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 · versava sobre o crime de apropriação indébita e outro que versava sobre o crime de estelionato. Acertei ambos e, com isso, ... Resumo: O presente trabalho

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Sumário.

(Capítulo I): A questão da vida (?) nos fetos

anencéfalos. (13)

(Capítulo II ) Primeiras Linhas sobre o

Registro Civil de Pessoas Naturais.

( 36)

(Capítulo III): Relações familiares em seara

cartorária. ( 56)

( Capítulo IV): Contratos de leasing X CDC

( Capítulo V): A Sucessão Trabalhista nos

Processos de Falência e Recuperação Judicial.

( 102)

(Capítulo VI ): Competência Tributária.

(135)

(88)

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Agradecimentos:

Aos leitores, ferramenta e razão de ser de

nosso trabalho.

Aos meus pais: Paulo Brigagão e Maria

Aparecida Naves Brigagão, in memorian, são

duas estrelas que tenho no céu olhando por mim.

Ao meu melhor amigo: Jesus Cristo, meu

grande companheiro de jornada.

Ao Marcus Vinícius Oliveira, pelo amor-

pérola, hoje transformado.

À minha amiga do coração Arminda de

Freitas, por sua dedicação por minha família, por

mais de 30 anos.

À minha tia Eunice, por sua dedicação!

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Prefacio:

NOSSA AMIZADE PODERIA TER

OFUSCADO MINHA VISÃO CRÍTICA,

TORNANDO-A COMPLASCENTE COM

QUAISQUER LINHAS QUE VOCÊ

ESCREVESSE..

MAS A CLAREZA E A OBJETIVIDADE

DE SUAS LIÇÕES (POIS SÃO EXATAMENTE

ISTO - LIÇÕES) TORNARAM INÓCUA TAL

COMPLASCÊNCIA, POIS A SUA LINGUAGEM

COLOQUIAL, PRECISA, CONSTRUIU UM

LIVRO MAIS DO QUE NECESSÁRIO PARA

AQUELES QUE PROCURAM A

ATUALIZAÇÃO NOS ESTUDOS JURÍDICOS,

MAS UM LIVRO QUE, POR SER RICO EM

COMENTÁRIOS DOUTRINÁRIOS, JULGADOS

RELEVANTES CONSEGUE SER ÚNICO, A

COROAR COM LOUVOR ESTE SEU COMEÇO

NA ÁRDUA BIBLIOGRAFIA JURÍDICA.

BOA SORTE!

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CARINHOSAMENTE;

MARIA ALICE DA FONSECA

LOPES. (SERVIDORA PÚBLICA E

ESPECIALISTA EM DIREITO PRIVADO).

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Notas sobre a Autora.

Paula Naves Brigagão. Aprovada em

Concurso Público ao Cargo de Notários e

Registradores no Estado de Minas Gerais.

Palestrante no Curso Jurídico à Distância

Unieducar. Escritora na área Jurídica. Ex.

Conciliadora e Ex Juíza Leiga no Tribunal de

Justiça do Rio de Janeiro. Ex Defensora Dativa do

TRF da 1ª Região. Mestranda em Direito das

Relações Internacionais, pela Universidad La

Empresa, Montevidéu, UY.

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Notas da Autora à Primeira Edição.

Olá. Antes que você, leitor, se pergunte:

quem é essa maluca que escreve sobre tudo? Eu lhe

respondo: eu, Paula, não sou uma pessoa que sabe

tudo, longe disso, mas sim alguém que aprendeu a

fazer um estudo interdisciplinar dos institutos

jurídicos e que, por esse detalhe, foi aprovada em

um concurso público de peso.

No dia em que você, leitor, começar a

estudar as disciplinas jurídicas observando-as como

um sistema, um todo, acredite em mim, você estará

apto a lograr aprovação em qualquer, veja bem,

qualquer concurso público, para qualquer carreira

jurídica. Isso porque, a título de exemplo, não

existe um Direito Penal para um concurso da

Magistratura, outro para o concurso do Ministério

Público e outro para o concurso de Notários. Há,

sim, algumas posições mais liberais, outras mais

conservadoras; mas o Direito continua sendo o

Direito Penal. Logo, ele é um só. A sua divisão se

dá apenas para fins didáticos.

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Assim, um relato da minha experiência

pessoal: Vi-me na contingência de responder, em

minha prova oral, acerca de um caso concreto que

versava sobre o crime de apropriação indébita e

outro que versava sobre o crime de estelionato.

Acertei ambos e, com isso, conquistei a minha

banca examinadora. Meu concurso: Notários.

Detalhe, esse é o concurso da moda atualmente. Só

no meu concurso tinha para mais de seis mil

inscritos. Era gente saindo pelo ladrão. Conclusão:

O candidato é obrigado a fazer “o diferencial” para

obter êxito.

Ah, mas Direito Penal não cai nesse tipo de

concurso? Vai nessa! Sendo, pois unitário o

Direito, os seus ramos: Penal, Civil, Tributário,

Administrativo, etc., são ramos interdisciplinares, e

devem, pois, merecer o estudo, com afinco; sem

exercícios de adivinhações pelo candidato que

acha, muitas das vezes, que pode escolher a

matéria. O candidato que só estuda Civil ou só

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estuda Penal ou só estuda Tributário chega a uma

prova específica, se chegar, e vai enxugar gelo.

Gabarita uma determinada disciplina e não

consegue o mínimo para a outra. Conseqüência:

volta a engrossar a fila dos concurseiros de plantão.

Já o candidato que não é perito em nenhuma

disciplina, mas tem o conhecimento interdisciplinar

de todas elas, esse é o candidato certo.

Outra coisa. Muitas vezes o candidato pensa

que só estudar resolve o concurso. Afirmo: não

basta isso! Eu fui uma das vinte primeiras

colocadas no meu concurso para tabeliã, na prova

discursiva. Se isso foi bom? Nem tanto. Basta dizer

que não fui uma das vinte colocadas após a prova

oral. A Banca passou a esperar muito de mim e me

espremeu pior que laranja de feira. Antes de

começar a prova, eu já estava sendo parabenizada

pelo Presidente da Banca, pela nota na prova

discursiva. Senti até um frio na espinha. Dureza!

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Na minha prova oral, eu tive que responder

a quatro questões, de disciplinas variadas. Ah mas é

pouco! É sim, infelizmente, porque as chances de

errar diminuem. Na metade delas, ou seja, na

segunda, veio uma questão que eu não esperava.

Era um determinado prazo de loteamento urbano,

do Direito Notarial. Prazo não tem como. Ou você

sabe, ou não sabe. Não dá para sair por um

princípio, não há como. Eu, definitivamente, não

sabia aquele prazo. Respirei, contei até 10 ( dez) e

comecei a dialogar com o meu examinador. Até

que, em um determinado momento, ele se virou

para mim e disse:

“- Doutora, não sou eu aqui o objeto de

indagações e sim a senhora. A doutora está me

argüindo! Como pode isso!?”

Ambos sorrimos. De fato, eu não sabia a

resposta, mas mostrei a ele a minha tranqüilidade

com relação a isso e o papo jurídico sobre o tema

surgiu, naturalmente, sem que nos déssemos conta.

A isso se chama equilíbrio emocional, que não se

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encontra em nenhum manual, mas que o candidato

deve trabalhar consigo mesmo, durante os meses e

anos de preparação. É trabalho árduo e contínuo.

Por fim. O principal a ser dito. Passei anos a

fio estudando para concursos, embora tenha sido

aprovada no meu primeiro concurso para Notários.

Só estudar não bastou. Ditadura nos concursos?

Não. Isso não existe. O candidato acha (como eu

achei!) que pode escolher o concurso, mas é o

inverso. O concurso escolhe o candidato.

Desistir de um sonho? Não aconselho, mas

é preciso ter flexibilidade para saber enxergar as

outras opções, que são tão boas quanto. A vida é

plena de possibilidades. O futuro a Deus pertence.

Somente ELE sabe o que nos fará feliz na vida.

Confie NELE para a escolha de suas escolhas, com

humildade. Isso é sabedoria. Sabedoria e

conhecimento são coisas diferentes.

Quanto aos insucessos do percurso, quem

não sabe perder também não sabe ganhar! Começa

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a ganhar aquele que aceitou um insucesso como

aprendizado, no caminho rumo à vitória.

No mais. Desejo um ótimo estudo a todos

os leitores. Muita garra, muita persistência e força

de vontade. São as chaves para o sucesso. A

jornada só está começando. Boa leitura!

Um fraternal abraço e que Deus os abençoe.

Paula Naves Brigagão.

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A questão da vida (?) nos fetos anencéfalos.

Sumário:

1.1) A vida humana; 1.2) A separação entre

o Estado e a igreja; 1.3) Considerações adicionais;

1.4) Conclusão; 1.5) Bibliografia.

Palavras – Chaves: Dignidade, Vida,

Durabilidade, Anencefalia.

Resumo: O presente trabalho pontua a

origem da vida e da morte como aspectos centrais -

no que tange a interrupção da gravidez de feto

anencéfalo, hoje, reconhecida no julgamento da

ADPF 54 pelo Supremo Tribunal Federal, como

faculdade da gestante. Discute-se a questão da

viabilidade e durabilidade do mesmo, bem como as

questões da tipicidade e ilicitude da conduta

perpetrada.

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(1.1) A vida humana.

“A nova fonte de poder não é o dinheiro nas

mãos de poucos, mas informação nas mãos de

muitos”. (John Lennon).

Anencefalia consiste na ausência (integral

ou parcial) de cérebro - decorrente de má formação

do feto no útero materno, ocasionada por

fechamento no tubo neural que estrutura o dueto:

espinha e cérebro.

O Supremo Tribunal Federal, em decisão

recente, proferida em 12 de abril do presente ano,

na Ação de Argüição de Descumprimento de

Preceito Fundamental (ADPF 54) “bateu o

martelo” no sentido de que a conduta de

interrupção da gravidez em feto desprovido de

cérebro não mais é típica, ilícita e culpável, ou seja,

crime de aborto para os efeitos decorrentes do

Código Penal.

A questão de fundo que irá abrilhantar a

discussão, in casu, é a vida humana. Não somos

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“dona da verdade”, até porque a verdade é relativa,

e o artigo em comento não visa a convencer o leitor

de nada, não é essa a nossa intenção, mas a de

apenas levantar alguns questionamentos jurídicos, a

de fazer pensar.

A mais alta Corte do país se valeu da

construção de um raciocínio lógico. Explicou a

vida pela morte e se serviu de base legal para tanto:

“Aborto é crime contra a vida em potencial. No

caso da anencefalia, a vida não é possível. O feto

está juridicamente morto”.

O Ministro Marco Aurélio não inventou isso

da cabeça dele. Foi o próprio legislador quem nos

ensinou, através da Lei de Transplantes (Lei

9.434/97), que a ausência das funções cerebrais é

fator determinante para se auferir o óbito de uma

pessoa.

Logo, o Supremo Tribunal Federal decidiu

de forma coerente com a Lei de Transplantes. É

verdade. Tanto foi coerente com o legislador que

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seria um argumento redondamente fraco e repleto

de imperfeições o de que teria a Corte Maior

atuado como legislador positivo.

Sendo verdade que cada macaco deve ficar

no seu galho e que não houve usurpações de

funções, mas uma decisão baseada em uma lei,

também é verdade que a decisão foi baseada na lei,

mas não foi baseada no sistema como um todo.

Isso porque construir o raciocínio da vida

pela morte é atropelar o que o próprio legislador

nos ensinou sobre o momento em que se inicia a

vida humana. Não há lacunas na ordem jurídica

sobre tal fato.

O que há é um descompasso legislativo

entre vida e morte. Se a morte é definida por

funções cerebrais, a vida é definida pela respiração.

E essa não é mais uma elucubração doutrinária.

Foi à ordem legal quem nos ensinou assim.

Precisou nos ensinar, por força da imensa

insegurança jurídica que reinava entre nós, ao se

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precisar o instante da morte. A lei veio com vistas a

colocar uma “pá de cal” sobre o assunto.

Assim, até o ano de 1997 em que ganhou

vigência a Lei 9.434/97 (art. 3º) poucas não foram

às discussões sobre o tema. Especialmente, por um

fato que marcou o mundo no ano de 1973.

Célebre foi o caso de Jason Arthur, que,

“dado como morto ao sofrer, em 14 de julho de

1973, uma grave lesão cerebral em uma piscina,

nos Estados Unidos, tendo a sua mãe anuído no

transplante de seus rins e do seu fígado, respondeu

aos estímulos de dor quando os médicos se

preparavam para a operação, recobrando a

respiração 45 minutos depois”.1

Logo, ainda que a medicina não seja uma

ciência exata, o legislador achou por bem que

houvesse uma lei a fim de regulamentar o assunto e

1 Antonio Chaves, apud Maria Helena Diniz, ob,

p.268.

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assim o fez na lei em epígrafe. O tema morte

ganhou disciplina própria com a Lei de

Transplantes (Lei 9.434/97) e o tema vida já

contava com a disciplina da Lei Registral (Lei

6.015/73).

Dispõe a Lei 6.015/73, em seu parágrafo 2º:

“No caso de a criança morrer na ocasião do parto,

tendo, entretanto, respirado, serão feitos os dois

assentos, o de nascimento e o de óbito, com os

elementos cabíveis e com remissões recíprocas”.

(grifo nosso!).

Não há que se falar que a Lei de

Transplantes, por ser mais recente, teria revogado

tacitamente a Lei 6.015/73, já que se uma trata do

momento em que se dá a vida e a outra trata do

momento em que se dá a morte, não é difícil

concluir que tratam de coisas distintas. A lei é auto-

explicativa.

Assim, ou o legislador define a vida pela

formação cerebral ou o sistema fica de cabeça para

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baixo. Se assim não o fez e vivemos em uma

democracia presumir que essa teria sido a sua

vontade seria como confundir a volunta legis com a

volunta legislatoris - e é princípio de hermenêutica

que o sistema legal não se baseia na vontade do

legislador e sim na vontade da lei - e a lei é clara

como água cristalina: a respiração é fato jurídico.

Essa, a sua natureza jurídica; tanto que o

registrador civil de pessoas naturais é a autoridade

competente para lavrar o assento de nascimento

após o ser vivo ter respirado. O Estado dotou o

profissional de fé pública para tanto. O fato natural

(respiração) ganhou contornos jurídicos ao

incorporar para si as conseqüências da lei registral.

Por todos, com a sabedoria que lhe é

inerente, Walter Ceneviva: “No Brasil há

nascimento e há parto quando a criança, deixando o

útero materno, respira. É na respiração

cientificamente comprovada que se completa a

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formação fática do nascimento. Sem ela, tem-se o

parto de natimorto”. 2

2 Walter Ceneviva. Lei dos Registros Públicos Comentada, 13ª edição, São Paulo: Editora Saraiva, ano de 1999.

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(1.2) A separação entre o Estado e a

igreja.

Na respectiva decisão do Supremo Tribunal

Federal destacou-se a separação entre o Estado e a

igreja. É bom que seja assim. A liberdade religiosa

é uma conquista da cidadania.

É fator de legitimidade popular. A

legitimidade é filha única da democracia. Ser livre

é possuir o poder de escolha. Até por que Deus é.

ELE não se impõe a ninguém. O bonito da fé reside

justamente nisso. Como é triste quando nos

deparamos com alguns políticos que usam o nome

de Deus para ganharem eleições! Ver aquilo que é

sagrado sendo banalizado. Manipulam os eleitores

pelo poder da fé. Ser religioso não significa

necessariamente ter Deus.

Foi citado, ainda, na decisão o evangelho

de São Marcos no intento de se defender a

separação entre Estado e Igreja a justificar a

interrupção da gravidez. Para sermos fiéis

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reproduzimos: “Dai a Cesar o que é de Cesar e a

Deus o que é de Deus.” Verdade bíblica, mas que,

se mal interpretada, pode causar distorções

avassaladoras no mundo.

É bem verdade que política e religião não

deveriam se misturar, até por questões éticas,

também o é que a ciência até hoje não conseguiu

nos explicar, com clareza, de onde viemos. Se a

liberdade religiosa nos assegura até mesmo o

direito de desacreditar que a vida seja um dom de

Deus, a ninguém foi dado o direito de presumir que

a vida seja propriedade do homem ou que o mesmo

possa dela dispor como melhor lhe aprouver.

Mas a ciência nos prova que não há vida

durável sem o cérebro. É fato. Até mesmo o

famoso caso de 2008, ocorrido em Patrocínio

Paulista, interior de São Paulo em que a nascitura

Marcela de Jesus Ferreira sobreviveu um ano e oito

meses em face de ausência parcial de cérebro e

porque sua mãe, Cacilda Galante Ferrari, se

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recusou, terminantemente, a interromper a

gravidez. A vida não é durável, mas é viável.

Não estamos em países da Europa em que é

condição para existir e ser pessoa a forma humana

ou a sobrevida nas 24 horas seguintes ao parto.

No Brasil, o Código Civil, em seu art. 2º,

menciona que é pessoa quem nasce com vida e não

que é pessoa quem nasce com vida durável e com

determinada forma (tal como na França). A vida

viável se dá com a nidação, do encontro do

espermatozóide com o óvulo. Não há que se

confundir vida viável com durabilidade da vida.

Uma coisa é uma coisa. Outra coisa é outra coisa!

Não temos o direito de confundirmos alhos com

bugalhos.

Por amor ao debate, citamos o ensinamento

sensato do jurista Pablo Stolze Gagliano (em obra

conjunta) sobre o tema do início da vida, em que o

mesmo faz referência ao estudo objeto de citação

do doutrinador Sérgio Abdalla Semião: “No

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instante em que principia o funcionamento do

aparelho cardiorrespiratório, clinicamente aferível

pelo exame de docimasia hidrostática de Galeno, o

recém-nascido adquire personalidade jurídica,

tornando-se sujeito de direito, mesmo que venha a

falecer minutos depois. Esse exame é baseado na

diferença de peso específico entre o pulmão que

respirou e o que não respirou, mergulhados na

água. O primeiro, por se achar com os alvéolos

dilatados e impregnados de ar, sobrenada, ao passo

que o segundo, compacto e vazio, com as paredes

alveolares colabadas e, por conseguinte, mais

denso, vai ao fundo. Na eventual impossibilidade

de utilização desse método principal de

investigação (se, por acaso, o pulmão do neonato já

vier impregnado de líquido), outras técnicas são

aplicáveis, como a docimasia pulmonar histológica

(verificação dos alvéolos pulmonares, pois, se

houve respiração, apresentarão dilatação uniforme

e, caso contrário, as paredes alveolares estarão

coladas), docimasia óptica de Icard (exame

microscópico de fragmento do pulmão, esmagado

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em uma lâmina, quando, ao observar pequenas

bolhas de ar na película esmagada, deduz-se a

respiração), docimasia química de Icard (passagem

rápida de fragmento do pulmão em álcool absoluto,

a seguir mergulhado em solução alcoólica de

potássio cáustico a 30%, que dissolve o estroma

pulmonar, liberando bolhas de ar, no pulmão que

respirou), docimasia radiográfica de Bordas (exame

radiográfico dos pulmões que se mostrarão opacos

– se não respiraram – ou transparentes – se não

receberam oxigênio), e as docimasias respiratórias

indiretas (verificação de outros órgãos (verificação

de outros órgãos como estômago, intestinos, fígado

e ouvidos – trompas de Eustáquio – conjuntamente

com os pulmões, para tentar constatar se houve ar

circulando no corpo do nascituro”. 3

3 Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho.

Novo Curso de Direito Civil. Parte geral. Vol.1. 13ª Edição.

Editora Saraiva, ano de 2011.

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(1.3) Considerações adicionais.

Se a falta de cérebro torna quase impossível

a vida humana, e é faculdade da mulher a

interrupção da gravidez em tais casos, isso equivale

a tratar o mesmo instituto com dois pesos e duas

medidas.

Assim, caso a mulher opte em não

interromper a gravidez, o bebê nascerá e, ainda que

dure alguns poucos minutos, e morra logo após,

será, pela Lei Civil, considerado pessoa. Isso para

fins de transmissão de bens.

Logo, no campo sucessório, o recém-

nascido adquire e transmite direitos aos seus

herdeiros, mesmo que sem cérebro; mas, para fins

penais não é pessoa, é um ser juridicamente morto,

a justificar a não criminalização de aborto. Um

paradoxo! Para questões patrimoniais o anencéfalo

é pessoa, para questões existenciais é um ser

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juridicamente morto. E o pior, se é faculdade da

mulher a interrupção da gravidez do anencéfalo,

essa passa ao cargo de legislador sem investidura

ou mandato. A pergunta que não quer calar, nessas

hipóteses, é a seguinte: onde ficaria a harmonia do

sistema?

Correlacionar o tema em comento com a

dignidade humana é trabalho delicado, já que se

trata (a dignidade humana) de conceito jurídico

indeterminado. A dor de uma mãe que carrega em

seu ventre uma pessoa que não irá viver é coisa

monstruosa. Não existe dor maior no mundo que a

dor de uma mãe ao perder o seu filho, saber que

está gerando alguém que irá morrer e se sentir

totalmente impotente diante desse fato.

Mas se morre é porque esteve vivo e como

os bens fundamentais devem ser ponderados para

que não entrem em colisão deve-se auferir na

ponderação os bens jurídicos vida versus

dignidade: mas dignidade de quem? Da mãe ou do

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nascituro? Acaso o nascituro é menos digno porque

nasceu sem cérebro? Acaso o nascituro é coisa apta

a ser jogada no lixo?

Em verdade, não há que se falar, pois, em

ponderação, já que de apenas uma vida se tem, qual

seja, a do feto anencéfalo, já que gerar um feto

anencéfalo não coloca, por si só, a mulher em

iminente risco de vida, embora seja causa de

imenso sofrimento para a mesma. Mas será o

sofrimento a causa maior da dignidade?

Ainda que o seja, será a ponderação de uma

vida e uma dignidade (do anencéfalo) versus a

dignidade da mulher. Dois bens jurídicos

sacrificados em prol de um só. Seria isso

proporcional?

O próprio Direito Penal, ao adotar para o

estado de necessidade a teoria unitária, nos ensina

que os bens jurídicos sacrificados devem ser de

igual ou menor valor, sob pena de subvertermos a

forma em prol do fundo.

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29

Para ilustrar, citamos as lições do penalista

Cleber Masson que explica as teorias inerentes ao

estado de necessidade, com a maestria que lhe é

peculiar: “De acordo com a teoria unitária o estado

de necessidade é causa de exclusão da ilicitude,

desde que o bem jurídico sacrificado seja de igual

valor ou de valor inferior ao bem jurídico

preservado. Exige, assim, somente a razoabilidade

na conduta do agente. Foi à teoria adotada pelo

Código Penal, como se extrai da expressão prevista

no art. 24, caput:...cujo sacrifício, nas

circunstâncias, não era razoável exigir-se. Já a

teoria diferenciadora, derivada do direito alemão

(não vigente no Brasil no Código Penal Brasileiro,

figurando, tão-somente no Código Penal Militar) é

alicerçada no princípio da ponderação de bens e

deveres, diferencia o estado de necessidade

justificante (excludente da ilicitude) do estado de

necessidade exculpante (excludente da

culpabilidade). Para essa teoria, há estado de

necessidade justificante somente com o sacrifício

de bem jurídico de menor relevância para a

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30

proteção de bens jurídicos da mais alta importância.

Exemplo: destruição do patrimônio alheio para a

salvação da vida humana... A proporcionalidade,

também conhecida como razoabilidade, refere-se

ao cotejo de valores, ou seja, à relação de

importância entre o bem jurídico sacrificado e o

bem jurídico preservado no caso concreto. Não se

pode, previamente, estabelecer um quadro de

valores, salvo em casos excepcionais de vida versus

patrimônio”. 4

O tipo penal é o modelo genérico e abstrato

ditado pela lei penal que tem por fim descrever

condutas criminosas ou condutas permitidas, sob a

pecha de crime ou não.

Construir o raciocínio de que a interrupção

de feto anencéfalo não constitui o crime de aborto

4 Cleber Masson, Direito Penal. Vol.1. Editora:

Método, ano de 2012.

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porque não preenche o tipo legal é interpretação

por demais simplista por parte do operador de

direito, que deve analisar o sistema como um todo e

não normas isoladas que não condizem com a

harmonia do sistema.

Ademais, para que tal fosse feito, o

consentimento da ofendida (mulher grávida de feto

anencéfalo) deveria estar contido no tipo, tal como

fez o legislador penal no crime de violação de

domicílio (Art. 150: “Entrar ou permanecer,

clandestina ou astuciosamente, ou contra a vontade

expressa ou tácita de quem de direito, em casa

alheia ou em suas dependências. Pena: detenção de

1 (um) a 3 (três) meses ou multa”. Assim, o

consentimento da vítima veio expresso como

elemento do tipo, o que não se constata no crime de

aborto (art. 127 do Código Penal).

Não, há, pois, coerência lógica em se falar

em exclusão do tipo penal por força da

jurisprudência, data vênia, respeitável decisão

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32

recente do Supremo Tribunal Federal a respeito do

assunto.

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33

(1.4) Conclusão.

Cada vez mais é exigido do operador do

direito um conhecimento interdisciplinar e, para

tanto, uma interpretação sistemática dos temas

jurídicos colocados em cheque - para que ganhe

primazia à justiça do caso concreto em face de

algumas normas isoladas.

Não estamos com isso fazendo apologia ao

sofrimento ou minimizando a dor de uma mãe que

carrega em seu ventre um ser vivo que não lhe

propiciará a alegria desejada como todo e qualquer

nascimento. Todavia, esse pequeno feto, feio e sem

calota craniana é tão dotado de dignidade como

qualquer um de nós. Ele até nem goza de muitos

direitos, mas, ao menos, o Direito de Nascer lhe

pertence, por sua condição de gente e não de coisa,

como quer nos parecer.

Conclui-se que o sofrimento é inerente a

vida humana e nos enriquece como pessoas. Não é

um processo fácil, mas a luta diária é o que nos

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desafia a viver. Associar o sofrimento a dignidade,

a fim de evitá-lo, é manipular a vida sem ser Deus,

sem ser médico, sem ser cientista e, menos ainda,

sem exercer mandato para legislar!

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35

(1.5) Bibliografia.

DINIZ, Maria Helena. Código Civil

Anotado. 5. Ed. São Paulo. Saraiva, 1999.

FARIAS, Cristiano Chaves de. Direito Civil

– Teoria Geral, 2 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris,

2005.

FIUZA, César. Direito Civil – Curso

Completo. 4 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2001.

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36

Primeiras Linhas sobre O Registro Civil

de Pessoas Naturais.

Sumário: (Introdução: 1.1. (Aspectos relevantes da

Lei 8935/94; 1.2) Apontamentos de Emolumentos e

Gratuidades; 1.3) Conclusão; 1.4) Bibliografia.).

Introdução.

O Registro Civil de Pessoas Naturais é o

nosso objeto de estudo. Trataremos, em um

primeiro momento, da parte introdutória do Direito

Registral.

A importância prática do Registro Civil das

Pessoas Naturais consiste na atribuição de se

assentarem, em livros próprios, de forma precisa,

fatos e atos jurídicos que influam de sobremaneira

no estado de uma pessoa natural, revestindo-se de

suma importância para os três sujeitos que

compõem o cenário registral, quais sejam; o

particular, a sociedade e o Estado. Cada macaco no

seu galho!

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37

Ensina-nos com maestria o Tabelião

Reinaldo Velloso dos Santos: “O registro dos

principais fatos na vida de uma pessoa é

extremamente relevante para qualquer sociedade,

pois, propicia segurança quanto às informações

constantes desses assentos. Os livros de registros,

conservados por tempo indefinido, preservam a

memória dos acontecimentos mais importantes da

vida de todas as pessoas”.5

No que toca a sociedade, à importância

prática reveste-se no trato das relações negociais:

obrigações e contratos celebrados entre as partes. A

capacidade aqui é, pois, vista como possibilidade

de contratação.

Já no que concerne ao Estado, o Registro

Civil de Pessoas Naturais constitui um banco de

dados, uma fonte de informações necessárias para o

fomento de políticas públicas, abarcando o INSS

(Instituto de Seguro Social) e a Justiça Eleitoral –

5 Registro Civil das Pessoas Naturais, Porto Alegre, Sérgio A Fabris, Editor, 2006.

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38

cada órgão, com o dever de “dar baixa” ao cadastro

do beneficiário ou do eleitor – em casos de

falecimento; havendo a publicidade necessária

quanto aos assentamentos e efeitos daí decorrentes.

No que toca ao particular, para a

comprovação dos seguintes fatos jurídicos:

casamento, emancipação, interdição, morte,

filiação, etc.

Assim, o indivíduo, por meio de seu registro

de nascimento, vai poder comprovar o seu

casamento; a sua emancipação, se menor, pelos

seus genitores – por via de escritura pública

(documento hábil); a sua idade (pela data de

nascimento); bem como a sua filiação e os direitos

e deveres dela decorrentes, o seu local de

nascimento; se interditado, o curador vai se utilizar

desse registro de nascimento para fins de

representação do interditado; o óbito de um

familiar, comprovado através de uma certidão, com

o signo da fé pública que abarca a eficácia e

autenticidade do ato.

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39

O Registro Civil de Pessoas Naturais

também comprova o início e o término da

personalidade jurídica da pessoa natural, não

denotando forma de constituição, mas de

comprovação da mesma. O Registro Civil é, pois,

declaratório de uma situação jurídica pré-existente.

Dispõe a Lei 6.015/73, em seu parágrafo 2º:

“No caso de a criança morrer na ocasião do parto,

tendo, entretanto, respirado, serão feitos os dois

assentos, o de nascimento e o de óbito, com os

elementos cabíveis e com remissões recíprocas”.

(grifo nosso!).

A lei é clara como água cristalina: a

respiração é fato jurídico. Essa a sua natureza

jurídica, tanto que o registrador civil de pessoas

naturais é a autoridade competente para lavrar o

assento de nascimento após o ser vivo ter respirado.

O Estado dotou o profissional de fé pública para

tanto. O fato natural (respiração) ganhou contornos

jurídicos ao incorporar, para si, as conseqüências

da Lei Registral.

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40

Por todos, com a sabedoria que lhe é

inerente, Walter Ceneviva: “No Brasil há

nascimento e há parto quando a criança, deixando o

útero materno, respira. É na respiração

cientificamente comprovada que se completa a

formação fática do nascimento. Sem ela, tem-se o

parto de natimorto”. 6

O sistema de Registro Civil de Pessoas

Naturais sofreu pouca modificação no decorrer da

história. Sistema esse que era adotado pela igreja

católica cuja peça chave era o registro de batismo.

A regulamentação cibernética do registro civil de

pessoas naturais se deu em doses homeopáticas,

gradativamente.

Importante destacarmos uma modificação

recente sobre o tema, advinda da Lei 11.977, de

6 Walter Ceneviva. Lei dos Registros Públicos

Comentada, 13ª edição, São Paulo: Editora Saraiva, ano de

1999.

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41

07.07.2009 que introduziu no seio da sociedade o

livro de registro eletrônico, por força do qual os

registros feitos a partir da vigência da Lei 6.015/73

deverão, pois, ser acoplados no sistema de registro

eletrônico, no lapso temporal de 5 (cinco) anos.

Durante o período Colonial e Imperial, o

Registro Civil de Pessoas Naturais, no Brasil, ficou

sob a mira da igreja católica apostólica romana, já

que o Estado Brasileiro, a época, não era laico e a

sua religião oficial era a religião católica apostólica

romana. Logo, os registros da igreja serviam como

prova civil para todos os efeitos: nascimento,

casamento, óbito, etc.

Ensina-nos Luiz Guilherme Loureiro: “O

nascimento é um fato biológico com importantes

conseqüências jurídicas e sociais, daí a necessidade

de seu registro e publicidade, para que toda a

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42

sociedade tenha conhecimento da existência do

novo indivíduo”.7

Tal situação fora modificada, pois, com a

chegada dos imigrantes e escravos ao território

nacional havendo, pois, uma pluralidade religiosa

no mesmo contexto fático.

O sistema de batismo da igreja ruiu frente à

necessidade de regulamentação dos atos e fatos

jurídicos de pessoas que professavam religião

diversa e que não se utilizavam do registro emitido

pela igreja católica. O nome técnico para tal

ocorrência história denomina-se laicização do

registro civil, atuando, desse modo, no caminho

evolutivo para o surgimento da República.

7 Luiz Guilherme Loureiro. Registros Públicos. Editora Método, 2011.

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43

1.1) Aspectos relevantes da Lei 8935/94.

O primeiro aspecto a ser destacado é o art. 6º da

Lei 8.935/94 que retrata a denominação do

profissional do direito (oficiais) no que tange ao

registro civil de pessoas naturais, às interdições e às

tutelas. São, pois, os profissionais responsáveis

pelo serviço registral.

Denominação atécnica essa que nos fora dada

pelo legislador a tais profissionais do direito, tendo

em vista que, ao mencionar os oficiais de

interdições e tutela incidiu em atecnia, tendo em

vista que nem todos os oficiais de Registro Civil

das Pessoas Naturais detêm atribuição

/competência para a prática de atos de registro civil

de interdições. Detêm tal atribuição somente os

oficiais de registro civil das pessoas naturais do

primeiro ofício da sede de cada comarca.

Ademais, o art. 6º supramencionado faz

referência à tutelas, havendo controvérsia em

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44

alguns Estados da Federação acerca do fato de tal

ato não ser objeto de registro e, sim, de averbação.

Ensina-nos com a maestria que lhe é peculiar o

Tabelião no Estado de São Paulo Luiz Guilherme

Loureiro, partindo o autor da premissa de ser a

tutela objeto de averbação e não de registro: “A

averbação das sentenças de tutela com nomeação

de tutor será feita na Unidade de Serviço que

registrou o nascimento do tutelado”.8

Outro detalhe a ser mencionado refere-se ao

atendimento ao público. Preceitua o art. 4º da Lei

8.935/94 o seguinte: “os serviços notariais e de

registro serão prestados, de modo eficiente e

adequados, em dias e horários estabelecidos pelo

juízo competente, atendidas as peculiaridades

locais, em local de fácil acesso ao público e que

ofereça segurança para o arquivamento de títulos e

documentos. Parágrafo Primeiro: os serviços de

Registro Civil de Pessoas Naturais serão prestados

8 Luiz Guilherme Loureiro. Registros Públicos. Editora Método, 2011.

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45

aos sábados, domingos e feriados, pelo sistema de

plantão. Parágrafo Segundo: O atendimento ao

público será de seis horas diárias”.

A natureza jurídica da expressão “fácil acesso”

denota um conceito jurídico indeterminado, local a

que se chegue valendo-se de razoáveis meios de

transportes urbanos.

É importante que se diga que quando se

menciona dia e horário, o preceito correlaciona-se

com a publicidade dos atos praticados, tendo em

vista que o juiz os atribui, no intento de facilitar o

acesso das pessoas às informações a seu respeito ou

a respeito de terceiros, em local de fácil acesso às

mesmas.

A mens legis visa, pois, a publicidade de tais

assentamentos, de forma ampla. Já o sistema de

plantão, cuja razão de ser é pela urgência do

registro de óbito, é o diferencial do registro civil

das pessoas natural em relação às demais espécies

registrárias. No que toca ao lapso temporal

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46

explicitado pela Lei, nada mais significa que a

aplicação prática do princípio constitucional da

eficiência, que rege a prática dos atos

administrativos, nos termos do art. 37 da Lei

Maior.

No que concerne ao artigo 12 da lei em

comento, em sua parte final, preceitua o legislador:

“Sujeitos os registradores de imóveis e

registradores civis das pessoas naturais as normas

que definirem as circunscrições geográficas”.

Observe o leitor que existem, pois, regras de

atribuições/ competência para os registradores civis

das pessoas naturais, o que não se dá no âmbito do

tabelionato de notas, em que é, pois, faculdade das

partes a escolha pelo tabelião. Esse é o outro lado

da moeda, da aplicação do princípio da

publicidade, para que a sociedade possa ter a

garantia de fiscalização dos assentamentos

praticados no registro civil de pessoas naturais.

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47

Utilizamos nessa obra os termos atribuição e

competência como expressões sinônimas, mas há

vozes na doutrina que delineiam a distinção de tais

expressões, no sentido de que atribuição é o ato que

confere ao indivíduo a prática generalizada de certa

função, ao passo que competência denota o poder

delimitado de agir. Para nós tal distinção é de

pouca monta, já que o poder de agir está presente

como marco em ambos os institutos.

Ensina-nos Jussara Citroni Modaneze, em obra

conjunta: “O oficial de registro deverá observar,

rigorosamente, sob pena de responsabilidade, as

jurisdições territoriais de sua competência no

tocante aos atos referentes ao registro civil,

conforme adiante mencionado em cada ato

específico, devendo sempre ter muita cautela ao

lavrar os assentamentos de nascimento, óbito,

habilitação de casamento, bem como ao praticar os

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48

atos privativos do livro E da sede de cada comarca,

conforme disposto no art. 12 da Lei. Nº 8.935/94”.9

Já no que diz respeito ao artigo 26 da lei

8.935/94, o mesmo é digno de nota em face da não

acumulação dos serviços elencados no art. 5º de seu

corpo, salvo nos municípios que não comportarem,

em razão do volume dos serviços ou da receita, a

instalação de mais de um dos serviços.

Assim, menores a receita e o volume de serviço

permite-se, por via legal, que os serviços de

registro civil de pessoas naturais possam ser

acumulados com os de outra especialidade, mas,

em um primeiro plano, a delegação é autônoma.

Logo, a regra é a não acumulação. Todavia, há

realidades fáticas que se impõem às realidades

legais do país.

Já o art. 44 da lei estudada teve seu parágrafo

primeiro vetado e dispunha que, nas localidades em

9 Jussara Citroni Modaneze, Perla Caroline Veiga Tieri, Thomaz Mourão Tieri. Direito Notarial E Registral. Editora Saraiva, 2011.

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49

que esse registro civil não fosse sustentável, o

poder público estaria adstrito a subvencioná-las. O

veto pautou-se pela política no que toca

inconveniência da norma, já que a delegação da

atividade registrária inclui perdas e ganhos pela

atividade privada. Os parágrafos do artigo 44

constituem norma de caráter híbrido: norma

imperativa versus norma permissiva.

Atente-se o leitor para o fato de que o registro

civil de pessoas naturais deve estar presente em

todo e qualquer município do Estado Brasileiro.

Trata-se de norma imperativa. Mas também resta

presente o caráter de permissividade da mesma,

ficando a cargo de cada Estado dispor de sedes

distritais, ou seja, no sentido de que a extensa

dimensão territorial pode ser constituída de parca

população.

A ideia de extensão territorial não é sinônima

de população extensa, a justificar a criação de sedes

distritais.

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50

Ensina-nos, com proficiência, Walter Ceneviva:

“Houve, antes da edição da lei, uma tendência para

a oficialização de tabelionatos e cartórios de

registros, que encontrou eco na mídia e na OAB,

não sendo, porém acolhida na Constituinte. Norma

constitucional expressa apontou para rumo oposto,

repercutindo na lei ordinária, cujo art. 50 confirma

o caráter privado da mesma”. 10

10 Walter Ceneviva. Lei dos Notários e dos Registradores Comentada. Editora Saraiva, 2007.

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51

1.2) Apontamentos de emolumentos e

gratuidades.

O Registro Civil de Pessoas Naturais foi,

em grande parte, atingido pela gratuidade - que

abarca a todos, sendo irrelevante a situação

econômica de cada qual. Há, em alguns Estados da

Federação, um fundo de compensação, mas fica a

cargo de cada Estado definir o piso de tais fundos.

Trata-se de discricionariedade legal.

A título de exemplo: No estado do Rio de

Janeiro o fundo de compensação gira em torno de

R$ 6.000,00 ( seis mil reais). Em Minas Gerais já

gira em torno de R$ 1.200,00 ( mil e duzentos

reais). Um paradoxo! Mas atente-se o leitor que

não existe uma norma nacional padronizando o

valor do fundo.

A base legal para dita gratuidade encontra

amparo no art. 5º, LXXVI, da CRFB/88 que aduz:

“são gratuitos para os reconhecidamente pobres, na

forma da lei, o registro civil de nascimento e a

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52

certidão de óbito”. Norma constitucional de

eficácia limitada, ou seja, necessitava de uma lei

infraconstitucional para a sua regulamentação.

Todavia, há que se ressaltar que a Lei

8.935/94 disciplinou uma gratuidade mais ampla:

do registro, da primeira certidão (tanto de

nascimento quanto de óbito) e não discriminando a

situação financeira da parte. Preocupou-se o

legislador apenas com a igualdade formal. Uma

lástima! A redação é, pois, de pobreza franciscana!

Destaca com acuidade Jussara Citroni

Modaneze em obra conjunta: “ É bom ressaltar que,

no tocante a gratuidade dos reconhecidamente

pobres que solicitam a habilitação de casamento e

seu efetivo registro e demais certidões (nascimento,

casamento e óbito), deverão ser orientados que a

declaração falsa poderá implicar responsabilização

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53

civil e crime de falsidade ideológica, de acordo

com o art. 299 do Código Penal”. 11

11 Jussara Citroni Modaneze, Perla Caroline Veiga Tieri, Thomaz Mourão Tieri. Direito Notarial E Registral. Editora Saraiva, 2011.

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54

1.3) Conclusão:

A identificação do ser humano é seu maior

bem, o que o identifica e o distingue dos demais.

Sendo fato que a personalidade jurídica se dá com

o mero nascimento com vida, também o é o de que

o registro de tal nascimento implica em várias

conseqüências práticas, para fins tributários,

eleitorais, sucessórios, etc. Logo o Registro Civil

constitui a sede para o melhor desenvolvimento da

cidadania do cidadão.

Fato é que se a Constituição da República

impôs limitações no que toca à cobrança de

emolumentos, a lei infraconstitucional a estendeu

ainda mais. Só o tempo poderá propiciar a certeza

dos benefícios e malefícios de tal sistema, já que o

registrador continua a responder objetivamente

pelos atos praticados (essa a nossa posição, embora

divergente em doutrina e jurisprudência), em

consonância ao papel por ele desempenhado, qual

seja, a de servidor público em sentido amplo.

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55

1.4) Bibliografia:

1. VELLOSO DOS SANTOS, Reinaldo. Registro

Civil das Pessoas Naturais. Porto Alegre: Fabris,

2006.

2. MODANEZE, Jussara Citroni, Perla Caroline

Veiga Tieri, Thomaz Mourão Tieri. Direito

Notarial E Registral. Editora Saraiva, 2011.

3. CENEVIVA; Walter. Lei dos Notários e dos Registradores Comentada. Editora Saraiva, 2007.

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56

Relações familiares em seara cartorária.

Sumário: Introdução. 1.1) A marca da inovação

legislativa, 1.2) Opcionalidade da via cartorária,

1.3) Requisição por advogado, 1.4) Prazo para a

abertura do processo de inventário e partilha, 1.5)

Conclusão, 1.6) Conclusão,1.7) Bibliografia.

Introdução.

Anos e anos se passam com processos

insolúveis na Justiça, o que a aumenta a descrença

da população em uma “Justiça” efetiva. Com vistas

a desburocratizá-la e facilitar a vida do cidadão, o

legislador criou a Lei 11.441 no ano de 2007,

possibilitando a que alguns deslindes possam ser

solucionados, com maior presteza, pelos cartórios

extrajudiciais. Mais uma opção a cargo do

indivíduo.

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57

1.1) A marca da inovação legislativa no

cenário jurídico.

As relações familiares, hoje, podem e

devem ser resolvidas em seara cartorária, a fim de

conferir maior celeridade em algumas relações

jurídicas. A Lei 11.441/2007 trouxe significativas

modificações aos artigos 982, 983 e 1.031, caput,

todos do Código de Processo Civil (CPC).

Optamos, ao invés de redigirmos um quadro

comparativo sobre o tema, abordarmos, em tópicos,

o que a mudança trouxe de diferente ao cenário

jurídico brasileiro.

O mais importante a ser dito é o seguinte: A

proposição legislativa visa deslocar, em parte, a

atividade jurisdicional para a atividade notarial.

Tivemos, pois, uma permissão legal para a

realização de divórcio e separações consensuais,

bem como inventário e partilha por escritura

pública - o que até então só encontrava eco em via

judicial.

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58

Exige, no entanto, que haja concordância

entre todos os envolvidos, para que o inventário e a

partilha sejam realizados por essa via. De toda

sorte, não restou abolido o procedimento por via

judicial - em havendo testamento ou interessado

incapaz.

No que toca às separações consensuais, a

pergunta que não quer calar: as mesmas ainda

subsistem, mesmo após o advento da Emenda

Constitucional 66, do ano de 2010?

A resposta afirmativa se impõe. Até a

respectiva emenda, o instituto da separação

extrajudicial se dava após o lapso temporal de

1(um) ano da realização do matrimonio, via

escritura pública. O mesmo lapso temporal exigido

para a conversão da separação em divórcio, bem

como para a separação de corpos.

Com o advento da Emenda Constitucional

66 de 2010 não há mais que se falar em prazo como

requisito para o instituto do divórcio, não mais

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59

figurando como requisito a separação ( judicial ou

extrajudicial, pelo período de 1- um- ano).

Uma coisa é uma coisa. Outra coisa é outra

coisa.

Na atualidade, o divórcio independe de

prazo, mas isso, por si só, não implica na extinção

do instituto da separação judicial em face da

magnitude social da mesma. Assim, a possibilidade

de reconciliação do casal ainda é juridicamente

possível. Não se mostra razoável a alegação de

falta de interesse de agir ( condição da ação), tendo

em vista que apenas o divórcio tem o condão de

extinguir o vínculo matrimonial.

Parece despicienda tal afirmação, mas não o

é. Os relacionamentos afetivos estão cada vez mais

complexos e as pessoas têm cada vez menos

certezas se amam ou não. Muitas vezes só o tempo

é capaz de clarear os sentimentos.

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60

Ressaltamos que a via extrajudicial não

elimina a possibilidade de se recorrer ao Judiciário,

conforme previsão legal atinente.

Repise-se: A adoção desse procedimento

cartorário é válida para os casos que não envolvam

interesses de menores e incapazes (no inventário) e

consensualidade (nas separações e divórcios).

Importante se diga que a mudança proposta

representa e representará um enorme passo para

descongestionar a atividade “burocrática” do

Estado, tanto no campo das sucessões, quanto no

campo das relações de família, contratos e

obrigações.

Faz-se salutar destacarmos um dado

bastante precioso: Hoje, mesmo os processos de

inventário feitos consensualmente são definidos

num prazo médio de ( 1) um ano. Nesse período,

herdeiros que não tinham problemas entre si

passam a entrar em colisão, por conta da

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61

convivência forçada na administração do

patrimônio comum, antes da partilha.

Para abrilhantarmos a nossa obra, citamos

passagem do livro de Luiz Rodrigues Wambier, em

obra conjunta, no seguinte sentido: “No caso parece

ter havido equívoco do legislador, já que, exigindo-

se que todos os interessados sejam capazes e que

não haja litígio, estar-se-á diante de arrolamento e

não inventário. Ocorre que, para nós, não houve

atecnia do legislador, já que o arrolamento é um

procedimento simplificado do inventário e partilha

e a lei, em seu artigo 982, do CPC, faz menção

tanto ao inventário quanto a partilha”.12

12 WAMBIER, Luiz Rodrigues, Editora RT, pág. 306. Ano 2007.

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62

1.2) Opcionalidade da via cartorária.

Trazemos ao leitor a seguinte indagação:

Ticio faleceu no estado civil de viúvo,

deixando dois filhos, Zimprônio e Abelardo.

Ambos maiores e capazes. Deixou vasto

patrimônio e, em razão do grande apego entre os

irmãos, resolveram partilhar amigavelmente a

herança e requereram a abertura do inventário por

arrolamento. Tal seria possível?

Entendemos perfeitamente possível. Isso

porque o art. 2.016 do CC determina que a partilha

deva ser judicial quando algum dos herdeiros for

incapaz. Tal não se dá no caso em comento. Deve-

se, pois, aplicar a lei 11.441/2007, ou seja, o envio

das partes para a via extrajudicial. Ainda que a lei

não faça menção expressamente ao arrolamento

esse é o seu espírito.

Todavia, se Tício, além dos dois filhos,

deixasse um menor, Joaquim, como se procederia a

situação?

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63

Haveria, pois, mudança na resposta por

inteiro.

Entendemos que o procedimento não

poderia ser bipartido, pois a lei é taxativa ao exigir,

para a feitura da escritura pública em cartório, o

requisito da capacidade e do consenso das partes

(requisitos objetivos). O art. 2016 do CC determina

que a partilha deva ser judicial, quando algum dos

herdeiros for incapaz, visando ao melhor interesse

do menor. E, aqui, o intérprete deve optar uma

interpretação sistemática e teleológica da

norma.(grifo nosso!)

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul,

em decisão exarada em abril de 2007, logo, três

meses após a publicação da lei, deu ênfase a

opcionalidade da via judicial ou extrajudicial por

parte dos interessados, mas todos figuravam como

partes/capazes.

Mas as indagações não para por aí: Pergunta-se:

E o caso daquela pessoa que já iniciou o processo

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64

na Justiça? A mesma poderá buscar a solução do

caso extrajudicialmente?

Entendemos que a resposta afirmativa se

impõe. Aonde existe a mesma razão deverá existir

o mesmo direito. Essa nada mais é que uma regra

de hermenêutica.

Para tanto, poderá se valer das seguintes

possibilidades: apresentar uma petição informando

que está desistindo da ação interposta, ou, ainda,

simplesmente abandonar o processo em tramitação

ou efetivar o divórcio no cartório extrajudicial e,

conseqüentemente, levar à extinção do processo

judicial.

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65

(1.3) Requisição por advogado.

Imprescindível a presença de advogado

comum ou de advogados de cada um dos

interessados, sob pena de o tabelião restar impedido

de lavrar a escritura pública.

Os custos de todos os procedimentos

dependem do valor patrimonial a ser partilhado e

das peculiaridades de cada caso. Dessa forma, além

da despesa dos honorários ao representante legal

(advogado), o casal ou o inventariante terão que

arcar com as despesas do cartório que variam,

dependendo do valor do patrimonial que entrará na

partilha de bens.

Assim, a nova modalidade de inventário

exige a prestação de assessoria do advogado - que

deverá seguir as bases do exercício da advocacia,

ou seja, a ética, a responsabilidade e os deveres de

aconselhar e informar precisamente os seus

clientes. Encargo atribuído ao causídico é recolher

do cliente o imposto de transmissão causa mortis

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66

(ITCD). Já existe, inclusive, Lei Estadual prevendo

tal possibilidade. Trata-se da Lei Estadual Paulista

10.705/00, com redação da Lei 10.992/01 e Portaria

CAT-5 de 22 de janeiro de 2007. Através da

Portaria CAT-5 de 22 de janeiro de 2007, a

Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo

disciplinou que as primeiras declarações para a

obtenção do documento, imprescindível para lavrar

a escritura de inventário e partilha, (certidão de

regularidade do ITCMD) deverá ser feita via

Internet.

Como a Lei nº 11.441/ 2007 prevê que a

escritura e demais atos notariais serão gratuitos

àqueles que se declararem pobres sob as penas da

lei, será criado um novo encargo oneroso para os

cartórios com essa gratuidade.

Entendemos, pois, que tal gratuidade para o

cidadão não deve gerar custos para o cartório

(serventia), que deve ser remunerado pelo Estado

para a prestação desse relevante serviço público,

em sentido amplo.

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67

A gratuidade é, pois, dever do Estado e não

dos cartórios. O advogado, quando indicado para

patrocinar a causa de juridicamente necessitado, no

caso da impossibilidade da Defensoria Pública no

local da prestação do serviço, faz jus aos

honorários fixados pelo juiz, segundo tabela

organizada pelo Conselho Seccional da OAB, e

pagos pelos Estados.

Importante salientar que a seccional da

OAB do Distrito Federal reduziu em 50% a tabela

de honorários, cobrados em casos de separação,

divórcios e inventários consensuais feitos

diretamente nos cartórios. 13

13 Nota informada no próprio site da Ordem dos Advogados do Brasil do Distrito Federal: (www.oab.df.org.br)

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68

(1.4) Prazo para a abertura do processo

de inventário e partilha:

Dispõe o artigo 983, do CPC, que tal prazo

deva ser aberto dentro de 60 (sessenta) dias, a

contar da abertura da sucessão; ultimando-se nos

12 (doze) dias subseqüentes, podendo o juiz

prorrogar tais prazos de ofício ou a requerimento

das partes.

O artigo 983 do Código de Processo Civil,

dispõe basicamente da penalidade de ordem fiscal

em que, caso não seja respeitado o respectivo prazo

de 60 ( sessenta) dias —contados a partir da data

do óbito do autor da herança— haverá a aplicação

de multa sobre o valor do imposto, além de

correção monetária e juros de mora, de acordo com

o artigo 21 da Lei 10.705/00 (com as alterações da

Lei 10.992 de 21 de dezembro de 2001). Confira o

leitor o que preceitua a legislação em vigor:

“Art. 1.124-A. A separação consensual e o divórcio

consensual, não havendo filhos menores ou

incapazes do casal e observados os requisitos legais

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69

quanto aos prazos, poderão ser realizados por

escritura pública, da qual constarão as disposições

relativas à descrição e à partilha dos bens comuns e

à pensão alimentícia e, ainda, ao acordo quanto à

retomada pelo cônjuge de seu nome de solteiro ou à

manutenção do nome adotado quando se deu o

casamento.

§ 1º A escritura não depende de homologação

judicial e constitui título hábil para o registro civil e

o/registro/de/imóveis.

§ 2º O tabelião somente lavrará a escritura se os

contratantes estiverem assistidos por advogado

comum ou advogados de cada um deles, cuja

qualificação e assinatura constarão do ato notarial.

§ 3º A escritura e demais atos notariais serão

gratuitos àqueles que se declararem pobres sob as

penas/da/lei.”

Art. 4º Esta Lei entra em vigor na data de sua

publicação. (Art. 5º): Revoga-se o parágrafo único

do art. 983 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de

1973 – Código de Processo Civil.”

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70

O artigo 1124, alínea A, do Código de

Processo Civil é filho legítimo da Lei 11441/2007;

até então inexistente em nosso ordenamento

jurídico. Com tal lei, no que toca a separação

consensual e divórcio, feitos via cartorária,

filtramos três pressupostos indispensáveis para a

sua concretização: deverá haver consensualidade

tanto no divórcio quanto na separação, o ato é

administrativo - o que equivale a dizer que a

escritura pública substitui a homologação judicial

e; por fim, inexistência de filhos menores e

incapazes.

Já no que concerne ao inventário e partilha

no bojo de tal relação, destacamos dois

pressupostos relevantes: O inventário e a partilha

poderão ser feitos administrativamente se não

houver testamento e os interessados forem capazes

e estiverem concordes. Desta feita, após a edição da

lei em epígrafe, inventários, partilhas, separações

consensuais e divórcios consensuais, podem ser

feitos administrativamente, desde que observadas

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71

às condições expressas na nova lei; condições estas

que se revestem em condições específicas de

procedibilidade para a prática do ato.

Registre-se que se houver testamento ou

interessado incapaz, o inventário deve ser judicial.

De acordo com o que preleciona Luiz Rodrigues

Wambier, em obra conjunta: “de acordo com o

parágrafo segundo do artigo 1124, A, do CPC, é

obrigatória a presença de advogados comuns ou de

advogados de cada parte” 14 ; ou seja: Esse

advogado pode ser o mesmo para todos os

interessados ou cada um pode ter o seu advogado,

ou advogados.

A qualificação e a assinatura dos advogados

constarão do ato notarial. Trata-se de um

pressuposto específico para o ato.

E aqui surgem as seguintes indagações: Os

separandos ou divorciandos, de comum acordo,

14 WAMBIER, Luiz Rodrigues, Editora RT, pág. 306. Ano 2007.

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72

poderão separar-se por mera procuração outorgada

ao advogado? A presença das partes seria

imprescindível ao ato? Caso fosse acatada a

possibilidade do deslinde matrimonial poderia o

mesmo ser obtido por meio de procuração? E em

assim sendo, esta seria uma procuração de natureza

pública ou particular?

A questão é objeto de grandes controvérsias

em artigos já publicados em sites jurídicos sobre o

tema: Paulo Lôbo, que é conselheiro do CNJ,

publicou um artigo sobre o tema, intitulado

“Divórcio e separação consensuais extrajudiciais15.

No respectivo artigo, ele defende a

utilização de procuração para separação e divórcio

consensuais extrajudiciais. Para sermos fiéis as

suas palavras: “Qualquer dos cônjuges pode ser

representado por procurador, com poderes

específicos e bastantes, por instrumento público ou

particular de procuração, porque não há vedação

legal e é simétrico ao ato solene do casamento, que 15 Fonte: site do CNJ: www.cnj.jus.br

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73

permite a representação convencional do nubente.

Por outro lado, há a indispensável assistência e

presença de seu advogado na lavratura da escritura,

como garantia da defesa de seus interesses. Dessa

forma, se para o ato mais solene que é o casamento

o legislador admite a procuração, não faria sentido

restringir num ato meramente administrativo” 16.

O autor admite, inclusive, que tal

procuração seja particular. Mas a matéria não é

pacífica: No Rio Grande do Sul já há provimentos

quantos ao tema: Resolução CNJ nº 35/2007.

“Inventário – separação – divórcio – extrajudiciais.

Atos notariais e registrais. Lei nº 11.441/2007.

Em boa hora, o Provimento 04/07 da

Corregedoria-Geral da Justiça do Rio Grande do

Sul adotou essa cautela em mais de um dispositivo.

Assim, o art. 619-C, § 4°, da CNNR, introduzido

por aquele ato, dispõe que os cônjuges

16 Paulo Lôbo, Divórcio e Separação Consensuais extrajudiciais, publicado no site do CNJ, em 27 de fevereiro de 2007, www.cnj.com.br.

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74

comparecerão pessoalmente para a lavratura do ato

notarial, inadmitida a sua representação por

procuração. Mais adiante, o § 5° determina que a

falta de anuência de uma das partes quanto a

qualquer das cláusulas apresentadas, ou a recusa de

alguma pretensão que objetivava ver consignada,

impedirá a realização do ato, devendo, então, ser

informada pelo tabelião a possibilidade de ingresso

na via judicial.

Havendo fundados indícios de prejuízo a

um dos cônjuges ou existindo dúvida sobre a

declaração de vontade, impõe-se a negativa à

lavratura da escritura pública de separação ou

divórcio.

Ora, somente com a presença do casal é que

o tabelião poderá conferir a anuência plena,

esclarecida e consciente com todas as cláusulas do

pacto (cujos termos e conseqüências deverão ser

explicados em todos os seus detalhes, no ato) e

verificada eventual dúvida quanto à declaração de

vontade.

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75

Outro assunto importante é o relativo à

possibilidade de escolha entre os procedimentos

judicial e extrajudicial.

A Resolução 35, do CONSELHO

NACIONAL DE JUSTIÇA possibilita tal escolha.

E, aqui, trazemos à colação importante

julgado proferido pelo Tribunal de Justiça do Rio

Grande do Sul sobre o Tema: TIPO DE

PROCESSO: Apelação Cível NÚMERO:

70019033596. Inteiro Teor Decisão: Acórdão

RELATOR: Sérgio Fernando de Vasconcellos

Chaves. EMENTA: INVENTÁRIO E

PARTILHA. LEI 11.441/2007. POSSIBILIDADE

DE REALIZAÇÃO PELA VIA

ADMINISTRATIVA. DIREITO DE ESCOLHA

DAS PARTES. 1. Pela nova redação do art. 982 do

CPC, primeira parte, a regra permanece sendo a

realização do inventário pela via judicial, tendo a

lei apenas facilitado para as partes a opção pela via

administrativa. 2. Embora a realização do

inventário pela via administrativa possa dar maior

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76

celeridade ao procedimento de partilha de bens.

DATA/DE/JULGAMENTO:

25/04/2007.PUBLICAÇÃO: Diário de Justiça do

dia 03/05/2007.

Vale ressaltar, sobre a negativa de

comparecimento das partes ao ato cartorário; caso

se torne possível verificar, de plano, que o autor é

contrário a possibilidade de realização da separação

e do divórcio extrajudiciais, através de procuração,

deve o tabelião recusar o ato. É o mais sensato!

Entendemos que o casal deva comparecer

pessoalmente ao ato de separação consensual ou

divórcio devido à solenidade do mesmo.

O ato não deixou de ser solene por trazer a

desburocratização ao Poder Judiciário. A família

continua a ser a “célula mater” da sociedade.

Colocar a família em primeiro lugar não é uma

proposição ética tão óbvia, trivial, nem tão aceita

por aí. Basta acessar a internet e o leitor encontrará,

com facilidade, milhares de artigos que lhe dirão

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77

para colocar em primeiro lugar os outros - a

sociedade, os amigos, o dever, o trabalho, o cliente

- raramente a família! Valores familiares estão

pouco na moda no contexto atual.

Não se pode confundir, aqui, economia

processual com tutela inefetiva, sob pena de

colocarmos a forma em prol do fundo. Um

paradoxo! Ora, se no processo judicial, onde

maiores são as cautelas, com a presença do

magistrado e do Ministério Público, o

comparecimento pessoal das partes é indispensável,

não se ostenta prudente dispensá-lo justamente

quando revestida de menor fiscalização a

formalização do acordo (via cartorária). Não

haveria o menor sentido em assim proceder!

No mesmo pensar vem á baila decisão

monocrática do STJ não totalmente fiel ao tema,

mas proferida após a publicação da lei e, ao que

tudo indica, pela complexidade doas fatos

arrolados, se fez presente a opcionalidade como

consta em ementa abaixo transcrita:

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Processo SE 002487 Relator (a) Ministro BARROS

MONTEIRO Data da Publicação DJ 24.04.2007

Decisão:SENTENÇA ESTRANGEIRA Nº 2.487 –

IT:(2007/0007896-3).

DECISÃO

.

I. M. S. D., brasileira, e M. F., italiano, qualificados

na inicial, formularam pedido conjunto de

homologação de sentença estrangeira de separação

consensual, proferida pelo Tribunal de Florença,

Itália, em 09 de novembro de 2005. Foram

apresentados os documentos indispensáveis à

homologação: procurações (fls. 04/05), inteiro teor

da sentença estrangeira de separação consensual,

devidamente chancelada por autoridade consular

brasileira (fls. 22/32), respectiva tradução por

profissional juramentado no Brasil (fls. 11/20), bem

como a certificação do trânsito em julgado da

decisão, ocorrido em 08 de novembro de 2006(fls.

21 e 31-verso). O Ministério Público Federal, no

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79

parecer de fl. 35, opinou pelo deferimento do

pedido.

Segundo alegam os requerentes, embora a esposa

tenha adotado, no Brasil, o patronímico do marido,

ao transcreverem o casamento na Itália,

permaneceu a mulher com seu nome de solteira,

conforme consta da sentença, razão pela qual

pedem autorização para que volte a usar seu nome

de solteira.

Decido.

A sentença foi proferida por autoridade competente

e as partes foram devidamente citadas na ação de

divórcio. Por outro lado, a pretensão não ofende a

soberania ou a ordem pública (Resolução/STJ nº

9/2005, arts. 5º e 6º), restando assim atendidos os

pressupostos indispensáveis ao deferimento do

pedido. No que se refere ao nome da requerente,

ainda que nada conste da sentença de separação

judicial, é forçoso reconhecer que a mulher, ao

separar-se, não mais utilizava o patronímico do

marido, razão pela qual se mostra necessário

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80

deferir-lhe autorização para retomar seu nome de

solteira no Brasil, para fins de registro junto ao

cartório competente. Posto isso, homologo a

sentença estrangeira de separação judicial e

autorizo a requerente a retomar seu nome de

solteira. Expeça-se a carta de sentença.

Publique-se./Intimem-se.

Brasília,19/de/abril/de/2007.

MINISTRO BARROS MONTEIRO

Atente o leitor de quem irá homologar tal

sentença estrangeira, ainda que a separação tenha

sido consensual, não será o cartório e sim o Poder

Judiciário. E aqui surge a seguinte dúvida: Poderá

ser feita a separação consensual ou o divórcio

consensual perante o consulado brasileiro em país

estrangeiro, se o casal vive fora do Brasil?

Veja: em decisão monocrática o Ministro

Barros Monteiro fez menção à chancela da

autoridade consular, mas não dispensou sua

homologação pelo Poder Judiciário. È cediço que a

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81

lei foi publicada em 04 de janeiro de 2007 e sua

decisão proferida em 19 de abril de 2007.

Entretanto, não nos pareça que deva ser

assim. O Poder Judiciário pauta-se, ao prestar o

serviço da jurisdição, pelos princípios da

necessidade e da adequação. Princípios estes que

estão revestidos no exercício regular do direito de

ação; qual seja: o interesse de agir. Se uma questão,

ainda que envolvendo interesses de ordem familiar,

pode ser resolvida administrativamente, já não se

faz necessária a prestação jurisdicional. E a nova

lei veio adequar algumas situações nela previstas

em outro âmbito, diverso do âmbito judicial.

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82

1.5) Benefícios e malefícios do sistema adotado.

Acerca dos benefícios e malefícios de tal

sistema, com essa nova implementação, o judiciário

deve ser beneficiado com o “desafogamento” de

infindáveis novas ações ( dando-se, sobretudo, uma

maior efetividade ao princípio da economia

processual e razoabilidade - em seu sentido

substantivo, qual seja, o devido processo legal) - e

as partes serão beneficiadas com uma agilidade na

busca de seus interesses, interesses estes até então

não divergentes.

Outra vantagem de ordem prática a ser

citada: O principal benefício que a lei 11.441/2007

trouxe foi quanto ao tempo de espera das partes em

relação a esses tipos de ações, o prazo para entrega

da certidão pelo cartório vai ser de, no máximo,

uma semana – segundo estimativas jornalísticas.

Isto é, havendo consenso entre as partes nos

casos contemplados pela lei 11441/2007, a

escritura da separação, do divórcio ou do inventário

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83

será conseguida de forma bem mais rápida que a

tradicional (via Judiciário). Espera-se, também, que

haja gradualmente uma desinflação processual da

justiça comum, cuja demanda vem crescendo

anualmente em todo o país.

Mas a nova lei apresenta aspectos

negativos: No caso da separação e do divórcio, está

sendo eliminada uma etapa que o direito processual

brasileiro vê com importância, que é a tentativa de

reconciliação de que trata o art. 1.122 do Código de

Processo Civil, que dá o comando ao magistrado

para ouvir os cônjuges sobre os motivos da

separação consensual, esclarecendo-lhes as

conseqüências da manifestação de vontade.

Assim sendo, entendemos que o termo

“poderão” não denota o caráter de

discricionariedade, como ressaltado pelos autores

supra mencionados; mas cabe ressaltar que esta

vinculação das partes ao sistema cartorário

(administrativo) deve ser vista com temperamentos.

Sempre que houver uma omissão legal, o CPC, em

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84

seus dispositivos 1120 e seguintes, deve ser

buscado (em caráter subsidiário) para resolver tais

deslindes, sob pena de violarmos os princípios do

acesso à justiça e do devido processo legal. Assim,

a título de exemplo, João e Maria se separam

administrativamente, via cartório. Um mês após o

desenlace resolvem sair para um romântico jantar a

luz de velas e, após uma tórrida noite de amor,

concluem que não conseguem viver um sem o

outro. Desesperados, o casal resolve colocar um

fim a respectiva separação. Indaga-se: Isso seria

possível administrativamente falando? A lei aqui é

omissa: não determinou tal hipótese pela via

administrativa, o que nos leva a entender que

somente restaria ao “casal apaixonado” a via

judicial para tal procedimento.

Não cabe ao chefe da serventia resolver tal

deslinde, pois não possui competência para tal.

Assim, nosso entendimento é no sentido de

que no caso de reconciliação do casal na separação

consensual em cartório, o processo de retomada se

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85

faz da seguinte forma: Através do procedimento

judicial na separação, em casos de reconciliação, os

interessados devem comunicar ao juiz da retomada

do casamento através de uma simples petição.

Ocorrerá pelo registro de um novo negócio

jurídico bilateral em cartório de registro civil,

perante o oficial de registros civis. E como ocorre

nos divórcios de uma maneira geral, a reconciliação

exige/novas/núpcias.

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86

1.6) Conclusão:

A praticidade das relações negociais é o que

propicia, às mesmas, efetividade. Nada mais

significa que a eficácia horizontal dos direitos

fundamentais, ou seja, o Estado, despindo-se de seu

poder de império (Jurisdição), assegurando

proteção aos negócios jurídicos travados entre os

particulares em suas relações privadas.

Logo, o Judiciário exercerá, como de

costume, o papel de fiscal das atividades notariais;

mas em alguns casos, permitidos em lei e por opção

das partes, não mais proferirá decisão em

inventários e partilhas, bem como em separações e

divórcios, o que até então desempenhava na

jurisdição voluntária (administração pública dos

interesses privados). Teremos agora uma

administração particular dos interesses privados,

desempenhada pelos notários e fiscalizada pelo

Estado (Poder Judiciário!) no caminho para uma

Justiça mais célere e efetiva.

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87

1.7) Bibliografia:

LÔBO, Paulo. A PEC do divórcio:

conseqüências jurídicas imediatas. Revista

Brasileira de Direito das Famílias e Sucessões,

vol11, Porto Alegre: Magister; Belo Horizonte:

IBDFAM, ago./set.2009.

VELLOSO DOS SANTOS, Reinaldo.

Registro Civil das Pessoas Naturais. Porto Alegre:

Fabris, 2006.

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88

Contrato de Leasing x CDC

Sumário. Introdução. (1.1) : Dignidade

Humana X CDC; 1.2) Venda extrajudicial do bem

em Contrato de Leasing e Responsabilização Civil,

1.3) Dignidade Humana X CDC, 1.4)

Responsabilidades distintas e CDC, 1.5)

Conclusão, 1.6) Bibliografia.

Palavras- Chaves: Consumidor,

Contraditório, Dignidade Humana e Contrato de

Leasing.

Resumo: O presente trabalho versa sobre o

Direito ao Contraditório que não fora exercido, de

maneira ampla, nos contratos de leasing; que nada

mais são que contratos consumeristas, devendo-se,

pois, respeito aos Direitos da Personalidade do

Consumidor, sob pecha de nulidade absoluta dos

atos praticados, sem a prévia ciência da

contraparte. Pincela a autora as responsabilidades

diferenciadas do Banco de Dados e do Fornecedor

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89

do bem, abusos de direito em campos distintos,

com causas peculiares, que não se confundem.

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90

Introdução.

O nome da pessoa natural denota muito

mais que um sinal de identificação da mesma no

seio social, ultrapassa o Direito de Propriedade ou

as Questões de Estado, é, pois, um Direito da

Personalidade amparado por Lei (art. 11 do Código

Civil) e que integra, em sentido amplo, o conceito

de honra do indivíduo perante os seus semelhantes.

Nome e honra não são sinônimos, mas os conceitos

se entrelaçam num dado momento, ao ponto de se

dizer que um homem honrado é aquele que tem um

nome a zelar. Nome sujo no mercado é ainda pior

que não ter nome! Ambos (nome e honra) estão

abarcarcados pela pirâmide maior, qual seja: a

dignidade da pessoa humana.

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91

1.1) Dignidade Humana X CDC.

É cediço que o conceito de dignidade da

pessoa humana é fluido e se aplica a todos os ramos

do Direito e entre os ramos do Direito e suas

vicissitudes. Assim, nas relações privadas entre os

particulares, por força da eficácia horizontal dos

Direitos Fundamentais, vinculando não somente os

poderes públicos, mas os particulares entre si em

suas relações; dentre outras, consumeristas, há que

se aplicar o princípio em comento para que se

possa aferir o real significado da palavra Justiça.

Ensina-nos Simone Hegele Bolson: “No

âmbito das relações de consumo podem ocorrer

violações à dignidade da pessoa humana,

principalmente quando tais violações ferem os

direitos de personalidade, tais como a honra, o

nome, a intimidade, a integridade físico – psíquica

e a imagem dos consumidores” 17 – grifos nossos!

17 BOLSON, Simone Hegele. O princípio da dignidade da pessoa humana, relações de consumo e o dano moral ao consumidor. RT. 46/289.

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92

Assim, quem contrai um empréstimo,

financia um veículo automotor, enfim, quem se

coloca em uma situação de devedor, por si só, não é

menos digno porque é devedor; afinal são as

relações entre credores e devedores que dão a

engrenagem necessária ao mercado de consumo e

movimentam, com alta lucratividade, o mercado de

capitais.

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93

1.2) Venda extrajudicial do bem em

contrato de leasing e

responsabilização civil.

Ser devedor ou ser credor é assumir papéis

que, por vezes, se invertem, a depender do caso

concreto. Logo, a título de exemplo, o sujeito é

devedor porque financiou um veículo automotor.

Em contrapartida, a financiadora do veículo

automotor, titular do crédito, é devedora de

transparência, informação e cooperação (deveres

laterais anexos.).

Esses são deveres e princípios, por assim

dizer, comezinhos de hermenêutica que devem ser

respeitados, para se dizer o mínimo, em toda e

qualquer relação contratual que seja pautada pela

boa-fé objetiva. A violação a esses deveres anexos

é o que se convencionou denominar de violação

positiva do contrato ou adimplemento ruim.

O Código de Defesa do Consumidor é

incompatível com obrigações ou contraprestações,

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94

por assim dizer, que lesam direta ou indiretamente

a boa-fé ou a equidade. Assim, relações contratuais

que, por via transversa, burlam o Código de Defesa

do Consumidor implicam fraude à lei. Esse é o

exemplo mais cristalino do instituto.

Ora, em contrato de leasing com venda

extrajudicial do bem, em havendo venda por preço

menor o devedor deve ser imediatamente avisado,

por um preço maior também. O Direito de ser

informado está inerente e vai além, abarca,

inclusive, o momento pretérito de venda do bem.

Sim, é direito do devedor o de ser previamente

informado da data do leilão para que dele possa

estar presente e, assim, exercer o seu direito de

defesa e ter a chance de obter o bem para si, purgar

a mora pelo preço em que está o bem sendo

ofertado. Tem, pois, o devedor, o direito de purgar

a mora.

Se o bem é leiloado e o fato sequer é

comunicado ao consumidor, nem antes do leilão,

nem durante e nem após, se o consumidor não foi

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95

informado e não pôde exercer o seu direito de

defesa há que se concluir que o contrato, por via

transversa, afrontou o Código de Defesa do

Consumidor e está sendo utilizado como

instrumento de fraude à lei, já que o próprio

contrato garante ao consumidor o acesso a

informação do valor de sua dívida ou de seu

crédito.

Trata-se de um princípio de hermenêutica:

Aonde existe a mesma razão existe o mesmo

Direito. Os contratos de leasing e CDC são regidos

pelo Código de Defesa do Consumidor, como

quaisquer outros. Os juros pactuados correrão da

data do aviso do débito gerado por sua venda

extrajudicial. Logo, se não houve aviso, seja por

escrito, seja por forma verbal, ou por uma terceira

forma, inventada pelas partes (fofoca), se não

houve aviso de qualquer espécie, não houve juros:

nem andando quanto menos correndo. É princípio

da ordem econômica a defesa do consumidor! Não

há nem que se falar em desequilíbrio contratual

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96

porque não houve um equilíbrio inicial que possa

ter dado margem a um desequilíbrio posterior. Do

contrário, haverá um enriquecimento sem causa de

uma das partes e, em conseqüência, o

empobrecimento da outra.

Não fomos nós que inventamos isso. Foi o

próprio legislador quem nos ensinou dessa maneira.

É o que preceitua o art. 2º, parágrafo 3º, do

Decreto-Lei nº 911/69. Decreto esse ratificado pela

jurisprudência dos Tribunais Superiores: Alienação

Fiduciária – venda extrajudicial do bem – direito do

consumidor de ser previamente comunicado: “A

venda do bem apreendido pode ser feita

extrajudicialmente, a critério do credor, nos termos

do art. 2º, parágrafo 3º, do DL 911/69, a fim de que

possa acompanhar a venda e exercer eventual

defesa de seus interesses”. (STJ, Resp 209410/MG

DJU 14/02/2000, p. 39, Rel. Min. Ruy Rosado

Aguiar, J, 9/11/1999, 4ª T./ REVJUR, v.8, p.72).

Logo, se a venda extrajudicial do bem não

fora sequer comunicada, sequer há provas de que

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97

tenha a mesma, de fato, ocorrido e, em tendo

ocorrido, sem ciência prévia ou posterior do

devedor, tem-se aí nulidade de pleno direito, por

cerceamento ostensivo aos princípios

constitucionais do contraditório e ampla defesa

(art.5º, LV; CRFB).

Dessa forma, sendo a venda nula, nula é

cobrança que dela decorre, sem falar que, se de tal

cobrança surgiu a negativação do nome do

consumidor em cadastro de inadimplentes, nula,

pois, será a negativação, por abuso de direito. (art.

187 do CC) em diálogo de fontes com o Código do

Consumidor (art. 6º, III, CDC). Incide, pois, uma

nulidade em cascata. Sujar o nome do devedor sem

informá-lo é chamá-lo de consumidor apenas no

nome retirando-lhe toda e qualquer dignidade a ele

inerente.

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98

1.3) Responsabilidades distintas e

CDC.

Deve-se, pois, fazer uma distinção

importante sobre as obrigações de cada qual. A

instituição financeira não tinha o dever de

comunicar ao devedor que o seu nome estava sendo

negativado. Essa atribuição compete ao órgão que

administra o banco de dados, qual seja, o SPC. A

Instituição Financeira detinha o dever jurídico de

informar ao consumidor de que o veículo seria

leiloado na data estipulada por ela e também, já que

leiloado sem aviso, pelo valor que fora vendido e o

saldo restante. Já o Banco de dados ( SPC) detém o

dever jurídico de comunicação prévia da dívida

gerada.

A notificação por escrito ao devedor não é

favor do credor. É direito do devedor. Assim, reza

o art. 43 do Código de Proteção e Defesa do

Consumidor.

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99

Ensina-nos Leonardo de Medeiros Garcia:

“Quando não solicitada pelo consumidor, à

abertura de cadastro, ficha, registro de dados

pessoais e de consumo deverá por escrito lhe ser

comunicada, uma vez que o aviso ou comunicação

de abertura de cadastro ou inscrição é obrigatório

pelo sistema consumerista”. 18

Ademais, no que tange a responsabilização

civil do banco de dados, a sonegação de

informação e notificação hábil ao devedor, é causa

de dano gravíssimo, nos termos da Súmula 359, do

Superior Tribunal de Justiça, nos seguintes termos:

“Cabe ao órgão mantenedor do cadastro de

proteção ao crédito a notificação do devedor antes

de proceder à inscrição”.

18 GARCIA; Leonardo de Medeiros, Direito do Consumidor, 3ª edição, Editora Impetus.

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100

1.4) Conclusão.

À vista do que fora dito, não existe ampla

defesa sem contraditório e vice e versa. Os direitos

à informação e à reação são bem mais que simples

direitos que consubstanciam princípios, mas

vetores do sistema jurídico, seja funcionando nos

contratos de leasing, seja funcionando nos demais

contratos consumeristas. Não importa, pois, o

rótulo que se dê, se a substância é única.

Em assim sendo, é nula de pleno direito

qualquer cláusula que macule ditos princípios, sob

pena de fraude à Lei de Proteção e Defesa do

Consumidor (Lei 8.078790) e burla ao

ordenamento jurídico como um todo.

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101

1.5) Bibliografia.

AGUIAR JR., Ruy Rosado de. A boa fé na

relação de consumo. Revista Direito do

Consumidor 14/20.

MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no

Código de defesa do Consumidor. 4. Ed.

São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.

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102

A sucessão trabalhista na falência e na

recuperação judicial.

Resumo

Este trabalho trata da situação do

empregado e seus direitos trabalhistas em face da

alienação da empresa- em casos de falências e

recuperação judicial, colocando, pois, em cheque

uma colisão aparente entre os princípios da

preservação da empresa e o da continuidade das

relações de trabalho, o que implica na

impossibilidade de sucessão de créditos

trabalhistas, tanto em seara de falência como em

seara de recuperação judicial.

Palavras chave: sucessão trabalhista;

falência; recuperação judicial.

(Sumário: (1.1) Noções Introdutórias;

(1.2) Alguns esclarecimentos necessários; (1.3)

Os doutrinadores afetos ao Direito do Trabalho

e o Supremo Tribunal Federal; (1.4) A

Recuperação Judicial e as suas minúcias

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103

trabalhistas; 1.5) Conclusão; (1.6) Referências

Bibliográficas.

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104

(1.1) Noções Introdutórias.

A parte mais vulnerável da relação no

instante da recuperação judicial de uma empresa,

sem dúvida alguma, é o empregado. Em caso de

alienação do fundo empresarial,

independentemente do novo sucessor se

responsabilizar contratualmente ou não, arca com

todas as obrigações trabalhistas do sucedido em

caso de falência, face ao princípio reitor das

relações de trabalho, qual seja, o princípio da

continuidade. Tal raciocínio é questionado no que

toca a recuperação judicial.

Cumpre aos estudiosos analisar se com a

criação da Nova Lei de Falências e Recuperação

Judicial (11.101/05) houve, de forma efetiva, a

diminuição da proteção ao empregado nos

contratos firmados entre ele e o empregador.

O tema em epígrafe é objeto de

intermináveis discussões, discussões essas travadas

não somente em seara do Poder Judiciário;

abarcando os demais Poderes (Poder Legislativo e

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105

Poder executivo) com o mesmo grau de

profundidade. Assim, se faz necessária uma breve

introdução para que o leitor possa vir a

contextualizar o problema de forma clara.

Em verdade, toda a problemática aqui

apontada centra-se no parágrafo único do art. 60 da

Lei 11.101/05 (Lei de falências).

Tal artigo possui uma redação que deve ser

examinada em cotejo ao inciso II do art. 141 da

mesma lei em comento. Assim, prescreve o inciso

II do art. 141 da Lei 11.101/05, em outras palavras,

da alienação dos bens do devedor, em caso de

falência.

Em contrapartida, aponta o parágrafo único

do artigo 60 da Lei de falências a alienação, esse

agora feito no reduto da Recuperação Judicial:

ambas, pois, alienações feitas em momentos e fases

distintas.

O objeto central da alienação em fase de

falência está, pois, livre de qualquer ônus e não há

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106

que se falar em sucessão do arrematante nas

obrigações afetas ao devedor; inclusive, as de

natureza tributária, bem como as averbadas à

legislação trabalhista e aquelas decorrentes de

acidente de trabalho. Assim, no inciso II do artigo

141 da lei em epígrafe o nosso legislador

infraconstitucional fez constar expressamente em

diploma legal a exclusão de toda e qualquer

sucessão (tributária, trabalhista, bem como as

decorrentes de acidentes de trabalho). Base Legal:

arts. 10 e 448 da Consolidação das Leis do

Trabalho).

Já o objeto central da alienação em fase de

Recuperação Judicial está, pois, também isento de

qualquer ônus e não se cogita em sucessão do

arrematante nas obrigações portadas pelo devedor;

inclusive aquelas oriundas de natureza tributária.

Aqui, pois, houve um silêncio eloqüente do

legislador no tocante as obrigações de natureza

trabalhistas, bem como aquelas concernentes aos

acidentes de trabalho; diverso do que ocorre em

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107

alienação da falência em que a isenção quanto a

tais obrigações por parte do sucessor é feita de

forma expressa; de moldo a não gerar qualquer

dúvida a respeito do tema.

Resta, pois a análise de que se, com o

objetivo de proteção à empresa e aplicação do seu

principio da continuidade, a mesma teria

extrapolado os seus limites de competência

legislativa - face aos artigos 10 e 448 da

Consolidação das Leis do Trabalho - que, em

outras palavras, assegura que em eventual mudança

da estrutura empresarial o empregado ficaria a

salvo; ou seja, se quem adquire os ativos da

empresa responde ou não pelos débitos trabalhistas

pretéritos, sob pena de mácula ao princípio do in

dubio pro operario.

No escólio do doutrinador José Augusto

Rodrigues Pinto: “O princípio da continuidade diz

respeito à empresa, singularmente considerada.

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108

Através da continuidade da empresa se visa á

permanência da relação individual do trabalho”.19

À primeira vista a falta de previsão legal no

que tange a exclusão de toda e qualquer sucessão

(tributária, trabalhista e aquelas decorrentes de

acidente de trabalho) pode soar aos ouvidos dos

leitores mais desavisados como um lapso, uma

falha ou mesmo um esquecimento por parte do

legislador; mas, ao aprofundarmos o estudo do

tema em apreço verificamos que tal silêncio fora,

pois, intencional.

Tal ato constituiu objeto de uma emenda em

que constavam expressamente as seguintes

expressões: “derivadas da legislação do trabalho e

as do acidente de trabalho”. Isso pelo fato de que o

19 PINTO, José Augusto Rodrigues. Curso de Direito

Individual do Trabalho: Noções Fundamentais de direito do

trabalho, sujeitos e institutos do direito individual. 5 ed. São

Paulo: LTR, 2003, p.154.

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109

parágrafo único do art. 60 da Lei 11.101/05 tinha

redação idêntica ao inciso II do art. 141 da lei ora

versada.

Todavia, por iniciativa de um membro do

Poder legislativo encampado no Senado Federal,

houve a apresentação de uma emenda no Senado

Federal suprimindo as sucessões trabalhistas e de

acidente do trabalho, ao argumento de que não

haver sucessão em caso de alienação na falência se

faz por razões lógicas já que se está alienando o

objeto para o pagamento do próprio credor e, por

conseqüência lógica, o próprio empregado, já que

alienação é para saldar a dívida e não haveria

sentido naquele que adquire o objeto continuar a

devedor se a venda fora justamente para saldá-la. O

mesmo raciocínio não se aplica a recuperação

judicial. Isso porque na mesma o devedor persistirá

com o seu patrimônio para lograr êxito em salvar a

sua atividade.

Assim sendo, quem o adquire deve saber o

que está adquirindo.

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110

Igualmente, a análise dogmática do contexto

histórico vem mudando, pugnando pela

irresponsabilidade do sucedido por débitos

trabalhistas, anteriores a sucessão; ainda que à

custa de calorosas discussões a respeito do tema.

Mas o fato é que a lei, assim emendada, foi

publicada e se desprendeu da vontade do legislador,

passando a existir tão-somente a vontade da lei;

com existência jurídica autônoma, o que permite

aos hermeneutas a sua aplicação livre de amarras, o

que vem sendo feito paulatinamente.

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111

(1.2) Alguns esclarecimentos necessários.

Assim, para que o leitor possa bem

compreender a questão de fundo se faz necessária a

compreensão da natureza do crédito de natureza

trabalhista. Nos moldes do art. 958 do Código Civil

a preferência é um gênero e comporta, pois duas

espécies; quais sejam: o privilégio e a garantia (real

e quirografária). O privilégio decorre da lei. Já a

garantia pode decorrer da lei ou do contrato.

No privilégio, a ordem de pagamento é

ditada pela lei. O privilégio nada mais é que a

ordem de vocação dos credores na partilha da

garantia comum que se subsume no patrimônio do

devedor. Assim, quanto mais o credor executa o

mesmo objeto haverá um privilégio no que toca

aquela ordem de pagamento. Já a garantia traduz-se

em fornecer ao credor como adimplemento da

obrigação o patrimônio do devedor, como um todo

– garantia quirografária; bem como ao credor,

assegurando a adimplência da obrigação, um bem

destacado do patrimônio não necessariamente do

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112

devedor – garantia real. A diferença que reside sob

o âmbito do Direito Material entre o crédito

fazendário, o crédito trabalhista, bem como o

crédito quirografário é quanto à anterioridade

(ordem de preferência) no recebimento de tais

créditos, o que dá via processo.

Em não havendo processo não que se

vislumbrar diferença material quanto aos créditos e

sim quanto ao objeto a que eles se vinculam. Em

não havendo processo não se cogita na ordem de

pagamento. Assim, a alienação é revestida de

garantida real e não há que se confundir com o

privilégio, já que este não decorre da vontade das

partes. Trata-se de uma imposição legal!

Dessas premissas surgiu uma discussão

interessante acerca da natureza jurídica da

preferência no crédito trabalhista. Originalmente, o

crédito de natureza trabalhista apresentava a

natureza jurídica de um crédito quirografário. Se o

privilégio decorre de lei é dotado de

excepcionalidade, logo, é norma de natureza

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113

restritiva. Nos primórdios, então, o Supremo

Tribunal Federal firmou a sua jurisprudência, em

um conflito de competência (Conflito de

Competência – CC: 2488 e CC 2627), no sentido

de que o crédito trabalhista ostentava o status de

crédito quirografário.

Há que se ressaltar que pelo Decreto _ lei

7661/45 (que regulamenta a falência em nosso

ordenamento jurídico até o advento da lei

11.101/05) figurava entre nós o instituto da

concordata. Pelo instituto da concordata o art. 147

do Decreto-Lei 7661/45 previa que a mesma só

atingiria o passivo concordatário.

Logo, surgiu a discussão, a saber, se os

empregados se sujeitavam ou não a concordata. Na

ótica esposada à época pelo Supremo Tribunal

federal os empregados estavam a ela adstritos pelo

fato de crédito trabalhista ostentar a natureza de

quirografário. Era, pois, intocável.

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114

Somente com a lei 3.726 de 11 de fevereiro

de 1960 o crédito trabalhista recebe o status de

crédito privilegiado alterando a lei de falências á

época (decreto – lei 7661/45); ganhando, pois

privilégio.

O crédito trabalhista só ganhou privilégio

porque a lei assim definiu os seus contornos. Após

a alteração da lei de falência o Supremo Tribunal

federal ostentou o entendimento de que o crédito

trabalhista passou a ser privilegiado e, portanto,

restou excluído do instituto da concordata, já que a

mesma estava adstrita ao crédito quirografário, tão-

somente; declarando formalmente o seu

entendimento jurisprudencial no conflito de

competência 2591.

Em consonância com tal entendimento o

Supremo Tribunal Federal esculpiu o verbete

sumular de número 227, que em outras palavras

resumia o seu entendimento no seguinte sentido: “a

concordata do empregador não impede a execução

do crédito e nem a reclamação do empregado na

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115

justiça do trabalho”. Isso porque até a lei 3.726/60

o crédito trabalhista era quirografário.

A concordata foi extinta e atualmente

lidamos com o instituto da recuperação judicial e,

hoje, o amparo legal para o privilégio do crédito

trabalhista continua não constando da Consolidação

das Leis do Trabalho e também não constando na

Constituição da República Federativa do Brasil,

mas tão só no Código Tributário nacional (art. 186,

do Código Tribunal Nacional) que prescreve, em

outras palavras, que o crédito tributário prefere a

qualquer outro, independentemente da data de sua

constituição ou de sua natureza, ressalvados os

créditos decorrentes da legislação do trabalho e por

acidente do trabalho.

Assim, se o crédito tributário prefere a

qualquer outro, com a exceção do crédito

trabalhista e por acidente do trabalho estes possuem

primazia sobre qualquer outro crédito, inclusive o

crédito de natureza tributária. Eis aí, pois, a

supremacia legal dos mesmos.

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116

(1.3) Os doutrinadores afetos ao Direito do

Trabalho e o Supremo Tribunal Federal.

Destarte, o Supremo até então resolveu a

questão. Todavia, o Direito do Trabalho é regido

por um princípio basilar; qual seja o princípio da

norma mais favorável (também conhecido como

princípio do in dúbio pro operário) que explicita

que a dúvida que surgir deve ser solucionada de

molde a não prejudicar o empregado.

É cediço que o Direito do Trabalho

constitui um ramo do Direito que contém em seu

bojo uma jurisprudência axiológica; tal ramo do

direito só existe com vista à proteção do

empregado.

Assim, diante de tais premissas, a pirâmide

valorativa do Direito do Trabalho distingue-se da

pirâmide kelseniana (que preconiza a Constituição

da República em seu ápice). No Direito do

Trabalho estará no topo da interpretação aquela

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117

norma que se mostrar mais favorável ao

empregado; favorável, pois, as suas condições de

trabalho virão para o ápice da pirâmide, ainda que

seja hierarquicamente uma norma periférica. A

base legal para tal assertiva encontra-se no próprio

art. 8º da Consolidação das Leis do Trabalho.

Esse princípio da norma mais favorável

exige do intérprete, no escólio da decisão proferida

pelo Supremo Tribunal Federal, indagações: se a

norma for a mais favorável será a mais favorável

para o empregado ou será a mais favorável para os

empregados (no plural)? Poderá a norma mais

favorável beneficiar apenas um empregado, ainda

que em detrimento dos demais? Ou será aquela

norma mais favorável que irá beneficiar a classe

dos empregados?

É cediço que em um processo concursal o

que temos é uma execução coletiva (tanto de

falência como de recuperação judicial).

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118

Teremos, pois, a classe dos empregados

executando coletivamente o empregador; portanto,

em verdade, o princípio da norma mais favorável

deve ser compreendido como aquele que for mais

favorável a classe dos empregados: empregados

como um todo considerado! Do contrário o

intérprete subverteria o fundo sob a forma.

Nas preciosas lições do Marcelo Papaléo:

“Não se parte do objetivo de liquidar para repartir,

mas de conservar para salvar e ter melhores

resultados para todos”.20

No sentido acima esposado, vem o Supremo

Tribunal Federal e aduz que em caso de falência a

execução deve ser feita no juízo da falência e não

no juízo trabalhista.

Não compete ao juízo do trabalho a

execução individual de cada empregado, sob pena

20 SOUZA, Marcelo Papaléo de. A nova Lei de Recuperação e Falência e as suas conseqüências no Direito e Processo do Trabalho. 2. Ed. São Paulo: Ltr, 2006, p.141.

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119

de frustrar-se o processo concursal e, por

conseqüência, a classe de empregados.

E essa questão bem bater agora as portas do

Supremo Tribunal Federal, sob uma nova

perspectiva, qual seja: a Recuperação Judicial.

O Egrégio Supremo Tribunal Federal (na

Ação Direta de Inconstitucionalidade - ADI nº

3.934-2-DF), na lavra do seu Ministro Relator.

Logo, o MIn. Relator Ricardo Lewandowski

manifestou-se pela constitucionalidade dos artigos

60, parágrafo único, 141, inciso II, e 83, incisos I e

IV, alínea “c”, da Lei nº 11.101/2005, que afasta a

sucessão quando da alienação de ativos nos

processos de falência e de recuperação judicial e

apresenta limitação a 150 salários mínimos por

credor para fins de preferência, na falência, dos

créditos decorrentes da legislação do trabalho.

Logo, os artigos 60, parágrafo único, e 141,

inciso II, da Lei nº 11.101/2005 encontram-se

constitucionalmente hígidos, quando afastam a

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120

sucessão nos créditos trabalhistas, aduzindo que o

legislador ordinário, ao assim proceder, visou à

concretização dos valores constitucionais da livre

iniciativa e da função social da propriedade

(empresa).

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121

(1.4) A Recuperação Judicial e as suas minúcias

trabalhistas.

Com o advento da Lei 11.101/05, por força

do art. 54, os empregados passaram a ser incluídos

como partes na Recuperação Judicial, ostentando,

pois o status de sujeitos passivos no tange a mesma.

Assim, no cenário jurídico despontaram dois

pontos de vista acerca da sucessão trabalhista na

recuperação judicial.

Sob uma primeira perspectiva seria, mesmo

em face da omissão legislativa, se mostraria

perfeitamente possível a sucessão trabalhista na

recuperação judicial, ao argumento de que a

Consolidação das Leis do Trabalho traça diretrizes

mais protecionistas ao empregado e é tida como lei

especial que versa sobre assunto, ainda que a lei

11.101/05 verse em sentido contrário.

Aqueles que argumentavam favoravelmente

à sucessão trabalhista inserida na Recuperação

Judicial apresentavam basicamente os seguintes

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122

argumentos: o primeiro argumento valeu-se de uma

interpretação histórica, qual seja o estudo do

projeto de lei que teve a sua modificação veiculada

por uma emenda que propositalmente teria feito a

supressão das obrigações trabalhistas e de acidente

do trabalho da sucessão para que o julgador ficasse

livre para incluí-las ou não em cada caso concreto.

A outra argumentação residia em uma

interpretação sistemática em que ao exame

detalhado do instituto da Recuperação Judicial nos

deparamos com o inciso II do art. 141, da Lei

11.101/05 que apregoa a exclusão da sucessão em

caso de falência, mas não o fazendo no que tange

ao instituto da Recuperação Judicial.

Ainda sob essa mesma ótica citamos a

interpretação lógico-sistemática: É cediço que a

Consolidação das Leis do Trabalho, como o próprio

nome já denota, constitui-se em uma consolidação;

logo, lei geral trabalhista. Assim, os arts. 10 e 448

da Consolidação das Leis do Trabalho preceituam

expressamente a sucessão trabalhista como um

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123

direito subjetivo do empregado, não se distinguindo

se em caso de alienação ocorrida em recuperação

judicial ou fora dela. Trata-se de uma garantia do

empregado, no suor de seu lavor, da solvência da

prestação trabalhista.

Logo, transferido o patrimônio empresarial

restará para o empregado o seu direito de seqüela.

Assim, como a regra no Direito do Trabalho é a

aplicação do principio in dubio pro operario e

como a Lei 11.101/05 não excluiu a sucessão

trabalhista na recuperação judicial (fazendo-a

apenas no que tange a falência), como não foi

proibida, assim, é permitida.

Também a jurisprudência: “Sucessão

Trabalhista. Configuração. Hipótese. O fato de o

contrato de trabalho do reclamante ter findado

antes da efetivação da sucessão não descaracteriza

esta, pois, ao adquirir a unidade econômica

jurídica, a empresa sucessora passou a ser

responsável também pelos contratos laborais

extintos. Dessa forma, responde o empreendimento,

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124

representado pelo sucessor, pelas dívidas

trabalhistas oriundas dos contratos de trabalho

findos ou vigentes à época da transferência da

unidade produtiva. (TRT/MS – AP – 1111/2001 –

005-24-00-3- REL.: JUIZ NINCANOR DE

ARAÚJO LIMA – DOE 31.10.2002. REVISTA

SYNTHESIS 36/2003, P.222.).

Em contrapartida, há um segundo ponto de

vista (hoje dominante nos Tribunais Superiores:

ADI 3934, STF.) acerca da impossibilidade da

Sucessão Trabalhista na recuperação judicial.

Comungamos de tal entendimento e vamos expor

ao leitor os argumentos que corroboram essa

segunda visão sobre a discussão ora versada.

Essa questão bateu as portas do Supremo

Tribunal federal que opinou favoravelmente pela

respectiva impossibilidade: a já citada Ação Direta

de Inconstitucionalidade, de relatoria do Ministro

Ricardo Lewandowski. A título ilustrativo vale

citar o Recurso extraordinário (593855), com

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125

repercussão geral, também de relatoria do Ministro

Ricardo Lewandowski.

E o fundamento discorrido pelo Supremo

Tribunal Federal cingiu-se aos seguintes

argumentos: Quando o tema versar sobre

recuperação judicial o artigo que a coroa é o art. 47

da Lei 11.101/05. Já quando o tema versar sobre

falência o embasamento jurídico lastreia-se no art.

75 da lei em comento.

Tais artigos, em outras palavras, prescrevem

as formas que existem de sucessões em cada um

dos respectivos institutos.

Lei é norma de comportamento e, portanto,

quando o legislador fixa as condutas ele tenciona

regulamentar os comportamentos dos operadores

do direito.

É direcionar a nossa conduta hermenêutica.

Isso porque na lei 11.101/05 muito mais que uma

interpretação gramatical ou lógico-sistemática o é a

consagração viva do método teleológico.

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126

A aplicação da lei cinge-se a sua finalidade

prescrita. O intérprete deve aplicar a lei, sem perder

de vista a intenção do legislador.

Diante de tais premissas é imperioso

constatar-se que, ao vedar-se a sucessão trabalhista

em seara falencial, à intenção do legislador foi a de

tornar hígido o princípio da preservação da

empresa.

O objetivo maior da falência é promover a

preservação da empresa. Já o artigo 47 da lei ora

versada visa não somente a preservação da

empresa, mas somada a ela a preservação do

empresário. Atente-se o leitor que os termos

empresário e empresa não se confundem. A

empresa denota a atividade. O empresário é o

sujeito que a desenvolve.

E, aqui, há que se pontual que o intuito do

legislador não foi à preservação do empresário na

falência e sim a preservação da empresa/ atividade.

Já a recuperação judicial em tempo algum afastará

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127

o empresário; pode até afastar os administradores

da sociedade empresária, mas não a sociedade em

si.

A olhos nus, investidor algum compraria

uma empresa em recuperação judicial com o risco

de, ao adquiri-la, por ela pagar e ainda dispor

financeiramente de um passivo, de um débito de

natureza trabalhista; pois se tal ocorresse até

haveria a preservação da empresa, mas jamais

haveria a preservação do empresário, já que atolado

em dívidas. Um paradoxo!

Se há uma compra de um devedor em

recuperação judicial correndo o risco de herdar as

suas dívidas trabalhistas já adquire o bem

insolvente para desenvolver a atividade. Logo, sem

um bom desenvolvimento da atividade surgirá o

desemprego em massa.

E o raciocínio é muito simples: se não

houver a aplicação de uma interpretação teleológica

na sucessão não haverá investimentos (compra) e,

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128

se ninguém comprar haverá a falência e, por obra

dela, as relações trabalhistas se diluirão.

Ensina-nos Maximilianus Fuhrer, que: “a

falência é um processo de execução coletiva, em

que todos os bens do falido são arrecadados para

uma venda judicial forçada, com a distribuição

proporcional do ativo entre os credores. Do mesmo

não se vale à Recuperação Judicial”.21

Ainda se vale o Supremo Tribunal Federal

para corroborar o seu entendimento de uma

interpretação gramatical. Isso por que o parágrafo

único do art. 60 da lei 11.101/05 prescreve

nitidamente que não haverá sucessão; inclusive a

de natureza tributária. E, aqui, o termo inclusive é

utilizado exemplificativamente. Não há, pois que se

falar em qualquer tipo de sucessão em se tratando

de Recuperação Judicial. Assim, não se aplicará a

sucessão trabalhista nem para a falência e tão

pouco para a Recuperação Judicial.

21 FUHRER, Maximilianus Cláudio Américo. Roteiro das Falências e Concordatas, 18ª edição, Revista dos Tribunais.

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129

Todavia a questão não resta pacificada face

ao ativismo judicial, em que cada juízo decide de

acordo com a sua conveniência e oportunidade.

Não há súmula vinculante sobre o tema e ora dão

primazia a continuidade da empresa sem a

sucessão, ora dá proteção ao empregado

isoladamente.

A questão bateu as portas do Superior

Tribunal de Justiça via conflito de competência. O

mesmo passou a não conhecer dos conflitos de

competência (ainda que a falência já tenha sido

decretada ou a recuperação judicial concedida), ao

argumento de que tendo sido desconsiderada a

personalidade jurídica do devedor falido ou em

recuperação não haveria o conflito, pois quem

estará sendo executado será somente o terceiro que

não é tido por sujeito processual a ser objeto de

julgamento em vara cível (falência) e sim sujeito

processual na vara do trabalho.

Em havendo, pois, conflito de competência

entre juiz de trabalho e juiz de direito competente

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130

para dirimi-lo será o Superior Tribunal de Justiça,

nos termos do artigo 105 da Constituição da

República federativa do Brasil.

Dessa feita, a jurisprudência do Superior

Tribunal de Justiça não guarda, pois, sintonia com a

jurisprudência acolhida pelo Supremo Tribunal

federal, que, em decisões monocráticas vem

conhecendo do agravo interposto aos conflitos de

competência no Superior tribunal de Justiça, na

lavra do Ministro Celso de Melo e batendo o

martelo, ou seja, dando a última palavra no sentido

de que não compete ao juiz do trabalho decidir

quanto ao cabimento ou não de sucessão trabalhista

em seara de recuperação judicial.

Em caráter ilustrativo cite-se o agravo de

instrumento de número 796 844/ STF.

Em palavras simples, o Supremo Tribunal

Federal vem decidindo que em caso de falência ou

de recuperação judicial se o juiz desconsidera a

personalidade jurídica após a falência ou após a

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131

distribuição do pedido de recuperação judicial

falecerá ao juiz do trabalho a competência para

julgar o deslinde. Tal competência será exclusiva

da vara de falências. Somente o juiz de falências

deterá a competência para julgar o caso concreto.

Tal entendimento da corte maior encontra

consonância com o preceituado na lei 11.101, que

em seu art. 82, prescreve em palavras simples que a

responsabilidade dos sócios é limitada e será

apurada no próprio juízo da falência,

independentemente de habilitação do ativo.

E como fica a decisão do Supremo Tribunal

Federal face ao art. 114 da Constituição da

República que prevê expressamente a competência

da justiça do Trabalho para as causas trabalhistas?

Não há que se cogitar em violação ao artigo

114 da Lei Maior. Isso porque tal artigo delimita

tão-só a competência material da justiça do

Trabalho (questões atinentes a férias não pagas, a

FGTS) e deve ser interpretado em cotejo ao artigo

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132

113 da Carta Magna que apregoa que a Lei disporá

acerca de jurisdição e a competência do juízo do

trabalho. Assim, para assegurar a execução não há

necessidade de justiça especializada e lei material

não se coaduna com ela.

O tema do momento descortinou no caso

Varig (Empresa de Aviação Aérea sujeita a

Recuperação Judicial) – indagou-se a possibilidade

de o princípio da continuidade das relações de

trabalho constituir um obstáculo efetivo ao

princípio da preservação da empresa.

A Corte Superior opinou no sentido de que

a preservação da empresa caminha de mãos dadas a

continuidade das relações de trabalho. Ora,

transferir uma sucessão trabalhista no bojo de uma

recuperação judicial ensejaria instabilidade e total

falta de segurança no emprego ao próprio

empregado minando, por via transversa, o instituto

da recuperação Judicial.

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133

(1.5) Conclusão:

A empresa dá o sustento ao empregado. O

termo empresa aqui utilizado assume caráter

funcional, prático, qual seja, o de enfatizar a

despersonalização do empregador e insistir na

relevância da vinculação do contrato empregatício

ao empreendimento empresarial,

independentemente do seu efetivo titular.

E, em assim sendo, o princípio da

conservação da empresa tem sido observado não

mais como um simples meio de preservação dos

interesses dos credores, mas sim e principalmente

como uma forma de solução da crise econômica da

empresa e preservação desta, bem como dos

próprios empregos e, conseqüentemente, da

dignidade do trabalhador.

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134

(1.6) Referências Bibliográficas:

BARRROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito

do Trabalho. 3. Ed. São Paulo: LTr, 2007.

FILHO, Evaristo de Moraes. Sucessão nas

Obrigações e a teoria da empresa. Rio de Janeiro:

Forense, 1960, v.2, p.254.

SOUZA, Marcelo Papaléo. A nova Lei de

Recuperação e Falência e as suas conseqüências

no Direito e no Processo de Trabalho. 2. Ed. São

Paulo: LTr,2006.

Sucessão Trabalhista Diante da Lei de

Recuperação e Falência - publicado 07/02/2008

por Catarina Costa em HTTP:

//www.webartigos.com

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135

Competência Tributária.

Sumário: (1.1) A competência para legislar

sobre Direito Tributário e os Entes da Federação;

(1.2) Características da competência tributária;

(1.3) Conflito de competência; (1.4) Conclusão;

(1.5) Bibliografia.

Palavras-Chaves: federação e competência

tributária.

Resumo: O presente trabalho aborda, com

acuidade, os respectivos encargos legais dos entes

federativos que desempenham a função legislativa e

administrativa na criação e no recebimento dos seus

próprios, esses últimos delegáveis, ao contrário do

que se dá nos primeiros.

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136

(1.1) A competência para legislar sobre Direito

Tributário e os Entes da Federação.

A competência para legislar sobre o Direito

Tributário não necessariamente irá configurar a

competência tributária.

Esclarecemos o leitor: a competência para legislar

sobre o Direito Tributário é genérica, isto é, abarca

matérias de fiscalização dos tributos, sobre a

arrecadação, instituição, redução, majoração e até

mesmo a concessão de benefício fiscal; de

competência tanto da esfera legislativa quanto da

esfera executiva.

Já a competência tributária de que

estudaremos nesse tópico tem um sentido mais

restrito. Trata-se apenas de uma parcela desse poder

genérico em legislar no que tange, primariamente, a

instituição e; secundariamente, a modificação e

extinção dos tributos; poder esse, em regra,

exercido pelo Legislativo, com raras exceções (art.

150, I, CRFB, c.c o art. 97 do CTN).

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137

Assim a mesma se delineia da seguinte

forma no cenário jurídico: Competência tributária é

a aptidão para criar in abstrato tributos, bem como

modificá-los e extingui-los, com autorização

constitucional para tanto.

Quem possui competência tributária são os

entes políticos, quais sejam: União, Estados,

Distrito Federal e Municípios – trata-se, pois, de

tarefa legislativa incumbida a cada ente da

federação.

Note o leitor que o legislador constituinte

delimitou em seu art. 24 a competência concorrente

para que se legisle em Direito Tributário

delegando-a a União, aos Estados e ao Distrito

Federal.

Tal artigo, todavia, não pode ser

interpretado isoladamente, sob pena de exclusão do

Município, o que feriria de morte o sistema

federativo. Assim, o mesmo legislador constituinte

nos ensinou que devemos fazer uma interpretação

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138

sistemática entre o art. 24 e o art. 30 (ambos da

CRFB/88), esse último propicia aos Municípios

legislarem supletivamente no que toca ao Direito

Tributário.

Logo, na omissão de normas gerais da

União, os Estados, o Distrito Federal e os

Municípios serão detentores de competência plena

no que toca a instituição do tributo e, para tanto,

retiram o seu fundamento de validade da própria

Lei Maior.

È a Constituição da República que esboça o

poder de tributar do Estado Democrático de Direito,

prevendo o poder de tributar e o delimitando a cada

ente federativo como forma de melhor assegurar a

autonomia financeira, que é o alicerce da federação.

A norma ao ditar competências delimita-as. Isso

porque não há competências ilimitadas.

Dessa maneira, sobrevindo normas gerais da

União sobre o assunto, as normas já editadas dos

Estados e Municípios não serão revogadas. Ficarão,

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139

pois, com a sua eficácia suspensa naquilo em que

for contrário ao estatuído pelas normas gerais

(federais). O tema pode parecer sem relevância,

mas não fugiu a argúcia do examinador da Ordem

dos Advogados do Brasil em São Paulo, que no ano

de 2007 formulou a seguinte questão aos seus

examinados. Vejamos:

(OAB – SP – Janeiro – 2007). A

Constituição Federal estabelece que:

A) Compete exclusivamente à União

legislar sobre direito tributário.

B) Os Estados podem legislar sobre direito

tributário, desde que autorizados pelo

Senado Federal.

C) Compete à União, aos Estados e ao

Distrito Federal legislar

concorrentemente sobre direito

tributário.

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140

D) Os Municípios não detêm competência

para legislar sobre direito tributário.

Resposta por nós fornecida: A assertiva

correta é a letra c, com lastro no art. 24, I da

CRFB/88. (Art. 24.). “Compete à União, aos

Estados e ao Distrito Federal legislar

concorrentemente sobre: I. direito tributário”.

Atente o candidato para o fato de que uma coisa

é uma coisa e outra coisa é outra coisa. A

competência concorrente dos três entes

federativos (União, Estados e Distrito Federal)

não afasta a competência dos Municípios para

legislarem sobre o tema. Há que se ressaltar que

os Municípios, é verdade, não legislam

concorrentemente; mas legislam sim,

supletivamente; portanto, os mesmos possuem

competência para legislar sobre Direito

Tributário.

Assim, a produção de normas jurídicas

atinente aos tributos chama-se competência

tributária - a mesma tem o condão de desenhar o

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141

perfil jurídico de um tributo ou os expedientes

necessários à sua funcionalidade. Todavia, a mesma

não se confunde com a capacidade tributária ativa:

que nada mais significa que a possibilidade de

integrar a relação jurídica tributária, na qualidade

de sujeito ativo e com funções de cobrar, arrecadar

e fiscalizar tributos.

A primeira situa-se no plano constitucional

e é, pois, intransferível, já a segunda é delegável.

Há que se perquirir a natureza jurídica de tal

delegação. Trata-se de um contrato, ou seja, um

acordo que é estabelecido entre o ente político e a

pessoa jurídica por ele escolhida, contrato esse

celebrado mediante lei ou convênio. Assim, não se

impõe a capacidade ativa a nenhum ente: nenhum

ente poderá se vir obrigado a arrecadar, fiscalizar

ou cobrar um tributo que não é de sua alçada.

A título de exemplo citamos um caso de

capacidade ativa entre entes da federação,

autorizada pelo legislador constituinte: No que toca

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142

ao ITR (Imposto Territorial Rural) afeto a União, a

mesma, após a emenda constitucional n. 42/04,

passou a ostentar a faculdade de delegar a

capacidade ativa aos Municípios, uma vez que os

mesmos, já titulares da competência para

instituírem o IPTU (Imposto Predial e territorial

Urbano) já ostentam cadastros referentes ao

perímetro de zona urbana e zona rural – o que é de

uma praticidade ímpar.

Sem a pretensão de esgotarmos o tema,

vamos citar ao leitor curioso uma jurisprudência

fresquinha, do apagar das luzes do ano de 2010.

O Supremo Tribunal Federal, ao apreciar

um caso que envolvia a capacidade ativa tributária,

deliberou que a imunidade encerra exceção

constitucional à capacidade ativa tributária, ou seja,

a imunidade torna intocáveis pelo tributo certas

pessoas e coisas. Por estar intimamente relacionada

com os direitos humanos não pode ser revogada

pelo ente detentor de arrecadação e fiscalização de

tributos. Isso porque um contrato não tem a força

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143

de sobrepor-se a uma intributabilidade

constitucional. Imunidade não se revoga por

contrato.

Confira o leitor: Informativo 605 RE

N.564.413 – SC: “Relator: Ministro Marco Aurélio

– Imunidade – Capacidade Ativa Tributária. A

imunidade encerra exceção constitucional à

capacidade ativa tributária, cabendo interpretar os

princípios regedores de forma estrita”.

O caso em epígrafe envolvia uma cobrança

devida pelo ente detentor de capacidade ativa, por

não configurar imunidade. No caso concreto, a

imunidade não se estendia ao lucro das empresas

exportadoras, pois, se assim o fosse derrogaria a

capacidade ativa tributária do ente arrecadador e

fiscalizador da mesma.

Hugo de Brito Machado acrescenta: “ Só a

pessoa jurídica de Direito público que exercita a

atividade estatal específica pode instituir o tributo

vinculado a essa atividade. A competência

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144

tributária, assim, é privativa do ente estatal que

exercita a atividade respectiva.”22 (Curso de Direito

Tributário, Malheiros Editores, 21.ª, edição, pág.

258.).

Atente o leitor para a seguinte premissa: A

Constituição da República não inova o

ordenamento criando tributos. Ela “passa a bola”

aos entes federativos, através do instituto criado por

ela, que se traduz na competência tributária. Assim,

a Lei Magna apenas outorga competência tributária

(que é competência legislativa dos entes políticos,

pois possuem legislativo autônomo e

representativo) para criar "in abstrato" os tributos,

já previstos em seu corpo.

A competência tributária não é inalterável,

pode sim ser alterada, desde que se respeite o

procedimento formal de uma emenda constitucional

22 Curso de Direito Tributário, Malheiros Editores,

21.ª, edição, 2007.

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145

e haja respeito ao princípio federativo (cláusula

pétrea).

A título de exemplo citamos a Emenda

Constitucional de número 41. Houve supressão a

uma competência que era dos Estados que

detinham a faculdade de instituir duas

contribuições: 1ª) a contribuição para o custeio da

previdência social dos seus servidores e, 2ª) a

contribuição para a assistência social para os seus

servidores.

Houve supressão no que concerne a sua

segunda contribuição. Assim, a EC 41/2003 alterou

o art. 149, parágrafo único da CRFB/88,

transformando-o em parágrafo primeiro, para

suprimir a contribuição para a assistência social de

seus servidores, e criando os parágrafos segundo,

terceiro e quarto no mesmo artigo.

Por fim, há que se mencionar, sem medo de

errar, que o Sistema Tributário Nacional não é

imune as críticas, pelo fato de concentrar

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146

competências tributárias em demasia nas mãos da

União, que é “mão de vaca” no momento de se

proceder a repartição das receitas tributárias por ela

auferidas.

Ensina-nos Ricardo Lobo Torres: “Mas a

verdade é que, da mesma forma que acontece nos

sistema tributário econômico, também o sistema

federado ideal é utópico. Depara-se hoje com a

crítica universal aos sistemas de discriminação de

rendas. Há descontentamento da doutrina para com

os ordenamentos dos diversos Estados Federais –

Alemanha, Argentina, Estados Unidos etc. Ao que

tudo indica, o verdadeiro equilíbrio no federalismo

fiscal é inatingível, principalmente em virtude da

exagerada concentração de receitas em favor da

União, decorrentes do excesso de intervencionismo

estatal da exasperação da idéia de desenvolvimento

econômico e da desequilibrada distribuição de

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147

responsabilidades pelo fornecimento de serviços

públicos”.23

23 TORRES; Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário, 13ª edição, p.364.

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148

(1.2) Características da competência tributária:

(1ª) Privatividade: retrata a exclusividade da

pessoa política na instituição de sua competência.

Quem detém a privatividade é somente a União, já

que em algumas hipóteses ela poderá legislar sobre

matérias de competência dos Estados e dos

Municípios - Art. 154, I - regra de fechamento; Art.

154, II - mais que uma exceção, confirma a regra

em caso de normalidade. Assim, como uma mesma

matéria não poderá ser objeto de tributação por

duas pessoas políticas diferentes, no cenário

jurídico brasileiro não há que se falar em bi-

tributação.

(2ª) Indelegabilidade: configurando-se em

um poder de legislar é, por essência, indelegável a

competência tributária. Tal postulado fortalece a

estruturação da repartição de competências no

cenário jurídico brasileiro. O que se delega é a

capacidade ativa de cobrança, arrecadação e

fiscalização de tributos, o que não se confunde com

a competência tributária. A primeira (capacidade

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149

ativa) retrata um poder administrativo enquanto a

segunda (competência tributária) retrata um poder

político.

(3ª) Incaducabilidade: significa que a

mesma não se encontra perdida pelo seu não

exercício no decurso do tempo. A Lei Maior não

delimita, em regra, lapso temporal para que o ente

federativo exercite a sua competência tributária

instituindo tributos. Até já o fez e exemplo disso foi

quando a EC 3/1993 delimitou para a União o lapso

temporal de até 31/12/1994 para que a mesma

instituísse o IPMF (Imposto Provisório sobre a

Movimentação Financeira), mas isso retrata uma

exceção que não desnatura a regra; e exemplo disso

é que desde 1988 está previsto em seu texto o

Imposto sobre Grandes Fortunas - que até hoje não

foi implementado pela União, até porque não é de

interesse de quase ninguém que assim o seja.

(4ª) Inalterabilidade: A autonomia

legislativa dada ao ente federado não tem o condão

de alterar as diretrizes básicas traçadas na

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150

Constituição da República. A Lei Fundamental

funcionará como uma espécie de moldura a que

deve se adequar a lei infraconstitucional de cada

ente; sob pena de invasão de competência, o que,

por si só, macula o pacto federativo.

(5ª) Irrenunciabilidade: Fica facultado ao

ente federativo o exercício ou não de sua

competência, mas dela não pode abrir mão por livre

e espontânea vontade, a seu bel prazer, do contrário

haveria o engessamento do Poder Legislativo ao

deliberar sobre o tema em momento futuro.

Assim, quando a União achar que deve, se

um dia porventura achar que deve, instituirá o

Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF), pode até

não implementá-lo nunca, por questões de

conveniência e oportunidade (renúncia tácita), mas

jamais deverá formalizar expressamente tal

renúncia, sob pena de afronta ao texto

constitucional.

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151

(6ª) Facultatividade: A Constituição não

obriga aos entes federados exercitarem as suas

competências.

Assim, a pessoa política é livre para

exercitar sua competência tributária, sendo que o

não-exercício da competência tributária não a

transfere a outras pessoas políticas. Isso por que

competência tributária não é res nullius, a

competência tributária é privativa de cada pessoa

política (artigo 8.º do Código Tributário Nacional).

Assim, a competência tributária confere e

delimita o poder e nada obsta a que o ente a exerça

de forma parcial face ao traço da facultatividade. A

implementação ou não do tributo fica ao alvedrio

de cada ente, ainda que desagrade à opinião pública

e o ente seja sancionado moralmente por críticas

jornalísticas.

Questão emblemática surgiu com a edição

da Lei de Responsabilidade Fiscal (LC 101/00) que

faz alusão em seu artigo 11, parágrafo único, a

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152

instituição de tributos para que o ente exerça uma

boa gestão fiscal. Foi ajuizada no Supremo

Tribunal Federal uma ação direta de

inconstitucionalidade (ADI 2238) questionando se

tal dispositivo obrigava o ente à instituição de

tributos.

Chamado a se pronunciar sobre o tema, em

medida cautelar, o Supremo Tribunal Federal

considerou válido o dispositivo supracitado e

esposou o entendimento no sentido de que esse

dispositivo não cria ao ente a obrigação de

instituição do tributo, pois a Constituição da

República assim não o exigiu. A Lei Maior confere

ao ente o poder e não o dever de instituição do

tributo.

A função do dispositivo da Lei de

Responsabilidade Fiscal foi apenas a de veicular

uma sanção no que concerne as transferências

voluntárias (são aquelas nas quais um ente repassa

recursos a outro, sem qualquer obrigatoriedade para

tanto), matéria que não guarda reserva

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153

constitucional. Assim, se o ente federativo não

exerceu a sua competência tributária plena (porque

a isso não é obrigado!) não recebe recursos

(transferência voluntárias) de outro ente. Não é

obrigado a instituir, apenas deixa de receber uma

benesse. A sanção pela vedação de transferências

voluntárias não tem o condão de obrigar o ente a

criar o tributo que não lhe convém.

Em termos práticos: A União até hoje não

instituiu o Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF).

Não está a isso obrigada. Por não ter exercido a sua

competência tributária plena poderá deixar de

receber um recurso de outro ente porque isso

equivaleria a uma renúncia de receita e a lei

penaliza o ente que renuncia receita própria,

deixando de receber receita alheia, por uma questão

de equidade e justiça fiscal. Do contrário estaria a

União fazendo graça com chapéu alheio.

Há, entretanto, uma exceção à regra da

facultatividade: a competência para criar o Imposto

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154

sobre Circulação de Mercadorias e Serviços

(ICMS) é obrigatória.

(7ª) Intransferibilidade: Outro ente da federação até

pode se beneficiar do repasse das receitas auferidas,

mas é fato que a competência não se transfere para

o mesmo, tendo em vista o fato de que não existe

competência concorrente para instituir o tributo. O

não exercício da competência, por si só, não tem o

condão de transferi-la a outro ente da federação.

Essa, pois, a dicção do disposto no artigo 8º do

Código Tributário Nacional: “o não exercício da

competência tributária não a transfere a pessoa

jurídica de direito público diversa daquela a que a

Constituição a tenha atribuído”.

A regra acima pode parecer aos menos

desavisados como um imperativo lógico do

sistema, mas existe não sem uma razão de ser. E a

razão é ordem histórica.

O leitor deve ficar atento porque essa foi

uma inovação legislativa que seguiu as diretrizes da

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155

Constituição da República, datada de 1988. Isso

porque na Constituição Federal de 1946 havia a

previsão de que, acaso um ente não exercesse a

competência tributária que lhe era outorgada, outro

ente poderia assim fazê-lo; até que o tributo do ente

omisso fosse por ele criado, quando, então, a lei do

ente criador ( em havendo omissão) perderia a sua

eficácia.

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156

(1.3) Conflito de competência.

A distribuição rígida de competências entre

os entes fora elaborada para que não houvesse

conflito entre elas de forma que a mesma

competência não pode ser exercida

simultaneamente. O que se pode dizer é que

existem zonas cinzentas entre dois tributos, não se

podendo precisar com clareza qual deles incidirá no

caso em concreto. Todavia, o conflito será

meramente aparente já que cada um ficará em seara

própria. Como diz o ditado: “cada um no seu

quadrado”.

Vejamos: O Imposto Predial e Territorial

Urbano (IPTU) é de competência dos Municípios.

O Imposto Territorial Rural é de competência da

União. O critério distintivo é saber a localização do

imóvel. Se estiver situado em zona urbana é

irrelevante a sua destinação. Incidirá, pois, o IPTU.

A fixação desse critério se dá via lei complementar.

Logo, ainda que Joãozinho resida em perímetro

urbano explorando a pecuniária no lote em que

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157

construída a sua casa será contribuinte do Imposto

Predial e territorial Urbano.

O mesmo no que toca ao Imposto de

Circulação de Mercadoria (ICMS) e ao imposto

sobre serviços (ISS). A Lei Complementar 116 de

2003 delimita que os serviços nela previstos, exceto

exceções criadas por ela mesma, serão tributados

pelo ISS, ainda que versem sobre operações e

circulação de mercadorias.

O tema não passou despercebido pelo

examinador da Magistratura do Estado de São

Paulo que indagou aos candidatos:

(Juiz de Direito – SP – 2003): Não cabe à lei

complementar:

A) estabelecer as alíquotas aplicáveis às

operações e prestações interestaduais e de

exportação.

B) estabelecer normas gerais sobre

obrigações tributárias.

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158

C) dispor sobre conflitos de competência,

em matéria tributária, entre a União, os Estados, o

Distrito Federal e os Municípios.

D) regular as limitações constitucionais ao

poder de tributar.

Resposta por nós ofertada: A assertiva

correta subsume-se na letra a, com lastro no art.

155, parágrafo 2º, inciso IV, da CRFB. Logo,

todas as demais hipóteses estão sujeitas a

reserva de lei complementar: estabelecer

normas gerais sobre obrigações tributárias,

dispor sobre conflitos de competência, em

matéria tributária, entre a União, os estados, o

Distrito federal e os Municípios, bem como

regular as limitações constitucionais ao poder de

tributar.

O Superior Tribunal de Justiça deliberou

sobre tema relevante em seara de competência

tributária que envolvia conflito aparente de normas

entre o Estado e o Município.

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159

Vejamos: Processo Resp 898471 / AC;

RECURSO ESPECIAL 2006/0238570-0 Relator

(a) Ministro JOSÉ DELGADO (1105) Órgão

Julgador T1 - PRIMEIRA TURMA Data do

Julgamento 03/05/2007 Data da Publicação/Fonte

DJ 31.05.2007 p. 396. Ementa:

RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO E

PROCESSUAL. COMPETÊNCIA PARA

EXECUTAR MULTA IMPOSTA A PREFEITO

POR TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO.

ILEGITIMIDADE DO ESTADO DO ACRE.

RECURSO NÃO-PROVIDO. 1. Cuidam os autos

de ação de execução de título extrajudicial movida

pelo Estado do Acre em desfavor de Luiz Pereira

de Lima, ex-prefeito do Município de Plácido

Castro, que em grau de apelação recebeu acórdãos

com a seguinte ementa :

"APELAÇÃO CÍVEL. MULTA APLICADA

PELO TCE A PREFEITO MUNICIPAL.

EXECUÇÃO PROPOSTA PELO ESTADO DO

ACRE. ILEGITIMIDADE. É o Estado do Acre

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160

parte ilegítima para promover execução judicial,

para cobrança de multa imposta pelo Tribunal de

Contas do Estado autoridade municipal, vez que a

titularidade do crédito é do próprio ente público

prejudicado, por seus representantes judiciais."

“EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.

OBSCURIDADE. OMISSÃO.

1. Inexistindo obscuridade e omissão no

Acórdão embargado, nega-se provimento ao

recurso.

2. “Os Embargos de Declaração não se

prestam ao reexame da causa”

Em sede de recurso especial pela letra "a", o

recorrente sustenta violação do artigo 39, § 2º da

Lei 4.320/79, alegando que a".referida norma não

determina, portanto, quais verbas decorrentes da

receita não tributária são destinadas à Fazenda

Pública Estadual quais são destinadas à Fazenda

Pública Municipal, mas tão somente,dentre toda a

receita do ente público, considerado em si mesmo,

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161

qual receita é tributária e qual é não tributária.".

Não sendo o Estado do Acre gestor do orçamento

municipal e não detendo competência para

arrecadar receita municipal, quer seja tributária ou

não-tributária, não pode figurar no pólo ativo da

cobrança de multa aplicada pelo Tribunal de Contas

a Prefeito municipal. 3. Recurso especial não-

provido.

Imaginemos a seguinte situação hipotética:

Um determinado Município cobra IPTU com

alíquotas diferenciadas de acordo com a qualidade

do imóvel. Paga menos quem possui imóvel

comercial.

È, pois, lícita tal prática e aqui não se

confunde competência com o princípio da

isonomia, até porque os imóveis não estão em um

mesmo patamar de igualdade. Se fossem todos

comerciais e houvesse distinção aí sim restaria

ofensa ao princípio da isonomia.

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162

Conclusão.

Em nome do princípio do federalismo o

poder de tributar foi delimitado, poder esse, que

englobou a competência legislativa, fatiando o bolo

(receita) entre as pessoas políticas: União, Estados,

Distrito Federal e Municípios.

Desta feita, para que se viva em um Estado

Democrático de Direito foi preciso que se

classificasse a competência em privativa, comum,

cumulativa, residual, especial e extraordinária; com

vistas a garantir a “isonomia” entre os entes e

maior eficiência no sistema. Ainda há muito por

fazer, mas já é um começo!

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163

Bibliografia:

CARRAZA, Roque Antonio. Curso de

Direito Constitucional Tributário. 14 ed. São Paulo.

Malheiros, 2000.

MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito.

Código Tributário Nacional ( anotado). São Paulo.

Atlas. 2007.

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164