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NOSSOS AGRADECIMENTOS A GARDÊNIA CURY | JOSIENE SAIBROSA DA SILVA
ZÉLIA SUASSUNA | DANTAS SUASSUNA | FAMÍLIA SUASSUNA | MANELITO DANTAS
LUCIA RIFF | LUCAS M.A.C. | GRAX MEDINA | JAVÉ MONTUCHÔ | LÍVIO GALENO
MARCIANO RIBEIRO | ROBERTO SCHMITT-PRYM | VALDIR LIMA | MÁRIO FILHO
NIÈDE GUIDON | PARQUE NACIONAL SERRA DA CAPIVARA
Direitos reservados à HOBLICUARua 24 de Janeiro, 160 - Centro/Norte
64000-235 | Teresina| Piauí | Brasil+55 [86] 32214984 | +55 [86] 995320816
[email protected] | [email protected]©2015 Copyright HOBLICUA e seus colaboradores
ISSN: 2358-5609
EDITORES
CONSELHO EDITORIAL
CONSULTORIA, SELEÇÃO DE TEXTOS E VERBETE
REVISÃO DE TEXTO
TRANSCRIÇÃO DE TEXTO
PROJETO GRÁFICO
FOTOGRAFIAS
FOTOGRAFIA P. 111
PORTA HOBLICUA
ACERVO ICONOGRÁFICO
TRATAMENTO ICONOGRÁFICO
CHECAGEM
CAPA E EDITORAÇÃO ELETRÔNICA
ADMINISTRATIVO
APOIO CULTURAL
DOUGLAS MACHADOJOÃO MARCELLO DE MACÊDO CLAUDINO
ANDRÉ SEFFRIN CARLOS NEWTON JÚNIOR LUIZ ANTONIO DE ASSIS BRASIL SYLVIE DEBS
CARLOS NEWTON JÚNIOR
SILVANA SEFFRIN
ALANA YASMIM DOS SANTOS THIAGO FURTADO
JOFFRE RIO
DOUGLAS MACHADO
FERNANDO PEREIRA
PAULO VASCONCELLOS
FAMÍLIA SUASSUNA
MARCÍLIO BENÍCIO
LUCAS MACHADO
ALG PUBLICIDADE
JOYCE CARVALHO
CONSTRUTORA SUCESSOHALLEY GRÁFICA E EDITORA
13
AO CRISTO CRUCIFICADO
Ó felix culpa!Escrito à leitura de Santa Teresa de Ávila e do poeta Gregório de Matos.
Se esse Céu, desejado e imerecido,
for, Coroa de crimes resgatados,
no termo de meus Dias fatigados,
pelo Amor, à minh'alma concedido,
sei que este Amor, que é vosso e que, ferido,
jaz em meu Peito, cego de pecados,
excederá de muito os sons Alados
dos Sonhos em que vivo suspendido.
Mas, lembrando o Desterro meu, presente,
(se permitido for) na Aventurança
talvez eu chore a falta desusada
do tempo em que, contrito e Penitente,
achava a própria Culpa grata e mansa
por ser de Vós remida e consolada.
[1951]
Poemas
14
Ariano Suassuna
A UMA DAMA TRANSITÓRIA
Deixa a cabeça em meu peito
enquanto o Sol agoniza:
longe, na tarde Dourada,
ouço-te a Voz desvelada,
antiga, forte, Indivisa.
Tempo e fortuna passaram,
passaram Sede e saudade:
deixa a cabeça em meu peito
que teu Cabelo desfeito
canta a Vida e a brevidade.
Um dia terei passado
e Tu passarás também:
mas, antes, um outro Peito,
talvez sem tanto proveito,
guarde o que o meu hoje tem.
Que seja, pois: vida é Fruto,
morte, Sol, sono e Suspeita.
E eu te quero como à Vida
doce e cruel – sem Medida
na sua Glória imperfeita.
[1953]
Ariano Suassuna
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modo nas zonas de sombra da minha vida que eu não teria coração para
resistir à sua leitura. Vou ver, então, se, com este, permanecendo fiel ao
que julgo ser a minha verdade, consigo ser mais impessoal e manter um
certo distanciamento entre minha vida e minhas palavras.
Primeiro, não quero que se entenda como desatenção o fato de
não ter querido, cercando esta cerimônia, certos acontecimentos que,
exatamente por respeito ao essencial, não quis que a perturbassem.
Como escritor, lido com imagens, mas quero que, no meu caso, elas
correspondam sempre a uma verdade singular e profunda. Por outro lado,
não acredito que, na posse daqueles a quem mais admiro aqui, tenha
havido qualquer acréscimo desse tipo. Na de Joaquim Nabuco, talvez sim.
Na de Euclydes da Cunha, creio que não. Sei que minhas dimensões não
são as de Euclydes da Cunha, mas é à linhagem dele que sempre procurei
me filiar.
Ora, pelo que li e ouvi a respeito da maneira pela qual me foram
entregues, no Recife, as insígnias que passo a usar, notei que tudo estava
sendo entendido como uma daquelas atitudes menos graves referidas por
Hélio Pólvora. O equívoco parte de um desentendimento fundamental:
aquilo que é sério e grave para mim nem sempre é o mesmo que para
os outros.
Um dia, lendo Alfredo Bosi, encontrei uma distinção feita por
Machado de Assis e que é indispensável para se entender o processo
histórico brasileiro. Ele critica atos do nosso mau governo e coisas da nossa
má política. Mostra-se ácido e amargo com uns e outras e depois explica:
Não é desprezo pelo que é nosso, não é desdém pelo meu país.
O país real, esse é bom, revela os melhores instintos. Mas o país
oficial, esse é caricato e burlesco.
Quando eu quis que o uniforme que uso agora fosse feito por
uma costureira e uma bordadeira do Recife, Edite Minervina e Cicy
Discurso de posse na ABL
55
Ferreira, estava levando em conta a distinção estabelecida por Machado
de Assis e uma frase de Gandhi que li aí por 1980, e que me impressionou
profundamente. Dizia ele que um indiano verdadeiro e sincero, mas
pertencente a uma das duas classes mais poderosas de seu País, não deveria
nunca vestir uma roupa feita pelos ingleses. Primeiro, porque estaria se
acumpliciando com os invasores. Depois porque estaria, com isso, tirando
das mulheres pobres da Índia um dos poucos mercados de trabalho que
ainda lhes restavam.
A partir daí, passei a usar somente roupas feitas por uma costureira
popular e que correspondessem a uma espécie de média do uniforme
de trabalho do brasileiro comum. Não digo que fiz um voto, que é coisa
mais séria e mais alta, colocada nas dimensões de um Profeta, como
Gandhi, ou de um Monge, como Dom Marcos Barbosa. Não fiz um
voto: digamos que passei a manter um propósito. Não pretendo passar
pelo que não sou. Egresso do Patriarcado rural derrotado pela Burguesia
urbana em 1889, 1930 e 1964, ingressei no Patriciado das cidades como
o escritor e professor que sempre fui. Continuo, portanto, a integrar uma
daquelas classes poderosas às quais fazia Gandhi a sua recomendação. Sei
perfeitamente que não é o fato de me vestir de certa maneira, e não
de outra, que vai fazer de mim um camponês pobre. Mas acredito na
importância das roupagens para a liturgia, como creio no sentido dos
rituais. Eu queria que minha maneira de vestir indicasse que, como
escritor pertencente a um país pobre e a uma sociedade injusta, estou
convocado a serviço. Pode até ser que o País objete que não me convocou.
Não importa: a roupa e as alpercatas que uso em meu dia a dia são apenas
uma indicação do meu desejo de identificar meu trabalho de escritor
com aquilo que Machado de Assis chamava o Brasil real e que, para mim,
é aquele que habita as favelas urbanas e os arraiais do campo. Voltarei
depois a este assunto, de tal modo é ele importante na minha visão do
mundo e, em particular, na do nosso País, a esta altura submetido a um
processo de falsificação, de entrega e vulgarização que, a meu ver, é a
impostura mais triste, a traição mais feia que já se tramou contra ele.
Ariano Suassuna
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Pedro. Acho que saiu até a notícia no jornal, o meu nome como Pedro.
Esse foi um dos motivos, aliás, de eu ter escolhido o nome Pedro para o
narrador de A Pedra do Reino, não é? O nome Pedro deu origem a um
trocadilho feito pelo Cristo: “Tu és Pedro, e sobre essa pedra eu edificarei
a minha Igreja.” Então, eu gosto muito do nome Pedro. Mas depois
meu pai se fixou na escolha de Ariano, que é um nome de um santo
quase desconhecido. Quase desconhecido não, eu acho que é obscuro
e desconhecido. Ele foi um funcionário elevado na administração do
Egito e converteu-se ao cristianismo, motivo pelo qual foi martirizado.
E meu pai me colocou esse nome de Ariano. O Suassuna veio nas
águas do Movimento Nativista, que deu origem à Independência do
Brasil. A família do meu bisavô é originária de um engenho chamado
Suassuna, o Engenho Suassuna, aqui em Pernambuco. E o ramo da nossa
família que era desse engenho era chamado Os Suassunas por causa do
engenho, mas era um apelido, uma alcunha. Mas o meu bisavô adotou
como nome. E como meu avô nasceu em 1824, o Movimento Nativista
da Independência ainda estava em plena ebulição, não é? Ele adotou
como nome mesmo, e ele já batizou meu avô com o nome de Suassuna:
Alexandrino Felício Suassuna. E o meu pai e os irmãos dele todos
adotaram, e nós, consequentemente, adotamos também.
DOUGLAS MACHADO
Em seu discurso de posse na Academia Brasileira de Letras, o senhor
disse que, como escritor, era “...aquele mesmo menino que, perdendo
o Pai assassinado no dia 9 de outubro de 1930, passou o resto da vida
tentando protestar contra sua morte”. De que maneira a biblioteca de
João Suassuna foi decisiva na formação do escritor Ariano Suassuna?
ARIANO SUASSUNA
Ah, foi uma influência fundamental essa biblioteca que ele nos deixou.
Foi nos exemplares de livros deixados por ele que eu li pela primeira
Entrevista
75
vez os livros de Eça de Queirós. Principalmente A cidade e as serras e
A ilustre casa de Ramirez, O mandarim, também, A relíquia. Li pela primeira
vez Os sertões no exemplar que pertenceu a ele, a meu pai; A carne, de
Júlio Ribeiro; O cortiço, de Aluísio Azevedo. Enfim, eu li uma porção
de livros que faziam parte do acervo da biblioteca que ele deixou.
E esses livros foram fundamentais na minha formação.
DOUGLAS MACHADO
Quais foram as outras influências entre autores e livros?
ARIANO SUASSUNA
Bom, quando menino eu recebi influência de autores que são até
desprezados, como de segunda ordem, mas que são autores que ainda
hoje eu prezo muito. Eu me lembro do estado de encantação em que
eu fiquei lendo Os três mosqueteiros pela primeira vez. E, logo depois,
eu li um livro de Alexandre Dumas que me impressionou muito e que
ainda hoje eu releio com um grande prazer. É um livro enorme, um
livro de 16 volumes, chamado Memórias de um médico, não é? E que se
passa nos dias que antecederam imediatamente a Revolução Francesa
ou então já na própria Revolução Francesa. De Alexandre Dumas, gosto
muito também d’O conde de Monte Cristo, gostei muito na juventude
e ainda hoje eu gosto muito. Acho uma obra muito importante. Teve
um papel muito importante na minha formação. Agora, logo depois
comecei a ler, digamos, algumas obras da literatura mais convencional e
tradicional. Eu li, com grande encanto, o Dom Quixote, de Cervantes; os
quatro maiores livros de Dostoiévski: Crime e castigo, O idiota, Os demônios
e Os irmãos Karamázov, e li também algumas peças de Calderón de la
Barca, mas isso foi uma leitura posterior. Aos 19 anos, eu li Calderón de
la Barca pela primeira vez. E, sim... eu me esqueci, nas leituras da infância
e da adolescência, de um livro que foi muito importante para mim,
Scaramouche, de um escritor chamado Rafael Sabatini, que era uma figura
Ariano Suassuna
76
muito curiosa. Ele nasceu em Portugal, filho de pai italiano e mãe inglesa.
Ele escrevia em inglês sobre a Revolução Francesa, também. No romance
dele, Scaramouche, a ação se passa na Revolução Francesa e teve logo
uma coisa que me tocou muito. É que quando começam os primeiros
tumultos que precederam a Revolução Francesa, o personagem central –
que é um jovem advogado, chamado André Louis Moreau – foge, porque
ele está ameaçado pela polícia. Foge e, incógnito, sem revelar quem era,
entra em uma companhia ambulante de teatro. De maneira que aquilo
era uma coisa que me encantava muito, porque tinha certa semelhança
com o circo, que era uma coisa que também foi muito importante na
minha formação literária e teatral durante a infância e a adolescência.
DOUGLAS MACHADO
Como era o Ariano menino?
ARIANO SUASSUNA
Eu era um menino, como disse, que gostava muito de ler. Eu normalmente
lia, e como ainda hoje, deitado. Eu lia na cama deitado, e era uma coisa
muito boa. Quando eu abria o livro era como se um mundo novo se
descortinasse diante de mim, não é? Agora, outra coisa que me encantava
muito: eu gostava de passear pelo mato. Inclusive a pretexto de caçar.
Eu caçava, juntamente com dois irmãos. Ora com meu irmão Marcos,
ora com João. Mais com Marcos. Mas quem primeiro me iniciou na
caçada foi João, que era o segundo dos meus irmãos. O mais velho era
Saulo e João é o segundo.
DOUGLAS MACHADO
Qual foi o primeiro circo, o primeiro espetáculo de teatro, a primeira
cantoria que ficou marcada na sua memória?
Pernambuco (TEP). Em 1947, escreve a sua primeira peça, a tragédia
Uma mulher vestida de sol. No ano seguinte, estreia em palco com Cantam
as harpas de Sião, depois reescrita sob o título O desertor de Princesa (1958).
Ainda estudante de Direito, escreve Os homens de barro (1949) e o Auto
de João da Cruz (1950). Em 1951, em Taperoá, para onde vai a fim de
curar-se do pulmão, escreve e encena, com mamulengos, o entremez Torturas
de um coração, seu primeiro trabalho ligado ao campo do cômico. Após
Torturas, escreve mais uma tragédia, O arco desolado (1952), para então
dedicar-se às comédias que o deixaram famoso: Auto da Compadecida
(1955), O casamento suspeitoso (1957), O santo e a porca (1957), A pena
e a lei (1959) e Farsa da boa preguiça (1960). A partir da encenação, no
Rio de Janeiro, do Auto da Compadecida, em janeiro de 1957, Suassuna
é alçado à condição de um dos nossos maiores dramaturgos. Encenado
em diversos países, o Auto encontra-se editado em vários idiomas, entre
os quais o alemão, o francês, o inglês, o espanhol e o italiano, e recebeu,
até hoje, três versões para o cinema. A partir de 1956, com A história do
amor de Fernando e Isaura, passa a dedicar-se, também, ao romance. Neste
ano, inicia carreira docente na Universidade Federal de Pernambuco,
onde irá lecionar disciplinas ligadas à arte e à cultura, aposentando-se
em 1989. Em 1960, forma-se em Filosofia pela Universidade Católica de
Pernambuco. De 1958 a 1970, trabalha em um longo romance, editado
em 1971, o Romance d’A Pedra do Reino e o príncipe do sangue do vai-e-volta,
cuja continuação, a História d’O rei degolado nas caatingas do sertão – ao
sol da Onça Caetana, sairá em livro em 1977. Na década de 1980, lança
dois álbuns de iluminogravuras, associando seu trabalho de escritor ao
de artista plástico. Em 1987, retorna ao teatro com As conchambranças de
Quaderna, levando ao palco o mesmo personagem do seu romance. Em
1990, toma posse na Academia Brasileira de Letras, ingressando, depois,
nas Academias de Letras dos estados de Pernambuco (1993) e da Paraíba
(2000). Pouco antes de morrer, concluiu um novo romance, ainda inédito,
intitulado Romance de Dom Pantero no palco dos pecadores.
Ariano Suassuna
114
Formato: 18 x 27 cm
Tipologia: Bembo
Papel: Pólen Bold 90 g/m2
Número de páginas: 120
Impressão: HALLEY GRÁFICA E EDITORA