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Impresso no Brasil – Printed in Brazil

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Capa: Danilo Oliveira

Produção Digital: Equiretech

Data de fechamento: 20.03.2017

1. ed. 2011; 2. ed. 2011; 3. ed. 2012; 4. ed. 2013; 5. ed. 2013; 6. ed. 2014; 7. ed. 2015; 8.ed. 2016; 9. ed. 2017.

DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP)(CÂMARA BRASILEIRA DO LIVRO, SP, BRASIL)

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Mamede, Gladston

Holding familiar e suas vantagens: planejamento jurídico e econômico do patrimônioe da sucessão familiar / Gladston Mamede, Eduarda Cotta Mamede. – 9. ed. rev., atual eampl. – São Paulo: Atlas, 2017.

Bibliografia.ISBN 978-85-97-01192-0

1. Direito empresarial 2. Direito societário 3. Empresas familiares 4. Holding familiar 5.Sucessão familiar I. Mamede, Eduarda Cotta. II. Título.

10-10548 CDU-34:338.93

Índice para catálogo sistemático: 1. Planejamento jurídico e econômico dopatrimônio e da sucessão familiar: Direito empresarial 34:338.93

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Aos nossos pais,Antônio e Elma Mamede,

José Geraldo e Atair Cotta,nossa gratidão por todo o Amor,

Carinho e Dedicação.

E aos nossos filhos,Filipe, Roberta e Fernanda,

a quem amamos demais.

Deus os abençoe e lhes dê boa sorte na vida.

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Nota dos autores

O tempo enterra, sem qualquer comiseração, histórias lindas, casosimpressionantes. Esquece, passa por cima, supera. Sobrevivem um pouco,enquanto a língua ainda corre à rédea solta, mas depois se embrenham nosilêncio, como se deixassem de existir. Por isso, é sempre bom contar bonscausos, sabemos nós, os mineiros. Nas cozinhas perfumadas de café e pão dequeijo, a gente repete à larga as narrativas que se ouviram dos pais, avós, tios,amigos. E, assim, vamos dando sobrevida ao passado, se bem que, deveras,quem conta um conto aumenta um ponto.

A história de Pantaleão e Honorina é verdadeira, vou de logo avisando. Nãoé invencionice, não. Nem os nomes são inventados; são esses mesmos, razãopela qual quem bisbilhotar um pouco logo encontrará ecos dessas linhas naboca do povo. Afinal, os parentes deles ainda estão lá, em Ponte Nova, onde osfatos se passaram há várias décadas. O caso se deu nas beiras iniciais dosnovecentos, enredado pelos meados do século, mas há netos que ainda estãovivos, embora velhos. Seus bisnetos estão adultos e criam filhos, entre novos eadolescentes.

Ponte Nova é uma cidade construída às margens do Rio Piranga, na Zonado Carmo, ou seja, na região de Mariana. Está próxima de Ouro Preto, outroraVila Rica, primeira capital da Província das Minas Gerais. Cidade bonita ondecorrem os dias numa brejeirice gostosa e honrada, merecendo o progresso,embora guardando um jeitinho só seu. Foi ali que viveram Pantaleão eHonorina. Casaram-se e fizeram família, tocando a vida no reiterar das manhãs,entregues ao ofício dos dias. De filhos tiveram uma reca, criada com atenção ecarinho. Juntos construíram uma família e mesmo um casarão no alto domorro, com varanda e tudo. E foram assim, velhice adentro, cumprindo o

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destino.Mas Honorina morreu.

Pantaleão chorou seu caixão, velando o corpo amado. Os olhos queimaramna ausência da esperança, roubada agressivamente pela morte. Secou-se emlágrimas por renovadas vezes e, cambaleante, viu entregarem-na a terra. Noentanto, manteve-se em pé, homem cumprindo seu dever de homem.

Estavam, enfim, apartados, Pantaleão e Honorina. Ele a chorou ali, nocemitério, como a chorou no purgatório interminável das noites, condenado aoquarto que nem os cobertores esquentavam e as paredes não davam fim. Foiassim que aprendeu que a cama vazia dos viúvos é a pior das câmaras detorturas. A vida, nessas madrugadas, é pior que a morte. É impiedosa; é cruel.

Findo o martírio de cada noite, aos dias entregava-se sentado na varandada casa sem vida. Nunca antes se dera conta dessa vantagem: dali se via fácil ocemitério. Por um tal horizonte, pagaria qualquer preço. Mas, por sorte, a casajá era sua e, por isso, passava as horas namorando, a distância, o túmulo deHonorina, tomando conta do seu leito até que a noite lhe obrigasse novamenteao tombo na cisterna da cama, entregue às dores da ausência. Velou-a, assim,por cerca de um mês, suportando o contraste das lembranças, felizes em seuconteúdo, terríveis por serem apenas retalhos apodrecidos de um tempopassado. Até isso a morte tinha matado.

Ao cabo de mês, morreu ele próprio, para renovada tristeza dos filhos, quechoraram o seu caixão, velaram o seu corpo e, enfim, entregaram-no à terra.Apartaram-se dos pais e foram tocar suas vidas até que também morreram,como já morreram mesmo alguns de seus próprios filhos. É a regra da vida.Contudo, desde aquele dia, em que também baixou à terra, Pantaleão libertou-se das noites geladas e solitárias em que era torturado. Pantaleão está junto deHonorina, pelos séculos e séculos e séculos… Deus nos proteja, os enamorados.

A felicidade tornou-se um mito. Todos a querem, mas quase ninguém estácerto de possuí-la. Ela nunca é completa, nunca é total; estranho, não? Ondeestaria, então, a felicidade? Na qualidade de mito, a felicidade mora junto deoutros mitos de nosso tempo: a paixão avassaladora, o príncipe encantado ou ohomem divino, a mulher linda e gostosa, a fama e a fortuna, o carro magnífico,o luxo etc. etc. São mitos que nos atam a um futuro idílico, de difícilconcretização e, assim, sempre parece faltar alguma coisa. Nunca nos sentimosverdadeira e perenemente felizes, enquanto seguimos a rotina de trabalhar econsumir. Trabalhamos para consumir, na ilusão de que produtos e serviços nosvão fazer felizes, sendo melhor quanto mais consumirmos. Assim, vendem-nosfalsas esperanças e mesmo imagens: quem somos, quem seríamos,

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contrastando-nos com modelos que são, eles próprios, uma construção artificiale irreal, envoltos em seus próprios dilemas pessoais.

Contudo, a felicidade não está ligada a qualquer produto ou situação; nãoestá na viagem ao exterior, no emprego que eu não tenho, no prêmio de loteriaque não ganhei (ainda!). Ao contrário do que nos insiste em dizer apublicidade, a felicidade não está condicionada a isto ou aquilo, não decorre deuma compra. É apenas um estado d’alma e somos nós que podemos condicioná-la. É singela e verdadeira, bem distante da imagem eufórica reiterada pelosanúncios: gargalhadas constantes, emoções fortes constantes, paixão constante(você será feliz com esta ou aquela bebida, numa viagem para tal ou qual lugar,usando esta ou aquela roupa etc.). Uma ilusão de felicidade cega-nos os olhos enos empurra para o consumo de produtos e serviços, como se ali estivesse o queprocuramos. Não está.

Assim, cada vez mais, padecemos de um certo vazio, com maior ou menorfrequência. Chamem-no de tristeza, melancolia ou depressão, por vezes nosvemos sustidos por um fio sobre um abismo escuro, inseguros, insatisfeitos, semperspectivas. Não se trata de um privilégio nefasto do princípio do novoMilênio, o terceiro, já que a angústia está presente em vários outros momentosda história, a exemplo do barroco, romantismo, simbolismo, existencialismoetc.

Talvez seja o próprio conceito de felicidade que precise ser remodelado erepensado. Talvez, se ele fosse menos mítico, menos hollywoodiano (essesembustes que são seguidos pelo The End), pudesse ser mais fácil de ser vivido.Será que não estamos apegados demais a essas referências míticas para sermosfelizes? Felicidade não se confunde com fuga: o ser humano feliz não se temeou se odeia: aceita-se como é, ainda que queira – e se esforce – por melhorar;respeita-se e procura conhecer-se (e não se iludir). Por outro lado, felicidadenão é sinônimo de irresponsabilidade: não é um estado de abandono das coisascotidianas, mas uma harmonização (segundo o Aurélio, harmonia é a“disposição bem ordenada entre as partes de um todo”) dos elementos quecompõem a vida: trabalho, convivência com os outros, os tantos atos cotidianos(como alimentar-se, por exemplo), paisagens, circunstâncias, o tempo: em tudohá inúmeros detalhes que merecem atenção, pois podem revelar pequenosprazeres (que sempre serão os melhores, porque são mais verdadeiros que osmais exaltados).

Estamos perdendo os instantes, atropelando os dias e, de tempo em tempo,percebemos que a vida está indo “rápido demais” (estamos tão preocupados emnão perder tempo, que acabamos perdendo o tempo). O antídoto pode ser não

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só a simplicidade, como a valorização de uma postura nova: a atenção nosdetalhes (como nos sentidos: aromas, sabores, texturas, cores, sons), a gratidão,a cordialidade, o sorriso, a paciência, o carinho. Perceber um outro mundo queexiste paralelo a este caótico em que vivemos. A vida é, acima de tudo, simples.As complicações são um fenômeno cultural humano. Então, seria bomcompreendermos a simplicidade da vida. Note, por exemplo, que uma parteconsiderável (senão a maior) dos problemas é construída, mentalmente, pornós mesmos. Quem irá, em si, arar e fertilizar a terra da felicidade? Quem irá sedispor a um esforço tão inglório, tão pouco comum, tão pouco provável(ilógico, quase!) de fazer-se harmonioso?

Queremos encontrar, dentro dos nossos olhos, a paz. Sabemos que ela estálá. Por vezes a vemos: vemo-la em nós. Sabemos que é difícil, mas queremostentar. Erramos muito, mas queremos continuar tentando. Quem sabe nãovamos conseguir? Há uma promessa antiga: Você pode tentar milhares de vezes:a porta sempre estará aberta, dizem os sufis.

Com Deus,Com carinho.

Gladston e Eduarda Mamede

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Sumário

Tecnologia jurídica e advocaciaQualidade e inovaçãoGestão da inovação jurídica

Inovação advocatíciaA teoria da empresa

HoldingDefinição de holdingEquívocos comuns

Natureza jurídica: simples ou empresáriaTipicidade societária

Tipos societáriosSociedade simples comumSociedade em nome coletivo

Sociedade em comandita simplesSociedade limitada

Sociedade anônimaSociedade em comandita por ações

Eventos societáriosDimensão escritural das sociedadesTransformação societária

Incorporação societária

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Fusão societáriaCisão societária

JustificaçãoProtocolo

Planejamento patrimonial e familiarEstruturação empresarialUniformidade administrativa

Contenção de conflitos familiaresDistribuição de funções

Administração profissionalProteção contra terceiros

Proteção contra fracassos amorososDesenvolvimento de negócios

Offshore company

Planejamento sucessório e tributárioO desafio da sucessão

Herança e testamentoSucessão premeditada

Holding na sucessão hereditáriaPlanejamento fiscalAnálise fiscal

Constituição da holding familiarNatureza e tipo societário

Sociedades contratuaisSociedades por açõesSubscrição e integralização de capital

Integralização pela transferência de bensEireli holding

Direitos sobre quotas e açõesQuotas e açõesIndivisibilidade, grupamento e desdobramento

CondomínioUsufruto

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PenhorCessão

Outras cláusulas e ônus

Relações societárias

Planos diversosCônjugesSócio incapaz

Faculdades e obrigações sociaisPactos parassociais

Acordo de acionistasAcordo de quotistas

Execução e resoluçãoOutros pactos parassociais: regulamentos internos

Proteção dos minoritários da holdingResultados sociais: lucros ou perdasRelações entre sociedades

Subsidiária integralGrupo de sociedades

Funcionamento e extinçãoEntificação do patrimônioRepresentação e administração

Administração coletivaTérmino da administração

Deliberações sociaisDissolução

Empresas familiares

O desafioDefinição

O papel do advogadoValorização da família

Bibliografia

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Tecnologia jurídica e advocacia

Qualidade e inovação

De tempos em tempos, o ambiente empresarial é sacudido por tendências ou,como denunciam alguns, por modismos que são repetidos como ladainhas e, assim,tornam-se obrigações para os gestores empresariais. Esses movimentos conceituais,que propõem novas posturas na organização e na atuação empresarial, sãohabitualmente respostas às grandes demandas que se verificam em cada tempo.Assim, os desperdícios financeiros justificaram, no passado, a preocupação com ocontrole dos centavos para evitar perdas pesadas que se verificavam nos detalhes daoperação; a confusão organográfica das corporações, tempos depois, justificou umapreocupação com a reengenharia corporativa; a preocupação com os programas dequalidade, por seu turno, responde a uma alteração de paradigma que foi colocadopela indústria japonesa, entregando à sociedade produtos mais confiáveis e, aindaassim, mais baratos, ampliando seu poder de concorrência em relação aos processosprodutivos despreocupados com os detalhes qualitativos.

Tão logo as organizações produtivas aprenderam os méritos da atenção aoparâmetro da qualidade total, uma nova onda chegou às empresas: a valorização dainovação, tomada como uma necessidade primordial para a preservação da empresae para o seu sucesso. Todos afirmam que estão atentos para as inovações, quebuscam inovar, que inovam. A inovação é o chavão da atualidade. Incluí-la numa

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conversa profissional, nomeadamente discussões empresariais, é meio para mostrar-se atualizado, moderno, progressivo. Afirmar-se inovador é indispensável para serevelar competente para qualquer coisa, ainda que poucos revelem efetivacapacidade de inovar.

A compreensão do que seja inovação, aliás, revela variantes. Os que ainterpretam restritivamente, compreendem-na exclusivamente como ruptura,revolução: algo que altera, por completo, o que estava posto antes. Em oposição, háaqueles que, como nós, acreditam que a inovação refere-se à marcha constante dasociedade, da tecnologia, do mercado etc., podendo verificar-se mesmo na evoluçãosem ruptura: pequenas medidas que viabilizem uma adaptação constante ao que énecessário para manter uma produção de qualidade. Aliás, a aceleração dacompetitividade econômica, bem como a aceleração da tecnologia, das práticassociais, do mercado etc. tornam uma necessidade elementar a manutenção de níveissatisfatórios de inovação. A compreensão dessa evolução constante do ambienteprofissional está na raiz da compreensão do que seja inovação, tema que não étranquilo.

Os méritos da inovação não estão restritos à tecnologia, como se estudará,embora se deva reconhecer que a inovação é essencial para a sobrevivência dasempresas em determinados mercados ou, mesmo, para definir a envergadura deseus resultados, a exemplo do que se passa com a indústria/comércio de benseletrônicos, eletrodomésticos, automóveis, tecnologia da informação (TI) etc.Nessas indústrias, o sucesso da atividade negocial atrela-se à capacidade dedesenvolver novidades e apresentá-las ao mercado, mantendo elevado o volume delançamentos para conservar o ritmo de vendas.

A demanda por evolução e pela implantação de novidades alcança todos osaspectos da condição, da situação e dos procedimentos empresariais, podendoconcretizar-se de forma simplificada e barata. Uma empresa que destine seusprodutos para a classe social B pode inovar passando a atuar também junto aoutra(s) classe(s) social(is), desenvolvendo bens e/ou serviços que atendam aosconsumidores de outro nicho de mercado. A inovação pode dar-se na logística devarejo, a exemplo dos canais de venda; coisa simples, como a opção por vendapulverizada, feita por meio de pracistas ou até de sacoleiras.

Veja o caso da cadeia norte-americana de restaurantes Waffle House, quedecidiu inovar sua postura em situações de catástrofes, como furacões, tufões,terremotos, inundações, criando um marketing do desastre. Quando o comum, nascalamidades, é que as empresas interrompam suas atividades, a rede decidiuestabelecer rotinas para manter-se funcionando ou voltar a funcionar o maisrapidamente possível para, assim, atender aos clientes que padecem dos efeitos dodesastre. Dessa maneira, estabelece uma conexão visceral com o público, o que lhepermite não fazer quase nenhum investimento em publicidade. Para implementar

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tal política mercantil, foi preciso definir e treinar a equipe em processos de gestãode crises, incluindo geradores móveis e centros móveis de comando.

Os exemplos são múltiplos e bem diversos. Todos, porém, apontam para aindispensabilidade de se atentar para novas formas e meios de atuar. Inovar naorganização, inovar nas atividades, inovar em tecnologia, nos procedimentos, nasrotinas, nas posturas, nos detalhes. Fazer de um jeito novo, em tudo, para fazermelhor e obter melhores resultados. Lutar contra a ramificação da pirataria para,assim, manter as vantagens mercadológicas que se obteve, evitando a usurpaçãoindevida por outrem. Aliás, mesmo no crime, observa-se que quadrilhas inovam,constituindo procedimentos logísticos engenhosos para realizar operaçõesdelituosas mais seguras e mais vantajosas.

Há inovação na adoção de novas tecnologias, novas estratégicas, novosprocessos, novos modelos negociais, novos produtos. Não é preciso inventar nada,não é preciso criar o que ninguém pensou até agora, nem é indispensável comprarequipamentos caríssimos ou embrenhar-se no desenvolvimento de novos produtos.A inovação não corresponde a uma fórmula estática, única, igual para todos. Podeser simples, para uns, embora para outros demande complexidade. Em muitoscasos, limita-se a incrementações, como um esforço deliberado para melhorar oatendimento ao público, elevar o padrão de relacionamento com clientes (supplychain: acompanhamento das relações com clientes), o controle sobre a operação,além de estratégias para aumentar a receita e/ou a lucratividade.

Não há fórmulas estáticas, cristalizadas, portanto. O que se exige é umapreocupação com o que pode ser alterado para, assumindo um novo contorno,melhorar a operação. Para uns, aumento de mecanização, para outros, redução;para uns, aquisição de suplementos de informática (hardware), para outros,preocupação com os programas (software) que são usados nas atividades negociais.Em ambos os casos, contudo, vias diversas para incremento tecnológico, percebe-se,tendo por alvos, conforme a situação, um aumento de produtividade ou delucratividade.

Gestão da inovação jurídica

A percepção da importância da inovação negocial, compreendida como umapostura estratégica essencial, é uma realidade que não exclui o Direito e, justamentepor isso, coloca-se em discussão o papel do advogado nesse ambiente criativo,marcado por uma ferrenha disputa por mais e melhores negócios. O jurista é umdos elos dessa cadeia de alterações criativas, vale dizer, um dos vetores quepermitem a administradores empresariais e investidores realizarem seus desejos dealterar suas atividades para experimentar avanços. A simples opção por passar a

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efetuar vendas on-line, por exemplo, tem grandes implicações jurídicas queprecisam ser previamente pensadas.

As empresas devem buscar uma melhoria sistêmica que não se resume aavanços tecnológicos, mas que deve compreender todo o processo empresarial e,assim, a própria arquitetura do negócio. Justamente por isso, esse movimentoevolutivo implicará o recurso a profissionais diversos, entre os quais os advogados.O diálogo dessas múltiplas fontes e a análise da empresa, a partir desses ângulosvariados, deve ser hábil à definição de medidas que permitam à organizaçãoresponder às demandas criadas pelas mudanças sociais e mercadológicas. O sucessodessas operações está diretamente vinculado ao estabelecimento de uma basejurídica segura e adequada para dar tradução correta e otimizada aos interesses,deveres e direitos das partes envolvidas, permitindo que o negócio efetivamenteconduza ao resultado visado.

O advogado não é o único vetor de inovação, por certo; mas é um profissionalindispensável para que a concretização de estratégias de reformulação se faça deforma juridicamente correta e sustentável. Sem planejamento jurídico adequado,esses movimentos podem se revelar catastróficos. Veja o caso dos chamadosinvestidores-anjo, um perfil inovador de investimento que grassa principalmente nosetor de tecnologia. Denomina-se investidor-anjo a pessoa que aporta capital, empequeno montante, para estimular o desenvolvimento de empresas iniciantes (start-up) promissoras. O conceito inclui pessoas naturais interessadas em investimentosnão financeiros, alcançando até empresas que estimulam seus empregados acriarem seus negócios próprios, assumindo a condição de sócio desseempreendimento, até que invistam em novos negócios. As implicações jurídicas, emtodos os casos, são múltiplas e seu tratamento correto é indispensável para osucesso da iniciativa.

Noutros casos, a atuação do jurista – e a incidência dos parâmetros jurídicos –será lateral, acessória. Por exemplo, a constituição de rotinas empresariais quepermitam reduzir o prazo de entrega de mercadorias, ainda que se concretize pormeio do uso de instrumentos tecnológicos específicos, como mídias digitais paratransmissão on-line de pedidos, é uma evolução que consome tempo, criatividade einvestimentos em aparelhagem específica, não é inovação que permita aconstituição de uma propriedade intelectual e/ou um direito de uso exclusivo. Omesmo se diz sobre a alteração na composição da receita da organização, aconstituição de shopping center virtual, funcionando pela Internet e até estratégiasespecíficas, como a formação de bancos de terrenos, por incorporadoras, paragarantir a continuidade de seu trabalho.

Os exemplos são muitos e, em sua maioria, fascinantes, mormente quando se dáatenção às suas implicações jurídicas. Vejam-se as empresas (fala-se em market-places) que assumem a função de intermediar espaços publicitários na Internet: de

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um lado, identificam páginas e blogs com boa visibilidade junto ao público em gerale aferem seu interesse em receber anunciantes, de outro lado, negociam comempresas a veiculação de material publicitário naqueles sítios. Mas a adoção dessasinovações negociais não prescinde de proteção jurídica própria: a manutenção, emníveis elevados de qualidade e segurança, dessas relações jurídicas, conformeparâmetros de excelência do Direito Obrigacional, Contratual, Empresarial etc.

Há mesmo casos em que a inovação jurídica está representada pela posturasingela de amoldar a organização e sua atividade negocial ao Direito vigente. Emmuitos casos, o esforço para respeitar princípios e normas do Direito Ambiental,trabalhando para implementar níveis mais elevados de sustentabilidade daatividade produtiva, levou organizações a perceberem a existência de sinergiasprodutivas que, enfim, melhoraram os resultados empresariais, reduzindo custos,criando novas fontes de receita, ampliando lucro operacional etc.

A estruturação e a administração das organizações e das atividades negociais é,por si só, um plano relevante para o estabelecimento e o aproveitamento deinovações. Nem sempre o olhar que procura inovar dirige seus olhos para si mesmo,ou seja, para a própria estrutura de gestão. No entanto, é usual que as bases e osmecanismos da arquitetura e da gestão empresarial só sejam repensados nosmomentos de crise, a exemplo dos ambientes de estagnação mercantil ou doscontextos de maior dificuldade para a solvência das obrigações empresariais. Asadversidades revelam-se defensoras convincentes da necessidade de se mudar acondução das atividades produtivas e negociais para que se encontrem alternativasque permitam manter seus resultados e, assim, preservar sua existência (pagamentode fornecedores, trabalhadores, administradores etc.) e, mais do que isso, preservara remuneração de seus sócios/investidores. Isso inclui posturas clássicas, como ocorte de custos e a percepção de sinergias que possam ser aproveitadas paraaumentar a lucratividade das operações. Mas há muito mais que pode ser feito.

O estabelecimento dessas inovações na administração da sociedade e/ou nagestão de suas atividades produtivas e negociais pode demandar, ou não, operaçõesjurídicas específicas, como a alteração do ato constitutivo, aprovação pelacoletividade social, alteração de pactos parassociais eventualmente existentes, comoacordos de quotistas ou acionistas, regimento interno etc. Noutros casos, não épreciso fazer intervenções de tal natureza. Em nossos dias, uma das ferramentasmais utilizadas para criar impactos inovadores na estruturação jurídica deorganizações produtivas e/ou de patrimônios mais vastos são as chamadas holdings,nessas destacadas as holdings familiares. Cuida-se de intervenções jurídicasfascinantes, dadas no nascedouro da pessoa jurídica, permitindo um trabalho deplanejamento estratégico por parte do jurista, contador, administrador de empresasou consultor de outra especialidade.

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3 Inovação advocatícia

No âmbito do Direito, a demanda por inovação fica clara quando se atenta paraa frenética produção legislativa atual, como também à elevação do debatedoutrinário, recheado de novas teorias que, rapidamente, ganham o debatejudiciário e, assim, criam um ambiente de constantes alterações jurisprudenciais. Équanto basta para que haja uma inevitável reaproximação da advocacia dauniversidade. Aliás, não só a advocacia, mas igualmente a judicatura e outrascarreiras jurídicas. Não é mais possível acreditar que os anos de graduação sãosuficientes para garantir uma capacitação perpétua do profissional jurídico. Tornou-se indispensável uma rotina de capacitação constante para assimilar as novastecnologias jurídicas, desenvolvendo as competências profissionais que permitamatender ao cliente na medida de suas necessidades atuais, certo que soluçõesantigas podem não lhe atender adequadamente.

Por isso é inquestionável que as bancas de advocacia, assim como aMagistratura e o Ministério Público, entre outras instituições jurídicas, precisam sereaproximar das faculdades de Direito, senão da universidade como um todo,aproveitando os benefícios da multidisciplinaridade. Assim, pode-se edificar umambiente de constante qualificação dos recursos humanos, individuais e coletivos(pessoas e equipes). O fato de que o operador está atento para o trabalho dopesquisador é, em si, uma vantagem remarcável, já que eleva o nível de atualizaçãoda intervenção jurídica.

Não é apenas nessa reaproximação entre a academia e os escritórios em que a

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inovação jurídica deve dar-se a revelar. Afinal, como já dito, há inovação tanto nasgrandes revoluções, quanto nas mudanças singelas, desde que sejam eficazes, comoaquelas que estabeleçam novas rotinas operacionais (o que é particularmente útilem bancas de advocacia). Dito por outra forma, não é obrigatório um esforçodescomunal, o dispêndio de grandes valores, a contratação de especialistas. Importauma preocupação perene com o que pode ser alterado para melhorar o que se faz eaumentar o sucesso do trabalho.

Uma das mais impressionantes inovações apresentadas por algumas bancas deadvocacia foi a reaproximação do cliente, compreendido não apenas como umpaciente da ação profissional, mas como um copartícipe. Essa postura de integração,aproximando advogado e cliente, tem sido meio para, inclusive, permitir umaevolução na assessoria técnica que, paulatinamente, abandonaria o contenciosojudiciário para concretizar-se por meio da consultoria: a incorporação do advogadonas rotinas que, cotidianamente, levam à concretização dos atos jurídicos para querevelem as qualidades que o Direito lhes comanda.

Essa aproximação do advogado da atividade cotidiana do cliente, tornando-oum consultor do que será feito, conduz mesmo a uma elevação da qualidade dotrabalho e de sua eficácia. Mais do que apontar o que deve ser feito, o advogadopode apontar formas diversas de fazê-lo, considerando diferentes institutos eferramentas jurídicas, oferecendo ao cliente uma preciosa vantagem competitiva.Isso inclui a percepção de inovações e tendências jurídicas que podem se tornarposturas e caminhos inusitados no setor, com resultados remarcáveis para o cliente.

Não é pouco. A compreensão das referências jurídicas de cada negócio podeconduzir ao aproveitamento de oportunidades mercadológicas, ou seja, uma corretaanálise jurídica da empresa, segundo a melhor tecnologia do Direito, pode se tornarum vetor para a fundação de novos modelos de negócio, resultante da modificaçãoda organização e/ou de seus mecanismos e procedimentos. São incontáveis os casosde empresas que, compreendendo corretamente as oportunidades que resultavamde normas ambientais, consumeristas, trabalhistas, estabeleceram cenáriosnegociais diversos, ainda mais lucrativos que os anteriores.

Daí destacarmos que o advogado não só pode, como deve, compreender astendências do Direito e, assim, ser capaz de análises que incluam táticas diversaspara que se possa alcançar resultados assim ou assado, conforme a avaliação eopção de seus consulentes. No entanto, a assessoria jurídica demanda uma atençãoredobrada para o estágio de evolução jurídica que a empresa e a família revelam,bem como para o processo, o ritmo e a cadência corretos para que sejamestabelecidos padrões jurídicos mais elevados. É preciso cuidar para que ocrescimento jurídico seja paulatino, considerando todas as limitações que sãoinerentes às pessoas e organizações que revelam baixa eficiência jurídica. O(s)advogado(s) deve(m) trabalhar para que haja um crescimento uniforme, no qual se

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verifiquem constantes ganhos de qualidade jurídica em todos os pontos daestrutura, solidificando-se em sua cultura.

Facilmente se percebe que isso requer não apenas a capacidade de trabalharcom qualidade jurídica e de fornecer conteúdo jurídico de qualidade, masigualmente revela a capacidade de atender a cada cliente de forma personalizada,compreendendo suas necessidades e possibilidades, atendendo a tais parâmetros naassessoria oferecida. Na carteira de cada escritório haverá clientes em estágiosdiversos de evolução jurídica e cada um tem o direito de ser atendido emconformidade com a sua realidade particular.

Obviamente, o trabalho inicial exige mais cuidados. Será preciso ensinar aoperar de forma que, primeiramente, atenda à lei; o desconhecimento faz com quemuitos pratiquem atos ilícitos, sem o saberem, sendo surpreendidos com autuações,processos etc. Depois, trabalhar para a capacitação jurídico-operacional das pessoas,o que se faz seguindo padrões jurídicos de excelência (não apenas o que é lícito,mas a melhor alternativa, entre as juridicamente possíveis). É um trabalho deotimização jurídica da organização, de sua atuação, de seus negócios e demaisrelações jurídicas. Lamentavelmente, são poucos os profissionais e escritórios que seencarregam de um diagnóstico rotineiro das demandas jurídicas da organizaçãoassessorada e, concomitantemente, de um planejamento de sua evolução,monitorando os respectivos resultados.

Com o passar do tempo, diversos conceitos e práticas são assimilados, e aassessoria dos profissionais do Direito faz-se mais dispensável no dia a dia, podendoocupar-se do desenvolvimento e oferecimento de ferramentas jurídicas maissofisticadas, em conformidade com os eventos com os quais se depare a organizaçãoassessorada. Aliás, conforme a capacidade da banca de advocacia, essa sofisticaçãopode alcançar níveis mais e mais superiores, incluindo a gestão jurídica estratégicade negócios que já exibem maturidade jurídica para operações mais sofisticadas.

A teoria da empresa

Antes de passarmos a questões mais práticas, que provavelmente irão interessarmais ao leitor, será preciso nos debruçar sobre alguns aspectos teóricos, ainda quesejam um pouco mais áridos. Essa aridez, contudo, não nos autoriza a evitá-los,certo que são essenciais para a construção de uma análise jurídica, completa eresponsável, sobre o tema empresa familiar. Aliás, essa será a tônica das demaisseções deste capítulo, bem como do Capítulo 2. Com efeito, estaria incompleto olivro se não nos debruçássemos sobre a teoria da empresa, vale dizer, sobre amaneira como o direito trata a empresa. Como essa abordagem provavelmente podenão interessar a empresários, investidores, contadores, administradores

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empresariais, entre outros, é possível simplesmente saltá-la para se concentrar nosaspectos mais práticos, que serão examinados a partir do terceiro capítulo.Entretanto, conhecimento nunca é demais e nossa proposta é explorar os temas emlinguagem simples e de fácil compreensão.

Em 2002, a legislação brasileira ganhou um novo Código Civil que, entre outrasinovações, adotou a Teoria da Empresa, abandonando a Teoria do Ato de Comércio,vigente entre nós desde 1850, quando aqui se editou o Código Comercial (Lei556/1850), ainda durante o governo de D. Pedro II, pela Graça de Deus e UnânimeAclamação dos Povos, Imperador Constitucional e Defensor Perpétuo do Brasil, comose lê na abertura daquela legislação. Essa norma regeu nosso Direito ComercialTerrestre por um século e meio e, no que se refere ao Direito Comercial Marítimo,ainda está em vigor, passados mais de 160 anos de sua edição.

O Código Civil de 2002 alinha-se com o Direito italiano de meados do séculoXX, mais especificamente com o Código Civil italiano de 1941, adotando a Teoria daEmpresa, perspectiva jurídica que realça a importância da organização dos meios deprodução. Importa menos o ato de comercializar, praticado até mesmo por camelôse sacoleiros; importa a organização de estruturas empresariais para a produção deriqueza, estruturas essas que são estabelecidas com a finalidade de atender, deforma otimizada, às demandas de um mercado cada vez mais ampliado e já hámuito reconhecido como uma vasta massa de pessoas, entre fornecedores, parceiroscomerciais e consumidores. Partindo da ideia de empreender, a empresa é umaorganização de meios de produção e de trabalho para a realização de uma atividadenegocial. Obviamente, essa estrutura não precisa ser complexa e, no seunascedouro, pode ser mesmo diminuta e singela. Grandes corporações nasceram deínfimas empresas que, embora o mercado não percebesse, já expressavam umapotencialidade de crescimento que o tempo viu realizar.

Note-se que a empresa é um ente sem personalidade jurídica. A pessoa é oempresário (firma individual) ou a sociedade empresária. A empresa é um objeto derelações jurídicas, é um bem coletivo. É um fenômeno econômico que não seconfunde (1) com sua base patrimonial (aspecto estático da empresa), que é oestabelecimento (complexo organizado de bens, nos termos do artigo 1.142 doCódigo Civil), nem se confunde (2) com o seu titular, que será o empresário ou asociedade empresária (da mesma forma que esta não se confunde com as pessoasde seus sócios, nem de seu administrador ou administradores). O próprio artigo1.142 do Código Civil deixa-o claro. O dispositivo considera estabelecimento todocomplexo de bens organizado, para exercício da empresa, por empresário, ou porsociedade empresária. O estabelecimento é parte da empresa; mas apenas umaparte: a sua base material, o seu aspecto estático. Quem entra à noite nasinstalações de uma fábrica que não está funcionando vê o estabelecimento, não vê aempresa. Durante o dia, o conjunto do estabelecimento e das atividades ali

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desempenhadas (aspecto dinâmico) dá expressão à empresa.

A empresa, portanto, é essa conjunção do aspecto estático (o estabelecimento, opatrimônio organizado para o seu exercício) e de um aspecto dinâmico:procedimentos, rotinas, pessoas, imagem pública etc. A ideia de organização lhe éprópria, inerente: organização de meios materiais e imateriais, incluindo pessoas eprocedimentos, para a consecução de determinado objeto, com a finalidade de obtervantagens econômicas apropriáveis: o lucro que remunera aqueles que investiramna formação do capital empresarial. A empresa, na sua qualidade de organização, éum conjunto de partes com funções específicas, constituída artificialmente peloengenho humano, com a finalidade de otimizar a atuação econômica, produzindoriquezas. Opõe-se, portanto, ao trabalho meramente pessoal, trabalho simples.

Na empresa há uma estruturação da atividade produtiva com vistas à execuçãohabitual e regular dos atos negociais. Por isso, manifesta-se (1) como atividade:complexo de atos constantes, desenvolvidos no tempo; não é ato isolado, nem oconjunto de atos simultâneos, mas a atividade; (2) como estrutura estável, humanae procedimental; não se trata da mera reunião de pessoas, eventual edesestruturada, mas de unidade funcional, ainda que desempenhada peloempresário individual ou por um único empregado; (3) como estrutura material:conjunto de bens organizados para a realização do objeto social e, assim, produçãode lucro: imóveis, móveis e bens imateriais; (4) intuito empresarial, que é animusespecífico: intenção empresarial, distinta da intenção dos autônomos, por exemplo;e (5) identificação social como empresa, ou seja, como ente econômico, social ejurídico.1

A caracterização da empresa não exige, no Direito brasileiro, complexidade ougrandiosidade. Um boteco é uma empresa: uma atividade negocial organizada,desenvolvida a partir de bens materiais e imateriais estruturados, para a circulaçãode bens e prestação de serviços, ainda que tocado apenas por uma pessoa

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(empresário) que, assim, deve inscrever-se no Registro Mercantil; o fato de serauxiliado por familiares não altera isso. Importa o intuito empresarial comoelemento caracterizador da empresa. O Direito Empresarial não é uma disciplina dericos; serve a ricos e pobres. Aliás, sob tal perspectiva, é uma disciplina jurídica detransformação social: são incontáveis os casos de pessoas que superaram a pobrezaconstituindo uma empresa, fazendo-a progredir e, assim, enriqueceram lícita elegitimamente. O Direito Empresarial é a disciplina jurídica dessa realidade detransformações, evoluções e superações individuais e coletivas (as sociedades).

A empresa não é apenas uma realidade intangível, mas também concreta,composta por bens materiais imóveis e móveis. Somem-se direitos (bens imateriais,como marcas e patentes). Todas essas relações jurídicas enfeixam-se na empresa emantêm uma unidade, escrituralmente representada e atermada (a contabilidadeempresarial). Consequentemente, a empresa não é só uma universalidade de fato,isto é, pluralidade de bens singulares que, pertinentes à mesma pessoa, tenhamdestinação unitária (artigo 90 do Código Civil), mas também de universalidade dedireito (artigo 91), por se tratar de complexo de relações jurídicas, de uma pessoa,dotadas de valor econômico.

Tomada como coletividade jurídica e fática, a empresa é um bem patrimonialque pode ser negociado em sua universalidade; pode-se arrendar a empresa, pode-se dá-la em garantia real etc. Isso não impede, também, que o titular da empresanegocie bens isoladamente (artigo 90, parágrafo único, do Código Civil): venderuma ou mais máquinas, vender o imóvel, vender ferramentas etc. A união e aorganização de bens (materiais e imateriais), no âmbito da empresa, são flexíveis. Épróprio da dinamicidade do mercado que essa mutabilidade da empresa e, assim, apossibilidade de que bens ou conjuntos de bens sejam alienados ou, em oposição,adquiridos e incorporados às atividades mercantis.

No entanto, há valores que, embora tenham projeção econômica, não permitema negociação destacada da universalidade jurídica que é a empresa. São vantagensinerentes à coletividade, como o capital intelectual, a boa imagem junto aomercado, a clientela, entre outras. A logística, por exemplo, é um elemento deinquestionável importância e repercussão econômica. Mas é elemento que estáincrustado na coletividade que é a empresa e não pode ser destacado para seralienado. A logística é a forma de se realizar a atividade empresarial em si, é a suaprática constante, sua habitualidade, seu jeito, sua estrutura eficaz, em muitocobiçada pelo mercado. Pode-se ensinar a logística, copiar a logística; mas trata-seapenas de um procedimento e de um conhecimento, não de um bem jurídicopassível de individualização e, destarte, de cessão, de transferência unitária,permitindo que seu valor, não obstante seja, sim, uma vantagem mercantil, sejaanotado no patrimônio ativo da pessoa. Justamente por isso, verificam-se aquisiçõesde empresas que se justificam justamente pelo interesse em sua logística, ou seja, na

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excelência dos processos e rotinas com os quais concretiza suas atividadesprodutivas.

Por fim, destacamos que a empresa é fenômeno que se submete à Parte Geraldo Código Civil: exige titular capaz, objetos lícitos, possíveis e determináveis, bemcomo forma prescrita ou não defesa em lei. Não há empresa se a atividade é ilícita,impossível ou indeterminada ou indeterminável; proibido o jogo, um cassino não éempresa. Também não é empresa a organização constituída com forma e objetolícitos, mas por motivação ilícita (artigo 166, II, do Código Civil) ou com afinalidade de fraudar a lei (artigo 166, VI, do Código Civil).2

1 Aproveitamos, portanto, a teoria poliédrica de Alberto Asquini. ConferirMARCONDES, Sylvio. Questões de direito mercantil. São Paulo: Saraiva, 1977.2 MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: empresa e atuação empresarial. 5.ed. São Paulo: Atlas, 2011. v. 1, capítulo 1, seções 2 a 3.

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Holding

Definição de holding

Muito se fala sobre as holdings e, mais especificamente, sobre holdingsfamiliares. Esse burburinho generalizado tem uma razão de ser bem clara: adescoberta por muitos dos benefícios do planejamento societário, ou seja, daconstituição de estruturas societárias que não apenas organizem adequadamente asatividades empresariais de uma pessoa ou família, separando áreas produtivas deáreas meramente patrimoniais, além de constituírem uma instância societáriaapropriada para conter e proteger a participação e o controle mantido sobre outrassociedades. Parece complicado, mas não é. Por um lado, uma boa estruturaçãosocietária compreenderá as características e as necessidades das atividadesnegociais para, então, sugerir uma distribuição do conjunto dos atos empresariaispor uma ou mais pessoas, concentrando numa só sociedade ou desmembrando porduas ou mais, de modo a otimizar relações jurídicas, conter custos e riscos etc. Poroutro lado, a parte não operacional do patrimônio da pessoa ou da família pode ser,ela própria, atribuída a uma sociedade (holding), com as vantagens que aqui serãoexplicadas. Essa parte não operacional do patrimônio pode ser constituída,inclusive, pelas participações societárias, em uma ou mais sociedades, o quetambém será muito proveitoso, como se estudará.

To hold, em inglês, traduz-se por segurar, deter, sustentar, entre ideias afins.

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Holding traduz-se não apenas como ato de segurar, deter etc., mas como domínio. Aexpressão holding company, ou simplesmente holding, serve para designar pessoasjurídicas (sociedades) que atuam como titulares de bens e direitos, o que podeincluir bens imóveis, bens móveis, participações societárias, propriedade industrial(patente, marca etc.), investimentos financeiros etc. Habitualmente, as pessoasmantêm esses bens e direitos em seu patrimônio pessoal. No entanto, procuraremosdemonstrar neste livro que, para certos perfis de pessoas e de patrimônios, pode serinteressante a constituição de uma sociedade, ou até de uma estrutura societária(duas ou mais sociedades), com a finalidade de assumirem a titularidade de bens,direitos e créditos, bem como a própria titularidade de atividades negociais.

Holding (ou holding company) é uma sociedade que detém participação societária em outra ou de outras sociedades,tenha sido constituída exclusivamente para isso (sociedade de participação), ou não (holding mista).

Esse é um aspecto essencial do tema que iremos desenvolver: não se trata deuma equação universal que se aproveite a todos. Há casos em que o melhor érecorrer à constituição e/ou manutenção de uma sociedade holding, há casos emque o melhor é não fazê-lo. É preciso procurar uma solução específica para cadapessoa, para cada família, para cada conformação patrimonial, para cada negócioou conjunto de negócios. Será sempre indispensável o trabalho de um especialistapara analisar as situações que se apresentam, avaliar seu estado e suas alternativase, enfim, definir a melhor estratégia. Esse especialista não precisa ter formaçãoacadêmica jurídica, exclusivamente. A habilidade para avaliar uma melhorconformação para as organizações empresariais, para o patrimônio pessoal oufamiliar, para atividades negociais pode resultar de outras formações acadêmicas,como a Administração de Empresas, a Contabilidade e a Economia.

Realce-se, sobre tais esforços de análise crítica e planejamento patrimonial esocietário, que o sucesso raramente resulta de eventos aleatórios. É claro que a sortepode, sim, sorrir para alguém em determinado momento de sua vida e, sem mais oumenos, conduzi-lo a resultados inesperados. Confiar no destino, contudo, não é algosábio. Mesmo os que foram bafejados inesperadamente pela fortuna precisam tercompetência, cautela e cuidado para mantê-la e, quiçá, para expandi-la. É semprerecomendável recorrer às ciências jurídica, contábeis, empresariais e econômicaspara ampliar as oportunidades de se obterem vantagens lícitas e relevantes.

A constituição de uma sociedade holding pode realizar-se dentro de contextosdiversos e para atender a objetivos variados. Para ilustrar, basta dizer ser comumreferir-se a tipos diversos de holding, como a denominada holding pura, cujo objetosocial é exclusivamente a titularidade de quotas ou ações de outra ou outrassociedades. Em português, usa-se a expressão sociedade de participação. Como nãodesenvolve atividade negocial (operacional), a receita de tais sociedades é composta

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exclusivamente pela distribuição de lucros e juros sobre o capital próprio, pagospelas sociedades nas quais tem participação. Em alguns casos, havendo autorizaçãono seu contrato social ou estatuto social, ou autorização dada pela reunião ouassembleia de sócios, a receita poderá resultar de operações realizadas com ostítulos que tenham em carteira, como o aluguel de ações, aquisição e alienação departicipações societárias, debêntures etc.

No âmbito das holdings puras, há quem faça distinção entre a holding decontrole (sociedade de controle) e a mera holding de participação (sociedade departicipação). Essa distinção é de fácil compreensão: a holding de controle teria porfinalidade específica deter quotas e/ou ações de outra ou outras sociedades emmontante suficiente para exercer o seu controle societário; já a holding departicipação seria aquela constituída para titularizar quotas e/ou ações de outra ououtras sociedades, sem que detenha o controle de qualquer delas. Mas não é umadistinção legal; as sociedades de participação não precisam se dedicarexclusivamente ao controle ou à mera participação societária, podendo mesmocontrolar uma(s) sociedade(s) e ter mera participação minoritária em outra(s).

Em muitos casos, de acordo com o planejamento estratégico de determinadaempresa, família ou grupo empresarial, a holding pura pode ser constituída não como objetivo de simplesmente titularizar participação ou participações societárias, mascom o objetivo de centralizar a administração das atividades realizadas por todasessas sociedades, controladas ou não. As expressões holding de administração eholding de organização, com pequenas variantes entre si, são utilizadas para traduziressa situação. A diferença sutil entre ambas está no fato de que a holding deadministração efetivamente funciona como um quartel general, estruturando planosde atuação, definindo estratégias mercadológicas, distribuindo orientaçõesgerenciais e, se necessário, intervindo diretamente na condução das atividadesnegociais das sociedades controladas ou, a partir de ajustes com os demais sócios,nas sociedades em que haja mera participação societária. Em oposição, a holding deorganização não demanda efetiva coordenação administrativa, podendo serconstituída, dentro de determinada estruturação societária, para dar a conformaçãoque se planejou, o que não raro implica a assimilação de parâmetros fiscais,negociais, entre outros. A holding de organização também é muito usada parapermitir a acomodação de sócios.

Em oposição à holding pura, fala-se na holding mista. Neste caso, tem-se umasociedade que não se dedica exclusivamente à titularidade de participação ouparticipações societárias (quotas e/ou ações), mas que se dedica simultaneamente aatividades empresariais em sentido estrito, ou seja, à produção e/ou circulação debens, prestação de serviços etc. Nesse sentido, nunca é demais recordar o artigo 2o,§ 3o, da Lei 6.404/76, segundo o qual a sociedade pode ter por objeto social aparticipação em outras sociedades, ou seja, pode ser constituída sob a forma de

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holding pura. A mesma norma, adiante, contemplará a holding mista quando afirmaque essa participação em outras sociedades, mesmo quando não seja prevista nocontrato social ou no estatuto,1 é permitida como meio de realizar o objeto social oupara beneficiar-se de incentivos fiscais. Portanto, uma sociedade que tenha porobjeto a produção ou a comercialização de certo produto, ou a prestação dedeterminado serviço, pode titularizar quotas ou ações de outra ou outrassociedades, sem que isso precise constar no seu objeto social.

Embora o artigo 2o, § 3o, da Lei 6.404/76, nada fale a respeito, é possíveltambém que se constitua uma sociedade com o objetivo de ser a proprietária (atitular) de um determinado patrimônio, entre bens imóveis, bens móveis,propriedade imaterial (patentes, marcas etc.), aplicações financeiras, direitos ecréditos diversos. Desse patrimônio podem constar, inclusive, quotas e ações deoutras sociedades. Para esses casos, é comum ouvir a expressão holding patrimonial,da mesma forma que é usual a referência à holding imobiliária, isto é, a sociedadeconstituída para ser proprietária de imóveis, tenham ou não a finalidade locativa.

Holding pura: sociedade constituída com o objetivo exclusivo de ser titular de quotas ou ações de outra ou outrassociedades. É também chamada de sociedade de participação.

Holding de controle: sociedade de participação constituída para deter o controle societário de outra ou de outrassociedades.

Holding de participação: sociedade de participação constituída para deter participações societárias, sem ter o objetivode controlar outras sociedades.

Holding de administração: sociedade de participação constituída para centralizar a administração de outras sociedades,definindo planos, orientações, metas etc.

Holding mista: sociedade cujo objeto social é a realização de determinada atividade produtiva, mas que detémparticipação societária relevante em outra ou outras sociedades.

Holding patrimonial: sociedade constituída para ser a proprietária de determinado patrimônio. É também chamada desociedade patrimonial.

Holding imobiliária: tipo específico de sociedade patrimonial, constituída com o objetivo de ser proprietária de imóveis,inclusive para fins de locação.

A chamada holding familiar não é um tipo específico, mas uma contextualizaçãoespecífica. Pode ser uma holding pura ou mista, de administração, de organizaçãoou patrimonial, isso é indiferente. Sua marca característica é o fato de se enquadrarno âmbito de determinada família e, assim, servir ao planejamento desenvolvidopor seus membros, considerando desafios como organização do patrimônio,administração de bens, otimização fiscal, sucessão hereditária etc. São todos temasque serão desenvolvidos neste livro.

Equívocos comuns

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É muito comum ouvir ou ler algumas afirmações equivocadas sobre holdings.Por exemplo, por conta do já citado artigo 2o, § 3o, da Lei 6.404/76, há quem digaque as sociedades de participação só podem ser constituídas sob a forma desociedades por ações, o que não é correto. Podem adotar tanto um tipo societáriocontratual, a exemplo da sociedade limitada, quanto um tipo societário estatutário,a exemplo da sociedade anônima. Em sentido diametralmente oposto, masigualmente incorreto, está a afirmação de que a holding deve ser uma sociedadesimples, com registro em Cartório de Registro de Pessoas Jurídicas. Oposto pelo fatode que, por previsão legal, as sociedades por ações não são sociedades simples, massociedades empresárias (artigo 982, parágrafo único, do Código Civil). Assim, paraos que insistem nessa posição, a holding deveria ser uma sociedade por quotas.

Outra informação errada que, lamentavelmente, consta com habitualidade dodiscurso de pessoas despreparadas diz respeito às sociedades limitadas. É possívelouvir (e mesmo ler) que uma holding precisa ser uma sociedade limitada, ao passoque outros atestem que não pode ser uma sociedade limitada, insistindo ser precisoconstituir uma sociedade em nome coletivo. Ainda é preciso destacar não serindispensável que uma sociedade holding (ou sociedade de participação) tenhaapenas pessoas físicas por sócios. A sociedade de participação pode ter todos ossócios que sejam pessoas físicas ou pessoas jurídicas. Pessoas físicas podem sersócias de pessoas jurídicas. Aliás, entre os sócios pode haver, mesmo, outra ououtras sociedades de participação, o que não é raro. Não há limitação sobre o tipode pessoa, nem mesmo sua natureza jurídica. As pessoas jurídicas podem ser atéfundações ou associações. Portanto, uma única sociedade operacional pode serconstituída por várias sociedades de participação (holdings); em meio a tais sócias,pode haver pessoas naturais, assim como pode haver outras pessoas jurídicas, comosociedades operacionais.

Quem dá ouvidos a qualquer um acabará nada entendendo. Por todos os lados,opiniões diversas acabam por criar uma balbúrdia na qual sobram ignorância e

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nhém-nhém-nhém. Para afastar tais riscos, iremos proceder a uma pequena incursãopelos elementos essenciais da Teoria Geral do Direito Societário, aclarandoconceitos, esclarecendo dúvidas e sanando equívocos. Estudaremos os conceitos desociedades simples e empresárias, bem como veremos os elementos essenciais dosdiversos tipos societários. Como se não bastasse, a compreensão dessasparticularidades é vital para que se possa ter alternativas para cada caso emconcreto, identificando qual a melhor forma para a constituição de uma holding,atendendo as demandas específicas de cada família, de cada empresa, de cadasituação.

Essencialmente, é preciso frisar que não há uma fórmula mágica. Existemmúltiplos caminhos para o planejamento societário e patrimonial, bem comodiversas formas que podem ser adotadas para uma sociedade de participação, parauma holding familiar. O estudo do tema, como aqui se fará, jamais afastará aindispensável atuação de um especialista que, partindo de uma análise doselementos presentes no caso em concreto, determine a solução que melhor atendeaos interesses que lhe foram apresentados.

Natureza jurídica: simples ou empresária

Por força do artigo 982 do Código Civil brasileiro, as sociedades dividem-se emdois tipos: sociedades simples e sociedades empresárias. Essa divisão resulta daadoção, entre nós, da teoria da empresa. Assim, parte-se do pressuposto de que háum tipo específico de atividade negocial que caracteriza empresa: a atividadeeconômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços. Oelemento central seria a organização dos meios sob a forma de empresa, emoposição às atividades negociais que se desenvolvem de forma simples. É umaclassificação que dá margem a muitas dúvidas e discussões, havendo uma amplazona cinza, na qual proliferam as dúvidas sobre certas atividades negociais: seriamsimples ou empresárias? Pior: se alguém se pretende empresário, registrando-se naJunta Comercial, não é possível declarar judicialmente o contrário, forçando-o a darbaixa em seu registro. Assim, a maioria das biroscas existentes no país, como bares,armarinhos, mercearias etc., tocados por uma única pessoa, tem por titular umapessoa natural (empresário) ou pessoa jurídica (sociedade) registrada na JuntaComercial.

A bem da verdade, essa distinção segue uma tradição histórica que já deveriater sido superada. Hoje, pretende-se a distinção entre sociedades empresárias esociedades simples; no sistema anterior, a distinção entre sociedades comerciais esociedades civis. Na raiz dessa insistência estão momentos históricos há muitosuperados. O Direito Civil – e as atividades produtivas compreendidas como simples

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– corresponderia a uma visão patriarcal da sociedade, com base romana; partiria dopater familias em Roma, avançando pelo senhor feudal medievo (protegido até pelaMagna Carta), avançando pelos chefes de família com fortes lastros agrários, doRenascimento em diante. Em oposição, haveria um espaço do mercado, antesidentificado com o comércio, agora identificado com a empresa, cuja lógica nãoseria a autoridade e a atuação pessoal do pai de família, mas a lógica concorrencialdo mercado, estruturando constantemente novas estratégias organizativas paraotimizar as oportunidades de lucro. Justamente por isso, já tivemos ocasião dedefender o fim das distinções, estabelecendo um tratamento único para todas asatividades negociais, submetidas a uma só disciplina jurídica: um Direito Negocialque poderia bem manter a denominação de Direito Empresarial.2

As sociedades empresárias registram-se nas Juntas Comerciais. As sociedades simples registram-se nos Cartórios deRegistro de Pessoas Jurídicas, salvo as sociedades cooperativas, registradas também nas Juntas Comerciais.

A distinção, contudo, preserva-se no Direito brasileiro. O artigo 982 do CódigoCivil estabelece que as sociedades podem ser: (1) empresárias ou (2) simples; asempresárias são aquelas que têm por objeto o exercício de atividade própria deempresário sujeito a registro, conforme a previsão anotada nos artigos 966 e 967 doCódigo Civil; as demais são consideradas sociedades simples. Essa divisão, tendopor referência a estrutura – empresarial ou não – da atividade, encontra umaexceção no parágrafo único daquele artigo 982, tomada pelo tipo societário: associedades por ações são consideradas empresárias; a sociedade cooperativa éconsiderada simples. Em ambos os casos, a força excepcionadora de tal norma tornaindiferente a estrutura existente em concreto. Uma sociedade cooperativa podetocar um negócio sob a forma empresarial e, ainda assim, será considerada umasociedade simples. Em oposição, a uma sociedade anônima pode corresponder umaatividade negocial que todos definiriam como não sendo uma sociedadeorganizada; ainda assim, será considerada uma empresa.

As sociedades empresárias devem registrar seus atos constitutivos (contratosocial ou estatuto social) na Junta Comercial. Segundo o Código Civil, taissociedades podem adotar um dos seguintes tipos societários: (1) sociedade emnome coletivo; (2) sociedade em comandita simples; (3) sociedade limitada; (4)sociedade anônima; e (5) sociedade em comandita por ações. Em oposição, associedades simples registram-se nos Cartórios de Registro de Pessoas Jurídicas, àexceção da sociedade cooperativa que, em face da Lei 5.764/71, deve ser registradana Junta Comercial. As sociedades simples podem adotar os seguintes tipossocietários: (1) sociedade simples (em sentido estrito ou comum); (2) sociedade emnome coletivo; (3) sociedade em comandita simples; (4) sociedade limitada; e (5)sociedade cooperativa.

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Esteja-se atento, em meio a essa análise, para as normas da Lei 11.101/05:somente as sociedades empresárias têm o direito ao instituto da recuperação,judicial ou extrajudicial, previsto naquela norma. As sociedades simples não. Maisdo que isso, diante da quebra, as sociedades empresárias serão submetidas àfalência, procedimento otimizado previsto na aludida Lei 11.101/05. As sociedadessimples, para além de não terem direito à recuperação, submetem-se aoprocedimento da insolvência civil, previsto no Código Civil e no Código de ProcessoCivil. Cuida-se de uma desvantagem, sem sombra de dúvidas. No entanto, nunca édemais recordar que essa desvantagem é praticamente inexistente no âmbito dasholdings puras, mormente quando detenham apenas participações societárias, certoque seu risco de insolvência é mínimo: para além das obrigações fiscais incidentessobre sua receita, não contraem outras obrigações e, assim, não se tornaminadimplentes.

No Capítulo 3, examinaremos os tipos societários. De qualquer sorte, seráproveitoso deixar realçado, já nesse ponto, que não há qualquer limitação oudeterminação sobre a natureza jurídica de uma holding. Consequentemente, taissociedades em tese podem revelar natureza simples ou empresária e, dependendodo tipo societário que venham a adotar, poderão ser registradas quer na JuntaComercial, quer no Cartório de Registro de Pessoas Jurídicas. Portanto, também anatureza jurídica que se dará à holding constitui uma alternativa estratégica àdisposição do especialista que, considerando as particularidades de cada caso,elegerá a melhor escolha.

Tipicidade societária

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Vige no Direito brasileiro o princípio da tipicidade societária. Assim, só se podecriar uma sociedade, simples ou empresária, seguindo um dos tipos (formas)previstos na legislação. Não se pode inventar um tipo novo, nem se pode pretendercriar uma sociedade que adote uma conformação mista: parte de um tipo societário,parte de outro tipo. Isso não significa, contudo, que as sociedades brasileiras sejam,em tudo, padronizadas. Cada tipo societário tem um conjunto mínimo decaracterísticas, entre elementos obrigatórios e elementos vedados. Atendido essepadrão mínimo, há um amplo espaço para que, nos contratos sociais e nos estatutossociais, uma cara própria seja dada a cada sociedade.

Os tipos contratuais se dividem em dois grandes grupos: (1) sociedadescontratuais e (2) sociedades estatutárias. A diferença elementar, obviamente, é o tipode ato constitutivo: (1) contrato social ou (2) estatuto social. Mas, para além dessasimplicidade elementar, um conjunto mais amplo de caracteres faz a distinção entreos dois casos. As sociedades contratuais têm seu foco e sua ênfase na pessoa doscontratantes e no vínculo recíproco (vínculo contratual) que estabelecem entre si.Justamente por isso, todos os sócios devem estar obrigatoriamente nomeados equalificados no ato constitutivo, assinando-o. Se há uma alteração na composiçãosocietária, seja a pessoa de um ou mais sócios, seja na mera participação que cadasócio tem no capital social, o contrato social deverá ser alterado para traduzi-la. Alógica das sociedades contratuais, portanto, é a lógica das relações negociais, com adefinição de obrigações e faculdades recíprocas entre os sócios. Todas as sociedadescontratuais têm seu capital dividido em quotas, razão pela qual se usa também orótulo sociedades por quotas.

Em oposição, a grande marca nas sociedades estatutárias é o foco na pessoajurídica que se constitui, no ente instituído. Daí falar-se também em sociedadesinstitucionais. Esse foco no ente é característica que também se verifica em duasoutras pessoas jurídicas que também se organizam a partir de estatutos sociais: asassociações e as fundações. O foco na instituição é de tal magnitude que o estatutosocial sequer lista seus membros, ou seja, sequer traz a lista de seus sócios. Apenasfaz referência aos sócios que fundaram a pessoa jurídica, estando presentes àassembleia que aprovou o estatuto social. Nas sociedades institucionais, em tese,não há reconhecimento, nem uma aceitação mútuos; os membros ingressam e saemsem que haja alteração – por tal motivo – no ato constitutivo e, assim, na instituição(na pessoa jurídica). Dessa maneira, os sócios não mantêm relações jurídicas diretasentre si, não havendo falar em reciprocidade entre os acionistas ou cooperados.Todos têm direitos e deveres apenas para com a sociedade.

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Visto isto, será proveitoso examinar as características essenciais de cada tiposocietário. Essa análise terá como objetivo direto listar tais características. Noentanto, o desenvolvimento do tema será feito já considerando o aproveitamentodesses tipos societários ao objeto do presente estudo. Esse aproveitamento serámelhor trabalhado na sequência, quando o desenvolvimento do texto permitirabordar, com mais profundidade, as vantagens e as desvantagens de cada tiposocietário para atender ao objetivo de constituição de uma holding familiar. Nãoabordaremos a sociedade cooperativa, certo que essa não se presta para o objeto denossos estudos: não pode ser usada como holding familiar, nem pode ser sociedadecontrolada.

Por fim, um ponto merece ser destacado. Como se estudará no Capítulo 4, aregra geral é a de que qualquer pessoa, natural ou jurídica, possa ser sócia de umasociedade simples ou empresária, contratual ou estatutária. Há algumas limitações,como sociedades contratuais ajustadas entre cônjuges casados pelo regime dacomunhão universal de bens ou pelo regime da separação obrigatória de bens. Paraalém dessa limitação, vige no Direito brasileiro uma limitação para que certaspessoas atuem como empresárias (registrar-se como firma individual), discussãoque não se aproveitaria a esta investigação, certo que seu objeto são sociedades. Noentanto, aqueles que estão impedidos de empresariar também não podem ocupar afunção de administradores societários.

Pessoas impedidas de exercer a administração societária

→ Magistrados.

→ Membros do Ministério Público.

→ Servidores Públicos.

→ Militares da ativa.

→ O falido, se não forem declaradas extintas suas obrigações.

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→ Moralmente inidôneos, como tal compreendidos os condenados por crime falimentar, de prevaricação, suborno, concussão,peculato, contra a economia popular, contra o Sistema Financeiro Nacional, contra as normas de defesa da concorrência, contra asrelações de consumo, contra a fé pública ou a propriedade, ou a pena criminal que vede, ainda que temporariamente, o acesso acargos públicos.

→ Estrangeiros com visto temporário.

Reitere-se: tais pessoas podem ser sócias de uma holding e, mesmo, de outrassociedades, como suas controladas e filiadas; apenas não podem exercer funções deadministração.

1 A norma fala especificamente em sociedades por ações e seus estatutos sociais.Contudo, há muito se tem por estabelecido sua aplicação às sociedades por quotas e seuscontratos sociais.2 Conferir MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: empresa e atuaçãoempresarial. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010. v. 1. capítulos 1 e 2.

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Tipos societários

Sociedade simples comum

O artigo 983 do Código Civil afirma que a sociedade simples pode serconstituída sob a forma de sociedade em nome coletivo, sociedade emcomandita simples, sociedade limitada ou sociedade cooperativa. Mas, ao finaldo dispositivo, também aceita que se constitua sociedade subordinada “àsnormas que lhe são próprias”. Dessa maneira, acabou por aceitar um quintotipo, ao qual se atribuem nomes diversos como uma sociedade simples comumou sociedade simples em sentido estrito, entre outros. Esse tipo societário regula-se pelas normas inscritas nos artigos 997 a 1.038 do Código Civil.Essencialmente, cuida-se de tipo societário que tem natureza societária única:será sempre uma sociedade simples e contratual, sendo que sua existênciaprincipia a partir do registro do contrato social no Cartório de Registro Civil dasPessoas Jurídicas do local de sua sede.

Pessoas naturais e pessoas jurídicas podem ser sócias de uma sociedadesimples comum, sendo que o vínculo mantido entre elas é marcado por mútuosreconhecimento e aceitação, a implicar a necessidade de voto unânime paraque haja cessão de quotas entre os sócios (mudando a composição societária)

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ou mesmo dos sócios para terceiros, aplicados os artigos 997 e 999 do CódigoCivil, bem como seu artigo 1.003. Dessa maneira, respeitada a regra geral,disposta em lei, mesmo o detentor de uma participação mínima no capitalsocial, inferior a 1%, pode recusar a cessão de quotas entre sócios ou paraterceiros. No entanto, é regra legal que se aplica no silêncio do contrato social.É lícito aos sócios estipular regra diversa no contrato social, incluindo a livrecirculação dos títulos societários, independentemente da aprovação dos demaissócios, ou qualquer quórum específico de aprovação que lhes pareça adequado;por exemplo, aprovação de 78,6%.

Essa mesma lógica dos mútuos reconhecimento e aceitação se reflete noartigo 1.002 do Código Civil, vedando ao sócio fazer-se substituir no exercíciodas funções, a não ser que haja consentimento dos demais sócios, isto é, daunanimidade do capital social, salvo estipulação contratual em contrário.Ademais, a administração da sociedade será atribuída exclusivamente a pessoaque seja sócio: um, alguns ou todos. De qualquer sorte, trata-se de tiposocietário no qual não há limite de responsabilidade, vale dizer, os sóciosrespondem, todos, solidária e ilimitadamente, pelas obrigações sociais.

Sociedade em nome coletivo

A sociedade em nome coletivo pode ser simples ou empresária, conformedecidam seus sócios, cabendo, então, arquivar seu contrato social,respectivamente, no Registro Civil das Pessoas Jurídicas ou na Junta Comercial.Esse tipo societário só pode ter pessoas físicas como sócios (ou pessoasnaturais), sendo que o nome da sociedade será composto a partir do nome civilde um, algum ou todos os sócios, no todo ou em parte (obrigatoriamente, opatronímico, isto é, o sobrenome); se não estão presentes os nomes de todos,emprega-se a expressão e companhia ou sua abreviação (e Cia. ou & Cia.) aofinal da razão social. Aliás, é desse sistema de participação societária e decomposição da firma social que resulta a expressão sociedade em nome coletivo.

Sociedade em nome coletivo: composta apenas por pessoas físicas, sendo administrada por sócio ou sócios. Ossócios respondem solidária e ilimitadamente pelas obrigações sociais.

A sociedade em nome coletivo é regida pelos artigos 1.039 a 1.044 doCódigo Civil, que lhe definem normas específicas, aplicando-se supletivamenteas normas da sociedade simples, vale dizer, seus artigos 997 a 1.038. Também,

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para este tipo societário, os mútuos reconhecimento e aceitação são elementosessenciais. Assim, é indispensável haver voto favorável de todos os sócios,mesmo dos que tenham participação societária ínfima, para que haja cessão dequotas entre os sócios (mudando a composição societária) ou mesmo dos sóciospara terceiros, aplicados os artigos 997 e 999 do Código Civil, bem como seuartigo 1.003, embora possam o contrato social trazer regra diversa, incluindo alivre circulação dos títulos societários, independentemente da aprovação dosdemais sócios, ou qualquer quórum específico de aprovação, como visto acima.

Também na sociedade em nome coletivo não há limite de responsabilidadeentre as obrigações sociais e o patrimônio dos sócios. Portanto, os sócios sãoresponsáveis subsidiariamente, em relação à sociedade, pelas obrigações dela. Aobrigação deve ser exigida da pessoa jurídica e, somente se esta não pudersatisfazê-la, nascerá para o credor o direito de voltar-se contra um ou maissócios, recorrendo ao seu patrimônio pessoal, de forma ilimitada, para asatisfação de seu crédito. Essa obrigação dos sócios, de adimplir as obrigaçõesnão satisfeitas pela sociedade, é solidária entre si, alcançando a totalidade dopatrimônio de todos. Portanto, cada um responde com a totalidade dopatrimônio pela totalidade das dívidas sociais não pagas. Aquele ou aqueles quepagarem podem voltar-se contra os demais sócios para repartir,proporcionalmente, os ônus desse adimplemento. Contudo, a lei permite aestipulação, no ato constitutivo ou por unânime convenção posterior, de umalimitação de responsabilidade entre si, ou seja, entre os sócios. Essa regra temvalidade entre os sócios, não afetando o direito de terceiros à plena satisfaçãode seus créditos. Realce-se que mesmo o sócio admitido na sociedade não seexime das dívidas sociais anteriores à admissão; no entanto, embora não possaimpedir que o seu patrimônio responda pela obrigação, poderá exigir dos sócioscontemporâneos ao fato que lhe reembolsem integralmente o que pagou. Peloângulo oposto, os sócios que se retiraram da sociedade manterão umaresponsabilidade residual pelas obrigações constituídas ao tempo em que aindaestavam na sociedade, se ainda não prescritas.

Somente os sócios podem administrar uma sociedade em nome coletivo:um, alguns ou todos (administração coletiva). Se o contrato nada fala arespeito, a administração societária será considerada simultânea, ou seja,competirá a cada um dos sócios, separadamente, sendo que cada um tem afaculdade de impugnar a operação pretendida por outro, tornando a matériacontroversa e, assim, afeta à decisão por maioria de votos. A indicação doadministrador ou administradores, bem como a definição de seus poderes,serão dispostas no ato constitutivo; optando os sócios por fazê-lo por meio de

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um documento em apartado, esse documento deverá ser levado ao registro dasociedade.

Sociedade em comandita simples

A sociedade em comandita simples é um tipo societário de verificaçãomuito rara. Cuida-se de uma sociedade contratual que pode se revestir denatureza simples ou empresária. Seu quadro social deve ser composto porsócios de dois tipos diversos: o chamado sócio comanditário é aquele queinveste na sociedade, mas não a administra; essa administração é umaatribuição do(s) sócio(s) comanditado(s). Como são apenas investidores, ossócios comanditários não têm responsabilidade subsidiária pelas obrigaçõessocietárias não adimplidas; seu patrimônio pessoal está preservado. O mesmonão se diz do comanditado: é sua obrigação administrar a empresa,respondendo pessoalmente pelo inadimplemento da sociedade, regra quealcança mesmo o sócio ou os sócios comanditados que sejam admitidos nasociedade quando o débito já estava constituído, contratual ouextracontratualmente, respeitado o artigo 1.025 do Código Civil.

Sociedade em comandita simples: composta por duas classes de sócios: (1) sócios comanditários: são meramenteinvestidores, não administrando a sociedade; têm responsabilidade limitada, não respondendosubsidiariamente pelas obrigações sociais; (2) sócios comanditados: administram a sociedade; têmresponsabilidade subsidiária pelas obrigações sociais não satisfeitas pela sociedade.

O contrato social deve discriminar quem são os comanditários e oscomanditados, sendo que estes últimos só podem ser pessoas físicas, já queassumem a representação da sociedade e sua administração. Aliás, os sócioscomanditários não podem praticar qualquer ato de gestão, nem ter seu nomena firma social, sob pena de ficarem sujeitos às mesmas responsabilidades desócio comanditado. Entretanto, os comanditários não estão impedidos departicipar das deliberações da sociedade, nem de fiscalizar as operações sociais,o que não se interpreta como ato de gestão, administração ou representação.Mas, segundo o parágrafo único do artigo 1.047 do Código Civil, ocomanditário pode ser constituído procurador da sociedade, para negóciodeterminado e com poderes especiais.

No caso de morte de sócio comanditário, a sociedade, salvo disposição docontrato, continuará com os seus sucessores, que designarão quem osrepresente. Na falta de sócio comanditado, os comanditários nomearão

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administrador provisório para praticar, durante 180 dias, os atos deadministração, sem assumir a condição de sócio. Aliás, esse é o prazo máximoem que se admite que a sociedade tenha uma única categoria de sócio: 180dias.

Sociedade limitada

Na sociedade limitada, a responsabilidade de cada sócio pelas obrigaçõesda sociedade é restrita ao valor não integralizado de suas quotas (artigo 1.052do Código Civil), embora todos sejam solidariamente responsáveis pelaintegralização total do capital social. Se todo o capital social estiver realizado,os sócios não mais serão responsáveis pelas obrigações sociais, salvo adesconsideração da personalidade jurídica, que se estudará adiante. Asociedade limitada é regida pelos artigos 1.052 a 1.087 do Código Civil.Havendo lacuna nessas normas, aplicam-se as normas da sociedade simples(artigos 997 a 1.038 do Código Civil), embora seja possível aos sócios, por meiode cláusula expressa no contrato social, estabelecerem a regência supletiva daLei 6.404/76, ou seja, das regras aplicáveis às sociedades por ações.

Na sociedade limitada, a responsabilidade de cada sócio é restrita ao valor de suas quotas, mas todos respondemsolidariamente pela integralização do capital social.

Como ocorre com as demais sociedades contratuais, o registro da sociedadelimitada se fará no Cartório de Registro Civil das Pessoas Jurídicas, se sociedadesimples, ou na Junta Comercial, se sociedade empresária. Seu capital social édividido em quotas, optando entre dois sistemas diversos: (1) quotas iguais:todo o capital social é dividido em quotas de mesmo valor, sendo atribuído acada sócio o número de quotas correspondente à sua participação no capitalsocial, ou (2) uma quota para cada sócio, no valor total de sua participação nocapital, caso em que se admitem quotas desiguais. A quota é indivisível emrelação à sociedade, salvo se, por meio de alteração do capital social, houveruma mudança na divisão do capital social para concentrar – somar – quotas(grupamento de quotas) ou para dividi-las (desdobramento de quotas). Essaindivisibilidade, todavia, não impede a constituição de condomínio sobre quotaou quotas. Constituído um condomínio sobre quota, os direitos inerentes a elaserão exercidos por um condômino representante; em se tratando de espólio desócio falecido, o inventariante exercerá os direitos da quota. Note que, se a

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quota titularizada em condomínio não estiver integralizada, todos oscondôminos serão solidariamente responsáveis pelas prestações necessárias àsua integralização, independentemente do percentual que detenham.1

A administração da sociedade limitada será atribuída a uma ou maispessoas naturais, sócios ou não sócios, designadas no contrato social ou em atoseparado, desde que não se trate de pessoa que esteja impedida de empresariar.Pode ser atribuída, inclusive, à totalidade dos sócios (administração coletiva ousimultânea), o que pode ser interessante para uma holding, como também serávisto na sequência. Nesse caso, o poder de administrar e representar asociedade não se estenderá, de pleno direito, aos que posteriormente adquiramessa qualidade, tornando necessária uma alteração contratual para estender-lhes o respectivo poder (artigo 1.060, parágrafo único, do Código Civil). Sócioou sócios se elegem administradores por escolha que demanda a aprovação demetade mais um do capital social. Já a designação de administrador não sócioexige unanimidade, enquanto o capital não estiver integralizado, em doisterços, no mínimo, após a integralização (artigo 1.061 do Código Civil).

É possível instituir um conselho fiscal na sociedade limitada, por meio de cláusula no contrato social.

A sociedade limitada comporta a instituição de conselho fiscal (artigos1.066 a 1.070 do Código Civil), previsto em seu contrato social, sendocomposto de três ou mais membros e respectivos suplentes, sócios ou não,residentes no país, eleitos na assembleia geral anual. Os conselheiros nãopodem ser administradores da sociedade, nem de sociedade por ela controlada,nem empregados de quaisquer delas ou dos respectivos administradores,cônjuge ou parente destes até o terceiro grau; também é vedada a participaçãodaqueles que estão proibidos de empresariar. Ademais, aos sócios minoritários,que representarem pelo menos um quinto do capital social, assegura-se odireito de eleger, separadamente, um dos membros do conselho fiscal e orespectivo suplente. O membro eleito, ou o suplente, é investido nas suasfunções assinando termo de posse lavrado no livro de atas e pareceres doconselho fiscal, no qual se mencionará seu nome, nacionalidade, estado civil,residência e a data da escolha. Se o termo não for assinado nos 30 diasseguintes ao da eleição, esta se tornará sem efeito. A investidura perdurará,salvo cessação anterior, até a subsequente reunião ou assembleia anual. Asfunções de conselheiro fiscal são remuneradas em valores fixados anualmentepela reunião ou assembleia dos sócios que os eleger.

Ao conselho fiscal compete, além de outras atribuições determinadas na lei

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ou no contrato social, os seguintes atos, que praticam individual ouconjuntamente: (1) examinar, pelo menos trimestralmente, os livros e papéisda sociedade e o estado da caixa e da carteira, devendo os administradores ouliquidantes prestar-lhes as informações solicitadas; (2) lavrar no livro de atas epareceres do conselho fiscal o resultado dos exames referidos no inciso I desteartigo; (3) exarar no mesmo livro e apresentar à assembleia anual dos sóciosparecer sobre os negócios e as operações sociais do exercício em que servirem,tomando por base o balanço patrimonial e o de resultado econômico; (4)denunciar os erros, fraudes ou crimes que descobrirem, sugerindo providênciasúteis à sociedade; (5) convocar a assembleia dos sócios se a diretoria retardarpor mais de 30 dias a sua convocação anual, ou sempre que ocorram motivosgraves e urgentes; (6) praticar, durante o período da liquidação da sociedade,os atos a que se refere este artigo, tendo em vista as disposições especiaisreguladoras da liquidação.

As atribuições e os poderes conferidos pela lei ao conselho fiscal não podemser outorgados a outro órgão da sociedade, e a responsabilidade de seusmembros obedece à regra que define a dos administradores. Para assisti-lo noexame dos livros, dos balanços e das contas, o conselho poderá escolhercontabilista legalmente habilitado, mediante remuneração aprovada pelaassembleia dos sócios.

O poder supremo de toda sociedade, simples ou empresária, é dos sócios, que podem deliberar por meio dereunião ou assembleia, convocáveis pelo administrador ou, alternativamente, pelos sócios ou pelo conselhofiscal, nas licenças do artigo 1.073 do Código Civil.

Na sociedade limitada, como nas demais sociedades, o poder supremo édos sócios, deliberando em reunião ou assembleia. Nas sociedades limitadas,cabe ao contrato social estabelecer se as deliberações serão tomadas emreuniões (forma mais simplificada) ou assembleias (procedimento formal),embora essa última via seja obrigatória quando o número dos sócios forsuperior a dez (artigo 1.072, § 1o, do Código Civil). A assembleia demandaconstituição de presidência e secretaria, atribuídas aos presentes antes dainstalação, com trabalhos e deliberações lavrados em ata no livro de atas daassembleia, devidamente assinada pelos membros da mesa e por sóciosparticipantes da reunião, quantos bastem à validade das deliberações, mas semprejuízo dos que queiram assiná-la. Cópia dessa ata, autenticada pelosadministradores ou pela mesa, será apresentada ao Registro Público paraarquivamento e averbação, nos vinte dias subsequentes à reunião. Será

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entregue cópia autenticada da ata ao sócio que a solicitar. Mais do que isso,será obrigatória a realização de uma assembleia ordinária anual, nos quatromeses seguintes ao término do exercício social, com o objetivo de tomar ascontas dos administradores e deliberar sobre o balanço patrimonial e o deresultado econômico, sendo que os documentos respectivos devem ser postos,por escrito, à disposição dos sócios que não exerçam a administração até trintadias antes da data marcada para a assembleia, o que se comprovará por escrito.Tais documentos serão lidos e o presidente da assembleia os submeterá adiscussão e votação, nesta não podendo tomar parte os membros daadministração e, se houver, os do conselho fiscal. Nessa assembleia, ademais, sedesignarão os administradores, quando for o caso, além de serem tratadosquaisquer outros assuntos, devendo estes constar da ordem do dia.

A reunião dispensa tais formalismos, não demandando sequer ata: se édecidida alteração contratual, bastará que os sócios que detenham o capitalmínimo necessário para sua aprovação assinem o respectivo instrumento, queserá levado ao Registro; havendo qualquer outra deliberação, bastará tomá-laem documento apartado, assinado pelo número mínimo de sócios necessáriospara a sua validade, sendo levada a registro quando se deseje a suapublicidade. De qualquer sorte, diz o artigo 1.072, § 3o, do Código Civil, areunião ou a assembleia torna-se dispensável quando todos os sócios decidirem,por escrito, sobre a matéria que seria objeto delas, expediente que é maiscomumente utilizado pelas sociedades limitadas brasileiras.

Cabe ao administrador ou administradores convocar a reunião ouassembleia. Também poderá convocar a reunião ou a assembleia: (1) o sócio,quando os administradores retardarem a convocação, por mais de sessenta dias,nos casos previstos em lei ou no contrato; (2) sócio ou sócios titulares de maisde um quinto do capital, quando não atendido, no prazo de oito dias, pedido deconvocação fundamentado, com indicação das matérias a serem tratadas; (3) oconselho fiscal, se houver, se os administradores retardarem sua convocaçãoanual por mais de trinta dias ou sempre que ocorram motivos graves eurgentes. O anúncio de convocação da assembleia de sócios será publicado portrês vezes, ao menos, no órgão oficial da União ou do Estado, bem como emjornal de grande circulação, sendo que entre a data da primeira inserção e a darealização da assembleia deverá mediar o prazo mínimo de oito dias, para aprimeira convocação, e de cinco dias, para as posteriores (artigo 1.152, § 3o, doCódigo Civil). Mas se todos os sócios comparecerem ou se declararem, porescrito, cientes do local, data, hora e ordem do dia, tal procedimento –incluindo a publicação – será desnecessário. A reunião ou assembleia será

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instalada com a presença, em primeira convocação, de titulares de no mínimotrês quartos do capital social e, em segunda, com qualquer número, sendo queo sócio pode ser representado na assembleia por outro sócio, ou por advogado,mediante outorga de mandato com especificação dos atos autorizados, devendoo instrumento ser levado a registro, juntamente com a ata, quando se trate deassembleia.

Sociedades Limitadas

Matérias que dependem da deliberação dos sócios nas sociedades

Matéria Quórum de aprovação

Aprovação das contas da administração Maioria dos presentes

Designação dos administradores, quando feita em ato separado Mais da metade do capitalsocial

Destituição de administrador que seja sócio e tenha sido nomeado por meio de cláusula docontrato social

2/3 do capital social

Destituição de administrador que não seja sócio ou de sócio nomeado por documento emapartado

Mais da metade do capitalsocial

Destituição dos administradores Mais da metade do capitalsocial

Modo de remuneração dos administradores, quando não estabelecido no contrato social Mais da metade do capitalsocial

Modificação do contrato social 75% do capital social

Incorporação, fusão e dissolução da sociedade, ou a cessação do estado de liquidação 75% do capital social

Nomeação e a destituição dos liquidantes e o julgamento das suas contas Maioria dos presentes

Pedido de recuperação da empresa2 Mais da metade do capitalsocial

Outras matérias previstas pelo contrato social Quórum previsto pelo contratosocial

As deliberações que sejam tomadas em conformidade com a lei e o contratosocial, em reunião ou em assembleia, vinculam todos os sócios, ainda queausentes, desde que não tenha havido falha na convocação. Vinculam, até, ossócios que se abstiveram de votar e aqueles que votaram em sentido diverso.

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Interpretam-se, portanto, como deliberação da coletividade social e, como tal,da sociedade. O exercício do direito de voto nas deliberações sociais, emreunião ou assembleia, faz-se sempre no interesse da sociedade, caracterizandovoto abusivo aquele que sobrepõe os interesses individuais ao da coletividadesocial. Isso não importa dirigismo na deliberação; o sócio pode votar comoquiser, desde que tenha por fim específico o bem da sociedade e não o seu bemindividual em prejuízo da sociedade. Justamente por isso, nenhum sócio, por siou na condição de mandatário, pode votar matéria que lhe diga respeitodiretamente (artigo 1.074, § 2o, do Código Civil). O voto abusivo, incluindoaquele que reflete conflito de interesses com a sociedade, é ato ilícito quedetermina o dever de indenizar pelos danos decorrentes. Aliás, as deliberaçõesinfringentes do contrato ou da lei tornam ilimitada a responsabilidade dos queexpressamente as aprovaram (artigo 1.080).3

Sociedade anônima

Na sociedade anônima (ou companhia), o capital social divide-se em ações.Seus sócios (acionistas) têm responsabilidade limitada à realização dasrespectivas ações. Assim, integralizadas as ações titularizadas pelo acionista,não terá ele responsabilidade alguma, nem mesmo subsidiária, pelas obrigaçõessociais, ainda que não satisfeitas pela companhia. Qualquer que seja o objetosocial de uma sociedade anônima, bem como qualquer que seja a forma deestruturação de suas atividades, sempre se tratará de uma sociedadeempresarial, regida por um estatuto social, registrado na Junta Comercial, epelas normas da Lei 6.404/76. Ao contrário do contrato social, o estatuto socialnão traz o nome dos sócios da empresa, mas apenas registra aqueles queestavam presentes à sua fundação, dispensando alterações quando haja cessãode ações e, com ela, da condição de sócio; essa transferência será feita em livropróprio. Mas o estatuto deve definir, de modo preciso e completo, o objeto dacompanhia, que pode ser qualquer empresa de fim lucrativo, desde que não sejacontrária à lei, à ordem pública e aos bons costumes. Esse objeto pode ser,inclusive, participar de outras sociedades: ser uma holding. Também sociedadesque tenham outros objetos sociais podem ter participações em outrassociedades, ainda que isso não esteja previsto no seu ato constitutivo.

A sociedade anônima é sempre empresária, registrando-se na Junta Comercial. Pode ser companhia fechada ouaberta, essa última com títulos negociados no mercado aberto, ou seja, nas bolsas de valores, desde que haja

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autorização da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

As ações e outros títulos da sociedade anônima podem ser negociadosmediante oferta pública, isto é, no chamado mercado de valores mobiliários,sob responsabilidade da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), hipótese emque se terá uma companhia aberta. Em contraste, há a companhia fechada, cujostítulos não estão admitidos à oferta pública no mercado de valores mobiliários.Todo o mercado de valores imobiliários no Brasil está submetido àregulamentação e à fiscalização pela Comissão de Valores Mobiliários, ditandonormas sobre informações que as companhias devem divulgar ao público,relatório da administração e demonstrações financeiras, padrões decontabilidade, relatórios e pareceres de auditores independentes, divulgação defatos relevantes ocorridos nos seus negócios e muito mais. Seu poder defiscalização inclui a faculdade de examinar e extrair cópias de registroscontábeis, livros ou documentos, intimar pessoas para prestar informações(como contadores, auditores independentes, consultores e analistas de valoresmobiliários etc.), bem como apurar e punir condutas fraudulentas no mercadode valores mobiliários. Sem registro e autorização da Comissão de ValoresMobiliários, não pode haver emissão e negociação pública de títulos societários.

Para a constituição de uma sociedade anônima faz-se necessário, nomínimo: (1) a subscrição, pelo menos por duas pessoas, de todas as ações emque se divide o capital social fixado no estatuto; (2) o pagamento em dinheiro,como entrada, de no mínimo 10% (se mais não exigir lei especial) do preço deemissão das ações subscritas; e (3) o depósito, no Banco do Brasil S.A. ou emoutro estabelecimento bancário autorizado pela Comissão de ValoresMobiliários, da parte do capital realizado em dinheiro, a ser efetuado pelofundador, no prazo de cinco dias contados do recebimento das quantias, emnome do subscritor e a favor da sociedade em organização, que só poderálevantá-lo após haver adquirido personalidade jurídica. Caso a companhia nãose constitua em seis meses da data do depósito, o banco restituirá as quantiasdepositadas diretamente aos subscritores. Para além desses requisitos comuns,distingue-se a constituição entre subscrição pública, para companhias abertas, esubscrição particular, para companhias fechadas. Já a constituição decompanhia por subscrição pública depende do prévio registro da emissão naComissão de Valores Mobiliários e subscrição intermediada por instituiçãofinanceira. Companhias holdings, normalmente, são constituídas por subscriçãoparticular do capital, que pode fazer-se por deliberação dos subscritores emassembleia geral ou por escritura pública, considerando-se fundadores todos os

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subscritores.4

O Direito brasileiro aceita a figura da subsidiária integral, ou seja, umasociedade anônima que tem um único acionista: uma sociedade brasileira. Asubsidiária integral é constituída mediante escritura pública, com todas as açõessendo subscritas pela sociedade que deterá o seu controle acionário integral.Também é possível a conversão de uma companhia em subsidiária integral, oque se faz por meio da aquisição, por sociedade brasileira, de todas as suasações ou, ainda, por meio da incorporação de todas as ações do capital social aopatrimônio de outra companhia brasileira, para convertê-la em subsidiáriaintegral, tornando-se os acionistas da companhia incorporada sócios dasociedade incorporadora.5

O estatuto social fixará, em moeda nacional, o valor do capital dasociedade anônima, bem como o número de ações em que se divide. As ações,conforme a natureza dos direitos ou vantagens que confiram a seus titulares,são ordinárias, preferenciais, ou de fruição. As ações ordinárias conferem a seustitulares todos os direitos sociais; já nas ações preferenciais, determinadasfaculdades (nomeadamente o direito de voto) são trocadas por algumaspreferências ou vantagens, a saber: (1) prioridade na distribuição de dividendo,fixo ou mínimo; (2) prioridade no reembolso do capital, com prêmio ou semele; ou (3) acumulação dessas duas preferências e vantagens. Se a açãopreferencial goza de prioridade na distribuição de dividendo fixo, há um piso,vale dizer, um percentual mínimo do lucro líquido do exercício cuja distribuiçãoserá obrigatória para os titulares das ações preferenciais; o estatuto fixará talpercentual e, se for omisso, aplica-se o artigo 202 da Lei 6.404/76, que serefere a metade do lucro líquido, diminuído das importâncias que sejamdestinadas à constituição da reserva legal e à formação da reserva paracontingências. Quando se trate de preferência com direito a dividendo fixo, oestatuto definirá um valor ou percentual sobre o valor contábil da ação comovantagem na distribuição de lucros aos acionistas. De qualquer sorte, o estatutoda companhia com ações preferenciais declarará as vantagens ou preferênciasatribuídas a cada classe dessas ações e as restrições a que ficarão sujeitas, epoderá prever o resgate ou a amortização, a conversão de ações de uma classeem ações de outra e em ações ordinárias, e destas em preferenciais, fixando asrespectivas condições.

O capital social divide-se em ações, cuja cessão não depende da anuência dos demais sócios, embora o estatutoda companhia fechada possa prever direito de preferência para os acionistas. Esse direito pode também estarprevisto em acordo de acionistas. A transferência de ações se faz por meio do Livro de Transferência de Ações,

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sem alteração do estatuto social. É, portanto, um processo bem mais simples.

No que se refere à forma, todas as ações serão nominativas, isto é, o nomedo respectivo titular constará do registro da companhia, no livro de registro deações nominativas, presumindo-se a titularidade deste sobre os títulos. As açõestransferem-se por anotação feita no Livro de Transferência de Ações Nominativas,datada e assinada pelo cedente e pelo cessionário, ou por seus legítimosrepresentantes; em se tratando de ato judicial (herança, arrematação,adjudicação etc.), a averbação faz-se à vista de documento do juízo, que ficaráem poder da companhia. As ações são títulos de livre circulação, ou seja, seustitulares podem vendê-las para qualquer pessoa, sócio ou não sócio, sendo quea admissão desse terceiro na sociedade não depende de aprovação dos demaisacionistas, nada disciplinando a Lei 6.404/76 a esse respeito. No entanto, nacompanhia fechada a circulação das ações pode sofrer limitações impostas peloestatuto. Tais limitações, para serem válidas, deverão estar minuciosamentereguladas no estatuto e não podem traduzir impedimento de negociação, nemsujeição do acionista ao arbítrio dos órgãos de administração da companhia ouda maioria dos acionistas. O mais comum é a previsão do direito de preferênciados acionistas para a aquisição das ações, cumprindo àquele que as quer venderoferecê-las em primeiro lugar – e em igualdade de condições – à coletividadesocial. A limitação à circulação criada por alteração estatutária somente seaplicará às ações cujos titulares com ela expressamente concordarem, mediantepedido de averbação no Livro de Registro de Ações Nominativas.

As ações podem ser oferecidas em penhor ou em caução, mesmo judicial,devendo o ônus ser averbado no Livro de Registro de Ações Nominativas. Asações também podem ser objeto de usufruto, fideicomisso, alienação fiduciáriaem garantia, entre outras cláusulas ou ônus, que serão igualmente averbadosno Livro de Registro de Ações Nominativas. Mesmo a promessa de venda da açãoe o direito de preferência à sua aquisição podem ser averbados em tais livros, oque fará com que sejam oponíveis a terceiros.

O estatuto ou a assembleia geral extraordinária pode autorizar a aplicaçãode lucros ou reservas de capital no resgate ou na amortização de ações,determinando as condições e o modo de proceder-se à operação. O resgateconsiste no pagamento do valor das ações para retirá-las definitivamente decirculação, cancelando-as, extinguindo-as. Habitualmente, o resgate implica aredução do capital social, no montante correspondente às ações canceladas.Mas quando se utilizam lucros ou reservas de capital para a operação, épossível haver resgate de ação sem que haja alteração no capital social,

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aumentando-se o valor contábil de cada ação. Nessa hipótese, se as ações têmvalor nominal, o estatuto social será alterado para atribuir novo valor nominalàs ações remanescentes. Salvo disposição em contrário do estatuto social, oresgate de ações de uma ou mais classes só será efetuado se, em assembleiaespecial convocada para deliberar sobre essa matéria específica, for aprovadopor acionistas que representem, no mínimo, a metade das ações da(s) classe(s)atingida(s).

Já a amortização consiste na distribuição aos acionistas, a título deantecipação e sem redução do capital social, de quantias que lhes poderiamtocar em caso de liquidação da companhia, podendo ser integral ou parcial. Aamortização pode abranger todas as classes de ações ou só uma dessas classes.As ações integralmente amortizadas poderão ser substituídas por ações defruição (também chamadas ações de gozo), com as restrições fixadas peloestatuto ou pela assembleia geral que deliberar a amortização; em qualquercaso, ocorrendo liquidação da companhia, as ações amortizadas só concorrerãoao acervo líquido depois de assegurado às ações não amortizadas valor igual aoda amortização, corrigido monetariamente.

Reembolso é a operação pela qual, nos casos previstos em lei, que serãoestudados no Capítulo 3, a companhia paga aos acionistas dissidentes dedeliberação da assembleia geral o valor de suas ações. Corresponde, portanto, aum direito de recesso (ou de retirada), que nas sociedades por ações é maisreduzido do que nas sociedades contratuais. A regra geral para o cálculo dovalor de reembolso é utilizar o valor de patrimônio líquido da ação constantedo último balanço aprovado pela assembleia geral, quando ocorrido há menosde 60 dias (artigo 45, § 1o, da Lei 6.404/76). O estatuto social, todavia, podeprever que o reembolso se fará por meio de levantamento de balanço especialou pelo valor econômico da companhia, a ser apurado em avaliação. Olevantamento de balanço especial, como fora uma dissolução da companhia, éigualmente a solução quando o balanço tenha sido aprovado em assembleiarealizada há mais de 60 dias, ou sempre que se demonstre haver gravesdistorções no balanço aprovado, como reservas ocultas de capital.6

Na hipótese de levantamento de balanço especial, a companhia pagaráimediatamente 80% do valor de reembolso calculado com base no últimobalanço e, levantado o balanço especial, pagará o saldo no prazo de 120 dias, acontar da data da deliberação da assembleia geral. Alternativamente, se oestatuto determinar que o reembolso se faça a partir da avaliação do valoreconômico da companhia, utilizar-se-ão três peritos ou empresa especializada,que deverão apresentar laudo fundamentado, com a indicação dos critérios de

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avaliação e dos elementos de comparação adotados e instruído com osdocumentos relativos aos bens avaliados, respondendo civilmente pelos danosque eventualmente causem, por culpa ou dolo, na avaliação dos bens; se o atocaracterizar crime, haverá igual responsabilização penal. Os peritos ou empresaespecializada serão indicados em lista sêxtupla ou tríplice, respectivamente,pelo Conselho de Administração ou, se não houver, pela diretoria, e escolhidospela assembleia geral em deliberação tomada por maioria absoluta de votos,não se computando os votos em branco, cabendo a cada ação,independentemente de sua espécie ou classe, o direito a um voto.

O valor de reembolso poderá ser pago à conta de lucros ou reservas, excetoa legal, e nesse caso as ações reembolsadas ficarão em tesouraria; se não hácomprometimento do capital social, aliás, também se poderá deliberar pelocancelamento das ações, aumentando-se o valor nominal das açõesremanescentes, se houver. Se assim não ocorrer, a companhia terá cento e vintedias, a contar da publicação da ata da assembleia que aprovou o reembolso,para substituir os acionistas dissidentes, cujas ações tenham sido reembolsadasà conta do capital social. Vencido esse prazo, não sendo substituídos osacionistas, o capital social se considerará reduzido no montantecorrespondente, cumprindo aos órgãos da administração convocar a assembleiageral, dentro de cinco dias, para tomar conhecimento daquela redução.7

A administração da sociedade anônima está a cargo de um conselho de administração e de uma diretoria; ascompanhias fechadas podem ter apenas diretoria, se assim prever o estatuto social.

A administração da companhia está a cargo de um conselho deadministração e de uma diretoria; as companhias abertas e as de capitalautorizado deverão ter ambos os órgãos, mas as companhias fechadas podemter apenas diretoria, conforme previsão de seu estatuto social. A diretoria terá acomposição, atuação e funcionamento previstos pelo estatuto, respeitadas asregras da Lei 6.404/76. Podem ser criados, ainda, quaisquer órgãos comfunções técnicas ou destinados a aconselhar os administradores. A ata daassembleia geral ou da reunião do conselho de administração que elegeradministradores deverá conter a qualificação e o prazo de gestão de cada umdos eleitos, devendo ser arquivada no registro do comércio e publicada. Aassembleia geral fixará o montante global ou individual da remuneração dosadministradores (conselheiros e administradores), inclusive benefícios dequalquer natureza e verbas de representação, tendo em conta suasresponsabilidades, o tempo dedicado às suas funções, sua competência e

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reputação profissional e o valor dos seus serviços no mercado. A renúncia doadministrador torna-se eficaz, em relação à companhia, desde o momento emque lhe for entregue a comunicação escrita do renunciante, e em relação aterceiros de boa-fé, após arquivamento no registro de comércio e publicação,que poderão ser promovidos pelo renunciante.

O conselho de administração é um órgão de deliberação colegiada, sendocomposto por, no mínimo, três pessoas físicas, eleitas pela assembleia geralentre os acionistas, podendo ser por ela destituídos a qualquer tempo. Oestatuto da companhia deverá estabelecer: (1) o número de conselheiros, ou omáximo e mínimo permitidos, e o processo de escolha e substituição dopresidente do conselho pela assembleia ou pelo próprio conselho; (2) o modode substituição dos conselheiros; (3) o prazo de gestão, que não poderá sersuperior a três anos, permitida a reeleição; (4) as normas sobre convocação,instalação e funcionamento do conselho, que deliberará por maioria de votos,podendo o estatuto estabelecer quórum qualificado para certas deliberações,desde que especifique as matérias. Serão arquivadas no registro do comércio epublicadas as atas das reuniões do conselho de administração que contiveremdeliberação destinada a produzir efeitos perante terceiros.

O conselheiro deve ter reputação ilibada, não podendo ser eleito, salvodispensa da assembleia geral, aquele que ocupar cargos em sociedades quepossam ser consideradas concorrentes no mercado, em especial, em conselhosconsultivos, de administração ou fiscal; e aquele que tiver interesse conflitantecom a sociedade. Se o conselheiro eleito reside ou tem domicílio no exterior, asua posse no órgão fica condicionada à constituição de representante residenteno país, com poderes para receber citação em ações contra ele propostas combase na legislação societária, mediante procuração com prazo de validade quedeverá estender-se por, no mínimo, três anos após o término do prazo de gestãodo conselheiro. Na eleição dos conselheiros, é facultado aos acionistas querepresentem, no mínimo, 10% do capital social com direito a voto, esteja ounão previsto no estatuto, requerer a adoção do processo de voto múltiplo,atribuindo-se a cada ação tantos votos quantos sejam os membros do conselho,e reconhecido ao acionista o direito de cumular os votos num só candidato oudistribuí-los entre vários. Essa faculdade deverá ser exercida pelos acionistas até48 horas antes da assembleia geral, cabendo à mesa que dirigir os trabalhos daassembleia informar previamente aos acionistas, à vista do Livro de Presença, onúmero de votos necessários para a eleição de cada membro do conselho.

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Competência do Conselho de Administração

(1) fixar a orientação geral dos negócios da companhia;

(2) eleger e destituir os diretores da companhia e fixar-lhes as atribuições, observado o que a esse respeito dispuser oestatuto;

(3) fiscalizar a gestão dos diretores, examinar, a qualquer tempo, os livros e os papéis da companhia, solicitar informaçõessobre contratos celebrados ou em via de celebração e quaisquer outros atos;

(4) convocar a assembleia geral ordinária ou, quando julgar conveniente, extraordinária;

(5) manifestar-se sobre o relatório da administração e as contas da diretoria;

(6) manifestar-se previamente sobre atos ou contratos, quando o estatuto assim o exigir;

(7) deliberar, quando autorizado pelo estatuto, sobre a emissão de ações ou de bônus de subscrição;

(8) autorizar, se o estatuto não dispuser em contrário, a alienação de bens do ativo permanente, a constituição de ônus reaise a prestação de garantias a obrigações de terceiros;

(9) escolher e destituir os auditores independentes, se houver, deliberação que poderá ser vetada pelos conselheiros eleitospelos minoritários que representem, pelo menos, 15% do total das ações com direito a voto e pelos preferencialistas querepresentem, no mínimo, 10% do capital social.

A representação da companhia é privativa dos diretores. No silêncio doestatuto e inexistindo deliberação do conselho de administração, competirão aqualquer diretor a representação da companhia e a prática dos atos necessáriosao seu funcionamento regular; mas o estatuto pode estabelecer quedeterminadas decisões, de competência dos diretores, sejam tomadas emreunião da diretoria. Nos limites de suas atribuições e poderes, é lícito aosdiretores constituir mandatários da companhia, devendo ser especificados noinstrumento os atos ou operações que poderão praticar e a duração domandato, que, no caso de mandato judicial, poderá ser por prazoindeterminado. A Diretoria será composta por dois ou mais diretores (pessoasnaturais), eleitos e destituíveis a qualquer tempo pelo conselho deadministração, ou, se inexistente, pela assembleia geral, devendo o estatutoestabelecer: (1) o número de diretores, ou o máximo e o mínimo permitidos;(2) o modo de sua substituição; (3) o prazo de gestão, que não será superior atrês anos, permitida a reeleição; (4) as atribuições e os poderes de cada diretor.Os membros do conselho de administração, até o máximo de 1/3 (um terço),poderão ser eleitos para cargos de diretores.

O administrador da companhia (membro do conselho de administração ouda diretoria) deve empregar, no exercício de suas funções, o cuidado ediligência que todo homem ativo e probo costuma empregar na administraçãodos seus próprios negócios. Isso implica exercer as atribuições que a lei e o

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estatuto lhe conferem para lograr os fins e no interesse da companhia,satisfeitas as exigências do bem público e da função social da empresa. Mesmoque o administrador seja eleito por grupo ou classe de acionistas, ele tem, paracom a companhia, os mesmos deveres que os demais, não podendo, ainda quepara defesa do interesse dos que o elegeram, faltar a esses deveres. Não se lhespermite praticarem atos de liberalidade à custa da companhia, como fazeremdoações, empréstimos gratuitos etc. Note-se, porém, que o conselho deadministração ou a diretoria podem autorizar a prática de atos gratuitosrazoáveis em benefício dos empregados ou da comunidade de que participe aempresa, tendo em vista suas responsabilidades sociais. Não podem, ademais,tomar por empréstimo recursos ou bens da companhia, ou usar bens, serviçosou crédito da sociedade, em proveito próprio, de sociedade em que tenhainteresse, ou de terceiros; somente com autorização prévia da assembleia geral,conselheiros ou diretores poderão fazer uso de tais empréstimos, bens, serviçosou créditos, sendo que, para os membros da diretoria, essa autorização pode serdada pelo conselho de administração. Também é vedado aos administradoresreceber de terceiros, sem autorização estatutária ou da assembleia geral,qualquer modalidade de vantagem pessoal, direta ou indireta, em razão doexercício de seu cargo. Se recebem importâncias, desrespeitando tal vedação, osvalores pertencerão à companhia (artigo 154, § 3o, da Lei 6.404/76).

Os administradores também estão submetidos a um dever de lealdade, ouseja, o administrador deve servir com lealdade à companhia e manter reservasobre os seus negócios. Não podem usar, em benefício próprio ou de outrem, asoportunidades comerciais de que tenham conhecimento em razão do exercíciode seu cargo, com ou sem prejuízo para a companhia. Também rompe com odever de lealdade aquele que se omite no exercício ou proteção de direitos dacompanhia ou, visando à obtenção de vantagens, para si ou para outrem, deixarde aproveitar oportunidades de negócio de interesse da companhia. Écomportamento desleal, igualmente, adquirir, para revender com lucro, bem oudireito que sabe necessário à companhia, ou que esta tencione adquirir. Atente-se, ademais, para os conflitos de interesses. É vedado ao administrador intervirem qualquer operação social em que tiver interesse conflitante com o dacompanhia, bem como na deliberação que a esse respeito tomarem os demaisadministradores, cumprindo-lhe cientificá-los do seu impedimento e fazerconsignar, em ata de reunião do conselho de administração ou da diretoria, anatureza e a extensão do seu interesse. Mais que isso, o administrador só podecontratar com a companhia em condições razoáveis ou equitativas, idênticas àsque prevalecem no mercado ou em que a companhia contrataria com terceiros.

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Se não o faz, o negócio celebrado com a companhia poderá ser anulado, e oadministrador interessado será obrigado a transferir para a companhia asvantagens que dele tiver auferido. Sobre o tema leia-se adiante o caso parailustração [Banco Real].

Os administradores são civilmente responsáveis pelos atos que praticarem violando a lei ou o estatuto social,bem como quando atuarem com dolo ou culpa.

O ato praticado pelo administrador em nome da companhia, quando nãoexceda os poderes outorgados pelo estatuto, nem desrespeite a lei, é ato que seinterpreta como tendo sido praticado pela própria sociedade. Se oadministrador procede com violação da lei ou do estatuto, e mesmo se, dentrode suas atribuições ou poderes, atua com culpa ou dolo, responderá civilmentepelos prejuízos que causar, devendo indenizá-los. Contudo, o juiz poderáreconhecer a exclusão da responsabilidade do administrador se convencido deque este agiu de boa-fé e visando ao interesse da companhia (artigo 159, § 6o,da Lei 6.404/76). Em relação aos outros administradores (conselheiros oudiretores), o administrador não é responsável por atos ilícitos por elespraticados, exceto: (1) se for conivente com eles, (2) se negligenciar emdescobri-los ou (3) se deixar de agir para impedir a sua prática quando tenhaconhecimento do ato ilícito.

Quando o ato ilícito decorra de deliberação da diretoria ou do conselho deadministração, o administrador dissidente exime-se de responsabilidade se fizerconsignar sua divergência em ata de reunião do órgão de administração ou, nãosendo possível, dela dê ciência imediata e por escrito ao órgão daadministração, no conselho fiscal, se em funcionamento, ou à assembleia geral.Diferente será a hipótese de se tratar de prejuízos causados em virtude do nãocumprimento dos deveres impostos por lei para assegurar o funcionamentonormal da companhia; neste caso, como se trata de obrigações legais daadministração, todos os administradores são solidariamente responsáveis pelosdanos, ainda que, pelo estatuto, tais deveres não caibam a todos eles. Nascompanhias abertas, essa responsabilidade está restrita aos administradoresque, por disposição do estatuto, tenham atribuição específica de darcumprimento àqueles deveres. No entanto, torna-se solidariamente responsávelpelos prejuízos alheios o administrador que, tendo conhecimento do nãocumprimento dos deveres pelo seu antecessor ou pelo administradorcompetente para o ato, deixa de comunicar o fato à assembleia geral.

O ajuizamento da ação de responsabilidade civil contra o administrador,

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pelos prejuízos causados ao patrimônio da sociedade, deverá ser feito pelaprópria companhia, a partir de prévia deliberação da assembleia geral ordináriaou extraordinária; neste último caso, se expressamente prevista na ordem dodia ou se for consequência direta de assunto nela incluído. Na mesmaassembleia, serão substituídos o administrador ou administradores contra osquais deva ser proposta ação, já que se tornam impedidos de exercer suasfunções a partir da deliberação. Se a ação não for proposta no prazo de trêsmeses da deliberação da assembleia geral, qualquer acionista poderá ajuizá-la.Se a assembleia deliberar não promover a ação, poderá ela ser proposta poracionistas que representem 5%, pelo menos, do capital social. Se tais acionistassaírem-se vencedores, os resultados da ação por eles promovida deferem-se àcompanhia, mas esta deverá indenizá-los, até o limite daqueles resultados, detodas as despesas em que tiverem incorrido, inclusive correção monetária ejuros dos dispêndios realizados.

A sociedade anônima tem, obrigatoriamente, um conselho fiscal, mas cabe ao estatuto dispor se seufuncionamento será permanente ou eventual.

A sociedade anônima tem, obrigatoriamente, um conselho fiscal, compostode, no mínimo, três e, no máximo, cinco membros, e suplentes em igualnúmero, acionistas ou não, eleitos pela assembleia geral. Mas cabe ao estatutodispor se seu funcionamento será permanente ou eventual, ou seja, sefuncionará apenas nos exercícios sociais em que sua instalação for pedida pelosacionistas. O conselho fiscal, quando o funcionamento não for permanente,poderá ser formulado em qualquer assembleia geral (ordinária ouextraordinária), ainda que a matéria não conste do anúncio de convocação,bastando que o peçam que representem, no mínimo, 10% das ações com direitoa voto, ou 5% das ações sem direito a voto; na mesma assembleia, seusmembros serão eleitos e o conselho instalado, funcionando até a primeiraassembleia geral seguinte. A assembleia geral ainda fixará a remuneração dosmembros do conselho fiscal, além do reembolso, obrigatório, das despesas delocomoção e estadia necessárias ao desempenho da função; essa remuneraçãonão poderá ser inferior, para cada membro em exercício, a 10% da que, emmédia, for atribuída a cada diretor, não computados benefícios, verbas derepresentação e participação nos lucros. A função de membro do conselho fiscalé indelegável.

Para a constituição do conselho fiscal, os titulares de ações preferenciaissem direito a voto, ou com voto restrito, terão direito de eleger, em votação em

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separado, um membro e respectivo suplente; igual direito terão os acionistasminoritários, desde que representem, em conjunto, 10% ou mais das ações comdireito a voto; os demais acionistas com direito a voto poderão eleger osmembros efetivos e suplentes que, em qualquer caso, serão em número igualàqueles outros mais um. Somente podem ser eleitos para o conselho fiscalpessoas naturais, residentes no país, diplomadas em curso de níveluniversitário, ou que tenham exercido, por prazo mínimo de três anos, cargo deadministrador de empresa ou de conselheiro fiscal. Nas localidades em que nãohouver pessoas habilitadas, em número suficiente, para o exercício da função,caberá ao juiz dispensar a companhia da satisfação de tais requisitos. Atente-separa o fato de a reeleição ser legalmente permitida. São inelegíveis para oscargos do conselho fiscal, a exemplo do que também se passa com os cargos deadministração da companhia, as pessoas impedidas de empresariar.

Sociedades Anônimas

Competência do Conselho Fiscal

(1) fiscalizar, por qualquer de seus membros, os atos dos administradores e verificar o cumprimento dos seus deveres legais eestatutários;

(2) opinar sobre o relatório anual da administração, fazendo constar do seu parecer as informações complementares quejulgar necessárias ou úteis à deliberação da assembleia geral;

(3) opinar sobre as propostas dos órgãos da administração, a serem submetidas à assembleia geral, relativas à modificaçãodo capital social, emissão de debêntures ou bônus de subscrição, planos de investimento ou orçamentos de capital,distribuição de dividendos, transformação, incorporação, fusão ou cisão;

(4) denunciar, por qualquer de seus membros, aos órgãos de administração e, se estes não tomarem as providênciasnecessárias para a proteção dos interesses da companhia, à assembleia geral, erros, fraudes ou crimes que descobrirem, esugerir providências úteis à companhia;

(5) convocar a assembleia geral ordinária, se os órgãos da administração retardarem por mais de um mês essa convocação, ea extraordinária, sempre que ocorrerem motivos graves ou urgentes, incluindo na agenda das assembleias as matérias queconsiderarem necessárias;

(6) analisar, ao menos trimestralmente, o balancete e demais demonstrações financeiras elaboradas periodicamente pelacompanhia;

(7) examinar as demonstrações financeiras do exercício social e sobre elas opinar;

(8) exercer essas atribuições, durante a liquidação, tendo em vista as disposições especiais que a regulam.

As atribuições e os poderes conferidos pela lei ao conselho fiscal não podemser outorgados a outro órgão da companhia. Os órgãos de administração sãoobrigados, através de comunicação por escrito, a colocar à disposição dosmembros em exercício do conselho fiscal, dentro de 10 dias, cópias das atas de

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suas reuniões e, dentro de 15 dias do seu recebimento, cópias dos balancetes edemais demonstrações financeiras elaboradas periodicamente e, quandohouver, dos relatórios de execução de orçamentos. O conselho fiscal, a pedidode qualquer dos seus membros, tem, ainda, o poder de requerer aos órgãos deadministração esclarecimentos ou informações, desde que relativas à suafunção fiscalizadora, assim como a elaboração de demonstrações financeiras oucontábeis especiais. Ademais, os membros do conselho fiscal assistirão àsreuniões do conselho de administração, se houver, ou da diretoria, em que sedeliberar sobre os assuntos em que devam opinar.

Se a companhia tiver auditores independentes, o conselho fiscal, a pedidode qualquer de seus membros, poderá solicitar-lhes esclarecimentos ouinformações e a apuração de fatos específicos. Em oposição, se a companhianão tiver auditores independentes, o conselho fiscal poderá, para melhordesempenho das suas funções, escolher contador ou firma de auditoria e fixar-lhes os honorários, dentro de níveis razoáveis, vigentes na praça e compatíveiscom a dimensão econômica da companhia, os quais serão pagos por esta.Acresça-se que o conselho fiscal poderá, para apurar fato cujo esclarecimentoseja necessário ao desempenho de suas funções, formular, com justificativa,questões a serem respondidas por perito e solicitar à diretoria que indique, paraesse fim, no prazo máximo de trinta dias, três peritos, que podem ser pessoasfísicas ou jurídicas, de notório conhecimento na área em questão, entre os quaiso conselho fiscal escolherá um, cujos honorários serão pagos pela companhia.

O conselho fiscal atua a bem da companhia e dos acionistas. Assim, noâmbito das matérias de sua competência, deverá fornecer informações aoacionista, ou grupo de acionistas que representem, no mínimo, 5% do capitalsocial, sempre que solicitadas. Nas reuniões da assembleia geral, os membrosdo conselho fiscal, ou ao menos um deles, deverão comparecer e responder aospedidos de informações formulados pelos acionistas. Nesse sentido, ospareceres e as representações do conselho fiscal, ou de qualquer de seusmembros, poderão ser apresentados e lidos na assembleia geral,independentemente de publicação e ainda que a matéria não conste da ordemdo dia.

Os membros do conselho fiscal têm os mesmos deveres dosadministradores, respondendo pelos danos resultantes de omissão nocumprimento de seus deveres e de atos praticados com culpa ou dolo, ou comviolação da lei ou do estatuto. A responsabilidade por omissão no cumprimentode seus deveres é solidária, mas dela se exime o membro dissidente que fizerconsignar sua divergência em ata da reunião do órgão e a comunicar aos órgãos

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da administração e à assembleia geral. Mas o membro do conselho fiscal não éresponsável pelos atos ilícitos de outros membros, salvo se com eles foiconivente, ou se concorrer para a prática do ato. Devem exercer suas funçõesno exclusivo interesse da companhia; considerar-se-á abusivo o exercício dafunção com o fim de causar dano à companhia, ou aos seus acionistas ouadministradores, ou de obter, para si ou para outrem, vantagem a que não fazjus e de que resulte, ou possa resultar, prejuízo para a companhia, seusacionistas ou administradores.

Caso para ilustração

Banco Real

ASA – Administradora de Bens Ltda., Carbrasmar – Indústria e Comércio Ltda., Dig Distribuidora Guanabarina deVeículos Ltda., Disbrasa Distribuidora Brasileira de Veículos Ltda., Dive Distribuidora de Veículos Ltda., Ed.Empreendimentos Diversificados Ltda., Empreiteira de Mão de Obra Ltda., Enrico Guarneri Ltda., Fiorenza AutoDistribuidora Ltda., Maria Stella Londres Slerca, Mário Slerca Junior, Recomi Ltda., Sul Dive Distribuidora de Veículos Ltda.,Alessandra Guarneri Slerca, Marco Enrico Slerca, Roberto Slerca e Mário Slerca Neto, acionistas minoritários das holdingsabertas Real S.A. Participações e Administração e Consórcio Real Brasileiro de Administração S.A., além da sociedade decapital aberto Banco Real de Investimentos, ajuizaram ação indenizatória contra Aloysio de Andrade Faria, sob a alegaçãode que o réu, na qualidade de sócio controlador e diretor, transferiu o controle do Grupo Real ao ABN Amro Bank, retirandodas duas holdings abertas (Real S.A. Participações e Administração e Consórcio Real Brasileiro de Administração S.A.) e doBanco Real de Investimentos o controle sobre o Banco Real, sobre a Cia. Real de Crédito Imobiliário e sobre as demaiscompanhias integrantes do grupo. Segundo os autores, essa operação se fez em proveito próprio e em desproveito dassociedades controladoras. Para tanto, o réu teria promovido repetidas cisões, provocando a redução do valor de suasposições acionárias em tais sociedades, prejuízo que, segundo os autores, não teria ocorrido caso não tivessem sidocindidas as sociedades ou ainda pudesse ter sido realizada a alienação pelas próprias companhias das quais os autores sãosócios. Pleitearam a indenização equivalente à diferença entre o valor de suas ações, logo após a conclusão da operação(novembro de 1998), e o valor que elas teriam caso não fosse adotado o procedimento denunciado.

O Juiz de Direito da 37a Vara Civil do Rio de Janeiro, considerando inexistir a prova dos danos diretos alegados pelosautores, julgou improcedente o pedido inaugural. Os autores apelaram para o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, massua Décima Quarta Câmara Cível, por unanimidade, também lhes recusou a indenização pleiteada: “Não pratica ato ilegalquem, usando dos poderes de acionista controlador, transfere o poder que detém sobre companhias abertas do Grupo aterceiros, sem audiência das minorias. Para obter indenização mister se faz a demonstração de danos diretos sofridos pelosacionistas, e não danos indiretos, através de supostos prejuízos sofridos pela companhia.”

Por meio do Recurso Especial 556.265/RJ, a questão foi submetida à Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça. Osautores insistiram na tese de que, ao promover as cisões, o recorrido abusou do poder de controle, usurpou a oportunidadecomercial que cabia às empresas Consórcio Real, Real Participações e Banco Real de Investimentos, agindo em conflito deinteresses sociais. Argumentaram, ademais, que o controlador teria usado do direito de votar em Assembleia Geral quandose achava em situação de impedimento. Dessa maneira, as sociedades foram cindidas de modo a possibilitar que ocontrolador, Aloysio de Andrade Faria, auferisse com exclusividade a contraprestação correspondente ao poder de controle.Para os recorrentes, esse comportamento caracterizaria venda a non domino [venda por quem não é o proprietário], já que

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a participação societária alienada pertenceria às duas holdings abertas (Real S.A. Participações e Administração e ConsórcioReal Brasileiro de Administração S.A.) e ao Banco Real de Investimentos.

Afirmaram ainda serem falsas as duas justificativas apresentadas em assembleia para justificar as cisões: (1) anecessidade das cisões para separar os ativos que o ABN Amro Bank desejava adquirir; e (2) o valor atribuído às ações doBanco Real. A primeira seria falsa pois asseveraram que o objeto de interesse do ABN já estava individualizado dentro dassociedades independentes, sendo suficiente, pois, que as empresas Consórcio Real e Real Participações vendessemsimplesmente as suas próprias ações do Banco Real e, por meio de uma de suas subsidiárias, o Banco Real de Investimentosalienasse as ações da Cia. Real de Crédito Imobiliário, dispensando, assim, o complexo processo de cisões. Aduziram que asholdings abertas e suas subsidiárias poderiam também vender as ações que entraram como contrapeso no negócio e que seencontravam em seus balanços, livres e desembaraçadas. Alegaram que a prova do prejuízo se encontra nos fatos, em simesmos, por eles descritos. Por fim, sustentando tratar-se de contrato de venda, e não de permuta, o firmado entre ocontrolador e o ABN Amro Bank, sendo que a omissão do valor pago e a não identificação das ações a serem recebidas pelorecorrido configuram simulação, circunstância indicadora do dolo com que agira ele em detrimento do público acionário.

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, contudo, rejeitou os argumentos dos minoritários, por unanimidade,em acórdão assim ementado:

“– Considera-se controlada a sociedade na qual a controladora, diretamente ou por meio de outras controladas, étitular de direitos de sócios que lhe assegurem, de modo permanente, preponderância nas deliberações sociais e o poder deeleger a maioria dos administradores.

– Ao controlador indireto é permitido apropriar-se do sobrevalor correspondente ao seu poder de controle, bem deconteúdo econômico autônomo e independente. Inexistência no caso de venda a non domino, tampouco da alegadasubtração de oportunidade comercial, de que seriam titulares as holdings abertas. Exercício regular da função decontrolador.

– Não ocorrência de dano, quer das holdings abertas, quer dos acionistas minoritários. Sem a prova da existência deprejuízo, não há lugar para a indenização pretendida.

– Existência dos danos alegados a depender do reexame de matéria fático-probatório (Súmula no 7/STJ).”Em seu voto, o Ministro Barros Monteiro, relator, destacou que o ponto central da controvérsia residia em saber a

quem cabe colher o proveito econômico decorrente da transferência do controle da parcela do Grupo Real efetuada emnegócio jurídico celebrado com o ABN Amro Bank; se ao réu, como aconteceu, ou às sociedades abertas Consórcio Real, RealParticipações e Banco Real de Investimentos. O demandado detinha 99,99% do capital social das holdings fechadas, NovaAmérica, Transamérica e Fortaleza. Cada uma dessas três sociedades era titular de participações minoritárias nas duasholdings abertas, Consórcio Real e Real Participações. Por sua vez, estas últimas detinham participações minoritárias em trêscompanhias operacionais abertas do Grupo Real: Banco Real, Banco Real de Investimentos e Cia. Real de Investimentos.Assim, entendeu o magistrado, ao reverso do sustentado pelos ora recorrentes, as duas holdings abertas, Consórcio Real eReal Participações, não eram individualmente detentoras do controle das companhias operacionais do Grupo Real pelasquais se interessava o Banco holandês. Por conseguinte, é impróprio asseverar-se que parcela do patrimônio pertencenteàs duas holdings citadas foi retirada indevidamente pelos réus. Na verdade, Aloysio de Andrade Faria era o controlador detodo o Grupo Real; detinha o controle direto das três holdings fechadas (Nova América, Transamérica e Fortaleza) e ocontrole indireto, por meio das holdings abertas (Consórcio Real e Real Participações), das companhias operacionais abertas(Banco Real, Banco Real de Investimentos e Cia. Real de Investimentos).

Dessa maneira, concluiu o julgador, se o réu detinha o controle indireto do Banco Real e do Banco Real deInvestimentos, não se pode dizer tenha ele vendido o que não era seu (venda a non domino), nem tampouco que tenhausurpado a oportunidade comercial das holdings abertas (Consórcio Real e Real Participações) e do Banco Real de

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Investimentos de alienar diretamente as companhias operacionais abertas de interesse do ABN Amro Bank. Cabia ao réulegitimamente apropriar-se do sobrevalor correspondente à posição ostentada, não às holdings abertas (Consórcio Real eReal Participações), como almejam os recorrentes. Se o demandado celebrou o negócio jurídico com o Banco holandês,auferindo a vantagem econômica resultante de seu poder de controle, não há falar em ilicitude de comportamento ouabuso de direito, nem sequer de conflito de interesses em relação às sociedades controladas, tampouco de voto emsituação de impedimento.

Continuou o relator: os recursantes alegaram a impossibilidade de “destacar-se parte do patrimônio do Grupo Real, afim de que separadamente fosse destinada a transferência do controle à instituição financeira alienígena. Em verdade, ascisões operadas tiveram como escopo precípuo viabilizar a negociação com o ABN Amro Bank, cujos interesses seadstringiam apenas a determinadas companhias operacionais do Grupo Real. Se cedido fosse pelo réu Aloysio de AndradeFaria o controle direto que detinha, ipso facto restaria prejudicada a transferência do controle indireto mantido em relaçãoa algumas das sociedades controladas. Todavia, no caso, haveria que se desagregar uma parcela do grupo, a fim de atenderaos objetivos do Banco holandês, e a engenharia societária pertinente era aquela eleita pelos réus – a da cisão. Não se vêilegalidade alguma nesse procedimento: se Aloysio de Andrade Faria podia ceder todo o seu poder de controle, podia – porquestão de lógica –, transferir o menos, isto é, parte dele. Quem pode o mais, pode o menos. Tais cisões não prejudicaram asholdings abertas, uma vez que não eram elas as titulares do poder de controle do Banco Real e do Banco Real deInvestimentos. Também não acarretaram perdas aos acionistas minoritários das citadas holdings abertas, Consórcio Real eReal Participações e à companhia operacional aberta, Banco Real de Investimentos, pois passaram eles – acionistas – adeter o mesmo número de ações nas novas sociedades criadas com as cisões”.

Por fim, atestou o julgador não terem relevância para o deslinde da lide os detalhes técnicos relativos à engenhariasocietária que deu ensejo e concretude à transferência do controle ao Banco holandês. Certo é ter havido a transposição departe do poder de controle exercido por Aloysio de Andrade Faria para a sociedade denominada Taluk S.A., que foi alienadaem seguida à entidade financeira estrangeira. Se houve venda ou permuta, aspecto puramente formal, tal circunstância édestituída de significação para o desate da controvérsia, o mesmo devendo ser dito com respeito ao valor atribuído àsações do Banco Real, tido pelo recorrente como nulo, simbólico ou meramente contábil.

Sociedade em comandita por ações

A sociedade em comandita por ações também tem seu capital socialdividido em ações, sendo regida pela Lei 6.404/76. Contudo, há uma distinçãoentre os sócios que investem e sócios que administram, sendo certo que osdiretores devem ser, obrigatoriamente, sócios, sendo nomeados por meio decláusula disposta no estatuto social, sem limitação de tempo, só havendodestituição por deliberação de acionistas que representem no mínimo doisterços do capital social. O princípio alcança mesmo a gerência social, a exigir,igualmente, nomeação pelo estatuto social e mesmo quórum especial paradestituição.

Os acionistas investidores (comanditários), que não exercem aadministração social, não respondem subsidiariamente pelas obrigações sociais.

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Em oposição, os acionistas que exercem a administração assumem a condiçãode comanditados, respondendo com seu patrimônio pessoal, ilimitadamente,pelas obrigações sociais. Essa responsabilidade é subsidiária em relação àsociedade e solidária entre os diretores. Mesmo o diretor destituído ouexonerado, por força do artigo 1.091 do Código Civil, continua, durante doisanos, responsável pelas obrigações sociais contraídas sob sua administração.

Nesse tipo societário, não se admite que a assembleia geral, sem oconsentimento dos diretores, mude o objeto essencial da sociedade, prorrogue-lhe o prazo de duração, aumente ou diminua o capital social, crie debênturesou partes beneficiárias, bem como delibere a participação em grupo desociedade. De resto, não se aplica à sociedade em comandita por ações odisposto nesta lei sobre conselho de administração, autorização estatutária deaumento de capital e emissão de bônus de subscrição.

1 MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: direito societário: sociedadessimples e empresárias. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010. v. 2, capítulo 13 (Sociedadelimitada: estrutura), seção 4.3 (Condomínio de quotas).2 Havendo urgência na medida, os administradores, com autorização de titularesde mais da metade do capital social, podem requerê-la preventivamente3 MAMEDE, Gladston. Manual de direito empresarial. 5. ed. São Paulo: Atlas,2010. Capítulo 6 (Tipos de sociedades contratuais), seção 4 (Sociedade limitada).4 Sobre a constituição de companhias, conferir: MAMEDE, Gladston. Direitoempresarial brasileiro: direito societário: sociedades simples e empresárias. 4. ed.São Paulo: Atlas, 2010. v. 2, capítulo 18 (Constituição das sociedades por ações).5 Sobre a constituição de companhias, conferir: MAMEDE, Gladston. Direitoempresarial brasileiro: direito societário: sociedades simples e empresárias. 4. ed.São Paulo: Atlas, 2010. v. 2, capítulo 23 (Controle, coligação e subsidiariedade),seção 5 (Subsidiária integral).6 Sobre reservas ocultas de capital, conferir MAMEDE, Gladston. Direitoempresarial brasileiro: empresa e atuação empresarial. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010.v. 1, capítulos 8 a 10. Também Direito empresarial brasileiro: direito societário:sociedades simples e empresárias. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010. v. 2, capítulo 21(Direitos dos acionistas), seção 7 (Direito de retirada).7 MAMEDE, Gladston. Manual de direito empresarial. 5. ed. São Paulo: Atlas,2010.

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Eventos societários

Dimensão escritural das sociedades

A empresa é uma criação humana, um somatório de realidades concretas (bens materiaisimóveis e móveis) e intangível (bens imateriais, como marcas e patentes, direitos,procedimentos, rotinas etc.). As possibilidades e os méritos da constituição de uma holdingfamiliar, bem como de todo e qualquer planejamento societário, estão no próprio artifíciojurídico que é a pessoa jurídica. Sua existência reflete uma evolução instrumental e conceitual dasociedade. As possibilidades e os méritos da constituição de uma holding familiar, bem como detodo e qualquer planejamento societário, estão no próprio artifício jurídico que é a pessoajurídica. Cunhada ao longo da evolução jurídica da humanidade, essa figura é simplesmentefascinante por sua realidade e por suas potencialidades. Da percepção antiga da existência degrupos sociológicos que transcendiam os indivíduos que os compunham, permitindo referir-se aogrupo como um ente social, evoluiu-se para um estágio ainda mais sofisticado, no qual o cenáriosocial e econômico não é mais constituído apenas por seres humanos (pessoas físicas ou pessoasnaturais), mas igualmente por seres meramente jurídicos (pessoas jurídicas ou pessoas morais),em muitos casos com existência de fato, como as operações por meio das quais se concretiza aatividade negocial de uma sociedade empresária, por vezes como mera existência escritural,como as chamadas sociedades de participação, sociedades patrimoniais, sociedades imobiliáriase outras, constituídas meramente para funcionar como titulares de bens. Isso para não falar naschamadas sociedades de gaveta, isto é, da prática já difundida de constituir sociedades quemantêm exclusivamente operações escriturais, sem existência de fato, mantidas por objetivosestratégicos os mais variados, muitos dos quais ilícitos, outros de licitude duvidosa, o que nãoatende à função da prática jurídica.

A pessoa jurídica funciona como um meio mais eficaz para a consecução das finalidades daatuação econômica. A empresa permite mais do que simplesmente empreender, certo que seconstitui no esforço para que melhores condições sejam estabelecidas para o sucesso da

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atividade. Nesse sentido, é possível afirmar que a empresa é uma organização de iniciativas, deprocedimentos, de fórmulas que são dispostas de modo a permitir a realização de metaseconômicas, com maior eficácia. Todas essas relações jurídicas enfeixam-se na empresa emantêm uma unidade, escrituralmente representada e atermada (a contabilidade empresarial).1

A sociedade, que está por trás da empresa, é um ente que pode ser objeto de planejamento jurídico que otimize sua estrutura. Essaintervenção será melhor quando revele tecnologia jurídica atual e esteja focada na necessidade de buscar sustentabilidade jurídica.

Mesmo a sociedade (simples ou empresária) é um artifício jurídico: um ente escritural cujainfraestrutura é definida pelo ato constitutivo (contrato ou estatuto social), devidamenteregistrado e passível de alterações. Na esmagadora maioria das sociedades, as possibilidadesoferecidas por essa dimensão escritural não são exploradas. São micro, pequenas e médiasatividades negociais, não raro com atos constitutivos simples, seguindo fórmulas dispostas naInternet ou reiteradas em fotocópias. Mais do que isso, a própria estrutura operacional é simples:um só estabelecimento ou, quando muito, uma estrutura simplificada de sede e um ou outroestabelecimento secundário (filial, sucursal, agência).

No entanto, as possibilidades oferecidas pelo sistema jurídico permitem o manejo lícito dasestruturas societárias para que se ajustem, da melhor maneira possível, às necessidades dosinvestidores (sócios) e da própria empresa.

A arquitetura jurídica das coletividades de sociedades pode ser diversa e deve considerarparticularidades de cada caso dado em concreto, ou seja, as particularidades de cada atividadenegocial, de cada patrimônio familiar e, mesmo, de cada família. Em muitos casos, comoilustração, o desenho societário é alterado para acomodar os membros de uma nova geração.Noutras, a decisão de retirar os parentes da gestão, de um modo radical, implica uma completareformulação do desenho societário, alterando a sua lógica: a engenharia societária familiarhabitualmente não se amolda confortavelmente à engenharia da gestão profissional, mormentequando exercida por gestores absolutamente estranhos ao clã.

Nesse sentido, o domínio da teoria e da tecnologia do Direito Societário licencia aoespecialista compor estruturas corporativas simples (uma pessoa jurídica) ou complexas (gruposde sociedades) que podem atender a finalidades múltiplas, como a reengenharia da atividadeprodutiva. O fundamento dessa maleabilidade jurídica está no fato de que as pessoas jurídicassão entes cuja existência se desenha a partir de atos constitutivos, vale dizer, o contrato social ouo estatuto social, construídos nos limites licenciados pela lei.

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Assim, evitando-se o que a lei proíbe e acatando-se o que a lei determina (ou seja,respeitando o princípio da legalidade, inscrito no artigo 5º, II, da Constituição da República), osfundadores e, nos momentos posteriores, os acionistas ou quotistas das sociedades simples ouempresárias podem definir os parâmetros jurídicos que pautam a sua subsistência. É quantobasta para que se definam vias lícitas e legítimas para o planejamento societário e, até, paraplanejamento patrimonial e tributário, como já tivemos ocasião de demonstrar.

Planejamento societário, antes de mais nada, para estabelecer uma arquitetura corporativaque atenda às demandas como funcionalidade, eficiência, segurança etc., organizandoadequadamente o amplo leque das atividades e do patrimônio de alguém, compreendidas ascaracterísticas da empresa, suas necessidades e possibilidades.

Essas intervenções fazem-se melhor quando refletem uma tecnologia jurídica refinada eatualizada, compreendendo-se como expressão inovadora. De fato, a tecnologia jurídica tambémexperimenta inovações de ordens diversas, como mudanças legislativas, alteraçõesjurisprudenciais, evolução da teoria jurídica (doutrina), novas práticas e procedimentosestabelecidos pelos advogados no exercício de sua profissão, além de inovações que resultem dospróprios atores mercantis: empresários, investidores, gestores etc., no exercício da constanteprocura por meios mais eficazes de apresentarem-se ao mercado.

Mais do que isso, reiteramos o que afirmamos outrora, a manutenção ou a alteração dasestruturas societárias devem sempre considerar o parâmetro da sustentabilidade jurídica. Nãobasta pensar a empresa com fins a realizar seu objeto social, visando à verificação de lucro. Éindispensável que empresa e sociedade sejam estruturadas e orientadas para uma estabilidade,ou seja, que se busque a preservação da empresa, o que inclui comportamentos para apreservação do patrimônio produtivo. A sustentabilidade jurídica compõe a boa administração(boa governança) empresarial, estabelecendo uma atuação consciente dos parâmetros jurídicos e,assim, capaz de evitar problemas como multas, condenações etc.

Sustentabilidade jurídica é uma postura empresarial que visa preservar o negócio,assegurando que as atividades empresariais tenham impactos favoráveis junto a trabalhadores,fornecedores, sócios, comunidade em geral e Estado. Concretiza-se por meio do respeito anormas jurídicas de ordens diversas, como ambientais, fiscais, empresariais etc., visando darestabilidade ao negócio e, assim, evitando seja vítima de solavancos bruscos, com a imposição demultas, indenizações etc. Não é, contudo, atitude de mera sujeição. Comporta expressãoproativa, o que se faz a partir da utilização dos instrumentos mais modernos disponibilizadospela tecnologia jurídica. Assim, há caminhos diversos, estratégias diferentes, para se garantirsustentabilidade jurídica de um patrimônio, de uma empresa: sistematização das atividades,negociais ou não, entre sociedades controladoras e controladas, coligadas ou afiliadas, além desociedades que, apesar de controle ou participação societária comum, não mantêm relaçõesentre si.2

Compreendendo a tecnologia societária por outro ângulo, afirmam-se as vias que se podemcursar nos chamados eventos societários, o que será tratado neste capítulo. O primeiro dos temasa ser enfrentado já demonstra a envergadura do tema: as sociedades (incluindo a holding)podem experimentar transformação de tipo societário, havendo procedimentos para tanto. Esseseventos podem também se verificar tendo por contexto a pluralidade de entes, tomada comoponto de partida ou como resultado, em operações como a incorporação, a fusão e a cisão, todaselas extremamente comuns para a concretização de planejamentos societários, razão pela qualdevem ser abordadas neste livro.

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2 Transformação societária

É possível que uma sociedade transforme o seu tipo societário. Assim, como exemplo, umasociedade em comandita simples pode se tranformar numa sociedade anônima, assim como umasociedade anônima pode se transformar numa sociedade limitada, entre múltiplas outraspossibilidades, entre os tantos tipos estudados no Capítulo 2, além da própria sociedadecooperativa, que ali não se estudou. Essa conversão de tipo societário, segundo o artigo 1.113 doCódigo Civil e o artigo 220 da Lei 6.404/76, não demanda a dissolução da sociedade, nãohavendo falar, consequentemente, em sua liquidação. A sociedade se mantém, mas apenastransforma o seu tipo societário. Esse procedimento se concretiza obedecendo os preceitos queregulamentam a constituição e inscrição do tipo societário em que vai converter-se, principiandopela aprovação da medida por todos os sócios, embora se aceite que os sócios o expressempreviamente esse consentimento, prevendo-o no ato constitutivo da sociedade, comoestabelecem os artigos 1.114 do Código Civil e 221 da Lei 6.404/76. Frise-se, contudo, que aprevisão, no ato constitutivo, do consentimento para uma transformação no futuro apenasdispensa a deliberação unânime dos sócios quotistas ou acionistas, mas não afasta a preservaçãodos interesses da minoria dissidente, que terá o direito de se retirar da sociedade, isto é, terádireito de recesso. É o que estabelecem os mesmos artigos citados.

É possível a uma sociedade converter seu tipo societário, incluindo de tipo contratual para tipo estatutário ou vice-versa.

Frise-se, contudo, que o parágrafo único do artigo 221 da Lei 6.404/76 prevê a possibilidadede renúncia prévia ao direito de retirada no caso de transformação em companhia, disposta nocontrato social. A norma é plenamente aplicável às sociedades contratuais, embora silente oCódigo Civil, já que o artigo 221 é-lhes inteiramente dirigido: fala em consentimento unânime dossócios, salvo previsão no contrato social; o parágrafo único, por sua vez, fala não só em renúnciados sócios, mas ainda em sua previsão no contrato social; como se só não bastasse, em sua partefinal, o parágrafo fala em renúncia ao direito de retirada no caso de transformação em companhia.Esse transformação em companhia deixa claro que a norma dirige-se às sociedades contratuais.

A transformação do tipo societário não poderá modificar ou prejudicar os direitos doscredores, em qualquer caso (artigos 1.115 do Código Civil e 222 da Lei 6.404/76). Tem-se,assim, que as obrigações constituídas sob o regime jurídico anterior, próprio do tipo societárioabandonado, se preservam, com as características e as qualidades próprias daquele regime,incluindo as garantias pessoais, se existirem. A previsão é extremamente relevante quando setransforma uma sociedade que adotava tipo que prevê responsabilidade subsidiária dos sóciospelas obrigações sociais em sociedade em que não existe essa responsabilidade, como asociedade limitada ou a sociedade anônima. Portanto, o limite de responsabilidade será válido apartir da transformação, sendo que os sócios ainda terão responsabilidade subsidiária pelas

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obrigações constituídas ao tempo em que a sociedade mantinha sua qualidade anterior. Essaregra alcança, inclusive, aqueles que se retiraram da sociedade em função da transformação, emface do estabelecimento da responsabilidade residual pelo artigo 1.032 do Código Civil.

Se decretada a falência da sociedade transformada, seus efeitos alcançarão os sócios quetinham responsabilidade subsidiária, no tipo anterior, se ainda houver obrigações constituídasantes da transformação, desde que os titulares dos créditos anteriores à transformaçãoexpressamente o peçam. Aliás, segundo o artigo 1.115, parágrafo único, do Código Civil, bemcomo o artigo 222, parágrafo único, da Lei 6.404/76, o deferimento da extensão das obrigações,por responsabilidade subsidiária, somente beneficiará aos que expressamente as requereram nomomento adequado, afastados os que deixaram tal direito precluir, e às obrigações que, sendoobjeto do pedido expresso, tenham sido constituídas no período anterior à transformação.

Incorporação societária

Uma pessoa jurídica pode incorporar outra pessoa jurídica. Focando no alvo do presenteestudo, uma sociedade, simples ou empresária, pode incorporar uma outra sociedade, simples ouempresária (artigos 1.116 do Código Civil e 227 da Lei 6.404/76). Essa operação podeconcretizar-se entre sociedades de mesmo tipo ou entre sociedades de tipos diversos (artigo 223da Lei 6.404/76). Assim, uma sociedade em nome coletivo pode incorporar uma sociedadeanônima, ou vice-versa, como exemplo. Essa regra conhece uma única limitação: se a sociedadeincorporadora e/ou a sociedade incorporada forem uma sociedade anônima com títulosadmitidos à negociação no mercado aberto (companhias abertas), dessa operação deverá resultaruma companhia aberta (artigo 223, § 3o, da Lei 6.404/76). Aliás, a regra não é específica para aincorporação, aplicando-se também para outras mutações societárias, ou seja, à fusão e à cisão,que serão tratadas nas seções seguintes deste capítulo. De outra face, embora não se trate deuma limitação, não se deve olvidar que, se a sociedade incorporadora e/ou a sociedadeincorporada forem uma sociedade por ações (sociedade anônima ou sociedade em comanditapor ações) deverão ser aplicadas as normas que constam da Lei 6.404/76.

Para que uma sociedade incorpore outra ou outras, a operação deverá ser aprovada portodas as envolvidas, incorporadora e incorporada(s). Essa aprovação tem quórum de deliberaçãoque varia conforme o tipo societário. Na sociedade simples comum, na sociedade em nomecoletivo e na sociedade em comandita simples, será preciso aprovação por todos os sócios(artigos 997 e 999 do Código Civil). Na sociedade limitada, demanda-se aprovação por, nomínimo, três quartos do capital social (artigos 1.071, VI, e 1.076, I, do Código Civil). Nasociedade anônima, a incorporação de outra sociedade demanda aprovação por maioria naassembleia geral especialmente convocada para examinar tal proposição (artigos 223 e 227 daLei 6.404/76); mas a aprovação da incorporação da companhia fechada por outra sociedadedemanda aprovação de acionistas que representem metade, no mínimo, das ações com direito avoto (artigo 136, IX, da Lei 6.404/76. Na sociedade em comandita por ações, também serápreciso maioria na assembleia geral especialmente convocada para examinar tal proposição(artigos 223 e 227 da Lei 6.404/76), além do consentimento dos diretores ou gerentes (artigo283 da Lei 6.404/76). As mesmas regras aplicam-se para a fusão e a cisão, a serem estudadasnas seções subsequentes.3

Quórum para aprovação de incorporação, fusão e cisão

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Tipo societário Quórum Norma

Sociedade simples em comum Unanimidade Artigos 997 e 999 do Código Civil

Sociedade em nome coletivo Unanimidade Artigos 997 e 999 do Código Civil

Sociedade em comanditasimples

Unanimidade Artigos 997 e 999 do Código Civil

Sociedade limitada 75% Artigos 1.071, VI, e 1.076, I, do CódigoCivil

Sociedade anônima3 Maioria dos presentes à assembleia geral Artigos 223 e 227 da Lei 6.404/76

Sociedade em comandita porações

Maioria dos presentes à assembleia geral e consentimento de diretores ougerentes

Artigos 223, 227 e 284 da Lei 6.404/76

Essa deliberação será tomada à vista de uma justificação que será apresentada aos sócios(artigo 225 da Lei 6.404/76), trazendo as bases da operação (artigo 1.117 do Código Civil),instrumento que será abordado na seção 6 deste capítulo. Sendo aprovada a operação, os sóciosautorizarão os administradores a seguirem no procedimento, praticando os atos necessários,incluindo a assinatura de um protocolo com as condições gerais do evento, tema que será objetode análise na seção 7 deste capítulo.

Como resultado da incorporação, os sócios da sociedade incorporada passarão a ser sóciosda sociedade incorporadora, na mesma medida em que o patrimônio da incorporada irá seacrescer ao patrimônio da incorporadora. Isso implicará uma redefinição da participaçãosocietária na incorporadora. Mais do que isso, será preciso que se aprove um aumento de capitalcorrespondente ao patrimônio que lhes será acrescido, bem como um aumento de quotas ouações, a serem destinados aos sócios da incorporada, que passarão a ser sócios quotistas ouacionistas da incorporadora (artigo 227, § 1o, da Lei 6.404/76). A integralização do capitalcorrespondente às novas quotas ou ações se fará com o patrimônio líquido da sociedadeincorporada. Para que essa operação seja confiável, serão nomeados peritos para avaliar opatrimônio líquido da sociedade a ser incorporada (artigos 1.117, § 2o, do Código Civil, e 227, §1o, da Lei 6.404/76).

Enfim, convoca-se nova reunião ou assembleia de sócios, conforme o caso, para aprovaçãodo laudo de avaliação e finalização dos atos de incorporação. O legislador fala, somente, emaprovação pelos sócios da incorporadora (artigo 1.120 do Código Civil), regra que deve ser vistacom restrições, já que é preciso preservar os direitos dos sócios da incorporada. Parece-nos serdireito dos sócios da incorporada, diante da avaliação dos ativos e da definição da posiçãosocietária que ocuparão na nova sociedade, desistir do negócio naqueles termos. Somente se osavaliadores forem constituídos como árbitros, na forma da Lei 9.307/96, o laudo de avaliação,em sua qualidade de sentença arbitral, terá que ser acatado pelos sócios da incorporada. Nessesentido, relembre-se do artigo 226 da Lei 6.404/76, segundo o qual a incorporação somente seefetivará nas condições aprovadas se os peritos nomeados determinarem que o valor dopatrimônio ou patrimônios líquidos a serem vertidos para a formação de capital social é, aomenos, igual ao montante do capital a realizar. Por outro lado, havendo diferença a menor, ossócios quotistas ou acionistas, segundo o artigo 1.117, § 1o, do Código Civil, podem autorizar aosadministradores a subscrição em bens pelo valor da diferença que se verificar entre o ativo e opassivo. Por fim, a nova coletividade social aprovará os atos por meio dos quais a operação se

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ultima, incluindo a indispensável deliberação da extinção da sociedade incorporada (artigos1.118 do Código Civil e 227, § 3o, da Lei 6.404/76).4

Atente-se para o fato de que, ao final da operação, as relações jurídicas que compunham asociedade incorporada, então já inexistente, passarão a compor o universo da sociedadeincorporadora. São diversas as decisões do Superior Tribunal de Justiça que reconhecem haversucessão empresarial não apenas na incorporação, mas também na fusão e na cisão,reconhecendo que o sucessor mantém a responsabilidade empresarial do sucedido, o quecompreende, além dos tributos, as multas moratórias ou punitivas; essas verbas sãocompreendidas como dívida de valor, acompanhando o passivo do patrimônio objeto daincorporação, fusão ou cisão. Assim, a Primeira Turma, julgando o Recurso Especial 1.085.071SP: “Em interpretação ao disposto no art. 133 do CTN, o STJ tem entendido que aresponsabilidade tributária dos sucessores estende-se às multas impostas ao sucedido, sejam denatureza moratória ou punitiva, pois integram o patrimônio jurídico-material da sociedadeempresarial sucedida.” Também a Segunda Turma, como se afere do Recurso Especial959.389/RS: “(2) A responsabilidade tributária não está limitada aos tributos devidos pelossucedidos, mas abrange as multas, moratórias ou de outra espécie, que, por representarempenalidade pecuniária, acompanham o passivo do patrimônio adquirido pelo sucessor. (3)Segundo dispõe o artigo 113, § 3o, do CTN, o descumprimento de obrigação acessória faz surgir,imediatamente, nova obrigação consistente no pagamento da multa tributária. Aresponsabilidade do sucessor abrange, nos termos do artigo 129 do CTN, os créditosdefinitivamente constituídos, em curso de constituição ou ‘constituídos posteriormente aosmesmos atos, desde que relativos a obrigações tributárias surgidas até a referida data’, que é ocaso dos autos.”

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Esses precedentes não são únicos. Cita-se, ainda, o julgamento do Recurso Especial592.007/RS: “Os artigos 132 e 133, do CTN, impõem ao sucessor a responsabilidade integral,tanto pelos eventuais tributos devidos quanto pela multa decorrente, seja ela de carátermoratório ou punitivo. A multa aplicada antes da sucessão se incorpora ao patrimônio docontribuinte, podendo ser exigida do sucessor, sendo que, em qualquer hipótese, o sucedidopermanece como responsável. É devida, pois, a multa, sem se fazer distinção se é de carátermoratório ou punitivo; é ela imposição decorrente do não pagamento do tributo na época dovencimento.” Some-se o Recurso Especial 1.056.302/SC: “Quanto à multa, tem-se que osencargos incidentes sobre o tributo (multa, juros etc.) integram o passivo patrimonial daempresa sucedida, razão pela qual por eles responde a sucessora.”

Essa regra não se limita, por óbvio, às relações jurídicas tributárias. Assim, no julgamento doRecurso Ordinário em Mandado de Segurança 4.949/MG, a Terceira Turma do SuperiorTribunal de Justiça, sob a relatoria do Ministro Cláudio Santos, afirmou que “a empresaincorporadora sucede a incorporada em todos os seus direitos e obrigações, de modo que aindenização por esta devida, em processo já em fase de execução, constitui obrigação a sersatisfeita pela incorporadora”. Mas dela também resultam benefícios para a sociedade. Seguindoa mesma lógica, não há, em sentido jurídico, transferência de bens entre o patrimônio dassociedades (o que se repete na fusão e na cisão). Por isso a Primeira Turma do Superior Tribunalde Justiça, quando julgou o Recurso Ordinário em Mandado de Segurança 8.874/DF, decidiuque: “A incorporação não configura fato gerador do ICMS, que caracteriza-se pela saída física ejurídica da mercadoria. Em caso de incorporação, não há saída física, inexistindo venda aconsumidor final. Em caso de incorporação, quem responde pelos impostos devidos, depois desua efetivação, é a empresa incorporadora que continua a respectiva exploração.”

Fusão societária

É possível a duas sociedades fundirem-se, dando origem a uma outra sociedade. Emboratambém aqui se tenha um somatório de patrimônios e coletividades sociais, a operação não sefaz sob a forma da absorção de um corpo social (incorporado) por outro (incorporador), maspela fusão desses corpos, a implicar um somatório no qual fazem um mesmo movimento: os doiscorpos sociais somam-se a bem da constituição de uma terceira pessoa. Somam-se ospatrimônios (ativo e passivo) e as coletividades sociais (sócios quotistas e/ou acionistas), mas abem de um novo corpo social são extintas as nominações (razão social ou denominação)anteriores (artigos 1.119 do Código Civil e 228 da Lei 6.404/76).

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Podem se fundir sociedades de tipos iguais ou diferentes, sendo que a sociedade fruto dafusão poderá tomar qualquer tipo societário, mesmo diferente daqueles que caracterizavam associedades que se fundiram, embora também aqui devam ser respeitados os limites legais, comoa aplicação da Lei 6.404/76, se há sociedade por ações envolvida na operação, ou a preservaçãoda abertura do capital, se há companhia aberta entre as envolvidas. Em suma, as mesmas balizasvistas na seção anterior para a incorporação, o que inclui a aprovação pelos sócios dascorporações envolvidas, nos mesmos percentuais, a partir de uma justificação que delineie, deforma confiável, uma projeção das bases do negócio, mas que, para a fusão, deverá vir acrescidado projeto do ato constitutivo (contrato social ou estatuto social) da nova sociedade, bem comoo plano de distribuição do capital social (artigo 1.120, § 1o, do Código Civil). O procedimento étambém igual no alusivo à assinatura do protocolo e no que diz respeito ao periciamento dospatrimônios sociais envolvidos.

Diante da avaliação, será convocada reunião ou assembleia dos sócios para tomarconhecimento dos laudos e aprová-los (artigos 1.120, §§ 2o e 3o, do Código Civil, 228, § 2o, daLei 6.404/76). Parece-nos, também aqui, ser direito de cada coletividade social, à vista do laudode avaliação, desistir da operação naqueles termos, sempre que fuja significativamente dostermos da justificação aprovada. Ressalva-se, também para a fusão, a hipótese de os avaliadoresterem sido constituídos como árbitros, na forma da Lei 9.307/96, caso em que o laudo deavaliação assumirá o contorno de sentença arbitral, devendo ser acatado pelas partes. Aoperação se ultima pela aprovação da constituição da nova sociedade, com extinção dasanteriores, definidas as novas participações societárias, sendo que a integralização do capital sefará com o patrimônio líquido de cada sociedade, embora seja lícito – se permitido pelos demaissócios – admitir complementos por parte dos sócios que desejam fazê-lo para, assim, ampliar suaparticipação societária. Caberá aos administradores fazer inscrever, no registro próprio da sede,os atos relativos à fusão, dando baixa nos registros anteriores (artigos 1.121 do Código Civil e228, § 3o, da Lei 6.404/76).

Como resultado da fusão, somam-se os patrimônios sociais, ou seja, faculdades e obrigaçõesjurídicas, em termos análogos àqueles estudados, na seção anterior, para a incorporação, sendoque a sociedade resultante da fusão sucederá aquelas que se fundiram (artigos 1.119 do CódigoCivil e 228 da Lei 6.404/76). Portanto, não há transferência, nem transmissão de bens, damesma maneira que não se perdem as obrigações das sociedades extintas, já que a sociedade

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resultante da fusão as assumirá todas, com seus respectivos acessórios.

Cisão societária

É possível uma sociedade cindir-se, ou seja, dividir-se, criando novo ou novos corpos sociais.A operação implica a transferência de parcelas do patrimônio da sociedade para uma ou maissociedades, constituídas para esse fim ou já existentes, extinguindo-se a companhia cindida, sehouver versão de todo o seu patrimônio, ou dividindo-se o seu capital, se parcial a versão. Essadefinição, inscrita no artigo 229 da Lei 6.404/76, acaba por permitir quatro situações diversas:5

Operações de cisão

(1) Cisão total da sociedade em duas ou mais sociedades, criadas na operação, extinguindo-se a sociedade cindida.

(2) Cisão parcial da sociedade, que se mantém, sendo criada uma ou mais sociedades novas.

(3) Cisão parcial da sociedade, que se mantém, sendo transferidos parte de seu corpo social e patrimônio para outra ou outras sociedades preexistentes,que a incorporam.

(4) Cisão total da sociedade, que se extingue, sendo transferidos parte de seu corpo social e patrimônio para outras sociedades preexistentes queincorporam tais partes do patrimônio cindido.

Obviamente, havendo cisão combinada com incorporação, nos moldes das hipóteses 3 e 4 doquadro acima, deverão ser aplicadas, conjuntamente, as normas que regulam ambos osinstitutos. Frise-se ser também possível que tais operações envolvam transformações de tiposocietário, que poderá dar-se na sociedade cindida, quando se mantenha existente, ou nassociedades incorporadoras. Essa transformação concomitante apenas exigirá o respeito aospreceitos reguladores da constituição e inscrição próprios do tipo para o qual se dará a conversão(artigo 1.113 do Código Civil). Já no alusivo às sociedades criadas, não há qualquer dúvida deque poderão adotar um tipo societário orginal que seja distinto da sociedade de que provieram,embora se deva ter cuidado para que, nas companhias abertas, essa operação não se concretizeem prejuízo do mercado de valores mobiliários.

A cisão deverá ser aprovada pelos membros da sociedade cindida, respeitados os percentuaisde aprovação que foram listados na seção 3 deste capítulo, já que são os mesmos aplicáveis àincorporação e à fusão. Mas é lícito ao contrato ou ao estatuto social prever quórum específicopara tal deliberação, hipótese em que será respeitada a previsão do ato constitutivo, nãopadecendo de qualquer defeito. Essa deliberação se fará em face da justificação (artigo 225 daLei 6.404/76), sendo que, se a operação incluir a criação de uma nova sociedade, seráapresentado o projeto de ato constitutivo da nova sociedade (contrato ou estatuto social).Aprovada a proposta, serão nomeados os peritos que avaliarão a parcela do patrimônio a sertransferida; se essa sociedade for adotar a forma de sociedade por ações, a assembleia queaprovar a justificação e nomear peritos funcionará como assembleia de constituição da novacompanhia (artigo 229, § 2o, da Lei 6.404/76).

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Nas parcelas cindidas do corpo social e na parcela que se mantenha, na hipótese de cisãoparcial, a participação societária no capital social guardará proporção com a participaçãooriginária. A instituição de distinções demanda aprovação unânime pelos demais sócios, já que oato implica disposição de direito (artigo 229, § 5o, da Lei 6.404/76). Os sócios da sociedadetitulares de cada parte do patrimônio que foi cindida receberão as ações ou quotas que lhescabem diretamente da sociedade incorporadora, se a parcela for incorporada por sociedadepreviamente existente, ou da nova sociedade, se à parcela corresponder a criação de uma novapersonalidade jurídica. Com a aprovação, pelas reuniões e/ou assembleias de sócios dassociedades objeto da operação, os atos constitutivos e, havendo, as alterações contratuais ouestatutárias, serão levadas ao Registro Público.

Justificação

As deliberações dos sócios, quotistas ou acionistas, sobre a proposta de realização deincorporação, fusão ou cisão, fazem-se à vista de uma justificação, viu-se acima. Nesse estudosobre as bases do negócio, deverão estar expostos os motivos ou finalidades da operaçãoproposta, e o interesse de cada sociedade na sua realização (artigo 225, I, da Lei 6.404/76).Exige-se, ademais, uma descrição minuciosa sobre como ficará o capital social da sociedade ousociedades quando concluída a operação, bem como a participação societária dos sócios,incluindo a hipótese de ser necessária a emissão de quotas ou ações em substituição aos títulosanteriores (artigo 225 da Lei 6.404/76). Se são muitos sócios, como ocorre com as sociedadesanônimas de capital aberto, essa projeção poderá ser feita por classe de ação, estimando-se aproporção. Por exemplo: cada grupo de 1.075 quotas da sociedade incorporada corresponderá a2 ações da sociedade incorporadora.

Como essa proposição faz-se antes da avaliação do(s) patrimônio(s) líquido(s) da(s)sociedade(s) envolvida(s), a justificação não precisa ser exata na descrição das bases do negócio.Será apenas uma estimativa que levará em conta os últimos balanços patrimoniais. Ainda assim,é essencial que a justificação projete, em conformidade com estimativas confiáveis, a situaçãofinal da operação, ou seja, qual será o estado do patrimônio da sociedade incorporada oufundida, ou das sociedades objeto da cisão, bem como a participação dos sócios nestas,

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permitindo que os sócios tenham uma compreensão adequada da medida sobre a qual devemdeliberar. A justificação não tem a obrigação de ser exata, mas de ser confiável, leal, retratandoo conhecimento que efetivamente se tem dos elementos envolvidos, mesmo aqueles que destoemdo balanço, mas que, sabidos, irão impactar a operação.

Ainda devem ser especificadas eventuais modificações nos direitos e deveres dos sóciosquotistas ou acionistas (artigo 225, II, da Lei 6.404/76). Essas modificações podem resultar,antes de mais nada, de alterações que venham a ser produzidas no ato constitutivo da sociedadeou sociedades envolvidas, incluindo a elaboração de contrato ou estatuto social parasociedade(s) que seja(m) criada(s). Outra hipótese é a transformação de tipo societário,implicando direitos e deveres distintos, sejam por força de lei, sejam por força do novo atoconstitutivo, atribuído à sociedade transformada.

Elementos obrigatórios da justificação (artigo 225 da Lei 6.404/76)

(1) Os motivos ou fins da operação e o interesse da sociedade na sua realização.

(2) As quotas ou ações atribuíveis aos sócios, diferenciadas por espécies e classes (se houver).

(3) Modificações em direitos e deveres dos sócios.

(4) A composição societária após a operação, diferenciadas por espécies e classes (se houver), especificando eventual emissão de quotas ou ações, suasubstituição ou extinção.

(5) Estimativa do valor que caberá aos sócios dissidentes que exercerem o direito de recesso (direito de retirada).

Por fim, a justificação deverá dar aos sócios uma medida confiável sobre a liquidação de suasquotas ou ações, na hipótese de votarem contra a operação e serem nela vencidos. Com efeito,sempre que não se fizer necessária a unanimidade do capital social para a aprovação daoperação, como se passa nas sociedades limitada, anônima e em comandita por ações, os sóciosvencidos terão o direito de se retirar da sociedade (direito de recesso), com a liquidação de suasquotas ou o reembolso de suas ações. Dessa forma, para orientar a decisão dos sócios, inclusivesobre esse aspecto, a justificação deverá projetar o valor que seria atribuível, por quota ou ação,na hipótese de recesso.

É muito comum, entre os profissionais do Direito e da Contabilidade, concluir operações deincorporação, fusão e cisão numa só tacada, ou seja, num só ato, não confeccionando justificaçãoe não assinando protocolo. Embora essa estratégia seja lícita, quando não haja discordância dossócios, acaba por revelar um risco, considerando a possibilidade de desentendimentos futuros e,a partir deles, da alegação de que um ou alguns sócios foram induzidos a erro, o que podeconduzir à anulação da operação. Justamente por isso, parece-nos que o respeito aoprocedimento inscrito no Código Civil e na Lei 6.404/76, com exposição das bases do negócio(justificação), assinatura de protocolo, além da realização da adequada avaliação dos ativos,trabalha a favor da higidez da operação, sendo de todo recomendável seguir esses trâmites.

Protocolo

Aprovada a realização da operação (incorporação, fusão ou cisão), à vista da justificação,será assinado um protocolo pelos órgãos de administração ou sócios das sociedades, estipulandoas bases do evento social. Esse protocolo está previsto no artigo 224 da Lei 6.404/76 e conterá, aexemplo da justificação, uma ampla descrição da situação societária que resultará da operação,

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incluindo:

Elementos obrigatórios do protocolo (artigo 224 da Lei 6.404/76)

(1) o número, espécie e classe das quotas ou ações que serão atribuídas em substituição dos direitos de sócios que se extinguirão e os critérios utilizadospara determinar as relações de substituição;

(2) os elementos ativos e passivos que formarão cada parcela do patrimônio, no caso de cisão;

(3) os critérios de avaliação do patrimônio líquido, a data a que será referida a avaliação e o tratamento das variações patrimoniais posteriores;

(4) a solução a ser adotada quanto às ações ou quotas do capital de uma das sociedades possuídas por outra;

(5) o valor do capital das sociedades a serem criadas ou do aumento ou redução do capital das sociedades que forem parte na operação;

(6) o projeto ou projetos de estatuto, ou de alterações estatutárias, que deverão ser aprovados para efetivar a operação;

(7) todas as demais condições a que estiver sujeita a operação.

Muitos dos elementos que devem constar do protocolo não poderão ser afirmados comcerteza. Justamente por isso, os valores que estejam sujeitos a determinação pela avaliação a serpromovida nos patrimônios das sociedades envolvidas na operação serão indicados porestimativa (artigo 224 da Lei 6.404/76).

Não se pense que o protocolo é uma formalidade vazia, sem efeitos. Trata-se de um contratofirmado entre as partes, ou seja, entre as sociedades, por seus órgãos de administração, ou pelossócios, na cisão ou na hipótese de terem, eles mesmos, firmado o protocolo. Cuida-se de umcontrato preliminar, embora de tipo específico: não é uma promessa de contratar, mas umapromessa de negociar,6 ou seja, de conduzir o processo visando a sua concretização, embora hajaa possibilidade de que não se ultime, se presentes elementos relevantes para tanto,designadamente uma distorção entre as estimativas que constavam da justificação/protocolo e osvalores efetivamente encontrados na auditoria e na avaliação das empresas.

Portanto, o protocolo só obriga as sociedades quando reflita a situação que foi aferida após aavaliação, ainda que com pequenas variações. Havendo distorção relevante entre o que sepactuou e o que se encontrou, é direito da sociedade, ou mesmo de sócio que tenha aprovado aoperação, recusar a sua concretização nos novos termos. Nesse sentido aponta o artigo 226 daLei 6.404/76, segundo o qual as operações somente se efetivarão nas condições aprovadas se osperitos nomeados determinarem que o valor do patrimônio ou patrimônios líquidos a seremvertidos para a formação de capital social é, ao menos, igual ao montante do capital a realizar.

1 Conferir MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: empresa e atuação empresarial. 5. ed.São Paulo: Atlas, 2011. v. 1, capítulo 2 (Teoria geral do direito empresarial).2 Conferir MAMEDE, Gladston; MAMEDE, Eduarda Cotta. Blindagem patrimonial e planejamentojurídico. São Paulo: Atlas, 2011.3 A aprovação da incorporação da companhia fechada por outra sociedade demanda aprovação deacionistas que representem metade, no mínimo, das ações com direito a voto (artigo 136, IX, da Lei6.404/76).4 MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: direito societário: sociedades simples eempresárias. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010. v. 2, capítulo 8 (Coligação, transformação, incorporação,fusão e cisão).5 Para a análise detalhada das hipóteses, conferir: MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro:direito societário: sociedades simples e empresárias. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010. v. 2, capítulo 8

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(Coligação, transformação, incorporação, fusão e cisão).6 Conferir MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: teoria geral dos contratos. São Paulo:Atlas, 2010. v. 5, capítulo (Contrato preliminar).

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Planejamento patrimonial e familiar

Estruturação empresarial

É preciso estar atento para o papel auxiliar desempenhado pelo Direito na definição deestratégias mercadológicas e nas proposições de administração corporativa, ou seja, noestabelecimento do benchmarking, termo reiterado pelo mercado. A definição da engenharia, oumesmo os processos reestruturantes da empresa (reengenharia), não são questões jurídicas, mastemas afetos às Ciências da Administração Empresarial. Contudo, a partir do momento em queos executivos, especialistas e consultores definem aquela que creem ser a melhor arquiteturapara as atividades produtivas, sua proposição precisa ser submetida ao operador jurídico, sejapara simplesmente executá-la, seja para identificar propostas que se afastem das licenças legaisou, ainda, propostas cujos impactos jurídicos (fiscais, trabalhistas etc.) podem se revelarexcessivos, recomendando uma redefinição.

Infelizmente, a compreensão da utilidade do planejamento societário para o sucesso dasorganizações produtivas, incluindo empresas e grupos empresariais familiares, foi enfraquecidapela proliferação pelo mercado de falsos especialistas, oferecendo fórmulas milagrosas,inclusive a famigerada blindagem patrimonial, rótulo sob o qual foram elencadas promessasdiversas, como uma vertiginosa redução de encargos fiscais, proteção dos bens contra iniciativasde credores, inclusive a fazenda pública etc. Esses oportunistas e suas promessas ardilosas sãoos responsáveis por lamentáveis naufrágios empresariais, quando não acabam por conduzirempresários respeitados para o noticiário policial. Esse enredo trágico repetiu-se algumas vezes:apenas com a chegada da polícia, acaba-se por descobrir que a fórmula mágica, na qual seconfiou um dia, incluía a prática de atos que são definidos como crime pela legislação brasileira.

Em oposição, é possível e mesmo recomendável que as organizações produtivas,principalmente as empresas familiares, reconheçam os benefícios de uma análise séria de suaorganização, sua estrutura, seus métodos de funcionamento etc. Dessa análise pode resultar aconcepção de uma arquitetura societária que, incluindo ou não a constituição de uma holding

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(conforme o caso que se apresente e suas características individuais), melhor atendará àrealidade atualmente vivenciada pela(s) empresa(s), bem acolherá e expressará seus planos edesejos futuros. É um enredo proveitoso para que se prepare o ingresso das novas gerações naorganização. Dessa maneira, não se pode pesquisar o tema sem considerar esse viés: asoportunidades que, à luz da ciência da administração empresarial, podem ser percebidas eaproveitadas.

Os horizontes são variados, com numerosas alternativas de posturas administrativas quepodem conduzir os resultados comerciais para níveis mais satisfatórios. Um exemplo fácil é aadoção de uma estrutura multissocietária (a multiplicação da quantidade de pessoas jurídicasutilizadas para realizar os negócios), cada qual ocupando-se de determinada parcela dasoperações, permitindo níveis maiores de descentralização administrativa que, conforme constedas cláusulas dispostas nos contratos sociais e dos estatutos sociais, poderá ser maior ou menor.Pelo lado oposto, há grupos de empresa que, pelas qualidades que revelam, recomendam umesforço inverso, ou seja, a incorporação ou fusão de sociedades com a finalidade de centralizara administração, eliminando divergência, reduzindo custos etc. Não há solução que, em tese,seja melhor ou pior. Há diversas opções que, conforme as condições verificadas em cadaorganização, se mostraram mais ou menos recomendáveis.

A constituição de sociedades pode ser recomendável para abrigar certas atividadesnegociais específicas, já exploradas ou em cuja exploração se vá investir, considerando nãoapenas as demandas da organização administrativa das empresas, como também outros fatores,a exemplo dos reflexos fiscais. Aliás, a concentração de atividades numa só sociedade ou a suadistribuição entre sociedades diversas são medidas diversas que, conforme as particularidadesde cada caso, podem resultar em economia fiscal lícita. Voltaremos ao tema no Capítulo 5,quando abordaremos o tema do planejamento tributário.

Nas empresas familiares, essa reestruturação societária pode ser utilizada para acomodar osvalores das novas gerações, permitindo-lhes demonstrar sua capacidade (além de ganharexperiência) no desenvolvimento de algum projeto específico. É o caso de setores, até entãosubdimensionados na organização, mas em relação aos quais algum ou alguns jovens depositamesperança, desejando explorá-los. A constituição da sociedade acomoda-os, dá-lhes aoportunidade pedida, na mesma medida em que preserva o tronco principal da empresa ougrupo de empresas, evitando problemas de ordem diversa, incluindo a possibilidade defracassos e, até, de falência. Basta recordar que, adotando tipo societário em que haja previsãoda responsabilidade limitada dos sócios, nomeadamente a sociedade limitada e a sociedadeanônima, não haverá responsabilidade subsidiária da sociedade holding pelas obrigações dasociedade controlada. Dessa modo, o eventual fracasso dessas iniciativas não contaminaria asociedade controladora, bastando encerrá-los.

Por outro lado, como cada sociedade mantém relações comerciais e jurídicas próprias,carrega individualmente o risco de sua atuação, evitando que haja uma contaminação dos bonsnegócios por aqueles que se mostram deficitários. Assim, pode-se assistir a uma “expansão denegócios rentáveis, apesar do insucesso de outras associadas, pois cada empresa afiliada podeser considerada isoladamente”, como ensina Djalma Oliveira, sendo que, concomitantemente,pode-se assistir a um “enxugamento das estruturas ociosas das empresas afiliadas,relativamente aos serviços comuns a todo o grupo”, além da “centralização de alguns trabalhos,com possibilidade de redução das despesas operacionais”.1

No entanto, essas são investigações que devem ser feitas considerando os parâmetros de

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outras ciências, como a Administração de Empresas, a Economia e a Contabilidade. Sob talperspectiva, o Direito traz apenas normas instrumentais: define limites lícitos e práticas ilícitas,define procedimentos, requisitos e elementos. Portanto, a perspectiva jurídica para asconveniências empresariais é meramente instrumental. Ainda assim, o operador do Direito éindispensável para que, redigindo de forma adequada cláusulas, alterações e documentos, possagarantir movimentos seguros. Justamente por isso, o diálogo entre os especialistas das diversasáreas ainda é o meio mais confiável para o sucesso de tais intervenções.

Ainda nesse contexto, nunca é demais realçar que a melhor postura administrativa é aquelaque pesquisa os efeitos jurídicos das decisões tomadas, verificando não apenas sua licitude, masigualmente os impactos que terá, a exemplo de encargos fiscais e trabalhistas, além dosmelhores caminhos para que sejam concretizadas. Isso vale para a contratação da atuaçãoconjunta entre sociedades (joint venture), a incorporação de outras sociedades, a fusão comoutras sociedades, a aquisição ou a alienação de estabelecimentos, a terceirização de fasesprodutivas, entre tantos outros.

Uniformidade administrativa

Quando se tenha não apenas uma empresa, mas um grupo de empresas, a constituição deuma holding pode ser recomendável para centralizar a administração das diversas sociedades eas diversas unidades produtivas. Por essa via, a holding deixa de ser apenas a depositária dasparticipações societárias, mas assume um papel primordial de governo de toda a organização,definindo parâmetros, estabelecendo metas, definindo processos funcionais uniformes ouautorizando a excepcional adoção de fórmulas alternativas nessa ou naquela unidade, entretantas outras possibilidades vantajosas. A holding, por essa perspectiva, torna-se (e deve tornar-se) um núcleo de proatividade, avaliando o desenrolar dos fatos empresariais e trabalhandopara oferecer diretivas que melhorem o desempenho dos atores produtivos.

Ainda sob esse prisma, percebe-se um quadro curioso: a holding nasce de um esforço deplanejamento mas, uma vez constituída, acaba por poder se tornar, ela própria, um centrogerador de planejamento organizacional e mercadológico. Dessa maneira, principalmente emnegócios que surgiram e se desenvolveram a partir da filosofia de uma família, torna-se viávelexpandir as atividades, diversificando a atuação empresarial, sem perder o jeito de fazer ascoisas. Deve-se realçar que essa influência administrativa não se manifesta apenas sobre associedades controladas, mas também sobre aquelas nas quais a holding tenha mera participaçãosocietária, embora relevante. Nessas corporações, embora a cultura da holding (seubenchmarking) não se afirme como uma simples expressão do seu poder de controle, poderesultar da influência positiva que ela exerce, como sócia, junto a seus pares. Essa influênciaempresarial positiva, proporcionada por sociedades de participação, é uma realidade comum eproveitosa para o mercado.

A holding pode centralizar a administração das diversas sociedades e unidades produtivas, dando-lhes unidade, estabelecendo metas ecobrando resultados. Dessa maneira, torna-se núcleo de irradiação de uma cultura empresarial (benchmarking) que pode, até,influenciar sociedades nas quais tem simples participação societária e não o controle.

Não é só. Numa estrutura multissocietária, vale dizer, quando se tenham várias sociedadessob o controle ou com a participação de uma mesma família, a holding pode assumir não apenas

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o papel de núcleo de liderança, mas de núcleo de representação. Com efeito, a holding pode setornar a sociedade que representa o conjunto das sociedades controladas, na mesma proporçãoem que também representa a família que a controla. Isso permite obter uma vantajosa unidadede discurso nas relações com o mercado e a sociedade: fala pelas sociedades, assim comoeventualmente fala pela família, o administrador da holding ou, ainda melhor, a sua assessoriade imprensa. Esse aspecto tem muita relevância hodiernamente, quando vivemos numasociedade de informação e opinião, com efeitos econômicos diretos. Não é só. Pode, também,“atuar como procuradora de todas as empresas do grupo empresarial junto a órgãos de governo,entidades de classe e, principalmente, instituições financeiras, reforçando o seu poder debarganha e sua própria imagem”.2

Alfim, um aspecto essencial precisa ser destacado: todas essas proposições constituem merapossibilidade organizacional. Da centralização administrativa à unidade de discurso têm-seapenas metas, possibilidades, proposições. Há um largo espaço entre a proposição e a realidade.Esse movimento de realização preenche-se de formas diversas, realçada a capacidade do(s)administrador(es) em implementar uma cultura empresarial de respeito à liderança da holdingsobre as sociedades. No entanto, para além desse poder e capacidade de liderança, importa dardestaque aos instrumentos jurídicos que podem – e devem – ser utilizados pelo operador doDireito para garantir a seus clientes a conquista de uma tal condição. Isso se faz por meio decláusulas dispostas no ato constitutivo da holding e das sociedades controladas, bem como pormeio de documentos apartados que assegurem, juridicamente, a predominância da sociedadecontroladora sobre as unidades produtivas. A existência dessas cláusulas, nos contratos sociais e

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nos estatutos sociais, permitirá que sejam tomadas, se necessário, medidas judiciais paraassegurar a predominância da holding sobre todos as corporações que deveriam estarsubmetidas a ela.

Contenção de conflitos familiares

A constituição de holdings tem sido usada, há muito, para o planejamento sucessório, comose estudará no Capítulo 5. Para além do planejamento da sucessão em si, preparando seusdiversos aspectos, inclusive seus impactos fiscais, importa considerar a oportunidade de seevitar a eclosão de conflitos familiares. Lamentavelmente, as disputas entre familiares sãoconhecidas por se aproximarem de um vale tudo, com episódios lamentáveis que, rapidamente,conquistam a atenção de fofoqueiros e maledicentes, ervas daninhas que dominam,endemicamente, todas as paisagens. Dessa maneira, famílias respeitáveis podem ser lançadas nolamaçal dos boatos, das futricas, dos escândalos que fazem a alegria daqueles que se divertemnoticiando as desavenças que se verificaram no seio dessa ou daquela família. O pior é quandose observa que essas desavenças acabam por colocar em risco a hegemonia da família sobredeterminado negócio. A hipótese é tola, certo que os envolvidos, cegos por impulsos primitivosde disputa, acabam por não perceber que se enfraquecem mutuamente quando enfraquecem opoder que a família tem sobre empresa(s) ou grupo de empresas. Na busca de uma vitória,todos perdem.

O Direito de Família não cometeu o erro de pretender criar regras detalhadas para definir orelacionamento entre irmãos, pais e filhos etc., o que seria um equívoco, considerando a cargaeminentemente afetiva dessas relações pessoais. No entanto, o Direito Empresarial e, maisespecificamente, o Direito Societário, constituíram-se como disciplinas jurídicas que não estãoatreladas às limitações emotivas e, justamente por isso, puderam sobejar normas para aconvivência entre os sócios. Resulta daí uma outra grande vantagem para a constituição de umaholding familiar, na medida em que a submissão de familiares ao ambiente societário acaba poratribuir regras mínimas à convivência familiar, no que se refere aos seus aspectos patrimoniais enegociais: ao menos em relação aos bens e aos negócios, os parentes terão que atuar comosócios, respeitando as balizas erigidas não apenas pela lei, mas igualmente pelo contrato socialou estatuto social. Mais do que isso, a eclosão de conflitos familiares, no alusivo àqueles temas(bens e negócios), terá que se resolver pelas regras do Direito Empresarial, nas quais estãodefinidos não apenas procedimentos, mas até instrumentos de prevenção e de solução.

Não se trata de um aspecto menor. É preciso se atentar para o fato de que a constituição deuma holding familiar implica uma transmutação da natureza jurídica das relações mantidasentre os familiares. Relações que estavam submetidas ao Direito de Família passam a estarsubmetidas ao Direito Societário, no qual há instrumentos mais eficazes para a regência docomportamento dos indivíduos, a exemplo da necessidade de se respeitar a affectio societatis, ouseja, a obrigação de atuar a bem da sociedade, de seu sucesso, convivendo em harmonia com osdemais sócios. Mais do que isso, o contrato social (sociedade por quotas) ou o estatuto social(sociedades por ações) viabiliza a instituição de regras específicas para reger essa convivência,dando ao instituidor, nos limites licenciados pela lei e pelos princípios jurídicos, uma faculdadede definir as balizas que orientarão a convivência dos parentes em sua qualidade de sóciosquotistas ou acionistas da holding. Mais do que isso, nos conflitos que mantenham entre si, ossócios terão no Direito Societário instrumentos para a solução das disputas, podendo submetê-

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las ao Judiciário ou, havendo cláusula compromissória, a árbitros.Não é só. Na medida em que atribui-se a uma sociedade holding o controle da empresa ou

grupo de empresas, afastam-se os eventuais conflitos familiares do ambiente de produção. Osconflitos familiares ficam confinados à holding, expressando-se, ali, sob a forma de conflitossocietários, ou seja, sob a forma de conflitos que merecem a regência legal das normas doDireito Societário, disciplina do Direito Empresarial. O regime jurídico empresarial e, maisespecificamente, o regime jurídico societário foram desenvolvidos, ao longo dos séculos, paraatender aos desafios da convivência entre os indivíduos, evitando que as inevitáveis desavençaseventuais possam pôr em risco a organização produtiva. É testemunho dessa evolução oprincípio da preservação da empresa (ou princípio da preservação das atividades negociais),3

princípio esse que, no contexto das sociedades, simples ou empresárias, traduz-se comoprincípio da preservação societária,4 refletido, por exemplo, na regra do artigo 1.033, IV, doCódigo Civil, que permite que as sociedades contratuais tenham um único sócio pelo prazo de180 dias, período no qual, espera-se, será reconstituída a pluralidade de sócios.

A constituição de uma holding erige uma instância societária para acomodar, segundo as regras do Direito Empresarial, eventuaisconflitos familiares, fazendo com que, ao final, a família vote unida nas deliberações que sejam tomadas nas sociedades de queparticipa ou que controla.

Como se não bastasse, a holding erige uma instância societária distante da sociedade ousociedades produtivas. As eventuais disputas familiares se dão no âmbito da holding, devendoser ali decididas, respeitadas as já aludidas normas do Direito Empresarial, mas igualmente asregras que estejam dispostas no ato constitutivo (contrato social ou estatuto social) ou, até, emacordos parassociais (acordo de quotistas ou acordo de acionistas). Seguindo esses parâmetros,a controvérsia terá que resolver-se no âmbito da holding; a decisão tomada será a decisão daholding que atua sobre as sociedades controladas como um indivíduo: a pessoa jurídicacontroladora.

Os benefícios da constituição dessa instância societária, com a respectiva contenção dosconflitos familiares no âmbito da holding, são múltiplos. A principiar pelo fato de nãoenfraquecer o controle sobre a sociedade produtiva. Aqueles que eventualmente sejam vencidosnos conflitos havidos no plano da holding não podem associar-se a outros sócios para, assim,enfraquecer a posição familiar. Isso preserva o poder da família sobre a empresa ou empresas

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que controla. Imagine-se na figura acima que a holding familiar detenha 52% da sociedadeoperacional, ao passo que os sócios Y e W detenham, cada qual, 24%. Se a participaçãosocietária no âmbito da holding é igualitária, cada sócio votará com 20% nas deliberaçõessocietárias; ainda que E seja vencido, ou mesmo se A e E forem vencidos, no âmbito dasociedade operacional, a holding votará com seus 52% e, assim, manterá o controle. A e Esequer podem alegar que os 20%, detidos por cada um, correspondem a 13% da sociedadecontrolada para, assim, juntando-se com Y e W, fazerem a maioria na deliberação societária,deixando vencido os demais sócios-familiares. Reiteramos: são duas instâncias diversas e, assim,não há confusão entre a deliberação havida no âmbito de uma instância (a holding) e aquelahavida no âmbito da outra (a sociedade produtiva, controlada pela holding).

Note-se que essa vantagem preserva-se mesmo diante da decisão de qualquer sorte deapartar-se da sociedade. Nas sociedades por ações, essa retirada conhece poucas hipóteses; aLei 6.404/76 restringe as situações nas quais o sócio pode pedir para se retirar da sociedade,levando o valor de sua participação societária, o que é justificado pela compreensãoinstitucional da sociedade. Embora a jurisprudência tenha ampliado essas hipóteses, mormenteno âmbito de sociedades familiares, aproximando da situação das sociedades contratuais, restaa compreensão de que, para permitir que a holding cumpra a sua finalidade, a retirada de umsócio deve fazer-se por meio do pagamento, em dinheiro, de sua parte na sociedade, emconformidade com a lei, se o contrato social não trouxer regra diferente. Assim, sendo possívelefetuar o pagamento em dinheiro, preserva-se integral a participação nas sociedadescontroladas ou filiadas, mantendo o poder familiar sobre aquelas empresas.

Caso para ilustração

R.W. Empreendimentos Agropastoril LTDA.

Examinando o Recurso Especial 302.366/SP, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça se deparou com uma sociedade de participações(holding), R.W. Empreendimentos Agropastoril LTDA., que fora constituída sob a forma de sociedade limitada, constituída com a exclusiva finalidadede deter 50% das ações de um grupo empresarial (Tanac S.A.). No entanto, os sócios se desentenderam de forma tal que rompeu-se a mútuaconfiança e disposição para atuar em sociedade (affectio societatis), motivando um pedido judicial de dissolução parcial da sociedade, ou seja,resolução da sociedade em relação ao sócio que pretendia sua retirada (uma outra sociedade de participações); mais do que isso, pediu-se que, comoresultado da retirada do sócio, lhe fossem transferidas ações da sociedade controlada em percentual correspondente à participação do retirante nocapital social da holding controladora. Citadas para o feito, a holding e os demais sócios pediram a improcedência da ação, pretendendo que asociedade continuasse com a mesma finalidade e participações societárias. Destacaram que a holding fora constituída com a finalidade de exercer ocontrole social de um grupo societário e, com a retirada de um sócio, esse controle se perderia. Alternativamente, se o Judiciário considerassepossível a dissolução, pediram que essa se fizesse não pela transferência da proporção que o sócio deteria nas participações societárias, mas pelovalor correspondente, após regular apuração de haveres (liquidação do valor das quotas), devendo o pagamento ser efetuado pela forma constanteno contrato social.

Os magistrados do Superior Tribunal de Justiça entenderam que a ação deveria ser julgada procedente em parte: decretaram a dissoluçãoparcial da holding, mas indeferiram a pretensão de que houvesse a divisão das participações societárias detidas por ela. Assim, determinaram aliquidação das quotas da sócia retirante, reembolsando-a pelo valor real (valor de mercado) da proporção que lhe caberia nas participaçõessocietárias detidas pela holding, devendo o pagamento efetuar-se em conformidade com o que previa o contrato social: 36 prestações iguais esucessivas, devidamente atualizadas. Foi essa a emenda do acórdão:

“COMERCIAL E PROCESSUAL CIVIL. ACÓRDÃO ESTADUAL. NULIDADE NÃO CONFIGURADA. DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE. HAVERES.APURAÇÃO. PRETENSÃO DE ENTREGA EM AÇÕES DE OUTRA EMPRESA QUE COMPÕEM O PATRIMÔNIO DA SOCIEDADE OBJETO DA DISSOLUÇÃO.IMPOSSIBILIDADE. HIGIDEZ DO CONTRATO QUE ESTABELECE A RESTITUIÇÃO EM PARCELAS. CORREÇÃO MONETÁRIA PREVISTA ESTATUTARIAMENTE.DÉBITO JUDICIAL. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. CRITÉRIO. MATÉRIA DE FATO. SÚMULAS No 5 E 7-STJ. INCIDÊNCIA. CPC DE 1939, ART. 668 C/C ART. 1.218,VII, DO ATUAL CPC. EXEGESE.

I. Muito embora não houvesse obstáculo à fixação pelo Tribunal estadual, na fase cognitiva, do índice de correção monetária a ser aplicado e

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dos juros moratórios, não se identifica motivo à nulificação do acórdão a quo por omissão, se este remete as questões para a liquidação dos haveressocietários, buscando-se agora, inclusive, evitar contramarcha processual.

II. A apuração dos haveres do sócio retirante deve se fazer de conformidade com o contrato social, quando disponha a respeito, caso dos autos,inexistindo empecilho a que o pagamento se faça em parcelas mensais e sucessivas, corrigidamente, o que minimiza os efeitos da descapitalizaçãoda empresa atingida. Precedentes do STJ.

III. Descabida a pretensão ao recebimento dos haveres em ações que a empresa parcialmente dissolvida – uma “holding” – detém em seupatrimônio, porquanto o pagamento, e aqui também por força de determinação do contrato social, se faz em dinheiro, mediante a apuração do realvalor da participação do sócio retirante.

IV. Havendo sucumbência recíproca, possível a compensação igualitária, importando o critério de distribuição adotado pela instância ordináriaem matéria de fato, obstado o seu exame pelo STJ, ao teor da Súmula no 7.

V. Incidente a correção monetária das prestações dos haveres, seja porque prevista contratualmente, seja por se cuidar de débito oriundo dedecisão judicial, com a finalidade de compensar a defasagem ocorrida na expressão econômica da moeda nacional.

VI. Recursos especiais da autora e das rés não conhecidos” (REsp 302.366/SP, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA,julgado em 5-6-2007, DJ 6-8-2007, p. 492).

Os sócios que pediam a retirada argumentaram que o Judiciário poderia desconsiderar a previsão do ato constitutivo sobre a forma deliquidação da quota, sendo que o justo e o equânime seria o recebimento dos haveres na forma de ações correspondentes ao que a holding(sociedade em dissolução parcial) detinha na sociedade controlada. Os julgadores, contudo, entenderam que o artigo 668 do Código de Processo Civilde 1939, ainda aplicável à dissolução de sociedades, deve ser respeitado: a apuração de haveres deve se fazer (1o) pelo modo estabelecido nocontrato social, (2o) pelo modo convencionado pelos sócios e (3o) pelo modo determinado na sentença. Assim, havendo regra disposta no contratosocial, esta deveria ser respeitada.

Lê-se no voto: “Na espécie em comento, o estatuto prevê o pagamento em trinta e seis parcelas mensais e sucessivas, atualizadamente, demodo que nem é à vista, e tampouco o é em ações de outra empresa. E, por último, nem se pode afirmar, aqui, que o critério estatutário éinteiramente absurdo, lesivo, a justificar, excepcionalmente, uma interferência do Judiciário para coibir abuso manifesto. É que a dissolução parcial,é bastante elementar, causa trauma interno da empresa, a sua descapitalização, de modo que o pagamento parcelado atenua o impacto, desde que,é claro, haja a correção das prestações, para não causar enriquecimento injustificado do sócio remanescente. […] Especificamente sobre orecebimento em ações, não tem cabimento. Além de não estar previsto no contrato social, não se fracionam os bens concretos de uma sociedade nocaso de dissolução parcial. Ou seja, se ela tem uma frota de cem caminhões e quinhentos computadores, duzentas mesas, etc., não se faz a repartiçãode cada um dos bens em si, mas pelo valor correspondente aos mesmos, na proporção da participação societária daquele que se retira. O mesmoocorre com o patrimônio de uma holding em ações de terceira empresa, hipótese dos autos. A dissolvida não perde, em princípio, as ações do grupocontrolado. Ela tem é de entregar, à sócia retirante, o valor relativo à sua participação minoritária, em dinheiro, e, é claro, na apuração dessemontante será considerado o real valor das ações do Grupo, porém, não, a entrega material das aludidas ações, em si. Na verdade, o resultadoprático da pretensão da autora seria a extensão da dissolução parcial às demais sociedades.”

Distribuição de funções

Um dos graves desafios das empresas familiares está na capacidade que os membros dasnovas gerações revelam, ou não, para a atividade negocial ou atividades negociaisdesenvolvidas pela empresa ou empresas controladas. É comum ouvirem-se narrativas de paisque fizeram de tudo para que seus filhos dessem certo na empresa, mas acabaram sendoobrigados a reconhecer que não revelavam qualquer pendor para a atividade. Noutro giro,embora acabe-se por alocar todos os herdeiros, alguns mostram vontade e capacidade paradirigir, outros para funções menores, criando o desafio das diferenças de remuneração.

Com a constituição de uma holding familiar, nomeadamente uma sociedade departicipações (holding pura), todos os herdeiros, junto com seus pais, são colocados na mesmacondição: são todos sócios. Como a holding pura não tem atividade operacional, aadministração pode ser atribuída a todos os sócios ou, se atribuída a algum em especial, pode-seprever um pro labore figurativo, estipulado em valor mínimo. Assim, como a receita da

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sociedade de participação é composta exclusivamente pela distribuição de lucros e juros sobre ocapital próprio, pagos pelas sociedades nas quais tem participação, independentemente dafunção desempenhada pelos sócios, estejam ou não trabalhando nas empresas, nessa ou naquelafunção, a participação nos resultados se fará de acordo com a participação no capital social daholding. Isso não é alterado, sequer, se há autorização no contrato social ou estatuto social, ouautorização dada pela reunião ou assembleia de sócios, para que a receita também resulte deoperações realizadas com os títulos que tenham em carteira, como o aluguel de ações, aquisiçãoe alienação de participações societárias, debêntures etc. Diga-se o mesmo com as receitasadvindas das sociedades patrimoniais, titulares de bens imóveis e móveis alugados, marcas epatentes licenciadas etc.

Divisão funcionaldos membros da

família

Holding → todos os familiares tornam-se, indistintamente, sócios da holding, cuja receita provém das sociedades controladas efiliadas. Cada sócio recebe dividendos proporcionais à sua participação societária, independentemente de trabalhar, ou não, nasempresas.

Sociedades operacionais → aqueles que mostram disposição e vocação para atuar nas empresas ocupam cargos de direção oufunções no organograma das sociedades produtoras, sendo remunerados por este trabalho, por meio de pro labore, se diretores,ou salário, se funcionários.

A conclusão necessária é simples: no âmbito de uma holding pura, os sócios nivelam-se.Mesmo uma filha que tenha optado por se dedicar às prendas domésticas terá a mesma retiradade um filho executivo: a receita obtida a partir do patrimônio familiar (quotas, ações, títulos,imóveis, móveis etc.), partilhada na proporção da participação societária. Em oposição, aquelesque mostrem pendor para atuar nas sociedades operacionais, nelas tomarão lugar, sendoremunerados por esse trabalho, segundo as regras do Direito Empresarial (administradoressocietários, que são remunerados por meio de pro labore) ou do Direito do Trabalho, sedesempenharem funções ao longo dos níveis operacionais da organização empresarial:jornalistas, engenheiros, relações públicas etc.

Reiteramos, pela importância, que o direito à participação nos lucros em nada se confundecom o trabalho na sociedade. A remuneração pelo trabalho se faz por meio do pro labore, paraos administradores, ou por meio de salário, para os trabalhadores, destacando-se que um sóciopode, sim, ser empregado pela própria sociedade, certo que a personalidade jurídica do sócio édistinta da personalidade da sociedade. O direito aos dividendos nasce da titularidade dasquotas ou ações, ou seja, da participação societária. Não mais que isso. O lucro é a remuneraçãodo capital investido na sociedade, tenha havido integralização pelo próprio sócio, tenha havidointegralização por terceiros em seu favor. Essa realidade ficou patente no julgamento Agravo1.0024.02.790738-5/001 pela 11a Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, noqual a relatora, Desembargadora Selma Marques, confirmou decisão que determinara opagamento a um dos sócios, por ocasião da dissolução parcial da holding, da quantiacorrespondente aos lucros que não lhe foram distribuídos nos exercícios entre 1992 e 2003,incluindo indenização pela respectiva mora, destacado seu direito a receber os dividendos emface de sua participação da sociedade. Esse direito, destacaram os julgadores, em nada seconfundia e em nada fora prejudicado pela apuração do valor que lhe cabia no acervopatrimonial, resultado de sua retirada da coletividade social.

Lê-se no acórdão:

“Cumpre ressaltar que cabe aos administradores encarregados da gestão da sociedade

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promover a apuração contábil dos resultados obtidos pela sociedade em dado períodototalizando os créditos e débitos acumulados. Terminadas as operações contábeis, casoo resultado seja positivo o lucro será reinvestido na própria atividade social oudistribuído entre os sócios, que terão a sua disposição um acréscimo patrimonial. Aviolação das regras contábeis e a elaboração de lançamentos sem vinculação exata comas operações concretizadas geram lucros ilícitos e fictícios, constituindo verdadeiragestão fraudulenta que vincula os responsáveis ou beneficiados. Por isso, ainda queexista acordo judicial homologando a dissolução parcial da sociedade extinguindoparcialmente o mérito, persiste a lide em relação aos pedidos relacionados à nãodistribuição correta dos lucros ao autor pelos demais sócios.” Adiante, fez constar arelatora:

“A participação nos resultados da empresa representa a principal motivação para aexistência da sociedade. A repartição dos lucros entre os membros da sociedadecorresponde no plano jurídico a direito inerente à titularidade da quota social. Frise-seque a dissolução parcial da sociedade implica não apenas na retribuição pelas quotas,mas também na busca pelo reestabelecimento da participação dos lucros com asrespectivas perdas que porventura tenha sofrido o sócio retirante em detrimento dofavorecimento dos demais sócios.”

Facilmente se percebe, depois da leitura desse precedente, que essa característica daholding é essencial e, portanto, mais do que uma possibilidade, a adequada distribuição dedividendos, bem como o emprego correto do acervo patrimonial da holding, é uma obrigação deseus administradores. Não se trata, portanto, de uma fantasia ou de um caminho para engodos.Os sócios da sociedade de participação deverão demonstrar maturidade para compreender osdireitos de todos, mesmo dos minoritários, respeitando-os.

Administração profissional

Tomando a questão por um outro lado, pode-se perceber na constituição da holding umaoutra vantagem, da qual podem lançar mão os familiares nela reunidos: manter o controle quea família exerce sobre a empresa ou grupos de empresas, mas afastar os seus membros dacondução dos negócios para, assim, garantir uma administração profissional e, com ela, umasérie de benefícios. A administração familiar nem sempre é meritória. Em incontáveis casos,afirma-se como mera expressão de um direito hereditário: herdei a empresa e, assim, tenho odireito a ela e posso administrá-la. Não se pesquisa se há, ou não, capacidade técnica paraadministrar, se há tino comercial, se as virtudes reveladas pelo fundador ou por aquele queconsolidou e expandiu a empresa estão efetivamente presentes no(s) herdeiro(s). Simplesmentese afirma, como assessório do direito à empresa (tomada como bem herdado), o direito àadministração da empresa.

A holding familiar também pode servir para afastar a família da direção e execução dos atos negociais, embora mantendo o controledas sociedades operacionais.

A situação é mais simples quando há um herdeiro universal, ou seja, quando a empresa ougrupo de empresas é herdado por uma só pessoa. Nesses casos, sua insistência em administrar a

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corporação, mesmo sem revelar virtudes para tanto, produzirá danos exclusivamente no seupatrimônio e sobre seus interesses jurídicos e econômicos. É claro que, para além de si, sãodiretamente afetados trabalhadores e suas famílias, fornecedores e consumidores etc. Contudo,o Direito não evoluiu para um nível em que se possa dar uma proteção eficaz para esses danos;e chega a ser duvidoso os méritos de uma tal intervenção: muitos que foram tidos como loucosem suas atitudes nada mais foram do que visionários, a reformular os modos de produção,rotinas mercadológicas, produtos, serviços etc., mostrando-se amplamente vitoriosos ao fim desuas gestões. Essa referência não pode ser desprezada pelo Direito e, por si só, recomenda que oEstado se mantenha fora da avaliação sobre o mérito da administração empresarial. O estudodos sistemas altamente intervencionistas aponta para uma tendência de fracasso pelainabilidade de gerar inovação competitiva.

O problema se afirma com mais força quando se tenha uma coletividade de herdeiros.Nesses casos, a pretensão e a insistência em administrar as empresas, manifestada por um oualguns herdeiros, acaba por produzir resultados diretos sobre os demais, mesmo quando semantenham afastados dos negócios. Os erros cometidos pelos herdeiros/administradoresimpactarão o patrimônio familiar e, assim, afetarão negativamente o patrimônio de toda afamília. Em se tratando de sociedades por ações, isso não será, segundo a Lei 6.404/76, ummotivo suficiente para o exercício do direito de recesso, isto é, o direito de retirar-se dasociedade e receber a sua parte no patrimônio societário, embora a jurisprudência do SuperiorTribunal de Justiça tenha evoluído de forma positiva e importante neste sentido, como se veráadiante. Já nas sociedades por quotas, nas quais se admite com mais facilidade o direito derecesso, em muitos casos o seu exercício pode revelar-se interessante: a grande vantagemrepresentada pelo patrimônio societário pode estar na capacidade que a empresa tem deproduzir resultados e não no patrimônio a partilhar, sendo melhor conservá-la do que dissolvê-la, ainda que dissolução parcial (resolução da sociedade em relação a um ou alguns sócios, coma correspondente liquidação de suas quotas).

Como se só não bastasse, a administração familiar tem uma outra grande desvantagem emrelação à administração profissional: é muito mais fácil dispensar o administrador profissional,quando não está funcionando, do que o administrador familiar. A dispensa do administradorfamiliar é dolorosa, recheada de ressentimentos e deixa feridas na família, por vezesinsuperáveis. O processo de discussão sobre a sua continuidade, ou não, à frente dos negóciosnormalmente envolve considerações nada objetivas, como a afirmação de preferências parentais,nem sempre verdadeiras, chantagens diversas: o baú de memórias é aberto para que fatos quedeveriam estar há muito superados sejam usados, nessa hora, como armas pontiagudas eafiadas. Qualquer que seja a solução a que se chega, habitualmente a família – e seu patrimônio– sofrem impactos diretos.

O recurso à administração profissional, por seu turno, acaba com esses cenários: todos osmembros da família nivelam-se como iguais sócios da holding familiar e, ali, discutem osnegócios do clã. Na holding, a família mantém a participação societária na empresa ou emvárias empresas concentrada e indivisa, com os benefícios daí resultantes. Mas em lugar dedestacar familiares para ocupar as funções diretivas, são contratados administradoresprofissionais para assumir as posições de comando. Não obstante esses administradoresprofissionais sejam os executores dos atos de administração, ocupando-se do dia a dia daempresa, dependem diretamente da família controladora: eles ocupam o cargo deadministração (presidente, diretor etc.) em função do voto dado pela sociedade controladora (a

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holding), estando obrigados a preservar os interesses da família na empresa, sob pena de seremafastados pelo mesmo voto. Essa opção pela administração profissional, por seu turno, éreversível a qualquer momento, certo que a holding familiar poderá indicar um membro dafamília para assumir a administração.

Note-se que, para atender a eventuais vaidades pessoais, é possível constituir um ou maisadministradores societários, inclusive com cargos de rótulo pomposo (presidente, diretor etc.)na holding. Como se trata de uma sociedade de participação, a condição de seu administradornão implica a obrigação de realizar atos operacionais, que estarão sob a responsabilidade dosadministradores profissionais contratados para conduzir as sociedades produtivas controladas.

Proteção contra terceiros

Concentrados todos os títulos societários (quotas ou ações) na holding, mantém-se umaunidade da(s) participação(ões) societária(s), evitando que a fragmentação entre os herdeirosafaste o controle que a família exerceu, até então, sobre a(s) sociedade(s). Trata-se de umavantagem remarcável. A constituição da holding, dessa maneira, constitui-se numa estratégicajurídica para manter a força da participação familiar, dando expressão unitária a participaçõesfragmentárias. Se o patriarca ou matriarca detinham, até seu falecimento, 51% das quotas ouações de uma sociedade, não é inevitável ver três filhos com singelos 17%, cada um, ficando àmercê dos demais sócios. Por meio da holding, mantém-se o poder de controle, por meio datitularidade dos mesmos 51%, assegurando a cada herdeiro um terço da participação nasociedade de participações.

Essa estratégia jurídica é ainda mais eficaz quando se prepara para enfrentar o risco deataques de terceiros, resultado das opções de vida tomadas por cada herdeiro, sócio da holding, ea possibilidade de, apesar delas, manter o controle societário da(s) sociedade(s)operacional(is). É o caso da penhora da participação de um dos sócios na holding, quandoinadimplente. Um exemplo é o julgamento pela Vigésima Câmara de Direito Privado doTribunal de Justiça de São Paulo do Agravo de Instrumento 7.393.883-1, versando sobre apenhora de quotas que uma devedora detinha numa holding, a Avaré Participação eAdministração Ltda., então com mais de dez anos de atuação.

Se a holding foi constituída sob a forma de sociedade por quotas, simples ou empresária,inclusive a sociedade limitada, a previsão de um quórum para a aprovação da cessão dequota(s) para terceiros ou, pelo ângulo inverso (se assim optar o contrato social), a previsão de

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um quórum para o exercício do direito de oposição ao ingresso de terceiros impedem o atovoluntário de cessão e constituem, mesmo, requisito de validade para a constituição de gravame(penhor) sobre os títulos societários. Lembre-se, pelo que foi visto no Capítulo 2, que a próprialei já prevê que a cessão da condição de sócio depende da concordância da unanimidade dossócios, na sociedade simples comum, sociedade em nome coletivo e sociedade em comanditasimples. Ademais, o próprio legislador outorgou a sócios que representem mais de 25% docapital de uma sociedade o direito de obstarem o ingresso de um estranho na sociedade. Essepercentual pode ser elevado, sendo lícito ao contrato social prever a concordância daunanimidade dos sócios.

Obviamente, essas limitações não impedem a prática de atos de império pelo Estado, aexemplo da desapropriação das quotas ou, mais comum, a sua penhora em processo executivo.No entanto, a possibilidade de penhorar e, consequentemente, leiloar e/ou transferir quota ouquotas para outrem não traduz transferência da condição de sócio, mas mera transferência daexpressão patrimonial dos títulos, se há cláusula de aprovação ou de oposição. Diante dessascláusulas, aquele que adjudicou as quotas precisará ser aceito como sócio pela coletividadesocial; não o sendo, terá o direito à liquidação das quotas para, assim, apurar o seu valorpatrimonial. A vantagem, nesse caso, é que o pagamento do valor dessa participação faz-sepreferencialmente em dinheiro, permitindo que a sociedade, por si ou por seus sócios, pague aoadjudicante o valor apurado da participação societária, conservando intacto o acervo de açõese/ou quotas por meio do qual a holding mantém sua posição nas sociedades controladas,filiadas ou nas quais tenha simples participação. Neste sentido, leia-se o caso para ilustraçãoque consta da seção 3 deste capítulo [R.W. Empreendimentos Agropastoril LTDA.]. O sóciodevedor, por seu turno, perderá a participação societária que tinha na holding, no montante dapenhora/leilão.

Nas sociedades por ações, a defesa do acervo societário, ou seja, das ações que garantem ocontrole de algumas sociedades e/ou a mera participação em outras, faz-se por meio da buscado exercício do direito de adjudicá-las em juízo, requerido pela própria sociedade ou seussócios. Se a holding ou outros de seus sócios adjudicarem os títulos, o sócio-devedor perderá suaparticipação, mas o restante da família manterá intacta a holding e seu patrimônio societário.Nesse sentido, é fundamental destacar que, mesmo diante da previsão legal de que as ações sãotítulos societários de circulação ampla, é possível a estipulação, no estatuto social (devidamenteregistrado para que a previsão seja eficaz em relação a terceiros), que sua circulação é restrita, abem da coerência societária. Ainda que possa haver certa controvérsia jurídica sobre adesnaturação da natureza intuitu pecuniae das sociedades por ações, diante de tais previsões, opróprio Judiciário tende a compreender a finalidade da holding e a necessidade de proteção aela, sociedade, e a seus sócios (os familiares), desde que isso não traduza em prejuízo para oscredores do sócio inadimplente. É quanto basta para se pretender junto ao Juízo da execuçãoque as ações sejam conservadas com a holding e os demais sócios, evitando o ingresso de umestranho, o credor ou o terceiro adjudicante, desde que satisfeitos seus direitos aocorrespondente valor patrimonial dos títulos adjudicados.

Proteção contra fracassos amorosos

Há um ponto delicado e desagradável que deve ser examinado: a utilidade da constituiçãode holdings familiares para fazer frente aos desafios que resultam da desagregação familiar de

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nossos dias, nomeadamente ao impressionante número de divórcios. Comumente, as opçõesafetivas constituem um grande desafio e um enorme risco para o patrimônio pessoal e familiar.Raramente as pessoas estão dispostas, enquanto estão apaixonadas ou enamoradas, e ajustamum futuro em comum, a aceitar a simples possibilidade de que alguns enredos desagradáveisvenham a dar cabo de seus sonhos de felicidade. Contudo, esses desfechos desagradáveis sãocomuns e, assim, devem compor o exame frio que o operador jurídico faz da realidade: estásempre presente o risco de o casal vir, um dia, mais cedo ou mais tarde, a se desentender e,assim, terminar num processo litigioso de separação, onde o ódio substitui o amor e o desejo devingança empurra as partes para um perde/ganha que é, na maioria das vezes, terrível paraaquele que tem mais posses.

Como se só não bastasse, ainda é preciso enfrentar um assunto ainda mais e, ainda assim,muito comum: o oportunismo daqueles que investem sobre herdeiros ingênuos e ingênuas,fazendo, à larga, juras de amor, enquanto mantêm seus olhos fixos no baú que, acreditam, lhesdará vida confortável sem esforço. O golpe é antiquíssimo mas, lamentavelmente, ainda emvoga. O pai ou mãe que, do alto de seus anos de vida e de sua experiência, percebe o engodoem que se deixa cair seu filho ou filha terá, uma vez mais, na constituição de uma holdingfamiliar, uma alternativa para evitar que ao naufrágio sentimental de seu filho ou filhacorresponda um proporcional naufrágio econômico que, mais do que a ele, vitime a família e opatrimônio familiar.

As soluções para o combate desse fenômeno são múltiplas. Como se verá no Capítulo 5,sobre o planejamento sucessório, é possível, no ato de constituição da holding, fazer doação dequotas ou ações gravadas com a cláusula de incomunicabilidade, evitando sejam alvo de umapartilha resultante de uma separação ou divórcio, ou, ainda mais amplo, gravar os títulos com acláusula de inalienabilidade que, na forma do artigo 1.911 do Código Civil, implicaimpenhorabilidade e incomunicabilidade. A matéria será desenvolvida naquele Capítulo, masimporta antecipar que, se a participação doada compõe a legítima, ou seja, se compõe o mínimoa que o herdeiro tem direito (sua proporção em 50% do patrimônio do autor da herança), serápreciso atender à limitação do artigo 1.848 do Código Civil: a clausulação deverá estarfundamentada, demonstrando haver causa justa para impedir a alienação, penhora oucomunicação patrimonial. Cria-se, assim, uma situação constrangedora e, ademais, passível dediscussão judicial.

Para além dessa situação clássica, se a holding é constituída sob a forma de sociedadecontratual, ainda que limitada, o próprio Código Civil, em seu artigo 1.027, impede o cônjugeou convivente (sociedade de fato) de exigir desde logo a sua parte em face da separação. Terá quepedir a liquidação das quotas, o que permite aos demais sócios (membros da família) entregar-lhe dinheiro e não participação societária, sendo que o(a) sócio(a) ex-cônjuge perderá um nacode sua participação: aquilo que a sociedade ou os demais sócios indenizaram ao seu meeiro seráretirado de sua parte e transferido para a parte dos demais.

Nas sociedades por ações, não há essa limitação posta na lei. O caminho para a proteçãodos interesses familiares é colocar a limitação no estatuto social: prever que o ingresso dequalquer sócio depende da anuência unânime dos demais e que, diante da recusa, aquele queadquiriu as ações em virtude de penhora/leilão/adjudicação, separação judicial ou herança,terá o direito ao reembolso de seu valor, calculado nos moldes previstos na Lei 6.404/76. Dessamaneira, embora não se possa impedir que o ex-cônjuge (casamento) ou ex-convivente(sociedade de fato ou união de fato) tenha uma vantagem patrimonial com a separação, impede-

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se que ele ingresse na holding (e, assim, no bloco de controle das sociedades operacionais) ouque obtenha participação societária proporcional, enfraquecendo a holding.

Desenvolvimento de negócios

A opção pela constituição de uma holding não é estratégia que se preste apenas para contero patrimônio familiar, conservando-o. Também serve à própria condução otimizada dosnegócios, constituindo-se num valioso instrumento que, conforme o interesse de seus sócios,pode funcionar para a expansão, concentração, diversificação etc., como já insinuado emmomentos anteriores deste livro. Em suma, a holding familiar deve ser encarada como uminstrumento jurídico que serve a uma estratégia empresarial. E, a partir da definição dessaestratégia, sua execução pressuporá, uma vez mais, o recurso a outros mecanismos e institutosjurídicos, sempre no esforço de alcançar vantagens duradouras e seguras para osempreendimentos e investimentos.

Para arrematar este capítulo, importa destacar as possibilidades desse aspecto do tema.Com a constituição da holding familiar, cria-se um núcleo patrimonial e organizacional, umcentro de poder personalizado (uma pessoa jurídica) que, mantendo uma coerência própria,poderá buscar vantagens econômicas lícitas em âmbitos diversos, conforme se apresentem asoportunidades, no mesmo setor ou em outro, na mesma região ou em outra, mantendo acondição de controlador ou aceitando a mera participação. Serve, até mesmo, para aconcretização de uma engenharia de riscos, criando uma instância distanciada entre algumasoperações e o patrimônio investidor. E isso de forma lícita, sem que seja necessário desrespeitarnormas ou princípios jurídicos, embora haja, sim, quem se arrisque a arquitetar estruturaçõescorporativas com motivos ilícitos e/ou desonestos, abusando das possibilidades jurídicaslegítimas. Contudo, o abuso no exercício de uma faculdade jurídica é ato ilícito, define o artigo187 do Código Civil, podendo mesmo caracterizar ilícito penal, ou seja, crime. A tecnologiajurídica não deve servir à prática de atos ilícitos, nem de atos que tenham por fim fraudar a lei.

Portanto, mais do que simplesmente manter a participação societária na(s) empresa(s)controlada(s), ou seja, na(s) sociedade(s) operacional(is), é possível, por exemplo, adquirirparticipações societárias em sociedades que são consideradas estratégicas para os planospresentes ou futuros do núcleo familiar. Não há um conteúdo exclusivo. Pelo contrário,operações diversas como grupar sociedades (fusão ou incorporação) ou desagrupar atividadesem sociedades diversas (cisão) estão colocadas à disposição para que sejam tomadas conformeas circunstâncias que se apresentem. As balizas para a eleição, entre os múltiplos caminhospossíveis, são a necessidade e as oportunidades que se revelem ao olhar atento e hábil dosatores econômicos. Essas balizas podem recomendar a mera conservação do patrimônio, dasparticipações societárias e das atividades negociais, ou a busca de aquisições. A holding permitea conservação de uma unidade entre os investidores (seus sócios), mesmo quando se faznecessário segmentar mercados, unidade essa que se mantém quando, em oposição, é precisoconcentrar em determinado nicho, fugindo dos riscos e ameaças.

O Direito serve a tais movimentos. Um exemplo claro é a decisão pela expansão geográfica,que pode ocorrer pela simples abertura de filiais ou pela constituição de outras sociedadescontroladas. Em outros casos, dependendo do perfil da empresa, a constituição de umasociedade franqueadora e a franquia de estabelecimentos empresariais para terceiros pode seapresentar como a melhor alternativa.5 O mesmo pode ocorrer quando a opção é pela expansão

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no portfolio de bens ou serviços negociados ou, em sentido reverso, na especialização em um oualguns bens ou serviços, permitindo mesmo a alienação para outrem de unidades produtivasautônomas: unidades produtivas (maquinário e instrumental de linha de produção),estabelecimentos ou conjunto de estabelecimentos (trespasse),6 alienação de participaçãosocietária etc. A preservação do núcleo representado pela holding, ademais, permite mesmonegócios com terceiros que se concretizarão exclusivamente nas sociedades operacionais, desdea fusão societária, até o estabelecimento de consórcios (joint ventures) para aproveitamento desinergias, exploração de certo empreendimento, compartilhamento de vantagens empresariais(goodwill of trade) diversas: clientela, logística, tecnologia, investimentos em publicidade epromoção etc.

Offshore company

Em sentido próprio, a expressão offshore company, ou simplesmente offshore, traduz umasociedade que seja constituída no exterior. Muitos especialistas recorrem a esses entes para oplanejamento societário e patrimonial, no que, a rigor, não há nada de ilícito. Não há lei quevede a constituição de sociedade no exterior, desde que seja feito para fins lícitos, respeitada alegislação brasileira. Em muitos casos, essas pessoas jurídicas são vitais para captação definanciamentos externos, realização de negócios internacionais etc. Prova-o o fato de muitasempresas estatais terem, em sua estrutura societária, controladas no exterior, a exemplo doBanco do Brasil Cayman’s ou da Petrobras International Finance Company – PIFCO, também comsede nas Ilhas Cayman.

No entanto, é preciso cuidado quando a criação dessas sociedades estrangeiras tem porfinalidade fraudar as leis brasileiras. Em muitos casos, as sociedades são constituídas emdeterminadas localidades cujo regime fiscal é mais benéfico (ditos paraísos fiscais), tendo porfinalidade controlar ou participar das atividades negociais no Brasil, para além de mecanismosde proteção à identidade de investidores, incluindo titulares de contas bancárias, quotas emfundos de investimento e, até, sócios e administradores de sociedades negociais. Se não háobjetivos ilícitos, dependendo da configuração do planejamento societário, a constituição deoffshore companies é apenas mais uma estratégia colocada à disposição do especialista para amelhor arquitetura para o patrimônio e as atividades negociais submetidas à sua análise.

Por fim, é preciso ter atenção para o fato de que, apesar de se realizarem no exterior, essasoperações, quando usam patrimônio situado no Brasil, designadamente para a integralização decapital, devem respeitar também a lei brasileira. Assim, o desrespeito a essas regras, incluindo oque diz respeito às regras protetivas à meação de cônjuges ou ao direito de herdeirosnecessários à legítima, poderá dar azo a contestações judiciais. Neste sentido, trazemos um casopara ilustração: Alatna Participações Ltda., julgado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo.

Caso para ilustração

Alatna Participações Ltda.

Vera Lúcia ingressou com uma ação contra seu ex-marido, Fernando, e contra Alatna Participações Ltda., sociedade da qual ambos eram sócios,além de Anniston Investors Limited, Sequóia Trading Group e Harmony Private Foudation. Pediu a anulação de diversos atos jurídicos que forampraticados com o objetivo, alegou, de subtrair bens que lhe pertenceriam por meação. Disse que praticou muitos desses atos por ter sido vítima dedolo, ou seja, por ter sido induzida a erro. De abertura, obteve do juiz a antecipação de tutela para sustar o aumento do capital social da sociedade-ré, de R$ 100,00 para R$ 5.595.77,50, além do bloqueio nas matrículas dos bens imóveis que seriam utilizados na realização do capital social. O ex-

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marido agravou, alegando não ter havido nem dolo, nem erro, nem prejuízo ao patrimônio da autora. Pelo contrário, assessorados por especialistas,ambos decidiram criar uma holding familiar para o abrigo de recursos amealhados durante o casamento, bens estes transferidos para um trust, aHarmony Private Foudation, por intermédio da sociedade Alatna Participações Ltda. Então, foram criadas duas sociedades offshores, as quaisreceberam quotas da Alatna e as transmitiram à fundação Harmony, que continua sob a titularidade das partes. Em face desses fatos, argumentou, aautora continuaria na administração do patrimônio comum, de modo indireto, não sofrendo prejuízo, certo que a prática de atos de disposiçãodependa de sua autorização.

O Tribunal de Justiça de São Paulo, por sua Sexta Câmara de Direito Privado, conheceu da controvérsia por meio do Agravo de Instrumento472.959-4/9-00, mas não alterou a decisão concessiva da antecipação de tutela. Segundo o relator, Desembargador Encinas Manfre, “Como, àprimeira vista, a meação dela nos imóveis motivo de integralização de capital social da Alatna não correspondeu à da divisão de quotas dessaempresa – a agravada ficara com apenas uma, ao passo que ao agravante couberam 5.595.576 –, o MM. Juiz a quo não afastou a hipótese de se terverificado subtração de bens passíveis de compor a meação dela. Sua Excelência, nesse passo, ainda, expressou acerca de sucessivas constituições,alterações e cessões de ações a empresas situadas em regiões consideradas suspeitas, não bastasse se aproximar o divórcio das partes, tudo com apossibilidade de direitos de terceiros de boa-fé e da ora agravada serem atingidos de modo inafastável. Enfim, em síntese, a autora, assim, alega tersido induzida pelo marido, o agravante, a destinar bens do casal para integralização de capital da empresa sem que a ela se reservasse o número dequotas ao qual teria direito na respectiva composição societária”.

Também a Alatna Participações Ltda. agravou da decisão concessiva da antecipação de tutela. Mas os seus argumentos foram similares aos deFernando e, assim, houve decisão parelha, proferida pela mesma Sexta Câmara de Direito Privado, julgando o Agravo de Instrumento 473.929-4/0-00.

Registre-se, ademais, o julgamento do Agravo de Instrumento 493.776-4/7-00, reconhecendo aquela Câmara que o valor da causa deveriacorresponder não a R$ 5.595.577,00, total do patrimônio objeto da controvérsia, mas R$ 2.797.788,50, ou seja, metade daquele montante, já queesse seria o benefício buscado pela autora: a sua meação.

1 OLIVEIRA, Djalma de Pinho Rebouças de. Holding, administração corporativa e unidade estratégicade negócio: uma abordagem prática. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010. p. 19-20.2 OLIVEIRA, Djalma de Pinho Rebouças de. Holding, administração corporativa e unidade estratégicade negócio: uma abordagem prática. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010. p. 18.3 Conferir MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: empresa e atuação empresarial. 4. ed.São Paulo: Atlas, 2010. v. 1, capítulo 3 (Princípios gerais do Direito Empresarial).4 Conferir MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: direito societário: sociedades simplese empresárias. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010. v. 2.5 Sobre o tema, conferir MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: empresa e atuaçãoempresarial. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010. v. 1, capítulo 16 (Franquia empresarial).6 Sobre o tema, conferir MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: empresa e atuaçãoempresarial. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010. v. 1, capítulo 11, seção 5 (Trespasse).

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Planejamento sucessório e tributário

O desafio da sucessão

Não considerar, permanentemente, a necessidade de sucessão na titularidade da empresa oudos títulos societários (quotas ou ações), bem como da administração societária, é um errocomum nas corporações e que cobra um preço alto das empresas. Com efeito, quando fatoresimprevistos criam a necessidade de substituição do administrador empresarial, forma-se umasituação potencialmente crítica: a sucessão é inevitável, mas aquele que assumirá a gestão daempresa estará diante de um cenário que lhe é absolutamente estranho. O novo responsável pelacondução da atividade negocial terá que rapidamente tomar pé de toda a estrutura empresarial,das pessoas envolvidas, da cultura interna de trabalho, clientes, logística etc.

O grande número de empresas familiares existentes no país, das menores (microempresas) agrandes grupos econômicos, deixa claro os riscos, para as organizações produtivas, de processosnão planejados de sucessão empresarial. Não é só. Do outro lado, a própria empresaexperimentará o tranco dessa alteração, o baque da substituição abrupta na gestão de suasatividades, o que habitualmente tem efeitos terríveis sobre a organização. São incontáveis os casosde negócios que eram vantajosos até a morte do responsável pelo comando das atividades e, apartir da sucessão, começaram a definhar. Em alguns casos, vê-se claramente que a empresaingressou na crise já a partir da sucessão não planejada: o caos é concomitante à substituição.Justamente por isso, a Ciência da Administração de Empresas dedica redobrada atenção para otema, sendo voz corrente a recomendação de que as organizações estejam sempre preparadaspara a sucessão de comando. A sucessão é um dos pontos mais críticos na história das empresas.Perde-se, assim, todo o trabalho de uma vida, quando não o trabalho de algumas gerações.

Uma das características das atividades negociais é a expectativa de continuidade que lhes éinerente. É usual que as sociedades sejam constituídas com prazo indeterminado de duração, ouseja, que sua instituição se faça sobre a presunção de que se prolongarão no tempo. Só algumassociedades de propósito específico (SPE) são constituídas com um horizonte determinado para oencerramento de suas atividades; são sociedades constituídas com o objetivo de personificar

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consórcios empresariais (joint ventures) que se ocupam de empreitadas específicas, como aconstrução de uma usina hidroelétrica ou coisa parecida.

Diretamente vinculado à ideia de perpetuidade está o princípio contábil da continuidade. Essabaliza, que orienta o trabalho de todos os contadores, assim como dos auditores e consultores,compreende a escrituração contábil como sendo um relato das variações patrimoniais de um ente(a sociedade empresária) cujo funcionamento, pressupõe-se (e deve-se pressupor, é bom frisar),irá se prolongar no tempo. Assim, é uma função da contabilidade oferecer informações uniformessobre a evolução de atividades negociais da empresa.1 Diante da expectativa de perpetuidade, afalta de uma reserva técnica de líderes/gestores constitui um risco extremado para a organização,em níveis próximos ao da irresponsabilidade.

O problema é maior em empresas familiares. A falta de uma perspectiva permanente desucessão está na raiz de crises reiteradamente enfrentadas por atividades negociais familiares, demicroempresas a grandes grupos, em boa medida por legar para os parentes, logo após o terrívelevento da morte, a função de definir a substituição no comando da empresa. Na maioria dasvezes, esse equívoco tem uma origem bizarra: a expectativa que todos nós temos de que apenascom a velhice mais longeva esse problema acometerá a corporação. Mas o tempo é o senhor darazão, não o contrário. O tempo, ele sim, decide o momento de todos os eventos na vida e oadministrador empresarial responsável não é aquele que pretende ditar o momento em que osfatos irão se passar, sejam bons ou ruins, mas aquele que prepara a corporação para enfrentarfatos possíveis ou certos que poderão se dar a qualquer momento.

Trabalhar com a ideia da própria morte não é agradável. Ainda assim, a história está repletade exemplos de homens e de mulheres especiais, cujo caráter altivo e vencedor não se fezperceber apenas pelo que construíram em vida, mas pela capacidade de constituir um legado: suapresença e sua excelência se fizeram sentir por muitos anos, por vezes décadas ou séculos, após asua morte. Há algo de comum entre esses homens e mulheres: eles não recusaram encarar a ideiade seu fim, mas assumiram-na e conviveram com ela. Por um lado, a certeza de um limite paraseus dias lhes ofereceu uma medida e, assim, assinalou as demandas e, eventualmente, a urgênciacom que deveriam estruturar seus planos e concretizá-los, incluindo seu direito de usufruir asvantagens decorrentes de suas vitórias. Por outro lado, a consideração do próprio fim, mesmoquando não se tem a mínima ideia de quando isso acontecerá, é uma vantagem incontestável paraaqueles que se preocupam com a preservação de seu trabalho. A verdade nua e crua é simples:com a morte, os bens são transferidos para os herdeiros. Essa transferência habitualmente se fazsem qualquer planejamento, do que pode resultar uma desordem que cobra o seu preço.

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Não se pode deixar de considerar o custo elevado da ausência de um plano sucessório e,mesmo, da preparação de pessoas para que venham eventualmente a ocupar a administraçãosocietária a bem da proteção dos interesses familiares. Em outras palavras, repetindo o que jáfaziam os nossos antepassados, há séculos é preciso formar sucessores. Corajosamente, éindispensável preparar a família para a sucessão, ainda que isso implique trabalhar com a ideia daprópria morte. É o que sempre fizeram, ao longo da história da humanidade, os grandes homens emulheres que, assim, protegeram suas famílias, suas comunidades, suas empresas e, em algunscasos, seu povo e seu Estado. A lista de exemplos é larga.

Nunca é demais recordar que os efeitos dessa imprecisão, nas empresas familiares, serãosentidos por entes queridos. A empresa familiar é patrimônio da família. O despreparo de umaorganização para a sucessão pode constituir um legado maldito que se deixa para esses entesqueridos, retirando-os do conforto em que viviam e remetendo-os para um tempo de agruras. Opior é que, na esmagadora maioria dos casos, não se tem apenas uma empresa familiar, decontrole familiar, mas uma empresa de administração familiar. A formação dos sucessores, nessesambientes, é um processo mais longo e para o qual se deve ter redobrada atenção para evitar quese verifiquem impactos negativos junto à clientela, fornecedores, bem como junto ao corpo defuncionários, resultado de uma completa ausência de vias de comunicação preexistentes.

São incontáveis os casos de empresas familiares que não se recuperaram do baque de umapassagem abrupta entre gerações, indo à falência ou enfrentando crises que se solucionaram coma alienação do negócio para outros, deixando a família em dificuldades. Noutros casos, embora aempresa consiga sobreviver à sucessão improvisada, o processo improvisado cobra um preçoelevado, impedindo o empreendimento de seguir o ritmo anterior de ascensão: apesar de osucessor despreparado revelar uma surpreendente capacidade de gestão, há um gasto de tempo eum volume de erros no processo necessário para entender as rotinas de produção eadministração, inteirar-se da logística de funcionamento, reconstituir os canais de comunicação,restabelecer as relações internas e externas etc.

Nesses casos, assiste-se a uma situação muito próxima à de uma loteria. A preservação e odesenvolvimento da empresa seguirão a reboque da capacidade de superação daqueles que seviram jogados inesperadamente em seu comando e na sua capacidade de surpreender naqualidade de sucessores. Não raro, essa substituição improvisada exibe-se como uma ascensãoprematura de um jovem profissional para funções para as quais não foi formado/preparado,ampliando a probabilidade de que incida em erros reiterados e constantes. Isso é um risco nãoapenas para a empresa, mas igualmente para a própria carreira daquele que, sem o devidopreparo, vê-se colocado em postos de liderança ou cargos elevados de gestão.

Herança e testamento

Em linhas gerais, com a morte abre-se a sucessão, ou seja, a herança se transmiteimediatamente aos herdeiros legítimos e testamentários (artigo 1.784 do Código Civil). Asucessão para os chamados herdeiros legítimos dá-se por força de lei, ao passo que a sucessãopara os herdeiros testamentários faz-se por disposição de última vontade. Se a pessoa morre semque haja testamento, ou há problemas neste, a herança se transmite aos herdeiros legítimos, que adividirão proporcionalmente, segundo as regras do Código Civil. Chama-se isso de sucessãointestada ou sucessão legítima, ou seja, sucessão de quem não deixou testamento (sucessão abintestado). São herdeiros necessários os descendentes, os ascendentes e o cônjuge, a elespertencendo, de pleno direito, a metade dos bens da herança, o que é chamado de a legítima

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(artigos 1.845 e 1.846 do Código Civil). Quando entre os bens há uma ou mais empresas, odesafio será (1) sua administração durante o inventário, já que os atos de gestão estarão afeitosao processo de inventário, e (2) eventual disputa entre os herdeiros por suas partes nopatrimônio, ou seja, por seus quinhões. Note que, com a divisão dos bens, há uma divisão daparticipação societária na(s) empresa(s). Se a família detinha 60% das quotas ou ações, quatroherdeiros irão deter, cada um, 15%, o que pode levar a um enfraquecimento do poder decontrole. Há, ademais, o risco de que os herdeiros se engalfinhem numa disputa pelaadministração societária.

Em oposição, há a chamada sucessão testamentária, ou seja, a sucessão que segue asdisposições de última vontade do falecido, expressadas por meio de um testamento. O poder detestar, contudo, não é irrestrito. Entre outras limitações, se há herdeiros necessários, o testador sópoderá dispor da metade da herança (artigo 1.789). Por exemplo, se uma pessoa tem apenas doisherdeiros (dois filhos), será preciso garantir-lhes 50% da herança, o que nos conduz a 25% paracada um. No entanto, os outros 50% podem ser objeto de disposição de última vontade, por meiode testamento. É preciso realçar que tais afirmações estão feitas nos limites que interessam àpresente análise e, para tanto, são rasas. Não levam em conta, por exemplo, o direito que ocônjuge ou convivente possa ter a parte dos bens.

Note que os ascendentes só têm direito à herança se não há descendentes. Se há, não herdam.O mesmo não ocorre com o cônjuge. Mesmo havendo descendente, ele(a) terá direito a participarda herança, salvo (1) se casado(a) com o(a) falecido(a), no regime da comunhão universal debens; (2) se casado(a) com o(a) falecido(a) no regime da separação obrigatória de bens (artigo1.640, parágrafo único, do Código Civil); (3) se casado(a) no regime da comunhão parcial, o(a)falecido(a) não houver deixado bens particulares; (4) se estavam separados judicialmente, aotempo da morte; ou (5) se estavam separados de fato, há mais de dois anos, ao tempo da morte,salvo prova, neste caso, de que essa convivência se tornara impossível sem culpa do sobrevivente.

É possível atribuir, por meio de testamento, determinados bens para cada herdeiro, mesmo se, em face dessa distribuição, um herdeiroreceber mais do que o outro, desde que respeitada a legítima.

A existência da legítima, contudo, não afasta o direito de livre indicação dos bens que irãocompor a parte de cada herdeiro, desde que respeitados os limites legais. Se o patrimônio dotestador é de R$ 1.000.000,00 e há quatro herdeiros necessários, R$ 500.000,00 comporão alegítima, ou seja, cada herdeiro necessário terá direito legal a R$ 125.000,00. Os outros R$500.000,00 podem ser livremente dispostos. Isso quer dizer que, respeitando o valor da legítima,o testador pode distribuir livremente os bens entre os herdeiros (e, mesmo, para um terceiro). Odireito à legítima limita-se ao valor, não alcançando o direito de preferir certo bem e/ou não

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2.1

aceitar outro(s). É possível deixar um imóvel rural para um herdeiro, quotas ou ações para outro,depósitos bancários para outro etc. Essa distribuição será válida mesmo se as partes (os quinhões)não forem absolutamente iguais, desde que se garanta, a todos, a legítima. No exemplo acima,isso quer dizer que todos devem receber bens que, no mínimo, totalizem R$ 125.000,00. Aliás,nada impede que um receba bem(ns) no valor de R$ 125.000,00 e outro bem(ns) no valor de R$500.000,00. Aliás, três podem receber apenas R$ 125.000,00 e o outro receber R$ 625.000,00, ouseja, sua parte na legítima e a totalidade da parte testável. É o que se apura do artigo 1.849 doCódigo Civil.

Essa licença foi utilizada, durante décadas, para dar lastro a uma postura hoje inaceitável.Comerciantes e industriais deixavam suas empresas para os filhos, ao passo que, para suas filhas,deixavam bens de raiz, ou seja, imóveis, acreditando que não teriam capacidade para tocar osnegócios. Sem que pudessem se opor a essa divisão, as filhas acabavam sendo vítimas do fato deque seu quinhão não tinha a mesma capacidade de gerar riquezas que o quinhão atribuído aseu(s) irmão(s). A prática não se justifica mais. Ademais, a possibilidade de constituição de umaholding familiar, nos moldes estudados no Capítulo 4, permite acomodar todos os herdeiros numamesma sociedade, todos em igualdade de condições, deixando as funções de administraçãoempresarial para aqueles que revelem essa qualidade.

De qualquer sorte, o testamento foi o caminho habitualmente utilizado para evitar conflitosentre herdeiros; o testador fazia a prévia distribuição dos bens e, com a sua morte, não haviaespaço para a discussão sobre o mérito desse ato, salvo se presentes nulidades ou anulabilidadesque, no entanto, fogem ao objeto deste livro. Contudo, o testamento permite apenas a divisãoantecipada dos bens, incluindo participações societárias, respeitando o direito de cada herdeiro àsua parte legítima sobre o patrimônio. Não resolve o problema da empresa ou empresas, namedida em que não permite definir uma distribuição de funções no âmbito das unidadesprodutivas. E se essa distribuição deixou a dois ou mais herdeiros participações na sociedade,mantém-se grande a chance de que a abertura da sucessão seja seguida por uma disputa porpoder pelos negócios. Como se só não bastasse, a divisão, entre dois ou mais herdeiros, daparticipação societária pode conduzir a uma fragmentação das quotas ou ações e, com ela, àperda do poder de controle que a família mantinha sobre o negócio.

Sucessão premeditada

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Há empresas, sim, que se preparam cuidadosamente para a sucessão de comando, mesmocorporações familiares. Em contraste com os riscos e desafios enfrentados por empresas que nãodispõem de mecanismos confiáveis para a sucessão, verificam-se diversos casos nos quais as novasgerações foram levadas, no tempo adequado, para experimentar a organização empresarialfamiliar, ocupando postos em sua estrutura funcional, sendo preparadas para a sucessão. Noutros,os herdeiros foram preparados, não para a administração/gerência dos negócios, mas paraassumir a condição de sócios conscientes e ativos que, assim, podem se beneficiar, comresponsabilidade, da atuação de administradores profissionais que se encarregam do dia a dia doempreendimento. Não se pode descartar, ainda, a possibilidade de se arquitetar uma situaçãomista, na qual sejam combinados quadros familiares e quadros profissionais, o que pode terexcelentes resultados para todos.

A sucessão premeditada não causa surpresas; pode ser preparada e executada com redobradacautela. Pode até ser testada, experimentada, escolhendo, não apenas a pessoa certa, mas omomento adequado, quando a empresa vive um momento mais tranquilo, evitando que eventosimponderáveis decidam o instante necessário. Permite, ademais, recorrer a rotinas de preparação,como admitir os pretendentes na organização e submeter-lhes a um rodízio de funções (jobrotation), fazendo com que conheçam o negócio por diversas perspectivas à medida que alteramcargos e funções na organização. Mais do que isso, sucessão monitorada, que permiteacompanhamento dos novos gestores por seus antecessores e, até, a retomada da administraçãopelos antigos responsáveis, quando se faça necessário para a preservação da atividade negocial,diante dos fatos que tenham se verificado.

O pior é verificar o amplo leque de efeitos negativos que podem decorrer de uma escolhaequivocada. O despreparo, o desinteresse, a incapacidade técnica, entre outros vícios do gestor,contaminam a empresa, espantam valores técnicos, atentam contra o compromisso profissionaldos colaboradores (a exemplo dos empregados). Cunha-se, assim, um estado de desalentocorporativo que comumente resulta em crise econômica, perda de mercado, problemas financeirosetc. Esse cenário é suficientemente assustador para justificar a institucionalização de mecanismossucessórios que contribuam para a preservação da empresa.

No entanto, ainda que se planeje realizar a sucessão em vida, a simples possibilidade de osfatos anteciparem a necessidade de substituição do administrador societário recomenda edificarsoluções jurídicas para o desafio. Observe-se que não se encontram soluções para esse desafio noDireito de Família ou no Direito Sucessório (que cuida da sucessão hereditária). Embora taisdisciplinas cuidem das relações que entre si mantêm os familiares e os herdeiros, até que seinventarie o patrimônio do falecido, não oferecem soluções prontas e seguras para o desafioexperimentado pelas empresas diante da morte de seu administrador.

Ainda fora do âmbito jurídico, é preciso realçar a importância de se dar preparação técnicaadequada àquele que se escolheu ou, melhor ainda, àqueles que estão sendo avaliados para umaescolha futura. Essencialmente, administradores qualificados tendem a exibir um leque maior decompetências para o desempenho de suas funções, a exemplo de questões elementares comocapacidade de delegar funções, desenhar estratégias, fixar metas, monitorar resultados, gerirfinanças e, ademais, usar instrumentos modernos de administração empresarial.

Uma ferramenta moderna para tanto, muito repetida em nossos dias, é o recurso ao coaching,ou seja, a um treinador pessoal, um especialista em administração de empresas que realiza umaquase terapia profissional, buscando preparar e/ou readequar a pessoa para o exercício dasfunções, mormente quando deve atender a novas demandas. Tem-se, assim, um processopedagógico individual que muito lembra a atuação remunerada dos sofistas gregos,

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designadamente no século V a.C., tendo merecido a crítica daqueles que compreendiam a filosofiacomo uma atividade para iniciados, bem como daqueles que resistiam a essa intervenção porafastar-se da Paideia (paideiα) clássica.

O coach trabalha individualmente com a pessoa, procurando desenvolver habilidades ecompetências para o exercício de suas funções, incluindo a busca pela constituição de uma basepsicoemocional à altura das demandas, bem como virtudes técnicas (que muito lembram a Arete− aretε − sofistica), como a capacidade de avaliação, de crítica, de diálogo, de decisão, bemcomo prepará-la para situações específicas, como ambientes de alta competitividade, crisesfinanceiras e/ou mercadológicas etc.

Para além dessas questões que são mais próprias da ciência da administração e que apenasnarramos, importará trabalhar os instrumentos do Direito Empresarial – nomeadamente doDireito Societário – que servirão ao profissional que assessora famílias empresárias. É possívelcombinar instrumentos societários com os institutos do Direito de Família para assim estruturarcondições adequadas para a manutenção da riqueza empresarial, apesar da sucessão, no tempo,de seus titulares. Noutras palavras, a substituição no comando dos negócios, sem o prejuízo daorganização empresarial, pode ser planejada por meio de mecanismos jurídicos.

Holding na sucessão hereditária

O chefe de família desempenha um importante papel social. Por um lado, dele se esperaatenção e respeito a todos os seus filhos, dando-lhe tratamento igualitário, ainda que lhe sejapossível, nos limites da lei (50% do patrimônio, segundo o artigo), dispor livremente de seupatrimônio. O costume entre as famílias, contudo, é permitir a distribuição de partes iguais entreos herdeiros, sem preferir uns e preterir outros. No entanto, a existência de personalidades, perfise vocações diversas pode recomendar que essa distribuição se faça de uma maneira mais refinada,compreendendo as necessidades e as potencialidades de cada herdeiro, bem como da própriaempresa ou grupo empresarial, cujas existência e atuação repercutem em trabalhadores,fornecedores, consumidores e na comunidade em geral. Infelizmente, os mecanismos ordináriosdo Direito Sucessório não abrem margem para que se prepare uma sucessão qualitativa, paraalém da prévia distribuição de certos bens para certas pessoas. Uma compreensão dasnecessidades e potencialidades, refletindo-se num desenho organográfico prévio e, a partir dele,numa atribuição de funções, não encontra alicerce nas regras sobre inventários, testamentos etc.Mas a combinação do Direito Sucessório com o Direito Societário pode, sim, oferecer umaalternativa mais profícua para o planejamento futuro da família e da corporação empresarial.

Mesmo quando não se está diante dos riscos de disputas entre os herdeiros ou de umapossível incapacidade para gerir eficazmente o patrimônio e os negócios da família, o eventomorte, por si só, oferece incontáveis desafios que podem ser, senão evitados, simplificados quandoa família recorre a um planejamento prévio. Não se pode esquecer que a morte lança os herdeirose o patrimônio familiar nas teias burocráticas dos procedimentos de inventário, os quais, por maiscompetentes que sejam os advogados, podem ser desenrolar por um longo período. Some-se aincidência de tributos que, infelizmente, podem se elevar quando as pessoas agem de formaimprovisada. Em muitos casos, a falta de planejamento faz com que sejam praticados diferentesatos, muitos deles considerados hipóteses de incidência tributária, o que conduz à obrigação depagar mais e mais tributos quando, em oposição, o planejamento pode definir, de forma lícita elegítima, caminhos com menor oneração fiscal.

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A constituição da holding, em oposição, viabiliza a antecipação de todo esse procedimento epode, mesmo, evitar o estabelecimento de disputas, na medida em que permite que o processo desucessão à frente da(s) empresa(s) seja conduzido pelo próprio empresário ou empresária, na suacondição de chefe e orientador da família, além de responsável direto pela atividade negocial. Issopermite que uma nova administração empresarial seja ensaiada e implementada, com apossibilidade, inclusive, de se perceber, em vida, que alguém de quem se esperava capacidadegerencial não a tem. Quando esse trabalho é bem conduzido, a nova estrutura organizacionalassenta-se enquanto está viva a geração anterior. A morte causa apenas danos sentimentais e nãodanos patrimoniais. Já está definido que todos os herdeiros são sócios da holding e, assim,participam dos lucros da(s) empresa(s), assim como já está definida a administração dasatividades negociais, por herdeiros ou administração profissional, nos moldes estudados noCapítulo 4.

Alguns instrumentos jurídicos podem ser utilizados para tanto. O primeiro deles, obviamente,é a constituição da sociedade holding, constituição essa que se fará nos moldes que serãoestudados nos próximos capítulos. Assim, o patrimônio da família, ou a parte eleita pelointeressado, já não mais pertencerá à pessoa natural, mas à pessoa física. A sucessão hereditária,assim, se fará não nos bens ou na empresa ou na participação societária na(s) sociedade(s)operacionais, mas na participação societária na holding. No entanto, será ainda preciso decidir sea transferência das quotas ou ações da sociedade de participação se fará antes ou após a morte. Seantes, a transferência se fará por doação, caracterizando adiantamento de legítima, ou seja,entrega antecipada da parte que caberá aos herdeiros necessários após a morte. Aliás, pode haver,mesmo, a doação da parte disponível do patrimônio. Se a preferência é a transferência após amorte, deve-se utilizar do testamento; assim, o controle da holding se mantém com osascendentes, sendo transferido para os descendentes apenas após a morte. Alternativamente, há orecurso ao usufruto: transfere-se aos herdeiros apenas a nua propriedade dos títulos societários(quotas ou ações), mantendo o(s) genitor(es) a condição de usufrutuários, ou seja, podendoexercer os direitos relativos àqueles títulos e, dessa maneira, podendo manter a administração daholding e, com ela, o controle das sociedades operacionais e demais investimentos da família.

De outra face, o planejamento sucessório ainda permite aos pais proteger o patrimônio queserá transferido aos filhos por meio de cláusulas de proteção (cláusulas restritivas). Assim, paraevitar problemas com cônjuges, basta fazer a doação das quotas e/ou ações com a cláusula deincomunibalidade e, assim, os títulos estarão excluídos da comunhão (artigo 1.668 do CódigoCivil), embora não se excluam os frutos percebidos durante o casamento (artigo 1.669); no casodos títulos societários (quotas ou ações), esses frutos são dividendos e juros sobre o capital

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próprio. Aliás, não é preciso ser explícito nas medidas de proteção do(a) herdeiro(a) em face deseu cônjuge. Pode-se simplesmente gravar os títulos com a cláusula de inalienabilidade, certo que,por força do artigo 1.911 do Código Civil, essa cláusula imposta aos bens por ato de liberalidadeimplica impenhorabilidade e incomunicabilidade. No entanto, é preciso cautela em relação àoperação quando alcance a legítima. Com efeito, por força do artigo 1.848 do Código Civil, salvose houver justa causa, declarada no testamento, não pode o testador estabelecer cláusula deinalienabilidade, impenhorabilidade e de incomunicabilidade, sobre os bens da legítima. É umlimite ao poder de disposição de última vontade, podendo criar situações desagradáveis quedevem ser calculadas quanto a seus efeitos no ambiente familiar.

Por fim, chamamos a atenção para a necessidade de atender ao artigo 979 do Código Civil,segundo o qual, além de no Registro Civil, serão arquivados e averbados, no Registro Público deEmpresas Mercantis, os pactos e declarações antenupciais do empresário, o título de doação,herança, ou legado, de bens clausulados de incomunicabilidade ou inalienabilidade. Esse é,infelizmente, um erro comum cometido por profissionais ligados ao planejamento/gestãoempresarial: advogados, contadores, administradores de empresa: olvidar-se que o registropúblico desempenha a fundamental função de tornar os atos societários eficazes em relação aterceiros. Se o ato não está registrado, não poderá ser oposto aos terceiros (cônjuges, credoresetc.).

Planejamento fiscal

É discurso corrente que a constituição de uma holding, nomeadamente da holding familiar, éuma medida que tem por mérito a obtenção de vantagens fiscais.

Em sua generalidade, essa afirmação é falsa. O resultado fiscal pode ser vantajoso ou não,conforme o caso e, principalmente, conforme a engenharia que seja proposta para a estruturasocietária. Portanto, não é correto ver a constituição de uma holding familiar como a solução paratodos os problemas e, principalmente, uma garantia de recolhimento a menor de tributos. Não éassim. É indispensável a avaliação por um especialista que, para cada situação, faça uma avaliaçãodos cenários fiscais para definir, em cada caso, qual é a situação mais vantajosa, sendo possívelque, no fim das contas, a constituição da holding se mostre desaconselhável por ser maistrabalhosa e onerosa. Isso pode decorrer, inclusive, da incidência de tributos a que a pessoanatural não está submetida, como a Cofins e o PIS.

Melhor será quando a constituição da holding familiar atenda a um esforço para oplanejamento tributário que pode alcançar a totalidade do patrimônio familiar ou parte dele,nomeadamente as sociedades operacionais que venham a ter seu controle transferido para asociedade de participações (holding). É preciso, contudo, muito cuidado, pois essa possibilidadenão se traduz em licença para transferir bens sem pagar impostos. No Brasil, essa transferência,entre vivos (inter vivos) ou causada pela morte (causa mortis), é tributada. A bem da precisão, nãohá distinção nos encargos tributários entre a doação em vida e a transferência dos mesmos bensem função da morte, haja ou não um testamento. Essa tributação é de 4% sobre o valor dos benstransferidos. No entanto, há vantagens laterais que não podem ser desconsideradas. De abertura,a simplicidade do procedimento de doação, que consome infinitamente menos tempo do que oprocesso de inventário, ainda que haja testamento e consenso entre os herdeiros.

A constituição da holding familiar se encarta numa compreensão maior dos desafios relativosao patrimônio e às atividades negociais, observando os respectivos impactos fiscais e examinando-lhes a adequação e, mais do que isso, as oportunidades existentes no sistema legal vigente. Essas

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oportunidades não são poucas. Em verdade, em muitos casos (e não em todos) a legislação fiscaloferece balizas que podem definir cenários mais ou menos onerosos, definidos a partir daconformação adotada pelo contribuinte. Essas oportunidades justificam que a opção pelaconstituição de uma holding familiar se faça acompanhar de um planejamento tributário que, deresto, pode justificar mesmo a adoção de uma estrutura societária mais complexa,multissocietária. Isso quando a criação da sociedade de participação (ou sociedade patrimonial)não tiver por mérito a adequação da família e seu patrimônio à linha adotada no planejamentotributário da(s) sociedade(s) ou grupo de sociedades controlados ou nas quais tenha participaçãosocietária relevante.

De qualquer sorte, as situações são múltiplas. Por exemplo, há impactos favoráveis diretossobre a tributação sobre aluguéis quando se tem sociedade patrimonial cujo objeto social inclua alocação de bens. O mesmo ocorre quando se contrasta a legislação tributária aplicável à pessoafísica daquela aplicável às pessoas jurídicas. A principiar pelo fato de que, para muitas situações,os mesmos fatos estão submetidos a alíquotas diversas quando o contribuinte seja uma pessoajurídica ou uma pessoa física, a exemplo da tributação de rendimentos, nomeadamente naincidência do imposto de renda sobre a vantagem auferida na venda de bens imóveis. Isso paranão falar na própria caracterização do que seja renda para efeitos de tributação. A pessoa jurídicatem a faculdade de provisionar valores, para além de formar reservas de lucros (com rubricasdiversas, como reserva de contingências) e fundos contábeis. Por essa via, sobrevalores auferidospela companhia não se tornam imediatamente disponíveis e, portanto, não se sujeitam atributação pelo imposto de renda. Some-se a faculdade de simplesmente incorporar lucros aocapital social.

Não é só. Em relação às pessoas físicas, a legislação fiscal não prevê grandes variações ouhipóteses para verificação do fato gerador, identificação de base de cálculo e, até, enquadramentona alíquota determinada para a exação. Um exemplo claro é o imposto de renda: a definição dealíquotas se faz em função do valor dos rendimentos auferidos; não há variação de alíquotas emfunção do tipo de atividade desempenhada pelo contribuinte. Em oposição, para as pessoasjurídicas, a mesma legislação tributária contempla uma gama de elementos diversos, a principiarpor uma maior variabilidade de regimes tributários. Como se só não bastasse, a legislaçãotributária contempla uma série de fatores que, de acordo com o regime tributário eleito, criamuma maior variabilidade na definição do valor final do tributo que deverá ser recolhido. Isso ésuficiente para tornar mais útil, senão recomendável, o recurso constante ao planejamentosocietário.

De qualquer sorte, não há espaço para improvisações e negligência. O Direito Tributáriotornou-se uma das disciplinas jurídicas mais dinâmicas, constantemente impactado por novasregras, legais ou regulamentares, para além de uma frenética sucessão de interpretaçõesjudiciárias que, infelizmente, podem experimentar guinadas inacreditáveis: posições já pacificadasnos Tribunais são simplesmente invertidas. Nesse sentido, o planejamento fiscal de qualquerempresa ou grupo de empresa tornou-se um processo constante, uma iniciativa continuada.Embora ainda se possam traçar balizas de médio e longo prazo, cada vez mais são necessáriasintervenções para fazer frente a mudanças imediatas, para não falar, mesmo, em possibilidadesmomentâneas, como incentivos fiscais, refinanciamentos tributários etc.

Análise fiscal

Para que se possa avaliar se há vantagens fiscais, ou não, na constituição de uma holding, o

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primeiro passo é obrigatoriamente conhecer a realidade apresentada, certo que não há fórmulaúnica, ideal, mágica, aplicável a todo e qualquer cliente.

Atenção particular deve ser dada à situação fiscal já apresentada para, então, verificar seexistem alternativas lícitas para estabelecer uma situação melhor.

É preciso compreender a realidade vivida pela empresa e seus sócios (a família) para aferir se a constituição de uma holding é umavantagem. Em muitos casos, simplesmente não é.

Em incontáveis casos, observa-se que corporações mantêm práticas fiscais equivocadas, nãoraro resultantes da má compreensão da legislação e dos regulamentos tributários que, no Brasil,constituem um emaranhado assustador de normas, editadas à rédea solta pelos órgãosfazendários. Incapaz de acompanhar a evolução dessas normas, os contribuintes vivenciam rotinasfiscais viciadas que podem, inclusive, envolver a não observação de formalidades essenciais,tornando possível uma autuação fiscal. Chega-se a encontrar contribuintes que revelamambiguidades fiscais, isto é, posturas e procedimentos tributários distintos, para as mesmashipóteses, adotados por funcionários ou setores diferentes. Essas ambiguidades precisam serlevantadas e uma solução apresentada para atingir um estágio de uniformidade fiscal. Issodemandará, inclusive, o treinamento de pessoal para a adoção de novas rotinas fiscais.

Nesse sentido, a própria constituição de uma holding pode constituir uma medida alvissareira,pois, ao centralizar a administração das diversas sociedades e as diversas unidades produtivas,como visto no Capítulo 4, assume um papel primordial de governo de toda a organização.Consequentemente, a holding pode se tornar um polo para a consolidação de posturas uniformes,definidas em conformidade com as melhores práticas tributárias, não só visando a economia norecolhimento de impostos, taxas e contribuições, mas também evitando a verificação de erros e osrespectivos prejuízos que podem causar ao caixa. Trata-se apenas de uma possibilidade. Emmuitos casos, constata-se a existência de uma política empresarial centralizada que convive compráticas descentralizadas que são diversas, senão incompatíveis, entre si. O pior é que a dispersãolegislativa tornou-se uma realidade muito forte, razão pela qual as atividades negociais,dependendo de seu objeto, podem ser submetidas a um regionalismo tributário muito forte. Issoquer dizer que a manutenção da atividade pode ser mais vantajosa em certo Estado ou Municípiodo que em outros. Em muitos casos, vantagens de tal ordem que recomendam mudar a sede deuma unidade produtiva ou, mesmo, abrir uma filial.

Por outro lado, por vezes há oportunidades tributárias que simplesmente não forampercebidas e, dessa maneira, não estão sendo aproveitadas, para não falar nos casos derecolhimento indevido de tributos e contribuições e parafiscais, para maior, permitindo oaproveitamento de créditos. Mas pode haver, igualmente, recolhimento a menor, a exigir imediataconfissão e recolhimento da diferença apurada, evitando os custos de uma autuação pelafiscalização.

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Inevitavelmente, o planejamento exige uma mudança na cultura da empresa. Desenvolvida anova proposta fiscal, torna-se indispensável que os diversos setores da(s) empresa(s) vivenciem aspráticas tributárias que foram recomendadas. Em outras palavras, será preciso que a empresa sigaas linhas mestras que foram desenhadas no projeto societário e fiscal. Mais especificamente, éindispensável que os administradores estejam comprometidos com os cenários que forampropostos pelo especialista e que sigam os parâmetros que foram traçados no plano dereestruturação.

Ao fim, cabe destacar um ponto: proposições fiscais constroem-se a partir de uma tecnologiajurídica refinada, mas altamente mutável. Como dito, há uma avalanche de normas, entre leis,decretos, regulamentos, instruções fazendárias etc. Isso implica estudo e aprimoramentoconstante, tanto dos especialistas, quanto das organizações. A solução proposta para um exercíciopode simplesmente não servir para o(s) exercício(s) fiscal(is) seguinte(s).

De qualquer sorte, o estudo sobre a viabilidade e a oportunidade de constituição de umaholding familiar pode – e deve – ser posto em âmbitos maiores, considerando suas múltiplaspossibilidades e reflexos. Dependendo do tipo de planejamento societário que se tenha elegidocomo o melhor para o patrimônio familiar e/ou para a(s) sociedade(s) ou grupo de sociedades,pode-se mesmo chegar a situações nas quais os sócios da holding familiar podem perceber seushaveres livres da incidência de tributos, uma vez que os ônus fiscais foram já suportados pelaprópria sociedade, sendo calculados não apenas em função do montante dos rendimentos, masconsiderando outros fatores, como o tipo de atividade exercida.

1 Conferir MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: empresa e atuação empresarial. 5. ed.São Paulo: Atlas, 2010. v. 1, capítulo 8 (Escrituração contábil).

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Constituição da holding familiar

Natureza e tipo societário

Como visto nos capítulos inaugurais, não corresponde à holding um tipo específico desociedade, nem uma natureza específica, observação essa que alcança as holdings familiares.Portanto, a holding familiar é caracterizada essencialmente pela sua função, pelo seu objetivo, enão pela natureza jurídica ou pelo tipo societário. Pode ser uma sociedade contratual ouestatutária, pode ser uma sociedade simples ou empresária. Ademais, pode adotar todas as formas(ou tipos) de sociedades estudadas no Capítulo 1: sociedade simples, sociedade em nomecoletivo, sociedade em comandita simples, sociedade limitada, sociedade anônima ou sociedadeem comandita por ações. Só não poderá ser um sociedade cooperativa, já que esse tipo societárioatende às características essenciais do movimento cooperativo mundial, não se compatibilizandocom a ideia de uma holding familiar.

Constitui uma decisão importante a eleição da natureza jurídica que se atribuirá à sociedade,bem como o respectivo tipo societário. Importante por que à ampla gama de alternativascorresponde um leque diverso de possibilidades. O especialista (operador jurídico, contabilista,administrador de empresa) deverá focar-se nas características da(s) atividade(s) negocial(is)titularizada(s) e, até, nas características da própria família para, assim, identificar qual é o tiposocietário que melhor se amoldará ao caso dado em concreto. Diversas questões devem serpesadas. Um exemplo claro é a eventual existência de atos operacionais de qualquer natureza,determinando riscos de prejuízos. Se a sociedade só é titular de patrimônio, material e/ouimaterial (incluindo títulos societários), não assumirá obrigações e, assim, não será indispensávelrecorrer a um tipo societário que preveja limite de responsabilidade entre as obrigações dasociedade e o patrimônio dos sócios. Em oposição, se a sociedade for assumir obrigações, havendorisco de não as suportar, melhor será adotar um tipo societário em que os sócios não tenhamresponsabilidade subsidiária pelas obrigações sociais, ou seja, a sociedade limitada ou a sociedadeanônima.

Para além dessas questões gerais, diversas questões acessórias devem ser consideradas pelo

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especialista antes de decidir entre uma natureza (simples ou empresária) e um tipo societário,designadamente as motivadoras, gerais e específicas, da constituição, conforme se apure junto aossócios, bem como as metas que sejam pretendidas. Isso justificará um exame, ainda que resumido,de cada um dos tipos societários para destacar seus méritos e deméritos, considerando a suautilidade para os fins focados.

Por ora, importa examinar a natureza que se atribuirá à sociedade, que poderá ser umasociedade simples ou empresária. Em termos práticos, não há grandes diferenças entre ambas,tanto é assim que há três tipos societários em comum: sociedade em nome coletivo, sociedade emcomandita simples e sociedade limitada. De abertura, a diferença está no registro: sociedadessimples são registradas nos Cartórios de Registro Público de Pessoas Jurídicas; sociedadesempresárias, por seu turno, nas Juntas Comerciais. A distinção não é singela, considerando que asJuntas Comerciais têm um controle mais rígido sobre os atos empresariais, atos societários e afins.A interferência dos Registradores é, habitualmente, bem menor, assim como seu poder deintervenção, ao contrário do que se passa com as Juntas, que têm órgãos deliberativos com poderpara julgamento, ainda que contra eles se possa recorrer ao Judiciário. Os registradores têm opoder de suscitar dúvidas junto ao Poder Judiciário. Aqui, também, há uma outra distinçãoimportante: muitas das discussões sobre os atos da Junta Comercial deverão ser submetidas àJustiça Federal, já que desempenham função federal delegada. Em oposição, os atos registraiscivis são discutidos na Justiça Estadual.

De outra face, quando se opta pela constituição de uma sociedade simples, ainda que sob aforma de sociedade limitada, afasta-se a aplicação da Lei 11.101/05, ou seja, afasta apossibilidade do pedido de falência, embora também afaste a viabilidade do pedido derecuperação de empresa. Assim, a sociedade estará submetida, para a hipótese de não conseguirfazer frente às suas obrigações, ao processo de insolvência, previsto no Código Civil e no Códigode Processo Civil, sendo bem distinto. Trata-se de um aspecto que deve ser levado em conta,igualmente. Para determinados perfis, melhor será sujeitar-se ao regime jurídico falimentar, queinclui a possibilidade de pedir a recuperação, judicial ou extrajudicial, da empresa. A falência éum processo de interposição mais fácil e de curso mais célere, por ser mais habitual; no entanto, opedido por inadimplemento tem alçada mínima de 40 salários-mínimos (artigo 94, I, da Lei11.101/05). Em oposição, o processo de insolvência civil é mais raro, de trâmite mais difícil ecustoso, o que pode parecer uma vantagem para alguns.

Sociedadesimples

→ Registro em Cartório de Registro Público de Pessoas Jurídicas, a quem seus atos registrais estarão submetidos.

→ Não está submetida à Lei 11.101/05: não pode pedir recuperação judicial ou extrajudicial; submete-se ao processo de insolvênciacivil (Código Civil e Código de Processo Civil).

Sociedadeempresária

→ Registro nas Juntas Comerciais; seus atos registrais estão submetidos à Junta Comercial e ao Departamento Nacional de Registro doComércio.

→ Submissão à Lei 11.101/05: pode pedir recuperação judicial ou extrajudicial; sua insolvência processa-se sob a forma de falência.

Obviamente, a opção pela natureza simples ou empresária está restrita aos três tipos comunsjá mencionados. A escolha de qualquer um dos demais tipos implica eleição de natureza jurídica.Escolhendo constituir a holding sob a forma de sociedade anônima ou sociedade em comanditapor ações, será uma sociedade empresária. Em oposição, a sociedade simples ordinária (ousociedade simples comum) é sempre uma sociedade simples. De qualquer sorte, parece-nos que aanálise de nosso tema será mais profícua se, superando a questão da natureza simples ouempresária da holding, focamos na sua natureza contratual (sociedades por quotas) ou estatutária

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(sociedades por ações), com todas as implicações daí decorrentes.

Sociedades contratuais

O Código Civil disciplina quatro tipos societários que têm por ato constitutivo um contrato: ocontrato social; daí serem chamadas de sociedades contratuais. Como visto, as sociedadescontratuais podem ser simples ou empresárias; as simples poderão assumir as seguintes formas:sociedade simples (em sentido estrito ou comum), sociedade em nome coletivo e sociedade emcomandita simples ou sociedade limitada; as sociedades empresárias contratuais poderão assumira forma de sociedade em nome coletivo, sociedade em comandita simples ou sociedade limitada.Em todos os casos, a participação de cada sócio no capital social da pessoa jurídica se faz pormeio de quotas, razão pela qual é utilizado, para além do rótulo sociedade contratual, o desociedade por quotas. A lógica do contrato marca as sociedades por quotas: há um negócio jurídicoentre os sócios, que se reconhecem na condição de partes, sendo nomeados e qualificados noinstrumento de contrato, firmando-o. A transferência da condição de sócio ou a mera alteração naparticipação no capital social implicam a alteração do instrumento de contrato social. Suascláusulas constituem obrigações recíprocas, assumidas entre os sócios e, a partir do registro dasociedade, destes para com a pessoa jurídica criada. Tem-se, assim, um elo específico entre aspartes (os sócios), que passam a estar, na forma do contratado, obrigados uns perante os outros.

As sociedades contratuais podem ser constituídas intuitu pecuniae, sem restrições à cessão de quotas, ou intuitu personae, hipótese naqual a cessão de quotas para um terceiro dependerá da aprovação pela totalidade dos demais sócios ou, nas sociedades limitadas, por75% do capital social.

A teoria que se ocupa das sociedades contratuais percebeu, há muito, que as sociedades sediferenciavam entre si em dois grandes grupos, formados a partir da consideração do foco que sedava, na sua constituição e manutenção, à identidade das pessoas de seus sócios. Com efeito, hásociedades nas quais se percebe que o fator fundamental que dá sustentação à sua existência é omútuo reconhecimento e aceitação dos sócios: estão juntas por que são aquelas pessoas e nãooutras. São sociedades constituídas primordialmente em função das pessoas (intuitu personae).Em oposição, há sociedades em que a identidade do sócio é um elemento acessório; importa adisposição em investir na atividade negocial; nesses casos, há sociedades que se constituemprimordialmente em função do capital a ser investido (intuitu pecuniae).

A regra geral das sociedades contratuais é serem constituídas intuitu personae, ao passo que aregra geral das sociedades estatutárias é a constituição intuitu pecuniae. Embora o ato constitutivo(contrato social e estatuto social) possa criar situações específicas, no seu silêncio serão aplicadasas normas legais que apontam para aquelas soluções. Assim, o artigo 1.002 do Código Civil prevêque o sócio não pode ser substituído no exercício das suas funções sem o consentimento dosdemais sócios, expresso em modificação do contrato social. Já o artigo 1.003 limita a eficácia dacessão total ou parcial de quota sem o consentimento dos demais sócios e a correspondentemodificação do contrato social. Como se só não bastasse, o artigo 1.026, não permite que asquotas da sociedade intuitu personae sejam transferidas ao credor do sócio, facultando-lhe apenasfazer recair a execução sobre o que a este couber nos lucros da sociedade, ou na parte que lhetocar em liquidação. A proteção à sociedade de pessoas também está no artigo 1.028, regulando asucessão na titularidade da quota ou quotas do sócio falecido. No alusivo especificamente àsociedade limitada, o artigo 1.057 do Código Civil prevê que o sócio tem o direito de ceder sua

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quota a estranho se não houver oposição de titulares de mais de um quarto do capital social.No entanto, a aplicação do princípio da autonomia da vontade acaba por permitir que, por

meio de cláusulas dispostas no ato constitutivo e tornadas públicas por meio do arquivamento noregistro, acabem por tornar intuitu pecuniae uma sociedade contratual ou, pelo anverso, acabempor tornar intuitu personae uma sociedade por ações. À matéria deve-se dar redobrada atenção,fazendo constar no contrato social ou no estatuto social cláusulas que protejam o caráterexcepcionalíssimo da sociedade de participação, constituída para abrigar um patrimônio familiare, assim, demandando uma proteção específica. Particular atenção se deve ter com as sociedadespor ações, nas quais não se poderá prever o direito de oposição à alienação de participaçãosocietária a terceiros, mas o direito de preferência à sua aquisição, nas mesmas condições.

Visto isto, façamos um exame dos tipos societários contratuais, tendo por referência específicaseu aproveitamento como holding familiar.

Sociedade simples comum. Como visto, o artigo 983 do Código Civil permite que a sociedadesimples se constitua pelas normas que lhe são próprias, ou seja, aplicando-se os artigos 997 a1.038 do Código Civil. Sua estrutura é muito similar à sociedade em nome coletivo, embora nãohaja limitação de sócios exclusivamente pessoas físicas. Seu registro se dá obrigatoriamente nosCartórios de Registro Público de Pessoas Jurídicas. Outra vantagem é a permissão de que aintegralização de capital se faça por meio de prestação de serviços.

Sociedade em nome coletivo. Como visto, poderá ter natureza simples ou empresária, regra quetambém se aplica às holdings. O fato de todos os sócios serem pessoas físicas, com previsão legalde atuação pessoal e limitações ao ingresso de terceiros, sem a aprovação unânime dos sócios,aproxima esse tipo societário das necessidades de uma holding familiar. No entanto, só poderá seradministrada por sócio(s): um, alguns ou todos. Não admite administração profissional, emborapossam ser contratados gerentes e outros prepostos: contadores, conselheiros financeiros,advogados etc. O grande defeito é o fato de que os sócios respondem pessoalmente, com seupatrimônio particular, pelas obrigações sociais não satisfeitas pela sociedade. No entanto, quandose trate de holding pura, habitualmente se envereda por um quadro no qual há apenas receita e asobrigações limitam-se aos tributos. Não há riscos operacionais, o que acaba por reduzir aimportância da adoção de tipos societários que prevejam limite de responsabilidade.

Nunca é demais destacar haver um preço para o limite de responsabilidade. Justamente porser necessário proteger terceiros, as regras para a sociedade limitada e a sociedade anônima sãomais rígidas, nomeadamente para temas como redução de capital social, distribuição dedividendos etc. Tais operações são simplificadas na sociedade em nome coletivo, vez que olegislador reconhece na responsabilidade subsidiária dos sócios uma forma de garantia para oscredores. A mesma lógica sustenta o fato de as sociedades em nome coletivo comportarem aintegralização do capital subscrito por meio de prestação de serviços, nos moldes constantes docontrato social, não importa se simples ou empresárias.1

Sociedade em comandita simples. Também poderá ter natureza simples ou empresária, regraque também se aplica às holdings. A grande característica desse tipo societário é a divisão dossócios em duas classes: comanditários (investidores; não administram a sociedade e têmresponsabilidade limitada) e comanditados (administradores da sociedade, com responsabilidadesubsidiária pelas obrigações sociais). Dessa maneira, protegem-se os investidores (comanditários),inclusive dos atos que sejam praticados pelo(s) comanditado(s). Recorde-se que os comanditáriosnão podem participar da administração, sob pena de perderem a proteção ao seu patrimôniopessoal. Mas não estão excluídos das deliberações sociais, o que preserva seus direitos einteresses; e os atos de administração são reduzidos, o que mitiga o problema. A grande

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dificuldade é encontrar pessoas que aceitem assumir a condição de comanditados, ainda que suaparticipação no capital social possa ser integralizada por meio de prestação de serviços. Outragrande vantagem da sociedade em comandita simples é que tem funcionamento e administraçãomais simples, como a sociedade em nome coletivo, embora com algumas limitações em relação àsparticipações societárias dos comanditários no capital social.2

Sociedade limitada. Trata-se de um dos tipos mais utilizados para a constituição de holdings,podendo ser simples ou empresária. Essa ampla utilização tem razão óbvia: a responsabilidade decada sócio pelas obrigações da sociedade é restrita à integralização do capital social. Como naholding essa integralização se faz com a constituição, por meio de participações societárias eoutros bens, não haverá mais falar em responsabilidade pessoal. A proteção legal à alienação dequotas é mais frágil do que nas demais sociedades contratuais, já que as quotas podem serlivremente cedidas de um sócio para outro, alterando um eventual equilíbrio das participaçõessocietárias, da mesma maneira que a cessão para terceiros estranhos é facilitada: basta a anuênciade 75% do capital social. De qualquer sorte, ambas as fragilidades podem ser corrigidas por meiode cláusulas dispostas no contrato social: a previsão da necessidade de aprovação unânime para acessão de quotas, seja para sócios, seja para não sócios. Não se permite a integralização do capitalpor meio de prestação de serviços.

Embora não seja prática comum nas holdings, a adoção do tipo limitada permite a nomeaçãode administrador societário que não seja sócio. Outra vantagem é a possibilidade de constituiçãode conselho fiscal, como visto no Capítulo 2. Outro ponto que merece particular atenção é oquórum legal para deliberações, pois também aqui podem ser convenientes alterações, por meiode cláusulas dispostas no contrato social, com o objetivo de proteger as minorias sociais. Bastarecordar que algumas matérias, seguindo a regra geral, disposta em lei, são aprovadas por 75%de capital social, a exemplo de incorporação, fusão e dissolução da sociedade.3

A opção pelo tipo sociedade limitada ainda implica atenção para os parâmetros fixados peloCódigo Civil para eventuais aumento ou redução do capital social. O aumento do capital social,quando não haja regras específicas em lei especial, poderá ser aprovado por sócios querepresentem 75% do capital social, desde que já estejam integralizadas as quotas da sociedade,exigindo alteração do contrato social (artigos 1.071, V, 1.076, I, e 1.081 do Código Civil). Até 30dias após a deliberação, terão os sócios preferência para participar do aumento, na proporção dasquotas de que sejam titulares, direito esse que pode ser livremente cedido, total ou parcialmente,a qualquer outro sócio, bem como cedido a terceiro (não sócio), desde que não haja oposição detitulares de mais de 25% do capital social. Subscrita a totalidade do aumento, haverá reunião ouassembleia dos sócios, para que seja aprovada a modificação do contrato. Esse procedimento serádispensável se o aumento decorrer da incorporação de lucros, já que todos os sócios dela sebeneficiam, na proporção de suas quotas.

A redução do capital social é mais complexa, embora também se faça por meio de alteraçãocontratual. De abertura, duas possibilidades se colocam: (1) redução em face de perdasirreparáveis, depois de integralizado o capital, e (2) redução por ser excessivo o capital social, aqualquer momento. A redução para assimilar perdas irreparáveis faz-se por meio da diminuiçãoproporcional do valor das quotas, em prejuízo dos sócios. Já a redução por excesso não exige queo capital esteja totalmente integralizado; portanto, pode fazer-se tanto por meio da devolução devalores aos sócios, como por meio da exoneração da obrigação de integralizar parcelas aindapendentes. Mas o artigo 1.084, § 1o, do Código Civil, prevê um procedimento para tal diminuição:a ata que registra a aprovação da medida deverá ser publicada, passando a correr, de então, umprazo de 90 dias para que o credor quirografário, por título líquido anterior a essa data, possa

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opor-se à redução deliberada. Somente quando transcorrido esse prazo, sem que hajaimpugnação, ou se provado o pagamento da dívida ou o depósito judicial do respectivo valor, aredução se tornará eficaz, procedendo-se à averbação, no Registro Público de EmpresasMercantis, da ata que tenha aprovado a redução.

Sociedades por ações

As chamadas sociedades estatutárias ou sociedades institucionais têm seus elementos deidentificação e regras de funcionamento especificados em estatutos e não em contratos. Adiferença é marcante. Embora também conste do estatuto social o conjunto das normas queorientam a existência e o funcionamento da pessoa jurídica, esse instrumento jurídico não revelaa característica do contrato, ou seja, não registra um acordo recíproco de obrigações e faculdades.Distintamente, o estatuto funda uma instituição (uma associação, uma fundação, umacompanhia). Não traz partes que contratam, mas as regras da instituição. Não há, sequer,reconhecimento mútuo obrigatório. O estatuto é o resultado da ação dos instituidores e osacionistas que eventualmente venham a compor, no futuro, a companhia a ele aderem pelasimples assunção dos títulos societários, o que se fará não pela alteração do ato constitutivo, comose dá nas sociedades contratuais, mas por meio de anotação no Livro de Registro de AçõesNominativas.

É interessante observar que essa facilidade de transações com as ações, prescindindo mesmode alterações no ato constitutivo e, assim, da prática de atos registrais, é vantagem própria dascompanhias com maior dinamicidade na alternância de sócios, nomeadamente as companhiasabertas. Não é, portanto, uma vantagem que se aproveite à holding familiar, já que a lógica quemarca a constituição e a existência dessas sociedades é a preocupação com a preservação de umpatrimônio familiar, designadamente a unidade nas participações em outras sociedades e, assim,a força respectiva, a exemplo do poder de controle. Ainda assim, as eventuais transferências, intervivos ou causa mortis, realizam-se de forma simplificada, nos livros da companhia, sem demandaralteração do ato constitutivo.

As sociedades por ações têm um custo de manutenção mais elevado, já que a Lei 6.404/76 exige a publicação de diversos atos sociais.Estas publicações são caras.

Essa realidade acaba por impactar a holding, quando constituída sob a forma de sociedadeanônima ou sociedade em comandita por ações. O primeiro grande impacto está na naturezaintuitu pecuniae das sociedades por ações, ou seja, na compreensão legal de que a cessão livre éum elemento que compõe a essência das ações, ao ponto de serem restritos os casos de recesso(retirada da sociedade): o acionista que deseja sair da sociedade deve alienar suas ações,permitindo que outrem assuma o ônus do investimento, visando ao bônus correspondente: oslucros. Quando a companhia é constituída para albergar uma holding, torna-se indispensávelcolocar cláusulas no estatuto social que mitiguem o risco de desfazer o controle familiar sobre asparticipações societárias. Não se pode, pura e simplesmente, proibir a cessão das ações ou anecessidade de aprovação dessa cessão pela maioria (simples, absoluta ou qualificada) dosdemais acionistas, se são mantidas as restrições legais ao direito de recesso. Criar-se-ia umahipótese de abuso de direito, que o artigo 187 do Código Civil considera um ato ilícito. Afinal,sem poder alienar livremente, pelo melhor preço, e sem poder liquidar sua participação societária,a ação estaria esvaziada de seus principais atributos econômicos e sociais. A solução é criar um

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direito de preferência, nas mesmas condições oferecidas pelo terceiro ou, alternativamente,estipular o direito de recesso, ainda que vinculado ao pagamento do valor das ações em dinheiro(preservando o acervo societário) e mesmo sendo estipulado prazo e/ou parcelamento, em termosrazoáveis, para esse exercício.

Ainda quando não se tenha restrição à circulação de títulos, a constituição da holding sob aforma de sociedade por ações encontra uma vantagem nas já referidas restrições ao exercício dodireito de recesso, o que acaba por dificultar as pretensões de dissolução parcial da sociedade e,assim, de liquidação de participações acionárias, com o correspondente decréscimo do patrimôniosocial. Não é uma característica que se possa desprezar, considerando que a manutenção dosinvestimentos é a grande razão de ser das sociedades patrimoniais e, com destaque entre elas, dassociedades de participações. No entanto, o Judiciário tem exigido, em diversas oportunidades,que a manutenção desse sistema societário não se faça em contextos distorcidos, rompendo com arazão de ser do mecanismo jurídico. Essas distorções verificam-se primordialmente em sociedadesfamiliares, nas quais a natureza institucional, afirmada pela lei, acaba por não encontrar reflexonas relações efetivamente mantidas entre os acionistas.

A possibilidade de serem constituídas duas espécies diversas de ações, ordinárias epreferenciais, é também uma grande vantagem. A cada ação ordinária corresponde um voto nasdeliberações da assembleia geral, embora o estatuto possa estabelecer limitação ao número devotos de cada acionista. O estatuto pode deixar de conferir às ações preferenciais algum ou algunsdos direitos reconhecidos às ações ordinárias, inclusive o de voto, ou conferi-lo com restrições,desde que tal supressão ou restrição não atinja os direitos essenciais do acionista. Em oposição, ospreferencialistas acessam, primeiro, os resultados do exercício. Isso permite acomodar osherdeiros, conforme sua maior ou menor afinidade e habilidade para os negócios, em classesdiversas: deixar alguns com ações ordinárias, ocupando-se das deliberações sobre os negóciossociais, e deixar outros na condição de beneficiários preferenciais dos resultados da companhia.Para a proteção desses sócios, a lei prevê que as ações preferenciais adquirem o direito ao voto sea companhia, pelo prazo previsto no estatuto, não superior a três exercícios consecutivos, deixarde pagar os dividendos fixos ou mínimos a que fizer jus, direito que conservará até o pagamento,se tais dividendos não forem cumulativos, ou até que sejam pagos os cumulativos em atraso.

A adoção dos tipos societários por ações, ademais, coloca à disposição da sociedade departicipação um importante instrumento de captação de recursos que pode ser utilizado parafinanciar a expansão de seu patrimônio, incluindo a ampliação de suas participações societárias:as debêntures. As debêntures são instrumentos que conferem aos seus titulares um direito decrédito contra a companhia (artigo 52 da Lei 6.404/76). Sua grande vantagem é permitir ofracionamento do valor que se toma em mútuo; assim, se a companhia pretende tomar um milhãode reais emprestados, pode emitir um milhão de debêntures no valor, cada uma, de R$ 1,00,facilitando sejam encontrados mutuantes dispostos ao negócio proposto, cada qual subscrevendoum número próprio de títulos. Facilmente se percebe que a holding não funciona exclusivamentecomo um instrumento para a preservação do patrimônio familiar. Permite o seu controle e, maisdo que isso, o seu emprego otimizado, a partir do qual se pode mesmo aumentá-lo.

O artigo 176 da Lei 6.404/76 determina a publicação, anualmente, do balanço patrimonial e das demonstrações financeiras. Assim, essasinformações acabam chegando ao conhecimento de todos (disclosure), o que nem sempre é desejável.

A principal desvantagem que é apontada para a constituição de holdings sob tipos societáriospor ações é o custo. A Lei 6.404/76 exige que diversos atos societários sejam publicados. Assim,

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seu artigo 94 prevê que nenhuma companhia poderá funcionar sem que sejam arquivados epublicados seus atos constitutivos. Também o artigo 124 fala em publicação, por três vezes, daconvocação da assembleia geral, ao passo que o artigo 130 demanda a publicação das atas dasassembleias realizadas. Para terminar os exemplos, citamos que o artigo 146 exige a publicaçãoda ata que elege os administradores e o artigo 176 exige a publicação das demonstraçõesfinanceiras de cada exercício: balanço patrimonial, demonstração dos lucros ou prejuízosacumulados, demonstração do resultado do exercício e demonstração dos fluxos de caixa. Essaspublicações, para além de seu elevado custo, têm a desvantagem de dar a conhecer detalhes sobrea companhia, mitigando a proteção do princípio do sigilo da escrituração contábil. O mercadoencarta esse fato no que chama de disclosure, isto é, na revelação de informações empresariais,embora não se tenha, nessa hipótese, quebra do dever de confidencialidade. No entanto, paraevitar essa revelação, muitas grandes empresas brasileiras abandonaram a forma de sociedadespor ações, transformando-se em sociedades limitadas. Isso justificou a edição da Lei 11.638/07,que obriga as sociedades de grande porte, não importa o seu tipo societário, a publicarem seusdemonstrativos contábeis.4

Subscrição e integralização de capital

A constituição de uma sociedade, simples ou empresária, tem elementos essenciais nasubscrição do capital social e na sua integralização. O capital social é o montante do investimentofeito pelos sócios na empresa, ou seja, o valor alocado para a realização de seu objeto social. Daí anecessidade de se definir, no contrato social ou no estatuto social, devidamente registrado, qualserá o seu valor efetivo, exigindo o legislador que seja expresso em moeda corrente,integralizando-o e conservando-o no patrimônio societário. Deve-se, portanto, atender aosprincípios que orientam o capital social: princípio da realidade (ou princípio da subscriçãointegral), princípio da intangibilidade, princípio da fixidez (ou princípio da variabilidadecondicionada) e princípio da publicidade.5 Todavia, não basta definir o capital social, mas épreciso distribuir os ônus do investimento na sociedade. Coloca-se, assim, o instituto dasubscrição e, como decorrência, da integralização.

A subscrição é o ato de assumir um ou mais títulos societários, ou seja, quotas ou ações. Essestítulos, contudo, correspondem a parcelas do capital social e, assim, devem ser integralizados, ouseja, é preciso que se transfira para a sociedade o valor correspondente às quotas ou ações queforam subscritas. Com efeito, a constituição da sociedade implica a destinação de valores para aformação do capital social. É dever de todo sócio contribuir para a sociedade, a principiar pelaintegralização da(s) quota(s) ou ação(ões) subscrita(s); se não for feita no ato da assinatura docontrato social, ou ato de fundação da companhia, deverá ser feita na forma (ou modo) e prazoestipulados pelo contrato ou estatuto social. Forma ou modo, pois o sócio pode ter-secomprometido, por exemplo, a transferir à sociedade a propriedade de determinado imóvel comoforma de integralização dos títulos societários que subscreveu, assumindo tal declaração, devida eregularmente assinada, a natureza de promessa, permitindo, inclusive, pedido judicial de outorgade escritura.

Todavia, esses valores não precisam estar representados por dinheiro (pecúnia). Qualquerbem com expressão econômica pode ser destinado à formação do patrimônio empresarial, desdeque suscetível de avaliação pecuniária, isto é, desde que se possa atribuir-lhe um valor na moedacom curso obrigatório no país; a integralização se fará pela transferência do bem, que seráescriturado por seu valor pecuniário. Em alguns casos, como nas sociedades simples, sociedade

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em nome coletivo e sociedade em comandita simples, no que diz respeito ao sócio comanditado,permite-se mesmo que a integralização se faça por meio da prestação de serviços. O fato de setratar de uma holding não altera a regra geral: o capital social pode ser integralizado por meio dedinheiro ou pela transferência de bens, direitos e créditos.

A integralização do capital correspondente às quotas ou ações de um sócio não é ato que só possa ser praticado por ele. É possível queterceiros integralizem o capital para um sócio, em vida (inter vivos) ou em função da morte (causa mortis).

Nas sociedades por quotas, o contrato deverá especificar como cada sócio realizará a suaparticipação no capital social, ou seja, como integralizará sua quota. Nas sociedades por ações,essa matéria é estranha ao estatuto social, embora se verifiquem situações nas quais a cláusulaque define o capital social esclareça terem sido todas as ações subscritas e integralizadas no atode constituição. Aliás, nas sociedades patrimoniais, nomeadamente nas holdings familiares, écomum recorrer a essa fórmula: todo o capital social é subscrito e integralizado no ato daconstituição, o que se faz por meio da transferência dos bens para a sociedade: as participaçõessocietárias ou, eventualmente, outros bens, móveis ou imóveis, materiais ou imateriais(propriedade intelectual, como marcas, patentes etc.). Mas frisamos que não é obrigatório; épossível que se ajuste que a integralização se fará posteriormente, em parcelas, embora sejasituação rara na constituição de holdings familiares.6

Atente-se para o fato de que a integralização, ou seja, o ato de conferir valores para aformação do capital social, não é ato privativo do sócio. O investimento pode ser feito por outrem,em nome e a bem do sócio. Não há vedação legal de que o investimento seja feito por umterceiro, onerosamente (contrato de mútuo ou outro, remunerado por juros ou doutro jeito) ougratuitamente: doação, inter vivos ou causa mortis. Essa via é de uso comum na constituição deholdings familiares, sejam sociedades por quotas, sejam sociedades por ações.

Integralização pela transferência de bens

O direito de participar de uma sociedade decorre não apenas da subscrição de suas quotas ouações, assumindo a condição de sócio, mas, igualmente, da integralização do capital social, acaracterizar investimento na sociedade e, assim, na atividade negocial que será por ela explorada,como visto anteriormente. A integralização do capital correspondente aos títulos que subscreveuconstitui uma obrigação elementar de todos os sócios.

Segundo previsão anotada no artigo 997, V, do Código Civil, a integralização do capital socialpoderá fazer-se mediante: (1) pagamento em dinheiro; (2) cessão de crédito, inclusive endossode títulos de crédito; (3) transferência de bens imóveis ou móveis, incluindo direitos pessoais comexpressividade econômica, a exemplo da titularidade de marca ou patente; e serviços que devamser prestados pelo sócio, em certos tipos societários. Habitualmente, faz-se a integralização docapital social de uma holding familiar pela transferência do patrimônio familiar para a sociedade;daí falar-se em sociedade patrimonial. Não é preciso fazer a transferência de todo o patrimôniofamiliar; pode-se eleger parcelas deste patrimônio, como apenas as participações societárias,criando uma sociedade de participações, ou apenas bens imóveis, criando uma sociedadeimobiliária etc. Há uma liberdade para se eleger qual ou quais bens do patrimônio do casal serãousados para a integralização do capital social da holding, sendo mesmo possível a transferência detodos os bens. Em qualquer caso, a partir da transferência, para integralização, os bens passam aser de propriedade da sociedade constituída, ao passo que seus sócios passam a ser titulares das

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quotas ou ações da sociedade.

Para a proteção dos demais sócios, assim como à própria sociedade, o legislador viu por bemestabelecer uma responsabilidade do sócio que, em lugar de transferir pecúnia, recorre àtransferência de bens e direitos, incluindo créditos. Assim, torna-o responsável pela evicção,sempre que transfira domínio, posse ou uso, e o bem vem a ser reconhecido como pertencente aoutrem, sendo-lhe entregue. Aplicado o artigo 447 do Código Civil, se a coisa foi recebida emcontrato oneroso, vale dizer, se aquele a quem foi transferido o seu domínio, posse ou uso pagoupor isso, a exemplo da transferência para integralização de quota ou quotas de sociedade simplesou empresarial, o alienante (aqui, o sócio) responderá pela evicção, vale dizer, pelo prejuízosofrido pelo cessionário, no caso, a sociedade. Em relação à sociedade simples comum, sociedadeem nome coletivo e sociedade em comandita simples, a questão da integralização do capital socialpela transferência de bens está confinada a tais balizas. Confiando na responsabilidade subsidiáriado sócio pelas obrigações sociais, o legislador não dedicou maior atenção à integralização pelatransferência de bens para tais sociedades por quotas. Apenas à sociedade limitada deu o CódigoCivil maior atenção, na mesma toada em que a Lei 6.404/76 preocupou-se com o tema nassociedades por ações.

No alusivo à sociedade limitada, o Código Civil demanda que a integralização do capital sefaça por meio de bens que tenham expressão econômica e que permitam uma avaliação,regulando com o valor a ser realizado no capital social, sob pena de caracterização de fraude.Nesse sentido, o § 1o do artigo 1.055 do Código Civil prevê que todos os sócios responderão,solidariamente, pela exata estimação dos bens que forem incorporados ao patrimônio social paraa realização de quotas, até o prazo de cinco anos da data do registro da sociedade. Mais não seexige; nenhum procedimento específico. Afirma-se exclusivamente a responsabilidade solidáriados sócios pela exata estimação do valor dos bens; é quanto basta. O credor que se considerarprejudicado deverá, apenas, provar que o valor dos bens foi estimado excessivamente e, em facedisso, pedir a responsabilização dos sócios pelos prejuízos que tal fato lhe tenha causado.

Para as sociedades limitadas, o Código Civil não prevê um procedimento específico para a integralização do capital por meio datransferência de bens; apenas torna os sócios solidariamente responsáveis pela exata estimação do seu valor. Para as sociedades anônimasa Lei 6.404/76 exige a avaliação dos bens por três peritos ou sociedade especializada.

Resta examinar as sociedades por ações, nas quais também se admite que o capital social sejaintegralizado não só em dinheiro, mas também pela incorporação de qualquer espécie de benssuscetíveis de avaliação em dinheiro (artigo 7o da Lei 6.404/76). Fala-se em incorporação, pois osbens oferecidos são absorvidos pelo patrimônio comum, societário e, assim, a companhia passa aser titular do bem. Incorporação, portanto, do patrimônio individual para o patrimônio coletivo.

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Somente bens – o que, realço, incluem o dinheiro e o crédito – podem ser utilizados para aintegralização do capital subscrito. Não se permite a contribuição em serviços, isto é, não há falarem aplicação, nem mesmo subsidiária, dos artigos 997, V, e 1.006 do Código Civil.

A Lei 6.404/76 prevê um minucioso procedimento para a avaliação dos bens que foremoferecidos pelos acionistas como forma de integralização das ações que subscreveram. Esseprocedimento principia mesmo antes da assembleia de fundação, com o oferecimento dos bensaos fundadores e sua aceitação por esses. Destaque-se não ser necessário que o bem oferecido(coisa ou direito) seja de propriedade do subscritor, podendo pertencer a terceiro que concordecom a transferência do bem para a sociedade, realizando o valor das ações subscritas pelobeneficiário de seu ato. Nessa hipótese, o terceiro – proprietário da coisa (móvel ou imóvel) outitular do direito – deverá apresentar instrumento prometendo entregar o bem para incorporaçãoao patrimônio social, caso (1) concorde com a avaliação e (2) sejam o bem e seu valor aprovadospela assembleia. Essa hipótese não está expressamente contemplada pelo legislador, mas resultaclara do princípio segundo o qual pode-se adquirir direito para si ou para outrem, além das regrasespecíficas de pagamento a favor de terceiros, por mera liberalidade ou não, que se anotam noCódigo Civil.

A integralização do capital correspondente às ações subscritas, no todo ou em parte, exigeuma avaliação feita por três peritos ou por empresa especializada, nomeados quando daassembleia geral dos subscritores (artigo 8o da Lei 6.404/76). Contudo, os bens não poderão serincorporados ao patrimônio da companhia por valor acima do que lhes tiver dado o subscritor (§4o desse artigo 8o), ainda que os avaliadores apurem valor superior. Os peritos ou a empresaavaliadora deverão apresentar laudo fundamentado, com a indicação dos critérios de avaliação edos elementos de comparação adotados e instruído com os documentos relativos aos bensavaliados, permitindo, assim, que qualquer interessado conheça as razões motivadoras doquantum apurado. Justamente por isso, exige-se ainda que os avaliadores estejam presentes àassembleia que conhecer do laudo, a fim de prestarem as informações que lhes forem solicitadas.

Aprovada a integralização, os bens serão incorporados ao patrimônio da companhia. Tanto osavaliadores quanto o subscritor responderão perante a companhia, perante os acionistas e mesmoperante terceiros, pelos danos que lhes causarem por culpa ou dolo na avaliação dos bens. E nãose pode afastar, sequer, a possibilidade de responsabilização criminal, se o ato se amoldar àsdefinições legais de tipos penais. Em se tratando de bens em condomínio, cotitularizados por doisou mais subscritores, a responsabilidade destes será solidária. Ademais, a responsabilidade civildo subscritor ou de acionistas que contribuam com bens para a formação do capital social seráidêntica à do vendedor, com o que responderão tanto pela evicção, quanto pela existência devícios redibitórios (artigo 10 da Lei 6.404/76). Por outro lado, se a integralização das ações fez-sepela transferência de crédito, o acionista responderá pela solvência do devedor.

Destaque-se que, sendo ofertados e aceitos bens imóveis para a integralização de açõessubscritas e, assim, passando a formar o capital social, sua incorporação à companhia não exigeescritura pública (artigo 89 da Lei 6.404/76). A ata na qual se deliberou a incorporação do bempoderá ser levada ao Registro de Imóveis, certo que a certidão dos atos constitutivos dacompanhia, passada pelo registro do comércio em que foram arquivados, será o documento hábilpara a transferência, por transcrição no registro público competente, dos bens com que osubscritor tiver contribuído para a formação do capital social (artigo 98, § 2o, da Lei 6.404/76).Exige-se, contudo, que a ata da assembleia geral que aprovar a incorporação identifique, comprecisão, o bem a ser incorporado, embora possa descrevê-lo sumariamente, desde que sejasuplementada por declaração, assinada pelo subscritor, contendo todos os elementos necessários

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para a transcrição no registro público (§ 3o do artigo 98). Não se trata de mera averbação, mas deinscrição no Cartório de Registro de Imóveis, como decidiu a Segunda Seção do Superior Tribunalde Justiça, julgando os Embargos de Divergência no Recurso Especial 96.713/MG.

É de se destacar que a transferência de bens para a sociedade, a título de integralização docapital social, pode fazer-se tanto pelo valor de mercado, também chamado de valor venal (ovalor pelo qual efetivamente pode ser vendido), quanto por seu valor escritural, vale dizer, pelovalor que está escriturado na declaração de bens da pessoa ou, em se tratando de empresário oupessoa jurídica, pelo valor que consta de seus registros contábeis. A matéria envolve questõesdiversas, sob a perspectiva do Direito Empresarial, e outras tantas, sob a perspectiva do DireitoTributário. Com efeito, sob a perspectiva do Direito Empresarial, há uma preocupação dolegislador com a proteção dos interesses e direitos de terceiros. Nas sociedades em que há sócioscom responsabilidade subsidiária pelas obrigações sociais (sociedade simples comum, sociedadeem nome coletivo e sociedade em comandita simples), o legislador silenciou a respeito do tema.O mesmo não ocorre com as sociedades em que há limite de responsabilidade. Assim, para asociedade limitada, prevê-se que todos os sócios são responsáveis pela integralização do capitalsocial (artigo 1.052 do Código Civil), sendo que, pela exata estimação de bens conferidos aocapital social respondem solidariamente todos os sócios, até o prazo de cinco anos da data doregistro da sociedade (artigo 1.055, parágrafo único). Já para as sociedades por ações, o artigo 8o

da Lei 6.404/76 disciplina a avaliação cuja transferência seja oferecida para a integralização docapital social da companhia.

Portanto, a regra elementar é que o capital social não pode ser integralizado por meio datransferência de bens cujo valor de mercado (valor venal) seja inferior ao valor das quotas ouações a serem integralizadas. Isso atende ao princípio da realidade do capital social, tambémchamado de princípio da subscrição integral: o capital social não pode ser uma ficção, umaafirmação retórica; deve ser real e, portanto, precisa ter sido efetivamente investido na sociedade.Mas se a transferência não pode ser feita por valor inferior àquele que se pode, de fato, obter coma venda do bem, nada impede que a integralização se faça por valor inferior àquele, o quesimplesmente formará uma reserva oculta de capital, em nada proibida e, até, estimulada poruma interpretação exacerbada do princípio da segurança, que deve orientar a escrituraçãocontábil.7 Dessa maneira, é possível a transferência do bem por valor inferior àquele que lhe dá omercado (o valor pelo qual poderia ser alienado), optando o(s) subscritor(es) por lhe atribuir,para fins de integralização, o mesmo valor com que está relacionado em sua declaração de bens.A opção tem uma justificativa simples: a transferência do bem por valor superior àquele que

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consta de sua declaração de bens é tributável.Nesse sentido, o julgamento do Agravo Regimental no Recurso Especial 1.016.766/PR pela

Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça:

“(1) Hipótese em que a incorporação do imóvel ao capital societário se deu por valormaior do que o de aquisição do imóvel. (2) Aplicação da jurisprudência do SuperiorTribunal de Justiça no sentido de que é legítima a incidência de Imposto de Renda sobreganhos de capital decorrentes da diferença entre o valor de aquisição e o de incorporaçãode imóveis de pessoa física, para integralização de capital de pessoa jurídica da qual ésócio.” Da mesma turma, cite-se ainda o Recurso Especial 867.276/RS: “É legítima aincidência de imposto de renda sobre ganhos de capital decorrente da diferença entre ovalor de aquisição atualizado e de incorporação de imóveis de pessoa física paraintegralização de capital de pessoa jurídica da qual é sócio.” A jurisprudência da PrimeiraTurma não é distinta. Julgando o Recurso Especial 660.692/SC, decidiu-se que“caracteriza acréscimo patrimonial, passível de incidência do imposto de renda, o ganhode capital referente à diferença entre o valor atualizado da aquisição de imóvel de pessoafísica e a sua incorporação para a integralização de capital de pessoa jurídica”. Some-se ojulgamento do Recurso Especial 789.004/RS: “Está sujeito à tributação do imposto derenda o resultado obtido pelo sócio com a transferência de imóvel do seu patrimônio paraintegralizar participação no capital social de pessoa jurídica.”

Por fim, destaque-se que as regras aqui estudadas sobre a incorporação de bens para aintegralização do capital aplicam-se, inteiramente, à hipótese de sociedade já constituída, quandohá deliberação de aumentar o seu capital social.

Eireli holding

Uma empresa individual de responsabilidade limitada – eireli – pode ser uma holding?Acredito que sim, embora tal afirmativa, por si só, não dê uma exata dimensão ao problemaenvolvido na questão. Será preciso explorar com mais profundidade os elementos que estãoimplicados nessa questão jurídica.

De abertura, insisto na posição que assumi: a empresa individual de responsabilidadelimitada nada mais é do que uma sociedade unipessoal. Embora a Lei 12.441/11 seja confusa emseu conteúdo, diversos de seus termos apontam para essa solução, a principiar pela referência acapital social (artigo 908-A, caput, do Código Civil), que é próprio das sociedades, e não a capitalregistrado, que é expressão mais ampla e, assim, adequada para uma pessoa jurídica sui generis,como querem alguns. Não é só; o § 3o do mesmo artigo também aponta nessa direção, quandoreconhece que a eireli pode resultar da concentração de quotas de uma sociedade limitada nasmãos de um único sócio. Por fim, o § 6o, segundo o qual se aplicam à empresa individual deresponsabilidade limitada, no que couber, as regras previstas para as sociedades limitadas.

Essa sociedade unipessoal pode ter qualquer objeto lícito, sendo que, para remarcá-lo, o § 5o

do mesmo artigo 980-A do Código Civil aceita, inclusive, que seu objeto seja a prestação deserviços de qualquer natureza a remuneração decorrente da cessão de direitos patrimoniais de autorou de imagem, nome, marca ou voz de que seja detentor o titular da pessoa jurídica, vinculados àatividade profissional. Noutras palavras, a amplitude do objeto é tal que se aceita como atividadenegocial mesmo a exploração de direitos personalíssimos, ou seja, de atributos essenciais da

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personalidade, sempre que a sua exploração econômica seja lícita, ou seja, sempre que nãoconflite com as normas que protegem o direito da personalidade e, assim, vedam a suadisposição, o que nos conduz para a figura dos direitos indisponíveis.

Se pode tanto, pode menos: titularizar patrimônio tangível, composto por bens materiais(coisas, ou seja, res, fundus) e/ou patrimônio intangível, composto por bens imateriais, vale dizer,faculdades (ius) com expressividade econômica e passíveis de livre disposição, a exemplo demarcas, patentes, registros de direitos industriais, titularidade de programas de computador,direitos autorais (fora o direito à autoria em si, que é personalíssimo e, entendo, indisponível),crédito (incluindo aqueles materializados em títulos, como debêntures, cédulas, notas, letras etc.)e, por fim, participações societárias.

Portanto, a empresa individual de responsabilidade limitada – eireli pode ser titular departicipações societárias, sejam quotas, sejam ações. Também não há qualquer restrição lógica oulegal que limite essa participação. Dessa maneira, referenciando-se pelo artigo 1.097 do CódigoCivil, pode haver simples participação, pode haver participação relevante (ou filiação), assim comopode haver controle societário. Friso: uma eireli pode deter o controle societário de umasociedade simples, de uma sociedade em comandita simples (na condição de comanditária,obviamente) ou de uma sociedade limitada (sendo indiferente, em ambos os casos, a naturezajurídica societária, simples ou empresária), além de sociedade anônima ou sociedade emcomandita por ações (obviamente, não na condição de diretor ou gerente, que é própria depessoas naturais).

Mais do que isso, acredito não haver qualquer restrição lógica, nem há qualquer restriçãolegal, para que o objeto social da empresa individual de responsabilidade limitada sejaexclusivamente esse: titularizar o capital social de outra ou de outras sociedades, isto é, para quefuncione como sociedade de participação ou, como de uso corrente, uma holding. É lícito constituiruma holding eireli, mesmo que haja participação numa só sociedade. Visto por outro ângulo –para ser exaustivo – é possível que o controlador de uma sociedade seja uma eireli que tenha sidoconstituída exclusivamente para titularizar as quotas ou ações daquela sociedade, e de nenhumaoutra mais.

No entanto, a análise da questão ainda exige atenção para aspectos laterais, relativos aocomportamento das pessoas envolvidas, naturais ou jurídicas. De abertura, é indispensável que oexercício dessas faculdades societárias seja lícito. Vale dizer, o ato ilícito, praticado por qualquerpessoa – inclusive o titular de uma eireli – implica o dever de indenizar os prejuízos que tenhamsido experimentados pela(s) vítima(s), resultem de dolo, de culpa ou de abuso de direito (artigos186 a 188 e 927 a 954 do Código Civil, com reflexos nos seus artigos 1.016 e 1.080).Consequentemente, se houver a prática de ato ilícito, comissivo ou omissivo, com dolo, culpa ouabuso de direito, o sócio unipessoal da empresa individual de responsabilidade limitadaresponderá pelos danos advindos, devendo indenizá-los (artigo 927).

Não é só. Também se aplica o artigo 50 do Código Civil, ou seja, pode haver desconsideraçãoda personalidade jurídica, se há “abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio definalidade, ou pela confusão patrimonial”. Se presente tal situação, “pode o juiz decidir, arequerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que osefeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particularesdos administradores ou sócios da pessoa jurídica”.

Diriam alguns que tal entendimento esvazia a eireli. Não acredito. O Direito estaria esvaziadode suas funções principais se qualquer instituto pudesse ser utilizado como instrumento para aprática de atos ilícitos ou abusivos. Mutatis mutandis, se não houver a prática de atos dolosos,

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culposos, abusivos – incluindo fraudes –, a proteção legal deverá ser integral, incluindo o limiteentre o patrimônio pessoal do único sócio e o patrimônio da empresa individual deresponsabilidade limitada – eireli, a impedir que as obrigações desta, ainda que não adimplidas,sejam satisfeitas com o patrimônio pessoal de seu sócio solitário.

1 Conferir MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: direito societário: sociedades simples eempresárias. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010. v. 2, capítulo 11 (Sociedade em nome coletivo).2 Conferir MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: direito societário: sociedades simples eempresárias. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010. v. 2, capítulo 12 (Sociedade em comandita simples).3 Conferir MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: direito societário: sociedades simples eempresárias. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010. v. 2, capítulos 13 e 14.4 Para o exame detalhado das sociedades por ações: MAMEDE, Gladston. Direito empresarialbrasileiro: direito societário: sociedades simples e empresárias. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010. v. 2, Parteespecial II (Sociedades institucionais).5 Sobre esses princípios, conferir: MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: empresa eatuação empresarial. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010. v. 1, capítulo 5, seção 1.3.2 (Princípios jurídicos queorientam o capital social).6 Sobre a obrigação de integralizar o capital subscrito, nas parcelas que foram estipuladas, conferirMAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: direito societário: sociedades simples e empresárias.4. ed. São Paulo: Atlas, 2010. v. 2, capítulo 3, seções 3.3 a 3.5. Para as sociedades limitadas: capítulo13, seção 5 (Sócio remisso). Para as sociedades por ações: capítulo 18, seção 5 (Integralização dasações).7 Sobre o princípio da segurança: MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: empresa eatuação empresarial. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010. v. 1, capítulo 8 (Escrituração empresarial), seção 2(Princípios aplicáveis à escrituração).

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Direitos sobre quotas e ações

Quotas e ações

O capital de uma sociedade é dividido em partes ideais, em parcelas. Esses pedaços sãochamados de quotas, nas sociedades contratuais, e de ações, nas sociedades institucionais(estatutárias). Essas quotas e ações são títulos societários que podem ser compreendidospor dois ângulos diversos: patrimonial e societário. Tomados por seu aspecto patrimonial,os títulos societários, em sua condição de partes do capital social, dão o direito a umaparcela do acervo patrimonial da sociedade, se dissolvida. É um bem jurídico comexpressividade econômica, portanto. Do outro ponto de vista, quota e ação são títulos departicipação social, ou seja, atribuem direitos e deveres sociais, em conformidade com oque esteja disposto no ato constitutivo, nos limites licenciados pela legislação.

Portanto, tomadas sob o ângulo patrimonial, as quotas e as ações de qualquer

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sociedade, inclusive de uma holding, constituem bens jurídicos sobre os quais podem serestabelecidas relações acessórias, a exemplo do usufruto, do qual já se falou, penhor,penhora, aluguel etc. O tema é relevante em qualquer sociedade, simples ou empresária,contratual ou estatutária. Contudo, nas sociedades patrimoniais, incluindo as sociedades departicipação (holdings puras), o tema ganha uma importância maior. Por um lado, apossibilidade de estabelecer relações laterais define instrumentos preciosos para oplanejamento sucessório, a exemplo do usufruto, sobre o qual se falou anteriormente e,agora, se estudará em detalhes. No entanto, como uma faca de dois gumes, essapossibilidade também pode constituir risco para a coletividade social e, destarte, para aestrutura de constituição de um ente para conservar o patrimônio e a participação emoutras sociedades.

A lei não criou qualquer limite para o capital e para a participação societária, seja emquotas ou ações, no âmbito das sociedades estudadas. Essas limitações estão restritas àssociedades cooperativas.1 Não há capital social mínimo, nem capital social máximo, emborahaja tratamento específico para as micro e pequenas empresas, assim como para associedades de grande porte.2 O capital pode estar dividido em qualquer número de quotasou ações, desde que igual ou superior a duas. Quotas e ações podem ter qualquer valormonetário (sendo obrigatoriamente expresso em moeda nacional corrente) e o número desócios conhece apenas um mínimo, dois, sem que haja um máximo; contudo, há situaçõesexcepcionais em que se aceita que a sociedade tenha um sócio apenas (unipessoalidade),matéria que foge do objetivo deste estudo. Por fim, não há valor mínimo (absoluto oupercentual) para a participação de cada sócio no capital social, embora a concentração degrande montante no patrimônio de um grande sócio pode reforçar, dependendo do caso, oargumento de confusão patrimonial, a justificar a desconsideração da personalidadejurídica.

Indivisibilidade, grupamento e desdobramento

Quotas e ações são definidas com liberdade pelo ato constitutivo da sociedade(contrato social ou estatuto social), em seu número e seu valor. Essa divisão implica, poróbvio, chegar-se a um resultado matemático: estabelecendo o ato constitutivo que o capitalsocial é de R$ 500.000,00 e que são 500.000 quotas ou ações, cada título societário terá ovalor de R$ 1,00. Isso é indiferente entre sociedades contratuais e estatutárias. Contudo,nas sociedades contratuais, admite-se que as quotas tenham valores distintos, atribuindo-seuma quota a cada sócio. Nas sociedades estatutárias, as ações terão o mesmo valor, maspodem ser divididas em espécies diversas (ordinárias ou preferenciais), às quaiscorrespondem direitos diversos.3 Há uma outra diferença fundamental: o estatuto social deuma sociedade anônima precisa apenas definir o valor global do capital social e o númerode ações; não é obrigatório que o valor nominal das ações esteja expresso no estatutosocial. É uma faculdade, segundo o artigo 11 da Lei 6.404/76. Por seu turno, o contratosocial deve trazer expresso não só o valor total do capital social e o número de quotas, maso valor das quotas e os respectivos titulares:

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Modelo de cláusula contratual

Cláusula Quinta – O capital social é de R$ 100.000,00 (cem mil reais), divididos em 1.000 (um mil) quotas no valor unitário de R$ 100,00 (cemreais) cada. A participação de cada sócio no capital social será a seguinte:

a) Flávio Valério Cláudio Constantino ………… 300 quotasb) Marco Aurélio Valério Maxentio ……………. 400 quotas

c) Caio Aurélio Diocleciano ………………………. 300 quotas

Por meio de alteração do contrato social ou do estatuto social, essa divisão do capital(assim como o próprio capital social) pode ser modificada: número e/ou seu valor dequotas ou de ações. Portanto, há eventos societários que podem determinar uma talalteração. Antes de mais nada, tal alteração é possível, ou melhor, é necessária quando hajamodificação do valor do capital social: o aumento do capital social implica aumento nonúmero de quotas ou de ações ou, alternativamente, aumento no seu valor nominal; aredução do capital social, mutatis mutandis, implicará redução no número de ações ouredução em seu valor nominal. Em segundo lugar, pode haver grupamento de quotas ouações, isto é, o contrato social ou o estatuto social podem ser alterados para prever queduas ou mais quotas ou ações serão agrupadas em uma só, para além de outras equações.Obviamente, isso implica elevação do valor do título societário, excetuada a hipótese de aoperação ter-se realizado com a concomitante redução do capital.

Também pode haver desdobramento de quotas ou ações, ou seja, o contrato social ou oestatuto social poderão ser alterados para prever o fracionamento dos títulos já existentes;por exemplo, prevendo que cada quota ou ação se tornará duas (com metade do valor) ou10 (cada qual com um décimo do valor). Obviamente, pode haver concomitante aumentode capital social e desdobramento das quotas ou ações, o que pode conduzir a uma situaçãona qual, apesar de uma quota ou ação ter se tornado duas, o seu valor tenha se conservado.Assim, 1.000 quotas ou ações no valor de R$ 100,00 podem se tornar 100 quotas ou açõesno valor de R$ 1.000,00 (grupamento), assim como podem se tornar 10.000 quotas ouações no valor de R$ 10,00 (desdobramento), entre tantas outras alternativas.

No que diz respeito às sociedades por ações, ainda há uma última hipótese: ocancelamento de ações, a implicar haver menos ações para o mesmo capital social:diminuição no número de ações e aumento proporcional de seu valor (nominal ou não,conforme a já citada licença do artigo 11 da Lei 6.404/76). O cancelamento encontra

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previsão e tratamento nos artigos 12 e 30, § 1o, b, da Lei 6.404/76, podendo resultar tantoda compra de seus próprios títulos, quanto de operações de resgate.4

Quotas e ações somente comportam divisão (ou grupamento) se assim deliberarem ossócios em reunião ou assembleia, atendidos o respectivo quórum de deliberação:unanimidade, na sociedade simples em comum, na sociedade em nome coletivo e nasociedade em comandita simples, como se afere do artigo 997, III e IV, cominado com oartigo 999, primeira parte, ambos do Código Civil, se outra não for a previsão do contratosocial. Nas sociedades limitadas, simples ou empresárias, esse quórum de deliberação é de75%, como se apura da combinação dos artigos 1.071, V, e 1.076, I, também do CódigoCivil, se o contrato social não dispuser diferente, erigindo percentual maior (inclusive aunanimidade) ou menor. Já nas sociedades anônimas, maioria absoluta dos votos (artigo129 da Lei 6.404/76), se maior quórum não for exigido pelo estatuto social, sendo que aassembleia geral somente se instalará em primeira convocação com a presença deacionistas que representem 2/3 (dois terços), no mínimo, do capital com direito a voto,mas poderá instalar-se em segunda com qualquer número (artigo 135); mas exige-se que aconvocação dessa assembleia faça-se mediante anúncio publicado por 3 (três) vezes, nomínimo, contendo, além do local, data e hora da assembleia, a ordem do dia, e, no caso dereforma do estatuto, a indicação da matéria.

Quotas e ações são indivisíveis, salvo alteração do contrato ou estatuto social. Não se pode ceder fração de quota ou ação, mas épossível constituir condomínio sobre quota ou ação.

Afora a alteração do contrato social ou do estatuto social, nos termos acima vistos,quotas e ações são indivisíveis. Portanto, não é lícito pretender transferir frações de quotaou de ação (meia quota ou 0,46 de ação, como exemplos). Compreende-se, assim, o artigo1.056 do Código Civil, que fala ser a quota indivisível em relação à sociedade, retirando, portal forma, a validade de qualquer ajuste estranho ao contrato social por meio do qual um,alguns ou mesmo todos os sócios estabeleçam uma divisão de quota social. Nem mesmo asociedade pode fazê-lo, razão pela qual, no grupamento de ações, assim como emissão denovas ações por capitalização de lucros ou reservas, chegando-se a frações de ação, háprocedimento específico para resolver a indevida divisão do direito.

Condomínio

A regra de indivisibilidade de quotas e ações em relação à sociedade, salvo se feita pormeio de reforma do ato constitutivo, não impede o estabelecimento de condomínio dequota (artigo 1.056, §§ 1o e 2o, do Código Civil) e de ação (artigo 28 da Lei 6.404/76). Aconstituição desse condomínio poderá dar-se por ato havido entre vivos (ato inter vivos) oupor ter a ocorrência da morte como sua causa (ato causa mortis).

O ato entre vivos pode realizar-se por documento público ou privado, já que não hádeterminação de forma obrigatória; mas será preciso atender às regras societárias: emprimeiro lugar, aprovação pelos demais sócios, quando se tratar de sociedade intuitupersonae; unanimidade na sociedade simples em comum, na sociedade em nome coletivo e

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na sociedade em comandita simples (artigos 997, I, 999 e 1.003 do Código Civil); e, nasociedade limitada, não ter a oposição de mais de 25% do capital social (artigo 1.057 doCódigo Civil); nas sociedades intuitu pecuniae, contratuais (por força de previsãocontratual) ou legais (sociedades por ações), essa aprovação não será necessária. A simplesapresentação do documento por meio do qual o condomínio foi constituído deve bastarpara que a alteração seja feita. Isso é simples, nas sociedades por ações, já que implicamera anotação no Livro de Registro de Ações Nominativas. Na sociedade por quotas,contudo, será preciso alterar o contrato social, fazendo dele constar a existência decondomínio sobre a quota (ou quotas). Se os demais sócios resistirem, os condôminospoderão recorrer ao Judiciário para o exercício de seu direito.

A constituição causa mortis do condomínio pode resultar, antes de mais nada, daprópria morte do sócio, aplicado o artigo 1.784 do Código Civil. Afinal, o espólio acaba porconstituir um condomínio sobre o patrimônio que era do falecido, perdurando até que seresolva a sucessão, partilhando-se os bens entre eventuais meeiros e herdeiros, legítimose/ou testamentários. Portanto, tem-se, nessa situação, um condomínio provisório (artigo1.056, § 1o, do Código Civil), resultado de previsão legal e não podendo ser recusado pelosdemais sócios, mesmo nas sociedades contratuais intuitu personae. Nestas, a recusa se faráao longo do procedimento de inventário ou arrolamento, conduzindo à liquidação da quotaou quotas do de cujus. Nas sociedades intuitu pecuniae ou quando houver aceitação desucessão nas sociedades intuitu personae, ao final do inventário ou arrolamento, judicial ouextrajudicial, duas situações serão possíveis: a meeira e/ou um ou mais herdeiros assumema titularidade das quotas ou ações, com as alterações registrais correspondentes, ou seaceita, mesmo, a manutenção do condomínio sobre a participação societária. Também épossível que a formação do condomínio resulte de disposição de última vontade, tendo otestador previsto uma destinação não fracionária de sua participação, mas em totalidade,sendo sobre ela constituído um condomínio.

Embora o condomínio conduza a uma situação de múltiplos titulares da participaçãosocietária (quota(s) ou ação(ões), indiferentemente), não se atribui a todos os condôminosuma faculdade societária individual, permitindo-lhes participar da vida social isoladamente.Pelo contrário, as faculdades sociais correspondentes às quotas ou ações serão exercidasobrigatoriamente por meio de um representante que deverá ser indicado pelos condôminos,sendo o inventariante, em se tratando do espólio.

Cuida-se de hipótese rara, mas juridicamente possível.

Usufruto

É possível constituir usufruto sobre quotas ou ações. O artigo 1.390 do Código Civilprevê que o usufruto pode recair em um ou mais bens, móveis ou imóveis, em umpatrimônio inteiro, ou parte deste, abrangendo-lhe, no todo ou em parte, os frutos eutilidades. Quando o instituto é aplicado em quotas ou em ações, tem-se um nu-titular, ouseja, alguém que é titular dos títulos societários, mas apenas de seu direito patrimonial; emoposição, haverá um usufrutuário, a quem corresponderá o direito de exercer as faculdadessociais das quotas. O usufrutuário ou usufruidor conserva a posse das quotas ou ações,

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usando-as na coletividade social, inclusive para exercício de voto e para o recebimento dosfrutos, ou seja, dos dividendos.

A constituição do usufruto rege-se pelas regras gerais da cessão de participaçãosocietária, razão pela qual submete-se mesmo às limitações aplicáveis às sociedades intuitupersonae ou, nas sociedades limitadas, à regra do artigo 1.057 do Código Civil, nas quais sesubmete à possibilidade de oposição de titulares de mais de um quarto do capital social, naomissão do contrato. Nas sociedades intuitu pecuniae, trata-se de medida livre. Por isso, asociedade deverá acatá-la, reconhecendo a existência de um acionista cuja titularidade estádespida dos direitos que lhe decorreriam e de um usufruidor das ações, que legitimamentetitularizará as faculdades decorrentes da ação que usufrui.

O usufruto será constituído por meio de instrumento público ou privado, certo nãohaver forma prescrita ou defesa em lei. Nas sociedades por ações o usufruto, deverá seraverbado no livro de registro de ações nominativas, caso não seja escritural, hipótese na quala averbação será feita nos livros da instituição financeira depositária, que o anotará noextrato da conta de depósito fornecida ao acionista. Nas sociedades contratuais, não nosparece que a constituição do usufruto exija alteração contratual, já que não interfere nacomposição societária. Ainda assim, é fato relevante para a vida societária, razão pela qualdeve ser devidamente cientificada aos demais sócios, bem como averbada no RegistroMercantil da sociedade, neste aspecto aplicando-se, em interpretação analógica, o artigo1.057, parágrafo único, combinado com o artigo 1.391, ambos do Código Civil. No entanto,quando o usufruto seja constituído por meio de doação (cessão gratuita das quotas ouações), será indispensável a alteração do contrato social, fazendo constar como sócio(s)o(s) donatário(s). No entanto, é preciso atenção para eventual existência de previsão dedireito de preferência para a transferência dos títulos societários, o que certamente afetaráa possibilidade de cessão das quotas ou ações para a constituição de usufruto, emboradevendo haver particular atenção para as hipóteses relativas a cônjuge, companheiro oudescendentes.

O usufruto de quotas ou de ações rege-se, também, pelas regras ordinárias do instituto: os artigos 1.390 a 1.411 do Código Civil.

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O usufruto se regerá pelas regras dos artigos 1.390 e seguintes do Código Civil,podendo experimentar limitações lícitas dispostas no seu ato de constituição. Portanto, ousufrutuário terá direito ao exercício das faculdades sociais, a incluir a percepção dos frutoscivis das quotas ou ações (distribuições de lucro). O usufruto, por força do artigo 1.392 doCódigo Civil, estende-se aos acessórios do bem e seus acrescidos; essa regra, todavia, temapenas parcial aplicação no Direito Societário. Alcança, por certo, a distribuição dedividendos: o usufrutuário tem o direito de os perceber (artigo 1.394 do Código Civil),desde que não se trate de dividendos decorrentes de lucros já verificados, incluídos os quetenham sido contabilizados sob a rubrica de reservas de lucros a realizar; afinal, segundo oartigo 1.398 do Código Civil, os frutos civis, vencidos na data inicial do usufruto,pertencem ao proprietário, e ao usufrutuário os vencidos na data em que cessa o usufruto.Excetua-se dessa regra, por óbvio, a hipótese de usufruto decorrente de doação de quotasou ações, quando o usufruidor fará jus aos dividendos pendentes, na qualidade de ex-titular(e donatário), bem como aos que venham a ser distribuídos no futuro, na nova qualidade: ade usufruidor.

O artigo 1.392 também se aplica à hipótese de aumento de capital por incorporação delucros ou reservas, ex vi do artigo 169 da Lei 6.404/76, com distribuição de novas ações,incorporando-se essas àquel’outras, dadas em usufruto; a regra deve ser aplicada, poranalogia, às quotas das sociedades contratuais. No entanto, havendo aumento de capitalpor subscrição de novas quotas ou ações, como previsto no artigo 170 da Lei 6.404/76, odireito de preferência assegurado pelo seu artigo 171 tem disciplina própria, anotada no §5o deste dispositivo: é atribuído em primeiro lugar ao acionista com titularidade nua dasações e, somente nos dez últimos dias do prazo para exercício da preferência, aousufrutuário, diante da inércia daquele. Se o sócio nu-proprietário não exerce o direito depreferência e o usufruidor o faz, as quotas e ações subscritas pertencerão a este, ousufrutuário, por igual razão. Nesta hipótese, o sócio usufrutuário, nu-titular das quotas ouações, não está obrigado a entregar tais títulos ao usufrutuário dos outros títulos sociais, jáque a regra geral do artigo 1.392 do Código Civil, prevendo que o usufruto estende-se aosacessórios da coisa e seus acrescidos, comporta exceção, segundo texto expresso do artigo.Não está obrigado, insistimos, mas poderá fazê-lo, sem que isso caracterize constituição denovo usufruto.

Por fim, aplicado o artigo 1.410 do Código Civil, o usufruto de quota extingue-se: (1)pela renúncia ou morte do usufrutuário; (2) pelo termo de sua duração; (3) pela extinçãoda pessoa jurídica, em favor de quem o usufruto foi constituído, ou, se ela perdurar, pelodecurso de trinta anos da data em que se começou a exercer; (4) pela cessação do motivode que se origina; (5) pela liquidação da sociedade, incluindo a sua falência; (6) pelaconsolidação (aquisição das quotas ou ações pelo usufrutuário); (7) por culpa dousufrutuário, quando não exerce os direitos sociais relativos às quotas ou ações.

Penhor

Os artigos 1.419 a 1.460 do Código Civil produziram grande variação em relação aoque se encontrava disposto nos artigos 755 e seguintes do Código Civil. Para principiar,

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utilizou-se o termo bem (artigo 1.419), em lugar de coisa, ao se referir ao objeto dagarantia pignoratícia (penhor); nessa linha, o artigo 1.451 prevê a possibilidade de seremempenhados direitos, suscetíveis de cessão, sobre coisas móveis.5 Portanto, quota ou as quotasde sociedade podem ser dadas em penhor, podem ser empenhadas, servindo como garantiade obrigação assumida por seu titular ou, mesmo, por outrem, certo ser lícito ooferecimento do penhor a favor de obrigação alheia. Coerentemente, o artigo 39 da Lei6.404/76 prevê que as ações podem ser dadas em penhor, constituindo, portanto, umarelação de garantia real ou, em plano maior, de um direito real sobre coisa alheia.

É possível oferecer quotas e ações como garantia (penhor) de uma dívida própria ou de terceiros. Contudo, se a dívida não forpaga, o credor poderá pedir que os títulos societários sejam excutidos: penhorados e alienados para o pagamento da dívida.

No penhor, tem-se uma dívida garantida por um bem móvel, com eficácia erga omnes,nos mesmos moldes do direito de propriedade. Assim, se quotas ou ações foremempenhadas, será constituído um vínculo real entre a relação obrigacional garantida e atitularidade da ação empenhada. Se a obrigação não é adimplida, a tempo e modo, ocredor pignoratício tem o direito de excutir os títulos sociais empenhados (artigo 1.422 doCódigo Civil). Excutir é converter o penhor em penhora, o que se faz em execução do títuloextrajudicial ou judicial. Não é lícito, contudo, estabelecer pacto comissório, ou seja,estabelecer que o credor pignoratício ficará com o bem se a dívida não for paga novencimento; uma tal cláusula é nula (artigo 1.428 do Código Civil). Isso, contudo, nãoinvalida a dação em pagamento, se feita após o vencimento da obrigação, nem mesmoafasta a possibilidade de adjudicação dos bens, pelo credor, em juízo.6

A constituição de penhor sobre títulos societários faz-se pelo registro correspondente(artigo 1.452 do Código Civil) que, no caso, será dúplice: num primeiro plano, Cartório deRegistro de Títulos e Documentos (artigo 127 da Lei 6.015/73). Contudo, esse registro nãoserá suficiente, certo que a publicidade dos atos societários se faz por meio específico paraque, assim, tenha eficácia sobre terceiros. Assim, nas sociedades contratuais, éindispensável haver a averbação da constituição do penhor sobre o direito no registroespecífico correspondente: Registro Civil das Pessoas Jurídicas, se sociedade simples, ou noRegistro Mercantil, a cargo das Juntas Comerciais, se sociedade empresária. A mesma regranão alcança as sociedades por ações; segundo o artigo 39 da Lei 6.404/76, será feitaaverbação do instrumento de contrato de penhor no livro de registro de ações nominativas;em se tratando de ação escritural, o penhor se constitui pela averbação do respectivoinstrumento nos livros da instituição financeira, a qual será anotada no extrato da conta dedepósito fornecido ao acionista. Em ambos os casos, a companhia ou a instituiçãofinanceira tem o direito de exigir um exemplar do instrumento de penhor.

Sobre o penhor de ações, há um destaque de fundamental importância. Em se tratandode obrigação (dívida) da qual seja credora a própria companhia, aplica-se a regra que lheimpede negociar com as próprias ações, anotada no artigo 30, caput, da Lei 6.404/76. O §3o deste mesmo artigo traz vedação expressa nesse sentido: a companhia não poderáreceber em garantia as próprias ações. Essa regra só é excepcionada, segundo o mesmo § 3o

e o artigo 148, ainda da Lei de Sociedades Anônimas, na hipótese de penhor de ações paraassegurar a gestão dos seus administradores; em fato, o artigo 148 permite que o estatuto

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da companhia estabeleça que o exercício do cargo de administrador deva ser assegurado,pelo titular ou por terceiro, mediante penhor de ações da companhia ou outra garantia.

A constituição de penhor, por um dos sócios, sobre suas quotas ou ações na holdingconstitui, sim, um desafio para o planejamento familiar. De abertura, pelo risco de que ostítulos societários sejam excutidos. Como se só não bastasse, o artigo 1.454 do Código Civilconstitui um problema extra, na medida em que outorga ao credor pignoratício não apenasa faculdade, mas igualmente a obrigação de praticar os atos que sejam necessários àconservação do direito empenhado. A norma constitui uma licença para a pretensão depraticar atos de ingerência na sociedade, sob o pretexto de que se está praticando atos deconservação e defesa. Ademais, a alegação de que fatos societários diversos implicaram adeterioração ou depreciação da garantia, em níveis que excedam o normal da vidasocietária, permitirá o pedido de vencimento antecipado da dívida, aplicado o artigo 1.425,I, do Código Civil.

Obviamente, o Judiciário deve ser cauteloso no acolhimento de tais pretensões; isso,contudo, não quer dizer que as pretensões não serão analisadas, ou seja, que o dispositivoacaba por permitir uma judicialização da administração societária da holding. Para evitartais riscos, faz-se necessário criar, no âmbito do contrato social, cláusulas que limitem oimpacto de uma eventual constituição de garantia real sobre a participação societária dequalquer dos sócios. Essas regras devem guardar sintonia com as balizas que orientam acessão dos títulos societários, matéria que será examinada agora.7

Cessão

Quotas e ações são direitos pessoais com expressividade patrimonial econômica e,assim, comportam cessão por ato entre vivos (inter vivos) ou causado pela morte (causamortis). Obviamente, para que isso ocorra, é preciso que sejam respeitados não apenas osrequisitos legais, mas também as regras dispostas no contrato social ou no estatuto social,desde que lícitas. Essa possibilidade de estabelecer regras para regrar a transferência dequotas assume uma importância vital no âmbito das holdings familiares, na medida em queconstitui mecanismo para preservação da unidade societária. Mas essas regras não podem

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constituir um abuso de direito, ou seja, não podem exceder manifestamente os limitesimpostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes, sob penade caracterizarem um ato ilícito (artigo 187 do Código Civil) e, assim, não serem válidas.Esse abuso decorre essencialmente do esvaziamento das faculdades patrimoniais inerentesaos títulos. É o que aconteceria, por exemplo, se as previsões no ato constitutivoconduzissem a uma situação na qual o sócio se visse impossibilitado de fruir a vantagemeconômica de sua participação societária, tendo que simplesmente suportar a condição desócio.

Nas sociedades simples em comum, em nome coletivo e em comandita simples, a regraé que a cessão das quotas demande a aprovação de todos os demais sócios (artigos 997,999 e 1.003 do Código Civil). Essa previsão habitualmente é amainada nos contratossociais por meio de cláusula que assegura a sucessão hereditária legítima,independentemente da aprovação dos demais sócios ou condicionada à simples aprovaçãopela maioria dos sócios remanescentes. Outra cláusula comum é a permissão, nesses tipossocietários, da livre circulação das quotas entre os próprios sócios, criando por meio docontrato social uma regra semelhante àquela que o próprio Código Civil prevê para associedades limitadas. De qualquer sorte, essas limitações ao direito de cessão dos títulos sãocontrabalanceadas pela previsão legal de um direito de recesso, inscrito no artigo 1.029 doCódigo Civil. Nessa senda, o sócio pode retirar-se da sociedade contratada por prazoindeterminado, sem precisar motivar sua iniciativa, vendo liquidada as suas quotas; bastanotificar os demais sócios com antecedência mínima de 60 dias. O mesmo direito derecesso é garantido quando haja sociedade contratada por prazo ou termo certo, ainda nãotranscorrido. No entanto, o exercício desse direito de retirar-se faz-se judicialmente,provando a justa causa para o recesso, segundo a letra do mesmo artigo 1.029.

Nas sociedades contratuais (sociedade simples em comum, sociedade em nome coletivo, sociedade em comandita simples esociedade limitada), a cessão de quotas, de um sócio para outro ou para um terceiro, estranho à sociedade, exige a alteração docontrato social, devidamente arquivada no Registro Público, fazendo constar a nova composição societária.

A sociedade limitada tem suas regras próprias. Assim, a transferência entre vivos éregrada pelo artigo 1.057 do Código Civil, segundo o qual a transferência independe deaudiência dos demais sócios. Já a cessão a terceiro, estranho ao corpo social, pode merecera oposição de sócios que representem mais de 25% do capital social; se isso ocorrer, acessão não poderá se concluir. Portanto, a opção do Código Civil foi tornar a sociedadelimitada intuitu personae, embora não de forma absoluta: não é necessária a aprovação detodos os demais sócios, mas é possível a oposição por aquele(s) que detenha(m) mais de25% do capital social. Essas disposições legais aplicam-se aos contratos que sejam silentessobre o tema. É lícito prever a necessidade de aprovação unânime, criando uma sociedadeinteiramente intuitu personae, assim como se pode prever não ser necessária a aprovação,criando uma sociedade intuitu pecuniae. Também é possível criar parâmetros próprios,como a previsão de um percentual diverso (60%, um terço ou outro qualquer), necessidadede aprovação pela maioria dos demais sócios, independentemente de sua participação nocapital social etc. Outra figura de estipulação comum é a previsão do direito de preferência,nas mesmas condições, em relação a terceiros. A solução mais comum é prever a regular

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cessão causa mortis, ou seja, que diante da morte do sócio suas quotas serão transferidas àmeeira e/ou ao herdeiro ou herdeiros, independentemente da anuência dos demais sócios,ao passo que, em relação a terceiros, prevejam-se limitações. De qualquer sorte, taisprevisões criam uma limitação legítima para o direito de livre disposição dos títulossocietários. Neste sentido, leia-se adiante o caso para ilustração [Plastseven Indústria eComércio Ltda.].

Já as sociedades por ações estão submetidas a uma ampla negociabilidade, já que são,por definição, sociedades constituídas intuitu pecuniae. Essa ampla possibilidade denegociação das ações é facilitada pelo fato de que a transferência não implica prática deatos no Registro Público: a transferência das ações opera-se por termo lavrado no livro detransferência de ações nominativas, datado e assinado pelo cedente e pelo cessionário, ouseus legítimos representantes; se a transferência deu-se em bolsa de valores, o cessionárioserá representado, independentemente de instrumento de procuração, pela sociedadecorretora, ou pela caixa de liquidação da bolsa de valores. Segue-se a averbação no livro deregistro de ações nominativas. Se a transferência resulta de transmissão por sucessãouniversal ou legado, de arrematação, adjudicação ou outro ato judicial, ou por qualqueroutro título, somente se fará mediante averbação no livro de registro de ações nominativas, àvista de documento hábil, que ficará em poder da companhia.

Para as holdings familiares, o artigo 36 da Lei 6.404/76 proporciona uma excelenteoportunidade jurídica, na medida em que admite ao estatuto da companhia fechada aimposição de limites à circulação das ações. A norma, contudo, exige que essas limitaçõessejam minuciosamente reguladas e que, ademais, não traduzam, direta ou indiretamente,uma proibição de negociação, o que implicaria retirar do título uma das faculdadespróprias de seu caráter patrimonial econômico, além de sujeitar o acionista a umaassociação perene (vedada pelo artigo 5o, XX, da Constituição) ou determinar uma situaçãoanáloga à expropriação dos valores relativos à propriedade da ação (violando o artigo 5o,XXIII, da Constituição). O artigo 36 ainda veda que as limitações estatutárias à circulaçãodas ações assumam contorno tal que acabem por sujeitar o acionista ao arbítrio dos órgãosde administração da companhia ou da maioria dos acionistas. Por fim, estabelece que alimitação à circulação, se prevista em alteração estatutária, somente se aplicará às açõescujos titulares com ela expressamente concordarem, o que será averbado no livro de registrode ações nominativas.

Nesse quadro, a situação mais comum é a previsão de um direito de preferência para ospróprios acionistas, a quem as ações deverão ser oferecidas primeiro – em igualdade decondições (preço, prazo de pagamento etc.). De qualquer sorte, como em muitos casos severifica que a cessão das ações, apesar de possível, não é viável, em face dasparticularidades da própria sociedade, a jurisprudência evoluiu para aceitar a dissoluçãoparcial da companhia, apesar de não haver previsão legal nesse sentido, quando severifique que a companhia não está atendendo aos interesses legítimos do acionista e acessão das ações é, na prática, inviável, nomeadamente por se tratar de sociedade familiar.Neste sentido, o Agravo Regimental no Recurso Especial 1.079.763/SP, julgado pelaSegunda Seção do Superior Tribunal de Justiça.

Caso para ilustração

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Plastseven Indústria e Comércio Ltda.

Rodrigo Zanco Bueno, Marcos de Freitas Bueno e Márcia de Freitas Bueno ingressaram com ação ordinária de anulação de cessãode quotas sociais, cumulada com pedido de exercício de preferência, contra Ticino Participações Ltda. e Riccardo Garofletti,argumentando que Riccardo cedera suas quotas à Ticino sem autorização dos demais sócios, contrariando previsão inscrita no contratosocial. Efetuaram o depósito do valor do negócio e pediram para que as quotas lhes fossem transferidas no exercício do direito depreferência. Em sua defesa, os réus afirmaram que a alteração do quadro societário foi proposta pelo contador e auditor da própriaempresa, sugerindo que cada sócio constituísse uma empresa do tipo holding, objetivando benefícios fiscais. Assim, Riccardo Garofletticonstituiu a sociedade Ticino Participações Ltda. com seus familiares, pretendendo integralizar ali o seu capital com as quotas sociais dasociedade Plastseven Indústria e Comércio Ltda., sendo que os autores tinham ciência desse fato. Ademais, os réus alegaram que ocontrato social apenas veda a cessão onerosa das quotas sociais sem a anuência dos demais sócios. Assim, como não houve a necessáriaanuência, o contrato deve ser considerado desfeito, com o retorno das quotas ao cedente, recompondo a coletividade social. Essesargumentos, contudo, não foram acolhidos pela sentença, que julgou procedente o pedido: anulou a cessão de quotas e deferiu oexercício do direito de preferência, apesar da alegação do réu de que as quotas teriam valor muito superior àquele que constava daintegralização do capital da holding.

Por meio da Apelação 366.547.4/0-00, a questão foi levada ao conhecimento da Sexta Câmara de Direito Privado do Tribunal deJustiça de São Paulo. Os desembargadores reconheceram, antes de mais nada, que não houve uma cessão de quotas tipicamenteconsiderada das quotas sociais, mas a formação de compropriedade, por meio da constituição de holding familiar. Ainda assim, essatransferência das quotas dependia do assentimento ou aquiescência formal e expresso dos demais sócios, por força da cláusula 20 docontrato social: “Cláusula 20 – As quotas de capital não poderão ser cedidas ou transferidas a terceiros sem o prévio assentimento dosdemais sócios. A concordância destes será dada preferentemente no próprio instrumento de alteração do contrato social, valendo,contudo, para todos os efeitos e direitos a concordância manifestada em instrumento à parte.”

Assim, mesmo que os demais sócios tivessem conhecimento da intenção do sócio-réu de constituir uma holding para abrigar suaparticipação societária, a cessão de quotas para a sociedade de participação dependia do atendimento ao requisito formal inscrito nocontrato social: o consentimento expresso dos sócios, o que não ocorreu. Contudo, os desembargadores não concluíram que os demaissócios tinham o direito de preferência, à míngua de qualquer previsão nesse sentido, razão pela qual reformaram a sentença nesteaspecto. Isso não significaria o retorno do sócio-réu ao quadro societário, já que os julgadores acolheram o argumento dos sócios-autores de que a demanda em si comprovava a quebra da afinidade societária [affectio societatis]. Por isso, determinaram a liquidaçãode suas quotas, com a apuração de haveres para que fosse apurado o efetivo valor das quotas do sócio réu.

Outras cláusulas e ônus

O artigo 40 da Lei 6.404/76 ainda aceita que ações sejam objeto de alienação fiduciáriaem garantia, tipo contratual no qual a propriedade resolúvel do bem garantidor de umaobrigação, bem como sua posse indireta, ficam com o credor, ao passo que o devedorfiduciário, assumindo a posição de fiel depositário, conserva a posse direta do bemgarantidor. A operação poderá ser constituída mesmo quando o bem alienadofiduciariamente já pertencia ao patrimônio do devedor, conforme a Súmula 28 do SuperiorTribunal de Justiça. A propriedade fiduciária é resolúvel e, assim, paga a obrigação,resolve-se o domínio do credor e o bem passa à titularidade do devedor. A operação temdiversas implicações que fogem ao objeto deste estudo. De qualquer sorte, deve-se destacarque também deverá ser anotada no livro de registro de ações nominativas.

O mesmo artigo 40 permite a constituição de fideicomisso sobre ações. Portanto, élícito ao acionista instituir, por testamento, herdeiros ou legatários para as ações,estabelecendo que tais herdeiros ou legatários – chamados, no contexto do instituto, de

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fiduciários – conservarão a titularidade resolúvel dos títulos sociais até (1) a sua morte, (2)até a verificação de certo termo ou prazo ou (3) sob certa condição, quando as ações serãotransmitidas a outra pessoa, chamada fideicomissário, que é aquele a favor de quem atitularidade se resolve. O fiduciário terá a titularidade das ações, até a realização dacondição (seja a sua morte, seja outra condição).

Por fim, o artigo 40 refere-se a outras cláusulas e ônus que também aceita sejaminstituídos sobre a ação, determinando para todos a averbação no livro de registro de açõesnominativas ou no livro da instituição financeira depositária, se ação escritural. Assim, apenhora das ações, o seu arresto, a promessa de venda, o pacto de preferência etc.

1 Conferir MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: direito societário: sociedadessimples e empresárias. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010. v. 2, capítulo 26 (Sociedades cooperativas).2 Conferir MAMEDE, Gladston et al. Comentários ao Estatuto Nacional da Microempresa e daEmpresa de Pequeno Porte. São Paulo: Atlas, 2007. MAMEDE, Gladston. Direito empresarialbrasileiro: empresa e atuação empresarial. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010. v. 1, capítulo 6 (Micro epequena empresa). MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: direito societário:sociedades simples e empresárias. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010. v. 2, capítulo 5, seção 8(Sociedades de grande porte).3 Conferir MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: direito societário: sociedadessimples e empresárias. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010. v. 2, capítulo 17 (Capital social e ações).4 Conferir MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: direito societário: sociedadessimples e empresárias. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010. v. 2, capítulo 17, seção 6.1 (Resgate deações).5 Conferir MAMEDE, Gladston. Código civil comentado: penhor, hipoteca e anticrese: artigos1.419 a 1.510. São Paulo: Atlas, 2003. v. 14 (Coleção coordenada por Álvaro Villaça Azevedo).6 Conferir MAMEDE, Gladston. Código civil comentado: penhor, hipoteca e anticrese: artigos1.419 a 1.510. São Paulo: Atlas, 2003. v. 14.7 MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: direito societário: sociedades simples eempresárias. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010. v. 2, capítulo 13, seção 4.5 (Penhor de quotas), ecapítulo 19, seção 6.1 (Penhor de ações).

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Relações societárias

Planos diversos

No âmbito de uma investigação sobre holdings familiares, o tema das relações entre sóciospode ser compreendido em dois planos diversos. Num plano interno, colocam-se as relações queos sócios da holding mantêm entre si, reiterando-se o que já se disse anteriormente: a partir daalocação do patrimônio familiar como patrimônio de uma sociedade, por meio de integralizaçãodo capital desta, as relações pertinentes a esse patrimônio deixam de ser familiares e passam a serempresariais ou, mais precisamente, societárias. A investigação dessa dimensão interna corporisda holding é essencial, certo que diz respeito ao relacionamento de seus sócios, suas faculdades eseus deveres.

Por outro ângulo, divisa-se um plano diverso, no qual se listam as relações que a holding, nasua condição de sociedade de participação, manterá com as sociedades nas quais tenhaparticipação societária. Neste plano, destacam-se as relações mantidas entre sociedades,igualmente relevantes para este estudo. Será este o tema de estudo deste capítulo: as relaçõessocietárias ad intra (entre os sócios da holding) e ad extra (entre a holding e as sociedades nasquais detém participação societária).

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Principiaremos pelo exame das relações societárias ad intra, abordando o problema decônjuges sócios, tema vital para a constituição de holdings familiares.

Cônjuges

A constituição de holdings familiares, no Brasil, encontra uma dificuldade no artigo 977 doCódigo Civil que, embora afirme a faculdade de os cônjuges contratarem sociedade entre si, oucom terceiros, impede essa contratação se estiverem casados no regime da comunhão universal debens, ou no da separação obrigatória. A primeira coisa que se afere do dispositivo é a permissãopara que pessoas casadas contratem sociedade com terceiros, faculdade essa cujo exercícioindepende da autorização do respectivo cônjuge. Portanto, não há falar em outorga conjugal,certo que o outro cônjuge não pode se opor à subscrição de quotas ou ações ou, até, ao seurecebimento em negócio oneroso, a exemplo da aquisição. Essencialmente, a participação numasociedade, contratual ou estatutária, é direito pessoal e, assim, não é um daqueles atos jurídicosque necessitem da autorização prevista no artigo 1.647 do Código Civil, excetuado se, para aintegralização do capital social, for necessário transferir ou gravar de ônus real os bens imóveis,hipótese em que a autorização será obrigatória, não por se tratar de contratação de sociedade,mas por força do inciso I daquele artigo 1.647.

O artigo 977 do Código Civil proíbe os cônjuges, casados no regime da comunhão universal de bens ou no regime da separação obrigatóriade bens, de contratarem sociedade entre si ou com terceiros.

Mudando a perspectiva, observa-se que o artigo 977 do Código Civil licencia que cônjugesconstituam sociedade entre si, mesmo quando inclua a participação de terceiros, se o casal forcasado pelo regime da comunhão parcial de bens, regime de participação final nos aquestos eregime de separação de bens (desde que não se trate de regime obrigatório, por força do artigo1.641 do Código Civil). Essa contratação não afeta as relações patrimoniais concernentes aocasamento, que não são prejudicadas pelo fato de os cônjuges terem constituído relaçõessocietárias que superem as relações familiares. Mais do que isso, o artigo 977 é expresso ao sereferir à contratação da sociedade. Assim, aplica-se às sociedades contratuais, simples ouempresárias, ou seja, à sociedade simples em comum, à sociedade em nome coletivo, à sociedadeem comandita por ações e à sociedade limitada. Não se aplica às sociedades estatutárias,

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acreditamos, certo que nessas não há contratação de sociedade, fugindo à hipótese do artigo 977,bem como ao seu contexto legislativo. A sociedade anônima e a sociedade em comandita seregulam pela Lei 6.404/76, que não faz qualquer restrição ao fato de cônjuges serem sócios entresi, incluindo ou não terceiros, sendo indiferente o regime de bens de seu casamento.

No entanto, vige a proibição de os cônjuges, casados em comunhão universal ou emseparação obrigatória de bens, contratarem sociedade entre si. O artigo 977 simplesmente veda aconstituição da sociedade, simples ou empresária, a partir de patrimônios que se comunicam(comunhão de bens) ou de patrimônios que não podem, em função de lei, comunicar-se. Lembre-se que o regime da separação obrigatória de bens alcança as hipóteses arroladas no artigo 1.641do Código Civil, vale citar: (1) pessoas que se casem com inobservância das causas suspensivas dacelebração do casamento; (2) quando qualquer dos cônjuges tenha mais de 60 anos; (3) quando ocasamento dependa de suprimento judicial.

Caso para ilustração

Ancart Participações Ltda.

O Registro de Imóveis da 2a Zona de Porto Alegre suscitou uma dúvida junto ao Judiciário Gaúcho: Theo Carlos e Maria Regina, casados peloregime de comunhão universal de bens, poderiam ser sócios de Ancart Participações Ltda., uma sociedade simples? O juiz disse que não, tendo emvista o artigo 977 do Código Civil. Por meio de apelação, a questão foi levada ao Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, mas a decisão foi amesma. Seguiu-se a interposição do Recurso Especial 1.058.165/RS, examinado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, alegando-seque as limitações legais do art. 977 não se aplicariam às sociedades simples, mas tão somente às empresárias, tendo em vista a localização domencionado dispositivo legal no texto do Código Civil. Localizado no Livro do Código que é dedicado ao Direito da Empresa, as disposiçõessomente diriam respeito à capacidade para ser empresário, aplicando-se, pois, apenas às sociedades empresárias, que, na forma do artigo 982 doCódigo Civil de 2002, são aquelas que possuem por objeto o exercício de atividade própria de empresário sujeito a registro.

A maioria dos julgadores, seguindo o voto da Ministra Nancy Andrighi, concordou com os julgadores gaúchos. Segundo a Ministra, o “artigo977 do Código Civil de 2002 inovou no ordenamento jurídico pátrio ao permitir expressamente a constituição de sociedades entre cônjuges,ressalvando essa possibilidade apenas quando eles forem casados no regime da comunhão universal de bens, tal como ocorre na hipótese dosautos, ou no da separação obrigatória. Em suma, tais restrições possuem a finalidade de evitar que a constituição de sociedades possa ser utilizadacomo instrumento para acobertar eventuais tentativas de burla ao regime de bens do casamento. […] Não há nas características conceituais dassociedades simples e das empresárias peculiaridade alguma que faça supor que a restrição prevista no artigo 977 do Código Civil de 2002 somenteatinja as últimas. […] Assim, em face da ausência de relevante distinção entre a sociedades simples e empresárias no que concerne às suasformas de organização, não se constata a existência de qualquer razão conceitual que faça supor que apenas às sociedades empresárias selegitimaria a restrição do artigo 977 do Código Civil de 2002.”

Essa afirmação fundou-se, antes de mais nada, no artigo 982, segundo o qual “o traço diferenciador entre as sociedades empresárias e assimples é o fato de as primeiras terem por objeto o exercício de atividade própria de empresário sujeito a registro. No que concerne à forma departicipação dos sócios nas sociedades, o artigo 983 do Código Civil de 2002 é expresso ao dispor que a sociedade empresária deve constituir-sesegundo um dos tipos regulados nos artigos 1.039 a 1.092 do Código Civil (sociedade em nome coletivo, sociedade em comandita simples,sociedade limitada, sociedade anônima, sociedade em comandita por ações), sendo facultado às sociedades simples que não desejaremsubordinar-se às normas que lhe são próprias, constituirem-se de conformidade com qualquer um daqueles tipos, exceto os previstos para associedades por ações”.

Dessa maneira, os julgadores não acolheram a pretensão de que, por sua localização, o dispositivo só se aplicaria às sociedades empresárias.“Verifica-se que em todos os artigos insculpidos no mencionado Capítulo II (Da Capacidade) do Título I (Do Empresário), sempre que o legislador sereferiu exclusivamente ao empresário ou à atividade de empresa, o fez de forma expressa, somente não fazendo menção a essa característica no járeferido artigo 977, utilizando a expressão sociedade sem estabelecer qualquer especificação, o que impossibilita o acolhimento da tese de queessa ‘sociedade’ seria apenas a empresária. Registre-se, ademais, que a adoção do entendimento do recorrente poderia levar à conclusão de que olegislador teria se equivocado ao trazer no livro destinado ao Direito de Empresa todos os regramentos atinentes à sociedades simples, afinal,segundo o conceito trazido pela própria lei, essas sociedades não têm por objeto a atividade empresarial.”

O Ministro Massami Uyeda, contudo, foi voto vencido. Para ele, “a interpretação dos dispositivos legais deve ser sistemática, não pode serisolada. Claro, o legislador, dentro da Capacidade, traçou depois o que se deve entender por sociedade. […] A interpretação linear do artigo 977,que fundamenta as decisões que são objeto da impugnação pela via do recurso especial, não se sustenta numa interpretação sistemática dos

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artigos que tratam, especificamente, do tipo, da natureza de sociedade”.

Sócio incapaz

As sociedades, simples ou empresárias, podem ter sócios que sejam incapazes, absoluta ourelativamente. A Lei 12.399/11 alterou o Código Civil para acrescentar um § 3o ao seu artigo 974,prevendo que o Registro Público de Empresas Mercantis a cargo das Juntas Comerciais deveráregistrar contratos ou alterações contratuais de sociedade que envolva sócio incapaz, desde queatendidos, de forma conjunta, os seguintes pressupostos: (1) o sócio incapaz não pode exercer aadministração da sociedade; (2) o capital social deve ser totalmente integralizado; (3) o sóciorelativamente incapaz deve ser assistido e o absolutamente incapaz deve ser representado porseus representantes legais.

Como se sabe, a incapacidade civil absoluta impede a prática pessoal de atos jurídicos, sendonulos os atos praticados pessoalmente pelo incapaz (artigos 3o e 166, I, do Código Civil); oabsolutamente incapaz pratica atos jurídicos por meio de um representante: pais ou tutor(menores de 16 anos) ou o curador (interditados), nos limites franqueados pela legislação.

Tem-se, ainda, a incapacidade civil relativa (artigo 4o do Código Civil), situação na qual apessoa pode praticar, pessoalmente, atos jurídicos, mas a validade desses está condicionada àassistência por seus pais ou tutor (maiores de 16 e menores de 18 anos) ou o curador(interditados), devendo-se respeitar, aqui também, as regras legais que buscam proteger osincapazes. Sem a assistência legal, o ato praticado pelo relativamente incapaz poderá ser anulado(artigo 171, I, do Código Civil), embora se aceite que o ato praticado sem assistência sejaposteriormente ratificado.

Representantes e assistentes não têm amplo arbítrio para agir. Tutores e curadores agem nadependência da autorização judicial, como se afere dos artigos 1.740 a 1.762 e 1.782 do CódigoCivil. Em relação aos pais, há restrição para a alienação de bens imóveis (artigo 1.691 do CódigoCivil), além da previsão de que são pessoalmente responsáveis pela administração ruinosa dosbens dos filhos (artigo 1.637 do Código Civil), podendo ser processados por algum parente oupelo Ministério Público, a quem cumpre a defesa dos direitos e interesses dos incapazes, ou aindapelos próprios filhos, uma vez alcançada a maioridade.

Note-se, contudo, que as restrições legais cunhadas para a proteção das pessoas que revelamincapacidade absoluta ou relativa estão dirigidas para o plano da prática de atos civis e não para oplano da titularidade de bens e direitos. Consequentemente, no plano da Teoria Geral do Direito,não se veda aos incapazes a titularidade de quotas ou ações de sociedades, simples ouempresárias. O sócio é apenas o titular de quotas (quotista) ou ações (acionista); é a sociedadequem pratica atos de empresa. Portanto, incapazes podem (1) receber quotas ou ações emdoação, (2) adquirir onerosamente quotas ou ações e, até, (3) ingressar numa sociedade quandode sua constituição, subscrevendo e integralizando seu capital social. Basta que os atos societáriossejam praticados pelo representante, se absoluta a incapacidade, ou que haja assistência de pai,tutor ou curador, se incapacidade relativa.

Se há incapacidade superveniente ou se ao incapaz toca, por herança, uma participaçãosocietária, situações diversas ocorrem conforme se tenha sociedade intuitu personae ou intuitupecuniae. Nessas últimas, a livre circulação dos títulos conduz à plena sucessão na titularidade dasquotas ou ações. Já nas sociedades intuitu personae, essa sucessão deverá submeter-se às regraslimitadoras da transferência de títulos, se não houver regra no contrato social que assegure a

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sucessão hereditária legítima, o que é comum e recomendável. Assim, na sociedade simples emcomum, na sociedade em nome coletivo e na sociedade em comandita simples, o incapaz deveráser aceito pelos demais sócios (unanimidade), sendo que não poderá assumir a condição de sóciocomanditário, já que implica administração da sociedade. Aliás, o artigo 1.030 do Código Civilexpressamente permite a exclusão judicial do sócio por incapacidade superveniente. Nassociedades limitadas, não há norma específica, mas deve-se aceitar o parâmetro posto no artigo1.057, ou seja, a atribuição da faculdade de oposição a sócio(s) que detenha(m) mais de 25% docapital social.

Por fim, deve-se atentar para a previsão inscrita no artigo 974, § 2o, do Código Civil, segundoo qual obrigatoriamente haverá um limite de responsabilidade entre o patrimônio do incapaz e asobrigações da empresa, que, em relação a si, estarão garantidas apenas pelo que não seja estranhoao acervo da empresa ou ao que seja resultado dos lucros distribuídos, mesmo que se trate desociedade sem limite de responsabilidade (sociedade em nome coletivo, por exemplo), ou, ainda,na hipótese de desconsideração da personalidade jurídica, como previsto no artigo 50 do CódigoCivil ou no artigo 28 do Código das Relações de Consumo (Lei 8.078/90).

Faculdades e obrigações sociais

O estabelecimento de uma sociedade implica a definição de faculdades e obrigações para osseus membros, isto é, para os sócios. Nas sociedades contratuais, essas obrigações são recíprocas:todos os sócios são contratantes entre si. Como não bastasse, a tradição jurídica reconhece,mesmo nessas sociedades, haver obrigações de cada sócio para com a pessoa da própriasociedade. Trata-se de um reflexo da compreensão institucionalista que, no Direito Societário,casa-se melhor com as sociedades por ações (a exemplo das associações), onde faculdades eobrigações não se afirmam em relação aos demais membros (conferir artigo 53, parágrafo único,do Código Civil), mas em relação à instituição, ou seja, à sociedade criada, nos termos do estatutosocial.

Essas obrigações e faculdades mútuas, tanto dos sócios, como da própria sociedade, têm porelemento comum a finalidade que a lei definiu para as sociedades: não importa qual seja o seuobjeto de atuação, sua finalidade é econômica e sua razão de ser é a produção de vantagenspecuniárias (lucro) que possam ser apropriadas pelos sócios. Para outras finalidades há outrasfiguras jurídicas, a exemplo das associações ou das fundações. A sociedade, não. Ela reúnepessoas com a finalidade específica de realizar uma determinada atividade econômica, visando aoestabelecimento de lucro e sua distribuição para os sócios. O fundamento do investimento, damanutenção de valores na sociedade, é este.

Princípios elementares doDireito Societário

→ A personalidade da sociedade é distinta das personalidades de seus sócios

→ O patrimônio da sociedade é distinto dos patrimônios de seus sócios

→ A existência da sociedade é distinta das existências de seus sócios

Essa finalidade, contudo, é cumprida pela sociedade, que é uma pessoa jurídica e, portanto,um ente com personalidade, patrimônio e existência distintos das pessoas de seus sócios, sejamesses pessoas físicas ou jurídicas. Reside aqui a grande dificuldade prática enfrentada nas holdingsfamiliares, cabendo aos operadores do Direito, da Contabilidade e da Administração de Empresasalertar seus clientes: com a transferência do patrimônio para a sociedade patrimonial,

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integralizando o seu capital, os bens passam a ser de propriedade da holding e não de seus sócios.Os sócios são titulares das quotas ou ações da holding, conforme se trate, respectivamente, desociedade contratual ou sociedade institucional. Portanto, o sócio se relaciona com os demaissócios e com a sociedade titular do patrimônio. A personalidade jurídica da sociedade não seconfunde com a personalidade jurídica da sociedade. Um sócio pode negociar com a sociedade,como exemplo. O patrimônio da sociedade não se confunde com o patrimônio dos seus sócios. Asdívidas da sociedade não são dívidas dos sócios (embora possa haver responsabilidade subsidiária,conforme o tipo societário), da mesma maneira que as dívidas dos sócios não são dívidas dasociedade. A existência da sociedade não se confunde com a existência dos sócios. Os sóciospodem morrer e a sociedade perdurar.

Nesse sentido, os membros da família, diante da constituição de uma holding, precisamcompreender que, mais do que cônjuges, filhos, pais, irmãos, primos etc., são sócios. Seusinteresses, seus direitos, seus atos devem considerar as leis que pautam o Direito Societário, bemcomo as normas que constem do ato constitutivo, ou seja, do contrato social ou estatuto social.Nos limites da lei, o ato constitutivo define as relações entre os sócios, regrando a maneira pelaqual serão resolvidos os assuntos internos da sociedade. Todos os sócios e, eventualmente,administradores não sócios estão obrigados a respeitar não apenas a lei, mas as regras inscritas nocontrato social ou no estatuto social. E os conflitos havidos entre eles irão se resolver segundoesses mesmos parâmetros.

Entre os deveres gerais de todos os sócios, em qualquer sociedade, está o comprometimentocom a sociedade, não apenas respeitando o contrato social, mas atuando a bem dos interesses dasociedade, não se admitindo que o exercício do seu poder de voto se faça sobrepondo seu própriointeresse ao interesse da coletividade. Se aceita atuar em sociedade, o sócio não pode pretenderque o seu interesse privado seja superior e predominante ao interesse da sociedade (a pessoajurídica) e sua coletividade social (os demais sócios). Justamente por isso, tanto o Código Civil,quanto a Lei 6.404/76, trazem normas que reprimem a atuação do sócio em conflito de interessescom a sociedade. Contudo, essa repreensão não é tão ampla que impeça o sócio de votar em simesmo para a administração societária. Julgando o Agravo de Instrumento 990.10.005287-0, aSegunda Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo manifestou oentendimento que o fato de um acionista votar em si mesmo para diretor de uma sociedadeanônima não constitui, em princípio, o conflito de interesses previsto no artigo 115 da Lei6.404/76. Realce-se, no entanto, que o relator, Desembargador Morato de Andrade, no corpo deseu voto, ressaltou estar claro “que circunstâncias especiais poderão levar à conclusão de que, emdeterminado caso, a eleição não será válida, por força de motivos graves, concretos ecomprovados que evidenciem a incompatibilidade do candidato com o exercício do cargo, o quepor ora não se tem na hipótese dos autos”.

O sócio deve agir cumprindo com suas obrigações sociais e atuando a bem da realização doobjeto social e da concretização de resultados positivos, respeitados os direitos de todos os demaissócios. Esse comprometimento traduz-se, inclusive, no respeito ao affectio societatis, ou seja, oesforço para manter comportamento afeito à vida social, revelando ânimo para a sua manutenção.Todo sócio está obrigado a atuar, por ações e omissões, a bem da sociedade e da coletividadesocial. Isso não quer dizer que os sócios não possam ter conflitos entre si. Podem sim. O conflito éum direito do sócio, embora limitado pelo dever de convivência e de atuação a favor dasociedade. Esse conflito pode expressar-se nos debates, nas votações e, eventualmente, até mesmono exercício de pretensões judiciais. Mas tais conflitos devem decorrer respeitando a harmoniasocial, ou seja, os parâmetros da boa convivência social e, ademais, visando o melhor para a

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sociedade.Se esses limites são vencidos, a perda da affectio societatis poderá conduzir à exclusão do

sócio, pela sociedade e pelos demais sócios, ou ao exercício do direito de retirada (recesso) pelosócio, contra a sociedade e os demais sócios. Note-se que a previsão do direito de recesso pelaperda da affectio societatis está positivamente restrita às sociedades contratuais. No entanto, ajurisprudência do Superior Tribunal de Justiça evoluiu para reconhecer esse direito nascompanhias familiares. Essa posição exsurgiu do julgamento, pela Segunda Seção, dos Embargosde Divergência no Recurso Especial 111.294/PR:

“– É inquestionável que as sociedades anônimas são sociedades de capital (intuitupecuniae), próprio às grandes empresas, em que a pessoa dos sócios não tem papelpreponderante. Contudo, a realidade da economia brasileira revela a existência, em suagrande maioria, de sociedades anônimas de médio e pequeno porte, em regra, de capitalfechado, que concentram na pessoa de seus sócios um de seus elementos preponderantes,como sói acontecer com as sociedades ditas familiares, cujas ações circulam entre os seusmembros, e que são, por isso, constituídas intuitu personae. Nelas, o fator dominante emsua formação é a afinidade e identificação pessoal entre os acionistas, marcadas pelaconfiança mútua. Em tais circunstâncias, muitas vezes, o que se tem, na prática, é umasociedade limitada travestida de sociedade anônima, sendo, por conseguinte, equivocadoquerer generalizar as sociedades anônimas em um único grupo, com característicasrígidas e bem definidas.

– Em casos que tais, porquanto reconhecida a existência da affectio societatis como fatorpreponderante na constituição da empresa, não pode tal circunstância ser desconsideradapor ocasião de sua dissolução. Do contrário, e de que é exemplo a hipótese em tela, aruptura da affectio societatis representa verdadeiro impedimento a que a companhiacontinue a realizar o seu fim, com a obtenção de lucros e distribuição de dividendos, emconsonância com o artigo 206, II, b, da Lei no 6.404/76, já que dificilmente podeprosperar uma sociedade em que a confiança, a harmonia, a fidelidade e o respeito mútuoentre os seus sócios tenham sido rompidos.

– A regra da dissolução total, nessas hipóteses, em nada aproveitaria aos valores sociaisenvolvidos, no que diz respeito à preservação de empregos, arrecadação de tributos edesenvolvimento econômico do país. À luz de tais razões, o rigorismo legislativo deveceder lugar ao princípio da preservação da empresa, preocupação, inclusive, da nova Leide Falências – Lei no 11.101/05, que substituiu o Decreto-lei no 7.661/45, então vigente,devendo-se permitir, pois, a dissolução parcial, com a retirada dos sócios dissidentes, apósa apuração de seus haveres em função do valor real do ativo e passivo.

– A solução é a que melhor concilia o interesse individual dos acionistas retirantes como princípio da preservação da sociedade e sua utilidade social, para evitar adescontinuidade da empresa, que poderá prosseguir com os sócios remanescentes.”

A solução se aplica às inteiras, às holdings familiares. Aliás, aplica-se com mais ênfase e razãona medida em que sua grande razão de ser é entificar um patrimônio. Sua importância é vital,considerando que as hipóteses legais para o exercício de retirada da sociedade anônima são bemreduzidas, como se estudará no Capítulo 9.

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5 Pactos parassociais

É corriqueiro ouvir especialistas do Direito, da Contabilidade e da Administração de Empresaslistarem os pactos sociais como solução para quase todos os desafios de convivência no âmbito dasholdings familiares. Assim não nos parece. Acreditamos que são o contrato social e o estatutosocial, devidamente registrados, o melhor meio para isso. Ainda assim, não se pode deixar dereconhecer que os acordos entre sócios são um instrumento jurídico valioso, podendo servirmesmo aos interesses e às estratégias dos membros de uma holding; senão todos, dois ou maisque, acordando-se, busquem uma posição predominante na sociedade.

A estipulação de pactos em separado (documentos apartados ou side letters) não é eficaz emrelação a terceiros (artigo 997, parágrafo único, do Código Civil); essa ineficácia, contudo, nãotraduz nulidade: o ajuste é válido entre os seus signatários, se não padecer de qualquer outrovício, mas apenas entre esses. Para os terceiros, será coisa passada entre outros [res inter aliosacta], salvo se forem públicos, ou seja, salvo se houver meios para que os terceiros tomemconhecimento de seu conteúdo. Portanto, é juridicamente possível que os sócios, todos ou alguns,contratem entre si regras específicas para sua atuação societária, extraordinárias ao contratosocial (acordo de quotistas) ou ao estatuto social (acordo de acionistas).

O acordo pode ser celebrado entre todos os sócios (acionistas ou quotistas), situação que nãoé muito comum, salvo justamente em empresas familiares, para cuidar de matérias que, porqualquer motivo, julga-se que não devem constar do ato constitutivo (contrato social ou estatutosocial). É mais usual que esses acordos sejam celebrados apenas entre alguns sócios, permitindo-lhes combinar suas forças e, assim, manter o controle societário, o que é útil quando nenhumdeles, isoladamente, consegue manter esse controle. Nas sociedades familiares, é um preciosoinstrumento para que os parentes possam ajustar regras para garantir não apenas o domínio sobrea empresa, mas mecanismos que estabeleçam um ambiente de boa convivência, como seráestudado nos momentos seguintes deste livro.

É lícito aos sócios, alguns ou todos, celebrar contratos entre si, ajustando o exercício dos direitos societários, como o direito de voto, odireito de escolher os administradores, o direito de preferência na transferência de participação societária, entre outros. Isso se faz pormeio de acordo de quotistas (sociedades contratuais) ou acordo de acionistas (sociedades estatutárias).

O acordo entre sócios é chamado de pacto parassocial, vale dizer, uma convenção paralela aoato constitutivo (contrato social ou estatuto social), ato constitutivo esse que é a principalconvenção que, como visto, define os atributos de existência e funcionamento da sociedade.Justamente por isso, o pacto parassocial não pode contrariar o ato constitutivo, assim como nãopode, obviamente, contrariar a Constituição da República, os princípios jurídicos e as leis. Deveestruturar-se como um ajuste sobre as relações intestinas (interna corporis) da sociedade,concretizada para aquém de suas regras universais, legais ou estatutárias, embora sem poderdesrespeitá-las.

O mais fascinante no mecanismo dos pactos parassociais é a percepção de que suapossibilidade jurídica está assentada sobre a afirmação de uma discricionariedade privada dossócios, ou seja, de uma faculdade jurídica de negociarem os direitos inerentes às suasparticipações societárias, desde que tenham por objeto direito disponível e que sejam respeitadasas balizas postas pelo Direito Obrigacional, Contratual e Societário. Coloca-se, assim, umadimensão interna ao corpo da sociedade, na qual os desígnios societários podem constituirmatéria de contratação prévia, formando-se um ambiente negocial. São obrigações pessoais,

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5.1

resultantes do exercício da liberdade de livre atuação jurídica e econômica, liberdade de contratar,nos limites licenciados pela Constituição e pelas leis (artigos 1º, IV, e 5º, II, da Constituição daRepública), respeitados os princípios jurídicos.

Não há uma definição legal de forma obrigatória, razão pela qual tais convenções poderão terestrutura variada. Podem apresentar-se sob a forma de uma declaração conjunta, de cláusulascontratadas e, mesmo, de uma deliberação comum (uma ata de reunião ou assembleia) dosacordantes. É indiferente. Podem ser simples, prevendo uma cláusula apenas, como a preferência,entre os acordantes, na transferência de quotas ou ações, assim como podem ser complexas,prevendo obrigações e faculdades diversas, até procedimentos executórios, podendo mesmo regero controle da sociedade. Podem eleger foro para a solução de pendengas, ainda que diverso dasede social e do foro de eleição que conste do ato constitutivo. Podem definir mecanismos paravoto uniforme (voto conjunto, combinado), inclusive limitando as matérias a que se aplica ouenvolver todas as matérias, assim como podem trazer cláusula de arbitragem.

Portanto, os acordos de quotistas ou de acionistas podem ter por objeto qualquer direitodisponível, próprio da realidade social, direta ou indiretamente. Não são válidos se vencem oslimites legais, principiológicos e, mesmo, se desrespeitam o ato constitutivo. Não lhes é lícitoultrapassar o limite de sua função social, bem como os parâmetros da boa-fé e da probidade,razão pela qual constitui ato ilícito o pacto parassocial urdido para prejudicar o restante dacoletividade social. A parassocialidade não pode ser espaço de negação da sociedade e do podersoberano da coletividade geral.

Em oposição, podem ser mecanismos poderosos para a preservação da sociedade, seusdireitos e interesses. Ilustra a previsão de cláusula de não concorrência, por meio da qual osacordantes assumem a obrigação de não participar de outra sociedade que atue no mesmosegmento econômico. Assim, todas as oportunidades negociais que surjam na área – ou em áreasafins, conforme a previsão do acordo – deverão ser obrigatoriamente apresentadas àadministração societária para que sejam aproveitadas pela sociedade.

O acordo parassocial é, exclusivamente, um acerto de atuação societária lícita, ética e proba.Não pode ser meio para a prática de voto abusivo, ou para descumprimento (direto ou indireto)de qualquer obrigação social, como o correto exame de contas e atos de administração, o queimplicaria desconsiderar a verdade do que se passou para estabelecer o artificialismo de umapostura de anuência cega com posturas que podem ser lesivas à companhia, aos acionistas emesmo a terceiros: o Estado, a comunidade, os trabalhadores etc. Tanto é assim que o § 2º doartigo 118 da Lei 6.404/76 deixa claro que os acordos não poderão ser invocados para eximir osócio de responsabilidade no exercício do direito de voto, ou do poder de controle. Portanto, osócio acordante responderá pelo ato ilícito, incluindo o abuso no direito de voto.1

É preciso muito cuidado com a composição do acordo, ou seja, com a definição dos termosque serão ajustados pelas partes (os sócios) e que os obrigarão. Atenção ao que se coloca e ao quese deixa de colocar em cada cláusula, ônus e bônus. Em muitos casos, a omissão de certaobrigação pode parecer uma vantagem, mas, em certo ponto, pode revelar-se um problema. Aindaque haja uma mesma essência no acordo de sócios, há distinções importantes entre o acordo deacionistas e o acordo de quotistas, razão pela qual vamos nos debruçar sobre cada um deles paraexplorar suas peculiaridades.

Acordo de acionistas

O acordo de acionistas é a figura mais comum no Direito brasileiro. O artigo 118 da Lei

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5.2

6.404/76 permite que o acordo de acionistas seja arquivado na sede da companhia, se tiver porobjeto a compra e venda de ações, a preferência para adquiri-las, o exercício do direito a voto ou dopoder de controle, a partir do que a própria empresa estará obrigada a observar o ajuste, emboranão esteja vinculada a outros pontos que tenham sido legitimamente ajustados, fora de taismatérias.2 Não é arquivamento obrigatório, mas a opção de manter o ajuste oculto não vinculará acompanhia e/ou terceiros.

Arquivado o acordo, a companhia poderá solicitar aos seus membros esclarecimentos, nomomento do arquivamento ou posteriormente, quando surja dúvida sobre os seus termos ouaplicação. No ato de arquivamento do acordo, será indicado um representante para comunicar-secom a companhia, prestando ou recebendo informações, quando solicitadas. Essa representaçãolimita-se à interlocução com a companhia; não configura mandato para proferir, em assembleia,voto contra ou a favor de determinada deliberação. Para caracterizar o mandato, faz-se necessáriohaver cláusula expressa no ajuste, que poderá até ter prazo que supere um ano, que, afora oacordo de acionistas, é o limite de representação ordinária nas assembleias gerais (artigos 118, §7º, e 126, § 1º, da Lei 6.404/76).

Ausente a cláusula de mandato, será mantido o exercício individual do direito de presença,voz e voto nas assembleias, embora beneficiando-se os demais pactuantes das garantias inscritasnos §§ 8º e 9º do mesmo artigo 118: como resultado da vinculação da companhia aos termos doacordo de acionista arquivado em sua sede, o presidente da assembleia ou do órgão colegiado dedeliberação da companhia não computará o voto proferido com infração de acordo de acionistasdevidamente arquivado.

Se um acordante estiver ausente da assembleia ou da reunião de órgão de administração dacompanhia, ou mesmo se pretender abster-se de votar, qualquer outro partícipe do acordodevidamente arquivado terá o direito de votar com as ações pertencentes ao acionista ausente ouomisso, fazendo valer o ajuste parassocial. Para tanto, deverá, de pronto, levantar questão deordem, invocando o ajuste arquivado e, com base nele, requerer o direito de votar pelo acionistaausente ou omisso. O indeferimento desse requerimento implicará anulabilidade da deliberação, oque poderá ser pedido por qualquer dos signatários do acordo de acionistas. A mesma regra seaplica ao caso de membros do conselho de administração eleitos nos termos de acordo deacionistas, permitindo à parte prejudicada votar pelo conselheiro ausente ou omisso.

A eficácia das faculdades e obrigações disposta no acordo de acionista, perante terceiros,pressupõe publicidade. Assim, deverá ser arquivado na companhia e averbado nos livros deregistro e nos certificados das ações. Em se tratando de ações escriturais, a ausência do certificadode ações criará uma dificuldade, certo que não se dá a terceiros acesso aos livros e documentossocietários. Será preciso, portanto, arquivamento na Junta Comercial que, de resto, é medidaaconselhável em qualquer caso, mesmo havendo certificado de ação no qual se anotou aexistência do ajuste parassocial. Ainda no âmbito das sociedades por ações, se o ajuste dispõesobre política de reinvestimento de lucros e distribuição de dividendos, a companhia – se aberta –deverá informá-las à assembleia geral, no relatório anual (artigo 118, § 5º, da Lei 6.404/76).3

Acordo de quotistas

A possibilidade jurídica do acordo de quotistas, em qualquer sociedade contratual, simples ouempresária, decorre da própria teoria geral do Direito Obrigacional e, ademais, da liberdade deação jurídica e econômica que é garantida pelo artigo 1º, IV, da Constituição da República, atodas as pessoas no Direito brasileiro. Também é óbvio que, uma vez estipuladas tais obrigações,

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são elas válidas entre os seus acordantes, aplicados os artigos 1º, IV, e 5º, II, da Constituição daRepública, além dos artigos 107, 112, 113, 219, 247 a 249 e 421 a 425 do Código Civil.

A possibilidade do arquivamento do acordo de quotistas no Registro Mercantil resulta da Lei8.934/94, que cuida do Registro Público de Empresas Mercantis e Atividades Afins. Logo em seuartigo inaugural, essa norma prevê que o Registro Mercantil tem por finalidade dar garantia,publicidade, autenticidade, segurança e eficácia aos atos jurídicos das empresas mercantis. Olegislador referiu-se genericamente a atos jurídicos, sem os limitar. Na sequência, o artigo 2º dizque os atos das firmas mercantis individuais e das sociedades mercantis serão arquivados noRegistro Público de Empresas Mercantis e Atividades Afins, independentemente de seu objeto, salvoas exceções previstas em lei. E a Lei 8.934/94 não veda a averbação do acordo de quotistas emqualquer de seus artigos, dentre os quais cabe realçar o artigo 35, no qual são arroladas asproibições de arquivamento. Ademais, seu artigo 32, I, e, prevê que o registro mercantilcompreende o arquivamento de atos ou documentos que possam interessar ao empresário e àsempresas mercantis, definição na qual se alberga, confortavelmente, o acordo de quotistas.

A grande vantagem é que o arquivamento do acordo de quotistas no Registro Público faz comque ganhe eficácia perante terceiros, o que pode ser essencial para matérias como o direito depreferência na aquisição de quotas. Se o acordo está arquivado na Junta Comercial, não poderá oterceiro pretender o direito à cessão de quotas concretizada em desrespeito ao direito depreferência, argumentando ser estranho ao ajuste e/ou desconhecê-lo.4

Execução e resolução

Os pactos parassociais, envolvam quotistas ou acionistas, são contratos e, assim, submetem-seàs regras gerais do Direito Obrigacional e do Direito dos Contratos, na mesma toada em quetambém estão submetidos ao Direito Societário, certo ter a sociedade e a empresa como objetos,alcançando o comportamento econômico-social dos pactuantes, nos limites da lei e do atoconstitutivo. Trata-se de ajuste que depende da existência da sociedade para existir, mas écontrato acessório. O pacto deve ser voluntariamente cumprido por seus signatários ou poderáhaver aplicação coercitiva. Mas sua realização pressupõe conformidade com a Constituição, as leise o estatuto. Não é lícito pretender execução do ajuste parassocial para obrigar seus partícipes adeliberar contra a lei, a exemplo de medidas que contrariem a legislação ambiental ouconsumerista.

A execução do acordo de sócios pode ser posta em dois planos diversos. O primeiro plano dizrespeito exclusivamente à sociedade anônima quando o ajuste parassocial seja arquivado na sededa companhia e tenha por objeto (1) a compra e venda de ações, (2) a preferência para adquiri-las,(3) o exercício do direito a voto ou do poder de controle (artigo 118 da Lei 6.404/76). Nesse caso, aexecução faz-se pelas regras do próprio artigo 118. De abertura, impedimento de negociação nabolsa ou no mercado de balcão das ações vinculadas ao acordo de acionistas averbado na sede dacompanhia (§ 4º), garantindo a manutenção da proporção de participação dos pactuantes nasdeliberações sociais. Garante, ademais, o que Barbosa Filho chama de acordos de bloqueio, visandoevitar a dispersão da titularidade das ações dos pactuantes, circunscrevendo sua circulação entreestes, nos termos do acordo.5 Em segundo lugar, a obrigação do presidente da assembleia geral oudo órgão colegiado de deliberação da companhia não computar o voto proferido com infração deacordo de acionista devidamente arquivado (§ 8º). Some-se a permissão aos pactuantes parasubstituir o acionista – ou mesmo o membro do órgão colegiado – ausente ou omisso (§ 9º).

Portanto, a execução do acordo de acionistas no alusivo ao exercício do direito a voto ou do

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poder de controle comporta execução no plano da própria companhia, que está vinculada aostermos que estejam expressos no instrumento que foi arquivado em sua sede. Isso pode tornar-seum desafio, já que o acordo pode envolver um conjunto de regras próprias para o exercícioconjunto das faculdades instrumentais do acionista; mas as dúvidas solucionam-se com aaplicação do § 11 do mesmo artigo 118, permitindo o pedido de esclarecimentos. Ademais, aindacomo consequência dos §§ 8º e 9º, afirma-se a possibilidade de ir ao Judiciário para anular adeliberação na qual se tenha computado voto proferido com infração do acordo de acionista,determinando-se, ademais, que a companhia respeite os termos do pacto arquivado, como lhedetermina o caput do artigo 118.

Noutro plano, colocam-se três casos: (1) o acordo de acionista que tenha por objeto temasestranhos ao rol anotado no caput do artigo 118 da Lei 6.404/76; (2) o acordo de acionistas nãoarquivado na sede da companhia; e (3) o acordo de quotistas, nas sociedades contratuais. Nessescasos, o ajuste não se beneficia dessas formas específicas de execução. Será preciso recorrer àsregras gerais que disciplinam a execução de obrigação de fazer, incluindo a obrigação de prestardeclaração de vontade, como o voto ou a transferência de ações. Entretanto, não se pode afastar apossibilidade de o próprio negócio parassocial estabelecer solução diversa, desde quejuridicamente possível, a exemplo da estipulação de multa. Obviamente, para que seja executada,a convenção parassocial deverá apresentar-se líquida e certa.

Também no alusivo à resolução, o pacto parassocial segue a regra geral dos contratos,havendo que distinguir entre (1) contratação por prazo indeterminado, (2) contratação vinculadaa condição resolutiva e (3) contratação por prazo ou em função de termo determinado. Se oacordo de sócios for estipulado por prazo indeterminado, qualquer um dos pactuantes o poderádenunciar, respeitando os requisitos estipulados no ajuste para tanto. Não havendo qualquerestipulação, basta notificar as demais partes, sendo usual a concessão de prazo de 30 dias paraque o ajuste compreenda-se como extinto. Não é correto pretender irrevogável o acordo de sóciosque não tenha cláusula de revogação, assim como não é lícita a cláusula de irrevogabilidade. Asobrigações anotadas no acordo parassocial caracterizam pacto de trato sucessivo: prestações que sesucedem, prolongando a realização do ajuste. A irrevogabilidade, assim, caracterizaria sujeiçãoeterna da parte, figura estranho ao Direito brasileiro, senão incompatível. Submeter o sócio, adaeternum, ao acordo é expropriá-lo de suas faculdades juridicamente assinaladas, a bem deinteresses privados.

Havendo cláusula expressa estipulando condição resolutiva, deverá ser esta respeitada.Aplicado o artigo 127 do Código Civil, enquanto não se realizar a condição resolutiva, vigorará onegócio jurídico, podendo exercer-se desde a conclusão deste o direito por ele estabelecido. Noentanto, ainda segundo aquele Código, não são lícitas as condições que contrariem a lei (onegócio será invalidado se estipulada condição ilícita ou de fazer coisa ilícita, segundo o artigo123, II, do mesmo Código), a ordem pública ou os bons costumes, estando proibidas as condiçõesque privem de todo efeito o negócio jurídico, bem como aquelas que sujeitem o ato ou negócio aopuro arbítrio de uma das partes. Assim, é possível pedir a declaração judicial da invalidade decondição resolutiva que tenha sido fixada de modo a impedir a resolução do pacto, determinandoilegítima sujeição ad eternum das partes.

Mais fácil é a hipótese de pacto ajustado por prazo ou a termo, se não se tratar de estipulaçãoque, por seus termos, implique sujeição indefinida ou desproporcional. Nesse caso, o acordosomente poderá ser denunciado motivadamente, segundo suas próprias normas ou normas legais,dentre as quais, creio, a exceção de contrato não cumprido e a resolução por onerosidade excessiva.Assim, na decisão do Recurso Especial 388.423/RS, a Quarta Turma do Superior Tribunal de

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Justiça afirmou ser “admissível a resolução do acordo de acionistas por inadimplemento daspartes, ou de inexecução em geral, bem como pela quebra da affectio societatis, com suporte nateoria geral das obrigações, não constituindo impedimento para tal pretensão a possibilidade deexecução específica das obrigações constantes do acordo, prevista no art. 118, § 3º, da Lei6.404/76”.6

Outros pactos parassociais: regulamentos internos

A possibilidade de estipulação de pactos societários para além do ato constitutivo (contratosocial ou estatuto social) não conduz exclusivamente à figura do acordo de sócios, nos moldesacima analisados. A bem da precisão, a coletividade social tem poder para estipular regras para asua convivência e, como decorrência, para o funcionamento da empresa. A partir dessapossibilidade jurídica, coloca-se a oportunidade de se estabelecerem regulamentos comoregimento interno, código de conduta dos administradores e/ou sócios, código de ética societária,código de governança corporativa etc.

É preciso ressaltar que, agora, não estamos falando sobre contratos celebrados entre certos(uns ou todos) sócios para acertar matérias como conteúdo de voto, eleição conjunta deadministradores, direito de preferência etc. Estes são os acordos de quotistas e acionistas, queanalisamos acima e vinculam o exercício das faculdades sociais. Agora, estamos chamando aatenção para outro plano dos pactos parassociais: como ocorre nos condomínios, nos clubesrecreativos e noutros ambientes coletivos, podem-se ajustar regulamentos internos.

Importa atentar para as matérias que, de acordo com o Código Civil (sociedades contratuais)e a Lei 6.404/76 (sociedades por ações), podem ser decididas por maioria simples. Todas essasmatérias podem ser dispostas nesses regulamentos, a principiar do regulamento interno,instrumento habitualmente composto para cuidar de questões relativas aos trabalhadores, masque também podem cuidar de disciplinar matérias que digam respeito à coletividade social, desdeque aprovadas por número de sócios correspondente ao quórum exigido para a deliberaçãodaquela matéria.

Assim, por exemplo, o regimento pode trazer a vedação de que parentes, sanguíneos ou porafinidade, sejam contratados para trabalhar na empresa, como empregados ou como prestadoresde serviço; a vedação pode alcançar cônjuge, companheiro(a), namorado(a) e outras pessoas comas quais o(s) administrador(es) e/ou sócio(s) mantenha(m) envolvimento afetivo e/ou sexual.Também é ambiente onde podem ser dispostas regras sobre o funcionamento das reuniões ou

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assembleias de sócios, o que nos remete para a figura do manual de reuniões ou assembleias(proxy statement), ele próprio um regramento interno, como se estudará adiante.

A grande vantagem dos instrumentos de regulamento interno, recebam o nome que se lhesatribua (regimento interno, código de ética, código de boa governança etc.), é criar regras que,sendo válidas e eficazes entre os sujeitos envolvidos na empresa (sócios, administradores,gerentes, empregados), não precisam ser publicadas e, portanto, permitem tratar de questõesmais delicadas. É quanto basta para que se torne uma ferramenta extremamente útil paraempresas familiares, podendo cuidar de assuntos como as regras para a sucessão entre osfamiliares, os requisitos mínimos para a contratação de parentes para postos na empresa etc.

Proteção dos minoritários da holding

Um dos grandes riscos da entificação do patrimônio familiar pela constituição de umasociedade holding é a transmutação da natureza jurídica das relações mantidas pelos familiares,que passam a estar submetidas ao Direito Empresarial e, mais especificamente, ao DireitoSocietário. Isso torna possível que acordos parassociais, formais ou informais venham a criarprejuízos para alguns dos partícipes. Com efeito, como resultado desses ajustes, alguns partícipes(alguns familiares) podem se perceber na condição de sócio minoritário, com as limitações daídecorrentes. Por exemplo, numa sociedade com três irmãos, o acordo entre dois pode prejudicar oterceiro. Essa situação é, infelizmente, muito comum e, portanto, é preciso que o fundador estejaatento para a possibilidade de que venha a ocorrer. A forma por excelência para evitar um talcenário funesto é a prevenção, não por meio dos pactos parassociais, que podem ser denunciadose, assim, extintos, com maior facilidade. O contrato social ou o estatuto social, respectivamentenas sociedades por quotas e por ações, são o melhor instrumento para dispor normas de proteçãoaos minoritários, mormente quando se preveja a necessidade de aprovação unânime para a suaalteração.

Não é só isso. Como a holding e as empresas produtivas constituem instâncias societáriasdiversas, aplicadas as regras ordinárias, dispostas no Código Civil e na Lei 6.404/76, os membrosda sociedade de participação experimentarão algumas dificuldades para o exercício dafiscalização dos atos praticados no âmbito das sociedades controladas, ainda que tais atos sejampraticados por cônjuge, irmão, primos etc. Se agem com honestidade e boa-fé, os controladorese/ou administradores trabalham a favor das sociedades e da holding, ambiente que favorece atodos. Contudo, distorções no comportamento que se espera desses atores familiares podem, sim,determinar um enredo de abusos. Como dissemos anteriormente, as relações familiares passam aser resolvidas segundo o regime jurídico empresarial. Nesse sentido, a urgência, que é própria aosconflitos familiares, acaba por ver-se enredada por um ambiente que atende a outra lógica: oDireito Societário.

Esse contraste entre cenários suportados por princípios diversos nem sempre é de assimilaçãofácil, como se afere, por exemplo, do julgamento do Agravo de Instrumento 990.10.179220-6,pela Segunda Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo. No caso, a sócia deuma holding familiar (uma sociedade anônima), detentora de 48,95% das ações, moveu uma açãocautelar contra o outro acionista, seu ex-marido, a quem pertenciam as ações restantes. Pretendeua concessão de medida limitar sem a audiência da parte contrária [inaudita altera pars], para quelhe fossem exibidos demonstrativos financeiros, relatórios de auditores, atos societários edescrição detalhada de endividamento das empresas com bancos e governo, tudo para queesclareça a causa dos vultosos prejuízos apresentados pelas mesmas no último exercício. A Corte,

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contudo, confirmou o indeferimento da medida: “indiscutível embora o direito de fiscalização daautora, as providências solicitadas são de muita amplitude, não sendo aconselhável o deferimentoda liminar antes de se possibilitar a manifestação das rés [as sociedades]. Afinal, há divergênciaentre as partes até mesmo sobre a extensão desse direito de fiscalização no que toca às empresascoligadas”. Concluíram os julgadores: “Após a contestação, o pleito poderá ser reiterado emprimeiro grau.” Facilmente se percebe que a urgência do problema familiar foi submetida àcadência que deve orientar os interesses institucionais nos conflitos entre sócios, nomeadamenteno contexto das companhias (Lei 6.404/76).

A constituição de uma holding pode afastar os seus sócios dos negócios e do patrimônio das sociedades filiadas e controladas. Isso podepermitir abusos por parte daqueles que eventualmente controlem a holding e, assim, controlem as sociedades empresariais.

Contudo, como se verá no caso para ilustração, abaixo transcrito, a Quarta Turma do SuperiorTribunal de Justiça, julgando o Recurso Especial 1.223.733/RJ, chamou a atenção para aparticularidade do vínculo existente entre os sócios da holding familiar: “A existência da relaçãojurídica entre as empresas controladas e as holdings familiares está intimamente relacionada como liame jurídico entre estas e a recorrente, defluindo-se daí interesses diretos e indiretos sobretodas as sociedades empresariais do grupo, uma vez que o aviltamento do patrimônio dassociedades controladas acarretará, consequentemente, o esvaziamento do patrimônio dassociedades controladoras, da qual a recorrente integra diretamente o quadro social.” Nessecontexto específico, os julgadores chamaram atenção para as implicações da participação indiretados sócios da holding familiar nas sociedades controladas. Superando a distinção entre sócio diretoe sócio indireto (sócio da holding controladora), entenderam os julgadores existir “interesse em severem exibidos documentos que, em virtude de relações jurídicas coligadas, são comuns àspartes”, ou seja, entenderam pelo direito dos sócios da holding de exercerem atos de fiscalizaçãosobre as sociedades fiscalizadas.

Segundo os ministros, “sob a ótica de que, in casu, a personalidade jurídica no grupo deempresas deve ser tomada dentro da realidade maior da junção das empresas componentes, e nãono seu aspecto meramente formal, a confiança que deve reinar entre os sócios da empresatambém deve imperar no relacionamento entre os sócios da holding e as empresas coligadas,constituindo-se em um dos pilares da affectio societatis.” Assim, “ao impedir-se o acesso darecorrente aos documentos das empresas coligadas apenas com fundamento em umainterpretação restritiva dos artigos 1.020 e 1.021 do Código Civil, corre-se o risco de instaurar-se,ou arrefecer-se, um clima de beligerância entre os sócios da holding, comprometendo a existênciada affectio societatis e, em última análise, atuando contra os princípios da confiança e dapreservação da empresa”.

De qualquer sorte, independentemente dessa solução jurisprudencial, há uma alternativajurídica para evitar situações como essas. O mecanismo mais comum é o acordo de quotistas, nassociedades contratuais, ou o acordo de acionistas, nas sociedades estatutárias. Por meio dessesajustes parassociais, assinado por todos os membros da família, regulam-se questões como odireito de preferência na aquisição dos títulos societários (quotas ou ações) de seus membros,exercício do poder de voto, ocupação dos cargos da administração societária, direito defiscalização dos atos administrativos, da escrituração contábil e dos documentos empresariais,realização de auditorias, direito de retirada (recesso) da sociedade, ingresso de terceiros nasociedade, entre tantos outros. Todavia, acordos de quotistas ou acionistas são contratos e, assim,as partes que os firmaram a eles não estão vinculadas para sempre. Aliás, raramente o Direitoaceita a constituição de obrigações perpétuas e esse não é um dos casos. Portanto, pode haver a

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retirada de um ou mais acordantes, com efeitos nefastos sobre o equilíbrio das relações entre osquotistas ou acionistas da própria holding.

Em oposição, a colocação dessas cláusulas no âmbito do próprio ato constitutivo, ou seja, docontrato social ou do estatuto social, protegido por uma cláusula que estabeleça a necessidade devoto unânime para que sejam alterados, acabará por criar uma proteção mais eficaz. O atoconstitutivo pode trazer qualquer norma que não contrarie a legislação, incluindo os princípiosjurídicos, embora a validade dessas previsões esteja também vinculada ao respeito da mesmalegislação e princípios. Com efeito, uma cláusula lícita pode ser executada de forma ilícita, aexemplo do abuso de direito resultante do desrespeito à função social da respectiva faculdadejurídica, bem como a desatenção aos princípios da boa-fé e da honestidade.7

Não se esqueça, ademais, que a colocação no ato constitutivo de regras de proteção a todos ossócios, designadamente os minoritários, incluindo direitos que se estendem, de forma legítima(não abusiva), sobre as sociedades controladas, constituirá medida de boa governança corporativa,refletindo uma preocupação bem atual da teoria societária. Assim, diversos instrumentos podemser erigidos, como a constituição de conselho consultivo, a previsão de que as deliberações devemser aprovadas não apenas pela maioria do capital social, mas também pela maioria dos sócios(voto por cabeça), a previsão de quórum mais elevado ou, até, o estabelecimento de indispensávelunanimidade nas votações.

Caso para ilustração

Única Participações Ltda.

Regina ajuizou uma ação cautelar de exibição de documentos contra as sociedades Única Participações Ltda., Naveriver Navegação FluvialLtda., H. Dantas Construção e Reparos Navais Ltda., H. Dantas Comércio, Navegação e Indústrias Ltda., H. Dantas Serviços Marítimos e PortuáriosLtda., Caboto Comercial e Marítima Ltda., Speedboat – Serviços de Transporte e Turismo Ltda., Flunave Fluvial Navegação Ltda. e SulnorteServiços Marítimos Ltda. A ação também foi dirigida contra José, Adolfo e Augusto, sócios da autora. A petição inicial argumentou que a autora erasócia minoritária de uma holding familiar, sociedade que controlaria as sociedades rés, alegando que os sócios majoritários estariam se utilizandode subterfúgios e artimanhas para impedir seu acesso à administração das sociedades controladas. Assim, pediu a exibição de documentos queseriam imprescindíveis ao exercício da fiscalização da administração das controladas.

Como haveria participação direta em algumas sociedades e participação indireta noutras, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro manteve aobrigação de exibição de todos os documentos requeridos tão somente em relação às sociedades nas quais a autora constasse do quadro socialcomo integrante, de forma direta. Por meio do Recurso Especial 1.223.733/RJ, o caso mereceu o exame da Quarta Turma do Superior Tribunal deJustiça, que manifestou-se de forma distinta, seguindo o voto do Ministro Luiz Felipe Salomão. Para os julgadores, tem-se nítida “a constituição deuma holding, cujas empresas das quais a recorrente integra diretamente o quadro social, são também controladoras daquelas em que nãoparticipa, ao menos de maneira direta, do capital estipulado no contrato social”. Ressaltou-se, ademais, tratar-se de holding familiar. “Nessecenário, cinge-se a controvérsia em saber se a participação indireta tem o condão de conferir ao sócio da holding familiar – que participa doquadro social de outras empresas –, o direito de pedir a exibição de documentos que a lei confere aos sócios destas últimas. Com efeito, nostermos do art. 1.021 do Código Civil e art. 844, II, do CPC, o sócio tem direito de acesso aos documentos da sociedade, a fim de analisar eventualirregularidade na administração e para exame da pertinência de possível ação.”

“No presente caso, contudo, para a resolução justa da controvérsia, não pode ser dado o excessivo peso, como fez o acórdão recorrido, aofato de a recorrente não ser sócia direta das empresas das quais requer a exibição dos documentos, para afastar-lhe esse direito. Isso porque, apeculiaridade do caso recomenda uma mitigação da norma de direito material, uma vez que a recorrente é sócia de quatro holdings familiares,estas, por sua vez, sócias controladoras das empresas das quais o acórdão recorrido afastou a obrigação de exibição dos documentos. Sobreleva,aqui, para além da questão do sócio direto, o interesse em se verem exibidos documentos que, em virtude de relações jurídicas coligadas, sãocomuns às partes. Observa-se que os documentos cujo teor pretende a recorrente conhecer se encontram diretamente relacionados às atividadesdas empresas Speedboat – Serviços de Transporte e Turismo Ltda., Flunave Fluvial Navegação Ltda., Sulnorte Serviços Marítimos Ltda. e H. DantasServiços Marítimos e Portuários Ltda., das quais são sócias majoritárias, respectivamente, Única Participações Ltda., Naveriver Navegação FluvialLtda. e H. Dantas Comércio, Navegação e Indústrias Ltda., e, destas, a autora detém quotas do quadro social.”

Prosseguiram os julgadores: “Retomando a questão relativa à possibilidade de os autores obterem os documentos desejados, é bem de ver

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que, no presente caso, tratando-se de uma holding familiar, a relação jurídica dos sócios desta com as empresas por ela controladas ressoa aindamais evidente esse direito. Isso porque, ao se criar uma holding familiar, objetiva-se a concentração e proteção do patrimônio da família,facilitando a gestão dos bens e ainda obtendo maiores benefícios fiscais em caso de sucessão. Não havendo nenhuma limitação ou determinaçãosobre a sua natureza jurídica, a ‘chamada holding familiar não é um tipo específico, mas uma contextualização específica’, sendo que sua ‘marcacaracterística é o fato de se encartar no âmbito de determinada família e, assim, servir ao planejamento desenvolvido por seus membros, considerandodesafios como organização do patrimônio, administração de bens, otimização fiscal, sucessão hereditária etc.’(MAMEDE, Gladston. Holding familiar esuas vantagens: planejamento jurídico e econômico do patrimônio e da sucessão familiar. São Paulo: Atlas, 2011, p. 5). No grupo de empresas deque cuidam os presentes autos, a recorrente é sócia de quatro holdings que – possuindo quase a totalidade das quotas das demais empresas dogrupo –, deixam de ser apenas depositárias de participações societárias, assumindo papel primordial de governo de toda a organização. Assim,consoante preleciona Gladston Mamede, na já referida obra Holding Familiar: ‘A holding pode se tornar a sociedade que representa o conjunto dassociedades controladas, na mesma proporção em que também representa a família que a controla’ (p. 55).”

“[…] Desse modo, a existência da relação jurídica entre as empresas controladas e as holdings está intimamente relacionada com o liamejurídico entre estas e a recorrente, defluindo-se daí interesses diretos e indiretos sobre todas as sociedades empresariais do grupo, uma vez que oaviltamento do patrimônio da sociedade controlada acarretará, consequentemente, o esvaziamento do patrimônio da sociedade controladora.[…] Ademais, na hipótese de ocorrer a prática de atos fora dos limites do contrato social, em desvio de finalidade ou para fins de confusãopatrimonial, poderá surgir, inclusive, a desconsideração da personalidade jurídica do grupo, sendo atingido o patrimônio dos sócios, dentre eles, arecorrente. Conquanto aqui não se esteja a estabelecer previamente a possibilidade de desconstituição, essa hipótese, ao menos em tese, revela-se pertinente para se demonstrar a presença do interesse da recorrente em verificar a regularidade na administração do grupo, no qual édetentora, ainda que minoritária, de quotas das empresas controladoras. Ademais, a reforçar a presença do interesse da recorrente, cumpreressaltar que a legislação nacional possui, em seus mais diversos campos, dispositivos que tratam da responsabilidade solidária ou subsidiária dassociedades integrantes de grupos econômicos como o art. 2o, § 2o, da CLT, o art. 17 da Lei 8.884/94, o art. 28 do CDC e o art. 30, IX, da Lei8.212/91.”

“A esta altura, vale rememorar que o grupo empresarial familiar em questão foi constituído sob a forma de sociedade limitada, onde ossócios foram congregados, por ocasião da sua constituição, por motivações pessoais, agindo substancialmente como força atrativa a afeiçãorecíproca e a mútua confiança que permeava entre eles, considerada a base da affectio societatis. Esta última, analisada sob o seu aspecto objetivo,‘traduz o dever geral de todos os sócios de atuarem a bem da sociedade, permitindo que se realizem as suas funções jurídica, econômica e social’(MAMEDE, Gladston. Direito Societário. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 104). Dessa forma, ao impedir-se o acesso da recorrente aos documentosdas sociedades coligadas apenas com fundamento em uma interpretação restritiva dos arts. 1.020 e 1.021 do Código Civil e do art. 844, II, do CPC,corre-se o risco de instaurar, ou arrefecer, um clima de beligerância entre os sócios da holding, comprometendo a existência da affectio societatis e,em última análise, atuando contra o princípio constitucional da preservação da empresa.”

Resultados sociais: lucros ou perdas

A atividade desenvolvida por qualquer sociedade tem um resultado positivo ou negativo. Sepositivo, fala-se em superávit ou, ainda, em lucro; se negativo, fala-se em déficit ou, melhor, emprejuízo. Essa vantagem ou desvantagem econômica são da sociedade, não dos sócios, já que opatrimônio e a atuação é da pessoa jurídica e não dos titulares de suas quotas ou ações. Noentanto, esses resultados da sociedade acabam por produzir efeitos sobre o patrimônio dos sócios,inclusive quando se trate de uma holding familar, o que justifica a presente análise.

Nas sociedades por quotas, de acordo com o artigo 997, VII e VIII, o contrato social deveráestipular a participação de cada sócio nos lucros e nas perdas, bem como estipular se os sóciosrespondem, ou não, subsidiariamente, pelas obrigações sociais. Assim, o contrato social deveráestipular a participação dos sócios nos lucros e nas perdas sociais, sendo vedada a exclusão dequalquer deles de uma ou outra participação, excetuados os sócios cuja contribuição socialconsista em trabalho, que somente participa dos lucros, na proporção da média do valor dasquotas (artigo 1.007 do Código Civil). Consequentemente, participar dos lucros é direito do sócio,assim como participar das perdas é um dever do sócio; e será nula a estipulação contratual queexclua qualquer sócio de participar dos lucros e das perdas, à exceção, reitero, do sócio obrigado à

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prestação de serviços, no que se refere às perdas (artigo 1.008).Os benefícios da sociedade, inclusive de uma holding, devem ser atribuídos a todos os sócios.

Não se admite a utilização do bem coletivo (e a sociedade o é), a bem de um ou alguns, emprejuízo de outro(s). Essa questão surgiu no julgamento do Agravo 1.0024.02.790738-5/001 pela11a Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, no qual a relatora, DesembargadoraSelma Marques, reconheceu a irregularidade de empréstimos indevidamente realizados pelaholding a terceiros, sem a cobrança de juros ou correção monetária. Os prejuízos sofridos pelasociedade deveriam ser indenizados pelos responsáveis, o que se refletiria no direito do sócio que,pleiteando sua retirada (direito de recesso), buscava a liquidação de suas quotas. “A utilizaçãopelos agravantes, sócios controladores, da importância auferida pela holding de forma contráriaao objeto social da empresa, para beneficiarem outras sociedades das quais têm participação fereo dever de lealdade existente entre os sócios.”

No que diz respeito às perdas, os efeitos sobre os sócios dependerá do regime a que estejasubmetido o tipo societário. Na sociedade simples ordinária e na sociedade em nome coletivo,assim como em relação aos sócios comanditados da sociedade em comandita simples e sóciosdiretores das sociedades em comandita por ações, se os bens da sociedade não sejam o suficientepara satisfazer a suas obrigações, a suas dívidas, os sócios responderão pelo saldo com seus bensparticulares; é a responsabilidade subsidiária. Entretanto, os bens dos sócios só podem serexecutados pelas dívidas da sociedade depois que os bens sociais o forem.

Nas sociedades limitada e anônima, assim, como em relação aos sócios comanditários dasociedade em comandita simples e sócios não diretores da sociedade em comandita por ações, nãohá falar em responsabilidade subsidiária pelas obrigações não satisfeitas pela sociedade. Contudo,a aplicação desse limite de responsabilidade pressupõe a prática de atos lícitos. Se oadministrador ou se os sócios, em coletividade, praticarem atos ilícitos dos quais resultem danos,econômicos ou morais, a outrem, deverão indenizar os prejuízos resultantes. O limite deresponsabilidade serve para a proteção dos sócios contra os riscos do negócio, nunca para aprática de atos ilícitos. Neste caso, a responsabilidade é pessoal e não se afasta, sequer, com aretirada da sociedade ou com a extinção desta. É responsabilidade aquiliana, fruto da prática deato ilícito, ainda que no exercício da condição de sócio e do poder de votar nas deliberaçõessocietárias.

Assim, diante do Agravo 1.0024.02.790738-5/001, a 11a Câmara Cível do Tribunal de Justiçade Minas Gerais reconheceu a legitimidade de ex-sócios de uma holding para responder a ação naqual se pleiteava indenização por prejuízos sofridos pela inadequada administração da sociedade.“Foram eles os beneficiados pelos possíveis prejuízos causados ao autor pela falha da repartição,distribuição e aplicação dos lucros (posto que não teriam sido os lucros referidos nem distribuídospara os autores, nem incorporados à sociedade). Ademais, o fato de terem incorporado aopatrimônio pessoal o valor correspondente às quotas que possuíam na sociedade somente fazagravar suas responsabilidades, e não eximi-las. […] Assim, uma vez julgadas procedentes asdemandas pendentes, não há dúvidas de que os sócios beneficiados com a aplicação equivocada(segundo as alegações do autor) dos lucros da sociedade, deverão ser responsabilizados.”

Relações entre sociedades

Para além das relações societárias interna corporis, aqui já examinadas, importa tambémexaminar as relações societárias mantidas pela holding com outras sociedades, ou seja, suasrelações com sociedades coligadas. Afinal, na grande maioria dos casos as holdings apresentam-se

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como sociedades de participações, ou seja, sociedades constituídas com a finalidade de deterquotas ou ações de outras sociedades, nomeadamente empresas operacionais, conservando opoder societário correspondente a determinada participação, em bloco, o que iria se desfazer sehouvesse um fracionamento pela sucessão hereditária. Por outro ângulo, mesmo quando aholding é constituída com objetivos maiores, qualificando-se como sociedade patrimonial, ou seja,titularizando bens móveis e imóveis, materiais e imateriais, é usual que parte desse acervopatrimonial seja composto por quotas ou ações de empresa, recolocando o problema da coligaçãosocietária, ou seja, das relações societárias entre sociedades.

O Código Civil lista sob o rótulo geral de sociedades coligadas todas as relações de capitalmantidas entre sociedades (artigo 1.097 do Código Civil). Essas relações de capital podem ser detrês tipos, segundo esse mesmo artigo: (1) controle, (2) filiação (ou coligação, em sentido estrito)ou (3) mera participação societária. A situação de controle não é exclusivamente matemática(50% + 1 voto), embora seja óbvio que seja controlador aquele que detenha a maioria absolutado capital votante, se o ato constitutivo (contrato social ou estatuto social) não prevê outromecanismo ou outra equação para o controle societário, como muito se estudou neste livro:necessidade de unanimidade, estabelecimento de quórum qualificado, necessidade de simultâneaaprovação por cabeça (voto per capita), entre outras.

A condição de controlador (e, por extensão, de sociedade controladora) resulta de umasituação de fato, apurada em cada caso dado em concreto: a capacidade de decidir as deliberaçõessociais e eleger a maioria dos administradores, de modo duradouro, constantemente (artigo 243,§ 2º, da Lei 6.404/76 e artigo 1.098, I, do Código Civil). Quando há participação societária difusa,o controle pode ser obtido com menos de 50% do capital votante. Pode haver mesmo controleindireto. Isso ocorre quando a titularidade das ações ou quotas necessárias para decidir asdeliberações sociais e de eleger a maioria dos administradores for de uma sociedade que, por seuturno, seja controlada por outra. Assim, se A controla a Sociedade Ypsilon, tendo o poder dedecidir seus desígnios, e se essa sociedade controla a Sociedade Dáblio, tendo o poder de decidirseus desígnios, A exerce o controle, ainda que indireto, da Sociedade Dáblio, como na ilustração:

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Essas estruturas societárias em cadeia são construídas com finalidades diversas; podematender a certo planejamento societário, buscando dar aos negócios uma organografia adequada,assim como podem servir a certas estratégias societárias.8 Basta lembrar que estruturas em cadeiapermitem exercer o controle com menor desembolso de capital, admitindo sócios nascontroladoras intermediárias. Não é uma questão jurídica por que se faz isso; o Direito importa-secom a possibilidade de fazê-lo e os meios corretos para tanto, além dos reflexos da situação. ODireito é o meio que permite a concretização de estratégias planejadas por administradores deempresa, investidores, consultores etc.

A situação de controle societário, mesmo quando manifestada por uma outra sociedade(inclusive uma holding, nos moldes aqui estudados), determina não apenas vantagens, resultantesda faculdade de exercer o poder de voto nas deliberações e eleições sociais. Determina,igualmente, obrigações para com a sociedade e para com a coletividade social. Por exemplo, nascompanhias abertas, o controlador deve informar imediatamente as modificações em sua posiçãoacionária na companhia à Comissão de Valores Mobiliários e às Bolsas de Valores ou entidades domercado de balcão organizado nas quais os valores mobiliários de emissão da companhia estejamadmitidos à negociação, nas condições e na forma determinadas pela Comissão de ValoresMobiliários (artigo 116-A da Lei 6.404/76). Mais do que isso, é certo que constitui ato ilícito oexercício do poder de controle societário fora dos limites da licitude, da boa-fé, da probidade e,mesmo, desconsiderando as funções sociais da companhia. Essa responsabilidade do acionistacontrolador tem expressão positiva no artigo 117 da Lei 6.404/76, que a contempla comodecorrente de atos praticados com abuso de poder, embora não se possa afastar a hipótese de atosdolosos, por motivos óbvios.

Distinta da condição de controle é a situação de mera coligação. A expressão sociedadecoligada pode ser utilizada em sentido largo (artigo 1.097 do Código Civil), abrangendo assituações em que uma sociedade participa do capital social de outra, haja controle, filiação oumera participação. Em sentido estrito, sociedade coligada é sinônimo de sociedade filiada (artigos1.099 e 243, § 1º, da Lei 6.404/76). Há filiação ou coligação, em sentido estrito, quando umasociedade titulariza, no mínimo, 10% do capital de outra sociedade, sem que, contudo, tenha estacontrole sobre aquela, ou seja, sem que a empresa coligada tenha capacidade de decidir asdeliberações sociais e de eleger a maioria dos administradores. É indiferente tratar-se de capitalvotante ou não; o legislador não fez qualquer restrição. Importa tratar-se de uma participação queo legislador considera relevante: mais de 10% do capital de outra sociedade.

Em oposição, há simples participação societária quando uma sociedade possua menos de 10%do capital com direito a voto de outra sociedade (artigo 1.100 do Código Civil). A limitação aocapital com direito a voto, feita pelo legislador, não se sustenta. Seu efeito seria deixar no limbo asparticipações inferiores a 10% do capital sem direito a voto, o que resultaria, nesses casos, num

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enfraquecimento do capital social nos casos de participação recíproca, o que não é desejável.O artigo 1.101 do Código Civil veda que uma sociedade participe de outra, que seja a sua

sócia (caracterizando, portanto, participação recíproca) em montante que seja superior ao de suaspróprias reservas, excluída a reserva legal, isto é, reservas que sejam determinadas por leiespecífica, a exemplo do artigo 193 da Lei 6.404/76. Portanto, a participação recíproca somente étolerada nos limites dos lucros que, não tendo sido distribuídos, foram reservados na sociedade.9

Dessa maneira, evita-se o aviltamento da garantia geral que os ativos empresariais devemproporcionar para os respectivos passivos empresariais. Evita-se, assim, o risco deenfraquecimento do capital social das sociedades em que há participação recíproca. Se a sociedadeA tivesse R$ 500.000,00 em quotas da sociedade B e esta, por seu turno, tivesse R$ 500.000,00em quotas da sociedade A, esses direitos se compensariam e, assim, apesar de existirem naescrituração contábil de ambas as pessoas jurídicas, não se traduziriam em riqueza efetiva.

A participação recíproca só é admitida se há reservas de capital em montante superior aovalor da participação recíproca, excluída a reserva legal, ou seja, as reservas que sejamdeterminadas em lei, a exemplo do artigo 193 da Lei 6.404/76. São reservas de capital os valoresque, embora pudessem ser distribuídos como lucros, foram conservados na sociedade para, assim,fortalecê-la. Esses valores são escriturados em rubrica própria (reserva de capital) e não seconfundem com outras rubricas similares: fundos e provisões, que abordaremos adiante, quandoexaminarmos a administração financeira das sociedades empresariais familiares. Fundos eprovisões não atendem à exigência de reservas, por montante superior ao valor da participaçãorecíproca (artigo 1.101 do Código Civil). É preciso que os valores estejam escriturados comoreserva, isto é, que constituam sobra de valores conservada voluntariamente na contabilidade semfinalidade específica (reserva inominada), servindo ao reforço do capital registrado. A participaçãorecíproca está limitada a tal reserva.

As quotas e as ações titularizadas por sociedades com participações recíprocas que excedam ovalor das reservas inominadas de capital constituirão participação societária indevida. Ademais, adescoberta desse excesso de participação societária recíproca, a partir da aprovação do balançopatrimonial, implica a obrigação de alienar as quotas ou ações em excesso, no prazo de 180 dias,contados daquela aprovação (artigo 1.101, parágrafo único, do Código Civil). Enquanto essaalienação não for providenciada, a sociedade não poderá exercer o direito de voto correspondenteàs ações ou quotas em excesso. A desatenção à determinação legal de transferência das açõesimplicará caracterização de fraude societária, dando azo até à desconsideração da personalidadejurídica, podendo atingir, conforme o caso, administradores e sócios.10

A sociedade controladora e suas controladas podem constituir um grupo de sociedades, mediante convenção pela qual se obriguem acombinar recursos ou esforços para a realização dos respectivos objetos, ou a participar de atividades ou empreendimentos comuns.

Por fim, será proveitoso esclarecer que a participação recíproca, que acabamos de analisar, nãose confunde com a participação cruzada, muito comum em famílias empresárias. A evolução dahistória familiar, na exploração dos negócios, pode conduzir a situações de participação cruzada,ou seja, cenários nos quais os mesmos parentes são sócios de sociedades diversas, mas emproporções inversas: o(s) controlador(es) de uma sociedade é minoritário noutra e vice-versa.

Não há limitação legal para isso, nem requisitos específicos ou limites de capital. Aliás, taissituações não oferecem grandes desafios sempre que as partes envolvidas conseguem manterrelações harmônicas entre si. Há casos nos quais, apesar dos percentuais diversos nas sociedades,estabelece-se mesmo uma situação de controle comum, podendo mesmo ver-se estabelecida uma

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9.1

administração compartilhada das duas sociedades, incluindo uma economia com os custos dagestão administrativa (back office), o que é lícito.

No entanto, registram-se casos em que a convivência entre tais parentes azeda e, assim, asituação de controle comum se desfaz: cada parte invoca a sua condição de controlador dessa edaquela sociedade, exercendo seu poder societário. Nesse cenário, a participação cruzada pode setornar um grande problema, pois as desavenças podem criar um conjunto de retaliaçõesrecíprocas, tornando-se um obstáculo para o bom andamento da empresa e, ainda mais, para oseu crescimento. Nesses cenários, é recomendável a intervenção do advogado e de consultoresempresariais para buscarem uma forma de desfazer a participação cruzada e, assim, resolver oproblema.

Um último ponto deve ser observado: os administradores não podem, em prejuízo de umasociedade, favorecer sociedade coligada, controladora ou controlada. Cumpre-lhes zelar para queas operações entre as sociedades, se houver, observem condições estritamente comutativas, oucom pagamento compensatório adequado; os administradores respondem civilmente perante asociedade gerida pelas perdas e danos resultantes de atos que desrespeitem tal regra (artigo 245da Lei 6.404/76). Coligação, aqui, interpreta-se em sentido largo, a incluir as hipóteses decontrole, de mera filiação e, até, de mera participação societária.

Para além da responsabilidade dos administradores, há a responsabilidade da própria pessoajurídica: a sociedade controladora está obrigada a reparar os danos que causar à controlada porinfração de suas obrigações de controle. O poder de controle deve ser utilizado para fazer asociedade realizar o seu objeto e cumprir sua função social, respeitando os direitos dos demaissócios, de todos aqueles que trabalham na empresa, além dos direitos e interesses da comunidade(artigo 246).

Subsidiária integral

Outra alternativa jurídica para a composição da arquitetura societária da(s) atividade(s)negocial(is) de uma família é a constituição de uma subsidiária integral. O artigo 251 da Lei6.404/76 autoriza que uma sociedade anônima seja constituída, mediante escritura pública, tendouma sociedade brasileira como único acionista. A subsidiária integral é outra pessoa jurídica,outra sociedade. Mas só tem um sócio: ela é controlada por uma outra sociedade, o que podeservir para planejamento societário ou patrimonial. Por exemplo, no Brasil, companhias queexploram rodovias, concedidas pelo Poder Público, constituem uma subsidiária integral para cadaconcessão. Assim, a Concessionária da Rodovia Presidente Dutra S/A é uma subsidiária integral daCCR S/A. Aliás, nestes casos, fala-se em sociedade de propósito específico (SPE), certo que acompanhia foi constituída com o propósito específico de administrar a concessão da RodoviaPresidente Dutra.

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A intercomunicação marcante entre as sociedades deixa a subsidiária integral em condiçãoanáloga à de órgão social da controladora, embora com autonomia subjetiva (personalidadejurídica própria) e patrimonial (faculdades – inclusive a titularidade de bens – e obrigaçõespróprias), o que implica escrituração contábil própria. Apesar do controle integral, cuidam-se deduas sociedades diversas, duas pessoas jurídicas diversas.

Segundo a Lei 6.404/76, a subsidiária integral deverá ser, obrigatoriamente, uma sociedadeanônima. A regra mantém-se válida na constituição de sociedades anônimas que sejamsubsidiárias integrais. Contudo, em face da Lei 12.441/11, alguns juristas passaram a sustentar apossibilidade de constituição de empresas individuais de responsabilidade limitada (eireli) porpessoas jurídicas; a prevalência desse entendimento, sobre o qual ainda pairam muitas dúvidas,levará à possibilidade de se constituir subsidiária integral sob duas formas diversas: sociedadeanônima ou eireli.

As dúvidas não param aí. A constituição de subsidiária integral, nos termos da Lei 6.404/76,só pode ser feita por sociedade brasileira, ou seja, por sociedade constituída no Brasil, segundo asleis brasileiras e com sede no país, ainda que seus sócios e seu capital sejam estrangeiros. Amesma limitação não alcançaria a eireli, caso prevaleça o entendimento de que pode ter umapessoa jurídica como titular, permitindo, assim, que sociedades empresárias estrangeirasconstituíssem-se empresas individuais de responsabilidade limitada no país.

Não é essa a nossa posição, contudo, embora não se possa prever qual entendimentoprevalecerá no Direito brasileiro, depois de a questão ser levada aos tribunais. Por isso, por ora,vamos voltar à regência da Lei 6.404/76, ou seja, vamos retornar à figura da sociedade anônimasubsidiária integral, deixando de lado a figura da eireli.

Como a subsidiária integral tem um único acionista, sua constituição se faz por subscriçãoprivada, ou seja, por meio de escritura pública. No entanto, se a sociedade acionista for umacompanhia de capital aberto, a operação estará submetida às normas e ao controle da Comissãode Valores Mobiliários, em face das suas inequívocas repercussões sobre os interesses dosacionistas da controladora, além de investidores e, por fim, do mercado como um todo.

Pode-se criar uma subsidiária integral ou transformar uma sociedade anônima em subsidiáriaintegral. Para essa transformação, bastará que uma sociedade brasileira, seja qual for a sua formasocietária, adquira todas as ações de uma determinada companhia, convertendo em subsidiáriaintegral (artigos 251, § 2º, e 252 da Lei 6.404/76). É teoricamente possível, inclusive, operaçãomais complexa: aquisição de todas as quotas de uma sociedade contratual e, no prazo de 180dias, durante o qual é lícita a unicidade social (artigo 1.033, IV, do Código Civil), providenciar-setransformação societária em companhia, com previsão estatutária de cuidar-se de subsidiária

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9.2

integral.A condição de companhia subsidiária integral de outra sociedade é reversível. É possível

admitir outros acionistas, seja por meio de aumento de capital, com emissão de novas ações, sejaalienando parte das ações, restaurando a pluralidade de acionistas. Isso pode ocorrerconservando-se o controle acionário ou, mesmo, alienando-o, embora conservando participaçãosocietária.11

Grupo de sociedades

Ademais, a holding (sociedade controladora) e suas controladas podem constituir um grupode sociedades, um conjunto empresarial regulado por uma convenção específica (um contrato, umato de constituição do grupo), por meio da qual se obriguem a combinar recursos ou esforços paraa realização dos respectivos objetos sociais, ou a participar de atividades ou empreendimentoscomuns (artigo 265 da Lei 6.404/76). A constituição do grupo de sociedade pressupõe a existênciade uma sociedade controladora e, em contraste, de sociedades controladas. A sociedadecontroladora poderá ser uma sociedade de participação ou holding pura ou mista.

Parece-nos que o uso reiterado dessas expressões, pelos artigos 265 a 274 da Lei 6.404/76,implica não se admitir a constituição formal de um grupo de sociedades quando há mera situaçãode coligação ou filiação (10% ou mais do capital da outra sociedade, sem que haja controle).Aliás, o artigo 265, § 1º, não só exige o controle das sociedades filiadas (expressão que podecausar dúvida, em face do texto do artigo 1.097 do Código Civil), mas também exige controle demodo permanente, embora aceite controle direto ou indireto, bem como controle resultante deacordo com outros sócios de quotistas ou acionistas.

A impossibilidade de constituição formal, vale dizer, de constituição de direito do grupo semque haja uma relação de controle societário, não impede sociedades meramente coligadas deagruparem-se de fato, vale dizer, informalmente, inclusive mediante o estabelecimento plenamenteválido de uma convenção intragrupal. Não há norma jurídica que o vede. Mas não será um grupode sociedades em sentido estrito, não podendo sequer usar as palavras grupo ou grupo de sociedade,por expressa proibição do artigo 267, parágrafo único, que as reservam para os gruposorganizados de acordo com a Lei 6.404/76.

A convenção de grupo societário deverá conter os elementos listados pelo artigo 269 da Lei6.404/76:

(1) A designação do grupo, ou seja, o seu nome, do qual constarão as palavras grupo desociedades ou grupo (artigo 267); nada impede que o núcleo da denominação repita o núcleo dadenominação de uma das sociedades do grupo: Grupo Abril e Editora Abril S.A.

(2) A indicação da sociedade de comando, necessariamente brasileira (artigo 265, § 1º), e dassociedades filiadas.

(3) As condições de participação das diversas sociedades, esclarecendo como se dará acombinação de recursos e/ou esforços para a realização dos respectivos objetos sociais, aparticipação em atividades ou empreendimentos comuns, respeitando a lei e os atos constitutivos.

(4) O prazo de duração, se houver, e as condições de extinção.

(5) As condições para admissão de outras sociedades e para a retirada das que o componham;a retirada é elemento intrínseco à convenção do grupo de sociedades (artigo 269, V); os grupossocietários são cindíveis por definição, caracterizando a previsão contrária como indevida sujeiçãode uma parte às demais, cláusula leonina e, assim, inválida. As condições para admissão e para a

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retirada não podem contrariar leis; por exemplo, não se pode estabelecer que sociedademeramente coligada, da qual a sociedade de comando não detém o controle, passe a fazer partedo grupo.

(6) Os órgãos e cargos da administração do grupo, suas atribuições e as relações entre aestrutura administrativa do grupo e as das sociedades que o componham. As relações entre associedades, a estrutura administrativa do grupo e a coordenação ou subordinação dosadministradores das sociedades filiadas serão estabelecidas na convenção do grupo, embora cadasociedade conserve personalidade e patrimônios distintos (artigo 266). Particular atenção deveser dada aos atos constitutivos das sociedades filiadas – estatutos ou contratos sociais –, quedeverão compatibilizar-se com o que dispõe a convenção, sob pena de a adesão ao grupocaracterizar ato ultra vires e, assim, não vincular a respectiva sociedade. Assim, a adesão ao grupopode exigir alterações nas cláusulas do ato constitutivo, designadamente naquelas que cuidam daadministração e/ou representação societária.

(7) A declaração da nacionalidade do controle do grupo; o grupo de sociedades considera-sesob controle brasileiro se (a) a sua sociedade de comando está sob o controle de pessoas naturaisresidentes ou domiciliadas no Brasil; (b) pessoas jurídicas de direito público interno; ou (c)sociedade ou sociedades brasileiras que, direta ou indiretamente, estejam sob o controle destasúltimas (artigo 269).

E (8) as condições para alteração da convenção.

A convenção de grupo deve ser aprovada (artigo 270), observando as normas para alteraçãodo contrato social ou do estatuto, exigindo, portanto, voto favorável de acionistas querepresentem metade, no mínimo, das ações com direito a voto, se maior quorum não for exigidopelo estatuto (artigo 136, V). Garante-se aos sócios dissidentes da deliberação o direito derecesso, com reembolso de suas ações ou quotas, segundo as regras estudadas anteriormente,inclusive no que se refere ao prazo decadencial e à possibilidade de a deliberação ser revertidapela assembleia, avaliando os efeitos nefastos do reembolso pedido. A sociedade que, por seuobjeto, dependa de autorização para funcionar só pode participar de grupo de sociedades após aaprovação da convenção do grupo pela autoridade competente para aprovar suas alteraçõesestatutárias (artigo 268).

Uma vez aprovada a convenção pela sociedade controladora (sociedade de comando) e portodas as sociedades controladas (sociedades filiadas), deverá ser ela levada a arquivamento noregistro do comércio da sede da sociedade de comando, juntamente com as atas das assembleiasgerais, ou instrumentos de alteração contratual, de todas as sociedades que tiverem aprovado aconstituição do grupo, além de declaração autenticada do número das ações ou quotas de que asociedade de comando e as demais sociedades integrantes do grupo são titulares em cadasociedade filiada, ou exemplar de acordo de acionistas que assegura o controle de sociedadefiliada. Se as sociedades filiadas tiverem sede em locais diferentes, deverão ser arquivadas noregistro do comércio das respectivas sedes as atas de assembleia ou alterações contratuais quetiverem aprovado a convenção, sem prejuízo do registro na sede da sociedade de comando.

O grupo se considerará constituído a partir da data do arquivamento, cuja certidão deverá serpublicada na imprensa, passando a sociedade de comando e as filiadas a usar as respectivasdenominações acrescidas da designação do grupo. As alterações da convenção do grupo tambémserão devidamente arquivadas, cumpridas as formalidades legais, e publicadas para valerem emrelação a terceiros; a falta de cumprimento dessas formalidades, no entanto, não pode ser opostapela companhia, ou por seus acionistas, a terceiros de boa-fé.

Atente-se para o fato de que o grupo de sociedades não tem personalidade jurídica própria,

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não é uma pessoa jurídica. É apenas uma convenção entre pessoas jurídicas (as sociedades decomando e as filiadas), embora disponha de uma estrutura administrativa, definida na convenção,podendo ter, inclusive, órgãos de deliberação colegiada e cargos de direção geral (artigo 272 daLei 6.404/76). A representação da sociedade de comando e das filiadas cabe exclusivamente aosrespectivos administradores societários, em conformidade com os respectivos estatutos oucontratos sociais. É possível, contudo, que a convenção, devidamente arquivada e publicada,disponha expressamente de modo diverso (artigo 272).

Em sua atuação, os administradores das sociedades filiadas observarão suas atribuições,poderes e responsabilidades, de acordo com os respectivos estatutos ou contratos sociais, masigualmente a orientação geral e as instruções expedidas pelos administradores do grupo, desdeque não importem violação da lei ou da convenção do grupo. Os administradores do grupo e osinvestidos em cargos de administração em mais de uma sociedade poderão ter a sua remuneraçãorateada entre as diversas sociedades. Também é lícito à convenção estipular uma gratificação aosadministradores, à qual farão jus somente nos exercícios em que se verificarem lucros suficientespara que se atribua o dividendo obrigatório aos acionistas (artigo 202 da Lei 6.404/76).

A combinação de recursos e esforços, a subordinação dos interesses de uma sociedade aos deoutra, ou do grupo, e a participação em custos, receitas ou resultados de atividades ouempreendimentos somente poderão ser opostas aos sócios minoritários das sociedades filiadas (ouseja, os demais sócios, excluídas a sociedade de comando e as demais filiadas do grupo) nostermos da convenção do grupo (artigo 276). Havendo distribuição de custos, receitas e resultados,serão determinados e registrados no balanço de cada exercício social das sociedades interessadas,assim como as compensações entre sociedades, previstas na convenção do grupo.

Se a sociedade de comando do grupo causar danos à sociedade filiada por descumprimentodos deveres genéricos de acionista controlador e dos deveres específicos de sociedadecontroladora, deverá indenizá-los, sendo réus a administradora de comando e os administradores(artigo 276, § 3º). A ação poderá ser interposta por acionistas que representem 5% ou mais docapital social, bem como a qualquer acionista, desde que preste caução pelas custas e honoráriosde advogado devidos no caso de vir a ação a ser julgada improcedente (artigo 246). A sociedadecontroladora, se condenada, além de reparar o dano e arcar com as custas, pagará honorários deadvogado e prêmio de 5% ao autor da ação, calculados sobre o valor da indenização (artigo 246,§ 2º).12

1 MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: direito societário: sociedades simples eempresárias. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2011. v. 2, capítulo 3, seção 6 (Acordo de quotistas), e capítulo 21,seção 6 (Acordo de acionistas).2 Conferir BARBOSA FILHO, Marcelo Fortes. Sociedade anônima atual: comentários e anotações àsinovações trazidas pela Lei 10.303/01 ao texto da Lei 6.404/76. São Paulo: Atlas, 2004. p. 121-122.3 MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro (volume 2): direito societário: sociedades simplese empresárias. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2011. Capítulo 21, seção 6 (Acordo de acionistas).4 MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro (volume 2): direito societário: sociedades simplese empresárias. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2011. Capítulo 3, seção 6 (Acordo de quotistas).5 BARBOSA FILHO, Marcelo Fortes. Sociedade anônima atual: comentários e anotações às inovaçõestrazidas pela Lei 10.303/01 ao texto da Lei 6.404/76. São Paulo: Atlas, 2004. p. 122.6 MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: direito societário: sociedades simples eempresárias. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2011. v. 2, capítulo 21, seção 6 (Acordo de acionistas).7 Conferir MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: teoria geral dos contratos. São Paulo:

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Atlas, 2010. v. 5.8 Conferir MAMEDE, Gladston; MAMEDE, Eduarda Cotta. Blindagem patrimonial e planejamentojurídico. São Paulo: Atlas, 2011.9 Conferir MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: empresa e atuação empresarial. 4. ed.São Paulo: Atlas, 2010. v. 1, capítulos 8 a 10.10 MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: direito societário: sociedades simples eempresárias. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2011. v. 2, capítulo 8, seção 1 (Sociedades coligadas: controle,filiação e mera participação).11 MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: direito societário: sociedades simples eempresárias. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2011. v. 2, capítulo 23, seção 5 (Subsidiária integral).12 MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: direito societário: sociedades simples eempresárias. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2011. v. 2, capítulo 23, seção 7 (Grupo de sociedades).

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Funcionamento e extinção

Entificação do patrimônio

A alocação do patrimônio familiar para a integralização de uma holdingimpacta não só as relações familiares, mas essencialmente o direito depropriedade das pessoas envolvidas. Esse ponto tem sido reiterado e precisa sersempre frisado. Os membros da família deixam de ser proprietários dos bensusados na integralização, sejam móveis ou imóveis, sejam materiais ouimateriais (a exemplo de quotas e ações). A holding passará a ser a proprietáriadesses bens. Os membros da família se tornam membros da holding, ou seja,tornam-se sócios e, assim, titulares de suas quotas ou ações, conforme o tiposocietário escolhido. O profissional do Direito, da Contabilidade ou daAdministração de Empresas que realiza uma tal operação e/ou que prestaconsultoria para a família deve ser muito cuidadoso no tratamento dessasquestões e na exposição de suas implicações.

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Como ilustrado pelo gráfico anterior, a expectativa dos familiares,habitualmente, é que a sucessão lhes dará domínio direto sobre parcela dopatrimônio social. O uso da palavra domínio, aqui, é muito rico: é habitualhaver uma expectativa, em cada herdeiro, de se tornar o senhor da parcela dopatrimônio que lhe caberá com a sucessão. Sem compartilhamento, semconvivência, sem interferências. O custo dessa lógica individualista, contudo, émuito grande. Basta recordar ser muito comum ouvir histórias de pessoas quefalam da imensa fortuna de um avô ou bisavô, completamente perdida pelafragmentação do patrimônio na sucessão hereditária. Essa fragmentação,habitualmente, desfaz a vantagem de mercado detida por um patrimônioprodutivo: a grande propriedade agropecuária se torna um conjunto de áreasimprodutivas, a rede de lojas se fragmenta etc. A isto também serve a estratégiade constituir uma holding familiar, como se viu anteriormente: para manter aforça do patrimônio familiar, a bem de todos os membros da família.

No entanto, com a constituição da holding familiar, essa lógica privadaaguda, radical, desfaz-se. Não apenas as relações do herdeiro com a parcela quelhe toca no patrimônio, mas suas relações com os demais herdeiros. Não é maisuma questão de Direito de Família, de Direito Sucessório ou de Direito dePropriedade. Passa-se a ter uma questão de Direito Empresarial e, maisprecisamente, de Direito Societário. Os herdeiros não serão proprietários dopatrimônio familiar, mas titulares das quotas ou ações da sociedade que, porseu turno, será a proprietária daquele patrimônio e, assim, conservará a suaunidade.

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2 Representação e administração

Um dos aspectos relevantes dessa questão está justamente na administraçãoda holding. As pessoas jurídicas são administradas em conformidade com seuato constitutivo, ou seja, de acordo com o contrato social, se sociedade porquotas, ou o estatuto social, se sociedade por ações. Não só administração, masigualmente representação, ou seja, a definição de quem poderá firmar contratose praticar atos em nome da sociedade. Atos físicos que, realizados por sereshumanos, são juridicamente considerados como tendo sido praticados pelapessoa jurídica. Esse mecanismo jurídico pode levar a uma situação na qual osmembros da família, na condição de sócios, tenham sua ingerência sobre opatrimônio limitada às deliberações sociais, cabendo a um deles, ou a umadministrador profissional (conforme o tipo societário adotado), a prática dosatos de administração e a representação da holding.

É fundamental atentar para o fato de que o ato constitutivo, seja umcontrato ou um estatuto, deverá definir quais são os poderes e quais asatribuições do(s) administrador(es). Quanto mais cuidadosa e minuciosa for adefinição das atribuições e dos poderes do administrador, constante do atoconstitutivo, maior será a segurança dos sócios em relação a seus atos. Aliás,preservam-se, dessa maneira, não só os interesses e direitos dos próprios sócios,mas também os de terceiros que, consultando o ato constitutivo, quem éverdadeiramente, de direito, o administrador e quais são os seus poderes. Esseesforço inclui até a definição de atos que só podem ser praticados apósautorização da reunião ou assembleia de sócios e de atos que não podem ser

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praticados de forma alguma.

Modelo de cláusula contratual

Cláusula – À sociedade é vedado dar aval ou prestar fiança em favor de terceiros, inclusive em favor de seus sócios, salvoautorização expressa da unanimidade dos sócios, em assembleia convocada expressamente para decidir a matéria.

Nas sociedades simples em comum, na sociedade em nome coletivo e nasociedade em comandita simples, o administrador será nomeado por meio docontrato social. Será um dos sócios, na sociedade em nome coletivo e nasociedade em comandita simples, neste último caso, um sócio comanditado. Nasociedade limitada, a nomeação poderá fazer-se por meio de cláusula nocontrato social ou por documento em apartado, hipótese na qual a nomeação eo termo de posse são anotados num livro de atas da administração. Cuida-se delivro facultativo, acreditamos, salvo quando se recorra a nomeações por meiode documento em apartado. Tanto a sociedade simples em comum (artigo1.019, parágrafo único, do Código Civil), quanto a sociedade limitada (artigo1.061) admitem a nomeação de não sócio para a administração societária,embora definindo uma série de requisitos e de limitações.1

Não podem ser administradores, além das pessoas impedidas por leiespecial, os condenados a pena que vede, ainda que temporariamente, o acessoa cargos públicos; ou por crime falimentar, de prevaricação, peita ou suborno,concussão, peculato; ou contra a economia popular, contra o sistema financeironacional, contra as normas de defesa da concorrência, contra as relações deconsumo, a fé pública ou a propriedade, enquanto perdurarem os efeitos dacondenação (artigo 1.011, § 1o, do Código Civil). No que diz respeito aosimpedimentos legais, listam-se magistrados, membros do Ministério Público,militares e funcionários públicos. É fundamental atentar para o fato de que aconstituição ou a destituição de administrador, bem como sua atribuição depoderes ou eventuais limitações, constem de atos (contrato, alteraçãocontratual, documento em apartado, ata da assembleia geral etc.) que tenhamsido levados ao Registro Público. O registro é indispensável para darpublicidade à nomeação e, assim, preservar os direitos e interesses de todos osenvolvidos, nomeadamente por dar eficácia ao ato perante terceiros. Noentanto, o registro não é pressuposto de validade da nomeação (artigo 1.012 doCódigo Civil); mesmo sem o registro, a nomeação é válida, embora sua eficáciaesteja limitada aos partícipes do ato: sociedade, sócios e administrador.Consequentemente, as obrigações do administrador para com a sociedadeprincipiam imediatamente após a nomeação, se o contrário não constar do

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respectivo instrumento.No plano das sociedades contratuais, o Código Civil deixa claro que o

administrador é um mandatário da sociedade (artigo 1.011, § 2o,); aliás, asregras do mandato (artigos 653 a 691 do Código Civil) lhe são aplicáveis. Noexercício de seus poderes, não poderá fazer-se substituir por outrem (artigo1.018), salvo em operações específicas (determinados negócios), devendooutorgar procuração que precise o ato que deverá ser praticado. Exemplo é aoutorga de procuração a advogado ou, mesmo, para que alguém firmedeterminado contrato. Também não impede a contratação de gerentes e deoutros prepostos (artigos 1.172 a 1.176 do Código Civil), como contadores,gerentes financeiros, de pessoal etc.

Justamente por ser apenas um mandatário da sociedade, o administradorda sociedade contratual atua – e deve atuar – nos limites da lei e dos poderesque lhe foram outorgados. O artigo 1.071 do Código Civil define matérias quesão obrigatoriamente da competência da coletividade dos sócios, dependendoda deliberação dos sócios: (1) a aprovação das contas da administração; (2) adesignação dos administradores, quando feita em ato separado; (3) adestituição dos administradores; (4) o modo de sua remuneração, quando nãoestabelecido no contrato; (5) a modificação do contrato social; (6) aincorporação, a fusão e a dissolução da sociedade, ou a cessação do estado deliquidação; (7) a nomeação e destituição dos liquidantes e o julgamento dassuas contas; (8) o pedido de concordata (recuperação de empresa, no sistemainstituído pela Lei 11.101/05). Para além dessas matérias, o contrato socialpode estipular qualquer outra matéria que, para ser executada, exija votofavorável da maioria absoluta, qualificada ou mesmo da unanimidade dossócios, protegendo a minoria. De qualquer sorte, é dever do administradorexercer suas funções com probidade, isto é, honestamente, atuando de formaativa, com cuidado e diligência, tratando os negócios da sociedade como sefossem seus (artigo 1.011 do Código Civil).

Em se tratando de sociedade anônima, pode-se recorrer a uma estruturaadministrativa composta por dois órgãos: conselho de administração ediretoria. Essa duplicidade, contudo, justifica-se apenas quando seja vasta acorporação ou, principalmente, quando sejam muitos os sócios, a exemplo dascompanhias abertas. Na esmagadora maioria dos casos, contudo, as sociedadesfamiliares são compostas por poucos sócios e, assim, têm apenas uma diretoria,que é um órgão administrativo imprescindível para as companhias, competindo-lhe a representação da companhia e a prática dos atos necessários ao seufuncionamento regular, sendo composta por dois ou mais diretores (acionistas

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ou não), conforme definição do estatuto. Os membros da diretoria são eleitos(prazo de gestão não superior a três anos) e podem ser destituídos a qualquertempo, pelo conselho de administração, ou, se não existir conselho, pelaassembleia geral.

Os administradores da companhia estão obrigados a empregar, no exercíciode suas funções, o cuidado e a diligência que todo homem ativo e probo(honesto) costuma empregar na administração dos seus próprios negócios,exercendo as atribuições legais e estatutárias no interesse da companhia e deforma que permita a boa realização das finalidades da empresa, emboraestejam igualmente obrigados a satisfazer às exigências do bem público e dafunção social da empresa (artigo 154 da Lei 6.404/76). Não se lhes permite:(1) praticar ato de liberalidade à custa da companhia, embora o conselho deadministração ou a diretoria possam autorizar a prática de atos gratuitosrazoáveis em benefício dos empregados ou da comunidade de que participe aempresa, tendo em vista suas responsabilidades sociais; (2) sem préviaautorização da assembleia geral ou do conselho de administração, tomar porempréstimo recursos ou bens da companhia, ou usar, em proveito próprio, desociedade em que tenha interesse, ou de terceiros, os seus bens, serviços oucrédito; (3) receber de terceiros, sem autorização estatutária ou da assembleiageral, qualquer modalidade de vantagem pessoal, direta ou indireta, em razãodo exercício de seu cargo; as importâncias recebidas com infração a tal dispostopertencerão à companhia (artigo 154, §§ 2o e 3o).

Um dever específico é a lealdade: servir à companhia com lealdade emanter reserva sobre os seus negócios, razão pela qual se veda aoadministrador: (1) usar, em benefício próprio ou de outrem, com ou semprejuízo para a companhia, as oportunidades comerciais de que tenhaconhecimento em razão do exercício de seu cargo; (2) omitir-se no exercício ouproteção de direitos da companhia ou, visando à obtenção de vantagens, para siou para outrem, deixar de aproveitar oportunidades de negócio de interesse dacompanhia; e (3) adquirir, para revender com lucro, bem ou direito que sabenecessário à companhia, ou que esta tencione adquirir. Nesse sentido, o artigo156 veda-lhe intervir em qualquer operação social na qual tenha interesseconflitante com o da companhia, bem como na deliberação que a respeitotomarem os demais administradores, cumprindo-lhe cientificá-los do seuimpedimento e fazer consignar, em ata de reunião do conselho deadministração ou da diretoria, a natureza e extensão do seu interesse; se aindaassim o negócio vier a ser realizado, o § 1o exige que as condições sejamrazoáveis ou equitativas, idênticas às que prevalecem no mercado ou em que a

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companhia contrataria com terceiros, sem o que será anulável, e oadministrador interessado será obrigado a transferir para a companhia asvantagens que dele tiver auferido.

Por fim, recorde-se que o ato de administração, quando exceda os poderesoutorgados pelo ato constitutivo ou desrespeite a lei, é ato ilícito, do qualresulta a responsabilidade civil do administrador. Essa regra aplica-se tambémàs holdings e o obrigará a indenizar prejuízos decorrentes, sejam sofridos pelosdemais sócios, pela sociedade ou por terceiros.2

Administração coletiva

É possível, nas sociedades contratuais, estabelecer por meio do contratosocial que a sociedade terá uma administração coletiva, ou seja, que todos ossócios serão simultaneamente administradores. O recurso a essa solução podeser interessante em holdings familiares, mormente quando se tenha poucossócios que, assim, podem se reunir com assiduidade e estarem presentes sempreque se faça necessário praticar atos sociais. A administração coletiva coloca ossócios em contato permanente e constante, exigindo deles o debate e adeliberação sobre os negócios sociais, ou seja, sobre a administração dopatrimônio material e/ou imaterial (a exemplo de participações societárias)detido pela holding.

É recomendável que este tipo de administração esteja bem regrada nocontrato social. Afinal, se para determinado ato não se encontra definido nocontrato social ou em documento apartado, devidamente averbado no registroda pessoa jurídica, qualquer administrador representará a sociedade perante osterceiros. Aliás, segundo o artigo 1.010 do Código Civil, competindo a todos ossócios decidir sobre os negócios da sociedade, as deliberações serão tomadaspor maioria de votos, contados segundo o valor das quotas de cada um;portanto, cada sócio terá na votação o peso de sua participação no capitalsocial. Havendo empate, prevalece a decisão sufragada por maior número desócios (independentemente do valor de suas quotas). Persistindo o empate, aquestão deverá ser levada ao Judiciário para que a resolva. Essa regra geralaplica-se no silêncio do contrato; assim, é possível estabelecer, no contratosocial, outra regra, como a necessidade de unanimidade ou de maioriaqualificada, assim como o recurso não ao Judiciário, mas a um meio alternativopara a solução de controvérsias quando se chegue a um impasse nas votações,designadamente a nomeação de árbitros. É medida saudável, mormente

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considerado o tempo que consome a solução de uma controvérsia judicial.

Artigo 1.010, § 3o, do Código Civil: Responde por perdas e danos o sócio que, tendo em alguma operaçãointeresse contrário ao da sociedade, participar da deliberação que a aprove graças a seu voto.

É preciso cautela com a disposição inscrita na cabeça do artigo 1.013 doCódigo Civil, segundo o qual a administração da sociedade, nada dispondo ocontrato social, compete separadamente a cada um dos sócios. Portanto, a regrageral – para o silêncio do contrato – é que os atos de administração sejamexercíveis por cada um dos sócios, separadamente. O § 1o atribui aos demaissócios-administradores, a cada um deles, o poder de impugnar a operação (oato). No entanto, se o ato já houver sido praticado, poderão advirconsequências em relação ao terceiro de boa-fé, incluindo o dever de indenizar.Para resolver o problema, o § 2o do mesmo artigo afirma que qualqueradministrador que realize operação sabendo – ou devendo saber – estar agindoem desacordo com a maioria responderá por perdas e danos perante asociedade.

Essa solução é arriscada, potencialmente conflituosa e pode se revelaronerosa para os interesses da sociedade familiar. Assim, parece-nos que omelhor, em se tratando de administração coletiva, é estipular no contrato socialque os atos deverão ser praticados, obrigatoriamente, de forma conjunta. Naadministração conjunta, a competência e o poder para praticar atos deadministração encontram-se submetidos ao concurso necessário de todos ossócios. Portanto, o ato somente terá validade se todos os administradores deleparticiparem, chancelando-o. Alternativamente, há contratos sociais queestabelecem não a necessidade de todos, mas de alguns: dois ou a númerocorrespondente à maioria. São possibilidades estratégicas que devem serconsideradas em cada caso.

Frise-se a gravidade da instituição de administração conjunta. Bastarecordar que tal cláusula, posta no contrato social tornado público pelo registro,tem eficácia sobre terceiros. No entanto, não se deve perder de vista o artigo1.014 do Código Civil que, em sua parte final, erige uma exceção à regra deconcurso necessário de todos os sócios alcançados pela cláusula deadministração conjunta: os casos urgentes, em que a omissão ou retardo dasprovidências possa ocasionar dano irreparável ou grave.3

Término da administração

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Um ponto interessante na existência e no funcionamento de toda equalquer sociedade, alcançando com destaque o tema das holdings, diz respeitoao término da administração. São incontáveis situações nas quais odesentendimento entre os sócios leva ao desejo de alteração no comando daholding ou, mesmo, das sociedades experimentais. A questão parece simples,mas não é. A solução legal, aplicável para quando o contrato social seja silentesobre o tema, beneficia a figura do administrador, dificultando sua substituiçãoem alguns casos, como se verá.

Nas sociedades simples em comum, sociedade em nome coletivo esociedade em comandita simples, quando se tenha um sócio nomeadoadministrador por meio de cláusula disposta no contrato social, sua destituiçãopressupõe o seu próprio voto favorável, já que o artigo 1.019 do Código Civilafirma: são irrevogáveis os poderes do sócio investido na administração porcláusula expressa do contrato social, salvo justa causa, reconhecidajudicialmente, a pedido de qualquer dos sócios. Em oposição, o seu parágrafoúnico assevera serem revogáveis, a qualquer tempo, os poderes conferidos asócio por ato separado, ou a quem não seja sócio. De qualquer sorte, esses sãotipos de adoção rara.

Mais comuns são as sociedades limitadas, nas quais também pode havernomeação de administrador sócio ou não sócio, por meio de cláusula nocontrato social ou por meio de instrumento em separado, público ou privado,devidamente levado a registro. Em todos os casos, a cessão da administraçãopoderá decorrer da renúncia, do término do prazo certo da constituição ou dadestituição, devendo ser imperiosamente averbada no registro públicocorrespondente nos dez dias seguintes à sua ocorrência (artigo 1.063, § 2o, doCódigo Civil). Cumprido esse prazo, a averbação retroagirá em seus efeitos àdata da ocorrência (artigo 36 da Lei 8.934/94).

A destituição do administrador na sociedade limitada, que é a hipótesemais interessante, diferencia-se considerando as seguintes variantes: (1) ser, ounão, sócio; (2) o meio de sua constituição; e (3) o motivo da destituição. Adestituição imotivada do administrador que é sócio e foi nomeado por meio decláusula no contrato social da sociedade limitada exige voto favorável de, nomínimo, dois terços do capital social, se outro percentual não fixar o contrato(artigo 1.063 do Código Civil). Se o administrador é sócio, mas foi nomeadopor documento em apartado, basta a maioria simples dos votos. O mesmo sediga em relação ao não sócio, seja nomeado por meio do contrato social, sejanomeado por meio de instrumento em apartado. Por fim, tem-se o problema dadestituição motivada do administrador. A regra, aqui, é a mesma para qualquer

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sociedade contratual: a medida pode ser pedida ao Judiciário por qualquersócio, independentemente do seu percentual de participação no capital social(artigo 1.019, caput, do Código Civil).

Deliberações sociais

Embora se dê extremada importância para a administração societária, nãose pode olvidar que o poder supremo de qualquer sociedade é da coletividadedos sócios, em reunião ou assembleia. Como já reiteramos em diversosmomentos de nossa análise, a constituição da holding afasta os familiares dodomínio direto do patrimônio, tornando-os sócios. O arbítrio individual, assim,cede espaço para o foro de deliberação coletiva que é a reunião ou assembleiade sócios, que assume a configuração de um foro de expressão coletiva davontade. Consequentemente, a alternativa para a definição de uma decisão é odiálogo entre os sócios para, enfim, decidir, no voto, o que a sociedade fará.Como se o próprio diálogo já não fosse uma dificuldade, opondo-se ao exercícioarbitrário da razão individual, a reunião ou assembleia societária impõe umaoutra dificuldade: o peso do voto. As deliberações não se tomam por cabeça,mas cada um vota com o peso que tem na participação no capital social. Assim,quem tem 30% do capital tem um voto com peso 3 em 10, e quem tem 10%vota com peso 1 em 10.

Contudo, essa constituição de um espaço obrigatório de diálogo edeliberação, entre os partícipes do patrimônio entificado pela constituição daholding, pode experimentar uma curiosa alteração circunstancial se aquele quecria a holding opta por uma solução diversa: constituir uma sociedade anônimae criar distinções entre espécies de ações e, com isso, entre os próprios sócios.Com efeito, as ações da companhia podem ser divididas e diferenciadas emduas espécies (artigo 15 e seguintes da Lei 6.404/76): ações ordinárias,destinadas àqueles que se interessam não apenas pelos resultados sociais, masigualmente pela deliberação dos assuntos societários, e ações preferenciais, paraos que estão mais preocupados com os resultados societários, preferindo ter umacesso preferencial aos seus resultados. As ações ordinárias aproximam-semuito das quotas das sociedades contratuais: seus titulares têm o poder dedeliberar os assuntos societários e, ademais, participar dos resultados sociais. Jáas preferenciais são títulos que dão acesso preferencial a algumas vantagens,definidas pelo estatuto social conforme a licença constante no artigo 17 da Lei6.404/76, em prejuízo de algumas faculdades, nomeadamente a participação

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nas deliberações sociais. O cerceamento no direito de voto é uma medidaextrema, razão pela qual o artigo 15, § 2o, da Lei 6.404/76 limita o número deações preferenciais sem direito a voto, ou que estejam sujeitas a qualquerrestrição nesse direito de votar: não pode ultrapassar 50% do total das açõesemitidas.

Tipos de vantagens atribuíveis às ações preferenciais(artigo 17 da Lei 6.404/76)

(1) prioridade na distribuição de dividendo, fixo ou mínimo;

(2) prioridade no reembolso do capital, com prêmio ou sem ele; e

(3) vantagens políticas (artigo 18).

Lembre-se, porém, que a supressão ou restrição do direito de voto serásuspensa se, por até três exercícios consecutivos, se menor prazo não estipular oestatuto, deixar a companhia de pagar os dividendos fixos ou mínimos a quefizerem jus as ações preferenciais sem direito de voto ou com direito de votorestrito; vencido esse prazo, tais ações adquirirão o exercício pleno dessedireito, conservando-o até o pagamento integral da vantagem que lhes édevida.

Para além dessas questões, importa observar que um dos aspectosestratégicos essenciais na constituição de uma holding é a atribuição de poderespara a coletividade dos sócios, em reunião ou assembleia, e do respectivoquórum de deliberação. Esses parâmetros definirão o bom futuro, ou não, dasociedade, pautando a convivência entre aqueles que, em face da constituiçãoda pessoa jurídica, serão mais sócios do que parentes. É preciso submeter aoinstituidor a lista de matérias necessariamente afetas à coletividade dos sócios,definida pelo legislador, bem como o quórum para elas previsto em leis, paraque ele possa avaliar se efetivamente atendem, ou não, à visão de futuro quetem para o seu patrimônio e seu negócio, tocado por seus herdeiros.4

Dessa maneira, opte-se por uma sociedade por quotas ou por umasociedade por ações, será sempre conveniente dar atenção redobrada, naredação do contrato social ou do estatuto social, às regras sobre as matérias quedependem de deliberação da reunião ou assembleia dos sócios e as matériasque podem ser praticadas pelo(s) administrador(es), sem depender daautorização ou aprovação da coletividade dos sócios. Não é só. Nestainvestigação e definição do que seja melhor para o futuro da holding, e de todosos seus sócios, é preciso também focar a conveniência de estabelecer

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percentuais mínimos para que determinadas matérias sejam aprovadas, emboracom o cuidado de não engessar a condução da empresa.

Superadas tais questões, realça-se que os sócios têm o direito, mas não odever, de participar das deliberações sociais. Apenas os administradores têm odever de comparecer. As votações demandam, conforme a matéria, umpercentual mínimo do capital social para serem aprovadas, a exemplo do que seviu, anteriormente, para a destituição do administrador social. Não é a únicahipótese. Nas sociedades limitadas, a modificação do contrato social, assimcomo a aprovação de incorporação, fusão e dissolução, assim como a cessaçãodo estado de liquidação, dependem de aprovação de três quartos do capitalsocial (artigo 1.076, I, do Código Civil). Pela maioria dos presentes, aprovam-seas contas da administração.

Nas sociedades contratuais, todos os sócios podem participar dasdeliberações sociais; contudo, nenhum sócio, por si ou na condição demandatário, pode votar matéria que lhe diga respeito diretamente (artigo1.074, § 2o, do Código Civil). Cuida-se, contudo, de expressão de interpretaçãorestrita, não alcançando apenas matérias nas quais o interesse do sócio sejaobjetivamente contrário ao da sociedade, o que não se revela, contudo, emcasos como o exercício do direito de voto a bem da eleição de si mesmo paraqualquer dos órgãos da administração societária.

Dissolução

A sociedade limitada, simples ou empresária, extingue-se pela dissolução(artigo 1.087 cominado com os artigos 1.033 e 1.044 do Código Civil), que sedá nesses casos: (1) vencimento do prazo de duração, embora possa haverimediata prorrogação por prazo indeterminado quando, vencido o prazoprevisto ou verificado o termo assinalado para a existência social, não entrar asociedade em liquidação, nem qualquer sócio oponha-se ao prosseguimento desuas atividades; (2) deliberação unânime dos sócios nesse sentido, estejacontratada por prazo determinado ou indeterminado; (3) deliberação favorávelda maioria absoluta dos sócios também a extingue, quando contratada porprazo indeterminado; e (4) unicidade social (um só sócio), sem que apluralidade seja reconstituída em 180 dias, bem como quando seja extinta, naforma da lei, sua autorização para funcionar.

No alusivo às sociedades por ações, as hipóteses de dissolução dacompanhia estão listadas no artigo 206 da Lei 6.404/76, que as divide em três

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grandes grupos. Em primeiro lugar, está a dissolução de pleno direito, que sehaverá: (1) pelo término do prazo de duração; (2) nos casos previstos noestatuto; (3) por deliberação da assembleia geral; (4) pela existência de umúnico acionista, verificada em assembleia geral ordinária, se o mínimo de doisnão for reconstituído até a do ano seguinte, ressalvada a hipótese de subsidiáriaintegral; (5) pela extinção, na forma da lei, da autorização para funcionar. Numsegundo grupo colocam-se as hipóteses de dissolução por decisão judicial: (1)quando anulada a sua constituição, em ação proposta por qualquer acionista;(2) quando provado que não pode preencher o seu fim, em ação proposta poracionistas que representem 5% ou mais do capital social; e (3) em caso defalência, na forma prevista na respectiva lei. Por fim, tem-se a dissolução pordecisão de autoridade administrativa competente, nos casos e na formaprevistos em lei especial.5 A essas hipóteses soma-se a quebra da affectiosocietatis nas companhias familiares, como visto no Capítulo 8 deste livro.

Como o fim de uma sociedade tem efeitos que transcendem os envolvidos,alcançando trabalhadores, fornecedores e, enfim, a economia como um todo,cunhou-se no Direito Empresarial o princípio da preservação da empresa, quepode também ser compreendido como princípio da preservação das atividadesnegociais para, assim, alcançar as sociedades simples.6 Dessa maneira, doutrinae jurisprudência passaram a valorizar a figura da dissolução parcial dasociedade, figura cunhada como via alternativa para as pretensões dedissolução total, sempre que fosse possível preservar a pessoa jurídica e, assim,o negócio. A bem da precisão, nas sociedades contratuais, essa dissoluçãoparcial corresponde à figura da resolução do contrato em relação a um ou maissócios (artigos 1.028 a 1.032 do Código Civil), com liquidação das respectivasquotas sociais. Por seu turno, nas sociedades institucionais, corresponde aodireito de retirada da sociedade (artigo 137, caput, da Lei 6.404/76), comreembolso do valor de suas ações (artigo 45 da Lei 6.404/76).

Nas sociedades contratuais, o direito de recesso é inerente à contratação,sempre que a sociedade tenha sido contratada por prazo indeterminado ou, secontratada por prazo certo, já tenha transcorrido esse tempo e, assim, tenhahavido uma prorrogação por tempo indeterminado. Exige, apenas, notificaçãodos demais com 60 dias de antecedência. Se os demais sócios queremprosseguir com a sociedade, haverá resolução do contrato em relação àqueleque sai, liquidando suas quotas. Ademais, a dissolução parcial pode resultar,igualmente, da exclusão de um sócio (artigo 1.085 do Código Civil). Nassociedades por ações, de acordo com o artigo 137 da Lei 6.404/76, o direito deretirar-se da companhia, mediante reembolso do valor das suas ações, está

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limitado aos casos em que o acionista seja vencido em deliberação que: (1)aprove a criação de ações preferenciais ou aumento de classe de açõespreferenciais existentes, sem guardar proporção com as demais classes de açõespreferenciais, salvo se já previstos ou autorizados pelo estatuto; (2) aprove aalteração nas preferências, vantagens e condições de resgate ou amortização deuma ou mais classes de ações preferenciais, ou criação de nova classe maisfavorecida; (3) determine a redução do dividendo obrigatório; (4) aprove afusão da companhia, ou sua incorporação em outra; (5) aprove a participaçãoem grupo de sociedades; (6) aprove a mudança do objeto da companhia; (7)aprove a cisão da companhia. Como se viu no Capítulo 8, para além dessassituações, a jurisprudência acrescentou a perda da affectio societatis, quando setrate de companhia familiar.

O grande desafio da dissolução parcial está na liquidação dos títulossocietários. Para as sociedades por quotas, o artigo 1.031 do Código Civil prevêque a liquidação se fará com base na situação patrimonial da sociedade, à datada resolução, verificada em balanço especialmente levantado, mas permite queo contrato traga disposição contratual em contrário. O instituidor da holdingfamiliar, preocupado em dar tratamento igualitário a todos os seus herdeiros,deve ter muito cuidado aqui. O levantamento de um balanço especialmentepara aferir o valor das quotas é a forma mais justa, evitando que o sócio sejavítima de desvirtuamentos contábeis, a exemplo da necessidade de que os bensconstem da escrituração pelo valor histórico de aquisição. Isso, por si só,recomenda não se recorrer a soluções simplistas, como o uso do último balanço.

A mesma preocupação, aliás, deve-se ter com a regra do § 2o deste mesmoartigo 1.031, a prever que a quota liquidada será paga em dinheiro, no prazo denoventa dias, a partir da liquidação, salvo acordo ou estipulação contratual emcontrário. Esse pagamento da totalidade dos haveres em prazo tão exíguo, 90dias, pode ser nefasto para a sociedade, exigindo alienação de parte de seupatrimônio. Isso, numa holding de participação, pode significar a necessidadede alienar quotas e/ou ações de seu portfólio, reduzindo a força da participaçãosocietária em sociedades operacionais ou, até, a perda do controle. Dessamaneira, é recomendável estudar a conveniência de se recorrer a regras,dispostas no ato constitutivo, que estabeleçam pagamento escalonado. Há quemestipule pagamentos semestrais ou, mesmo, 24 parcelas mensais. As fórmulaspossíveis são muitas e sua validade exige, apenas, que não se mostremabusivas, ou seja, que não esvaziem a participação no acervo social, que é umadecorrência da titularidade das quotas, assim como das ações.

As mesmas soluções podem ser aplicadas quando a holding tenha sido

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constituída sob a forma de sociedade por ações, bastando dispô-las no estatutosocial. Segundo a Lei 6.404/76, as regras para o reembolso poderão estardispostas no estatuto, mas só se permite que o valor de reembolso seja inferiorao patrimônio líquido constante do último balanço aprovado pela assembleiageral, nos 60 dias anteriores, se estipulado com base no valor econômico dacompanhia, a ser apurado em avaliação (artigo 45, § 1o).

A questão da retirada de um sócio ou, até, da dissolução total da sociedadetambém desperta renovada atenção por seus desdobramentos tributários,destacado que, se apurado que o(s) sócio(s) experimentaram uma vantagempatrimonial, deverão recolher imposto de renda sobre o benefício. Mas épreciso que haja, efetivamente, uma vantagem econômica apurável emconcreto, ou seja, realizada, sem o que não poderá haver exação. A matéria temsido renovada nos tribunais, em boa medida em face do notório e desmoderadoapetite do Fisco, apetite esse que parece determinar uma visão distorcida darealidade, vendo renda e lucro onde não há ou, no mínimo, onde ainda não há.

A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, diante do RecursoEspecial 668.378/ES, confirmou acórdão do Tribunal Regional Federal da 2a

Região, afirmando, com fulcro no parecer do Ministério Público, que o Fisconão demonstrara “aquilo que os autos desmentem, a saber, a supostadistribuição de lucros, a redundar em ganho para os sócios e justificar aincidência do imposto de renda, no caso concreto”, bem como lançando aassertiva de que

“quando a holding foi extinta, não havia lucro efetivo a ser distribuídoaos sócios, sendo substituído o valor de participação de cada um dosquotistas por ações e quotas de outras empresas (as controladas), nãohavendo geração de riqueza nova, uma vez que ocorreu apenas umapermuta de bens. Tratou-se de simples fato permutativo, do ponto devista das ciências contábeis, que provoca uma troca de elementospatrimoniais, sem, contudo, alterar o patrimônio líquido docontribuinte. Não se pode confundir com a hipótese de fatosmodificativos positivos (plano contábil), que importam em uma efetivamutação aumentativa dos elementos patrimoniais da pessoa,caracterizando acréscimo patrimonial, fato imponível do imposto derenda”.

Aquela Alta Corte não viu nenhuma ilegalidade nesta conclusão, nãoconhecendo do recurso especial por ser necessário reexame probatório, o que évedado pela Súmula 7/STJ.

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Com efeito, os sócios de uma holding, sejam pessoas físicas ou jurídicas, játêm em seu patrimônio pessoal os títulos societários (quotas ou ações) que,enfim, correspondem a parcelas do capital social da sociedade (a holding). Essecapital social não se confunde com o patrimonio social. O patrimônio socialpode elevar-se como resultado das atividades sociais, incluindo a possibilidadede incorporação de lucros. Contudo, se o patrimônio social é o resultado diretoda integralização de capital, não tendo merecido incorporações, a dissolução dasociedade determinará mero reembolso dos sócios, mormente quando hajamero rateio dos títulos que compõem o acervo patrimonial da holding,afastando até a verificação de lucro na alienação dos títulos para que o rateio sefaça em dinheiro. O mesmo parâmetro aplica-se à resolução da sociedade (aholding) em relação a um ou alguns sócios, bem como na redução de seucapital social, ainda que paga em dinheiro, desde que não haja acréscimopatrimonial para o sócio. Destaque-se que essa equação não se altera peloargumento de que os títulos societários valorizaram-se; essa valorização demercado apura-se na alienação. E no rateio dos títulos não há alienação. Ostítulos serão inscritos na declaração de bens dos sócios pelo valor contábil quemantinham na holding; somente quando alienados se verificará lucro ou não,podendo haver mesmo prejuízo. O mesmo parâmetro deve ser observadoquando o patrimônio da holding é constituído por bens imóveis ou móveis, enão apenas por títulos societários (quotas ou ações).

Foi esse o entendimento esposado pelo acórdão confirmado pelo SuperiorTribunal de Justiça:

“Simples ingresso de direitos reais e pessoais não significamnecessariamente acréscimo ou incremento patrimonial. A riquezatributável pelo imposto de renda precisa ser efetivamente nova, assimentendida como o real incremento líquido positivo de elementospatrimoniais. Ou seja, não houve lucro algum distribuído, sendo quepara os ex-sócios da holding extinta apenas houve mera expectativa delucro, o que não autoriza a autoridade impetrada a exigir a exação emquestão, pois como já explanado, a disponibilidade não pode sercaracterizada em tese. Desta forma, repita-se, meras expectativas deganho futuro não configuram renda tributável. Conforme já foidemonstrado, a substituição não implica em realização de lucro, namedida em que não é capaz de caracterizar disponibilidade econômicaou jurídica de renda, nem acréscimo patrimonial, não estando, pois,sujeita à incidência do imposto de renda.”

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O lucro pressupõe efetivo superávit na atividade negocial da sociedade. Adistribuição de lucros ilícitos ou fictícios acarreta responsabilidade solidária dosadministradores que a realizarem e dos sócios que os receberem, conhecendoou devendo conhecer-lhes a ilegitimidade (artigo 1.009 do Código Civil).

1 Conferir MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: direito societário:sociedades simples e empresárias. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010. v. 2, capítulo 14(Sociedade limitada: funcionamento).2 Conferir MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: direito societário:sociedades simples e empresárias. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010. v. 2, capítulo 5,seção 5 (Responsabilidade civil); capítulo 22, seção 6 (Responsabilidade dosadministradores).3 MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: direito societário: sociedadessimples e empresárias. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010. v. 2, capítulo 5 (Administraçãosocietária).4 Conferir MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: direito societário:sociedades simples e empresárias. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010. v. 2, capítulo 22,seção 1 (Assembleia geral).5 Sobre essas hipóteses, conferir MAMEDE, Gladston. Direito empresarialbrasileiro): direito societário: sociedades simples e empresárias. 4. ed. São Paulo:Atlas, 2010. v. 2, capítulo 25 (Dissolução, liquidação e extinção).6 Conferir MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: empresa e atuaçãoempresarial. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010. v. 1, capítulos 3 (Princípios gerais doDireito Empresarial).

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Empresas familiares

O desafio

Estar no mercado já é difícil. São milhares de empresas engalfinhadas numa luta cotidiana.Segundo números do Sebrae, 27% das empresas abertas em São Paulo fecham depois de umano de funcionamento; 37% não sobrevivem ao segundo ano de existência.1 No quinto ano apóssua criação, 58% das empresas já encerraram sua curta existência. São números estarrecedores.

Nesse contexto, entre o amplo universo das empresas existentes, destacam-se algumasorganizações que trazem certa qualidade: sua existência está fortemente lastreada por umafamília ou grupo de famílias. Assim, a existência da empresa e das atividades empresariaismostra-se muito referenciada pelo ambiente doméstico, o que acaba por influenciá-las: a vidada empresa (passado, presente e futuro) não está restrita aos seus estabelecimentos, suasplantas produtivas, seu histórico de iniciativas e negócios. A vida da empresa avança sobre avida da família ou das famílias, quando não é o contrário: a vida de uma família torna-se a vidada empresa. Não é nada simples. Um observador externo que preste atenção apenas àsestruturas administrativas, produtivas, mercadológicas etc. não perceberá questões vitais sobrea empresa, questões essas que se localizam fora dos estabelecimentos empresariais: seu cenárioé o ambiente familiar.

Há quem acredite tratar-se de uma desvantagem, já que empresas familiares seriam vítimas

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de conflitos que são estranhos ao meio econômico que deveria organizar-se de maneiraexclusivamente técnica ou, como se ouve e lê reiteradamente, administrar-se de formaprofissional. Nós não pensamos assim. A condição de empresa familiar não é, em si, uma causaeficaz de sucesso ou fracasso da atividade negocial. A realidade mostra que há empresas cujaprincipal virtude é justamente ser uma empresa familiar. Seu sucesso está calçado na condiçãofamiliar. Mais do que isso, não se desconhecem casos de empresas que, abandonando a gestãofamiliar e optando por uma administração profissional, viram-se conduzidas a crises econômico-financeiras, em muitos casos pela incapacidade do gestor estranho à família de compreender-lhea estrutura, a dinâmica e o funcionamento.

Não é correta a afirmação de que são melhores as empresas conduzidas por técnicos,estranhos à família. Não é correta a afirmação de que as sociedades não controladas por umafamília ou grupo de famílias são melhores. Veem-se empresas familiares pujantes, comotambém são vistas empresas familiares em crise, na mesma toada em que se veem empresas nãofamiliares pujantes e em crise. Importa a qualidade da vida societária, da administraçãosocietária e da gestão empresarial, sendo que a excelência pode estar numa família ou entretécnicos profissionais. Como se não bastasse tal constatação óbvia, há incontáveis histórias nasquais se percebe que o melhor de uma empresa, sua força, seu diferencial, sua vantagem, são oslaços familiares e a convicção nos valores que foram transmitidos de geração a geração.

A principal virtude de uma empresa pode ser justamente a sua condição de organização familiar. Erram aqueles que consideram issoum defeito.

No entanto, não se pode desconhecer que a empresa familiar tem desafios próprios e elesprecisam ser conhecidos, estudados e tratados. A influência da família sobre a empresa implica,em muitos casos, ver o negócio contaminar-se por questões que são, sim, absolutamenteestranhas ao ambiente empresarial, incluindo desentendimentos e disputas que foram geradasno palco das relações domésticas. Assim, os negócios podem experimentar a influência negativade sentimentos estranhos ao mercado, como amor, ódio, ressentimento, gratidão, ciúmes,paixão etc. Certa feita, em meio a uma reunião de sócios, primos entre si, discutindo a criseeconômico-financeira experimentada pela empresa, o administrador, questionado sobre umasérie de atos desastrosos que praticara e débitos que provocara, não hesitou em alegar em suadefesa: – Você não devia dizer isso… quando você veio para Belo Horizonte, minha mãe acolheuvocê. Você não comia lá em casa todos os dias e papai até lhe ajudou a comprar os livros dafaculdade!

Por isso é preciso trabalhar a família para adequar-se à empresa, aproveitando seus bônus(vantagens regulares que ela proporciona, nomeadamente os lucros que distribui) e assumindoseus ônus. Os parentes precisam aprender que os cenários diversos implicam posturas diversas:a família e a empresa. Na empresa, os familiares são sócios (quotistas ou acionistas) e, assim,seu comportamento deve orientar-se pelas regras do Direito Societário, que é uma disciplina doDireito Empresarial. Se, em casa, Fulano é meu irmão ou primo, na empresa, ele é meu sócio.Portanto, é preciso aprender a ser sócio, certo que as relações entre quotistas e acionistas têmuma natureza jurídica própria, rito e tônica específicos, e esses natureza, rito e tônica são muitodistintos daqueles que se referem ao plano familiar.

O fato de a empresa estar ancorada numa família precisa ser tratado e desenvolvido semprena direção das vantagens, ou seja, sempre reconhecendo a possibilidade de haver problemas e,assim, evitando-os. No mínimo, é preciso perceber que a empresa é uma riqueza da família, é

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um patrimônio produtivo que deve ser preservado ou – melhor ainda – deve ser otimizado para,assim, render frutos por longo período, beneficiando diversas gerações. Isso exige, antes dequalquer coisa, compreender que uma empresa não é um cabide de empregos: a riqueza que elapode proporcionar vem dos lucros e não do fato de empregar a todos. Aliás, a prática dependurar familiares na empresa, salvo situações muito específicas, é um caminho quehabitualmente leva a uma crise econômico-financeira e, enfim, ao seu fim, com prejuízo para opatrimônio familiar.

Veja-se o exemplo da Cargill Inc., empresa multinacional do setor agropecuário. Em 2008, acorporação criou uma escola de líderes cujo objetivo é educar e preparar as novas gerações dasfamílias Cargill e MacMillan, que detêm seu controle acionário. Dessa maneira, preservam-se osinteresses corporativos, voltados para a manutenção e sucesso da atividade negocial, na mesmatoada em que se atendem aos legítimos interesses dos membros das famílias controladoras. Maisdo que isso, ao trazer os jovens para a empresa e educá-los corretamente, a corporaçãotransforma-se essencialmente num vetor de união.

Definição

Há muitas maneiras pelas quais se pode compreender o que seja uma empresa familiar. Otratamento teórico mais comum é aquele que reconhece como familiar as empresas cujas quotasou ações estejam sob o controle de uma família, podendo ser administradas por seus membros,ainda que com o auxílio de gestores profissionais. Por esse ângulo, estariam incluídas apenas associedades em que o controle é detido por dois ou mais parentes. Essa equação nos remeteria aduas situações mais comuns: ou a constituição da sociedade foi levada a cabo por parentes(pais, filhos, primos etc.), ou já houve uma sucessão na titularidade do capital social e, assim, achegada dos herdeiros à corporação teria o condão de transformá-la em empresa familiar. Maisrara é a hipótese de parentes adquirirem, em conjunto, o controle de uma sociedade jáexistente, o que também criaria uma situação que se amoldaria à fórmula usual decaracterização de sociedades familiares.

Para ser mais preciso, a definição de uma fórmula, nos termos acima, tem por objetivo criaruma referência, ou seja, uma limitação para fins de estudo. Como facilmente se percebe, adefinição desses critérios objetivos permite o levantamento de dados para orientar análisesestatísticas. Não sem razão, esses estudos estatísticos são habitualmente precedidos de umadefinição das referências que orientarão a coleta dos dados. Por exemplo, pode-se estipular quea coleta se limitará a empresas que estejam na segunda geração ou qualquer outro parâmetroobjetivo.

Diferentemente desses trabalhos, recusamos qualquer critério objetivo. Optamos por umaperspectiva subjetiva, ou seja, por compreender como familiar toda empresa em que o titular outitulares do controle societário entendem como tal. Noutras palavras, importa-nos aquilo que ossócios entendem como sendo uma empresa familiar, ainda que fuja ao que habitualmente sejacompreendido como tal. Esse enfoque nos permitirá tratar dos desafios das sociedades que,embora ainda estejam sob o controle da primeira geração, destinam-se a se manter com afamília. Cuida-se de uma perspectiva mais larga, que alcançará pessoas que estariam excluídaspela análise objetiva, na mesma toada em que se sentirão excluídos aqueles que não secompreendam como parte de uma empresa familiar.

A justificativa para essa definição é bem simples: nosso objetivo, aqui, é oferecer soluções

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para aqueles que, compreendendo-se como parte de uma empresa familiar, enfrentam desafiospróprios desse tipo de organização. Nossa meta, portanto, é servir à comunidade em geral naresolução das equações que se lhe apresentem. Aliás, essa compreensão ampla deixa ao largodiversas outras questões que poderiam ser relevantes para estudos sociológicos. Basta recordarque o próprio conceito de família é muito amplo e, assim, desafia não só uma teorização, comoa própria prática da advocacia empresarial. A situação mais simples é representada pelas célulasfamiliares mais elementares, ou seja, quando a relação entre a família e a empresa ainda está naprimeira geração. O fundador é o pai, a mãe ou o casal. A sucessão se faz habitualmente para osfilhos.

Essa compreensão simplificada, própria de empresas que enfrentaram ou devem enfrentar asua primeira sucessão hereditária, não atende à complexidade do tema. Não se pode olvidarque, em muitos casos, a múltipla sucessão de gerações tem impactos diretos sobre a coletividadesocial e familiar. Habitualmente, a família se fragmenta e espraia-se, o que leva à formação denúcleos familiares diversos, alguns mais próximos entre si, outros mais distantes, segundo alógica aleatória das uniões afetivas. Alguns desses núcleos podem mesmo perder o patronímicofamiliar, enquanto outros o conservam. Esses fatos corriqueiros, próprios da evolução do tempo,podem impactar a empresa e, mais do que isso, podem impactar o bloco de controle familiar,demandando esforços para manter sua coesão, a bem da empresa, da coletividade social e dopróprio bloco de controle.

Essa opção metodológica, contudo, acaba por revelar uma realidade interessante: osnúmeros extremamente baixos de empresas que conseguem efetivamente fazer a transição deuma geração para outra. Considerando cada universo de 100 empresas, sabe-se que apenas 30%delas irão chegar à segunda geração; apenas 13% das empresas chegam à terceira geração e,alcançando a quarta geração, apenas 5%, sendo que, em 65% dos casos, o fim dessas empresastem causa eficaz em conflitos entre os sócios.2

A consideração desses números é suficiente para chamar a atenção dos sócios/familiarespara os desafios que devem enfrentar, no dia a dia, a bem da preservação da empresa, valedizer, a bem da preservação de seu patrimônio comum, a bem de si próprio e das geraçõesfuturas.

O papel do advogado

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O que se viu, até aqui, recomenda abordar um questão lateral: o papel do advogado naassessoria às empresas familiares e, mais do que isso, a forma como deve atuar. Lidar comempresas familiares – designadamente com o seu planejamento jurídico e com a convivênciaentre os sócios – exige muita habilidade e sensibilidade do advogado. Não é correto encará-lasapenas como atividades negociais, nem como se fossem apenas ativos empresariais que podemser traduzidos em cifras. Essa postura provavelmente causará desconforto, senão indisposiçãoou mesmo rejeição e atrito.

É preciso estar atento para o fato de que as empresas familiares são a história de uma vida esua existência está ancorada nessa história. Aquele complexo organizado de bens e atividades éo resultado do trabalho cotidiano, realizado ao longo de anos, por um homem, uma mulher, umcasal, uma família. Justamente por isso, os parentes veem a empresa com um olhar diverso,normalmente com fortes implicações emocionais. É muito comum que tais pessoas contemplema empresa com a mirada dos anos, as recordações de toda uma vida e seus desafios.

O advogado que atua junto às famílias empresárias deve ter redobrada cautela e sensibilidade para compreender os dilemas e osdesafios que envolvem as famílias e a vida privada. Não se trata apenas de negócios; são questões familiares, acima de qualquer coisa.

Não se espera que o advogado conheça toda a história ou que expresse a mesmacompreensão de quem vivenciou tempos marcados por dificuldades e sacrifícios, esforçosreiterados, trabalho disciplinado e muita fé. Mas é preciso ser capaz de entender que a empresaé o legado de seu fundador e/ou administrador, que é a sua obra e, assim, uma parte essencialde sua vida. Em todos os seus aspectos, detalhes e elementos, a empresa reflete momentos desua vida: é um grande caleidoscópio de recordações e sentimentos, entre crises e vitórias,oportunidades e desafios, incertezas e esperança. Definitivamente, a empresa familiar não éapenas um ativo; não é apenas um negócio.

O resultado mais elementar desta perspectiva é o fato de ser habitual – e, até, muitorazoável – que o sócio, seja ou não o fundador ou o controlador, não se sinta confortável emseparar a empresa da família. E isso pode ocorrer de forma positiva ou negativa: há mesmoaqueles que não suportam uma empresa, por melhor que seja, em virtude de experiênciasvividas no passado. Em incontáveis casos, os conflitos vividos em empresas familiares têm raízesem conflitos vividos em família e que são, infelizmente, transportados para o contexto negocial,com prejuízos para a corporação. Essa realidade é assustadoramente comum.

Ainda que o mercado tenha o hábito salutar de colocar a família e a atividade profissionalem lados opostos, há aqueles que não conseguem implementar essa divisão entre o planodoméstico e o plano dos negócios. Não apenas pessoas. Famílias inteiras para as quais a vidadoméstica, a vida familiar, é uma parte da vida da empresa – e vice-versa. Família e empresaviveram bons momentos juntas, assim como sofreram juntas os maus momentos. Entre irmãosessa equação é comum e complexa. Daí ser indispensável que o profissional tenha tato, muitotato. O que pode estar atrás de uma controvérsia societária é, na verdade, uma mágoa trazidada infância, como aqueles que têm a certeza de que seu(s) irmão(s) foi mais querido pelos pais,foi melhor tratado, teve mais vantagens ao longo da criação.

Facilmente se percebe que em raras oportunidades se poderá trabalhar para uma empresafamiliar e tratar os negócios de uma forma impessoal. Para começar, é corriqueiro que seusadministradores sustentem seus cargos não por estarem à altura do empreendimento, masporque são parte da família e, assim, é seu direito desempenhar a função, o que é uma realidadecom lastros constitucionais. Isso é uma verdade, é bom que se frise: os titulares de quotas ou

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ações de uma sociedade dividem sua propriedade coletiva e têm a faculdade de exercer os atoslícitos de afirmação de seus direitos, inclusive escolher os gestores e, até, escolherem-se paragestores.

Atente-se para o fato de que é mesmo legítima a pretensão de que existam fortes elos entreo ambiente doméstico e o ambiente empresarial, levando à ideia de que a empresa é parte dafamília e, mais do que isso, que a empresa pode – e deve – ser um vetor para preservar afamília. Isso não é, por si só, um prejuízo. Por isso, qualquer profissional que se disponha atrabalhar numa empresa familiar ou para os membros de uma família ligada a uma corporaçãoempresarial deve ter esse cenário em mente para, assim, calcular seus passos.

A mesma regra aplica-se ao advogado. É um erro lamentável e perigoso compreender aspessoas envolvidas apenas como investidoras, como sócias, como parceiras etc. Há uma históriaem potencial por trás de cada sócio/familiar e que pode estar motivando o seu comportamento.Por isso, insistimos na necessidade de muita cautela para enfrentar eventuais problemas ouconflitos em sociedades familiares. Mais do que isso, repetimos a advertência já feita: a matrizde uma discordância pode ter suas raízes em fatos havidos há muito tempo, por vezes nainfância, mas que ainda marcam as pessoas e orientam o seu comportamento.

Por esse ângulo, fica claro serem justificados os desafios que normalmente são encontradosnas corporações familiares. O maior deles é a subjetividade. É compreensível que a históriapessoal e familiar de cada sócio influencie seu comportamento no âmbito da sociedade. Écorriqueiro que as pessoas tragam para as reuniões/assembleias os sentimentos quecolecionaram ao longo de anos, desde a infância: admiração, confiança, medo, antipatia,mágoa, ressentimento etc. A confusão entre os ambientes domésticos e negocial é o resultado dacondição humana. Em muitos casos, as famílias submetem-se a intervenções psicológicas oupsicanalíticas para tentar resolver os desafios que trazem do ambiente doméstico e, assim, evitarque contaminem a vida societária. Mas essas intervenções fogem ao objeto do presente estudo,que é jurídico.

Eis por que havemos de reiterar as qualidades pessoais que devem ser reveladas peloprofissional que pretenda atuar junto a empresas familiares. A realização desse trabalho podeconduzir a horizontes diversos, não sendo raro verem-se crises entre os familiares e osespecialistas, como restrições ao trabalho, limites às intervenções, desgastes pessoais, discussõesacaloradas e mesmo agressivas, para além de outras formas de resistência e, mesmo, de atuaçãosistemática no sentido de prejudicar a intervenção. Infelizmente, por pior que esteja o cenário,muitos o preferirão assim. O advogado (assim como o consultor empresarial ou outro expert)tende a focar-se nas dimensões objetivas da sociedade e da empresa, procurando identificarproblemas e corrigi-los por meio da aplicação de seus conhecimentos técnicos. Mas pode ver suaintervenção comprometida pelo enredo de disputas sucessórias e problemas de relacionamentofamiliar.

Não é só. Em muitas oportunidades, a resistência é oferecida por pessoas que gravitam ao

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redor da empresa e/ou da família, atuando como conselheiros formais ou informais, e que têmmuito a perder com a resolução dos impasses familiares. Essa oposição também pode seroferecida por funcionário ou funcionários que ocupem postos de gestão da organização e que,igualmente, sintam-se ameaçados pelas alterações propostas, trabalhando pela conservação doscenários havidos, que consideram positivos para si, apesar de serem negativos para acorporação e para a família titular. Superando todas essas adversidades, o advogado devedemonstrar à família – e, eventualmente, a outros sócios – as vantagens do emprego datecnologia jurídica, nomeadamente da melhor teoria societária, para beneficiar a todos osenvolvidos. Afinal, essas intervenções são meios eficazes para dar nova expressão e qualidade àvida social e ao negócio.

Valorização da família

Muito se fala dos problemas das empresas familiares, de seus desafios, de suas dificuldades.É um discurso crítico comum, mas que deixa de lado um aspecto importantíssimo: a empresapode ser um instrumento para a unidade familiar, para a harmonia e a boa convivência entre osparentes. Mais do que isso, é possível intervir juridicamente sobre a sociedade empresáriafamiliar para otimizar a sua condição em um ambiente que favorece e estimula o bomrelacionamento entre os familiares. Efetivamente, é possível criar estruturas jurídicas quetransformem a empresa num ambiente que favoreça e estimule o bom relacionamento entre osparentes. Essa meta tem na sua raiz o estímulo à participação de cada familiar na condição deinvestidor, de sócio, de proprietário de partes do capital social (quotas ou ações) e, assim, comparticipação útil nas reuniões e assembleias, com interesse nos assuntos societários e no futuroda empresa.

Sim. Mais do que simplesmente manter a empresa no âmbito da família, é possíveltransformar a sociedade num espaço para a preservação da unidade familiar. Há ferramentaspara estabelecer um ambiente societário que envolva os parentes, aproximando-os eestimulando o diálogo, as boas relações, a harmonia. Ferramentas que não apenas prolonguema convivência, mas que trabalhem pela melhoria dos laços fraternais e, ademais, contribuamdecisivamente para o sucesso da atividade negocial, a bem de todos. A proposta deste livro éjustamente esta: trabalhar essas ferramentas, esses mecanismos, expor as estruturas de umaengenharia societária voltada para estabelecer um ambiente empresarial que acolha melhoruma família.

Noutras palavras, o Direito é um dos instrumentos que se coloca à disposição doadministrador societário para esse planejamento, embora não se possa olvidar que háferramentas dispostas em outras disciplinas do conhecimento. E o jurista deve estar conscientedas contribuições que podem ser oferecidas pelos experts dessas outras áreas: ciências daadministração, mercadologia, psicologia, relações sociais etc. Há instrumentos não jurídicos quepodem e devem ser estimulados, como a assunção do compromisso de manter a culturafamiliar, a criação de ambientes que lhe sejam destinados e de rotinas que estimulem aconvivência entre os parentes. Isso é ainda mais útil quando se verifica a formação de núcleosfamiliares mais distanciados uns dos outros, resultado da sucessão de gerações.

A experiência narra diversas situações muito interessantes, voltadas sempre para integrar afamília, manter seus laços de afinidade e afetividade, valorizar a sua compreensão como um clã,como um grupo afim. É impressionante o rol de medidas simples e eficazes que podem ser

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adotadas para alcançar esse objetivo. Por exemplo, há notícia de empresas que trouxeram ohistórico familiar para dentro de suas páginas na Internet, ostentando com orgulho os elos entrea atividade negocial e o clã que a ergueu: fotos ilustram a narrativa do que se passou, dasdificuldades às vitórias, criando, por meio da valorização dos antepassados, um sentimento depertença que é útil à boa convivência entre os sócios. Noutros casos, há páginas específicas parao convívio familiar nas quais se listam as datas de aniversário, as datas de eventos comuns(festas, celebrações) e mesmo fotografias e filmes de fatos atuais, como uma festa junina, umaapresentação de ballet, um aniversário, além de informações sobre a empresa: agenda dereuniões e/ou assembleias, relatórios econômicos.

A adoção de políticas de valorização da família empresária pode incluir iniciativas as maisdiversas, nomeadamente aquelas que valorizam sua posição na empresa. Com efeito, não háuma tradição brasileira de ser sócio, no sentido pleno do instituto, o que explica asobrevalorização das funções de administração. Assim, pode ser extremamente útil criar umacultura que dê suporte a essa postura incomum: expor as faculdades e as obrigações do sócio,educar para noções elementares de contabilidade (permitindo a análise de relatórios contábeis),compreender as estruturas organográficas das empresas, incluindo visitas às respectivas plantas,estudar os parâmetros elementares de mercadologia e as estratégias adotadas pela empresa etc.

Ao advogado caberá trabalhar a regência jurídica da convivência familiar no âmbito da(s)sociedade(s) empresária(s), o que se fará por meio do ato constitutivo e/ou de pactosparassociais, como acordo de quotistas ou acionistas, regimento interno, manual para asreuniões ou assembleias de sócios, além da instituição de órgãos societários, como o conselhofamiliar, entre outros. A proposição e a implantação desses instrumentos jurídicos, entretanto,exigem cautela, evitando criar apreensão entre administradores e/ou sócios. É precisocompreender a equação sob a qual se sustenta o convívio empresarial-familiar para não se versurpreendido com particularidades que não foram percebidas e, uma vez confrontadas, colocamtodo o trabalho a perder. Ilustra a situação de empresas que mantêm pesadas estruturas degestão, incompreensíveis para quem não percebe que sua justificativa é acomodar vários ramosfamiliares diversos de uma empresa que já experimenta a terceira ou quarta – senão mais –geração em seu controle e administração. É fundamental aprender a organização para agirsobre ela. É preciso assimilar o olhar que os familiares/sócios têm da corporação, seus valores,sua lógica, suas expectativas, além dos alicerces familiares.

1 Valor Econômico, 17 maio 2011, p. F1.2 Valor Econômico, 17 maio 2011, p. F1.

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