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9
1 INTRODUÇÃO
O Brasil é um país marcado por profundas desigualdades sociais, econômicas
e políticas, que influenciam o acesso à justiça, uma vez que poucas pessoas
conhecem seus direitos ou têm condições de reivindicá-los, os custos para se
interpor uma ação no Poder Judiciário são elevados, além do fato de que esta
instituição enfrenta problemas como os de demora e ineficiência na resolução de
conflitos, o que tem por consequência a descrença da população no Poder
Judiciário.
Todavia, apesar de marcado por notáveis desigualdades, o Brasil é um
Estado Democrático, que vem, inclusive, contando com iniciativas dos últimos
governos no sentido de diminuir as disparidades existentes. De qualquer sorte, o
país ainda está longe do que o preâmbulo da Constituição da República Federativa
do Brasil de 1988 coloca como dever do Estado, a saber, “assegurar o exercício dos
direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o
desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade
fraterna, pluralista e sem preconceitos”.
Percebe-se, portanto, que a Constituição Federal elevou a justiça ao patamar
dos valores supremos da sociedade brasileira e, sendo um valor de tão relevante
importância, foi previsto em diversos dispositivos do texto da Carta Magna, tal como
o artigo 5º, inciso LXXIV, responsável por estabelecer que “o Estado prestará
assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de
recursos”.
Essa assistência jurídica integral e gratuita deve ser prestada, de acordo com
o artigo 134 da Constituição Federal, pela Defensoria Pública, importante
instrumento de concretização do acesso à justiça, que proporciona ampla orientação
jurídica e defesa a toda a população de baixa renda.
Todavia, apesar de, na teoria, procurar-se efetivar ao máximo o acesso à
justiça, a própria doutrina discorre sobre alguns entraves à sua concretização. Além
disso, necessário ressaltar que a doutrina atribui diferentes sentidos à expressão
“acesso à justiça”, conforme se verificará oportunamente.
Desse modo, com o escopo de averiguar se o direito fundamental de acesso
à justiça está sendo cumprido na Defensoria Pública do Estado do Paraná, o
10
presente trabalho encontra-se dividido em quatro capítulos, tendo primeiro sido
realizada uma análise da desigualdade social no Brasil e de sua influência no
acesso à justiça, passando-se em seguida para uma abordagem da Defensoria
Pública no Brasil, direcionando-se o enfoque, ao final, para a Defensoria Pública do
Paraná e seus principais problemas.
11
2 CENÁRIO DA DESIGUALDADE
Antes de adentrar na análise específica do tema “acesso à justiça”, faz-se
necessário, para uma melhor compreensão da questão, traçar um panorama da
desigualdade no Brasil, sendo utilizados, para esse fim, alguns aspectos da teoria
desenvolvida por Karl Marx, observando-se, todavia, que somente se pretendeu
fazer um apanhado geral, sem esgotar o tema. Veja-se que tal escolha foi feita
considerando os limites da presente monografia, não se esquecendo, todavia, das
teorias desenvolvidas por outros autores, clássicos e contemporâneos1.
Cumpre enfatizar, ainda, que o motivo para se partir dessa teoria adveio, além
de sua notável relevância, de ser ela a mais proeminente no que se refere ao
conceito de estratificação social, que tem por definição a existência de posições
desiguais ocupadas pelos indivíduos na sociedade.2
Na teoria de Marx, constata-se a existência do conceito de classe, cujo
significado é, segundo Anthony Giddens, o de “um grupo de pessoas que se
encontram em uma relação comum com os meios de produção – os meios pelos
quais elas extraem seu sustento”.3 (grifo do autor).
Nas atuais sociedades industriais modernas, há o predomínio do capital, que
pode ser compreendido como os bens, tais como a riqueza, o maquinário, dentre
outros, possíveis de serem utilizados para a produção de mercadorias por parte dos
capitalistas, sendo importante ressaltar que o capitalista é aquele que, além de deter
os meios de produção, detém uma posição social, e o proletário é o que está
excluído dos meios de produção, necessitando vender seu trabalho para os
capitalistas. Nesse sentido, as relações de produção do sistema capitalista seriam
as responsáveis pela produção das desigualdades sociais.
Existe entre as classes teorizadas por Marx uma relação de exploração, que,
dentro do sistema capitalista, pode ser observada através do conceito de mais-valia,
referente ao lucro que os capitalistas obtêm a partir do trabalho de seus
empregados, tendo em vista que, ao final de um dia de trabalho, os trabalhadores
1 Cf. GIDDENS, Anthony. Constituição da Sociedade. Editora Martins Fontes, 2003; e BOURDIEU,
Pierre. A miséria do mundo. São Paulo, Vozes, 2003. 2 GIDDENS, Anthony. Sociologia. Tradução de Sandra Regina Netz. 4. ed. Porto Alegre: Artmed,
2005. p. 251. 3 Ibid., p. 235.
12
produzem além do necessário para cobrir os custos de sua contratação, sendo esse
“além” atinente ao lucro do empregador.4
Para Marx, o sistema capitalista, como já adiantado anteriormente, é
responsável pelo surgimento de desigualdades, propondo, então, em linhas gerais,
uma transformação da sociedade capitalista para uma sociedade mais justa e
humana.
A teoria de Max Weber acerca da estratificação foi desenvolvida por meio da
teoria de Marx, contudo, foi ela modificada e aperfeiçoada, no sentido de que a
estratificação social, além da questão de classe já trazida por Marx, foi acrescentada
por mais dois aspectos, quais sejam, status e partido, sendo o primeiro referente “ao
apreço, ou a “honra social”, concedido a indivíduos ou a grupos”, e o segundo
referente “à mobilização ativa de grupos para garantir objetivos definidos.” 5 Desse
modo, percebe-se que Weber procurou evitar, ao contrário de Marx, colocar o fator
econômico como determinante dos acontecimentos históricos e sociais.
Indo mais adiante na análise de Giddens, é possível apreender que, apesar
de grande parte das pessoas na sociedade moderna deter um maior poder aquisitivo
se comparado há algumas gerações, a riqueza permanece concentrada com um
pequeno número de indivíduos.
Outro conceito trabalhado pelo autor é o da exclusão social, alusivo aos
processos que culminam no isolamento de certos indivíduos que não terão um
envolvimento pleno na sociedade. A análise de exclusão pode ser feita em termos
econômicos, no que tange à produção e ao consumo, em termos políticos, referente
à participação política ativa de todos os indivíduos, e em termos sociais, relativa à
vida social e comunitária. Segundo ele:
Aos indivíduos que são excluídos socialmente devido a condições precárias de habitação, escolas de qualidade inferior ou transporte limitado, podem ser negadas as oportunidades de auto-aperfeiçoamento oferecidas à maioria das pessoas da sociedade. Os sem-teto representam uma das formas mais extremas de exclusão social. As pessoas que não possuem uma residência permanente podem acabar sendo barradas de muitas atividades cotidianas que a maioria das pessoas consideram triviais.
6
4 GIDDENS, 2005, p. 235.
5 GIDDENS, 2005, p. 252.
6 GIDDENS, 2005, p. 280.
13
Percebe-se, portanto, que a consequência dessa exclusão, que reflete uma
desigualdade, é a de que os indivíduos excluídos ficam impossibilitados de participar
plenamente das instituições e atividades acessíveis a maior parte das outras
pessoas.
2.1 DESIGUALDADE NO BRASIL
A partir do panorama geral da desigualdade acima traçado, parte-se para uma
análise da desigualdade no âmbito específico do Brasil, começando pela obra
“Cidadania no Brasil: o longo caminho”, de José Murilo de Carvalho7.
Para o autor, o esforço para a construção da democracia ganhou força em
1985, após o fim da ditadura militar, sendo uma das marcas desse esforço a
importância que assumiu a palavra cidadania no contexto nacional, tendo, inclusive,
a Constituição Federal de 1988 sido denominada de Constituição Cidadã. Ocorre
que, apesar desse primeiro entusiasmo cívico, percebeu-se que, muito embora o fim
da ditadura tenha trazido liberdade, livre manifestação de pensamento, de ação
política, sindical e de participação, bem como direito de voto, ainda há inúmeros
problemas em outras áreas, sendo alguns exemplos a violência urbana, o
desemprego, as grandes desigualdades sociais e econômicas, a má qualidade da
educação, dentre outros.8 A consequência disso é, segundo o autor, que “os
próprios mecanismos do sistema democrático, como as eleições, os partidos, o
Congresso, os políticos, se desgastam e perdem a confiança dos cidadãos” 9,
surgindo daí a importância de se refletir sobre a cidadania.
Segundo Carvalho, a cidadania é um fenômeno complexo e historicamente
definido, tendo tornado-se costume desdobrá-la em direitos civis, que garantem a
vida em sociedade, direitos políticos, garantidores da participação no governo da
sociedade, e direitos sociais, que têm por função a garantia da participação na
riqueza coletiva, do que decorre que cidadão pleno seria o que fosse titular dos três
direitos. Para ele, a cidadania plena constitui um ideal talvez inatingível, mas que
7 CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil: o longo caminho. 8. ed. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2006. 8 CARVALHO, 2006, p. 7-8.
9 Ibid., p. 8.
14
tem servido de parâmetro para a análise da cidadania em cada momento histórico e
em cada país.10
O autor coloca que, conforme explicitado por T. A. Marshall, a cidadania na
Inglaterra possui uma cronologia e sequência lógica, uma vez que primeiro vieram
os direitos civis, para, com base no exercício dos direitos e liberdades civis, surgirem
os direitos políticos e, por fim, a partir destes últimos, nascerem os direitos sociais.11
Já no Brasil, essa pirâmide foi invertida, tendo em vista que primeiro vieram
os direitos sociais, implantados por Getúlio Vargas, em um período marcado pela
supressão de direitos políticos e redução de direitos civis, ou, em outras palavras,
em meio a um governo paternalista marcado pelo autoritarismo estatal, depois
vieram os direitos políticos e, por último, vieram os direitos civis, que, segundo
Carvalho, continuam inacessíveis a maior parte da população.12
Para o autor, uma das razões para as dificuldades em relação aos problemas
da pobreza e da desigualdade pode ter a ver com a inversão da pirâmide ora em
comento, haja vista possuir a sequência inglesa uma lógica capaz de reforçar a
convicção democrática.13
Todavia, coloca que não há um caminho único para a cidadania, mas que
seria razoável conjeturar que caminhos diferentes afetam o tipo de cidadão e, assim,
de democracia que se origina, o que é ainda mais verdadeiro quando a base da
pirâmide passa a consistir nos direitos sociais. As consequências dessa inversão na
pirâmide podem ser as seguintes: excessiva valorização do Poder Executivo, o que
tem raízes no fato de que, no Brasil, os direitos sociais são concedidos e não
conquistados, tal como ocorre na Inglaterra, o que forma mais uma “estadania”, em
contraste com a cidadania; busca por um messias político, pois, como a experiência
democrática tem sido curta e, ao mesmo tempo, os problemas sociais têm, no mais
das vezes, se agravado, aumenta a impaciência da população com o mecanismo
democrático mais lento de decisão, o que tem por resultado a busca nos recursos
mais rápidos de solução através de lideranças carismáticas; desvalorização do
Legislativo e de seus titulares, deputados e senadores, o que surge em contrapartida
10
Ibid., p. 8-9. 11
Ibid., 10-11. 12
CARVALHO, 2006, 219-220. 13
Ibid., p. 220.
15
à valorização do Executivo; favorecimento de uma visão corporativista dos
interesses coletivos.14
Delimitando a análise para as dificuldades na área social, Carvalho coloca
que a desigualdade se dá, sobretudo, no âmbito regional e racial, sendo a pobreza e
a miséria uma consequência da desigualdade que concentra a riqueza nas mãos de
poucas pessoas. No que tange aos direitos civis, a falta de garantia deles se
constata, especialmente, na segurança individual, integridade física e acesso à
justiça. Quanto ao Judiciário, somente uma pequena parte da população pode contar
com a proteção da lei, uma vez que, de um lado, estão os privilegiados,
posicionados acima da lei, sempre defendendo seus interesses pessoais através do
dinheiro e prestígio social, e de outro, uma segunda classe, sujeita aos rigores e
benefícios da lei, o que remete a uma profunda desigualdade. Há, também, os
cidadãos de terceira classe, sendo eles a grande população marginal da sociedade,
muitas vezes, ignorando, na prática, seus direitos civis ou tendo eles
desrespeitados.15
Desse modo, elucida o autor que o Judiciário não vem cumprindo o seu papel,
uma vez que o acesso à justiça é limitado a um pequeno número de pessoas;
poucas pessoas conhecem os seus direitos ou têm condições de reivindicá-los; os
custos para se contratar um bom advogado não podem ser arcados por grande
parcela da população, sendo que, apesar de ser dever constitucional a prestação de
assistência jurídica gratuita aos mais necessitados economicamente, o Estado não
fornece defensores públicos em número satisfatório para atender todos os
necessitados; há uma lentidão no Judiciário. A consequência desses problemas
estaria na descrença da população no Judiciário ou no sentimento de que ele só
funciona para os que possuem melhores condições econômicas.16
Oportuno se torna traçar, nesse aspecto do tema, um paralelo entre essa
última desigualdade trazida por Carvalho e o conceito de estratificação e exclusão
sociais trazidos por Giddens, haja vista ser essa diferença quanto à proteção da lei
fruto da existência de posições desiguais ocupadas pelos indivíduos na sociedade
(conceito de estratificação social), o que pode remeter a alguns casos de exclusão
social, já que, havendo posições desiguais entre pessoas da mesma sociedade,
14
Ibid, p. 220-222. 15
CARVALHO, 2006, p. 215-216. 16
Ibid., 214-215.
16
alguns sairão prejudicados, ficando, algumas vezes, até mesmo excluídos da
proteção da norma legal, sendo um exemplo disso o caso de um sem-teto que tenha
um direito seu ferido, mas que ficará à margem do ordenamento jurídico, advindo daí
a notável influência que a desigualdade exerce sobre o acesso do cidadão à justiça.
Roborando o assunto, Carvalho elucida que a democracia política ainda não
conseguiu resolver os problemas econômicos, tais como a desigualdade e o
desemprego, persistindo, ainda, os problemas da área social e havendo
agravamento da situação dos direitos civis no que tange à segurança individual.17
Para concluir, aduz o autor que, com a inversão da pirâmide, reforçou-se na
sociedade brasileira a supremacia do Estado, mas que a organização da sociedade
não deve ser feita contra o Estado, somente contra o Estado corporativo, clientelista.
Nesse sentido, duas experiências, que apontam no sentido de colaboração entre
sociedade e Estado, favorecem a cidadania, quais sejam, o surgimento das
organizações não governamentais, responsáveis por desenvolver atividades de
interesse público sem serem parte do governo, e a utilização de meios alternativos
de participação popular na elaboração e execução de políticas públicas. Todavia,
coloca que, apesar de essas duas experiências contribuírem com a cidadania, a
cultura do consumo, que faz com que as pessoas queiram ser consumidoras e não
cidadãs, dificulta a solução da incapacidade do sistema representativo reduzir as
desigualdades sociais e a divisão da população em função da educação, renda ou
cor. 18
A partir de todo o exposto, conclui-se que a intenção de Carvalho não é a de
propor soluções para a questão da cidadania, mas a de, basicamente, contribuir,
através do enfrentamento da questão, a identificar quais as barreiras para a
construção democrática.19
Saindo de uma visão mais teórica acerca da desigualdade no Brasil e partindo
para uma abordagem empírica do assunto, tem-se que, segundo análise realizada
por Celi Scalon”20, através de um estudo que teve por base alguns temas constantes
no survey do International Social Survey Programme (ISSP), com o objetivo de
apresentar um quadro descritivo dos dados concernentes à percepção acerca das
17
Ibid., p. 199. 18
CARVALHO, 2006, p. 227-229. 19
Ibid., p. 13. 20
SCALON, Celi. O que os brasileiros pensam das desigualdades sociais?. In: SCALON, Celi (Org.). Imagens da desigualdade. Belo Horizonte: UFMG, 2004. p. 17-35.
17
desigualdades dentro do Brasil, 96% dos brasileiros reconhece a existência de
desigualdades de renda dentro da sociedade, o que, para a autora, não é um dado
digno de gerar surpresa, levando-se em conta que a igualdade é um valor hoje
universal e que é plenamente difundida e popular a ideia de que o Brasil é um país
com elevadas taxas de concentração de renda e desigualdade de oportunidades.
Contudo, apesar dessa percepção um tanto que negativa da realidade, a pesquisa
demonstrou que o sonho dos brasileiros consiste em viver em uma sociedade de
classe média. Sobre o conflito de classes, a autora demonstra que 60% dos
entrevistados acredita existir um conflito de classes, o que contraria a disseminada
opinião de que a sociedade brasileira possui baixa taxa de conflito. 21
Ademais, se de um lado demonstra-se a percepção de existência de
desigualdade, de outro, fica evidenciado, através das análises de Scalon, que
grande parte dos entrevistados coloca no Estado a responsabilidade sobre a
mitigação dessa desigualdade, sendo que poucas pessoas responderam que teriam
responsabilidade em resolver tal questão, muito embora um número superior a 60%
acredite que o fato de as desigualdades persistirem deve-se à falta de união com o
intuito de combatê-las.22 Sobre esse ponto da análise da autora, é possível
estabelecer um paralelo com a obra anteriormente examinada de Carvalho, no
sentido de que, para esse autor, a excessiva valorização do Poder Executivo é uma
consequência da inversão na pirâmide, ou seja, é uma consequência do fato de que,
no Brasil, primeiro vieram os direitos sociais, depois os direitos políticos e, por
último, os direitos civis.
Uma visão diferente acerca da desigualdade no Brasil é trazida por Jessé
Souza23, que procura estudar a questão da desigualdade “sem apelar para
estratégias culturalistas que enfatizam a continuidade do personalismo, familismo e
patrimonialismo” 24. Para Souza, a desigualdade não é fruto de relíquias pré-
modernas, mas, pelo contrário, é um fenômeno moderno do desenvolvimento
periférico, tendo em vista ser associada à eficácia de instituição e valores modernos,
os quais tornam a desigualdade naturalizada, difícil de ser percebida na vida
cotidiana, sem pôr em dúvida, em um nível mais profundo, a legitimidade do sistema
21
Ibid., p. 31. 22
SCALON, 2004, p. 32. 23
SOUZA, Jessé. Modernização periférica e naturalização da desigualdade: o caso brasileiro. In: SCALON, Celi (Org.). Imagens da desigualdade. Belo Horizonte: UFMG, 2004. p. 75-113. 24
Ibid., p. 85.
18
que abriga essa desigualdade.25 Essa teoria explicaria os resultados da pesquisa
realizada pelo International Social Survey Programme (ISSP), no sentido de que há,
entre todas as classes, uma convergência de valores e disposições, o que se pode
ser percebido, por exemplo, através do fato de ser reconhecido, entre todos os
grupos de escolaridade e renda, que as qualificações profissionais, bem como a
iniciativa profissional, apresentam-se como legítimos fundamentos para as
diferenças de funções e remuneração26, além de ser possível constatar-se que essa
ordem social aparenta ser mais profunda entre as camadas menos favorecidas, haja
vista serem elas as que mais acreditam que as pessoas são recompensadas pelos
seus esforços27 ou mesmo que as diferenças salariais são necessárias para a
prosperidade do Brasil.28
Como o autor analisa a desigualdade a partir da perspectiva de ser ela um
fenômeno moderno do desenvolvimento periférico e não como uma relíquia pré-
moderna, é possível fazer uma contraposição entre o pensamento de Souza e o de
Carvalho, tendo em vista que, para o último, como já explicitado anteriormente, a
desigualdade seria fruto de uma inversão na pirâmide, fugindo, então, à explicação
moderna proposta por Souza.
Ao ensejo da conclusão desse tópico do presente trabalho, importante trazer
alguns dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), referentes aos
gráficos sobre política e situação social brasileira29: houve uma queda da
desigualdade, nos anos de 1995 a 2008, mas o Brasil está longe de atingir os
índices de países desenvolvidos; houve maior crescimento dos rendimentos dos
mais pobres em relação aos indivíduos com maiores rendimentos30; e, em 2007,
constatou-se que 34,5% da população urbana ainda possui condições de moradia
inadequadas.31
25
Ibid., p. 85. 26
Ibid., p. 78. 27
SOUZA, 2004, p. 84. 28
Ibid., p. 85. 29
INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA. Política e situação social brasileira. Disponível em: <http://agencia.ipea.gov.br/images/stories/PDFs/091015_abrahaocoletvsp.pdf>. Acesso em: 16 jul. 2013. 30
INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA. Política e situação social brasileira. Disponível em: <http://agencia.ipea.gov.br/images/stories/PDFs/091015_abrahaocoletvsp.pdf>. Acesso em: 16 jul. 2013. p. 18. 31
INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA. Política e situação social brasileira. Disponível em: <http://agencia.ipea.gov.br/images/stories/PDFs/091015_abrahaocoletvsp.pdf>. Acesso em: 16 jul. 2013. p. 37
19
A última publicação do IPEA que deu sequência à série “Situação Social
Brasileira”32 foi publicada no ano de 2012, analisando, no que se refere à distribuição
de renda, o período que vai de 1995 a 2009, com ênfase no biênio 2008-2009. As
conclusões são de que a desigualdade continuou a sua queda em 2009, mas a um
ritmo um pouco menor do que nos anos anteriores, o que não indica o início de
tendência de menor redução de desigualdade.
Impende também proceder à análise de outro documento de salutar
importância para o tema em questão, qual seja, o “PNAD 2008: primeiras
análises”33, ressaltando-se que o Comunicado da Presidência nº 30 deu início a uma
série de análises do IPEA, abordando os temas da pobreza, desigualdade,
qualidade dos domicílios e acesso a bens. No que tange à desigualdade, esse
documento demonstra que, apesar de ter havido uma queda na desigualdade, um
Coeficiente de Gini de 54,4 ainda coloca o Brasil “na metade mais desigual da região
mais desigual do mundo”.34 Além disso, é possível constatar que os 40% mais
pobres sobrevivem com 10% da renda nacional, enquanto os 10% mais ricos vivem
com mais de 40%, sendo que, ainda hoje, a renda apropriada pelo 1% mais rico é
equivalente a dos 45% mais pobres. Outro dado que merece atenção é o de que o
que um brasileiro pertencente ao 1% mais rico, o que equivale a uma família com
uma renda per capita acima de R$ 4.400,00 (quatro mil e quatrocentos reais) por
mês, pode gastar dentro de três dias equivale ao que um brasileiro nos 10% mais
pobres levaria um ano para gastar. Com isso, se 1/3 (um terço) da renda nacional
fosse distribuída de maneira igualitária, seria possível garantir a todas as famílias
brasileiras a satisfação de suas necessidades mais básicas. Todavia, o documento
demonstra que, atualmente, quase cinquenta milhões de pessoas ainda vivem com
renda abaixo do nível de R$ 190,00 (cento e noventa reais) por mês, sendo que,
para abrandar a extrema pobreza, bastaria contar apenas com 1% (um por cento) da
32
INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA. Situação social brasileira. Disponível em: <https://ipea.gov.br/agencia/images/stories/PDFs/livros/livros/livro_situacaosocial_vida2.pdf>. Acesso em: 16 jul. 2013. 33
INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA. PNAD 2008: primeiras análises. Disponível em: <http://agencia.ipea.gov.br/images/stories/PDFs/090923_comupres30final.pdf>. Acesso em: 16 jul. 2013. 34
INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA. PNAD 2008: primeiras análises. Disponível em: <http://agencia.ipea.gov.br/images/stories/PDFs/090923_comupres30final.pdf>. Acesso em: 16 jul. 2013. p. 3.
20
renda dos 25% mais ricos do país,35 do que decorre que todos esses dados ainda
demonstram a profunda desigualdade existente na sociedade brasileira.
Em 2012, foram divulgados os dados do PNAD 2011, demonstrando que o
Brasil atingiu no ano de 2011 o menor nível de desigualdade social já verificado
desde o início das séries históricas, em 1960, mas, mesmo assim, a desigualdade
brasileira está entre as doze mais altas do mundo. A diminuição da desigualdade é
medida pelo coeficiente de Gini, que passou de 0,594 em 2001 para 0,527 em 2011.
Ademais, o salário dos 10% mais pobres da população brasileira cresceu 91,2%
entre 2001 e 2011. Já a renda dos 10% mais ricos aumentou 16,6% no período, de
forma que a renda dos mais pobres cresceu 550% sobre o rendimento dos mais
ricos36.
2.2 A INFLUÊNCIA DA DESIGUALDADE NO ACESSO À JUSTIÇA
Importante trazer alguns dados que demonstram a influência dessa
desigualdade acima trabalhada no acesso à justiça, partindo do texto “Acesso e
recurso à justiça no Brasil: algumas questões”, de Mário Grynszpan37, que utiliza
dados obtidos através de duas pesquisas, sendo a primeira referente ao survey “Lei,
justiça e cidadania”, concretizado em 1997 pelo Centro de Pesquisa e
Documentação de História Contemporânea do Brasil, da Fundação Getulio Vargas
(CPDOC-FGV), e pelo Instituto de Estudos da Religião (Iser), e a segunda tendo por
base um levantamento de processos de cinco Juizados de Pequenas Causas,
localizados em diferentes pontos da cidade do Rio de Janeiro. Necessário
mencionar que os dados utilizados referem-se à cidade do Rio de Janeiro e de sua
Região Metropolitana38, mas que, apesar de ser uma pesquisa regional, a análise de
35
INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA. PNAD 2008: primeiras análises. Disponível em: <http://agencia.ipea.gov.br/images/stories/PDFs/090923_comupres30final.pdf>. Acesso em: 16 jul. 2013. p. 14. 36
UOL NOTÍCIAS. Economia. Apesar de avanço, Brasil continua entre os 12 países mais desiguais, segundo o IPEA. Disponível em: <http://economia.uol.com.br/ultimas-noticias/redacao/2012/09/25/apesar-de-avanco-brasil-continua-entre-os-12-paises-mais-desiguais-segundo-ipea.jhtm>. Acesso em: 16 jul. 2013. 37
GRYNSZPAN, Mário. Acesso e recurso à justiça no Brasil: algumas questões. In: PANDOLFI, Dulce et al. (Org.) Cidadania, justiça e violência. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1999. 38
Ibid., p. 102.
21
seus resultados tende a contribuir, de uma forma geral, para o estudo da influência
das desigualdades sobre o acesso à justiça.
Segundo Grynszpan, uma das atribuições fundamentais da justiça é a de
garantir os direitos dos cidadãos. Sendo assim, a sua efetivação ocorre, em grande
parte, no momento em que a pessoa que se sente injustiçada a ela recorre, o que
depende, contudo, de outros fatores, como a visão das noções morais de justiça dos
indivíduos e o tipo de visão que estes possuem da justiça enquanto instituição, o que
relaciona-se com o reconhecimento de sua legitimidade.39 Sobre essa legitimidade,
aduz o autor:
Um dos suportes básicos da legitimidade da justiça é a crença difundida na sua inarredabilidade, na sua isenção, na imparcialidade com que se apropria das leis, no tratamento equânime que dispensa às partes em disputa e, também, na sua eficiência, o que se traduz na produção de resultados satisfatórios num tempo razoável. Ressaltar a importância desta crença significa perceber que, uma vez que ela se veja abalada, o próprio reconhecimento da legitimidade da justiça é que termina sendo comprometido, com reflexos sobre os graus em que a população a ela recorre para garantir os seus direitos, para resolver os seus conflitos.
40
Conforme demonstrado pelo texto ora em comento, é possível perceber,
através dos resultados da pesquisa “Lei, justiça e cidadania”, um questionamento da
população quanto à eficiência, imparcialidade e equanimidade da Justiça. Alguns
resultados que amparam essa afirmação tecida pelo autor são os seguintes: para
90,7% dos entrevistados, a aplicação das leis é mais rigorosa para uns do que para
outros; para 95% da população, a Justiça é mais rigorosa com os pobres do que
com os ricos; quanto ao elemento “cor” como critério discriminador, 66,4% das
pessoas acreditam que os negros são tratados de forma mais rigorosa, sendo que
para apenas 1,1% dos entrevistados os brancos poderiam ser desfavorecidos; por
último, quanto às distinções entre os sexos, diferentemente da constatação de que
ricos e brancos são vistos como detentores de uma condição mais privilegiada,
observou-se que a posição socialmente dominante masculina não foi vista, para a
maioria dos respondentes, como apta a conferir um privilégio diante da Justiça, haja
vista que 44,0% declarou que a última trata homens e mulheres de maneira igual,
tendo, contudo, a percentagem próxima de 38,5% respondido que os homens são
39
Ibid., p. 103. 40
GRYNSZPAN, 1999, p. 103.
22
desfavorecidos, com somente 10,6% apontando as mulheres como possuidoras de
um tratamento mais rigoroso.41
Ademais, ressalta o autor que “os dados apresentados evidenciam que a
justiça, na percepção da população, é, em larga medida, uma instituição hostil,
iníqua e ineficiente, o que, certamente, termina por pesar sobre a opção do
recurso.”42
Indo mais além no exame do texto em questão, é possível perceber que,
questionados sobre quais são os direitos mais importantes, 25,8% coloca os direitos
sociais como os mais importantes, 11,7% lembra, em primeiro lugar, dos direitos
civis e, por fim, 1,6% entende os diretos políticos como os primordiais, sendo estes
percebidos mais como deveres do que como direitos. Todavia, os dados que mais
chamam a atenção são os de que 56,7% da população não chegou a citar um direito
sequer, sob o argumento de que não sabia ou não queria responder.43
Para concluir, Grynszpan coloca que a noção de cidadania contrapõe-se
historicamente à ideia de privilégio. Todavia, ainda hoje é possível constatar-se que
parcelas significativas da população são destituídas de recursos formais e de
direitos indispensáveis a sua defesa. A consequência disso é, principalmente, a de
que a própria legitimidade da ordem democrática resta afetada, reforçando-se assim,
mecanismos não legais, hierarquizantes, informais, dentre outros, de resolução de
problemas, bem como de decisão de disputas. Por último, coloca que a necessária
reversão dessa tendência vai além do aumento na oferta dos serviços judiciários,
abarcando, além de mudanças nas posturas dos operadores do sistema jurídico, a
criação de meios que tornem possível a apropriação e o reconhecimento desses
serviços por parte da população.44
Nesse aspecto, é importante mencionar o lançamento pela Fundação Getúlio
Vargas de um índice que mede a confiança na Justiça (ICJBrasil), com o intuito de
avaliar trimestralmente, em Pernambuco, Amazonas, Bahia, Minas Gerais, Rio de
Janeiro, São Paulo, Rio Grande do Sul e Distrito Federal, a confiança e a percepção
que o cidadão deposita no Judiciário.45
41
Ibid., p. 103-106. 42
Ibid., p. 106. 43
GRYNSZPAN, 1999, p. 108. 44
Ibid., p. 113. 45
FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS. Relatório ICJBrasil. Disponível em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/10754/Relatorio_ICJBrasil_4TRI_2012.pdf?sequence=1>. Acesso em: 20 set. 2013. p. 06.
23
Os resultados do ICJBrasil para o quarto trimestre de 2013 demonstram que
seguiu-se a tendência, já identificada nos períodos anteriores, de má avaliação do
Judiciário como prestador de serviços públicos. Para 90% dos entrevistados, o
Judiciário é moroso e resolve os conflitos de forma lenta ou muito lenta. Além disso,
79% respondeu que os custos para acessar o Judiciário são altos ou muito altos e
69% acredita que o Judiciário é difícil ou muito difícil para utilizar. Outros dois
problemas apontados são a falta de honestidade, com 64% dos entrevistados tendo
considerado o Judiciário nada ou pouco honesto, e a parcialidade, com 62% dos
entrevistados opinado que o Judiciário é nada ou pouco independente.46
46
FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS. Relatório ICJBrasil. Disponível em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/10754/Relatorio_ICJBrasil_4TRI_2012.pdf?sequence=1>. Acesso em: 20 set. 2013. p. 12.
24
3 ACESSO À JUSTIÇA
Adentrando em uma análise do ordenamento jurídico brasileiro, tem-se que,
apesar de marcado por notáveis desigualdades, as quais influenciam no acesso à
justiça, conforme já explicitado anteriormente, a Constituição Federal, em seu
preâmbulo, elevou a justiça ao patamar dos valores supremos da sociedade
brasileira.
Assim, sendo um valor de tão relevante importância, pode ser encontrado em
diferentes pontos do texto da Carta Magna, tais como o artigo 5º, inciso XXXV, que
garante a todos o acesso ao Poder Judiciário ao estabelecer que “a lei não excluirá
da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”47, bem como o inciso
LXXIV do mesmo artigo, responsável por assegurar que “o Estado prestará
assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de
recursos”48.
Com isso, demonstrada a importância do tema “acesso à justiça”,
especialmente para a sociedade brasileira, passa-se, agora, a um estudo
pormenorizado do assunto, partindo da obra “Acesso à Justiça”, de Mauro
Cappelletti e Bryant Garth49, de salutar importância para o assunto em questão,
para, posteriormente, partir para o exame de outras teorias.
Para Cappelletti e Garth, a evolução do acesso à justiça culminou,
atualmente, em uma importante valorização do tema. Nesse sentido, trazem à tona
que, nos Estados Liberais dos séculos XVIII e XIX, em que predominava uma visão
individualista dos direitos, só conseguia obter o acesso à justiça quem possuísse
condições econômicas de arcar com os seus custos. A consequência disso é que
prevalecia um acesso à justiça meramente formal, mas não efetivo, o qual
correspondia a uma igualdade também formal, mas não efetiva.50
Com o tempo, as ações e relacionamentos passaram a assumir um caráter
mais coletivo do que individual e, com isso, o Direito também migrou de uma visão
47
BRASIL, Constituição Federal (1988). Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 05 out. 1988. artigo 5º, inciso XXXV 48
BRASIL, Constituição Federal (1988). Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 05 out. 1988. artigo 5º, LXXIV. 49
CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Tradução de Ellen Gracie Northfleet. Acesso à justiça. Porto Alegre: Fabris, 1988. 50
Ibid., p.9.
25
individualista para uma visão coletivista. Passou-se a se reconhecer, então, os
direitos e deveres sociais dos indivíduos, comunidades, associações e governos.
Com essa mudança de pensamento, houve o reconhecimento da necessidade de
haver um acesso efetivo à justiça.51
Nesse sentido, “o acesso à justiça pode, portanto, ser encarado como o
requisito fundamental – o mais básico dos direitos humanos – de um sistema jurídico
moderno e igualitário que pretenda garantir, e não apenas proclamar os direitos de
todos”.52 Percebe-se, desse modo, que o acesso à justiça deve ser amparado pelo
ordenamento jurídico, mas é de suma importância que ele também seja garantido,
de maneira efetiva, à população.
Os autores trazem, desse modo, duas premissas, sendo a primeira a
premissa do acesso, no sentido de que este deve ser igual, e a segunda a premissa
da justiça, a qual deve produzir resultados individuais, mas igualitários. A
preocupação central, portanto, é a de que deve haver um acesso efetivo à justiça.
No decorrer do texto, há, em um primeiro momento, um diagnóstico das
barreiras para a concretização desse acesso e, posteriormente, é feito um
prognóstico de como transpor esses obstáculos.
Sobre os obstáculos a serem superados, os autores colocam que o conceito
de efetividade refere-se à garantia de que os resultados de reivindicação de direitos
não sejam influenciados por diferenças não condizentes com o Direito, sendo tão
somente resultado dos méritos jurídicos das partes contrárias. Contudo, explicitam
que essa igualdade é utópica, tendo em vista que essas diferenças não podem ser
completamente eliminadas. Desse modo, passa a ser necessário saber quais das
barreiras ao efetivo acesso à justiça podem e devem ser superadas, sendo salutar,
para esse fim, partir da identificação desses obstáculos.53
A primeira barreira diz respeito às custas judiciais, pois deixam o processo
deveras dispendioso, sendo que, nos países em que os advogados são particulares,
os custos com o profissional do Direito apresentam-se como um dos maiores
encargos. Ademais, esses custos são agravados quando está em jogo uma causa
de pequeno montante, já que, muitas vezes, caso seja ela decidida por processo
judiciário formal, seus custos tenderão a ultrapassar o valor pleiteado. O fator tempo
51
CAPPELLETTI; GARTH, 1988, p. 10. 52
Ibid., p. 12. 53
Ibid., p. 15.
26
também é visto como um meio de encarecer o processo, posto que, caso a solução
judicial demore a ocorrer, os custos para as partes aumentarão, além de tal delonga
mostrar-se como uma pressão aos economicamente mais frágeis, haja vista poder
fazer com que eles tenham que desistir de suas causas ou mesmo aceitar acordos
por valores muito menores aos que teriam direito a receber caso pudessem dar
continuidade a sua ação.
A segunda barreira consiste na possibilidade das partes, concernente a
algumas vantagens ou desvantagens estratégicas que algumas partes terão. Esse
segundo obstáculo subdivide-se, primeiramente, em recursos econômicos, no
sentido de que algumas partes terão a capacidade de arcar com o valor dos custos
judiciais, além de ser possível, para elas, arcar com a demora na resolução do litígio.
Há, portanto, nessa primeira subdivisão, um enfoque econômico. Contudo, há
também uma incapacidade cognitiva, correspondente à segunda subdivisão da
barreira ora em comento, segundo a qual existe uma dificuldade em entender a lei,
reconhecer a existência de um direito e até mesmo em saber o modo de se propor
uma ação. Ademais, pode a pessoa simplesmente não querer recorrer ao Judiciário,
por motivos dos mais diversificados, como desconfiança no profissional do Direito ou
mesmo formalismo e procedimentos complicados. A terceira subdivisão faz menção
ao litigantes habituais (entidades desenvolvidas) e eventuais (cidadãos individuais,
com pouco contato com o Judiciário), no sentido de que aqueles têm maior poder do
que estes, já que detêm maiores conhecimentos e experiência judicial.
A terceira barreira é concernente aos problemas especiais de direitos difusos,
sendo a questão central nesse obstáculo a legitimidade para a propositura da ação,
tendo em vista que pode não existir o direito de os cidadãos buscarem corrigir
lesões a esses direitos ou o benefício que eles conseguirão com essa busca pode
ser reduzido demais para motivar o cidadão a propor uma ação. Além disso, mesmo
que seja possível aos cidadãos organizaram-se na busca da efetivação e proteção a
esses direitos, eles podem estar dispersos, sem conseguir organizarem-se em torno
de um objetivo comum ou mesmo pode lhes faltar a necessária informação para tal.
Concluindo, tecem os autores a seguinte argumentação:
Um exame dessas barreiras ao acesso, como se vê, revelou um padrão: os obstáculos criados por nossos sistemas jurídicos são mais pronunciados para as pequenas causas e para os autores individuais, especialmente para
27
os pobres; ao mesmo tempo, as vantagens pertencem de modo especial aos litigantes organizacionais, adeptos do uso do sistema judicial para obterem seus próprios interesses.
54
Para os autores, as barreiras devem ser transpostas simultaneamente, tendo
em vista que, caso seja eliminada a figura do advogado, por exemplo, defrontar-se-
ia com a barreira cognitiva, havendo, portanto, um inter-relacionamento entre os
obstáculos.
Passando do diagnóstico das barreiras para o prognóstico, são apresentadas
três ondas, cujo significado é o de trazer soluções práticas para os obstáculos
existentes no acesso à justiça, sendo a primeira onda referente à assistência
judiciária aos economicamente menos favorecidos, a segunda à representação dos
interesses difusos e a terceira a um novo enfoque de acesso à justiça.
Para os limites da presente monografia, interessam algumas questões da
primeira, passando-se agora, então, a uma análise de tais pontos.
A primeira onda, marcada por uma expansão na oferta de assistência
judiciária aos economicamente menos favorecidos, está intimamente relacionada
com a primeira barreira supramencionada. Tem-se, em um primeiro modelo, o
Sistema Judicare, cuja expressão é a da figura de um advogado particular pago pelo
Estado, com o intuito de proporcionar aos mais pobres as mesmas condições de
representação caso pudessem arcar com os custos de um advogado particular.
Algumas críticas a esse sistema consistem no fato de ele não auxiliar as pessoas de
baixa renda a conhecerem melhor os seus direitos, além de poder fazer com que
elas sintam-se intimidadas em ter que recorrer a um advogado particular.
Em um segundo modelo, os autores apresentam a figura do advogado
funcionário público, que tem a sua remuneração advinda dos cofres públicos,
podendo-se fazer aqui um paralelo com o modelo de Defensoria Pública adotado
pelo Brasil, que será objeto de maiores considerações posteriormente, salientando
que esse modelo conta com a vantagem de estar mais próximo da pobreza e de
poder saber quais são os problemas enfrentados por essa classe.
Todavia, algumas das desvantagens são as de ser esse sistema muito
paternalista, ao tratar os economicamente menos favorecidos como se não fossem
capazes de perseguir seus próprios interesses, além de conter a séria contradição
54
CAPPELLETTI; GARTH, 1988, p. 28.
28
de precisar do apoio do governo para atividades de natureza política, que muitas
vezes necessitam até mesmo ir contra esse mesmo governo.55 Outra desvantagem
consiste na dificuldade em manter um número suficiente de advogados atuando de
forma a atender de maneira eficiente cada pessoa de baixa renda que necessite de
um atendimento jurídico. Nesse sentido, aduzem os autores:
A solução de manter equipes de advogados assalariados, se não for combinada com outras soluções, é também limitada em sua utilidade pelo fato de que – ao contrário do sistema judicare, o qual utiliza a advocacia privada – ela não pode garantir o auxílio jurídico como um direito. Para sermos realistas, não é possível manter advogados em número suficiente para dar atendimento individual de primeira categoria a todos os pobres com problemas jurídicos. Por outro lado, e não menos importante, é o fato de que não pode haver advogados suficientes para estender a assistência judiciária à classe média, um desenvolvimento que é um traço distintivo fundamenta da maior parte dos sistemas judicare
56. (grifos dos autores)
Diante dos limites de cada um dos sistemas em questão, os autores propõem
um modelo combinado, em que os pontos fracos de cada um serão supridos pelos
pontos fortes, trazendo exemplos de países que adotaram esse modelo combinado.
Outra abordagem sobre o tema é feita pelo professor Kim Economides57, para
quem, quando o assunto em voga é acesso à justiça, é necessário analisar, além do
lado da oferta dos serviços jurídicos, o lado da demanda, relacionado com o acesso
à justiça por parte dos operadores do direito, pois, sem esse último acesso, seria
inútil o acesso à justiça por parte dos cidadãos.58
O autor aduz que, no atual estágio da pesquisa sobre o acesso à justiça, já se
definiram os contornos gerais da questão, contudo, ainda não se encontraram
soluções práticas efetivas para o problema. Quanto às pesquisas realizadas,
depreende-se, a partir da leitura da obra ora em comento, que já houve evolução
nos estudos sobre o acesso à justiça, tendo-se abandonado, por exemplo, uma
simplória explicação econômica, referente à pobreza, para explicar o motivo de as
pessoas valerem-se, ou não, do uso dos serviços jurídicos, reconhecendo-se, agora,
os complexos processos aptos a influenciar os indivíduos a recorrerem ou não ao
55
CAPPELLETTI; GARTH, 1988, p. 41. 56
Ibid., p. 42-43 57
ECONOMIDES, Kim. Lendo as ondas do “Movimento de Acesso à Justiça”: epistemologia versus metodologia?. In: PANDOLFI, Dulce et al. (Org.) Cidadania, justiça e violência. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1999. 58
Ibid., p. 62.
29
Judiciário, haja vista poder o não acesso à justiça, por exemplo, ser consequência
da opção do indivíduo.59
Discorrendo ainda sobre a evolução das pesquisas sobre o acesso à justiça, o
autor coloca que, em meados da década de 70, desenvolveu-se uma vertente
alternativa, denominada “Teoria da Organização Social”, que concentra suas
análises não só na demanda dos serviços jurídicos, mas também na oferta de tais
serviços e na natureza deles, pois, normalmente, os prestadores de serviços
jurídicos atendem determinadas categorias de clientes, enquanto os mais
desfavorecidos economicamente recebem atendimento de defensores públicos, o
que influencia a mobilização da lei.60
Como o mercado deixa espaços vazios de atuação, Economides explicita que
o governo poderia preencher tais espaços, podendo, além do atendimento jurídico,
fornecer serviços jurídicos preventivos, extrajudiciais e paralegais, o que teria por
consequência um incremento do acesso à justiça por parte da população. Contudo,
aponta alguns motivos pelos quais o governo não agiria dessa forma, sendo eles:
[...] em primeiro lugar, o governo corre o risco de ser parte na mesma ação legal que financia; em segundo, ao estimular o litígio colocando à disposição procedimentos informais e juizados de pequenas causas, podem-se exacerbar os problemas gerais de congestionamento (e custos) dos tribunais do sistema judiciário mais amplo; em terceiro, investir diretamente no ataque às causas da pobreza e das injustiças pode ser uma estratégia mais eficiente de assegurar “justiça” do que a dependência de advogados e remédios jurídicos.
61
Ainda, coloca o autor que a responsabilidade por garantir o acesso à justiça a
setores excluídos da sociedade é do governo e de organismos profissionais e que,
como o mercado pode deixar espaços vazios na oferta de serviços jurídicos, faz-se
necessária uma ação conjunta entre o governo e as profissões jurídicas no sentido
de preencher esses espaços.62
Prosseguindo sua análise, Economides tece comentários a respeito das
“ondas” teorizadas por Cappelletti e Garth, elucidando que, no que diz respeito à
59
ECONOMIDES, Kim. Lendo as ondas do “Movimento de Acesso à Justiça”: epistemologia versus metodologia?. In: PANDOLFI, Dulce et al. (Org.) Cidadania, justiça e violência. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1999. p. 65. 60
Ibid., p. 67. 61
Ibid., p. 68. 62
Ibid., p. 69.
30
terceira onda (novo enfoque de acesso à justiça), não é correto equiparar a
resolução de disputas com o acesso à justiça, pois corre-se o risco de se propor
soluções pacíficas, que até podem deixar o cidadão satisfeito, mas que não se
comparam ao resultado que ele pode obter caso opte pela justiça formal.63
O autor propõe, então, uma quarta onda, como um acréscimo às três ondas
anteriormente explicitadas, que seria a do acesso à justiça dos operadores do
direito, indicando novos desafios para a responsabilidade profissional e para o
ensino do Direito. Nesse sentido, estaria o ensino do Direito sendo passado de uma
maneira muito tecnicista, estando longe do conceito de “justiça”, do que decorre que
o problema concentra-se na ética profissional.
Dentro da quarta onda em questão, é necessário verificar, primeiramente, o
acesso da população ao ensino do Direito e, em segundo lugar, o acesso à justiça
por parte dos operadores do Direito, sendo que, nesse ponto, há responsabilidade
por parte das faculdades e dos organismos profissionais no sentido de impor um
controle de admissão para o Direito, bem como de estabelecer padrões mínimos de
profissionalização64, devendo os direitos humanos ser ensinados, dentro das
faculdades de Direito, em um mesmo patamar de importância se comparado as
outras disciplinas.
Sobre o acesso à justiça relacionado aos operadores do Direito, Horácio
Wanderlei Rodrigues assevera que a má qualidade profissional apresentada por
muitos desses operadores mostra-se como um dos problemas ao efetivo acesso à
justiça. Nesse sentido, a formação positivista que estaria sendo passada aos
bacharéis em Direito estaria fazendo com que eles não conseguissem trabalhar de
maneira competente com os princípios gerais do Direito e com os instrumentos
fornecidos pela hermenêutica. Assim, o ensino jurídico seria um dos grandes
responsáveis por esse entrave ao efetivo acesso à justiça, na medida em que não
há como ter um efetivo acesso à justiça sem que haja profissionais devidamente
qualificados e não há como ter operadores jurídicos devidamente qualificados sem
um bom nível de ensino jurídico.65
63
ECONOMIDES, Kim. Lendo as ondas do “Movimento de Acesso à Justiça”: epistemologia versus metodologia?. In: PANDOLFI, Dulce et al. (Org.) Cidadania, justiça e violência. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1999. p. 72. 64
Ibid., p. 73. 65
RODRIGUES, Horácio Wanderlei. Acesso à justiça no direito processual brasileiro. São Paulo: Acadêmica, 1994. p. 128.
31
Partindo-se para a análise feita pelo autor Boaventura de Sousa Santos66
acerca do acesso à justiça, necessário mencionar que a sua abordagem é realizada
a partir da constatação de que todos são iguais perante a lei (igualdade jurídico-
formal), mas que, na realidade, tal igualdade é confrontada com uma profunda
desigualdade sócio-econômica, problemática esta que é antiga e já foi abordada por
outros autores.
No decorrer do texto, Santos aduz que a contribuição da sociologia ao acesso
à justiça consistiu em fazer uma investigação acerca dos obstáculos econômicos,
sociais e culturais ao acesso efetivo à justiça por parte das classes economicamente
menos favorecidas, com o objetivo de propor soluções para a superação dessas
barreiras.67
Adentrando na análise dessas barreiras, tem-se que, no que diz respeito ao
obstáculo econômico, a justiça é mais cara para os economicamente mais
necessitados, tendo em vista que os custos da Justiça são os mesmos para todos e,
normalmente, os mais pobres são os protagonistas de ações de valor mais reduzido,
sendo que o custo de se propor uma demanda é tanto maior quanto menor é o valor
da causa, haja vista poder o custo de se impetrar uma demanda ficar mais alto do
que o da própria ação. Outro fator que agrava a situação das pessoas detentoras de
uma renda mais reduzida é o da lentidão da justiça, que não raras vezes importa em
um custo adicional na demanda. Assim, percebe-se que a lentidão gera um preço
adicional, que é ainda mais sentido pelos mais necessitados economicamente, até
mesmo pelo fato de que a maioria depende financeiramente da quantia que irá
ganhar com o término da ação.
Quanto aos obstáculos sociais e culturais, verifica-se que são eles
observados na medida em que as pessoas detentoras de uma baixa renda tendem a
conhecer menos os seus direitos e, mesmo que reconheçam que o seu problema é
jurídico, tendem a hesitar em intentar uma ação, sendo essa dúvida uma possível
consequência de alguns fatores: primeiramente, pode ser fruto de experiências
anteriores negativas com a justiça; em segundo lugar, pode ser consequência de um
receio em sofrer represálias ao se recorrer ao Judiciário; em terceiro lugar, pode ser
resultado do fato de que, normalmente, é difícil que as pessoas economicamente
66
SANTOS, Boaventura de Sousa. Pela mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade. 10. ed. São Paulo: Cortez, 2005. 67
Ibid., p. 168.
32
menos favorecidas conheçam um advogado, saibam como contatá-lo ou mesmo
tenham amigos que possam indicar um profissional do Direito.
Um meio de se combater tais obstáculos pode advir através da contratação
de advogados, subsidiados por comunidades, fundações ou pelo governo, que
atuem observando os problemas dos mais necessitados economicamente como um
problema de classe.68
Uma abordagem do acesso à justiça mais direcionada ao Brasil é a realizada
por Fernando Pagani Mattos69, que adota como significado da ampla expressão
“acesso à justiça” o “[...] acesso aos valores e significados e direitos fundamentais
do ser humano”70, conceituando esse acesso como um princípio e um direito
fundamental básico do ser humano, posto que previsto dessa forma pela Carta
Magna de 1988, sendo ele um meio de tornar os direitos efetivos. Ademais, a
importância do acesso à justiça pode também ser vislumbrada na medida em que,
garantindo o mínimo existencial à população, garante-se a dignidade da pessoa
humana.71
Todavia, apesar de previsto constitucionalmente, o autor assinala que, na
prática, existem alguns entraves ao efetivo acesso à justiça, sendo os principais
deles: insuficiência de recursos econômicos; “chicanas” processuais; descrença da
população no Judiciário; capacidade jurídica pessoal; condições da ação; julgamento
antecipado da lide; conscientização da população acerca dos direitos difusos e
coletivos; e aspectos simbólicos, psicológicos e ideológicos vinculados à noção de
justiça e de poder judiciário.72
Sabendo-se quais são as barreiras citadas pelo autor, passar-se-á, agora, a
uma análise das que interessam a presente monografia.
O obstáculo da insuficiência de recursos econômicos diz respeito aos
elevados custos necessários para se intentar uma ação ou mesmo para responder
uma ação, o que faz com que grande parcela da população não possa arcar com
tais despesas, o que é agravado se a outra parte possui boas condições
econômicas. Outro fator que pode influenciar na procura pelo Judiciário é o
envolvimento emocional na espera pela decisão, sendo a morosidade outro
68
SANTOS, 2005, p. 172. 69
MATTOS, Fernando Pagani. Acesso à justiça: um princípio em busca de efetivação. Curitiba: Juruá, 2009. 70
Ibid., p. 60. 71
Ibid., p. 72. 72
Ibid., p. 89.
33
obstáculo ao acesso à justiça. Contribuem para essa morosidade a legislação
processual vigente, bem como o despreparo de certos operadores do Direito, o que
tem por consequência o fato de a credibilidade do Poder Judiciário ficar afetada73.
Sobre essa descrença da sociedade no Poder Judiciário, registra o autor:
Acrescem ainda outros problemas: carência de recursos materiais e humanos por parte do judiciário; ausência de autonomia com relação aos demais poderes no âmbito do Estado, sua localização apenas nos grandes centros urbanos, o corporativismo de seus membros e a inexistência de mecanismos de controle externo por parte da sociedade; falta de preparo dos profissionais do direito; respostas insuficientes como fatores complicadores à concretização do acesso à justiça. Em outras palavras: os problemas educacionais, tanto do cidadão quanto do operador do direito, também constituem entraves ao acesso à justiça.
74
Soma-se a isso o fato de inúmeras pessoas não saberem quais são os seus
direitos e quais seriam os instrumentos jurídicos aptos a viabilizá-los, sendo algumas
causas desse problema a deficiência na educação; as mensagens passadas pelos
meios de comunicação, que valorizam a violência e o “jeitinho brasileiro” como forma
de solução de conflitos; e as instituições de assistência judicial, que não existem em
número suficiente ou são pouco atuantes75, acrescentando-se a isso a má formação
de alguns profissionais do Direito.
Verifica-se, ainda, uma falta de reivindicação por parte da população no que
concerne aos direitos difusos, o que decorre de uma anterior descrença no Judiciário
ou mesmo do fato de eles não serem percebidos pelos indivíduos mais
desfavorecidos economicamente e que não tem acesso à informação.76
Outra barreira diz respeito aos aspectos simbólicos, psicológicos e
ideológicos, o que pode ser verificado, por exemplo, através do medo e do
sentimento de inferioridade da população em relação ao operador do Direito, o que
pode reduzir o interesse do indivíduo em reivindicar seus direitos.77
Após a identificação dos obstáculos ao acesso à justiça, Mattos passa a
discorrer sobre algumas propostas de superação desses obstáculos, sendo que
serão enumerados os que são importantes ao tema dessa monografia.
73
MATTOS, 2009, p. 78-79. 74
Ibid., p. 80. 75
Ibid., p. 72. 76
Ibid.. p. 85. 77
Ibid., p. 87-88.
34
Quanto à barreira da “carência de recursos econômicos”, uma das propostas
de superação a ela diz respeito à Defensoria Pública. Segundo o autor, a Defensoria
Pública é um meio, previsto constitucionalmente, de se efetivar o acesso à justiça.
Trata-se de “um “órgão criado e subsidiado pelo Estado, com a finalidade precípua
de oferecer assistência jurídica completa, justo para proporcionar à população a
correta noção de quais são seus direitos [...]78.
Sabendo-se da importância da Defensoria Pública, é salutar que todos os
Estados ofereçam os serviços desse órgão à população. Assim, sobre os Estados
que não implementaram a Defensoria Pública, o autor coloca que, ao descumprirem
disposição constitucional, impossibilitam à população de baixa renda os serviços
jurídicos aptos a garantir o acesso à justiça.
Quanto à morosidade do Judiciário, Mattos leciona estar havendo um
movimento legislativo com o intuito de criar mecanismos que tornem o processo
mais célere. Além disso, discorre sobre a importância de as Faculdades de Direito
formarem profissionais com habilidades técnicas voltadas para as necessidades
sociais, tendo em vista que o despreparo do advogado é, muitas vezes, causa de
prolongamento na duração do litígio, bem como de dificuldade na promoção da
justiça.79
Veja-se que a má formação de alguns profissionais do Direito pode também
ser uma consequência da proliferação das faculdades de Direito, que formam um
grande número de profissionais, muitas vezes despreparados, aos quais a
população de baixa renda poderá ter fácil acesso, diante do baixo valor dos
honorários, o que pode reforçar a desigualdade e o não cumprimento do amplo
direito de defesa
No que diz respeito à descrença dos cidadãos no Judiciário, o autor coloca
que o problema está na ausência de compromisso político com as questões sociais
e não na promulgação de novos textos legais.80
No que tange à capacidade jurídica pessoal, Mattos enfatiza a necessidade
de se investir na educação, de modo que a população possa conhecer seus direitos,
sendo necessário, para isso, a implementação de políticas públicas que tenham por
objetivo final a educação e a cultura.
78
MATTOS, 2009, p. 97. 79
Ibid., p. 106-107. 80
Ibid., p. 111.
35
Por último, no que se refere aos aspectos simbólicos, psicológicos e
ideológicos vinculados à noção de justiça e de poder judiciário, o autor assinala o
fato de o indivíduo hipossuficiente ver o magistrado e, em menor grau, o advogado,
como figuras superiores e distantes, o que tem por resultado o fato de o Judiciário
ficar distante de considerável parcela da população.81 Como solução a essa barreira,
o autor profere o seguinte ensinamento:
Políticas direcionadas a ajustar essa situação, equilibrar a oferta e a procura pela justiça, afastar o distanciamento entre o judiciário e seus usuários, e desobstruir as vias e acesso à justiça são um imperativo que se impõe. A alteração da forma de composição do órgão máximo da justiça nacional, quiçá, possa ser uma alternativa para minimizar os problemas enfrentados. Com efeito, uma observação associada às origens históricas do poder judiciário dá conta que o critério político de preenchimento das onze vagas existentes no Supremo Tribunal Federal se aproxima do modelo imperial, o que tende a gerar uma dívida de gratidão. Daí decorrem decisões de cunho político que afetam a estabilidade do ordenamento jurídico, como o esvaziamento conferido ao mandado de injunção, instrumento potencial de abertura das vias que dão acesso à justiça. Por fim, [...], não há necessidade de novos ritos para garantir a cidadania e um efetivo acesso à justiça, eis que é necessário que os operadores do direito percebam a nova realidade na qual devem operar, apliquem todo o instrumental que está à sua disposição e dos próprios cidadãos, e possibilitem a estes a efetividade do poder judiciário ante os conflitos que lhe sejam apresentados.
82
Como conclusão de todo o exposto, é possível perceber que a superação das
barreiras do acesso à justiça deve ser fruto da conjugação entre uma correta
utilização dos aparatos legais disponíveis com a implementação de políticas públicas
afins.83
81
MATTOS, 2009, p. 126. 82
Ibid., p. 128-130. 83
Ibid., p. 134.
36
4 DEFENSORIA PÚBLICA
4.1 O PAPEL DA DEFENSORIA PÚBLICA NO ACESSO À JUSTIÇA
Como forma de se materializar o acesso à justiça, o legislador previu a
criação da Defensoria Pública, previsão contida no artigo 134 da Carta Magna,
segundo o qual “a Defensoria Pública é instituição essencial à função jurisdicional do
Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos
necessitados, na forma do art. 5º, LXXIV”.84
Por sua vez, o artigo 5ª, inciso LXXIV, estabelece que “o Estado prestará
assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de
recursos”85.
A partir de uma simples leitura dos artigos ora em comento, é possível
perceber que a Defensoria Pública configura-se como um importante instrumento de
concretização do acesso à justiça, proporcionando ampla orientação jurídica e
defesa a toda a população de baixa renda.
Ressalte-se, nesse diapasão, que Cappelletti e Garth situam a figura do
advogado funcionário público como fazendo parte da primeira onda de acesso à
justiça, marcada, tal como já explicitado em capítulo próprio acerca do “Acesso à
Justiça”, por um aumento na oferta de assistência judiciária aos economicamente
menos favorecidos. Nesse contexto, é possível traçar um paralelo entre a figura do
advogado funcionário público, que possui a sua remuneração advinda dos cofres
públicos, com o modelo de Defensoria Pública adotado pelo Brasil, na qual os
Defensores Públicos também possuem a sua remuneração advinda dos cofres
públicos.
No mesmo sentido, retomando a análise da obra de Boaventura de Sousa
Santos, realizada no mencionado capítulo acerca do “Acesso à Justiça”, constata-se
que o autor identifica três obstáculos ao efetivo acesso à justiça por parte das
classes menos favorecidas economicamente, sendo eles de ordem econômica,
84
BRASIL, Constituição Federal (1988). Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 05 out. 1988. artigo 134. 85
BRASIL, Constituição Federal (1988). Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 05 out. 1988. artigo 5º, inciso, LXXIV.
37
social e cultural. Como uma forma de se combater tais obstáculos, Santos sugere a
contratação de advogados subsidiados por comunidades, fundações ou pelo
governo, de modo que o problema dos menos favorecidos economicamente seja
encarado como um problema de classe. Transpondo tal sugestão para a realidade
brasileira, tem-se que a Defensoria Pública seria, portanto, um meio de se combater
os obstáculos ao acesso efetivo à justiça.
Do mesmo modo, Fernando Pagani Mattos, tal como já elucidado no mesmo
capítulo sobre o “Acesso à Justiça”, explica que a Defensoria Pública é uma forma
de superação da barreira da “carência de recursos econômicos”, proporcionando à
população de baixa renda os serviços jurídicos essenciais ao efetivo acesso à
justiça.
Indo mais adiante, Paulo Osório Gomes Rocha pondera que a Defensoria
Pública possui o papel de proporcionar representatividade aos grupos vulneráveis,
sendo estes aqueles que não são incluídos no processo das decisões estatais
essenciais, solucionando qualquer ofensa aos seus direitos fundamentais através de
medidas judiciais ou extrajudiciais. Elucida, ainda, o autor que a Defensoria Pública
mostra-se como um importante instrumento de se efetivar a dignidade da pessoa
humana, fundamento da República Federativa do Brasil, segundo previsão do artigo
1º, inciso 3º, da Constituição Federal, e como uma forma de se colocar em prática os
direitos fundamentais.86
Horácio Wanderlei Rodrigues assevera que a Defensoria Pública, ao lado de
outras previsões legislativas, configura-se como um meio de se solucionar os
obstáculos existentes ao acesso efetivo à justiça. Ademais, enuncia o autor que a
Defensoria Pública é fundamental para possa ser cumprido o preceito legal contido
no artigo 5º, inciso LXXIV, citado pelo artigo 134 da Constituição Federal,
anteriormente transcrito. Para o autor, tal artigo faz referência à assistência jurídica e
não à assistência judiciária, o que tem por escopo ampliar a assistência às pessoas
detentoras de baixa renda, na medida em que lhes proporciona, além da assistência
para se postular em juízo (assistência judiciária), as assessorias preventiva e
extrajudicial (assistência jurídica). Rodrigues explica, ainda, que o artigo em questão
prevê que a assistência jurídica, além de integral, por proporcionar a assessoria
86
ROCHA, Paulo Osório Gomes. Concretização de direitos fundamentais na perspectiva jurídico-constitucional da Defensoria Pública: um caminho ainda a ser trilhado. Revista de Direito Constitucional e Internacional. São Paulo, ano 15, n. 60, p. 186-188, jul./set. 2007. p. 186-189.
38
jurídica, preventiva e extrajudicial, será gratuita, isentando, portanto, as pessoas de
baixa renda de todas as despesas necessárias ao efetivo acesso à justiça.87 Sobre o
tema, o doutrinador esclarece:
Pode-se, então, resumidamente, salientar que o texto constitucional de
1988, ao referir-se à assistência jurídica, estabelece-a como direito em dois planos distintos: (a) a assistência jurídica judiciária, que deve ser prestada pela Defensoria Pública, podendo também ser patrocinada por profissionais liberais nos termos das Leis nº 1.060/50 e nº 8.906/94; e (b) as assistências jurídicas preventiva e extrajudicial, que devem ser prestadas pela Defensoria Pública.
88
No que tange ao anteriormente mencionado artigo 134, da Constituição
Federal, Rodrigues ensina que a previsão da Defensoria Pública como instituição
fundamental ao papel jurisdicional do Estado é uma forma buscada pelo legislador
de contrabalancear a previsão contida no artigo 133 da Carta Magna, segundo a
qual é o advogado indispensável à administração da justiça.89
Nessa esteira, cumpre assinalar que o legislador constitucional elevou a
Defensoria Pública ao patamar de função essencial à justiça, na medida em que o
artigo 134, da Constituição Federal, faz parte do Capítulo IV, que versa sobre as
funções essenciais à justiça.
Para finalizar essa primeira introdução ao tema, importante destacar o
entendimento de Sílvio Roberto Mello Moraes, para quem a Defensoria Pública
alcança a garantia e efetividade do Estado Democrático de Direito, indo além,
portanto, dos limites estabelecidos pelo artigo 134 da Constituição Federal, na
medida em que garante, a cada pessoa detentora de baixa renda, o exercício dos
direitos e garantias individuais previstos pela Carta Magna.90
4.2 ASPECTOS INSTITUCIONAIS DA DEFENSORIA PÚBLICA
87
RODRIGUES, 1994, p. 58-59. 88
Ibid., p. 60. 89
Ibid., p. 59. 90
MORAES, Sílvio Roberto Mello. Princípios institucionais da defensoria pública: lei complementar 80, de 12.1.1994. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais, 1995. p. 17.
39
O artigo 134, parágrafo 1º, da Constituição Federal, prevê que caberá à Lei
Complementar a organização da Defensoria Pública, conforme se verifica a seguir:
Artigo 134. [...] § 1º Lei complementar organizará a Defensoria Pública da União e do Distrito Federal e dos Territórios e prescreverá normas gerais para sua organização nos Estados, em cargos de carreira, providos, na classe inicial, mediante concurso público de provas e títulos, assegurada a seus integrantes a garantia da inamovibilidade e vedado o exercício da advocacia fora das atribuições institucionais.
91
A Lei Complementar responsável por tal tarefa é a nº 80, de 12.01.1994,
conhecida como Lei Orgânica Nacional da Defensoria Pública, tendo, recentemente,
sofrido alterações com a Lei Complementar nº 132, de 07.10.2009.
Diante dessa primeira informação, importante esclarecer que, nesta seção da
presente monografia, primeiro serão abordadas as principais mudanças trazidas
pela nova Lei, para, em seguida, passar-se à análise dos principais aspectos da
Defensoria Pública, através de um exame dos pontos mais importantes contidos na
Lei 80/94, com as alterações advindas da Lei 132/09.
Começando, desse modo, pelas principais mudanças trazidas pela nova Lei,
necessário sublinhar que, para o Presidente da Associação Nacional dos
Defensores Públicos (ANADEP), André Luiz Machado de Castro, foram elas as
seguintes: definição legal da Defensoria Pública como forma de expressão do
regime democrático e como instituição permanente, compromissada com a
promoção dos direitos humanos (artigo 1º); previsão de que os Defensores Públicos,
em audiências, sentarão no mesmo plano dos membros do Ministério Público (artigo
4º, inciso XXII, parágrafo 7º); formação de lista tríplice destinada à escolha do
Defensor Público-Geral (artigo 6º); legitimidade para a Defensoria Pública promover
a tutela coletiva, através de todas as espécies de ação cabíveis (artigo 4º, inciso VII);
previsão de que a responsabilidade por prestar assistência jurídica e integral é da
Defensoria Pública, e não de qualquer outro órgão (artigo 4º, inciso XXII, parágrafo
5º); previsão de que devem ser priorizadas pela Defensoria Pública as regiões
detentoras de uma maior taxa de exclusão social e adensamento populacional
(artigo 107); autonomia conferida à Defensoria Pública para abrir concurso público,
91
BRASIL, Constituição Federal (1988). Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 05 out. 1988. artigo 134.
40
organizar e prover os cargos de sua carreira e de serviços auxiliares, praticar atos
de gestão, elaborar a sua proposta orçamentária, bem como a sua folha de
pagamento (artigo 97-A); possibilidade de convocação de audiência pública, com o
principal objetivo de saber quais são os principais anseios da população interessada
(artigo 4º, inciso XXII); e, por fim, previsão de eficácia plena e imediata
executoriedade para todos os dispositivos da nova Lei, com poucas exceções (artigo
97-B, parágrafo 5º).92
Passando, agora, para a análise dos principais aspectos da Defensoria
Pública, cumpre assinalar que a Lei Complementar nº 80/94 versa, segundo Sílvio
Roberto Mello Moraes, sobre a “organização da Instituição, funcionamento,
atribuições e competência de seus órgãos, bem como do regime jurídico de seus
membros”.93
O artigo 1º da Lei em questão, que teve a sua redação modificada pela Lei
Complementar nº 132/09, trata sobre as atribuições da Instituição, estabelecendo
que:
Art. 1º A Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, assim considerados na forma do inciso LXXIV do art. 5º da Constituição Federal.
94
Percebe-se, portanto, que a Defensoria Pública é encarregada por prestar,
além da defesa judicial, a orientação e informação jurídicas, a promoção dos direitos
humanos e, ainda, a defesa extrajudicial. Como já explicitado anteriormente,
assegurando as assessorias preventiva, judicial e extrajudicial, está sendo garantida
a assistência jurídica, mais ampla do que a assistência judicial, que somente
engloba a assessoria jurídica.
92
CASTRO, André Luiz Machado de. Nova Lei Orgânica Nacional da Defensoria Pública. ANADEP, Distrito Federal, out. 2009. Disponível em: http://www.anadep.org.br/wtk/pagina/materia?id=7436>. Acesso em: 20 mar. 2010. 93
MORAES, 1995, p. 16. 94
BRASIL, Lei Complementar nº 80, de 12 de janeiro de 1994. Organiza a Defensoria Pública da União, do Distrito Federal e dos Territórios e prescreve normas gerais para sua organização nos Estados, e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 13 jan. 1994. Artigo 1º.
41
Ressalte-se que as funções de orientação jurídica e de defesa extrajudicial
acabam, dentre outros benefícios, por desafogar o Poder Judiciário, na medida em
que proporcionam, por exemplo, a celebração de acordo sob a supervisão do
Defensor Público.95 Ademais, é papel da Defensoria Pública promover, também, a
assistência jurídica extrajudicial, que abrange a defesa perante qualquer um dos
Poderes e não somente perante o Poder Judiciário.
Nesse diapasão, convém mencionar que o artigo 4º, responsável por delimitar
quais as funções institucionais da Defensoria Pública, abrange todas essas formas
de defesa acima tratadas, ou seja, abrange a orientação jurídica e a defesa judicial e
extrajudicial.
O artigo 2º da Lei ora em comento dispõe acerca da organização da
Instituição, estabelecendo que a Defensoria Pública é composta pela Defensoria
Pública da União, pela Defensoria Pública do Distrito Federal e dos Territórios, e
pelas Defensorias Públicas dos Estados.96
Conforme disposição do artigo 14, “a Defensoria Pública da União atuará nos
Estados, no Distrito Federal e nos Territórios, junto às Justiças Federal, do Trabalho,
Eleitoral, Militar, Tribunais Superiores e instâncias administrativas da União”97. No
que se refere à Defensoria Pública do Distrito Federal e Territórios, bem como à
Defensoria Pública dos Estados, cabe a elas a assistência jurídica aos que
comprovarem insuficiência de recursos em todos os graus de jurisdição e instâncias
administrativas do Estado (artigos 64 e 106).
O artigo 3º da Lei 80/94, que não sofreu alterações com a nova Lei, é o
responsável por delimitar quais são os princípios institucionais da Defensoria
Pública, sendo eles a indivisibilidade, a unidade e a independência funcional.
Para o doutrinador Paulo Galliez98, tais princípios conferem um sentido lógico
e racional à Lei, compondo um sistema que a integra. Explicando o significado dos
três princípios, o doutrinador elucida que, pelo princípio da indivisibilidade, deve-se
95
MORAES, 1995, p. 19. 96
BRASIL, Lei Complementar nº 80, de 12 de janeiro de 1994. Organiza a Defensoria Pública da União, do Distrito Federal e dos Territórios e prescreve normas gerais para sua organização nos Estados, e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 13 jan. 1994. artigo 2º. 97
BRASIL, Lei Complementar nº 80, de 12 de janeiro de 1994. Organiza a Defensoria Pública da União, do Distrito Federal e dos Territórios e prescreve normas gerais para sua organização nos Estados, e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 13 jan. 1994. artigo 14. 98
GALLIEZ, Paulo Cesar Ribeiro. Princípios institucionais da Defensoria Pública. 3. ed. Rio de Janeiro, Editora Lumen Juris, 2009. p. 29-52.
42
entender que, após iniciada a atuação do Defensor Público, deve a assistência
jurídica ser prestada até que seja alcançado o seu objetivo, do que decorre que as
normas fundamentais da Defensoria Pública, bem como o funcionamento de seus
órgãos devem ser prestados de maneira contínua a ininterrupta, mesmo nos casos
de férias, impedimento, afastamento ou licença, casos em que a lei prevê a
substituição ou a designação de outro Defensor Público.
Quanto ao princípio da unidade, o autor assevera que a Defensoria Pública
atua como um todo, como uma unidade, o que é obtido através da utilização
contínua e permanente de todos os mecanismos e prerrogativas próprias da atuação
do Defensor Público.
No que se refere ao princípio da independência funcional, Galliez pondera
que tal princípio garante ao defensor público ampla liberdade de ação perante todos
os órgãos da administração pública, em especial o Judiciário, eliminando qualquer
possibilidade de hierarquia entre a Defensoria Pública e demais agentes e
organismos estatais, como magistrados, promotores de justiça, dentre outros. Como
desdobramento de tal princípio, que é, ao mesmo tempo, princípio e garantia, o
doutrinador coloca que estão as garantias da inamovibilidade, irredutibilidade de
vencimentos e estabilidade (artigo 127 da Lei Complementar 80/94), necessárias
para que o Defensor Público possa exercer plenamente a independência funcional,
na medida em que elimina qualquer possibilidade de redução de seus vencimentos e
de perda do seu cargo e garante a permanência em seu órgão de atuação. Para
Sílvio Roberto Mello Moraes, o princípio em questão é o de maior importância para a
Instituição, garantindo, inclusive, a representação dos hipossuficientes, não raras
vezes contra o próprio Estado, sendo absolutamente necessário, para tanto, que a
sua atuação seja pautada na autonomia e na liberdade.99
Nesse contexto, importante ressaltar que a Emenda Constitucional nº 45/2004
foi a responsável por garantir a autonomia funcional, administrativa e iniciativa de
suas propostas orçamentárias às Defensorias Públicas Estaduais.
A Lei 132/09 acrescentou o artigo 3º-A, responsável por traçar os objetivos da
Defensoria Pública, que compreendem a necessidade de se priorizar a dignidade da
pessoa humana, bem como a redução das desigualdades sociais (inciso I); a
afirmação do Estado Democrático de Direito (inciso II); a necessidade de se efetivar
99
MORAES, 1995, p. 22.
43
e de se fazer prevalecer os direitos humanos (inciso III); e, por fim, a garantia dos
princípios do contraditório e da ampla defesa, ambos previstos constitucionalmente
(inciso IV)100.
Importante destacar, ainda, que a Lei em análise traz algumas garantias e
prerrogativas aos membros da Defensoria Pública, absolutamente necessárias para
que possam ser colocadas em prática as suas funções institucionais.
Quanto às garantias, estas já foram abordadas anteriormente, sendo elas a
independência funcional no exercício de suas funções, que é, segundo Paulo
Galliez, ao mesmo tempo princípio e garantia; a inamovibilidade; a irredutibilidade de
vencimentos; e a estabilidade; estando previstas no artigo 43, referente aos
membros da Defensoria Pública da União, no artigo 88, que versa sobre as
garantias dos membros da Defensoria Pública do Distrito Federal e Territórios e, por
fim, no artigo 127, que trata sobre as garantias dos membros da Defensoria Pública
do Estado.
No que se refere às prerrogativas, estas estão previstas no artigo 44, atinente
aos membros da Defensoria Pública da União; no artigo 89, que trata sobre as
prerrogativas dos membros da Defensoria Pública do Distrito Federal e dos
Territórios; e no artigo 128, referente às prerrogativas dos membros da Defensoria
Pública do Estado.
Tais artigos trazem um grande rol de prerrogativas, sendo que serão
analisadas na presente monografia três delas, quais sejam, necessidade de
intimação pessoal dos membros da Defensoria Pública, em qualquer processo, grau
de jurisdição ou instância administrativa; contagem em dobro de todos os prazos;
representação dos assistidos independentemente de outorga de procuração,
excetuados ao casos em que a lei exige poderes especiais.
Segundo Sílvio Roberto Mello Moraes, as prerrogativas de intimação pessoal
e de contagem em dobro de todos os prazos não se tratam de um privilégio
injustificável, que colocaria os membros da Defensoria Pública em uma suposta
vantagem processual em relação à outra parte, sendo, pelo contrário, uma forma
encontrada pelo legislador de assegurar uma verdadeira igualdade entre as partes,
na medida em que reconhece a quantidade de trabalho de um Defensor Público,
100
BRASIL, Lei Complementar nº 80, de 12 de janeiro de 1994. Organiza a Defensoria Pública da União, do Distrito Federal e dos Territórios e prescreve normas gerais para sua organização nos Estados, e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 13 jan. 1994. artigo 3º-A.
44
certamente maior que a de um advogado particular, bem como as normalmente
precárias condições de trabalho fornecidas pelo Estado. Assim, tais prerrogativas
seriam uma forma de conceder tratamento igualitário a partes que são desiguais.101
Quanto à prerrogativa de representação dos assistidos, independentemente
de outorga de procuração, excetuados os casos em que a lei exige poderes
especiais, o autor pondera que a representação dos assistidos pelo Defensor
Público decorre do próprio texto constitucional e da investidura do agente no cargo e
não da outorga de procuração. Assevera, ainda, que, mesmos nos casos em que a
lei exige poderes especiais, deveria a representação dos assistidos ser realizada
independentemente da formalidade de outorga de mandato, ressaltando que deveria
bastar a expressa anuência do assistido com os termos da petição e a
obrigatoriedade de assinatura da petição pelo Defensor Púbico e pelo assistido.
4.3 ANÁLISE DA REALIDADE INSTITUCIONAL DA DEFENSORIA PÚBLICA
No ano de 2009, foi lançado, pelo Ministério da Justiça, o III Diagnóstico da
Defensoria Pública no Brasil102, que tem por objetivo realizar uma análise dos
progressos obtidos pela Instituição, bem como mapear as barreiras que ainda
precisam ser enfrentadas, abrangendo os anos de 2006, 2007 e 2008 e alguns
dados parciais do ano de 2009. Ressalte-se que ainda não foi lançado um
diagnóstico com os dados de 2010 a 2013, mas, tendo em vista a importância da
pesquisa realizada por esse documento, será ele objeto de análise.
Sobre a Defensoria Pública da União e do Distrito Federal, o Diagnóstico
esclarece que estas não possuem autonomia administrativa e iniciativa de proposta
orçamentária. Diante disso, a Defensoria Pública do Distrito Federal, que deveria ser
organizada e mantida pela União, em obediência ao artigo 21, inciso XIII, da
Constituição Federal, ainda não foi implantada, tendo ficado sob a responsabilidade
do Distrito Federal, em decorrência da competência legislativa concorrente prevista
101
MORAES, 1995, p. 97-98. 102
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. III Diagnóstico Defensoria Pública no Brasil. Brasil, 2009. Disponível em: <http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/III%20Diagn%C3%B3stico%20Defensoria%20P%C3%BAblica%20no%20Brasil.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2013.
45
pelo artigo 24, inciso XIII, da Constituição federal, instituir e manter um órgão
responsável por prestar o serviço de assistência jurídica gratuita, sendo tal órgão
denominado de Centro de Assistência Jurídica (CEAJUR).103
Outra informação trazida pelo documento em questão é a de que as
Defensorias Públicas dos Estados do Paraná, que, oportunamente, será objeto de
análise mais detida, e do Amapá não estão estruturadas de acordo com a Lei
Complementar nº 80/94, com as alterações advindas da Lei Complementar nº
132/09104, ressaltando-se que a Defensoria Pública do Paraná não havia sido
incluída nos dois Diagnósticos realizados anteriormente.
A primeira Defensoria Pública implantada foi a do Rio de Janeiro, no ano de
1954. A segunda foi a de Minas Gerais, instalada em 1981, seguida pela Defensoria
Pública do Mato Grosso do Sul, em 1982, pela do Pará, em 1983, e pela da Bahia,
em 1984, sendo a mais nova a Defensoria Pública do Estado de São Paulo,
instalada em 2006.105
A partir desse breve panorama geral da Defensoria Pública no Brasil, passa-
se, agora, à análise de alguns pontos específicos contidos no III Diagnóstico da
Defensoria Pública.
O primeiro ponto a ser analisado é quanto às atribuições do Defensor Público
Geral. Todavia, antes de se passar ao exame de tais atribuições pelo Diagnóstico
em comento, necessário esclarecer quem é o Defensor Público Geral. Nesse
sentido, ressalte-se que:
No ápice da pirâmide Institucional, encontra-se o Defensor Público geral (cf. art. 6º, adiante), a quem compete dirigir a Defensoria Pública, superintender e coordenar suas atividades, bem como orientar-lhe a atuação. A ele, todos os membros da Defensoria Pública estão hierarquicamente subordinados, sob o ponto de vista administrativo.
106
103
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. III Diagnóstico Defensoria Pública no Brasil. Brasil, 2009. Disponível em: <http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/III%20Diagn%C3%B3stico%20Defensoria%20P%C3%BAblica%20no%20Brasil.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2013. p. 21-22. 104
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. III Diagnóstico Defensoria Pública no Brasil. Brasil, 2009. Disponível em: <http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/III%20Diagn%C3%B3stico%20Defensoria%20P%C3%BAblica%20no%20Brasil.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2013. p. 29. 105
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. III Diagnóstico Defensoria Pública no Brasil. Brasil, 2009. Disponível em: <http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/III%20Diagn%C3%B3stico%20Defensoria%20P%C3%BAblica%20no%20Brasil.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2013. p. 46. 106
MORAES, 1995, p. 22.
46
Sabendo-se qual é o papel do Defensor Público Geral, passa-se ao exame de
suas atribuições, tendo por base o Diagnóstico em questão.
Primeiramente, ressalte-se que esse documento assevera que tais atribuições
refletem, em larga escala, a própria autonomia da Instituição. No entanto, constata
que as atribuições de cada Defensor Público Geral não são iguais, variando entre os
Estados. Desse modo, lista cinco atribuições diferentes, vinculadas ao exercício da
autonomia funcional, administrativa e financeira, tendo em vista que a verificação da
quantidade dessas atribuições é umas das formas de se verificar o nível de
efetividade da autonomia da Instituição.
As cinco atribuições referem-se à (1) capacidade de propor ao Poder
Legislativo a criação e extinção de seus cargos, bem como (2) a fixação e reajuste
dos vencimentos dos seus membros e servidores; (3) decidir sobre as sanções
disciplinares a serem aplicadas aos Defensores Públicos ou Servidores; (4) fornir os
cargos iniciais da carreira, assim como dos serviços auxiliares; e (5) abrir,
independentemente de autorização do Poder Executivo, concurso para Defensores
Públicos ou serviços auxiliares.107 Os resultados obtidos foram os seguintes:
[...] Verifica-se que 6 DPGs responderam possuir todas as 5 atribuições listadas no diagnóstico: Alagoas, Rio Grande do Sul, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Roraima e Rondônia. Em seguida, os DPGs da Bahia, São Paulo, Tocantins e Rio de Janeiro reúnem pelo menos 3 dessas atribuições. Por outro lado, os DPGs da Paraíba, Pará, Acre, Espírito Santo, Amazonas, Pernambuco, Ceará, Amapá, Rio Grande do Norte e DPU possuem apensa uma atribuição. Os DPGs do Paraná e Distrito Federal não indicaram nenhuma atribuição.
108
O segundo ponto a ser examinado é a existência de Lei Orgânica,
esclarecendo tal documento que devem as Defensorias Públicas Estaduais ser
organizadas por meio de leis complementares estaduais, em obediência ao
107
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. III Diagnóstico Defensoria Pública no Brasil. Brasil, 2009. Disponível em: <http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/III%20Diagn%C3%B3stico%20Defensoria%20P%C3%BAblica%20no%20Brasil.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2013. p. 31-33. 108
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. III Diagnóstico Defensoria Pública no Brasil. Brasil, 2009. Disponível em: <http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/III%20Diagn%C3%B3stico%20Defensoria%20P%C3%BAblica%20no%20Brasil.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2013. p. 33-34.
47
mandamento contido no artigo 134, da Constituição Federal. Nesse sentido,
esclarece que praticamente todos os Estados cumprem tal preceito constitucional,
com exceção dos Estados do Paraná e do Rio Grande do Sul, que não indicaram a
existência de Lei Orgânica.109
Outro assunto a ser analisado diz respeito à autonomia da Instituição,
elucidando o III Diagnóstico que, atualmente, das Defensorias Públicas que foram
incluídas na pesquisa, somente duas estão subordinadas a alguma Secretaria
Estadual, sendo elas a do Paraná, subordinada à Secretaria de Estado da Justiça de
Cidadania (SEJU), e a do Distrito Federal, vinculada à Secretaria de Justiça, Direitos
Humanos e Cidadania.110
Quanto ao Conselho Superior, “[...] órgão colegiado integrante da
administração superior da Defensoria Pública”111, o Diagnóstico assevera que a sua
existência ou inexistência indica o nível de democracia interna da instituição, sendo
uma forma de descentralização das decisões a serem tomadas e da gestão da
Instituição. Com exceção das Defensorias Públicas do Paraná e do Amapá, todas as
outras possuem Conselho Superior.112
Em relação ao orçamento das Defensorias Públicas, o documento conclui
que, comparado com o Ministério Público e com o Poder Judiciário, as Defensorias
Públicas representam a menor participação no orçamento dos Estados.113 “Em
média, o orçamento executado pela Defensoria Pública foi de 22,01% do executado
pelo Ministério Público e 7,86% do executado pelo Poder Judiciário das unidades da
Federação.”114
109
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. III Diagnóstico Defensoria Pública no Brasil. Brasil, 2009. Disponível em: <http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/III%20Diagn%C3%B3stico%20Defensoria%20P%C3%BAblica%20no%20Brasil.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2013. p. 37. 110
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. III Diagnóstico Defensoria Pública no Brasil. Brasil,2009. Disponível em:<http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/III%20Diagn%C3%B3stico%20Defensoria%20P%C3%BAblica%20no%20Brasil.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2013. p. 37-38. 111
MORAES, 1995, p. 44. 112
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. III Diagnóstico Defensoria Pública no Brasil. Brasil, 2009. Disponível em: <http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/III%20Diagn%C3%B3stico%20Defensoria%20P%C3%BAblica%20no%20Brasil.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2013. p. 38-39. 113
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. III Diagnóstico Defensoria Pública no Brasil. Brasil, 2009. Disponível em: <http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/III%20Diagn%C3%B3stico%20Defensoria%20P%C3%BAblica%20no%20Brasil.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2013. p. 259. 114
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. III Diagnóstico Defensoria Pública no Brasil. Brasil, 2009. Disponível em: <http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/III%20Diagn%C3%B3stico%20Defensoria%20P%C3%BAblica%20no%20Brasil.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2013. p. 84.
48
Os recursos das Defensorias Públicas advêm dos Estados e da União, sendo
que alguns Estados possuem fundos próprios para o custeio da Instituição. Os
Estados que não possuem tal fundo são os do Acre, Sergipe, Amapá, Maranhão,
Bahia, Pernambuco, Mato Grosso, Paraná, Rondônia e Minas Gerais.115
A fim de possibilitar a execução de seus projetos, vinte Defensorias Públicas
possuem algum convênio firmado com o Executivo Federal, sendo que os Estados
de Roraima, Paraná, Sergipe e Amapá são os que não mantêm tal convênio.116
Sobre o papel que vem sendo desempenhado pela Defensoria Pública, a
maioria dos Defensores Públicos avalia como boa e ótima a qualidade do serviço
público prestado, ponderando, contudo, que é excessiva a demanda de trabalho.117
É o que se verifica a seguir:
A grande maioria dos Defensores Públicos entende que a Defensoria Pública vem desempenhando seu papel no processo de transformação social e que vê positivamente a aproximação da Defensoria Pública com a sociedade civil. A maior parte dos Defensores Públicos da União e dos Estados avalia como bom e ótimo a qualidade do serviço público prestado pela sua instituição, sendo esse índice de 83,3% e 84,3%, respectivamente. Por outro lado, a maior parte dos Defensores Públicos da União e dos Estados avalia como excessiva a demanda de trabalho sob sua responsabilidade, atualmente com percentuais de 65,8% e 72,1%, respectivamente.
118
Como conclusão, o Diagnóstico assevera que, no que diz respeito à
Defensoria Pública, muito já se evoluiu, mas muito ainda precisa ser feito. Nesse
sentido:
115
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. III Diagnóstico Defensoria Pública no Brasil. Brasil, 2009. Disponível em: <http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/III%20Diagn%C3%B3stico%20Defensoria%20P%C3%BAblica%20no%20Brasil.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2013. p. 49. 116
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. III Diagnóstico Defensoria Pública no Brasil. Brasil, 2009. Disponível em: <http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/III%20Diagn%C3%B3stico%20Defensoria%20P%C3%BAblica%20no%20Brasil.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2013. p. 99. 117
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. III Diagnóstico Defensoria Pública no Brasil. Brasil, 2009. Disponível em: <http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/III%20Diagn%C3%B3stico%20Defensoria%20P%C3%BAblica%20no%20Brasil.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2013. p.266 118
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. III Diagnóstico Defensoria Pública no Brasil. Brasil, 2009. Disponível em: <http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/III%20Diagn%C3%B3stico%20Defensoria%20P%C3%BAblica%20no%20Brasil.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2013. p. 266
49
[...] A sua análise autoriza a conclusão de que desde a edição da Emenda Constitucional nº 45 a Defensoria tem aproveitado um franco aperfeiçoamento com a revisão de sua organização institucional, e sensível aumento do número de cargos nos confins mais distantes do território brasileiro. O estudo ainda aponta, porém, um enorme déficit no grau de cobertura dos serviços prestados pela instituição o que reclama um contínuo e progressivo plano de ação por parte dos chefes do Poder Executivo em todas as Unidades da Federação e dos dirigentes da Defensoria Pública, no sentido de prosseguir no processo de ampliação e aperfeiçoamento institucional de molde a extirpar os verdadeiros “buracos negros” existentes no território brasileiro, onde não se cumpre o primado constitucional do acesso à Justiça.
119
Em março de 2013, foi lançado pela ANADEP e Ipea o “Mapa da Defensoria
Pública no Brasil”120, no qual restou demonstrado que a Defensoria Pública só está
presente em 754 (setecentos e cinquenta e quatro) das 2.680 (duas mil seiscentos e
oitenta) comarcas distribuídas em todo o país. Além disso, somente 59,5% dos
cargos de defensor público criados no Brasil estão providos.
O documento mostra, ainda, que Paraná e Santa Catarina, últimos Estados a
criarem suas Defensorias Públicas em 2011 e 2012, respectivamente, ainda não têm
o órgão efetivamente implantado, assim como Goiás e Amapá. Os únicos Estados
que não apresentam déficit de defensores públicos, considerando o número de
cargos providos, são Distrito Federal e Roraima; os que possuem déficit de até 100
defensores públicos são Acre, Tocantins, Amapá, Mato Grosso do Sul, Paraíba,
Rondônia e Sergipe. Os Estados com maiores déficits em números absolutos são
São Paulo (2.471), Minas Gerais (1.066), Bahia (1.015) e Paraná (834). O déficit
total do Brasil é de 10.578 defensores públicos.
Outro aspecto importante revelado no estudo é a discrepância dos
investimentos no sistema de justiça, tendo em vista que os Estados contam com
11.835 (onze mil oitocentos e trinta e cinco) magistrados, 9.963 (nove mil
novecentos e sessenta e três) membros do Ministério Público e 5.054 (cinco mil e
cinquenta e quatro) defensores públicos.
119
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. III Diagnóstico Defensoria Pública no Brasil. Brasil, 2009. Disponível em: <http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/III%20Diagn%C3%B3stico%20Defensoria%20P%C3%BAblica%20no%20Brasil.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2013. p. 14. 120
ANADEP E IPEA. Mapa da Defensoria Pública no Brasil. Brasil, 2013. Disponível em: <http://www.ipea.gov.br/sites/mapadefensoria>. Acesso em: 10 set. 2013
50
5 DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO PARANÁ
A Defensoria Pública do Estado do Paraná é prevista pelos artigos 127 e 128
da Constituição do Estado do Paraná, a seguir transcritos:
Art. 127. A Defensoria Pública é instituição essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica integral e gratuita, a postulação e a defesa, em todas as instâncias, judicial e extrajudicial, dos direitos e dos interesses individuais e coletivos dos necessitados, na forma da lei. Parágrafo único. São princípios institucionais da Defensoria Pública a unidade, a impessoalidade e a independência na função. Art. 128. Lei complementar, observada a legislação federal, disporá sobre a organização, estrutura e funcionamento da Defensoria Pública, bem como sobre os direitos, deveres, prerrogativas, atribuições e carreiras de seus membros.
121
Em obediência ao artigo 128, da Constituição Estadual, bem como ao artigo
134, da Constituição Federal, foi promulgada a Lei Complementar nº 55, de
04.02.1991, que instituiu a Defensoria Pública no Estado do Paraná, contemplando
apenas sete artigos.
Ocorre que, como já explicitado anteriormente, a Lei que regulamentou a
criação das Defensorias Públicas Estaduais é a Lei Complementar Federal nº 80, de
12.01.1994, que, recentemente, sofreu alterações com a Lei Complementar nº 132,
de 07.10.2009.
Percebe-se, portanto, que a Lei Complementar Federal em questão é
posterior à Lei Complementar que instituiu a Defensoria Pública no Estado do
Paraná. Assim, o Paraná precisaria realizar a adequação de sua lei estadual à lei
nacional, no que se refere às regras gerais ali estabelecidas.122 Um dos grandes
problemas da Defensoria Pública do Paraná é que ela foi criada como um órgão
vinculado à Secretaria de Estado da Justiça e da Cidadania (SEJU), quer dizer, sem
autonomia funcional, administrativa e financeira.
Ressalte-se que, em 2007, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento de
uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, declarou como inconstitucional o artigo 2º,
121
PARANÁ (Estado). Constituição do Estado do Paraná (1989). Diário Oficial [do] Estado do Paraná, nº 3116, Paraná, 5 out. 1989. 122
MORAES, 1995, p. 16.
51
inciso IV, alínea ‘c’, da Lei Estadual nº 12.755, do Estado de Pernambuco, que
previa a vinculação da Defensoria Pública Estadual à Secretaria de Justiça e Direitos
Humanos, vinculação esta, portanto, nos mesmos moldes da realizada no Estado do
Paraná. O fundamento de tal decisão foi no sentido de que a Emenda Constitucional
nº 45/04 conferiu autonomia funcional e administrativa às Defensorias Públicas
Estaduais, bem como iniciativa de proposta orçamentária, do que decorre ser
inconstitucional a vinculação da Defensoria Pública à Secretaria de Estado.123
Todavia, há um entendimento minoritário de que a Defensoria Pública, sendo
uma Instituição sujeita a normas gerais de lei complementar federal, deve ser
subordinada a alguma Secretaria de Estado. Esse é o entendimento de José Afonso
da Silva, para quem:
[...] Não satisfaz aos ditames do art. 134 a simples criação ou manutenção de procuradoria de assistência judiciária, subordinada à Procuradoria-Geral ou à Advocacia-Geral. A Constituição considera a Defensoria Pública uma instituição essencial à função jurisdicional, destinada à orientação jurídica e à defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do art. 5.º, LXXIV. Se é uma instituição e ainda sujeita a normas gerais de lei complementar federal, a toda evidência não pode ser órgão subordinado ou parte de outra instituição, que não ao próprio Estado, por meio de uma Secretaria, que deverá ser a Secretaria da Justiça, até porque a distribuição de seus membros – os Defensores Públicos – deve ser feita diferente da dos Procuradores do Estado.
124
Como resultado da ausência de regulamentação da Defensoria Pública do
Paraná, não existia carreira de defensor público no Paraná, não havendo uma fonte
oficial de dados que permita averiguar quantos profissionais atuam na instituição.
Todavia, segundo o jornal Gazeta do Povo, de junho de 2009, a Defensoria Pública
do Paraná contava com apenas quarenta e oito profissionais, sendo alguns
advogados voluntários, outros cargos comissionados e, por fim, alguns advogados
do quadro especial, lotados em secretarias do governo e, muitas vezes,
123
BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Constitucional. Ação Direta de Inconstitucionalidade: art. 2º, inciso IV, alínea c, da L.est. 12.755, de 22 de março de 2005, do Estado de Pernambuco, que estabelece a vinculação da Defensoria Pública estadual à Secretaria de Justiça e Direitos Humanos: violação do art. 134, 134, §2º, da Constituição Federal, com a redação da EC 45/04: inconstitucionalidade declarada. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.569-0. Requerente: Diretório Nacional do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). Requerido: Governados do Estado de Pernambuco e Assembléia Legislativa do Estado de Pernambuco. Relator: Min. Sepúlveda Pertence. Diário de Justiça, 11 maio 2007. 124
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo. 16. ed. São Paulo: Malheiros, 1999. p. 617.
52
emprestados à Defensoria Pública. Outro dado trazido pela reportagem é o de que,
em julho de 2008, foi realizado um levantamento pela Associação Nacional das
Defensorias Públicas, cujo resultado foi o de que o Paraná possui 0,5 Defensor
Público para um grupo de 100.000 (cem mil) habitantes, enquanto no Rio de Janeiro
há 4,1 e, em Roraima, 9,6. 125
A atuação desses profissionais da Defensoria Pública do Paraná é realizada
perante as Varas Criminais, bem como em áreas de Direito Civil em geral, Família,
Infância e Juventude, Tribunal do Júri e Juizados Especiais Cíveis, de acordo com
informações trazidas pelo III Diagnóstico da Defensoria Pública no Brasil126.
Além disso, tal atuação praticamente se restringe à cidade de Curitiba, apesar
de, teoricamente, a Defensoria Pública ser do Estado do Paraná. Diante disso,
segundo a mesma reportagem anteriormente citada do jornal “Gazeta do Povo”, o
atendimento nas outras cidades do Estado depende de Convênios firmados com as
Faculdades de Direito, bem como de programas como o da Defensoria Itinerante,
em que os Defensores Públicos se dirigem até as pessoas que deles precisam.127
Segundo outra reportagem do jornal “Gazeta do Povo”, publicada em julho de
2013128, há, no âmbito do sistema penal, 10 (dez) Defensores Públicos, quando o
ideal seriam 844 (oitocentos e quarenta e quatro); 1(um) Defensor para cada
768.000 (setecentos e sessenta e oito mil) pessoas com renda mensal inferior a três
salários mínimos, sendo que o ideal seria de um defensor a cada 10.000 (dez mil)
pessoas nessa situação; 25.000 (vinte e cinco mil) atendimentos anuais (sociais ou
jurídicos), dos quais 5.000 (cinco mil) geram processos judiciais; 137 (cento e trinta e
sete) assessores de estabelecimento penal; 25.000 (vinte e cinco mil) assistidos no
sistema carcerário.
Ademais, necessário mencionar que, segundo informações divulgadas pela
Coordenadoria dos Direitos da Cidadania (CODIC), como consequência da ausência
de regulamentação da Defensoria Pública do Paraná, o Estado deixou de receber,
125
BOREKI, Vinicius. Entrevista: Josiane Fruet Bettini Lupion, chefe da Defensoria Pública do Paraná. Gazeta do Povo, Curitiba, 01 jun. 2009. Vida e Cidadania, Justiça. 126
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. III Diagnóstico Defensoria Pública no Brasil. Brasil, 2009. Disponível em: <http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/III%20Diagn%C3%B3stico%20Defensoria%20P%C3%BAblica%20no%20Brasil.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2013. p. 136-137. 127
BOREKI, Vinicius. Entrevista: Josiane Fruet Bettini Lupion, chefe da Defensoria Pública do Paraná. Gazeta do Povo, Curitiba, 01 jun. 2009. Vida e Cidadania, Justiça. 128
BARAN, Katna. Por que precisamos da Defensoria Pública no Paraná. Gazeta do Povo, Curitiba, 12 jul. 2013. Justiça e Direito.
53
do governo federal, a quantia de R$ 1.000.000,00 (um milhão) do Programa
Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci)129. É o que se verifica a
seguir:
A verba que poderia vir para o Paraná está no pacote de R$ 13 milhões distribuídos para 11 regiões metropolitanas com as maiores taxas de homicídios no país, além de Teresina (PI). A defensoria de São Paulo recebeu R$ 3,2 milhões; a do Rio de Janeiro, R$ 1,8 milhão; e a do Rio Grande do Sul, R$ 1,3 milhão. Além disso, o Pronasci entregou 12 veículos para o transporte de defensores públicos. O Paraná não recebeu o seu veículo. O dinheiro do Ministério da Justiça deve ser usado para reforçar o trabalho das defensorias estaduais, com objetivo de diminuir a superlotação das delegacias e tentar recuperar jovens detidos pela prática de pequenos delitos e crimes de menor potencial ofensivo. “O Paraná não recebeu recursos porque não tem Defensoria. E também não quis receber um carro”, afirma o secretário de Reforma do Judiciário, Rogério Favreto. “É insustentável o Paraná não avançar nessa questão. Ele é um dos únicos que continua trabalhando com defensores improvisados.”
130
Veja-se, ainda, que, na ausência de uma Defensoria Pública estruturada,
resta à população que necessita de seus serviços recorrer ao trabalho dos
advogados dativos, nomeados pelos juízes para atuar nos casos que a Defensoria
não consegue cobrir. No Paraná, essa atividade é estruturada por meio de um
convênio entre a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PR), o Tribunal de Justiça e
a Procuradoria do Estado. Atualmente, estão inscritos 3.720 (três mil setecentos e
vinte) advogados. Desse total, 782 (setecentos e oitenta e dois) já foram nomeados
pelos juízes, alguns mais de uma vez, totalizando mais de 2.800 (duas mil e
oitocentas) nomeações desde 2010, sendo esse cadastro apenas um referencial
para os magistrados, que também podem nomear advogados sem consultar a
lista131.
Todavia, apesar de ser considerado um serviço essencial, o trabalho dos
advogados dativos pode sair mais caro do que a estruturação da Defensoria Pública,
conforme se constata a seguir:
129
COORDENADORIA DOS DIREITOS DA CIDADANIA. Falta de advogados públicos prejudica defesa de presos no Paraná. Disponível em: <http://www.codic.pr.gov.br/modules/noticias/article.php?storyid=1393>. Acesso em: 26 mar. 2013. 130
COORDENADORIA DOS DIREITOS DA CIDADANIA. Falta de advogados públicos prejudica defesa de presos no Paraná. Disponível em: <http://www.codic.pr.gov.br/modules/noticias/article.php?storyid=1393>. Acesso em: 26 mar. 2013. 131
BARAN, Katna. Por que precisamos da Defensoria Pública no Paraná. Gazeta do Povo, Curitiba, 12 jul. 2013. Justiça e Direito.
54
Apesar de ser considerado um serviço essencial, os especialistas apontam que o trabalho dos dativos acaba saindo muito mais caro aos cofres estaduais do que o investimento necessário para a estruturação da defensoria pública. “Um defensor atua em média em 80 casos por mês, se fosse cobrar pela tabela do OAB, como é o caso dos dativos, o estado teria de desembolsar quase R$ 100 mil para cada um”, explica o coordenador da Associação Nacional dos Defensores Públicos da Região Sul, Rafael Português.
132
Além disso, tal convênio foi repudiado pela Associação Nacional dos
Defensores Públicos, e para André Castro, Presidente da Associação, em entrevista
concedida ao jornal “Gazeta do Povo”, a contratação não é realizada por concurso
público ou através de critérios de seleção mais rigorosos, do que decorre que a
assistência jurídica prestada tende a ser mais cara e de menor qualidade. Afirma,
ainda, que o orçamento reservado para o pagamento dos advogados dativos poderia
ser utilizado para o início da estruturação da Defensoria Pública no Paraná133.
Toda esse quadro em que a Defensoria Pública do Paraná está inserida vem
sendo alvo de inúmeras críticas, inclusive em jornais e outros meios de comunicação
de grande circulação. Um exemplo é uma matéria veiculada no jornal “Gazeta do
Povo”, segundo a qual:
Para o presidente da Associação Nacional dos Defensores Públicos (Anadep), Fernando Calmon, o Paraná vive uma situação de “faz-de-conta” quando o assunto é a Defensoria. “A situação do Paraná é muito ruim. É uma negativa de direitos à população do estado”, critica. “O Paraná está vivendo na contramão da história, em situação anterior à dos anos 80. Ou o estado cumpre o que diz a Constituição, ou vai continuar vivendo em um faz-de-conta.”
134
Vários podem ser os motivos para essa ausência de regulamentação, que é
uma decisão de competência do Governo do Estado. Um deles já foi citado no
capítulo 3 da presente monografia, na explanação da obra de Kim Economides. Para
o autor, o governo poderia preencher os espaços vazios de atuação do mercado,
132
BARAN, Katna. Por que precisamos da Defensoria Pública no Paraná. Gazeta do Povo, Curitiba, 12 jul. 2013. Justiça e Direito. 133
BOREKI, Vinicius. Acordo do PR com OAB é alvo de críticas. Gazeta do Povo, Curitiba, 26 mar. 2010. Vida e Cidadania, Direito. 134
BERTOTTI, João Natal; LOPES, José Marcos. Falta de advogados públicos prejudica defesa de presos no PR. Gazeta do Povo, Curitiba, 28 jul. 2008. Vida e Cidadania, Justiça.
55
fornecendo, por exemplo, serviços jurídicos, preventivos, extrajudiciais e paralegais,
o que incrementaria o acesso à justiça por parte da população. Todavia, fornece
alguns motivos que poderiam levar o governo a não agir dessa forma, sendo o
primeiro deles o risco que o governo teria de ser parte na mesma ação que financia;
o segundo, um aumento nos custos e no congestionamento dos tribunais do sistema
judiciário mais amplo; e o terceiro, o fato de que pode ser uma estratégia mais
eficiente investir diretamente no ataque às causas da pobreza e das injustiças do
que promover a dependência de advogados e remédios jurídicos.135
Para Sílvio Roberto Mello Moraes, o motivo dessa ausência poderia estar
justamente na importância do papel exercido pela Defensoria Pública, bem como na
influência de tal Instituição na mudança do atual quadro social. Nesse sentido, o
doutrinador pondera que:
E é justamente pela importância do papel da Defensoria Pública e sua direta influência na mudança do atual quadro social, que a Instituição, não raras vezes, se depara com poderosos inimigos que, pertencentes às fileiras dos opressores e antidemocráticos, não pretendem qualquer mudança na situação social presente. Muitas vezes, travestidos de falsos democratas, agem sorrateiramente, enfraquecendo e aviltando a Instituição que certamente mais lhes assusta, pois o seu papel transformador, reduz o domínio que exercem sobre os desinformados e despreparados que, infelizmente, constituem a maior parte da nação brasileira. Preocupa-os, portanto, a idéia de uma Defensoria Pública forte, independente e transformadora, capaz de exercer com altivez sua missão constitucional, livre de ingerências políticas.
136 (Sem grifos no original)
É preciso considerar, também, a hipótese levantada por Santos137 de que,
sendo a Defensoria Pública voltada para a população de baixa renda, a instituição
pode sofrer o mesmo descaso enfrentado por outras instituições públicas existentes
no Brasil, que acabaram virando sinônimo de instituições voltadas para pobres, tal
como ocorre com a educação pública e a saúde pública, por exemplo. Santos, a
partir da abordagem eliasiana dos Estabelecidos/Outsiders, discute “a
desvalorização material das profissões que atuam junto aos pobres no Brasil”,
135
ECONOMIDES, 1999, p. 65. 136
MORAES, 1995, p. 17. 137 SANTOS, André Filipe Pereira Reid dos. Direito e profissões jurídicas no Brasil após 1988:
expansão, competição, identidades e desigualdades. 2008. Tese (doutorado) – Sociologia e Antropologia, UFRJ, Rio de Janeiro, 2008.p. 131-135.
56
tratando particularmente do caso da Defensoria Pública do Rio de Janeiro em
contraposição ao Ministério Público do mesmo estado.
Outro motivo pode ser o de que a estruturação da Defensoria Pública é
onerosa ao Estado. Essa é a opinião do Procurador-Geral do Estado, Carlos Marés,
divulgada em reportagem veiculada pelo jornal “Gazeta do Povo”:
O procurador-geral do estado, Carlos Marés, considera a defensoria imprescindível, mas lembra que sua estruturação é bastante onerosa ao Estado. Segundo ele, diversos estados brasileiros enfrentam dificuldades orçamentárias para a sua implantação. “A criação da defensoria é um problema, pois tem de ser estruturada em todas as regiões do estado. Acredito que atualmente falta no Brasil um estudo para se saber como funcionam as defensorias.”
138
Já para o doutrinador Paulo Galliez, na medida em que o clamor público
exigir, há esperanças para o processo de consolidação da Defensoria Pública, que
se verificará mesmo diante da resistência do poder econômico139.
Em consonância com o preceituado por Galliez, a situação da Defensoria
Pública do Paraná está se modificando, pois em 10 de maio de 2011 foi aprovada a
redação final do Projeto de Lei que institui a Defensoria Pública no Paraná, Lei esta
que foi sancionada em 19 de maio do mesmo ano e que contou com a participação
de movimentos sociais que atuaram em prol da regulamentação da instituição.
Em 2012, foi realizado o concurso público, do qual foram aprovados noventa
e cinco Defensores Públicos, com cento e noventa e sete vagas previstas em edital.
A homologação do resultado foi publicada em Diário Oficial em 16 de maio de 2013,
e, muito embora o dia 19 de junho tenha sido o limite estabelecido para
apresentação dos exames médicos, as nomeações não foram feitas até o momento.
Veja-se, todavia, que a previsão inicial era de que os Defensores assumissem o
cargo ainda no primeiro semestre de 2013.
Para analisar esse processo de transição, foi realizada uma entrevista com
Miguel Godoy, doutorando e mestre em Direito do Estado pela Universidade Federal
do Paraná, que, exercendo a função de assessor jurídico da Secretaria de Justiça do
138
DEDA, Rhodrigo. Constituição do Paraná tem itens sem regulamentação. Gazeta do Povo, Curitiba, 25 out. 2009. Vida Pública, Legislação. 139
GALLIEZ, 2009, p.15.
57
Governo do Estado do Paraná (SEJU), participou da elaboração do Projeto de Lei
em questão.
Segundo Godoy, o grande diferencial na elaboração da Lei foi o fato de ela
não ter sido elaborada por um grupo de técnicos ou por poucos especialistas na
área, uma vez que foi, na realidade, produto de um amplo processo de discussão
com os diversos agentes, entidades, poderes e organizações e entre estes e o povo.
Para isso, o primeiro passo foi estabelecer uma versão preliminar do Projeto
de Lei de estruturação da Defensoria Pública e da carreira de Defensor Público.
Esse Projeto Preliminar foi escrito com base em três Leis de Defensorias Públicas
estaduais: a Lei de Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, que é a lei mais
antiga do país, a Lei de Defensoria Pública do Estado de São Paulo e a do Mato
Grosso do Sul, tendo em vista serem estas consideradas, até então, como as
melhores leis de Defensoria Pública do país, assim consideradas pelo Ministério da
Justiça.
Após a sua elaboração, o Projeto foi submetido a um amplo processo de
discussão, por meio de reuniões abertas e amplamente divulgadas. Foi então
apresentada a versão preliminar ao Tribunal de Justiça, ao Ministério Público do
Estado do Paraná, à OAB, à Assembleia Legislativa e à população, pela internet, por
jornais como a Gazeta do Povo e pela divulgação feita na própria Defensoria Pública
do Estado do Paraná. Importante destacar a participação de alguns agentes da
sociedade civil, como os estudantes, especialmente dos estudantes das Faculdades
de Direito da Universidade Federal do Paraná, da PUC e da Curitiba, que se
organizaram por meio dos Centros Acadêmicos e compareceram a todas as
reuniões.
A partir da consulta, o texto final foi encaminhado pelo Governador Beto Richa
à Assembleia Legislativa, momento em que esse texto foi submetido mais uma vez à
consulta pública, para que fossem apresentadas novas sugestões. Não houve
alteração no texto que havia sido encaminhado, ocorrendo, em seguida, a votação
em dois turnos e a aprovação por unanimidade.
O momento atual para Godoy é de um contrassenso, uma vez que, se por um
lado foi elaborada a melhor Lei do país, por outro, ainda que haja previsão
orçamentária e dinheiro para cumprir e efetivar essa Lei, isso não está sendo feito.
Para ele, o governo do Estado não tem cumprido com aquilo a que ele
mesmo se propôs a fazer por meio da Lei que ele mesmo criou. O concurso para
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Defensor Público já foi realizado, passaram menos candidatos do que o número de
vagas disponíveis, o que prova que foi um concurso sério, há mais vagas para
serem preenchidas, e o governador até o presente momento não deu posse a esses
Defensores aprovados por concurso público.
A justificativa é que o Estado do Paraná encontra-se limitado pela Lei de
Responsabilidade Fiscal, ou seja, o Estado do Paraná, hoje, já gasta mais do que
poderia do seu orçamento com pessoal. Portanto, ainda que haja previsão
orçamentária para a implementação, ela está impedida pela Lei de
Responsabilidade Fiscal.
Segundo Godoy, essa é uma justificativa verídica, que impede que o governo
nomeie os Defensores. No entanto, essa também é uma escolha não só definida
pela Lei de Responsabilidade Fiscal, mas também pela forma como o pessoal é
gerido no Estado. É necessário analisar que prioridades são dadas na hora de se
nomear os demais servidores que entram na conta orçamentária do Poder
Executivo. Hoje existe esta impossibilidade de nomeação dos Defensores Públicos,
tendo em vista que foram nomeados professores e policiais militares. Há, no mínimo,
uma escolha política muito clara de nomear, primeiro, professores e policiais
militares, em detrimento dos Defensores Públicos. É uma escolha política,
discricionária do governo do Estado, mas que não é impassível de questionamento e
críticas.
Para ele, se esse limite foi atingido, precisa ser diminuído, corrigido, para que
se inclua, necessariamente, a Defensoria Pública nessa dotação orçamentária, sob
pena de se taxar tal opção como uma escolha política, que não leva em conta, tal
como deveria, a Defensoria Pública.
Do exposto, verifica-se ser imprescindível que o Estado do Paraná efetive e
finalize a implementação da Defensoria Pública do Paraná, de modo que se
concretize o acesso à justiça, proporcionando ampla orientação jurídica e defesa a
toda a população de baixa renda, conforme preceituado pelo artigo 134 da
Constituição Federal, já que de nada adianta a existência de uma Lei se na prática
não pode ela ser efetivada.
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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
No presente estudo, primeiramente foi realizada uma análise da
desigualdade, utilizando-se as teorias desenvolvidas pelos teóricos Karl Marx, pelo
fato de ser elas a mais proeminente no que se refere ao conceito de estratificação
social, referente às posições desiguais ocupadas pelos indivíduos na sociedade, o
que se infere a partir da obra de Anthony Giddens, oportunamente analisada. Tal
escolha foi feita considerando os limites da presente monografia, não se
esquecendo, todavia, das teorias desenvolvidas por outros autores, clássicos e
contemporâneos, em especial Max Weber e Pierre Bourdieu.
A estratificação social existente na sociedade pode remeter a alguns casos de
exclusão social, conceito este também trabalhado por Giddens, tendo em vista que,
havendo posições desiguais entre pessoas da mesma sociedade, alguns serão
prejudicados, ficando, algumas vezes, até mesmo excluídos da proteção da norma
legal, sem nem ao menos poder se socorrer do Poder Judiciário com o intuito de
solucionar seus problemas.
Após o exame de tais teorias, passou-se ao exame da desigualdade no
âmbito do Brasil, tendo-se constatado que o Brasil é um país marcado por profundas
desigualdades, que afetam o acesso à justiça, haja vista terem por consequência um
sentimento de descrença da população em relação ao Poder Judiciário, que passa a
ser entendido como uma Instituição hostil, iníqua e ineficiente, o que é comprovado
através das pesquisas apresentadas ao longo do Capítulo 2 da presente monografia.
Todavia, apesar de marcado por tais desigualdades, constatou-se que a
Constituição Federal, em seu preâmbulo, elevou a justiça e a igualdade, ao lado de
outros valores, ao patamar de valores supremos da sociedade brasileira.
Desse modo, sendo a justiça dotada de tão relevante importância, foi prevista
constitucionalmente através de outros dispositivos, destinados a concretizar o
acesso à justiça, tal como o artigo 134, responsável pela previsão de criação da
Defensoria Pública.
Mas qual o significado da expressão acesso à justiça? No estudo bibliográfico
realizado, constatou-se que a obra “Acesso à justiça”, de Mauro Cappelletti e
Bryanth Garth, é de salutar importância para o tema em comento, sendo que,
segundo os autores, o acesso à justiça engloba a igualdade de acesso (premissa do
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acesso) e a produção de resultados individuais, mas igualitários e socialmente justos
(premissa da justiça). Deve o acesso à justiça ser amparado pelo ordenamento
jurídico, mas é também imprescindível que ele seja garantido de maneira efetiva à
população.
Todos os autores apresentados abordaram alguns entraves à concretização
do acesso à justiça, bem como algumas soluções que podem ser utilizadas com o
escopo de efetivar tal acesso. Por exemplo, a Defensoria Pública é apresentada
como forma de se efetivar o acesso à justiça, proporcionando ampla orientação
jurídica e defesa a toda a população de baixa renda.
Todavia, mesmo a doutrina tece críticas à forma de atuação da Defensoria
Pública, discorrendo sobre alguns problemas que se configurariam como obstáculos
ao acesso à justiça.
No caso do Estado do Paraná, objeto específico do presente estudo, foi
possível constatar que houve a recente aprovação e sanção da lei que instituiu a
Defensoria Pública, bem como a realização de concurso público. Todavia, ainda não
houve a efetiva estruturação e consequente nomeação dos candidatos aprovados,
muito embora a previsão inicial fosse de que os Defensores Públicos assumissem o
cargo ainda no primeiro trimestre de 2013, sendo a justificativa a de que o governo
estadual ultrapassou o limite das despesas com folha de pagamento estabelecido
pela Lei de Responsabilidade Fiscal.
Contudo, mostra-se imprescindível que o Estado do Paraná efetive e finalize a
implementação da Defensoria Pública do Paraná, de modo que se concretize o
direito fundamental do acesso à justiça, proporcionando ampla orientação jurídica e
defesa a toda a população de baixa renda, conforme preceituado pelo artigo 134 da
Constituição Federal, já que de nada adianta a existência de uma Lei se na prática
não pode ela ser efetivada.
Por fim, ressalte-se que a presente monografia não procurou esgotar o tema,
podendo vir a ser objeto de estudo de análises mais aprofundadas posteriormente.
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