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JOYCE CARVALHO

CONSTRUTORA SUCESSOHALLEY GRÁFICA E EDITORA

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AO CRISTO CRUCIFICADO

Ó felix culpa!Escrito à leitura de Santa Teresa de Ávila e do poeta Gregório de Matos.

Se esse Céu, desejado e imerecido,

for, Coroa de crimes resgatados,

no termo de meus Dias fatigados,

pelo Amor, à minh'alma concedido,

sei que este Amor, que é vosso e que, ferido,

jaz em meu Peito, cego de pecados,

excederá de muito os sons Alados

dos Sonhos em que vivo suspendido.

Mas, lembrando o Desterro meu, presente,

(se permitido for) na Aventurança

talvez eu chore a falta desusada

do tempo em que, contrito e Penitente,

achava a própria Culpa grata e mansa

por ser de Vós remida e consolada.

[1951]

Poemas

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Ariano Suassuna

A UMA DAMA TRANSITÓRIA

Deixa a cabeça em meu peito

enquanto o Sol agoniza:

longe, na tarde Dourada,

ouço-te a Voz desvelada,

antiga, forte, Indivisa.

Tempo e fortuna passaram,

passaram Sede e saudade:

deixa a cabeça em meu peito

que teu Cabelo desfeito

canta a Vida e a brevidade.

Um dia terei passado

e Tu passarás também:

mas, antes, um outro Peito,

talvez sem tanto proveito,

guarde o que o meu hoje tem.

Que seja, pois: vida é Fruto,

morte, Sol, sono e Suspeita.

E eu te quero como à Vida

doce e cruel – sem Medida

na sua Glória imperfeita.

[1953]

Sonetos de Albano Cervonegro

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Ariano Suassuna

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modo nas zonas de sombra da minha vida que eu não teria coração para

resistir à sua leitura. Vou ver, então, se, com este, permanecendo fiel ao

que julgo ser a minha verdade, consigo ser mais impessoal e manter um

certo distanciamento entre minha vida e minhas palavras.

Primeiro, não quero que se entenda como desatenção o fato de

não ter querido, cercando esta cerimônia, certos acontecimentos que,

exatamente por respeito ao essencial, não quis que a perturbassem.

Como escritor, lido com imagens, mas quero que, no meu caso, elas

correspondam sempre a uma verdade singular e profunda. Por outro lado,

não acredito que, na posse daqueles a quem mais admiro aqui, tenha

havido qualquer acréscimo desse tipo. Na de Joaquim Nabuco, talvez sim.

Na de Euclydes da Cunha, creio que não. Sei que minhas dimensões não

são as de Euclydes da Cunha, mas é à linhagem dele que sempre procurei

me filiar.

Ora, pelo que li e ouvi a respeito da maneira pela qual me foram

entregues, no Recife, as insígnias que passo a usar, notei que tudo estava

sendo entendido como uma daquelas atitudes menos graves referidas por

Hélio Pólvora. O equívoco parte de um desentendimento fundamental:

aquilo que é sério e grave para mim nem sempre é o mesmo que para

os outros.

Um dia, lendo Alfredo Bosi, encontrei uma distinção feita por

Machado de Assis e que é indispensável para se entender o processo

histórico brasileiro. Ele critica atos do nosso mau governo e coisas da nossa

má política. Mostra-se ácido e amargo com uns e outras e depois explica:

Não é desprezo pelo que é nosso, não é desdém pelo meu país.

O país real, esse é bom, revela os melhores instintos. Mas o país

oficial, esse é caricato e burlesco.

Quando eu quis que o uniforme que uso agora fosse feito por

uma costureira e uma bordadeira do Recife, Edite Minervina e Cicy

Discurso de posse na ABL

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Ferreira, estava levando em conta a distinção estabelecida por Machado

de Assis e uma frase de Gandhi que li aí por 1980, e que me impressionou

profundamente. Dizia ele que um indiano verdadeiro e sincero, mas

pertencente a uma das duas classes mais poderosas de seu País, não deveria

nunca vestir uma roupa feita pelos ingleses. Primeiro, porque estaria se

acumpliciando com os invasores. Depois porque estaria, com isso, tirando

das mulheres pobres da Índia um dos poucos mercados de trabalho que

ainda lhes restavam.

A partir daí, passei a usar somente roupas feitas por uma costureira

popular e que correspondessem a uma espécie de média do uniforme

de trabalho do brasileiro comum. Não digo que fiz um voto, que é coisa

mais séria e mais alta, colocada nas dimensões de um Profeta, como

Gandhi, ou de um Monge, como Dom Marcos Barbosa. Não fiz um

voto: digamos que passei a manter um propósito. Não pretendo passar

pelo que não sou. Egresso do Patriarcado rural derrotado pela Burguesia

urbana em 1889, 1930 e 1964, ingressei no Patriciado das cidades como

o escritor e professor que sempre fui. Continuo, portanto, a integrar uma

daquelas classes poderosas às quais fazia Gandhi a sua recomendação. Sei

perfeitamente que não é o fato de me vestir de certa maneira, e não

de outra, que vai fazer de mim um camponês pobre. Mas acredito na

importância das roupagens para a liturgia, como creio no sentido dos

rituais. Eu queria que minha maneira de vestir indicasse que, como

escritor pertencente a um país pobre e a uma sociedade injusta, estou

convocado a serviço. Pode até ser que o País objete que não me convocou.

Não importa: a roupa e as alpercatas que uso em meu dia a dia são apenas

uma indicação do meu desejo de identificar meu trabalho de escritor

com aquilo que Machado de Assis chamava o Brasil real e que, para mim,

é aquele que habita as favelas urbanas e os arraiais do campo. Voltarei

depois a este assunto, de tal modo é ele importante na minha visão do

mundo e, em particular, na do nosso País, a esta altura submetido a um

processo de falsificação, de entrega e vulgarização que, a meu ver, é a

impostura mais triste, a traição mais feia que já se tramou contra ele.

Ariano Suassuna

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Pedro. Acho que saiu até a notícia no jornal, o meu nome como Pedro.

Esse foi um dos motivos, aliás, de eu ter escolhido o nome Pedro para o

narrador de A Pedra do Reino, não é? O nome Pedro deu origem a um

trocadilho feito pelo Cristo: “Tu és Pedro, e sobre essa pedra eu edificarei

a minha Igreja.” Então, eu gosto muito do nome Pedro. Mas depois

meu pai se fixou na escolha de Ariano, que é um nome de um santo

quase desconhecido. Quase desconhecido não, eu acho que é obscuro

e desconhecido. Ele foi um funcionário elevado na administração do

Egito e converteu-se ao cristianismo, motivo pelo qual foi martirizado.

E meu pai me colocou esse nome de Ariano. O Suassuna veio nas

águas do Movimento Nativista, que deu origem à Independência do

Brasil. A família do meu bisavô é originária de um engenho chamado

Suassuna, o Engenho Suassuna, aqui em Pernambuco. E o ramo da nossa

família que era desse engenho era chamado Os Suassunas por causa do

engenho, mas era um apelido, uma alcunha. Mas o meu bisavô adotou

como nome. E como meu avô nasceu em 1824, o Movimento Nativista

da Independência ainda estava em plena ebulição, não é? Ele adotou

como nome mesmo, e ele já batizou meu avô com o nome de Suassuna:

Alexandrino Felício Suassuna. E o meu pai e os irmãos dele todos

adotaram, e nós, consequentemente, adotamos também.

DOUGLAS MACHADO

Em seu discurso de posse na Academia Brasileira de Letras, o senhor

disse que, como escritor, era “...aquele mesmo menino que, perdendo

o Pai assassinado no dia 9 de outubro de 1930, passou o resto da vida

tentando protestar contra sua morte”. De que maneira a biblioteca de

João Suassuna foi decisiva na formação do escritor Ariano Suassuna?

ARIANO SUASSUNA

Ah, foi uma influência fundamental essa biblioteca que ele nos deixou.

Foi nos exemplares de livros deixados por ele que eu li pela primeira

Entrevista

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vez os livros de Eça de Queirós. Principalmente A cidade e as serras e

A ilustre casa de Ramirez, O mandarim, também, A relíquia. Li pela primeira

vez Os sertões no exemplar que pertenceu a ele, a meu pai; A carne, de

Júlio Ribeiro; O cortiço, de Aluísio Azevedo. Enfim, eu li uma porção

de livros que faziam parte do acervo da biblioteca que ele deixou.

E esses livros foram fundamentais na minha formação.

DOUGLAS MACHADO

Quais foram as outras influências entre autores e livros?

ARIANO SUASSUNA

Bom, quando menino eu recebi influência de autores que são até

desprezados, como de segunda ordem, mas que são autores que ainda

hoje eu prezo muito. Eu me lembro do estado de encantação em que

eu fiquei lendo Os três mosqueteiros pela primeira vez. E, logo depois,

eu li um livro de Alexandre Dumas que me impressionou muito e que

ainda hoje eu releio com um grande prazer. É um livro enorme, um

livro de 16 volumes, chamado Memórias de um médico, não é? E que se

passa nos dias que antecederam imediatamente a Revolução Francesa

ou então já na própria Revolução Francesa. De Alexandre Dumas, gosto

muito também d’O conde de Monte Cristo, gostei muito na juventude

e ainda hoje eu gosto muito. Acho uma obra muito importante. Teve

um papel muito importante na minha formação. Agora, logo depois

comecei a ler, digamos, algumas obras da literatura mais convencional e

tradicional. Eu li, com grande encanto, o Dom Quixote, de Cervantes; os

quatro maiores livros de Dostoiévski: Crime e castigo, O idiota, Os demônios

e Os irmãos Karamázov, e li também algumas peças de Calderón de la

Barca, mas isso foi uma leitura posterior. Aos 19 anos, eu li Calderón de

la Barca pela primeira vez. E, sim... eu me esqueci, nas leituras da infância

e da adolescência, de um livro que foi muito importante para mim,

Scaramouche, de um escritor chamado Rafael Sabatini, que era uma figura

Ariano Suassuna

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muito curiosa. Ele nasceu em Portugal, filho de pai italiano e mãe inglesa.

Ele escrevia em inglês sobre a Revolução Francesa, também. No romance

dele, Scaramouche, a ação se passa na Revolução Francesa e teve logo

uma coisa que me tocou muito. É que quando começam os primeiros

tumultos que precederam a Revolução Francesa, o personagem central –

que é um jovem advogado, chamado André Louis Moreau – foge, porque

ele está ameaçado pela polícia. Foge e, incógnito, sem revelar quem era,

entra em uma companhia ambulante de teatro. De maneira que aquilo

era uma coisa que me encantava muito, porque tinha certa semelhança

com o circo, que era uma coisa que também foi muito importante na

minha formação literária e teatral durante a infância e a adolescência.

DOUGLAS MACHADO

Como era o Ariano menino?

ARIANO SUASSUNA

Eu era um menino, como disse, que gostava muito de ler. Eu normalmente

lia, e como ainda hoje, deitado. Eu lia na cama deitado, e era uma coisa

muito boa. Quando eu abria o livro era como se um mundo novo se

descortinasse diante de mim, não é? Agora, outra coisa que me encantava

muito: eu gostava de passear pelo mato. Inclusive a pretexto de caçar.

Eu caçava, juntamente com dois irmãos. Ora com meu irmão Marcos,

ora com João. Mais com Marcos. Mas quem primeiro me iniciou na

caçada foi João, que era o segundo dos meus irmãos. O mais velho era

Saulo e João é o segundo.

DOUGLAS MACHADO

Qual foi o primeiro circo, o primeiro espetáculo de teatro, a primeira

cantoria que ficou marcada na sua memória?

Pernambuco (TEP). Em 1947, escreve a sua primeira peça, a tragédia

Uma mulher vestida de sol. No ano seguinte, estreia em palco com Cantam

as harpas de Sião, depois reescrita sob o título O desertor de Princesa (1958).

Ainda estudante de Direito, escreve Os homens de barro (1949) e o Auto

de João da Cruz (1950). Em 1951, em Taperoá, para onde vai a fim de

curar-se do pulmão, escreve e encena, com mamulengos, o entremez Torturas

de um coração, seu primeiro trabalho ligado ao campo do cômico. Após

Torturas, escreve mais uma tragédia, O arco desolado (1952), para então

dedicar-se às comédias que o deixaram famoso: Auto da Compadecida

(1955), O casamento suspeitoso (1957), O santo e a porca (1957), A pena

e a lei (1959) e Farsa da boa preguiça (1960). A partir da encenação, no

Rio de Janeiro, do Auto da Compadecida, em janeiro de 1957, Suassuna

é alçado à condição de um dos nossos maiores dramaturgos. Encenado

em diversos países, o Auto encontra-se editado em vários idiomas, entre

os quais o alemão, o francês, o inglês, o espanhol e o italiano, e recebeu,

até hoje, três versões para o cinema. A partir de 1956, com A história do

amor de Fernando e Isaura, passa a dedicar-se, também, ao romance. Neste

ano, inicia carreira docente na Universidade Federal de Pernambuco,

onde irá lecionar disciplinas ligadas à arte e à cultura, aposentando-se

em 1989. Em 1960, forma-se em Filosofia pela Universidade Católica de

Pernambuco. De 1958 a 1970, trabalha em um longo romance, editado

em 1971, o Romance d’A Pedra do Reino e o príncipe do sangue do vai-e-volta,

cuja continuação, a História d’O rei degolado nas caatingas do sertão – ao

sol da Onça Caetana, sairá em livro em 1977. Na década de 1980, lança

dois álbuns de iluminogravuras, associando seu trabalho de escritor ao

de artista plástico. Em 1987, retorna ao teatro com As conchambranças de

Quaderna, levando ao palco o mesmo personagem do seu romance. Em

1990, toma posse na Academia Brasileira de Letras, ingressando, depois,

nas Academias de Letras dos estados de Pernambuco (1993) e da Paraíba

(2000). Pouco antes de morrer, concluiu um novo romance, ainda inédito,

intitulado Romance de Dom Pantero no palco dos pecadores.

Ariano Suassuna

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Formato: 18 x 27 cm

Tipologia: Bembo

Papel: Pólen Bold 90 g/m2

Número de páginas: 120

Impressão: HALLEY GRÁFICA E EDITORA