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A CIDADE E O URBANO NO ENSINO DE GEOGRAFIA: considerações a partir
da abordagem conceitual nos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCNs
Poliana Santos Ferraz de Oliveira1 [email protected]
Dinamara De Carvalho Lopes2 [email protected]
Layonara Moreira de Sousa3 [email protected]
Resumo
Este artigo busca analisar as abordagens dos conceitos de cidade e urbano presentes nos
Parâmetros Curriculares Nacionais – PCNs de Geografia. Parte-se de uma análise
teórica dos conceitos destacados, seguindo-se com uma discussão acerca do ensino de
Geografia e seus propósitos gerais. A análise é focada nos PCNs, apresentando suas
especificidades quanto à Geografia, identificando aí a abordagem dos conceitos de
cidade e urbano apresentados nas orientações para a disciplina na educação básica. O
artigo se encontra em um estágio preliminar, inicialmente produzido a partir de pesquisa
bibliográfica e documental, destacando-se as obras de Cavalcanti (2005, 2008, 2012),
Lefebvre (2001, 2008), Sorbazo (2010) e Souza (2009), além dos dois volumes dos
PCNs analisados (BRASIL, 1997, 1998).Posteriormente, far-se-á uso da observação
direta da prática docente em sala de aula, com intuito de compreender o processo de
ensino aprendizagem dos conteúdos de cidade e espaço urbano. O estudo sobre a
abordagem dos conceitos cidade e urbano nos PCNs de Geografia evidencia o papel da
percepção como procedimento cognitivo principal para a compreensão dos processos
que se materializam nesses espaços, destacando-os enquanto paisagem e derivando daí
uma abordagem comumente descritiva (considerando as percepções de cada indivíduo),
onde preponderam os elementos que visualmente compõem uma representação da
cidade e do urbano frente aos processos que os produzem dialeticamente.
Palavras-chave: Ensino de Geografia. Cidade. Urbano
1 INTRODUÇÃO
1 Graduada em Licenciatura Plena em Geografia (UESPI); Professora da Rede Particular de Ensino.
Especialista em Geografia e Ensino pela Universidade Estadual do Piauí-UESPI. 2 Graduada em Licenciatura Plena em Geografia (UESPI); Professora da Rede Particular de Ensino.
Especialista em Geografia e Ensino pela Universidade Estadual do Piauí-UESPI. 3 Graduada em Licenciatura Plena em Geografia (UESPI); Especialista em Geografia e Ensino pela
Universidade Estadual do Piauí-UESPI.
2
O mundo, no último século, tem se configurado de modo cada vez mais urbano.
As cidades ganham novas dinâmicas e adquirem novos papeis e importância. Viver nas
cidades, sob um modo de vida urbano (e industrial) tornou-se parte do cotidiano da
maior parte da população que habita o planeta, tornando os estudos acerca do espaço
urbano de extrema importância. No âmbito do ensino de Geografia, a compreensão dos
conceitos de Cidade e Urbano ganha importância como elementos da construção de
reflexões por parte dos alunos acerca de seu próprio modo de vida, seu cotidiano.
Nesse âmbito, os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCNs merecem destaque
com o intuito de dar suporte à formação escolar no que se refere a propostas
curriculares. Diante do exposto, esta pesquisa foi desenvolvida questionando-se como
são abordados os conceitos de cidade e urbano nos Parâmetros Curriculares Nacionais –
PCNs de Geografia. O problema de pesquisa ganha relevo à medida em que tal
instrumento normativo direciona a composição curricular básica da disciplina no âmbito
dos ensinos fundamental e médio, tendo rebatimento direto, portanto, na formação
escolar.
Partindo de tal problema tivemos como objetivo geral analisar as abordagens dos
conceitos de cidade e urbano presentes nos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCNs
de Geografia. Para tanto, propusemos especificamente conhecer as principais
abordagens dos conceitos de cidade e urbano no âmbito da ciência geográfica; discutir o
ensino de Geografia e seus propósitos gerais; conhecer os PCNs e suas especificidades
quanto à Geografia; Identificar a abordagem dos conceitos de cidade e urbano nos
Parâmetros Curriculares Nacionais – PCNs para a disciplina Geografia na educação
básica.
No sentido de alcançar tais objetivos, foram desenvolvidas atividades de
pesquisa bibliográfica e documental, material revisado no intuito de se compreender
conceitos e temas fundamentais para a proposta de investigação (cidade, urbano, ensino
de Geografia).
2 A CIDADE E O URBANO: APROXIMAÇÕES TEÓRICAS
3
A cidade é uma construção humana, forma materializada a partir do conteúdo
urbano produzido por relações sociais específicas. Noutras palavras, pode-se dizer,
concordando com Lencioni (2008, p. 114) que a cidade é objeto e o urbano fenômeno.
Corrêa (2000, p. 9) apresenta esse espaço urbano como algo “fragmentado e articulado,
reflexo e condicionante social, um conjunto de símbolos e campo de lutas”.
Este, contudo, é um dos entendimentos a respeito da cidade e do urbano. Souza
(2009, p. 2) destaca que nos trabalhos de análise sobre estes conceitos “notam-se, na
atualidade, a utilização de diversas orientações teóricas e metodológicas”, tendo forte
influência as teorias vinculadas ao pensamento de Henri Lefebvre, sobretudo às suas
obras mais dedicadas diretamente à cidade e ao urbano, O Direito à Cidade e A
Revolução urbana (LEFEBVRE, 1999, 2001).
Com base nos referenciais lefebvreanos, Carlos (1994, p. 50) apresenta a cidade
como sendo, “antes de mais nada, trabalho objetivado, materializado, que aparece
através da relação entre o construído (casas, ruas, avenidas, estradas, edificações,
praças) e o não construído (o natural)”. Mark Gottdiener (2010, p. 127), apresentando a
perspectiva da produção do espaço de Lefebvre, expõe que o espaço
[...] é uma localização física, uma peça de bem imóvel, e ao mesmo tempo
uma liberdade existencial e uma expressão mental. O espaço é ao mesmo
tempo o local geográfico da ação e a possibilidade social de engajar-se na
ação. Isto é, num plano individual, por exemplo, ele não só representa o local
onde ocorrem os eventos (a função de receptáculo), mas também significa a
permissão social de engajar-se nestes eventos (a função da ordem social).
Neste sentido, à medida que o espaço aparece em Lefebvre como algo que
ultrapassa a condição de receptáculo, de palco onde as coisas acontecem, a compreensão
do espaço urbano a partir dessa orientação teórica seguirá esta perspectiva, aparecendo
não apenas como espaço de distribuição de materialidades específicas, mas como lócus
das possibilidades do encontro, das relações sociais, da transformação.
É nesse sentido que Sorbazo (2010, p. 58), amparado nas ideias de Lefebvre,
afirma que “O urbano corresponde à morfologia social, uma realidade social composta
de relações presentes e relações a serem concebidas construídas ou reconstruídas pelo
pensamento”.
4
Os dois conceitos – Cidade e Urbano – precisam estar articulados, requerem
uma compressão na qual sua condição de inseparabilidade seja a base para a análise de
processos e dinâmicas que produzem esse espaço, possibilitando entender a sociedade
urbana em suas múltiplas facetas e relações complexas. É nessa perspectiva que
Cavalcanti (2008, p.66) ressalta que “Não se pode fazer uma separação absoluta entre
espaço urbano e cidade, assim como, numa análise dialética, não se pode fazer uma
separação absoluta entre forma e conteúdo”.
Concordamos com Lencioni (2008, p. 110-111) quando a autora afirma que “a
construção de conceitos é um exercício do pensamento sobre o real”, sendo os conceitos
“uma forma de reflexo dos objetos”, possuindo conteúdos tanto objetivos quanto
subjetivos, havendo sempre uma “distância” entre o conceito e o real que ele tenta dar
conta de explicar.
Para Souza (2009, p. 6)
A Geografia trabalhada nas escolas na atualidade necessita promover avanços
em relação aos conteúdos ensinados, em relação às concepções em torno da
ciência geográfica e de seus conceitos, em relação às metodologias de ensino
da disciplina e em relação aos processos de aprendizagem e aquisição de
conhecimento por parte dos alunos. Essa necessidade de mudança é
recorrente em autores que tratam da Geografia e de seu ensino na educação
básica.
Estudar a cidade, enquanto espaço onde se expressam profundas contradições
sociais, lócus da sociabilização de maior parte da população do planeta e onde se
evidenciam a maioria dos problemas sociais e ambientais contemporâneos, se mostra
cada vez mais necessário no sentido de formar sujeitos ativos na transformação do
mundo e na construção de soluções futuras para tais problemáticas. Para tanto, como
sugere Souza (2009, p. 9) é preciso formar
Um aluno autônomo sujeito de sua aprendizagem e que seja capaz de
construir um pensamento espacial, tendo como referência a cidade e o
urbano, espacialidade referência para a maioria das práticas espaciais das
pessoas no mundo atual.
5
O Ensino de Geografia pode (e, acreditamos, deve!) ter papel ativo nesse
processo, apresentando o mundo como realidade historicamente produzida, em
constante transformação e, portanto, passível de transformação.
3 O ENSINO DE GEOGRAFIA E SEUS PROPÓSITOS
A complexidade das relações que reproduzem o mundo contemporâneo (tanto
entre homem e natureza quanto entre homens e homens) tem produzido um cenário de
difícil interpretação aos diversos campos disciplinares, demonstrando as dificuldades de
compreensão de um mundo articulado a partir de um saber fragmentado com base nos
preceitos do positivismo. Nesse contexto, a educação hoje requer novas formas de se
pensar práticas pedagógicas em sala de aula, que articulem fenômenos e processos,
aproximando ainda tais elementos das vivências dos sujeitos, experiências dos
estudantes. O Ensino de Geografia proporciona meios que permitem essa forma de
analisar o mundo e para isso a prática de aplicação/construção dos conceitos em sala
permite a construção de interpretações do mundo capazes de formar sujeitos ativos na
transformação da realidade. Como afirma Castrogiovanni (2007, p. 8):
Desencadear os processos de compreensão do mundo, considerando o espaço
produzido pelos homens ao longo de suas vidas é oportunizar aos alunos a
capacidade de se entenderem sujeitos da sua história. E isto será possível se
invertermos a equação dada pela escola Tradicional que é ‘o professor passa
o conhecimento, dando aula’, para a escola e a sala de aula como laboratório
para investigar, para aprender a perguntar e fazer perguntas significativas, no
sentido de que levem a compreender o mundo da vida e não apenas
identificar dados e fenômenos.
Os avanços metodológicos experimentados no campo da Geografia a partir da
década de 1970 reverberam lentamente sobre a Geografia escolar. Tais orientações
metodológicas passam a compor a produção de materiais didáticos e, mais tarde, são
impressas na composição curricular da disciplina, a partir da elaboração dos PCNs.
Cavalcanti (2012, p. 11) destaca que “[...] a geografia passa a ser uma ciência
que estuda o espaço na sua manifestação global e nas suas manifestações singulares”. É
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nessa abordagem multiescalar que a Geografia propõe compreender a sociedade e
pensar o espaço. Nessa perspectiva Cavalcanti enfatiza que
[...] a geografia [...] reafirma seu foco de análise, que é o espaço, mas, por
outro, torna-se mais consciente de que esta é uma dimensão da realidade, e
não a própria realidade, complexa e interdisciplinar por si mesma. O espaço
como objeto da análise é concebido não como aquele da experiência
empírica, não como um objeto em si mesmo, a ser descrito
pormenorizadamente, mas sim como uma abstração, uma construção teórica,
uma categoria de análise que permite apreender a dimensão da espacialidade
das/nas coisas do mundo (CAVALCANTI, 2012, p. 18).
Desta forma, torna-se possível a construção de uma abordagem que possibilite
uma reflexão por parte do aluno a partir de sua própria realidade, buscando
compreender a dinâmica social que gera as transformações no espaço geográfico.
Compreender as abordagens desses conceitos no ensino de Geografia e, mais
especificamente, nos PCNs se mostra de relevante importância, uma vez que os
currículos manifestos são produtos de uma construção que carrega consigo as
influências teóricas, metodológicas e políticas dos sujeitos e grupos que os elaboraram,
delimitando abordagens no campo de certas opções.
4 OS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS E O ENSINO DE
GEOGRAFIA
.
No sentido de implantar as orientações destes organismos internacionais, no ano
de 1995 o Ministério da Educação – MEC dá início à elaboração de um documento para
reunir informações capazes de auxiliar na elaboração de propostas curriculares com uma
referência nacional, pois em cada estado brasileiro existia uma “proposta curricular
oficial”. Conforme consta no próprio documento de Introdução aos Parâmetros
Curriculares Nacionais.
O processo de elaboração dos Parâmetros Curriculares Nacionais teve início
a partir do estudo de propostas curriculares de Estados e Municípios
brasileiros, da análise realizada pela Fundação Carlos Chagas sobre os
currículos oficiais e do contato com informações relativas a experiências de
outros países. Foram analisados subsídios oriundos do Plano Decenal de
Educação, de pesquisas nacionais e internacionais, dados estatísticos sobre
7
desempenho de alunos do ensino fundamental, bem como experiências de
sala difundidas em encontros, seminários e publicações (BRASIL, 1997,
p.17).
Os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCNs tornam-se, dessa maneira, uma
referência básica para a orientação dos professores na elaboração de suas abordagens e
metodologias, levando em conta a proposição de um currículo assentado na idéia do
desenvolvimento de competências básicas por parte dos educandos, do desenvolvimento
de um ensino contextualizado e da valorização de uma abordagem interdisciplinar.
Este documento foi dividido em duas partes, a primeira dedicada a uma
abordagem geral da própria proposta dos PCNs, trazendo uma introdução com o intuito
de justificar e fundamentar as opções realizadas em sua elaboração, e a segunda parte
voltada para propostas específicas de cada área de conhecimento, dando orientações
para a construção de um currículo nacional. Nos PCNs de Geografia são apresentadas
cada etapa de ensino com suas características específicas, divididas em quatro ciclos.
Na caracterização da área de Geografia presente nos PCNs é apresentado um
percurso de constituição desta ciência e de sua consolidação enquanto disciplina escolar,
evidenciando um destaque aos conceitos de paisagem, lugar território e espaço
geográfico. Albuquerque (2005, p. 70-71) afirma não ser possível identificar a
prevalência de uma corrente teórica da Geografia efetivamente utilizada na elaboração
do PCNs de Geografia.
Reúne-se assim os conteúdos em eixos temáticos, temas e itens, distribuídos em
quatro ciclos. O primeiro ciclo deve abordar principalmente questões relativas à
presença e ao papel da natureza e sua relação com a ação dos indivíduos e da sociedade
na construção espaço geográfico, focando no estudo da natureza em suas múltiplas
formas na paisagem local (BRASIL, 1997). No segundo ciclo devem ser abordados
principalmente as diferentes relações entre as cidades e o campo em suas dimensões
sociais, culturais e ambientais, tendo como objetivo central a construção por parte dos
alunos das categorias paisagem urbana e paisagem rural (BRASIL, 1997).
Para o terceiro ciclo são propostos eixos temáticos que abordam a Geografia
como uma possibilidade de leitura e compreensão do mundo. o estudo da natureza e sua
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importância para o homem, o campo e a cidade como formações socioespaciais, a
cartografia como instrumento na aproximação dos lugares e do mundo. Por sua vez, o
quarto ciclo deve ser composto por eixos voltados a compreensão da evolução das
tecnologias e das novas territorialidades em redes, da modernização e da problemática
ambiental (BRASIL, 1998).
5 A CIDADE E URBANO NO ENSINO DE GEOGRAFIA: CONSIDERAÇÕES A
PARTIR DOS PCNS
A cidade e o urbano aparecem nos PCNs de Geografia como foco para o ensino
no segundo e no quarto ciclo do ensino fundamental. Suas abordagens, concepções
conceituais e temas relacionados apresentam diferenças em cada ciclo, embora
carreguem pontos essenciais em comum.
As diferentes relações entre cidade e campo (em suas dimensões sociais,
culturais e ambientais), devem ser, conforme indicado nos PCNs, o propósito dos
estudos da Geografia no segundo ciclo do Ensino Fundamental. Para isso, sugere o
documento, deve-se considerar “o papel do trabalho, das tecnologias, da informação, da
comunicação e do transporte” (BRASIL, 1997, p. 93).
Nessa perspectiva, a abordagem da cidade e do urbano é pensada a partir da
categoria paisagem, evidenciando o papel da “paisagem local” enquanto elemento
fundamental para a observação dos alunos. É a partir de uma escala local que é
apresentada a possibilidade de se “perceber como as paisagens urbanas e rurais foram se
configurando e estão profundamente interligadas”, embora se afirme que “outras escalas
podem ser abordadas e analisadas”. A percepção aparece, assim, como o processo
cognitivo de destaque para o ensino de Geografia (BRASIL, 1997, p. 93).
Diante disso, ressalta-se que o urbano e o rural devem ser compreendidos “para
além de seus aspectos econômicos ou da descrição compartimentada dos fenômenos
sociais e naturais que os caracterizam”, requerendo uma abordagem que contemple
múltiplas dinâmicas estabelecidas entre as cidades e o campo, suas semelhanças e
diferenças, as formas de trabalho e a “produção e percepção do espaço e da paisagem”
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(BRASIL, 1997, p. 93). É nessa perspectiva que figuram entre os objetivos do ensino de
Geografia para o segundo ciclo do Ensino Fundamental
• reconhecer e comparar o papel da sociedade e da natureza na
construção de diferentes paisagens urbanas e rurais brasileiras;
• reconhecer semelhanças e diferenças entre os modos de vida das
cidades e do campo, relativas ao trabalho, às construções e moradias, aos
hábitos cotidianos, às expressões de lazer e de cultura;
• reconhecer, no lugar no qual se encontram inseridos, as relações
existentes entre o mundo urbano e o mundo rural, bem como as relações que
sua coletividade estabelece com coletividades de outros lugares e regiões,
focando tanto o presente e como o passado;
• conhecer e compreender algumas das conseqüências das
transformações da natureza causadas pelas ações humanas, presentes na
paisagem local e em paisagens urbanas e rurais;
• reconhecer o papel das tecnologias, da informação, da comunicação e
dos transportes na configuração de paisagens urbanas e rurais e na
estruturação da vida em sociedade; [...] (BRASIL, 1997, p. 95-96)
Esta abordagem feita nos PCNs torna-se, de certa maneira, restrita, uma vez que
não apresenta tais conceitos de uma forma ampla, enquanto frutos de um processo
histórico, restringindo-se a uma proposta que assegure ao aluno uma percepção do
próprio espaço que vive (apenas). Assim, os conceitos de cidade e urbano são
trabalhados na escola em determinados momentos de forma isolada, fazendo com que o
aluno compreenda a relação que ele mantém com seu dia a dia e seu lugar, ficando
restritas as articulações do lugar com o mundo.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os PCNs de Geografia são apresentados como uma proposta pedagógica que
visa a ampliação das capacidades dos alunos do ensino fundamental de observar,
conhecer, explicar, comparar e representar as características do lugar em que vivem e
diferentes paisagens e espaços geográficos. Diferentes conceitos aparecem para isso,
com maior ou menor importância, destacando-se os conceitos de paisagem e lugar,
embora sejam também apontados os de território e mesmo espaço geográfico.
Os estudos sobre o espaço urbano adquirem grande importância no
desenvolvimento da ciência geográfica no contexto da intensificação do processo de
10
urbanização a partir da segunda metade do século XX. No âmbito da Geografia, a
cidade e o urbano aparecem, de modo geral, vinculados a duas perspectivas: uma
relacionada a aspectos mais quantitativos e materiais, quase sempre apontando o
fenômeno urbano a partir dos números relacionados à população e cuja materialidade se
coloca como uma expressão direta dessa concentração populacional; outra mais
dedicada aos processos constitutivos do fenômeno, ligada aos estudos das relações
sociais que constituem o fenômeno urbano e produzem a cidade a partir das relações
sociais de produção (em grande parte vinculada às contribuições teóricas lefebvreanas).
Os PCNs, no que diz respeito aos conceitos de cidade e urbano, apresentam
diferentes abordagens conforme a etapa de ensino, divididas no documento em quatro
ciclos. Tais conceitos aparecem como elementos de destaque no segundo e terceiro
ciclos.
Embora em cada ciclo estes conceitos apareçam ligados a outros conteúdos
específicos de cada etapa de ensino, a abordagem dada a eles nos PCNs trazem
elementos que os evidenciam enquanto forma materializada. Nesse sentido, a cidade e o
urbano aparecem, antes de tudo, como espaços que se opõem ao campo e ao rural,
ficando em segundo plano sua natureza de produto social, historicamente produzido,
fruto de relações sociais demarcadas no âmbito de uma sociedade caracterizada por
conflitos e contradições.
Tal perspectiva se reforça quando a abordagem dada à cidade e ao urbano
destaca-os enquanto paisagens e ressalta o papel da percepção como procedimento
cognitivo principal para a compreensão dos processos que aí se materializam, derivando
daí uma abordagem descritiva (considerando as percepções de cada indivíduo).
Repensar a abordagem destes e de outros conceitos no âmbito do ensino de
Geografia aparece como necessidade premente. Identificar as abordagens e explicitar
que os currículos elaborados são frutos de opções teóricas, metodológicas e políticas se
coloca como passo importante na construção de estratégias de um ensino de Geografia
que vise a superação da descrição dos fenômenos. Tais propósitos e os resultados da
presente pesquisa se põem, dessa maneira, como elementos motivadores para o
prosseguimento com a investigação, alimentando pesquisas futuras.
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