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    TERA, 17 DE JUNHO DE 2008, 09H26 ATUALIZADA S 15H02

    Raposa Serra do Sol: um lugar de direitoMarina Silva

    De Braslia (DF) muito especial para mim estrear no territrio dos internautas, por meio de Terra Magazine, a quem agradeo pela

    oportunidade. Espero dedic-la a um bom dilogo com as crticas e idias de todos vocs. Tambm especial por

    acontecer num momento novo, no Brasil e no mundo, que exige conhecimento, sensibilidade e intuio para identificar, na

    massa impressionante de informaes que nos chega, a profundidade dos fatos e processos, a conexo entre passado e

    futuro, enfim, o nosso espao de escolhas reais, sejam individuais ou coletivas.

    Faz parte desse espao uma interpelao tica da qual no podem fugir nem os pases desenvolvidos nem os em

    desenvolvimento, entre eles o Brasil. A Amaznia, com sua incomparvel floresta tropical, sua biodiversidade e sua

    diversidade social, talvez seja o maior smbolo dessa interpelao. Para os pases desenvolvidos, a pergunta que se faz

    sobre seu passado. Destruram sua biodiversidade, arrasaram os povos originrios dos lugares conquistados e

    provocaram, a partir da revoluo industrial, alteraes ambientais to extensas que levaram atual crise ambientalglobal, em cujo centro esto as mudanas climticas.

    Embora parea paradoxal, nossa situao bem melhor porque somos questionados sobre o futuro. Quando somos

    perguntados sobre o passado, estamos diante do quase irremedivel. Sobre o futuro, temos a chance de projet-lo. Isso

    implica dizer o que vamos fazer com nossa biodiversidade, porque temos 20% das espcies vivas do planeta; com nossos

    recursos hdricos, porque temos 11% da gua doce disponvel, 80% dos quais na Amaznia; com a maior floresta tropical

    e com a maior diversidade cultural do mundo. O Brasil ainda tem cerca de 220 povos indgenas que falam mais de 200

    lnguas.

    Essa uma poderosa interpelao porque permite escolhas e, portanto, exige que estejamos altura da oportunidade de

    optar. A discusso de carter civilizatrio, no se esgota em circunstncias ou polmicas pontuais. O Brasil uma

    potncia ambiental e humana e no pode se conformar em querer, sculos depois, a mesma trajetria que fez dos pasesdesenvolvidos, ricos, porm com graves desequilbrios ambientais. Nossa meta deve ser: desenvolvidos, porm por meio

    de caminhos diferentes.

    A diferena est, em primeiro lugar, em aceitar a interpelao tica a que me referi, sem tentar lhe dar respostas banais e

    evasivas. A falsa polmica em torno da demarcao da reserva indgena Raposa Serra do Sol, em Roraima, resume a

    radicalidade exigida por essa interpelao.

    Como ministra do Meio Ambiente enfrentei, ao lado dos ministrios da Justia e do Desenvolvimento Agrrio, uma

    situao no Par em que um grande grileiro apossou-se de 5 milhes de hectares na Terra do Meio. Conseguimos criar

    nessa rea a maior estao ecolgica do pas, com 3 milhes e 800 mil hectares. Vi a Polcia Federal implodir 86 pistas

    clandestinas usadas para trfico de drogas e roubo de madeira. E nunca ningum disse que aquele grileiro era ameaa

    soberania nacional. Mas os 18 mil ndios de Roraima so assim considerados por alguns e muitas vezes tratados como se

    fossem mais estrangeiros do que os estrangeiros, porque sequer so reconhecidos como seres humanos em p de

    igualdade com os demais.

    Um exemplo: o mundo ocidental tem em Jerusalm um ponto de referncia do sagrado para inmeras religies de matriz

    judaico-crist. Ficaramos chocados se algum quisesse destru-la e a defenderamos como algo que constituinte

    essencial de nossa cosmoviso. No entanto, em relao cosmoviso dos ndios, acha-se pouco relevante considerarem

    o Monte Roraima o lugar da origem do mundo.

    Pode parecer, para quem acompanha o caso de Raposa Serra do Sol, que a criao da reserva indgena foi um

    procedimento autoritrio e injusto, que desconsiderou direitos dos no-ndios. No verdade. A legislao brasileira define

    detalhadamente critrios para demarcao. O contraditrio garantido por decreto, exigindo que sejam anexados, ouvido

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    e examinados os argumentos contrrios. Manifestam-se proprietrios de terra, grileiros, associaes, sindicatos de

    trabalhadores ou patronais, prefeituras, rgos pblicos estaduais e federais, apresentando tudo o que considerem

    relevante. Por isso, a demarcao fsica das reas leva, em geral, muitos anos, o que elimina quaisquer possibilidades de

    aodamento.

    Roraima tem cerca de 400 mil habitantes num territrio de cerca de 225 mil quilmetros quadrados. A populao rural no

    chega a 90 mil pessoas, das quais 46 mil so indgenas, ou seja, 52% do total, ocupando 47% das terras. Raposa Serra

    do Sol ocupa 7,7% da rea do Estado e abriga 18 mil ndios. Por outro lado, seis rizicultores ocupam 14 mil hectares em

    terras da Unio. Em maio ltimo, o Ibama autuou a fazenda Depsito, do prefeito de Pacaraima, Paulo Csar Quartiero,

    por ter aterrado duas lagoas e nascentes, alm de margens de rios, e por ter desmatado reas destinadas preservao

    permanente e reserva natural legal.Em 1992, quando foi homologada a reserva Ianomami, seis vezes maior do que a Raposa Serra do Sol, houve muito

    estardalhao, alimentado pela acusao de que isso representaria ameaa soberania nacional e grave risco de

    internacionalizao da Amaznia. Passados 16 anos, a reserva abriga 15 mil ndios em rea de fronteira e no se tem

    notcia de que tenham causado qualquer dano nossa soberania e muito menos que pretendam ser uma "nao indgena

    separada do territrio brasileiro, como diziam poca os opositores da homologao.

    Estamos perto da deciso do Supremo Tribunal Federal sobre a demarcao contnua de Raposa Serra do Sol. Ser um

    grande desafio para a instituio e para todo o Pas, num momento que o mestre Boaventura de Souza Santos chama de

    bifurcao histrica. Diz ele que as decises do STF condicionaro decisivamente o futuro do pas, para o bem ou para o

    mal. Que esta deciso seja parte da resposta que devemos dar interpelao tica sobre nosso futuro.

    Marina Silva professora secundria de Histria, senadora pelo PT do Acre e ex-ministra do Meio Ambiente.

    http://terramagazine.terra.com.br/interna/0,,OI2953627-EI11691,00.html

    Localizao e extenso das Terras Indgenas

    O Brasil tem uma extenso territorial de 851.196.500 hectares, ou seja, 8.511.965 km2. Asterras indgenas somam 694 reas, ocupando uma extenso total de 113.233.949 hectares(1.132.339 km2). Assim, 13.3% das terras do pas so reservados aos povos indgenas.

    A maior parte das terras indgenas concentra-se na Amaznia Legal: so 422 reas,111.401.207 hectares, representando 22,25% do territrio amaznico e 98.42% daextenso de todas as terras indgenas do pas.O restante, 1.58%, espalha-se pelasregies Nordeste, Sudeste, Sul e estado do Mato Grosso do Sul.

    Essa situao de flagrante contraste pode ser explicada pelo fato de a colonizao do Brasilter sido iniciada pelo litoral, o que levou a embates diretos contra as populaes indgenas

    que a viviam, causando enorme depopulao e desocupao das terras, que hoje esto emmos da propriedade privada. Aos ndios restaram terras diminutas, conquistadas a duraspenas. Por exemplo, em So Paulo, a terra Guarani Aldeia Jaragu tem apenas dois hectaresde extenso, o que impossibilita que vivam da terra.

    H vozes dissonantes em relao ao tamanho das terras indgenas na Amaznia, alegandoque haveria "muita terra para poucos ndios". Esses crticos se esquecem de que os ndios tmque tirar todo seu sustento da terra. Muitas vezes, as terras indgenas tm grandes partesno agricultveis, e sofrem ou sofreram diversos tipos de impactos

    http://pib.socioambiental.org/pt/c/terras-indigenas/demarcacoes/localizacao-e-extensao-das-tis

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    EDIO 175/OUTUBRO DE 2014 - 07/10/2014

    Estrada de Ferro MadeiraMamor: Fim da linhaA lendria Ferrovia do Diabo, em Rondnia, que h 100 anos tentou atravessar a floresta, est em runaspor Caio Barretto Briso

    A estao de Porto Velho durante aenchente deste ano no Rio Madeira.Estaes, cemitrios e locomotivas so onico legado da ferrovia mais importantej planejada no Brasil.

    Foto: Felipe Fittipaldi

    tempo de chuva. Com o Rio Madeira correndo cheio sobre a plancie amaznica, possvel ouvir suas guas a certa

    distncia. Enquanto caminhamos mata adentro, algum sussurra atrs de ns. Aqui, diz Lord Jesus Brown, um senhor negro

    de quase 2 metros de altura. Ele para diante de um pedao de concreto cravado no solo. a lpide de um estrangeiro morto em

    1910. Tentamos ler seu nome, mas as letras esto muito esmaecidas. No faz diferena. O povo morria igual a bicho, diz Lord

    Muitos acreditavam que este lugar era amaldioado.

    O cemitrio da Candelria fica a poucos quilmetros do Centro de Porto Velho, a capital de Rondnia. Aqui jazem mais de 1

    500 homens que morreram entre 1907 e 1912, durante a terceira e ltima tentativa de construo da lendria Estrada de Ferro

    Madeira-Mamor. Somando esse contingente aos que pereceram antes, o total de mortos beira os 10 mil. O matagal j ocultou

    quase todas as sepulturas desses aventureiros, vindos de pases to diversos quanto Irlanda e ndia, Alemanha e Barbados,

    Estados Unidos e Grcia. incrvel que se tenha conseguido abrir um caminho de 366 quilmetros em uma das regies mais inspitas do planeta para

    tudo se perder em to pouco tempo. Feita para escoar a imensa produo de borracha amaznica, que abasteceu o mundo e

    permitiu o boom da indstria automobilstica at o comeo do sculo 20, a Madeira-Mamordemorou quatro dcadas para ficar

    pronta. Tanto tempo que, ao ser concluda, em 1912, o ciclo da borrachana Amrica do Sul j estava em declnio. O mercado

    migrou para as colnias britnicas da sia aps os ingleses levarem para l 70 mil sementes da Hevea brasileira, das quais 2

    800 germinaram. Sessenta anos depois de inaugurada, a estrada de ferro foi desativada pelo governo militar, que construiu uma

    rodovia para substitu-la e destruiu boa parte do maquinrio e dos documentos histricos. Rondnia chora at hoje o fim da

    ferrovia. Todos lamentam que ela tenha sido fechada, todos gostariam que ela um dia voltasse. As pessoas recordam o trem

    avanando sobre os trilhos, cortando a floresta: as lembranas mais singelas parecem ser as mais marcantes. Quando a via

    completou 100 anos, em 2012, uma das locomotivas foi preparada para apitar e soltar fumaa, num gesto simblico. Muitos

    foram s lgrimas.A CRISE FINANCEIRA que tomou conta dos Estados Unidos em 1873 acabou conduzindo os americanos para o que seria a

    primeira grande obra do pas em territrio estrangeiro. Com a quebra de bancos, os projetos de ferrovias no pas foram

    interrompidos, deixando uma legio de engenheiros e trabalhadores desempregados. Quando souberam que a respeitada firma

    P&T Collins, dos irmos Peter e Thomas Collins, fora contratada para criar uma ferrovia na Amaznia, 80 mil homens se

    candidataram a uma vaga.

    O navio Mercedita, com 210 homens e 1 050 toneladas de material, deixou o cais de Willow Street, na Filadlfia, na tarde de 3

    de janeiro de 1878. Anunciada com destaque pelos jornais americanos, a partida era tambm um marco, uma vitria em uma

    empreitada na qual os ingleses saram derrotados. Vinte anos antes, a construtora Public Works, de Londres, abandonou

    equipamentos beira do Rio Madeira sem assentar um nico quilmetro de linha. Nos tribunais londrinos, declarou que a zona

    era um antro de podrido onde seus homens morriam qual moscas e que, mesmo se dispondo de todo o dinheiro do mundo e

    de metade de sua populao, seria impossvel construir a estrada.

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    Convocado para servir durante aSegunda Guerra, Jos Primo Dinizveio do Nordeste para sersoldado da borracha. Chegou

    at os seringais de Rondnia pelaferrovia e nunca mais voltou parasua terra natal. Hoje pastor numaigreja adaptada em sua prpriacasa em Porto Velho

    Foto: Felipe Fittipaldi

    Mas nada parecia arrefecer o otimismo dos americanos at que chegaram Amaznia. O acordo era que fossem feitos 10

    quilmetros de trilhos por ms. Passados quatro meses, contudo, apenas 3 quilmetros estavam prontos. A malria atacava os

    homens sem piedade. As condies eram to ruins que um grupo de 300 americanos abandonou a obra e fugiu de barco, sem

    um tosto, para Belm. L, encontraram situao igual ou pior do que na frente de trabalho. Tiveram de pedir esmola nas ruas

    para sobreviver. Thomas Collins investiu o que tinha no projeto tanto que se mudou com a mulher para Santo Antnio, onde asobras seguiam a duras penas. Esperava um financiamento que viria da Inglaterra, o qual nunca chegou. Sem ter como pagar os

    homens, assistiu de mos atadas debandada daquele exrcito de flagelados. Ele prprio esteve entre a vida e a morte quando

    um ndio lhe atravessou o pulmo com uma flechada. Foram trs meses de agonia antes de o empresrio voltar para casa,

    derrotado e com uma dvida de 800 000 dlares. O historiador Manuel Rodrigues Ferreira conta no livroA Ferrovia do Diabo,

    de 1960, que a senhora Collins enlouqueceu na floresta. Ao regressar, teve de ser internada num hospital para doenas mentais

    onde morreu. Os 7 quilmetros de trilhos, assentados ao longo de 18 meses, passaram 28 anos entregues selva. A pequena

    locomotiva Baldwin se transformou em galinheiro.

    Corria o ano de 1907 quando teve incio a ltima tentativa de concluso da obra. O Brasil passara de Imprio a Repblica, e a

    concesso da ferrovia, entregue ao americano George Earl Church, foi transferida para seu conterrneo Percival Farquhar.

    Agora havia um motivo a mais para a obra: em 1903, o Brasil tornara-se signatrio do Tratado de Petrpolis, em que se

    comprometia com a Bolvia a fazer a linha frrea em troca do territrio do Acre. A maior parte dos trabalhadores veio do Caribe,de ilhas como Barbados e Antilhas, onde no se sabia do suplcio enfrentado antes por ingleses e americanos.

    Farquhar no conjugava o verbo fracassar. Para combater a malria, construiu o hospital da Candelria. Em 1910, contratou

    Oswaldo Cruz, mdico sanitarista de reputao internacional, para realizar uma inspeo na regio. As palavras dele, em carta

    enviada para a esposa, no deixam dvidas sobre as condies precrias: No se conhece pessoas nascidas no local: essas

    morrem todas. A regio est de tal modo infectada que a populao no tem noo do que seja o estado hgido e para ela a

    condio de ser enfermo constitui normalidade. Os operrios foram obrigados a tomar doses altas de quinino; muitos se

    recusaram, preferindo o risco de adoecer a ingerir o remdio amargo. Mas, com a constante troca de operrios em 1910, a

    mdia foi de 500 novos a cada ms , a obra foi enfim concluda.

    UMA FRASE PROFTICA marca a entrada de Jaci-Paran, primeira parada em minha jornada, ao lado do fotgrafo Felipe

    Fittipaldi, em busca de vestgios da MadeiraMamor. Est declarado: Jaci-Paran do Senhor Jesus, l-se na placa

    enferrujada. Nada poderia combinar menos com este vilarejo, a 90 quilmetros da capital Porto Velho. O lugar aparece com

    frequncia nas pginas policiais dos jornais de Rondnia, famoso pela presena dos trabalhadores da Usina Hidreltrica de

    Jirau, em fase inicial de operao no Rio Madeira. Eles se sentam em bares, acendem cigarros e esperam as mulheres. Posso

    beber com voc?, elas perguntam, sorrindo ao mesmo tempo em que enchem o copo. Os pees logo so arrastados para

    quartos escuros dentro do bar.

    Um pouco adiante est Abun, um povoado que se formou em torno da estao ferroviria, hoje uma runa. As casas f icam

    beira da BR- 364, assim como uma igreja catlica, outra evanglica e trs pequenos mercados. s margens da estrada, pedao

    de locomotivas rodas, motores, bitolas. Nos anos 1970, quando a estrada de ferro foi desativada, no se sabia o que fazer com

    tanto material. As peas foram simplesmente abandonadas, diz o ex-ferrovirio Zacarias Batista da Silva, de 77 anos,

    conservador de linha entre 1960 e 1969. Dez horas por dia, sua funo era capinar e roar o entorno dos trilhos e trocar os

    dormentes de madeira apodrecidos entre os quilmetros 244 e 255. Existiam 26 acampamentos ao longo da ferrovia. O meu er

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    o mais isolado, entre o vazio e o nada. A gente ficava 30 dias no meio do mato, sem ver a famlia, conta. Peguei malria dez

    vezes.

    Em alguns trechos da BR-425, em direo a Guajar-Mirim, a floresta parece engolir a estreita passagem. Uma chuva pesada

    comea a cair, alagando os buracos no meio do caminho e tornando ainda pior a travessia at Nova Mamor, cidade de 23 mil

    habitantes nascida quando a rodovia, ainda sem asfalto, alcanou o lugar, em 1968. A formao desse novo ncleo urbano

    esvaziou Vila Murtinho, a 10 quilmetros de distncia, no encontro dos rios Mamor e Beni, onde nasce o Madeira. Vila Murtinho

    era uma das principais estaes da ferrovia, estratgica para o escoamento da borracha boliviana que descia o Rio Beni. Com a

    rodovia, o trem passou a vir cada vez menos, at cessar. O povo acompanhou os novos ventos e mudou-se para Nova Mamor

    Hoje a vila parece mal-assombrada. A estao seria irreconhecvel no fosse uma inscrio, quase apagada, onde se l

    E.F.M.M., sigla de Estrada de Ferro Madeira-Mamor.

    AS MESMAS quedas-dgua que exigiram a construo da ferrovia, por dificultarem o transporte da borracha pelo Madeira at o

    Amazonas, agora recebem de uma s vez duas hidreltricas. Um novo ciclo de desenvolvimento est em curso no oeste de

    Rondnia. Cada usina ter aproximadamente 50 turbinas. Por enquanto, 32 esto em operao na Usina de Santo Antnio, em

    Porto Velho, enquanto 12 funcionam na de Jirau, prxima a Jaci-Paran. Quase 3 mil ribeirinhos foram removidos das reas

    alagadas pelos empreendimentos, que geram, hoje, mais de 2 000 megawatts mdios com a potncia mxima, as duas vo

    gerar metade da energia de Itaipu.

    Para compensar o impacto das obras, foi decidido que Santo Antnio e Jirau fariam uma srie de investimentos. Em 2005, o

    Instituto do Patrimnio Histrico e Artstico Nacional (Iphan) tombou os primeiros 8 quilmetros da ferrovia e exigiu das usinas

    uma compensao: a reabertura do trecho turstico da linha, de Porto Velho at Santo Antnio, que funcionou na dcada de

    1980. Como em outubro de 2014, Porto Velho comemora seu centenrio, havia esperana de que o passeio de trem e os

    cemitrios da Candelria e das locomotivas fossem restaurados antes disso o que, j se sabe, no acontecer.

    Para complicar, est sendo estudada a construo de uma terceira usina, perto de Nova Mamor. Se isso acontecer, uma ilha

    fluvial poder ficar debaixo dgua. Os moradores de um antigo vilarejo, Vila Bela, esto preocupados. Quando Jirau entrou em

    operao, a 100 quilmetros rio abaixo, os peixes minguaram. Os ribeirinhos tiveram de abandonar a pesca, principal fonte de

    renda de quase todas as 160 famlias. O que piora a situao de Vila Bela o fato de o pedao de terra pertencer Bolvia.

    Ningum deve obter nenhuma compensao vinda do Brasil. No queremos dinheiro. Queremos que devolvam o nosso

    trabalho, suplica Jos Guali Pinto, de 45 anos, olhar sofrido, porm amvel.

    A Usina de Jirau faz parte doComplexo Hidreltrico do RioMadeira, que j conta comoutra barragem, a de SantoAntnio. Ainda esto sendorealizados estudos paraviabilizao de uma terceirausina de grande porte naregio

    Foto: Felipe Fittipaldi

    Enquanto isso, Nova Mamor j comea a se preparar para uma nova leva de migrantes. Dono do modesto hotel Dallas, Manoe

    Fernandes de Lima planeja aumentar o nmero de quartos de 15 para 45. Nascido na localidade chamada Caldeiro do Inferno,

    ele v com bons olhos a chegada do progresso. Sua famlia se mudou para Nova Mamor quando a rodovia foi aberta. Antes a

    gente s via o rio. Carro, trator, tudo era novidade, lembra. Mas, se uma hidreltrica for erguida ali, os migrantes no sero

    como ele nem como seus pais, que buscam vnculos com o lugar e nele se estabelecem. Sero milhares de operrios

    desenraizados e centenas de garotas de programa atrs de um novo mercado. Exatamente como em Jaci-Paran, a cidade do

    Senhor Jesus.

    POUCOS MESES APS nossa primeira visita a Rondnia, o Rio Madeira entra em fria. Suas guas sobem tanto que chegam

    ao nvel mais alto j conhecido, perto de 20 metros acima do normal. Ruas se transformam em crregos. Casas e pequenos

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    edifcios ficam submersos. Mais de 30 mil pessoas so desabrigadas. Na capital, acompanhados pelo historiador Aleksander

    Palitot, tentamos entrar de caiaque no antigo galpo onde fica o museu da ferrovia, no Parque Madeira-Mamor, mas as portas

    esto trancadas. Por uma brecha, v-se uma locomotiva quase totalmente submersa. Mveis centenrios boiam. mais uma

    tragdia na histria da ferrovia, afirma Palitot. Perto dali, uma fantica religiosa, diante de uma pequena plateia, anuncia o

    apocalipse: A fria de Deus vai inundar a Terra. o fim se aproximando. Na verdade, porm, tudo leva a crer que a presena

    das duas hidreltricas no Madeira, e no a ira dos cus, tenha agravado os efeitos da cheia do inverno amaznico.

    A viagem pela Madeira-Mamor termina em Guajar-Mirim, ltima cidade da fronteira oeste de Rondnia, o ponto final da

    estrada de ferro, onde at hoje vivem muitos ex-ferrovirios. Do outro lado do Rio Mamor fica uma zona de livre comrcio, na

    Bolvia. Todos querem pegar logo uma balsa e atravessar o rio atrs de roupas e perfumes importados e uma poro de

    quinquilharias falsificadas. O povo de Guajar faz as compras na Bolvia, onde tudo mais barato, diz Llia Alves Pontes de

    Oliveira, de 58 anos.

    O pai de Llia foi um dos 60 mil soldados da borracha durante a Segunda Guerra Mundial, quando a Madeira-Mamor voltou a

    ser acionada pelo pas para transportar um batalho de nordestinos, a maioria cearense, que se deslocavam para os seringais

    de Rondnia em busca de uma vida melhor. Chegando l, com alimentao precria e sem nenhuma assistncia mdica, eram

    submetidos a longas jornadas na selva. O pretexto parecia nobre: ajudar os pracinhas, soldados brasileiros da Fora

    Expedicionria que lutaram na Itlia. O motivo real: fornecer borracha durante a guerra para os americanos. Calcula-se que

    metade do contingente de seringueiros nada menos que 30 mil homens tenha morrido nos seringais.

    O drama da Ferrovia do Diabo parece amenizado em Guajar. Aps tanto abandono visto ao longo do caminho, a estao de

    passageiros no est apenas de p, mas restaurada. Ali funciona o Museu Municipal Histrico de Guajar-Mirim, reinaugurado

    h poucos meses, aps cinco anos de portas fechadas, com o esforo de pessoas que dariam a vida pela ferrovia. No

    entardecer em que passamos por l, crianas brincam de subir e descer da locomotiva que fica no ptio do casaro. Agora faz

    de conta que o trem est acelerando, diz um dos meninos. Piu, piu!, grita para o alto, como se a mquina estivesse, por um

    milagre, apitando. Nos sonhos de uma criana, o trem se movimenta.

    http://viajeaqui.abril.com.br/materias/estrada-de-ferro-madeira-mamore-ferrovia-do-diabo?pw=1

    Amaznia concentra quase 60% dasmortes por conflitos no campo no BrasilComisso Pastoral da Terra solicitou audincia para esta tera com o ministro da Justia;Rondnia lidera lista de homicdios, com um quarto dos casos em 2012, seguida pelo Parpor Sarah Fernandes publicado 22/04/2013 16:43, ltima modificao 06/05/2013 13:01

    Ao todo 60% dos envolvidos em conflitos so indgenas, quilombolas e posseiros (Foto: Arquivo/RBA)

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    So Paulo Os estados que compem a Amaznia concentraram, em 2012, 489 dos 1.067 conflitos por terraregistrados no pas (45,8%), que envolvem desocupaes, resistncia e enfrentamentos motivados pelo acesso terra.Os dados so do relatrio Conflitos no Campo no Brasil ,lanado hoje (22), em Braslia, pela Comisso Pastoral daTerra (CPT).

    Na Amaznia esto 97% das reas envolvidas em conflitos. L se concentraram 58,3% dos assassinatos (21 de 36);84,4% das tentativas de homicdio (65 de 77); 77,4% das ameaas de morte (229 de 296); 62,6% dos presos (62 de 99)63,6% dos registros de agresso (56 de 88); e 67% dos casos de trabalho escravo. A expanso da indstria extrativamineral apontada como um dos principais responsveis pelas ocorrncias.

    Os conflitos decorrem, por um lado, da ao de grupos que lutam contra o acesso desigual terra e ao uso dosrecursos naturais, contra a insegurana da posse e a distribuio concentrada da propriedade, aponta o texto. Por

    outro, decorrem tambm da reao dos grandes proprietrios aos esforos empreendidos pelos movimentos sociais parreduzir a concentrao fundiria, democratizar a terra e pressionar o Estado a mudar o padro de suas polticasagrrias.

    Em todo o pas, os assassinatos motivados por conflitos por terra aumentaram 24% entre 2011 e 2012, passando de 29para 36. Rondnia, estado com maior nmero de ocorrncias, concentrou nove dos homicdios, seguida pelo Par, comseis. As tentativas de assassinatos tambm aumentaram 51% no perodo analisado (de 38 para 77), assim como as

    prises de trabalhadores 11,2% (de 89 para 99).

    At a ltima sexta-feira (19), j foram registrados nove homicdios no campo em 2013, de acordo com a CPT.Observa-se forte protagonismo de setores conservadores, como fazendeiros, grileiros, empresrios e mineradoras,combinado com um aumento dos ndices de violncia privada, diz o texto.

    Em relao aos grupos sociais envolvidos nos conflitos, 15% eram indgenas, 12%, quilombolas, 9%, membros deoutras comunidades tradicionais, e 24%, posseiros e ocupantes de reas sem o ttulo de propriedade. Conclui-se que60% dos que esto envolvidos em conflitos fazem parte de grupos humanos que no se enquadram nos parmetrosexigidos pelo capitalismo e sobre os quais a presso maior, diz o texto.

    Os conflitos so as aes de resistncia e enfrentamento que acontecem em diferentes contextos sociais no mbitorural, envolvendo a luta pela terra, gua, direitos e pelos meios de trabalho ou produo, explica o relatrio. Estesconflitos acontecem entre classes sociais, entre os trabalhadores ou por causa da ausncia ou m gesto de polticas

    pblicas.

    Representatividade

    O relatrio destaca que as populaes tradicionais tm pouca representatividade no Congresso Nacional, uma vez que

    Frente Parlamentar da Agropecuria era composta, em 20 de maro, por 214 deputados e 14 senadores, uma super-representao da populao rural, que 14% do total da populao brasileira, de acordo com o Censo de 2010.Segundo o texto, 41,7% dos deputados defendem os interesses de apenas 9,1% dos proprietrios rurais.

    Tendo isso em vista, a Comisso Pastoral da Terra solicitou uma audincia amanh (23) com o ministro da Justia,Jos Eduardo Cardozo, para entregar o relatrio e discutir violncia e impunidade dos crimes no campo. O encontroainda no foi confirmado.

    O capital continua a espoliar as comunidades de seus territrios, pois a disputa dura e desigual. Os indgenas ecamponeses contam com a fora de sua resistncia e o apoio de seus aliados. J os interesses do capital so defendidosestimulados e financiados pelos poderes pblicos, e so enaltecidos pela grande mdia, conclui o relatrio.

    O documento elaborado anualmente pela Comisso Pastoral da Terra desde 1985. Os dados levantados proveem de

    declaraes, cartas, boletins de ocorrncia e relatos, reportagens e publicaes de diversas instituies.http://www.redebrasilatual.com.br/ambiente/2013/04/amazonia-concentra-o-maior-numero-de-conflitos-por-terra-do-pais

    29/05/2014 - 14:07

    Fiscalizao flagra escravido na extrao de piaava no AmazonasTreze trabalhadores eram submetidos a servido por dvida, jornadas excessivas e condies degradantes

    de alojamento em Barcelos (AM), no meio da floresta AmaznicaPor Igor Ojeda

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    A vassoura que voc usa em casa pode ter tido trabalho escravo em seu processo de fabricao. Uma operao realizadaentre 27 de abril e 11 de maio resgatou 13 pessoas em condies anlogas de escravos trabalhando na extrao depiaava em em duas comunidades rurais entre os municpios de Barcelos e Santa Isabel do Rio Negro, no norte do estadodo Amazonas, a cerca de 400 quilmetros da capital Manaus. A fibra, originria de uma das espcies de palmeira, amplamente utilizada na produo de vassouras.

    Os trabalhadores resgatados eram submetidos ajornadas excessivas e servido por dvida e ficavamalojados em construes improvisadas no interior dafloresta Amaznica, sem condies de segurana ehigiene. Segundo os relatos colhidos pelos integrantes

    da fiscalizao, eles extraiam a piaava de segunda asexta-feira. Nos fins de semana, faziam obeneficiamento da fibra, conhecido comopenteamento. Participaram da operaorepresentantes do Ministrio Pblico Federal noAmazonas (MPF/AM), Ministrio Pblico do Trabalho noAmazonas (MPT 11 Regio), Ministrio do Trabalho eEmprego (MTE), Exrcito e Polcia Federal.

    De acordo com informaes do MPT, os trabalhadorescontraam dvidas j antes de iniciarem as atividades.Intermedirios chamados de patrezinhos ou

    aviadores davam adiantamentos em dinheiro ou

    Piaabeiros ficavam alojados em construesimprovisadas no interior da floresta Amaznica. Fotos:

    MPT/AM

    forneciam mercadorias e insumos necessrios para a realizao dos trabalhos, como combustvel e alimentos, comvalores superfaturados em at 140%.

    Segundo o procurador Renan Bernardi Kalil, os piaabeiros precisavam passar um longo perodo de tempo extraindopiaava para enfim quitarem a dvida e obterem algum rendimento, que em mdia ficava em R$ 200 mensais. Nenhum do13 resgatados havia conseguido ganhar um valor correspondente ao salrio mnimo brasileiro, de R$ 724, e em algunscasos novas dvidas eram contradas. Alm disso, descontos de 20% eram aplicados sobre o peso da piaava extrada,tanto na entrega dos piaabeiros aos intermedirios, quanto no repasse destes ao empregador.

    A escravido contempornea no Brasil definida pelo artigo 149 do Cdigo Penal. Segundo este, tanto jornadas excessivasquanto condies degradantes de trabalho e servido por dvida servem para caracterizar o crime. De acordo com o queos integrantes da operao apuraram, o empregador dos 13 trabalhadores resgatados era o empresrio Luiz Cludio

    Morais Rocha, o Carioca, proprietrio da empresa Iraj Fibras Naturais da Amaznia. Depoimentos das vtimas e doprprio Luiz Cludio confirmam que este visitava periodicamente os locais de extrao e, portanto, sabia das condiesprecrias a que estavam submetidos seus funcionrios.

    O lugar onde os piaabeiros trabalhavam e se alojavam era de acesso muito difcil. A equipe de fiscalizao teve de viajarpor horas para chegar base montada pelos prprios trabalhadores. Um piaabeiro de 61 anos, h 45 anos no ramo edesde novembro no atual trabalho, relatou que j continuou a extrair piaava mesmo depois de ter sido picado por umescorpio. Quando sou picado trabalho do mesmo jeito. A gente trabalha dodo, mas faz esforo para terminar o trabalhopara pagar o que a gente deve. Se eu for embora no dia que eu fui picado, um dia de trabalho perdido, por isso que agente faz esse esforo, relatou fiscalizao.

    Investigao

    Com base em denncias, o MPF e o MPT japuravam as irregularidades trabalhistas na cadeiaprodutiva da piaava em Barcelos. Em dezembro doano passado, integrantes do MPF aproveitaram arealizao de um projeto do rgo na regio paracolher depoimentos e fazer um diagnstico dasituao. A estimativa que pelo menos mais 80trabalhadores vinculados a Luiz Cludio estejam nasmesmas condies que os 13 resgatados, alm deoutros ligados a outros empregadores. Por essarazo, as investigaes e fiscalizaes vo continuar.O MPF estuda adotar medidas judiciais na esfera

    criminal.

    Para pagarem suas dvidas com o empregador, trabalhadores chegam a

    continuar trabalhando mesmo depois de terem sido picados por escorpio

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    No fim de maio, a Justia do Trabalho do Amazonas, a pedido do MPT, determinou a quebra do sigilo bancrio de LuizCludio e sua empresa, e o bloqueio de R$ 255.472,94, alm de imveis e veculos, para que se garanta o pagamento daverbas rescisrias e indenizao dos trabalhadores resgatados. Segundo comunicado do rgo, o procurador Renan Kalilpediu a liminar diante das condies extremamente degradantes a que estavam submetidos os empregados, endividadosisolados geograficamente e sem qualquer expectativa de receber seus direitos trabalhistas. Segundo ele, a medida foinecessria porque o empregador descumpriu o poder de notificao do Ministrio do Trabalho e Emprego para arealizao dos procedimentos administrativos cabveis e tambm procedeu de m f nas negociaes entabuladas nasemana seguinte ao resgate dos trabalhadores, quando houve o acordo de pagamento das verbas rescisrias eindenizaes devidas.

    No ltimo dia 21, o MPF e o MPT entregou uma lista de recomendaes a rgos e autarquias estaduais e federais das

    reas do meio ambiente, produo rural, trabalho e emprego e poltica fundiria no Amazonas, com indicaescompromissos no sentido de regularizar a cadeia produtiva da piaava e acabe com o regime de aviamento sistema deadiantamento de mercadorias a crdito na atividade extrativista do estado. Secretaria de Meio Ambiente eDesenvolvimento Sustentvel, por exemplo, recomendou-se que deixe de promover qualquer tratativa com os patres quexplorem a piaava sob o regime de aviamento, no qual os trabalhadores so submetidos a condies anlogas deescravo, que legitime essa prtica e desenvolva aes permanentes de formao e capacitao dos piaabeiros,inclusive mediante aes de conscientizao quanto s relaes de trabalho nos piaabais.

    28/03/14

    Campe em conflitos no campo, regio amaznica tem

    falhas na proteo de defensores/as de Direitos HumanosDo total de 1067 conflitos por terra no campo ocorridos em 2012 no Brasil, 489 foram em solo amaznico. O Par est h doi

    anos fora do Programa de Proteo aos Defensores dos Direitos Humanos.

    Reivindicar territrio tradicional e se organizar para garantir condies e devida trouxe riscos aos quilombolas da comunidade Patos do Ituqui,localizada em Santarm/Par. Desde que fizerem o auto-reconhecimentocomo comunidade quilombola, as lideranas comunitrias sofremconstantes ameaas e intimidaes por fazendeiros vizinhos s terras ondevivem.

    O quilombo Patos do Ituqui exemplo do contexto de presso e violaode direitos em que vivem comunidades tradicionais, pequenos agricultores,trabalhadores sem terra e indgenas da regio Amaznica. Os dadosconfirmam a gravidade da situao: em 2012, do total de 1067 conflitos porterra no campo ocorridos no Brasil, 489 foram em solo amaznico.Considerando o total de conflitos no pas, a Amaznia concentra 58,3%

    dos assassinatos, 84,4% das tentativas de assassinatos, 77,4% das ameaas de morte, 62,6% de presos por conflitos e 63,6% deagresses, segundo o Relatrio de Conflitos no Campoda Comisso Pastoral da Terra CPT.

    O cenrio que coloca a Amaznia no topo da lista de conflitos no campo de grandes projetos de infraestrutura, com a expanso

    do agronegcio principal fronteira de expanso agrcola do pas projetos hidreltricos, minerrios e construo de portosgraneleiros. Por outro lado, a falta de regularizao fundiria, de demarcao das terras indgenas e titulao dos territriosquilombolas gera insegurana e torna o terreno ainda mais frtil para conflitos e ameaas aos povos que defendem seus territrios

    Com o objetivo de fortalecer a atuao dos defensores, a Terra de Direitos realiza nos dias 31 de maro e 1 de abril uma oficinasobre os desafios a avanos nas polticas para defensores/as de direitos. O encontro ser em Santarm, Oeste do Par, no Centrode Formao Francisco Roque, e vai reunir lideranas indgenas, trabalhadores agroextrativistas, quilombolas e ribeirinhos. AFederao das Organizaes Quilombolas de Santarm FOQS, a CPT/Santarm/BR 163 e Sindicato dos Trabalhadores eTrabalhadoras Rurais STTR de Santarm so parceiro da atividade.

    Falhas na poltica de proteo

    Desde 2004, existe no Brasil o Programa de Proteo aos Defensores dos Direitos Humanos PPDDH, criado para adotarmedidas de proteo a pessoas que estejam ameaadas em decorrncia da atuao na promoo ou proteo dos direitos. Em 10

    anos de funcionamento, 464 casos foram atendimentos e 257 defensores/as foram includos no Programa. Segundo informaes

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    da Secretaria de Direitos Humanos da Presidncia da Repblica, 325 defensores/as recebem ou receberam algum tipo medidasprotetivas.

    Apesar de estar no topo da violncia no campo, o Par apresenta falhas na proteo de defensores/as. O estado est h dois anossem o Programa de Proteo, por falta de renovao com o governo federal.

    Para a assessora jurdica da Terra de Direitos em Santarm, rina Batista Gomes, uma grande dificuldade do PPDDH que sejainstitudo em mbito estadual. Segundo a advogada, preciso transformar o Programa em uma poltica de estado, assim esteproblema poderia ser resolvido com a aprovao do marco legal do PPDDH, em tramitao desde 2009 (PL 4575/2009).

    preciso fortalecer os/as defensores/as de direitos humanos, dar visibilidade a sua luta e construir estratgias para a suaproteo. Mas acima de tudo, preciso que os rgos responsveis pela execuo da poltica pblica cumpram o seu papel eatuem para assegurar os direitos territoriais das comunidades, afirma rina Batista Gomes.

    Em Santarm, a assessoria jurdica da Terra de Direitos acompanha casos de ameaa aos defensores/as. A organizao tambmcompe a coordenao do PPDDH, como uma das representantes da sociedade civil.

    http://terradedireitos.org.br/2014/03/28/campea-em-conflitos-no-campo-regiao-amazonica-tem-falhas-na-protecao-de-defensoresas-de-direitos-humanos/

    A realidade e a fantasiaPor Lcio Flvio Pinto | Cartas da Amaznia qui, 12 de jan de 2012

    Duas extensas rodovias iniciaram, nos anos 1950, a integrao definitiva da Amaznia ao Brasil. Eram a Belm-Braslia e a Braslia-Acre, com mais de dois mil quilmetros de comprimento. Seus eixos partiam da capitalfederal nos rumos norte e oeste da nova fronteira econmica em abertura. O mineiro Juscelino Kubutscheckqueria que, nos seus cinco anos de mandato como presidente da repblica, o Brasil se desenvolvesse num ritmo10 vezes superior medida do tempo: "50 anos em 5", era o seu slogan.

    O ciclo dos "grandes projetos", entretanto, comeou e se consolidou durante os governos dos generais, que sesucederam de 1964 a 1985. O primeiro desses "grandes projetos" entrou em operao em 1979. O equivalente a

    um bilho de dlares foi investido para que nesse ano comeasse a funcionar uma das maiores minas de bauxitado mundo.

    Distante mil quilmetros do litoral, numa regio isolada e pouco habitada da selva amaznica, sua capacidadenominal era de 3,5 milhes de toneladas do minrio, que d origem ao alumnio. Hoje produz seis vezes mais.

    Dezenas de grandes navios singram os rios Amazonas e Trombetas para ir buscar a carga, que distribuda pelomundo. Outras duas grandes jazidas de bauxita entraram depois em atividade no Par porque a produo daprimeira no pode mais crescer. O rio Trombetas simplesmente no comporta mais nenhum navio. Suacapacidade de escoamento foi saturada.

    Durante os seis primeiros anos de funcionamento, o grande projeto" do Trombetas ofereceu a seus visitantes umespetculo de desperdcio, irracionalidade e selvageria.

    O transporte do minrio entre a mina e o porto, numa distncia de 30 quilmetros, era e ainda feito portrem. Um tero da carga era de rejeito, argila inaproveitvel. Uma vez descartado do processo de lavagem esecagem do minrio, esse material era despejado num dos mais belos lagos da regio, o Batata.

    Quase 20% da superfcie do lago se tornaram terreno slido, compactado. A gua do lago ficou vermelha, comovermelha se tornou toda a paisagem ao redor. Como boa parte da produo ia para o Canad, onde est a sede deum dos scios do empreendimento, a Alcan, o minrio precisava ser secado para no congelar nos pores dosnavios nos perodos de inverno mais intenso.

    A secagem era feita em fornos, que deixavam escapar uma nuvem de p vermelho, da cor da bauxita. Ocombustvel era derivado de petrleo, muito poluente. Durante um tempo a madeira tambm foi queimada.Como o governo pretendia construir uma hidreltrica s proximidades, em Cachoeira Porteira, a Minerao Riodo Norte foi autorizada a abater as rvores situadas na rea do futuro lago. A hidreltrica no saiu. As rvoresforam sacrificadas em uso muito menos nobre do que se tivessem permanecido ali, em p.

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    Em 1985, o recm-empossado presidente Jos Sarney foi mina, na poca controlada pela estatal CompanhiaVale do Rio Doce (em parceria com cinco multinacionais e o grupo Ermrio de Moraes). A TV Globo documentoua visita. Entre as imagens festivas, exibiu cenas chocantes do lago assoreado e da paisagem coberta de pvermelho. Foi um impacto, de repercusso internacional. Parecia uma estampa de Marte na Terra.

    Como uma mineradora que reunia tantos scios importantes no mundo se comportava daquela maneira? Porque, ao invs de transportar lixo mineral de trem para descarreg-lo depois num esplndido lago natural, nofazia a lavagem e a deposio na prpria mina? Por que no colocava filtros nas chamins da usina de secagem dbauxita para evitar a poluio?

    Eram tantos e to graves os questionamentos que a Minerao Rio do Norte precisou fazer novos investimentos eir atrs de tecnologia para corrigir erros flagrantes.

    As operaes de seleo e descarte do minrio foram transferidas para o alto da serra, onde est a jazida. Osburacos provocados pela extrao da argila, uma das sequelas da lavra, foram preenchidos com terra vegetal e afeito o replantio das espcies nativas. Nunca uma mina de bauxita abrigara essa experincia. A tcnica foiadaptada de minas de fosfato da Flrida, nos Estados Unidos. O p vermelho desapareceu. S ento esse "grandeprojeto" entrou no sculo 20, antecipando-se centria seguinte.

    Talvez se as imagens de televiso no tivessem corrido mundo, colocando em m situao perante a opiniopblica internacional o primeiro presidente civil depois das duas dcadas de regime militar brasileiro, e logo emsua primeira viagem (e ainda mais: glamourosa Amaznia), as mudanas no tivessem acontecido. Ou pelomenos no seriam promovidas de forma to ampla e imediata.

    Outra grande mina de bauxita comeou a funcionar h dois anos do outro lado do rio Amazonas, quase na

    mesma posio geogrfica da jazida do Trombetas. de propriedade exclusiva da Alcoa, a maior empresa dealumnio do mundo, que tambm participa da Minerao Rio do Norte.

    A multinacional americana se instalou em Juruti sem querer repetir os erros do Trombetas. Adotou vriasiniciativas para que sua entrada na nova regio fosse suave e sem maiores impactos sociais e ecolgicos. Garanteque pretende funcionar sob um padro de excelncia sem igual em qualquer outro lugar.

    No est conseguindo. Surgiram reas de atrito com a populao primitiva, resistncias e conflitos. Mas nemsempre a responsabilidade pode ser transferida empresa. s vezes por desconhecimento, desinformao oum orientao dos seus crticos ou adversrios.

    V-se que eles ignoram a histria evolutiva dos seus vizinhos do outro lado do gigantesco Amazonas. Um dosseus manifestos ainda faz referncia aos buracos abertos na mina e ao assoreamento do lago Batata, como se o

    modo antigo de produo continuasse em vigor.Uma visita ao local os colocaria em sintonia com a realidade. No para que necessariamente mudem de posio.Mas para perceberem que a complexidade da Amaznia impe mais do que iniciativas voluntaristas e idias semcompromisso com a realidade concreta.

    Afinal, todos os que vivem nessa incrvel regio precisam resolver problemas surgidos no contato do homem comessa natureza nica. Problemas pequenos ou grandes, recorrentes ou absolutamente inditos. Do Joo da Silvaou da multinacional. Se que querem ficar de vez na Amaznia e no apenas continuar em trnsito, comodesatentos turistas ou exploradores, de passagem.

    https://br.noticias.yahoo.com/blogs/cartas-amazonia/realidade-e-fantasia-215228933.html

    10/05/2012 - 20h12

    Obras em hidreltricas podem atrapalhar metabrasileira de emissesCLAUDIO ANGELO - DE BRASLIA

    A reduo de unidades de conservao na Amaznia para fazer um conjunto de hidreltricas do PAC podeemitir 152 milhes de toneladas de gs carbnico -- mais de 10% da meta brasileira de reduo de gasesde efeito estufa.

    O clculo foi feito pelo Imazon (Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amaznia), uma ONG de pesquisasde Belm. Um estudo da ONG, que ser divulgado nesta sexta-feira, alertou contra a aprovao pela

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    Cmara dos Deputados, prevista para a semana que vem, de uma medida provisria polmica que cortar1.500 quilmetros quadrados (o equivalente a uma cidade de So Paulo) de sete reas protegidas paraacomodar os reservatrios das usinas.

    A chamada MP 558 determina a reduo do parque nacional da Amaznia, das florestas nacionais deCrepori, Itaituba 1 e Itaituba 2 e da rea de proteo ambiental do rio Tapajs, no Par, para permitir aconstruo das usinas do complexo Tapajs. Entre elas est a quarta maior hidreltrica do Brasil, So Luizdo Tapajs, de 6.133 megawatts.

    Alm disso, ela incorpora uma medida provisria anterior, que caducou na Cmara, para reduzir os parquesnacionais do Mapinguari e dos Campos Amaznicos, em Rondnia e no Amazonas, visando acomodar as

    hidreltricas de Tabajara e do rio Madeira.A reduo de 1.050 km2 s no Tapajs causaria o desmatamento direto, o alagamento e a degradao deflorestas intactas -- que formam 85% das matas da regio atingida -- com a consequente emisso decarbono.

    A medida provisria objeto de uma ao direta de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal,movida pelo procurador-geral da Repblica, Roberto Gurgel. Segundo Gurgel, inconstitucional reduzirreas protegidas por MP. Alm disso, as reas a serem cortadas so de "extrema relevncia" para aconservao da biodiversidade, segundo diagnstico do Ministrio do Meio Ambiente.

    O governo tem pressa em ver os parques reduzidos. As duas usinas do Madeira, afinal, esto em plenaconstruo, e as cinco do Tapajs foram includas no Plano Decenal de Energia, cuja previso quecomecem a gerar em 2017. Para que o licenciamento tenha incio, porm, preciso mexer nos parques.Como a Folha revelou em fevereiro, o governo j marcara para 2013 o leilo de So Luiz mesmo sem tercomeado o licenciamento.

    No Congresso, o governo manobra para converter a medida provisria em lei. Um projeto de lei deconverso, de autoria do deputado Z Geraldo (PT-PA), deve ser votado em plenrio da tera-feira quevem. Para que vingue, precisa ser apreciado pelo Senado at o final do ms.

    Segundo o Imazon, se a Cmara aprovar o projeto, o governo estar abrindo um "precedente perigoso"para a reduo de vrias outras reas protegidas da Amaznia. H pelo menos 22 usinas planejadas para aregio no Plano Decenal de Energia, e 13 delas impactam diretamente unidades de conservao.

    O estudo tambm critica a medida de compensao proposta pelo governo -- a criao de uma estaoecolgica (Esec) em Maus, no Amazonas. A regio, porm, de prioridade mais baixa do que o Tapajspara a conservao da biodiversidade.

    "O governo est entrando num modelo de produo de energia sem ter todas as informaes sobreimpactos na mesa", disse Elis Arajo, pesquisadora do Imazon e coautora do estudo.

    O deputado disse que o procurador est "equivocado" em mover a ao, j que a matria "relevante eurgente": "Santo Antnio e Jirau j esto em construo, Tapjs vai comear o estudo".

    Segundo ele, o risco de desmatamento uma "interpretao dada" ao impacto das usinas. "Nem tudo oque ser desafetado ser alagado", afirmou Z Geraldo. "E sero acrescidas aos parques da Amaznia e doMapinguari muito mais reas do que sero retiradas."

    http://www1.folha.uol.com.br/ambiente/1088671-obras-em-hidreletricas-podem-atrapalhar-meta-brasileira-de-emissoes.shtml