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Cópias da sentença do 13.2 Juízo Cível da Comarca de Lisboa e dos acórdãos da Relação de Lisboa e do Supremo Tribunal de Justiça proferidos no processo de registo da marca nacional n.2 193 425. Cópia da sentençaproferidano 13.ªJuízo Cível, 1.ªSecção, processo n.ª 10499, no recurso de registo de marca em que são recorrente GAF Corporation e recorridos o director do Serviço de Marcas, do InstitutoNacional da Propriedade Industrial, e António Fonseca Guimarães. GAF Corporation recorredo despacho do Ex. mo Director do Serviço de Marcas de 20 de Dezembro de 1984 que concedeu a António Fonseca Guimarães o registoda marca nacional n.º 193 425, G-A-F, alegando que tal marca se confunde com as marcas da recorrente n.os 156 914, 158 161 e 159 641 - GAF. Cumprindo o disposto no artigo 206.° do Código da Propriedade Industrial,o Sr.Directordo Serviço de Marcas respondeu o que consta a fl. 60. A parte contrária (fls. 64 e segs.) alega a faltade afini- dade dos produtos protegidos pelas marcas em confronto e a falta de semelhança das mesmas marcas. Vejamos. Nos termos do n.ª 12.ª do artigo 93.° do Código da Propriedade Industrial, será recusado o registo das marcas que constituam reprodução ou imitação, total ou parcial, de marca anteriormenteregistadapor outrem para o mesmo produto ou produto semelhante. De harmonia com taldisposição e com a do artigo 94.ª, são requisitos da imitação ou usurpação da marca: Destinarem-se as marcas à protecção do mesmo pro- duto ou de produtos afins; Existir entre as marcas semelhança tal que induza facilmente em erro ou confusão o consumidor. Basta a falta de um daqueles requisitos para afastar a aplicação das citadas disposições legais, visto que se trata de requisitos cumulativos essenciais. Ora, no caso sub judice nenhum daqueles requisitos se verifica. A marca n.ª 193 425, registada em nome de António Fonseca Guimarães, destina-se a fitasmagnéticas gravadas, discos de música e fitas magnéticas virgens e de alta fidelidade (fl. 19). As marcas da recorrente destinam-se a material fotográfico sensível à luz,papel diazótipo sensível à luz, telas e filmes, cópias fotográficas processadas por diazótipos (fl. 27), filme fotográfico e cinematográfico, sensível à luz e revelado (fl.32), e máquinas fotográficas, projectores, visores e acessórios e transparências (fl. 37). É manifesto, pois, não existir semelhança entre os pro- dutos protegidos pelas marcas da recorrente e o produto protegido pela marca da recorrida e, portanto, não é possível erro ou confusão do mercado acerca de tais produtos. Por outro lado, a existência das letras «G», «A» e «F» em todas as marcas não basta para lhes dar semelhança gráfica, figurativa ou fonética. Aquelas letras não fun- cionam nas referidas marcas como caracteres do alfabeto, não atribuem àquelas marcas a característicade nominativas ou mistas. Na verdade, as marcas da recorrente não passam de marcas figurativas, constituídas por três figuras brancas inscritas num quadrado preto (fls. 27, 32 e 37). Essas figuras brancas lembram os sinais «G», «A» e «F» do alfabeto. Contudo, não funcionam aqui nessa qualidade de letras, visto que o traço distintivo reside na sua forma particular, inconfundível com qualquer outra forma. Por sua vez, a marca n.ª 193 425 (fl.19) é marca mista, na medida em que se compõe de figuras e do vocábulo «Portugal» sendo as figuras representativas de uma torre (semelhante à Torre dos Clérigos) e de três figurasbrancas sugerindo as letras «G», «A» e «F», de forma muito di- versa daqueloutras figuras brancas insertas nas marcas da recorrente. Forma essa bem mais importante que a seme- lhança com caracteres do alfabeto na sua função de impressionar o consumidor. Cotejando agora todas as marcas, verificamos que a n.° 193 425 é inconfundível com as da recorrente.

158 161 e 159 641 - GAF. - servicosonline.inpi.pt · festo; 7) As fitas magnéticas assinaladas pela marca ora impugnada fazem também parte dos filmes da apelante; 8) Dado o modo

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Cópias da sentença do 13.2 Juízo Cível da Comarca de Lisboa e dos acórdãos da Relação de Lisboa e do Supremo Tribunal de Justiça proferidos no processo de registo da marca nacional n.2 193 425.

Cópia da sentença proferida no 13.ª Juízo Cível, 1.ª Secção, processo n.ª 10 499, no recurso de registo de marca em que são recorrente GAF Corporation e recorridos o director do Serviço de Marcas, do Instituto Nacional da Propriedade Industrial, e António Fonseca Guimarães.

GAF Corporation recorre do despacho do Ex. mo Director do Serviço de Marcas de 20 de Dezembro de 1984 que concedeu a António Fonseca Guimarães o registo da marca nacional n.º 193 425, G-A-F, alegando que tal marca se

confunde com as marcas da recorrente n.os 156 914, 158 161 e 159 641 - GAF. Cumprindo o disposto no artigo 206.° do Código da

Propriedade Industrial, o Sr. Director do Serviço de Marcas respondeu o que consta a fl. 60. A parte contrária (fls. 64 e segs.) alega a falta de afini-

dade dos produtos protegidos pelas marcas em confronto e a falta de semelhança das mesmas marcas. Vejamos. Nos termos do n.ª 12.ª do artigo 93.° do Código da Propriedade Industrial, será recusado o registo das marcas que constituam reprodução ou imitação, total ou parcial, de marca anteriormente registada por outrem para o mesmo produto ou produto semelhante. De harmonia com tal disposição e com a do artigo 94.ª,

são requisitos da imitação ou usurpação da marca:

Destinarem-se as marcas à protecção do mesmo pro- duto ou de produtos afins;

Existir entre as marcas semelhança tal que induza facilmente em erro ou confusão o consumidor.

Basta a falta de um daqueles requisitos para afastar a aplicação das citadas disposições legais, visto que se trata de requisitos cumulativos essenciais. Ora, no caso sub judice nenhum daqueles requisitos se

verifica. A marca n.ª 193 425, registada em nome de António

Fonseca Guimarães, destina-se a fitas magnéticas gravadas, discos de música e fitas magnéticas virgens e de alta fidelidade (fl. 19). As marcas da recorrente destinam-se a material fotográfico sensível à luz, papel diazótipo sensível à luz, telas e filmes, cópias fotográficas processadas por diazótipos (fl. 27), filme fotográfico e cinematográfico, sensível à luz e revelado (fl. 32), e máquinas fotográficas, projectores, visores e acessórios e transparências (fl. 37). É manifesto, pois, não existir semelhança entre os pro-

dutos protegidos pelas marcas da recorrente e o produto protegido pela marca da recorrida e, portanto, não é possível erro ou confusão do mercado acerca de tais produtos. Por outro lado, a existência das letras «G», «A» e «F»

em todas as marcas não basta para lhes dar semelhança gráfica, figurativa ou fonética. Aquelas letras não fun- cionam nas referidas marcas como caracteres do alfabeto, não atribuem àquelas marcas a característica de nominativas ou mistas. Na verdade, as marcas da recorrente não passam de marcas figurativas, constituídas por três figuras brancas inscritas num quadrado preto (fls. 27, 32 e 37). Essas figuras brancas lembram os sinais «G», «A» e «F» do alfabeto. Contudo, não funcionam aqui nessa qualidade de letras, visto que o traço distintivo reside na sua forma particular, inconfundível com qualquer outra forma. Por sua vez, a marca n.ª 193 425 (fl.19) é marca mista,

na medida em que se compõe de figuras e do vocábulo «Portugal» sendo as figuras representativas de uma torre (semelhante à Torre dos Clérigos) e de três figuras brancas sugerindo as letras «G», «A» e «F», de forma muito di- versa daqueloutras figuras brancas insertas nas marcas da recorrente. Forma essa bem mais importante que a seme- lhança com caracteres do alfabeto na sua função de impressionar o consumidor. Cotejando agora todas as marcas, verificamos que a

n.° 193 425 é inconfundível com as da recorrente.

O despacho recorrido fez, pois, correcta aplicação da lei. Pelo exposto, nego provimento ao recurso. Custas pela recorrente.

Lisboa, 24 de Junho de 1986. -Joaquim Dias.

Está conforme o original.

A Escrivã-Adjunta, (Assinatura ilegível.)

Cópia do acórdão proferido no Tribunal da Relação de Lisboa, processo n.ª 10 449, da 1.ª Secção do 13.ª Juízo Cível da Comarca de Lisboa, nos autos de recurso de marca em que são recorrente GAF Corporation e recor- ridos o director do Serviço de Marcas, do Instituto Nacional da Propriedade Industrial, e António Fonseca Guimarães.

Fls. 113 a 122 v.ª dos autos: I - GAF Corporation interpôs recurso do despacho do

director do Serviço de Marcas, do Instituto Nacional da Propriedade Industrial, datado de 20 de Dezembro de 1984 que concedeu a António Fonseca Guimarães o registo da marca nacional n.ª 193 425, G-A-F, alegando que tal marca se confunde com as marcas da recorrente n.os 156914, 158 161 e 159641, GAF. Respondeu o director do Serviço de Marcas, remetendo

para o processo administrativo, no sentido de não se verificar, com a concessão do registo da marca n.ª 193 425, qualquer infracção ao Código da Propriedade Industrial, nomeadamente aos seus artigos 93.º, n.ª 12.ª, e 94.º A parte contrária, por sua vez, alega a falta de seme-

lhança das marcas e a falta de afinidade dos produtos por elas protegidos. O recurso foi decidido por sentença do 13.° Juízo Cível

(1.ª Secção), que, considerando inconfundíveis as marcas em confronto e não existir qualquer semelhança entre os produtos que visam proteger, lhe negou provimento, con- firmando o despacho do director do Serviço de Marcas. Dessa sentença apelou a recorrente GAF Corporation,

que, nas alegações, sustentou as seguintes conclusões:

1) Esta em causa a concessão do registo da marca G-A-F para fitas magnéticas gravadas, discos de música e fitas magnéticas virgens e de alta fidelidade;

2) Esta marca é igualmente constituída, em segundo plano e sem qualquer poder individualizador, pela Torre dos Clérigos;

3) A apelante (no recurso escreveu-se «apelada», mas trata-se, sem dúvidas, de lapso manifesto) é titular desde 1970 de três marcas GAF, que individualizam, entre outros produtos, filmes cinematográficos;

4) A marca sub judice contém as letras que caracterizam as marcas da apelante (nesta conclusão de novo se escreveu, por manifesto lapso, «apelada»);

5) O modo diferente como essas letras estão dese- nhadas não impede, de modo algum, a confundibilidade das referidas marcas;

6) A semelhança do conjunto das marcas é mani- festo;

7) As fitas magnéticas assinaladas pela marca ora impugnada fazem também parte dos filmes da apelante;

8) Dado o modo como estes produtos se relacionam e a sua finalidade genérica comum, qualquer consumidor pode pensar que os mesmos per- tencem à mesma esfera económica;

9) As marcas assinalam, pois, produtos manifesta- mente afins;

10) A marca sub judice constitui, pois, nos termos do estabelecido no artigo 94.º do Código da Propriedade Industrial, imitação das marcas da apelante;

11) Acresce que a apelante é uma empresa de expressão mundial, cujos produtos são noto- riamente conhecidos, não só no estrangeiro, como em Portugal;

12) Trata-se, pois, do que os autores chamam «marcas notórias», que beneficiam em todos os países signatários da Convenção de Paris de uma protecção reforçada;

13) Mas a marca impugnada contém ainda o nome «GAF» da apelante, o qual se encontra protegido em Portugal por virtude do artigo 8.° da Convenção de Paris e do artigo 146.º do Código da Propriedade Industrial, não podendo o apelado incluí-lo na sua marca;

14) Finalmente, não restam dúvidas de que a eventual concessão do registo em apreciação facultaria ao apelante condições óptimas de concorrência desleal, mesmo independentemente das suas intenções;

15) A sentença recorrida fez, pois, errada aplicação dos artigos 93.º, n.os 6.ª a 12.ª, 94.ª, 187.ª, n.º 4.ª, e 212.ª, n.ª 1.ª, todos do Código da Propriedade Industrial, e deve ser revogada, mandando-se recusar o registo da marca n.ª 193425, G-A-F.

A parte contrária (António Fonseca Guimarães) contra- -alegou, sustentando o julgado. Já nesta instância, o digno representante do Ministério

Público emitiu parecer no sentido de não se verificarem os requisitos legais da imitação de marcas a que se reporta o artigo 94.º do Código da Propriedade Industrial, pelo que entendia não merecer provimento a presente apelação, devendo confirmar-se a sentença recorrida. Colhidos os vistos dos Ex. mos Adjuntos, cumpre decidir. II - 1 - Verifica-se que a recorrente é titular das

seguintes marcas (cf. documentos a fis. 27, 32 e 37):

N.Q 156914, para assinalar material fotográfico sen- sível à luz, papel diazótipo sensível à luz, telas e filmes e cópias fotográficas processadas por diapositivos - produtos estes da classe 1.ª;

N.ª 158 161, para assinalar filme fotográfico e ci- nematográfico sensível à luz e revelado-pro- dutos estes da classe 9.ª;

N.ª 159641, para assinalar «transparências» -pro- duto da classe 9.ª

Estes registos foram concedidos, respectivamente, em 14 de Dezembro de 1970, 19 de Janeiro de 1971 e 7 de Abril de 1971. Por outro lado, verifica-se que o recorrido António

Fonseca Guimarães é titular da marca n.ª 193 425, para assinalar fitas magnéticas gravadas, discos de música e fitas

magnéticas virgens e de alta fidelidade - produtos todos da classe 9.ª, cuja concessão foi feita por despacho de 20 de Dezembro de 1984 (cf. documentos a fis. 17 e 20). As marcas da recorrente são constituídas por um qua-

drado negro em cujo interior estão desenhadas a branco as letras «GAF» (cf. fis. 27, 32 e 37). Por sua vez, a marca do recorrido é constituída pela

sequência de letras «G-A-F», desenhadas a branco e sombreadas a negro, separadas por traços (hífens), tendo em segundo plano e à esquerda uma reprodução da Torre dos Clérigos, do Porto, e por baixo daquelas letras a palavra «Portugal», num tipo gráfico muito menor - tudo como se vê a fl. 20. 2 - As marcas da recorrente, todas de desenho igual,

são essencialmente nominativas, surgindo numa sequência de letras que exprime gráfica e foneticamente a palavra «GAF» [gaf(e)], ou seja, a própria designação da recor- rente. A marca do recorrido é mista, figurativa ou emblemática

e nominativa, mas, sem dúvida, é esta última característica, representada pela sequência de letras «G-A-F», que sobressai. Não pode aceitar-se a afirmação, constante da sentença

recorrida, de que as letras «G», «A» e «F», contidas em todas as marcas em causa, não funcionam nelas como caracteres de alfabeto, não atribuindo às ditas marcas a característica de nominativas ou mistas. Na verdade, o público (a quem se destinam os produtos

individualizados pelas marcas) tende sempre a ver no desenho de uma letra a sua simbologia própria, na sua expressão nominativa e fonética. Por isso, quando se lhe depara uma sequência de letras, a primeira ideia que ocorre é a da formação de uma palavra, possivelmente de um nome - sobretudo, caso se trate de público de expressão portuguesa, se tal sequência se apresentar legível segundo as regras próprias da nossa língua. Tudo isto é do senso comum, porque realmente tal atitude é a que corresponde à função normal das letras. Ainda que a sequência em que estas se apresentam não se destine a formar palavras, como sucede, por exemplo, com NATO (ou OTAN), as pessoas são levadas a reproduzir ou a ler tal sequência como se efectivamente se tratasse de uma palavra. Caso é que a índole da língua o permita. Por isso, no exemplo apontado ninguém diz «éne-á-tê-ó», mas sim «nato», como se de uma palavra se tratasse. Trata-se de uma prática gene- ralizada, resultante precisamente da circunstância de cor- responder à função própria das letras: a formação de palavras. É assim que as siglas se lêem usualmente como palavras, quando as letras que as formam surgem numa sequência legível segundo a índole da língua em que se apresentam. No caso concreto sub judice é flagrante que a sequência

de letras «G», «A» e «F» das marcas da recorrente exprime a sua própria designação comercial; pelo menos, a parte nobre, essencial, dessa designação: «GAF». No que respeita à marca do recorrido, não é o desenho

da Torre dos Clérigos, do Porto, ou a grafia da palavra «Portugal» que impressionam. O elemento «marcante» é a sequência de letras assim formada: «G-A-F». Com tracinhos ou sem tracinhos entre tais letras, o senso

comum, ou seja, a experiência comum, ensina que as pessoas tendem não a soletrá-las, não a designá-las isola- damente umas das outras, mas a lê-las numa só palavra: «gaf(e)». Ora, esta sequência de letras, que se lê como «gaf(e)»,

surge na marca do recorrido como o seu elemento

«significante» por excelência. Digamos que é ela parte nobre da marca. Porquê tais letras? Já se viu que, no caso das marcas da recorrente, a

respectiva sequência de letras traduz o seu nome comercial. No caso da marca do recorrido poderá dizer-se que as

letras que nela aparecem, separadas (ou unidas ...) por tracinhos à moda de hífens, simbolizam as iniciais do seu nome: António Fonseca Guimarães. Mas então por que não as dispôs o recorrido por esta

ordem «A-F-G»? Certamente porque assim não se leriam «gaf(e)». Pouco interessa que os caracteres tipográficos de umas

e outras sejam diferentes, o tamanho e o desenho sejam outros, haja ou não tracinhos entre as letras. Como ensina Ferrer Correia, «na marca nominativa» [e na marca do recorrido esta é a característica saliente], o que interessa é a imitação do conteúdo ideológico. Neste tipo de marcas, com efeito, o direito ao uso exclusivo abrange não apenas o uso da marca na forma em que tenha sido registada, mas ainda o uso da mesma palavra ou palavras noutras formas em que possam ser reproduzidas (v. g., em diferentes caracteres tipográficos, com outra tinta, em

diferente tamanho, etc.)». (Lições de Direito Comercial, 1973, p. 331.) 3 - Mas o fulcro da questão consiste, porém, em saber

se entre os produtos objecto das marcas em causa existe identidade, semelhança ou afinidade manifesta para os efeitos previstos nos artigos 93.ª, n.ª 12.º, e 94.º do Código da Propriedade Industrial. «Na verdade, uma marca não tem de ser distinta de toda

e qualquer outra marca já existente, seja qual for o produto para que tiver sido adoptada e esteja sendo usada; tem de ser distinta, e portanto nova, no sentido de que não deve confundir-se com qualquer outra que tenha sido adoptada ou usada para produtos do mesmo género.» (J. G. Pinto Coelho, Lições de Direito Comercial, 1957, I, p. 379.) Verifica-se que a marca do recorrido se destina a

assinalar produtos da classe 9.', tal como duas das marcas da recorrente (as n.os 158 161 e 159 641). Todavia, embora pertençam esses produtos à mesma classe, isso não significa forçosamente a existência de semelhança ou afinidades entre eles, pelo menos isso não significa só por si um indício de grau tal que se imponha desde logo o funcionamento do artigo 94.ª do Código da Propriedade Industrial. Sendo certo que os produtos assinalados pelas marcas

em questão não são idênticas nem semelhantes, há que averiguar, porém, se são ou não manifestamente afins. Na falta de um conceito legal de afinidade, é a doutrina

e a jurisprudência que têm desenvolvido o seu significado jurídico.

De uma maneira geral, a jurisprudência afere a eventual afinidade entre outros produtos em função da sua utilidade e fim, com vista a estabelecer a sua possibilidade de concorrência no mercado. Quando um produto é afim de outro, acaba por concor-

rer com ele no mercado, sendo assim susceptível de enfraquecer a clientela do último. Os produtos objecto das marcas são bens económicos,

portanto coisas dotadas de utilidade, isto é, aptas a satisfazer necessidades humanas. Frequentes vezes encontram-se entre si em relações de

complementaridade ou de substituição, com vista à satisfação daquelas necessidades. Se a relação for de complementaridade, os bens respectivos são de procura conjunta, pois em comum, como complemento um do

outro, podem satisfazer uma dada necessidade - para além das eventuais necessidades que cada um, de per si, possa ainda virtualmente satisfazer. Assim, a despeito da sua eventual diferença, maior ou menor, e até da diferença entre as necessidades que cada um desses produtos visa especificamente satisfazer, o simples facto de, em com- plemento um do outro, poderem em conjunto satisfazer outras necessidades confere-lhes, sem dúvida, a carac- terística de manifesta afinidade. Se a relaç,ão entre os produtos for de substituição, sucede

então que dada necessidade, normalmente satisfeita por determinado produto, pode ser também satisfeita, embora em menor grau, de uma forma menos perfeita ou mais custosa, por um outro produto, que, assim, pode ser ou funcionar como sucedâneo do primeiro. Também neste caso, sem embargo das diferenças

existentes entre os produtos, a despeito mesmo das peculiares necessidades visadas por cada um, se devem caracterizar tais produtos como manifestamente afins. Por outro lado, importa ter presente que as próprias ne-

cessidades -normalmente as secundárias, não vitais ou supérfluas - se apresentam como variáveis, mudando por acção de factores diversos, de carácter social, como a propaganda e a publicidade. Surgem assim relações de substituição relativas à própria satisfação de necessidades em que se opera a escolha, com uma consequente subs- tituição dos bens económicos. Ora, os bens nesta situação, aptos a substituírem-se a

outros por força do câmbio das necessidades respectivas (que se encontram, pois, entre si numa relação de subs- tituição), mercê eventualmente de um acção propagandística ou publicitária, devem igualmente considerar-se manifes- tamente afins dos outros, que substituem, concorrendo com eles no mercado (e assim podendo enfraquecer a clientela própria de determinada marca, usual nos bens substituídos). Nessa ordem de ideias, assume também especial relevo,

para avaliar da afinidade dos produtos, a influência que a confusão gerada entre as respectivas marcas pode determinar para levar o consumidor a supor que eles têm a mesma origem, fazendo-lhe presumir pertencerem à mesma esfera económica. Podem, pois, considerar-se produtos manifestamente

afins todos aqueles que visam satisfazer necessidades que, podendo embora ser diferentes umas das outras, são susceptíveis de se encontrarem entre si numa relação de conexão (complementaridade, substituição). Na actualidade, as unidades de produção são levadas a

diversificar a gama dos produtos que fabricam por força das regras de optimização dos recursos. Isto é patente sobretudo nas grandes unidades empresariais. Vê-se, assim, conhecidas empresas, como a Gillete, produzirem aparelhos metálicos de barbear, máquinas eléctricas de barbear, sabões para a barba, cosméticos, etc. - tudo produtos que, pela sua materialidade, respeitam à indústria metalúrgica, à indústria eléctrica e à indústria química (e que, não obstante, surgem manifestamente afins, dada a sua utilização e finalidade). Esta é uma realidade da economia actual que se impõe ao consumidor e que, forçosamente, há que ponderar para apreciar a eventual afinidade dos produtos (cf. o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de Fevereiro de 1979, no Boletim, n.ª 284, p. 238). 4 - A marca do recorrido destina-se a individualizar

fitas magnéticas gravadas, discos de música e fitas magnéticas viagens e de alta fidelidade (cf. fl. 15). Ora, nos filmes cinematográficos protegidos pela marca

n.2 158 161 (v. fl. 32), da recorrente, é natural que

comportem, como de resto ela própria o afirma (fl. 13, n.ª 69), banda sonora, isto é, fita magnética gravada ou virgem. Aliás, pode obter-se um efeito semelhante ao visado pela banda sonora de um filme, com a adequada utilização de uma fita magnética ou de um disco. Existe, sem dúvida, uma relação de complementaridade

entre tais produtos, nos termos já referidos. Por outro lado, também facilmente se descortinam rela-

ções de substituição entre os produtos assinalados pelas marcas em causa, pois é frequente que a necessidade recreativa de filmar ou apreciar um filme (cf. marca n.Q 158 161, fl. 32) seja, na impossibilidade ou dificuldade de o fazer, substituída pela gravação de música ou audição de música gravada (cf. a marca n.ª 193 425, fl. 19). Trata-se de produtos oriundos das tecnologias da

reprodução de sons e imagens. A clientela dos respectivos produtos é a mesma para uns e para outros. Concorrem no mercado. Se, porventura, a marca do recorrido assinalasse mobiliário de madeira, nada haveria que relacionasse a respectiva sequência de letras «G-A-F», mormente na sua expressão fonética, com os produtos individualizados pelas marcas da recorrente. Mas o que acontece no caso sub judice é que a índole, a natureza dos produtos assinalados por aquela marca G-A-F, é suficientemente semelhante à dos produtos das marcas da recorrente, de tal forma que um consumidor normal, não especialmente atento (até distraído), seria facilmente levado a pensar tratar-se de produtos da mesma origem, produzidos também pela GAF Corporation. Porque, na verdade, a clientela própria de tais produtos, todos eles relacionados com a reprodução sonora e visual, não se confunde, v. g., com a clientela dos produtos de mobiliário. Deve entender-se, assim, que todos os produtos que

respeitem ao mundo da gravação e reprodução de sons e imagens (fitas magnéticas, discos, filmes, cassettes vídeo, aparelhagens sonoras e de projecção, etc.), concorrendo todos no mesmo mercado para satisfação de necessidades conexas (e por isso afins), são efectivamente produtos manifestamente afins. Afinidade significa, a este respeito, sobretudo conexão. E é patente que esta existe, em maior ou menor grau,

entre todos os produtos assinalados pelas marcas em causa. Assim, a semelhança nominativa existente entre elas,

que se revela sobretudo na sua expressão fonética [«gaf(e)» para todas elas], pode facilmente induzir em erro o consu- midor e provocar confusão no mercado, nos termos e para os efeitos dos artigos 93.ª, n.ª 12.ª, e 94.° do Código da Propriedade Industrial, levando-o a crer serem tais produtos oriundos da mesma esfera económica. 5 - Nesta conformidade, concede-se provimento à

apelação, revogando-se a sentença recorrida e, consequentemente, também o despacho do director do Serviço de Marcas, do Instituto Nacional da Propriedade Industrial, que admitiu o registo da marca n.º 193 425 ao recorrido António Fonseca Guimarães. Custas pelo recorrido.

Lisboa, 9 de Abril de 1987. -José Manuel de Carvalho Pinheiro - Joaquim Fonseca Henriques de Matos - Fernando Heitor Barros de Sequeiros.

Está conforme.

Lisboa, 7 de Dezembro de 1990. - (Assinatura ilegí- vel.)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

GAF Corporation, sociedade anónima, com sede em Nova Iorque, recorre do despacho do director do Serviço de Marcas, do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), de 20 de Dezembro de 1984 que concedeu a António Fonseca Guimarães, industrial, residente no Porto, o registo da marca nacional n.ª 193 425, G-A-F, publicado no Boletim da Propriedade Industrial, n.ª 12-1984, de 3 de Junho de 1985. Indica como fundamento a possibilidade de facilmente

induzir em erro ou confusão o consumidor, visto a marca cujo registo foi concedido ser uma imitação da marca GAF, da recorrente, registada sob os n.os 156 914, 158 151 e 159 641, para produtos semelhantes ou afins. O recorrido António Fonseca Guimarães sustenta que

as marcas em questão não são susceptíveis de confusão, tanto no aspecto gráfico como emblemático, e que tais marcas se destinam a assinalar produtos totalmente distintos. Por sentença, com fundamento no aspecto inconfundível

das marcas e na sua função de assinalar produtos distintos, foi negado provimento ao recurso. Em recurso de apelação interposto pela GAF Corpo-

ration, ao mesmo foi dado provimento e, consequentemente, revogados tanto a sentença impugnada como o despacho da administração. Desta decisão vem o presente recurso de revista, inter-

posto por António Fonseca Guimarães, em cuja alegação conclui, por violação dos artigos 93.ª, n.° 12.ª, e 94.ª do Código da Propriedade Industrial, dizendo, em resumo:

A marca do agora recorrente não é imitação da marca da sociedade recorrida, porque tais marcas não di- zem respeito a produtos semelhantes ou afins, nem são susceptíveis de confusão, quer no aspecto figurativo, quer no aspecto fonético;

Efectivamente, os produtos que elas se destinam a assinalar não são concorrentes no mercado, nem têm a mesma utilidade e fim.

A recorrida GAF Corporation sustenta o decidido. Tudo visto. 1 - Ao agora recorrente foi concedido, por despacho

de 20 de Dezembro de1984, o registo da marca n.º 193 425, G-A-F, para assinalar fitas magnéticas gravadas, discos de música e fitas magnéticas virgens e de alta fidelidade, produtos estes da classe 9.ª Por seu lado, a sociedade recorrida é titular das marcas

GAF, com os seguintes números: 156 914, para assinalar material fotográfico sensível à luz, papel diazótipo sensível à luz, telas e filmes e cópias fotográficas processadas por diazótipos, produtos estes da classe 1.ª; 158 161, para as- sinalar filme fotográfico e cinematográfico sensível à luz e revelado, produtos estes da classe 9.ª, e 159 641, para assinalar «transparências», produto este da classe 9.ª Estes registos foram concedidos, respectivamente, em 14 de Dezembro de 1970 e 19 de Janeiro de 1971 e 7 de Abril de 1971. A marca do agora recorrente é constituída pela sequência

das letras «G-A-F», desenhadas a branco e sombreadas a negro, separadas por traços, tendo em segundo plano e à esquerda uma reprodução da Torre dos Clérigos, do Porto, e por baixo daquelas letras a palavra «Portugal», em tipo gráfico mais pequeno.

A marca da sociedade agora recorrida é constituída por um quadrado negro, em cujo interior estão desenhadas a branco as letras «GAF». 2-Segundo o disposto no artigo 93.ª, n.ª 12.º, do

Código da Propriedade Industrial, deve ser recusado o re- gisto de marcas que contenham a reprodução ou imitação, total e parcial, de marca anteriormente registada por ou- trem, para o mesmo produto ou produto semelhante, que possa induzir em erro ou confusão no mercado. Por seu lado, o artigo 94.ª estabelece que se considera

imitada ou usurpada, no todo ou em parte, a marca desti- nada a objectos ou produtos inscritos no reportório sob o mesmo número, ou sob números diferentes mas de afi- nidade manifesta, que tenha tal semelhança gráfica, figurativa ou fonética com outra já registada que induza facilmente em erro ou confusão o consumidor, não podendo este distinguir as duas senão depois de exame atento ou confronto. Tal como se diz na decisão recorrida, embora sejam

diferentes os aspectos figurativos ou emblemáticos das marcas em questão, são perfeitamente idênticos os aspectos gráficos e fonéticos. A palavra identificativa da marca é constituída pelas mesmas letras (é insignificativa a diferença dos caracteres tipográficos) e tem, portanto, a mesma sonoridade. Neste aspecto, ambas as marcas se mostram sinalizadas pela palavra «GAF». Ora, nas condições da actual sociedade, a publicidade

comercial é o instrumento mais poderoso da concorrência entre os agentes económicos, com vista ao alargamento do consumo, quase sempre de uma vasta gama de produtos aparentemente diferentes, mas que se destinam a satisfazer, de um modo aproximadamente igual, as mesmas neces- sidades. Esta publicidade faz-se, no mundo actual, através da

imprensa, mas sobretudo através da rádio e da televisão, sendo estes últimos meios de comunicação social os mais poderosos. A nota mais saliente do recurso aos media para

publicidade em massa dos produtos é a da alteração profunda das regras da concorrência, onde o elemento fonético das marcas se toma dominante. Se na rádio apenas se ouve o nome da marca, também na televisão sucede o mesmo, onde frequentemente se esconde o elemento figurativo. Portando, considera-se ajustada, na decisão recorrida, a

qualificação jurídica das marcas em questão, neste primeiro aspecto, como marcas semelhantes, por forma a poderem induzir facilmente em erro ou confusão o consumidor. 3 - A semelhança gráfica, figurativa ou fonética de uma

marca com outra já registada, por forma a induzir fa- cilmente em erro ou confusão o consumidor, não é o único pressuposto para se considerar haver imitação ou usurpação, no todo ou em parte, de uma marca. Um segundo pressuposto, legalmente exigido, é o de

ambas as marcas se destinarem a assinalar produtos seme- lhantes ou manifestamente afins. É evidente que nenhuns efeitos nocivos traz à concorrência entre os agentes económicos a utilização de marcas idênticas para sinalização de produtos distintos, isto é, destinados à satisfação de diferentes necessidades. Constata-se que tanto a marca do agora recorrente como

a marca relativa aos registos n.os 158 161 e 159 641 da recorrida, se destinam a assinalar produtos da classe 9.ª; isso, porém, é irrelevante, pois, como se diz na decisão recorrida, não significa só por si a existência de seme- lhanças ou afinidades entre eles.

Dado que os produtos se destinam à satisfação das necessidades humanas, o critério para a sua distinção é o da sua utilidade e fim, isto é, a relação entre as suas qualidades e as necessidades susceptíveis de por eles serem satisfeitas. Há produtos, como sucede na actividade farmacêutica,

numa vasta gama de marcas e designações, que têm a mesma composição e se destinam ao mesmo fim; a dife- rença de marcas tem por objectivo evitar a concorrência desleal, para que o consumidor possa escolher a marca que maior confiança lhe proporcione. Outros produtos há que, sendo diferentes, podem proporcionar, embora em graus diferentes, a satisfação das mesmas necessidades e, por isso, são bens economicamente sucedâneos. Outros, ainda, são complementares, pois, em conjunto, como complemento um do outro, podem satisfazer uma dada necessidade. 4 - No caso concreto, os bens protegidos pelas marcas

em questão situam-se em planos diferentes, têm utilidades e fins diferentes, sendo irrelevantes que todos eles se proponham a satisfação de necessidades recreativas. Este conceito de necessidade recreativa, em que a decisão recorrida se apoia, é de tal modo vago, impreciso e indeterminado que não pode servir de suporte para a qualificação dos referidos bens no aspecto concorrencial. Os bens produzidos por recorrente e recorrida não

podem efectivamente concorrer no mercado. Enquanto as fitas magnéticas gravadas, discos de música e fitas magnéticas virgens, bens produzidos pelo recorrente, se destinam a gravadores, leitores e gravadores-leitores de som apenas e de som e imagem, e nunca podem constituir complemento de máquinas fotográficas, máquinas de filmagem e de aparelhos de projecção, também o material fotográfico e filmes fotográficos e cinematográficos, bens estes produzidos pela recorrida, destinados precisamente a ser utilizados naquelas máquinas e aparelhos, nunca podem adaptar-se a gravadores-leitores, aparelhos estes a que se destinam os produtos do agora recorrente. Para a qualificação dos bens em questão, no domínio

das suas apetências concorrenciais, a análise não deve perder-se em formulações de tipo conceptualista, com esquecimento das utilidades e fins próprios de cada produto; por outro lado, a sua afinidade não pode apoiar-se em conceitos vagos das necessidades humanas. Se a manteiga e a margarina são bens sucedâneos por satisfazerem, em maior ou menor grau, os mesmos fins e necessidades alimentares semelhantes, já uma cassette sonora ou de vídeo e um tabuleiro de xadrez não são bens sucedâneos, embora satisfaçam, qualquer deles, necessidades recreativas. O consumidor, ao adquirir uma fita magnética gravada

ou para gravação, ou, então, um filme fotográfico ou cinematográfico revelado ou não revelado, não pode ser induzido em erro, pois, destinando-se aqueles produtos a aparelhos totalmente distintos, não lhe pode ser vendida uma dessas coisas em vez da outra. Portanto, os produtos em questão, os do recorrente e os

da recorrida, não são idênticos, nem semelhantes, nem afins; eles não são concorrentes no mercado por terem utilidades e fins totalmente distintos. Não sendo possível qualquer indução em erro ou confusão do consumidor, não há qualquer inconveniente em que sejam assinalados por marcas semelhantes. Para concessão do registo da marca do agora recorrente,

a Administração apoiou-se no parecer do técnico, junto ao processo; nele se sublinha a diversidade dos pro- dutos em causa, que não apresentam entre eles qualquer afinidade.

A esse resultado se chega, efectivamente, através da análise das qualidades dos produtos, tal como se acabou de fazer. 5 - Pelo exposto, concede-se provimento ao recurso e

revoga-se a decisão recorrida para subsistir o despacho da Administração. Custas pela recorrida neste Tribunal e na Relação.

Lisboa, 1 de Junho de 1988. - (Assinaturas ilegíveis.)