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2009 09 21 - Ensaio e Discurso Sobre a I

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e n s a i o e d i s c u r s o

s o b r e a .~ ~ I

I N T E R P R E T A Ç A O / A P L l C A Ç A O

D O D I R E I T O

S ª   e d i ç ã o

E R O S R O B E R T O G R A U   I

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íIII!

I

 INTERPRETAÇÃOE   COMPREENSÃO DO DIREITO

A interpretação do direito é costumeiramente apresentada ou

descrita como atividade de mera compreensão do significado das nor-mas jurídicas.

Ou o intérprete identifica o significado da norma, ou o determi-

na. Ainda que sob essas duas variantes - ato de conhecimento ou ato

de vontade -, permanece a idéia fundamental de   qJJe...i.nterpretar    é_~identificar ou determinar    =   com reender) a significação de alo. No   I Icaso, compreender o significado da norma Jun lca.

Daí a afirmação de que somente seria necessário interpretarmos

normas quando o sentido delas não fosse claro. Quando isso não

ocorresse, tornando-se fluente a compreensão do pensamento do

legislador - o que, contudo, em regra não se daria, dadas a ambigüi-

dade e a imprecisão das palavras e expressões jurídicas -, seria des-necessária a interpretação.

Essa concepção - que nele põe vigorosa ênfase e privilegia o

 pensamento do legislador - passou por um processo de transforma-

ção ainda não completamente apreendido pelos que se dedicam aoestudo do direito e pelos que o operam.

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 /l

 POR   QUE   INTERPRETAMOS O DIREITO

 Não pretendo produzir, aqui, um discurso prescritivo, no sentido

de propor pautas para a interpretação do direito. Minha exposição é

descritiva - desejo relatar como se processa a interpretação do direito.

O fato é que praticamos sua interpretação não - ou não apenas -

 porque a linguagem jurídica seja ambígua e imprecisa, mas porque

interpretação e aplicação do direito são uma só operação, de modo

que interpretamos para aplicar o direito e, ao fazê-lo, não nos limita-

mos a interpretar    (=compreender) os textos normativos, mas tambémcompreendemos   (= interpretamos) os fatos.

O intérprete procede à interpretação dos textos normativos e,

concomitantemente, dos fatos, de sorte que o modo sob o qual os

acontecimentos que compõem o caso se apresentam vai também

 pesar de maneira determinante na produção da(s) norma(s) aplicá-

vel(veis) ao caso.

Mas não é só, visto que - repito-o - a interpretação do direito é

constitutiva, e não simplesmente declaratória. Vale dizer: não se limi-

ta a uma mera compreensão dos textos e dos fatos; vai bem além disso.

Como e enquanto interpretação/aplicação, ela parte da com-

 preensão dos textos normativos e dos fatos, passa pela produção dasnormas que devem ser ponderadas para a solução do caso e finda com

a eScolha de uma determinada solução para ele, consignada na norma

de decisão.

Por isso convém distinguirmos as normas jurídicas produzidas

 pelo intérprete, a partir dos textos e dos fatos, da norma de decisão do

caso, expressa na sentença judicial.

/lI

 INTERPRETAMOS   NORMAS?

Antes disso, no entanto, um aspecto importantíssimo deve ser 

explicitado, atinente ao equívoco reiteradamente consumado pelos

que supõem que se interpretam normas.

O que em verdade se interpreta são os textos normativos; :Ida

interpretação dos textos resultam as normas. Texto e norma não se ./

identificam. A norma é a interpretação do texto normativo.

A interpretação é, portanto, atividade que se presta a transformar 

textos - disposições, preceitos, enunciados - em normas.

Daí, como as normas resultam da interpretação, o ordenamento,

no seu valor histórico-concreto, é um conjunto de interpretações, isto

é, um conjunto de normas.

O conjunto dos textos - disposições, enunciados - é apenas orde-

namento em potência, um conjunto de possibilidades de interpreta-

ção, um conjunto de normas potenciais [Zagrebelsky].

O significado (isto é, a norma) é o resultado da tarefa interpreta-

tiva. Vale dizer: o significado da norma é produzido pelo intérprete.

Por isso dizemos que as disposi@ll~~~~~~~~~JSt()~!!ada /

<:IiZeili;êlesdizem o que os intérpretes dizem que eles dizem  IB ii~ .Cárcova]. ~

 , ;._.,..-.,~.t;i$

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 IV 

 NORMA JURÍDICA E NORMA DE DECISÃO

o   intérprete produz a norma jurídica não por diletantismo, mas

visando à sua aplicação a casos concretos.

Interpretamos para aplicar o direito e, ao fazê-lo - já o vimos,

. linhas acima -, não nos limitamos a interpretar    (= compreender) os

textos normativos, mas também compreendemos   (= interpretamos)

os fatos.

A norma jurídica é produzida para ser aplicada a um caso concre-

to. Essa aplicação se dá mediante a formulação de uma decisão judi-cial, uma sentença, que expressa a norma de decisão.

Aí a distinção entre as normas jurídicas e a norma de decisão.

Esta   é   definida a partir daquelas.

De outra banda, é importante também observarmos que todos os

()peradores do direito o interpretam, mas apenas uma certa categoria

de~es.realiza plenamente o processo de interpretação, até o seu ponto

d Sll~lOante, que se encontra no momento da definição da norma de

eC1são E t /. d .   1/   d . --" . s e , qu e es ta a ut Or Iz a o a ir a e m a mt er pr et aç ao t ao -

somente como produção das normas jurídicas, para dela extrair nor-

:~~ ele.~ecisão, é aquele que Kelsen chama de "intérprete autênti-

. () JUiZ.

V

 INTERPRETAÇÃO E  CONCRETIZAÇÃO DO DIREITO

Relembre-se: os textos normativos carecem de interpretação não

apenas por não serem unívocos ou evidentes - isto é, por serem des-

tituídos de clareza -, mas sim porque devem ser aplicados a casos

concretos, reais ou fictícios [Müller]. Quando um professor discorre,

em sala de aula, sobre a interpretação de um texto normativo sempre

o faz - ainda que não se dê conta disso - supondo a sua aplicação a

um caso, real ou fictício.

O  fato é que a norma é construída, pelo intérprete, no decorrer do

 processo de concretização do direito. O texto, preceito jurídico, é,

como diz Friedrich Müller, matéria que precisa ser "trabalhada".

Partindo do texto da norma (e dos fatos), alcançamos a norma

 jurídica, para então caminharmos até a norma de decisão, aquela que

confere solução ao caso. Somente então se dá a concretização do

direito. Concretizá-lo é produzir normas jurídicas gerais nos quadros

de solução de casos determinados [Müller].

A concretização implica um caminhar do texto da norma para a

norma concreta (a norma jurídica), que não é ainda, todavia, o desti-

no a ser alcançado; a concretização somente se realiza em sua pleni-tude no passo seguinte, quando é definida a norma de decisão, apta a

dar solução ao conflito que consubstancia o caso concreto. Por isso

Su~tento que interpretação e concretização se superpõem. Inexist.s   I ,hOJe, interpretação do direito sem concretização; esta é a derradeira \etapa daquela. -.~

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r ,

o  CARÁTER ALOGRÁFlCO DO DIREITO   31

VI 

O CARÁTER ALOGRÁFICO DO DIREITO

Há dois tipos de arte: as alográficas e as autográficas. Nas pri-meiras - alográficas (música e teatro) - a obra apenas se completacom o concurso de dois personagens, o autor e o intérprete; nas artesautográficas (pintura e romance) o autor contribui sozinho para a rea-lização da obra [Ortigues].

Em.ambas há interpretação, mas são distintas, uma e outra.

A interpretação da pintura e do romance importa compreensão: aobra, objeto da interpretação, é completada apenas pelo seu autor;a compreensão visa à emoção estética, independentemente da media-ção de um intérprete.

A interpretação musical e teatral importa compreensão   + repro-d~Ção: a obra, objeto da interpretação, para que possa ser compreen-dl?a, tendo em vista a emoção estética, reclama um intérprete; o

 pnmeiro intérprete compreende e reproduz e o segundo intérpretecOI~Preende mediante a (através da) compreensão/reprodução do pri-meiro intérprete.

 _ O direito é alográfico. E alográfico é porque o texto normativona~ ~,eCompleta no sentido nele impresso pelo legislador. A "comple-

~u ~ do texto somente é atingida quando o sentido por ele expressa-o e Produzido, como nova forma de expressão, pelo intérprete.

t t   M~s o "sentido expressado pelo texto" já é algo novo, distinto doex o.  Ea n Orma.

crev:epetindo: as normas resultam da interpretação, que se pode des-

mulast

~o~?, u~ processo intelectivo através do qual, partindo de fór-sições 1lllgUIStIcascontidas nos textos, enunciados, preceitos, dispo-

, a cançat"h   d . - d 'd .'HOSa etermmaçao e um conteu o normatIvo.

o   intérprete desvencilha a norma do seu invólucro (o texto);neste sentido, ele "produz a norma".

Abrangendo textos e fatos, como vimos, a interpretação do direi-to opera a mediação entre o caráter geral do texto normativo e suaaplicação particular: isto é, opera a sua inserção na vida.

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VII 

 A PRODUÇÃO DA NORMA PELO INTÉRPRETE

 Não estou, no entanto, a afirmar que o intérprete, literalmente,

crie a norma.

 Note-se bem: ele não é um criador   ex nihito;   ele produz a norma,

sim, mas não no sentido de fabricá-la, porém no de reproduzi-la.

O produto da interpretação é a norma. Mas ela já se encontra,

 potencialmente, no invólucro do   texto normativo.   Vou me valer mais

adiante, pretendendo deixar isso bem mais claro, de uma metáfora, a

metáfora da   Vênus de Milo.

Por ora, repitamos: a norma encontra-se, em estado de potência,

involucrada no texto. Mas ela se encontra assim nele involucrada ape-

nas parcialmente, porque os fatos também a determinam - insisto

nisso: a norma é produzida, pelo intérprete, não apenas a partir de ele-

mentos que se desprendem do texto (mundo do dever-ser), mas tam-

 bém a partir de elementos do caso ao qual será ela aplicada, isto é, a

 partir de elementos da realidade (mundo do ser). Interpreta-se tam-

 bém o  caso,   necessariamente, além dos  textos   e da realidade - no mo-

mento histórico no qual se opera a interpretação - em cujo contexto

serão eles aplicados.

A norma encontra-se em estado de potência involucrada no textoe o intérprete a desnuda. Neste sentido - isto é, no sentido de desven-

cilhamento da norma de seu invólucro: no sentido de fazê-la brotar do

texto, do enunciado - é que afirmo que o intérprete "produz a norma".

O intérprete compreende o sentido originário do texto e o mantém

(deve manter) como referência de sua interpretação [Gadamer].

VIII 

 A METÁFORA DA VÊNUS DE MILO

Suponha-se a entrega, a três escultores, de três blocos de mármo-

re iguais entre si, encomendando-se, a eles, três   Vênus de Milo.

Ao final do trabalho desses três escultores teremos três   Vênus de

 Milo,   perfeitamente identificáveis como tais, embora distintas entre

si: em uma a curva do ombro aparece mais acentuada; noutra as

maçãs do rosto despontam; na terceira os seios estão túrgidos e os

mamilos enrijecidos. Não obstante, são, definidamente, três   Vênus de

 Mito -   nenhuma   Vitória de Samotrácia.

Esses três escultores "produziram" três   Vênus de Mito.   Não

gozaram de liberdade para, cada um ao seu gosto e estilo, esculpir as

figuras ou símbolos a que a inspiração de cada qual aspirava - o prin-

cípio de existência dessas três   Vênus de Mito   não está neles.

Tratando-se de três escultores experimentados - o que de fato

ocorre na metáfora de que lanço mão -, dirão que, em verdade, não

criaram as três   Vênus de Mito.   Porque lhes fora determinada a produ-

ção de três   Vênus de Mito   (e não de três   Vitórias de Samotrácia,   ou

outra imagem qualquer) e, na verdade, cada uma dessas três   Vênus de

 Mito   já se encontrava em cada um dos blocos de mármore eles-

dirão - apenas desbastaram o mármore, para que elas brotas~em, talcomo se encontravam, ocultas, no seu cerne.

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 IX 

 MAIS DE UMA VÊNUS DE   MIL O

Vê-se, assim, que diferentes intérpretes - qual diferentes escul-

tores "produzem" distintas   Vênus de Milo -   "produzem", a partir do

mesmo texto normativo, distintas normas jurídicas. Parafraseando

Kelsen, afirmo que dizer que uma dessas   Vênus de Milo   é fundada na

obra grega não significa, na verdade, senão que ela se contém dentro

da moldura ou quadro que a obra grega representa - não significa que

ela é  a Vênus de Milo,   mas apenas que é uma   das   Vênus de Milo  que

 podem ser produzidas dentro da moldura da obra grega.

X

 INTERPRETAÇÃO   =  APLICAÇÃO; INTERPRETAÇÃO DOS TEXTOS E DOS FATOS

 Não será demasiada a insistência neste ponto: interpretação e

aplicação não se realizam autonomamente. A separação em duas eta-

 pas - de interpretação e aplicação - decorre da equivocada concep-

ção da primeira como mera operação de subsunção.

O intérprete discerne o sentido do texto a partir e em virtude de

um determinado caso dado; a interpretação do direito consiste em con-

cretar a lei em cada caso, isto é, na sua aplicação [Gadamer]. Assim,existe uma equação entre interpretação e aplicação: não estamos,

aqui, diante de dois momentos distintos, porém frente a uma só ope-

ração [Marí]. Interpretação e aplicação consubstanciam um processo

unitário [Gadamer], superpondo-se.

Assim, sendo concomitantemente aplicação do direito, a interpre-

tação deve ser entendida como produção prática do direito, precisa-

mente como a toma Friedrich Müller: não existe um terreno compos-

to de elementos normativos   (=   direito), de um lado, e de elementos

reais ou empíricos   (=  realidade), do outro.

 _ Vou repetir, mais uma vez: a norma é produzida pelo intérprete,

nao apenas a artir de elementos . ativo. o dev r-ser, mas também a artir de el caso ao ual será

ela aplicada, isto e, a partir de dados da realidade (mundo do ser).- - - - -   --

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 XI 

 A   CHAMADA "MOLDURA DA NORMA"

Logo, o que incisivamente deve aqui ser afirmado, a partir da

metáfora de Kelsen, é o fato de a "moldura da norma" ser, diversa-

mente, moldura do texto, mas não apenas dele; ela é, concomitante-

mente, moldura do texto e moldura do caso. O intérprete interpreta

também o caso, necessariamente, além dos textos, ao empreender a

 produção prática do direito.

Por isso inexistem soluções previamente estruturadas, como pro-

dutos semi-industrializados em uma linha de montagem, para os pro- blemas jurídicos.

O trabalho jurídico de construção da norma aplicável a cada caso

é trabalho artesanal. Cada solução jurídica, para cada caso, será sem-

 pre, renovadamente, uma nova solução. Por isso mesmo - e tal deve

ser enfatizado -, a interpretação do direito realiza-se não como mero

exercício de leitura de textos normativos, para o quê bastaria ao intér-

 prete ser alfabetizado.

 XI I 

O RELATO DOS FATOS

 No decorrer desse trabalho, como a interpretação abrange tam-

 bém os fatos, o intérprete os reconforma, de modo que podemos dizer 

que o direito institui a sua própria realidade. Daí a importância do

relato dos fatos   (= narrativa dos fatos a serem considerados pelo

intérprete) para a interpretação.

Pois é certo que os fatos não são, fora de seu relato (isto é, fora

do relato a que correspondem), o que são.

O que desejo afirmar é a fragilidade do compromisso entre orelato e seu objeto, entre o relato e o relatado.

Esse compromisso é, antes de mais nada, comprometido em

razão (1) de jamais descrevermos a realidade; o que descrevemos é o

nosso modo de ver a realidade. Além de não descrevermos a realida-

de, porém o nosso modo de ver a realidade, (2a) essa mesma realida-

de determina o nosso pensamento e, (2b) ao descrevermos a realida-

de, nossa descrição da realidade será determinada (i) pela nossa

 pré-compreensão dela   (=  da realidade) e (ii) pelo lugar que ocupamos

ao descrever a realidade   (= nosso lugar no mundo e lugar desde o qual

 pensamos). Por isso caberá aqui tudo o que digo no Ensaio sobre a

 pré-compreensão.. Também no que tange aos fatos não existe, no direito, o  verda-

~elro.   Inútil buscarmos a   verdade dos fatos,   porque os fatos que

~mportarão na e para a construção da norma são aqueles recebi-

os/pe~cebidos pelo intérprete - eles, como são percebidos pelo intér- prete e que' .• - /.. - d - / . - d ' mlormarao conlormarao a pro uçao cnaçao a norma.

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 XI II 

 A  INTERPRETAÇÃO DO DIREITO

Alcançado este ponto de minha ex~osição, UI~a bre~e ~íntese

 pode ser ensaiada, na afirmação de que a mterp:~taçao .do direIto ~em

caráter constitutivo - não meramente declaratono, pOIS- e consiste

na produção, pelo intérprete, a partir de texto.s n,o~ativos e dos fatos

atinentes a um determinado caso, de normas JundIcas a serem ponde-

radas para a solução desse caso, mediante a definição de uma norma

de decisão.

 Interpretar    é, assim, dar concreção   (=   concretizar) ao direito. Neste sentido, a interpretação   (=  interpretação/aplicação) oper~ a

inserção do direito na realidade; opera a mediação entre o carater 

geral do texto normativo e sua aplicação particular; em outros termos,

ainda: opera a sua inserção na vida. "

Lembro, neste passo, a exposição de Gadamer sobre o pe~s~-;I

mento de Aristóteles: toda lei se encontra em uma tensão necessana

em relação à concreção do atuar, porque é geral e .n~opode cont~r. em

si a realidade prática em toda sua concreção; a leI e sempre defIcien-

te, não porque o seja em si mesma, mas sim porque, em presença ~a

ordenação a que se referem as leis, a realidade humana é sempre defI-

ciente e não permite uma aplicação simples das mesmas.

Isto é: a interpretação - que é interpretação/aplicação - vai do

universal ao singular, através do particular, do transcendente ao con-

tingente; opera a inserção das leis   (=  do direito) no mundo do ser 

(=  mundo da vida).

r )

Isto posto, há de vir a indagação: a interpretação/aplicação do

direito é uma ciência? __"~

A interpretação do ~eito é uma prudêncig; -   o   saber prático,   a

 phrónesis,   a que refere Aristóteles.

Cogitam os que não são intérpretes autênticos, quando do direi-

to tratam, da juris prudentia,   e não de uma juris scientia;   o intérpre-

te autêntico, ao produzir    normas jurídicas, pratica   ajuris prudentia,   e

não  juris scientia.

O intérprete atua segundo   l 'me a lógica da conseqüência [ parato]: ~ lógica Jurídica é   ª    da .

esc várias possibilidades corretas. Interpretar um texto nor-

mativo significa esc n re várias interpretações possíveis,

de modo que a escolha seja apresentada como adequada [Larenz~

norma não é QQjetode demonstração, mas de justificação. Por isso a

alternativa verdadeiro/falso é estranha aó direito; no direito há apenas

o aceitável   Uustificável). O sentido do justo comporta sempre mais de

uma solução [Heller].

Daí por que afirmo que a problematização dos textos normativos

não se dá no campo da ciência: ela se opera no âmbito da prudência,

expondo o intérprete autêntico ao desafio desta, e não daquela. São

distintos, um e outro: na ciência, o desafio de, no seu campo, existi-

re~ questões para as quais ela (a ciência) ainda não é capaz de con-

fenr respostas; na prudência, não o desafio da ausência de respostas,

mas da existência de múltiplas soluções corretas para uma mesmaquestão [Adomeit].

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 xv

 INVIABILIDADE DA ÚNICA SOLUÇÃO CORRETA

Dá-se na interpretação de textos normativos algo análogo ao que

se passa na interpretação musical.

 Não há uma única interpretação correta   (exata)   da  Sexta Sinfonia

de Beethoven: a  Pastoral   regida por Toscanini, com a Sinfônica de

Milão, é diferente da  Pastoral   regida por von Karajan, com a Filar-

mônica de Berlim. Não obstante uma seja mais romântica, mais der-

ramada, a outra mais longilínea, as duas são autênticas - e corretas.

 Ne o peremptoriamente a exisC la  Qll:-reta ve Ira, po an o para o caso jurídico - ainda que o intérpre-

te esteja, através dos pnncIpios, vincula o pe o sistema jurídico. Nem

mesmo o juiz Hércules [Dworkin] estará em condições de encontrar 

 para cada caso uma resposta verdadeira, pois aquela que seria a única

resposta correta simplesmente não existe.

O fato é que, sendo a interpretação convencional, não possui rea-

lidade objetiva com a qual possa ser confrontado o seu resultado (o

interpretante), inexistindo, portanto, uma interpretação objetivamen-

te verdadeira [Zagrebelsky].

 XV I 

 PRUDÊNCIA, PRÉ-COMPREENSÃO E   CÍRCULO HERMENÊUTICO

A evolução da reflexão hermenêutica permitiu a superação da

concepção da. interpretação como técnica de subsunção do fato no

álveo da previsão legal e instalou a verificação de que ela se desen-

volve a partir de pressuposições.

Pois a compreensão escapa ao âmbito da ciência. O  compreender 

é algo existencial, consubstanciando, destarte, experiência. O que se

compreende, no caso da interpretação do direito, é algo - um "objeto"- que não pode ser conhecido independentemente de um "sujeito".

Quando afirmo ser uma prudência o direito estou a dizer, tam-

 bém, que o saber prático que interpreta é saber prático do sujeito, isto

é, do intérprete - quer dizer, daquele intérprete.

Ser uma prudência o direito, isso também explica sua facticida-

de e historicidade, razão pela qual sua operacionalização reclama o

manejo de noções, e não somente de conceitos.

Ensina mais ainda a reflexão hermenêutica: ensina que o proces-

so de interpretação dos textos normativos encontra na pré-compreen-

são o seu momento inicial, a partir do qual ganha dinamismo um

~ovimento circular, que compõe o círculo hermenêutico - matériasas quais dedico atenção no Ensaio.

O que neste passo desejo enfatizar, contudo, é o fato de a inter-

 pretação consubstanciar uma experiência conflitual do intérprete, de

modo tal que a norma de decisão por ele produzida traz bem impres-sas em s' .

I as marcas desse(s) conflIto(s).

det Le~bro a observação de Frosini: a decisão judicial considera e é

ermlllada pelas palavras da lei e pelos antecedentes judiciais; pela

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42 ENSAIO E DISCURSO SOBRE A INTERPRETAÇÃO/APLICAÇÃO DO DIREITO

figura delitiva que se imputa; pelas interpretações elabora~as pelasduas ou mais partes em conflito; pelas regras processuaIs; pelasexpectativas de justiça nutridas pela consciência da soc~edade; ~inal-mente, pelas convicções do próprio juiz, que pode estar mfluencIado,de forma decisiva, por preceitos de ética religiosa ou social, por esquemas doutrinais em voga ou por instâncias de ordem política.

E mais: o juiz decide sempre dentro de uma situação históricadeterminada, participando da consciência social de seu tempo, consi-derando o direito todo, e não apenas um determinado texto normativo.

Por isso mesmo - como direi ao final deste Discurso -, o direitoé contemporâneo à realidade.

I!I

1

I

 XV II 

CÂNONES E PAUTAS   PARA A INTERPRETAÇÃO

É necessário ainda dizermos que a reflexão hermenêutica repu-dia a metodologia tradicional da interpretação e coloca sob acesas crí-ticas a sistemática escolástica dos métodos, incapaz de responder àquestão de se saber por que um determinado método deve ser, emdeterminado caso, escolhido.

Inexistindo regras que ordenem, hierarquicamente, o uso doscânones hermenêuticos, eles acabam por funcionar como justificati-

vas a legitimar os resultados que o intérprete se predeterminara aalcançar; o intérprete faz uso deste ou daquele se e quando lhe aprou-ver, para justificá-los.

 Não obstante, a prudência recomenda seja a interpretação ade-quada a algumas pautas, a três das quais desejo deitar alguma aten-ção, (i) a primeira relacionada à interpretação do direito no seu todo;(ií) a segunda, à finalidade do direito; (iii) a terceira, aos princípios.

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 XV/lI 

 NÃO SE INTERPRETA O DIREITO EM TIRAS

A interpretação do direito é interpretação   do direito,   no seu todo,

não de textos isolados, desprendidos   d~

~ta o direito em tiras, aos pedaços.--------

A interpretação de qualquer texto de direito impõe ao intérprete,

sempre, em qualquer circunstância, o caminhar pelo percurso que se

 projeta a partir dele - do texto - até a Constituição. Um texto de direi-

to isolado, destacado, desprendido do sistema jurídico, não expressa

significado normativo algum.

X/X

 A  FINALIDADE DO DIREITO

 E AS NORMAS-OBJETIVO

Ensina von Jhering que   afinalidade   é o criador de todo o direito

e nã() existe norma ou instituto jurídico que não deva sua origem a

uma finalidade.

Daí a importância das normas-objetivo, que surgem definida-

mente a partir do momento em que os textos normativos passam a ser 

dinamizados como instrumentos de governo. O direito passa a ser 

operacionalizado tendo em vista a implementação de políticas públi-

cas, políticas referidas a fins múltiplos e específicos. Pois a definição

dos fins dessas políticas é enunciada precisamente em textos norma-

tivos que consubstanciam normas-objetivo e que, mercê disso, pas-

sam a determinar os processos de interpretação do direito, reduzindo

a amplitude da moldura do texto e dos fatos, de modo que nela não

cabem soluções que não sejam absolutamente adequadas a tais nor-

mas-objetivo.

A contemplação, no sistema jurídico, de normas-objetivo impor-

ta a introdução, na sua "positividade", de fins aos quais ele - o siste-

ma - está voltado. A pesquisa dos fins da norma, desenrolada no con-

texto funcional, toma-se mais objetiva; a metodologia teleológicarepousa em terreno firme.

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x x

OS PRINCÍPIOS

Este pretende ser um Discurso sobre a interpretação, não sobre os

 princípios. Quanto a eles remeto o leitor à exposição desenvolvida no

Ensaio. Sinteticamente, contudo, permito-me observar o que segue.

A última década do século passado é marcada, no campo da

meditação sobre o direito, pelo paradigma dos princípios.

Mas isso se passou de tal modo que, por um lado, foram eles

 banalizados e, por outro, grande parte do que tem sido referido como

doutrina produzida em torno deles dá testemunho acabado de que as pessoas que possuem inteligência bem-formada correm sempre o

risco de supor que a criatividade de que são dotadas é suficiente para

suprir a falta de leitura de que padecem.

Toma-se a nuvem por Iuno, come-se gato por lebre e tudo passa

a ser "principializado" - se é que o termo já foi cunhado. Pautas nor-

mativas - como a da proporcionalidade e a da razoabilidade - são

tidas como princípios e paira imprecisão absoluta quanto ao que se

 possa ou deva ter como   princípios de direito,   coisa distinta dos prin-

cípios gerais do direito.

Ora, se o direito é definido, enquanto   sistema,   como uma ordem

axiológica ou teleológica de princípios [Canaris], cumpre indagarmosquais princípios compõem essa ordem.

I X X I 

OS PRINCÍPIOS DE DIREITO

Compõem essa ordem, inicialmente, (i) os princípios explícitos,

recolhidos no texto da Constituição ou da lei; após, (ii) os  princípios

implícitos,   inferidos como resultado da análise de um ou mais precei-

tos constitucionais ou de uma lei ou conjunto de textos normativos da

legislação infraconstitucional (exemplos: o   princípio da motivação

do ato administrativo -   art. 93, X, da Constituição; o   princípio da

imparcialidade do juiz -   arts. 95, parágrafo único, e 5º, XXXVII, da

Constituição); por fim, (iii) os princípios gerais de direito,   também

implícitos,   coletados no direito pressuposto, qual o da   vedação do

enriquecimento sem causa.

 Note-se bem - mas  bem   mesmo - que estou a referir, aqui, princí-

 pios gerais  de  direito, e não os chamados "princípios gerais do direito".

A alusão ao   direito pressuposto   torna necessária uma sugestão,

que formulo ao leitor, no sentido de que examine no Ensaio a expo-

sição desenvolvida sobre o tema, bem assim sobre a distinção entre o

direito e os direitos.

Isso permitirá a perfeita compreensão de que os  princípios gerais

de direito - princípios implícitos,   existentes no   direito pressuposto -

não são resgatados fora do ordenamento jurídico, porém   descobertos

no seu interior.   É   imperioso que isso fique muito claro, para quenenhuma dúvida a respeito possa ser levantada: esses princípios, se

existem, já estão positivados; se não for assim, deles não se trata.

Os princípios de direito que descobrimos no interior do ordena-

mento jurídico são princípios   deste   ordenamento jurídico,   deste  direito.

Os princípios em estado de latência existentes sob cada ordenamento -

isto é, sob cada   direito posto -   repousam no   direito pressuposto   que a

ele corresponda. Neste   direito pressuposto   os encontramos ou não os

encontramos; de lá os resgatamos, se nele preexistirem.

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 XX II 

 A NÃO-TRANSCENDÊNCIA DOS PRINCÍPIOS

o  que sustento, firmemente, é a não-transcendência dos princí- pios implícitos, princípios gerais de um determinado direito.

Sua "positivação" não se dá mediante seu resgate no universo dodireito natural, como tantos supõem; ela não é  constituída,  essa "posi-tivação", mas simplesmente   reconhecida,   no instante do seu desco-

 brimento (do princípio) no interior do direito pressuposto da socieda-de a que corresponde.

Vamos ser bem claros: eles não são "positivados", visto já serem positivos. É uma tolice imaginar-se que o juiz, o jurista, o doutrina-dor, possa ser autor da alquimia de transformar algo exatamente noque esse algo sempre fora.

Insisto: os princípios gerais de direito não constituem criação jurisprudencial; e não preexistem externamente ao ordenamento. Aautoridade judicial, ao tomá-los de modo decisivo para a definição dedeterminada solução normativa, simplesmente comprova a sua exis-tência no bojo do ordenamento jurídico, do direito que aplica, decla-rando-os. Eles são, destarte, efetivamente   descobertos   no interior dedeterminado ordenamento. E o são - repito-o - justamente porqueneste mesmo ordenamento (isto é, no interior dele) já se encontra-vam, em estado de latência.

III

If 

 XX III 

 PRINCÍPIO   É   NORMA JURÍDICA

Os princípios, todos eles - os explícitos e os implícitos -, cons-tituem norma jurídica.

Também os princípios gerais de direito - e não será demasiada ainsistência, aqui, em que se trata de princípios de um determinadodireito - constituem, estruturalmente, normas jurídicas.

 Norma jurídica   é gênero que alberga, como espécies, regras e princípios - entre estes últimos incluídos tanto os princípios explíci-

tos quanto os princípios gerais de direito.Quanto à distinção entre princípio e regra remeto o leitor ao texto

do Ensaio, onde dela trato criticamente.

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KELSEN E A POSITIVAÇÃO DOS PRINCÍPIOS   51

 XX IV 

 KELSEN    E A POSITIVAÇÃO DOS PRINCÍPIOS

Parece-me mais importante, a esta altura de meu Discurso, lem- brar a crítica de Kelsen a Esser.

Kelsen dedica todo um capítulo da   Teoria Geral das Normas   àcrítica da exposição de Esser sobre os princípios, recusando qualquer importância jurídica a eles.

O único fundamento de validade da norma individual queexpressa a decisão judicial de um caso concreto - diz Kelsen - é o

 princípio formal, de direito positivo, da força da coisa julgada. Nenhum outro princípio - diz ele - pode fundamentar essa validade.

Por isso, os princípios morais, políticos ou dos costumes não podem ser chamados de jurídicos   senão na medida em que influen-ciam a criação de normas jurídicas individuais pelas autoridadescompetentes. Mas isso não significa que eles sejam "positivados" ouque preencham as características das normas jurídicas.

Essa crítica de Kelsen tem sido geralmente ignorada pelos auto-res que se dedicam à análise do tema dos princípios, seja por deslei-xo, seja por falta de resposta adequada, creio.

De minha parte, jamais aceitei a idéia, corrente, de que o intér-

 prete autêntico "positive" os  princípios implícitos   ao criar normas dedecisão.

E isso pela simples razão de que eles não necessitam ser "positi-vados", visto que já se encontram integrados no sistema jurídico,cumprindo ao intérprete exclusivamente descobri-los, em cada caso.

Os princípios   explícitos,   esses se manifestam de modo expresso.Os demais,   implícitos,   não são "positivados", mas descobertos nointerior do ordenamento; pois eles já eram, nele,   princípios de direi-

to positivo,   embora latentes. Em outros termos: o intérprete autênticonão "positiva" nada. O princípio já estava positivado. Se n~o fosseassim, não poderia ~r induzido. Devo insistir e deixar mUIto bemvincado este ponto: ato de "descoberta" ., . te emdeterminad namento é declaratório ' constitutivo. Diante

;sso efetivamente se desvanece a crítica de Kelsen.

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 xxv

OPOSIÇÃO E CONTRADIÇÃO ENTRE PRINCÍPIOS

Uma das falsas novidades introduzidas pelo paradigma dos prin-

cípios é a relativa à oposição ou contradição - como já mencionavaGény - entre princípios.

Tudo quanto os mais ingênuos pensam ter sido em relação a isso

inventado nas duas últimas décadas do século passado já em 1965

Poulantzas ensinava, ao afirmar que o juiz deve resolver a contradi-

ção entre dois princípios jurídicos, em relação a um caso concreto,

referindo-se à infra-estrutura (isto é, à realidade); o que o juiz deve

apurar é qual dos dois princípios assume, no caso concreto, importân-cia mais significativa em relação aos dados da realidade.

Observo no Ensaio - e desejo repeti-lo aqui - que a falta de refle-

xão tem levado alguns analistas do pensamento da doutrina a confun-

dir valores (teleológicos) com princípios (deontológicos), colocando-se

à deriva diante de uma mal-digerida apreensão da exposição dworkini-

niana, que em rigor exclui os princípios do âmbito normativo.

Os conflitos e as oposições entre princípios são conflitos e opo-

sições entre normas. A superposição entre regra e norma, de um lado,

e princípio, de outro, só pode resultar de uma contestação do positi-

vismo à Dworkin, de incompreensão ou do desiderato de confundir.

A tensão entre princípios é própria ao sistema jurídico, sempre,

desde sempre tendo sido assim. O que torna complexa a compreen-

são dessa circunstância é o fato de o pensamento tradicional ensinar 

que o direito é dotado de uma universalidade plena (ele é abstrato egeral), na qual não cabem exceções.

. .Mas é precisamente o inverso disso o que se dá. A inserção do

dIreito no mundo da vida, mediante a sua interpretação/aplicação,

opera-se em plano que não se pode particularizar senão mediante aexceção, caso a caso. Os mais velhos já o haviam percebido.

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