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A Carne de Aves no Mundo em 2020 Por Osler Desouzart [email protected] Um amigo dos mais diletos reclamou recentemente que tenho esquecido as aves em meus artigos. É verdade que não tenho escrito sobre elas, mas não logro esquecê-las. O front das carnes bovinas e suínas tem apresentado mais necessidade de atenções, enquanto as aves seguem se comportando bem, ainda que muitos avicultores, pressionados pelos preços dos grãos e pela montanha-russa dos mercados, possam não concordar. Entretanto, em escala global a escalada inexorável do frango em relação às demais carnes continua. O Gráfico I mostra o progressivo distanciamento das carnes suínas e de aves na liderança da produção mundial de carnes. Gráfico I 1 Quando focamos nessas duas espécies dominantes e estendemos o gráfico para uma série anual, podemos verificar (cf. Gráfico II) que a produção de carnes de aves reduz a distância que a separa do total da produção de carnes suínas, marchando para a liderança na produção de todas as carnes, o que deve acontecer até 2020. Gráfico II 1 Elaborado por ODConsulting com base em dados da FAOSTAT - Carnes Evolução recente 95-10.xlsx

A carne de aves no mundo em 2020

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Page 1: A carne de aves no mundo em 2020

A Carne de Aves no Mundo em 2020

Por Osler Desouzart

[email protected]

Um amigo dos mais diletos reclamou recentemente que tenho esquecido as aves em meus

artigos. É verdade que não tenho escrito sobre elas, mas não logro esquecê-las. O front das

carnes bovinas e suínas tem apresentado mais necessidade de atenções, enquanto as aves

seguem se comportando bem, ainda que muitos avicultores, pressionados pelos preços dos

grãos e pela montanha-russa dos mercados, possam não concordar.

Entretanto, em escala global a escalada inexorável do frango em relação às demais carnes

continua. O Gráfico I mostra o progressivo distanciamento das carnes suínas e de aves na

liderança da produção mundial de carnes.

Gráfico I

1

Quando focamos nessas duas espécies dominantes e estendemos o gráfico para uma série

anual, podemos verificar (cf. Gráfico II) que a produção de carnes de aves reduz a distância que

a separa do total da produção de carnes suínas, marchando para a liderança na produção de

todas as carnes, o que deve acontecer até 2020.

Gráfico II

1 Elaborado por ODConsulting com base em dados da FAOSTAT - Carnes Evolução recente 95-10.xlsx

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As projeções da OECD-FAO apontam para uma continuidade do crescimento da produção

mundial de todas as carnes (cf. Gráfico III) e na continuidade do encurtamento da distância

que separa as carnes de aves da liderança da carne suína.

Gráfico III

3

2 Idem

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Na ODCONSULTING acreditamos que a carnes de aves já devem alcançar a liderança entre

todas as carnes em 2020. As razões que nos levam a sustentar esta tese residem na crescente

universalização da produção de carnes de aves e na alta concentração da produção de carnes

suínas num único país, a China. Pensamos que os índices de crescimento futuro da produção

de carne suína chinesa devem ser mais modestos, com espaço para a internacionalização de

parte da produção chinesa e um aumento da participação da importação no atendimento do

crescente consumo chinês.

Reforça nossa convicção o fato de que o crescimento futuro do consumo de carnes em geral se

verificará principalmente na África e Ásia, principalmente em países onde a religião islâmica é

predominante, favorecendo o consumo, sobretudo de carne de frango cuja ingesta não sofre

restrições.

Ainda que num prazo relativamente curto de tempo como é o ano 2020 a equação de

eficiência no uso de recursos naturais para a produção de carnes esteja presente, mas ainda

não seja o fator mais determinante, é unânime que a carne de frango é a mais eficiente e

menos demandante desses recursos. Somando esse fator à geografia futura da produção e a

ausência de restrições religiosas a seu consumo, reforça-se nossa convicção nas carnes de

aves, mormente a do frango, como a que prevalecerá no futuro.

4

Pequenas diferenças de pensamento à parte, vamos olhar mais adiante as previsões de

crescimento dos principais produtores mundiais até 2020 e para isso nos renderemos à

excelência do trabalho desenvolvido pela OECD-FAO, assim como o do USDA-ERS, de

fornecerem perspectivas e projeções a 10 anos, horizonte que cabe como uma luva para todas 3 As projeções de 2011 a 2020 são OECD-FAO Agricultural Outlook 2011-2020, de junho de 2011, enquanto os dados

de 2009 e 2010 são da FAOSTAT em 29.03.2012 - Carnes por espécies.xlsx 4 Dados a 2010 são da FAOSTAT e as projeções são elaboradas pela ODConsulting. Produção Mundial de Carnes por

espécies 1948 a 2011 base de dados e projeções a 2050nov2011.xlsx

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as empresas que fazem planejamento estratégico, o que é aqui enfaticamente recomendado.

Ah, mas em 10 anos tanta coisa muda, argumento que ouço com muita frequência. Felizmente

as coisas mudam e seguirão mudando, mas para quem tem planejamento estratégico as

mudanças implicarão em ajustar uma rota traçada, situação melhor do que ser conduzido por

essas mudanças como uma nau em pane.

Irresistível neste momento não reafirmar um dos nossos bordões: “Se você não sabe aonde

vai, qualquer caminho serve”. As quantificações apresentadas nas projeções não pretendem

acertar em cheio os números até a casa do quilo. Indicam sim um cenário que me podem

pautar. Se eu traço como meta ter 5% da produção brasileira de carnes de aves em 2020 o

mínimo dos mínimos que pode me interessar é saber o quanto o Brasil deverá produzir em

2020.

Lança-se então mão das projeções existentes, como a disponibilizadas pelo nosso MAPA, pela

OECD-FAO e pelo USDA-ERS (cf. Gráfico IV). Ah, mas os números divergem! Ótimo, pois seria

de desconfiar se fossem os mesmos. Mas convergem em mostrar que a produção brasileira

crescerá anualmente e permitirá a elaboração de três cenários para a empresa. É perfeito e

devemos gritar “eureka”? Não, mas a empresa já estará melhor do que sem qualquer

horizonte quantificado.

Gráfico IV

5

Feito o comercial das vantagens de se dispor de um planejamento estratégico, vamos então

dar uma olhada em quantificações dos principais atores mundiais nas carnes de aves.

Comecemos por estabelecer o quem foi quem na avicultura em 2011 através dos gráficos de

Pareto dos principais produtores (Gráfico V), importadores (Gráfico VI), exportadores (Gráfico

VII) e consumidores (Gráfico VIII).

5 Fontes: MAPA, OECD-FAO, USDA-ERS TABELAS GERAIS projeções agronegócio Brasil 2020-2021.xlsx

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Os dados relativos à produção brasileira de carnes de aves estão subestimados, pois fontes da indústria estimam a produção brasileira de carne de frangos em 12.863,2 (milhares tm), a qual teria que agregar umas 505 mil tm de carne de peru e umas 11.000 de carnes de pato, ganso, galinha d’angola e outras aves, perfazendo um total de umas 13.379,2 milhares de tm. Entretanto, vamos mantê-los na forma original para efeitos de comparação com o total mundial. Mui lamentavelmente há uma decisão da indústria brasileira de não divulgar os dados da produção brasileira, decisão essa que já criticamos em mais de uma ocasião. Ficamos com um vazio de um endosso oficial aos números do Brasil que já é o terceiro maior produtor de carnes de aves do mundo. Mas como pedir à FAO que corrija seus números se não dispomos números oficiais a oferecer ou mesmo os da nossa entidade máxima, a UBABEF, que eram oficiosos, mas de aceitação e credibilidade universal?

Gráfico V

6

Gráfico VI

6 Elaborado a partir de dados do Food Outlook, Nov 2011, GIEWS-FAO. Poultry meat Food Outlook Nov

2011.xlsx

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7

Gráfico VII

Gráfico VIII

7 Idem

8 Idem

8

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Vamos verificar no Gráfico IX como a OECD-FAO estimam o balanço mundial de carnes de aves

entre 2012 e 2020. É interessante observar que nas projeções da OECD-FAO o comércio

internacional de carnes de aves seguirá representando entre >10% e <11% do total a

produção/consumo mundial. O USDA-ERS ainda que apresentando cifras do balanço mundial

de carnes de aves distintos dos da OECD-FAO converge quase que com precisão à casa decimal

com a estimativa de que o comércio internacional ficará nesses percentuais. Outros estudos e

projeções, inclusive os da CIRCA-Europa10 mostram que os percentuais do trade internacional

de carnes de aves não sofrerá acréscimos percentuais sobre a totalidade da produção ou do

consumo. Até esta data nunca tive acesso a um estudo que chegasse a uma conclusão

diferente.

Portanto, exportar é a solução com o limite de 10-11% do total produzido e consumido a nível

mundial. Atentem que o Brasil exporta quase 1/3 de sua produção de carnes de aves e já

detém 1/3 do mercado mundial de carnes de aves. Não é realista, portanto, acreditar que

grandes expansões futuras da avicultura brasileira sejam alavancadas por maior participação

no mercado internacional. Se lograrmos manter a posição atualmente detida sem perdas para

novos concorrentes, já fica de bom tamanho.

Gráfico IX

9 Idem

10Communication & Information Resource Centre Administrator http://circa.europa.eu/

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A Tabela I apresenta a evolução da produção daqueles países que serão os quinze principais

produtores em 2020. Ainda que o total da produção desses países signifique 78,9% do total

que o mundo deve produzir em 2020, comparem com o fato de que os quinze principais países

produtores responderam em 2011 por 81,9% da produção mundial. O Brasil será a terceira

força produtora mundial (já o é, mas faltam-nos as estatísticas da UBABEF para confirmá-lo

perante os pares mundiais), a África do Sul adentra a lista dos principais, e a Indonésia sai.

Tabela I

12

11

Os dados de 2012 a 2020 têm como fonte OECD-FAO Agricultural Outlook 2011-2020. Entretanto, para o ano de 2011 foram usadas os dados mui preliminares do Food Outlook de Nov 2011 (GIEWS-FAO). CARNE AVES ABC.xlsx 12

Elaborado por ODConsulting com base no databank da OECD-FAO Agricultural Outlook http://www.agri-outlook.org/document/15/0,3746,en_36774715_36775671_48172367_1_1_1_1,00.html. CARNE AVES ABC em 2020.xlsx

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A Tabela II demonstra a Arábia Saudita superando a União Europeia como primeira

importadora mundial, aposta na continuidade da expansão das compras mexicanas e mostra

uma China muito modesta.

Tabela II

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Comparem por favor, os números da China Continental com os expostos no Gráfico VI, onde

ainda figura Hong Kong como importador de 1,2 milhão de toneladas de carnes de aves em

201114. Quando recebi esses números pela primeira vez pensei que estavam errados e busquei

confirmá-los em outras fontes. O USDA coloca as importações líquidas de Hong Kong em torno

das 400 mil tm e as da China Continental em baixíssimas 350 mil tm anuais.

As estatísticas da FAOSTAT (cf. Gráficos X e XI) mostram uma China com quantidades

crescentes de importação, parcela das quais atendidas pelas reexportações de Hong Kong, que

para tal aumenta em proporção direta suas compras de carnes de aves no exterior. Quando

fontes disponíveis indicam uma China comprando ≥ 1 milhão de toneladas do exterior, é que

me fazem afirmar que seguramente esse país estará comprando mais que as 679 mil toneladas

indicadas pelas projeções OECD-FAO.

Gráfico X

13

Idem # 12 14

A fonte desses dados de 2011 é o Food Outlook Nov 2011, GIEWS-FAO.

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Gráfico XI

Se a tabela de importações provocou maiores reflexões, as de Exportação (cf.Tabela III) e as de

Consumo (cf.Tabela IV) são mais chãs de aceitação. Ao que podemos enxergar para o

horizonte de dez anos, Brasil e Estados Unidos manterão a liderança das vendas mundiais,

ainda que as projeções para as exportações da União Europeia estejam em patamar muito

discreto.

Tabela III

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No que diz respeito ao consumo, o Planeta China poderá surpreender e o Brasil, hoje quarto

maior consumidor mundial de carnes de aves, poderá diminuir a diferença que o separa da

U.E.-27.

Tabela IV

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Acredito que possa ser útil conhecer o que corresponderia em termos per capita esse consumo

projetado para Brasil, apresentado no Gráfico XII. Foi estimado a partir de um cálculo simplista

de assumir como válidos os dados de consumo total expostos na Tabela IV e dividi-lo pelas

estimativas da ONU sobre o tamanho da população brasileira naqueles anos. Não sei se serão

tão modestos quanto o resultado observado no gráfico em questão, mas também não partilho

do otimismo ufanista de acreditar que a demanda brasileira per capita aumentará >2 kg por

ano indefinidamente, o que nos levaria a um consumo per capita de mais de 64 kg em 2020.

É lícito esperar que nos aproximemos de um nível de saturação, quando então o consumo per

capita estacionaria num certo patamar, de onde faria muito mais movimentos laterais do que

15

Idem # 12 16

Idem # 12

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propriamente ascendentes. Entre os 51,42 kg/hab/ano das projeções OECD-FAO e os 64,18

kg/hab/ano resultantes de uma perpetuação do crescimento do consumo brasileiro em mais

de 2 kg/hab/ano, invoco o princípio do “virtus in medium”, mas não enunciarei qual deverá ser

o patamar em que o brasileiro estacionará seu consumo per capita de carnes de aves,

independentemente do seu aumento de poder aquisitivo. Agora, por favor, não duvidem que

há um nível de saturação e que o céu não é o limite, como raramente o é.

Gráfico XII

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Qual o bom de tudo isso? É que a avicultura seguirá crescendo e que o Brasil terá um papel

relevante nesse crescimento e seguirá como um dos principais atores do segmento avícola. A

avicultura mundial seguirá crescendo graças à ciência e à tecnologia. Estudiosos sérios de

empresas de genética de frango com quem tive e tenho o privilégio de conviver não hesitam

em endossar que em 2020 estaremos fazendo um frango de 2200g de peso vivo em ≤ de 37

dias e com uma conversão ≤ de 1,4kg.

Espero que todos vocês vejam essa projeção (acreditem é mais projeção do que profecia) se

concretizar. Mas terão que fazer a parte de vocês para que isso aconteça, começando por

defender o uso de ciência e tecnologia contra ativismos e argumentos sem qualquer

sustentação científica, e que chamei de reedição da Inquisição com roupagens modernas e

intransigência secular. O único limite aceitável para ciência e tecnologia é o determinado pela

ética. Fora disso, é caça às bruxas.

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CARNE AVES ABC em 2020.xlsx