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http://dx.doi.org/10.5007/1984-8420.2014v15n1p1 1 Work. Pap. Linguíst., 15(1): 01-13, Florianópolis, jan/abr, 2014 UM OLHAR PARA O TRABALHO COM O GÊNERO CONVITE EM TURMAS DE ALFABETIZAÇÃO A LOOK AT THE WORK WITH THE GENRE “INVITATION” IN CLASSES OF LITERACY Terezinha da Conceição Costa-Hübes Professora do Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Letras nível de Mestrado e Doutorado da UNIOESTE; Coordenadora do Projeto de Pesquisa Formação Continuada para Professores da Educação Básica nos anos iniciais: ações voltadas para a Alfabetização em Municípios com Baixo IDEB da Região Oeste do Paraná, vinculado ao Programa Observatório da Educação CAPES/INEP e à Linha de Pesquisa Linguagem: Práticas Linguísticas, Culturais e de Ensino. [email protected] Mônica de Araújo Saraiva Mestre pelo Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Letras –– nível de Mestrado e Doutorado da UNIOESTE, Campus de Cascavel, inserida na linha de Pesquisa Linguagem: práticas linguísticas, culturais e de ensino, sob orientação da Profª Drª Terezinha da Conceição Costa-Hübes. Pesquisadora, bolsista Capes, integrante do Projeto de Pesquisa Formação Continuada para Professores da Educação Básica nos anos iniciais: ações voltadas para a Alfabetização em Municípios com Baixo IDEB da Região Oeste do Paraná, vinculado ao Programa Observatório da Educação. [email protected] RESUMO: O presente texto é resultado de estudos, reflexões e pesquisas articuladas ao Projeto Formação Continuada para Professores da Educação Básica nos anos iniciais: ações voltadas para a Alfabetização em Municípios com Baixo IDEB da Região Oeste do Paraná, vinculado ao Programa Observatório da Educação CAPES/INEP. Nesse contexto, nossa pesquisa, em específico, focaliza-se em ações de mediação na apropriação da linguagem escrita por meio do trabalho com gêneros discursivos. Assim, como parte desse processo investigativo, objetivamos, neste artigo, analisar atividades de produção escrita de textos em uma turma do 2º ano (anos iniciais), a partir de um trabalho mediado com o gênero convite. Guiadas pela indagação: como a mediação do professor, durante o trabalho com gêneros discursivos na perspectiva da alfabetização, pode contribuir com a aquisição da linguagem escrita de alunos do 2º ano do ensino fundamental?”, pretendemos refletir sobre um encaminhamento didático-metodológico em um processo investigativo qualitativo, do tipo etnográfico, respaldado na metodologia da pesquisa-ação, com o gênero convite, na perspectiva de ressaltar a importância da mediação do professor durante esse processo de ensino. Trata-se, portanto, de uma pesquisa cunhada na Linguística Aplicada, recorrendo a aportes teóricos da Psicologia Histórico-Cultural (VYGOTSKI, 1995, 2001, 2007) e da concepção Dialógica de Discurso (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2004; BAKHTIN, 2003), logo, dentro da abordagem sócio-histórica da linguagem. Buscamos, também, apoio teórico nos estudos de Geraldi (2003, 2006), Cagliari (2009, 1998), Martins (2007) e em outros autores que abordam sobre a inserção da criança na interação social por meio da escrita. Os

2950UM OLHAR PARA O TRABALHO COM O GÊNERO CONVITE EM TURMAS DE ALFABETIZAÇÃO

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O presente texto é resultado de estudos, reflexões e pesquisas articuladas aoProjeto Formação Continuada para Professores da Educação Básica nos anos iniciais: açõesvoltadas para a Alfabetização em Municípios com Baixo IDEB da Região Oeste do Paraná,vinculado ao Programa Observatório da Educação – CAPES/INEP.

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    1 Work. Pap. Lingust., 15(1): 01-13, Florianpolis, jan/abr, 2014

    UM OLHAR PARA O TRABALHO COM O GNERO CONVITE EM TURMAS DE ALFABETIZAO

    A LOOK AT THE WORK WITH THE GENRE INVITATION IN CLASSES OF LITERACY

    Terezinha da Conceio Costa-Hbes Professora do Programa de Ps-graduao Stricto Sensu em Letras nvel de Mestrado e

    Doutorado da UNIOESTE; Coordenadora do Projeto de Pesquisa Formao Continuada para Professores da Educao Bsica nos anos iniciais: aes voltadas para a Alfabetizao

    em Municpios com Baixo IDEB da Regio Oeste do Paran, vinculado ao Programa Observatrio da Educao CAPES/INEP e Linha de Pesquisa Linguagem: Prticas

    Lingusticas, Culturais e de Ensino. [email protected]

    Mnica de Arajo Saraiva Mestre pelo Programa de Ps-graduao Stricto Sensu em Letras nvel de Mestrado e

    Doutorado da UNIOESTE, Campus de Cascavel, inserida na linha de Pesquisa Linguagem: prticas lingusticas, culturais e de ensino, sob orientao da Prof Dr Terezinha

    da Conceio Costa-Hbes. Pesquisadora, bolsista Capes, integrante do Projeto de Pesquisa Formao Continuada para Professores da Educao Bsica nos anos iniciais: aes

    voltadas para a Alfabetizao em Municpios com Baixo IDEB da Regio Oeste do Paran, vinculado ao Programa Observatrio da Educao.

    [email protected]

    RESUMO: O presente texto resultado de estudos, reflexes e pesquisas articuladas ao Projeto Formao Continuada para Professores da Educao Bsica nos anos iniciais: aes voltadas para a Alfabetizao em Municpios com Baixo IDEB da Regio Oeste do Paran, vinculado ao Programa Observatrio da Educao CAPES/INEP. Nesse contexto, nossa pesquisa, em especfico, focaliza-se em aes de mediao na apropriao da linguagem escrita por meio do trabalho com gneros discursivos. Assim, como parte desse processo investigativo, objetivamos, neste artigo, analisar atividades de produo escrita de textos em uma turma do 2 ano (anos iniciais), a partir de um trabalho mediado com o gnero convite. Guiadas pela indagao: como a mediao do professor, durante o trabalho com gneros discursivos na perspectiva da alfabetizao, pode contribuir com a aquisio da linguagem escrita de alunos do 2 ano do ensino fundamental?, pretendemos refletir sobre um encaminhamento didtico-metodolgico em um processo investigativo qualitativo, do tipo etnogrfico, respaldado na metodologia da pesquisa-ao, com o gnero convite, na perspectiva de ressaltar a importncia da mediao do professor durante esse processo de ensino. Trata-se, portanto, de uma pesquisa cunhada na Lingustica Aplicada, recorrendo a aportes tericos da Psicologia Histrico-Cultural (VYGOTSKI, 1995, 2001, 2007) e da concepo Dialgica de Discurso (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2004; BAKHTIN, 2003), logo, dentro da abordagem scio-histrica da linguagem. Buscamos, tambm, apoio terico nos estudos de Geraldi (2003, 2006), Cagliari (2009, 1998), Martins (2007) e em outros autores que abordam sobre a insero da criana na interao social por meio da escrita. Os

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    resultados so reveladores da importncia da interveno do professor frente s atividades que promovam a apropriao da linguagem escrita. PALAVRAS-CHAVE: Alfabetizao. Apropriao da linguagem escrita. Gneros discursivos

    ABSTRACT: This paper is the result of studies, reflections and articulated research to the project Continuing Education for Teachers of Basic Education in the lower elementary school: actions to literacy in cities with low IDEB of Western Paran, linked to the Centre for Education Program - CAPES/INEP. In this context, our research, in particular, focuses on actions to mediate the appropriation of writing by working with speech genres language. Thus, as part of this investigative process, we aim in this paper to analyze the written text activities in a class of 2nd year (lower elementary school), considering a work using the gender invitation. Guided by the question: how mediation of the teacher, while working with speech genres from the perspective of literacy, may contribute to the acquisition of written language of students in the 2nd year of elementary school? - Intend to reflect on a didactic - methodological strategies on a qualitative research process, of the ethnographic type, endorsed by the methodology of action research, with gender invitation, from the perspective of emphasizing the importance of the teachers role as mediator during this teaching process. It is, therefore, a research in Applied Linguistics, using the theoretical framework of Cultural-Historical Psychology (VYGOTSKY, 1995, 2001, 2007) and the concept of Dialogic Discourse (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2004; BAKHTIN, 2003), being within of the socio-historical approach to language . We also seek support in theoretical studies such as Geraldi (2003, 2006), Cagliari (2009, 1998), Martins (2007), and other authors who address on the inclusion of children in social interaction through writing. The results reveal the teacher importance of intervention in activities that facilitate the appropriation of the written language. KEYWORDS: Literacy. Appropriation of written language. Speech genres

    INTRODUO

    Compreender a linguagem como social, histrica e ideolgica significa abalizar as condies humanas de interao, reconhecendo os sujeitos nessa imerso social, (re)construindo-se na relao com o(s) outro(s). Nas condies de interao, os discursos so organizados em funo do contexto, atendendo ao propsito de fazer-se compreendido pelo(s) outro(s) com o(s) qual(is) enuncia. Para abarcar as necessidades estabelecidas, a linguagem se amplia, se renova, se constitui, se ramifica, tendo como preceito, apenas, seu compromisso com a interao. Nessa alquimia da inter-ao, fundam-se os pilares do discurso, moldado em funo do que, como, quando, onde e para quem dizer. Como diz Bakhtin: o emprego da lngua efetua-se em forma de enunciados (orais e escritos) concretos e nicos (BAKHTIN, 2003, p. 261), j que se configuram para uma situao especfica, em um dado momento histrico e para aquela situao de interao. Partindo dessa compreenso, o objetivo que orientou o processo investigativo foi o de analisar a prtica pedaggica, tendo em vista a identificao de aes de mediao na apropriao da linguagem escrita, durante a efetivao de um plano de trabalho com os gneros contos de fadas e convites1. Sustentada pela metodologia da pesquisa-ao, nossa pesquisa se amparou

    1 Nesse texto, devido ao recorte necessrio, focaremos apenas no gnero convite.

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    nos fundamentos que norteiam a concepo scio-histrica da linguagem, conforme Bakhtin/Volochinv (2004) e Bakhtin (2003), assim como na psicologia histrico-cultural de Vygotsky (1995, 2001, 2007). Se ampararmos o ensino nesses pressupostos, no podemos ignorar a dinamicidade da lngua e o fato de ela constituir-se para/em situaes de uso da linguagem. Sendo assim, cabe-nos planejar seu ensino a partir dos usos reais, (re)significados nos diferentes gneros discursivos. O trabalho com os gneros comporta, desde os anos iniciais, a anlise e a compreenso do funcionamento e dos mecanismos que organizam a linguagem oral e escrita. Logo, tom-los como instrumentos culturais que favoream essa apropriao, significa embasar o ensino da lngua em preceitos socialmente construdos. Nesse sentido, o processo de apropriao da linguagem escrita perpassa pela compreenso dos signos historicamente e socialmente produzidos pela humanidade, pois por meio de signos que atuamos socialmente em resposta s necessidades e propsitos de interao como locutores e interlocutores. Logo, reconhec-los e compreend-los uma condio para a insero social. Como diz Vygotsky, o homem uma criatura social, e as condies socioculturais o modificam profundamente [...] (VYGOTSKY, 1996, p. 220). Assim, a escola deve ser o espao por excelncia de promoo dessas modificaes, favorecendo, aos sujeitos, o domnio de instrumentos que possibilitem a sua insero e participao na sociedade letrada. Apoderar-se da linguagem escrita e ter acesso pleno leitura so condies estabelecidas por uma sociedade grafocntrica que, a cada dia mais, exige de seus cidados essas capacidades. sobre essa lngua socialmente estabelecida e as relaes que a circundam que vamos discorrer neste texto, tomando como referncia encaminhamentos didticos com o gnero convite, a fim de analisar nossa prtica pedaggica, tendo em vista a identificao de aes de mediao na apropriao da linguagem escrita. Para isso, organizamos o texto da seguinte forma: primeiramente traamos algumas reflexes sobre o ensino de lngua portuguesa nos anos iniciais, abordando brevemente o processo de alfabetizao e o trabalho com os gneros discursivos; a seguir, socializamos prticas de leitura e produo escrita de textos do gnero convite em turmas do segundo ano do ensino fundamental, a fim de apresentarmos algumas possibilidades de trabalho com o gnero em turmas de alfabetizao; por fim, encerraremos com algumas consideraes sobre o trabalho apresentado.

    2 O TRABALHO COM A LNGUA PORTUGUESA NOS ANOS INICIAIS

    Pensar o trabalho com a Lngua Portuguesa (LP, doravante) requer, antes de tudo, refletir sobre seu objeto de ensino e sobre os usos que o aluno estabelece socialmente, com contedos inerentes lngua materna. Nesse sentido, os encaminhamentos didticos, relacionados ao ensino da lngua, dentro da perspectiva da alfabetizao, devem provocar em ns, professores, aes e intervenes pela atividade mediadora, de forma que a lngua seja portadora de significao social e seja reconhecida pelo aluno como instrumento de interlocuo mediante a uma intencionalidade. Na efetivao desse trabalho, preciso estar consciente de que a educao um bem a servio da emancipao social do aluno, que se concretiza pela apropriao do conhecimento produzido ao longo da histria da humanidade. Nesse sentido, Cagliari (2009) contribui ao afirmar que

    [...] o objetivo mais geral do ensino de lngua portuguesa para todos os anos da escola mostrar como funciona a linguagem humana e, de modo

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    particular o portugus; quais os usos que tem, e como os alunos devem fazer para estenderem ao mximo, ou abrangendo metas especficas, esses usos nas suas modalidades escrita e oral, em diferentes situaes da vida. Em outras palavras, o professor de lngua portuguesa deve ensinar aos alunos o que uma lngua, quais as propriedades e usos que ela realmente tem, qual o comportamento da sociedade e dos indivduos com relao aos usos lingsticos, nas mais variadas situaes de sua vida (CAGLIARI, 2009, p. 24).

    Todavia, no podemos desconsiderar que o aluno, ao ingressar na escola, j traz consigo domnios sobre sua lngua materna. Esses conhecimentos, de modo geral relacionados oralidade, podem ser considerados e tomados como ponto de partida, objetivando elevar esse conhecimento para o domnio dos aspectos convencionais relacionados leitura e escrita. Segundo Cagliari, para que os sistemas de escrita continuem a ser usados, preciso ensinar s novas geraes como faz-lo (CAGLIARI, 1998, p.12), afinal esse um legado deixado escola: estender o conhecimento da leitura e da escrita a cada nova gerao, socializando os saberes que so prprios da cultura da escrita. Tendo em vista a natureza social da linguagem, importante que, desde a compreenso e o traado da primeira letra, a criana seja conscientizada da funo integralizadora da linguagem, presente tanto no ato da leitura quanto no da escrita. Seus usos fundamentam-se na presena de um interlocutor, j que escrevemos para que algum, fazendo uso do conhecimento de uma convencionalidade histrica e social, comum entre os sujeitos envolvidos, interaja e dialogue por meio das significaes estabelecidas pela escrita. Ao pensarmos no processo de alfabetizao, importante recorrer s questes propostas por Geraldi: para que ensinamos o que ensinamos [...] para que as crianas aprendem o que aprendem? (GERALDI, 2006, p. 40). A ausncia dessa reflexo pode ofuscar e comprometer o processo de ensino e aprendizagem da linguagem escrita, pois corre-se o risco de direcionar as atividades e reflexes apenas aos fenmenos estruturais da lngua, esquecendo-se de sua funo na sociedade. Trabalhar com a linguagem escrita envolve os aspectos fundamentais que justifica, desde os primrdios, a interao entre sujeitos. Para compreender os recursos usados em uma produo escrita e o sentido que expressam, preciso refletir sobre a lngua, compreendendo sua dimenso dialgica. Nesse sentido, vale retomar as palavras de Bakhtin/Volochinov (2004), para quem a verdadeira substncia da lngua se encontra na interao verbal entre sujeitos sociais, que promovem a linguagem por meio de seu uso em diferentes situaes scio-comunicativas. Assim,

    A verdadeira substncia da lngua no constituda por um sistema abstrato de formas lingsticas nem pela enunciao monolgica isolada, nem pelo ato psicofisiolgico de sua produo, mas pelo fenmeno social da interao verbal, realizada atravs da enunciao ou das enunciaes. A interao verbal constitui assim a realidade fundamental da lngua (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2004, p. 123, grifos no original).

    Portanto, na relao interindividual que se torna possvel a concretizao da lngua. Tomando essa orientao como princpio, preciso reconhecer a leitura e a escrita como aes sociais que permeiam todo e qualquer trabalho com a linguagem. E, ao propiciar prticas efetivas com a leitura e a escrita na escola, estas deveriam organizar-se de forma que

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    promovessem a autonomia do aluno, ampliando seus horizontes e capacitando-o para atividades conscientes de interao. Nesse sentido, Martins refora que o produto do trabalho educativo revela-se na promoo da humanizao dos homens, na consolidao de condies facilitadoras para que os indivduos se apropriem do saber historicamente sistematizado pelo gnero humano (MARTINS, 2007, p. 5). Logo, as aes com a linguagem, fundamentadas em seus usos sociais, favorecem a apropriao da leitura e da escrita quando estas fizerem parte de um trabalho preocupado com a promoo de sujeitos sociais. Para isso, defendemos que os gneros discursivos devam ser tomados como instrumentos para o ensino da lngua, pois muitos deles, alm de recuperarem o surgimento da escrita, registram a histria da humanidade e revelam seus diferentes usos na atualidade, bem como colaboram para a promoo da cultura da humanidade.

    Assim, ao abordar questes relacionadas ao processo de alfabetizao, no podemos desconsiderar a sua especificidade, e isso exige que nossas aes docentes ampliem as possibilidades de participao do aluno em atividades que envolvem os usos sociais da linguagem, o que demanda a apropriao do sistema da escrita. Segundo Cagliari,

    [...] a criana que se inicia na alfabetizao j um falante capaz de entender e falar a lngua portuguesa com desembarao e preciso nas circunstncias de sua vida em que precisa usar a linguagem. Mas no sabe escrever nem ler. Esses so usos novos da linguagem para ela, e sobretudo isso o que ela espera da escola (CAGLIARI, 2009, p. 25).

    O conhecimento com o qual a criana adentra na escola jamais poder ser ignorado no processo de ensino e aprendizagem; ao contrrio, deve ser concebido como ponto de partida para o trabalho com outras formas de interao por meio da linguagem escrita. Stemmer (2007), ao abordar a importncia do aprendizado da leitura e da escrita, destaca que esse compromisso deve ser prioritrio no sistema escolar, visto que o domnio da escrita tornou-se uma necessidade histrica, promovedora das relaes sociais entre os sujeitos. Para que a apropriao da escrita se efetive como um bem social, o professor pode atuar intervir e propor constantemente atividades de reflexo e de anlise da linguagem, de forma que contribua com insero de seu aluno no mundo da escrita. Esse processo de reflexo colaborativa se faz necessrio visto que o aluno, principalmente nos primeiros ciclos do ensino fundamental, est construindo internamente o domnio dos aspectos formais da lngua escrita, desenvolvendo-os por meio de aes mediadas pelos signos sociais presentes. Por isso, muito importante que a criana entenda a significao da escrita para a sua vida e para a humanidade e se aproprie da sua funo social. Segundo Cagliari (1998), essa compreenso pode assentar-se em uma anlise do surgimento da escrita, justificado pelo ato da leitura. Quem escreve almeja ser compreendido por meio da atividade de leitura, pois a escrita no existe no vazio, e sim, em funo de uma necessidade socialmente estabelecida, seja ela de registrar alguma memria ou convidar, avisar, nomear, entre outras finalidades. Considerando tais pressupostos sociais de uso da escrita, destacamos a importncia do trabalho com os gneros discursivos desde os anos iniciais, pois se a escola um espao privilegiado de mediao do conhecimento, deve favorecer a sua transformao e apropriao por meio dos diferentes usos da linguagem. Nesse sentido, cabe a ela proporcionar aos alunos o contato com a diversidade dos gneros discursivos existentes a fim de que os alunos possam

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    no s (re)conhec-los, mas tambm empreg-los em diferentes situaes de interao, manifestando, assim, o conhecimento adquirido. Para isso, como professores, devemos assumir o compromisso de proporcionar meios eficientes para que o aluno possa no s conhecer os discursos existentes, mas atuar sobre eles como um instrumento de interao, seja no papel de locutor ou interlocutor. Se, como afirmam Martins e Arce (2007), a criana precisa dominar os mecanismos das aes e operaes realizadas no cotidiano [...], (MARTINS; ARCE, 2007, p. 23), os gneros discursivos so os meios pelos quais organizamos socialmente nossos modos de dizer. Dessa forma, o trabalho intencional com diferentes gneros podem favorecer no somente a apropriao da leitura e da escrita, mas tambm dos mecanismos lingustico-discursivos que organizam e sustentam os discursos em funo de um por que e para que(m) dizer, justificando os contedos referentes leitura e escrita. As prticas de leituras e de escritas devem representar aes com a linguagem. Dessa forma, os gneros discursivos, que so constitudos por linguagem viva, representam a dinamicidade da lngua que pode e deve ser ensinada na escola. Abordar o ensino da linguagem escrita a partir de gneros uma forma de garantir-lhe maior significao, pois faz-se necessrio que o aluno compreenda o que e como escrever, bem como a funcionalidade da escrita nos diferentes gneros discursivos. Com relao ao trabalho com a escrita em turmas no processo inicial de alfabetizao, Cagliari (1998) destaca que Ensinar as crianas a tornar conscientes os procedimentos de decifrao da escrita uma estratgia que as agradam mais do que ficarem repetindo coisas aparentemente sem sentido, ou ser largadas a prpria sorte, esperando que saiam de dentro de si os conhecimentos que a escola exige para ler e escrever (CAGLIARI, 1998, p. 9).Ao contrrio disso, ensinar a ler e a escrever significa promover a criana condio de sujeito participante da histria da humanidade, construindo discursos tambm por meio da linguagem escrita. Apesar das orientaes pedaggicas, tanto na formao inicial quanto na continuada, direcionarem para a realizao de um trabalho voltado apropriao da linguagem escrita atrelada aos seus usos sociais, percebemos uma grande dificuldade, por parte dos professores alfabetizadores, no trabalho didtico a partir dos gneros discursivos que circulam socialmente. Tal fato parece apontar para a existncia de um distanciamento entre a teoria propagada pelos documentos pedaggicos e pelas instituies formadoras, e a prtica efetivada na sala de aula. Essa percepo, inicialmente emprica, direcionou-nos para a necessidade de olharmos para as aes de mediao no trabalho com os gneros discursivos no processo de apropriao da linguagem escrita pelos alunos. Na perspectiva de apresentar algumas contribuies para o trabalho com os gneros durante o processo de apropriao da linguagem escrita, abordamos, a seguir, algumas possibilidades de trabalho com o gnero convite, tomando como parmetro uma turma do 2 ano do Ensino Fundamental.

    3 O GNERO CONVITE NA SALA DE AULA: SOCIALIZANDO UM PROCEDIMENTO DE ENSINO

    A turma de 2 ano, locus da pesquisa, era formada por 23 alunos, pertencentes a uma escola da rede municipal de ensino de Cascavel PR, na qual atuamos como professora regente em 2012. E pela experincia acumulada nesse nvel de ensino, consideramos essa fase como o

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    momento essencial para destacar a importncia da leitura e da escrita na formao de sujeitos crticos e participativos da vida na sociedade. Logo, as prticas de leitura e de escrita no trabalho com o processo de alfabetizao precisam promover atividades de anlise e reflexo sobre a lngua, a partir da linguagem escrita em situaes reais de uso, garantidas em diferentes gneros discursivos. Partindo desse pressuposto, selecionamos o gnero convite para efetivao de um plano de trabalho de leitura, de produo textual e de anlise lingustica, recorrendo s prticas de reescrita para provocar, nos alunos, a anlise crtica de seu texto. A escolha do gnero em questo se justifica pelo fato de as crianas, desde cedo, envolverem-se com essa forma de linguagem, manifestada principalmente nos convites de aniversrios. Partindo desse princpio, levamos para a sala de aula diversas amostras de textos do gnero, a partir das quais promovemos atividades de reflexo coletiva sobre seu contexto de produo e de circulao. Consideramos diferentes situaes de uso, uma vez que o convite se configura diferentemente para cada situao, quando se trata da escrita: convite de reunio da escola, de reunio de empresas, de aniversrio, de casamento, de festa junina etc., e de diferentes maneiras ainda quando se materializam na oralidade. Pautando-nos em tais reflexes, tomamos como exemplo o texto seguinte, uma amostra do gnero convite de reunio da escola, sobre o qual desenvolvemos a anlise descrita a seguir:

    Figura 1: Convite para reunio na escola

    Fonte: http://gibarbosa1.blogspot.com.br/2010/08/modelo-de-convite-p-reuniao-de-pais-e.html

    Consideramos, para este trabalho que, em relao interao da criana com a linguagem escrita, quanto mais ricas e diversificadas forem [...], maior ser seu interesse em compreender e dominar o sistema da escrita (STEMMER, 2007, p. 132). Nesse sentido, importante destacarmos que os alunos dessa turma de 2 ano constantemente realizavam, sob nossa mediao, atividades de leitura, compreenso e interpretao de diferentes textos pertencentes a diversos gneros discursivos, o que nos permite afirmar que j reconheciam o uso da linguagem escrita como parte de uma necessidade de interao estabelecida entre sujeitos histricos e sociais. Depois da leitura de um texto selecionado para ser explorado com os alunos, normal surgirem indagaes por parte do professor: possvel trabalhar esse texto com alunos no processo inicial de alfabetizao/de letramento? Qual o grau de interesse dos alunos? A forma em que foi abordado o contedo torna-o passvel de compreenso? Antes, porm, de nos determos nessas indagaes, vamos retomar brevemente a fala de Geraldi, para quem ensinar

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    a lngua ampliar a experincia do aluno com a nossa (GERALDI, 2003, p.121). Essa ideia refora que somente com a organizao e a efetivao de um trabalho mediador entre o aluno, o objeto de estudo e o professor torna-se possvel a apropriao das diferentes formas de usos da linguagem. Em se tratando de turmas no processo inicial de alfabetizao, no s possvel o desenvolvimento de encaminhamentos com os gneros discursivos, como essencialmente necessrio, pois, diante das aes e reflexes sobre a linguagem, os alunos passam a conceber o principal e real papel da oralidade e da escrita como resposta a uma necessidade no convvio social. Por se tratar de alunos no processo inicial de aquisio da linguagem escrita, faz-se necessrio a orientao do professor na reflexo sobre as caractersticas e contedos prprios da escrita, como disposio grfica da escrita no papel, recursos grficos utilizados (acentuao, segmentao e pontuao) como elementos estruturantes do discurso e suas relaes com os efeitos de sentidos, de acordo com a finalidade a que se prope. Essa apropriao acontece gradativamente, de acordo com as atividades de leitura e de escrita e as mediaes propiciadas pelo conhecimento possibilitado pelo professor aos sujeitos envolvidos no processo de ensino e aprendizagem. H tambm a necessidade de explorar as relaes entre o registro escrito e o sistema alfabtico e fontico, evidenciando a individualidade que cada letra assume no registro escrito e a construo de significados. Ao iniciar as reflexes sobre o texto (figura 1), em especfico, conversamos sobre seu contexto de produo e de circulao, enfatizando aspectos como: quem o produziu, onde, para quem, com que propsito, para circular em que meio. Refletir sobre esses elementos que, de certa forma, organizam a linguagem escrita, significa reconhecer que a lngua se configura em funo de uma necessidade de interao, conforme postula Bakhtin (2003). As reflexes permitiram aprofundar, um pouco mais, o conhecimento dos alunos sobre o gnero convite, atentando para sua funcionalidade na sociedade, seu contedo temtico, sua construo composicional e seu estilo que se imbricam na organizao do texto, fato que pode ser conferido nos encaminhamentos de anlise. Para proceder atividade de anlise e reflexo sobre a lngua, por exemplo, abordamos inicialmente o seguinte recorte do texto: como seu pequeno tem se desenvolvido?. A partir da leitura e reflexo desse fragmento, questionamos s crianas sobre o significado assumido pelo termo pequeno, relacionando-o com outras situaes de uso e com outras significaes. Com essa relao, podemos conferir ao aluno a dinamicidade da lngua e como os sentidos so construdos, tendo em vista o seu contexto de uso e a situao de interao. Logo, o emprego desse termo no se configura apenas como uma marca de estilo, mas tambm relaciona-se com o contedo temtico, j que colabora com a construo de sentidos do texto naquela situao de uso da lngua. Segundo Cagliari, essa procura das relaes entre significado e significante , em outras palavras, saber como uma lngua funciona e quais os usos que tem (CAGLIARI, 2009, p. 26), e isso s se torna possvel em uma atividade contextualizada, a partir do momento que substituirmos a fragmentao do nosso objeto de ensino em sala de aula. Temos que direcionar nossas aes para alm da leitura de palavras, a fim de explorar o seu significado dentro de diferentes situaes concretas de enunciao. Outro aspecto interessante que exploramos com os alunos foi a prpria construo do texto escrito que, relacionado com seu contexto de produo e de circulao, do forma ao contedo temtico: ao elaborar parte do convite com indagaes, estaria a professora questionando os pais sobre o comportamento de seu filho na escola? Ela realmente esperava ouvir deles a resposta a essas perguntas? Quem poderia responder a esses questionamentos? Qual foi o propsito da professora ao fazer o convite em forma de indagaes? Alm disso,

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    analisamos com os alunos o questionamento: Como vai sua adaptao em nossa escola?. Pensamos juntos: para quem seria essa pergunta? Por que ela foi elaborada? Quem estaria se adaptando escola? Entendemos que o professor, em seu privilegiado papel de mediador, deve instigar o aluno a ler e a compreender aquilo que esta lendo, indo alm de uma simples decodificao do que est escrito. Ao analisar o formato do gnero convite, verificamos, com os alunos, se o texto era capaz de cumprir com sua funo social, que se resumia em convidar os pais/responsveis a participarem da reunio promovida pela professora de seu filho, dando indicativos de onde e quando seria. Aps as atividades relacionadas leitura e anlise lingustica, e considerando as palavras de Geraldi (2003), o qual afirma que no trabalho em sala de aula deve ser considerado [...] a produo de textos (orais ou escritos) como ponto de partida (e ponto de chegada) de todo processo de ensino/aprendizagem da lngua (GERALDI, 2003, p.135), conduzimos os alunos a vrias outras atividades, envolvendo a sistematizao da escrita para, posteriormente, encaminharmos para a atividade de produo escrita de texto. Para isso, apresentamos a seguinte proposta de produo:

    Elaborem um CONVITE para um COLEGA que estuda nessa mesma escola, no mesmo perodo que voc, convidando-o para apreciar nossa exposio de textos do gnero convites que vai ser realizada no dia 23/042012, aps o intervalo, no saguo da escola.

    Tomando como parmetro esse encaminhamento para a produo escrita de textos do gnero convite, apresentamos, a seguir, duas produes que ilustram o resultado obtido pelos alunos, inicialmente, sem a nossa mediao, visto que o objetivo naquele momento era diagnosticar a compreenso individual de cada um em relao ao gnero e proposta de produo, para posteriores intervenes:

    Figura 2: Texto produzido pelo aluno A2

    Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

    2 O projeto de pesquisa encontra-se amparado pelo Comit de tica em Pesquisa da Unioeste, sob parecer

    069/2011 CEP, uma vez que est vinculado ao Projeto do Observatrio da Educao sob ttulo: Formao Continuada para Professores da Educao Bsica nos anos iniciais: aes voltadas para a Alfabetizao em Municpios com Baixo IDEB da Regio Oeste do Paran. Todavia, optamos por no mencionar o nome completo dos alunos.

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    O texto acima representa o resultado obtido pelos alunos que demonstraram uma boa compreenso no s da funo social, mas tambm do formato do gnero. Como possvel observar, o autor coloca-se no texto como algum que tem o que dizer e direciona-se para seu interlocutor, com quem age por meio da linguagem escrita. Cumprindo um objetivo em especfico (convidar), garante as informaes necessrias para que a ao com a linguagem se efetive. Sendo assim, entendemos que esse aluno, alm de cumprir com seu propsito comunicativo, compreendeu a funo social do gnero convite. Para ilustrar ainda mais o resultado desse trabalho com o gnero convite na sala de aula, apresentamos mais um texto.

    Figura 3: Texto produzido pelo Aluno M

    Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

    Esse texto representa os alunos que, embora tenham compreendido a funo social do gnero, apresentaram maior dificuldade para sistematiz-lo, demarcando a ausncia de informao, como, por exemplo, o local, alm de no conseguir configurar minimamente a sua estrutura composicional. Todavia, dos 23 alunos que compem a turma, apenas 3 se portaram dessa forma, enquanto 16 conseguiram cumprir com a proposta de produo e 4 fugiram da proposta, fazendo um convite, no entanto, para brincar ou para um aniversrio. Esse resultado revelou-se de forma satisfatria para nosso trabalho, j que grande parte dos alunos respondeu com sucesso ao objetivo proposto. Lembramos que os textos aqui expostos foram produzidos e arquivados como diagnstico do desenvolvimento do aluno, portanto sem nenhum tipo de interveno ainda. As intervenes foram feitas posteriormente, com atividade de anlises lingustica, que propiciaram a reescrita do texto, a partir da avaliao dos resultados obtidos. Para auxiliar nesse sentido, recorremos a Gonalves (2007), para quem a organizao de uma Lista de Constataes/Controle possibilita ao aluno o reconhecimento do gnero, tendo em vista sua funo social e seu propsito discursivo. Esse instrumento configura-se em uma orientao por meio da qual o aluno retoma e revisa sua produo escrita, direcionando-o a superar as limitaes presentes em seu texto.

    Com essa finalidade, organizamos uma lista para orientar o aluno nesse processo de retomada da sua escrita, na qual procuramos contemplar questes pontuais, envolvendo a situao social de produo. Para isso, propusemos que avaliassem as informaes contidas em seus textos, verificando se contemplavam os aspectos essenciais de forma que o convite cumprisse

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    com sua funo social. Desse modo o aluno, conforme a leitura e retomada do texto, assinalavam as opes sim ou no, afirmando ou negando a presena de determinada informao pertinente ao gnero. O quadro a seguir orientou essa atividade:

    Quadro 1: Avaliao do gnero convite Elementos que organizam o convite Sim No

    Para quem o convite se dirige? Est claro o motivo do convite? Procurou convencer? Tem a data? Tem o horrio?

    Quem est sendo convidado? Onde vai ser a reunio? Quem est convidando?

    Fonte: Elaborado pela pesquisadora.

    Conforme podemos conferir, essa lista direciona, de certa forma, o olhar do aluno para seu prprio texto, incentivando-o a conferir e, posteriormente, reorganizar (se necessrio) as informaes que necessariamente devem se fazer presentes naquela produo escrita. E, a partir das constataes efetivadas, o procedimento seguinte consiste na reescrita do texto, incorporando e/ou mantendo as informaes, na perspectiva de contemplar, da maneira mais eficiente possvel, o propsito comunicativo. Embora no estejamos aprofundando nossas reflexes sobre o gnero em foco, a presente anlise ilustra uma das possibilidades de prticas de encaminhamentos voltadas ao trabalho com os gneros discursivos no processo inicial de alfabetizao. Durante esse perodo de alfabetizao se faz necessrio destacar a importncia do papel do professor na mediao entre aquilo que o aluno faz sozinho e o que necessita de auxlio para fazer. As produes escritas iro sempre representar as apropriaes j efetivadas e o distanciamento entre o conhecimento que pretendemos atingir. Nesse sentido, os resultados obtidos nos daro o direcionamento para a continuidade do trabalho. A anlise em foco demonstrou, porm, que a maioria se apropriou das condies sociais do gnero convite, compreendendo sua funo social e sua composio, mesmo que tenham apresentado pequenos desvios no formato, os quais podero ser trabalhados gradativamente, conforme a situao de interao exigir desse gnero.

    4 CONSIDERAES FINAIS

    Ao abordar questes relacionadas ao ensino, Cagliari (1998) argumenta que o que se prope que a escola ensine os alunos a estudar, a trabalhar com os conhecimentos, e no com o objetivo menor de ganhar nota para passar de ano (CAGLIARI, 1998, p.10). Partilhando desse pressuposto, procuramos abordar no texto o quanto possvel e essencial transformao do espao da sala de aula em lugar privilegiado para a reflexo sobre a lngua em sua essncia, sem deixar de lado sua convencionalidade. Para interagirmos socialmente por meio da escrita, alm de compreender os diferentes discursos e suas variadas formas de organizao efetivadas nos gneros discursivos, precisamos nos apropriar de seu sistema convencional e de suas regras, e isso um fato histrico, pois, conforme Cagliari (1998) , so [...] as regras que permitem ao leitor decifrar

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    o que esta escrito e saber como o sistema de escrita funciona para us-lo apropriadamente (CAGLIARI,1998, p.15). Enfim, a aprendizagem est relacionada diretamente ao ensino, portanto, para aprender necessrio que se ensine. O aluno por si s no capaz de apropriar dos diferentes discursos e do sistema da escrita. necessrio que a escola ensine a ler, a escrever e, para isso, preciso reportar tambm aos aspectos estruturantes da lngua, aos seus mecanismos e seu funcionamento. Apresentar o alfabeto ao aluno, relacionando-o com o uso na vida social fundamental porque sem conhecer o alfabeto, com certeza o aluno no aprender a ler e a escrever, assim como tambm apenas conhecer o alfabeto e no desenvolver uma linguagem compreensiva e interativa no garantir a aprendizagem da escrita como meio de interao entre sujeitos histricos, sociais e concretos. O processo investigativo possibilitou-nos avaliar e refletir sobre as nossas aes no trabalho com os gneros discursivos e a sua contribuio na apropriao da linguagem escrita pelos alunos. Com essas consideraes, tentamos demonstrar, por meio desse artigo, que possvel alfabetizar, tomando os gneros como ponto de partida para o processo de ensino e aprendizagem e o texto escrito do aluno como revelador dos aspectos (no) dominados da escrita. A partir dessa constatao, cabe ao professor atuar como veculo de mediao da cultura da escrita, conduzindo as prticas de leituras, de anlise e de produo escrita, de forma que a criana se aproprie, cada vez mais, dos usos sociais da lngua.

    REFERNCIAS

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    _____. Obras Escolhidas. Tomo II. Madri, Espanha: A. Machado Libros, 2001. _____. Obras Escolhidas. Tomo III. Madri: Visor, 1995.

    Recebido em: 03/06/2013

    Aceito em: 07/04/2014