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7 A BUSCA DE UM NOVO MODELO ECONÔMICO: PADRÕES ALTERNATIVOS DE ARTICULAÇÃO PÚBLICO-PRIVADO 1 DOSSIÊ ESTADO E POLÍTICA ECONÔMICA NA AMÉRICA LATINA RESUMO Rev. Sociol. Polít. , Curitiba, 14, p. 7-28, jun. 2000 Eli Diniz Universidade Federal do Rio de Janeiro Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro O presente artigo tem por objetivo analisar, a partir de uma perspectiva histórica, os padrões de articulação entre os setores público e privado no Brasil, ao longo das várias fases da industrialização por substituição de importações, confrontando-os com o momento atual, marcado pela desestruturação dos antigos canais de articulação Estado-sociedade, sem a criação de formatos institucionais alternativos para a negociação entre elites estatais e interesses organizados. Além da perspectiva diacrônica, o artigo lança mão da abordagem comparativa, contrastando o caso brasileiro com as experiências de outros países, em momentos decisivos de sua trajetória, marcados pela reestruturação econômica e redefinição de estratégias de desenvolvimento. PALAVRAS-CHAVE: Empresariado e Estado; padrões de articulação Estado-sociedade; processo decisório e democracia; transição e reestruturação produtiva; estratégias de desenvolvimento. I. INTRODUÇÃO A crise internacional dos anos 80 representou um ponto de inflexão na história das sociedades latino-americanas. No caso do Brasil, onde o processo de modernização capitalista, sob os auspícios do modelo nacional-estatista, mais havia avançado, os efeitos da reestruturação da ordem mundial foram particularmente expressivos. Assim, observou-se o questionamento simultâneo da modalidade de inserção do país no sistema internacional, da trajetória da industrialização por substituição de importações, bem como da forma de Estado que desencadeou e conduziu essa via de desenvolvimento. No decorrer desse processo, a agenda neoliberal tornou-se progressivamente hegemôni- ca, observando-se paralelamente a ascensão das ideologias pró-mercado. No plano teórico, a ênfase nos argumentos neoclássicos e neo-utilitaristas, ao recuperar a crença na eficácia do livre jogo das forças do mercado e na centralidade do auto-inte- resse individual para a dinâmica econômica, refor- çou a rejeição do modelo de Estado desenvolvi- mentista, responsável pelo êxito da trajetória anterior. Este tipo de Estado seria crescentemente percebido como símbolo do atraso, expressando uma era que se esgotara. Radicalizou-se a discussão sobre moder- nização e atraso, apontando-se o retorno à pers- pectiva liberal como um imperativo dos novos tempos. Como é sabido, este é um debate forte- mente influenciado pelas conjunturas internacio- nais, em suas flutuações ao longo do tempo. Os sinais emitidos por tais movimentos cíclicos ampli- ficam-se no espaço internacional, repercutindo nos vários países e definindo novos parâmetros para as noções de modernidade e não modernidade. Assim foi nos anos 30, quando se deu a transição da sociedade agro-exportadora para a ordem urbano-industrial. Naquele momento, foi o Estado forte e altamente intervencionista que se impôs como expressão da modernidade. Nos anos 1 A presente versão foi elaborada como parte de uma consultoria para o Instituto de Estudos para o Desenvol- vimento Industrial (IEDI); agradeço a Júlio Sérgio Gomes de Almeida e aos demais membros da diretoria dessa organização a autorização para efeito de publicação dos dados e demais informações levantados.

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REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA Nº 14: 7-28 JUN. 2000

A BUSCA DE UM NOVO MODELO ECONÔMICO:PADRÕES ALTERNATIVOS DE

ARTICULAÇÃO PÚBLICO-PRIVADO1

DOSSIÊ ESTADO E POLÍTICA ECONÔMICA NA AMÉRICA LATINA

RESUMO

Rev. Sociol. Polít., Curitiba, 14, p. 7-28, jun. 2000

Eli DinizUniversidade Federal do Rio de Janeiro

Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro

O presente artigo tem por objetivo analisar, a partir de uma perspectiva histórica, os padrões de articulaçãoentre os setores público e privado no Brasil, ao longo das várias fases da industrialização por substituiçãode importações, confrontando-os com o momento atual, marcado pela desestruturação dos antigos canaisde articulação Estado-sociedade, sem a criação de formatos institucionais alternativos para a negociaçãoentre elites estatais e interesses organizados. Além da perspectiva diacrônica, o artigo lança mão daabordagem comparativa, contrastando o caso brasileiro com as experiências de outros países, em momentosdecisivos de sua trajetória, marcados pela reestruturação econômica e redefinição de estratégias dedesenvolvimento.

PALAVRAS-CHAVE: Empresariado e Estado; padrões de articulação Estado-sociedade; processo decisórioe democracia; transição e reestruturação produtiva; estratégias de desenvolvimento.

I. INTRODUÇÃO

A crise internacional dos anos 80 representouum ponto de inflexão na história das sociedadeslatino-americanas. No caso do Brasil, onde oprocesso de modernização capitalista, sob osauspícios do modelo nacional-estatista, mais haviaavançado, os efeitos da reestruturação da ordemmundial foram particularmente expressivos.Assim, observou-se o questionamento simultâneoda modalidade de inserção do país no sistemainternacional, da trajetória da industrialização porsubstituição de importações, bem como da formade Estado que desencadeou e conduziu essa viade desenvolvimento.

No decorrer desse processo, a agendaneoliberal tornou-se progressivamente hegemôni-ca, observando-se paralelamente a ascensão das

ideologias pró-mercado. No plano teórico, a ênfasenos argumentos neoclássicos e neo-utilitaristas,ao recuperar a crença na eficácia do livre jogo dasforças do mercado e na centralidade do auto-inte-resse individual para a dinâmica econômica, refor-çou a rejeição do modelo de Estado desenvolvi-mentista, responsável pelo êxito da trajetóriaanterior. Este tipo de Estado seria crescentementepercebido como símbolo do atraso, expressandouma era que se esgotara.

Radicalizou-se a discussão sobre moder-nização e atraso, apontando-se o retorno à pers-pectiva liberal como um imperativo dos novostempos. Como é sabido, este é um debate forte-mente influenciado pelas conjunturas internacio-nais, em suas flutuações ao longo do tempo. Ossinais emitidos por tais movimentos cíclicos ampli-ficam-se no espaço internacional, repercutindo nosvários países e definindo novos parâmetros paraas noções de modernidade e não modernidade.

Assim foi nos anos 30, quando se deu atransição da sociedade agro-exportadora para aordem urbano-industrial. Naquele momento, foi oEstado forte e altamente intervencionista que seimpôs como expressão da modernidade. Nos anos

1 A presente versão foi elaborada como parte de umaconsultoria para o Instituto de Estudos para o Desenvol-vimento Industrial (IEDI); agradeço a Júlio Sérgio Gomesde Almeida e aos demais membros da diretoria dessaorganização a autorização para efeito de publicação dos dadose demais informações levantados.

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50 e 60, o modelo estatocêntrico ganhou fortescontornos nacionalistas. Em contraste, na décadade 80, eis que uma nova versão do binômio moder-nidade-atraso assume o primeiro plano. Estatismo,nacionalismo e intervencionismo, manifestaçõesde uma fase ultrapassada, seriam estigmatizadose o pólo moderno passaria a ser representado pelatrilogia mercado, livre iniciativa e internacio-nalismo.

Na afirmação e propagação da nova orienta-ção, papel marcante foi desempenhado pelos diri-gentes e a alta tecnocracia dos organismos multi-laterais, notadamente o FMI e o Banco Mundial,que, no decorrer dos anos 80, enfatizariam insis-tentemente a supremacia do mercado, em contra-posição à ineficiência do Estado. Consagrada pelochamado Consenso de Washington, a visão pró-mercado traduziu-se num receituário homogêneo,envolvendo, entre suas prioridades, a desregula-mentação, a abertura, a liberalização comercial efinanceira e, já nos anos 90, a reforma do Estado.Em síntese, a globalização implicaria, no planoexterno, a internacionalização das economias e airrelevância dos Estados nacionais e, no âmbitointerno, a atualidade do Estado mínimo.

O que me parece importante ressaltar éque as abordagens dominantes viriam a adquiriras características de um jogo de soma zero. Àdicotomia Estado x mercado – que contrapõe umavisão maximalista, presa ao paradigma estatista, auma concepção minimalista, identificada com aidealização do mercado – corresponderiam as pola-ridades Estado x sociedade, burocracia governa-mental x grupos de interesse, cada um dos pólospercebidos como forças opostas. Segundo estaótica, da dinâmica social e do jogo dos interessesparticulares emergiriam forças desagregadoras,ameaçando a integridade do Estado e a coerênciadas políticas governamentais. Nesse sentido, ofortalecimento de um dos termos implicaria neces-sariamente o enfraquecimento do outro. Gruposorganizados fortes, enquanto fonte de demandascorporativas, seriam particularmente deletérios,representando ameaça potencial de captura doEstado.

De forma similar, passou a prevalecer umavisão reducionista acerca da relação entreburocracia e política. À tradição teórica de verEstado-sociedade como entidades polares, asso-ciou-se a tendência a encarar burocratas e políti-cos como atores antagônicos. Assim, ganhou re-

alce a dicotomia racionalidade governativa x im-perativos democráticos, caracterizada pela ten-sãoentre as lógicas contraditórias de reforço dadiscricionariedade estatal, por um lado e de apro-fundamento do jogo democrático, por outro. Emconseqüência, a meta de neutralizar a política seriacrescentemente percebida como um requisito paraa preservação da racionalidade burocrática, o queresultou na tendência a concentrar poder decisórionas elites técnicas, confinadas nos altos escalõesburocráticos (DINIZ, 1996b).

Nos anos 90, verificou-se uma nova inflexãono debate internacional. A melhoria da capacidadede governo passou a ser enfatizada como condiçãodo êxito das políticas de estabilização e reformasestruturais. Já em fins da década de 80, os diri-gentes e tecnocratas dos países emergentes foramsurpreendidos por um documento do Banco Mun-dial, no qual afirmava-se peremptoriamente acentralidade da chamada governance para explicardiferenciais de desempenho econômico entreaqueles países (apud HAGGARD & KAUFMAN,1992, p. 331). Pouco depois, em 1991, como res-salta Evans, o então vice-presidente e diretor-administrativo daquela instituição ressaltou oexemplo dos países recentemente industrializadosda Ásia Oriental, em que uma ação governamen-tal mais incisiva teria representado fator funda-mental para o crescimento industrial acelerado daregião (EVANS, 1998, p. 52). A seguir, numa pu-blicação de 1994, a mesma agência destacariaa importância da responsabilidade política das eli-tes estatais para o bom desempenho de seus go-vernos, o que implicaria a obrigação de seus diri-gentes de responder por suas ações, quer dianteda sociedade, quer diante de outras instâncias depoder (WORLD BANK, 1994, p. 12). Finalmente(é ainda Peter Evans quem nos diz) o World Deve-lopment Report de 1997 adota o ponto de vista deque “Estados capazes e ativos constituem elemen-tos-chave em qualquer esforço bem sucedido paraconstruir modernas economias de mercado”(EVANS, 1998, p. 52). Em outros termos, acapacidade de ação do governo, a presença de umEstado ativo e eficiente ganhariam realce comocondições favoráveis à modernização econômica.

Desta forma, no final da década de 90, estamosassistindo, na esfera internacional, à evolução paraum ambiente menos uniforme, favorecendo acontrovérsia e possibilitando o questionamento daperspectiva minimalista. Nesse sentido, o referidorelatório do Banco Mundial publicado em 1997

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não só situa o Estado como ator central das trans-formações do mundo contemporâneo, como res-salta a inviabilidade do fortalecimento de econo-mias de mercado sem a presença de um Estadocapaz e efetivo. No âmbito deste processo, per-dem atualidade o enfoque neoliberal da relaçãoEstado-mercado e a abordagem tecnocrática daação governamental (DINIZ, 1998b). Em conse-qüência, cabe avançar na redefinição do papel doEstado, de modo a torná-lo mais consentâneo comas exigências de administrar estratégias deretomada do desenvolvimento numa ordem mun-dial globalizada. Repensar tais questões implicaromper com as antigas polaridades e focalizar opapel do Estado em suas relações com o mercadoe a sociedade, a partir da ótica de um jogo desoma positiva. O objetivo do presente texto éanalisar as implicações deste debate para os rumosdo Brasil em face dos desafios da reestruturaçãoprodutiva em curso e da busca de um novo modeloeconômico.

I. A EXPERIÊNCIA INTERNACIONAL

I.1 O MODELO ASIÁTICO

Um balanço da literatura sobre o papel doEstado nos países de industrialização recente daÁsia oriental, os chamados NICs (Coréia do Sul,Taiwan, Hong Kong e Cingapura), chama a aten-ção para aspectos que contradizem a ortodoxialiberal dominante nos anos 80. O cerne do debateestá constituído pela avaliação do grau em que aintervenção direta do Estado teria contribuído parao extraordinário desempenho econômico dospaíses da área, entre os anos 70 e 80 (HAGGARD& MOON, 1990, p. 210). Destoando das inter-pretações neoclássicas, tais estudos mostram queos Estados nacionais não só não foram omissos,como assumiram, em parceria com os grupos in-dustriais emergentes, responsabilidades crescentesde direção e coordenação das estratégias dedesenvolvimento então desencadeadas.

Nessa linha, estudos mais recentes sobre odesempenho dos NICs e sobre a economia políticados programas de estabilização nos países emdesenvolvimento chamaram a atenção para ainfluência de arranjos institucionais específicos,como o regime político em vigor, o formato deorganização e a lógica de atuação dos grupos deinteresse, as formas de articulação Estado-socie-dade, o grau de institucionalização do sistemapartidário, ou ainda as características do aparatodecisório, notadamente na área da política econô-

mica (HAGGARD & MOON, 1990, p. 211). Umaimportante implicação dessas análises foi o avançodas formulações acerca dos determinantes políti-co-institucionais das opções de políticas públicas.

Sob esse aspecto, os trabalhos de Amsden(1985, 1989) e de Wade (1990) sobre a Coréia doSul e Taiwan são particularmente relevantes. Emambos os casos, destaca-se o papel decisivo doEstado no desencadeamento e sustentação deestratégias bem-sucedidas de desenvolvimentoeconômico. Através de intervenções seletivas, dacombinação de incentivos ao setor privado, asso-ciados à exigência de desempenho, foi possívellevar à prática projetos compartilhados de trans-formação da estrutura produtiva e de inserçãoinovadora no mercado internacional. Nesta modali-dade de industrialização tardia, o estreitamento dosvínculos entre os setores público e privado, aoinvés de propiciar formas predatórias de articulaçãoempresário-Estado, levando a resultados sub-óti-mos do ponto de vista da sociedade como umtodo, conduziu a um esforço cooperativo voltadopara o aprofundamento da industrialização e aimplementação de objetivos abrangentes e de longoalcance. À idéia de livre mercado, Wade contrapõea noção de “mercado governado”, destacando opapel ativo dos governos, orientando os processosde alocação de recursos, definindo padrões deinvestimento, incentivando setores-chave, influen-ciando, enfim, o comportamento dos agenteseconômicos.

Um passo importante para o aprimoramentoda abordagem institucional foi dado por Evans(1992), ao utilizar a noção de “autonomia inserida”,para explicar o sucesso dos Estados desenvol-vimentistas do Leste Asiático. Essa noção abarcaum complexo de fatores, combinando a inde-pendência do Estado em face de interesses decaráter particular com capacidade de inserção nasociedade, configurando um Estado ativo, comforte poder regulatório e alta capacidade de fazervaler suas decisões, garantindo, ao mesmo tempo,o necessário respaldo político para implementar aagenda pública. Sua análise aponta para a impor-tância de se levar em conta o exame da estruturainterna do Estado, aliado ao estudo do caráter daarticulação Estado-sociedade. Desse ponto devista, se é necessário implantar uma burocraciaautônoma e meritocrática para assegurar um cres-cimento acelerado, não menos relevante é a cons-trução de sólidas conexões com os atores privadosestratégicos, responsáveis pela sustentação política

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de projetos de transformação produtiva.

O argumento é ilustrado a partir do estudo doJapão, da Coréia e Taiwan (EVANS, 1992, p.152-166). Focalizando agências estratégicas, como oMITI (Ministério do Comércio Internacional e daIndústria), no Japão, o DPE (Departamento dePlanejamento Econômico), na Coréia, além doCPDE (Conselho de Planejamento e Desenvol-vimento Econômico) e do DDI (Departamento deDesenvolvimento Industrial, do Ministério deAssuntos Econômicos), em Taiwan, Evans deslocaa atenção para a associação entre diferentesarranjos institucionais e a eficácia de estratégiasdesenvolvimentistas. Tais órgãos são apresentadoscomo exemplos de insulamento burocrático,combinados com a intensa imersão na estruturasocial, através não só de vínculos institucionali-zados, como também de uma rede de conexõesinformais. Dessa forma, a capacidade governativaseria o resultado da conjugação de uma burocraciameritocrática, coerente e eficiente, com a operaçãode canais institucionalizados para a negociaçãocontínua de metas e políticas específicas. Nos trêscasos, os quadros burocráticos superiores eramrecrutados nas universidades de elite, entre os seusmais talentosos membros. O alto prestígio con-ferido ao status burocrático, os níveis compen-sadores de remuneração e os padrões de carreiracom base em níveis satisfatórios de desempenho,ao lado do respaldo social explicariam a eficiênciada máquina burocrática.

Finalmente, Cheng, Haggard & Kang (1996),em seu estudo sobre a relação entre desenhoinstitucional, política econômica e crescimento,na Coréia do Sul e em Taiwan, fornecem algunselementos adicionais para a compreensão doimpacto do arcabouço institucional na consecuçãodas metas governamentais. Reconhecendo arelevância da cooperação entre o Estado e o setorempresarial, nos dois casos considerados, ressal-tam, por outro lado, a necessidade de relativizar oimpacto de diferentes padrões de articulaçãopúblico-privado sobre os resultados de políticaspúblicas. Assim, no caso de Taiwan, o peso datradição política autoritária, as características dasassociações empresariais, tais como sua fraquezaorganizacional, sua fragilidade política e relativainoperância como locus de ação coletiva,favoreceram o predomínio de formas de relacio-namento de natureza tópica e personalizada. Emcontraste, no caso coreano, as organizações em-presariais, dotadas de maior força e independência,

revelaram-se mais eficientes, desempenhando umpapel mais expressivo na formulação e imple-mentação de políticas, com base numa tramainstitucional mais sólida. Entretanto, neste últimocaso, o estreitamento dos vínculos com os grandesconglomerados, os chaebol, cujo fortalecimentofoi estimulado pelo governo, levou a uma assimetriano que se refere à influência do setor empresarial,responsável por um desequilíbrio em benefício dosgrandes grupos econômicos, mostrando que osriscos de práticas predatórias ou de rent-seekingnão podem ser subestimados.

Uma avaliação do conjunto dessas experiênciasrevela que o êxito da política industrial e daestratégia exportadora resultou da convergênciaentre a iniciativa estatal e a participação ativa doempresariado, sob distintos arranjos institucionais.Não é possível, portanto, definir um único padrão,pois diferentes combinações podem gerar resul-tados semelhantes, de tal forma que resulta inócuoprocurar uma receita única para o sucesso. Ade-mais, as estruturas institucionais constituem umtodo, de tal forma que se torna inócuo transplantaruma parte, separando-a do conjunto do sistemano qual está integrada. Finalmente, um aspectocomum aos vários casos foi o esforço no sentidode construir capacidade estatal, através dereformas voltadas para a criação de burocraciasbaseadas no mérito e na competência, integradaspor um quadro de funcionários de alto nível técnicoe profissional, recrutados nas melhores instituiçõeseducacionais, capazes de desenvolver forteidentificação com as metas organizacionais.Entretanto, não se observou uma evolução nosentido da construção de burocracias isoladas, semcomunicação com os agentes produtivos. Osautores citados mostraram, por exemplo, que naCoréia os mecanismos consultivos desempenha-ram um papel importante na expansão das expor-tações, enquanto em Taiwan, à medida que severificaram mudanças na direção de uma estruturaindustrial mais moderna e complexa e de umsistema político mais aberto, o adensamento dosvínculos institucionais articulando o Estado aosetor empresarial tornou-se um aspecto centralda estratégia industrial do governo. Apontaramainda a existência de um estreito intercâmbiogoverno-empresariado no nível micro, tantosetorial, quanto da própria firma. Esse conjuntode mecanismos aumentariam os fluxos de infor-mação entre agentes econômicos e atores estatais,reforçando ademais as condições de implementação

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das políticas e de aquiescência em relação às deci-sões governamentais.

Dessa forma, os diferentes estudos aqui refe-ri-dos convergem para uma visão que admite apossi-bilidade de formas não predatórias de arti-culação Estado-empresário, destacando, ao con-trário, seus efeitos criativos. Revelam ainda que achave de uma estratégia bem sucedida de açãocooperativa é o insulamento da burocracia no sen-tido da auto-nomia de seus instrumentos de for-mulação e de coordenação, sem, contudo, produ-zir o isolamento ou acentuar a falta de comunica-ção e de transpa-rência das agências governamen-tais. Por outro lado, o fechamento do processodecisório, longe de representar uma garantia decoerência e eficácia das políticas, pode ter efeitosperversos a curto e longo prazos.

I.2 TRANSIÇÃO E REESTRUTURAÇÃO PRO-DUTIVA NA ITÁLIA

O caso italiano será analisado funda-mentalmente com base nos trabalhos de RichardLocke (1992, 1995). O autor desenvolveu uminteressante estudo sobre a reação da economia edas empresas italianas, em face do impacto dacrise dos anos 70, caracterizada por três fatosinter-relacionados: o colapso do sistema monetáriointernacional, os aumentos dos preços do petróleo,em 1973 e 1978 e a onda de greves e de protestosliderados pela militância sindical, em fins de 1969,episódio conhecido por Outono Quente. A gradualrecuperação econômica da década de 80 não obe-deceu a um padrão nacional uniforme, variandoem função da região e dos setores considerados,bem como dos mecanismos institucionais envol-vidos e, sobretudo, da forma de inserção das em-presas e sindicatos na estrutura sócio-políticalocal. Centrando a análise nos setores automo-bilístico e têxtil, o autor mostra distintas modalida-des de reestruturação produtiva e reerguimentoda atividade econômica, refletindo diferentesconcepções e estratégias alternativas de ação dosprincipais atores econômicos. Essas estratégias,por sua vez, são condicionadas pelo complexo defatores que caracterizam o contexto local, tais co-mo as formas de associativismo, de representaçãopolítica e de governança econômica predominantes.

Deslocando o foco dos sistemas nacionais edos traços macro-institucionais do sistema políticopara o plano da micropolítica, Locke utiliza umaabordagem mais adequada para explicar as varia-ções entre sub-unidades nacionais dentro do

território nacional. A partir da observação dos di-ferentes complexos subnacionais, identifica trêstipos de redes em função das modalidades de arti-culação entre os vários atores econômicos e so-ciais. Tais padrões foram construídos com baseno trabalho de campo relativo ao ajuste industrialocorrido na Itália na época considerada. Estrutu-rando de distintas maneiras as relações, os fluxosde informação e a distribuição dos recursos entreos atores locais, estas diferentes redes sócio-polí-ticas criam padrões alternativos de comportamentodos atores econômicos. Durante o processo dereestruturação industrial na Itália dos anos 80,empresas e sindicatos inseridos em redes policên-tricas lançaram mão da negociação para administraras mudanças, enquanto os atores situados emcontextos caracterizados por estruturas polarizadastendiam a assumir formas conflitivas de compor-tamento. A análise das estratégias de ação dasprincipais empresas do setor automotivo, a Fiat ea Alfa Romeo, permitiram ao autor mostrar essesdistintos padrões em funcionamento (LOCKE,1995, especialmente cap. 4).

A Fiat, localizada em Turim, num contextomarcado por uma tradição de relações industriaisde teor paternalista, autoritário e hierárquico, ocu-pou, desde sua implantação na área, posição centralna vida da cidade e exerceu o domínio da políticalocal. Os sindicatos, altamente politizados e orienta-dos ideologicamente, apresentavam uma organiza-ção débil, a despeito de uma prática de confronto,em face de uma atitude igualmente pouco propíciaao diálogo por parte dos empresários. A posturaambígua da empresa, a um tempo repressiva epaternalista, rejeitando, por exemplo, a cogestãono interior da fábrica e a implantação dos conse-lhos operários, realimentava o conflito. Além disso,os grupos de interesse, partidos políticos e asso-ciações civis não alcançaram um desenvolvimentoexpressivo, razão pela qual não surgiram organi-zações capazes de mediar o conflito entre em-presários e trabalhadores. Nos anos 80, reagindoà crise da década anterior, a Fiat empreende umesforço de reestruturação, com a introdução denovas tecnologias, a reorganização da rede de for-necedores e revendedores, o aumento da compe-titividade, utilizando uma tática coercitiva na rela-ção com os trabalhadores. Estes não participaramdas decisões relativas ao ajuste, conduzido comautonomia pela empresa. Em conseqüência, embo-ra a reestruturação tenha ocorrido, não se observa-ram condições propícias a compromissos duráveis

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e a práticas cooperativas, o que elevou o custo doajuste.

Em contraste, a Alfa Romeo, diante dosmesmos desafios ligados à necessidade dereestruturação para reagir à crise dos anos 70,adotou uma estratégia de negociação, obtendoresultados altamente favoráveis não só do pontode vista da produtividade e lucratividade daempresa, como também do que se refere àsrelações trabalhistas. Através de acordos entre ossindicatos locais e a direção da empresa, o ajustefoi conduzido de modo a atender aos objetivos deaumentar a produtividade da empresa, ao lado damelhoria da qualificação da mão-de-obra, atravésde programas de reciclagem e aprendizagem denovas habilidades. O resultado foi o aumento dorendimento do trabalho e a queda dos níveis degreve e absenteísmo. Em síntese, a reestruturaçãonegociada resultou em ganhos para ambos os lados.O recurso a uma tática de ganhos mútuos explica-se, em grande parte, pelas características docontexto sócio-político no qual a indústria estavainserida. Localizada em Milão, a Alfa Romeodefrontou-se com sindicatos fortes, atuantes erepresentativos, porém sem deter o monopólio darepresentação de interesses na esfera local,dividindo o espaço com sindicatos igualmente bemestruturados, em outros setores da atividadeprodutiva, como as indústrias têxtil e química, entreoutras. Além de uma estrutura diversificada degrupos de interesse, em Milão partidos políticosmais orgânicos e enraizados socialmente,organizações culturais e religiosas atuantes e umamultiplicidade de associações secundárias dariamà vida política local um dinamismo maior. Aexistência de uma economia policêntrica e de umaestrutura associativa plural e competitivacontribuiria para evitar a evolução para um cenáriode soma-zero, favorecendo, ao contrário, táticasde compromisso e de cooperação entre a empresae os sindicatos.

Portanto, a Fiat e a Alfa Romeo, por estareminseridas em diferentes economias locais, cada qualapresentando um dado padrão de associativismoe uma dada estrutura de relações sócio-políticas,seus respectivos gestores da empresa e líderessindicais defrontaram-se com diferentes combi-nações de incentivos e restrições que influenciaramsua capacidade de formular e implementar estra-tégias para lidar com os desafios e administrar amudança. Assim, problemas semelhantes foramtratados de maneiras distintas com resultados

também diversos (LOCKE, 1995, p. 178-179).

Finalmente, o estudo do caso italiano revelaoutro aspecto interessante. Entre fins dos anos70 e meados dos anos 80, a Confindustria (asso-ciação de cúpula empresarial) e sindicatos detrabalhadores realizaram duas experiências deconcertação, envolvendo acordos tripartites paraalcançar objetivos comuns, segundo o modelosueco. O primeiro visando à garantia do empregoe restauração do crescimento econômico, em trocade moderação das demandas salariais e o segundoobjetivando reformar o sistema de indexação sala-rial. De forma similar, observou-se um intento dereforma da legislação trabalhista italiana atravésdo Estatuto dos Direitos dos Trabalhadores paradisciplinar e introduzir maior centralização e maiormargem de previsibilidade nas relações industriaisitalianas. Todas estas iniciativas inspiradas no mo-delo neocorporativo europeu falharam quanto àconsecução dos objetivos que pretendiam. Ao invésde promover maior nível de centralização, padro-nização e aquiescência, tais reformas desencadea-ram inúmeros conflitos intra-organizacionais queresultaram no aumento da descentralização e dafragmentação características do sistema italiano(LOCKE, 1995, p. 31, 80-82). Tal exemplo ilustraas dificuldades de introduzir mudanças pelatransposição de modelos exógenos, alheios aolegado institucional do país.

I.3 A POLÍTICA DAS REFORMAS NA AMÉ-RICA LATINA E AS RELAÇÕES PÚBLICO-PRIVADO

Na América Latina, a partir de meados dosanos 70, a piora da crise, caracterizada, entreoutros fatores, pelo agravamento do endivida-mento externo e pelo aumento acelerado dosíndices de inflação, fez-se acompanhar de umadrástica mudança da agenda pública e dos prin-cipais parâmetros que nortearam o antigo modelocorrespondente à estratégia da industrializaçãosubstitutiva de importações. Do ponto de vistainstitucional, independente dos regimes políticosem vigor, os diferentes governos adotaram a viada redução do tamanho do Estado paralelamenteao fortalecimento dos seus instrumentos de poder,com a ampliação das faculdades legislativas doExecutivo e o reforço do estilo tecnocrático degestão.

Em nome da supremacia do mercado, expan-diram-se os poderes regulatório e intervencionistado Estado, segundo uma lógica concentradora e

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discricionária que consagraria a extrema autono-mização do Executivo. No Chile, do GeneralPinochet, através dos Decretos-Leis; na Argentinaatravés dos Decretos de Necessidade e Urgência;nos países andinos através dos Decretos deEmergência; no Brasil, num primeiro momento,mediante os Decretos-Leis, herança dos governosmilitares e, depois da Constituição de 1988, porintermédio das Medidas Provisórias (MPs) –enfim, em toda a América Latina, os programasde estabilização e de ajuste seguiram o modelo dogoverno burocrático, caracterizado pela tendênciaao desequilíbrio institucional no tocante à articu-lação entre os poderes e à baixa efetividade dosmecanismos de controle e de cobrança externos(CONAGHAN & MALLOY, 1994; DINIZ, 1995,1997, 1998a, 1998b; O’DONNEL, 1991). Aconcentração decisória no Executivo pela exacer-bação de suas funções legislativas esvaziou acapacidade governativa do Congresso, a despeitodo alargamento de suas prerrogativas, naquelespaíses em que a crise econômica coincidiu com odesencadeamento de um amplo processo de demo-cratização, após a queda dos regimes militares quevigoraram entre as décadas de 60 e 70.

A despeito, porém, desses traços comuns, épossível detectarmos algumas diferenças, entrepaíses ou ao longo de diferentes momentos nummesmo país, quanto à forma de articulação Estado-sociedade e, sobretudo, quanto à conexão entreos setores público e privado. Assim, por exemplo,alguns governos, como ocorreu no Chile e noMéxico, criaram condições favoráveis para ummaior envolvimento da classe empresarial nas fasesde negociação ou implementação de reformasorientadas para o mercado, como a privatização ea abertura comercial, a despeito das característicasautoritárias do regime político. Em ambos oscasos, sistemáticas de concertação e consultaentre atores estatais e lideranças empresariaiscontribuíram para melhores resultados daspolíticas econômicas, do que tentativas anterioresbaseadas em meios coercitivos de implementação(SILVA, 1993, 1997; SCHNEIDER, 1997). Emoutros países, como na Venezuela, ativaram-seformatos tradicionais de teor fragmentado epersonalista, ampliando-se as oportunidades derent-seeking e generalizando-se as práticasclientelistas. Em outros ainda, como no Brasil, nalinha do confinamento burocrático, preferiu-se aopção pela reforma induzida e controlada pelacúpula tecnocrática, procedimento de longa

tradição no país, em que os vínculos informais eo intercâmbio personalizado, protegidos doescrutínio público, tendem a tornar-se as formasmais prováveis de articulação.

I.3.1 O caso chileno

Considerando o caso chileno, Silva (1993,1997) apresenta uma das mais sugestivas análises.Dividindo o período estudado em três fases, o autorajuda a esclarecer as nuanças envolvidas naassociação entre graus e formas de articulaçãoEstado-empresário, por um lado e desempenhoeconômico, por outro, sob diferentes regimespolíticos. As duas primeiras fases desdobram-sesob o governo do General Pinochet, uma das maisseveras ditaduras latino-americanas das últimasdécadas, enquanto a terceira corresponde aoprimeiro governo democrático, posterior à quedado autoritarismo.

Na primeira fase, que o autor identifica comocorrespondente ao neoliberalismo radical (1975-1982), no contexto de um Estado com alto graude autonomia, a rede de conexões entre aburocracia e as elites empresariais assumiu a formade contatos personalizados, envolvendo grandesconglomerados e os segmentos da elite tecno-crática chamados de Chicago-boys. Progressi-vamente, as associações empresariais foram sendomarginalizadas, destituídas que foram de qualquermargem de influência sobre o processo decisório.A simbiose entre a alta tecnocracia e os conglo-merados, no interior de um restrito círculo depoder, conduziu a políticas unilaterais e rígidas,voltadas para o favorecimento dos interesses dessepequeno e seleto grupo de empresários, semconsiderar outros setores da economia. Preo-cupados em maximizar ganhos financeiros decurto prazo, os atores privilegiados, sem encontrarmaior resistência, empenharam-se numa compe-tição pela consolidação de suas posições. Oresultado foi o colapso financeiro de 1982-83. Naspalavras do autor: “Meu argumento mostra que,durante a formulação das políticas, relaçõesaltamente insuladas de tecnocratas radicais pró-mercado e um reduzido grupo de empresários quecompartilhavam seus pontos de vista contribuírampara definir políticas voltadas para ganhos finan-ceiros de curto-prazo, em detrimento de investi-mentos na produção, o que, como muitos outrosestudos mostraram, contribuiu para a gravidadeda crise que se seguiu” (SILVA, 1997, p. 162).

Na segunda fase, correspondente ao neolibe-

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ralismo pragmático (1983-1988), desenvolveram-se formatos de negociação mais integrados eformalizados, envolvendo associações de caráterabrangente, articulando interesses transsetoriais,ao lado de organizações setoriais, o que se traduziuem resultados mais favoráveis em termos daelevação dos níveis de investimento e da conse-cução de metas acordadas (SILVA, 1997, especial-mente p. 165-179). A nova equipe econômica nãoabandonou a ênfase nas políticas liberais e noprograma de estabilização, mas procurou, parale-lamente, amparar e estimular os produtores locais,nas áreas agrícola, industrial e de mineração. Defe-sa contra a competição internacional predatória,incentivos à exportação, taxas de juros favoráveisforam alguns dos instrumentos utilizados. A cúpulatecnocrática responsável pelas principais decisõeseconômicas foi recrutada entre os quadros de maisalto nível técnico da administração pública. Abaixodeste núcleo, empresários proeminentes assumiramMinistérios setoriais importantes, como os da Agri-cultura, Mineração, Indústria e Comércio e ObrasPúblicas. Os Ministros mantinham contato siste-mático com o empresariado, através de canais decomunicação com associações empresariais decúpula, dotadas de alto grau de representatividadee coesão. Um primeiro nível de consulta e negocia-ção envolvia a organização guarda-chuva integradapelas grandes associações empresariais, aConfederação da Produção e do Comércio (CPC),que participava de discussões sobre câmbio, taxade juros e política monetária em geral, com oMinistro da Fazenda e autoridades do BancoCentral. Num segundo nível, associações decúpula de setores específicos participavam deinstâncias decisórias vinculadas aos Ministériosligados às suas respectivas áreas de atividades(SILVA, 1997, p. 166-167). Esse tipo de intercâm-bio favoreceu a articulação de um acordo em tornoda recuperação econômica do país, após a débâclede 1982-83. Como ressalta o autor, através desteprocesso, a CPC desempenhou um papel ativo nanegociação de uma proposta alternativa aoneoliberalismo radical.

Finalmente, a última fase refere-se à demo-cracia chilena ao longo do período 1990-1994. Obloco de oposição de centro-esquerda, queascendeu ao poder em março de 1990, após avitória das forças democráticas sobre o regime dePinochet, à frente da Concertação de Partidos pelaDemocracia, revelou desde o início seu compro-misso com a preservação do modelo liberal. Ainda

assim, tornou-se necessário vencer a desconfian-ça dos investidores e da classe capitalista em ge-ral. Para tanto, a estratégia de manter o padrão denegociação com as associações empresariaisrevelou-se crucial.

O governo de Patrício Aylwin estabeleceu umasistemática de consulta com as associaçõesempresariais de cúpula, dotadas de alto teor deabrangência, para a discussão das questões maisrelevantes, incluindo os ajustes na orientaçãoneoliberal pragmática da fase anterior. A práticaenvolveu negociações em torno das mudanças napolítica tributária e na legislação trabalhistaatendendo ao objetivo do governo de compatibili-zar crescimento econômico com maior grau deeqüidade. Além desse nível mais geral, a discussãode problemas setoriais de teor mais específicodesencadeava nova modalidade de negociações,envolvendo as lideranças de organizações setoriais.A política de consenso via concertação implicouuma permanente disposição para o diálogo entre acúpula decisória das agências governamentaisestratégicas, como os Ministérios da Fazenda eda Economia, o Banco Central e autoridades liga-das à área trabalhista, por um lado, e as liderançasempresariais e sindicais, por outro.

Como ressalta Silva (1997, p. 176), do ladodos empresários, a existência de uma organizaçãoguarda-chuva, a CPC, facilitou a interação com aelite decisória em torno das medidas que afetavamo conjunto da classe empresarial. A entidadeoperava como um filtro, eliminando pontos deatrito e ajustando as perspectivas dos diferentessegmentos empresariais de forma a criar umaunidade em torno de aspectos básicos da agendade discussão. O consenso interno referente àspropostas governamentais possibilitava o êxito doprocesso de implementação. As organizaçõessetoriais tendiam a seguir as diretrizes acordadaspela cúpula, eliminando deserções parciais quepoderiam afetar o resultado final. Do lado da eliteestatal, a viabilidade do processo interativodecorreu da abertura para o diálogo, para a trocade informações e, sobretudo, de uma atitude deflexibilidade, indispensável para criar um clima deconfiança mútua. Tal postura contrasta fortementecom a rigidez dos tecnocratas neoliberais daprimeira fase, imbuídos de princípios dogmáticose, por isso mesmo, avessos à consulta e à nego-ciação. O resultado traduziu-se num desempenhoeconômico favorável às partes envolvidas, com amanutenção de altos níveis de investimento, de

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produção e exportação.

I.3.2 O caso mexicano

A análise do caso mexicano fornece novas evi-dências acerca das vantagens de um padrão deinteração cooperativo entre os setores público eprivado para evitar problemas de interferências eresistências empresariais de vários tipos, como oconhecido fenômeno do free-rider (OLSON,1965), ou ainda coalizões distributivas (OLSON,1982), vetos parciais, entre outros. Comparandoos programas de estabilização e reformas no Brasile no México, ao longo dos anos 80 e início dos90, Schneider salienta que as variações quanto aosritmos, alcance, profundidade e êxito na imple-mentação desses programas decorreram, em gran-de parte, do formato das relações entre governo eempresariado (SCHNEIDER, 1997, especialmentep. 191-207). A incorporação sistemática das asso-ciações empresariais no desenho da implementaçãodas políticas, no segundo caso, contribuiu parafacilitar a consecução das metas e reduzir os cus-tos das reformas.

Definindo concertação como um proces-so de reuniões sistemáticas entre os representantesdas associações empresariais e o governo, incluin-do ou não os sindicatos operários, para negociaraspectos relevantes da implementação das políti-cas, o autor destaca os ganhos em termos deintercâmbio de informações, transparência, flexibi-lidade, redução da incerteza e garantia de credibili-dade das propostas governamentais. Como estáamplamente registrado na literatura especializada,regimes autoritários, burocracias centralizadas eautônomas, processos decisórios fechados e ex-cludentes podem criar condições propícias parainiciar reformas ou políticas de natureza polêmica,mas não constituem condição suficiente para exe-cutá-las e menos ainda para consolidá-las ao longodo tempo (HAGGARD & KAUFMAN, 1992;DINIZ, 1997, especialmente cap. 2). Em contra-partida, a capacidade de articular coalizões, obterapoio dos grupos interessados, inclusive do setorprivado, criar consenso em torno de decisões go-vernamentais de curto e longo alcance, ampliaros horizontes das lideranças empresariais, ajustá-los aos objetivos coletivos são requisitos essenciaispara assegurar a continuidade das políticas.

No México, a concertação revelou-se um im-portante instrumento para alcançar esses objetivos,contribuindo para moderar expectativas e adequaras preferências dos atores empresariais às con-

dições reais. Dois fatores foram fundamentais. Noque se refere ao governo, a existência de umapostura favorável a práticas de negociação entreas elites estatais revelou-se crucial. Quanto aosempresários, uma importante condição foram osgraus de organização e integração alcançados pelaclasse empresarial, não só em termos setoriais,como em seu conjunto.

Um passo importante foi dado em 1975,quando as organizações setoriais reuniram-se paraformar uma associação de cúpula de caráter abran-gente, o Conselho de Coordenação Empresarial(CCE), cujo presidente progressivamente viria aadquirir a prerrogativa de falar em nome do setorprivado como um todo2. Essa heterogeneidadenão impediu que a organização manifestasse umgrau satisfatório de unidade, alcançando projeçãonacional como representante da classe empresarialem suas negociações com o governo (TIRADO,1996, p. 267-271).

Dessa forma, nos anos 80, o Conselho tornou-se o principal interlocutor do governo, sobretudono que diz respeito aos acordos relativos aos pro-gramas de estabilização. Assim, em 1987, apósvárias semanas de consulta com as lideranças em-presariais, o governo mexicano concluiu o Pactode Solidariedade Econômica, para viabilizar polí-ticas de renda e metas de redução drástica da infla-ção (SCHNEIDER, 1997, p. 202-203). Segundovários analistas, o pacto foi um dos fatores respon-sáveis pelo sucesso do programa, entre 1988 e1995 (CARDOSO, 1991; CÓRDOBA, 1991).

Além disso, os grandes empresários mexicanospossuíam organizações mais informais para agre-gar seus interesses, como o Conselho Mexicanode Homens de Negócios (CMHN), integrado por

2 Incorporando as oito associações empresariais nacionaismais importantes do país, quais sejam, a Confederação deCâmaras Nacionais de Comércio (Concanaco), a Confederaçãode Câmaras Industriais (Concamin), a Confederação Patronalda República Mexicana (Coparmex), o Conselho NacionalAgropecuário (CNA), a Associação Mexicana de Instituiçõesde Seguros (AMIS), a Associação Mexicana de Intermediáriosda Bolsa (AMIB), o Conselho Mexicano de Homens deNegócios (CMHN) e a Associação de Banqueiros do México(ABM), que no total estão integrados por mais de 900 000empresários, o CCE tem uma base de grande amplitude,integrada por empresários de todos os tamanhos, de todas asregiões e de todos os setores, incluindo desde os dirigentesdos conglomerados mais expressivos do país até um grandenúmero de pequenos e médios empresários.

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cerca de 30 dos proprietários dos maiores gruposempresariais do país, representando de 20 a 30%do PIB. Cabe ainda citar o Grupo dos Dez,reunindo os maiores industriais de Monterrey(SCHNEIDER, 1997, p. 201). Finalmente, em1990, foi criada a Coordenadoria Empresarial deComércio Exterior (COECE), cujos representantesintegrariam os fóruns para negociar os passosnecessários à concretização do Acordo NorteAmericano de Livre-Comércio (NAFTA). Dandoseqüência à tática de ação conjunta, COECE egoverno criaram comitês relativos a cerca de vintesetores, integrados por cinco ou mais membrosda burocracia governamental e de oito a dezrepresentantes dos empresários, que funcionariamcomo instâncias de negociação. Entre 1990 e 1992,foram realizadas inúmeras reuniões entre osnegociadores de ambos os lados para ajustarpontos de vista e estratégias de ação(SCHNEIDER, 1997, p. 205).

A liberalização comercial passou a figurar entreas políticas setoriais concertadas e, finalmente,em 1994, o governo reativou a Comissão Mistapara a Promoção das Exportações (COMPEX),que recriou um espaço para representantes dogoverno e dos empresários negociarem medidasde regulação e promoção das exportações (PUGA,1994). A concertação foi conduzida através dofuncionamento desses múltiplos fóruns, contri-buindo para a consolidação da liberalização comer-cial, um dos principais itens da agenda de refor-mas, pela garantia do apoio do setor privado. Alémde possibilitar o aumento do fluxo de informaçõesentre governo e empresários, o processo abriuespaço para que estes pudessem propor políticascomplementares e compensatórias, reduzindo oscustos das políticas. A colaboração traduziu-setambém num esforço por parte das associaçõesempresariais no sentido de ativar seus departa-mentos de pesquisa, de modo a coletar dados glo-bais e setoriais e fornecer ao governo as informa-ções necessárias a uma ação mais ajustada àsnecessidades da indústria local.

Em contraste, como ressalta Schneider,reforçando conclusões de vários estudos queanalisaram a formação e trajetória dos principaissegmentos empresariais e suas relações com oEstado no Brasil, entre 1930 e 1980 (DINIZ &BOSCHI, 1991; DINIZ, 1992), o caso brasileiroé ilustrativo de uma classe empresarial com baixacapacidade de ação coletiva, dada a falta deorganizações de alto teor de abrangência e de

representatividade, aliada à baixa disposiçãogovernamental para práticas de concertação(SCHNEIDER, 1997, p. 201-208).

II. BRASIL: AS RELAÇÕES PÚBLICO-PRIVADONUMA PERSPECTIVA HISTÓRICA

Quando se observa a trajetória do capitalismoindustrial brasileiro entre as décadas de 30 e 70,período em que se consolida o modelo da indus-trialização por substituição de importações, pode-se constatar um alto grau de continuidade institu-cional. Essa continuidade está representada pelatradição centralista do Estado, pelas formasdominantes de articulação Estado-sociedade, pelopadrão de incorporação de atores estratégicos aosistema político e pelo modelo de presidencialismoque se implantou. A persistência dessa matrizinstitucional, marcada pelo peso do corporativis-mo e dos mecanismos intervencionistas, explica-se, em grande parte, pelas características docontexto histórico em que se processaram atransição da sociedade agro-exportadora para aordem urbano-industrial, nos anos 30-40, e o surtomodernizante, entre fins dos anos 60 e 70, quandose dá o aprofundamento da industrializaçãosubstitutiva de importações. Efetivamente, foi soba égide dos regimes autoritários então em vigor,que se definiu e se consolidou o modelo institucio-nal que presidiu a construção do capitalismoindustrial no país. O interregno democrático de1945 a 1964 não implicou a ruptura com aspectosessenciais desse modelo, que só seria posto emxeque com a deflagração da crise internacionaldos anos 80, que provocaria uma drástica rede-finição das estratégias e da agenda pública dassociedades latino-americanas.

No primeiro desses momentos, correspondenteao governo Vargas, de 1930 a 1945, foram lançadasas bases da industrialização capitalista, atribuindo-se primazia ao papel do Estado como indutor doprocesso de desenvolvimento. Paralelamente aofortalecimento dos mecanismos de centralizaçãodo Estado e de sua capacidade de intervenção navida econômica e social, observou-se a concentra-ção do poder decisório no Executivo e o esvazia-mento da arena parlamentar-partidária. Outroaspecto fundamental da engenharia político-institucional que orientou a reforma do Estado doperíodo foi a montagem do modelo corporativode intermediação de interesses. A incorporação dosatores emergentes – empresários e trabalhadoresurbanos – ao sistema político se fez por meio de

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sua inserção nessa estrutura altamente hierar-quizada e subordinada ao Estado.

Definidas como entidades paraestatais, asorganizações empresariais e sindicais transfor-maram-se em peça fundamental do processo dearticulação entre o mundo dos interesses e a esferaestatal. Crucial do ponto de vista de seus efeitossobre o funcionamento do sistema político foi otiming das reformas. Dessa maneira, a montagemda estrutura corporativa precedeu a institucio-nalização das regras da competição política(SANTOS, 1988), acarretando uma disjunçãoentre as instâncias da organização e da represen-tação dos interesses, cabendo ao Estado papelcentral na administração do conflito distributivo.

Tais traços foram acentuados pelo fechamentocrescente do sistema político, culminando naimplantação de um modelo francamente autoritáriocom o golpe de 1937 e a instauração do EstadoNovo. No decorrer do tempo, a estrutura corpora-tiva transformou-se na via preponderante desocialização e de definição de identidade políticados atores estratégicos da ordem industrial emformação. Nenhum desses atores formou suaidentidade coletiva através da mediação dos parti-dos políticos como ocorreu no modelo europeu.

Considerando-se as classes empresarial eoperária, cabe ressaltar, porém, que os efeitosdesse processo foram desiguais. No primeiro caso,não houve a destruição das estruturas de represen-tação previamente existentes. Embora tendo quese adaptar ao novo formato imposto pelo governoVargas, os industriais puderam manter parte daestrutura montada anteriormente, preservando asassociações civis de caráter setorial criadas desdeos primórdios da industrialização. Estas passarama funcionar ao lado da estrutura corporativa oficialintegrada pelos sindicatos, federações e confede-rações. Instaurou-se, a partir de então, o sistemadual de representação que o empresariado indus-trial mantém ainda em hoje vigor (DINIZ &BOSCHI, 1979, 1989; LEOPOLDI, 1984). Emcontraste, os trabalhadores tiveram as organizaçõescriadas por intermédio de sua militância política,ao longo das duas primeiras décadas do séculoXX, rejeitadas pelo novo código legal.

Um ponto adicional deve ser destacado. Osistema corporativo de intermediação de interessesfoi articulado ao processo decisório em fase dereestruturação, abrindo novos espaços políticospara a classe empresarial em formação. Esta alcança

uma inserção direta no aparelho de Estado. Insti-tucionalizou-se a prática da negociação comparti-mentada entre os grupos econômicos e o Estado,transformando-se o Executivo em arena privilegia-da para o encaminhamento das demandas empre-sariais (DINIZ, 1992). Nesta instância, as negocia-ções entre os setores público e privado seriamprocessadas sem a interferência de forças exter-nas, protegidas do jogo político e distantes dosmecanismos de controle público.

No decorrer do tempo, sobretudo durante oslongos períodos de vigência de regimes autori-tários, verificou-se uma exacerbação dessa ten-dência, culminando na constituição de núcleossolidários de interesses envolvendo os setores pú-blico e privado, no interior de agências governa-mentais específicas. Tal prática consolidou-se,sobrevivendo às mudanças de regime político. Épreciso lembrar que a redemocratização do país,no período pós-45, não afetou de maneira substan-cial o centralismo da administração varguista,preservando-se, em grande parte, o arcabouçoinstitucional do governo deposto. Executivo forte,controle do processo decisório pela alta burocraciagovernamental, subordinação dos sindicatos aoMinistério do Trabalho, desenvolvimento de umaclasse empresarial fortemente dependente do apoiodo Estado persistiriam como elementos centraisdo novo regime. Na verdade, a experiência destafase conduziu à instauração de um sistema políticosemicompetitivo, caracterizado pela reduzida auto-nomia dos instrumentos de representação e pelamarginalização dos partidos e do Congresso doprocesso de formulação de políticas. Este perma-neceu sob controle das elites técnicas, enclausu-rado no interior da burocracia governamental,observando-se a consolidação da tendência anteriorà formação de arenas insuladas de negociação entreelites dos setores privado e estatal. O fortale-cimento dos Conselhos e Comissões econômicos,como o CDI (Conselho de DesenvolvimentoIndustrial), o CPA (Conselho de Política Adua-neira), a Comissão de Revisão de Tarifas doMinistério da Fazenda, o Conselho Consultivo deAcordos Comerciais com o Exterior do Itamarati(LEOPOLDI, 1992), a expansão de funções deórgãos, como a CACEX (Carteira de ComércioExterior, do Banco do Brasil) e a criação dos Gru-pos Executivos do governo Kubitschek represen-taram importantes momentos deste processo deampliação dos canais de acesso das elitesempresariais às instâncias decisórias.

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O golpe de 1964 reintroduziu o regime auto-ritário no país. Durante os 21 anos de ditaduramilitar, alguns dos aspectos centrais desse modeloforam acentuados, notadamente a centralização dopoder do Estado, o fortalecimento do Executivoparalelamente ao debilitamento da instânciaparlamentar-partidária, a representação dos interes-ses pela via do corporativismo estatal, além doreforço do padrão burocrático, insulado e frag-mentado de negociação entre as elites empresariaise estatais. Expandiu-se consideravelmente o nú-mero de Conselhos Técnicos com representaçãoempresarial. No Conselho Monetário Nacional(CMN), no Conselho Interministerial de Preços(CIP), no Conselho de Desenvolvimento Econô-mico (CDE), no Conselho de DesenvolvimentoIndustrial (CDI) e no Conselho de Desenvol-vimento Comercial (CDC), entre outros, o modelobipartite de negociação prevaleceria (BOSCHI,1979; DINIZ, 1994a).

Essa estreita associação entre corporativismoestatal, Estado intervencionista e debilidade daestrutura representativa foi acentuada pelo tipo depresidencialismo que se configurou historica-mente. No decorrer do tempo, sobretudo sob oimpacto das longas fases de autoritarismo, cons-truiu-se um sistema fortemente concentrador dasprerrogativas da autoridade presidencial, con-sagrando o desequilíbrio entre um Executivo sobre-dimensionado e um Legislativo crescentementeesvaziado em seus poderes. A falta de freiosinstitucionais e a ineficácia do sistema de chequesexacerbaram o arbítrio do Executivo, o que veio aconstituir-se em um dos principais componentesda instabilidade institucional do país. O isolamentoda esfera presidencial, seu fechamento ao escru-tínio público, a falta de espaço institucional para ainterferência das forças políticas e a inoperânciados mecanismos de controles mútuos gerariamdificuldades adicionais para a articulação entre ospoderes e a comunicação com a sociedade que sediferenciava com o avanço da modernização. Oregime de 1964 levou esse processo às últimasconseqüências, implantando um ultrapresidencia-lismo e reeditando a figura do Decreto-Lei,instrumento amplamente utilizado por Vargas,entre 1933 e 1945. Esse conjunto de fatores levariaà subversão do princípio da separação dos poderese reduziria o Congresso à condição de órgãolegitimador das decisões emanadas do Executivo(DINIZ, 1992).

Finalmente, a ditadura militar do período 1964-

1985 representou um momento decisivo na consti-tuição de dois outros traços fundamentais da po-lítica brasileira. Um deles, o estilo tecnocrático degestão da economia, fechado e excludente, refor-çaria a concepção acerca da supremacia da abor-dagem técnica, abrindo caminho para a ascensãodos economistas notáveis às instâncias decisóriasestratégicas para a definição dos rumos do capita-lismo industrial. O segundo, responsável pelaprimazia dos valores voluntaristas, forneceu ele-mentos para a consolidação de uma cultura políticadeslegitimadora da ação dos partidos e do Congres-so na promoção do desenvolvimento. Retomou-se a tendência, impulsionada pelo pensamentoautoritário hegemônico nos anos 30, a idealizar oExecutivo enquanto agente das transformaçõesnecessárias à modernização do país. Assim, a idéiade reforma e de mudança seria associada ao mode-lo de Executivo forte, sendo o Legislativo, aocontrário, percebido como força aliada ao atrasoe à defesa de interesses particularistas e tradi-cionais.

À luz dessas considerações, torna-se claro quea herança de Vargas na esfera institucional reveloualta capacidade de sobrevivência. Após o longoprocesso de transição que se desenrolou entre 1974e 1985, tendo em vista a meta da instauração dademocracia no país, o novo governo civil iniciouo desmonte da legislação, mecanismos e demaiscomponentes do arsenal autoritário do antigo re-gime. Entretanto, inúmeros aspectos do arcabouçoinstitucional varguista desafiariam as propostas demudança, inclusive durante os debates quemarcaram o processo da Constituinte. Entre ostraços de maior persistência, cabe mencionar aestrutura corporativa de intermediação de interes-ses, cujos elementos centrais, a unicidade sindicale a contribuição compulsória, foram preservados,embora tenham sido desativados os principaismecanismos de coerção sobre os sindicatos. Outroaspecto, que não só persistiu, mas foi acentuado,diz respeito ao modelo de presidencialismo forte,dotado de vastas prerrogativas e ampla margemde arbítrio. Cabe lembrar que o aguçamento dacrise durante toda a década de 80 forneceu osargumentos e as condições para o reforço daconcentração decisória no Executivo, reeditandoa tradicional assimetria entre a burocracia governa-mental e a arena parlamentar-partidária. Dada acentralidade assumida pelos planos de estabilizaçãoeconômica, o confinamento burocrático das deci-sões foi acentuado, prevalecendo o estilo

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tecnocrático de gestão da economia. Através daampla utilização dos Decretos-Leis, herança doregime autoritário, em um primeiro momento, edas Medidas Provisórias, após a elaboração daConstituição de 1988, o Executivo preservaria suaindependência de ação. Nesse quadro, os econo-mistas integrantes da rede transnacional de cone-xões manteriam sua posição de verdadeiros mento-res e gestores da política governamental.

II.1 A INOVAÇÃO INSTITUCIONAL REPRE-SENTADA PELAS CÂMARAS SETORIAIS

Essa longa linha de continuidade quanto aosmecanismos institucionais de articulação Estado-sociedade sofreu mudanças expressivas no de-correr da década de 90. Sob o impacto da criseem escala mundial dos anos 80 e da configuraçãode uma nova ordem internacional, observou-se oesgotamento da estratégia da industrialização porsubstituição de importações, paralelamente a umaforte pressão externa no sentido da redefinição daagenda pública. Temas como o recuo do Estado,a privatização, a abertura externa da economia, adesregulamentação, a reinserção no sistema inter-nacional, tornaram-se preponderantes. Como foiressaltado, ao lado dos programas de estabilização,as reformas orientadas para o mercado passarama dominar a agenda pública nos diferentes paíseslatino-americanos, embora a ordem de prioridadese o ritmo de execução tenham variado caso a caso.

No Brasil, o marco desse processo foi ogoverno do Presidente Fernando Collor de Mello,eleito após a crise de governabilidade experimen-tada pelo país a partir dos últimos dois anos dogoverno Sarney. É então que se observa uma claraidentificação com as diretrizes do chamado “Con-senso de Washington”. Nesse momento, verificou-se uma drástica redefinição de rumos, determinan-do o estreitamento e o enrijecimento da agendapública, com a centralidade atribuída aos progra-mas de estabilização e ao chamado ajuste estrutural.Como derivação da nova postura oficial, asreformas sociais perdem prioridade, sendo de fatodescartadas da agenda. Por outro lado, a reformado Estado ganhou destaque, sendo incorporadaao programa do governo, logo após a posse doPresidente.

Sob a égide das diretrizes neoliberais, o queprevaleceu, durante o governo Collor, foi umaconcepção minimalista de reforma do Estado. Àluz do enfoque reducionista dominante, os refor-madores privilegiaram as metas de corte de gastos

e redução do déficit público, o que se traduziunum esforço de enxugamento da máquina estatal.Cortes de pessoal e extinção de órgãos sem crité-rios implicaram de fato a mutilação do aparelhoburocrático, agravando os problemas de irracio-nalidade e ineficiência. Observou-se o predomíniode uma agenda negativa de desmantelamento dolegado do passado, em franco descompasso emrelação à complexidade das tarefas a serem desem-penhadas pelo Estado num mundo globalizado, emque competitividade e capacidade de inserçãoestratégica transformaram-se em chave para osucesso. Uma visão mais pertinente implicaria des-locar a ênfase para a redefinição do papel e areestruturação do aparelho estatal, restringindo emalguns setores e ampliando em outros a participa-ção do Estado, tendo em vista sobretudo a melhoriada qualidade da administração pública.

Um segundo aspecto da reforma empreendidanesse período foi a radicalização da centralizaçãodo poder na cúpula tecnocrática, com a criaçãodo Ministério da Economia, um superministério,que englobou três antigos ministérios e algumassecretarias da administração anterior. Na esteiradesse processo, verificou-se o fechamento degrande parte das arenas corporativas, que até ogoverno anterior ainda funcionavam no interiorda burocracia governamental. No âmbito da políticaindustrial, por exemplo, foram extintos o CDI ediversos outros órgãos anteriormente encarrega-dos da decisão e implementação dessa políticasetorial, além de inúmeros conselhos e comissõesvoltados para decisões específicas na área de fo-mento à produção industrial (DINIZ, 1997, p.146). De acordo com a primazia atribuída às metasde estabilização e ajuste, para muitos dos novosdecisores a política industrial seria, aliás, irrele-vante.

Foi dentro desse contexto de insulamentoburocrático e de predomínio do estilo tecnocráticode gestão, que foram criadas, no início dos anos90, as Câmaras Setoriais, arena de negociaçãovoltada para a articulação de acordos em torno depolíticas setoriais. Reunindo representantes empre-sariais e lideranças sindicais, ao lado de técnicos edecisores governamentais, as Câmaras Setoriaisinauguraram um padrão tripartite de negociação,consagrado internacionalmente pelo corporativis-mo europeu. Essa característica levou autores quese dedicaram ao estudo da mais expressiva dessascâmaras, a da indústria automotiva, a afirmaremque se tratava da introdução do neocorporativismo

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no Brasil. Em outros trabalhos, tive a oportunida-de de refutar amplamente esse tipo de interpreta-ção (DINIZ, 1994b, p. 296-303; 1997, p. 160-187) – razão pela qual farei apenas uma breve alu-são ao tema, abordando alguns pontos que meparecem essenciais.

Como foi salientado, a construção do capita-lismo industrial no país teve como pano de fundouma engenharia político-institucional que agregariaos interesses em categorias hierarquizadas e nãocompetitivas, observando-se a articulação diretaentre os setores público e privado pela via docorporativismo sem a mediação partidária. Insti-tucionalizou-se uma sistemática de negociação decaráter setorial e bipartite entre representantes doempresariado e integrantes dos altos escalõesburocráticos, dando origem, em alguns casos, àchamada privatização do Estado. A participaçãodos trabalhadores em arenas de negociação ficourestrita à presença dos sindicatos operários,representando os interesses de suas respectivascategorias, ao lado das elites empresariais e detécnicos governamentais na discussão de questõesmuito específicas na área trabalhista, sob a tutelado Ministério do Trabalho.

É nesse sentido que se pode apontar o impactoinovador das práticas inauguradas pelas CâmarasSetoriais, já que consagraram uma sistemática denegociação tripartite em que os trabalhadoresaparecem como interlocutores legítimos, determi-nando, portanto, a ruptura da relação diádica eexcludente da tradição corporativa no Brasil.Tratava-se, na verdade, do pleno aproveitamentodas virtualidades do modelo corporativo que, navariante que predominou entre as décadas de 30 e70, tornaram-se subutilizadas. Em primeiro lugar,o padrão de tutela e de ingerência do Estadoinviabilizou a resolução do conflito distributivo pelanegociação autônoma entre as partes interessadas.Em segundo lugar, a marginalização da represen-tação dos trabalhadores conteve a negociação típicadesse sistema dentro de parâmetros demasiadorestritos. Finalmente, o caráter tópico e localizadodos acordos obstaculizou a evolução na direçãode uma ampla parceria com o Estado, em virtudeda reduzida representatividade dos interessesenvolvidos, do peso dos nexos clientelistas e doalcance limitado das questões negociadas.

Ao legitimar o trabalhador sindicalizado comointerlocutor, o mecanismo em que se baseou ofuncionamento das Câmaras Setoriais permitiu

certamente alargar o âmbito das negociações, sem,entretanto, implicar a ruptura com a setorizaçãodos interesses, induzida pela configuraçãomonopolista do mercado, típica do sistemacorporativo brasileiro. Tal mecanismo não significaautomaticamente a garantia do prevalecimento daótica do interesse público e a subordinação dasnegociações a critérios de teor abrangente e alcanceglobal. Pode ter eficácia no sentido de eliminar osacertos diretos entre grandes empresários egoverno, abalando a prática do Estado atreladoaos interesses de clientelas privadas, mas nãoimpede por si só a sobrevivência do antigo padrãodo Estado a serviço de interesses corporativosorganizados, mudança que exigiria uma série deoutras condições.

É preciso lembrar que a estratégia empresarialde enfrentamento da crise que se abateu sobre aeconomia brasileira, durante os dois primeirosgovernos da Nova República, traduzindo-se noaumento da dívida externa e na aceleração doprocesso inflacionário, não se orientou no sentidode reverter a fragmentação e a setorização dosinteresses, características do corporativismobrasileiro. Ao contrário, a evolução recenteacentuou a diferenciação e a dispersão. Além dossindicatos e associações (como a ABDIB, aANFAVEA, a ABINEE etc.), criaram-se novasorganizações, justapostas às antigas, querepresentaram canais adicionais de participação,tornando ainda mais complexa a estrutura dual derepresentação historicamente consolidada (DINIZ& BOSCHI, 1993a, 1993b). Entre estas novasorganizações, cabe destacar o IEDI (Instituto deEstudos para o Desenvolvimento Industrial), oPNBE (Pensamento Nacional das BasesEmpresariais) e os Institutos Liberais, notadamenteos do Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e SãoPaulo. Os novos núcleos afirmaram-se pelaampliação dos canais de participação, para alémda estrutura corporativa oficial, preconizando umapostura de maior autonomia e independência porparte da representação empresarial. Finalmente, apartir da instauração da Nova República,generalizou-se a prática do lobby empresarial, queveio a consagrar-se como uma modalidade rotineirade pressão sobre os poderes públicos. Desde ostrabalhos do Congresso Constituinte, esse estilode atuação pela via do lobby passou a ocupar umespaço cada vez maior, não só em função daimportância assumida pela atividade parlamentar,como também em conseqüência do já aludido

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fechamento das arenas de representação corpora-tiva no interior da burocracia governamental.

O maior pluralismo dos órgãos de repre-sentação empresarial resultou, no entanto, no au-mento da diversidade e do conflito, sem a contra-partida da criação de uma entidade de cúpula decaráter abrangente e transsetorial, capaz de atenuaros efeitos combinados das clivagens setoriais,regionais ou relativas ao porte das empresas. Estefoi, aliás, um dos fatores responsáveis pela inviabili-dade dos pactos em torno dos programas de estabi-lização econômica ensaiados pelos dois primeirosgovernos da Nova República (DINIZ, 1997, p.94-104). A ausência de interlocutores reconheci-dos pelo conjunto das classes empresariais etrabalhadoras como seus porta-vozes legítimoscriaria expectativas negativas quanto à proba-bilidade de serem acatados os pactos eventual-mente articulados pelas lideranças. O conjunto detraços acima resumidos inviabilizariam, no casobrasileiro, o modelo do neocorporativismo, carac-terístico dos países da social-democracia européia,modelo que se revelou capaz de operar no planomacropolítico, em arenas multissetoriais, produ-zindo acordos de ampla envergadura e cobrindoum vasto espectro de políticas.

Por outro lado, embora não tenham alteradoradicalmente o alcance do corporativismo brasi-leiro, as Câmaras Setoriais, que tiveram umfuncionamento intermitente e transitório, entre1991 e 1995, constituíram um importante instru-mento de política industrial, representando de fatouma experiência de economic governance, nointerior de uma burocracia cada vez mais afeitaao estilo insulado e tecnocrático de gestão. O con-ceito, introduzido recentemente pela literatura inter-nacional, refere-se a uma nova forma de abordara questão da eficácia da ação estatal, com ênfasena sustentabilidade política das decisões. Nessesentido, governança significa a capacidade de ogoverno resolver aspectos da pauta de problemasdo país através da formulação e da implementaçãodas políticas pertinentes, ou seja, tomar e executardecisões, garantindo sua continuidade no tempo eseu efetivo acatamento pelos segmentos afetados(COHEN & ROGERS, 1995; HOLLINGS-WORTH, SCHMITTER & STREECK, 1994;CONAGHAN & MALLOY, 1994; LOCKE, 1995).Em outros termos, a noção de governança eco-nômica envolve não só a capacidade de o governotomar decisões com presteza, mas também, esobretudo, sua habilidade de criar coalizões de

apoio para suas políticas, gerando adesões e con-dições para práticas cooperativas, aumentandosubstancialmente a eficácia do processo de imple-mentação.

Essa experiência de criação de um espaço ins-titucional destinado a integrar processos de formu-lação de políticas e de articulação de interessesmostrou-se relativamente eficaz no caso dos acor-dos da indústria automotiva (março de 1992,fevereiro de 1993 e fevereiro de 1995), viabilizan-do um ajuste criativo em face da crise acirradapela abertura comercial (DINIZ, 1997, p. 169-170). Conjugando a redução dos preços e da cargafiscal sobre os automóveis com a consecução decertas metas básicas, como a retomada dos inves-timentos, a manutenção do nível do emprego e areestruturação produtiva do setor, as negociaçõespossibilitaram o reerguimento e a melhoria do de-sempenho do complexo automotivo como um to-do. Obteve-se a recuperação dos níveis de produ-ção com a preservação dos níveis de emprego entre1992 e 1995, detendo-se a queda abrupta verificadaentre 1990 e 1992. Ao invés de experimentar umaforte redução, como previam seus críticos, osacordos da indústria automotiva propiciaram umexpressivo aumento da arrecadação. Além disso,as câmaras constituíram um importante espaçopara o desencadeamento de uma discussão sobreformas de parceria entre capital, trabalho e gover-no, tendo em vista a implementação de políticassetoriais concertadas, rompendo com as práticashistoricamente enraizadas de negociações bipar-tites.

Os efeitos foram, porém, limitados, já que ascondições institucionais e políticas do momentonão foram favoráveis a esse tipo de experimento,que acabou por se configurar como um esforçolocalizado, com fraco poder de reprodução, des-pertando fortes resistências no interior da própriaequipe econômica do governo, bastante identifica-da com o estilo centralizado de gestão econômica(FRANCO, 1993a, 1993b). A postura das elitestecnocráticas, francamente contrária à aberturade espaços de negociação no interior do aparelhoestatal para a discussão da política econômica emgeral e, particularmente, de política industrial, seria,aliás, um dos fatores responsáveis pelo esvazia-mento das Câmaras Setoriais a partir de 1995.

III. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A análise do caso brasileiro, durante o recenteprocesso de reformas orientadas para o mercado,

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ainda que bastante preliminar, chama a atençãopara alguns pontos que merecem ser ressaltados.Considerando-se a dimensão político-institucional– notadamente a natureza do processo decisório,o padrão de gestão da economia, as característicasda agenda pública e da coalizão dominante, bemcomo as formas de articulação entre os setorespúblico e privado – é possível detectarmos, aolongo dos vários governos da Nova República,algumas similitudes, além de contrastes signi-ficativos.

Quanto aos pontos de convergência, obser-vou-se uma evolução no sentido dainstitucionalização do estilo tecnocrático de ges-tão, caracterizado pela expansão das prerrogati-vas legislativas do Execu-tivo, via Decretos-Leise Medidas Provisórias, pela concentração do pro-cesso decisório na alta tecno-cracia governamen-tal, representada sobretudo pela equipe econômicaque controla as decisões estra-tégicas, pelo altograu de insularidade burocrática, pelo esvaziamentodo poder governativo do Con-gresso e pelo pre-domínio de um estilo coercitivo de implementação(DINIZ, 1997, especialmente cap. 2 e 5). Entre-tanto, para além desse ponto co-mum, podemosencontrar diferenças marcantes.

Assim, no governo Sarney, a autonomia da altaburocracia coexistiu com o baixo grau de unidadeda elite estatal, não se configurando um consensono interior da equipe governamental em torno doesgotamento da antiga ordem e da necessidade deinstauração de um novo modelo. O enclausura-mento das decisões estratégicas na alta tecnocraciase fez acompanhar do alto grau de conflito intra-burocrático e da fragmentação do aparelho esta-tal. Esse traço refletiu-se na defasagem entre osprocessos de formulação e de implementação daspolíticas, este marcado por forte politização e pelalógica do conflito, aquele caracterizado pela con-centração e pela hiperatividade decisórias (DINIZ,1997, cap. 2). Ademais, deve-se destacar a hetero-geneidade da coalizão dominante, seu grau acen-tuado de dissenso interno e a complexidade daagenda pública, traduzida pela ênfase na adminis-tração dos problemas ligados à inflação e à dívidaexterna, ao lado das questões associadas à cons-trução da democracia e ao resgate da dívida soci-al. Final-mente, quanto à articulação Estado-soci-edade, persistiram, em larga medida, os mecanis-mos herdados da antiga ordem institucional, coma ativação das arenas corporativas de representa-ção de interesses no interior dos conselhos e co-

missões econômicos ligados ao aparelho estatal.Paralelamente, com o fortalecimento do Congres-so, difundiu-se a prática do lobby na medida emque o Legislativo viria a adquirir centralidade comoarena de administração dos conflitos.

O governo Collor representou, como vimos,um ponto de inflexão, com a redefinição da agendapública, centrada na estabilização econômica e nodesencadeamento das reformas estruturais. Oaumento da insularidade burocrática, associado auma fraca base de sustentação parlamentar e par-tidária, constituíram-se em fatores de fragilidadedo governo, contribuindo para inviabilizá-lo emfunção do isolamento político, que progressiva-mente se agravou. A descoberta de um esquemade corrupção de proporções inusitadas e a crisede credibilidade que se seguiu levaram ao impeach-ment do Presidente. O alto grau de discricionarie-dade da elite estatal traduziu-se pela autonomia daformulação de políticas que se fez acompanhardo estilo coercitivo de implementação. Como res-saltei em outro trabalho (DINIZ, 1997, p. 189), oPlano Collor constituiu um experimento paradigmá-tico de “reforma pelo alto”, norteado para o com-bate à inflação e para a destruição dos pilares domodelo estatista-desenvolvimentista. Radicalizou-se o padrão anterior de intervenção tecnocrática,privilegiando-se a mudança induzida pela viaadministrativa, descartando-se a via política, estapercebida como obstáculo à racionalidade dasdecisões tecnicamente concebidas. No que serefere à articulação entre os setores público eprivado, não se observou uma orientação uniforme.Por um lado, foram extintas as arenas corporativasque tradicionalmente eram utilizadas para ointercâmbio entre grupos privados e segmentosda elite estatal, como o CDI (Conselho deDesenvolvimento Industrial) e diversos outrosórgãos anteriormente encarregados da decisão eimplementação da política industrial, além deinúmeros conselhos e comissões voltados paraquestões específicas na área de fomento à produçãoindustrial. Por outro lado, foram criados espaçosnovos, como os GEPS (Grupos Executivos dePolítica Setorial) e, sobretudo, as Câmaras Seto-riais, a que nos referimos anteriormente. Esse tipode iniciativa teve por objetivo criar condições paramobilizar o apoio dos agentes privados em tornode políticas específicas ou diante de possíveisobstruções desencadeadas pelos conflitos inter-burocráticos.

Finalmente, com o primeiro governo Fernando

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Henrique Cardoso verificou-se a efetiva configu-ração de uma nova agenda pública, caracterizadapela prioridade atribuída à estabilização e às refor-mas liberais, lado a lado à desconstruçãoinstitucional, designada como desmonte da EraVargas, marcando a ruptura radical com o antigoparadigma e lançando as bases de um novo regimede incentivos e regulações. Progressivamente, oEstado aumenta sua independência em relação àsociedade, ao mesmo tempo em que se observa aperda de autonomia diante da ordem internacional.Ao lado do reforço do modelo tecnocrático degestão, observou-se uma alta coesão da equipegovernamental. Além disso, em contraste com ogoverno Collor, o Presidente Fernando Henriquecontou com a formação de uma numerosa baseparlamentar, mantendo o apoio de cerca de 80%do Congresso durante todo o seu primeiromandato. Tal apoio parlamentar, embora de difíciladministração, garantiu-lhe a aprovação dasmedidas integrantes de sua agenda, notadamenteas reformas constitucionais, que necessitavampassar pelo Congresso.

Em outros termos, tanto a alta tecnocraciainsulada na burocracia, como a ampla e heterogêneacoalizão parlamentar de sustentação do governo,foram cruciais para a implementação do programagovernamental. Este dependia fortemente daaprovação das reformas constitucionais paraalcançar seus objetivos. Para tanto, o Presidentedisporia não só de uma ampla base de apoio, comotambém de uma distribuição interna de poder quefavorecia os líderes dos partidos e as Presidênciasda Câmara e do Senado, cabendo ainda mencionaro recurso ao intercâmbio clientelista para adistribuição de cargos na administração pública,como forma de assegurar a coesão da basegovernista. A utilização intensa dos podereslegislativos da Presidência, via edições e reediçõesde Medidas Provisórias, usadas de maneirairrestrita, ao lado dos procedimentos referidos,caracterizou o estilo de gerenciamento político queviabilizou a implementação da agenda gover-namental. A inegável relevância das negociaçõeslevadas a efeito no Congresso desdobraram-sedentro de limites definidos previamente peloExecutivo numa divisão do trabalho, em que oLegislativo configurou-se ainda como a instânciapara a qual seriam canalizados os interesses dosgrupos de pressão e dos lobbies. Dentro dessalógica, o cerne do projeto governamental, repre-sentado pelo plano de estabilização e demais

políticas estratégicas, seria inegociável, cabendoao núcleo tecnocrático, ou seja, à equipeeconômica, administrá-lo de forma autônoma emface das forças internas, através do amplo recursoàs MPs. Por outro lado, no Congresso, nego-ciações e partilha de poder, distribuição de re-compensas e aplicações de sanções, ao lado dasfunções já assinaladas, criariam as condiçõesnecessárias para garantir a consecução das metasbásicas estipuladas pelo governo. Finalmente, noque se refere às relações entre os setores públicoe privado, foram eliminados os últimos canaisinstitucionalizados de negociação, ainda existentes,deslocando-se para a arena parlamentar aadministração dos conflitos e a expressão dasdemandas e interesses dos diferentes grupos.

Quanto ao impacto da política de reformasainda em curso sobre os grupos empresariais,alguns aspectos podem ser destacados. Emprimeiro lugar, os dados revelam que não é possíveldistinguir uma única linha evolutiva a partir dasmudanças determinadas pelo intenso processo dereestruturação industrial ao qual a indústriabrasileira foi submetida sob o impacto daglobalização e como conseqüência das políticasgovernamentais da última metade dos anos 90.Não se pode descortinar uma reação uniforme ouestratégias convergentes. O quadro resultante écomplexo e multifacetado. A heterogeneidade efragmentação da estrutura de representação dosinteresses empresariais, traços historicamenteconsolidados, persistem, manifestando-se pelacoexistência de diferentes segmentos, comcaracterísticas diversas e orientações tambémdiferenciadas – em alguns casos, contraditórias.

Essa segmentação não é atenuada pela existên-cia de instituições e organizações de alto teor deaglutinação, como ocorreu no caso do neocorpora-tivismo europeu, dotado de arenas transsetoriaisde negociação, que, ao longo do tempo, funcio-naram no sentido da agregação de interesses efavoreceram a formulação de plataformas de teorabrangente. Além disso, não se observou o surgi-mento de uma liderança empresarial alternativa,de projeção nacional, capaz de exercer o papel deporta-voz da classe como um todo, ou que tenhacondições de expressar um novo consenso emtorno de uma via alternativa de desenvolvimento.Baixa coesão e dificuldades para alcançar um graurazoável de unidade interna não permitem anteveruma evolução no sentido de modos de açãoconcertados ou estratégias coletivas de articulação

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de pactos de maior envergadura.

É verdade que, durante a última década, veri-ficou-se uma profunda desestruturação do apara-to produtivo que se desenvolveu com base na es-tratégia da industrialização substitutiva de impor-tações, com sinais de uma reestruturação em no-vas bases. Assim, o tripé nacional-desenvolvimentista legado pelo regime militar –formado pelas empresas nacionais, multinacionaise estatais, sob a égide de um Estado altamenteintervencionista – sofreu um primeiro abalo coma abertura promovida pelo governo Collor e foiefetivamente desarticulado sob o impacto daspolíticas implementadas pelo Presidente FernandoHenrique Cardoso. Um complicador adicionaldecorre do fato de que os grandes atores da erado capitalismo globalizado não são os empresáriosindustriais, senão que os bancos, fundos de pen-são, seguradoras e fundos especulativos, configu-rando-se a hegemonia do capital financeiro.

De maneira similar, lideranças expressivas,ligadas ao antigo modelo, perderam espaço, aba-ladas pelos efeitos de uma abertura descontroladae do acirramento da concorrência dos produtosestrangeiros. Além disso, entidades que haviamse destacado como segmentos de ponta do antigopadrão esvaziaram-se politicamente, como aABIMAQ e o SINDIPEÇAS, ou experimentarammudanças substanciais, adaptando-se aos novostempos, como é o caso da ABDIB, que alterouseus estatutos para incluir entre seus sóciosempresas estrangeiras. Outras experimentaram umprocesso de revitalização, modernizando-se eaperfeiçoando seus recursos técnicos, como é ocaso da CNI. Em contraste, lideranças alternativasdespontaram, representando uma nova geraçãoempresarial, que já não tem vínculos com a viadesenvolvimentista do passado e se encontraminseridas no circuito do capital internacional.Nesse contexto, ganharia crescentemente espaçouma visão internacionalista, em contraste com apostura nacionalista do passado. Entretanto, aausência de uma entidade ou de uma liderança compoder integrador torna difícil prever a direção dastransformações em curso.

Tais dificuldades, por outro lado, não devemobscurecer a percepção dos indícios de umaexpressiva mudança, cujos primeiros sinais vierama público após a crise externa de meados de 1997.Trata-se da constituição de um núcleo, que vemganhando força, envolvendo entidades de peso,como a FIESP e o IEDI, lideranças antigas e novas,

em torno de uma postura de crítica ao atual mode-lo. Em síntese, solicita-se a retomada do desen-volvimento e uma forma de inserção externa com-patível com a preservação e o fortalecimento doparque industrial local, bem como do patrimônioconstruído ao longo das várias fases da industria-lização do país.

O alvo é a formulação de uma nova estratégia,que preserve o espaço para uma política industrialconsistente. Nesse sentido, observa-se a confluên-cia em torno de uma visão que conflita com aperspectiva mais ortodoxa hoje dominante e queobjetiva conduzir as políticas de inserção nosistema internacional de forma independente, embenefício de um projeto de mais longo prazo,voltado para o desenvolvimento do país. Paraganhar força política, entretanto, esta posturanecessita transcender os estreitos limites do setorempresarial, alargando o leque de alianças.

Por outro lado, a incorporação de outrossegmentos, aí incluindo as lideranças sindicais,encontra um sério obstáculo que não pode sersubestimado, pois, em última análise, implicaromper o relativo isolamento do empresariadobrasileiro e sua histórica inflexibilidade diante dapauta de demandas dos trabalhadores. Como foiressaltado, a falta de tradição de pactos e negocia-ções, envolvendo a disposição para transigir eceder, em benefício de uma agenda comum, a faltade consciência da responsabilidade social da eliteindustrial diante do agravamento das condiçõessociais do país, constituem um traço do desenvol-vimento histórico da classe empresarial. Este é,sem dúvida, um dos principais desafios do momen-to presente, ao lado da lacuna representada pelaausência de espaços institucionais para a articulaçãoentre Estado e grupos organizados, conseqüênciada primazia do padrão tecnocrático de governo.

Finalmente, quanto aos órgãos de representa-ção de interesses, as lideranças empresariais, eminúmeros momentos, revelaram forte insatisfaçãocom as limitações da estrutura corporativa, apon-tando a setorização de demandas, o imediatismo,a oligarquização dos cargos de direção, a baixarepresentatividade e a rigidez dessa estrutura comoum anacronismo e um obstáculo para que a classeviesse a desenvolver condições de exercer um papelde liderança na definição de uma nova estratégiade desenvolvimento para o país. A falta de unidadee de coesão, a ausência de uma visão de longoprazo são outras dificuldades freqüentemente sa-

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lientadas (DINIZ & BOSCHI, 1993b). Entretan-to, não se observou por parte das elites empresa-riais a adoção de uma estratégia de mudança radi-cal desse modelo. De maneira similar, não se veri-ficou um investimento na criação de uma organi-zação de cúpula de caráter abrangente nos mol-des do neocorporativismo europeu. No decorrerdo tempo, a estrutura dual de representação deinteresses, historicamente consolidada, foi refor-ça-da, observando-se um padrão de mudança poracréscimo, sem eliminar as organizações tradicio-

nais. O que se tem hoje é um sistema híbrido emultipolar de representação de interesses, marca-do pela coexistência de antigas e novas organiza-ções, sistema que comporta uma grande diversi-dade de instrumentos de vocalização de deman-das e de formas de atuação. Esta multiplicidadenão elimina, porém, o vezo setorial e particularistado conjunto do sistema. Desta forma, este é maisum desafio que se coloca para a superação dosantigos entraves a uma efetiva modernização dasrelações capita-listas no Brasil.

Recebido para publicação em 3 de janeiro de 2000

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