147
Anual POBita ANO XII - 2005 - NÚMERO 1 2

12a. Edição da Revista do IHGP

Embed Size (px)

Citation preview

  • RBvi~ta Anual

    I-fi~ttia~ Pita~icabana~

    Pa~~ado ~etn POBita

    ANO XII - 2005 - NMERO 1 2

  • Z L Cl~:3lA.19 N ~ 500Z ~ IIX ClN'o'

    IUfOd WS OpBliliBd

    liBU Bq B1!1B.J!d ijB!.J9lli!H

    rBnUV Blli!l\~

    'o" B '0"::11 :::JV'l:II d :3 a c :::J 1.:1'o"!::I EJ 0:3 EI "

    :3 C:::JI!::IC.LSIH C.Ln.LI.LSNI "

    http:Cl~:3lA.19

  • o INSTITUTO HISTRICO EGEOGRFICO DE PIRACICABA no se responsabiliza, pelos textos aqui

    publicados, cabendo toda e qualquer responsabldade aos seus autores, no havendo endosso por parte do Instituto

    Histrico e Geogrfico de Piracicaba

    Os artigos foram revisados pelos seus autores.

    Piracicaba, novembro de 2005. v~~

    ~~reF.rrazpresl:~:o:O IHGP

    Copyright 2005 by IHGP

    Todos os direitos reservados ao IHGP

    Impresso no Brasil - Printed in Brazil

  • O Instituto Histrico e Geogrfico de Piracicaba

    agradece o apoio para presrvao e divulgao da

    nossa histria

    , a

    V Votorantim Celulose e Papel

  • o INSTITUTO HISTRICO E GEOGRFICO DE PIRACICABA

    Cumprindo a Lei Municipal N 2.160 de 18 de dezembro de 1974, edita o volume Revista O Passado Piracicabano (Sem Poeira).

    APOIO

    PREFEITURA MUNICIPAL DE PIRACICABA

    SECRETARIA MUNICIPAL

    DE AO CULTURAL

  • DIRETORIA DO INSTITUTO HISTRICO E GEOGRFICO DE PIRACICABA

    Gesto 2004 2006

    HALDUMONT NOBRE FERRAZ

    Presidente

    PAULO CELSO BASSETTI

    Vice-Presidente

    RUY NORBERTO O. COSTA

    l' Secretrio

    CEcLlO ELIAS NEITO

    2' Secretrio

    FLAVIO RIZZOLO

    l' Tesoureiro

    WALDEMAR ROMANO

    2 Tesoureiro

    ANTONIO HENRIQUE CARVALHO COCENZA

    Orador

    MARLY THEREZ1NHA GERMANO PERECIN

    Bibliotecria

    SUPLENTES DA DIRETORIA

    RENATO LEME FERRARI

    l' Suplente

    GILBERTO JLIO PIATTO

    2' Suplente

    MANOEL GOMES TROIA

    3' Suplente

    CONSELHO FtSCAL

    cEZRlO CAMPOS FERRARI

    LEGARDETH CONSOLMAGNO

    BENNUR GALVO AMARAL

    SUPLENTES DO CONSELHO FISCAL

    HUGO PEDRO CARRADORE

    FRANCISCO DE ASSIS FERRAZ DE MELLO

    THIMOTEO JARDIM

  • Apresentao

    EM FAVOR DA MEMRIA

    Hugo Pedro Carradore

    A histria a testemunha dos tempos. a luz da verdade. a vida da memria. e a mestra da vida.

    O Inslluto Histrico e Geogrfico de Piracicaba entidade cultural e tem como propsito fundamental o de preservar a memria piracicabana. por meio da investigao, pesquisa de informaes documentais e propagao dos temas alvo da histria.

    O objetivo da Revista IHGP que ela seja memorial do conhecimento e uma caixinha da histria. Assim que, esta emisso de nmero doze elaborada com o auxilio e da pesquisa dos membros do Instituto Histrico e Geogrfico de Piracicaba e de autores das cincias sociais.

    Desde a fundao do IHGP em 1967, como uma abertura em favor da cultura, suas sucessivas diretorias tm procurado desenvolver projetos e atividades com o propsito de promover o conhecimento e bem servir a educao da juventude promissora piracicaba na.

    No trmino do seu binio de mandato a atual diretoria, sob a presidncia de Haldumont Nobre Ferraz, sente-se na obrigao de tomar pblico um brevirio de algumas atividades.

    Alm das sesses magnas, comemorativas, palestras e exposies. o IHGP abriu suas portas aos universitrios para a elaborao de trabalho de mestrado.

    Tambm, cabe destacar vrios projetos em andamento que no podero ser interrompidos: digitalizao de acervos referentes Histria de Piracicaba e formao da fototca. f

    Durante esse mandato foi feita a aquisio do quadro histrico "Memria da Armao Monoeira, 1774 - margem direita do rio Piracicaba". de autoria do premiado artista plstico piracicabano. Eduardo Borges de Arajo

    De grande importncia foi a criao das medalhas culturais, atravs de lei: Mrito Histrico "Mrio Neme" e Mrito Empresarial. "Bandeirante do Progresso". que sero ortogadas a personalidades. que nas respectivas reas enalteceram o nome de Piracicaba escrevendo hoje a sua histria

    O registro da histria o reservatrio mundial do esprito e do conhecimento do passado.

  • NDICE

    Biografia Dr. Frederico Pimentel Gomes

    Marly de Bem Gomes ............................................................................... 1

    A Educao Pblica no Interior do Estado de So Paulo:

    Piracicaba como Modelo de Experincia Pedaggica na l'Repblica

    Marly Therezinha Germano Perecin ......................................................... 3

    Recreio do Corumbatai no Picado de Luis Pedroso de Barros

    Frei Sermo Dorizot!o ............................................................................... 24

    Piracicaba, seu Rio, seus Peixes

    Nelson Souza Rodrigues ....................................................................... 62

    A Participao de Piracicaba em Exposies Universais

    Mrcia Oehlmeyer Cosia ...................................................................... 102

    Capito Nho Lica

    FranciscoA.F. de Mello .......................................................................... 111

    Eugnio Nardim Simplesmente Neno

    Francisco A.F. de Mello .................................................................. 113

    Memrias da Escravido: Etnia Brasileira, o Negro no Branco

    Hugo Pedro Carradore .......................................................................... 115

    Contribuio no Entendimento da Festa do Divino no Vale Mdio Tiet

    Olivio Nazareno Alleoni ......................................................................... 125

    Geografia Prisional.: A Interiorizao do Sistema Penitencirio no Estado de So Paulo Joo Luiz Franchi ................................................................................. 146

  • 1 Instituto Histnco e Geogrfico de Piracicaba

    FREDERICO PIMENTEL GOMES (1921 - 2004)

    Marly de Bem Gomes

    Nasceu em Piracicaba. estado de So Paulo. no dia 19 de dezembro de 1921. Filho de Raymundo Pimentel Gomes e Sylvia de Souza Gomes. Sendo seu pai engenheiro agrnomo formado pela ESALQ/USP na Turma de 1922. Morreu em 24 de novembro de 2004. Era neto de famlia de tradicionais fazendeiros do Cear. Foi casado com Mary Lee Fonseca de Bem Gomes. e deixou as filhas: Dr.' Marli de Bem Gomes. divorciada. Dr.' Valquiria de Bem GomesAlcntara, casada com Dr. Paula Bardauil Alcntara. e. Dr.' Vangri de Bem Gomes Vertoni. viva de Dr. Paulo Csar Verton;' Deixou ainda seis netos e trs bisnetos.

    Veio da Paraiba para fazer dois anos no Colgio Universitrio anexo a ESALQ/USP em 1937. e depois cursou mais quatro anos, formando-se engenheiro agrnomo na Turma de 1943. com a mdia (9.5), que a maior mdia obtida na ESALQ/USP at hoje. Tendo por isto recebido o Prmio Epitcio Pessoa, Como calouro recebeu o apelida de Mosquito,

    Seu primeiro emprego j foi na ESALQ/USP, como assistente do Prol. Jos de Mello Moraes, passando dai para ser assistente da 16' Cadeira de Matemtica e Estatstica. sob a chefia do Prof, Orlando Carneiro,

    Foi bolsista da Fundao Rockfeller em 1952/1953. na Universidade da Carolina do Norte. EUA. onde se especializou em Estatstica, Ai realizou a primeira prova correta da anlise da varincia regresso no-linear. aplicando Lei de Milschertich. que indica a resposta das plantas aos adubos. um trabalho pioneiro no assunto.

    Teve grande destaque profissional. foi: Reitor da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (1964), Diretor Geral do Departamento de Promoo Agropecuria do Ministrio da Agricultura (1965). Diretor da Revista de Agricultura (1968-2004). Diretor da Escola de Engenharia de Piracicaba (1971-1974). Chefe do Depto. de Matemtica e Estatstica da ESALQ/USP (1970-1978). Membro Titular do Conselho Estadual do Estado de So Paulo (1973-1975). Representante da ESALQ no Conselho Universitrio da USP. com dois mandatos sucessivos (1974-1976 e 19761978). Coordenador do Curso de Mestrado em Experimentao e Estatstica (1965-1978), Presidente do Instituto Histrioo e Geogrfico de Piracicaba. com dois mandatos (1995-1996 e 1997-1998).

  • 2 PrO" Df" Marli de Bem Gomes

    Realizou na ESALQ/USP os concursos de livre-docncia em 1948, e o de ctedra em 1959, em ambos foi aprovado com "Distino e Louvor"_

    Foi agraciado com as seguintes honrarias: Medalha Marechal Rondon (1965), Medalha do Bicentenrio de Piracicaba (1969), Medalha Prudente de Moraes (1995), Medalha do Mrito Cientfico e Tecnolgico, entregue na comemorao do 1" Centenrio da ESALQ/USP, em 2001, alm do trofu do l' Centenrio da ESALQ/USP pelo seu trabalho na implantao da Ps-Graduao, em 1964.

    Lecionou Estatstica Experimental em Castelar, Argentina, a convite do Instituto Nacional de Tecnologia Agropecuria - INTA (1961 l, em Concepcin Del Uruguay, Argentina, a convite da FAO (1972), e novamente em Castelar, Argentina, a convite da OEA (1973). Lecionou muitas disciplinas nos cursos de Mestrado e Doutorado da ESALQ/USP.

    Publicou mais de 52 trabalhos, entre arligos, livros e teses. Sendo que dentre eles se destacam o livro Curso de Estatstica Experimental at hoje adotado por cursos de ps-graduao, j na 14' edio, e que foi traduzido para o Espanhol. E o livro Estatstica Aplicada a Experimentos Agronmicos e Florestais. feito em colaborao com o Eng'-Ftal Carlos Henrique Garcia, cuja primeira edio foi feita em 2002, e onde busca reunir conhecimentos bsicos especializados da Estatstica Experimental aplicada a ensaios com lavoura e florestais. com detalhes essenciais sobre a utilizao de aplicativos usuais, e tambm detalhes sobre a interpretao dos resultados fornecidos pelo computador. Os aplicativos principeis usados foram o SAS (statstical Analysis System (SAS Institute Inc.)) e o Sanes! (Sistema de Anlise Estatstica para Microcomputadores).

    Prof' D'" Marli de Bem Gomes. Professora Associada Aposentada da ESALQ/USP, Diretora da Revista de Agricultura, filha do Dr. Frederico Pimentel Gomes.

  • Instituto, Histrico e Geogrfico de Piracicaba 3

    A EDUCAO PBLICA NO INTERIOR DO ESTADO

    DE SO PAULO: PIRACICABA COMO MODELO

    DE EXPERINCIA PEDAGGICA NO ESTADO

    DE SO PAULO, DURANTE A 1" REPBLICA

    Mar/y Therezinha Germano Perecin

    1. INTRODUO

    Comemorou-se, em dezembro de 1996 p.p., o centenrio da introduo do Ensino Complementar Escola Normal de So Paulo, no interior do Estado. Trata-se do mais antigo educandrio pblico paulista de segundo grau, criado para Piracicaba, no ano de 1896, a Escola Complementar, hoje Escola de 1 e 2 graus "Sud Mennucci", No foi escolha aleatria. Piracicaba se situava entre as primeiras cidades paulistas e tinha o seu peso poltico, Prudente Jos de Moraes Barros elegera-se, em 1884, primeiro presidente civil do pais e o PRP se alava a ambiciosos planos de oligarquia nacional. A Repblica Velha tinha os seus compromissos com os segmentos urbanos da populao, onde as classes mdias souberam pressionar por escolaridade, No Interior, o 1 grau sempre foi objeto de negociao eleltoreira e um dos trunfos do partido dominante,

    A partir de 1895, o governo republicano paulista deu criao aos novos Cursos Complementares, de 2 grau, Escola Normal de So Paulo (capital), transformada em modelo de ensino, centro Irradiador de cultura e eixo do projeto pblico educacional para a sociedade do caf. A evoluo do ensino pblico paulista estava condicionado pelas novas realidades: crescimento econmico, expanso demogrfica e prementes necessidades de qualificao s novas categorias profissionais, tais como engenheiros (urbanizao, transportes e eletrificao), agrnomos (produo agropecuria, principalmente, caf), e, professores para os grupos escolares, objetivando-se a educao de largos segmentos das populaes urbanas. Nas duas primeiras legislaturas do Congresso Paulista, era predominante a corrente de opinio sobre o ensino elementar pblico e obrigatrio.

    O curso oferecido pela Escola Normal da Capital, reformada pela Lei nO 88 de 08/09/1892, era bastante exigente de capacitao anterior por parte do aluno, comportava 17 Cadeiras e tinha a durao prevista para quatro anos, O seu currculo era diversificado e abrangente: Letras, Cincias Exatas, Biolgicas e Humanas, Educao Civica, Desenho, Msica, Caligrafia e Ginstica, A primeira Escola Complementar, criada

    t ...,

  • 4 Marly Therezinha Germano Perecin

    anexa Escola Normal, em 1895, era um desdobramento natural das necessidades deste ensino voltado para a formao de professores da escola elementar e do ginsio, tinha finalidades propeduticas ao magistrio. '

    2. O INTERIOR PAULISTA E A EDUCAO SECUNDRIA

    Em 1896, era criada a Escola Complementar, que foi introduzida em Piracicaba, seguindo-se, no ano imediato, criao de mais duas, em Itapetininga e no Bairro da Luz, em So Paulo. O ano de 1897 assistiu

    . instalao de trs Escolas Complementares: a de Piracicaba (hoje, Escola Sud Mennucci), a de Itapetnnga (hoje, Peixoto Gomide) e a paulista, posteriormente transferida para a cidade de Guaratinguetf (hoje, Cons. Rodrigues Alves).

    A Escola Complementar de Piracicaba a mais antiga, no interior, e a segunda, em ordem cronolgica, no Estado de So Paulo. Em virtude da exiguidade de professores diplomados na Escola Normal de So Paulo, - esta, incapaz de atender demanda, na poca, os diplomados pelas Escolas Complementares obtiveram o direito de lecionar em escolas pblicas elementares, desde que houvessem exercitado a prtica do ensino, durante um ano, em grupos escolares ou escolas-modelo.'

    A primeira turma de complementaristas de Piracicaba formou- se em 1900, exatamente a data da criao da primeira Escola-modelo, o futuro Grupo Escolar Morais Barros, At, ento, o nico estabelecimento pblico de ensino preliminar em Piracicaba era o Primeiro Grupo Escolar (hoje, Baro do Rio Branco), construido entre 1894-1897, Iniciando o sculo XX, aquele educandrio passava a integrar em seu corpo docente, seis jovens complementaristas saldas, em 1900, da primeira turma: d~ Eugnia da Silva, dona Olivia Bianco, dona Maria Isabel da Silva, dona Antonia Azevedo, dona Ana Joaquina Bueno Verderese e dona Domitila Silveira de Menezes.'

    Geraes de piracicabanos tem passado pelas mos benfazejas dos educadores complementaristas e norma listas, Avalie-se, portanto, o significado desta Escola centenria, a Sud Mennucci, na Histria da Educao brasileira!

    1 Reynaldo Kuntz Busch: ~E\loluo e OrganlzaoAlual do Ensino Normal em So PauloH , In Centenrio do Ensino Normal em So Paulo 1846 -1946. Poliantia Comemorativa, p. 09..14. 2 Ibidem ~ Listagem de alunos formados pera Escora Complementar de Piracicaba, ano de 1900. Colaram grau 15 educadores. A cifra pouco expressiva, considerando-se a grande procura pelo curso na poca, Muitos alunos transreriram-se de Piracicaba para a Escola Normal da Praa objetivando um diploma que lhes conteria maiores vantagens no exerccio do magistrio.

  • Instituto Histrico e Geogrfico de Piracicaba 5

    3. A EXPANSO DA REDE ESCOLAR

    Em desenvolvimento ao projeto de ensino pblico do governo republicano de So Paulo. outras Escolas Complementares foram criadas, a partir de 1902, nas mais importantes cidades do interior paulista. As exigncias da escolarizao das classes urbanas levaram ao decreto nO 2025 de 2910311911, que transformava as Escolas Complementares em Escolas Normais Primrias, incluindo as trs maiores unidades do interior: Piracicaba, Campinas e Guaratinguet."

    As Escolas Normais Primrias tambm desenvolveram amplo e diversificado currculo: Pedagogia (que se prestou, desde o inicio, a todas as experincias educacionais), Letras, Cincias Exatas, Biolgicas e Humanas, Educao Cvica, Msica, Desenho, Caligrafia, Trabalhos Manuais, Economia Domstica e Ginstica. Em 1912, a Cadeira de Pedagogia passava a compreender trs disciplinas: Pedagogia, Psicologia e Metodologia do Ensino. .

    Em razo de constantes mudanas no ensino, primeiramente, a Escola Normal de So Paulo, seguida de outras duas, a de So Carlos e a de Itapetininga, passaram a denominar-se Escolas Normais Secundrias. Durou pouco tempo a discriminao: Em 1920, a Lei n 1750 de 081121 1920, que reformulou o ensino pblico de So Paulo (reforma "Sampaio Dria"), fundia as Escolas Normais' em uma s, ou seja, de tipo nico, com curso de quatro anos de durao.'

    Mas, a carreira do professor no tinha estmulos: baixos salrios, insegurana no trabalho, nomeaes polticas, percalos com as sucesses na oligarquia perrepista. O antigo projeto republicano paulista de instalar um grupo escolar em cada bairro, via-se bloqueado pelas prprias contradies internas do partido dominante. A escolarizao era v~al, tanto para a qualificao profissional e acesso a outros nveis de ensino, exigidos pelo crescimento econmico e social de So Paulo, como para a formulao dos votos no processo eleitoral, que sustinha a continuidade do Partido.

    Concesses foram feitas, incluindo a reduo do curso Normal para trs anos e a oferta de estmulos oficiais em nveis de salrios e equiparaes com outras escolas particulares (as Escolas Normais Livres) e Municipais. A partir de 1926, deu-se o "boom" das Escolas Normais. A .poltica de defesa e valorizao do caf, tentada com xito, desde 1906 (Convnio de Taubat), na dcada de vinte, viria a permitir o aumento das receitas do Estado e a sua melhor distribuio em proveito dos fins sociais.

    la Reynaldo Kuntz Busch. alo cit 4 Ibidem

  • 6 Marly Therezinha Germano Perecin

    Os resultados da nova poltica educacional foram rpidos, revertendo no aumento do nmero dos ingressantes no magistrio pblico, em certo prestgio da carreira, particularmente, no interesse da profissionalizao da mulher, e, logicamente, em dividendos para a organizao republicana.

    O preenchimento dos quadros do magistrio pblico fazia-se acompanhar da expanso da rede de escolas urbanas, suburbanas e rurais, revertendo em favor do atendimento da necessidade bsica de escolaridade primria e na cooptao dos votos. Fenmeno idntico, porm, no massivo, ocorreu com as Escolas de nvel superior, a Politcnica (1894), a Medicina (1912) e a Luiz de Queiroz (instalada em 1901, deixava de ser considerada tcnica de segundo grau, em 1925).

    Apesar da inexperincia em instruo pblica, o Estado de So Paula cumpriu, razoavelmente, bem o seu Projeto de Ensino, elaborado nos ltimos anos do sc. XX, relativo aos trs nveis. Muito embora, seletivo e elitista, quanto ao secundlo e ao superior, as luzes do saber que iluminavam o Projeto, tinham por foco dispersor o ide rio republicano da escola laica, gratuita (malgrado as pequenas taxas cobradas), eficiente, qualificadora. A dar razo aos "patres", a instruo era essencial sad e do regime representativo (Prudente) e tinha a fora regeneradora de que carecia a nao (Amrica Brasiliense). Objeto de interesse e de negociao da parte da classe dominante, a instruo pblica consolidou a estrutura de poder montada pelos "histricos", em So Paulo.'

    Ousaramos dizer que a fora do PRP devia-se tanto ao prestgio da oligarquia cafeera quanto expanso das foras produtivas, sociedade engajada na metropolizao da cidade de So Paulo, inleriorizao da economia, ao desenvolvimento industrial e escolarizao de que vieram a servir-se os antigos segmentos sociais e os novos, arrivistas, constitudos pelos imgrantes e os seus descendentes de primeira gerao.

    4. IDEOLOGIA E CONSCINCIA

    O interior no foi passivo s transformaes operadas no final do sculo XIX, O movimento republicano, vitorioso em 1889, precipitou uma nova manifestao de conscincia poltica, junto aos segmentos emergentes de classe mdia. antiga populao de origem urbana, procedente da monarquia, comearam a somar-se representantes das correntes imigracionais, de vivncia urbana ou camponesa, sirios, libaneses, judeus, espanhis, portugueses e italianos. Piracicaba, aos

    :> Elza Nadai: ~O Projeto do EnSIno Superor,~ Cap, I da tese Ideologia do Progresso e Ensino Superior (So Paulo 1891 - 1934). P. 15 - 61

  • 7 Instituto Histrico e Geogrfico de Piracicaba

    poucos, foi perdendo aquele visual de cidade colonial, espremida entre as ruas Piracicaba (voluntrios) e dos Ourives (Rangel Pestana), contida entre o ribeiro do Itapeva (hoje, Av. Armando Salles de Oliveira) e a rua do Porto, asfixiada pelas propriedades rurais, que lhe tolhiam a uroa n iza o.

    O iderio republicano continha o filtro das idias liberais da Revoluo Francesa, enriquecido pelas contribuies do Positivismo de Augusto Comte, do evolucionismo de Spencer e pelo modelo de federalismo, exitoso nos Estados Unidos. Eram idias assimiladas pelos prceres republicanos em compasso s transformaes materiais do pas, via Maonaria, Imprensa e propaganda, consensualizadas nas importantes cidades do Oeste Paulista e do Vale Mdio do Tiet, Jundiai, Campinas, Itu, Tiet, Botucatu, Piracicaba, alimentadas pelas suas lideranas polticas regionais e locais. Escolaridade e voto tornaram-se questes inseparveis. A primeira era garantia da segunda. Ambas, justapostas, convertiam-se em "artificios" de sustentao da poderosa classe proprietria cafezista que assumira o controle poltico de So Paulo.

    Desde os primeiros momentos de vida republicana, marcados pelas relaes conflituosas entre o poder militar e o civil, sobressairam-se duas lideranas do antigo Oeste Paulista: os irmos Moraes Barros e Campos Salles, ou seja, Piracicaba e Campinas, cidades sedes de republicanos histricos e criticos da Monarquia. Promulgada a Constituio liberal de 1891, despontou Prudente Jos de Moraes Barros como figura nacional e futuro Presidente, a simbolizar a grande ruptura com o passado colonial e monrquico, a acenar para os novos tempos de rpidas e sucessivas transformaes. Piracicaba haveria de colher dividendos.

    Em Piracicaba, a instruo vinha do Imprio, em nvel de Primeiras Letras e Humanidades, ministradas em aulas particulares ou pequenos colgios de durao efmera, como o de Tristo Mariano, de Jlio Huffenbaecher ou da famlia Wolf, sempre lutando para sobreviver. As famlias poderosas tinham por hbito enviar os seus jovens para os importantes colgios de So Paulo, mais particularmente, para a cidade de Itu, o grande centro poltico, religioso e educacional da Provincia. Ali funcionavam dois grandiosos educandrios, o Colgio de Nossa Senhora do Patrocnio (das Irms de S. Jos de Chamberry) para meninas e moas, e o Colgio So Lus (Jesuta), para meninos e rapazes. Naquela capital histrica do Vale Mdio do Tiet, estudaram as elites paulistas, a mais fina flor da aristocracia do caf, sinhazinhas e nhonhs, futuros bares e baronesas na Monarquia, reis do caf e polticos na Repblica!

    Nas ltimas dcadas do sculo XIX, ainda no Imprio, Piracicaba ganhou dois importantes educandrios, o Colgio Plracicabano, de Miss Marlha Watls (1881), e o Colgio de Nossa Senhora da Assuno, das

  • 8 Marty Therezinha Germano Perecin

    Irms de So Jos. discpulas de Me. Theodora Voiron. a fundadora da matriz ituana (1893). Dois colgios confessionais. marcos histricos do movimento transformacional da sociedade piracicabana. ainda sobrecarregada pelas permanncias estruturais do passado, tresandando ao rano colonial. FaUava uma escola laica para as novas lideranas, imbuidas de liberalismo e positivismo. prprios do final do sculo XIX.

    Piracicaba experimentava as mais importantes transformaes no ltimo quartel do sculo XIX. Ao apito estridente da locomotiva sacolejante. procedente da Cla. Ituana de Estradas de Ferro. correspondiam o estalar das moendas dos engenhos, as cantigas de imigrantes no apanhar do caf, o bulcio urbano na Praa do Mercado e, j, os primeiros passos de operrios ressoando nas caladas. A partir de 1877, os memorialistas referiam-se com entusiasmo ao progresso piracicabano: - Um grande centro agropecurio, com destacada produo em cana-de-acar e caf, avultada escravaria e dotado de expressivo comrcio. Em 1886, a populao urbana constituia-se de 7.000 habitantes (homens livres), ocupando 1.600 moradias no permetro urbano. Uma projeo descompromissada poderia situar cerca de 25.000 habitantes em todo o municipio. Observamos que a populao escrava decaira bastante em termos numricos: de 5.339 escravos matriculados, em 1877, para 3.694 em 1886.'

    5. OS PASSOS DA EDUCAO PBLICA DE 2 GRAU

    Em 1893, rua do Rosrio, inaugurou-se o colgio da Sociedade Propagadora da Instruo de Piracicaba. Tratava-se de uma experincia nova, fruto da iniciativa particular de um grupo de conhecidas famlias liberais (incluindo-se ex-monarquistas e republicanas), que se quotizaram, formando uma sociedade de capital por aes, dentro do objetivo de constituir uma escola laica de Primeiras Letras e Humanidades, o Colgio Ipiranga. No era a primeira vez que, em Piracicaba, se transferia capital de origem fundiria para o setor da educao. Joo Manoel de Moraes Sampaio, grande proprietrio rural, tido como o maior acionista, foi aclamado Presidente da nova sociedade.'

    As primeiras Atas de Sesses desta Sociedade referem-se construo do edificio, instalao da luz eltrica, inaugurao e benzimento do prdio (15/0811893). Observamos, com bastante curiosidade, os intimas relacionamentos de amizade e graus de parentesco entre esses acionistas,

    S Manoel de Moraes Barros: "Piracicaba-estado presente~. in A!manak de Piraccaba para o ano de 1900, p. 127 - 131. Joo BapHsla da Rocha Conceio: Relatrio do Presidente da Cmara (1883 ~ 16(6). Leandro Guerrin: Histria de Piracicaba em Quadrinhos, p. 131 'l Atas da SOCIedade Propagadora da Instruo: ano de 1893 '

  • 9 Instnuto Histrico e Geogrfico de Piracicaba

    bem como a insuspeita vinculao de muitos deles com a Loja Manica de Piracicaba, fundada, em 1875, sob a liderana do Dr. Prudente Jos de Moraes Barros. Pareciam triunfar as novas idias no campo da Educao e Piracicaba experimentava verdadeira febre de escolas. Lembramos que um ano antes, Luiz Vicente de Souza Queiroz, desistira de levar adiante, sob a sua particular iniciativa, num grandioso projeto que transferira para o estado, a sua sonhada Escola de Agricultura. Esta somente se tornaria realidade em 1901, sob iniciativa oficial do governo paulista.

    Em cinco de fevereiro de 1897, aps quatro anos de atividade, foi encerrado o projeto da Sociedade Pro pagadora da Instruo de Piracicaba, procedendo-se a sua liquidao e venda do imvel, com terreno anexo, Cmara Municipal, pelo valor de 34 contos e quinhentos mil ris. Ao todo, vinte e trs quinhes, valendo cada um deles, cerca de hum conto e quinhentos mil ris.' Extinta a sociedade, a escola particular (Colgio Rosa), que ali veio a funcionar, sob a direo do pro!. Augusto Salgado, tambm encerrou atividades. Por aquisio da Cmara Municipal, passaram o imvel e benfeitorias condio de bens pblicos. Mediante acordo com a Instruo Pblica de So Paulo e posterior concesso, o acervo era destinado instalao de uma Escola Complementar, a primeira a ser instalada no interior do Estado de So Paulo.

    Sim, havia febre de escolas mas, as coisas pareciam haver se precipitado, Era antiga a aspirao de se implantar, em Piracicaba, o ensino pblico laico, em nvel de segundo grau. Naquele momento, sonhava-se com a instalao de um Ginsio, por conta do Estado, pois este era o curso testado com xito nas unidades superiores. Mas, era dificil sensibilizar os poderes pblicos!

    Piracicaba possua dois brilhantes colgios confessionais, um protestante e outro catlico. A escola laica, de efmera durao, proporcionada pela Sociedade Propagadora de Instruo, tambm proporcionara boa qualidade de ensino. As famlias de posse, j, no precisaram encaminhar os seus filhos aos outros centros culturais. Porm, a realidade no escondia que o ensino pago, apesar da boa qualidade, era altamente elitista. A classe poltica impunha-se a constatao de que os segmentos emergentes de classe mdia permaneciam margem da escolaridade. Enquanto se perdiam no anonimato das profisses artesanais os seus melhores talentos, esperdiava-se o poder de barganha dos votos, indispensveis ao fortalecimento da oligarquia perrepista.

    Algo precisava ser construdo na rea da educao, era consenso na classe poltica de Piracicaba. _ No adiantava criar escolas superiores!

    a Atas da Sociedade Propagadora da Instruo em dala de 05/0tl1897

  • 10 Therezinha Germano Perecin

    - repetiam, na capital, os congressistas que condenavam o pas de burocratas e doutores bacharis em que o Brasil se convertera, durante o Imprio. Reclamavam por investimentos prioritrios na infra-estrutura do ensino, ou seja, as escolas elementares, consentindo, gradativamente, no segundo grau, preferencialmente, para a complementao do prprio magistrio, postergando-se as faculdades.

    Esta opinio teve de ser acatada pela Cmara Municipal de Piracicaba que tambm expressava, naquele final de sculo, o pensamento liberal e positivista da cidade mas, tinha o projeto do segundo grau ginasial, propedutico s escolas superiores.' Veremos que, entre desencontros e acertos, organizou-se a rede escolar pblica de Piracicaba, convertida em campo de experimentao na Educao brasileira. Outra escola tcnica, profissionalizante, de segundo grau, a Escola Prtica de Agricultura foi projeto implantado, em 1901, na Fazenda So Joo da Montanha. O aspirado curso ginasial somente viria a ser criado em Piracicaba, anos mais tarde, em 1933; naquele momento vingou a idia do Curso Complementar.

    6. A EDUCAO EQUACIONADA POLITICAMENTE

    Na ltima dcada do sculo XIX, era aspirao dos professores piracicabanos de primeiras letras, unir as suas aulas num nico grupo escolar, a exemplo do que j se fazia na capital. Bastava que a Cmara doasse o terreno apropliado para nele vir a ser construido, s expensas do Estado, o primeiro Grupo Escolar da cidade. Outros interessados perceberam que, futuramente, poderia ser-lhe acoplada outra novidade, a chamada Escola Complementar que o Govemo paulista introduzia em seu projeto de escola pblica.

    O Senador Manoel de Moraes Barros liderou o movimento nas esferas polticas de So Paulo e a reivindicao atingiu os seus objetivos. Em meados de 1895, era lanada a pedra fundamental do futuro Grupo Escolar (hoje, Baro do Rio Branco), o mais antigo da cidade. A sua instalal!o deu-se em 13 de maio de 1897 quando, j, se achava nos primeiros dias de atividade a Escola complementar de Piracicaba (instalada pouco antes, em 21 de abril). Ambas as escolas foram conquistadas polticas locais, sendo Prudente Jos de Moraes Barros, Presidente do Brasil, seu irmo, Manoel de Moraes Barros, Senador da Repblica e Paulo de Moraes Barros (filho deste), a personalidade mais influente na Cmara Municipal.

    I Defendia*o Paulo Moraes Barros, Presidente da Cmara Municipal, em 1892. e vereador no binio 1896 - 1898

  • Instituto Histrico e Geogrfico de Piracicaba 11

    indispensvel lembrar que a Escola Politcnica, funcionando em So Paulo, desde 1894, oferecia os apreciados cursos de Engenharia Civil, Industrial, Agricola e Artes Mecnicas, atraindo, com justificadas razes, a juventude paulista, motivada pela metropolizaio da capital. Luiz de Queiroz, por sua vez, enfrentara tamanhas dificuldades, em realizar o seu acalentado projeto de uma Escola de Agricultura, que o entregara, em 1892, ao Estado. Este manteve, em Piracicaba, entre 1893 e 1896, o engenheiro agrnomo Leo Affonso Morimont, que, valentemente, tentou implantar a Escola Prtica Agrcola de segundo grau.

    Naquele final de sculo, a educao pblica se achava em fase experimental e as dificuldades de implantao eram inauditas, no tanto por escassez de verbas mas, particularmente, pela falta de profissionais, de know how, e mudanas ocorridas no direcionamento dos interesses prioritrios do estado, Sob Bernardino de Campos (1892 - 1896), tivemos saneamento e educao, Sob Manoel Ferraz de Campos Salles (18961898), imigrao e defesa do caf.

    O grande passo para a instalaio da educao pblica de segundo grau em Piracicaba fora dado no momento em que se efetuou a compra dos imveis da Sociedade Propagadora de Instruo, mediante capitais levantados pela Cmara Municipal com apoio poltico e financeiro do Senador Manoel de Barros, doador de cinco contos de ris. Lei Municipal aprovada em 06/02/1896, autorizava a intendncia a efetuar o negcio. Em maro do ano seguinte, a Cmara oficiava ao governo do Estado oferecendo-lhe o imvel adquilido para nele instalar-se o Ginsio pblico. 'o Naquele mesmo ms, a Secretaria dos Negcios do Interior aceitava a oferta mas, esclarecia ser impossivel a implantao de um Ginsio, propondo que se instalasse, de imediato, a Escola Cornplementar, criada em dezembro de 1896."

    J, em 01/04/1896, achando-se em fase adiantada de construio o primeiro Grupo Escolar de Piracicaba, o Presidente do Estado. Dr. Bemardino de Campos, estivera, pessoalmente, na cidade para efeito de assistir, juntamente, corn as mais expressivas autoridades do Partido, ao lanamento da pedra fundamental do edifcio, onde seria instalada a Escola Prtica de Agricultura. Corriam simultneas as diversas iniciativas educacionais, Deconido um ano, AGazeta de Piracicaba punha em destaque a concomitncia das obras referentes ao Primeiro Grupo Escolar, elogiado por ser o edifcio mais belo da cidade (o estilo neogtico de Victor Dubugras), continuidade dos empreendirnentos na Fazenda So Joo da Montanha e iminente instalaio da Escola Complementar de Piracicaba.'2

    10 CorrespondnCia da Cmara Municipal de 02103/1897 11 Gazeta de Piracicaba, edio de 25103/1897 12 Decreto Estadual de 30/0311897

  • 12 Therezinha Germano Perecin

    Com efeito: instalao do novo curso se efetivou em 21 de abril de 1997. Na galeria dos quadros de formatura de professores da Escola Sud Mennucci, existem fotografias daquele edifcio escolar da rua do Rosrio. revelando a arquitetura slida, em dois pavimentos, a fachada discreta e bela. No segundo andar, destacavam-se sete janelas com detalhes de um clssico despretencioso, mas imponente. O edificio era belo e funcional para a poca, dotado de amplos jardins murados e espaos livres. Foi a primeira sede do curso de Magistrio, em Piracicaba, a Escola Complementar, posteriormente, convertida em Escola Normal Primria (1911) e, em Escola Normal Secundria (1920). O querido historiador paulista, Tito Livio Ferreira, que foi, em sua juventude, complementarista em Piracicaba, referia-se quela casa com emoo e saudade.

    7. A ESCOLA COMPLEMENTAR DE PIRACICABA

    Na ltima dcada do sculo XIX, Piracicaba firmara-se entre as cinco mais progressistas cidades do Estado de So Paulo. Asua populao urbana dobrara e a classe poltica sentia haver chegado a hora de passar da teoria para a prtica, o antigo ide rio republicano de Instruo. A construo de um "Inteligentzia" paulista era questo de ruptura com o passado e equilbrio com presente, dado o furor das transformaes operadas com a revoluo dos transportes ferrovirios, com o incio da industrializao e da metropolizao da sua capital. Criar escolas era questo de sobrevivncia!"

    A Gazeta de Piracicaba, rgo do PRP local, informava, no inicio de fevereiro, que a Escola Complementar j possua professores nomeados para dirigirem as duas seces do curso organizado, a masculina e a feminina. Eram respectivamente, o prof. Antnio Alves Aranha e a sua esposa, praf" Dona Escolstica do Couto Aranha." Alguns dias, posteriormente, o mesmo peridico avisava que o praf. Aranha se encontrava instalado na cidade, prevendo-se grande afluncia de alunos." Naquela poca, o edifcio se achava em obras, recebendo a indispensvel adequao e o novo mobilrio. Em 03/04, anunciava-se o encerramento das matrculas e o incio das aulas, havendo mais de trinta alunos. A escola pblica preparava-se, no interor, para a arrancada que haveria de culminar no desenvolvimento da poderosa elite pensante, qual, Monteiro Lobato, nos meios intelectuais de So Paulo, chamaria de "o perigo piracicabano".

    Em 21 de abril, ao meio dia, hora em que os liberais comemoram o suplcio do Tiradentes, ocorreu a cerimnia de instalao da primeira

    I) Jos Enio Casalechi: O Partido Republicano PauHsta, p. 30-31 1J Gazeta de Piracicaba, edlo de 11/0211897 15 Gazeta de Piracicaba. edio de 1510211897

  • /3 Instituto Histrico e Geogrfico de Piracicaba

    Escola Pblica de Piracicaba. A declarao oficial partiu do Presidente da Cmara Municipal, Dr. Paulo de Moraes Barros, diante dos' alunos, convidados e autoridades locais: Joaquim Andr Sampaio, Intendente Municipal, Benedicto Cndido Corte Brilho, Inspetor Literrio do Distrito, Antnio Alves Aranha, Diretor da Escola Complementar, Antnio de Mello Cotrim, Diretor do Primeiro Grupo Escolar. Da leitura da Ata de instalao conservamos a palavra do Diretor, Prof. Aranha, "augurando o futuro promissor da Escola e concitando a todos para o cumprimento do dever pelo engrandecimento moral e intelectual da Ptria". O orador oficial do evento, Dr. Antonio Pinto de Almeida Ferraz, cuja alocuo se afirma, em Ata, haver sido brilhante, "saudava a Instruo e a Liberdade"."

    Nascida sob o signo da Liberdade, a Escola Complementar de Piracicaba, iniciava as suas atividades pedaggicas no dia seguinte. O curso tinha a durao de quatro anos e oferecia o mesmo currculo da sua congnere na capital. Na rea de Linguas: Portugus e Francs. Na rea de Cincias Exatas e Biolgicas: Matemtica Elementar, Mecnica, Astronomia, Quimica, Histria Natural. Na rea das Cincias Humanas: Geografia, Histria do Brasil e Geral. Nas reas de Atividades: Desenho, Msica, Trabalhos Manuais, Ginstica e Exerccios Militares.

    Conseguimos levantar o corpo docente das trs primeiras sries. Plimeiro ano: Prof" Augusta dos Santos e Prof Joo Baptista Nogueira. Segundo Ano: Prol"- Teresa Canto Rodrigues e Prof. Joo Loreno Rodligues. Terceiro Ano: Profa Escolstica do Couto Aranha e Prof. Antnio Alves Aranha. 11 Como se nota, prevalecia a diviso rigorosa dos sexos e cada docente lecionava todas as disciplinas do curso, durante o ano letivo. A diviso do alunado em duas seces, masculina e feminina, ir prevalecer por vrias dcadas, influindo na arquitetura das escolas, construidas com alas especficas e recreios com rigorosa separao interna.

    Em 1900, ltimo ano do sculo XIX, colava grau a primeira turma, composta pelos 15 educadores sados daquela matriz. No resisto tentao de repetir-lhes os abenoados nomes, porque os mesmos fazem parte da Histria da Educao do Brasil, e ainda, permanecem na memria de muitos piracicabanos: Joaquim Diniz, Jos Henrique Menezes, Joaquim da Silva Nunes, Cherubin Fernandes Sampaio, Jos Martins de Toledo, Dornitla Silveira de Menezes, Ana Joaquina Bueno, Avelna Ferreira. da Cunha, Carolina de Souza Costa, Olivia Bianco, Antnia de Azevedo, Anna Cndida Couto, Maria Isabel da Silva, Eugnia da Silva e Cndida Corra Borges."

    t(i Ata da instalao da Escola Complementar de Piracicaba, datada de 21/04/1897 11 Ibidem ta Relao de alunos graduadOS em 1900 pela Escola Complementar de Piracicaba

  • 14 Marly Therezinha Germano Perecin

    A to aspirada complementariedade dos graus de ensino pbliCO, em Piracicaba, somente se efetivaria, em 1925, com a elevao da "Luiz de Queiroz" condio de Escola Superior.

    10. ATENEU PAULISTA

    Piracicaba atrvessou o sculo XIX convulsionada pelas aberturas de ruas e construo.da rede de esgotos, dentro do plano de saneamento do Dr. Paulo de Moraes Barros, aplicado pela Cmara Municipal. Rondavam ameaadoras, apavorantes epidemias: peste bubnica, febre amarela. variola. Durante as duas primeiras dcadas do sculo XIX, a poltica desenvolvida pela Cmara Municipal manteve elogivel padro de zelo santrip e coerncia administrativa, responsveis pelo visual da cidade: limpa, arborizada, dotada de praas aconchegantes nas tardes de vero. Ao velho apelido de "Noiva da Colina", proveniente do sc. XIX, acrescentou, por mritos prprios, o de Prola dos Paulistas."

    Sempre crescendo, em populao e progresso, o municipio ostentava, em 1911, cerca de 48 mil habitantes e classificava-se, orgulhosamente, como a segunda cidade paulista em nmero de escolas, quarenta unidades!. S perdia para a capital nas cifras da Educao, deixando para atrs outras importantes matrizes culturais: Santos, Campinas, Sorocaba.'" Foi quando assumiu, com eterna vaidade, o aposto que lhe foi mais caro e envaidecedor, aquele que vem sendo, continuamente, repetido, atravs dos tempos, - o de "Ateneu Paulista"!

    Roberto Capri, um intelectual italiano, autor de vrias obras de divulgao sobre os municpios do Estado de So Paulo, muito escrevera a respeito de Piracicaba. Mas, no "Libro D'Oro dello Stato di S. paolo" que profere estas prolas: - "Piracicaba puo inorgoglirsi di essere una delle citt paoliste, ave I' instruzione tenuta in altssimo conto: si pu considerare I' Ateneo paulista". Pronto: - a est! Comprova-se para quem o desejar! Nunca se disse "Atenas Paulista"."

    Qual seria o sentido atribuido por Roberto Capri quilo que qualificava a cidade, de forma to envaidecedora? Primeiro: Ateneu, em sentido lato, diz respeito Academia, estabelecimento de ensino superior para Arte, Cincia e Literatura, ou Escola monumental a expressar um momento de florescimento e grandeza. Segundo: tenmo de origem grega - Athnaion, templo de Atenas na GrCia antiga, tambm lugar pblico onde os literados liam as suas obras. Portanto, centro cultural. Akadema

    tQ Marly Therezjnha Germano perecin: A Sfn!ese Urbana, p_ 1617, 48 '" Ibidem. p. 17. 101 2\ Roberto Capri: Libra O'Oro deito Stato di S. Paolo. p. 576

    http:construo.da

  • Instituto Histrico e Geogrfico de Piracicaba 15

    termo de origem grega e designa a escola criada por Plato, em 387 AC. Terceiro: o elogio do autor pode expressar o seu prprio imaginrio porm, no deixa de refletir o processo transformacional experimentado por Piracicaba nas primeiras dcadas do sculo XX. A antiga boca de serto, no sculo XViii, havendo passado pela fase de fronteira agrcola, no sculo XIX, surpreendia com o seu florescimento cultural, fruto da expanso das escolas e da manifestao de sua jovem elite pensante, bem no estilo monumental.

    Pois bem, aquele Ateneu Paulista, beira rio plantado, ia de vento em popa. O ufanismo piracicaba no chegava s alturas, pelos xitos da Escola Prtica de Agricultura "Luiz de Queiroz", pela Escola Normal (exComplementar), pelos grupos escolares urbanos e pelo ensino rural, pelos colgios confessionais, o Piracicabano e o Nossa Senhora Assuno, pela Universidade Popular (grande biblioteca com circulO de conferncias), pelas sociedades beneficentes, pelo progresso generalizado no comrcio e na indstria. E, principalmente, pelo enorme prestgio poltico de Paulo de Moraes Barros, guindado, em 1912, ao cargo de Secretrio da Agricultura e Obras, durante o governo estadual do Cons. RodriguesAlves. Os canais polticos permaneciam abertos para grandes investimentos pblicos, na Escola de Agronomia e na nova sede da Escola Nomnal a ser inaugurada.

    O iderio republicano implicitava grandes realizaes materiais no campo da educao pblica no Estado de So Paulo: atestam as belas escolas histricas construdas durante as primeiras dcadas do sculo XX. Economia cafeeira, burguesia dominante, Partido Republicano Paulista e ideologia do progresso material so questes inseparveis na anlise da conjuntura que fez da Educao, em Piracicaba, uma funo da Politica. O PRP tinha na cidade grande peso, fato que provinha dos republicanos histricos, principalmente, dos irmos Moraes Barros (Presidente e Senador), e, na segunda dcada, do herdeiro poltico destes, Paulo de Moraes Barros. At 1926, quando este se transferiu para a oposio, o Partido Democrtico, que ajudOU a fundar, nada se fez sem a sua chancela, sem o seu aval no 8" distrito.22

    11. O PALCIO DA EDUCAO PARA O POVO

    Pouco antes de partir para a Europa, em abril de 1913, Paulo de Moraes Barros telegrafara ao Prefeito Fernando Febeliano da Costa, comunicando-lhe haver sido expedida a autorizao para iniciar as obras da futura nova sede da Escola Normal de Piracicaba. J contava com a

    22 Maria Ligia Coelho Prado: A Democracia Ilustrada p. 16-18 Nicalau Sevcenko: Orreu Exttlco na Metrpole, p. 127

    http:distrito.22

  • , 16 Marly Tlierezinha Germano Perecin

    planta de Bianchi e Castagnola, emitida pelo Departamento de Obras Pblicas, DOP, havendo sido designado responsvel pela edificao o engenheiro Eduardo Kiehl, figura que Piracicaba tanto respeitou.

    Em novembro de 1912,AltinoArantes, Secretrio do Interior, vinha Piracicaba, em importante diligncia, a fim de receber a doao, feita pela Cmara Municipal. do terreno situado no loteamento da antiga Chcara Laport, o qual era destinado construo da planta palaciana da Escola Nomnal. No ano seguinte, em 05/07, ao meio dia, festiva celimnia assinalava o lanamento da primeira p de concreto nas vastas fundaes, bem no ngulo direito do edifcio (esquina da So Joo com a XV de Novembro). :

    A Imprensa convocara o pblico a comparecer no antigo ground do Club Sportivo (Chcara Laport), para prestigiar as autoridades do Partdo. Bandas de msica, foguetrio, longos discursos pollticos e acaloradas palmas faziam parte do ritual perrepista no Estado de So Paulo, mormente, em Piracicaba. Assim, naquele momento, o Diretor da Escola Normal, Prof. Dr. Honorato Faustino, no se furtava a enaltecer a atuao dos chefes do PRP de Piracicaba, eminentes figuras "que no perdiam tempo em questinculas e s cuidavam do progresso da cidade".

    A cerimnia do lanamento da pedra fundamental do edifcio ficava marcada para o ms de agosto vindouro, no mesmo estilo perrepista. Era tudo assim. Na verdade, durante quatro anos, construiu-se um palcio, para atender demanda da crescente populao escolar e para cumprir um iderio, dentro dos padres comportamentais da classe dominante. Causavam espanto, na pequena classe mdia e na pobreza da cidade, o porte do edificio e a ostentao do art nouveau a decorar a acrpole do BairroAlto. O primoroso trabalho de carpintaria e os arremates dos espaos interiores em ecltica deixaram a ver que jamais havia sido empreendida na cidade obra de tamanho quilate, nem mesmo na Escola Agrcola! O clmax aconteceu quando entraram os artesos da pintura. comandados por um italiano da Real Academia de 8010gna. Luigi Lacchini.

    Era notrio, na poca, que por questes de "artimanhas polticas". haviam sido trocadas as plantas das escolas a serem construdas em Pirassunung e Piracicaba. Para aquela cidade, mo esperta, na ausncia de Paulo de Moraes Barros, encaminhou o mais esplndido palcio j construido no Estado de So Paulo. A Escola Normal de Pirassununga mais parece a sede de uma universidade europia. de pasmar. pela beleza arquitetnica e pela riqueza interior! Piracicaba, que possua populao maior, ficou com a planta menor, mais pobre ... Por compensao, recebeu o tesouro artstico que a singulariza dentre todas

    "Gazeta de Piracicaba, edies de 05/07/1913 e de 07/07/1913

  • InStituto Histrico e Geogrfico de Piracicaba 17'-'"

    as escolas histricas da Primeira Repblica, construdas, palacanamente, nas mais importantes cidades do Estado de So Paulo,

    A inaugurao da sede nova da Escola Normal de Piracicaba, rua So Joo, no Bairro Alto, deu-se em 11 de agosto de 1917, A Escola, contava vinte anos de atendimento clientela escolar, havendo diplomado dezesseis turmas de professores primrios. J deitava tradi.o pela qualidade do ensino e valor dos profissionais que lanava no magistrio pblico, O prprio diretor, Prol. Dr. Honorato Faustno, lavrou em manuscrito, a nota da inaugurao. Tratava-se de uma das mais expressivas solenidades da histria de Piracicaba, a qual comparecia a cpula do P.R. Paulista, atravs dos seus prceres da capital e do interior: Deputados, Senadores, Secretrios de Estado, o Presidente de So Paulo, Altino Arantes, o Diretor Geral da Instruo Pblica, Oscar Thompson, mais autoridades locais e os diretores das grandes escolas de Piracicaba, "Luiz de Queiroz", Colgio Piracicabano, Grupos Escolares "Baro do Rio Branco" e "Moraes Barros"."

    A Primeira Repblica entregava ao Povo de Piracicaba, em pleno fastgio do caf, o seu mais soberbo palcio. E o povo associava aquela alegoria deslumbrante, de pedra, cimento e tinta, s fantasias do passado, que lhe povoavam o imaginrio, onde reis, principes e duques recebiam por morada outros tantos palcios; ou, recuavam aos tempos, viva lembrana, em que a aristocracia local enviava os seus rebentos para estudar na Europa ou nos prestigiosos COlgios de Itu e So Paulo. Os governos republicanos de So Paulo entregavam aos diversos segmentos da classe mdia, que vivia sobriamente, palcios que se transformavam em templos de cultura pela nobreza da vocao. At a Revoluo de 30, a Educao ajudou, a consolidar a aliana entre aquela classe e a burguesia cafezista, a instruo se impunha como fator de ascenso social para uns e de iluminao para outros. A educao secundria de massas ser fenmeno da segunda metade do sculo XX.

    12. A ESCOLA NORMAL DE PIRACICABA

    Vimos que, durante as primeiras dcadas do sculo XX, a Educao em So Paulo estava associada hegemonia de um partido que expressava, politicamente, a burguesia cafeeira, ideologia do progresso material e ao fenmeno do crescimento demogrfico, mantedor da expanso dos diversos segmentos da classe mdia. Em Piracicaba, construira-se um artstico palcio no valor montante de 527: 416$235, falo extraordinrio para a poca, principalmente, por considerar-se que

    U Ata de Inaugurao da nova sede, manuscrita pelo seu Diretor. Honorato Faustino, em 1110811927

    http:tradi.o

  • 18 Marly Therezinha Germano Perecin

    se tratava apenas de uma Escola Normal Primria. Apenas em 1920, a reforma Sampaio Dria criava as Escolas Normais de tipo nico e o Estado passava a estimular a carreira do magistrio, facilitando a proliferao das Escolas Normais, pblicas e particulares, equiparando as escolas Livres e Municipais s oficiais. Em 1928, Piracicaba ganhou mais uma unidade de ensino para o magistrio primrio, a Escola Normal Livre do Colgio Nossa Senhora Assuno.

    A Primeira Repblica ensejou oportunidades, atravs dos seus polticos, para que Piracicaba, se consolidasse como um centro cultural e fizesse das suas escolas importantssimo fator de transformao social. A Cmara Municipal, onde pontificavam as lideranas perrepistas, particularmente, Fernando Febelano da Costa, o eterno Prefeito da cidade, teve grande parte de responsabilidade. O Dr. Samuel de Castro Neves, que foi deputado estadual, atuou positivamente, na criao de vrias escolas primrias, urbanas e rurais.

    Porm. a figura mais expressiva era de Paulo de Moraes Barros, cacique eleitoral do 8 Distrito, herdeiro do prestgio da famlia, que tinha acesso cpula do Partido e fazia pender vantagens Piracicaba, particularmente na rea da Educao. Como Secretrio da Agricultura e Obras, teve atuao decidida na Escola Luiz de Queiroz, ampliando os seus laboratrios, equipando os seus gabinetes e construindo novos espaos. Como presente imorredouro a sua terra natal deixou o Palcio da Educao para o Povo, a Escola Normal, em sua nova sede.

    Pouco antes da inaugurao, ainda, sob o governo de Rodrigues Alves, deve haver cado em desgraa perante as vestais do Partido. Provamno o retardamento da inaugurao, transferida para o governo recm empossado de Altino Arantes. A justaposio das placas de inaugurao, no Saguo de entrada, para encobrir os mritos do govemo do Cons. RodriguesAlves e do seu Secretrio da Agricultura e Obras, s foi descoberta por ocasio das obras de restaurao da Escola, em 1985. A pequena placa de bronze, afixada no Salo de Msica, em sinal de reparao, homenageia e reconhece a iniciativa de Paulo de Moraes Barros.

    Voltemos inaugurao da nova sede da Escola Normal, em 11 de agosto de 1917. O Diretor Honorato Faustino determinara o levantamento fotogrfico dos momentos da edificao, da armao do colossal madeiramento, das principais dependncias, dos detalhes artsticos, dos ambientes de grande efeito. Raras so as fotografias com grupos humanos; mesmo assim, revestem-se de grande importncia, pois apresentam figuras da poca, professores, alunos, poHticos e operrios.

    Chama a ateno uma fotografia de grande beleza plstica, tirada no Salo Nobre, em plena fase de inaugurao da sede, apresentando, junto aos clebres painis de Lacchini, o corpo docente da Escola: o Diretor,

  • 19 Instituto Histrico e Geogrfico de Piracicaba

    Prof. Dr. Honorato Faustino; o Auxiliar de Diretor, Prof. Manasss Ephraim Pereira; o Secretrio, Fernando Paes de Almeida; o corpo docente integrado pelos Professores: Joaquim da Silveira Santos (Portugus), Pedro de Mello (Francs), Jos de Assis Veloso (Matemtica), Joo Baptista Nogueira (Histria e Geografia), Carlos Martins Sodero (Fisica, Quimica e Histria Natural), Justlno Marcondes Rangel (Pedagogia), Fabiano Losano (Msica), Joaquim Bueno de Mattos (Desenho), David Muller e Henrique Seoane (Ginstica), Maria Leopoldina Mendes (Trabalhos Manuais).

    Transcorrido um sculo, constatamos com orgulho que daquele educandrio paulista, em Piracicaba, saram grandes mestres do magistrio secundrio e superior, milhares de soldados annimos da grandeza da Ptria nas escolas primrias, nomes brilhantes das Cincias, da Literatura e das Artes. Poucas, ombreiam com esta Escola no inventrio de servios prestados Educao! Em 1945, a Escola Normal de Piracicaba recebeu o nome de um dos seus mais ilustres alunos, Sud Mennucci, educador e jornalista."

    13. A ESCOLA - PINACOTECA

    o nosso grande receio que, um dia, neste pais, fartamente, dotado de ignorantes bem Intencionados, a Escola "Sud Mennucci", venha a ser convertida em museu ou sede de um daqueles departamentos burocrticos, tipo "cabides de emprego". No permitam os ex-alunos e os piraccabanos que tal calamidade sobrevenha. Bastam aquelas que a Escola, j, suportou, sem sucumbir, ao longo do seu trabalho, secularmente, dedicado causa da Educao. Nosso receio no infundado, que os ex-alunos estejam vigilantes! A razo? Onde, neste pais, numa escola pblica, poder ser encontrada a riqueza decorativa, a beleza plstica, o tesouro em telas a leo e afrescos (alegricos e polticos), que aquela Escola restaurada guarda, conserva, ostenta, oferece?

    Ningum escapa ao Impacto da sua grandeza interior, nem ao sortilgio da sua beleza plstica, a cliana, ou o desconhecido, que venham pela rua S. Joo, a meio do calor e da luminosidade do sol piraccabano. Todo aquele que ascendeu as escadarias daquela acrpole, ao adentrar, queda-se, perplexo, no Saguo. Mgica penumbra, ali, esconde formas e imagens, que dilatao das pupilas, se apresentam, paulatinamente, ao espectador desavisado, insinuando-se em seu imaginrio e despertando misteriosas interrogaes remanescentes de um passado, onde, at as paredes falavam. - Qual o desvendamento do mistrio?

    Z~ Decreto~Lej nU 14.575 de 01lQ311945.

  • 20 Marty Therezinha Germano Perecin

    _ Faa-se a luz! Ilumine-se a mente interior, afastem-se as trevas da ignorncia e da presuno! - Esta a chave do cdigo ao desavisado forasleiroque penetra o limiar, a ante-sala do Ateneu Paulista (Piracicaba).

    Atmosfera inusitada avisa estar adentrando o Templo do Saber, sob um teto pesado de madeira, geometricamente, trabalhado, paredes profusamente, decoradas com elementos marmreos, barrocos e neoclssicos, tonalidade sombria, algo assustador. direita e esquerda, os painis de Luigi Lacchinj que, ali, pintou, como mestre italiano, alegorias para um Liceu. Figuras clssicas, greco-romanas, e estilizaes perfeitas reforam e homenageiam s Artes: Pintura, Escultura e Msica (painel da direita), e ao saber em geral, as Cincias Fsicas, Naturais e Humanas (painel da esquerda).

    Os elementos decorativos dos corredores e das salas de aula compem-se de coloridas barras festonadas ou geomtricas, afixadas no alto das paredes. Do meio corpo para o rodap, h pintura marmrea, distribuda em todo o conjunto. Quanto a este detalhe, convm lembrar que a restaurao se acha inacabada. Apenas se colheu amostra, no corredor direita do Salo de Msica, mais nada. Por incompreenso dos responsveis, na poca, deu-se novo "banho de tinta', sob injustificadas razes, apesar dos nossos protestos. timo seria que alunos e ex-alunos se unissem para esta ltima arrancada na recuperao do patrimnio artstico da Escola Sud Mennucci.

    As obras de Lacchini se distribuem pelos halls de entrada, nas duas alas, nas escadarias, da direita e da esquerda, nestas, h belas alegorias ao trabalho didtico. O Salo de Msica, construdo em anfrteatro, inteiramente recoberto, a leo, numa profuso de marmreo, barras e espeCialidades que se completam com o teto geomtrico, em madeira. Embora um tanto pesado, ,jamais resvala para a desarmonia com os outros espaos nem peca por exagero ou mau gosto. Tem tudo, na medida certa.

    O ponto alto da obra de Lacchini se acha no Salo Nobre, inteiramente, recoberto, a leo, em tonalidade cpia com decoraes adequadas a sua funo. Sempre presente, em diversos recortes, o emblema da Escola Normal de Piracicaba. A importncia deste Salo devese srie dos trs painis histricos, que, em sucesso linear e cronolgica, representam os momentos-chaves do processo libertrio das etnias brasileiras.

    O primeiro, sintetiza na figura do grande estadista, Pe. Diogo Antnio Feij, que dedicou a vida ao alargamento do direito de voto, descentralizao do poder e s garantias do Ato Adicional (1834), as questes polticas que, no contexto da poca, se traduziam por ampliao das liberdades constitucionais da populao mestia e branca inferior, eufemisticamente, chamada de Terceiro Estado ou Povo. O segundo painel

  • 21 Instituto Histrico e Geogrfico de Piracicaba

    lembra a libertao dos negros. atravs do passo decisivo da Lei dos Nascitumos ou do Ventre Livre. obtida pelo Ministro Rio Branco (1871). O terceiro simboliza. atravs do Mal. Deodoro da Fonseca na clssica postura da Proclamao, a lei da Grande Naturalizao. concedida pela Repblica. recm instituida (1889). aos imigrantes. aqueles novssimos brasileiros que, ainda. no possuiam cidadania.

    A mensagem do Salo Nobre, decodificada pela Histria. se traduz na Luta do Povo Brasileiro pela sua Liberdade, durante o sculo XIX. No pode haver contedo mais nobre nem mais brasileiro numa escola. onde as paredes ensinam o que deve ser mais caro na histria das sociedades. Eis porque nica entre as chamadas escolas histricas da Primeira Repblica, jia da Educao Brasileira. Corao do Ateneu Paulista!

    As obras de arte no se limitam aos painis e afrescos de Luigi Lacchini. H numerosas telas de inestimvel valor, mobilirio. quadros de fonmatura e acervo fotogrfico. Um detalhe: entre os anos de 1964 e 1965. todas as paredes da Escola (com as obras de arte) foram cobertas por um banho criminoso de tinta cor de rosa. com o consentimento dos responsveis pelo patrimnio escolar paulista. Em 1985, levantou-se o clamor dos ex-alunos pela restaurao da sua amada Escola e pelo tombamento do CONDEPHAAT. A causa no poderia deixar de ser vitoriosa. Quem se der ao prazer de visitar a Escola centenria. rua So Joo, 1121. em Piracicaba, poder conhecer a mais bela jia do patrimnio artistico e cultural da Educao Paulista.

  • 22 Marly Therezinha Gennano Perecin

    FONTES PRIMRIAS

    ATAS: Alas da Sociedade Propagadora da Inslruo, ano de 1893 e 1897.

    Arquivo particular (Maria C. T. M. Torres, Piracicaba) Ala da Instalao da Escola Complemenlar de Piracicaba, ano de

    1897. Arquivo da Escola "Sud Mennucci" de Piracicaba. Ata da Inaugurao da nova sede da Escola Normal de Piracicaba,

    ano de 1927. Arquivo da Escola "Sud Mennucci" de Piracicaba.

    CORRESPONDNCIA: Correspondncia da Cmara Municipal de Piracicaba, ano de 1897.

    Arquivo da Cmara Municipal de Piracicaba.

    LISTAGEM DE ALUNOS: Primeira turma de formandos da Escola Complementar de

    Piracicaba. Arquivo da Escola "Sud Mennucci" de Piracicaba.

    RELATRIO: Relatrio do Prasidente da Cmara Municipal de Piracicaba para

    o perodo 1883-1886. Arquivo da Cmara Municipal de Piracicaba.

    PERiDICOS: Almanaque Almanak de Piracicaba para o ano de 1900

    JORNAL A Gazeta de Piracicaba. Edies de 25/03/1897; 11/0211897, 15/

    0211897; 05/07/1913; 07/07/1913

    REVISTA Centenrio do Ensino Normal em So Paulo 1846 - 1946. Polianlia

    Comemorativa. D.E.I de So Paulo, 1948

  • 23 Instituto Histrico e Geogrfico de Piracicaba

    FONTES SECUNDRIAS

    Capri, Roberto. Libro D'Oro dello Stato di S. Paolo. 2' Edizione riveduta e ampliata. J. de Salemo & Cia. Roma, si data.

    Casalecchi, Jos Enio. O Partido Republicano Paulista (1889 1(26). So Paulo, Brasliense, 1987.

    Guerrini, Leandro. Histria de Piracicaba em Quadrinhos, 2 V. Piracicaba, Instituto Histrico e Geogrfico de Piracicaba, 1970.

    Nadai, Elza. Ideologia do Progresso e do Ensino Superior em Silo Paulo (1891 - 1(34). Tese doutorado. Silo Paulo, USp, 1981.

    Perecin, Marly Therezinha Germano. A Sintese Urbana. Piracicaba, Instituto Histrico e Geogrfico de Piracicaba, 1989.

    Prado, Maria Lgia Coelho. A Democracia Ilustrada (O Partido democrtico de Silo Paulo, 1926 - 1(34). So Paulo, A/lca, 1986.

    Sevcenko, Nicolau. Or/eu Ex//ico na Metrpole. Silo Paulo, sociedade e cultura nos frementes anos 20. Silo Paulo, Companhia das Letras, 1992.

  • 24 frei Sermo Dorizotlo

    RECREIO DO CORUMBATA NO PICADO

    DE Lus PEDROSO DE BARROS

    Obs.: Este texto, colocado disposio dos leitores por insistncia do Sr. Haldumont Nobre Ferraz, honrado Presidente do Instituto Histrico e Geogrfico de Piracicaba, aparece fora de contexto, pois faz parte de uma pesquisa mais ampla, a ser publicada no momento oportuno.

    frei Sermo Dorizotlo.

    1- Piracicaba e a Estrada para Cuiab

    As estradas sempre representaram, desde a antiguidade, . desenvolvimento e conquista estratgica. Por elas h rpida comunicao, agiliza-se a exportao e importao de gneros diversos. Ao longo de seu percurso originam-se aglomerados humanos e por elas movimentase o exrcito. A expanso do Imprio Romano se deve s clebres legies de soldados. Nunca estavam paradas. Se no combatiam, construiam estradas. O Reino de Portugal teve seu desenvolvimento ligado descoberta das grandes rotas maritimas, como o caminho das Indias e o do Brasil. Infelizmente os nossos descobridores sempre se sentiram muito vontade no mar, pouco no cho firme, e bloquearam nosso desenvolvimento e expanso terrestres.

    Mrio Neme introduz sua ltima obra Apossamento do Solo e Evoluo da Propriedade Rural na Zona de Piracicaba, descrevendo sinteticamente as duas extensas vias de penetrao no sculo XVII, da ento Vila de So Paulo, heranas indigenas, em direo ao Norte, utilizada pelo Anhanguera em 1722 na procura de ouro em Gois, e Noroeste, Picado de Luis Pedroso de Barros, caminho por terra at as minas de ouro de Cuiab. Sobre esta via, rumo Noroeste, j se encontram aluses em 1606 e referncia expressa num papel oficial Ou seja na avaliao do inventrio de Bemardo Bicudo de 14 de agosto de 1650: [ ... ] uMais se botou neste inventlio meia legua de terras de maltas naninhos em Capibali (Capivaril) na estrada velha do serto que vae para o sertf10 dos Bilreiros'''. A estrada velha do serto dos Bilreiros, ou seja, dos indios caiaps, senhores absolutos de todo o interior da capitania de So Paulo '.

    !Inventrios e Testamentos, So Paulo: ARQUIVO 00 ESTADO, 1921 , v. 15, p. 176-177 e 181. 2 NEME, Mrio. Apossamento do Solo e Evoluo da Propriedade Rural na Zona de Piracicaba. So Paulo: Fundo de Pesquisas do Museu Paulista da USP, 1974. p. 7.

  • 25 Instituto Histrico e Geogrfico de Piracicaba

    Aos 21 de novembro de 1721, o governador da Capitania de So Paulo Rodrigo Cezar de Menezes lanou o seguinte bando, edital: "Por ser convte, Ao real servio de S, Magde, Q' Os, ge. e aos moradores desta capp,nia, abrirse o caminho p./o certo p.a as novas minas do Cuyab, p.a ficar mais facl a todos o hirem, e virem com cavalos, e cargas com mais comodidade de q. ' at agera expetimenlo pellos tios por onde se navega assim a resp.to da dilao como do risco, seccos e correntezas do d.o Rio, e tendo considerao a todas estas rezes pello grande dezejo, q' tenho de procurar adiantar todas as utilidades dos moradores desta capp.nia, q' ella seja a melhor, e mais abastecida, tenho procurado, q' algas pessoas della abro o caminho em direitura pello certo, de sorte q' fique a todos mais facil a sua conduo, e por q' nesta capp.nia h pessoas abastadas de escravos, e com prstimo, e intelligncia, p.a emprenderem, e conseguirem o fim desta delfigencia /oge: Ordeno e mando q' toda a pessoa q' quizer abrir o d.o cam.o, pode vir fal/arme, ou apresentarme petio em q' declare o quer abrir; e as conveniencias que se lhe ho de fazer, respelando o trabalho, e despeza q' h de de fazer o ajuste comaquella pessoa, q' se entender o far foge, e pedir os premios, e honras, q' forem iguaes ao servio q' hade fazer, e toda a pessoa q' quizer fazer este servio a S. Mg.de apresentar a sua petitlo na Secretr.a deste Governo at 24 do mez q' vem, p,a eu tomar sobre este particular o expediente q' for mais conveniente ao real servio e p,a q' chegue a noticia de todos mandey lanar este bando, q' se publicar na praa desta cid,e, e ruas p,aes della, e depois de reg,do na Secretr.a deste Governo se fixar no corpo da guarda, Dado nesta cid, e de So Paulo aos 23 de Novr.o de 1721. - O Secret.o do Govr.o Gervamo Leyte Rebel/o a fes. - Rodrigo Cezar de Menezes, - Tambm se mandou lanar na Villa de Santos, e nas de Outa e Sorocava" '.

    Como nenhum concorrente tivesse conseguido construir a estrada para as Minas de Ouro de Cuiab, o sertanista Lus Pedroso de Barros se ofereceu, com um grupo de implcados na tentativa de homicdio do Desembargador Sindicante Antonio da Cunha Souto Maior, pela qual seus nomes foram lanados no rol dos culpados, por proviso rgia de 17 de novembro de 1713, para a abertura da estrada para Cuiab, para obterem perdo do crime', O governador aceitou a oferta depois de consultar o vice-rei.

    Luis Pedroso era filho de Loureno Castanho Taques e D. Maria de Arajo. Casou-se com D. Agostnha Rodrigues, mas faleceu em 1730 sem deixar descendncia ' .

    .1 ARQUIVO DO E.STADO. CO 0406, Lvro de Provises 125, p. 6 ~ 61/; e Documentos Interessantes v. 12, p, 14 -15 . DOCUMENTOS INTERESSANTES. v. 49. p. 114-117.

    5 AZEVEDO MARQUES, Manuel E, de. Apontamentos da Provncia de So PaulO, So Paulo: L.

    Martins, 1/. 2, p. 85-87.

  • 26 frei Sermo Dorizotto

    AdolphoAugusto Pinto em sua obra Histria da Viao Pblica de S. Paulo, publicada em 1903, incorre em grave erro 6. Para o autor Luis Pedroso de Barros construira a estrada de So Paulo a Gois. Todos os documentos conservados falam da estrada para as Minas de Ouro de Cuiab. Gois no era de incio o objetivo principal, seria atingido por uma derivao construida pelos ituanos no serto, j antes de 1730, durante o govemo de Caldeira Pimentel.

    Conforme afirmao de Jorge Balestrini Filho, Lus Pedroso partiu para a empreitada aos 2 de agosto de 1723 e voltou em abril de 1724. Em julho de 1724, tendo o governador exigido melhorias no caminho retornou ao trabalho entregando-o pronto em 1725 ou 1726. Esse cronograma no completo, como se prova adiante 7.

    Porterterrninado rapidamente na segunda vez sua empreitada surgem divergncias entre os historiadores. Dr. Gentil de Assis Moura julgou polisso que luis Pedroso teria utilizado boa parte da estrada aberta por Bartolomeu Paes, na margem esquerda do rio liet, mas contestado por Mrio Neme '.

    A opinio unnime dos historiadores piracicaba nos insiste sobre a sada de lus Pedroso de lIu e chegada em Piracicaba pela estrada aberta, ou melhor, pela trilha indigena restaurada por Felipe Cardoso. E dai? Justamente neste ponto surgem as primeiras dificuldades, ou seja, no trajeto entre Piracicaba e os Campos de Araraquara. Jorge Balestrini Filho defende o caminho pelo Morro de Araraquara (Serra de So Pedro e do Itaquiri). Sem dvida, lus Pedroso na sua primeira tentativa, cursou esse rumo, conforme sua carta de 2 de maio de 1724:

    'Exmo SI'. A dous de agosto party da Vlla de Ilu seguindo o Caminho do rio

    Capivary, e dahy ao rio Pirassicava, e deste ao morro de Araraquara donde principio os Campos do d. o Araraquara.

    O mato que se en/erme/e da Villa de I/hu Araraquara sero sete ou oi/o dias. Atravessey os d. Os Campos ath as Cabesseiras de Jacarepepira p . . seram des dias. Desta paragem continuey a marcha rompendo pella ponta de mato de Jacarepepira na demanda e de/egencia de ver se podia descubrir mais campos; e a sy caminnhey sempre por serrados cortando algas pontas de maios virgens, porem tudo o mais ca/andivas aq . chamo Serrados ath dentro do rio grande.

    6 PINTO,Adolpho Augusto, Hfstna da Viao PlbliL:a de So Paula, So Paulo; Typographia

    e PapelarIa Vanordell &. ela, 1903, p,14.

    '7 BALESTR!NI FILHO, Jorge. O Caminho de Luis Pedro$O de Barros. Revista do I H G Sp,

    So Paulo.1969. v. 66.. p. 9397. S MOURA, Gentil de Assis,Q primeiro caminho para as minas de Cuyab. Revista do f,H.GS.Rv. 13, 1911, p. 182 e NEME, Mrio. A primitiva estrada para Cuiab. Revista do Arquivo Municipal de So Paulo, So Paulo, 1940, v, 69, p. 2Q5~206.

    http:f,H.GS.Rv

  • 27 Instituto Histrico e Geogrfico de Piracicaba

    A mayor parte dos Serrados, e as restingas dos matos virgens com pastos p." as bestas. Em quanto ser capazes p." introduzir por elles gadOS p.B o rio grande, tem a dificuldade dos Serrados. Tambem p." se poder abrir pronptam.te dificulta o mesmo mato, ou Serrados porq. ' todo se ade abrir com instrum.tos de Fousses, e machados, e necessita de fora de gente, e de sustento; tempo e rossas, aque fis com as muitas aguas no ouve tempo p." poder queimar, e a sy produzia pouco. Quando V. Exa. seja Servido q' se abra o Caminho por onde eu fiz a picada estou a obediencia de \I. Exa. Concedendome os oito Companlleiros, q.'a V. Exa. nomeey. p." tudo me tem \I. Exa. seos peso A pessoa de \I. Exa. guarde Deos Largos annos.

    Chacra 2 de Maio de 1724

    Aos ps de \I. Exa.

    Luiz Pedroso de Barros" '.

    A carta no convenceu o governador. De imediato, aos quatro de

    maio, D. ROdrgo Csar de Menezes pede explicaes depois de ter ouvido pessoalmente o sertanista:

    "Pella resposta q.' II.M. d ao q . . lhe pergunte, vejo q.' na derrota q . . segue emcontrou dificuldades, q . . lhe embaraaro o q . intentou, no sendo de menos supozio no haver capacidade, p.e se introduzirem gados at o Rio grande por lhe servir de estorvo os serrados q . . II.M. dis h por aquellas p.tes Tambem hua das objees, q . . a VM se offerece de poder abrirse o caminho com brevidade a funda no mesmo mato e serrados por ser precizo abrirse com os instrumentos de foces, e machados, dependendo lambem de fora de genle e de sustento.

    Porem p.lo q.' a II.M. ouo todos esses embaraos venser quando auto companheiros de \I. M. poSSElO ser atlendidos no seu requerim.lo, neste particular no faltava q . . dizer a \I. M. lembrandome do q . . lhe ouvi, antes de intentar a viagem; mas bastar q' VM. Me diga se por essa p.te poronde segura abrir caminho haver comodidade q . baste p o o sustento dos gados, e cavalgaduras, como tambm o tempo em q' poder ficar caps de poder andarse, e como todas estas circunslancias, h perciza saberemse, espero a resposta de II.M. p. a a vista della tomar a rezoluo, q'entender h mais conveniente ao servio de EI Rey meu S." e bem comum. No posso deixar de lembrar II.M. o q . me tem devido nos seus particulares, atlendendo ao servio q' \I. M. se offereceu fazer, pois p. a facilitar mais o caminho digo mais o perdo de seu crime, devia e deve no arastame de adiantar, e concluir a dita delligenc/a, p." q'melhor assente, no s6 perdo q . per/ende, mas as m.ces e honras, q . . EI Rey meu S.r costuma despenar com os q . . como leaes vassalos o sabem

    , ARQUIVO DO ESTADO. Oflcos da Cmara de Ilu. CO 0292.55.1.29.

    http:0292.55.1.29http:requerim.lohttp:pronptam.te

  • 28 fre Senno Dorizotto

    seNir. D.s g.de a \l.M. m.s annos. Si!Jo Paulo 4 de Mayo de 1724. - Rodrigo Cezar de Menezes" '0.

    O Governador escreve novamente a Lus Pedroso no dia cinco de maio. Pairavam srias dvidas sobre a viabilidade do caminho traado. Eram interrogaes lanadas pelo prprio irmo e companheiro de jornada de Lus Pedroso, o capito Loureno Castanho. Eis um trecho da missiva do govemador: "Hme perciza q' \l.Mce me diga por escrito o mesmo q' hontem me dica por palavra, porque como ouvi, que o Capp.m Loureno Castanho disera a varias pessoas, q' palia picada \l.M. fes, aberto por ella o Caminho podi!Jo hir alguns lotes de gado ainda q' piquenos, e como acompenhou a \l.M. o diria com algum fundam, to, e assim esta circunstancia como a dequerer conste porpapal, o q' \l.M. dis, me obriga a ordenanne o faa e h se tem, ou ni!Jo o d,o caminho algua capacidade p . poderhirgado, ainda q' sejo piquenos os lotes, e para eles poder haver pastos, e quando totalmente \!.M. entenda no h hua, e outra couza, me dir quando eu haja de entender ser assim conveniente, se esta prompto p. poder o hiracabar com os companheiros, q' pede aprefeicoandoo de sorte, q' posso como dice hir gente e cavalgaduras" ".

    Pela documentao existente possivel concluir que Lus Pedroso na primeira tentativa j tenha alcanado os campos deAraraquara e o rio Grande (Paran) mas o caminho, pelo trajeto escolhido, a serra, no era viveL

    Affonso de Taunay observa: "Luis Pedroso de Barros se oferecera a realizar tal obra. Estivera nove meses no serto e voltara mal satisfeito com os resultados"".

    O capito-general Rodrigo Csar o fez tornar ao trabalho, para que conseguisse possibilitar o trnsito de tropas, soldados, annas, munio e gente. Pelas matas do Morro de Araraquara, alm da falta de pastos para os animais, seria muito difcil o trnsito pelas ingremes encostas da serra. Escreve o governador: "Pella abertura do novo caminho q' fez o Sarg.to mor Lus Pedrozo pertendo fazer com q'se introduza gado, e cavalgaduras por elle nas ditas minas, e para se faci/litar mais a passagem e vencer hua grande parte da disMncia, me foi percizo elleger hum cabo dos milhares Certanistas, p. q'com hum Corpo de gente v assistir naquella paragem, q' for mais conveniente, e possa no s6 embaraar as hostilidades que o gentio Cayap6 costuma fazer, porser o mais brbaro, mas destruhillo, p.q' sem impedimento posso os viandantes cursar o caminho, com a introduo da gado, e socorro de gente, q' se faz mui necessario" ".

    "DOCUMENTOS INTERESSANTES. v, 20, p.l1',

    " DOCUMENTOS INTERESSANTES, v. 20, p, 112,

    !l TAUNAY, Affonso de E, Hlst6na das Bandeiras Paulistas. So Paulo: Melhoramentos,

    1951. tomo 2,p. 32,

    "DOCUMENTOS INTERESSANTES. v. 20, p. 211.

  • 29 Instituto Histrico e Geogrfico de Piracicaba

    Lus Pedroso voltou ao trabalho, depois de um perodo de dois meses de descanso, buscando uma altemativa para a regio serrana, a parte difcil, impossivel de trafegar ou seja de Piracicaba at os campos de Araraquara. Nesta ltima tentativa caminhou mais para o norte, orientado pelo rio Corumbata, subindo o espigo da margem direita, para no haver necessidade de construo de pontes. O Picado buscou o Porto de Recreio, caminhando entre as cabeceiras dos ribeires Limoeiro e Caiapi, conservando o caminho mais seco e transitvel na poca das chuvas. No Porto Recreio atravessou o Corumbalai, subindo pela margem esquerda e depois de cruz-lo novamente, margeou seu afluente Passa-Cinco e bandeou para os lados de Itaqueri, atravessando os hoje municipios de Ipena e ltirapina, contornando a parte mais ngreme da Serra de So Pedro e do Itaqueri, buscando Brotas e os ento j conhecidos saltos de Avanhandava e Itapura. Estavam resolvidos assim os dois maiores empecilhos, o cume da serra e a falta de capim para os animais das tropas, existente naturalmente junto aos rios e ribeires, pois no Morro de Araraquara (Serra de So Pedro e do Itaqueri) existiam os "serrados" e no os pastos. O sucesso da empreitada de Lus Pedroso era agora previsvel, tendo o prprio governador se convencido da necessidade de cooperar. Aos 17 de junho de 1724 escreve ao Alferes Jos A. Torres, tesoureiro dos novos direitos da capitania, ordenando entregar ao Alferes Manuel Antunes [ ...] "setenta e hum mil, e quinhentos e vinte r.s, que se despendero com doze Indios da Aldea de Baruery q' foro com Luiz Pedrozo de Barros a abrir o caminho pO as minas do Cuyaba". Os ndios saberiam com facilidade seguir a antiga trilha indgena e evitariam um possvel ataque de surpresa dos caiaps ",

    Escreve o governador aos 20 de novembro de 1724: "O caminho foi logo a el/e Luis Pedrozo e gastando nove mezes se recolheu a povoado, e encontrando bastantes diffculdades p.o a abertura del/e, sendo hua, e a mayor a falta de Campos, p. o pasto de gados, e cavalgaduras. Tomei a mandalo dentro de dous meses com fora de Companheiros poderozos, no havendo athequi noticia alga, " [ ...] ".

    Lus Pedroso mudou portanto o rumo do trajeto inicial do caminho conforme aparece confirmado pela carta-relatrio do govemador ao Rei de Portugal, quando o trabalho estava para ser concludo. em dezembro de 1724: [ .. .] "e porque depois se ofereceu Luiz Pedroso de Barros para o abrir pela parte mais conveniente, pedindo por prmio se lhe perdoasse o crime que lhe resultou de uma assuada que se fez ao Sindicante Antnio da Cunha Souto-maior, o que conseguiu da Relao do Estado,

    "DOCUMENTOS INTERESSANTES. v. 13, p. 2" "DOCUMENTOS INTERESSANTES. v. 20. p. 132133.

  • 30 frei Senno Dorizotto

    comutandoselhe a sentena que tinha tido pena pecuniria, e procurando logo a ir abrir o dito caminho, foi sem demora, e depois de andar nove meses na deligncia se recolheu a esta Cidade, dando conta do que havia feito, e porque no tinha comodidade para irem gadOS se resolveu a tomar; escolhendo diferente rumo em que se pudesse achar melhores passagens para cavalgaduras e gados, e assim por ele espero cada dia se recolha com o caminho feito por ter capacidade e prstimo para isso e fora dos parentes e amigos que o acompanham" ".

    D. Rodrigo Csar de Menezes, govemador-i)eral da Capitania concede a Luis Pedroso de Barros aos 23 de maro de 1725 "a merca do habito das tres hordens com tena de cincoenta mil reis cada anno pagos das Minas de Cuyab", por haver concluido o caminho s minas. O caminho estava terminado e seu trajeto aceno pelo governador ". Ele e seus oito companheiros recebem o perdo pela assuada contra o desembargador sindicante.

    Luis Pedroso, apesar de perdoado e condecorado, volta pela terceira vez ao serto, o que consta da carta do governador de 22 de abril de 1725:"0 Sarg.toMorLuis Pedrozo de Barros, q.' se achava encarregado da abertura do caminho sahiu com a pIcada, e agora torna aprefeoa/a de sorte q. ' fique capas de entrar gado, e cavalgaduras" ". Esse texto importante para a compreenso, o aperfeioamento da estrada s se d agora, depois da segunda e bem sucedida misso de abertura da mesma, no depois da primeira tentativa.

    Aos 27 de setembro de 1725 o rei confirma a concesso da sobredita merc a Luis Pedroso".

    A documentao, preservada neste perodo da histria em relao ao caminho de Cuiab, ajuda o pesquisador a reanalisar um ponto. Aos 10 de outubro de 1725 Rodrigo Csar de Menezes escreve: {. ..] "concorrendo juntamente p."ella a abertura do caminho por honde ho de hyr gados e cavalgaduras, o que est em termos de brevemente se lhe pr capas, {. ..] "Tambm fiz q . . na melhor paragem se puzesse caza de registo p." OS escravos e cargas q . .entrarem pagarem o q. 'se lhes impoz sem q . . haja descaminho algum q.' prejudique a Real Fazenda de V. Mag.e'~ Esse deve ter sido o posto fiscal de Piracicaba que os camaristas de So Paulo queriam abolir tendo sido severamente repreendidos. Se j existia fiscalizao organizada era porque a estrada estava aberta, para ser mais preciso, estava em uso e sendo melhorada, trabalho que vai at dezembro desse ano 20. Isso de fcil constatao. Em abril de 1725 Luis

    " DOCUMENTOS INTERESSANTES, v. 32, p. 82. "DOCUMENTOS INTERESSANTES. v. 20. p. 156 e v. 32, p, 118, !3 DOCUMENTOS INTERESSANTES. v. 20, p. 161. " DOCUMENTOS INTERESSANTES, v. 18, p. 176, "DOCUMENTOS INTERESSANTES, v, 32. p. 130.

  • 31 Instituto Histrico e Geogrfico de Piracicaba

    Pedroso em pessoa pede a ampliao de uma de suas sesmarias, mais Ptrs lguas de comprido e uma lgua de largo" junto a uma sesmaria j recebida. Com despacho de 22 de novembro de 1725, seu irmo Maximiano Ges de Siqueira pede, como procurador de Luis Pedroso de Barros, prorrogao de prazo para demarcar duas sesmarias, pois "Lus Pedroso se achava na ocupailo, { . .] na Aber/ura do caminho das novas Minas do Cuyab". No despacho final pode-se ler que tal pedido era contra a lei, mas o favor foi concedido aos dois irmos, portanto, a justificativa que Lus Pedroso se achava no serto, foi aceita".

    Aos 18 de janeiro de 1726 em carta D. Rodrigo manifesta inteno de utilizar o caminho: "Pella aber/ura do novo caminho q: fez o Sarg.to mor Luiz Pedroso per/endo fazer com q. se introduza gado e cavalgaduras pore/le nas ditas minas"{..]. Quem de fato comb%u gados e cavalgaduras para as minas foi o sobrinho de Lus Pedroso: f.. .] "sendo a primeira pessoa q . se anima a levalo o Mestre de Campo Manoel Dias, { ..] um dos melhores ser/anistas" ".

    Aos 8 de maio de 1726 o governador comunica ao Rei que o SargentoMor Luis Pedroso renuncia, por no ter filhos, a merc do Hbito de Cristo em favor de seu sobrinho, o Mestre de Campo Manuel Dias Barbosa ".

    Aos 10 de julhO de 1726 D. Rodrigo Csar de Menezes, capitogeneral da Capitania de So Paulo, escreve a seu preposto Sebastio Ferraz do Rgo, localizado em Cuiab, proibindo terminantemente a passagem pelo Picado de Luis Pedroso s minasde Cuiab, dando como desculpa o possivel contrabando de ouro. Segundo consta, nesta mesma data envia ao serto de Gois o Capito Bartolomeu Bueno da Silva com ordens "para abrir o caminho daquelas minas para as do Cuiab".

    Segundo Mrio Neme o objetivo era comercial e poltico, Ou seja, garantir para a Capitania, entenda-se povoaes e porto de Santos, todo o comrcio com as duas zonas de minerao, as minas de ouro de Gois e Cuiab, atravs duma nica estrada, o Caminho dos Batatais ". De Piracicaba, ainda em mera germinao, roubaram uma excelente oportunidade de tornar-se interposto. Luiz D' Alincourt, um sculo depois, ir observar em sua viagem, referindo-se a Santos: " esta Vila o interposto de todos os objetos de expor/ailo, e impor/allo da Provincia de Goyaz, e Mato-Grosso; ou conduzidos por terra, ou pelos rios" ", A proibio do

    21 ARQUIVO DO ESrADO. Requerimentos de Sesmarias.CO 323, 8.1. 68 e 80.1.71.

    "DOCUMENTOS INTERESSANTES. V. 32, p. 156.

    13 Idem, Ibidem, p. 158.

    1';: NEME, Mrio. Apossamento do Solo e Evoluo da Propn'edade Rural na Zona de

    Piracicaba,1974, p. 23,

    2$ D'AUNCOURT, Luiz. Memn'a sobre a Viagem do Porto de Santos cidade de Cuiab.

    So Paulo: Livraria Martins, 1976. p. 29.

    http:Sesmarias.CO

  • 32 frei Sermo Dorizotlo

    governo surtiu efeito, favorecendo o monoplio dos comerciantes portugueses das docas santistas. Piracicaba s nasceu por estar rodeada duma natureza privilegiada, o rio com seu salto, terras produtivas, tima posio geogrfica e desbravadores destemidos!

    O governo da metrpole tinha por princpio o favorecimento do litoral, pois julgava ser mais fcil a defesa do territrio por mar. Dispunha de hbeis marujos, com extraordinria experincia do comrcio martimo. Essa mentalidade perdurou no Brasil favorecendo as cidades e capitais, construidas beira-mar, e a centralizao do comrcio e poder, prejudicando o interior e o serto. J observara astutamente o historiador Frei Vicente de Salvador escrevendo que nosso pais s se desenvolveria quando deixasse de ser caranguejo. Esse crustceo pode sair do mar por alguns instantes, mas para ele retorna apressado, ao menor perigo. Se analisarmos as rodovias do estado de So Paulo, por exemplo, constatamos como todas conduzem capital, centro comercial e financeiro, e ao mar. No mero acaso. uma prova concreta da mentalidade transmitida por nossos antepassados lusitanos.

    Os portugueses chegaram ao cmulo de destruir obras preciosas e documentos indicativos das riquezas de sua colnia sulamericana, para mant-Ia distante dos olhares interesseiros de outras naes. At o momento, por exemplo, nenhum mapa da estrada de Lus Pedroso foi encontrado. Aps a proibio do uso desse caminho deve ter seguido uma destruio de papis cartogrficos, se existiram. Por outro lado tambm se sabe, os conhecimentos cartogrficos e geogrficos eram nessa fase, principalmente com respeito aos registros dos caminhos para as minas de ouro e pedras preciosas, transmitidos em segredo de sertanista para sertanista, pois envolviam lucros econmicos muito altos ".

    Nova proibio do uso de mais de um caminho, portanto o de Luis Pedroso, para as minas de Gois e Cuiab, aparece na Carta rgia de 10 de janeiro de 1730, para se evitar o contrabando do ouro. No haveria necessidade de proibio se a estrada no estivesse sendo usada! Aos 25 de abril de 1730 o governador de S. Paulo escreve ao rei denunciando os ituanos por terem aberto um caminho por terra para Gois e outro pelos rios. Na realidade os ituanos nunca desistiram do seu caminho e agoraj tinham conseguido um desvio para Gois, como atesta Bartolomeu Paes de Abreu em seu requerimento de 20 de julho de 1728: [ . .] "derrota mais conveniente para o caminho das minas do Cuiab, h a mesma dos Guais devidindo-se em certa altura a entrada para os Guais, fazendo derrota mais direita a buscar o Cuiab, e os Guais, a mo direita. Todas

    26 COSTA, Antnio Gilberto (Org.) Cartografia da Conquista do Territrio das Minas. Belo Horizonte: U F M G Editora, 2004. p. 50.

  • ______'_ln_'_st=itu~t:.:O_'_H_'_i_'_st:.;..lcO e Geogrfico de Piracicaba JJ

    as pessoas antigas, e peritas nas campenhas destes sertes assentam ser assim o melhor;" [ ... ] ". O mesmo certanista retoma a proposta de (re)abrir o caminho e a reapresenta ao governo aos 8 de abril de 1734. Ele queria a oficializao da estrada e com isso o direito de cobrar pedgio sobre as pessoas, escravos, animais de carga, gado e auferir uma bela porcentagem do ouro trazido das minas ".

    O novo caminho dos ituanos pelos rios, referido acima pelo governador, consistia em despachar por terra as bestas carregadas e descer, muitas vezes com as prprias famlias pelo Tiet, saltando para a margem direita do rio antes de Avanhandava ou Itapura, evitando assim os perigosos saltos, em espeCial o redemoinho de Itapura, onde centenas de pessoas perderam a vida, e continuando a viagem por terra at a barranca do rio Paran, no Picado de Luis Pedroso, ou subindo pelo serto a Gois. A utilidade da rota descoberta pelos ituanos vai se tornar patente no perodo anterior e durante a guerra do Paraguai, quando o governo criou as colnias militares de Avanhandava e Itapura. Piracicaba, localizada na intermediao desse caminho. se beneficiou dele, tendo obtido seu comrcio naqueles anos um grande incentivo,

    Nos anos de 1736 e 1737 os camaristas de So Paulo se manifestam, em representaes ao rei Dom Joo V, a favor de uma via mais breve de comunicao por terra com Cuiab, apoiando as propostas de Bartolomeu Paes de Abreu e de Manuel Dias. A carta da Cmara de So Paulo de 14 de julho de 1736, por exemplo, de extraordinria veemncia: [ .. .] 'porque os Governadores pem olhos nos seus interesses, perecendo o bem pblico" [ ... ] ". evidente, aps a devida concesso, haveria apenas melhorias no Picado de Luis Pedroso, de quem Manuel Dias, alm de sobrinho, havia sido o brao direito e herdara no minimo o rascunho dos mapas, assim como as mercs e honrarias pela construo da estrada. Nessa proposta a estrada viria de Mogi, Estrada de Gois, atingiria o Picado em Ipena, depoisde atravessar Rio Claro. Infelizmente requerimento dos sertanistas no obteve resposta.

    2- O Povoador de Piracicaba e a Estrada para Cuiab

    Em 1770 o Povoador de Piracicaba, Antnio Correia Barbosa, convence o Governador D, Lus Antnio de Souza Botelho Mouro, o

    " DOCUMENTOS INTERESSANTES, v. 24, p, 58.

    '" DOCUMENTOS INTERESSANTES, v. 24. p, 181-183,

    :19 CL Revista do I H G B, Documentos Histricos sobre a Capitania de So Paulo existentes

    no Arquivo Histrico Ultramarino de Lisboa, Rio de Janeiro: Departamento de Imprensa

    NaCional, 1956. v. 3 (especial), p. 131 e TAUNAY, Affonso de E. Histria das Bandeiras

    Paulistas. So Paulo: Melhoramentos, 1951. p. 94, v2,

  • 34 frei Senno Dorizotto .'

    Morgado de Matheus, a oficializar o caminho de Cuiab por Piracicaba e Campos de Araraquara, para alcanar Iguatem (Iv ai). Escreve o Morgado de Matheus aos 20 de abril de 1770: [.. .] "tenho resolvido mandar, fazer a d. B picada pela povoao de Pirassicaba, poronde entravo antigamente, os descobridores pela d. a paragem em direitura ao Rio Grande" [ ... }'o. Em duas cartas o