6533554 Paul Gibier O Espiritismo Faquirismo Ocidental

  • Upload
    mpeceq

  • View
    41

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

  • www.autoresespiritasclassicos.com

    Paul Gibier

    O Espiritismo(Faquirismo Ocidental)

  • Contedo resumido

    O autor, conceituado cientista francs, que foi diretor do Instituto Pasteur de Nova Iorque e membro da Academia de Cincias dessa cidade, faz um estudo histrico, crtico e experimental da fenomenologia esprita, apoiado em vasta e autorizada documentao, inclusive em suas prprias experincias.

    Entre outros interessantes assuntos, discorre a obra sobre as crenas espiritualistas da antiguidade, em especial o Bramanismo, cujos adeptos j compreendiam, h muitos sculos, diversos conceitos hoje formulados pela Doutrina Esprita. Gibier dedica especial ateno aos maravilhosos fenmenos medinicos dominados pelos faquires hindus.

    O autor faz, ainda, uma compacta dissertao sobre as origens do Espiritismo, as fraudes em matria de Espiritismo, as investigaes de Sir William Crookes, sobre os fenmenos de percusso, materializaes, movimento de corpos com e sem contato do mdium, etc.

    Ao trmino de suas concluses, Gibier afirma: Mos obra! porque j no permitido tratar com pilhrias e zombarias fceis um assunto to grave. (...) Quando um fato verdadeiro, a Humanidade inteira no o privaria de ser.

  • Sumrio

    Prefcio....................................................................................5

    Introduo................................................................................7

    Primeira Parte.......................................................................23Captulo I

    Rpido olhar sobre a fisiologia do Esprito..............23Captulo II

    A doutrina esprita. Os mdiuns............................29Captulo III

    Origens do Espiritismo.............................................31Captulo IV

    O Espiritismo entre os ndios daAmrica. A Cabala hebraica..................................39

    Captulo V

    Uma palavra sobre a ndia........................................47Captulo VI

    Faquirismo................................................................70Captulo VII

    O Espiritismo na Europa..........................................79Captulo VIII

    Das fraudes em matria de Espiritismo..................108

    Segunda Parte......................................................................114Captulo I

    Opinio dos sbios sobre os fatos espritas............114

  • Captulo II

    Investigaes do Sr. William Crookes...................144Captulo III

    Experincias de Zllner..........................................175Captulo IV

    Teorias emitidas para explicao dosfenmenos chamados espiritualistas......................178

    Terceira Parte

    Experimental.......................................................................180Captulo I

    Preliminares............................................................180Captulo II

    Experincias com Slade..........................................184Captulo III

    Experincias da primeira categoria Fenmenos diversos............................................187

    Captulo IV

    Experincias da segunda categoria Escrita espontnea...............................................197

    Concluses...........................................................................214

  • Prefcio

    tarefa ingrata a de apresentar aos seus contemporneos um conjunto de fatos que eles ignoram ou dos quais s ouviram falar de modo a despertar-lhes preveno contra os mesmos.

    Tal , entretanto, o trabalho que nos impusemos.Devemos prevenir os leitores de que o assunto do qual nos

    vamos ocupar, quase desconhecido entre ns, est, entretanto, h muito tempo em ordem do dia nos pases vizinhos, principalmente na Inglaterra, onde no se passa ms sem que revistas ou jornais filosficos dos mais srios no o tratem com a mesma ateno que concedem aos problemas oficialmente cientficos.

    Em presena do silncio geralmente observado entre ns, pensamos praticar uma obra til fazendo conhecer o estado atual do que se denomina o Espiritismo, questo que tambm examinamos em mltiplas experincias e observaes.

    Pedimos, pois, ao leitor que tenha pacincia lendo esta obra, e que espere, para lavrar uma sentena definitiva, at ao momento de entrar na terceira parte, consagrada s nossas experincias pessoais.

    Essas experincias, que raros cientistas consentiram empreender, autorizam-nos a dizer, antes de comear, que o assunto digno de ateno, por esse motivo falamos dele seriamente.

    Sabemos a que nos expomos procedendo assim.Poderamos, sem descobrirmo-nos, chamar a ateno do

    pblico e dos sbios sobre certos fatos naturais segundo pensamos, mas regidos por leis ainda desconhecidas da cincia moderna , descrevendo-os no tom de uma zombaria acre-doce; mas no pensamos nisso um instante. Esse processo indigno de um verdadeiro filsofo; seria de fato uma covardia.

    Preferimos caminhar direito ao alvo.

  • Paris, outubro de 1886.

  • Introduo

    O assunto tratado nesta obra daqueles a cujo respeito um homem preocupado de sua reputao cientfica deve usar de extrema circunspeco. No conhecemos, com efeito, nada mais comprometedor; e o exemplo dos ultrajes prodigalizados, nesses ltimos tempos, aos sbios mais eminentes da Inglaterra e da Alemanha, que ousaram examinar de perto a questo do Espiritismo, e dizer o que viram, para dar que pensar aos mais temerrios.

    Antes de entrarem no estudo experimental do sonambulismo provocado, do hipnotismo, da sugesto e de todos esses fenmenos ainda mal definidos, que eram classificados outrora na categoria dos fatos do magnetismo animal, os cientistas, e os mdicos em particular, pensaram maduramente. O motivo desse excesso de prudncia fcil de compreender-se: a questo magnetismo havia sido muito mal vista por causa dos magnetizadores, dos charlates e saltimbancos de toda espcie.

    Os fenmenos de hipnotismo, de catalepsia provocada, etc., a cujo estudo muitos se entregam vigorosamente h alguns anos, especialmente na escola de Salptrire, podem em rigor receber da escola materialista alem uma explicao mecanicista, e outras; mas onde nos parece difcil dar, atualmente pelo menos, explicao satisfatria de fenmenos observados na ordem dos fatos cuja exposio vamos tentar. Devemos dizer, em primeiro lugar, que os fenmenos do hipnotismo ou magnetismo animal, se bem que tomando os elementos do seu determinismo no domnio da fora nervosa, ou da matria nervosa agente, se quiserem, parece-nos diferirem completamente dos de que vamos tratar.

    Entretanto, no ser intil, antes de abordar o estudo do Espiritismo, entrarmos em algumas consideraes sobre os fenmenos to interessantes do hipnotismo, dos quais a cincia mdica conveio enfim em ocupar-se oficialmente desde alguns

  • anos atrs, depois de hav-los conservado por muito tempo no ndex.

    No ser mister estendermo-nos longamente neste assunto, fornecendo argumentos de nossa lavra; no, porque nos basta apanhar os fatos que vm cair sob nossa mo. Estes fatos tornam-se, de dia em dia, to numerosos que principiam a no surpreender mais ningum: ei-los que se tornam clssicos. Dentro de quantos anos poderemos dizer o mesmo daqueles aos quais este livro especialmente consagrado? No sabemos ao certo, mas pensamos que no tardar muito.

    Somos inimigos do maravilhoso e do misticismo e no admitimos que coisa alguma se produza fora das leis da Natureza.

    Pensamos, enfim, que, se nos demonstrarem sua existncia, os fenmenos chamados espritas no devem ser mais sobrenaturais do que os da sugesto e do hipnotismo, alguns exemplos dos quais citaremos.

    Alm disso, antes de prosseguirmos, devemos explicar-vos, por uma vez, acerca da palavra fenmeno, que forosamente vir muitas vezes ao bico de nossa pena no correr deste estudo:

    Pela palavra fenmeno designamos todo fato que se apresenta observao, sem ligarmos a este fato nenhum carter, a no ser o natural. Conservamos assim palavra um sentido conforme a sua etimologia (o que aparente).

    O estudo do magnetismo ou do hipnotismo de alguma sorte uma entrada em matria preparatria ao estudo dos fatos devidos fora psquica, sendo esta a denominao que se deu ao agente particular que preside os fenmenos chamados espiritualistas, e estes surpreendem menos depois da observao dos primeiros.

    Causam admirao, primeira vista, as observaes de sugesto, que ningum pode pr em dvida, e diante das quais o cptico mais endurecido obrigado a bater em retirada, sob pena de parecer to impenetrvel s inovaes, como o professor Bouillaud teimando em ver no fongrafo um artifcio de ventriloquia.

  • Sabemos o que sugesto: muita gente lhe sensvel. O sujet, posto em um estado particular, pode ser obrigado a executar qualquer ato, por mais extravagante, por mais criminoso que se suponha, se aquele, sob cuja influncia estiver momentaneamente, lhe der ordem, sugerir-lhe a idia naquele sentido.

    Alguns desses fatos podem ser explicados pela sugesto simples, cuja importncia o Dr. Bernheim, de Nancy, demonstrou, mas vamos ver que essa explicao no pode ser generalizada. Eis um exemplo de sugesto pura, citada pelo Dr. Bernheim em sua obra recente.1

    Sugeri um dia a S. que, quando acordasse, veria atrs de si, sobre um mvel, uma colher de prata, e que ele a meteria no bolso. Despertando, no se voltou e no viu a colher. Mas sobre a mesa, diante dele, estava um relgio: eu lhe havia sugerido tambm a sugesto negativa, que ele no veria ningum na sala e achar-se-ia s, o que se realizou. A idia do roubo, sugerida para a colher, apresentou-se-lhe no crebro para o relgio. Olhou-o, tocou-o, depois disse:

    No, isso seria um roubo.E deixou-o.Se a sugesto do roubo da colher lhe tivesse sido repetida

    com fora e ordenada imperiosamente, no duvido de que ele a houvesse levado.

    Depois de j escrito isto, tive ocasio de hipnotizar novamente S.. Fiz-lhe a mesma sugesto, mais imperiosamente:

    Colocareis a colher em vosso bolso; no podereis proceder de outro modo.

    Quando despertou, viu a colher, hesitou um instante, depois disse:

    Ora, tanto pior!E meteu-a no bolso.

    O Sr. Vtor Meunier, redator cientfico do jornal Le Rappel, teve outrora o mrito, e podemos dizer a coragem porque era

  • coragem nessa poca de falar, sendo um dos primeiros em Frana, no jornal La Presse, do magnetismo animal. O nmero de 23 de julho de 1886 do Le Rappel, pela pena do Sr. Vtor Meunier, que se interessava sempre pelo assunto, consagrou sua Causerie scientifique s novas experincias que lhe foram comunicadas pelo Dr. Libault, de Nancy. De acordo com uma lei que nos impusemos para o presente trabalho, reproduziremos textualmente o artigo do erudito cronista. Veremos por esse documento que o magnetismo est hoje completamente na ordem do dia. Trata-se, nesse caso particular, de vesicaes produzidas ou impedidas, sobre a pele de um indivduo hipnotizado, por simples sugesto. Em outros casos pode-se, pelo mesmo processo, produzir a embriaguez, a alegria, etc., mudar a personalidade de um indivduo, de tal maneira que uma moa se julgava general, ao passo que um general dar sua palavra que uma aia de criana ou ama de leite, etc.. V-se gente caminhar a quatro ps, ladrar como co, outros miando como gatos, porque lhes foi sugerida a idia de que eles se haviam tornado co ou gato, e isso com uma seriedade que desafia toda idia de imitao e de fraude.

    Eis o interessante artigo do Sr. Vtor Meunier:

    O Dr. Libault enviou-nos a ata de uma curiosa experincia de sugesto hipntica feita a 9 deste ms, em Nancy.

    Ela tem por autor o Sr. Focachon, farmacutico em Charmes (Meurthe-et-Moselle), j conhecido de nossos leitores, e por testemunhas, alm do sbio correspondente citado: os Srs. Ligeois, professor da Faculdade de Direito de Nancy, Fvre, ex-tabelio, e o Dr. Brulard, que seguiram as experincias do princpio ao fim e garantem as mesmas.

    Devem recordar-se que no intuito de saber se o pretendido milagre da estigmatizao no esconde algum fenmeno hipntico, o Sr. Focachon empreendeu, servindo-lhe de sujet uma Srta. Elisa ..., investigaes que o levaram a produzir queimaduras e vesicaes por meio de simples sugesto; o que foi verificado pelos professores Beaunis e Bernheim, da

  • Faculdade de Medicina de Nancy, Ligeois, da Faculdade de Direito, Srs. Dr. Brulard, Libault, e enfim, Laurent, arquiteto estaturio, e Simon. Le Rappel deu notcias de tudo isso o ano passado.

    Ora, depois de haver obtido vesicao sem substncia vesicante, o Sr. Focachon ficou naturalmente curioso de saber se o efeito inverso produzir-se-ia tambm, isto , se por sugesto poderia impedir que uma substncia vesicante produzisse vesicao.

    desta experincia que se trata agora. Como veremos, ela foi perfeitamente dirigida.

    Um pedao de tela episptica dAlbespeyres foi cortado em trs partes. Duas sero respectivamente aplicadas nos braos da Srta. Elisa, uma para experimentar o caso em questo, a influncia da sugesto destinada a fazer dela matria inerte; a outra, que no far objeto de sugesto alguma, para produzir seus efeitos ordinrios. O terceiro fragmento ser colocado em um doente que tiver necessidade dele.

    Por estas disposies vemos que esto reunidos todos os termos de comparao e meios de verificao, no s quanto qualidade do agente episptico e aptido natural e atual do sujet para ressentir seu efeito, mas ainda quanto ao papel da sugesto para modificar essa qualidade e essa disposio.

    Assim se fez. Estando a Srta. Elisa adormecida, um primeiro quadrado de tela vesicante de 5 centmetros de lado foi colocado sobre a face palmar de seu antebrao esquerdo, no ponto de reunio do tero superior com o tero mdio, e um segundo quadrado de 2 centmetros de lado foi posto no lugar correspondente do antebrao direito. Ao mesmo tempo, no Hospcio Civil, a ltima poro de tela era aplicada pelo Dr. Brulard sobre a parte anterior e superior do peito de um tsico.

    Voltemos Srta. Elisa. Mal os emplastros so-lhe aplicados, o Sr. Focachon, com energia, faz ao sujet, j em sonambulismo, esta declarao: O vesicatrio de seu

  • antebrao esquerdo (vesicatrio de 5 centmetros de lado) no produzir a efeito algum.

    Desde o comeo da experincia, 10:25 da manh at 8 da noite, a Srta. Elisa no ficou sozinha um instante.

    s 8 da noite, reunidos em torno da moa, as testemunhas supracitadas, depois de verificarem pelo estado do curativo que tudo se achava em ordem, retiraram-se e notaram ento isto:

    Antebrao esquerdo (aquele onde estava colocado o maior dos vesicatrios, cuja sugesto devia anular o efeito): A pele est intacta. O revulsivo nada produziu absolutamente. A sugesto realizou-se plenamente. Apenas lemos na ata havia vermelhido em redor de uma picada de alfinete desapercebida no momento de fazer-se o curativo e situada perto de um ponto da pele que estava ocupado pela borda externa do vesicatrio.

    Antebrao direito (aquele em que foi colocado o menor dos vesicatrios, que no havia sido objeto de nenhuma sugesto): O revulsivo tinha determinado uma irritao pronunciada da epiderme e a paciente acusava uma sensao dolorosa. To eminente parecia a vesicao que as testemunhas resolveram prolongar a experincia e pediram ao Sr. Focachon que repusesse os dois vesicatrios. Quarenta e cinco minutos depois havia direita duas flictenas (empolas) bem visveis, uma das quais, ao ser furada, deixou correr alguma serosidade. (Na manh seguinte o Dr. Libault recebia do Sr. Focachon, que regressara a Charmes com o seu sujet, um carto postal comunicando-lhe que o pequeno vesicatrio produzia um corrimento abundante, seguido de forte inflamao). Quanto ao vesicatrio posto pelo Dr. Brulard no doente do Hospital Civil, produziu-lhe uma empola magnfica.

    Por conseguinte, os signatrios da ata concluem assim:Do que precede, resulta para ns que, por meio da

    sugesto no estado sonamblico, pode-se neutralizar os efeitos de um vesicatrio de cantrida; sua concluso

  • absolutamente inatacvel, porque ela a frmula do fato que lhes foi dado observar.

    Seja-nos permitido citar tambm a observao seguinte, que extramos do livro do Dr. Bernheim (pg. 181). Veremos por este exemplo se a sociedade no estaria no direito de regulamentar as prticas do magnetismo.

    Meu colega, Sr. Ligeois, professor na Faculdade de direito de Nancy, estudou particularmente, em uma memria que fez sucesso, as relaes da sugesto com o Direito Civil e Criminal.

    Ele fez numerosas experincias, estabelecendo a possibilidade de sugerir crimes que os indivduos hipnotizveis executavam sem saber o mvel que lhes guiara as mos.

    Eis como exemplo uma destas observaes:Devo acusar-me diz o Sr. Ligeois de haver tentado

    fazer matar meu amigo Sr. P., ex-magistrado, e isto coisa grave, em presena do Sr. Comissrio Central de Nancy.

    Munira-me de um revlver e alguns cartuchos. Para banir a idia de uma simples brincadeira, ao indivduo que ia servir experincia, e que escolhi ao acaso entre os cinco ou seis sonmbulos que se achavam naquele dia em casa do Dr. Libault, meti uma cpsula no revlver e fiz fogo para o jardim; entrei, em seguida, mostrando aos assistentes um carto que a bala acabava de perfurar.

    Em menos de 15 segundos, sugiro Sra. G. a idia de matar o Sr. P., com um tiro de revlver. Com uma inconscincia absoluta e a mais perfeita docilidade, a Sra. G. encaminha-se para o Sr. P. e dispara-lhe um tiro de revlver.

    Interrogada imediatamente pelo Sr. Comissrio Central, ela confessa o crime com inteira indiferena. Matou o Sr. P. porque este lhe desagradava. Podem prend-la; sabe bem o que a espera; se lhe tirarem a vida, ir para o outro mundo, como sua vtima, que v estendida no cho, banhada de sangue. Perguntam-lhe se no teria sido eu quem sugerira a

  • idia do assassnio que ela acabava de praticar. Afirma que no; foi levada a isso espontaneamente, s ela culpada.

    mister que se saiba: as observaes referidas pelos experimentadores que acabamos de citar apresentam as mais srias garantias de autenticidade. Elas so, na maior parte, recolhidas em um servio de hospital, diante dos discpulos do servio do mestre, o qual experimenta em presena deles e, por esta publicidade, esses documentos impem-se tanto quanto pela honorabilidade cientfica dos que a fazem conhecer.

    At aqui a sugesto por palavra intervm manifestamente s; mas h casos em que a mesma influncia parece seguir caminho muito diferente. Assim, na sesso de 31 de maio de 1886, da Sociedade Mdico Psicolgica, o Dr. Paulo Garnier leu um trabalho do Dr. Dufour, mdico-chefe do Asilo de Saint-Robert (Isre), no qual se encontra uma observao de fatos de sugesto inteiramente diferentes. Ei-la:2

    A observao mais importante a de um tal T., atacado de histero-coreia, considerado como muito perigoso, e que, no obstante, foi posto em liberdade na seo de segurana, porque o Dr. Dufour tinha horror aos meios de constrangimento.

    A aplicao das mos no dorso arrasta quase imediatamente T. para trs. Fica rapidamente acessvel sugesto, que sucessivamente venceu nele crises de grande histeria, tendncias ao suicdio, alucinaes penosas da audio, etc.3 T., que se evadiu trs vezes de um asilo, passeia livremente pelo estabelecimento. Estando em estado de sonambulismo, foi-lhe sugerido que no se evadisse.

    De outra parte, T. sensvel ao dos medicamentos a distncia: os fatos referidos pelo Dr. Dufour so verdadeiramente surpreendentes.

    Uma grama de ipeca posta em um papel dobrado, colocada sobre a cabea de T., coberto com um chapu alto, determinou nuseas, regurgitaes, que cessam desde que o medicamento retirado.

  • A atropina dilata levemente as pupilas, seca a garganta, produz uma frouxido muscular geral.

    Um pacote de razes de valeriana, posto em cima da cabea sob um grosso bon de l, produziu fatos inconcebveis! T. segue uma mosca com os olhos, deixa a cadeira para correr atrs dela, pe-se a andar a quatro ps, brinca como um gatinho com uma rolha, arredonda as costas se algum ladra, lambe as mos e passa-as nas orelhas.

    Com a retirada da valeriana, tudo desaparece e T. acha-se a quatro ps, admirado de ver-se nessa posio. No tem lembrana alguma do que ocorreu.

    O louro cereja, em aplicao sobre a cabea, provocou em T., que anarquista e ateu, uma exploso de sentimentos religiosos. Ele mostra uma parede nua onde seria mister colocar um Cristo, ajoelha-se diante da parede, ergue as mos ao cu; depois, descobre-se. Nesse momento, com as folhas que caem desaparece a sua devoo. No lhe resta lembrana do que se passou.

    Toda idia de embuste da parte do paciente, todo pensamento de sugesto possvel deve ser afastado, dada a ignorncia de T. sobre esse ponto e as precaues tomadas para nada dizer-se e nada fazer-se que possa produzir a sugesto.

    O efeito assim produzido por medicamentos colocados sobre a cabea de um sujet, mas no absorvidos, pode explicar-se de quatro modos diferentes:

    1) o sujet, por uma espcie de dupla vista, l no pensamento do operador e auto-sugestiona-se; por exemplo: a sua pupila se dilata porque ele l, no pensamento do operador, que tal o efeito provocado pela atropina;

    2) adivinha, pelo mesmo mecanismo, a natureza do remdio com o qual ele se acha em relao; a haveria ainda auto-sugesto;

    3) os medicamentos seriam dotados de um fluido especial, produzindo, a distncia, em dadas condies, os efeitos fisiolgicos ordinrios;

  • 4) enfim, a sugesto poderia operar-se, a distncia, pelo operador, por meio de seu pensamento e independente dele.

    Em todos os casos, exceto no terceiro, haveria exteriorizao do sensorium de um dos dois indivduos em presena do operador ou do sujet.

    Fique entendido que s damos estas explicaes a ttulo de hiptese. Nossa regra a de limitarmo-nos aos fatos.

    Todos esses fatos, hoje largamente demonstrados, foram acolhidos durante mais de sculo, nas diversas sociedades cientficas, por negao absoluta. Como admirar-se, depois disso, que os fatos muito mais interessantes, mas tambm mais inverossmeis que vo ser estudados aqui, estejam ainda hoje banidos pela cincia oficial?

    Assim, quando em uma reunio de cientistas, a questo do Espiritismo trazida discusso em Paris, por exemplo, no ano da graa de 1886, nove vezes em dez ouvireis dizer: Tudo isso pilhria! H muito que o Espiritismo est enterrado; e, desde a grande epidemia de espiritomania que reinou no mundo h uns 30 anos, mal se v, aqui e ali, alguns malucos que ainda se dem s prticas das mesas giratrias. Tudo isso produto da trapaa ou de uma alucinao coletiva.

    Mas se, querendo ir ao fundo das coisas, perguntardes aos que resolvem por palavras o problema das mesas giratrias (que, se giraram, fizeram girar tambm no poucas cabeas), convencer-vos-eis de uma coisa: que a opinio to afirmativamente emitida no se apia sobre nenhuma experincia pessoal.

    Fizestes experincias sobre o assunto?, perguntamos centenas de vezes. Eu no caio nessa!, responderam-nos quase sempre. boa! porque ento pronunciai-vos assim? Permiti-nos observar que isso pouco cientfico... para um cientista. Replicaram-nos que aquilo era impossvel e por conseguinte aquilo no merecia exame. Littr definiu o Espiritismo: Superstio dos espritas.4 Entretanto, tem-nos acontecido que, dirigindo-nos a homens, cuja autoridade cientfica universalmente faz lei principalmente em matria de

  • Fisiologia ou de Patologia nervosa, tem-nos acontecido recolher uma informao discreta neste gnero: Vale a pena procurar; talvez se descubra a alguma coisa!

    Quisemos verificar o assunto e, movidos por curiosidade bem natural, procuramos por ns mesmos saber o que h ou no de verdade nele.

    Declaramos, em alta voz, que, comeando essas pesquisas, tnhamos a ntima convico de nos acharmos em presena de uma mistificao colossal que convinha desmascarar e custamos a perder essa idia.

    Tentamos, em primeiro lugar, algumas experincias em famlia ou em pequeno crculo de amigos to crentes como ns; mas essas experincias, embora houvessem produzido certos resultados positivos, no nos satisfizeram.

    Fizemos pesquisas na literatura especial; mas, salvo algumas raras obras escritas com esprito verdadeiramente cientfico, nada encontramos que arrastasse convico, pelo menos a um homem habituado s observaes rigorosamente exatas. Diremos mais: a leitura dessas histrias de almas do outro mundo, acompanhadas de comentrios carolas e supersticiosos, provocavam-nos antes o tdio e inspiravam-nos o receio de um extravio intelectual comprometedor. Mas verdadeiros sbios no desdenharam ocupar-se destas coisas; porque no faramos ns o mesmo? O assunto no digno? No o pensamos e, ademais, como disse um dos homens aos quais acabamos de aludir: dever dos homens de cincia, que aprenderam a trabalhar de maneira exata, examinar os fenmenos que atraem a ateno do pblico, a fim de confirmar-lhes a realidade ou explicar, sendo possvel, as iluses das pessoas honestas e desmascarar as fraudes dos impostores. 5

    Levados cada vez mais pelo desejo de ver com os prprios olhos, assistimos a muitas reunies espritas anunciadas pelos jornais; ouvimos conferncias muito bem feitas, na forma seno no fundo, por homens que pareciam gozar de todas as suas faculdades intelectuais, e freqentamos uma sociedade no seio da qual se encontravam reunidas pessoas muito sensatas, pelo

  • menos em aparncia, e exaltados, e fanticos que criam em tudo quanto se lhes diz. Deixamo-nos tentar a ponto de sentar-nos perto de um cavalheiro ou de uma dama que se diziam mdiuns, com as mos sobre uma mesa representando provisoriamente um esprito, e confessamos que descobrimos em ns mesmo uma aparncia inteiramente ridcula naquela posio. Entretanto, somos obrigados a declarar que desde o comeo testemunhamos coisas surpreendentes e inexplicveis, segundo pensamos, no estado atual de nossos conhecimentos. Exemplo: somos convidados a pensar em uma pessoa de nossa famlia morta h tempos; pensamos em um amigo falecido h dois anos, e depois de alguns segundos, por meio de pancadas correspondendo a letras do alfabeto, a mesa indica-nos exatamente o nome do nosso amigo, sua idade, que no sabamos ao certo naquele momento e que verificamos depois , sua ltima doena e a aldeia em que morreu. Que quer dizer isto? Ser nova manifestao do magnetismo? Ter havido a transmisso de nosso pensamento? O mdium ter lido tais coisas em nossos olhos? No importa, o fato muito curioso e merece bem estudado. Vereis muito mais diziam em torno de ns , se vos dispuserdes a observar esses fenmenos.

    Se o leitor consentir em perder algumas horas conosco, ver igualmente muito mais.

    Podemos afirmar desde j que os sbios eminentes, aos quais aludimos acima, tinham razo quando nos diziam: Vale a pena procurar; talvez se descubra a alguma coisa! Diremos por nossa vez: h alguma coisa de real nos fenmenos insuficientemente estudados pelos homens de cincia que aprenderam a trabalhar de maneira exata. Pensamos que a razo que faz recuar aqueles homens diante do estudo, do que ousaremos denominar um novo ramo da Cincia, a mesma que os levou outrora a adiarem o estudo do magnetismo animal, disfarado por mais segurana sob o nome de hipnotismo.

    Talvez pensem que nos deixamos facilmente induzir em erro. Os que nos conhecem sabem que no pecamos por excesso de credulidade: pertencemos escola que teima em no admitir seno o que se demonstra, e em no crer seno no que se v. Ora,

  • atualmente, j para ns est demonstrado que certos indivduos possuem em alto grau uma faculdade especial que se acha mais ou menos desenvolvida em cada um de ns e que, por meio desta faculdade, por uns denominada fora psquica (Cox, W. Crookes, etc.) e por outros ectnica ou dica, possvel obter certos fenmenos inexplicveis no estado atual da Cincia. Damos testemunho do fato; quanto s diferentes hipteses que do a chave dos fenmenos provocados por essa fora, at presentemente, coisa alguma demonstrando, segundo pensamos, que elas sejam mais do que hipteses, esperaremos o resultado da experimentao para firmarmos uma opinio e exprimi-la.

    O que se segue no foi escrito no intuito de fazer o leitor partilhar de uma crena que o autor no tem, mas no de plantar uma balisa a mais em o novo caminho a trilhar em direo Verdade. Sabemos haver temeridade em tentar uma aventura to arriscada; mas, por Deus! tanto pior para quem nos quisesse mal por desejarmos separar o falso do verdadeiro!

    Dvamos os ltimos retoques a este livro, quando recebemos, uma manh, a visita de nosso bom amigo, o Dr. X., um dos nossos ex-coletas do Internato dos hospitais. Depois dos cumprimentos do estilo, amigo X., que parecia examinar-nos com inquieta ateno, o que, entre parntesis, nos embaraava um pouco, disse-nos abrupto:

    No vos ocupais de Espiritismo? Conversaremos a este respeito. respondemos. Mas, por

    que esta pergunta? Porque ouvi dizer, e depois de ter-vos escutado, ficaria

    admirado que tal acontecesse, porque um homem de bom senso... H mais que admirar em vossas palavras, caro amigo,

    porque, enfim, sabeis o que o Espiritismo? boa! Espiritismo ...Aqui, nosso amigo, o Dr. X., um sbio que a Faculdade de

    Medicina honrar-se- de contar, um dia, entre seus mais brilhantes professores, deu-nos, em uma curta preleo, a prova de que no conhecia a primeira palavra da questo. Ele teve, bem

  • entendido, a inteno de demonstrar-nos outra coisa. Por isso ficou muito surpreendido quando lhe respondemos:

    Mas, segundo dizeis, s ignorantes e homens estranhos a toda cincia se tm ocupado at hoje de Espiritismo! Ficai sabendo que sbios, ilustres entre os mais ilustres, pronunciaram-se de maneira completamente afirmativa sobre a realidade dos fenmenos espritas.

    Pusemos-lhe as provas debaixo dos olhos, e como X. no dos que dizem: nem que me provassem eu acreditaria... ficou literalmente estupefato.

    Embora! disse-nos ele em vosso lugar, deixaramos que outro se comprometesse vontade, e no me ocuparia com tais coisas. Contentais-vos em fazer a histria do Espiritismo; limitais o vosso trabalho em provar fatos que verificais; declarais que no sois esprita, seja; mas nem todos diro isto... Os bons amiguinhos ho de dizer negligentemente, quando falarem a vosso respeito: Ah, pois sim! Fulano, que se ocupa de Espiritismo e vos faro passar por visionrio, alucinado, que sei eu?...

    Muito bem! possvel que, procedendo deste modo, eu me prejudique muito no ponto de vista de minha profisso; pode ser que eu esteja trancando meu caminho s academias, pequenas e grandes; mas, desde que verifico um fato, nada me impedir de proclam-lo, porque, em seu gnero, ele me parece da mais alta importncia: E pur si muove!

    Prefiro a felicidade de procurar a verdade honra de fazer parte de uma sociedade que tapasse os olhos para no v-la. Porventura Galvni deixou-se vencer pelas zombarias dos finrios de sua poca? No. Sou atacado escreveu ele por duas espcies de gente: os sbios e os ignorantes. Uns e outros me ridicularizam e denominam o mestre de dana das rs. Pois bem! seja; entretanto acredito haver descoberto uma das maiores foras da Natureza. Haveria ele tido a intuio da transmisso da fora a distncia pela eletricidade, da luz eltrica, e de outras coisas mais colossais, talvez, que no conhecemos?!

  • Minhas pretenses so menos elevadas: nada descobri, nada mais fiz do que verificar o que cem mil outros verificaram antes de mim; o que vi muitos cientistas distintos, em Frana, viram-no igualmente, mas nenhum deles teve a coragem de diz-lo alto. mister que um de ns se arrisque; os outros seguiro... cedo ou tarde, principalmente se, conforme a frase de William Crookes, pudermos dizer dos fenmenos em questo no que aquilo possvel, mas que aquilo verdade.

    Adeus! disse-nos X., despedindo-se , tendes muita coragem.

    Segundo a palavra do nosso amigo X., haver tanta coragem em ocupar-se uma pessoa de um ramo inexplorado dos conhecimentos naturais? No seria antes desertar da Cincia teimar-se em negar exame aos atos afirmados por milhares de pessoas, que pertencem freqentemente s classes mais esclarecidas e sobre todos os pontos do globo? Descontando a parte devida a fraudes possveis, no lcito que os sbios se desinteressem de um assunto a respeito do qual um homem como o professor Challis, de Cambridge, escreveu que os testemunhos relatando os fenmenos espritas tm sido to numerosos, to concordes, que devemos admitir ou que os fatos so tais como so referidos ou ento que no h mais possibilidade de crer em coisa alguma sobre o testemunho dos homens.

    Podemos ter como supersticiosas as doutrinas do Espiritismo; mas que pensar da origem desta superstio? Em nosso sculo positivo, devemos saber explic-la. Ela tem uma causa e esta causa reside em fatos sem dvida mal interpretados. Escutemos antes o professor Morgan:6

    Vi bem e ouvi bem, em condies que tornam impossvel a incredulidade, fenmenos chamados espiritualistas e dos quais um ser razovel no pode admitir a explicao por impostura, acaso ou erro.

    At a, sinto o terreno firme sob meus passos; mas, quando mister chegar causa destes fenmenos, no posso admitir as explicaes que tm sido, at agora, apresentadas.

  • Facilmente encontram-se explicaes naturais, mas estas so insuficientes; de outra parte, a hiptese espiritualista (leia-se: esprita), que mais satisfatria, ainda bem difcil de ser admitida.

    A opinio de um sbio positivista to considervel como o professor Morgan dever porventura ser tratada com desdm? Quem poder ento reclamar a ateno e o respeito para sua prpria palavra?

    No conhecemos todas as leis da Natureza; novas foras oferecem-se nossa ateno com uma persistncia inelutvel; no temos o direito de adiar por mais tempo o seu exame, porque, segundo a expresso do ilustre William Thomson,7 a Cincia obrigada, pela eterna lei da honra, a encarar sem temor todo problema que pode francamente ser-lhe apresentado.

  • PRIMEIRA PARTE

    CAPTULO IRpido olhar sobre a fisiologia do Esprito

    Nos primeiros tempos de nossos estudos mdicos, lembramo-nos ter visto, um dia, entrar em uma pequena livraria da margem esquerda do Sena, onde casualmente nos achvamos, um homem de aspecto inspirado, de rosto magro e plido, animado por duas pupilas febris.

    O homem trazia um manuscrito que vinha oferecer ao editor, dizendo-lhe em tom misterioso: Isto contm coisas da mais alta importncia, mas devo dizer que no sou o autor verdadeiro, porque elas me foram ditadas por Espritos.

    Naturalmente, aquele autor foi acompanhado at porta com todas as honras devidas sua classe de colaborador dos Espritos. A expresso desta fisionomia singular no se apagou ainda de nossa memria e, ultimamente, levado pelos nossos estudos, prosseguindo em certas observaes at no meio das sociedades espritas, tornamos a encontrar a mesma expresso em certo nmero de adeptos fanticos. Entre os primeiros cristos, deviam ter esse aspecto os que iam espontaneamente entregar-se para pasto das feras nos circos romanos. No duvidamos tambm que, sendo necessrio para confisso de sua f, muitos espritas no recuariam diante da perseguio, o que no provaria nada.

    Entretanto, se um certo nmero de espritos terrestres, j se v se deixam entusiasmar pelas prticas espiritualistas a ponto de permitirem que sua razo perca o terreno, justo dizer que eles formam a minoria, em Paris pelo menos. Conhecemos, por nossa parte, muitos homens sinceros e esclarecidos que estudam friamente a questo na esperana de surpreenderem a a razo, o porqu da vida.

  • Uma coisa que geralmente se ignora no mundo cientfico e no pblico em geral que os adeptos do Espiritismo esto espalhados, em grande nmero, sobre todos os pontos do globo e em todas as classes da sociedade. Tm suas associaes de estudos, de socorros mtuos, e, sem ir at pretender que constituam uma conjurao secreta cujas vastas ramificaes minam o mundo como as toupeiras cavam a terra, segundo a expresso de uma folha clerical , mister, entretanto, reconhecer que o Espiritismo ganha dia a dia uma importncia tal pelo nmero crescente de seus nefitos, que brevemente sero obrigados a ocupar-se dele nas esferas oficiais, quer cientficas quer polticas. O Espiritismo tornou-se uma crena, uma verdadeira religio.

    Em Frana o nmero dos espritas menor que na Inglaterra ou nos Estados Unidos, mas pensamos no exagerar dizendo que em Paris existem aproximadamente cem mil.

    Jornais espritas, revistas e outras folhas peridicas imprimem-se em todos os pases da Terra. Pode-se fazer uma idia mais precisa da importncia que adquiriu a nova doutrina, pela quantidade das principais publicaes que lhe servem de rgo, e cujo nmero aumenta diariamente.

    Treze revistas ou jornais espritas publicam-se em francs (La Revue Spirite, La Pense Libre, Le Spiritisme, La Lumire, em Paris, La Religion Laque, em Nantes, etc.), 27 em ingls, 36 em espanhol, 5 em alemo, 3 em portugus, 1 em russo, 2 em italiano. Um jornal esprita franco-espanhol imprime-se em Buenos Aires e outro franco-flamengo em Ostende.

    Entre essas publicaes, duas so redigidas por homens revestidos de um carter cientfico, tais so os Proceedings da Sociedade de Investigaes Psquicas de Londres,8 entre cujos membros destacamos os nomes de Gladstone, ex-primeiro ministro, W. Crookes e A. Russel Wallace. Estes dois ltimos so, ao mesmo tempo, membros da Sociedade Real de Londres, sociedade sbia que corresponde ao nosso Instituto de Frana. O professor Balfour Stewart igualmente membro da Sociedade Real. Atualmente a Sociedade de Investigaes Psquicas conta 254 membros efetivos, 21 membros honorrios, 255 membros

  • associados. Muitos sbios franceses fazem parte da Sociedade de Investigaes Psquicas, a ttulo de membros correspondentes. Citemos os Drs. Bernheim e Libault, de Nancy, Charles Richet, professor substituto da Faculdade de Medicina de Paris e diretor da Revue Scientifique.

    Um jornal esprita alemo, o Sphinx, redigido igualmente por homens de cincia.

    Um dos ardentes propagandistas do Espiritismo, em S. Petersburgo, o Sr. Alexander Aksakof, Conselheiro Secreto do Czar Alexandre III.

  • APNDICE

    EXTRATOS DOS REGULAMENTOS E ESTATUTOS DASOCIEDADE DE PESQUISAS PSQUICAS DE LONDRES

    Art. 1) Ttulo O nome da Sociedade : Sociedade para as Investigaes Psquicas.

    Art. 2) Fim da Sociedade Esta Sociedade estabelecida para o fim:

    a) de unir em corpo organizado os homens de cincia e os investigadores, no intuito de animar o estudo de certos fenmenos obscuros, compreendendo os que se conhecem comumente sob a denominao de psquicos, mesmricos, espiritualistas, e dar publicidade aos resultados dessas investigaes;

    b) de imprimir, vender ou distribuir as publicaes relativas a assuntos psquicos ou anlogos; de fornecer aos investigadores, por meio de correspondncia ou por qualquer outra maneira, informaes sobre estes assuntos; de reunir ou coordenar os fatos que lhe so relativos; de abrir sales de leitura, livrarias ou outros locais anlogos e de fazer em geral tudo que puder contribuir para a aquisio dos objetos citados.

    Os membros pagam 1 guinu por ano (25 fr.) ou 10 guinus de uma vez por todas. Os membros fundadores pagam 20 guinus.

    Nota Para prevenir qualquer erro, fica expressamente estabelecido que fazer parte da Sociedade no implica na aceitao de explicaes particulares sobre os fenmenos examinados, como a crena de operao no mundo fsico produzida por foras no reconhecidas pela Cincia.

    Membros e associados honorrios O conselho pode nomear membro honorrio da Sociedade toda pessoa distinta por seu saber ou por sua experincia nas investigaes psquicas; e associado honorrio toda pessoa que tiver prestado alguns servios Sociedade. Os membros assim eleitos podem ser reelegveis anualmente. Membros e

  • associados honorrios gozam dos privilgios, sem nenhuma das obrigaes ligadas a esses ttulos.

    Membros correspondentes O conselho ter o direito de eleger como membros correspondentes, gozando das mesmas prerrogativas que os membros honorrios, todas as pessoas capazes e que desejem auxiliar os projetos da Sociedade. Sero elegveis nas reeleies anuais.

    O secretrio enviar a cada membro uma notcia de todas as questes que devem ser tratadas em reunio geral. A reunio especial dos membros da sociedade poder ser convocada pelo presidente, pelo conselho ou pelo secretrio, a pedido de dez membros. Dez dias antes destas reunies, ser dado aviso de todas as questes que devero ser tratadas e nenhum outro assunto poder ser estudado. Todos os membros recebero uma circular para a reunio geral.

    Um livro de presena ser assinado por cada membro, sua entrada na sala das reunies. Em todas as reunies do conselho, 4 membros formaro comisso e todas as questes sero decididas por votao, e uma deciso tomada pela maioria ser, salvo certos casos previstos, a deciso do conselho.

    Comisses compostas de membros da Sociedade sero formadas para o estudo de projetos especiais. Cada comisso designada comunicar seus relatrios ao conselho, pela voz de seu presidente, e nenhum relatrio ser publicado sem a sano do conselho. O conselho ter direito, com uma maioria de trs quartos dos membros presentes, de suspender ou corrigir algumas das disposies regulamentares ou leis da Sociedade, depois de comunicar isso a todos os membros, sete dias antes da reunio. Estas alteraes ficaro em vigor at prxima reunio geral, a menos que no sejam confirmadas pela maioria dos membros presentes.

    O conselho ter o poder de empregar os fundos da sociedade, compostos de legados e doaes, do modo que ele julgar conveniente, vendendo-os ou transformando-os. O conselho poder estabelecer sucursais na Gr-bretanha ou

  • em outro lugar e ter a possibilidade de cooperar com as Sociedades que tm em vista as mesmas idias.

    Auditores Haver dois auditores: um escolhido pelos membros da Sociedade, outro pelos membros do conselho. Estes auditores daro contas ao conselho dos relatrios da Sociedade, sero autorizados a examinar em todos os detalhes a questo das despesas a fim de verificar o emprego dos fundos, segundo os estatutos.

    Propriedades e fundos Cada livro aceito pela Sociedade para leitura ou publicao ficar sendo sua propriedade absoluta, a menos que os direitos de autor tenham sido especialmente reservados. Os bens da Sociedade sero confiados pelo conselho a uma comisso formada por membros e outros oficiais da Sociedade.

    Comunicaes O registro de uma comunicao com endereo a um membro ou associado ser feito como o dos membros e associados que residem no estrangeiro, contanto que estes ltimos indiquem um lugar de seu endereo no Reino-Unido. Comunicaes enviadas pelo secretrio de uma sucursal ou Sociedade aliada sero consideradas como avisos dos membros da sociedade a que pertence o secretrio.

  • CAPTULO IIA doutrina esprita. Os mdiuns

    O fundamento da doutrina professada pelos espritas reside em um axioma que a base de sua f e sobre o qual todos esto de acordo: Ns podemos, segundo os espritas, comunicar com os Espritos, isto , com as almas dos homens que morreram. Veremos mais tarde que as opinies esto divididas sobre grande nmero de outros pontos e que o Espiritismo, embora negue ser uma religio, nem por isso evitou a sorte das religies: seus crentes dividiram-se em seitas.

    Mas, como os espritas admitem a possibilidade das relaes entre os mortos e os vivos? Segundo eles, essas relaes ou comunicaes ocorrem por intermdio de indivduos dotados de um poder especial no definido ainda, por meio do qual os Espritos podem adquirir a fora necessria de ao sobre a matria que cai sob nossos sentidos materiais. Os indivduos possuidores da qualidade particular que serve de lao, de meio de comunicao, de intermedirio entre os dois mundos, so denominados mdiuns.

    Somos todos falando segundo a teoria esprita mais ou menos mdiuns, mas muito poucos indivduos possuem o poder medinico (ainda um neologismo) ou medianmico, em grau suficiente para dar lugar a fenmenos evidentes.

    Sem querermos dar um vocabulrio completo da linguagem esprita, somos forados, para sermos compreendidos pelos que ignoram totalmente essa coisa nova, a dar algumas explicaes sobre os termos que formos obrigados a empregar. De resto, a maior parte destas expresses se fazem compreender por si mesmas, e devemos dizer que, se geralmente so justas, algumas no so muito felizes. So, no raras vezes, fnebres e o cunho sepulcral de algumas delas tem contribudo para cercar de um vu de vaga tristeza os mistrios da Doutrina Esprita: alguns profanos seriam mais depressa tentados a consider-la uma

  • espcie de vampirismo. Assim que nos escritos especiais fala-se sempre em vida de alm-tmulo, em comunicao de alm-tmulo; diz-se que somos Espritos encarnados. Um homem que deixa a vida desencarnou, etc. Se fssemos espritas, esforar-nos-amos por fazer desaparecer o que poderia ensombrar uma doutrina cujas principais pretenses so consolar os vivos da perda dos que se foram e fazer-lhes encarar a morte como o fazia a religio de nossos avs, os Gauleses como um despertar cheio de encantos, e a vida futura como um alvo desejvel. Falaremos depois das diferentes espcies de mdiuns.

  • CAPTULO IIIOrigens do Espiritismo

    Como demonstraremos depois, se a palavra Espiritismo de data recente, a doutrina a que ela se aplica, que quer definir em uma palavra, to antiga quanto o mundo. Todavia, em nossa moderna civilizao europia-americana, a apario dos fenmenos espritas, sua classificao, sua determinao metdica datam, por assim dizer, de ontem.

    A histria dessas manifestaes, contada longamente pelos crentes da primeira hora, tem tal perfume sui generis, que pensamos dever cont-la resumidamente.

    Foi em dezembro de 1847, segundo um autor norte-americano,9 que uma famlia de origem alem, a famlia Fox cujo nome primitivo (Voss) havia sido americanizado veio estabelecer-se em um povoado chamado Hydesville. Essa aldeia est situada no condado de Wayne, circunscrio de Arcdia, nos Estados Unidos.10

    A famlia Fox compunha-se do pai e da me, John fox, sua mulher e trs filhas. Se o Espiritismo chegar a ser (como sua pretenso) a religio do futuro, os nomes das duas mais novas meninas Fox ficaro clebres na Histria. Uma, Margarida, tinha 15 anos; a outra, Kate, tinha apenas 12.

    As pessoas que compunham a famlia Fox pertenciam Igreja Episcopal Metodista, da qual eram, diz a Sra. Hardinge, membros exemplares e incapazes de merecerem a suspeita de fraude ou duplicidade.

    Alguns dias depois que se instalaram em sua nova residncia de Hydesville, fatos extraordinrios, cuja intensidade foi crescendo, produziram-se na casa.

    Observamos ainda uma vez que me posiciono aqui como um simples narrador.

  • Ouviram-se, conta a Sra. Emma Hardinge, pancadas nas paredes, no soalho e peas vizinhas, etc. s vezes, estando a famlia reunida para a refeio da noite, fazia-se grande rumor no quarto de dormir das meninas; todos corriam a inteirar-se da causa do barulho; se bem que portas e janelas estivessem hermeticamente fechadas, no encontravam ningum, mas os mveis estavam de pernas para o ar ou misturados uns com os outros! Esses mveis, mesmo em presena da famlia, eram agitados por movimento oscilatrio como se estivessem sacudidos sobre as ondas. Esse fato sucedia principalmente com o leito das meninas. Os Fox viam sua moblia mover-se como se estivesse animada de vida especial; ouviam-se passos no soalho. As meninas sentiam mos invisveis correndo sobre seus corpos; estas mos eram quase sempre frias. Sucedia tambm que as meninas experimentassem a sensao de um grande co a esfregar-se de encontro sua cama.

    Freqentemente, durante a noite, John Fox levantava-se acompanhado da mulher e, seguido das meninas Fox, rodeava sua propriedade, procurando surpreender os vizinhos trocistas, que, segundo pensavam, eram os autores das perturbaes trazidas, noite, por essas desordens que tanto tinham de inslitas como de desagradveis.

    Como j se ter adivinhado, nenhum vestgio se descobria que indicasse a passagem de um ser humano.

    Enfim, em fevereiro de 1848, a vida tornara-se insuportvel na casa habitada pela famlia Fox; seus integrantes passavam as noites sem dormir, e at os dias no eram isentos de perturbao. Durante todo o ms de maro, ouviram-se os mesmos rudos com variao de intensidade, mas a 31 de maro de 1848 elas foram mais fortes do que de costume. Pela centsima vez, John Fox e a Sra. Fox fizeram trancar as portas e janelas, investigando a procedncia dos rumores; mas eis que um fato novo e inteiramente inesperado se revela: ouvem-se sons imitando manifestamente, e como por zombaria, os sons produzidos por portas e janelas, que eram abertas e fechadas! Desta vez havia motivo para perder-se a cabea.

  • A mais nova das meninas, a pequena Kate Fox, vendo que esses rudos no lhe ocasionavam mal algum, acabara por familiarizar-se com eles e como, naturalmente, os atribuam ao diabo, a menina Fox, sentindo-se sem dvida com a conscincia pura, tinha chegado a caoar com o seu autor, a quem ela chamava o Sr. P-de-cabra.

    Uma noite, fazendo estalar os dedos certo nmero de vezes, ela disse ao invisvel barulhento:

    Fazei como eu, Sr. P-de-cabra.E instantaneamente o mesmo rudo foi repetido semelhante a

    outras tantas vezes. A menina fez ainda alguns movimentos com o dedo e o polegar, mas devagarinho, e, com grande surpresa sua, foi dado o nmero de pancadas igual ao nmero de movimentos que ela havia executado silenciosamente.

    Minha me! exclamou ela ateno! ele v e ouve!A Sra. Fox, to maravilhada como sua filha, disse ao

    misterioso companheiro: Conte at dez, e dez pancadas foram ouvidas. Foram feitas muitas perguntas, que tiveram respostas exatas. A pergunta: Sois homem? no teve resposta, mas muitas pancadas claras soaram quando indagaram: Sois esprito?

    Com permisso do invisvel visitante foram chamados os vizinhos, e grande parte da noite passou-se em fazer as mesmas experincias, com os mesmos resultados.

    Tal a origem, o ponto de partida do moderno Espiritualismo, a primeira comunicao diz Eugne Nus, em uma obra da qual teremos ocasio de falar mais de uma vez estabelecida por uma menina de doze anos com esse fenmeno que devia em breve invadir a Amrica e a Europa, negado pela Cincia, explorado por charlates, ridiculizado pelos jornais, anatematizado pelas religies, condenado pela justia, tendo contra si todo o mundo oficial, mas por si esta fora mais poderosa do que tudo: o atrativo do maravilhoso. 11

    Assim, acabou-se por verificar que esses rudos eram produzidos por um agente invisvel e que esse agente se dava por um Esprito. Restava descobrir o meio de comunicar com tal

  • Esprito; mas isso no tardou, e como se as bases do Espiritismo devessem simultaneamente estabelecer-se, dentro de poucos dias foram descobertas a mediunidade e o meio de comunicao entre este mundo material e o mundo espiritual, com o auxlio do spiritual telegraph, isto , por meio dos rappings, ou pancadas, indicando as letras do alfabeto.

    A descoberta da mediunidade resultou do fato de observar-se que os exerccios dos Espritos executavam-se mais freqentemente em presena das Srtas. Fox e principalmente por meio da mais moa: Kate Fox.

    Os modernos espiritualistas acharo talvez que contamos, num tom menos respeitoso do que eles desejariam, esta curta histria do comeo de sua f, mas no devem esquecer-se de que no partilhamos ainda as crenas que lhes so caras. contamos imparcialmente os fatos que encontramos consignados, sem comentrio, do mesmo modo que exporemos sem discusso os que observamos, tendo o cuidado, todavia, de indicar minuciosamente as precaues, igualmente pouco respeitosas, de que cercamos cada uma de nossas experincias, como era nosso dever.

    Voltemos histria da famlia Fox. Segundo a Sra. Hardinge, verificou-se que, graas a certas foras magnticas, alguns indivduos possuam o poder de mdiuns, o qual era recusado ao comum dos mortais, e que esse poder, ou antes essa fora especial, diferia extremamente segundo os indivduos que a possuam, e que era muito sensvel s diversas emoes morais que a fazem variar de intensidade em um mesmo indivduo. Resultaria tambm das observaes feitas desde os primeiros momentos, por meio das comunicaes ou mensagens, que esse movimento esprita, isto , a inaugurao dessas comunicaes entre os habitantes dos dois mundos, foi preparado por Espritos cientficos e filosficos que, durante sua existncia sobre a Terra, se haviam ocupado especialmente de pesquisas sobre a eletricidade e sobre diversos outros fluidos imponderveis. testa desses Espritos achava-se Benjamim Franklin, que freqentemente, dizem, deu instrues para explicar o fenmeno, e indicou a maneira de aperfeioar, de

  • desenvolver as vias de comunicao entre os vivos e os mortos. Numerosos Espritos, tanto para dar uma nova demonstrao do fenmeno como atrados por afeies de famlia, dizem, vieram trazer provas irrefutveis de sua identidade, anunciar que continuavam a viver, mas sob outra forma, que amavam sempre e que, da esfera mais feliz onde estavam colocados, velavam pelos que choravam sua morte, desempenhando, por alguma forma, junto deles, o papel de anjos de guarda.

    Os crculos, os harmoniosos meetings, recomendados pelos Espritos, constituram-se depressa e numerosos mdiuns revelaram-se. As prticas espritas espalharam-se como um rastilho de plvora; mas no faltaram desgostos e nem tudo foi felicidade nas famlias dos mdiuns. No raramente os spiritual circles eram invadidos por fanticos de diferentes seitas, e cenas selvagens acompanharam essas irrupes, nas quais houve a deplorar violncias, grosserias e absurdos de toda espcie.

    Foi uma confuso indescritvel; uns anunciavam que o movimento indicava a volta prxima do Messias, que o millenium havia chegado, e que o fim deste mundo perverso estava prximo, etc.

    Naturalmente, os diferentes cleros das mil e tantas seitas ocuparam-se da questo; os padres catlicos, julgando-se os mais fortes, confiantes e com grandes reforos de hissopes, vieram exorcizar os Espritos e as mesas caprizantes. Mas as mesas possessas faziam coro e respondiam amm s oraes exorcistas. O efeito era nulo: a gua benta da Idade Mdia havia-se deteriorado!

    A famlia Fox, que no quis submeter-se e que se considerava encarregada da misso de espalhar o conhecimento desses fenmenos, foi expulsa da Igreja Episcopal Metodista. Ela refugiou-se em Rochester 12 por causa da perseguio do Esprito batedor, que continuava, com menos sem-cerimnia ainda, a perturbar o seu lar. Mas em Rochester, cuja populao carola como a de todas as cidades da Amrica reparte-se em multido de seitas, houve perseguies de outro gnero e, desta vez, devidas maldade dos vivos. O povo amotinou-se contra os Fox; estes se ofereceram para dar uma prova pblica dos fenmenos

  • em presena da populao de Rochester reunida na maior sala da cidade, em Corynthian Hall. A primeira conferncia esprita foi recebida com vaias e assobios; no obstante, depois de um desses tumultos que parecem ser o apangio das reunies pblicas anarquistas, nomearam uma comisso. Aps o mais minucioso exame, contra a geral expectativa, contra sua prpria expectativa, a comisso concluiu pela realidade dos fenmenos anunciados. Mal satisfeitos, os cidados de Rochester elegeram segunda comisso, que foi mais rigorosa ainda do que a precedente. Os mdiuns, isto , as meninas Fox, foram revistadas e at despidas por comissrios femininos: segundo relatrio, ainda mais favorvel do que o precedente.

    A indicao dos habitantes de Rochester exacerbara-se e, por insistncia, uma terceira comisso foi nomeada, compondo-se de pessoas das mais incrdulas e escarnecedoras. As investigaes foram ainda mais ultrajantes para as pobres mocinhas; mas, humilhada, a comisso foi obrigada a proclamar que Rochester no tinha razo. A exasperao dos populares era indescritvel; falava-se de linchar mdiuns e comissrios e, quando a leitura do relatrio da comisso foi feita sobre o estrado do Corynthian Hall, a famlia Fox, seus amigos e os comissrios s deveram a sua salvao, segundo a Sra. Hardinge, interferncia de um qualquer, chamado George Willets, que, em razo do carter pacfico de sua religio, tinha nessas circunstncias dramticas uma autoridade particular. O qualquer George Willets postou-se arrogantemente no alto do estrado, em frente da multido que o ia invadir, e declarou que a quadrilha de bandidos que queria linchar as duas raparigas s o conseguiria passando sobre o cadver dele!

    Pouco faltou para que o Espiritismo, em seu comeo, contasse por mrtires os seus primeiros apstolos.

    Seja qual for a opinio professada nesta matria, o espetculo dessas mocinhas, quase sofrendo o martrio dessa multido exasperada por algumas pancadas e movimentos inexplicveis de uma mesa, provoca a comoo. Alm do interesse apresentado pelo fato, sob o ponto de vista da histria do Espiritismo,

  • pareceu-nos que havia ali um documento humano, como se diz hoje, merecendo as honras de uma meno especial.

    Como natural, a curiosidade, o atrativo do maravilhoso tambm concorrendo, todos quiseram ver; a populao, na Amrica do Norte, interessou-se pela nova doutrina, parte no intuito de combat-la, parte no de sustent-la. Enquanto os homens srios e particularmente os sbios de todas as ordens no se pronunciavam, muita gente, que no sabe ter opinio por si mesma, manteve-se reservada. Mas desde o dia em que a discusso atingiu as alturas de um debate cientfico, a questo mudou de aspecto e pode-se dizer que imediatamente a Amrica do Norte se achou literalmente submersa pelas ondas do Espiritismo.

    Primeiramente, o juiz Edmonds 13 publicou um trabalho sobre investigaes que ele empreendera com idia de demonstrar a falsidade dos fenmenos espritas. O resultado final foi diametralmente oposto ao que o autor primitivamente se propusera.

    Em seguida, o sbio Mapes, professor de Qumica na Universidade, depois de repelir desdenhosamente as coisas, foi obrigado a convir que elas nada tinham de comum com o acaso, a fraude ou a iluso.

    Chegou a vez do Dr. Hare, professor da Universidade de Pensilvnia, que publicou uma obra cuja repercusso foi considervel.14

    Robert Hare instituiu uma srie de experincias muito engenhosas, demonstrando que em ausncia de toda a presso efetiva, s por aposio dos dedos de um mdium, o instrumento com o qual o professor experimentava acusava um aumento de peso de muitas libras. Assim, como veremos mais tarde, o professor Crookes, de Londres, repetiu essas experincias e reconheceu-lhes rigorosa exatido!

    Um sbio e original escritor, portador de nome bem conhecido dos que se ocupam da questo social, Robert Dale Owen, filho do famoso Robert Owen, da Inglaterra, publicou um livro sobre o mesmo assunto, onde se encontra grande

  • quantidade de fatos realmente muito curiosos, para no empregar a expresso de extraordinrios.15 Mas essa obra de data quase recente e foi escrita em momento em que relativa calma se produzira nos espritos. mister recuar-se mais para ter um resumo das propores que atingiu a agitao provocada nos primeiros tempos pela questo do moderno Espiritualismo na livre Amrica.

    De 1850 a 1860, s se falava nisso em toda parte; as sociedades sbias examinavam, os clrigos discutiam, os homens de letras, os advogados, todo o mundo, em uma palavra, agitava-se e... injuriava-se. Foi a coisa a tal ponto que o Conselho Legislativo do Alabama, para lanar um pouco de gua fria sobre a efervescncia epidmica que se apoderara dos crebros norte-americanos, votou uma resoluo (bill) decretando que toda pessoa disposta a entregar-se s manifestaes espiritualistas seria condenada a pagar uma multa de 500 dlares. No lembra isto o famoso

    De part le Roy defense DieuDe faire miracle en ce lieu! *

    * (Por ordem do rei, fica Deus proibido de fazer milagres neste lugar.)

    dos convulsionrios de Saint-Medard?Pena foi que o governador tivesse recusado sancionar a lei

    adotada pela legislatura do Alabama; este marco falta-nos para indicar a grande excitao que assinalou a histria do moderno Espiritualismo, em 1860. Enfim, j bonito ver-se uma assemblia eleita, composta de homens graves, ditando uma medida calcada em um draconismo to cmico.

    Se quisssemos acompanhar o Espiritismo, desde 1860 at a hora atual, entraramos em seguida na exposio das pesquisas que foram feitas sobre esta matria por diferentes sbios, mas prometemos demonstrar que o Espiritismo velho como o mundo; devemos, pois, retrogradando, fazer a nossa demonstrao; isto nos levar provavelmente a provar ligeiramente que o mundo muito mais velho do que geralmente se pensa.

  • CAPTULO IVO Espiritismo entre os ndios daAmrica. A Cabala hebraica

    1

    A maior parte dos autores que escreveram em defesa do Espiritismo sempre referiram antigas lendas de casas mal-assombradas, de aparies, de vises, etc., a fim de mostrarem que as aparies a que eles chamavam Espritos verificaram-se em todos os tempos. Isso provaria, segundo esses escritores, que as relaes entre os vivos e os mortos so bem autnticas, porque foram verificadas e notadas em pocas nas quais se ignorava at o nome de Espiritismo.

    No sabemos se esse argumento possui algum valor para certas pessoas; quanto a ns, s aceitamos essas narrativas como documentos de expectativa e no cremos que a maior parte delas possa ser invocada a ttulo de provas incontestveis da existncia da alma humana.

    Seja como for, para tirar deste trabalho o que poderia ele apresentar de demasiado rido, caso se limitasse a expor fatos puramente experimentais, pensamos que o leitor no levar a mal mencionarmos algumas dessas narraes, que damos a ttulo de curiosidade.

    J que assistimos ao nascimento do Espiritismo na Amrica do Norte, no deixaremos esse pas sem fazermos uma curta excurso entre os nativos do Novo Mundo. Veremos que os mdiuns so notavelmente encontrados entre os peles-vermelhas, que representam, talvez, segundo dados recentes sobre a histria do planeta Terra, os restos de uma antiqssima raa outrora preponderante sobre o nosso globo.

    Seria a vizinhana dos peles-vermelhas que determinou a apario dos fenmenos aos quais nos referimos acima? uma causa que nos parece ocioso investigar.

  • Compilamos da interessante obra de Eugne Nus os seguintes excertos.16

    Eis, em primeiro lugar, a histria escrita por um tal Alexandre Henri, feito prisioneiro pelos ndios, nas guerras de 1759. Sir William Johnson dirigira uma mensagem aos peles-vermelhas convidando seus chefes, instalados no salto Santa Maria, para que viessem concluir a paz no forte do Nigara.

    Era uma coisa de grandssima importncia para ser abandonada deciso da simples sabedoria humana. Fizeram-se, pois, os preparativos necessrios para ser evocada solenemente e consultada a Gr-Tartaruga. Comearam por construir uma grande casa ou wigwam, no interior da qual foi colocada uma espcie de barraca, para uso do sacerdote e recepo do Esprito. Essa barraca, com quatro ps de dimetro, era feita de peles de alce cobrindo um madeiramento construdo com esteios enterrados a dois ps de profundidade, com dez ps de altura, oito polegadas de espessura, e fortemente ligados por travessas. As peles estavam solidamente ajustadas em torno desse madeiramento por correias, exceto de um lado onde foi deixada uma pequena abertura pela qual o padre devia entrar.

    Com pouca demora chegou o padre em estado de completa nudez. Aproximou-se da barraca, na qual se introduziu arrastando-se sobre suas mos e seus joelhos. Mal sua cabea havia penetrado na abertura, o madeiramento macio e slido, como j o descrevi, comeou a ser sacudido; e a pele pendente porta ainda no tornara a descer quando sussurros de vozes numerosas foram ouvidas na barraca, umas dando gritos selvagens, outras ladrando como ces, outras uivando como lobos.

    A esse horrvel concerto misturavam-se lamentaes, soluos como de desespero, de angstia e de dor aguda. Palavras eram tambm articuladas como que saindo de bocas humanas, mas em lngua desconhecida de todo o auditrio.

  • Depois de algum tempo, um silncio mortal sucedeu a esse tumulto confuso e horrvel. Em seguida, uma voz, que no tinha sido ainda ouvida, indicou a chegada de novo fenmeno na barraca. Era uma voz fraca e baixa, semelhante ao grito de um cozinho. Mal foi ouvida esta voz, quando todos os ndios bateram palmas de jbilo, gritando que era o chefe dos Espritos, a Tartaruga, o Esprito que nunca mentia. Eles haviam pateado anteriormente as outras vozes que eram ouvidas de tempos a tempos, reconhecendo-as como pertencentes aos Espritos maus e mentirosos que enganam os homens. Novos sons vieram da barraca. Durante o espao de hora e meia, uma sucesso de rudos foram ouvidos, no meio dos quais vozes diversas se escutavam.

    Desde que o padre entrara na barraca, at que todos esses rumores cessaram, sua voz no se fizera ouvir. Mas ento ele se dirigiu multido anunciando a presena da Gr-Tartaruga e o consentimento do Esprito em responder a todas as perguntas que lhe fossem feitas. As perguntas foram dirigidas pelo chefe da povoao, que previamente passou, pela abertura da barraca, uma grande quantidade de tabaco. Era um sacrifcio oferecido ao Esprito, porque os indgenas imaginam que os Espritos gostam tanto de tabaco como eles. Sendo aceito o tabaco, ele pediu ao padre que perguntasse se os ingleses se preparavam ou no para fazer a guerra aos ndios e se havia no Forte do Nigara grande quantidade de uniformes vermelhos.

    Apenas estas perguntas foram feitas pelo padre, a barraca foi imediatamente sacudida e, alguns minutos depois, ela continuou a agitar-se to violentamente que eu esperava v-la desabar a qualquer momento.

    Eu pensava que era o preldio da resposta; mas um grito terrvel anunciou claramente que a Gr-Tartaruga acabava de partir. Um quarto de hora decorreu em silncio, e eu estava impaciente para ver qual seria o novo incidente desta cena. Foi a volta do Esprito, cuja voz se fez de novo ouvir, e que ento pronunciou um grande discurso. A linguagem da Tartaruga, semelhante que j havamos escutado, era

  • ininteligvel para todos, exceto para o padre. S quando o Esprito acabou de falar e o padre nos traduziu sua narrativa, foi que achamos o sentido dessa extraordinria comunicao. O Esprito, como no-lo informou o padre, tinha, durante sua ausncia, transposto o lago Huron, ido ao forte do Nigara, e dali a Montreal. No Forte do Nigara no havia visto muitos soldados; mas, descendo o So Loureno at Montreal, tinha visto o rio guarnecido de embarcaes cheias de soldados, to numerosos como as folhas das rvores. Ele encontrara-os navegando pelo rio para virem combater os ndios. O chefe perguntou ento se, no caso em que os ndios fossem visitar Sir William Johnson, este os receberia como amigos. O Esprito respondeu, sempre de acordo com a interpretao do padre, que Sir William Johnson encheria suas canoas de presentes: cobertores, panelas, espingardas, plvora, balas e grandes pipas de rum, em tanta quantidade quanto coubesse nas canoas, e que todos voltariam em segurana para a povoao.

    Ento o transporte foi universal e, no meio de palmas, cada qual exclamou: Eu irei, eu irei tambm!

    Estive atento, durante toda a cena que descrevi, em observar as conivncias que pudessem ter ocorrido, mas foi-me impossvel descobrir alguma.

    O resultado da expedio, contada na histria de Drake, confirma inteiramente as promessas feitas pelo Esprito que nunca havia mentido.

    Na Histria da Nova-Frana, de Charlevoix, encontra-se, feita por de Champlin, a descrio de uma cena igual ocorrida entre os algonquinos e os hures.

    Eis ainda outra narrao mais moderna, que copiamos da mesma obra; tirada de uma carta escrita pelo Sr. Larrabe, presidente do Tribunal de Wisconsin, ao Governador Tallmadge.

    Conversei a semana passada com L. John du Bay, que conheo um pouco. Passou toda a sua vida no meio dos ndios e foi, durante muitos anos, agente da Companhia Americana de Peles. Contou-me muitos fatos provando que

  • as comunicaes com os habitantes do outro mundo so muito comuns entre os ndios. Disse-me que, em diferentes ocasies, viu um mdico ndio construir trs choas, enterrando esteios que eram cobertos de peles de cervo formando pequenas barracas que s podiam conter uma pessoa sentada. Essas barracas eram dispostas a cerca de dois ps de distncia uma da outra. Em uma, o mdico colocava seu calado (mocassins), em outra suas perneiras, e postava-se na do meio. Ento, todo ndio que queria conversar com um bravo defunto fazia perguntas. Logo as barracas comeavam a oscilar como se fossem sacudidas por algum colocado no interior, e ouviam-se vozes saindo de uma e de outra, e s vezes das trs ao mesmo tempo.

    Esses sons s eram inteligveis para o mdico, que se encarregava de traduzi-los. Du Bay diz que segurou essas barracas muito freqentemente e empregou toda a sua fora para deter-lhes o movimento, mas debalde; levantou ento as peles, e certificou-se de no existir ningum em seu interior.

    Du Bay contou-me tambm alguns exemplos do poder da segunda vista desses mdicos. H alguns anos, ele chegara a uma feitoria sobre as cachoeiras do Wisconsin. Esperava ali outro negociante, que devia chegar de um ponto mais setentrional, sobre o lago Superior. Esperava em vo havia alguns dias, quando o mdico se props anunciar-lhe o instante em que seu amigo chegaria. A proposta foi aceita com incredulidade. O mdico sentou-se na relva e tapou a cabea com uma coberta. Passados alguns minutos, ergueu-se e disse:

    Amanh as nuvens cobriro o cu; mas, quando o Sol estiver a tempo de desaparecer no poente, vereis um espao claro e nesse espao o sol. Ento, se olhardes ao longe, para a ponta de terra sobre a outra banda dos lagos, vereis chegar o vosso amigo.

    No dia seguinte, como havia sido predito, o cu esteve nublado at o pr do Sol; depois, as nuvens dissiparam-se e o Sol se mostrou. Du Bay olhou para o ponto indicado, mas

  • no viu chegar o negociante. Voltou-se para o mdico vermelho e comeou a gracejar. Este respondeu somente:

    Vou ver.Ento, sentando-se como na vspera, um momento e

    levantando-se disse: Em cinco minutos o avistareis.Ao fim desse tempo, disse du Bay, o negociante aparecia e

    chegava ao lugar...

    Segundo o Dr. Fizgibbon, ltimo governador de Bay Island, muitos indgenas so naturalmente mdiuns e por esse motivo obtm resultados mais poderosos e mais extraordinrios que qualquer mdium branco. Os Espritos que se manifestam por seu intermdio do-se uns por hispano-americanos, outros pretendem pertencer a raas mais antigas que construram as cidades, cujas runas maravilhosas so encontradas sob o solo das chamadas florestas virgens da Amrica. Outros Espritos, segundo os mdiuns vermelhos, que lhe traduzem o idioma desconhecido, dizem-se ainda mais antigos e inculcam-se fencios, japoneses, trtaros e rabes chegados em diferentes pocas, por tribos, em um tempo em que, no existindo o estreito de Bhring, a Amrica e a sia formavam um s continente.

    Por que, perguntar-nos-o, introduzis em uma obra sria e que pretende ser de qualidade cientfica, contos azuis como esses? Em parte j respondemos a esta objeo: s citamos esses contos a ttulo de curiosidade o que no significa duvidarmos de modo algum da boa f dos que os escreveram ou a ttulo de documentos de expectativa.

    Mas, deixemos a Amrica e sigamos para outras plagas.

    2

    Temos hoje a prova de que entre os antigos hebreus o texto vulgar dos livros da Lei, cuja leitura Moiss recomenda a todos, a Gnesis, bem como as outras partes do Pentateuco no eram consideradas pelos iniciados do Templo e das sinagogas como a manifestao completa da Verdade. Alguns homens, fazendo

  • parte do que se chamava a Cabala, possuam uma gnesis para seu uso, assim como sua teologia e sua filosofia, que o vulgo devia ignorar. Se os documentos que temos sobre a Cabala so muito incompletos, isso devido ao modo de iniciao, que se fazia sombra dos tabernculos e consistia quase unicamente em um ensino oral. provvel que tenha sucedido o mesmo com a maior parte das iniciaes: cada religio tinha seu esoterismo, no qual somente os padres eram iniciados sob a f de juramento terribilssimo. Lembra-te, meu filho diziam os bramas hindus ao nefito , de que s existe um Deus, senhor soberano e princpio de todas as coisas, e que todo brama deve adorar em segredo. Mas saiba tambm que um mistrio que no deve jamais ser revelado ao estpido vulgo. Se o fizesses, suceder-te-iam grandes desgraas. 17

    A quintessncia da doutrina, ou hermetismo, era reservada para um nmero limitado de iniciados.

    3

    Os que consideram a Bblia como a palavra de Deus no devem opor nenhuma dificuldade em admitir as aparies dos mortos: a narrativa da evocao da sombra de Samuel diante de Saul, pela pitonisa do Endor, fora-os a isso. Quanto a ns, que s temos por objetivo os fatos, consignamos que a pretendida comunicao dos vivos com os mortos e as prticas para a provocarem eram de conhecimento vulgar entre os hebreus, que certamente as receberam dos egpcios.

    Mas o fato curioso que essa espcie de necromancia foi, de alguma sorte, uma das bases da doutrina cabalstica, como o provam os raros escritos que chegaram at ns sobre essa teocosmogonia secreta. Eis um extrato das lendas cabalsticas, onde a prtica das evocaes se acha demonstrada:

    Um dia, nosso mestre Jochanan ben Zachai foi viajar, montado em um burro e acompanhado pelo rabi Eleazar ben Aroch. Ento, este pediu que lhe ensinasse um captulo da Mercaba.18

  • No vos disse respondeu o mestre que proibido explicar a Mercaba a uma s pessoa, a menos que a sua sabedoria e a sua prpria inteligncia dispensem auxlio estranho?

    Ao menos replicou Eleazar seja-me permitido repetir diante de ti o que me ensinaste desta cincia.

    Pois bem! fala respondeu ainda o mestre.Dizendo isto, apeou-se, cobriu a cabea e sentou-se numa

    pedra, sombra de uma oliveira... Apenas Eleazar, filho dAroch, comeou a falar da Mercaba, um fogo baixou do cu, envolvendo todas as rvores do campo, que pareciam cantar hinos, e do meio do fogo ouvia-se um Esprito exprimir sua alegria por escutar esses mistrios.

    O cu cobriu-se subitamente de espessas nuvens, um meteoro muito parecido com o arco-ris brilhou no horizonte, e viram-se os Espritos chegando para ouvi-los (os que recitavam um captulo da Mercaba), como curiosos que se apertam passagem de um noivado. 19

    Os Espritos, as almas dos justos diz o Zohar, obra cabalstica , povoam os espaos infinitos.

    As descobertas modernas trouxeram-nos conhecimentos muito preciosos sobre a antiga civilizao egpcia e sobre a doutrina esotrica dos sacerdotes de sis. Mas, como estes ltimos procedem evidentemente da ndia, podemos afirmar, sem temor de cometer um erro grave, que os mistrios de sis deviam divergir pouco dos mistrios dos templos em que Brama era adorado, muitos milhares de anos antes que os vales do Nilo e as plancies de Mnfis houvessem sido submetidas s primeiras dinastias dos Faras.

    Aplicar-nos-emos, pois, principalmente, em procurar na ndia a origem das prticas espiritualistas. Esse estudo far o objeto do captulo que se segue; mas, antes de terminar, lembraremos incidentemente que o uso de fazer girar diversos objetos: mesas, vasos e, principalmente, as joeiras era conhecido dos gregos. Alguns escritores satricos, como Tecrito, Luciano, etc., zombaram dessas prticas supersticiosas.

  • CAPTULO VUma palavra sobre a ndia

    Os tempos esto prximos.

    1

    No hesitamos em afirm-lo bem alto: no partilhamos as idias da escola esprita e repelimos como prematura e insuficientemente demonstrada a teoria da interveno da alma dos antepassados nos fenmenos determinados por meio de certos indivduos, a que chamaremos mdiuns, conformando-nos com o hbito e em falta de melhor nome. Mas afirmamos ainda uma vez e provaremos que existe uma categoria inteira de fenmenos aparentemente contrrios s leis conhecidas da Natureza, inexplicveis presentemente: o que no quer dizer que devamos renunciar a procurar a explicao deles. Faamos observar ainda que a famlia Fox, da Igreja Episcopal Metodista, provavelmente nunca ouvira falar da religio de Brama salvo de seu simbolismo trivial e que no obstante a Doutrina Esprita moderna, que pouco variou em suas crenas da primeira hora, acha-se quase completamente de acordo com a religio esotrica atual dos brmanes. Ora, esta j era ensinada aos iniciados dos graus inferiores nos templos do Himalaia, h talvez mais de cem mil anos! A semelhana pelo menos curiosa e pode-se dizer, sem cair em paradoxo, que o Espiritismo o Bramanismo esotrico ao ar livre. Mas no se segue que dessa comparao se deva tirar argumento pr ou contra as doutrinas do moderno Espiritualismo. Sem fornecer esse argumento, o fato no menos interessante.

    A ndia dar-nos- sem dvida a chave dos mistrios que nos enchem de inquietao; dir-nos- um dia quais so os frutos dessa rvore, da qual um rebento inesperado surgiu no solo americano para lanar seus germens por todos os ventos das terras civilizadas, como um desafio Cincia que faz o orgulho

  • dos homens modernos. Essa rvore ser a da cincia do bem ou do mal? da vida ou da morte?

    Quem o sabe? Daqui a pouco tempo o escol de tudo quanto se ocupa de cincia buscar talvez nas experincias psquicas os derradeiros mistrios da Fisiologia transcendente. Naturalmente, no sero os velhos que serviro de instrumento a esse movimento, mas os novos de amanh, os do futuro, aqueles cujas arterolas cerebrais no estiverem ainda incrustadas pelo ateroma dos conhecimentos adquiridos e pelas teorias filosficas oficiais. Ns, os moos de hoje, estamos sem dvida velhos demais. E nem excetuamos os da escola positivista, cujo chefe era a negao do Positivismo quando tratava de absurdos e repelia como impossveis fatos que ele no tinha examinado. Estamos sem dvida velhos demais, repetimo-lo ainda, porque recebemos uma deplorvel educao. Estamos impregnados de idias medievais; estamos saturados de histria baseada sobre o esoterismo bblico, e que s tem de histria o nome. Mas pacincia! brevemente saberemos bastante da verdade para reconhecermos o erro, e quando a evidncia nos cegar com a intensidade de suas luzes, seremos obrigados a render-nos discricionariamente. Ento, jogaremos de parte as velharias, as doutrinas caducas, para bebermos sequiosamente na fonte da Verdade!

    Feliz mocidade! feliz infncia! mais felizes os que ainda no nasceram: eles sabero! Suas inteligncias no sero obscurecidas pelos erros que se infiltraram em nossas veias, ao mesmo tempo que os sucos do leite materno. Podemos, pois, diz-lo com toda a segurana, porque sabemos que os fatos no nos desmentiro: Os tempos esto prximos.

    Brevemente a luz brilhar como um globo em fuso, projetando em toda parte os seus raios deslumbrantes, em feixes incandescentes. E no do Norte que ela nos h de vir, mas sim do Oriente, bero do gnero humano e guarda natural de seus conhecimentos. Foi ali que as diferentes raas, que alternadamente predominaram sobre a esfera terrestre, tornaram a encontrar, aps muitos mil anos de recomeo e de barbrie, a

  • histria da Humanidade, o fio cem vezes interrompido da Cincia imortal.

    Que sbios somos ns! Andamos muito orgulhosos das nossas descobertas dos ltimos sculos. E de fato, estamos justificados por esse orgulho, mas em muitos casos s fizemos descobrir pela segunda vez! Sejamos mais modestos e faamos justia aos nossos avs.

    Em vossos futuros livros, senhores autores clssicos, ao tratarem da histria do mundo, por favor no o faais recomear h seis mil anos. Os vossos jovens leitores sorririam de compaixo ao lerem as vossas obras, porque gritar-lhe-emos bem alto o que a ndia nos ensina todos os dias, a saber: que sem dvida nunca chegaremos a conhecer a poca em que o homem comeou a viver em sociedade sobre a Terra, to longe se perde essa poca na noite dos tempos.

    Ademais, acaso j no sabemos que os vestgios do homem e de sua indstria se encontram no que se chama provisoriamente as camadas geolgicas do perodo, ou antes, dos perodos glaciais? Mesmo muito recentemente, no foram esses vestgios encontrados, at em depsitos de uma das camadas do perodo tercirio? E no indica isso que os indivduos, cujos vestgios encontramos assim, viveram em tempos to remotos que a imaginao mal pode figur-los e fica assombrada?

    Mas para que escavar to profundamente o seio de nossa me comum? Para arrancar os segredos daqueles de seus filhos que ela ali conserva adormecidos h muitos milhares de sculos, ninando, com um balano imenso, seu sono eterno no espao infinito! Esse balano gigantesco,20 que gasta 25.000 anos para completar-se, acaso no intervm nos cataclismos peridicos de que nos falam os livros hindus? Ser verdade que durante esses 25.000 anos o Sol alumie alternadamente os continentes e o oceano sobre o mesmo hemisfrio? Ser verdade que dentro de alguns sculos as guas, arrastando massas enormes de gelo, trazidas dos mares austrais, varrero as nossas obras penosamente erguidas e cobrir-nos-o durante muitas centenas de sculos? Que pensaro a respeito dos nossos crnios fsseis os gelogos e antroplogos sbios das academias do sculo 320

  • de nossa era, se escavarem a turfeira sob a qual ser sepultada o que tiver sido a Europa atual, quando as guas houverem abandonado de novo o nosso hemisfrio boreal? Oh! questes que fazem enlouquecer!

    Voltemos, pois, ndia; por seu intermdio que poderemos ver claro sobre a estrada onde est penando a nossa raa. Estamos longe de saber tudo; os sacerdotes de Brama guardam severamente seus tesouros cientficos. Seus templos regurgitam de riquezas inestimveis, mais incomparveis, parece, a outras que esto cuidadosamente ocultas em certos santurios subterrneos da sia, situada fora do alcance peridico dos flagelos diluvianos, nas raras altitudes em que no se encontram mais as conchas calcificadas, indcios de submerso anterior.

    Em toda parte esto sendo traduzidos e estudados os livros snscritos que o acaso ou as investigaes pacientes pem nossa disposio; os nossos vizinhos do outro lado da Mancha instituram, para esse fim, escolas especiais. Uma Sociedade que se incumbiu de espalhar pelo mundo inteiro as doutrinas altamente altrusticas de Buda e as literaturas da ndia formou-se h poucos anos e j se contam por centenas as suas ramificaes e publicaes. Essa Sociedade, que tomou o ttulo de Sociedade Teosfica, possui grande nmero de filiados divididos em lojas repartidas desigualmente pela ndia, Europa, Amrica e Austrlia. Existe uma loja em Paris. A sede principal da Sociedade Teosfica na ndia, em Adiar, onde ela possui um estabelecimento importante, com uma biblioteca muito rica, salas de reunio, etc. Os teosofistas, como se intitulam os membros dessa Sociedade, dizem receber as suas instrues de uma confraria ou fraternidade de homens extraordinrios, espcie de taumaturgos que vivem nas solides do Tibet. De modo contrrio aos propagandistas de religio, eles no se dirigem s multides, mas aos homens mais distintos das naes. Ademais, no admitem nenhum dogma; procuram, dizem eles, e ensinam a verdade que, segundo sua divisa, est acima de todas as religies.

    No queremos avanar coisa alguma que no possamos provar. Falando da antiguidade da ndia, resta-nos fornecer as

  • provas que a estabelecem. Para dar idia da antiguidade da cincia hindu, recordemos primeiro a opinio de um autor clerical que no brilha, entretanto, pelo seu amor ao povo hindu. Esse autor no deixou de adaptar os clculos astronmicos s exigncias da Gnesis bblica, segundo o mtodo predileto de seu mulo Loriquet:

    Os hindus diz o padre Guerin 21 aplicavam a lgebra Geometria; discutiam em suas escolas a questo do movimento da Terra, proveniente da rotao diurna sobre seu eixo no meio do espao; discorriam a respeito da queda dos corpos pesados e comparavam a Terra a um m; calculavam os senos, os co-senos e organizavam tbuas deles; faziam, como coisa ordinria e simples, a soma do quadrado de cada um dos lados de um ngulo reto em um tringulo igual ao quadrado da hipotenusa!

    Diodoro da Siclia, o historiador grego do sculo de Augusto, citado por Amiano Marcelino,22 afirma que os caldeus aprenderam a Astronomia com os sbios da ndia. E, segundo Eusbio,23 os etopes, de quem os egpcios aprenderam o que sabiam, no eram porventura uma colnia de hindus? Mas, sobre esse ponto ainda, possvel que a cincia moderna, iluminada pela ndia, venha a modificar os escritos dos historiadores gregos.

    Encontram-se a esse respeito todos os desenvolvimentos desejveis no excelente livrinho do engenheiro Tremeschini,24 a quem tomamos uma parte do que nesta obra se refere astronomia hindu.

    Um dos mais antigos livros da li