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Estudos de Literatura para o Ensino Médio e Vestibulares Honneur Monção

3500894 Estudos de Literatura Ensino Medio e Vestibulares[1]

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  • Estudos de Literatura para o Ensino Mdio e

    Vestibulares

    Honneur Mono

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    Ttulo: Literatura Brasileira para Vestibulares Autor: Honneur Mono Editora: CopyMarket.com, 2000

    A Evoluo da Poesia Romntica no Brasil

    Honneur Mono

    As Geraes

    ponto pacfico que, na literatura brasileira h, pelo menos trs romantismos: o nacionalista, o individualista e o social. Para explicar esse fato, Karl Mannhein oferece-nos um enfoque sociolgico. As transformaes resultantes da Revoluo Francesa, em diversos planos da vida, geraram o descontentamento de vrios segmentos sociais:

    1 - A aristocracia foi deslocada do centro do poder e elege o passado como fulcro de suas aspiraes de recuperao da glria e do esplendor perdidos. Seu conservadorismo ressentido desconfia do progresso e da vida coletiva. Da o mergulho nos temas que elegem o herosmo, o medievalismo, a religiosidade, a tradio, o passado remoto em geral, a natureza e a idealizao dos personagens e do amor.

    2 - A burguesia em ascenso dividiu-se em dois segmentos, se no antagnicos, pelo menos divergentes:

    a) os que, tendo ficado marginalizados do poder, mergulharam no pessimismo, no negativismo, no escapismo, na exasperao egtica; seus temas prediletos so a morbidez, o tdio, o satanismo, a bomia, o sonho, o erotismo irrealizado.

    b) os que assumiram a atitude liberal-progressista, rebelando-se contra as instituies anacrnicas. Engajados nas grandes causas sociais, os temas constantes so: a liberdade, os proletrios oprimidos pela Revoluo Industrial na Europa, os escravos na Amrica, a causa republicana, a exaltao do progresso.

    O Brasil da 2 metade do sc. XIX uma nao agrria, atrasada, perifrica no contexto mundial veja o leitor que nada mudou desde ento , no se podendo transplantar cabalmente a realidade europia para o contexto brasileiro. Os temas literrios, contudo, so praticamente idnticos e possibilitam essas aproximaes:

    A 1 gerao dcada 1840/50 (Indianista ou Nacionalista), de Gonalves de Magalhes, Gonalves Dias (inclusive a fico de Alencar).

    A 2 gerao dcada 1850/60 (Byroniana, do Mal-do-Sculo, Individualista ou Ultra-Romntica), de lvares de Azevedo, Casimiro de Abreu, Fagundes Varela etc

    A 3 gerao dcada 1860/70 (Condoreira, Social ou Hugoana), representada, principalmente, por Castro Alves.

    Castro Alves (1847-1871) surgiu para a literatura numa poca particularmente agitada da vida poltica brasileira. A efervescncia ideolgica do perodo contaminou a literatura e fez da poesia um plpito em que se veiculavam idias novas e se procurava atrair adeptos e correligionrios. O teatro e as praas pblicas tornaram-se palco de inflamados discursos poticos, declamados ardorosamente pelos prprios autores.

    Nesses precursores dos showmcios modernos, discutia-se a proclamao da repblica, a Guerra do Paraguai, a reforma do ensino, a abolio da escravatura e os demais problemas polticos, sociais, filosficos e ideolgicos que afligiam a intelectualidade do Imprio do Brasil.

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    Castro Alves, jovem, bonito, galante, inflamado, culto e indiscutivelmente genial, chegou e empolgou as platias com seu discurso de tom elevado e sua figura bela e empolgante, o poeta chegava na hora certa. Foi consagrado principalmente porque sua eloqncia agradava muitssimo ao pblico da poca em que viveu.

    Seu tema predileto, mas no nico, foi a escravido. Os poemas de cunho social abarcam quase todo o rosrio preferido pela poesia da poca. Na poesia abolicionista, insupervel a marca do gnio baiano. Seu clamor por liberdade e suas invectivas contra a mancha obscena da escravatura no encontram paralelo em nenhuma poca e em nenhum autor da literatura brasileira.

    As imagens grandiosas, hiperblicas, reforadas por apstrofes e antteses provocantes, a linguagem enftica e altissonante so marcas da escola condoreira hugoana de que ele o representante maior em nossas letras.

    No poeta das Espumas Flutuantes, essas caractersticas no se encontram apenas em poemas de temtica que se pode chamar pica, porque abordam grandes questes coletivas, mas aparece tambm em poemas propriamente lricos, seja os de tema amoroso, seja os que nos revelam o poeta como um admirvel pintor de paisagens.

    Suas imagens, quase sempre arrojadas e intensas, costumam alternar o pequeno e o grandioso e tm uma espcie de atrao csmica e telrica indiscutvel uma preferncia pelos magnos elementos da natureza, como oceanos, cus, noite, estrelas, montanhas e tufes.

    {O poeta exercitou seu estro tambm na poesia lrico-amorosa, de forma dissonante em relao aos demais romnticos, pois revela-se por uma poesia sensual e, por vezes, extremamente ertica. Sua expresso amorosa prenhe de sensualidade, e a configurao da mulher, nos momentos mais marcantes de seus poemas erticos, destacada por uma realidade, uma "carnalidade" inexistente na poesia de seus coetneos e predecessores prximos ou distantes, que tendiam pura idealizao feminina, seja na figura da mulher-anjo, seja na da mulher-demnio.

    Castro Alves, diferentemente, fala de mulheres reais, mulheres que so, por assim dizer, motivo de lubricidade; de realizao e de frustrao amorosa, mas palpveis, virtuosas ou pecaminosas.

    A leitura dos poemas de Castro Alves remete-nos para um momento eletrizante da vida brasileira, em que vrias correntes de pensamento se entrecruzavam em choques ideolgicos marcantes e apaixonantes. O poeta bem soube erigir o seu monumento literrio que tem o dom de congregar homens de diferentes pocas na reflexo sobre uma realidade de profunda significao humana e social.

    Primeira Gerao Romntica

    a gerao que introduz e consolida a esttica romntica na literatura brasileira. Coube a Gonalves de Magalhes, com o seu famoso Suspiros Poticos e Saudades, dar incio a um fazer potico que levava em conta a natureza e o ambiente de nossa terra; valorizando sobremaneira nossa cultura, a tradio e a formao tnica da gente brasileira. Evidentemente que seus versos ressentem-se, ainda, de uma certa influncia clssica, que s vai ser inteiramente superada no primeiro grande poeta genuinamente brasileiro: Antnio Gonalves Dias.

    A poesia de Gonalves Dias reveste-se de maior elaborao esttica e j dentro dos padres romnticos. Mais conhecido como poeta indianista, escreveu tambm poemas lrico-amorosos da mais perfeita extrao de sentimentalidade romntica.

    O mais famoso dos poemas de Gonalves Dias, cantado em prosa e verso, imitado, plagiado, parafraseado, parodiado e admirado desde que foi escrito, a Cano do Exlio, fala-nos bem prximo do amor exagerado terra natal. Lembrando a Carta de Caminha, podemos dizer que o sentimento ufanista perpassa a literatura brasileira numa constante bem perceptvel e este poema um de seus modelos mais bem acabados.

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    TEXTO I Cano do Exlio

    Kennst du das Land, wo die Zitronen blhn,

    Im dunkeln Laub die Gold-orangen glhn,

    ...................................................

    Kennst du es wohl? - Dahin! Dahin!

    Mcht ich ... ziehn.

    (Goethe)

    Minha terra tem palmeiras,

    Onde canta o Sabi;

    As aves, que aqui gorjeiam,

    No gorjeiam como l.

    Nosso cu tem mais estrelas,

    Nossas vrzeas tm mais flores,

    Nossos bosques tm mais vida,

    Nossa vida mais amores.

    Em cismar, sozinho, noite,

    Mais prazer encontro eu l;

    Minha terra tem palmeiras,

    Onde canta o Sabi.

    Minha terra tem primores,

    Que tais no encontro eu c;

    Em cismar - sozinho, noite -

    Mais prazer encontro eu l;

    Minha terra tem palmeiras,

    Onde canta o Sabi.

    No permita Deus que eu morra,

    Sem que eu volte para l;

    Sem que desfrute os primores

    Que no encontro por c;

    Sem quinda aviste as palmeiras,

    Onde canta o Sabi.

    (Gonalves Dias)

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    A vertente indianista aparece como um tema inovador na poesia j a partir dos poemas de estria do Autor. Representam uma busca de razes nacionais. Voltando-se para o passado histrico, imita o medievalismo presente no romantismo europeu.

    Gonalves Dias idealiza seu ndio dentro dos padres do bom selvagem de Rousseau, com evidente inteno de preservar o que restava do primitivismo de nossa cultura. Preocupado com a omisso histrica, o Autor imagina um personagem indgena que represente o modelo ideal para a pesquisa lrica e herica do passado. Assim, o ndio na poesia gonalvina adquire o status de cavaleiro medieval, puro e valoroso, dentro da tradio das novelas de cavalaria.

    TEXTO II O CANTO DO PIAGA

    O Guerreiros da Taba sagrada,

    Guerreiros da Tribo Tupi,

    Falam Deuses nos cantos do Piaga,(1)

    O Guerreiros, meus cantos ouvi.

    Esta noite era a lua j morta

    Anhang(2) me vedava sonhar;

    Eis na horrvel caverna, que habito,

    Rouca voz comeou-me a chamar.

    Abro os olhos, inquieto, medroso,

    Manits(3)! que prodgios que vi!

    Arde o pau de resina fumosa,

    No fui eu, no fui eu que o acendi!

    Eis rebenta a meus ps um fantasma,

    Um fantasma d'imensa extenso;

    Liso crnio repousa a meu lado,

    Feia cobra se enrosca no cho.

    O meu sangue gelou-se nas veias,

    Todo inteiro ossos, carnes tremi,

    Frio horror me coou pelos membros,

    Frio vento no rosto senti.

    Era feio, medonho, tremendo,

    O guerreiro, o espectro que eu vi

    Falam Deuses nos cantos do Piaga

    Guerreiros, meus cantos ouvi!

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    (1) O mesmo que Paj. Espcie de mdico e sacerdote.

    (2) O gnio do mal.

    (3) Divindade dos ndios norte-americanos e canadenses. Eqivale a Tup, o deus maior.

    Entretanto tambm explora um veio questionador do sofrimento em razo do amor. Numa linguagem vibrante, mas destituda do descabelamento e das lgrimas to presentes em outros autores romnticos, Gonalves Dias estabelece constantes reflexes poticas em torno do mal-de-amor, lembrando, e preservando de maneira admirvel, as mais caras tradies lricas da poesia medieval portuguesa;

    TEXTO III RECORDAO

    Nessun maggior dolore...

    DANTE

    Quando em meu peito as aflies rebentam

    Eivadas de sofrer acerbo e duro;

    Quando a desgraa o corao me arrocha

    Em crculos de ferro, com tal fora,

    Que dele o sangue em borbotes golfeja;

    Quando minha alma de sofrer cansada,

    Bem que afeita a sofrer, sequer no pode

    Clamar: Senhor, piedade; e que os meus olhos

    Rebeldes, uma lgrima no vertem

    Do mar d'angstias que meu peito oprime:

    Volvo aos instantes de ventura, e penso

    Que a ss contigo, em prtica serena,

    Melhor futuro me augurava, as doces

    Palavras tuas, sfregos, atentos

    Sorvendo meus ouvidos, nos teus olhos

    Lendo os meus olhos tanto amor, que a vida

    Longa, bem longa, no bastara ainda

    por que de os ver me saciasse!... O pranto

    Ento dos olhos meus corre espontneo,

    Que no mais te verei. Em tal pensando

    De martrios calar sinto em meu peito

    To grande plenitude, que a minha alma

    Sente amargo prazer de quanto sofre.

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    Na poesia lrico-amorosa o sentimento constante o da incerteza, da dvida diante do sentimento amoroso. Incapaz de fixar-se no objeto de seu amor, o sujeito-potico manifesta seu inconformismo pela dor da irrealizao plena, da posse do objeto de seu amor.

    TEXTO IV SE TE AMO, NO SEI

    Amar! Se te amo, no sei.

    Oio a pronunciar

    Essa palavra de modo

    Que no sei o que amar.

    Se amar sonhar contigo,

    Se pensar, velando, em ti,

    Se ter-te n'alma presente

    Todo esquecido de mi!

    Se cobiar-te, querer-te

    Como uma bno dos cus

    A ti somente na terra

    Como l em cima a Deus;

    Se dar a vida, o futuro,

    Para dizer que te amei:

    Amo; porm se te amo

    Como oio dizer, no sei.

    A obra potica de GD destaca-se no panorama do Romantismo brasileiro como a de maior equilbrio entre os planos da forma e do contedo. Representa ele o manancial em que se vo abeberar os mais diferentes autores romnticos e posteriores, servindo de modelo e inspirao para um sem nmero de composies boas e ms que constituem nosso acervo cultural.

    Segunda Gerao Romntica

    A chamada Segunda Gerao Romntica marca o apogeu, na literatura brasileira, do egocentrismo e da emoo

    exacerbada. Voltados inteiramente para o seu prprio interior, os poetas dessa fase produziram poemas

    pessimistas, entediados da existncia e profundamente desencantados da vida. A temtica predominante a

    morte, a solido, a tristeza, a melancolia e o sofrimento amoroso. Escritos, por assim dizer, ao correr da pena,

    sem a preocupao em reformar o texto, e por jovens poetas que, quase todos, morreram na flor da idade, os

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    textos dessa gerao revelam, s vezes, um sentimentalismo piegas e exagerado que compromete a qualidade do

    trabalho artstico.

    Perpassando tais textos, encontramos:

    1. O predomnio da emoo, do sentimento o subjetivismo No Romantismo, a imposio do "eu" do artista realidade opera-se de modo radical. Assim, a funo

    emotiva ou expressiva da linguagem, centrada no emissor, predominante. A realidade captada pelo

    prisma pessoal do poeta.

    Personagens marcados pelo mal-de-amor, que no escapam ao destino trgico de sofrer

    profundamente diante da impossibilidade da concretizao da relao amorosa.

    2. A evaso ou escapismo. A fuga realidade Profundamente idealizador, o romntico tem na insatisfao uma das suas constantes. O mundo real

    traa sempre o mundo da fantasia, da imaginao. Inadaptado realidade, ou o romntico se rebelava e

    assumia a atitude revolucionria dos condoreiros, ou se deprimia e buscava a fuga. O escapismo

    projetou-se das formas mais diversas: no limite, a morbidez, o desejo de morrer, como lenitivo s

    tenses internas; em outros planos, a bomia desbragada, o culto da solido, o gosto pelas runas, pelo

    passado, por lugares exticos e longnquos, a poesia cemiterial. Diz-se que os romnticos tm um

    temperamento "lunar"; o sol, a luz, o dia no lhes aprazem, por representarem a realidade de que fugiam;

    a lua, a noite, as paisagens desertas faziam-se refgios e confidentes das atribulaes e tristezas do poeta.

    o que vamos ver nos textos que se seguem:

    "Pensamento gentil de paz eterna,

    Amiga morte, vem. Tu s o termo

    De dois fantasmas que a existncia formam,

    Dessa alma v e desse corpo enfermo.

    Pensamento gentil de paz eterna,

    Amiga morte, vem. Tu s o nada,

    Tu s a ausncia das moes da vida,

    Do prazer que nos custa a dor passada."

    (Junqueira Freire)

    O predomnio do sonho, da imaginao ainda um aspecto do escapismo. Vejamos:

    "Oh! ter vinte anos sem gozar de leve

    A ventura de uma alma de donzela!

    E sem na vida ter sentido nunca

    Na suave atrao de um rseo corpo

    Meus olhos turvos se fechar de gozo!

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    Oh! Nos meus sonhos, pelas noites minhas

    Passam tantas vises sobre o meu peito."

    (lvares de Azevedo)

    Observe no texto o erotismo que, como caracterstico da poesia de lvares de Azevedo, s se realizava no

    sonho, na fantasia.

    Vamos fazer um teste?

    Quando eu te fujo e me desvio cauto,

    Da luz de fogo que te cerca, bela!

    Contigo dizes, suspirando amores,

    Meu Deus, que gelo, que frieza aquela!

    QUESTO 01 Na temtica de Casimiro de Abreu, como ilustra a estrofe acima, salientam-se os sentimentos de:

    A) ternura e desencanto.

    B) timidez e melancolia.

    C) amor e medo.

    D) amargura e revolta.

    E) alegria e encantamento.

    Ah! Vem, plida virgem, se tens pena,

    De quem morre por ti, e morre amando,

    D vida em teu alento minha vida,

    Une nos lbios meus minha alma tua.

    QUESTO 02 Por suas caracterstica estilsticas, o texto : A) romntico e revela o amor adorao.

    B) romntico e revela a sensualidade.

    C) romntico e revela o amor platnico.

    D) romntico e revela o amor perdido.

    E) neo-romntico e revela a fuga da realidade.

    Descansem o meu leito derradeiro,

    Na floresta dos homens esquecida,

    sombra de uma cruz, e escrevam nela,

    Foi poeta - sonhou e amou na vida.

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    QUESTO 03 Tipicamente romntico, o fragmento do poema acima revela-nos: A) a atitude pantesta.

    B) a idealizao da mulher.

    C) o tom egocntrico e o senso do mistrio.

    D) a f no poder criador.

    E) a conscincia da solido e a proximidade da morte.

    Todos cantam a sua terra,

    Tambm vou cantar a minha,

    Nas dbeis cordas da lira,

    Hei de faz-la rainha;

    Hei da dar-lhe realeza,

    Nesse tropo de beleza,

    Em que a mo da natureza,

    Esmerou-se em quanto tinha.

    QUESTO 04 Assinale a alternativa correta. A) sentimento de marginalizao da sociedade.

    B) patriotismo, evidenciado pela exaltao do passado.

    C) patriotismo, evidenciado pela exaltao da natureza.

    D) liberalismo poltico.

    E) Tdio existencial

    QUESTO 05 Na poca da independncia do Brasil, quando nosso pas precisava auto-afirmar-se como nao, entrou em vigncia entre ns um estilo de poca que, pelos ideais de liberdade que professava atravs de

    sua ideologia, se prestava admiravelmente a expressar esses anseios nacionalistas. Tal estilo foi o Romantismo.

    Assinale a alternativa que melhor representa o nacionalismo romntico.

    A) Meu canto de guerra / Guerreiros ouvi. / Sou filho das selvas, / Nas selvas cresci.

    B) Quando eu te fujo e me desvio cauto / da luz de fogo que te cerca, bela!

    C) Deus, Deus, onde ests que no respondes? / Em que mundo, em questrela tu

    tescondes?

    D) que saudades que eu tenho, / Da aurora da minha vida.

    E) Dormir aos berros da arenosa praia / da ruinosa Alcntara, evocando...

    QUESTO 06 Assinale a caracterstica no-aplicvel ao texto romntico.

    A) O escritor goza de liberdade de expresso quanto temtica e forma.

    B) O importante o culto da forma, a arte pela arte.

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    C) A mensagem primordialmente pessoal, intimista e amorosa.

    D) Enfatiza-se a auto-expresso, o subjetivismo, o individualismo.

    E) A linguagem do autor a mesma do povo: simples, espontnea.

    Terceira Gerao Romntica A POESIA SOCIAL DO ROMANTISMO I A 3 gerao romntica ficou conhecida como condoreira por usar uma linguagem to elevada quanto o vo do

    condor ou hugoana, por ser fortemente inspirada pela poesia engajada socialmente do escritor francs Victor

    Hugo.

    Desprezando o pieguismo ultra-romntico, devota-se a temas sociais e polticos (proclamao da repblica,

    abolio da escravatura, aperfeioamento do ensino, mudanas sociais, progresso).

    Seu representante maior Castro Alves, poeta baiano de grande talento e versatilidade.

    Castro Alves (1847-1871) surgiu para a literatura numa poca particularmente agitada da vida poltica brasileira. A

    efervescncia ideolgica do perodo contaminou a literatura e fez da poesia um plpito em que se veiculavam

    idias novas e se procurava atrair adeptos e correligionrios. O teatro e as praas pblicas tornaram-se palco de

    inflamados discursos poticos, declamados ardorosamente pelos prprios autores.

    Nesses precursores dos showmcios modernos, discutia-se a proclamao da repblica, a Guerra do Paraguai, a

    reforma do ensino, a abolio da escravatura e os demais problemas polticos, sociais, filosficos e ideolgicos

    que afligiam a intelectualidade do Imprio do Brasil.

    Castro Alves, jovem, bonito, galante, inflamado, culto e indiscutivelmente genial, chegou e empolgou as platias

    com seu discurso de tom elevado e sua figura bela e empolgante, o poeta chegava na hora certa. Foi consagrado

    principalmente porque sua eloqncia agradava muitssimo ao pblico da poca em que viveu.

    Seu tema predileto, mas no nico, foi a escravido. Os poemas de cunho social abarcam quase todo o rosrio

    preferido pela poesia da poca. Na poesia abolicionista, insupervel a marca do gnio baiano. Seu clamor por

    liberdade e suas invectivas contra a mancha obscena da escravatura no encontram paralelo em nenhuma poca e

    em nenhum autor da literatura brasileira.

    As imagens grandiosas, hiperblicas, reforadas por apstrofes e antteses provocantes, a linguagem enftica e

    altissonante so marcas da escola condoreira hugoana de que ele o representante maior em nossas letras.

    No poeta das Espumas Flutuantes, essas caractersticas no se encontram apenas em poemas de temtica que se

    pode chamar pica, porque abordam grandes questes coletivas, mas aparece tambm em poemas propriamente

    lricos, seja os de tema amoroso, seja os que nos revelam o poeta como um admirvel pintor de paisagens.

    Suas imagens, quase sempre arrojadas e intensas, costumam alternar o pequeno e o grandioso e tm uma espcie

    de atrao csmica e telrica indiscutvel uma preferncia pelos magnos elementos da natureza, como

    oceanos, cus, noite, estrelas, montanhas e tufes.

    O poeta exercitou seu estro tambm na poesia lrico-amorosa, de forma dissonante em relao aos demais

    romnticos, pois revela-se por uma poesia sensual e, por vezes, extremamente ertica. Sua expresso amorosa

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    prenhe de sensualidade, e a configurao da mulher, nos momentos mais marcantes de seus poemas erticos,

    destacada por uma realidade, uma "carnalidade" inexistente na poesia de seus coetneos e predecessores

    prximos ou distantes, que tendiam pura idealizao feminina, seja na figura da mulher-anjo, seja na da mulher-

    demnio.

    Castro Alves, diferentemente, fala de mulheres reais, mulheres que so, por assim dizer, motivo de lubricidade;

    de realizao e de frustrao amorosa, mas palpveis, virtuosas ou pecaminosas.

    A leitura dos poemas de Castro Alves remete-nos para um momento eletrizante da vida brasileira, em que vrias

    correntes de pensamento se entrecruzavam em choques ideolgicos marcantes e apaixonantes. O poeta bem

    soube erigir o seu monumento literrio que tem o dom de congregar homens de diferentes pocas na reflexo

    sobre uma realidade de profunda significao humana e social.

    Vamos fazer um teste?

    TEXTO ODE AO DOUS DE JULHO (Castro Alves)

    ERA NO DOUS de julho. A pugna imensa

    Travara-se nos cerros da Bahia.

    A anjo da morte plido cosia

    Uma vasta mortalha em Piraj.

    Neste lenol to largo, to extenso,

    Como um pedao roto do infinito...

    O mundo perguntava erguendo um grito:

    Qual dos gigantes morto rolar?!...

    Debruados do cu... a noite e os astros

    Seguiam da peleja o incerto fado...

    Era a tocha - o fuzil avermelhado!

    Era o Circo de Roma - o vasto cho!

    Por palmas - o troar da artilharia!

    Por feras - os canhes negros rugiam!

    Por atletas - dous povos se batiam!

    Enorme anfiteatro - era a amplido!

    No! No eram dous povos, que abalavam

    Naquele instante o solo ensangentado...

    Era o porvir em frente do passado,

    A Liberdade em frente Escravido,

    Era a luta das guias - e do abutre,

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    A revolta do pulso - contra os ferros,

    O pugilato da razo com os erros,

    O duelo da treva e do claro!...

    QUESTO 01. Julgue os seguintes itens: (1) A ode geralmente uma variante pica, tema guerreiro, assunto glorioso, exaltao das faanhas

    hericas; o confronto maquiavlico e maniquesta da liberdade contra o Despotismo, a viso

    mitolgica e conceptista; na potncia verbal de Castro Alves.

    (2) Alegoria, comparao, metfora, hiprbole, prosopopia, onomatopia, so figuras de linguagem

    que fundamentam a oratria grandiloqente e hugoana da poesia vibrante de Castro Alves inseridas

    no contexto da Ode do Dous de Julho.

    (3) Condoreirismo, viso progressista e liberal, messianismo poltico e social, poesia de comcio

    identificada com a abolio, mas, tambm lirismo sensual e viril, paisagismo exuberante e Mal-do-

    Sculo ocasional; so tpicos inerentes poesia de Castro Alves.

    (4) Os pares antitticos, tpicos do Barroco Literrio, o uso permanente e pertinente do contraste e o

    tom retumbante e metafrico, so aspectos determinantes do perfil retrico e condoreiro do poema.

    (5) O pice da poesia abolicionista, em termos formais e temticos, o poema O Navio Negreiro,

    apstrofe conscincia nacional, grito sublime de uma alma de poeta contra a injustia, os absurdos

    e misrias de um sistema social infame: a escravido.

    (6) Castro Alves tambm escreveu e publicou um romance sobre a Inconfidncia Mineira: Gonzaga ou

    a Revoluo de Minas.

    QUESTO 02. Levando em conta a estruturao sintticosemntica do poema, pode-se afirmar que: (1) O primeiro verso da segunda estrofe caracteriza uma figura de linguagem denominada animismo. (2) Os vocbulos pugna (v. 1) e pugilato (v. 23) apresentam o mesmo semantema.

    (3) O tema fundamental do poema o episdio de Canudos, tambm retratado por Euclides da Cunha

    em sua mais clebre obra: "Os Sertes".

    (4) Todas as rimas do poema so ricas e consoantes.

    (5) A segunda estrofe bom exemplo de paralelismo em todos os nveis de organizao do idioma:

    fnico, lexical, sinttico e semntico.

    QUESTO 03 Julgue os itens a seguir, com base no texto "Ode ao Dous de Julho". (1) No perodo "O mundo perguntava erguendo um grito", a orao grifada subordinada adverbial

    modal reduzida de gerndio.

    (2) A orao "Qual dos gigantes morto rolar?!..." subordinada substantiva objetiva direta.

    (3) O ncleo do sujeito da orao do item (1) gigantes.

    (4) Em "Qual dos gigantes mortos rolar?!..." e "No sei qual o seu nome", o pronome interrogativo

    QUAL adjunto adnominal, no primeiro perodo e predicativo do sujeito, no segundo perodo.

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    (5) A segunda orao do segundo perodo do item (3) subordinada substantiva objetiva direta

    justaposta.

    QUESTO 04. Julgue os itens a seguir, com base no texto "Ode ao Deus de Julho". (1) Em "A pugna imensa travara-se nos cerros da Bahia", o termo grifado pronome apassivador.

    (2) Transpondo para a voz passiva analtica a orao do item (1), temos: A pugna imensa fora travada

    nos cervos da Bahia.

    (3) Em "No! No eram dous povos, que abalavam / Naquele instante o solo ensangentado..." Que pronome relativo com funo sinttica de sujeito.

    (4) A segunda orao do perodo supracitado subordinada adjetiva explicativa.

    (5) Na palavra ensangentado, h 13 letras, 10 fonemas e trs dgrafos voclicos.

    QUESTO 05. Assinale verdadeiro ou falso. (1) Na primeira estrofe, os verbos esto no mesmo tempo, indicando aes que se processam

    concomitantemente.

    (2) O vocbulo "cosia" tem um parnimo cujo significado "preparar alimentos" e escreve-se com z.

    (3) A locuo "em Piraj" relaciona-se com o verbo "coisa", ao passo que o vocbulo "plido"

    relaciona-se com o substantivo "anjo".

    (4) O adjetivo "plido" traduz uma caracterstica que o substantivo "anjo" j possua antes de "coser".

    (5) O adjetivo "morto" est relacionado ao pronome "qual" e traduz uma caracterstica que se passar a

    ter, uma caracterstica que ser adquirida.

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    Ttulo: Literatura Brasileira para Vestibulares Autor: Honneur Mono Editora: CopyMarket.com, 2000

    A Literatura do Simbolismo

    Honneur Mono

    A arte literria , por sua prpria natureza, essencialmente simblica. Por isso mesmo, falar de smbolo, em Literatura no nenhuma novidade.

    No final do sculo XIX surgiram vrias correntes estticas que se entrecruzavam na busca de uma nova forma de expresso artstica. O Simbolismo foi uma delas, aprofundando o subjetivismo romntico, purificado do excesso de lgrimas e de pieguice, e teve uma curta durao na Literatura brasileira, j pelo seu elitismo e refinamento, j pelo "sufocamento" a que foi submetido pela avalanche da poesia parnasiana.

    Aprofundando o sentimentalismo e o emocionalismo romnticos, o Simbolismo vem instaurar uma espcie de "tomada de conscincia" dos estados emocionais, numa atitude que entrelaa a afetividade com a cognio. Esta atitude promove a chamada "busca do eu-profundo" em que o poeta mergulha dentro de si mesmo e examina os desvos ntimos do inconsciente, sentindo-os, e examinando-os e perquirindo-os .

    Na revelao dos resultados desta introspeco, os textos vm carregados de uma linguagem nova, enriquecidos por neologismos, arcasmos, exotismos e grafismos indispensveis comunicao da novidade esttica.

    Percebe-se, por conseguinte, que se trata de uma mudana radical da forma de expresso literria, elevando a Literatura a cimos ainda no alcanados em qualquer esttica anterior em sua original forma de manifestar-se.

    Origens e Caracterizao

    Encontram-se nos poemas de As Flores do Mal, de Charles Baudelaire, em 1857, as origens mais notveis e prximas da esttica simbolista. consensual a idia de que praticamente toda a poesia moderna e no s o Simbolismo teve origem nessa profunda alterao na arte da elaborao potica que veio desmitificar a poesia, incorporando-a existncia de um homem j sem mitos e sem deuses.

    O satanismo irreverente e corrosivo de Baudelaire a matriz de uma poesia que anseia por libertao de todas as limitaes e "insulamentos" da expresso potica. Sua "Teoria das Correspondncias" entende que os sentidos corpreos, a emoo e a espiritualidade interagem no momento exato da percepo da realidade exterior. Assim, as cores, os aromas, o pensamento incorporam-se em sinestesias inslitas e sugestivas da realidade.

    CORRESPONDNCIAS

    1. A natureza um templo onde vivos pilares

    2. Podem deixar ouvir confusas vozes: e estas

    3. Fazem o homem passar atravs de florestas

    4. De smbolos que o vem com olhos familiares.

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    5. Como os ecos alm confundem seus rumores

    6. Na mais profunda e mais tenebrosa unidade,

    7. To vasta como a noite e como a claridade,

    8. Harmonizando os sons, os perfumes e as cores.

    9. Perfumes frescos h como carnes de criana

    10. Ou obos de doura ou verdejantes ermos

    11. E outros ricos, triunfais e podres na fragrncia

    12. Que possuem a expanso do universo sem termos

    13. Como o sndalo, o almscar, o benjoim e o incenso

    14. Que cantam dos sentidos o transporte imenso.

    Baudelaire, Charles. Traduo de Jamil A. Haddad. As Flores do Mal. So Paulo-SP:

    Editora Max Limonad Ltda. 1981.

    Os conceitos embutidos neste soneto so fundamentais para o entendimento da esttica simbolista. A imagem da correspondncia de cores e sons, da integrao sensorial representam de fato o ideal de expresso potica perseguido pelos poetas do movimento.

    Em poemas simbolistas sempre presente uma camada sonora extremamente rica, pela aproximao obsessiva da poesia com a msica. O ideal esttico simbolista estabelecia uma relao ntima dos sons das palavras com a msica, da a presena constante das assonncias e aliteraes que, associadas s sinestesias e ao cromatismo, corporificam a "Teoria das Correspondncias" e conferem ao poema um carter sugestivo-sensorial de extrema beleza.

    O Simbolismo na Literatura Portuguesa

    {O Simbolismo portugus tem seu marco inicial nos poemas publicados nas revistas "Os Insubmissos" e "Bomia Nova", ambas em 1889, com colaboraes de Eugnio de Castro, Antnio Nobre, Camilo Pessanha e outros. Seguindo os passos de Baudelaire, Mallarm, Rimbaud e Verlaine, os autores portugueses elaboraram poemas carregados de musicalidade, espiritualidade e sugestes da realidade. Apartados da tcnica fria tpica do Parnasianismo, mas conscientes do valor do plano da expresso, souberam casar a forma e o contedo de tal maneira que o resultado so poemas que falam bem de perto ao esprito e no descuram da riqueza expressiva da lngua portuguesa.

    Antnio Nobre

    Soneto

    Na praia l da Boa Nova, um dia,

    Edifiquei (foi esse o grande mal)

    Alto Castelo, o que a fantasia,

    Todo de lpis-lazli e coral!

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    Naquelas redondezas no havia

    Quem se gabasse dum domnio igual:

    Oh Castelo to alto! parecia

    O territrio dum Senhor Feudal!

    Um dia (no sei quando, nem sei donde)

    Um vento seco de Deserto e spleen

    Deitou por terra, ao p que tudo esconde,

    O meu condado, o meu condado, sim!

    Porque eu j fui um poderoso Conde,

    Naquela idade em que se conde assim ...

    NOBRE, Antnio. In TORRES, Alexandre Pinheiro (org.). Antologia da poesia portuguesa. Porto: Lello & Irmo, 1977.

    A poesia de Antnio Nobre revela opulenta musicalidade e ritmo, alternando um vocabulrio refinado, prprio da esttica simbolista, com um registro mais coloquial e familiar. Explorou temas mais ligados ao pessimismo, ao tdio existencial, ao confessionalismo intimista e morte

    SONETO

    1. Virgens que passais, ao Sol-poente,

    2. Pelas estradas ermas a cantar!

    3. Eu quero ouvir uma cano ardente,

    4. Que me transporte ao meu perdido Lar.

    5. Cantai-me, nessa voz onipotente,

    6. O Sol que tomba, aureolando o Mar,

    7. A fartura da seara reluzente,

    8. O vinho, a Graa, a formosura, o luar!

    9. Cantai! cantai as lmpidas cantigas!

    10. Das runas do meu Lar desenterrai

    11. Todas aquelas iluses antigas

    12. Que eu vi morrer num sonho como um ai...

    13. suaves e frescas raparigas,

    14. Adormecei-me nessa voz... Cantai!

    Nobre, Antnio. Antologia in Nossos Clssicos. So Paulo - SP: Agir, 1973.

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    A predominncia da camada fnica, com a explorao intensa das vogais abertas, aliada a signos relacionados ao campo semntico do canto e do saudosismo conferem ao poema um tom suave e sugestivo de fim de tarde em cenrio buclico e sonhador, crepuscular.

    Eugnio de Castro

    UM SONHO

    Na messe , que enlourece, estremece a quermesse ...

    O sol, o celestial girassol, esmorece ...

    E as cantilenas de serenos sons amenos

    Fogem fluidas, fluindo fina flor dos fenos...

    As estrelas em seus halos

    Brilham com brilhos sinistros ...

    Cornamusas e crotalos

    Ctolas, citaras, sistros,

    Soam suaves, sonolentos,

    Sonolentos e suaves,

    Em suaves,

    Suaves, lentos lamentos

    De acentos

    Graves,

    Suaves ...

    CASTRO, Eugnio de. In: TORRES, Alexandre Pinheiro (org.). Antologia da poesia portuguesa: Porto, Lello & Irmo, 1977.

    J a partir do ttulo o poema sugere uma situao que transcende a realidade palpvel. A presena macia das aliteraes e assonncias; as sinestesias e o vocabulrio refinado incorporam claramente a arte potica tpica do Simbolismo.

    O autor considerado o iniciador e um dos mais expressivos exemplos do Simbolismo portugus.

    Camilo Pessanha

    Soneto

    Quem poluiu, quem rasgou os meus lenis de linho,

    Onde esperei morrer, meus to castos lenis?

    Do meu jardim exguo os altos girassis

    Quem foi que os arrancou e lanou no caminho?

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    Quem quebrou (que furor cruel e simiesco!)

    A mesa de eu cear, tbua tosca de. pinho?

    E me espalhou a lenha? E me entornou o vinho?

    Da minha vinha o vinho acidulado e fresco...

    minha pobre me! ... No te ergas mais da cova.

    Olha a noite, olha o vento. Em runa a casa nova ...

    Dos meus ossos o lume a extinguir-se breve.

    No venhas mais ao lar. No vagabundes mais.

    Alma da minha me ... No andes mais neve,

    De noite a mendigar s portas dos casais.

    PESSANHA, Camilo. Clepsidra e outros poemas. Lisboa: tica, 1973.

    Profundamente pessimista, incorporando a filosofia budista, segundo a qual o mundo feito de iluso e sofrimento, Camilo Pessanha, em seus poemas, explora o prazer magoado de contemplar a passagem inconsistente da vida. So textos sofridos, doentios, e marcado pelas imagens fluidas e efmeras.

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    Ttulo: Literatura Brasileira para Vestibulares Autor: Honneur Mono Editora: CopyMarket.com, 2000

    O Simbolismo no Brasil

    Honneur Mono

    Sob a influncia dos simbolistas franceses, j na dcada de 1880 aparecem poemas antecipadores do Simbolismo, que se foi desenvolvendo em grupos espalhados por praticamente todo o pas.

    bem verdade que os livros didticos restringem sua apreciao a dois principais poetas dessa fase Cruz e Sousa e Alphonsus dos Guimarens relegando ao esquecimento pelo menos uma meia centena de outros bons autores. Este fato se deve, principalmente, em razo da concomitncia do Simbolismo e do Parnasianismo, de grande apelo popular em nosso meio.

    A mera leitura de textos-propostas dos autores revela sua viso potica, preferncia vocabular e temtica, como se percebe nos textos a seguir.

    TEXTO I ARTE (fragmentos)

    Busca palavras lmpidas e castas,

    novas e raras, de clares radiosos,

    dentre as ondas mais prdigas, mais vastas

    dos sentimentos mais maravilhosos.

    Busca tambm palavras velhas, busca,

    limpa-as, d-lhes o brilho necessrio

    ..........................................................

    Enche de estranhas vibraes sonoras

    a tua estrofe, majestosamente ...

    Pe nela todo o incndio das auroras.

    Para torn-la emocional e ardente.

    Derrama luz e cnticos e poemas

    no verso e torna-o musical e doce

    como se o corao, nessas supremas

    Estrofes, puro e diludo fosse.

    .............................................................

    e na harpa do teu Sonho, corda a corda,

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    deixa que as iluses passem cantando.

    .............................................................

    Faz estrofes assim! E depois na chama

    do amor, de fecund-las e acend-las,

    derrama em cima lgrimas, derrama,

    como as eflorescncias das Estrelas.

    (Cruz e Sousa)

    TEXTO II AEIOU

    "A memria de Artur Rimbaud"

    Manh primavera. Quem no pensa

    Em doce amor, e quem no amar?

    Comea a vida. A luz do cu imensa...

    A adolescncia toda sonhos. A.

    O luar erra nas almas. Continua

    O mesmo sonho de oiro, a mesma f,

    Olhos que vemos sob a luz da lua...

    A mocidade toda lrios. E.

    Descamba o sol nas prpuras de ocaso.

    As rosas morrem. Como triste aqui!

    O fado incerto, os vendavais do ocaso...

    Marulha o pranto pelas faces. I.

    A noite tomba. O outono chega. As flores

    Penderam murchas. Tudo, tudo p.

    No mais beijos de amor, no mais amores...

    sons de sinos a finados! O.

    Abre-se a cova. Lutulenta e lenta,

    A morte vem. Consoladora s tu!

    Sudrios rotos na manso poeirenta...

    Crnios e tbias de defunto. U.

    (Alphonsus dos Guimaraens)

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    Cruz e Sousa (O Dante Negro O Cisne Negro)

    {Joo da Cruz e Sousa nasceu a 24 de novembro de 1862, na cidade do Desterro, atual Florianpolis, capital da ento provncia de Santa Catarina. Filho de dois negros escravos, trazia nas artrias sangue sem mescla da frica, e no profundo psiquismo milenrias foras adormecidas de angstia e sonho. Tiro a esta referncia todo acento literrio, pois que de fato significa um puro dado positivo, indispensvel compreenso do destino e do canto do Poeta Negro. Morreu a 19 de maro de 1898, na cidade de Stio, Minas, para onde fora transportado s pressas vencido pela tuberculose. Nos seus trinta e seis anos de existncia terrena, percorreu todo um ciclo de experincias tremendas de sofrimento. Mas umas tantas circunstncias propiciatrias, entre as quais essas prprias experincias, salvaram para o Brasil, talvez mesmo para o mundo, toda uma soberba florada de Beleza que, sem elas, no se haveria produzido.

    Essas circunstncias foram: a de haver sido amparado, na infncia, por uma famlia de linhagem fidalga, que o mandou instruir e o educou num sentimento grave da vida; a de haver sido combatido, desprezado, humilhado quando extremamente j se lhe condensara na alma a energia criadora, o que deu lugar a que esta no se dispersasse ao doce afago das alegrias do mundo; a de haver, no entanto, encontrado, no seio mesmo da universal hostilidade, o apoio de miraculosas mos compreensivas, que lhe afastaram os passos do desespero definitivo; a de haver sido perpetuamente pobre e no ter conhecido nunca seno a face trgica de tudo, o que serviu a dar estrutura e forma profundamente "funcionais" ao mundo de sonho, dor e desejo que nesse "nbio contemporneo de Davi" como que existia "desde toda a eternidade".

    Intil longamente explorar, no sentido biogrfico, uma vida que s pela sua repercusso numa alma antiga de poeta se revestiu de significao comovente. A Cruz e Sousa, de fato aconteceu apenas que, vindo para o Rio j homem feito, aps uma peregrinao pelo norte e o sul do pas como "ponto" de uma companhia dramtica, nesta cidade lutou, casou, teve filhos, viu a mulher enlouquecer, sofreu misria, amargou ultrajes e, por fim, entisicou, saindo ltima hora para morrer sob o benigno cu mineiro; vida esta que se reproduz em milhes de exemplares no seio da populao miservel do Brasil. Havia, porm, essa "alma antiga". Houve a conjuno de circunstncias que resultaram no seu canto imortal. Este canto que, no fim de contas, nos importa.

    A obra de Cruz e Sousa, afora alguns inditos de importncia mnima, se compendia nos seguintes volumes: Missal e Broquis, publicados em 1893, o primeiro de prosa, o segundo de poemas, nicos livros aparecidos ainda em vida do poeta; depois de sua morte, por diligncia de amigos, principalmente de Nestor Vtor, vieram a lume: Evocaes, prosa, em 1898; Faris, poemas, em 1900; ltimos Sonetos, em 1905.

    Caractersticas marcantes da obra do autor Recorrncia de manifestaes a realidades sociais degradantes: doena, pobreza, discriminao racial,

    loucura;

    Viso pessimista e vagamente espiritualista; Poemas em prosa; Preocupao formal (influncia parnasiana): soneto, mtrica perfeita, rimas raras; Pendor para uma poesia filosfica e meditativa; Equilbrio entre a expressividade e a construo esttica; Concepo trgica da vida; Busca da transcendncia.

    A cosmoviso presente na obra do Autor deixa entrever trs aspectos marcantes:

    A dor proveniente da busca de afirmao social em uma sociedade marcada pelo preconceito racial; A revolta contra a condio degradante do negro, dos miserveis e dos humilhados em geral;

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    A aceitao da dor em face da constatao do prprio valor. A procura da sublimao do sofrimento pela glria de ser um iluminado (poeta)

    O crtico literrio francs Roger Bastide catalogou, na obra de Cruz e Sousa, a ocorrncia de 169 (cento e sessenta e nove) ocorrncias de imagens associadas cor branca. Tanto bastou para que se imaginasse logo que o poeta tinha a fixao pela cor, numa nsia de se "branquear" por intermdio de sua poesia. Esta hiptese e no passa de uma hiptese pode ser contraditada por uma verdade observvel na obra de outros simbolistas de relevo.

    A cor branca, na cultura ocidental, sempre foi smbolo de pureza ou de purificao. Simbolicamente, as noivas casam-se de branco e com flores brancas ornando suas frontes. Uma esttica que busca evadir-se de um mundo considerado impuro, defeituoso, manchado no poderia deixar de eleger a cor branca como uma de referncias prediletas. Assim, comum encontrar-se em poemas simbolistas imagens emolduradas por nuvens, estrelas, brilhos, neve, nvoa, cristais, espuma, prolas, cascatas, vus, marfim, lrio, linho, lenis e outras que lembram o branco.

    O exotismo da linguagem prprio da preferncia por um universo misterioso, sugestivo e que foge a qualquer tipo de percepo racional:

    FLORES DA LUA

    1. Brancuras imortais da Lua Nova,

    2. frios de nostalgia e sonolncia...

    3. Sonhos brancos da Luz e viva essncia

    4. dos fantasmas noctvagos da Cova.

    5. Da noite a tarda e taciturna trova

    6. solua, numa tremula dormncia...

    7. Na mais branda, mais leve florescncia

    8. tudo em Vises e Imagens se renova.

    9. Mistrios virginais dormem no Espao,

    10. dormem o sono das profundas seivas,

    11. montono, infinito, estranho e lasso ...

    12. E das Origens de luxria forte

    13. Abrem nos astros, nas sidreas leivas

    14. flores amargas do palor da Morte.

    O poema Sideraes, a seguir, revela a obsesso pela cor branca, e o desejo de transcendncia, ao ponto de suprema integrao psquica e espiritual, ao mistrio da noite infinda.

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    SIDERAES

    1. Para as Estrelas de cristais gelados

    2. as nsias e os desejos vo subindo,

    3. galgando azuis e siderais noivados

    4. de nuvens brancas a amplido vestindo.

    5. Num cortejo de cnticos alados

    6. os arcanjos, as ctaras ferindo,

    7. passam, das vestes nos trofus prateados,

    8. as asas de ouro finamente abrindo ...

    9. Dos etreos turbulos de neve

    10. claro incenso aromal, lmpido e leve,

    11. ondas nevoentas de Vises levanta ...

    12. E as nsias o os desejos infinitos

    13. vo com os arcanjos formulando ritos

    14. da Eternidade que nos Astros cante ...

    A tortura moral diante do preconceito; o acmulo de incertezas, o tumulto psicolgico, o erotismo contido e a viso trgica e pessimista da vida podem ser percebidas nos versos a seguir.

    TDIO

    Vala comum de corpos que apodrecem,

    Esverdeada gangrena

    Cobrindo vastides que fosforescem

    Sobre a esfera terrena.

    Bocejo torvo de desejos turvos,

    Languescente bocejo

    De velhos diabos de chavelhos curvos

    Rugindo de desejo.

    Sangue coalhado, congelado, frio,

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    Espasmado nas veias...

    pesadelo sinistro de algum rio

    De sinistras sereias ...

    Alma sem rumo, a modorrar de sono,

    Mole, trbida, lesse...

    Monotonias lbricas de um mono

    Danando numa praa ...

    Mudas epilepsias, mudas, mudas,

    Mudos epilepsias,

    Masturbaes mentais, fundas, agudas,

    Negras nevrostenias.

    Flores sangrentas do soturno vcio

    Que as almas queima e morde...

    Msica estranha de letal suplcio,

    Vago, mrbido acorde...

    Um vocabulrio sinistro, ttrico, fnebre, cadavrico, cuja contundncia verbal e temtica so agressivamente "pouco poticas" conferem ao texto um sentido mais de asco que de tdio existencial como sugere o ttulo. Esta linha potica anticonvencional ser retomada mais tarde, vigorosamente, por Augusto dos Anjos.

    O exotismo da linguagem prprio da preferncia por um universo misterioso, sugestivo e que foge a qualquer tipo de percepo racional:

    FLORES DA LUA

    1. Brancuras imortais da Lua Nova,

    2. frios de nostalgia e sonolncia...

    3. Sonhos brancos da Luz e viva essncia

    4. dos fantasmas noctvagos da Cova.

    5. Da noite a tarda e taciturna trova

    6. solua, numa tremula dormncia...

    7. Na mais branda, mais leve florescncia

    8. tudo em Vises e Imagens se renova.

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    9. Mistrios virginais dormem no Espao,

    10. dormem o sono das profundas seivas,

    11. montono, infinito, estranho e lasso ...

    12. E das Origens de luxria forte

    13. Abrem nos astros, nas sidreas leivas

    14. flores amargas do palor da Morte.

    O poema Sideraes, a seguir, revela a obsesso pela cor branca, e o desejo de transcendncia, ao ponto de suprema integrao psquica e espiritual, ao mistrio da noite infinda.

    SIDERAES

    1. Para as Estrelas de cristais gelados

    2. as nsias e os desejos vo subindo,

    3. galgando azuis e siderais noivados

    4. de nuvens brancas a amplido vestindo.

    5. Num cortejo de cnticos alados

    6. os arcanjos, as ctaras ferindo,

    7. passam, das vestes nos trofus prateados,

    8. as asas de ouro finamente abrindo ...

    9. Dos etreos turbulos de neve

    10. claro incenso aromal, lmpido e leve,

    11. ondas nevoentas de Vises levanta ...

    12. E as nsias o os desejos infinitos

    13. vo com os arcanjos formulando ritos

    14. da Eternidade que nos Astros cante ...

    A tortura moral diante do preconceito; o acmulo de incertezas, o tumulto psicolgico, o erotismo contido e a viso trgica e pessimista da vida podem ser percebidas nos versos a seguir.

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    TDIO

    Vala comum de corpos que apodrecem,

    Esverdeada gangrena

    Cobrindo vastides que fosforescem

    Sobre a esfera terrena.

    Bocejo torvo de desejos turvos,

    Languescente bocejo

    De velhos diabos de chavelhos curvos

    Rugindo de desejo.

    Sangue coalhado, congelado, frio,

    Espasmado nas veias...

    pesadelo sinistro de algum rio

    De sinistras sereias ...

    Alma sem rumo, a modorrar de sono,

    Mole, trbida, lesse...

    Monotonias lbricas de um mono

    Danando numa praa ...

    Mudas epilepsias, mudas, mudas,

    Mudos epilepsias,

    Masturbaes mentais, fundas, agudas,

    Negras nevrostenias.

    Flores sangrentas do soturno vcio

    Que as almas queima e morde...

    Msica estranha de letal suplcio,

    Vago, mrbido acorde...

    Um vocabulrio sinistro, ttrico, fnebre, cadavrico, cuja contundncia verbal e temtica so agressivamente "pouco poticas" conferem ao texto um sentido mais de asco que de tdio existencial como sugere o ttulo. Esta linha potica anticonvencional ser retomada mais tarde, vigorosamente, por Augusto dos Anjos.

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    ALPHONSUS DOS GUIMARAENS

    O outro grande representante do Simbolismo na Literatura brasileira, Afonso Henrique da Costa Guimares, o chamado "solitrio de Mariana" viveu sempre afastado das "igrejinhas" literrias do Rio e de So Paulo, mas foi poeta altamente prolfico, tendo publicado dez obras em verso e prosa. A crtica considera-o um poeta "monotemtico", por que quase tudo que escreveu gira em torno do amor e da morte. (A prima e namorada prematuramente falecida e a fixao na figura de Nossa Senhora com quem a amada identificada ) so os temas constantes, explorados em um ambiente de profunda tristeza lrica, em poemas de caractersticas elegacas (lutuosas) e carregados de misticismo.

    Caractersticas Marcantes da Obra do Autor.

    Cenrio religioso, velhas cidades e igrejas de Minas Gerais; Devoo mariana, exaltao Virgem Maria; Musicalidade suave que lembra sinos e cnticos religiosos; Poemas ligados a velrios, sepultamentos, missas de rquiem; Vocabulrio litrgico; Ternura e melancolia; Simplicidade expressiva, contrastando com a linguagem elitista do movimento Simbolista como um todo;

    A obsesso da morte, em Alphonsus dos Guimaraens, difere da atitude mrbida de outras estticas. A morte vista e ansiada como libertao e como possibilidade de reaproximao da amada na esfera em que o absoluto Deus oferece a superao da dor de viver.

    SONETO XIV

    Nada somos, sabeis, e que seremos

    Mais do que duas mseras ossadas?

    As loucas iluses em que vivemos

    So estrelas que morrem desmaiadas

    Sem longo dos espritos blasfemos,

    Pobres crianas a ouvir contos de fadas

    Ao cu as nomes almas ergueremos,

    Corno duas princesas encantadas.

    O silncio agoniza pelas naves...

    So trindades que vo morrer no poente,

    Baixando mudas como vos de aves.

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    Que subam para o cu as nossas almas,

    Baloiando entre os astros suavemente,

    To objetivas como duas palmas!

    (Pastoral aos Crentes do Amor e da Morte)

    Poeta realmente religioso, devoto da Virgem Maria, assume sua religiosidade emocional, mas contida, numa atitude de aceitao e xtase mstico.

    SEGUNDA DOR

    Mos que os lrios invejam, mos eleitas

    Para aliviar de Cristo os sofrimentos,

    Cujas veias azuis parecem feitas

    Da mesma essncia astral dos olhos bentos:

    Mos de sonho e de crena, mos afeitas

    A guiar do moribundo os passos lentos,

    E em sculos de f, rosas desfeitas

    Em hinos sobre as torres dos conventos:

    Mos a bordar o santo Escapulrio,

    Que revelastes para quem padece

    O inefvel consolo do Rosrio:

    Mos ungidas no sangue da Coroa,

    Deixai tombar sobre a minha Alma em prece

    A bno que redime e que perdoa!

    (Setenrio das Dores de Nossa Senhora)

    OBSERVAO:

    O Setenrio das Dores de Nossa Senhora constitui-se de 49 sonetos dedicados s Sete Dores da Virgem Maria, conforme a tradio ritual catlica. obra referencial do lirismo mariano e litrgico de Alphonsus.

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    Textos marcantes da obra do Autor

    Ho de Chorar por ela os Cinamomos

    Ho de chorar por ela os cinamomos,

    Murchando as flores ao tombar do dia.

    Dos laranjais ho de cair os pomos,

    Lembrando-se daquela que os colhia.

    As estrelas diro: "Ai, nada somos,

    Pois ela se morreu silente e fria... "

    E pondo os olhos nela como pomos,

    Ho de chorar a irm que lhes sorria.

    A lua, que lhe foi me carinhosa,

    Que a viu nascer e amar, h de envolv-la

    Entre lrios e ptalas de rosa.

    Os meus sonhos de amor sero defuntos...

    E os arcanjos diro no azul ao v-la,

    Pensando em mim: - "Por que no vieram juntos? -

    ROSAS

    Rosas que j vos fostes, desfolhadas

    Por mos tambm que j se foram, rosas

    Suaves e tristes! Rosas que as amadas,

    Mortas tombam, beijaram suspirosas ..

    Umas rubras o vs, outras fanadas,

    Mas cheios do calor das amorosas...

    Sois aroma de alfombras silenciosas,

    Onde dormiram tranas destranadas.

    Umas brancas, da cor das pobres freiras,

    Outras, cheias de vio e de frescura,

    Rosas primeiras, rosas derradeiras!

    Ai! quem melhor que vs, se a dor perdura,

    Para coroar-me, rosas passageiras,

    O sonho que se esvai na desventuras

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    OSSEA MEA

    Mos de finada, aquelas mos de neve,

    De tons marfneos, de ossatura rica,

    Palrando no ar, num gesto brando e leve,

    Que parece ordenar, mas que suplica.

    Erguem-se ao longe como se as eleve

    Algum que ante os altares sacrifica:

    Mos que consagram, mos que partem breve,

    Mos cuja sombra nos meus olhos fica ...

    Mos de esperana para as almas loucas,

    Brumosas mos que vim brancas, distantes,

    Fechar ao mesmo tempo tantas bocas...

    Sinto-as agora, ao luar, descendo juntas

    Grandes, magoadas, plidas, tacteantes,

    Cerrando os olhos das vises defuntas...

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    Ttulo: Literatura Brasileira para Vestibulares Autor: Honneur Mono Editora: CopyMarket.com, 2000

    Mo e a Luva Honneur Mono

    DO AUTOR Machado de Assis, na atualidade, transformou-se em uma das raras unanimidades nacionais. Raramente passa-se uma semana sem que algo de novo em torno do autor e de sua obra seja publicado, republicado, discutido, analisado por crticos, entendidos ou meros curiosos.

    O Autor praticamente inseparvel do conceito de Literatura brasileira. Nascido, criado e radicado por toda sua vida no Rio de Janeiro, seus romances, crnicas, contos, poemas e peas teatrais, que foi um de nossos mais perfeitos polgrafos, elegem como cenrio a ento capital do Brasil, na segunda metade do sculo XIX. Entretanto, mesmo com esse cenrio e tempo histrico imutvel, explora sua temtica com tal maestria e propriedade que o texto torna-se anaespacial e atemporal, fazendo o leitor passar despercebido por limites que em outras circunstncias datariam a obra.

    DA OBRA

    Fazendo parte da obra dita romntica de Machado de Assis, A Mo e a Luva inova o romance romntico tradicional, no sentido de criar situaes e personagens em que o mvel das aes humanas no mais se restringe ao amor puro e simples, mas volta-se para o aspecto social em que o desejo de ascender socialmente, mesmo custa do sacrifcio afetivo, tico e moral. Basta essa viso para perceber-se a mudana radical: Guiomar, a herona, em que pesem os dotes fsicos de extrema feminilidade e beleza o que tpico do romance romntico , revela um comportamento em que a determinao, a frieza, a hipocrisia governam as atitudes que tm sempre o fito de atingir o objetivo delineado e perseguido implacavelmente.

    A linguagem, o vocabulrio, a tessitura e algumas atitudes so, claramente, romnticos. Entretanto os protagonistas Guiomar e Lus Alves seriam facilmente, se isso fosse possvel, transplantados para um romance realista sem que houvesse necessidade da qualquer mudana em sua caracterizao psicolgica e comportamento social. Percebe-se, por conseguinte, que os romances dessa fase so como o treinamento para o grande ficcionista que viria a seguir.

    "ADVERTNCIA DE 1814

    Esta novela, sujeita s urgncias da publicao diria, saiu das mos do autor captulo a captulo, sendo natural que a narrao e o estilo padecessem com esse mtodo de composio um pouco fora dos hbitos do autor. Se a escrevera em outras condies, dera-lhe desenvolvimento maior e algum mais aos caracteres, que a ficam esboados. Convm dizer que o desenho de tais caracteres, o de Guiomar sobretudo, foi o meu objeto principal, se no exclusivo, servindo-me a ao apenas de tela em que lancei os contornos dos perfis. Incompletos embora, tero eles sado naturais ou verdadeiros?

    Mas talvez estou eu a dar propores muito graves a uma cousa de to pequeno tomo. O que vai a so umas poucas pginas que o leitor esgotar de um trago, se elas lhe aguarem a curiosidade, ou se lhe sobrar alguma hora que absolutamente no possa empregar em outra cousa, mais bela ou mais til."

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    DO TTULO

    Escolhido a rigor, o ttulo como um resumo bastante sinttico da obra. Guiomar e Lus Alves so to semelhantes em suas reaes, atitudes e ambies que sua perfeita unio lembra o casamento de uma luva feita sob medida para uma determinada mo.

    "O destino no devia mentir nem mentiu ambio de Lus Alves. Guiomar acertara; era aquele o homem forte. Um ms depois de casados, como eles estivessem a conversar do que conversam os recm-casados, que de si mesmos, e a relembrar a curta campanha do namoro, Guiomar confessou ao marido que naquela ocasio lhe conhecera todo o poder da sua vontade.

    Vi que voc era homem resoluto, disse a moa a Lus Alves, que, assestado, a escutava.

    Resoluto e ambicioso, ampliou Lus Alves sorrindo; voc deve ter percebido que sou uma e outra cousa.

    A ambio no defeito.

    Pelo contrrio, virtude; eu sinto que a tenho, e que hei de faz-la vingar. No me fio s na mocidade e na fora moral; fio-me tambm em voc, que h de ser para mim uma fora nova.

    Oh! sim! exclamou Guiomar.

    com um modo gracioso continuou:

    Mas que me d voc em paga? um lugar na cmara? uma pasta de ministro?

    O lustre do meu nome, respondeu ele.

    Guiomar, que estava de p defronte dele, com as mos presas nas suas, deixou-se cair lentamente sobre os joelhos do marido, e as duas ambies trocaram o sculo fraternal. Ajustavam-se ambas, como se aquela luva tivesse sido feita para aquela mo.

    ENREDO

    Guiomar moa de origem humilde, rf, mantida em uma escola para formao de professores por uma protetora rica. Surge um pretendente Estevo e ela o descarta porque ele no encarnava o ideal de homem que ela imaginara para marido. Deixando a escola e indo viver como filha, em casa de sua protetora, reencontra o antigo namorado que procura, por todos os modos, reatar o namoro.

    Guiomar tivera humilde nascimento; era filha de um empregado subalterno no sei de que repartio do Estado, homem probo, que morreu quando ela contava apenas sete anos, legando viva o cuidado de a educar e manter. A viva era mulher enrgica e resoluta, enxugou as lgrimas com a manga do modesto vestido, olhou de frente para a situao e determinou-se luta e vitria.

    A madrinha de Guiomar no lhe faltou naquele duro transe, e olhou por elas, como entendia que era seu dever. A solicitude, porm, no foi to constante a princpio como veio a ser depois; outros cuidados de famlia lhe chamavam a ateno.

    Guiomar anunciava desde pequena as graas que o tempo lhe desabrochou e perfez. Era uma criaturinha galante e delicada, assaz inteligente e viva, um pouco travessa, decerto, mas muito menos do que usual na infncia. Sua me, depois que lhe morrera o marido, no tinha outro cuidado na Terra, nem outra ambio mais, que a de v-Ia prendada e feliz. Ela mesma lhe ensinou a ler mal, como ela sabia, e a coser e bordar, e o pouco mais que possua de seu ofcio de mulher. Guiomar no tinha dificuldade nenhuma em reter que a me lhe ensinava, e com tal afinco lidava por aprender, que viva, ao menos nessa parte, sentia-se venturosa. Hs de ser minha doutora, dizia-lhe muita vez; e esta simples expresso de ternura alegrava a menina e lhe servia de incentivo aplicao.

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    A casa em que moravam era naturalmente modesta. Ali correu a infncia, mas solitria, o que um pouco mais grave. A me, quando a via embebida nos jogos prprios da idade, infantilmente alegre, mas de uma alegria que fazia mal a seus olhos de me, to fundo lhe doa aquele viver, - a me sentia s vezes pularem-lhe as lgrimas dos olhos fora. A filha no as via, porque ela sabia escond-Ias; mas adivinhava-as atravs da tristeza que lhe ficava no rosto. S no adivinhava o motivo, mas bastava que fossem mgoas de sua me, para lhe descair tambm a alegria.

    J agora h outro que Jorge , sobrinho e protegido da madrinha de Guiomar. Jorge conta, em suas investidas, com o auxlio poderoso de Mrs. Oswald, dama de companhia da baronesa.

    Era um rapaz de vinte e cinco a vinte e seis anos. Jorge chamava-se ele; no era feio, mas a arte estragava um pouco a obra da natureza. O muito mimo empece a planta, disse o poeta, e esta mxima no s aplicvel poesia, mas tambm ao homem. Jorge tinha um lindo bigode castanho, untado e retesado com excessivo esmero. Os olhos, claros e vivos, seriam mais belos, se ele no os movesse com afetao, s vezes feminina. O mesmo direi dos modos, que seriam fceis e naturais, se os no tornasse to alinhados e medidos. As palavras saam-lhe lentas e contadas, como a fazer sentir toda a munificncia do autor. No as proferia como as demais pessoas; cada slaba era por assim dizer espremida, sendo fcil ver ao cabo de alguns minutos, que ele fazia consistir toda a beleza da elocuo nesse alongar do vocbulo. As idias oravam pelo modo de as exprimir; eram chochas por dentro, mas traziam uma cdea de gravidade pesadona, que dava vontade de ir espairecer o ouvido em cousas leves e folgazs.

    Tais eram os defeitos aparentes de Jorge. Outros havia, e desses, o maior era um pecado mortal, o stimo. O nome que lhe deixara o pai, e a influncia da tia podiam servir-lhe nas mos para fazer carreira em alguma cousa pblica; ele, porm, preferia vegetar toa, vivendo do peclio que dos pais herdara e das esperanas que tinha na afeio da baronesa. No se lhe conhecia outra ocupao.

    No obstante os defeitos apontados, havia nele qualidades boas; sabia dedicar-se, era generoso, incapaz de malfazer, e tinha sincero amor velha parenta. A baronesa, pela sua parte, queria-lhe muito. Guiomar e ele eram as suas duas afeies principais, quase exclusivas.

    Tal era a pessoa cujos interesses defendia Mrs. Oswald, por amor da baronesa, e no menos de si prpria. A baronesa tambm tinha os seus sonhos, como ela mesma disse, e esses eram deixar felizes aquelas duas crianas. Jorge pela sua parte estava disposto a estender o colo ao sacrifcio; e, bem examinadas as cousas, talvez amasse sinceramente a moa. A diferena entre ele e Estevo que seu amor era medido como os seus gestos, e to superficial como as suas outras impresses.

    A este tringulo amoroso, formado por Jorge, Estevo e Guiomar, acrescenta-se Lus Alves, amigo de Estevo e vizinho de Guiomar, que passa a assedi-la de maneira discreta e eficiente.

    Durante trs dias deixou Lus Alves de ir casa da baronesa, estando alis a morrer por isso. Entrava porm no plano esta ausncia; era das instrues que ele mesmo dera ao seu corao; no havia, remdio seno observ-las.

    No quarto dia recebeu um bilhete da baronesa que o cumprimentava pela eleio. A mala do Norte chegara, e com ela a notcia da vitria eleitoral. Estava Lus Alves deputado; ia enfim dar a sua demo no fabrico das leis. Estvo foi o primeiro que o felicitou; era o antigo companheiro dos bancos da academia; tanto ou mais do que os outros devia aplaudir aquela boa fortuna. No lhe escondeu, entretanto, a inveja que ela lhe metia:

    Deputado! suspirou ele. Oh! eu tambm podia ser

    deputado.

    Estvo dizia isto, como a criana deseja o dixe que v no colo de outra criana, nada mais. Eram os seus sonhos de outrora, que renasciam tais quais eram, inconsistentes, vagos, prestes a dissiparem-se com o primeiro raio da manh.

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    Lus Alves apressou-se a ir agradecer baronesa a felicitao. Guiomar teve um leve estremecimento quando o viu, mas recebeu-o tranqila e risonha, quase indiferente. O advogado era hbil; no a perseguiu com os olhos; sobre acordar a ateno das demais pessoas, era seguir o mtodo comum. Ele no queria parecer-se com os outros.

    Guiomar, entretanto, observava-o a espaos, de revs, como a querer surpreend-lo; a pouco e pouco, porm, o seu olhar foi sendo mais direito e firme. O de Lus Alves era natural e igual como antes era, como era ainda agora com todos.

    Ao sair, junto porta de uma sala, onde acaso a topou, Lus Alves teve ocasio de lhe dizer esta simples palavra:

    Perdoou-me?

    A moa retirou a mo, que ele tinha presa na sua, e furtou o corpo, ao mesmo tempo que lhe caam as plpebras.

    Perdoou-me? repetiu ele.

    Guiomar retirou-se sem dizer palavra. Lus Alves esperou que ela desaparecesse e saiu. A moa, entretanto, ficou irritada por nada lhe ter respondido, sendo verdade que nada achou nem acharia talvez que lhe responder; mas arrependeu-se e pensou longo tempo naquilo.

    Quer dizer que o amava? Quer dizer que estava prestes a isso?

    Mrs. Oswald toma o partido de Jorge e tenta convencer Guiomar a dar-lhe a preferncia, pois, segundo ela, a baronesa faria muito gosto nesta unio. Guiomar, entretanto, tem outros planos. Ela no aceita que ningum, nem nada, tolha seus planos de grandeza. Deseja um marido que seja ambicioso, forte, atrevido, inescrupuloso, capaz de vencer todos os obstculos para manter-se sempre em posio privilegiada e superior. Este homem Lus Alves e ela o incentiva a pedir sua mo baronesa, preterindo os pretendentes que no preenchiam os requisitos que ela traara para o seu futuro marido.

    Podia dar-lhe Lus Alves este gnero de amor? Podia; ela sentiu que podia. As duas ambies tinham-se adivinhado desde que a intimidade as reuniu. O proceder de Lus Alves, sbrio, direto, resoluto, sem desfalecimentos, nem demasias ociosas, fazia perceber moa que ele nascera para vencer e que a sua ambio tinha verdadeiramente asas, ao mesmo tempo, que as tinha ou parecia t-las o corao. Demais, o primeiro passo do homem pblico estava dado; ele ia entrar em cheio na estrada que leva os fortes glria. Em torno dele ia fazer-se aquela luz, que era a ambio da moa, a atmosfera, que ela almejava respirar. Estvo dera-lhe a vida sentimental, Jorge a vida vegetativa; em Lus Alves via ela combinadas as afeies domsticas com o rudo exterior.

    O destino no devia mentir nem mentiu ambio de Lus Alves. Guiomar acertara; era aquele o homem forte. Um ms depois de casados, como eles estivessem a conversar do que conversam os recm-casados, que de si mesmos, e a relembrar a curta campanha do namoro, Guiomar confessou ao marido que naquela ocasio lhe conhecera todo o poder da sua vontade.

    Vi que voc era homem resoluto, disse a moa a Lus Alves, que, assestado, a escutava.

    Resoluto e ambicioso, ampliou Lus Alves sorrindo; voc deve ter percebido que sou uma e outra cousa.

    A ambio no defeito.

    Pelo contrrio, virtude; eu sinto que a tenho, e que hei de faz-la vingar. No me fio s na mocidade e na fora moral; fio-me tambm em voc, que h de ser para mim uma fora nova.

    Oh! sim! exclamou Guiomar.

    E com um modo gracioso continuou:

    Mas que me d voc em paga? um lugar na cmara? uma pasta de ministro?

    O lustre do meu nome, respondeu ele.

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    Guiomar, que estava de p defronte dele, com as mos presas nas suas, deixou-se cair lentamente sobre os joelhos do marido, e as duas ambies trocaram o sculo fraternal. Ajustavam-se ambas, como se aquela luva tivesse sido feita para aquela mo.

    TEMPO NARRATIVO

    Predomina o tempo cronolgico, determinando uma narrativa lenta, compassada, arrastando-se por detalhes muitas vezes dispensveis, como se pode observar nos fragmentos a seguir.

    Lus Alves acudiu-lhe com as pastilhas a consolao passou; nova palestra, novo riso, novo desespero, e assim se foram escoando as horas da noite, que o relgio da sala de jantar batia seca e regularmente, como a lembrar aos dous amigos que as nossas paixes no aceleram nem moderam o passo do tempo.

    A aurora para os dous acadmicos coincidiu com as badaladas do meio-dia, o que no admira, pois s adormeceram quando ela comeava a apagar as estrelas. Estvo passou a noite, a manh, quero dizer, muito sossegado e livre de sonhos maus. Quando abriu os olhos estranhou o aposento e os objetos que o rodeavam. Logo que os reconheceu, despertou-se-lhe, com a memria, o corao, onde j no havia aquela dor aguda da vspera. Os sucessos, embora recentes, comeavam a envolver-se na sombra crepuscular do passado.

    A natureza tem suas leis imperiosas; e o homem, ser complexo, vive no s do que ama, mas tambm (fora diz-lo) do que come. Sirva isto de escusa ao nosso estudante, que almoou nesse dia, como nos anteriores, bastando dizer em seu abono que, se o no fez com lgrimas, tambm o no fez alegre. Mas o certo que a tempestade serenara; o que havia era uma ressaca, ainda forte mas que diminuiria com o tempo. Lus Alves evitou falar-lhe de Guiomar. Estvo foi o primeiro a recordar-se dela.

    D tempo ao tempo, respondeu Lus Alves, e ainda te hs de rir dos teus planos de ontem. Sobretudo, agradece ao destino o haveres escalado to depressa. E queres um conselho?

    A promessa cumpriu-se pontualmente. Lus Alves apresentou Estvo baronesa, na seguinte noite, como seu companheiro e amigo, como advogado capaz de zelar os interesses da ilustre cliente. A recepo foi geralmente boa, salvo por parte de Guiomar, que pareceu aborrecida de o ver naquela casa. Quando Estvo a saudou, como quem a conhecia de longo tempo, ela mal pde retribuir-lhe o cumprimento; em todo o resto da noite no lhe deu palavra. Daquela parte o acolhimento no podia ser pior; mas Estvo sentia-se feliz, desde que v-Ia, respirar o mesmo ar, nada mais pedindo por ora, e deixando o resto fortuna.

    Estvo meteu a mo nos cabelos com um gesto de angstia; Lus Alves sacudiu a cabea e sorriu. Achavam-se os dous no corredor da casa de Lus Alves, Rua da Constituio, que ento se chamava dos Ciganos; ento, isto , em 1853, uma bagatela de vinte anos que l vo, levando talvez consigo as iluses do leitor, e deixando-lhe em troca (usurrios!) uma triste, crua e desconsolada experincia.

    Eram nove horas da noite; Lus Alves recolhia-se para casa, justamente na ocasio em que Estvo o ia procurar; encontraram-se porta. Ali mesmo lhe confiou Estvo tudo o que havia, e que o leitor saber daqui a pouco, caso no aborrea estas histrias de amor, velhas como Ado, e eternas como o cu. Os dous amigos demoraram-se ainda algum tempo no corredor, um a insistir com o outro para que subisse, o outro a teimar que queria ir morrer, to tenazes ambos, que no haveria meio de, os vencer, se a Lus no ocorresse uma transao.

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    Pois sim, disse ele, convenho em que deves morrer, mas h de ser amanh. Cede da tua parte, e vem passar a noite comigo. Nestas ltimas horas que tens de viver na Terra dar-me-s uma lio de amor, que eu te pagarei com outra de filosofia.

    Eram nove horas da noite; Lus Alves recolhia-se para casa, justamente na ocasio em que Estvo o ia procurar; encontraram-se porta. Ali mesmo lhe confiou Estvo tudo o que havia, e que o leitor saber daqui a pouco, caso no aborrea estas histrias de amor, velhas como Ado, e eternas como o cu. Os dous amigos demoraram-se ainda algum tempo no corredor, um a insistir com o outro para que subisse, o outro a teimar que queria ir morrer, to tenazes ambos, que no haveria meio de, os vencer, se a Lus no ocorresse uma transao.

    Pois sim, disse ele, convenho em que deves morrer, mas h de ser amanh. Cede da tua parte, e vem passar a noite comigo. Nestas ltimas horas que tens de viver na Terra dar-me-s uma lio de amor, que eu te pagarei com outra de filosofia.

    ESPAO

    O espao fsico com declaraes explcitas sobre alguns logradouros que identificam o Rio de Janeiro.

    Estvo meteu a mo nos cabelos com um gesto de angstia; Lus Alves sacudiu a cabea e sorriu. Achavam-se os dous no corredor da casa de Lus Alves, Rua da Constituio, que ento se chamava dos Ciganos; ento, isto , em 1853, uma bagatela de vinte anos que l vo, levando talvez consigo as iluses do leitor, e deixando-lhe em troca (usurrios!) uma triste, crua e desconsolada experincia.

    (...)

    A baronesa escreveu nesse mesmo dia ao sobrinho, comunicando-lhe a resposta de Guiomar. Os leitores no tero dificuldade de admitir que o corao de Jorge no sentiu o golpe profundamente, mas sentiu alguma cousa. No foi nessa noite casa da tia; no foi tambm na segunda; na terceira chegou a descer as escadas; na quarta embicou para Botafogo.

    RESUMINDO

    Trs pretendentes e uma s prenda: Guiomar uma jovem de origem humilde, mas com uma ambio desmedida. Controla os impulsos de seu corao de forma absolutamente racional. Aparenta fragilidade e pureza, quando apenas interesseira e determinada. Afilhada de uma rica baronesa, desperta o interesse de trs pretendentes completamente diferentes um do outro:

    Estevo sentimental, doidivanas, ingnuo, piegas. Amaria a primeira mulher que o olhasse. No se valoriza e por isso no mereceu a preferncia de Guiomar. Embora sincero, superficial, inseguro, volvel, fragilizado por sua futilidade e isso o coloca como carta fora do baralho.

    UM DIA DE MANH acordou Estvo com a resoluo feita de dar o golpe decisivo. Os coraes frouxos tm destas energias sbitas, e prprio da pusilanimidade iludir-se a si mesma. Ele confessava que nada havia feito, e que a situao exigia alguma cousa mais.

    "Nunca as circunstncias foram mais propcias do que hoje, pensava o rapaz; Guiomar trata-me com afabilidade de bom agouro. Demais, h nela esprito elevado; h de reconhecer que um sentimento discreto e respeitoso, como este meu, vale um pouco mais do que lisonjarias de sala."

    A resoluo estava assentada; restava o meio de a tornar efetiva. Estvo hesitou largo tempo entre dizer de viva voz o que sentia ou transmiti-lo por via do papel. Qualquer dos modos tinha para ele mais perigos que vantagens. Ele receava ser frio na declarao escrita...

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    Jorge fraco de carter. Egosta e narcisista, espera que o mundo se ajuste sua volta e que todos o tenham como centro e referncia. Sua futilidade e indefinio de objetivos fazem com que a ambiciosa Guiomar o rejeite. Ele no ama Guiomar, mas casar-se com ela lhe conveniente nos aspectos econmicos (a fortuna da baronesa ficaria toda sob seu comando) e afetivos (agradaria a baronesa). No fica claro por que razo, mas conta com o apoio de Mrs. Oswald para vencer a resistncia de Guiomar em aceit-lo.

    A baronesa no perdeu tempo em circunlquios. Apenas viu o sobrinho interpelou-o diretamente.

    Disseram-me, foi Mrs. Oswald quem me disse, que tu gostas de Guiomar.

    Jorge no contava muito com semelhante interrogao; todavia, no era to ingnuo que corasse, nem to apaixonado que lhe "tremesse a: voz. Puxou gravemente os punhos da camisa, consertou a gravata, e respondeu singelamente:

    No me atrevia a falar-lhe destas cousas.

    Por que no? interrompeu a baronesa; so assuntos que se podem tratar entre mim e ti, sem desar para nenhum de ns. ento verdade o que me disse Mrs. Oswald?

    .

    Amas deveras, ou...

    Deveras. Recuaria, se visse que uma aliana entre ns ficava mal ao lustre de nossa famlia; mas, posto que ela seja...

    Guiomar minha filha, apressou-se a dizer a baronesa.

    Justamente; no pode haver melhor ttulo.

    Tem ainda outro, continuou a baronesa; uma alma anglica e pura. Henriqueta no teve melhor corao nem mais amor aos seus. Alm disso, a natureza deu-lhe um esprito superior, de maneira que a fortuna no fez mais do que emendar o equvoco do nascimento. Finalmente de uma beleza pouco comum...

    Rara, titia, pode dizer que de uma beleza rara, acudiu Jorge, pela Primeira vez lhe luziu nos olhos alguma cousa, que no era gravidade de costume.

    J vs, prosseguiu a baronesa, que ela possui todos os direitos ao amor e mo de um homem, como tu.

    A baronesa tinha um corao ingnuo e liso...

    Lus Alves frio, metdico, reservado, ambicioso. Corre por fora, mas sabe o que quer. No revela seus sentimentos a ningum. S se decide em pedir Guiomar quando tem o domnio total da situao e sabe que o sucesso de sua empreitada est assegurado. Mesmo assim, deixa a ela a deciso sobre o momento e a convenincia de pedi-la em casamento ou no. um jogador calculista que s aposta com a certeza de ganhar.

    Lus Alves compreendera toda a expresso dos olhos de Guiomar; era, porm, homem frio, resoluto. Inclinou o busto com toda a graa correta e de bom-tom, e disse-lhe na voz mais branda que lhe permitia o seu rgo forte e severo:

    Parece-lhe que fui um pouco audaz, no ? Fui apenas sincero; e ainda que a sua delicadeza me condene, estou certo de que h em seu corao misericrdia de sobra...

    Guiomar tinha readquirido toda a posse de si mesma.

    Est enganado, disse ela, no o condeno, pela simples razo de que o no entendi.

    Tanto melhor, redargiu Lus Alves sem pestanejar; o meu delito nesse caso no passou da esfera da inteno.

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    Mas... referia-se viagem?

    Referia-me; perguntava quando iam.

    Esta presena de esprito de Lus Alves ia muito com o gnio de Guiomar; era um lao de simpatia. A moa respondeu que o comendador viria busc-las da a quinze ou vinte dias.

    Trs meses apenas? perguntou o advogado.

    Trs ou quatro.

    OUTROS PERSONAGENS

    Mrs. Oswald uma espcie de governanta da casa da velha baronesa. Intrometida, ambiciona eternizar-se como agregada na famlia. Subserviente e ardilosa, faz tudo para estar bem com todos, particularmente com a baronesa. Move-a unicamente a preocupao com sua segurana no esquema familiar e na ocupao de uma posio importante e influente. Suprime facilmente suas vontades e projetos, para se ajustar s novas situaes. aliada de Jorge na empresa de conquistar o amor de Guiomar, mas quando esta d sua preferncia a Lus Alves, acomoda-se rapidamente a esta realidade.

    A madrinha baronesa uma velhota bondosa que tudo faz pela felicidade da afilhada, que considera filha adotiva. Personalidade idealizada, reunindo em si a pureza de intenes, o instinto maternal, a ingenuidade e a renncia; representa o mais forte toque genuinamente romntico de toda a narrativa.

    Quer fazer de sua vida e de seus dois amores Jorge, o sobrinho e Guiomar, a afilhada um conto de fadas com final feliz. Quando percebe que estava a intrometer-se indevidamente no destino e nos anseios da afilhada, muda seu projeto e aceita resignadamente a preferncia de Guiomar por Lus Alves.

    CONCLUINDO

    Mesmo tendo sido repudiado pelo autor que, taxativamente, afirmou melhor seria no t-lo publicado, o livro tem a marca inconfundvel do mestre. Situaes ambguas, ironia, hipocrisia, falsidades, interesses escusos, todos os ingredientes usados sobejamente para realizar um estudo da alma humana com a pena da galhofa e a tinta da melancolia num meio riso que mais parece um rctus de amargura a revelar o desencanto e o desalento ante a misria fsica e moral do ser humano irremediavelmente condenado pequenez.

    SERVIO: A Mo e a Luva faz parte do rol de obras recomendadas pelo Programa de Avaliao Seriada (PAS UnB), para leitura pelos alunos do 2 ano do Ensino Mdio, neste ano de 1.999.

    BIBLIOGRAFIA:

    ASSIS, Machado de. A Mo e a Luva Rio de Janeiro - RJ: Nova Aguillar, 1997.

    BOSI, Alfredo. Histria Concisa da Literatura Brasileira. So Paulo SP: Ed. Cultrix, 1985.

    BOSI, Alfredo e outros. Machado de Assis. So Paulo SP: Ed. tica, 1982.

    MONO, Honneur. PAS-UnB-Literatura 2 ano do 2 Grau. Braslia DF: Ed. do Autor, 1.999.

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    EXERCCIOS PROPOSTOS

    TEXTO I

    Um ms depois de chegar Estvo a So Paulo, achava-se a sua paixo definitivamente morta e enterrada, cantando ele mesmo um responso, a vozes alternadas, com duas ou trs moas da capital, todas elas, por passatempo. Claro que dous anos depois, quando tomou o grau de bacharel, nenhuma idia lhe restava do namoro da Rua dos Invlidos. Demais, a bela Guiomar desde muito tempo deixara o colgio e fora morar com a madrinha. J ele a no vira da primeira vez que veio corte. Agora voltava graduado em cincias jurdicas e sociais, como fica dito, mais desejoso de devassar o futuro que de reler o passado.

    A corte divertia-se, como sempre se divertiu, mais ou menos, e para os que transpuseram a linha dos cinqenta divertia-se mais do que hoje, eterno reparo dos que j no do vida toda a flor dos seus primeiros anos. Para os vares maduros, nunca a mocidade folga como no tempo deles, o que natural dizer, porque cada homem v as cousas com os olhos da sua idade, Os receios da juventude no so decerto igualmente nobres, nem igualmente frvolos, em todos os tempos; mas a culpa ou o merecimento no dela, a pobre juventude, sim do tempo que lhe cai em sorte.

    A corte divertia-se, apesar dos recentes estragos do clera bailava-se, cantava-se, passeava-se, ia-se ao teatro. O Cassino abria os seus sales, como os abria o Clube, como os abria o Congresso, todos trs fluminenses no nome e na alma. Eram os tempos homricos do teatro lrico, a quadra memorvel daquelas lutas e rivalidades renovadas em cada semestre, talvez por um excesso de ardor e entusiasmo, que o tempo diminuiu, ou transferiu, - Deus lhe perdoe, - a cousas de menor tomo. Quem se no lembra, - ou quem no ouviu falar das batalhas feridas naquela clssica platia do Campo da Aclamao, entre a legio casalnica e a falange chartnica, mas sobretudo entre esta e o regimento lagrsta? Eram batalhas campais, com tropas frescas, e maduras tambm, apercebidas de flores, de versos, de coroas, e at de estalinhos. Uma noite a ao travou-se entre o campo lagrsta e o campo chartonista, com tal violncia, que parecia uma pgina da Ilada. Desta vez, a Vnus da situao saiu ferida do combate; um estalo rebentara no rosto da Charton. O furor, o delrio, a confuso foram indescritveis; o aplauso e a pateada deram-se as mos, e os ps. A peleja passou aos jornais. "Vergonha eterna (dizia um) aos cavalheiros que cuspiram na face de uma dama!" "Se for mister (replicava outro) daremos os nomes dos aristarcos que no saguo do teatro juraram desfeitear Mlle. Lagrua!" "Patulia desenfreadas "Fidalguice balofa!" (...)

    01 - Aps uma leitura atenta do fragmento, analise os itens a seguir e julgue-os como certos ou errados.

    (1) Infere-se que Estevo fosse um rapaz volvel, dado a namoricos inconseqentes.

    (2) O aforismo popular "O tempo o senhor da verdade" encontra respaldo no primeiro pargrafo.

    (3) A atrao que Estevo sentira por Guiomar foi apagada com o distanciamento espacial e temporal.

    (4) No segundo pargrafo, o Autor elabora uma digresso em torno do saudosismo sempre presente em pessoas mais velhas.

    (5) Infere-se do terceiro pargrafo que as classes abastadas participassem ativamente das preocupaes governamentais com o estado sanitrio da populao em geral.

    (6) Em "eram os tempos homricos do teatro lrico..." h uma impropriedade semntica em relao caracterizao dos gneros literrios.

    (7) Em "tropas frescas e maduras tambm..." h uma referncia a verduras e legumes consumidos na poca.

    (8) Lagrustas so partidrios dos lemas da revoluo francesa.

    (9) Infere-se que algum cuspira no rosto de senhora da alta sociedade carioca da poca.

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    02 - Sobre o fragmento so feitas as seguintes afirmaes.

    I - Jovens e velhos tomavam o partido das cantoras de sua preferncia.

    II - Trs clubes rivalizavam-se na disputa por apresentar a melhor pea lrica.