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Editorial · 2012-12-30 · do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI) e o Código do Imposto Municipal sobre as Transacções Onerosas de Imóveis (CIMT), estabele-ceu, no nº 4

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PropriedadeVida Económica - Editorial S. A.

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R. Gonçalo Cristóvão, 1116º Esq. 4049-037 Porto Telef.: 223 399 400Fax: 222 058 098E-mail: [email protected]

DElEGAÇÃO EM lISbOA

Av. Fontes Pereira de Melo, nº 61069-106 lisboa Telef.: 217 937 747Fax: 217 937 748

IMPRESSÃO

Uniarte Gráfica - Porto

Registo nº 108640 no ICS

Nº 6 | Setembro/Outubro 2010

3REVISTA FISCAl Setembro/Outubro | 2010

EditorialO Decreto – lei nº 287/2003, de 12 de Novembro, pelo qual se pro-

cedeu à reforma da tributação do património e que aprovou o Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI) e o Código do Imposto Municipal sobre as Transacções Onerosas de Imóveis (CIMT), estabele-ceu, no nº 4 do seu artigo 15º que, no prazo máximo de 10 anos após a entrada em vigor do CIMI – que ocorreu em 1 de Dezembro de 2003 –, seria promovida uma avaliação geral dos prédios urbanos.

Importa relembrar que, com a reforma da tributação imobiliária, pretendeu-se, por um lado, corrigir os valores inscritos nas matrizes com a inflação acumulada e, por outro lado, criar uma fórmula para os imóveis que se transaccionassem após o ano de 2003. A expectativa era a de que a respectiva receita fiscal crescesse significativamente como consequência do aumento do valor dos imóveis.

Efectivamente, a grande novidade da reforma da tributação do patri-mónio foi a criação de uma fórmula objectiva de determinação do valor patrimonial tributário dos imóveis, baseada na área, localização, tipo de utilização, características, etc. Esta foi a forma encontrada para fazer a aproximação dos valores patrimoniais constantes das matrizes prediais aos valores de mercado dos imóveis.

Porém, a eficácia daquela reforma ficou logo comprometida, à parti-da, por se haver adiado o momento da reavaliação geral e se ter optado por uma avaliação progressiva, à medida em que os imóveis fossem sen-do transaccionados.

Na verdade, a reavaliação dos imóveis é um dos capítulos mais po-lémicos do sistema fiscal português e, volvidos que são quase 7 anos sobre a referida data, verifica-se que muito dificilmente os Serviços de Finanças vão conseguir cumprir a indicada meta temporal para proce-derem à reavaliação do valor patrimonial de todos os imóveis urbanos, pois pouco mais de um terço desses imóveis foi, até agora, reavaliado.

A consequência é inequívoca e redunda numa situação de absoluta injustiça: os proprietários de imóveis adquiridos depois de 2003 vão pa-gar um imposto sobre o património imobiliário – o IMI – mais elevado do que os proprietários de imóveis nunca transaccionados após essa data, porquanto os valores patrimoniais destes últimos imóveis, inscritos nas respectivas matrizes prediais, são irrisórios face aos seus valores de mercado. Assim, cerca de dois terços dos contribuintes que são proprie-tários de prédios urbanos mantêm uma espécie de privilégio fiscal face ao outro terço, o que se afigura inadmissível.

4 REVISTA FISCAl Setembro/Outubro | 2010

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SumárioActualidade

Análise e Doutrina O crime de abuso de confiança fiscal

JurisprudênciaAnotadaResumosSumários

SínteseJurisprudênciaLegislação FiscalDoutrina Fiscal

União EuropeiaLegislação Jurisprudência

Espanha

actualidade

5REVISTA FISCAl Setembro/Outubro | 2010

Portal das Finanças a autentica-ção com Cartão de Cidadão

A DGCI disponibilizou um novo serviço no Portal das Finanças (www.portaldasfinancas.gov.pt), com vista a permitir o acesso ao Portal das Finanças por meio da utilização do Cartão de Cidadão. Para tanto, torna-se ne-cessário dispor de Cartão de Cidadão com certificados válidos, leitor de cartões para permitir a comunicação com o Cartão, acesso à internet e software para utiliza-ção do cartão (disponível em www.cartaodecidadao.pt). O utilizador deverá, então, aceder ao Portal das Finaças com o Cartão de Cidadão utilizando o botão ou ícone apresentados no ecrã e seguindo os passos aí descritos. O utilizador será redireccionado para o site do Fornece-dor de Autenticação, onde terá de autorizar o envio da informação indicada para o Portal das Finanças e, segui-damente, facultar os dados solicitados. Por fim, o utiliza-dor é redireccionado de volta para o Portal das Finanças já devidamente autenticado.

A autenticação com recurso ao Cartão de Cidadão não inviabiliza a utilização do conjunto NIF e senha como método alternativo de acesso. Por outro lado, caso uma entrega tenha sido efectuada com recurso a auten-ticação com o Cartão de Cidadão, tal não implica que na respectiva consulta seja também necessário efectuar a autenticação com o Cartão de Cidadão.

De sublinhar ainda o facto de ser possível aceder com o Cartão de Cidadão mesmo quando não se dispo-nha de senha do Portal das Finanças, já que, no momen-to da primeira autenticação, passará a ser possível aceder de imediato às funcionalidades do Portal das Finanças.

Acordos de Troca de Informações em Matéria Fiscal

O Estado Português assinou, no passado mês de Julho, três Acordos sobre a Troca de Informações em Matéria Fiscal com os Governos das Ilhas de Jersey, Guernsey e Man. Ainda durante o mês de Julho, foram assinados Acordos com o Governo de Santa lúcia e com o Governo de St. Kitts and Nevis.

Estes acordos têm por base o Modelo de Acor-do sobre Troca de Informações em Matéria Fiscal da OCDE, constituindo instrumentos legais que atribuirão competência às autoridades portuguesas para solicitar às autoridades competentes destes territórios elementos

relevantes ao combate à fraude e evasão fiscal, designa-damente informações sobre a movimentação de fundos bem como sobre a titularidade de sociedades, fundações, trusts ou outro tipo de veículos aí criados.

Com a entrada em vigor dos referidos acordos, po-derão aqueles territórios ser retirados da lista constante da Portaria n.º 150/2004, de 13 de Fevereiro (diploma que aprova a lista dos países, territórios e regiões com regimes de tributação privilegiada, claramente mais fa-voráveis).

É, pois, dada continuidade ao processo de negocia-ção destes acordos, assim concretizando um dos objec-tivos fixados na área fiscal pela lei do Orçamento do Estado para 2010. Estão também em curso trabalhos que deverão brevemente conduzir à assinatura de acor-dos semelhantes com outros territórios.

A entrada em vigor do Regime Excepcional de Regu-larização Tributária (em aplicação até 16 de Dezembro de 2010) confere especial relevância ao alargamento da rede nacional de Acordos sobre Troca de Informações. No mês de Maio, foi publicada a portaria que aprova o modelo de declaração de regularização tributária de elementos patrimoniais colocados no exterior e as res-pectivas instruções de preenchimento, definindo as ca-racterísticas dos documentos a apresentar por empresas e particulares que desejem até essa data regularizar a sua situação tributária.

Lista de devedores ao Fisco

A DGCI actualizou, recentemente, a lista de Deve-dores ao Fisco, da qual passam a constar mais de 3098 novos devedores, totalizando 24.318 contribuintes.

Do universo de novos devedores integrados na lis-ta, mais de 52% são administradores e gerentes de em-presas, que foram legalmente responsabilizados pelas respectivas dívidas (percentagem que corresponde a um total de 1627 contribuintes).

O valor das dívidas já recuperadas pela Administra-ção Fiscal no seguimento do procedimento de publici-tação ultrapassou já 1.129.972.455 euros, sendo que o montante de dívidas recuperadas no decurso do ano de 2009 atingiu os 322.012.363 euros.

O número de pessoas colectivas publicitadas é de 8 149, enquanto o número de pessoas singulares incluídas ascende a 16.169.

Da lista de devedores constam contribuintes que possuem dívidas fiscais ao Estado anteriores a 31 de De-

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6 REVISTA FISCAl Setembro/Outubro | 2010

zembro de 2009. Verifica-se, nestes casos, que a situação de incumprimento relativa ao dever de pagamento per-siste, apesar da actuação da administração fiscal no senti-do de que os devedores regularizem a situação e das me-didas de coerção já adoptadas nos respectivos processos.

Os devedores que constem da lista de Devedores e que regularizem a sua situação tributária, através do pagamento das dívidas, serão excluídos da aludida lista. Esta actualização é feita de forma diária.

Certidões de domicílio na Internet

O Ministério das Finanças e da Administração Públi-ca anunciou a criação de um novo serviço, que possibili-tará a emissão de certidões de residência aos contribuin-tes através da internet.

Além das vantagens óbvias ao nível da comodida-de proporcionada aos contribuintes, que assim evitam deslocações desnecessárias aos serviços de finanças, assinala-se o facto de este serviço ser prestado de forma gratuita, ao contrário do que sucede com as certidões emitidas em papel nos Serviços de Finanças.

A certidão emitida é acompanhada de um código seguro de validação, que depois servirá para verificação por parte dos interessados, através do site da DGCI (www.portaldasfinancas.gov.pt), que garante a sua auten-ticidade.

Espera-se que a criação deste serviço permita di-minuir os custos financeiros, temporais e burocráticos para os contribuintes e, ao nível da DGCI, libertar re-cursos internos para tarefas de maior valor acrescentado. Procura-se, desta forma, dar cumprimento aos objecti-vos traçados no Plano Para a Qualidade no Serviço ao Contribuinte, que serve de enquadramento a este novo serviço.

Dupla tributação – conclusão de negociações com as autoridades dos Barbados

De acordo com comunicado divulgado pelo Gabine-te do Ministro de Estado e das Finanças, o Estado Por-tuguês concluiu com as autoridades de barbados nego-ciações com vista à celebração de uma convenção para evitar a dupla tributação em matéria de impostos sobre o

rendimento. Esta convenção deverá ser, proximamente, objecto de assinatura.

O Governo português tem vindo a desenvolver es-forços no sentido de minorar os efeitos dupla tributação internacional e os custos fiscais associados à internacio-nalização das empresas portuguesas, tendo, para tanto, vindo a alargar a rede portuguesa de convenções para evitar a dupla tributação.

A convenção que irá agora ser celebrada, e que tem por base o Modelo da OCDE, deverá pernitir à admi-nistração fiscal portuguesa proceder à troca de informa-ções com as autoridades de barbados, reforçando, desta forma, o combate à evasão e fraude fiscal.

No decurso do ano de 2010, foram concluídas ne-gociações de convenção de dupla tributação com a Co-lômbia e o Panamá, estando ainda em curso negociações com o Paraguai, o Peru e o Equador. Foram também ce-lebrados recentemente acordos de troca de informações em matéria fiscal com as bermudas, Ilhas Caimão, Santa lúcia e St Kitts & Nevis, estando prevista a celebração de mais acordos deste tipo ainda em 2010.

Operação “Resgate Fiscal”

De acordo com comunicado divulgado pelo Ministé-rio das Finanças e da Administração Pública, a operação “Resgate Fiscal”, lançada em Agosto de 2008, permitiu, até Junho de 2010, a recuperação de 812 milhões de eu-ros por parte da DGCI.

A operação “Resgate Fiscal” tem como objectivo recuperar receitas fiscais desviadas por empresas infrac-toras e não entregues, de forma dolosa, nos cofres do Estado (estando aqui compreendidas, nomeadamente, as retenções efectuadas a trabalhadores e o imposto re-cebido previamente de clientes).

No âmbito da operação levada a cabo pela DGCI, verificou-se que os vinte maiores devedores que efec-tuaram o pagamento das prestações tributárias em falta deram origem, por si só, a um encaixe de 124 milhões de euros. Estes contribuintes representam 0,03% do to-tal do universo dos infractores, dando todavia origem a 15,19% das receitas fiscais recuperadas naquele período. Desde o início da operação, 70,25% dos infractores (o que corresponde a 36.675 contribuintes) já regulariza-ram parte ou a totalidade das dívidas fiscais.

Embora os ilícitos fiscais se registem em todos os sectores de actividade económica, verifica-se que a fal-ta de entrega dolosa de impostos nos cofres do Estado

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é particularmente gravosa nos sectores da construção civil, restauração, manutenção e reparação de veículos automóveis, transportes, vestuário e actividades de con-tabilidade.

Reembolsos do IVA

A Comissão Europeia adoptou recentemente uma proposta de adiamento do prazo para a apresentação de pedidos de reembolso do IVA relativos a 2009. A pro-posta da Comissão vai no sentido de que seja concedido mais tempo aos contribuintes para a apresentação dos seus pedidos de reembolso do IVA, já que se verifica uma aplicação tardia, pelos Estados-Membros, do novo procedimento de reembolso do IVA, que entrou em vi-gor em 1 de Janeiro de 2010. A Comissão propõe ain-da uma harmonização de alguns elementos dos portais electrónicos nacionais de reembolso do IVA, por forma a que seja melhorada a sua interoperabilidade, tornando-os igualmente mais acessíveis aos contribuintes.

Em 1 de Janeiro de 2010 entrou em vigor a Direc-tiva 2008/9/CE do Conselho, de 12 de Fevereiro de 2008 , que define as modalidades de reembolso do im-posto sobre o valor acrescentado previsto na Directiva 2006/112/CE a sujeitos passivos não estabelecidos no Estado-Membro de reembolso, mas estabelecidos nou-tro Estado-Membro. Esta directiva veio permitir o re-embolso do IVA relativo a despesas relacionadas com a actividade empresarial efectuadas por sujeitos passivos num Estado-Membro em que não estão estabelecidos. Adicionalmente, foi criado um sistema electrónico pelo qual os sujeitos passivos apresentam os seus pedidos de reembolso através de um portal electrónico criado pelo Estado-Membro em que estão estabelecidos.

Sucede, porém, que, embora os Estados-Membros estivessem obrigados a disponibilizar este portal electró-nico a partir de 1 de Janeiro de 2010, verificou-se que, em muitos casos, havia atrasos consideráveis na imple-mentação desta medida, a que acrescem diversos proble-mos técnicos registados nos portais que se encontravem já em funcionamento.

Por este motivo, e com o intuito de salvaguardar o direito dos contribuintes à dedução do IVA, revelou-se necessário adiar de Setembro de 2010 para Março de 2011 o prazo de apresentação dos pedidos de reembolso de despesas relativos a 2009.

Por outro lado, na falta de um consenso, por parte dos Estados-Membros, no que respeita ao funcionamen-

to técnico da directiva, mostra-se necessário estabelecer um mecanismo eficiente de harmonização de certos re-quisitos pormenorizados neste domínio. A Comissão propõe, nesse sentido, que lhe seja concedida compe-tência para adoptar (ainda que sob reserva do parecer positivo do Comité Permanente para a Cooperação Ad-ministrativa) as disposições técnicas necessárias para que um sistema pan-europeu desta natureza seja plenamente interoperável.

Dupla tributação e evasão fiscal – novas convenções celebradas

O Estado Português assinou recentemente novas convenções para evitar a dupla tributação em matéria de impostos sobre o rendimento, com as autoridades da Colômbia e do Panamá.

O Governo português tem vindo a desenvolver es-forços no sentido de alargar a rede portuguesa de con-venções para evitar a dupla tributação, por forma a fazer face ao fenómeno da dupla tributação internacional e os custos fiscais associados à internacionalização do tecido empresarial português, assim procurando igualmente re-forçar os mecanismos de troca de informação com ou-tras administrações tributárias.

Refira-se que Portugal celebrou já convenções deste tipo com o brasil, a Venezuela, o México, o Chile, Cuba e Uruguai. Decorrem actualmente negociações com vis-ta à celebração de convenções semelhantes com o Peru, o Equador e o Paraguai.

DGCI disponibiliza Agenda Electrónica no Portal das Finanças

A DGCI passou a disponibilizar, no Portal das Fi-nanças (www.portaldasfinancas.gov.pt) a Agenda Elec-trónica Interactiva,.medida esta que se enquadra no Pla-no para a Qualidade no Serviço ao Contribuinte.

Esta nova funcionalidade permite ao contribuinte consultar e gerir todas as suas obrigações fiscais futuras, assim como o histórico de todos os acontecimentos e interacções que efectuou com a Administração Fiscal no decurso do último ano.

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8 REVISTA FISCAl Setembro/Outubro | 2010

A Agenda Electrónica conterá todas as datas que já são conhecidas dos sistemas da Administração Fis-cal, como sejam a entrega da declaração do IRS e da declaração periódica do IVA ou o pagamento do IMI e do IUC. O contribuinte poderá ainda personalizar a Agenda, adicionando outros dados do seu interesse, tais como a entrega de petições e o cumprimento de outras obrigações fiscais.

Além disso, o contribuinte poderá solicitar à DGCI que o informe antecipadamente (via e-mail ou SMS) da aproximação dos prazos de cumprimento dessas obriga-ções, bem como agendar reuniões ou pedidos de entre-vistas com os serviços da DGCI.

O acesso a estas funcionalidades depende, no entan-to, do registo no Portal e inserção da senha pessoal de acesso.

PEDIDOS PARA:

R. Gonçalo Cristóvão, 111, 6º esq.

4049-037 - PORTO Tel. 223 399 400Fax 222 058 098

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ASSINATURA

(recortar ou fotocopiar) 3ª EDIÇÃO - SETEMBRO DE 2010

9REVISTA FISCAl Setembro/Outubro | 2010

análiseedoutrina

O crime de abuso de confiança fiscal

I. O crime de abuso de confiança fiscal está tipifi-cado no artigo 105º do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT), sendo que a origem deste preceito legal encontra-se no RJIFNA, concretamente no artigo 24º deste diploma legal, o qual consagrava este mesmo tipo legal de crime fiscal (1).

Na sua versão originária (2), o artigo 24º do RJIF-NA não exigia o elemento apropriação, sendo, porém, exigida a intenção de obter um enriquecimento patri-monial indevido resultante da falta de entrega ou da entrega fora do prazo, o qual, contudo, não tinha de passar pela apropriação (3).

Na redacção resultante do Decreto-lei 394/93, de 24 de Novembro, o artigo 24º do RJIFNA passou a exigir que, além da não entrega, também existisse apro-

(*) Advogado

(**) Na secção «Jurisprudência (sumários)» são publicados sumários de acórdãos atinentes ao crime de abuso de confiança fiscal.

(1) Para uma análise da evolução verificada no direito penal português quanto ao crime de abuso de confiança fiscal, ver MÁRIO FERREI-RA MONTE, “Da Legitimação do Direito Penal Tributário – Em Particular, os Paradigmáticos Casos de Facturas Falsas”, Coimbra, Coimbra Editora, 2007, pp. 281 ss., ISABEL MARQUES DA SILVA, Regime Geral das Infracções Tributárias, Cadernos IDEFF, nº 5, 3ª edição, Coimbra, Almedina, 2010, pp. 224 ss e ASSUNÇÃO MAGA-LHÃES MENEZES e TITO ARANTES FONTES, “O Conflito de deveres e o Abuso de Confiança Fiscal”, Actualidad Jurídica Uría Me-néndez, 12-2005, pp. 49-52 [citado em 19 de Junho de 2010], disponí-vel em http://www.uria.com/esp/actualidad_juridica/n12/art3.pdf. (2) Na sua redacção originária, o artigo 24º, nº 1, do RJIFNA estatuía o seguinte: “1 - Quem, com intenção de obter para si ou para outrem vantagem patrimonial indevida, e estando legalmente obrigado a en-tregar ao credor tributário a prestação tributária que nos termos da lei deduziu, não efectuar tal entrega total ou parcialmente será punido com pena de multa até 1000 dias.”. (3) Afastando-se, assim, do crime de abuso de confiança comum, p.p. pelo artigo 300º do CP de 1982, cujo nº 1 estabelecia o seguinte: “1 - Quem, ilegitimamente, se apropriar de coisa móvel que lhe foi en-tregue por título não translativo de propriedade, será punido com prisão até 3 anos.”.

priação (4). Assim, para além de se verificar uma aproxi-mação ao correspondente crime de abuso de confiança comum, passou a ser necessário que o autor integrasse no seu património a prestação retida que deveria ter sido entregue ao Estado. A apropriação passou, pois, a ser o resultado típico, o que significa que o dolo passou a concretizar-se na intenção de apropriação por meio da violação da relação de confiança, com a consequente ob-tenção de um enriquecimento patrimonial (5).

O nº 1 do referido artigo 105º corresponde, assim, ao nº 1 do artigo 24º do RJIFNA, na redacção resultante do Decreto-lei nº 394/93, de 24 de Novembro, embora com diferenças relevantes, a saber: a expressão “quem se apropriar” foi substituída pela expressão “quem não entre-gar” e o valor da multa deixou de depender do valor da prestação tributária.

Os seus nºs 2 e 3 correspondem aos mesmos núme-ros do artigo 24º do RJIFNA, em qualquer uma das suas redacções.

O seu nº 4 corresponde ao nº 5 do artigo 24º do RJIFNA, na redacção originária, e ao nº 6 deste precei-to, na redacção resultante do Decreto-lei nº 394/93, de 24 de Novembro, tendo sido substituída a condição de procedibilidade que aí se encontrava por uma condição de punibilidade.

O seu nº 5 corresponde ao nº 5 do artigo 24º do RJIFNA, na redacção decorrente do Decreto-lei nº 394/93, de 24 de Novembro, tendo sido substituída a referência ao valor 5 milhões de escudos pela referência a 50 000 euros e sendo cominada directamente a pena aplicável às pessoas colectivas.

O seu nº 7 não tem qualquer correspondência em norma legal anterior, maxime no artigo 24º do RGIT.

O nº 1 deste artigo 105º, face ao regime legal an-terior, excluiu o requisito da apropriação e voltou a ser

(4) Em virtude da nova redacção que lhe foi dada pelo citado diplo-ma legal, este preceito passou a prescrever o seguinte no seu nº 1: “1 - Quem se apropriar, total ou parcialmente, de prestação tributária deduzida nos termos da lei e que estava legalmente obrigado a entre-gar ao credor tributário será punido com pena de prisão até três anos ou multa não inferior ao valor da prestação em falta nem superior ao dobro sem que possa ultrapassar o limite máximo abstractamente estabelecido.”. (5) Cfr. MÁRIO FERREIRA MONTE, ob. cit., p. 283.

Por Dr. Ricardo Rodrigues Pereira (*)

análiseedoutrina

10 REVISTA FISCAl Setembro/Outubro | 2010

bastante a não entrega, tendo assim desaparecido do tipo o dolo consubstanciado na apropriação. Assim, o crime de abuso de confiança fiscal, previsto no RGIT, afasta-se do crime de abuso de confiança comum, previsto no artigo 205º do CP (6). Neste último, a apropriação constitui elemento do tipo objectivo de ilícito, traduzindo-se sem-pre, neste contexto específico, na inversão do título de posse ou detenção (7).

Esta alteração consubstanciou-se em tornar lei aque-le que era o entendimento preconizado pela jurisprudên-cia no sentido de que quem não entrega no prazo a pres-tação tributária deduzida ou cobrada, usando-a para um fim diferente do legalmente estatuído, está a apropriar-se dela (8).

A doutrina não tem um entendimento unânime quanto à bondade desta solução legal. Para uns autores, este regime resulta mais congruente com as exigências próprias da função do imposto e, por isso, mais adequa-do à relação tributária subjacente (9). Para outros autores, este regime retoma uma tipicidade objectiva, ou seja, a não entrega do imposto, decorrido o prazo, é suficiente para preencher os pressupostos do tipo legal de crime, sem que exista qualquer referência à intenção do agen-te determinante desse comportamento, o que constitui uma violência (10).

II. Ao crime de abuso de confiança fiscal, a que às vezes se chama crime de apropriação fiscal indevi-da, subjaz uma relação de confiança estabelecida entre o Estado, enquanto credor tributário, e o contribuinte, enquanto devedor tributário, a qual, por vezes, não é res-peitada, dando lugar a violações que se consubstanciam, por um lado, em prejuízos para o património do Estado, com a inerente limitação deste em realizar finalidades públicas, e que, por outro lado, permitem que o devedor se aproprie de quantias monetárias que não lhe perten-cem (11).

(6) O nº 1 do artigo 205º do CP estatui o seguinte: “1 – Quem ilegiti-mamente se apropriar de coisa móvel que lhe tenha sido entregue por título não translativo da propriedade é punido com pena de prisão até três anos ou com pena de multa.”. (7) Neste sentido, JORGE DE FIGUEIREDO DIAS, “Comentário ao artigo 205º do Código Penal”, Comentário Conimbricense do Có-digo Penal, Parte Especial, Tomo II, Artigos 202º a 307º, AA. VV., Coimbra, Coimbra Editora, 1999, p. 103.8 - Cfr. ISABEL MARQUES DA SILVA, ob. cit., p. 226.(9) Cfr. MÁRIO FERREIRA MONTE, ob. cit., p. 283 e GERMA-NO MARQUES DA SILVA, “Notas sobre o regime geral das infrac-ções tributárias”, Direito e Justiça, Volume XV, Tomo II, 2001, p. 67.(10) Cfr. RUI DUARTE MORAIS, A Execução Fiscal, 2ª edição, Coimbra, Almedina, 2006, pp. 59-60.(11) Cfr. MÁRIO FERREIRA MONTE, ob. cit., p. 280.

Na realidade, o crime de abuso de confiança fiscal assenta na existência de uma relação de confiança, no âmbito da qual uma prestação tributária é entregue a um sujeito passivo, pelo qual foi retida ou recebida, para que este, numa posição de detenção e domínio sobre ela, a entregue ao fisco. O agente é, desta forma, como que um fiel depositário da prestação tributária retida ou de-duzida, assumindo uma posição jurídica de detentor da mesma para que, seguidamente e sem nunca a integrar no seu património, esta seja entregue ao credor tributá-rio (12).

O que aqui está aqui em causa é “uma relação especial no autêntico sentido da palavra: nela estão presentes interesses da Fazenda Pública, derivados da relação jurídico-tributária” (13).

Consequentemente, é a partir da violação daquela re-lação de confiança estabelecida entre o credor tributário e o contribuinte que se verifica a consumação do crime de abuso de confiança fiscal (14).

O objecto específico do abuso de confiança fiscal é, pois, uma prestação tributária, deduzida ou recebida, ainda que tenha natureza parafiscal, desde que tenha va-lor superior a € 7500.

Pelo que o bem jurídico que se visa tutelar são as receitas fiscais do Estado, pois resulta da estruturação legal do tipo que constituiu entendimento do legislador que o património do Estado é lesado pela não entrega tempestiva das prestações tributárias deduzidas ou rece-bidas. Consequentemente, o crime de abuso de confian-ça fiscal é um crime de dano (15).

Tendo desaparecido a referência ao elemento apro-priação, o elemento objectivo do tipo, isto é, o facto tipi-camente ilícito, consiste em não entregar à Administra-ção Tributária determinada prestação tributária deduzida ou recebida, mesmo que tenha natureza parafiscal. Deste modo, estando em causa obrigações tributárias, basta a não entrega dos valores respectivos para que exista a censura jurídico-penal.

(12) Cfr. ASSUNÇÃO MAGALHÃES MENEZES e TITO ARAN-TES FONTES, loc. cit., pp. 50-51. (13) Cfr. MÁRIO FERREIRA MONTE, pp. 293-294.(14) Cfr. ASSUNÇÃO MAGALHÃES MENEZES e TITO ARAN-TES FONTES, loc. cit., p. 51. (15) ANDRÉ DA COSTA FONTES DE OLIVEIRA, “A Volubili-dade do Crime de Abuso de Confiança Fiscal”, trabalho realizado no âmbito do III Curso de Pós-Graduação em Direito Fiscal, da Facul-dade de Direito da Universidade do Porto, pp. 14-15 [citado em 19 de Junho de 2010], disponível em http://www.direito.up.pt/cije_web/backoffice/uploads/publicacoes/Oliveira_Andre.pdf.

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análiseedoutrina

Tributos “são, em termos latos, as receitas cobradas pelo Estado ou por outros entes públicos para a satisfação de necessida-des públicas, sem função sancionatória” (20).

Imposto “é uma prestação pecuniária, singular ou reite-rada, que não apresenta conexão com qualquer contraprestação retributiva específica, exigida por uma entidade pública a uma outra entidade (sujeito passivo), utilizada exclusiva ou principal-mente para a cobertura de despesas públicas. O imposto tem como conteúdo um dever de prestar que surge pela simples verificação de um facto previsto na lei, dando origem a uma relação jurídica tributária” (21).

Taxas são receitas que têm “carácter sinalagmático, não unilateral, o qual por seu turno deriva funcionalmente da natureza do facto constitutivo das obrigações em que se traduzem e que con-siste ou na prestação de uma actividade pública ou na utilização de bens do domínio público ou na remoção de um limite jurídico à actividade dos particulares” (22).

Contribuições especiais “não passam de impostos es-peciais, impostos que (…) apresentam a particularidade de terem por base manifestações da capacidade contributiva de determinados grupos de pessoas resultantes do exercício de uma actividade ad-ministrativa pública e não, ou não exclusivamente, do exercício de uma actividade do respectivo contribuinte como acontece nos impos-tos” (23). Existem duas modalidades: a das contribuições de melhoria “que se verifica naqueles casos em que é devida uma prestação, em virtude de uma vantagem económica particular resul-tante do exercício de uma actividade administrativa, por parte de todos aqueles que tal actividade indistintamente beneficia” e a das contribuições por maiores despesas “que ocorre naquelas situações em que é devida uma prestação em virtude de as coisas possuídas ou de a actividade exercida pelos particulares darem origem a uma maior despesa das autoridades públicas” (24).

Tributos parafiscais são os que “são cobrados para a cobertura das despesas de pessoas colectivas públicas não ter-ritoriais, ou seja, [são] tributos objecto de uma verdadeira con-signação subjectiva de receitas” (25). Podem ser de natureza económica, como sucede com as designadas taxas para os organismos de coordenação económica, ou de natu-reza social, como acontece com as contribuições para a segurança social.

Importa aqui chamar à colação o artigo 20º da lGT, cujo nº 1 estatui o seguinte: “1 - A substituição tributária

(20) J. L. SALDANHA SANCHES, Manual de Direito Fiscal, 3ª edi-ção, Coimbra, Coimbra Editora, 2007, p. 21. (21) bidem, p. 22.(22) ALBERTO XAVIER, Manual de Direito Fiscal I, Lisboa, s. n., 1981, p. 42.(23) JOSÉ CASALTA NABAIS, Direito Fiscal, 5ª edição, Coimbra, Almedina, 2010, p. 28. (24) Ibidem, p. 27.(25) Ibidem, p. 32.

Assim, este ilícito criminal foi convertido num crime de mera inactividade, ou seja, o crime de abuso de con-fiança fiscal é um crime omissivo puro (16).

Noutra parametria, assente que o objecto da não en-trega é necessariamente uma prestação tributária deduzi-da, por conta ou a título definitivo, e que o agente estava legalmente obrigado a entregar ou que, tendo sido rece-bida, havia obrigação legal de liquidar, então a prévia de-dução ou cobrança da prestação tributária constitui um pressuposto do tipo. Não se verificando aquela dedução ou cobrança da prestação tributária, não estão, pois, pre-enchidos os elementos objectivos do tipo.

Pelo que a conduta consubstanciada na não entrega de prestação tributária motivada pela sua não dedução, não liquidação ou por não ter sido recebida terá relevân-cia apenas para efeitos contra-ordenacionais, integrando a contra-ordenação fiscal de falta de entrega da presta-ção tributária, nos termos do disposto no artigo 114º, nºs 4 e 5, alínea a) (17).

III. São as seguintes as prestações tributárias cuja não entrega à Administração tributária configura a práti-ca do crime de abuso de confiança fiscal:

Prestação tributária deduzida nos termos da lei e que estava legalmente obrigado a entregar (nº 1);

Prestação tributária que foi deduzida por conta da-quela, bem como aquela que, tendo sido recebida, haja obrigação legal de a liquidar (nº 2);

Prestação deduzida de natureza parafiscal e desde que possa ser entregue autonomamente (nº 3).

Sobre o conceito de prestação tributária, para efeitos de aplicação desta norma legal, há que atender ao disposto na alínea a) do artigo 11º deste diploma legal (18).

Há que salientar que, “para efeitos do crime de abuso de confiança fiscal, sempre se procedeu a uma clara extensão do con-ceito de prestação tributária (…), por forma a abranger as situ-ações de retenção na fonte que têm natureza de imposto por conta (…), as prestações que, tendo sido recebidas, haja obrigação legal de liquidar (…) e, ainda, as de natureza parafiscal (…)” (19).

Densificando conceitos, temos que:

(16) Neste sentido, ISABEL MARQUES DA SILVA, ob. cit., p. 228 e SUSANA AIRES DE SOUSA, “Os crimes fiscais: Análise dogmática e reflexão sobre a legitimidade do discurso incriminador”, Coimbra, Coimbra Editora, 2006, p. 123. (17) Neste sentido, ISABEL MARQUES DA SILVA, ob. cit., p. 232. (18) Importa ainda ter em consideração os artigos 3º (Classificação dos tributos) e 4º (Pressupostos dos tributos) da LGT. (19) ASSUNÇÃO MAGALHÃES MENEZES e TITO ARANTES FONTES, loc. cit., p. 50.

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verifica-se quando, por imposição da lei, a prestação tributária for exigida a pessoa diferente do contribuinte.”.

Assim, “verifica-se substituição tributária quando, por im-posição legal, a prestação tributária vai ser entregue ao Fisco (lato sensu) não pelo sujeito que realizou o facto tributário, mas por um terceiro que com ele mantém relações especiais e que lhe vai exigir a quantia em causa” (26). Sendo que, a maior parte das vezes, “a técnica financeira mediante a qual a substituição tributária se efectiva é a retenção na fonte, a qual significa que certos rendimen-tos, ao serem pagos ou colocados à disposição, serão objecto de uma amputação a título de pagamento do tributo, recebendo o respectivo credor um montante menor do que aquele que receberia sem a veri-ficação desta técnica (recebe o rendimento a que teria direito menos a importância retida)” (27). No entanto, “pode dar-se substitui-ção tributária sem retenção na fonte, nos casos em que determinada entidade está obrigada a liquidar o imposto incidente sobre outra e a entregá-lo ao Estado (sem reter quantia alguma)” (28).

A propósito da repercussão legal do imposto, pode ver-se o artigo 37º do CIVA.

IV. Na medida em que constitui uma infracção omis-siva, o crime de abuso de confiança fiscal considera-se praticado na data em que termine o prazo para o cum-primento dos respectivos deveres tributários, como pre-ceitua o nº 2 do artigo 5º.

Contudo, a alínea a) do nº 4 do artigo 105º estatui uma condição de punibilidade do tipo, nos termos da qual a não entrega à Administração tributária de uma prestação tributária deduzida ou recebida, ainda que de natureza parafiscal, só é punível se tiverem decorrido mais de 90 dias sobre o termo do prazo legal da entrega dessa prestação.

Além desta condição de punibilidade, importa ain-da considerar aquela outra que consta da alínea b) do mesmo nº 4, por via da qual os factos só são objecto de punição se, tendo havido declaração mas faltando a entrega da respectiva prestação tributária, o contribuinte não pagar aquela prestação tributária acrescida dos juros respectivos e do valor da coima aplicável, no prazo de 30 dias após notificação para o efeito.

A propósito desta alínea b), importa ter em consi-deração o acórdão de uniformização de jurisprudência proferido pelo STJ, em 9 de Abril de 2008, no âmbito do processo nº 07P4080, nos termos do qual:

“A exigência prevista na alínea b) do n.º 4 do artigo 105.º do RGIT, na redacção introduzida pela Lei 53-A/2006, configura

(26) OAQUIM FREITAS DA ROCHA, “Apontamentos de Direito Tributário (A Relação Jurídica Tributária)”, Braga, AEDUM, 2009, pp. 29-30.(27) Ibidem, p. 30.(28) Ibidem, p. 30.

uma nova condição objectiva de punibilidade que, nos termos do artigo 2.º, n.º 4, do Código Penal, é aplicável aos factos ocorridos antes da sua entrada em vigor. Em consequência, e tendo sido cumprida a obrigação de declaração, deve o agente ser notificado nos termos e para os efeitos do referido normativo (alínea b) do n.º 4 do art. 105.º do RGIT)” (29).

Atento o estatuído no nº 4 do artigo 105º, Américo Taipa de Carvalho considera que a consumação do cri-me de abuso de confiança fiscal verifica-se:

No respeitante ao crime cometido por omissão de entrega de prestações tributárias deduzidas mas não de-claradas, no 1º dia após o decurso dos 90 dias referidos na alínea a) do nº 4;

Relativamente ao crime cometido por omissão de entrega de prestações deduzidas e declaradas, no 1º dia após o decurso dos 30 dias referidos na alínea b) (30).

As condições de punibilidade previstas neste nº 4 têm relevância para efeitos quer do início do prazo de prescrição do procedimento criminal, quer da suspen-são desse mesmo prazo prescricional, nos termos dos artigos 119º, nº 1, e 120º, nº 1, alínea a), do CP. Em termos práticos, “o termo inicial do prazo de prescrição conta-se a partir do 91º dia posterior ao termo do prazo legal de entrega da prestação tributária (…). Antes de decorridos os 90 dias poderá, contudo, haver contra-ordenação por falta de entrega da prestação tributária (p.p. no art. 114º, nº 1 do RGIT)” (31).

V. Relativamente ao tipo subjectivo de ilícito, o cri-

me de abuso de confiança fiscal é, como acontece com todos os demais crimes previstos no RGIT, um crime doloso(32), não sendo, porém, necessário dolo específico.

Assim, quando a não entrega da prestação tributária deduzida fique a dever-se a negligência do agente, po-derá constituir contra-ordenação por falta de entrega da prestação tributária, p. p. no art. 114º, nº 2.

Por outro lado, importa averiguar quem pode ser au-tor do crime de abuso de confiança fiscal. A este pro-pósito dir-se-á, desde logo, que este crime só pode ser cometido por aqueles que estejam legalmente obrigados

(29) Disponível em www.dgsi.pt.(30) AMÉRICO TAIPA DE CARVALHO, “O crime de abuso de confiança fiscal: As consequências jurídico-penais da alteração intro-duzida pela Lei nº 53-A/2006, de 29 de Dezembro”, Coimbra, Coim-bra Editora, 2007, pp. 43-54. A este respeito, ver também MARTA TRABULO, “Crime de Abuso de Confiança Fiscal”, trabalho reali-zado no âmbito do III Curso de Pós-Graduação em Direito Fiscal, da Faculdade de Direito da Universidade do Porto, pp. 9-20 [citado em 19 de Junho de 2010], disponível em http://www.direito.up.pt/cije_web/backoffice/uploads/publicacoes/Trabulo_Marta.pdf.(31) ISABEL MARQUES DA SILVA, ob. cit., p. 229.(32) Nos termos do disposto no artigo 13º do CP, uma vez que não está prevista a punição a título de negligência em nenhum dos crimes previstos no RGIT.

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ao cumprimento dos deveres tributários que são pressu-postos pela norma incriminadora.

Mas, ao abrigo do disposto no artigo 6º, este crime pode ainda ser cometido por quem actue em nome da-queles que estão obrigados ao cumprimento dos referi-dos deveres tributários (33).

Relativamente à responsabilidade das pessoas colec-tivas, há que atentar no disposto no artigo 7º, maxime nos seus nº s 1 e 2, sendo que, como resulta do seu nº 3, existindo responsabilidade criminal da pessoa colectiva, podem também ser punidos os respectivos agentes indi-viduais do crime.

VI. A admissibilidade da exclusão da ilicitude do fac-to, nomeadamente com fundamento no direito de ne-cessidade (artigo 34º do CP) ou no conflito de deveres (artigo 36º do CP), tem sido objecto de acesa contro-vérsia na doutrina e na jurisprudência, sendo que esta última tem, maioritariamente, sufragado o entendimento segundo o qual não se verificam, relativamente ao crime de abuso de confiança fiscal, os requisitos daquelas cau-sas de justificação.

A situação mais frequente é aquela em que o agente, motivado pela insuficiência de rendimentos, utiliza o va-lor da prestação tributária devida para o pagamento de salários aos seus trabalhadores, de energia, de matérias-primas adquiridas aos seus fornecedores, etc., com a in-tenção de manter a empresa em laboração e os respecti-vos postos de trabalho, sem o que esta teria de encerrar.

Mário Ferreira Monte preconiza, a este respeito, a seguinte posição, a que aderimos: “Entendemos que, em relação ao direito penal português, tendo em conta, nomeadamente, o artigo 36º do CPPort, é legítimo sustentar aqui a existência de uma causa de justificação relativamente ao conflito de deveres. Efectivamente, um dever – o de pagar salários, absolutamente indispensáveis para a sobrevivência dos trabalhadores e das suas famílias – que é positivo, cumpre-se à custa do sacrifício de um dever igual ou inferior, também positivo, que é o de efectuar a entrega ao Estado da quantia tributada. É certo que o crime de abuso de confiança fiscal chega a produzir-se nestes casos porque, na realidade, o devedor se apropria indevidamente de uma quantia que em rigor não é sua, ostentando a sua custódia para entregá-la ao Estado, ou simplesmente não a entrega, como deveria fazer (…). Dá-se apropriação ou, rectius, ausência de entrega, ao utilizar as quantias no pagamento de salários. Sem embargo, também parece indiscutível que, ao provar-se que a empresa não consegue pagar mensalmente os salários porque não obtém rendimentos suficientes, e que aplica estas retenções no pagamento dos referidos salários, estamos perante, não uma incorporação no

(33) ISABEL MARQUES DA SILVA, ob. cit., p. 232.

património do obrigado, mas uma utilização para a realização de outros interesses, igualmente legítimos, o que se traduz, isso sim, numa não entrega ao Estado da prestação tributária. Se isto se produz no momento em que se deveriam satisfazer as obrigações fiscais, é sustentável que aqui opera uma causa de justificação. (…) Esta [a lei] não exclui expressamente a possibilidade de que a utilização dos valores não entregues para pagamento de salários funcione como uma causa de justificação. Consequentemente, cabe aplicar esta causa de justificação quando se prove que tal situação se deu” (34).

Ainda segundo este autor, “o direito ao salário é um di-reito constitucionalmente protegido, previsto no artigo 59º da CRP, donde não ser legítimo inferir que a satisfação dos deveres de contri-buição para com a Fazenda Pública, previstos nos artigos 103º e 104º da CRP, prevaleça sobre o dever de pagamento de salários de-corrente daquele primeiro direito, ainda que, por estarem em causa, num caso, interesses do Estado, a obrigação se funde directamente na lei, e no outro, por estarem em causa interesses particulares, a obrigação possa fundar-se num contrato. É que este contrato não é mais nem menos que a consequência jurídica da aplicação da lei respectiva, que por sua vez tem fundamento constitucional. O contrato de trabalho para ser legal e, mormente, constitucional, deve prever o direito ao salário. Caso contrário é ilegal” (35).

Augusto Silva Dias aponta os seguintes requisitos para que se possa invocar a causa de justificação: “a) a empresa não consiga mensalmente rendimentos que lhe permitam suportar o pagamento dos salários e a retenção das prestações de-vidas ao fisco e, portanto, que possibilitem o cumprimento de todas as obrigações concorrentes; b) essa situação se verifique no momento em que aquelas obrigações deveriam ser satisfeitas; c) as prestações retidas sejam utilizadas total ou parcialmente no pagamento de salários aos trabalhadores, admitindo-se que uma parte possa ser investida na aquisição de equipamentos e matéria-prima e, assim, simultaneamente, na auto-preservação da empresa e na garantia das condições de emprego dos trabalhadores, valores que precedem e sustentam o dever de pagamento dos salários” (36).

Ainda neste âmbito, afirmam Assunção Magalhães Menezes e Tito Arantes Fontes o seguinte: “[Q]uando um devedor, por insuficiência de rendimentos, usa a prestação tributá-ria exclusivamente para pagamento dos salários dos trabalhadores, em vez de proceder ao pagamento de impostos, poderá o mesmo estar perante uma situação de conflito de deveres, tal como prevista no artigo 36º do Código penal, reconhecendo-lhe a lei uma total li-berdade de escolha para o cumprimento de um ou outro dever. (…) A impossibilidade do cumprimento simultâneo deverá ser verifica-da, assim e em primeiro lugar, pela comprovação do débil estado financeiro da empresa em questão, pois só isso poderá justificar que

(34) Ob. cit., pp. 284-288. (35) Ibidem, p. 287.(36) “Crimes e contra-ordenações fiscais”, Direito Penal Económico e Europeu, Textos Doutrinários, Volume II, Coimbra, Coimbra Edi-tora, p. 463.

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o conflito de deveres possa surgir – razão pela qual, além do mais, esse estado financeiro se deverá verificar sempre no momento em que ambas as obrigações devam ser satisfeitas” (37).

VII. Em função do valor da prestação tributária não entregue, o crime de abuso de confiança fiscal poderá revestir a forma simples ou a forma agravada.

O crime de abuso de confiança fiscal será simples se o valor da prestação tributária não entregue for inferior a € 50 000 (devendo, sempre, ser superior a € 7 500), como resulta dos nºs 1 e 5, a contrario, deste artigo 105º.

O crime de abuso de confiança fiscal será agravado se o valor da prestação tributária não entregue for superior a € 50 000, como resulta no referido nº 5.

A pena cominada para crime de abuso de confiança fiscal simples é de prisão até três anos ou multa até 360 dias, se o agente for uma pessoa singular (nº 1). Se o agente for uma pessoa colectiva, a pena aplicável é a de multa até 720 dias, por força do disposto no artigo 12º, nº 3.

Por seu turno, para o crime de abuso de confiança fiscal agravado é cominada a pena de prisão de um a cin-co anos, para as pessoas singulares, e de multa de 240 a 1200 dias, para as pessoas colectivas (nº 5).

Tendo em vista quer a verificação do cometimento do crime, quer a determinação do seu carácter simples ou agravado, o nº 7 deste artigo 105º estatui que os valores a considerar são aqueles que devam constar de cada decla-ração a apresentar à Administração tributária.

Os valores a considerar não são, pois, os efectiva-mente declarados pelo agente, mas sim aqueles que, nos termos da legislação fiscal aplicável, devam constar da declaração a submeter à Administração tributária, pelo que os valores declarados pelo agente só serão conside-rados se estiverem correctamente apurados, ou seja, em conformidade com a referida legislação.

Ademais, deve ser considerado, isoladamente, o valor constante de cada declaração apresentada à Administra-ção tributária. Pelo que, caso o agente não tenha entre-gue diferentes prestações tributárias constantes de diver-sas declarações apresentadas à Administração tributária, o valor global de todas essas prestações não pode ser considerado quer para sustentar que o crime de abuso de confiança fiscal se produziu, quer para o qualificar, sendo apenas relevante para aferir o grau de ilicitude no âmbito da determinação da medida concreta da pena.

Relativamente à determinação da medida da pena e à suspensão da pena de prisão, devem ser tidos em consi-deração os artigos 13º, 14º e 15º.

(37) Loc. cit., pp. 56-57.

Para além da aplicação das penas previstas nos re-feridos nºs 1 e 5, pode ainda haver lugar à aplicação de penas acessórias, nos termos do artigo 16º.

Por outro lado, relativamente ao crime de abuso de confiança fiscal simples, uma vez que não é abstractamen-te aplicável uma pena de prisão superior a três anos, a pena pode ser dispensada dentro do condicionalismo estatuído no nº 1 do artigo 22º.

Acresce que, quer quanto ao crime de abuso de con-fiança fiscal simples, quer quanto ao crime de abuso de confiança fiscal agravado, a pena pode ser especialmente atenuada, nos termos do disposto no nº 2 do artigo 22º.

VIII. No atinente à punibilidade da tentativa, verifi-camos que o RGIT é omisso quanto a esta matéria, pelo que temos de prescrutar a solução legal no CP, aplicável subsidiariamente por via da alínea a) do artigo 3º.

Ora, como decorre do artigo 23º, nº 1, do CP, salvo disposição legal contrária, a tentativa só é punível se ao respectivo crime consumado corresponder pena de pri-são superior a três anos.

Consequentemente, a tentativa de abuso de confian-ça fiscal simples não é punível, atenta a moldura legal abs-tracta da pena de prisão cominada para este crime (cfr. nº 1).

Porém, a tentativa de abuso de confiança fiscal agra-vado já é punível, uma vez que lhe é abstractamente apli-cável uma pena de prisão superior a três anos (cfr. nº 5). Neste caso, a tentativa será punível com a pena aplicável ao crime consumado, especialmente atenuada, nos ter-mos do disposto no artigo 23º, nº 2, do CP.

IX. Relativamente à possibilidade de existência de concurso de crimes e de crime continuado, para deter-minarmos se, num caso concreto, “há um só ou vários cri-mes depende do preenchimento dos critérios do nº 1 do artigo 30º [do CP]. Concluindo-se no sentido da pluralidade de crimes, a questão de saber se há ou não crime continuado depende da verifi-cação ou não dos requisitos do nº 2 do artigo 30º do Código Penal (realização plúrima do mesmo tipo de crime ou vários tipos mas que protejam fundamentalmente o mesmo bem jurídico; execução por forma essencialmente homogénea e no quadro de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agen-te)” (38).

(38) ISABEL MARQUES DA SILVA, ob. cit., pp. 235-236, onde esta autora refere ainda o seguinte: “Não nos parece que o facto de con-siderarmos o crime de abuso de confiança como um crime omissivo puro exclua a possibilidade do crime continuado”.

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Uma outra questão que se coloca, neste âmbito, é a de saber se existe, ou não, concurso entre o crime de abuso de confiança comum, p.p. pelo artigo 205º do CP, e o crime de abuso de confiança fiscal.

A este propósito, desde logo, podemos dizer que “[a] norma que tipifica o crime de abuso de confiança fiscal encontra-se numa relação de especialidade com a que tipifica o crime de abuso de confiança comum, sendo a especialidade determinada pelo objec-to específico do abuso de confiança fiscal – uma prestação tributá-ria deduzida ou recebida, ainda que de natureza parafiscal -, ao menos quando ao gente tenha violado apenas interesses do Estado na sua veste fiscal” (39).

Pelo que, por força daquela relação de especialidade, entre os dois crimes existe um concurso legal ou aparen-te e, portanto, sendo a mesma situação subsumível quer na norma especial deste artigo 105º, quer na norma co-mum do artigo 205º do CP, aplica-se a primeira, atento o princípio lex specialis derogat legi generali (40).

Contudo, como refere Mário Ferreira Monte, poderá colocar-se a hipótese de sobreposição total de interesses entre os dois crimes se a situação concreta “implicar apro-priação, uma vez que o actual artigo 105º do RGIT, ao contrário (…) do artigo 205º do CPPort, não exige este requisito, bastando-se com a não entrega” (41).

(39) Ibidem, p. 228. No mesmo sentido, MÁRIO FERREIRA MON-TE, ob. cit., pp. 290-291.(40) Cfr. MÁRIO FERREIRA MONTE, ob. cit., p. 291.(41) Ibidem.

Assim, caso tenha havido apropriação, “apesar do tipo do artigo 105º do RGIT estar realizado, uma vez que a apropria-ção pressupõe sempre a não entrega – o inverso é que não é verda-deiro –, e de, portanto, à primeira vista, se verificar um concurso aparente que levaria ao afastamento da norma geral, o certo é que, como também se realiza o tipo do artigo 205º do CPPort, não se pode, pelos princípios que regulam os casos de concursos, excluir ab initio a aplicação deste último tipo, uma vez que da factualidade ocorrida emerge um elemento – a apropriação – que só se encontra previsto no artigo 205º do CPPort e não no artigo 105º do RGIT. Em termos práticos, contudo, uma tal depuração seria despicienda. Isto porque, havendo apropriação, já terá ocorrido o crime de abuso fiscal, pela não entrega. E tendo ocorrido no seio de uma relação fiscal, ou seja, envolvendo a violação de deveres fiscais, não haveria razão para fazer intervir aqui uma norma clássica, geral, apenas porque na factualidade se realizou mais que aquilo que o tipo fiscal exige. Ora, o que importa para a norma penal fiscal é que não se entregue a quantia, não relevando se houve apropriação ou não. Ao contrário, para a norma do CPPort, a censura jurídico-penal só se faz quando, para além da não entrega, existe apropriação. Esta, portanto, exige mais que aquela” (42).

X. À semelhança do que sucede com todos os crimes tributários, o crime de abuso de confiança fiscal é um crime público e, portanto, o respectivo procedimento criminal não depende quer de queixa, quer de acusação particular.

(42) Ibidem, p. 292.

Uma referência e um instrumento de trabalho para todos quantos desenvolvem a sua actividade profissional em íntima relação com o mundo tributário, sejam quadros de empresas, advogados, magis-trados, consultores, revisores oficias de contas, técnicos oficiais de contas e demais profissionais que lidam com esta matéria.

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jurisprudência[anotada]

16 REVISTA FISCAl Setembro/Outubro | 2010

Recurso por oposição de acórdãos Matéria colectável Avaliação indirecta Manifestações de fortuna IRS

SumárioI - A admissibilidade dos recursos por oposição de

acórdãos, tendo em conta o regime previsto nos artigos 27.º, alínea b) do ETAF e 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, depende de existir con-tradição entre o acórdão recorrido e o acórdão invocado como fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito, sendo que a oposição de soluções jurídicas pressupõe identidade substancial das situações fácticas, entendida esta não como uma total identidade dos factos mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais.

II - Evidenciada a aquisição, pela recorrente, de um imóvel com valor de aquisição superior a 250.000,00 €, quando ela declarara rendimentos líquidos inferiores em 50% relativamente ao rendimento padrão (que foi fixado pelo legislador em 20% do valor da aquisição - cfr. tabela constante do n.º 4 do art.º 89.º-A da lGT), consideram--se verificados os pressupostos legais para a avaliação indirecta do seu rendimento tributável.

III - Para prova da ilegitimidade deste acto de avalia-ção indirecta só deve dar-se relevância à justificação total do montante que permitiu a “manifestação de fortuna”, pelo que a justificação meramente parcial não afasta a aplicabilidade da determinação indirecta dos rendimen-tos que permitiram tal manifestação de fortuna.

IV - Já assim não é, contudo, no que respeita à fi-xação do rendimento sujeito a tributação como “incre-mento patrimonial” em sede de IRS, onde a justificação parcial há-de relevar para a fixação presuntiva do mon-tante do “acréscimo patrimonial não justificado” sujeito a imposto, atenta a natureza das normas em causa – con-cernentes à incidência objectiva do imposto -, a proi-bição constitucional de presunções legais absolutas de rendimentos derivada do princípio da capacidade con-tributiva, o disposto no artigo 73.º da lei Geral Tributá-ria - que determina que «as presunções consagradas nas normas de incidência tributária admitem sempre prova em contrário» -, e bem assim a busca de um cânone in-terpretativo conforme aos princípios da igualdade, da capacidade contributiva, da tributação dos rendimentos

reais e do Estado de Direito Democrático, que a solução adoptada no acórdão recorrido não permite alcançar.

V - Assim, embora a justificação parcial não afaste a aplicação do método de avaliação indirecta previsto no artigo 89.º-A da lGT, não pode deixar de ser conside-rada na quantificação do rendimento tributável que vai ser determinado por esse método, entendendo-se que a quantificação do rendimento tributável da recorrente deve ser igual a 20% do valor de aquisição, deduzindo-se a este valor de aquisição o montante do empréstimo bancário que a recorrente demonstrou ter efectuado para a aquisição do imóvel, já que este montante não está, nem pode estar, sujeito a IRS, não podendo, conse-quentemente, ser presumido ou considerado como ren-dimento sujeito a tributação.

VI - Não tendo a administração tributária efectuado a dedução relativa ao empréstimo bancário na avaliação do rendimento tributável da recorrente a que procedeu, há manifesto excesso na quantificação, o que fere de ile-galidade o acto fixou à ora recorrente o rendimento tri-butável de €75.000,00 com recurso a avaliação indirecta.

Supremo Tribunal Administrativo

Acórdão de 19 de Maio de 2010

Processo nº 0734/09

Relator: Dra. Isabel Marques da Silva

Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tribu-

tário do Supremo Tribunal Administrativo: - Relatório - 1 – A..., com os sinais dos autos, não se conforman-

do com o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 21 de Abril de 2009 (fls. 210 a 220), que negou provimento ao recurso por si interposto da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que jul-gou improcedente o recurso interposto do despacho de 13/11/2008 do Director de Finanças de lisboa que de-cidiu fixar-lhe o rendimento tributável em sede de IRS no ano de 2004 com recurso a avaliação indirecta, ao abrigo do disposto nos artigos 87.º, alínea d) e 89.º da lGT, dele vem, nos termos dos números 2 e 3 do arti-go 280.º e artigo 284.º do CPPT, interpor recurso para este Supremo Tribunal, por oposição com o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 4 de Março de 2008, proferido no recurso n.º 2259/08, formulando as seguintes conclusões:

A. O douto acórdão recorrido não fez a interpreta-ção conforme o espírito do legislador no que se refere à desconsideração do montante do crédito bancário, para

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calcular o valor base para efeitos de determinação do rendimento padrão, estribando a posição no acórdão deste douto TCA Sul, datado de 20.03.2007 – proc.° n.° 1678/07.

b. A recorrente defende posição contrária, estriba-da em jurisprudência mais recente, deste mesmo douto tribunal, fazendo referência ao acórdão de 04.03.2008, proc.° n.º 02259/08, jurisprudência segundo a qual, na aquisição de imóvel pelo preço de 375.000 euros, com recurso ao crédito de 250.000 euros, o montante de 125.000 euros restante cai fora do âmbito de incidência do artigo 89.°-A da lGT.

C. O douto acórdão recorrido não faz a interpreta-ção das diversas normas do artigo 89.º-A da lei Geral Tributária, em obediência ao definido nos números 1, 2 e 3 do artigo 9.º do Código Civil.

D. Da motivação do douto acórdão recorrido não se alcança porque é que “... na letra da lei não se prevê que se subtraia ao valor da aquisição o valor justificado por outras fontes para calcular o rendimento padrão”, quando a interpretação não deve cingir-se à letra da lei, de acordo com o n.º 1 do artigo 9.º do CC.

E. O pensamento legislativo não será, decerto, o de considerar a totalidade do valor da aquisição, para deter-minar o rendimento padrão, como se defende no douto acórdão recorrido, por resultar totalmente distorcida a aplicação da norma, como aconteceria no caso da aqui-sição de imóvel por 375.000 euros com recurso ao cré-dito de 374.999 euros, sendo a parte excedente 1 euro, em que a disponibilidade necessária do adquirente seria apenas de 1 euro, e o encargo com o pagamento do cré-dito é igual ao da situação em que o mútuo é de 375.000 euros.

F. As implicações fiscais são de uma diferença cho-cante; no primeiro caso o rendimento padrão é de 75.000 euros e no segundo é zero.

G. A norma ínsita no n.° 4 do artigo 89.°-A da lGT não pode ter outra interpretação distinta da que foi dada no acórdão do TCA Sul, in proc.° n.º 02259/08, de 04.03.2008, do Exmo. Relator José Correia, uma vez que, ao remeter para as situações previstas no n.° 1, pre-tende acautelar que situações substancialmente diferen-tes tenham um tratamento tributário diferente, como se demonstra pelos exemplos referidos nas alegações, onde se inclui o referido nestas conclusões, sob pena de existi-rem graves incongruências na aplicação da norma.

H. Ao fazer a interpretação da norma ínsita no artigo 89.°-A (em especial os n.°s 3 e 4 da lGT) no sentido em que o fez, o douto acórdão recorrido violou nor-mas constitucionais, designadamente, os artigos 13.º/1 e 104.º/3 da CRP.

I. Noutro aspecto em que o douto acórdão recorrido não fez a correcta aplicação do direito, é o que se refere à apreciação da prova documental apresentada com a p.i., facto esse determinante para a decisão de improcedência do recurso, ao considerar que não ficou provada a ori-gem do montante de 125.000 euros.

J. Os vendedores são o pai e a mãe da recorrente, que não receberam até à presente data a diferença entre o preço e o mútuo, e essa situação corresponde, sem margem para dúvidas, a um empréstimo concedido para “pagar” o preço restante do imóvel, no acto da celebra-ção da escritura em que declararam ter recebido, não existindo duas versões contraditórias, como referido na douta decisão recorrida.

K. Existindo dúvidas no espírito do julgador, bas-taria deitar mão do disposto no artigo 13.º do CPPT, violado na douta sentença, para que fossem explicitadas as alegadas contradições, com vista ao conhecimento se-guro da verdade material.

l. Seriam pertinentes e adequadas as diligências a le-var a efeito pelo M.° Juiz, a coberto do artigo 13.º do CPPT, se se entendia existirem versões contraditórias, pese o facto de se tratar de um processo urgente, e do disposto no art.º 146.°-b do CPPT, não dispensa o juiz do poder/dever de ordenar as diligências que considere indispensáveis ao apuramento da verdade material, nos termos do artigo 13.°, n.° 1, do CPPT, conforme tem sido jurisprudência comummente aceite.

M. A douta sentença valora como facto relevante para a decisão, a indicação constante da escritura sobre o recebimento do preço, pese embora tratar-se de uma declaração formal, que vincula somente as partes inter-venientes, o que implica que essa situação corresponda a um empréstimo dos vendedores, não havendo neces-sidade de alterar essa declaração formal, quase sempre pré-elaborada pelo notário, como foi o caso, atendendo ao grau de parentesco entre compradores e vendedores, e quando já estava acordado que o restante preço seria pago “a posteriori”.

N. Conforme é jurisprudência comummente aceite, a prova exigida ao contribuinte é apenas quanto à fonte das manifestações de fortuna evidenciadas, de forma a determinar se as mesmas foram omitidas à declaração para efeitos de IRS.

O. A declaração assinada por todos os intervenientes na escritura e detentores do capital e da gerência da so-ciedade b..., lda., demonstra a veracidade dos factos in-vocados pela recorrente, contudo não foi considerada na douta decisão recorrida, ainda que não tenha sido posta em causa a veracidade dessa mesma prova documental nem arguida a sua falsidade.

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2 - Contra-alegando, vem o Director de Finanças de lisboa dizer que:

a) O objecto do presente recurso é o acórdão de 21/04/2009 no qual o Tribunal Central Adminis-trativo do Sul considerou improcedente o recurso apresentado pela requerente e, em consequência, manteve a decisão que procedeu à correcção do rendimento colectável, por aquela declarado, em sede de IRS no ano de 2004, com recurso ao méto-do indirecto consagrado no artigo 89.º-A da lGT;

b) Decorre dos autos que no ano de 2004 a recor-rente efectuou a aquisição de um imóvel pelo va-lor de € 375.000,00 tendo, nesse mesmo ano, o seu agregado familiar declarado como rendimentos em sede de IRS o montante de € 15.860,60;

c) Verificados os pressupostos legais para a avalia-ção indirecta da matéria colectável e tendo-se, por via legal, invertido o ónus da prova, não logrou a recorrente justificar a proveniência de parte signifi-cativa do valor que desembolsou na aquisição;

d) Resultando da norma a aplicar que o valor do ren-dimento padrão corresponde, no caso de aquisição de imóveis, a vinte por cento do valor de aquisição e que em nenhuma situação, a lei manda subtrair ao valor de aquisição os montantes parcialmente justificados, constata-se que o acórdão recorrido expressa uma correcta interpretação da norma contida no n.º 4 do artigo 89.º-A da lGT.

3 - O Exmo. Magistrado do MP junto deste STA emite parecer no sentido de que o recurso deve consi-derar-se findo, nos termos do n.º 5 do artigo 284.º do CPPT, por inexistência de identidade de situação factual.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. - Fundamentação - 4 – Questões a decidir Importa averiguar previamente se, no caso dos au-

tos, estão reunidos os requisitos de admissibilidade do recurso por oposição de acórdãos, cuja não verificação impede o conhecimento do presente recurso.

Concluindo-se no sentido da verificação daqueles re-quisitos, haverá então que conhecer do seu mérito, sen-do a questão que constitui o objecto do presente recurso a da interpretação do disposto no artigo 89.º-A da lGT nas situações em que o contribuinte apenas demonstra a origem de parte dos rendimentos que lhe permitiram o acréscimo patrimonial em que se consubstanciou a ma-nifestação de fortuna.

5 – Matéria de facto Mostra-se assente a seguinte factualidade: A. A... (doravante identificada como recorrente) de-

clarou rendimentos no ano de 2004, em sede de IRS e

em conjunto com o seu marido C..., no montante de € 15.860,60 (quinze mil, oitocentos e sessenta euros e ses-senta cêntimos) – processo administrativo apenso.

b. Através de escritura celebrada em 14 de Julho de 2004, a recorrente adquiriu a seus pais, D... e E..., com a concordância do seu irmão F... e mulher G..., o prédio urbano inscrito na matriz predial da freguesia de Car-cavelos, concelho de Cascais, sob o artigo 2087.º, pelo valor de € 375.000,00 (trezentos e setenta e cinco mil euros) - doc. de fls. 13/16.

C. Da escritura referenciada na alínea que antecede consta que os alienantes já receberam o preço acordado - doc. de fls. 13/16.

D. Para esta aquisição, a recorrente utilizou crédito concedido pelo H..., actual banco I..., no montante de € 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros), através de contrato de mútuo celebrado em 14 de Julho de 2004 - doc. de fls. 17/27.

E. Atentos os valores de aquisição do imóvel e do rendimento declarado no ano de 2004, a Direcção de Finanças de lisboa (DFl) desencadeou acção de ins-pecção para consulta e recolha de elementos tendentes à averiguação da situação patrimonial da recorrente - doc. de fls. 65/119 e PAT apenso.

F. Notificada para exercício do direito de audição, a recorrente declarou que o imóvel em causa foi adquirido e pago com recurso a empréstimo bancário, no mon-tante de € 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros), conforme contrato de mútuo com hipoteca e fiança que juntou, tendo a parte restante (€ 125.000,00) origem em poupanças feitas desde 1990, guardadas em casa, resul-tantes das explicações que dava e do exercício de fun-ções no lNEC, bem como empréstimos obtidos junto de familiares - doc. de fls. 89/91 e PAT apenso.

G. Por decisão de 13 de Novembro de 2008, o Direc-tor de Finanças de lisboa decidiu a fixação à ora recor-rente do rendimento tributável de € 75.000,00 (setenta e cinco mil euros), a enquadrar na categoria G (incremen-tos patrimoniais) de IRS, do ano de 2004 - doc. de fls. 65/119 e PAT apenso.

H. A recorrente é sócia-gerente, com uma quota no valor nominal de €8.750,00 (oito mil, setecentos e cin-quenta euros), da sociedade “b..., lda.”, que tem um ca-pital de €22.500,00 (vinte e dois mil e quinhentos euros) - doc. de fls. 28/31.

I. D..., E..., F..., a recorrente e seu marido C... assina-ram declaração, datada de 26/11/2008, da qual consta que os pais da recorrente não receberam desta a quantia de €125.000, que falta pagar do preço de venda do imó-vel urbano inscrito sob o artigo 2087.° da freguesia de Carcavelos, correspondendo a mesma a um empréstimo

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familiar, cujo pagamento será efectuado através da alie-nação da quota da recorrente na sociedade “b..., lda.”, e/ou dos suprimentos e prestações suplementares de capital que detém na mesma sociedade - doc. de fls. 51.

6 – Apreciando. 6.1. Dos requisitos de admissibilidade do recurso por

oposição de acórdãos Vem a recorrente interpor o presente recurso do

acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 21 de Abril de 2009 (fls. 210 a 220 dos autos) que negou provimento ao recurso por si interposto da sentença do Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sin-tra que julgou improcedente o recurso por si interposto do despacho do Director de Finanças de 13/11/2008 que decidiu fixar-lhe o rendimento tributável em sede de IRS referente ao ano de 2004, mediante avaliação in-directa, ao abrigo do disposto nos artigos 87.º e 89.º da lGT, com fundamento em oposição com o acórdão do mesmo Tribunal de 4 de Março de 2008, proferido no recurso n.º 2259/08.

Não obstante o Relator do acórdão recorrido ter pro-ferido despacho em que reconhece a alegada oposição de acórdãos, importa reapreciar se a mesma se verifica, já que tal decisão, como vem sendo jurisprudência pacífica e reiterada deste Supremo Tribunal (vide, entre outros, o Acórdão de 7 de Maio de 2003, rec. n.º 1149/02), não só não faz caso julgado como não impede ou desobriga o Tribunal de recurso de a apreciar (cfr. art. 685.º-C, n.º 5, do Código de Processo Civil - CPC) – cfr. também neste sentido JORGE lOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário: Anotado e Co-mentado, volume II, 5.ª ed., lisboa, Áreas Editora, 2007, p. 814 (nota 15 ao art. 284.º do CPPT).

O presente processo iniciou-se no ano de 2008, pelo que lhe é aplicável o regime legal resultante do ETAF de 2002, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, e 4.º, n.º 2, da lei n.º 13/2002, de 19 de Fevereiro, na redacção que lhe foi conferida pela lei n.º 107-D/2003 de 31 de Dezembro.

Assim, a admissibilidade dos recursos por oposi-ção de acórdãos, tendo em conta o regime previsto nos artigos 27.º, alínea b) do ETAF e 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), de-pende de existir contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão invocado como fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito.

Como já entendeu o Pleno da Secção do Contencio-so Administrativo deste Supremo Tribunal Administrati-vo (Acórdão de 29 de Março de 2006, rec. n.º 1065/05), relativamente à caracterização da questão fundamental sobre a qual deve existir contradição de julgados, devem adoptar-se os critérios já firmados no domínio do ETAF

de 1984 e da lPTA, para detectar a existência de uma contradição:

- identidade da questão de direito sobre que recaí-ram os acórdãos em confronto, que supõe estar- -se perante uma situação de facto substancialmente idêntica;

- que não tenha havido alteração substancial na regu-lamentação jurídica;

- que se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta;

- a oposição deverá decorrer de decisões expressas, não bastando a pronúncia implícita ou a mera con-sideração colateral, tecida no âmbito da aprecia-ção de questão distinta (Acórdãos do Pleno desta Secção do STA de 26 de Setembro de 2007, 14 de Julho de 2008 e de 6 de Maio de 2009, recursos nú-meros 452/07, 616/07 e 617/08, respectivamente).

A alteração substancial da regulamentação jurídica relevante para afastar a existência de oposição de julga-dos verifica-se «sempre que as eventuais modificações le-gislativas possam servir de base a diferentes argumentos que possam ser valorados para determinação da solução jurídica» (v. Acórdãos do Pleno da Secção de Contencio-so Tributário do STA de 19 de Junho de 1996 e de 18 de Maio de 2005, proferidos nos recursos números 19532 e 276/05, respectivamente).

Por outro lado, a oposição de soluções jurídicas pres-supõe identidade substancial das situações fácticas, en-tendida esta não como uma total identidade dos factos mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais (cfr. JORGE lOPES DE SOUSA, op. cit., p. 809, e o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26 de Abril de 1995, proferido no recurso n.º 87156).

Vejamos, então, se tais pressupostos se verificam. Desde logo, importa referir que o acórdão tido por

fundamento já transitou em julgado (vide fls. 294). A questão que constitui o objecto do presente recur-

so é a interpretação do disposto no artigo 89.º-A da lGT nas situações em que o contribuinte apenas demonstra a origem de parte dos rendimentos que lhe permitiram o acréscimo patrimonial em que se consubstanciou a ma-nifestação de fortuna.

Assim, a questão que se pretende submeter à apre-ciação deste Tribunal reside em saber se, na determina-ção da matéria tributável ao abrigo do disposto no supra citado preceito legal se deve considerar o rendimento padrão decorrente da tabela, ou se o mesmo deverá ser calculado apenas sobre o montante que o contribuinte não logrou demonstrar ou justificar.

Já quanto à invocada errada aplicação do direito ale-gadamente feita no acórdão recorrido no que se refe-

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re à apreciação da prova documental apresentada pela recorrente [conclusões I) e seguintes das alegações] da mesma se não conhecerá por se mostrar fora do âmbi-to do presente recurso que visa resolver a oposição de julgados e não reapreciar a decisão recorrida em 3.º grau de jurisdição.

Defende o Excelentíssimo Procurador Geral Adjun-to junto deste Tribunal que as situações de facto verifi-cadas nos acórdãos recorrido e fundamento lhe parecem ser distintas porquanto neste último a Administração tri-butária não terá dado oportunidade ao contribuinte para demonstrar a origem dos rendimentos com que pagou o remanescente do valor do imóvel depois de deduzi-do o valor do mútuo, o que não aconteceu no acórdão recorrido, em que a recorrente teve oportunidade de se pronunciar.

Todavia, não cremos que assim seja. Com efeito, a identidade substancial das situações

fácticas que se exige, como supra já deixámos escrito, deve ser entendida não como uma total identidade dos factos mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais.

E, na verdade, é isso mesmo que sucede. Tanto num acórdão como noutro, estamos perante

situações em que os contribuintes adquiriram imóveis em 2004 por um valor superior a € 250.000,00, quando um deles apenas apresentou na declaração de IRS refe-rente a esse mesmo ano rendimentos no montante de € 15.860,00 e o outro nem sequer chegou a apresentar tal declaração.

Ambos os contribuintes apenas fizeram prova de que utilizaram nessas aquisições crédito bancário no valor de € 250.000,00.

Perante estes factos, entendeu a Administração tri-butária que estavam verificados os pressupostos legais a que alude o artigo 89.º-A da lGT para avaliação indi-recta da matéria colectável, tendo-lhe fixado rendimen-tos, a enquadrar na categoria G de IRS, no montante do rendimento padrão apurado nos termos do n.º 4 daquele normativo, ou seja, 20% do valor de aquisição dos imó-veis em causa.

Nos dois processos, os contribuintes vieram defen-der ter ilidido a presunção prevista no n.º 3 do artigo 89.º-A da lGT, comprovando que correspondem à realidade os rendimentos declarados e ser outra a fon-te das manifestações de fortuna evidenciadas, além de alegarem que para apuramento do rendimento padrão deveria ter sido considerado apenas o valor de aquisição dos imóveis deduzido do valor dos empréstimos utiliza-dos, o que determinaria a que a situação descrita caísse

fora do âmbito de incidência do n.º 4 do artigo 89.º-A da lGT.

Ora, enquanto no acórdão recorrido se entendeu mostrarem-se verificados os pressupostos legais para a avaliação indirecta da matéria colectável e se considerou como rendimento tributável em sede de IRS, a enqua-drar na categoria G, o rendimento padrão apurado nos termos da tabela constante do n.º 4 do artigo 89.º-A da lGT, que, tratando-se de imóveis, é de 20% do valor de aquisição, já no acórdão fundamento se decidiu ter o contribuinte ilidido a presunção de evasão fiscal rela-tivamente aos rendimentos do ano em causa, com a jus-tificação do recurso ao crédito. Mas, mesmo que assim se não entendesse, sempre se deveria considerar que o rendimento padrão teria de ser calculado apenas sobre o montante não justificado, ou seja, ao valor de aquisição sem recurso ao crédito.

E, assim sendo, há, efectivamente, oposição de julga-dos justificativa da admissibilidade do presente recurso, pelo que haverá que conhecer do seu mérito.

6.2. Da interpretação do artigo 89.º-A da lei Geral Tributária (lGT)

Dispõe o art.º 89.º-A da lGT, na redacção anterior à lei n.º 53-A/06 de 29/12 e à lei n.º 19/08 de 21/4, que “há lugar a avaliação indirecta da matéria colectável quando falte a declaração de rendimentos e o contribuin-te evidencie as manifestações de fortuna constantes da tabela prevista no n.º 4 ou quando declare rendimentos que mostrem uma desproporção superior a 50%, para menos, em relação ao rendimento padrão resultante da referida tabela”.

Por sua vez, estabelece o seu n.º 2 que entre as ma-nifestações de fortuna previstas na tabela supra referida estão as aquisições de imóveis cujo valor de aquisição seja igual ou inferior a 50 000 contos (€ 249 398,95), adquiridos no ano em causa ou nos três anos anteriores adquiridos pelo sujeito passivo ou qualquer elemento do agregado familiar (al. a)) e os bens que aqueles fruam, adquiridos nesse ano ou nos três anos anteriores, por sociedade na qual detenham, directa ou indirectamen-te, participação maioritária, ou por entidade sediada em território de fiscalidade privilegiada ou cujo regime não permita identificar o titular respectivo (al. b)).

Por último, determina o seu n.º 3 que, “verificadas as situações previstas no n.º 1, cabe ao sujeito passivo a prova de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna evidenciadas, nomeadamente herança ou do-ação, rendimentos que não esteja obrigado a declarar, utilização do seu capital ou recurso ao crédito”.

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No caso dos autos, a recorrente apenas provou a proveniência de parte do preço que pagou pelo imóvel, mostrando os rendimentos por si declarados uma des-proporção superior a 50%, para menos, em relação ao rendimento resultante da tabela do n.º 4 do artigo 89.º-A da lGT (na redacção vigente no ano de 2004).

A alegação da recorrente de que, no caso em apreço, por via da justificação parcial efectuada no âmbito do presente recurso, já não existiria desproporção entre os rendimentos declarados e o rendimento padrão – 20% do valor de aquisição, subtraído do valor justificado – de modo a legitimar a aplicação do método indirecto de avaliação da matéria colectável, não tem suporte legal, como se decidiu já no acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA 28/1/09, no recurso n.º 761/08, e também no acórdão da mesma Secção de 27/5/09, no recurso n.º 403/09, onde expressamente se afirma que o valor justificado por outras fontes de ren-dimento ou património apenas releva para a tentativa de demonstração de que, apesar da verificação em abstracto dos pressupostos legais da avaliação indirecta, esta não deve ocorrer porque as manifestações de fortuna evi-denciadas foram adquiridas com aquele valor.

Assim, uma vez evidenciada a aquisição, pela recor-rente, de um imóvel com valor de aquisição superior a 250.000,00 €, quando ela declarara rendimentos líquidos inferiores em 50% relativamente ao rendimento padrão (que foi fixado pelo legislador em 20% do valor da aqui-sição - cfr. tabela constante do n.º 4 do art.º 89.º-A da lGT), têm de considerar-se verificados os pressupostos legais para a avaliação indirecta do seu rendimento tri-butável.

Com efeito, cabendo à Administração tributária o ónus de prova da verificação dos pressupostos legais vinculativos da sua actuação, cabe-lhe provar que o ren-dimento líquido declarado pelo sujeito passivo mostra uma desproporção superior a 50%, para menos, em re-lação ao rendimento padrão fixado na referida tabela.

O rendimento padrão serve assim, numa primeira fase, para verificar se ocorrem os pressupostos legais para o recurso a métodos indirectos de determinação do rendimento tributável. E uma vez provados esses pres-supostos, passa a competir ao sujeito passivo o ónus de prova da ilegitimidade do acto por erro nos pressupos-tos, pela demonstração de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte da manifestação de fortuna evidenciada, nomeadamente herança ou doação, rendimentos que não esteja obrigado a declarar, utilização do seu capital ou recurso ao crédito (n.º 3 do artigo 89.º-A da lGT).

Neste contexto, para prova da ilegitimidade deste acto de avaliação indirecta só deve dar-se relevância à justificação total do montante que permitiu a “mani-festação de fortuna”. A justificação meramente parcial não afasta a aplicabilidade da determinação indirecta dos rendimentos globais que permitiram tal manifestação de fortuna.

Ora, não tendo a Recorrente justificado a totalidade do montante que lhe permitiu efectuar a referida aquisi-ção, têm de se dar por verificados os pressupostos legais para a aplicação do método indirecto de avaliação do seu rendimento tributável, e legitimado o acto.

Assim, não se demonstra, pois, a ilegalidade do re-curso à avaliação indirecta, como bem se entendeu no acórdão recorrido.

Entende-se, contudo, que já assim não é no que res-peita à fixação do rendimento sujeito a tributação como incremento patrimonial em sede de IRS, onde a justifi-cação parcial há-de relevar para a fixação presuntiva do montante do “acréscimo patrimonial não justificado” sujeito a imposto.

Embora se tenha presente a decisão recorrida seguiu a anterior jurisprudência deste Supremo Tribunal, desig-nadamente a que resulta do supra citado aresto do Pleno desta Secção, e bem assim que a solução perfilhada é a que resulta literalmente da letra do n.º 4 do artigo 89.º-A da lGT, que apenas prevê de forma expressa a possibi-lidade de afastamento do valor determinado tendo por referência o “rendimento padrão” quando a administra-ção tributária fixar rendimento superior, de acordo com os critérios fixados no artigo 90.º, entende-se, contudo, ser outra a solução imposta pelo espírito do sistema, conformado pelos princípios constitucionais e legais pertinentes atendendo à natureza das normas em causa.

Assim, no que à natureza das normas em causa res-peita, parece dever entender-se que as normas previstas no n.º 4 do artigo 89.º-A da lei Geral Tributária são, nes-ta segunda fase (em que em causa está a determinação e quantificação do rendimento sujeito a IRS), normas de incidência objectiva de IRS, integrantes da norma con-tida na alínea d) do n.º 1 do artigo 9.º do respectivo Có-digo (neste sentido, JOSÉ GUIlHERME XAVIER DE bASTO, IRS: Incidência Real e Determinação dos Ren-dimentos líquidos, Coimbra, 2007, pp. 368/369, nota 415), ou, pelo menos, normas que densificam e concre-tizam aquelas e, como tais, sujeitas a idênticas regras e princípios.

Ora, se assim é, então ter-se-á de considerar ser-lhes aplicável a proibição de presunções legais absolutas de rendimentos derivada do princípio da capacidade con-tributiva (neste sentido, JOSÉ CASAlTA NAbAIS, O

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Dever Fundamental de Pagar Impostos, Coimbra, Al-medina, 1998, em especial pp. 497/498), que, no plano da lei ordinária, o artigo 73.º da lGT, ao dispor que «as presunções consagradas nas normas de incidência tri-butária admitem sempre prova em contrário», expressa-mente consagra.

Não pode, pois, deixar de ser reconhecido ao con-tribuinte o direito de provar o manifesto excesso dessa quantificação, pela demonstração de que o seu rendi-mento tributável não pode ser igual ao rendimento pa-drão que a lei fixa ou presume, na medida em que logrou demonstrar a proveniência de parte do montante que permitiu a manifestação de fortuna e esse montante não está sujeito a declaração e tributação como rendimen-to para efeitos de IRS. Impedir o contribuinte de fazer essa prova ou defender que não se pode dar qualquer relevância à demonstração da proveniência parcial do rendimento utilizado na manifestação da fortuna, argu-mentando que a quantificação tem, necessariamente, de ser aquela que resulta da aplicação de um critério estrita-mente legal e que parte de uma ficção ou presunção de um determinado rendimento sujeito a tributação (ren-dimento padrão), constituiria, desde logo, uma clara e directa violação do artigo 73.º da lGT, pois que, sendo a situação em apreço uma daquelas que bule com a inci-dência objectiva de IRS, há que dar à parte desfavorecida com esta presunção a possibilidade de a ilidir, mediante prova em contrário (n.º 2 do artigo 350.º do Código Ci-vil).

Acresce que a solução a que conduziria o não relevo da justificação parcial da manifestação de fortuna leva-ria a tributar de forma igual situações diversas e para as quais a Constituição parece impor tratamento tributário diverso, em conformidade com os princípios da igualda-de, da capacidade contributiva e da tributação dos ren-dimentos reais.

De facto, mal se compreenderia, à luz dos referidos princípios, que, perante contribuintes relativamente aos quais se verificassem os pressupostos legais do recurso à avaliação indirecta por “sinais exteriores de riqueza” e que tivessem adquirido imóveis de valor idêntico, o con-tribuinte que nada justificou fosse tributado em sede de categoria G de IRS por montante exactamente igual ao contribuinte que justificou que parte significativa da fon-te do acréscimo patrimonial não justificado lhe adveio do recurso a um empréstimo bancário, acrescendo, ainda que o montante obtido por via do empréstimo bancário acabaria também por ser tributado, não obstante tratar-se comprovadamente de montante não sujeito a tributa-ção em sede de IRS.

Ora, a interpretação adoptada no acórdão recorrido conduz, inevitavelmente, a um tratamento grosseiramen-te igualitário de situações diversas e bem assim autoriza e valida a tributação de rendimentos que, comprovada-mente, não estão sujeitos a tributação em sede de IRS, razões pelas quais deve ser rejeitada sob pena de afronta aos princípios da igualdade, da capacidade contributiva e da tributação dos rendimentos reais (Cfr., o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 348/97, de 29 de Abril de 1997, que julgou inconstitucional, por violação do prin-cípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da Consti-tuição, a norma do §2 do artigo 14.º do Código do Im-posto de Capitais, na parte em que não permite a elisão de onerosidade dos mútuos efectuados pelas sociedades a favor dos respectivos sócios e respectiva anotação de CASAlTA NAbAIS, que convoca também o princípio da capacidade contributiva para defesa de que a predita norma também é inconstitucional em si mesma, na me-dida em que permite a tributação de situações sem qual-quer suporte na capacidade contributiva - «Presunções Inilidíveis e Princípio da Capacidade Contributiva: Acór-dão n.º 348/97, processo n.º 63/96», Fisco, n. 84/85, Setembro/Outubro 1998, ano IX, pp. 85/95).

Tenha-se finalmente em conta que a natureza subsi-diária da avaliação indirecta (artigo 85.º, n.º 1 da lGT) - de que, ao menos na perspectiva do legislador (cfr. a alínea d) do n.º 1 do artigo 87.º da lGT), a avaliação por sinais exteriores de riqueza comunga -, e bem assim a regra segundo a qual à avaliação directa se aplicam, sempre que possível e a lei não prescreva em sentido diferente, as regras da avaliação directa (artigo 85.º n.º 2 da lGT) parecem igualmente militar no sentido de que a justificação parcial feita pelo contribuinte do acréscimo patrimonial há-de reflectir-se na fixação do rendimento a sujeitar a imposto, tanto mais que o n.º 4 do artigo 89.º-A da lGT expressamente admite o afastamento da tributação do montante determinado pelo “rendimento padrão” quando existam indícios fundados, de acordo com os critérios previstos no artigo 90.º, que permitam à administração tributária fixar rendimento superior, o que permite afirmar o carácter supletivo do recurso ao rendimento padrão, ao menos na perspectiva da Admi-nistração tributária.

Ora, se assim é para a Administração tributária, pe-rante meros indícios, embora fundados e consonantes com critérios legalmente definidos, não se vê que deva ser de outro modo quando a situação seja a inversa e o contribuinte disso faça prova.

É que julgamos que também no plano procedimen-tal tributário o princípio do Estado de Direito Demo-crático (artigo 2.º da Constituição da República) postula

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esse justo equilíbrio, essa paridade de posições jurídicas recíprocas, nas situações em que não se vislumbra que um interesse público de especial relevo imponha solução diversa (cfr., sobre o tema em geral, PEDRO MACHE-TE, Estado de Direito Democrático e Administração Paritária, Coimbra, Almedina, 2007).

Diga-se finalmente que a solução propugnada é a sustentada pela mais recente doutrina que ex professo tratou a questão (cfr. JOÃO SÉRGIO RIbEIRO, A Tributação Presuntiva do Rendimento: Um Contributo para Reequacionar os Métodos Indirectos de Determi-nação da Matéria Tributável, Coimbra, Almedina, Abril 2010, pp. 301/305), o que não deve deixar de ser salien-tado.

Os argumentos supra expostos conduzem, assim, a que se entenda que a justificação parcial, embora não afaste a aplicação do método de avaliação indirecta pre-visto no artigo 89.º-A da lGT, não pode deixar de ser considerada na quantificação do rendimento tributável que vai ser determinado por esse método, entenden-do-se que a quantificação do rendimento tributável da recorrente deve ser igual a 20% do valor de aquisição deduzido do montante do empréstimo bancário que de-monstrou ter efectuado para a aquisição do imóvel em questão, já que este montante não está, nem pode es-tar, sujeito a IRS, não podendo, consequentemente, ser presumido ou considerado como rendimento sujeito a tributação.

Ora, atendendo a que, no caso dos autos, a adminis-tração tributária nenhuma dedução relativa ao emprésti-mo bancário efectuou na avaliação do rendimento tribu-tável da recorrente a que procedeu, há manifesto excesso na quantificação, o que fere de ilegalidade o acto que constitui o objecto do presente recurso judicial - acto que fixou à ora recorrente o rendimento tributável de € 75.000,00 com recurso a avaliação indirecta –, pelo que se impõe a respectiva anulação judicial.

O acórdão recorrido que assim o não considerou, não pode, pois, manter-se.

O recurso merece provimento. - Decisão - 7 - Termos em que, face ao exposto, acordam os Ju-

ízes do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provi-mento ao recurso jurisdicional, revogar o acórdão recor-rido e, julgando procedente o recurso judicial, anular o sindicado despacho do Director de Finanças de lisboa.

Custas pela autoridade recorrida, na instância e neste Supremo Tribunal.

lisboa, 19 de Maio de 2010. Isabel Cristina Mota Marques da Silva (relatora) –

Joaquim Casimiro Gonçalves – Dulce Manuel da Con-ceição Neto – João António Valente Torrão – Alfredo

Aníbal bravo Coelho Madureira – António José Martins Miranda de Pacheco – António Francisco de Almeida Calhau (vencido, nos termos do voto de vencido jun-to pelo Ex.mo Conselheiro Jorge lino) – Domingos brandão de Pinho (vencido nos termos da declaração de voto do Ex.mo Cons.º Jorge lino) – Francisco António Vasconcelos Pimenta do Vale (vencido nos termos que constam do Acórdão do Pleno desta Secção prolatado no rec. Nº 761/08, de 28/01/09, de que fui Relator, bem como nos termos da declaração de voto do Ex.mo Con-selheiro Jorge lino) – Jorge lino Ribeiro Alves de Sousa (Vencido conforme declaração que anexo).

Voto de vencido 1. O douto presente acórdão entende que, no caso,

a quantificação do rendimento tributável deve ser igual a 20% do valor de aquisição do imóvel, deduzindo-se a tal valor o montante do empréstimo bancário efectuado para a aquisição do imóvel.

O acórdão defende que para a quantificação do ren-dimento tributável ao «valor padrão» [20% do valor de aquisição do imóvel] deva abater-se o valor do emprésti-mo efectuado para a aquisição do imóvel.

Ou seja: o acórdão defende que, quando o contri-buinte não faça, como deve fazer, «a prova de que cor-respondem à realidade os rendimentos declarados», o «valor padrão» de rendimento tributável [de 20% do valor de «manifestações de fortuna evidenciadas»] seja diminuído até ao montante da prova justificativa que ele faça dessas «manifestações de fortuna».

2. E, assim – nessa lógica –, se, por hipótese, o con-tribuinte tiver feito a prova justificativa de 20% do valor das «manifestações de fortuna evidenciadas», então pa-rece que não haveria qualquer rendimento tributável… O que, por absurdo, está manifestamente fora da “vo-luntas legis”. E, não tendo, como não tem, «na letra da lei um mínimo de correspondência verbal», não pode tal interpretação gozar de alguma validade jurídica – cf. o n.º 2 do artigo 9.º do Código Civil.

3. Em casos que tais – e nos termos do n.º 4 do ci-tado artigo 89.º-A da lei Geral Tributária [na redacção, aqui aplicável, da lei n.º 107-b/2003, de 31/12] – con-sidera-se como rendimento tributável em sede de IRS, a enquadrar na categoria G, o rendimento padrão de 20% do valor de aquisição de imóveis de valor de aquisição igual ou superior a € 250.000, quando não existam in-dícios fundados, de acordo com os critérios previstos no artigo 90.º, que permitam à Administração Tributária fixar rendimento superior.

Segundo os termos da lei, uma realidade é o «valor de aquisição» das «manifestações de fortuna evidenciadas»; outra realidade é o «rendimento padrão», que a lei presu-me e fixa em 20% apenas daquele «valor de aquisição».

Esta presunção legal de «rendimento padrão», para

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efeitos de rendimento tributável, é claramente uma pre-sunção “juris tantum”, elidível por meio da prova da presença de rendimentos proporcionados a suportar a totalidade do «valor de aquisição» das «manifestações de fortuna evidenciadas».

Realmente, para efeitos de combate à evasão fiscal – augúrio do normativo supracitado – a única solução razoável é a exigência da prova de meios ou rendimento igual, no mínimo, ao «valor de aquisição» das «manifes-tações de fortuna evidenciadas».

E não tem sentido sequer pensar-se que o contri-buinte tem de provar, não o valor das «manifestações de fortuna evidenciadas», mas apenas o «rendimento pa-drão» legalmente presumido. De tal modo, a lei estaria precisamente a consentir a evasão fiscal que justamente pretende travar por meio do mecanismo legal em foco. É que este «rendimento padrão» é um rendimento pre-sumido na suposição muito natural, conforme ao senso comum (id quod plerumque accidit), da existência de evasão fiscal fortemente indiciada por «manifestações de fortuna evidenciadas» em franca discrepância com ren-dimentos declarados.

4. Segundo a lei, o «valor padrão» não pode ser “des-contado” ou baixado. Ao contrário: tal «valor padrão» poderá ser aumentado, se a Administração Tributária estiver na posse de elementos que lhe permitam fixar um rendimento superior. O rendimento tributável nunca poderá ser inferior ao «valor padrão».

O “desconto” dos valores provados na aquisição das «manifestações de fortuna evidenciadas» ao «rendimen-to padrão» tributável – que se defende no acórdão – só poderia compreender-se se o mecanismo legal em foco fosse o de uma determinação do rendimento tributável por método indirecto. E não é. Na verdade, a determi-nação do rendimento tributável pelo modo previsto no artigo 89.º-A da lei Geral Tributária [na redacção, aqui aplicável, da lei n.º 107-b/2003, de 31/12] constitui e integra um procedimento próprio, específico, que não é de avaliação indirecta - portanto, sem relação de sub-sidiariedade com o procedimento da avaliação directa.

Com efeito, entre a avaliação directa e a avaliação in-directa existe uma relação de subsidiariedade.

Mas essa relação de subsidiariedade não existe entre a avaliação directa e a determinação da matéria colectá-vel com base em manifestações de fortuna. A avaliação directa «pressupõe que se conheça a categoria ou a fonte do rendimento», e, para a determinação do rendimento tributável por manifestações de fortuna, o único méto-do possível para apurar esses «rendimentos ocultos» é, na verdade, o do mecanismo legal em presença, «isto porque este mecanismo pressupõe o desconhecimento da fonte do rendimento que se pretende apurar», «não sendo sequer concebível ou pensável uma aplicação da determinação directa». E o que é certo é que a presunção de rendimento [de 20% do valor de aquisição do imó-vel] – legalmente elidível pela prova de rendimento, no mínimo, igual ao «valor de aquisição» das «manifestações de fortuna evidenciadas» –, traduz uma proposição pres-critiva decorrente da impossibilidade de determinação directa da ocorrência do evento descrito no facto jurídi-co típico, para fins de desencadeamento válido da obri-gação tributária, com vista a surpreender e atingir a real capacidade contributiva, e levar à prática, tanto quanto possível, o princípio constitucional da igualdade tributá-ria (cf., neste sentido, João Sérgio Ribeiro, A Tributação Presuntiva do Rendimento: Um Contributo para Ree-quacionar os Métodos Indirectos de Determinação da Matéria Tributável, Coimbra, Almedina, Abril 2010, pp. 279, 285 e 299; e, também, José Casalta Nabais, O Dever Fundamental de Pagar Impostos, pp. 497 e 498).

5. Neste entendimento, afigura-se que a jurisprudên-cia do Pleno desta Secção do Supremo Tribunal Admi-nistrativo tem vindo, nestes casos, a trilhar um caminho amoldado ao «espírito do sistema, conformado pelos princípios constitucionais e legais pertinentes», de que fala o acórdão – caminho do qual é o mesmo presente acórdão que se afasta decididamente, sem razões con-vincentes, salvo o devido respeito.

Termos em que se confirmaria o acórdão recorrido. lisboa, 19 de Maio de 2010. Jorge lino Ribeiro Alves de Sousa.

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anotação

No acórdão supra transcrito podemos observar a situação de um contribuinte que adquiriu, por compra e venda, um imóvel no valor de € 375.000, no ano de 2004, sendo que, nesse mesmo ano, apresentou uma declaração de rendimentos, conjuntamente com o seu marido, no valor de € 15.860,60. Atendendo à discrepância entre o valor dos rendimentos apresentados e o do bem adquirido, e por imperativo legal, o sujeito passivo em causa foi tributado, através de métodos indirectos, em sede de IRS, designadamente na categoria G, tendo-lhe sido fixa-do em € 75.000 o rendimento correspondente ao ano de 2004, por despacho do Director de Finanças de Lisboa.

Discordando de tal acto tributário, o sujeito passivo interpôs re-curso judicial para o Tribunal Administrativo e Fiscal competente, no caso o TAF de Sintra, tendo em vista a anulação do referido acto.

É de sublinhar que nos encontramos no domínio do artigo 89º-A da Lei Geral Tributária, já sobejamente referido no acórdão em análise, pelo que o recurso judicial interposto pelo contribuinte terá de ter seguido o preceituado no nº 7 do referido artigo, segundo o qual o recurso da decisão de avaliação da matéria colectável pelo método indirecto resultante de manifestações de fortuna obedece a um regime especial que consiste na sua apresentação no tribunal tributário, com efeito suspensivo, a tramitar como processo urgente. Esta disposição normativa afasta, ainda, expressamente a possibilidade de se lançar mão do pedido de revisão da matéria colectável, previsto no artigo 91º da LGT que, como sabemos, é um meio gracioso e gratuito.

Vejamos, então, o que dispõe a Lei Geral Tributária acerca das manifestações de fortuna evidenciadas por um sujeito passivo.

Conforme já foi dito, esta matéria é tratada no artigo 89º-A da LGT. Analisemos o seu regime.

Dispõe a norma citada que há lugar à avaliação indirecta da matéria colectável quando o sujeito passivo não apresente qualquer declaração de rendimentos e simultaneamente evidencie determinadas manifestações de fortuna previstas na tabela ínsita no nº 4 do artigo 89º-A (1) ou quando o rendimento líquido declarado mostre uma desproporção superior a 50%, para menos, em relação ao rendimento padrão que resulta da mesma tabela.

Vejamos, a título de exemplo, a tramitação do processo no seio da Administração Tributária. Elejamos a primeira situação: a Admi-nistração Tributária depara-se com uma compra e venda de um imóvel de valor superior a € 250.000 efectuada por um sujeito passivo que não apresentou declaração de rendimentos.

O procedimento a adoptar consiste em adicionar ao valor de aqui-sição de tal imóvel a quantia que o contribuinte comprador pagou a título de imposto municipal sobre transacções e, bem assim, o valor das despesas com a escritura e, sobre o valor apurado, aplicar a percenta-gem de 20%, determinando-se, assim, o chamado rendimento padrão. Posteriormente, o elemento da Administração Tributária propõe ao Director-Geral a avaliação indirecta da matéria colectável, a qual coincidirá, geralmente, com o rendimento padrão.

Quando o sujeito passivo tenha apresentado declaração de rendi-mentos mas evidencie um consumo superior àquele que os rendimentos declarados parecem permitir, e voltando ao exemplo da aquisição de um imóvel de valor igual ou superior a € 250.000, a Administração

1 - Vide tabela infra in “O QUE DIZ A lEI”.

Tributária observa o rendimento declarado pelo contribuinte, após o que compara tal rendimento com o valor que resultar de 10% da soma do valor de aquisição do imóvel, do IMT pago e das despesas inerentes à escritura. Se o rendimento declarado for superior a 10% da quantia que resultar desta soma, o processo será arquivado.

Pelo contrário, se o rendimento declarado for inferior a 10% da soma destas quantias, é proposta a avaliação indirecta da matéria colectável. Dessa forma, a Administração Tributária fará acrescer à matéria colectável declarada a diferença desta para o rendimento pa-drão. Ou seja, determina-se o valor correspondente a 20% da soma do valor de aquisição do imóvel, do IMT pago e das despesas notariais, subtraindo-se a tal valor a matéria colectável declarada.

A partir deste momento, o contribuinte tem o ónus de provar que correspondem à verdade os rendimentos declarados e que é outra a fonte das manifestações de fortuna evidenciadas. O contribuinte é obrigatoriamente chamado ao procedimento administrativo tendente ao apuramento da matéria colectável por métodos indirectos, nos termos do princípio da participação, plasmado, para o nosso caso em concreto, no artigo 60º, nº 1, alínea d) da LGT (direito de audição (2) antes da decisão de aplicação de métodos indirectos, quando não haja lugar a relatório de inspecção), podendo, então, juntar os elementos que tiver por convenientes e que sejam idóneos a demonstrar a veracidade da declaração que estiver em crise. Não é, contudo, obrigado a fazê-lo.

Caso a Administração Tributária não faculte ao sujeito passi-vo a possibilidade de exercer o direito de audição prévia, incorre na preterição de uma formalidade essencial que, só por si, inquina todo o procedimento.

Retomando o caso dos autos, e segundo os elementos de que dis-pomos, o imóvel que terá originado a manifestação de fortuna eviden-ciada terá sido adquirido pela quantia de € 375.000, tendo o sujeito passivo declarado uma matéria colectável no valor de € 15.860,60. Assim, e se, por hipótese de raciocínio, o sujeito passivo não lograsse provar que os recursos que lhe permitiram fazer tal aquisição eram de fonte legítima e, de alguma forma, dispensados de tributação, ou já tributados noutra sede, a Administração Tributária poderia fixar um rendimento padrão equivalente a € 75.000 (20% x 375.000, pressupondo-se que já estão aqui incluídos o IMT e as despesas nota-riais), devendo subtrair a tal rendimento a quantia de € 15.860,60, uma vez que já havia sido declarada e tributada. Assim, à matéria colectável do sujeito passivo deveria acrescer, ao rendimento referente a 2004, a quantia de € 59.140,40. De salientar que se levanta aqui um problema referente ao escalão a aplicar ao sujeito passivo, visto que, naturalmente, o somatório da tributação isolada de € 15.860,60 e posteriormente de € 59.140,40 é diferente tributar a quantia de € 75.000 de uma só vez.

Ora, sucede que, no caso dos autos, o sujeito passivo demonstrou ter recorrido ao crédito bancário, tendo contraído um empréstimo no valor de € 250.000. A ser assim, continuarão verificados os pressu-postos para que se realize a avaliação matéria colectável por métodos indirectos? Terão, forçosamente, de continuar. A demonstração do re-curso ao crédito bancário mais não é do que a precisa efectivação da prova de que é outra a fonte dos recursos que permitiram alcançar o consumo evidenciado. Isto é, o facto de o contribuinte ter justificado a proveniência de uma parte substancial da quantia utilizada na aqui-sição do bem identificado não se traduz na preclusão da verificação

2 - A propósito do direito de audição prévia, vide a Circular nº 13/99, de 8 de Julho.

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dos requisitos contidos no nº 1 do artigo 89º-A da LGT mas antes na observância, por parte do sujeito passivo, do ónus que lhe impõe o nº 3 deste mesmo artigo.

Então, o que fazer relativamente à equação que se destina a apu-rar o rendimento padrão? O valor de tal rendimento deve manter-se? A questão foi largamente debatida nos autos, tendo concluído os Ve-nerandos Conselheiros que seria forçoso que a quantia correspondente ao mútuo celebrado fosse subtraída ao valor de aquisição do imóvel em causa. No entanto, esta posição não foi unânime, o que se pode verificar pelos votos de vencido que se apresentaram.

“Quid juris”?Em nossa opinião, tendo o sujeito passivo logrado provar que

adquiriu um imóvel, em parte, com capitais alheios, neste caso do Banco junto do qual efectuou o empréstimo, forçoso é concluir que tais capitais não podem ser tributados como se rendimentos do sujeito passivo se tratassem, uma vez que não o são. Não haveria qualquer razoabilidade nessa solução. Assim, à soma do valor de aquisição do imóvel, do IMT pago e das despesas notariais, haveria que deduzir a quantia de € 250.000, uma vez que tal quantia haverá sido colocada à disposição do contribuinte a título de empréstimo. Estamos em crer que foi essa a solução adoptada pelo acórdão em apreço.

Quer isto dizer que não se trata de deduzir ao rendimento padrão apurado a quantia mutuada. Ao ser assim, a interpretação da lei fa-cultaria um mecanismo de evasão fiscal digno de nota. Trata-se apenas de deduzir ao valor de aquisição do imóvel a quantia obtida a título de empréstimo para determinar novamente o rendimento padrão em termos correctos. Se recorrermos aos números dos autos, que premissas poderemos estabelecer?

Ora, já vimos que o preço do imóvel foi de € 375.000. Se a este valor subtrairmos a quantia mutuada, encontraremos um valor de € 125.000. por uma questão de raciocínio, vamos olvidar o facto de o contribuinte ter invocado que o vendedor do imóvel nunca recebeu tais € 125.000, o que não sabemos se corresponde à verdade ou não, e vamos supor que o sujeito passivo recorrente nos autos despendeu efectivamente da quantia de € 125.000.

Temos então que, em primeiro lugar e em teoria, estão verificados os pressupostos para a avaliação indirecta da matéria colectável, aten-dendo aos argumentos que expendemos supra. O valor de aquisição tem de decrescer a € 125.000. De acordo com as regras que já tivemos oportunidade de explicitar, temos agora de comparar o rendimento de-clarado com o novo valor de aquisição. Ora, o rendimento declarado é de € 15.860,60. O novo rendimento padrão seria de € 25.000 (20% x 125.000). Podemos, pois, concluir que, no caso em concreto, não há uma desproporção superior a 50%, para menos, em relação ao rendi-

mento padrão corrigido. Assim, no caso dos autos não haveria lugar a qualquer tributação adicional. Já não seria assim se a diferença entre o rendimento declarado e o rendimento padrão fosse superior a 50%, para menos, do primeiro relativamente ao segundo.

Assim, teremos de concluir que quer o Tribunal Administrati-vo e Fiscal de Sintra quer o Tribunal Central Administrativo Sul deveriam ter decidido no sentido oposto àquele que veio a efectivar-se.

“Quid juris”, agora, a propósito de vir o Supremo Tribunal Ad-ministrativo a conhecer da decisão?

No caso dos autos, temos já esgotado o “duplo grau de decisão”, isto é, a mesma questão já foi apreciada por duas instâncias judi-ciais, como sendo o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra e o Tribunal Central Administrativo Sul, o que poderia implicar que a questão decidenda não fosse passível de ser novamente apreciada. Como sabemos, os poderes de cognição das secções do Supremo Tri-bunal Administrativo e do Pleno das Secções deste mesmo Tribunal são bastante apertadas, obedecendo a critérios de dignidade jurídica, económica e social. Podemos comprovar esta observação pela leitura dos artigos 26º e 27º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, conjugados com os artigos 150º a 152º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos. (3)

Sucede que, conforme vem descrito no acórdão em análise, o sujei-to passivo havia recorrido para o Tribunal Central Administrativo Sul, estribando a sua pretensão num acórdão desse mesmo Tribunal que decidiu a favor do contribuinte num caso idêntico ao que se nos apresenta. Não iremos tecer demais considerações acerca da identidade fáctica dos themas decidendos de cada um dos acórdãos, uma vez que o douto acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Su-premo Tribunal Administrativo explana cabalmente em que consiste tal identidade e qual a génese dos critérios adoptados para tal, pelo que fazemos nossas tais considerações.

Salientamos apenas que, uma vez que se trata de um recurso de uniformização de jurisprudência interposto ao abrigo do artigo 27º, nº 1, al. b) do ETAF, conjugado com o artigo 152º, nº 1, al. a), do CPTA, o Supremo Tribunal Administrativo não conheceu, nem po-deria conhecer, da questão de facto invocada pela recorrente no sentido de não ter entregue aos alienantes do imóvel por si adquirido a quantia de € 125.000.

Em jeito de conclusão, diremos apenas que a decisão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administra-tivo espelha todos os corolários de justiça tributária e processual, sendo, por tudo o que se vem de expor, de aplaudir.

3 - Vide infra O QUE DIZ A lEI.

oquedizalei

LEI GERAL TRIBUTáRIA

Artigo 60º (Princípio da participação)

1 - A participação dos contribuintes na formação das decisões que lhes digam respeito pode efectuar-se, sempre que a lei não prescrever em sentido diverso, por qualquer das seguintes formas:

a) Direito de audição antes da liquidação;b) Direito de audição antes do indeferimento total ou parcial dos

pedidos, reclamações, recursos ou petições;

c) Direito de audição antes da revogação de qualquer benefício ou acto administrativo em matéria fiscal;

d)(*) Direito de audição antes da decisão de aplicação de métodos indirectos, quando não haja lugar a relatório de inspecção;

e) Direito de audição antes da conclusão do relatório da inspecção tributária.

2 - É dispensada a audição:a) No caso de a liquidação se efectuar com base na declaração do con-

tribuinte ou a decisão do pedido, reclamação, recurso ou petição lhe seja favorável;

b) No caso de a liquidação se efectuar oficiosamente, com base em valores objectivos previstos na lei, desde que o contribuinte tenha sido notificado para apresentação da declaração em falta, sem que o tenha feito.

jurisprudência[anotada]

27REVISTA FISCAl Setembro/Outubro | 2010

3 - Tendo o contribuinte sido anteriormente ouvido em qualquer das fases do procedimento a que se referem as alíneas b) a e) do n.º 1, é dis-pensada a sua audição antes da liquidação, salvo em caso de invocação de factos novos sobre os quais se não tenha pronunciado.

4 - O direito de audição deve ser exercido no prazo a fixar pela ad-ministração tributária em carta registada a enviar para esse efeito para o domicílio fiscal do contribuinte.

5 - Em qualquer das circunstâncias referidas no n.º 1, para efeitos do exercício do direito de audição, deve a administração tributária comunicar ao sujeito passivo o projecto da decisão e sua fundamentação.

6 - O prazo do exercício oralmente ou por escrito do direito de audi-ção, não pode ser inferior a 8 nem superior a 15 dias.

7 - Os elementos novos suscitados na audição dos contribuintes são tidos obrigatoriamente em conta na fundamentação da decisão.

Artigo 89º-A (Manifestações de fortuna e outros acréscimos patrimoniais não justificados)

1 - Há lugar a avaliação indirecta da matéria colectável quando falte a declaração de rendimentos e o contribuinte evidencie as manifestações de fortuna constantes da tabela prevista no n.º 4 ou quando o rendimento líquido declarado mostre uma desproporção superior a 50%, para menos, em relação ao rendimento padrão resultante da referida tabela.

2 - Na aplicação da tabela prevista no n.º 4 tomam-se em conside-ração:

a) Os bens adquiridos no ano em causa ou nos três anos anteriores pelo sujeito passivo ou qualquer elemento do respectivo agregado familiar;

b) Os bens de que frua no ano em causa o sujeito passivo ou qualquer elemento do respectivo agregado familiar, adquiridos, nesse ano ou nos três anos anteriores, por sociedade na qual detenham, di-recta ou indirectamente, participação maioritária, ou por entidade sediada em território de fiscalidade privilegiada ou cujo regime não permita identificar o titular respectivo.

c) Os suprimentos e empréstimos efectuados pelo sócio à socieda-de, no ano em causa, ou por qualquer elemento do seu agregado familiar.

3 - Verificadas as situações previstas no n.º 1 deste artigo, bem como na alínea f) do n.º 1 do artigo 87.º, cabe ao sujeito passivo a comprovação de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna ou do acréscimo de património ou da despesa efectuada.

4 - Quando o sujeito passivo não faça a prova referida no número an-terior relativamente às situações previstas no n.º 1 deste artigo, considera-se como rendimento tributável em sede de IRS, a enquadrar na categoria G, no ano em causa, e no caso das alíneas a) e b) do n.º 2, nos três anos seguintes, quando não existam indícios fundados, de acordo com os cri-térios previstos no artigo 90.º, que permitam à administração tributária fixar rendimento superior, o rendimento padrão apurado nos termos da tabela seguinte:

Manifestações de fortuna Rendimento padrão

1. Imóveis de valor de aquisição igual ou superior a € 250.000

20% do valor de aquisição.

2. Automóveis ligeiros de passageiros de valor igual ou superior a € 50.000 e motociclos de valor igual ou supe-rior a € 10.000.

50% do valor no ano de matrí-cula com o abatimento de 20% por cada um dos anos seguintes.

3. barcos de recreio de valor igual ou superior a € 25.000

Valor no ano de registo com o abatimento de 20% por cada um dos anos seguintes.

4. Aeronaves de Turismo Valor no ano de registo com o abatimento de 20% por cada um dos anos seguintes.

5. Suprimentos e empréstimos feitos no ano de valor igual ou superior a € 50 000

50% do valor anual

5 - Para efeitos da alínea f) do n.º 1 do artigo 87.º: a) Considera-se como rendimento tributável em sede de IRS, a en-

quadrar na categoria G, quando não existam indícios fundados, de acordo com os critérios previstos no artigo 90.º, que permitam à administração tributária fixar rendimento superior, a diferença entre o acréscimo de património ou a despesa efectuada, e os ren-dimentos declarados pelo sujeito passivo no mesmo período de tributação;

b) Os acréscimos de património consideram-se verificados no perí-odo em que se manifeste a titularidade dos bens ou direitos e a despesa quando efectuada;

c) Na determinação dos acréscimos patrimoniais, deve atender-se ao valor de aquisição e, sendo desconhecido, ao valor de mercado;

d) Consideram-se como rendimentos declarados os rendimentos lí-quidos das diferentes categorias de rendimentos.

6 - A decisão de avaliação da matéria colectável pelo método indirecto constante deste artigo é da competência do director de finanças da área do domicílio fiscal do sujeito passivo, sem faculdade de delegação.

7 - Da decisão de avaliação da matéria colectável pelo método indi-recto constante deste artigo cabe recurso para o tribunal tributário, com efeito suspensivo, a tramitar como processo urgente, não sendo aplicável o procedimento constante dos artigos 91.º e seguintes.

8 - Ao recurso referido no número anterior aplica-se, com as neces-sárias adaptações, a tramitação prevista no artigo146.º-b do Código de Procedimento e de Processo Tributário.

9 - Para a aplicação dos nºs 3 a 4 da tabela, atende-se ao valor médio de mercado, considerando, sempre que exista, o indicado pelas associa-ções dos sectores em causa.

10 - A decisão de avaliação da matéria colectável com recurso ao mé-todo indirecto constante deste artigo, após tornar-se definitiva, deve ser comunicada pelo director de finanças ao Ministério Público e, tratando-se de funcionário ou titular de cargo sob tutela de entidade pública, também à tutela destes para efeitos de averiguações no âmbito da respectiva com-petência.

11 - A avaliação indirecta no caso da alínea f) do n.º 1 do artigo 87.º deve ser feita no âmbito de um procedimento que inclua a investigação das contas bancárias, podendo no seu decurso o contribuinte regularizar a situação tributária, identificando e justificando a natureza dos rendimentos omitidos e corrigindo as declarações dos respectivos períodos.

jurisprudência[resumos]

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Impugnação judicialIRCMétodos indiciáriosDireito de audiçãoFundamentação

sumário1. Encontram-se preenchidos os pressupostos para

o lucro tributável ser apurado por métodos indirectos quando através da contabilidade da contribuinte, mercê das suas omissões, deficiências e irregularidades, não é possível apurar os reais custos e nem os reais proveitos;

2. Em sede de impugnação judicial, actualmente, no âmbito da vigência do CPPT, cabe à Administração Fis-cal assentar os pressupostos que levaram à tributação, em juízos de probabilidade, necessariamente elevada, sem exigir uma certeza do facto tributário, em que a maior parte das vezes, não é possível;

3. E ao contribuinte, que alegue e prove factos (atra-vés de prova concludente) que ponham em dúvida (fun-dada) os pressupostos em que assentou o juízo de pro-babilidade elevado feito pela Administração para prova da existência do facto tributário ou da sua quantificação;

4. Na decisão que fixa o lucro tributável do exercício através de métodos indirectos, não tem a AT que res-ponder ao sujeito passivo, ponto por ponto, quanto aos seus argumentos ou razões aduzidas em sede do direito de audição, ainda que, nessa decisão, os tenha de ter em conta;

5. Em sede de comissão de revisão, na falta de acor-do dos peritos, o órgão competente para a decisão re-solverá, de acordo com o seu prudente juízo, tendo em conta a posição de ambos os peritos;

6. Esta decisão encontra-se fundamentada do ponto de vista formal, quando dá a conhecer ao administrado o iter cognoscitivo e valorativo seguido de molde a atin-gir o resultado expresso daquele montante de matéria tributável.

Tribunal Central Administrativo Sul

Acórdão de 30 de Junho de 2009

Processo nº 02694/08

Relator: Dr. Eugénio Sequeira

descriçãodosFactosO Representante da Fazenda Pública, inconforma-

do com a sentença proferida pelo Tribunal Tributário

de lisboa que julgou procedente a impugnação judicial deduzida uma sociedade comercial, veio da mesma re-correr.

Para julgar procedente a impugnação judicial dedu-zida considerou o Tribunal “a quo”, em síntese, que a Administração Tributária não justificou as razões para a aplicação dos métodos indirectos na determinação do lucro tributável, fundamento que julgou procedente e anulou a liquidação em conformidade, e não conheceu dos outros fundamentos da impugnação judicial com os quais a ora recorrida igualmente pretendia obter a pro-cedência da impugnação, certamente por os haver consi-derado prejudicados.

O recorrente, de acordo com a matéria das conclu-sões das alegações do recurso e que delimitam o seu ob-jecto, vem insurgir-se contra esta factualidade e respecti-va subsunção por o relatório da inspecção tributária ter apurado em termos concretos e precisos, quanto a umas fracções autónomas vendidas e em que houve lugar a dois empréstimos de valor superior ao preço declarado nas escrituras públicas de compra e venda, que tais pre-ços não correspondiam aos seus valores reais, mas sim os correspondentes aos dois empréstimos pelos quais foi constituída como garantia cada uma dessas fracções autónomas, pelo que a contabilidade ao não reflectir essa realidade padecia de omissões que não a tornavam apta para o efeito de apurar o lucro tributável do exercício.

questãojurÍdicaA determinação do lucro tributável por métodos in-

directos.

decisãodoacÓrdãoA principal questão a decidir consubstancia-se em sa-

ber se, no caso concreto, ocorrem os pressupostos para o lucro tributável ser apurado por métodos indirectos.

Nos termos do disposto no art. 16º, nº 1, do CIRC - Métodos de determinação da matéria colectável - A matéria colectável é, em regra, determinada com base em declaração do contribuinte, sem prejuízo do seu con-trolo pela administração fiscal.

2 – …3 – A determinação do lucro tributável por métodos

indiciários só pode verificar-se nos termos e condições previstos na secção V.

Nos termos do disposto no art. 17º do CIRC - De-terminação do lucro tributável - O lucro tributável das pessoas colectivas e outras entidades mencionadas na alínea a) do nº1 do art. 3º é constituído pela soma algé-brica do resultado líquido do exercício e das variações patrimoniais positivas ou negativas verificadas no mes-

jurisprudência[resumos]

29REVISTA FISCAl Setembro/Outubro | 2010

mo período e não reflectidas naquele resultado, determi-nados com base na contabilidade e eventualmente corri-gidos nos termos deste Código.

Nos termos do art. 23º do CIRC - Consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem in-dispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte pro-dutora, nomeadamente os seguintes: …

Nos termos do disposto no art. 51º do CIRC - Apli-cação de métodos indiciários:

1 - A determinação do lucro tributável por métodos indiciários verificar-se-á sempre que ocorra qualquer dos seguintes factos:

a) inexistência de contabilidade, falta ou atraso de es-crituração dos seus livros e registos e, bem assim, irregularidades na sua organização ou execução;

b) ...c) Existências de diversas contabilidades com pro-

pósito de dissimular a realidade perante a adminis-tração fiscal;

d) Erros e inexactidões na contabilização das opera-ções ou indícios fundados de que a contabilidade não reflecte a exacta situação patrimonial e o resul-tado efectivamente obtido.

2 - A aplicação de métodos indiciários em conse-quência de anomalias e incorrecções da contabilidade só poderá verificar-se quando não seja possível a compro-vação e a quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à determinação da matéria colectável de harmonia com as disposições da secção II deste capítulo.

3 - ...4 - ... E a do art. 98º, nº 3, alínea a), do mesmo Código

- Na execução da contabilidade deverá observar-se em especial o seguinte: Todos os lançamentos devem estar apoiados em documentos justificativos, datados e sus-ceptíveis de serem apresentados sempre que necessário.

E a do art. 29º do Código Comercial - Todo o co-merciante é obrigado a ter livros que dêem a conhecer, fácil, clara e precisamente, as suas operações comerciais e fortuna.

Como se pode ler do preâmbulo do Código do Im-posto Sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas ... Em qualquer caso, procura-se sempre tributar o rendimento real efectivo, que, para o caso das empresas, é mesmo um imperativo constitucional. Como corolário desse princípio, é a declaração do contribuinte, controlada pela administração fiscal, que constitui a base da determina-ção da matéria colectável.

A determinação do lucro tributável por métodos indiciários é, consequentemente, circunscrita aos casos

expressamente enumerados na lei, que são reduzidos ao mínimo possível, apenas se verificando quando tenha lu-gar em resultado de anomalias e incorrecções da conta-bilidade, se não for de todo possível efectuar esse cálculo com base nesta. Por outro lado, enunciam-se os critérios técnicos que a administração deve, em princípio, seguir para efectuar a determinação do lucro tributável por mé-todos indiciários, garantindo-se ao contribuinte os ade-quados meios de defesa...

Dado que a tributação incide sobre a realidade eco-nómica constituída pelo lucro, é natural que a contabili-dade, como instrumento de medida e informação dessa realidade, desempenhe um papel essencial como suporte da determinação do lucro tributável.

Resulta assim claro que a determinação do lucro tribu-tável com recurso a métodos indiciários, hoje chamados de indirectos, tem uma feição excepcional e apenas a lei a autoriza, para aqueles casos em que não seja possível tal apuramento tendo por base a contabilidade do sujeito passivo, como diz a norma do art. 51º, nº 2, do CIRC.

Por outro lado, o apuramento do lucro tributável com o recurso a métodos indiciários não se encontra estabelecido em benefício do sujeito passivo do imposto, e para colmatar eventual resultado injusto para este se tal lucro fosse apurado com o recurso aos elementos da sua contabilidade, ainda que eventualmente corrigidos.

Mas desde que se verifiquem os requisitos de tal norma, não sendo possível apurar, directamente, através da contabilidade do sujeito passivo a matéria colectável desse exercício, legitimada fica pela Administração Fiscal o lançar mão dos métodos indiciários, hoje chamados de indirectos, para determinação desse lucro, em que a Administração Tributária se poderá basear em todos os elementos de que disponha, nos termos do disposto no art. 52º do CIRC, designadamente em quaisquer elemen-tos existentes na contabilidade do sujeito passivo, quer relativos a esse exercício, quer relativos a qualquer um outro, para os extrapolar e valorar para o exercício em causa, não constituindo qualquer erro ou ilegalidade a extrapolação da margem calculada para um exercício ao ser aplicada num outro diferente, quando nenhuma pro-va for feita de que as mesmas tivessem sofrido quaisquer alterações (para pior) ao longo dos mesmos exercícios.

Neste caso concreto, não tendo a ora recorrida vindo juntar ou requerer qualquer prova (constituída ou cons-tituenda), designadamente a junção de parecer pericial (art. 117º, nº 2, do CPPT), sobressaindo, suficientemen-te indiciado, que a escrituração de vendas das fracções vendidas em que houve lugar a dois empréstimos, tendo como única garantia cada uma das fracções vendidas, por montantes superiores aos declarados em cada uma

jurisprudência[resumos]

30 REVISTA FISCAl Setembro/Outubro | 2010

dessas escrituras de compra e venda, retiravam a credi-bilidade da mesma escrita que por valor inferior as es-criturava, sobretudo ao nível dos proveitos, que sempre teriam de ser estimados, calculados, presumidos, afas-tando a possibilidade de, através dessa escrita, apurar o real volume de negócios da impugnante, dos seus reais proveitos, o que afectava a totalidade dos proveitos da sua actividade no exercício em causa, e não apenas uma ou outra operação, em que fosse assim possível, utilizar as correcções técnicas para esse apuramento.

Por outro lado, ao contrário do que parece defendi-do pela ora recorrida, não necessitava a Administração Tributária de, formalmente, expressamente mencionar nesse relatório da inspecção tributária a impossibilida-de de através dessa contabilidade apurar, comprovar e quantificar directa e exactamente a matéria colectável do exercício, bastando que dos factos apurados a con-cretizem, como no caso se entende que exprimem essa impossibilidade.

Ao contrário do entendimento vazado pelo Juiz “a quo” na sentença recorrida, em que desvalorizou estes elementos apurados em sede de realização de exame à escrita e não contrariada por qualquer outra prova, a for-ma como a fiscalização tributária, partindo de dois casos em que comprovadamente houve declaração do preço na escritura pública de compra e venda de cada uma des-sas fracções por valor inferior ao real, antes correspon-dendo tal preço de compra e venda ao somatório dos dois empréstimos obtidos junto da entidade mutuante, procedimento que fez extrapolar para os restantes dez nas mesmas situações, poucas dúvidas poderão restar que a mesma contabilidade não reflectia os reais provei-tos obtidos pela ora recorrida no exercício de 2001 em causa, em que estes serão de montantes superiores aos constantes na mesma.

A impossibilidade do apuramento, quer dos reais custos, quer dos reais proveitos, directamente, através da sua contabilidade permitia ou não que se socorresse aos métodos indiciários para esse apuramento?

A resposta é positiva, face às obrigações da impug-nante em manter uma escrita organizada de molde atra-vés dela se pudesse apurar e controlar o lucro tributável, quer sobretudo quanto aos proveitos, por a escrituração abaixo dos seus reais valores que assim não se sabe o seu volume, quer quanto à variação da sua produção que também foi corrigida face a tais incorrectas escritura-ções, desta forma se não podendo também, apenas, ope-rar com correcções técnicas na determinação do lucro tributável do exercício, resultados que não se encontra-vam espelhados nessa mesma contabilidade, desiderato que através desta não era possível alcançar.

Assim, face à existência destes diversos índices, que se nos afiguram fundados e suficientes, aberto se encon-trava o caminho para lançar mão dos métodos indiciá-rios, por os mesmos não carecerem de ser cumulativos. Ou seja, tal contabilidade não tinha o mérito de espelhar o resultado efectivo, concreto, da realidade económica-financeira do respectivo exercício da contribuinte, apare-cendo sobretudo os proveitos escriturados por defeito, apoiados em documentos que não davam a conhecer a sua verdadeira existência e extensão, em suma, pela con-tabilidade da impugnante não era possível apurar os reais custos e os reais proveitos, efectivamente obtidos.

Face a tais anomalias, não permitindo através da con-tabilidade da impugnante apurar a verdadeira situação patrimonial da empresa e nem o resultado efectivamen-te obtido, não restava outro caminho à Administração Fiscal senão lançar mão de tais métodos indiciários, sob pena de beneficiar o infractor que não organiza a sua contabilidade de acordo com as regras legais previstas nos códigos tributários e comerciais, de molde a apurar e controlar o lucro tributável da sua actividade nesses exercícios.

Não podendo também no caso apenas operar-se com correcções técnicas no apuramento da matéria co-lectável, quando o que se encontra em causa é uma falta generalizada de credibilidade da sua escrita comercial, sobretudo ao nível dos proveitos quanto às doze frac-ções em causa, pelos apontados vícios supra, que não uma ou outra operação mal contabilizada ou um outro proveito a acrescer ou um ou outro custo a não ser ele-gível, em que apenas haveria que os desconsiderar no apuramento da matéria colectável.

Cabia à Fazenda Pública e ora recorrente o ónus de provar os pressupostos da tributação por métodos in-diciários, cabendo-lhe demonstrar que a liquidação não pode assentar nos elementos fornecidos pelo contri-buinte e que o recurso àquele método se tornou a única forma de calcular o imposto, competindo-lhe, por isso, especificar os motivos da impossibilidade da comprova-ção e quantificação directa e exacta da matéria colectável e indicar os critérios utilizados na sua determinação, fa-zendo assentar o volume da matéria colectável presumi-da em dados objectivos, racionais e fundamentados, ap-tos a inferir os factos tributários, não em meras suspeitas ou suspeições, ainda que não se possa exigir o mesmo grau de certeza nessa quantificação do que aquela que é apurada através da contabilidade do sujeito passivo, por ser inerente àquela uma aproximação à realidade a qual se desconhece, através da utilização de índices como se-jam as margens médias de lucro líquido sobre as vendas e prestações de serviços ou compras, as taxas médias de

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rentabilidade de capital investido, o coeficiente técnico de consumos ou utilização de matérias-primas e outros custos directos, como hoje se exemplifica na norma do art. 90º da lGT.

Na verdade, tendo a determinação da matéria tribu-tável por métodos indiciários de ser feita por aproxima-ção à realidade que se procura apurar, é necessário que se demonstre que teve por suporte elementos de facto possíveis e prováveis, extraídos de parâmetros gerais e comuns, adequados à situação.

E, por isso, a Administração Fiscal tem de utilizar elementos de facto conhecidos que, segundo as regras da experiência, pautados por critérios de razoabilidade e de normalidade e tendo em linha de conta as espe-cificidades próprias do contribuinte, conduzam à extra-polação dos factos desconhecidos ou à aproximação da realidade que se procura alcançar.

A Administração Tributária tem, assim, de indicar e justificar os critérios que utiliza na determinação da matéria tributável por métodos indiciários, por forma a que o contribuinte deles fique ciente e apto a discutir a valorimetria aplicada, isto é, para que possa provar que os critérios utilizados são desadequados e/ou inadmissí-veis para a sua actividade, que houve erro ou manifesto excesso na matéria tributada quantificada.

Caberá, então, àquele a quem o método é oposto (no caso, a impugnante) o “ónus probandi” de que a reali-dade é completamente distinta do resultado a que con-duziu a utilização das mencionadas regras, que o critério utilizado é ostensivamente desadequado e/ou inadmis-sível, que houve erro ou manifesto excesso na matéria tributável quantificada.

No caso, face aos indícios supra, que se afiguram como fundados e seguros, carreou a Administração Tri-butária elementos certos e determinados donde se pode extrair que a contabilidade da impugnante não reflectia a totalidade das operações realizadas, sobretudo ao ní-vel dos proveitos, e daí, legitimada ficava, para passar ao apuramento da matéria tributável da contribuinte com o recurso aos métodos indirectos, tendo em vista en-contrar o volume de negócios do exercício em causa de 2001, que a contabilidade não espelhava como deveria.

Para a passagem aos métodos indiciários, entre outros requisitos, nas normas dos arts. 87º a 90º da lGT e 52º a 54º do CIRC, que foram concretamente aplicados no caso, pode-se bastar com a existência de indícios fundados de que a contabilidade não reflecte a exacta situação patrimo-nial e o resultado efectivamente obtido, não restringindo a lei a liberdade da actuação da Administração Tributária no sentido dos meios aptos a demonstrá-lo, assim podendo ser utilizados quaisquer índices aptos a revelá-los.

É que, nos termos do art. 90º da lGT, então já vi-gente, os procedimentos dirigidos à declaração dos direi-tos dos contribuintes neles podem ser utilizados todos os elementos de que disponha a entidade competente, sem os restringir a qualquer categoria de meios.

Assim sendo, cabia agora à impugnante no âmbito do ónus probatório que sobre si impende, ter vindo tra-zer aos autos prova certa e segura, tendo em vista infir-mar os indícios seguros em que a Administração Fis-cal se fundou para a passagem aos métodos indiciários, designadamente quanto às apontadas anomalias da sua contabilidade relacionadas, sobretudo com os proveitos, e, se o conseguisse, não obstante aqueles fundados in-dícios, não teriam a virtualidade de alterar o resultado contabilístico declarado, por devidamente explicados e justificados.

Contudo, apesar de a contribuinte ter posto em cau-sa os pressupostos em que se fundou a Administração Fiscal para lançar mão dos métodos indiciários, desig-nadamente quanto aos proveitos que lhe foram imputa-dos, em vários artigos ao longo da sua petição inicial de impugnação judicial, a verdade é que nem sequer articu-la factualidade concreta e precisa, relevante, que possa ser objecto de prova, testemunhal ou por documentos, quanto a este fundamento, limitando-se a meras conjec-turas e generalidades insusceptíveis de serem apreendi-das, encontrando-se assim longe de colocar em dúvida séria, fundada, os indícios supra referidos, centrando-se essencialmente, em invalidar os pressupostos em que se fundou a Administração Tributária para a passagem a tais métodos, sem contudo apresentar outros mais ade-quados por mais próximos da realidade que se visa al-cançar, não tendo desta forma vindo colocar de forma minimamente consistente em causa a matéria apurada pela fiscalização, não tendo por isso logrado provar que esses pressupostos são errados e/ou desajustados à re-alidade em causa, não podendo a impugnação judicial deixar de improceder por este fundamento, com o pro-vimento do recurso e a revogação da sentença recorrida que em contrário decidiu.

Sociedades sujeitas ao regime de transparência fiscal

sumário1. Em impugnação judicial visando só o lucro tribu-

tável corrigido pela AT não se pode conhecer da prescri-ção da obrigação tributária por esta não ser objecto da impugnação.

jurisprudência[resumos]

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2. No regime de transparência fiscal a sociedade é sujeito passivo de IRC embora não esteja obrigada ao pagamento do imposto. Neste regime é imputada aos sócios, no seu rendimento tributável para efeitos de IRS ou IRC, a matéria colectável determinada nos termos do CIRC.

3. Está vedado à sociedade no regime de transpa-rência fiscal reclamar ou impugnar autonomamente a matéria colectável que for determinada e que dê origem a liquidação de IRC só lhe assistindo, nesta situação, re-correr hierarquicamente.

Tribunal Central Administrativo Sul

Acórdão de 30 de Junho de 2009

Processo nº 02522/08

Relator: Dr. Pereira Gameiro

descriçãodosFactosUma sociedade de advogados vem recorrer da sen-

tença proferida pelo Tribunal Tributário de lisboa na parte em que lhe julgou improcedente a impugnação que deduzira na sequência da notificação de que, re-lativamente ao IRC de 1992, foi o lucro tributável de-clarado de Esc. 16.065.696$00 corrigido para Esc. 149.747.624$00, pretendendo que se declare prescrita a obrigação tributária em sede de IRC relativa ao ano de 1992 e que se abata à matéria colectável a referida verba de Esc. 90.378.563$00.

A impugnação foi julgada parcialmente procedente e anulado o acto de liquidação impugnado nos autos na parte em que desconsidera como custos os relati-vos a rendas no montante de Esc. 15.120.000, a obras no montante de Esc. 810.000, a contrato de leasing no montante de Esc. 14.801.449 e o acréscimo ao lucro tri-butável no montante de Esc. 1.033.439, com base na se-guinte fundamentação:

Vem a impugnante pedir que o montante do lucro tributável referente ao IRC do exercício de 1992, cor-rigido para Esc. 149.747.624, seja reduzido para Esc. 17.299.0958, alegando para o efeito que os custos se in-serem no disposto no art. 23° do CIRC.

Cumpre decidir.Importa, assim, decidir se os empréstimos, as rendas,

as rendas leasing e os encargos com os empréstimos do b….. e do b…. são custos nos termos do art. 23° do CIRC.

Quanto aos empréstimos.Alega a impugnante que não foi posta em causa a na-

tureza dos empréstimos, mas a dos juros que os oneram,

pelo que, sendo a actividade da impugnante prestação de serviços e atendendo à dimensão e às potencialidades da sua clientela, que asseguram sua a continuidade e o seu futuro, sendo as mesmas traduzidas e consubstanciadas na existência de contratos e permanente assistência em processos, torna-se necessário um adequado tratamento aos clientes de modo a fixar a sua continuidade, sendo imperioso lançar mão de todos os recursos, designada-mente os de índole financeira com recurso aos emprésti-mos bancários, para se atingir aquele objectivo, pelo que os juros são custos da impugnante nos termos do art. 23° do CIRC.

A impugnada alega que os empréstimos foram por quantias certas e elevadas, tendo havido situações em o empréstimo de um banco era transferido para outro, não existindo nestas operações qualquer situação de gestão, tal como consta dos Anexos 1, 2 e 12 (cf. fls. 96, 97 e 127 dos autos) e que os pagamentos por conta no montante de Euros 186.948.207 e as provisões recebidas no mon-tante de Esc. 70.403.800, mostram que o financiamento foi efectuado pela impugnante a clientes, através dos em-préstimos bancários.

Acresce referir que a impugnante aderiu ao Dl n° 124/96, de 10/08, em autodenúncia e referente ao exer-cício de 1992, pelo montante de Esc. 16.819.631.

Importa antes de mais apreciar o contrato de arren-damento e, consequentemente, os contratos de emprés-timos e, por fim, integrá-los na actividade da impugnan-te no sentido de se saber se os pagamentos efectuados podem ou não serem considerados como custos nos termos do art. 23° do CIRC.

O contrato de arrendamento entre a sociedade “I………. – Sociedade ………….. SA” e a impugnante em que esta arrenda a fracção autónoma designada pela “l”, que corresponde ao 3° andar do prédio urbano sito na Rua C………. n.°….e …- A, sendo que a fracção arrendada se destina exclusivamente a habitação dos ad-ministradores, colaboradores ou clientes da impugnante, nenhum outro uso lhe podendo ser dado sem o prévio consentimento por escrito da 1° outorgante a sociedade “I………”.

Nos termos do art. 23°, n° 1, do CIRC, consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem in-dispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto.

A questão a decidir passa, portanto, pela apreciação da alegada indispensabilidade de tais custos para a reali-zação dos proveitos sujeitos a imposto, sendo que o re-ferido art. 23° do CIRC enuncia, exemplificativamente, nas suas diversas alíneas, várias categorias concretas de encargos dedutíveis. Porém, da necessidade de compro-

jurisprudência[resumos]

33REVISTA FISCAl Setembro/Outubro | 2010

vação da indispensabilidade para a realização dos pro-veitos ou ganhos sujeitos a imposto, resulta claro que a lei só contempla os encargos que sejam determinantes para aquele fim.

Sem embargo da relevância assumida pela realidade jurídico-económica subjacente às normas fiscais, a lei exige a comprovação da indispensabilidade do custo na obtenção dos proveitos e não apenas a comprovação da possibilidade de obtenção desses proveitos.

Mas como deve aferir-se o conceito de indispensa-bilidade?

Aceitando-se que estamos perante um conceito vago necessitado de preenchimento (cfr. Ac. do STA, de 23/9/98) e aceitando-se que não estamos, quanto a tal preenchimento, perante qualquer poder discricionário (em termos de discricionariedade técnica) por parte da impugnada, importa, então, atentar nos termos em que a lei enquadra tal conceito.

O art. 23° do CIRC dispunha, na redacção à data:“1 - Consideram-se custos ou perdas os que compro-

vadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manu-tenção da fonte produtora, nomeadamente os seguintes:

a) Encargos relativos à produção ou aquisição de quaisquer bens ou serviços, tais como matérias utiliza-das, mão-de-obra, energia e outros gastos gerais de fa-bricação, conservação e reparação;

(...) c) Encargos de natureza financeira, como juros de

capitais alheios aplicados na exploração, descontos, ágios, transferências, diferenças de cambio, gastos com operações de crédito, cobrança de dividas e emissão de acções, obrigações e outros títulos e prémios de reem-bolso;

d) Encargos de natureza administrativa, tais como re-munerações, ajudas de custo, pensões e complementos de reforma, material de consumo corrente, transportes e comunicações, rendas, contencioso, seguros, incluindo os de vida e operações do ramo “Vida”, contribuições para fundos de poupança - reforma, contribuições para fundos de pensões e para quaisquer regimes comple-mentares de segurança social.

(...)2 - No caso das rendas de locação financeira, não é

aceite como custo ou perca do locatário a parte da renda destinada a amortização financeira.”

Seguindo de perto a fundamentação no Ac. do TCAS, de 17/07/2007, proc. n° 01107/06 (in www.dgsi.pt):

Fazendo apelo ao Estudo de Tomás de Castro Ta-vares (“Da Relação de Dependência Parcial entre a Contabilidade e o Direito Fiscal na Determinação do

Rendimento Tributável das Pessoas Colectivas: Algumas Reflexões ao Nível dos Custos”, in CTF, nº 396, págs. 7 a 177) e confrontando as três interpretações possí-veis ali enunciadas em termos da interpretação da regra constante do art. 23º do CIRC (indispensabilidade como sinónimo de absoluta necessidade, ou com o significa-do de conveniência, ou identificando-se com a noção de interesse societário) diremos, como aponta o autor, parecer evidente que da noção legal de custo fornecida pelo art. 23° do CIRC não resulta que a AT possa pôr em causa o princípio da liberdade da gestão, sindicando a bondade e oportunidade das decisões económicas da gestão da empresa e considerando que apenas podem ser assumidos fiscalmente aqueles de que decorram, di-rectamente, proveitos para a empresa ou que se revelem convenientes para a empresa. A indispensabilidade a que se refere o art. 23° do CIRC como condição para que um custo seja dedutível não se refere à necessidade (a des-pesa como uma condição sine qua non dos proveitos) nem sequer à conveniência (a despesa como conveniente para a organização empresarial), sob pena de intolerável intromissão da AT na autonomia e na liberdade de ges-tão do contribuinte, mas exige, tão-só, uma relação de causalidade económica, no sentido de que basta que o custo seja realizado no interesse da empresa, em ordem, directa ou indirectamente, à obtenção de lucros.

A noção legal de indispensabilidade recorta-se, por-tanto, sobre uma perspectiva económico-empresarial, por preenchimento directo ou indirecto, da motivação última de contribuição para a obtenção do lucro. Os cus-tos indispensáveis equivalem aos gastos contraídos no interesse da empresa ou, por outras palavras, em todos os actos abstractamente subsumíveis num perfil lucra-tivo. Este desiderato aproxima, de forma propositada, as categorias económicas e fiscais, através de uma inter-pretação primordialmente lógica e económica da causa-lidade legal. O gasto imprescindível equivale a todo o custo realizado em ordem à obtenção de ingressos e que represente um decaimento económico para a empresa. Em regra, portanto, a dedutibilidade fiscal do custo de-pende, apenas, de uma relação causal e justificada com a actividade da empresa. E fora do conceito de indispen-sabilidade ficarão apenas os actos desconformes com o escopo social, aqueles que não se inserem no interesse da sociedade, sobretudo porque não visam o lucro.

Neste sentido vai, também, o entendimento de An-tónio Moura Portugal (“A Dedutibilidade dos Custos na Jurisprudência Fiscal Portuguesa”, Coimbra Editora, 2004, pags. 113 e sgts.), quando sustenta que «A solução acolhida entre nós (pelo menos na doutrina), na esteira dos entendimentos propugnados pela doutrina italiana,

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tem sido a de interpretar a indispensabilidade em função do objecto societário», que esta exigência da indispensabi-lidade dos custos para a realização dos proveitos ou ma-nutenção da fonte produtora se encontrava «inicialmente associada a uma condição de “razoabilidade” (artigo 26° do CCI)» e que se é certo «que a “razoabilidade” está pre-sente em algumas disposições do CIRC, de forma expres-sa (23º), … deixou de ser tolerável a sua utilização como fundamento para limitar quantitativamente os encargos incorridos pelos sujeitos passivos. O problema é que o Fisco tem vindo a utilizar a indispensabilidade para pre-cludir que determinados gastos, por si valorados como excessivos ou inapropriados, possam ser acolhidos pelo balanço fiscal. Talvez por isso se note na doutrina uma propensão para uma interpretação ampla do termo, re-cusando qualquer leitura do mesmo que pressuponha ou contemporize com juízos subjectivos do controlador pú-blico sobre a bondade da gestão empreendida (…).

A indispensabilidade deve assim ser aferida a partir de um juízo positivo da subsunção na actividade socie-tária, o qual, por natureza, não deve ser sindicado pelo Direito Fiscal, que se não deve imiscuir, muito menos valorar as decisões empresariais do contribuinte. Só esta concepção está de acordo com os princípios de liberda-de de gestão empresarial e, ao mesmo tempo, respeita interesses específicos do direito fiscal (que estão na base da limitação expressa que é feita à dedutibilidade de cer-tos encargos).

Os custos indispensáveis equivalem, assim, aos gas-tos contraídos no interesse da empresa. A dedutibilidade fiscal do custo deve depender apenas de uma relação jus-tificada com a actividade produtiva da empresa e esta in-dispensabilidade verifica-se “sempre que - por funciona-mento da teoria da especialidade das pessoas colectivas - as operações societárias se insiram na sua capacidade, por subsunção ao respectivo escopo societário e, em es-pecial, desde que se conectem com a obtenção de lucro ainda que de forma indirecta ou mediata”». (1)

Para este autor, a interpretação para a indispensabi-lidade «deve ser aferida a partir de um juízo positivo da subsunção na actividade societária. Este, por sua vez, não deve ser sindicado pelo Fisco ou pelos tribunais, porque a isso obriga a liberdade de iniciativa económica. (…) uma interpretação da indispensabilidade em fun-ção do objecto social e da actividade desenvolvida pela sociedade. A identificação com a actividade comercial, industrial ou agrícola desenvolvida pelo sujeito passivo é critério suficiente. Se se quiser falar de “relação causal”, esta só pode ter lugar por via de uma ligação entre os custos e a actividade da empresa. Nunca entre os custos e os proveitos ou a manutenção da fonte produtora.»

Em idêntico sentido parece ter seguido o ac. do STA, 2ª secção, de 29/3/2006, rec. nº 01236/05, ao referir que «À luz do vigente CIRC, pode desde logo afirmar-se que, a todas as luzes, constitui um custo indispensável o gas-to que a própria lei imponha. Mesmo pelo critério mais limitativo – o da necessidade, que tende a só considerar dedutíveis os gastos sem os quais os proveitos não po-deriam ser obtidos – este tipo de despesa é elegível. Não obstante, há que atender a que nem todos estes custos, cuja incursão a empresa não possa evitar, são dedutíveis – lembre-se a derrama, que a lei exclui dos custos de-dutíveis, e que motivou larga produção jurisprudencial.

(…) A regra é que as despesas correctamente con-tabilizadas sejam custos fiscais; o critério da indispen-sabilidade foi criado pelo legislador, não para permitir à Administração intrometer-se na gestão da empresa, ditando como deve ela aplicar os seus meios, mas para impedir a consideração fiscal de gastos que, ainda que contabilizados como custos, não se inscrevem no âmbi-to da actividade da empresa, foram incorridos não para a sua prossecução mas para outros interesses alheios.

Em rigor, não se trata de verdadeiros custos da em-presa, mas de gastos que, tendo em vista o seu objecto, foram abusivamente contabilizadas como tal. Sem que a Administração possa avaliar a indispensabilidade dos custos à luz de critérios incidentes sobre a sua oportuni-dade e mérito.

O conceito de indispensabilidade não só não pode fazer-se equivaler a um juízo estrito de imperiosa neces-sidade, com já se disse, como também não pode assentar num juízo sobre a conveniência da despesa, feito, neces-sariamente, “a posteriori”. Por exemplo, os gastos feitos com uma campanha publicitária que se revelou infrutífe-ra não podem, só em função desse resultado, afirmar-se dispensáveis.

O juízo sobre a oportunidade e conveniência dos gastos é exclusivo do empresário. Se ele decide fazer des-pesas tendo em vista prosseguir o objecto da empresa mas é mal sucedido e essas despesas se revelam, por úl-timo, improfícuas, não deixam de ser custos fiscais. Mas todo o gasto que contabilize como custo e se mostre estranho ao fim da empresa não é custo fiscal, porque não indispensável.

Entendemos, pois, que são custos fiscalmente dedu-tíveis todas as despesas que se relacionem directamente com o processo produtivo (para o nosso caso, não in-teressa considerar as de investimento), designadamente, com a aquisição de factores de produção, como é o caso do trabalho. E que, sob pena de violação do princípio da capacidade contributiva, a Administração só pode ex-cluir gastos não directamente afastados pela lei debaixo

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de uma forte motivação que convença de que eles fo-ram incorridos para além do objectivo social, ou seja, na prossecução de outro interesse que não o empresarial, ou, ao menos, com nítido excesso, desviante, face às ne-cessidades e capacidades objectivas da empresa.»

Ora, sendo certo que a questão da comprovação (questão que, como se disse, aqui nem sequer está em causa) é diversa da questão da própria dispensabilidade ou indispensabilidade do custo, também, como igual-mente refere Tomás Tavares (loc. cit., pag. 167), «da noção legal de custo não se pode extrair uma cláusula geral que conceda à Administração Fiscal uma potestas de sindicância da bondade e oportunidade das decisões económicas da gestão da empresa, ou seja, que filtre a assunção fiscal dos custos empresariais sob uma reduto-ra bitola de conexão com os proveitos. Quer dizer, sob pena de ilícita imiscuição na autonomia a na liberdade de gestão do sujeito passivo, veda-se que o Fisco precluda a dedutibilidade dos custos por motivos de que desse registo não decorrem, directamente, quaisquer provei-tos para a empresa. A noção de legal de indispensabi-lidade entre as componentes positivas e negativas do rendimento, pelo contrário, apenas intima uma relação de causalidade económica, no sentido da admissibilida-de fiscal dos encargos reputados de indispensáveis pelo órgão de gestão, dado que contribuem, ainda que indi-recta ou mediatamente, para a percepção dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtora. Ora, este de-siderato verifica-se sempre que - por funcionamento da teoria da especialidade do fim das pessoas colectivas - as operações societárias se insiram na sua capacidade, por subsunção no respectivo escopo estatutário e, em espe-cial, desde que se conectem com a obtenção do lucro, ainda que de forma indirecta ou mediata. Assim, se a Administração Fiscal duvida fundadamente da inserção no interesse societário de determinada despesa, passa a impender sobre o contribuinte, o ónus da prova de que tal operação se insere na sua capacidade. O sujeito pas-sivo, porque se encontra em contacto directo com os factos e dado que possui uma visão omnicompreensiva do raio e do alcance das suas acções, tem portanto de provar a bondade e subsumibilidade dessas operações sobre o escopo societário. (....).

(1) Em termos de jurisprudência, o mesmo autor, referenciando vários arestos do STA e do TCA, dá-nos conta do recurso ao conceito de “relação de exigente indispensabilidade” entre custos e proveitos ou “in-dispensabilidade eficiente”; de recurso ao conceito de “obrigatoriedade ou de exigibilidade” (a decisão sobre se um custo é indispensável ou não fica a depender, em exclusivo, da respectiva origem: se o custo provier de

alguma obrigação legal ou contratual, tal como se encon-tram definidas no Código Civil, então o mesmo terá o epíteto de indispensável, caso contrário não); e do recur-so ao conceito de Indispensabilidade ajuizada em função da normalidade básica do gasto (não alcançando por isso prova de relevância e indispensabilidade relativamente aos proveitos do contribuinte).

E analisando criticamente as decisões em causa, o autor contesta o recurso a expressões como “relação de exigente indispensabilidade” entre custos e proveitos ou “indispensabilidade eficiente”, já que isso «pressupõe um juízo a posteriori sobre a decisão empresarial» e já que «Estamos perante uma construção que privilegia o elemento do resultado ou destino do custo (a respectiva consequência tem de ser a obtenção de um proveito) e que, como facilmente se constata, restringe a aceitação da dedutibilidade fiscal das despesas às que produzem resultados. Todavia, um custo indispensável não pode ser somente aquele que implique, de forma directa, a ob-tenção de determinados proveitos. O juízo que se faça sobre o alcance da utilização do termo indispensabili-dade deve admitir, no mínimo, uma potencialidade abs-tracta para a obtenção daqueles proveitos. É que, nunca é de mais relembrá-lo, há formas subtis e não evidentes de contraprestação que o Fisco e o próprio tribunal não estão em condições de conhecer e sequer avaliar. Por ou-tro lado (…) tal equivaleria a abrir a porta a uma perigosa sindicância a posteriori da dedutibilidade do custo, em função dos respectivos resultados. Ou seja, à consagra-ção de um poder geral de intromissão na gestão da so-ciedade, atribuído ao Fisco e aos tribunais, restrição que dificilmente quadraria com a liberdade de iniciativa eco-nómica prevista no artigo 61º da nossa Constituição.»

E contesta, igualmente, o uso do conceito “obriga-toriedade ou de exigibilidade”, dado que se traduz na «… abordagem clássica da indispensabilidade, assente na obrigatoriedade do custo e, consequentemente, na respectiva exigibilidade (ou possibilidade de exigência). (…) parte de um conceito rígido de indispensabilidade, que privilegia a origem do custo, o que leva a que a mes-ma seja reconduzida à família das teses que defendem uma acepção restritiva do termo. (…) tal interpretação deve ser afastada, por ser demasiado limitativa, mesmo que confinada às fronteiras dos encargos de natureza administrativa . (…) Por outro lado, as limitações ineren-tes a esta interpretação são evidentes quando transpos-ta a fronteira dos encargos de natureza administrativa. Como compatibilizar esta visão restritiva com a abertura manifestada pelo próprio legislador, que inclui no catálo-go exemplificativo do artigo 23° do CIRC despesas não obrigatórias como as relacionadas com publicidade ou

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com investigação e desenvolvimento? Ou com as despe-sas de representação? As insuficiências deste critério in-terpretativo estão à vista. (…) nem na lógica empresarial, nem na própria disciplina do imposto a configuração dos custos (tal como dos proveitos) está dependente de uma qualquer obrigação (ou direito). Em suma, fundar a não dedutibilidade de um determinado encargo com base na respectiva natureza (obrigatória/não obrigatória) é via que não nos parece segura e que se presta a maiores di-ficuldades do que aquelas que pretende resolver, poden-do, inclusivamente, levar o sujeito passivo a conseguir alegar e provar a justificabilidade económica da despesa realizada e a sua ligação com os proveitos obtidos, mas ver tal esforço revelar-se infrutífero, dada a rigidez da formulação legal na interpretação aqui acolhida.»

Finalmente, quanto ao uso do conceito de “indispen-sabilidade em função da normalidade básica do gasto”, o autor refere que «a sua eficiência, em termos de norma-lidade, é por demais problemática e longínqua nos seus efeitos para que as verbas despendidas recebam ou pos-sam receber o tratamento e qualificação de custos à base do artigo 26° invocado”.

Nos termos expostos, a impugnante celebrou um contrato de arrendamento, para fins habitacionais, con-tudo não nos podemos esquecer que afectou a fracção autónoma à sua actividade, sendo inegável que, con-forme consta do extracto anual da conta ……., os pa-gamentos das rendas foram efectuados, além de que a impugnada não as coloca em causa, mas tão-só o fim do contrato de arrendamento, pelo que as mesmas se devem considerar custos da actividade da impugnante nos termos do art. 23° do CIRC:

Coisa bem diferente são os empréstimos contraídos e consequentemente os seus juros, pois nos mesmos esti-pula-se como fim, no contrato de conta de crédito entre o b… e a impugnante no valor de Esc. 15.000.000.000, a aquisição de 500 m2 de área adicional ao espaço que ocupa no imóvel sito na Rua C……… n.°…, em que a impugnante, em carta datada de 27/03/1997 envia-da ao técnico da administração tributária, refere que “2 – O contrato de financiamento de 150.000.000$00 à U………… referiu a aquisição de 500 m2 de área adicional ao espaço ocupado por este escritório por ser considerado útil referir fim especifico para registo da operação no sistema do banco. Não houve qualquer aquisição de área adicional. Aliás, a cláusula 2 do con-trato de empréstimo refere uma simples declaração de intenções.”

Acresce referir que em 01/09/1992 a U………….s procedeu a uma transferência bancária para a impugnan-te do valor supra mencionado, contudo em 03/09/1992

a impugnante emitiu um cheque no mesmo valor, tal como consta do Anexo 1, fls. 96 dos autos.

Ora, para os juros serem considerados custos nos ter-mos do art. 23° do CIRC, a impugnante tinha que provar que o empréstimo realizado o foi no âmbito da sua activi-dade, sendo indispensável para a realização dos proveitos, sendo que não carreou para os autos provas da imputação do empréstimo na actividade exercida e que o mesmo era indispensável para a realização dos proveitos, pelo que não se pode considerar que os juros são custos do exercí-cio, improcedendo a sua pretensão neste ponto.

Quanto ao empréstimo entre a impugnante e o b…., contrato de conta caucionada no montante de Esc. 50.000.000, tendo como fim o financiamento intercalar para a aquisição da fracção autónoma sita na Rua C………. n°… -..° Dto, em l….., também não se pode aceitar, em função do que consta do termo da SISA, lavrado em 30/04/1996, em que a sociedade “C…………….. SA”, compra a fracção autónoma sita na Rua C……….. n.°… - ..° Dto, em l…….à sociedade “I……- I…………… SA”, pelo preço de Esc. 57.935.000.

Tal como já foi referido, só podem ser custos os im-putados na actividade desde que indispensáveis e devi-damente comprovados, sendo estes os dois requisitos, já amplamente explanados e não tendo sido carreada para os autos prova dos mesmos, a sua pretensão não pode proceder relativamente a este aspecto.

De facto, apesar do empréstimo ter sido realizado entre a impugnante e o b…, o que é certo é que o des-tino não foi para a actividade da impugnante, mas para uma outra sua associada, tal como consta do termo de SISA e, como refere o Ac. do STA, de 07/02/2307, proc. n.°01046/05:

“A questão em apreço é, pois, a de se saber se os encargos suportados pela recorrente resultantes de em-préstimos bancários contraídos para fazer face a pres-tações acessórias efectuados a uma sua associada pelos quais não cobrou quaisquer juros devem ser ou não con-siderados custos fiscais à luz do artigo 23º do CIRC.

Dispõe este normativo que se consideram custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a im-posto ou para a manutenção da fonte produtora.

Assim, os custos previstos naquele artigo 23º têm de respeitar desde logo à própria sociedade contribuinte, isto é, para que determinada verba seja considerada custo da-quela é necessário que a actividade respectiva seja por ela própria desenvolvida, que não por outras sociedades.

A não ser desta forma, como que podia ser imputada a uma sociedade o exercício da actividade de outra com a qual ela tivesse alguma relação.

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As quantias controvertidas correspondem a juros de empréstimos bancários contraídos pela recorrente e aplicados no financiamento gratuito de uma sociedade sua associada.

Tais verbas não estão, pois, directamente relaciona-das com qualquer actividade do sujeito passivo inscrita no seu objecto social, que é a fabricação de azulejos e não a gestão de participações sociais ou financiamento de sociedades de risco, nem sequer se reportam, ainda que indirectamente, à sua actividade.

Por outro lado, não se trata aqui de juros de capitais alheios aplicados na própria exploração, esses sim pre-vistos como custos na alínea c) do n.º 1 do artigo 23º do CIRC.

A mera possibilidade de poder vir a ter no futuro ga-nhos resultantes da aplicação desses capitais na sua as-sociada não determina só por si que tais investimentos possam enquadrar-se no conceito de custos fiscais porque para isso era necessário que tais encargos fossem indis-pensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujei-tos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.

E tal indispensabilidade está longe, neste caso, de ter sido demonstrada”.

Nos termos expostos, não se pode considerar como custo o montante dos juros e imposto de selo pois os mesmos não têm a ver com a actividade da impugnante, mas de uma sua associada pelo que, tal como é referido no acórdão supra, os mesmos não são custos. Além de que aquele montante foi levantado em 23/12/1991 pela impugnante, não tendo esta provado o fim do mesmo, como lhe competia.

Sobre esta questão veja-se ainda o Ac. do Pleno, de 06/06/2007, proc. n° 0163/07, no qual se conclui que “É sobre o recorrente que recai o ónus da prova dos pressupostos do exercício do direito de recorrer que in-voca, pelo que a eventual dúvida sobre a identidade das situações fácticas subjacentes aos acórdãos recorrido e fundamento deve ser processualmente valorada contra o recorrente, conduzindo ao não conhecimento do re-curso”, acrescentando “Na verdade, a existência de um acórdão em oposição com o recorrido é um dos pres-supostos do recurso com fundamento em oposição de julgados e é sobre o Recorrente e não sobre o Recorrido que recai o ónus da prova dos pressupostos de que de-pende a apreciação jurisdicional da sua pretensão.”

Com efeito, de acordo com a regra básica em matéria de ónus da prova, que consta do art. 342°, n° 1, do Códi-go Civil, é àquele que invocar um direito que cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado, o que, estando em causa a invocação: de um direito processual (o de recorrer com fundamento em oposição de julga-

dos) se reconduz a ser o recorrente quem tem o ónus da prova dos respectivos pressupostos.”

Por todo o exposto e quanto às questões controver-tidas trazidas à lide pela impugnante, as mesmas impro-cedem quanto aos juros e imposto de selo relativos aos contratos de empréstimo do b…. e b…, quer quanto aos montantes de Esc. 821.098 e de Esc. 478.580 con-tabilizados na conta 62232 “Conservação e Reparação” cujos documentos de suporte se referem à colocação de uma bomba para um furo de água e um termo acumu-lador de 300 litros, cuja morada era a do sócio mas que foi riscada.

Na verdade, não se pode aceitar estes montantes, pois os mesmos não são custos da sociedade, mas de terceiros, estando os mesmos vedados no art. 23° do CIRC, tal como já foi referido aquando se explanou nos vários acórdãos.

Por último, quanto às rendas leasing e uma vez que uma parte delas se refere ao exercício de 1992, relativas às fracções autónomas “C” e “D” do prédio urbano sito na Rua C………. n.°… - ..° Dto e Esq, em l……., sendo que a locatária era a impugnante, as mesmas são de con-siderar como custo, em virtude da cessão da posição con-tratual só ter sido em 1994, pelo que procede a questão e consequentemente o decréscimo do lucro tributável no montante de Esc. 1.033.439 considerado pela impugnada como subjacente a estas rendas não deve ser mantido.

No caso em apreço conclui-se que as rendas, no montante de Esc. 15.120.000 e as obras no montante de Esc. 810.000, são custos do exercício, as que digam respeito ao ano de 1992, sendo-o, também, o contrato leasing no montante de Esc. 14.801.419 e o acréscimo ao lucro tributável no montante de Esc. 1.033.439, no mesmo pressuposto, mas já não se consideram custos do exercício os juros e imposto de selo referentes aos contratos celebrados quer com o b… quer com o b…., nos montantes de Esc. 8.451.644, Esc. 3.910.309 e Esc. 90.378.563, porque a impugnante não carreou para os autos provas da indispensabilidade do mesmo, nem que foram afectos à sua actividade.”

questãojurÍdicaO regime de transparência fiscal.

decisãodoacÓrdãoA recorrente suscita a questão da prescrição da dí-

vida tributária em sede de IRC relativa ao ano de 1992 e discordando do decidido na parte em que a impug-nação foi julgada improcedente entende que deve ser abatida à matéria colectável a referida verba de Esc. 90.378.563$00.

jurisprudência[resumos]

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Começando pela apreciação da questão da prescri-ção, logo importa concluir que à recorrente não assiste qualquer razão, pois que a prescrição tem a ver com a obrigação tributária e, no caso em apreço, não se im-pugna qualquer acto tributário de liquidação mas, pura e simplesmente, o lucro tributável que relativamente ao IRC do exercício de 1992 foi corrigido pela Administra-ção Tributária, muito embora se refira na sentença que a impugnação é da liquidação adicional de IRC, relativa ao exercício de 1992 em que o lucro tributável foi corrigido e se tenha aí anulado em parte essa pretensa liquidação. Dos elementos dos autos, nomeadamente da petição ini-cial, se verifica que não está em causa nos autos qualquer liquidação de IRC feita à impugnante que só pede a re-dução do lucro tributável e que no concernente ao valor refere que é o do IRS que em consequência das correc-ções deveria ser liquidado nos termos do nº 1 do art. 5º do CIRC. Do exposto resulta que não está em causa a liquidação de qualquer imposto mas só a correcção do lucro tributável e daí não haver que fazer qualquer apreciação sobre a prescrição por não estar em causa qualquer obrigação tributária como a própria recorrente entendeu na petição inicial.

Improcede, assim, a invocação feita quanto à pres-crição.

E, ultrapassada a questão da prescrição, é chegado o momento de se apreciar se se deve ou não abater à maté-ria colectável a referida verba de Esc. 90.378.563$00. Só que para se responder a esta questão tem que se apurar se a ora recorrente podia ou não impugnar a matéria co-lectável em causa.

Afigura-se que não.Na situação em apreço estamos perante uma socie-

dade de advogados a que, ao tempo, e nos termos do art. 5º do CIRC (hoje art. 6º), era aplicável o regime de transparência fiscal em que é imputada aos sócios, no seu rendimento tributável para efeitos de IRS ou IRC, consoante o caso, a matéria colectável, determinada nos termos do CIRC, não sendo a sociedade tributada em IRC como resulta do art. 12º do CIRC, excepto, actual-mente, quanto às tributações autónomas (cfr. art. 12º do CIRC, actual).

Nesta situação a sociedade é sujeito passivo de IRC, embora não esteja obrigada ao pagamento do imposto, pois que não é tributada em sede de IRC mas o paga-mento do imposto é transferido para as pessoas dos res-pectivos sócios ou membros, em sede de IRS ou IRC. E tratando-se de correcções à matéria colectável da socie-dade, como é o caso, isso implica que a DGCI promova as correspondentes modificações na liquidação efectu-ada àqueles cobrando-se ou anulando-se as diferenças

apuradas como resulta, hoje, expressamente, do art. 92º do CIRC.

E a propósito desta situação em que são alterados os rendimentos declarados nas sociedades sujeitas ao regi-me de transparência fiscal veio a DGCI pelo Ofício-Cir-culado nº 5/94, de 16.2, prestar a seguinte informação em matéria de notificações:

“1. Implicações do regime de transparência fiscal em matéria de notificações.

1.1. Caracterizando-se o referido regime pela impu-tação aos sócios da matéria colectável determinada nos termos do CIRC, integrando-se no seu rendimento tri-butável para efeitos do IRS ou IRC, consoante os casos, deve a sociedade transparente ser notificada:

a) Da matéria colectável fixada por métodos indiciá-rios, para efeitos de reclamação nos termos do art.º 54.º do CIRC ou 84.º do Código de Processo Tributário;

b) Das correcções de natureza quantitativa suscep-tíveis de recurso hierárquico, nos termos do art.º 112.º do CIRC (sobre o âmbito do recurso hierárquico, ver ofício-circulado n.º 15/92, de 21.10, da D.S. do IRC).

c) Da alteração de prejuízos fiscais. Decidida a eventual reclamação ou recurso hierárqui-

co relativamente às correcções referidas nas alíneas a) e b), devem ser corrigidas as liquidações de IRS ou IRC dos sócios das sociedades sujeitas ao regime de transpa-rência fiscal em função do acréscimo de matéria colectá-vel que a cada um for imputável.”

No caso em apreço a ora recorrente foi notificada nos termos do art. 111º do CIRC da correcção do ren-dimento, onde se dispunha, tal como hoje se dispõe no art. 128º do CIRC, que:

1 - Os sujeitos passivos de IRC, os seus representan-tes e as pessoas solidária ou subsidiariamente respon-sáveis pelo pagamento do imposto podem reclamar ou impugnar a respectiva liquidação, efectuada pelos servi-ços da administração fiscal, com os fundamentos e nos termos estabelecidos no CPT, hoje, CPPT.

3 - As entidades referidas no n.º 1 podem ainda re-clamar e impugnar a matéria colectável que for determi-nada e que não dê origem a liquidação de IRC, com os fundamentos e nos termos estabelecidos para a reclama-ção e impugnação dos actos tributários.

E, na sequência dessa notificação, apresentou a im-pugnação em causa, só que, como decorre do nº 3 do art. 111º, hoje art. 128º, nº 5, do CIRC, não podia haver impugnação da matéria colectável que tinha sido deter-minada, pois que ela dava origem a IRC.

Só seria admissível impugnação judicial dessa matéria se ela não desse origem a liquidação de IRC ou de IRS. Como aquele resultado corrigido é positivo ele deu ori-

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gem necessariamente a IRC ou IRS consoante os sócios, como a ora recorrente dá mesmo a entender na petição inicial, pelo que a sociedade em causa não podia impug-nar a matéria colectável em causa.

O que podia era ter interposto recurso hierárquico, no prazo de trinta dias, nos termos do nº 2 do art. 112º do CIRC vigente ao tempo, sendo que a petição já não pode ser aproveitada para tal efeito por ter sido ultrapas-sado este prazo com a apresentação da petição inicial.

Não sendo, pois, legalmente admissível impugnação judicial da matéria colectável em causa determinada pela Administração Tributária, não pode, assim, em recur-so, ser apreciado o suscitado pela recorrente embora se mantenha o decidido na 1ª instância que não foi objecto de recurso e que se mostra transitado em julgado.

OposiçãoInexigibilidade por falta de noti-ficação da liquidação dentro do prazo de caducidadeAutoliquidação

sumárioI) Face à tipologia da liquidação tributária segundo

o critério orgânico ou da qualidade do sujeito compe-tente para a realizar, existe a liquidação administrativa levada a efeito pela AT, e a liquidação efectuada pelos particulares, que abrange a denominada autoliquidação e a liquidação por terceiro ou liquidação em substituição.

II) Por imperativo legal, é ao contribuinte que in-cumbe apresentar as declarações, sendo o prazo de ca-ducidade previsto no art. 45º da lGT aplicável mesmo nessas situações de autoliquidação, como resulta da in-terpretação conjugada do disposto nos arts. 83º, nº 10, 93º e 128º nº 1 e nº 2 do CIRC.

III) Na verdade, a liquidação prevista no nº 1 pode ser corrigida, se for caso disso, dentro do prazo a que se refere o art. 93º, cobrando-se ou anulando-se então as diferenças apuradas (art. 83º, nº 10, do CIRC), sen-do que, versando a caducidade do direito à liquidação, o mencionado art. 93º do CIRC estabelece que “A liquida-ção de IRC, ainda que adicional, só pode efectuar-se nos prazos e nos termos previstos nos artigos 45º e 46º da lei Geral Tributária”.

IV) Essa corresponde à melhor hermenêutica jurídi-ca como o acentua o preceituado no art. 128º, nºs 1 e 2, do CIRC que, reportando-se à faculdade de reclamação

e/ou impugnação, determina que “A faculdade referida no número anterior é igualmente conferida relativamen-te à autoliquidação, à retenção na fonte e aos pagamen-tos por conta, nos termos e prazos previstos nos artigos 131º a 133º do C.P.P.T, sem prejuízo do disposto nos números seguintes”.

V) Sendo legalmente admissível impugnar a autoli-quidação, por identidade de razão, é igualmente admis-sível deduzir oposição na execução resultante do não pagamento de liquidações que tiveram por base auto-liquidações anteriores, como sucede no caso dos autos.

VI) E o certo é que, como se apurou nos autos, quer as autoliquidações quer as posteriores liquidações da AT e suas notificações ocorreram para além do prazo de caducidade, pelo que, não havendo liquidação adicional (oficiosa), mas autoliquidação operada para além do pra-zo de caducidade ínsito no art. 45º, nº 1, da lGT e visto que não ocorreram causas suspensivas das tipificadas nesse mesmo normativo, é configurável o fundamento de oposição previsto no artigo 204°, n° 1, alínea e), do C.P.P.T., consistente na falta da notificação da liquida-ção do tributo no prazo de caducidade é fundamento de oposição.

Tribunal Central Administrativo Sul

Acórdão de 30 de Junho de 2009

Processo nº 03132/09

Relator: Dr. José Correia

descriçãodosFactosO Ministério Público e uma sociedade comercial

vieram interpor recurso jurisdicional da sentença pro-ferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de loulé, que julgou improcedente a oposição deduzida a umas execuções fiscais pendentes no competente Serviço de Finanças, por dívidas de IRC dos anos de 2000 e 2001.

Para o Juiz “a quo”, uma vez que, no caso concreto, não estamos perante um acto da Administração Tribu-tária (que efectivamente se tivesse acontecido poderia a oposição singrar com fundamento na falta de notifica-ção no prazo de caducidade), mas efectivamente houve um acto voluntário do próprio sujeito passivo ao pro-ceder em 6 de Dezembro de 2006 à entrega das decla-rações Modelo 22 respeitantes aos exercícios de 2000 e 2001 (autoliquidação). Autoliquidação que é a liquidação que não é feita pela Administração Tributária, mas pelo próprio sujeito passivo, seja ele o contribuinte directo, o substituto legal ou o responsável legal (art 82°, n° 1, 84°, n° 2, e 18°, n° 3, da lGT).

jurisprudência[resumos]

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Sendo assim, prossegue o Juiz “a quo”, a Adminis-tração Tributária limitou-se a exigir ao sujeito passivo o imposto contido em declarações remetidas em seu nome e que nas mesmas declarações se encontra apurado, o imposto devido, e findo o prazo do seu pagamento vo-luntário, legitimada se encontra a Administração Tribu-tária para extrair a competente certidão de dívida e exigir a sua cobrança coerciva em sede de execução fiscal, nos termos do disposto nos arts. 88° e 148° e segs. do CPPT, como efectivamente veio a acontecer.

Pelos fundamentos expostos, e considerando-se que foi o próprio contribuinte que, dirigindo-se à Adminis-tração Tributária, reconheceu o seu erro (com o envio das declarações Modelo 22) e exigiu daquela a sua cor-recção, ou seja, é o próprio contribuinte que informa a Administração Tributária dos valores correspondentes aos exercícios de 2000 e 2001, não se aplicando aqui o prazo de caducidade previsto no art. 45° da lGT, con-clui que teria de improceder a oposição.

Em suma: por estarmos perante uma obrigação de autoliquidação, entendeu o Juiz “a quo” que não podia nestes casos existir caducidade do direito de liquidar, im-procedendo a oposição por esse motivo.

Os recorrentes insurgem-se contra o assim funda-mentado e decidido por, no fundamental, o Ministério Público entender que, sendo o prazo de caducidade pre-visto no art. 45º da lGT aplicável mesmo em situações de autoliquidação, como resulta da interpretação conju-gada do disposto nos arts. 83º, nº 10, 93º e 128º, nºs 1 e 2, do CIRC, no caso dos autos, quer as autoliquidações quer as posteriores liquidações da Administração Tribu-tária e suas notificações ocorreram para além do prazo de caducidade, pelo que se verifica o fundamento previs-to no art. 204º, nº 1, al. e), do C.P.P.T. e a oponente en-tender que o prazo de caducidade previsto no artigo 45° da lGT opera nos casos em que o imposto foi autoliqui-dado e no caso em apreço parte da quantia exequenda foi exclusivamente liquidada pela Administração Fiscal.

questãojurÍdicaA liquidação tributária administrativa e a liqui-

dação tributária efectuada pelos particulares (autoli-quidação e liquidação por terceiro ou liquidação em substituição) e o regime legal da caducidade do direi-to à liquidação previsto nos artigos 45º e 46º da lGT.

decisãodoacÓrdãoOs recorrentes entendem que o prazo de caducidade

só se inicia a partir do momento da entrega das decla-rações pelos contribuintes contendo as autoliquidações dos impostos.

Preliminarmente, diga-se que a caducidade do direito de liquidação, como a caducidade em geral, serve-se de prazos prefixados, caracterizados pela peremptoriedade e, no ensinamento de Aníbal de Castro, in A Caducida-de na Doutrina, na lei e na Jurisprudência, p. 41, visa «limitar o lapso de tempo a partir do qual ou dentro do qual há-de exercer-se o direito...» e não é de conheci-mento oficioso e constitui uma ilegalidade idêntica a todas as outras que se englobam no art. 99° do CPPT, e que não merece pois tratamento diverso, pelo que ne-cessita de alegação na petição inicial, sob pena de o seu conhecimen to ficar precludido, o que tudo foi observa-do no caso concreto.

A lGT determina no seu art. 45º, nº 1, que “o direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for va-lidamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro”.

A oponente, ora recorrente, alegara inicialmente que, reportando-se os tributos exequendos aos exercícios de 2001 e 2001, a Administração Fiscal só podia liquidá-los e notificar a contribuinte dessas liquidações até ao final dos anos de 2004, no que respeita ao imposto relativo ao no de 2000, e até ao final do ano de 2005, no que respeita ao tributo do ano de 2001. Ora, como a Administração Fiscal não efectuou tais liquidações e notificações dentro dos prazos em que o deveria fazer, o direito de liquidar o tributo e de notificar dessas liquidações caducou, pelo que já não poderia ser exercido no final do ano de 2007 e no início do ano de 2007, verificando-se o fundamento de oposição ínsito na al. e) do nº 1 do art. 204º do CPPT.

As dívidas provenientes de IRC assumem natureza tributária e, como tal, estão sujeitas ao regime da cadu-cidade do art. 45º da lGT e das notificações dos actos tributários consagrado no art. 38º do CPPT.

Assim sendo, dispõe o art. 36º, nº 1, deste diploma legal que “os actos em matéria tributária que afectem os direitos e interesses legítimos dos contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados”.

Posto isto e voltando ao caso “sub judice”, resulta provado que foi em 06-12-2006 que o sujeito passivo procedeu à entrega do Modelo 22, correspondente ao período de tributação de 2000-01-01 a 2000-12-31 e de 2001-01-01 a 2001-12-31 e que a liquidação de IRC do ano de 2000, foi notificada à oponente por carta registada de 18-12-2006 e a liquidação de IRC do ano de 2001, foi notificada à oponente por carta registada de 22-12-2006.

Uma vez que a lGT determina no seu art. 45º, nº 1, que “o direito de liquidar os tributos caduca se a li-quidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro”,

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é esse o prazo de caducidade a considerar e o mesmo contava-se, porque estamos em presença de um imposto periódico, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário (cfr. nº 4 do mesmo preceito legal).

O Juiz «a quo» também perfilha o entendimento de que o IRC em causa é um imposto periódico, o que significa que, respeitando o acto tributário aos anos de 2000 e 2001, deveria a Administração Tributária proce-der à sua liquidação e notificar esta, ao sujeito passivo, até 31-12-2004 e 31-12-2005, respectivamente, por força do regime estabelecido no art. 45° da lGT.

É, pois, manifesto que a “liquidação” em causa foi notificada à devedora originária por via postal e ficou provado que este postal, com que se pretendia notificá-la, foi recebido pela destinatária.

A ser assim, a falta de notificação da liquidação no prazo estabelecido na lei acarretava a caducidade do di-reito à liquidação dos questionados tributos.

Não obstante, o Juiz «a quo» defende que o art. 45º do lGT não é aqui aplicável, por se tratar de uma obri-gação de autoliquidação.

Todavia, por imperativo legal, é ao contribuinte que incumbe apresentar as declarações e, como bem refere o recorrente Ministério Público, o prazo de caducidade previsto no art. 45º da lGT é aplicável mesmo nessas si-tuações de autoliquidação, como resulta da interpretação conjugada do disposto nos arts. 83º, nº 10, 93º e 128º nºs 1 e 2, do CIRC.

Na verdade, consoante o disposto no art. 83º, nº 10, do CIRC, “A liquidação prevista no nº 1 pode ser corri-gida, se for caso disso, dentro do prazo a que se refere o artº 93º, cobrando-se ou anulando-se então as diferenças apuradas”.

Versando a caducidade do direito à liquidação, o mencionado art. 93º do CIRC estabelece que “A liquida-ção de IRC, ainda que adicional, só pode efectuar-se nos prazos e nos termos previstos nos artigos 45º e 46º da lei Geral Tributária”.

Da concatenação destas normas, em plena concor-dância com o recorrente Ministério Público, resulta que não se pode excluir as situações de autoliquidação da su-jeição ao prazo de caducidade, ficando abrangidas pelo mesmo quer as liquidações efectuadas pela Administra-ção Tributária, quer as autoliquidações operadas pelo sujeito passivo.

Que essa corresponde à melhor hermenêutica jurídi-ca decorre igualmente do preceituado no art. 128º, nºs 1 e 2, do CIRC que, reportando-se à faculdade de recla-mação e/ou impugnação, determinar que “A faculdade referida no número anterior é igualmente conferida rela-tivamente à autoliquidação, à retenção na fonte e aos pa-

gamentos por conta, nos termos e prazos previstos nos artigos 131º a 133º do C.P.P.T, sem prejuízo do disposto nos números seguintes”.

Ora e como bem salienta o Ministério Público, sen-do legalmente admissível impugnar a autoliquidação, por identidade de razão, é igualmente admissível deduzir oposição na execução, resultante do não pagamento de liquidações que tiveram por base autoliquidações ante-riores, como sucede no caso dos autos.

E o certo é que, como se apurou nos autos, quer as autoliquidações quer as posteriores liquidações da Administração Tributária e suas notificações ocorreram para além do prazo de caducidade.

Nesse conspecto, o que é determinante para o caso é saber se estamos perante uma situação em que o con-tribuinte tivesse procedido à autoliquidação dos tributos em causa ou, antes, perante uma liquidação oficiosa leva-da a cabo pela Administração Tributária.

Isso aconselha a que se teçam algumas considerações sobre a tipologia da liquidação tributária segundo o cri-tério orgânico ou da qualidade do sujeito competente para a realizar, face ao qual existe a liquidação adminis-trativa levada a efeito pela Administração Tributária, e a liquidação efectuada pelos particulares, que abrange a denominada autoliquidação e a liquidação por terceiro ou liquidação em substituição.

Assim, a liquidação, “lato sensu”, é o conjunto de todas as operações tendentes ao apuramento do impos-to, compreendendo o lançamento subjectivo destinado a determinar ou identificar o contribuinte ou sujeito pas-sivo da relação fiscal e o lançamento objectivo por meio do qual se determina a matéria colectável ou tributável do imposto e, bem assim, se determina a taxa a apli-car, no caso de pluralidade de taxas, a liquidação stricto sensu traduzida na determinação da colecta através da aplicação da taxa à matéria colectável ou tributável e as (eventuais) deduções á colecta.

Como decorre do probatório, em 06-12-2006, o su-jeito passivo procedeu à entrega do Modelo 22, corres-pondente aos períodos de tributação de 2000-01-01 a 2000-12-31 e de 2001-01-01 a 2001-12-31 e a liquidação de IRC do ano de 2000, foi notificada à oponente por carta registada de 18-12-2006 e a liquidação de IRC do ano de 2001, foi notificada à oponente por carta regista-da de 22-12-2006.

Assim, segundo resulta do probatório, a contribuin-te procedeu à procedeu à respectiva autoliquidação para além do próprio prazo de caducidade.

Assim, não havendo liquidação adicional (oficiosa) mas autoliquidação operada para além do prazo de cadu-cidade ínsito no art. 45º, nº 1, da lGT e não ocorreram

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causas suspensivas das tipificadas nesse mesmo norma-tivo, é configurável o fundamento de oposição previsto no artigo 204°, n° 1, alínea e), do C.P.P.T., consistente na falta da notificação da liquidação do tributo no prazo de caducidade é fundamento de oposição.

Procede, pois, o presente recurso, a impor a revoga-ção da sentença e do acto e a procedência da oposição.

Impugnação de IMI Arguição de nulidades da sentença – art. 668º, nº 1, als. b), c) e d), do CPC e art. 125º do CPPT Caducidade do direito à impugnação Regime de liquidação e pagamento do IMI Residência nos termos do art. 19º da LGT e domicílio fiscal

sumárioI) À semelhança do que sucede no processo judicial

comum, conforme o estatuído na al. d) do nº 1 do artº 668º do CPC, é causa de nulidade da sentença a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar.

II) Resultando da análise da sentença que o Tribunal «a quo» pronunciou especificamente e de forma clara, rigorosa e explícita sobre todas as causas de pedir invo-cadas, ainda que não aluda a sobre todos e cada um dos argumentos aduzidos, pois o que importa é que o tribu-nal decida, como decidiu, as questões postas, não lhe in-cumbindo apreciar todos os fundamentos ou razões em que eles se apoiam para sustentar a pretensão, conclui-se que a sentença não está, de todo em todo, afectada na sua validade jurídica por omissão de pronúncia, não se verificando a arguida nulidade.

III) A nulidade da sentença geralmente designada por excesso ou indevida pronúncia, segundo o disposto no artº 668º, nº 1, al. d), 2ª parte do CPC e artº 125º do CPPT, existe quando o tribunal toma conhecimento de questão de que não se podia conhecer.

IV) A excepção da caducidade do direito à impug-nação pode ser conhecida mesmo depois de o despacho liminar a mandar prosseguir a impugnação, pois o mes-mo não faz caso julgado, pelo que, a essa luz, também não pode afirmar-se que existe nulidade por excesso de

pronúncia fundamentalmente porque, apesar de no des-pacho de convolação se ter considerado não caducado o direito à impugnação, o Tribunal «a quo» se ter vindo a pronunciar sobre a dita caducidade, violando o caso jul-gado constituído pela despacho (liminar) determinativo da convolação.

V) Muito embora a não especificação dos fundamen-tos de facto da decisão constitua causa de nulidade da sentença prevista no nº 1 do artº 125º do CPPT, que é de conhecimento oficioso por força do nº 4 do artº 712º do CPC, há que distinguir a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada, pois o que a lei considera só gera nulidade a falta absoluta de mo-tivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade.

VI) Decorrendo do alegatório que a recorrente não invoca a falta absoluta da motivação, excluída ficou a sentença da previsão da al. b) do nº 1 do artº 668º do CPC, irrelevando que ela seja deficiente ou que ocorra mesmo a falta de justificação dos fundamentos.

VII) É causa de nulidade da sentença a «oposição dos fundamentos com a decisão», sendo que este vício afecta a estrutura lógica da sentença, por contradição en-tre as suas premissas, de facto e de direito, e a conclusão: -os fundamentos invocados pelo juiz não conduziriam ao resultado expresso na decisão; conduziriam logica-mente, isso sim, a resultado oposto. Ou seja: -existe aqui um vício real no raciocínio do julgador, uma real contra-dição entre os fundamentos e a decisão que se analisa em que a fundamentação aponta num determinado sentido e a decisão segue caminho oposto, ou, pelo menos, di-recção diferente.

VIII) Alcançando-se que dos fundamentos aduzidos na sentença sob censura não podia nem devia logica-mente extrair-se um resultado oposto ao que nele foi expresso, não ocorre a falada nulidade.

IX) A liquidação do IMI é normalmente efectuada nos meses de Fevereiro e Março do ano seguinte àquele a que respeitar, mas as restantes liquidações, nomeada-mente as adicionais e as resultantes de revisões oficiosas, são efectuadas a todo o tempo sem prejuízo do prazo de caducidade (nºs 1 e 2 do artº 113º do CIMI).

X) O prazo “normal” de pagamento do imposto em duas prestações se o seu montante for superior a € 250, efectua-se nos meses de Abril e Setembro, ou sé em Abril se o montante for igual ou inferior àquele limite (cfr. nº 1 do artº 120º do CIMI).

XI) Se a liquidação tiver lugar fora do prazo referido no nº 2 do artº 113º do mesmo Código, o sujeito passivo

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é notificado para proceder ao pagamento, o qual terá lu-gar até ao fim do mês seguinte ao da notificação.

XII) Tratando-se nos autos de liquidação feita fora do prazo “normal” como o consentia o nº 4 do artº 113º, tinha o impugnante de ser notificado para proceder ao pagamento, o qual terá lugar até ao fim do mês seguinte ao da notificação.

XIII) Visto que o prazo para pagamento voluntário do tributo terminou em 31.12.2006 e tendo a Impugna-ção judicial dado entrada em 25.05.2007, dúvidas não sobram de que, tendo em conta o no n° 1 do art. 102° do CPPT, que estabelece que a impugnação judicial deve ser apresentada no prazo de 90 dias contados do termo do prazo para o pagamento voluntário, tal prazo se mostra excedido, o que acarreta a verificação da invocada cadu-cidade do direito a deduzir impugnação judicial como doutamente declarado na sentença.

XIV) O domicílio fiscal do sujeito passivo é, salvo disposição em contrário, para as pessoas singulares, o local da residência habitual, sendo obrigatória a comu-nicação do domicílio do sujeito passivo à administração tributária e ineficaz a mudança de domicílio enquanto não for comunicada à administração tributária.

XV) Os sujeitos passivos residentes no estrangeiro, bem como os que, embora residentes no território na-cional, se ausentem deste por período superior a seis me-ses, bem como as pessoas colectivas e outras entidades legalmente equiparadas que cessem a actividade, devem, para efeitos tributários, designar um representante com residência em território nacional e, independentemen-te das sanções aplicáveis, depende da designação de re-presentante nos termos do número anterior o exercício dos direitos dos sujeitos passivos nele referidos perante a administração tributária, incluindo os de reclamação, recurso ou impugnação, podendo a administração tribu-tária poderá rectificar oficiosamente o domicílio fiscal dos sujeitos passivos se tal decorrer dos elementos ao seu dispor.

XVI) Em face destas disposições, como o próprio contribuinte declarou que residia nas Seicheles e não co-municou a mudança de domicílio à administração tribu-tária, está correcta a decisão da administração fiscal de proceder à liquidação por referência àquela residência.

XVII) Para os prédios que sejam propriedade de en-tidades que tenham domicílio fiscal em país, território ou região sujeitos a um regime fiscal claramente mais favorável, constantes de lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças, a taxa do imposto é de 5% (cfr. n° 3 do art. 112° do CIMI, na redacção dada pela lei n° 55-b/2004, de 30 de Dezembro).

Tribunal Central Administrativo Sul

Acórdão de 30 de Junho de 2009

Processo nº 03112/09

Relator: Dr. José Correia

descriçãodosFactosUm contribuinte recorre da sentença proferida pelo

Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou improcedente a impugnação por si deduzida contra a li-quidação de Imposto Municipal sobre Imóveis dos anos de 2005 e 2006.

Evocando o disposto no n° 1 do art. 102° do CPPT, que estabelece que a impugnação judicial deve ser apre-sentada no prazo de 90 dias contados do termo do prazo para o pagamento voluntário da prestação tributária le-galmente notificada ao contribuinte e levando em conta a matéria levada ao probatório, de acordo com a qual o prazo para pagamento voluntário do tributo terminou em 31.12.2006, pelo que tendo a impugnação judicial dado entrada em 25.05.2007, concluiu o Juiz «a quo» que o prazo de 90 dias se mostra excedido, com a conse-quente verificação da invocada caducidade do direito a deduzir impugnação judicial.

Com base no assim fundamentado, veio a decidir-se na sentença pela procedência da excepção peremptória da caducidade do direito de acção invocada pela Fazen-da Pública relativamente à impugnação da liquidação de IMI relativa ao ano de 2005.

questãojurÍdicaO regime de liquidação e pagamento do IMI (artigos

113º e 120º do CIMI). A interpretação e aplicação do disposto no artigo 19º

da lGT.

decisãodoacÓrdãoO art. 113º, nº 1, do CIMI dispõe que “O imposto é

liquidado anualmente, em relação a cada município, pelos serviços centrais da Direcção-Geral dos Impostos, com base nos valores patrimoniais tributários dos prédios e em relação aos sujeitos passivos que constem das matrizes em 31 de Dezembro do ano a que o mesmo respeita”.

Esclarece depois o nº 2 do mesmo preceito legal que “A liquidação referida no número anterior é efectuada nos meses de Fevereiro e Março do ano seguinte”.

Porém, o nº 4 ressalva que “As restantes liquidações, nomeadamente as adicionais e as resultantes de revisões oficiosas, são efectuadas a todo o tempo sem prejuízo do

jurisprudência[resumos]

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disposto no art. 116º” – este estabelece o prazo geral de caducidade remetendo para a lGT.

Do regime legal decorrente das transcritas normas, resulta que a época “normal” para efectuar as liquida-ções do imposto é nos meses de Fevereiro e Março do ano seguinte àquele a que respeitar.

Por outro lado, o prazo “normal” de pagamento do imposto em duas prestações se o seu montante for supe-rior a € 250, efectua-se nos meses de Abril e Setembro, ou só em Abril se o montante for igual ou inferior àquele limite (cfr. nº 1 do art. 120º do CIMI).

Todavia, se a liquidação tiver lugar fora do prazo re-ferido no nº 2 do art. 113º do mesmo Código, o sujeito passivo é notificado para proceder ao pagamento, o qual terá lugar até ao fim do mês seguinte ao da notificação.

Ora, tratando-se nos autos de liquidação feita fora do prazo “normal” como o consentia o nº 4 do art. 113º, tinha o impugnante de ser notificado para proceder ao pagamento, o qual terá lugar até ao fim do mês seguinte ao da notificação.

Como se provou, a liquidação referente ao ano de 2005 foi originada pela transmissão da fracção nos ter-mos da escritura pública de compra e venda lavrada em 05.05.2005, através da qual o Impugnante adquiriu o prédio urbano em apreço.

Os dados que a permitiram foram declarados pelo contribuinte em 25-10-2006 28-10-2006 e a respectiva nota de cobrança foi emitida em 04-11-2006.

Efectuada a liquidação do Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) referente ao ano de 2005 em 28-10-2006 e sendo a respectiva nota de cobrança emitida em 04-11-2006, foi o Impugnante notificado para o respectivo pagamento voluntário com terminus em 31.12.2006.

Sendo assim, visto que o prazo para pagamento vo-luntário do tributo terminou em 31.12.2006 e tendo a Impugnação judicial dado entrada em 25.05.2007, dúvi-das não sobram de que, tendo em conta o n° 1 do art. 102° do CPPT, que estabelece que a impugnação judicial deve ser apresentada no prazo de 90 dias contados do termo do prazo para o pagamento voluntário, tal pra-zo se mostra excedido, o que acarreta a verificação da invocada caducidade do direito a deduzir impugnação judicial como doutamente declarado na sentença.

Resta, então, aquilatar se a sentença enferma de erro de julgamento sobre a decisão de fundo que se prende com a determinação sobre se “in casu” se mostra preen-chida a previsão ínsita no n°3 do art. 112° do CIMI por forma a se poder concluir pela aplicação da estatuição prevista no citado preceito.

Como bem refere o Juiz «a quo», a questão passa por determinar qual o domicílio fiscal do Impugnante.

Este entende que, possuindo domicílio fiscal na Na-míbia, a taxa máxima aplicável em sede de cálculo e li-quidação de IMI é de 0,8% ou até mesmo 0,5% sobre o valor patrimonial tributário do imóvel e não a taxa de 5% aplicada pela Administração Fiscal.

Já o Juiz «a quo» entende que, devendo aplicar-se o n° 1 do art. 19° da lGT, que nos diz que o domicílio fiscal do sujeito passivo é, salvo disposição em contrário, para as pessoas singulares, o local da residência habitual, o facto relevante para a localização do domicílio fiscal das pessoas singulares é a residência habitual, pelo que, resultando do probatório que o Impugnante apresentou em 03.11.2004 no competente Serviço de Finanças o documento de inscrição e obtenção do cartão de con-tribuinte, no qual declarou ter nacionalidade alemã e ter residência nas Seicheles, o domicílio que releva é nas Sei-cheles.

Nesse sentido, evoca o estatuído no n° 3 do art. 112° do CIMI, na redacção dada pela lei n° 55-b/2004, de 30 de Dezembro, segundo o qual “para os prédios que sejam propriedade de entidades que tenham domicílio fiscal em país, território ou região sujeitos a um regi-me fiscal claramente mais favorável, constantes de lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças, a taxa do imposto é de 5%.”

É assertivo que o CIMI não fornece uma definição de “domicílio fiscal”, razão pela qual se impõe trazer à colação o n° 1 do art. 19° da lGT, que estabelece que o domicílio fiscal do sujeito passivo é, salvo disposição em contrário, para as pessoas singulares, o local da resi-dência habitual.

Foi em face de todo este circunstancialismo que o Juiz «a quo» conclui, irrepreensivelmente, que bem an-dou a Administração Fiscal ao aplicar à situação trazida a juízo o n° 3 do art. 112° do CIMI.

Também é de sufragar o que na sentença se expende quanto ao declarado no certificado emitido pelo Consu-lado Geral de Portugal em Joanesburgo em 03.05.2007, e do qual consta que o Impugnante é residente na Namí-bia desde 13.05.1982.

Na verdade, por força do estatuído no n° 3 do art. 43° do CPPT e n° 3 do art. 19° da lGT, impendia sobre o Impugnante o dever de comunicar a alteração do seu domicílio fiscal.

Decorrendo do art. 43° do CPPT em conformidade com o n° 13 do art. 19° da lGT a regra da inoponibili-dade à Administração Tributária da mudança de domicí-lio que não lhe tiver sido declarada, referindo o seu n°3 que a comunicação só produz efeitos se o interessado fizer a prova de já ter solicitado ou obtido a actualização do domicílio ou sede no número fiscal do contribuinte.

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E, o Juiz «a quo» não descurou as implicações do regime dos arts. 19º da LGT e 43º do CPPT.

O n° 6 do artigo 19° da Lei Geral Tributária confere à Administração Fiscal a faculdade de, reputando ter em seu poder elementos seguros quanto à alteração de mo-rada dos sujeitos passivos, promover oficiosamente a al-teração do domicílio fiscal desses mesmos contribuintes.

A matéria contida no n° 6 do artigo 19° da Lei Geral Tributária é de uma extrema sensibilidade, exigindo que para o accionamento de tal mecanismo por parte da Ad-ministração Fiscal, esta se rodeie e muna de todos os cui-dados cautelas, em ordem a acautelar, sem margem para dúvidas, que efectivamente os elementos de que dispõe consubstanciam uma real alteração de morada.

E não uma indesejada atribuição de relevo a elemen-tos que porventura, na óptica do sujeito passivo, mais não revelam do que uma mera alteração transitória que esse mesmo sujeito passivo conscientemente não pre-tendeu comunicar à Administração Fiscal.

É que, como decorre do n° 2 do mesmo normati-vo, sobre o contribuinte recai a obrigação de comunicar o local da sua residência habitual aos serviços da Ad-ministração Tributária. A estes somente se concede a possibilidade, o poder/dever, de rectificar a informação

disponível sobre o domicílio fiscal dos sujeitos passivos, na condição de terem acesso a elementos que, com se-gurança, embora a lei não o diga expressamente, o tra-tamento desta matéria exige particulares cautelas, sob pena de se poder estar a atribuir importância e relevo a uma alteração meramente transitória e que o sujeito passivo não pretenda exercitar, não se olvidando que a comunicação por parte deste de alterações do domicilio fiscal obedece a específico e privativo formalismo, inclu-sive documental., atestem a mudança, alteração, deven-do, obviamente, se necessário, diligenciar pela confirma-ção dos dados acedidos.

Por outro lado, o recorrente nem sequer arguiu a fal-ta da sua citação/notificação, se esta foi dirigida para o domicílio, sendo neste sentido que deverá ser entendida a «ineficácia» cominada no nº 3 do art. 19º da LGT.

Ademais, a regra da inoponibilidade estabelecida pelo n° 1 do art. 43º do CPPT, decorrente do eventual incumprimento da respectiva obrigação fiscal, só cede-ria, deixando de verificar-se, quando em confronto com norma que, por sua vez, imponha à Administração Fis-cal o dever de transmitir os seus actos mediante notifica-ção ou citação obrigatoriamente pessoal.

PEDIDOS PARA:

R. Gonçalo Cristóvão, 111, 6º esq. 4049-037 - PORTO • Tel. 223 399 400 • Fax 222 058 098 • [email protected]

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jurisprudência[sumários]

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baseariam no respeito pelo caso julgado ou pelo prin-cípio ne bis in idem e mandou atender à conduta que integre a continuação, e que se tenha descoberto depois do trânsito em julgado da primeira condenação, já tran-sitada, desde que se trate de uma conduta mais grave do que as que já tinham sido conhecidas, determinando-se que nesse caso “a pena que lhe for aplicável substitui a anterior”.

V - A solução legal desinteressou-se de agravar a res-ponsabilidade do agente, em virtude de uma reiteração, que simplesmente passasse a ver-se acrescida. As “con-dutas mais graves” serão então aquelas que integrem um tipo próximo do da condenação transitada (que proteja substancialmente o mesmo bem jurídico), mas com uma moldura penal mais severa. Na verdade, as condutas pu-nidas pelo mesmo tipo legal, integrantes da continuação, que simplesmente revelem, no caso, um grau de ilicitude maior, ver-se-ão, nesta linha, consumidas pela condena-ção já julgada. É que a expressão “conduta mais grave”, do n.º 2 do art. 79.º do CP, é também empregue no n.º 1 do preceito, e aí não oferece dúvida que a gravidade da conduta se afere pela pena aplicável, e portanto, pela moldura abstracta do crime, não fazendo qualquer senti-do que a mesma expressão seja usada nos dois números com sentido diferente.

VI - Pelo crime de abuso de confiança fiscal o re-corrente foi condenado no Proc. n.º … na pena de 2 anos de prisão suspensa por 4 anos e 6 meses na sua execução, sob condição de pagamento nesse tempo, da quantia global em dívida, com os acréscimos legais. A pena aplicada nestes autos pelo mesmo crime continu-ado, de abuso de confiança fiscal, não só teve em conta mais retenções de IVA, e retenções de IRS, como re-flectiu na medida da pena essa consideração, passando a pena para 2 anos e 8 meses de prisão. Todavia, dado que nenhuma das parcelas retidas, que se provaram só nestes autos, tem montante superior às tomadas em conta no Proc. n.º …, como, sobretudo, não representam o co-metimento de crime com moldura penal mais gravosa, o que aponta para a manutenção daquela pena.

VII - Em matéria de aplicação das leis no tempo não se poderá desfazer a unidade criminosa do crime continuado, para se aplicar em relação a cada uma das actuações, a lei que for mais favorável ao agente. Aplica--se sempre a lei nova, ainda que mais severa, desde que a execução tenha cessado ou o último acto tenha sido pra-ticado no domínio da mesma lei nova. Deste modo, não chega a pôr-se qualquer questão de sucessão relevante de leis no tempo quando o último facto que integra a actu-ação continuada do agente já se processou no domínio da lei nova.

ABUSO DE CONFIANçA FISCAL

SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIçA

Aplicação da lei penal no tempoCaso julgado“Rebus sic stantibus”ConstitucionalidadeCrime continuado“Non bis in idem”

SUMáRIOI - Estando em causa condutas integradas numa mes-

ma continuação criminosa e tomadas em consideração em diferentes processos, face ao art. 79.º do CP, na sua anterior redacção, a jurisprudência do STJ havia maiori-tariamente abandonado a posição de Eduardo Correia, nos termos da qual, nenhuma das condutas anteriores à condenação transitada em julgado, descobertas após esta, que viessem a ser integradas na continuação, pode-riam ser tidas em conta.

II - A jurisprudência dominante entendia, ao con-trário, ser possível a ultrapassagem da suposta limitação derivada do caso julgado, o qual, no caso de crime conti-nuado, se assumiria sob a condição “rebus sic stantibus”, embora dentro de certos parâmetros. Entendia-se que o caso julgado não era impeditivo do julgamento das in-fracções parcelares integradas num crime continuado e que só posteriormente viessem a ser descobertas.

III - A divisão passou a ser então, entre a posição maioritária dos que pensavam, que deviam ser conside-radas as condutas novas, só se entre elas houvesse al-guma que assumisse maior gravidade (cf. v.g. Acs. do STJ de 10-04-2002, de 03-03-2004 e de 08-03-2006, proferidos respectivamente nos Procs. n.ºs 228/02 - 3.ª, 4013/03 - 3.ª e 4401/05 - 5.ª), e a posição de quem en-tendia que as condutas novas sempre deveriam ser tidas em conta, apenas por o seu número acrescido dever ter reflexo na punição (cf. v.g. Acs. do STJ de 04-05-1983, Proc. n.º 36975 - 3.ª, da Relação de Guimarães de 22-11-2004, Proc. n.º 1598/04, ou da Relação do Porto de 03-05-2006, Proc. n.º 42865/05).

IV - A jurisprudência dominante do STJ, que vai no primeiro sentido, obteve consagração legislativa com a reforma da lei 59/2007, de 04-09. O acrescentamento do n.º 2 do art. 79.º do CP afastou as objecções que se

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VIII - A eliminação do elemento apropriação do art. 107.º do RGIT não fez mais do que clarificar o enten-dimento da lei, enveredando pela interpretação do art. 27.º-b do RJIFNA, nos termos da qual, aquele segmento não constituía um elemento típico do crime, com ver-dadeira autonomia (cf. v.g. Ac. do STJ de 26-01-2000, Proc. n.º 815/99 - 3.ª). A expressão final “do mesmo se apropriando”, que se via na previsão do art. 27.º-b do RJIFNA, constituía a síntese conclusiva do comporta-mento antes descrito.

IX - Não se vê como é possível receber um montan-te monetário, como depositário, para lhe dar um destino, e, em prejuízo do destinatário, afectar o montante a ou-tra finalidade, sabendo que se está a beneficiar ilegitima-mente outrem (ou o próprio), actuando o depositário num quadro em que não tenha feito seu o montante re-cebido. O agente tem forçosamente que agir em relação a esse montante como se fosse coisa sua, e ainda que por escasso tempo, logo que ultrapassada a data estipulada para a respectiva entrega.

X - Na linha da jurisprudência do TC, também se entende que não existe qualquer vício de inconstitucio-nalidade no crime de abuso de confiança fiscal. Não está em causa aqui, simplesmente, a aplicação de uma pena que pode ser de prisão, devido ao facto de alguém não cumprir as suas dívidas. Toda a arquitectura dos precei-tos que prevêem os crimes de abuso de confiança fiscal ou contra a segurança social, inclui, para além disso, o elemento apropriação, melhor, um dolo de apropriação de certos montantes, em relação aos quais tudo se passa como se o agente fosse depositário.

XI - No contexto de um Estado de Direito que a CRP quis que fosse um Estado Social de Direito, os cri-mes em apreço revelam, para além de um desvalor de resultado, cifrado na não entrada nos cofres do Estado dos montantes retidos, um desvalor de acção pautado no desvio desses montantes. O agente podia reter as pres-tações que devia canalizar para o Estado, e, não só as re-teve, como as afectou dolosamente a outros propósitos.

Acórdão de 18 de Fevereiro de 2010

Processo nº 432/09.9YFlSb

Relator: Dr. Souto de Moura

Abuso de confiançaConstitucionalidadePrincípio da igualdade

ApropriaçãoFrustração de créditoEscolha da penaSuspensão da execução da penaCondição da suspensão da execução da pena Concurso de infracçõesCrime único Medida concreta da pena

SUMáRIOI - O sistema fiscal visa a satisfação das necessidades

financeiras do Estado e outras entidades públicas e uma repartição justa dos rendimentos e da riqueza, e a tribu-tação do património pessoal ou real deve concorrer para a igualdade entre os cidadãos (arts. 103.º, n.º 1, e 104.º, n.º 3, da CRP), pelo que é da maior evidência, quer no plano teórico quer no plano prático, que o lançamento dos impostos, mostrando-se a coberto da tutela da lei ordinária, sustentada pela lei fundamental, reclama para sua cobrança um regime punitivo deferido ao Estado, sem o qual aquela superior e pública finalidade se mos-traria seriamente comprometida, integrando-se, como se integra, o delito de fuga aos impostos naquilo que se apelida de “delinquência patrimonial de astúcia”.

II - Por isso o “jus puniendi” de que o Estado se mostra detentor na luta contra os devedores de impostos e contribuições à Segurança Social, quando aos credores particulares do Estado lhes é denegada igual tutela, en-quanto figura incumpridora e em mora nas suas obriga-ções, não reveste qualquer tratamento chocante, forma diferenciada ou desproporcionada, em colisão com os princípios com dignidade constitucional sediados ao ní-vel da igualdade dos cidadãos e da menor compressão dos direitos fundamentais - arts. 13.°, n.º 1, e 18.º, n.º 2, da CRP.

III - Trata-se de assegurar tratamento diferenciado e desigual, justificado e de todos aceite, numa área e a uma entidade vocacionada à realização de fins públicos, de prossecução de incontornáveis interesses de índole financeira, nacionais e comunitários, de subsistência co-lectiva, de justa repartição dos rendimentos, objectivos ocupantes na pirâmide de interesses de posição de topo, superiorizando-se aos privados.

IV - O devedor dos impostos (e de prestações à Se-gurança Social) surge colocado em posição aproximada

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à de fiel depositário, sendo de «levar em conta este as-pecto peculiar da posição dos responsáveis tributários, que não comporta uma pura obrigação contratual por-que decorre da lei», além de que a impossibilidade de cumprimento não é elemento constitutivo do crime de abuso de confiança fiscal previsto no art. 105.º do RGIT (o mesmo se podendo dizer quanto ao art. 24.º do RJIF-NA), escreveu-se no Ac. do TC n.º 312/00 (DR II Série, de 17-10-2000), seguido de perto pelo Ac. do TC n.º 54/2004, de 20.1.2004, Proc. n.º 640/03, onde - como em outros daquele TC (cf. os n.ºs 663/98 e 516/00, DR II Série, de 15-01-1999 e 31-01-2001) -, se teve como pressuposto legal a falta dolosa de entrega de prestações à administração fiscal e a sua não correspondência à consagração de um caso de prisão por dívidas.

V - No RJIFNA, na redacção conferida ao Dl 20-A/90, de 15-01, pelo Dl 394/93, de 24-11, exigia-se para configuração do crime de abuso de confiança fiscal a apropriação indevida por inversão do título da posse, com censurável “animus rem sibi habendi”; no RGIT, aprovado pela lei 15/01, de 05-06, basta a não entrega, mas subjacentemente, embora a tónica se tenha deslo-cado, na lei nova, para a simples não entrega, continua a estar presente a ideia de apropriação, pois que quem recebe das mãos de terceiro prestações tributárias, fican-do investido na qualidade de seu depositário, e não as entrega, em via de regra é porque delas se apropriou, conferindo-lhes um destino não legal.

VI - O novo preceito (art. 105.º do RGIT) manifesta um alargamento da punibilidade, abrangendo claramen-te não só as situações de indevida apropriação mas tam-bém as de intencional não entrega.

VII - Tendo em consideração que: - os arguidos, enquanto membros do Conselho de Administração da arguida V, SA, ao longo dos meses de Janeiro, Feverei-ro, Março e Maio de 1996, Julho, Setembro, Novembro e Dezembro de 1998, e Janeiro de 1999, deixaram de entregar nos cofres do Estado a importância de € 257 396,30, a título de IVA exigível, resultante da diferen-ça entre o imposto liquidado pela sociedade arguida aos clientes e o imposto por si suportado e dedutível na-queles períodos; - decidiram, igualmente, não pagar ao Estado o IRS, descontando nas remunerações pagas aos seus trabalhadores (categoria A) e administradores ou colaboradores por conta própria (categoria b) a soma de € 129 653,94, correspondente aos meses de Janeiro e Julho a Dezembro de 1997; Janeiro, Março a Agosto e Outubro a Dezembro de 1998; Janeiro a Dezembro de 1999 e 2000; e Janeiro, Fevereiro e Março de 2001;

- no uso daquela qualidade estatutária os arguidos inte-graram, indevidamente, no património social da socie-dade arguida, aquelas importâncias, no montante global de € 386960,24, que aquela afectou ao pagamento das despesas decorrentes do giro normal da empresa, desig-nadamente ao pagamento de salários e fornecedores; - a sociedade arguida, de 31 de Maio de 1999 até 28 de Dezembro de 2000, por intermédio daqueles arguidos, com o fito de frustrarem a satisfação dos créditos tri-butários, foi alienando, faseadamente, o seu imobiliza-do e existências/matérias-primas à empresa designada à data por JFH, lda., actualmente E, lda., de que aqueles eram sócios gerentes; - as vendas ascenderam, quanto ao imobilizado, ao valor líquido de € 333 059,63, acrescido de IVA liquidado no valor de € 56 210,14, e as vendas das existências ascenderam a € 1574 513,674, acrescido de IVA liquidado no valor de € 267 667,41; - ao tempo a sociedade era devedora de avultados créditos ao Es-tado, já liquidados; - a actuação dos arguidos foi-o em nome e no interesse da arguida sociedade, em conjuga-ção de esforços, de forma livre e consciente, no intuito de eximi-la ao pagamento dos impostos, cientes da proi-bição e punibilidade da sua conduta, particularmente de que a venda do activo imobilizado e das suas existências obstava à satisfação, total ou parcial, dos créditos fiscais, objectivo a que se propuseram; - a intensidade do dolo é elevada, repetida ao longo do tempo como se mostra a intenção de defraudar o Estado; e o desvalor da acção, ou seja a ilicitude, situa-se no mesmo nível, a ter presente a importância vultuosa dos impostos insatisfeitos, com o correlativo prejuízo para o Estado, e o engenho de que se lançou mão para frustrar créditos do Estado, desfa-zendo-se do «casco social», alienando-o a favor de uma sociedade de que eram sócios os arguidos, revelador de uma personalidade mal conformada, englobante de uma inconsideração e um desprezo total por valores cujo cum-primento cada vez mais se reclama; - colhem ainda signifi-cativo peso as exigências de prevenção especial, apesar de os arguidos serem delinquentes primários, de o arguido J ter confessado os factos e de o R admitir, apenas, esta-rem em falta os supracitados valores, de pelo desvio do seu legal destino se terem proposto satisfazer salários e matérias-primas, porque jamais as importâncias não en-tregues integram património social, havendo que dar-lhes o seu encaminhamento estipulado por lei, tudo de escasso valor atenuativo; só a pena privativa da liberdade satisfaz de forma adequada as finalidades da pena.

VIII - A exigência de pagamento da prestação tribu-tária como condição da suspensão da execução da pena, à margem da condição económica do responsável tribu-

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tário, e do princípio da razoabilidade, previsto para a sus-pensão nos termos do art. 51.º, n.º 2, do CP, nada tem de desmedida, justificando-se pela necessidade da eficácia do sistema penal tributário e o tratamento diferenciado pelo interesse preponderantemente público a acautelar.

IX - E tal inconsideração de possibilidade económi-ca, pressuposta na lei tributária, tem sido havida como conforme à CRP porque a lei não exclui a suspensão, porque mesmo parecendo impossível a satisfação da prestação não é de excluir que, por mudança de fortu-na, o devedor esteja em condições de arcá-la, porque só o incumprimento doloso determina a revogação, por fim porque sempre restam, em casos de dificuldades de cumprimento, alternativas, já que no regime rege o prin-cípio “rebus sic stantibus”, norteado pelos princípios da culpa e da adequação.

X - Dado que as omissões de pagamento dos im-postos em causa respeitam, genericamente, a períodos sucessivamente renováveis (mês a mês), posto que aque-la omissão se desenvolva em momentos sucessivos, não sendo a distância temporal entre eles alongada, antes preexistindo uma conexão temporal, não poderá dei-xar de se levar em apreço o ensinamento doutrinário de Eduardo Correia (Unidade e Pluralidade de Infracções, págs. 96-97), no sentido de se cada um dos actos for um mero «explodir», mais ou menos automático, de uma mesma carga volitiva integrada num projecto volitivo que se mantém uniforme, não obstante a repetição da materialidade ele aglutina um só propósito criminoso e um só crime.

XI - Assim, é de condenar cada um dos arguidos, como co-autores de um crime de abuso de confiança fiscal, p. e p. pelo art. 105.º, n.ºs 1 e 5, do RGIT, em 2 anos e meio de prisão, e de um crime de frustração de créditos, p. e p. pelo art. 25.º, n.º 1, do Dl 394/93, de 24-11, em 6 meses de prisão; e, em cúmulo jurídico, cada um, em 2 anos e 8 meses de prisão, pena essa suspensa na sua execução pelo período de 5 anos, com a condi-ção de, nesse mesmo prazo, pagarem a quantia de € 474 609,34, devendo documentar nos autos dentro do prazo de 1 ano o pagamento de 1/5 de tal quantia, dentro de 2 anos o pagamento de 2/5, dentro de 3 anos o pagamen-to de 3/5, dentro de 4 anos o pagamento de 4/5, e no último ano o restante.

Acórdão de 18 de Outubro de 2006

Processo nº 06P2935

Relator: Dr. Armindo Monteiro

Abuso de confiança fiscal

SUMáRIOO crime de abuso de confiança fiscal tem, como um

dos seus elementos objectivos, a dedução ou o recebi-mento da prestação tributária, o que, no âmbito do im-posto sobre o valor acrescentado (IVA), significa que o devedor tributário só pode praticar esse crime se tiver recebido o montante da prestação tributária, se esta lhe tiver sido entregue pelo adquirente.

Acórdão de 13 de Dezembro de 2001

Processo nº 01P3749

Relator: Dr. Hugo lopes

TRIBUNAL DA RELAçÃO DE COIMBRA

Abuso de confiança fiscalResponsabilidade civilCompetência do tribunal criminal

SUMáRIOI - Praticando o arguido factos subsumíveis a um cri-

me de natureza fiscal ou tributária, constitui-se na obri-gação de indemnizar.

II - Mesmo correndo termos execução fiscal sobre o contribuinte e arguido, tal circunstância não obsta a que a Administração tributária fique na posse de mais título exe-cutivo e, consequentemente, que o tribunal criminal não tenha competência para conhecer daquele pedido civil.

Acórdão de 2 de Novembro de 2005

Processo nº 2296/05

Relator: Dr. Félix Almeida

Abuso de confiança fiscalCondições de punibilidade

SUMáRIOI - A lei 53-A/2006 veio introduzir no crime de abuso

de confiança fiscal, p. e p. art.º 105º do RGIT, uma nova condição objectiva de punibilidade (al. b) do seu n.º 4).

jurisprudência[sumários]

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II - Verificando-se ter havido a comunicação ali pre-vista, há que dar ao arguido a possibilidade de afastar aquela condição.

Acórdão de 14 de Março de 2007

Processo nº 1728/06.7YRCbR

Relator: Dra. Elisa Sales

Condições de punibilidadeCrimeAbuso de confiança fiscal

SUMáRIOA nova lei (53-A/2006) incluiu uma condição de puni-

bilidade, seja positiva seja de exclusão, do crime de abuso de confiança fiscal a qual (art. 2º, n.º 4, o CPP) só pode ter como efeito a aplicabilidade ou inaplicabilidade, imediata, da sanção penal contida na norma incriminadora.

Acórdão de 18 de Abril de 2007

Processo nº 120/04.2IDGRD.C1

Relator: Dr. Gabriel Catarino

Abuso de confiança fiscalLei mais favorável

SUMáRIO1. A punibilidade do crime de abuso de confiança

fiscal previsto na nova redacção do artigo 105º do RGIT, no caso de ter sido comunicada à administração tribu-tária a correspondente declaração, depende da falta de pagamento da quantia correspondente e juros e do valor da coima aplicável, no prazo de 30 dias após notificação para o efeito.

2. Por isso, mesmo na fase do recurso após condena-ção, há que oficiar à administração fiscal para que proceda àquela notificação, para se verificar se ocorre ou não aquela condição de punibilidade, regime mais favorável ao arguido.

Acórdão de 28 de Março de 2007

Processo nº 72/03.6IDAVR.C1

Relator: Dr. Félix Almeida

Abuso de confiança fiscalLei mais favorável

SUMáRIOA condição de punibilidade do crime de abuso de con-

fiança fiscal prevista no número 4 da nova redacção do ar-tigo 105º do RGIT, não opera se não tiver sido comunica-da à administração tributária a correspondente declaração.

Acórdão de 28 de Março de 2007

Processo nº 96/04.6TAGVA.C1

Relator: Dr. Jorge Dias

Condições de punibilidade

SUMáRIOI. A lei 53-A/2006, de 29/12, veio introduzir uma

verdadeira condição de punibilidade relativa ao crime de abuso de confiança fiscal.

II. Devem considerar-se descriminalizadas todas as situações que preencham os requisitos contemplados pela nova norma, sem que a condição se tenha verificado.

Acórdão de 28 de Março de 2007

Processo nº 59/05.4IDCTb.C1

Relator: Dr. Ataíde das Neves

Abuso de confiança fiscalLei mais favorável

SUMáRIO1. A punibilidade do crime de abuso de confiança

fiscal previsto na nova redacção do artigo 105º do RGIT, no caso de ter sido comunicada à administração tribu-tária a correspondente declaração, depende da falta de pagamento da quantia correspondente e juros e do valor da coima aplicável, no prazo de 30 dias após notificação para o efeito.

2. Por isso, mesmo na fase do recurso após condena-ção, há que oficiar à administração fiscal para que proce-da àquela notificação, para se verificar se ocorre ou não aquela condição de punibilidade, regime mais favorável ao arguido.

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jurisprudência[sumários]

REVISTA FISCAl Setembro/Outubro | 2010

Acórdão de 21 de Março de 2007

Processo nº 825/98.5TAlRA.C1

Relator: Dr. Carlos barreira

Abuso de confiança fiscalPedido cívelLegitimidade

SUMáRIO1. A existência de título executivo, ou título de igual

valor, não impede que se demandem os arguidos no en-xerto cível deduzido em processo penal, embora releve para efeitos de responsabilização pelas custas.

2. Em processo crime por abuso de confiança fiscal pode ser deduzido pedido cível contra todos os arguidos – sociedade e sócios gerentes.

Acórdão de 13 de Junho de 2007

Processo nº 11773/04.1TDlSb.C1

Relator: Dr. Jorge Dias

Abuso de confiança fiscalIndemnização ao EstadoPedido civilExistência de título executivo

SUMáRIOEm processo crime por abuso de confiança fiscal o

Estado Português demandante civil tem interesse pro-cessual quanto à dedução do pedido de indemnização civil nesta sede contra todos os demandados/arguidos com responsabilidade solidária no pagamento da dívida apurada, mesmo que quanto à sociedade já tenha título executivo.

Acórdão de 1 de Outubro de 2008

Processo nº 187/06.9IDACb.C1

Relator: Dr. Jorge Dias

Crime de abuso de confiança fiscalPena de substituição condicionadaPrincípio da culpabilidade

SUMáRIO1. A pena terá que, ao assumir-se como função de

manutenção da vigência da norma, ter como medida o peso da norma violada e a medida da sua vulneração; a situação de asseguramento cognitivo dessa norma; a res-ponsabilidade do autor pela sua motivação ao cometer o crime. O princípio da culpabilidade, ou a densificação da materialidade volitiva posta na execução de uma con-duta, no que quer que isso possa ser mensurável, há-de, segundo o artigo 40.º do código vigente, dosear a medi-da da pena.

2. Ao sujeitar a pena de substituição à condição de pagamento da quantia em dívida, o tribunal foi além do grau de culpa do agente, que agiu num quadro desfa-vorável para a empresa, com a intenção de manter os postos de trabalho vindo posteriormente a reconhecer a falta e tendo ainda durante o período de laboração da empresa procurado solver a dívida. Quem assim age fá -lo não com a intenção deliberada de defraudar a Fa-zenda Nacional mas como forma de minorar ou atenu-ar as dificuldades momentâneas da empresa que gere e convencido, certamente, de que poderia mais tarde vir a solver a dívida.

Acórdão de 10 de Dezembro de 2008

Processo nº 87/05.0IDCbR.C1

Relator: Dr. Gabriel Catarino

Abuso de confiança fiscalConsumação

SUMáRIOO crime de abuso de confiança fiscal é um crime

omissivo puro que se consuma no momento em que o agente não entrega a prestação tributária devida, haja ou não haja entrega da declaração tributária.

Acórdão de 11 de Março de 2009

Processo nº 24/05 1IDGRD.C1

Relator: Dr. Ribeiro Martins

jurisprudência[sumários]

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Abuso de confiança fiscal Condições objectivas de punibilidadeContraditório

SUMáRIO1. A condição objectiva de punibilidade prevista na

versão originária do nº 4 do art. 105º do RGIT passou para a actual alínea a) do mesmo número. E na recém--criada alínea b) estabeleceu-se uma segunda condição objectiva de punibilidade que só opera, além do mais, se a prestação tiver sido comunicada à administração tribu-tária através da correspondente declaração.

2. Sendo a notificação efectuada ao abrigo do art. 105º, nº 4, b), do RGIT na redacção da lei 53-A/2006, de 29 de Dezembro, uma consequência da lei, e sendo imposta a sua aplicação aos factos pretéritos por força de jurisprudência obrigatória, não se descortina qual-quer razão que determine a necessidade de assegurar o contraditório.

Acórdão de 28 de Abril de 2009

Processo nº 98/06.8IDlRA-D.C1

Relator: Dr. Vasques Osório

Abuso de confiança fiscalCrime continuadoConcurso de crimesCaso julgadoPrincípio “ne bis in idem”

SUMáRIO1. O referente “mesmo crime” do art.º 29º, 5, da

Constituição da República Portuguesa não deve ser in-terpretado no seu estrito sentido técnico-jurídico, mas sim em função do valor que o princípio assume para a dignidade da pessoa humana, de forma a garantir-se que não possa mais, por aquele acontecimento, voltar a ser incomodado, assegurando-se, assim, “ad futurum”, a paz jurídica ao cidadão.

2. A verificação de crime continuado não se caracte-riza, na sua essência, pela homogeneidade das condutas, que apenas traduz reiteração criminosa, mas sim pela di-minuição considerável da culpa.

3. O crime continuado não se afasta teleologicamen-te do concurso real, na medida em que nele não existe

apenas uma resolução criminosa mas sim tantas resolu-ções – e desvalores - quantas as condutas autónomas e parcelares que o integram.

Acórdão de 28 de Abril de 2009

Processo nº 8/06.2IDCTb.C1

Relator: Dr. Fernando Ventura

Abuso de confiança fiscalPrincípio da vinculação temáticaLiquidação do IVAPrescriçãoImpugnação (ampla) da matéria de factoApropriaçãoAdministradores de factoConstitucionalidade

SUMáRIO I – Com a dedução da acusação fica definido e fi-

xado o objecto do processo, exigindo-se, a partir desse momento, uma necessária correlação entre a acusação e a decisão. Essa correlação traduz-se na exigência de que, definido o objecto do processo, o tribunal não possa, como regra, atender a factos que não foram objecto da acusação, estando, por conseguinte, limitada a sua acti-vidade cognitiva e decisória, o que constitui a chamada vinculação temática do tribunal.

II - Depois de fixado na acusação, o objecto do pro-cesso deve manter-se o mesmo até ao trânsito em julga-do da sentença – é o chamado princípio da identidade.

III - Ao juiz de julgamento, incumbe o papel de di-recção da fase de julgamento balizado e limitado pelo conteúdo da acusação ou da pronúncia, pelo “thema decidendum” (objecto do processo) e pelo “thema pro-bandum” (extensão da cognição).

IV - No caso de abuso de confiança fiscal por não entrega do IVA, a verificação do crime não depende de qualquer liquidação pela administração tributária, pelo que o prazo de prescrição do procedimento criminal é não o de 4 anos, previsto no n.º 3 do artigo 21.º do RGIT, mas antes o prazo previsto no n.º 1 da mesma norma, que sofre as interrupções e suspensões previstas na lei penal.

V - O recurso em que se impugne (amplamente) a decisão sobre a matéria de facto não constituiu um novo

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julgamento do objecto do processo, mas antes um remé-dio jurídico que se destina a despistar e corrigir, cirurgi-camente, erros “in judicando” ou “in procedendo”, que o recorrente deverá expressamente indicar, impõe-se a este o ónus de proceder a uma tríplice especificação, es-tabelecendo o artigo 412.º, n.º 3, do C.P.Penal.

VI - A «apropriação» é uma consequência lógica do des-vio do destino das prestações tributárias retidas, pelo que, assim entendida, como omissão de entrega dessas presta-ções a quem de direito, com sua utilização para outros fins. Não se trata apenas da não entrega das prestações tributá-rias, mas da sua utilização para outros fins, com consciência de que as mesmas eram pertença do Estado.

VII - O legislador, avisado como é e conhecedor de que nesta área as cifras negras são grandes [Cfr. Pream-bulo do Código Penal e lopes Rocha, A responsabili-dade das Pessoas Colectivas, CEJ 1085, pág. 110], no desenho do ilícito típico das condutas voluntárias dos titulares de órgãos de pessoas colectivas, desconsiderou a circunstância da sua regular ou irregular constituição, ou mera associação de facto, quer a circunstância de os agentes serem titulares de direito ou meramente de facto.

VIII - Não é inconstitucional o artigo 105.º do RGIT, designadamente no sentido de que tal artigo acolhe, como elemento implícito, a exigência de apropriação.

Acórdão de 25 de Março de 2009

Processo nº 97/04.4IDCbR.C1

Relator: Dr. Jorge Gonçalves

Abuso de confiança fiscalConstitucionalidade

SUMáRIO1 - A criminalização da não entrega dolosa daquilo

que se recebeu a título não translativo da propriedade, mesmo sem a prova da inversão do título de posse, não corresponde a qualquer medida discriminatória, desne-cessária ou excessiva susceptível de constituir a violação do art.º 18º, 2 da Constituição da República Portuguesa.

2 - Não são inconstitucionais os art.ºs 105º e 107º do RGIT face ao que se estatui nos art.ºs 13/1 e 18/2 da Constituição da República Portuguesa.

Acórdão de 26 de Maio de 2009

Processo nº 206/02.8TAACb.C1

Relator: Dr. Ribeiro Martins

Abuso de confiança fiscalConsumação

SUMáRIOO sentido materialmente constitucional que deve

ser dado ao tipo penal contido no artigo 105º do RGIT exige que se considerem elementos do tipo de ilícito: a existência (legal) de uma obrigação de entrega à adminis-tração tributária de uma prestação tributária; a existência de uma prestação tributária efectivamente deduzida ou cobrada (nos termos legais); a falta dolosa dessa entrega. O crime de abuso de confiança fiscal é um crime omissi-vo puro que se consuma no momento em que o agente não entrega a prestação tributária devida, haja ou não declaração tributária.

Acórdão de 21 de Outubro de 2009

Processo nº 12/08.6IDGRD.C1

Relator: Dr. Gomes de Sousa

Abuso de confiança fiscalPrestação tributáriaNão entrega

SUMáRIO 1. Só é criminalmente punível a não entrega de pres-

tação tributária de valor superior a € 7500,00. 2. Por prestação tributária entende-se cada prestação

tributária de per si e não a quantia total em dívida. 3. Da conjugação do nº 1 e nº 7 do artº 105 resulta

que o que está em causa é a não entrega de cada uma das prestações tributárias.

Acórdão de 7 de Outubro de 2009

Processo nº 74/05.8IDCbR.C1

Relator: Dra. Alice Santos

Abuso de confiança fiscalPedido cível

SUMáRIO1. Com a alteração ao artº 105º do RGIT introdu-

zida pela lei 53-A/06, de 29/12 o legislador pretendeu efectuar uma separação entre os contribuintes que res-peitarem as suas obrigações declarativas e aqueles que não o fizeram. E, só em relação aos primeiros existem

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diferenças de regimes, na medida em que a al. b) do nº 4 agora vigente restringe a sua aplicação aos casos em que quando a prestação for comunicada à administração tributária através da correspondente declaração.

2. Com a definição de uma nova condição atinente à estrutura valorativa da acção, operou-se uma modifica-ção do tipo e não “apenas” a aposição de uma condição objectiva de punibilidade.

3. A alteração introduzida pela lei n° 53-A/2006, de 29 de Dezembro, no artº 105º do RGIT constitui verda-deira alteração do tipo de ilícito.

4. O artº 2º, nº 2, do CP estipula que a descriminali-zação determina apenas a cessação da execução da con-denação criminal e dos efeitos penais, e não também dos efeitos cíveis gerados por ilicitude que deixou de integrar o ordenamento penal.

5. Formado caso julgado relativamente ao pagamen-to, inexiste fundamento para privar o demandante do seu direito à acção executiva (artº 2º do CPC), compo-nente da garantia constitucional de acesso ao direito e aos tribunais (artº 20º da CRP).

Acórdão de 5 de Dezembro de 2007

Processo nº 2464/03.1 TAlRA

Relator: Dr. Fernando Ventura

Abuso de confiança fiscalAplicação da lei no tempoInconstitucionalidade

SUMáRIOI - Perante duas configurações do mesmo tipo legal,

que encerram uma questão de aplicação da lei no tempo, sendo a vigente a menos exigente em termos de integração, o regime aplicável é o vigente no momento da infracção.

II - O actual regime do crime de abuso de confian-ça fiscal prescinde de qualquer referência ao elemento subjectivo da intenção de obtenção de vantagem patri-monial indevida, ou de apropriação, e reduz o núcleo da infracção ao denominador comum da não entrega.

III - A norma constante dos artigos 24º do RJIFNA e 105º do RGIT não violam o princípio de que ninguém pode ser privado da sua liberdade pela única razão de não poder cumprir uma obrigação contratual, implica-do pelo direito à liberdade e segurança consagrado no artigo 27º, nº 1, da Constituição, em consonância com o

previsto no artigo 1º do Protocolo nº 4 adicional à Con-venção Europeia dos Direitos do Homem.

IV - Os artigos 11º, nº 7, do RGIFNA e 14º, nº 1, do RGIT suscitam dúvidas quanto à sua constitucionalida-de, uma vez que a obrigatoriedade do condicionamento da execução da suspensão, sem que em tal tarefa exista a mínima intervenção pelo juiz no sentido de adequação da condição à culpa ou às circunstâncias do caso con-creto representa uma violação do princípio da propor-cionalidade.

Acórdão de 19 de Março de 2003

Processo nº 251/03

Relator: Dr. Santos Cabral

TRIBUNAL DA RELAçÃO DE ÉVORA

Abuso de confiança fiscalQualificaçãoCrime continuadoMultaComparticipação

SUMáRIO 1. No actual quadro legal, não pode ser considera-

do o valor global de todas as prestações para o efeito de qualificar o crime de abuso de confiança, mas tão-somente o valor que devia constar de cada declaração a apresentar à administração tributária. O valor global das prestações não entregues apenas releva em sede de determinação da pena para aferir o grau de ilicitude.

2. A punição do crime continuado é encontrada, nos termos do art. 79.º do Código Penal, na moldura penal cor-respondente à conduta mais grave que integra a continua-ção (no caso a conduta relevante é a correspondente à não entrega da quantia de € 12.587,36), mas são tidas em con-sideração todas as condutas englobadas no crime de con-tinuado e não somente a conduta mais grave, para efeitos de determinação da medida da pena (cf. art.13.º do RGIT).

3. A determinação da medida da pena de multa de substituição é agora levada a cabo de forma autónoma, sendo este o sentido da remissão que o n.º 1, 2.ª parte, do art. 43.º do Código Penal faz para o art. 47.º. Assim, os dias de multa de substituição são determinados dentro

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da moldura dada pelo n.º 1 deste artigo – limite mínimo de 10 dias e máximo de 360 – de acordo com os crité-rios estabelecidos no n.º 1 do art. 71.º, correspondendo a cada dia uma quantia entre €5 e €500, fixada em função da situação económica financeira do condenado e dos seus encargos pessoais (cf. n.º 2 do art. 47.º do Código Penal.

4. A actuação dos gerentes em nome da sociedade configura caso análogo ao de «comparticipação» a que se refere o art. 402.º, n.º 2, al. a), do Código de Processo Penal e que por isso deve ser aplicável por força do art. 4.º do Código de Processo Penal.

Acórdão de 24 de Março de 2009

Processo nº 20/06.1IDSTR.E1

Relator: Dr. Gilberto Cunha

Crimes fiscaisCondição objectiva de punibilidade

SUMáRIO1 - A partir de 1 de Janeiro de 2007, a punibilida-

de criminal e, consequentemente, a responsabilidade penal do “devedor” tributário passou a depender não apenas da circunstância de terem decorrido mais do que os 90 dias referidos na al. a) do n.º 4 do art. 105.º do RGIT, mas ainda, apenas no caso de ter sido comuni-cada a prestação à administração tributária, também do facto de o “devedor”, apesar de notificado (interpelado, avisado, advertido ou intimado) pela Administração Tri-butária, não entregar a prestação e legais acréscimos no prazo de 30 dias, após a notificação para o fazer [al. b) do n.º4 do mesmo artigo].

2 - O legislador passou a entender que não deve ser criminalizada a conduta dos sujeitos passivos que, tendo cumprido as suas obrigações declarativas, regularizem a situação tributária em prazo a conceder. Adicionou uma nova condição à criminalização da conduta. Nos casos em que ocorre ocultação, ou seja, quando não houve declara-ção do montante devido, não se aplica esta nova condição.

3 - O n.º 4 do artigo 105° do RGIT estabelece agora uma condição objectiva de punibilidade, adicional ao de-curso do prazo de 90 dias sobre o termo do prazo legal para entrega da prestação tributária anteriormente exis-tente, relativamente àqueles contribuintes que cumprem a obrigação declarativa. Essa nova condição consiste na não regularização da situação tributária declarada mas não paga, no prazo de 30 dias depois da notificação efectua-da para o efeito. Trata-se de um pressuposto adicional de

punibilidade. Com esta alteração, o legislador visou dife-renciar as situações daqueles contribuintes que cumprem a obrigação declarativa e dos outros que nada fazem.

4 - A condição de punibilidade não é a notificação que deve ser feita para pagamento, mas sim a atitude que o contribuinte toma perante esse procedimento (de notificação) que agora se exige. Parece-nos ser excessiva-mente formalista colocar a tónica na notificação; o que releva é a regularização, no todo, da situação tributária em prazo expressamente concedido para o efeito.

5 - O regime emergente do art. 105.º do RGIT deve aplicar-se aos factos praticados no domínio da redacção anterior, uma vez que vem possibilitar aos arguidos uma última oportunidade de não serem punidos criminal-mente pelos factos praticados, cumpridas que se mos-trem as condições impostas na al. b).

Acórdão de 6 de Novembro de 2007

Processo nº 2210/07-1

Relator: Dr. Ribeiro Cardoso

Regime Geral das Infracções TributáriasCondição objectiva de punibilidade

SUMáRIOCom a entrada em vigor da redacção do art. 105º, nº

4, do RGIT, dada pela lei nº.53-A/2006, de 29.12, im-põe-se que se proceda à notificação a que alude a alínea b), para, após o decurso do prazo de 30 dias, se possa apreciar da existência da condição objectiva de punibi-lidade aí prevista.

Acórdão de 29 de Maio de 2007

Processo nº 1764/06-1

Relator: Dr. Carlos berguete Coelho

Abuso de confiança fiscalCrime continuadoAcusação manifestamente infundada

SUMáRIOI. O crime de abuso de confiança fiscal pode revestir

a forma de continuado.

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II. A divergência sobre a qualificação jurídico-penal dos factos nela descritos não constitui fundamento legal de rejeição da acusação.

Acórdão de 4 de Abril de 2002

Processo nº 43/02-1

Relator: Dr. Manuel Nabais

TRIBUNAL DA RELAçÃO DE GUIMARÃES

Abuso de confiança fiscal Apropriação ilícita

SUMáRIOI – O facto de os contribuintes remeterem aos ser-

viços da administração do IVA as declarações previstas na lei não demonstra que eles receberam as correspon-dentes quantias.

II – As declarações periódicas enviadas nos termos do art.º 24.º do IVA servem a função de auto liquidação do imposto e, como consta do n.º 1, al. c), do referido artigo, referem-se «às operações efectuadas no exercício da (...) actividade no decurso do mês precedente, com a indicação do imposto devido ou do crédito existente (...)», mas tais declarações não valem para além do seu conteúdo e do destino que a lei lhes reserva: lato senso, qual é o imposto devido.

III – É claro que quando a operação sujeita à tribu-tação é a última da cadeia entre a produção e o consumo – caso das lojas que vendem a retalho -, à entrega do produto corresponde, por regra, em simultâneo, o pa-gamento do preço e o documento que titula a operação tem a dupla função de factura e recibo.

IV – Mas à saída da empresa produtora ou do co-merciante “grossista”, o negócio é por regra realizado com o pagamento a prazo, de 8, 30, 60 e 90 dias, donde, como é sabido, a declaração periódica para efeitos de IVA não corresponde necessariamente à cobrança efec-tiva dos montantes que integram a prestação de IVA, pelo comprador.

V – É necessário, portanto, como passo prévio da apropriação do imposto, o recebimento do correspon-dente montante pelo sujeito passivo obrigado à sua en-trega ao Estado.

VI – Assim, a prova deste recebimento é indispen-sável, pelo menos de forma parcial, mas representativa, para daí se poder concluir que à não entrega do imposto corresponde a apropriação do mesmo.

VII – Dos preceitos respectivos e da configuração do imposto em causa resulta, inequivocamente, que a declaração que traduz as operações efectuadas e o mon-tante final liquidado (encontrado, e que serve simultane-amente de reconhecimento da obrigação de pagamento) não depende da efectiva cobrança do imposto aos clien-tes, pois, se assim fosse, seria pervertida totalmente a filosofia do imposto.

VIII – O exercício de uma actividade sujeita a IVA é aleatório nos seus resultados líquidos e, por isso, envol-ve vantagens e riscos, pelo que, imputar o imposto nas transacções com os clientes e não o receber é um risco do próprio operador tributário, que apenas tem a válvula de escape prevista no artº 71º do CIVA para reposição da verdade tributária.

IX – Aliás, em conformidade, em todos os diplomas legais que passaram a punir a falta de pagamento, total ou parcial, do imposto é expressamente consignado que se trata da “prestação tributária deduzida” e não da que tiver sido efectivamente recebida».

X – A tese acolhida nestes autos na 1ª instância, e agora confirmada no acórdão que fez vencimento, não tem qualquer sentido e reduz a estilhas todo o sistema, em especial, o preceito do citado artº 71º do CIVA.

XI – Além disso, tal tese produz um verdadeiro ca-taclismo ao nível probatório, impondo ao Ministério Pú-blico uma prova impossível ou diabólica.

XII – No caso do IVA, o método de cobrança é o es-tabelecido na lei e a sua liquidação cabe a determinados contribuintes, que deverão entregar os montantes res-pectivos nas condições já expostas, independentemente de fazerem vendas a dinheiro ou a crédito, não cabendo ao Estado controlar ou impor qualquer modalidade de venda.

XIII – No caso das vendas a crédito, o vendedor as-sume os consequentes riscos para a sua actividade, mas o Estado garante-lhe, através dos mecanismos do citado artº 71º, nºs 8 e 9, que, pelo menos, quanto aos créditos incobrados, o contribuinte não perderá o valor corres-pondente ao IVA que já contabilizou e entregou.

XIV – Os valores do IVA cobrados nas vendas a dinheiro e os que são facturados nas vendas a crédito, re-cebidas ou não, entram no giro contabilístico do comer-ciante ou do empresário e, materialmente, confundem-se com os demais bens que constituem o activo, neste incluídas as disponibilidades de caixa.

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XV – Se as vendas foram feitas a dinheiro, a parte correspondente ao IVA entrou em caixa e deverá ser en-tregue a quem pertence; se houve vendas a credito, isso é da conta e risco do contribuinte, que mais não tem que fazer, também, do que entregar ao Estado a sua parte, sendo que, como já por mais uma vez se disse, este lhe garante a devolução, no caso de o contribuinte não vier a receber o seu crédito.

Acórdão de 9 de Junho de 2005

Processo nº 203/04-1

Relator: Dr. Ricardo Silva

Abuso de confiança fiscalDescriminalizaçãoOrçamento do Estado

SUMáRIOI - De acordo com o disposto no artigo 113º da lei

n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro, que aprovou o Or-çamento de Estado para 2009, foi alterada a redacção do n.º 1 do artigo 105º do Regime Geral das Infracções Tri-butárias (RGIT), aprovado pela lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, mediante a introdução de um limite ao valor da prestação tributária ali considerada, passando-se a exigir que ela seja de “valor superior a € 7500”.

II - Por força daquele limite, independentemente da sua qualificação dogmática - como elemento conforma-dor da ilicitude penal ou como condição objectiva de punibilidade -, é inquestionável que deixaram de ser pu-nidas as condutas em que o valor da prestação tributária - o de cada declaração a apresentar à administração tri-butária, de acordo com o n° 7 do referido art. 105° - não excede € 7500.

III - Tendo sido proferida sentença, mas antes do respectivo trânsito, encontrando-se o processo pendente na Relação no momento da entrada em vigor do novo diploma legal, entende-se que a apreciação de todas as questões novas que resultam da mudança da lei penal no tempo deverá ser efectuada na primeira instância, por forma a não privar o arguido e o Ministério Público de um grau de recurso.

Acórdão de 20 de Abril de 2009

Processo nº 214/03.1IDbRG.G1

Relator: Dr. Cruz bucho

Abuso de confiança fiscalMedida da pena

SUMáRIOI – O Mº Pº recorrente defende um enquadramento

da conduta aos arguidos no nº 5 do artº 105° do RGIT, e não no seu nº 1, tal como foi entendido na sentença recorrida, uma vez que o valor que está em causa nos autos é superior a 50.000 Euros, pedindo, em substitui-ção da pena de multa decidida pela sentença recorrida, a aplicação de uma pena de prisão de 1 ano e seis meses, ainda que suspensa na sua execução, condicionada ao pagamento pelo arguido da prestação tributária em dívi-da e acréscimos legais, nos termos do artº 14° do RGIT.

II – E assiste-lhe toda a razão, pois que, tendo-se apurado, para além do mais, que no período referente a Junho de 2005, os arguidos se apoderaram da quantia de €133.344,04, de IVA, que fizeram sua, não a entre-gando nos cofres do Estado, como estavam obrigados, é evidente que tal factualidade não é subsumível ao n° 1 do citado preceito legal, mas antes ao n° 5, como bem observa recorrente.

III – Na verdade, para efeitos de enquadramento ju-rídico, é irrelevante o facto de o arguido haver entregue, entretanto, nos cofres do Estado a quantia € 98 373, 24 para liquidação do IVA referente ao mês de Junho de 2005, tendo sido imputado no capital respectivo a quan-tia de € 71 396, 14.

IV – Tal factualidade releva, sem dúvida, mas apenas em sede de medida da pena, não já para efeitos do en-quadramento jurídico.

V - Assim, em face da ilicitude dos factos que é ele-vada, do dolo, que é directo, das necessidades de preven-ção geral neste tipo de criminalidade que, infelizmente se vêm acentuando preocupantemente, o lapso de tempo já decorrido desde a prática dos factos, de ser o arguido primário, e da entrega ao Estado de uma parte significa-tiva dos valores apropriados, sem esquecer, nos termos do artº 13º do RGlT, o prejuízo causado, entendemos justa, adequada e proporcional a pena de 18 meses de prisão.

VI – Atendendo, no entanto, às circunstâncias em que decorreu o crime e os motivos que o determinaram, aliado ao facto de o arguido não possuir antecedentes criminais e já haver entregue parte dos valores em causa, cremos que a ameaça da pena é suficiente para o afas-tar, de futuro, de comportamentos delituosos, pelo que se suspende a sua execução da pena por 18 meses (cfr. artº 50°, n° 5 do C. Penal) com a condição de pagar ao

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Estado o montante global dos impostos em dívida e de-mais acréscimos legais, disso fazendo prova nos autos, no mesmo prazo.

Acórdão de 23 de Junho de 2008

Processo nº 1193/08-1

Relator: Dr. Tomé branco

Abuso de confiança fiscalPluralidade de infracções

SUMáRIOI – Coloca-se o problema de se saber se, deixando

de entregar as prestações relativas a dois tipos diferentes de impostos, o IVA, como imposto indirecto e o IRC, como imposto directo, em períodos temporais diferen-tes, o arguido cometeu um crime continuado ou vários crimes fiscais.

II – Dispõe o artigo 30º do Código Penal que «o número de crimes determina-se pelo número de tipos de crime efectivamente cometidos, ou pelo número de vezes que o mesmo tipo de crime foi cometido pela con-duta do agente”.

III – No caso, sendo um só o tipo legal de crime em equação – abuso de confiança fiscal p. e p. no artigo 24 nº 1 e nº 6 do Dec. lei nº 20-A/90 de 15/01 – o número de crimes eventualmente cometidos pelo recorrente há-de forçosamente ser aferido em função da critério so-brante daquele artigo 30º, ou seja, pelo número de vezes que o mesmo tipo de crime foi preenchido pela conduta do agente.

IV – Conforme diz Alfredo José de Sousa (Direito Penal Fiscal - Uma perspectiva – Textos Doutrinários, VoI. II, pág. 168) «entre o obrigado tributário e a Fa-zenda Nacional estabelece-se uma relação de confiança fundada na lei, cuja violação por aquele se torna passível de juízo de censura ético-jurídica. Para além disso, ao lado dos deveres gerais do contribuinte ou de terceiros a ele ligados de prestar informações à Administração Fiscal sobre a situação tributária, há deveres específicos de verdade, de boa fé, de confiança, de obediência a or-dens legais dos seus agentes que devem ser observados aquando ou posteriormente ao concreto cumprimento daqueles deveres gerais.» E, mais adiante “todos esses deveres convergem para a revelação da real capacidade contributiva de cada um e de todos os cidadãos obriga-dos a pagar impostos, tendo em vista a realização dos princípios da igualdade e justiça tributárias. Daí que os

bens jurídicos a tutelar nos crimes fiscais sejam similares aos tutelados em crimes idênticos previstos no Código Penal, integrando um bem jurídico mais amplo: a con-fiança da Administração Fiscal na verdadeira capacidade contributiva dos contribuintes.”

V – No entanto, considerando-se que a pluralidade de incumprimento de impostos não se confunde neces-sariamente com pluralidade de violação de bem ou bens jurídicos, pode haver incumprimento simultâneo de mais do que um imposto e ser um só o bem jurídico violado.

VI - Assim, sendo: um só o bem jurídico atingido, o que resta a averiguar é se o crime foi preenchido uma só vez pela conduta da arguida, como decidido, ou se a con-duta desenhada pelos factos permite concluir que foram duas (ou mais) as vezes em que esse preenchimento se verificou, tal como pretende o Mº Pº recorrente.

VII – Ora, os factos dados como provados permi-tem afirmar a existência de resoluções distintas em re-lação ao não pagamento ou retenção ilegal de cada um dos impostos em falta (IRS e IVA, respectivamente), pois que, por um lado, não são coincidentes os perío-dos temporais das respectivas prestações em falta, já que enquanto a não entrega do IVA teve início em Julho de 1999, a retenção e não entrega ao Estado das impor-tâncias relativas ao IRS descontadas nos salários dos trabalhadores teve início em Fevereiro de 2000, e, por outro lado, meses houve em que entregou ao Estado as quantias retidas nos salários dos trabalhadores ao nível de IRS, e não entregou o IVA retido.

VIII – Quer isto dizer que houve uma renovação da actividade criminosa, pois que há linhas de comporta-mento que evidenciam condutas diversas e que integram a prática de crimes distintos, um relativo ao IVA e outro relativo ao IRS, isto é, distintos estados de espírito em relação a cada um deles, enfim distintas resoluções.

IX - Ora, sempre que possa verificar-se uma plura-lidade - de resoluções no sentido de determinações de vontade, de realizações do projecto criminoso - o juízo de censura será plúrimo, sendo que «para afirmar uma unidade resolutiva é necessária uma conexão temporal que, em regra e de harmonia com os dados da experiên-cia psicológica, leva a aceitar que o agente executou toda a sua actividade sem ter de renovar o respectivo proces-so de motivação», (Eduardo Correia, Direito Criminal II, pág. 202).

X – Visto o raciocínio acima efectuado, deverá en-tender-se assim que os factos provados integram, em concurso real, a prática de quatro crimes relativos ao IVA e quatro crimes relativos ao IRS, por tais serem os períodos de conexão temporal a considerar relativamen-te a cada um destes impostos.

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XI – Ora, dado que os factos imputados à arguida se mantêm os mesmos com alteração do número de crimes integrantes do concurso, tal implica que se ordene que, após a baixa do processo, deva ser reaberta a audiência para ser cumprido o disposto no art. 358, nºs 1 e 2 do C. P. P.

Acórdão de 25 de Fevereiro de 2008

Processo nº 2235/06-1

Relator: Dra. Estelita Mendonça

Abuso de confiança fiscalIndemnização ao EstadoNatureza jurídica

SUMáRIOI – No crime de abuso de confiança fiscal, a conde-

nação no pedido cível deve fazer-se com base nas regras do direito civil e não da lei Geral Tributária (cf. artº 129º do Código Penal), pois os “danos” derivam da prática de um crime.

II – Com efeito, quando o artº 129º do Código Penal remete a regulação da indemnização de perdas e danos emergentes do crime para a lei civil, esta só pode ser o artigo 483º do Código Civil, que apenas contempla a res-ponsabilidade por factos ilícitos, mas com total exclusão da responsabilidade contratual e da responsabilidade por factos lícitos, nos casos contemplados na lei.

III – Assim, a responsabilidade do arguido gerente é solidária com a da sociedade em nome da qual agiu.

IV – À condenação no pedido cível não obsta o fac-to de a sociedade ter efectuado um acordo de pagamen-to com o demandante e ter já pago 53 prestações das 150 que lhe foram concedidas.

Acórdão de 28 de Outubro de 2007

Processo nº 214/07-2

Relator: Dr. Filipe Melo

Abuso de confiança fiscalLei mais favorávelCondições de punibilidade

SUMáRIOI – A al. b) do n.º 4 do artº 105.° do RGIT, na redac-

ção operada pela lei nº 53-A/2006, de 29 de Dezembro,

não veio acrescentar nenhum elemento novo ao tipo legal, tendo-se limitado a estabelecer uma condição ob-jectiva de punibilidade, a saber, a não entrega das presta-ções comunicadas à administração tributária, acrescidas dos juros respectivos e do valor da coima aplicável, no prazo de 30 dias após notificação para o efeito.

II – Se nos trinta dias subsequentes à comunicação houver lugar ao pagamento daquelas quantias, a conduta é “despenalizada”, melhor dizendo, não é punida, assim se aplicando retroactivamente a lei nova mais favorável.

III – O objectivo do aditamento foi, claramente, o de possibilitar a despenalização de condutas após a re-gularização fiscal, assim contribuindo para o combate à evasão fiscal, uma das principais medidas de política fis-cal consagradas no OE2007, reforçando o cumprimen-to voluntário das obrigações tributárias e aumentando a receita global.

IV – Aliás, do Relatório do Orçamento do Estado para 2007 (relatório este que, por força do disposto no n.º 2 do artigo 31º da lei n.º 91/2001, de 20 de Agos-to - lei de enquadramento orçamental - acompanha necessariamente a proposta de lei de Orçamento de Estado), resulta expressamente que (…) «não deve ser criminalizada a conduta dos sujeitos passivos que, tendo cumprido as suas obrigações declarativas, regularizem a situação tributária em prazo a conceder, evitando-se as-sim a proliferação de inquéritos por crime de abuso de confiança fiscal que, actualmente, acabam por ser arqui-vados por decisão do Ministério Público na sequência do pagamento do imposto».

V – A tese do imediato arquivamento faz tábua rasa da circunstância de aquela notificação dever efectuar-se na vigência da lei nova (ela não foi efectuada na vigência da lei anterior pela simples razão de a lei, na ocasião, não a prever!), subverte por completo o anunciado propósito legislativo de recuperação do montante da dívida fiscal e, sendo equivalente nos seus efeitos a uma amnistia, não desejada pelo legislador (conforme foi já apontado por Saldanha Sanches, apud Público de 1 de Fevereiro de 2007), é geradora de uma desigualdade gritante entre quem pagou e quem não pagou e, por isso, incompreen-sível para a comunidade.

VI – Tem também que se consignar que, conforme resulta claramente do teor literal da citada nova alínea b) (“a prestação comunicada à administração fiscal”), a nova condição objectiva de punibilidade não abarca to-dos os crimes de abuso de confiança fiscal (e de abuso de confiança à Segurança Social), mas apenas os casos em que a existência da dívida fiscal é participada pelo sujeito

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passivo, através da correspondente declaração, que não foi acompanhada do respectivo meio de pagamento.

VII – Nos casos em que ocorre ocultação, ou seja, quando não houve declaração do montante devido, não se aplica esta nova condição de punibilidade – cfr. ex-pressamente neste sentido os Acs da Rel. de Guimarães de 23-3-2007, proc.º n.º 1917/06-1, rel. Cruz bucho e da Rel. de lisboa de 26-4-2007, proc.º n.º 3256/07, rel. Fernando Correia Estrela, este último in www. dgsi.pt/.

Acórdão de 17 de Setembro de 2007

Processo nº 1118/07-2

Relator: Dr. Cruz bucho

Abuso de confiança fiscalCondição

SUMáRIOI – Os recorrentes impugnam a notificação que lhes

foi feita ao abrigo da nova redacção do artigo 105º, n° 4 do RGlT, na medida em que a mesma não determina os valores a pagar.

II – No entanto, tão compete ao tribunal penal fixá-los, embora não possam ser excedidos os parâme-tros fixados na acusação, pois que o tribunal não tem ao seu dispor todos os elementos que permitam avaliar com segurança a plena configuração da situação fiscal do contribuinte, podendo, inclusivamente, os arguidos, no momento da notificação, terem créditos compensáveis que diminuam o valor global a pagar.

III – O que a notificação significa é que os arguidos têm o prazo de 30 dias para junto da Administração Fis-cal regularizarem o pagamento a que alude a norma do art. 105 n° 4 al. b) do RGIT, comprovando-o, depois, nos autos, se estes já estiverem em fase judicial.

IV – Isto nada tem a ver com a entidade compe-tente para determinar a notificação, que será a que, em cada caso, superintender no processo (autoridade fiscal, MºPº, juiz de instrução ou juiz do julgamento), pois que outro entendimento seria transformar o processo penal num braço do direito fiscal, o que não corresponde, ma-nifestamente, à sua vocação e natureza.

V – Quanto à falta de identificação da coima, esta é a aplicável pela falta da entrega da prestação tributária no prazo legal, e que se encontra prevista no art. 114º do RGIT, e, também aqui, será junto da Administração Fiscal que os arguidos terão de regularizar a situação.

Acórdão de 18 de Junho de 2007

Processo nº 983/07-1

Relator: Dr. Fernando Monterroso

Abuso de confiançaCondição

SUMáRIOI – A lei nº 53-A/2006 de 29 de Dezembro, que

aprovou o Orçamento de Estado para 2007, consagrou importantes alterações ao regime da infracções tribu-tárias, nomeadamente no que concerne aos crimes de abuso de confiança fiscal (e de abuso de confiança à Segurança Social), pois que, com o disposto no artigo 95° da citada lei nº 53-A/2006 foi alterada a redacção do nº 4 do artigo 105° do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT) aprovado pela lei nº 15/2001, de 5 de Junho, o qual passou a consagrar na sua alínea b) que os factos só são puníveis se “a prestação comunicada à administração tributária através da correspondente de-claração não for paga, acrescida dos juros respectivos e do valor da coima aplicável, no prazo de 30 dias após a notificação para o efeito.”

II – A citada norma reveste, inequivocamente, a natureza de condição objectiva de punibilidade, recor-dando-se aqui que tais condições são elementos que a lei requer para a punibilidade da conduta, mas que são absolutamente independentes da ilicitude e da culpabili-dade da própria conduta.

III - Sobre este conceito, entre outros, as obras ge-rais de Eduardo Correia, Direito Criminal, I, Coimbra, 1963, pág. 370-371; Teresa beleza, Direito Penal, 2º vol. lisboa, 1983, págs.367-368 e 372; Germano Marques da Silva, Direito Penal Português, II, lisboa, 1998, págs. 38-39, e, bem assim os estudos de Frederico lsasca, Da Participação em Rixa, lisboa, 1985, págs. 113-117, Ma-nuela Valadão e Silveira, Sobre o crime de incitamento ou ajuda ao suicídio, lisboa, 1990, págs. 115-122; Te-resa Quintela de brito, Crime praticado em estado de inimputabilidade auto-provocada, por via de consumo de álcool ou drogas, lisboa, 1991, págs. 110-118; Pedro Caeiro, sobre a natureza dos crimes falenciais, Coimbra, 1996, págs. 297-300; e Frederico l. Costa Pinto, llícito e punibilidade no crime de participação em rixa, in liber Discipulorum para Jorge de Figueiredo Dias, Coimbra, 2003, págs. 869-900.

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IV – É claramente este o sentido para que apontam, convergentemente, os elementos literal [“Os factos des-critos nos números anteriores só são puníveis se”], siste-mático [a nova norma integra a alínea b) do nº 4 sendo que a alínea a) do mesmo número tem vindo a ser consi-derada, de forma unânime, como condição objectiva de punibilidade] – cfr. Jorge lopes de Sousa e Manuel Simas Santos, Regime Geral das infracções Tributárias, lisboa, 2001, pág. 587-588; Tolda Pinto e Reis bravo, Regime Geral das Infracções Tributárias, Coimbra, 2002, pág. 333, Paulo José Rodrigues Antunes, Infracções Fiscais e seu Processo, Coimbra, 2002, pág. 129; Costa Andrade “O abuso de confiança fiscal e a insustentável leveza de um acórdão do Tribunal Constitucional”, cit., págs. 312 e 322; Nuno lumbrales, “O abuso de confiança fiscal no Regime Geral das Infracções Tributárias”, Fiscalidade, nº 13/14 -2003, pág. 93, Susana Aires de Sousa, Os Cri-mes Fiscais, Coimbra, 2006, pág. 136-138.

V – Não há, a este propósito, vozes dissonantes na doutrina portuguesa, sendo que a designação de “condi-ção da instauração” imputada a Alfredo lopes de Sou-sa, Infracções Fiscais Não aduaneiras, Coimbra, 33 ed., págs. 108-109 e, depois, aceite por Augusto Silva Dias (Crimes e Contra-ordenações Fiscais, in Direito Penal Económico e Europeu, vol. II, Coimbra, 1999, pág. 463), se reportava ao nº 6 do artigo 24° do RGIFNA, cuja re-dacção era então substancialmente diferente: “Para ins-tauração do procedimento criminal (…) é necessário que tenham decorrido 90 dias sobre o termo do prazo legal da entrega da prestação”.

VI – Conforme se refere a págs. 44 do Relatório do Orçamento do Estado para 2007 (disponível em www.govemo.pt),: “Neste sentido, não deve ser criminalizada a conduta dos sujeitos passivos que, tendo cumprido as suas obrigações declarativas, regularizem a situação tributária em prazo a conceder, evitando-se assim a proliferação de inquéritos por crime de abuso de confiança fiscal que, actu-almente, acabam por ser arquivados por decisão do Minis-tério Público na sequência do pagamento do imposto”, o objectivo foi, claramente, o de possibilitar a despenalização de condutas após a regularização fiscal, assim contribuindo para o combate à evasão fiscal, uma das principais medi-das de política fiscal consagradas no OE2007, reforçando o cumprimento voluntário das obrigações tributárias e au-mentando a receita global (cfr. neste sentido o Relatório do Orçamento do Estado para 1997, pág. 26).

VII – Uma vez mais, à semelhança do que aconte-cera com o nº 4 do artigo 105°, agora integrando a alí-nea a), são razões de política criminal que subjazem à

formulação do preceito em análise: a entrega ainda que fora de prazo põe fim ao prejuízo patrimonial do Esta-do atenuando ou eliminando as exigências de prevenção; constituindo um incentivo ao pagamento das prestações em falta, é um instrumento de combate à evasão fiscal e, simultaneamente, aumenta a receita global e permite evitar os custos que o procedimento criminal acarreta para a administração fiscal (cfr. Susana Aires de Sousa, Os Crimes Fiscais, cit., pág. 136; sobre a relevância no âmbito do direito penal tributário da regularização da situação tributária pelo contribuinte, cfr. págs. 307-314, e Mário Monte, “Da reparação penal como consequência jurídica autónoma do crime”, in liber Discipulorum cit., págs. 150-154).

VIII – À luz do disposto nos artigos 29°, nº 4, da Constituição da República e artigo 2° do Código Penal, o intérprete não pode deixar de extrair as devidas conse-quências desta norma relativamente aos processos pen-dentes, nomeadamente àqueles em que já tenha ocorrido condenação ainda não transitada em julgado.

IX – A este respeito, H.H. Jescheck é peremptório ao afirmar que as condições objectivas de punibilidade comungam de todas as garantias do Estado de Direito, estabelecidas para os elementos do tipo (Tratado de De-recho Penal, Parte general, 4ª ed., trad. Esp., Granada, 1993), sendo que entre nós parece também ser esta a solução defendida por Teresa beleza, quando assinala que quanto as estas condições funcionam as mesmas exigências de garantia da lei penal em termos de inter-pretação e de aplicação (Direito Penal, 2° vol., lisboa, 1983, pág. 367-368 e 372).

X – Entre estas garantias do Estado de Direito, des-taca-se a retroactividade da lei penal mais favorável, pelo que deve ser efectuada a notificação em causa, e só de-pois de constatada a ausência de pagamento no prazo fi-xado (30 dias), o processo deve prosseguir, assim como, se nos mesmos trinta dias subsequentes à comunicação houver lugar ao pagamento daquelas quantias, a conduta é “despenalizada”, melhor dizendo, não é punida, assim se aplicando retroactivamente a lei nova mais favorável.

XI – Não se perfilha, pois, o entendimento segun-do o qual o processo deve ser imediatamente arquivado por nele não se ter efectuado a notificação em causa, na medida em que o facto punível segundo a lei vigente no momento da sua prática não foi eliminado do número de infracções pela lei nova (artigo 2°, nº 2, do Código Penal), pois que a citada lei nº 53-A/2006 não provo-cou qualquer alteração ao nível da tipicidade, do ilícito

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e da culpa, limitando-se a criar uma nova condição de punibilidade.

XII – A tese do imediato arquivamento faz tábua rasa da circunstância de aquela notificação dever efectuar-se na vigência da lei nova (ela não foi efectuada na vigência da lei anterior pela simples razão de a lei, na ocasião, não a prever!), subverte por completo o anunciado propósito legislativo, de recuperação do montante da dívida fiscal e, sendo equivalente nos seus efeitos a uma amnistia, não desejada pelo legislador, geradora de uma desigualdade gritante entre quem pagou e quem não pagou e, por isso, incompreensível para a comunidade.

XIII – Esta nova condição objectiva de punibilida-de não abarca, no entanto, todos os crimes de abuso de confiança fiscal (e de abuso de confiança à Segurança Social), pois que, na verdade, só se aplica aos casos em que a existência da dívida fiscal é participada pelo su-jeito passivo, através da correspondente declaração, que não foi acompanhada do respectivo meio de pagamento, estando, portanto, o seu âmbito de aplicação, restringi-do aos casos de atraso na entrega do valor declarado, pois que, neste caso, ocorrendo a regularização da dívida fiscal e demais alcavalas no prazo fixado, a lei passa a considerar que existe apenas uma contra-ordenação para situações que antes eram consideradas crime de abuso de confiança fiscal.

Acórdão de 26 de Março de 2007

Processo nº 1917/06-1

Relator: Dr. Cruz bucho

Abuso de confiança fiscalDeveres que podem condicionar a suspensão da execução

SUMáRIOI – Num crime de abuso de confiança fiscal, a res-

ponsabilidade do arguido deve considerar-se limitada ao valor dos impostos dívida ao Estado atinentes ao perío-do em que efectivamente exerceu a gerência da empresa.

II – Não pode, como é óbvio, por falta de funda-mento legal, estender-se a sua responsabilidade indem-nizatória aos períodos de gerência dos demais arguidos, por forma a obrigar o recorrente a pagar a totalidade do imposto em dívida.

III – Assim, condição a que ficou sujeita a suspen-são da execução da pena restringe-se ao pagamento ao

Estado da quantia de imposto ainda em dívida, referente ao respectivo período de gerência e demais acréscimos legais ainda em dívida.

Acórdão de 11 de Dezembro de 2006

Processo nº 2123/06-1

Relator: Dr. Tomé branco

Abuso de confiança fiscalCrime continuado

SUMáRIOI – O IVA contabilizado é devido independente-

mente de o preço dos bens vendidos ou dos serviços prestados ser ou não recebido ou de se pedir qualquer compensação, pois dos preceitos respectivos do Código do IVA (cf., em especial os artºs 16º a 40º) e da confi-guração do imposto em causa, resulta inequivocamente que a declaração das operações efectuadas e o montante final liquidado (encontrado, e que serve simultaneamen-te de reconhecimento da obrigação de pagamento) não depende da efectiva cobrança do imposto aos clientes.

II – Com efeito, o exercício de uma actividade sujei-ta a IVA é aleatória nos seus resultados líquidos e, por isso, envolve vantagens e riscos e imputar o imposto nas transacções com os clientes e não o receber é um risco do próprio operador tributário, que apenas tem a válvula de escape prevista no artº 71º do CIVA para reposição da verdade tributária.

III – Acresce que, em conformidade, em todos os di-plomas legais que passaram a punir a falta de pagamento, total ou parcial, do imposto é expressamente consignado que se trata da “prestação tributária deduzida” e não da que tiver sido efectivamente recebida.

IV – Aliás, admitir o contrário, era transmitir ao Esta-do os riscos próprios da actividade empresarial, ou seja, era fazer com que o Estado suportasse também as consequên-cias das vendas a crédito não cobradas, o que é um absurdo.

V – No caso das vendas a crédito, o vendedor assu-me os consequentes riscos para a sua actividade, mas o Estado garante-lhe, através dos mecanismos do citado artº 71º, nºs 8 e 9, que, pelo menos, quanto aos créditos incobrados, o contribuinte não perderá o valor corres-pondente ao IVA que já contabilizou e entregou.

VI – Os valores do IVA cobrados nas vendas a di-nheiro e os que são facturados nas vendas a crédito, recebidas ou não, entram no giro contabilístico do co-

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merciante ou do empresário e, materialmente, confun-dem-se com os demais bens que constituem o activo, neste incluídas as disponibilidades de caixa.

VII – Se as vendas foram feitas a dinheiro, a parte correspondente ao IVA entrou em caixa e deverá ser en-tregue a quem pertence. Se houve vendas a crédito, isso é da conta e risco do contribuinte, que mais não tem que fazer, também, do que entregar ao Estado a sua parte, sendo que, como já por mais uma vez se disse, este lhe garante a devolução, no caso de o contribuinte não vier a receber o seu crédito.

VIII – Sendo o crime continuado constituído por várias infracções parcelares, a sentença que incide sobre parte delas não produz efeito de caso julgado sobre as demais, não obstando ao procedimento criminal pelas que foram descobertas depois (ou processadas depois ou em paralelo; de facto não se compreendem certos procedimentos da investigação e instrução destes casos), nem acarretando, por isso, violação do princípio ne bis idem.

IX – Ao apreciar-se conduta delituosa integrada numa continuação criminosa da qual, parte, já foi julga-da, também por crime continuado, por factos que com os dos autos, devem ser tidos por uma única continua-ção criminosa, deverá apurar-se a gravidade dessa con-duta em relação à já apreciada.

X – Nestes casos há que escolher uma só pena, de acordo com o disposto no artº 79º do Código Penal, tendo em atenção toda a conduta continuada e perdendo autonomia a decisão aplicada anteriormente e se se con-cluir que a conduta agora apreciada é de igual ou menor gravidade deve manter-se a pena aplicada anteriormente e, se for de maior gravidade, haverá que fixar-se uma nova pena por toda a conduta continuada.

Acórdão de 20 de Novembro de 2006

Processo nº 1796/06-2

Relator: Dr. Anselmo lopes

Abuso de confiança fiscalCrime continuado

SUMáRIOI – A realização plúrima do mesmo tipo de crime

pode constituir: a) um só crime, se ao longo de toda a realização tiver persistido o dolo ou a resolução inicial; b) um só crime na forma continuada, se toda a actuação

não obedecer ao mesmo dolo, mas este estiver interliga-do por factores externos que arrastam o agente para a reiteração das condutas; c) um concurso de infracções, se não se verificar qualquer dos casos anteriores - por todos, v. ac. S.T.J. de 25-6-86 in bMJ 358/267.

II – Nos crimes tributários, a omissão das entregas pode ser fruto da execução de um plano prévio, gizado antes da primeira falta, cujo dolo todas abrange – caso em que se estará perante a hipótese acima aludida em a); se, pelo contrário, antes de cada falta, foi tomada a resolução de não entregar a próxima prestação, então o comportamento do agente cairá numa das hipóteses das als. b) ou c).

III – No caso em apreço interessa acentuar que o «crime continuado» pressupõe sempre a existência de uma pluralidade de resoluções, decorrendo isso, inequi-vocamente, da norma do artº 32, nº 1, do Cod. Penal, de-vendo, no caso dos crimes tributários, considerar-se que haverá uma resolução criminosa para cada omissão de entrega e não uma resolução para cada período abrangi-do pela continuação.

IV – A punição menos grave desta forma de crime (art. 79 do Cod. Penal) decorre da circunstância da cul-pa se mostrar diminuída, por o agente ter repetidamente deparado com uma situação exterior igual às que ante-riormente o haviam solicitado para o comportamento criminoso.

V – Nos crimes tributários, é vulgar acontecer esta forma de crime. O agente, num dado momento, por difi-culdades ou outra razão, não entrega uma prestação que tinha retido. Aquando da próxima prestação, porque as dificuldades se mantêm e nenhuma reacção institucional houve à sua falta, toma nova decisão de não fazer as en-tregas. Nas seguintes, mantendo-se o quadro, repete-se o comportamento. A manutenção deste quadro exterior. que facilitou a repetição da actividade criminosa, toma cada vez menos censurável o comportamento do agente por não agir de acordo com o Direito.

VI – Mas todo este quadro “estável”’ se altera se houver uma qualquer reacção institucional.

VII – Na verdade, se os serviços tributários reclama-rem as entregas em falta, se o arguido for notificado para prestar declarações no processo crime, ou se for julgado pelos factos já praticados, isso são sinais de alerta que lhe são dados quanto ao desvalor da sua conduta, adequados a faze-lo interiorizar que o Direito não permite a prática dos factos, pelo que se ele persistir no seu comporta-mento, então, em vez duma diminuição de culpa, deverá, antes, ser considerado que houve um agravamento, pois

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que a interpelação ao arguido sobre o carácter ilícito da sua conduta, altera, inevitavelmente, o quadro de solici-tação externa em que ele se move, não podendo deixar de ter reflexos no juízo concreto de censura que é feito.

VIII – Poderá, eventualmente, acontecer que seja possível estabelecer uma relação de «crime continuado» entre todos os factos posteriores à interpelação, mas é desajustado considerar que actos tão relevantes como o julgamento, ou as prévias notificações que inevitavel-mente existiram no âmbito do processo crime, nenhuma relevância têm sobre o juízo de censura que merecem os factos praticados dai para a frente.

Acórdão de 17 de Junho de 2006

Processo nº 1011/05-1

Relator: Dr. Fernando Monterroso

Abuso de confiança fiscalConflito de deveresApropriação ilícitaInversão de título

SUMáRIOI – Foi dado como provado relativamente à difícil

situação económica da empresa arguida em crime de abuso de confiança fiscal que “ (…) vem atravessando dificuldades financeiras há vários anos, que se traduzem em resultados líquidos de exercício negativos e num pas-sivo acumulado que ronda um milhão de contos”; e bem assim que “ despenderam tais quantias no giro comercial e industrial da referida sociedade.”

II – Com isto temos que os arguidos agiram moti-vados pela vontade/ necessidade de manter a empresa em actividade e que não motivados por ganância ou para o seu enriquecimento pessoal directo, mediante a apro-priação das correspondentes quantias.

III – Estas circunstâncias, que são, certamente, aten-díveis, no plano da ponderação da culpa, de forma ate-nuativa, não são causa de exclusão da ilicitude.

IV – No entanto, permanece, efectivamente de pé a apropriação, a partir do momento em que os arguidos, tendo cobrado montantes que não lhes pertenciam, por lhes terem sido retidas dos ordenados dos seus empre-gados para pagamento do imposto de IRS deram um destino a tais quantias diferente da entrega delas ao seu proprietário, o Estado, aplicando-as em fins que eram do seu interesse próprio.

V – Deste ponto de vista é irrelevante que os argui-dos se tenham ou não integrado as quantias em causa directamente nos seus patrimónios pessoais – e dizemos directamente, porque, sendo a arguida sociedade comer-cial parte desses patrimónios, por essa via, não deixaram de o fazer indirectamente, pelo menos na medida em que com a aplicação desses dinheiros tenham querido, também, salvaguardar esse património.

VI – Certo é que, se em vez de investirem as quantias retidas e não entregues na empresa, as tivessem doado a uma instituição filantrópica, também as não teriam inte-grado no seu património e ninguém poria em causa que se teria, nesse caso, dado a inversão do título da posse das mesmas, pois que, efectivamente, a inversão do títu-lo dá-se não pela apropriação para si, das quantias, mas pela disposição das mesmas “animus domini”, ou seja pela apropriação que, no plano psicológico, precede ou acompanha a acção de passar a dispor das mesmas como se lhes pertencessem.

VII – Pois bem, o interesse dos arguidos em manter a empresa em laboração não constitui causa de justifica-ção do facto ilícito, porque não se verifica um conflito de deveres de, pelo menos, igual peso, entre os deveres da actividade empresarial e o de entregar ao Estado as quantias retidas a título de cobrança de um imposto.

Acórdão de 25 de Maio de 2005

Processo nº 1039/04-1

Relator: Dr. Ricardo Silva

Pena de multaPena de prisãoCrimeAbuso de confiança fiscal

SUMáRIOI – O crime em causa, de abuso de confiança fiscal

p. e p. pelo artigo 105.°. n.° 1 da lei n.° 15/2001 de 5 de Junho, é punível com pena de prisão até três anos ou multa até 360 dias.

II – Dispõe o art. 70 do Cod. Penal que nestes casos o tribunal deverá dar preferência à pena não privativa da liberdade sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, sendo que assim que, a escolha entre a pena de prisão e a alternativa ou de substituição depende unicamente de considerações

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de prevenção geral e especial” – Maia Gonçalves em anotação ao art. 70 do Cód. Penal.

III – Razões de prevenção geral positiva têm sido apontadas para que nos crimes fiscais se opte por penas privativas da liberdade, mesmo quando o arguido tem boa inserção social e não tem antecedentes criminais, já que a pena tem, sempre, o fim de servir para manter e re-forçar a confiança da comunidade na validade e na força de vigência das suas normas de tutela de bens jurídicos sendo, assim, no ordenamento jurídico-penal, o instru-mento, por excelência, destinado a revelar perante a co-munidade que a ordem jurídica é inquebrantável, apesar de todas as violações que tenham lugar — cf. Figueiredo Dias. Temas básicos da Doutrina Penal, pags. 74 e ss.

IV – Assim, a pena, em caso algum, deverá pôr em causa o limite inferior constituído pelas “exigências mí-nimas de defesa do ordenamento jurídico”, pelo que, se estes forem postos em causa pela pena de multa, não deverá ser feita a opção por esta.

V – São exigências desta natureza que relevam neste tipo de crimes, em que, não raras vezes, os seus autores durante largos meses ou anos reiteram comportamen-tos criminosos, lesando o fisco em dezenas ou centenas de milhares de euros, pois que o conhecimento público de que alguém com tal comportamento fora sancionado com uma simples pena pecuniária, afrontaria o senti-mento geral da nossa sociedade que vem reclamando um maior rigor nas relações do cidadão com a administração fiscal, e poria em causa a credibilidade de que ainda go-zam as normas jurídicas que tutelam criminalmente as infracções fiscais.

VI – Mas, o certo é que, se a lei continua a prever a aplicação de pena pecuniária, algumas situações haverá em que esta é adequada, mesmo ponderando as referidas exigências de prevenção geral positiva, como acontece no caso do recorrente, já que o seu comportamento se limita à não entrega do IVA de duas facturas datadas dos meses de Janeiro e Fevereiro de 2001, pois que embora o valor não seja despiciendo (está em causa IVA no valor global de 3.173.18), estamos longe de valores e compor-tamentos do conhecimento público que têm alarmado a sociedade portuguesa.

VII – Finalmente, se dirá que, as penas têm fins pró-prios, definidos nas normas do Cod. Penal, e o direito penal não tem a função instrumental de ser «braço lon-go» de outros ramos de direito, por isso que, na escolha da espécie de pena (prisão ou muita) não há que ponde-rar o interesse do Fisco em receber as quantias em dívi-da, o que mais facilmente ocorreria se ao arguido fosse

imposta uma pena de prisão com suspensão condiciona-da ao pagamento.

Acórdão de 16 de Janeiro de 2006

Processo nº 2223/05-1

Relator: Dr. Fernando Monterroso

TRIBUNAL DA RELAçÃO DE LISBOA

Abuso de confiança fiscalFraude fiscalImposto sobre o Valor Acrescentado

SUMáRIO1 – Se a não entrega ao Estado do montante res-

peitante ao IVA representou uma vantagem patrimonial para o arguido, deve entender-se que o mesmo praticou apenas um crime de abuso de confiança fiscal e não tam-bém um crime de fraude fiscal.

2 - O montante relativo ao IVA é devido ao Estado a partir do momento em que é emitida a factura relativa à operação que a ele está sujeita e liquidado o respectivo quantitativo.

3 - Assim, é indiferente o conhecimento se o contri-buinte foi, ou não, recebedor da retribuição respeitante a essa operação (incluindo, ou não, o IVA).

4 – Tendo em conta o nº 7 do artº 105º do RGIT, para enquadrar os factos no nº 1 ou no nº 5 da referida disposição legal, deve ter-se em conta o quantitativo que deveria constar em cada declaração trimestral não entre-gue e não o quantitativo global do IVA em falta.

5 - De igual forma (considerando o valor que deveria constar de cada declaração) se deve proceder por virtude do 113º da l. 64-A/08 de 31/12 (que aprovou o O.G.E. de 2009), o qual deu nova redacção ao artº 105º, nº 1, do RGIT, introduzindo o valor limite de € 7.500,00, abaixo do qual a conduta do agente não é criminalmente punível.

6 - Tal consideração, por aplicação do artº 2º, nº 1, do C.P., deve ser feita mesmo para os crimes praticados antes do RGIT.

Acórdão de 4 de Fevereiro de 2009

Processo nº 11036/2008-3

Relator: Dr. Nuno Garcia

jurisprudência[sumários]

66 REVISTA FISCAl Setembro/Outubro | 2010

Crime fiscalMeios de provaPresunções

SUMáRIOI – Em processo penal é admissível prova por pre-

sunções, contudo, o recurso a estas, tem sempre que ser conjugado com o princípio in dubio pro reo, cedendo as presunções perante a simples dúvida sobre a sua exacti-dão no caso concreto.

II – Embora para efeitos de tributação fiscal seja ad-mitido o recurso a métodos indiciários, em hipóteses em que o Estado só não tributa o rendimento real por fac-tos imputáveis ao próprio contribuinte, o agente desses mesmos factos não pode vir a ser condenado criminal-mente, apenas, com base na presunção em que se vem a traduzir a utilização daqueles métodos indiciários, pois, em processo penal, o silêncio e a falta de colaboração do arguido não afastam o ónus da acusação de provar todos os elementos constitutivos do crime.

Acórdão de 25 de Novembro de 2008

Processo nº 8904/2008-5

Relator: Dr. Vieira lamim

Abuso de confiança fiscalNotificaçãoRegime concretamente mais favorávelCompetênciaPrincípio da separação de poderes

SUMáRIO1. Cabendo ao tribunal o poder de decidir se os ar-

guidos reúnem as condições para beneficiar do regime mais favorável resultante do n.º 4 do artigo 105º do RGIT, na redacção que lhe foi dada pelo artigo 95º da lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, cabe-lhe forço-samente a competência para praticar os actos indispen-sáveis a essa decisão.

2. Entre esses actos figura a notificação prevista na alínea b), do n.º 4 do artigo 105º do RGIT.

3. O principio da separação de poderes constante dos artigos 2º, 111º e 203º CRP não se mostra viola-do com a notificação a que alude o art.º 105º do RGIT

quando ordenada e feita pelo tribunal em processo cri-me que se encontra a correr os seus termos.

Acórdão de 6 de Maio de 2008

Processo nº 1721/2008-5

Relator: Dr. Emídio Santos

Abuso de confiança fiscalNotificação do arguido Despacho de mero expedienteRecurso

SUMáRIOÉ irrecorrível, nos termos do art.º 400.º, n.º 1 /a) do

CPP, o despacho judicial mediante o qual foi ordenada a notificação expressamente prevista na al. b) do n.º 4 do art. 105.º do RGIT, na redacção introduzida pela lei n.º 53-A/2006, de 29-12, por ser um despacho de mero expediente uma vez que, para além de não envolver qual-quer interpretação da lei, não interfere com qualquer di-reito do seu destinatário.

Acórdão de 12 de Março de 2008

Processo nº 728/2008-3

Relator: Dr. Telo lucas

Condições de punibilidadeAbuso de confiança fiscalSucessão de leis no tempo

SUMáRIO1. As condições objectivas de punibilidade são aque-

les elementos situados fora da definição do crime, cuja presença constitui um pressuposto para que a acção an-tijurídica tenha consequências penais.

2. A nova redacção dada ao art.º 105º, n.º 4, do RGIT pela lei 53-A/2006, de 29.12, não opera a eliminação do número das infracções ou modificação dos respectivos elementos constitutivos, não se configurando qualquer descriminalização.

Acórdão de 27 de Setembro de 2007

Processo nº 7129/07-9

Relator: Dr. Guilherme Castanheira

67

jurisprudência[sumários]

REVISTA FISCAl Setembro/Outubro | 2010

Abuso de confiança fiscalDescriminalizaçãoNotificação

SUMáRIOO art. 95.º da lei nº 53-A/06, de 29/12 (Orçamento

do Estado para 2007), ao alterar o nº 4 do art. 105.º do RGIT, não introduziu qualquer elemento novo do qual resulte encurtamento do campo de incidência do crime de abuso de confiança fiscal, susceptível de configurar uma situação de descriminalização, limitando-se a consa-grar uma nova condição objectiva de punibilidade.

Acórdão de 18 de Setembro de 2007

Processo nº 5349/2007-5

Relator: Dr. Vieira lamim

Abuso de confiança fiscalCondições de punibilidade

SUMáRIO1- O n° 4 do artigo 105° do RGIT estabelece agora

uma condição objectiva de punibilidade, adicional ao de-curso do prazo de 90 dias sobre o termo do prazo legal para entrega da prestação tributária anteriormente exis-tente, relativamente àqueles contribuintes que cumprem a obrigação declarativa. Essa nova condição consiste na não regularização da situação tributária declarada mas não paga, no prazo de 30 dias depois da notificação efec-tuada para o efeito.

2 - Trata-se de um pressuposto adicional de punibili-dade. Com esta alteração, o legislador visou diferenciar as situações daqueles contribuintes que cumprem a obriga-ção declarativa e dos outros que nada fazem. Esta nova redacção do artigo 104.º, al. b), do RGIT estabelece um novo requisito de punibilidade, no sentido de que agora os factos não serão puníveis criminalmente se o agente regularizar a dívida tributária nos termos aí definidos. A não punição resultará de uma atitude positiva do agente que obsta a essa consequência penal, pagando a dívida.

3 - Face à entrada em vigor do novo regime, con-sagrando uma condição objectiva de punibilidade ma-nifestamente mais favorável ao arguido, deve ser-lhes conferida a possibilidade de obstar à sua punição, no-tificando-os para no prazo de 30 dias ser efectuado o pagamento das prestações em dívida, juros e coima pela

não entrega da prestação no prazo legal (artigo 114° e 27° do RGIT). Decorrido esse prazo, caso se verifique a regularização da situação tributária deverá considerar-se o facto não punível, arquivando-se o processo. Na nega-tiva devem os autos prosseguir para julgamento.

Acórdão de 13 de Setembro de 2007

Processo nº 5972/07-9

Relator: Dr. Fernando Estrela

Abuso de confiança fiscalEstado de necessidade

SUMáRIO1. É irrelevante a prova do recebimento dos valores de-

duzidos para o preenchimento do crime de abuso de con-fiança fiscal, porque o recebimento não faz parte do tipo.

2. A obrigação fiscal estava sujeita à periodicidade mensal, cujo valor incluía a globalidade dos serviços ou fornecimentos facturados num mês pela sociedade arguida, e desde que exista uma parcela desses valores em divida, o crime tem-se por verificado, pois a norma refere-se à não entrega, total ou parcial.

3. No caso em apreço estamos incontestavelmente perante uma não entrega ao credor tributário da prestação tributária deduzida por conta daquele, estando preenchi-do o elemento subjectivo porquanto o arguido, consciente da obrigação de entrega e da proibição subjacente à não entrega, voluntariamente, optou por dar outro destino àqueles montantes, além de se mostrar verificada a condi-ção objectiva de punibilidade (decurso do prazo de 90 dias sobre o termo do prazo legal para a entrega), não sendo elemento do tipo o recebimento da quantia deduzida.

4. Pela ponderação dos interesses em causa, não se podem considerar verificados os requisitos do estado de necessidade desculpante se, perante dois interesses de natureza patrimonial, um que reveste natureza par-ticular, beneficiando o próprio arguido pois permite-lhe continuar a sua actividade e outro que reveste nature-za colectiva, o arguido optou pelo primeiro, que não se pode considerar superior ao interesse colectivo visado pela obrigação fiscal, destinado à satisfação de necessi-dades colectivas essenciais.

Acórdão de 19 de Dezembro de 2006

Processo nº 3360/2006-5

Relator: Dra. Filipa Macedo

jurisprudência[sumários]

68 REVISTA FISCAl Setembro/Outubro | 2010

Abuso de confiança fiscalAutoria materialConflito de interessesPena de prisãoSuspensão da execução da penaCondição resolutiva

SUMáRIOI – É de manter a condenação da arguida como au-

tora material do crime de abuso de confiança fiscal, uma vez que está demonstrado que os técnicos que a auxilia-vam na administração da sociedade lhe deram sempre conhecimento de que a sociedade não tinha a situação fiscal regularizada, existindo dívidas ao Fisco e a arguida nada vez para regularizar tal situação.

II – O interesse do Fisco prevalece sempre sobre os interesses da empresa ou dos seus trabalhadores, não ha-vendo conflito de interesses entre manter a empresa em laboração ou pagar as quantias devidas ao fisco.

III – Tendo em atenção o montante em dívida, é de manter a condenação da pena de prisão efectiva, suspen-sa na sua execução sob condição resolutiva do pagamen-to ao Fisco das quantias em dívida.

Acórdão de 6 de Julho de 2006

Processo nº 3372/2006-9

Relator: Dr. João Carrola

Abuso de confiança fiscalExtinção do procedimento criminalNotificação

SUMáRIONos termos da actual redacção do artº 105º, nº 6, do

R.G.I.T. (introduzida pela lei nº 60-A/2005, de 30/12), para que ocorra causa extintiva do procedimento crimi-nal, os pagamentos em dívida têm que ser efectuados até 30 dias após a notificação da Administração Fiscal para proceder ao pagamento das quantias em dívida.

Acórdão de 6 de Julho de 2006

Processo nº 5544/2006-9

Relator: Dr. João Carrola

Abuso de confiança fiscalEstadoTrabalhadorConflito de interessesConflito de deveresEstado de necessidade

SUMáRIOI – Em termos gerais pode dizer-se que o crime de

abuso de confiança fiscal pressupõe a verificação de um prejuízo para o Estado (fazenda nacional), uma vez que o contribuinte retém quantias, delas se apropriando, em vez de as entregar, como devia, ao Estado.

II – Esse elemento importante – “apropriação” – é determinante independentemente da existência ou não de lucro que dessa apropriação directa ou indirectamen-te resulte.

III – Não colhe a argumentação de que, no conflito de deveres entre pagar os salários dos trabalhadores e manter a laboração e pagar as quantias devidas ao Es-tado, o primeiro se sobrepõe ao segundo. A verdade é que não se deve entender como conflito de deveres a situação em que estejam em confronto interesses pró-prios (manter a sociedade em funcionamento para o que tem que se satisfazer as obrigações para com os traba-lhadores) e interesses alheios – cumprir a obrigação de entregar ao Estado as quantias que lhe pertencem.

IV – Não colhe, por último, a argumentação da ve-rificação de estado de necessidade desculpante uma vez que só o seria se não tivesse sido causada pelo agente do facto necessário.

Acórdão de 22 de Setembro de 2004

Processo nº 4855/2004-3

Relator: Dr. Clemente lima

Abuso de confiança fiscalCrime continuadoMedida da penaPena de prisãoPena suspensa

SUMáRIOI – O crime de abuso de confiança fiscal, quando

praticado na forma continuada, deve ser qualificado em

69

jurisprudência[sumários]

REVISTA FISCAl Setembro/Outubro | 2010

função do valor de cada uma das prestações retidas e não do valor total dos valores retidos indevidamente e não entregues à administração fiscal.

II – Face às necessidades de protecção do bem jurí-dico, às exigências de prevenção e à gravidade da infrac-ção a medida concreta da pena deverá ser detentiva, em-bora suspensa, sob condição do pagamento ao Estado das quantias indevidamente retidas.

Acórdão de 3 de Fevereiro de 2004

Processo nº 9490/2003-5

Relator: Dr. Cabral Amaral

TRIBUNAL DA RELAçÃO DO PORTO

Infracção fiscalAbuso de confiança fiscalPrescrição do procedimento criminal

SUMáRIONo crime tributário, a prescrição conta-se a partir do

91º dia posterior ao termo do prazo legal de entrega da prestação.

Acórdão de 21 de Abril de 2010

Processo nº 184/06.4IDPRT.P1

Relator: Dra. lígia Figueiredo

Abuso de confiança fiscalDescriminalizaçãoGerente

SUMáRIOI - Com a nova redacção conferida ao art. 105º do

RGIT pela lei 64-A/2008, passou a constituir elemento do tipo de ilícito (abuso de confiança fiscal) que a presta-ção tributária em falta seja de valor superior a € 7500,00, sendo certo que, nos termos do n.º 7 do referido art. 105º do RGIT, “os valores a considerar são os que, nos

termos da legislação aplicável, devam constar de cada declaração a apresentar à administração tributária”.

II - Para a consumação do crime de abuso de con-fiança fiscal, exige a lei uma actuação voluntária por parte do agente, ou seja, comportamentos activos ou omissivos que interfiram na gestão da sociedade, sendo insuficiente para gerar a responsabilização penal a mera posição de representante, por si só (gerente de direito).

Acórdão de 13 de Janeiro de 2010

Processo nº 1/06.5IDPRT.P1

Relator: Dr. Melo lima

Abuso de confiança fiscalSuspensão da execução da pena

SUMáRIONão é inconstitucional o condicionamento da sus-

pensão da execução da pena de prisão ao pagamento da prestação tributária e acréscimos legais em falta: a obri-gação em causa – pagar impostos em dívida – é uma obrigação pública fiscal que deriva da lei e não tem por fonte qualquer contrato.

Acórdão de 11 de Novembro de 2009

Processo nº 338/05.0IDPRT.P1

Relator: Dr. António Gama

Crimes tributáriosPedido cível

SUMáRIOI. Pelos danos causados pelos crimes tributários res-

pondem os agentes do crime, não nos termos da lei Geral Tributária, mas nos termos da lei civil.

II Assim, o administrador da empresa que seja tam-bém agente do crime, não responderá subsidiariamente, mas solidariamente, nos termos do art. 497º do Código Civil.

Acórdão de 30 de Setembro de 2009

Processo nº 16/05.0IDbGC.P1

Relator: Dr. Francisco Marcolino

jurisprudência[sumários]

70 REVISTA FISCAl Setembro/Outubro | 2010

Abuso de confiança fiscalPessoa singularPessoa colectivaGerenteNotificação

SUMáRIOSendo arguidos a sociedade e o gerente, a notificação

deste, na qualidade de representante legal daquela, para o efeito previsto no art. 105º, nº 4, alínea b), do RGIT, não dispensa a mesma notificação em seu nome pessoal, pois são diversas as qualidades em que intervém no processo.

Acórdão de 13 de Maio de 2009

Processo nº 142/05.6IDPRT.P1

Relator: Dr. Melo lima

Crimes fiscaisNotificaçãoPagamento

SUMáRIOA entidade competente para determinar a notificação

prevista na al. b) do n.º 4 do art. 105º do Regime Geral das Infracções Tributárias é a entidade titular do procedimen-to ou do processo, ou seja, a Administração, o Ministério Público, o Tribunal de Instrução Criminal ou o Tribunal do Julgamento, consoante a fase em que ele se encontre quando surge a necessidade de proceder a essa notificação.

Acórdão de 14 de Janeiro de 2009

Processo nº 0714675

Relator: Dr. luís Ramos

Abuso de confiança fiscalPrescrição do procedimento criminal

SUMáRIOO prazo de prescrição do procedimento pelo crime

de abuso de confiança fiscal só se inicia após o decurso do prazo de 90 dias estabelecido na alínea a) do nº 4 do art. 105º do RGIT.

Acórdão de 25 de Março de 2009

Processo nº 0846951

Relator: Dra. Olga Maurício

Abuso de confiança fiscalDescriminalização

SUMáRIOCom a entrada em vigor da nova redacção do nº 1 do

art. 105º do RGIT, introduzida pela lei nº 64-A/2008, de 31 de Dezembro, não se preenche o crime de abuso de confiança fiscal se cada uma das prestações tributárias não entregues for de valor não superior a € 7 500, ainda que o valor de todas elas exceda esse montante.

Acórdão de 25 de Fevereiro de 2009

Processo nº 0816634

Relator: Dr. luís Teixeira

Abuso de confiança fiscalDispensa de penaPessoa colectiva

SUMáRIOI - As pessoas colectivas podem beneficiar de dispen-

sa de pena ao abrigo do disposto no artº 22º do RGIT. II - Para efeitos do artº 402º, nº 2, alínea a), do Códi-

go de Processo Penal, a actuação dos gerentes em nome da sociedade configura caso análogo ao da compartici-pação.

Acórdão de 4 de Fevereiro de 2009

Processo nº 0643542

Relator: Dr. António Gama

Abuso de confiança fiscal

SUMáRIOPara o preenchimento do tipo criminal de abuso de

confiança fiscal não é imprescindível a apreensão mate-rial das quantias pelo agente, bastando que elas, em vez de serem entregues à administração fiscal, sejam desvia-

71

jurisprudência [sumários]

REVISTA FISCAL Setembro/Outubro | 2010

das para outros fins, designadamente para fazer face a outros encargos lícitos da empresa.

Acórdão de 22 de Outubro de 2008

Processo nº 0813921

Relator: Dr. Jorge França

Abuso de confiança fiscalUnidade de resoluçãoUnidade de infracções

SUmárioComete um só crime de abuso de confiança fiscal

o agente que, em obediência a uma única resolução to-mada em 1999, deixa de entregar à administração fiscal, dando-lhes outro destino, as prestações tributárias dedu-zidas e liquidadas desde essa altura até 2004.

Acórdão de 9 de Julho de 2008

Processo nº 0714660

Relator: Dr. Francisco Marcolino

Abuso de confiança fiscalPagamento

SUmárioA notificação do arguido (gerente na data da prática

dos factos) para efectuar o pagamento das quantias em dívida, nos termos do art. 105º, n.º 4 al. b) do RGIT, numa altura em que já tinha sido declarada a falência da

sociedade (notificada na pessoa do liquidatário), não im-pede o arguido de fazer o pagamento pelo qual também é responsável.

Acórdão de 26 de Março de 2008

Processo nº 0716952

Relator: Dr. Manuel Braz

infracção fiscalCondição de exclusão da punibilidadeAplicação da lei no tempo

SUmárioi - A alínea b) do nº 4 do art. 105º do RGIT, intro-

duzida pela Lei 53-A/2006, de 29/12, representa uma condição de exclusão da punibilidade, na medida em que a regularização da situação tributária leva à desnecessida-de da pena, estando essa faculdade na disponibilidade do agente, muito embora exista uma vertente adjectiva, ou seja, a sua notificação para pagar a prestação tributária que devia ter sido entregue.

ii - Consagrando a nova lei um regime mais favo-rável ao arguido (possibilidade de afastar a punição), deve ela ser aplicada aos casos ocorridos anteriormente, fazendo-se a notificação prevista na alínea b) do n.º 4 do art. 105º do RGIT.

Acórdão de 5 de Dezembro de 2007

Processo nº 0416130

Relator: Dr. Joaquim Gomes

sÍntese

72 REVISTA FISCAl Setembro/Outubro | 2010

JURISPRUDÊNCIA

I Série do DR

Supremo Tribunal de Justiça

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/2010, de 09.07

“A retribuição mensal prevista no n.º 7 da cláusula 74.ª do contrato colectivo de trabalho celebrado entre a ANTRAM - Associação Nacional de Transportes Públi-cos Rodoviários de Mercadorias e a FESTRU - Federa-ção dos Sindicatos de Transportes Rodoviários Urbanos, publicado no boletim do Trabalho e Emprego, 1.ª série, n.º 9, de 8 de Março de 1980, e no boletim do Trabalho e Emprego, 1.ª série, n.º 16, de 29 de Abril de 1982, ten-do como base mínima de cálculo o valor equivalente a duas horas extraordinárias, é devida em relação a todos os dias do mês do calendário.”

Supremo Tribunal Administrativo

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo n.º 5/2010, de 14.07

“Uniformiza a jurisprudência nos seguintes termos: salvo disposição legal em contrário, os órgãos das so-ciedades anónimas de capitais exclusivamente públicos - hoje empresas públicas, ex vi do artigo 3.º do Decre-to-lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro - são órgãos da Administração Pública nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 2.º, n.º 2, do CPA, quando exerçam poderes de autoridade, designadamente em matéria dis-ciplinar.”

II Série do DR

Tribunal Constitucional

Acórdão n.º 128/2010, de 08.06“Não julga inconstitucional a norma do artigo 6.º do

Regime Geral das Infracções Tributárias, na medida em que inclui no seu âmbito incriminatório a figura do ad-ministrador de facto de uma sociedade.”

Acórdão n.º 176/2010, de 28.06“Julga organicamente inconstitucional a norma do §

7.º da Portaria n.º 234/97, de 4 de Abril (portaria re-lativa ao factor de compensação do gasóleo colorido e marcado e ao sistema de funcionamento da venda ao público do produto); julga organicamente inconstitucio-nal a norma do artigo 3.º, n.º 2, alínea e), do Código dos Impostos Especiais de Consumo (aprovado pelo Decreto-lei n.º 566/99, de 22 de Dezembro, na redac-ção anterior às alterações introduzidas pelo artigo 69.º da lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, ao artigo 74.º deste Código).”

Acórdão n.º 251/2010, de 19.07“Não julga inconstitucional a norma que se extrai

dos artigos 2.º, n.º 2, 11.º, n.º 3, 13.º-A e 16.º do Código do Imposto Municipal da Sisa e do Imposto sobre Su-cessões e Doações, quando interpretada no sentido da sujeição a imposto da sisa do contrato-promessa com tradição conjugado com a sua irrelevância para efeitos de caducidade da isenção da sisa.”

LEGISLAçÃO FISCAL

Lei n.º 20/2010, de 23.08Alarga o conceito de pequenas entidades para efeitos

da aplicação do Sistema de Normalização Contabilística (SNC) - primeira alteração ao Decreto-lei n.º 158/2009, de 13 de Julho

Lei n.º 22/2010, de 23.08Alarga o âmbito da não tributação em sede de IVA

das transmissões de livros a título gratuito, alterando o

Código do IVA, aprovado pelo Decreto-lei n.º 394-b/84, de 26 de Dezembro

Portaria n.º 785/2010, de 23.08Actualiza os coeficientes de desvalorização da moeda

a aplicar aos bens e direitos alienados durante o ano de 2010, para efeitos de determinação da matéria colectável do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares

Portaria n.º 762/2010, de 20.08Primeira alteração da Portaria n.º 117-A/2008, de

8 de Fevereiro, que regulamenta as formalidades e os procedimentos aplicáveis ao reconhecimento e controlo

sÍntese

73REVISTA FISCAl Setembro/Outubro | 2010

das isenções e das taxas reduzidas do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos (ISP)

Declaração n.º 169/2010, de 12.08Certificação de programa de facturação (modelo 24)

e respectivas instruções

Portaria n.º 653/2010, de 11.08Altera a taxa do imposto sobre os produtos petrolí-

feros e energéticos (ISP) aplicável ao gasóleo de aque-cimento

Decreto Legislativo Regional n.º 14/2010/M, de 05.08

Altera o Decreto legislativo Regional n.º 34/2009/M, de 31 de Dezembro, que aprova o Orçamento da Região Autónoma da Madeira para 2010

Lei n.º 15/2010, de 26.07Introduz um regime de tributação das mais-valias

mobiliárias à taxa de 20 % com regime de isenção para os pequenos investidores e altera o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares e o Estatuto dos benefícios Fiscais

Portaria n.º 467/2010, de 07.07Define o custo de aquisição ou o valor de reavaliação

das viaturas ligeiras de passageiros ou mistas

Despacho normativo n.º 18-A/2010, de 01.07Pedido de reembolso do IVA e inscrição no regime

mensal

Lei n.º 12-A/2010, de 30.06Aprova um conjunto de medidas adicionais de con-

solidação orçamental que visam reforçar e acelerar a re-dução de défice excessivo e o controlo do crescimento da dívida pública previstos no Programa de Estabilidade e Crescimento (PEC)

Portaria n.º 454-A/2010, de 29.06Aprova a declaração modelo n.º 39 , «Rendimentos

e retenções a taxas liberatórias» e respectivas instruções de preenchimento

Declaração de rectificação n.º 2/2010/M, de 25.06

Rectificação do despacho n.º 1/2010/M que aprova as tabelas de retenção de IRS na fonte para vigorarem durante o ano de 2010 na Região Autónoma da Madeira

Portaria n.º 363/2010, de 23.06Regulamenta a certificação prévia dos programas in-

formáticos de facturação do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas

Despacho n.º 10444-A/2010, de 22.06Tabelas de retenção - Região Autónoma dos Açores

Decreto-Lei n.º 73/2010, de 21.06No uso da autorização legislativa concedida pelo ar-

tigo 130.º da lei n.º 3-b/2010, de 28 de Abril, aprova o Código dos Impostos Especiais de Consumo, transpon-do a Directiva n.º 2008/118/CE, do Conselho, de 16 de Dezembro

Decreto-Lei n.º 72-A/2010, de 18.06Estabelece as normas de execução do Orçamento do

Estado para 2010

Despacho n.º 10289-A/2010, de 18.06Constituição de um Grupo de Trabalho para Enqua-

dramento Fiscal dos Mercados Energéticos

Lei n.º 11/2010, de 15.06Introduz uma nova taxa de IRS (no valor de 45 %)

para sujeitos passivos ou agregados familiares que obte-nham rendimentos anuais superiores a A 150 000

Despacho n.º 1/2010/M, de 14.06Despacho que aprova as tabelas de retenção de IRS

na fonte para vigorarem durante o ano de 2010 na Re-gião Autónoma da Madeira

Portaria n.º 303/2010, de 08.06Regulamenta as deduções à colecta para efeitos de

IRS nos encargos com equipamentos de eficiência ener-gética ambiental e revoga a Portaria n.º 725/91, de 29 de Julho

Declaração n.º 118/2010, de 04.06Tipografias autorizadas a imprimir facturas e outros

documentos de transporte

Resolução da Assembleia da República n.º 50/2010, de 31.05

Recomenda ao Governo a manutenção em activida-de do Serviço de Finanças Viseu 2

Portaria n.º 293/2010, de 31.05Revoga o n.º 9.º da Portaria n.º 523/2003, de 4 de Ju-

lho, que aprova o modelo da declaração de pagamento de

sÍntese

74 REVISTA FISCAl Setembro/Outubro | 2010

Circular n.º 73/2010, de 27.08, da DGAIECImplicações processuais relativas à aplicação de coi-

ma única, em cúmulo jurídico, ao concurso de contra-ordenações aduaneiras.

Circular n.º 71/2010, de 13.08, da DGAIECIVA – Vendas efectuadas a exportadores nacionais.

Instruções de aplicação do regime de isenção previsto no artigo 6.º do Decreto-lei n.º 198/90, de 19 de Junho

Ofício-Circulado n.º 30119/2010, de 12.08, da DSIVA

IVA - Soro Fisiológico

Circular n.º 69/2010, de 10.08, da DGAIECCirculação de produtos de tabaco manufacturado

estampilhados nas Regiões Autónomas - Novas referên-cias a utilizar no SIC-DA

Circular n.º 68/2010, de 30.07, da DGAIECRectificação ao ponto 9 da Circular n.º 66/2010, Sé-

rie II

Circular n.º 66/2010, de 28.07, da DGAIECNovo Código dos Impostos Especiais de Consumo

Esclarecimentos

Circular n.º 65/2010, de 28.07, da DGAIECCodificação de Rubricas Aduaneiras - Recursos Pró-

prios Comunitários transferidos de OE para Comissão Europeia

Circular n.º 64/2010, de 26.07, da DGAIECExportação de medicamentos de uso humano: es-

clarecimento. Ref. às Circulares nºs 37/2010 e 59/2010, Série II.

DOUTRINA FISCAL

Circular n.º 8/2010, de 22.07, da DSIRCCIRC - Artigo 19.º - Contratos de construção (Re-

dacção introduzida pelo Decreto-lei n.º 159/2009, de 13 de Julho)

Circular n.º 62/2010, de 21.07, da DGAIECInstruções de aplicação relativas ao sistema de recur-

sos próprios das Comunidades. Da prescrição das dívi-das declaradas ou consideradas incobráveis. (Referência à Circular nº 70/2008, Série II)

Circular n.º 61/2010, de 20.07, da DGAIECNotas Pormenorizadas das Decisões nºs. 01 a 07 do

ano 2010, respeitantes à reunião de 27 de Abril de 2010, do CTA

Circular n.º 60/2010, de 20.07, da DGAIECReconhecimento da isenção do ISP prevista na alínea

f) do n.º 1 do artigo 71.º do Código dos Impostos Espe-ciais de Consumo (CIEC)

Circular n.º 59/2010, de 19.07, da DGAIECExportação de medicamentos de uso humano: escla-

recimento. - Ref. à Circular n.º 37/2010, Série II.

Circular n.º 58/2010, de 16.07, da DGAIECRestituições à exportação. Alterações ao Manual das

Restituições à Exportação.

Circular n.º 7/2010, de 15.07, da DSRIRegime Especial de Tributação dos Rendimentos de

Valores Mobiliários Representativos de Dívida

Circular n.º 56/2010, de 14.07, da DGAIECFranquia de direitos de importação e isenção do IVA

- Importação faseada de bens pessoais pertencentes a

retenções na fonte de imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS) e de imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas (IRC) e do imposto do selo (IS)

Decreto Regulamentar Regional n.º 2/2010/M, 26.05

Executa o Orçamento da Região Autónoma da Ma-deira para 2010

Portaria n.º 260/2010, de 10.05Aprova o modelo de declaração de regularização

tributária de elementos patrimoniais colocados no ex-terior e as respectivas instruções de preenchimento

sÍntese

75REVISTA FISCAl Setembro/Outubro | 2010

particulares provenientes de países terceiros por ocasião da transferência da sua residência habitual para território nacional – contagem do período de seis meses de utili-zação dos bens.

Circular n.º 57/2010, de 14.07, da DGAIECInstruções de aplicação da Portaria n.º 250-A/2010,

de 3 de Maio

Ofício-Circulado n.º 60074/2010, de 09.07, da DSGCT

Procedimentos a adoptar relativamente à reformula-ção de planos de pagamentos em prestações provenien-tes de procedimento extrajudicial de conciliação ou de processo de insolvência

Circular n.º 54/2010, de 02.07, da DGAIECInstruções sobre os Formulários do Pedido de Au-

torização e da Autorização para Utilizar Procedimentos Simplificados.

Ofício-Circulado n.º 30118/2010, de 30.06, da DSIVA

IVA - Alteração das taxas reduzida, intermédia e nor-mal

Circular n.º 52/2010, de 30.06, da DGAIECEstatuto aduaneiro das mercadorias. Publicação do

Manual de Prova de Estatuto.

Circular n.º 53/2010, de 30.06, da DGAIECCodificação de rubricas aduaneiras de receita para o

Imposto sobre o Valor Acrescentado.

Circular n.º 6/2010, de 25.06, da DSIRS Retenção na fonte sobre rendimentos do trabalho

dependente e pensões - RA Açores

Ofício-Circulado n.º 30117/2010, de 25.06, da DSIVA

IVA - bombas de calor

Ofício-Circulado n.º 90016/2010, de 23.06, da SDGC

Atribuição de número de identificação fiscal às he-ranças indivisas / declarações de actividade

Circular n.º 49/2010, de 18.06, da DGAIECAviso aos importadores – importações na UE de

atum proveniente da Colômbia e de Salvador.

Ofício-Circulado n.º 20146/2010, de 16.06, da DSIRS

Controlo de faltosos - falta de entrega do anexo G/G1 do ano de 2006 - artigo 76.º, n.º 1, alínea b) e n.º 3, do CIRS - Revisão por erro imputável aos serviços

Circular n.º 4/2010, de 15.06, da DSIRS Retenção na fonte sobre rendimentos do trabalho

dependente e pensões - RA Madeira

Circular n.º 3/2010, de 15.06, da DSIRS Retenção na fonte sobre rendimentos do trabalho

dependente e pensões

Circular n.º 5/2010, de 14.06, da DGCI Enquadramento fiscal das prestações sociais substi-

tutivas da retribuição pagas no âmbito da protecção da parentalidade.

Ofício-Circulado n.º 90015/2010, de 08.06, do SDGC

Entrada em produção no sistema de gestão de regis-to de contribuintes (SGRC) da opção pelo regime fiscal do “residente não habitual” – Dec.-lei nº 249/2009, de 23/09.

Circular n.º 48/2010, de 31.05, da DGAIECProcedimentos a adoptar no âmbito do incentivo

fiscal à destruição de veículos em fim de vida (VFV): re-gime geral, regime excepcional para a Região Autónoma da Madeira (RAM) e regime de reembolso.

Circular n.º 47/2010, de 26.05, da DGAIECRegularização das DAV’s apresentadas pelos opera-

dores registados antes da vigência da lei n.º 22-A/2007, de 29 de Junho que aprovou o Código do Imposto sobre Veículos (CISV).

UNIÃO EUROPEIA

76 REVISTA FISCAl Setembro/Outubro | 2010

LEGISLAçÃO

• Decisão da Comissão, 2010/213/UE, de 18 de Dezembro de 2009, relativa ao auxílio estatal C 34/07 (ex N 93/06) respeitante à introdução, na Po-lónia, do regime do imposto sobre a arqueação para apoio ao transporte marítimo internacional

Jornal Oficial n.º L 90, de 10/04/2010, p. 0015-0026

• Regulamento (UE) nº 243/2010 da Comissão, de 23 de Março de 2010, que altera o Regulamento (CE) nº 1126/2008 que adopta certas normas inter-nacionais de contabilidade nos termos do Regula-mento (CE) nº 1606/2002 do Parlamento Europeu e do Conselho, em conformidade com o documento «Melhoramentos introduzidos nas normas interna-cionais de relato financeiro (IFRS)»

Jornal Oficial n.º L 77, de 24/03/2010, p. 0033-0041

• Regulamento (UE) nº 244/2010 da Comissão, de 23 de Março de 2010, que altera o Regulamento (CE) nº 1126/2008, que adopta certas normas inter-

nacionais de contabilidade nos termos do Regulamen-to (CE) nº 1606/2002 do Parlamento Europeu e do Conselho, no que diz respeito à norma internacional de relato financeiro (IFRS) 2

Jornal Oficial n.º L 77, de 24/03/2010, p. 0042-0049

• Directiva 2010/23/UE do Conselho, de 16 de Março de 2010, que altera a Directiva 2006/112/CE, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, no que se refere à aplicação facul-tativa e temporária de um mecanismo de autoliquida-ção ao fornecimento ou prestação de certos serviços que apresentam um risco de fraude

Jornal Oficial n.º L 72, de 20/03/2010, p. 0001-0002

• Directiva 2010/12/UE do Conselho, de 16 de Fevereiro de 2010, que altera as Directivas 92/79/CEE, 92/80/CEE e 95/59/CE, no que se refere à estrutura e às taxas do imposto especial de consumo que incide sobre os tabacos manufacturados, e a Di-rectiva 2008/118/CE

Jornal Oficial n.º L 50, de 27/02/2010, p. 0001-0007

JURISPRUDÊNCIA

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIçA (PRIMEIRA SECçÃO)6 DE MAIO DE 2010

«Incumprimento de Estado – IVA – Directiva 2006/112/CE – Artigo 98.°, n.os 1 e 2 – Prestações de serviços por agências funerárias – Aplicação de uma taxa reduzida às prestações de transporte de cadá-

veres em veículo»

No processo C-94/09,que tem por objecto uma acção por incumprimento nos termos do artigo 226.° CE, entrada em 6 de Março de 2009,

Comissão Europeia, representada por M. Afonso, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

uniãoeuropeia

77REVISTA FISCAl Setembro/Outubro | 2010

demandante,contraRepública Francesa, representada por G. de Bergues e J.-S. Pilczer, na qualidade de agentes,demandada,

1) A acção é julgada improcedente.2) A Comissão Europeia é condenada nas despesas.

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIçA (SEGUNDA SECçÃO)20 DE MAIO DE 2010

«Livre prestação de serviços – Cidadania da União – Artigos 18.° CE e 49.° CE – Legislação nacional em matéria de imposto sobre o rendimento – Direito de deduzir do imposto bruto uma percentagem

fixa da totalidade das despesas de ensino – Curso universitário frequentado num Estado-Membro – Im-posição de um limite quantitativo – Dedução que não excede o máximo fixado para as propinas pagas para prestações semelhantes fornecidas por universidades públicas nacionais – Imposição de um limite territorial – Dedução que não excede o máximo fixado para as propinas pagas para prestações equiva-lentes fornecidas pela universidade pública nacional mais próxima do domicílio fiscal do contribuinte»

No processo C-56/09,que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.° CE, apresentado pela Commissione

tributaria provinciale di Roma (Itália), por decisão de 14 de Janeiro de 2009, entrado no Tribunal de Justiça em 9 de Fevereiro de 2009, no processo

Emiliano ZanotticontraAgenzia delle Entrate - Ufficio Roma 2,

1) O artigo 49.° CE deve ser interpretado no sentido de que:– se opõe a uma legislação nacional que prevê a possibilidade de os contribuintes deduzirem do imposto bruto

as despesas de cursos de ensino universitário ministrados pelas universidades situadas no território desse Esta-do-Membro, mas que exclui de forma geral essa possibilidade no que se refere às despesas de ensino universitário suportadas num estabelecimento universitário privado situado noutro Estado-Membro;

– não se opõe a uma legislação nacional que prevê a possibilidade de os contribuintes deduzirem do imposto bruto as despesas de cursos de ensino universitário suportadas numa universidade privada situada noutro Estado-Mem-bro no limite do máximo fixado para as despesas correspondentes previstas para a frequência de cursos semelhan-tes ministrados na universidade pública nacional mais próxima do domicílio fiscal do contribuinte.

2) O artigo 18.° CE deve ser interpretado no sentido de que:– se opõe a uma legislação nacional que prevê a possibilidade de os contribuintes deduzirem do imposto bruto as

despesas de cursos de ensino universitário ministrados nos estabelecimentos situados no território desse Esta-do-Membro, mas que exclui de forma geral essa possibilidade no que se refere às despesas universitárias suportadas numa universidade situada noutro Estado-Membro;

– não se opõe a uma legislação nacional que prevê a possibilidade de os contribuintes deduzirem do imposto bruto as despesas de cursos de ensino universitário suportadas numa universidade privada situada noutro Estado-Membro no limite do máximo fixado para as despesas correspondentes previstas para a frequência de cursos semelhantes ministrados na universidade pública nacional mais próxima do domicílio fiscal do contribuinte.

uniãoeuropeia

78 REVISTA FISCAl Setembro/Outubro | 2010

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIçA (PRIMEIRA SECçÃO)20 DE MAIO DE 2010

«Aproximação das legislações – Directiva 90/434/CEE – Regime fiscal comum aplicável às fusões, ci-sões, entradas de activos e permutas de acções entre sociedades de Estados-Membros diferentes – Artigo

11.°, n.° 1, alínea a) – Aplicabilidade a impostos sobre transmissões de direitos»

No processo C-352/08,que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.° CE, apresentado pelo Hoge Raad der

Nederlanden (Países baixos), por decisão de 11 de Julho de 2008, entrado no Tribunal de Justiça em 31 de Julho de 2008, no processo

Modehuis A. Zwijnenburg BVcontraStaatssecretaris van Financiën,

O artigo 11.°, n.° 1, alínea a), da Directiva 90/434/CEE do Conselho, de 23 de Julho de 1990, relativa ao regime fiscal comum aplicável às fusões, cisões, entradas de activos e permutas de acções entre sociedades de Estados-Membros diferentes, deve ser interpretado no sentido de que os regimes de favor que esta institui não podem ser recusados ao sujeito passivo que gizou uma construção jurídica que compreendia uma fusão de empresas, com o intuito de evitar o pagamento de um imposto como o que está em causa no processo principal, a saber, o imposto sobre as transmissões de direitos, uma vez que este imposto não cabe no âmbito de aplicação desta directiva.

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIçA (TERCEIRA SECçÃO)20 DE MAIO DE 2010

«Regulamento (CEE) n.º 1591/84 – Acordo de Cooperação entre, por um lado, a Comunidade Eco-nómica Europeia e, por outro, o Acordo de Cartagena e os seus países membros, Bolívia, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela – Cláusula da nação mais favorecida – Efeito directo – Imposto especial

sobre a importação de bananas na Grécia»

No processo C-160/09,que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.° CE, apresentado pelo Symvoulio tis

Epikrateias (Grécia), por decisão de 1 de Abril de 2009, entrada no Tribunal de Justiça em 8 de Maio de 2009, no processo

Ioannis Katsivardas - Nikolaos Tsitsikas OEcontraYpourgos Oikonomikon,

O artigo 4.º do Acordo de Cooperação celebrado entre, por um lado, a Comunidade Económica Europeia e, por outro, o Acordo de Cartagena e os seus países membros, bolívia, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela, aprovado pelo Regulamento (CEE) n.º 1591/84 do Conselho, de 4 de Junho de 1984, não confere aos particulares direitos que estes possam invocar nos órgãos jurisdicionais de um Estado-Membro.

ESPANHA

79REVISTA FISCAl Setembro/Outubro | 2010

Doutrina do Tribunal Económico Administrativo Central

Procedimentos de gestãoProcedimentos de cobrança voluntáriaGarantias de pagamento

Resumo: Para a adopção de medidas cautelares nos termos do artigo 81 da lGT (ley 58/2003) é necessá-rio que existam indícios objectivos de que, caso não se-jam adoptadas tais medidas, a cobrança das dívidas seria frustrada ou gravemente dificultada e que as medidas adoptadas são proporcionais ao dano que se pretende evitar. No caso concreto, as medidas cautelares não es-tavam suficientemente fundamentadas, não bastando que as dívidas sejam de valor elevado, sendo necessária a constatação ou a fundada suspeita de que o devedor realizou actos tendentes a impedir a Hacienda Pública de cobrar a dívida.

N.º de Resolução: 00/2596/2006Data: 09/07/2008

Impuesto sobre Actividades EconómicasGestão

Resumo: A entidade incorporante pode requerer a devolução, nos termos do disposto no artigo 89.2 do Texto Refundido de la Ley Reguladora de las Haciendas Locales (Real Decreto legislativo 2/2004), da parte do Impuesto sobre Actividades Económicas correspondente aos trimes-tres em que a entidade incorporada não exerceu activi-dade, assim como dos juros que sejam devidos, perante a Oficina competente para efectuar o referido reembolso,

sempre que justifique devidamente que ocorreu a dita incorporação com uma sucessão a título universal de todos os direitos e obrigações da empresa incorporada.

N.º de Resolução: 00/3502/2007Data: 09/07/2008

Impuesto sobre la Renta de las Personas FisicasBase tributável: rendimentosRendimentos de actividades empresariaisImpuesto sobre SociedadesValoração e imputaçãoOperações vinculadas

Resumo: É procedente a aplicação do artigo 16 da lIS (ley 43/1995) para determinar o valor das opera-ções entre a pessoa física e as duas sociedades às quais está ligada. A pessoa física aparece como vendedora e compradora das matérias-primas e subcontrata determi-nados serviços com as citadas empresas, cujas receitas provêem na sua quase totalidade dos serviços prestados à pessoa física. No caso concreto, há lugar à aplicação do método de valoração residual da alínea c) do artigo 16 da lIS, preço derivado da distribuição do resultado total da operação, tendo em conta os riscos assumidos, os activos implicados e as funções desempenhadas, por não existir um mercado na zona para a actividade do sujeito passivo.

N.º de Resolução: 00/1995/2006Data: 10/07/2008

espanha

80 REVISTA FISCAl Setembro/Outubro | 2010

Impuestos EspecialesImpuesto sobre Determinados Medios de Transporte

Resumo: A devolução do Impuesto Especial sobre De-terminados Medios de Transporte prevista no artigo 66.3 da Ley de Impuestos Especiales (ley 38/1992) requer que o empresário que se dedica profissionalmente à revenda de veículos envie o veículo para fora do território de aplicação do imposto mediante uma venda definitiva e que o envio definitivo seja comprovado mediante a certi-ficação da baixa no correspondente registo emitida pelo órgão competente em matéria de circulação em nome do citado empresário que se dedica profissionalmente à revenda de meios de transporte.

N.º de Resolução: 00/3918/2007Data: 23/07/2008

Impuesto sobre el Valor AñadidoDeduções e devoluçõesPro rata

Resumo: Para a consideração de um bem como de investimento, o artigo 108 da Ley del IVA (ley 37/1992) não exige que o mesmo tenha sido utilizado de forma efectiva durante um prazo superior a um ano como meio de exploração ou instrumento de trabalho, sendo sim re-quisito necessário para a dita qualificação que o bem seja normalmente destinado àquela finalidade durante o re-ferido prazo. O sujeito passivo deve comprovar, através dos meios de prova admitidos em direito, que os bens, pela sua natureza e função, estarão normalmente desti-nados à utilização na actividade empresarial ou profissio-nal por um período de tempo superior a um ano como instrumento de trabalho ou meio de exploração.

Para a exclusão no cálculo do pro rata das operações imobiliárias e financeiras, devem tratar-se de opera-ções não habituais, segundo indica o artigo 104 da Ley del IVA ou, nos termos da Sexta Directiva, operações acessórias. A apreciação de um e outro conceito deve ser efectuada de maneira individualizada, atendendo

sempre aos princípios inerentes ao sistema comum do IVA. Carecem deste carácter acessório ou não habitual e devem ter-se em conta na determinação do pro rata, as operações imobiliárias e financeiras que constituam um prolongamento directo, permanente e necessária da acti-vidade económica tributável do sujeito passivo.

N.º de Resolução: 00/3192/2007Data: 23/07/2008

Impuesto sobre el Valor AñadidoAspectos geraisLugar de realização do facto tribu-tável

Resumo: No conceito de estabelecimento está-vel previsto no artigo 69.Cinco.a) da Ley del IVA (ley 37/1992), nas “agências ou representações autorizadas para contratar em nome e por conta do sujeito passi-vo” devem ser incluídos aqueles agentes ou represen-tantes do empresário não estabelecido que, sem ser os que subscrevem o contrato comercial, estão autorizados a negociar e, por isso, estabelecem todos os elementos e detalhes do mesmo, dirigindo e levando a cabo o pro-cesso de negociação que se conclui com a celebração do contrato, obrigando com isso a empresa não estabe-lecida. O armazenamento da mercadoria num depósi-to propriedade de um terceiro não implica, por si só, a existência de um estabelecimento estável nos termos do artigo 69.Cinco.e) da Ley del IVA (ley 37/1992). Um ar-mazém no qual os bens são temporariamente deposita-dos só assumirá o carácter de estabelecimento estável de um empresário não estabelecido quando este empresário disponha do armazém como proprietário ou como titu-lar de um direito real de uso do bem, como arrendatário, seja da totalidade ou de uma parte concreta e determi-nada do imóvel. Não pode sê-lo quando o empresário é mero destinatário de um serviço de depósito ou arma-zenamento que é efectuado por um terceiro, ainda que este seja uma entidade do mesmo grupo empresarial ou seja sua filial.

N.º de Resolução: 00/2343/2005Data: 23/07/2008

espanha

81REVISTA FISCAl Setembro/Outubro | 2010

Impuesto sobre la Renta de las Personas FisicasAspectos geraisSujeito passivoBase tributável: rendimentosRendimentos do trabalho

Resumo: O benefício fiscal regulado nos artigos 73.2 e 75 da ley 19/1994, de Modificación del Régimen Eco-nómico y Fiscal de Canarias, não é aplicável aos tripulantes de embarcações do dominio público uma vez que estas não são passíveis de inscrição no Registro Especial de Bu-ques y Empresas Navieras, nem estão adstritas aos serviços regulares de navegação entre as Ilhas Canárias e entre estas e o resto do território nacional.

N.º de Resolução: 00/1384/2007Data: 24/07/2008

Procedimentos de gestãoProcedimentos de cobrança voluntáriaGarantias de pagamentoLey General TributariaObrigados tributáriosResponsáveis solidários e subsidiáriosSucessores

Resumo: A adopção de medidas cautelares prevista no artigo 81 da lGT (ley 58/2003) para assegurar a co-brança da dívida tributária é um poder discricionário da Administración Tributaria tendente a assegurar a cobrança das referidas dívidas, quando existam indícios objectivos de que aquela cobrança pode ser frustrada ou gravemen-te dificultada. Para a sua adopção é necessário um título jurídico que possibilite à Administración Tributaria adoptá-las uma vez que, tratando-se de assegurar a cobrança de uma dívida tributária, o destinatário da medida caute-lar há-de ter a condição de obrigado tributário. Neste pressuposto, foram adoptadas medidas cautelares no decurso de um procedimento administrativo de rever-são (título jurídico que faculta à Administración Tributaria a possibilidade de as adoptar), perante a existência de indícios objectivos de fuga ao pagamento das dívidas, pelo que têm de ser consideradas conformes com o or-denamento jurídico.

N.º de Resolução: 00/1907/2007Data: 10/09/2008

Impuestos PatrimonialesDocumentos notariais

Resumo: Não é aplicável às escrituras públicas de declaração de obra nova a taxa reduzida de 0,3% prevista para os actos jurídicos documentados no artigo 13.3.C) da ley 13/2003, da Comunidad de Castilla y León, de Me-didas Económicas, Fiscales y Administrativas, pois é pressu-posto necessário para a sua aplicação que as escrituras formalizem a aquisição de uma casa, ou seja o acto ou negócio jurídico pelo qual o interessado passa a ostentar a propriedade sobre a mesma.

N.º de Resolução: 00/3665/2006Data: 10/09/2008

Impuesto sobre el Valor AñadidoDeduções e devoluções

Resumo: Para poder deduzir os valores de IVA su-portados nas aquisições de bens ou serviços, segundo o artigo 97 da Ley del IVA (ley 37/1992), é necessário possuir o documento justificativo do Direito à dedução, o qual deve cumprir os requisitos formais regulamen-tarmente estabelecidos. Nas facturas, a identificação do destinatário (NIF) é um requisito substancial exigido pelo artigo 3 do Real Decreto 2402/1985, cuja falta impede o exercício do direito à dedução enquanto não for sanada.

N.º de Resolução: 00/3537/2006Data: 10/09/2008

Impuesto sobre SociedadesFusões

Resumo: Não é aplicável o regime especial de fu-sões, cisões, entrada de activos e troca de valores do Ca-pítulo VIII do Título VIII da lIS (ley 43/1995). Não se verifica “razão económica válida” na incorporação de uma sociedade transparente cujo activo não está afecto a nenhuma actividade económica, visto que não há que falar de “reestruturação empresarial” quando não exis-

espanha

82 REVISTA FISCAl Setembro/Outubro | 2010

te “actividade empresarial” e não se considera “motivo económico válido” suficiente da entidade a simples re-dução de custos. Tão pouco se verifica “razão económi-ca válida” na incorporação de uma sociedade inactiva. Não se considera “motivo económico válido” a situação de desequilíbrio patrimonial da incorporada, uma vez

Resumo do Boletin Oficial del Estado

Ley 3/2010, de 20 de Maio, pela qual se determina a tributação aplicável aos veículos híbridos eléctricos e aos veículos eléctricos.

bOE de 14.06.2010

Protocolo que modifica el Convenio entre el Rei-no de España y el Gran Ducado de Luxemburgo para evitar a dupla tributação em matéria de impostos sobre o rendimento e sobre o património e para prevenir a fraude e a evasão fiscal, celebrado em bruxelas em 10 de Novembro de 2009.

bOE de 31.05.2010

Corrección de errores de la Ley 2/2010, de 1 de Março, pela qual são transpostas determinadas directi-vas no âmbito da tributação indirecta e é modificada a Ley del Impuesto sobre la Renta de no Residentes para adaptá-la às normas comunitárias.

bOE de 26.05.2010

Orden EHA/1338/2010, de 13 de Maio, pela qual são aprovados os modelos de declaração do Impuesto so-bre Sociedades e do Impuesto sobre la Renta de no Residentes correspondente a estabelecimentos estáveis e a entida-des em regime de imputação de rendimentos constitu-ídas no estrangeiro e com presença em território espa-nhol, para os períodos de tributação iniciados entre 1 de Janeiro e 31 de Dezembro de 2009, são dadas instruções relativas ao procedimento de declaração e pagamento e são estabelecidas as condições gerais e o procedimento para a sua apresentação electrónica.

bOE de 24.05.2010

Resolución de 18 de Maio de 2010, da Dirección Ge-neral de la Agencia Estatal de Administración Tributaria, relativa ao registo de procurações e ao registo das sucessões e das representações legais de menores e incapazes para a rea-lização de actos por Internet perante a Agencia Tributaria.

bOE de 21.05.2010

Orden EHA/1198/2010, de 4 de Maio, pela qual é regulamentado o Registro Electrónico del Ministerio de Eco-nomía y Hacienda.

bOE de 11.05.2010

Orden EHA/1059/2010, de 28 de Abril, pela qual são reduzidos os índices de rendimento líquido aplicáveis no período de tributação de 2009 no método de determinação directa do Impuesto sobre la Renta de las Personas Físicas para as actividades agrícolas e pecuárias afectadas por diversas circunstâncias excepcionais e os módulos do regime espe-cial simplificado do Impuesto sobre el Valor Añadido para as re-construções ou reparações de casas particulares aprovados pela Orden EHA/99/2010, de 28 de Janeiro, pela qual são estabelecidos para o ano de 2010 o método de determinação directa do Impuesto sobre la Renta de las Personas Físicas e o re-gime especial simplificado do Impuesto sobre el Valor Añadido.

bOE de 30.04.2010

Resolución de 27 de Abril de 2010, da Subsecreta-ría, pela qual é modificada a relação de procedimentos e actos previstos na Orden EHA/693/2008, de 10 de Março, e é creado o Registro Electrónico del Ministerio de Eco-nomía y Hacienda.

bOE de 29.04.2010

Orden EHA/993/2010, de 21 de Abril, pela qual é estabelecido o procedimento para a devolução parcial dos montantes do Impuesto sobre Hidrocarburos suportados pelos agricultores e criadores de gado.

bOE de 23.04.2010

Resolución de 6 de Abril de 2010, da Presidencia de la Comisión Nacional de la Competencia, pela qual é modifi-cada a Resolución de 23 de Abril de 2008, que regula o procedimento para a apresentação da autoliquidação e as condições para o pagamento por via electrónica da taxa prevista no artigo 23 da ley 15/2007, de 3 de Julho, de Defensa de la Competencia.

bOE de 16.04.2010

que perante a mesma o correcto teria sido efectuar um aumento de capital para reduzir perdas, sem necessidade de recorrer a uma incorporação.

N.º de Resolução: 00/953/2007Data: 11/09/2008