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Elizabeth Maria da Costa Ávila A Imagem de Deus em Sf 3,14-17 na mensagem de juízo do livro de Sofonias Dissertação de Mestrado Dissertação apresentada ao programa de Pós-graduação em Teologia da PUC-Rio como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Teologia Bíblica. Orientadora: Profa. Maria de Lourdes Corrêa Lima Rio de Janeiro Março de 2008

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Elizabeth Maria da Costa Ávila

A Imagem de Deus em Sf 3,14-17

na mensagem de juízo do liv ro de Sofonias

Dissertação de Mestrado

Dissertação apresentada ao programa de Pós-graduação em Teologia da PUC-Rio como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Teologia Bíblica.

Orientadora: Profa. Maria de Lourdes Corrêa Lima

Rio de Janeiro Março de 2008

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Elizabeth Maria da Costa Ávila

A Imagem de Deus em Sf 3,14-17 na mensagem de juízo do liv ro de Sofonias

Dissertação apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre pelo programa de Pós-Graduação em Teologia do Departamento de Teologia do Centro de Teologia e Ciências Humanas da PUC-Rio. Aprovada pela Comissão Examinadora abaixo assinada.

Profa. Maria de Lourdes Corrêa Lima Orientadora

Departamento de Teologia – PUC-Rio

Prof. Leonardo Agostini Fernandes Departamento de Teologia – PUC-Rio

Prof. Paulo Severino da Silva Filho Seminário Teológico Presbiteriano Simonton

Prof. Paulo Fernando Carneiro de Andrade Coordenador Setorial de Pós-Graduação e Pesquisa do

Centro de Teologia e Ciências Humanas – PUC-Rio

Rio de Janeiro, 12 de março de 2008

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Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução total ou parcial do trabalho sem autorização da universidade, da autora e da orientadora.

Elizabeth Maria da Costa Ávila

Graduou-se em Teologia pelo Instituto Superior de Teologia da Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro em 2005.

Ficha Catalográfica

CDD: 200

Ávila, Elizabeth Maria da Costa

A Imagem de Deus em Sf 3,14-17 na

mensagem de juízo do livro de Sofonias / Elizabeth Maria da Costa Ávila; orientadora: Maria de Lourdes Corrêa Lima. –2008.

138f.; 30 cm Dissertação (Mestrado em Teologia) –

Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2008.

Inclui bibliografia. 1. Teologia – Teses. 2. Bíblia. 3.

Teologia Bíblica. 4. Exegese do Antigo Testamento. 5. Doze Profetas. 6. Livro de Sofonias. 7. A Imagem de Deus. I. Lima, Maria de Lourdes Corrêa. II. Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Departamento de Teologia. III. Título.

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A meu esposo, Antônio João,

meus pais, Seraphim e Alice,

meus filhos, Marcos, Ricardo e Viviane,

meus netos, Ricardo, Gabriela e Bernardo,

com amor e carinho pela compreensão e apoio.

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Agradecimentos

Inicialmente, meu louvor a Deus que, em sua infinita bondade, me proporcionou a

oportunidade de uma maior proximidade com Ele mediante o estudo de sua

Palavra, a fim de levá-la a seus filhos e meus irmãos.

À minha orientadora, Profa. Dra. Maria de Lourdes Corrêa Lima, por ter aceitado

orientar-me neste trabalho, demonstrando toda a sua competência nas diversas

fases da pesquisa, e por ter sido acima de tudo uma amiga, que me incentivou, não

me deixou abater pelas dificuldades e confiou em mim.

Ao CNPq e à PUC-Rio, pelos auxílios concedidos, sem os quais este trabalho não

poderia ter sido realizado.

Ao Departamento de Teologia, que me admitiu em seu corpo discente, dando-me

a oportunidade de prosseguir meus estudos na pós-graduação, ajudando em minha

formação acadêmica e em meu crescimento espiritual.

Aos ilustríssimos Professores Doutores: Manuel Bouzon Garcia (in memoriam),

Isidoro Mazzarolo, José Otácio de Oliveira Guedes, Ludovico Garmus e Paulo

Cezar Costa pelos cursos que ministraram com grande maestria e boa-vontade.

À minha família: pais, esposo, filhos, filha, noras e netos pela compreensão,

paciência, apoio e carinho dedicados em todo o percurso destes dois anos.

Aos meus colegas de curso, pela amizade e troca fraterna de conhecimentos:

Francisco Alexandre Vasconcelos, Ismael Cesar Granato, Marcelo Carneiro,

Marco Antônio Wanderley, Maria da Conceição Vieira e Teresa Akil.

Ao Prof. Dr. Leonardo Agostini Fernandes que muito me auxiliou na obtenção do

material para a pesquisa e me incentivou, principalmente nos momentos difíceis.

A todas as pessoas amigas que de uma forma ou de outra me estimularam com

uma palavra de incentivo e me acompanharam com suas orações.

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Resumo

Ávila, Elizabeth Maria da Costa; Lima, Maria de Lourdes Corrêa. A Imagem de Deus em Sf 3,14-17 na mensagem de juízo no livro de Sofonias. Rio de Janeiro, 2008. 138p. Dissertação de Mestrado – Departamento de Teologia, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.

A imagem de Deus em Sf 3,14-17 é uma imagem de alegria pela salvação

do povo redimido. O regozijo de Deus vem manifestado logo após a sua ameaça

da destruição total da criação. A presente dissertação visa verificar

detalhadamente se a exortação à alegria dirigida ao povo pelo profeta, como

também a exultação de alegria da parte de Deus têm coerência com o restante do

livro de Sofonias. Este estudo fundamenta-se na pesquisa dos trabalhos realizados

por diversos estudiosos nos últimos 30 anos. Adquire maior relevância, uma vez

que o livro de Sofonias carrega uma densa mensagem da justiça e do amor

generoso de Deus. O desenvolvimento da presente pesquisa se dá pela aplicação

de uma abordagem diacrônica (capítulo 2) e sincrônica (capítulo 4), a fim de

proporcionar uma base crítica aceitável sobre a perícope em estudo. Inicia-se com

a tradução do texto, seguida pela delimitação, a datação e sua organização. Segue-

se com a análise exegética em seus aspectos formais, redacionais e teológicos.

Passa-se à verificação das correspondências terminológicas, temáticas e teológicas

entre o texto e o restante do livro. Este estudo chega à conclusão de que a perícope

Sf 3,14-17 revela pontos de contato com os capítulos precedentes do livro. Mostra

também a passagem de um processo de julgamento (cf. Sf 1,2–3,8) para um

processo de salvação daqueles que se convertessem. Com isso, fica justificada a

exteriorização da alegria de Deus.

Palavras-chave

Teologia Bíblica; Exegese do AT; Literatura Profética; Livro de Sofonias.

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Abstract

Ávila, Elizabeth Maria da Costa; Lima, Maria de Lourdes Corrêa (Advisor). The Image of God in Zeph 3,14-17 in the judgment message in the book of Zephaniah. Rio de Janeiro, 2008. 138p. MSc. Dissertation – Departamento de Teologia, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.

The image of God in Sf 3,14-17 is an image of joy for the salvation of the

redeemed people. God’s delight comes manifested after a threat of total

destruction of the creation. The present dissertation aims at verifying in full detail

if the joy exhortation driven to the people by the prophet as well as the

manifestation of God's joy have coherence with the remaining Zephaniah’s book.

This study is based on our research on works of several scholars in the last 30

years. It has great relevance once it brings God's dense message of justice and

generous love. The development of the present research is based on the

application of a diachronous approach (chapter 2) and a synchronous one (chapter

4) in order to provide an acceptable critical basis on the pericope in study. It

begins with the translation of the text, followed by the delimitation, dating and its

organization. Then an exegetic analysis on formal, redactional and theological

aspects is done. It continues with the verification of the terminological, thematic

and theological correspondences among the text and the remaining of the book.

This study reaches the conclusion that the pericope Sf 3,14-17 reveals contact

points with the precedent chapters of the Zephaniah’s book. It also shows the

passage from a judgmental process (cf. Sf 1,2–3,8) to a salvation process of those

converts. Therefore, the exteriorization of the joy of God is justified.

Keywords

Biblical theology; Exegesis of the OT; Prophetic literature; Book of Zephaniah.

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Sumário

1. Introdução 13

1.1. Tema 13

1.2. Roteiro e Método 15

2. Sf 3,14-17: texto e crítica 16

2.1. Tradução, notas filológicas e crítica textual 16

2.2. Delimitação do texto e unidade 28

2.3. Época do texto no contexto do livro de Sofonias 39

2.4. Organização do texto 49

3. Comentário ao texto de Sf 3,14-17 62

3.1. Hino de exultação com justa motivação: Jerusalém – YHWH: v. 14-15b 62

3.2. Discurso: ações de Jerusalém – o “não” é motivo de esperança: v. 15c-16 72

3.3. Discurso: ações de YHWH – ratificam a esperança de Jerusalém: v. 17 82

4. Sf 3,14-17 no contexto do livro de Sofonias 90

4.1. Correspondências terminológicas de Sf 3,14-17

com o conjunto do livro 90

4.2. Correspondências temáticas de Sf 3,14-17

com o conjunto do livro 101

4.3. Significado de Sf 3,14-17

para o livro de Sofonias 114

5. Conclusão 119

5.1. Síntese da pesquisa 119

5.2. Considerações finais 124

6. Referências bibliográficas 126

7. Apêndices (tabelas) 134

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Lista de siglas e abreviações

Ab Abdias

Am Amós

AnBib Analecta biblica

AncB The Anchor Bible

Ap Apocalipse

AT Antigo Testamento

AUSS Andrews University Seminary Studies

BDB The Brown-Driver-Briggs Hebrew and English Lexicon, ed.

BROWN, F.; DRIVER, S.; BRIGGS, C. USA: Hendrickson, 1999.

BHS Biblia Hebraica Stuttgartensia, ed. K. ELLIGER – W.

RUDOLPH. Stuttgart: Deutsche Bibelgesellschaft, 1997.

BHSApp Biblia Hebraica Stuttgartensia. Aparato crítico

BiKi Bibel und Kirche

BSac Bibliotheca Sacra

BZAW Beihefte zur Zeitschrift für die alttestamentliche Wissenschaft

BZK Zürcher Bibelkommentare

c. capítulo(s)

CAT Commentaire de l’Ancien Testament

CBQ The Catholic Biblical Quarterly

CCS The Communicator’s Commentary Series

1Cr Primeiro livro das Crônicas

2Cr Segundo livro das Crônicas

Ct Cântico dos Cânticos

DBHP Dicionário Bíblico Hebraico-Português, ed. ALONSO SCHÖKEL, L.

São Paulo: Paulus, 1997.

DITAT Dicionário Internacional de Teologia do Antigo Testamento, ed.

HARRIS, R. L.; ARCHER, Jr., G. L.; WALTKE, B. K. São Paulo:

Vida Nova, 1998.

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10

DTMAT Diccionario Teologico Manual del Antiguo Testamento, ed.

JENNI, E.; WESTERMANN, C., vol. I-II. Madrid: Cristiandad,

1978.1985 DicV Dicionário Vine, ed. VINE, W. E.; UNGER, M. F.; WHITE Jr., W.

Rio de Janeiro: CPAD, 1985.

Dn Daniel

Dt Deuteronômio

Ecl Eclesiastes

Eclo Eclesiástico

Ef Efésios

Esd Esdras

EstBib Estudos Bíblicos

EThL Ephemerides Theologicae Lovanienses

Ex Êxodo

ExpB The Expositor’s Bible

Ez Ezequiel

f. feminino

GK Genesius’ Hebrew Grammar, edited and enlarged by the late

KAUTZSCH, E. Oxford: Clarendon Press, 1909.

GLAT Grande Lessico dell’Antico Testamento, ed. BOTTERWECK, G.

J.; RINGGREN, H. Brescia: Paideia, 1988.

Gn Gênesis

GTJ Grace Theological Journal

Hab Habacuc

IB The Interpreter’s Bible

Is Isaías

JBL Journal of Biblical Literature

Jl Joel

1Jo Primeira carta de João

Jo Evangelho segundo João

Jó Jó

Joüon-Mur A Grammar of Biblical Hebrew, ed. P. JOÜON – T. MURAOKA,

vol. I-II, SubBi 14/I-II. Roma: PIB, 2003.

Jr Jeremias

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11

Js Josué

JSOTSup Journal for the Study of the Old Testament. Supplement Series

Jz Juízes

KAT Kommentar zum Alten Testament

Lc Lucas

Lm Lamentações

Lv Levítico

LXX Septuaginta

m. masculino

Ml Malaquias

Mq Miquéias

Mss manuscritos massoréticos

Mt Mateus

n. número

Na Naum

NAC The New American Commentary

Ne Neemias

NIB The New Interpreter’s Bible

Nm Números

NT Novo Testamento

ÖBS Österreichische Biblische Studien

Os Oséias

p. página

pl. plural

Pr Provérbio

RevScRel Revue des sciences religieuses

RIBLA Revista de Interpretação Bíblica Latino-Americana

Rm Romanos

1Rs Primeiro livro dos Reis

2Rs Segundo livro dos Reis

Rt Rute

Sf Sofonias

SBLSP Society of Biblical Literature Seminar Papers

SBSSymS Society of Biblical Literature Symposium Series

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12

sg. singular

Sl Salmo

1Sm Primeiro livro de Samuel

2Sm Segundo livro de Samuel

SubBi Subsidia Biblica

Syr Peshita

T Targum

Tg Tiago

TM texto massorético

v. versículo(s)

Vg Vulgata

vol. volume

VT Vetus Testamentum

VTB Vocabulário de Teologia Bíblica

Zc Zacarias

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1

Introdução

1.1.

Tema 1.1.1.

O horizonte temático

A manifestação da alegria do homem por YHWH na BH é vastamente

colocada, são muitos os motivos, como por exemplo: por ter recebido graças (cf.

Is 61,10) ou por estar em sua presença (cf. Sl 122,1). Todavia, a citação da

manifestação de regozijo de YHWH por seu povo é raríssima. Ele, em poucas

passagens, compraz-se com seu povo pelo que ele próprio lhes proporcionou (cf.

Dt 28,63; 30,9; Sl 35,27; Is 62,5; Jr 32,41).

Todavia, em nenhuma delas a manifestação de alegria é tão vibrante e

colocada na posição em que este texto se encontra, ou seja, inserido num conjunto

de oráculos de punição. Como entender, então, essa imagem de YHWH em Sf

3,14-17, que é de uma alegria sem limites?

Numerosos estudos sobre o livro foram feitos. Neles há divergências

específicas sobre este texto, a respeito de sua autoria, em relação à época de sua

redação, no que concerne ao gênero literário, se o autor estaria enviando uma

mensagem de esperança para seus contemporâneos ou dirigindo-se a gerações

vindouras.

A finalidade do presente estudo é apresentar os principais resultados das

pesquisas feitas sobre a imagem de Deus nas últimas três décadas e procurar

entender a riqueza da mensagem apresentada pelo texto. Onde, após uma ameaça

de destruição total apresentada nos capítulos precedentes (cf. Sf 1,2–3,8) e de uma

promessa (cf. Sf 3,9-13), inesperadamente, Sf 3,14-17 coloca o ouvinte-leitor

diante do profeta exortando Jerusalém a alegrar-se com sua restauração. Passando,

imediatamente após, a descrever a exultação de alegria do próprio YHWH com a

salvação de seu povo, de forma tão direta, absoluta e liricamente viva.

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14

Esta dissertação também visa mostrar a relevância da mensagem

transmitida, através desta imagem de YHWH em Sf 3,14-17, para a compreensão

do livro de Sofonias, para os Doze Profetas, como também para a teologia do AT.

1.1.2.

O texto

Sf 3,14-17, pertencendo à última unidade do livro de Sofonias, praticamente

o conclui. Sua mensagem é de salvação, porém em total oposição e na mesma

dimensão do julgamento preconizado por todo o escrito. Enquanto este é mundial,

a perícope abre-se para uma perspectiva de restauração universal e definitiva.

O livro inicia-se com uma visão de destruição, mostrando que YHWH

estenderá sua mão contra todas as nações e que Israel não terá sorte diferente (cf.

Sf 1,2-6). Todos pecaram, logo, todos são merecedores de castigo. YHWH se

apresenta como juiz e mostra toda a radicalidade de seu julgamento (cf. Sf 3,5-8),

cuja execução se dará no yôm YHWH. A descrição deste dia mostra o quanto ele

será terrível (cf. Sf 1,14-18).

Inesperadamente, no meio de tantos oráculos de punição surge uma fagulha

de esperança dentro deste yôm (cf. Sf 3,9-13), seguindo-se, então, pelo texto de

nosso estudo. Na sua relação com o restante da profecia, Sf 3,14-17 emerge

justamente com uma visão oposta. Este texto inicia-se com uma exortação à

alegria aos fiéis minoritários, que passaram através da punição das nações.

Sf 3,14-17 revela o futuro do povo eleito, o tempo de salvação que YHWH

preparou para os redimidos. É a chegada de um início de salvação definitiva. A

palavra do profeta chamando o povo à alegria tem um caráter eminentemente

escatológico.1 Porque este estado de felicidade que já estão vivendo ainda não está

completo. Por isso, segue-se ao texto uma nova promessa (cf. Sf 3,18-20).

Esta visão indica o caminho a seguir nesta pesquisa, que deve ser o de

considerar o texto primeiramente em si mesmo e depois em sua relação com o

restante do livro, a partir do qual surgiu, para o qual foi escrito e no qual encontra

sua função e explicação.

1 Cf. ACHTEMEIER, E., Preaching from the Book of Zephaniah, p. 103; BARSOTTI, D., Meditazione sul libro di Sofonia, p. 157; ESZENYEI SZÉLES, M., Zephaniah, p. 71; MOTYER, J. A., Zephaniah, p. 897.

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15

1.2.

Roteiro e Método

O primeiro capítulo versará sobre o texto e os elementos que compõem a

crítica redacional. Iniciar-se-á com a tradução, acompanhada das notas filológicas

que se fazem necessárias para justificá-la, juntamente com a crítica textual

daqueles pontos que oferecem problemas de leitura (ponto 1). Seguir-se-á a

delimitação do texto e da unidade literária, a partir de uma visão do livro de

Sofonias em sua totalidade (ponto 2). Na seqüência será apresentado o

levantamento da época provável da redação do texto, a partir da datação do livro

em seu conjunto (ponto 3). Chegar-se-á, então, à organização do texto, à

estruturação e ao gênero literário utilizado (ponto 4).2

O segundo capítulo apresentará o comentário exegético-teológico do texto a

partir da consideração em separado de cada uma de suas seções. Esta análise

exegética perpassará elemento por elemento, onde se verificará a teologia presente

nos termos e nas expressões, que se ligam e caracterizam este anúncio salvífico, a

fim de chegar a uma percepção do alcance e compreensão da mensagem de alegria

presente em Sf 3,14-17. Referências a outros corpora serão marginais e far-se-ão

presentes quando tornarem-se necessárias para elucidar aqueles pontos que

apresentarem certa dificuldade.

O terceiro capítulo analisará a correspondência do texto com o conjunto do

livro, por meio das convergências e divergências encontradas. Num primeiro

momento, trabalhar-se-á com os próprios termos do texto e depois com os

vocábulos sinonímicos e antinonímicos (ponto 1). Num segundo passo, dar-se-á a

verificação da continuidade e da contraposição dos temas e perspectivas

encontradas no texto (ponto 2). E em terceira instância, far-se-á a investigação do

valor que Sf 3,14-17 tem para o livro de Sofonias, seja no aspecto terminológico,

seja no aspecto temático, seja no aspecto teológico (ponto 3). Esta tríplice análise

tratará de uma questão fundamental para a compreensão do texto em si e no

conjunto do livro, bem como procurará levar à percepção da profundidade da

mensagem sofoniana como um todo. Tendo por objetivo clarificar a imagem de

alegria de Deus colocada dentro de uma mensagem de juízo que perpassa quase

todo o escrito.

2 Tomaremos por base os passos apresentados na obra de H. Simian-Yofre (cf. Diacronia: os métodos histórico-críticos, p. 73-108).

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2

Sf 3,14-17: texto e crítica

2.1.

Tradução, notas filológicas e crítica textual

Exulta de alegria, filha de Sião; 14a !AYci!AYci!AYci!AYci----tB; yNIr" tB; yNIr" tB; yNIr" tB; yNIr"

grita de alegria, Israel; 14b laer"f.yI W[yrIh'laer"f.yI W[yrIh'laer"f.yI W[yrIh'laer"f.yI W[yrIh'

regozija 14c yxim.fiyxim.fiyxim.fiyxim.fi

e celebra de todo coração, filha de Jerusalém. 14d ~Øil'v'Wry>~Øil'v'Wry>~Øil'v'Wry>~Øil'v'Wry> t t t tB; bleB; bleB; bleB; ble----lk'B. yzIl.['w>lk'B. yzIl.['w>lk'B. yzIl.['w>lk'B. yzIl.['w>

Revogou Yhwh tuas sentenças, 15a %yIj;P'v.mi hw"hy> rysihe%yIj;P'v.mi hw"hy> rysihe%yIj;P'v.mi hw"hy> rysihe%yIj;P'v.mi hw"hy> rysihe

expulsou teu inimigo. 15b %bey>ao hN"Pi%bey>ao hN"Pi%bey>ao hN"Pi%bey>ao hN"Pi

O rei de Israel, Yhwh, está no teu meio, 15c %Ber>qiB. hw"hy> laer"f.yI %l,m,%Ber>qiB. hw"hy> laer"f.yI %l,m,%Ber>qiB. hw"hy> laer"f.yI %l,m,%Ber>qiB. hw"hy> laer"f.yI %l,m,

não temerás mais o mal. 15d dA[ [r" yair>ytidA[ [r" yair>ytidA[ [r" yair>ytidA[ [r" yair>yti----al{al{al{al{

Naquele dia, será dito a Jerusalém: 16a ~Øil;v'Wryli rmea'yE aWhh; ~AYB;~Øil;v'Wryli rmea'yE aWhh; ~AYB;~Øil;v'Wryli rmea'yE aWhh; ~AYB;~Øil;v'Wryli rmea'yE aWhh; ~AYB;

não temerás, Sião; 16b !AYci yair"yTi!AYci yair"yTi!AYci yair"yTi!AYci yair"yTi----la;la;la;la;

não desfalecerão tuas mãos. 16c %yId"y" WPr>yI%yId"y" WPr>yI%yId"y" WPr>yI%yId"y" WPr>yI----la; la; la; la;

Yhwh, teu Deus, está no teu meio, 17a $Ber>qiB. %yIh;l{a/ hw"hy>$Ber>qiB. %yIh;l{a/ hw"hy>$Ber>qiB. %yIh;l{a/ hw"hy>$Ber>qiB. %yIh;l{a/ hw"hy>

como um herói, ele salvará, 17b [:yviAy rABGI[:yviAy rABGI[:yviAy rABGI[:yviAy rABGI

alegrar-se-á por ti com regozijo 17c hx'm.fiB. %yIl;[' fyfiy"hx'm.fiB. %yIl;[' fyfiy"hx'm.fiB. %yIl;[' fyfiy"hx'm.fiB. %yIl;[' fyfiy"

guardará silêncio no seu amor, 17d Atb'h]a;B. vyrIx]y:Atb'h]a;B. vyrIx]y:Atb'h]a;B. vyrIx]y:Atb'h]a;B. vyrIx]y:

jubilará por ti com exultação. 17e hN"rIB. %yIl;[' lygIy"hN"rIB. %yIl;[' lygIy"hN"rIB. %yIl;[' lygIy"hN"rIB. %yIl;[' lygIy"

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17

− v. 14:

a) A raiz de origem hebraica !nr, como verbo, apresenta no qal dois

significados básicos: “berrar, gritar de alegria, exultar” e “gemer ou lamentar-se”,

podendo ainda ser traduzida como um substantivo verbal “canto de júbilo” (cf. Sl

32,7). Na maioria dos casos, no AT, o verbo tem YHWH como objeto.3 Tomamos

!nr no sentido de “exultar de alegria” devido ao contexto em que se encontra.

A maior ocorrência deste verbo está nos Salmos.4 Fora dos Salmos, ela

aparece em texto poético de caráter hínico na literatura profética,5 denotando

pertencer prevalentemente ao âmbito da linguagem cúltica, mas não se reduzindo

ao culto (cf. Pr 1,20; 8,3). A manifestação deste “exultar”, geralmente, é feita em

alta voz e faz-se acompanhar de uma expressão corporal ruidosa (cf. Is 12,6; 54,1;

Sf 3,14; Zc 2,14). Quase sempre, está empregado com verbos que traduzem um

grito forte ou uma elevação da voz (cf. [wr, xmf, zl[, fwf, lyg).6 Num contexto

de tristeza encontra-se apenas em duas citações: Sl 35,27 e Lm 2,19.7

Os sujeitos deste verbo podem ser indivíduos isolados (cf. Is 54,1), um

grupo distinto do todo (cf. Is 35,6), um conjunto de homens (cf. Jr 31,7), a

sabedoria personificada (cf. Pr 1,20), a “filha de Sião” (cf. Sf 3,14) e a criação (cf.

Jr 51,48). Na maioria dos casos este convite à exultação vem expresso no

imperativo e está ligado com um louvor a YHWH, como uma resposta pela sua

atuação em favor do povo (cf. Dt 32,43).8

Em todas as ocorrências do verbo em Isaías, a conotação percebida é a de

uma alegria santa celebrada em Sião, acompanhada de gritos (cf. Is 12,6). Seu

emprego freqüente no AT induz a pensar que tal alegria era o estado de espírito

máximo que o povo atingia na sua religião.9

b) A raiz [wr “gritar, romper em gritaria, clamar”, desenvolvida apenas no

hebraico, é um verbo incomum com várias conotações e sentidos, que aparece no

hifil em quase todas as suas ocorrências no AT, sendo utilizado principalmente

3 Cf. WHITE, W., “!nr”, DITAT, p. 1434-1435; ALONSO SCHÖKEL, L., “!nr”, DBHP, p. 622. 4 Cf. Sl 5,12; 20,6; 32,11; 33,1; 35,6.27; 67,5; 84,3; 98,4. 5 E. Ben Zvi acrescenta que o verbo !nr na forma qal é bem atestado na literatura profética pós-monárquica e principalmente no livro de Isaías: Is 12,6; 24,14; 44,23; 49,13; 52,9; 54,1; Jr 31,7; Sf 3,14; Zc 2,14 (cf. A Historical-Critical Study of the Book of Zephaniah, p. 239). 6 Cf. BROWN, F.; DRIVER, S.; BRIGGS, C., “!nr”, BDB, p. 943. 7 Cf. SWEENEY M. A., Zephaniah, p. 197. 8 Cf. FICKER, R., “!nr”, DTMAT, vol. 2, p. 983-989. 9 Cf. WHITE, W., loc. cit.

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18

nos Salmos.10 O sentido básico é “fazer barulho” mediante grito ou ao som de

algum instrumento, especialmente um rp'wOv, “trombeta” (cf. Nm 10,9; Os 5,8).

Este verbo é usado em rituais do templo (cf. 1Sm 4,5; Esd 3,11.13), aparece

em alguns Salmos (cf. Sl 47,2; 95,1.2; 100,1) e em contexto de entronização

através da aclamação do rei (cf. 1Sm 10,24; Sl 98,6). Também ocorre em textos

proféticos (cf. Is 44,23; Sf 3,14; Zc 9,9).

Sua maior aplicação pode ser encontrada em situação de batalha.11 Na

medida em que no verso 15b lê-se %bey>ao hN"Pi “expulsou teu inimigo”, o contexto

parece apontar para um hino de louvor a YHWH pela sua ação libertadora dirigida

a Israel num contexto bíblico.12

c) A raiz xmf “regozijar, alegrar”, significa o afeto subjetivo, interno, que às

vezes vem explicitado com o termo ble “coração” (cf. Ex 4,14; Sl 19,9), denotando

o “estar plenamente alegre ou contente”.13 Ela ocorre diversas vezes no AT

falando da alegria religiosa perante YHWH (cf. 1Sm 2,1; 1Cr 16,10; Sl 5,11).

Quando usado no modo intransitivo, o seu significado prende-se à ação do sujeito.

Desta forma, encontra-se o povo como aquele que se alegra com a atuação de

YHWH (cf. Sf 3,14).

Este verbo sugere três estados do sujeito:

• uma emoção espontânea e descontinuada, por não representar um bem-estar

permanente (cf. 1Sm 11,9), embora possa ser, em alguns casos, contínuo (cf.

1Rs 4,20);

• uma felicidade extrema que é expressa de maneira visível, acompanhada de

dança, canto e instrumentos musicais (cf. Sl 149);

• um sentimento provocado por um incentivo exterior e não sistemático como

produto de uma situação, uma circunstância ou de uma experiência exterior (cf.

Ex 4,14).14

Estes três estados de espírito são plausíveis de serem aceitos porque são

pertinentes à situação que agora eles vivem.

10 Cf. WHITE, W., “[wr” , DITAT, 1412-1413; ALONSO SCHÖKEL, L., “[wr” , DBHP, p. 612. 11 Cf. Nm 10,7.9; Js 6,5.10.16.20; Is 42,13; Jr 50,15; Os 5,8; Jl 2,1. 12 Cf. SWEENEY, M. A., Zephaniah, p. 197. 13 Cf. WALTKE, B. K., “xmf”, DITAT, p. 1482-1483; ALONSO SCHÖKEL, L., “xmf”, DBHP, p. 644-645. 14 Cf. VINE, W. E.; UNGER, M. F.; WHITE Jr., W., “xmf”, DicV, p. 33-34.

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d) A raiz zl[ só aparece na forma verbal qal e significa “fazer festa, celebrar,

regozijar-se, exultar, cantar vitória” (cf. Hab 3,18; Sl 68,5; 149,5).15 Este verbo

refere-se a uma celebração que brota da emoção de regozijo que quer exteriorizar

o que vai no coração, referindo-se a uma alegria religiosa (cf. Sl 28,7; Hab 3,18;

Sf 3,14). Por isso, este verbo é impróprio para o aflito (cf. Jr 15,7) e para aquele

que pecou (cf. Jr 11,15). Algumas vezes, além de expressar um sentimento

individual, aparece também em manifestações coletivas, no todo ou numa parte,

de um povo ou de uma cidade (cf. Is 23,12), especialmente quando se refere a

Jerusalém (cf. Sf 3,14).16

− v. 15:

a) A formulação da oração em 0-qatal marca normalmente limites textuais de

abertura e fechamento de segmentos ou seções. A marca de abertura se dá após

um sinal de sof pasuq ou de ’atnaH. O final do v. 14 está marcado por um sof

pasuq, indicando que o verso 15a inicia um novo parágrafo.17 Sua função

principal é a apresentação de fatos passados, porém novos para o leitor, e que são

importantes para o fio condutor do discurso.18

Outra função desta estruturação 0-qatal é a de mostrar que a informação

nova apresentada pela oração é necessária para o desenvolvimento do texto,

precedendo o ponto principal do discurso.19

Além disso, a disposição 0-qatal pode apresentar-se em grupo, quando

aparece em orações imediatamente seguidas. Como é o caso dos versos 15ab, com

as raízes rws “revogar” e hnp “expulsar”.20

b) A raiz rws é muito comum no hifil e tem como idéia básica “remover,

extirpar”.21 É um verbo de movimento, expressando a ação de desviar ou afastar.

Esta forma verbal, quando usada nos livros históricos e proféticos, geralmente,

15 Cf. ALONSO SCHÖKEL, L., “ zl[”, DBHP, p. 498-499. 16 Cf. SCHULTZ, C., “zl[”, DITAT, p. 1122. 17 Cf. DEL BARCO DEL BARCO, F. J., Profecía y Sintaxis, p. 132 18 Cf. Ibid., p. 228. 19 Cf. Ibid., p. 133. 20 Oito casos de 0-qatal ocorrem nos Profetas Menores, a saber: Os 8,5; 9,7; 9,9; Am 4,10; 5,21; Mq 2,13; Na 2,8; Sf 3,15 (cf. Ibid., p. 141). 21 L. Alonso Schökel explicita o que é removido: a) realidades materiais como vestimentas, coroa (cf. 1Rs 20,41; Jó 19,9); b) pessoas e membros do corpo (cf. 1Sm 17,46; 1Rs 20,24); c) realidades imateriais, como palavra, sentenças (cf. Is 31,2; Sf 3,15): cf. “rws”, DBHP, p. 464-465.

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20

tem YHWH como o sujeito da ação.22 A idéia de afastamento pode envolver

questões espirituais (cf. 1Sm 12,20; Is 6,7).23

c) O BHSApp indica que em vez de %yIj;P'v.mi deve ser lido %yIj;p.fooOm. conforme o T,

substituindo “tuas sentenças” pela expressão “teus adversários”. Segundo alguns

críticos isto se deve ao fato de ser feita uma ligação com %bey>ao “teu inimigo”.24

O termo jP'v.mi traduzido por “causa, julgamento; direito; norma”, é uma

palavra polissêmica, cujo significado é clarificado pelo campo semântico e pelo

contexto no qual se encontra. Quer seja empregado no governo do homem pelo

homem (cf. 1Rs 7,7), quer no governo de toda criação por Deus (cf. Sl 36,7).

O campo judicial e forense parece ser sua aplicação primária, com os atos e

pressupostos pertinentes a um processo (cf. Dt 16,18); entretanto, é também

utilizado no campo religioso (cf. Lv 5,10) e político (cf. 2Rs 17,27); e ainda, com

menos força, ocorre no campo profano, ligado ao costume (cf. 1Sm 27,11), ao

estilo (cf. Jz 13,12), ao modo de proceder (cf. Sf 3,8) e como um projeto

arquitetônico (cf. Ex 26,30). Em todos os campos, o sentido básico é o de estar de

acordo ou não com o direito, com a norma.25

No campo religioso e político significa “decisão, norma, ritual, cerimonial”:

empregado na esfera cultual (cf. Lv 5,10) e na legislação religiosa (cf. Ex 21,1).

Aparece com verbos estabelecer, promulgar (rbd “dizer”, cf. Dt 4,45); e com os

verbos de cumprir / não cumprir (l[p “cumprir”, cf. Sf 2,3).

Este mesmo vocábulo no plural, ~yjiP'v.mi, freqüentemente vem significando

“decreto, estatuto” e é geralmente usado com ~yQixu “decretos”, quando então é

traduzido por “juízos” (cf. Dt 4,5.8.14; Ne 20,25; Ml 3,22). Já no singular

apresenta uma maior ocorrência denotando “julgamento, sentença” (cf. Os 5,11;

Am 5,24; Zc 7,9).26 Em Sf 3,15 encontra-se no plural com um sufixo de 2ª f.sg.

%yIj;P'v.mi, porém pode ser traduzida por “tuas sentenças” uma vez que a palavra

22 Cf. SCHWERTNER, S., “rws”, DTMAT, vol. 2, p. 198-200. 23 Cf. PATTERSON, R. D., “rws”, DITAT, p. 1034.1035. 24 Cf. CARBONE, S. P.; RIZZI, G., Sofonia, p. 444. Concordando com esta justificativa encontra-se KELLER, C.–A., Sophonie, p. 213. Além disso, R. L. Smith explica que esta leitura de “teus adversários” é feita como um particípio piel ou poel como em Jó 9,15 (cf. Zephaniah, p.143). 25 Cf. CULVER, R. D., “jP'v.mi”, DITAT p. 1604-1606; ALONSO SCHÖKEL, L., “jP'v.mi”, DBHP, p. 410-411. 26 Cf. VINE, W. E.; UNGER, M. F.; WHITE Jr., W., “jP'v.mi”, DicV, p. 159.

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abrange todos os níveis de um julgamento, desde a instauração do processo de

juízo até a sua execução.

Além disso, a LXX, com ta. avdikh,mata, sou “as tuas iniqüidades” e a Vg

com iudicium tuum “teu julgamento”, apresentam termos semelhantes, com o

significado de sentença. Logo não há razão para mudança, uma vez que o TM está

fortemente apoiado por estas duas traduções.

d) A raiz hnp na maioria das ocorrências leva o sentido de “virar para trás, virar

em outra direção”. Este é um verbo de movimento, físico ou mental. No piel toma

o significado de “preparar, desalojar, expulsar”.27

e) O termo %bey>ao “teu inimigo” é lido, em muitos manuscritos da LXX, Syr e T

como %yIb'y>ao “teus inimigos”, o que também pode ser visto na Vg.28 Contudo, por

não haver uma mudança significativa e o singular poder ser tomado como

coletivo, optamos em permanecer com a lição do TM.

f) Onde se lê %l,m,, os manuscritos da LXX segundo a recensão de Luciano de

Antioquia trazem basileu,sei conforme Mq 4,7, devendo ser lido %l{m.yI “reinará”.

Todavia, é uma lição isolada e, sem a evidência de um manuscrito mais forte, não

constitui razão para uma mudança.

g) A forma verbal p-yiqtol usada nos v. 15d.16bc, é uma forma predominante

no discurso preditivo, podendo também aparecer numa exortação. A letra “p”,

nestes versículos, representa as partículas negativas al{ e la;.29

h) O termo [r:, tomado como substantivo, pode referir-se a coisas que parecem

trazer aflição, tais como relatos dados por mensageiros (cf. Ex 33,4) ou

maravilhas terríveis (cf. Dt 6,22); acontecimentos (cf. Ecl 2,17; 9,3) ou períodos

(cf. Gn 47,9; Pr 15,15) que podem dar errado, gerando aflição. Esse substantivo

pode ainda designar descontentamento (cf. 1Sm 29,7) ou tristeza de coração (cf.

Ne 2,1-2; Pr 25,20). Pode exprimir deficiências morais (cf. Pr 15,3) que provocam

a ira de Deus, como a idolatria (cf. 2Rs 17,11), o orgulho (cf. Jó 35,12), a

violência contra os outros (cf. 1Sm 2,23; Ez 20,44).30

27 Cf. VINE, W. E.; UNGER, M. F.; WHITE Jr., W., “hnp”, DicV, p. 329-330. 28 J. J. M. Roberts propõe que o plural deva ser preferido de acordo com os manuscritos citados (cf. Zephaniah, p.220). 29 Cf. DEL BARCO DEL BARCO, F. J., Profecía y Sintaxis, p. 195. 30 Cf. LIVINGSTON, G. H., “[r:”, DITAT, p. 1442-1443.

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22

i) O BHSApp diz que yair>yti-al{, “não temerás”, provavelmente deve ser lido de

acordo com dois manuscritos hebraicos medievais, porque a LXX traz ouvk o;yh|

“não verás” e a Syr yair>ti-al{, as quais devem ter lido em um texto consonântico

diferente do TM. Neste caso, pode ter havido uma escrita defectiva do verbo ary

“temer” ou foi usada uma forma verbal proveniente do verbo har “ver”.31

O TM entende yair>yTi como um qal yiqtol do verbo ary, que nesta forma

verbal pode aparecer: em sentido dinâmico, “assustar-se” (cf. Am 3,8); em sentido

estático ou durativo, “sentir medo, temer” (cf. Gn 18,15); em formas negativas

“não temer”: enunciativas (cf. Nm 12,8) ou imperativas com conotação positiva

(cf. Sf 3,15.16); e num uso específico de “respeitar, prestar culto”, tanto no campo

religioso como no profano (cf. Sf 3,7).32

Todavia, a Vg apresenta uma lição com a qual o TM sai apoiado, podendo

perfeitamente ser mantido o sentido da raiz ary.

− v. 16

a) A forma verbal x-yiqtol que ocorre nos versos 16a.17b também é usada em

discurso preditivo. No verso 16a o termo “x” é a expressão aWhh; ~AYB; e no verso

17b “x” é o termo rABGI.33

b) A raiz hpr significando “desfalecer, declinar”, não tem aqui a acepção

comum de “abandonar” ou “declinar o dia” (cf. Ex 4,26; Jz 19,9). Como vem junto

com o sujeito %yId"y" “tuas mãos”, toma o sentido de “acovardar-se, desmoralizar-se”

(cf. Esd 4,4; Jr 49,24), tornando-se um sinônimo de arEy" “temer” (cf. Dt 31,6; Ez

21,12). Uma observação atenta nota que a concordância do sintagma WPr>yI-la; com

seu sujeito %yId"y" nesta sentença apresenta esta particularidade.

c) A expressão %yId"y" é um substantivo comum dual feminino construto com

sufixo de 2a f.sg., mas WPr>yI-la; apresenta-se na 3ª m.pl. Contudo, se o dual é

feminino, ele pode vir acompanhado pela forma verbal tanto no feminino como no

31 C.–A. Keller faz sua opção por “ver” porque o contexto em que o termo aparece é de uma liberação total e acrescenta que har no texto exprime tanto uma sensação visual como também uma experiência total (cf. Sophonie, p. 213). Por outro lado, J. J. M. Roberts pensa na possibilidade do autor ter sido influenciado pela leitura do verso 16b ary e que [r har “ver um mal” no idioma comum suporta a correção (cf. Zephaniah, p. 220). 32 Cf. ALONSO SCHÖKEL, L., “ary”, DBHP, p. 292-293. 33 Cf. DEL BARCO DEL BARCO, F. J., Profecía y Sintaxis, p. 195.

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23

masculino. Como na forma verbal do qatal não existe a 3ª f.pl., uma vez a 3ª pl. é

comum aos dois gêneros, isto deve ter colaborado para que no yiqtol às vezes o

feminino fosse negligenciado.34

− v. 17

a) No período [:yviAy rABGI $Ber>qiB. %yIh:l{a/ hw"hy> parece-nos ter ocorrido uma elipse da

partícula comparativa K.K.K.K. (como), entre os termos rABGI $Ber>qiB., a fim de se evitar o

encontro consonantal, que pode sugerir dois casos:

• da mesma consoante entre o final de uma palavra e o início da outra, uma vez

que a duplicação do kaf rafé é totalmente estranho à língua hebraica;35

• a não existência de duas consoantes homorgânicas juntas,36 uma vez que o kaf e

o ghimel são palatais, ambas possuindo um som forte e explosivo ou fricativo.37

A ausência de vocalização interna no kaf pode ser um indício proposital a

favor destas observações.

Chama a atenção, também, o fato de que a expressão $Ber>qiB. apresentando

em seu final o $ sem o shewa ou o qamets seja a única ocorrência na BHS.

A LXX apresenta em seu texto: ku,rioj o qeo,j sou evn soi, dunato.j sw,sei se

(“O Senhor, teu Deus, está em ti, poderoso te salvará”) e a Vg traz: Dominus Deus

tuus in medio tui Fortis ipse salvabit (“O Senhor, teu Deus, está em teu meio,

Forte, ele mesmo, salvará”). Desta forma, nota-se que os acentos do TM fazem

com que o texto da BH tenha uma elevação no ritmo do verso diferente daquele

encontrado na Vg.38 Além do que, o acento colocado entre $Ber>qiB. e [:yviAy rABGI é

disjuntivo.39

Quanto à declinação, tanto a LXX com dunato.j, como Vg com Fortis,

trazem o termo como um adjetivo, no nominativo singular, fazendo com que o

mesmo esteja ligado à %yIh:l{a/ hw"hy>, para não ser o sujeito do verso 17b, mas um

atributo do sujeito do verso 17a. Assim, também o TM.

34 Para maiores esclarecimentos veja: Joüon-Mur., § 150c.d; GK, § 145p. 35 Cf. Joüon-Mur., § 5k. 36 Cf. ALONSO SCHÖKEL, L., P. DBHP; BROWN, F.; DRIVER, S.; BRIGGS, C., BDB. 37 Cf. GK § 6o-q. 38 Cf. CARBONE, S. O.; RIZZI, G., Sofonia, p. 352. 39 Cf. FRANCISCO, E. de F., Acentos Massoréticos, p. 190-200; BEN ZVI, E., A Historical-Critical Study of the Book of Zephaniah, p. 247.

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24

Alguns estudiosos40 explicam que [:yviAy rABGI é uma concisa oração relativa

assindética, sem o uso da partícula relativa rv,a] entre rABGI e [:yviAy.41 Desta forma,

torna-se uma oração relativa de atribuição, introduzida pela simples sobreposição

das palavras (cf. Is 40,20; Jr 13,20). Esta ausência é atestada na poesia hebraica

antiga (cf. Sl 56,10).

Há quem explique a oração como assindética, mas dividindo diferentemente

os versos 17ab, considerando rABGI do verso 17b como um aposto do verso 17a,

traduzindo como se houvesse a preposição K. prefixada.42

O verso 17b apresenta uma oração em x-yiqtol, denotando um discurso

preditivo.43 Estando ligado ao verso 17a, as duas sentenças fundamentam as

exortações que aparecem na seqüência das frases em p-yiqtol e x-yiqtol que as

precedem. A partícula comparativa K. expressa, então, uma relação de similitude,

considerando, porém, a diferença que em uma frase com o verbo no qatal, o

sentido é de igualdade, e em uma frase com o yiqtol, o senso é de semelhança.44

Mantendo a divisão do v. 17 do TM, a nossa tradução considera o verso 17a

como uma oração nominal e o verso 17b como uma oração coordenada

assindética, levando em conta a possibilidade plausível, sem entender com isso

desejar fechar a questão, de que tenha ocorrido uma elipse da partícula K. entre os

termos rABGI $Ber>qiB..

b) O termo rwOBGI “herói, forte, poderoso” ocorre no hebraico, do ponto de vista

gramatical, apenas como adjetivo. Pela sua forma intensiva, fala de uma pessoa

particularmente forte e poderosa, que fez, faz e será capaz de fazer grandes atos e

que é superior aos seus companheiros de ação. Nesta palavra é possível distinguir

dois significados básicos: no sentido geral, o valor de alguma qualidade ou

situação (cf. Dn 11,3); no sentido particular, valor de ordem militar ou bélica (cf.

1Sm 14,52). Na maioria das vezes está associada ao combate e tem relação com a

40 Cf. SWEENEY, M. A., Zephaniah, p. 201-202; MOTYER, J. A., Zephaniah, p. 957; BEN ZVI, E., A Historical-Critical Study of the Book of Zephaniah, p. 247; VLAARDINGERBROEK, J., Zephaniah, p. 213. 41 Sobre oração assindética veja Joüon-Mur., § 158a; por outro lado, em GK, § 155a-n, encontra-se uma explicação de que é incorreto falar em omissão de rv,a], sendo então, esta característica sintática, assinalada como uma oração coordenada atributiva. 42 H. Irsiglier traz “YHWH, dein Gott, is in deiner Mitte, als ein Held, / der (siegreich) hilft” (como um herói que salvará), estendendo o verso 17a até herói, deixando apenas o verbo [vy no verso 17b (cf. Zefanja, p. 418). 43 Cf. DEL BARCO DEL BARCO, F. J., Profecía y Sintaxis, p. 195.232. 44 Cf. Joüon-Mur., § 133g.

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25

força e a vitalidade do herói guerreiro bem sucedido (cf. 2Rs 5,1; 1Sm 16,18). Em

algumas passagens este conceito é usado, metaforicamente, para proclamar a força

guerreira de YHWH (cf. Sl 24,8; 78,65; Is 42,13), para afirmar que ele é um herói

(cf. Dt 10,17; Jr 20,11) e que “um resto, o resto de Jacó, se converterá ao Deus

herói” (Is 10,21).45

c) A raiz [vy significando “salvar” fala da libertação através da ação divina (cf.

Is 30,15; 45,17), que age contra os inimigos humanos (cf. Nm 10,9; 2Sm 22,4),

contra todo o pecado (cf. Is 64,4; Jr 4,14) e contra qualquer desgraça (cf. Sl 34,7;

Ez 34,22).46

d) A forma verbal 0-yiqtol nos versos 17c-e é usada tanto em orações que

indicam fatos futuros como desejados (mais do que algo real),47 como aparece em

segmentos textuais com orientação futura.48

O 0-yiqtol em posição inicial absoluta pode ocorrer em três estruturas

diferentes: 1) em estruturas com relações causais; 2) em esquemas de bimembros;

3) em forma de paralelismo.49

Os versos 17c-e apresentam em sua estruturação um paralelismo das

orações. O paralelismo é um fator que deve ser considerado quando se analisa os

elementos textuais pertencentes à estrutura de 0-yiqtol da repetição.50

e) A raiz fyf / fwf significa “regozijar-se, alegrar-se”, podendo aparecer em

sua forma absoluta (cf. Is 35,1; Jó 3,22) ou acompanhado de uma partícula

preposicional B. ou l[; junto a um pronome (cf. Dt 28,63; Sl 70,5), a uma pessoa

(cf. Is 61,10; Lm 4,21) ou a uma coisa (cf. Jó 39,21; Sl 119,14). Esta raiz é

sinônima de xmf, zl[, lyg (que aparecem em Sf 3,14-17) e de #l[. Sua ocorrência

limita-se à forma verbal qal.51

45 Cf OSWALT, J. N., “rwOBGI” , DITAT, p. 242-243; ALONSO SCHÖKEL, L., “rwOBGI” , DBHP, p. 127-128; KÜHLEWEIN, J., “rABGI”, DTMAT, vol. 1, p. 568-574; KOSMALA, H., “rABGI”, GLAT, p. 1861-1863; VLAARDINGERBROEK, J. Zephaniah, p. 213. 46 Cf. MOTYER, J. A., Zephaniah, p. 957. 47 Cf. DEL BARCO DEL BARCO, F. J., Profecía y Sintaxis, p. 231. 48 Cf. Ibid., p. 168. 49 Cf. Ibid., p. 231. 50 A existência de 30 casos com uma seqüência em 0-yiqtol pode ser constatada na BHS, porém somente em quatro deles (cf. Os 10,11; Mq 7,19; Na 2,6; Sf 3,17) o paralelismo se dá com três elementos (cf. Ibid., p. 177). 51 Cf. ALONSO SCHÖKEL, L., “fyf / fwf”, DBHP, p. 642; COHEN, G. G., “fwf”, DITAT, p.

1471.

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26

f) O termo hx'm.fi, que significa “regozijo”, é um substantivo derivado da

mesma raiz do verbo xmf que aparece no verso 14c. A palavra pode ser usada

com uma predominância da expressão externa (cf. 1Rs 1,40; Ne 12,27) ou com

uma predominância da emoção interna (cf. Pr 12,20; Eclo 30,22) ou ainda pode

aparecer indiferenciadamente (cf. Pr 21,15; Ecl 8,15).52 Também é usado em

situações de festa: de casamento (cf. Jr 25,10), de despedida (cf. Gn 31,27), mas

especialmente para mostrar a alegria que o povo tem nos dias santificados perante

YHWH (cf. Nm 10,10; Ne 8,12) ou em comemorações sagradas (cf. 2Sm 6,12;

Esd 3,12). Todavia, o uso do termo para expressar o regozijo de YHWH ocorre

apenas duas vezes (cf. Ecl 9,7; Sf 3,17).53

g) A expressão Atb'h]a;B. vyrIx]y: “guardará silêncio no seu amor” tem a indicação

no BHSApp de que provavelmente deve ser lida Atb'h]a; vDEx;y> conforme a LXX

(kainiei/ se evn – “te renovará em”) e a Syr, que lendo um d no lugar de um r,

mudou o verbo vrx, “calar, guardar silêncio”, para vdx, “renovar”; e introduzindo

o pronome pessoal se, “tu”.

Carbone e Rizzi explicam que, na mudança do verbo para vdx, este foi lido

como se fosse um hifil (vydxy) ou um piel (vdxy). Todavia, não há ocorrência na

BH deste verbo no hifil e os raros usos no piel têm o sentido de “fazer de novo”

(cf. Sl 51,12; Is 61,4). O acréscimo do pronome pessoal ao verbo como objeto

indireto, na LXX, causa uma alternância na ação de YHWH, que sai de si mesmo

(v. 17c) para agir sobre o povo (v. 17d) e volta para si (v. 17e).54

Já a raiz vrx significa “calar”, no hifil pode ter um sentido causativo “fazer

calar”, como em Jó 11,3; porém, normalmente é intransitivo, isto é, causativo

interno “guardar silêncio”, como em Gn 34,5.55 Este verbo pode ser empregado,

como vrEx', com o mesmo significado, isto é, o da não-comunicação tanto no falar

como no ouvir. No hifil tem sua maior ocorrência e geralmente ligado ao sentido

de “guardar silêncio”, mas quase sempre se refere ao homem (cf. Gn 24,21).56

52 Cf. ALONSO SCHÖKEL, L., “hx;m.fi”, DBHP, p. 645. 53 Cf. VINE, W. E.; UNGER, M. F.; WHITE Jr., W., “hx;m.fi”, DicV, p. 34; WALTKE, B. K., “hx;m.fi”, DITAT, p. 1443. 54 Cf. CARBONE, S. P.; RIZZI, G., Sofonia, p. 446-447. 55 Cf. ALONSO SCHÖKEL, L., “vrx”, DBHP, p. 248; DELCOR, M., “vrx”, DTMAT, vol. 1, p. 885-888. 56 Cf. COPPES, L. J., “vrEx'”, DITAT, p. 542.

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27

Barthélemy diz que é difícil encontrar um sentido natural com vdx no

contexto onde ele se encontra, o qual é um momento de alegria. Assim, ele

apresenta duas possibilidades de esclarecimento: 1) o contexto pede um verbo que

indique sentimento ou emoção; ou 2) após “alegrar-se sobre ti com regozijo” há

duas formas contrastantes de manifestar este júbilo, guardando silêncio no seu

amor e celebrando.57

Como o TM apresenta o texto difficilior e entendendo que o sentimento de

alegria pode ser manifestado tanto interior como exteriormente, optamos por

manter o texto da BHS com o verbo vrx, aonde esta emoção ao mesmo tempo em

que vem expressada através de palmas, gritos e cantos, encontra-se também

guardada no coração.

h) A raiz lyg significa em sua origem “dar voltas, girar”, no sentido rotatório,

ou seja, de “rodear de alegria” emitindo gritos extáticos, de arrebatamento. Na

língua hebraica tomou o sentido de uma manifestação espontânea e entusiástica de

alegria, “gritar de júbilo, jubilar”. No pós-exílio passa a ser usado basicamente

como sinônimo de xmf, fwf, !nr, zl[, para designar vários tipos de alegria (cf. Is

61,10; Zc 9,9). Restringe-se fundamentalmente à forma qal.

O verbo lyg constrói-se em forma intransitiva, freqüentemente no seu modo

absoluto sem fazer qualquer referência direta ao motivo ou ao objeto que conduz a

esta celebração da alegria (cf. Sl 51,10; Pr 23,24-25). Quando é mencionada a

causa, vem acompanhado das partículas preposicionais: B. + seu objeto (cf. Is 9,2),

pessoa (cf. Is 41,16) ou acontecimento (cf. Sl 9,15); l[; + pessoa (cf. Sf 3,17); yKi +

57 Cf. BARTHÉLEMY, D., Critique Textuelle de l’Ancien Testament, p. 913-915. R. L. Smith diz que vydxy é uma forma muito difícil de se entender aqui. Por isso, acredita que talvez a melhor interpretação seja “silenciar” no sentido de “permanecer” em seu amor (cf. Zephaniah, p.143).

Por outro lado, P. R. House e C.–A. Keller são a favor de “renovar” porque consideram “silenciar” fora do contexto de alegria do versículo, afirmando que é possível a troca de um d por

um r. Todavia, C.–A. Keller explica que vdx em árabe significa tanto “vaguear” como “correr para um objetivo”; por isso opta por traduzir o versículo como “ele corre em sua alegria” (cf. HOUSE, P. R., Zephaniah, p. 133; KELLER, C.–A., Sophonie, p. 214).

Entretanto, J. J. M. Roberts é de opinião que este versículo está deslocado, causando uma construção corrompida, pois no lugar onde se encontra, separa dois versículos que falam da alegria de Deus. Para ele este versículo deveria vir imediatamente antes do v. 18 e assim o verbo que se apresenta como intransitivo se tornaria transitivo, cujo objeto estaria no verso 18a, onde “Deus traria para o silêncio”, no sentido de “acalmar” aqueles que estão aflitos. Além disso, ele chama a atenção para o fato dos versos 17c e 17e terem sua ação ligadas ao sufixo %yIl;[' e que de acordo com isso as lições da LXX e Syr trazem a tradução “ele te renovará”, amarrando o verbo com o sufixo (cf. Zephaniah, p.220).

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28

motivo (cf. Jl 2,21). Traduz o sentimento e sua manifestação, tanto individual (cf.

Sl 13,5) como coletiva (cf. Sl 32,11). 58

A maioria das ocorrências de lyg está nos Salmos e nos livros proféticos,

sendo que nestes últimos aparece quase sempre em forma de hino (cf. Jl 2,21;

Zc 10,7).59 O seu uso restringe-se a ações presentes e futuras (de promessa e

espera), nunca aparece para expressar uma ação passada.

Na maioria dos casos em que lyg aparece, o sujeito é o próprio homem (cf.

Sl 9,15; Is 61,10) ou o povo que se alegra por algum motivo, geralmente por uma

ação ou atributo divinos (cf. Sl 14,7; 48,12), ou ainda perante YHWH (cf. Sl 35,9;

Zc 9,9); podendo ser também a natureza (cf. 1Cr 16,31; Sl 97,1). No entanto, o

próprio YHWH, como sujeito, aparece celebrando a alegria apenas em duas

citações (cf. Is 65,19; Sf 3,17).

i) O substantivo hN"rI, que significa “exultação, grito de júbilo”, com muita

probabilidade deriva da raiz !nr, que aparece no Pentateuco (cf. Lv 9,24; Dt 32,43),

embora hN"rI esteja ausente. Pode referir-se a um grito de alegria (cf. Is 14,7) como

também de lamento (cf. 1Rs 8,28). Sua maior ocorrência é na forma poética dos

hinos, denotando a exultação de alegria (cf. Sl 105,43; 126,5).60

2.2.

Delimitação do texto e unidade

2.2.1.

A visão do livro de Sofonias em seu conjunto

O texto se apresenta na BHS dividido em três capítulos, seguindo o esquema

básico de vários livros proféticos: oráculos contra Judá–Jerusalém (cf. Sf 1,2–2,3);

oráculos contra as nações estrangeiras (cf. Sf 2,4–3,8); oráculos de salvação para

Judá e para as nações estrangeiras (cf. Sf 3,9-20).61

Além desta tripartição, que é bem aceita, deve-se acrescentar que o livro

gravita em torno de um tema que lhe dá a unidade: o yôm YHWH. A lembrança

58 Cf. ALONSO SCHÖKEL, L., “lyg” , DBHP, p. 137; LEWIS, J. P., “lyg” , DITAT, p. 262. 59 Cf. WESTERMANN, C., “lyg”, DTMAT, vol. 1, p. 591-596. 60 Cf. WHITE, W., “hN"rI”, DITAT, p. 1435-1436. 61 Cf. KAISER Jr., W. C., Zephaniah, p. 210; ACHTEMEIER, E., Zephaniah, p. 61.

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29

deste grande dia aparece constantemente numa forma de estribilho de acordo com

a fórmula temporal tradicional: “naquele dia” (Sf 1,10; 3,11.16) – “naquele

tempo” (Sf 3,19.20).62

Dentro desta divisão, Sf 3,14-17 faz parte dos oráculos de salvação para

Jerusalém. Entretanto, há divergências entre os estudiosos na aceitação deste texto

como uma unidade independente ou pertence a uma unidade maior, cujo início e

fim variam de acordo com a interpretação que se faz do livro, de acordo com o

tema, o destinatário, o sujeito do discurso e as características estéticas formais.

Uma das explicações é a de que o pequeno livro de Sofonias, excetuando o

título, poderia constituir um único capítulo, uma vez que foi na Idade Média que

se introduziu tal divisão. Embora os Mss mais antigos tivessem já uma separação

em pisqot, estas nem sempre são concordantes. Dentre estes Mss, o Códice de

Leningrado é considerado o mais conhecido e amplamente aceito, por apresentar o

menor número de subdivisões e, assim, estar mais próximo do possível original.63

Contudo, uma posição contrária a esta divisão em pisqot é a de que, embora

nos Mss tenham sido utilizados critérios válidos, eles não abarcam totalmente as

características lingüísticas do texto (sintáticas e semânticas), como também a

forma de comunicação com o ouvinte-leitor: o que o orador quis dizer, quem era o

destinatário e qual o objeto do oráculo profético.64

O livro parece que foi escrito para enviar uma mensagem com o objetivo de

sensibilizar o público. Nele foram utilizadas determinadas formas e estruturas, que

são de grande valia para o estudo histórico-crítico adotado por alguns

estudiosos.65

Assim, deve ser levado em conta que o estudo do livro está dividido entre

aqueles que vêm o escrito primeiramente como um processo de composição

histórica e, portanto, valorizam a análise diacrônica, e os que, em princípio, levam

em conta o trabalho literário, enfatizando a análise sincrônica.66

62 Cf. SEYBOLD, K., Zephanja, p. 85; KELLEY, P. H., Zephaniah, p. 90-91. Quanto à fórmula temporal (v. 16a), S. J. De Vries explica que quando esta fórmula é usada nos profetas menores pré-exílicos ela é exclusivamente introdutória (redacional) com a função de ligar apêndices redacionais. Estas fórmulas temporais de transição fazem parte dos materiais secundários, são poéticos e têm suas transições temporais com rubrica litúrgica ou em anacruse (cf. Futurism in the Preexilic Minor Prophets Compared with That of the Postexilic Minor Prophets, p. 252.259). 63 Cf. BERLIN, A., Zephaniah, p. 17-19. 64 Cf. SWEENEY, M. A., Zephaniah, p. 5-7. 65 Cf. BEN ZVI., A Historical-Critical Study of the Book of Zephaniah, p. 268-269. 66 Cf. FLOYD, M. H., Zephaniah, vol. 2, p. 166-168.

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30

Todas estas considerações mostram a complexidade do estudo e da

delimitação dos cinqüenta e três versículos do livro de Sofonias. Os estudiosos se

dividem em dois grupos: no primeiro estão aqueles67 que visualizam o livro como

um escrito único dividido em pequenas unidades, excetuando ou não a titulação

(cf. Sf 1,1). Estas unidades, por sua vez, podem ou não estar relacionadas aos oito

ou nove oráculos, de acordo com a visão de cada um. No segundo grupo estão

aqueles68 que consideram o escrito de Sofonias formado por duas ou três grandes

unidades, que por sua vez se subdividem em seções. Contudo, tanto as grandes

unidades como as suas subunidades apresentam extensões diferentes em função

dos critérios adotados para sua delimitação.

A partir disto, vê-se que no c. 3 há muitos sinais indicando que as unidades

que o formam não estão compiladas nem compostas num único conjunto.

Todavia, muitos elementos internos mostram que há uma relação entre elas. Estes

elementos incluem: posição literária, marcadores cronológicos, horizontes

literários, mudança nas perspectivas teológicas e correspondência temática.69

Serão elencadas, a seguir, algumas delimitações encontradas nos estudos

sobre Sofonias para Sf 3,14-17, considerando a justificativa de cada estudioso. O

critério adotado será a partir da visão daqueles que concebem o texto como uma

unidade independente (v. 14-17 ou 14-18aa), seguido daqueles que o consideram

parte de uma unidade maior (v. 14-20; 9-17; 9-20; 8-20; 6-20), sem divisão e

seccionando-a em subunidades, e ainda vendo Sf 3,14-17 formado por duas seções

(v. 14-15; 16-17 ou 16-18aa).

67 BAKER, D. W., Zephaniah, p. 87; BALL Jr., I. J., Rhetorical Shape of Zephaniah, p. 164 (considera Sf 2,1-7 um modelo, que é desmembrado e trabalhado em três subunidades); BARKER, K. L.; BAILEY, W., Zephaniah, p. 389; BERLIN, A., Zephaniah, p. 17-20; FLOYD, M. H., Zephaniah, p. 165; SMITH, R. L., Zephaniah, p. 124; HOUSE, P. R., Zephaniah, p. 118-126; KELLER, C.–A., Sophonie, p. 179; O’BRIEN, J. M., Zephaniah, p. 90-91; SWEENEY, M. A., A Form-Critical Reassessment of the Book of Zephaniah, p. 391. 68 ACHTEMEIER, E., Zephaniah, 61-61; ALONSO SCHÖKEL, L.; SICRE DIAZ, J. L., Zephaniah, p. 1144-1146; ASURMENDI, J., Sofonia, p. 138-140; BENNETT, R. A., The Book of Zephaniah, p. 662; BEN ZVI, E., A Historical-Critical Study of the Book of Zephaniah, p. 325-326; BERNINI, G., Sofonia, p. 9-11; BOADT, L., Zephaniah, p. 204; CLARK, D. J.; HATTON, H. A., Zephaniah, p. 141; DEMPSEY, C. J., Zephaniah, p. 86; ESZENYEI SZÉLES, M., Zephaniah, p. 64-65; KAISER, W. C., Zephaniah, p. 212; KOCH, K., Zefanja, p. 264; MACKAY, J. L., Zephaniah, p. 242; MARTIN, F., Le livre de Sophonie, vol. 39, p. 3; MOTYER, J. A., Zephaniah, p. 901; NOGALSKI, J., Zephaniah, p. 171; PATTERSON, R., Zephaniah, p. 21; RENAUD, B., Le Livre de Sophonie, p. 2-3; ROBERTS, J. J. M., Zephaniah, p. 161-163; ROBERTSON, O. P., Zephaniah, p. 29; SCHÜNGEL-STRAUMANN, H., Sofonia, p. 9; SILVA, R. R., Resta esperança para o Resto de Israel, p. 22; SPREAFICO, A., Sofonia, p. 35-45; VLAARDINGERBROEK, J., Zephaniah, p. 8-9; WALKER, L. L., Zephaniah, p. 543; ZENGER, E., Einleitung in das Alte Testament, p. 516-519. 69 Cf. NOGALSKI, J. D., Zephaniah 3, p. 210-211.

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31

2.2.2.

Algumas propostas de delimitação

a) Sf 3,14-17 uma unidade independente

Na consideração de uma unidade bem delimitada está a percepção de uma

troca de metáforas junto ao vocabulário. Os problemas internos que são

apresentados nos v. 11-13 são agora substituídos por preocupações externas. O

horizonte literário se estende além do contexto imediato. Há a presença de

marcadores cronológicos e o estilo dos versos separam os v. 14-17 dos v. 18-20,

embora Sião continue como o destinatário desta última seção.70

Estes versos encontram-se formados por dois convites diferentes à alegria

(cf. Sf 3,14-15.16-17), que estão ligados pela frase temporal (v. 16a) e contêm

relações recíprocas que permitem considerar uma unidade interna bem marcada.

Estes chamados ao júbilo são colocados dentro do c. 3 separando dois oráculos de

salvação (cf. Sf 3,9-13.18-19).71

Todavia, a partir de um estudo sobre a versificação e a métrica dos versos de

Sf 3,14-17 é possível afirmar que não há razões estilístico-literárias que permitam

a sua divisão. A unidade interna do texto baseia-se nas repetições verbais. Os

limites externos estão estabelecidos pelas transições temáticas, mudança de sujeito

e pelos indicadores retóricos, como os imperativos.72

b) Sf 3,14-18aa uma unidade independente

Esta tese leva em conta as observações introdutórias de cada uma das seções

do livro e a pessoa do sujeito. Em Sf 3,14-18aa encontram-se as palavras do

profeta, enquanto nas unidades que estão imediatamente antes e depois é o próprio

YHWH o orador. Como a alegria é um sentimento que se manifesta

principalmente em dia de festa, o texto deve estender-se até o verso 18aa.73

c) Sf 3,14-17 uma parte da unidade indivisível de Sf 3,14-20

A opção por esta unidade maior tem como critério a reversão de tudo o que

foi apresentado anteriormente em todo o livro (cf. Sf 1,2–3,13). A criação que

70 Cf. NOGALSKI, J. D., Zephaniah, p. 214-215. 71 Cf. BEN ZVI, E., A Historical-Critical Study of the Book of Zephaniah, p. 320. No que concorda D. Baker, porém considerando o segundo oráculo estendendo-se até o v. 20 (cf. Zephaniah, p. 87-88). 72 Cf. Van GROL, H. W. M., Classical Hebrew Metrics and Zephaniah 2-3, p. 186. 73 Cf. KELLER, C.–A., Sophonie, p. 179.212.

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32

estava para ser totalmente aniquilada (Sf 1,2-3.14-18; 3,8) é aqui reafirmada.

Porque YHWH de guerreiro destruidor passa a ser para Sião seu divino protetor.74

Essa mudança de estado gera uma exortação à Sião–Jerusalém, para que

busque a YHWH. Com a conversão de seus corações, Jerusalém deverá ser

estabelecida como o centro santo de toda a criação e de todas as nações.75

Com isso, é possível observar algumas mudanças. A primeira, no

destinatário da mensagem, que da relação do resto com Judá e as nações, passa a

dirigir-se somente a Sião.76 A segunda, na forma verbal, que inicia com um

imperativo, o qual carrega em si uma introdução a uma nova comunicação.77

Essa comunicação iniciada no v. 14 pode ser vista como uma unidade

interna coerente, numa temática bem articulada até o v. 20 e que não deve ser

quebrada.78

d) Sf 3,14-17 uma subunidade de Sf 3,14-20

O critério que subdivide Sf 3,14-20 em duas subunidades baseia-se na

progressão do “já e ainda não” realizado. Nos v. 14-17 a progressão está na

atitude do povo em relação a YHWH, primeiro chamado a “alegrar-se” pelo que

YHWH já realizou (v. 14-15) e depois instado a “não temer” pelo que Ele ainda

trará (v. 16-17); enquanto nos v. 18-20 a progressão aparece no agir de YHWH,

que da punição dos líderes apóstatas do povo (v. 18) passa a relatar como

restaurará os remanescentes fiéis (v. 19-20).79

Outro critério é aquele que visualiza a unidade formada por três salmos

celebrativos (v. 14-15; 16-18a; 18b-20), fundamentado na probabilidade da

influência do dêutero-Isaías e do trito-Isaías (cf. Is 40-66, especialmente Is 62).80

e) Sf 3,14-17 uma subunidade de Sf 3,9-17

A tese que justifica esta unidade baseia-se na reversão de pronunciamentos

negativos de julgamento para palavras positivas de consolação e confiança. A

subunidade de Sf 3,14-17 aparece como uma resposta profética ao que foi

74 Cf. BERLIN, A., Zephaniah, p. 148. 75 Cf. SWEENEY, M. A., Zephaniah, p. 194. 76 Cf. O’BRIEN, J. M., Zephaniah, p. 90-91. 77 Cf. ROBERTS. J. J. M., Zephaniah, p. 204. 78 Cf. KAPELRUD, A. S., The Message of the Prophet Zephaniah, p. 38. Assim também W. P. Brown, explicando que a chamada ao louvor em Sf 3,14-20 marca o final das palavras de julgamento de YHWH contra Jerusalém (cf. Zephaniah, p. 116). 79 Cf. FLOYD, M. H., Zephaniah, vol. 2, p. 239. 80 Cf. SCHÜNGEL-STRAUMANN, H., Sofonia, p. 9.24.

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33

prometido nas duas subunidades anteriores (v. 9-10 e v. 11-13), que tinham

YHWH como orador.

A frase temporal (v. 16a) não introduz uma unidade nova, mas funciona

como um divisor temático dentro de Sf 3,14-17, porque muda de perspectiva, que

da remoção dos inimigos (v. 3,15) passa para a alegria de YHWH por Sião (v. 17).

Enquanto separa-se da unidade posterior (v. 18-20), onde YHWH volta a ser

nomeado na 1ª pessoa do sg. Ficando perceptível que Sf 3,14-17 apresenta-se

como um conjunto com sentido lógico e coeso, tendo como único orador o profeta

e apresentando elementos paralelos com os v. 9-10.11-13.81

f) Sf 3,14-17 uma parte da unidade indivisível de Sf 3,9-20

O princípio que fundamenta esta opção é a alternância entre o universal e o

particular, entre os gentios e o povo eleito. Isto pode ser percebido a partir de uma

visão de conjunto do livro.

Esta passagem do todo para a parte é um estilo do autor que utiliza o fator

surpresa desenvolvido no tema do yôm YHWH, visando à correção dos eleitos. A

restauração em Sf 3,9-20 é vista como uma unidade indivisível.82

g) Sf 3,14-17 uma subunidade de Sf 3,9-20

Dentro ainda da visão da alternância do todo para a parte, se for levado em

conta o tom e o conteúdo deste texto, é possível notar que inicialmente tem-se

uma promessa de conversão universal e de salvação para o resto de Judá (v. 9-13)

e em seguida uma exortação à alegria endereçada a Jerusalém pela vitória que lhe

foi trazida por YHWH (v. 14-20).83

Um outro princípio que considera o v. 9 como o início de uma nova unidade

fundamenta-se na mudança do enfoque introduzido com a partícula za' (então).

Com isso, passa-se de um contexto de acusações e julgamentos para falar da

conversão mundial (v. 9-10) e da preservação do resto (v. 11-13), que gera uma

expressão de alegria (v. 14-17) pela restauração do povo de YHWH em sua terra

(v. 18-20). A era messiânica ora iniciada é um tempo de júbilo.84

81 Cf. NOGALSKI, J. Zephaniah, p. 175-176.201-204. 82 Cf. ALONSO SCHÖKEL, L.; SICRE DIAZ, J. L., Sofonias, p. 1145-1147. 83 Cf. BENNETT, R. A., The Book of Zephaniah, p. 665.698-701. 84 Cf. KAISER, Jr., W. C., Zephaniah, p. 235. Todavia, D. A. Dorsey é a favor de que a última unidade do livro comece em Sf 3,8 por causa da partícula !kel' (por isso), que comumente é usada para introduzir uma unidade conclusiva (cf. The Literary Structure of the Old testament, p. 310-314).

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34

Este momento de alegria é descrito em Sf 3,14-17, quando são projetados

para o futuro os motivos que falam das ações de YHWH que mudarão

radicalmente a sorte do povo eleito.85

h) Sf 3,14-18aa uma subunidade de Sf 3,9-20

Da semelhança redacional de Sofonias com os antigos profetas, surge uma

explicação para a mudança de enfoque. Esta similaridade leva à conclusão de que

não é possível deixar seus ouvintes-leitores com uma mensagem de castigo, sem

alguma esperança. Como o julgamento é para todas as nações (cf. Sf 1,2–3,8), a

salvação também é anunciada para todos (cf. Sf 3,9-20): para os pagãos que se

converterem (v. 9-10) e para os de Judá que se renovarem espiritualmente (v. 11-13).

Diante disso, só restam hinos de alegria (v. 14-15.16-18a) e esperança (v. 18b-20).86

Contudo, por apresentar dificuldades insuperáveis, às vezes é difícil fundamentar-se

exclusivamente nos critérios temáticos do sistema tripartido profético: oráculos de

condenação contra Judá-Jerusalém, oráculos de condenação contra as nações, oráculos de

salvação. Por isso, sem eliminar a apreciação do conteúdo, a opção é fazer a leitura através

de critérios literários. Com isso, a unidade intermediária desta seção, Sf 3,14-18a,

aparece nitidamente marcada, porque há uma mudança temática na próxima seção

(v. 18b-20), onde YHWH passa a ser o orador.87

i) Sf 3,14-17 dentro da unidade de Sf 3,6-20

Fugindo também do sistema tripartido profético, mas considerando a

estrutura do texto e a temática global do livro, é possível perceber uma

composição circular entrelaçada por palavras-gancho e repetição de motivos.

Deste modo, Sf 3,6-20 pode ser visto como uma unidade indivisível .88

Também é plausível considerar que a forma atual do livro visa dar ao

anúncio uma dimensão universal e projetada para o futuro, a fim de mostrar à

comunidade dos pobres como será para eles o tempo que há de vir. Este resto

pobre subsistirá no seio de Sião. Na tomada deste ponto de vista, Sf 3,14-17 é

subdividido em duas seções (v. 14-15 e v. 16-17).89

85 Cf. ESZENYEI SZÉLES, M., Zephaniah, p. 64.106. 86 Cf. BERNINI, G., Sofonia, p.11-13. Também J. Vlaardingerbroek apresenta este esquema de subdivisão para Sf 3,9-20 (cf. Zephaniah, p. 192-194). 87 Cf. RENAUD, B., Le livre de Sophonie, p. 2-3.19. 88 Cf. ZENGER, E., Einleitung in das Alte Testament, p. 516 (citando LOHFINK, N., Zefanja und das Israel der Armen, p. 103-104). 89 Cf. GORGULHO, G., Sofonias e o valor histórico dos pobres, p. 33-34.

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35

Outros critérios que podem ser observados junto com os temáticos são os

retóricos. Sf 3,6-20 teria sido escrito a partir de uma série de oráculos do profeta

que foram pronunciados em ocasiões distintas. Esta unidade se liga com a anterior

(cf. Sf 2,4–3,5) pela alternância entre Jerusalém e as nações e na relação que

existe entre os oráculos. Entretanto, Sf 3,14-17 é a parte mais unitária e bem

articulada desta unidade.90

Em síntese, percebe-se que Sf 3,14-17, pertencendo ou não a uma unidade

maior, é aceito pela maioria dos estudiosos como um conjunto textual bem

delimitado. No presente estudo considera-se esta perícope como uma subunidade

de Sf 3,6-20. Esta unidade parece trazer um discurso coerente, onde as

subunidades estão interligadas e continuam a apresentar a alternância entre

Jerusalém e as nações como perpassa todo o livro, sob diferentes aspectos. Ao

juízo das nações junta-se Jerusalém por não ter temido a YHWH (v. 6-8); abre-se

um tempo de promessas aos povos e depois ao povo eleito, mostrando a

universalidade da punição e da salvação (v. 9-13); que irromperá na realização das

promessas (v. 14-17), que por terem sua realização definitiva no futuro abre um

tempo de novas promessas (v. 18-20).

Na consideração de Sf 3,14-17 como um conjunto textual, percebe-se que o

texto não apresenta problemas quanto à sua delimitação inicial, visto que os

críticos em unanimidade concordam que no v. 14 começa uma nova unidade ou

subunidade, de acordo com a divisão que cada estudioso apresenta para o livro.

Todavia, o seu fechamento no v. 17 apresenta algumas discordâncias no que tange

a compreensão da extensão do último verso.

A concordância entre os críticos, quanto ao início do texto, está no fato de

que este se encontra delimitado tanto pela forma como pelo conteúdo e também

pela sua posição no livro. Além disso, a certeza da pessoa do discurso, do sujeito

da ação e sobre quem recai a ação.

Sf 3,14-17 traz uma mensagem de alegria para Sião, porque YHWH

revogou sua sentença, está em seu meio e se rejubila com ela. Por isso, vem

colocado no final do livro, logo após a descrição de como será “o resto” de Israel

que será preservado após o julgamento dos soberbos fanfarrões existentes em seu

90 Cf. SPREAFICO, A., Sofonia, p. 42-43.

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meio e depois do afastamento daqueles que os oprimiam com suas atitudes

injustas e corruptas (cf. Sf 3,11-13).

Na análise comparativa das características de Sf 3,14-17 com as da perícope

anterior, Sf 3,11-13, é perceptível que o v. 14 discorre sobre algo novo devido às

mudanças observadas em vários pontos.

No que diz respeito à ação, observa-se que em Sf 3,11-13 as ações verbais

estão todas numa série com sentido de futuro: yviAbte al{ (não terás), rysia'

(afastarei), ypisiAt-al{ (não continuarás), yTir>a;v.hiw> (deixarei), Wsx'w> (procurará),

Wf[]y:-al{ (não praticarão), WrB.d:y>-al{ (não dirão), aceM'yI-al{ (não se encontrará), W[r>yI

(apascentarão) e Wcb.r"w> (repousarão).

Por outro lado, no v. 14 as formas verbais aparecem numa cadeia de quatro

ações no imperativo: yNIr" (exulta de alegria), W[yrIh' (grita de alegria), yxim.fi

(regozija), yzIl.[' (celebra), mostrando que os momentos dos discursos são

diferentes.

Embora a pessoa do discurso varie, o sujeito da ação é sempre YHWH. Na

perícope de Sf 3,11-13 é o próprio YHWH quem fala ao povo fazendo-lhe

promessas, evidenciado pelas formas verbais rysia' (v. 11) e yTir>a;v.hiw> (v. 12) na

primeira pessoa do singular e através da expressão yvid>q' rh;B. (em meu monte santo

– v. 11).

Em contrapartida, em Sf 3,14 encontramos o profeta, em nome de YHWH

(cf. v. 15a – onde YHWH aparece em 3ª pessoa), exortando o povo a alegrar-se, a

regozijar-se através de uma tríplice chamada dirigida à: !AYci-tB; (filha de Sião),

laer"f.yI (Israel) e ~Øil'v'Wry> tB; (filha de Jerusalém). O profeta como a pessoa do

discurso que convida o povo ao júbilo (v. 14), torna-se ainda mais claro no v. 15

quando fala de YHWH, dizendo que “revogou YHWH as tuas sentenças” e

“expulsou teu inimigo” (v.15) Ambas as formas verbais estão na terceira pessoa

do singular. Depois, passa por uma referência a Jerusalém (v. 16) e volta a fazer

menção a YHWH (v. 17).

Ainda é possível admitir que o direcionamento à segunda pessoa do

feminino, que aparece no v. 14 em três das quatro ações verbais, continua nos

sufixos preposicionais que apresentam os motivos deste chamado à alegria (v.

15.16.17) e na última ação verbal yair>yti-al{ (não temerás), que apresenta-se no

yiqtol (v. 16b).

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37

Todas estas constatações estão em perfeita consonância com o

desenvolvimento do tema, pois nota-se que em Sf 3,11-13 há uma mensagem de

esperança futura para o resto de Israel, depois da manifestação do yôm YHWH; ao

passo que em Sf 3,14 a missiva é uma exortação ao regozijo imediato, porque

YHWH já está no meio do povo e se alegra por aquilo que lhe proporciona.

A delimitação final do texto apresenta certa disparidade entre os críticos.

Em parte, esta discordância deriva do fato de não haver unanimidade a respeito da

autoria destes versículos, se são do profeta ou obra de um redator. Por causa disto,

alguns não fazem o estudo do texto como ele se apresenta hoje no cânon bíblico,

mas a partir da separação do que consideram autêntico e não-autêntico.91

Por outro lado, a LXX, propondo uma divisão sintático-gramatical diferente

do TM, acrescenta wj evn h`me,ra| eorth/j (como em dia de festa), como continuação

e conclusão do v. 17. Com isso, desloca para o v. 18, de forma simplificada, a

expressão d[eAMmi ygEWn (os aflitos afastados da festa), que se inicia com o seguinte

verso kai. suna,xw tou.j suntetrimme,nouj (e reunirei os aflitos).92 Alguns críticos

seguiram esta divisão.93

Na análise comparativa de Sf 3,14-17 com a perícope posterior, Sf 3,18-20,

observa-se que a pessoa do discurso mudou, visto que no v. 17 encontra-se o

profeta falando sobre o agir de YHWH em relação a seu povo, uma vez que as

ações verbais estão na 3ª pessoa do m.sg. e dão esta indicação. Por outro lado, no

v. 18 depara-se com a voz do próprio YHWH, na 1ª pessoa do m.sg., mencionando

sua atuação em favor deles.

Em Sf 3,14-17 presencia-se uma restauração já começada e por isso motivo

de alegria, mas não em seu estágio final; o que é muito sugestivo para a

mensagem da perícope de Sf 3,18-20, onde há um retorno a uma mensagem de

promessa, para um futuro definitivo, quando então todos os povos da terra

reconhecerão a Jerusalém totalmente restaurada, como o centro de nome e louvor,

como o lugar de onde parte a salvação. Então, o conteúdo das promessas dos v.

91 A abordagem sobre a redação do texto, como também da posição dos críticos, será feita mais adiante. 92 Cf. CARBONE, S. P.; RIZZI, G., Sofonia, p. 446-447. 93 Cf. ASURMENDI, J., Sofonia, p. 138; BERNINI, G., Sofonia, p. 13; DORSEY, D. A., The Literary Structure of the Old Testament, p. 313; KELLER, C.-A., Sophonie, p. 179-180; SCHÜNGEL-STRAUMANN, H., Sofonia, p.24; WESTERMANN, C., Prophetic Oracles of Salvation in the Old Testament, p. 121.

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18-20 pode ser assim resumido: contra os impenitentes (v. 18), os que agem

contra o povo eleito (v. 19) e de retorno dos exilados (v. 20). Deixando clara a

continuação da alternância entre Jerusalém – nações até o v. 20.

Neste trabalho seguiremos a divisão apresentada pelo TM por encontrarmos

em Sf 3,14-17 uma unidade bem organizada.94

2.2.3.

Unidade de Sf 3,14-17

A partir das constatações acima, é possível aceitar que em Sf 3,14-17 trata-

se de uma palavra dirigida à filha de Sião – filha de Jerusalém (v. 14a-d), através

de Sofonias, que fala em lugar de YHWH.

Percebe-se uma continuidade que atravessa todo o discurso do texto, por

intermédio da permanência do mesmo orador-profeta que se dirige ao mesmo

destinatário, identificado na 2ª f.sg. e renomeado através das três formas utilizadas

no v. 14 numa ordem diversa: Israel–Jerusalém–Sião (v. 15c.16ab). O sujeito

determinante na ação, porém, é YHWH, fixo na 3ª m.sg. e nomeado também por

três vezes (v. 15a.c.17a).

Este oráculo, apesar da ausência de uma fórmula introdutória convencional,

está colocado após uma série de promessas feitas pelo próprio YHWH para a

iminente vinda do yôm YHWH (v. 9-13), momento no qual a justiça será

implantada. Estas promessas se colocam após uma ameaça de castigo (v. 6-7) e de

um tempo de espera para a sua realização (v. 8).

Com a chegada do yôm YHWH, o resto, que permaneceu fiel a Ele, reunido

em Sião, é exortado a regozijar-se “com todo o coração” (v. 14c), porque YHWH,

“o rei de Israel” e “o teu Deus”, “está no teu meio” (v. 15c.17a), “revogou tuas

sentenças” (v. 15a) e “expulsou teu inimigo” (v. 15b).

Por isso é dito: “não temerás” (v. 15d.16b), porque de agora em diante não

acontecerá “mais o mal” (v. 15d), como também “não desfalecerão tuas mãos”

(v. 16c), isto é, eles estarão sempre fortes diante de qualquer tipo de afronta futura,

certos de que YHWH é um “herói” e sempre “salvará” (v. 17b).

Ao resto, que agora representa a filha de Sião–Jerusalém, Sofonias fala da

alegria de YHWH por causa deles (v. 17c-e), pois, ao se manterem fiéis, tornaram-se

94 Cf. c. I, seção 2.4, p. 49-55.

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abertos às bênçãos prometidas. Esta alegria de YHWH permanecerá sendo

exteriorizada (v. 17c.e), prolongada e mantida no “silêncio do seu amor” (v. 17d).

Em seqüência a esta palavra do profeta, que chama tanto o povo ao regozijo

como fala da alegria do próprio YHWH com o resto fiel, em Sf 3,18-20 encontra-

se, para estes que estavam aflitos e que YHWH reunirá (v. 18), um elenco das

bênçãos a serem recebidas (v. 19.20), mas também uma palavra de reprovação

para os que atentam contra Jerusalém (v. 19).

Com esta visão de conjunto, pode-se dizer que Sf 3,14-17 apresenta uma

unidade redacional, uma vez que não se encontram tensões dentro destes

versículos, havendo continuidade entre os v. 14 a 17. Estes seguem uma única

linha de pensamento, embora com diferentes momentos. Como também mostra

ser uma subunidade textual de Sf 3,6-20, revelando-se parte integrante do

desenvolvimento de uma situação instaurada, na qual está perfeitamente ajustada.

2.3.

Época do texto no contexto do livro de Sofonias

2.3.1.

A datação do livro em seu conjunto

Não é fácil determinar uma data provável para o livro de Sofonias. Os

críticos têm posições divergentes quanto à época histórica retratada no escrito e ao

período composicional. Isto se deve ao fato de se encontrar dados que podem

remontar tanto à época que antecede à reforma josiânica (cf. Sf 1,4-6), como ao

período que lhe sucede, sugerindo a queda da Assíria (cf. Sf 2,15); outras

informações, porém, parecem pertencer ao período exílico ou pós-exílico imediato

(cf. Sf 3,11-13.14-17).95

Se tomarmos como ponto inicial a determinação da atuação de Sofonias, a

única referência direta ao profeta encontra-se no título de seu livro (cf. Sf 1,1). Se

considerarmos o conteúdo deste versículo como autêntico, pode-se colocar seu

ministério profético durante a época do rei Josias (640 – 609 a.C.).96

95 Cf. MASON, R., Zephaniah, p. 35-43. 96 Cf. SPREAFICO, A., Sofonia, p. 62; ALONSO SCHÖKEL, L.; SICRE DIAZ, J. L., Sofonias, p. 1143.

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O contexto histórico do livro parece indicar o tempo da menoridade de

Josias, uma vez que não há menção ao rei e sim aos filhos do rei (cf. Sf 1,8),

levando a crer que Josias estava sob tutela e o governo encontrava-se nas mãos de

políticos palacianos pró-assírios. A reforma josiânica ainda não havia acontecido

(cf. 2Rs 22,3–23,25; 2Cr 34,1–35,19), porque existe uma recriminação à idolatria

de Judá, ao sincretismo religioso (cf. Sf 1,4-5), como também ao comportamento

dos oficiais da corte (cf. Sf 3,4) e dos sacerdotes em Jerusalém (cf. Sf 3,4).97

O movimento pró-reforma partiu de um grupo de aristocratas cultos

inconformados com a situação que se havia instalado em Judá na época dos reis

Manassés (cf. 2Rs 21,2-7.16) e Amon (cf. 2Rs 21,20-22). É plausível que este

grupo contasse com o apoio de determinados profetas (cf. 2Rs 21,10-15), dentre

eles Sofonias, que proclama seus oráculos contra Judá. Nesta reforma, motivos

políticos, sociais e religiosos se entrelaçavam indissoluvelmente.98

Todavia, não se deveria colocar a atuação de Sofonias após a reforma,

porque o texto deixa entrever que a Assíria ainda era uma potência forte capaz de

gerar temor. O profeta acusa a afluência de usos e costumes assírios, sobretudo

junto à aristocracia de Jerusalém (cf. Sf 1,1-6.8-9). Josias começa a implantar sua

reforma por volta de 628/627 a.C. Todavia, somente quando sente o poder assírio

enfraquecido é que este monarca leva ao auge sua reforma (622 a.C.).99

Outra possível indicação é a de que Sofonias provavelmente já não exercia

seu ministério quando teve início a reforma josiânica. Esta suposição baseia-se no

fato de que Josias decidiu consultar um profeta a respeito do Livro da Lei

encontrado (cf. 2Rs 22,3), mas a consulta foi feita à profetisa Hulda e não a

Sofonias.100 A partir desta informação, a pregação do profeta seria antecedente ao

ministério profético de Jeremias, iniciado em 627 a.C. (cf. Jr 1,1-3)101 e da tomada

de Nínive, capital da Assíria, destruída em 612 a.C. (cf. Sf 2,13-15),102 como

97 Cf. CAZELLES, H., História Política de Israel, p.182-183; ESZENYEI SZÉLES, M., Zephaniah, p. 61-64; BRIGHT, J., História de Israel, p. 381-389. 98 Cf. ALBERTZ. R., Historia de la religión de Israel en tiempos del Antiguo Testamento, p. 378-379; DONNER, H., História de Israel e dos povos vizinhos, vol. 2, p. 378-385.390-391; SOGGIN, J. A., Storia d’Israele, p. 362-369; MILLER, J. W., Between the Times: Zephaniah, Nahum, Habakkuk, Obadiah, p, 143. 99 Cf. CAZELLES, H., op. cit., 182-183; DONNER, H., op. cit., vol. 2, p. 384-385. 100 Cf. ALONSO SCHÖKEL, L.; SICRE DIAZ, J. L., Sofonias, p. 1144. 101 Cf. BRIGHT, J., História de Israel, p. 386; FOHRER, G., História da Religião de Israel, p. 319. 102 J. Asurmendi explicita que se forem levados em conta os dados do livro (cf. Sf 2,13-15), Sofonias não teria conhecido a queda de Nínive (Sofonia, 138).

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também da tensão com Moab e Amon (cf. Sf 2,8-12), que remonta ao tempo da

deportação do rei Joacaz em 609 a.C. devido ao domínio egípcio sobre Judá (cf.

2Rs 23,31-35) e do reinado do rei Joaquim, de 609 a 597 a.C. (cf. 2Rs 24,2).103

A conjuntura internacional na época de Sofonias, contudo, já indicava

algumas mudanças, não havendo um quadro seguro e preciso sobre a situação de

Judá e da Palestina. A Assíria, da qual era vassala, estava mostrando sinais de

declínio. O oráculo contra Amon e Moab é muito genérico, não se referindo a fatos

concretos, mas ao modo como eles agem. Tudo isto pode sugerir, mais do que

previsões futuras, uma intuição do profeta para um futuro imediato.104

Por outro lado, determinadas informações se ajustam ao tempo posterior de

Josias (cf. Sf 2,11; 3,9-10), porque possuem temas com uma maior identificação

ao contexto pós-monárquico (cf. Sf 3,14-20), devido à terminologia utilizada, ao

estilo, à linguagem e à mensagem teológica.

Entretanto, admite-se que o trabalho redacional não se deve a um único

autor, mas que o texto passou por mais de uma mão, nas reelaborações sofridas,

até alcançar o seu estágio final.105

Dentro desta panorâmica, alguns estudiosos optam pela efetiva escrita do

livro na época do rei Josias.106 Outros são pelo parecer que Sofonias deixou seus

103 A. Spreafico lembra que no período de Josias não havia tensões com os reinos vizinhos de Amon e Moab (cf. Sofonia, p. 64). 104 Cf. SPREAFICO, A., Sofonia, p. 64-66. Concordando com as colocações sobre a conjuntura da época e dizendo ser possível uma confidência de Sofonias a respeito da queda do Império Assírio, P. H. Kelley diz que a data mais provável para o ministério de Sofonias seria entre os anos 630-625 a.C., por volta da época da vocação de Jeremias (cf. Zephaniah, p. 91). 105 W. L. Holladay é do parecer que o alargamento dos pronunciamentos autênticos de Sofonias se deu após a reforma, quando então apresenta sua preocupação com o inimigo do norte e dos lapsos no cumprimento da lei do Deuteronômio, citando Jeremias como o adaptador (cf. Reading Zephaniah with concordance, p. 672). Da mesma forma, E. Ben Zvi diz que o livro de Sofonias, como se apresenta, foi redigido a partir de um material composicional já existente e de algumas poucas adições pós-composicionais (cf. A Historical-Critical Study of the Book of Zephaniah, p. 347). Além disso, S. J. De Vries diz que os materiais que anunciam julgamento são originais ou redacionais pré-exilicos; enquanto aqueles que falam de salvação são exílicos ou pós-exílicos; e quando a salvação de Israel aparece como uma salvação adicional (cf. v. 16a) é sempre pós-exílico (cf. Futurism in the Preexilic Minor Prophets Compared with That of the Postexilic Minor Prophets, p. 259-260). Um outro tipo de análise é feito por B. G. Curtis, que considera a contagem da delineação poética e das partículas de prosa (ta – rva – h). Estas partículas raramente aparecem na poesia. Embora o TM de Sofonias seja, nesta análise, designado uma prosa oracular, Sf 3,14-17 nas suas 55 palavras apresenta apenas uma ocorrência destas partículas, awhh !wyb, e uma acentuação poética. A baixa incidência das partículas no texto geralmente aponta para um material mais antigo oracular ou poético (cf. The Zion-Daughter Oracles, p. 172-180). 106 Assim se posiciona J. J. M. Roberts (cf. Zephaniah, p. 163); como também M. Eszenyei Széles, que é por uma datação anterior a 630 a.C. (cf. Zephaniah, p. 61). Segundo L. Alonso Schökel; J. L. Sicre Diaz, a maioria dos estudiosos se coloca a favor de ter sido Sofonias quem promoveu esta reforma (cf. Sofonias, p. 1144).

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42

oráculos sob forma de palavras isoladas como era o comum em sua época.107

Ainda há quem diga que o livro poderia se aplicar a qualquer tempo do povo

eleito, pois as afirmações sobre a idolatria são de ordem geral e os inimigos de

Israel mencionados: cidades filistéias, Moab e Amon, Egito e Assíria, parecem ser

elementos estereotipados (cf. Sf 2,4-15).108

Para os que optam por uma datação mais tardia, o tempo do reinado de

Josias poderia ter sido escolhido como o período literário, isto é, não seria o

período histórico, mas aquele que serviu de base para o escrito, por ter sido

considerado muito favorável para os ouvintes-leitores desesperançados. Um dos

motivos para a escolha deste tempo encontra-se no império assírio que iniciava

sua decadência e Judá estava sendo governado por um monarca piedoso,

preocupado com uma reforma religiosa e que procurou, de certa forma, sustentar a

independência política da Assíria e recuperar o território de Israel. Isto aumentaria

as esperanças religiosas e políticas dos seus compatriotas.109

A partir de tudo o que foi acima considerado, poder-se-ia dizer que o livro

alcançou sua forma final depois de um prolongado desenvolvimento. Isto é

fundamentado por algumas teses:

a) um estudo bastante pormenorizado considera como sofonianas as seguintes

passagens: 1,2-5.7.8ab-9.12ab-18aa; 2,1-2ba.3-6.7abba.12ab-14; 3,6-7 e talvez

3,1-4. 110

b) estas poucas e variadas expressões proféticas (a), permaneceram vivas no culto

a YHWH continuado e no ensino de círculo de discípulos (cf. Sf 1,7-8), na forma

de tradição oral. Tempos mais tarde estes oráculos foram colocados por escrito.

Certamente houve uma primeira redação no período pré-exílico, feita por um

“discípulo de Sofonias”, que recolheu e ordenou os oráculos do profeta sem

grandes mudanças ou acréscimos. Posteriormente, na época exílica houve uma

107 Segundo E. Sellin – G. Fohrer, com segurança podem ser atribuídos ao profeta os seguintes oráculos: Sf 1,4-5.7-9.12-13.14-16; 2,1-3; 3,11-13 (cf. Introdução ao Antigo Testamento, p. 689-690). No entanto, E. Zenger diz que é questionável considerar Sf 3,12-13 como anterior ao exílio (cf. Einleitung in das Alte Testament, p. 519). 108 Conforme R. Mason, estas nações estariam simbolizando os inimigos de Israel do norte, sul, leste e oeste, que em algum momento da história a oprimiram (cf. Zephaniah, p. 21-22). 109 A. Berlin chama este momento de “pequena idade de ouro”, embora menor do que na época de Davi e Salomão, e que este tempo foi o melhor período entre o Cisma (931 a.C.) e o edito de Ciro (538 a.C.), acrescentando que a audiência exílica e pós-exílica teve muita afinidade com as palavras de Sofonias (cf. Zephaniah, p. 47); da mesma opinião J. M. O’Brien (cf. Zephaniah, p. 92). 110 Cf. LANGOHR, G.; Le Livre de Sophonie et la critique d’autenticité, p. 1-27.

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43

reinterpretação da mensagem sofoniana mudando a linguagem para a da época

exílica e início da era pós-exílica, sendo esta redação colocada na segunda metade

do século V a.C.111 Desta redação fazem parte: 1,1aa (fórmula introdutória);

2,7aabb.11; 3,10.18-20.112 Depois disto teria havido uma nova edição cujo redator

poderia ter sido um anti-helenista e antipagão, com pouquíssimas alterações,

porém significativas. E a última seria muito recente, uma vez que a LXX

originária não a teria conhecido. Contudo, não se podendo ir além do século III-II

a.C.113

c) o processo de composição do livro passou por três estágios: 1º) original; 2º) de

releitura; 3º) da redação. No período original seriam encontrados nove oráculos:

Sf 1,4-5.7-9.12-13.14-16; 2,1-3.4.13-14; 3,6-8.11-13. No período da releitura

seriam adicionados os textos exílicos de caráter hínico e antológico, ligados às

idéias dêutero-isaianas (Sf 3,14-20), os de caráter deuteromístico (Sf 2,10-11) e os

que falam da presença de colônias judaicas no Egito (Sf 3,9-10). O redator pós-

exílico adicionaria ainda o título (Sf 1,1), as introduções (Sf 1,8a.10a.12a), as

fusões (Sf 1,17-18) e as glosas explicativas (Sf 1,4.13; 3,8d.9b.10.11a).114

d) os noves oráculos sofonianos, citados acima, foram deixados sob a forma de

palavras isoladas. Outros (Sf. 1,2-3.10-11.17; 2,5-7.8-11.12.15; 3,1-5.9-10), de

origem desconhecida, foram acrescentados em época posterior formando a grande

redação de Sf 1,1–2,13. Por último o escrito foi ampliado com oráculos de

inspiração no dêutero-Isaías: Sf 3,14-15.16-18aa.18ab-20, os quais são promessas

escatológicas posteriores, alargando a modesta visão de Sofonias sobre o futuro

para uma expectativa de pura salvação.115

e) as três etapas seriam: 1ª) fundo sofoniano; 2ª) importante trabalho de edição; 3ª)

glosas pontuais. As glosas e retoques redacionais apontam para uma redação pós-

exílica dos séculos VI ou V a.C., quando o autor final fez a estruturação do livro.

111 Segundo M. Eszenyei Széles, quando o redator, no tempo da restauração pós-exílica, acrescentando mais material, deu a conformação do esquema tripartido, o fez dentro de uma visão escatológica (cf. Zephaniah, p. 64). 112 A. Bonora afirma que alguns versículos têm uma maior compreensão se vistos à luz do contexto pós-exílico, visto se ajustarem melhor a este tempo: 2,7.9b.10; 3,10b.16-20. Porém, ainda há outros versículos que alguns estudiosos subtraem do profeta do século VII (cf. Sofonia, p. 79). 113 Cf. SPREAFICO, A., Sofonia, p. 28-29. 114 Cf. TESTA, E., Sofonia, p. 291-292. 115 Cf. SELLIN, E.; FOHRER, G., Introdução ao Antigo Testamento, vol. 2, p. 689-690.

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44

Estas glosas, se fossem retiradas, não comprometeriam o texto, nem a

autenticidade dos oráculos que estão bem enquadrados no século VII a.C. 116

Em síntese, a posição dos estudiosos é muito divergente em relação à

datação dos oráculos do livro. Todavia, podemos formular as seguintes

constatações:

• A pregação do profeta está na base do escrito do livro de Sofonias, que em sua

época teria deixado seus oráculos em forma de palavras isoladas conservadas

pela tradição oral.

• Esta mensagem original de oráculos independentes teria recebido na época pré-

exílica imediata uma primeira escrita sem grandes alterações, logo após a

atuação do profeta.

• A este escrito, na época exílica e pós-exílica, teriam sido acrescentadas

introduções, glosas explicativas, como também teriam sido feitas fusões, a fim

de dar uma boa estruturação ao livro.

• Estas alterações teriam surgido a partir da reflexão das palavras do profeta do

século VII, adaptando-as ao contexto que o povo estava vivendo. Isto teria sido

obra de um redator pós-exílico.

2.3.2.

Algumas propostas de datação de Sf 3,14-17

Dentro do contexto apresentado, para se abordar a época de Sf 3,14-17,

deve-se levar em conta alguns pontos sobre a autenticidade e as tradições

redacionais. Os estudiosos se dividem na aceitação ou não da autenticidade do

texto, se sua redação é obra de Sofonias ou de um ou mais redatores, sendo a

escrita pré-exílica, exílica ou pós-exílica.

Alguns posicionamentos serão apresentados. O critério adotado será o da

autenticidade do material. Começará pelos que se posicionam pela não-

autenticidade total de Sf 3,14-17 (a); passando pelos que admitem uma

autenticidade parcial, isto é, sofoniano (Sf 3,14-15) e não-sofoniano (Sf 3,16-17)

(b); chegando àqueles que acolhem a autenticidade total da perícope (c).

116 Cf. RENAUD, B., Sophonie, p. 178-180.

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45

a) não-autenticidade total de Sf 3,14-17

a.1) Sofonias, um autor fictício pós-monárquico, colocou por escrito um material

de nível pré-composicional, que poderia ser originário de um profeta real e do

tempo de Josias. Esta afirmação leva em consideração que no livro não há

referências nem expectativas de aparecimento de uma nova elite social-política,

um outro rei piedoso, oficiais ou juízes. O único rei na sociedade ideal será

YHWH e o povo será formado pelos humildes e pobres. A sociedade é convidada,

então, a se identificar com aquela de Sf 3,14-15, que não são os ouvintes-leitores

do profeta, mas uma Jerusalém do futuro. Embora Sf 3,16-17 possa ser uma

adição, não parece refletir uma audiência diferente da anterior. Então, Sf 3,14-17

não seria material sofoniano e pertenceria ao nível composicional.117

a.2) Concorda com o pensamento anterior (a.1), mas, diferentemente, acredita

haver uma grande probabilidade de Sf 3,14-20, e não somente os v. 14-17, ser

uma interpretação refletida do redator que incluiu o dado de esperança no final do

livro.118

a.3) Sf 3,14-17 é uma glosa tardia, apresentando-se como um oráculo pós-exílico.

Sf 3,16-17 apresenta uma forma literária muito próxima ao dêutero-Isaías. A

exortação à alegria assemelha-se a Is 12,6 e ainda com Is 54,1; Zc 2,14; 9,9. A

menção de YHWH como rei de Israel lembra a perspectiva teológica nos Salmos

do Reino (cf. Sl 96-100). Sua datação recairia no pós-exílio imediato.119

a.4) Muitos dados falam a favor de uma redação principal do livro na época

exílica ou pós-exílica imediata, como uma legitimação das palavras acusatórias da

culpa da classe alta por ocasião do exílio da Babilônia (587 a.C.). Desta forma é

discutível colocar na época pré-exílica tardia Sf 3,14-15, que é muito próximo a

Mq 4,6-8 e Zc 9,9-10, textos certamente mais tardios. Enquanto Sf 3,16-20 é tido

por certo como sendo do período pós-exílico.120

a.5) O convite à alegria, com todas estas manifestações, é similar ao dêutero-Isaías

(cf. Is 41,16; 49,13). As razões apresentadas são as mesmas, ou seja, a retirada do

castigo, o afastamento dos inimigos e o retorno de YHWH para o meio do povo.

117 Cf. BEN ZVI, E., A Historical-Critical Study of the Book of Zephaniah, p. 35.355-356. 118 Cf. BOADT, L., Zephaniah, p. 207. 119 Cf. RENAUD, B., Le livre de Sophonie, p. 24-25. 120 Cf. ZENGER, E., Einleitung in das Alte Testament, p. 519.

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46

Esta proclamação surge como um louvor pela libertação proporcionada por

YHWH a seu povo. A disposição das sentenças nas frases, palavra por palavra,

neste tipo de oráculo de salvação, ocorre também em escritos de outros profetas

(cf. Jl 2,21.23; Zc 2,10; 9,9).121

a.6) Os oráculos que aparecem em Sf 3,14-20 não dão a entender que seja apenas

uma salvação parcial que se manterá por mais algum tempo, por isso pressupõem

adições posteriores à época do profeta. Sf 3,14-15 indicando influência dêutero-

isaiana poderia ser datado no pós-exílio imediato (539-520 a.C.), enquanto Sf

3,16-20 seria ainda mais posterior.122

a.7) A única ocorrência destes quatro verbos no imperativo, juntos num mesmo

versículo, aparece em Sf 3,14-15. Nas passagens dos profetas pré-exílicos, de

Isaías e de Jeremias é difícil encontrar indícios do uso destes verbos para exprimir

a alegria de Israel.123 Contudo, encontra-se a ocorrência de !nr – xmf – zl[ para

mencionar a alegria provocada pela ação salvífica de YHWH em prol do povo no

dêutero-Isaías (cf. Is 44,23; 49,13) e no trito-Isaías (cf. Is 61,7; 66,10).

Além desses, há outros textos, provavelmente pós-exílicos da literatura

profética, onde se pode citar a ocorrência destes verbos expressando a alegria do

povo.124 Todavia, não é possível levantar provas pré-exílicas da ocorrência destes

verbos manifestando a alegria, sem que haja problemas crítico-literários. Com

exceção de Is 9,2 e Hab 3, que dos quatro verbos usam apenas dois (nnr – [wr). 125

b) autenticidade parcial: Sf 3,14-15 autêntico e Sf 3,16-17 não-autêntico

b.1) Considera o aparecimento de Sofonias em torno de 630 a.C. Como alguns

versículos (Sf 1,18; 2,7.9b.10; 3,8) supõem o exílio, o livro deve ter recebido sua

121 C. Westermann lembra que os oráculos de salvação do tempo exílico e pós-exílico apresentam uma relação muito grande com os lamentos dos “remanescentes” (cf. Prophetic Oracles of Salvation in the Old Testament, p. 130). 122 Cf. ALBERTZ, R. Exile as Purification, p. 223. 123 Cf. Os 5,8; 9,1; Mq 4,9; 7,8; Ez 7,12; 25,6; 35,14; Ab 1,12. 124 Cf. Hab 3,18; Zc 2,14; 4,10; 9,9; 10,7; Jl 2,21.23. 125 J. IHROMI também explicitou que estes verbos tendem a aparecer no material de Jeremias considerado “secundário” (!nr em Jr 31,7; [wr em Jr 50,15; xmf em Jr 31,13; 43,13; 50,11 [qere]; zl[ em Jr 11,15; 50,11 [qere]); 51,39; no material “secundário” do proto-Isaías (!nr em Is 12,6; 24,14; 35,6; [wr em Is 15,4; xmf em Is 14,8; 25,9; 39,2; zl[ em Is 23,12); e no dêutero e trito-Isaías (!nr em Is 42,11; 44,23; 49,13 54,1; 61,7; 65,14; xmf em Is 65,13; 66,10; [wr em Is 42,13; 44,23), chamando a atenção de que xmf ocorre no trito-Isaías e não no dêutero-Isaías, enquanto [wr ocorre no dêutero-Isaías e não no trito-Isaías (cf. Die Häufung der Verben des Jubelns in Zephanja III 14f., 16-18, p. 106-110).

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forma final no exílio (Sf. 1,1–3,15), com Sf 3,14-15 originário do profeta. Sf 3,16-

20 só poderia provir do pós-exílio tardio, porque o texto fala do retorno dos

dispersos.126

b.2) Aceita-se Sf 1,1-18; 2,1-6.8-9a.11-15; 3,1-10a.bb-15 como de Sofonias. No

pós-exílio o livro teria sofrido complementações em vista do destino futuro dos

que se encontravam na diáspora. Um destes acréscimos seria Sf 3,16-20.127

c) autenticidade total de Sf 3,14-17

c.1) Sofonias foi a primeira voz profética dirigida a Judá depois de Isaías e

Miquéias. O conteúdo de Sf 3,14-17 teria sido comunicado ao povo entre os anos

612–609 a.C., após a queda de Nínive, capital da Assíria, e depois do mau êxito

da reforma josiânica, que tinha em sua base a pregação de profetas como Sofonias

e Jeremias. O c. 3 traz uma série de oráculos de Sofonias e, com o fracasso da

reforma, Sf 3,14-17 poderia muito bem ter sido proclamado após o encerramento

da atuação do profeta.128

c.2) Situando o ministério de Sofonias entre os anos 630–625 a.C., considera-se

como autêntico o texto de Sf 3,14-17, porque não haveria discrepância com a

perícope anterior, Sf 3,8-13, uma vez que a dualidade Israel–nações estrangeiras

continua e porque a linguagem usada não seria fruto de uma reflexão profunda,

nem de uma inspiração, mas do entusiasmo do profeta que convoca Sião–

Jerusalém ao júbilo por ela continuar a habitar o monte santo e por estar próxima

de YHWH.129

c.3) Sf 3,14-17 estaria perfeitamente em sintonia com a concepção de Sofonias a

respeito de Jerusalém, de Israel e da monarquia. Além disso, se algo do texto fosse

tirado, deixaria uma lacuna importante no que se refere ao livro como um todo. As

duas subunidades (v. 14-15 e v. 16-17) dentro deste texto seriam na realidade uma

duplicação, mas estariam dentro dos recursos comuns da poesia hebraica,

principalmente para conseguir um paralelismo.130

126 Cf. RUDOLPH, W., Zephanja, 255-256. 127 Cf. LOHFINK, N., Zefanja und das Israel der Armen, p. 102. 128 Cf. Achtemeier acrescenta que Sofonias pode ter sido um membro do grupo profético levítico que estava por trás da reforma deuteronômica, que teria como membro também Jeremias e mais tarde o trito-Isaías. Estes reformadores teriam uma retórica comum (cf. Zephaniah, p. 61-62.80). 129 KELLER, C.-A., Sophonie, p. 181.213. 130 Cf. SPREAFCIO, A., Sofonia, p. 25.

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48

c.4) O v. 14, iniciando com exortações imperativas, com verbos que traduzem

“regozijo” e “canto de alegria”, seguidos pelos vocativos ligados ao povo eleito,

evocaria o estilo do dêutero-Isaías, de acordo com Is 54,1 (cf. ainda Is 44,23;

52,2). Todavia, embora o texto seja uma proclamação da salvação operada por

YHWH, quanto ao vocabulário destes imperativos haveria pouca ou nenhuma

ligação entre estes dois profetas. No dêutero-Isaías não está presente a expressão

ble-lk'B. (v. 14c), “de todo coração”, característica da linguagem deuteronômica; a

expressão %Ber>qiB. (v. 15c.17a), “no teu meio”, e %Ber>qimi (v. 11), “do teu meio”; o

verbo hnp (v. 15b), significando “expulsar”, só aparece junto com o objeto direto

“caminho” no sentido de “preparar” (cf. Is 40,3; 57,14; 62,10); e a expressão

hx'm.fiB. (v. 17c), “com regozijo” ligado a YHWH, ocorre apenas em Is 55,2 (e

hx'm.fii em Is 35,10; 51,3.11) relacionado ao povo eleito. A partir destas

observações, é possível considerar Sf 3,14-17 como um oráculo genuíno do

profeta e até se poderia propor o inverso; Sofonias é quem teria influenciado o

pensamento sobre a alegria do dêutero-Isaías.131

Em síntese, para os críticos que se posicionam pela não-autenticidade de

Sf 3,14-17, o autor do escrito seria fictício e teria trabalhado em um material

pertencente a um profeta do tempo de Josias.

Aqueles que dividem o texto de Sf 3,14-17 em duas subunidades,

geralmente aceitam Sf 3,14-15 como autêntico, enquanto rejeitam a autenticidade

de Sf 3,16-17.

Sobre a autenticidade de Sf 3,14-17, pode-se colocar o pensamento de

Spreafico a respeito da ligação entre história e profecia. Nos estudos mais antigos,

quando a ação profética era avaliada, levava-se em conta que os oráculos

proféticos eram considerados como previsões de eventos futuros, que se

realizariam na vida de Israel ou num futuro imediato. Desta forma, não era

encontrada qualquer dificuldade quando o profeta falava de eventos estranhos a

seu tempo. Os críticos, ao abandonarem esta concepção da correspondência entre

os eventos históricos e o anúncio profético, começaram a procurar acontecimentos

que estivessem ligados aos oráculos.132

131 Cf. HOLLADAY, W. L., Reading Zephaniah with a concordance, p. 683-684. 132 Cf. SPREAFICO, A., Sofonia, p. 64.

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49

Numa visão geral das colocações, não há uma justificativa bastante forte

para postergar o texto de Sf 3,14-15, retirando dele sua autenticidade. Porque a

conjuntura da época de Sofonias evidenciava a Assíria, da qual o reino de Judá era

vassalo, dando mostras de fraqueza e a grande expectativa com o reinado de

Josias, não só na parte religiosa com a reforma, mas também na parte político-

econômico-social, com a possibilidade de independência e aumento territorial.

Diante deste quadro, é possível supor a intuição do profeta quanto aos

acontecimentos de um futuro muito próximo; quando ele começa a exortar a

comunidade a alegrar-se com a realidade próxima da libertação de todo tipo de

idolatria e da sua independência, podendo sonhar com um futuro promissor.133

Contudo, não se pode afastar a hipótese do texto ter sido reinterpretado

dentro do contexto do exílio e pós-exílio imediato. Porque a morte de Josias, o

fracasso da reforma, a ascensão da Babilônia com a posterior devastação de

Jerusalém, a destruição do templo e o exílio tornam-se ocasiões para uma releitura

da profecia de Sofonias.

Mais tarde (538-520 a.C.), quando a dominação da Babilônia havia terminado e

a liberdade alcançada através do edito de Ciro, os primeiros exilados começam a

retornar para a terra prometida, deixando para trás a desgraça do desterro. A volta para

casa, porém, não estava sendo muito animadora, ainda atuavam as conseqüências

desoladoras da catástrofe de Jerusalém. Uma terra devastada, com os muros da cidade

cheios de brechas e o grandioso templo construído por Salomão destruído.

Este momento da história do povo sugere também um outro momento

propício a uma releitura da profecia de Sofonias, levando o autor a uma nova e

grande exortação à alegria pela liberdade recebida como bênção de YHWH e

agora vivida.

2.4.

Organização do texto

A partir da análise do esquema abaixo se explicitará a divisão das seções.

133 M. A. Sweeney diz que dentro desta perspectiva do julgamento de YHWH contra Jerusalém– Israel, devido aos pecados cometidos, há a possibilidade de ver neste contexto da invasão dos assírios a punição de YHWH. Nos séculos VIII e VII eles foram os maiores inimigos de Israel e Judá. A iminente queda do reino da Assíria durante o tempo de atuação do profeta no reino de Josias, tornava-se um motivo para ver aí o momento de restauração de Jerusalém e Israel também por ação de YHWH (cf. Zephaniah, p. 198-199).

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50

Os extremos do texto estão em relação, apresentam termos correlatos: yNIr"

(v. 14a) com hN"rIB. (v. 17e) - yxim.fi (v. 14c) com hx'm.fiB. (v. 17c); e possuem

similitude de lexemas em torno do júbilo: W[yrIh' (v. 14b) - yzIl.['w> (v. 14d) - fyfiy"

(v. 17c) - lygIy" (v. 17e). No v. 14, há uma exortação à alegria dirigida a um

destinatário específico: filha de Sião – Israel – filha de Jerusalém, visando

evidenciar o que YHWH fez em seu favor. Já nos versos 17c-e é o próprio

YHWH que se demonstra jubiloso com o seu feito em prol de Sião.

O conteúdo dos v. 14-15b está articulado num paralelismo sinonímico. Eles

possuem um teor temático próximo e que preparam os v. 15c-17. Os lexemas

confirmam este conteúdo, pois mostram que o sujeito, o destinatário e as ações se

repetem em alternância terminológica.

No meio de todas as frases verbais com predicados dinâmicos e iniciativos,

surgem, em posições estratégicas, duas orações nominais estáticas (v. 15c.17a),

chamando a atenção. Estas sentenças têm um teor idêntico e apresentam o mesmo

DESTINATÁRIO SUJEITO AÇÃO

Adj.Adv.

Tempo

Adj.Adv

Lugar

Adj.Adv.

Modo

Obj.Dir.

Obj. Ind.

Vocativo

Aposto

Núcleo

Predicação

Verbal

14a

14b

14c

14d

15a

15b

15c

15d

16a

16b

16c

17a

17b

17c

17d

17e

dA[

aWhh; ~AYB ;

%Ber>qiB.

$Ber>qiB.

ble-lk'B.

hx'm.fiB.

Atb'h]a;B.

hN"rIB.

%yIj;P'v.mi

%bey>ao

[r"

~Øil;v'Wryli

%yIl;['

%yIl;['

!AYci-tB;

laer"f.yI

~Øil'v'Wry> tB;

!AYci

laer"f.yI %l,m,

%yIh;l{a/

rABGI

hw"hy>

hw"hy>

%yId"y"

hw"hy>

yNIr"

W[yrIh'

yxim.fi

yzIl.['w>

rysihe

hN"Pi

yair>yti-al{

rmea'yE

yair"yTi-la;

WPr>yI-la;

[:yviAy

fyfiy"

vyrIx]y:

lygIy"

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51

sujeito, hwhy, acoplado a um aposto que especifica a forma como ele se apresenta

laer"f.yI %l,m, e %yIh;l{a/, e o local em que se encontra %Ber>qiB.. Estas frases parecem

soar como um refrão.

Pela distribuição terminológica, confirma-se que Sf 3,14-17 é uma unidade

bem articulada. Esta afirmação tem a seu favor duas constatações oriundas do

próprio texto. A primeira delas está na existência de duas séries ternárias, uma

ligada ao sujeito passivo que sofre a ação: !AYci-tB; “filha de Sião”, laer"f.yI “Israel” e

~Øil'v'Wry> tB; “filha de Jerusalém”, e a outra funda-se no sujeito ativo que pratica a

ação, hw"hy>, que aparece citado três vezes (v. 15a.15c.17a), como os termos que

dizem respeito ao destinatário mencionado com três diferentes nomes.134

A segunda constatação encontra-se nos três nomes citados no v. 14 como

destinatários, que vão reaparecer nos versos seguintes (v. 15c.16ab), embora não

na mesma ordem. Enquanto, o sujeito da ação, na posição que ocupa no texto,

mostra que o escrito desenvolve-se em três momentos.

Num primeiro momento há uma formulação das palavras de modo a deixar

entrever dois sujeitos. Onde uma exortação ao regozijo endereçada a Jerusalém

(sujeito passivo) vem seguida com a justa motivação pelas ações de YHWH

(sujeito ativo).

Num segundo momento há o desenvolvimento das ações do sujeito passivo.

Logo após a declamação do refrão há a apresentação das ações de Jerusalém que

são aguardadas em vista do que é apregoado pelo refrão, que mostra a presença do

sujeito ativo. Onde o “não” (al{ – la;), que aparece em três ações verbais, é motivo

de esperança.

Num terceiro momento há o desenvolvimento das ações do sujeito ativo.

Logo após a segunda declamação do refrão inicia-se a apresentação das ações de

YHWH em favor de Jerusalém, através de quatro verbos, que ratificam a

esperança do sujeito passivo.

Nesta alternância entre sujeito ativo e sujeito passivo é possível observar que

nem YHWH nem Jerusalém se encontram na posição sintática de um segundo

sujeito, mas ambos estão no mesmo nível, como se fossem atores que se revezam

no desenrolar desta ou daquela cena.135

134 Cf. SPREAFICO, A., Sofonia, p. 45. 135 Cf. WEIGL, M., Zefanja, p. 219.

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52

Um detalhe chama a atenção do ouvinte-leitor. No meio de todo o texto,

emoldurado pelos dois refrões e ladeado pelas orações em forma negativa,

encontra-se na referência que evoca o yôm YHWH, aWhh; ~AYB; (v. 16a), que é o

tema que perpassa todo o escrito de Sofonias.

Assim, uma das possibilidades de organização do texto é dispô-lo em três

seções:

v. 14-15b Hino de exultação com justa motivação: Jerusalém – YHWH 1ª seção

v. 15c-16c Discurso: ações de Jerusalém – o “não” é motivo de esperança 2ª seção

v. 17 Discurso: ações de YHWH – ratificam a esperança de Jerusalém 3ª seção

Em síntese, esta é uma palavra de salvação declarada pelo profeta e dirigida

ao ouvinte-leitor progressivamente em formas distintas. Inicia com uma

exortação, que se tornou uma forma própria dos profetas (exortação + motivo);

este chamado segue em forma de discurso falando das esperadas ações dos

exortados e continua num segundo discurso sobre as ações do motivador. Ambos

os discursos são introduzidos por um refrão.

2.4.1.

A primeira seção, v. 14-15b

A seção inicial apresenta uma chamada profética em dois momentos: uma

exortação à alegria feita a Sião–Israel–Jerusalém, imediatamente seguida pela

apresentação dos motivos que justificam esta atitude. As razões se fundamentam

nas ações favoráveis de YHWH em prol de seu povo.

Em esquema, a organização dos v. 14-15b pode ser proposta deste modo:

1° momento: Exortação à alegria sujeito passivo

yNIr" (14a) !AYci-tB; W[yrIh' (14b) laer"f.yI yxim.fi (14c) yzIl.['w> (14d) ~Øil'v'Wry> tB;

2° momento: Motivação sujeito ativo

%yIj;P'v.mi Rysihe (15a) hw"hy> %bey>ao hN"Pi (15b)

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53

Esta exortação (v. 14) é muito forte, vindo através de quatro imperativos

sinonímicos (yNIr" – v. 14a, W[yrIh' – v. 14b, yxim.fi – v. 14c, yzIl.['w> – v. 14d), que

servem para dar uma especial ênfase à temática da alegria. Este versículo não

possui elementos distintos que possam deixar entrever um outro tipo de temática.

Vê-se, porém, que a sede de tudo isto fica evocada na locução “de todo o

coração” (v. 14d), marcando não só um aspecto humano individual, mas do mais

íntimo da comunidade inteira, envolvendo-a totalmente em todas as suas

dimensões. O povo de Israel (v. 14b) fica sublinhado e entrelaçado entre as

locuções que se tocam em reciprocidade: “filha de Sião” (v. 14a) e “filha de

Jerusalém” (v. 14c).136

Dois verbos deste apelo à alegria, que deve ser “de todo coração”, estão

interligados pela partícula conjuntiva aditiva w, a qual estabelece a conexão das

duas ações com tal locução, mostrando a ligação entre o ser e o agir do destinatário,

tanto no âmbito interno (“regozija” – v. 14c) como também no âmbito externo

(“celebra” – v. 14d).137

Na análise dos quatro verbos verifica-se a seguinte ordem de apresentação:

dois verbos como manifestação exterior (v. 14ab), seguido do terceiro verbo que

mostra uma emoção interior (v. 14c) e no último há a exteriorização do sentimento

interior (v.14d).

Em seguida, surgem as razões apresentadas ao povo para levá-lo ao júbilo,

vindo através de duas ações verbais na 3ª pessoa m.sg. (rys.he – v. 15a, hN"Pi – v. 15b)

com os seus respectivos objetos de atuação (%yIj;P'v.m – v. 15a, %bey>ao – v. 15b),

denotando que o orador está se referindo ao sujeito ativo: hwhy (v. 15a).

A partir deste movimento entre sujeito passivo e sujeito ativo, o profeta passa

a descrever as conseqüentes ações de cada um.

2.4.2.

A segunda seção, v. 15c-17

O primeiro discurso é dirigido ao sujeito passivo, descrevendo as ações

esperadas por parte dele.

136 M. A. Sweeney diz que o v. 14 comporta, então, a premissa retórica ou parenética básica para os versículos seguintes (cf. Zephaniah, p. 195). 137 Cf. Joüon-Mur., § 115c.

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54

1º Discurso: Ações próprias do povo

Refrão: CAUSA %Ber>qiB. hw"hy> laer"f.yI %l,m, (15c) parte do sujeito ativo

dA[ [r" yair>yti-al{ (15d) antes (al{) O yôm yôm yôm yôm YHWH EFEITO (16a) ~Øil;v'Wryli rmea'yE aWhh; ~AYB; sobre o depois (la;)

sujeito passivo !AYci yair"yTi-la; (16b)

%yId"y" WPr>yI-la; (16c)

O primeiro discurso iniciado pelo refrão (v. 15c) mostra o porquê das

atitudes do povo. A presença de YHWH “no meio do povo” como “rei” é a causa

que justifica os efeitos do “não temor” (v. 15d.16b) e do “não desanimar” (v.16c).

Três são as ações verbais negativas: “não temerás” (v. 15d.16b) e “não

desfalecerão tuas mãos” (v. 16c). Todavia, estas exortações em forma negativa

têm um teor positivo. A primeira delas yair>yti-al{ com a partícula al{ tem um valor

de ordem permanente, enquanto nas duas outras yair"yTi-la; e WPr>yI-la; com a

partícula la; têm um sentido de ordem imediata.138

Estas partículas negativas são distintas, porque a de ordem permanente vem

em seguida ao que é dito de YHWH no refrão; enquanto as de ordem imediata

vêm após a colocação do aWhh; ~wOYB; (v. 16a).139

Esta expressão aWhh; ~wOYB; no meio da palavra profética parece estar ligando

o tema da alegria do povo com o tema da alegria de YHWH, geradas por este tão

grande dia.

2.4.3.

A terceira seção, v. 17

O segundo discurso continua sendo dirigido ao sujeito passivo, porém

descrevendo as ações por parte do sujeito ativo.

138 Cf. Joüon-Mur., § 116j. 139 Segundo alguns autores, esta fórmula seria um reenvio à expressão yAm YHWH (cf. JENNI, E. “~wOy”, 997; SPREAFICO, A. Sofonia, 98). Um aprofundamento ulterior será feito no comentário.

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55

2º Discurso: Ações próprias de YHWH Refrão: CAUSA $Ber>qiB. %yIh;l{a/ hw"hy> (17a) parte do sujeito ativo

[:yviAy rwOBGi (17b) sobre o sujeito passivo EFEITO fyfiy" hx'm.fiB. %yIl;[' (17c) sobre o vyrIx]y: Atb'h]a;B. (17d)

sujeito ativo lygIy" hN"rIB. %yIl;[' (17e)

O segundo discurso iniciado pelo refrão (v. 17a) mostra quais são as atitudes

de YHWH para com seu povo, uma vez que ele está “no teu meio” como “teu

Deus” e isto é motivo para as quatro ações provenientes de YHWH recaírem sobre

ele próprio.

Na análise desses quatro verbos ([vy – v. 17b, fyf / fwf – v. 17c, vrx – v.

17d, lyg – v. 17e), percebe-se que eles se sucedem numa ordem similar aos verbos

da 1ª seção: dois verbos como manifestação exterior (v. 17bc), seguido do terceiro

verbo que mostra uma emoção interior (v. 17d) e no último há a exteriorização do

sentimento interior (v. 17e). O fato de YHWH ser declarado “ teu Deus” leva à

primeira ação verbal que vai gerar as três ações subseqüentes.

Nos três verbos que denotam a alegria de YHWH, percebe-se que há um

jogo de sentimentos. O primeiro e o último verbos, que são expressões de atitudes

externas de algo que brota no íntimo do ser (“alegrar-se-á” e “jubilará”),

emolduram o segundo verbo que manifesta justamente esta atitude interior

(“guardará silêncio”).

Este texto apresenta uma espécie de moldura. Duas das raízes utilizadas no

início do texto !nr (v. 14a) e xmf (v.14c) para exortar Sião–Israel–Jerusalém à

alegria, reaparecerão no seu fechamento em forma de substantivos, em ordem

inversa, hx'm.fiB. (v. 17c) e hN"rIB. (v. 17e) para mostrar o modo como YHWH se

alegrará por ela.

A posição de Jerusalém, de um povo chamado à alegria pela sua nova

situação proporcionada por YHWH (1ª seção), passa a ser ela própria o objeto da

alegria de YHWH (3ª seção). Isto pode ser comprovado pela dupla colocação da

expressão %yIl;[' (v. 17c.e).

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56

2.4.4.

A estruturação do texto

A análise da organização do texto mostra que, após a exortação à alegria

dirigida ao povo e depois de discorrer sobre as razões que fundamentam tal

manifestação de regozijo (1ª seção), segue-se a exposição das atitudes exigidas ao

povo (2ª seção), que acabam resultando na razão do próprio YHWH exultar de

alegria (3ª seção).

A visão de conjunto exposta nas três seções em que o texto aparece

disposto, aponta para uma estruturação quiástica bem articulada. Vários são os

estudiosos que desdobram o texto dentro de lógica simétrica.140

Todavia, esta lógica é trabalhada a partir de uma unidade maior, onde os

particulares que foram acima evidenciados nas seções não aparecem claramente.

Partindo do princípio de que cada unidade apresenta uma integridade interna,

Baker desenvolve Sf 3,14-17, disposto em 6 + 1 + 6, assim:141

A O cantar de Sião (v. 14a)

B Os gritos de alegria de Israel (v. 14b)

C A alegria de Jerusalém (v. 14cd)

D A libertação de YHWH (v. 15ab)

E A presença de YHWH, o rei (v. 15c)

F Mais nenhum temor (v. 15d)

G A mensagem futura de Jerusalém (v. 16a)

F’ Mais nenhum temor (v. 16bc)

E’ Presença de YHWH, o Deus (v. 17a)

D’ O salvador poderoso (v. 17b)

C’ A alegria de Deus (v. 17c)

B’ O silêncio de Deus (v. 17d)

A’ O cantar de YHWH (v. 17e)

140 A estruturação quiástica apresenta uma extensão variável de acordo com o critério adotado pelo estudioso para a delimitação da unidade. Assim, para Sf 3,9-20 (cf. MOTYER, J. A., Zephaniah, p. 902); para Sf 3,8-20 (cf. DORSEY, D. A., The Literary Structure of the Old Testament, p. 313); para Sf 3,6-20 (cf. LOHFINK, N., Zefanja und das Israel der Armen, p. 104; GORGULHO, G., Sofonias e o valor histórico dos pobres, p. 34); para Sf 3,6-15 (cf. WEIGL, M., Zefanja und “das Israel der Armen”, p. 253). 141 Cf. BAKER, D. W., Zephaniah, p. 87-88. Outras estruturações quiásticas são apresentadas por: MOTYER, J. A., Zephaniah, 956; SPREAFICO, A., Sofonia, p. 188; IRSIGLIER, H., Zefanja, p. 406.

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57

Em tal estruturação levou-se em consideração o conteúdo presente em cada

verso, apontando-se as suas relações internas. Entretanto, pode-se propor uma

estrutura alternativa para Sf 3,14-17 possibilitando a utilização e visualização do

paralelismo concêntrico, que valoriza os contatos terminológicos apresentados nas

três seções.

Com isto, temos a seguinte estrutura:

A A alegria de Sião dada por YHWH (v. 14)

B As razões dessa alegria (v. 15ab)

C Pela presença de YHWH no meio do povo (15c)

D A atitude exigida (15d)

E Naquele dia [da ação de YHWH] (16a)

D’ As atitudes exigidas (16bc)

C’ Pela presença de YHWH no meio do povo (17a)

B’ A razão dessa alegria (v. 17b)

A’ A alegria de YHWH por Sião (v. 17c-e)

Este quiasmo mostra que YHWH, ao lado da temática da alegria, ocupa o

centro da perícope. A lógica encontrada parte da exortação à alegria que Sião deve

manifestar proporcionada por YHWH (A), seguida pelos motivos que

fundamentam esta alegria (B), devida à presença de YHWH, como rei, no meio do

povo (C), de modo que, em contrapartida, uma tomada de posição é requerida (D).

Naquele dia [da ação de YHWH] (E) é enviada à Sião uma mensagem exigindo

um comportamento compatível (D’) com a presença divina (C’), fundamento da

alegria (B’) e razão pela qual o próprio YHWH figura como sujeito e objeto da

própria alegria que proporciona a Sião (A’).

2.4.5.

Gênero literário

A unidade de Sf 3,14-17 combina as exortações à alegria através de

imperativos (cf. v. 14) com a imediata apresentação dos motivos que justificam tal

estado de ânimo (cf. v. 15ab). Esta disposição dos elementos assemelha-se muito à

estrutura de um hino de louvor. Alguns estudiosos, acrescentando a estas

similaridades o motivo da realeza divina (cf. v. 15c), classificam Sf 3,14-15 como

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58

um hino de entronização.142 Outros críticos, porém, fazem objeção a esta

qualificação.143

Aqueles que vêem Sf 3,14-17 como um hino de entronização, explicam que

as idéias e a terminologia usadas foram ganhando espaço nas festividades

relacionadas com o Ano Novo, principalmente naquelas em que se celebrava a

entronização do rei. Estes hinos iniciavam com uma chamada à alegria, usando

com muita freqüência o verbo [wr (cf. Sl 47,2; 98,4.6).144

Uma das objeções feitas para que não seja um hino de entronização

encontra-se no destinatário da mensagem. A explicação dada é a de que os

imperativos femininos são típicos dos oráculos proféticos quando estão fazendo

uma exortação à alegria; enquanto nos hinos isto é atípico.145

Assim, os imperativos femininos nas exortações de alegria faziam parte dos

oráculos de obtenção de um objetivo. Estes eram dirigidos à mulher nos cultos de

fertilidade sexual. Aos poucos, os profetas começaram a direcioná-los a Israel ou

Sião, personificando-as como mulher. Talvez, este desenvolvimento tenha se dado

no culto do templo. Alguns profetas utilizavam expressões próprias do culto em

seus oráculos (por exemplo: Isaías e Oséias) e principalmente em festas de Ano

Novo, que eram ligadas à entronização de YHWH.146

Estas imagens do culto à fertilidade podem ocorrer em alguns oráculos (cf.

Is 54,1; Jl 2,21.23), porém parece uma explicação bastante forçada para justificar

as origens do gênero literário hínico. É difícil pensar neste contexto de culto à

fertilidade em Sofonias.147 Como também apresenta dificuldade a idéia de ser um

142 Cf. BARSOTTI, D., Meditazione sul libro di Sofonia, p. 157-158; KAPELRUD, A. S., The Message of the Prophet Zephaniah, p. 39-40. 143 Cf. RUDOLPH, W., Zephanja, p. 298; ESZENYEI SZÉLES, M., Zephaniah, p. 111; SMITH, R. L., Zephaniah, p. 143-144; MASON, R., Zephaniah, p. 25. 144 A. S. Kapelrud explica que nestes grandes festivais YHWH era homenageado como rei pelo seu povo e, a seguir, promessas para o novo ano eram enviadas ao povo pelo rei, sacerdote ou profeta em nome de YHWH (cf. Eschatology in Micah and Zephaniah, p. 260). Assim também, SEYBOLD, K. Zephanja, p. 116. 145 Esta é a opinião de Crüsemann lida em KAPELRUD, A. S. The Message of the Prophet Zephaniah, p. 39. Indo mais além L. Sabottka afirma que eles são mais atípicos ainda nos salmos de entronização (cf. Zephanja, p. 124-125). 146 F. Crüsemann dentro desta idéia, toma Is 12,4-6 como ponto de partida para o estudo do texto de outros profetas, dentre eles Sf 3,14-15; in: KAPELRUD, A. S. The Message of the Prophet Zephaniah, p. 39. Contudo, R. Mason diz que se deve ter cuidado na consideração da origem cúltica do hino, porque isto poderia reduzir a ação de YHWH à derrota militar dos inimigos do povo, esvaziando o sentido da libertação de todos os tipos de pecados apontados antes no próprio livro (cf. Zephaniah, p. 25). 147 Esta explicação apresentada por M. H. Floyd, serve para objetar a teoria de Crüsemann (cf. Zephaniah, p. 244-245).

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hino cantado na presumida festa de entronização de YHWH. Se este texto fosse

assim admitido, dever-se-ia considerá-lo um discurso da sucessão periódica do

domínio de YHWH, como se ele se afastasse e fosse novamente introduzido. Isto

também não condiz com a leitura do restante do livro.148

Outros críticos são pelo parecer de que se trata de um hino eminentemente

escatológico de louvor que abre a era messiânica, pronunciado na festa da

entronização do rei YHWH. Toda a comunidade renovada é chamada a participar

do rito com grande alegria. Depois de todo o medo, de todo terror, tem início uma

era de paz que pede uma atmosfera festiva.149

Neste ponto, mostra-se necessária uma comparação entre as exortações

proféticas ao júbilo e os hinos de louvor, sendo possível levantar algumas

diferenças:

• Nos chamados proféticos encontra-se o destinatário na 2ª pessoa f.sg., porque é

ao gênero humano como tal que este se direciona (cf. Is, 12,6; Jl 2,23). Nestas

manifestações, embora celebrem a atuação de YHWH, não estão dirigidas a ele.

• Nos hinos de louvor, de acordo com a pessoa do endereçamento há uma

mudança: se é ao povo, está na 2ª m.pl. (cf. Sl 134; 135), se é a YHWH

diretamente, está na 2ª m.sg., (cf. Sl 131; 132) ou se indiretamente,

descrevendo-o, está na 3ª m.sg. (cf. Sl 99; 147).150

No caso de Sf 3,14, o vocativo aparece na 2ª pessoa f.sg. A alegria não se

deve a uma ação feita pelo próprio povo (cf. 1Sm 18,6-7), mas lembra o que

YHWH fez para libertá-lo de todos os tipos de opressão vivida pelos que são fiéis

aos preceitos divinos.

Por outro lado, a ênfase deste texto está colocada na presença de YHWH no

meio de seu povo (v. 15c.17a), sendo isto motivo de restauração e bênção. Neste

caso, deve-se colocar Sf 3,14-17 entre os oráculos de salvação.

Vários são os motivos que fundamentam os oráculos de salvação, como

especificados a seguir:

148 Cf. ESZENYEI SZÉLES, M., Zephaniah, p. 110. 149 Cf. BARSOTTI, D., Meditazione sul libro di Sofonia, p. 157-158; WALKER, L. L., Zephaniah, p. 562-563. 150 Cf. FLOYD, M. H., Zephaniah, p. 245. Como explica H. Irsiglier, estes verbos de expressão de alegria não possuem objeto preposicional, não se endereçando a alguém. Lingüisticamente, não se trata de uma alegria direcionada a alguém ou perante YHWH como é típico nos Salmos de Israel (cf. Sl 32,11; 33,1; 47,2; 66,1; 81,2; 97,12; 98,4.6; 100,1) que celebram a alegria (cf. Zefanja, p. 414).

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• lamento do povo – como tal não constitui um elemento do oráculo, mas o

profeta normalmente anuncia a resposta de YHWH às súplicas de seu povo151;

os oráculos exílicos e pós-exílicos estão estreitamente relacionados com os

lamentos do “resto” e a resposta se assemelha à linguagem de adoração;

• perdão e retorno de YHWH para o meio do povo – nesta resposta é claramente

anunciado ao povo que YHWH mais uma vez o beneficiará152;

• louvor a YHWH antecipado – aqui a proclamação é feita em forma de hino

(especificamente Sf 3,14-15; cf. Sf 3,16-17).153 Este louvor antecipador

geralmente é o único motivo do oráculo, encontrando eco no conteúdo e na

forma do dêutero-Isaías154 e em outros profetas.155

Em Sf 3,15c.17a a restauração da relação do povo com YHWH quer dizer

que mais uma vez ele reina no meio do povo (cf. Ez 10,18-19; Zc 2,10.12; Jl 2,27;

Mq 4,7b). Em todas estas passagens, há mais ênfase na presença de YHWH no

meio do povo do que na restauração em si. Isto mostra uma transição na

linguagem cúltica, onde é proclamado que YHWH é rei, como nos Salmos de

Jerusalém (cf. Sl 96; 98-99) que falam do reinado divino.

Em Sf 3,15d.16bc pode-se encontrar exortações de encorajamento para que

não haja temor, a fim de transmitir segurança. Este tipo de convite amiúde ocorre

nos profetas, principalmente no dêutero-Isaías (cf. Is 41,10.13.14; 43,1.5),

algumas vezes em Jeremias (cf. Jr 46,27.28; Lm 3,57) e ainda em outros profetas

(cf. Ez 2,63; Ab 2,5; Zc 8,13.15).156

A partir disto, quando a certeza da redenção torna-se muito grande e

evidente para os profetas, eles começam a proclamar exortações (de tipo

litúrgicas) ao povo.157 A forma estrutural como estes chamados são proferidos

151 Cf. Zc 10,6b; Os 14,8; Sf 3,17; Mq 7,7. 152 Cf. Zc 1,16.17b; Na 1,12b; Sf 3,17b. 153 C. Westermann diz que Sf 3,14-17 está dividido em duas partes e os imperativos que aparecem nos v. 14.16 permitem uma estreita relação entre os v. 14-15 e os v. 16-18a (cf. Prophetic Oracles of Salvation in the Old Testament, p. 94.131-135). 154 Cf. Is 40,9-11; 42,10-13; 44,23; 45,8; 48,20-21; 49,13; 51,3; 52,7-12; 54,1-2. 155 Cf. Zc 2,10; 9,9-10; 10,6b-7; Na 1,15. 156 A. Berlin explica que em geral estas exortações são usadas para introduzir um oráculo (cf. Zephaniah, p. 143-144). Para J. Vlaardingerbroek, estas palavras são caracteristicamente sacerdotais, mais tarde assumidas pelos profetas, que as usaram em seus oráculos de salvação (cf. Zephaniah, p. 213). H. Irsiglier acrescenta que a promessa “não temas” (Sf 3,16b), no estilo do antigo oráculo de salvação sacerdotal (ou profético) era em resposta a uma queixa do indivíduo (cf. Zefanja, p. 421). Com esta opinião concorda R. A. Bennett (cf. The book of Zephaniah, p. 665). 157 Cf. Is 12,6; 54,1; Jl 2,21; Zc 2,14; 9,9.

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torna-se, com o passar do tempo, um gênero profético: exortação à alegria +

especificações dos motivos para tal.158

Em síntese, o universo do texto é um conjunto de elementos que estão

ligados a um Sitz im Leben em um determinado momento histórico. Além disso, é

possível a existência de vários gêneros literários num texto e dentre estes haver a

predominância de um.159 Pode-se, então, dizer que Sf 3,14-17 é um oráculo de

salvação composto de uma parte hínica e de uma parte discursiva desdobrada em

duas alocuções, uma direcionada ao povo e outra a YHWH. Todavia, todos os

elementos e partes do texto estão tão estreitamente ligados que este não apresenta

rupturas nem tensões.

158 Cf. VLAARDINGERBROEK, J., Zephaniah, 206. Uma especificação do gênero de cada verso apresenta G. Krinetzki, que identifica neles síndromes bem marcadas (cf. Zefanjastudien, p. 157-166): − 14.15c – fórmula hínica pré-existente adotada pelos profetas, mas que na realidade introduz um

texto profético e não um hino; − 15a – fórmula jurídica que anuncia profeticamente um ato de justiça de YHWH; − 15b – apresenta um novo grande feito histórico-salvífico na linha da tradição da conquista de

terra; − 15d – supõe um oráculo salvífico sacerdotal na configuração profética; − 16a – antiga fórmula temporal de introdução profética, dando um cunho escatológico em

vista à consolação profética; − 16b – corresponde à linguagem dos oráculos de salvação sacerdotais; − 16c – indica a tradição da guerra santa e do grande yôm YHWH, também com a linguagem

dos oráculos de salvação sacerdotais e de consolação profética, tornando-se todo o v. 16 uma promessa de consolação;

− 17ab – fórmula proveniente da tradição hínica de Jerusalém, com o termo rwOBGI pertencente preferencialmente à linguagem de guerra, como uma metáfora para a intervenção de YHWH;

− 17c-e – continua a fórmula hínica; assim, a promessa de consolação do v. 16 torna-se no v. 17 um oráculo de salvação numa linguagem hínica.

159 Cf. SIMIAN-YOFRE, H., Diacronia: os métodos histórico-críticos, p. 100-104. Também M. H. Floyd diz que esta unidade é uma “chamada profética ao regozijo”, mas que tem a função de introduzir uma exortação profética relativa à salvação (cf. Zephaniah, p. 244).

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3

Comentário ao texto de Sf 3,14-17

3.1.

Hino de exultação com justa motivação: Jerusalém – YHWH: v. 14-15b

Exulta de alegria, filha de Sião; grita de alegria, Israel; regozija e celebra de todo coração, filha de Jerusalém. Revogou Yhwh tuas sentenças, expulsou teu inimigo.

Esta seção contém uma exortação à alegria dirigido a destinatários

específicos, mostrando um júbilo evidente, como o que se encontra em muitos

textos proféticos,160 seguido das razões que justificam tal alegria.

a) o convite à alegria

Quatro imperativos caracterizam esta exortação ao regozijo: yNIr" (exulta de

alegria) – W[yrIh' (grita de alegria) – yxim.fi (regozija) – yzIl.[' (celebra). Todos eles

são termos muito semelhantes, que exprimem a alegria. Ao traduzir, não se faz

uma notória diferenciação entre eles, embora exista algo sutil.

Uma destas diferenças está na manifestação da alegria própria destes verbos,

em três deles (!nr – [wr – zl[) ela aparece numa forma exteriorizada do estado de

ânimo de quem a está experimentando (cf. Is 24,14; Esd 3,11; Jr 11,15), ao passo

que em xmf há uma interiorização do mesmo sentimento (cf. 2Cr 7,10; Is 39,2).161

Esta emoção invisível pode ser deduzida através das demonstrações visíveis

expressadas pelos outros três verbos.162

Na totalidade da BH não se encontra em qualquer outra passagem a

ocorrência destes quatro verbos juntos. Isoladamente, porém, é possível encontrar

a utilização de todos os quatro verbos somente nos escritos proféticos de Isaías e

160 Cf. Is 12,6; 52,9-10; 54,1; 66,10-14; Jl 2,23; Zc 2,14; 9,9-10. 161 Cf. detalhado anteriormente no ponto 2.1, p. 16-28. 162 Cf. SPREAFICO, A., Sofonia, p. 183.

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Jeremias (cf. !nr: Is 12,6; Jr 31,7 – [wr: Is, 42,13; Jr 50,15 – xmf: Is 25,9; Jr 41,13

– zl[: Is 23,12; Jr 11,15).

Os verbos xmf e zl[, que estão no qal imperativo f.sg. dirigidos à “filha de

Jerusalém”, aparecem juntos apenas em duas outras citações em toda a BH (cf.

2Sm 1,20; Jr 50,11). Porém, elas são dirigidas aos filisteus e aos babilônios. Em

2Sm 1,20 Davi quer impedir a alegria dos filisteus pela morte de Saul; enquanto

em Jr 50,11 o profeta fala que, embora os babilônios se alegrem pela devastação

que no passado haviam causado a Israel, eles terão a mesma sorte.163 Podendo-se

perceber que não se relacionam com o contexto da passagem de Sf 3,14, que é

eminentemente de alegria para Jerusalém porque estes inimigos foram afastados, o

que ajuda a enfatizar a grandiosidade do momento, que deve ser celebrado ble-lk'B.

(de todo coração).

Como o coração abarca todas as dimensões da existência humana, é possível

referir-se ao homem em sua totalidade (cf. Gn 24,45; Ez 21,12). No AT, o termo

não visa somente à dimensão individual, mas principalmente leva em conta um

grupo inteiro de indivíduos, referindo-se ao ble de todos, como se fossem e

formassem um só coração (cf. Gn 42,28; Ex 35,29).164

E desta forma, o povo como um todo, unido num só coração, está sendo

exortado através da multiplicação das palavras sinônimas, que indicam júbilo. Isto

porque o profeta quer mostrar a exuberância do apelo. Os quatro verbos,

colocados um após o outro, mostram cada um por si e num convite crescente que

a alegria deve ser vivida intensamente.165

Esta alegria aparece quando o povo experimenta um júbilo tão intenso em

seu coração, que não consegue conter toda a emoção. Por isso, transborda de seu

peito todo esse sentimento, manifestado através de gritos triunfantes e fortalecido

163 Cf. SWEENEY, M. A., Zephaniah, p. 197-198. 164 O “coração” além de designar o órgão corporal (cf. 1Sm 25,37; Sl 37,15), abarca várias funções do homem: a) centro vegetativo (cf. Gn 18,5; Jó 31,9); b) centro emotivo (cf. Is 57,15; Jz 16,25); c) centro noético racional (cf. Pr 22,17; Jr 3,16); d) centro volitivo (cf. Sl 39,4; 1Rs 8,17); e) esfera religiosa (cf. Ez 11,19; 1Sm 24,6): cf. FABRY, H.-J., “ble”, GLAT, vol. 4, p. 636-682; STOLTZ, F., “ble”, DTMAT, vol. 1, p. 1176-1185; VINE, W. E.; UNGER, M. F.; WHITE Jr., W., “ble”, DicV, p. 82-84; WOLFF, H. W., Anthropology of the Old Testament, p. 40-58; EISSFELDT, O., “El corazón”, The Old Testament, p. 148-151. 165 Cf. MACKAY, J. L., Zephaniah, p. 292; ESZENYEI SZÉLES, M., Zephaniah, p. 111. Além disso, J. Ihromi explica que pela freqüência com que estes verbos que falam do júbilo e da alegria ocorrem no AT e aqui são colocados juntos, mostra que o orador da profecia de Sofonias, que os colocou neste hino, é, ele próprio, um grande anunciador da alegria (cf. Die Häufung der Verben des Jubelns in Zephanja III 14f., 16-18, p. 110).

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de expressões ruidosas de cânticos, risos, palmas, batidas com os pés, danças e

ruídos produzidos por instrumentos (cf. Sl 98; 100). Não deve haver nenhuma

restrição ou constrangimento para esta manifestação. Tal alegria já é sinal e

dádiva da nova bênção para Sião.166

O profeta, valendo-se destes quatro imperativos para levar o povo a este

estado de ânimo, que é de uma total e intensa alegria, o faz através de sentenças

que apresentam um paralelismo sinonímico e as endereça a três destinatários

particulares.

b) os destinatários do convite

b.1) !AYci-tB;

O substantivo !AYci (Sião) em muitas passagens refere-se aos arredores do

templo (cf. Is 35,10; Jr 31,6), em outras citações está relacionado com Jerusalém

(cf. Is 10,24; Jr 30,17) e até mesmo com o povo de Israel (cf. Sl 97,8; Is 1,27).

Porque em Sião, inicialmente, estava instalada a capital do reino unido e depois do

cisma (931 a.C.) ficou apenas a capital do reino do sul. Entretanto, raramente Sião

é citada como a capital de Judá (cf. Is 40,9).

A maioria das citações de Sião no AT está nos escritos poéticos e proféticos.

O salmista declara a ajuda que provém de Sião (cf. Sl 14,7; 20,3), assim como das

bênçãos (cf. Sl 128,5; 134,3) e que “de Sião, beleza perfeita, YHWH resplandece”

(cf. Sl 50,2). Profetas tais como Isaías, Jeremias, Joel, Sofonias e Zacarias (cf.

Is 24,23; Jr 31,6.12; Jl 3,5; Sf 3,15.17; Zc 9,9) falam de Sião como o centro no

qual YHWH agirá promovendo a salvação de Israel.167 À qual o profeta envia sua

segunda chamada.

b.2) laer"f.yI

O substantivo laer"f.yI (Israel), ao longo da história do povo eleito, foi

tomando uma variedade de significações:

• o nome recebido pelo patriarca Jacó, faz com que seus filhos sejam conhecidos

como os “filhos de Israel” (cf. Gn 32,32);

• o reino do norte era chamado de reino de Israel (cf. 1Rs 12,20);

166 Cf. IRSIGLIER, H., Zefanja, p. 414; EMMERSON, G., Zephaniah, p. 66. Em contrapartida, G. Rinaldi fala que este entusiasmo se apresenta como um idílio na fantasia imaginativa do profeta a respeito de uma comunidade ideal (cf. Sofonia, p. 1249). 167 Cf. HARTLEY, J. B., “!wOYci”, DITAT, p. 1282-1283; RENDTORFF, R. The Canonical Hebrew Bible, p. 577-578.

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• após a queda e deportação do reino do norte pela Assíria (722 a.C.), o reino do sul

ou de Judá passou a receber a designação de “Israel” (cf. 2Rs 21,8; Jr 2,14.31);

• encontra-se também a personificação do termo, representando o povo eleito que

saiu do Egito (cf. Ex 5,1);

• como uma entidade ideal, o resto dos deportados, na comunidade exílica e pós-

exílica (cf. Is 44,21; 49,3).168

Por estas várias significações, pode-se perceber que o termo laer"f.yI foi

fechando seu campo de abrangência, ou seja, caminhou do geral para o particular.

De todo o povo eleito proveniente dos filhos de Jacó–Israel chega-se a este resto

que retorna do exílio. Estes remanescentes devem ser entendidos como todo o

povo que permaneceu fiel à promessa de ter YHWH habitando no seu meio,

inclusive os que emigraram do reino do norte antes da queda de Samaria,169 e

agora habitam em Jerusalém. A estes são enviados os dois últimos convites.

b.3) ~Øil'v'Wry> tB;Þ

O substantivo ~Øil'v'Wry> (Jerusalém) indicava antes de tudo a sede do templo,

que abrigava a arca da aliança e somente em segundo lugar é que era considerada

a cidade de Davi. Os profetas pré-exílicos já não fazem a ligação de Jerusalém

como a residência do rei, mas como a cidade de Deus. Não é somente da arca que

provém a santidade de Jerusalém, mas também a sua unicidade e exclusividade.

Em Jeremias, Jerusalém passa a ser o trono de YHWH, o único lugar para o seu

culto.170 Porque o templo edificado na cidade de Jerusalém, escolhida por YHWH

para nela habitar (cf. Dt 12,13-14.18.21), tornava concreta a sua presença e a

partir dela abençoar todo o seu povo. O Templo tornou-se o centro de unidade das

doze tribos como povo da aliança do único Deus, YHWH (cf. 1Rs 8,14-21).171

168 Cf. ZOBEL, H.-J., “laer"f.yI”, GLAT, vol. 4, p. 45-50; BROWN, F.; DRIVER, S.; BRIGGS, C., “laer"f.y>”, BDB, p. 975; PAYNE, J. B., “laer"f.y>”, DIDAT, p. 1490-1491. 169 Cf. ROBERTS, J. J. M., Zephaniah, p. 222; WALKER, L. L., Zephaniah, p. 1506. Para G. Bernini, o profeta com as expressões “filha de Sião” e “filha de Jerusalém” estava se referindo, em sentido coletivo, aos habitantes da cidade, que é a capital de todo o reino (cf. Is 54,1; Zc 9,9). Entretanto, ao convocar “Israel”, ele estava se referindo a todos os descendentes de Jacó–Israel (cf. Jr 17,13; 50,17-19; Ez 4,3.13; 6,2-3), ou seja, a todo povo eleito (cf. Sofonia, p. 81). D. L. Petersen explicita que este grupo dentro de Israel pode pertencer a uma seita formada por perfeccionistas, mas o mais provável é que sejam pessoas que ouviram e perseveraram nas palavras dos profetas mais antigos e mantiveram a esperança do restabelecimento radical da realeza de YHWH (cf. Zephaniah, p. 205). 170 Cf. TSEVAT, M., “~Iyl;v'Wry>”, GLAT, vol. 3, p. 1087-1096; PAYNE, J. B., “~Iyl;v'Wry>”, DITAT, p. 665-666. 171 Cf. FERNANDES, L. A., O Sl 122, p. 57-89.

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Para todo o povo de Israel, que residia fora de Jerusalém, chegar à Cidade

Santa era, sem dúvida, motivo para festejar alegremente (cf. Sl 122). Ele esquece

os numerosos obstáculos e perigos que enfrentou durante o longo caminho, pois

os seus olhos avistam e contemplam o monte santo de Deus: Sião.

b.4) Considerações

Dois destes destinatários vêm precedidos do termo tB; (filha), cujo sentido

principal é o da menina da casa, com referência a uma descendente do sexo

feminino (cf. Gn 24,15; Ex 20,10).172 Quando este termo é usado no plural twOnB.

(filhas), designa freqüentemente as mulheres pertencentes a uma cidade, terra ou

povo (cf. Is 3,16.17; Ct 1,5; Ez 16,27). Todavia, no singular esta palavra, ligada a

um nome de cidade, terra, capital ou povo, torna-se uma personificação poética

para designar a cidade e/ou seus habitantes (cf. Is 1,8; Sf 3,14).173 Quando aparece

no plural após o nome de uma cidade, refere-se às vilas e aldeias que pertencem a

uma cidade-mãe, isto é, a uma cidade maior (cf. Js 15,45; Ne 11,25).174

No AT encontram-se várias citações em que o termo “tB;” no f.sg. vem

acrescido do nome de uma cidade, povo ou país (cf. Sl 45,13; Is 23,10; Os 1,3).

Esta aplicação, em alguns casos, é interpretada como a capital do país, porque está

relacionada com o rei (cf. Jr 50,42; 51,33). Em Sf 3,14-15 não há esta indicação

em todo o livro, porque não há qualquer alusão a um rei. Por isso, esta

possibilidade deve ser descartada.175 A sua referência está ligada ao povo em si

mesmo.

As expressões “filha de Sião” e “filha de Jerusalém”176 ocorrem somente em

textos proféticos ou poéticos. “Filha de Jerusalém” aparece 7 vezes,177 enquanto

172 Cf. MARTENS, E. A., “tB;”, DITAT, p. 192. 173 Cf. Para maiores esclarecimentos veja: GK, § 122s. 174 Cf. HAAG, H., “tB;”, GLAT, vol. 1, p. 1765-1778; BROWN, F.; DRIVER, S.; BRIGGS, C., “tB;”, BDB, p. 123; ALONSO SCHÖKEL, L., “tB;”, DBHP, p. 122-123. Além disso, J. M. P. Smith explicita que isto se deve ao fato de que Jerusalém, desde o tempo de Davi, foi ocupando o lugar central do Reino, tornando-se a capital e o ponto de referência para os israelitas. Principalmente quando o seu território começou a diminuir cada vez mais (cf. Zephaniah, p. 255-256). 175 SPREAFICO, A., Sofonia, p. 191-192. H. Thurman acrescenta que o termo “filha” junto a um nome, a princípio significava uma aldeia que estava sob a proteção de uma cidade cercada (cf. Jz 1,27), com o tempo passou a representar a comunidade de Israel como um todo (cf. Zephaniah, p. 1032-1033). 176 M. A. Sweeney explica que a utilização das expressões “filha de Sião” e “filha de Jerusalém” se deve a um antigo costume mediterrâneo de nomear as cidades como uma mulher ou uma noiva de uma divindade (cf. Zephaniah, p. 198). 177 Cf. 2Rs 19,21; Is 37,22; Lm 2,13.15; Mq 4,8; Sf 3,14; Zc 9,9.

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“filha de Sião” é usada 26 vezes.178 Além disso, em todo o AT uma exortação à

alegria no imperativo dirigida à !wOYci-tB;, como a que se encontra em Sf 3,14,

somente aparece em Zc 2,14; 9,9 e no uso concomitante com ~Il'v'Wry> tB; é vista

apenas em Zc 9,9.179

Sintaticamente a expressão pode ser um genitivo epexegético,180 que leva a

uma personificação da cidade ou do país, isto é, “a filha que é Sião” ou “a filha

que é Jerusalém”. Deste modo, Sião é a filha personificada de YHWH, como

também Jerusalém (cf. 2Rs 19,21; Is 37,22; Zc 9,9).181

Neste ponto, a questão é saber se o ouvinte-leitor está diante de uma cidade

personificada (cf. Is 10,32; 16,1; 52,2; Jr 6,2.23; Lm 2,15) ou de uma população

representada por uma única figura feminina (cf. Is 12,6; Mq 1,13). Esta diferença

é muito sutil, uma vez que a cidade e seus habitantes são vistos numa relação

muito estreita.182

Outros questionamentos surgem: os três vocativos representariam um único

sujeito? Ou as exortações teriam distintos direcionamentos? “Filha de Sião” seria

o mesmo que “filha de Jerusalém”? Quem seria “Israel”? Um povo ou uma nação

ou apenas um grupo seleto do povo eleito?

Alguns estudiosos183 são do parecer de que “filha de Sião” e “Israel” são

denominações que representam a comunidade formada por todos aqueles que são

fiéis a YHWH, e que por várias vezes são mencionados no AT. Enquanto a

menção à “filha de Jerusalém” evoca um pequeno grupo de fiéis israelitas que

habita em Jerusalém.

Outros comentadores,184 chegando a um denominador comum, apontam para

a equivalência entre as expressões “filha de Sião” e “filha de Jerusalém”. Para

eles, o profeta teria usado estes títulos no f. sg. para fazer referência ao povo eleito

178 Cf. 2Rs 19,21; Sl 9,15; Is 1,8; 10,32; 16,1; 37,22; 52,2; 62,11; Jr 4,31; 6,2.23; Lm 1,6; 2,1.4.8.10.13.18; 4,22; Mq 1,3; 4,8.10.13; Sf 3,14; Zc 2,14; 9,9. 179 Cf. BEN ZVI, E., A Historical-Critical Study of the Book of Zephaniah, p. 239. 180 Para pormenores sobre “genitivo epexegético” veja-se GK, § 128k. H. Irsiglier explica que a ligação do termo tB; no construto com o substantivo próprio não deve ser entendido como relação de pertença no sentido de “filha de”, mas deve ser visto como uma relação de esclarecimento de quem é a pessoa chamada filha, isto é, a “filha Sião” (cf. Zefanja, p. 412). 181 MOTYER, J. A., Zephaniah, p. 956. 182 Cf. VLAARDINGERBROEK, J., Zephaniah, p. 208; ROBERTS, J. J. M., Zephaniah, p. 222. 183 CLARK, D. J.; HATTON, H. A., Zephaniah, p. 197-198. 184 Cf. BAKER, D. W., Zephaniah, p. 117; BERLIN, A., Zephaniah, p. 136-137; THURMAN, H., Zephaniah, p. 1032-1033. Além disso, R. Rendtorff acrescenta que Sião e Jerusalém nos Salmos (cf. Sl 51,20; 102,22; 128,5; 135,21; 147,12) aparecem como parallelism membrorum (cf. The Canonical Hebrew Bible, p. 577).

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que recebe agora e continuará recebendo as bênçãos divinas. Sofonias não estaria

falando de uma parte de Jerusalém, de um quarteirão (cf. Sf 1,11), mas dirigindo-

se à cidade, vista nos seus habitantes (cf. 2Rs 19,21; Is 37,22 são paralelos).185

A inclusão do vocativo “Israel”, que a princípio tem uma conotação étnica

(cf. Ex 4,22), no meio das duas expressões “filha (que é) Sião” e “filha (que é)

Jerusalém” é muito sugestivo. Os três títulos denotam uma entidade político-

geográfica (cf. 2Sm 15,8; 2Rs 5,4; Is 15,32) e, ao mesmo tempo, carregam um

conceito religioso-ideológico (cf. Sl 122).186

Sião–Israel–Jerusalém evocam memórias do passado e da herança da

eleição do povo. Estes três termos têm uma gama de significados, que o profeta

parece ter em mente ao citá-los juntos. Porque cada um dos nomes poderia trazer à

lembrança, daqueles que estão sendo exortados, vários períodos da vida do povo

em que foi presenciada a ação de YHWH em sua história.187

Embora os três vocativos estejam se referindo ao povo, não é possível

esquecer que “Sião” é o lugar santo da habitação de YHWH188 e “Jerusalém” é a

cidade das promessas messiânicas (cf. Is 28,16). “Israel” foi incluído junto e entre

estes dois baluartes porque a esperança futura da nação sempre pensava no povo

todo, como na época em que o reino estava unificado.189

Todos aqueles remanescentes do povo, após a catástrofe do exílio, que se

mantiveram fiéis no temor ao Senhor e esperançosos na promessa de YHWH

durante sua provação, são chamados a integrar esta comunidade renovada e a

tomar parte deste momento de tão grande alegria, deixando extravasar plenamente

185 A. Spreafico explica que embora em Sf 1,11 haja uma menção aos habitantes de Mactés, o qual era um quarteirão ocupado pela população vinda do reino do Norte quando da destruição da Samaria (722 a.C.), a suposição de que !wOYc-tB; se refira a estes habitantes é difícil de se sustentar (cf. Zephaniah, p. 192-193). 186 Cf. BERLIN, A., Zephaniah, p. 136-137; BAKER, D. W., Zephaniah, p. 117. 187 Cf. MACKAY, J. L., Zephaniah, p. 292; MOTYER, J. A., Zephaniah, p. 956; BAKER, D. W., Zephaniah, p. 117-118. 188 H. Irsiglier lembra que nos espaços semíticos-ocidentais e helenísticos-gregos, os fundamentos histórico-religiosos do nome da cidade como “filha” são pesquisados normalmente tendo em vista a deusa da cidade. Porém, a metáfora “filha de Sião” como figura de mulher, a muito tempo desvaneceu a base mítica, despertando no povo a lembrança dos atos salvíficos de YHWH e a fé de ser Sião o lugar escolhido por Deus para habitar no seu meio (cf. Zefanja, p. 413). 189 L. ALONSO SCHÖKEL; J. L. SICRE DIAZ dizem que a voz de Sofonias dirigida à cidade de Jerusalém designa, claramente, o povo que traz o nome da eleição, Israel (cf. Sofonias, p. 1161). Enquanto M. A. Sweeney diz que o uso do imperativo no masculino ligado a “Israel” ao lado dos outros imperativos femininos ligados à “filha de Sião” e à “filha de Jerusalém”, faz sentido; pelo fato de que era esperada, com a reforma de Josias, a reconstrução da cidade de Jerusalém para que viesse a se tornar o centro santo de todo Israel e do mundo (cf. Zephaniah, p. 199).

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todo o regozijo que sente em seu íntimo. Para isso, a eles são apresentadas as duas

razões que justificam tal convite.

c) as razões para o convite

c.1) %yIj;P'v.mi hw"hy> rysihe

Neste primeiro motivo da alegria (revogou YHWH tuas sentenças), o verbo

rws tem o sentido de uma decisão legal de “remover” pela arbitração. A expressão

jP'v.mi rWs aparece em Jó 27,2; 34,5 significando a “remoção do direito”. Numa

transposição do sentido para Sf 3,15 entende-se como a remoção daquilo que por

direito pertenceria a Jerusalém, que vem a ser “as sentenças”. Este fato já se

encontra atestado em Ez 5,8, pois “eis o que diz o Senhor YHWH: também eu me

ponho contra ti, executarei os meus julgamentos no meio de ti, aos olhos das

nações”.190

Além disso, %yIj;P'v.mi estando no plural, significa que não só uma, mas toda

possível sentença dirigida contra o povo (cf. Ez 5,8), qualquer que fosse sua

origem, estava agora revogada. O sujeito de todas as bênçãos é somente YHWH.

Foi ele que revogou as sentenças que pesavam sobre o povo, porque só ele tem

poder para isso (cf. Is 45,21).

A este primeiro motivo para a exultação de alegria, vem unir-se um

segundo. Estas duas fortes razões estão tão intimamente ligadas, que se

complementam e se explicam.

c.2) %bey>ao hN"Pi

A outra ação de YHWH (expulsou teu inimigo) em favor do povo vem

expressa com o verbo hnp no piel, mostrando que o propósito de YHWH não é

apenas o de expulsar o inimigo, mas de preparar um lugar seguro para o povo

viver debaixo de suas bênçãos (cf. Gn 24,31; 2Sm 7,10).

O verbo/substantivo bya, no texto, apresenta-se no particípio m.sg. by:a'

(aquele que é inimigo). Sendo tomado no coletivo,191 representa todo inimigo

(definido ou indefinido), seja no campo militar (cf. Js 7,8), político (cf. Dt 28,68),

social (cf. Sl 55,13-14) ou religioso (cf. Nm 10,35). Há inúmeras passagens que

190 Cf. BERNINI, G., Sofonia, p. 81; BEN ZVI, E., A Historical-Critical Study of the Book of Zephaniah, p. 242. 191 Sobre o uso da forma plural veja GK, § 124a; Joüon-Mur., § 136f.

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falam da intervenção de YHWH como guerreiro contra os inimigos do povo (cf.

Ex 23,22).192

Muitas vezes no AT encontra-se YHWH utilizando “os inimigos”, ou seja,

“as nações estrangeiras”, como seu instrumento para mostrar a sua força salvadora

através da derrota dos opressores (cf. Is 42,13; 59,18; 62,8) ou para punir os

pecados de alguns do povo (cf. Dt 32,41; Ez 7,27; Os 5,1), porque se colocaram

contra os estatutos de YHWH, os quais o povo havia se comprometido a cumprir

(cf. Ex 21,1; 24,3; Dt 7,12).193

Esses “inimigos”, quando se trata de ajuste de contas, representam duas

possibilidades de abordagem:

• os inimigos externos representados pelas nações estrangeiras, que servem de

instrumento para YHWH aplicar seu castigo;

• os inimigos internos representados por aqueles que, no meio do povo, oprimem

seus próprios irmãos, desencadeando a punição advinda da justiça de YHWH.

As ações dos inimigos, tanto dos externos como dos internos, estão ligadas

entre si.194

c.3) Considerações

A mensagem de Sofonias pode indicar um outro caminho além dos

especificados, isto é, com as sentenças sendo revogadas, concomitantemente os

inimigos são afastados. A linha de pensamento, então, pode ser a de “realce

contínuo”, ou seja, o profeta pode ter querido dar a entender que não só o

julgamento terminou, mas que não haverá nada que leve a um outro julgamento

futuro.195

As formas verbais rysihe e hN"Pi no qatal constatam que o fundamento e

motivo do regozijo se devem ao fato de que YHWH agiu como libertador. Os

inimigos, que anteriormente como instrumento de seu castigo oprimiam o povo,

agora são afastados por YHWH, como quem aplaina um caminho e se livra de

obstáculos (cf. Is 40,3; 57,14; 62,10; Ml 3,1). YHWH cria novamente para Israel

192 Cf JENNI, E., “byao”, DTMAT, vol. 1, p. 194-200. 193 Cf. SWEENEY, M. A., Zephaniah, p. 198. 194 A. Berlin chama a atenção ao fato de que não se deve tentar identificar aqui um inimigo particular, como a Assíria, Baal ou qualquer outro inimigo de Deus (cf. Zephaniah, p. 143). 195 Cf. BEN ZVI, E., A Historical-Critical Study of the Book of Zephaniah, p. 243. H. Irsiglier diz que às vezes os versos de 3,15ab apontam para um fato válido de uma vez por todas, isto é, YHWH suspendeu as “sentenças”, que está expressa de uma maneira geral no objeto plural (cf. Zefanja, p. 414).

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um espaço vital, gerando novas possibilidades de vida à semelhança da saída do

Egito (cf. Sl 80,9).196 Este byEao, tomado em sentido coletivo, é inimigo do povo e não

de YHWH (cf. Is 1,24; 66,6.14).197

Uma vez que YHWH mostrava ter revogado as iniqüidades do povo e

retirado todas as sentenças que pesavam sobre ele, não havia motivo para utilizar

as nações como instrumento para punir seu povo.198 Com a finalidade de mostrar

esta ligação entre “sentenças” e “inimigos” o profeta utiliza o recurso do

paralelismo, onde a revogação das sentenças que pesavam sobre Jerusalém–Israel

coincide com a expulsão do inimigo (v. 15ab).199

Os dois versos (15ab) falam da anulação dos julgamentos e do afastamento

dos inimigos, não dando pistas de sua identificação. Contudo, indicam a

imutabilidade do amor de YHWH por seu povo, que apesar de apontar para a

necessidade de castigá-lo por seus pecados, não pode deixá-lo longe de seu

misericordioso perdão e de sua completa redenção.200

O afastamento dos inimigos, também mostra a fidelidade de YHWH às suas

promessas. Para Abraão prometeu bênçãos numerosas e que sua “posteridade

conquistará a porta (isto é, as cidades) dos inimigos” (Gn 22,17). Uma das

bênçãos prometidas no Deuteronômio é a de que “YHWH te entregará, já

vencidos em tua frente, os inimigos que se levantarem contra ti; sairão contra ti

por um caminho, e por sete caminhos fugirão de ti” (Dt 28,7).

Em síntese, esta dupla motivação, remoção das sentenças (v. 15a) e

afastamento dos inimigos (v. 15b), tão fortemente imbricadas, uma vez que uma

justifica a outra, torna-se o agente gerador da grande exortação de júbilo que é

dispensada ao povo (v. 14). Todavia, torna-se necessário mostrar as conseqüências

positivas advindas deste fato antecipador de um futuro promissor, já começado a

ser vivido, mas não ainda plenamente.

196 Cf. WEIGL, M., Zefanja, p. 223. 197 Cf. THURMAN, H., Zephaniah, p. 1033; 198 Cf. KAISER Jr., W. C., Zephaniah, p. 238; ESZENYEI SZÉLES, M., Zephaniah, p. 112. 199 G. del Olmo Lete explica que o paralelismo existente entre %yIj;P'v.mi (v. 15a) e %bey>ao (v. 15b) trata-se de um recurso lingüístico do tipo sinédoque, enquanto o inimigo é o executor das sentenças que pesam sobre Israel, isto é, o exílio (cf. El libro de Sofonías y la filología semítica nor-occidental, p. 302). Mas, E. Ben Zvi diz que este paralelismo não indica necessariamente que %yIj;P'v.mi estaria se referindo a pessoas (cf. A Historical-Critical Study of the Book of Zephaniah, p. 243). 200 Cf. ROBERTSON, O. P., Zephaniah, p. 336.

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3.2.

Discurso: ações de Jerusalém – o “não” é motivo de esperança: v. 15c-16

O rei de Israel, Yhwh, está no teu meio, não temerás mais o mal. Naquele dia, será dito a Jerusalém: não temerás, Sião; não desfalecerão tuas mãos. No oráculo, o profeta, ao não falar quem são esses inimigos, deixa

subentendido que todos e tudo o que se colocava contra o povo foi afastado

definitivamente, tornando aparente alguns atributos de YHWH. Sofonias também

aponta as ações esperadas de Israel, que não deverá mais temer nenhum tipo de

doença ou ameaça interna, como também qualquer tipo de invasão externa será

impossível, pois agora é afirmada a presença de YHWH.

a) os atributos de YHWH que fundamentam as razões

%Ber>qiB. hw"hy> laer"f.yI %l,m, (o rei de Israel, YHWH, está no teu meio) é uma frase

nominal que apresenta dois atributos de YHWH, o de rei e o da sua presença no

meio do povo.201

a.1) laer"f.yI %l,m,

O título de %l,m, aplicado a uma divindade era comum entre os povos antigos

no mundo semítico.202 A idéia de hw"hy> %l,m, não aparece nos textos referentes aos

tempos patriarcais. Somente após a instauração da monarquia como regime

político do povo eleito é que o título de rei, aplicado aos reis de Judá–Israel (cf.

2Sm 5,4-5; 1Rs 12,23; 2Cr 18,31), aparece relacionado a YHWH (cf. Ex 15,18;

Nm 23,11; Dt 33,5), numa representação simbólica (cf. Jz 8,23; 1Sm 8,7),

indicando um regime teocrático.

Embora tensões cercassem o estabelecimento de um rei terreno para reinar

em lugar de YHWH, a condução da arca por Davi para Jerusalém simbolizava a

fusão da realeza de YHWH com o trono de Davi (cf. 2Sm 6–7; Sl 132).

201 H. Irsiglier explica que primariamente o texto do v. 15c era uma exortação da proclamação de %l'm' hw"hy> (YHWH reina, cf. Sl 96,10), mas que o texto hebraico do TM que foi transmitido pela tradição substituiu o grito de proclamação por uma frase nominal com a confissão da eterna presença salvífica de YHWH como rei de Israel (cf. Is 41,21; 43,15; 44,6) “no meio de” (cf. Sl 46,6; Jr 14,9; Zc 2,14) Jerusalém (cf. Zefanja, p. 415). 202 Cf. SOGGIN, J. A., “%l,m,”, DTMAT, vol. 1, p. 1237-1252.

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Todavia, a idéia da realeza de YHWH, como rei de Israel no meio de seu

povo, é comum no AT. Na caminhada pelo deserto, o povo eleito já afirmava em

seus louvores: “YHWH reinará para sempre e eternamente” (Ex 15,18). Gideão

não aceita ser coroado rei pelo povo, dizendo: “porque é YHWH quem reinará

sobre vós” (Jz 8,23).203

O reinado de YHWH se estende sobre todos os seres da terra e do céu (cf.

Sl 24,7-10; 95,3-6; Jr 10,7). Porém, Ele escolheu um povo para seu domínio

particular e fez dele “um reino de sacerdotes e uma nação santa” (Ex 19,6). Sua

regência se destaca dos outros reinados, porque ele não está ligado a um governo

político, mas com a moral. A queda da dinastia davídica e conseqüente deportação

para a Babilônia serviram para fazer com que os guias religiosos do povo

voltassem seu olhar para YHWH e o governo teocrático original, do qual nunca

deveriam ter se afastado (cf. Ex 10,21).204

A expressão hw"hy> %l,m,, em todas as citações (41 vezes), ocorre em textos

poéticos com uma única exceção em prosa (cf. 1Sm 12,12). O seu uso é

progressivo, havendo uma pequena ocorrência nos textos que se referem à época

pré-monárquica (cf. Nm 23,21; Dt 33,5; Sl 24), que vai aumentando naqueles que

aludem ao período monárquico (cf. Is 6,5; Jr 8,19) até chegar à sua maior

ocorrência nos do tempo pós-exílico (cf. Zc 14,9.16.17; Ml 1,14). O que leva a

pensar que o seu emprego é relativamente tardio.

a.2) %Ber>qiB.

A expressão br<q,B. (em meio de) formada pelo substantivo br<q, (meio), quando

prefixado pela partícula B., passa a significar o lugar dentro do qual está a ação.

Esta expressão é utilizada em paralelo com ble (cf. Jr 9,7; Is 26,9),205 mostrando

estar no meio não só de uma comunidade, mas também no coração de cada

membro desta (cf. Jr 31,31-34).

“Ele está no meio de Sião–Jerusalém” é uma fórmula de origem litúrgica

(cf. Sl 46,6; Is 12,6; Mq 3,7), pois com uma proclamação similar se celebrava e se

reconhecia a realeza de YHWH. Esta declaração, sendo repetida aqui, afiança a

203 Cf. BARKER, K. L.; BAILEY, W., Zephaniah, p. 494-495; ROBERTSON, O. P., Zephaniah, p. 337. 204 Cf. DEVILLE, R.; GRELOT, P., “reino”, VTB, p. 871-877. 205 Cf. COPPES, L. J., “br<q,”, DITAT, p. 1370 ; ALONSO SCHÖKEL, L., “br<q,”, DBHP, p. 591.

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Sião uma segurança absoluta.206 O profeta, no contexto em que se encontrava,

apresenta YHWH como a única possibilidade para justificar o que vem

acontecendo e como solução definitiva para a situação que o povo está vivendo.207

Embora em algumas passagens se encontre a menção da ausência ou

impotência de YHWH (cf. Jr 5,12; Sl 10,4; 14,1), ele é o soberano da promessa

divina e como resultado de sua benevolente presença não há o que temer (v. 15d).208

Sua presença é ativa, extraordinária, de uma espontaneidade imediata e total, “que

não se cansa nem se afadiga” (Is 40,28), que “não dorme nem cochila” (Sl 121,4),

que prontamente reage em favor do povo (cf. Dt 6,21). YHWH está sempre

presente e atento.

Por isso, embora a celebração do retorno de YHWH para sua habitação no

meio do povo pressuponha sua ausência da cidade no tempo de julgamento, não

fala do abandono do povo fiel. Nos profetas encontram-se estas palavras:

“aguardo a YHWH, que esconde sua face da casa de Jacó, nele ponho minha

esperança” (Is 8,17). Mais tarde, é relatada a saída do templo de Jerusalém por

YHWH como parte do julgamento e de sua destruição (cf. Ez 8–11). Também o

sofrimento de Sião–Jerusalém e o aparente fracasso de YHWH na não-salvação

do povo, na tradição de Israel são vistos como conseqüência do pecado.209 Agora

YHWH tomou de novo na mão o cetro em Jerusalém.

a.3) Considerações

Aquele que retém o cetro tem como principais tarefas: proteger o povo,

julgar suas causas e lutar em suas guerras (cf. 1Sm 8,20). Claramente, a imagem

da presença humana do rei na cidade conduz um sentido de segurança ao povo.

Esta representação é empregada, metaforicamente, a YHWH, para descrever a

proteção de Jerusalém contra os perigos internos e externos.

Os efetivos reis falharam na execução de suas obrigações, mas YHWH

quando reconhecido como rei, dispensa aos seus uma proteção sem igual. O povo

não presenciará mais destruição e desgraça.210 Como seu rei os protege, os guia,

os reúne (cf. Is 48, 17; Sl 80). Ele é o rei dos exércitos (cf. Is 6,5), ele conduz os

206 Cf. KELLER, C.-A., Sophonie, p. 214-215. 207 Cf. SPREAFICO, A., Sofonia, p. 186. 208 Cf. BAKER, D. W., Zephaniah, p. 118. 209 Cf. SWEENEY, M. A., Zephaniah, p. 199. 210 Cf. CLARK, D. J.; HATTON, H. A., Zephaniah, p. 198-199; SWEENEY, M. A., loc. cit.

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acontecimentos da história (cf. Dt 4,27), ele julga seu povo e as nações, exercendo

seu juízo (cf. Sl 50,4; 96,13), porque ele é justo (cf. Dt 32,4).

Além do mais, Sofonias não cita em todo seu escrito outro rei específico

além de YHWH, não faz referência a alguma ação da linha davídica, nem

menciona qualquer possibilidade de que algum descendente venha a ocupar o

trono. Sofonias, porém, não considera que as promessas feitas estejam canceladas.

Embora ele não mencione a manutenção da monarquia, ele deixa claro que

Jerusalém continua sendo o lugar da habitação de YHWH, “a cidade do grande

rei” (cf. Sl 48,3).

Para o resto de Israel, que agora se reúne como comunidade de Sião,

habitando novamente em Jerusalém, é importante que YHWH, já no meio dessa

“filha de Sião – filha de Jerusalém”, construa o seu reinado libertador já no

presente e com isso proporcione tranqüilidade, não devendo o resto ter qualquer

tipo de temor.211

b) as ações esperadas do povo

Como conseqüências da atuação de YHWH na história de seu povo e de sua

presença no meio dele são esperados o não-temor e a ação construtiva. Por isso,

surgem três exortações estimulantes.

b.1) dA[ [r" yair>yti-al{

A primeira delas (não temerás mais o mal) com o verbo ary (temer) no qal

denota um sentido estático ou duradouro. Como também a partícula negativa al{,

que tem em sua base uma ordem de estado permanente.212

A expressão yair>yti-al{ na 2ª pessoa f.sg., mostra que o orador está se dirigindo

a uma figura de mulher, que representa o povo. Esta fórmula é mais freqüente nos

Salmos e é usada quando se está livre de todo temor. O medo é um sentimento

que nasce tanto diante de uma guerra, como diante de algo ou alguém que é visto

como inimigo (cf. Gn 31,31; 1Sm 7,7), alguma coisa que seja uma ameaça à

própria vida, como, por exemplo, as catástrofes naturais.213 Aparece, então, nos

Salmos de confiança (cf. Sl 23,4) ou nos Salmos de louvor (cf. Sl 118,6).214

211 Cf. ROBERTSON, O. P., Zephaniah, p. 337; IRSIGLIER, H., Zefanja, p. 415. 212 Cf. Nota 138. 213 Cf. COSTACURTA, B., La vita minacciata, p. 41. 214 Cf. STÄHLI, H. P., “ary”, DTMAT, vol. 2, p. 1051-1068.

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Assim sendo, o termo [r : (mal) tem aqui o sentido de calamidade ou

desgraça (cf. Is 45,7), não de culpa moral. Porque o contexto de Sf 3,14-15b

indica que YHWH revogou as sentenças e conseqüentemente afastou os inimigos.

Desta maneira, também apartou todos os perigos que ameaçavam seu povo.215

Então, o “mal” é visto como tudo aquilo que estava acontecendo ainda em

Jerusalém, mostrando que o medo instalado abrangia toda a cidade e não somente

parte do povo.

O povo parecia estar ainda de olhos fechados para a nova realidade,

anunciada em Sf 3,14-15b como já existente. É, então, necessário um impulso

profético, uma exortação para que aquele resto, a “filha de Sião”, compreenda

toda a extensão das bênçãos já recebidas.216

É como se YHWH desse um basta no castigo infligido ao povo como

resultado do juízo (cf. Ez 5,8) sobre a cidade e seus habitantes (cf. Jó 27,2; 34,5).

O juízo é o fruto do julgamento feito por YHWH ao povo, que pode resultar em

condenação para aqueles que se mantêm afastados dos preceitos de YHWH e que

experimentam o castigo vindo através dos diversos tipos de opressão (cf. Sl 9,5-9;

Is 3,11); mas que pode também implicar em salvação para aqueles que se mantêm

na amizade com YHWH, cumprindo seus mandamentos, e, portanto, recebendo

suas bênçãos (cf. Sl 48,12; 97,8).

Se agora YHWH já está no meio de um resto renovado, não há lugar para o

temor. Pois, no futuro, após a restauração total de Sião–Israel–Jerusalém não

haverá desvio dos estatutos de YHWH. Porque ele também estará “no meio de”

cada membro da comunidade, isto é, no interior de cada coração, provocando uma

mudança radical. O que se constatará é uma renovação da conduta social, religiosa

e moral, onde só existirá motivos para o regozijo.217

Por isso, a sentença dA[ [r" yair>yti-al{ ligada ao que foi declarado antes (v. 15ab),

ou seja, às ações passadas de YHWH, enfatiza que as promessas de libertação se

realizaram, continuam acontecendo e Sião–Israel–Jerusalém agora será restaurada

para exercer o papel que sempre lhe foi destinado, o de ser o centro da criação (cf.

Is 4,2-6).218 O que acarretará as futuras proclamações dirigidas a Jerusalém.

215 Cf. MOTYER, J. A., Zephaniah, p. 956. 216 Cf. IRSIGLIER, H., Zefanja, p. 414; KAISER, W. C., Zephaniah, p. 238. 217 Cf. RINALDI, G., Sofonia, p. 1249. 218 Cf. KAPELRUD, A. S., Eschatology: Micah and Zephaniah, p. 261.

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b.2) !AYci yair"yTi-la;

Mais uma vez é dito ao povo (não temerás, Sião), também no qal na 2ª f.sg.

como nas formas verbais anteriores direcionadas aos redimidos (v. 14) e nos

sufixos dos substantivos relacionados a ele (v. 15). A diferença está em que agora

vem nomeado explicitamente o destinário, !AYci, porém sem a designação anterior

tB;, mas isso não parece acarretar qualquer mudança. O endereçamento continua a

ser o resto que YHWH libertou. Porém agora, a sentença yair"yTi-la; apresenta em

sua forma verbal a partícula negativa la;, denotando uma ordem imediata, mais de

acordo com o contexto do v. 16.219

Esta exortação, embora pareça uma repetição da anterior, está mais ligada

ao que será dito a seguir, ou seja, as ações de YHWH presentes e que se

estenderão a um futuro definitivo.

A expressão yair"yTi-la; é uma fórmula que convida à tranqüilidade. Com

freqüência vem acompanhada de frase subordinada, introduzida pela partícula yKi,

ou de uma outra sentença independente (cf. v. 17a). Seu uso teológico é freqüente,

tendo YHWH ou seu mensageiro como portador da mensagem. A palavra divina

aparece quando há uma promessa de salvação e consolo.220 E junto a esta fórmula,

geralmente, é apresentada a base que fundamenta esta confiança (cf. v. 17c-e).221

Aqui em Sf 3,16b, a expressão yair"yTi-la;, dentro de um oráculo salvífico,

parece estar combinada com a confiante certeza da presença definitiva de YHWH.

Em Is 43,5 este sentimento fica mais claro com a complementação explícita “eu

estou contigo”, embora em Sofonias isto apareça implicitamente na afirmação de

que YHWH está no meio do povo (cf. v. 15c.17a). Esta presença gera ainda uma

terceira exortação (v. 16c).

b.3) %yId"y" WPr>yI-la;

Este forte estímulo (não desfalecerão tuas mãos) continua a exortação

anterior (v. 16b). A expressão “desfalecer as mãos” não é comum na cultura

ocidental, mas para o judeu “mão” simboliza “poder” e “força”. O desfalecimento

das mãos denota a perda das forças ou do poder. Ela aparece periodicamente ao

longo da BH para mostrar que, em face de uma adversidade ou de uma ameaça, as

219 Cf. Nota 138. 220 Cf. STÄHLI, H. P., “ary”, DTMAT, vol. 2, p. 1051-1068. 221 Cf. BARKER, K. L.; BAILEY, W., Zephaniah, p. 495.

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pessoas tornam-se débeis (cf. 2Sm 4,1; Esd 4,4; Ne 6,9).222 Por isso, a exortação

para não deixar que isto aconteça mostra a necessidade de incutir ânimo e

coragem, a fim de levar o ouvinte-leitor a agir.223

O que aqui está sendo profetizado e em conseqüência ao que foi dito

anteriormente nos v. 14.15, sem dúvida, é um estado de salvação. Todavia, não é

possível pensar num estado indestrutível e sem ameaças futuras do bem-estar do

povo, como se fosse o amanhecer escatológico definitivo.224

A linha do discurso do profeta denota certa tendência, uma vez que as

antigas promessas foram dirigidas para a casa de Davi e ao futuro rei davídico,

proveniente de Belém, como também para Jerusalém, o ponto centralizador do

reino de Davi. Sofonias manifesta a esperança do restabelecimento de um novo

reino como o de Davi, porém maior, pois abrangeria todas as nações, tendo

Jerusalém como o centro (cf. Sf 3,9-10).225

E nesta perspectiva, esta sentença negativa, tem um valor positivo. A união,

bastante comum, dos termos “medo” e “mãos acovardadas”, tem uma conotação

muito forte. O medo que o ser humano sente é uma reação psicológica que se

manifesta através de uma ação fisiológica. O desfalecer das mãos, muito mais do

que a evidência externa, é a conseqüência de seu estado de ânimo.226

b.4) Considerações

Na comparação de dA[ [r: yair>yti-al{ (v. 15d) com yair"yTi-la; (v. 16b) e com

%yId"y" WPr>yI-la; (v. 16c) observam-se as relações existentes entre estas três sentenças

negativas. O medo foi afastado por causas objetivas, porque o povo não

experimentará “um mal novamente” (15d), por isso eles não terão mais aquela

realidade subjetiva do temor (v. 16b) que leva ao efeito paralisante da falta de

força, ou seja, do desânimo pela ausência de confiança (v. 16c).227

222 W. C. Kaiser diz que mãos frouxas ou fracas, além de sugerirem desânimo e desespero, indicam falta de envolvimento (cf. Zephaniah, p. 238). 223 Cf. SWEENEY, M. A., Zephaniah, p. 201. 224 J. Vlaardingerbroek diz que, no contexto do AT em suas últimas formas, o v. 16 pode ter adquirido esta visão de um estado de salvação definitiva (cf. Zephaniah, p. 213). 225 Cf. KAPELRUD, A. S., Eschatology: Micah and Zephaniah, p. 261. 226 Cf. BAKER, D. W., Zephaniah, p. 118. 227 G. Rinaldi é de opinião que as duas sentenças (v. 16bc) parecem ser mais uma expressão da satisfação do profeta do que uma palavra de incentivo para o povo que teve sua sorte mudada (cf. Sofonia, p. 1249). Todavia, M. Eszenyei Széles explica que se deve notar que este versículo transmite o que um profeta certamente poderia dizer ao pronunciar um oráculo num lugar santo (cf. Zephaniah, p. 112).

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O temor e a falta de confiança eram conseqüências da expectativa da

realização do julgamento de YHWH, mas agora após a libertação daquele resto

não há mais lugar para estes sentimentos. A total ausência de medo e ansiedade

será o estado alegre do povo renovado de Deus. O homem, como um todo, poderá

rejuvenescer. 228

Por isso, YWHW através do profeta previne o povo. Ele libertou-o de todos

os seus inimigos, mas não é para que eles fiquem se deleitando com estas graças

recebidas. Aqueles que estão tendo o privilégio de estar recebendo as benesses de

YHWH têm que se dedicar no desempenho disciplinado dos seus deveres e devem

perseverar. Esta disciplina mais do que uma dominação do espírito serve para

movê-los a agir sempre dentro do caminho desta nova aliança como para seu

próprio bem.229

O estado de desânimo que se abateu sobre o povo é aquele contra o qual se

insurgiu o dêutero-Isaías no círculo dos exilados, que pensavam que YHWH os

havia abandonado. Eles sentiam-se privados da sua proteção e ajuda (cf. Is 40,27;

49,14). E também o trito-Isaías fala da preocupação de YHWH com aquele de

espírito abatido, e ele, Isaías, estava sendo enviado para consolá-los (cf. Is 57,15;

61,1-3), visto o seu questionamento da proteção divina (cf. Is 58,2-3; 59,1; 63,19).

Eles se questionavam como no tempo do deserto: “YHWH está em nosso

meio ou não?” (Ex 17,7). Ou diziam: “por que serias como um homem atônito,

como um herói incapaz de salvar?” (Jr 14,9).

Estas interpelações pareciam sugerir que a comunidade ainda não havia se

dado conta da amplitude da situação de libertos que estavam vivendo. Tornava-se

necessária a exortação à alegria (v. 14) e ao afastamento de todo tipo de temor,

desânimo e resignação que tolhe o agir (v. 16). A ação profética neste momento

do povo estava voltada para a reconstrução da vida social, política, econômica

como um todo e, principalmente, a vida religiosa, que estava laxa. Era urgente a

superação daquela estagnação e da falta de paz interior. 230

c) no yôm YHWH

~Øil;v'Wryli rmea'yE aWhh; ~AYB; (naquele dia, será dito a Jerusalém) abre o v. 16.

A expressão aWhh; ~AYB; pode referir-se a um determinado dia já previamente

228 Cf. BERNINI, G., Sofonia, p. 82; KELLER, C.-A., Sophonie, p. 214. 229 Cf. ROBERTSON, O. P., Zephaniah, p. 339. 230 Cf. IRSIGLIER, H., Zefanja, p. 412.421.

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descrito no livro de Sofonias ou a um tempo já conhecido e esperado pelo povo.

Porque a palavra ~Ay é usada para designar um acontecimento decisivo ou uma

série de eventos, um momento ou período no qual o destino está fixado (cf. Is 9,3;

Jr 25,33).231

Pela tradição do povo ao tempo de Amós, os israelitas, que se consideravam

privilegiados por pertencerem ao povo eleito, aguardavam este dia como um

momento muito feliz em suas vidas. Pela sua experiência histórica (cf. Js 10,12-13;

Jz 7,15-25; 2Sm 5,17-25), neste dia, YHWH os libertaria de toda e qualquer

opressão.232 Amós herda esta suposta tradição de uma ação determinada de

YHWH, dirigida para o bem-estar do povo e que por eles era ansiosamente

aguardada (cf. Am 5,18a).

Na realidade, pouco se sabia sobre o que realmente era esperado até o termo

yôm YHWH ser usado por Amós. Ele opôs-se a esse privilégio, declarando que

este yôm seria “de trevas e não de luz” (Am 5,18b), trazendo uma maior certeza

de um julgamento divino (cf. Am 3,2). Não é necessário pensar que Amós fosse o

primeiro ou o único a perceber o significado do yôm YHWH. Certo é que a

expressão foi usada em seu livro para recordar aquilo de que ele e os profetas

sempre se deram conta: as trevas do julgamento dos ímpios (cf. Am 9,7-10) se

misturam com a luz da esperança dos fiéis (cf. Am 9,11-15).

Esta fórmula aWhh; ~AYB; é típica, mas não exclusiva, das proclamações que

anunciam a libertação de um inimigo ou de outra ameaça.233 Esta expressão faz

uma ponte, conectando adverbialmente o que será dito posteriormente (v. 16-17)

com o que foi apresentado anteriormente (v. 14-15).

Nada da verdadeira substância muda dos v. 14-15 nos v. 16-17, é apenas

uma reiteração da afirmação anterior do profeta. Todavia, com esta fórmula

conectante há o deslocamento do discurso inicial para um tempo futuro

indeterminado. Assim, com o verso 16a transpondo para o futuro a realização

231 A. Berlin diz ser um dia no futuro, porque depois que YHWH tiver removido as sentenças que pesam sobre o povo, não haverá mais motivo para temor de nova punição (cf. Zephaniah, p. 143); assim também D. J. Clark e H. A. Hatton dizem que xWhh; ~wOYB; marca explicitamente um tempo futuro (cf. Zephaniah, p. 199). 232 Cf. AUVRAY, P; LÉON-DUFOUR, X., “Dia do Senhor{”, VTB, p. 230-232. 233 J. M. O’Brien diz que o v. 16 com os verbos no futuro unidos às expressões aWhh; ~AYB; e yair"yTi-la; são características de “promessa de salvação”, como um desenvolvimento dos oráculos de salvação que os sacerdotes faziam na época pré-exílica (cf. Zephaniah, p. 125). Enquanto H. Irsiglier explica que a promessa profética respondia à queixa e ao desânimo (cf. Zefanja, p. 421). Para maiores explicações veja FLOYD, M. H., Zephaniah, p. 248-249.

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completa da salvação de YHWH, retroativamente o grito de júbilo do v. 14 ainda

não é totalmente pleno.234

A forma verbal rmea'y E, no nifal yiqtol, ocorre poucas vezes nos profetas,

sendo mais utilizada por Isaías (cf. Is 4,3; 19,18; 32,5; 61,6; 64,42), seguida por

Jeremias (cf. Jr 4,11; 7,32; 16,14), Ezequiel (cf. Ez 13,12), Oséias (cf. Os 2,12) e

Sofonias (cf. Sf 3,16). A forma passiva impessoal, na 3ª pessoa m.pl., enfatiza o

destinatário da mensagem, mas suprime o orador.235

Diferentemente da literatura hebraica mais tardia e do NT, o AT não

conhece o passivum divinum, mas isto não descarta a possibilidade de YHWH ser

o sujeito. Como os profetas seriam os veiculadores da palavra divina, eles ao

escreverem seus oráculos poderiam querer dar uma ênfase maior à sua mensagem,

por isso usavam a forma passiva impessoal (cf. Nm 23,23; Sl 87,5).236

Desta forma, quem dirá a Jerusalém as sentenças seguintes do não-temor e

do não-desânimo? YHWH? Os inimigos? Os profetas?237 E quem será o sujeito da

ação que gera o oráculo de confiança?

A tradição bíblica lembra que eram os profetas que proclamavam seus

oráculos de salvação junto com as palavras consagradas no templo. O freqüente

uso da fórmula “não temas” indica que o sujeito da ação deve ser YHWH ou

algum representante seu. A forma verbal do nifal se refere à palavra de um outro.

Assim, o sujeito da ação não poderá ser o profeta. Então, por exclusão percebe-se

que YHWH é o sujeito, enquanto Sofonias é o portador de sua mensagem para o

povo.238

Em síntese, no discurso do profeta dirigido à Jerusalém (v. 15c-16), ele

principia com um refrão muito forte e explicativo. YHWH, como rei de Israel,

está novamente habitando a cidade (v. 15c). Por isso, as ações do povo devem ser

pertinentes a esta nova situação que estão vivenciando, ou seja, a realidade de

libertos (v. 15d.16bc).

234 Cf. IRSIGLIER, H., Zefanja, p. 420-421. 235 A respeito da construção passiva impessoal com objeto indireto veja Joüon-Mur., § 128ba; GK, § 121a. 236 Cf. VLAARDINGERBROEK, J., Zephaniah, p. 212. 237 J. L. Mackay diz que a frase impessoal não convida a uma especulação de quem seria(m) o(s) orador(es) desta exortação (cf. Zephaniah, p. 293). 238 A. Spreafico afirma que somente YHWH é o sujeito autorizado para colocar fim àquela situação ameaçadora e geradora do medo (cf. Sofonia, p. 187-188).

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A presença de YHWH como rei é a garantia da preservação da

tranqüilidade, pois ele não deixa de agir em prol do povo nem um instante. Mas,

em contrapartida, ele quer que seu povo também seja operante (v. 16c),

valorizando a proteção recebida e fomentando sua permanente benesse.

No v. 16 houve a retomada dos nomes “Jerusalém” e “Sião” sem a

especificação tB;. “Será dito a Jerusalém” (v. 16a) deixa explícito que se trata dos

habitantes de Jerusalém, que é reafirmado com “não temas, Sião” (v. 16b).

Todavia, Sião é colocado aqui, logo após Jerusalém, para enfatizar a cidade como

centro religioso, uma vez que Sião é o nome do monte santo escolhido por

YHWH para sua habitação junto a seu povo (cf. Sl 132,13-14).239

A frase temporal, que inicia o v. 16a e traz uma nova exortação ao povo,

mostra um futuro indefinido em relação à primeira exortação feita no v. 14, que

chamava o povo à alegria. A situação ideal proposta aqui e que acontecerá no

futuro não está em descontinuidade com o convite ao regozijo feito para o

presente momento que o povo está vivendo. Mas que se dará quando tudo estiver

realizado plenamente.240 Quando então à alegria do povo se juntará a alegria de

YHWH confirmando sua esperança.

3.3.

Discurso: ações de YHWH – ratificam a esperança de Jerusalém: v. 17

Yhwh, teu Deus, está no teu meio, como herói, ele salvará, alegrar-se-á por ti com regozijo guardará silêncio no seu amor, jubilará por ti com exultação. Após um primeiro discurso do profeta dirigido à Jerusalém exortando-a a

agir, passa-se a um segundo discurso onde se fala das ações de YHWH que vêm

ratificar a esperança de Jerusalém para continuar agindo, sem deixar que o temor

grasse em seu meio, não deixando suas mãos voltarem a desfalecer. Afinal, YHWH

está em seu meio, deixando visível outros atributos, e se alegrará com seu povo.

239 Cf. CLARK, D. J.; HATTON, H. A., Zephaniah, p. 199; BROWN, W. P. Zephaniah, p. 116. 240 E. Ben Zvi diz que o texto sugere um tipo de continuidade entre as duas exortações (v. 14.16) através das expressões e das concepções do homem piedoso vivendo numa situação não-ideal, mas que geralmente será aceita num futuro ideal (cf. A Historical-Critical Study of the Book of Zephaniah, p. 322-323).

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a) outros atributos de YHWH

a.1) $Ber>qiB. %yIh;l{a/ hw"hy>

A frase nominal (YHWH, teu Deus, está no teu meio) apresenta mais um

atributo de YHWH, o de ser o Deus de Israel e, ao mesmo tempo, enfatiza o

predicado da sua presença no meio do povo.

YHWH no meio do povo é a razão do não-temor confiante que está ligado à

sua presença pessoal, tanto como seu rei (v. 15c) como seu Deus (v. 17a), sinal de

segurança e das bênçãos concomitantes para o resto.241 Em alguns Salmos os dois

títulos são colocados juntos numa afirmação pessoal de fé: “meu Deus e meu rei”

(Sl 5,3; cf. Sl 84,4; 145,1) e também coletivamente (cf. Sl 44,5; 74,12).242

Este novo refrão $Ber>qiB. %yIh;l{a/ hw"hy> não exclui a afirmação do anterior

%Ber>qiB. hw"hy> laer"f.yI %l,m,, mas o abarca em toda a sua extensão e o explicita, uma

vez que a idéia da realeza de YHWH está fundamentada no fato primordial de que

ele é o Deus de Israel.243 Como rei ele é capaz de julgar e fazer cumprir seu

julgamento, mas somente como Deus pode mudar e revogar as sentenças que

pesavam sobre o povo. Esta atitude não mostra uma inconsistência da parte dele,

mas sim o domínio soberano de YHWH. Como conseqüência de seu amor

compassivo ele muda a sorte do pecador, ele liberta-o, evidenciando o seu poder

re-criador.244

A relação que %Ber>qiB. hw"hy> laer"f.yI %l,m, (v. 15c) carrega para o que é dito nos

versículos anteriores (v. 15ab), onde como rei afasta as ameaças e garante a

segurança, é a mesma relação que $Ber>qiB. %yIh;l{a/ hw"hy> (v. 17a) transporta para o

que é exortado nos versículos precedentes (v. 16bc), que confirma a tranqüilidade

de espírito assegurada pela presença constante de YHWH. O elemento comum é

hwhy, nome e natureza revelados no deserto. Seu nome não permite que ele seja

apenas juiz ou redentor, mas ele é ambos concomitantemente. Sua natureza em

plenitude está agora habitando no meio deles. Porque como juiz “revogou as

sentenças” (v. 15a), como redentor vive “no meio dos” redimidos (v. 15c.17a).

A presença de $Ber>qiB. %yIh;l{a/ hw"hy> é a certeza objetiva de que YHWH

perdoou e esqueceu seus pecados e está satisfeito com os redimidos, pois agora

241 Cf. BAKER, D. W., Zephaniah, p. 118; KING, G. A., The Remnant in Zephaniah, p. 423. 242 Cf. SEYBOLD, K., “%l,m,”, GLAT, vol. 5, p. 130. 243 Cf. BERNINI, G., Sofonia, p. 81-83. 244 Cf. ESZENYEI SZÉLES, M., Zephaniah, p. 110-112.

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não há nada para afastar aquele que é o santo do meio do povo. Na redenção do

resto está também o objetivo central de YHWH, que é o seu retorno a Sião, como

aquele herói que traz a salvação.245

a.2) [:yviAy rABGI

Esta fórmula [:yviAy rABGI (como herói, ele salvará), que caracteriza YHWH

como herói libertador, é freqüente em contextos que querem assegurar aos

destinatários que determinada ameaça já tem passado (cf. Is 7,4-9; Jr 10,20-26).246

Aqui, ele está declarando paz para Israel, ele não mais se vingará deste resto do

povo com a destruição. Agora só há lugar para um temor sadio, aquele que busca

andar nos caminhos de YHWH.247

Tudo isto porque o amor de YHWH por seu povo não é uma emoção que

incapacita de agir em favor de sua amada, muito pelo contrário, “YHWH sai como

um herói, como se fosse um guerreiro” e “atira-se violentamente sobre os seus

inimigos” (Is 42,13). Quando o poder de YHWH é despertado (cf. Sl 80,2), seu

amor age concretamente para salvar seu povo. Nada nem ninguém podem resistir

ao seu poder, por isso é dito ao povo: “não temerás mais o mal” (Sf 3,15).248

Embora o papel da expressão, nos versos 15c e 17a, seja similar, há uma

sutil diferença. Sua posição no verso 17a parece mais a de um herói em posição de

ataque, enquanto a imagem no verso 15c mostra YHWH como rei defendendo seu

povo.249

Os versos 17ab seguem o verso 16b, onde yair"yTi-la; é uma resposta típica

quando se quer tranqüilizar alguém diante de uma desgraça. Contudo, não

necessariamente este desastre refere-se a uma guerra (cf. Gn 21,17; Rt 3,11), por

isso é necessário saber o contexto de tal declaração para se entender a natureza do

desastre.

A frase dos versos 17ab relembra quase que palavra por palavra a súplica

existente em Jr 14,9, onde o profeta fala: “Porque és como um homem atônito,

como um guerreiro que não pode salvar? Mas tu estás em nosso meio, Iahweh, e

teu nome é invocado sobre nós. Não nos abandones!” YHWH seria para

245 Cf. MOTYER, J. A., Zephaniah, p. 957; BERLIN, A., Zephaniah, p. 145. 246 Cf. SWEENEY, M. A., Zephaniah, p. 202. 247 Cf. BARKER, K. L.; BAILEY, W., Zephaniah, p. 495. 248 Cf. ROBERTSON, O. P., Zephaniah, p. 339; MACKAY, J. L., Zephaniah, p. 293. 249 Cf. CLARK, D. J.; HATTON, H. A., Zephaniah, p. 200; BEN ZVI, E., A Historical-Critical Study of the Book of Zephaniah, p. 247.

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Jerusalém como um herói que não quer ajudar efetivamente. Eles estão diante de

uma grande seca, mas apesar da súplica, eles não estão confiantes na atuação de

YHWH. E a continuação do texto mostra que YHWH rejeitou o pedido deles.

Diferentemente do que é proclamado em Jeremias, a promessa de salvação em

Sofonias que diz: [:yviAy rABGI $Ber>qiB. %yIh;l{a/ hw"hy> (v. 17ab) responde positivamente,

pois YHWH salva e salvará, livrando-os das ameaças e do medo.250

O confronto destas duas passagens deixa claro que a presença de YHWH no

meio do povo ou da cidade não significa salvação. YHWH pode agir ou não

salvificamente.251 Por isso, é necessário tomar conhecimento de todo o anúncio.

No caso de Sf 3,15.17, frases esclarecedoras os acompanham. A revogação das

sentenças (v. 15a) e a conseqüente expulsão do inimigo ligando-se a Sf 3,15 e a

exortação ao não-temor vinculado a Sf 3,17, mostram que a ação de YHWH é

favorável e que o elemento principal da mensagem deste não traz as conotações

militares da expressão [:yviAy rABGI.252

Esta certeza fica mais clara nos três versos finais, que comunicam a alegria

que YHWH experimenta em relação ao resto de Israel, que foi por ele libertado de

todo tipo de perseguição e que agora morará em paz em Jerusalém, junto ao lugar

de sua habitação, no monte Sião.

b) a alegria de YHWH

O grande convite à alegria de que trata o texto conclui-se com três sentenças

descrevendo a alegria de YHWH.

b.1) hx'm.fiB. %yIl;[' fyfiy" (alegrar-se-á por ti com regozijo) é a primeira declaração

descritiva deste júbilo e é a única citação na BHS utilizando o substantivo hx'm.fi

para expressar a alegria de YHWH em relação a seu povo. Na outra citação,

encontra-se Coélet dizendo a seus ouvintes-leitores: “Yhwh se agrada das tuas

obras” (Ecl 9,7)

b.2) Atb'h]a;B. vyrIx]y: (guardará silêncio no seu amor) é a segunda afirmação. Esta

imagem de YHWH é única no AT. Talvez por causa disso, esta oração apresente

uma dificuldade muito grande de entendimento. Algumas hipóteses para este

silêncio são apresentadas pelos estudiosos. Uma delas é a que fala da indulgência

250 Cf. IRSIGLIER, H., Zefanja, p. 422; BERLIN, A., Zephaniah, 145. 251 Cf. SPREAFICO, A., Sofonia, p. 188. 252 Cf. BEN ZVI, E., A Historical-Critical Study of the Book of Zephaniah, p. 248-249.

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de YHWH por amor a seu povo, preferindo ficar calado quanto aos pecados de

seu povo (cf. Sl 50,21; Is 42,14).253 Uma outra leva em conta o amor

profundamente sentido, que concentra-se na amada com meditação e

admiração.254 Outra ainda baseia-se no seu plano em relação ao bem do resto.255

Muitos outros entendimentos opcionais têm sido propostos.256 Seguiremos na

linha desta segunda interpretação.

A partir daí, percebe-se que o verbo vrx é usado aqui no sentido

intransitivo, descrevendo mais a condição do sujeito que está quieto, isto é, em

silêncio, do que propriamente falando que o sujeito transmite tranqüilidade ao

objeto. Além do mais, o paralelismo que existe nos três versos (v. 17c-e) também

sugere este sentido intransitivo.

Observando-se o primeiro e o último versos (v. 17c.e), vê-se que eles

apresentam um termo médio %yIl;[' (por ti). Como no paralelismo hebraico é

comum a omissão de um termo que aparece em outra linha, é possível entendê-lo

como pertencente também ao verso intermediário (v. 17d), que seria lido

“guardará silêncio por ti no seu amor”.257

b.3) hN"rIB. %yIl;[' lygIy" (jubilará por ti com exultação) é a terceira asseveração. De

todas as palavras usadas neste oráculo para falar da alegria, lyg é a mais forte delas

no significado, todavia ainda tem um sentido apenas aproximativo, para exprimir

o júbilo que se desprende do sujeito com gritos espontâneos e entusiásticos.258

O paralelo mais comum a lyg é o verbo xmf, seguido por fwf, !nr, [wr hifil ,

zl[. Isto denota que ele pertence ao campo semântico da alegria, que muito mais

253 I. J. Ball Jr. faz alusão a Rashi e a outros comentadores judeus como apresentando esta interpretação (cf. A Rhetorical Study of Zephaniah, p. 185-186). Nesta mesma linha posiciona-se E. Ben Zvi, explicando que se houver a consideração de que Sf 3,16-17 contém uma resposta positiva para a súplica do povo, que se reconheceu pecador e sabedor da razão de suas desgraças (cf. Jr 14,7; Sl 41,5; 51,5-7), esta resposta divina será o afastamento das sentenças por causa de seu amor pelo povo (cf. Mq 7,17-19). O contraste evidente entre os versos 17d e 17e reforçam a tradução de vrx por “silenciar” (cf. A Historical-Critical Study of the Book of Zephaniah, p. 252). 254 Esta é a interpretação de C. F. Keil (cf. The Twelve Minor Prophets, vol 2. Grand Rapids: Eerdmans, 1954) citada por KING, G. A. The Remnant in Zephaniah, p. 424. 255 Cf. WALKER, L. L., Zephaniah, p. 563. 256 R. D. Patterson lista seis interpretações com seus respectivos autores. Estas, além das três apresentadas são: o descanso de Deus em seu amor, a paz e o silêncio dados por Deus ao crente e a canção de alegria de Deus de sua preocupação amante (cf. Zephaniah, p. 383). 257 Cf. ROBERTSON, O. P., Zephaniah, p. 340-341. Por outro lado, A. Berlin diz que este verso 17d, que é totalmente obscuro, interrompe um paralelismo (v. 17c.e) perfeitamente compreensível, o que sugere não ter sido este o seu lugar original (cf. Zephaniah, p. 145). 258 Cf. LEWIS, J. P., “lyg”, DITAT, p. 346.

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do que um sentimento, uma emoção ou um estado de alma é a manifestação

exterior e que acontece em comunidade. No período pós-exílico, este verbo foi

utilizado com os que lhe são semelhantes e acima citados apenas como

sinônimos.259

b.4) Considerações

A partir destas colocações, pode-se dizer que, nestes três versos finais do

texto, o profeta está falando da alegria que o próprio YHWH está sentindo pelo

triunfo do seu povo, de sua libertação e salvação.260 Outras vezes na BH se

encontram passagens que falam da alegria de YHWH, mas não com a ênfase que é

dada em Sf 3,17, de modo absoluto e lírico. Esta é uma das descrições mais

vibrantes e emocionantes que falam da alegria e do amor de YHWH por seu povo

em todo o AT.

Os sentimentos exortados ao povo pelo profeta no início do texto (v. 14) são

agora (v. 17) os do próprio YHWH. Os verbos fyf / fwf (v. 17c) e lyg (v. 17e)

poderiam simplesmente dar a entender uma alegria interior, mas a presença do

termo hx'm.fi e principalmente hN"rI, mostra enfaticamente que YHWH exterioriza

seus sentimentos exultantemente.261

A alegria proclamada nos versos 17c-e não apresenta mais o homem como

sujeito da ação, mas o próprio YHWH. O objeto desta alegria tem também

peculiaridades bem significativas. Nos outros textos que falam do júbilo de

YHWH em relação ao homem, além de não ser afirmado enfaticamente, é dito que

YHWH se alegrará por fazer o bem a Jerusalém (cf. Dt 30,9; Is 65,19; Jr 32,41),

porém encontrando a alegria mais em si próprio do que com a cidade ou com o

povo. Diferentemente em Sf 3,17, onde YHWH se alegrará pelo povo. Além

disso, o autor proclama este regozijo de forma direta, utilizando cinco termos (fwf

- hx'm.fi - vrx - lyg - hN"rI) para descrever a profundidade e a extensão deste

sentimento.262

Este sentimento de alegria que YHWH vivenciará tem seu alicerce no seu

grande amor. A utilização abundante de termos para manifestar a letícia de

259 Cf. BARTH, Ch., “lyg”, GLAT, vol. 1, p. 2067-2082. 260 P. R. House diz que as razões para a libertação do resto fundamentam-se na satisfação de YHWH com eles e no seu poder salvador (cf. Zephaniah, p. 67). 261 Cf. SPREAFICO, A., Sofonia, p. 188. 262 Cf. BARSOTTI, D., Meditazione sul libro di Sofonia, p. 157-170.

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YHWH vai surgindo progressivamente. Primeiro implica num contentamento, que

desabrocha numa manifestação externa, seguida por uma prontidão de estar junto

à pessoa amada em silêncio, que por fim não se contendo em si de amor torna a

exteriorizar este sentimento e agora com grande exultação, como se YHWH

cantasse, gritasse e dançasse.263

A pessoa divina é um todo como a pessoa humana, por isso é o ser por

inteiro que estará vibrando em seu amor. A alegria descrita assemelha-se àquela

que um jovem noivo amoroso (cf. Sl 19,6) experimenta no encontro com sua

noiva, quando esta lhe é trazida pelos amigos, pura, sem mancha, sem nenhuma

sentença pesando sobre ela. Este júbilo tão grande não será visível somente no que

ele poderá proporcionar à sua noiva, mas transparecerá naquilo que ele

experimentará (cf. Is 62,5).264 Contudo, no amor nem tudo tem necessidade de ser

pronunciado com palavras, os noivos se entendem perfeitamente. Por isso,

YHWH Atb'h]a;B. vyrIx]y: (Sf 3,17), no enlevo com sua noiva.265

Talvez a maior dificuldade esteja em compreender a imensidão deste amor

de YHWH, que o arrebatará de tal forma que o fará sair de si mesmo para alegrar-

se pela sorte do resto do povo. Para algumas pessoas é quase insondável este amor

que, de tão profundo, é capaz de perder-se no silêncio da contemplação pelos

remanescentes, é capaz de fazer emudecer para depois explodir em aclamações

que ecoam como a dos próprios redimidos quando são exortados pelo profeta (cf.

Sf 3,14).266

Mas, embora pareça excessivo o modo como o profeta expressou a alegria

de YHWH por sua amada, deve-se ter em mente que ele em sua essência é o

amor. E que se o homem, com todas as limitações de sua natureza, é capaz de

exprimir tão fortemente seus sentimentos em relação a outra pessoa, quanto mais

YHWH, que pode atingir a profundezas muito maiores sem que haja qualquer

restrição de tempo, lugar, modo e duração desta exteriorização de amor e alegria

pelo seu objeto.

263 Cf. J. A. Motyer falando da progressão da expressão de alegria diz que partindo de uma emoção que o deleita, passa a uma contemplação sem palavras da pessoa amada e não conseguindo conter-se, explode numa exultação vocal (cf. Zephaniah, p. 958). 264 Cf. BERNINI, G., Sofonia, p. 83; KELLER, C.-A., Sophonie, p. 214-215; MACKAY, J. L., Zephaniah, p. 293-294; IRSIGLIER, H., Zefanja, p. 422. 265 Cf. ESZENYEI SZÉLES, M., Zephaniah, p. 113. 266 Cf. KING, G. A., The Remnant in Zephaniah, p. 424. Para O. P. Robertson aquele Deus onipotente se deleitando com a sua criação explica-se em si mesmo, mas torna-se incompreensível como o Santo possa experimentar êxtase pelo pecador (cf. Zephaniah, p. 340).

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89

O objeto de amor de YHWH está limitado pelo termo %yIl;['. Pelo contexto

de Sf 3,14-17 fica claro que se trata da “filha de Sião – Israel – filha de

Jerusalém”, isto é, o resto do povo eleito que, mantendo-se fiel à aliança e à

promessa, foi liberto do cativeiro da Babilônia e agora já começa a usufruir das

bênçãos de YHWH. Mas, não é nele nem em algo que ele tenha feito que é para

serem encontradas as razões desta alegria irrestrita de YHWH, mas na própria

natureza do Senhor.267

Em síntese, a presença potente de YHWH $Ber>qiB. (v. 17a) como [:yviAy rABGI

(v. 17b) será motivo para ser dito yair"yTi-la;, e se tornar motivo para hx'm.fi (v. 17c)

e hN"rI (v. 17e), porque YHWH ama profundamente seu povo de modo que vyrIx]y:,

numa contemplação profunda de sua amada (v. 17d).

267 Cf. ROBERTSON, O. P., Zephaniah, p. 341-342.

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4

Sf 3,14-17 e o contexto do livro de Sofonias

4.1.

Correspondências terminológicas de Sf 3,14-17 com o conjunto do livro

A terminologia presente em Sf 3,14-17 é significativa, capaz de acentuar os

diferentes aspectos que caracterizam a imagem de Deus, enquanto evidencia o

alcance da sua intertextualidade com a mensagem de juízo no inteiro livro de

Sofonias. A partir do que foi analisado no capítulo anterior, é possível atestar que

todos os termos e expressões do texto têm uma conotação positiva e favorável ao

povo redimido.

4.1.1.

1ª seção: v. 14-15b

a) Esta seção é marcada por termos e expressões hápax legómena em

Sofonias:268

− !nr – [wr – xmf – zl[

A unicidade destes verbos no livro mostra o contraste do texto com o escrito

que lhe antecede, visto que compõem a exortação à alegria que Sofonias dirige

aos redimidos por YHWH.269 No entanto, o adjetivo zyLi[; (alegre), da mesma raiz

do verbo zl[, aparece duas vezes no livro em sentido pejorativo. A primeira no

f.sg., em 2,15, falando da Assíria como hz"yLi[;h' ry[ih' (a cidade alegre) e a segunda

no pl. qualificando %tew"a]G: yzEyLi[; (os alegres orgulhosos), em 3,11. Ambas as

citações descrevem os inimigos do povo, os externos e os internos, que serão

afastados por YHWH. Portanto, é uma alegria apenas passageira, que diverge do

regozijo ao qual o povo está sendo convidado, que é duradouro.

Em antagonismo à alegria que o povo é exortado a manifestar pelas ações

salvíficas de YHWH, encontra-se, em 3,11, YHWH falando ao povo sobre o

268 Cf. Tabela 2 e 7, p. 135.138, respectivamente. 269 Além disso, a forma verbal yzIl.[' no qal imperativo f.sg. é um hápax legómenon na BHS (cf. EVEN-SHOSHAN, A., “yzIl.['”, A New Concordance of the Bible, p. 880).

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tempo em que te yBi T.[;v;P' (revoltaste contra mim). O verbo [vp expõe uma atitude

oposta do povo, que em lugar de louvar a YHWH, rebela-se contra ele. Outro

antagonismo aparece na demonstração do sentimento, que em lugar da alegria será

de pavor, manifestado em 1,10 através dos termos e expressões de hq'['c. lAq

(grito), hl'l'ywI (uivo) e lAdG" rb,v,w> (grande lamento) no yôm YHWH, como também

com os verbos lly (uivar) em 1,11 e lhb (sentir pânico) em 1,18.

Ainda uma outra ação antagonista pode ser observada em 1,16 com o

tArcuB.h; ~yrI['h, l[; h['WrT. (grito de guerra contra as cidades fortificadas), cuja

proteção encontra-se nos muros da cidade, enquanto no texto o verbo [wr deixa

claro que o grito é de júbilo, entretanto é devido unicamente à proteção de

YHWH.270

− !AYci-tB; – ~Øil'v'Wry> tB;

Estas expressões únicas, que se referem ao povo redimido do pós-exílio,

estão em continuidade com 3,10, onde se lê yc;WP-tB; (filha da minha dispersão),

mencionando este mesmo povo enquanto ainda no período exílico. A diferença

entre as duas expressões do texto de estudo e esta última, que lhes antecede, está

também no espaço temporal, mostrando que há uma continuidade no escrito de

Sofonias.

− ble-lk'B.

O substantivo ble, escrito desta forma, aparece mais duas vezes fora do texto

na forma mais extensa bb'le, porém com uma conotação de castigo. Em 1,12

YHWH castigará os homens que dizem ~b'b'l.Bi (no coração deles) que YHWH

nada pode fazer. Enquanto em 2,15 é a soberba Assíria que se gaba Hb'b'l.Bi (no seu

coração) de si mesma, porém também será castigada. Nos dois casos o coração,

em vez de servir para conclamar a alegria, era o lugar para arquitetar planos e

pensamentos perniciosos.

A expressão, por sua vez, traz uma característica muito marcante do livro,

que é trabalhada com o termo lKo, um substantivo em hebraico, citado 22 vezes e

que transmite a noção de “totalidade”. Nela, o profeta exorta a “todos” os

membros da comunidade dos redimidos a alegrar-se, envolvendo-se com “todo” o

270 Cf. WEIGL, M., Zefanja, p. 226.

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seu ser, porque YHWH agiu em seu favor. Em situação antagônica encontra-se

YHWH contra “todo” tipo de injustiça, de impiedade, de idolatria271. Há, porém, a

advertência a “todos os pobres da terra” para buscar a YHWH (cf. 2,3), que

promete salvar a todos (cf. 3,9.11) e dar-lhes reconhecimento entre todos os povos

da terra (cf. 3,19.20) e ainda colocar “os animais de todas as espécies” repousando

na terra destruída (cf. 2,14). Com esta colocação Sofonias deixa bem claro que

YHWH não admite meio termo, ou se é totalmente a favor dele ou totalmente

contra ele.

− %bey>ao hN"Pi

Tanto esta expressão, como o verbo hnp e o verbo/substantivo bya, são

hápax.272 Em Sofonias encontram-se outras passagens, que, embora não utilizando

estes termos, têm uma conotação similar. YHWH declara a seu povo: %tew"a]G: yzEyLi[;

%Ber>Qimi rysia' (tirarei do meio de ti os alegres orgulhosos), em 3,11, e %yIN:[;m.-lK'-ta,

hf,[o ynIn>hi (eis-me agindo contra todos os teus opressores), em 3,19. Em direção

oposta coloca-se a citação em 3,8, que apresenta um oráculo de YHWH dizendo que

derramará a sua cólera sobre toda a terra, englobando Jerusalém num castigo comum

e universal.

Em antonímia está o verbo dqp (visitar), que na forma verbal qal pode tomar

um valor negativo com o significado de “castigar, exigir contas”. Deste modo pode-se

encontrar YHWH prometendo punir a todos de seu povo que se afastaram dele (cf.

1,8.9.12).

b) Termos que nomeiam o povo e que ocorrem, cada um deles, duas vezes no

texto:273

− !AYci

Este substantivo não aparece fora do texto. Porém, em situação contrastante,

em 3,11 há uma menção a Sião através da expressão yvid>q' rh;B. (no meu monte

santo), não mais aludindo ao povo e sim ao lugar geográfico, de onde YHWH

retirará todos os inimigos do povo.

271 Cf. Sf 1,2.4.8.9.112.182; 2,112.15; 3,72.82; 3,19. 272 Inclusive a forma verbal hN"Pi no piel qatal na 3ª m.sg. é um hápax legómenon na BHS (cf. EVEN-SHOSHAN, A., “hN"Pi”, A New Concordance of the Bible, p. 948). 273 Cf. Tabela 1 e 7, p. 135.138, respectivamente.

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− laer"f.yI

Fora do texto, a ocorrência deste substantivo se dá apenas mais duas vezes.

Contudo, a referência é sempre o povo de Israel que é observante dos preceitos de

YHWH e em contexto favorável a ele. Em 2,9 aparece ligado a um atributo de

YHWH, de ser o laer"f.yI yhel{a/ (Deus de Israel) e em 3,13 encontra-se declarado

quem é laer"f.yI tyrIaev. (o resto de Israel).

− ~Øil;v'Wry>

Este substantivo também só ocorre mais duas vezes no restante do livro.

Diferentemente das passagens do texto, estas outras tratam de palavras duras de

maldição dirigidas ao povo pecador: ~Øil'v'Wry> ybev.Ay-lK' l[;w> hd"Why>-l[; ydIy" ytiyjin"w>

(estenderei minha mão contra Judá e contra todos os habitantes de Jerusalém),

em 1,4, e tArNEB; ~Øil;v'Wry>-ta, fPex;a ] (eu esquadrinharei Jerusalém com lanternas),

em 1,12.

c) Expressão e termos restantes:274

− %yIj;P'v.mi rysihe

O verbo rws, aqui na voz de Sofonias, está na forma verbal do hifil qatal na

3ª m.sg. Em continuidade de sentido ocorre ainda em 3,11, agora na forma verbal

do hifil yiqtol na 1ª sg., o que denota que o próprio YHWH está se dirigindo ao

povo para comunicar-lhe: %tew"a]G: yzEyLi[; %Ber>Qimi rysia' (eu afastarei de teu seio os

alegres orgulhosos), os quais significam os inimigos internos. A diferença está no

espaço temporal, mostrando que em 3,15 a promessa anterior de 3,11 já havia se

tornado realidade.

Por outro lado, o substantivo jP'v.mi, aqui com sufixo de 2ª f.sg., %yIj;P'v.mi,

ocorre mais três vezes e em cada uma apresenta um sentido diverso. Em duas

delas, o substantivo aparece com o sufixo de 3ª m.sg. e denotam uma advertência:

a primeira, em 2,3, com a acepção de “decreto, mandamento”, incentivando a

buscar YHWH todos os Wl['P' AjP'v.mi rv,a] (que cumprem seu preceito), de modo a

não sofrerem o castigo que está para vir; a segunda, em 3,5, com o significado de

“julgamento”, pois YHWH !TeyI AjP'v.mi rq,BoB; rq,BoB; (manhã após manhã promulga

o seu juízo), que pode ser de maldição ou bênção. O último termo, que vem ligado

274 Cf. Tabela 1 e 7, p. 135.138, respectivamente.

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a um sufixo de 1ª sg., acontece em 3,8 em sentido negativo, uma vez que YHWH

está avisando que trará o castigo sobre toda a terra, incluindo os não-tementes do

povo.

− hwhy

As outras ocorrências do termo, de acordo com a situação, mostram

continuidade ou oposição de sentido. Com YHWH como o sujeito da frase,

encontra-se:

• favorável a seu povo (cf. 2,7.9.10.11; 3,12.20);

• favorável a todos os povos (cf. 3,9);

• contra seu povo (cf. 1,7.10; 2,5; 3,5.8);

• contra todos os povos (cf. 1,2.3.17).

Com YHWH como objeto, tem-se:

• uma postura positiva de seu povo diante dele (cf. 1,7);

• uma postura positiva de todos os povos diante dele (cf. 2,3);

• uma postura negativa de seu povo diante dele (cf. 1,5.62.12; 3,2);

• uma palavra neutra dirigida ao profeta quando de sua vocação (cf. 1,1).

E ainda relacionado ao yôm YHWH negativamente (cf. 1,7.8.142.18; 2,22) e

positivamente, em advertência (cf. 2,3).

d) Primeiras conclusões:

A seção apresenta, no aspecto terminológico, poucos elementos de contato

com o restante do livro de Sofonias. Encontram-se numerosos hápax legómena,

não só em relação aos termos, mas também nas expressões utilizadas. Por outro

lado, as situações opostas verificadas através dos próprios termos ou de seus

antônimos são suficientes para mostrarem-se em sintonia com os capítulos

anteriores.

Dentre os pontos de contato de oposição é importante destacar Sf 3,10-11,

que está relacionado com as promessas. Seu povo é chamado de “filha da minha

dispersão”, porque seus integrantes estavam sofrendo o castigo pelos seus erros,

mas que trariam futuramente suas oferendas como verdadeiros adoradores de

YHWH (cf. 3,10); não teriam mais vergonha de seus erros e seus inimigos

orgulhosos seriam afastados (cf. 3,11). Enquanto em Sf 3,14-15 estas promessas

já se tornaram realidade. A “filha” já voltou do exílio e está em Sião–Jerusalém, o

castigo foi revogado e os inimigos afastados (cf. 3,14-15).

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A verdadeira alegria, apregoada e manifestada através de gritos e danças em

Sf 3,14-17, traz um outro ponto de contato digno de ser mencionado, uma vez que

no livro não existe outro momento propício. Em oposição encontra-se o medo e o

pânico (cf. 1,10.11.18), com o grito de guerra (cf. 1,16); enquanto em contraste

aparece uma falsa alegria dos inimigos externos e internos (cf. 2,15; 3,1).

Um estágio redacional posterior é sugerido pela terminologia nova usada,

pela diferença a nível cronológico e comportamental tanto da parte do povo como

da parte de YHWH, denotando uma passagem de tempo e uma nova situação

histórica. O texto final do livro muda a situação de juízo condenatório, tanto

descrito como ameaçada, para uma condição de salvação.

4.1.2.

2ª seção: v. 15c-16

a) Termos e expressões que se apresentam como hápax legómena em

Sofonias:275

− [r:

O termo “mal” empregado no verso 15c, explicitamente, e no verso 16b,

implicitamente, engloba todas as impiedades e injustiças descritas no livro e que

agora eles não precisarão mais temer; ainda que este vocábulo não seja aplicado

diretamente para mencionar tais desgraças.

− laer"f.yI %l,m,

Esta expressão indica a realeza de YHWH, num governo teocrático sobre

Israel. A expressão é única no livro, porém o termo %l,m, comparece mais duas

vezes. A primeira citação, em 1,1, serve apenas para situar o ministério de

Sofonias no tempo de Josias, hd"Why> %l,m, (rei de Judá). A ocorrência em 1,8 é

diametralmente oposta ao sentido do texto, visto que faz referência aos príncipes e

%l,M,h; ynEB; (os filhos do rei), que num governo monárquico nos moldes das outras

nações, têm uma postura idólatra. Estes mesmos príncipes aparecem citados em

3,3 também numa palavra dura contra eles, que “no meio do povo rugem como

leões”, mas que o juízo recairá sobre eles. Mais negativamente ainda, a raiz $lm

275 Cf. Tabela 4 e 7, p. 136.138, respectivamente.

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aparece em 1,5 no nome da divindade ~Kol.mi, que está associada com a suprema

apostasia do povo de adorar um falso %l,m,.276

− %yId"y" WPr>yI-la;

Além da expressão, os termos que a compõem, o verbo hpr e o substantivo

dual com sufixo de 2ª f.sg. %yId"y", também são hápax. Nas outras três vezes em que

o termo dy" aparece fora do texto, ele é usado no singular e em sentido de

condenação. A primeira ocorrência está com um sufixo de 1ª sg., quando YHWH

diz: “estenderei ydIy" (a minha mão) contra Judá” (1,4); as outras duas com um

sufixo de 3ª m.sg., Ady" (a sua mão), reportando-se ao fato de que, em 2,13, YHWH

!Apc'-l[; Ady" jyEw> (estenderá a sua mão contra o Norte), isto é, a Assíria, que depois

de desolada, em 2,15, Ady" [:ynIy" qrov.yI h'yl,[' rbeA[ lKo (quem passa por ela assobia e

agita a sua mão).

b) Termos e expressões que ocorrem no restante do livro:277

− %Ber>qiB.

Esta mesma expressão com o sufixo de 2ª f.sg. aparece em 3,12, porém

difere na atuação, uma vez que se trata de uma promessa de salvação ao resto que

ainda está sofrendo a opressão. Outras três passagens aparecem no livro com

alguma modificação da expressão. Em duas delas HB'r>qiB. (no meio dela), com

sufixo de 3ª f.sg., refere-se a Jerusalém. A primeira, em 3,5, apresenta YHWH

atuando como juiz e promulgando suas sentenças de castigo ou salvação. A

segunda está em 3,3 e é condenatória, visto que YHWH fala da liderança da

cidade que oprime seu povo. A última passagem, em 3,11, traz %Ber>Qimi (do teu

meio), mantendo o sufixo de 2ª f.sg., mas mudando o prefixo para !mi, todavia, é da

mesma forma condenatória, pois fala da expulsão do meio do resto daqueles que

são soberbos.

− ary

Este verbo reaparece em 3,7, na mesma forma verbal yair>yTi, em total

oposição. Trata-se de uma afirmação positiva de YHWH, contudo com um sentido

negativo, porque ele esperava que o povo passasse a temê-lo, vendo como ele

276 Cf. CULVER, R. D., “%l,m{”, DITAT, p. 844-845. 277 Cf. Tabela 3 e 7, p. 136.138, respectivamente.

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aniquilou as nações, mas isso não aconteceu. Enquanto nas duas vezes que

aparece no texto de estudo, o verbo embora com uma partícula negativa acoplada,

tem um sentido positivo, dado que são exortações feitas ao povo para “não temer”,

não desanimar, porque YHWH vela pelo seu resto redimido.

− aWhh; ~AYB;

Várias são as expressões usadas para falar do yôm Yhwh. A única

declaração de salvação advinda com a chegada deste dia é a de 3,16 com a

expressão aWhh; ~AYB; (naquele dia). Esta mesma expressão ocorre em 3,11 num

momento de promessa desta salvação para o povo e em 1,9.10 descrevendo o

castigo de YHWH. Outras citações a respeito deste yôm apresentam modificações

em sua formulação, podendo ter um cunho de ameaça ou de advertência. Assim,

encontra-se em 1,15.16 e 2,2 como um ~Ay (dia) de angústia; em 1,15.18 como

hw"hy> tr:b.[, ~AyB. (no dia da cólera de Yhwh); em 2,2.3 como hw"hy>-@a; ~AyB.. (no dia

da ira de Yhwh); em 1,7.14 hw"hy> ~Ay (dia de Yhwh); em 1,8 hw"hy> xb;z< ~AyB. (no dia

do sacrifício de Yhwh); em 3,8 ~Ayl . (para o dia). O único uso do termo ~Ay no

plural surge no versículo de abertura do livro com ymeyBi (nos dias) “de Josias”

(1,1), fazendo referência ao tempo em que a palavra de YHWH foi dirigida a

Sofonias.

Ainda na alusão ao yôm YHWH encontra-se no livro o termo t[e (tempo).

Com uma conotação negativa, aparece em 1,12 onde é dito: ayhih; t[eB' (naquele

tempo) do castigo para Jerusalém e em 3,19, com a mesma expressão, é predito o

castigo para os opressores do povo. Contrariamente, em 3,20 há uma mensagem

de esperança e promessa para Jerusalém nas duas vezes em que o termo aparece:

uma com a mesma expressão e a outra somente com t[eB' (no tempo).

c) Primeiras conclusões:

Apesar dos hápax legómena que continuam a surgir no texto,

terminologicamente esta seção também se apresenta ancorada no escrito de

Sofonias. Isto pode ser detectado pela posição antagônica de várias afirmações,

como também através das expressões %Ber>qiB. e aWhh; ~AYB; e do verbo ary, que

ajudam a fazer o elo com o restante do escrito, mostrando que há uma

transformação do contexto inicial do livro.

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Os pontos de contato que chamam mais atenção são três. No primeiro trata-

se do reinado de YHWH no futuro (cf. 3,15), que está em total oposição aos reis

do passado, corruptos, idólatras e que não defendiam seu povo, mas apenas seus

interesses (cf. 1,8; 3,3).

A segunda oposição encontra-se no termo “mão”, que é usado em sentido de

condenação: por YHWH para destruir (cf. 1,4; 2,13) ou pelo homem para

demonstrar desdém (cf. 2,15); enquanto as mãos dos redimidos, que não devem

desfalecer, estarão agindo para construir (cf. 3,16).

Por fim, o terceiro ponto, que deve ser mencionado, se relaciona com o

verbo “temer”. Enquanto os ímpios não temem YHWH com reverência, mas com

medo das desgraças (cf. 3,7); os remidos não temem as desgraças porque têm um

temor reverencial por YHWH (cf. 3,16).

Novamente aparece o fator cronológico, mostrando um processo de

realização das promessas em andamento, reforçando a sugestão de um estágio

redacional posterior. Mas mais do que isso se evidencia o motivo teológico, que

tem por objetivo mostrar a mudança ocorrida, que de uma situação de perdição

passa a uma condição de restauração e recriação.

4.1.3.

3ª seção: v. 17

a) Esta seção é quase que totalmente marcada por termos e expressões hápax

legómena em Sofonias:278

− hx'm.fiB. %yIl;[' fyfiy " – Atb'h]a;B. vyrIx]y: – hN"rIB. %yIl;[' lygIy"

Estas expressões, que fazem parte do discurso do profeta em relação à

manifestação de alegria, agora da parte de YHWH, como também os verbos que

as compõem fyf / fwf – vrx – lyg e os substantivos hx'm.fi e hN"rI são hápax.

Em antagonismo aos verbos e aos substantivos que traduzem a alegria

sentida por YHWH em relação aos redimidos, encontra-se a expressão @a; + !Arx'

(furor da ira), que ocorre duas vezes fora do texto. Em 2,2 encontra-se o apelo à

conversão feito por Sofonias à nação para que não tem vergonha de mudar

enquanto é tempo: hw"hy>-@a; !Arx] ~k,yle[] aAby"-al{ (não venha sobre vós o furor da

278 Cf. Tabela 6 e 7, p. 137.138, respectivamente.

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ira de Yhwh) e, em 3,8, YHWH que diz: yPia; !Arx] lKo ymi[.z: ~h,yle[] %Pov.li (derramar

contra eles minha indignação, todo o furor da minha ira).

− [:yviwOy rABGI

Somente a expressão é hápax. O verbo [vy é usado mais uma vez fora do

texto, em 3,19. Em similaridade de sentido, também na forma verbal do hifil ,

porém na 1ª sg., deixando claro que é o próprio YHWH, que dirigindo-se ao povo,

afirma: h['leCoh;-ta, yTi[.v;Ahw> (salvarei as que coxeiam). Enquanto em 3,17 é o

profeta que fala da salvação que será trazida por YHWH.

Com terminologia sinonímica a [vy encontra-se o verbo lcn em 1,18 onde

está escrito que hw"hy> tr:b.[, ~AyB. ~l'yCih;l. lk;Wy-al{ (não poderá salvá-los no dia da

cólera de Yhwh), porém em situação oposta à do texto. E com terminologia

antinonímica a [vy, como também em contraposição ao texto, aparecem os verbos:

@ws (aniquilar) na forma verbal do hifil (cf. 1,2.3); trk (extirpar) na forma verbal

do hifil (cf. 1,3.4; 3,6) e do nifal (cf. 1,11; 3,7); dba (destruir) na forma verbal do

hifil (cf. 2,5) e do piel (cf. 2,13).

O substantivo rABGI também aparece uma única vez fora do texto, porém num

contexto totalmente oposto. Porque fala de um homem herói que, no yôm YHWH,

não terá a mínima força para salvar a si mesmo, quanto mais lutar pelo povo. A

passagem de 1,14 comenta que até rABGI ~v' x;rEc{ (o herói gritará).o

− Atb'h]a;B. vyrIx]y:

Apesar da expressão ser hápax, em 1,7 aparece a partícula de interjeição sx;

(calai, silêncio) em sentido sinonímico oposicional. Porque está dando uma ordem

ao povo pecador, afastado de YHWH, para calar-se diante dele, pois o yôm Yhwh

está próximo e será o dia de sua ira. Por outro lado, no texto, é YHWH quem se

cala diante de seu povo redimido, enlevado em seu amor.

b) Termos e expressões que ocorrem no restante do livro:279

− %yIh;l{a/ hw"hy>

A ocorrência desta expressão em 2,7 dá-se com a mudança do sufixo para 3ª

m.pl., ~h,yhel{a/ hw"hy > (Yhwh seu Deus); a mesma fórmula de modo ampliado em 2,9

279 Cf. Tabela 5 e 7, p. 137.138, respectivamente.

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100

laer"f.yI yhel{a/ tAab'c. hw"hy> (Yhwh dos exércitos, Deus de Israel); e em 3,2 com o

profeta chamando a atenção do povo que não se aproxima de h'yh,l{a/-la, (seu

Deus), aparecendo com sufixo de 3ª f.sg. Estas três citações estão com sentido

negativo. Além destas, o termo é usado para os ídolos em 2,11, onde YHWH diz

que aniquilará yhel{a/-lK' (todos os deuses).

c) Primeiras conclusões:

A análise acima deixa bem visível a quantidade de hápax legómena nesta

parte do escrito, mais acentuada que o material do texto que lhe antecede.

Todavia, há pontos de contatos com as expressões %yIh;l{a/ hw"hy> e %Ber>qiB. como o

termo rABGI que aparecendo em posições contrárias ao restante do escrito, mostram

uma mudança na condição do povo, denotando, com isso, haver uma continuidade

com os capítulos precedentes. Por outro lado, o verbo [vy faz a ponte entre o texto

de estudo com a parte do livro que vem escrita logo a seguir e que o encerra,

reafirmando o desenvolvimento contínuo do livro.

Importante lembrar é a figura do “herói”, que quando se trata de um homem,

este não pode salvar ninguém da ira de YHWH, enquanto quando o herói é o

próprio YHWH, todos que dele se aproximam recebem a salvação.

Com terminologia sinonímica, embora em total oposição, duas situações

chamam a atenção. O verbo “salvar”, que enquanto YHWH como rei e Deus de

Israel salvará seu povo ([vy), nem a prata nem o ouro poderá salvar o povo que

não tem YHWH como seu rei e seu Deus (lcn). E a questão do “silêncio”, que os

pecadores devem guardar diante de YHWH por causa de sua ira; enquanto por

causa do amor de YHWH, ele próprio guarda silêncio diante dos redimidos de seu

povo.

Assim, é possível observar que a utilização de termos sinônimos e

antônimos no restante do livro corrobora e, ao mesmo tempo, acentua a

profundidade da mensagem que Sofonias quer passar para seus ouvintes-leitores.

Ele quer mostrar a vitória do bem sobre o mal, da justiça sobre a injustiça, do

justo sobre o injusto, o que provoca a mudança de uma iminente destruição para

uma situação de salvação, que vem a gerar o estado de alegria em que se

encontram YHWH e seu povo. Ao mesmo tempo em que reafirma a prevalência

da sugestão do estágio redacional posterior, tanto pela terminologia quanto pela

mensagem que é passada através do escrito.

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101

4.2.

Correspondências temáticas de Sf 3,14-17 com o conj unto do livro

4.2.1.

1ª seção: v. 14-15b

Os temas que se encontram nestes versículos não se apresentam no restante

do livro como tal, porém mostram uma evolução dos eventos vivenciados pelo

povo, tais como:

a) a alegria (v. 14)

b) os nomes pelos quais é exortado (v. 14)

c) a anistia das sentenças (v.15a)

d) a libertação de qualquer poder opressor (v. 15b)

Cada tema será estudado separadamente em vista de deixar bem evidente a

reversão do quadro inicial e as novas perspectivas.

a) A alegria do povo não é mencionada em nenhum momento do livro até este

ponto. Pelo contrário, logo após a introdução (cf. 1,1), Sofonias começa

pronunciando um oráculo de YHWH, comunicando que suprimirá tudo da face da

terra, homens e animais (cf. 1,2-3). YHWH continua: “estenderei a minha mão

contra Judá e contra todos os habitantes de Jerusalém” (1,4; cf. 1,12-13), visto

que aqueles que detêm o poder, ou seja, príncipes, juízes, profetas e sacerdotes,

são corruptos e idólatras, como também muitos do povo (cf. 1,5-6.8-9; 3,1-4). As

nações opressoras do povo eleito, dos quatro cantos da terra, também receberão a

visita de YHWH. Elas serão destruídas, traspassadas pela espada, suas terras se

tornarão um deserto (cf. 2,4-15).

Este castigo de YHWH é proveniente de sua justiça, porque ele é o justo e

não pode aceitar a iniqüidade (cf. 3,5). Mas, apesar de todo seu descontentamento,

em algumas ocasiões é colocada uma advertência para a mudança de vida, isto é,

para a conversão a ele (cf. 2,1-3; 3,8). Como também há momentos em que são

proferidas promessas de restauração (cf. 3,9-13). Todavia, em nenhum ponto no

decurso do escrito se pode depreender qualquer sintoma de alegria. O tom de

júbilo encontrado no texto mostra que a guerra contra aqueles que não se

mantiveram na aliança com YHWH está no passado; agora os fiéis são vitoriosos.

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102

b) Sofonias, ao convidar o povo à alegria, utiliza uma forma carinhosa para

dirigir-se a ele: “filha de Sião – Israel – filha de Jerusalém”. Isto está em

continuidade com 3,10, onde o próprio YHWH fala ao resto do povo pobre e

humilde, que se encontra no exílio. Ao dirigir-se a estes membros do povo, para

fazer-lhes uma promessa de libertação e de uma vida tranqüila, YHWH chama-os

afetuosamente de “filha da minha dispersão”.

No restante do escrito não há nenhuma outra nomeação delicada nem a

Sião–Jerusalém, nem a nenhuma das nações. Pelo contrário, diferentemente do

contexto do texto, as duas vezes em que YHWH direciona seu discurso a

Jerusalém é para condená-la por suas más ações (cf. 1,4.12).

c) O tema da anistia das sentenças é muito relevante no contexto do livro. Na

leitura do escrito pode-se perceber o desenrolar de uma situação, que a princípio

era caótica e mostrava-se insustentável, passando para uma promessa de

clemência e chegando, por fim, a um estado de remissão. Os pecados do povo

eram inúmeros (cf. 1,4-6.8-9.12-13; 3,1-4.7.11) e YHWH a cada dia apresentava-

se como juiz (cf. 3,5) e testemunha (cf. 3,8) para julgá-los. Inclusive ele aniquilou

as nações para lhes servir de exemplo, mas nem isto os demoveu, pelo contrário

ainda tornaram-se mais arraigados a seus atos injustos (cf. 3,6-7).

Entretanto, não é a intenção de YHWH destruir a obra de sua criação, nem

muito menos ser injusto. Por isso, ele vem em socorro do fraco e indefeso. A

princípio através de advertências a fim de que eles não sejam pegos de surpresa,

mas tenham a chance de procurar a salvação (cf. 2,1-3), porque o dia do ajuste de

contas, o yôm YHWH, será terrível (cf. 1.7.10-11.14-18). Numa segunda instância

YHWH promete um indulto a todos que invocam o seu nome e colocam-se

debaixo de seu jugo (cf. 3,9-13). Até chegar ao tempo da salvação daqueles que o

buscaram de coração sincero (cf. 3,14-20). É clara a evolução da ação de YHWH

visando à justiça.

d) Junto com o tema da revogação do castigo surge um outro que fala do

afastamento do inimigo. O que é muito sugestivo pela interligação que há entre os

dois temas.280 Anteriormente, YHWH menciona a utilização do recurso de reunir

as nações e os reinos para executar sua condenação contra o povo (cf. 3,8). Assim,

estas nações constituiriam os inimigos externos. Depois, YHWH diz que afastará

280 Cf. comentário ao versículo, p. 69-71.

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103

os orgulhosos fanfarrões de sua montanha santa, significando os inimigos internos

do povo, aqueles que em vez de lutar pelos membros da sociedade ainda lhes

impunham mais opressões (cf. 3,11).

Desta forma, o afastamento do inimigo por YHWH constitui para os

redimidos o banimento de todo o tipo de opressão, para que eles possam ser

apascentados e repousar sem que ninguém os inquiete (cf. 3,13). Isto é um fator

muito forte para levá-los ao grande clamor de alegria (cf. 3,14).

4.2.2.

2ª seção: v. 15c-16

Estes versículos oferecem temas que continuam a reforçar o desenrolar de

um processo de implantação da justiça, presenciado desde o início do livro. Ao

mesmo tempo em que eles dão seguimento e um maior entendimento à seção

anterior. São eles:

a) o reinado de YHWH (v. 15c)

b) o porquê do não-temor (v. 15d.16b)

c) o yôm YHWH (v. 16a)

d) o chamado à ação (v. 16c)

As perspectivas para a vida do povo mostram-se extremamente favoráveis,

em total oposição à antiga condição. As características desta diferença são:

a) A abordagem inicial do livro, embora situe Sofonias no tempo do reinado de

Josias, rei de Judá (cf. 1,1), dá a entender que o povo estava sem um soberano

sentado no trono. O escrito menciona os príncipes, os filhos do rei (cf. 1,8) que

rugem como leão (cf. 3,3). O uso desta metáfora, do rei dos animais rugindo,

sublinha a sua investida sobre a presa indefesa de forma cruel, opressiva e

egoísta.281

Diferentemente, coloca-se a soberania de YHWH. Ele é o rei justo, que luta

por seus súditos (cf. 2,4-15; 3,11), não oprime o fraco, nem aquele que o busca

sinceramente. Pelo contrário, ele mesmo deseja que o procurem, como pode-se

entender das palavras de Sofonias: “procurai a YHWH, vós todos os pobres da

terra, que realizais a sua ordem” (2,3).

281 Cf. MOTYER, J. A., Zephaniah, p. 942.

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104

b) O capítulo inicial da profecia de Sofonias deixa entrever um clima tenso, onde

YHWH mostra-se insatisfeito com o agir dos homens. Ele diz que visitará e

aniquilará toda a sua criação (cf. 1,2-6.8-13.17-18). Diante disso, humanamente

falando, o homem não pode deixar de sentir pavor. Muito mais aquele que não

pratica a iniqüidade, que é reto em sua conduta diante de YHWH e dos homens.

Seria uma contradição pedir que eles não temessem, visto que até o homem

valente, acostumado com as guerras, temerá e gritará por socorro (cf. 1,14), gritos

e uivos dos habitantes se levantarão (cf. 1,10-11). Por outro lado, apesar de

YHWH destruir as nações para servir de exemplo a seu povo, os ímpios não

temem a YHWH com um temor reverencial.

Todavia, no texto de estudo, o resto do povo, que agora habita em

Jerusalém, é exortado a não-temer (cf. 3,15.16). Este convite, surgindo depois da

ação de YHWH a favor deles, sugere que agora eles não estão mais sob uma

situação de ameaça. Contudo, este não-temor, significando não ter medo, vem

acompanhado de um temor reverencial a YHWH. Indicando, com isso, que houve

uma alteração no seu contexto histórico e comportamental.

c) Nitidamente apresentado no livro é o caráter judicial e punitivo associados ao

yôm YHWH, tanto para Judá–Jerusalém como para as nações circunvizinhas, que

na história do povo foram motivo de opressão (cf. 1,7.14-18). Este yôm manifesta

a ação de YHWH, que parece ter sido esquecido por seu povo (cf. 1,6), por causa:

da idolatria (cf. 1,4-5.8-9); das várias injustiças praticadas pelos diversos níveis de

liderança do povo (cf. 3,3-4) e daqueles soberbos que de alguma forma atingem os

fracos (cf. 3,11); enfim, do descaso daqueles que “dizem em seu coração: Yhwh

não faz o bem nem o mal” (1,12).

A descrição deste yôm revela que YHWH não é um Deus passivo e alheio

ao ser e ao agir de sua criação, de modo especial o seu povo. Ele não admite

injustiças contra o seu nome e contra as classes mais fracas. Ele acabará com a

falsa confiança daqueles que se julgam detentores de algum poder. Por si só

ninguém poderá escapar da ira de YHWH que se acende no fogo de seu zelo, pois

“nem a prata nem o ouro serão capazes de salvá-los” (1,18). O yôm YHWH será

um “dia de angústia e de tribulação” (1,14).

Contudo, YHWH é justo e quer a salvação dos homens. Por isso, antes da

chegada do seu yôm ele procura advertir os homens (cf. 2,3), promete a libertação

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105

dos que manifestam um temor reverencial por ele (cf. 3,9-13.18-20) e tenta,

pedagogicamente, fazer seu povo mudar de atitude através da lição aplicada às

outras nações (cf. 3,6). Assim, aqueles que não estavam afastados dele, bem como

os que, entendendo seu chamado, se converteram a tempo, puderam ter seu

destino mudado e começaram a usufruir das bênçãos recebidas. É a estes que

Sofonias diz: “naquele dia se dirá” (3,16a), significando o dia no qual a salvação

estará completa, porque no momento da profecia eles viviam “o já e ainda não” da

restauração final.

d) YHWH não é inerte, ele está agindo permanentemente (cf. 3,19). Ele observa

e julga a cada dia (cf. 3,5). Toda a profecia narra suas ações passadas, presentes e

futuras. Por isso, ele quer que todos estejam em ação, não quer ninguém

desanimado, com as mãos inativas. Dentro desta perspectiva encontra-se, no texto,

o chamado aos redimidos para não deixar que suas mãos desfaleçam, ou seja,

fiquem sem ação.

Contudo, ele quer ações justas, inteiramente opostas àquelas praticadas

pelos que estavam afastados de YHWH. Sofonias relata o proceder das principais

classes de liderança do povo: príncipes, juízes, profetas e sacerdotes (cf. 3,3-4).

Cada um dentro de seu campo de atuação apresenta-se em oposição à atuação

desejada e esperada por YHWH. Todos parecem preocupados com o acúmulo de

riquezas, que infelizmente não poderá salvá-los. Outra má ação que também

denota ser uma prática comum e abominável entre o povo é a idolatria, pois eles,

embora se “prostrem diante de YHWH”, não deixam de procurar também outros

deuses (1,5; cf. 1,8-9).

4.2.3.

3ª seção: v. 17

Os temas do v. 17, dando prosseguimento e justificando as seções

anteriores, apresentam uma postura de YHWH diversa daquela dos capítulos

iniciais do livro. São eles:

a) YHWH no meio do povo (17a, cf. 15c)

b) YHWH, Deus de Israel (v. 17a)

c) YHWH, o herói que salva (v. 17b)

d) a alegria de YHWH (v. 17c-e)

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106

O relacionamento de YHWH com o povo mostra perspectivas novas. As

promessas feitas precedentemente, agora estão em pleno curso de realização,

mostrando que algo de bom aconteceu.

a) A presença de YHWH no meio do povo é evidente. Não dá sinais de

abandoná-lo. Vê, ouve, conhece a miséria do povo. Sofonias assevera isto quando

diz que “manhã após manhã ele promulga o seu julgamento, à aurora ele não

falta” (3,5). Enfatizando a diferença entre sua atuação e aquela exercida pelas

lideranças no meio do povo (cf. 3,3-4).

A diferença dentro do livro está na ligação afetiva entre ele e seu povo.

Inicialmente YHWH apresenta-se no meio do povo como juiz e testemunha (cf.

3,5.8). A situação apresenta-se tão caótica que ele mostra-se consumido pelo ardor

da sua ira (cf. 3,8). Sofonias dá a entender que YHWH parece ser abandonado por

seu povo, substituindo-o por seus ídolos, pelos seus interesses econômico-social-

político-religiosos, que não se apresentam em sintonia com a justiça dele.

Em contrapartida, no nosso texto ele deleita-se no meio daqueles que ele

redimiu. Porque estes o buscam e o seguem, se alegram pelas suas obras. Ele está

no meio do povo como seu rei e seu Deus. Como rei ele age com justiça, procura

encaminhar seu povo de modo a tê-lo como modelo, mas é como Deus, no meio

do povo, que ele executa a justiça. Enfim, como rei ele liberta, porém somente

como Deus ele salva e recria.282

b) A afirmação de YHWH como Deus de Israel não aparece no primeiro capítulo

do livro. Neste, YHWH diz que eliminará o resto de Baal (cf. 1,4), como

igualmente aqueles que se prostram nos telhados para os astros e ao mesmo tempo

para ele (cf. 1,5). Esta exposição sugere uma prática que mostra o não-

reconhecimento da unicidade de YHWH.283

A partir do capítulo 2, nos oráculos contra as nações já se presencia o

reconhecimento de YHWH como o Deus do povo eleito (cf. 2,7). O próprio

YHWH se diz “Deus de Israel” (cf. 2,9) e que suprimirá todos os deuses da terra

(cf. 2,11), mostrando que não admitirá mais qualquer outro tipo de idolatria.

282 M. Eszenyei Széles comenta que não é uma questão de YHWH uma vez mais tornar-se rei no meio do povo, mas é a demonstração de seu poder real através de seus atos recriativos (cf. Zephaniah, p. 112). 283 A. Spreafico comenta que é possível imaginar que houvesse um panteon onde estariam YHWH, Baal e as milícias celestes (cf. Sofonia, p. 86).

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107

Como os inimigos de Israel, os ídolos também serão todos destruídos, para

que todos os povos possam reconhecer a YHWH como o único Deus. Mais

adiante, Sofonias, condenando a cidade rebelde, manchada e opressora de

Jerusalém, fala claramente que seus habitantes “em YHWH não confiaram, de seu

Deus não se aproximaram” (3,2).

Por fim, o reconhecimento da unicidade e soberania de YHWH é visível,

uma vez que se verifica uma postura completamente diferente (cf. 3,15.16).

YHWH está no meio do povo como seu Deus (cf. 3,17) e como seu rei (cf. 3,15),

significando para eles total segurança e tranqüilidade. Isto é motivo para os

sentimentos contagiantes de alegria (cf. 3,14).

c) YHWH, como um herói que salva, mostra o imenso abismo que se abre

quando a confiança é colocada no ser humano, que: é falho, não é constante, é

passível também de ser acometido pelo medo, é finito, podendo sucumbir a

qualquer momento.

O único momento do livro que fala de um herói é através de uma imagem

negativa, descrevendo seu estado de espírito e sua atuação no yôm YHWH. Este

não poderá salvar-se, este guerreiro valente gritará amargurado (cf. 1,14). Em

oposição, YHWH é nomeado o “Senhor dos Exércitos” (2,9), significando que

não apenas que ele possui poder, mas que pela própria pessoa e por natureza, ele é

toda a potencialidade e poder.284 Ele é o garante da salvação do povo. Ele

defenderá qual pastor o seu rebanho, não permitindo que os lobos ferozes se

aproximem e que eles conheçam de novo a desgraça. “Sim, eles serão

apascentados e repousarão sem que ninguém os inquiete” (3,13).

d) Junto à alegria do povo está a alegria de YHWH. Esta alegria é única em todo

o livro, manifestando uma mudança radical, uma vez que no início YHWH mostra

que não está satisfeito com a atitude dos homens. Ele fala do seu yôm como um

“dia de cólera” (1,18), onde ele executará seus julgamentos. Toda injustiça e

impiedade serão castigadas. Por quase todo o escrito (cf. 1,2-3,8) os oráculos são

de punição.

Todavia, a clemência de YHWH apagou os numerosos erros daqueles que o

buscaram e o seguiram. Antes a alegria de YHWH não tinha por que existir.

284 Cf. MOTYER, J. A., Zephaniah, p. 934.

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108

Somente depois da restauração total do povo, ele poderá dar vazão ao seu amor

generoso e extravasar inteiramente todo o seu contentamento com o povo e pelo

povo.

4.2.4.

Síntese

Desde o início do livro, Sofonias deixa entrever que em Jerusalém a

injustiça havia se instalado, transformado a cidade. O profeta chama a atenção

para sua insatisfação tanto em relação aos habitantes da terra (cf. 1,2-3), como, e

especialmente, com a classe dirigente de Jerusalém, que com suas atitudes

oprimiam o povo e serviam de modelo negativo, levando, com isso, os membros

da sociedade a agir erroneamente (cf. 1,4-13).

Por outro lado, com um sentimento diametralmente oposto, em Sf 3,14-17

encontra-se YHWH alegre no meio do povo por ele redimido. Várias asseverações

são feitas a respeito de YHWH:

• ele é “rei de Israel” (v. 15c);

• ele está “no meio” do povo (v. 15c.17a);

• ele é seu “Deus” (v. 17a);

• ele é um herói que salva (v. 17b);

• ele agiu em prol do povo (cf. v. 15ab).

Por tudo isso é dito ao povo para “não temer” (v. 15d.16b).

Como entender duas atitudes de YHWH tão conflitantes: ira e alegria?

Amor generoso e cólera? Que estava sendo dito sobre Jerusalém no início do

escrito e no final dele? Por que houve a reversão da situação? Só é possível

entender esta mudança tão radical a partir da exposição da justiça de YHWH, de

seu amor generoso e da realização do yôm YHWH.

1. A justiça de YHWH

Sf 3,1-8 carrega uma descrição muito densa desta problemática. No v. 3,5

está o âmago da explicação para o entendimento da mudança operada no decorrer

do livro, que de total destruição apresenta a salvação de um resto.

Em 3,5a encontra-se o profeta declarando publicamente que “YHWH é justo

no meio dela”, referindo-se à cidade de Jerusalém. Esta afirmação de que YHWH

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é “justo” está em total oposição com os habitantes de Jerusalém, um povo rebelde

que não busca o seu Deus, e com aqueles que se acham no direito de habitar

Jerusalém como líderes (cf. 3,3-4).

A cidade de Jerusalém abriga forças antinômicas: YHWH e o povo,

encontrando-se todos “no meio dela”. Da cidade é dito que ela é “rebelde e

impura, a cidade opressora” (3,1), enquanto de YHWH é afirmado que ele é

“ justo” (3,5a).

Sofonias diz que YHWH comparece “manhã após manhã” (3,5c), sentando-

se como juiz num tribunal para dar o seu juízo. Esta forma de falar da presença de

YHWH no meio do povo significa que o julgamento não é ocasional, acontecendo

em dias marcados, mas é permanente e sem interrupção.

“À aurora ele não falta” (3,5d), significando a certeza de que ela romperá,

em qualquer situação, haja tempo bom ou haja tempestade, ela não faltará. Isto

quer dizer que, estando eles em momentos de tranqüilidade ou em épocas ruins,

YHWH sempre os visitará, mostrando sua justiça.285

A aurora também lembra que a justiça é luz e não trevas. Os julgamentos

com suas devidas sentenças não são feitos e declarados na calada da noite, a fim

de surpreender os réus. Pelo contrário, é um juízo público, às claras, para

conhecimento de todos. Em contraposição àqueles que agem na surdina, para que

ninguém tome conhecimento de suas más ações.286

A presença de YHWH como luz no meio do povo também é sinal de que

eles não andarão nas trevas. Mesmo quando a noite chegar, a luz não faltará.

Apesar disso, os ímpios não acolhem esta fonte luminosa, tornando difícil a

reconciliação. Estes dois pólos, acolher e não-acolher, confirmam que a presença

de YHWH no meio do povo é sinal de contradição, punição para uns e premiação

para outros.287

A colocação de YHWH como justo, logo após a descrição da atuação das

lideranças, quer deixar bem evidente os opostos. YHWH como rei suplanta os

príncipes e os filhos do rei, porque ele afasta os perigos que ameaçam o povo;

como juiz promulga a justiça, castigando os que dele se afastam e premiando os

que o buscam e procuram andar em seu caminho; como Deus ele salva e não

285 Cf. ROBERTSON, O. P., Zephaniah, p. 322. 286 Cf. BERLIN, A., Zephaniah, p. 130. 287 Cf. SPREAFICO, A., Sofonia, p. 160.

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110

precisa de intermediários: sacerdotes relapsos e maus profetas, que não cumprem

sua missão de buscar a salvação do povo, conduzindo-o por caminhos seguros.

YHWH, procurando educar seu povo, investe contra as nações (cf. 3,6). O

ensinamento divino é uma realidade visível, aos olhos do povo, visto que eles

precisam de situações concretas para se fundamentar. O fato de eles persistirem

em seus atos pecaminosos significa que não acolheram o ensinamento divino.

Porque o “acolher” requer mudança de atitude e ter a YHWH como paradigma.

Esta mudança é colocada em evidência no confronto de 3,5b, onde é dito

que YHWH “não pratica a iniqüidade”, e 3,13, onde YHWH declara que o resto

de Israel “não praticará a iniqüidade”.288 Entretanto, muitos não se transformam,

não mostram seu temor reverencial por ele. A ira subseqüente de YHWH (cf. 3,8)

é resultado deste não-temor (cf. 3,7).

A ira divina significa o afastamento definitivo da presença de YHWH. Sua

ira é suscitada pelo descaso dos ímpios, que é manifestado através de: a) idolatria

(cf. 1,5.9); b) afastar-se dele (cf. 1,6); c) não procurá-lo (cf. 1,6); d) agir sem

consultá-lo (cf. 1,6); e) não confiar nele, considerando que ele não pode fazer

nada (cf. 1,12; 3,2); f) violar a lei e a aliança (cf. 3,4); g) profanação do que é

santo (cf. 3,4); h) traição (cf. 3,4); i) não-temor (cf. 3,7); j) rebelar-se contra ele

(cf. 3,11).

Contudo, YHWH, na sua benevolência, ainda dilata o prazo da execução do

castigo, quando diz “esperai-me” (3,8). Porque talvez os ímpios ainda reflitam e

se convertam. O amor generoso de YHWH por seu povo é muito grande e não se

acaba. “Os favores de YHWH não terminaram, suas compaixões não se esgotaram;

elas se renovam todas as manhãs, grande é a sua fidelidade” (Lm 3,22-23).

Apesar disso, a justiça de YHWH não se resume ao seu povo, mas estende-

se a todos que invoquem o nome de YHWH e estejam dispostos a aceitar o seu

jugo (cf. 3,9). Deixando claro que tanto a perdição como a salvação são

universais.289 Embora em 3,10, com o apelativo de “filha da minha dispersão”, se

restrinja ao povo eleito exilado.

A justiça divina, porém, não aniquila a criação. A ira santa de YHWH pode

ser satisfeita e tão logo ela seja saciada haverá um canal no qual as bênçãos se

escoam.

288 Cf. SWEENEY, M. A., Zephaniah, p. 172. 289 Cf. SWEENEY, M. A., op. cit., p. 183; PETERSEN, D. L., Zephaniah, p. 205.

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111

2. O amor generoso de YHWH

Partindo-se desse ponto das bênçãos que se escoam, percebe-se que o amor

predomina sobre a ira divina. O julgamento não é a última palavra, mas o amor

abre uma brecha para deixar a misericórdia de YHWH se tornar patente, capaz de

trazer a salvação, fazendo com que se descerre uma porta para a esperança tanto

para Israel como para as nações. Sofonias deixa claro que o julgamento não causa

obliteração para a salvação.290

Toda a cólera manifestada no início da profecia, no entanto, dá lugar à

temática da alegria do povo (v. 14) e de YHWH (v. 17c-e). Esta reversão no

destino de alguns membros do povo, o resto, é devida à justiça e ao amor

misericordioso de YHWH.

É unicamente por um amor gratuito e imerecido que Deus liberta Israel de

suas sentenças e de seus inimigos, sem pedir nada em troca, a não ser que o povo

o siga com seu amor, sua humildade e obediência.

YHWH, sendo justo, não poderia deixar perecer aqueles que, apesar de

pecadores, mostram-se tementes e buscam refúgio em seu Nome (cf. 3,12). A ira

de YHWH é motivada pelo desprezo que o povo manifesta por ele.

Na visão de YHWH como o noivo amante, sua ira é oriunda da falta de

apreço de sua amada, que não valoriza seu amor fiel. Porém, não querendo perdê-

la totalmente, oferece-lhe uma chance de reconciliação. Ele está disposto a

esquecer todos os seus erros (cf. 3,11) e recriá-la (cf. 3,9.12-13).

Ira e amor estão conjugados em YHWH.291 Seu amor misericordioso é

capaz de perdoar e esquecer uma multidão de pecados. Este amor é capaz de

afastar a ira, porém não o castigo.

O castigo faz parte da justiça divina, ele é educativo, ele é necessário para

burilar as imperfeições e gerar a transformação. Por isso, YHWH deixa seu povo

ir para o exílio, mas não o esquece lá.292 Ele nunca deixa de estar ao lado do povo.

E a mudança no agir do povo se percebe quando YHWH diz que “do outro lado

dos rios da Etiópia, os meus suplicantes, a filha da minha dispersão, trarão a

minha oferenda” (3,10). Porque no yôm YHWH tudo mudará.

290 Cf. KING, G. A., The Message of Zephaniah, p. 217. 291 M. L. C. Lima comenta que “o amor surge como única instância capaz de evitar o desencadear da ira ou diminuir o seu furor” (cf. Salvação entre juízo, conversão e graça, p. 151-152). 292 Cf. SWEENEY, M. A., Zephaniah, p. 182.

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3. O yôm YHWH

O yôm YHWH (cf. 1,14-18) é o “dia” do ajuste de contas. É o “dia” em que

a justiça de YHWH prevalecerá e será definitiva. Porque se esgotou o tempo em

que ele usou de toda a sua paciência e longanimidade. Este grande dia trará a

intervenção de YHWH para dentro da realidade humana, em suas atividades,

demonstrando a soberania universal de YHWH, como também sua superioridade

sem igual.

Este yôm é um divisor de águas. A presença de YHWH com sua justiça

redundará em causa de duplo efeito: punição para uns e salvação para outros. Por

isso, é um dia de trevas para aqueles que praticam a iniqüidade e se afastam de

YHWH (cf. 1,15-16). Mas, para os que permanecem fiéis e tementes será um dia

de luz (cf. 3,11.16.19.20).

Sofonias deixa patente a relação existente entre a causa e o efeito, porque é

somente através do julgamento do mal que a salvação pode chegar à sua plena

realização. Estes dois pólos, embora pareçam incongruentes, se completam. Este

yôm não é um tempo de destruição ou de julgamento opressor, mas é um tempo de

salvação e da vitória do bem sobre o mal.293

Este yôm divulga a misericórdia e o amor de YHWH, que não podiam ser

manifestados anteriormente, embora nunca ausentes. No início do livro não cabia

esta colocação. Mas neste yôm ficará claro que nem a destruição, nem o castigo

têm a palavra final, até mesmo no pensamento de YHWH. Desta feita, a profecia

de Sofonias, embora falando que o yôm YHWH será um dia tenebroso, não deixa

de advertir e de fazer uma promessa.

A advertência vem para todos os pobres da terra. É geral e universal. Ela

destina-se àqueles homens que ouvem o chamado de YHWH e realizam seus

decretos, para que eles estejam protegidos no “dia da ira de Yhwh” (2,3).

Contudo, YHWH não pára na advertência, ele prossegue. Ele faz uma promessa

de salvação para aqueles que derem ouvidos ao que ele diz.

E é da salvação destes que Sf 3,14-17 se ocupa. O texto mostra a vitória que

YHWH proporcionou àqueles que foram redimidos. Ele não só revogou as

293 Cf. KING, G. A., The Day of the Lord in Zephaniah, p. 30. Em acréscimo, R. D. Patterson comenta que julgamento e esperança são dois temas que embora pareçam irreconciliáveis, na realidade são dois aspectos de uma perspectiva divina. Ambos estão entrelaçados na realização dos propósitos de YHWH (cf. Zephaniah, p. 370).

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sentenças que pesavam sobre eles, mas recriou-os. Sofonias mostra a recriação,

quando escreve o que YHWH diz: “darei aos povos lábio puro” (3,9), deixando

bem claro que a salvação é para todos, ou seja, Israel e os outros povos.294 Não há

paralelo na BHS para esta volta. Este uso é único.295 Esta mudança inclui a

conversão, a renovação e purificação de todos os redimidos.

YHWH proporciona para o resto sobrevivente de seu povo e dos outros

povos uma segurança duradoura e a descrição destes remanescentes como

libertados, restaurados, recriados e abençoados só serve para demonstrar que o

yôm YHWH é um dia de salvação.

O resto do povo, que agora habita em Jerusalém e com o qual YHWH se

alegra devido à sorte deles, é constituído pelos pobres e humildes, que, estando

em oposição aos orgulhosos (cf. 3,11), reconhecem YHWH como seu rei e seu

Deus. Este novo comportamento do povo não é uma ação própria de si, mas da

intervenção de YHWH.296 Ele recria um resto que representa a descendência do

povo eleito. Este é o verdadeiro Israel, remanescente do antigo povo da aliança do

Sinai, porém englobando a todos os que confiaram na salvação de YHWH.297

A alegria de YHWH está no povo, que enfim tem as características

desejadas por ele (cf. 3,12-13):

• humilde, pois reconhecem sua miséria;

• dependentes, porque buscam tudo o que precisam em YHWH;

• buscam refúgio no nome de YHWH, porque acreditam em tudo o que engloba

este Nome;

• remanescente redimido, o único Israel, porque em sua vida não há iniqüidade,

não se desviam da lei;

• não são mentirosos, porque têm os lábios purificados.

294 A. Spreafico chama a atenção para a relação entre Israel e os povos, desde o início da profecia entre 1,2-3 e 1,4-6, entre 2,4-15 e 3,1-5. A solidariedade entre o povo eleito e as nações é tanto para a perdição como para a salvação (cf. Sofonia, p. 172-173). 295 J. A. Motyer explica que aqui Sofonias introduz uma afirmação que descreve um cancelamento da confusão de Babel, (cf. Gn 11, 1-9) quando se deu a multiplicidade de línguas, no desejo dos homens de organizarem suas vidas, por si próprios, sem Deus; agora eles terão hr"Wrb. hp'f', “lábio puro” (Sf 3,9), significando uma única língua, uma única forma de viver, isto é, colocar-se-ão sob o jugo de YHWH (cf. Zephaniah, p. 951-952). Assim também, SMITH, R. L., Zephaniah, p. 142; MACKAY, J.L., Zephaniah, p. 287. 296 P. H. Kelley comenta que a qualidade mais valorizada por Sofonias é a humildade, por isso o objetivo do profeta era levar o povo ao arrependimento, à obediência e a ser humilde de coração para que pudesse receber as bênçãos de YHWH (cf. Zephaniah, p. 91). 297 Cf. SPREAFICO, A., Sofonia, p. 179-180.

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114

O resto redimido e recriado se alegra e YHWH, ao ver a alegria e

restabelecimento de sua criatura, não tem outra alternativa a não ser explodir em

seu imenso amor por sua criação.

4.3.

O significado de Sf 3,14-17 para o livro de Sofonia s

4.3.1.

Do ponto de vista terminológico

A análise da terminologia do texto mostrou a sua particularidade em relação

ao restante do vocabulário empregado.

Entre as três seções em que o texto foi subdividido e analisado, observa-se a

repetição de alguns termos, apontando a sua unidade. Enquanto entre elas e o

restante do livro, um uso acentuado de termos e expressões hápax deixa entrever a

singularidade da mensagem neste ponto do escrito.

No restante do vocabulário empregado, a recorrência a termos já utilizados

no texto precedente (cf. Sf 1,1–3,13), como também no escrito que lhe segue (cf.

Sf 3,18-20), é muito reduzida. Com raras exceções como: hwhy e ~Ay. Por outro

lado, nota-se o uso de sinônimos e antônimos descrevendo uma situação oposta

àquela apresentada no texto em estudo.

Alguns termos e expressões ajudam a fazer o elo e apontam para a evolução

do escrito, tais como:

− na continuidade de conotação tipo positivo-positivo: as expressões %Ber>qiB.,

%yIh;l{a/ hw"hy> e aWhh; ~AYB;, os verbos [vy e rws, os termos tB; e jP'v.mi.

− na continuidade de conotação negativo-positivo, ou seja, a mesma

terminologia primeiramente usada em contento e sentido negativos e depois

em positivo: a expressão aWhh; ~AYB;, %Ber>qiB. e ~yhil{a/ hw"hy>, o verbo ary, os

termos rABGI, %l,m,, jP'v.mi, ble e a partícula l[;.

Além disso, a multiplicidade de pontos de contato no corpo do livro

analisados298 indica que, longe de ser uma caracterização secundária, este texto

está em completa sintonia com o restante do livro.

298 Também sendo possível a visualização a partir da Tabela 7, p. 138.

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115

4.3.2.

Do ponto de vista temático

A análise das temáticas apresentadas em cada seção mostra uma reversão

total do quadro inicial descrito por Sofonias. Os temas abordados apresentam uma

sucessão de estados psíquicos, políticos, sociais, religiosos, que partem de uma

situação negativa para uma condição positiva. São eles:

− da tristeza inicial devida à opressão e injustiças sociais – à esperança pela

promessa de restauração – à alegria da salvação;

− de uma citação do nome de Jerusalém para proclamar-lhe o castigo – a uma

lembrança afetiva como “filha da minha dispersão” do tempo do castigo – à

exortação carinhosa de “filha de Sião” e “filha de Jerusalém” no tempo da

libertação;

− de uma condenação certa – a uma advertência para a conversão – a uma

promessa de remissão – à anistia do castigo;

− de uma opressão interna e externa – à visão do aniquilamento dos inimigos

externos e promessa de afastamento dos orgulhosos de seu meio – a um estado

de libertação de qualquer tipo de ameaça;

− de lideranças humanas opressivas, corruptas e ímpias – à implantação da

justiça com o afastamento destes líderes – ao reinado absoluto de YHWH;

− do medo do inimigo e da ira de YHWH, junto ao não-temor reverencial a ele –

às advertências e ações pedagógicas de YHWH – ao não-temor de ameaças e

ao temor reverencial a YHWH por causa de seus feitos;

− do yôm YHWH de aniquilamento total da terra – à advertência de mudança de

vida – à promessa de restauração dos tementes e observadores de seus

preceitos – ao yôm YHWH que trouxe punição para os ímpios e salvação para

os que se converteram a tempo;

− das más ações dos poderosos e inação dos oprimidos – à chamada a não deixar

desfalecer as mãos, significando ação para construir um mundo nos moldes de

YHWH;

− da presença dos ímpios no meio do povo que ignoravam a presença de YHWH

e diziam que ele nada podia fazer – à ação de YHWH como juiz e testemunha

no meio do povo – à presença permanente de YHWH como rei, herói e seu

Deus;

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116

− da idolatria, com YHWH sendo substituído no coração do povo pelos deuses

das nações – ao reconhecimento pelas nações de que YHWH é o Deus de

Israel – à recognição pelo povo de que YHWH é seu único Deus e está em seu

meio;

− da colocação da confiança em um herói humano que no momento do

yôm YHWH não poderá salvar-se e se amedrontará – à confiança em YHWH,

o único herói capaz de salvar;

− da ordem de YHWH para que os pecadores se calem diante dele no dia de sua

ira – ao silêncio de YHWH diante do povo redimido, objeto de seu amor.

− da ira de YHWH devida ao caos implantado na humanidade e particularmente

em Jerusalém – a um tempo de espera pela mudança de comportamento dos

homens – à alegria pela restauração e recriação de uma nova sociedade dentro

dos parâmetros divinos.

Esta exposição deixa claro que Sf 3,14-17 apresenta o ponto de chegada de

um processo necessário de purificação, pois não é desejo de YHWH acabar com a

obra de sua criação, porém ele a quer como foi idealizada.

4.3.3.

Do ponto de vista teológico

A ordem das idéias que aparecem no livro de Sofonias é conduzida neste

texto a uma conclusão. As retomadas dos lexemas e dos temas, como os hápax

correm paralelamente ao desenrolar da trama do livro, fazendo desembocar neste

acorde final.

O texto de Sf 3,14-17 não pode, nem deve literariamente ser amputado.

Caso isto viesse a acontecer haveria a mutilação tanto da composição artística

como da mensagem teológica que carrega, que está fundamentada na justiça

divina.

A intervenção de YHWH, naquela situação caótica e injusta apresentada no

início da obra, altera a direção da história, que do aniquilamento de toda a terra

chega à salvação daqueles que reconhecem a soberania de YHWH e aceitam o seu

jugo. O profeta deixa claro que esta mudança de conjuntura não está restrita a

Jerusalém. Mas em oposição à destruição de toda a terra, a salvação é proposta

para todos os povos, ela é universal.

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117

Para Sofonias, Israel não é um povo a parte na sua concepção de história,

mas está inserido no meio de todas as nações. De modo que, o juízo vindo para

todos os povos, recai também sobre o povo eleito. Assim como a salvação que é

proporcionada a Israel estende-se a todos aqueles que se tornarem adoradores de

YHWH. Ficando claro que tanto a punição como a salvação é para todos.

Partindo então do anúncio de uma intervenção divina contra tudo e contra

todos (cf. 1,2-3), incluindo Jerusalém (cf. 1,4-6), YHWH coloca-se contra aqueles

que detêm o poder, praticam injustiças e mantêm práticas sincretistas e idolátricas.

Estes são os príncipes, juízes, sacerdotes, profetas, comerciantes, ourives e todos

os que podem oprimir de alguma forma os fracos (cf. 1,8-13.18; 3,3-4).

No meio desta cidade rebelde, impura e opressora (cf. 3,1), YHWH, o justo,

apresenta-se todos os dias para julgar o procedimento do povo (cf. 3,5), ele não é

um Deus ausente. Insatisfeito, fala do dia de sua ira, o yôm YHWH (cf. 1,7.14-18;

2,2.3), quando afastará toda a iniqüidade.

O yôm YHWH é certo, ele se manifestará no cosmo e na história.

Entretanto, a sua ira não é inevitável. Ele deixa uma possibilidade de conversão a

todos (cf. 2,1-3), ele mostra a sua longanimidade (cf. 3,8). Ele não retira o castigo,

mas também não deixa de olhar pelos que o buscam de coração sincero. Ele nunca

deixa de estar ao lado do povo que o segue.

Dentro desta visão, Sf 3,14-17 é sem dúvida alguma uma mensagem de

salvação que surge a partir de um juízo instaurado e da justiça misericordiosa de

YHWH.

Neste texto vem sublinhada a mudança radical de todas as situações que

envolviam o povo. YHWH cria uma nova realidade, recriando um novo povo

forjado pelo seu ensinamento pedagógico e por sua ação interventora.

Esta nova sociedade é constituída pelos pobres e humildes (cf. 3,12), que

reconhecem a sua miséria e se sabem dependentes de YHWH. Esta coletividade

está em contraste com aquela formada pelos ricos e orgulhosos, os quais se diziam

detentores do poder (cf. 1,8-13; 3,3-4), que YHWH nada podia fazer (cf. 1,12),

praticando assim todo tipo de injustiça, e que foram, por isso, destruídos (cf.

3,11.15.19). Os remidos em contrapartida praticarão a justiça.

Eles terão YHWH em seu meio como rei garantindo a tranqüilidade e a

segurança, como herói salvando de qualquer situação, porque ele é o Deus de

Israel. Ele, habitando em Sião, lugar que escolheu para sua morada, torna

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Jerusalém, lugar onde agora habita o povo redimido, o novo Israel, um ponto de

referência para todos os povos o adorarem, cada um de seu lugar (cf. 2,11).

A alegria de Israel, colocada neste ponto, não se deve ao retorno dos

dispersos, mas pela presença de YHWH no meio do povo, como rei e guerreiro. A

alegria de Sião–Jerusalém junto à alegria do próprio YHWH é sinal de uma

realidade totalmente transformada. YHWH como rei poderá mudar radicalmente a

situação do povo.

Com a expressão “naquele dia, será dito a Jerusalém” (3,16), Sofonias

mostra que o resto pode se alegrar porque a restauração já começou, mas ela ainda

não está completa. Com isso ele faz a ligação com o restante da profecia, que diz

que todos os povos da terra reconhecerão seu novo Israel, porque YHWH lhes

dará nome e louvor (cf. 3,19-20).

No grande e definitivo yôm, YHWH manifestará uma alegria comparável a

de um noivo no dia do casamento, com sua noiva amada, trazida pelos amigos do

noivo. Ela apresentando-se purificada por ele. Sua alegria então será sem medida,

unindo-se à alegria de sua amada.

YHWH estará presente como o único e verdadeiro esposo que Jerusalém

deve ter. Este noivo está de volta depois de um período de separação, é o herói

voltando vitorioso do combate e que agora pode esposá-la.

Esta imagem de YHWH como noivo e Jerusalém como a noiva aparece nos

outros profetas, mas, sem dúvida alguma, ela jamais foi expressa assim tão

fortemente em outra passagem.

Não é Jerusalém que volta para YHWH, o texto em momento algum faz

qualquer alusão a uma conversão do povo. Mas é YHWH que retorna para

Jerusalém, que volta a habitar no meio do povo, depois de tê-lo libertado e

recriado. Por isso, o povo deve ter confiança, não deve temer e deve prorromper

em gritos e cânticos de alegria.

YHWH, o Deus de Israel, o grande rei, o guerreiro que salva, habitando em

Jerusalém, no meio do novo Israel, tomba perdidamente de amor pela “filha de

Sião”. Ao vê-la recriada e tão formosa, não conseguindo conter-se no seu silêncio,

explode de alegria e se junta a ela neste momento de imenso júbilo.

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5

Conclusão

5.1.

Síntese da pesquisa

5.1.1.

O texto e a crítica redacional

A partir da tradução com as justificações necessárias das opções feitas,

apresentadas nas notas filológicas e na crítica textual, adentrou-se no problema da

delimitação do texto. Observou-se, então, que há controvérsias entre os críticos

quanto ao texto de Sf 3,14-17 ser uma unidade independente ou não e quanto à

sua extensão. Quanto à sua dependência a uma unidade maior, várias possibilidades

foram encontradas para o início (v. 6; v. 8; v. 9; v. 11; v. 14), enquanto que para o

final apenas duas (v. 17; v. 20). Apesar destas diferenças, Sf 3,14-17 é considerado

pela maioria dos estudiosos como um conjunto textual bem delimitado. Quanto à

sua extensão não há dúvidas a respeito do seu início no v. 14, porém para o final,

alguns o fixam no v. 17, enquanto outros o estendem até o v. 18aa.

Nosso estudo considera Sf 3,14-17 como uma subunidade de Sf 3,6-20,

mantendo o término no último verso do v. 17. No confronto com a perícope

anterior, Sf 3,11-13, e com a que lhe é posterior, Sf 3,18-20, verificou-se uma

delimitação tanto pelo conteúdo como pela sua posição. Além de se constatar uma

mudança na pessoa do discurso e na forma verbal. A saber:

− quanto ao conteúdo e à posição que ocupa, constatou-se que Sf 3,14-17 é uma

mensagem de salvação, cujo tema é a alegria, e que está limitada pelos dois

lados por oráculos de promessa. Nos v. 11-13 há uma promessa de restauração,

nos v. 14-17 esta promessa já está realizada, porém não totalmente, o que faz

com que haja uma promessa para um futuro definitivo nos v. 18-20;

− quanto à pessoa do discurso e à forma verbal verifica-se que nos v. 11-13 e v.

18-20 é o próprio YHWH quem fala e quem promete, por isso as formas verbais

têm sentido de futuro, enquanto que no texto em estudo é o profeta quem se

dirige ao povo para mostrar a intervenção de YHWH passada, presente e futura.

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Na leitura do texto é perceptível a continuidade temática que o atravessa,

não apresentando tensões, nem cisões. Os versículos seguem uma única linha de

pensamento, embora apresentem momentos diferentes. Logo, em Sf 3,14-17 há

uma unidade textual abordando um conteúdo teológico específico.

Quanto à época do livro, a posição dos críticos é muito divergente em

relação à datação de cada oráculo. Principalmente sobre Sf 3,14-17, onde há

dúvidas sobre sua autenticidade. A mensagem do livro, transmitida por escrito,

revela que Sofonias atuou durante os primeiros anos do reinado do rei Josias,

anterior à reforma josiânica implantada em 622 a.C. A pesquisa, porém,

demonstrou que embora Sofonias necessariamente não seja o autor do livro, não é

possível negar que sua pregação esteja na base de todo o escrito. A redação do

livro passou por várias fases: 1) proclamação dos oráculos com escritos isolados

(pré-exílico); 2) uma releitura desses oráculos (exílio e pós-exílio); 3) a redação

final (pós-exílica).

A mensagem de Sf 3,14-17 é considerada por muitos como uma adição

posterior à profecia, principalmente os v. 16-17. Nossa colocação parte do

princípio de que Sofonias enviou esta palavra de salvação e alegria, porque via,

dentro das perspectivas que se abriam com a proximidade da reforma josiânica e a

favorável gestão política do rei Josias, um futuro promissor. Após a morte do rei,

fatos sucessivos e negativos acabaram levando o povo ao exílio (587 a.C.) e mais

tarde presencia-se o seu retorno (538 a.C.). Nesta época provavelmente houve

uma releitura da antiga profecia, atualizando-a para o momento que os redimidos

viviam, sendo adaptada ao novo contexto do pós-exílio imediato.

Nesta palavra de salvação declarada pelo profeta e dirigida ao ouvinte-leitor,

é possível distinguir-se três seções, devido à terminologia e a temática utilizadas,

bem como pelo uso de um refrão para introduzir a 2ª e 3ª seções. O texto inicia-se

com uma exortação a Jerusalém, seguida da justa motivação proporcionada pela

ação de YHWH (1ª seção); depois, em forma de discurso, o profeta fala das ações

que Jerusalém deve pôr em prática devido à esperança do futuro que YHWH vem

proporcionando (2ª seção); por último, um outro discurso aborda alguns atributos

e ações de YHWH que ratificam a esperança de Jerusalém (3ª seção). Na

alternância entre Jerusalém e YHWH através das três seções fica bem visível a

posição de Jerusalém, que de chamada à alegria pelas bênçãos recebidas de YHWH

(1ª seção), passa ela própria a ser o motivo da alegria de YHWH (3ª seção). Além

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disso, a visão de conjunto exposta nas três seções aponta para uma estruturação

quiástica bem articulada.

Quanto ao gênero literário, percebe-se que a unidade de Sf 3,14-17 traz uma

peculiaridade. A princípio, percebe-se uma estrutura própria dos hinos, pois há a

combinação de exortações à alegria através de imperativos (v. 14) com a

subseqüente exposição das razões para tal estado (v. 15ab). Por outro lado,

encontram-se elementos de oráculos de salvação, pois é colocada uma ênfase

muito grande na presença de YHWH no meio do povo, sendo isto motivo de

restauração e bênção (v. 15c.17ab). Há ainda o componente de encorajamento ao

não-temor, caracteristicamente de oráculos sacerdotais de bênção, que com

freqüência aparece nas profecias (v. 15d.16bc). Os profetas ao perceberem a

iminência de redenção, proclamavam exortações (litúrgicas) ao povo e a forma

como estas eram proferidas tornou-se um gênero profético. Com isso, há dois

gêneros literários neste texto, com a predominância do oráculo de salvação,

composto de uma parte hínica e de uma parte discursiva desdobrada em duas

alocuções, uma direcionada ao povo e outra a YHWH.

5.1.2.

O texto em si

O comentário aos versículos revelou um contexto de extrema manifestação

de alegria. O profeta inicia convocando o povo, que é formado pelo resto

redimido, pelos nomes de “filha de Sião”, “Israel”, “filha de Jerusalém”. A

comunidade é sacudida, é convidada a sair de sua letargia. O mensageiro da

alegria brada para o povo começar a festejar com gritos, cantos, danças, palmas,

batidas com os pés e ao som de instrumentos (v. 14).

Este momento de imensa alegria deve ser vivido de todo o coração, ou seja,

cada membro da comunidade deve juntar-se ao clamor, como se fosse uma única

voz. Todo o seu ser deve estar envolvido, não deve significar apenas uma

expressão externa, mas um extravasamento do que ele está vivendo no seu íntimo.

O profeta, para convencê-los, passa a narrar as razões que justificam esta

demonstração de júbilo. YHWH interveio em favor deles, revogando as sentenças

de castigo que pesavam sobre eles devido a seus numerosos pecados (v. 15a) e

afastando os orgulhosos que estavam em seu meio, oprimindo-os com suas

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práticas injustas e corruptas, como também expulsando as nações que os

subjugavam e os ameaçavam (v. 15b).

Esta intervenção de YHWH foi um ato libertador. Por isso, logo a seguir é

dito que ele, como rei de Israel está no meio do povo (v. 15c). Novamente ele

reina depois de tempos ruins, não significando que algum dia tenha se afastado do

povo ou deixado de reinar. Na realidade, o povo é que dele tinha se afastado e

colocado na sua vida homens e deuses para reinar. Agora, YHWH tomou

novamente o cetro, ele volta a ser o rei absoluto no coração do povo e da cidade.

A realeza de YHWH é sinal de tranqüilidade e de afastamento de ameaças,

porque ao rei compete a função de manter a segurança da cidade e o bem-estar do

povo. Por isso lhes é dito para não temer mais o mal (v. 15d). Isto não significa

que não haveria mais tempos difíceis, mas que a presença de YHWH no seu meio

e no seu coração era o garante de vitória constante.

A primeira exortação ao não-temor é plausível que seja endereçada ao

orante queixoso, para atestar-lhe que sua prece tinha sido atendida. Ao mesmo

tempo em que tem o encargo de trazer-lhe um oráculo de salvação. Por isso vem

junto da fórmula de introdução “naquele dia” dirigida a Jerusalém (v. 16a).

A segunda exortação (v. 16b) está ligada a um outro estímulo, que é o de

não deixar as mãos desfalecerem (v. 16c). O que tudo indica é que eles, além de

letárgicos, pareciam ter os olhos vendados e não conseguiam ver a realidade que

estavam vivendo: um momento de libertação, uma ocasião sem igual. Os remidos

pareciam estar mais voltados para as realidades visíveis, de um retorno para uma

terra destruída, do que para a bênção de ter YHWH em seu meio. Diante disso, a

palavra profética visa chamar a atenção deles, para sua passividade e falta de

ânimo, incapazes de agir. Pelo contrário, devem colocar mãos à obra, devem

reconstruir. Porque YHWH não descansa, está sempre agindo.

A atividade de YHWH, contrastante com a resignação paralisante dos

redimidos, não está resumida a ele ser o rei de Israel, mas é dito também que ele é

seu Deus (v. 17a) e os salva como um herói (v. 17b). Porque como rei ele pode

libertá-los dos inimigos, mas somente como Deus é que pode salvá-los e cancelar

as sentenças devidas aos seus pecados.

O profeta, este grande mensageiro da alegria, declara ao povo que YHWH

está vibrando de alegria pela vitória deles, por eles terem, enfim, saído do

yôm YHWH triunfantes. Neste ponto de sua mensagem, o profeta compara

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YHWH a um noivo no dia de seu casamento. Ele está repleto de amor e

felicidade, por isso ele manifesta sua alegria (v. 17c), depois ele fica em silêncio

contemplando sua noiva, objeto de seu grande amor (v. 17d), para de repente

explodir num extravasamento total de alegria (v. 17e).

Todavia, apesar de seu povo já estar vivendo sob suas bênçãos, ainda não é

o momento definitivo. Jerusalém, porém, já está colocada no lugar que deve

ocupar, como centro de toda a humanidade, o lugar que YHWH escolheu para

habitar e ser adorado no meio de sua criação.

5.1.3.

O texto em seu contexto

A pertinência de Sf 3,14-17 ao restante do livro foi analisada sob três pontos

de vista:

− terminológico: percebe-se pelos vocábulos sinônimos e antônimos que há

ligação entre o texto e o restante do livro. Todavia, a quantidade de termos e

expressões hápax e a pequena recorrência ao vocabulário comum do livro

sugerem duas possibilidades: 1) a novidade da mensagem contrastante com o

restante do livro requer termos e expressões distintos para descrevê-la; 2) sendo

uma releitura da profecia de Sofonias, evidencia o trabalho redacional posterior.

O autor que atualizou a mensagem de Sofonias visava a comunidade dos

redimidos, que, no pós-exílio imediato, habitava numa Jerusalém destruída,

saqueada e invadida. Era o momento da reconstrução e o povo mostrava-se

desanimado. Parecia que eles não tinham se conscientizado da realidade de

libertos pela intervenção de YHWH.

Este grande incentivador relê a mensagem sofoniana, que havia sido dirigida

aos contemporâneos da época do rei Josias, numa expectativa de futuro imediato,

mas não realizado. Esta releitura, adaptada ao contexto que estão vivendo, visa

mostrar ao povo, através de uma grande exortação à alegria, ao não-temor e ao

ânimo, que a realização das promessas estava em franco cumprimento.

− temático: a exposição dos temas de Sf 3,14-17 denota os momentos finais de

um processo, que veio sendo relatado através dos três capítulos do livro. Havia

graves erros na humanidade. YHWH, o justo, havia instaurado um julgamento.

Ele mesmo, como juiz e testemunha, comparecia todas as manhãs para julgar as

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atitudes dos homens: de seu povo e das nações. O yôm YHWH seria o momento

da execução das sentenças. Porém, YHWH, querendo a salvação de suas criaturas,

ainda os advertia e prometia salvação, caso mudassem o agir.

Este oráculo de salvação dirigido ao povo serve para chamá-los a viver a

alegria do momento, que era o da realização das promessas. O castigo havia sido

revogado e os inimigos afastados. Ficando evidente que Sf 3,14-17 está em

perfeita sintonia com a evolução temática do livro, mostrando-se uma parte

integrante de todo o processo. Todavia, deixa claro que a restauração, embora já

uma realidade, ainda não chegou ao seu estágio definitivo. Por isso, os versículos

finais do livro (v. 18-20) voltam a apresentar novas promessas.

− teológico: a mensagem passada pelo texto é a da vitória de YHWH, o justo,

sobre toda a injustiça causada pelos homens com seu afastamento dele, colocando

sua confiança no poder dos homens e dos falsos deuses. Com isso, a impiedade, a

injustiça e a corrupção grassaram no meio deles. Havia necessidade de punição,

porém, YHWH, amando sua criação e sendo fiel às promessas feitas, não podia

deixar perecer o justo com o injusto. Por isso, apontou um caminho de salvação

para quem se convertesse. Mas, não podia deixar os erros impunes, por isso

permitiu que fossem para o exílio, porém não os abandonou lá, trazendo-os de

volta para Jerusalém.

Sf 3,14-17 vem mostrar a vitória da justiça de YHWH, que recria um novo

povo, o Israel do futuro, formado por todos que o buscam de coração sincero e o

têm como seu rei e seu Deus. Todavia, o autor deixa evidente que como o juízo é

universal, isto é, para todas as nações incluindo Israel, a salvação também é para

todos, não apenas para o povo eleito.

5.2.

Considerações finais

A partir de tudo o que foi pesquisado e apresentado neste estudo, conclui-se

que Sf 3,14-17 é, sem dúvida alguma, uma mensagem de salvação que surge a

partir de um juízo instaurado, da justiça misericordiosa e do amor generoso de

YHWH.

Isto revela que era o objetivo do autor final concluir o livro com ela,

mostrando a vitória da justiça e assegurando a presença permanente de YHWH no

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meio do povo, com o reconhecimento geral da unicidade de sua realeza e

divindade.

Este texto não pode, nem deve, literariamente, ser amputado. Caso isto

acontecesse, haveria a mutilação tanto da composição artística como da

mensagem teológica que carrega, que está fundamentada na justiça divina.

O profeta, apresentando a alegria com imagens que sugerem o presente e o

futuro, dando a entender “um já e ainda não definitivo”, deixa entrever a

necessidade de um aprofundamento ulterior de seus elementos; a fim de verificar

se esta alegria e salvação teriam para seus contemporâneos um caráter iminente e

limitado ou se teriam no pensamento do autor um caráter escatológico.

O livro de Sofonias aparece apenas nove vezes citado no NT299. Contudo, a

passagem da anunciação está diretamente relacionada a Sf 3,14-17. A exortação à

alegria proclamada pelo profeta aos redimidos porque eles têm YHWH em seu

meio, como seu Deus e seu rei, é também dirigida a Maria pelo anjo Gabriel. A ela

é dito: “Alegra-te, cheia de graça, o Senhor é contigo” (Lc 1,18). E logo a seguir,

acrescenta: “Não temas, Maria! Encontraste graça junto de Deus” (Lc 1,30). Neste

momento as promessas começam a ter sua realização definitiva. Com Jesus

cumpriu-se o tempo, é o Deus visivelmente no meio do povo, é a máxima

manifestação da misericórdia de YHWH e de seu amor generoso.

Em sua essência Deus é Amor (cf. 1Jo 4,8). O amor de Deus pelo mundo é

sem limites (cf. Jo 3,16). Por isso entregou seu Filho ao mundo e Jesus com sua

morte na cruz e ressurreição destruiu o pecado, afastou o que pesava contra nós e

nos garantiu para sempre a salvação. Embora as tribulações ainda continuem, o

cristão tem a certeza de sua presença como rei e Senhor. Jesus mesmo garantiu

sua presença no meio daqueles que se reunirem em seu nome (cf. Mt 18, 20).

Vivendo neste tempo de espera, já usufruímos das bênçãos futuras, quando,

então, teremos a garantia da eterna segurança da Jerusalém celeste com a presença

de Cristo no meio dela (cf. Ap 21,2-4; 22,3); quando então haverá um grande e

único clamor de alegria no dia do encontro definitivo do noivo com sua noiva

purificada (cf. Ef 5, 25-27; Ap 19,7-9).

299 As citações são: Mt 13,41 (Sf 1,3); Lc 1,28 (Sf 3,14-15); 4,18 (Sf 2,3); Rm 1,18 (Sf 1,15); 2,5 (Sf 1,14-18); Tg 2,5 (Sf 2,3); Ap 8,1 (Sf 1,7); 14,1 (Sf 3,12-13); 14,5 (Sf 3,13).

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7

Apêndices

7.1.

Tabela 1 – 1ª seção: v. 14-15b

Vocabulário: pontos de contato no contexto do livro de Sofonias

TERMO Sf 3,14-15b RESTANTE DO L IVRO

tB; 14a.d 3,10 !AYci 14a.16b

laer"f.yI 14b.15c 2,9; 3,13 zl[ 14d 2,15; 3,11: zyLi[;

lKo 14d 1,2.4.8.9.112.182; 2,3.112.14.15; 3,72.82.9.11.14.192.20

ble 14d 1,12; 2,15: bb'le ~Øil;v'Wry> 14d.16a 1,4.12

rws 15a (hifil ) 3,11 (hifil )

hwhy 15a.15c.17a 1,1.2.3.5.62.73.8.10.12.142.17.18 2,22.32.5.7.9.10.11 3,2.5.8.9.12.20

jP'v.mi 15a 2,3; 3,5.8

7.2.

Tabela 2 – 1ª seção: v. 14-15b

Vocabulário: hápax legómena no contexto do livro de Sofonias

TERMO Sf 3,14-15b

!nr 14a [wr 14b xmf 14c zl[ 14d hnp 15b bya 15b

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135

7.3.

Tabela 3 – 2ª seção: v. 15c-16

Vocabulário: pontos de contato no contexto do livro de Sofonias

TERMO Sf 3,15c-16 RESTANTE DO L IVRO

%l,m, 15c 1,1.8 1,5: ~Kol.mi

br<q, 15c.17a 3, 3.5.11.12 ary 15d.16b (qal) 2,11 (nifal); 3,7 (qal) dA[ 15d 2,15; 3,11

~Ay 16a 1,1.7.8.9.10.142.156.16.18; 2,22.3; 3,8.11

rma 16a (nifal) 1,12; 2,15 (qal) 3,7.20 (qal)

dy" 16c (dual) 1,4; 2,13.15 (singular)

7.4.

Tabela 4 – 2ª seção: v. 15c-16

Vocabulário: hápax legómena no contexto do livro de Sofonias

TERMO Sf 3,15c-16

[r: 15d hpr 16c %yId"y" 16c

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136

7.5.

Tabela 5 – 3ª seção: v. 17

Vocabulário: pontos de contato no contexto do livro de Sofonias

TERMO Sf 3,17 RESTANTE DO L IVRO

~yhil{a/ 17a 2,7.9; 3,2: para Deus 2,11: para os ídolos

rABGI 17b 1,14 [vy 17b (hifil ) 3,19 (hifil )

l[; 17c.e (a favor) 1,42.83.92.122.16; 2,22.5.8.10.11.13; (contra) 3,8.18

7.6.

Tabela 6 – 3ª seção: v. 17

Vocabulário: hápax legómena no contexto do livro de Sofonias

TERMO Sf 3,17

fyf / fwf 17c

hx'm.fi 17c vrx 17d

tb'h]a; 17d lyg 17e hN"rI 17e

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137

7.7.

Tabela 7 – Sf 3,14-17

Termos e expressões no contexto do livro de Sofonia s

TERMOS E

EXPRESSÕES

EM CONTINUIDADE EM CONTRASTE

14a 14b 14c 14d

!nr [wr Xmf zl[

3,11: [vp 1,10: hq'['c. lAq 1,10: hl'l'ywI antônimos 1,10: lAdG" rb,v,w 1,11: lly 1,18: lhb

14a 14d

!AYci-tB; ~Øil'v'Wry> tB;

3,10: yc;WP-tB;

14d ble-lk'B. 1,12: ~b'b'l.Bi 2,15: Hb'b'l.Bi

15a jP'v.mi 2,3: Wl['P' AjP'v.mi 3,5: !TeyI AjP'v.mi

3,5: !TeyI AjP'v.mi 3,8: yjiP'v.mi

15b %yIj;P'v.mi rysihe 3,11: %tew"a]G: yzEyLi[; rysia'

15b %bey>ao hN"Pi 3,11: %tew"a]G: rysia' expr. 3,19: %yIN:[;m.-lK'-ta, sinôn.

15c laer"f.yI %l,m, 1,1: hd"Why> %l,m, 1,8: %l,M,h; ynEB;

15c 17a

%Ber>qiB. 3,5: HB'r>qiB. 3,11: %Ber>Qimi 3,12: %Ber>qiB.

3,3: HB'r>qiB.

15d 16b

yair>yti-al{ yair>yti-la;

3,7: yair>yti-%a;

16c aWhh; ~AYB; 3,11: aWhh; ~AYB; 3,19.20: ayhih; t[eB' 3,20: t[eB'

1,9.10: aWhh; ~AYB; 1,7.142.156.16; 2, 22: ~Ay 1,8.18; 2,3: ~AyB. 3,8: ~Ayl. 1,12: t[eB'

17a ~yhil{a/ hw"hy> 2,7.9; 2,11; 3,2

17b [:yviwOy rABGI 1,14: rABGI ~v' x;rEco

17b [vy

1,18: lcn sinôn. 1,2.3: @ws 1,3.4.11; 3,6.7: trk antôn. 2,5.13: dba

17d vrx 1,7: sx; sinônimo

17c 17d 17e

hx'm.fiB. %yIl;[' fyfiy" Atb'h]a;B. vyrIx]y: hN"rIB. %yIl;[' lygIy"

2,2; 3,8: @a; + !Arx' antôn.

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138

7.8.

Tabela 8 – Sf 3,14-17

Temas por seção no contexto do livro de Sofonias

TEMAS CONTINUIDADE/CONTRASTE

14 a alegria do povo contr. – situação de medo e angústia contin. – esperança de restauração

14 os nomes como é exortado contr. – Jerusalém contin. – filha da dispersão

15a a anistia das sentenças contr. – promulgação do castigo contin. – advertência e promessa

15b a libertação da opressão contr. – opressão dos poderosos contin. – aniquilamento dos opressores

15c o reinado de YHWH contr. – lideranças humanas contin. – afastamento dos líderes

15d.16b o porquê do não-temor contr. – medo dos opressores e de YHWH contin. – eliminação pedagógica dos povos

16a o yôm YHWH salvífico contr. – aniquilamento de tudo contin. – promessa aos tementes

16c o chamado a ação

contr. – más ações dos poderosos contin. – o agir permanente de YHWH

15c.17a YHWH no meio do povo contr. – os ímpios no meio do povo contin. – a justiça de YHWH em seu meio

17a YHWH, Deus de Israel contr. – idolatria e sincretismo contin. – reconhecimento de YHWH

17b YHWH, o herói que salva contr. – herói humano que não salva e que se amedronta

17c-e a alegria de YHWH contr. – a ira de YHWH contin. – a longanimidade de YHWH

7.9.

Tabela 9 – Sf 3,14-17

Temas gerais no contexto do livro de Sofonias

TEMAS CONTRASTE

A justiça de YHWH A injustiça das lideranças humanas

O amor generoso de YHWH A ira de YHWH

O yôm YHWH salvífico O yôm YHWH condenatório

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