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Escola Superior de Educao Joo de Deus
Mestrado em Cincias da Educao Educao pela Arte
A Arte: uma viagem
mgica com Mir
Joana Filipa Formiga Carreira
Lisboa, Novembro de 2013
II
Escola Superior de Educao Joo de Deus
Mestrado em Cincias da Educao Educao pela Arte
A Arte: uma viagem
mgica com Mir
Relatrio apresentado Escola Superior de Educao Joo de Deus, para a obteno do grau de
Mestre em Cincias da Educao, na especialidade de Educao pela Arte, sob orientao
Professor Doutor Rui Andr Alves Trindade.
Joana Filipa Formiga Carreira
Novembro de 2013
III
RESUMO
O tema escolhido para este estudo A Arte: uma viagem mgica com Mir
pretendeu familiarizar a criana com a Arte e que se expressasse atravs da mesma,
descobrindo as mais diversas formas de expresso e tcnicas, num equilibrado
desenvolvimento pessoal.
Para tal enquadrou-se a proposta nas teorias da Educao pela Arte considerando
as caractersticas do sistema educativo pr-escolar e do papel do educador de infncia.
Sero explorados conceitos relacionados com a Arte como Arte Infantil, Arte
Contempornea, Expresso Plstica.
Aps serem encontrados os fundamentos tericos que demarcam a criao desta
proposta foi realizado um projeto de investigao ao numa sala de jardim de infncia,
com 15 crianas dos 3 aos 5 anos de idade. As atividades estimularam as crianas
participantes a desenvolver respostas criativas perante os desafios propostos, assim
como a capacidade de improvisao, o desenvolvimento da expresso pessoal, a
imaginao e a sensibilidade, o respeitar as manifestaes de arte dos colegas e as
diferenas.
Da anlise dos resultados obtidos conclui-se que a Arte deve ser absorvida pelo
ensino e intencionalmente desenvolvida, pois o seu contributo enorme no sentido em
que desenvolve a criana na sua totalidade a sua intelectualidade e tambm a esfera
afetiva-emocional.
Palavras-chave: Arte, Educao, Expresso Plstica, Formao Pessoal e Social,
Intencionalidade Educativa, Arte Contempornea, Criatividade e Auto-expresso.
IV
ABSTRACT
The chosen subject for this study "Art: a magical journey with Mir" intended to
familiarize the child with the Art, and express themselves through it, discovering the
most diverse techniques and forms of expression, in a balanced personal development.
For this purpose the proposition was framed in theories of Education through
Art, considering the characteristics of the Preschool Education system and the role of
the Preschool Education teacher. Concepts related to Art will be explored, such as Child
Art, Contemporary Art, and Artistic Expression.
After the theoretical foundations that mark the creation of this proposal were
found, a research/action project was carried out in a kindergarten room with 15 children,
from three to five years old. The activities aimed the encouragement of the participant
children, in order to develop creative responses to the proposed challenges, as well as
the ability to improvise, the development of personal expression, imagination and
sensitivity, and to respect the artistic manifestations of their colleagues as well as their
differences.
Through the analysis of the results obtained, it's possible to conclude that Art
should be used in teaching and purposefully developed because their contribution is
huge in the sense that the child develops as a whole - their intellect and also the
emotional/affective sphere.
Keywords: Art, Education, Artistic Expression, Personal and Social Education,
Intention in Education, Contemporary Art, Creativity and Self-Expression.
V
AGRADECIMENTOS
A todos, porque nunca estamos ss,
verdade, pelo apoio incondicional!
Aos meus pais e famlia, pelo
encorajamento e amizade
Aos meus amigos, pela partilha
s minhas colegas e professores desta
etapa, pelo apoio
Ao meu orientador, Professor Doutor Rui
Trindade, pela persistncia e
acompanhamento deste projeto, pela
incansvel dedicao
Ao Professor Doutor Jos de Almeida, por
toda a disponibilidade e incentivo
s crianas participantes, que fazem valer a
pena e enchem os meus dias de sonhos
Educadora Anabela Gameiro, pelo calor
humano com que me acolheu e
compartilhou toda a sua sabedoria de
longos anos de experincia
E um especial agradecimento ao Miguel,
por tudo e por nada Pela sua constante
presena, incentivo e apoio incondicional,
pelas longas horas de conversa, dedicao e
partilha deste projeto pessoal Pelo seu
amor e compreenso
Bem hajam
NDICE
INTRODUO 1
PARTE I ENQUADRAMENTO TERICO 5
CAPTULO I 6
1 - A EDUCAO PELA ARTE 7
2 - A ARTE NA VIDA DA CRIANA 11
3 - O LUGAR DA ARTE NO JARDIM DE INFNCIA EM PORTUGAL
21
3.1 O Papel do Educador de Infncia ..................................................................... 25
3.2 Compreender a Arte Infantil ............................................................................. 32 3.3. A Expresso Livre ............................................................................................. 33
4 - A ARTE CONTEMPORNEA E A CRIANA 37
5 - A EXPRESSO PLSTICA 40
5.1. - O mundo plstico da criana e a evoluo do desenho grfico ................... 43
PARTE II ESTUDO EMPRICO 49
CAPTULO II - METODOLOGIA 50
1. Problemtica e questes de partida (Projeto) ................................................. 51 2. Mtodos, Tcnicas e instrumentos da Investigao ........................................ 53
CAPTULO III APRESENTAO E DESENVOLVIMENTO DO
PROJETO DE ESTGIO 60
1. Localizao ......................................................................................................... 61
2. Destinatrios e sua caracterizao ................................................................... 61 3. Finalidades ......................................................................................................... 63 4. Objetivos ............................................................................................................. 63 5. Organizao Geral ............................................................................................. 64 6. Procedimentos .................................................................................................... 65 7. Planificao das Sesses de Interveno .......................................................... 65
CAPTULO IV APRESENTAO E ANLISE DOS RESULTADOS
72
4.1 Relato das sesses com o grupo ...................................................................... 73 4.2. Dados recolhidos do Livro de Registos da Exposio .................................... 95 4.2. Anlise das entrevistas .................................................................................... 101
CONCLUSO 109
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS 113
ANEXOS 120
ANEXO 1 Guio da entrevista semi-estruturada: Educadora Cooperante Educadora
de Apoio 121
ANEXO 2 Transcrio das Entrevistas 123
ANEXO 3 Quadro de Categorizao das Entrevistas 128
ANEXO 4 Livro de Registo da Exposio 132
ANEXO 5 Quadro de Categorizao do Livro de Registos da Exposio 151
ANEXO 6 Ofcio dirigido aos pais das crianas sobre o projeto a desenvolver com
pedido de autorizao para registar os seus educandos em todo o processo de
investigao 157
ANEXO 7 Folheto informativo da exposio 159
ANEXO 8 Convite da exposio aos pais 163
ANEXO 9 Registos fotogrficos do projeto desenvolvido em suporte digital 164
NDICE DE QUADROS
Quadro 1 Tcnicas de Investigao utilizadas 53
Quadro 2 Processo de Categorizao 54
Quadro 3 Caracterizao das Famlias das Criana 62
Quadro 4 Caracterizao da Escolaridade e Emprego dos Pais das
Crianas 62
Quadro 5 Sesses a desenvolver 64
Quadro 6 Planificao das sesses 66
Quadro 7 Categorizao dos Registos do Livro: Perceo dos Pais e
Comunidade 96
Quadro 8 Categorizao dos Registos do Livro: Trabalhos 97
Quadro 9 Categorizao dos Registos do Livro: Arte 98
Quadro 10 Categorizao dos Registos do Livro: Expetativas 99
Quadro 11 Categorizao dos Registos do Livro: Apreciao das crianas
100
Quadro 12 Categorizao das Respostas das Entrevistas: Formao
Profissional 102
Quadro 13 Categorizao das Respostas das Entrevistas: Definio de
Educao pela Arte 103
Quadro 14 Categorizao das Respostas das Entrevistas: Importncia da
Educao pela Arte no JI 104
Quadro 15 Categorizao das Respostas das Entrevistas: Integrar as
expresses no planeamento 106
NDICE DE FIGURAS
Figura 1 Garatuja 44
Figura 2 Pr-escrita 45
Figura 3 Figura humana girino/cabeudo 45
Figura 4 Desenho de criana de 4 anos 45
Figura 5 Transparncia, criana de 6 anos 46
Figura 6 Humanizao: O sol da lua, criana de 5 anos 46
Figura 7 Rebatimento: Estrada entre rvores 47
Figura 8 Perspetiva Afetiva: O caracol 47
Figura 9 Simbolismo da cor 48
Figura 10 Visionamento das obras de arte de Mir 73
Figura 11- Material didtico sobre Mir coberto para criar expetativa 74
Figura 12 Jogos 74
Figura 13, 14 e 15 Explorao dos jogos e materiais sobre Mir pelas
crianas 74
Figura 16 Criana a fazer o registo da histria 75
Figura 17 e 18 Crianas, aos pares, a pintar cenas da histria 75
Figura 19, 20 e 21 Crianas a desenhar a partir de uma mancha informal
76
Figura 22 Explorao de uma obra de arte original 77
Figura 23 Recortes de elementos de obras de Mir 78
Figura 24, 25 e 26 Crianas a criar a sua prpria pintura, com aguarela, a
partir de um fragmento de uma pintura do artista 78
Figura 27 Recortes de linhas de obras de Mir 79
Figura 28 Linha colada no suporte de interveno 79
Figura 29 e 30 Crianas a criar o seu prprio desenho a partir de uma
linha, tambm retirada da obra do artista, integrando-a 80
Figura 31 Um dos trabalhos finais: Linha uma mangueira 80
Figura 32 Cadavre Exquis 81
Figura 33 Criana a pintar livremente s/ tela 82
Figura 34 Um dos trabalhos finais 82
Figura 35 e 36 Crianas a explorar e a realizar colagem/pintura de
diferentes materiais 83
Figura 37 Criana muito concentrada na realizao da sua colagem 84
Figura 38 Alguns dos trabalhos finais 84
Figura 39 Crianas a iniciar a atividade 85
Figura 40 Pormenor de uma aplicao 85
Figura 41 Criana a dispor os materiais na sua criao 85
Figura 42 Crianas a pintar as pedras 86
Figura 43 Alguns dos trabalhos finais 86
Figura 44 Distribuio do barro para dar incio atividade 87
Figura 45 e 46 Crianas a explorar o barro 88
Figura 47 e 48 Crianas a aplicar a aguarela para finalizar a sua pea
88
Figura 49 Crianas a pintar o mural de azulejos 89
Figura 50 Trabalho final 89
Figura 51 Crianas a pintar o seu auto-retrato 90
Figura 52 Auto-retrato na capa Final de Ano 90
Figura 53, 54 e 55 Crianas embrenhadas na experincia da pintura
gestual 91
Figura 56 Capas Final de Ano 91
Figura 57 e 58 Resultado final das Capas Final de Ano 92
Figura 59 Exposio montada 93
Figura 60 Alguns dos trabalhos finais expostos 94
Figura 61 Pais na inaugurao da exposio 94
Figura 62 Pais na inaugurao da exposio II 94
Figura 63 Livro de Registos 95
Figura 64 Vista geral do hall onde se encontra o Livro de Registos 95
Figura 65 Trabalhos finais: Pintura livre s/ tela 98
Figura 66 Preferncias sobre as atividades desenvolvidas 100
1
INTRODUO
O estudo que aqui se apresenta destina-se obteno do grau de Mestre em
Cincias da Educao, na especialidade de Educao pela Arte. Intitula-se de A arte:
uma viagem mgica com Mir e prende-se com a vivncia da Arte em contexto pr-
escolar, mais especificamente as artes plsticas, e os benefcios que traz aos educandos
quando intencionalmente abordada. Desde h muito que a incluso da Arte no ensino
ponto de discusso e troca de ideias entre pedagogos, docentes e outros mais
relacionados com a causa, como via de promoo da criatividade, do desenvolvimento
harmnico da criana e da expresso pessoal. Contudo, embora j se vejam alguns
frutos, esta uma prtica escassamente investigada e aplicada, muitas vezes relegada
para segundo plano.
Se aplicada desde cedo, esta via educativa prepara a criana para, ao longo do
seu crescimento, encontrar um modo saudvel de se expressar criativamente nas mais
diversas situaes que vo surgindo. A sociedade de hoje exige isso mesmo e torna-se
urgente escola e docentes desempenharem um papel que facilite a formao do carter,
a competncia emocional e o desenvolvimento da criatividade. So todas capacidades
que caminham lado a lado e adquiridas na infncia. Urge, deste modo, correntes
pedaggicas e metodologias alargarem a transmisso do saber de conhecimentos
cientficos e tcnicos ao experienciar a prpria vida a partir de dentro, com a finalidade
de abrir espaos para manifestaes que possibilitem o trabalho com a diferena, o
exerccio da imaginao, a autoexpresso, a descoberta e a inveno, novas experincias
percetivas, experimentao da pluralidade, multiplicidade e diversidade de valores,
sentido e intenes.
A funo deste Projeto que a criana se familiarize com a arte e se expresse
atravs da mesma, descobrindo as mais diversas formas de expresso e tcnicas, num
equilibrado desenvolvimento pessoal. Mir foi o artista plstico escolhido para suporte
nas atividades, uma vez que a sua linguagem prpria, ldica e de cores vivas, muito
prxima da linguagem das crianas. Caractersticas dominantes do desenho infantil,
como o ideografismo, a humanizao, o espao topolgico e o rebatimento tambm se
verificam nas obras de Mir. Doutros tambm se falaram, medida que as sesses
foram sendo desenvolvidas.
2
Ao pensar neste projeto contextualizamos o trabalho na vertente do ldico e do
fazer, com a ao mais significante do que os resultados, que, todavia revelam a
autenticidade expressiva e, consequentemente, a sensibilidade esttica s cores e s
formas. As atividades promovem o desenvolvimento do educando na criao da
respetiva linguagem expressiva, o crescimento da sua autonomia e a capacidade
criativa, de acordo com as suas emoes, ideias e inquietaes interiores.
Com base na funo do nosso projeto, pretendemos atingir os seguintes
objetivos: Promover o desenvolvimento e formao equilibrada da personalidade, em
interao com o meio humano, cultural e artstico em que vive; Apurar a sensibilidade e
afetividade; Proporcionar o contacto com diferentes tendncias estticas da expresso
plstica, permitindo a descoberta e o desenvolvimento de interesses e aptides;
Propiciar criana um domnio das suas virtualidades expressivas e criativas;
Possibilitar uma estreita ligao das crianas com a Arte; Desenvolver e aprofundar a
sensibilidade esttica; Interessar, estimular e incentivar a explorao vivencial das
oportunidades educativas; Fortalecer a auto-estima; Desenvolver a capacidade
cognitiva.
Este um estudo de carcter qualitativo, sendo que este um mtodo de
investigao que procura entender um caso, de acordo com a compreenso das
necessidades, motivaes e comportamentos dos participantes, e, a partir da, situar a
interpretao do caso estudado. As tcnicas de recolha de dados utilizadas foram a
entrevista, estudos por observao e fotografias e a anlise documental, atravs das
quais pretendemos conhecer os resultados e da retirar algumas concluses.
Este estudo divide-se em duas partes: Enquadramento Terico e Estudo
Emprico. O Enquadramento Terico resulta da reviso da literatura efetuada que
fundamenta este estudo no I captulo. Est dividido em cinco pontos que consideramos
pertinente abordar, tendo em considerao a base do nosso Estudo. No ponto 1 A
Educao pela Arte, explanado o conceito desta metodologia, a sua evoluo, as suas
bases psicopedaggicas, e os seus principais impulsionadores. No ponto 2 A Arte na
vida da criana: a formao do carter, as emoes e a criatividade, abordado a
importncia que a Arte representa no desenvolvimento da criana e sendo esta um
elemento indispensvel no desenvolvimento do carter, emoes e criatividade, tornou-
se impretervel aprofundar a sua contribuio nestes trs?. No ponto 3 O lugar da Arte
3
no Jardim de Infncia em Portugal, procurmos concretizar uma sinopse da histria da
Educao em Portugal numa perspetiva de estudo da insero da Arte no sistema pr-
escolar, centrada no esclarecimento dos acontecimentos chave que contriburam
claramente para a transformao e evoluo da mesma. Ainda neste ponto, falamos do
papel do educador de infncia, da Arte infantil e da Expresso livre, todos
indispensveis para que a abordagem da Arte no contexto pr-escolar seja bem
conseguida e o desenvolvimento expressivo seja uma realidade no processo educativo
da criana. No ponto 4 A Arte Contempornea e a criana, uma vez que foi um artista
contemporneo o escolhido para ponto de partida e base do nosso projeto, procura expor
as razes da escolha e o porqu de esta corrente ser mais facilitadora do processo
criativo da criana. Por ltimo, no ponto 5 A Expresso Plstica, conjetura o seu
valor, dentre as outras expresses, para a criana e no currculo da Educao Pr-
Escolar. Ainda so referidas as caractersticas prprias da linguagem expressiva da
criana no mundo plstico da criana e a evoluo do desenho grfico.
O Estudo Emprico abrange o II captulo: Metodologia onde se descreve os
mtodos, tcnicas e instrumentos de investigao utilizados para a realizao do projeto;
o III captulo: Apresentao e desenvolvimento do Projeto de Estgio onde se d a
conhecer a organizao geral do projeto, os seus destinatrios e procedimentos
efetuados; e, por fim, o IV captulo: Apresentao e Anlise dos Resultados onde so
apresentados os dados recolhidos ao longo do estudo e a respetiva anlise, efetuada em
funo dos objetivos propostos. No final deste estudo apresentam-se as concluses
surgidas.
Por fim, apresentam-se as referncias bibliogrficas e os anexos, que integram o
guio das entrevistas, a transcrio e anlise das mesmas; a transcrio do Livro de
Registos e a sua anlise; o panfleto informativo da exposio; a informao aos pais do
projeto de estgio; e o suporte digital que contm todos os registos fotogrficos
efetuados ao longo das sesses.
Como principais resultados podemos referir a relevncia das atividades
propostas para o desenvolvimento da criana, tendo em considerao a intencionalidade
educativa, o desempenho do educador de infncia e a valorizao do ambiente e espao
educativo.
4
Ressalvando as naturais limitaes do Estudo e em conformidade com os
resultados obtidos consideramos pertinente haver continuidade na reflexo, sempre de
forma fundamentada e crtica, sobre a temtica em estudo para que o caminho a
percorrer no reconhecimento da Arte no ensino e o seu contributo como pedagogia no
desenvolvimento integral da criana seja cada vez mais curto e, consequentemente, seja
uma realidade proporcionada a todas as crianas.
De mencionar que as regras cumpridas para a redao e apresentao do Estudo,
esto de acordo as normas APA, American Psychological Association.
5
PARTE I ENQUADRAMENTO TERICO
6
CAPTULO I
7
1 - A EDUCAO PELA ARTE
Em linhas gerais, poderemos dizer que Educao pela Arte o promover da Arte
em diferentes contextos e ambientes educativos, seja formais ou informais, assim como
ter um papel contributivo na sociedade, tornando-a criativa e consciente da sua
identidade cultural. A nossa sociedade global, requer cada vez mais um pensamento
divergente pois exige-nos o estarmos abertos s relaes com o meio envolvente e
considerar as especificidades dos diversos pblicos com quem se relaciona, e cada vez
mais o trabalho uma tarefa de equipa que implica uma srie de competncias
emocionais e relacionais que podem determinar o xito. Nesse sentido, a Educao pela
Arte tem grande relevncia na preparao das crianas, o nosso futuro, para serem
flexveis, adaptveis e especialmente criativas. Privilegia e estimula tanto o
desenvolvimento cognitivo tanto o desenvolvimento afetivo, alm de que ajuda a
estabelecer pontes entre culturas, ao fortalecer o respeito pelas suas comunidades.
No entanto, o conceito de Educao pela Arte s foi desenvolvido e seriamente
considerado no contexto da Educao na segunda metade do sculo XX, por Herbert
Read, numa obra sua intitulada Education throught art, onde retomando a perspetiva
de Plato e baseando-se em grandes pedagogos, como Rousseau, Froebel, Montessori, e
em psiclogos com conhecimento do desenvolvimento e comportamento da criana,
defende que a arte dever ser a base de toda a Educao. criada, desta forma, uma
metodologia abrangente de todas as dimenses da personalidade e, em especial daquela
que esquecida pelas outras perspetivas metodolgicas: o desenvolvimento afetivo-
emocional.
At meados desse sculo, na educao artstica e oficial dos jovens,
predominava uma atitude passiva de contemplao da beleza. , portanto, indiscutvel o
papel de Read, no ps guerra, ao abrir as portas a novos mtodos de ensino, lanando as
bases para a educao artstica moderna: introduziu a auto-expresso na educao
artstica (Godinho, 2006, p.34). A importncia da criatividade, associada ao mundo
interior e afetivo da criana, a defesa da liberdade de expresso, e um sistema de ensino
baseado na arte, capaz de mudar a sociedade moral e socialmente, foram outros dos seus
contributos pedaggicos.
8
A Educao pela Arte torna-se uma vanguarda nos anos setenta. A Arte na
infncia ganha importncia e sofre um impulso a nvel mundial para tal contribuindo a
fundao do movimento internacional de educao pela arte ao abrigo da UNESCO em
1954 (Steers, 2006).
Vale a pena transcrever as palavras de Irene Wojnar (citada por Sousa, 2003),
que no seu livro Esthtique et Pdagogie, define este conceito, afirmando que:
Distingue-se atualmente a ideia de Educao pela Arte aquela que implica,
como consequncia do contacto do homem com o meio, o seu efeito sobre o
conjunto de personalidade, e a ideia de uma educao esttica constituindo
uma parte do processo educativo geral, e paralela a uma educao moral e
intelectual.
A ideia de Educao pela Arte no se trata de um s domnio da educao
correspondendo formao de uma sensibilidade esttica, do gosto baseada no
princpio esttico e concedendo-lhe o primado entre os outros factores
exercendo o seu efeito sobre o ser humano. A formao do homem deve ser
concebida como um processo total. A Arte nela intervm em diversos planos
da vida, o que tem consequncias no somente para a sensibilidade esttica
propriamente dita, mas tambm para a vida intelectual afectiva e moral (p.80).
No fundo, a Educao no surge com funo de ensinar Arte, mas de utilizar
esta como via de promover a Educao no tende a formar profissionais, a pr as
crianas ao servio da arte, mas sim a arte ao servio das crianas (Rodrigues citada
por Sousa,2003, p. 80). Pretende-se, num intuito integrante e globalizante, uma
educao do sensrio e da psicomotricidade aliadas sociabilidade e sensibilidade da
dimenso afetivo-emocional.
Joo dos Santos (1913-1987), um dos grandes pedagogos portugueses, refere, na
sua vasta obra, que a educao deve integrar todas estas dimenses acima referidas com
o intuito de proporcionar criana as mais amplas possibilidades de desenvolvimento,
ajudando-a no entender de si mesma e da sociedade que a rodeia: A educao atravs
da arte a que melhor permite a exteriorizao das emoes e sentimentos e a
sublimao dos instintos (). A educao atravs da arte permite criana sublimar
os seus instintos e ao mesmo tempo expandir os impulsos e sentimentos elementares
(Joo dos Santos citado por Sousa, 2003, p.82). () Esclarecida atravs da experincia
pessoal, a criana ficar apta a realizar o que constitui o nosso ideal de psiclogos e
educadores: o contacto com o OUTREM e a sua OBRA (Joo dos Santos, citado por
Cmara, 2007, p. 15).
9
Ao ser estimulada para se consciencializar das capacidades emocionais das suas
experincias e a exterioriza-las atravs da utilizao da palavra, do gesto, do som, do
grafismo, de toda uma variedade de formas de expresso ao seu dispor, potencia-se o
modo como a criana aprende, como comunica e como interpreta os significados do
quotidiano. Atravs de vivncias simblicas e emocionais, -lhe possibilitado colocar
em ao diversos mecanismos psicolgicos de defesa (catarse, compensao,
sublimao) que a fortalecero na sua luta contra frustraes e conflitos de vida e, por
conseguinte, dota-a de uma viso mais abrangente na compreenso da sociedade. Piaget,
alis, mostrou em 1926 que cada pessoa assimila a realidade e acomoda-se a ela, sua
prpria maneira e diferentemente de todas as outras, sendo por isso importante
conseguir integrar as emoes no contexto geral de uma linguagem convencional.
Como bases psicopedaggicas da sua ao, a Educao pela Arte utiliza
principalmente os princpios da espontaneidade, da atividade, do ludismo, da criao e
da expressividade. Na idade pr-escolar, o pedagogo francs Debesse diz-nos que, a
criana reencontra o seu modo de expresso natural no jogo/atividade ldica, uma
atividade complexa e bem estruturada. Atravs do jogo a criana vai-se conhecendo a si
prpria, os outros e o seu meio, pelos modos expressivos de que dispe e v
descobrindo, quer pelos gestos, pelas mos, pelo movimento, pela mimica, pelos traos
e cores e sons, pela voz e palavra, ou por outros mais (Santos, 2008). Piaget defende
mesmo que a atividade ldica que desenvolve as capacidades cognitivas da criana.
Tambm aparenta ser mesmo a nica metodologia para se propiciar criana qualquer
atividade educativa no campo dos afetos/emoes/sentimentos. Froebel (citado por
Read, 2001) enfatiza mesmo que o jogo a mais elevada expresso do
desenvolvimento humano da criana, porque s por si a livre expresso daquilo que
est na alma da criana. o produto mais puro e mais espiritual da criana e ao mesmo
tempo um tipo e uma cpia da vida humana em todas as fases e em todas as relaes
(p.120). Deste modo, podemos deduzir que a Arte est ligada ao jogo, sendo este o seu
modo metodolgico fundamental.
Todavia, na Educao pela Arte, o jogo dever ser um jogo artstico (expresso
dramtica, expresso plstica, expresso musical), transformando-se dessa forma em
algo mais que o simples contentamento das necessidades ldicas: o contentamento das
necessidades de expresso da vida afetiva.
10
A Educao pela Arte entende-se como um conceito incluso dum processo
educativo que defende uma nova abordagem, na transmisso do conhecimento, onde o
individuo tido como principal e mais importante elemento. Tambm Fusari e Ferraz
(1992) comungam desta ideia afirmando que a Educao pela Arte um movimento
educativo completo e cultural que procura a composio de um ser humano completo,
total, valorizando os aspetos intelectuais, morais e estticos no despertar para a
conscincia individual harmonizada ao grupo social do qual faz parte. Nas palavras de
Arquimedes da Silva Santos (2008):
o que mais importa apreender, para alm da designao educao pela arte, a autntica inteno educativa de fundo, aquela em que se considera as actividades de feio expressiva, criativa, artstica, esttica, intimamente
implcitas na formao integral e humanista da criana e do adolescente, ,
prosseguindo uma via contnua e ascendente ao longo da vida. (p.39)
Robinson (1992) refora ainda a importncia de, para alm de as crianas
explorarem os seus prprios pensamentos e percees, entenderem que estes so
moldados por aqueles que os rodeiam e a cultura onde esto inseridos e vice-versa.
Desta forma, v-se um currculo cheio de artes no sendo s preocupado com a
expresso de pensamentos das pessoas mas inclusivamente com o entender a cultura das
outras pessoas. Como menciona Reis (2003, p. 53) a educao pela arte deve levar a
cada estudante o conhecimento da arte atravs das civilizaes, da criatividade e do
processo artstico, do vocabulrio e da comunicao artstica.
Por conseguinte, defendemos que a Educao pela Arte no deve ser uma mera
probabilidade. imprescindvel para desenvolver talentos, estimular a imaginao,
encontrar uma profunda satisfao pessoal e coletiva, e um meio para o conhecimento e
apreciao da Arte e da Cultura que precisam ser transmitidos de gerao em gerao.
11
2 - A ARTE NA VIDA DA CRIANA
De acordo com Gonalves (1976), a criana tem uma inata necessidade de se
exprimir, transmitindo aos que a rodeiam o que pensa, sente e imagina. por isso
mesmo criadora duma expresso viva pois representa o mundo conforme o sente, ao
contrrio do adulto que j est formatado pelos padres da sociedade.
A expresso inata de que detentora pode ser desenvolvida com o contributo da
Arte e transversalmente a construo da formao do carter e o desenvolvimento da
sua criatividade. Neste perodo de crescimento da criana decisivo proporcionar-lhe
vivncias que privilegiam, a par do desenvolvimento cognitivo, um desenvolvimento de
uma imaginao criadora e um desenvolvimento harmonioso da sensibilidade e
afetividade. Citando Santos (2008), a rea da Arte vai despertar na criana a
necessidade de entreabrir a vida afetiva atravs da expressividade artstica. E com o que
consegue realizar, sendo embora obra transitria e logo esquecida, somente pelo
imediato prazer de fazer, como num jogo, a criana cresce (p.112).
Neste crescimento da criana em relao com a Arte, necessrio que haja a
consciencializao do quo importante esta e, como tal, respeit-la a fim de
proporcionar um ambiente onde a criatividade, as sensaes e pensamentos da criana,
possam continuar a ser explorados livremente atravs da expresso prpria e
espontaneidade natural em qualquer atividade artstica (Cardoso e Valsassina, 1988).
Sendo que a Arte um elemento indispensvel no desenvolvimento da
criatividade, carter e emoes, torna-se premente analisar mais a fundo a sua
contribuio neste trs pontos.
Formao do Carter
O contributo da Arte na formao do Carter acontece devido ao meio de
expresso e de libertao que a Arte encerra. Atravs dela o homem liberta-se de tudo
que o possa constranger, escravizar e alienar, e cresce por dentro no sentido de, como
referencia Eurico Gonalves (1976), ser ele mesmo o poeta-sonhador-construtor do seu
prprio destino: Revela-se tal como e, sem quaisquer truques, artifcios ou
12
roupagens, aproxima-se assim dos outros. Aos outros oferecida a possibilidade de o
aceitarem tal como e estabelecerem com ele um verdadeiro dilogo (p.10).
Desta forma a formao do Carcter vai-se construindo com base no conseguir
expressar o que temos dentro de ns sem hesitaes, dificuldades, sentimentos de temor
e de esperana, dvidas e entusiasmos. Um passo gigantesco na direo da comunicao
verdadeira com os outros, sem a qual no pode haver entendimento. Esta uma postura
socialmente necessria para que a relao com os outros seja envolvida por empatia.
Este desabrochar do indivduo para uma experienciao da prpria vida a partir
de dentro vai tornando-o criativo e atento criatividade dos outros, tendo este tornar-se
criativo um papel muito importante nas interligaes afetivas que formam a
personalidade afetiva e ajudam na resoluo de tenses, conflitos e frustraes da
experincia interna no seu propsito de encontrar na prpria vida a qualidade e a
felicidade que lhe do sentido e intencionalidade (Sousa, p.111, 2003) e, por
conseguinte, desenvolve qualidades como a sensibilidade, a transparncia lcida, a
recetividade e o prazer da descoberta no dilogo com os outros que fazem parte da
formao da pessoa, e tambm desenvolve a inteligncia, a fluidez e mobilidade de
pensamento, o poder de anlise e de sntese, a reflexo crtica e a imaginao.
Stern (s/d a) refora esta ideia dizendo que atravs da Arte, a criana desenvolve
a sua personalidade, forma o seu carter e torna-se um ser socivel, desligado de
complexos, mas com sentido de responsabilidade: Se a ao educativa consiste em
suprimir entraves, para facilitar a exteriorizao, ensina tambm a qualidade de
linguagem e um requintamento do ser (p.17).
Nesta linha de pensamento, Santos (2008) refere que este desenvolvimento
harmonioso da personalidade proporcionado pelas formas de atividade artsticas
adaptadas expresso do eu. S estas conseguem oferecer um espao onde se podem
realizar vivncias com a finalidade de a criana se construir enquanto pessoa e adquirir
competncias para a vida. O aprender a olhar, diretamente, para si mesma e para os
acontecimentos da sua vida fundamental e reflete-se no modo como se pensa, no que
se pensa e no que se produz com o pensamento.
O desabrochar da sensibilidade artstica pela descoberta dos diferentes campos
de criao das artes plsticas, musica, dana, teatro, cinema ou da escrita
13
pode contribuir largamente para o desenvolvimento harmonioso da
personalidade da criana e facilitar a sua integrao social. Essa sensibilidade
mais desenvolvida coloca-os em melhor posio para valorizar as capacidades
prprias e, mais ainda, a sua liberdade de expresso. Criatividade,
comunicao, integrao social so as traves mestras para afrontar, a partir da
escola, o mundo no protegido das relaes humanas e trabalhos (Reading,
citado por Godinho, p.39, 2006)
A Arte e a formao de Carcter so, ainda, o contedo de uma educao
cuidada e personalizada, apesar de primeira vista poderem parecer realidades distintas
e aparentemente isoladas na vida do homem. preciso empenho, esforo, disciplina e
experincia de liberdade tanto em atividades no domnio da Arte, como para ter carter
(Godinho, 2006).
Emoes
Sendo as emoes, por excelncia, um fator de grande influncia no
desenvolvimento de crianas, adolescentes e todos ns; e constituindo as artes a
linguagem dos afetos (emoes, sentimentos) de compreender a sua importncia pela
possibilidade do desenvolvimento completo do ser, de formao equilibrada da
personalidade. Importa, pois, aprofundarmos este campo.
As emoes foram at h pouco tempo um assunto inexplorado, mas tm vindo a
assumir um papel de relevo na nossa sociedade. Ento o que isto de emoes e qual a
sua importncia? Como nos diz Damsio as emoes tm importncia relativamente
racionalidade, no sentido em que os sentimentos fazem parte na tomada de decises
racionais: Os sistemas emocional e cognitivo no crebro esto muito mais integrados
do que se acreditava originalmente (Bar-On & Parker, 2002). Inclusive podem ter o
papel de orientao cognitiva, sendo que guiam a ateno, elaboram significados e tm
o seu prprio percurso de memria.
A parte racional e a emocional, chamemos-lhes mente, funcionam em harmonia
a maioria do tempo. Contudo, a mente emocional domina, por vezes, devido ao facto de
atuar mais rpido que a mente racional. Isto acontece porque as emoes so privadas
da reflexo.
A mente emocional tem como grande vantagem o poder de ler uma realidade
emocional, por exemplo o conseguirmos detetar que aquela pessoa est furiosa
connosco, aquela pessoa est a mentir, o que eu estou a fazer est a deix-la triste.
14
Atravs desta primeira anlise, sabemos se nos acautelar, em quem confiar, quem est
em apuros. A desvantagem que, por vezes, estas impresses e julgamentos intuitivos,
to rapidamente deduzidos, podem ser errados ou mal dirigidos. Ainda assim, a
rapidez que confere, em situaes de urgncia, a nossa mobilidade de ao no instante.
Em suma, um gnero de radar para o perigo, o que permite a nossa sobrevivncia.
Urge aprender a gerir e a controlar as emoes, de modo a que funcionem a
nosso favor e no representem obstculos. O sermos emocionalmente equilibrados
conhecer e controlar os prprios sentimentos e saber reconhecer e lidar eficazmente com
os sentimentos dos outros permite, em todos os domnios da vida, ser mais satisfeitos.
Estas competncias emocionais podem ser ensinadas s crianas, dando a oportunidade
no s da sua aprendizagem, mas tambm do seu aperfeioamento ao longo da vida.
Daniel Goleman (2011) apresenta cinco competncias para dotarmos as nossas
emoes de inteligncia:
1. Autoconhecimento emocional: conhecimento que o ser humano tem de si
mesmo, incluindo dos seus sentimentos e intuio; autoconscincia.
2. Controlo emocional: capacidade de gerir as emoes, canalizando-as para
uma manifestao adequada a cada situao.
3. Auto-motivao: direcionar emoes para a prossecuo de objetivos
estabelecidos; ser capaz de colocar os sentimentos ao nosso servio.
4. Empatia: reconhecer as emoes do outro e saber colocar-se no seu lugar;
compreender o outro para uma melhor gesto das relaes.
5. Relacionamentos pessoais: aptido e facilidade de relacionamento; est
associado em parte com a capacidade emptica.
O estar preparado para lidar com as frustraes, controlar as emoes e dar-se
com os outros so competncias adquiridas desde a infncia e que tm uma extrema
importncia no xito das vidas futuras, pois iro refletir-se na capacidade de motivao
prpria, na persistncia a despeito das frustraes, no controlar dos impulsos e adiar a
recompensa; no regular o prprio estado de esprito e impedir que o desnimo subjugue
a faculdade de pensar, de sentir empatia e de ter esperana (Goleman, 2011).
15
Estas concluses so partilhadas por diferentes psiclogos como Gardner,
Sternberg, Goleman e outros, que afirmam que a inteligncia emocional uma parte
crucial do que faz as pessoas terem xito prtico eficaz na vida.
Na escola, as suas correntes pedaggicas e metodologias, preocupam-se
essencialmente com a transmisso do saber de conhecimentos cientficos e tcnicos,
esquecendo-se no meio de tudo isto das competncias emocionais. Apesar de algumas
destas competncias como o afeto, compreender, falar que so objeto de aprendizagem
sem que sejam ensinadas, importante estas serem inclusas na educao atravs de
experienciar a prpria vida a partir de dentro. Neste contexto, vale a pena transcrever a
parecer de Gardner (citado por Goleman, 2011):
A contribuio mais importante que a escola pode fazer para o desenvolvimento de uma criana ajudar a encaminh-la para onde os seus talentos lhe sejam mais teis,
onde se sinta satisfeita e competente. um objetivo que perdemos completamente de
vista. (). Devamos passar menos tempo a classificar as crianas e mais tempo a
ajud-las a identificar as suas competncias e dons naturais, e a cultiv-los (p.57).
Um dos aspetos da Educao pela Arte , precisamente, o seu contributo para o
domnio das emoes, uma vez que, atravs da experincia artstica, as crianas tm a
oportunidade de vivenciar situaes que conduzem expresso das mesmas. As
diversas formas de expresso artstica proporcionam ao aluno instrumentos de
afirmao da sua prpria identidade. A aprendizagem artstica contribui para o
conhecimento pessoal, o que permite que () os alunos encontram seus prprios
sentimentos, assim como dos outros indivduos. Os alunos precisam de veculos
educacionais que lhes permitam essa explorao (Gardner, 1990, p.124).
Alis, Piaget (citado por Santos, 2008, p.30) refere que na vida da criana h
duas necessidades primordiais: a adaptao realidade material e social e o conjunto de
realidades individuais que se exprimem pelos jogos simblicos. Deste modo a Arte ser
um aproximar destas duas necessidades, como uma sntese entre expresso do eu e as
formas de atividade adequadas.
Criatividade
Tudo o que antes no existia, mas era realizvel de maneira essencial e global
Bruno Munari (2007, p.15)
16
O Homem ao longo da sua evoluo vai constantemente desenvolvendo novas
construes, criando constantemente coisas e conhecimentos inovadores, numa ao de
progresso que no existe em nenhuma outra espcie animal, ou como Cropley (1999)
nos diz, em nenhum produto tecnolgico, por mais avanado que seja. Isto deve-se
capacidade nica de pensar de modo aberto e imaginativo, em que ao invs de uma
sequncia de raciocnio associativo surge uma viso imediata e intuitiva
proporcionadora de, no apenas uma, mas vrias hipteses para um mesmo problema. A
esta capacidade podemos design-la, de acordo com Guilford (citado por Sousa, 2003),
como pensamento divergente, criativo ou original.
A Criatividade um conceito muito complexo na medida em que envolve
diversas dimenses como a situao criativa, o produto da criatividade, o processo e a
pessoa; e todas elas se podem interligar. Torna-se, por isso mesmo, difcil haver uma
definio precisa. Contudo, Torrance (1988) considera que, essencial uma definio
que possibilite encontrar modelos cientficos para este conceito. Assim, o autor opta por
definir a criatividade atravs dos processos psicolgicos implicados e descreve o
pensamento criativo como o processo de tomar conhecimento das dificuldades,
problemas, ausncias de informao, elementos desaparecidos, anomalias, de cometer
erros e formular hipteses acerca de deficincias, avaliar erros e hipteses,
possivelmente rev-las e comprov-las e, no final, comunicar os seus resultados.
Vernon (1989) considera que, apesar da existncia de diferentes aproximaes
conceptuais sobre o fenmeno da criatividade, possvel encontrar um consenso
relativamente seguinte definio: A criatividade a capacidade da pessoa para
produzir ideias, descobertas, reestruturaes, invenes, objectos artsticos novos e
originais, que so aceites pelos especialistas como elementos valiosos no domnio das
Cincias, da Tecnologia e da Arte. Tanto a originalidade como a utilidade como o
valor so propriedades do produto criativo, embora estas propriedades possam variar
com o passar do tempo.
Ainda segundo Cropley (1999), a criatividade pode ser vista como um fator da
sade mental humana - uma vez que caratersticas bsicas de uma pessoa criativa, como
flexibilidade, abertura, coragem, so pr-requisitos para uma personalidade saudvel; e
tambm da inteligncia pois depende de um conjunto de divergncias desenvolvidas
no processamento de informao disponveis pela inteligncia.
17
Teresa Amabile concorda que a criatividade est associada inteligncia, uma
vez que necessrio ter capacidades na rea que se pretende fazer algo criativo. De
acordo com esta autora a criatividade relaciona-se com o pensamento divergente,
caracterizado pela fluncia, flexibilidade, e originalidade de ideias e solues. No seu
modelo componencial de Criatividade (1983), Amabile referencia trs componentes
necessrios para o trabalho criativo que precisam estar em interao: (1) habilidades do
domnio, (2) processos criativos relevantes, (3) motivao intrnseca e extrnseca.
Segundo Sternberg (2011), as pessoas so criativas em virtude de uma
combinao especial de atributos de personalidade, inteligncia e estilo cognitivo. A
criatividade pode tomar mltiplas formas e expressar-se, tambm, de diferentes
maneiras e isto deve-se, pelo menos parcialmente, s combinaes entre tipos de
inteligncia, de personalidade e de estilo, que so praticamente infinitas. Robert
Sternberg na sua Teoria do Investimento em Criatividade 1988 contempla seis
fatores distintos e interrelacionados dos quais, quando convergem, resulta a criatividade.
So eles: (a) inteligncia, (b) estilos intelectuais, (c) conhecimento, (d) personalidade,
(e) motivao e (f) contexto ambiental.
Tanto Amabile como Sternberg referem que o ambiente exerce uma influncia
crucial sobre cada um dos componentes/fatores e afeta de sobremaneira a produo
criativa de trs modos distintos: o grau em que promove o gerar de novas ideias; a
extenso em que encoraja e d o suporte necessrio ao desenvolvimento das ideias
criativas; e a avaliao que feita do produto criativo.
Para Csikszentmihalyi o conceito de Criatividade construdo entre o criador e a
sua audincia. Por essa razo defende que o foco de estudo da criatividade deve ser nos
sistemas sociais e no apenas no individuo, e mais importante que definir criatividade
investigar onde ela se encontra. Nesta linha de pensamento, a criatividade resultante
dos sistemas sociais que julgam o produto criativo e no o produto individual. O modelo
de sistemas prope, pois, criatividade como um processo que resulta da interseco de
trs fatores: (1) indivduo bagagem gentica e experincias pessoais, (2) domnio
cultura, (3) e campo sistema social. O autor diz-nos ainda que uma resposta criativa
tem maior probabilidade de ocorrer quando o indivduo tem amplo acesso informao
relativa a um domnio e quando as informaes a ele pertinentes esto conectadas entre
si, so claras, relevantes e aprofundadas; e se despertam o interesse do indivduo e
18
impulsionam o seu engajamento na rea. No seu livro Fluir (2002), podemos constatar
que as pessoas que procuram desempenhar tarefas criativamente encontram mais prazer
no que fazem. O prazer, por sua vez, altamente motivador, propondo uma espiral
positiva com trs elementos: criatividade, prazer e motivao.
De acordo com Gardner (1999), todas as pessoas tm potencial para serem
criativas, mas apenas o sero se o pretenderem ser, se estiverem dispostas a refutar a
ortodoxia, a aceitar as observaes e a no se deixarem perturbar com ataques ou
insultos. O autor ao invs de ver a criatividade como uma propriedade geral, v os
indivduos como criativos ou no criativos em domnios especficos, que comummente
mapeiam a inteligncia. Tal como Csikszentmihalyi (1996), v a criatividade como
envolvendo no apenas mentes humanas, mas tambm em domnios em que os
indivduos trabalham, e campos que realizam julgamentos sobre a qualidade e novidade
do trabalho. Defendendo que no possvel generalizar a atividade criativa num
esquema bsico, traou cinco tipos diferentes de atividades criativas: (1) a soluo de
um problema bem definido; (2) a conceo de uma teoria abrangente; (3) a criao de
uma obra congelada; (4) a execuo de um trabalho ritualizado e (5) uma execuo de
alto risco. Entre estes tipos de atividade e os campos a que se aplicam h uma relao.
Na Educao, a criatividade tem vindo a assumir um papel de relevo nas
estratgias de ensino e aprendizagem, mas no respeitante s crianas, segundo Santos a
criatividade tem sido alvo de aceso debate na questo de saber se as produes infantis,
podem ou no ser considerados trabalhos criativos (2008, p.101).
Embora possam haver discordncias relativas a este ponto, de acordo com
diversos investigadores do desenvolvimento da criatividade - como Ribot, McMillan,
Andrews, Grippen, Markey, Griffiths, Ligon, entre outros desde o nascimento que esta
se manifesta. Pode no ser necessariamente a criatividade a que habitualmente
associamos novidade revolucionria de algo na sociedade, mas um tipo diferente de
criatividade, no menos vlida.
o caso da criatividade expressiva, um dos cinco diferentes tipos de criatividade
caracterizados por Taylor (citado por Sousa, 2003), em que a pessoa tem inteira
liberdade de expressar os seus sentimentos, de modo criativo. Interessa mais a catarse
19
emocional do ato que propriamente a criao obtida. O desenho livre, a improvisao
dramtica e outras atividades semelhantes situam-se neste mbito.
ento fundamental que a criatividade da criana precise ser trabalhada e
desenvolvida, como se fosse uma necessidade biolgica desta, assim como todas as
outras, para que passe do potencial para a ao. Sem dvida, h que o possibilitar,
atravs de meios e motivaes adequadas, a passagem deste poder criativo aco
criativa, ou seja, criao (Sousa, p.196, 2003).
Se a criana tiver oportunidade de experienciar possibilidades de realizao por
si mesma, num ambiente de confiana e sem juzos de valor, explorar situaes novas,
sonhar e imaginar acalentando sensaes e articulando ideias, tornar-se- o fruto desta
formao nos primeiros anos de vida e desenvolver uma personalidade criativa, ao
invs de algum apenas repetidor de cdigos da sociedade (Munari, 2007).
Personalidade criativa ser o conjunto de caractersticas pessoais associadas ao
processo mental de criao, provocado por um ambiente social e cultural de pertena de
um indivduo. Csikszentmihaly (1996) acrescenta ainda que, a curiosidade, a admirao
e o interesse so tambm caractersticas fundamentais que fazem parte do crescimento
de um futuro criador. No entanto, necessrio que os indivduos criadores lhe tenham
acesso e no apenas interesse, sob o risco de no se chegar a estados de inovao. um
aspeto decisivo, na maior parte dos casos, a possibilidade de proporcionar s futuras
geraes este tipo de acesso que, como se percebe, importantssimo.
A criatividade uma fora vital e poderosa que pode incutir significado vida.
O desenvolvimento dela permite-nos entra numa viagem de amadurecimento e
autoconhecimento. Superamos as normas culturais, dando lugar nossa individualidade.
O caminho vida criativa leva totalidade e a uma viso ampliada das nossas
possibilidades. Experimentamos novas definies de sucesso ao transformarmos o medo
de correr riscos em excitao, aprendendo com o que anteriormente chamvamos de
erros. Ficamos recetivos s nossas imaginaes, tornando-nos veculos para o fluxo
criativo de ideias, solues, invenes e abordagens vida. Desenvolvemos
relacionamentos saudveis, perspetivas inovadoras a questes antigas, estilos de gesto
nicos, nova literatura e obras de arte. Ter uma vida criativa significa viver em
constante renovao. O processo criativo orgnico, alternando todas as nossas
20
atividades e pensamentos. Aprender a viver criativamente algo que dura para sempre.
Quando nos dedicamos a uma vida criativa, comprometemo-nos a uma vida de
crescimento dirigida pelo nosso eu criativo. Recebemos, assim, a maior das
recompensas: tornamo-nos quem realmente somos, livres de expectativas (Ealy, 1996).
21
3 - O LUGAR DA ARTE NO JARDIM DE INFNCIA EM
PORTUGAL
Para alm do entendimento dos nveis ou natureza da interao entre as diversas
formas de expresso, O desenvolvimento criativo e cultural deve constituir uma funo
bsica da educao reconhecido unanimemente e que atravs da Cultura e da Arte se
pode conduzir ao pleno desenvolvimento do ser (Comisso Nacional da UNESCO,
2006, p. 3). Este princpio tambm se encontra contemplado nos art. 22. e 27. da
Declarao Universal dos Direitos do Homem, que se referem satisfao dos direitos
() sociais e culturais indispensveis sua dignidade e ao livre desenvolvimento da
personalidade (art. 22.) e participao livre na vida cultural da comunidade, de
fruir das artes (art. 27.). Na Conveno sobre os Direitos da Criana, os art. 29. e
31. designam como uma das funes da Educao promover o desenvolvimento da
personalidade da criana, dos seus dons e aptides mentais e fsicas na medida das suas
potencialidades (art. 29.), o que demonstra a consciencializao da pedagogia ser
voltada para as caractersticas especificas da cada criana e o ser baseada na sua
curiosidade de aprender pelas vivncias de culturais, artsticas e sociais da comunidade,
nas quais tem o direito de participar plenamente de forma intencionalmente
organizada e sustentada em actividades recreativas, artsticas e culturais, em condies
de igualdade (art. 31.).
Desta forma, numa anlise Declarao Universal dos Direitos do Homem e a
Conveno sobre os Direitos da Criana, podemos verificar que se valoriza o
enriquecimento cultural da criana como um direito, visando a sua satisfao e
realizao pessoais assim como a prpria incluso e participao ativas na comunidade
envolvente e da sociedade em geral. Acreditamos que os artigos mencionados reforam
este estudo, na medida em que reafirmam o papel da Educao Pr-Escolar num
conceito de promoo do desenvolvimento integrado e integral da criana assente num
processo de ensino e de aprendizagem socio-construtivista. Nesta linha de pensamento,
a Educao pela Arte, devido s experincias e vivncias que proporciona,
fundamental no desenvolvimento da personalidade da criana, da sua identidade cultural
e coletiva, das suas aptides criativas em variados domnios, na compreenso do mundo
22
que o rodeia no seu processo de socializao baseado em valores democrticos e de
compreenso e respeito pela diversidade cultural, entre outros aspetos.
Em Portugal, foi com a Lei de Bases do Sistema Educativo de 1986 (Lei n
46/86 de 30 de Setembro) que pela primeira vez se constituiu um quadro de referncia
que marcou de forma significativa a valorizao da Cultura e da Arte em Educao,
nomeadamente atravs da implementao de linhas orientadoras Contribuir para a
realizao do educando, atravs do pleno desenvolvimento da personalidade, da
formao de carcter e da cidadania, preparando-o para uma reflexo consciente sobre
os valores espirituais, estticos, morais e cvicos e proporcionando-lhe um equilibrado
desenvolvimento fsico (Artigo 3 b).
A LBSE tambm contempla esta formao nos quatro nveis de escolaridade do
sistema educativo. Especificamente, na educao pr-escolar desenvolver as
capacidades de expresso e de criao da criana, assim como a imaginao criativa, e
estimular a actividade ldica (alnea f do n 1 do 5 artigo).
neste sentido que a Educao pela Arte fulcral uma vez que a construo das
diversas competncias que tm vindo a ser salientadas, tanto na Declarao dos Direitos
do Homem e da Conveno dos Direitos da Criana como na Lei de Bases, so
desenvolvidas no carter expressivo das mais variadas manifestaes artsticas -
etnogrficas, clssicas, contemporneas ao estimular na criana sentimentos, emoes
e interpretaes diversas. Podemos mesmo depreender que se impedirmos a criana de
ter experincias de fruio e contemplao esttica, a observar e refletir individual e
coletiva sobre as observaes/experimentaes, a partilhar opinies, sentimentos e
percees; isso impedi-la de usufruir de um direito proclamado como essencial no seu
desenvolvimento harmonioso e equilibrado enquanto Ser Humano.
Com a publicao do Decreto-Lei n 344/90 de 2 de novembro, novamente o
papel da Educao Artstica reafirma-se como parte integrante e imprescindvel da
formao global e equilibrada da pessoa, independentemente do destino profissional que
venha a ter e vem afirmar a formao esttica e a educao da sensibilidade como de
elevada prioridade da reforma educativa em curso [na poca] e do vasto movimento de
restituio escola portuguesa de um rosto humano (Prembulo). Este Decreto-Lei
prev a Educao artstica processando-se genericamente em todos os nveis de ensino
23
como componente da formao geral dos alunos (artigo 3), e atravs de quatro
grandes vias (art. 4):
. Educao artstica genrica em todos os nveis do sistema escolar
. Educao artstica vocacional em escolas de formao profissional especfica de
artistas
. Educao artstica em modalidades especiais - no Ensino Especial
. Educao artstica extraescolar em grupos de teatro e dana, coros, tunas, entre
outros.
A necessidade das expresses artsticas na educao pr-escolar ficou finalmente
reconhecida pela entidade que regula o sistema de ensino. Ainda definiu e regulamentou
concretamente a implementao da Educao Artstica no sistema escolar, referindo-se
esta s reas da msica, dana, teatro, cinema e audiovisual, e artes plsticas, atravs
das quais se pretende promover competncias concretas no mbito da Educao
Artstica. Alm disto tambm considerado a criao de oportunidades educativas que
promovam na criana o conhecimento e desenvolvimento de competncias de
comunicao e expresso atravs das mltiplas linguagens artsticas, da sensibilizao
para os valores estticos, das capacidades criativas e reflexivas atravs de um processo
integrado, individual e coletivo, que facilite tambm um desenvolvimento sensorial,
motor e afetivo equilibrados (art. 2. do Decreto-Lei 344/90).
J antes, em 1979, o Ministrio da Educao Portugus tinha constitudo uma
comisso para elaborar um Plano Nacional de Educao Artstica, no qual estava
previsto a insero da Educao pela Arte no Sistema educativo portugus, com o
objetivo do desenvolvimento harmonioso da personalidade (alnea 1 do artigo 2)
atravs de um conjunto de atividades de expresso artstica pedagogicamente adequadas
(alnea 2 do artigo 2), embora nunca fosse oficializado.
Apesar de, como vimos, a Educao Pr-Escolar ser considerada na LBSE e de
outros documentos do ME, s nos ltimos quinze anos, viveu grandes mudanas, quer
relativamente formao de educadores quer no mbito da sua posio na organizao
do currculo.
24
Em 1997 criou-se uma rede nacional de jardins de infncia, passando esta
educao, Pr-Escolar, a ser tambm responsabilidade do Estado, de acordo com o
Decreto-Lei n 147/97 de 11 de Junho.
Visava-se, assim, garantir igualdade de acesso educao a todas as
crianas, enfatizando-se a necessidade de cada uma usufruir de um
desenvolvimento social e pessoal equilibrado. No mesmo ano, foi dada
orientao oficial acerca das caractersticas fsicas dos jardins de
infncia: qualidade esttica, recursos mltiplos e materiais naturais. A
educao pr-escolar foi oficialmente definida como o lugar de
desenvolvimento de atitudes e de aprendizagem da linguagem, de
expresso artstica e de um conhecimento geral do mundo. (Dionsio e
Pereira, p.2)
Ainda nesse ano, o grupo de trabalho ministerial para a Educao Pr-Escolar
apresentou as Orientaes Curriculares para a Educao Pr-Escolar. Um dos objetivos
deste documento foi unificar os conhecimentos sobre Educao Pr-Escolar e sobre o
que esta teria que proporcionar s crianas, servindo como base para todos os
profissionais desta rea: As Orientaes Curriculares constituem um conjunto de
princpios para apoiar o educador nas decises sobre a sua prtica, ou seja, para
conduzir o processo educativo a desenvolver com as crianas. (ME, 2002, p.13)
Estas Orientaes Curriculares assentam numa srie de princpios gerais,
interligados entre si, com base nos quais o educador intervm educativamente. A
interveno pressupe: a organizao do ambiente educativo como suporte do trabalho
curricular; as reas de contedo, que designam formas de pensar e organizar a
interveno do educador e as experincias proporcionadas s crianas; a continuidade
educativa, considerando o que as crianas j sabem; e a intencionalidade educativa
como coerncia e consistncia dada ao desenrolar de todo o processo educativo (ME,
2002). As reas de contedo subdividem-se em trs diferentes reas: Formao Pessoal
e Social; Expresso e Comunicao; Conhecimento do Mundo; e todas elas contemplam
a educao esttica.
Focando mais a Educao pela Arte na anlise das Orientaes Curriculares,
podemos confirmar que a Educao Pr-Escolar deve tambm desenvolver a expresso
e comunicao atravs de linguagens mltiplas como meios de relao, de informao,
de sensibilizao esttica e de compreenso do mundo (ME, 2002, p. 21). Esta rea de
contedo, de to abrangente, considerada primria, sendo que promove a
25
experimentao e a criao, a vontade de aprender e a curiosidade por novas
descobertas. Sendo assim, a criana poder aprender a conhecer-se e a relacionar-se
com os outros e o meio real e imaginrio envolvente, atravs do procedimento da
descoberta, para alm se apropria dos instrumentos essenciais sua formao e
desenvolvimento equilibrados, aprendizagem ao longo da vida e plena insero na
sociedade como ser autnomo, livre e solidrio, ao estabelecer novas relaes e ao
adquirir novos conhecimentos e competncias. A Expresso e Comunicao enquanto
rea desenvolve-se transversalmente pelos domnios das expresses motora,
dramtica, plstica e musical; o domnio da linguagem oral e escrita; e, por ltimo, o
domnio da matemtica, o que vem reiterar o princpio bsico da integrao curricular,
evidenciando por um lado, a especificidade prpria de cada uma, e por outro lado, a
relao de interdependncia, transversalidade e complementaridade que as une
(Oliveira, 2009, p.81).
A importncia atribuda por estas reformas educativas Educao Esttica e
Artstica vem acentuar a ideia de que estas desempenham um importante papel no
desenvolvimento e formao integral da criana, especialmente no desenvolvimento das
suas capacidades afetivas, ldicas, expressivas e cognitivas, contribuindo como
componentes importantes da formao pessoal e social do indivduo.
3.1 O Papel do Educador de Infncia
() ensinar uma arte. Apesar de haver muitas competncias inerentes ao acto de ensinar, tal como muitas competncias esto nos esforos dos artistas, as decises que
se devem tomar sobre quando e como combinar tais competncias, o saber como fazer
esta combinao, no um saber tcnico. No h dvida que pode ser aprendido, mas
tambm vem das crenas subjacentes e paixes do [educador] sobre as crianas e o
mundo (Walsh, cit por Serra, 2004, p. 73).
Durante todo o seu desenvolvimento expressivo a criana conhece e aperfeioa
saberes, tcnicas e sensaes, construindo assim, a sua potica pessoal. nesse percurso
que se faz indispensvel uma boa prtica pedaggica desenvolvida pelo educador.
Ao conhecer o nvel de desenvolvimento da criana e as competncias j por ela
adquiridas, o melhor que o educador pode dar para proporcionar a criao permitir-lhe
que o faa consoante os seus prprios conhecimentos e no prever que adquira
26
determinados conhecimentos para posteriormente estar apta a faz-lo. Gardner (citado
por Hargreaves, 2002) refere que nos primeiros anos de vida o desenvolvimento da
competncia artstica acontece com naturalidade. Nesta fase o educador deve centrar-se
em apoiar o processo em curso de forma natural, respondendo s iniciativas da criana e
intensificando a sua ao educativa, de forma gradual, no sentido de complexificar as
oportunidades de aprendizagem de habilidades tcnicas e reflexivas no domnio da Arte.
Deste modo, a experimentao assume um papel elementar no desenvolvimento
integral da criana e do seu processo criativo, em particular. O processo criativo mais
do que a representao de algo, o reflexo das experincias da criana em interao
com os objetos e o outro, sendo, por isso, um processo dinmico, inacabado e em
constante evoluo.
Contudo, isto s ser concretizvel se o educador for consciente das
potencialidades educativas da Arte e desenvolver as suas prprias competncias ao nvel
da intencionalidade e qualidade da ao pedaggica nesta rea. No basta limitar-se a
reproduzir planeamentos de atividades e projetos pedaggicos, como se fossem uma
frmula chave para diferentes contextos educativos, h que refletir sobre a prtica do
dia-a-dia e, se necessrio, reformular as suas concees e avaliar e diversificar as
formas de agir atravs da procura de novas estratgias mais adequadas.
Nesta busca, necessrio que tambm se conhea diversos meios artsticos e
formas de Arte assim como ter conhecimento do desenvolvimento do mundo plstico da
criana. Para alm disso, de acordo com Althouse, Johnson e Mitchell (2003), o
educador deve estar sempre atualizado sistematicamente acerca dos materiais, a sua
utilizao, funes e novas aplicaes e, inclusive, experienci-los de modo a ter noo
das suas potencialidades.
Outro ponto a ter em considerao para o sucesso das aprendizagens da criana
o discurso do educador. As mesmas autoras referem a importncia de o discurso uma
vez que este constitui uma estratgia fundamental para a melhoria do processo do
desenvolvimento. necessrio que este seja adequado criana, mas no destituda de
rigor conceptual, sendo que cabe ao educador ter domnio dos conceitos especficos da
Arte e integr-los de forma natural, adequada e contextualizada na sua pedagogia.
Vygotsky concorda com a enorme importncia que tem o discurso, defendendo que a
27
criana estimulada a desenvolver um pensamento mais complexo e elaborado com um
dilogo questionador e de apoio falado pelo educador.
A ao do educador, de acordo com a escala de empenhamento do adulto de
Laevers (citado por Oliveira-Formosinho, 2000) deve centrar-se em trs dimenses
fundamentais: a sensibilidade, a autonomia e a estimulao. Sensibilidade para com os
sentimentos de bem estar emocional e interesses pessoais da criana. Autonomia no
respeitante autonomia e liberdade que o adulto proporciona criana nas suas
experincias, escolhas, manifestaes de ideias e opinies. Estimulao no que concerne
ao grau de estimulao que a criana usufrui da parte do educador. Estas dimenses
vm certificar que a ao do educador vai para alm da motivao e envolvimento da
criana, desencadeando processos ricos de desenvolvimento dentro das competncias de
organizao e gesto do currculo. Nesta conceo, a criana dever ter oportunidades,
contempladas nas estratgias traadas pelo educador, que a levem a envolver-se na
criao e no desenvolvimento das atividades e projetos, seja individualmente ou em
grupo, com vista aquisio de competncias bsicas.
na funo pedaggica que o educador deve, como refere Santos (citado por
Sousa, 2003, p.83) ter uma pedagogia atenta s virtualidades da criana, vai
possibilitar-lhes, primordialmente, a espontaneidade das suas expresses, as quais
livremente desabrochando numa actividade ldica proporcionam tambm, quando essa
actividade apresenta j uma feio artstica, uma abertura para a criatividade. Nesta
linha de pensamento, o educador ir permitir criana, atravs do jogo, desenvolver um
processo crescente que a dota de novas competncias comunicativas, tcnicas e
relacionais com os materiais, consigo mesmo e com os outros. Neste processo, partindo
do pressuposto que a criana se desenvolve de forma integrada, h que valorizar e a
articular todos os saberes e aspetos inerentes ao desenvolvimento da Arte. Esse um
dos indicadores da intencionalidade educativa do educador, caso contrrio, as atividades
sero apenas momentos de expresso livre, em que a criana exterioriza as imagens e
conhecimentos que vai construindo atravs das suas vivncias, sem qualquer objetivo
intencionalmente definido. O conjunto de experincias com sentido e ligao entre si o
que far o desenrolar do processo educativo ser coerente e consistente.
A intencionalidade do educador o suporte desse processo, sendo necessrio
que haja reflexo sobre a ao pretendida e como esta se adequa s necessidades da
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criana e, ainda, sobre os valores e intenes que lhe esto implcitas (ME, 2002). Esta
reflexo acontece antes, durante e depois da ao, ou seja supe planeamento, adaptao
e avaliao: Este processo refletido define a intencionalidade educativa que caracteriza
a atividade profissional do educador (ME, 2002, p.94). Quando esta intencionalidade
existe e tambm o exemplo em qualquer atividade educativa, contribumos para a
formao de valores e carcter dos mais jovens (Seligman, 2004; Simancas, 1993), para
alm do sucesso de futuras aprendizagens da criana.
Considerando-se a importncia da Arte no desenvolvimento da personalidade e
dos aspetos emocionais-sentimentais, de compreender que a relao educativa entre
educador e criana seja estabelecida numa estreita forma mtua de relao afetiva. Se
assim no for, no poder haver uma ao verdadeiramente educativa:
A ao educativa deve basear-se na relao afetiva, espontnea A educao , na fase da vida da criana que corresponde aquisio da linguagem falada,
fortemente impregnada pelo afeto do educador; toda a educao que anule o
afeto, e portanto elimine certa liberdade de experincia emocional, no mais
que um adestramento (Joo dos Santos, citado por Sousa, 2003 p.147)
Estabelecendo esta relao existir um clima e comportamento situacional de
simpatia, de considerao, de estima, de delicadeza, de amizade, mtuos e duradouros,
por sinal o clima mais adequado para as vivncias educacionais (Sousa, 2003).
Para que esta relao e o clima de bem-estar se estabeleam necessrio que o
educador seja compreensivo, atento e acredite nas capacidades da criana, sem
autoritarismos, exigncias, imposies e diretividades, com a finalidade de esta se sentir
segura para ser tal como ela , com as suas contradies, com o seu desejo de brincar,
de se movimentar, de se expressar, de descobrir e de explorar. No fundo, como Garret
(1829) nos diz dirigido mas no levado, guiado mas no forado, . Read (citado
por Leite e Malpique, 1986) e Venegas (2002) vm corroborar esta perceo afirmando
que deve estar presente um clima de abertura, de apoio e de criao de oportunidades de
aprendizagem na ao pedaggica do educador, e que devem inclusive ter em conta os
interesses e os ritmos de cada criana.
No confundamos, no entanto, este papel de no diretividade com uma total falta
de interveno e alienao perante as responsabilidades com a criana. O educador est
sempre presente, mas como nos elucida Sousa, nos bastidores, pois presta toda a ajuda
indispensvel ao desempenho da criana sem se tornar na figura principal.
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Vale a pena transcrever as palavras de Arquimedes Santos (1977 perspetivas
psicopedaggicas, citado por Sousa, 2003):
Isto no exclui, porm, a autoridade do educador, antes a tem por uma
das suas qualidades, e a prpria criana, querendo ser aceite tal e qual , nas
suas perturbaes de comportamento ou dificuldades escolares, sentir-se-
desorientada sem o apoio do educador, o qual, banindo completamente quer as
sanes quer as punies, poderia suscitar no aluno o sentimento de abandono.
Uma orientao no diretiva deve, contudo, permitir que a criana
encontre mais tarde a sua autonomia. Poder-se-, pois, dizer que, no educador,
uma atitude no diretiva , antes do mais, uma ao sobre si mesma que, por seu
turno, propicia criana ser ela prpria.
Concluindo assim: uma verdadeira educao deve levar a criana a
poder passar sem os seus educadores e assumir a sua liberdade.
Surge neste clima educacional uma atmosfera de comunicao emptica em que a
autossuficincia da criana pode ser estimulada e desenvolvida de modo muito
significativo, ao se apropriar de uma autoconfiana e uma formao de valores (Sousa,
2003).
O educador, na Educao pela Arte, deve apoiar-se nesta atitude no diretiva para
conseguir estabelecer o clima de liberdade e de abertura que esta sugere na motivao
da auto-descoberta da criana. Arquimedes Santos (2008) alude a trs simples princpios
de no diretividade no contexto artstico: nunca impor a uma criana uma atividade
artstica; dar somente conselhos tcnicos, simples e precisos; abster-se de qualquer
apropriao ou crtica artstica. Eurico Gonalves (1976) menciona ainda a importncia
de o educador deixar que a criana faa as suas opes que, em regra, correspondem a
um determinado tipo de sensibilidade e de comportamento pessoal.
De acordo com Joyce, Kluwin e Weil (em Sousa, 2003), o educador desempenha
um papel de alter-ego benevolente que aceita todos os pensamentos e sentimentos da
criana, comunicando, assim, indiretamente que todos eles so essenciais para o seu
desenvolvimento emocional e para se encontrarem solues positivas. No fundo, a ao
do educador deve permitir a liberdade da criana se expressar de acordo com a sua fase
de desenvolvimento, as suas competncias, a sua personalidade, experincias e
conhecimentos prvios. Lowenfeld e Brittain (1970) partilham este pensamento e
defendem que o educador deve ter o cuidado de no se manifestar depreciativamente em
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relao s produes da criana para que no as desmotive na continuidade do seu
processo criativo.
Por vezes, o adulto, desde muito cedo, critica desenhos e outros trabalhos
artsticos da criana, sem se aperceber que a est a constranger e a mold-la a esquemas
padro da sociedade; tantas vezes acontece encorajar a criana a desenhar algo real,
dando-lhe modelos para que imite, sem de fato ter noo que a garatuja uma
importante iniciao de expresso grfica atravs da qual a criana comunica de si para
si e de si para os outros. Nas manipulaes de objetos em que a criana,
imaginativamente, d outra utilidade diferente da qual para o que foi criado, h por
vezes a no compreenso do adulto perante tal, culminando numa crtica (Ferreira,
2009).
Estas situaes dificultam muitas das qualidades expressivas espontneas da
criana, podendo perder-se ao invs de esta se tornar um criador cheio de recursos As
restries colocadas () levam muitas vezes a um corte radical na capacidade criadora
da criana, perdendo esta a auto-confiana que possua at ali, pois sente que os seus
trabalhos so alvo de crticas e que no podero mais expressar-se livremente (Ferreira,
2009, p.60).
com a atividade de expresso artstica que a criana vai organizar e concretizar
o seu pensamento, libertando-se na sua espontaneidade. Se for induzida a pintar
determinado objeto com uma cor especfica, apenas porque o adulto o v assim,
impedida de se expressar como idealizou, sendo o seu sentimento de satisfao
reprimido. H que compreender que para a criana raramente existe uma relao
entre a cor escolhida, para pintar um objecto, e o objecto representado. Um homem
pode ser vermelho, azul, verde ou amarelo (Lowenfeld-Brittain, p.147, 1970).
O papel do educador deve ser, deste modo, o de facilitador, motivador e
estimulador de oportunidades para que a criana explore por si mesma, descubra os seus
conhecimentos e estabelea as suas relaes A verdadeira educao cria condies
para a criana se construir a si prpria, atravs de atividades espontneas derivadas de
uma necessidade interior de agir, experimentando-se (Gonalves, p.11, 1976). Tudo
isto sempre numa relao pessoal que permite ao educador guiar os educandos no seu
crescimento e desenvolvimento.
31
Tambm o jogo dever ser potenciado pelo educador como ponto de partida para
a sensibilidade esttica e para o conhecimento da Arte. Igualmente o incentivo da
imaginao e da perceo so, segundo Bou (1989), fatores importantes no
desenvolvimento da criatividade artstica que no devem ser descuidados. Rodrigues
(2002) comunga desta ideia referindo que o jogo uma oportunidade da criana se
revelar atravs da sua linguagem grfica e cromtica e de desenvolver as suas
capacidades fsicas e intelectuais. uma ferramenta pedaggica de relevo que o
educador deve promover, criando situaes de jogo enriquecedoras e que facilitem a
aprendizagem colaborativa e sustentada na educao cvica.
Relativamente explorao dos materiais pela criana, Alarcn (2000) menciona
que esta deve ter experincias em que interaja com diferentes materiais, e medida que
o faz o educador deve progressivamente complexificar a sua explorao. Este autor
sugere que o educador prepare previamente as atividades ao nvel dos recursos materiais
e humanos, sendo que a escolha de material criteriosa deve facilitar e no inibir o
desenvolvimento da criana.
Desta forma, h que estimular o esprito ldico, construtivo e reflexivo atravs da
explorao de diferentes materiais em contextos diversos na instituio e na
comunidade. As formas de comunicao da criana so ampliadas com a materializao
das ideias e a transformao dos materiais, promovendo o seu autoconhecimento e do
meio envolvente. Sendo atravs do jogo que as crianas experienciam sensaes e
percees, materiais e cdigos especficos da Arte, por isso fundamental a sua
vivncia nas expresses, uma vez que no envolvimento das atividades permitido
criana tirar prazer, desenvolver a curiosidade e a vontade de aprender e de ampliar,
cada vez mais, os seus saberes e desenvolver novas competncias (Rodrigues, 2002).
Outro dos pontos em que a intencionalidade educativa do educador
preponderante na organizao do espao que deve valorizar tambm a Educao pela
Arte. O espao tambm comunica e fonte de aprendizagens, sendo importante ter um
carter dinmico que acompanhe e suporte os processos nele vividos (Forneiro, 1998).
A sua organizao pelo educador deve partir do princpio que o espao existe para ser
vivido pela criana devendo, deste modo, as caractersticas fsicas e relacionais
facultarem a que a criana sinta isso (Althouse, Johnson e Mitchell, 2003).
32
Em linhas gerais, importante o educador ser flexvel, possuir a capacidade de
motivar e entusiasmar a criana para que tenha sucesso na sua prtica pedaggica. Isso
acontece quando a vivncia de desafios e a oportunidade de expressar as suas ideias,
alegrias, frustraes, sucessos e insucessos concedida criana por meio de atividades
com estratgias adaptadas a cada uma, aos seus interesses e necessidades, sempre com o
intuito de a incentivar na sua descoberta prpria de expresso (Lowenfeld e Brittain,
1970).
No fundo, concordamos com Stern (n.d.b, p. 101) quando nos diz que
evidente que a ao do educador deixa uma marca profunda no psiquismo e o que
edificado na infncia a base de uma constituio equilibrada.
3.2 Compreender a Arte Infantil
indiscutvel que a escola o local privilegiado para a educao pela arte. Isto
foi impulsionado, sobretudo em relao infncia, nos anos 60 pelo grande defensor da
expresso espontnea da criana Herbert Read, como j vimos.
Read fala-nos da expresso livre como experimentao sensorial e libertao de
tenses interiores. Hoje vista da perspetiva de que h uma arte infantil, no sentido em
que as crianas usam uma linguagem simblica, figurativa e narrativa prpria para se
expressarem criativamente como Gardner (1994) demonstrou ao detetar esta
intencionalidade na comunicao dos produtos da atividade artstica.
Se criana dotada de faculdades de expresso totais, empregando-as para
traduzir a sua viso da melhor maneira, numa linguagem prpria, ento torna-se
necessrio compreender e respeitar a arte infantil a fim de que a respeite e proteja de
influncias nefastas (Stern, n.d.a, p. 19).
Segundo Gonalves (1976) a partir desta compreenso que vem o
conhecimento do mundo da criana, pois esta projeta-se naquilo que faz com
sinceridade e autenticidade. Mais ainda, sabendo que as criaes infantis tm este
carter especfico, que se afasta muito do mundo adulto, as atividades artsticas no
devem partir das concees estticas do educador.
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Sabendo que as criaes infantis se afastam das dos adultos, devemos permitir
essa diferena em vez de estabelecer comparaes entre os dois lados. essencial
focarmo-nos no que o diferencia, s assim faremos pouco a pouco descobertas que
ajudam a compreend-la (Stern, n.d.a, p. 27). Tambm no devemos compar-las com
as das outras crianas, pois o processo criativo no o mesmo para todas as crianas
(Stern, n.d.b, p. 22).
Ainda a ter em conta como esta linguagem prpria surge, no acontecendo por
criao espontnea. De acordo com Stern (n.d.b, p.22) a arte infantil formada de dois
elementos: h o que vem da criana, do seu eu profundo, e o que vem do exterior, pela
observao e pela experincia. Como ser em formao, a criana sensvel a tudo o
que est sua volta desde a mais tenra idade. O desejo que tem de explorar e apropriar-
se do mundo que toca e observa manifesta-se naquilo que expressa, aliado s sensaes
tidas neste processo. Esta associao da sensao e do signo um fator importante que
preciso conhecer para se compreender a arte infantil (Stern, n.d.a, p.29).
Tambm a liberdade de iniciativa que deve ser proporcionada, para que a criana
continue a expressar-se com emoo, sensibilidade e imaginao criativa fiel a ela
mesma.
Ao compreender a arte infantil, percebemos tambm que condies devem ser
criadas de forma a esta poder ser desenvolvida pela criana naturalmente, para que no
acontea o desapreo ou a incompreenso da atividade infantil (Gonalves, 1976).
Agora que o educador conhece bem o campo da sua atividade e os problemas
relativos tcnica de educao artstica ele deve poder situar a criao infantil e mesmo
justific-la junto de artistas que julgaro o trabalho das suas crianas. Deve saber e fazer
admitir que a arte infantil no um comeo nem uma forma incompleta de arte adulta,
mas uma arte particular e com os seus prprios valores (Stern, n.d.b, p. 100).
3.3. A Expresso Livre
A expresso inconsciente, expressa-se como necessidade. Tem significado s
para o prprio, traduzindo a realizao de expresses de sentimentos, livremente, de
forma pessoal e sem outro interesse que no seja s a satisfao da necessidade de
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expressar-se. Para Read (citado por Reis, 2003, p. 116) a expresso livre ou espontnea
a exteriorizao sem constrangimento das atividades mentais do pensamento,
sentimento, sensao e intuio. Esta exteriorizao intrnseca em todos ns, repletos
de instintos, de influxos, de impulsos, de tenses, de desejos, de emoes, de
sentimentos (Sousa, 2003).
Piaget (citado por Sousa, 2003) define que expresso ser a exteriorizao da
personalidade. Efectua-se atravs do jogo simblico, realizando desejos, a
compensao, a livre satisfao das necessidades subjectivas. Numa palavra, a
expresso to completa quanto possvel do Eu, distinto da realidade material e social
(p. 184).
Tambm a criana, desde que nasce, tem necessidade de se exprimir, a par da
sua evoluo global, aquilo que no consegue formular verbalmente. F-lo atravs do
seu corpo, com sons e movimentos para comunicar algo: chora ou grita quando tem
fome, dor, sorri quendo reconhece o rosto da me. Tambm expressa os seus
sentimentos de alegria, tristeza, serenidade; desejos; ideias; curiosidades; experincias;
no fundo um conjunto de situaes emotivas que revelam o seu mundo interior.
De acordo com Stern (n.d.a) possibilitar o espao para a expresso permitir
criana qualquer coisa de seu, expressando individualmente os seus sentimentos.
Surgir assim o que a criana no consegue transmitir atravs da linguagem verbal.
Faz-lo atravs da Arte o mais adequado, sendo que a arte, (), a segunda
linguagem que, sendo a linguagem do inconsciente, vem completar a da razo. Nasce
com ela a expresso total. (). Esta segunda linguagem um meio de libertao que
permite criana escrever o jornal ntimo do seu psiquismo (p.60).
Esta expresso acontece em smbolos cuja configurao, colorao, tamanho e
situao espacial obedecem a formulao de capital importncia, porque a nica
possvel e a sua ausncia provoca na criana um desequilbrio, para no dizer
perturbaes graves (Stern, n.d.a, p.14). Carrega consigo uma funo especfica de
expressar aquilo que no pode ser dito por palavras.
medida que exprime o que sente, pensa e imagina, tambm comunica com os
outros, e f-lo com autenticidade, pois ao faz-lo no conhece o sucesso ou insucesso,
apenas o faz pelo prazer ou pela necessidade que sente. O que importa, o que vale, o
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momento que dura