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RECICLE INFORMAÇÃO: Passe este jornal para outro leitor ou indique o site Ano VIII - Edição 87 - Fevereiro 2015 Distribuição Gratuita Vale do Paraíba Paulista - Litoral Norte Paulista - Região Serrana da Mantiqueira - Região Bragantina - Região Alto do Tietê O reino pedregoso de Suassuna Lembro-me do contraste entre o respeitoso silêncio e as sonoras gargalhadas numa tarde no Sa- lão de Atos da UFRGS. Tratava- se da aula inaugural do ano de 1996. O motivador desses es- pasmos de comicidade e admira- ção era Ariano Suassuna. Como se fosse um Quixote sertanejo, o escritor hipnotizou uma platéia de quase dois mil alunos com a sua técnica de encantamento que remonta aos primórdios da experiência literária: a arte de narrar histórias. Leia mais Pagina 4 ***************** TEMA OU LEMA Um tema a ser discutido ou um lema a ser seguido. Atualmente, não há mais “Espaço para o Im- proviso”. Leia mais Pagina 5 ANALFABETISMO FUNCIONAL E A QUALIDADE DO ENSINO Segundo dados do Instituto Pau- lo Montenegro e da Ação Educa- tiva, tivemos certo progresso no Alfabetismo Funcional. Em 2001, 61% da população brasileira era alfabetizada funcionalmente, ou seja, tínhamos 39% de analfabe- tos funcionais. Já em 2011 era 73% a quantidade de alfabetiza- dos funcionais, consequente- mente 27% ainda amargavam à beira do alfabetismo funcional. Leia mais Pagina 9 ************* Solidariedade x Fraternidade O que são esses direitos? São direitos que se preocupam com a humanidade, com a coleti- vidade, e por isso mesmo requer o envolvimento e a participação de todos. Leia mais Pagina 10 www.formiguinhasdovale.org /// CULTURAonline BRASIL /// http://www.culturaonlinebrasill.net A experiência e os impactos da escravidão africana na Região Amazônica Quando se fala sobre a presença negra na Amazônia é frequente ver o espanto das pessoas. Ainda hoje, especialmente fora da regi- ão, é comum ouvir a pergunta: “Mas, afinal, existiu escravidão na Amazônia?” Página 13 Dia 20 de Fevereiro se comemora o dia Mundial da Justiça Social. No en- tanto, no Brasil pouco temos o que comemorar. Apesar de ser um país rico em recur- sos naturais e com um PIB (Produto In- terno Bruto) figurando sempre entre os 10 maiores do mundo, o Brasil é um país extremamente injusto no que diz respeito à distribuição de seus recursos entre a população. Página 14

087 - Fevereiro · se da aula inaugural do ano de 1996. O motivador desses es-pasmos de comicidade e admira-ção era Ariano Suassuna. Como se fosse um Quixote sertanejo, o escritor

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Ano VIII - Edição 87 - Fevereiro 2015 Distribuição Gratuita

Vale do Paraíba Paulista - Litoral Norte Paulista - Região Serrana da Mantiqueira - Região Bragantina - Região Alto do Tietê

O reino pedregoso de Suassuna

Lembro-me do contraste entre o respeitoso silêncio e as sonoras gargalhadas numa tarde no Sa-lão de Atos da UFRGS. Tratava-se da aula inaugural do ano de 1996. O motivador desses es-pasmos de comicidade e admira-ção era Ariano Suassuna. Como se fosse um Quixote sertanejo, o escritor hipnotizou uma platéia de quase dois mil alunos com a sua técnica de encantamento que remonta aos primórdios da experiência literária: a arte de narrar histórias.

Leia mais Pagina 4 *****************

TEMA OU LEMA

Um tema a ser discutido ou um lema a ser seguido. Atualmente, não há mais “Espaço para o Im-proviso”.

Leia mais Pagina 5

ANALFABETISMO FUNCIONAL

E A

QUALIDADE DO ENSINO

Segundo dados do Instituto Pau-lo Montenegro e da Ação Educa-tiva, tivemos certo progresso no Alfabetismo Funcional. Em 2001, 61% da população brasileira era alfabetizada funcionalmente, ou seja, tínhamos 39% de analfabe-tos funcionais. Já em 2011 era 73% a quantidade de alfabetiza-dos funcionais, consequente-mente 27% ainda amargavam à beira do alfabetismo funcional.

Leia mais Pagina 9 *************

Solidariedade x Fraternidade

O que são esses direitos?

São direitos que se preocupam com a humanidade, com a coleti-vidade, e por isso mesmo requer o envolvimento e a participação de todos.

Leia mais Pagina 10

www.formiguinhasdovale.org /// CULTURAonline BRASIL /// http://www.culturaonlinebrasill.net

A experiência e os impactos da escravidão africana na Região

Amazônica

Quando se fala sobre a presença negra na Amazônia é frequente ver o espanto das pessoas. Ainda hoje, especialmente fora da regi-ão, é comum ouvir a pergunta: “Mas, afinal, existiu escravidão na Amazônia?”

Página 13

Dia 20 de Fevereiro se comemora o dia Mundial da Justiça Social. No en-tanto, no Brasil pouco temos o que comemorar. Apesar de ser um país rico em recur-sos naturais e com um PIB (Produto In-terno Bruto) figurando sempre entre os 10 maiores do mundo, o Brasil é um país extremamente injusto no que diz respeito à distribuição de seus recursos entre a população.

Página 14

Page 2: 087 - Fevereiro · se da aula inaugural do ano de 1996. O motivador desses es-pasmos de comicidade e admira-ção era Ariano Suassuna. Como se fosse um Quixote sertanejo, o escritor

Fevereiro 2015 Gazeta Valeparaibana Página 2

A Gazeta Valeparaibana é um jornal mensal gratuito distribuído mensalmente para download

Editor : Filipe de Sousa - FENAI 1142/09-J

Email: [email protected]

Designe e artes gráficas: Rede Vale Comunicações www.formiguinhasdovale.org

Editorial

Rádio web CULTURAonline Brasil

NOVOS HORÁRIOS e NOVOS PROGRAMAS

Prestigie, divulgue, acesse, junte-se a nós !

A Rádio web CULTURAonline Brasil, prioriza a Educaç ão, a boa Música Nacional e programas de interesse geral sobre sustentabilidade social, cidadania nas temáticas: Educação, Escola, Professor , Família e Socie-dade.

Uma rádio onde o professor é valorizado e tem voz e , onde a Educação se discute num debate aberto, crí tico e livre. Mas com responsabilidade!

Acessível no link: www.culturaonlinebr.org

A esquerda e a direita segundo Ariano Suassuna

"Quem, na sua visão do social, coloca a ênfase na justiça, é de esquerda. Quem a coloca na efi-cácia e no lucro é de direita".

Não concordo com a afirmação, hoje muito comum, de que não mais existem esquerda e direita. Acho até que quem diz isso normalmente é de direita.

Talvez eu pense assim porque mantenho, ainda hoje, uma visão religiosa do mundo e do ho-mem, visão que, muito moço, alguns mestres me ajudaram a encontrar. Entre eles, talvez os mais importantes tenham sido Dostoiévski e aquela grande mulher que foi santa Teresa de Ávila. Como consequência, também minha visão política tem substrato religioso. Olhando para o futuro, acredito que enquanto houver um desvalido, enquanto perdurar a injustiça com os infortunados de qualquer natureza, teremos que pensar e repensar a história em termos de esquerda e direita. Temos também que olhar para trás e constatar que Herodes e Pilatos eram de direita, enquanto o Cristo e são João Batista eram de esquerda. Judas inicialmente era da esquerda. Traiu e pas-sou para o outro lado: o de Barrabás, aquele criminoso que, com apoio da direita e do povo por ela enganado, na primeira grande “assembléia geral” da história moderna, ganhou contra o Cristo uma eleição decisiva.

De esquerda eram também os apóstolos que estabeleceram a primeira comunidade cristã, em bases muito parecidas com as do pré-socialismo organizado em Canudos por Antônio Conselhei-ro. Para demonstrar isso, basta comparar o texto de são Lucas, nos “Atos dos Apóstolos”, com o de Euclydes da Cunha em “Os Sertões”.

Escreve o primeiro: “Ninguém considerava exclusivamente seu o que possuía, mas tudo entre eles era comum. Não havia entre eles necessitado algum. Os que possuíam terras e casas, ven-diam-nas, traziam os valores das vendas e os depunham aos pés dos apóstolos. Distribuía-se, então, a cada um, segundo a sua necessidade”.

Afirma o segundo, sobre o pré-socialismo dos seguidores de Antônio Conselheiro: “A propriedade tornou-se-lhes uma forma exagerada do coletivismo tribal dos beduínos: apropriação pessoal a-penas de objetos móveis e das casas, comunidade absoluta da terra, das pastagens, dos reba-nhos e dos escassos produtos das culturas, cujos donos recebiam exígua quota parte, reverten-do o resto para a companhia” (isto é, para a comunidade).

Concluo recordando que, no Brasil atual, outra maneira fácil de manter clara a distinção é a se-guinte: quem é de esquerda, luta para manter a soberania nacional e é socialista; quem é de di-reita, é entreguista e capitalista. Quem, na sua visão do social, coloca a ênfase na justiça, é de esquerda. Quem a coloca na eficácia e no lucro é de direita.

Ariano Suassuna, ícone do Movimento Armorial (1927- 2014).

IMPORTANTE

Todas as matérias, reportagens, fotos e demais conteúdos são de inteira responsa-

bilidade dos colaboradores que assinam as matérias, podendo seus conteúdos não corresponderem à

opinião deste projeto nem deste Jornal.

CULTURAonline BRASIL

O otimista é um tolo. O pessimista, um cha-to. Bom mesmo é ser um realista esperan-çoso.

********

Eu digo sempre que das três virtudes teolo-gais chamadas, eu sou fraco na fé e fraco na qualidade, só me resta a esperança. Eu sou o homem da esperança.

********

… que é muito difícil você vencer a injustiça secular, que dilacera o Brasil em dois países distintos: o país dos privilegiados e o país dos despossuídos.

********

"Tenho duas armas para lutar contra o de-sespero, a tristeza e até a morte: o riso a cavalo e o galope do sonho É com isso que enfrento essa dura e fasci-nante tarefa de viver."

********

Não sou nem otimista, nem pessimista. Os otimistas são ingênuos, e os pessimistas amargos. Sou um realista esperançoso. Sou um homem da esperança. Sei que é para um futuro muito longínquo. Sonho com o dia em que o sol de Deus vai espalhar justi-ça pelo mundo todo.

********

O sonho é que leva a gente para a frente. Se a gente for seguir a razão, fica aquieta-do, acomodado.

********

Não sei, só sei que foi assim! (em o Auto da compadecida)

Gazeta Valeparaibana

Um MULTIPLICADOR dos Projetos Sociais

“ALeste” e

Formiguinhas do Vale

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Fevereiro 2015 Gazeta Valeparaibana Página 3

Povos Indígenas

Dia 7 de Fevereiro é dedicado à luta do Po-vos Indígenas e assim resolvemos trazer um pequeno histórico no pós 1500.

Em 1500, quando os portugueses chegaram ao Brasil, estimava-se que havia por aqui cerca de 6 milhões de índios. Nos anos 50, segundo o antropólogo Darcy Ribei-ro, a população indígena brasileira estava entre 68.000 e 100.000 habitantes. Passados os tempos de matança, escravismo e catequização forçada, atualmente há cerca de 280.000 índios no Brasil. Contando os que vivem em centros urbanos, a população indígena ultrapassa os 300.000. No total, quase 12% do território nacional pertence aos índios. Quando os portugueses chegaram ao Brasil, havi-a em torno de 1.300 línguas indígenas. Atualmen-te existem apenas 180. O pior é que cerca de 3-5% dos 210 povos com culturas diferentes têm menos de 200 pessoas.. Hoje em dia, o que parecia impossível está acon-tecendo: o número de índios no Brasil e na Ama-zônia está aumentando cada vez mais. A taxa de crescimento da população indígena é de 3,5% ao ano, superando a média nacional, que é de 1,3%. Em melhores condições de vida, alguns índios recuperaram a sua auto-estima, reintroduziram os antigos rituais e aprenderam novas técnicas, co-mo pescar com anzol. Muitos já voltaram para a mata fechada, com uma grande quantidade de crianças indígenas. "O fe-nômeno é semelhante ao 'baby boom' do pós-guerra, em que as populações, depois da matan-ça geral, tendem a recuperar as perdas reprodu-zindo-se mais rapidamente", diz a antropóloga Marta Azevedo, responsável por uma pesquisa feita pelo Núcleo de Estudos em População da Universidade de Campinas. Com terras garantidas e população crescente, po-de parecer que a situação dos índios se encontra agora sob controle. Mas não! O maior desafio da atualidade é manter viva sua riqueza cultural.

Organização e Sobrevivência do Grupo Os índios brasileiros sobrevivem utilizando os re-cursos naturais oferecidos pelo meio ambiente com a ajuda de processos rudimentares. Eles ca-çam, plantam, pescam, coletam e produzem os instrumentos necessários a essas atividades. A terra pertence a todos os membros do grupo e cada um tira dela seu próprio sustento. Existe uma divisão de tarefa por idade e por sexo: em geral, cabe à mulher o cuidado com a casa, as crianças e a roça; o homem é responsável pela defesa, pela caça (que pode ser individual ou co-letiva) e pela colheita de alimentos na floresta.

Os mais velhos - homens e mulheres - adquirem grande respeito por parte de todos. A experiência conseguida por muitos anos de vida os transforma em símbolos de tradições da tribo. O pajé é uma espécie de curandeiro e conselheiro espiritual.

O Chefe da Tribo Os índios vivem em aldeias e, muitas vezes, são comandados por chefes, que são chamados de cacique, tuxánas ou morubixabas. A transmissão da chefia pode ser hereditária (de pai para filho) ou não. Os chefes devem conduzir a aldeia nas mudanças, na guerra, devem manter a tradição, determinar as atividades diárias e res-ponsabilizar-se pelo contato com outras aldeias ou com os civilizados. Muitas vezes ele é assessorado por um conselho de homens que o auxiliam em suas decisões.

Alimento - Pesca Além de um conhecimento profundo da vida e dos hábitos dos animais, os índios possuem técnicas que variam de povo para povo. Na pesca, é co-mum o uso de substâncias vegetais (tingui e tim-bó, entre outras) que intoxicam e atordoam os pei-xes, tornando-os presas mais fáceis. Há também armadilhas para pesca, como o pari dos teneteharas - um cesto fundo com uma aber-tura pela qual o peixe entra atrás da isca, mas não consegue sair. A maioria dos índios no Brasil pra-tica agricultura.

Cultura Indígena O esforço das autoridades para manter a diversi-dade cultural entre os índios pode evitar o desa-parecimento de muita coisa interessante. Um quarto de todas as drogas prescritas pela medici-na ocidental vem das plantas das florestas, e três quartos foram colhidos a partir de informações de povos indígenas. Na área da educação, a língua tucana, apesar do pequeno número de palavras, é comparada por lingüistas como a língua grega, por sua riqueza estrutural - possui, por exemplo, doze formas dife-rentes de conjugar o verbo no passado.

Ritos e Mitos No Brasil, muitas tribos praticam ritos de passa-gem, que marcam a passagem de um grupo ou indivíduo de uma situação para outra. Tais ritos se ligam à gestação e ao nascimento, à iniciação na vida adulta, ao casamento, à morte e a outras fa-ses da vida. Poucos povos acreditam na existên-cia de um ser superior (supremo); a maior parte acredita em heróis místicos, muitas vezes em dois gêmeos, responsáveis pela criação de animais, plantas e costumes. A arte se mistura à vida cotidiana. A pintura corpo-ral, por exemplo, é um meio de distinguir os gru-pos em que uma sociedade indígena se divide, como pode ser utilizada como enfeite. A tinta vermelha é extraída do urucum e a azul, quase negro, do jenipapo. Para a cor branca, os índios utilizam o calcário.

Os trabalhos feitos com penas e plumas de pás-saros constituem a arte plumária indígena. Alguns índios realizam trabalhos em madeira.

A pintura e o desenho indígena estão sempre liga-dos à cerâmica e à cestaria. Os cestos são co-muns em todas as tribos, variando a forma e o tipo de palha de que são feitos.

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Calendário Feriados, Datas Comemorativas

1 – Dia do Publicitário 1 – Dia do Tomate

2 – Dia de Iemanjá 2 – Dia da Receita Federal 5 – Dia do Datiloscopista 6 – Dia do Agente de Defesa Ambiental

7 – Dia do Gráfico 7 – Dia Nacional Luta dos Povos Indígenas

9 – Dia do Frevo 9 – Dia do Zelador

10– Dia Internacional da Internet Segura 10– Dia do Atleta Profissional 11– Dia de Nossa Senhora de Lourdes 12– Dia de Santa Eulália de Barcelona 13– Dia Mundial da Rádio 14– Dia da Amizade 16– Dia do Repórter 17– Carnaval 18– Cinzas 19– Dia do esporte 20– Dia Mundial da Justiça Social 21– Dia Internacional da Língua Materna 22– Dia da Criação do IBAMA 26– Dia do Comediante

27– Dia Nacional do Livro Didático 27 - Dia do Idoso

28– Dia da Ressaca 28– Dia Mundial das Doenças Raras

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Fevereiro 2015 Gazeta Valeparaibana Página 4

Literatura I O reino pedregoso de Suassuna Lembro-me do contraste entre o respeitoso silêncio e as sonoras gargalhadas numa tar-de no Salão de Atos da UFRGS. Tratava-se da aula inaugural do ano de 1996. O motiva-dor desses espasmos de comicidade e admi-ração era Ariano Suassuna. Como se fosse um Quixote sertanejo, o escritor hipnotizou uma platéia de quase dois mil alunos com a sua técnica de encantamento que remonta aos primórdios da experiência literária: a arte de narrar histórias. Nessa atmosfera de oralidade impregnada de sentidos míticos e mágicos anticartesianos, perpetua-se um espírito poético oriundo do cordel nordestino que introduz um sertão so-nhoso e brutal. Suassuna instaura uma enig-mática territorialidade na qual emergem deu-ses e diabos, sob a lei do acaso e da fatalida-de. Esses seres-ameaçadores resultam de um sopro de imaginação que produz sentidos desérticos e espinhentos de uma terra-fera: o reino sertanejo do delírio e do sacrifício. En-raizada numa sagração onírica, a narrativa também propõe um diálogo entre o Nordeste e a Península Ibérica através de um audacio-so projeto estético que intercambia a poesia oral com as imagens e os sons armoriais. Herdeiro da heráldica medieval, o Movimento Armorial nasce com o objetivo de salvaguar-dar um manancial de insígnias, brasões e bandeiras que constituem a força imagística da cultura popular (dos estandartes de mara-catus às bandeiras de clubes de futebol). Ari-ano acabou desencadeando uma nova con-ceptualidade no interior da arte brasileira que navega entre iluminuras arabescas e acordes de rabeca. O escritor paraibano busca uma abertura de significados que convidam o lei-tor a reconstruir uma tradição literária marca-da por uma cosmovisão de elementos híbri-dos e (pluri) historiográficos: o texto cômico de Plauto, os figurantes da commedia dell'ar-te, as histórias coletivas da falação cotidiana. O Romance d'A Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta, publicado em 1971, talvez seja o mais audacioso livro de Suassuna. A obra se configura como uma

epopéia satírica e apocalíptica, constituída por alucinações e desventuras de uma espé-cie de cronista-fidalgo (Pedro Dinis Ferreira Quaderna). O romance-memorial-poema-folhetim se a-presenta dividido em folhetos que focalizam a prometida volta de dom Sebastião por meio de um banho de sangue nas pedras do Reino sertanejo. Na crueza espinhenta e indomada da ressurreição do mito, nasce a esperança da contemplação de um reino presentificado por duas enormes pedras onde pingos prate-ados brilham ao sol. Como esfinges a serem decifradas, as pedras trazem consigo o mis-tério nordestino de uma metamorfose visce-ral: como o fraco se torna forte, como o real se torna fantasia, como a memória se torna lenda. Segundo Quaderna, "Deus fala por meio das pedras". Assim, é preciso que ouçamos esse pedregoso discurso que brota da tênue sepa-ração entre a anedota tragicômica e o lamen-to da desesperança lírica. Os enigmas do Reino estão camuflados nas pedras que re-sistem ao tempo, simbolizando a força de u-ma cultura armorial-popular brasileira que, formada pelo sangue dos seus heróis, profe-tas e santos, permanece renovada na escrita de Ariano. Entre o riso, o sonho e o desvairio, evidencia-se, portanto, a representação de uma brasilidade que mergulha num mundo maravilhoso, orquestrado pelas suturas razão-desrazão e homem-pedra. O sertão continua sendo o lugar do encontro com deuses an-cestrais, pedrificando-se como uma fonte per-pétua de mitologizações populares. Uma das lições aprendidas no interior da pe-dra é a capacidade de dizer sim à vida, ape-sar da aridez das mortes trágicas, da secura da alma rachada do sertanejo. Nesse roche-do de narrativas, a pedra aprisiona e adorme-ce. Que Ariano continue trilhando esse pe-dregoso reino da imaginação, encastelado no canto improvisado, no folheto, no romance, nas danças populares, no espetáculo de ma-rionetes, nas histórias sem dono. Suriel Ribeiro - Artesania Literária

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Poemas de Ariano Suassuna Noturno Têm para mim Chamados de outro mundo as Noites perigosas e queimadas, quando a Lua aparece mais vermelha São turvos sonhos, Mágoas proibidas, são Ouropéis antigos e fantasmas que, nesse Mundo vivo e mais ardente consumam tudo o que desejo Aqui. Será que mais Alguém vê e escuta? Sinto o roçar das asas Amarelas e escuto essas Canções encantatórias que tento, em vão, de mim desapossar. Diluídos na velha Luz da lua, a Quem dirigem seus terríveis cantos? Pressinto um murmuroso esvoejar: passaram-me por cima da cabeça e, como um Halo escuso, te envolveram. Eis-te no fogo, como um Fruto ardente, a ventania me agitando em torno esse cheiro que sai de teus cabelos. Que vale a natureza sem teus Olhos, ó Aquela por quem meu Sangue pulsa? Da terra sai um cheiro bom de vida e nossos pés a Ela estão ligados. Deixa que teu cabelo, solto ao vento, abrase fundamente as minhas mão... Mas, não: a luz Escura inda te envolve, o vento encrespa as Águas dos dois rios e continua a ronda, o Som do fogo. Ó meu amor, por que te ligo à Morte?

*******************

A mulher e o reino Ó romã do pomar, relva, esmeralda, olhos de Ouro e de azul - minha Alazã! Ária em corda do sol, fruto de prata, meu Chão e meu Anel - cor da Manhã! Ó meu Sono, meu sangue, Dom, coragem água das pedras, rosa e beldever! Meu candeeiro aceso da Miragem meu mito e meu poder - minha Mulher Dizem que tudo passa e o tempo duro tudo esfarela O sangue há de morrer Mas quando a luz me diz que esse ouro puro se acaba por finar e corromper meu Sangue ferve contra a vã Razão e há de pulsar o Amor na escuridão!

O que é o Movimento Armorial ?

Movimento Armorial foi uma iniciativa artística cujo objetivo seria criar uma arte erudita1 a partir de elementos da cultura popular do Nordeste Brasileiro. Um

dos fundadores e diretores foi o escritor Ariano Suassuna. Tal movimento procura orientar para esse fim todas as formas de expressões artísticas: músi-

ca, dança, literatura, artes plásticas, teatro, cinema,arquitetura, entre outras expressões.

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Fevereiro 2015 Gazeta Valeparaibana Página 5

Cidadania

TEMA OU LEMA

Um tema a ser discu-tido ou um lema a ser seguido. Atualmente,

não há mais “Espaço para o Improviso”.

Infelizmente, não é o que temos visto e senti-do a respeito da economia brasileira onde a inflação se encontra no topo, num cresci-mento desprezível e sem metas bem defini-das que leva a maus resultados e com muita dose de descaso e de corrupção onde se tem justificado o injustificável.

Estamos navegando num barco sem direção que funciona convenientemente às entidades e identidades que não mostram a cara e des-viam nosso dinheiro sem nenhuma indigna-ção enquanto exercem seus mandatos de forma inimputável.

Mediante a situação, por vezes, dá-se a im-pressão de sermos reféns de um inconfor-mismo, pois a reação da maioria é de que tudo já é esperado, tolerado e nós indolentes a isso faz parecer de que no Brasil, nada irá adiantar e nada dará certo.

A repulsa social, tem se mostrado através de atitudes sem delimitações como botar fogo

em ônibus, enfrentamento com a polícia e invasão de prédios como se essas ações fossem admiráveis e como se não houvesse nenhuma importância para quem sofre as consequências disso e que é o próprio povo. São vândalos disfarçados de justiceiros, o-portunistas, aproveitadores tão desonestos quanto aqueles que estão no comando da exploração e a quem queremos tanto comba-ter.

Poxa, como está sendo difícil ser brasileiro...

Faz tempo que não vivemos uma política ho-nesta, uma economia sem crises, sem nos sentirmos ameaçados por todos os lados.

Será que viveremos sempre à mercê da sor-te? Isso é um privilégio?

Não temos guerras, terremotos, maremotos, mas, em compensação temos uma sucessão de crises e que tão acostumados a isso nem dá para imaginar o que seria um brasileiro viver sem essa“sorte”, mas com dignidade.

Do jeito que as coisas andam e a cada ano que passa revivemos as mesmas situações.

Cada vez mais os políticos dos quais depen-demos para administrar nossa economia, vi-vem na zona de conforto e o povo na zona de indiferença talvez já sem capacidade de análise e ação.

Genha Auga

Jornalista MTB: 15320

Na cidade, a pressão da opinião pública é capaz de fazer o que a lei não consegue!

Porque precisamos fazer a Reforma Política no Brasil?

Seus impostos merecem boa administração. Bons políti-cos não vem do nada. Para que existam bons políticos

para administrar o país, toda a sociedade precisa colaborar para que eles possam nascer e terem sucesso. É preciso um sistema eleitoral moderno para melhorar a qualidade da política. Os políticos "tradicionais" tem horror à reforma política, porque ela pode mudar a situa-ção atual onde eles usam e manipulam o eleitor e são pouco cobrados !

SOBRE DEMOCRACIA REPRESENTATIVA

Democracia representativa é o exercício do poder po lítico pela população eleitora não diretamente, mas através de seus representantes , por si designados, com man-

dato para atuar em seu nome e por sua autoridade, i sto é, legitimados pela soberania popular.

VOCÊ TAMBÉM É RESPONSÁVEL!

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Cidadania

Entende-se por cidadania o direito de partici-par ativamente da sociedade na qual o indiví-duo está inserido. Um conjunto de direitos e deveres que permite a uma pessoa participar da vida e do governo de seu povo. Uma pes-soa sem cidadania fica em uma posição de inferioridade no grupo em que essa está in-serida e é “impedida” de tomar decisões im-portantes para sociedade, por exemplo. Desde a Grécia e Roma antigas notam-se o surgimento de uma futura cidadania. Já havi-am designações de cargos e atribuições so-ciais. Apenas pessoas “oficialmente cidadãs” tinham o direito de ocupar cargos importan-tes e tomar decisões para a sociedade. Foi na França do século XVIII ( com a Revolução Francesa ) e nos EUA ( com a Declaração dos Direitos Humanos ) que o conceito de cidadania foi oficialmente adotado, com influ-ências da Roma antiga. E foi também na França que se introduziu na legislação mo-derna as resignações de cidadania e cidada-nia ativa. A cidadania teve um sentido políti-co no século XVIII, mas, atualmente, tem um sentido jurídico. As “normas” para uma pessoa ser considera-da cidadã vai de acordo com as leis de cada Estado. No Brasil, por exemplo, é considera-do um cidadão brasileiro uma pessoa que tenha nascido aqui ou tenha descendência – no caso, pai ou mãe – brasileira. A cidadania indica que um “cidadão oficial” tem direito a todas as leis que o Estado reserva a seus cidadãos e uma futura proteção em territórios estrangeiros – aí entra o papel das embaixa-das. O direito de votar e ser votado, influenci-ar nas decisões do governo, ter uma função e um emprego na Administração pública são exemplos dos direitos concedidos pela cida-dania.

"Ser cidadão é ter direito à vida, à liberda-de, à propriedade, à igualdade perante a lei: é, em resumo, ter direitos civis.”

( Jaime Pinsky, A História da Cidadania) Não existe sucesso ou felicidade sem o exercício pl eno da cidadania e da ética.

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Fevereiro 2015 Gazeta Valeparaibana Página 6

Cultura Popular

O FREVO como cultura Popular

Com origens no final do século XIX, o frevo é uma manifestação da cultura corporal tipica-mente pernambucana.

Não é novidade afirmar que o termo frevo se deve a uma alteração popular da palavra fer-ver. Segundo informações disponíveis no site do “Galo da Madrugada”, um dos blocos mais tradicionais de carnaval do Recife, como o rit-mo era bastante acelerado, “com o passar dos anos, o termo usado pelas pessoas para o ritmo era ‘frervendo’ e assim ficou conheci-do como frevo”.

Segundo Edson Carneiro, citado no Dicionário Cravo Albin da Música Popular Brasileira, é necessária a distinção entre a música do frevo e a dança do frevo.

Ainda que muitos reconheçam a música frevo como folclore, os musicólogos a classificam como uma particularidade da Música Popular Brasileira. No entanto, essa discussão acerca da música é da alçada da Educação Artística.

É a cultura corporal, o interesse da Educação Física e, por isso, é especificamente a dança que será abordada nesse texto.

Inicialmente, o termo frevo designava uma fo-lia de rua marcada pela música intensa. Rela-tos de jornais da época, anteriores ao aconte-cimento anual, são indicativos para mostrar que essa festa realmente ganhava as ruas da cidade de Recife. Para conter o “frervor” dos foliões, os organizadores passaram a contra-tar grupos de capoeira que se apresentavam à frente dos blocos, com o intuito de controlar os comportamentos violentos que por vezes surgiam. Além disso, o uso do guarda-chuva – ou sombrinha, dependendo da região – na dança também tem a mesma origem: os gru-pos de capoeira usavam também esse artefa-to para controlar a população.

Se observarmos de perto, hoje, os movimen-tos corporais do frevo, podemos identificar claramente a influência da capoeira na sua composição, especialmente movimentos bai-xos, que requerem máximas flexões dos joe-lhos. Atualmente há, em média, 120 passos catalogados para o frevo.

Em geral, os passos mais complexos, que in-cluem habilidades acrobáticas, são realizados apenas por passistas dos blocos, a grande massa de foliões mantém a sua diversão com passos mais simples e populares.

Alguns blocos são tão importantes que aju-dam a perpetuar o frevo como patrimônio cul-tural do Recife, como é o caso do já citado “Galo da Madrugada”, do Recife, e o “Clube de Vassourinhas”, de Olinda. Por isso, vale a pena comentar um pouco sobre eles.

O Clube de Vassourinhas é um elemento sim-bólico do frevo pernambucano. Desfila há mais de cem anos nas ruas da cidade de Olin-da e ganhou lugar na história, dentre outras coisas, pela música-símbolo do frevo: Vas-sourinhas, composta por Matias da Rocha e Joana Batista em 1907. Tamanha é a popula-ridade dessa música, que até foi adaptada pa-ra um jingle político da candidatura de Jânio Quadros à presidência da República.

O Galo da Madrugada surgiu em 1978 com o único propósito de resgatar o frevo de rua. Sai todos os anos no sábado de carnaval e, em 1984, entrou para o Guiness como o maior bloco de rua do mundo. Seu hino é sempre cantado com muita alegria pela cidade do Re-cife durante o carnaval, composto por José Mário Chaves, já foi até gravado pelo cantor Alceu Valença:

“Ei pessoal, vem moçada Carnaval começa no Galo da Madrugada

(BIS)

A manhã já vem surgindo, O sol clareia a cidade com seus raios de cris-

tal E o Galo da madrugada, já está na rua, sal-

dando o Carnaval Ei pessoal...

As donzelas estão dormindo As cores recebendo o orvalho matinal

E o Galo da Madrugada Já está na rua, saldando o Carnaval

Ei pessoal...

O Galo também é de briga, as esporas afia-das

E a crista é coral E o Galo da Madrugada, já está na rua

Saldando o Carnaval Ei pessoal...”

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A cultura, pela definição clássica de Edward B. Tyl or, que é considerado o pai do

conceito moderno de cultura, diz que a cultura é “a quele todo complexo que inclui o conhecimento, as crenças, a arte, a moral, a lei, os costumes e todos os outros

hábitos e capacidades adquiridos pelo homem como me mbro da sociedade”.

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Fevereiro 2015 Gazeta Valeparaibana Página 7

Contos, Poesias e Crônicas

CUIDAR DO AMOR

Genha Auga – jornalista MTB: 15.320

Nosso amor tem fé e crença e estão enraizados nas profundezas do Uni-verso de tal forma que juntos, promovem-nos estabilidade, rejuvenescimento e, assim, de olhos fechados e no silêncio, solidificamos nossos corações.

Nesse contexto,vivemos cada vez mais com qualidade, nosso sorriso jamais será arreba-tado por alguém e a raiva encarece em nossas almas porque é sobreposta pela coragem e pela energia do nosso amor que movimenta nossas vidas.

O mundo será nosso mestre enquanto quisermos aprender e cuidar do sentimento subli-me que nos mantém unidos e que alvorece a cada dia.

Temos a força para enfrentar cada momento, seja bom ou ruim, pois não esquecemos que a vida é uma mistura do amargo e do doce e, com humildade e cumplicidade, juntos, degustaremos todos os sabores que o destino nos apresentar com a sabedoria que trans-cende as dificuldades e, que somada às alegrias, teremos a felicidade como resultado.

Numa sociedade movida à dinheiro e hipocrisia, enco ntramos pessoas propensas aos mais diversos rumos i ncluindo-se a devassidão. Cuidado com quem andas, pois tua companhia sumariza quem és. Não te-nha medo de lutar pelo que acredita, apenas seja você mesmo nos mais divergentes momento s que possam surgir. Fazendo isto, certamente afetará os que estã o à tua volta que não gostam do que veem. Saberão fazer a triagem do joio e do trigo. Só tome cuidado com o lado com que ficará, pois uma escolha errada pode te afetar drasticamente. Pense no seu futuro. Sua escolha hoje, será o seu f uturo amanhã. Seja feliz, haja com honestidade sempre.

CORAGEM

Passaram-se os anos, foi preciso coragem.

Deixar o lugar onde dedicara sua vida. Competência e honestidade foi seu

jargão. Preservou em tempo o que lhe restara:

saúde e dignidade.

Foi preciso coragem para dedicar-se à própria vida.

Dormir mais, transgredir regras,

falar de seus pensamentos, ter desobrigações sem culpas,

conhecer pessoas desinteressadas.

Desprendeu-se de tudo. Tornou-se gostosamente uma vadia!

Não ficou nenhum “vazio”, preencheu-se de amor e tranquilidade

antes que a morte a levasse ou a loucura a condenasse.

Essa coragem a fez uma adorável

desocupada. Aposentou-se!

Genha Auga

Lágrimas Escarlates

Poema de Boanerges Filho

Que o meu pensar, falar, escrever e cantar possa, tão somente, levantar os sons e atitu-des de paz entre todos os homens de qualquer nação, cor, língua, bandeira sexual, cren-ça...

Que os gemidos agoniados do meu próximo, na agonia da sua dor nas profundezas da depressão do abandono, sejam tão altos e agudos que rasguem em sangria os tímpanos adormecidos nos mais secretos recôncavos da minha alma inerte e enferma.

Que, com isso, eu não consiga fugir em disparada sem antes lhe deixar um bálsamo que cure a sua dor e refrigere as pisaduras na sua alma fumegante!

Que as lágrimas, escarlates e escaldantes, daquele que cruzar o meu caminho, possam me molhar e queimar tanto que eu não consiga me mover covardemente em fuga sem entes enxugá-las do rosto desfigurado da sua alma retorcida!

Que eu pobre em sensibilidade e misericórdia, porém, transbordante de arrogância e es-tupidez, possa do meu doentio sono ser acordado pelo clamor daqueles que, mesmo em silêncio, imploram por socorro desesperadamente!

“Paz e amor ”, era lema do movimento hippie em 1968. Mas no Brasil, esse lema é muito anterior. Nilo Peçanha era vice-presidente da República,

morreu o titular, Afonso Pena, em junho de 1909, e ele assumiu o governo dizendo que seu governo seria “de paz e amor”. Por falar nisso, os hippies

se cumprimentavam mostrando os dedos indicador e médio abertos (como o V de vitória), significando paz e amor. Mas aqui havia uma gozação. Diziam que o cumprimento de hippies cearenses era levantando três dedos (o indi-

cador o médio e o anular), significando “paz, amor e rapadura”.

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Fevereiro 2015 Gazeta Valeparaibana Página 8

Carnaval - Indústria Cultural Porque o carnaval não é mais como

em outros carnavais

Nos preparamos para a reta final dos grandes negócios... Mais um

carnaval.

Ninguém precisa atravessar o deserto do Saara, dizer à

mamãe que quer mamar ou perguntar à jardineira por

que ela está tão triste para saber que, nos próximos di-

as, o carnaval vai mobilizar milhões de pessoas de norte

a sul do País e será tema onipresente na mídia, goste-

se ou não dele. Tão inevitáveis quanto a transmissão

dos desfiles das escolas de samba ou as repetidas ex-

plicações sobre as origens de blocos e outras manifes-

tações tradicionais são os comentários nostálgicos dos

que, como naquele comercial de TV sobre uma coleção

de livros de fotografias, garantem que bons mesmo e-

ram os carnavais de antigamente. Quiçá os do tempo

em que as folias comandadas pelo adiposo Rei Momo

eram referidas pelo garboso epíteto de “tríduo momes-

co”.

Nostalgia e saudosismo, entretanto, não cabem mais

nesse cenário, aponta o professor Waldenyr Caldas,

docente da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da

USP e pesquisador de áreas como música e manifesta-

ções de massa. “O carnaval hoje é um produto da indús-

tria cultural, como o futebol, a telenovela, o shopping

center. Não somos nós que queremos isso. É o proces-

so transformacional da sociedade que gera esse tipo de

coisa”, diz o professor. Pode-se ser contra desumanida-

des e injustiças do capitalismo, afirma Caldas, mas é

nele que navega a indústria cultural, e é em torno do

capital e da compra e da venda – seja de produtos, idei-

as, imagens etc. – que giram as coisas.

Caldas localiza em meados da década de 1950 – no

governo de Juscelino Kubitschek – o começo da trans-

formação do carnaval em produto da indústria cultural.

Pouco depois, durante a ditadura militar, o modelo das

escolas de samba deixa de ser amador/profissional para

se tornar exclusiva e irreversivelmente profissional.

“Hoje as escolas são grandes empresas que trabalham

o carnaval com objetivos mercantis. É importante o re-

gistro histórico, mas não tem sentido que ele se mante-

nha como uma coisa artesanal.

Se tudo muda, por que o carnaval tem que continuar

sendo aquela coisa tradicional?” pergunta.

Para o professor, não se pode imaginar que, na era digi-

tal, a festa fosse realizada como na primeira metade do

século passado. Então, dê-lhe sambódromo, televisão,

camarote de cervejaria, “celebridades” pagas para apa-

recer aqui ou ali, marketing, patrocínios, imagens e mais

imagens.

Política no enredo

A origem do carnaval brasileiro está no entrudo portu-

guês, que incluía brincadeiras em que os participantes

se atiravam ovos e tomates. Essa festa chega ao Brasil

com algumas características semelhantes, mas a partir

da vinda da família real ao Rio de Janeiro, em 1808,

começa a passar por transformações. “Vai aparecendo

uma coisa mais organizada, que não são exatamente

blocos, mas brincadeiras que coincidiam com aquelas

totalmente desconexas do entrudo”, diz Caldas.

Esse processo evolutivo ganha força durante a Repúbli-

ca Velha, no final do século 19 e primeiras décadas do

século 20.

É o período das marchinhas de Chiquinha Gonzaga e

de compositores como Noel Rosa, Sinhô, Pixinguinha e

João da Baiana. No Rio de Janeiro, surgem os blocos

tanto nas regiões citadinas quanto nos morros. Nos dias

de carnaval, esses blocos se encontravam e havia

“confrontos” – não beligerantes, mas de celebração – da

cultura popular vinda do morro com aquela dos morado-

res das classes médias. É dessa forma espontânea que

nasce o carnaval.

O presidente Getúlio Vargas, especialmente no período

do Estado Novo (1937-1945), institucionaliza o carnaval.

“Ele percebe que isso seria politicamente interessante

para ele, porque a festa já havia se tornado o principal

produto da cultura lúdica da época, como a telenovela é

na atualidade”, afirma Caldas.

Com fins político-ideológicos, Getúlio coopta as escolas,

que passam a receber ajuda governamental – apenas,

porém, se os seus enredos fizessem a exaltação dos

feitos oficiais.

Não por acaso, é a época em que são compostos gran-

des sambas-exaltação, alguns populares até hoje, como

Aquarela do Brasil, de Ary Barroso (de 1939).

No ano da morte de Ricardo Reis, José Saramago des-

creve o carnaval português de meados da década de

1930 e sublinha as diferenças que o marcavam em rela-

ção ao do Brasil. Saramago coloca Reis a observar o

corso, o desfile de carros enfeitados:

“Estes carros rangem, bamboleiam, pintalgados de figu-

ras, e em cima deles há gente que ri e faz caretas, más-

caras de feio e de bonito, atiram com parcimónia ser-

pentinas ao público, saquinhos de milho e feijão que

acertando aleijam, e o público retribui com um entusias-

mo triste. (…) Ai como é diferente o carnaval em Portu-

gal. Lá nas terras de além e de Cabral (…) desfilam os

blocos dançando avenida abaixo, com vidrilhos que pa-

recem diamantes, lantejoilas que fulgem como pedras

preciosas, panos que talvez não sejam sedas e cetins

mas cobrem e descobrem os corpos como se o fossem”,

tudo ao som do “samba terramoto da alma”.

O modelo de cooptação das escolas de samba pelo Es-

tado passou por transformações, mas se mantém até

hoje. Durante a ditadura militar (1964-1985), algumas

escolas enfrentaram problemas por não querer prestar

homenagem ao establishment e acabaram censuradas.

Já no período da redemocratização houve o famoso

episódio da alegoria do Cristo Redentor, proibido de

aparecer como mendigo no desfile da Beija-Flor em

1989. O carro saiu mesmo assim, com a imagem cober-

ta por uma lona preta e uma faixa com os dizeres:

“Mesmo proibido, olhai por nós”.

A partir dos anos 50 há algumas concessões e abertu-

ras que o próprio Vargas é obrigado a aceitar por conta

de seu retorno como presidente eleito democraticamen-

te. Mesmo com a censura, porém, nunca deixou de ha-

ver espaço para o escracho e para a crítica às questões

políticas e sociais. O samba Lata d’água na cabeça é

um exemplo claro, aponta Caldas. A letra (“Lata d’água

na cabeça/ Lá vai Maria/ Sobe o morro e não se cansa/

pela mão leva a criança/ lá vai Maria/ Maria lava a roupa

lá no alto/ Lutando pelo pão de cada dia/ Sonhando com

a vida do asfalto/ Que acaba onde o morro principia”)

tem um texto político fantástico que denuncia a miséria

dos morros e o pouco caso do Estado em relação à peri-

feria.

As escolas também continuam recebendo recursos pú-

blicos. É comum que Estados ou regiões usem verba

oficial para encomendar enredos exaltando belezas na-

turais ou episódios históricos. Para o professor, é um

ato legítimo dos governos, que podem utilizar essas ver-

bas da mesma forma que os recursos para publicidade

na mídia. Patrocinados ou não, os enredos não se fur-

tam a mostrar a exuberância da criatividade dos compo-

sitores e carnavalescos, que conseguem fazer sambas

nos quais se misturam em poucas estrofes o antigo Egi-

to com as cataratas do Iguaçu, tudo rimando com

“Sapucaí” ou “nossa escola brilhando na avenida”.

Fontes: site da USP e Wikipédia

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Se não houvesse carnaval, nem futebol, nem novela c ooptativa e nenhum outro evento que ludibriasse o p ovo brasileiro, O Brasil já era um país de primeiro m undo.

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Fevereiro 2015 Gazeta Valeparaibana Página 9

Espaço Educação

ANALFABETISMO FUNCIONAL E A

QUALIDADE DO ENSINO

Segundo dados do Instituto Paulo Montenegro e da Ação Educativa, tivemos certo progresso no Al-fabetismo Funcional. Em 2001, 61% da população brasileira era alfabetizada funcionalmente, ou seja, tínhamos 39% de analfabetos funcionais. Já em 2011 era 73% a quantidade de alfabetizados fun-cionais, consequentemente 27% ainda amargavam à beira do alfabetismo funcional. Porém, isso de certa forma, ainda não é um dado a ser comemo-rado, pois o próprio instituto nos dá o que é ser alfabetizado e a escala de alfabetização, daí perce-bemos que ainda falta muito para sair da zona de perigo. Para entendermos melhor como isso funciona o próprio Instituto nos dá uma orientação sobre ca-da estágio do alfabetismo: Analfabeto - Corresponde à condição dos que não conseguem realizar tarefas simples que envolvem a leitura de palavras e frases ainda que uma parce-la destes consiga ler números familiares (números de telefone, preços etc.); Rudimentar - Corresponde à capacidade de locali-zar uma informação explícita em textos curtos e familiares (como um anúncio ou pequena carta), ler e escrever números usuais e realizar operações simples, como manusear dinheiro para o pagamen-to de pequenas quantias ou fazer medidas de com-primento usando a fita métrica; Básico - As pessoas classificadas neste nível podem ser consideradas funcionalmente alfabetizadas, pois já leem e compreendem textos de média ex-tensão, localizam informações mesmo que seja necessário realizar pequenas inferências, leem nú-meros na casa dos milhões, resolvem problemas envolvendo uma sequência simples de operações e têm noção de proporcionalidade. Mostram, no en-tanto, limitações quando as operações requeridas envolvem maior número de elementos, etapas ou relações; e Pleno - Classificadas neste nível estão as pessoas cujas habilidades não mais impõem restrições para compreender e interpretar textos em situações usuais: leem textos mais longos, analisando e rela-cionando suas partes, comparam e avaliam infor-mações, distinguem fato de opinião, realizam infe-rências e sínteses. Quanto à matemática, resolvem problemas que exigem maior planejamento e con-trole, envolvendo percentuais, proporções e cálcu-lo de área, além de interpretar tabelas de dupla entrada, mapas e gráficos. Ao lermos essa classificação vemos o quão é difícil

sair de uma fase de alfabetismo rudimentar para, por exemplo, alfabetismo pleno. Onde é que estamos errando? Pois ao vermos es-ses resultados e confrontamos com as declarações de um Ministro da Educação dizendo ser vontade do governo enxugar o currículo do Ensino Médio, nós, enquanto professores ficamos preocupados. A título de ilustração citamos aqui um trecho do livro de Armindo Moreira – Professor não é Educa-dor - em que uma professora de língua portuguesa defendia o uso de gírias, corruptelas e solecismos em sala de aula como algo normal, pois no enten-der dessa professora, o uso da língua-padrão nãos seria a única forma de alguém se expressar. Segue o trecho: “Dizia professora: Devemos ensinar os alunos a falarem como o povo fala. E prosseguiu: A gíria faz parte da linguagem do povo, por isso devemos usá-la em sala de aula. E também os solecismos, como nóis fumo, tu viu, treis milhão (...)são erros só para a classe dominante: para o povo não é. Fiz notar à professora que, para ela, a palavra povo significava pessoa sem instrução. Ela concordou, mas não gostou. (...) todo cidadão tinha o direito sagrado de apren-der a língua-padrão (...) não lhe reconhecer esse direito gera desigualdades nocivas ao indivíduo e à sociedade. Lembrei que se a criança aprendesse a língua-padrão, poderia mais facilmente melhorar de vida. Ela afirmou que pobre sempre seria pobre, mesmo que instruído. Ela, simplesmente, disse que eu estava errado. “Então, eu concluí que, podería-mos contratar a zeladora para ministrar aulas de língua portuguesa – e a professora, com seu curso superior, iria procurar outro emprego”. Brilhante a conclusão do professor Armindo. Se seguirmos a mesma linha de raciocínio também concluímos que o principal instrumento de domi-nação dos dominantes, leia-se opressores, é o co-nhecimento, a instrução. Então, para que os opri-midos se libertem e mudem esse jogo é necessário ensinar-lhes a língua-padrão, caso contrário iremos mantê-los sob o jugo das classes dominantes, sem chances de progresso na vida profissional. Quando perguntamos: Qual o objetivo da escola? Temos como resposta: - Educar para a vida. Que vida? Uma vida de pobreza? Sem condições de al-çar um voo mais alto? Ao analisarmos os dados apresentados pelo Insti-tuto Paulo Montenegro verificamos que a porcen-tagem de alfabetizados Plenos praticamente não mudou em dez anos de pesquisa, ficando em torno de 25%. Portanto, temos 75% da população entre os níveis Analfabeto, Rudimentar e Básico. Isso não é suficiente para um país, como o nosso, aspirar grandes voos, haja vista o Ideb, recentemente pu-blicado. Não conseguimos melhorar nossos indicadores e, talvez, seja esse relaxamento no ensino de língua portuguesa e matemática nosso grande entrave. Cabe dizer aqui que na matemática também temos aqueles que acham que basta aprender as quatro operações básicas, pois como disse a professora do exemplo: “pobre será sempre pobre, instruído ou

não”. Um grande erro sem dúvida. E voltamos à nossa eterna dúvida: - A quem interessa um ensino sem qualidade? Recentemente, na prova de redação do Enem 2014 ocorreu um fiasco sensacional, porém trágico. Mais de 500 mil alunos zeraram a prova de reda-ção e apenas 250 conseguiram nota máxima, 248 mil foram anuladas por não obedecerem ao tema proposto, isso num universo de 6 milhões de estu-dantes. A mediocridade impera no meio estudantil, nossos alunos não sabem ler, falar e muito menos escrever a língua padrão. Do total de alunos, apenas 250 são alfabetizados plenos e terão alguma chance durante a vida pro-fissional outros são, como dizemos na gíria “meia boca”. A grande maioria, no entanto, podemos considerar como analfabetos funcionais e irão girar em torno, como satélites, ou como moscas em tor-no do doce, sem porém nunca prová-lo de fato. Não há remédio para isso, o mal está feito. Os empregadores terão que arcar com o custo dis-so e a sociedade irá amargar os efeitos dessas polí-ticas desastradas e inconsequentes. O país ficará patinando, como um carro no lamaçal, gastando seus recursos sem sair do lugar. Enquanto a educa-ção for considerada política partidária e não como política de estado esses serão os resultados. En-quanto isso, “nóis fumo, agente vamos, menas” e outras desgraças mais continuarão a povoar o mundo desencantado dos jovens. Não bastasse esse desalento, ainda temos professores que falan-do e escrevendo erradamente tal qual o aluno, querem se igualar por baixo, na tentativa de ser “bonzinho”, quando na verdade deveriam estar um patamar acima, exigindo que escrevessem correta-mente, lessem corretamente, buscando o melhor para eles, fazendo com que adquiram vocabulário para poderem expressar suas ideias. Só assim, fi-nalmente, teremos condições de sairmos da condi-ção de país subdesenvolvido. Referencias:

Instituto Paulo Montenegro e Ação Educativa mos-tram evolução do alfabetismo funcional na última década. Disponível em: http://www.ipm.org.br/ipmb_pagina.php?mpg=4.02.01.00.00&ver=por Moreira, A. Professor não é Educador. Charqueadas: Profeduc, 2012. Omar de Camargo

Técnico Químico Professor em Química. [email protected]

Ivan Claudio Guedes

Geógrafo e Pedagogo. Articulista e Palestrante. Especialista em Gestão Ambiental. Mestre em Geo-ciências e doutorando em Geologia. [email protected]

OUÇA-NOS

E agora José?

Todos os Sábados 16 horas Na CULTURAonline BRASIL

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Fevereiro 2015 Gazeta Valeparaibana Página 10

Direitos Humandos Direitos Humanos de terceira

Geração Solidariedade/Fraternidade O que são esses direitos?

São direitos que se preocupam com a huma-nidade, com a coletividade, e por isso mesmo requer o envolvimento e a participação de todos.

Primeiro devo dizer que cada geração dos Di-reitos humanos corresponde a nossa evolu-ção como sociedade e como seres humanos. A teoria das gerações está relacionada ao lema da Revolução Francesa. Assim, os Direi-tos de primeira Geração estão consagrados pelo princípio da liberdade, onde estão os in-teresses individuais civis e políticos. Os de segunda geração estão consagrados pelo princípio da Igualdade ( Econômicos, sociais e culturais) e os de terceira pelo princípio da Solidariedade ou Fraternidade. Entram aí os interesses coletivos e difusos. São direitos que tratam do meio – ambiente, da paz, do progresso da humanidade, cooperação entre os países, da autodeterminação dos povos e outros. Alguns desses princípios estão em nossa Constituição federal.

Se esses direitos estão baseados no princípio da solidariedade, deduzimos que eles perpas-sam os limites do individualismo, se pensa no bem estar de uma sociedade. A ideia de soli-dariedade ultrapassa as fronteiras, é global, se prioriza o bem comum, os interesses da humanidade. Por serem direitos mais recen-tes, eles estão em convenções e pactos inter-nacionais e não na Declaração Universal dos Direitos Humanos. São eles:

Direito a qualidade de vida, a um meio ambi-ente cuidado e preservado, à proteção dos recursos naturais, hídricos, a qualidade do ar que respiramos, a tudo que envolve a ecologi-a. Direito de preservar a identidade cultural de um povo, as culturas em geral, as minorias, direito a uma sociedade mais justa, mais igua-litária e linear. Direito a PAZ , que foi adotado pela ONU em 1966. No Brasil ele se encontra formalizado no art. 4º, VI da Constituição Fe-

deral, rege as relações internacionais ( defesa da paz). Um direito universal e fundamental, um direito da humanidade. Alguns classificam o Direito à paz como Direito de quinta gera-ção. Existem algumas controvérsias. O fato é que é um direito que está positivado e que é indispensável para que as nações possam se desenvolver e conviver harmoniosamente.

O Direito ao DESENVOLVIMENTO, adotado em 1986 pela ONU, encontra-se no art. 1º da Declaração sobre o Direito ao Desenvolvi-mento. Prega o desenvolvimento da pessoa humana de forma geral, contemplando todos os seus aspectos dentro das sociedades e-xistentes. A Carta Africana de Direitos Huma-nos e dos Povos já reconhece desde 1981, o direito ao desenvolvimento como um direito do ser humano.

O Direito ao PATRIMÔNIO comum da huma-nidade, previsto pela ONU em 1974, compre-ende o uso comum do mar e seu subsolo. A UNESCO, na Convenção do Patrimônio Mun-dial, se propõe a proteger e conservar o patri-mônio cultural , natural e misto. Podemos con-siderar que o conhecimento também faz parte do patrimônio da humanidade. Os bens mate-riais e imateriais que são considerados impor-tantes e essenciais para a humanidade de-vem ser protegidos.

O Direito à COMUNICAÇÃO, está consagra-do na Constituição Federal no art. 220: “ A manifestação do pensamento, a criação, a ex-pressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Consti-tuição “.

Surgiu em 1969 na ONU. É de fundamental importância numa sociedade democrática em que vigora o Estado de Direito. É o Estado reconhecendo o direito à liberdade de expres-são, à comunicação, e o direito à informação como direitos fundamentais .

O Direito de AUTODETERMINAÇÃO DOS POVOS, diz respeito ao direito que cada na-ção possui de conduzir o seu próprio destino. Referendado na carta das nações unidas, no Pacto Internacional de direitos civis e políticos de 1966.

Direito ao MEIO AMBIENTE saudável, preser-vado. O enunciado desse princípio está na declaração de Estocolmo de 1972. Faz parte de algumas constituições e de outros docu-mentos internacionais. É um direito difuso que faz parte dos direitos fundamentais, diz res-peito aos indivíduos e a coletividade. da A Lei nº 6.938 / 1981, no art. 3°, inc. I, dispõe sobre a política nacional do meio ambiente, como “o conjunto de condições, leis, influências e inte-rações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”

A proteção e a preservação do meio ambiente assim como a sua degradação atinge a huma-nidade, o planeta, e a todos os seres vivos que aqui habitam, portanto, a sua proteção é função de todos e não apenas do Estado. Es-se direito fundamental está intrinsecamente ligado à qualidade de vida.

Todos esses direitos são imprescritíveis, ou seja, não perdem a validade nunca e são ina-lienáveis, o que quer dizer que não podem ser transferidos, cedidos, vendidos. Os direitos fundamentais são também irrenunciáveis, não posso abrir mão nem me desfazer deles. São invioláveis, efetivos, universais e indivisíveis. São direitos do homem que estão positivados, são para todos, devem ser garantidos pelo poder público.

Somos nós os titulares desses direitos, pois são direitos difusos, por isso a nossa partici-pação na sua proteção é importante, devemos estar atentos para defender os direitos de soli-dariedade. Precisamos deixar de lado o ego-ísmo de pensarmos apenas individualmente e pensarmos no bem comum, na coletividade. O fortalecimento dos direitos humanos depen-de de nós. Como diz Eduardo Galeano: "Mesmo que não possamos adivinhar o tempo que virá, temos ao menos o direito de imagi-nar o que queremos que seja.”

E poderá ser aquilo que queremos...

Mariene Hildebrando Prof. e especialista em Direitos Humanos

Email: [email protected]

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Fevereiro 2015 Gazeta Valeparaibana Página 11

O outro lado da história

O BRASIL NÃO FOI COLÔNIA

“ A expansão portuguesa não foi, nem fruto do a-caso, nem um feito político da Coroa ou de corte-são esforçados, antes a missão de uma Ordem

iniciática.” Manuel J. Gandra

CONTINUAÇÂO

Por: Loryel Rocha Parte IV (Final

Muito embora Tito Lívio (A Ordem de Cristo e o

Brasil) distingua sobremaneira a atuação dos jesuí-

tas portugueses dos jesuítas espanhóis, Frei Ber-

nardo da Costa (in: Inéditos da Crônica da Ordem

de Cristo) apresenta um Compêndio Histórico so-

bre os jesuítas e a Ordem de Cristo que contém

denúncias graves. Frei Bernardo acusa os jesuítas

de se apossarem não só do patrimônio templário

pertencente a Ordem de Cristo, bem como, de in-

tentaram assumir o seu papel no desempenho do

ideal sinárquico .

Frei Bernardo acusa os jesuítas de se apossarem

não só do patrimônio templário pertencente a Or-

dem de Cristo, bem como, de intentaram assumir

o seu papel no desempenho do ideal sinárquico.

Este documento elucida os estragos e ruínas que a

Companhia de Jesus fez ao Reino e aos templários.

Não sem razão, Gandra afirma que D. João II ao

mudar o destino nacional o transforma numa

questão de “Secos e Molhados”, ou seja, numa

mera questão de finanças, de procura por riquezas

materiais, caminho diametralmente oposto ao

perseguido pela Ordem do Templo e sua sucedâ-

nea a Ordem de Cristo. O início da decadência de

Portugal, com claras repercussões para a futura

história brasileira.

No tocante à questão do referido desempenho do

ideal sinárquico dos jesuítas em solo brasileiro,

Wilson Martins (in:Historia da inteligência brasilei-

ra (1550-1794), vol. I. São Paulo: T.A. Queiroz,

1992, p.13-14), afirma que os dados da Companhi-

a de Jesus revelam algumas singularidades, onde

percebe-se um plano de “conquista espiritual”,

refletido na estratégica instalação e disseminação

geográfica dos colégios jesuítas, que rejeitavam

tudo que viesse a ser profano. Alerta para o fato

de o fundador português da Companhia de Jesus,

o Pe. Simão Rodrigues ser também o “implacável e

encarniçado denunciador de Damião de Góis pe-

rante os tribunais da Inquisição”. Damião de Góis,

comendador da Ordem de Cristo, guarda-mor da

Torre do Tombo, cronista-mor do Reino, embaixa-

dor de Portugal nas cortes da Europa, foi um dos

maiores pensadores portugueses. Personagem

importante para os planos do rei D. Sebastião,

que em 1572, tinha conseguido do Papa Pio V a

autorização para (ré)-reformar os estatutos das

ordens religiosas e militares de Cristo, Aviz e Santi-

ago. Pretendia o rei fazer renascer a antiga força

militar destas ordens. Neste quesito, Damião de

Góis era um personagem central. O jovem rei a-

fastava-se do seu tio, Cardeal-Inquisidor (futuro

rei de Portugal) e dos dois padres jesuítas que o

haviam educado. Damião de Góis foi assassinado.

Tito Lívio (op. cit.,1980) apresenta a personalidade

“ressentida” e a “sede de poder” que apresentava

o Pe. Simão Rodrigues.

No entanto, embora tenha havido uma quebra de

harmonia, o ideal sinárquico dos templários pode

ser vislumbrado nos reis seguintes à D. João II, no-

tadamente em D. Afonso V, D. Manuel I, D. Sebas-

tião I, D. João IV e D. João VI. Dos Descobrimen-

tos Marítimos (1500) até a proclamação da Inde-

pendência do Brasil (1822) Portugal teve 12 Reis,

suprimindo-se o Cardeal-Rei D. Henrique (1580) e

a Dinastia Filipina (1640). Sendo o Brasil Província

de Portugal, estes reis também pertencem a histó-

ria brasileira, pois, são igualmente reis do Estado

do Brasil.

Consigna Tito Lívio(1980, p. 57) sobre o nome Ter-

ra de Vera Cruz atribuído ao Brasil:

“Alí não foi hasteada a bandeira do Rei, a bandeira

da Coroa Portuguesa, mas, a bandeira da Ordem

de Cristo, porque esse patrimônio lhe fora adjudi-

cado pelos Papas Martinho V, Nicolau V e Calisto

III, no século XV.[...] O fato de a terra descoberta

em 1500 receber o nome de Província de Santa

Cruz está explicado”.

Estes breves traços são suficientes para se verifi-

car que a matéria que envolve a palavra “colônia”

aplicada ao Brasil não é matéria dispicienda e “dá

panos para a manga”, segundo o dito popular.

Este fio de Ariadne perpassa toda a Dinastia de

Avis e dos Bragança para desembocar nos dias de

hoje.

Assim, constitui matéria de alta relevância os a-

contecimentos históricos envolvendo a Ordem do

Templo e sua sucedânea, a Ordem de Cristo no

tocante as matérias respeitantes à história do Bra-

sil. Suprimi-las, ou antes, delegar exclusivamente

à Portugal tal herança, é uma fórmula bem eficaz

de escamotear a história.

Fernando Pessoa (Mensagem), de modo lapidar,

diz:

Cumpriu-se o Mar e o Império se desfez.

Senhor, falta cumprir-se Portugal.

Vaticina a poetisa e folclorista brasileira Anna Ma-

ria Dutra de Menezes de Carvalho(in: As Brasilía-

des), entendendo ser chegada a hora de quebrar o

silêncio:

É difícil atingir o mistério sagrado

que envolve o Brasil em oculta intenção

perguntar qual Missão, intuir qual mestrado

ilumina o futuro desta nossa nação.

E quando este gigante de repente acordar

vão rugir pororocas, vão cantar minuanos

e os mitos secretos e os tesouros do mar

surgirão nos espaços, sagrados, profanos,

e será revelado em seu credo abismal

o silêncio de Deus, pela voz da verdade

e o Brasil transmutado, paraíso ideal

será Ele, só Ele, por toda a eternidade

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O Brasil Não Foi Colônia é o título de uma conferên cia proferida pelo historiador paulista brasileiro Tito Lívio Ferreira na Sociedade de Geografia de Lisboa em 27/06/1957.

O Brasil Não Foi Colônia, longe de ser um título pr ovocativo ou ingênuo, configura uma chamada de aten ção, lançada em meados do século XX, que já na altura es tava e, ainda está, na contramão da historiografia nacional,

submetida à um pensamento marxista, árduo defensor de uma história republicana anômala, que privilegia as literaturas que se esmeram em “desmontar” a memória da monarquia portuguesa e, por conseguinte, do Bra sil.

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Fevereiro 2015 Gazeta Valeparaibana Página 12

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A Gazeta Valeparaibana , um veículo de divul-gação da OSCIP “Formiguinhas do Vale”, orga-nização sem fins lucrativos, somente publica matérias, relevantes, com a finalidade de abrir discussões e reflexões dentro das salas de au-las, tais como: educação, cultura, tradições, his-tória, meio ambiente e sustentabilidade, respon-sabilidade social e ambiental, além da transmis-são de conhecimento.

Assim, publica algumas matérias selecionadas de sites e blogs da web, por acreditar que todo o cidadão deve ser um multiplicador do conheci-mento adquirido e, que nessa multiplicação, no que tange a Cultura e Sustentabilidade, todos devemos nos unir, na busca de uma sociedade mais justa, solidária e conhecedora de suas res-ponsabilidades sociais.

No entanto, todas as matérias e imagens serão creditadas a seus editores, desde que adjudi-quem seus nomes. Caso não queira fazer parte da corrente, favor entrar em contato. [email protected]

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Pensão por morte de quem?

Da Constituição Federal, lei ou Segu-rado?

As mudanças advindas da medida provisória 664/30 provocam espanto aos juristas e mais ainda aos segurados da previdência social. A começar pela numeração recebida, 664/2014, isso quer dizer que foi a 664ª medida do ano, vale dizer, mais de 55 ao mês. Haja urgência e relevância para a edição de tantas medidas provisórias! Onde esteve e o que fez o Poder Legislativo durante todo o ano? Aprovou/votou medidas provisórias apenas? Parece que sim.

Os benefícios previdenciários realmente são urgentes, mas daí a demandar uma medida provisória que os restrinja, foge a qualquer razoabilidade, deixando de lado a relevância da matéria o que, implica dizer, se afasta dos preceitos constitucionais para a edição de norma legislativa dessa natureza.

Ao depararmos com as novas regras para a concessão da pensão por morte, seguro de-

semprego e auxílio-doença, imperiosa a leitu-ra da exposição de motivos da MP 644/14, exposição essa que podemos deixar, em hi-pótese alguma, de fazer uma leitura atenta e criteriosa, como a qualquer texto normativo.

Dessa exposição extraímos os motivos que levaram a exigência de carência para a con-cessão por morte, de casamento ou união es-tável vigente há mais de dois anos, e a perda de seu caráter vitalício ao cônjuge/companheiro sobrevivente. São eles: eleva-dos custos com a concessão do benefício pa-ra dependentes cujo segurado/instituidor havi-a recolhido apenas um único mês para a pre-vidência social; casamentos entre cônjuges com idade mais avançada visando a seguran-ça do sobrevivente (na falta de um deles) com o benefício da pensão; e, ainda, sua limitação temporal para que os dependentes mais jo-vens (cônjuges/companheiros) tenham um incentivo ao trabalho e busquem seu próprio sustento. A medida chegar a colocar a popu-lação brasileira como, toda ela, useira e vezei-ra em prática de artimanhas e truques mági-cos para o percebimento da pensão mantida pelo INSS, como se fosse norma de conduta de todos os segurados e dependentes: não querer mais trabalhar e só viver em busca do valor que viriam a receber a título de pensão pela morte de seu respectivo cônjuge/companheiro.

A exposição de motivos se esquece tão so-mente de um princípio jurídico abraçado por toda a legislação pátria: a boa-fé se presume. Através da medida provisória, o legislador parte do pressuposto inarredável que paira sobre os segurados: sua má-fé e má índole na obtenção do benefício de pensão por mor-

te. Chega a causar arrepios a leitura breve dessa exposição de motivos que, também tra-ta de aumento da expectativa de sobrevida, déficit da Previdência e necessidade de ajus-tes das contas, apresentando percentuais sem mencionar o aumento da arrecadação.

Apenas através da Justiça do Trabalho, a ar-recadação da Previdência Social aumentou, nos últimos anos, consideravelmente. Tam-bém não trata a exposição de motivos, dos aportes de verbas da Previdência Social para outras esferas/investimentos do Governo, que não a proteção ao trabalhador. Já em vigor, não resta outra opção ao trabalhador/segurado, aceita-la, eis que certamente será convertida em lei.

Mas pairam dúvidas :

1ª É constitucional a medida, como instrumen-to normativo?

2ª. A proteção prevista pelo artigo 201, inciso I da Constituição Federal: prevalece a cobertu-ra dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada?

3ª. Cumpre os fundamentos elencados pelo artigo 1º, incisos III e IV, da Constituição Fe-deral?

De grão em grão, que culminam em tonela-das, o Poder Executivo vem legislando e, em matéria previdenciária, as coberturas desses eventos passo a passo mutilada, até chegar o dia que se tornarão letra morta, sem direito a pensionista! Quem viver verá.

Enviado por : Claudia Andreucci

Publicado por: Claudia Mohallem no site JusBrasil em 23/01/2015

Temos todos que "dar uma força" aos aposentados e pensionistas . Hoje, são eles. Amanhã, seremos nós.

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Fevereiro 2015 Gazeta Valeparaibana Página 13

A Floresta e a África

Floresta negra

A experiência e os impactos da escravidão africana

na Região Amazônica

Quando se fala sobre a presença negra na Amazônia é frequente ver o espanto das pessoas. Ainda hoje, espe-cialmente fora da região, é comum ouvir a pergunta: “Mas, afinal, existiu escravidão na Amazônia?”

Podemos começar respondendo que a experiência da escravidão africana também marcou a trajetória da parte norte da colônia portuguesa na América. Em decorrên-cia disso, hoje a presença negra na Amazônia é inegá-vel, com enorme impacto na vida da região, marcando sua história, suas formas de comer, vestir, amar, dan-çar, cantar, rezar, trabalhar, juntamente com todas a-quelas heranças intangíveis que as pessoas levam na pele, nos olhos e na alma.

São inúmeros os sinais dessa presença. Existem hoje 406 comunidades quilombolas nos estados do Amapá, Amazonas, Maranhão e Pará. Os dados são da Funda-ção Cultural Palmares, entidade do governo federal res-ponsável pela certificação dessas comunidades, etapa necessária para o reconhecimento de suas garantias constitucionais e, especialmente, o direito às terras em que vivem. Em todo o Brasil, são cerca de 2 mil comuni-dades já certificadas.

Agora, pergunta-se: se a presença negra na Amazônia é tão relevante, por que sabemos tão pouco sobre ela? Para começar, é preciso lembrar que, durante muito tempo, boa parte da historiografia partiu do princípio de que a escravidão não teve grande importância na regi-ão, já que ali se costumava usar o trabalho indígena em maior escala que o africano. Inclusive, havia certo con-senso de que estudar a presença africana no Brasil era relevante apenas nos lugares onde existia grande nú-mero de escravos. Basicamente, isso significava falar das regiões Sudeste e Nordeste do País.

Durante anos, esses argumentos foram usados para justificar a falta de aprofundamento da pesquisa sobre a presença negra na Amazônia. O resultado disso reper-cutiu fundo na produção historiográfica sobre o tema e alcançou os livros didáticos. Afinal, quanto menos se pesquisava sobre o assunto, mais difícil era falar sobre ele.

Desde o fim da década de 1980, esse cenário vem sen-do revertido em razão da notável expansão dos estudos sobre a escravidão africana e as experiências de traba-

lhadores cativos e libertos, ancorados em sólida pesqui-sa documental, novas temáticas e métodos.

O mergulho nesse universo vem revelando outras histó-rias sobre a vida dos africanos Brasil afora. Tais resulta-dos ajudam a fortalecer as lutas contemporâneas dos movimentos sociais de negritude porque iluminam traje-tórias de indivíduos e comunidades, colaboram nos pro-cessos de reconhecimento de terras quilombolas e fun-damentam reivindicações de políticas de ação afirmativa e combate ao racismo.

Hoje, as pesquisas revelam um Brasil muito mais diver-so do ponto de vista étnico-racial do que se pensava no passado. Os estudos fazem isso trazendo outros perso-nagens para a cena, entre eles, homens e mulheres de origem africana, escravizados ou não, que viveram na Amazônia.

Enegrecendo a floresta

Estudos recentes indicam que a Amazônia foi conectada às redes do tráfico atlântico ainda no fim do século XVII e, até meados de 1750, estima-se a entrada de cerca de mil indivíduos na região, provenientes, em especial, da Costa da Mina, área tradicional de comércio negreiro na África.

O tráfico era feito com forte comprometimento da coroa portuguesa e, considerando que o Grão-Pará e o Mara-nhão não eram uma de suas rotas mais rentáveis, havia certa irregularidade nos desembarques até a segunda metade do século XVIII, quando foi criada a Companhia Geral de Comércio do Grão-Pará e Maranhão.

A partir daí, coube à nova empresa a tarefa de ampliar a oferta de escravos para os proprietários da região, em especial porque a coroa portuguesa resolveu, no mes-mo período, abolir a escravidão dos índios (1755) que eram trazidos dos altos cursos dos rios amazônicos pa-ra servir nas propriedades no Pará e no Maranhão. Os índios eram trabalhadores indispensáveis e o fim de sua escravidão, somado à presença dos escravos, não re-presentou uma redução dessa importância. Eles conti-nuaram a ser empregados em diversas formas de traba-lho compulsório e, inclusive, compartilharam muitas des-sas experiências com os escravos negros.

Enquanto a Companhia esteve em funcionamento (1755-1778), estima-se que tenha comercializado perto de 25 mil escravos na imensa área que hoje conhecemos co-mo Maranhão, Pará, Amazonas e Mato Grosso. Até me-ados do século XIX, seguindo os novos fluxos do tráfico internacional, as populações desembarcadas na Amazô-nia serão procedentes, em sua maioria, da África Cen-tral Atlântica.

Assim, no século XIX já era bastante evidente a presen-ça da população escrava africana nas vastidões amazô-nicas, trabalhando com os índios nas lavouras de café, tabaco, cana-de-açúcar, na coleta de produtos da flores-ta, nas canoas do comércio e também nos diversos nú-cleos urbanos existentes floresta adentro. Como disse o historiador Flávio dos Santos Gomes, há muito tempo a floresta já estava enegrecida.

Que tipo de atividades realizavam os escravos? Circu-lando pelas ruas de Belém e Manaus estavam carrega-

dores africanos, vendedoras de açaí, mucamas e cria-dos, forros negociando suas produções de tabaco, arti-gos de latão e cobre, oferecendo seus serviços de sapa-teiro, carpinteiro e ourives, divertindo-se nas festas do Espírito Santo, de Nossa Senhora de Nazaré ou, ainda, como membros da Irmandade do Rosário.

Escravos foram empregados na construção de fortale-zas, condução de embarcações para Mato Grosso, nas fazendas de cana, arroz, tabaco, mandioca, milho, na criação de gado e de cavalos na Ilha de Marajó. Tam-bém eram artesãos, tecelões de chapéus e redes de algodão, apanhadores de açaí, pescadores, trabalhado-res do porto, dos arsenais de guerra e da Marinha, das obras públicas, calafates, carpinteiros, pedreiros, ferrei-ros, vendedores de tabaco, garapa e frutas. Também estavam nas casas senhoriais servindo, ninando, zelan-do, cozinhando, lavando e costurando. Estavam em to-dos os lugares dividindo espaços com os trabalhadores índios, o que tornava essas cidades diferentes das ou-tras.

No século XIX, Manaus e Belém surpreendiam os via-jantes estrangeiros que por ali passavam. Suas belezas naturais eram atrativos inquestionáveis, mas a diversi-dade étnico-racial de suas populações era o tema recor-rente nos relatos. Os dados mostram que existia, ao lado de uma grande maioria de índios vivendo nas cida-des, dos escravos africanos e dos chamados brancos, uma grande variedade de tipos mestiços que tornava a Amazônia um laboratório extraordinário para estudo dos efeitos das “misturas raciais”.

Mas outros laços ligavam as histórias de índios e africa-nos relacionados com suas experiências de solidarieda-de construídas a partir do duro cotidiano que muitas ve-zes compartilharam. As tentativas de constituir novos espaços fora da escravidão levaram à formação de mui-tos quilombos/mocambos que, eventualmente, reuniram índios e africanos no mesmo espaço. As fugas também foram frequentes e, em vários casos, épicas, porque atravessavam amplos espaços do território amazônico.

Escravos lançaram mão de muitas estratégias para so-breviver em um mundo adverso e se esforçaram para manter, no limite de suas possibilidades, o controle de suas vidas. Buscaram juntar dinheiro para alcançar al-forria, formaram comunidades independentes, guarda-ram segredos no fundo da alma e transmitiram a seus descendentes.

Mas a presença negra não se reduziu à escravidão. Outros homens e mulheres viveram na região sendo professores de música, chefes de polícia, capoeiras, gráficos, lavadeiras, oleiros, carpinteiros – uma lista sem fim. Apesar de o silêncio sobre essas histórias notáveis ainda ser persistente, não há como negar que está sen-do revertido pela força inquebrantável de todas essas experiências históricas. •

Por Patrícia Melo Sampaio* Professora do Departamento de História da Ufam e pes-quisadora do CNPq

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Fevereiro 2015 Gazeta Valeparaibana Página 14

Conhecer

Dia Mundial da Justiça Social

Dia 20 de Feve-reiro se come-mora o dia I-Mundial da Jus-tiça Social. No entanto, no Bra-sil pouco temos o que comemo-rar.

Apesar de ser um país rico em recursos natu-

rais e com um PIB (Produto Interno Bruto) fi-gurando sempre entre os 10 maiores do mun-do, o Brasil é um país extremamente injusto no que diz respeito à distribuição de seus re-cursos entre a população. Um país rico; po-rém, com muitas pessoas pobres, devido ao fenômeno da desigualdade social, que é ele-vado.

Pesquisadores da área social e econômica

atribuem essa elevada desigualdade social no Brasil a um contexto histórico, que culminou numa crescente evolução do quadro no país.

Mesmo sendo uma nação de dimensões con-tinentais e riquíssima em recursos naturais, o Brasil desponta uma triste contradição, de es-tar sempre entre os dez países do mundo com o PIB mais alto e, por outro lado, estar sempre entre os 10 países com maiores índi-ces de disparidade social.

Dados

Em um relatório da ONU (Organização das Nações Unidas), que foi divulgado em julho de 2010, o Brasil aparece com o terceiro pior índice de desigualdade no mundo e, em se tratando da diferença e distanciamento entre ricos e pobres, fica atrás no ranking apenas de países muito menores e menos ricos, co-mo Haiti, Madagascar, Camarões, Tailândia e África do Sul.

A ONU mostra ainda, nesse estudo, como principais causas de tanta desproporcionalida-de social, a falta de acesso à educação de

qualidade, uma política fiscal injusta, baixos salários e dificuldade da população em des-frutar de serviços básicos oferecidos pelo Es-tado, como saúde, transporte público e sanea-mento básico.

Teóricos brasileiros, pessoas e instituições que estão à frente de iniciativas que visam diminuir, e quem sabe, acabar com o proble-ma da desigualdade no Brasil, apontam uma difícil fórmula que deve aliar democracia com eficiência econômica e justiça social como u-ma solução viável para o problema.

Mesmo com a Constituição Federal e diver-sos códigos e estatutos, assegurando o aces-so à educação, moradia, saúde, segurança pública, além de autonomias econômicas e ideológicas, a realidade que se vê ainda é dis-tante do que se reza nos direitos do cidadão brasileiro no tocante à erradicação da desi-gualdade social neste país, em constante crescimento econômico e político.

Da redação

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21 de Fevereiro

Dia Internacional da Língua Materna O dia internacional da língua materna foi insti-tuído em 1999 na Conferência Geral da UNESCO. O principal objetivo é promover a diversidade cultural linguística e alertar para as tradições linguísticas e culturais. Teve a sua origem no Dia do Movimento da Língua celebrado em Bangladesh desde 1952.

Existem cerca de 6000 línguas faladas no mundo, sendo que metade estão quase a de-saparecer. Assim, a UNESCO propõe a recu-peração das línguas ameaçadas. A língua portuguesa é uma das línguas mais faladas no mundo, por isso não se encontra dentro das línguas ameaçadas.

A Importância da Língua Portuguesa no Mundo Globalizado

Em meu artigo inaugural, falarei acerca de u-

ma das minhas maiores paixões, a Língua Portuguesa. Discorrerei, então, sobre a nossa língua materna e sua importância e soberania no mundo contemporâneo. Já somos mais de 200 milhões de falantes no planeta, o que faz desse idioma o terceiro mais falado no univer-so lingüístico ocidental, ficando atrás apenas do Inglês e do Espanhol.

É importante ressaltar que a Língua Portugue-sa é importante não apenas para Portugal, mas também para todos os demais povos que integram a Comunidade dos Paises de Língua Portuguesa, dentre os quais o Brasil aparece como a nação mais importante, na sua ascen-são, considerando o elevado número de falan-tes e sua projeção a nível mundial.

Ao contrário dos que muitos pensam, o mun-do do novo milênio não será bilíngüe - língua nacional mais o Inglês, mas trilíngüe ou quem sabe até multilíngüe.

A famosa globalização não ocorrerá somente em torno dos Estados Unidos, que se intitula a superpotência do planeta, mas ainda de for-ma diversa, em torno de grupos econômicos diferentes, sejam regionais ou continentais, como é o caso do Bloco Econômico da Améri-ca do Sul e a União dos Países Europeus e até mesmo os blocos culturais e lingüísticos como o da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa e o da Comunidade dos Países

de Língua Francesa.

É importante então que busquemos cada vez mais valorizar e defender a nossa língua ma-terna. Afinal preservá-la denota muito mais do que somente zelar pelo falar de um povo, sig-nifica defender o que há de mais precioso em nossa nação: nossa identidade, nossos costu-mes, nossa história e até mesmo nosso futu-ro.

Refletirmos sobre este tema é, portanto, de extrema importância, haja vista que nosso idi-oma é o traço principal da união entre Brasil, Portugal e outros países falantes da Língua Portuguesa.

A língua de Camões se tornou de forma inten-sa, um elemento característico da nação bra-sileira e veículo de comunicação de uma das mais ferventes e genuínas culturas do mundo atual.

Não devemos deixar que o moderno Mundo Virtual nos iluda com a imagem de um supos-to império da Língua Inglesa.

O seu uso no mundo de hoje não substitui de forma nenhuma a função essencial e primordi-al de fortes línguas nacionais, como é o caso da nossa rica e maravilhosa Língua Portugue-sa

Por : Rokatia Kleania

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Fevereiro 2015 Gazeta Valeparaibana Página 15

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Negócios da saúde

Dia 28 de Fevereiro é o dia dedicado inter-nacionalmente às doenças raras e é sobre doença que resolvemos trazer este artigo.

Para um visitante

dos Estados Uni-

dos, Cuba desori-

enta. Automóveis

norte-americanos

estão em todo

lugar, mas todos

datam dos anos

50. Nossos cartões bancários, cartões de crédito e tele-

fones inteligentes não funcionam. O acesso à internet é

praticamente inexistente. E o sistema de saúde também

parece irreal. Há médicos demais.

Todo mundo tem um médico da família. Tudo é de gra-

ça, totalmente de graça — e não precisa de aprovação

prévia ou de algum tipo de pagamento. Todo o sistema

parece de cabeça para baixo. É tudo muito organizado e

a prioridade absoluta é a prevenção. Embora Cuba te-

nha recursos econômicos limitados, seu sistema de saú-

de resolveu alguns problemas que o nosso [dos Estados

Unidos] ainda nem enfrentou.

Médicos de família, junto com enfermeiras e outros pro-

fissionais de saúde, são os responsáveis por dar atendi-

mento primário e serviços preventivos para seu grupo

de pacientes — cerca de mil pacientes por médico em

áreas urbanas.

Todo o cuidado é organizado no plano local e os pacien-

tes e seus profissionais de saúde geralmente vivem na

mesma comunidade. Os dados médicos em fichas de

papel são simples e escritos à mão, parecidos com os

que eram usados nos Estados Unidos 50 anos atrás.

Mas o sistema é surpreendentemente rico em informa-

ção e focado na saúde da população.

Todos os pacientes são categorizados de acordo com o

nível de risco de saúde, de I a IV. Fumantes, por exem-

plo, estão na categoria de risco II, e pacientes com do-

ença pulmonar crônica, mas estável, ficam na categoria

III.

As clínicas comunitárias informam regularmente ao dis-

trito sobre quantos pacientes tem em cada categoria de

risco e sobre o número de pacientes com doenças como

a hipertensão (bem controlada ou não), diabetes, asma,

assim como sobre o status de imunização, data do últi-

mo teste de Papanicolau e casos de gravidez/cuidado

pré-natal.

Todo paciente é visitado em casa uma vez por ano e

aqueles com doenças crônicas recebem visitas mais

frequentes. Quando necessário, os pacientes podem ser

direcionados a policlínicas distritais para avaliação de

especialistas, mas eles retornam para as equipes comu-

nitárias para acompanhamento. Por exemplo, a equipe

local é responsável por garantir que o paciente com tu-

berculose siga as recomendações sobre o regime anti-

microbial e que faça os exames.

Visitas em casa e conversas com familiares são táticas

comuns para fazer com que os pacientes sigam as reco-

mendações médicas, não abandonem o tratamento e

mesmo para evitar gravidez indesejada. Numa tentativa

de evitar infecções como a dengue, a equipe de saúde

local visita as casas para fazer inspeções e ensinar as

pessoas sobre como se livrar da água parada.

Este sistema altamente estruturado, orientado para a

prevenção, produziu resultados positivos. As taxas de

vacinação de Cuba estão entre as mais altas do mundo.

A expectativa de vida de 78 anos de idade é virtualmen-

te idêntica à dos Estados Unidos. A taxa de mortalidade

infantil em Cuba caiu de 80 por mil nos anos 50 para

menos de 5 por mil — menor que nos Estados Unidos,

embora a taxa de mortalidade materna esteja bem aci-

ma daquela dos países desenvolvidos e na média para

os países do Caribe.

Sem dúvida, os resultados são consequência de melho-

rias em nutrição e educação, determinantes sociais bá-

sicos para a saúde pública. A taxa de alfabetização de

Cuba é de 99% e o ensino sobre saúde é parte do currí-

culo obrigatório das escolas. Um recente programa na-

cional para promover a aceitação de homens que fazem

sexo com homens foi desenhado para reduzir as taxas

de doenças sexualmente transmissíveis e aumentar a

aceitação e adesão aos tratamentos.

Os cigarros já não são oferecidos na cesta básica men-

sal e o número de fumantes decresceu, embora as equi-

pes médicas locais digam que continua difícil convencer

fumantes a deixar o vício. Os contraceptivos são gratui-

tos e fortemente encorajados. O aborto é legal, mas

considerado um fracasso do trabalho de prevenção.

Não se deve romantizar o sistema de saúde cubano. O

sistema não é desenhado para escolha do consumidor

ou iniciativas individuais. Não existe sistema de saúde

privado pago como alternativa. Os médicos recebem

benefícios do governo como moradia e alimentação,

mas o salário é de apenas 20 dólares por mês. A educa-

ção é gratuita e eles são respeitados, mas é improvável

que obtenham riqueza pessoal.

Cuba é um país em que 80% dos cidadãos trabalham

para o governo e o governo é quem gerencia orçamen-

tos. Nas clínicas de saúde comunitárias, placas infor-

mam aos pacientes quanto o sistema custa ao Estado,

mas não há forças de mercado para promover eficiên-

cia.

Os recursos são limitados, como descobrimos ao ter

contato com médicos e profissionais de saúde cubanos

como parte de um grupo de editores-visitantes dos Esta-

dos Unidos. Um nefrologista de Cienfuegos, a 240 quilô-

metros de Havana, tem uma lista de 77 pacientes em

diálise na província, o que em termos de população dá

40% da taxa dos Estados Unidos — similar ao que era

nos Estados Unidos em 1985.

Um neurologista nos informou que seu hospital só rece-

beu um CT scanner doze anos atrás. Estudantes norte-

americanos de universidades médicas cubanas dizem

que o trabalho nas salas de cirurgia é rápido e eficiente,

mas com pouca tecnologia. Acesso à informação via

internet é mínimo. Um estudante informou que tem 30

minutos por semana de acesso discado.

Esta limitação, como muitas outras dificuldades de re-

cursos que afetam o progresso, é atribuída ao embargo

econômico dos Estados Unidos [imposto em 1960], mas

podem existir outras forças no governo central traba-

lhando contra a comunicação fácil e rápida entre cuba-

nos e os Estados Unidos.

Como resultado do estrito embargo econômico, Cuba

desenvolveu sua própria indústria farmacêutica e agora

fabrica a maior parte das drogas de sua farmacopeia

básica, mas também alimenta uma indústria de exporta-

ção. Recursos foram investidos no desenvolvimento de

expertise em biotecnologia, em busca de tornar Cuba

competitiva no setor com os países avançados.

Existem jornais médicos acadêmicos em todas as espe-

cialidades e a liderança médica encoraja fortemente a

pesquisa, a publicação e o fortalecimento de relações

com outros países latino-americanos. As universidades

médicas de Cuba, agora 22, continuam focadas em a-

tendimento primário, com medicina familiar exigida co-

mo primeira residência de todos os formandos, embora

Cuba já tenha hoje o dobro dos médicos per capita que

os Estados Unidos.

Muitos dos médicos cubanos trabalham fora do país,

como voluntários num programa de dois anos ou mais,

pelo qual recebem compensação especial. Em 2008,

havia 37 mil profissionais de saúde cubanos trabalhando

em 70 países do mundo. A maioria trabalha em áreas

carentes, como parte da ajuda externa de Cuba, mas

alguns estão em áreas mais desenvolvidas e seu traba-

lho traz benefício financeiro para o governo cubano (por

exemplo, subsídios de petróleo da Venezuela).

Todo visitante pode ver que Cuba continua distante de

ser um país desenvolvido em infraestrutura básica, co-

mo estradas, moradias e saneamento. Ainda assim, os

cubanos começam a enfrentar os mesmos problemas

de saúde de países desenvolvidos, com taxas crescen-

tes de doenças coronárias, obesidade e uma população

que envelhece (11,7% dos cubanos tem 65 anos de ida-

de ou mais).

O seu incomum sistema de saúde enfrenta estes proble-

mas com estratégias que evoluiram da peculiar história

política e econômica de Cuba, um sistema que — com

médicos para todos, foco em prevenção e atenção à

saúde comunitária — pode informar progresso também

para outros países.

Page 16: 087 - Fevereiro · se da aula inaugural do ano de 1996. O motivador desses es-pasmos de comicidade e admira-ção era Ariano Suassuna. Como se fosse um Quixote sertanejo, o escritor

Fevereiro - 2015

Edição nº. 87 Ano VIII

Sustentabilidade Social e Ambiental - Educação - Reflorestamento - Desenvolvimento Sustentável - Cidadania

De novo a Grécia! O partido Syriza, de e x t r e m a -e s q u e r d a , venceu as eleições le-gislativas na Grécia on-

tem com bandeira anti-austeridade, anti-União Europeia e extremamente interventora na e-conomia. Como é um país parlamentarista, o partido indicou o Primeiro-Ministro, novo chefe de governo do país. Por que isso aconteceu e quais as conseqüências dessa eleição?

Não podemos descolar essa análise da reali-dade político-econômica da Grécia pré-crise. Ao entrar na União Europeia, recebeu maci-ços investimentos em infra-estrutura através do Estado, contabilizando esses recursos co-mo dívida pública. Além disso, um maciço Es-tado de bem-estar social gerou outra grande dívida pública. Isto ocorre porque promessas políticas são de graça na hora de falar, mas custam dinheiro na hora de fazer. Foi uma op-ção política da Grécia recorrer a empréstimos para bancar seu assistencialismo, já que sua economia não gerava recursos suficientes pa-ra este fim. Só que todo empréstimo, um dia, precisa ser pago.

Quando a Grécia atingiu níveis absurdos de endividamento, a fonte secou e os investido-res não tiveram mais interesse em refinanciar essa dívida, sendo necessária uma interven-ção do FMI, exigindo que os direitos sociais fossem reduzidos e políticas de austeridade implementadas, para que crédito fosse dispo-nibilizado novamente para os helênicos.

O problema das políticas de austeridade é que ninguém quer pagar a conta depois da farra de gasto público promovido. Isso ocorre na Grécia, no Brasil e em todo o mundo. Aqui mesmo, após os anos de gasto desenfreado dos governos PT, algumas poucas medidas de austeridade, e mesmo assim enviesados com muito aumento de impostos e pouco cor-te de gastos, já tem sido base de uma grita de toda a sociedade.

Dentro desse cenário, a vitória do Syriza não é de se espantar.

É evidente que foram políticas de esquerda que levaram a Grécia para o estado lastimá-vel em que se encontra, mas o marketing dos partidos de esquerda culpando o capitalismo pelos problemas é muito eficiente, e as popu-lações acabam optando por políticas interven-toras para tentar consertar problemas de polí-ticas interventoras. Certamente é uma fórmula que não dará certo.

Especialmente dentro da realidade de propos-tas do Syriza. A se confirmar uma moratória e a estatização da maior parte da economia grega, imediatamente o peso das dívidas nas contas públicas é jogado fora, o que dará fôle-go ao Governo grego, mas aquilo que criou a dívida em primeiro lugar é reforçado e apro-fundado. Como o Syriza irá pagar por rede assistencialista, SUS grego, transporte públi-co gratuito e outras “benesses”? Somente três alternativas serão possíveis: (i) aumento ex-ponencial dos impostos gregos, o que vai o-primir a criação de riqueza do país; (ii) expan-são da base monetária, pagando gastos públi-cos com hiperinflação; ou (iii) com emprésti-mos.

Essa última parte, que foi a solução de outro-ra, não poderá ser aplicada, pois ninguém irá emprestar dinheiro para um país caloteiro, restando apenas inflação e impostos para bancar os devaneios esquerdistas de pessoas que não entendem a lição mais básica da e-conomia: vivemos em um mundo de escas-sez. No longo prazo, esse modelo claramente não se sustentará. Mas para que se preocupar com isso, afinal, no longo prazo, todos estare-mos mortos, certo?

Por : Bernardo Santoro

Toda a imprensa europeia tem os olhos postos na Grécia.

A vitória do Syriza nas eleições le-g i s l a t i v a s deste domin-go é o des-taque princi-

pal nos sites dos jornais europeus, que questi-onam se o resultado abrirá portas ou não para uma mudança no rumo político da Europa.

O "El País" escreve que o triunfo da esquerda radical na Grécia abre uma nova era política e obriga a Europa a refletir sobre as políticas anticrise. "Os gregos elegeram este domingo a esperança, mas também a incerteza, frente ao medo do futuro e a miséria do presente, a acreditar pelo avanço dos resultados, que dá uma folgada vantagem à esquerda radical do Syriza frente ao partido de centro-direita da Nova Democracia".

O resultado, escreve o "El País", "abre uma

nova era na política grega e sem dúvida terá repercussões no resto da Europa, obrigando a uma reflexão sobre as políticas seguidas du-rante e pós-crise"

"PASOK, o Titanic socialista" é o título de ou-tro artigo do "El País", que destaca a pesada derrota do partido de Evánguelos Venicelos, que, segundo os primeiros resultados, surge em sexto lugar, passando a ser irrelevante no novo cenário político grego.

No "El Mundo", Thodoris Georgakopoulo es-creve uma crônica sob o título "Tsipras, o flau-tista que encanta a Grécia e assusta a Euro-pa", onde aborda o percurso do líder do Syri-za, Alexis Tsipras, e o possível efeito de con-tágio político na Europa. Será Tsipras um "político comprometido" ou um "louco inexpe-riente?", questiona Georgakopoulo.

O jornal britânico "The Guardian" dedica um editorial no site defendendo que as eleições gregas "destruíram as regras do período pós-recessão" e "abanaram a União Europeia". "Durante seis anos, os gregos protestaram contra as imposições de Bruxelas e neste do-

mingo a paciência finalmente acabou, especi-almente entre a classe média, derrotando o governo da Nova Democracia, pró-austeridade, e elegendo a coligação de es-querda Syriza, que é contra a austeridade", pode ler-se no editorial.

O texto refere ainda que o resultado terá co-mo consequência que "o passado não mais servirá de guia para o futuro, pelo menos em Atenas, se é que não mesmo na Europa".

Já a BBC sublinha a "substancial vitória eleito-ral" do Syriza. O francês "Le Monde" realça a "vitória histórica da esquerda radical" na Gré-cia, defendendo o seu enviado especial a Ate-nas que Alexis Tsipras "será suficientemente forte para governar sem coligação, quer ele tenha maioria absoluta ou não".

"Syriza já festeja antes da maioria absoluta", escreve por sua vez o jornal alemão "Die Welt", que dá conta da comemoração de mi-lhares de pessoas nas ruas de Atenas, logo após as primeiras projeções eleitorais.

Por : ILIANA COELHO