gerar o desinteresse pela leitura do gênero poema, por isso é
necessário a mediação do professor entrar em cena.
3.6.1 Os dados sob um olhar bakhtiniano
Em seguida, fizemos um levantamento das atividades do Caderno com foco em
dois importantes conceitos bakhtinianos. O primeiro deles, o gênero do discurso, com
suas características constitutivas: o conteúdo, o material e a forma, sendo o material
dividido em estilo individual e estilo do gênero, e o segundo conceito, as relações
dialógicas, em três partes distintas: 1) uma constitutiva do enunciado; 2) o discurso
citado; e 3) e a outra a formação da consciência. Descobrimos, ainda, ser necessário
adotarmos uma nova classificação das tarefas, com vistas à igualdade entre o termo
“assunto” que encontramos na sequência didática do Caderno e o “tema” bakhtiniano.
O resultado desse levantamento está representado no gráfico de número 2, por
meio de porcentagem, referente a um total de 135 informações extraídas do Material,
das atividades presentes nas 15 oficinas, e compiladas na “TABELA 2 – Tipos de
atividades: perspectiva bakhtiniana”, e que também poderá ser visto no anexo deste
trabalho.
97
Gráfico 2 – Atividades na perspectiva bakhtiniana
Fonte: Organizado pela autora/2013, com informações compiladas da TABELA 2 no anexo.
Na representação gráfica dos dados acima e com vistas do gráfico 2, o conjunto
de tarefas no Caderno demonstra que o maior número de atividades se refere à
Forma, uma das dimensões do gênero discursivo, além disso, a característica formal
esteve presente em 59% das atividades de todas as oficinas. Em seguida o Material
apresentou 22%, sendo que o “estilo individual” teve uma representatividade de 21%,
enquanto o “estilo do gênero” apenas 1%. A participação do conceito “Conteúdo”
definido por Bakhtin (2010[1924]), foi de 10%, enquanto que “Assunto”, na
denominação da SD, representou 8%.
Para finalizar, buscamos atividades articuladas às relações dialógicas, contudo,
tanto a “dimensão constitutiva do enunciado” como o “discurso citado” e até mesmo a
“formação da consciência”, não foram comentadas nas atividades. Entendemos que
se olharmos esses itens pelo viés bakhtiniano, todos os poemas são dialógicos
considerando, em primeiro lugar, que a palavra do poeta já foi pronunciada por alguém
em um outro tempo e em um outro espaço qualquer. Segundo, não encontramos
discurso citado direto ou indireto livre, mas temas ou sujeitos retratados nos poemas
pertencem ao contexto interacional, histórico, sociológico e ideológico, pois o poeta é
um indivíduo da sociedade. Em terceiro, todas as formas de linguagem, inclusive o
gênero discursivo poema, pertencente à esfera artística literária, contribui para a
formação de nossa consciência. Dessa maneira, a reflexão de tais itens constituidores
98
de toda a produção textual, com os alunos seria retomada por eles, nas leituras e
produção de poemas.
Diante do resultado obtido no segundo gráfico, verificamos que houve, em
grande medida, uma preocupação do discurso autoral com os aspectos formais
durante o processo de ensino nas oficinas, pois encontramos 79 atividades
classificadas nessa categoria, em um universo de 135 tarefas analisadas ao longo das
15 etapas, o que representa 59% de participação no processo de execução das
tarefas. Nesse sentido, entendemos que foi concedido à Forma o status de prioridade.
Ainda seguindo esse mesmo raciocínio a respeito do aspecto formal é inevitável
comentarmos que na concepção desse Material a Forma é vista como apenas uma
dimensão. Todavia, nos estudos de Bakhtin e seu Círculo, para efeitos de
compreensão e análise de obras quaisquer ela pode ser dividida/pensada em “forma
composicional” e “forma arquitetônica”, mas divisões que são complementares.
Cabe ressaltar, nesse momento, que a elaboração da sequência didática
privilegia o ângulo formal e semântico da língua sendo, portanto, bem sucedida em
projeto inicial. Porém, o Caderno poderia as relações dialógicas pois, se pensarmos
em nossa perspectiva bakhtiniana, lamentavelmente, outras faces de análise dos
gêneros discursivos deveriam ter sido acrescentadas, como complemento do ensino-
aprendizagem do poema, nosso argumento se baseia no discurso do MEC, da
Fundação Itaú Social e do CENPEC, a saber, “proporcionar ensino de qualidade para
todos [...] democratização dos usos da língua portuguesa, perseguindo o ‘iletrismo’
[...] e o fracasso escolar [...] contribuir direta e indiretamente para a formação docente”
(ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 03-09).
No próximo subtópico, buscaremos comparar a discursividade com o
dialogismo.
3.6.2 Uma análise comparativa dos aspectos discursivos e dialógicos
Para concluirmos essa fase em busca de evidências, preocupamo-nos, agora,
em trazer um comparativo dos aspectos discursivos e das relações dialógicas,
encontradas em cada uma das 15 oficinas do Caderno. Para cumprir nosso intento,
foi necessário quantificar e apresentar novamente as atividades que trazem os
conceitos de gênero do discurso (o conteúdo, o material e a forma), comentadas no
99
gráfico 2 acima, mas de forma consolidada. Quanto às atividades em que
encontramos os conceitos de relações dialógicas, o levantamento foi feito apenas para
nosso crescimento intelectual e detalhado em sete partes, a saber:
1) Contexto Sócio-histórico: aspectos que envolvem diferentes épocas e
períodos de tempo;
2) Contextualização do autor: dados da vida real e do trabalho do poeta;
3) Relações autor-herói (questões dialógicas internas): são relacionamentos
entre o poeta (autor-criador) e o eu lírico;
4) Projeto discursivo: a intenção ou querer dizer, questões ideológicas,
colocadas pelo autor, mas representadas na voz do eu lírico;
5) Reconstrução de sentidos pelo leitor: novos e diferentes sentidos
conectados à realidade do aluno;
6) Discurso alheio (citado) e/ou vozes: discursos de outras pessoas ou funções
de instituições sociais, citados direta ou indiretamente;
7) Intertextualidade ou Interdiscursividade: coincidência de unidades
linguísticas em textos diferentes ou, mesma unidade de sentido em textos
de diferentes espaços e períodos de tempo.
Cabe destacar que esse quadro comparativo que se encontra no anexo do
trabalho “TABELA 3 – Aspectos discursivos/dialógicos” serviu para compreendermos
como se deu a distribuição interna das atividades, dentro dos conceitos bakhtinianos
apresentados, e qual a possível intenção teórico-metodológica do Caderno. Abaixo,
no gráfico 3, podemos visualizar como foi o comportamento desses conceitos, de um
total de 181 atividades que o Caderno apresenta nessas características.
100
Gráfico 3 – Aspectos discursivos e dialógicos
Fonte: Organizado pela autora/2013, com informações compiladas da TABELA 3 no anexo.
Conforme dissemos no primeiro parágrafo deste tópico, os conceitos de gênero
discursivo foram apresentados novamente de forma unificada, daquela vista
anteriormente no gráfico 2, mas cabe destacar que, embora a quantidade de tarefas
sejam as mesmas em ambas as análises, o percentual encontrado para cada conceito
foi diferente, tendo em vista que acrescentamos as atividades das sete relações
dialógicas distintas da primeira. E, enquanto no item anterior mencionamos um
universo de 135 tarefas, nesta análise esse parâmetro subiu para 181 tarefas,
acrescido de 46 atividades das novas relações dialógicas.
Mesmo diante deste novo prisma, o Caderno demonstra que o conteúdo, o
material e a forma continuam em destaque. A forma persiste no primeiro lugar, com
uma representatividade de 44% das atividades, o material vem a seguir com 17%, já
somados com estilo individual e com estilo do gênero, mais o conteúdo perfazendo
um total de 14% e, há de lembrar, que o assunto nesta análise foi incorporado ao
conteúdo. Para as relações dialógicas, o que se destaca é o projeto discursivo, com
8% do total, em seguida temos 6% para a contextualização do autor e a reconstrução
de sentidos pelo leitor. O contexto sócio-histórico representa 4% e a intertextualidade
ou interdiscursividade 2%. Por último, sentimos a falta de discussões sobre as
101
relações autor-herói e discurso alheio e/ou vozes. Talvez essas questões não tenham
sido abordadas, porque a concepção da linguagem seja a Teoria da Comunicação11.
Dos estudos de Saussure, surgiu a denominação de receptor, por conta da
relação existente entre enunciação e enunciado. A evidência de dois autores, um
“autor intrínseco ao enunciado e o autor como pessoa real” (ZAVALA, 2012, p. 158)
se comunicando em uma alteridade dialógica e percebendo a ligação entre a
enunciação e a vida real, constitui essa relação que torna possível apreendermos o
mundo por meio de signos.
A respeito do olhar extralocalizado bakhtiniano, Zavala (2012) aponta para o
fato de que
Bakhtin estabelece uma diferenciação entre duas consciências, a do autor e a consciência do criador, [...] A consciência do autor é a consciência da consciência, uma consciência ampla porque abrange a do personagem e a do seu próprio mundo. A do personagem se apresenta como extraposição à do autor, em uma unidade conclusiva: se a do autor é onisciente, sabe como concluir o personagem que vai criando. Além disso, como criadores estamos fora de nós mesmos, e esse fora, essa extralocalidade ou exotopia, gera um processo de elaboração muito amplo. Mediante os cronotopos se estabelecem inter-relações de caráter dialogístico, mas esse diálogo não pode ser incorporado ao mundo representado, já que se encontra fora dele, no mundo do autor e do intérprete, dos ouvintes e dos leitores. (ZAVALA, 2012, p. 159).
Nesse sentido, sob a visão bakhtiniana, por conta dos cronotopos, são
elaboradas relações dialógicas no mundo exterior ao texto, ou seja, não nos espaços
da representação, mas entre autor-artista e as interpretações, porque há duas
consciências diferentes. Uma em que o autor envolve a consciência da personagem,
no caso do poema a consciência de eu-lírico, que está situada fora desse elemento
consciente do autor, possibilitando a ele um todo conclusivo, já que esse autor é
onisciente.
Além disso, as relações dialógicas que envolvem o outro e a enunciação são
responsáveis pelo estilo e a escolha do gênero, pois ela tem dupla orientação: é
orientada para o próprio enunciado e para o destinatário. Vale lembrar que pertence
11 Na teoria da comunicação o texto deve ser analisado considerando a sociedade e a época que o produziu, bem como sua intenção ou finalidade. Os elementos constitutivos da linguagem são o emissor, a mensagem, o receptor, o canal de comunicação, o código e o contexto. A partir desses elementos Roman Jacobson desenvolveu as funções linguísticas: a referencial, a emotiva, a conativa, a fática, a metalinguística e a poética. Elas são uteis para a análise ou produção textual, mas nenhum texto apresenta uma só função, isto é, existe o predomínio de alguma delas mesclada às outras.
102
à arquitetônica a função de integrar o material, a forma e o conteúdo, organizar o
espaço, o tempo e os sentidos na construção, tornando possível a unidade de sentido
total dos enunciados.
Após releitura de alguns textos do Círculo de Bakhtin, em busca de
esclarecimentos para a compreensão do discurso poético, Padilha (2005) afirma ter
encontrado três caminhos, os quais tendem para o mesmo fim. Em primeiro lugar, a
ética e a estética são interconectadas, sendo que esta última sempre estará repleta
dos valores de experiências reais. Depois, a formulação de uma noção de linguagem,
em que o autor é partícipe ativo no processo criativo de uma obra de arte e em terceiro,
que as próprias considerações do Círculo, sobre o discurso no romance nos
esclarecem a respeito do discurso poético em sentido estrito (o poema).
Seguindo essa linha de pensamento, no texto de Bakhtin Para uma Filosofia do
Ato (1920-1924), o filósofo russo iniciou suas preocupações relacionadas à ética e à
estética, em outras palavras, a atividade real da vida cotidiana em correlação com a
atividade estética, as quais foram mais detalhadas em obras subsequentes. Nesse
texto de 1920-24, Bakhtin vê em uma manifestação literária, mais precisamente o
poema Razluka (Separação) de Pushkin12, condições para demonstrar a arquitetônica
do ato responsável, em nosso mundo concreto. Tal empreendimento é proposta de
seu projeto de pesquisa uma filosofia primeira ou filosofia moral, pois ela estabelece
uma relação em que é permitida a manutenção da alteridade do centro de valor de
toda a arquitetônica. O centro é considerado de modo exotópico e transgrediente. Tal
relacionamento se dá entre o autor e o herói no interior do texto.
Na arquitetônica de Bakhtin (1920-24), não há divisão entre o mundo das
experiências vividas na realidade e embora haja diferença, unicidade e singularidade
constituindo a personalidade de cada sujeito, não existe indiferença entre eles. Ao
contrário, no mundo oficial, relacionamentos são estabelecidos e mantidos a partir de
identidades, tais comportamentos subjugam o mundo da vivência – experiências reais
– porque está sendo considerada a separação entre esses dois universos. Para
Bakhtin (1920-24), entretanto, eles estão interligados, por meio da alteridade. Então,
12 Alexander Sergueievitch Pushkin (1799 - 1837). Romancista e poeta russo da era romântica é considerado por muitos como o maior poeta russo. Fundador da literatura moderna russa, Pushkin foi pioneiro no uso do discurso vernacular nos seus poemas e peças teatrais criando um estilo de narrativa que misturava drama, romance e sátira associada com a literatura russa, influenciando fortemente os futuros escritores. Também escreveu ficção histórica, poemas, novelas e peças teatrais (MATRIOSHKA, 2010; Disponível em: <http://mundoeslavo.blogspot.com.br/2010/03/alexander-
sergueievitch-pushkin.html>). Acesso em: jan. 2014.
103
a arquitetônica bakhtiniana obedece a um movimento essencial composto de três
momentos que são o “eu-para-mim, o outro-para-mim, e eu-para-o-outro” (BAKHTIN,
2010, p. 23).
Vejamos como Bakhtin (1920-24) nos apresenta a arquitetônica real do mundo
realmente experimentado e sua análise em um poema narrativo, uma obra de arte,
para que compreendamos seu pensamento filosófico a respeito do Ser (ativo e capaz
de tomar posições concretas) e da vida.
Razluka (Separação)
Alexander Sergueievitch Pushkin
Em direção às margens da pátria distante
Estavas deixando o solo estrangeiro.
Na hora atroz que o tempo não cura,
Muito já chorei enquanto perto de ti eu estava,
Procuravam os meus dedos gelados
Segurar-te ainda por algum momento.
Que a mordaz pena da partida
Não terminasse implorava meu lamento.
Mas eis que do meu beijo doloroso
Então os teus lábios separaste.
Da terra do exílio tenebroso
A uma outra terra tu me convocaste.
Disseste: o dia no qual nos encontraremos
Debaixo do céu sempre azul na cor,
Lá na sombra dos olivais reuniremos,
Amigo meu, os beijos do amor,
Mas, ai de mim, onde do céu resplandece
O arco de um azul festivo
E a sombra das oliveiras sobre as águas se estende
Tu para sempre adormeceste.
A tua beleza e cada tormento teu
Desapareceram na urna sepulcral –
E também o beijo do teu encontro...
Mas eu a espero, a tua promessa vale!
104
Nesta poesia há dois personagens: o herói lírico (o autor objetivado) e ela (Riznich), e, em consequência, dois contextos de valores, dois pontos concretos que são correlatos e momentos valorativos concretos do existir. Além disso, o segundo contexto, sem perder a própria independência, é, sobre o plano dos valores, abrangido pelo primeiro (é afirmado sobre o plano dos valores deste); e ambos são, por sua vez, envoltos pelo contexto estético unificante e que afirma os valores, do autor-artista e contemplador, o qual se acha colocado fora da arquitetônica da visão de mundo da obra (diversamente do autor-heroi, que é membro desta arquitetônica). O lugar singular do sujeito estético (do autor, do contemplador) no existir, o ponto de irradiação da sua atividade estética – do seu amor objetivo por um certo homem – tem uma só definição: a sua exotopia [vnenachodimost] em relação a todos os momentos da unidade arquitetônica da visão estética, que torna pela primeira vez possível abraçar a arquitetônica inteira, seja espacial ou temporal, com uma única atividade afirmativa dos valores. A empatia estética – visão do herói, do objeto, a partir do interior – se realiza ativamente deste lugar singular exotópico, e precisamente a partir daqui se realiza a recepção estética, afirmação e enformação da matéria da empatia e da visão, torna possível, pela primeira vez, a atividade estética da informação. (BAKHTIN, 1920-24, p. 131-132).
Após verificarmos no poema lírico “Separação” a realização da arquitetônica
descrita por Bakhtin (1920-24), foi possível compreendermos que assim como no
Romance, também no poema, o homem, um ser humano, é apresentado – objetivado
– por Bakhtin (1920-24) como herói e, por isso, há relação autor-herói.
No poema de Pushkin (1830), localizamos dois centros de valores reais e
concretos, ou seja, um herói e uma heroína. O âmbito valorativo do autor-herói (o
herói-lírico), abrange o centro de valor dela e ao mesmo tempo os dois centros são
intrapostos, porque a partir do olhar dele a heroína está partindo para a Itália, um país
distante. De fato, o que para ela significa um retorno, para ele é uma partida. Assim,
o herói acrescenta uma outra conotação – de atos éticos – para a realidade que é
percebida pelo observador e que gera um entre muitos outros acabamentos, conforme
o olhar do leitor. O dinamismo desse outro âmbito é formado em movimento de
exotopia, isto é, o espaço e o tempo em que o leitor observa fora dele mesmo e,
também, de quem está sendo observado, tudo isso relacionado ao herói e ao autor-
artista. A valoração positiva ou negativa ocorre neste ponto. Já que o leitor esteve
afastado para a leitura, deve voltar, entretanto, esse retorno adiciona algo à
constituição dele mesmo. As características culturais daquele “antigo” leitor, que
incluiu os centros de valores, tanto do heroi-lírico como do autor-artista, englobam
todos eles, ou seja, o “eu” do leitor é distinto do próprio leitor. Dessa forma,
105
considerando o ato da empatia, do ponto de vista temático, tal objeto, será sempre
uma experiência positiva ou negativa, conforme o valor, para cada leitor.
Desse modo, a análise de um poema, pelo viés bakhtiniano, deve considerar o
conteúdo, o material e a forma, sendo que o conceito material nos lembra que todo
esse processo de análise, somente é possível por conta de nossa concepção de
língua como interação – fenômeno extraordinário – duplicidade de centros de valores,
em que os relacionamentos do mundo real e da ficção fluem infinitamente, com o
acréscimo de que o contemplador tem participação ativa nas criações ficcionais.
A análise, na sala de aula, portanto, em nossa opinião, precisa ser realizada
“na prática” e não somente na esfera científica, já que a partir dessa demonstração,
feita por Bakhtin (1920-24), verificamos a existência de relações dialógicas, na vida
(ética) e na arte literária (estética). Desse modo nessa inter-relação que resulta em
uma obra artística verificamos a participação ativa entre o autor-artista, o autor-criador
e o contemplador como seres ativos no processo da criação.
Bakhtin/Volochinov (2010[1929]) afirma que a verdadeira natureza da língua
não constitui as formas linguísticas do código, nem manifestações monológicas
isoladas, menos ainda atos fisiológicos de produção, mas sim “fenômeno social da
interação verbal” (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2010[1929], p. 127), ou seja, uma língua
real e que evolui continuamente. Então,
O diálogo, no sentido estrito do termo, não constitui, é claro, senão uma das formas, é verdade que das mais importantes, da interação verbal. Mas, pode-se compreender a palavra ‘diálogo’ num sentido amplo, isto é, não apenas como comunicação em voz alta, de pessoas colocadas face a face, mas toda comunicação verbal, de qualquer tipo que seja. (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2010[1929], p. 127).
Como Bakhtin/Volochinov (2010[1929]) opõe-se às abordagens objetivistas e
idealistas da linguagem, a interação verbal designa trocas verbais e respostas entre
interlocutores. O ato de fala, desde o início, surge em uma relação estabelecida no
ambiente da “arena em que se defrontam e lutam duas entonações, dois pontos de
vista, dois discursos” (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2010[1929], p. 174). Essa dinâmica
se dá em um cenário de conflitos ideológicos e, nesse caso, não suscita respostas
mecânicas ou automáticas, antecipam o conteúdo das reações dos interlocutores do
diálogo, esses materializam suas respostas a partir da compreensão ativa responsiva
originando novos sentidos. Assim,
106
A orientação dialógica é naturalmente um fenômeno próprio a todo discurso. Trata-se da orientação natural de qualquer discurso vivo. [...] o discurso se encontra com o discurso de outrem e não pode deixar de participar, com ele, de uma interação viva e tensa. Apenas o Adão mítico que chegou com a primeira palavra num mundo virgem, ainda não desacreditado, somente este Adão podia realmente evitar por completo está mútua orientação dialógica do discurso alheio para o objeto. (BAKHTIN, 2010[1934-1935], p. 88).
Bakhtin (2010[1934-1935]) diz que uma orientação interna e constitutiva da
linguagem é fundamentada em dois preceitos. O primeiro, a vinculação com os
enunciados já ditos e noções concebidas anteriormente por outras pessoas e o
segundo, a presunção da resposta do outro, respostas conforme a compreensão ativa
do interlocutor. Embora essa dialogicidade interna seja adquirida por meio do contato
com o outro, na sociedade, ela se dá na subjetividade do falante, constituindo a
formação de sua própria consciência, já existem nesse ambiente duas consciências
em diálogo simultâneo. Entrelaçamento da consciência em formação e de tudo que é
percebido no social, por exemplo, ao aceitarmos uma regra já estabelecida ou não.
Por isso, temos discursos que, por um lado se mostram monológicos, mas, por outro,
são dialógicos.
Sobral (2009), em harmonia com o pensamento de Bakhtin e o Círculo, a
respeito do discurso, comenta a dialogicidade discursiva, esta responsável por
podermos visualizar, principalmente na contemporaneidade, em unidade de sentido
os diferentes discursos, inclusive os poemas. Sobre esse movimento interativo tanto
com o passado como com o futuro o dialogismo
[...] busca dar conta do elemento constitutivo não apenas dos discursos como da própria linguagem e mesmo do ser e do agir humanos. Para o Círculo, a recepção presumida dos discursos é tão parte da criação do sentido quanto o são sua produção e sua circulação: não há sentido fora da diferença, da arena, do confronto, da interação dialógica, e assim como não há um discurso sem outros discursos, não há eu sem outro, nem outro sem eu. (SOBRAL, 2009, p. 20).
Sobral (2009) comenta a respeito das dimensões do enunciado: a constitutiva
inerente ao ato da enunciação, em que pronunciamos palavras que já foram ditas por
outras pessoas, mas que quando nós as pronunciamos tornam-se nossas.
Também, os aspectos presumidos geradores de sentidos, a produção e a
circulação de um enunciado que ocupam o mesmo plano de relevância na criação de
107
um enunciado, por isso os enunciados somente realizam-se nas interações sociais e
o eu e o outro, com todas as suas diferenças, completam as lacunas em branco
reciprocamente e, ainda, a terceira, a formadora da consciência do indivíduo, pois tal
formação tem início nas relações, no meio social. Dessa forma, podemos dizer que
em todos os poemas há relações dialógicas, ainda que de modos diferentes.
Considerando, então, as dimensões constitutivas do enunciado não pode haver
enunciado, que seja apenas monológico, poderia sim ter uma tendência ao
monologismo, por exemplo, uma ordem. Contudo, mesmo assim, essa ordem estaria
formando o caráter de alguém. Ou como o próprio Sobral (2009) diz:
Aquele que se mostra, em termos de sua organização, e de seu projeto enunciativo [...], voltado, tanto em termos de incorporação como de negação, para a “neutralização”, na superfície discursiva, das vozes que o constituem, pondo em destaque a voz do locutor/enunciador, ou seja, criando o efeito de instauração de uma só voz como a voz dominante. (SOBRAL, 2009, p. 20).
Dizendo em outras palavras, vozes de discursos sociais dominantes. “A palavra
mais monológica não é senão o grau mais baixo de alusão à palavra do outro”
(PONZIO, 2010, p. 38). Retornamos, portanto, ao ponto principal deste tópico: todo e
qualquer discurso tem um componente dialógico.
Para Bakhtin/Volochinov (2010[1929]) é no terreno da linguagem, na interação
verbal, que se dá o amplo processo de transmissão e recepção de informações e,
nesse processo, são incorporados todos os tipos de comunicação denominados, pelo
filósofo, russo como diálogo, inclusive, a poesia.
Quando se leva em conta o “confronto” de vozes de que fala o Círculo, percebe-se com clareza que todo discurso (e mesmo toda palavra) é arena, lugar de confronto, de presença do outro, não se podendo pois conceber um discurso monológico como discurso que neutralize todas as vozes que não a daquele que enuncia (SOBRAL, 2009, p. 24).
De acordo com Sobral (2009) os textos poéticos, ainda que sejam os poemas
épicos, que apresentam personagens sem representação de diálogo face a face,
tendem a somente deixar que sobressaia a voz objetivada (tematizada) do poeta,
mesmo que haja a forma convencional do diálogo, enquanto nos textos prosaicos, há
uma grande variedade de diálogos.
108
Concordamos com Padilha (2005), no seguinte: antes é necessário refletirmos
sobre a concepção de romance, para chegarmos ao conhecimento da noção de
poesia.
Bakhtin (1934), ao discorrer sobre as particularidades de O Discurso na Poesia
e o Discurso no Romance diz ser complicado compreendermos, às vezes, o tema nos
discursos. Isso, deve-se ao fato de que já incidiu sobre as palavras um
desacreditamento sócio-verbal em que as palavras já avaliadas, retomadas e com
novas nuanças de sentidos retornam ao contexto real comunicativo.
Desse modo, para o filósofo russo, é necessário conhecer a natureza do
enunciado e as relações estabelecidas entre as esferas e os gêneros e as
características destes. Dessa maneira, não corremos o risco de analisar o enunciado
formalmente como se fossem apenas formas abstratas da língua.
Já nas considerações de Medviédev (2012[1928]), todos os enunciados – os
das esferas ideológicas – obedecem às condições de exigência da avaliação social,
inclusive os enunciados complexos do campo literário e uma “combinação de palavras
em um enunciado concreto ou em uma apresentação literária é sempre determinada
pelos seus coeficientes de avaliação e pelas condições sociais de realização desse
enunciado” (MEDVIÉDEV, 2012[1928], p. 187).
Medviédev (2012[1928]) diz que, apesar de sua preocupação se ocupar em
caracterizar o enunciado poético, a avaliação social está presente em todos os
enunciados concretos e singulares, pronunciados em todos os campos da
comunicação humana, ainda que eles sejam compostos por uma única palavra, pois
o enunciado concreto é um elemento da comunicação inerente à vida, é
[...] um fenômeno histórico. [...] possui significado histórico e social, [...] também, o próprio fato de sua pronúncia e, em geral, de sua realização aqui e agora, em dadas circunstâncias, em dado momento histórico, nas condições de dada situação social. (MEDVIÉDEV, 2012[1928], p. 183).
Toda modificação feita pelo ser humano se torna, em algum período de tempo,
objeto histórico. Seja uma transformação na natureza, seja uma modificação
tecnológica ou uma criação intelectual. Nesse sentido, quando o homem cria um
"enunciado concreto", o que se insere na criação intelectual, o enunciado poderá em
algum período histórico virar objeto de análise científica das ciências humanas. Ora,
tal relação ocorre devido ao sentido, ao significado que esse enunciado teve no
109
momento da sua criação. Em outras palavras, quando o poeta, ou qualquer outro
intelectual, molda seu enunciado, este tem um sentido, uma significação, uma
relevância para a compreensão de algum aspecto sócio-histórico naquele momento,
assim a circunstância daquele momento deve ser contextualizada com outras fontes
de análise no hoje, no aqui e agora.
Nessa perspectiva, de acordo com Medviédev (2012[1928]), cabe à avaliação
social atualizar o ato, pois é imprescindível tentar perceber se tal ato se tornou um fato
social. Vale ressaltar que, na teoria de Émile Durkheim (1858-1917), o fato social, que
tem como características ser externo ao indivíduo, ser coercitivo e universal, tende a
impor, às vezes de modo imperceptível embora presente, a intenção do enunciado. O
ato enunciativo ao se tornar um fato social desencadeia toda uma estrutura, toda uma
engrenagem social que proporcionará a sua própria continuidade mesmo que esta
seja a visão de um grupo dominante ou de um único enunciador, o que estabelece por
sua vez o próximo enunciado, já possuidor de um conteúdo e uma forma pré-definida
amplamente (re)conhecida pelos indivíduos que o legitimam.
Por isso, “a avaliação social determina todos os aspectos do enunciado,
penetrando-o por inteiro, porém, ela encontra a expressão mais e típica na entonação
expressiva” (MEDVIÉDEV, 2012[1928], p. 185). Disso, Medviédev (2012[1928])
conclui, sobre o enunciado, que ele não pode ser analisado distanciado da
comunicação social, pois ele se tornaria objeto. A palavra como símbolo, suas formas
gramaticais definidas a partir do ponto de vista da linguística são sinais técnicos com
apenas um sentido e que ainda não foram individualizados na história. Assim a
avaliação social surge da renovação do enunciado.
Precisamos compreender o enunciado “no contexto da sua contemporaneidade
e da nossa (caso elas não coincidam). É necessário compreender o sentido do
enunciado, o conteúdo do ato e a realidade histórica” (MEDVIÉDEV, 2012[1928], p.
185). Portanto, aquela avaliação social é demonstrada com mais intensidade na
entonação expressiva do enunciado, ela é quem
dá cor a cada palavra do enunciado reflete sua singularidade histórica, diferente da entonação sintática que é mais estável. O caráter expressivo é determinado não pelo esquema lógico do sentido, mas por toda a sua plenitude e integridade individual, e por toda sua situação concreta e histórica. Da mesma forma, a entonação expressiva dá cor ao sentido e ao som, aproximando-os de forma intima na união peculiar do enunciado. (MEDVIÉDEV, 2012[1928], p. 185).
110
Conforme Medviédev (2012[1928]), a palavra entra no enunciado por meio da
vida, em que de enunciado em enunciado vai se construindo a comunicação, então,
essas palavras, seguramente, só entram nos enunciados com a permissão da
avaliação social. E isso diz respeito tanto ao enunciado das diversas esferas
ideológicas quanto ao enunciado poético.
Neste trabalho, foi possível compreendermos que o enunciado é a unidade da
comunicação real, com suas próprias caraterísticas singulares e a necessidade de ele
ser analisado, por meio das interações reais da comunicação. Além disso, convém
sabermos sua natureza e, também, como se dão suas relações nas esferas
comunicativas. Por final, percebemos que a avaliação social é responsável por cada
novo enunciado concreto.
Retornando ao que dissemos sobre a Teoria da Comunicação em que
A compreensão passiva do significado linguístico de um modo geral não é uma compreensão; é apenas seu momento abstrato, mas é também uma compreensão passiva mais concreta do sentido da enunciação, da idéia do falante. Permanecendo puramente passiva, receptiva, não trazendo nada de novo para a compreensão do discurso, ela apenas o dubla, visando, no máximo, a reprodução completa daquilo que foi dado de antemão num discurso já compreendido. (BAKHTIN, 1934, p. 90).
E Bakhtin (1934) acrescenta mais adiante que o falante (emissor) fica isolado,
não ultrapassa seus próprios limites de contexto ou de círculo, não deixando espaço
para a compreensão, réplicas e outros novos sentidos. Entretanto, nas interações
reais discursivas “a compreensão concreta é ativa”, porque apenas na resposta – na
dialogicidade - é que encontramos graus diferentes de entendimento. (BAKHTIN,
1934, p. 90).
Dessa forma, portanto, em um poema poderíamos encontrar o discurso alheio
e/ou vozes, por exemplo, expresso em uma língua estrangeira, mas ainda temos o
dialogismo constitutivo de toda linguagem, em que Bakhtin (1934) assegura que
apenas o Adão bíblico “podia evitar por completo esta mútua orientação dialógica do
discurso alheio para o objeto” (BAKHTIN, 1934, p. 88).
O projeto discursivo de Bakhtin era representar a arquitetônica de um mundo
real, mas representado na estética. Pensamos que o empreendimento bakhtiniano
pode ser transposto para o ensino da língua materna nas escolas, inclusive pelo
111
material didático OLPEF, porque Bakhtin (1920-24) nos leva ao entendimento de que
seus estudos partem de bases literárias para tratar temáticas relativas à linguagem.
Na obra de Cristovão Tezza Entre a prosa e a poesia: Bakhtin e o formalismo
russo, no quarto capítulo, o professor tenta articular as considerações bakhtinianas
sobre as diferenças entre o discurso prosaico e o discurso poético. Tomando como
base as distinções feitas por Bakhtin (1934), denomina as considerações do filósofo
russo como tese ou hipótese bakhtiniana.
Ao longo da história há processos de centralização e descentralização na
existência da corrente verbal e ideológica de todas as línguas. Nesse contexto o
discurso poético configura a “expressão das forças centrípetas da linguagem; e o
discurso romanesco das formas centrífugas” (PADILHA, 2005, p. 29). A pesquisadora
cita as palavras de Tezza (2003) afirmando que “O estilo poético necessitaria [...] de
uma ‘atitude isolante diante do plurilinguismo’, um ‘apagamento deliberado da
dimensão dialógica da palavra’, a linguagem num poema se realiza como algo
‘indiscutível’, ‘indubitável’, englobante’ (PADILHA, 2005, apud TEZZA, 2003, p. 277)
Ao escolhermos, então, seguir a orientação dialógica da linguagem bakhtiniana
e de seu Círculo, devemos pensar em qualquer discurso, inclusive o poético, como
manifestação viva da linguagem. “Porque neles se instauram e reinstauram relações
dialógicas diversas, cujos níveis vão aflorar ou ‘hibernar’ de acordo com movimentos
e fatores sócio-historicamente determinados” (BAKHTIN, 1929, p. 123).
Tipos de enunciados – os gêneros discursivos –, por conta do momento verbal
e da demanda de cada esfera da sociedade, são criados, estabilizados, legitimados e
oficializados como “forma prototípicas”. Ex.: nos gêneros poéticos temos “o soneto, e
os versos decassílabo e alexandrino” (PADILHA, 2005, p. 30).
Dessa forma, “os gêneros poéticos serviram, sim, à centralização, à unificação,
e o romanesco era expressão ainda nascente, das forças descentralizadoras, em
oposição à vida linguística-ideológica oficial” (PADILHA, 2005, p. 30).
Desse modo, portanto, é que precisamos entender o texto poético como
centralizado e o discurso romanesco como descentralizado, mas conforme Tezza
(2003) ainda vai haver outra forma de descentralização e centralização – que não
pode ser mecânica, porque na língua tudo acontece de fora para dentro e de dentro
para fora.
A atitude do poeta é responsável por decidir todas as ações do herói (lírico) e
seu tema tendo como base a relação autor-herói-objeto. Tudo isso resulta na
112
“composição formal e [...] a centralização ou descentralização do discurso, a presença
ou não da palavra alheia” (PADILHA, 2005, p. 32).
Padilha (2005), nos alerta sobre a referência de Mikhail Bakhtin no texto, em
que ele discorre sobre o romance de Dostoievski com as muitas vozes, consciências
independentes umas das outras que não se mesclam e a polifonia, pois o filósofo
russo delineia algumas características que diferenciam o discurso poético do discurso
no romance. A esse respeito Bakhtin(1961) esclarece que ele considera o “discurso
[...] em sua integridade concreta e viva, e não a língua como objeto especifico da
linguística, [...] abstração absolutamente legítima e necessária de alguns aspectos da
vida concreta do discurso” (BAKHTIN, 1961, p 207).
O discurso poético, no sentido restrito, requer a uniformidade de todos os discursos, sua redução a um discurso do primeiro tipo ou pertencer a variedades atenuadas de outros tipos. Aqui, evidentemente, também são possíveis obras que não reduzem toda a matéria de seu discurso a um denominador; embora esses fenômenos sejam raros e específicos no século XIX. Situamos nesse contexto a lírica “prosaicização” de Heine, Barbier, Niekrássov e outros (só no século XX ocorre uma acentuada “prosação” da lírico). Uma das peculiaridades essencialíssimas da prosa está na possibilidade de expressividade acentuada sem reduzi-los a um denominador comum. Nisso reside a profunda diferença entre os estilos em poesia e em prosa. Mas, na poesia toda uma série de problemas essenciais tampouco pode resolver-se sem incorporação daquele plano de exame do discurso, porque diferentes tipos de discurso requerem em poesia elaboração estilística diversa. (BAKHTIN, 1961, p. 174).
Padilha (2005) explica a declaração bakhtiniana em afirmar a respeito da
problemática dos tipos de discurso prosaico ao analisarmos textos poéticos. “O
tratamento ‘estilístico’ diferente aponta para uma crítica a uma estilística que só
conhece e só sabe pensar seu objeto em termos de uma fala direta pertencente ao
autor e orientada para o referente” (PADILHA, 2005, apud BAKHTIN, 1961, p. 174).
Para Bakhtin (1961) as falas estão inter-relacionadas. Um enunciado poético é
concreto, configura o início de um texto com diferentes significações e tem como
participantes ativos um autor, um herói e um ouvinte, que “fisicamente” estão
localizados em um determinado período de tempo e espaço real. Assim, o enunciado
adquire suas próprias marcas – impossíveis de serem apagadas – orientadas para os
dois lados: do autor para o herói e o tema, simultaneamente, a outra orientação parte
do ouvinte em direção ao objeto e ao herói.
113
Bakhtin (1920) pensava dessa forma em relação ao princípio criador na relação
entre o autor e o herói, isto é, uma oposição dele ao texto de Barthes, mesmo antes
deste ter escrito algo sobre “A morte do autor”, nas palavras de Padilha (2005):
Subvertendo a ordem cronológica dos fatos, Bakhtin, nos textos de 1920-1930, em defesa do princípio criador na relação do autor e do herói, já constatava a imensa confusão contestada por Barthes e parece responder, anos antes ao alarde e ao que foi alardeado, anos depois. (PADILHA, 2005, p. 34). A prática mais corrente consiste em extrair um material biográfico de uma obra e, inversamente, em explicar uma obra pela biografia, contendo-se com uma coincidência entre fatos pertencentes respectivamente à vida do herói e à do autor [...] Denunciamos simplesmente o procedimento puramente factual, desprovido de qualquer princípio, tal como é praticado atualmente, baseado na confusão total entre o autor-criador, componente da obra, e o autor-homem., componente da vida (BAKHTIN, 1920-1930[1979], p. 29-31).
Do ponto de vista bakhtiniano (1930) são destacados o movimento produtivo da
atividade criadora uma reação ativa e englobante do autor sobre o herói:
Um autor não é o depositário de uma vivência anterior, e sua reação global não decorre de um sentimento passivo ou de uma percepção receptiva; o autor é a única fonte de energia produtora da forma, a qual não é dada à consciência psicologizada, mas se estabiliza em um produto cultural significante (BAKHTIN, 1920;1930[1979], p. 28)
Nesse fragmento, percebemos a imprescindível atuação do autor. Padilha
(2005) explica que do ponto de vista bakhtiniano o autor é aquele que produz com
participação ativa e os julgamentos valorativos dele decidem ativamente na
construção da obra. Por isso, o autor não pode ser como queria Barthes um produtor
com “papel passivo, receptivo de formas e discursos anteriores” (PADILHA, 2005, p.
34).
Como os julgamentos de valor são decisivos para a seleção de palavras em
uma obra, Padilha (2005) nos relembra outros textos a respeito:
Julgamentos de valor antes de tudo, determinam a seleção de palavras do autor e a recepção desta seleção (a co-seleção) pelo ouvinte. O poeta, afinal, seleciona palavras não do dicionário, mas do contexto da vida onde as palavras foram embebidas e se impregnaram de julgamentos de valor [...] (BAKHTIN/ VOLVOCHINOV, 1926, p. 11).
114
Todos os elementos do estilo de uma obra poética estão também impregnados da atitude avaliativa do autor com relação ao conteúdo e expressam sua posição social básica. Frisemos uma vez mais que aqui não nos referimos que aquelas avaliações ideológicas que estão incorporadas no conteúdo de uma obra na forma de julgamentos ou conclusões, mas àquela espécie mais entranhada, mais profunda de avaliação via forma que encontra expressão na própria maneira pela qual o material artístico é visto e disposto (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 1926, p. 14).
A intenção de Padilha (2005), foi demonstrar que a relação entre autoria, estilo,
forma, apreciação valorativa estabelecida por Bakhtin é essencial demonstrar que o
poeta e o prosador na posição de autores de enunciados poéticos diferentes,
assumem posições díspares frente aos seus objetos. Cada um desses artistas
escolhem estabelecer relações não semelhantes com a matéria prima, que resultam
em obras artísticas com aspectos diversos, porque o material bruto linguístico já está
embebido de posicionamentos avaliativos, anteriores.
Padilha (2005) conclui que, se na visão bakhtiniana, os enunciados participam
ativamente dos diálogos de todo o contexto social e de infinitas formas, seus discursos
são aproximados de seus objetos enunciativos, essa concretização é realizada de
maneira diferente, ou seja, no discurso poético a orientação se dá sem intermediários,
já no discurso romanesco as vozes alheias são presentes.
Se representarmos a intenção, isto é, a orientação sobre o objeto de tal discurso pela forma de um raio, então nós explicaremos o jogo vivo e inimitável de cores e luzes nas facetas da imagem que é construída por elas, devido à refração do ‘discurso-raio’ não no próprio objeto (como jogo de imagem-tropo do discurso poético no sentido restrito, na ‘palavra isolada’), mas pela sua refração naquele meio do discurso alheios, de apreciações e de entonações através do qual passa o raio, dirigindo-se para o objeto. A atmosfera social do discurso que envolve o objeto faz brilhar as facetas de sua imagem (PADILHA, 2005, apud BAKHTIN, 1934-35, p. 87).
Em mais um excerto de Bakhtin (1934) vemos particularidades essenciais do
discurso poético e prosaico. Padilha (2005) torna claro que a ação do prosador é
permitir a expansão de vozes em meio à totalidade discursiva, ao contrário, no caso
do poeta, a ação é a de isolar. Então, em um espaço e tempo determinados, há um
encontro entre o artista e o objeto. Nesse momento, a linguagem artística (a forma e
o conteúdo) é produzida pelo autor-criador e como co-participante ativo entra em cena
115
o leitor, resultando em uma obra com vida própria. Percebemos, assim, nessa
diferenciação a importante característica do discurso poético – o isolamento.
De acordo com Padilha (2005), “O isolamento a que se refere Bakhtin é [...]
uma marca da atitude do poeta em relação ao seu objeto” (PADILHA, 2005, p. 36).
Pois, ao manusear o material verbal o isolamento da palavra usada no cotidiano é
feito na própria linguagem do poeta. Esse trabalho artístico insere e o integra na
própria obra de arte.
Para Bakhtin, além de nos fazer notar o discurso poético, tal isolamento é
inerente ao conteúdo. “O isolamento ou a separação não se relacionam nem com o
material, nem com a obra, como coisas, mas com o seu significado, com o seu
conteúdo, que liberta de algumas ligações indispensáveis com a unidade da natureza
do evento ético do ser” (BAKHTIN, 1924, p. 59-60).
Segundo Padilha, novamente, temos o conceito de estilo, isto é, uma relação
entre “forma-autor, material e conteúdo” (PADILHA, 2005, p. 36).
O isolamento torna possível pela primeira vez a realização positiva da forma artística, pois possibilita uma relação não cognitiva e não ética com o acontecimento, possibilita uma livre moldagem do conteúdo, libera a atividade do nosso sentimento do objeto, do sentimento do conteúdo e libera também todas as energias criativas desse sentimento. Assim o isolamento é a condição negativa do caráter pessoal, subjetivo (mas não psicologicamente subjetivo) da forma; ele permite que o autor-criador se torne um elemento constitutivo da forma (PADILHA, 2005, apud BAKHTIN, 1924, p. 59-61).
Como explica Padilha (2005) o autor-criador em sua relação espaço-temporal-
avaliativa toma conhecimento da palavra habitual e a isola para que o conteúdo
(semântica) dela, por meio dos sons, do ritmo, das imagens, sejam combinadas e
tragam novidades que não façam parte da rotina nem do âmbito em que vivem as
pessoas. Nesse sentido,
A língua do poeta é sua própria linguagem, ele está nela e dela é inseparável. Ele utiliza cada forma, cada palavra, cada expressão no seu sentido direto (por assim dizer, “sem aspas”), isto é, exatamente como a expressão pura e imediata de seu pensar. Quaisquer que tenham sido as “tormentas verbais” que o poeta tenha sofrido no processo de criação, na obra criada a linguagem passa a ser um órgão maleável, adequado até o fim ao projeto do autor. (PADILHA, 2005, apud BAKHTIN, 1934-1935, p. 94).
116
No discurso poético, apesar das tormentas verbais enfrentadas pelo poeta
durante o processo de criação da obra poética, a linguagem torna-se adequada ao
projeto discursivo do autor até o final do trabalho, sendo que o modo de apropriação
das formas, das palavras e das expressões é de modo direto (expressão pura e
imediata de seu pensar) sem a intermediação das aspas para demarcar discursos os
alheios.
Na imagem poética, em sentido restrito (na imagem-tropo), toda ação, a dinâmica da imagem-palavra, desencadeia-se entre o discurso (em todos os aspectos) e o objeto (em todos os seus momentos). A palavra imerge-se na riqueza inesgotável e na multiformidade contraditória do próprio objeto com sua natureza “ativa” e ainda “indisível”; por isso, ela não propõe nada além dos limites de seu contexto (exceto naturalmente o tesouro da própria língua). A palavra esquece a história da concepção verbal e contraditória do seu objeto e também o presente plurilíngue dessa concepção. (BAKHTIN, 1934-1935, p. 87).
No poema, as imagens-tropo (as figuras de linguagem) adquirem movimento
em uma ação dinâmica entre a imagem e a palavra. Esse movimento suscita entre o
aspecto cientifico, religioso, filosófico, poético etc, por exemplo, e o objeto em todos
os espaços de tempo. Mas, o compromisso do poeta é com a arte linguística dele e,
por isso em seu objeto não há contaminação com os discursos vigentes do outro. O
poeta, apenas, usando suas figuras de linguagem é capaz de criar, descrever, definir
sem se importar com a historicidade da língua ou contextos externos.
Padilha (2005) recorre a Antônio Candido (1992) para nos auxiliar no
esclarecimento do trecho de Bakhtin (1934), em que, por meio da mobilização das
imagens-tropo13 o poeta pode construir, desfazer ou refazer um universo de
novidades.
Portanto, na comparação, sobretudo em sua forma mais radical, a metáfora, o mundo está e não está presente. De fato, graças a ela o escritor acentua a intensidade da analogia até parecer que não há mais mundo, mas sim uma mensagem com vida própria, podendo inclusive não se referir a algo que a experiência comprove. (...) Nesse processo de desfazer a realidade o mundo se vai desfigurando e o objeto referido pela palavra parece passar dele para ‘dentro’ do discurso. Aparentemente, não é mais o mundo, é outra coisa, que parece não existir fora dos limites do texto. (PADILHA, 2005, apud CANDIDO, 1992, p. 41-42).
13 Conforme Padilha “compreendo a expressão imagem-tropo por todos os recursos expressivos da língua, as chamadas figuras de linguagem da qual o poeta lança mão ao criar um poema: metáforas, metonímias, antíteses, aliterações etc.” (PADILHA, 2005, p. 37).
117
Padilha (2005) completa o raciocínio, ou seja, Cândido dialoga muito bem a
respeito do “esquecimento” de que fala o filósofo russo. Trata-se do autor-homem
fazer “ressurgir sob a autoridade da voz do poeta [...] o mundo refeito pela linguagem”
(PADILHA, 2005, p. 38).
Ao contrário da descentralização do discurso romanesco, o poeta centraliza sua
linguagem, fecha-se em seu próprio trabalho, com a língua, garantindo para sua
criação a autoridade semântica do texto. Nesse ponto Padilha (2005) nos lembra a
distinção bakhtiniana entre sinal e signo relacionada à linguagem, em outras palavras,
o artefato representando a língua e o poema a obra artística. A pesquisadora retorna
a Bakhtin.
Nos gêneros poéticos, a consciência literária (no sentido da unidade de todas as intenções semânticas e expressivas do autor) realiza-se inteiramente na sua própria língua; ela é inteiramente imanente, exprimindo-se nela direta e espontaneamente sem restrições nem distâncias. A língua do poeta é sua própria linguagem, ele está nela e é dela inseparável. Ele utiliza cada forma, cada palavra, cada expressão no seu sentido direto (por assim, dizer, “sem aspas”), isto é, exatamente como a expressão pura e imediata de seu pensar. Quaisquer que tenham sido as “tormentas verbais” que o poeta tenha sofrido no processo de criação, na obra criada a linguagem passou a ser um órgão maleável, adequado até o fim ao projeto do leitor. (BAKHTIN, 1934-1935, p. 93-94)
Como Bakhtin explica a consciência literária – unidade da intenção expressiva
e semântica do autor realizada inteiramente na língua dele – “é imanente, exprimindo-
se nela direta e espontaneamente sem restrições nem distância” (PADILHA, 2005,
apud BAKHTIN, 1934-1935[1975], p. 93-94). A língua em que o poeta escreve é a
linguagem dele, o poeta está representado nessa linguagem e não pode separar-se
dela.
O poeta utiliza formas, palavras e expressões no sentido direto – discurso direto
– sem citar o discurso de ninguém, isto é, como uma expressão pura e imediata de
seu próprio pensamento. Mesmo que o poeta tenha tido “tormentas verbais” no
processo de criação, a linguagem na obra criada (resultado) passa a ser um órgão
maleável, que se adequa até o fim ao projeto do autor.
A particularidade do “oficio” do poeta é denominada de “consciência literária”,
uma junção de todas as expressões e significações do querer do poeta são
concretizadas na língua dele mesmo. Ele faz todas as escolhas verbais ou semânticas
118
conforme sua própria vontade. Grosso modo, o trabalho é do poeta sem a interferência
do discurso de mais ninguém e, por isso quem está definitivamente representado na
linguagem poética é o poeta.
Como Bakhtin em “diversas” considerações esclarece que o discurso poético é
centralizador, tal afirmação pode ser confundida com compreensões voltadas para
que a centralização corresponda a discurso monológico e autoritário, ao contrário do
discurso romanesco. Vejamos o que nos diz Tezza (2003):
A ideia de centralização da linguagem é um conceito complexo, e seria pueril toma-lo apenas no sentido “autoritário”, que o termo implica, dando a essa entonação, digamos assim, como diriam Bakhtin e Voloshinov, uma marca temática ou ideológica necessariamente excludente. Há muitos planos a considerar no aspecto centralizador do estilo poético, e o primeiro deles é também estritamente formal, como queriam os formalistas (e paravam aí). Do ponto de vista da linguagem, a centralização não é primordialmente um fenômeno temático (manifestação de uma opinião “autoritária”, por exemplo, que exigiria a análise conteudística do momento verbal, o seu “tema” para decidir o grau de “autoridade”), mas dialógico; na sempre dupla orientação da palavra, é preciso avaliar que espaço o meu centro de valor dá ao centro de valor alheio e a todos os centros de valores que pulsam no objeto quando a ele me refiro. (TEZZA, 2003, p. 258).
Para Padilha (2005), se o discurso poético, na visão bakhtiniana, a realização
da linguagem se dá como algo indubitável, indiscutível, englobante, porque a língua
do poeta é a própria língua da obra, ela não comporta controvérsias, nada pode ser
contestado. “A ideia da pluralidade de mundos linguísticos, igualmente inteligíveis, e
significativos, é organicamente inacessível para o estilo poético” (BAKHTIN, 1934, p.
94).
No poema, ainda que não haja diferentes linguagens sociais ou ideológicas,
existe no âmbito de nosso cotidiano, em nossos parâmetros éticos ou cognitivos, são-
nos dadas possibilidades de liberdade para contestarmos a palavra do outro. Na
contemplação do artístico, porém, isso nos é proibido, exceto, como diz Padilha
(2005), seria possível discordarmos “desta imagem se pudéssemos, outrossim, na
posição de poetas, contrapor a ela outra imagem” (PADILHA, 2005, p. 40).
Padilha (2005) complementa citando o próprio Bakhtin.
Na obra poética a linguagem realiza-se como algo indubitável, indiscutível, englobante. Tudo o que vê, compreende e imagina o poeta, ele vê, compreende e imagina com os olhos da sua linguagem, nas formas internas, e não há nada que faça sua enunciação sentir a necessidade de utilizar uma linguagem alheia, de outrem. A ideia da
119
pluralidade de mundos linguísticos, igualmente inteligíveis e significativos, é organicamente inacessível para o estilo poético. (BAKHTIN, 1934, p. 94).
De acordo com Bakhtin (1934), as condições para a realização da intenção
individual e direta do caráter poético são as formas linguísticas dispostas, pelo poeta,
e a qualidade de ser unicamente dele originadas, a partir da fluência de seu intelecto.
Entretanto, o filósofo apresenta uma exceção, isto é, o plurilinguismo (as outras
linguagens sócio-ideológicas) podem ser encontradas em gêneros poéticos
‘inferiores’, sátiras, comedias etc. Por exemplo, nas falas dos personagens como
objetal essencialmente “como uma ‘coisa’ e não no mesmo plano da linguagem real
da obra: trata-se do gesto representado do personagem e não do discurso que
representa” (BAKHTIN, 1934, p. 94-95).
De tudo o que já vimos, no Material do OLPEF, considerando a teoria
enunciativo-discursiva bakhtiniana, mais uma vez, o Caderno demonstra que há uma
preocupação com os elementos do poema e que nos aproximariam do pensamento
bakhtiniano, se não fosse o privilégio da forma, que somados totalizam 75% das
atividades, e desprezam alguns pontos do dialogismo, uma vez que aparece apenas
em 25% do conjunto, ou seja, 3/4 do caderno ensaiam as relações dialógicas.
3.7 Exame do corpus: o oculto bem à vista no Caderno Poetas da Escola
Quantos véus que escondem a face do ser mais próximo, não precisamos [...] levantar, véus
depositados nele pelas casualidades de nossas reações, de nosso relacionamento com ele
e pelas situações da vida, para ver-lhe o rosto em sua verdade e seu todo
Mikhail Bakhtin
Após termos descrito sucintamente a organização interna de cada uma das
oficinas, no capítulo 5 e anteriormente termos apresentado alguns gráficos para
facilitar a visualização do quadro geral das atividades, analisaremos agora algumas
atividades as quais são pertinentes ao tema geral desta pesquisa, que consiste em
investigar os indícios relacionados ao processo de ensino-aprendizagem das autoras
do Caderno Poetas da Escola, no sentido da qualidade de formação do aluno em
leitores e produtores do gênero literário poema, nas escolas públicas brasileiras.
120
Por enquanto, as informações estão dizendo o que nosso olhar comum já havia
observado: uma tendência formal. Em seguida, foram surgindo outros aspectos, por
exemplo, a nulidade discursiva, isso caracteriza ocultação dialógica bastante visível,
mas continuemos nossa investigação.
Nesta seção, analisaremos de forma mais detalhada nosso corpus, 5 oficinas,
as quais pensamos serem as mais representativas, conforme os aspectos que
buscamos identificar e comentar durante o percurso de nossa pesquisa, ou seja, como
vem sendo tratado o gênero poema no Caderno do professor da OLPEF e como
poderia ter sido se o método de análise sociológico bakhtiniano tivesse sido adotado
como referencial teórico da elaboração e operacionalização das atividades no
decorrer da sequência.
Após reler este material, nós decidimos pelas oficinas 1, 2, 6, 7 e 8, que
parecem ser as que mais representam a dimensão formal e que, de acordo com nossa
perspectiva discursivo-enunciativa de Bakhtin, encontramos menor ênfase nesses
aspectos.
3.7.1 OFICINA 1 – Memória de versos e mural de poemas
Na realidade, todo signo ideológico vivo tem, como Jano, duas faces.
Bakhtin/Volochinov
Figura 7 – Oficina 1
Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 24-25.
121
A oficina de número 1, intitulada “Memórias de versos e mural de poemas”, visa
à consideração da cultura do aluno, ativação do conhecimento e, também, o
reconhecimento de formas poéticas. Essa oficina está dividida em três etapas de
atividades. Na primeira etapa, é feito levantamento do conhecimento prévio sobre
poemas, para diagnosticar, com o intuito de descobrir se há ou não apreciação do
gênero, o que motivou tal gosto e, também, uma identificação dos elementos formais
como ritmo, rima e forma.
Nessa atividade, temos pontos relevantes a serem comentados. A preocupação
com o diagnóstico inicial nos lembra a teoria vygotskyana, uma vez que tal
procedimento e detecção dos conhecimentos prévios pode tornar mais eficaz e
eficiente o ensino-aprendizagem da língua e, também, que a cultura do aluno está
sendo admitida. A princípio, temos ainda a impressão de que existe atenção
dispensada à apreciação quanto à poesia/poema, por conta de nossa visão
bakhtiniana. Todavia, um pouco mais adiante, está claro que tal valoração é
direcionada aos elementos do poema e à forma composicional. Nesse sentido, na 1ª
interação entre alunos e professores, portanto, teria sido uma excelente oportunidade
para iniciar o trabalho com as considerações de Medviédev (2012[1928]) em que
afirmam serem todos os enunciados – cremos que mais intensamente os das esferas
ideológicas – submetidos às condições de exigência da avaliação social, inclusive os
enunciados complexos do campo literário.
Esta etapa chama a atenção ao seguinte trecho “Se a maioria conhece poemas
infantis vamos apresentar alguns clássicos” (ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 26).
Amorim (2009) apresenta o conceito de memória de passado e memória de futuro
bakhtiniano, em que a autora apresenta dois níveis para tais conceitos. O primeiro,
em que a “memória que o outro guarda de mim é fundamental para a construção da
minha unidade” (AMORIM, 2009, p. 09), está relacionado à relação entre o autor e o
eu-lírico e corresponde ao relacionamento que estabelecemos com o outro. Uma
condição de união em que um complementa o outro, por meio de um olhar externo,
obtido também de uma posição externalizada e, por isso, na visão bakhtniana, uma
memória do passado responsável pelo acabamento do herói-lírico.
Ainda, no primeiro nível podemos visualizar o que Amorim (2009), esclarece
em seu texto, a memória de futuro, ou seja, que “a memória do herói é futura, porque
está intrinsecamente comprometida com o por-vir” (AMORIM, 2009, p. 10). É
122
interessante constatar que tal memória é constituída conforme a amplitude do
horizonte e dos valores, mas a memória artística do passado diz respeito ao todo
estético da personagem ou do herói-lírico.
Nesse contexto, portanto, e conforme Amorim (2009) surge uma diferença entre
os atos éticos do autor e da personagem, na qual “o ato ético do artista não coincide
com o ato do herói e, em relação ao herói que o artista retrata, o trabalho da memória
é um trabalho de acabamento” (AMORIM, 2009, p. 10). Significa dizer que embora a
ética, a cognição e a estética estejam entrelaçados, o acabamento pertence à estética,
após a criação, uma finalização no plano artístico, já que o artista tem posição externa
privilegiada, na qual observa a situação de fora e valorativa – com seus próprios
julgamentos – e que o autor-lírico não tem. Mas, “a diferença de posição não indica
apenas uma relatividade de pontos de vista, mas vai mais longe e produz qualidades
distintas de memória” (AMORIM, 2009, p. 10).
Na primeira etapa do Caderno, pensamos que seria significativo se como disse
Bakhtin/Volochinov (2010[1929]), “na realidade, todo signo ideológico vivo tem, como
Jano, duas faces” (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2010[1929], p. 48) e que elas poderiam
ser exploradas, com os alunos, de forma que eles pudessem identificar as relações
entre o autor e a personagem (autor-lírico) e, por meio delas, pudessem encontrar as
representações do outro e deles mesmos como sujeitos nos textos trabalhados, isto
é, conectando a realidade à arte.
Ainda, nesse sentido, Amorim (2009) afirma que a posição diferente dos
sujeitos não indica somente que os pontos de vista são relativos, antes demonstram
outras qualidades da memória. Veremos como na próxima etapa.
Na etapa de número 2 “Memórias de versos da comunidade”, a entrevista é
utilizada como estratégia de ensino e o foco é a alimentação temática. Os alunos
precisam conversar com os parentes e a comunidade para coletar dados a respeito
de poetas clássicos ou contemporâneos e, finalmente, fixá-los no mural. O título
“Memórias de versos da comunidade” nos traz uma reflexão sobre a concepção de
Memória de passado e Memória de futuro de Bakhtin (2010[1979]), pois levando em
consideração que os enunciados são inerentes às relações humanas, percebemos
ser necessário identificarmos a ideologia que os regem. Mas não se trata do conceito
de ideologia marxista, em que uma falsa consciência baseada em uma única
interpretação, pertencente a um só estrato da sociedade (os burgueses, na época de
123
Marx) e com tendência monológica é imposta à classe “dita” dominada pela esfera
dominante.
A ideia a que nos referimos diz respeito ao pensamento bakhtiniano, no qual é
possível, além de refletirmos, interpretarmos e transformarmos nosso mundo
concreto, formar nossas características culturais e noções satisfazendo às classes
sociais com discursos contraditórios ou não no mesmo tempo e espaço e, ainda assim
convivermos em harmonia e colaboração uns com os outros. Cabe ressaltar que,
nessa perspectiva, a ideologia do cotidiano pode ser vista como forma de rompimento
de regras convencionadas.
Nesse sentido, Amorim (2009) designa a memória do objeto. Arraigada na
cultura, em todos os pensamentos, nas representações dos indivíduos e nas relações
referentes à essência individual de cada um, ela reconstitui a intersubjetividade
paralelamente às relações externas. A autora cita Bakhtin:
As tradições culturais e literárias (inclusive as mais antigas) se conservam e vivem não na memória individual e subjetiva de um homem isolado ou em algum “psiquismo” coletivo, mas nas formas objetivas da própria cultura (inclusive nas formas linguísticas e verbais), e nesse sentido elas são intersubjetivas e interindividuais (consequentemente, também sociais); daí elas chegam às obras literárias, às vezes quase passando por cima da memória individual subjetiva dos autores. (BAKHTIN, 2002, apud AMORIM, 2009, p. 10).
Como o poema configura uma das representações linguísticas e verbais,
poderíamos abordar a memória do objeto em conjunto com os alunos, mas conforme
já explicitamos, em nossos gráficos 2 e 3, não encontramos nos aspectos dialógicos
algo em que os alunos pudessem se atentar para os signos. Um poema é um signo
repleto de poesia, melhor dizendo, um poema constitui uma obra de arte, com uma
existência na linha divisória do material/signo e uma outra nas ideologias e na
estrutura sócio-histórica e econômica de um povo.
Em direção contrária, vimos aspecto rechaçado por Bakhtin/Volochinov
(2010[1929]), o psicologismo, na oficina 4. Vejamos um trecho da seção Orientações
para o trabalho com leitura de poemas, em que são disponibilizadas ao professor
diretrizes, as quais devem servir de orientação a qualquer poema. Nesse ponto, o
Caderno indica coleções de textos (em CDs) de autores famosos como a “Coleção
Poesia Falada, da editora Nossa Cultura; Ou isto ou aquilo, da gravadora Luz da
Cidade (poemas de Cecília Meireles lidos por Paulo Autran)” (ALTENFELDER;
124
ARMELIN, 2010, p. 47). O Material não especifica um poema em particular para a
compreensão.
Figura 8 – Sugestão do Caderno
Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 45.
Os questionamentos presentes, na citação, nos levam a comparar a
perspectiva sociológica durkheiniana (Sociologia Funcionalista – Émile Durkhein) com
o pensamento bakhtiniano. Na primeira, cada indivíduo tem sua própria função social
e, desse modo, é aceitável construirmos um álibi. Contudo, no momento em que um
indivíduo transgride a um papel, ele já está sendo legitimado. Na concepção
bakhtiniana (2010[1920-1924]), temos outras categorias, com as quais podemos
trabalhar: a assinatura significa dizer que representamos um papel na sociedade, mas
respondemos por ele com responsabilidade, não temos o direito de construir álibi
(justificativa) em nossa existência e quando reconhecemos nossa singularidade
participativa, tal assinatura já equivale à nossa própria ação.
Nesse sentido, os valores construídos e cultivados pelos grupos sociais e,
também, as ideologias delineiam o horizonte social – o contexto sócio-histórico –, por
isso é imperativo que o aluno reconheça tanto a discursividade por meio da memória
dos objetos, como a materialidade linguística (da palavra), se aspiramos a uma
significativa formação de leitor literário para o aluno. Logo, retomando o raciocínio de
Bakhtin/Volochinov (2010[1929]), o melhor é ajustar nossas leituras de poemas às
duas faces do Jano, em outras palavras, uma atenção que deveríamos dispensar a
uma conexão entre a vida real e da cultura em nossas interpretações a propósito, esse
é um questionamento provocador que colocamos no título desse capítulo.
Seguindo esse raciocínio, de acordo com o pensamento bakhtniano e Amorim
(2009), seria mais proveitoso ao trabalho com o gênero discursivo poema refletirmos
sobre a intenção discursiva e as ideologias rememoradas no objeto, pois, ao
analisarmos obras artísticas, é imprescindível pensarmos em duas dimensões
125
constituidoras da arte, a saber: uma polifonia como fator transgressor e responsivo,
mas ao mesmo tempo elemento de transformação. Referente à condição
transgressora, a arte transgride às ideologias totalitárias e tendenciosas ao
monolinguismo liberando e difundindo vozes, outrora apagadas, por discursos em que
há somente uma interpretação.
Assim, seria interessante que os alunos fossem levados ao reconhecimento ou
a percepção da existência das expressões (das visões de mundo ou das intenções
discursivas, isto é, os presumidos) pertencentes aos papeis sociais no poema, uma
vez que eles são os responsáveis pela presença e pelo movimento das ideologias,
para se possível e de acordo com o querer do aluno transgredi-las. Por exemplo,
considerando o poema como gênero discursivo, o autor (herói-lírico com seus
aspectos éticos e cognitivos) e o contemplador (o leitor) constroem o objeto de forma
conectada, mas um outro autor (o poeta) com uma visão de totalidade e
transgrediência a respeito do todo do texto lhe conferindo acabamento estético.
Nesse contexto as respostas são construídas não no psicologismo, em que há
um “eu” absoluto e sem estar relacionado a um outro, pois é a relação de dois
pensamentos ativos (o do autor –poeta e, também do autor-lírico) trabalhando em
conjunto. Em Bakhtin/Volochinov (1929), a língua e a ideologia não são originadas na
consciência e, também não constituem produtos dessa consciência. Por isso, os
questionamentos do Caderno, no trecho, poderiam ser um gancho, para conversar
com os alunos, sobre a natureza social da enunciação – ponto fundamental para
lermos ou produzirmos um texto -, ou seja, é preciso observar e refletir sobre o que
existe e acontece ao próprio redor. Buscar material para a interpretação dos poemas
na realidade que abrange os aspectos interacionais, históricos, sociológicos e
ideológicos.
Cabe salientar a importância da linguagem simplificada do professor ao se
dirigir às crianças, visto que são alunos de 5º e 6º anos.
Na 3ª fase, “Um mural caprichado”, há uma sugestão para que professor e
alunos construam um mural e registrem todas as produções feitas pelos alunos. Essa
tarefa objetiva leituras futuras.
126
3.7.2 OFICINA 2 – O que faz um poema
Figura 9 – Oficina 2
Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 30-31
Já dissemos antes, na leitura do gráfico 1, que a distribuição das atividades
revelam maior número para a produção oral nas oficinas, com representatividade de
35% em que demonstra 1/3 das atividades do Manual destinadas à oralidade e, em
seguida, temos os elementos fundamentais do poema com 23%. Na etapa 1, veremos
atividades de oralização.
Para Dolz & Schneuwly (2004[1998]) “O oral é tudo aquilo que é dito em voz
alta” (DOLZ; SCHNEUWLY, 2004[1998], p. 127) e que a oralidade comporta
dimensões e particularidades. A voz é produzida pela boca do latim os, oris, oral. A
oralidade diz respeito à linguagem falada, por meio do aparelho fonador. Há também
concretização particular do som, o timbre da voz, o qual consiste na multiplicidade de
registros e de intensidade de sons emitidos e da configuração em geral e
particularidades singulares vocais de cada emissor. Dolz & Schneuwly (2004[1998])
acrescentam a importância do controle audiovisual para a oralização porque, ao
mesmo tempo em que fala, o emissor também pode ouvir. Sendo assim, temos a voz
como suporte de propagação da fala e nela são emitidos os sons, as vogais, e as
consoantes que finalmente são agrupados em sílabas.
Dolz & Schneuwly (2004[1998]) esclarecem que há na Linguística, por exemplo,
correntes responsáveis pelo estudo da produção e da característica física dos sons
humanos como a Fonética descritiva. Existe também a Psicolinguística direcionada
127
para estudos da recepção dos sons pelo ouvinte e, ainda, a Fonoestilística que “estuda
a variabilidade fônica – tanto do ponto de vista da produção como da recepção – como
informação suplementar de uma expressão, no sentido linguístico e sociolinguístico”
(DOLZ; SCHNEUWLY, 2004[1998], p. 128).
Verificamos, portanto, a riqueza e a complexidade do campo de estudos da
oralização dos sons que têm em sua extensão de existência desde a articulação de
vogais e consoantes – os fones – até suas diferentes combinações em que resultam
nas silabas, mas, além disso, temos os prosodemas que são agrupamentos de sílabas
em “unidades vocais maiores de nível supra-segmental” (DOLZ; SCHNEUWLY,
2004[1998], p. 129), em que para a linguística europeia o fluxo da fala se desenvolve
de modo linear conforme seu próprio ritmo e melodia. Assim, a prosódia é responsável
pelo tom (altura), pelo acento (intensidade) e pelo ritmo (duração).
Dolz & Schneuwly (2004[1998]) dizem que existem vários níveis que passam
da oralidade espontânea para a escrita oralizada, mas dois tipos podem ser
enfatizados, pois têm particularidades diferentes. Primeiramente, o “oral espontâneo”,
uma improvisação estabelecida nos diálogos durante as interações, isto é, o modelo
pelo qual se dá a comunicação, somado a isso, existe a “vocalização”, ou seja, um
texto lido ou recitado por alguém. Então, em meio a esses dois tipos de oralidade,
desde previsíveis ou restritas, bem como em seus aspectos conteudísticos ou formais,
há todas as modalidades orais.
Dolz & Schneuwly (2004[1998]) comentam, ainda, sobre as ‘escorias’ do oral
espontâneo, ou seja, quando comparamos um discurso escrito e formal que foi
elaborado, lido e reescrito como um espontâneo, logo percebemos inadequações.
Seguindo então esse raciocínio, se o discurso das autoras do Caderno é o de que
pretendem formar cidadãos protagonistas que assumam posições críticas a partir das
práticas de linguagens sociais, por que há, então, grande ênfase nas atividades do
Poetas da Escola relacionadas à oralização apenas para identificar elementos formais
caraterísticos e recorrentes no poema sem reflexão?
Para ilustrar o que foi dito temos na 2ª etapa uma retomada da 1ª. Vejamos o
poema “Tem tudo a ver” de Elias José, o qual fundamenta o trabalho de distinção
entre o gênero poema e outros gêneros discursivos.
128
Figura 10 – Poema “Tem tudo a ver”
Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: Coletânea de poemas. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 02.
Figura 11 – Algumas questões sobre o poema
Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 32-33.
Na elaboração desses questionamentos, pelo discurso autoral, os meninos são
incentivados a perceberem a forma composicional do poema separada da poesia.
129
Figura 12 – Atividades da Oficina 2
Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 35.
Em primeiro lugar, entretanto, é necessário comentar que o último item das
atividades citadas no quadro acima, afirma que “Algumas pessoas acham que a
função da poesia é cantar amores ou mágoas, mas, na verdade, a poesia pode falar
de qualquer assunto”. Essa afirmação contradiz ao que percebemos em nossa
reflexão, sobre a capa, pois nela encontramos características do Romantismo. Além
disso, como transmitir culturas e ideologias é uma das funções do livro didático,
poderíamos, então pensar, com mais cuidado, na explicação de Bakhtin/Volochinov
(1929), a respeito dos discursos ideológicos do cotidiano (que ainda não foram
oficializados), mas que estão em constante diálogo com as ideologias das instituições
como a ciência, a religião, a cultura, a mídia e a educação, por exemplo.
De acordo com esses estudiosos, é entre o campo – espaço- intermediário das
pessoas comuns e de tudo o que elas expressam em formas de linguagem no dia-a-
dia e, também entre o sistema social-ideológico (regente das normas de um povo),
que se dá a materialização da palavra ou dos signos. Disso decorre, portanto, nosso
130
cuidado em não permitir a perpetuação de pensamentos equivocados nem ao
esquecimento em buscar pelos implícitos em nossa realidade concreta, para que eles
não se sejam legitimados no sistema ideológico oficial.
Os alunos, entretanto, são conduzidos a compreensão e interpretação dos
poemas balizados pelos parâmetros da forma composicional separada do conteúdo,
o que na visão bakhtiniana essas duas formas são únicas e inseparáveis. Verificamos
que eles podem falar, já não estamos essencialmente diante do ensino bancário de
Paulo Freire, entretanto, suas falas não incidem sobre questões essenciais para a
compreensão e o que esperamos que os alunos sejam capazes é de compreender os
textos e, além disso produzir suas próprias réplicas.
Nesse sentido, Rojo (2004), após discorrer sobre a decodificação como uma
leitura “de maneira simplista – apenas como um processo perceptual e associativo de
decodificação de grafemas (escrita) em fonemas (fala), para se acessar o significado
da linguagem do texto” (ROJO, 2004, p. 02), afirma que mesmo que sejam
capacidades importantes, são insuficientes para realizar uma efetiva compreensão.
Em seguida, capacidades mais eficazes em que se aliam simultaneamente a
visão de mundo, o entendimento das práticas sociais e o domínio básico ou mais
avançado dos conhecimentos linguísticos, revelam leitura compreensiva. A leitura
como compreensão textual foi dividida em dois períodos: o primeiro, a compreensão
textual, em que havia relação entre o leitor e o texto. O ponto convergente estava em
o leitor encontrar o significado somente no texto, por meio de “estratégias (cognitivas,
metacognitivas) do leitor” (ROJO, 2004, p. 03). Logo depois, foi incluído o autor no ato
de leitura, nesse momento, havia interação entre as orientações disponibilizadas pelo
escritor, o material textual e a interpretação do leitor.
Do ponto de vista mais recente, há a leitura como réplica:
[...] um ato de se colocar em relação um discurso (texto) com outros discursos anteriores a ele, emaranhados nele e posteriores a ele, como possibilidades infinitas de réplica, gerando novos discursos/textos. O discurso/texto é visto como conjunto de sentidos e apreciações de valor das pessoas e coisas do mundo, dependentes do lugar social do autor e do leitor e da situação de interação entre eles – finalidades da leitura e da produção do texto, esfera social de comunicação em que o ato da leitura se dá. (ROJO, 2004, p. 03, grifos da autora).
Partindo dessa breve reflexão teórica e do foco das atividades ao longo do
Caderno, vimos um índice extremamente baixo de discursividade no tratamento
131
didático. Especificamente na oficina de número 2, o questionamento “Do que tratam
os poemas?” vimos na primeira orientação do Caderno, para que haja conversa entre
professor e aluno, sobre o que acharam do poema. A princípio, temos a impressão de
que haverá análise discursiva, entretanto, ao avançarmos nos questionamentos
seguintes, constatamos a busca por elementos formais. Na segunda etapa, há
direcionamento das autoras para a temática do poema “Tem tudo a ver”, mas não há
atividades, nas quais demonstram a leitura como réplica, conforme a citação de Rojo
(2004), nem a investigação de suas características junto aos alunos.
A nosso ver, a fala espontânea não está contribuindo para a ampliação de
conhecimento menos ainda para assumir posição ativa e crítica da parte dos meninos.
Essa dificuldade também poderia ser vista de outro modo à luz de Ponzio (2010), um
grande estudioso de Mikhail Bakhtin.
Ponzio (2010) aponta a diferenciação entre a palavra ordinária (a cotidiana) e
a palavra literária. A primeira caracterizada pela escrita científica, a propagandística,
a informativa etc, ou seja, uma palavra submetida às funções sociais ocupadas pelo
indivíduo. Os que utilizam essa palavra se identifica como o “eu” proprietário dela e,
por isso têm a responsabilidade e respondem por ela.
Seguindo ainda o raciocínio de Ponzio (2010), na Palavra literária, todavia, há
fuga do único tom de voz. O texto literário não está submetido ao significante nem ao
significado decidido a priore. Uma criação literária não serve aos significados
normativos, também não está limitada a um vocabulário restrito. A homogeneidade
jamais é componente das regras morfológicas e sintáticas, e finalmente as
irregularidades e as exceções são marcas fundamentais dessa palavra.
De acordo com Ponzio (2010), uma das particularidades da obra literária é o
caráter dialógico, ou seja, as possibilidades de vivermos experiências diretas e
concretas de percepção, de reação e de resposta à palavra dos outros, mas tais
experiências são materializadas depois de apreendermos o grau de dialogicidade
interna da palavra, isto é, o conteúdo, a semântica e os recursos expressivos.
Na direção de Ponzio (2010), portanto, estudar os textos complexos se faz
necessário, pois tais textos estão envolvidos em relação dialógica constante, em
posições contrárias ou a favor, por conta das interações nas atividades humanas.
Dessa forma, acreditamos que os alunos podem assumir posição ativa e crítica.
Depois de termos compreendido o conceito de oralização, conforme Dolz e
Schnewly (2010), uma orientação do Caderno, em que pensávamos ser leitura
132
significativa, mas era simplista, finalmente, sugerimos leitura dialógica, com infinitas
possibilidades de réplicas. A seguir, veremos a linguagem no uso denotativo e
conotativo.
3.7.3 OFICINA 6 – Sentido próprio e figurado
Chamo de sentidos às respostas e perguntas. Aquilo que não responde
a nenhuma pergunta não tem sentido para nós.
Mikhail Bakhtin
Figura 13 – Oficina 6
Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 64-65.
A oficina 6 “Sentido próprio e figurado” tem a finalidade de apresentar a
diferença entre os conceitos de Denotação (sentido próprio) e Conotação (sentido
figurado), além de delimitar o texto poético. Na 1ª etapa o discurso autoral explica que
o poema se aproxima de outros textos literários, mas apresenta suas próprias
especificidades. Vejamos.
O convívio e o trabalho com textos poéticos ajudam a desenvolver nos alunos a capacidade para perceber esses recursos expressivos. [...] descobrir que o poema, quando lido com atenção, sugere múltiplos sentidos, todos decorrentes dos recursos selecionados pelo poeta para compor seu texto. (ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 66).
133
Concordamos com a asserção do caderno, em que textos poéticos são capazes
de despertar no indivíduo a curiosidade por termos desconhecidos e,
consequentemente, a revelação de seus possíveis significados e, conforme o Caderno
do Professor (2010),
Figura 14 – Alguns sentidos na Oficina 6
Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 68.
O trecho acima nos faz refletir sobre a diferença entre o discurso na vida e o
discurso na poesia de Bakhtin/Volochinov (1926), porque na vida há dois
interlocutores que discutem algo e participam, simultaneamente, do processo da
criação verbal e o tema é exterior a esse processo, mas, na poesia também existe
uma relação a três: o autor, o herói (tema14) e o contemplador. Este pode ser um leitor
ou um ouvinte e consiste na voz social que é ouvida pelo autor artista e é representada
na fala do herói.
Uma característica desse contemplador é que ele não tem a função de apenas
assumir ou adotar valores passivamente, porque se assim o fosse os textos literários
apenas repetiriam valores sociais. O leitor/ouvinte/contemplador consiste em
apreciador, ou seja, tem o direito de refletir, utilizar, modificar um pensamento, uma
ideia, embora a propriedade da obra não lhe pertença.
Na criação do discurso artístico (da poesia), portanto, existe ao mesmo tempo
relação de união dos sujeitos sociais por um lado: autor/poeta com o autor/eu-lírico e
14 Conforme já citamos em nota as palavras de Bakhtin/Volochinov (2010).
134
o contemplador, mas que são sujeitos dissociados, por outro, podemos ver alguns
pontos divergentes entre o Discurso na vida e o discurso na Arte.
a) A divulgação dos presumidos no discurso artístico, em outras palavras, de
acordo com o nosso horizonte social, que pode ser mais ou menos amplo,
ocorre a naturalização de nossa cultura. Porque, naturalizamos valores
abstratos, a partir de acontecimentos reais ao nosso redor e, assim refratamos
(reproduzimos) um valor que nos é estranho como se fosse evidente,
unicamente, porque antes ele já nos foi refletido (transmitido). Assim,
pensamos que os discursos artísticos constantemente propõem interrogações
como, por exemplo: quem somos nós, de onde viemos, para onde vamos e, tal
discurso, provoca no observador estranhamento. Como observadores temos,
então, condições de extrapolar o limite somente do conhecimento das
ideologias e perceber, de fato, o que é inerente a nossa existência e
comportamento.
b) O estranhamento, outra diferença,
Figura 15 – Poema “Livros e Flores”
Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 67.
É correto dizer, como no Caderno, que a inversão sintática provoca, no aluno,
um espanto para favorecer o ritmo do poema e que convém colocar na ordem direta
da norma padrão para facilitar o entendimento. No entanto, se considerarmos o poema
como gênero discursivo, devemos buscar, também, os sentidos em sua
135
historicidade15, contextos, características constitutivas intrínsecas ao enunciado
concreto e o tema e significação que nos levam ao entendimento de que, além de
serem formas linguísticas, as palavras encerram sentidos diferentes a cada nova
situação de uso real.
Nesse sentido, poderíamos nos preocupar com os efeitos provocados, nos
alunos, nos momentos reais de comunicação, durante a aula, em primeiro lugar e,
depois com as abstrações linguísticas.
E quanto ao sentido figurado ou estranhamento que poderia ter sido explorado
no Caderno? O que vimos, portanto, na voz das autoras, talvez seja um
direcionamento para que o aluno siga o raciocínio e a conclusão do Material de apoio.
A tendência é que respondam que o poeta ama a pessoa a quem dedica os versos e quer saber se é correspondido. A página, denotativamente, pode ser lida e se revela a todos os leitores; a página, conotativamente – no contexto do poema –, só pode ser lida por quem conhece bem os olhos nos quais ela se esconde. Um sentido não descarta o outro, ambos se complementam. (ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 69).
Por estarmos conscientes de que um sentido é complemento do outro,
conforme o trecho acima, parece-nos estar manifestada uma das lacunas deste
Manual, porque a ênfase concedida às unidades linguísticas direcionam o aluno para
concluir o que já está exposto como verdade e não o que poderia ter suscitado, de
acordo sua própria reflexão e naturalização referente a sua cultura, comparado ao seu
contexto amplo e imediato e que resulta em sua leitura particular.
c) Na última diferença entre os discursos, é preciso examinarmos qual a
voz social interiorizada no autor-artista-poeta e que está sendo
demonstrada. Aqui, seria uma oportunidade adequada para
relembrarmos, com os alunos, a relação entre
autor/herói/contemplador e quais os papeis que cada um ocupa na
elaboração do texto. Comentando, ainda, que a voz descrita em
“Livros e flores” provavelmente seria de um interlocutor que deseja
obter, ou já representa o papel social de namorado, noivo ou marido
15 Fiorin (2008), esclarece que por conta do confronto dialógico de vozes, do contexto real, a historicidade dos enunciados é semântica, visto que, de fato, o que buscamos é a entonação das palavras que conferem sempre novos sentidos, já que a História está contida neles.
136
ou mesmo só um pretendente. Este papel configura o “lugar social”,
que foi internalizado pelo autor-escritor, a partir da instituição familiar,
mas revelado na construção do todo textual pelo autor-herói. Portanto,
essa é a terceira característica que diferencia os discursos na vida e
na arte.
Uma sugestão para ser trabalhada nesse poema é a historicidade, pois
Machado de Assis cria metáforas baseadas em uma concepção de namoro com as
características de sua época (século XIX). Mas, um namorado, hoje, não escreveria
desse modo para a namorada. Com isso, o aluno perceberia que a linguagem já
constituída pode ser revisitada ou refeita de outra forma, porque o desuso traz marcas
históricas e que o poema pertence à Estética Romântica, que perdura até hoje, mas
sofre alterações históricas, sociais e culturais.
A citação de Bakhtin/Volochinov (1929), no capítulo Tema e Significação, que
discute, especificamente, a questão do sentido próprio e figurado, da conotação e
denotação é adequada, nesse momento. Vejamos:
Para constituir uma ciência sólida da significação, é importante distinguir bem entre o tema e a significação e compreender bem a sua inter-relação. Até o momento ninguém compreendeu a importância dessa conduta. Tais distinções como as que se estabelecem entre o sentido usual e ocasional de uma palavra, entre o seu sentido central e os laterais, entre denotação e conotação, etc., são fundamentalmente insatisfatórias. A tendência básica subjacente a todas essas discriminações – de atribuir maior valor ao aspecto central, usual da significação, pressupondo que esse aspecto existe e é estável – é completamente falaciosa”. (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2010[1929], p. 136).
De acordo com a afirmação de Bakhtin/Volochinov (2010), se considerássemos
a ciência da significação com suas relações entre si, não desprezaríamos o tema, pois
ele somente pode ser localizado em uma compreensão ampla e, já na espera de uma
resposta ativa, abrangendo tanto o contexto imediato como o amplo.
A etapa 3 “Definições poéticas” visa à apresentação das “definições poéticas”:
“Modéstia”, “Reticências” e “Recordação” de Mário Quintana.
137
Figura 16 – Definições poéticas
Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: Coletânea de poemas. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 11.
Os alunos fazem atividade em grupo, leem e discutem sobre as “definições
poéticas” para descobrir o significado e expõem suas conclusões em atividade lúdica
de apresentação. Em seguida, é proposto que eles realizem uma atividade para
fixação, individualmente ou em grupos, produção escrita empregando as definições
poéticas. Nessa etapa, a nosso ver, temos a atividade lúdica como estratégia de
ensino-aprendizagem do poema como ponto positivo, pois a ludicidade é capaz de
levar os alunos ao conhecimento de diversas linguagens da arte, as quais mobilizam
o interesse deles para a leitura, tanto de textos poéticos como especificamente do
poema, e em seguida nos tornarmos atores em nosso próprio teatro.
Ao final deste tópico, verificamos os conceitos de denotação e conotação, os
quais são diferentes dos sentidos – como respostas e questionamentos –, para o
Círculo bakhtiniano, as relações entre o autor e o herói, bem como o tema e a
significação de Bakhtin/Volochinov (1929), em que há o inerente germe ativo da
resposta compreensiva. Vale ressaltar que Bakhtin/Volochinov (1929) afirma que
diferenciar significado e tema é um dos problemas mais complexos para a Linguística.
Por isso, em Marxismo e Filosofia da Linguagem esses termos foram analisados no
sentido de colaborarem com a clareza dessa dificuldade. Esclarece, ainda, que apesar
da compreensão e distinção do que sejam significação e tema, não há como
estabelecer uma divisão rígida entre eles.
Segundo Bakhtin/Volochinov (1929) a significação é como uma tecnologia para
que o tema se realize. Isto é, as palavras registradas no dicionário são códigos
linguísticos, em que cada um desses registros tem diversas significações. Por
exemplo, nos dicionários, o registro das palavras “Teus olhos são meus livros”
assumem outro significado.
138
No momento da enunciação, contudo, as formas da língua adquirem diferentes
temas. Bakhtin/Volochinov (1929) denomina, assim, o tema “um sistema de signos
dinâmico e complexo, que procura adaptar-se adequadamente às condições de um
momento da evolução. O tema é uma realização da consciência em devir ao ser em
devir” (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 1929, p. 132).
O tema parte das formas estáticas e abstratas da língua para se realizar, de
modo sempre dinâmico nas situações reais de interação entre os interlocutores. Uma
mesma palavra pode, em muitas situações comunicativas diferentes, assumir uma
variada pluralidade de sentidos.
Dessa forma, na unidade temática é que são respondidos variados
questionamentos como: quem produziu? Onde? Quando? Para quem? Qual o
conteúdo? Por isso, as formas fixas e convencionais da língua são utilizadas na
concretização do tema, nas esferas de comunicação, de acordo com o fluxo
permanente da consciência e as novas situações de produção de discursos que ainda
irão surgir.
Lembramos a participação do outro na construção do tema.
Verificamos que só o outro como tal pode ser o centro axiológico da visão artística e, consequentemente, o herói de uma obra, que só ele pode ser essencialmente enformado e concluído, pois todos os elementos do acabamento axiológico – do espaço, do tempo, do sentido – são axiologicamente transgredientes à auto-consciência ativa, estão fora da linha de uma relação axiológica consigo mesmos. (BAKHTIN, 2010, p. 174).
A interação, entre o outro e o eu, torna realizável a troca de experiências as
quais o sujeito que absorve, interioriza e compreende o sentido na ação do outro, do
que exterioriza, e vice-versa. Vale ressaltar que, em alguns casos, essa inter-relação
nem sempre ocorre de maneira cordial, amigável, mas sempre consciente. Mesmo
que os indivíduos envolvidos estejam em lados antagônicos na esfera social, ou seja,
membros de grupos que se hostilizem, há sim troca de percepções do eu e do outro.
Afinal, tão logo a identidade de um indivíduo seja colocada à prova, este mesmo
indivíduo começa a ver sua própria identidade com a percepção do outro. Nesse
processo de trocas, é importante frisar que o indivíduo passa a questionar seus
valores morais, pessoais, éticos, religiosos etc. Essa postura dependerá apenas da
consciência do indivíduo, seja ele o eu ou o outro.
139
Nesse cenário, portanto, surgem os infinitos temas a serem desenvolvidos sob
o acabamento do outro. Finalmente, vimos as definições poéticas. Por conta do
sentido próprio e figurado, nesta seção, aprofundaremos nossa compreensão sobre
as figuras de linguagem no próximo capítulo.
3.7.4 OFICINA 7 – Comparação, metáfora, personificação
A índole responsiva do sentido.
O sentido sempre responde a certas perguntas.
Aquilo que a nada responde se afigura sem sentido para nós, afastado do diálogo.
Mikhail Bakhtin
Figura 17 – Oficina 7
Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 72-73.
Nesta oficina são retomados aspectos que buscam os sentidos colocando a
forma linguística em primeiro lugar, mas sob nossa visão bakhtiniana, cremos em
sentidos como respostas a questionamentos, pois se não há argumento e
contrapalavra não há diálogo. Dessa forma, relembraremos os estudos de Roman
Jakobson, no Círculo Linguístico de Praga, em que se busca a compreensão das
finalidades em que a língua é utilizada, isto é, como se dá a comunicação entre o
codificador (falante ou escritor) e o decodificador (ouvinte ou leitor). Entretanto, o
objetivo do professor era estabelecer o lugar da função metafórica entre as outras
140
funções da linguagem, porque ela era o fator transformador de uma mensagem verbal
em obra de arte. Conforme Jakobson (2005), há uma diferença entre a linguagem
poética e as outras materialidades verbais constitutivas de outras expressões, nesse
caso, a Poética deveria sim ter lugar definido na Linguística.
Nesse contexto, tomando por base os elementos constitutivos do processo
comunicativo, conforme Jakobson (2011) temos: 1) remetente (codificador); 2)
mensagem; 3) destinatário (decodificador); 4 contexto (ao qual se faz referência
durante a comunicação e deve ser de possível compreensão ao destinatário); 5)
código (deve ser parcial ou totalmente comum ao remetente e ao destinatário; 6)
contato (canal físico a partir do qual se estabelece a comunicação, envolve também
uma conexão psicológica entre remetente e destinatário). E Jakobson esclarece que
“cada um desses seis fatores determina uma diferente função da linguagem”
(JAKOBSON, 2005, p. 123).
Os estudos do professor Roman Jakobson a respeito das funções da
linguagem16 nos interessam, porque encontramos bases da teoria da comunicação
nas atividades do Caderno do Professor e que demonstraremos mais adiante.
Assim, a oficina 7, “Comparação, metáfora, personificação”, tem como meta a
identificação e, também, a utilização das figuras de linguagem. Essa oficina está
dividida em 4 etapas. Na 1ª “Recursos que aproximam dois termos” é apresentado o
conteúdo: a linguagem figurada, com ênfase na identificação, aprendizagem e
emprego das figuras: comparação, metáfora e personificação. Essas imagens são
apresentadas, pelo Caderno, como forte característica da linguagem poética. Desse
modo, “a metáfora produz efeitos de sentido que ampliam a significação do texto e as
possibilidades de interpretação” (ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 76). Após
leitura de “O leão” de Vinicius de Moraes temos as seguintes atividades:
16 De acordo com Padilha “as formulações de Jakobson sobre as funções da linguagem estiveram (e ainda estão) presentes nos livros e manuais didáticos, de ensino fundamental e médio no Brasil, constituindo-se, por muito tempo, em teoria obrigatória para a explicação/compreensão dos fenômenos da linguagem e da mesma forma, dos poéticos” (PADILHA, 2005, p. 57).
141
Figura 18 – Poema “O leão”
Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: Coletânea de poemas. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 12.
Figura 19 – Atividades da oficina 7
142
Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 74 - 76.
Como já dissemos, anteriormente, os sentidos (a significação) das figuras de
linguagem residem nas interações reais de comunicação e, assim deveriam ser
explorados por esse viés. De acordo com Bakhtin/Volochinov (1929) ao nos
comunicarmos (interagirmos) expomos todo um conteúdo de vozes sociais, as quais
fazem parte de nossa consciência. Por meio da língua, sempre com suas duas
direções, uma originada do enunciador e a outra destinada a alguém. Essa linguagem,
portanto, é o resultado da interação entre o locutor (falante) e o interlocutor (ouvinte),
além disso, todas as nossas palavras são ideológicas e já carregam avaliações. Por
isso, a interação é um evento dinâmico, em que temos a liberdade de compartilharmos
os nossos valores.
Nessa perspectiva, em Arte e responsabilidade, Bakhtin (2010[1919]) discorre
sobre o constante diálogo existente entre as dimensões da cultura humana, a saber,
143
a ciência, a arte e a vida. Para o filósofo russo, somente assim suplantaríamos a
dialética mecanicista abrindo espaço para as relações dialógicas entre essas três
instâncias para compreendermos a arte em total responsabilidade, pois “O poeta deve
compreender que a sua poesia tem responsabilidade pela prosa trivial da vida, e é
bom que o homem da vida saiba que a sua falta de exigência e a falta de seriedade
de suas questões vitais respondem pela esterilidade da arte” (BAKHTIN, 2010[1919],
p. XXXIV).
Um tratamento mais esclarecedor para o poema “O leão”, de Vinícius de
Moraes, poderia ser a reflexão a respeito da totalidade do texto, considerando o
poema como gênero discursivo, uma discussão em torno de que consiste em um
gênero complexo, pertencente ao campo artístico, a situação de produção, a
historicidade, os participantes, o conteúdo temático, a forma composicional, o estilo,
as relações dialógicas, além dos aspectos presumidos, o estranhamento e as vozes.
Compreendemos, assim, que é necessário equilibrar a materialidade das
formas linguísticas com os sentidos que os indivíduos aprendem na utilização da
língua viva, durante as experiências vividas em episódios de interação.
Entretanto, tal possibilidade poderia ter sido melhor explorada, pelo Caderno,
inclusive, se o poema não tivesse sido apresentado em fragmentos. A nosso ver,
compreendendo as relações autor-herói, ou seja, em que o herói – autor criador –
dialoga “dita” ao poeta o que é necessário dizer, principalmente a relação axiológica
– valores sociais, histórico-culturais – inerente ao objeto estético, em outras palavras,
ao tema em questão desenvolveríamos um trabalho fundamentado na visão da
unidade dialógica bakhtiniana, isto é, perspectiva em que há diálogo entre o autor
(poeta), o autor (criador) e aos múltiplos acabamentos de cada contemplador
considerando, também, as experiências vividas desse último.
Um ponto relevante da oficina 7 é que o Material auxilia o professor a mostrar
caminhos, para que o aluno reconheça determinadas figuras de linguagem em que,
às vezes, nem mesmo o professor consegue identificá-las sozinho, mas esse
tratamento, poderia executar dois movimentos. Por um lado, representaria controle
dos sentidos e, por outro, o papel do professor, nesse momento, seria o de mediador,
conforme disse Vygotsky (1935). Dessa forma, ainda que a proposta do OLPEF não
seja a ideal, torna-se legítima e o desenvolvimento das atividades depende da
habilidade do professor em permitir que os alunos se manifestem antes que a resposta
– para a atividade – seja do conhecimento deles.
144
Na 2ª etapa “Personificação”, encontramos a definição dessa figura. O trabalho
é desenvolvido em leitura do poema “Meus oito anos” de Casimiro de Abreu, e cópia
na lousa para observação das partes sublinhadas: metáfora e personificação.
Figura 20 – Poema “Meus oito anos”
Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: Coletânea de poemas. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 12.
145
Vejamos um trecho da atividade:
Figura 21 – Atividades da oficina 7
Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 77.
O poema “Meus oito anos” exalta a infância e foi escrito nos moldes do
Romantismo. Nesse sentido, pensamos que a escolha do texto não foi adequada para
as crianças, porque, por exemplo, na contemporaneidade infância feliz estaria
atrelada à posse e domínio de diferentes aparatos tecnológicos, enquanto que para o
eu-lírico de Casimiro de Abreu a felicidade estaria baseada em contemplar “o céu
bordado de estrelas”.
Dessa forma, como nos fundamentamos na perspectiva enunciativo-discursiva
bakhtiniana pensamos que, embora o Caderno tenha trabalhado o material (as
metáforas), o professor deveria ter sido orientado a trabalhar com a materialidade
sócio-histórica (saudade da infância) somado ao ponto de vista dos alunos, bem como
à contextualização do autor e o contexto sócio-histórico. Vale lembrar que, de acordo
com nosso gráfico número 3, esses itens tiveram pouca representatividade. Assim,
tratamento mais apropriado com “Meus oito anos” visa estabelecer conexão entre os
fatos reais e esclarecimento de que foi Casimiro de Abreu durante o século XVIII e a
vida real dos alunos de hoje, além de observarmos a materialidade linguística.
A didatização recorre à mesma estratégia de localização de figuras de
linguagem, da oficina 6, entretanto, pensamos em um trabalho mais significativo, isto
é, considerar as relações entre os seres humanos nas dimensões cognitiva, artística
e da vida real para alcançarmos uma compreensão efetiva do todo.
Na 3ª etapa “Estabelecer comparações”, é solicitado aos alunos que façam
uma atividade escrita: produção de comparações e metáforas sobre “O lugar onde
vivo”. Eles são questionados para ativar o conhecimento, a compreensão escrita se
146
dá por meio de preenchimento de espaços vazios, individualmente ou em duplas.
Depois, serão feitos apresentação e debate sobre a tarefa e, também cópia pela
professora dos exercícios de outros alunos. Existe, nesse sentido, o aspecto positivo
do trabalho colaborativo.
A respeito dessa etapa, é preciso lembrar que já discutimos em nosso primeiro
capítulo sobre a afirmação bakhtiniana de não existir “nada absolutamente morto:
cada sentido terá sua festa de renovação. Questão do grande tempo” (BAKHTIN,
2010[1974;1979], p. 410), conforme cada devida situação e espaço de tempo, mas, é
possível estabelecermos uma complementação entre essa afirmação e o explicitado
por Amorim (2009):
Criar não é dar livre expressão a um suposto gênio individual ou deixar agir a inspiração. A criação em Bakhtin supõe duplamente a memória coletiva. Do lado do leitor ou ouvinte, face ao objeto criado por mim, porque ele inscreve o que crio em uma cadeia discursiva e assim confere sentido ao objeto. E do lado do próprio criador que cria sempre no diálogo com outros. Para ouvir e fazer ouvir minha voz em um enunciado-objeto é preciso ouvir e fazer ouvir as vozes que nele falam. Não há, de acordo com a perspectiva baktiniana, criação sem repetição. (AMORIM, 2009, p. 12).
Vimos o mesmo esquecimento referente ao movimento retrospectivo da
memória de passado e o subsequente da memória de futuro abordado na oficina 1.
Os alunos poderiam ter sido instigados a investigarem quem são os sujeitos e os
modos de convivência dentro de cada contexto espacial e temporal, para assim
suscitarem diversas ideias para a construção textual, visto que a individualidade é
formada na intersubjetividade.
Para Amorim (2009), no primeiro momento, a preservação da cultura era
passada de um corpo a outros corpos, por meio da oralidade, de gestos ou de pinturas.
Mas, depois da invenção da escrita, a memória deixa o corpo do indivíduo e se instala
nas palavras que constituem um texto. É nesse material, portanto, que encontramos
os diferentes sujeitos e suas crenças, mas não só de materialidade são escritos os
textos, também dos valores contidos nas palavras. Por isso, tanto a tradição oral como
a escrita deveriam ser analisadas da mesma forma.
Amorim (2009) afirma que, em relação à educação e a formação do sujeito, é
imprescindível observarmos a verdade sobre os objetos sobre os quais falamos ou
escrevemos, porque “de nada adianta transmitir a técnica da escrita se não se
147
transmite um conhecimento verdadeiro” (AMORIM, 2009, p. 16). O que resultaria de
tal transmissão seria um equívoco por parte dos educandos, uma vez que acreditariam
serem detentores da verdade, mas ao contrário, isso não procederia.
Tal contexto nos leva à verdade istina17 e à pravda de Bakhtin (2010[1920-24]).
Na primeira, a verdade em si mesma, a abstração das formas linguísticas. Na
segunda, uma verdade de caráter autêntico – a pravda – responsável, alicerçada na
totalidade do interior do ato de leitura e escrita, que mantém seu olhar livre e indireto
contra a anulação de seus efeitos, plena de conhecimentos de seu contexto e
legitimada. Portanto, uma formação de sujeito capaz de refletir, pensar e agir
conforme suas convicções e vontades. De fato, concordamos em que as figuras
auxiliam na demonstração da linguagem poética, como disse Augusto Ponzio
(2010)18.
Mas não vimos busca pela verdade pravda, nessa etapa, no sentido de
enriquecer as imagens com conteúdo nem respostas originadas dos diálogos, não
vimos a busca pelo que alguém estaria querendo dizer nem pelo que um outro alguém
poderia ouvir. Em direção oposta, deparamo-nos com a orientação ao professor no
Caderno, para “adaptar as frases e ampliar seu número, conforme os lugares que
sejam significativos para os alunos” (ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 78).
Evidenciaria, nessa atividade elementar de completar os espaços em branco, um
preenchimento de palavras esvaziadas de sentido, porque logo abaixo é solicitado
aos alunos “um debate”, então essa hierarquia está invertida, porque em nossa ótica
bakhtiniana, primeiro, haveria o debate e depois a atividade escrita.
A 4ª etapa “Transformar comparações em metáforas” consiste na criação de
metáforas eliminando os termos de comparação, leitura das melhores frases
construídas pelos grupos. Compreendemos que seria, apenas, continuação do que já
vimos na etapa 3.
Neste tópico, vimos a índole do sentido que questiona e aguarda reposta. Além
disso, as figuras de linguagem, como ponto de partida para a criação do poema, mas
sem a preocupação com as relações internas ou externas do texto e que deveriam
17 Conforme Amorim (2012) a verdade istina “diz respeito à leis universais e a um universo de possibilidades [...] A palavra russa pravda traz em sua espessura semântica a ideia de validade e de justiça” (AMORIM, 2012, p. 22). 18 Ironia, a paródia, a metáfora, a alegoria, a parábola: esses são os elementos por meio dos quais se pode falar em maneira indireta, nos quais não existe a imposição do silêncio ligada à situação na qual existe alguém que quer dizer ou que quer ouvir e quer interrogar (PONZIO, 2010, p. 25).
148
estar associadas às memórias de passado e de futuro. Finalmente, pensamos sobre
como poderia ser a formação de um sujeito crítico, reflexivo e ativo, se ele fosse levado
a buscar a verdade, não das abstrações linguísticas, mas da realidade. Em nossa
próxima subseção, veremos a questão do som na poesia.
3.7.5 OFICINA 8 – Sonoridade na poesia
Não há arte de transmitir ou de ensinar se não se conhece a verdade sobre os
objetos (social-histórico-cultural) a respeito dos quais se fala ou escreve.
Marilia Amorim
O velho tanque!
Uma rã mergulha nele: tchimbum!
viMatsuo Bashô
Figura 22 – Oficina 8
Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 80-81.
A oficina 8, “Sonoridade na poesia”, foi dividida em duas etapas. Na 1ª, “Som e
sentido”, os alunos leem em grupo e em voz alta “Pássaro livre” de Sidônio Muralha,
além de “Haicai” da autora Ângela Leite, com o objetivo de perceber as repetições de
palavras, de versos e de letras que produzem sons, bem como a definição de
aliteração (repetição da mesma consoante), ritmo regular, ritmo irregular. Debatem
sobre os possíveis efeitos de sentido irregular que pode surgir em “Pátria minha” de
Vinicius de Moraes.
149
Figura 23 – Poemas “Pássaro livre” e “Haicai”
Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: Coletânea de poemas. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 14.
Na 2ª etapa “Trava-línguas”, conversam construindo o conceito de trava-
línguas, depois leem textos da lousa e os alunos são desafiados a decorá-los e
apresentá-los.
Figura 24 – Trava-línguas
Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: Coletânea de poemas. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 14.
A professora divide a turma em grupos para treinarem, mas individualmente os
meninos são responsabilizados por apenas um. Por meio de sorteio, são convidados
a apresentar, pois “Falar trava-línguas é uma verdadeira arte” (ALTENFELDER;
ARMELIN, 2010, p. 85). Em seguida, ouvem o trava-trovas “O pedreiro Pedro Alfredo”,
“Se um dia me der na telha”, “Chegou ‘seu’ Chico Sousa” da autoria de Ciça. Depois
de uma competição, os melhores da 1ª etapa são convidados a lerem em voz alta e
150
individualmente ou em grupos a produzirem e registrarem, no caderno, trava-línguas
ou travatrovas usando encontros consonantais ou sons parecidos. Após, leitura em
voz alta e socialização das produções, revisão e exposição dos textos no mural.
Figura 25 – Travatrovas
Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: Coletânea de poemas. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 03.
Inicialmente, é possível encontrarmos na 1ª etapa uma sugestão de leitura em
voz alta para observação de repetição de palavras, de versos e de letras. Temos,
portanto, as aliterações (repetição das consoantes) que formam um ritmo regular. No
final, vemos aliterações formando o ritmo irregular e versos diferentes.
Na orientação para a leitura retomamos a fala de Dolz & Schneuwly
(2004[1998]), por meio de sua afirmação de que o oral é tudo que pode ser dito em
voz alta, isto é, uma oralidade espontânea, mas ainda segundo esses autores, existem
diferentes níveis em que essa oralidade chega a ser uma escrita oralizada.
Dolz & Schneuwly (2004[1998]), entretanto, dizem que há também a
“vocalização”, texto lido ou recitado por alguém. Afirmam que em discurso oralizado e
transformado em escrita, quando recitado, pode haver a perspectiva de que haja
151
inadequações. Nesta oficina, além de haver a leitura oral sem reflexão, há também a
priorização da busca pelas formas linguísticas como se elas pudessem sozinhas dar
sentido ao poema.
Entre o final do século XIX e o início do século XX, a construção artística era
tema de algumas teorias da arte. Umas viam a criação artística como imitação, outras
como expressão e, ainda, outras como expressão. O analista literário deveria “revelar
a unidade construtiva da obra e a as funções puramente construtivas de cada um de
seus elementos” (FARACO, 2011, p. 22), ainda nessa direção, o autor nos lembra que
Mikhail Bakhtin critica “as abordagens biográficas e sociológicas da arte” (IBDEM, p.
22). Os estudos bakhtinianos desse período, portanto, focam o estético-formal para a
análise das obras de arte.
Faraco (2011) menciona um texto de Pável Madviédev (1926) intitulado
“Sociologismo sem sociologia”, no qual esse membro do Círculo bakhtiniano critica
P.N. Sakulim – teórico russo da literatura – pela pretensão de unir a poética literária
(estudo imanente da arte), com o “método sociológico para o estudo histórico, causal
da arte” (FARACO, 2011, p. 21). A contrapalavra de Medviédev (1926) aponta para a
dicotomia desses métodos ao não reconhecerem as relações internas do texto nem a
unidade sistemática de formação textual.
A respeito dessa primeira divisão dicotômica, a crítica recai sobre as relações
internas entre o autor e o eu, já acerca da segunda, incide na exclusão dos fatos
históricos, sociais e culturais do processo de criação artística.
Com base nos estudos de Bakhtin e de seu Círculo, para o estudo metodológico
da língua, retornamos à nossa oficina 8, e nos questionamos, por exemplo, o que
acrescentaria na formação do leitor e produtor de textos literários as atividades tanto
da 1ª quanto da 2ª etapa?
Temos uma leitura para ser recitada, porém desconectada da realidade, mas,
há uma atividade lúdica, na qual sabemos que é importante para a coordenação
motora e memorização de aspectos cognitivos. E, ainda, há a competição, que
funciona para mensurar a habilidade em algo. No caso do leitor literário, contudo, não
sei se conseguiríamos atribuir valor a um poema muito bem recitado, mas que esteja
apenas repetindo palavras sem reflexão. Isso, apesar de sabermos sobre a relevância
da forma aliada ao som, principalmente nos poemas visuais.
152
Walter (2011), aliás, comenta a respeito do poeta Haroldo de Campos ter
estudado “a relação entre os ideogramas japoneses utilizados na língua japonesa para
aplicação em seus poemas (WALTER, 2011, p. 33).
Conforme Walter (2011) o Método Ideogrâmico de Haroldo de Campos consiste
na aplicação das relações existentes entre os ideogramas nos poemas do poeta
brasileiro. Para o poeta, tanto o material como a forma eram importantes na
elaboração do significado, porque ele considerava o poema como um ideograma, uma
vez que a forma e o conteúdo têm relação de semelhança.
Pensamos que a forma apenas acompanha o conteúdo e precisamos de todas
as faces da língua para podermos, por exemplo, compreendermos o porquê de um
Haicai representar o instante em que uma rã pula dentro de um tanque.
Nesta oficina, vimos a prioridade formal para a construção e compreensão do
texto em oposição às relações de sentido subjacentes ao pensamento de Bakhtin e
seu Círculo de estudos. Nesse caso, principalmente, pudemos ver a crítica de
Medviédev (1926), pois para ele a compreensão deve estar aliada tanto às questões
sociológicas, históricas e causais como às formas fixas do sistema linguístico.
Mas, as palavras, os enunciados entram novamente na corrente dialógica
concretizadas nos atos de fala de formas diferentes.
Desse modo, de acordo com Bakhtin (1934), no romance há muitas vozes – as
visões de mundo, opiniões –, porque há “liberdade” para a realização delas, todas
com suas refrações, reproduções, o que nos remonta a “qualquer conversa é repleta
de transmissões e interpretações das palavras dos outros” (BAKHTIN, 1934, p. 139).
Na próxima seção apresentaremos nossas considerações finais.
153
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
O paradigma no qual se insere nossa pesquisa é o qualitativo e sócio-histórico,
a abordagem dialógica foi nossa metodologia de análise e a estratégia de geração de
dados, a pesquisa documental.
Buscamos nos estudos de Bakhtin e o Círculo a compreensão para embasar
nosso trabalho assumindo o poema como gênero discursivo, segundo a perspectiva
enunciativo-discursiva bakhtiniana. As categorias analíticas principais foram os
gêneros do discurso e as relações dialógicas com vistas à análise da linguagem
poética e, posterior, análise do Caderno Poetas da Escola.
Exploramos as contribuições do pensamento de Vygotsky para o ensino-
aprendizado da linguagem, no segundo capítulo, em que o psicólogo defende que a
apreensão do processo educacional é originada categoricamente a partir de
referências históricas e relacionamentos sócio-históricos, a relevância da criação da
ZPD pelo educador para o desenvolvimento do aluno, a defesa do acesso à literatura,
a escolarização e a didatização do poema, a assunção do gênero discursivo como
objeto de ensino-aprendizagem da língua e as particularidades do texto literário, as
considerações de Dolz & Schnewly para ensinar língua materna e, finalmente, o
gênero secundário como seguimento do gênero primário.
A compreensão de todas essas reflexões nos deram subsídios importantes para
esboçar os contornos de nossa pesquisa. Vimos o encontro de pensamento entre
Vygotsky e Bakhtin ao defenderem que a língua é adquirida no social e, portanto, o
indivíduo aprende desde criança, com as pessoas que o rodeiam. A ZPD é outro ponto
a ser comentado, visto que sua importância abrange tanto a avaliação do próprio
professor como a do aluno. Na escolarização e didatização da literatura,
lamentavelmente tivemos a oportunidade de tomar conhecimento das abordagens que
não representam a cultura de alguns grupos de alunos e, ainda, em grande medida
estratégias de ensino que privilegiam somente um dos aspectos do gênero em
questão. Entretanto, outro problema que em nosso julgamento se mostra
decepcionante está no fato de que muitos professores ainda trabalham com a
sequência didática elaborada para ensinar língua materna em Genebra, país
totalmente diferente do Brasil, mas aqui ainda temos a SD em nossa cultura.
154
Na terceira parte, examinamos teorias, as quais fundamentam o Caderno:
primeiramente, a Teoria Literária – figuras linguísticas de Roman Jakobson –, PCN
(1998). Em seguida, os pressupostos teóricos a respeito da sequência didática como
ferramenta de ensino do gênero literário poema, pois sabemos que professores de
Língua Portuguesa, em grande medida, por um ou outro motivo, não têm acesso aos
conhecimentos bakhtinianos e, por isso, planejam e desenvolvem suas aulas com
referência nos mesmos princípios teóricos e estruturais da sequência de Joaquim Dolz
e Bernard Schneuwly, proposta curricular para o ensino do francês.
Em seguida descrevemos a sistematização das atividades do Caderno Poetas
da Escola e refletimos sobre o que poderia estar implícito na ilustração da capa,
verificamos o aspecto físico do material, delineamos a estrutura generalizada do
Caderno, em que a decompomos em três blocos: uma parte preliminar, uma outra
com todas as oficinas e na última os critérios de avaliação e as referências e
resumimos a distribuição interna dos ateliês. Nessa descrição, objetivávamos o
possível destinatário, não familiarizado com o Caderno e selecionar nossa amostra
para a análise. Assim, o que mais nos chamou a atenção foi a excelente qualidade da
matéria prima do Caderno. Talvez, em nossa concepção, não valha a pena Material
extremamente caro e tão bem ilustrado que reserve 70% de suas atividades
fundamentadas em somente uma teoria. A título de ilustração, fazemos das palavras
de Cyntrão (2004) as nossas, é preciso que o leitor, no momento da leitura, traga para
seu contexto conexões com diferentes áreas de conhecimento da cultura humana,
para enfim desvendar os possíveis sentidos que parcialmente foram descritos no
texto.
Finalmente fizemos breve contextualização de nosso trabalho, em segundo
lugar uma observação do recorte de nossos dados em linguagem gráfica, e, em
terceiro, descrição, análise e avaliação das oficinas 1, 2, 6, 7 e 8. Por último, algumas
constatações sobre o que percebemos no Caderno em geral e nas atividades citadas.
Assim sendo, realizamos cuidadosamente mais uma leitura do projeto e atribuímos
valor qualitativo às oficinas e às atividades sob a ótica da análise dialógica discursiva
de Bakhtin e seu Círculo.
A princípio, constatamos o que já sabemos desde a nossa infância, na escola,
em relação à abordagem do poema, isto é, a história se repete, o ensino é voltado
para as questões da teoria literária e comunicativa, porque não encontramos o texto
sendo considerado nas dimensões constitutivas do gênero discursivo nem a análise
155
dos aspectos dialógicos. Essa era nossa suposição que estava implícita, mas foi
revelada na contagem das atividades recorrentes. Além disso, vimos que a oralidade
é presente em vários momentos dos encontros, todavia para a explicação de
conteúdos pelo professor ou identificação de elementos formais do poema.
Por isso, reavaliamos o que já havíamos pesquisado, lido e decidimos estender
um pouco mais nossa busca. Percebemos que se o poema pertence à esfera artística
literária, reivindica tratamento artístico, portanto. No entanto, os documentos oficiais
ainda não apresentam uma sistematização, para o gênero poema.
Nossa opção em trabalhar com o gênero poema é devida à frustração em
relação ao aprendizado desde a infância até a vida adulta. A princípio a intenção era
investigar por que os professores não são bem sucedidos na tarefa do ensino.
Contudo, nossa orientadora sugeriu que não entrássemos nessa questão, pois
sairíamos do escopo da Linguística Aplicada de estudarmos a língua em seus usos
cotidianos.
Após termos apresentado nosso percurso é necessário respondermos aos
questionamentos de pesquisa. Assim, a análise de nosso corpus teve como foco
principal analisar a inter-relação entre modelo teórico adotado e a abordagem didática
decorrente e suas implicações para o processo de ensino da língua materna, no caso
específico, da linguagem literária, na 2ª edição do Caderno Poetas da Escola do
Programa da Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro 2010. Com a
explicitação de nosso objetivo direcionamos nosso trabalho com a seguinte pergunta:
Objetivos específicos:
1) Descrever os modos como o gênero discursivo poema foi didatizado no
Caderno do Professor da Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro 2010.
2) Explicar como seria a contemplação das capacidades de leitura e produção
de tal gênero em uma perspectiva enunciativo-discursiva, levando em conta, para
além dos aspectos formais, os sócio-históricos, discursivos e ideológicos, imbricados
no processo de criação verbal.
156
Perguntas de pesquisa:
1) Como foi sistematicamente elaborada a proposta de trabalho com o gênero
do discurso poema no Caderno Poetas da Escola?
A equipe da Olimpíada organizou programa que tenciona ir de encontro ao
problema da leitura e escrita brasileira, e apresenta os seguintes objetivos.
Democratizar os usos da LP no sentido de combater o iletrismo e fracasso
escolar, pois no âmbito social o indivíduo precisa estar preparado para participar das
práticas letradas. Isso pode ser possível, conforme o Caderno se o aluno domina as
capacidades dos gêneros pertencentes à esfera social. É preciso também, na visão
psicológica da OLPEF, desenvolver diferentes estratégias de leitura para que se torne
um leitor autônomo.
Entretanto, tal concepção de língua como comunicação e a abordagem formal
do poema, implica em ensino tradicional de identificação, reconhecimento e
memorização de elementos formais do poema. Além disso, a estratégia de ensino se
dá por meio de sequência didática, elaborado pelos genebrinos, Dolz & Scnewly, cuja
estrutura trabalha o gênero de forma rígida sem dar oportunidade ao professor de
ampliar seus planejamentos.
Vale lembrar, que na seção “Prepare-se”, no início de cada oficina, em que o
professor é orientado para a realização do trabalho, cremos que além do que já existe
poderia haver outros enfoques, porque no texto poético existem relações dialógicas
internas e externas, as quais devem ser desveladas.
Logo, a preocupação do OLPEF enfatiza o aprendizado da estrutura do texto,
a norma padrão linguística e a função, a qual o texto está destinado, em nosso caso
a função poética. Pensamos, sobre esse aspecto, que ainda faltam pontos a serem
trabalhados ou no mínimo a hierarquia de análise deveria ser invertida, porque uma
reflexão de análise dialógica do discurso bakhtiniana extrapola os parâmetros do
Caderno.
2) Quais e como as contribuições teóricas bakhtinianas podem fundamentar a
transposição didática, privilegiando abordagem discursiva dialógica no ensino-
aprendizagem do gênero poema?
157
Como o objetivo de nossa primeira pergunta de pesquisa foi definir o gênero
literário, para então podermos compará-lo com o gênero discursivo na perspectiva
bakhtiniana, percebemos algumas lacunas no tratamento do primeiro.
Em contraste, sugerimos, sucintamente, que o modo de lidar, com o gênero em
questão, requer a análise das particularidades do gênero do discurso bakhtiniano,
inclusive, não esquecendo da memória de passado e de futuro. Acrescentado a isso,
é imperativo situá-lo em contexto imediato e, também, um mais amplo, observar as
relações dialógicas internas para ouvirmos as vozes sociais, buscando a verdade
istina (superficial) e a verdade pravda (sem relativismo adquirido em olhar externo) e,
consequentemente, respondê-las transgredindo e assinando, ou seja, assumindo
nossa responsabilidade sobre nossos atos. Jamais desconsiderarmos a crítica de
Bakhtin à estética material por não compreender que as formas arquitetônicas são as
que sustentam as formas composicionais e preenchem o material de significação,
portanto, tudo isso resulta na totalidade da obra de arte, mas, vale lembrar que em
outra ocasião Bakhtin e Volochinov sugerem um método sociológico de análise da
linguagem eficaz, que seria a investigação dos campos de comunicação humana (as
esferas), dos atos de fala (os gêneros discursivos) e a materialidade (o sistema
linguístico), devendo ser considerados nessa ordem.
Estamos conscientes de que um trabalho como este requer mudanças
significativas nas políticas públicas da educação, a reflexão do Governo Federal a
respeito dos investimentos aplicados, obtidos da arrecadação de impostos, abarcam
em sua amplitude de produção de materiais específicos, além de concessões
financeiras cedidas pelo Governo Público Federal, a participação no funcionamento
das escolas sem serem avaliados pela instituição de ensino, e de forma ainda bastante
incipiente pela academia.
Mas, também, acreditamos que a formação educacional se dá em contextos
diferentes, por isso desejamos a princípio que tenhamos contribuído com a
investigação de nosso objeto de pesquisa, ainda que pouco. Entretanto, uma pesquisa
cientifica gera outras discussões, e estas podem dar continuidade ao nosso raciocínio
ou de outros pesquisadores, ampliando a discussão em outras frentes de trabalho.
158
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163
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164
ANEXOS
TABELA 1 – Tipos de Atividades nos moldes da Sequência Didática
Tipos de Atividades: nos moldes da sequência didática
Conjunto de tematizações enfocadas nas atividades do Caderno
Situação de produção: apresentamos, neste item, atividades que exploram elementos como autor, leitor, suporte, finalidade, título e temática da produção.
Ativação de conhecimento prévio.
Predição dos conteúdos.
Diagnóstico. Esclarecimento das características e situação de produção do poema.
Incentivo aos alunos para que participem do Concurso.
Estabelecimento do prazo da apresentação.
Discussão em torno do título “Duas dúzias de coisinhas à toa que deixam a gente feliz”. Audição do poema em busca de possíveis temas.
Esclarecimento das particularidades do poema e diferença com outros textos. Os recursos expressivos sugerem vários sentidos.
Atividade em grupo. Audição do poema “Livros e flores” de Machado de Assis, com vistas à preocupação da organização sintática.
Apresentação das “definições poéticas”: Modéstia, Reticências, Recordação de Mário Quintana.
Apresentação do conteúdo: linguagem figurada.
Explicação para o termo metáfora.
Leitura do poema “Meus oito anos” de Casimiro de Abreu.
Cópia na lousa para observação dos sublinhados: metáfora e personificação.
Esclarecimento/definição de personificação.
Criação de metáforas eliminando os termos de comparação.
Definição de aliteração (repetição da mesma consoante).
Localização recorrente de repetição de palavras, rimas e aliteração.
Apresentação da aliteração construindo um ritmo irregular em fragmentos de “Pátria minha” de Vinícius de Moraes e “Coisas do reino da minha cidade” de Vintém de Cobre?.
Explicação a respeito de que as repetições provocam ritmos regulares ou irregulares em poemas, cantigas e brincadeiras infantis.
Explicação de trava-línguas.
Audição de “travatrovas” “O pedreiro Pedro Alfredo”, “Se um dia me der na telha”, “Chegou ‘seu’ Chico Sousa” de Ciça.
Contextualização da poesia popular brasileira.
Ativação do conhecimento.
Esclarecimentos: Patativa do Assaré e a temática da narrativa em versos.
Constatação de que existem regras para acentuar os versos.
Ativação do conhecimento. Leitura de “O milagre do Corcovado”.
Retomada das orientações da oficina 4 (página 45).
Exploração do tema. “Comente com eles a diferença de dimensão que os objetos assumem, vistos de longe e de perto”.
Releitura do poema para imaginar a cidade. Comparação entre as cidades dos dois poemas e descrição das diferenças e semelhanças.
165
Apresentação da situação. Ativação do conhecimento.
Delimitação do tema que retrata a cidade.
Atividade lúdica. Desenhos das impressões dos alunos em um painel.
Leitura e análise do poema vencedor do último concurso para motivação.
Retomada da situação de produção “O lugar onde vivo”.
Delimitação do tema, interlocutor, seleção de recursos, com foco na Teoria Literária.
Cópia na lousa, leitura e debate sobre alguns versos para aperfeiçoamento do texto.
Alimentação temática: organizamos, neste tópico, as atividades que apresentam diferentes estratégias de busca e seleção de informações para fundamentar a produção de texto.
Discussão para saber se há apreciação do gênero e qual seria a motivação.
Alimentação temática para ampliação dos conhecimentos.
Entrevista com os moradores do bairro.
Sugestão de interação entre a comunidade e os alunos.
Coleta de material de poetas clássicos ou modernistas.
Seleção dos poemas preferidos.
Providenciar cópias dos textos preferidos pelo professor e alunos para lerem em grupos.
Solicitação aos alunos para que selecionem poemas que serão fixados no mural.
Explicação sobre a diferença entre pseudônimo e heterônimo.
Esclarecimentos sobre Fernando Pessoa.
Busca de “impressões, sensações e sentimentos” com vistas à produção.
Planejamento e confecção do painel, em grupo, que retratará a cidade.
Atividade lúdica. Colagem dos elementos transcritos no painel.
Reflexão do que foi aprendido e realizado.
Elementos fundamentais do poema: sonoridade (rima), ritmo, metro, verso; unidades expressivas:
Leitura. Descrição da representação de poema para os alunos.
Debate sobre as características do poema: tematização e forma composicional.
Localização de palavras ou versos repetidos nas estrofes.
Conversa. Definição da função da poesia.
Leitura e compreensão do texto a ser apresentado com foco nos recursos linguísticos e lógicos do texto.
Análise do poema “Canção do exílio” de Gonçalves Dias com vistas a apreensão do modo como foram selecionadas as palavras, as rimas, versos e estrofes para articularem o sentido.
Definição dos conceitos de rima, versos regulares, versos brancos e verso solto.
Localização das rimas nos versos. Identificação dos modos como as rimas são apresentadas em quadras diferentes.
Identificação de rimas após leitura e audição nas quadras.
Compreensão. Busca do conhecimento de mundo via assimilação e relacionamento entre grafema e poema.
Conversa e percepção de grafema (rima interna) capazes de formar “uma lista”.
Identificação e transcrição de recursos linguísticos.
Organização dos recursos linguísticos correspondentes aos temas do texto.
166
Discussão. Levantamento e comparação de termos com temas sociais.
Exploração do título.
Aspectos metalinguísticos contribuem para a interpretação do texto.
Técnicas que agrupam a lista de termos e as formas linguísticas para uma produção coletiva.
Seleção individual de palavras. Localizar no dicionário.
Eleição da ordem em que os versos irão seguir.
Escolha do título do poema.
Esclarecimento das particularidades do poema e diferença com outros textos. Os recursos expressivos sugerem vários sentidos.
Atividade em grupo. Audição do poema “Livros e flores” de Machado de Assis, com vistas à preocupação da organização sintática.
Compreensão do texto. Verificação de termos no dicionário.
Definição de sentido próprio e sentido figurado.
Esclarecimento de ambivalência do termo, estranhamento causado pela inversão sintática.
Observação da sequência lógica textual.
Localização de sentido próprio e figurado.
Atividade em grupo. Leitura e discussão sobre as “definições poéticas” para descobrir significado.
Cópia na lousa para observação dos sublinhados: metáfora e personificação.
Esclarecimento/definição de personificação.
Leitura em voz alta. Na Coletânea, leitura em grupo, dos poemas de Sidônio Muralha e de Ângela Leite de Souza.
Percepção das repetições de palavras, de versos e de letras que produzem sons.
Debate sobre os possíveis efeitos de sentido que podem surgir com a aliteração em ritmo regular.
Audição de “travatrovas” “O pedreiro Pedro Alfredo”, “Se um dia me der na telha”, “Chegou ‘seu’ Chico Sousa” de Ciça.
Levantamento da temática, a partir do estilo do poeta.
Análise da acentuação em versos escondidos (ou divididos) de “Emigração e as consequências” para observação da acentuação.
Compreensão do tema e do tom via forma.
Busca do significado dos termos “triste” e “melancólico” no dicionário.
Retomada dos dois poemas. Observação dos recursos expressivos.
Identificar semelhanças: organização composicional, rimas, ritmo marcado e repetições. Recursos expressivos: figuras de linguagem. Apreciação valorativa positiva.
Produção de um quadro-resumo.
Percepção dos recursos no poema de Carla M. Xavier.
Adequação do título ao tema. Repetição ou eliminação de termos na construção do som.
Leitura para aperfeiçoar ou eliminar termos estilo.
Produção oral: caracterizamos este tópico com temáticas voltadas para o uso oral da linguagem.
Reconhecimento dos elementos do gênero poema e localização.
Debate visando o planejamento do mural.
167
Debate sobre as características do poema: tematização e forma composicional.
Avaliação do progresso dos alunos.
Atividade em grupo.
Leitura ou audição do CD do poema “Tem tudo a ver” de Elias José.
Debate e exposição em Datashow da construção composicional do poema.
Conversa. Definição da função da poesia.
Audição, leitura e debate sobre generalizações do ritmo e rima.
Percepção entre a leitura e efeitos sonoros do ritmo textual.
Atividade interativa com leitura oral da seleção de poemas e da coletânea.
Atividade lúdica voltada para o ritmo, as pausas e a entonação da voz.
Oralização. Busca de uma inter-relação entre o empírico e a subjetividade dos alunos com o conteúdo temático dos textos.
Arguição. Ampliação da interpretação do texto com centralização nos recursos expressivos.
Leitura e compreensão do texto a ser apresentado com foco nos recursos linguísticos e lógicos do texto.
Sugestão de audição de outros autores famosos para aperfeiçoar a leitura e a apresentação do texto.
Leitura. Composição de rimas. Localização no dicionário. Atividade trabalho com os elementos linguísticos.
Reconhecimento de rimas simples e populares (as quadrilinhas).
Oralização. Definição do conceito de quadrinha.
Leitura e revisão da quadra. Fixação da quadra no mural.
Discussão. Levantamento e comparação de termos com temas sociais.
Exploração do título.
Atividade em grupo. Leitura e discussão sobre as “definições poéticas” para descobrir significado.
Atividade lúdica: apresentação.
Atividade em grupo. Avaliação e leitura da letra de canção “O leão” de Vinícius de Morais.
Questionamento sobre o porque da comparação entre “rugido” e “trovão”.
Leitura do poema “Meus oito anos” de Casimiro de Abreu.
Questionamentos para a ativação do conhecimento, para a produção textual.
Apresentação e debate sobre a tarefa.
Criação de metáforas eliminando os termos de comparação.
Leitura das melhores frases construídas pelos grupos.
Leitura em voz alta. Na Coletânea, leitura em grupo, dos poemas de Sidônio Muralha e de Ângela Leite de Souza.
Debate sobre os possíveis efeitos de sentido que podem surgir com a aliteração em ritmo regular.
Cópia de trava-língua para decorar e apresentar.
Atividade em grupo para apresentação de trava-língua. Sorteio do trava-língua. Treinamento.
Competição. Solicitação aos melhores na 1ª etapa para ler em voz alta.
Leitura em voz alta e socialização das produções. Revisão e exposição dos textos no mural.
Audição e leitura do poema “Emigração e as consequências”.
168
Identificação de assuntos nos versos e estrofes.
Discussão e retomada das figuras: comparação e metáfora.
Leitura de versos. Debate para a identificação do estilo do autor.
Leitura para verificação da temática escolhida pelo poeta.
Leitura em voz alta para a percepção do ritmo cadenciado.
Leitura oral para a compreensão de que poemas, grandes ou pequenos, podem ou não terem ritmos marcados.
Audição e leitura. Retomada dos conhecimentos: regularidade das estrofes, tamanho dos versos, rimas, repetição dos versos. Observação da sequência de ideias para a forma do poema.
Leitura em voz alta das quadras.
Atividade lúdica: montagem de um painel ilustrado com o novo percurso do tatu.
Ativação do conhecimento. Leitura de “O milagre do Corcovado”.
Exploração do tema. “Comente com eles a diferença de dimensão que os objetos assumem, vistos de longe e de perto”.
Leitura do poema “Cidadezinha” de Mário Quintana. Releitura para imaginar a intenção da autora. Foco na forma e na idealização.
Interpretação dos sentimentos do poeta. Foco nas formas linguísticas.
Diferenças: tons alegre e triste dos poetas.
Conversa ou passeio: coleta de dados sobre a cidade. Foco nas impressões e sensações.
Conversa e descrição do ponto mais interessante.
Debate para esclarecer a intenção discursiva de Alberto Caieiro.
Observação do painel.
Audição e leitura de alguns poemas.
Aprendizado do significado de várias palavras: poema, poesia, poeta, verso, estrofe, estilo, tema, figuras, denotação, conotação, aliteração.
Cópia na lousa e conversa sobre os aspectos selecionados no mural para fundamentar a produção do poema coletivo.
Reler os versos constantemente para compor as rimas, o sentido, as figuras de linguagem, a forma composicional e os versos e estrofes.
Leitura em voz alta para adequação do tamanho dos versos, ritmo e exclusão de clichês.
Releitura do poema e a escolha do título.
Cópia na lousa, leitura e debate sobre alguns versos para aperfeiçoamento do texto.
Revisão do poema: título, tema, “O lugar onde vivo”, delimitação temática; harmonia do ritmo; organização em versos e estrofes; ocupação da página; margens; efeitos sonoros; ritmo marcado e rimas; repetição da mesma construção (paralelismo sintático); figuras de linguagem.
Atividade lúdica. Leitura de um poeta e outro de um aluno, para ensaio da apresentação. Foco no ritmo, pausas e entonação da voz.
Local decorado, música e teatro.
Produção escrita: agrupamos, neste tópico, atividades voltadas
Registros de poemas ou trechos conhecidos pelos alunos.
Fixação dos textos no mural.
169
para o exercício da produção escrita coletiva e individual.
Organização de um mural.
Registro, no mural, dos poemas analisados e produzidos pelos alunos, para futuras leituras.
Cópia das conclusões no caderno.
Produção escrita do 1° texto tematizando “O lugar onde vivo”.
Atividade de escrita. Preenchimento de lacuna, privilegiando o ritmo, o som e o verso para a construção do sentido.
Produção coletiva de quadra.
Em trio: composição dos versos. Elaboração coletiva do texto com a utilização de palavras e rimas que combinem.
Atividade para fixação: individualmente ou em grupos, produção escrita de definições poéticas.
Orientação de estratégia básica de leitura: sublinhar.
Atividade escrita: produção de comparações e metáforas sobre “O lugar onde vivo”.
Atividade escrita para compreensão. Preenchimento de espaços vazios, individualmente ou em duplas.
Cópia pela professora dos exercícios de outros alunos.
Criação de metáforas eliminando os termos de comparação.
Cópia de trava-língua para decorar e apresentar.
Individualmente ou em grupos produção e registro no caderno de trava-línguas ou travatrovas usando encontros consonantais ou sons parecidos.
Atividade individual ou em dupla. Produção de quadras acrescentando a cidade dos alunos ao percurso do tatu.
Produção a partir do primeiro verso original mantendo “o ritmo e as rimas nos versos pares”.
Registro de palavras e impressões dos alunos.
Escrita dos versos criados em conjunto na lousa.
1ª produção individual. Escrita e (re)escrita do poema. Privilégio de recursos literários, lingüísticos e aproximação dos aspectos da cidade.
Reescrita: organizamos, neste item, as atividades que envolvem atividades de reescrita orientadas coletiva e individualmente.
Sugestão aos alunos para que façam rascunhos para a refacção do texto se necessário.
Reler os versos constantemente para compor as rimas, o sentido, as figuras de linguagem, a forma composicional e os versos e estrofes.
Leitura em voz alta para adequação do tamanho dos versos, ritmo e exclusão de clichês.
Releitura do poema e a escolha do título.
1ª produção individual. Escrita e (re)escrita do poema. Privilégio de recursos literários, linguísticos e aproximação dos aspectos da cidade.
Reescrita.
Fonte: Organizada pela autora/2013, de ALTENFELDER; ARMELIN, 2010.
170
TABELA 2 – Tipos de Atividades: perspectiva bakhtiniana
Tipos de Atividades: nos moldes da sequência didática
Conjunto de tematizações enfocadas nas atividades do Caderno
Conteúdo
Ativação de conhecimento prévio.
Discussão para saber se há apreciação do gênero e qual seria a motivação.
Diagnóstico. Esclarecimento das características e situação de produção do poema.
Produção escrita do 1° texto tematizando “O lugar onde vivo”.
Esclarecimentos sobre Fernando Pessoa.
Discussão. Levantamento e comparação de termos com temas sociais.
Contextualização da poesia popular brasileira.
Ativação do conhecimento.
Esclarecimentos: Patativa do Assaré e a temática da narrativa em versos.
Leitura para verificação da temática escolhida pelo poeta.
Ativação do conhecimento. Leitura de “O milagre do Corcovado”.
Apresentação da situação. Ativação do conhecimento.
Debate para esclarecer a intenção discursiva de Alberto Caieiro.
Planejamento e confecção do painel, em grupo, que retratará a cidade.
*Assunto
Conversa. Definição da função da poesia.
Discussão em torno do título “Duas dúzias de coisinhas à toa que deixam a gente feliz”. Audição do poema em busca de possíveis temas.
Questionamentos para a ativação do conhecimento, para a produção textual.
Delimitação do tema que retrata a cidade.
Conversa ou passeio: coleta de dados sobre a cidade. Foco nas impressões e sensações.
Conversa e descrição do ponto mais interessante.
Busca de “impressões, sensações e sentimentos” com vistas à produção.
Registro de palavras e impressões dos alunos.
Atividade lúdica. Desenhos das impressões dos alunos em um painel.
Cópia na lousa e conversa sobre os aspectos selecionados no mural para fundamentar a produção do poema coletivo.
Delimitação do tema, interlocutor, seleção de recursos, com foco na Teoria Literária.
Material: unidades da língua, sons, palavras, imagens.
Estilo individual
Localização de palavras ou versos repetidos nas estrofes.
Leitura. Composição de rimas. Localização no dicionário. Atividade trabalho com os elementos linguísticos.
Reconhecimento de rimas simples e populares (as quadrilinhas).
Atividade de escrita. Preenchimento de lacuna, privilegiando o ritmo, o som e o verso para a construção do sentido.
171
Análise do poema “Canção do exílio” de Gonçalves Dias com vistas a apreensão do modo como foram selecionadas as palavras, as rimas, versos e estrofes para articularem o sentido.
Localização das rimas nos versos. Identificação dos modos como as rimas são apresentadas em quadras diferentes.
Explicação sobre a diferença entre pseudônimo e heterônimo.
Identificação de rimas após leitura e audição nas quadras.
Conversa e percepção de grafema (rima interna) capazes de formar “uma lista”.
Seleção individual de palavras. Localizar no dicionário
Em trio: composição dos versos. Elaboração coletiva do texto com a utilização de palavras e rimas que combinem.
Atividade escrita para compreensão. Preenchimento de espaços vazios, individualmente ou em duplas.
Apresentação e debate sobre a tarefa.
Leitura em voz alta. Na Coletânea, leitura em grupo, dos poemas de Sidônio Muralha e de Ângela Leite de Souza.
Definição de aliteração (repetição da mesma consoante).
Localização recorrente de repetição de palavras, rimas e aliteração.
Debate sobre os possíveis efeitos de sentido que podem surgir com a aliteração em ritmo regular.
Apresentação da aliteração construindo um ritmo irregular em fragmentos de “Pátria minha” de Vinícius de Moraes e “Coisas do reino da minha cidade” de Vintém de Cobre?.
Explicação a respeito de que as repetições provocam ritmos regulares ou irregulares em poemas, cantigas e brincadeiras infantis.
Individualmente ou em grupos produção e registro no caderno de trava-línguas ou travatrovas usando encontros consonantais ou sons parecidos.
Levantamento da temática, a partir do estilo do poeta.
Discussão e retomada das figuras: comparação e metáfora.
Leitura de versos. Debate para a identificação do estilo do autor.
Trabalho com a noção de ritmo nas quadras do poema “O buraco do tatu”.
Produção a partir do primeiro verso original mantendo “o ritmo e as rimas nos versos pares”.
Busca do significado dos termos “triste” e “melancólico” no dicionário.
Retomada dos dois poemas. Observação dos recursos expressivos.
Diferenças: tons alegre e triste dos poetas.
Leitura para aperfeiçoar ou eliminar termos estilo.
Estilo do gênero
Oralização. Definição do conceito de quadrinha.
Organização dos recursos linguísticos correspondentes aos temas do texto.
Forma: diálogo face a face, estética (valoração).
Registros de poemas ou trechos conhecidos pelos alunos.
Reconhecimento dos elementos do gênero poema e localização.
172
Alimentação temática para ampliação dos conhecimentos.
Entrevista com os moradores do bairro.
Coleta de material de poetas clássicos ou modernistas.
Registro, no mural, dos poemas analisados e produzidos pelos alunos, para futuras leituras.
Debate visando o planejamento do mural.
Debate sobre as características do poema: tematização e forma composicional.
Avaliação do progresso dos alunos.
Debate e exposição em Datashow da construção composicional do poema.
Predição dos conteúdos.
Cópia das conclusões no caderno.
Sugestão aos alunos para que façam rascunhos para a refacção do texto se necessário.
Audição, leitura e debate sobre generalizações do ritmo e rima.
Percepção entre a leitura e efeitos sonoros do ritmo textual.
Atividade interativa com leitura oral da seleção de poemas e da coletânea.
Atividade lúdica voltada para o ritmo, as pausas e a entonação da voz.
Oralização. Busca de uma inter-relação entre o empírico e a subjetividade dos alunos com o conteúdo temático dos textos.
Sugestão de audição de outros autores famosos para aperfeiçoar a leitura e a apresentação do texto.
Definição dos conceitos de rima, versos regulares, versos brancos e verso solto.
Produção coletiva de quadra.
Leitura e revisão da quadra. Fixação da quadra no mural.
Compreensão. Busca do conhecimento de mundo via assimilação e relacionamento entre grafema e poema.
Identificação e transcrição de recursos linguísticos.
Aspectos metalinguísticos contribuem para a interpretação do texto.
Técnicas que agrupam a lista de termos e as formas linguísticas para uma produção coletiva.
Eleição da ordem em que os versos irão seguir.
Escolha do título do poema.
Esclarecimento das particularidades do poema e diferença com outros textos. Os recursos expressivos sugerem vários sentidos.
Atividade em grupo. Audição do poema “Livros e flores” de Machado de Assis, com vistas à preocupação da organização sintática.
Compreensão do texto. Verificação de termos no dicionário.
Definição de sentido próprio e sentido figurado.
Esclarecimento de ambivalência do termo, estranhamento causado pela inversão sintática.
Observação da sequência lógica textual.
Localização de sentido próprio e figurado.
Atividade em grupo. Leitura e discussão sobre as “definições poéticas” para descobrir significado.
Atividade para fixação: individualmente ou em grupos, produção escrita de definições poéticas.
173
Apresentação do conteúdo: linguagem figurada.
Questionamento sobre o porque da comparação entre “rugido” e “trovão”.
Orientação de estratégia básica de leitura: sublinhar.
Explicação para o termo metáfora.
Cópia na lousa para observação dos sublinhados: metáfora e personificação.
Esclarecimento/definição de personificação.
Atividade escrita: produção de comparações e metáforas sobre “O lugar onde vivo”.
Criação de metáforas eliminando os termos de comparação.
Leitura das melhores frases construídas pelos grupos.
Explicação de trava-línguas.
Cópia de trava-língua para decorar e apresentar.
Atividade em grupo para apresentação de trava-língua. Sorteio do trava-língua. Treinamento.
Audição de “travatrovas” “O pedreiro Pedro Alfredo”, “Se um dia me der na telha”, “Chegou ‘seu’ Chico Sousa” de Ciça.
Competição. Solicitação aos melhores na 1ª etapa para ler em voz alta.
Leitura em voz alta e socialização das produções. Revisão e exposição dos textos no mural.
Identificação de assuntos nos versos e estrofes.
Leitura em voz alta para a percepção do ritmo cadenciado.
Leitura oral para a compreensão de que poemas, grandes ou pequenos, podem ou não terem ritmos marcados.
Constatação de que existem regras para acentuar os versos.
Análise da acentuação em versos escondidos (ou divididos) de “Emigração e as consequências” para observação da acentuação.
Audição e leitura. Retomada dos conhecimentos: regularidade das estrofes, tamanho dos versos, rimas, repetição dos versos. Observação da sequência de ideias para a forma do poema.
Atividade individual ou em dupla. Produção de quadras acrescentando a cidade dos alunos ao percurso do tatu.
Leitura em voz alta das quadras.
Retomada das orientações da oficina 4 (página 45).
Leitura do poema “Cidadezinha” de Mário Quintana. Releitura para imaginar a intenção da autora. Foco na forma e na idealização.
Compreensão do tema e do tom via forma.
Releitura do poema para imaginar a cidade. Comparação entre as cidades dos dois poemas e descrição das diferenças e semelhanças.
Interpretação dos sentimentos do poeta. Foco nas formas lingüísticas.
Identificar semelhanças: organização composicional, rimas, ritmo marcado e repetições. Recursos expressivos: figuras de linguagem. Apreciação valorativa positiva.
Leitura de “Confidência do itabirano” e “Alma Cabocla” para a percepção do tema. Privilégio das características literárias.
Produção de um quadro-resumo
Audição e leitura de alguns poemas.
174
Aprendizado do significado de várias palavras: poema, poesia, poeta, verso, estrofe, estilo, tema, figuras, denotação, conotação, aliteração.
Reler os versos constantemente para compor as rimas, o sentido, as figuras de linguagem, a forma composicional e os versos e estrofes.
Leitura em voz alta para adequação do tamanho dos versos, ritmo e exclusão de clichês.
Releitura do poema e a escolha do título.
Leitura e análise do poema vencedor do último concurso para motivação.
Percepção dos recursos no poema de Carla M. Xavier.
Adequação do título ao tema. Repetição ou eliminação de termos na construção do som.
Reescrita.
Revisão do poema: título, tema, “O lugar onde vivo”, delimitação temática; harmonia do ritmo; organização em versos e estrofes; ocupação da página; margens; efeitos sonoros; ritmo marcado e rimas; repetição da mesma construção (paralelismo sintático); figuras de linguagem.
Atividade lúdica. Leitura de um poeta e outro de um aluno, para ensaio da apresentação. Foco no ritmo, pausas e entonação da voz.
Fonte: Organizada pela autora/2013, de ALTENFELDER; ARMELIN, 2010.
175
TABELA 3 – Aspectos discursivos / dialógicos
Tipos de Atividades: nos moldes da
sequência didática
Conjunto de tematizações enfocadas nas atividades do Caderno
Conteúdo
Ativação de conhecimento prévio.
Discussão para saber se há apreciação do gênero e qual seria a motivação.
Diagnóstico. Esclarecimento das características e situação de produção do poema.
Produção escrita do 1° texto tematizando “O lugar onde vivo”.
Esclarecimentos sobre Fernando Pessoa.
Discussão. Levantamento e comparação de termos com temas sociais.
Contextualização da poesia popular brasileira.
Ativação do conhecimento.
Esclarecimentos: Patativa do Assaré e a temática da narrativa em versos.
Leitura para verificação da temática escolhida pelo poeta.
Ativação do conhecimento. Leitura de “O milagre do Corcovado”.
Apresentação da situação. Ativação do conhecimento.
Debate para esclarecer a intenção discursiva de Alberto Caieiro.
Planejamento e confecção do painel, em grupo, que retratará a cidade.
Conversa. Definição da função da poesia.
Discussão em torno do título “Duas dúzias de coisinhas à toa que deixam a gente feliz”. Audição do poema em busca de possíveis temas.
Questionamentos para a ativação do conhecimento, para a produção textual.
Delimitação do tema que retrata a cidade.
Conversa ou passeio: coleta de dados sobre a cidade. Foco nas impressões e sensações.
Conversa e descrição do ponto mais interessante.
Busca de “impressões, sensações e sentimentos” com vistas à produção.
Registro de palavras e impressões dos alunos.
Atividade lúdica. Desenhos das impressões dos alunos em um painel.
Cópia na lousa e conversa sobre os aspectos selecionados no mural para fundamentar a produção do poema coletivo.
Delimitação do tema, interlocutor, seleção de recursos, com foco na Teoria Literária.
Material
Localização de palavras ou versos repetidos nas estrofes.
Leitura. Composição de rimas. Localização no dicionário. Atividade trabalho com os elementos linguísticos.
Reconhecimento de rimas simples e populares (as quadrilinhas).
Atividade de escrita. Preenchimento de lacuna, privilegiando o ritmo, o som e o verso para a construção do sentido.
Análise do poema “Canção do exílio” de Gonçalves Dias com vistas a apreensão do modo como foram selecionadas as palavras, as rimas, versos e estrofes para articularem o sentido.
Localização das rimas nos versos. Identificação dos modos como as rimas são apresentadas em quadras diferentes.
Explicação sobre a diferença entre pseudônimo e heterônimo.
Identificação de rimas após leitura e audição nas quadras.
Conversa e percepção de grafema (rima interna) capazes de formar “uma lista”.
Seleção individual de palavras. Localizar no dicionário
176
Em trio: composição dos versos. Elaboração coletiva do texto com a utilização de palavras e rimas que combinem.
Atividade escrita para compreensão. Preenchimento de espaços vazios, individualmente ou em duplas.
Apresentação e debate sobre a tarefa.
Leitura em voz alta. Na Coletânea, leitura em grupo, dos poemas de Sidônio Muralha e de Ângela Leite de Souza.
Definição de aliteração (repetição da mesma consoante).
Localização recorrente de repetição de palavras, rimas e aliteração.
Debate sobre os possíveis efeitos de sentido que podem surgir com a aliteração em ritmo regular.
Apresentação da aliteração construindo um ritmo irregular em fragmentos de “Pátria minha” de Vinícius de Moraes e “Coisas do reino da minha cidade” de Vintém de Cobre?.
Explicação a respeito de que as repetições provocam ritmos regulares ou irregulares em poemas, cantigas e brincadeiras infantis.
Individualmente ou em grupos produção e registro no caderno de trava-línguas ou travatrovas usando encontros consonantais ou sons parecidos.
Levantamento da temática, a partir do estilo do poeta.
Discussão e retomada das figuras: comparação e metáfora.
Leitura de versos. Debate para a identificação do estilo do autor.
Trabalho com a noção de ritmo nas quadras do poema “O buraco do tatu”.
Produção a partir do primeiro verso original mantendo “o ritmo e as rimas nos versos pares”.
Busca do significado dos termos “triste” e “melancólico” no dicionário.
Retomada dos dois poemas. Observação dos recursos expressivos.
Diferenças: tons alegre e triste dos poetas.
Leitura para aperfeiçoar ou eliminar termos estilo.
Oralização. Definição do conceito de quadrinha.
Organização dos recursos linguísticos correspondentes aos temas do texto.
Forma
Registros de poemas ou trechos conhecidos pelos alunos.
Reconhecimento dos elementos do gênero poema e localização.
Alimentação temática para ampliação dos conhecimentos.
Entrevista com os moradores do bairro.
Coleta de material de poetas clássicos ou modernistas.
Registro, no mural, dos poemas analisados e produzidos pelos alunos, para futuras leituras.
Debate visando o planejamento do mural.
Debate sobre as características do poema: tematização e forma composicional.
Avaliação do progresso dos alunos.
Debate e exposição em Datashow da construção composicional do poema.
Predição dos conteúdos.
Cópia das conclusões no caderno.
Sugestão aos alunos para que façam rascunhos para a refacção do texto se necessário.
Audição, leitura e debate sobre generalizações do ritmo e rima.
Percepção entre a leitura e efeitos sonoros do ritmo textual.
Atividade interativa com leitura oral da seleção de poemas e da coletânea.
Atividade lúdica voltada para o ritmo, as pausas e a entonação da voz.
177
Oralização. Busca de uma inter-relação entre o empírico e a subjetividade dos alunos com o conteúdo temático dos textos.
Sugestão de audição de outros autores famosos para aperfeiçoar a leitura e a apresentação do texto.
Definição dos conceitos de rima, versos regulares, versos brancos e verso solto.
Produção coletiva de quadra.
Leitura e revisão da quadra. Fixação da quadra no mural.
Compreensão. Busca do conhecimento de mundo via assimilação e relacionamento entre grafema e poema.
Identificação e transcrição de recursos linguísticos.
Aspectos metalinguísticos contribuem para a interpretação do texto.
Técnicas que agrupam a lista de termos e as formas linguísticas para uma produção coletiva.
Eleição da ordem em que os versos irão seguir.
Escolha do título do poema.
Esclarecimento das particularidades do poema e diferença com outros textos. Os recursos expressivos sugerem vários sentidos.
Atividade em grupo. Audição do poema “Livros e flores” de Machado de Assis, com vistas à preocupação da organização sintática.
Compreensão do texto. Verificação de termos no dicionário.
Definição de sentido próprio e sentido figurado.
Esclarecimento de ambivalência do termo, estranhamento causado pela inversão sintática.
Observação da sequência lógica textual.
Localização de sentido próprio e figurado.
Atividade em grupo. Leitura e discussão sobre as “definições poéticas” para descobrir significado.
Atividade para fixação: individualmente ou em grupos, produção escrita de definições poéticas.
Apresentação do conteúdo: linguagem figurada.
Questionamento sobre o porque da comparação entre “rugido” e “trovão”.
Orientação de estratégia básica de leitura: sublinhar.
Explicação para o termo metáfora.
Cópia na lousa para observação dos sublinhados: metáfora e personificação.
Esclarecimento/definição de personificação.
Atividade escrita: produção de comparações e metáforas sobre “O lugar onde vivo”.
Criação de metáforas eliminando os termos de comparação.
Leitura das melhores frases construídas pelos grupos.
Explicação de trava-línguas.
Cópia de trava-língua para decorar e apresentar.
Atividade em grupo para apresentação de trava-língua. Sorteio do trava-língua. Treinamento.
Audição de “travatrovas” “O pedreiro Pedro Alfredo”, “Se um dia me der na telha”, “Chegou ‘seu’ Chico Sousa” de Ciça.
Competição. Solicitação aos melhores na 1ª etapa para ler em voz alta.
Leitura em voz alta e socialização das produções. Revisão e exposição dos textos no mural.
Identificação de assuntos nos versos e estrofes.
Leitura em voz alta para a percepção do ritmo cadenciado.
Leitura oral para a compreensão de que poemas, grandes ou pequenos, podem ou não terem ritmos marcados.
Constatação de que existem regras para acentuar os versos.
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Análise da acentuação em versos escondidos (ou divididos) de “Emigração e as consequências” para observação da acentuação.
Audição e leitura. Retomada dos conhecimentos: regularidade das estrofes, tamanho dos versos, rimas, repetição dos versos. Observação da sequência de ideias para a forma do poema.
Atividade individual ou em dupla. Produção de quadras acrescentando a cidade dos alunos ao percurso do tatu.
Leitura em voz alta das quadras.
Retomada das orientações da oficina 4 (página 45).
Leitura do poema “Cidadezinha” de Mário Quintana. Releitura para imaginar a intenção da autora. Foco na forma e na idealização.
Compreensão do tema e do tom via forma.
Releitura do poema para imaginar a cidade. Comparação entre as cidades dos dois poemas e descrição das diferenças e semelhanças.
Interpretação dos sentimentos do poeta. Foco nas formas lingüísticas.
Identificar semelhanças: organização composicional, rimas, ritmo marcado e repetições. Recursos expressivos: figuras de linguagem. Apreciação valorativa positiva.
Leitura de “Confidência do itabirano” e “Alma Cabocla” para a percepção do tema. Privilégio das características literárias.
Produção de um quadro-resumo.
Audição e leitura de alguns poemas.
Aprendizado do significado de várias palavras: poema, poesia, poeta, verso, estrofe, estilo, tema, figuras, denotação, conotação, aliteração.
Reler os versos constantemente para compor as rimas, o sentido, as figuras de linguagem, a forma composicional e os versos e estrofes.
Leitura em voz alta para adequação do tamanho dos versos, ritmo e exclusão de clichês.
Releitura do poema e a escolha do título.
Leitura e análise do poema vencedor do último concurso para motivação.
Percepção dos recursos no poema de Carla M. Xavier.
Adequação do título ao tema. Repetição ou eliminação de termos na construção do som.
Reescrita.
Revisão do poema: título, tema, “O lugar onde vivo”, delimitação temática; harmonia do ritmo; organização em versos e estrofes; ocupação da página; margens; efeitos sonoros; ritmo marcado e rimas; repetição da mesma construção (paralelismo sintático); figuras de linguagem.
Atividade lúdica. Leitura de um poeta e outro de um aluno, para ensaio da apresentação. Foco no ritmo, pausas e entonação da voz.
Contexto sócio-histórico
Se conhecerem os grandes poetas, vamos lhes propor poemas populares.
Conhecimento de poetas consagrados, da época modernista e contemporânea 26.
Acontecimentos 28, 46, 112.
Relação com os acontecimentos e as modificações ao longo do tempo 112.
Contextualização com a história da seca no Nordeste e a migração dos nordestinos para o Sul.
Contextualização do autor
Conhecimento de poetas desde o Modernismo à Contemporaneidade 28.
Pseudônimo e heterônimo 55.
Diferentes autores: contexto de Assaré 114. Mas, M. Quintana 71, V. Vinicius de Moraes 74, Casimiro de Abreu 76 só há citação. Assaré 114 está contextualizado. Na 128 e 132 deveria haver contexto.
179
O reflexo da mineração em Itabira-MG nos trabalhos de Carlos Drummond de Andrade.
Relações autor x herói: questões dialógicas internas
Não encontramos
Trabalho com o projeto discursivo: intenção ou o querer dizer, questões ideológicas
Esclarecimento do que seria a intensão discursiva do autor, mas não faz referência à ideologia. 35
Construção semântica. 66, 67, 68, 69, 70, 75, 76, 93, 104, 107, 113
Projeto discursivo. 114
Valoração da cidade pelos alunos. 116
Na adequação discursiva falta o projeto discursivo.
Trabalho com a reconstrução de sentidos pelo leitor
Pelo viés da forma 35, 93, 104, 123; inspiração 45, experiências e sensibilidade 47, 57, 60, verbo-visual 108, sentidos 113, impressão, sensação e sentimentos 116
Trabalho com o discurso alheio (citado) e/ou vozes
Não encontramos
Trabalho com intertextualidade ou interdiscursividade. Padilha (2005)
Intertexto 109; interdiscurso (identificação do tema e do projeto discursivo do autor) 103, 106
Fonte: Organizada pela autora/2013, de ALTENFELDER; ARMELIN, 2010.
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