21

Click here to load reader

Document9

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Document9

9. A tradução de um projeto educacional de

superação do fracasso escolar para a prática

docente

Neste capítulo, pretende-se apresentar os principais resultados e

as conclusões gerais deste estudo, além de se buscar a reflexão sobre

aspectos relacionados à tradução de políticas ou projetos educacionais de

superação do fracasso escolar para a prática docente.

Julga-se oportuno iniciar-se esta apresentação destacando que,

com relação ao projeto Reorganização da Trajetória Escolar no Ensino

Fundamental - Classes de Aceleração, a análise dos resultados leva à

conclusão que, de modo geral, o projeto foi positivamente avaliado pelas

professoras de ambas as escolas participantes e pela coordenadora

pedagógica da Escola II.

Na opinião das professoras das Escolas I e II e da coordenadora

pedagógica da Escola II, os fatores que teriam contribuído para o sucesso

desse projeto seriam: a) uma proposta pedagógica desafiadora tanto para o

professor, como para o aluno; b) a utilização de um material didático

adequado às necessidades dos alunos; c) a redução do número de alunos por

classe; d) o oferecimento de uma formação continuada de alta qualidade aos

professores e coordenadores pedagógicos.

Quanto aos fatores negativos, as professoras da Escola I (Ana,

Bianca e Célia) citaram: a) falta de interesse e de participação dos alunos

perante às atividades propostas; b) idade avançada dos alunos; c) mudança

do paradigma teórico - metodológico; d) falta de tempo para assimilar as

informações recebidas nas capacitações.

As professoras da Escola II (Elaine, Fernanda, Graça e Heloísa),

por sua vez, citaram como dificuldades: a) falta de tempo para a pesquisa e

para o planejamento das atividades; b) falta de uma equipe de especialistas

para casos específicos de alunos com maiores dificuldades; c) composição

232

Page 2: Document9

das Classes de Aceleração com alunos que já poderiam estar cursando

séries mais avançadas.

A coordenadora pedagógica da Escola II (Irene) não citou

dificuldades.

A avaliação do projeto pelas especialistas educacionais da D.R.E

coincide com a avaliação das professoras como também são semelhantes os

fatores de sucesso apontados por ambas. Também foi possível perceber que

existe entre as especialistas educacionais, a coordenadora pedagógica e as

professoras Elaine e Fernanda da Escola II, uma intensa preocupação com a

continuidade do processo ensino - aprendizagem e com a possibilidade de

inclusão dos alunos egressos na retomada de suas trajetórias escolares.

Os fatores negativos em relação ao projeto citadas pelas

especialistas da Diretoria Regional de Ensino estão relacionados,

principalmente, ao processo de seleção dos professores e à falta de

envolvimento de alguns professores das Classes de Aceleração com o

projeto.

Ainda a respeito da avaliação do projeto Classes de Aceleração,

convém salientar que a análise das respostas dadas pelos alunos egressos ao

questionário aplicado pela D.R.E. demostra que a grande maioria

considerou importante a sua participação no projeto, em termos de

aprendizado e de valorização de seu autoconceito. No entanto, afirmaram

que ainda possuíam dificuldades de aprendizagem capazes de prejudicar o

seu rendimento escolar nas séries subseqüentes, além de terem sinalizado

claramente o incômodo que sentiam por terem que estudar em classes

superlotadas e com professores que nem sempre podiam atendê-los em suas

demandas.

Com relação ao processo de tradução do projeto educacional de

superação do fracasso escolar para a prática docente, os resultados obtidos

permitem afirmar que, na situação investigada, ocorreram diferentes níveis

de tradução, especificamente quando se toma como parâmetro básico para

233

Page 3: Document9

esse processo os pressupostos teórico - metodológicos do projeto de

Aceleração, contidos na Proposta Pedagógica Curricular das Classes de

Aceleração.

Dessa maneira, percebe-se a existência de, um lado, um nível de

tradução mais aproximado e, de outro, um nível de tradução mais

distanciado do projeto de Aceleração para a prática docente.

Dentre os vários fatores que podem vir a influenciar tal

diferenciação nos níveis de tradução, chama a atenção aqueles relacionados

aos diferentes momentos ou níveis de aprendizagem e desenvolvimento

profissional em que as professoras e especialistas educacionais se

encontravam no decorrer do processo de implementação do projeto de

Aceleração.

Dessa forma, pode-se dizer que, na Escola I, a tradução do

projeto educacional para a prática docente ocorreu de forma mais

distanciada dos pressupostos teórico - metodológicos do projeto de

Aceleração, pois as professoras relataram muitas dificuldades na

compreensão e/ou aceitação de suas premissas ou princípios fundamentais

(concepção de fracasso escolar que não culpabiliza o aluno, confiança no

potencial de aprendizagem dos alunos ou no potencial do professor para

ensiná-los) e no estabelecimento de vínculos positivos com os alunos.

Além disso, a observação da prática pedagógica da professora

Ana mostrou que ela teve dificuldades em problematizar os conteúdos

curriculares para a realidade dos alunos e para o cotidiano da sala de aula,

sendo a problematização um dos aspectos mais importantes para o alcance

dos objetivos propostos pelo projeto em questão.

A ausência de uma figura de apoio consistente, seja a direção ou

a coordenação escolar, também deve ser considerada como um dos fatores

de insucesso ou um dos dificultadores da tradução do projeto educacional

para a prática docente, nessa escola em particular.

234

Page 4: Document9

A relevância do apoio do diretor, do coordenador pedagógico,

dos professores das Classes de Aceleração e de outras séries e, inclusive,

dos supervisores de ensino, coloca em evidência a necessidade de se

repensar a escola como uma “comunidade de aprendizagem”, a qual

envolve os diferentes elementos que a compõem.

Os dados obtidos junto às professoras e à coordenadora

pedagógica da Escola II mostram que a tradução do projeto educacional

para a prática docente nessa instituição pode ser considerada mais

aproximada dos pressupostos teórico - metodológicos do projeto de

Aceleração, principalmente devido ao fato das professoras terem aderido e

adotado os princípios básicos do projeto em suas práticas pedagógicas.

Essas professoras, em sua tradução do projeto de Aceleração

para a prática, parecem ter ido além da premissa inicial de que “todo

professor é capaz de ensinar e que todo aluno é capaz de aprender”, atuando

de acordo com a premissa de que seriam capazes de aprender a ensinar de

uma maneira diferente.

Dessa forma, é possível afirmar que o principal diferencial do

processo de tradução do projeto educacional na Escola II daquele realizado

na Escola I, parece ter sido a presença de uma crença muito intensa, tanto

por parte das professoras como da coordenadora pedagógica, de que seriam

capazes de realizar um bom trabalho junto aos alunos das Classes de

Aceleração.

Os resultados obtidos possibilitam que se teçam algumas

considerações específicas sobre o perfil pessoal e profissional das

professoras da Escola II, em especial, as professoras Elaine e Fernanda,

consideradas bem - sucedidas por terem realizado uma tradução mais

aproximada dos pressupostos do projeto para a prática pedagógica.

Em primeiro lugar, foi possível perceber que essas professoras

acreditaram no projeto educacional e procuraram compreender os seus

pressupostos teórico - metodológicos, buscando atuar de acordo com os

235

Page 5: Document9

mesmos, mas não se deixando prender em demasia às amarras das

prescrições e recomendações contidas em tal proposta.

Portanto, mesmo atuando de acordo com tais pressupostos, as

professoras bem - sucedidas não abriram mão dos conhecimentos

originados em suas experiências profissionais anteriores, nem de sua

capacidade de improvisação. A respeito da improvisação, PERRENOUD

(1997) coloca que os professores improvisam na medida em que se deparam

com um problema ou uma situação imprevista, ambígua ou complexa,

necessitando transpor, diferenciar, ajustar os esquemas disponíveis ou

coordená-los de uma maneira original.

Um outro aspecto a ser mencionado é que essas professoras

parecem ter aceitado com maior naturalidade os desafios impostos pelo

trabalho, enfrentando os dilemas da prática como oportunidade de

crescimento profissional.

A esse respeito, deve-se salientar que a busca por novos desafios

e maior comprometimento profissional de professores remete a alguma das

características indicadas por COOPER (1982) como parte do estágio de

diversificação da carreira docente, analisado por HUBERMAN (1995).

A utilização dos conhecimentos adquiridos ao longo da trajetória

profissional, a capacidade de improvisação e a atitude positiva diante dos

dilemas e desafios da prática, parece reforçar a idéia de que essas

professoras encontravam-se em um momento de desenvolvimento

profissional mais avançado do que as professoras da Escola I.

As professoras bem - sucedidas parecem ter compartilhado de

uma visão crítica sobre o fracasso escolar, não compactuando com a

concepção de que o fracasso escolar é causado por fatores individuais;

posicionaram-se contrariamente à discriminação e à exclusão do aluno,

procurando atuar de maneira favorável ao processo de inclusão escolar, mas

não se comportando de forma onipotente em relação às dificuldades dos

alunos.

236

Page 6: Document9

Dessa forma, pautaram a sua atuação em uma cultura escolar que

valoriza o sucesso do aluno e não a perpetuação de uma concepção de

ensino que sempre espera pelo fracasso. Na mesma perspectiva, foi possível

perceber que a criação e a manutenção de um bom vínculo afetivo com o

grupo de alunos, expresso por gestos e palavras, foi uma preocupação

constante das professoras bem - sucedidas, devido à crença de que a

existência desse vínculo positivo seria crucial para o sucesso do processo

ensino - aprendizagem dos alunos.

Também houve, por parte dessas professoras, a valorização do

trabalho em equipe, através de uma atuação colaborativa com as outras

professoras de Classes de Aceleração e, até mesmo, com as professoras de

séries regulares.

Essas mesmas professoras também valorizaram o processo de

formação continuada oferecido no decorrer do projeto, o que foi expresso

pelo envolvimento das mesmas no momento das capacitações. A

valorização da formação continuada foi confirmada pelas professoras

Elaine e Fernanda quando selecionaram os critérios ou condições

necessárias para que políticas de superação do fracasso escolar obtenham

sucesso, citando como critério básico a necessidade de um maior

investimento na formação docente, seja inicial ou continuada, e a

necessidade de que os próprios professores valorizem mais a sua profissão.

A análise dos dados indica ainda que, assim como a professora

bem - sucedida do estudo de SOUZA, VIÉGAS & BONADIO (1999), essas

professoras (assim como a professora Célia da Escola I), que já possuíam

uma predileção pessoal pelo trabalho pedagógico junto a alunos com

história de sucessivos fracassos escolares, manifestaram uma atitude mais

positiva em relação ao seu próprio sucesso e ao de seus alunos no processo

ensino - aprendizagem.

Entretanto, aquelas que, aparentemente, possuíam uma

concepção mais conservadora do fracasso escolar (como nos parece a

237

Page 7: Document9

situação da professora Bianca/Escola I), diante da experiência nas Classes

de Aceleração, não parecem ter modificado as suas crenças em relação ao

fracasso dos alunos, as quais, ao contrário, podem ter sido reforçadas.

Ambas as situações parecem confirmar a idéia de MARRERO

(1986, citado por SADALLA, 1998) de que, assim como as crenças que os

professores possuem sobre os alunos influenciam as suas escolhas

pedagógicas, as práticas cotidianas acabam por influenciar essas mesmas

crenças, o que possibilita ao professor elaborar e construir continuamente o

seu conhecimento prático e sua visão pessoal e contextualizada sobre o

ensino.

Concluindo-se o delineamento do perfil pessoal e profissional

das professoras bem - sucedidas, pode-se dizer que os aspectos

identificados até o momento se incorporam à definição de professor ideal

para atuar no projeto Classes de Aceleração, na visão das especialistas

educacionais: um professor pesquisador de sua própria prática e capaz de

acreditar e confiar no potencial de sucesso de seu trabalho.

No entanto, não se pode considerar o perfil pessoal e profissional

dessas professoras de forma isolada, mas também como um produto da

cultura escolar a que pertencem.

Nas palavras de PATTO (1998: 39), precisamos entender (...) o

comportamento dos professores como uma produção coletiva.

Dentre as várias definições existentes para o termo “cultura

escolar” adota-se, nesse momento, a de BRUNET (1988, citado em

NÓVOA, 1995: 29):

As organizações escolares, ainda que estejam integradas num contexto cultural mais amplo, produzem uma cultura interna que lhe é própria e que exprime os valores (ou os ideais sociais) e as crenças que os membros da organização partilham

Portanto, além da dimensão pessoal do processo de tradução,

deve-se compreender como a cultura escolar recebe as mudanças propostas

238

Page 8: Document9

e as traduz, de forma que as inovações se incorporem às concepções e aos

valores já existentes na instituição.

Assim, as escolas não podem ser consideradas tábulas rasas ou

folhas em branco, onde as exigências e prescrições das políticas

educacionais podem ser impostas com a garantia de que serão seguidas a

risca. Ao serem traduzidas para as salas de aula, as políticas educacionais

muito provavelmente serão ressignificadas para poderem se adequar às

características das culturas escolares (PATTO, 1998).

Não foi a intenção desse estudo investigar a cultura escolar das

instituições participantes do projeto Classes de Aceleração, mas há

condições de se afirmar, baseado ainda em PATTO (1998), que a tendência

de muitas escolas públicas, depois de décadas expostas a uma série de

políticas e reformas educacionais, é possuir uma dinâmica institucional

muitas vezes perversa, que desvirtua os reais objetivos da educação e que

atinge negativamente a todos os atores envolvidos no processo ensino -

aprendizagem, principalmente, os alunos e suas famílias.

Acredita-se que, apesar das instituições escolares estarem, há

muito tempo, descrentes quanto ao potencial das políticas educacionais

públicas em transformar a realidade escolar, podem-se encontrar escolas

onde os profissionais compartilham efetivamente do desejo de melhorar a

qualidade do ensino numa perspectiva ética e que buscam transpor essa

intenção para a prática cotidiana, através de sua competência ou de seu

talento artístico profissional, expressão cunhada por SCHÖN (2000: 29)

para se referir aos tipos de competência que os profissionais demostram em

certas situações da prática que são únicas, incertas e conflituosas.

A Escola II parece ser uma dessas instituições onde se busca

construir uma cultura do sucesso nas Classes de Aceleração e as

professoras Elaine, Fernanda, Graça e Heloísa e a coordenadora pedagógica

Irene demonstram ser profissionais que possuem um forte desejo de

melhorar a qualidade do ensino oferecido a todos os alunos, expresso pelo

239

Page 9: Document9

seu comprometimento em relação ao projeto Classes de Aceleração e,

especialmente, em relação ao sucesso dos alunos multirrepetentes.

À guisa de reflexão, serão feitas algumas considerações finais.

Considera-se que este trabalho trouxe algumas contribuições ou

subsídios para a compreensão de como professores e especialistas

educacionais recebem, pensam e agem diante da tarefa de traduzir para o

seu cotidiano de atuação profissional as políticas ou projetos educacionais

de superação do fracasso escolar.

A análise dos dados mostrou que a tradução das políticas ou

projetos educacionais de superação do fracasso escolar para a prática

docente não é uma tarefa fácil, pois envolve desafios e apostas pessoais dos

professores e a articulação de crenças que os mesmos possuem sobre

diversos aspectos da prática profissional (alunos, conteúdo curricular,

processo ensino - aprendizagem) com os pressupostos contidos na proposta

pedagógica dessas políticas, reforçando a idéia de que não é possível

esperar que os professores modifiquem as suas práticas apenas porque

assim foi decretado.

Em outras palavras, diante da complexidade do processo de

tradução das políticas ou projetos de superação do fracasso escolar para a

prática, não se pode acreditar que a simples implementação das políticas irá

garantir que essas sejam interpretadas e colocadas em prática pelo professor

da maneira como são previstas pelos órgãos decisórios.

Segundo McDIARMID (1995) é necessário que os professores

tenham a oportunidade para refletir criticamente sobre a nova prática

preconizada pelas reformas educacionais, sobre o que está sendo solicitado

deles, sobre as alterações que precisam fazer em sua prática atual, para que

consigam aprender a atuar de uma maneira nova. Entretanto, a busca por

essas respostas demanda, por parte dos professores, aquilo que o autor

denominou de “tempo e condições mentais propícias”, os quais,

240

Page 10: Document9

freqüentemente, não têm sido considerados no desenvolvimento

profissional docente.

Dessa forma, considera-se que o processo de implementação das

políticas pelos órgãos decisórios, de tradução das mesmas pelos professores

e a avaliação dos efeitos, diretos ou indiretos, que essas políticas acarretam,

envolve a articulação de diferentes noções de tempo.

Tem-se, dessa maneira, o tempo dos órgãos políticos e

administrativos para elaborarem e implementarem as reformas

educacionais, o qual parece ser bem diferente do tempo que os professores

necessitam para se adaptarem a essas mesmas reformas e às mudanças

previstas por elas, assim como para repensarem as suas concepções e

práticas, o qual, por sua vez, também é diferente do tempo dos alunos para

se adaptarem às novas condições impostas ao processo ensino -

aprendizagem e do tempo da realização de avaliações institucionais e de

pesquisas educacionais a fim de se analisar os resultados das reformas

implementadas.

Observando-se essa complexa questão de tempo, pode-se dizer

que a formação continuada oferecida às professoras e coordenadoras pelas

especialistas educacionais da D.R.E., nos moldes em que se caracterizou,

pode ser considerada como um dos principais fatores facilitadores do

processo de tradução, por ter possibilitado aos professores alguns

momentos para a reflexão sobre as situações vivenciadas na prática

pedagógica e ao buscar a articulação entre a teoria e a prática, apesar de não

ter sido realizada nas escolas, locus de formação ideal para processos dessa

natureza.

Além disso, acredita-se que os dados revelam, de forma mais

clara no caso das professoras da Escola II, que o diferencial do sucesso da

tradução não parece estar relacionado apenas aos fatores identificados até o

momento, mas também no nível de desenvolvimento profissional dessas

professoras.

241

Page 11: Document9

Dessa forma, o fato de ter cursado ou de estar cursando um curso

de nível superior parece indicar que possuem uma necessidade de formação

continuada e de aprimoramento pessoal e profissional. Nessa perspectiva,

inclui-se a professora Célia, antiga docente da Escola I, que na época da

coleta de dados participava do processo de seleção para ingressar em um

curso de pós - graduação strito sensu, em nível de mestrado.

Anteriormente, foi feita a referência à cultura escolar e suas

influências na tradução do projeto Classes de Aceleração para a prática

pedagógica. A esse respeito, o que os dados parecem mostrar é que existe,

de um lado, a formação acadêmica e aspectos da trajetória profissional de

cada uma das professoras que podem ter facilitado a compreensão dos

pressupostos teórico - metodológicos do projeto educacional em questão e a

tradução adequada do mesmo para a prática pedagógica e, de outro lado,

uma cultura escolar que atuaria a favor dessa tradução.

Nesse processo de tradução têm-se, de um lado, os aspectos

relacionado ao um nível pessoal e específico do professor, como as suas

crenças ou teorias pessoais, sua formação acadêmica e trajetória

profissional e, de outro, aspectos relacionados a um nível institucional,

como as concepções e valores que a cultura escolar possui sobre o processo

ensino - aprendizagem de alunos com história de fracasso escolar, o apoio

dado ao trabalho docente realizado com os alunos multirrepentes, o

investimento que é feito na formação continuada do corpo docente e a

valorização do professor enquanto profissional.

Acredita-se que novas pesquisas sobre os efeitos das Classes de

Aceleração devam ser realizadas, pois apesar da impressão imediata de que

esse projeto possibilitou uma melhoria no nível de auto - estima e de

motivação dos alunos para aprender, é urgente verificar como os alunos

egressos estão se adaptando às séries regulares e se o conjunto de

conhecimentos, habilidades e valores adquiridos no decorrer de sua

242

Page 12: Document9

passagem por essas classes foi o suficiente para que venham a obter efetivo

sucesso em suas vidas acadêmicas e no exercício de sua cidadania.

Portanto, julga-se necessário que as pesquisas sobre Classes de

Aceleração procurem ir além do indicador “resgate da auto - estima” (o que

não desmerece a importância da relação entre auto - estima e

aprendizagem), procurando analisar em profundidade e maior amplitude o

grau de apropriação dos conteúdos escolares, assim como o desempenho

acadêmico dos alunos egressos dessas classes, incluindo-se o estudo da

relação entre a promoção/retenção dos alunos ao final dos ciclos de

aprendizagem e/ou conceitos afins, como notas e conceitos bimestrais em

cada ciclo de aprendizagem.

Em outras palavras, apesar dos inegáveis benefícios trazidos

pelas Classes de Aceleração para os professores e os alunos participantes,

especialmente no que diz respeito às condições de trabalho pedagógico (as

quais, na opinião da pesquisadora, deveriam existir em todas as salas de

aula do sistema educacional!) e à adoção de uma concepção de fracasso

escolar que procura não culpabilizar o aluno multirrepetente, é necessário

que se investigue mais profundamente em que medida o projeto de

Aceleração realmente contribuiu para que os alunos se apropriassem dos

conteúdos escolares.

A preocupação com a realização desse tipo de pesquisas advém

do fato de que, em linhas gerais, o projeto Reorganização da Trajetória

Escolar no Ensino Fundamental - Classes de Aceleração teve como objetivo

maior a correção do fluxo escolar o que, certamente, implica a alteração das

estatísticas e indicadores educacionais mas, não necessariamente, propicia o

oferecimento de um ensino de qualidade ou subsidia a realização de

mudanças estruturais no sistema educacional que venham contribuir para a

real superação do fracasso escolar neste País.

243