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GUIA DO TÉCNICO EM SEGURANÇA DO TRABALHO Uma Proposta de Metodologia da Rotina

4808.2 Guia do Técnico de Segurança no Trabalholtr.com.br/loja/folheie/4808.pdf · E a mais famosa de suas frases foi seu epitáfio: “Os filósofos têm interpretado o mundo de

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Guia do Técnico em SeGurança do Trabalho

Uma Proposta de Metodologia da Rotina

Jairo brasilMestre em Educação pela UNISINOS – Universidade do Vale dos Sinos de São Leopoldo-RS. Licenciado e

Pós-graduado em Estudos Sociais pela UPIS – União Pioneira de Integração Social de Brasília-DF. Docente convidado no programa de Pós-graduação em Ciências do Trabalho da UNICLASS de Goiânia-GO.

Professor de Cursos Técnicos Profissionalizantes da região metropolitana de Porto Alegre. Consultor do SENAI-RS em Racionalização de Processos e Boas Práticas de Fabricação de empresas da região. Instrutor do SENAI em

cursos de PCP e Ferramentas de Qualidade In Company. Tutor do SEBRAE Nacional em cursos de Segurança Alimentar. Ex-Gerente Industrial de empresas do setor alimentício nos estados de SC, PR e GO por mais de 12 anos.

Guia do Técnico em SeGurança do Trabalho

Uma Proposta da Metodologia da Rotina

EDITORA LTDA.© Todos os direitos reservados

Rua Jaguaribe, 571CEP 01224-001São Paulo, SP – BrasilFone (11) 2167-1101www.ltr.com.br

Produção Gráfica e Editoração Eletrônica: LINOTECProjeto de Capa: RICE ARAÚJOIlustrações do texto: RICE ARAÚJOImpressão: COMETA GRÁFICA E EDITORA

Outubro, 2013

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Brasil, Jairo

Guia do técnico em segurança do trabalho : uma proposta de metodologia da rotina / Jairo Brasil. -- São Paulo : LTr, 2013.

Bibliografia

1. Ética profissional 2. Higiene do trabalho - Brasil 3. Segurança do trabalho – Brasil 4. Técnicos em segurança do trabalho – Manuais I. Título.

13-10622 CDD-362.850981

Índice para catálogo sistemático:

1. Brasil : Técnico em segurança do trabalho : Manuais 362.850981

Versão impressa - LTr 4808.2 - ISBN 978-85-361-2714-9Versão digital - LTr 7645.9 - ISBN 978-85-361-2728-6

aGradecimenToS

Chegar a esse ponto foi bastante complexo e, ao mesmo tempo instigante, pois não acreditava em ser capaz um dia desta façanha. Diz a sabedoria popular que um indivíduo só se torna completo depois de realizar três coisas: plantar uma árvore, criar um filho e escrever um livro.

Não creio que sejam tarefas difíceis de se realizar, pois a maioria de nós tem capacidade de desenvol-ver esta competência. Todavia, acredito ser difícil prever o êxito em cada uma delas. Plantar uma árvore requer um grande cuidado inicial, pois uma muda necessita de tratamento igual a uma criança nascitura. Tanto a árvore quanto a criança nas fases primevas, se não tiverem os cuidados essenciais dedicados a quem se desenvolve, podem ter comprometidas suas fases posteriores. Já plantei árvores, mas confesso que não as acompanhei em seu desenvolvimento. Aliás, nem sequer recordo o local em que elas estariam hoje. É bem provável que já tenham sido abatidas, e eu nem estava presente para chorar sua derrubada. Portanto, me considero deveras irresponsável por este desamparo. No caso de filho, graças a Deus tenho acompanhado seu desenvolvimento desde a tenra idade, talvez não como eu deveria, mas ultimamente tenho feito esforços. E quando dou graças a Deus, é porque sei o quanto é difícil proporcionar condições adequadas para o crescimento de um filho, bem como estar atento às suas atividades, seus relacionamen-tos e a influência destes no seu desenvolvimento.

Mas e o livro? Bem, a terceira ação para me tornar um indivíduo completo tem muito de doação e de expectativas. Outro dia, em minhas leituras analisava um texto de Eduardo Galeano, escritor pelo qual nutro grande admiração e exercito meu conhecimento do idioma hispânico ao ler suas obras. Ele fazia referência a Karl Marx, o escritor da famosa obra O Capital, e que descortinou uma forma de pen-samento crítico ao capitalismo, é considerado o marco do pensamento socialista-marxista. Para quem já leu ou esteve em contato com a obra, são nada mais nada menos do que quatro volumes: o processo de produção do capital (1867), o processo de circulação do capital (1885), o processo global da produção capitalista (1894) e teorias da mais-valia (1905). Em vida, Marx só conseguiu lançar o primeiro volume, sendo os demais publicados a partir do resgate de seus escritos e pela ajuda de seu companheiro Frederich Engels. Praticamente Marx levou uma vida para escrever O Capital. E nem sequer imaginava a influência que a obra teria no pensamento econômico e político mundial. Conta Eduardo Galeano, em seu livro Los hijos de los días, que no enterro de Karl Marx, no cemitério de Highgate, em Londres, compareceu uma multidão de onze pessoas, incluindo neste número o coveiro. E a mais famosa de suas frases foi seu epitáfio: “Os filósofos têm interpretado o mundo de diversas maneiras, mas o que importa é transformar o mundo.” Segundo Galeano, este profeta da transformação do mundo passou a vida fugindo da polícia e dos credores. Havia por parte do governo da Prússia, seu país, uma grande contestação às suas ideias. Ao comentar sua principal obra, Marx revelou: “Ninguém escreveu tanto sobre dinheiro tendo tão pouco. O Capital não me pagará nem os cigarros que fumei quando o escrevia.”(1)

(1) GALEANO, Eduardo. Los hijos de los días. 1ª Ed. Buenos Aires: Siglo Veintiuno Editores Argentina, 2012.

Sendo assim, da mesma forma não devo e não quero criar expectativas em relação a este livro. Mui-to menos tenho a pretensão de me comparar com o ícone da crítica capitalista. Só o reconhecimento de compor a galeria dos escreventes da área prevencionista já me basta, e quem sabe pague os momentos que dispensei para esta tarefa. E, se meus leitores chegaram até aqui, sinto-me extremamente lisonjeado, pois consegui atingir o objetivo principal, que me moveu desde o início.

Agradeço aos meus alunos e alunas, que sempre estiveram presentes.

Aos colegas docentes, pelas experiências enriquecedoras que juntos temos vivido.

Algumas pessoas são capazes de exercer grande influência em nossa vida, principalmente pelo sig-nificado que a presença delas traz para nós. Foi isso que ocorreu comigo em 2006, quando conheci o professor Attico Inácio Chassot, meu orientador no mestrado em Educação e de quem herdei este anseio da escrita. Minha gratidão a ele.

De suma importância foi a leitura crítica relaizada pelas queridas Beth Petry, minha prima do cora-ção, e Janaína Sostisso, colega dedicada na profissão docente em escolas técnicas, e de meu dileto aluno Wilson Carvalho. Grato a todos vocês.

Em especial, quero agradecer à minha querida Leodi, devota companheira nesses trinta anos e cuja cumplicidade permite tecer planos e ousar em momentos, os quais as forças se tornam minúsculas. Seu incentivo é o combustível de meus empreendimentos.

Minha gratidão àqueles parceiros que, atuando nas empresas por onde passei, fizeram meu conheci-mento se ampliar com suas dificuldades e vivências compartilhadas.

Grato a todos vocês e os votos de muito sucesso na vida pessoal e profissional.

Sumário

Apresentando o personagem: Este é o “Segurito” ............................................................................... 9

Prefácio ................................................................................................................................................ 11

Introdução ........................................................................................................................................... 13

Capítulo 1 – Os primórdios ................................................................................................................. 17

1.1 A origem de tudo .................................................................................................................. 17

1.2 Primórdios no Brasil ............................................................................................................. 18

1.3 A importância das formações técnicas no Brasil .................................................................. 22

1.4 A preocupação com a saúde do trabalhador ......................................................................... 23

Capítulo 2 – As origens da profissão ................................................................................................... 25

2.1 A legislação como ponto de partida ..................................................................................... 25

2.2 O surgimento da profissão ................................................................................................... 28

2.3 O estabelecimento de atribuições ao TST ............................................................................ 29

2.4 Evolução constante .............................................................................................................. 33

Capítulo 3 – Pisando o terreno com segurança ................................................................................... 35

3.1 Começando do começo ........................................................................................................ 35

3.2 Tamanho é documento ......................................................................................................... 36

3.3 Comportamento ................................................................................................................... 37

3.4 Apresentação pessoal ............................................................................................................ 40

Capítulo 4 – Matemática e Português: Por que e Para quê? ................................................................ 43

4.1 Que contribuição trazem esses conhecimentos? .................................................................. 43

Capítulo 5 – Navegando na rede ......................................................................................................... 47

5.1 Aplicativos e a Internet como ferramenta de pesquisa ......................................................... 47

5.2 As redes sociais ..................................................................................................................... 49

5.3 Os mecanismos de pesquisa ................................................................................................. 50

5.4 As plataformas de compartilhamento ................................................................................... 51

5.5 Páginas da internet ............................................................................................................... 57

Capítulo 6 – Planejar é preciso ........................................................................................................... 61

6.1 Por que planejar?.................................................................................................................. 61

Capítulo 7 – Participando de reuniões ................................................................................................ 65

7.1 Um estreante em reuniões .................................................................................................... 65

7.2 Tipos de reuniões ................................................................................................................. 66

7.2 Reuniões de CIPA ................................................................................................................. 69

7.3 Reuniões extraordinárias ...................................................................................................... 69

7.4 A síndrome das reuniões ...................................................................................................... 70

Capítulo 8 – Orientar e sensibilizar .................................................................................................... 71

8.1 Aprendendo a arte de ensinar ............................................................................................... 71

8.2 Levantando as necessidades ................................................................................................. 72

8.3 Local e condições para treinamento ..................................................................................... 73

8.4 Tipos de treinamento ............................................................................................................ 74

8.4.1 Treinamento de intervenção ...................................................................................... 74

8.4.2 Treinamento de divulgação ....................................................................................... 75

8.4.3 Treinamento de reciclagem ........................................................................................ 75

8.4.4 Treinamento de integração ........................................................................................ 76

8.5 A SIPAT ................................................................................................................................. 77

8.6 Palestras ................................................................................................................................ 78

8.7 DDS ...................................................................................................................................... 79

8.8 A avaliação............................................................................................................................ 79

Capítulo 9 – Multiplicando ações de segurança .................................................................................. 81

9.1 Criando uma agenda ............................................................................................................ 82

9.2 A importância da padronização ............................................................................................ 82

9.3 Política de segurança ............................................................................................................ 88

Capítulo 10 – Tratando os dados......................................................................................................... 89

10.1 Ferramentas indispensáveis.................................................................................................. 89

10.2 Fluxogramas e diagramas ..................................................................................................... 91

10.3 Cálculo de viabilidade econômica ........................................................................................ 95

Capítulo 11 – Relacionamento interpessoal ........................................................................................ 99

11.1 Aprendendo a relacionar-se .................................................................................................. 99

11.2 A rádio peão ......................................................................................................................... 100

11.3 Comportamento e relacionamento observados e analisados ................................................ 101

11.4 Santo de casa também faz milagres ...................................................................................... 104

11.5 Comportamentos estranhos ................................................................................................. 105

Conclusão ............................................................................................................................................ 107

Referências bibliográficas .................................................................................................................... 109

Guia do Técnico em Segurança do Trabalho 9

aPreSenTando o PerSonaGem:eSTe é o

“SeGuriTo”

SEGURITO é o personagem que ilustra todos os capítulos do nosso Guia do Técnico em Segurança do Trabalho. A criação do personagem é de autoria de Rice Araújo, um dos mais respeitados cartunistas bra-sileiros. Meu contato com Rice Araújo ocorreu durante um curso de Segurança Alimentar que ministrei pelo Sebrae, em que foi meu aluno lá pelos idos de 2010. No contato direto com os participantes, notei uma sensibilidade diferente naquele aluno que procurava saber todos os cuidados que se deveria ter com relação ao preparo dos alimentos. Conversando com ele, fiquei sabendo que o Rice trabalhava com char-ges e desenhos humorísticos. E ao mostrar-me toda sua qualidade e talento na criação de ilustrações, para os mais diversos veículos de comunicação e publicações país afora, desafiei-o a criar um desenho caricato para ilustrar minhas escrituras e atividades. Assim, nasceu esta integração entre professor e ilustrador, e o personagem que ilustra quase todos meus contatos com alunos, amigos e parceiros.

Quando estava finalizando a escrita deste livro, não tive dúvidas de que as ilustrações do Rice Araújo seriam uma forma de tornar mais leve a leitura deste guia para todos vocês. Então, fiz a ele mais um desafio: ser o ilustrador deste manual com a criação de um personagem que simbolizasse o Técnico em Segurança do Trabalho e todos os obstáculos e desafios enfrentados no acesso e afirmação no mercado de trabalho. E, como já imaginava, gostei muito do resultado.

Os desenhos de Rice Araújo não são fruto do acaso. Ele é um estudioso aplicado do assunto. Pra se ter uma ideia da sua dedicação e profissionalismo, pediu-me que lhe enviasse todos os capítulos para leitura, de forma a adequar cada ilustração ao conteúdo do texto. Confesso que cada vez que recebia uma das ilustrações, e nisso ele me impunha um razoável sofrimento sem saber, já me quedava curioso para adivinhar a construção da próxima, pois todas se relacionam com o todo que escrevi.

10 Guia do Técnico em Segurança do Trabalho

Tenho certeza de que esta parceria poderá estabelecer uma forma amena de construir o conhecimen-to pela leitura. Pelo menos é este o objetivo meu e do Rice neste quesito de integrar texto e ilustração. Espero que tenhamos conseguido atingi-lo aqui, e que no futuro outros conhecimentos sejam possíveis se trazer também, de uma forma mais aprazível e deliciosa, já que a maioria das leituras técnicas por vezes se mostra bastante intrincada.

Prof. Jairo Brasil

Guia do Técnico em Segurança do Trabalho 11

Prefácio

Um prelúdio, ou tentativa de fazer de utopias, realidades.

Vivo uma vez mais um gostoso desafio. Fazer a apresentação de um livro. Talvez deva creditar este fazer bastante frequente em minhas lides acadêmicas à generosidade de meus colegas, que me elegem por me reconhecerem marcado pela paixão por esse binômio maravilhoso: escrita leitura.

Ao questionar o convite, dizia que na área de Segurança do Trabalho sou um alienígena, mas conhe-ço o autor deste livro que ora prelibas, desde 2006. Não apenas colaborei para Jairo Brasil ascender nos degraus acadêmicos, mas nesta ação fiz um amigo – não no modelo volátil e efêmero dos ‘facefriends’, este atual modismo empanturrante – leal e sábio. Mesmo cessada a relação orientador-orientando, a nossa amizade se adensa e me enriquece. Assim, meu aval a esta obra se faz por reconhecer no autor deste livro um professor competente com expertise no tema desta obra.

Vou ser repetitivo ao apresentar este Guia do Técnico em Segurança do Trabalho. Escreve-se por último aquilo que será lido primeiro, e mais, há a imensa responsabilidade de seduzir o leitor, através de um pre-fácio. Aqui, mais do que seduzir um futuro leitor, quero trazer uma dimensão muito original deste livro.

Escrevo esta apresentação quando ainda estou envolvido emocionalmente com o filme Os miserá-veis – magistral direção de Tom Hooper em adaptação da obra homônima de Victor Hugo (1802-1885). A história se passa na França, no começo do século 19.

Qual conexão faço da dramática narrativa de um dos mais conceituados escritores do mundo oci-dental, de 200 anos passados, com este livro? A resposta é uma pecha para a humanidade judaico-cristã de então: ser trabalhador era sinônimo de ser escravo, ou pior, ser miserável.

Este livro – que também aborda com muita propriedade a história (da segurança) do trabalho – tem como objetivo maior garantir que mulheres e homens que vendem a sua força de trabalho ao capital, que não raro explora ao trabalhador, mereçam por primeiro fazê-lo com dignidade. E esta se faz com cada vez melhores condições de um trabalho seguro.

Mas o livro vai muito além de saborosas reminiscências à história da segurança. Ao leitor, que agora busca neste prefácio razões para decidir se encantar com a leitura, sugiro dê uma espiadela no sumário. Há os melhores acepipes a degustar. Vale a pena ver quanto é importante fazer mais segura a segurança do trabalho.

Vemos, no percurso de cada capítulo, que o Jairo traz com este livro as suas / as minhas / as nossas utopias: da importância de que cada mulher e cada homem ao assumir a situação de trabalhador não apenas viva a dignidade profissional de merecer segurança, mas possa realizar seu fazer transformações de fábricas em lugares de crescimento mútuo e realização pessoal. Sim! Sonhos podem transmutar-se em realidades.

O que está apresentado neste Guia procura colaborar para que cada uma e cada um possa munir-se de ferramentas – aqui usada em duas acepções: uma real (artefatos, produtos da Ciência e da Tecnologia),

12 Guia do Técnico em Segurança do Trabalho

e outra metafórica (mentefatos culturais entre os quais a segurança se faz ícone), para enfrentarmos os obstáculos do cotidiano, na busca de uma fábrica onde os trabalhadores sejam, acima de tudo, felizes por laborarem com segurança na transformação de suas energias em bens materiais.

Acredito que trouxe àqueles e àquelas que aderem ao meu entusiasmo na elaboração dessas tessi-turas acerca de Guia do Técnico em Segurança do Trabalho hão de encontrar motivos para se espraiarem nas páginas que estão adiante. Assim, meu voto é um só: à leitura. Sugiro saborear esse gostoso binômio escrita leitura. Este livro só terá sua epifania pelas ações de seus leitores. Logo, vale fruí-lo.

Attico Chassot

Licenciado em Química e doutor em Educação mestrechassot.blogspot.com

Morada dos Afagos, na chegada do outono de 2013.

Guia do Técnico em Segurança do Trabalho 13

inTrodução

“Quando se aprende a falar, se começa a estudar, Isso não acaba nunca. E só vai saber ler, só vai saber escrever Quem aprender o bê-a-bá. E além do abecedário, um grande dicionário

GUIA DO TÉCNICO DE SEGURANÇA DO TRABALHO: Uma proposta de metodologia da rotina

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INTRODUÇÃO

Quando se aprende a falar, se começa a estudar, Isso não acaba nunca. E só vai saber ler, só vai saber escrever Quem aprender o bê-a-bá. E além do abecedário, um grande dicionário Vamos todos precisar. Compositor Toquinho – Bê-a-Bá

Estar do lado de cá deste teclado, na tentativa de criar alguma coisa que vá ao

encontro das expectativas do leitor, é um grande desafio. Ainda mais quando esse leitor

imaginário ainda se debate pelas oportunidades que o mercado possa lhe oferecer, ou

que recentemente ofereceu, como uma primeira chance de ouro, e para a qual ele tanto

necessita provar que merece. Como escritor se imagina de tudo num momento destes,

desde o sucesso completo da obra, na visão mais otimista possível, com uma procura

acentuada dos leitores, até uma acachapante derrota, quando a obra precocemente se

encaminha aos sebos1. Por isso, muitas vezes durante a confecção destes parágrafos, fui

acometido de desespero e de euforia, ora por ter a impressão de escrever aquilo que

poderia contribuir com meus alunos e alunas, ora por crer que havia ultrapassado os

limites que saturam a paciência do leitor. Mesmo assim, a consciência me deixa

tranquilo, porque durante todo este tempo estive imbuído do espírito cooperativo, de

expor vários momentos de minha experiência que pudessem contribuir positivamente na

carreira de cada um e cada uma. Sem contar as oportunidades de que fui vítima de um

mal que acomete muitos escritores, a síndrome do papel em branco, em que não se

consegue dar vazão às ideias ou expressá-las. E quando isso acontece não adianta

insistir, por mais bem intencionado que se esteja.

Quando iniciei a carreira docente nos cursos profissionalizantes, lá pelos idos de

2002, ainda em Brasília, numa unidade de instituição pertencente ao sistema “S”2 de

Taguatinga, a convite do meu amigo e colega de trabalho, engenheiro Saraiva, algumas

coisas chamaram minha atenção. Como eu vinha do chão de fábrica, convivendo

rotineiramente com a área operacional, minha visão estava prenhe desta realidade. E 1 Livrarias especializadas em livros usados. 2 Sistema que congrega instituições conhecidas no país, responsáveis pela formação de técnicos em vários segmentos e áreas do conhecimento: SENAI, SENAC, SENAT, SENAR, SEBRAE.

Vamos todos precisar.”

Compositor Toquinho – Bê-a-Bá

Estar do lado de cá deste teclado, na tentativa de criar alguma coisa que vá ao encontro das expec-tativas do leitor, é um grande desafio. Ainda mais quando esse leitor imaginário ainda se debate pelas oportunidades que o mercado possa lhe oferecer, ou que recentemente ofereceu, como uma primeira chance de ouro, e para a qual ele tanto necessita provar que merece. Como escritor, imagina-se de tudo em um momento destes, desde o sucesso completo da obra, na visão mais otimista possível, com uma procura acentuada dos leitores, até uma acachapante derrota, quando a obra precocemente se encaminha aos sebos(1). Por isso, muitas vezes durante a confecção destes parágrafos, fui acometido de desespero e de euforia, ora por ter a impressão de escrever aquilo que poderia contribuir para meus alunos e alunas, ora por crer que havia ultrapassado os limites que saturam a paciência do leitor. Mesmo assim, a consciência me deixa tranquilo, porque durante todo este tempo estive imbuído do espírito cooperativo, de expor, em vários momentos, minha experiência e que ela pudesse contribuir positivamente na carreira de cada um e cada uma. Sem contar os momentos de que fui vítima de um mal que acomete muitos escritores, a síndrome do papel em branco, em que não se consegue dar vazão às ideias ou expressá-las. E quando isso acontece, não adianta insistir, por mais bem intencionado que se esteja.

(1) Livrarias especializadas em livros usados.

14 Guia do Técnico em Segurança do Trabalho

Quando iniciei a carreira docente nos cursos profissionalizantes, no ano de 2002, em Brasília, em uma unidade de instituição pertencente ao sistema “S”(2) de Taguatinga, a convite do meu amigo e colega de trabalho, engenheiro Saraiva, algumas coisas chamaram minha atenção. Como eu vinha do chão de fábrica, convivendo rotineiramente com a área operacional, minha visão estava prenhe desta realidade. E desde então, não conseguia apartar os conteúdos de sala de aula daquela realidade. Tudo que eu ponde-rava aos alunos, mentalizava acontecendo nos processos de produção. Talvez, esta tenha sido uma visão que me facilitou o ingresso nos cursos técnicos de segurança do trabalho; tecer a teoria levando em conta a visão prática. Dessa forma, durante dois anos estive ali envolvido, sempre aliando teoria e prática.

Ao final de 2004, retornei ao Sul, onde busquei dar continuidade à tarefa docente iniciada no Dis-trito Federal. Tive a oportunidade de recomeçar em uma escola de Esteio, região metropolitana do Rio Grande do Sul, ministrando conteúdos de Segurança I, disciplina que trabalha os principais fundamentos: conceitos iniciais, agentes ambientais e as normas introdutórias. Depois, comecei a atuar em outras es-colas da região metropolitana, com destaque para instituições da capital. Incluíram-se outras disciplinas como Tecnologia Industrial e, até mesmo, Desenho Técnico, conteúdo no qual sempre tive facilidade de atuação.

Uma das estratégias que me inspiraram e me inspiram nesse fazer docente é sempre estar preocupado com as dificuldades que alunos e alunas enfrentarão no mercado de trabalho. Se falo em agentes ambien-tais, de imediato imagino o pessoal envolvido com os ruídos, com vapores, com radiações, etc. O ruído é a marca potencial das fábricas, pois não se pode conceber a ideia de um processo fabril sem a presença de máquinas e equipamentos. São eles que dão o tom e o som da fabricação, muitas vezes excedendo os limi-tes de tolerância preconizados pela NR 15. Quando falo em vapores, logo imagino aquele gás com o qual inúmeras vezes tive contato, o gás amônia da refrigeração industrial. Extremamente tóxico, esse composto químico possui a propriedade de ocupar o lugar do oxigênio, criando uma grande dificuldade de perma-nência humana em suas proximidades. Lembro inclusive de alguns incidentes pelos quais passei durante minha tarefa como gestor industrial. Em um deles tivemos que evacuar às pressas uma sala de produção inteira, com mais de quarenta pessoas, quando o mecânico que realizava a manutenção na fábrica de gelo acabou perfurando acidentalmente a tubulação que conduzia o gás. As pessoas corriam desesperadas para a porta de saída, que não possuía as dimensões necessárias para suportar um contingente tão grande. Foi um grande pavor, funcionários pisoteados e outros com leves escoriações. Depois do susto, instalamos uma porta de emergência na sala, com abertura para fora e dimensões adequadas. Porta arrombada, tranca de ferro. Felizmente, o acidente não gerou maiores consequências. Essas experiências são daquelas que também se traz para a sala de aula. Ao falar de radiações, consigo resgatar as operações com solda elétrica e oxiacetilênica, durante as quais estive presente em momentos de manutenção de instalações industriais. Ali observei muitos soldadores despreocupados com sua saúde, negligenciando o uso das medidas de proteção individual.

A escrita deste livro surgiu da grande curiosidade e expectativa de alunos e alunas em saber como enfrentar e se sair bem nos primeiros tempos na função de profissional da segurança do trabalho. Quando questionado sobre como será lá dentro da empresa, eu falo de algumas situações. Principalmente, pela experiência vivenciada, e de observar na minha trajetória a atuação dos profissionais de segurança do trabalho. Dentro destas argumentações surgia sempre a promessa de um dia escrever algo que pudesse contribuir com a carreira destes egressos de cursos técnicos. Portanto, a partir de agora, essa promessa se consolida e deixa de ser um sonho para se transformar em uma realidade.

Espero que gostem da leitura, e que as experiências e dicas aqui trazidas possam contribuir em suas vidas profissionais. Não esquecendo que esse conteúdo deve ser considerado tão somente uma forma de organizar a rotina do técnico de segurança do trabalho. Não se esgotam em si estas propostas, pois a realidade exige que sempre estejamos em busca do conhecimento e constantemente nos atualizemos. Principalmente para uma profissão que requer o contato com aspectos variados, não somente relativo às demandas da ciência prevencionista, bem como das questões legais trabalhistas e previdenciárias e das nuances da vida profissional, tão intrincada neste limiar de novo século. Aproveito de antemão para

(2) Sistema que congrega instituições conhecidas no país, responsáveis pela formação de técnicos em vários segmentos e áreas do conhecimento: SENAI, SENAC, SENAT, SENAR, SEBRAE.

Guia do Técnico em Segurança do Trabalho 15

desculpar-me por alguns lapsos que possam ocorrer no uso da língua pátria, em que palavras ou expres-sões mal colocadas podem dar impressão diferente daquilo que realmente quis relatar. E dentre essas expressões adotei o uso de TST para referenciar o Técnico em Segurança do Trabalho. Isso pode ser ob-servado como uma atitude extremamente preconceituosa, por não levar em conta a grande participação do gênero feminino na profissão. Mas se esta for a conclusão de alguns leitores, posso afirmar que ela é precipitada e não se coaduna com minha intenção. Reconheço a nova realidade do mercado de trabalho e entendo a importância da inserção da mulher nesta nova realidade, e que atualmente chega a quase 50% do total. Que o digam as organizações, que cada vez mais veem na mulher um profissional de grande dedicação, empenho e responsabilidade. Portanto, o uso da expressão TST é tão somente um facilitador na construção do texto.

Como prática docente, não pude resistir de aproveitar cada abertura de capítulo para refrescar a memória dos leitores para as questões da legislação prevencionista. Por isso, perceberão cada um e cada uma que na introdução destes capítulos faço referência a um pequeno extrato de norma regulamenta-dora, no que costumo denominar “pílulas de segurança”, um projeto que ainda pretendo consolidar futuramente, utilizando ferramentas da tecnologia de informação por meio de vídeos informativos dire-cionados aos estudantes da profissão.

Em síntese, espero contribuir com todos vocês, alunos e alunas do curso técnico de segurança do trabalho, que a partir de agora enfrentam o desafio de construir uma nova profissão em um mercado extremamente competitivo. Também é intenção minha trazer alguns conteúdos que possam ajudar quem já está no mercado há mais tempo, e por outros motivos deixou de buscar alternativas de atua-lização. Nesse caso, saliento que qualquer profissão necessita de uma visão multifacetada, devendo o profissional sempre estar atento à acomodação e à letargia profissional.

Guia do Técnico em Segurança do Trabalho 17

Capítulo 1

Os primórdios

“Cabe ao Empregador informar aos trabalhadores os riscos profissionais que possam originar-se nos locais de trabalho.”

Norma Regulamentadora 01 – Disposições Gerais (1.7 Item a)

1.1 A orIgem De tuDo

O mundo moderno é feito de desafios e de escolhas. Todos somos provocados, desde a passagem da adolescência para a idade adulta, a buscar uma forma de realização na vida, neste fazer que envolve o ser humano há tantos séculos, o “trabalho”. A Revolução Industrial pode ser considerada um “divisor de águas” nesta realidade do trabalho. Foi com ela que o trabalho se especializou, em que cada operário ficou responsável por sua tarefa. Também, foi a Revolução Industrial que fez surgir aquilo que conhece-mos como “as fábricas”, com uma organização costumeira do arranjo físico, da sequência operacional e da linha de produção. Está claro que, até atingir o grau de organização atual, passaram-se muitas décadas. Nada se organizou tão repentinamente da noite para o dia.

Em um primeiro momento, muita coisa estava desorganizada. Os proprietários desses negócios contratam pessoas para realizarem o trabalho, sem que se tenham estabelecidas as regras de horário, produção, ganhos e qualidade. Que dirá a questão da saúde e da segurança do trabalhador. Os primeiros conglomerados produtivos são pequenas construções, nas quais se amontoam materiais, ferramentas, máquinas, insumos e pessoas. Ali tudo é improviso. E a insalubridade, que nem sequer era conhecida, ou ainda, estudada por algum especialista, predominava em todos os cantos, resultante das atividades e dos resíduos gerados pela manipulação de variados objetos: madeira serrada e aplainada, metais aquecidos e forjados, fios de algodão torcidos e tramados, etc.

Oriundos do artesanato, que na sua essência tinha o mestre artesão como detentor do processo e seus segredos, da matéria-prima mais conveniente e das especificidades das tarefas, aos poucos os produ-

18 Guia do Técnico em Segurança do Trabalho

tos começam a ser elaborados em escala industrial. Se é que se poderia chamar assim em seus primeiros momentos. Ou seja, há formação de estoques para posterior comercialização e atendimento a clientes, descobertos em terras distantes pelo Mercantilismo. O artesão perde sua ascendência em relação ao pro-cesso, dando espaço ao predomínio do mercador, que agora é seu superior hierárquico.

A melhoria dos processos fabris vai ocorrer, posteriormente, com a Teoria da Administração Científi-ca, trazida pelos estudos de Frederick Taylor. Nascido na Filadélfia, nos Estados Unidos, em 1856, Taylor formou-se em engenharia aos 21 anos e foi trabalhar posteriormente em uma siderúrgica, local em que postulou sua teoria. É dele a ideia de estudar a maneira correta de execução das tarefas e a análise crítica das operações. Também é de Taylor a substituição de métodos empíricos utilizados na produção e da va-lorização do treinamento, acompanhados de um espírito de equipe e da departamentalização do chão de fábrica. Embora outras inúmeras teorias tenham complementado os estudos de Taylor, suas ideias ainda fazem parte da realidade das fábricas no mundo.

Um outro cientista, Henri Fayol, de origem francesa, também, vai contribuir de forma significativa para o futuro das empresas, ao trazer Teoria Clássica da Administração. Henri Fayol fundou o Centro de Estudos Administrativos na França, onde se reuniam, periodicamente, pessoas preocupadas com as questões administrativas em vários ramos de negócios: comércio, indústria e administração pública. Em 1888, assumiu a direção geral de uma grande mineradora francesa em processo de falência e, utilizando sua teoria, conseguiu reverter a saúde econômica e financeira da empresa. Alguns princípios destacados por Fayol em sua obra são responsáveis pelas questões de autoridade e responsabilidade, subordinação, disciplina, centralização, remuneração, hierarquia, estabilidade entre outras. Fayol também será respon-sável pela criação dos cinco elementos das funções administrativas: o Planejamento, a Organização, o Comando, a Organização e o Controle. Surge o organograma que até hoje sintetiza a estrutura hierárquica de uma empresa. O organograma é aquele desenho que representa os níveis da hierarquia da organização, em que as posições superiores se ramificam demonstrando a ordem de poder. Isso será motivo de ilus-tração e destaque no capítulo 10 deste livro, que apresenta o organograma do SESMT de uma empresa.

Dentro dessa construção histórica do trabalho, pós-Revolução Industrial, aos poucos vai surgindo a necessidade premente de disseminar o conhecimento técnico destes processos e formar mão de obra especializada, tanto na parte operacional quanto na administrativa. É nessa perspectiva que surgem as formações técnicas. São elas que fazem parte de uma estrutura periférica necessária para dar suporte às organizações.

1.2 PrImórDIoS no BrASIL

A constituição da nossa indústria, assim como das profissões que com ela se desenvolveram ao longo do tempo, têm contorno histórico bem recente. Nossa colonização lusitana trouxe vários empecilhos para a construção do parque industrial brasileiro. No início, houve uma repressão muito acentuada por parte da metrópole para que algo aqui se desenvolvesse em termos de iniciativas empresariais. É sabido que nossa colonização se deu de modo bem antagônico àquela ocorrida na porção norte do continente ameri-cano, na criação dos Estados Unidos da América. Enquanto lá, nas treze colônias, prosperaram por meio de um modelo de colonização de fixação, com inúmeras famílias expulsas das terras inglesas, modelo que teve em seu cerne o luteranismo e o protestantismo, além da teoria weberiana do espírito capitalista, nas terras sul-americanas, os portugueses tinham como único objetivo acumular a maior quantidade possível de riquezas para retornar imediatamente à terra natal. Ou seja, uma colonização de exploração, em que o Estado era visto como um grande fornecedor de privilégios a todos aqueles que se aproximassem dele ou que dele se tornassem partidários. Não é de estranhar a quantidade de títulos de nobreza distribuídos no Brasil, principalmente quando se analisa a quantidade de ruas, avenidas, praças e outros monumentos que homenageiam duques, condes, viscondes, marqueses e outras nobrezas. Isso nos coloca a refletir, por que durante tanto tempo fomos impingidos como um povo de grande indolência. Talvez pela herança deixada por nossos antepassados.

Algumas pequenas iniciativas empresariais irão tomar vulto somente depois da chegada da famí-lia real portuguesa, em 1808, principalmente com o advento da abertura dos portos às nações amigas. Eram muito tímidas, se sabe, mas já demonstrando possibilidades de libertação das amarras portuguesas.

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A partir do Grito de Independência, em 1822, houve um pouco mais de afrouxamento e incentivo a essas iniciativas, embora a Inglaterra desfrutasse de um imenso predomínio na região em termos de produtos acabados. É essa potência mundial que também irá contribuir para a deflagração, em 1864, do maior con-flito armado já ocorrido na América do Sul, a Guerra do Paraguai, ou Guerra da Tríplice Aliança. A grande preocupação da Inglaterra naquele momento era o notório desenvolvimento do parque industrial para-guaio, país comandado por Solano Lopes e já com alguma predominância na fabricação e comercialização de ferramentas agrícolas e outros metais. Brasil, Argentina e Uruguai tiveram incentivos e financiamento inglês, objetivando eliminar possível concorrência e depor o Solano Lopes, em 1870, personagem que não demonstrou nenhuma preocupação com a população de seu país, massacrada até o último reduto de crianças e mulheres. Essa é uma das razões de extrema pobreza e miséria econômica que assolou a nação, deixando resquício até hoje.

Posteriormente, na segunda metade do século 17, ampliaram-se as possibilidades de iniciativas em-presariais brasileiras, com a chegada cada vez mais frequente de imigrantes da Europa que estava em crise. Antes mesmo da Proclamação da República, em 1889, alemães e italianos já demarcavam seus lotes e picadas no Sul e Sudeste, trazendo, além de famílias para povoar a terra nua, tecnologia e conhecimento no fabrico de móveis, calçados, roupas e alimentos. Também, não deve ser esquecida a grande habilidade com o cultivo da terra. Foi desta forma que surgiram iniciativas que se tornariam depois polos industriais de destaque, nos segmentos calçadista, moveleiro, têxtil e metalúrgico.

A Primeira Guerra Mundial, em 1914, foi também um momento de crescimento populacional tímido e de incentivo ao desenvolvimento das terras brasileiras, já que o conflito demandava bens que podiam ser extraídos do solo brasileiro para abastecer as tropas em combate, e a fuga do palco da escaramuça era evidente para os habitantes europeus. Nesse momento, o governo brasileiro também se debatia em con-flitos messiânicos internos, como a Guerra do Contestado, no Sul e a Revolta de Canudos, no Nordeste, além de uma série de greves nos serviços públicos.

O advento de um novo conflito mundial, em 1945, foi marcante no estabelecimento do parque indus-trial brasileiro. Inicialmente se posicionando de forma neutra em relação ao conflito, Getúlio Vargas agiu de forma sagaz e estratégica. Só no último momento se declarou favorável à posição dos Estados Unidos, Inglaterra e França. Disponibilizou tropas militares para auxiliar os Aliados, enviando um contingente a Monte Castelo, na Itália, sob o comando do marechal Mascarenhas de Moraes. Mas essa ajuda tinha uma intenção e um preço. Foi a moeda que possibilitou a implantação de nossa primeira indústria de base, em 1946, financiada junto aos Estados Unidos, a Companhia Siderúrgica Nacional. Em um primeiro mo-mento, a CSN tinha como finalidade principal abastecer a indústria de guerra, fornecendo o metal para o fabrico das armas e veículos usados nos campos de batalha. Foi, digamos assim, o pontapé inicial para ala-vancar as ações em prol da nossa indústria, e que seriam incrementadas na sequência por outros governos.

A produção do aço, matéria-prima essencial para a fabricação de metais laminados, possibilitou a aquisição de equipamentos de corte e dobra que lançaram as bases da indústria automobilística nacional. Com o governo Dutra, na sequência, o empresariado nacional obteve algumas facilidades para importar equipamentos usados, principalmente algumas sucatas do parque industrial inglês. Foi esse o início de nosso parque industrial.

Outro destaque do período getulista foi a instituição de nossa indústria petrolífera, que teve um iní-cio tímido e tumultuado nas decisões políticas que a envolveram, mas que, ao longo das décadas que se seguiram, demonstrou o quanto o governo brasileiro agira corretamente em sua defesa. É da era getulista também o incremento das primeiras ações para formação dos profissionais técnicos do país, com a criação de serviços de aprendizagem industrial e serviços sociais da indústria, ligados diretamente às confedera-ções. O sistema “S”, como é conhecido, é composto de instituições ligadas às federações da indústria e do comércio em todo o país: o SENAI(1) na aprendizagem industrial e o SENAC na aprendizagem comercial. Além disso, foram criadas instituições como o SESI e o SESC, ambos direcionados ao lazer e atendimento social de seus associados. Essa fórmula deu tão certo que evoluiu para outros segmentos da atividade

(1) A primeira unidade do SENAI construída no Brasil é o SENAI Visconde de Mauá, localizado na Av. Sertório, próximo ao centro de Porto Alegre.

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econômica, e hoje possui ramificações também na agricultura e no transporte, formando profissionais especializados em todos os estados da federação e atendendo grande número de trabalhadores e empresas.

Saindo do cenário político de forma violenta por via suicida, em 1954, Getúlio Vargas deu vez ao governo empreendedor do mineiro Juscelino Kubitscheck, eleito em 1956, e cujo mote de campanha era “Cinquenta anos em cinco”. Em seu Plano de Metas estavam algumas ações deveras ousadas, como a construção de Brasília, a nova capital, uma obra cujo maior objetivo era deslocar o eixo do desenvol-vimento econômico brasileiro, afastando-o da costa litorânea, onde permanecia desde a chegada dos portugueses. Mas essa não foi sua principal obra. JK foi um dos maiores responsáveis pela evolução do parque industrial brasileiro, isentando de tarifas as importações de máquinas e equipamentos, liberando a entrada de capitais externos para investimentos e instalando nossa primeira indústria automobilística. Também investiu na indústria siderúrgica e aumentou a produção da Petrobrás.

O governo militar do período 1964-1985 também contribuiu de alguma forma para a consolidação do parque industrial brasileiro, mesmo que se contestem a maneira como isso se deu e o abuso dos di-reitos humanos decorrentes do período de exceção. Aliás, inúmeros historiadores defendem a teoria de que os militares buscavam o desenvolvimento para amenizar e justificar a existência do regime no país, evitando assim reações internacionais. A implementação de uma matriz energética que sustentasse o cres-cimento industrial era imprescindível. E essa realidade foi possível com a instalação da Usina Hidrelétrica de Itaipu, no segundo semestre de 1974, considerada ainda hoje a maior do mundo em geração de energia elétrica proveniente da energia hidráulica. Entre 1975 e 1978, foram construídas nas duas margens do rio Iguaçu mais de 9.000 moradias e um hospital para atender aos trabalhadores e familiares. A inauguração da obra e o seu funcionamento efetivo só vão ocorrer em novembro de 1982, durante o governo Figuei-redo. Para se ter ideia da capacidade deste monumento da engenharia energética, somente em maio de 2007 foram instaladas as duas últimas unidades geradoras das 20 previstas no início da obra.

Como suporte a este crescimento industrial, e para lidar com novas tecnologias, havia necessidade de formar mão de obra qualificada. Assim, surgem as primeiras profissões técnicas periféricas administra-tivas, imperiosas para atender às demandas deste parque industrial eminente, com conhecimento teórico e prático que pudesse sustentar todas as operações do processo industrial brasileiro.

E são essas profissões técnicas que irão se destacar no segundo escalão das atividades fabris. Qual-quer empresa vai demandar profissionais com conhecimento suficiente para realizar a manutenção de máquinas e equipamentos, atuar na construção de projetos elétricos e de edificações, cuidar da saúde e segurança dos trabalhadores, entre outros. Nesse leque de profissões, os cursos técnicos assumem desde a metade do século XX, no Brasil, uma importância capital, proporcionando ainda destaque maior às instituições do sistema “S”, relatadas anteriormente.

Mas esse sistema de formação não se mostrará suficiente para atender à demanda que o país busca qualificar. Escolas públicas destinadas ao desenvolvimento de uma classe técnica vão surgir por todo o país(2), e posteriormente a iniciativa privada também se fará presente na formação desses profissionais. Outras escolas na área rural também foram importantes para a criação de profissionais com conhecimento em tecnologia agrícola, as famosas Escolas Técnicas Agrícolas(3).

Assim, as profissões técnicas vão assumindo um grau de importância no mercado de trabalho, na me-dida em que atendem à demanda das empresas nos seus setores operacionais. Surgem os técnicos adminis-trativos, técnicos contábeis, técnicos mecânicos, técnicos elétricos e eletrotécnicos, técnicos em edificações, técnicos de radiologia, técnicos em nutrição, técnicos em segurança do trabalho e, mais recentemente, os técnicos em meio ambiente. São todas profissões capazes de proporcionar uma boa rentabilidade financeira, além de servir como pilar de uma carreira profissional de nível superior, caso se queira ir adiante.

A década de 1980 colocou o desenvolvimento brasileiro diante de uma crise de grandes proporções. Foi o que se chamou de “A Década Perdida”. A grande recessão vivida pela América Latina como um todo impôs ao país um retrocesso em relação ao que vinha acumulando anteriormente. Inflação descontrolada,

(2) Uma destas escolas, que até hoje faz parte das instituições públicas famosas por formar profissionais desde aquele período, é a Escola Técnica Parobé, de Porto Alegre.

(3) No Rio Grande do Sul, uma das primeiras escolas de formação em técnicas agropecuárias é a Escola Técnica de Viamão.

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desemprego em ascensão e estagnação da economia foram a marca deste período, em que o Brasil tinha na presidência o senador José Sarney. A troca de moedas também foi a marca desse período. Vivemos às voltas com o cruzeiro, o cruzado e o cruzado novo. Em termos de crescimento econômico e de avanços no parque industrial brasileiro, fomos acometidos de grande frustração. Talvez, o maior mérito desse gover-no tenha sido a condução do processo democrático, quando no início dos anos 1990, tivemos o primeiro presidente brasileiro eleito pelo voto direto na nova república. Nada mais do que isso. Que me perdoem os historiadores de fazer dele “tábula rasa”.

Apesar de se tornar conhecido pelo processo de “impeachment”, ou impugnação de mandato, que sofreu em 1992, o governo de Fernando Collor de Mello teve um significado expressivo para a economia e para o parque industrial brasileiro. Seu início no comando do país assustou a todos, principalmente pelo o confisco dos valores depositados pela população na tradicional caderneta de poupança. Mas o que impactou de forma significativa a indústria naquele período foi a abertura do mercado nacional às importações e o início do programa de desestatização. Acossados pela concorrência externa, a maioria dos empresários brasileiros tiveram de se adequar à nova realidade. Isso fez com que nossas indústrias buscassem tecnologia e conhecimento para sobreviverem. As montadoras de veículos, acostumadas às reservas de mercado, se viram diante de um grande desafio: suportar a concorrência de marcas estaduni-denses, europeias e asiáticas. E esse foi somente um exemplo do que ocorreria também com a indústria de eletrodomésticos e equipamentos de informática.

Destituído do poder, o governo Collor teve no vice a sua sequência, com o mineiro Itamar Franco, que assumiu, em dezembro de 1992. A curta temporada de Itamar na presidência incluiu um grande méri-to: domar a inflação, que chegou a atingir o índice de 2.700% ao ano, em 1993. Seu ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, foi o condutor do Plano Real, responsável pelo equilíbrio financeiro e pela estabilidade econômica dos anos seguintes, com adaptações da moeda e o uso de similaridades com o dólar. Uma aposta que rendeu bons resultados e estabilizou a economia. É previsível imaginar como foi a evolução da indústria brasileira a partir deste cenário.

O governo seguinte, conhecido como governo FHC, agora com a inflação suficientemente domina-da, iniciou um período de estabilidade econômica e financeira. Uma das marcas desse governo foi o esta-belecimento de programas sociais, tal como o Bolsa Escola. Também ficou conhecido de forma negativa pela Crise do Apagão, que impactou a indústria nacional pela incerteza da infraestrutura necessária como matriz energética. Além da escassez de chuvas, a crise se acentuou pela falta de investimentos no setor de geração de energia. Os consumidores tinham cotas estabelecidas para consumir energia elétrica, e acima disso eram penalizados com valores crescentes de multa. Vivemos uma verdadeira economia de guerra, em que muitos brasileiros aprenderam forçosamente a economizar energia elétrica.

O sucesso do Plano Real possibilitou a reeleição de FHC para um segundo mandato, completando oito anos de governo, de 1995 a 2002. Uma outra marca do governo foram as privatizações, sendo essas medidas comuns aos governos adeptos do neoliberalismo. Mas em nenhum momento anterior da história brasileira houve tamanho descarte dos patrimônios estatais, como a telefonia, a eletricidade e as reservas minerais. As denúncias vieram à tona recentemente em obra do jornalista Amaury Ribeiro Junior(4). Na obra, o autor relata as ações de membros do governo tucano no uso da máquina pública para tirar vanta-gens das licitações e realizar negociatas com desvio de dinheiro público para contas no exterior. Segundo ele, estas operações envolveram a filha de José Serra, Verônica Serra, seu marido Alexandre Burgeois, o ex-diretor da área internacional do Banco do Brasil, Ricardo Sérgio de Oliveira, e a filha do ex-banqueiro Daniel Dantas, acusado de crimes de corrupção, Verônica Dantas.

O governo FHC foi o primeiro a ter o mandato cumprido integralmente desde a era JK, e o segundo a governar o país por mais tempo, além de Getúlio Vargas.

Em janeiro de 2003, pela primeira vez um metalúrgico assume a presidência da República. Líder sindicalista fundador do Partido dos Trabalhadores, Luiz Inácio Lula da Silva foi responsável pela organi-zação e ações do sindicato dos metalúrgicos do ABC paulista, berço das montadoras de automóveis, um dos maiores símbolos do parque industrial brasileiro.

(4) RIBEIRO Junior, Amaury. A privataria tucana. São Paulo: Geração Editorial, 2011. (Coleção história agora ; v. 5)