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Música e Músicos no Paraná: sociedade, estéticas e memória. v. 1, Curitiba: Artembap, 2014. 147 “Ó HOMEM, CONHECETE A TI MESMO E CONHECERÁS O UNIVERSO ...” 1 : os Festivais Penalva e as Mostras de Música Paranaense 2 Dra. Elisabeth Seraphim Prosser 3 Universidade Estadual do Paraná/ Escola de Música e Belas Artes do Paraná [email protected] Resumo Os Festivais Penalva e as Mostras de Música Paranaense, ao mesmo tempo que lembram a memória e o legado do sacerdote e músico José de Almeida Penalva, permitem conhecer numerosas obras compostas no Estado. Nos já realizados, foram apresentadas peças de quase cem compositores, com a participação de orquestras, coros, grupos de câmara e solistas. O resultado foi um panorama que abrangeu música popular e erudita, em estilos que vão do tradicional ao contemporâneo e permitem vislumbrar a qualidade e a amplitude da música escrita no Paraná. Palavraschave: Festival Penalva; Mostra de Música Paranaense “MAN KNOW THYSELF; THEN THOU SHALT KNOW THE UNIVERSE1 : the Festivais Penalva and the Mostras de Música Paranaense Abstract The Festivais Penalva and the Mostras de Música Paranaense recalled the memory and legacy of the priest and musician José de Almeida Penalva, as well as allowed the audience to hear numerous works composed in the state of Paraná (South Brazil). Works of almost hundred composers were presented, with the participation of orchestras, choirs, chamber groups and soloists. The result was an overview of popular or classical music, in styles ranging from traditional to contemporary, which gave a glimpse on quality and breadth of music composed in Paraná. Keywords: Festival Penalva; Mostra de Música Paranaense 1 Inscrição no oráculo de Delfos, atribuída aos Sete Sábios (c. 650 a.C.550 a.C.), adotada posteriormente por filósofos como Pitágoras e Sócrates. 2 Este artigo é uma compilação e ampliação de vários textos elaborados pela autora anteriormente (listados ao final) e que agora se mesclam formando uma narrativa mais abrangente. Além deles, são compilados também textos de outros autores que escreveram para os libretos de programação dos cinco Festivais Penalva e das quatro Mostras de Música Paranaenses realizados até o momento (entre 2003 e 2014). 3 Musicista, musicóloga, historiadora social da arte paranaense, professora e pesquisadora da Unespar/Embap, Organizadora do Acervo da Música Paranaense, Líder do Grupo de Pesquisa em Estudos em Musicologia Linha de pesquisa: Música Paranaense; Coordenadora Geral dos Festivais Penalva & Mostras de Música Paranaense; autora e organizadora de várias publicações sobre inúmeros aspectos da arte e da cultura no Paraná.

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Música e Músicos no Paraná: sociedade, estéticas e memória. v. 1, Curitiba: Artembap, 2014.

 

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“Ó  HOMEM,  CONHECE-­‐TE  A  TI  MESMO  E  CONHECERÁS  O  UNIVERSO  ...”1:  os  Festivais  Penalva  e  as  Mostras  de  Música  Paranaense2  

 Dra.  Elisabeth  Seraphim  Prosser3  Universidade  Estadual  do  Paraná/  

Escola  de  Música  e  Belas  Artes  do  Paraná  [email protected]  

 Resumo  Os  Festivais  Penalva  e  as  Mostras  de  Música  Paranaense,  ao  mesmo  tempo  que  lembram  a  memória   e  o   legado  do   sacerdote  e  músico   José  de  Almeida  Penalva,   permitem  conhecer  numerosas   obras   compostas   no   Estado.   Nos   já   realizados,   foram   apresentadas   peças   de  quase   cem   compositores,   com   a   participação   de   orquestras,   coros,   grupos   de   câmara   e  solistas.  O   resultado   foi   um  panorama  que  abrangeu  música  popular  e  erudita,   em  estilos  que  vão  do  tradicional  ao  contemporâneo  e  permitem  vislumbrar  a  qualidade  e  a  amplitude  da  música  escrita  no  Paraná.      Palavras-­‐chave:  Festival  Penalva;  Mostra  de  Música  Paranaense    

“MAN KNOW THYSELF; THEN THOU SHALT KNOW THE UNIVERSE…”1:  the  Festivais  Penalva  and  the  Mostras  de  Música  Paranaense  

 Abstract    The   Festivais   Penalva   and   the   Mostras   de   Música   Paranaense   recalled   the   memory   and  legacy  of  the  priest  and  musician  José  de  Almeida  Penalva,  as  well  as  allowed  the  audience  to  hear  numerous  works   composed   in   the   state  of  Paraná   (South  Brazil).  Works  of   almost  hundred   composers  were  presented,  with   the  participation  of  orchestras,   choirs,   chamber  groups   and   soloists.   The   result   was   an   overview   of   popular   or   classical   music,   in   styles  ranging   from  traditional   to  contemporary,  which  gave  a  glimpse  on  quality  and  breadth  of  music  composed  in  Paraná.    

 Keywords:  Festival  Penalva;  Mostra  de  Música  Paranaense  

 

                                                                                                                         1  Inscrição  no  oráculo  de  Delfos,  atribuída  aos  Sete  Sábios   (c.  650  a.C.-­‐550  a.C.),  adotada  posteriormente  por  filósofos  como  Pitágoras  e  Sócrates.  2  Este  artigo  é  uma  compilação  e  ampliação  de  vários  textos  elaborados  pela  autora  anteriormente  (listados  ao  final)  e  que  agora  se  mesclam  formando  uma  narrativa  mais  abrangente.  Além  deles,  são  compilados  também  textos  de  outros  autores  que  escreveram  para  os   libretos  de  programação  dos   cinco  Festivais  Penalva  e  das  quatro  Mostras  de  Música  Paranaenses  realizados  até  o  momento  (entre  2003  e  2014).  3Musicista,  musicóloga,  historiadora  social  da  arte  paranaense,  professora  e  pesquisadora  da  Unespar/Embap,  Organizadora  do  Acervo  da  Música  Paranaense,  Líder  do  Grupo  de  Pesquisa  em  Estudos  em  Musicologia  -­‐  Linha  de  pesquisa:  Música  Paranaense;  Coordenadora  Geral  dos  Festivais  Penalva  &  Mostras  de  Música  Paranaense;  autora  e  organizadora  de  várias  publicações  sobre  inúmeros  aspectos  da  arte  e  da  cultura  no  Paraná.  

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Música e Músicos no Paraná: sociedade, estéticas e memória. v. 1, Curitiba: Artembap, 2014.

 

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Desde   2002,   amigos,   colegas   e   ex-­‐alunos   do   Pe.   José   de   Almeida   Penalva,   cmf4  

(Campinas/SP,   1924-­‐Curitiba/PR,   2002),   além   de   outros   músicos,   pesquisadores   e  

estudantes,  se  reúnem  em  torno  do  seu  nome,  da  sua  lembrança  e  da  sua  obra  em  eventos  

que,   a  partir   de  2003,   transformaram-­‐se  nos   Festivais   Penalva.   Estes,   do  ano   seguinte  em  

diante,  alargaram-­‐se  para  conter  também  as  Mostras  de  Música  Paranaense5.    

                         Por   meio   deles,   a   comunidade  

musical   de   Curitiba   e   do   Brasil   rende  

uma   homenagem   a   este   mestre   que  

ensinava   pelo   seu   exemplo   e   que,   de  

acordo   com   inúmeros   depoimentos,  

deixou   tanta   saudade.   Além   de  

celebrarem  sua  memória  e  seu  legado,  

estes   eventos   abrem-­‐se   em   uma  

perspectiva   mais   ampla   ao   difundir   a  

música   escrita   no   Estado,   dando   a  

conhecer   antigos   e   novos  

compositores.   São   pesquisadores,  

artistas,   compositores,   professores,  

estudantes,  e  outros   interessados,  que  

se   congregam   para,   juntos,  

compartilharem   esse   universo   tão  

pouco   explorado   –   a   música   local.   A  

cada  edição,  são  cerca  de  sete  dias  de  

intensa      programação,    em    diversos    

   

 Pe.  José  de  Almeida  Penalva.  Curitiba,  dez.  1996.  Foto:  Marcos  Campos  

espaços  de  Curitiba,   com  concertos,  mesas-­‐redondas,  debates,  palestras,  missa   cantada   in  

memoriam  e  exposição  do  acervo  do  compositor.  

 

                                                                                                                         4  cmf,  em  minúsculas,  é  uma  sigla  usada  pelos  sacerdotes  da  ordem  a  que  o  Pe.  Penalva  pertencia  e  quer  dizer  Cor  Maria  Filius  (Filho  do  Coração  de  Maria).  5  Os  Festivais  Penalva  &  Mostras  de  Música  Paranaense  foram  realizados  nos  anos  de  2003,  2004,  2011,  2012  e  2014.  Desde  2012  ocorrem  bienalmente.  

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Música e Músicos no Paraná: sociedade, estéticas e memória. v. 1, Curitiba: Artembap, 2014.

 

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O  MESTRE  

Ao   músico-­‐sacerdote   e   ao   sacerdote-­‐músico,   nossa  homenagem.  Ao  mestre,  nosso  carinho  (PROSSER,  2011).    

Sacerdote,   compositor,   professor,   regente,   musicólogo   e   teólogo,   o   Pe.   Penalva  

residiu  em  Curitiba  por  quase  toda  a  sua  vida  e  teve  como  principais  instituições  de  atuação,  

de  um   lado,  o  Studium  Theologicum  e  a   Igreja   Imaculado  Coração  de  Maria  e,  de  outro,  a  

Escola  de  Música  e  Belas  Artes  do  Paraná  (Embap),  hoje  Campus  I  da  Universidade  Estadual  

do  Paraná  (Unespar).  

Um  dos  mais  importantes  compositores  brasileiros  da  segunda  metade  do  século  XX,  

José   Penalva,   como   assinava   suas   obras,   tornou-­‐se   figura   emblemática   da   composição   no  

Estado   e   do   País.   Autor   de   uma   obra   inovadora   e   expressiva,   escreveu   desde  música   de  

câmara  e  peças  solísticas  até  obras  corais,  orquestrais  e  corais-­‐orquestrais.    

Sua  obra  musical  é  considerada  por  muitos  como  monumental,  não  pela  quantidade  

de  composições  (mais  de  trezentas),  mas  pela  sua  dimensão  expressiva,  pelo  que  representa  

no   contexto   da   história   da  música   contemporânea   e   da  música   de   inspiração   tanto   sacra  

quanto   secular,   e   pela   sua   originalidade   e   qualidade.   Nela   amalgama   tanto   elementos   da  

poesia   e   da   música   nacional   (de   raiz   e   popular),   quanto   as   mais   ousadas   linguagens   da  

Vanguarda   e   da   Pós-­‐Vanguarda.   Sua   música   é   ao   mesmo   tempo   brasileira   e   universal,  

temporal  e  atemporal,  estabelecendo  uma  síntese  entre  estilos  e  valores  do  passado  e  do  

presente.  Ao  mesclar  linguagens  de  várias  épocas  e  lugares  e  estabelecer  pontes  temporais,  

construiu   uma   música   densa   em   camadas   de   significação,   intensidade   expressiva   e,   em  

outros   momentos,   cheia   de   humor   brincalhão   e   inteligente.   Refere-­‐se   ora   ao   “eterno”   e  

“imutável”,  ora  ao  simples  e  humano.  

Nas   suas   obras,   imprimiu   autenticidade,   maestria,   criatividade   e   coerência:   os  

universos  da  fé  e  de  pensamento  nos  quais  fincou  as  raízes  da  sua  existência  transformaram-­‐

se   em  mundos   sonoros   e   estéticos   carregados   de   conteúdos.   Sua   visão   aberta   ao  mesmo  

tempo  para  a  contemporaneidade  e  para  a  história  –  basta  observar  os  pilares  da  sua  obra  –  

se   mantém   sempre   nova,   única   e   reveladora   dos   mais   profundos   questionamentos   da  

existência   humana   e   das   respostas   que   encontrou.   Tudo   isso   fez   dele   um   nome   entre   os  

mais  respeitados  da  história  da  música  brasileira  de  concerto.  

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Música e Músicos no Paraná: sociedade, estéticas e memória. v. 1, Curitiba: Artembap, 2014.

 

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Henriqueta  Garcez  Duarte,  que  participou  com  Pe.  Penalva  da  criação  e  organização  

da  Associação  Pró-­‐Música   de  Curitiba   e   dos   Festivais   Internacionais   de  Música   do   Paraná,  

nos  anos  1960-­‐1970,  comenta:  

 

Tive   a   honra   de   conviver   com   o   Padre   Penalva,   mestre   espiritual,   conselheiro   e  amigo  de  todas  as  horas,  não  só  meu  como  de  toda  a  minha  família.  Quero  aqui,  no  entanto,  lembrar  o  Padre  Penalva,  Músico.  O  convívio  com  ele  era  um  permanente  aprendizado.  Sabia  tudo,  estava  a  par  de  todas  as  tendências  e  correntes  musicais  da  atualidade.  Tinha  seu  estilo  próprio,  marcante;  era  ele  mesmo,  apaixonado  pela  Música,   pela   Teologia,   pelo   seu   sacerdócio,   pela   vida   e   pela   humanidade   que   o  cercava,  a  quem  se  doava  com  generosidade  (DUARTE,  2003).  

 

E   Ingrid  Müller  Seraphim,  ao  falar  do  aspecto  inovador  de  Penalva,  tanto  na  música  

quanto  na  vida  como  sacerdote,  completa:  

 

Sempre  admirei  o  Padre  Penalva  pela  sua  visão  de  quem  estava  muito  adiante  do  seu  tempo.  Sua  música,  com  suas  muitas  facetas,  forma  um  caleidoscópio  colorido:  compõe  usando  vários  elementos  da  tradição  musical  desde  o  canto  gregoriano  e  a  polifonia   renascentista   até   as   linguagens   da   vanguarda.   Assim   como   na   música,  também   como   sacerdote   ele   não   tinha   barreiras:   era   aberto,   generoso,  compreensivo.   Conforme   suas   próprias   palavras,   era   ecumênico   por   natureza,  buscando  em  todos  o  seu  melhor  (SERAPHIM,  2003).  

 

Como  professor,  Penalva  era  criterioso,  sempre  atualizado,  de  pensamento  inovador  

e   crítico,   exigente.  Conhecia  profundamente  os   temas  pelos  quais   transitava  durante   suas  

memoráveis  aulas:  alargava  nossos  horizontes  e  possibilitava  a  compreensão  de  fatos-­‐chave  

da   história   da  música   e   da   performance.   O  mesmo   afirmam   alguns   de   seus   ex-­‐alunos   no  

Studium  Theologicum,  hoje  sacerdotes  de  destaque.  Isso  apontam  também  os  seus  escritos  

tanto  sobre  música  quanto  sobre  teologia,  nos  quais  fazia  profundas  reflexões  muitas  vezes  

questionadoras,  mas  sempre  humanas  e  ousadas.  Dizia:  “não  posso  dar  um  curso,  sem  antes  

estudar  à  exaustão  e  escrever  sobre  o  assunto”  (PENALVA,  1998).  

Como   regente,   buscava   a   perfeição,   seja   na   afinação   seja   na   expressividade   e   na  

sonoridade.  Cantar  sob  sua  direção,  tanto  no  Coro  Pró-­‐Música  quanto  no  Madrigal  Vocale,  

grupos  que  criou  e  aos  quais  se  dedicou  por  várias  décadas,  era  uma  escola,  um  aprendizado  

constante  e  intenso:  exigia  o  máximo  de  refinamento  e  envolvimento.    

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Bruno  Spadoni,  médico  e  músico,  discípulo  de  Penalva  enquanto  regente,  continua  a  

dirigir   o   Madrigal   Vocale   até   a   atualidade.   Durante   décadas   participou   do   grupo   como  

cantor,  regendo-­‐o  ocasionalmente.  Ele  descreve  sua  caminhada  ao  lado  do  mestre:  

 

José  Penalva  foi  um  grande  mestre  da  música  em  Curitiba  e  em  todo  o  Brasil.  Ele  não   somente  ensinou   com  grande  didática,  mas  principalmente  deu  um  exemplo  marcante  de  como  compor,  como  interpretar,  como  estudar,  como  explicar,  como  amar   a  música.   Esse   é   o  método  mais   elevado   de   ensino.   Por   cerca   de   15   anos,  estive  sob  sua  orientação  para  a  regência  coral  e  o  seu  método  foi  ‘aquilo  que  você  preparar,   você   rege’.   Frente   às  minhas   dificuldades   ele   pouquíssimas   vezes   falou  qualquer  palavra,  mas  o  exemplo  de  solução  dos  problemas  que  ele  disponibilizava  era  inestimável.  Até  hoje,  ao  me  deparar  com  problemas,  por  vezes  descubro  que  por  causa  disso  ele  fazia  de  determinada  maneira  e  obtinha  tal  resultado.  Além  de  eficaz,   este  método  de  ensino  é   também  muito  pessoal   e  humano.  A   sua  pessoa  cheia  de  grandeza  está  marcada  para  sempre  em  todos  nós  que  tivemos  a  graça  de  conviver  com  ele  (SPADONI,  2003).  

   Chico   Mello,   por   sua   vez,   hoje   compositor   consagrado   com   carreira   em   Berlim,  

Alemanha,  mostra  o  lado  do  professor  de  composição:  

 

Com  muita  saudade,  daqui  de  longe,  me  lembro  que  o  mundo  da  composição  e  da  música   contemporânea   me   foi   aberto   pelo   Pe.   Penalva.   Isso   aconteceu  gradativamente,   desde   minha   infância,   no   então   pequeno   mundo   da   música  curitibana,  sem  que  eu  o  percebesse  –  tanto  nos  festivais  de  música  nos  anos  60,  onde   as   atividades   de   Penalva  me   eram   sonoramente   instigantes,   como   em   sua  constante   presença   em   casa   de  minha   família.   De   nossas   conversas   nos   almoços  semanais,  quem  sabe  entre  um  doce,  que  ele  tanto  adorava,  e  um  cafezinho,  surgiu  a   ideia  de  eu  estudar  teoria  e  composição  sob  sua  orientação.  Foi  uma  felicidade.  Aos  sábados,  regularmente,  frequentava  eu  seus  aposentos  no  silencioso  convento,  levando   comigo   os   exercícios   da   semana.   Mais   que   simples   exercícios,   eram  pretextos   para   discussões   artísticas,   espirituais,   que  me   apontavam   um   caminho  para  me  aproximar  musicalmente  de  mim  mesmo.  Era  um  encontro  aberto,  sem  os  entraves   e   limites   dos   encontros   institucionais,   marcado   apenas   pelo   desejo   de  aprender   e   pelo   prazer   de   conversar   sobre   música,   de   informar,   de   ensinar.   E  ensinar   de   uma   forma   que   considero   rara:   propiciar   ao   aprendiz   não   só  descobertas,  mas  de   “des-­‐cobrir”  o  que   já   “sabe”,   e  desse   tanto   ir   construindo  a  própria  identidade  (MELLO,  2013).  

 

Inscreveu  marcas  em  toda  uma  geração  de  alunos,  músicos,  pensadores,  sacerdotes  

e  amigos,  este  regente  e  professor  que  não  se  contentava  a  não  ser  com  o  mais  perfeito.  Na  

música,   via-­‐se   o   sacerdote   sincero;   nas   suas   pregações,   reconhecia-­‐se   o  músico-­‐pensador  

ousado   e   original,   sempre   fiel   às   verdades   mais   fundamentais   do   cristianismo.   Como   ele  

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mesmo   dizia:   “Sou   profundamente   agradecido   a   Deus   por   me   permitir   usar   ao   mesmo  

tempo  a  batina  e  a  batuta”  (PENALVA,  1995).  

Assim,   o   rigor   com   que   abordava   qualquer   tema   e   o   estabelecimento   de   altos  

parâmetros   em   tudo   o   que   fazia   tornaram-­‐no   exemplo   para   os   seus   contemporâneos.  

Fizeram  dele,  também,  um  ícone  da  composição  e  da  música  no  Paraná.    

 

 

OS  FESTIVAIS  PENALVA  E  AS  MOSTRAS  DE  MÚSICA  PARANAENSE  

 

 Capa  do  libreto  com  a  programação  dp  IV  Festival  Penalva   e   III   Mostra   de   Música   Paranaense,  realizado  em  Curitiba,  em  2012.  

                         Poucas   semanas   após   o   falecimento  

do   Pe.   Penalva,   em   outubro   de   2002,   um  

pequeno   grupo   de   músicos,   formado   por  

alguns   professores,   ex-­‐professores   e   alunos  

da   Embap 6 ,   uniu-­‐se   para   realizar   um  

concerto   em   homenagem   ao   mestre   e  

amigo,  executando  várias  de  suas  obras.  Foi  

um  concerto  que  deixou  marcas  em  todos  e  

inspirou  o  grupo  a  organizar  no  ano  seguinte  

o   I   Festival   Penalva.   Participaram   desse  

evento  várias  orquestras  e   coros  da   cidade,  

além  de  grupos  de  câmara  e  solistas,  sempre  

graciosamente,   tocando   exclusivamente  

obras    do    compositor.    Foram    vários    os  

depoimentos  de  quem  participou,  afirmando  o  impacto  causado  pela  grandeza  da  produção  

e  a  profundidade  do  pensamento  do  compositor,  que  muitos   intuíamos,  a  partir  das  obras  

dele  que  já  conhecíamos.  Mas  aquela  era  a  primeira  vez  em  que  tantas  peças  de  Penalva  e  

para  tão  diferentes  formações  eram  executadas  em  uma  só  ocasião,  permitindo  vislumbrar  

as  dimensões  do  todo  e  seus  significados.    

                                                                                                                         6  Este  grupo  era  liderado  por  Bernadete  Zagonel,  Elisabeth  Seraphim  Prosser,  Henriqueta  Garcez  Duarte,  Ingrid  Müller  Seraphim  e  Salete  Chiamulera.  

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Música e Músicos no Paraná: sociedade, estéticas e memória. v. 1, Curitiba: Artembap, 2014.

 

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  Em  2004,  observa  Bernadete  Zagonel,  o  Festival  passou  a  assumir  

 

uma   perspectiva  mais   ampla,   envolvendo   os   outros   compositores   paranaenses   e  aqueles  residentes  no  Paraná.  Assim,  o   II  Festival  Penalva  ganhou  um  adendo  em  seu  nome:  I  Mostra  de  Música  Paranaense  (ZAGONEL,  2004).    

 

  A  figura  do  mestre  e  o  que  ela  representa  acabou  tornando-­‐se,  assim,  um  símbolo  da  

composição   no   Paraná.   Foi   surpresa   constatarmos   a   existência   de   tantos   compositores  

antigos  ou  novos,  a  maioria  vinculada  à  Escola  de  Música  e  Belas  Artes  do  Paraná  (Embap),  à  

Universidade   Federal   do   Paraná   (UFPR),   à   Pontifícia   Universidade   Católica   do   Paraná  

(PUCPR)   e   à   Faculdade   de   Artes   do   Paraná   (FAP),   comprovando-­‐se   grande   atividade  

composicional  no  Estado.  Outra  vez,  sua  figura  inspiradora  e  aglutinadora  nos  unia  em  torno  

da  boa  música.  

  Como  esses  eventos  eram  feitos  com  a  participação  voluntária  de  grande  número  de  

pessoas   e   dependia   de   aspectos   institucionais,   não   foi   possível   dar-­‐lhes   continuidade   nos  

anos  seguintes.  Até  que,  em  maio  de  2011,  Pe.  Jaime  Sánchez  Bosch,  amigo  pessoal  do  Pe.  

Penalva,  Diretor  do  Studium  Theologicum  e  guardião  do  acervo  do  compositor,  pensou  em  

fazer   uma   Semana   Penalva   em   outubro   seguinte.   Impossível   não   aderir   à   ideia   e   não  

transformá-­‐la  em  mais  um  evento  da  série.  Estavam  criados,  então,  o  III  Festival  Penalva  e  a  

II  Mostra   de  Música   Paranaense,   que  ocorreram  em  2011,   dirigidos   a   partir   de   então  por  

Elisabeth  Seraphim  Prosser.  O  sucesso  foi  tanto  que  os  Festivais  e  Mostras  seguintes  foram  

uma  consequência  natural,  dado  o  entusiasmo  e  o  envolvimento  cada  vez  maior  de  músicos,  

pesquisadores,   professores,   estudantes   e   outros   interessados,   e   da   presença   do   público  

crescente  a  cada  ano.  

 

 

DA  MINHA  ALDEIA  VEJO  O  MUNDO  

 

O  pensamento  que  norteia  a   realização  dos  Festivais  Penalva  &  Mostras  de  Música  

Paranaense   foi   traduzido   de   maneira   muito   sensível   por   Maria   José   Justino,   Diretora   da  

Escola  de  Música  e  Belas  Artes  do  Paraná/Universidade  Estadual  do  Paraná,  em  seu  texto  de  

apresentação  ao  libreto  de  programação  do  IV  Festival  e  III  Mostra,  em  2012:  

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Da  minha  aldeia  vejo  quanto  da  terra  se  pode  ver  no  Universo  Por  isso  a  minha  aldeia  é  tão  grande  como  outra  terra  qualquer.  

Fernando  Pessoa      

Esse  é  o  princípio  do  Festival  Penalva:  partindo  da  nossa  particularidade,  do  nosso  chão,   celebramos   o   universo.   Sob   a   aura   de   um   artista   que   inspirou  músicos   da  região   e   do   resto   do   país,   o   Festival   Penalva   atinge   sua   quarta   edição   e   firma-­‐se  como   referência   regional,  unindo   jovens   talentos  a  artistas   consolidados  no  meio  musical.  Festeja  a  música  em  todas  as  nacionalidades,  sem  deixar  de  lado  a  de  raiz  paranaense.   É   a   música   atravessando   fronteiras   e   firmando-­‐se   como   linguagem  universal,  como  parte  da  carne  do  universo.  O  Festival  Penalva  é  um  momento  de  encontro  da  diversidade  de  vozes  e  cores  da  música  (JUSTINO,  2012).    

 Na  mesma   linha  do  pensamento  de  Fernando  Pessoa,  Trotski   também  afirmou:  “Se  

queres   ser   universal,   começa   por   pintar   a   tua   aldeia”.   E   a   Profa.   Adalice   Araújo,  

compartilhando   da  mesma   convicção,   ao   trabalhar   durante   décadas   no   seu  Dicionário   da  

Arte  Paranaense  pretendia  que,  com  o  estudo  da  arte  local,  se  escrevesse  uma  nova  história  

da  arte  brasileira,  até  então  ainda  em  grande  parte  focada  nos  maiores  centros  culturais  do  

país,  como  Rio  de  Janeiro  e  São  Paulo.    

Para  os  músicos  e  pesquisadores  participantes  e  para  o  público,  cada  novo  Festival  &  

Mostra   tem   revelado   imensas   surpresas,   permitindo   perceber   não   apenas   a   grande  

dimensão  da  música  escrita  no  Estado,  mas  a  sua  qualidade  e  diversidade.    

 

 

MÚSICA  PANARAENSE?    

 

Desde  o   início   dos   Festivais   Penalva,   eram  muitos   os  músicos   e   pesquisadores   que  

aceitavam   o   convite   para   participar   do   evento.   Uma   homenagem   ao   mestre?   Uma  

oportunidade   de   tocar   e   conhecer   obras   dos   muitos   compositores   locais?   Chance   de  

resgatar  peças  e  compositores  do  passado  e  de  estrear  novas  obras,  do  popular  ao  erudito,  

passando  por  várias  linguagens  e  estilos?  Invariavelmente  havia  uma  atmosfera  de  alegria  e  

encantamento  –  um  conhece-­‐te  a  ti  mesmo  mesclado  com  entusiasmo  e  surpresa.  

Participaram  de  cada  um  mais  de  trezentos  músicos  divididos  em  orquestras,  coros,  

grupos   de   câmera   e   solistas,   em   várias   salas   de   concerto   da   cidade.  As   estreias   de  obras,  

algumas  escritas  especialmente  para  a  ocasião,  revelam  o  papel  não  apenas  de  incentivo  à  

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difusão   e   à   pesquisa   desse   repertório,   mas   de   fomento   à   criação,   desempenhado   pelo  

evento.   Em   cada   nova   edição,   foi   tocada   a   música   de   cerca   de   quarenta   compositores,  

abrangendo  um  século  e  meio  de  música,  e  perpassando  diversos  idiomas  composicionais.  

Por  música  paranaense   ou  de  compositores  paranaenses  entende-­‐se  a  música   feita  

no   Estado.   Trata-­‐se   da   produção   de   artistas   nascidos   ali,   ou   de   originários   de   diferentes  

lugares  e  que  adotaram  o  Paraná  como  residência,  ou,  ainda,  de  outros  que  nele  residiram  

por  algum  tempo,  desempenhando  papel  relevante  para  o  estudo  e  a  performance  musical,  

a  pesquisa  poética  em  música  e  a  criação,  bem  como  para  a  formação  de  novas  gerações  de  

músicos   e   estudiosos.   Outros,   ainda,   compuseram   ali   ocasionalmente,   mas   construíram  

carreiras  como  regentes,  intérpretes,  pesquisadores  ou  organizadores  culturais.    

Dentre  os  compositores  que  tiveram  obras  apresentadas  estão  os  reconhecidos  Alceo  

Bocchino,   José   Penalva,   Henrique   de   Curitiba,   Bento   Mossurunga,   Brasílio   Itiberê,   Jaime  

Zenamon,  Rodolfo  Coelho  de  Souza,  Chico  Mello,  Harry  Crowl  e  Mauricio  Dottori.  Ao   lado  

deles,  destacam-­‐se  os   jovens  Felipe  Ribeiro,  Alexandre  Brusamolim  de  Magalhães,  Rodrigo  

Henrique   de   Oliveira,   Willian   Lentz,   Daniel   Vargas,   Rogério   Krieger,   Márcio   Steuernagel,  

James  Corrêa  e  Fernando  Deddos,  entre  outros,  com  uma  linguagem  composicional  própria,  

expressiva   e   consistente,   e   um   conjunto   de   composições   que   já   figuram   entre   as   mais  

importantes   no   Estado.   Ao   lado   deles   passou-­‐se   a   conhecer   uma   geração   de   novos  

compositores,  alguns  ainda  estudantes,  que,  pelo  que  se  pôde  constatar  a  partir  das  obras  

apresentadas,  prometem  uma  produção  de  peso.  Um  quarto  grupo  é  o  de  compositores  que  

desempenharam   importante   papel   no   seu   tempo,  muitos   injustamente   esquecidos,   como  

Renée  Devraine  Frank,  Benedito  Nicolau  dos  Santos,  Rodrigo  Herrmann  e  outros.    

Os  Festivais  &  Mostras  tomaram  para  si  várias  funções:  o  resgate  da  produção  e  da  

memória   de   artistas   do   passado;   a   difusão   da   música   dos   compositores   de   destaque;   a  

oportunidade   de   performance   e   fruição   da   música   de   novos   compositores;   o   fomento   à  

composição  de  novas  obras;  a  estreia  de  peças   inéditas  de  compositores  do  passado  e  do  

presente,   inclusive   de   estudantes   dos   cursos   de   composição   das   universidades   locais;   o  

fomento  do  diálogo  entre  estilos  e  épocas;  o   incentivo  à  pesquisa,   com  sua  apresentação,  

debate   e   disponibilização;   e   a   possibilidade   de   se   ouvir   este   imenso   repertório,  

desconhecido  da  maioria.    

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A   seguir   é   apresentado   um  Quadro,   que   registra   os   nomes   dos   aproximadamente  

cem   compositores   que   tiveram   suas   obras   executadas   nos   Festivais   &  Mostras   realizados  

entre   2003   e   2014.   Estes   nomes   e   números   seriam   vazios   se   olhados   apenas   como   uma  

estatística   (que   por   si   só   já   é   reveladora).   Mas   adquirem   importância,   à   medida   que   os  

examinados  mais  de  perto  e  pelo  que  apontam.  Por  trás  de  cada  um  está  todo  um  universo  

criativo  e  poético,  uma   tendência.  Demonstram  a   fecundidade  da  atividade  composicional  

no  Estado  e  a   formação  sólida  que  os  compositores  mais   jovens   têm  recebido  nas  últimas  

décadas,  nos  cursos  de  composição  e  regência  da  Embap  e  de  outras  instituições.  

 

Compositores  que  tiveram  obras  apresentadas  nos  Festivais  Penalva  &  Mostras  de  Música    Paranaense  realizados  entre  2003  e  2014.  Acácio  Weber                                                                            Adailton  Pupia  Adriano  G.  Sviech  Alan  Rafael  Medeiros  Alceo  Bocchino                                                                      Alexandre  Brasolim  de  Magalhães  Alexandre  Gonçalves  Alexandre  Torres  Ana  Carolina  de  Lima  Andras  J.  Ellendersen  Audryn  Souza  Benedito  Nicolau  dos  Santos  Bento  Mossurunga  Bernadete  Zagonel  Bernardo  Cardeal  Bernardo  M.  Duarte  Brazílio  Itiberê  Brazílio  Itiberê  II  Carlos  Assis  Carmo  Bartoloni                    Carolina  Cesconetto  Chico  Mello  Cláudio  Menandro  Daniel  Migliavacca  Daniel  Miranda  Daniel  Vargas  Douglas  G.  Bertoncello  Eduardo  Cáceres  Eduardo  Frigatti  Elizabeth  Fadel  Emanuel  Martinez  Enzo  Fonseca  Veiga  

Ezidemar  Siemiatkouski  Fabio  Gottschild  Fabrício  Mattos  Felipe  de  Almeida  Ribeiro                                                                          Fernando  Deddos  Fernando  Garcia    Fernando  Nicknich  Fernando  Riederer  Gabriel  Jungles  Gilberto  Stefan  Guilherme  Campos  Gisele  Regina  Malon  Gustavo  Alencar  Harry  Crowl  Hélcio  Müller  Helio  Brandão                                                                      Helma  Haller  Henrique  Bérgamo  Henrique  de  Curitiba  Herculano  Sávitri  Inami  Custódio  Pinto  Jaime  Zenamon  James  Corrêa  João  Egashira  João  Guilherme  Dick  João  José  de  Félix  Pereira  João  Ramalho  Joaquim  Rebollo  José  Penalva  Juliana  Gomes  Julião  Boêmio  Klérison  Kiel  Kotacho                                              

Leonardo  Gorosito  Letícia  Lass  Lucas  Araujo  Melo  Luis  Henrique  Sierakowski  Luiz  Cláudio  Ribas  Ferreira  Luiz  Eulógio  Zilli  Maiko  Thomé  Araujo    Marcelo  Oliveira  Márcio  Steuernagel  Maria  Paz  Villahoz  Marilia  Giller  Maurício  Dottori    Norton  Dudeque  Octávio  de  Camargo  Osmário  Estevam  Jr.  Osvaldo  Ferraz  Renée  Devraine  Frank  Ricardo  Petracca  Rodolfo  Coelho  de  Souza  Rodolfo  Richter  Rodrigo  Henrique  de  Oliveira  Rodrigo  Herrmann                                                        Rogério  Krieger  Sérgio  Albach  Sólon  de  Albuquerque  Mendes  Tadeu  Taffarelo                                                                  Thiago  Portela    Victor  Lazzarini                                                                    Vinícius  Giusti  William  Hegenberg  Willian  Lentz                                                                                      Wilson  Moreira  

Fonte:  Elaborado  pela  autora  a  partir  da  programação  completa  dos  I  a  V  Festivais  Penalva  &  I  e  IV  Mostras  de  Música  Paranaense,  realizados  em  2003,  2004,  2011,  2012  e  2014.      

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Assim,   com   estilos   que   vão   do   Nacionalismo   à   Vanguarda   e   à   Pós-­‐Vanguarda,   da  

música  de  raiz  à  música  popular  e  à  erudita,  da  modalidade  e  da  tonalidade  à  música  atonal,  

concreta  e  eletrônica,  com  o  uso  de  instrumentos  tradicionais  e  instrumentos  acusmáticos  e  

suas  combinações,  os  Festivais  &  Mostras  revelam  concepções  diversas  e  até  contrastantes,  

permitindo   vislumbrar   o   que   se   compôs   no   passado   e   no   presente.   Possibilitam,   ainda,  

distinguir  algumas  das  tendências  estilísticas  que  certamente  se  farão  ouvir  nos  próximos  anos.  

 

 

O  PRÊMIO  PENALVA    

 

A   partir   de   2004,   foi   criado   no   âmbito   do   Festival   &   Mostra,   o   Prêmio   Penalva,  

outorgado  a  músicos  paranaenses  de  reconhecida  contribuição  para  a  cultura  brasileira.  Em  

2004,   foi   premiado   o   compositor   e   maestro   Alceo   Bocchino   (2004),   pela   sua   obra   como  

compositor   e   por   sua   atuação   como   maestro   fundador   e   depois   emérito   da   Orquestra  

Sinfônica   de   Curitiba.   Em   2011   receberam   o   prêmio   a   pianista,   cravista   e   organizadora  

cultural   Ingrid   Müller   Seraphim   (2011)   e   a   pianista   e   organizadora   cultural   Henriqueta  

Garcez  Duarte,  que,  por  sua  atuação  incansável  como  concertistas,  docentes  e  na  criação  e  

organização   dos   Cursos   Internacionais   de   Música   do   Paraná,   das   Oficinas   de   Música   de  

Curitiba,   da   Camerata   Antiqua   e   outros,   contribuíram   para   a   formação   de   incontáveis  

músicos  e  grupos,  consolidando  Curitiba  como  celeiro  de  grandes  intérpretes.  Em  2012,  foi  o  

pesquisador  e  folclorista  Inami  Custódio  Pinto  quem  recebeu  o  prêmio,  por  sua  atuação  na  

preservação  e  na  divulgação  do  fandango  caiçara,  dança  e  música  do   litoral  do  Estado.  Em  

2014,   foi   homenageada   a   Família   Brandão,   que,   assim   como   os   demais   premiados,   é  

protagonista  da  história  da  música  em  Curitiba  e  no  Brasil  dos  anos  1940  à  atualidade,  com  

sua  música  de  altíssimo  nível.    

  Transcrevemos   a   seguir   os   textos   dedicados   aos   homenageados,   publicados   nos  

libretos  de  programação  dos  Festivais  &  Mostras  realizados:  

 

PRÊMIO  PENALVA  2004  Nosso  homenageado,  o  maestro  e  compositor  Alceu  Bocchino  

Nasceu   em   Curitiba   em   1918,   onde   estudou   música   inicialmente   com   Antônio  Melilo  e   João  Poeck  e   foi  professor  da  Escola  de  Música  e  Belas  Artes  do  Paraná.  

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Revelou-­‐se  logo  um  grande  pianista,  acompanhador,  arranjador  e  compositor.  Aos  26   anos,   transferiu-­‐se   para   São   Paulo,   onde   estudou   composição   com   Camargo  Guarnieri  e  Dinoráh  de  Carvalho,  foi  professor  do  Conservatório  de  Santos  e  atuou  em  várias  emissoras  de  rádio  e   televisão.  Em  1946,   instalou-­‐se  no  Rio  de   Janeiro,  onde   desempenhou   intensa   atividade   como   regente,   diretor   musical,   redator   e  assessor  musical  de  várias  emissoras  de  rádio  e  de  televisão.  Desde  1979  é  maestro  titular  e  emérito  da  Orquestra  Sinfônica  do  Paraná,  dividindo  seu  tempo  entre  o  Rio  de  Janeiro  e  Curitiba.  Sua  produção  musical,  apresentada,  gravada  e  publicada  nas  Américas,  na  Europa  e  na  Ásia  Menor,  inclui  música  solística,  camerística,  orquestral  e  grande  número  de  canções   para   voz   e   piano.   Compõe   dentro   de   “uma   nova   tonalidade”,   aliando   a  tonalidade   e   o   modo   a   um   tratamento   ora   mais,   ora   menos   livre.   Nacionalista  convicto,   utiliza   freqüentemente   constâncias   rítmicas,   melódicas,   harmônicas   e  modais   da   música   folclórica   brasileira,   especialmente   paranaense   e   gaúcha,  combinadas  a  procedimentos  do  neo-­‐classicismo  centro-­‐europeu.  Divide   sua   própria   trajetória   em   três   períodos:   o   primeiro,   anterior   a   1944,   que  chama  de  período  juvenil;  o  segundo,  muito  influenciado  por  Camargo  Guarnieri  e  Francisco   Mignone,   com   linguagem   complexa   e   uso   freqüente   da   polifonia;   e   o  terceiro,  iniciado  em  fins  de  1951,  fortemente  marcado  por  Villa-­‐Lobos,  seu  amigo  pessoal,   com   tendência   à   simplicidade,   à   expressividade   e   à   brasilidade,  combinadas  a  linguagens  da  música  universal,  inclusive  com  o  dodecafonismo.  E  afirma:  “Sou,  antes  de  tudo,  um  compositor  nacionalista.  O  Brasil  e  o  Paraná  têm  muitas  manifestações  musicais   que   não   foram   ainda   estudadas,   registradas.   Este  material,  que  constitui  as  nossas  próprias  raízes,  a  riqueza  e  a  diversidade  da  nossa  própria   identidade,  é  muito  precioso  e  sobre  ele  se  pode  e  se  deve  trabalhar.  Por  isso  sou  nacionalista:  penso  que  dentro  da  nossa  própria  cultura  existe  uma  riqueza  inigualável,  pronta  para  ser  explorada”  (PROSSER,  2014).  

   

PRÊMIO  PENALVA  2011  Nossas  homenageadas,  Ingrid  Müller  Seraphim  e  Henriqueta  Garcez  Duarte  

Ingrid   Müller   Seraphim   e   Henriqueta   Garcez   Duarte,   ao   lado   de   José   Penalva,  Henrique  de  Curitiba  e  Neyde  Thomaz,  mudaram  os  rumos  da  história  da  música  e  da  cultura  em  Curitiba  e  no  Paraná.  Nossas   homenageadas   foram,   ambas,   professoras   da   Escola   de   Música   e   Belas  Artes   do   Paraná,   são   pianistas   e   pedagogas   ainda   atuantes   e   organizadoras  culturais   de   peso.   Empreenderam,   criaram   caminhos   e   forjaram   realidades   que  tiveram   como   fruto   um   sem  número   de  músicos   e   grupos   de   carreira   nacional   e  internacional.   Os   muitos   eventos   que   organizaram,   muitas   vezes   juntas   ou  apoiando   o   trabalho   uma   da   outra,   colocaram   Curitiba   entre   as   cidades   mais  importantes   no   cenário   musical   do   país.   Estes   tiveram,   igualmente,   um   alcance  muito  além  das  nossas  fronteiras.  Henriqueta  dedicou-­‐se  especialmente  à  Pró-­‐Música  de  Curitiba  –  criada  em  1963  –,  uma  sociedade  que  promovia  concertos,  em  uma  época  em  que  estes  eram  raros,  e  aos   Festivais   Internacionais   de   Música   -­‐   1965-­‐1977.   Ingrid   criou   e   consolidou   a  Camerata  Antiqua  e  a  Orquestra  de  Câmara  da  Cidade  de  Curitiba  –  1974-­‐2000  –,  bem   como   as   Oficinas   de   Música   –   1983-­‐2001,   que   constituem   ainda   hoje   os  projetos  mais  importantes  da  Fundação  Cultural  de  Curitiba  no  âmbito  da  música  e  que   continuam   encantando   e   formando   as   novas   gerações   de   músicos   e   de  apreciadores  da  arte.  Ambas  participaram,  também,  da  criação  e  da  organização  do  primeiro  concerto  em  honra  ao  Pe.  Penalva,  realizado  em  2002,  e  dos  I  e  II  Festivais  Penalva.   Como   musicistas,   ao   cravo,   ao   piano   ou   ao   órgão,   continuam  enriquecendo  a  vida  cultural  da  cidade.  

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Seus   ideais   e   o   seu   trabalho   tiveram   resultados   que   se   revelam   em   centenas   e  milhares  de  pessoas  que  participaram  desses  eventos  e  grupos,  e  que  tiveram  a  sua  vida  profissional  e  pessoal  impactadas  por  suas  atividades.  A  estas  duas  guerreiras  generosas,  multiplicadoras,   de   ampla   visão,   a   nossa   admiração   e   gratidão   (FEIJÓ,  2011).      

PRÊMIO  PENALVA  2012  Inami  Custódio  Pinto,  Prêmio  Penalva  2012  

A  Cultura  Popular  é  a  manifestação  espontânea  dos  povos  e  tem  sido  objeto  de  estudo,   já   desde   o   século   XX,   pela   academia   –   inicialmente   por   interessados   e  posteriormente   por   pesquisadores   que   observaram   nela   valores,   sentidos,  significados,   práticas,   calendários   relevantes   não   só   para   os   diferentes   grupos  que   nela   estavam   representados   como   também  para   as   análises   que   a   cultura  requer.   Um   desses   pesquisadores   foi   o   professor   Inami   Custódio   Pinto.  Curitibano,  desde   jovem   interessou-­‐se  pelas  expressões  artísticas  e  culturais  do  Paraná  e  dedicou-­‐lhes  sua  trajetória  docente  e  artística.  Foi  professor  de  várias  gerações  de  paranaenses,  brasileiros  de  outras  latitudes  e  estrangeiros   que   por   aqui   passaram,   em   instituições   como   a   Faculdade   de  Educação  Musical   do   Paraná,   o   Instituto   de   Pesquisa   do   Paraná   e   o   Grupo   de  Dança   Folclórica   Paranaense.   Dirigiu   o   Gabinete   de   Etnografia   do   Museu  Paranaense  e  a  Divisão  de  Folclore  e  Pesquisas  Históricas  do  Museu  da  Imagem  e  Som   do   Paraná.   Foi   apresentador   da   TV   Educativa   do   Paraná   e   produtor  fonográfico   das   gravadoras   Continental,   Copacabana   e   Chantecler.   Como  compositor,  tem  mais  de  uma  centena  de  obras  publicadas  e  gravadas.    O  professor   Inami  está  entre  o  grupo  de  brasileiros  que  entendeu  ser  o  estudo  das   manifestações   populares   do   país   fundamental   para   definir   questões  identitárias   brasileiras.  Nesse   grupo   estão  Mário   de  Andrade   e   Luíz   da   Câmara  Cascudo.   Ele   direcionou   sua   pesquisa   ao   Estado   do   Paraná,   onde   diversas  manifestações   estavam   presentes.   Este   território   com   características  diferenciadas,   uma   região   do   povo   guarani,   onde   também   se   estabeleceram  quilombos,   aliados   aos   processos   colonizadores   portugueses   e   espanhois,   além  de   alemães,   poloneses,   japoneses,   ucranianos   e   de   outras   etnias,   constitui   aos  olhos  de  um  pesquisador  atento  um  desafio  enorme.    Suas   obras   maiores   atestam   a   amplitude   e   a   importância   da   sua   produção.  Publicou,  entre  outras,  Folclore  no  Paraná,  Folclore,  Folpar   –  Curso  de  Folclore,  Curso   de   Introdução   aos   Estudos   de   Folclore,   Fandango   do   Paraná   e   Folclore:  Aspectos   Gerais.   Participou,   ainda,   como   co-­‐autor   em   Tocadores,   Fandango   de  Mutirão  e  A  [Des]Construção  da  Música  Paranaense.  Suas  obras  e  entrevistas  são  referência   em   publicações   nacionais   e   internacionais.   Recebeu   várias  homenagens  pelo  conjunto  da  sua  produção.  Sua   sensibilidade   sutil,   seu   senso   agudo   como   etnógrafo   e   seu   olhar   crítico  como  cientista  fizeram  de  Inami  Custódio  Pinto  um  paranaense  ilustre  próximo  do  seu  povo  (PITRE,  2014).  

   

PRÊMIO  PENALVA  2014    Os  Brandão:  família  que  transforma  vida  em  música  

Desde   bem   cedo   de   manhã   até   altas   horas   da   noite,   a   residência   da   família  Brandão,  em  Curitiba,  mergulha  em  um  universo  sonoro  e  poético  que  mais  parece  uma  escola  de  música  europeia.  A  casa,  em  meio  às  altas  árvores,  respira  música:  não  bastassem  os  muitos  pássaros  que  habitam  o  imenso  jardim,  ouvem-­‐se  de  cada  janela   e   ao  mesmo   tempo   diferentes   instrumentos   e   obras   sendo   estudados,   ou  grupos  de  câmara  ensaiando.    

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Música e Músicos no Paraná: sociedade, estéticas e memória. v. 1, Curitiba: Artembap, 2014.

 

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Tudo  começou  quando  o  ainda  estudante  de  medicina  e  violinista,  Hélio  Brandão,  em   1946,   foi   um   dos   responsáveis   pela   criação   da   Orquestra   Estudantil   de  Concertos,   regida   por   Bento  Mossurunga.   A   orquestra,   inicialmente,   ensaiava   na  casa   dos   pais   de   Hélio,   em   alegres   e   divertidos   encontros   aos   domingos.   Em  dezembro   daquele   ano,   passou   a   participar   do   grupo   a   pianista   Ophelia   Ribas  Moreira,  que   logo   se   tornou  amiga  dos   seus   integrantes  e  assídua   frequentadora  dos  seus  concertos,  e  com  quem,  mais  tarde,  Hélio  se  casou.  Cada   um   dos   sete   filhos   do   casal   estudou   um   instrumento,   formando,   nos   anos  1960  e  70,  uma  orquestra  de  câmara,  cujos  ensaios  ocorriam  às  5  horas  da  manhã  (!),   por   ser   o   único   horário   em   que   todos   estavam   em   casa.   Ainda   nos   anos   60,  formavam   também   um   coro   infanto-­‐juvenil   de   sonoridade   ímpar,   regido   pela  maestrina   Hildegard   Soboll   Martins.   Seguiram-­‐se   anos   de   estudos   de   alguns   na  Europa  e  de  mudança  de  outros  para  diferentes  cidades  e  países.  Quase  todos  acabaram  se  tornando  músicos  profissionais  e  solistas  admirados  nos  instrumentos  que  escolheram,  como  Maria  Alice  (violoncelo),  Maria  Ester  (violino),  Eunice   (viola   da   gamba),   Zelinha   (flauta   transversal)   e   Helinho   (contrabaixo   e  composição);   pesquisadores,   como   Maria   Luiza   (violino);   ou   por   hobby,   como   o  engenheiro   Renato   (piano).   Músicos   do   mais   alto   nível,   atuam   intensamente   no  cenário   nacional   e   internacional,   com   gravações   ao   lado   de   nomes   como   Jordy  Savall,   Montserrat   Filgueiras,   Olga   Kiun,   Roberto   de   Regina,   Ingrid   Seraphim   e  muitos  outros.    O   Prêmio   Penalva   de   2014   leva   o   nome   da   Família   Brandão   –   essa   família  acolhedora,   que   transforma   vida   em  música   e   que   contribui   tão   generosamente  para  a  cultura  da  cidade  e  do  país.  Essa  família  que,  em  muitos  momentos,  mudou  o  rumo  da  história  da  música  da  sua  aldeia  (como  dizia  Tolstoi)  e,  por  conseguinte,  do  mundo.  Em  nome  de  toda  a  comunidade  musical,  o  Festival/Mostra  agradece  o  privilégio  de  poder  ouvir  sua  arte  nas  nossas  salas  de  concerto  e  nas  suas  gravações  e  de  tê-­‐la  na  nossa  cidade  (PROSSER,  2014).  

      Pe.  Penalva  participou  da  vida  de  todos  estes  homenageados,  às  vezes  como  colega  

ou  colaborador,  outras  como  pesquisador,  regente  ou  professor,  mas  sempre  como  amigo.  

Por   isso,   nada   mais   justo   que   ter   esses   personagens   maiores   da   cena   musical   curitibana  

premiados  no  evento  que  leva  o  seu  nome.    

 

 

OUTROS  DESDOBRAMENTOS  

 

Os  Festivais  Penalva  &  Mostras  de  Música  Paranaense,  inspiraram  a  criação,  a  partir  

de   2012,   do   Acervo   da   Música   Paranaense   (Unespar/Embap),   vinculado   à   Biblioteca   da  

Embap,   e   do   Grupo   de   Pesquisa   em   Estudos   em   Musicologia/Linha   de   pesquisa:   Música  

Paranaense  (CNPq/Unespar/Embap).    

Os  três  formam,  assim,  um  tripé:    

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Música e Músicos no Paraná: sociedade, estéticas e memória. v. 1, Curitiba: Artembap, 2014.

 

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• Os  Festivais  &  Mostras  oferecem  aos  compositores,  intérpretes,  estudiosos  e  

ao   público,   a   performance   da   música,   sua   fruição,   sua   difusão   como  

fenômeno  sonoro,  acessível  à  academia  e  aos  ouvintes  de  modo  geral;  

• O  Acervo   pretende   a   guarda   e   a   disponibilização   das   obras   e   das   pesquisas  

realizadas,  com  vistas  à  coleta  de  todo  tipo  de  documento  relativo  à  música  

no   Estado   com   a   preservação   do   material   existente,   possibilitando   sua  

execução,  divulgação  e  pesquisa  em  arte  e  em  áreas  afins  (sociologia,  história,  

antropologia,  políticas  etc.);  e  

• o   Grupo   de   Pesquisa   Estudos   em   Musicologia,   com   sua   linha   de   pesquisa  

Música   Paranaense   (CNPq/Unespar/Embap),   contribui   para   a   construção   de  

um   corpo   teórico,   historiográfico   e   analítico   sobre   os   fazeres   musicais   no  

Estado   nos   seus   muitos   aspectos.   Um   dos   produtos   do   grupo   é   a   série   de  

livros  Música   e   Músicos   no   Paraná:   sociedade,   estéticas   e   memórias,   que  

disponibiliza  estudos  de  pesquisadores  sobre  este  tema.  

Os   Festivais   &   Mostras,   o   Acervo   e   o   Grupo   de   Pesquisa   se   retroalimentam,  

permitindo  que  se  preserve  a  memória  da  música,  dos  músicos  e  das  instituições  envolvidas,  

que   se   vislumbre   a   amplitude  dessa  música   e  que   se   elabore,   paulatinamente,   o   perfil   da  

atividade  composicional  no  Estado.  

 

 

UM  CAMPO  PROFÍCUO  DE  FRUIÇÃO,  DISCUSSÃO  E  CRIAÇÃO  

 

O   Pe.   Jaime   Sánchez   Bosch,   Diretor   do   Studium   Theologicum,   amigo   pessoal   de  

Penalva  e  atual  guardião  do  seu  acervo,  ao  comentar  sobre  o  IV  Festival,  escreveu:  

 O  Festival  Penalva  alcança  já  a  quarta  edição  e  marca  mais  uma  vez  o  ritmo  da  vida  cultural  de   Curitiba   e   do   Paraná,   fruto   de   um   sentimento   compartilhado   de   gratidão,   amizade   e  admiração   pelo   mestre.   Parece   que   o   espírito   generoso,   alegre   e   dedicado   de   Penalva  continua  a  pairar  no  nosso  meio,  suscitando  sempre  novas  manifestações  de  amor  à  música  e  do  gosto  de   “fazer   juntos”.  O   Festival   tem  muitos  protagonistas,   todos  entusiastas,   e   se  torna  realidade  graças  a  um  esforço  discreto  e  persistente  de  pessoas  dispostas  a  dar  tudo  para   que   todos   possamos   ter   momentos   de   íntima   fruição   e   lembrança   de   alguém   que  continua   presente   em   todos   nós.   A   todos   o   nosso  mais   profundo   agradecimento   (BOSCH,  2012)    

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Música e Músicos no Paraná: sociedade, estéticas e memória. v. 1, Curitiba: Artembap, 2014.

 

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Apesar   do   grande   número   de   compositores   participantes   do   evento,   outros   ainda  

estão  por   ter   suas  obras  apresentadas.   Espera-­‐se   contar   com  essa  produção  nas  próximas  

edições,  tornando  o  conjunto  dos  Festivais  &  Mostras  um  tempo  e  lugar  não  apenas  de  um  

progressivo  “conhece-­‐te  a  ti  mesmo”,  no  que  tange  à  história  da  música  feita  no  Paraná,  mas  

uma  possibilidade  de  mapeamento  dessa  música  e  ao  mesmo  tempo  um  campo  profícuo  de  

discussão  e  criação.    

 

REFERÊNCIAS  

DUARTE,   Henriqueta   Garcez.   Depoimento.   In:   PROSSER,   E.   S.   (org.).   I   Festival   Penalva.  Curitiba:  ArtEmbap,  2003.  Libreto  de  Programação.  

FEIJÓ,   Anna  Maria   Lacombe.  Nossas   homenageadas,   Ingrid  Müller   Seraphim   e  Henriqueta  Garcez   Duarte.   (Prêmio   Penalva   2011).   In:   PROSSER,   E.   S.   (org.)   III   Festival   Penalva   &   II  Mostra  de  Música  Paranaense.  Curitiba:  ArtEmbap,  2011.  Libreto  de  Programação.  

JUSTINO,  Maria   José.   Texto  de  Abertura.   In:   PROSSER,   E.   S.   (org.).   IV   Festival   Penalva   e   III  Mostra  de  Música  Paranaense.  Curitiba:  ArtEmbap,  2012.  Libreto  de  Programação.  

MELLO,  Chico.  Depoimento.  In:  PROSSER,  E.  S.  (org.).  I  Festival  Penalva.  Curitiba:  ArtEmbap,  2003.  Libreto  de  Programação.  

PENALVA,  José  de  Almeida.  Depoimentos  a  Elisabeth  Seraphim  Prosser.  Curitiba,  1995  e  1998.  

PITRE  VASQUEZ,  Edwin.  Inami  Custódio  Pinto,  Prêmio  Penalva  2012.  (Prêmio  Penalva  2012).  In:   PROSSER,   E.   S.   (org.)   IV   Festival   Penalva   &   III  Mostra   de  Música   Paranaense.   Curitiba:  ArtEmbap,  2012.  Libreto  de  Programação.  

PROSSER,  Elisabeth  Seraphim.  Apresentação.  In:  PROSSER,  E.  S.  (org.).  III  Festival  Penalva  e  II  Mostra  de  Música  Paranaense.  Curitiba:  ArtEmbap,  2011.  Libreto  de  Programação.  

_____.   Nosso   homenageado,   o   maestro   e   compositor   Alceu   Bocchino.   (Prêmio   Penalva  2004).  In:  PROSSER,  E.  S.  (org.)  II  Festival  Penalva  &  I  Mostra  de  Música  Paranaense.  Curitiba:  ArtEmbap,  2004.  Libreto  de  Programação.  

_____.  Os  Brandão:  família  que  transforma  vida  em  música.  (Prêmio  Penalva  2014).  In:  PROSSER,  E.  S.  (org.).  V  Festival  Penalva  &  IV  Mostra  de  Música  Paranaense.  Curitiba:  ArtEmbap,  2014.  Libreto  de  Programação.  

SERAPHIM,  Ingrid  Müller.  Depoimento.  In:  PROSSER,  E.  S.  (org.).  I  Festival  Penalva.  Curitiba:  ArtEmbap,  2003.  Libreto  de  Programação.  

SPADONI,   Bruno.   Depoimento.   In:   PROSSER,   E.   S.   (org.).   I   Festival   Penalva.   Curitiba:  ArtEmbap,  2003.  Libreto  de  Programação.  

ZAGONEL,  Bernadete.  Texto  de  apresentação.  In:  PROSSER,  E.  S.  (org.)  II  Festival  Penalva  &  I  Mostra  de  Música  Paranaense.  Curitiba:  ArtEmbap,  2004.  Libreto  de  Programação.