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2. implicações da concorrência perfeita

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2. Implicações da concorrência perfeita

2.1 As implicações dentro das empresas

O que é que facilita a vida a uma empresa que compete num mercado onde vigora a concorrência

perfeita?

Tudo o que a ajuda a reduzir os custos!

É daqui que vem, como consequência natural, a lógica de que as empresas grandes terão vantagem,

pois terão custos fixos mais diluídos por cada unidade produzida, essa vantagem será tanto mais forte

quanto maiores forem, e sendo cada vez maiores, terão cada vez mais vantagem sobre as empresas de

menor dimensão. É como uma profecia que se auto-realiza.

Empresas que competem pelo preço mais baixo têm, para maximizarem a sua vantagem competitiva, de

minimizar todas as perdas de tempo de fabrico, com paragens, limpezas e arranques. Por isso devem:

Produzir gamas de produtos pouco extensas;

Produzir produtos maduros, com um grande mercado, um sucesso garantido junto da massa de

clientes;

Produzir encomendas de grande dimensão;

Minimizar as alterações, variações e customizações aos produtos;

Minimizar as alterações aos planos de entrega e de produção.

Tudo, linhas de orientação que contribuem para aumentar a sua eficiência, pois o factor crítico de

sucesso para ganhar encomendas é o preço.

Tentar competir pelo preço mais baixo, sem seguir estas linhas de orientação é perigoso.

O exemplo da Xiameter

Em 2000, a Dow Corning detinha uma quota de 40% do mercado mundial de silicones. E começou a sentir a entrada de vários concorrentes de preço-baixo que começavam a fazer mossa. A Dow podia argumentar que ninguém sabia mais de silicones do que ela, uma vez foi ela que os inventou. Contudo, para um grupo crescente de clientes, na verdade isso era irrelevante. Eles próprios sabiam o suficiente sobre os “velhos” silicones que usavam. E, como operavam em mercados com margens apertadas e consumiam grandes quantidades, procuravam abastecer-se ao mais baixo preço. A Dow, em vez de reduzir preços e iniciar uma guerra, criou uma marca, a Xiameter, para os

clientes que procuravam grandes quantidades de silicones-padrão a baixo-preço. A Dow não se

limitou a criar a marca e a baixar os preços, criou um novo modelo de negócio para suportar a

nova marca.

Primeiro, identificou os clientes-alvo:

Grandes consumidores de silicones-padrão, as referências mais maduras do mercado;

Consumidores que não precisam de apoio técnico na utilização dos silicones;

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Consumidores que planeiam as suas necessidades com 2 a 4 semanas de antecedência.

Depois, ofereceu-lhes um preço competitivo sujeito a um conjunto de regras:

Figura 3 As regras da Xiameter vs Dow Corning

Com esta medida, a Dow não só conseguiu suster a hemorragia de clientes de grandes volumes,

como conseguiu valorizar os atributos da marca Dow Corning, evitando uma canibalização.

A estrutura produtiva adequada para maximizar a eficiência de empresas com grandes encomendas e,

idealmente, mono-produto, passa por:

Tecnologia de fabrico dedicada;

Volumes de produção elevados;

Velocidades de produção elevadas;

Tudo exigências ou limitações que dificultam, por que não são necessárias, alterações aos produtos e

aos prazos de entrega, por isso, as mudanças de linha, de produto, de referência, de cor, de modelo,

têm de ser minimizadas porque contribuem para um aumento do custo.

Não basta ter uma estrutura de maquinaria dedicada à produção de baixo custo, é também preciso ter o

tipo de encomendas que a suportam.

O exemplo da Mirandela

“A 6 de Outubro de 2006 o Semanário Económico publicava um extenso artigo de três páginas

sobre a indústria gráfica sob o título "Portugal ganha maior rotativa do mundo"

Eu não conheço nada da indústria gráfica, não conheço nada sobre o modelo de negócio das

gráficas, mas na altura, humildemente, ciente da minha ignorância, achei para mim mesmo que

este investimento não fazia sentido num país de 10 milhões de habitantes, numa economia que

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não descola de crescimentos raquíticos vai para quase dez anos, numa altura em que a internet

está a comer o mercado dos jornais e não só.

A maior rotativa do mundo deve estar pensada e desenhada para grandes produções, grandes

séries, grandes lotes de produção, logo não deve estar adaptada para mudanças rápidas de lote,

de série... pensava eu, com isto produzem o que produziam antes numa fracção de tempo mas

vão ficar com muito tempo livre... e a maior rotativa para ser viabilizada deve precisar de uma

elevada taxa de ocupação, só que só fazem sentido taxas de ocupação elevadas com grandes

séries, é absurdamente anti-económico, num negócio de preço-baixo (grandes séries) procurar

taxas de ocupação elevadas à custa do somatório de muitas pequenas encomendas... (e o custo

das mudanças e limpezas?).

A maior rotativa do mundo pediria o aumento da dimensão média das encomendas, não o

aumento puro e simples das encomendas.”

Escrito no blogue a 11 de Novembro de 2008

2.2 As implicações nas deslocalizações

A adopção do modelo da concorrência perfeita como o referencial a seguir na economia, traduz-se, num

mundo globalizado sem fronteiras, numa consequência lógica que decorre do resultado da análise de

qualquer folha de cálculo, há toda a vantagem económica em deslocalizar as unidades produtivas para

um espaço onde os custos possam ser levados ao mínimo mundial.

Assim, nasceu o modelo da China como a fábrica do mundo, com custos imbatíveis.

Se olharmos para as fotografias das fábricas chinesas, que nos chegam através dos media e da internet,

há uma constante: são unidades de produção muito grandes, que procuram tirar partido da escala, da

eficiência que a dimensão permite:

Figura 4 As mega-fábricas chinesas

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Este modelo requer, para maximizar a eficiência e, assim, reduzir os custos:

Grandes encomendas;

Pouca variedade;

Encomendas colocadas a vários meses de distância;

Contentores cheios, para minimizar custos de transporte;

Pagamento das encomendas à cabeça, seguida da produção, seguida do transporte por via

marítima e, vários meses depois, chegada às prateleiras do Ocidente. Sem se saber se os

produtos vão ter aceitação ou não.

Tudo é em grande neste modelo de compridas linhas de abastecimento, muito eficientes, mas lentas e,

por isso, pouco resilientes.

Figura 5 As longas cadeias de abastecimento

2.2 As implicações no modelo mental

A crença na superioridade e na inevitabilidade da concorrência perfeita, como modelo único para actuar no mundo dos negócios, leva a um modelo mental que é incapaz de ver outras alternativas. Quando o jovem pastor David ouviu o desafio humilhante de Golias, ofereceu-se

para o combater. Quando David foi levado à presença do rei Saúl este, de início, não quis dar ouvidos a essa possibilidade. Saúl não acreditava que um jovem pastor, sem experiência, sem cadastro militar tivesse alguma hipótese de vencer Golias. “David disse-lhe: «Ninguém desanime por causa desse filisteu! O teu servo irá combatê-lo.» Disse-lhe Saul: «Não poderás ir lutar contra esse filisteu. Não passas de uma criança, e ele é um homem de guerra desde a sua mocidade.»

Quem foi educado na teoria económica clássica, escrita no tempo em que se transaccionavam commodities, escrita no tempo em que os agentes económicos eram vistos como econs, seres puramente racionais, pensa como o rei Saul: “Como é que as PMEs portuguesas podem ter sucesso? Acaso têm custos mais baixos? Acaso têm mais dinheiro? Acaso têm…” Alguns até prevêem que só deslocalizando as suas actividades para a Ásia é que as PMEs terão futuro. Outros acham que só saindo do euro é que é possível ter futuro.

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Contudo, David lá conseguiu convencer o rei Saul a deixá-lo defrontar Golias. Disse-lhe o rei: «Vai, e que o Senhor esteja contigo.». “Então disse Saul a David:

Vai, e o SENHOR seja contigo. E Saul vestiu David com suas vestes, e pôs-lhe sobre a cabeça um capacete de bronze; e vestiu-o com uma couraça. E David cingiu a espada sobre as suas vestes, e começou a andar; porém nunca o havia experimentado; então disse David a Saul: “Não posso andar com isto, pois nunca o experimentei. E David tirou aquilo de cima de si.”

Os economistas, os políticos e os comentadores quando pensam em concorrência, pensam em agentes económicos que se encontram no mercado, para se enfrentarem com as mesmas armas e argumentos. A isso chamam de concorrência perfeita. Nesse universo, existe um grande número de empresas a produzir o mesmo produto ou serviço, empresas com dimensão e estrutura semelhante, existe um grande número de consumidores e todos com a mesma informação disponível sobre as ofertas e o mesmo gosto, existe uma grande homogeneidade dos produtos e serviços oferecidos e não existem barreiras à entrada e saída de agentes económicos. Ao aceitar enviar David para o combate com Golias, Saul só conseguia equacionar um combate de igual para igual, um combate com as mesmas armas. Uma luta por ser o melhor. Quando um qualquer David resolve combater de igual para igual com um qualquer Golias… perde!!! Perde sempre!!! David recusou a arma, a armadura, o capacete e as roupas de Saul… David resolveu que não iria competir com as mesmas armas, com as mesmas tácticas de Golias. Iria competir à sua maneira, iria combater fazendo uso daquilo em que era bom, daquilo em que tinha experiência. Ia seguir o caminho da concorrência imperfeita. Carlos Pereira da Cruz Promotor da concorrência imperfeita www.metanoia.pt