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1 7. ESTRUTURAÇÃO DO ESTADO NO BRASIL: A CONSTRUÇÃO DA REPÚBLICA, DA DEMOCRACIA, DA FEDERAÇÃO, DOS APARELHOS DE ESTADO E DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA FEDERAL. A construção do Estado brasileiro tem como marco inicial o ano de 1808, com a transferência da família real portuguesa para o Brasil, que se deu de forma confusa.Em primeiro lugar, a própria escolha das cinco, 10 ou 15 mil pessoas os números são imprecisos que comporiam a lotação dos navios, diz alguma coisa sobre as instituições e espaços de poder que estavam sendo transplantados. Em segundo lugar, a seleção dos bens que era possível carregar, além dos tesouros e objetos de indiscutível valor, contemplava material, livros, papéis, artefatos, instrumentos e símbolos necessários à administração. Em terceiro lugar, a instituição de um simulacro de governo em solo europeu, que se deu na forma de uma regência, logo destituída pelo ocupante. O fato é que a transferência da corte e mais tarde a elevação do Brasil a parte integrante do Reino Unido de Portugal constituíram as bases do Estado brasileiro, com todo o aparato necessário àafirmação da soberania e ao funcionamento do autogoverno. Mas o Estado que se forma apresenta importante especificidade: a herança patrimonialista. Em Os donos do poder, Faoro defende a tese segundo a qual durante seis séculos de história a estrutura política e social herdada de Portugal resistiu a mudanças fundamentais, permanecendo altamente centralizadora e patrimonial. O que o Brasil e a América espanhola têm em comum é o fato de terem sido colonizados por países onde não existiam questionamentos bem-sucedidos a suas estruturas de poder. O sistema colonial desses países levou-os a considerar suas colônias como negócios a serem explorados. ―... à época da descoberta, Portugal já não vivia em regime feudal: o rei é um ―autêntico capitalista‖, seus vassalos chegam ao Novo Mundo com o desejo de enriquecer. Os poderes que lhes são delegados têm apenas o objetivo de assegurar-lhes lucros. Apenas a forma jurídica dessa concessão assemelha-se às instituições feudais. Seu conteúdo, em compensação, é exclusivamente capitalista.‖(TOPALOV, 1978, p. 14, citado por RAPOSO, 2008a, p. 66.Corporativismo no Brasil, 1930-1945. Consultado em http://www.maxwell.lambda.ele.puc-rio.br/16279/16279_4.PDF p.35) Esta estrutura se caracterizava pela ausência de um sistema contratual entre o Estado e a sociedade. ―Patrimonial e não feudal o mundo português, cujos ecos soam no mundo brasileiro atual, as relações entre o homem e o poder são de outra feição, bem como de outra índole a natureza da ordem econômica, ainda hoje persistente, obstinadamente persistente.Na sua falta, o soberano e o súdito não se sentem vinculados à noção de relações contratuais, que ditam limites ao príncipe e, no outro lado, asseguram o direito de resistência, se ultrapassadas as fronteiras de comando.(FAORO, 1998, p. 17-18 inCorporativismo no Brasil, 1930-1945http://www.maxwell.lambda.ele.puc-rio.br/16279/16279_4.PDF ) Para compreender o patrimonialismo, é preciso primeiro compreender a sua base, isto é, a dominação tradicional. Weber denomina dominação tradicional aquela cuja legitimidade ―descansa na santidade de ordenações e poderes de mando herdados de tempos imemoriais...é assim porque sempre foi assim‖.5 No patrimonialismo, o chefe (rei, senhor etc.), que tem legitimidade através da tradição, exerce seu poder sem nenhum contrato que o limite. Isto contrasta com o feudalismo, em que existe uma relação contratual entre o governo e a vassalagem.‖(Corporativismo no Brasil, 1930-1945 http://www.maxwell.lambda.ele.puc-rio.br/16279/16279_4.PDF , p.36) 1- A Independência A Independência do Brasil é um dos fatos históricos mais importantes da política brasileira, pois marca o fim do domínio português. A Independência foi precedida de uma série de lutas de enfretamentos. Após o Dia do Fico 1 , D. Pedro tomou uma série de medidas que desagradaram a metrópole, pois preparavam caminho para a independência do Brasil. D. Pedro convocou uma Assembleia Constituinte, organizou a Marinha de Guerra, obrigou as tropas de Portugal a voltarem para o reino. Determinou 1 Em 9 de janeiro de 1822, D. Pedro I recebeu uma carta das cortes de Lisboa, exigindo seu retorno para Portugal. Porém, D. Pedro respondeu negativamente aos chamados de Portugal e proclamou: "Se é para o bem de todos e felicidade geral da nação, diga ao povo que fico."

7. ESTRUTURAÇÃO DO ESTADO NO BRASIL: A …igepp.com.br/uploads/arquivos/igepp_-_gestor_rf_ponto_7_e_10... · 7. ESTRUTURAÇÃO DO ESTADO NO BRASIL: ... em 7 de setembro de 1822,

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7. ESTRUTURAÇÃO DO ESTADO NO BRASIL: A CONSTRUÇÃO DA REPÚBLICA, DA DEMOCRACIA, DA FEDERAÇÃO, DOS APARELHOS DE ESTADO E DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA FEDERAL. A construção do Estado brasileiro tem como marco inicial o ano de 1808, com a transferência da família real portuguesa para o Brasil, que se deu de forma confusa.Em primeiro lugar, a própria escolha das cinco, 10 ou 15 mil pessoas — os números são imprecisos — que comporiam a lotação dos navios, diz alguma coisa sobre as instituições e espaços de poder que estavam sendo transplantados. Em segundo lugar, a seleção dos bens que era possível carregar, além dos tesouros e objetos de indiscutível valor, contemplava material, livros, papéis, artefatos, instrumentos e símbolos necessários à administração. Em terceiro lugar, a instituição de um simulacro de governo em solo europeu, que se deu na forma de uma regência, logo destituída pelo ocupante. O fato é que a transferência da corte e mais tarde a elevação do Brasil a parte integrante do Reino Unido de Portugal constituíram as bases do Estado brasileiro, com todo o aparato necessário àafirmação da soberania e ao funcionamento do autogoverno. Mas o Estado que se forma apresenta importante especificidade: a herança patrimonialista. Em Os donos do poder, Faoro defende a tese segundo a qual durante seis séculos de história a estrutura política e social herdada de Portugal resistiu a mudanças fundamentais, permanecendo altamente centralizadora e patrimonial. O que o Brasil e a América espanhola têm em comum é o fato de terem sido colonizados por países onde não existiam questionamentos bem-sucedidos a suas estruturas de poder. O sistema colonial desses países levou-os a considerar suas colônias como negócios a serem explorados. ―... à época da descoberta, Portugal já não vivia em regime feudal: o rei é um ―autêntico capitalista‖, seus vassalos chegam ao Novo Mundo com o desejo de enriquecer. Os poderes que lhes são delegados têm apenas o objetivo de assegurar-lhes lucros. Apenas a forma jurídica dessa concessão assemelha-se às instituições feudais. Seu conteúdo, em compensação, é exclusivamente capitalista.‖(TOPALOV, 1978, p. 14, citado por RAPOSO, 2008a, p. 66.Corporativismo no Brasil, 1930-1945. Consultado em http://www.maxwell.lambda.ele.puc-rio.br/16279/16279_4.PDF p.35) ―Esta estrutura se caracterizava pela ausência de um sistema contratual entre o Estado e a sociedade. ―Patrimonial e não feudal o mundo português, cujos ecos soam no mundo brasileiro atual, as relações entre o homem e o poder são de outra feição, bem como de outra índole a natureza da ordem econômica, ainda hoje persistente, obstinadamente persistente.Na sua falta, o soberano e o súdito não se sentem vinculados à noção de relações contratuais, que ditam limites ao príncipe e, no outro lado, asseguram o direito de resistência, se ultrapassadas as fronteiras de comando.‖(FAORO, 1998, p. 17-18 inCorporativismo no Brasil, 1930-1945http://www.maxwell.lambda.ele.puc-rio.br/16279/16279_4.PDF) ―Para compreender o patrimonialismo, é preciso primeiro compreender a sua base, isto é, a dominação tradicional. Weber denomina dominação tradicional aquela cuja legitimidade ―descansa na santidade de ordenações e poderes de mando herdados de tempos imemoriais...é assim porque sempre foi assim‖.5 No patrimonialismo, o chefe (rei, senhor etc.), que tem legitimidade através da tradição, exerce seu poder sem nenhum contrato que o limite. Isto contrasta com o feudalismo, em que existe uma relação contratual entre o governo e a vassalagem.‖(Corporativismo no Brasil, 1930-1945

http://www.maxwell.lambda.ele.puc-rio.br/16279/16279_4.PDF, p.36)

1- A Independência A Independência do Brasil é um dos fatos históricos mais importantes da política brasileira, pois marca o fim do domínio português. A Independência foi precedida de uma série de lutas de enfretamentos. Após o Dia do Fico1, D. Pedro tomou uma série de medidas que desagradaram a metrópole, pois preparavam caminho para a independência do Brasil. D. Pedro convocou uma Assembleia Constituinte, organizou a Marinha de Guerra, obrigou as tropas de Portugal a voltarem para o reino. Determinou

1Em 9 de janeiro de 1822, D. Pedro I recebeu uma carta das cortes de Lisboa, exigindo seu retorno para Portugal. Porém, D. Pedro respondeu

negativamente aos chamados de Portugal e proclamou: "Se é para o bem de todos e felicidade geral da nação, diga ao povo que fico."

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também que nenhuma lei de Portugal seria colocada em vigor sem o "cumpra-se", ou seja, sem a sua aprovação. Além disso, o futuro imperador do Brasil, conclamava o povo a lutar pela independência. O príncipe fez uma rápida viagem à Minas Gerais e a São Paulo para acalmar setores da sociedade que estavam preocupados com os últimos acontecimento, pois acreditavam que tudo isto poderia ocasionar uma desestabilização social. Durante a viagem, D. Pedro recebeu uma nova carta de Portugal que anulava a Assembleia Constituinte e exigia a volta imediata dele para a metrópole. Em resposta, proclamou a independência. A Independência do Brasil não foi um processo consensual. A chamada Guerra da Independência do Brasil estendeu-se de 1822, ano da proclamação da Independência, a 1824. A Guerra da Independência acabou por ser uma guerra civil Luso-Brasileira, já que portugueses e brasileiros combateram em ambos os lados. O que inicialmente começou como uma rebelião antilusitana em Salvador em 18 de fevereiro de 1822, se transformou, após a proclamação da independência, em 7 de setembro de 1822, em lutas mais encarniçadas nas regiões onde, por razões estratégicas, se registrava maior concentração de tropas do exército português, a saber, nas então Províncias Cisplatina(Uruguai), da Bahia, do Piauí, do Maranhão e do Grão-Pará2. Como a maior parte da oficialidade era de origem portuguesa, o governo brasileiro, através do Ministro José Bonifácio de Andrada e Silva, adotou as providências para eliminar a resistência portuguesa: a compra de armas e navios, o recrutamento de tropas nacionais e o contrato de estrangeiros (mercenários), bem como medidas repressivas como o confisco de bens e a expulsão daqueles que não aceitassem a emancipação política do Brasil. No plano econômico, proibiu-se o comércio, e, no diplomático, autorizou-se a guerra de corso (autorização para pilhar navios), contra Portugal. 2-A Constituição de 1824: A primeira Constituição do Brasil mantinha a monarquia, a dinastia da Casa de Orléans e Bragança e d. Pedro I como imperador e defensor perpétuo do Brasil. Constituía um Estado unitário e centralizador, cujo território era dividido em províncias, que substituíam as antigas capitanias. Os poderes políticos eram quatro — Legislativo, Moderador, Executivo e Judicial. Cada província era dirigida por um presidente nomeado pelo imperador, que tomava posse perante a câmara da capital. Em cada uma delas havia também um conselho geral, cujos membros eram eleitos juntamente com a representação nacional. O monarca exercia o Poder Moderador, com o apoio do Conselho de Estado, órgão de caráter consultivo e, ao mesmo tempo, o Poder Executivo, auxiliado pelos seus ministros de Estado. O Poder Legislativo era exercido pela Assembléia Geral, formada pela Câmara dos Deputados e pela Câmara dos Senadores ou Senado do império. O Poder Judicial era exercido pelos juízes de direito e pelos juízes de paz, para as tentativas de conciliação prévias a qualquer processo. Na capital do império e nas províncias havia um Supremo Tribunal de Justiça, composto de juízes letrados tirados das relações. A organização dos municípios não mudou de forma significativa, tendo as câmaras o mesmo papel que exerciam na colônia. 3-A Crise da Monarquia - O sistema monárquico brasileiro encontrava-se desgastado e era questionado por vários setores da população brasileira. O exército não aceitava mais a corrupção dentro do governo monárquico. Algumas imposições feitas pelo imperador também eram questionadas pelos militares. Entre elas, a proibição de oficiais do exército brasileiro em se manifestar na imprensa, sem a autorização do Ministro da Guerra. - Os membros da Igreja Católica Brasileira também estavam descontentes com o governo de Dom Pedro II, pois havia muita interferência real nos assuntos religiosos.

2Houve cisão no Exército luso-brasileiro que ocupava a Cisplatina(Uruguai). Regimentos portugueses recuaram para Montevidéu e foram cercados

pelos ex-companheiros, os brasileiros, liderados pelo Barão de Laguna. No norte do Pará e Maranhão, juntas pró-portuguesas declararam lealdade à pátria-mãe. Pernambuco era favorável à independência, mas, na Bahia, não havia consenso entre a população, o que deu origem a árduas batalhas na Campanha da Bahia.

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- A monarquia era um sistema enfraquecido no contexto mundial do final do século XIX. Muitos países importantes já haviam adotado a República, que possibilitava maior participação política dos cidadãos. No Brasil, a classe média, estudantes e profissionais liberais, simpáticos ao regime republicano, passaram a fazer oposição à Monarquia brasileira3. Queriam a implantação da República, para que pudessem ganhar poder e influenciar mais nas decisões políticas e administrativas do país. - Havia também um grande descontentamento dos fazendeiros conservadores. Antes adeptos da Monarquia, estes agricultores retiraram o apoio político que davam à Monarquia após a abolição da escravatura em 1888. Estes fazendeiros eram proprietários de grandes quantidades de escravos e não receberam indenização do governo após a abolição. - Os setores progressistas do Brasil eram contrários a uma série de situações mantidas pelo regime monárquico, tais como: voto censitário, miséria, ensino público para poucos, elevado índice de analfabetismo. 3.1-A Crise Econômica Desde o começo do séc. XIX o café transformou-se em um produto economicamente importante para o país. As grandes fazendas de café se expandiram por onde hoje é a região Sudeste, especialmente São Paulo, que ao final do século XIX respondia por mais da metade da produção nacional de café. O avanço do café coincidiu com a decadência das lavouras tradicionais de algodão e açúcar. Entre 1837 e 1838, as exportações de café, destinadas principalmente aos Estados Unidos, correspondiam a mais da metade do valor das exportações brasileiras. A lavoura cafeeira proporcionou aos grandes proprietários rurais do Sudeste (os barões do café) o suporte econômico necessário para consolidarem sua supremacia política perante as demais províncias do país. Nas décadas finais do século XIX, o Rio de Janeiro passa por um grande crescimento demográfico, com um contingente populacional quase que dobrando entre 1872 e 1890. Isso, claro, provoca diversos problemas estruturais e de higiene na região. Cresce o número de pessoas buscando emprego, conseqüentemente, de desempregados. Aumenta a quantidade de pessoas a morar em cortiços, agravandoos problemas decorrentes da falta de saneamento básico e do abastecimento de água: surtos de malária, varíola, febre amarela e tuberculose. A crise econômica em que o Brasil se encontravatambém influenciou na Proclamação da República, pois fez com que aumentasse o descontentamento da população brasileira. Esta crise foi agravada com a Guerra do Paraguai, pois o Brasil recorreu aos empréstimos ingleses, aumentando assim a dívida externa. 3.2- Positivismo O positivismo foi uma corrente filosófica que surgiu na França no século XIX e que ganhou força no Brasil no final deste século4. Militares, profissionais liberais e intelectuais defendiam os ideais positivistas. Estesideais eram favoráveis ao regime republicano e, portanto, contrários à Monarquia. A inscrição

3Além de não conseguir deter a campanha abolicionista, o governo imperial envolveu-se numa séria desavença com a Igreja Católica, conhecida

como Questão Religiosa (1872-1875), a qual contribuiu para desgastar mais ainda as bases de sustentação do regime monárquico. Depois de 1880, o abolicionismo ganhou novo fôlego. Os abolicionistas conquistaram adeptos também nos círculos militares, onde já se havia difundido a filosofia positivista, por iniciativa de Benjamin Constant. A recusa do exército em perseguir os escravos que fugiam em massa das fazendas (muitas vezes com a ajuda da ala mais radical dos abolicionistas) deu origem a Questão Militar. 4O Positivismo, doutrina criada por Augusto Comte,defendia a ideia de que o conhecimento científico é a única forma de conhecimento verdadeiro,

desconsiderando todas as outras formas do conhecimento humano que não pudessem ser comprovadas cientificamente. Tudo aquilo que não puder ser provado pela ciência é considerado como pertencente ao domínio teológico-metafísico caracterizado por crendices e vãs superstições. Para os positivistas o progresso da humanidade depende única e exclusivamente dos avanços científicos, único meio capaz de transformar a sociedade no ideal desejado. O positivismo de Augusto Comte era caracterizado pela ênfase no determinismo, na hierarquia e na obediência, na concepção de evolução para o progresso, na crença no governo da elite intelectual e no desprezo à teologia e à metafísica A ideia-chave do Positivismo Comtiano é a Lei dos Três Estados, de acordo com a qual o entendimento humano compreende três estágios na forma de conceber as suas ideias e a realidade: (1)Teológico: o ser humano explica a realidade por meio de entidades supranaturais (os "deuses"), buscando responder a questões como "de onde viemos?" e "para onde vamos?"; além disso, busca-se o absoluto. (2)Metafísico: é uma espécie de meio-termo entre a teologia e a positividade. No lugar dos deuses há entidades abstratas para explicar a realidade: "o Éter", "o Povo", "o Mercado financeiro", etc. Continua-se a procurar responder a questões como "de onde viemos?" e "para onde vamos?" e procurando o absoluto. É a busca da razão e destino das coisas, é o meio termo entre teológico e metafisico.(3)Positivo: etapa final e definitiva, não se busca mais o "porquê" das coisas, mas sim o "como", por meio da descoberta e do estudo das leis naturais, ou seja, relações constantes de sucessão ou de co-existência. A imaginação subordina-se à observação e busca-se apenas pelo observável e concreto. O lema do positivismo era: "Amor como princípio e ordem como base; o progresso como meta", e inspirou os dizeres da bandeira nacional brasileira ―Ordem e Progresso‖.

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"Ordem e Progresso" na bandeira brasileira, criada após a Proclamação da República, reflete a importância do Positivismo no processo republicano brasileiro. 4-O que é República? Inicialmente é a forma de governo na qual os governantes são eletivos e temporários, por oposição à monarquia, na qual os governantes são hereditários e vitalícios. Porém,o termo tem um significado mais amplo e filosófico, como mostra Maria Helena Versiani, na Revista Brasileira de Historia, 2010 no texto ―Uma República na Constituinte (1985-1988)‖ (http://www.scielo.br/pdf/rbh/v30n60/a13v3060.pdf ):

Por princípio, nas sociedades republicanas, a regulação política e as práticas sociais devem engendrar a noção de que é responsabilidade de todos consolidar o bem público – malgrado suspeitas que possam ser levantadas indicando que tal objetivo é uma virtualidade em um mundo onde prevalecem as disputas entre interesses privados. Assim, o terreno da República supõe alguma renúncia à lógica privada em favor da coisa pública. Rebaixa o interesse privado em nome do interesse público, de modo que todos devem orientar as suas ações sem perder de vista a supremacia do bem comum. ESTRUTURAÇÃO DO ESTADO NO BRASIL: A CONSTRUÇÃO DA REPÚBLICA 5-A República Velha O período que vai de 1889 a 1930 é conhecido como a República Velha. Este período da História do Brasil é marcado pelo domínio político das elites agrárias5 mineiras, paulistas e cariocas. O Brasil firmou-se como um país exportador de café, e a indústria apresentou significativo avanço. Na área social, ocorreram várias revoltas: 1896 – Os sertanejos liderados por Antônio Conselheiro foram derrotados pelas forças governamentais na Guerra de Canudos 1904 – Oswaldo Cruz com sua Lei da Vacina fez com que a população do Rio de Janeiro se rebelasse na Revolta da Vacina. 1910 – Os castigos corporais aplicado aos soldados da Marinha fez com que os mesmos se rebelassem contras os seus superiores na Revolta da Chibata. 1912 – No sul do Brasil as disputas por território entre Santa Catarina e Paraná gerou a Guerra do Contestado. 5.1-A República da Espada (1889 a 18946) Foi a primeira fase da República Velha. Em 15 de novembro de 1889, aconteceu a Proclamação da República, liderada pelo Marechal Deodoro da Fonseca. Nos cinco anos iniciais, o Brasil foi governado por

5A concepção de um povo ―bestializado‖, surge quando, após a conquista da Republica, por falta de uma organização política pela sociedade, o

poder é dado a gente envolvida com o liberalismo imperial. Com a Constituição de 1891 não dando obrigatoriedade, ao estado, em fornecer educação ao povo, e, o direito de voto só ser dado àqueles não analfabetos, a grande maioria da população é excluída da participação na comunidade política. Como é a primeira vez que o povo vê um modelo de república, há um descontentamento generalizado, inclusive desejando-se o retorno ao próprio modelo monarca, devido à simpatia a D.Pedro II e a princesa Isabel. Então, essa falta de intervenção do povo, quanto ao processo de consolidação da República, faz com que estudiosos os chamem de ―bestializados‖. E assim são tratados até a Revolta da Vacina, em que eclodiu um sentimento tão esperado pela defesa da honra e de seus direitos. Esses aspectos são examinados por José Murilo de Carvalho no livro Os Bestializados: O Rio de Janeiro e a República que não foi,1987.Embora a frase de Aristides Lobo (jornalista e líder republicano paulista, depois feito ministro do governo provisório), "O povo assistiu bestializado" à proclamação da república, tenha entrado para a história, pesquisas históricas, mais recentes, têm dado outra versão à aceitação da república entre o povo brasileiro.A tese defendida por Maria Tereza Chaves de Mello (A República Consentida, Editora da FGV, EDUR, 2007), indica que a república, antes e depois da proclamação, era vista popularmente como um regime político que traria o desenvolvimento, em sentido amplo, para o país.

6O dinheiro concedido por meio dos empréstimos na maioria das vezes não era utilizado de forma eficiente, como mostrava o pouco tempo de vida

de inúmeros estabelecimentos comerciais e industriais. Mesmo com o encerramento das atividades de muitas empresas, as ações das mesmas continuavam à venda na Bolsa de Valores, inclusive com preços ascendentes. Tudo isso gerou uma enorme especulação financeira, surgimento de empresas-fantasmas, etc., complicando ainda mais a situação econômica do país. Os problemas econômicos causados em razão da política do encilhamento foram parcialmente resolvidos no governo Campo Sales, por meio do controle da emissão de moeda e do estímulo ao crescimento industrial do país.http://www.brasilescola.com/historiab/encilhamento.htm.Autor não informado. Consultado em 08/07/2013.

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militares. Deodoro da Fonseca tornou-se Chefe do Governo Provisório. Em 1891, renunciou e quem assumiu foi o vice-presidente Floriano Peixoto, que intensificou a repressão aos que ainda lutavam pela monarquia. Portanto, quando o governo brasileiro se tornou republicano, foram os militares que assumiram as duas primeiras presidências do país. Ao final do mandato de Floriano Peixoto, a elite agrária subiu ao poder dando início ao período conhecido como Republica do Café com Leite, ou República Velha. 5.1.1-A Constituição de 1891 (Primeira Constituição Republicana) Após o início da República havia a necessidade da elaboração de uma nova Constituição, pois a antiga ainda seguia os ideais da monarquia. A constituição de 1891 garantiu alguns avanços políticos, embora apresentasse várias limitações, pois representava os interesses das elites agrárias do pais. A nova constituição implantou o voto universal (mas as mulheres, analfabetos, clérigos, militares de baixa patente ficavam de fora). A constituição instituiu o federalismo, o presidencialismo e o voto aberto. 5.1.2-O Encilhamento Nos primeiros anos após a proclamação da República, Deodoro da Fonseca se deparava com um sistema financeiro retrógrado e uma estrutura econômica arcaica, baseada no café. O Ministro da Fazenda, Rui Barbosa, adotou uma política que visava estimular a industrialização e o desenvolvimento de novos negócios, os bancos passariam a liberar empréstimos livremente às pessoas, sem mesmo saber de suas reais condições de pagamento. Esta política ficou conhecida como encilhamento. Para financiar o enorme volume de empréstimos, o governo foi obrigado a fazer grandes injeções de dinheiro no sistema econômico, provocando uma grande desvalorização da moeda, o que resultou em altíssimos níveis de inflação, e acabou desencadeando uma das mais graves crises econômicas vividas pelo Brasil. 5.2-A República das Oligarquias O período que vai de 1894 a 1930 foi marcado pelo governo de presidentes civis, apoiados pelas elites agrárias do país. Todos os Estados da Federação tinham o seu Partido Republicano. Os presidentes da República saiam dos seguintes partidos: Partido Republicano Paulista (PRP) e Partido Republicano Mineiro (PRM). Estes dois partidos controlavam as eleições, mantendo-se no poder de maneira alternada.Dominando o poder, estes presidentes implementaram políticas que beneficiaram o setor agrário do país, principalmente, os fazendeiros de café do oeste paulista. 5.2.1-Política do Café-com-Leite A maioria dos presidentes desta época eram políticos de Minas Gerais e São Paulo: era a ―política do café com leite‖, pois São Paulo era grande produtor de café e Minas Gerais era grande produtor de leite.Estes dois estados eram os mais ricos da nação e, por isso, dominavam o cenário político da república. Saídos das elites mineiras e paulistas, os presidentes acabavam favorecendo sempre o setor agrícola, principalmente do café (paulista) e do leite (mineiro). A política do café-com-leite sofreu duras críticas de empresários ligados à indústria, que estava em expansão neste período. Os estados que não tinham ligações com a política do café com leiteeram esquecidos pelo Governo Federal, com exceção do Estado do Amazonas que prosperou (no ciclo da borracha) graças à produção de borracha natural. Se por um lado a política do café-com-leite privilegiou e favoreceu o crescimento da agricultura e da pecuária na região Sudeste, por outro, acabou provocando um abandono das outras regiões do país.Os outros estados brasileiros, deixados de lado pela oligarquia cafeeira, especialmente das regiões Nordeste, Norte e Centro-Oeste tiveram seus problemas sociais agravados e passaram a fazer forte oposição a politica do café com leite.

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5. 2.1.1-O Convênio de Taubaté7 Essa foi uma política adotada pelo governo republicano para beneficiar os cafeicultores em momentos de crise. Quando o preço do café abaixava muito no mercado externo, o governo federal comprava o excedente de café e estocava. Esperava-se a alta do preço do café e então os estoques eram liberados. Esta política mantinha o preço do café, principal produto de exportação, sempre em alta e garantia os lucros dos fazendeiros de café. 5.2.2-Política dos Governadores Montada no governo do presidente paulista Campos Salles (1898-1902), esta política visava manter no poder as oligarquias. Em suma, era uma troca de favores políticos entre governadores e presidente. O presidente apoiava os candidatos dos partidos governistas nos estados, enquanto estes políticos davam suporte a candidatura presidencial e também durante a época do governo. Esse acordo era parte do fenômeno que veio a ser conhecido como ―coronelismo‖ 5.2.3-O coronelismo Descrito por Vitor Nunes Leal no livro Coronelismo, Enxada e Voto, o coronelismo foi um fenômeno típico da República Velha. Resultava do fato de que o poder do Estado brasileiro (presidência) e dos chefes dos Estados (governadores) não chegava aos grotões do interior e, por isso, precisava do apoio da autoridade do senhor local para manter a população sob controle e proporcionar legitimação pelo voto: o ―coronel‖. O coronel era um grande fazendeiro que geralmente dominava em um município, e utilizava seu poder econômicopara garantir a eleição dos candidatos que apoiava. Era usado o voto de cabresto, em que o coronel (fazendeiro) obrigava e usava até mesmo a violência para que os eleitores de seu "curral eleitoral" votassem nos candidatos apoiados por ele. Como o voto era aberto, os eleitores eram pressionados e fiscalizados por capangas do coronel, para que votasse nos candidatos indicados. O coronel também utilizava outros "recursos" para conseguir seus objetivos políticos, principalmente o clientelismo (troca de um bem público pelo voto) e a intimidação, em práticascomo: compra de votos, votos fantasmas, troca de favores, fraudes eleitorais e violência. 5.2.4-O Tenentismo O tenentismo foi um movimento que ganhou força entre militares de média e baixa patente durante os últimos anos da República Velha. No momento em que surgiu o levante dos militares, a inconformidade das classes médias urbanas contra os desmandos e o conservadorismo presentes na cultura política do país se expressava. Ao mesmo tempo, o tenentismo era mais uma clara evidência do processo de diluição da hegemonia dos grupos políticos vinculados ao meio rural brasileiro. Influenciados pelos anseios políticos das populações urbanas, os militares envolvidos nesse movimento se mostraram favoráveis às tendências políticas republicanas liberais. Entre outros pontos, reivindicavam uma reforma constitucional capaz de trazer critérios mais justos ao cenário político nacional. Exigiam que o processo eleitoral fosse feito com o uso do voto secreto e criticavam os vários episódios de fraude e corrupção que marcavam as eleições. Além disso, eram favoráveis à liberdade dos meios de comunicação, exigiam que o poder Executivo tivesse suas atribuições restringidas, maior autonomia às autoridades judiciais e a moralização dos representantes que compunham as cadeiras do Poder Legislativo. Entretanto, todo esse discurso liberal e moralizador também convivia com a opinião de alguns

7No início do século XX, ocorreu uma crise da superprodução do café, com queda do preço do café no mercado internacional. O Brasil, sozinho,

controlava três quartos da oferta mundial.Em fevereiro de 1906, os governadores (presidentes) de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais assinaram um convênio que estabelecia as bases de uma política conjunta de valorização do café, condicionado à aprovação pelo presidente da República. Entretanto, o presidente da República, Rodrigues Alves iria se recusar a assinar o acordo, que foi ratificado, então, pelo seu vice, Afonso Pena. O Convenio de Taubaté compreendia as seguintes medidas: A fim de estabelecer um equilíbrio entre a oferta e a procura, o governo interviria no mercado, adquirindo os excedentes dos cafeicultores. O financiamento das aquisições se efetuaria mediante o recurso a capitais obtidos por empréstimos no estrangeiro. A amortização e os juros desses empréstimos seria efetuada mediante um novo imposto cobrado em ouro sobre cada saca de café exportado. Para solucionar a médio e longo prazo o problema do excesso de produção, os governadores dos estados produtores adotariam medidas visando desencorajar a expansão das lavouras pelos cafeicultores.Com isso, os preços do produto eram mantidos artificialmente altos, garantindo-se os lucros dos cafeicultores. Estes, ao invés de diminuírem a produção de café, continuaram produzindo-o em larga escala, obrigando o governo a contrair mais empréstimos para continuar adquirindo esses excedentes.

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oficiais que defendiam a presença de um poder forte, centralizado e comprometido com mal definidas necessidades da nação brasileira8. A oligarquia cafeeira conseguiu dominar o cenário político brasileiro por mais de duas décadas.Os outros estados brasileiros, à margem do poder, passaram a fazer forte oposição ao governo oligárquico. Jovens oficiais do exército (tenentes), também estavam insatisfeitos com os rumos políticos do Brasil. Aproveitando a dissidência de algumas oligarquias estaduais, em 1922 os tenentes apoiaram a candidatura de Nilo Peçanha em oposição ao mineiro Arthur Bernardes, politicamente comprometido com as demandas dos grandes cafeicultores. A eleição presidencial de 1922 foi mais agitada da Republica Velha. Ao final, Artur Bernardes foi eleito novo Presidente da República, dando continuidade à política do café com leite. Osmilitares acreditavam que o candidato da oposição, Nilo Peçanha, era o verdadeiro vencedor das eleições presidenciais. Inconformados com mais um ato de corrupção por parte do governo, um grupo de militares, julgando-se defensores da moralização política do Brasil, iniciou uma série de revoltas contrárias à posse de Artur Bernardes como presidente. A primeira revolta a acontecer foi a Revolta do Forte de Copacabana. Os tenentes haviam tentado controlar as principais guarnições do Rio de Janeiro a fim de pressionar o governo a anular a eleição vencida por Artur Bernardes.No andamento da revolta, somente um grupo pequeno de rebeldes, conhecidos como os 18 do Forte de Copacabana, continuaram a lutar. Os rebeldes foram facilmente derrotados pelas forças do governo. Do grupo dos Dezoito do Forte de Copacabana, apenas dois sobreviveram. Nesse momento, a falta de unidade política dos militares acabou enfraquecendo essa primeira manifestação conhecida como Reação Republicana. Passados dois anos da revolta militar ocorrida no Rio de Janeiro, o Movimento Tenentista iniciou uma nova revolta, desta vez em São Paulo. Eduardo Gomes e Siqueira Campos, únicos sobreviventes dos 18 do Forte de Copacabana, inspiraram o militar Isidoro Dias a comandar um grande número de militaresno combateao governo oligárquico. O levante ocorrido em São Paulo ficou conhecido como Revolta Militar de 1924. No Norte do Brasil, os Tenentes também aderiram a Revolução de 1924. No Amazonas ocorreu a chamada Comuna de Manaus. Fracassada a tentativa de controlar São Paulo, os militares da Revolução de 1924 foram em direção ao Sul do país para se encontrar com as forças militares que haviam se rebelado no Rio Grande do Sul. A união dos dois grupos gerou a famosa Coluna Prestes, força militar que marchou por boa parte do território brasileiro a fim de provocar uma revolução. Apesar de toda essa mobilização, o Tenentismo não obteve êxito em acabar com o governo oligárquico. Em 1930, alguns dos ativistas do Movimento Tenentista, tomaram parte na revolta que derrubou o governo de Washington Luís. PRESIDENTES DA REPÚBLICAVELHA OU PRIMEIRA REPÚBLICA Marechal Deodoro da Fonseca 1889-1891 Marechal Floriano Peixoto 1891-1894 Pudente de Morais 1894-1898

8Esse parágrafo, bem como a Nota que se segue são de autoria de Rainer Sousa, publicados em

http://www.brasilescola.com/historiab/tenentismo.htm, não paginado, em 08/07/2013. ―As primeiras manifestações militares que ganharam corpo durante a República Oligárquica aconteceram nas eleições de 1922. Durante essas eleições a tensão entre os militares e o governo aumentou quando diversas críticas contras os militares, falsamente atribuídas a Arthur Bernardes, foram veiculadas nos jornais da época. Com a vitória eleitoral das oligarquias, a primeira manifestação tenentista veio à tona com uma série de levantes militares que ficaram marcados pelo episódio dos ―18 do Forte de Copacabana‖, ocorrido no Rio de Janeiro, em julho de 1922.Nos dois anos seguintes, duas novas revoltas militares, uma no Rio Grande do Sul (1923) e outra em São Paulo (1924), mostrou que a presença dos tenentistas no cenário político se reafirmava. Após terem suas pretensões abafadas pelas forças fiéis ao governo, esses dois grupos se juntaram para a formação de uma guerrilha conhecida como Coluna Prestes. Entre 1925 e 1927, esse grupo composto por civis e militares armados entrecortou mais de 24 mil quilômetros sob a liderança de Luís Carlos Prestes.A falta de apelo entre os setores mais populares, e as intensas perseguições e cercos promovidos pelo governo acabaram dispersando esse movimento. Luís Carlos Prestes, notando a ausência de um conteúdo ideológico mais consistente à causa militar, resolveu aproximar-se das concepções políticas do Partido Comunista Brasileiro.

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Campos Sales 1898-1902 Rodrigues Alves 1902-1906 Afonso Pena 1906-1909 Nilo Peçanha 1909-1910 Marechal Hermes da Fonseca 1910-1914 Wenceslau Brás 1914-1918 Delfim Moreira 1918-1919 Epitácio Pessoa 1919-1922 Arthur Bernardes 1922-1926 Washington Luiz 1926-1930 Wanderley Guilherme dos Santos,O Sistema Oligárquico Representativo da Primeira República, Dados, 2013.A íntegra do artigo encontra-se emhttp://www.scielo.br/pdf/dados/v56n1/a02v56n1.pdf

―A implantação da República, em 1889, aboliu as instituições monárquicas, entre elas, a do Poder Moderador; ratificou a mobilidade relativa do fator trabalho, instituída pela Abolição da Escravatura no ano anterior; extinguiu completamente o requisito de renda para a participação eleitoral, à frente de todos os países em que existiam eleições, mas manteve os vetos à participação feminina e dos analfabetos9. ―Instalava-se por inteiro o sistema representativo oligárquico, com todas as peculiaridades institucionais: conflito altamente regulado entre as elites e extensa exclusão nos direitos à participação. ―A verdade é que os primeiros quarenta anos da república oligárquica brasileira transcorreram sem qualquer transtorno sério e eficaz na obediência às normas políticas. Não houve interrupção nas eleições legislativas, não houve deposição de presidentes, antes de 1930, nem houve manifestações militares bem-sucedidas. Algumas tentativas de revolução na década de 1920, sim, embora todas fracassadas, violência na política local, sim, como é usual na política de sistemas oligárquicos, mas golpe de estado bem-sucedido, não. Ao contrário, todas as eleições presidenciais, seguidas da posse dos eleitos, foram pacíficas. As regras de competição intraoligárquicas foram eficazes a nível nacional, enquanto a nível local prevalecia a disputa com base no voto, na violência e na corrupção, esta última ausente, por desnecessária, das eleições presidenciais. ―A partir de 1902, as eleições presidenciais eram decididas por um colégio informal de que faziam parte os representantes dos estados federados e a liderança governista. (...) O consenso prévio às disputas presidenciais garantia a estabilidade governativa das administrações, que transcorriam sem os grandes estremecimentos característicos das reformas ministeriais. (...) Por certo, o consenso característico da sucessão presidencial não se reproduzia nas disputas locais, em que famílias competiam pelo privilégio de nomear o delegado, o juiz de direito, o diretor da escola pública e o arrecadador de impostos. À centralização federal correspondiam feudos paroquiais, suficientemente radicalizados como para substituir em grande parte a representação do estado na Câmara dos Deputados a cada eleição. ―Os revolucionários de 1930 referiam-se aos membros da elite destituída como oligarcas, do mesmo modo que, depois da Constituinte de1987-88, se tornou usual identificar a classe política do período1945-1964 como a representante da oligarquia hegemônica no Brasil deentão. ―Oligarca‖ e ―oligarquia‖, a literatura especializada o comprova, são termos carentes de significado preciso e consensual na históriabrasileira.‖ A ESTRUTURAÇÃO DO ESTADO NO BRASIL: A CONSTRUÇÃO DA DEMOCRACIA O texto que se segue foi extraído/adaptado do texto de Jose Murilo de Carvalho,República, Democracia e Federalismo, Brasil: 1870-1891. Revista Varia Historia, BH, 2011. A íntegra do artigo encontra-se em: http://www.scielo.br/pdf/vh/v27n45/v27n45a07.pdf

―O Manifesto de 1870 não fazia diferença entre república e democracia. As duas apareciam juntas já na gênese histórica que delas se fazia, a começar pela Inconfidência Mineira de 1789‖.

9E também: do clero, dos militares da baixa patente e dos mendigos. Nota da Profa. Maria das Graças Rua.

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―O que seria essa democracia? Era o governo do país por si mesmo, era a soberania popular exercida por sua representação. A monarquia era, por definição, não democrática porque nela o governo pertencia a uma família privilegiada, a um chefe não eleito pela nação. O Manifesto rejeitava radicalmente a legitimidade, consagrada na Constituição do Império, daquilo que na época da independência se chamava sistema misto de governo, uma monarquia constitucional em que se combinavam o princípio da hereditariedade do chefe de Estado e a representação popular. Aceitar que os poderes eram delegados da nação, como dizia a Constituição e, ao mesmo tempo, manter a hereditariedade e a irresponsabilidade do monarca seria, segundo o Manifesto, ―ultrapassar as raias do absurdo‖. Daí que ―a monarquia temperada é uma ficção sem realidade‖. A soberania só existiria quando o parlamento eleito exercesse a suprema direção política. A delegação da soberania teria que se exercer em funcionários eleitos e demissíveis. A conclusão era simples: ―o elemento monárquico não tem coexistência possível com o elemento democrático‖.

―Ora, a forma de governo apropriada ao exercício da soberania popular era é a república, entendida como fenômeno exclusivamente político. Logo, democracia e república eram uma e a mesma coisa, um país que se autogovernasse, isto é, que elegesse todos os seus governantes. Como argumento adicional, o Manifesto aduzia o isolamento do Brasil na América. ―Somos da América e queremos ser americanos‖. E a América era a república. Prudente de Morais, futuro presidente, ao ser eleito presidente da Assembleia Constituinte repetiu o argumento. Disse que nunca duvidara da vitória da República. ―bastava considerar que o Brasil fazia parte da América e que a América pertence à República, pertence à democracia‖.

―A mesma posição foi defendida por Assis Brasil em A República federal, publicado em 1881. Segundo ele, ―O caráter essencial da república é a ausência absoluta de privilégio de toda e qualquer espécie; por isso, só há democracia na república‖. Ou ainda: ―Toda república é democrática, isto é, o governo de todos por todos‖. Ainda: ―República é a forma de governo constituída pela democracia‖. Repetia ainda o Manifesto ao dizer que a monarquia constitucional era um sistema artificial e anormal, um ―elemento de perturbação na escala evolutiva‖ do absolutismo para a república. Só havia dois regimes naturais, o absolutismo e a república. No manifesto de 1889 o então chefe do partido Republicano Brasileiro, Quintino Bocaiúva, afirmava: ―O regime do governo republicano é a fórmula prática da democracia‖. O uso indiferenciado dos conceitos de república e democracia tinha, naturalmente, a função de extremar os republicanos dos liberais e liberais radicais, que não tinham dificuldade em ver aspectos democráticos nas monarquias constitucionais. República só foi separada de democracia nos textos dos positivistas.

―O segundo tema mais importante da propaganda republicana foi o federalismo. Para alguns, ele seria o mais importante‖. ―O federalismo era demanda quase unânime dentro do republicanismo. No campo liberal, Tavares Bastos vinha lutando pela descentralização desde a década de 1860. Ao final do Império, o federalismo já fazia parte da agenda de monarquistas como Joaquim Nabuco e Rui Barbosa. As divergências giravam apenas em torno da forma que ele devia assumir. A demanda federalista foi mais intensa entre os republicanos de São Paulo e do Rio Grande do Sul‖. ―Foi na Constituinte10, no entanto, que o federalismo emergiu com toda a força. Quase todos os constituintes eram federalistas, posto que divergissem sobre a forma que o federalismo deveria assumir. O próprio entendimento do conceito era confuso. Alguns o viam como descentralização, outros como federação, outros ainda como confederação. A posição dos estados na federação era definida como autonomia, soberania, independência, a despeito das dificuldades de se conceber conceitualmente a convivência de duplas soberanias ou duplas autonomias na mesma federação‖. ―O problema do federalismo afetou a discussão sobre o Congresso e a eleição presidencial. No primeiro caso, seguiu-se o modelo bicameral americano considerado indispensável em um sistema federal: o Senado representaria igualmente os estados desiguais‖. ―Pode-se concluir que, de fato, houve redução do leque de temas dentro do campo republicano. Os textos mais importantes concentraram-se em discutir o regime político e a forma de organização do Estado e da composição do corpo político. Nenhuma obra importante foi escrita sobre a escravidão que se comparasse ao Abolicionismo de Joaquim Nabuco (1883), ou a A Escravidão no Brasil de Perdigão Malheiro (1864-67).

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De 1891.

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Outro grande tema social, o da reforma da estrutura agrária, não fora tratado pelos radicais, mas o liberal André Rebouças o enfrentou em 1883, em Agricultura nacional: Estudos econômicos, desenvolvendo a idéia da democracia rural que consistia na multiplicação da pequena propriedade. Esse tema esteve completamente ausente da discussão dos propagandistas, pois era outro tabu político‖. ―Os propagandistas idealizaram suas repúblicas. Os dez primeiros anos do regime em nada corresponderam a seus sonhos. Proclamada por militares, a República foi marcada por constante instabilidade, guerras civis, crise financeira, falta de ordem e de progresso. De 1889 a 1897, foram dois presidentes militares e um civil. O primeiro militar foi forçado a renunciar. O segundo enfrentou duas guerras civis, uma no Sul, outra na capital. O civil, Prudente de Morais, teve um governo perturbado por conflitos com o Partido e com o Congresso, por revoltas militares e populares, e sofreu uma tentativa de assassinato. Deixou o país à beira da falência financeira.‖

O texto que se segue foi extraído/adaptado do texto de José Álvaro Moisés, Os significados da democracia segundo os brasileiros, Revista Opinião Pública, 2010.A íntegra do artigo encontra-se em: http://www.scielo.br/pdf/op/v16n2/a01v16n2.pdf ―Os brasileiros experimentaram as virtudes do regime democrático em apenas dois períodos de duas décadas cada, ou seja,entre 1946 e 1964 e, mais recentemente, entre 1988 até o presente. Fora desses curtos períodos de tempo, predominaram no país, durante a maior parte do século XX, sistemas políticos oligárquicos, autoritários ou semi-liberais que, por definição, não asseguravam as liberdades fundamentais, a competição política, a participação popular ou os direitos de cidadania. Em uma perspectiva temporal longa, portanto, a democracia é um fenômeno político relativamente novo no Brasil e, ao mesmo tempo, frágil e descontínuo na experiência política dos brasileiros.‖ 6-A Era Vargas AEra Vargas, ou Período Getulistadurou de 1930 a 1945. Iniciou-se com a consumação da Revolução de 1930, um movimento armado, liderado pelos estados de Minas Gerais, Paraíba e Rio Grande do Sul, que culminou com o Golpe de Estado de 1930, que depôs o presidente da república Washington Luís, em outubro de 1930, impediu a posse do presidente eleito Júlio Prestes e pôs fim à República Velha. A revolução de 1930 foi causada pela combinação entre a crise econômica de escala mundial, devido à quebra da Bolsa de Nova Yorque em 1929 (esmagando todas as economias com alguma participação nos mercados internacionais, caso do Brasil e suas exportações de café), a superproduçao da lavoura cafeeira, o conflito na sucessão presidencial que levou à ruptura da política do café com leite e foi precipitada pelo assassinato do candidato a vice-presidente da oposição, na chapa encabeçada por Getúlio Vargas e formada pela Aliança Liberal, que unia as oligarquias de Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Paraíba. A ―Revolução de 1930‖ representou muito mais do que a tomada do poder por novos grupos oligárquicos, com o enfraquecimento das elites agrárias. Do ponto de vista político, havia um quadro favorável à transformação do Estado para atender às novas exigências do seu papel de indutor do desenvolvimento. As elites oligárquicas excluídas do compromisso do antigo regime uniram-se às forças emergentes representativas da nova burguesia industrial e das camadas médias urbanas. O primeiro período de Vargas na presidência durou 15 anos, sendo quatro de governo provisório (1930-1934), três de governo constitucional(1934-1937) e oito de ditadura (1937-1945). Seus quinze anos de governo seguintes, caracterizaram-se pelo nacionalismo e populismo. 6.1-O Governo Provisório Ao ser nomeado chefe do governo provisório, Getúlio Vargas fez uma profunda mudança nos campos político e econômico. Declarou extinta a constituição de 1891 e afastou os governadores que pertenciam a República das Oligarquias. Houve uma grande concentração de poderes nas mãos do Executivo federal, em conseqüência da dissolução dos corpos legislativos e da nomeação de interventores para os governos estaduais. Como marco da incorporação de novos atores sociais, foi criado o Ministério do Trabalho,

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Indústria e Comércio11, que estabelecia uma interlocução com esses setores e lançava as bases do pacto corporativista que se seguiria. Os ―tenentes‖ foram absorvidos em diversas posições de governo, alguns inclusive como interventores nos estados, trazendo suas ideias e a marca da ruptura com o velho pacto oligárquico. Eles tinham o objetivo conter os possíveis levantes dos chefes locais que imperavam na República Velha. Mas o governo manteve a política de valorização do café e procurou contemporizar com as oligarquias que aderiram ao movimento revolucionário. Embora tenha contribuído para a ampliação e consolidação da burguesia industrial(incentivou a criação de indústrias no país, acarretando um acelerado crescimento industrial) essa foi a imagem bifronte da política de Vargas — uma face voltada para as oligarquias rurais e outra para as massas urbanas. 6.2-O Governo Constitucional A revolta paulista conhecida como Revolução Constitucionalista de 1932, fez com que o Governo Vargas se apressasse na tarefa de elaborar uma nova constituição.Em 16 de Julho de 1934 foi criada a nova Constituição do Brasil. Através de uma eleição indireta, Getúlio Vargas continuou no poder brasileiro.A Constituição de 1934 ficou marcada por ter dado as mulheres brasileiras o direito de votar e por criar as leis trabalhistas.No Governo Constitucional os partidos políticos do Brasil seguiram as doutrinas políticas dos países europeus. Os dois principais partidos políticos da época eram: AIB-Ação Integralista Brasileira - Partido que defendia a pratica de uma política totalitária no Brasil. Os Integralistas defendia a criação de um governo autoritário semelhante aos implantados na Itália e Alemanha (Nazi-Fascismo). O líder deste partido era Plínio Salgado. ANL - Aliança Nacional Libertadora - Partido político que defendia os ideais do Socialismo-Marxismo. Os aliancistas espelhavam-se principalmente no Partido Comunista da União Soviética. Luís Carlos Prestes era o principal líder dos Aliancistas.A Aliança Nacional Libertadora chegou a promover uma revolta armada fracassada que ficou conhecida como Intentona Comunista. O movimento vermelho forneceu o pretexto para Vargas preparar um golpe de estado. 6.3-O Estado Novo Com o pretexto de que o Brasil estava sendo ameaçado pelo comunismo, Getúlio Vargas apoiado pelas Forças Armadas pôs em pratica o "Plano Cohen", golpe de estado que deu origem ao Estado Novo.Fechou o Congresso Nacional em 1937, instalou o Estado Novo e passou a governar com poderes ditatoriais. A constituição de 1937, que criou o "Estado Novo", tinha caráter centralizador e autoritário: suprimiu a liberdade partidária, a independência entre os três poderes e o próprio federalismo existente no país, Vargas fechou o Congresso Nacional e criou o Tribunal de Segurança Nacional. Os prefeitos passaram a ser nomeados pelos governadores e esses, por sua vez, pelo presidente. Foi criado o DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda), com o intuito de projetar Getúlio Vargas como o "Pai dos Pobres" e o "Salvador da Pátria".Este governo assemelhava-se com o governo fascista de Mussolini da Itália. Assim como os nazi-fascistas, o Estado Novo perseguiu os comunistas.

No Estado Novo, Vargas deu mais importância à indústria, deixando de lado a agricultura. Iniciando a política nacional-desenvolvimentista, foram feitos investimentos na área de infraestrutura, criando a Companhia Siderúrgica Nacional (1940), a Vale do Rio Doce (1942), e a Hidrelétrica do Vale do São Francisco (1945).

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A criação do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, em 26 de novembro de 1930, foi uma das primeiras iniciativas do governo

revolucionário implantado no Brasil no dia 3 daquele mesmo mês sob a chefia de Getúlio Vargas. O "ministério da Revolução" - como foi chamado por Lindolfo Collor, o primeiro titular da pasta - surgiu para concretizar o projeto do novo regime de interferir sistematicamente no conflito entre capital e trabalho. Até então, no Brasil, as questões relativas ao mundo do trabalho eram tratadas pelo Ministério da Agricultura, sendo na realidade praticamente ignoradas pelo governo.

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Quando iniciou a Segunda Guerra Mundial, o Brasil manteve-se neutro no conflito. No entanto, quando os países do eixo declararam guerra aos Estados Unidos, o Brasil teve que apoiar os americanos já que o crescimento industrial do nosso país naquele momento dependia de capitais norte-americanos. Em 1945 a guerra chegava ao fim com os Países Aliados vencendo os Países do Eixo. As nações aliadas, defensoras da democracia, implantaram governos democráticos na Alemanha e Itália.

Como o Brasil pertencia ao grupo dos aliados, o Governo Ditatorial de Getúlio Vargas passou a ser mal visto. Porém, visando manter suas bases de poder e fazer face ao crescimento do Partido Comunista, Vargas criou, primeiramente, o PSD. Em seguida, organizou o PTB como partido político em maio de 1945, apenas um mês após a criação da UDN e do PSD. O PTB nasce sob chancela governamental, tendo como palco de articulação principal o Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio e como grande figura o então chefe do Estado Novo, o presidente Getúlio Vargas, no poder desde 1930.Tanto o PSD como o PTB resultam da frustação de um projeto de ―partido único de massas‖, que vinha sendo acalentado entre setores da cúpula do Estado Novo, mas que não conseguira superar dificuldades políticas, sobretudo as que diziam respeito às alianças entre lideranças regionais e lideranças sindicais. Getúlio Vargas visando a continuação de seu governo criou o Queremismo(Queremos Getúlio), movimento que buscava a permanência de Vargas na Presidência da República e que teve noPTB uma das mais importantes bases de sustentação.Getúlio Vargas foi deposto em 29 de outubrode 1945, por um golpe militar. Não houve resistência ao golpe por parte de Getúlio ou dos Queremistas.

Terminavam assim os 15 anos de governo da Era Vargas. O desmantelamento dos poderes estaduais e o fortalecimento de um governo central, o papel do Estado como principal investidor na economia, a criação de mecanismos sociais (como o sufrágio universal e a Consolidação das Leis do Trabalho) etc., são legados centrais, juntamente com a criação do primeiro grande partido trabalhista. A democracia, porém, ficou sempre em segundo plano.

O Presidente do Supremo Tribunal Federal, o ministro cearense José Linhares, assumiu, provisoriamente, a Presidência da República. Linhares era o substituto direto de Vargas, de acordo com a ordem sucessória da Constituição de 1937, que não previa a figura do Vice-Presidente.E teve como missão presidir as eleições de dezembro de 1945 e dar posse, em 31 de janeiro de 1946, aos que nela fossem eleitos.

6.4-A Constituição de 1946

O texto que se segue foi extraído/adaptado do texto de: http://www2.camara.leg.br/a-camara/conheca/

historia/historia/a4republica.html

Em meados de setembro de 1946, os constituintes assinavam a nova Carta na Mesa do plenário da Câmara dos Deputados. Começava aí a quarta República, um período de quase 20 anos de liberdade política e pluripartidarismo, interrompido pelo golpe militar de 1964. Após 15 anos de regime autoritário (1937-1945), os deputados e senadores constituintes aprovaram uma Constituição que restabelecia os Três Poderes da República e aperfeiçoava princípios da primeira Carta republicana. Sendo considerada um modelo pelos grandes juristas e tribunos da época, é reputada como a mais democrática das Constituições do país. Amplia os diretos da cidadania e permite a ampla formação de partidos, instalando a representação proporcional partidária. Registra-se a participação memorável dos deputados no plenário da Assembléia Constituinte e o início dos grandes debates nacionais para a formulação de novas leis para o país. Inaugura a primeira experiência efetivamente democrática da história constitucional do Brasil ao estabelecer as bases jurídicas do Estado de direito e ao conferir independência aos Poderes Legislativo e Judiciário. Todavia, manteve alguns traços distintivos do Estado Novo, como o corporativismo. Literalmente tão bem redigida quanto a de 1891, com a estrutura e as linhas gerais assemelhando-se, mas sem a rigidez presidencialista desta. Vigência de 18 de setembro de 1946 a 15 de março de 1967. A transição democrática se completa em 1947 com a eleição dos governadores e das Assembléias Constituintes dos estados. Conforme decisão constitucional a Assembléia Constituinte se transformou em Câmara dos Deputados e Senado Federal. Houve eleições para completar o número de 304 deputados - 38ª Legislatura (1946-1950), e que estavam previstos na Constituição de 1946. A Resolução nº 3.532, de 1950, do Tribunal

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Superior Eleitoral, manteve o quantitativo de 304 deputados para a 39ª Legislatura (1951-1954). A Lei nº 2.140, de 1953, determinou o quantitativo de 326 deputados para a 40ª Legislatura (1955-1958). Percentual que foi mantido na 41ª Legislatura (1959-1962). A Lei nº 4.095, de 1962, determinou o quantitativo de 404 deputados para a 42ª Legislatura (1963-1966). Percentual que foi mantido para a 43ª Legislatura (1967-1970), mas que foi aumentado para 409 deputados devido atranformação do Território do Acre em Estado. Com a nova Constituição, fica restabelecido o princípio federativo, com a autonomia para os Estados e Municípios e a independência dos três Poderes da União. O Poder Legislativo volta a ser bicameral, com o Senado voltando à posição de 1891. As eleições passam a ser diretas em todos os níveis, e há liberdade de organização partidária. Os deputados serão eleitos por sufrágio universal, voto secreto e direto, com sistema de representação proporcional dos partidos políticos. O Poder Legislativo nos Estados é exercido pelas Assembléias Legislativas. Admite-se, porém, uma fonte de atrito incompatível com o presidencialismo: a possibilidade de presidente e vice-presidente da República serem eleitos por partidos diversos. O Congresso Nacional abrirá seus trabalhos a 15 de março de cada ano e encerrará a sessão legislativa no dia 15 de dezembro (período legislativo de nove meses), com Legislatura de quatro anos. Estabelece a liberdade de culto, a total liberdade de pensamento, limitada apenas no que diz respeito aos espetáculos e diversões públicas. As liberdades e garantias individuais não podem ser cerceadas por qualquer expediente autoritário, reservada a aprovação do estado de sítio unicamente ao Congresso Nacional. A organização partidária é livre, apesar de que a ressalva que impedia a organização, registro ou funcionamento de qualquer partido político ou associação, cujo programa ou ação contrariasse o regime democrático, se tenha mostrado contraditória. O Estado social amplia suas conquistas ao tratar da participação obrigatória e direta do trabalhador nos lucros das empresas, com a instituição do repouso semanal remunerado, o reconhecimento do direito de greve, a aposentadoria facultativa do funcionário com 35 anos de serviço e a inserção da Justiça do Trabalho na esfera do Poder Judiciário. Mas um dos destaques para o aperfeiçoamento do Estado Democrático de Direito é a declaração, no Capítulo dos Direitos e das Garantias Individuais, de que a lei não poderá excluir da apreciação do Poder Judiciário qualquer lesão de direito individual. A Constituição, nesse caso, assegura um Estado Social de Direito vazado na mais ampla tradição liberal dos juristas brasileiros. São excluídas as penas de morte, banimento e confisco. Fica assegurado a todos os cidadãos trabalho que possibilite uma existência digna, e eleva-o à condição de obrigação social. Proclama o princípio da intervenção do Estado no domínio econômico e dá-lhe as bases que se assentam no interesse público; estabelece os limites da intervenção, que são os direitos fundamentais, objeto das garantias contidas na Constituição; condiciona o uso da propriedade ao bem-estar social e dispõe que a lei reprimirá toda e qualquer forma de abuso do poder econômico. Com respeito à legislação trabalhista e à previdência social, é declarada a participação obrigatória e direta do trabalhador nos lucros da empresa; instituído o repouso semanal remunerado e o salário mínimo; é conferido ao trabalhador estabilidade na empresa; proclamada a assistência aos desempregados; determinada a indenização ao trabalhador despedido; estendida a previdência às vítimas da doença, da velhice, da invalidez e da morte; passa a ser livre a associação profissional ou sindical; e são reconhecidos os direitos de greve e ao ensino gratuito. A educação deve se inspirar nos princípios da liberdade e nos ideais da solidariedade humana. O amparo à cultura é dever do Estado. Desaparece a representação classista e os órgãos de cooperação governamental; o Tribunal de Contas passa a ser regulado pelo Poder Legislativo como órgão de fiscalização orçamentária deste. As finanças municipais passam a ter um tratamento diferenciado, e o Brasil agrícola recebe uma política de recuperação das áreas atrasadas. Em contraste com outras constituições estrangeiras, as do Brasil, até então, não previam a punição de parlamentares indisciplinados ou de procedimento incompatível com as suas funções. É, então, instituída a Polícia Parlamentar. O art. 48, § 2º estatui que "perderá, igualmente, o mandato, o deputado ou senador cujo procedimento seja reputado, pelo voto de dois terços dos membros de sua Câmara, incompatível com o decoro parlamentar".

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Em síntese, os direitos civis e políticos, somados ao conceito de liberdade, foram assegurados, com acréscimo dos direitos sociais, culturais e econômicos, direitos coletivos e da coletividade, que passam a integrar a conquista da igualdade entre os cidadãos.

6.5-A Experiência Democrática ou República Populista12, 1945-1964

A eleição presidencial brasileira de 1945 foi a décima quarta eleição presidencial e a décima-segunda direta, mas é considerada a primeira eleição presidencial verdadeiramente democrática da História do Brasil. Pela primeira vez as mulheres votaram, praticamente, não houve acusações de fraude no pleito de 1945 e seu resultado foi acatado pela totalidade das forças políticas da época. Foi eleito o general Eurico Gaspar Dutra, o candidato do Partido Social Democrático (PSD), como Presidente da República. Além do novo presidente, elegeu-se também uma Assembleia Nacional Constituinte, com o objetivo de elaborar uma nova Constituição para o país. Nessa Assembleia, o PSD foi majoritário, com 54% dos membros. A novidade era a reduzida, porém combativa bancada comunista (14 deputados federais e um senador, Luís Carlos Prestes). Em síntese, a Assembléia, majoritariamente composta por elementos saídos da elite dominante, preservava a antiga ordem em suas linhas gerais.Na formação da Assembleia Nacional Constituinte de 1946, Getúlio Vargas foi eleito senador pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), legenda que ajudara a criar. Era o início de um regime democrático que duraria 19 anos, sobrevivendo entre diversas crises políticas.

6.5.1-O Governo Dutra

No Governo Dutra (1946-51) foi promulgada uma nova constituição, que manteve a república presidencialista e o princípio federativo e tornava os partidos políticos totalmente livres. Foi instituído o voto secreto e universal e a divisão do estado em três poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário). Externamente seu governo foi marcado pela aproximação com os Estados Unidos – início da guerra fria e a opção brasileira pelo capitalismo. Como reflexo desta política houve o rompimento das relações diplomáticas com a União Soviética e o Partido Comunista foi colocado na ilegalidade. A ação mais importante do Governo Dutra foi a criação do SALTE, plano social e econômico que integrava saúde alimentação, transporte e energia, o primeiro planejamento global da economia brasileira.Na época, o Brasil passava por um grande processo de urbanização nas capitais, devido aos investimentos maciços de indústrias nacionais e estrangeiras para impulsionar a economia urbana. Esse crescimento desordenado suscitou em um complicado período inflacionário:ao mesmo tempo que era injetado dinheiro nos centros urbanos, aumentava o custo de vida da população. O objetivo do Plano SALTE era direcionar o dinheiro público para setores emergenciais. Por mais que se apresentasse como uma iniciativa para diminuir os problemas sociais do país, o Plano SALTE acabou se tornando o pesadelo dos trabalhadores. Com o objetivo de diminuir a inflação, Gaspar Dutra cortou inúmeros gastos, dentre eles o piso salarial mínimo, que chegou a cair para a metade do que era antes.Ao mesmo tempo elevava-se o preço do café e das matérias-primas, auxiliando a balança comercial brasileira.

6.5.2-O Retorno de Vargas ao Poder Getúlio Vargas, maior expoente do populismo no Brasil, retornou ao poder de forma legal, sucedendo o seu sucessor. A Segunda presidência de Vargas foi marcada pelo nacionalismo e pelo intervencionismo estatal na economia, trazendo insatisfações ao empresariado nacional e ao capital internacional. Em 1951 o nacionalismo econômico de Vargas efetivou-se no projeto de estabelecer o monopólio estatal do

12http://jchistorybrasil.webnode.com.br/terceira-republica-ou-republica-populista-1945-1964-/ O período que vai da queda do Estado Novo (1945) ao Golpe Militar de 1964, foi marcado pelo Populismo.―Denomina-se Populismo, à forma de manifestação das insatisfações da massa urbana e, ao mesmo tempo, o seu reconhecimento e manipulação pelo Estado. Do ponto de vista da camada dirigente, o Populismo é, por sua vez, a forma dada ao Estado para dar conta dos anseios populares e, simultaneamente, elaborar mecanismos de seu controle. Esta nova conjuntura é determinada pelo desenvolvimento industrial e urbano que ocorrera nos anos anteriores a1930, mas que, após a Revolução, é ele próprio induzido pela ação do Estado‖. (Luís Koshiba e Denise Pereira)

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petróleo. Esse programa, que mobilizou boa parte a população brasileira tinha como slogan ―O Petróleo é nosso‖, resultando na criação da Petrobrás – empresa estatal que monopolizou a exploração e o refino do petróleo no Brasil. Propôs, no ano de 1954, um reajuste de 100% no salário mínimo, como forma de compensar as perdas salariais, em virtude da inflação.A aplicação de uma política nacionalista, bem como a aproximação de Vargas à classe trabalhadora, preocupava a classe dominante. Temia-se a criação de uma República Sindicalista, como na Argentina de Perón. O líder da oposição a Vargas era o jornalista Carlos Lacerda, que denunciava uma série de irregularidades do governo; Lacerda também era o porta-voz dos setores ligados ao capital estrangeiro.Neste contexto ocorreu o atentado da Rua Toneleiros, uma tentativa de assassinar Carlos Lacerda. No episódio foi morto o major da aeronáutica Rubens Vaz. Os resultados da investigação apontaram que Gregório Fortunato - principal guarda-costas do presidente - como o responsável pelo acontecimento. Embora nunca tivesse ficado provado a participação de Getúlio Vargas no episódio, este foi acusado pelos opositores como o mandante do atentado. Em 23 de agosto o vice-presidente, Café Filho rompeu com o presidente; no mesmo dia, o Exército divulga um manifesto exigindo a renúncia de Vargas. Na madrugada de 24 de agosto, Getúlio Vargas suicidou-se com um tiro no coração. 6.5.3-Governo de Café Filho (1954/1955) Após a morte de Vargas, Café Filho – vice de Vargas assumiu o poder. Nas eleições de 1956, o candidato da aliança PSD-PTB – Juscelino Kubitschek – venceu. O período de governo de Café Filho apresentou uma crise política quando o coronel Bizarria Mamede, da Escola Superior de Guerra, proferiu um discurso contra a posse de JK. Ficava claro a tentativa de um golpe e Henrique Lott, um defensor da legalidade constitucional e da posse dos candidatos eleitos, antecipou-se aos golpistas. Lott não assinou o pedido de demissão e organizou um contra-golpe. A presidência foi entregue ao presidente do Senado, Nereu Ramos, que governou até a posse de Juscelino Kubitschek (31/01/56). 6.5.4-Governo de Juscelino Kubitschek (1956/1961) Juscelino Kubitschek tomou posse da presidência do Brasil num clima tenso, pois a UDN posicionou-se contra sua posse. Somente com a proteção do exército e que Juscelino pôde exercer o seu mandato. Seu governo marcado pelo grande desenvolvimento econômico. Política econômica delineada pelo Plano de Metas, que tinha como lema ―Cinqüenta anos de progresso em cinco de governo.‖A realização do Plano de Metas resultou na expansão e consolidação do "capitalismo associado ou dependente" brasileiro, pois o processo de industrialização ocorreu em torno das empresas estrangeiras (as multinacionais). Estas empresas controlaram os setores chaves da economia nacional – maquinaria pesada, alumínio, setor automobilístico, construção naval – ocasionando a desnacionalização econômica.A política econômica de JK acarretou um processo inflacionário, em razão da intensa emissão monetária, e a política de abertura ao capital estrangeiro resultou em remessas de lucros e royalties ao exterior. O período de JK foi marcado, também, pela construção de Brasília, pela criação da Sudene (Superitendência para o Desenvolvimento do Nordeste). Todas as grandes construções realizadas no Governo Juscelino Kubitschek só foram possíveis com o uso do capital estrangeiro. Tais investimentos aumentaram a dívida externa do país. A inflação cresceu como nunca havia acontecido.A era JK foi também marcada por crises políticas, ocorrendo duas tentativas de golpe: o levante de Jacareacanga e o de Aragarças – insurreições por parte de alguns militares. No final de seu governo a dívida externa brasileira aumentou consideravelmente, levando o país a recorrer ao FMI e ao seu receituário. 6.5.5-Governo de Jânio Quadros (1961) Em 1960 houve eleições e Jânio da Silva Quadros, então governador de São Paulo foi o vencedor, tendo como partido político a UDN e como vice-presidente João Goulart, da coligação PSD/PTB. Jânio assume a presidência em um contexto de grave crise financeira: intensa inflação, crescimento da dívida externa e déficit na balança de pagamentos. Visando restabelecer o equilíbrio financeiro do país, Jânio realizou um reajuste cambial, restringiu os créditos, incentivou as exportações e congelou os

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salários. Iniciou a apuração de denúncias de corrupção administrativa e nomeou uma comissão para definir a limitação da remessa de lucros para o exterior. No campo externo, Jânio Quadros procurou estabelecer uma política externa independente dos Estados Unidos: aproximou-se dos países socialistas ao restabelecer as relações diplomáticas com a União Soviética, enviou o vice-presidente (João Goulart) à China e prestigiou a Revolução Cubana, ao condecorar com a Ordem do Cruzeiro do Sul um de seus líderes, Ernesto ―Che‖ Guevara. Tais atitudes preocuparam os norte-americanos e a classe dominante nacional. Jânio passou a ser mal visto também pelos setores conservadores do governo. As medidas econômicas e financeiras tomadas por Jânio Quadros mostraram-se desastrosas pois as mesmas fizeram com que o salário dos trabalhadores fossem congelados e os burguesia perdesse a facilidade de credito.As ações populistas já não eram tão eficazes como antes.

Sem apoio político, Jânio Quadros renunciou ao cargo de presidente em 25 de Agosto de 1961. Alegou que Forças Ocultas o fizeram a tomar esta decisão.Muitos historiadores políticos acreditam que, na verdade Jânio Quadros queria dar um Golpe de Estado. Como o seu vice, João Goulart, era visto como um comunista, acreditava ele que o Congresso jamais entregaria a Presidência a João Goulart. Jânio Quadros pensou que o Congresso e as Forças Armadas o forçariam a continuar na presidência, agora com os poderes fortalecidos.

6.5.6-Governo de João Goulart (1961/1964)

João Goulart – cujo apelido nos meios sindicais era Jango – não era bem visto pela elite nacional e pelas Forças Armadas. Era tido como agitador e com tendências comunistas. Representava uma ameaça a ―segurança nacional‖ trazendo risco às instituições democráticas do país.Sob estas alegações, os ministros militares pediram ao Congresso Nacional a permanência de Raniere Mazzilli na presidência –que assumiu interinamente visto que Jango estava na China. Contra a tentativa de golpe o governador do Rio Grande do Sul –Leonel Brizola –, e cunhado de João Goulart liderou a chamada ―campanha de legalidade‖, que buscava garantir a posse de João Goulart.

Para conciliar as duas correntes – favorável e contra a posse – o Congresso Nacional aprovou um ato adicional em 02 de setembro de 1961, estabelecendo o sistema parlamentarista no Brasil. Com o parlamentarismo os poderes do presidente foram limitados sendo que o primeiro-ministro é que governaria de fato.

Agora a situação era outra: João Goulart era vice-presidente e pela Constituição tinha de assumir a presidência. Os três ministros militares opunham-se ardentemente a sua posse como presidente da República, afirmando categoricamente que não permitiriam sua ascensão ao Governo e que por motivos de segurança nacional seu regresso ao Brasil seria absolutamente inconveniente. Tinham especial temor pelo fato de associarem a figura de João Goulart com forças comunistas, que na visão dos militares, certamente levariam o país à ruína subversiva.

Tal crise poderia ter gerado a antecipação do golpe militar de 1964 não fosse a ausência de um fator de substancial importância para qualquer ação militar: a unidade das Forças Armadas. No Rio Grande do Sul, sede do III Exército, o Governo local armava-se para enfrentar qualquer ação que impedisse a legítima posse de João Goulart, fundamentados sob o manto da legalidade e da constitucionalidade. Nesse contexto é que o líder do III Exército, Marechal Lopes, aderira ao movimento, opondo-se expressamente a orientação dos ministros militares de veto à posse do legítimo mandatário da vontade popular, numa promessa de obediência à Constituição.

Dois grupos, a partir de então se formaram. O primeiro, o daqueles que defendiam, inspirados nos ditames constitucionais, a posse de João Goulart para presidente, e o segundo, o daqueles que se opunham à posse de João Goulart, sendo este último constituído sobretudo pelos militares. Para resolver o impasse e chegar-se a um acordo, aprovou-se uma emenda constitucional que preconizava, em suma, o regime parlamentarista. Assim, João Goulart não teria plenos poderes para governar, suas ações ―subversivas‖ estariam contidas, na visão dos militares e a Constituição seria respeitada. Instaurar-se-ia, a partir de agosto de 1961, o regime parlamentarista no Brasil, o qual não demorou a ser derrubado. João Goulart

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precisava de poderes absolutos para governar, tendo em vista que dele se exigiriam muitas reformas a serem implementadas, tais como a reforma agrária e a reforma urbana, as quais sem os poderes do presidencialismo seriam impossíveis de serem levadas adiante. Não se acreditava que o Parlamento pudesse levar a cabo as reformas tão necessárias naquele momento.

Os Gabinetes parlamentares rapidamente se sucediam, passando de Primeiro Ministro para Primeiro Ministro, de Tancredo Neves passara para Auro Moura e, após para Brochado da Rocha e Hermes Lima; todos renunciaram. O fato é que, em janeiro de 1963, o povo foi chamado a um referendopara decidir sobre a permanência ou não do regime parlamentarista e como resultado garantiram a volta ao presidencialismo, o qual conferia poderes plenos a Jango, que agora era também o chefe de governo do Estado Brasileiro. Era o fim do parlamentarismo.

Inicia-se uma segunda fase do governo de João Goulart marcada pela execução do chamado Plano Trienal, que buscava combater a inflação e realizar o desenvolvimento econômico. O plano deveria ser acompanhado de uma série de reformas estruturais, denominadas reformas de base, que incluía a reforma agrária; a reforma eleitoral – estendendo o direito de votos aos analfabetos; a reforma universitária, ampliando o número de vagas nas faculdades públicas e a reforma financeira e administrativa, procurando limitar a remessa de lucro e os lucros dos bancos.

O descontentamento com a política do governo aumentou a partir do dia 13 de março de 1964 quando, num comício na Central do Brasil – diante de 200 mil trabalhadores – Jango radicalizou sua promessa de reforma agrária, lançou a ideia de uma ―reforma urbana‖ e decretou a nacionalização das refinarias particulares de petróleo.A reação uniu os grandes empresários, proprietários rurais, setores conservadores da Igreja Católica e a classe média urbana que realizaram a Marcha da Família com Deus e pela Liberdade.

Em seguida houve uma revolta dos marinheiros do Rio de Janeiro, servindo de pretexto para o golpe militar alegava-se que a disciplina nas Forças Armadas estava em jogo. Na noite de 31 de março de 1964 o general Olympío Mourão Filho colocou a guarnição de Juiz de Fora em direção ao Rio de Janeiro. No dia 1º de abril João Goulart foi deposto Encerrava-se assim o período democrático e iniciava-se a República Militar no Brasil13.

PRESIDENTES DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL, 1945-1964, com afiliação partidária14 José Linhares (interino, 1945-1946), sem partido Eurico Gaspar Dutra (1946-1951),PSD Getúlio Vargas (1951-1954),PTB João Café Filho (interino, 1954-1955),PSP Carlos Luz (interino, 1955),PSD Nereu de Oliveira Ramos (interino, 1955-1956),PSD Juscelino Kubitschek (1956-1961),PSD Jânio Quadros (1961),UDN Paschoal Ranieri Mazzilli (interino, 1961),PSD João Goulart (em regime parlamentarista, 1961-1963),PTB João Goulart (restauração do regime presidencialista, 1963-1964),PTB 7-A Ditadura Militar no Brasil, 1964-1984

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As Forças Armadas brasileiras adquiriram grande poder político desde a vitória na Guerra do Paraguai. A politização das instituições militares ficou evidente na Proclamação da República, que derrubou o Império e colocou no poder dois presidentes militares;ou com o tenentismo e a Revolução de 1930. Na década de 1950, importantes círculos militares se aliaram a ativistas de direita em tentativas de impedir que presidentes como Juscelino Kubitschek e João Goulart tomassem posse, devido ao seu suposto alinhamento com a ideologia comunista. O ponto crítico das tensões ocorreu quando Goulart prometeu reformas de longo alcance, expropriação de interesses comerciais e a continuação da independência da política externa iniciada por seu antecessor Jânio Quadros, com o Brasil tendo relações diplomáticas e comerciais com ambos os blocos capitalista e comunista. Certamente os militares temiam que fosse implantado no Brasil um regime socialista, à semelhança de Cuba. 14

http://www.infoescola.com/historia/republica-liberal-no-brasil/

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Segundo CODATO (2005): ―A ação final contra a ―democracia populista‖ (1946-1964) ou, como preferem os conservadores, a ―Revolução‖, trouxe duas novidades. Não se tratava mais de uma operação intermitente dasForças Armadas com um objetivo preciso, quase sempre o de combater a ―desordem‖ (a política de massas) ou o ―comunismo‖ (a política social) ou a ―corrupção‖ (i. e., a política propriamente dita), mas de uma intervenção permanente. A garantia política que as Forças Armadas emprestaram aos governos civis, notadamente no pós-1930,convertia-se agora num governo militar.‖ (...) ―um movimento institucional das ForçasArmadas (O’DONNELL, 1975; CARDOSO,1982). Foi o aparelho militar, e não um líder político militar, que passou a controlar primeiramente o governo (i. e., o Executivo), depois o Estado (e seus vários aparelhos) e, em seguida, a cena política (i. e., as instituições representativas).‖

Após a deposição de Goulart por golpe militar em 31 de março de a1964, em 9 de abril, é decretado o Ato Institucional Número 1 (AI-1), pelo qual se cassavam os mandatos políticos de opositores ao regime militar e se tirava a estabilidade de funcionários públicos.Foram suspensas as garantias constitucionais, coma supressão de liberdades individuais e a criação de um código de processo penal militar que permitiu que o Exército brasileiro e a polícia militar do Brasil pudessem prender e encarcerar pessoas consideradas suspeitas, além de impossibilitar qualquer revisão judicial. O Congresso Nacional foi dissolvido, e as eleições para vários cargos passaram a ser realizadas de forma indireta. O cargo de presidente passou a ser exercido pelos generais das forças armadas. O novo regime adotou uma diretriz nacionalista, desenvolvimentista e de combate ao comunismo e passou a governar por Atos Institucionais e por Decretos-Leis. 7.1-Os Atos Institucionais

A partir de 1º de abril, na prática uma junta militar governava o Brasil, porém formalmente foi declarado vago o cargo de presidente da república, pelo senador Auro de Moura Andrade, presidente do Senado Federal, que empossou o presidente da Câmara dos Deputados,Ranieri Mazzilli na presidência.

No dia 7 de abril de 1964, os ministros militares ignoraram o "Ato Constitucional" dos líderes parlamentares, que limitavam o expurgo no serviço público em todos os níveis, e deram início à série de "Atos Institucionais". Foram decretados dezessete atos institucionais, e cento e quatro Atos Complementares a eles.

A 9 de abril, foi baixado o "Ato Institucional"15, redigido por Francisco Campos, e que era para ser o único ato institucionalizador da "revolução de 1964". Dois dias depois, o marechal Castelo Branco - chefe do Estado-Maior e coordenador do golpe contra Jango - foi eleito presidente pelo Congresso; tomou posse na presidência em 15 de abril de 1964 para completar o mandato de Jânio Quadros, que iria de 31 de janeiro de 1961 até 31 de janeiro de 1966.

O "Ato Institucional" transferia poderes excepcionais para o executivo, ao mesmo tempo em que subtraia a autonomia do legislativo. O AI-1 marcava eleições presidenciais para outubro de 1965 e concedia à Junta Militar, entre outros tantos, o poder de cassar mandatos parlamentares.

Houve uma razão lógica para a decretação do Ato, que foi uma medida mais estratégica do que o diálogo. Os políticos, em sua maioria, estavam reticentes quanto aos caminhos que seriam tomados pelo governo de então. Naquela altura, a conversa, o convencimento pela razão e pelos argumentos seriam inócuos e demandariam muito tempo, o que daria espaço e fôlego aos depostos ou à oposição de se reorganizar. Os militares acreditavam na necessidade urgente de legitimar o golpe "por si mesmo".

Novas medidas vieram, com o enrijecimento ainda maior da ditadura: revogação da nacionalização das refinarias de petróleo; revogação dos decretos de desapropriação de terras; cassação e suspensão de direitos políticos; demissão de funcionários públicos; instauração de inquéritos; e o rompimento de relações diplomáticas com Cuba.

O governo da ditadura difundiu a ideia de que a intervenção militar impediu a implantação de um regime comunista no Brasil e utilizou-se desse argumento para justificar as suas ações arbitrárias e violentas.

Ao longo dos governos dos generais Humberto de Alencar Castelo Branco (1964-1967) e Artur da Costa e Silva (1967-1969), os Atos Institucionais foram promulgados e emendaram a Constituição durante todo o período da ditadura. Foi o fim do Estado de direito e das instituições democráticas.

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Porém, depois da edição do AI-2 (ver abaixo), o "Ato Adicional" inicial foi numerado como AI-1.

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No dia 10 de abril de 1964, a junta militar divulgou o Ato do Comando Revolucionário Nº 1, com a lista de cem nomes de suspeitos de serem comunistas, cujos direitos políticos foram suspensos. No mesmo dia, foi publicado Ato do Comando Revolucionário Nº 2, cassando o mandato de 40 membros do Congresso Nacional, que já haviam sido incluídos no ato de suspensão dos direitos políticos. Em 14 de Abril, o Ato Complementar No. 9 transforma a oposição em inimiga da Nação. A repressão se instalou imediatamente após o golpe de Estado antes do começo da luta armada. As associações civis contrárias ao regime eram consideradas inimigas do Estado, portanto passíveis de serem enquadradas.

Muitas instituições foram reprimidas e fechadas, seus dirigentes presos e enquadrados, suas famílias vigiadas. Na mesma época se formou dentro do governo um grupo que depois seria chamado de comunidade de informações. As greves de trabalhadores e estudantes foram proibidas e passaram a ser consideradas crime; os sindicatos sofreram intervenção federal, os líderes sindicais que se mostravam contrários eram enquadrados na Lei de Segurança Nacional como subversivos. Muitos cidadãos que se manifestaram contrários ao novo regime foram indiciados em Inquéritos Policiais Militares (IPM). Aqueles cujo inquérito concluísse culpados, eram presos. Políticos de oposição tiveram seus mandatos cassados, suas famílias postas sob vigilância. Muitos foram processados e expulsos do Brasil e tiveram seus bens indisponíveis.

Em julho de 1965, os governadores Magalhães Pinto (Minas Gerais) e Carlos Lacerda (Guanabara) que patrocinaram a conspiração anti-Jango com verbas e auxílio logístico, romperam com o governo federal. Naquele ano houve eleiçõesestaduais, segundo uma previsão legal anterior ao golpe militar. Com a vitória da oposição nas eleições em cinco estados do país, (especialmente as de Israel Pinheiro em Minas Gerais e Negrão de Lima na Guanabara- atual RJ), os militares avançam com a repressão: são reabertos os processos de cassação, partidos políticos são extintos, suas sedes invadidas e desativadas e o Poder Judiciário sofre intervenção do Executivo.

O Ato Institucional Número Dois, ou AI-2, foi baixado em outubro de 1965 como resposta aos resultados das eleições que ocorreram no início deste mês, sob o pretexto de quecertos dispositivos da Constituição de 1946 não eram compatíveis com a nova ordem "revolucionária".

O AI-2 extinguiu o pluripartidarismo, desativando todos os partidos políticos, e criando somente dois; o primeiro, partido situacionista, chamado deAliança Renovadora Nacional, ARENA, o segundo, um partido para fazer oposição ao primeiro, chamado de Movimento Democrático Brasileiro, MDB. Tornou indireta a eleição do Presidente da República, transferindo-a para o Congresso Nacional (dominado pela ARENA), mas também tornou o presidente Castelo Branco inelegível para este pleito.

Com o AI-2, o Poder Judiciário sofre intervenção direta do Poder Executivo. O Presidente precisava de mais poderes para fazer aprovar leis; a Justiça Militar precisava entrar na competência da Justiça Civil; o número de ministros do Supremo Tribunal Federal foi aumentado de onze para dezesseis, proporcionando ao governo a maioria no STF, desta forma, civis poderiam ser presos e processados por crimes contra a segurança nacional, a justiça ordinária era sobreposta pela justiça revolucionária.Desta forma, os julgamentos das ações dos golpistas deixam de ser competência da justiça civil, a legislatura passa a ser em causa própria, o Estado entra num regime de exceção ainda mais excludente dos direitos individuais do cidadão.

Reativou o poder presidencial de cassar e banir da vida pública os "subversivos", o estado de sítio poderia ser decretado por 180 dias sem consulta ao Congresso, com estes recursos, qualquer que fosse o rumo tomado pela política nacional, sempre iria prevalecer a vontade do poder executivo, este era mais um artifício para forçar a perpetuação dos militares no poder.

Poderiam ser demitidos sumariamente funcionários civis e militares que tivessem suas atividades consideradas incompatíveis com a revolução. De acordo com a constituição, os funcionários públicos, não poderiam ser demitidos sumariamente, este dispositivo, havia sido criado pelo Estatuto do Funcionário Público para evitar as perseguições políticas. Com o advento do AI-2, estas garantias foram canceladas e deixou de existir o dispositivo de ampla defesa do funcionário público na constituição, ficando seu emprego falível.

A autonomia dos entes federativos também foi violada, pois que a intervenção federal nos estados e municípios poderia ser decretada sem prévio aviso. O Congresso Nacional poderia ser fechado a qualquer momento. Desta forma, toda e qualquer resistência ao regime no país era cancelada pelo dispositivo institucional, se o presidente assim o decidisse, qualquer cidade ou estado poderiam ser isolados do resto da nação.

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Foram institucionalizados os Atos Complementares que poderiam ser baixados juntamente com decretos-lei, a qualquer momento, sob a alegação de assuntos relativos à segurança nacional. Desta maneira, todas as instituições ficavam subordinadas ao Conselho de Segurança Nacional, que passaria a baixar diretrizes, aconselhando ao Presidente, de que forma o Executivo deveria se comportar perante a Nação.

O AI-2 continuou em vigor até 15 de Março de 1967, quando Costa e Silva tomou posse e a nova Constituição de 1967, proposta pelo Executivo e ratificada pelo Congresso, entrou em vigor.

O Ato Institucional Número Três, ou AI-3, foi baixado pelo Presidente Humberto de Alencar Castelo Branco em 5 de fevereiro de 1966. A edição deste ato se fez necessária porque a derrota da ARENA, partido situacionista, nas eleições dos governos de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, estados onde se concentrava a maior população do Brasil, era iminente. Caso acontecesse, malograria todo o esforço dos golpistas. Novamente violando o princípio federativo da legitimação própria, o AI-3 determinava que a eleição de governadores e vice governadores seria indireta, executada por colégio eleitoral estadual, os prefeitos das capitais e das cidades de segurança nacional não seriam mais eleitos e sim indicados por nomeação pelos governadores.

Em seu artigo sexto excluía de ...(sic) apreciação judicial os atos praticados com fundamento no presente Ato institucional e nos atos complementares dele. Não se poderia contestar judicialmente a legalidade ou não da decisão tomada, reforçando a tese de que o regime estava aos poucos endurecendo.

Ato Institucional Número Quatro, ou AI-4 foi baixado por Castelo Branco em dezembro de 1966 convocando o Congresso Nacional para a votação e promulgação do projeto de Constituição, que revogava definitivamente a Constituição de 1946. Em 24 de janeiro de 1967, foi promulgada pelo Congresso Nacional uma nova Constituição, a quinta do período republicano. Essa Constituição, que dava grandes poderes ao presidente da República, seria modificada pela Emenda Constitucional N° 1, de 17 de outubro de 1969, que tornou o poder político ainda mais centralizado nas mãos do Executivo.

O Ato Institucional Nº 5 ou AI-5, sobrepondo-se à Constituição de 24 de janeiro de 1967, bem como às constituições estaduais, dava poderes ainda mais extraordinários ao Presidente da República e suspendia várias garantias constitucionais, tendo como primeira consequênciao fechamento do Congresso Nacional por quase um ano

Pelo artigo 2º do AI-5, o Presidente da República podia decretar o recesso do Congresso Nacional, das Assembléias Legislativas e das Câmaras de Vereadores, que só voltariam a funcionar quando o Presidente os convocasse. Durante o recesso, o Poder Executivo federal, estadual ou municipal, cumpriria as funções do Legislativo correspondente. Ademais, o Poder Judiciário também se subordinava ao Executivo, pois os atos praticados de acordo com o AI-5 e seus Atos Complementares excluiam-se de qualquer apreciação judicial (artigo 11).

Conforme o artigo 4°, o Presidente da República, ouvido o Conselho de Segurança Nacional, e "sem as limitações previstas na Constituição", podia decretar a intervenção nos estados e municípios, podia suspender os direitos políticos de quaisquer cidadãos por 10 anos e cassar mandatos eletivos federais, estaduais e municipais. Pelo artigo 5°, a suspensão dos direitos políticos, significava:I - cessação de privilégio de foro por prerrogativa de função; II - suspensão do direito de votar e ser votado nas eleições sindicais; III - proibição de atividades ou manifestação sobre assunto de natureza política; IV - aplicação, pelo Ministério da Justiça, independentemente de apreciação pelo Poder Judiciário, das seguintes medidas: a) liberdade vigiada; b) proibição de freqüentar determinados lugares; c) domicílio determinado.

Além disso, "outras restrições ou proibições ao exercício de quaisquer outros direitos públicos ou privados poderiam ser estabelecidas à discrição do Executivo.O Presidente da República podia também, conforme o artigo 8º, decretar o confisco de bens em decorrência de enriquecimento ilícito no exercício de cargo ou função pública, após a devida investigação - com cláusula de restituição se provada a legitimidade da aquisição dos bens.

O artigo 10 suspendia a garantia de habeas corpus, nos casos de crimes políticos, contra a segurança nacional, a ordem econômica e social e a economia popular. Durante a vigência do AI-5, também recrudesceu a censura. A censura prévia se estendia à imprensa, à música, ao teatro e ao cinema.

O AI-5 vinha na esteira de ações e declarações que, por um lado, expressavam o confronto da classe política com o regime, e assim fortaleceu a chamada ―linha dura‖ do regime militar. Os militares assumiram definitivamente que não estavam dispostos a ser um poder moderador e sim uma ditadura, colocaram a engrenagem para rodar as teses da Escola Superior de Guerra(ESG), o desenvolvimentismo imposto à

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sociedade.Assim, os Atos Institucionais e seus atos complementares se sucederam até o número dezessete.

7.2-O Decreto-Lei

Além dos Atos Institucionais, o regime militar governava por intermédio dos decretos-leis, fundados nos Atos Institucionais nº 2, de 27 de outubro de 1965 e nº 4, de 7 de dezembro de 1966, no artigo 58 do texto original da Constituição de 24 de janeiro de 1967, do artigo 55 da mesma Constituição de 1967, com a redação que lhe foi dada pela Emenda Constitucional nº 1, de 17 de outubro de 1969 e, editados com base no Ato Institucional nº 5, de 13 de dezembro de 1968.

A expedição do decreto-lei pressupunha alternativamente urgência ou interesse público relevante. O decreto-lei não podia implicar aumento de despesa e restringia-se a determinadas matérias. Em caso de ausência de manifestação do Congresso Nacional, o decreto-lei era considerado definitivamente aprovado por decurso de prazo, num período de 30 dias. Em caso de rejeição pelo Congresso, era como se o decreto-lei tivesse sido revogado (art.55, §2º da Emenda n° 1 à Constituição Brasileira de 1967: A rejeição do decreto-lei não implicará a nulidade dos atos praticados durante a sua vigência). O decreto-lei só podia ser rejeitado na sua totalidade, não poderia sofrer emendas.

7.3-O Governo Militar

A população era massificada pela propaganda institucional e pela propaganda nos meios de comunicação, que ou eram amordaçados pela censura ou patrocinavam a ditadura com programas de televisão – monopolizados pela Rede Globo - muito bem elaborados com audiência de milhões de telespectadores em horário nobre, número muito expressivo para a época. Havia muitos programas locais com farta publicidade também de cunho institucional, as maravilhas e a grandeza do país eram enaltecidas, slogans eram distribuídos fartamente em todos os meios de comunicação. Nesta época, foram liberados milhões de dólares a juros baixos para a montagem de centenas de canais de televisão e ampliação das grandes redes de alcance nacional. O ministério das Comunicações e a Delegacia Nacional de Telecomunicações, Dentel, liberaram milhares de canais de rádio e de televisão, a fim de possibilitar a formação de uma rede nacional de telecomunicações de alcance continental.

7.3.1-Humberto Alencar Castelo Branco (1964-1967)

Criou o SNI – Serviço Nacional de Informações, o Conselho Monetário Nacional e o Banco Central. Aprovou o Estatuto da Terra, que instituía a reforma agrária (mas não foi implementado).Em 1966 o governo instituiu o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e o Instituto Nacional de Previdência Social (INPS).Em 1967, estabeleceu duas leis essenciais para deliberar os limites do novo sistema político vigente: a Lei de Imprensa, que abrandava a liberdade de expressão, e a Lei de Segurança Nacional.Foi formulado e implementado o PAEG – Plano de Ação Econômica do Governo –, o qual tinha por objetivo refrear a inflação e recuperar o crescimento econômico do país.

7.3.2-Artur da Costa e Silva (1967-1969)

Combateu a inflação, revisou a política salarial e ampliou o comércio exterior. Iniciou uma reforma administrativa e expandiu as comunicações. O Brasil passava por um profunda crise no sistema de transportes, problema que recebeu a máxima atenção em seu governo, como início de uma ampla política de construção de rodovias, ao lado do Plano Nacional de Habitação, mas não enfrentou os problemas da Educação.Em setembro de 1869, sofreu um derrame cerebral. Como não havia nenhuma previsão constitucional para tal situação de emergência, foi sucedido por uma Junta Governativa Provisória, também conhecida como a Segunda Junta Militar. Costa e Silva faleceu em dezembro de 1969, deixando vago o cargo de presidente.AJunta Militar recusou-se a entregar a presidência para o vice do presidente falecido. Os ministros militares decidiram eleger Emílio Médici como novo Presidente do Brasil.

7.3.3-Emílio Garrastazu Médici (1969-1974)

Foi no Governo Médici que a economia brasileira alcançou o maior crescimento, o chamado Milagre Brasileiro, que foi interrompido com a primeira crise do petróleo, em 1973. Ao mesmo tempo, o endurecimento do regime caracterizou o período chamado ―anos de chumbo‖: os opositores do governo

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iniciaram a luta armada, porém, com a ajuda logística dos Estados Unidos o governo militar conseguiu dizimar estes movimentos.

7.3.4-Ernesto Geisel (1974-1979)

No Governo Ernesto Geisel iniciou-se a ―distensão‖ ou ―abertura política‖ do Brasil que seria lenta e gradual. Em 13 de outubro de 1978, no governo Ernesto Geisel, foi promulgada a emenda constitucional nº 11, cujo artigo 3º revogava todos os atos institucionais e complementares, no que fossem contrários à Constituição Federal, "ressalvados os efeitos dos atos praticados com bases neles, os quais estão excluídos de apreciação judicial" , restaurando o habeas corpus. A emenda constitucional entrou em vigor em 1º de janeiro de 1979.

7.3.5-João Batista Figueiredo (1979-1985) O Governo Figueiredo prosseguiu com a redemocratização, concedendoa anistia aos presos políticos e reestabelecendo as eleições diretas para governadores. Figueiredo se tornaria o ultimo presidente do regime militar.Pelo Movimento das Diretas Já, de apoio à Emenda Dante de Oliveira, a oposição exigiu a realização de eleições diretas para o cargo de presidente. Esta emenda não foi aprovada mas mesmo assim através do Colégio Eleitoral, foi eleito Tancredo Neves como presidente do Brasil. Este, porém, adoeceu e faleceu. Foi empossado, em seu lugar, o vice, José Sarney.

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8-A ESTRUTURAÇÃO DO ESTADO NO BRASIL: A CONSTRUÇÃO DA FEDERAÇÃO As Constituições brasileiras de 1891, 1937, 1946, 1967 e 1988 afirmaram a forma republicana e federativa do Estado. No entanto, o desenvolvimento do processo histórico da estrutura política do Estado brasileiro revela um processo cíclico de centralização do poder. 8.1-O nascimento do federalismo no Brasil A forma unitária do Estado monárquico é a gênese de uma tradição política centralizadora, que mitigou todas as iniciativas de descentralização. Durante o período colonial o Brasil foi dividido administrativamente em capitanias, as quais foram transformadas em províncias em 1821. Com a independência, a Constituição de 1824 manteve as mesmas divisas entre as províncias e não alterou os seus poderes. De fato, a Carta de 1824 previa que os governos das Províncias seriam presididos por pessoas nomeadas pelo Imperador e que todo cidadão tinha o direito de intervir nos negócios da sua localidade, nas Câmaras dos Distritos e no Conselho Geral da Província. As Câmaras dos Distritos tinham a competência de gerir a economia dos municípios.Por seu turno, os Conselhos Gerais das Províncias tinham competência para aprovar normas específicas para gerir os negócios da Província. Em 1831, D. Pedro I abdica do trono, em meio ao movimento das elites agrárias regionais contra o excessivo centralismo do monarca. A movimentação pela maior descentralização e a criação de um regime provincial continuou até que em 1834, por intermédio de Ato Adicional, foi aprovada a Lei n.º 16, de 12/8/1834, que emendou a Constituição do Império para criar uma Monarquia representativa. Adaptando princípios federalistas, os Conselhos Gerais das Províncias foram substituídos por Assembleias Legislativas. Essa mudança aumentou a descentralização do Estado brasileiro, garantindo às Províncias funções executivas e legislativas. Alguns historiadores chegaram a conceber, em face da evidente descentralização após 1834, o surgimento de um "Império Federado". 8.2-A República Federativa Com a Proclamação da República em 1889, os movimentos contrários à política do governo imperial foram definitivamente vitoriosos. O Governo Provisório expediu o Decreto nº 1, de 15/11/1889, instituindo a federação, transformando as antigas Províncias em Estados membros e criando os "Estados Unidos do Brazil". O Governo Provisório obrigou nos arts. 6º e 7º do Decreto n.º 1, de 1889, as antigas Províncias transformadas em Estados membros a integrar a nova federação. Posteriormente, a Constituição de 1891 trouxe no art. 1º a República Federativa como forma de governo e a regra da união perpétua e indissolúvel dos Estados membros. A Carta também instituiu o patrimônio de cada unidade federativa e adotou na repartição constitucional de competências a técnica de poderes enumerados e reservados. Os poderes dos Estados membros em matéria tributária foram fixados na Constituição, porém permitiu-se aos entes no art. 65 exercer "todo e qualquer poder, ou direito que lhes não for negado por clausula expressa ou implicitamente contida nas clausulas expressas da Constituição" . A Carta de 1891 manteve a obrigação dos Estados membros de formarem a federação brasileira, independentemente da vontade das populações locais, e previu, no art. 6º, a possibilidade de intervenção da União nos entes federados para garantir à força a manutenção da federação. A proclamação da República não alterou profundamente as estruturas socioeconômicas do Brasil imperial. A riqueza nacional continuou concentrada na economia agrícola de exportação, baseada na monocultura e no latifúndio. O que se acentuou foi a transferência de seu centro dinâmico para a cafeicultura e a conseqüente mudança no pólo dominante da política brasileira das antigas elites cariocas e nordestinas para os grandes cafeicultores paulistas.

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ARepública federalista, com estados politicamente autônomos, consagrou um novo pacto político que acomodava os interesses das elites econômicas do Centro-Sul e do resto do país. O governo federal ocupava-se de assegurar a defesa e a estabilidade e proteger osinteresses da agricultura exportadora através do câmbio e da política de estoques, com reduzida interferência nos assuntos ―internos‖ dos demais Estados. Lá vicejavam os mandões locais, grandes proprietários de terra e senhores do voto de cabresto,e as grandes oligarquias, que controlavam as eleições e os governos estaduais e asseguravam as maiorias que apoiavam o governo federal. A política dos governadores garantia a alternância na presidência da República de representantes de São Paulo e Minas Gerais. Esse sistema era marcado pela instabilidade dos governos estaduais passíveis de serem derrubados e substituídos em função da emergência de novas oligarquias. 8.3-A Centralização na Era Vargas Nos anos 1930, durante o período Vargas, observou-se a volta do centralismo, com a restrição da autonomia administrativa e política dos Estados membros. O Decreto n.º 19.398, de 11/11/1930, dissolveu o Congresso Nacional, as Assembleias Legislativas Estaduais e as Câmaras Municipais, cassou os mandatos de todos os Governadores e Prefeitos e nomeou interventores em cada Estado membro. O Decreto também previu a competência dos Interventores Estaduais para nomear os Interventores nos municípios. Dos atos dos Interventores Estaduais só cabia recurso ao Presidente da República. Vale observar que apesar de todo o centralismo, o Decreto n.º 19.398 fez questão de manter em vigor as Constituições e as Leis Estaduais, de reforçar a autonomia financeira dos Estados membros e de garantir que a nova constituição a ser elaborada manteria o sistema federativo. Outorgada por Getúlio Vargas, a Constituição de 1937 manteve no art. 21 a competência remanescente dos Estados membros e ampliou as hipóteses de intervenção da União nos entes federados. Havia, também, um dispositivo que previa a transformação do Estado membro em território da União se não fosse capaz de arrecadar receita suficiente para manutenção dos seus serviços, por três anos consecutivos. A Constituição de 1946 devolveu formalmente a autonomia administrativa e política aos Estados membros. 8.4-A Centralização no Regime Militar Isso, no entanto, foi novamente afetado pelo Golpe Militar de 1964. Durante o regime militar, as relações intergovernamentais do Estado brasileiro eram na prática muito mais próximas às formas que caracterizamum Estado unitário que àquelas que caracterizam as federações. A Constituição de 1967/1969 – do regime militar - construiu um federalismo meramente nominal, pois a competência da União era de tal forma dilatada que pouco restava para os Estados federados. O regime interferiu até mesmo no princípio de legitimação das unidades federativas, pois suspendeu as eleições diretas para os governos estaduais, prefeituras de capitais e de municípios―de segurança nacional‖. Além disso, sob o pretexto da ―integração nacional‖ o regime militar expandiu a faixa de fronteira, cujo território ficava inteiramente sob controle federal com políticas de segurança e defesa nacional. Sobre a Constituição de 1988, José Afonso da Silva escreve que a nova Carta buscou resgatar o princípio federalista e estruturou um sistema de repartição de competências que tentou refazer o equilíbrio das relações entre o poder central e os poderes estaduais e municipais. No entanto, a par de resgatar o princípio federalista, a Constituição de 1988 centralizou na União a maioria das competências. Com efeito, o rol dos artigos 21 e 22 é tão extenso que deixa pouca margem para os Estados membros. Além disso, o art. 25 previu que os Estados membros "organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem", observados os princípios da Constituição. Quanto a isso, a doutrina identifica dois tipos de normas presentes nas Constituições Estaduais, as de reprodução obrigatória e as de imitação.

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As normas de reprodução obrigatória são aquelas cuja inserção na Constituição Estadual é compulsória. Nesse caso, a tarefa do constituinte estadual limita-se a inserir aquelas normas no ordenamento constitucional do Estado membro, por um processo de transplantação. Já as normas de imitação representam aquelas cujo conteúdo é idêntico às das regras constitucionais federais, mas não há obrigatoriedade de sua reprodução nas Constituições dos Estados membros. Nesses casos a adesão é voluntária. O problema reside no fato de que o conceito jurídico de norma de reprodução obrigatória é indeterminado e que a jurisprudência acaba por determinar no caso concreto. Segundo o Supremo Tribunal Federal (STF), os limites constitucionalmente estabelecidos para o poder constituinte estadual determinam que um núcleo central da Constituição Federal seja obrigatoriamente reproduzido na Constituição do Estado membro. O voto do Ministro Sepúlveda Pertence, no julgamento da Reclamação n.º 370-1/MT, resumiu bem esse problema,verbis: ―59. No Brasil, a escalada centralista iniciada com a Constituição de 34, acentua-se nas posteriores, ainda quando se faça completa abstração das fases de paroxismo unitarista dos regimes autoritários de 37 e 67/69, para só levar em conta os textos democratizantes de 46 e 88. 60. Essa tendência progressiva de centralização se revela em duas dimensões básicas, paralelas, mas de sentido coincidente: não apenas na multiplicação dos temas reservados a legislação federal, mas também na crescente substituição da imposição, ao respeito dos ordenamentos locais de princípios gerais de conteúdo elástico, pela antecipação, no próprio texto da Constituição Federal, do trato normativo, denso e minudente, de matérias antes deixadas, em linha de principio, a organização autônoma do Estado-membro. 61. Nessa linha constante de substituição do mecanismo clássico - que restringia os preceitos substanciais da "constituição total" ao enunciado de princípios gerais limitativos da autonomia estadual -, pela técnica contemporânea — que, antecipadamente, subtrai, da esfera de auto-organização estadual, setores cada vez mais amplos de temas substancialmente locais, que o contribuinte federal direta e densamente regula — é que se situa a fonte da multiplificação, nos documentos constitucionais do Estado-membro, de preceitos de simples reprodução de formas federais de recepção compulsória pelas unidades federadas.‖ Leia mais: http://jus.com.br/revista/texto/17486/a-origem-do-federalismo-brasileiro#ixzz2YMWprafY 8.5-Federalismo e Instituições Federativas no Brasil no Brasil pós-1988 O texto que se segue foi extraído/adaptado do texto de Celina SOUZA, Federalismo, desenho constitucional e instituições federativas no Brasil pós 1988, Revista Sociologia Política, 2005. A íntegra do artigo encontra-se emhttp://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-44782005000100008&script =sci_arttext

―O artigo descreve os diversos desenhos constitucionais da federação brasileira, focalizando principalmente a Constituição Federal de 1988 e suas emendas. Argumento, em consonância com Riker, que os principais constrangimentos enfrentados hoje pelo federalismo brasileiro decorrem, em parte, maisda dificuldade dos governos de redirecionar o rumo de certas políticas públicas e de lidar com questões macro-econômicas não-antecipadas pelos constituintes de 1988 do que de problemas decorrentes do desenho constitucional. Isso mostra que existe uma distância entre os dispositivos constitucionais e as circunstâncias políticas e econômicas, com as últimas prevalecendo sobre os mandamentos constitucionais. Argumento, ainda, que esse desenho acomoda as clivagens regionais existentes no território, que geram, também, formas assimétricas de distribuição de poder territorial.‖

―O artigo está dividido em seis seções. A próxima descreve os dispositivos constitucionais sobre a federação inscritos nas constituições anteriores à de 1988, enquanto a seção seguinte focaliza a Constituição em vigor. A seção IV analisa osprincípios constitucionais da federação; a V trata da estrutura e do funcionamento do sistema federativo, detalhando suas principais instituições do ponto de vista constitucional; a VI é dedicada ao financiamento das instâncias federativas; a seçãoVII discute brevemente as principais mudanças constitucionais que afetam as esferas de governo e a última seção apresenta algumas conclusões.‖

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IV. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA FEDERAÇÃO IV.1. Federalismo IV.2. Estatuto dos entes constitutivos IV.3. Distribuição de competências entre os entes constitutivos V. ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DA FEDERAÇÃO V.1. Instituições gerais V.2. Poder Executivo federal V.3. Poder Judiciário federal V.4. Instituições estaduais V.5. Instituições municipais VI. SISTEMA FISCAL VI.1. Sistema tributário VI.2. Empréstimos VI.3. Alocação de recursos ―Apesar dessas limitações, a federação foi fortalecida com a Constituição de 1988 por ter promovido maior equilíbrio entre seus entes constitutivos. No entanto, as regras constitucionais continuam submetidas a dois tipos de tensão.‖ ―A primeira vem das novas demandas macro-econômicas trazidas pelas mudanças no ambiente internacional e que exigem, entre outras medidas, rígido controle fiscal e superávits primários. Tal tensão limita, obviamente, os recursos governamentais para serem usados em políticas de correção das desigualdades regionais, elevando a tensão entre a demanda macro-econômica por controle fiscal versus a demanda federativa por menor desigualdade regional. A segunda provém do fato de que o alto grau de constitucionalização contradiz o timing requerido pela nova agenda macro-econômica. Isso porque mudanças nas regras constitucionais que afetam o status quo requerem longas negociações com o Congresso Nacional. No entanto, tais negociações têm sido, em geral, favoráveis ao poder Executivo federal. Essas mudanças, todavia, ainda são submetidas ao julgamento de constitucionalidade por parte do STF.‖ ―Além das tensões referidas acima, os problemas atuais do federalismo e do constitucionalismo no Brasil apontam para três questões. A primeira, e mais importante, é que a federação está assentada em alto grau de desigualdade entre as regiões, a despeito das medidas constitucionais que buscam diminuí-la. Tal desigualdade é histórica e parece que soluções para minimizá-la vão requerer prolongadas negociações e longo tempo para seus efeitos serem sentidos – isso se e quando entrarem na agenda política e não apenas durante a elaboração de novas regras constitucionais. Ainda relacionada a essa questão, a abertura da economia brasileira também tende a aumentar a distância econômica entre os estados.‖ ―A segunda relaciona-se à tendência ao tratamento uniformedas esferas subnacionais, em particular os estados, associada à maior redução relativa de suas receitas, inclusive pelo pagamento de suas dívidas com a União, federalizadas no final dos anos 1990. Paralelamente, existem hoje relações diretas entre o governo federal e os municípios decorrentes da descentralização das políticas sociais. Esses fatores limitam a capacidade de iniciativa dos governos estaduais, inclusive no que se refere a novos investimentos tanto em infraestrutura como nas áreas sociais.’ ―A terceira questão é a escassa existência de mecanismos de coordenação e cooperação intergovernamentais, tanto vertical como horizontal, coibindo a criação de canais de negociação que diminuama competição entre os entes federados.’ ―A síntese que pode ser feita é que a solução para os principais problemas que afetam o federalismo brasileiro depende menos de como o federalismo está hoje desenhado na Constituição e das instituições que o modelam do que (a) do encaminhamento de conflitos políticos mais amplos, em que o das desigualdades regionais inscreve-se, e (b) da redefinição de prioridades governamentais – tema, portanto, do território das políticas públicas e não da Constituição.‖

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ESTRUTURAÇÃO DO ESTADO NO BRASIL: A CONSTRUÇÃO DOS APARELHOS DE ESTADO E DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA FEDERAL O texto que se segue foi extraído/adaptado do texto de “Brasil: 200 anos de Estado; 200 anos de administração pública; 200 anos de reformas”, Frederico Lustosa da Costa, RAP, 2008.A íntegra do artigo encontra-se emhttp://www.scielo.br/pdf/rap/v42n5/a03v42n5 São enfatizadas as três grandes reformas que se sucederam a partir de meados dos anos 1930 do século passado, separadas entre si por intervalos de 30 anos — 1937, 1967 e 1995 (ou 1998, ano da promulgação da Emenda Constitucional nº 19). 9.1-A Administração colonial portuguesaaté 1808. Em termos de aparato institucional e administrativo, havia na colônia uma ampla, complexa e ramificada administração.É verdade que, até 1808, existia no Brasil e, sobretudo, na sede do governo geral (vice-reino) uma administração colonial relativamente aparelhada. Mas a formação do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves e a instalação de sua sede na antiga colônia tornaram irreversível a constituição de um novo Estado nacional. Todo um aparato burocrático, transplantado de Lisboa ou formado aqui, em paralelo à antiga administração metropolitana, teve que ser montado para que a soberania se afirmasse, o Estado se constituísse e se projetasse sobre o território, e o governo pudesse tomar decisões, ditar políticas e agir. Em princípio, a administração colonial estava organizada em quatro níveis — as instituições metropolitanas, a administração central, a administração regional e a administração local. Desde o início da colonização, com o fracasso da administração privada da maioria das capitanias hereditárias, a Coroa portuguesa assumiu diretamente o seu controle e preocupou-se em instituir uma administração central para se ocupar das questões de defesa contra os ataques dos invasores e dos índios mais belicosos. A administração geral contemplava tanto a esfera propriamente administrativa quanto ajudiciária, com sua complexa distribuição de encargos, sujeita a superposições e conflitos de competência. (...)A administração geral às vezes se confundia com a administração local. Isso não quer dizer que não tenha havido um processo de gradual racionalização do governo colonial ao longo de três séculos. A partir da administração pombalina16, pouco a pouco, o empirismo paternalista do absolutismo tradicional foi sendo substituído pelo racionalismo típico do despotismo esclarecido. Essa mudança se expressava principalmente nos métodos e processos de trabalho que davam lugar à emergência de uma burocracia. 9.2-1930: A “burocratização” do Estado nacional A burocracia está no horizonte da administração pública que se consolida e atualiza. Se esse movimento se deu de forma lenta e superficial nos primeiros 100 anos de história do Brasil independente, ele vai encontrar seu ponto de inflexão e aceleração na Revolução de 1930. De fato, a partir desse marco e durante a maior parte do século XX, o Brasil empreendeu um continuado processo de modernização das estruturas e processos do aparelho de Estado. Como resposta a transformações econômicas e sociais de largo alcance, esse esforço se desenvolveu ora de forma assistemática, pelo surgimento de agências governamentais que se pretendia fossem ilhas de excelência com efeitos multiplicadores sobre as demais, ora de forma mais orgânica, por meio das reformas realizadas no governo federal, em 1938, 1967 e a partir de 1995.

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A administração pombalina ocorreu em Portugal entre os anos de 1750 e 1777 durante o governo do monarca Dom José I. A principal ideia era fazer com que o estado português fosse reformado, racionalizado e que, diante disso, pudesse ter um melhor funcionamento, em meio às crises do antigo regime. Essa postura édenominada de despotismo esclarecido‖. Diante dos indígenas, havia a necessidade do Estado em controlar a população nativa, na medida em que este era indispensável como mão-de-obra no trabalho regular, a partir de sua disciplina.

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A chamada ―Revolução de 1930‖ representou a transformação e a emergência do modelo de crescimento que presidiu o desenvolvimento nacional no século XX. Para compreendê-la é preciso entender como se dava a inserção do país na economia internacional e como o Brasil viveu a Grande Depressão. Sob o impulso de superação do esquema clientelista e anárquico de administração oligárquica, o governo de Getúlio Vargas iniciou uma série de mudanças que tinham pelo menos duas vertentes principais (Lima Junior, 1998): estabelecer mecanismos de controle da crise econômica, resultante dos efeitos da Grande Depressão, iniciada em 1929, e subsidiariamente promover uma alavancagem industrial; promover a racionalização burocrática do serviço público, por meio da padronização, normatização e implantação de mecanismos de controle, notadamente nas áreas de pessoal, material e finanças. 9.2.1-O Departamento Administrativo do Serviço Público(1938) De todas essas medidas, a mais emblemática foi acriação do Departamento Administrativo do Serviço Público, ―o líder inconteste da reforma e, em grande parte, seu executor‖ (Wahrlich, 1974:29). O Dasp foi efetivamente organizado em 1938, com a missão de definir e executar a política para o pessoal civil, inclusive a admissão mediante concurso público e a capacitação técnica do funcionalismo, promover a racionalização de métodos no serviço público e elaborar o orçamento da União. O Dasp tinha seções nos estados, com o objetivo de adaptar as normas vindas do governo central às unidades federadas sob intervenção. Essa primeira experiência de reforma de largo alcance inspirava-se no modelo weberiano de burocracia e tomava como principal referência a organização do serviço civil americano. Estava voltada para a administração de pessoal, de material e do orçamento, para a revisão das estruturas administrativas e para a racionalização dos métodos de trabalho. A ênfase maior era dada à gestão de meios e às atividades de administração em geral, sem se preocupar com a racionalidade das atividades substantivas. A reforma administrativa do Estado Novo foi, portanto, o primeiro esforço sistemático de superação do patrimonialismo. Foi uma ação deliberada e ambiciosa no sentido da burocratização do Estado brasileiro, que buscava introduzir no aparelho administrativo do país a centralização, a impessoalidade, a hierarquia, o sistema de mérito, a separação entre o público e o privado. Visava constituir uma administração pública mais racional e eficiente, que pudesse assumir seu papel na condução do processo de desenvolvimento, cujo modelo de crescimento, baseado na industrialização via substituição de importações, supunha um forte intervencionismo estatal e controle sobre as relações entre os grupos sociais ascendentes — a nova burguesia industrial e o operariado urbano (Marcelino, 1987). O Dasp representou a concretização desses princípios, já que se tornou a grande agência de modernização administrativa, encarregada de implementar mudanças, elaborar orçamentos, recrutar e selecionar servidores, treinar o pessoal, racionalizar e normatizar as aquisições e contratos e a gestão do estoque de material. O Dasp foi relativamente bem-sucedido até o início da redemocratização em 1945, quando houve uma série de nomeações sem concurso público para vários organismos públicos. A liberdade concedida às empresas públicas, cujas normas de admissão regulamentadas pelos seus próprios estatutos tornavam facultativa a realização de concursos foi em parte responsável por tais acontecimentos. Em 1938 Vargas também criou o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). 9.3- O Nacional-Desenvolvimentismo e a Administração Paralela Do ponto de vista institucional, a década que vai de 1952 a 1962 foi marcada pela realização de estudos e projetos que jamais seriam implementados.

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Esse período se caracteriza por uma crescente cisão entre a administração direta, entregue ao clientelismo e submetida, cada vez mais, aos ditames de normas rígidas e controles, e a administração descentralizada (autarquias, empresas, institutos e grupos especiais ad hoc), dotados de maior autonomia gerencial e que podiam recrutar seus quadros sem concursos, preferencialmente entre os formados em thinkthanks especializados, remunerando-os em termos compatíveis com o mercado. Constituíram-se assim ―ilhas de excelência‖ no setor público voltadas para a administração do desenvolvimento, enquanto se deteriorava o núcleo central da administração. JK traçou uma estratégia de ação com relação à administração e à operacionalização do Plano de Metas. Já na primeira reunião de seu ministério, em 1o de fevereiro de 1956, criou um órgão diretamente subordinado à Presidência da República, o Conselho do Desenvolvimento, que iria coordenar o detalhamento e a execução do plano. Tendo como secretário-executivo o presidente do BNDE, e reunindo todos os ministros, os chefes dos gabinetes civil e militar e o presidente do Banco do Brasil, o conselho constituiria uma administração paralela com autonomia de decisão suficiente para viabilizar a realização dos projetos. O Conselho do Desenvolvimento recorria a especialistas dos diversos setores previstos no Plano de Metas e também a economistas oriundos de órgãos do governo, como a Superintendência da Moeda e do Crédito (Sumoc). Atuava através de grupos executivos, aos quais cabia a responsabilidade pela concessão de incentivos ao setor privado para que as metas de que tratavam fossem atingidas. O mais conhecido de todos foi o Grupo Executivo da Indústria Automobilística (GEIA). A coordenação dos investimentos do setor público era atribuição do BNDE. Embora tenha havido avanços isolados durante os governos de Getúlio Vargas, Juscelino Kubitschek, Jânio Quadros e João Goulart, o que se observa é a manutenção de práticas clientelistas, que negligenciavam a burocracia existente, além da falta de investimento na sua profissionalização. A cada desafio surgido na administração do setor público, decorrente da própria evolução socioeconômica e política do país, a saída utilizada era sempre a criação de novas estruturas alheias à administração direta e o conseqüente adiamento da difícil tarefa de reformulação e profissionalização da burocracia pública existente (Torres, 2004:151). 9.4-A modernização autoritária (1964 a 1979) De certa forma, o governo militar realizou, à sua maneira, com sinais trocados, o programa de reformas de base — elaborou o Estatuto da Terra, promoveu uma reforma tributária, reorganizou o sistema bancário, reestruturou o ensino universitário e realizou uma ampla reforma administrativa. Em 1965 teve início a reforma tributária que se consolidou com a Constituição de 1967, uniformizando a legislação, simplificando o sistema e reduzindo o número de impostos. Ela trouxe uma brutal concentração de recursos nas mãos da União, esvaziando financeiramente estados e municípios que ficaram dependentes de transferências voluntárias. Ainda em 1964, o novo governo retirou do Congresso Nacional o projeto de lei elaborado pela Comissão Amaral Peixoto (criada no governo Goulart) para reexame do assunto por parte do Poder Executivo. Instituiu a Comestra (Comissão Especial de Estudos da Reforma Administrativa), presidida pelo ministro extraordinário para o planejamento de coordenação econômica, com o objetivo de proceder ao ―exame dos projetos elaborados e o preparo de outros considerados essenciais à obtenção de rendimento e produtividade da administração federal‖ (Wahrlich, 1974:44). 9.4.1-O Decreto-Lei nº 200,de 25 de fevereiro de 1967 Do trabalho dessa comissão e das revisões que se seguiram em âmbito ministerial resultou a edição do Decreto-Leinº 200, de 25 de fevereiro de 1967, o mais sistemático e ambicioso empreendimento para a reforma da administração federal. Esse dispositivo legal era uma espécie de lei orgânica da administração pública, fixando princípios, estabelecendo conceitos, balizando estruturas e determinando providências. O Decreto-Lei nº 200 se apoiava numa doutrina consistente e definia preceitos claros de organização e funcionamento da máquina administrativa. Em primeiro lugar, prescrevia que a administração pública deveria se guiar pelos princípios do planejamento, da coordenação, da descentralização, da delegação de

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competência e do controle. Em segundo, estabelecia a distinção entre a administração direta — os ministérios e demais órgãos diretamente subordinados ao presidente da República — e a indireta, constituída pelos órgãos descentralizados — autarquias, fundações, empresas públicas e sociedades de economia mista. Em terceiro, fixava a estrutura do Poder Executivo federal, indicando os órgãos de assistência imediata do presidente da República e distribuindo os ministérios entre os setores político, econômico, social, militar e de planejamento, além de apontar os órgãos essenciais comuns aos diversos ministérios. Em quarto, desenhava os sistemas de atividades auxilia-res-pessoal, orçamento, estatística, administração financeira, contabilidade e auditoria e serviços gerais. Em quinto, definia as bases do controle externo e interno. Em sexto, indicava diretrizes gerais para um novo plano de classificação de cargos. E finalmente, estatuía normas de aquisição e contratação de bens e serviços. Apesar da distância entre as metas estabelecidas e as metas cumpridas, não resta dúvida de que o Decreto-Lei nº 200 contribuiu para a consolidação do modelo de administração para o desenvolvimento no Brasil. A tentativa de modernização do aparelho de Estado, especialmente a partir da década de 1960, teve como conseqüência a multiplicação de entidades da administração indireta: fundações, empresas públicas, sociedades de economia mista e autarquias. A expansão e a multiplicação de novos centros de administração indireta buscavam maior agilidade e flexibilidade de atuação dessas entidades, melhor atendimento às demandas do Estado e da sociedade, facilidade de aporte de recursos e, naturalmente, facilidade de recrutamento, seleção e remuneração (Marcelino, 1988:44). Embora tenha se verificado um crescimento na administração direta, sobretudo com o aumento do número de ministérios que foram desmembrados de outros, a marca maior do modelo do crescimento foi mesmo a expansão da administração indireta. Isso resultou no fenômeno da dicotomia entre o Estado tecnocrático e moderno das instâncias da administração indireta e o Estado burocrático, formal e defasado da administração direta, que subsiste mesmo depois da reforma administrativa de março de 1990 (Marcelino, 1988:44). A reforma administrativa embutida no Decreto-Lei nº 200 ficou pela metade e fracassou. A crise política do regime militar, que se inicia já em meados dos anos 1970, agrava ainda mais a situação da administração pública, já que a burocracia estatal foi identificada com o sistema autoritário em pleno processo de degeneração (Bresser-Pereira, 1996:273-274). Antes da descrição da reforma administrativa da Nova República, merecem registro dois programas de reforma elaborados entre 1979 e 1982, a desburocratização e a desestatização. De iniciativa do Poder Executivo, os dois programas foram concebidos de forma a atender objetivos complementares que seriam o aumento da eficiênciae eficácia na administração pública e o fortalecimento do sistema de livre empresa. 9.5-A reforma administrativa da Nova República O governo civil que acabara de se instalar em 1985, após mais de duas décadas de ditadura militar, herdava um aparato administrativo marcado ainda pela excessiva centralização. Apesar de representar a primeira tentativa de reforma gerencial da administração pública pela intenção de mexer na rigidez burocrática, o Decreto-Lei nº 200/67 deixou seqüelas negativas. Em primeiro lugar, o ingresso de funcionários sem concurso público permitiu a reprodução de velhas práticas patrimonialistas e fisiológicas. E, por último, a negligência com a administração direta — burocrática e rígida — que não sofreu mudanças significativas na vigência do decreto, enfraqueceu o núcleo estratégico do Estado, fato agravado pelo senso oportunista do regime militar que deixou de investir na formação de quadros especializados para os altos escalões do serviço público. Para empreender tamanha tarefa, o governo Sarney instituiu uma numerosa Comissão Geral do Plano de Reforma Administrativa17. Na prática, nem a comissão, nem o grupo executivo que a sucedeu conseguiu implementar as medidas que preconizaram. A ampla reforma modernizadora e democrática foi deixada de lado para dar lugar à mais tradicional estratégia de reforma administrativa — a racionalização dos meios.

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―Em busca da flexibilidade do Estado: o desafio das reformas planejadas no Brasil, Gileno Fernandes MARCELINO, RAP Rio de Janeiro 37(3):641-59, Maio/Jun. 2003, pag. 649-650: ―Essa comissão era subdividida em câmaras que passaram a atuar em projetos específicos de avaliação da administração pública federal e de definição de diretrizes para áreas prioritárias como a própria organização da administração federal, a área de recursos humanos, ou ainda a informatização do setor público. A Comissão de Reforma trabalhou de agosto de 1985 a fevereiro de 1986, quando suas atividades foram interrompidas em razão da prioridade dada ao Plano Cruzado, de estabilidade econômica. Um grupo de

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Do ponto de vista da gestão pública, a Carta de 1988, no anseio de reduzir as disparidades entre a administração central e a descentralizada, acabou por eliminar a flexibilidade com que contava a administração indireta que, apesar de casos de ineficiência e abusos localizados em termos de remuneração, constituía o setor dinâmico da administração pública. Ela foi equiparada, paraefeito de mecanismos de controle e procedimentos, à administração direta. Apesar do propalado retrocesso em termos gerenciais, a Constituição de 1988 não deixou de produzir avanços significativos, particularmente no que se refere à democratização da esfera pública. Atendendo aos clamores de participação nas decisões públicas, foram institucionalizados mecanismos de democracia direta, favorecendo um maior controle social da gestão estatal, incentivou-se a descentralização político-administrativae resgatou-se a importância da função de planejamento. 9.6-A reforma do governo Collor18 (1990) ―Essa reforma tinha o objetivo de ―racionalização do setor público, recuperando-se a capacidade de gestão e controle de suas atividades‖. O saneamento da ação devia contemplar a ―correção das distorções e ineficiência embutidasque deram causa à desarticulação interna, com a prevalência de unidades descentralizadas e o crescimento exagerado do corporativismo‖. ―A apropriaçãodo Estado por segmentos de sua própria burocracia contrapõe-se aos interessesglobais da sociedade‖, segundo o documento Diretrizes de ação do governoCollor.‖ ―O programa de reforma administrativa iniciou-se com uma ampla reestruturação ministerial, objetivando rever a estrutura então vigente, herança ainda da era getulista, desdobrada no tempo, com competências, atribuições e objetivos definidos, evitando-se conflitos e superposições entreministérios e dentro deles. Os ministérios foram reduzidos de 18 para 12 (incluindo três militares) e fez parte desse programa a priorização das atividades-fim, limitando-se a não mais que 30% os recursos a serem utilizadosnos órgãos-meio.‖ 9.7-A reforma Bresser (1995) –PDRAE: O Plano Diretor da Reforma do Aparelho de Estado tinha como proposta explícita inaugurar a chamada ―administração gerencial‖, o que parece designar, como veremos, o fim da história da administração pública, espécie de panacéia redentora do estatismo patrimonialista e do ogro burocrático.O Pdrae partia de uma premissa — a de que a crise latino-americana era uma crise do Estado. A reforma do Estado deve ser entendida dentro do contexto da redefinição do papel do Estado, que deixa de ser o responsável direto pelo desenvolvimento econômico e social, para se tornar seu promotor e regulador.

estudos informal do próprio governo foi constituído e a partir de abril reiniciou-se o processo de reforma administrativa a ser implementado pelos próprios órgãos que o executariam. Seis meses depois, setembro de 1986, surgiram as primeiras medidas efetivas de desenvolvimento do programa de reforma. Conforme consta das diretrizes estratégicas da reforma aprovada em Exposição de Motivos de setembro de 1986, o programa tinha três objetivos fundamentais: racionalização das estruturas administrativas, formulação de uma política de recursos humanos e contenção de gastos públicos (Brasil, 1986).Assim, do ponto de vista de estrutura, havia o objetivo de fortalecer e modernizar a administração direta a partir do diagnóstico de que houve uma fuga ou ―escapismo‖ para a chamada administração indireta por motivos justificados ou não. Tentou-se, mais uma vez, fortalecê-la, de certa forma voltando-se às raízes do modelo ―clássico‖ de administração. Partiu-se, como conseqüência, para a tentativa de se reverter o processo de crescimento da administração indireta e de se reduzir o número de órgãos e entidades superpostos ou duplicados. Foi elaborada uma primeira versão da Lei Orgânica da Administração Pública Federal, que substituiria o Decreto-lei nº 200. Do ponto de vista dos recursos humanos, havia um claro objetivo de valorização da função pública e de renovação dos quadros. A Secretaria de Administração Pública (Sedap), através da instituição de uma nova Secretaria de Recursos Humanos e da Fundação Centro de Formação do Servidor Público(Funcep), desenvolveria o pessoal do setor público, especialmente através da Escola Nacional de Administração Pública (Enap) e do Centro de Desenvolvimento da Administração Pública (Cedam). Este promoveria o treinamento e reciclagem dos servidores públicos a serem eventualmente remanejados. A Enap, por sua vez, se encarregaria de formar quadros de carreira e novos quadros de dirigentes do setor público. Existia, ainda, o objetivo de se promover a avaliação do Existia, ainda, o objetivo de se promover a avaliação do desempenho do servidor, através da institucionalização do sistema do mérito, graças ao novo plano de carreira, ao Estatuto do Funcionalismo Público e a um plano de

retribuições.http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rap/article/viewFile/6735/5317, consultado em 08/07/2013. 18

―Segundo dados da Secretaria de Administração Federal (SAF), o ―desmonte‖ do aparato governamental afastou, até janeiro de 1991, 221.308 servidores e extinguiu vagas no serviço público; desse total, 134.912 servidores foram demitidos, 33.174 aposentados e 53.222 foram colocados ―em disponibilidade‖, uma solução administrativa adotada pela reforma, que significou, na realidade, colocar os servidores em casa, recebendo sem trabalhar, uma vez que o Supremo Tribunal Federal julgou inconstitucional a redução dos seus vencimentos. É importante mencionar que, desse total, os ―disponíveis‖ retornaram aoserviço público para atender a carência de pessoal dos seus antigos órgãos, após a ―criação‖ de novas vagas por aposentadoria, demissão ou morte.‖ (MARCELINO, op. cit)

http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rap/article/viewFile/6735/5317, consultado em 08/07/2013.

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O Estado assume um papel menos executor ou prestador direto de serviços mantendo-se, entretanto, no papel de regulador e provedor destes. Nesta nova perspectiva, busca-se o fortalecimento das suas funçõesde regulação e de coordenação, particularmente no nível federal, e a progressiva descentralização vertical, para os níveis estadual e municipal, das funções executivas no campo da prestação de serviços sociais e de infra-estrutura. Considerando essa tendência, pretende-se reforçar a governança — a capacidade de governo do Estado — por meio da transição programada de um tipo de administração pública burocrática, rígida e ineficiente, voltada para si própria e para o controle interno, para uma administração pública gerencial, flexívele eficiente, voltada para o atendimento da cidadania. Para isso, será necessária uma mudança em três planos: no plano institucional-legal, através da reforma da Constituição e das leis do país; no plano cultural, através da internalização de uma nova visão do que seja a administração pública; e no plano da gestão, onde afinal se concretiza a reforma (Mare, p. 4). Para realizar tarefa de tal envergadura, o PDRAE assinalava ser necessário: * a redefinição dos objetivos da administração pública, voltando-a para o cidadão-cliente; * o aperfeiçoamento dos instrumentos de coordenação, formulação e implementação e avaliação de política públicas; * a flexibilização de normas e a simplificação de procedimentos; * o redesenho de estruturas mais descentralizadas; * o aprofundamento das idéias de profissionalização e de permanente capacitação dos servidores públicos, idéias que vêm da administração pública burocrática, mas que jamais foram nela plenamente desenvolvidas. A administração pública gerencial volta-se para: * a definição precisa dos objetivos que o administrador público deverá atingir em sua unidade; * a garantia de autonomia do administrador na gestão dos recursos humanos, materiais e financeiros que lhe foram colocados à disposição; * o controle ou cobrança a posteriori dos resultados. Adicionalmente, praticar-se-ia a competição administrada no interior do próprio Estado, quando houvesse a possibilidade de estabelecer concorrência entre unidades internas. No plano da estrutura organizacional, a descentralização e a redução dos níveis hierárquicos tornar-se-iam centrais. Em suma, afirmava-se que a administração pública deve ser permeável à maior participação dos agentes privados e das organizações da sociedade civil, deslocando-se a ênfase dos procedimentos (meios) para os resultados (fins).De acordo com o plano, também há que se distinguir ainda três níveis de atuação do Estado: *central ou estratégico, incumbido de formular, supervisionar e avaliar a implementação das políticas públicas compostas pelo governo, a cúpula dos três poderes da República e o Ministério Público; * descentralizado, responsável pela execução das políticas e atividades exclusivas, como regulação, fiscalização, segurança, previdência básica; * de funções não-exclusivas do Estado, no qual bens e serviços públicos em hospitais, escolas, centros culturais e centros de pesquisa podem ser fornecidos por organizações estatais ou da sociedade civil — associações sem fins lucrativos e mesmo empresas privadas — sujeitas ao controle social. A reforma, tal como preconizada no Plano Diretor, pode ser interpretada com cinco diretrizes principais, a saber: * institucionalização, considera que a reforma só pode ser concretizada com a alteração da base legal, a partir da reforma da própria Constituição; * racionalização, que busca aumentar a eficiência, por meio de cortes de gastos, sem perda de ―produção‖, fazendo a mesma quantidade de bens ou serviços (ou até mesmo mais) com o mesmo volume de recursos; *flexibilização, que pretende oferecer maior autonomia aos gestores públicos na administração dos recursos humanos, materiais e financeiros colocados à sua disposição, estabelecendo o controle e cobrança a posteriori dos resultados; * publicização, que constitui uma variedade de flexibilizaçãobaseada na transferência para organizações públicas não-estatais de atividades não exclusivas do Estado (devolution), sobretudo nas áreas de saúde, educação, cultura, ciência e tecnologia e meio ambiente; * desestatização, que compreende a privatização, a terceirização e a desregulamentação.

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EDITAL 2013 – PONTO 10. O PROCESSO DEMOCRÁTICO A PARTIR DE 1985. A CONSTITUIÇÃO DE 1988.

LEITURA OBRIGATÓRIA: CODATO, Adriano Nervo. UMA HISTÓRIA POLÍTICA DA TRANSIÇÃO BRASILEIRA: DA DITADURA MILITAR À DEMOCRACIA. Revista de Sociologia e Política Nº 25: 83-106 NOV. 2005. A íntegra do artigo encontra-se emhttp://www.scielo.br/pdf/rsocp/n25/31113.pdf

Todos os parágrafos que se seguem foram extraídos/ adaptados de CODATO, 2005. ―Os estudos analíticos estabelecem que o regime ditatorial-militar durou 25 anos, de 1964 a 1989, teve seis governos – incluindo um governo civil – e sua história pode ser dividida em cinco grandes fases. Uma primeira fase, de constituição do regime político ditatorial-militar, corresponde, grosso modo, aos governos Castello Branco e Costa e Silva (de março de 1964 a dezembro de 1968); uma segunda fase, de consolidação do regime ditatorial-militar (que coincide com o governoMedici: 1969-1974); uma terceira fase, de transformação do regime ditatorial-militar (o governo Geisel: 1974-1979); uma quarta fase, de desagregação do regime ditatorial-militar (o governo Figueiredo: 1979-1985); e por último, a fase de transição do regime ditatorial-militar para um regime liberal-democrático (o governo Sarney: 1985-1989).‖ ―Já de início, três aspectos devem ser destacados nesse longo período. Primeiro, o processo de ―distensão política‖, depois chamado ―política de abertura‖ e, por fim, ―transição política‖, foi iniciado pelos militares, e não por pressão da ―sociedadecivil‖, ainda que ela tenha influído, de maneira decisiva, menos no curso e mais no ritmo dos acontecimentos. Segundo, esse processo teve sua natureza, andamento e objetivos determinados também pelos militares ou, mais exatamente, por uma de suas muitas correntes político-ideológicas. Por fim, ele correspondeu à necessidade dos próprios militares resolverem problemas internos à corporação, e não a uma súbita conversão democrática de parte do oficialato.‖ ―A ―Nova República‖ (1985-1990), último governo (ainda que civil) do ciclo do regime ditatorial-militar, encerra esse longoperíodo de transição ao estabelecer a hegemonia política do partido de oposição ao regime (1986), promulgar uma Constituição (1988) e realizar uma eleição popular para Presidente (1989).A década de noventa foi, de acordo com grandeparte da literatura, o período da consolidação do regime liberal-democrático. Esse processo compreende os governos de Collor de Mello (1990-1992), Itamar Franco (1992-1995) e Fernando Henrique Cardoso (1995-2002).‖ ―A ―consolidação democrática‖ deu-se em um quadro institucional peculiar. O cenário resultante da nova Constituição conjugou o presidencialismo como a forma de governo, o federalismo como a fórmula de relação entre o Estado central e as unidades subnacionais (MAINWARING, 1997), a coalizão política como a fórmula de governabilidade (ABRANCHES, 1988), tudo isso apoiado sobre um sistema partidário fragmentado (NICOLAU, 1996), pouco institucionalizado e demasiadamente regionalizado (ABRUCIO, 1998).‖ ―Essa combinação institucional – ou, para alguns, essa deformaçãoinstitucional – conduziu no final das contas o processo de transição para o seguinte ponto: uma democracia eleitoral, um Executivo imperial e um regime congressual que atua ora como colaborador, ora como sabotador das iniciativas do Presidente, ator central do sistema político.‖ Interessa especialmente o período pós-85, conhecido como ―Nova República‖, quando os principais fatos registrados são os que se seguem: “Transição, sob tutela militar, para o regime liberal-democrático (governo Sarney)” 1) abril-maio de 1985 (falece Tancredo Neves; emenda constitucional restabelece eleições diretas para Presidenteda República) – fevereiro de 1986 (anunciado o Plano Cruzado contra a inflação) 2) novembro de 1986 (vitória do PMDB nas eleições gerais e sua hegemonia na Assembleia Nacional Constituinte) – outubro de 1988 (promulgada nova Constituição) 3) março de 1989 (início da campanha para as eleições presidenciais) – dezembro de 1989 (Collor de Mello venceas eleições presidenciais)

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“Consolidação do regime liberal-democrático (governos Collor, Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso)” 1)março de 1990 (posse do Presidente eleito, Fernando Collor de Mello; anunciado o Plano Collor I) – janeiro de1991 (anunciado o Plano Collor II) 2)dezembro de 1992 (impedimento do Presidente Collor; o vice-Presidente Itamar Franco assume a Presidência daRepública) – julho de 1994 (lançado o Plano Real) 3)janeiro de 1995 (posse do Presidente eleito, Fernando Henrique Cardoso)– junho de 1997 (aprovada a emendaque permite a reeleição do Presidente da República e dos titulares dos poderes Executivos municipais e estaduais) 4)janeiro de 1999 (posse do Presidente reeleito, Fernando Henrique Cardoso)– outubro-novembro de 2000 (vitóriados partidos de oposição nas eleições municipais) 5)julho de 2002 (início da campanha para as eleições presidenciais) –janeiro de 2003 (posse do Presidente eleito,Luís Inácio Lula da Silva) ―Na década de noventa, a maior parte das análises sobre a democratização do regime dissociou as transformações político-institucionais das alterações dos aparelhos estatais. A discussão pública, seja no âmbito acadêmico, seja no âmbito político, voltou-se para algumas questões muito específicas, como por exemplo: a estrutura dos partidos (e seu baixo grau deinstitucionalização); o sistema de partidos (e seu alto grau de fragmentação); o sistema eleitoral (e sua fórmula ―disfuncional‖: proporcional com lista aberta); o sistema de governo (o federalismo e a competição entre as unidades nacionais); a forma de governo (presidencialista e suas impropriedade); as relações intergovernamentais (a concorrênciaentre os poderes Executivo e Legislativo) etc.‖ ―O foco quase exclusivo da literatura sobre a cena política colocou no primeiro plano do debate o tema (conservador) da governabilidade, que, inspirado por uma definição minimalista da democracia,se tornou o problema fundamental do processo de governo, obscurecendo o problema da transformação do sistema estatal.‖ ―A questão do Estado e da sua crise esteve mais associada ao problema da eficiência dos gastos públicos e sua solução, a ―reforma do Estado‖, a uma perspectiva mais administrativa (ou ―gerencial‖) que a aspectos essenciais da reconfiguração das relações de força/influência do sistema estatal e dos seus aparelhos de poder. De certa forma, a preocupação com as relações Executivo-Legislativo ou, mais propriamente, com a capacidade do Presidente de tomar decisões e implementá-la, sobrepôs-se às preocupações com o próprio poder Executivo, ou melhor, com os deslocamentos internos das relações de força entre os aparelhos do Estado, relegando ao segundo plano a identificação dos novos centros de poder real (e dos seus controladores) e suas conexões com os interesses sociais.‖ ―Uma dimensão importante da herança institucional da ditadura militar para os governos da década de noventa foi a permanência de núcleos de poder específicos no Estado brasileiro, dotados de grande independência e nenhum controlepolítico (i. e., parlamentar) ou social (i. e., público).‖ ―Nos governos Cardoso (1995-1998; 1999- 2002), para ficarmos no melhor exemplo, houve três expressões desse fenômeno. Na área econômica continuou vigorando, assim como no arranjo ditatorial, o esquema do ―superministério‖, agorarepresentado pela tríade Banco Central, Conselho de Política Monetária e Ministério da Fazenda.‖ ―Na área militar foram mantidos três ―feudos burocráticos‖ intocáveis: o Gabinete de Segurança Institucional (antiga Casa Militar), a Agência Brasileira de Inteligência (ABIN, antigo Serviço Nacional de Informações (SNI)) e a Justiça Militar.‖

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―Por fim, na área ―empresarial‖, i. e., naqueles aparelhos de Estado em que, por sua natureza ou competência, se administram os ―interesses do mercado‖ (política de privatizações, política de transportes, de comércio exterior, de comunicações,de educação etc.), a regra foi o contato direto de representantes influentes do mundo dos grandes negócios com decisores estratégicos, mecanismo muito pouco transparente e que, a propósito do ―regime autoritário‖, Cardoso (1975) conceituou como ―anéis burocráticos‖. ―Esse padrão não-democrático da relação Estado-sociedade permanece por uma razão básica. Quando se inspeciona a agenda que vigorou no governo de Fernando Henrique Cardoso, destacam-se as famosas reformas ―orientadas para o mercado‖:privatizações de empresas estatais, desregulamentações de esferas antes reguladas pelo Estado, controle rigoroso da inflação e do déficit público, redimensionamento dos ―gastos sociais‖ (nas áreas de educação, saúde e previdência), abertura comercial e financeira etc.‖ ―Na verdade, as reformas econômicas prescindiram de uma verdadeira reforma política, que aumentasse a representação, e de uma reforma do Estado, que favorecesse a participação. Ou melhor, as reformas neoliberais tiveram como precondição o arranjo autoritário dos processos de governo e a ausência de responsabilidade(accountability) dos governantes. Daí que sua implementação não combinou com as exigências de ampliação da cidadania e controle social sobre o Estado, suas burocracias e aparelhos de poder.‖

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LEITURAS COMPLEMENTARES

1) O texto que se segue foi extraído/adaptado do texto de Fernando Filgueiras, República, Confiança e Sociedade, Dados, 2007.

A íntegra do artigo encontra-se emhttp://www.scielo.br/pdf/dados/v50n4/v50n4a08.pdf

A reconstrução da idéia de república no mundo contemporâneo é a reconstrução de uma outra via para o tema da liberdade, a qual não significa mais a existência de indivíduos dotados de direitos privados e portadores de um tipo de autonomia que encontra na ausência de constrangimento o fundamento da política. Ponto comum ao ideal republicano contemporâneo é a reconstrução de um ideal de liberdade assente à existência de um sujeito coletivo, construído em torno de uma identidade enquanto povo, em vista de uma autonomia pública de iguais sujeitos de direitos.

Imbricado no tema da liberdade, o tema da democracia é fundamental como mecanismo de agregação de valor ao corpo político, além de servir como instrumento de decisões eficazes, com a condição de uma vida ativa por parte dos cidadãos. O sentido dado à democracia, no colorido republicano, é o fato de ela ser o lugar das práticas virtuosas, as quais são capazes de incorporar valor aos bens coletivos, evitando a corrupção do corpo político. A democracia é condição necessária à vida republicana, segundo Pettit, porque impede o uso arbitrário do poder e a dominação exercida por aqueles atores que se apossam dos meios de poder (Pettit, 1997). A democracia, entretanto, como aponta Bignotto (2004), não é contraditória a uma noção de império da lei, o qual se torna capaz de absorver os conflitos no interior do corpo político. O teor democrático do regime republicano é o ideal de não-dominação e a constante contestação por parte da sociedade civil em relação ao governo, não sendo contraditório em relação ao imperium das instituições da república. Em certo sentido, a democracia termina por ser a realização do governo amplo de Maquiavel, cujo império é legibusrestricto, impedindo qualquer forma de usurpação ou uso indevido do poder por parte dos atores políticos, em contraposição ao bem comum (Viroli,1993). O republicanismo é uma forma de liberdade positiva em que o agente moral deve buscar sua condição através de um ato de vigília que leva à excelência, tendo em vista uma pré-noção ou antecedência do bem comum, independentemente de qualquer forma racional ou transcendental de consciência (Taylor, 1997:275). É a existência de um bem comum que, para as diferentes vertentes do republicanismo contemporâneo, deve ser resguardada de qualquer ato arbitrário por parte do governante.

2) O texto que se segue foi extraído/adaptado do texto de Marta Arretche, Continuidades e Descontinuidades da Federação Brasileira: De como 1988 Facilitou 1995. Dados, 2009.

A íntegra do artigo encontra-se emhttp://www.scielo.br/pdf/dados/v52n2/v52n2a04.pdf O argumento central deste trabalho é que os formuladores da CF 88 criaram um modelo de Estado federativo que combina ampla autoridade jurisdicional à União com limitadas oportunidades institucionais de veto aos governos subnacionais. Não criaram um ambiente institucional que congelasse a distribuição original de autoridade de 1988, pois não estabeleceram regras que exigiriam, no futuro, a mobilização de supermaiorias para alterar aquele contrato original. Além disso, as regras que regem as interações entre as elites do governo federal e dos governos subnacionais favorecem as elites políticas instaladas no centro e limitam as oportunidades de veto das elites instaladas nos governos subnacionais. São essas condições institucionais que permitiram a expansão da autoridade da União sobre os governos subnacionais, além da preponderância do Executivo sobre o Legislativo. Assim, há mais continuidade entre as mudanças aprovadas nos anos 1990 e o contrato original de 1988 do que a noção de uma ruptura entre os dois períodos autorizaria supor.

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3) O texto que se segue foi extraído/adaptado do texto de Marta Arretche, Federalismo e Igualdade

Territorial: Uma Contradição em Termos? Dados, 2010. A íntegra do artigo encontra-se emhttp://www.scielo.br/pdf/dados/v53n3/a03v53n3.pdf

Este artigo argumenta que incluir na análise as desigualdades territoriais, bem como as relações entre a União e os governos subnacionais nos leva a uma interpretação mais precisa acerca das motivações para a adoção da fórmula federativa no Brasil e de seus resultados.

A despeito da inexistência de clivagens religiosas ou étnicas, a nação brasileiraé historicamente dividida entre jurisdições pobres e ricas. Se as primeiras não têm expressão política relevante, a clivagem entre unidades constituintes pobres e ricas está na origem da escolha por um desenho de Estado que permita ―manter a União‖ e evitar os riscos associados à fórmula majoritária, nos termos da clássica formulação de Lijphart (1984). Garantir o equilíbrio da representação das e nas jurisdições ricas e pobres foi, historicamente, um componente central do desenho das instituições políticas brasileiras. A segunda premissa analítica diz respeito às relações central-local. A descentralização da execução de políticas é compatível com a centralização da autoridade, mesmo em estados federativos (Obingeret alii, 2005). Estudos comparados revelaram que a governança local/intermediária/estadual é fortemente afetada pelas relações central-local (Sellers e Lidström, 2007; Razin, 2007), assim como as prioridades políticas dos governos subnacionais podem ser largamente afetadas pela estrutura de incentivos derivada de suas relações com níveis superiores de governo (Arretche, 2000). A análise adequada destas relações requer distinguir duas dimensões distintas de autoridade: a formulação e a execução de políticas públicas. Distinguir quem formula de quem executa permite inferir que, no caso brasileiro, embora os governos subnacionais tenham um papel importante – e até mesmo pouco usual em termos comparados – no gasto público e na provisão de serviços públicos, suas decisões de arrecadação tributária, alocação de gasto e execução de políticas públicas são largamente afetadas pela regulação federal.

4) O texto que se segue foi extraído/adaptado do texto de Marta Arretche, Relações Federativas Nas Políticas Sociais, Revista Educação Social, Campinas, 2002.

A íntegra do artigo encontra-se emhttp://www.scielo.br/pdf/es/v23n80/12922.pdf A distinção entre Estados federativos e unitários diz respeito às formas de distribuição da autoridade política dos Estados nacionais. Estados federativos são uma forma particular de governo dividido verticalmente, de tal modo que diferentes níveis de governo têm autoridade sobre a mesma população e território (Lijphart, 1999). Durante o regime militar, as relações intergovernamentais do Estado brasileiro eram na prática muito mais próximas às formas que caracterizamum Estado unitário que àquelas que caracterizam as federações. (...) Ao longo dos anos de 1980, recuperaram-se as bases do Estado federativo no Brasil. A democratização – particularmentea retomada de eleições diretas para todos os níveis de governo – e a descentralização fiscal da Constituição de 1988 alteraram profundamente as bases de autoridade dos governos locais. A autoridade política de governadores e prefeitos voltou a ser baseada no voto popular direto. Paralelamente, estes últimos também expandiram expressivamente sua autoridade sobre recursos fiscais – uma vez que se ampliou a parcela dos tributos federais que é automaticamente transferida aos governos subnacionais –, assim como passaram a ter autoridade tributária sobre impostosde significativa importância. A descentralização, por sua vez, diz respeito à distribuição das funções administrativas entre os níveis de governo (Riker, 1987). Formas as mais variadasde transferência de recursos e delegação de funções permitem que um dado nível de governo desempenhe funções de gestão de uma dada política, independentemente de sua autonomia política e fiscal. Em outras palavras, em Estados federativos a implementação dereformas de âmbito nacional tenderia a ser mais difícil do que em Estados unitários, porque os governos locais têm incentivos e recursos para implementar as suas próprias políticas independentemente do governo federal, porque têm

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representação no Parlamento para vetar as iniciativas de política que são contrárias a seus interesses ou, ainda,porque podem simplesmente não aderir à implementação de programas do governo federal. A lentidão do processo de descentralização das políticas sociais no Brasil até meados dos anos de 1990 (Almeida, 1995) poderia nos levar a acreditarque esta foi expressão da capacidade de veto dos governos locais, pois há diversas razões para crer que, de fato, estes – tomados em seu conjunto – resistiam a assumir a responsabilidade pela gestão das políticas sociais e pretendiam preservar sua autonomia para gastar os recursos recém-adquiridos com a descentralização fiscal (Arretche, 2000). No entanto, acapacidade do Governo Fernando Henrique Cardoso para implementar reformas das políticas sociais mostra que os governos locais não foram capazes de vetar um extensivo programa pelo qual muitas funções de gestão lhes foram transferidas. 5)O texto que se segue foi extraído/adaptado do texto de Maria Hermínia Tavares de Almeida Recentralizando A Federação? Revista de Sociologia e Política, 2005. A íntegra do artigo encontra-se emhttp://www.scielo.br/pdf/rsocp/n24/a04n24.pdf Sustenta-se aqui que, do ponto de vista das relações intergovernamentais, a federação brasileira é um arranjo complexo em que convivem tendências centralizadoras e descentralizadoras, impulsionadas por diferentes forças, com motivações diversas, produzindo resultados variados. Esse federalismo dual corresponde ao modelo norte-americano original – simultaneamente descritivo e prescritivo – em que ―os poderes dos governos geral e estadual, mesmo quando existem no interior dos mesmos limites territoriais, constituemsoberanias distintas e separadas, que agem em separado e com independência, nas esferas quelhes são próprias‖ (ACIR, 1981, p. 3). (...) As federações contemporâneas, em boa medida, não cabem mais no modelo de federalismo dual. Elas são melhor descritas por um dos dois modelos da tipologia baseada na natureza das relações intergovernamentais: o federalismo centralizado e o federalismo cooperativo. Ambos tratam de capturar as transformações do arranjo dual, em decorrência da expansão do escopo dos governos, em geral, e do governo federal, em particular. O primeiro é o federalismo centralizado, quando estados e governos locais quase se transformam em agentes administrativos de um governo nacional com grande envolvimento nos assuntos subnacionais, predomínio nos processos de decisão e no controle dos recursos financeiros10. O segundo é o federalismo cooperativo, caracterizado por formas de ação conjunta entre esferas de governo, em que as unidades subnacionais mantêm significativa autonomia decisória e capacidade de autofinanciamento. Esse é um arranjo complexo que pode combinar as duas primeiras acepções de descentralização discutidas anteriormente, ou seja, pode ser mais ou menos centralizado. No caso da federação brasileira remodelada pela Constituição de 1988, o modelo cooperativo adotado combinou a manutenção de áreas próprias de decisão autônoma das instâncias subnacionais; descentralização no sentido forte de transferência de autonomia decisória e de recursos para os governos subnacionais e a transferência para outras esferas de governo de responsabilidades pela implementação e gestão de políticas e programas definidos no nível federal. Em conseqüência, a avaliação dos rumos do federalismo brasileiro, em termos da polaridade descentralização-recentralização, deve levar em conta a complexidade desse arranjo cooperativo e as formas distintas que assumem as relações governamentais em diferentes áreas de políticas públicas.

Exercícios

1) (PUCC-SP)- O Plano de Metas, durante o período governamental de 1956/60, foi por muitos criticado em

virtude:

a) do aumento do custo de vida, associado a um grande processo inflacionário

b) da frustada implantação de parque industrial no Sudeste do Brasil

c) da nacionalização da distribuição dos derivados do petróleo

d) da inexistência de debate democrático nas decisões econômicas

e) do desaparecimento de capitais estrangeiros em prejuízo do desenvolvimento econômico.

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2) (UFRGS-RS) – Para enfrentar a crise brasileira, o governo Jânio Quadros defendeu:

I. uma política de combate à inflação

II. uma política comercial de abertura aos países socialistas

III. a estatização da economia

Quais as afirmações corretas?

a) apenas I

b) apenas II

c) apenas III

d) apenas II e III

e) apenas I e II

3) (Mackenzie) – O governo Juscelino Kubitschek foi responsável:

a) pela eliminação das disparidades regionais;

b) pela queda da inflação e da dívida externa;

c) por uma política nacionalista e de rejeição ao capital estrangeiro;

d) pela entrada maciça de capitais estrangeiros e a internacionalização de nossa economia;

e) por práticas antidemocráticas como a violenta repressão às rebeliões de Jacareacanga eAragarças.

4) (UFPA) – A crise gerada pela renúncia do presidente Jânio Quadros foi temporariamente

controlada em 1961 através:

a) das reformas de base com vistas à modernização do País;

b) do Ato Institucional nº 5 e o fechamento total do regime;

c) da emenda parlamentarista, que possibilitou a posse do presidente João Goulart, conciliando setores em

confronto;

d) do Golpe Militar, provocando a queda do governo Goulart;

e) da convocação de novas eleições, desfazendo o clima de acirramento da oposição entreesquerda e direita.

Respostas

1) A

2) E

3) D

4) C