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!!!"#$%&'()&*+### A década de 1980 marcou indelevelmente a Astronomia contemporânea. As duas sondas americanas Voyager 1 e 2, programadas para observar a região dos planetas jovianos, nos deixaram um legado valiosíssimo, carregado de informações preciosas, algumas extremamente surpreendentes, como a atividade vulcânica em Io. Durante dezembro de 1995 e setembro de 2003, a missão Galileo vasculhou Júpiter e seus satélites deixando-nos um legado inestimável de informações científicas. Desde julho de 2004, a sonda Cassini está observando Saturno e seus satélites, e as descobertas são impressionantes. Tivemos a primeira observação in loco da superfície de Titan pela sonda Huygens, liberada pela sonda Cassini durante uma de suas aproximações ao satélite. Graças a essas observações pudemos compreender melhor os planetas jovianos e conhecer detalhes reveladores de seus satélites. A última missão da Voyager 1 nos deixou uma das imagens mais fantásticas produzidas pelo ser humano: a Terra vista dos confins do Sistema Solar. A composição química dos satélites assemelha-se a dos planetas telúricos, formados de material rochoso, e a dos cometas, formados em boa parte de gases congelados. Os tamanhos variam muito: Dáctilo1, satélite do asteróide Ida, é um bloco rochoso com apenas 1,5 km; Ganimedes, o maior satélite do Sistema Solar, tem 2.631 km de raio, portanto maior que Mercúrio. Pela diversidade das características que apresentam, os satélites e os corpos menores tornam-se elementos fundamentais no estudo da origem do Sistema Solar. 5.6 Satélites dos planetas telúricos. Dentre os planetas telúricos, apenas Terra e Marte têm satélites naturais. 5.6.1 Lua A Lua é o satélite do SS melhor conhecido. A Tabela 5.2 apresenta suas propriedades mais importantes.

Aristarco de Samos (270 a.C), pioneiro na proposta do sistema heliocêntrico, estudou o movimento da Terra e da Lua e publicou seus resultados no pequeno tratado Sobre as dimensões e as distâncias do Sol e da Lua. Baseando-se em observações de eclipses, ele determinou o tamanho da Lua como sendo 4 vezes menor que o da Terra. Pelo fato de os eclipses serem curtos, Aristarco concluiu que os tamanhos aparentes da Lua e do Sol eram praticamente iguais. Objetos de mesmo tamanho angular têm diâmetros proporcionais às suas distâncias logo, concluiu, o Sol está bem mais longe que a Lua. Os valores para tamanho e distância da Lua têm boa precisão (levando-se em conta que as observações eram visuais), mas para o Sol os valores calculados são 10 vezes menores que os reais. Atmosfera

Como vimos, a Lua não tem atmosfera. Isto já era de conhecimento dos astrônomos quando as sondas lunares começaram a pesquisar a Lua em loco. A evidência observacional é a queda brusca do brilho das estrelas exatamente no instante em que elas cruzam o limbo lunar durante uma ocultação. Se houvesse atmosfera essa queda seria gradativa. A evidência teórica é que a velocidade de escape na Lua é muito pequena e a variação de temperatura durante um 1 A atração gravitacional entre corpos de massas relativamete pequenas faz com que um sistema do tipo Ida-Dáctilo não seja estável em escala de tempo de bilhões de anos. Há outros exemplos, inclusive um sistema triplo.

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dia lunar é enorme (veja a Tabela 5.2). Se existiu uma atmosfera lunar no passado, ela se dissipou rapidamente. Como a Lua está desprovida de atmosfera, o calor proveniente do aquecimento do solo pela luz solar se dissipa com rapidez, provocando variações rápidas e extremas de temperatura. Outra decorrência é a inexistência de crepúsculos: a transição entre dia e noite ocorre instantaneamente. Propriedades Valores Orbitais Distância média da Terra 384.401 km (60,4 raios da Terra) Maior aproximação (perigeu) 363.297 km Maior afastamento (apogeu) 405.505 km Período orbital (mês sideral) 27d 12h 43m 12s Mês sinódico (mês da lunação) 29d 12h 44m 03s Inclinação orbital (relativa à eclítica) 5o 8’ 43” Físicas Diâmetro 3.476 km (0,273 diâmetro da Terra) Massa 3,75 1025 g (0,0123 massa da Terra) Densidade média 3,34 g/cc Gravidade na superfície 0,165 gravidade da Terra Velocidade de escape 2,5 km/s (0,223 veloc. escape da Terra) Período de rotação 29d 12h 44m 03s Inclinação do eixo de rotação (relativa à órbita) 6o 41’ Albedo 0,07 Temperatura de superfície 125 K (noite) a 375 K (dia)

Tabela 5.2 Principais propriedades orbitais e físicas da Lua. Superfície A superfície lunar é bem antiga, e isto pode ser constatado pela permanência das figuras de superfície, sobretudo as crateras de impacto. Mesmo daqui da Terra, podemos diferenciar dois tipos básicos de terrenos lunares: os claros e brilhantes e os escuros. Ao observar a Lua com seu telescópio, Galileu denominou as regiões planas e escuras de mares, por imaginar que se tratassem de regiões cobertas por água. De maneira genérica podemos dividir a superfície lunar em dois tipos de terrenos: (a) os mares são regiões planas, de baixo albedo (portanto constituídas de material escuro, fortemente absorsor da luz incidente) e de nível mais baixo; (b) os continentes são as terras altas, acidentadas, de alto albedo (portanto brilhantes porque refletem a luz incidente) e fortemente marcadas por crateras de impacto. (Figura 5.35). Toda a superfície lunar é recoberta por uma camada relativamente espessa de poeira, provavelmente originada da pulverização das rochas da superfície, provocada por intenso e prolongado bombardeamento de corpos cadentes. Crateras A maioria das crateras lunares tem origem colisional. Como vimos, as crateras de impacto têm perfis característicos, com as paredes menos inclinadas e mais baixas que as paredes das crateras de origem vulcânica. Além disto, elas podem apresentar um pico central figura típica de colisão. Outra característica marcante das crateras de impacto, sobretudo as de grandes dimensões, são os raios: figuras retilíneas brilhantes que emanam dos bordos na direção radial, e se estendem a grandes distâncias. Eles são formados de material ejetado

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Figura 5.35 As faces lunares: a visível (à esquerda), sempre voltada para a Terra, e a oposta. Note a presença dos mares apenas na face visível. A outra face é mais fortemente marcada por crateras, algumas das quais não preenchidas por lavas. (R.R.Robbins et al. Fig. 8-27, p. 163). durante a colisão, alguns sugerindo a formação de crateras secundárias provocadas pela colisão de blocos rochosos arrancados da superfície durante a colisão. O exemplo mais ilustrativo é a cratera Copérnico (Figura 5.35).

A Lua nos mostra sempre a mesma face porque os períodos de rotação e translação são iguais. Este fenômeno, conhecido por rotação síncrona, é decorrente do efeito de maré. A longo prazo, todos os satélites tendem à rotação síncrona.As fases ocorrem em ambos os hemisférios: na Lua Nova o hemisfério oposto é iluminado integralmente, e vice-versa.

A superfície lunar apresenta inúmeras caldeiras vulcânicas que, vistas de cima, se parecem muito com aquelas encontradas na Terra. Nenhuma, no entanto, se parece com as dos grandes vulcões terrestres como, por exemplo, os encontrados na região do Havaí. O escorrimento de lavas característico da atividade vulcânica pode ser visto em algumas crateras lunares. Em ambos os tipos de crateras nota-se o alisamento das estruturas pela ação erosiva, provocada pelo bombardeamento contínuo e prolongado de meteoritos, micrometeoritos e raios cósmicos. Mares Os mares são regiões de contornos circulares, cercados por continentes. Eles se formaram de um processo duplo, onde um impacto violento, provocado pela queda de corpos com diâmetros acima de 30 km, gerou atividade vulcânica. A violência do impacto é suficiente para aquecer e fundir parte do material da superfície. Além disso, a erosão do solo no local de impacto afinou substancialmente a crosta de modo a permitir que o material fundido, que se

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encontrava sob pressão abaixo da superfície escoasse para cima, preenchendo toda a região do impacto. A análise das rochas trazidas pelos astronautas da missão Apollo mostra que algumas rochas colhidas na região dos mares, quando fundidas, fluem de maneira semelhante às lavas terrestres. A análise dos tamanhos dos cristais dessas rochas revela que o resfriamento aconteceu relativamente rápido, sobre um período de alguns anos. A Figura 5.36 mostra o fluxo de lavas solidificadas no Mar Imbrium, e a Figura 5.38 mostra duas amostras de rochas lunares.

A cratera da região do Mar Oriental pode nos revelar a violência de um impactos. Trata-se de uma cratera com quatro três anéis concêntricos, três dos quais vistos na Figura 5.37. O anel mais interno tem 620 km de diâmetro, e o mais externo, 900 km, todos formados por montanhas. A parte central da cratera foi preenchida por lava. Uma explicação alternativa para os anéis admite tratar-se de uma cratera gigantesca, cujas paredes desmoronaram formando terraços circulares. Composição do solo A camada superficial da Lua é recoberta por um mineral composto primariamente de matéria ejetada das crateras de impacto, chamado regolito. Esse material pulverizado durante as colisões cobriu toda a superfície lunar. Além dos impactos, a variação rápida de temperatura provocada pelo aquecimento e resfriamento do solo, ajuda a trincar e pulverizar as rochas. A análise química das rochas lunares trazidas pela missão Apollo permite classificá-las em três categorias principais: basaltos, brechas e KREEP. O basalto é uma rocha ígnea, resultante do resfriamento de uma mistura de minerais fundidos. Ele é o constituinte básico dos mares. As brechas (Figura 5.38) são formadas do fragmentos rochosos cimentados numa matriz. Essa fusão de materiais ocorre durante uma colisão, quando pressão e temperatura são elevadas bruscamente, fundindo parcialmente o material da matriz que, ao resfriar-se, cimenta os fragmentos rochosos que resistiram à fusão. Esses fragmentos rochosos podem ser mais velh os que as próprias brechas. KREEP é uma

Figura 5.36 Lavas solidificadas no Mar Imbrium. As lavas, com altura de 30 m, escoaram até distâncias de 600 km. (NASA)

Figura 5.37 Cratera multi-anelada do Mar Oriental. Aqui são vistos 3 dos 4 anéis: o mais interno tem 620 km de diâmetro, e o mais externo, 900 km. (NASA)

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palavra composta: K vem do elemento químico potássio; REE vem de rare earth elements (elementos raros na Terra); e P vem do elemento químico fósforo. Portanto, o KREEP é um basalto mas difere do terrestre porque é mais rico em fósforo, potássio e elementos raros na Terra. As brechas e os KREEPs são os constituintes básicos das terras altas. Outra característica das rochas lunares é a inexistência de água retida quimicamente. De maneira genérica podemos dizer que as rochas lunares são deficientes em elementos voláteis, quando comparadas às rochas terrestres. Isto pode ter duas explicações diferentes: (a) Terra e Lua formaram-se a partir de materiais com composição química ligeiramente diferentes, ou (b) o material lunar passou por um processo de aquecimento antes de formar a Lua.

A comparação das abundâncias do oxigênio e seus isótopos nas rochas terrestres e lunares revelam uma semelhança entre os dois corpos, embora ambos difiram dos meteoritos. Os mares são quimicamente homogêneos e diferem das terras altas porque possuem menor abundância de alumínio. Idade

A idade do terreno lunar pôde ser determinada através da análise do material trazido para a Terra. A maior parte das amostras colhidas nos mares tem idade que varia entre 3,1 e 3,9 bilhões de anos, semelhantes em idade às rochas terrestres mais antigas. Isto significa que se passaram cerca de 800 milhões de anos entre a fusão e a solidificação desse material. Amostras de material característico dos continentes (terras altas) têm idades entre 3,8 e 4,0 bilhões de anos, portanto os continentes são centenas de milhões de anos mais velhos que os mares.

A Lua deve ter se originado de um impacto catastrófico entre a Terra jovem e outro corpo com as dimensão de Marte (ver adiante). Esta colisão que deu origem à Lua ocorreu logo no início, há cerca de 4,5 bilhões de anos. Durante algumas centenas de milhões de anos sua superfície permaneceu encoberta por rocha fundida. Após a solidificação, houve um período de intenso bombardeamento criando as crateras e formando as brechas das terras altas, e os mares. Nos últimos 3 bilhões de anos, a Lua permaneceu fria quiescente e geologicamente inativa, pelo menos de eventos de grandes porporções.

Figura 5.38 Duas amostras de rochas lunares trazidas durante as missões Apollo: à esquerda, um basalto típico das regiões dos mares; à direita, uma brecha mostrando os minerais cimentados na matriz. (R.R.Robbins et al., fig. 8-29, p.165)

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Interior A densidade média das rochas trazidas pelos astronautas é 2,96 g/cc. Como a densidade média global (MLUA / VLUA) é 3,34 g/cc , vê-se que não há forte concentração de massa no seu interior, o que equivale a dizer que não deve haver um núcleo de ferro, como no caso terrestre. Isto também se constata ainda pela menor abundância do Fe na Lua, se comparada à solar. Sismômetros deixados na Lua durante a Missão Apollo revelaram dois tipos de eventos. O primeiro, mais freqüente, pequenos e profundos, está correlacionado ao movimento orbital e as forças de maré: eles acontecem quando a Lua está no apogeu (mais afastada) ou no perigeu (mais próxima), e nas fases nova e cheia. O segundo, menos freqüente e independente do movimento orbital, provém das camadas mais profundas, e pode estar relacionado com o impacto de meteoróides. Estruturalmente, a Lua possui: (a) uma crosta assimétrica com espessura de 60 km no hemisfério voltado para a Terra, e de 100 km no hemisfério oposto. Isto pode explicar e inexistência de mares na face oposta; (b) um manto com 935 km de espessura; (c) um núcleo com 738 km de raio. Dados sísmicos sugerem que a parte mais interna deste núcleo, com raio aproximado de 388 km, possa ser parcialmente liquida. No entanto, a inexistência de um campo magnético global na Lua sugere um núcleo sólido. Algumas regiões lunares apresentam campo magnético fóssil, adquirido no passado e aprisionado nas rochas, com intensidade de 1% do terrestre. Origem da Lua Há basicamente quatro propostas para a origem da Lua. A primeira é a hipótese de fissão: a Lua é formada de material terrestre que se desprendeu durante a fase inicial de formação da Terra, quando sua rotação era bem mais rápida. O fato de a densidade média da Lua ser praticamente igual à densidade média das rochas da superfície terrestre favorece esta hipótese. O material lunar teria sido “arrancado” da região onde hoje está o Oceano Pacífico. Mas há outros fatos que põem em dúvida tal hipótese. Por exemplo: (a) a dificuldade em explicar como esse material terrestre se aglomerou para formar a Lua. Parte desse material que entrou em órbita ao redor da Terra poderia retornar à superfície terrestre; (b) a teoria da fissão favoreceria a formação da Lua no plano equatorial da Terra. Não foi possível, pelo menos até o momento, explicar como esse plano orbital lunar poderia ter mudado de modo a ser quase coplanar com a eclíptica; (c) a movimentação dos continentes explica a formação do Oceano Pacífico. A segunda hipótese é a da captura gravitacional: a Lua teria sido formada em outro lugar do Sistema Solar e, posteriormente, capturada pela Terra. A maior dificuldade desta hipótese está exatamente em explicar como se deu essa captura. A terceira hipótese é a da acresção2: a Lua teria se formado nas proximidades da Terra, adquirindo massa através da captura da matéria circunvizinha à Terra. Esta hipótese é passível das mesmas críticas feitas à teoria da fissão. Como explicar as diferenças químicas entre os dois corpos? A quarta hipótese, teoria do impacto gigante, é mais recente e tem explicado melhor as críticas. Isto teria acontecido há 4 bilhões de anos, quando a Terra, ainda com a superfície fundida, teria sofrido um choque com um corpo com as dimensões de Marte. O material que

2 Embora inexistente no vernáculo, esta palavra foi oficializada pela Sociedade Astronômica Brasileira, por tratar-se de um termo bastante preciso: acresção significa “acúmulo gradativo de matéria pela ação atrativa da força gravitacional”

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formou Lua teria sido arrancado da crosta dos dois corpos colidentes. Esta hipótese explica, por exemplo: (a) a deficiência de ferro na Lua. A crosta é rica em silicatos e deficiente em ferro. No impacto, apenas o material das crostas dos dois corpos foi ejetado, o ferro do núcleo do corpo colidente fundiu e imergiu para o centro da Terra; (b) as densidades médias da Terra e da Lua são, respectivamente, 5,5 g/cc e 3,3 g/cc. Isso indica que a Lua é deficiente em ferro; (c) Terra e Lua têm a mesma composição isotópica de oxigênio. Marte e os meteoritos, que vêm de outras partes do Sistema Solar, têm composições diferentes. Isso indica que a Lua é formada do mesmo material que predominava nas vizinhaças da Terra; (d) semelhança de composição química entre planeta e satélite só se encontra nos casos Terra-Lua e Plutão e seus três satélites, nos demais não. (e) inexistência de água nas rochas. O superaquecimento do material da crosta teria vaporizado água; (f) a abundância de ouro e platina na superfície terrestre. Por serem elementos químicos pesados eles se concentrar nas partes mais internas, já que a Terra sofreu fracionamento. Com a hipótese do impacto, essa abundância pode ser atribuída ao corpo que colidiu com a Terra; (g) impactos violentos eram freqüentes nos primórdios de formação do SS. Como veremos adiante, boa parte das estruturas superficiais encontradas em alguns satélites dos planetas jovianos são explicadas através de colisões entre corpos.

5.6.2 Fobos e Deimos Fobos e Deimos3, satélites de Marte, são rochosos, pequenos e assimétricos. A Tabela 5.3 apresenta suas principais propriedades, e a Figura 5.39, partes de suas superfícies. Vistos da superfície marciana, Deimos nasce no Leste e se põe no Oeste, e Fobos transita em sentido oposto4. Além disto, como seus períodos orbitais são diferentes (veja tabela abaixo), Fobos cruza o céu marciano quase três vezes mais que Deimos. Apenas Fobos e um pequenino satélite de Júpiter, 1979J, orbitam seus planetas com período menor que a rotação do planeta. Assim como a Lua, ambos os satélites têm movimentos sincronizados, isto é, mostram sempre a mesma face para o planeta. A superfície de Fobos é marcada por crateras pequenas e apenas uma cratera grande, nenhuma porém com pico central. Algumas das estrias vistas em sua superfície estão ligadas à cratera maior, e pode ser um indicativo de que uma colisão de grande violência quase destruiu o satélite. A superfície de Deimos é mais lisa, sem grandes crateras, porém com numerosas figuras brilhantes de natureza ainda desconhecida. Qual a origem desses satélites? A densidade média de Marte é 4 g/cc e a dos dois satélites é aproximadamente 2 g/cc, o que pode significar diferença na composição química. Os albedos dos satélites (cerca de 0,02) são bem menores que o albedo da Lua, e semelhante ao albedo dos meteoritos tipo condritos carbonáceos (veja o tópico “meteoritos”) e asteróides parecidos com Ceres (planeta-anão). Como Marte está muito próximo do cinturão asteroidal (veja o tópico “asteróides”), é possível que Fobos e Deimos sejam dois asteróides capturados por Marte. Do ponto de vista dinâmico, tal captura é possível. Os candidatos mais prováveis são os asteróides do grupo Amor, cujos possuem periélios localizam-se internamente à orbita de Marte. Portanto, são os astróides que mais se aproximam de Marte.

3 Na mitologia grega, Fobos e Deimos, que significam respectivamente Derrota e Pânico, são os dois filhos de Ares, ou Marte para os romanos, o “deus da guerra”. Eles o acompanhavam nas batalhas. Outra versão diz que eles representam os dois cavalos que puxam a carruagem guerreira do deus Marte. 4 Isto é decorrência dos períodos orbitais dos satélites: o movimento de Fobos é mais rápido que o movimento diurno (rotação de Marte), por isso ele avança. O de Deimos é mais lento, por isso ele fica para trás.

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Satélite

(descoberta) Distância

(1.000 km) Período Orbital

(dia) Tamanho

(km) Massa

(MLUA = 1) Densidade média

(g/cc) Fobos (1877) 9,4 0,32 14 ! 11 ! 9 1,3 10-7 1,9

Deimos (1877) 23,5 1,26 8 ! 6 ! 6 2,7 10-8 2,1

Tabela 5.3 Propriedades principais dos satélites de Marte. (R.R.Robbins et al., pág. A7)

5.7 Satélites dos planetas jovianos Sendo planetas de massas grandes, os jovianos têm muitos satélites. Até 2005 eram 151, assim distribuídos: 63 de Júpiter, 47 de Saturno, 28 de Urano e 13 de Netuno. Uma parte deles tem órbitas quase circulares, situadas nos planos equatoriais dos planetas; a outra parte tem órbitas peculiares em algum aspecto como, por exemplo, forma orbital, inclinação, direção de movimento, etc. A maior parte deles tem densidade média ligeiramente superior a da água, mas há casos onde a densidade média é bem maior. Mas as diferenças mais marcantes estão nas superfícies.

5.7.1 Satélites de Júpiter Os quatro maiores satélites foram descobertos por Galileu, no início século 17, por isso são denominados satélites Galileanos. São eles: Io, Europa, Ganimedes e Calisto. Dois destes satélites são muito característicos: Ganimedes é o maior satélite do SS, maior mesmo que Mercúrio; Io é o corpo do SS que apresenta maior atividade vulcânica, bem mais intensa que a da própria Terra. Suas densidades médias são maiores que as dos demais satélites jovianos; entre eles, a densidade decai com a distância de Júpiter: Io é o mais denso, e Calisto o menos denso. A seguir, discutiremos os aspectos mais importantes de alguns satélites. Io É o satélite galileano mais interno, afastado apenas seis raios planetários do centro de Júpiter. Tem quase o tamanho da Lua e, como esta, tem movimento orbital sincronizado com

Figura 5.39 Os dois satélites de Marte: Fobos (à esquerda) e Deimos. (NASA)

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Satélite (descoberta)

Distância (1.000 km)

Período orbital (dias)

Raio (km)

Massa MLUA = 1

Densidade média (g/cc)

Metis (1979) 128 0,29 20 1,3 ! 10-6 2,8 Andrastéia (1979) 129 0,3 13 x 10 x 8 2,6 ! 10-7 4,5 Amaltéia (1892) 181 0,5 130 x 83 x 75 5,2 ! 10-5 1,8

Tebe (1979) 222 0,67 55 x 45 1 ! 10-5 1,5 Io (1610) 422 1,77 1815 1,21 3,5

Europa (1610) 671 3,55 1569 0,67 3,0 Ganimedes (1610) 1070 7,16 2631 2,02 1,9

Calisto (1610) 1883 16,69 2400 1,47 1,8 Leda (1974) 11.094 239 8 7,8 ! 10-8 2,7

Himalia (1904) 11.480 251 93 1,3 ! 10-4 2,8 Lisitéia (1938) 11.720 259 18 1 ! 10-6 3,1 Elara (1905) 11.737 260 38 1 ! 10-5 3,3

Ananke (1951) 21.200 631 R 15 5,2 ! 10-7 2,7 Carme (1938) 22.600 692 R 20 1,3 ! 10-6 2,8 Pasifae (1908) 23.500 735 R 25 2,6 ! 10-6 2,9 Sinope (1914) 23.700 758 R 18 1,0 ! 10-6 3,1

R significa retrógrado Tabela 5.4 Propriedades principais de parte dos satélites de Júpiter. (Adaptado de R.R.Robbins et al., pág. A7)

Júpiter. Por ser um corpo relativamente grande e estar entre Júpiter e Europa, as forças de maré em Io são gigantescas, chegando a provocar deformações de dezenas de metros em sua superfície, de forma semelhante às marés terrestres. A diferença é que na Terra, o efeito de maré se manifesta basicamente na hidrosfera, mas em Io é sobre todo o satélite. A dissipação de energia pela maré é tão grande que provoca atividade vulcânica generalizada (Figura 5.3B). As lavas expelidas pelos vulcões se espalham por toda a superfície, recobrindo depressões que porventura possam existir. Não se vê cratera de impacto na superfície de Io. Trata-se portanto de um corpo que tem superfície renovada constantemente (acredita-se que seja totalmente renovada em escala de milhão de anos), podendo mudar de aparência em curta escala de tempo. Este fato pôde ser constatado pela comparação das imagens das sondas Voyager 1 e 2 (final da década de 70) e Galileu (1995), além das imagens do telescópio espacial Hubble. Embora sua superfície seja recente, podemos destacar os seguintes tipos de terreno: caldeiras com vários quilômetros de profundidade, lagos de enxofre, talvez fundido (como o Loki Patera), montanhas que não se parecem com vulcões, fluxo de lavas com centenas de quilômetros de extensão e ventos vulcânicos. As lavas são compostas principalmente de enxofre. Em alguns locais, a temperatura é elevada o suficiente para fundir rochas de silicato. Os jatos de matéria vulcânica são expelidos a grandes velocidades e podem atingir alturas de 300 km. A nuvem de gás expelida durante a erupção forma uma atmosfera, parte da qual é ionizada. A sonda americana Pioneer 10 havia detectado uma ionosfera cerca de 100 km acima da superfície de Io. A sonda Galileu registrou uma ionosfera mais extensa, com cerca de 900 km. Isto pode ser uma evidência de que a atmosfera e a ionosfera desse satélite variam em tamanho de acordo com o nível da atividade vulcânica. A Figura 5.40, mostra uma montagem feita com imagens obtidas com equipamentos de solo. O gás ionizado expelido pelo vulcanismo expande-se, interage com o campo magnético de Júpiter e forma um toróide centrado na órbita de Io, por onde circulam correntes elétricas altíssimas. O satélite circula dentro desse toróide. É possível que Io seja a fonte primária de íons pesados na magnetosfera interna de Júpiter.

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Europa Europa é o menor satélite galileano. Sua superfície é uma das mais uniformes dentre os os planetas e satélites do SS. Estando também próximo de Júpiter, sofre efeitos de maré significativos. Sua crosta congelada relativamente jovem, com poucas crateras de impacto pode ser uma evidência do aquecimento decorrente da dissipação de energia por maré. As figuras de superfície mais marcantes são as linhas tortuosas e estreitas de cor escura, algumas apresentando a parte central mais clara (Figura 5.3A). As linhas claras são elevações com algumas centenas de metros de altura. Em toda a superfície de Europa não se vê qualquer montanha. Tudo indica que abaixo dessa superfície congelada exista um oceano de água líquida, de maneira semelhante ao que se encontra nas regiões polares da Terra. O calor gerado pelo efeito de maré já seria suficiente para manter a água no estado líquido. Há planos futuros para a colocação de uma sonda na superfície de Europa para explorar aspectos da superfície e fazer prospecção. Ganimedes A densidade média de Ganimedes é pouco mais que a metade da densidade média de Io e Europa, e quase o dobro da densidade da água. Isto significa que este satélite pode ser composto em boa parte por água. Sua superfície (Figura 5.41) mostra detalhes surpreendentes como terreno enrugado, terrenos de diferentes idades sobrepostos de forma confusa, além de camadas de água congelada nas latitudes mais ao norte. Assim como a Lua, ele possui regiões planas como os mares, continentes e crateras. Uma das características mais surpreendentes de Ganimedes é a presença de um campo magnético intrínseco. Há basicamente duas propostas teóricas para explicar esse magnetismo: (a) ele é gerado por convecção proveniente da interação das forças de Lorentz (magnética) e de

Figura 5.40 Toróide de vapor de sódio expelido por Io. (JPL)

Figura 5.41 Ganimedes, o maior satélite do SS, tem superfície acidentada e recoberta por gelo. (JPL)

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Coriolis (rotacional) induzida pelo campo magnético de Júpiter, e (b) pelo efeito dínamo causado por um núcleo fundido de ferro e enxofre. Calisto

A superfície de Calisto é a mais parecida com a de um planeta telúrico, mostrando inúmeras crateras de diferentes tamanhos. Algumas apresentam raios brilhantes, outras são preenchidas com gelo.

Dentre os satélites galileanos, Calisto é quem apresenta a superfície mais antiga. Como não há cratera com diâmetro superior a 50 km, acredita-se que sua crosta seja relativamente plástica a ponto de não suportar por muito tempo elementos de grandes massas como, por exemplo, montanhas. É possível dividí-los em dois grupos principais: (a) os que têm movimento direto (anti-horário), com distâncias entre 11-12 milhões de km de Júpiter, e (b) os que têm movimento retrógrado, com distâncias entre 21-24 milhões de km do planeta. 5.7.2 Satélites de Saturno A Tabela 5.5 apresenta as características físicas e orbitais mais importantes de alguns satélites de Saturno. A densidade média da maioria deles é pouco maior que a da água, indicando que na composição química deles, boa parte é gelo. Em valores aproximados, podemos dizer que 60 –70% é gelo e o restante é rocha. Não há uma relação direta entre os valores de densidade média e a distância ao planeta, como no caso dos satélites galileanos. Suas superfícies apresentam camadas de gelo de água, não de metano ou amônia.

Uma das figuras de impacto mais impressionantes é a base Valhalla (Figura 5.42), com sua aparência multi-anelada. A parte central, com de 600 km de diâmetro, é circundada por cerca de 30 anéis montanhosos, o mais externo com diâmetro de 3.000 km. Essa estrutura pode ter sido formada por uma colisão violenta que fundiu o material superficial. Ondas causadas pelo impacto se propagaram radialmente pelo fluido que se solidificou rapidamente, já que a temperatura ambiente é muito baixa (100 K). Esse impacto violento teria ocorrido entre 3,5 e 4 bilhões de anos atrás. Os demais satélites Como se pode constatar pela Tabela 5.4, os demais satélites jovianos são corpos pequenos, não esféricos e de dimensões asteroidais. Provavelmente, alguns deles foram capturados do cinturão asteroidal.

Figura 5.42 Uma das figuras mais intrigantes da superfície de Calisto é a base multi-anelada Valhalla. (NASA)

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Satélite

(descoberta) Distância

(1.000 km) Período orbital

(dia) Raio (km)

Mass (MLUA = 1)

Densidade média (g/cc)

Pan (1990) 133,58 0,58 10 Atlas (1980) 137,67 0,602 20!10

Prometeu (1980) 139,35 0,613 70!50!40 3,7 ! 10-6 0,7 Pandora (1980) 141,7 0,629 55!45!35 3 ! 10-6 0,7

Epimeteu (1980) 151,42 0,694 70!60!50 7,6 ! 10-6 0,7 Jano (1966) 151,47 0,695 110!100!80 2,7 ! 10-5 0,7

Mimas (1789) 185,52 0,942 196 6,2 ! 10-4 1,2 Encélado (1789) 238,02 1,37 250 1 ! 10-3 1,2

Tétis (1684) 294,66 1,888 530 0,01 1,2 Telesto (1980) 294,66 1,888 17!14!13 Calipso (1980) 294,66 1,888 17!11!11 Dione (1684) 377,4 2,734 560 0,01 1,4 Helena (1980) 377,4 2,737 18!16!15

Réia (1672) 527,04 4,518 765 0,03 1,3 Titã (1655) 1.221,83 15,95 2575 1,82 1,9

Hipérion (1848) 1.481,1 21,28 205!130!110 2,3 ! 10-4 1,4 Jápeto (1671) 3.560,13 79,33 730 0,03 1,2 Febe (1898) 12.952 550,5 110 5,4 ! 10-6 0,7

Tabela 5.5 Propriedades principais de parte dos satélites de Saturno (Adaptado de R.R.Robbins et al., pág. A7)

Outro fato interessante é que a maioria dos satélites de Saturno, assim como alguns satélites de Júpiter, apresentam uma das faces (hemisférios) mais marcadas por crateras de impacto. Como foi observado anteriormente, isto é devido ao sincronismo entre rotação e translação, fazendo com que uma das faces esteja sempre voltada para Saturno. A seguir discutiremos os aspectos mais importantes dos nove maiores satélites. Mimas ou Mimante

No grupo dos maiores, Mimas (Figura 5.43) é o satélite menor. Sua superfície congelada é fortemente marcada por crateras de impacto. A mais notável dentre elas é a cratera Herschel: o diâmetro é cerca de 1/3 do diâmetro do satélite, a profundidade é de 10 km, e o pico central tem 9 km de altura. Cogita-se que a origem dessa cratera tenha sido uma colisão de extrema violência, que possa ter fraturado Mimas em várias partes. Não se descarta a possibilidade de ocorrência de várias colisões que fragmentaram Mimas. Se isto for verdade, este satélite é de terceira ou quarta geração mas que originalmente se formou nas redondezas de Saturno. Encélado É um dos casos mais intrigantes. Sua superfície (Figura 5.44) tem uma face marcada por crateras de impacto, algumas com diâmetros de até 35 km, e por ranhuras . No entanto, a maior parte da sua superfície não apresenta crateras, o que revela a possibilidade de ter havido um processo de remodelagem da superfície. A dissipação de energia por efeito de maré poderia detonar um processo semelhante ao vulcanismo, porém com liberação de água, não de lava. O albedo é 0.9 (reflete 90% da luz incidente), igual o da neve, compatível com uma superfície recoberta com água congelada.

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Plumas de material congelado (grãos de gelo com cerca de 10 microns) extendendo-se acima da região polar sul foram registradas pela sonda Cassini em 2005. Acredita-se que elas sejam gêiseres expelidos de reservatórios de água líquida pressurizada no subsolo a temperaturas superiores a 0 Celsius.

Tétis A figura de superfície mais interessante em Tétis (Figura 5.45) é um desfiladeiro com cerca de 2.000 km de extensão, equivalente a quase três quartos do comprimento da sua circunferência. Embora não se saiba qual o mecanismo responsável pela origem dessa figura, há fortes indícios que ela possa ser conseqüência de uma colisão violenta, já que há uma cratera com cerca de 400 km de diâmetro. Proporcionalmente aos respectivos tamanhos, esta cratera é maior que aquela encontrada em Mima: a razão “diâmetro da cratera / diâmetro do satélite”, é 0,25 para Mima e 0,4 para Tétis! Portanto, a evolução deste satélite também é fortemente marcada pela colisão. A presença de elevada quantidade de crateras de impacto, leva a concluir que a superfície de Tétis é antiga.

Figura 5.43 Mimas, o mais interno do grupo de grandes satélites de Saturno, e a cratera Herschel. (Cassini)

Figura 5.44 Encélado (Cassini)

Figura 5.45 Estrutura de impacto Odisseu (450 km) em Tétis (Cassini).

Figura 5.46 Terreno complexo de fraturas em Dione. Esta é a face voltado para o lado oposto ao do movimento (Cassini).

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Dione Sua densidade média sugere a existência de material pesado (rochas) em maiores proporções que nos demais satélites. A superfície (Figura 5.46) é recoberta por gelo e não é densamente marcada por crateras, portanto é geologicamente jovem. Dione apresenta assimetria na distribuição de crateras: a face voltada para a direção do movimento orbital tem mais crateras. A planura e as diferenças de cor de sua superfície sugerem a ocorrência de processos renovadores, como liberação de líquido por ação vulcânica. Réia Embora seja maior, esse satélite se parece com Dione. A face voltada para a direção do movimento orbital é recoberta por gelo de água, e pode ser dividida em duas regiões: uma só com crateras grandes; outra apenas com crateras pequenas. Nesta face, vê-se também uma base multi-anelada. Há indícios de que Réia tenha passado por uma fase de vulcanismo com liberação de água liquida, que se resfriou rapidamente. Titã (ou Titan) Durante muito tempo ele foi tido como o maior satélite do SS, daí seu nome. Ele é ligeiramente menor que Ganimedes (portanto maior que Mercúrio) e o maior satélite de Saturno. Titã é o único satélite que apresenta atmosfera espessa, que impede a visão da sua superfície.

No dia 14 de Janeiro de 2005 a sonda Huygens5 foi lançada sobre Titã, a partir da sonda Cassini6. Ela registrou a descida com fotos e sinais de radar, revelando nuvens, rios, leitos de lagos, ilhas, rochas e poeira. O ambiente é frio, menos que -170°C, e a pressão na superfície é ecrca de 1,5 atm. Nessa temperatura o metano pode permanecer na forma líquida ou gasosa. Canais de drenagem nascem nas regiões brilhantes no alto das montanhas e morrem nas regiões baixas, escuras e planas, provavemente lagos. Isto é um indicativo que há estações sazonais e que durante o verão rios, provavelmente de metano líqüido, são formados nas regiões e desmbocam em lagos, no meio dos quais vêm-se formações que lembram ilhas (Figura 5.47). No local de pouso o material tem a consistência de areia fofa e a sonda está rodeada de grandes blocos de gelo de água, arredondados pela erosão, e partículas de hidricarbonetos depositada da atmosfera.

Composta de cerca de 99% de nitrogênio (no restante predomina o metano) sua atmosfera se estende até a altura de 600 km acima da superfície. Entre 200 e 300 km acima do nível superficial, há uma camada de névoa muito espessa, abaixo da qual acredita-se haver precipitação (talvez em forma de neve) de resíduos orgânicos solidificados, criando capas polares estratificadas semelhantes às terrestres, que podem encerrar evidências da evolução climática desse satélite. Observações no ultravioleta feitas pelas sondas Voyagers revelam a presença de hidrocarbonetos, incluindo etano, acetileno e cianeto de hidrogênio.

Pela composição química característica da sua atmosfera, possivelmente semelhante à atmosfera primitiva da Terra, Titã é visto como forte candidato a apresentar formas primitivas de vida, caso elas existam fora da Terra.

5 O holandês Cristitaan Huygens (1629-1695) é o descobridor de Titã. 6 Giovanni Domenico Cassini (1748-1845), italiano naturalizado francês, foi o descobridor da divisão entre os anéis A e B de Saturno.

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Hipérion (ou Hiperião) Hipérion (Figura 5.48) se parece mais com um fragmento de um corpo bem maior, e sua densidade ainda é desconhecida. É possível que ele tenha sido capturado por Saturno, depois de ter-se desprendido do corpo parental. O que mais chama atenção é sua superfície esponjosa, cuja razão ainda é desconhecida.

Jápeto Com duas faces completamente diferentes, Jápeto (Figura 5.49) é um dos objetos mais estranhos do SS. O hemisfério voltado para a direção do movimento orbital é extremamente escuro (albedo de somente 5%) e, aparentemente, desprovido de crateras de impacto. Já o outro hemisfério (parte superior da Fig. 5.49) é mais brilhante (albedo de 50%). Até o momento, ele é um caso único. Provavelmente, Jápeto é composto primordialmente de gelo de água, mas a razão dessa diferença entre os hemisférios ainda é desconhecida. A inexistência aparente de crateras revela a juventude de sua superfície, mas as informações disponíveis não nos permite saber se isto é conseqüência de uma possível atividade interna. Alguns tipos de materiais escurecem quando expostos aos raios cósmicos, mas isto é uma possibilidade que necessita comprovação. Febe Febe é um satélite pequeno (fragmento) e tão escuro quanto uma das faces de Jápeto. As informações disponíveis ainda são escassas para se dizer algo sobre a origem de Febe. No entanto é oportuno lembrar que o núcleo do cometa Halley também é escuro, tal como os meteoritos do tipo condritos carbonáceos (discutidos adiante). Demais satélites

Figura 5.47 No verão de Titã, rios escoam metano liqüido das montanhas para o lago. Ihas afloram do lago. (Huygens, ESA/NASA)

Figura 5.48 A estranhíssima superfície esponjosa de Hipérion (Cassini)

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Pela Tabela 5.5, vê-se que os demais satélites são muito pequenos, praticamente fragmentos. As sondas das séries Pioneer e Voyager descobriram vários desses fragmentos orbitando Saturno, alguns em configuração geométrica particular, como Dione B, que está na mesma órbita de Dione, porém a 60o à frente deste, e dois outros satélites, na mesma órbita de Tétis, um a 60o à frente e outro 60o atrás do satélite 7. 5.7.3 Satélites de Urano

Satélite (descoberta)

Distância (1.000 km)

Período Orbital (dias)

Raio (km)

Massa MLUA = 1

Densidade média (g/cc)

Cordélia (1986) 48,7 0,34 13 Ofélia (1986) 53,8 0,38 16 Branca (1986) 59,2 0,43 22

Cressida (1986) 61,8 0,46 33 Desdemona (1986) 62,6 0,47 29

Julieta (1986) 64,6 0,49 42 Pórcia (1986) 66,1 0,51 55

Rosalinda (1986) 69,9 0,56 27 Belinda (1986) 75,2 0,62 34

Puck (1985) 86 0,76 77 Miranda (1948) 129,8 1,41 236 0,00024 1,1

Ariel (1851) 191,2 2,52 579 0,02 1,6 Umbriel (1851) 266 4,14 586 0,01 1,5 Titânia (1787) 435,8 8,71 790 0,08 1,7 Oberão (1787) 582,6 13,46 762 0,08 1,6

Tabela 5.6 Propriedades principais de parte dos satélites de Urano (Adaptado de R.R.Robbins et al., pág. A7)

A tabela acima apresenta os parâmetros mais significativos de alguns dos satélites de Urano. Em meados da década de 80 foram descobertos 15 satélites, todos pequenos e parecidos com asteróides. Os cinco maiores têm densidades médias entre 1,5 e 1,7 g/cc, ligeiramente maiores que a de Urano (1,3 g/cc). Provavelmente esses satélites sejam constituídos de gases leves congelados como metano e amônia, e são mais escuros que os satélites de Saturno. Miranda (Figura 5.50A) é o que apresenta as características superficiais mais complexas e intrigantes, como penhascos com 5 km de altura, falhas, ranhuras profundas, crateras e vales. Há três regiões típicas denominadas “ovóides”. Há fortes indícios que sejam decorrentes de atividade geológica interna, mas não se descarta a possibilidade de estarem relacionados à impactos.

Ariel, Umbriel, Titânia e Oberão (Figuras 5.50B e 5.51) também apresentam superfícies com figuras exóticas, porém bem menos complexas que as de Miranda. Umbriel e Titânia têm crateras, algumas com raios (como na Lua) outras contendo substância escura. Oberão também tem muitas crateras, algumas com anéis brilhantes associados a material ejetado. Em certas crateras, a região central é escurecida, talvez constituída de água “suja” das camadas mais internas que aflorou à superfície. Há uma montanha (vulcão?) com 6 km de altura, um sinal de que pelo menos nessa região sua crosta não deve ser muito fina.

7 Estas duas posições estão em dois pontos de Lagrange Nessas regiões as forças gravitacionais se cancelam, e os corpos aí presentes adquirem órbitas estáveis. (Veja o item 5.8.3)

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O fato de Urano ter seu eixo de rotação quase paralelo ao plano da eclíptica implica um passado curioso de seus satélites. Se essa inclinação do eixo de rotação é proveniente de uma colisão, então seus satélites tiveram um passado conturbado, possivelmente marcado também por colisões. Se Miranda apresenta fortes indícios de processo colisional, Umbriel mostra figuras de superfície muito antigas, o que demonstra a possibilidade de um passado bem menos conturbado. De qualquer forma, ainda há muito o que pesquisar a respeito. 5.7.4 Satélites de Netuno As características físicas e orbitas principais dos satélites de Netuno são apresentadas na Tabela 5.7.

Netuno tem apenas um satélite grande, Tritão (Figura 5.52A), que pertence ao grupo dos grandes satélites do SS. Sua órbita está inclinada 20o em relação ao equador do planeta, e seu movimento é retrogrado, configurando um caso único no SS. Estas condições serviram de base para a hipótese de que Plutão e Caronte eram satélites de Netuno, e se desgarram por

Figura 5.49 A natureza e a origem do material escuro que cobre uma face de Jápeto, satélite de Saturno, e que também aparece em outros corpos do SS, ainda permanecem misteriosas. (NASA)

Figura 5.50 Miranda (A) e Ariel (B), dois satélites de Urano. A superfície de Miranda é uma das mais complexas já observadasde todo o Sistema Solar, e as figuras de superfície sugerem que processos colisionais possam ter contribuído para sua evolução. (NASA)

Figura 5.51 Umbriel (A), Titânia (B) e Orebão (C), são os três maiores satélites de Urano. (NASA)

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Satélite

(descoberta) Distância

(1.000 km) Período orbital

(dias) Raio (km)

Massa MLUA = 1

Densidade média (g/cc)

Náiade (1989) 48,3 0,29 29 Talassa (1989) 50,1 0,31 40 Despina (1989) 52,5 0,33 79 Galatéia (1989) 61,9 0,49 74 Larissa (1989) 73,5 0,55 96 Proteu (1989) 117,6 1,12 208 Tritão (1846) 354,8 5,88 R 1350 1,82 2

Nereida (1949) 5509 359,6 170 0,00028

Tabela 5.7 Propriedades principais do satélites de Netuno (Adaptado de R.R.Robbins et al., pág. A7) conseqüência de uma colisão ocorrida no passado entre Netuno e outro corpo (planeta?), e que também alterou a órbita de Tritão. Atualmente tem-se sabemos que Plutão e seus três satélites é um quarteto de corpos transetunianos e que dá nome a uma classe de objetos menores daquela região, “plutinos”.

Tritão possui uma atmosfera tênue composta de nitrogênio e metano; na superfície a pressão é da ordem de 10 milionésimos da pressão atmosférica terrestre ao nível do mar. Acredita-se que lá possa existir névoa composta de hidrocarbonetos. Na alta atmosfera, Tritão apresenta auroras, causadas pelas partículas eletricamente carregadas do cinturão de radiação de Netuno. A superfície congelada de Tritão é constituída de nitrogênio e apresenta figuras com relativa complexidade. Enquanto uma parte dela é uniforme, a outra é fortemente marcada por crateras, ranhuras e cristas, indicando possível atividade tectônica. A pequena quantidade de crateras, algumas provavelmente preenchidas por substância líqüida solidificada, é um indício de que sua superfície é jovem. A Figura 5.52B mostra um lago congelado, possivelmente constituído de uma mistura de água, metano e amônia. A descoberta mais importante foi a presença de pequenas linhas escuras, interpretadas como jatos de matéria rica em carbono expelida por gêiseres, atingindo alturas de até 8 km acima da superfície de Tritão. Uma interpretação possível é que essa matéria é ejetada na direção vertical e, nessa altura, a circulação atmosférica arrasta o material ejetado em direção praticamente paralela à superfície.

Figura 5.52 Tritão, satélite de Netuno, tem superfície congelada e relativamente complexa, com terrenos escuros e, possivelmente, gêisers em atividade. À direita, um detalhe da superfície mostrando um lago congelado provavelmente composto de uma mistura de água, metano e amônia. (NASA)

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Nereida é um satélite pequeno, com órbita altamente excêntrica (0,75) e inclinada 28o em relação ao equador de Netuno. A maior aproximação com Netuno é 1 milhão de km, e o maior afastamento, 10 milhões de km. Este fato fortalece a hipótese da colisão de Netuno com um corpo maior, mencionada anteriormente. 5.7.5 Anéis Embora constituam figuras específicas associadas aos planetas gigantes, os anéis podem ser considerados uma família de diminutos satélites que orbitam esses planetas, pois são constituídos de inúmeras partículas, com dimensões que vão de submilimétrica a métrica, dependendo do caso. Todos os planetas gigantes têm anéis. O caso mais evidentemente é o de Saturno; seus anéis são conhecidos desde o séc.17. Os anéis de Urano foram descobertos em 1977; os de Júpiter foram descobertos em 1979; e os anéis de Netuno foram confirmados em 1989. Os anéis de Saturno um outro anel mais interno, o C. Hoje sabemos que esse sistema é constituído de inúmeros anéis intercalados por intervalos, alguns largos, outros estreitos (Figura 5.53). A largura e a espessura dos anéis variam muito. Os três anéis maiores são: (1) C, o mais interno, tem cerca de 19.500 km de largura e é constituído de partículas muito finas. Na realidade há outro anel mais interno, o D (7700 km), e uma névoa de partículas que se estende até as nuvens mais altas da atmosfera de Saturno; (2) anel B, o mais brilhante, tem largura total de 26.000 km. De longe ele tem aparência uniforme, mas ele é constituído de milhares de anéis finos; (3) o anel A, com largura aproximada de 14.500 km, é mais uniforme que o anel B, e possui uma divisão (Divisão de Encke) próxima ao bordo externo. A cerca de 800 km deste bordo, mais para fora do planeta, há um pequenino satélite, apelidado de “pastor”. A divisão de Cassini, entre os anéis A e B, tem cerca de 4.800 km de largura. Além destes, há mais três anéis: (a) o anel F, a cerca de 3.000 km para fora do anel A, tem apenas algumas centenas de quilômetros de largura, e é cercado por dois pequeninos satélites, um ao lado do bordo interno e outro ao lado do bordo externo; (b) os anéis G (7.500

Figura 5.53 Quando vistos com maior resolução, os anéis de Saturno são constituídos de inúmeros anéis mais finos. (NASA)

Eles foram descobertos por Galileu Galilei em 1610; na realidade ele não anunciou a descoberta dos anéis, mas de uma estrutura dupla parecida com bulbos. Em 1659, Chistiaan Huygens anunciou que se tratava de um anel plano e fino, que não tocava a superfície do planeta. Mais tarde, Cassini reparou que o anel anunciado por Huygens não era contínuo (ou único), e que existia uma divisão que separava a parte mais externa da mais interna. Essa divisão ficou conhecida por Divisão de Cassini, e separa o anel A, mais externo, do anel B. Posteriormente, descobriu-se que havia

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km) e E (300.000 km, o mais externo de todos), são compostos de partículas dispersas. O satélite Mimas tem sua órbita entre estes dois anéis. As espessuras variam de 0,1 a 1 km para os anéis A e B, de 100 a 1.000 km para o anel G e 1.000 km para o anel E.

Essas divisões representam regiões de instabilidade gravitacional, ou seja, uma partícula dentro dessa região tem período orbital equivalente a frações (1/2, 1/3, 2/5, etc.) dos períodos orbitais dos satélites mais próximos. Nestas circunstâncias a órbita é instável, logo não é perene. Vistas com maior resolução pelas sondas Voyager, nota-se que essas regiões divisórias não estão totalmente vazias. Pequeninos satélites internos também atuam na modelagem dos anéis e na manutenção das lacunas. Observações em infravermelho revelam que as partículas que compõem os anéis são constituídas de água congelada ou de fragmentos rochosos recobertos por gelo de água. A massa total dos anéis é equivalente à massa de Fobos (satélite de Marte). Os tamanhos das partículas variam de micrométrico a quilométrico. Qual a origem desses anéis? Esta pergunta ainda não tem uma resposta definitiva, e as razões são as seguintes. Existe um limite mínimo de distância para um satélite orbitar um planeta; ele é conhecido por Limite de Roche. Se um corpo estiver numa órbita com raio menor que o limite de Roche as forças de maré serão maiores que a força de coesão do corpo, resultando na ruptura dele. Os anéis de Saturno estão dentro do limite de Roche. Isto, no entanto, não significa necessariamente que houve um corpo que se rompeu e deu origem aos anéis, mas é uma possibilidade. O raciocínio inverso também pode ser verdadeiro: o material que existia nas vizinhanças de Saturno não pôde formar um corpo maior (satélite) exatamente porque essa região estava dentro do limite de Roche. Satélites com atividade vulcânica podem suprir anéis próximos com cristais de gelo.

Como vimos, boa parte das figuras de superfície observadas nos satélites dos planetas gigantes são originárias de processos colisionais, alguns de extrema violência. Isto fortalece a hipótese de serem os anéis formados por fragmentos produzidos por colisões entre corpos. Os anéis de Júpiter, Urano e Netuno Júpiter possui cinco anéis. Em ordem crescente de distância do centro do planeta, são eles: Halo (33.000 km de largura), Principal (6.000 km), Amaltéia (181.000 km), Tebe (93.000 km) e Tebe extensão (58.000 km). A espessura pode atingir 20.000 km. Ele é constituído de partículas de poeira muito fina, com tamanhos de alguns microns8. Acredita-se que a fonte geradora dessa poeira possa ser o satélite Io. Urano tem doze anéis. Em ordem crescente de distância do centro do planeta, são eles: Seis (1,5 km de largura), Cinco (2 km), Quatro (2 km), Alfa (4 a 10 km), Beta (5 a 11 km), Eta (1,6 km), Gama (1 a 4 km), Delta (3 a 7 km), Lambda (2 km), Epsilon (20 a 96 km), R/2003 U2 (3.800 km) e R/2003 U1 (1.000 km). São anéis bastante escuros, sem cor definida, apenas os dois últimos descobertos recentemente tem cores: um azulado e outro avermelhado. As cores estão relacionadas com o tamanho das partículas. partículas menores refletem mais a cor azul. O material escuro pode ser tanto metano congelado ou minerais ricos em compostos orgânicos misturado com material impregnado com água, ambos em compostos de silício. Netuno tem seis anéis. Em ordem crescente de distância do centro do planeta, são eles: Galle (2.000 km de largura), Le Verrier (100 km, no máximo), Lassel (4.000 km), Arago (desconhecida), Sem nome (desconhecida) e Adams (15 km). A composição química dos anéis ainda é desconhecida. 8 O micron equivale a milésima parte do milímetro.

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!,"#-+&*./)0*+ 5.8 Introdução

Os asteróides, também chamados planetas menores, foram descobertos apenas no séc.19. No primeiro dia do ano de 1801, o astrônomo italiano Giuseppe Piazzi descobriu um objeto novo9 que se movimentava com maior rapidez que os planetas. Calculada a sua órbita, verificou-se que ela se localizava entre as órbitas de Marte e Júpiter, a mesma posição onde a relação de Bode (veja a nota de rodapé da pág. 5-5) sugeria haver um planeta. Nos anos seguintes, novos asteróides foram descobertos, todos com órbitas localizadas entre Marte e Júpiter.

No início costumava-se batizar os asteróides com nomes mitológicos. Como a quantidade de novos asteróides crescia rapidamente com o surgimento de instrumentação mais sofisticada, eles passaram a ser designados seqüencialmente por números.

5.8.1 Cinturão asteroidal É na região entre Marte e Júpiter que se localiza o cinturão asteroidal. Na Tabela 5.8 tem-se algumas características físicas e orbitais dos principais asteróides. A Figura 5.54 mostra as semelhanças aparentes entre os asteróides Ida e Graspa e os satélites Fobos e Deimos.

O cinturão não é preenchido uniformemente, e as falhas são conhecidas como lacunas de Kirkwood. Estas falhas correspondem a períodos orbitais específicos, decorrentes de um efeito conhecido por ressonância: a razão entre os períodos orbitais de Júpiter e do asteróide é sempre uma fração (1/1, 1/2, 1/3, 2/5, etc.). Por exemplo, no caso 1:2, enquanto Júpiter completa uma volta em sua órbita o asteróide completa duas em sua órbita. Portanto, a cada duas voltas o asteróide encontra-se novamente perto de Júpiter e fica submetido à atração gravitacional mais intensa do planeta. Isto instabiliza o movimento orbital do asteróide e o força a mudar sua órbita. Portanto, quando há ressonância a órbita é instável.

Outro fato surpreendente que as sondas espaciais constataram é que o cinturão é limpo de poeira fina. As sondas espaciais Pioneer 10, Voyagers, Galileo e Cassini cruzaram livremente a região do cinturão. Isto indica que o espaçamento entre os asteróides é grande. A massa total do cinturão asteroidal é da ordem de 4% da massa da Lua (ou meio milésimo da massa da Terra).

Três corpos no cinturão desafiam nosso conhecimento, pois se apresentam ora inativos, ora ativos: 133P/ (7968) Elst-Pizarro, 118401 (1999 RE70, P/2005 U1 (Read). Eles são discutidos adiante.

5.8.2 Asteróides que se aproximam da Terra

Nem todos os asteróides estão no cinturão. Os asteróides dos grupos Aten, Apollo e Amor são pequenos (menos de 30 km de diâmetro), possuem órbitas excêntricas e não coplanares com a eclíptica e alguns cruzam a órbita da Terra. Genericamente, eles são classificados como NEA, do inglês Near Earth Asteroids, e possuem periélio menor que 1,3 U.A.

9 Ceres, agora classificado como planeta-anão.

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Os asteróides do grupo Aten possuem órbitas com semi-eixo maior10 menor que 1 U.A., ou seja, ficam na região interna à orbita terrestre. Os do grupo Apollo têm órbitas com semi-eixo maior fora da órbita da Terra, porém possuem periélios internos a ela. Os asteróides do grupo Amor possuem órbitas exteriores à terrestre mas interiores a de Marte, ou seja, circulam entre os dois planetas. Estes asteróides aproximam-se muito de Marte. É possivel que os satellites marcianos Fobos e Deimos sejam asteróids capturados desse grupo. Ícaro (grupo Apollo), por exemplo, aproxima-se mais do Sol que Mercúrio. Os objetos desse grupo são os que apresentam maior probabilidade de se chocarem com a Terra. Eros, em sua máxima aproximação, passa a cerca de 20 milhões de km da Terra. Talvez tenha sido corpos deste grupo os responsáveis pelas crateras do Meteoro (Arizona) e de Chicxulub (Golfo do México). Esta última pode estar associada à extinção dos dinossauros.

Em agosto de 1972 um bólido foi visto, em pleno dia, em vários estados centrais dos EUA e alguns do sul do Canadá. O objeto cruzou a atmosfera terrestre a uma altura de 60 km, mas não caiu na superfície.

Embora as chances de colisão com a Terra sejam baixas, duas a cada milhão de anos, atualmente esses objetos estão sendo monitorados continuamente. Os mais perigosos são os menores que são vistos só quando estão muito próximos. Há várias propostas de atuação direta em objetos que poderão colidir com a Terra prevêm desde a destruição do objeto com armas atômicas até a alteração orbital por ação direta de artefatos como foguetes.

Asteróide (descoberta)

Diâmetro (1) (km)

Rotação (horas)

Excentricidade Albedo Tipo (2)

Pallas (1802) 583 7,9 0,23 0,09 M Juno (1804) 249 7,2 0,26 0,16 S Vesta (1807) 555 5,3 0,09 0,26 S

Astraea (1845) 116 16,8 0,19 0,13 S Hebe (1847) 206 7,3 0,20 0,16 S Iris (1847) 222 7,1 0,23 0,2 S

Elora (1847) 160 13,6 0,16 0,13 S Metis (1848) 168 5,1 0,12 0,12 S Higiea (1849) 443 18 0,12 0,05 C Eros (1898) 20 5,3 0,22 0,18 S

Aquiles (1906) 70 0,15 Hektor (1907) 230 6,9 0,03 0,03 C Hidalgo (1920) 30 10,1 0,66 M Amor (1932) 5? 0,43 Icarus (1949) 2 2,3 0,83

Appolo (1932) 2,5 0,56 Chiron (1977) 320 0,38

(1) Por serem pequenos, nem sempre os asteróides são esféricos; estes valores são os que representam melhor seus volumes. (2) Veja explicação no texto. Tabela 5.8 Características físicas e orbitais dos principais asteróides (H.Karttunen et al., p. 490, 1995) 5.8.2 Asteróides Troianos

Os troianos estão na mesma órbita de Júpiter, em dois grupos separados de Júpiter por uma distância equivalente a 1/6 da órbita. Estas duas regiões são conhecidas como pontos de

10 metade do eixo maior da órbita elíptica.

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Lagrange L4 e L5 (pontos de estabilidade gravitacional). Um grupo move-se à 1/6 de órbita a frente de Júpiter, enquanto o outro segue o planeta 1/6 de órbita atrás. Acredita-se que estes asteróides tenham sido capturados por Júpiter. Saturno, Vênus, Terra e Marte também têm pequenos corpos em seus pontos L4 e L5 . 5.9 Composição química

A composição química dos asteróides lembra a dos planetas telúricos. Os asteróides do cinturão apresentam diferenças de composição química que guardam relação com a posição orbital. Grosso modo, os asteróides mais próximos de Marte, tipo S, são mais claros e formados basicamente de uma mistura de rochas silicáticas e ferro, semelhante a dos meteoritos do tipo rocha-ferro (ou ferropétreos) discutidos adiante. Já os asteróides mais próximos de Júpiter (60% do total), conhecidos por tipo C, são mais escuros e têm composição química semelhante a dos meteoritos condritos carbonáceos (ricos em carbono). Os demais asteróides, conhecidos por tipo M (metálicos ou sideritos) são constituídos basicamente de uma liga de ferro e níquel.

Até agosto de 2006, Ceres foi o maior asteróide do cinturão, atualmente é planeta anão, o único do cinturão. Com 946 km de diâmetro ele concentra cerca de 25% da massa asteroidal total. Há evidências de que sua estrutura seja composta de uma crosta fina, um manto rico em água e um núcleo rochoso. Se a água for ! da massa do manto, então Ceres contém mais água doce que a Terra. O volume total de água em nosso planeta é 1,4 bilhão de km3, dos quais apenas 41 milhões de km3 é de água doce. Ceres pode conter 200 milhões de km3 de água doce, cinco vezes mais que a Terra! Outros asteróides também podem conter grandes quantidades de água. Parte da água da Terra deve ter vindo de asteróides que aqui cairam quando a Terra havia esfriado.11 Os asteróides metálicos, por outro lado, contém quantidades de liga ferro-níquel pura muito maior que todo o ferro até hoje utilizado pelo homem. Do ponto de vista econômico, esses objetos têm valor inestimável.

Tipo C M S Abundância 60% " 10% # 30%

Composição predominante C + Fe3O4 metais silicatos Albedo < 5% # 10% # 15%

Cor escuros intermediário claros Posição cinturão externo

(próximo de Júpiter) cinturão intermediário

cinturão interno

(próximo de Marte) Tabela 5.9 Características (valores médios) dos asteróides do cinturão asteroidal.

5.10 Origem

A origem dos asteróides é um assunto ainda em discussão porque envolve vários aspectos físicos e dinâmicos. O cinturão localiza-se na região onde a relação de Bode prevê a existência de um planeta. Este era um argumento forte para que se aventasse a possibilidade desse cinturão ter surgido da desintegração de um planeta. No entanto, não há nenhuma evidência científica que prove essa hipótese. As evidências dinâmicas não reforçam essa

11 A água primordial foi perdida durante o período em que a Terra era muito quente.

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possibilidade. A hipótese mais aceita, é que eles sejam fragmentos (planetésimos) que, na época de formação do SS, não se agregaram aos corpos maiores por influência gravitacional de Júpiter, que estava crescendo rapidamente naquela região (com o aumento da massa, o campo gravitacional aumenta). Colisões mútuas posteriores fragmentaram ainda mais os planetésimos maiores, aumentando a população de corpos menores. No entanto, é importante lembrar que a discussão da composição química dos asteróides é feita de forma comparativa, associando-os aos meteoritos.

As informações químicas dos asteróides são inferidas de observações espectroscópicas, polarimétricas e radiométricas. Já os meteoritos são analisados em laboratório. Alguns meteoritos do tipo ferro, por exemplo, apresentam indícios de terem sido formados em ambiente caracterizado por alta pressão e resfriamento muito lento (1oC / milhão de anos). Estas condições só podem ser encontradas em núcleos de corpos grandes, acima de 100 km de diâmetro. Como se acredita que esse tipo de meteorito esteja associado aos asteróides do tipo M, fica evidente que a hipótese de que os asteróides sejam planetésimos não agregados ainda apresenta dificuldades.

Dois fatos recentes demonstram a dificuldade de se desvendar este mistério. O primeiro são as imagens do telescópio Hubble mostrando uma cratera de 460km de diâmetro na superfície de Vesta, que tem apenas 555 km de diâmetro (Figura 5.55). Seria esta uma evidência de que os asteróides do cinturão, ou pelo menos parte deles, surgiram da fragmentação de um corpo maior? O segundo fato são as medições eco-radiométricas da sonda NEAR (Near Earth Asteroid Rendezvous) revelando que o interior do asteróide Matilde é fragmentado; na realidade ele seria um aglomerado de blocos unidos pela gravidade. Casta (Figura 5.54B) pode ser outro exemplo. Estas estruturas revelam um processo colisional, ou comprova a hipótese de que os asteróides sejam planetésimos não agregados aos planetas? Os meteoritos condritos ordinários (discutidos adiante) são os mais abundantes na Terra, e há fortes evidências espectrais para associá-los aos asteróides do grupo Apollo. Do ponto de vista dinâmico não é tarefa fácil demonstrar um processo dinâmico capaz de modificar as órbitas dos asteróides a ponto de colocá-los em órbitas típicas da família Apollo. Do ponto de vista físico, há poucos asteróides no cinturão com características espectrais semelhantes às dos asteróides Apollo. Uma hipótese alternativa é que esses asteróides sejam núcleos de cometas periódicos extintos, que perderam a componente volátil. Mas esta hipótese apresenta uma dificuldade: as altas temperaturas e os metamorfismos sofridos pelos condritos ordinários são incompatíveis com a natureza do gelo cometário.

Em 1979 foi descoberto o asteróide 7968, Porém, em 1997 ele foi redescoberto como cometa, possuidor de atmosfera com características cometárias. Quantro anos depois ele mostrou-se inativo (característica asteroidal), volotu a ser ativo em 2003 e inativo desde então. Atualmente ele é identificado por 133P/ (7968) Elst-Pizarro. Juntamente com os objetos P/2005 U1 (Read) e 118401 (1999 RE70) eles foram nova classe de objetos: os cometas do cinturão. Simulações dinâmicas indicam que eles sempre foram dessa região, ao contrário das famílias de Júpiter e de Halley

Outro caso intrigante é Chirão, descoberto em 1977. Seu afélio está próximo da órbita de Urano, e o periélio está dentro da órbita de Saturno. Embora classificado como asteróide, ele já se apresentou envolto por uma tênue nuvem de gás, algo parecido com uma coma cometária (discutida adiante).#

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Figura 5.54 (A): Fobos e Deimos, satélites de Marte, podem ser asteróides capturados. As semelhanças entre eles e os asteróides não são apenas morfológicas. (B): A densidade média de Casta indica material poroso, ou blocos rochosos agregados pela força gravitacional. (imagens da NASA)

Figura 5.55 : Figura 5.55 Asteróide Vesta, fotografado com o telescópio espacial Hubble em 04/9/97. A imagem central mostra os acidentes de superfície retratados em cores: amarelo representa o nível da superfície; azul as depressões mais profundas; vermelho as elevações mais altas. O hemisfério sul de Vesta é marcado por uma cratera de impacto com pico central. [P.Thomas (Universidade de Cornell), B.Zinner (Universidade do Sul da Geórgia), NASA]

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5.11 Introdução

Os cometas são os astros que, certamente, mais fascinaram o ser humano. Por serem de aparecimento, em grande parte, imprevisível eles sempre foram associados a mitos, superstições, alarmismo, etc. Sêneca (4 a.C – 65 d.C), em seu Livro VII de Naturales Quaestiones, exemplifica muito bem este aspecto quando diz: “Não há mortal tão apático, tão obtuso, tão voltado para a terra, que não se aprume e se oriente, com todas as forças do pensamento, para as coisas divinas, sobretudo quando algum fenômeno insólito aparece nos céus... Quando aparecem esses corpos (os cometas) de chama, com forma rara e insólita, todos querem ver como eles são, esquece-se de tudo para se indagar sobre a novidade. Não se sabe se se deve admirar ou temer, pois, nunca falta quem se aproveite para semear o medo prognosticando coisas terríveis”12.

Nem sempre os cometas foram vistos como maus presságios. Um cálculo retroativo no tempo, mostra que o cometa Halley (que reaparece a cada 75 anos) passou próximo à Terra entre os anos 11 a.C. e 66 d.C. Isto nos leva à possibilidade de que a estrela de Belém, que teria guiado os três reis magos até a mangedoura onde estava Cristo recém nascido, possa ser esse cometa. Fato também interessante é que nos afrescos do mestre florentino Giotto di Bondone, na Capela Scrovegni, em Pádua, na representação do nascimento de Cristo a estrela de Belém aparece na forma de um cometa. Possivelmente esta inspiração de Giotto tenha sido influenciada pela passagem do cometa Halley no fim do verão de 1301, antes de pintar aquela cena. Evidentemente, isto não se constitui em prova cabal, até porque ainda ela não foi comprovada, mas a possibilidade existe.

Talvez o papel mais marcante dos cometas na vida do ser humano seja a possibilidade deles serem fortes candidatos a abastecerem a Terra com água e compostos orgânicos, dois ingredientes indispensáveis para o surgimento da vida. Há evidências de que os cometas tiveram papel preponderante na formação da atmosfera atual e dos oceanos. Eles teriam bombardeado a Terra há cerca de 4 bilhões de anos. Além disso, as moléculas pré-bióticas, tais como polissacarídeos, aminoácidos e componentes de ácidos nucleicos, fartamente encontrada no material interestelar (que deu origem ao SS), poderiam encontrar nos cometas condições para se combinar e dar origem às formas mais primitivas de vida. Na teoria da Panspermia, a “semente da vida” veio de fora e encontrou na Terra as condições ambientais necessárias para se desenvolver. Nela, os cometas se apresentam como “portadores da vida”, numa espécie de “inseminação cósmica” onde o “espermatozóide-cometa” fecunda o “óvulo-Terra”.

5.12 Estrutura dos cometas

Fisicamente, os cometas são corpos de massa pequena, composta de elementos

químicos voláteis na forma de gelo [80% de água (H2O), 16% de monóxido de carbono (CO), 4% de dióxido de carbono (CO2) , e traços de amônia (NH3) e metano (CH4)] e partículas de poeira meteorítica. Esta estrutura forma o núcleo do cometa, que raramente excede duas dezenas de km (Figura 5.56A). O diâmetro médio13 é 10 km. Ao se aproximar do Sol, a temperatura superficial do núcleo aumenta e o material volátil é sublimado, isto é, passa diretamente da fase sólida para a gasosa.

12 Cometas: do mito à ciência, Oscar T. Matsuura, Ícone Editora, pág. 9, 1985. 13 Diâmetro correspondente ao volume médio, já que o núcleo cometário não é necessariamente esférico.

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Neste processo, o gás é ejetado de forma semelhante a um jato e arrasta os grãos

impregnados nessa massa congelada. Essa matérial em expansão forma a coma, um invólucro aproximadamente esférico com cerca de 100.000 km de diâmetro que envolve o núcleo, e as caudas (Figuras 5.4B e 5.56A). O núcleo e a coma formam a cabeça do cometa.

As caudas são classificadas por tipos. A cauda iônica (Tipo I) é formada por gás ionizado, é retilínea e apontada para a direção anti-solar. Esse gás ionizado é composto de moléculas e radicais produzidos por fotodissociação14 e fotoionização15 da luz solar sobre as moléculas vaporizadas da superfície do núcleo. Ao interagir com o vento solar16 esse gás ionizado é arrastado na direção anti-solar, adquirindo a aparência típica (Figura 5.56B).

A cauda Tipo II, composta de gás neutro e poeira, é mais larga e encurvada. Os grãos de poeira são arrastados para longe do Sol em virtude da pressão exercida pela radiação solar sobre os mesmos. Como o arrastamento pela luz é menos eficiente que o arrastamento pelo vento solar sobre íons, esta cauda é mais encurvada. Alguns cometas chegam a apresentar esta cauda dividida em duas, que se distinguem pela largura e curvatura; a mais larga e mais curvada é composta essencialmente por poeira. A cauda Tipo II também aponta para a direção oposta ao Sol. As caudas Tipos I e II podem ter comprimentos de até 1 UA e nem sempre estão presentes simultaneamente.

Núcleo, coma e parte a parte inicial das caudas estão envolvidos por um envelope imenso de hidrogênio, resultante da fotodissociação do radical hidroxila (OH+) pela luz solar. Esse envelope é observado na luz ultravioleta.

A água é o componente majoritário de gelo formado por hidratos de várias substâncias, tais como, CH3, NH4, CO2, e outros. A grandes distâncias heliocêntricas, o espectro dos cometas é essencialmente luz solar refletida pela matéria da coma e das caudas. Próximo do Sol, a cerca de 1 UA, a cabeça do cometa apresenta emissão molecular pelo carbono (C2), cianogênio (CN), oxigênio (O2), hidroxila (OH) e hidretos de nitrogênio (NH e NH2). A pequenas distâncias heliocêntricas surgem linhas de emissão do silício (Si), cálcio (Ca), sódio (Na), potássio (K) e níquel (Ni).

Ao expandir-se o material ejetado forma uma superfície imensa que reflete a luz solar, criando a aparência exótica dos cometas. Essa aparência varia com a distância heliocêntrica: quanto mais perto do Sol, maior o tamanho do cometa. O brilho pode ser expresso por uma lei fotométrica do tipo:

14 Dissociação da molécula pela ação da luz. Ex.: H2O ! OH + H, OH ! O + H. 15 Ionização provocada pela absorção de fótons. 16 fluxo de partículas eletricamente carregadas, expelido do Sol em alta velocidade.

Figura 5.56: (A) Estrutura de um cometa. (b) Orientação das caudas de um cometa durante seu trajeto (R.R.Robbins et al., Figuras 7-4, p.122, 7-5, p.123).

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B = const. ! R-n $-2

onde: const é uma constante; R e $, respectivamente, as distâncias heliocêntrica e geocêntrica; e n, o índice fotométrico. Os expoentes negativos indicam que brilho e distância são inversamente proporcionais, isto é, quando as distâncias aumentam o brilho diminui. O parâmetro mais crítico nesta expressão é o n; não há um valor típico, ele pode variar de um caso a outro. Para um mesmo cometa n pode variar com a distância heliocêntrica ou ainda ser diferente nas diversas aparições. Normalmente n aumenta quando a distância heliocêntrica diminui, ou seja, o brilho do cometa aumenta rapidamente quando este se aproxima do Sol. Valores razoáveis para n podem estar entre 1 e 6. Apesar de apresentarem uma composição química básica, os cometas podem diferir muito entre si. Um exemplo recente é o cometa Hale-Bopp, a maior atração astronômica do primeiro semestre de 1997, que apresentou um fato jamais observado anteriormente: uma das caudas era constituída essencialmente de sódio neutro (Figura 5.57). Os cometas novos (veja adiante) ou de períodos muito longos ficaram a maior parte de sua existência longe do Sol, em regiões muito frias, por isso são ricos em substâncias gasosa e sólida. Quanto mais freqüentes forem as aproximações ao Sol, mais o cometa estará exposto ao aquecimento. Em outras palvras, quanto menor o período menor será a longevidade do cometa. À medida em que o cometa envelhece, o gás vai-se tornando proporcinalmente mais abundante que a poeira. O material sólido que não foi ejetado durante a vaporização vai formando uma crosta superficial porosa, que atua como camada termicamente isolante e dificulta a liberação dos grãos imersos na massa congelada mais profunda. Com isso, apenas as moléculas dos gases conseguem passar pelos interstícios, e o cometa vai apresentando coma e caudas predominantemente gasosas. Com o passar do tempo, o próprio gás vai se exaurindo e o cometa vai perdendo brilho. Acredita-se que alguns tipos de asteróides, sejam na realidade cometas extintos. A Figura 5.58 mostra as semelhanças aparentes entre o asteróide Ida e o núcleo do cometa Halley. No caso do cometa Halley, o fato mais surpreendente foi a composição química do seu núcleo: composto de material escuro, o albedo é somente 5%, praticamente igual ao do carvão; a temperatura superficial do núcleo, na época em que foi observado pela sonda européia Giotto17, era 330 K (57o C), elevada demais para ser composta de gases congelados. Este fato associado à densidade média calculada (de 0,1 a 0,25 g/cc), leva à conclusão de que o núcleo é poroso (90% de espaço vazio) e os gases estão congelados nos interstícios mais profundos. Cerca de 80% da matéria dos jatos gasosos é vapor de água. Nosso conhecimento sobre a constituição do núcleo avançou muuito nos últimos anos graças às sondas espaciais. Em 1999 a sonda americana Deep Space 1, projetada para observar 9969 Braille, foi utilizada para fotografar de perto o cometa periódico Borrelly (19P/). Seu núcleo (Figura 5.59) lembra o do Halley, apesar ter cerca de ! do tamanho. Nesse mesmo ano, a sonda Stardust visita o cometa Wild 2 (81P/) para obter imagens de alta resolução, coletar poeira da coma e retornar à Terra com a amostragem. Ela foi resgatada em janeiro de 2006 e a poeira coletada já está sendo analisada em laboratório. A superfície do núcleo desse cometa é fortemente marcada por crateras, provavelmente de origem não colisional. Uma revelação surpreendente é a abundância de grãos de olivina18, comuns em alguns tipos de meteoritos. Isto reforça a idéia de que esses grãos são cozidos, resfriados rápidamente e ejetados para as partes mais distantes do disco protoplanetário pelos jatos bipolares quentes típicos de estrelas 17 nome dado em homenagem ao pintor florentino Giotto de Bondone (mencionado anteriormente). 18 material silicático muito duro, geralmente de magnésio ou ferro [(Mg, Fe)2SiO4) que se funde a temperaturas superiores a 1000 oC.

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em formação. No ano de 2005, a sonda Deep Impact foi ao encontro do cometa Tempel 1 (9P/) para fotografá-lo em diferentes regiões espectrais e lançar sobre ele um módulo de impacto de 300 kg para provocar uma cratera. O objetivo do impacto era atingir o subsolo do núcleo para comparar os materias do subsolo e da superfície, estudar o processo de formação da cratera para obter informações sobre a composição química e a natureza do material e verificar se a atividade do cometa mudaria com a abertura da cratera. Com a ajuda de dados observacionais complementares, como do telescópio espacial Spitzer, as conclusões foram surpeendentes. A atividade aumentou consideravelmente com a cratera exposta. Os grãos produzidos pelo impacto eram bem menores que os esperados, dos tamanho dos grãos de talco. Além de silicatos (areia) há argila e carbonatos (material básico das conhas marinhas), compostos que se acredita ser formado em ambiente rico em água líquida. Também foram encontrados minerais ricos em ferro (geralmente óxidos de ferro) e hidrocarbonetos aromáticos encontrados em fumaça de churasco e exaustão de veículos. Uma “receita básica” de cometas incluiria gelos de dióxido de carbono e de água, silicatos, carbonatos, ferro em ligadas metálicas e sulfetos, e moléculas orgânicas (hidrocarbonetos poliaromáticos). Como essa estrutura se formou? Como

Figura 5.58 Semelhança morfológica entre o asteróide Ida (NASA) e o núcleo do cometa Halley (Giotto, ESA). O núcleo do Halley é escuro (igual ao carvão), alongado (8 por 16 km), e o gás congelado e a poeira são ejetados de regiões localizadas. A cor avermelhada da imagem é falsa.

Figura 5.57 O cometa Hale-Bopp, um dos cometas mais brilhantes deste século, apresentou uma cauda constituída essencialmente de sódio neutro.

Figura 5.59 Núcleos dos cometas 19P/Borrelly (esquerda), 81P/Wild 2 (centro) e 19P/Tempel 1 (direita). Imagens da NASA, missões Deep Space 1, Stardust e Deep Impact, respectivamente. Imagens fora de escala.

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a argila e os carbonatos, que surgem em água líquida, apareceram nos cometas se estes são congelados? Isto pode indicar que nos primórdios do Sistema Solar os compostos estavam misturados de forma relativamente homogêna, e que houve um mecanismo que permitiu que materiais formados nas proximidades do Sol, onde havia água líquida, e outros formados nas regiões gélidas onde estão Urano e Netuno fossem incluídos num mesmo corpo, os cometas. Essas informações devem influenciar fortemente as teorias de formação planetária. 5.13 Órbitas e Nuvem de Oort De acordo com as características orbitas, os cometas podem ser classificados em periódicos e novos. Periódicos são todos os cometas que apresentam sucessivas passagens pelo periélio19. Quanto menor for o período (portanto menor é a órbita), mais vezes o cometa passará pelo Sol. Os cometas periódicos têm o prefixo “P/” antes do nome. Boa parte deles pertencem a famílias (conjunto de cometas com órbitas semelhantes), normalmente ligadas aos planetas maiores (Júpiter, Saturno, Urano e Netuno). Por esta razão, estes cometas têm períodos de no máximo centenas de anos, e suas órbitas estão praticamente sobre o plano da eclíptica. Estas famílias se formam pela ação atrativa (gravitacional) dos planetas, que “capturam” os cometas que se aproximam demais. A depender da configuração geométrica essa interação pode lançar o cometa para fora do SS20. Contrapondo-se aos cometas periódicos estão os cometas novos, com órbitas altamente excêntricas e distâncias afélicas enormes. Um cometa novo pode ser tanto de longuíssimo período (por isso está sendo visto agora) ou não periódico (está apenas passando pelo periélio). Os cometas passam a maior parte de suas vidas longe do Sol. Isto porque quanto mais excêntrica for a órbita, mais longínquo é o afélio e mais lento será o movimento nessa região (consequência da 3a Lei de Kepler). As órbitas não são necessáriamente coplanares com a eclíptica, e os movimentos podem ser direto ou retrógrado.Os cometas periódicos podem ter períodos curtos (até algumas dezenas de anos), médios (dezenas de anos) ou longos e muito longos (centenas ou milhares de anos). Estas características estão associadas às origens (regiões do SS de onde eles vêm) e aos aspectos dinâmicos (modificação da órbita devido às perturbações gravitacionais pelos planetas). Estudando as características orbitais dos cometas de períodos longos, o astrônomo holandês Jan Hendrik Oort propôs em 1950 a existência de uma nuvem esférica composta de cometas. Essa nuvem de Oort, com raio interno de 50.000 UA e externo de 100.000 UA, teria cerca de 100 bilhões de cometas cicundando o SS. Devido à movimentação do SS na Galáxia, perturbações gravitacionais de estrelas vizinhas, ou mesmo de nuvens interestelares, provocariam alterações nas órbitas de alguns desses cometas, ejetando alguns deles para dentro do SS, e outros para fora. Por permanecerem longo tempo longe do Sol, esses cometas conservaram sua composição química original inalterada. Por esta razão, os cometas novos são vistos como “fósseis” valiosos que nos permitem estudar a composição química primordial do SS. As estimativas da massa total da nuvem são incertas, mas seria várias vezes maior que a da Terra, podendo chegar a 100 vezes. Há quem sugira que o cinturão de Kuiper (abaixo) seja a parte interna da nuvem de Oort. A nuvem não é vista aos telescópios porque esse material está distribuído entre uma infinidade de cometas, muito espassados (baixa concentração) e dificílimos de serem observados (são pequenos e não têm atividade, por isso refletem pouquíssima luz solar). 19 Periélio é o ponto da órbita mais próximo do Sol. Afélio, é o oposto. 20 Este artifício é utilizado para acelerar as sondas espaciais e enviá-las a grandes distâncias.

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5.14 Cometas do cinturão de Kuiper Analisando as órbitas dos cometas de curto período (menor que 200 anos) notamos que a maioria se concentra sobre o plano da eclíptica. Um cometa de longo período, cuja órbita não seja necessariamente coplanar à eclíptica, pode, pela interação gravitacional com um planeta joviano, transformar-se num cometa periódico. No entanto, não é possível invocar este processo para explicar as órbitas de todos os cometas periódicos conhecidos. Esta é uma das razões que levaram o astrônomo Gerald P. Kuiper propor em 1951 a existência de um cinturão além da órbita de Netuno, entre 30 e 50 UA.21 Atualmente admite-se que essa região transnetuniana chegue até 100 UA. Acredita-se que o cinturão de Kuiper seja preenchido por objetos formados em sua maior parte de gases congelados misturados a material rochoso. Esses objetos (também chamados objetos transnetunianos, ver adiante), ou que daqui vieram, têm tamanhos variados; vão de alguns quilômetros (cometas de curto período) até centenas de quilômetros: Chirão tem 170 km de diâmetro. A observação direta dos objetos desse cinturão é uma tarefa muito difícil, pois as distâncias são enormes e os corpos que lá estão são pequenos. O telescópio espacial Hubble tem facilitado a observação desses objetos, e espera-se que no futuro próximo o desenvolvimento de equipamentos mais sensíveis e técnicas observacionais mais sofisticadas facilitem a coleta de informações mais detalhadas dos objetos daquela região.

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Os objetos transnetunianos, conhecidos como TNO (do inglês Trans-Neptunian Objects), são aqueles que orbitam o Sol a distâncias maiores que Netuno. Estão incluídos os KBOs (entre 30 e 50 UA), os SDOs (do inglês Scatered Disk Objects, entre 35 e 100 UA) e os próprios objetos da Nuvem de Oort (adiante de 50.000 UA).

Os KBO, também dividos em sub-classes, estão sob influência gravitacional de Netuno. Alguns exemplos: Plutão (2.300 km) e seus satélites,(1.200 – 1.800 km), Orcus (1.200 km), Quaouar (1.260 km), Ixion (500 km), Varuna (1.060 km), possivelmente Tritão (2.700 km). Os SDOs possuem órbitas mais excêntrica e inclinadas, resultantes de perturbação gravitacional. Por vezes, a designação SDO é substituída pela KBO (Scattered Kuiper Belt Objects). Alguns exemplos: possivelmente Sedna (1.200-1.800 km), 2002 TC302 (1.200 km), 2003 UB313 (2.600 – 3.400 km) e seu satélite. Na verdade essa região ainda é muito desconhecida por diversas razões. Além de ser muito vasta, é muito distante. Os objetos são pequenos e gélidos, difíceis de serem observados mesmo na região espectral do infravermelho que é muito sensível às baixas temperaturas. As características dinâmicas (excentricidade e inclinação das órbitas) desses objetos são muito diversificadas para se ter uma classificação simples. Mas a importância dessa região para o estudo da origem do Sistema Solar é inestimável pois os corpos que alí estão mantêm a composição química primitiva. Apenas os cometas de longo período, com suas órbitas altamente excêntricas, chegam até a região interna do SS e podem ser observados de perto, sobretudo a composição química da matéria sublimada pelo calor solar. 21 Embora a proposta tenha sido feita também por Kenneth E. Edgeworth, a referência mais comum é apenas a Kuiper, tanto que os objetos dessa região são designados por KBO (Kuiper Belt Objects).

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,!!"#9*&*2./)0*+:#3*&*2.2+:#3*&*2.)&2+#*#;2*).%#<20)%=%(#!5.15 Introdução

Pelo espaço interplanetário vagam corpos muito pequenos, na realidade fragmentos rochosos, com composição química semelhante a dos planetas telúricos: são os meteoróides. Os tamanhos variam de dimensões micrométricas até quilométrica, que é o limite de tamanho mínimo dos asteróides.

Quando caem na Terra, atravessam a atmosfera com velocidades que variam entre 11 km/s (velocidade de escape da Terra) e 53 km/s (órbita parabólica e retrógrada), suficientes para provocar fusão total ou parcial deles. Este fenômeno atmosférico é visto como um rastro luminoso efêmero denominado meteoro, também conhecido popularmente como estrela cadente. Os meteoros são provocados essencialmente pelos meteoróides pequenos (grãos), por isso são fenômenos efêmeros que podem desaparer (desintegram-se) antes de atingir o solo.

Um fenômeno muito comum é o chuveiro de meteoros, que pode apresentar até milhares de meteoros por hora. Os traços luminosos parecem provir de uma direção específica, chamada radiante. Na realidade é um efeito de perspectiva. O chuveiro recebe o nome da constelação onde estiver o radiante, por exemplo: Aquáridas (em Aquário), Perseidas (em Perseu), Dracônidas (em Dragão) e Leônidas (em Leão). Alguns desses chuveiros estão associados a cometas. Os mencionados acima, por exemplo, estão associados aos cometas Halley, Swift-Tuttle, Giacobini-Zinner e Tempel, respectivamente. A razão dessa associação é a seguinte: parte da poeira ejetada pelos cometas permanece em movimento ao redor do Sol, na órbita do cometa. Quando a Terra cruza a órbita de um desses cometas, ou passa muito próximo dela, essa poeira cai na Terra produzindo um chuveiro de meteoros. Portanto, este é um fenômeno periódico. Os chuveiros menionados acima ocorrem, nas seguintes datas:

Aquáridas (Halley), 2-6/maio e 25-31/junho; Perseidas (Swift-Tuttle), 10-14/agosto; Dracônidas (Giacobni-Zinner), 9-19/outubro; Leônidas (Tempel), 14-19/novembro.

Corpos grandes produzem meteoros muito mais intensos, como a bola de fogo e o bólido, que apresenta rastro de fumaça e ruído sonoro intenso. Um destes fenômenos ocorreu às 10h30 do dia 12/02/1947, na Sibéria, perto da cadeia montanhosa Sikhote-Alin (Figura 5.60). Testemunhas disseram ter visto uma bola de fogo deixando um rastro de espesso fumo e seguida de um ruído brutal. No local da queda foram encontradas várias crateras, com diâmetros entre 1 m e 30 m , e fragmentos constituídos basicamente de ferro.

Os meteoróides que sobrevivem à passagem pela atmosfera, caem no solo e passam a ser chamados meteoritos22. Do choque com o solo nascem as crateras, cujos tamanhos dependem da violência do impacto. Geralmente, a queda de um meteoróide grande produz uma cratera imensa (Figura 5.28B), mas podem ocorrer casos de desintegração explosiva ainda antes do meteoróide atingir o solo. Este foi o caso de Tunguska, região inóspita da Sibéria, onde toda uma região florestal foi devastada na manhã de 30/06/1908. Este fenômeno foi mais violento que o de Sikhote-Alin. A poeira produzida pela queda se dispersou pela atmosfera onde permaneceu por várias semanas. A luz solar refletida pela poeira clareava as noites, numa extensão vasta que ia das montanhas do Cáucaso até as ilhas Britânicas. Nenhum fragmento foi encontrado no solo.

22 Leitura complementar: Meteoritos, E. Picazzio, na revista Ciência Hoje, vol.4, no. 22 (1986)

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Na região do Alto Solimões, próximo ao Rio Curuçá, Amazonas, ocorreu um caso parecido em 13 de agosto de 1930, que ficou conhecido como “Tunguska brasileiro”. Segundo relatos, “o céu ficou avermelhado houve uma chuva de poeira seguida por um som assobiado de um bólido (fireball) vindo do céu”. Este evento foi inspecionado pela primeira vez pelo missionário Jesuítico Capuchino Fedele D´ Alviano, cinco dias depois. da ocorrência. Conversando com os habitantes locais ele soube dos detalhes e sete meses depois o artigo do jesuíta foi publicado no jornal do Vaticano "L´ Observatore Romano". Em 1931 o astrônomo inglês E. Bailey descobriu este artigo e, a partir dele, o astrônomo Ramiro de La Reza do Observatório Nacional no Rio de Janeiro iniciou sua investigação, que envolveu satélites, radares, aviões, registros sísmicos e entrevistas com testemunhas da explosão. Ele concluiu que provave;mente tratava-se de um asteróide de 30 metros que explodiu no ar, dividindo-se em três bólidos. Muito provavelmente, o Tunguska-Brasileiro, tal como foi chamado por Bailey, foi uma das quedas cósmicas mais importantes do último século.

Figura 5.60 (Em cima) Quadro retratando a queda em Sikhote-Alin. (Em baixo) Um dos meteoritos encontrados. (Sky & Telescope, Fev. 97, pág. 50)

Há fortes indícios de que a extinção dos dinossauros, ocorrida há 65 milhões de anos, entre os períodos cretáceo e terciário, tenha sido conseqüência da queda de temperatura, causada pelo obscurecimento repentino da atmosfera por poeira ejetada durante a colisão de um grande meteoróide com a crosta terrestre. Este fenômeno ocorreu no Golfo do México.

Poeira zodiacal é uma nuvem de grãos micrométricos que se aloja nas proximidades do plano da eclíptica. Ela se manifesta através da luz zodiacal, uma faixa tênue de luz vista nas vizinhanças do Sol, pouco antes do nascer, ou logo depois do ocaso. Esses grãos orbitam o Sol em trajetórias aproximadamente circulares, que evoluem secularmente. Nas proximidades do Sol, o raio orbital diminui gradativamente com o tempo, ou seja, os grãos espiralam em queda em direção ao Sol até a distância

aproximada de 3R (raios solares) quando a temperatura atinge o ponto de sublimação. Longe do Sol, o raio orbital aumenta gradati-vamente, porque os grãos são empurrados pela luz (pressão de radiação) solar. Portanto deve haver um mecanismo de suprimento de grãos, caso contrário a luz zodiacal já teria desaparecido.

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5.16 Composição química

Quanto à composição química, os meteoritos são classificados em três grupos básicos, subdivididos da seguinte maneira:

classe tipo subtipo ocorrência (%) metálicos 4

férropétreos 1

rochosos acondritos 9

condritos carbonáceos 5

ordinários. 81

Tabela 5.10 Classificação genérica de meteoritos, segundo a composição química predominante.

Os meteoritos metálicos (ferrosos ou sideritos) são constituídos de ferro (90-95%) e níquel (5-10%). A aparência externa destes meteoritos lembra restos de ferro siderúrgico, com superfície arredondada (moldada pela fusão atmosférica) e, às vezes, com depressões que se parecem com marcas de dedo em barro (Figura 5.61A). Internamente, a aparência é de ferro com traços de níquel. Eles são fortemente atraídos por imã. Após um tratamento adequado, é possível verificar em alguns deles a presença de estruturas retilíneas (figuras de Widmanstätten) que se formam sob condições físicas muito especiais: alta pressão e resfriamento muito lento (1o C / milhão de anos).

Os meteoritos ferropétreos (ou siderólitos), formam o grupo minoritário, e são formados de silicatos e da mistura ferro-níquel, em proporções comparáveis. Externamente se parecem com rocha ordinária, mas internamente apresentam cristais (escuros) arredondados de olivina23 numa matriz clara de ferro-níquel (Figura 5.61B).

23 Grupo de minerais silicáticos do tipo Mg2SiO4, Fe2SiO4, e outros.

Figura 5.61 (A) Amostra de meteorito metálico encontrada nas proximidades da cratera Hembury (Austrália): as depressões vistas na amostra são causadas pela abrasão durante a passagem pela atmosfera.). (B) Amostra do meteorito ferropétreo Sioux Co, colhida em Nebraska (EUA): a abrasão atmosférica deixa a superfície escurecida.

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Os meteoritos rochosos assemelham-se na aparência às rochas terrestres. Os acondritos lembram as rochas ígneas (basalto vulcânico) que sofreram fracionamento, como as brechas, que são constituídas de diferentes fragmentos rochosos cimentados por uma matriz de composição homogênea (Figura 5.62). Os condritos se diferenciam das rochas terrestres pela presença de côndrulos, esferas ou elipsóides submilimétricos minerais silicáticos, que se formaram em abiente de temperaturas elevadas e resfriaram-se rapidamente (Figura 5.63). A presença do ferro metálico e a ausência de óxido de ferro sugerem que os côndrulos se formaram em ambiente redutor, e foram incorporados posteriormente ao meteorito. Em idade, estes meteoritos são contemporâneos ao Sol. Os condritos carbonáceos apresentam inclusões ricas em cálcio e alumínio, também solidificadas a altas temperaturas, ambas incrustadas numa matriz formada de silicatos hidratados, condensados a baixas temperaturas. A cor escura dessa matriz se deve à presença de compostos orgânicos, inclusive aminoácidos. Isto significa que essa matriz jamais sofreu aquecimento superior a 200K. Portanto, fica evidente que os materiais que formam este tipo de meteorito tiveram origens diferentes e foram agregados num corpo único. Os condritos ordinários não apresentam minerais hidratados, nem compostos orgânicos. A matriz é formada por minerais de alta temperatura de fusão, mais clara, não apresenta inclusões de cálcio e alumínio, e assemelha-se aos côndrulos. Na amostragem de meteoritos, eles representam a maioria.

Figura 5.62 Meteorito rochoso acondrito, colhido em Chassigny (França). À direita, a textura interior é vista em luz polarizada. Sua composição química é única, por isso é paradigma de uma subclasse denominada “chassignite” (pronuncia-se chassinhite). Acredita-se que este meteorito tenha vindo de Marte. (JPL/NASA)

Figura 5.63 Meteorito rochoso condrítico. Os côndrulos são as incrustrações arredon-dadas, de cor clara.

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5.17 Origem

A análise da composição química nos permite associá-los aos corpos maiores. Os meteoritos do tipo ferro estão associados aos asteróides tipo M, que devem ter pertencido a corpos diferenciados24 que existiam no cinturão e que foram desintegrados em colisões violentas. Os meteoritos tipo ferropétreos associam-se aos asteróides tipo S, també diferenciados. Os condritos ordinários têm composição química semelhante a dos mantos e crostas dos planetas telúricos, provavelmente oriundos do cinturão. Os os condritos carbonáceos assemelham-se aos asteróides tipo C, ricos em carbono. Os acondritos se parecem muito com material encontrado na Lua e em Marte25.

Se a associação acima for correta, então os meteoritos podem representar tanto fragmentos que não foram agregados aos corpos na época de formação do sistema planetário, como fragmentos liberados por processo colisional entre corpos parentais.

Finalmente, a poeira zodiacal tem espectro semelhante ao dos asteróides e da poeira cometária. Como ela é reciclável, sua origem deve estar ligada a processos dinâmicos que envolvem esses corpos. A poeira de origem asteroidal deve ser produto da fragmentação oriunda das colisões mútuas, que de alguma forma reprocessa o material primitivo. Já a poeira de origem cometária é um produto primitivo, liberado durante as passagens periélicas. !

!

24 Nos primórdios do Sistema Solar, os corpos maiores que estavam aquecidos a temperaturas elevadas sofreram separação das fases silicáticas em relação às fases metálicas. Como conseqüência os materiais mais densos migraram para o interior do corpo, enquanto os menos densos migraram para a superfície. Esses corpos diferenciados quando se fragmentam por colisão violenta expelem materiais de composição características da região planetária que pertencia. Os metálicos vêm do interior. 25 As rochas marcianas que aqui chegaram distribuem-se em um grupo conhecido por SNC, sigla composta das inicias das cidades onde foram encontrados, a saber: Shergotty (Índia, 1865), Nakhla (Egito, 1911) e Chassigny (França, 1815).

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Sistema Solar (SS) é o nome do conjunto de corpos formados pelo Sol e pela família de objetos que estão ligados gravitacionalmente à ele. Ao redor do Sol, giram corpos de dimensão, aparência e composição química variadas (Figura 1.1). A tradicional divisão desses corpos em oito planetas, 3 planetas-anões, dezenas de satélites, milhares de asteróides, e miríades de cometas e fragmentos rochosos, hoje está em discussão. Os satélites Ganimedes e Titan (de Júpiter e Saturno, respectivamente) são maiores que os planetas Mercúrio. O Planeta-anão Eris (2003 UB313) é maior que Plutão. Com o avanço tecnológico teremos em breve informações mais detalhadas da população de corpos da região transnetunia (região adiante de Netuno) e muito possivelmente, teremos de repensar a classificação dos corpos do Sistema Solar.

Embora o SS seja único, porque ele está associado ao Sol (só há uma estrela com esse nome), há evidências observacionais recentes que mostram a existência de sistemas planetários associados a outras estrelas. A hipótese de existência de sistemas planetários externos não é nova, as evidências observacionais sim. Voltaremos a discutir este assunto com mais detalhes.

Qual é o tamanho do SS, e onde está o seu limite? Se considerarmos o limite visível, a instrumentação atual nos permite chegar pouco

além de Plutão, que está a cerca de 40 UA do Sol. Nessa região existem pequenos corpos congelados que giram ao redor do Sol, formando o Cinturão de Kuiper. A essa distância é difícil detectá-los, por isso apenas os corpos maiores têm sido observados.

Considerando as evidências observacionais indiretas, como o tamanho das órbitas dos cometas novos, podemos dizer que o limite do SS está muito mais adiante do Cinturão de Kuiper, mais precisamente a cerca de 150.000 UA do Sol. Este é o diâmetro externo da Nuvem de Oort; uma concha esférica constituída de incontáveis cometas que orbitam o Sol.

Se quiséssemos levar este raciocínio ainda mais ao extremo, poderíamos definir o limite do SS como aquele que delimita a região do espaço onde o campo gravitacional solar estiver presente. Teoricamente este limite tende ao infinito, porque havendo massa haverá campo gravitacional por menor que seja sua intensidade, mas na prática ele poderia ser delimitado pela distância intermediária entre o Sol e a estrela mais próxima (Próxima-Centauro).

Mercúrio Vênus Terra Marte Júpiter Saturno Urano Netuno

Raio 0,38 0,95 1 0,53 11,21 9,45 4 3,88 Massa 0,055 0,814 1 0,104 317,7 99,66 14,53 17,06 Densid. 5,4 5,2 5,5 3,9 1,3 0,7 1,3 1,6 Atmosfera CO2 (96)

N(3) N(78) O(21)

CO2(95) N(3)

H(73) He(20)

H(78) He(20)

H,He(15) H2O,CH4NH3 (60)

H,He(10) H2O,CH4NH3 (60)

Satélites 1 2 63 56 27 13 Distância 0,39 0,72 1 1,52 5,2 9,55 19,19 30,11 Rotação 58,6 -243 0,99 1,03 0,41 0,45 -0,72 0,67 Translação 0,241 0,615 0,99 1,08 11,86 29,43 83,76 163,75 Excentr. 0,21 0,01 0,02 0,09 0,05 0,06 0,05 0,01 Incl.Orbital 7,00 3,39 0 1,85 1,31 2,49 0,77 1,77 Incl.do eixo 0 177,3 23,45 25,2 3,12 26,73 97,87 29,57

Tabela 5.1 Parâmetros físicos dos planetas: Raio e Massa, em valores relativos aos da Terra; Densidade, em

g/cc; Atmosfera, entre parênteses o percentual de cada componente; Distância, em UA; Rotação, em dia de 24h; Excentricidade; Inclinação do plano orbital, relativamente ao plano da eclíptica, em grau; Inclinação do eixo de rotação, relativamente à órbita, em grau. (Adaptada de E.Picazzio, 1997).

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A Tabela 5.1 apresenta os parâmetros físicos mais relevantes dos planetas. Através dela,

podemos constatar que os planetas podem ser reunidos em dois grupos distintos, denominados telúricos (ou terrestres) e jovianos ( ou gigantes). O telúricos, têm a Terra como paradigma, ou seja, são pequenos, rochosos, densidades médias elevadas, excetuando Mercúrio, eles apresentam atmosferas constituídas de gases pesados, possuem poucos satélites, ou nenhum, e estão próximos do Sol. Estes planetas são: Mercúrio, Vênus, Terra e Marte (Figura 5.1).

Os planetas jovianos, Júpiter, Saturno, Urano e Netuno, são parecidos com Júpiter; eles são grandes, constituídos essencialmente de gases, densidades médias baixas, atmosferas espessas e compostas de gases mais leves, têm muitos satélites, e estão distantes do Sol (Figura 5.2).

Se considerarmos as similaridades mais próximas, podemos destacar 3 duplas de planetas muito parecidos (mas não iguais) entre si, a saber: Júpiter e Saturno, Urano e Netuno, e Vênus e Terra. A grosso modo, podemos dizer que se “retirássemos” os gases mais leves dos

Figura 5.2 Os quatro planetas jovianos. As imagens não estão rigorosamente em escala. (NASA)

Figura 5.1 Os quatro planetas telúricos. As imagens não estão rigorosamente em escala. (NASA)

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corpos da primeira dupla, ficaríamos com algo bastante parecido com os membros da segunda dupla. Se desta dupla “retirássemos” os elementos químicos mais leves, restariam dois corpos muito parecidos com aqueles da terceira dupla. Evidentemente isto não parece ser obra do acaso.

Em agosto de 2006, Plutão foi reclassificado e juntamente com Ceres (então asteróide) e Eris (2003 UB315) formam uma nova classe: os planetas-anões. A tabela abaixo apresenta os parâmetros físicos mais importantes. Este assunto será discutido adiante.

Ceres Plutão Eris

Raio 0,0738 0,18 0,19 Massa 0,00016 0,002 0,0027 Densid. 2,08 2,0 2,1 Atmosfera N2, CO, CH4 N2, CH4 Satélites 3 1 Distância 2,5-2,9 29,7-49,3 37,8-97,6 Rotação 0,3781 -6,387 Translação 4,599 248,09 557 Excentr. 0,08 0,249 0,442 Incl.Orb. 10,6 17,1 44,2 Incl.Eixo 4 119,6

De maneira genérica, a composição química dos satélites é bastante parecida com a dos

planetas telúricos. Todos têm superfícies sólidas, aa maioria recoberta por gelo (Figura 5.3A); alguns satélites apresentam atmosferas relativamente espessas, e Io (Figura 5.3B), satélite de Júpiter, apresenta atividade vulcânica intensa. Os tamanhos dos satélites são variados: o maior é Ganimedes (Júpiter), com 2.631 km de diâmetro (maior que Mercúrio); os menores são Deimos (Marte) e Leda (Saturno), com apenas 8 km.

Figura 5.3 Dois satélites galileanos: (A) Europa, o menor deles, tem a superfície recoberta por gelo; as rachaduras são evidenciadas pelas linhas escuras, provavelmente contaminadas pelo material submerso. (B) Io, o mais interno, têm a superfície recoberta por lavas e cinzas vulcânicas. Uma pluma vulcânica é vista no limbo. (NASA)

Tabela 5.2 Parâmetros físicos dos planetas-anões atuais (março/2007): Raio e Massa, em valores relativos aos da Terra; Densidade, em g/cc; Atmosfera, entre parênteses o percentual de cada componente; Distância, em UA; Rotação, em dia de 24h; Excentricidade; Inclinação do plano orbital, relativamente ao plano da eclíptica, em grau; Inclinação do eixo de rotação, relativamente à órbita, em grau

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Os asteróides, também chamados de planetóides. A grande maioria se parece mais com fragmentos rochosos de composição química semelhante a dos planetas telúricos (Figura 5.4A). A maior parte deles está concentrada no cinturão asteroidal, entre Marte e Júpiter, orbitando o Sol em trajetórias quase circulares. As semelhanças entre as composições químicas dos asteróides e a dos meteoritos nos levam a acreditar que haja um parentesco entre esses objetos.

Os cometas possuem composição química intermediária entre as dos planetas telúricos e jovianos. Eles são muito ricos em água e gases voláteis (Figura 5.4B). Quando, por envelhecimento, perdem esses gases um núcleo rochoso de densidade menor que a dos planetas telúricos surge, demonstrando semelhanças com alguns tipos de meteoritos e asteróides. Isto, no entanto, não significa que haja um processo evolutivo de transformação de um objeto em outro, mas que talvez possa haver casos em que o parentesco seja possível.

Uma característica dinâmica do SS é que a maior parte da matéria está concentrada próximo ao plano da eclíptica. Com exceção de Mercúrio, todos os planetas têm órbitas com inclinação menor que 3,5o, relativamente à eclíptica (Tabela 5.1). Dos planetas-anões, apenas Ceres tem órbita próxima do plano da eclíptica. Os demais têm órbitas altamente excêntrica e inclinada, muito parecidas com as órbitas de objetos transnetunianos (os espalhados) têm órbitas bem inclinadas em relação ao plano da eclítica. Os corpos cuja trajetórias mais se afastam deste plano são os cometas, mas mesmo assim não são todos; os cometas de períodos curtos estão mais próximos do plano da eclíptica. No caso dos satélites, suas órbitas estão próximas do plano equatorial dos planetas a que estão associados. Portanto, as inclinações dos planos orbitais dos satélites, relativamente ao plano da eclíptica, são diversificadas, já que os eixos de rotação dos planetas não são necessariamente perpendiculares ao plano da eclíptica (veja a Tabela 5.1).

Figura 5.4 (A) Ida, asteróide com 56 km de comprimento, fotografado pela sonda Galileu (NASA )a uma distância de 10.000 km. (B) Cometa West (1976 VI), fotografado em 1976 (Treugesel-Verlag Photeb).

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Os sentidos de rotação e de translação dos corpos do SS são coincidentes com o sentido de rotação do Sol, que, visto do norte eclíptico, é de Oeste para Leste (anti-horário). Mas há exceções: Vênus e Urano giram em sentido retrógrado; isso porque seus eixos de rotação estão inclinados em mais de 90 graus em relação à vertical do plano orbital (ver Tabela 5.1). A distribuição das órbitas dos planetas se dá segundo uma lei de espaçamento regular, representada aproximadamente pela relação de Bode1.

Estas características, evidentemente, devem ser decorrentes de processos físicos que marcaram a gênese e a evolução do SS. Estudar este passado, tendo o panorama presente como evidências, é um desafio pois estamos tentando desvendar algo que ocorreu nos últimos 4,5 bilhões de anos. Este assunto será abordado no final deste capítulo, após a discussão detalhada dos objetos do SS.

Referências E.Picazzio, 1997, “Marte no Universo”, Tabela1.1, p.19, em “Marte: Novas Descobertas”, Editores:

O.Massambani e M.S.M.Mantovani, Instituto Astronômico da USP (1997).

1 Proposta por Johann Elert Bode: d = (n + 4) / 10, com d (distância heliocêntrica) em UA, e n = 0 (Mercúrio), 3 (Vênus), 6 (Terra), 12 (Marte), 24 (Cinturão Asteroidal), 48 (Júpiter), etc.